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Sono GUIA SÍNDROME de APNEIA OBSTRUTIVA do FATORES DE RISCO cardiovasculares As complicações Diagnóstico e tratamento

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SonoGUIA

SÍNDROME de APNEIA OBSTRUTIVA

do

FATORES DE RISCO

cardiovascularesAs complicações

Diagnóstico e tratamento

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Coordenadora do ProjetoSónia Coutinho

[email protected]

Coordenadora EditorialSandra Silva

[email protected]

Produção & Design

Joana Lopes [email protected]

Inês [email protected]

Ana [email protected]

Redação e Publicidade Av. Infante D. Henrique, 333 H, 37

1800-282 Lisboa T. 218 504 065 Fax 210 435 935

www.newsengage.pt

Pré-press e impressão RPO

A reprodução total ou parcial de textos ou fotografias é possível, desde que

indicada a sua origem (News Engage) e com autorização da Direção.

Os artigos de opinião são da inteira responsabilidade dos seus autores.

Publicação isenta de registo na ERC, ao abrigo do Decreto Regula-

mentar 8/99, de 9/06, artigo 12º, número 1A.

Edição

Guia do Síndrome da Apneia do Sono é uma edição especial da News

Engage, dirigida a profissionais de saúde e público geral.

APOIO APOIO CIENTÍFICO

SonoGUIA

SÍNDROME da APNEIA OBSTRUTIVA

do 03

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09 16

18

07 14

12DR. JOAQUIM MIOTA

DR.ª INÊS SANCHES

DR.ª DYNA TORRADO

DR. JOAQUIM MOITA DR.ª ADÉLIA RAMAZANOVA

D.R.ª NÚRIA MADUREIRA

DR.ª MAFALDA VAN ZELLER DR.ª PAULA PINTO

DR.ª PAULA PINTO

FALAR DE SÍNDROME DE APNEIA OBSTRUTIVA

DO SONO (SAOS)

QUANDO SUSPEITAR DE SAOS?

O PAPEL DO MÉDICODE FAMÍLIA

OS DISPOSITIVOS DE PRESSÃO POSITIVA CONTÍNUA

(CPAP)

EXISTE TRATAMENTOALTERNATIVO?

RESSONAR NÃOÉ NORMAL

ATENÇÃO À OBESIDADE

SONOE CONDUÇÃO

O CORAÇÃO E A SÍNDROME DE APNEIA OBSTRUTIVA

DO SONO

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EDITORIAL

FALAR DE SÍNDROME DE APNEIA OBSTRUTIVA DO SONO (SAOS)O ar que respiramos entra pelo nariz (ou pela boca), passa à fa-ringe, laringe, brônquios e atin-ge finalmente o pulmão, onde se dá a oxigenação do sangue.A faringe é um tubo flexível. Esta flexibilidade permite no homem a fala. A criança quando nasce não tem faringe incipien-te. Pode parecer que grita pela mãe (ou pelo pai), mas não. Só no final do primeiro ano come-ça a surgir a linguagem.Portanto, quando falamos de apneia do sono, falamos, antes de mais, da necessidade de falar. Mas o que distingue o homem, trouxe desvantagens também. A faringe tende a colapsar du-rante o sono. Isso só não acon-tece em condições normais porque os músculos que a en-volvem, atuando como molas, a mantêm aberta. O SAOS surge quando estes músculos, (cha-mados dilatadores da faringe) perdem a tonicidade, ou seja, agem como molas pasmadas, e deixam encerrar a faringe. O colapso não é imediato. À medida que vai ocorrendo, au-menta a resistência à passagem do ar e a vibração das paredes da faringe. A esta vibração cha-mamos ressonar.O colapso provoca uma pausa respiratória (ou apneia). Quan-do as pausas têm uma duração superior a 10 segundos e ocor-rem mais do que cinco vezes por hora e provocam diminuição

DR. JOAQUIM MOITAPNEUMOLOGISTA DO SERVIÇO

DE PNEUMOLOGIA B E COORDENADOR DO CENTRO

DE MEDICINA DO SONO DO CENTRO HOSPITALAR E UNIVERSITÁRIO

DE COIMBRA.PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DO SONO (APS)

do oxigénio (O2) do dióxido de carbono (C02) no sangue, esta-mos com SAOS.Cada apneia só termina com um microdespertar, que na maioria das vezes é tão curto que o doente não tem consciên-cia dele, mas que é suficiente para interromper a continuida-de do sono. O sono passa a ser fragmentado e não são alcan-çadas as fases profundas que permitem a recuperação física e psíquica. No dia seguinte, o doente tem sonolência diurna excessiva, falta de memória, ra-ciocínio lento, irritabilidade.A SAOS é frequente. Depois dos cinquenta anos, um em cada cinco homens e uma em cada nove mulheres têm a doença.Nas páginas seguintes falamos dos fatores de risco, das mani-festações e das complicações da doença.Veremos que é uma das prin-cipais causas de doenças car-díacas, cerebrais e da diabetes. Quando não tratada, a SAOS mata mais que o tabaco.A sonolência diurna é uma das principais causas de acidentes de viação e de mau desempe-nho profissional.A incapacidade, em paralelo com o ressonar, a disfunção erétil, e a doença cardio e cé-rebro vasculares fomentam a desintegração social e familiar. A depressão e a insónia são co-muns nos doentes com SAOS.

A notoriedade que a doença tem entre a população aumen-tou nos últimos anos. Todos conhecemos alguém que sofre da doença. É necessário, con-tudo, aumentar a pressão para que as autoridades de saúde aumentem os recursos neces-sários (humanos e técnicos) para diagnosticar e tratar a doença em tempo útil. A SAOS é tratável!

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SINTOMAS E DIAGNÓSTICO

QUANDO SUSPEITAR DE SAOS?

DR.ª INÊS SANCHESPNEUMOLOGISTA.

