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265 Um Novo Ponto Guia Memórias do Cárcere: Ayeska Emilly Machado Alves Daniela Oliveira da Silva Luiz Vinícius de Souza Fernandes Nara Castro da Silva Andrade 1 Cada detento uma mãe, uma crença Cada crime uma sentença Cada sentença um motivo, uma história de lágrima sangue, vidas e glórias, abandono, miséria, ódio sofrimento, desprezo, desilusão, ação do tempo Misture bem essa química Pronto: eis um novo detento (Racionais MC’s) 1. Introdução O encarceramento, por sua própria natureza, apresenta dores que são comuns a qualquer detenção do planeta: a limitação de espaço, a impossibilidade de se deslocar, encontrar e estar junto com familiares, a segregação, a distância do meio social e a perda de contato com as normais experiências da vida, além da falta de ar, sol e luz (DARKE; KARAM, 2016). Porém, quando tais restrições físicas e psi- cológicas vão além de sanções legitimadas por um aparato normativo sancionado democraticamente, encontramos, então, uma grave violação dos direitos humanos. Em 1984, na Assembleia Geral das Nações Unidas, foi adotada a Convenção Contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradan- tes. No primeiro artigo da Convenção, o termo “tortura” é definido como qualquer ato pelo qual dores ou sofrimentos agudos, físicos ou mentais, que são infligidos intencionalmente a uma pessoa a fim de obter, dela ou de uma terceira pes- soa, informações ou confissões; de castigá-la por ato que ela ou uma terceira pessoa 1 Gostaríamos de agradecer à Professora Sabrina Fernandes pelo conhecimento compartilhado. A qua- lidade do trabalho não seria a mesma sem seu apoio e zelo. Seletividade Penal e Violação dos Direitos Humanos no Cárcere Global

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Um Novo Ponto Guia

Memórias do Cárcere:

Ayeska Emilly Machado AlvesDaniela Oliveira da Silva

Luiz Vinícius de Souza FernandesNara Castro da Silva Andrade 1

Cada detento uma mãe, uma crençaCada crime uma sentença

Cada sentença um motivo, uma história de lágrimasangue, vidas e glórias, abandono, miséria, ódio

sofrimento, desprezo, desilusão, ação do tempoMisture bem essa química

Pronto: eis um novo detento(Racionais MC’s)

1. Introdução

O encarceramento, por sua própria natureza, apresenta dores que são comuns a qualquer detenção do planeta: a limitação de espaço, a impossibilidade de se deslocar, encontrar e estar junto com familiares, a segregação, a distância do meio social e a perda de contato com as normais experiências da vida, além da falta de ar, sol e luz (DARKE; KARAM, 2016). Porém, quando tais restrições físicas e psi-cológicas vão além de sanções legitimadas por um aparato normativo sancionado democraticamente, encontramos, então, uma grave violação dos direitos humanos.

Em 1984, na Assembleia Geral das Nações Unidas, foi adotada a Convenção Contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradan-tes. No primeiro artigo da Convenção, o termo “tortura” é definido como

qualquer ato pelo qual dores ou sofrimentos agudos, físicos ou mentais, que são infligidos intencionalmente a uma pessoa a fim de obter, dela ou de uma terceira pes-soa, informações ou confissões; de castigá-la por ato que ela ou uma terceira pessoa

1 Gostaríamos de agradecer à Professora Sabrina Fernandes pelo conhecimento compartilhado. A qua-lidade do trabalho não seria a mesma sem seu apoio e zelo.

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tenha cometido ou seja suspeita de ter cometido; de intimidar ou coagir esta pessoa ou outras pessoas; ou por qualquer motivo baseado em discriminação de qualquer natureza; quando tais dores ou sofrimentos são infligidos por um funcionário público ou outra pessoa no exercício de funções públicas, ou por sua instigação, ou com o seu consentimento ou aquiescência (ONU, 1984, Art. 1º ).

A partir do momento em que a realidade de superlotação, falta de higiene e condições básicas de saúde, infraestrutura degradada, violência e tortura institu-cionalizadas se tornam o cotidiano de sistemas prisionais em muitos países, pode--se dizer que os Estados estão violando tratados de direitos humanos que estão em vigor. A situação fica mais preocupante quando relações entre tais atitudes com as práticas de tortura são possíveis e facilmente realizadas.

As condições inadequadas das prisões são ainda mais agravadas na medida em que o cárcere reconhecidamente afeta de maneira desproporcional setores da po-pulação, prejudicando, majoritariamente, grupos minoritários sem acesso à assis-tência legal mínima (ESCRITÓRIO DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE DROGAS E CRIME, 2015). A forma como muitos sistemas carcerários foram histórica e politicamente construídos levou a características como seletividade penal, crimi-nalização da pobreza e racismo institucionalizado. O resultado são prisões com condições desumanas e com sobrerrepresentação de negros, pobres e outros gru-pos marginalizados na realidade econômico-cultural de cada país.

Com a intenção de aprofundar o debate acerca das violações dos direitos hu-manos no âmbito prisional ao redor do mundo, com especial atenção para a dis-criminação racial sistematizada e invisibilizada dentro desse contexto, o presente artigo irá primeiro desenvolver uma breve revisão da literatura acerca do cárcere, focando nas autoras e autores que se dedicam a entender melhor a questão racial no sistema punitivo. Em seguida, será feita uma contextualização histórica e de dados atuais, na qual será destacado o desenvolvimento de tal mecanismo como forma de punição de setores sociais já estruturalmente oprimidos. Por fim, será explicado de forma sucinta quais princípios jurídicos regem o direito penal e quais mecanismos internacionais existem no sistema ONU sobre o tema.

2. O Sistema Penal ao Longo do Tempo: Estudos do Crime e do Criminoso

A criminologia, sendo considerada a “ciência do ser, empírica, baseada na análise e na investigação da realidade” (QUEIROZ apud PRADO, 2016), sofreu alterações de seu objeto de estudo ao longo dos séculos. Isso se dá em parte pela volátil definição do que vem a ser o crime e como se dá o processo de crimina-lização e por vivermos em uma sociedade líquida, com leis, valores e interesses

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mutáveis que se manifestam nas transformações políticas, sociais, ideológicas e culturais (SIQUEIRA, 2014).

Por muito tempo o estudo do crime em si foi o objeto principal da criminolo-gia, sendo essa a principal característica da Teoria Criminológica Clássica. Com a influência do desenvolvimento das ciências naturais surge a Teoria Criminoló-gica Positivista, que possui como objeto de estudo o criminoso. Por fim, a teoria mais aceita é a que considera e busca compreender o contexto social em que o criminoso está envolvido, pensando assim, no desvio social que leva o indivíduo a cometer o delito. Tal teoria denomina-se Criminológica Crítica (PRADO, 2016).

Considerando a problemática do subdesenvolvimento, da marginalização, do etiquetamento social e da seletividade penal nos países latino-americanos e a in-fluência de tais fatores sob a sociedade, o viés utilizado pelos autores latino-ame-ricanos para o estudo da criminologia é a Criminológica Crítica.

2.1. Autores Clássicos

O modelo punitivo moderno tal qual conhecemos é datado. Essa perspectiva historiográfica, adotada no presente trabalho, conflui para a espinha dorsal das te-ses dos clássicos da criminologia crítica. Grosso modo, quatro são as modificações fundamentais das quais esse sistema se valeu moldando as feições do que hoje chamamos controle penal moderno (PRANDO, 2006): (i) a substituição gradativa do suplício pela prisão, pela reclusão e pela servidão (FOUCAULT, 2007); (ii) a criação de instituições responsabilizadas pela exclusão de indivíduos considera-dos desviantes pela classe hegemônica; (iii) o aperfeiçoamento das catalogações desses desvios, levadas a cabo por um corpo de especialistas; e, por fim, (iv) o desenvolvimento do Estado Moderno, marcado pela racionalização, centralização político-econômica e pela burocratização (PRANDO, 2006).

O período anterior ao século XVIII é marcado por atrocidades no exercício do poder punitivo, o qual é caracterizado pela utilização do suplício como forma de manutenção do poder por meio da dor. Michel Foucault, filósofo e historiador francês e um dos principais teóricos do sistema carcerário, define o suplício em sua obra “Vigiar e Punir: Nascimento da Prisão”:

O suplício repousa na arte quantitativa do sofrimento. Mas não é só: esta produção é regulada. O suplício faz correlacionar o tipo de ferimento físico, a qualidade, a inten-sidade, o tempo dos sofrimentos com a gravidade do crime, a pessoa do criminoso, o nível social de suas vítimas (FOUCAULT, 2007, pp. 36-7).