SERVIÇO DE PNEUMOLOGIA, CENTRO HOSPITALAR DE VILA NOVA DE

GAIA/ ESPINHO

A Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono (SAOS) é um distúrbio respiratório do sono, de insta-lação progressiva ao longo de vários anos, e que se manifesta maioritariamente durante a noi-te, sem que o doente se aperceba. Desta forma, o doente com SAOS tende a subvalorizar os sintomas e poderão decorrer vários anos desde o início dos mesmos e a procura de ajuda médica para o seu diagnóstico.A SAOS caracteriza-se pela ocor-rência de forma repetida ao longo da noite da oclusão da via aérea superior durante o sono, o que vai condicionar uma descida da oxigenação do sangue e a inter-rupção do padrão de sono. Estas alterações, que ocorrem durante noite e que vão condicionar o aparecimento de sintomas notur-nos, vão acabar por se repercutir no estado geral do doente duran-te o dia, acabando também por surgirem sintomas diurnos atri-buíveis à SAOS.Os sintomas noturnos mais fre-quentes, que geralmente são re-portados pelo companheiro/a, são:• Ressonar - é o sintoma mais

frequente, cuja intensidade depende de pessoa para pes-soa e é influenciada pelo con-sumo de bebidas alcoólicas, utilização de medicação para dormir, excesso de peso e po-sição de dormir de costas. No entanto, a maioria das pessoas com roncopatia não tem SAOS,

pelo que este sintoma isola-damente não deve levantar a suspeita de SAOS;

• Paragens respiratórias - sur-gem em número e duração va-riável ao longo da noite. Geral-mente são descritas por outra pessoa e, quando são sentidas pelo doente, são descritas como uma sensação de sufoco noturno/falta de ar ou desper-tares noturnos;

• Sono agitado - caracterizado por movimentos corporais generalizados frequentes ou localizados aos membros infe-riores, que poderão culminar em episódios de microdesper-tares ou acordares noturnos;

• Insónia - relaciona-se com os despertares noturnos provo-cados pelas paragens respira-tórias, sendo frequente a insó-nia no meio do sono;

• Nictúria, poliúria e enurese - apesar de muitas vezes atri-buído a problemas de prósta-ta, deve-se à secreção de subs-tâncias que ocorre durante os eventos de apneia do sono. É também um dos motivos de causar despertares noturnos.

Os sintomas diurnos geralmente já são descritos pelo doente e os mais frequentes são:• Hipersonolência diurna - re-

sulta da fragmentação do sono e da destruturação das várias fases do sono que ocorre pela existência dos episódios de apneia. Inicialmente surge

O DOENTE COM SAOS TENDE A

SUBVALORIZAR OS SINTOMAS E PODERÃO

DECORRER VÁRIOS ANOS DESDE O INÍCIO

DOS MESMOS E A PROCURA DE AJUDA MÉDICA PARA O SEU

DIAGNÓSTICO

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SINTOMAS E DIAGNÓSTICO

em situações de inatividade (ex: a ler, a ver televisão), mas que pode surgir também em situações de atividade que re-querem um estado de atenção (ex: a conduzir, a trabalhar, a conversar, a comer);

• Sensação de sono não repa-rador- descrito como “acordo mais cansado do que quando me deitei”;

• Dor de cabeça matinal;• Fadiga / cansaço;• Défices cognitivos, como di-

ficuldade de concentração e diminuição da memória;

• Alteração do humor e da personalidade, incluindo a depressão e ansiedade;

• Disfunção sexual, como di-minuição da líbido e impotên-cia sexual.

Nenhum sintoma isolado é su-ficiente para diagnosticar uma SAOS, dado que podem ocorrer também em indivíduos saudáveis ou até mesmo estarem ausentes em doentes com SAOS. A par da existência de sintomas, devem ser também valorizadas outras variáveis como a exis-tência de fatores de risco para a SAOS e a existência de comorbi-lidades associadas, aumentan-

do, assim, a suspeição de SAOS e contribuindo para o correto encaminhamento dos doentes para a realização de exames de diagnóstico.

COMO DIAGNOSTICAR A SAOS?

O diagnóstico da SAOS é feito através de um exame chamado polissonografia. A polissonogra-fia é um exame que é realizado num laboratório do sono, moni-torizado por técnicos, e que con-

siste na colocação de diversos sensores que permitem avaliar o que acontece durante o sono.Para realizar a polissonografia são colocados vários sensores:- elétrodos na cabeça que regis-tam a atividade elétrica do cére-bro. Com a leitura e análise desse registo sabe-se se o doente dor-miu ou não, qual a qualidade do seu sono, assim como o número de vezes que acordou (nomeada-mente os acordares de forma não consciente) e as diferentes fases do sono por que passou;

O DIAGNÓSTICO DA SAOS É FEITO

ATRAVÉS DE UM EXAME CHAMADO

DE POLISSONOGRAFIA

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SINTOMAS E DIAGNÓSTICO

- elétrodos para ver o ritmo cardíaco e avaliar a existência de possíveis arritmias;- elétrodos situados ao lado dos olhos para ver os movimentos oculares;- elétrodo no queixo para ver o tónus da musculatura;- elétrodo nas pernas para de-tetor possíveis movimentos das pernas e assim saber se tem um sono tranquilo ou se, ao contrá-rio, tem um sono agitado, com necessidade de mover as per-nas durante o sono;- um pequeno microfone que se coloca no pescoço para registar o ressonar;- um sensor de posição cor-poral que permite ver em que posição dorme. Isto é muito importante porque há pessoas que só têm paragens respirató-rias quando dormem de costas;- um sensor no dedo que tem um sinal luminoso que permite avaliar a saturação do oxigénio no sangue, sem ser necessário colher sangue para análise.Para avaliar como o doente res-pira, são colocados:- sensores nos orifícios do nariz para ver como entra e sai o ar que respira;- uma banda elástica colocada à volta do tórax e outra no abdó-men, para ver os movimentos respiratórios e avaliar o esfor-ço respiratório que é realizado quando ocorre diminuição do calibre da via aérea e surgem