Nesse contexto, o indivíduo era privado temporariamente de sua liberdade enquan-to a sua punição final era determinada; ou seja, o encarceramento era utilizado como meio, e não como o fim da punição (SANTIS; ENGBRUCH, 2012). A punição nesse

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período buscava ser pública, de forma que o suplício fosse encarado como um espetá-culo com festas e público para assistir ao condenado pagar pelos seus atos.

Com o advento da burguesia na Europa, entre meados do século XVII e XVIII, a forma utilizada como punição começa a ser questionada. O período é o Iluminis-mo, e a repressão exacerbada e a tirania do Estado ao punir um indivíduo torna-se inaceitável aos ideais iluministas e burgueses. Punir o corpo deixa de ser um ato de orgulho e comemoração, pois o corpo agora possui outra funcionalidade: mão de obra para diversas funções e clientela para os produtos que passam a ser produ-zidos (GANEM, 2017).

Sendo o Iluminismo um período marcado pela busca à preconização de uma socie-dade mais humana, surge, então, o ideal do “contrato social” advindo dos teóricos John Locke, Rousseau e Thomas Hobbes. Por meio do contrato social, o indivíduo abre mão de parte de sua liberdade individual para que possa viver em sociedade, formando um corpo social, em troca de segurança e proteção de sua propriedade. Ao ser estabelecido esse contrato social, a sociedade reconhece a autoridade do governante e de suas leis (SANTOS; GUARIENTO; AVELAR et al., 2010).

Para a Teoria Clássica do Direito Penal, datada no mesmo período, o indivíduo, ao cometer um delito, utiliza-se do seu livre arbítrio, quebrando o contrato social antes es-tabelecido; assim, esse indivíduo criminoso deve ser expurgado do meio em que vive. A Teoria Clássica, dessa forma, estabelece o seu foco no crime em si, e não no crimi-noso, para o qual o abandono do suplício como forma de punição mostra a preferência pelo cárcere e pela prisão perpétua, servindo, o criminoso, por longa data, de exemplo para a sociedade (SANTOS; GUARIENTO; AVELAR et al., 2010).

A Escola Clássica não era uma escola propriamente estabelecida e foi assim deno-minada pela Escola Positivista, que veio décadas depois. O principal autor da Teoria Clássica é Cesare Beccaria, e suas obras, em específico a obra “Dos Delitos e Das Penas”, são consideradas as bases do Direito Penal moderno. Esse pensador clássico encara o crime numa perspectiva de sua prevenção, questionando-se o que deve ser feito, a fim de evitar que haja mais indivíduos destoantes na sociedade. Assim, Becca-ria acredita que a lei deve ser anterior ao ato, e que tais leis sejam claras, simples e edu-cativas, o que torna necessário que o processo e o julgamento do indivíduo se tornem públicos, garantindo, assim, uma maior segurança jurídica (JUNG, 2014). Sobre a pena de morte, Beccaria afirma que essa não se fundamenta em nenhum direito, pois o indivíduo coloca apenas uma parcela de sua liberdade no contrato social, uma parcela equivalente ao direito de punir do Estado. Por fim, pode-se assumir que Beccaria foi capaz de defender os ideais de igualdade ansiados no Iluminismo e os traduziu para o Direito e para a legislação (PRADO, 2016).

Ao se perceber que o indivíduo não mais age pelo livre-arbítrio, e sim pelas motivações e o contexto social do indivíduo, surge-se a necessidade de uma Teoria que abranja o indivíduo. Dessa forma, a Escola Clássica perde o protagonismo e assim surge a Teoria Criminológica Positivista (PRADO, 2016).

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A Escola Positivista fazia uma diferenciação dos indivíduos honestos dos criminosos, além de buscar entender o porquê de o indivíduo ser criminoso e o conjunto de complexas causas que influenciam a vida deste e as suas motiva-ções. Enquanto a Escola Clássica focava no crime em si, a preocupação e o foco da Escola Positivista eram o criminoso (PRADO, 2016). Da Teoria Positivista podemos destacar como principal autor Cesare Lombroso, antropólogo italiano que utilizava de explicações empíricas para teorizar acerca das causas do crime. Para Lombroso, os delinquentes poderiam ser categorizados em seis diferentes categorias desde criminosos natos a criminosos ocasionais. Tal teoria sofreu fortes críticas, pois nem todos os criminosos possuíam anomalias, o que mostra que os indivíduos criminosos não são iguais. Tempos depois, Enrico Ferri, criminologista italiano, em sua teoria, assume que o contexto em que o indivíduo está inserido é determinante no crime, sendo o delinquente resultado de diversos fatores sociais, tais como a desestrutura familiar (OSHIMA, 2013).

Dessa forma, assume-se como necessária a reafirmação da punição como meio de defesa pessoal da sociedade, tendo, também, um caráter reeducativo na pena. Assim, por meio da ideologia de defesa social2, o direito de punir do Estado mos-tra-se como resultado de um contrato social.

Hoje fala-se da Teoria Criminológica Crítica. Pautada na reação social, essa teoria foca nos mecanismos que tornaram o indivíduo criminoso e as razões polí-ticas da criminalização (FLAUZINA, 2006). Um dos principais pontos do Direito Penal é a definição do que vem a ser o crime: o crime em si não existe, sendo este um fenômeno mutável e construído pela sociedade. O crime possui caráter social e histórico, estabelecido de acordo com os interesses de dominação e hierar-quia, sendo assim, adotado como meio de controle social sob certos grupos sociais (BORGES, 2018). O caráter do crime sob a perspectiva apresentada é reafirmado pela teoria do etiquetamento ao abordar a criminalização secundária3.

Michael Foucault, em sua obra “Vigiar e Punir: O Nascimento da Prisão”, aborda os princípios da criminalidade, tornando-se um dos maiores contribuintes para os estudos sobre a estrutura das instituições judiciais e penitenciárias na épo-ca moderna. O autor assume que a prisão, a despeito do consenso de este ser um sistema falho, é a melhor forma de punição do indivíduo. Apesar do estabeleci-mento da função de ressocialização do indivíduo por meio do sistema carcerário, Foucault assume que, na verdade, o objetivo desse sistema nunca foi de ressocia-lização, e sim de manutenção da criminalidade, o que contribui no aumento da produção de crime nas classes mais baixas (FOUCAULT apud SOUZA, 2011).

2 Situando os elementos de uma teoria do desvio e dos comportamentos socialmente negativos, a ide-ologia da defesa social refere-se ao conjunto das representações sobre o crime e a pena tencionando o controle da criminalidade por meio da punição e da intimidação (BARATTA, 2002)3 Parte-se do pressuposto de que os pobres são os suspeitos da criminalidade, assim, o mecanismo de controle social pelos órgãos oficiais baseia-se na etiqueta penal atribuída a um grupo já marginalizado (CARDOSO, 2015).

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2.2. América Latina e Raça na Literatura Penal

Os estudos do crime realizados atualmente por autores latino-americanos por meio de um viés crítico têm buscado romper com as ideias gestadas no seio posi-tivista europeu, que se pautavam na análise do delinquente como um ser diferen-ciado e na causalidade de seus delitos (FLAUZINA, 2006). Esses autores, em que se destacam Ana Flauzina - pensadora brasileira de renome e principal referencial teórico do presente trabalho -, têm procurado compreender o crime a partir da constatação de que “o desvio é criado pela sociedade. O crime não existe como realidade ontológica, pré-constituída, mas como fruto da reação social (controle), que atribui o rótulo de criminoso a determinados indivíduos’’ (FLAUZINA, 2006, p. 19). A autora complementa:

Não existem condutas desviantes em si, ou indivíduos delinquentes por suas carac-terísticas pessoais e posição na pirâmide social, mas sim a criminalização discricio-nária de determinadas atitudes e indivíduos (FLAUZINA, 2006, p. 19, grifo nosso).

Combinam-se, portanto, as ações das “agências formais de controle (Legislati-vo, Polícia, Ministério Público, Judiciário, prisão)” (FLAUZINA, 2006, p. 25) e o imaginário social para criar etiquetas e rotulações de criminosos que se encaixam especificamente em determinadas populações. Isso faz com que as ações destas sejam especialmente punidas, enquanto outros grupos que cometem os mesmos atos permaneçam impunes ante ao sistema penal vigente, justamente por não se-rem alvos dos rótulos de criminalidade impostos (FLAUZINA, 2006). Com base nisso, pode-se destacar a importância da categoria racismo para se compreender a constituição dos sistemas penais por todo o mundo e, consequentemente, do cárcere. Entende-se racismo como:

uma doutrina, uma ideologia ou um sistema sobre o qual se apóia um segmento populacional considerado superior, por causa de características fenotípicas ou cul-turais, a fim de conduzir ou subjugar um outro, tido como inferior. Além de todas as características presentes na definição, sinalizamos expressamente para o caráter desumanizador inscrito na concepção do racismo. [...] O racismo serve como forma de catalogação dos indivíduos, afastando-os ou aproximando-os do sentido de hu-manidade de acordo com suas características raciais. (FLAUZINA, 2006, p. 12, grifo nosso).