as paragens respiratórias.O aparelho utiliza muitos cabos e sensores, mas é um exame có-modo, indolor e através do qual não passa corrente elétrica. Apenas captam um certo tipo de corrente que as pessoas emi-tem. Os sensores são fixados de maneira a que o doente se possa movimentar durante o exame.Depois de analisar todos os pa-râmetros registados durante a noite, vamos obter informação sobre a qualidade do sono (o tempo que dormiu, as diferen-tes fases do sono e o número de ciclos de sono, o número de des-pertares e microdespertares), o tipo e número de eventos res-piratórios (apneias, hipopneias e esforços respiratórios asso-ciados a microdespertares), a descida de oxigénio que ocorreu durante a noite, os movimentos involuntários dos membros in-feriores e a existência de outras perturbações do sono. No final do exame são quanti-ficadas as paragens respirató-rias (apneias) ou diminuição da amplitude da respiração (hipopneias) e é contabilizado o número de eventos por hora de sono através do índice de apneia hipopneia (IAH). De acordo com o IAH pode classifi-car-se a gravidade da SAOS em:• IAH entre 15 e 30 eventos/

hora- SAOS moderada• IAH superior a 30 eventos/hora

– SAOS grave

Este índice também é importante para orientar o tipo de tratamen-to a realizar.Atualmente este exame pode ser realizado em casa do doente, através de um equipamento por-tátil que vai gravar a informação recolhida por todos os sensores, sendo analisado posteriormente no laboratório do sono. Existe um outro tipo de exame, chamado estudo cardiorrespira-tório do sono, que é um exame menos complexo e com menos sensores que a polissonografia. Tem a vantagem de ser mais sim-ples, poder ser realizado no do-micílio e poder ser o doente a co-locá-lo na hora de ir dormir. São exames úteis no diagnóstico da patologia respiratória grave, no entanto podem conduzir a erros de diagnóstico.

ATUALMENTE ESTE EXAME PODE SER

REALIZADO EM CASA DO DOENTE, ATRAVÉS DE UM EQUIPAMENTO

PORTÁTIL QUE VAI GRAVAR A INFORMAÇÃO

RECOLHIDA POR TODOS OS SENSORES,

SENDO ANALISADO POSTERIORMENTE NO

LABORATÓRIO DO SONO

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FATORES DE RISCO

ATENÇÃO À OBESIDADE

A Síndrome de Apneia Obs-trutiva do Sono (SAOS) é um distúrbio respiratório com ele-vada prevalência. Os fatores de risco da SAOS são vários, sendo a obesidade o principal fator de risco e com maior impacto nes-ta patologia.

OBESIDADE A obesidade é definida por um índice de massa corporal (IMC) maior que 30 kg/m2, é um pro-blema de saúde pública, e é o principal fator de risco para a SAOS. Aproximadamente 70 por cento dos indivíduos com SAOS são obesos, e a prevalência da SAOS nos obesos é muito superior à descrita para a população geral. Dos indivíduos com IMC maior que 30 kg/m2, 26 por cento apresentam um índice de ap-neia-hipopneia (IAH) superior a 15 eventos/hora e 60 por cento têm um IAH superior a 5 even-tos/hora. Na obesidade mór-bida (IMC igual ou superior 40 kg/m2), a incidência da SAOS é 12 a 30 vezes superior à inci-dência na população em geral. Salienta-se que o aumento de 6 kg/m2 no IMC condiciona um risco 4 vezes maior de SAOS. Um dos possíveis mecanismos pelos quais a obesidade pode aumentar a resistência das vias aéreas superiores inclui a anatomia da área que rodeia a região e a diminuição da ativi-

DR.ª MAFALDA VAN ZELLER SERVIÇO DE PNEUMOLOGIA, CEN-

TRO HOSPITALAR DE SÃO JOÃO FACULDADE DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE DO PORTO

dade do diafragma como resul-tado da acumulação de gordura na parede abdominal. O aumento do diâmetro do pes-coço, com aumento da deposi-ção de tecido adiposo nas pa-redes do segmento colapsável da faringe, diminuição do tônus basal, o aumento da úvula e da deposição de tecido adiposo na base da língua condicionam uma carga extra para os mús-culos dilatadores da faringe. O aumento do perímetro cervical está associado a maior proba-bilidade de ter apneia do sono. A distribuição da gordura cor-poral também afeta a gravidade do quadro clínico da SAOS. A obesidade de tipo central ou an-dróide está relacionada não só com a síndrome metabólica e a aterosclerose, mas também está implicada nos mecanismos que associam a obesidade à SAOS. A obesidade visceral condicio-na maior produção de leptina pelos adipócitos, podendo re-fletir resistência a esta hormo-na e contribuir para a elevada prevalência de anomalias res-piratórias e metabólicas, in-cluindo a SAOS. Esta hormona atua não só nos mecanismos de controlo de peso e saciedade, mas também no centro respi-ratório. Se, por um lado, a obesidade aumenta o risco da SAOS, esta também predispõe à sobrecar-ga ponderal. Parece, portanto,

existir uma relação bidirecional entre a SAOS e a obesidade que gera um ciclo vicioso, em que ambas potenciam mutuamente a sua evolução e gravidade. Os complexos mecanismos adja-centes a este ciclo vicioso, em que a gordura visceral parece desempenhar um papel funda-mental, são responsáveis por diversas comorbilidades. A perda de peso é fundamental no tratamento de doentes obe-

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sos com SAOS. Está associada a melhoria significativa de SAOS, uma redução de 10 por cento do IMC pode reduzir para metade o IAH e, inclusive, estudos revela-ram que a normalização do peso pode levar à resolução SAOS em 60 por cento dos indivíduos.

GÉNERO Os homens apresentam 2-3 ve-zes maior risco de vir a desen-volver SAOS. A diferença de prevalência entre sexos pode resultar de diferenças anatómicas. Os ho-mens apresentam, em média, um maior calibre da via aérea superior, tornando-a mais vul-

nerável ao colapso. As diferenças hormonais entre sexos também parecem estar implicadas nesta diferença. A observação do aumento da incidência de SAOS em mulhe-res após a menopausa pode ser explicada pela perda da prote-ção hormonal.

IDADE A prevalência da SAOS aumen-ta com a idade. Com o envelhe-cimento há perda muscular ao nível dos músculos das vias aé-reas superiores, uma maior as-sociação com excesso de peso e outras comorbilidades, aumen-tando o risco.

FATORES ÉTNICOS Alguns estudos demonstraram que os afro-americanos e os hispânicos têm uma maior in-cidência de SAOS; afro-ameri-canos com SAOS são, em média, mais novos do que os caucasia-nos com o mesmo grau de gra-vidade de apneia do sono.

ALTERAÇÕES CRANIOFACIAIS Situações que provoquem alte-rações na arquitetura cranio-facial podem causar redução no diâmetro das vias aéreas, tal como acontece em doenças como Síndrome de Down ou Marfan.

HÁBITOS E ESTILO DE VIDA O álcool, assim como os seda-tivos, atuam sobre o sistema nervoso central, agravando o quadro clínico da SAOS. Mesmo pequenas quantidades de álcool afetam tanto o número de ap-neias, como a duração da cada apneia. Existem também alguns estudos que demonstram al-guma associação do tabagismo com a apneia do sono. Fumar aumenta a inflamação local e a retenção de fluidos nas vias aé-reas superiores. Este risco dimi-nui com a cessação tabágica. Os fatores de risco potencial-mente modificáveis revestem--se de particular importância na SAOS sendo a obesidade o prin-cipal e com maior impacto. De referir, ainda, a importância da evicção de sedativos, bebidas al-coólicas e da cessação tabágica.

FATORES DE RISCO

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TRATAMENTO

OS DISPOSITIVOS DE PRESSÃO POSITIVA CONTÍNUA (CPAP)

O CPAP, concebido por Sullivan em 1981, é o tratamento de eleição das formas moderadas e graves do SAOS. Constituiu um dos maiores avanços da medicina do fim de século pas-sado, ao permitir salvar milhões de vidas de doentesO CPAP é um gerador de pres-são. Atua, criando uma câma-ra-de-ar na faringe que impe-de o seu colapso.Com o CPAP aferido para uma pressão efetiva, as apneias e o ressonar desaparecem, o esfor-ço respiratório diminui, o oxigé-nio normaliza, as flutuações na pressão arterial diminuem. Os microdespertares que acom-panham as apneias desapare-cem e a fragmentação do sono é corrigida. Há um aumento imediato de sono profundo. O tempo e a arquitetura normal de sono são recuperados.A sonolência diurna excessiva que está relacionada com a frag-mentação do sono regride. O ra-ciocínio e a memória melhoram. O mesmo com a depressão e a ansiedade que frequentemente acompanham a doença. O CPAP contribui decisivamente para a recuperação da disfunção erétil que a maioria dos homens com a doença apresenta.A hipertensão arterial durante o dia tende a estabilizar ou mes-mo a diminuir.

JOAQUIM MOITAPNEUMOLOGISTA DO SERVIÇO DE

PNEUMOLOGIA B E COORDENADOR DO CENTRO

DE MEDICINA DO SONO DO CENTRO HOSPITALAR E UNIVERSITÁRIO

DE COIMBRA.PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DO SONO (APS)

Finalmente, uma palavra para as máscaras. Todos os dias sur-gem novos modelos adaptáveis a cada doente no sentido de evi-tarem fugas de ar e proporcio-narem o máximo conforto.Com todas estas caraterísticas, não há razão para não aderir ao tratamento, que, aliás, é obrigató-rio para a renovação da carta de condução e para o desempenho profissional de atividades que re-querem grande concentração.

O CPAP é proposto a indivíduos com mais de trinta apneias por hora, ou aqueles que tendo um SAOS com um número menor de apneias têm sintomas graves de doença cardíaca ou sonolên-cia diurna.Os atuais dispositivos têm di-mensões e peso reduzidos. São facilmente transportáveis. Tra-balham a 12 volts e têm trans-formadores de corrente.Há vários modelos: “CPAP”, “Au-toCPAP”, "BiPAP”. A escolha é feita pelo médico em função do tipo de doente e também das ca-racterísticas de cada doente.A adaptação é fácil. Contudo, o ensino é fundamental. Ideal-mente o aparelho deve ser usa-do toda a noite e sempre que o doente está a dormir.O CPAP é gratuito para os uten-tes do SNS, que tem contrato com várias empresas que o disponibilizam e são obrigados a um caderno de encargos que implica a assistência imedia-ta em caso de avaria, a revisão periódica e o fornecimento dos dados de utilização aos médicos hospitalar e de família.É muito importante que as dúvi-das e os problemas que surgem no início do tratamento sejam resolvidos com eficácia e rapi-dez. Os melhores doentes são os que se adaptam bem nas pri-meiras semanas.

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O PAPEL DO MÉDICO DE FAMÍLIA

PORQUE É IMPORTANTE?Sendo a apneia do sono uma doença com uma prevalência muito elevada e ainda muito subdiagnosticada por ser uma doença relativamente “nova”, o seu seguimento nos Cuidados de Saúde Primários corresponde à evolução natural de uma doença crónica que, graças à evolução tecnológica e à cada vez maior capacitação dos médicos de fa-mília, tem conseguido dar o salto desde os cuidados hospitalares para os cuidados primários.O aumento do volume de doen-tes referenciados às Unidades de Sono nos últimos anos fez com que as listas de espera aumentassem extraordinaria-mente, não só em Portugal, mas também na maior parte dos países desenvolvidos. Esta situação, junto da simplificação dos protocolos terapêuticos, propiciou a decisão de dar alta dos hospitais aos doentes esta-bilizados e manter o seguimen-to com o médico de família, como qualquer outra doença crónica controlada.Poderia comparar-se ao caso da diabetes há uns anos, quando os médicos de família não estavam familiarizados com a insulinote-rapia mas tiveram de aprender a prescrever insulina, pois tor-nou-se insustentável o acom-panhamento pelas unidades de diabetes de todos os diabéticos insulinizados.