Por meio do sistema penal, reiteram-se situações de desigualdade racial que se constituem mediante a criação de categorias racializadas nos contextos latino-a-mericanos, como as de crime e criminalizado. O processo de criminalização vai se dando primeiramente por meio do aparato legal. Este contribui com a criação de

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legislações que aplicam duras penas a práticas supostamente criminosas que são específicas e frequentes por parte de grupos racializados. Por outro lado, crimes mais danosos para a sociedade – como, por exemplo, desvio de dinheiro público por parte de autoridades políticas – costumam ter aplicação de penas mais bran-das, visto que são mais recorrentes entre populações privilegiadas por um sistema racista; ou seja, principalmente pessoas brancas (FLAUZINA, 2006).

Em segundo lugar, o processo de criminalização se realiza por intermédio do aparato jurídico-penal e das agências formais de controle social (Polícia, Minis-tério Público, Judiciário), que encarceram em massa populações racializadas por meio de processos repletos de seletividade penal, reproduzindo estigmas e dis-criminações que circulam e orientam também as relações sociais (FLAUZINA, 2006). Forja-se, então, um imaginário social no qual o crime tem etnia, cor, raça e classe social. Esse imaginário se retroalimenta, no sentido de que o poder está no sistema penal tanto em estabelecer quais serão os grupos mais vulneráveis aos seus tentáculos quanto em estampar um panorama de criminalidade que faz com que a sociedade os discrimine por sua dada propensão a serem o alvo preferí-vel dos processos de criminalização – por sua suposta “predisposição” ao crime (FLAUZINA, 2006; DAVIS, 2003).

Portanto, a seletividade penal é um processo que esconde o fato de que “a cri-minalidade, além de ser uma conduta majoritária, é ubíqua, ou seja, presente em todos os estratos sociais. O que ocorre é que a criminalização é, com regularida-de, desigual ou seletivamente distribuída pelo sistema penal” (ANDRADE, 2003 apud FLAUZINA, 2006). Pela quantidade enorme de infrações, o sistema não é capaz de abarcar todos os delitos e nem é sua intenção. O sistema penal busca en-tão se dirigir contra grupos específicos, visando ao controle social desses. Como destaca Flauzina:

As atribuições do sistema penal relacionam-se mais concretamente ao controle e perseguição de determinados indivíduos do que à contenção das práticas delituosas. Em outras palavras, “o sistema penal se dirige quase sempre contra certas pessoas, mais que contra certas ações definidas como crime” (FLAUZINA, 2006, p. 25).

No contexto latino-americano, o termo populações racializadas refere-se tan-to a pessoas de ascendência africana ou negra quanto a pessoas de ascendência indígena. (FLAUZINA, 2006). Essas duas populações contribuíram amplamente para a constituição de todos os países latino-americanos, porém, a partir do pós--independência, observou-se um processo de formação dessas nações que buscou o branqueamento desses indivíduos e de suas culturas. Almejou-se a construção de países europeizados, que priorizassem a influência ibérica e colonialista (FLAU-ZINA, 2006). Essa marcha deu-se tanto em relação à cultura e aos elementos abs-tratos que compõem uma nação quanto no tocante à sua própria população. As

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elites latino-americanas procuraram controlar e remover os elementos indígenas e africanos de suas nações recém-formadas, e um dos instrumentos usados para esses intentos foi o sistema penal (FLAUZINA, 2006).

Levando em consideração os seus passados, os sistemas penais latino-ameri-canos e também o estadunidense guardam profunda relação com o controle dos corpos e da força de trabalho de populações indígenas e negras (DAVIS, 2003; FLAUZINA, 2006). Tanto no período colonial quanto no pós-independência, fo-ram constituídos aparatos legais, jurídicos e policiais de controle do cotidiano, da ocupação e da circulação dessas populações pelos espaços que correspondiam aos seus territórios, ou seja, do modo de vida desses indivíduos no geral (FLAUZINA, 2006). Dessa forma, os sistemas penais da América Latina herdaram os aspectos privados advindos da experiência de escravidão e de trabalho compulsório aos quais foram submetidas populações africanas e indígenas, aspectos estes que bus-cavam o controle social desses corpos e de suas vidas (FLAUZINA, 2006).

Além disso, com o advento da modernidade, os recém-criados Estados latino--americanos aliam seu passado de controle social de grupos racializados com seus novos objetivos de embranquecimento de suas populações (FLAUZINA, 2006). A Abolição retira das populações negras o status desumanizante da escravidão somente na letra da lei. O imaginário social do período escravocrata permanece e adiciona-se a este a nova condição advinda dos preceitos do racismo biologizan-te do século XIX, que consegue adentrar os círculos de poder mais importantes dos Estados latino-americanos. A partir disso, essas elites aceitam as teorias que afirmavam que as populações africanas, mestiças e indígenas eram inferiores e que a raça branca era o modelo a ser seguido (COMAS, 1970). O objetivo a ser alcançado era a suposta “superioridade” da raça branca (FLAUZINA, 2006). As-sim, cria-se um alvo para os sistemas penais, o negro ou o indígena, que devia ser controlado com objetivo de “manter a ordem”, para que, de acordo com as elites latino-americanas, houvesse o progresso e o desenvolvimento desses países (FLAUZINA, 2006; SKIDMORE, 1976). Como afirma Flauzina:

Assim, sob o signo da manutenção da ordem, o arcabouço jurídico foi se armando para gerir a movimentação da massa negra das cidades, dizer onde e quando po-deriam circular e professar seus cultos, que tipo de atividades lhes eram cabíveis (FLAUZINA, 2006, p. 57).

Depreende-se disso que os sistemas penais latino-americanos nasceram, por causa dos aspectos acima citados, imbricados de proposições racialistas e repletos de ímpetos colonialistas e racistas. Com isso, constituiu-se também um imaginário social racista que serviu, e ainda serve, como fonte simbólica a demandar e apoiar os processos de criminalização, encarceramento e genocídio de populações negras e indígenas na América Latina (FLAUZINA, 2006).

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2.3 O cárcere como aspecto do genocídio: o Navio Negreiro foi a primeira prisão?

O encarceramento em massa como fenômeno que atinge principalmente as po-pulações negras, indígenas e pobres da América Latina pode ser considerado como um dos aspectos que contribui para o genocídio dessas populações. Esse genocídio assume múltiplas formas: é a morte física e coletiva de um povo, a morte de sua cultura e a devastação de suas comunidades, que perdem seus pais, suas mães, seus filhos e seus amigos para o sistema carcerário (FLAUZINA, 2006).

Arquitetado sempre tendo como espinha dorsal o racismo, o genocídio de po-pulações indígenas começa na América Latina com a colonização, enquanto os corpos africanos são raptados de seu continente, aprisionados em navios e trazidos para o Novo Mundo. A partir de Colombo, esses corpos só são considerados va-liosos caso sirvam como mão-de-obra. Sem esse aspecto, suas vidas não importa-vam e sua cultura foi brutalmente dilacerada (FLAUZINA, 2006). Como afirma Zaffaroni:

O colonialismo e o neocolonialismo foram dois momentos diferentes − mas igual-mente cruéis − de genocídio e etnocídio. (...) A destruição das culturas originárias, a morte de seus habitantes, em tal magnitude que chegou a alarmar os próprios coloni-zadores, e a escravidão através do transporte de africanos constituem as característi-cas evidentes do colonialismo. O neocolonialismo, por seu lado, praticado uma vez consumada a independência política, destacou-se por lutas cruentas que acabaram por impor o poder de minorias locais proconsulares dos interesses das potências industriais, que continuaram ou consumaram a empresa genocida e etnocida do colo-nialismo, desencadearam guerras de destruição intermináveis (como a do Paraguai), transportaram a população marginal européia para substituir a população desprezada como inferior e impulsionaram uma limitada secundarização da economia, à medi-da que era requerida uma maior complementaridade com o centro (ZAFFARONI, 2001, p. 118-119).