DR.ª DYNA TORRADOMÉDICA DE FAMÍLIA

NA UCSP MAR, TAVIRACOORDENADORA DO GRUPO DE TRABALHO DE APNEIA DO SONO DO GRESP (GRUPO DE DOENÇAS RESPIRATÓRIAS DA ASSOCIAÇÃO

PORTUGUESA DE MEDICINA GERAL E FAMILIAR)

Os novos desafios que são lança-dos à medicina nos dias de hoje obrigam os médicos à atualiza-ção constante na área científica e tecnológica. Os médicos de fa-mília têm a responsabilidade de saber referenciar e acompanhar esta patologia como fazem com outras, até bem mais complica-das, embora no futuro a curto/médio prazo façam o diagnóstico da apneia do sono desde os cen-tros de saúde com dispositivos simplificados e protocolos arti-culados com os hospitais.

QUAIS AS VENTAGENS DO ACOMPANHAMENTO PELO MÉDICO DE FAMÍLIA PARA OS DOENTES COM APNEIA DE SONO?Sem dúvida que a acessibilidade do doente ao seu médico e ao seu enfermeiro de família facilita o contacto com uma equipa que conhece não só o historial médi-co do doente, mas também o seu status bio-psico-socioeconómico e familiar.A proximidade e a confiança do doente no seu médico de famí-lia favorecem a expressão de dúvidas e receios em relação à doença e o seu tratamento que, possivelmente, não iria expor a outros especialistas.Da mesma forma, o médico de fa-mília sabe como melhor acalmar as inquietações do seu doente e motivá-lo, em virtude da perso-nalidade e literacia de cada doen-

A PROXIMIDADE E A CONFIANÇA DO DOENTE NO SEU MÉDICO DE

FAMÍLIA FAVORECEM A EXPRESSÃO DE

DÚVIDAS E RECEIOS EM RELAÇÃO À

DOENÇA E O SEU TRATAMENTO

SEGUIMENTO DO DOENTE

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SEGUIMENTO DO DOENTE

te, a seguir os cuidados e o melhor estilo de vida necessários para o controlo da apneia do sono.Mas certamente o médico de fa-mília constitui uma peça funda-mental na adesão e seguimento do doente sob tratamento com CPAP. Infelizmente, muitos doen-tes desconhecem-no e apenas se limitam a procurar no centro de saúde as receitas da ventilote-rapia; o médico de família pode resolver os efeitos adversos mais frequentes derivados do uso da CPAP, como a congestão nasal, a secura de boca ou a irritação da pele ou dos olhos. Pode tam-bém apoiar a correta utilização do equipamento, instruir sobre uma adequada higiene do sono

e aconselhar sobre a evicção de substâncias e medicamentos que possam agravar as apneias noturnas.O médico de família está capaci-tado para verificar se o doente está a fazer um uso correto da CPAP e se o tratamento está a ser eficaz, assim como detetar os sintomas ou situações que requerem de nova avaliação pelo especialista do sono.Portugal pode orgulhar-se de ter guias de atuação clínica para o seguimento da apneia do sono e um circuito hospital -> centro de saúde -> empresas de prestação de cuidados respiratórios domi-ciliários -> utente perfeitamente desenhado para a articulação

entre os diferentes níveis de cui-dados que garantem a vigilância do doente e a possibilidade de voltar a reencaminhá-lo à Unida-de do Sono de forma célere, em caso de necessidade.Por fim, vários estudos científicos têm demonstrado em diferentes países do mundo (Sánchez de la Torre em Espanha, Chai-Coetzer na Austrália, por exemplo) que o seguimento da apneia do sono nos Cuidados de Saúde Primários pode supor uma redução de até 60 por cento dos custos frente ao seguimento hospitalar, poupança não desprezável que contribui à indispensável sustentabilida-de do nosso Serviço Nacional de Saúde.

MédicoFamília

Unidadedo sono

Dormir com Apneia

do Sono

Empresa de Cuidados Respiratórios Domiciliários

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O CORAÇÃO E A SÍNDROME DE APNEIA OBSTRUTIVA DO SONO

A Síndrome de Apneia Obstruti-va do Sono é uma patologia com elevada prevalência na popula-ção e com enormes consequên-cias clínicas, sendo considerada atualmente um problema de saúde pública.

PORQUE É QUE OS DOENTES COM SÍNDROME DE APNEIA OBSTRUTIVA DO SONO TÊM MAIOR RISCO DE DOENÇAS CARDIOVASCULARES?A Síndrome de Apneia Obstru-tiva do Sono é uma situação caracterizada por paragens respiratórias que se repetem várias vezes ao longo da noite

DR.ª PAULA PINTOCOORDENADORA DA UNIDADE DE

SONO E VENTILAÇÃO NÃO INVASIVA DO SERVIÇO DE PNEUMOLOGIA DO CENTRO

HOSPITALAR LISBOA NORTEPROFESSORA DA FACULDADE DE

MEDICINA DE LISBOA

QUAL É A DOENÇA CARDIO-VASCULAR MAIS FREQUENTE NOS DOENTES COM SÍNDRO-ME DE APNEIA OBSTRUTIVA DO SONO?A apneia do sono é um fator de risco para hipertensão arterial, sendo esse risco tanto maior quanto maior a gravidade da doença. O padrão de hiperten-são arterial destes doentes é totalmente diferente do obser-vado nos indivíduos hiperten-sos não afetados pela apneia do sono, pois naqueles os valores tensionais não diminuem du-rante a noite e a hipertensão é muito frequentemente refratá-ria ao tratamento.

QUE OUTRAS DOENÇAS CAR-DIOVASCULARES SE ASSO-CIAM À SÍNDROME DE AP-NEIA OBSTRUTIVA DO SONO?A Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono é atualmente conside-rada também um fator de risco para o desenvolvimento de doen-ça coronária, podendo esta estar presente em cerca de 25 por cen-to dos doentes com Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono. É de salientar que pode existir doença coronária subclínica, (traduzida por calcificações das artérias co-ronárias que constituem marca-dores de aterosclerose) em cerca de 67 por cento de doentes com apneia do sono.Os doentes com apneia do sono apresentam ainda um risco

CONSEQUÊNCIAS

e que originam diminuição dos níveis de oxigénio no sangue e despertares. Estes levam a uma má qualidade do sono, que se pode traduzir em hipersono-lência durante o dia, podendo o doente adormecer com faci-lidade mesmo a conduzir ou no local de trabalho. Por outro lado, a redução dos níveis no-turnos de oxigénio no sangue pode levar a um aumento do risco de doenças cardiovascula-res, como hipertensão arterial, enfarte e arritmias, tendo estas sido apontadas como responsá-veis pelo aumento da mortali-dade observada nestes doentes. Existe um padrão circadiário de morte súbita na Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono, tendo os doentes com esta pa-tologia um pico de morte de causa cardíaca durante as horas de sono, entre a meia-noite e as seis da manhã, contrariamente aos indivíduos sem Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono, em que o pico de morte de causa cardíaca ocorre entre as seis da manhã e o meio-dia.Num estudo realizado na con-sulta de Patologia do Sono do Centro Hospitalar Lisboa Norte, verificou-se que em 305 doen-tes com Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono, 60 por cen-to dos mesmos apresentavam hipertensão arterial, 12 por cento sofriam de enfarte e 11 por cento de arritmias.

13

CONSEQUÊNCIAS

duas a quatro vezes superior de desenvolverem arritmias, sendo a fibrilhação auricular a mais frequente. A presença de arrit-mias noturnas em doentes com apneia do sono pode explicar o aumento da prevalência de mor-te súbita descrita recentemente neste grupo de doentes.A presença de Síndrome de Ap-neia Obstrutiva do Sono associa-se também a um risco duplo de desenvolvimento de insuficiência cardíaca. Tendo em conta o im-pacto negativo da apneia do sono no prognóstico dos doentes com esta patologia associada, tem sido sugerido que todos os doentes com insuficiência cardíaca devam ser investigados com estudos do sono para despiste de Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono.A prevalência de Síndrome de Ap-neia Obstrutiva do Sono entre os doentes que já tiveram acidentes vasculares cerebrais é elevada, podendo variar entre 44 a 74 por cento. A presença de apneia do sono nos doentes com aciden-tes vasculares cerebrais confere um maior risco de mortalidade prematura. É de salientar que a ocorrência de acidentes vascu-lares cerebrais nos doentes com Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono pode ser precedida por doença cerebrovascular subclí-nica, frequentemente designada como enfarte cerebral silencioso, que pode ser detetável através de ressonância magnética cerebral.

O TRATAMENTO DA SÍNDROME DE APNEIA OBSTRUTIVA DO SONO REDUZ

AS COMPLICAÇÕES CARDIOVASCULARES?

O tratamento da Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono com CPAP é muito eficaz, reduzindo a hipertensão arterial associada a esta patologia, um efeito que é notável a curto e a longo prazo, tendo sido provado que uma redução da pressão arterial de cerca de 10 mmHg se traduz numa diminuição significativa de eventos coronários (37por cento) e de acidentes vascula-res cerebrais (56por cento). A terapêutica com CPAP também

diminui grandemente o risco de eventos arrítmicos.Desta forma, os doentes hiper-tensos, com doença coronária, com arritmias e com insufi-ciência cardíaca com clínica su-gestiva de Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono deverão ser enviados a um centro especiali-zado em patologia do sono para realização de uma polissono-grafia para diagnóstico e trata-mento correto deste distúrbio do sono.

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CONSEQUÊNCIAS

SONO E CONDUÇÃO

DR.ª PAULA PINTOCOORDENADORA DA UNIDADE DE

SONO E VENTILAÇÃO NÃO INVASIVA DO SERVIÇO DE PNEUMOLOGIA DO CENTRO

HOSPITALAR LISBOA NORTEPROFESSORA DA FACULDADE DE

MEDICINA DE LISBOA

países que registavam os maio-res índices de sonolência foram a Holanda, Áustria, Bélgica, Por-tugal, Polónia e França. Os países com menor risco de sonolência ao volante foram a Croácia, Es-lovénia e Itália. A idade jovem, o género masculino, a condução ≥20,000 Km/ano, a sonolência diurna excessiva e a apneia do sono foram os principais de-terminantes para a sonolência ao volante. Assim, este estudo pan-europeu demonstrou o ris-co desta situação para a saúde pública, enfatizando a necessi-dade de esforços políticos para reduzir o peso da sonolência ao volante nos condutores. O trata-mento da apneia do sono com CPAP é muito eficaz, reduzindo significativamente o risco de aci-dentes de viação.

OS DOENTES COM APNEIA DO SONO DEVEM TER RESTRI-ÇÕES NA OBTENÇÃO/RENOVA-ÇÃO DA CARTA DE CONDUÇÃO?Tendo em conta o risco aumen-tado de acidentes de viação nos doentes com apneia do sono, torna-se fundamental existirem critérios para obtenção ou reno-vação da carta de condução em doentes com o diagnóstico de Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono. Poderá ser obtida ou re-novada a carta de condução em doentes com o diagnóstico de Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono tratada, em que esteja comprovada adesão e eficácia terapêutica (ausência de hiper-

Os doentes com Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono têm um risco aumentado de aciden-tes de viação? A sonolência diur-na excessiva representa um dos principais fatores de risco para acidentes de viação, sendo res-ponsável por 10 a 30 por cento de todos os acidentes de viação e é a principal causa de acidentes fatais. No entanto, a importância relativa da sonolência tem sido largamente subestimada nas estatísticas oficiais publicadas, sendo referida apenas em 1 a 3 por cento de todos os acidentes. Tendo em conta que a apneia do sono leva a hipersonolência diurna e a redução da concentra-ção e da atenção é uma condição clínica que está associada a um risco aumentado de acidentes de viação comparativamente à po-pulação geral, estimando-se que esse risco varie desde 2 até 12 vezes. Recentemente, um estudo conduzido pela European Sleep Research Society em 19 países europeus teve como objetivo estimar a prevalência, os deter-minantes e as consequências da sonolência ao volante. Para esse efeito foram realizados 12,434 questionários anónimos que revelaram que a prevalência da sonolência ao volante nos dois anos prévios foi de 17 por cento. Entre os indivíduos que referiam esse tipo de sonolência, a preva-lência de acidentes foi de 7 por cento (13,2 por cento envolven-do cuidados hospitalares e 3,6 por cento tendo sido fatais). Os