Com o advento do Estado Republicano-Positivista, forjou-se uma estrutura pública que teoricamente tornou-se um dos únicos espaços possíveis para o re-gramento formal do cotidiano e a resolução de conflitos. Dessa forma, o Estado assume o domínio da gerência e administração da vida (FLAUZINA, 2006). De acordo com Foucault, ao assumir a prerrogativa do direito de matar, o representan-te do Estado tem na morte o seu principal instrumento de atuação, pois cabe a ele o poder de “fazer morrer e deixar viver” (FOUCAULT, 2002, p. 286). Um exem-plo desse aspecto é o fenômeno de homicídios no caso brasileiro, que tem como principais vítimas pessoas jovens e negras. De acordo com o Atlas da Violência de 2017, de cada 100 pessoas assassinadas no Brasil, 71 são negras. Muitas dessas mortes são fruto de violência policial, ou seja, quando o Estado usa sua prerroga-

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tiva de gerência e administração da vida e da morte, geralmente acaba decaindo sobre os corpos negros a segunda circunstância (CERQUEIRA et al, 2017).

Ademais, é importante olhar o fenômeno do genocídio através de seus diversos ângulos, não considerando somente a aniquilação física, mas também a aniquilação simbólica de toda uma população. O primeiro desses ângulos que pode ser citado como exemplo, voltando ao caso brasileiro, é a configuração da espacialidade urbana nas cidades brasileiras a partir do pós-abolição, que empur-rou para as periferias o segmento negro desse país (FLAUZINA, 2006). Nesses locais de insalubridade, onde o acesso a direitos básicos como saúde, educação e saneamento básico é precário, uma outra dimensão de controle e extermínio do contingente negro se manifesta por meio do nível de pobreza a que está exposta essa população. Flauzina comenta sobre essa questão no seguinte trecho:

As questões anteriormente suscitadas que apresentam a disposição do Estado em privilegiar o segmento branco, com todo o investimento direcionado aos imigrantes e aos nacionais, em contraposição às estratégias de exclusão empreendidas para o negro, da vedação ao acesso à terra aos obstáculos inclusive legais que sempre es-tiveram entre os negros e as salas de aula, explicam a existência de realidades tão distintas na concentração de renda desses dois setores (FLAUZINA, 2006, p. 68).

Pode-se afirmar que a marginalização causada pela periferização da popula-ção negra, associada ao fator da pobreza, gera um contexto em que as políticas públicas atingem precariamente esse segmento, ocasionando a busca por outras formas de geração de renda, inclusive as não-ortodoxas. Essa situação associa-se ao imaginário social que leva à criminalização do contingente negro e da pobreza, fazendo com que sua condição de exclusão e extermínio seja retroalimentada pelo cárcere (FLAUZINA, 2006).

As prisões são conceituadas, para Angela Davis e Gina Dent (2003), como fronteiras dentro dos próprios Estados-nação, criando um regime totalmente di-ferente do que está em vigor fora dos muros. Muitas vezes esse regime é defi-nido pela violação cotidiana dos direitos humanos dos encarcerados e a tortura, aspectos simbólicos e reais que contribuem para o genocídio dos encarcerados negros e indígenas na América Latina. Definindo esses sistemas prisionais como instituições paradigmáticas da democracia, essas autoras afirmam que é importan-te perceber a função de controle social e de reforço de formas de opressão como racismo, classismo, sexismo e homofobia que o cárcere tem ao redor do mun-do (DAVIS; DENT, 2003). Assim, o cárcere como instituição desestabiliza tanto aqueles que nele estão, como seus familiares e suas comunidades.

Além disso, o aspecto de criminalização discricionária dos segmentos negros e indígenas na América Latina gera comunidades que são assombradas e até mesmo definidas pelo fantasma do cárcere (FLAUZINA, 2006). Enquanto para o resto da

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sociedade as prisões são porões ou são fronteiras dos quais se esquece (DAVIS; DENT, 2003), para estes grupos é um dos espaços dos quais jorra a sua própria realidade. Portanto, a realidade do cárcere torna-se um vetor da aniquilação física e simbólica de segmentos negros e indígenas, que lidam tanto com a sua materia-lidade, como com a sua possibilidade - o seu fantasma.

3. Para Além da Teoria: Entendendo Quem é Encarcerado no Mun-do Contemporâneo

Compreender a base teórica e bibliográfica que aborda o cárcere através dos anos, com especial atenção para as formas como o conhecimento também perpe-tua relações de opressão e com destaque para a literatura de raça do sul global, é apenas o primeiro passo para de fato apreender a complexa realidade do cárcere no mundo contemporâneo. É preciso ir além e se conectar tanto com as origens históricas do ato de punição quanto com os dados atuais que concernem às prisões ao redor do planeta.

A população carcerária mundial vem seguindo tendências contrárias às espe-radas nos últimos anos, e isso se deve a inúmeros fatores (WALMSLEY, [s.d.]). Aspectos de direito criminal, políticas e procedimentos, questões extra-legais e práticas jurídicas no âmbito prisional são alguns exemplos de fatores que interfe-rem diretamente na população carcerária, em termos quantitativos e qualitativos (JACOBSON; HEARD; FAIR, 2017). Porém, objetiva-se nessa seção, além de entender os números atuais, abordar os fatores que surgem do contexto político, econômico e geopolítico, nacionais e supranacionais.

Dentre os principais fatores nacionais, de origem do contexto político e eco-nômico, destaca-se: insuficiência de provisão de bem-estar; desigualdades sociais; punitivismo público e cultura do medo; abordagem da mídia ao crime e justiça; políticas penais populistas; teorias de punição e reforma; e, com especial foco, ra-cismo e marginalização institucionalizados (JACOBSON; HEARD; FAIR, 2017).

3.1. Perspectiva Atual e Dados Estatísticos

Desde o ano de 2000, a população carcerária mundial cresceu cerca de 19,5% (WALMSLEY, [s.d.]). Em 2000, a estimativa do número de encarcerados era de 8.644.300, e em 2015 esse número atingiu o marco de 10.657.134. Trazendo um recor-te de gênero para o debate, enquanto a população masculina cresceu cerca de 18,1% mundialmente desde 2000, a feminina cresceu 50,2% (WALMSLEY, [s.d.]). Porém, para além de uma análise estatística global, é preciso levar em consideração também os números no nível regional e, até mesmo, nacional, para melhor compreender o cres-cimento tão expressivo dessa população carcerária nas últimas décadas.

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As causas do crescimento exponencial do número de encarceramento no ní-vel global são complexas, muitas vezes se relacionando a questões estruturais, sobretudo aquelas sociais e políticas (JACOBSON; HEARD; FAIR, 2017). As consequências do encarceramento em massa são evidentes no cotidiano de vários países: condições degradantes e subumanas nas prisões e um resultado de reinte-gração social quase nulo (JACOBSON; HEARD; FAIR, 2017). Mais do que isso, continuar com o crescimento desproporcional significa lesar de forma sistemática grupos marginalizados na sociedade, sobretudo as minorias raciais e sociais (JA-COBSON; HEARD; FAIR, 2017).

Apesar do grande crescimento no número de encarcerados no mundo, na pers-pectiva regional essa percepção é diferente, já que há continentes que até mesmo apresentam crescimento negativo das taxas prisionais. Ainda citando os dados que se referem ao período de 2000 a 2015, o aumento de encarcerados na Oceania, foi de 59,1%, enquanto que no continente Americano foi de 40,5%. Já no continente Asiático, o crescimento chegou a 28,9%, ao passo que, na Europa, houve uma que-da no número da população prisional, chegando a -21,3%4 (WALMSLEY, [s.d.]).

4 Esses números, por serem relativos, podem gerar uma minimização da tendência geral do cárcere, por já incluírem países com grande volume de encarcerados. No caso da África, por exemplo, esse número final considera os índices de Ruanda, país com sistema prisional inflado por causa dos julgamentos do genocídio de 1994. Se os dados de Ruanda não forem considerados, o crescimento da população car-cerária africana chega a 25%, número bem maior. O mesmo acontece com a América, caso não sejam consideradas as estatísticas dos Estados Unidos, país com maior número de encarcerados no mundo, o número chega a 108% (WALMSLEY, [s.d.]).

Figura 1 – gráfico, em colunas, sobre número da População Prisional Total em 2016, por país

Fonte: INSTITUTO DE PESQUISA POLÍTICO CRIMINAL (ICPR), 2016.

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Os dados do gráfico anterior foram retirados do World Prison Brief (2016), base de dados organizada pelo Instituto de Pesquisa Político Criminal. Segundo esses dados, em 2016, Estados Unidos, China e Brasil eram os países com maior número de presos, sendo que, sozinhos, os três países chegam a ter em torno de 40% da população carcerária mundial do ano (ICPR, 2016). É preciso entender mais aprofundadamente o que tais números significam para a realidade da digni-dade humana, principalmente para a dos grupos minoritários.