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CONSEQUÊNCIAS

sonolência diurna) por médico especialista. Deverá ser negada a obtenção ou renovação da carta de condução aos doentes com Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono em qualquer uma das seguintes condições:• Doentes com hipersonolên-

cia diurna durante a condu-ção, após o tratamento;

• Ter tido um acidente de via-ção aparentemente relacio-nado com sonolência, já após o tratamento;

• Doentes sem adesão à tera-pêutica e sem seguimento médico recente.

EXISTE LEGISLAÇÃO PORTUGUESA RELATIVAMENTE À OBTENÇÃO/RENOVAÇÃO DAS CARTAS DE CONDUÇÃO?

O Decreto-Lei nº 40/2016 DR nº 145, Série 1 de 29-07-2016 refere no ponto 6.2 sobre Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono a seguin-te recomendação: 6.2.2 “Em caso de suspeita de Síndrome de Apneia Obstruti-va do Sono moderada ou grave, o candidato ou condutor deve ser observado por médico da especialidade competente po-dendo ser-lhe recomendado que não conduza veículos a motor até à confirmação do diagnóstico”. 6.2.3 “A carta ou licença de condução pode ser emitida ou revalidada, ao candidato

ou condutor com Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono moderada ou grave, desde que comprove, por parecer médico de especialidade competente, ter um controle adequado da sua afeção, seguir o tratamen-to adequado e estar melhor da sua sonolência.” 6.2.4 “Os candidatos ou con-dutores com Síndroma de Apneia Obstrutiva do Sono, moderada ou grave sob trata-mento devem ser submetidos a avaliação médica periódica, com intervalos não superiores a três anos para os condutores do grupo 1 e de um ano para os condutores do grupo 2,

com vista a avaliar se o tra-tamento é convenientemente seguido, se é necessário conti-nuá-lo e se é mantida uma boa vigilância”. A Síndrome de Apneia Obstru-tiva do Sono associa-se a um aumento da sonolência diur-na e consequentemente a um maior risco de acidentes de viação. O tratamento da apneia do sono com CPAP é muito eficaz, reduzindo significati-vamente o risco de acidentes de viação, pelo que os doentes adequadamente tratados po-derão obter ou renovar as suas cartas de condução, de acordo com a legislação em vigor.

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INVESTIGAÇÃO

EXISTE TRATAMENTO ALTERNATIVO?

DR.ª ADÉLIA RAMAZANOVALICENCIADA EM MEDICINA E CIRURGIA

PELA UNIVERSIDADE DE SANTIAGO DE COMPOSTELA, ESPANHA.INTERNA DO SERVIÇO DE

ESTOMATOLOGIA DO CENTRO HOSPITALAR LISBOA NORTE.

COLABORADORA NA CONSULTA MULTIDISCIPLINAR DO SONO DO CHLN

1 e 2). De forma similar ao CPAP deve ser utilizado durante o pe-ríodo de sono noturno e também em sestas diurnas. Segundo os grandes grupos de investigadores internacionais, as indicações para o tratamento com DAM são as seguintes:• Roncopatia Simples (ressonar);• Síndrome da Apneia do Sono

leve e moderada em caso de eleição pelo doente ou de não indicação para suporte venti-latório com CPAP;

• Recusa ou intolerância de CPAP pelo doente;

• Tratamento combinado.Estas indicações terapêuticas contemplam DAMs customizados e personalizados, ou seja, feitos à medida da morfologia de cada arcada dentária de cada doente e com possibilidade de ajuste ma-nual do avanço da mandíbula.O tratamento implica o segui-mento regular para evitar e eventualmente corrigir de forma atempada algum efeito adverso e ainda a realização do exame com-pleto do sono, a polissonografia, de forma a monitorizar os resul-tados obtidos.

Bloqueio dapassagem do ar

Fig.1 – Sem dispositivo de avanço mandibular. Fig. 2 – Com dispositivo de avanço mandibular.

Avanço da Mandíbula

Aparelho Intra Oral

Avanço da Musculatura Anexa

Inúmeros são os estudos que de-monstram a eficácia da ventilação com pressão positiva contínua (CPAP) no tratamento da SAOS. Porém, este tratamento tem in-dicações bem definidas que ex-cluem os casos ligeiros e os casos moderados sem sintomatologia associada. Além disso, a adesão ao tratamento por parte do doen-te nem sempre é a desejada e depende muito do trabalho de equipa de cada centro, pelo que existe a necessidade de oferecer outras opções terapêuticas para os doentes que não se adaptam à ventilação com pressão positiva.Desta necessidade surgiram os dispositivos de avanço mandibu-lar (DAM). Trata-se de um apare-lho que, tal como o nome indica, avança a mandíbula, atuando de forma mecânica na via aérea su-perior, evitando o seu colapso. Ao mesmo tempo, evita a queda da língua, uma vez que não permite o total relaxamento muscular da mesma. O dispositivo é intra-oral, fixado nas arcadas dentárias su-perior e inferior, e assegura a es-tabilidade e patência da via aérea superior durante o sono (figuras

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CRIANÇAS E ADOLESCENTES

RESSONAR NÃO É NORMAL

DR.ª NÚRIA MADUREIRA LABORATÓRIO DO SONO E VENTI-

LAÇÃO, SERVIÇO DE PEDIATRIA MÉDICA HOSPITAL PEDIÁTRICO, CENTRO HOSPI-TALAR E UNIVERSITÁRIO DE COIMBRA

trutiva do Sono em idade pediá-trica é o aumento das amígdalas e das adenóides, estruturas lin-fóides presentes na faringe e que atingem as suas maiores di-mensões entre os 3 e os 8 anos. Existem outros fatores que po-dem causar ou contribuir para este problema: a obesidade é uma causa crescente, particu-larmente em adolescentes; a rinite alérgica é um importante fator se houver outras mani-festações de alergias; e as alte-rações na conformação cranio-facial, como o queixo pequeno e recuado, o palato ogivado ou a má oclusão dentária devem também ser avaliadas. Na Síndrome de Apneia Obstru-tiva do Sono, o sono é habitual-mente agitado, com ressonar, respiração predominante pela boca e com pausas. As crianças/adolescentes podem também ter acordares frequentes, pe-sadelos e episódios de sonam-bulismo ou urinar na cama. Durante o dia, como o sono não é reparador, podem acordar cansadas e com olheiras, referir dores de cabeça ou estar sono-lentas. As crianças mais pequenas po-dem ter, durante o sono, um es-forço respiratório significativo e visível, transpiração excessiva e dormir em posições estranhas para garantir uma maior aber-tura das vias aéreas (como de cócoras ou com o pescoço em

Ressonar não é normal nas crianças ou adolescentes, ainda que seja uma situação frequen-temente desvalorizada pelos pais. Considera-se um sinal im-portante e ocorre em cerca de 10 a 15 por cento das crianças. Em circunstâncias normais, a passagem do ar pelas vias aéreas superiores (particularmente na-

riz e faringe) não causa nenhum som. O ressonar corresponde a um ruído produzido pela vibra-ção dos tecidos moles destas vias aéreas, quando há dificul-dade na passagem do ar por aí existir uma obstrução. Durante o dia, a ação de músculos presen-tes nestas estruturas contraria a obstrução, mas, à noite, estes músculos estão “adormecidos” e, portanto, existe dificuldade na passagem do ar. Na abordagem do ressonar, é fundamental avaliar se a dificul-dade na passagem do ar pelas vias aéreas superiores se acom-panha ou não de consequências. Se a obstrução das vias aéreas for significativa, pode haver interrupção na passagem do ar para os pulmões, limitando as trocas gasosas e levando à diminuição do oxigénio e acu-mulação de dióxido de carbono no organismo. Para que a passa-gem do ar seja restabelecida, a criança tem um microdespertar (permite que os músculos “acor-dem” e contrariem a obstrução), e ao longo da noite este ciclo de interrupção na passagem do ar – microdespertar – pode re-petir-se várias vezes, causando fragmentação do sono. Nestas circunstâncias fala-se em Sín-drome de Apneia Obstrutiva do Sono, que ocorre em cerca de 1/5 das crianças que ressonam. A principal causa para o resso-nar/Síndrome de Apneia Obs-

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hiperextensão). O esforço respi-ratório pode também levar a um importante gasto energético, condicionando um insuficiente aumento de peso. Nestas ida-des, a insuficiência de sono ma-nifesta-se mais frequentemente como hiperatividade, impulsi-

CRIANÇAS E ADOLESCENTES

O MEU FILHO RESSONA, QUE FAZER?

Em qualquer idade, o facto de a criança/adolescente ressonar deve ser reportado ao médico assistente. A avaliação dos si-nais e sintomas acompanhantes e o exame objetivo permitirão identificar as situações que ne-cessitam de investigação mais detalhada e/ou tratamento. Nem sempre serão necessários exames complementares de diagnóstico. Uma criança em idade pré-escolar ou escolar com clínica típica de Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono e aumento das amígdalas e ade-nóides deverá ser orientada para um otorrinolaringologista, já que o tratamento indicado é a sua remoção cirúrgica. Em casos ligeiros, poderá ser sufi-ciente o tratamento médico ou a abordagem específica do ex-cesso de peso. Em casos duvidosos, em crian-ças com outros problemas de saúde ou nas quais os trata-mentos anteriores foram ine-ficazes, torna-se mandatório

o envio para uma consulta de especialidade (pneumologia ou patologia do sono pediátricas). Nestas circunstâncias, poderá ser necessário realizar exames como o estudo poligráfico do sono. Este exame é efetuado no hospital e consiste na ava-liação, durante o sono, de dife-rentes parâmetros (atividade cerebral, atividade muscular, atividade cardíaca, respiração, níveis de oxigénio e dióxido de carbono). Apesar de ser consi-derado o exame de eleição para o diagnóstico da Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono, o facto de existirem poucos la-boratórios do sono pediátri-cos obriga a que só se efetue nas situações acima referidas. Existem exames alternativos, mais facilmente disponíveis e que se fazem em casa, como a oximetria noturna – avaliação do nível de oxigenação do san-gue durante a noite, através da aplicação de uma mola com um sensor num dedo – mas

que não são tão sensíveis ou específicos. Uma vez estabelecido o diag-nóstico e avaliada a situação, o tratamento poderá ser médico (corticóides nasais e anti-his-tamínicos), cirurgia otorrinola-ringológica, tratamento de or-todôncia (dentário), orientação da obesidade em consulta de nutrição ou, em casos excecio-nais, a utilização de ventilação não invasiva. Neste tratamento, as crianças respiram, durante a noite, com o auxílio de um ven-tilador que lhes fornece ar, atra-vés de uma máscara aplicada no nariz ou no nariz e na boca. Independentemente do trata-mento instituído, as crianças devem continuar a ser vigiadas já que podem voltar a ressonar e a manter a respiração pela boca. Esta alteração pode levar a perturbação no crescimento e desenvolvimento da face e dos dentes, responsável pelo reapa-recimento do ressonar e suas consequências.

vidade, irritabilidade e agressi-vidade. A deficiente oxigenação e a frag-mentação do sono comprome-tem o crescimento e o desenvol-vimento do cérebro, bem como a formação da memória e, por isso, estas crianças/adolescen-

tes podem ter dificuldades de aprendizagem e outras conse-quências neurocomportamen-tais. A Síndrome de Apneia Obs-trutiva do Sono tem também consequências cardiovasculares e metabólicas que podem per-sistir até à idade adulta.

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