O sistema carcerário dos Estados Unidos já é reconhecido por suas violações com relação aos direitos humanos, sobretudo no que tange à questão racial. Segun-do o Human Rights Watch (2014), a maioria das violações de direitos humanos que acontecem nos EUA são registradas dentro da justiça criminal, desde situações de perseguição e abuso policial até a punição injusta ou desproporcional (HUMAN RIGHTS WATCH, 2014). Estudos do Prision Policy Initiative (2014) indicam que, segundo censo estadunidense de 2014, negros dentro desse país têm cinco vezes mais chances de serem encarcerados do que brancos, enquanto os latinos têm duas vezes mais chances (SAKALA, 2014).

O censo indicou ainda que a população negra encarcerada era de cerca de 40%, e, juntos, latinos e negros representavam 59% dos presos estadunidenses. Além disso, segundo a instituição National Association for the Advancement of Colored People (NAACP), as mulheres negras são duas vezes mais presas do que as brancas nos Estados Unidos. É importante ressaltar que a população negra estadunidense é, em termos estatísticos, muito menor do que a branca: em 2014, 13,22% da população total dos Estados Unidos era composta por pessoas negras, essa informação intensifica a amplitude da violação no país (UNITED STATES CENSUS BUREAU, 2014). Os números impactam muito mais no dia a dia da po-pulação negra, que convive com um medo estrutural e recorrente. Poucos casos de violência racial dentro do sistema criminal recebem a atenção da mídia, e nomes, como o de Alton Sterling, homem negro morto em julho de 2016 em Lousiana por dois policiais brancos, são logo esquecidos, e pouco é feito para mudar a situação doméstica (BBC, 2017).

A Índia é outro país populoso em termos de cárcere e com problemas estru-turais em suas prisões. Segundo o censo indiano de 2013, 53% dos encarcerados indianos eram muçulmanos, dalits5 ou adivasis6 (VARMAL, 2014). Tal número indica que a punição dos grupos minoritários por meio do sistema prisional é uma tendência mundial, sobretudo em países do Sul Global com histórico de repressão e abusos culturais, sociais e econômicos. As prisões indianas estão superlotadas,

5 Dalit é a denominação para a casta mais baixa do sistema de castas indiano. Atualmente, representam um movimento de mudança e resistência ao sistema de opressão ainda adotado em meios sociais do país (MINORITY RIGHTS, [s.d.]).6 Advasis é o nome usado na Índia para denominar o grupo heterogêneo de indígenas originários da região; há cerca de 200 povos diferentes que falam aproximadamente 100 línguas, com grandes varia-ções étnicas e culturais que são chamados assim (MINORITY RIGHTS, [s.d.]).

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superando 18% de suas capacidades, e 67% dos presos estão em regime provisó-rio, ou seja, ainda não foram sentenciados por algum crime e aguardam o desfecho de seu processo (BANSAL, 2016). A falta de celeridade do sistema judicial é pon-to crucial para a explicação da atual conjuntura prisional mundial.

Segundo as estudiosas Sacha Darke e Maria Lucia Karam (2016), o crescimen-to do encarceramento mundial se explica por causa da expansão do poder punitivo, que se fez notar desde o fim do século XX. As autoras defendem que no caso lati-no-americano a expansão desse poder tem sido alimentada por uma política agres-siva de combate às drogas, junto com transições democráticas que não tiveram impacto progressivo na aplicação da lei penal. O caso brasileiro se encaixa bem a essa análise, sendo necessário um maior aprofundamento nas consequências do maior poder punitivo do Estado brasileiro (DARKE; KARAM, 2016).

A realidade brasileira não é animadora frente aos demais países. Jovens negros são a maioria das vítimas dos homicídios e do sistema prisional do país, e isso significa que

as instituições da segurança pública e da justiça criminal do país identificam este grupo da população como alvo de intenso controle flagrando em maior intensidade as suas condutas ilegais, com práticas que produzem violência e morte (SECRE-TARIA-GERAL DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA E SECRETARIA NACIO-NAL DE JUVENTUDE, 2015, p. 89).

Em 2012, a cada 100 mil habitantes negros, 292 estavam encarcerados, en-quanto esse número era de 191 encarcerados para brancos (SECRETARIA-GE-RAL DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA E SECRETARIA NACIONAL DE JUVENTUDE, 2015). Em 2016, o relator especial da ONU, Juan E. Méndez, condenou as situações das prisões brasileiras, que configuram práticas de tortura e maus tratos, e o racismo institucional do sistema carcerário, no qual cerca de 70% dos presos são negros. A superlotação das cadeias, falta de cumprimento da lei vigente e demora nos julgamentos também foram apontados pelo relator, que chegou a fazer recomendações em caráter emergencial para o Brasil (CONSELHO DE DIREITOS HUMANOS, 2016).

Uso excessivo da detenção pré-julgamento, falta de acesso ao aparato legal e à assistência, sistema de justiça criminal punitivo e uso inapropriado do aprisiona-mento; uso escasso de alternativas ao cárcere, medidas insuficientes para promo-ver a reintegração social e administração e infraestrutura inadequada das prisões são alguns pontos levantados para justificar a crise das prisões ao nível global (UNODC, 2015). As causas são as mais diversas e profundas, sendo necessária uma reestruturação sociopolítica e um maior entendimento por parte da sociedade e de autoridades às reais vítimas de um sistema puramente punitivo, seletivista e criminalizante.

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3.2. Brasil e o cenário global

As condições do sistema carcerário são de extrema precariedade, além deste se mostrar um sistema falho. Proposto inicialmente como uma alternativa aos suplí-cios a fim da ressocialização do indivíduo numa organização panóptica7, as prisões no Brasil se tornaram uma espécie de ambiente para castigo complementar. Além disso, esse ambiente prisional é “marcado por um conjunto de penas: trabalho for-çado, silêncio, privação alimentar, recalque da sexualidade, entre outros castigos” (BENTES, 2011, p 3).

Atualmente, o sistema carcerário brasileiro é o terceiro maior do mundo em popu-lação carcerária per capita, perdendo apenas para os Estados Unidos e a China, nessa ordem de colocação. Com um sistema projetado para comportar aproximadamente 368.049 pessoas, as prisões brasileiras possuem uma população carcerária de mais de 720 mil pessoas, segundo os dados do Levantamento Nacional de Informações Peni-tenciárias (Infopen), divulgados em dezembro de 2017 pelo Departamento Penitenciá-rio Nacional (Depen), do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJ).

Desde 1980, as ciências sociais brasileiras buscam abordar a desigual apli-cação de procedimentos judiciais aos diferentes grupos sociais no Brasil. Tais estudos apontam para uma seletividade racial no sistema penal, de forma que a punição recebida por indivíduos negros era mais severa do que indivíduos brancos nesse período (SÉRIE JUVENTUDE VIVA, 2015).

Nos dias atuais, deparamo-nos com uma seletividade penal que, ao invés de buscar prevenir crimes, ela própria os condiciona; isso se dá a partir dos seus pro-cessos de criminalização, em especial o de criminalização secundária. Exemplos disso são casos sem justificativa ou sem investigação que ocorrem na periferia e simplesmente são arquivados e esquecidos, juntamente dos corpos de milhares de vítimas de uma pobreza e uma cor que não foram escolhidas por elas mesmas. Ser pobre, negro e ainda morador da periferia é visto como um crime para a elite brasileira, o que mostra como, no Brasil, a indignação é seletiva. A respeito disso, podemos citar Matusiak (2017):

A seletividade racial é uma constância na historiografia dos sistemas punitivos e, em alguns casos, pode ser ofuscada pela incidência de variáveis autônomas. No entanto, no Brasil, a população jovem negra, notadamente aquela que vive na periferia dos grandes centros urbanos, tem sido a vítima preferencial dos assassinatos encobertos pelos “autos de resistência” e do encarceramento massivo, o que parece indicar que

7 “O Panóptico era um edifício em forma de anel, no meio do qual havia um pátio com uma torre, ocu-pada por um vigilante, no centro. [...] O panoptismo corresponde à observação total, é a tomada integral por parte do poder disciplinador da vida de um indivíduo. Ele é vigiado durante todo o tempo, sem que veja o seu observador, nem que saiba em que momento está a ser vigiado. [...] Em suma, o Panóptico desfaz a necessidade de combater a violência física com outra violência física, combatendo-a antes, com mecanismos de ordem psicológica.” (LOPES; SANTOS, [s.d.]).

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o racismo se infiltra como uma espécie de metarregra interpretativa da seletividade, situação que permite afirmar o racismo estrutural, não meramente conjuntural, do sistema punitivo (CARVALHO apud MATUSIAK, 2017).

As penitenciárias brasileiras enfrentam problemas como a superlotação, a vio-lência, a violação massiva dos direitos humanos e, ainda, o domínio de facções criminosas dentro das prisões. A Constituição de 1988 consagra como um dos seus princípios fundamentais o princípio da dignidade humana8, que é veementemente violada nessas instituições (MARTINS, 2017), além do princípio da humanidade, que busca assegurar a “inconstitucionalidade de qualquer pena ou conseqüência do delito que crie um impedimento físico permanente (morte, amputação, castra-ção ou esterilização, intervenção neurológica, etc.)” (ASSIS, 2007), com vigência tanto na ação legislativa quanto na ação judicial. Percebe-se o aumento da crimi-nalidade dos detentos libertos e a reincidência9 desses indivíduos, haja vista a não observância da disciplinarização dentro dos presídios e a falha na finalidade de ressocialização do sistema carcerário.

O descaso por parte do Estado para com a população carcerária brasileira é evi-dente; é apontado que a cobrança pela melhoria do sistema e a garantia dos Direi-tos Humanos devem partir da sociedade brasileira. Entretanto, ocorre justamente o contrário. Partindo do senso comum de que os Direitos Humanos são direitos voltados para “bandidos”, defensores desse raciocínio afirmam que defender a ga-rantia dos Direitos Humanos para todas as pessoas, inclusive as que se encontram no sistema prisional, é priorizar a criminalidade em detrimento dos direitos dos cidadãos ditos de bem e dignos. Isto é, grande parte da opinião pública brasileira concorda com as condições indignas de manutenção do sistema carcerário, pois enxerga os indivíduos presentes no sistema carcerário como inimigos, de forma que não mereçam ter garantia alguma de seus direitos e recebam apenas castigo, pois são “bandidos”.

Em 2017, o Brasil foi sabatinado por outros 109 países da Nações Unidas em um exame conhecido como Revisão Periódica Universal (RPU), promovida pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU de quatro em quatro anos com todos os países membros da Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU), na sede da ONU em Genebra (Suíça). Na referida sessão, são apresentadas sugestões e crí-

8 Apesar do reconhecimento da dignidade humana como qualidade inerente ao ser humano ser datada vale ressaltar que nunca houve uma época em que o indivíduo fosse alheio à sua dignidade. O referido princípio refere-se à um valor moral do respeito ao ser humano, sendo esse o preceito máximo do estado democrático de direito (LEMISZ, 2010).9 Julião (2009), sugere diferenciar quatro tipos de reincidência: i) reincidência genérica, que ocorre quando há mais de um ato criminal, independentemente de condenação, ou mesmo autuação; ii) rein-cidência legal, que, segundo a nossa legislação, é a condenação judicial por novo crime até cinco anos após a extinção da pena anterior; iii) reincidência penitenciária, quando um egresso retorna ao sistema penitenciário após uma pena ou por medida de segurança; e iv) reincidência criminal, quando há mais de uma condenação, independentemente do prazo legal (IPEA, 2015).

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ticas sobre o quadro de direitos humanos e temas sociais do país em questão, em especial no tocante aos tratados internacionais de direitos humanos dos quais o referido Estado é parte (CONECTAS, 2017).

Dessa forma, no seu terceiro ciclo de RPU, em 2017, o Brasil recebeu de quarenta e sete países diferentes mais de duzentas recomendações que se con-centravam, principalmente, em dois tópicos: a questão dos direitos indígenas e o sistema prisional brasileiro. De todas recomendações feitas, o Brasil recusou quatro medidas10. Quanto aos questionamentos a respeito do sistema carcerário, foi reconhecida a necessidade de dar prioridade aos direitos dos presos e prometi-do pela ministra de Direitos Humanos, Luislinda Valois, uma redução em 10% da população carcerária até o ano de 2019. Entre as medidas discutidas pelo governo brasileiro para se alcançar as recomendações propostas estão: o aumento de vagas em regime semiaberto, audiências de custódia e monitoramento eletrônico, além de busca por medidas alternativas ao encarceramento (NEXO JORNAL, 2017).

4. Direito e Direitos: A Sociedade entre o Direito Penal e os Direi-tos Humanos

Frente à necessidade de se fazer saber científico, ambas as correntes criminológi-cas, se clássica ou positivista, tinham como base, intrínseca e coadjuvante, determina-do pensamento que se preocupava antes de tudo com o perigo e a lesão que o crime e o desvio provocavam nos bens juridicamente protegidos, principalmente a propriedade e a vida (BARATTA, 2002). A essa perspectiva, de viés burguês e excludente, deno-minou-se, como dito anteriormente, ideologia da defesa social. Como, todavia, esse pensamento se apresenta no nosso meio? Decomposto em forma de princípios e regras gerais, pode-se afirmar prontamente (BARATTA, 2002).

Diz-se que seis são os princípios básicos da ideologia da defesa social que subsistem até nossos dias:

(a) princípio da legitimidade: justifica o fato de o Estado, como expressão abstrata da sociedade, por meio de várias instituições e institutos (leis, pri-sões e polícia, por exemplo), reprimir a conduta criminosa; (b) princípio do bem e do mal: de forma maniqueísta, coloca o crime e a sociedade em lados opostos e extremos, sendo o delito e o delinquente o mal a ser evitado e o bem social, aquilo buscado; (c) princípio da culpabilidade: interioriza no imaginário social a ideia de que todo crime é uma atitude resultante de vontade interior e, apesar de não

10 As medidas recusadas foram: (i) interrupção do congelamento de investimentos sociais por duas décadas; (ii) restauração da democracia e o Estado de direito após o “golpe de Estado parlamentar contra a presidente Dilma Rousseff”; (iii) proteção do casamento e da família heteronormativa como a unidade fundamental da sociedade (iv) seleção de candidatos nacionais para as eleições do órgão da ONU para tratados por meio de um processo aberto e baseado em mérito (CONECTAS, 2017)

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tiver sido descrita em lei formal, é reprovável por seu caráter desviante, mesmo que moralmente; (d) princípio da finalidade: a pena tem como função subsidiária prevenir o crime; (e) princípio da igualdade: a reação penal recai sobre todos e todas de ma-neira igual; (f) princípio do interesse social: o direito penal só protege interesses co-muns e fundamentais à sociedade.Como se vê, o sistema penal moderno do Ocidente emergiu sobre o amparo de princípios que, na realidade, não são aplicáveis. A sociedade é sub-re-presentada nos Poderes, e, na verdade, as instituições penais seguem inte-resses políticos e econômicos. Além disso, nem todo crime parte de uma vontade consciente e interna, e a pena não é igual para todos (BARATTA, 2002). Esquecer esse ponto, qual seja o recorte de raça e gênero, na crimi-nologia, foi um dos grandes desserviços do modelo moderno.

4.1. Direito Penal em crise

Apesar das louváveis críticas que se seguiram nos anos posteriores à crimino-logia positivista, trazidas à tona principalmente pela teoria do labeling approach (teoria do etiquetamento ou da rotulação) e pela criminologia crítica (FLAUZI-NA, 2006), a ideologia da defesa social e seus princípios disformes ainda são tidos no meio jurídico como um avanço do pensamento penal e penitenciário. A despeito do atraso que esse modelo representa para a ciência do direito contempo-rânea (BARATTA, 2002), sua principiologia difusa, sua simbologia e ritualística e principalmente seus pressupostos são aceitos categoricamente por boa parte dos juristas. Por isso, raras são as vezes em que uma visão analítica sobre o assunto é aceita, e mais raro ainda é ver ela ser objeto de discussão.

Sob a escusa de “proteção da sociedade”, o sistema penal se ocupou por muito tempo em criar inúmeras categorias penais vagas e pouco realistas, que diminu-íram a força normativo-jurídica do Direito Penal e atingiram os indivíduos da sociedade de maneira desigual. Foucault já havia resumido isso ao assumir que o sistema ao qual se referia deveria ser visto como um “instrumento para gerir diferencialmente as ilegalidades” (FOUCAULT, 2007, p. 109).

Simultaneamente, tal sistema tornou os (considerados) delinquentes - geral-mente de determinada classe econômica - em uma parcela “que não cabe no mun-do” (FLAUZINA, 2006, p. 27), verdadeiros proscritos, inimigos perseguidos e facilmente extirpáveis sob o indulto do discurso “para o bem da sociedade” ou “para o bem maior”. Por outro lado, o sistema moderno, para além de excluden-te e desigual, caracteriza-se por uma aparente contradição interna: ele falhou ao mesmo tempo que alcançou seu objetivo. Para seus fins básicos, o de manter ver-

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dadeiro antagonismo no meio social sempre em prejuízo aos grupos vulneráveis e tratá-los desigualmente, ele obteve êxito. Ana Flauzina (2006) chega a afirmar que essa aparente falência é na verdade um slogan e uma tática de manobra.

Ademais, sabe-se que o cárcere como principal forma de apenação entra cada dia mais em decadência e que o discurso jurídico-penal é deslegitimado por uma realidade brutal diversa. O fosso abissal que separa a teoria e a prática nesse caso é visível e tão basilar que pode ser percebido como algo estruturalizante e não conjuntural: é como se, na sua essência, o sistema penal nascesse com essa con-tradição, com esse vício, e deles se valesse para prosperar (FLAUZINA, 2006).

Tem-se como exemplo o cárcere em si: ele é a própria contradição consubs-tanciada. Ao mesmo tempo em que é um fracasso historicamente comprovado por dados estatísticos nos quesitos de ressocialização do apenado, combate da crimi-nalidade e defesa dos interesses sociais, ele se faz apto em separar a sociedade em polos opostos (“o cidadão de bem” e “o marginal”, o bem e o mal de um princípio já citado) e em servir como resposta técnica e institucionalizada do Estado frente à criminalidade, entre outros (BARATTA, 2004).

Zaffaroni e Batista, junto a tantos outros pensadores da América Latina, per-ceberam e retrataram isso em suas obras críticas:

Hoje, temos consciência de que a realidade operacional de nossos sistemas penais jamais poderá adequar-se à planificação do discurso jurídico-penal, e de que todos sistemas penais apresentam características estruturais próprias de seu exercício de poder que cancelam o discurso jurídico-penal e que, por constituírem marcas de sua essência, não podem ser eliminadas, sem a supressão dos próprios sistemas penais. A seletividade, a reprodução da violência, a criação de condições para maiores condutas lesivas, a corrupção institucionalizada, a concentração de poder, a ver-ticalização social e a destruição das relações horizontais ou comunitárias não são características conjunturais, mas estruturais do exercício de poder de todos os sis-temas penais (ZAFFARONI, 2001, p. 15, grifo nosso).

Para eles, os sistemas penais, principalmente os latino-americanos, são carac-terizados pelo constante abuso das sanções punitivas. Logo são, na verdade, irra-cionais (ZAFFARONI, 2001) e impossibilitados de cumprir funções úteis de fato à sociedade, que justificariam minimamente sua existência, os gastos públicos que suas instituições geram e a mística protetora que os cerca.

4.2. Direito Penal Mínimo e Garantia dos Direitos Humanos

Os estudos contemporâneos voltados para o Direito Penal, dos quais se des-tacam os estudos latino-americanos, muito têm falado sobre um modelo teórico que, em tese, seria o mais apropriado para a operacionalização do sistema penal,

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para sua verdadeira legitimação, ou pelo menos para impedir sua maior decadên-cia. Para este modelo deram o nome de Direito Penal Mínimo, mediado, por sua vez, pelo garantismo penal definido como “a tutela daqueles valores ou direitos fundamentais, cuja satisfação, mesmo contra interesse da maior, constitui objetivo justificante do direito penal” (FERRAJOLI, 2002, p. 33).

Partindo da premissa de que o Direito Penal deve servir aos mais vulneráveis, não apenas maximizando o bem-estar dos lesados, mas (e precipuamente) impos-sibilitando que a mão estatal pese arbitrariamente sobre os acusados, a transfor-mação do sistema penal pretendida por esse modelo perpassa processos de (SAN-CHES, 2010):

a) descriminalização e redução da pena;b) utilização de mecanismos menos abusivos;c) minimização da violência de que se vale esse instrumento de controle; d) extinção das violações aos Direitos e Garantias Fundamentais;e) aplicação estrita da lei (Princípio da Legalidade) e do devido processo penal (Princípio do Devido Processo Legal, da Ampla Defesa e do Contra-ditório)11.

A ética desse modelo é, portanto, uma ética humanista12, de valorização da vida humana, fundamental para o garantismo, visto que o processo de deslegitimação do direito penal descrito acima (realidade diferir do discurso jurídico-penal) tem como consequência a violação sistemática dos Direitos Humanos e a seletividade excludente. Falar, pois, de Direito Penal Mínimo é falar sobre Resgate dos Direi-tos Humanos (SANCHES, 2010).

4.2.1. Tratados e Convenções O Sistema ONU de proteção dos direitos humanos é baseado em instrumentos

de hard-law, tratados ou convenções internacionais firmadas e ratificadas pelos Estados-parte, e instrumentos de soft-law, declarações e outros instrumentos que não dependem da ratificação estatal (CHINKIN, 2014). O grande primeiro docu-mento a tratar do direito à dignidade humana no âmbito da ONU, além da Carta

11 São outros princípios básicos que deveriam nortear o processo penal: o da presunção da inocência (estabelece o estado de inocência do acusado até que seja comprovada legalmente sua culpa); do juiz natural (proíbe o tribunal de exceção) entre outros.12 “O processo relacionado com o início, a evolução e o fim da Metafísica, que conscientemente, embora sob aspectos cada vez diversos, situa o Homem num centro do Ser que é, sem que por isso já constitua o supremo Ser que é. O Homem, aqui, significa ora a humanidade singular, ora a humanidade universal, o indivíduo ou uma coletividade, o povo ou um conglomerado de povos. [...] Em qualquer dos casos, gira-se em volta do Homem, em órbitas mais estreitas ou mais amplas, mas de determinação metafísica.” (BEAU, 1959, p. 197).

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das Nações Unidas de 1945, que já previa a necessidade de alguns órgãos se de-dicarem ao pleno gozo dos direitos humanos (CARTA DA ONU, 1945), foi a De-claração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), de 1948. Além de garantir o direito de todo ser humano à vida, à liberdade e à segurança jurídica, a Declaração também estabelece que todos são iguais perante a lei e, sem distinção, têm direito à igual proteção desta e que ninguém será submetido a tortura nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes (DUDH, 1948).

Com o avanço dos sistemas de proteção, estabeleceu-se a necessidade de de-senvolvimento de instrumentos com maior força normativa, ou seja, que se cons-truíssem como pactos com os países, para que a obrigatoriedade universal dos direitos humanos fosse melhor compreendida. A partir de então, foram desenvol-vidos dois dos principais tratados de direitos humanos, o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC) e o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos (PIDCP), ambos de 1966, que atuaram como alicerces para a normatização de tais direitos em todo o mundo e como base para tratados posteriores, que versavam sobre temas mais específicos (ISHR, 2010).

Sabe-se, ademais, que o Estado Contemporâneo é um Estado Cooperativo (HÄBERLE, 2003). Nesse sentido, sem adentrar na extensa discussão acerca das fontes do direito penal, deve-se ter que os Tratados e as Convenções que versam sobre os Direitos Humanos (como os citados acima) e que vinculam seus signa-tários, são, pelo menos, capazes de servir como limites ou aportes no processo de criminalização, e isso pode ser aferido pela leitura dos dispositivos dessas Cartas.

Os artigos 9º e 10° do PIDCP (1966) tratam exatamente sobre os direitos hu-manos no processo penal. O inciso 1 deste último artigo define de imediato que:

Toda pessoa tem direito à liberdade e à segurança pessoal. Ninguém poderá ser preso ou encarcerado arbitrariamente. Ninguém poderá ser privado de liberdade, salvo pelos motivos previstos em lei e em conformidade com os procedimentos nela esta-belecidos13 (grifo nosso).

A Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, adotada em 1965, foi o primeiro tratado de direitos huma-nos no âmbito da ONU, muito por causa da situação política da época, de lutas contra a discriminação racial sistemática e institucionalizada ainda em muitos pa-íses. Os Estados que a ratificaram se comprometeram:

A declarar, como delitos puníveis por lei, qualquer difusão de ideias baseadas na superio-ridade ou ódio raciais, qualquer incitamento à discriminação racial, assim como quais-quer atos de violência ou provocação a tais atos, dirigidos contra qualquer raça ou qual-

13 Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Político. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d0592.htm>. Acesso em: 13 jan. 2018.

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quer grupo de pessoas de outra cor ou de outra origem étnica, como também qualquer assistência prestada a atividades racistas, inclusive seu financiamento14 (grifo nosso).

Se compararmos, por fim, o emblemático artigo que abre a Declaração Uni-versal dos Direitos Humanos (1948)15 com a realidade na qual, a despeito do que prevê a legislação interna e externa, encarcera-se arbitrariamente e se omite frente a discriminação racial e a punição seletiva, constatamos, pois, o desarranjo. Nes-se sentido, Tratados e Convenções que versam sobre Direitos Humanos podem16 servir como verdadeiros limites e marcos do sistema penal. Isso quando bem apli-cados. Se isso não ocorre, apenas compõem o amontoado legislativo que infla inutilmente o processo penal e o acervo legislativo dos Estados.

4.2.2. Princípios do Direito Penal (Mínimo)

Como então desinflar esse Leviatã? Baratta (2004) e Zaffaroni (2001) recorrem quase que de maneira similar aos princípios básicos do direito penal (BATISTA, 2007) para tanto. O penalista argentino, por exemplo, afirma que, mais importante do que enunciar tais princípios, faz-se necessário deixá-los “abertos”, “inacaba-dos”, prontos para se modificarem operacionalmente às necessidades humanas e aos conflitos que ocorrem no seu interior.

Os princípios podem ser divididos em três grandes categorias: (i) princípios de limitação formal; (ii) princípios de limitação funcional; e, por fim (iii) princípios de limitação pessoal. A primeira categoria, a mais importante para o presente tra-balho, pode ainda ser subdividida em:

a) Princípio da Legalidade: consiste em submeter a violência punitiva à lei. Isto é, a agência judicial deve ser restringida ao máximo no âmbito da legislação vigente e se, uma vez atuante fora dela, que se subordine às sanções cabíveis.b) Princípio da Taxatividade: sendo o crime a ação típica, injusta e cul-posa, proíbe os tipos penais abertos, ambíguos ou em branco, ao mesmo tempo em que impede a analogia na interpretação da lei penal. c) Princípio da Irretroatividade: consequência do primeiro princípio, as-

14 Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial. Dispo-nível em: <http://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/comissoes/comissoes-permanentes/cdhm/comite-brasileiro-de-direitos-humanos-e-politica-externa/ConvIntElimTodForDiscRac.html>. Acesso em: 13 jan. 2018.15 “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade”. Declaração Univer-sal dos Direitos Humanos. Disponível em: <https://www.unicef.org/brazil/pt/resources_10133.htm>. Acesso em: 13 jan. 2018.16 Isto é, a aplicação de uma hipótese legislativa a casos semelhantes, mesmo que os últimos não estejam tipificados em lei.

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segura que a lei não pode ter efeitos no passado para punir a conduta antes não tipificada.d) Princípio do Primado ou da Máxima Subordinação à Lei Penal Substantiva ou Substancial: o princípio da legalidade deve se estender a todas as arestas que compõem o sistema penal (lei, decreto, regulamento, acórdão, etc.). e) Princípio da Representação Popular: restringe o processo elaboração de lei em sentido formal ao Poder Legislativo, e garante a representação popular.

Já os princípios de limitação funcional e pessoal podem, ainda, ser divididos em: da resposta não contingente; da proporcionalidade abstrata; da idoneidade; da subsidiariedade; da proporcionalidade concreta; da implementação adminis-trativa da lei; do respeito pelas autonomias culturais; do primado da vítima; da personalidade; da responsabilidade pelo fato; da exigibilidade social (BARATTA, 2004). Tais princípios, se bem e associados a estratégias e mecanismos outros, são aptos para a elevação do Direito Penal a outro patamar digno de um verdadeiro Estado Democrático de Direito17. A seletividade aliada à violência arbitrária de um sistema paradoxalmente limitado, voraz por nova clientela desde sua concepção, resulta, como se pôde aferir nas seções anteriores, em violações institucionaliza-das e constantes de Direitos Humanos e de garantias fundamentais previstas em Constituição e em legislação interna ou externa, supralegal18 (como Tratados e Convenções, no Brasil, por exemplo), ou não.

O cárcere, para além de carregar em seu alicerce a contradição estruturalizante do sistema em que se insere, vale-se de violência inútil. Portanto, para que perdure e se legitime, pelo menos a médio prazo, deve recorrer a “minimalismos”, a exem-plo do Direito Penal Marginal e Mínimo latino-americano de Zaffaroni e italiano de Baratta (SANCHES, 2010). Assim, em longo prazo, talvez utopicamente, dis-pensamos qualquer controle social punitivo institucionalizado pelo Estado.

5. Conclusão

O modelo prisional atualmente utilizado pela maioria dos países não é eficien-te. Falha em questões de infraestrutura, condições básicas, superlotação e, sobretu-do, nos deveres de promover o patamar mínimo de garantia dos direitos humanos 17 “Em termos sintéticos, o Estado Democrático de Direito é a soma e o entrelaçamento de: constitu-cionalismo, república, participação popular direta, separação de Poderes, legalidade e direitos (indivi-duais e políticos)” (SUNDFELD, 2009, p. 54).18 No caso do Brasil, uma decisão sobre esse assunto foi emblemática: no Recurso Extraordinário n. 466.343, o Supremo Tribunal Federal reconheceu, por maioria, o caráter supralegal (acima das leis ordinárias, mas abaixo da Constituição Federal) dos Tratados e Convenções de Direitos Humanos dos quais o país faz parte.

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para os e as detentos/as. Somado a esses aspectos, está o fato de uma abordagem punitivista e seletivista afetar de forma desproporcional setores marginalizados da sociedade, com especial atenção para grupos racializados. Os números do encarce-ramento têm aumentado nos últimos anos, fazendo com que cada vez mais pessoas estejam sujeitas a tal mecanismo falho e degradante (UNODC, 2015).

Existem cinco propósitos da prisão: denúncia de um ato condenável; puni-ção; dissuasão; incapacitação ou administração de risco; e reabilitação ou resso-cialização (JACOBSON; HEARD; FAIR, 2017). Porém, raramente esses cinco propósitos são alcançados a partir do cárcere dentro do contexto atual. Quando o aprisionamento é a única ferramenta que o Estado lança mão: (i) a denúncia é comprometida, uma vez que cria um estigma associado ao tempo passado na prisão e se torna uma barreira para a reintegração social; (ii) a punição não é justa ou proporcional, pensando que ela se dá não somente por meio da privação da liberdade, como previsto no aparato normativo, mas também por intermédio da submissão a situações degradantes e de violência física e psicológica; (iii) os efei-tos da dissuasão são limitados, já que o ambiente carcerário leva a um impacto po-sitivo mínimo no comportamento no nível individual com relação à vida externa; (iv) a administração de risco é custosa e danosa, considerando que ela pode ser atingida por meio de outras estratégias de restrição ou controle, como monitora-mento eletrônico e supervisão direta; e (v) a ressocialização é quase nula, visto que é inerentemente contraditório considerar que medidas que envolvem separação da família e da comunidade, horas de confinamento, convivência forçada com outros condenados e exposição a condições desumanas e violentas atingirão tal propósito (JACOBSON; HEARD; FAIR, 2017).

Considerando os princípios do Direito Penal Mínimo já citados, dentre os quais o princípio do respeito pelas autonomias culturais e da proporcionalidade concreta se destacam, e a necessidade de garantir tanto o bem-estar dos lesados quanto à proporcionalidade com relação às sanções promovidas aos acusados, conclui-se que medidas alternativas não privativas da liberdade são capazes de atingir os ob-jetivos do cárcere em um número significante de casos e devem ser adotadas nas estratégias de segurança dos Estados (JACOBSON; HEARD; FAIR, 2017). Como defendido pelo Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos em visita à América do Sul, “medidas focadas só no encarceramento e na construção de novas prisões não são adequadas para enfrentar a situação. As alternativas pe-nais e a ressocialização também devem ser incluídas no debate” (ONU, 2017).

Para além disso, é necessário rever a forma como a segurança pública é encara-da nos países, principalmente com relação às alternativas violentas e militarizadas de combate, como o caso da guerra contra as drogas no continente americano (UNIC RIO, 2016). A maneira como a administração interna das detenções lida com os encarcerados é outro ponto que precisa ser revisto, não só em termos de estrutura, mas também em termos de relação profissional. Como bem define o

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Manual de Administração Prisional: uma abordagem em direitos humanos (2009, p. 21), “homens, mulheres e crianças que estão na prisão continuam sendo seres humanos. Sua humanidade vai além do fato de eles serem prisioneiros”. Ademais, diante do encarceramento massivo, o abandono estatal e o autogoverno que sur-gem como aspectos definidores de alguns sistemas prisionais, sobretudo aqueles do Sul Global, nasce a urgência para que

se desenvolvam entendimentos mais matizados sobre até que ponto a literatura sociológi-ca clássica sobre a vida nas prisões seria aplicável para além do Norte, especialmente te-orias sobre o panoticismo, as dores do encarceramento e as instituições totais. (DARKE; KARAM, 2016, p. 10).

Por fim, deve-se reconhecer o racismo como condição central na dinâmica do sistema prisional de diversos países, com destaque para os anteriormente abor-dados: Estados Unidos e Brasil. A seletividade penal faz com que a aplicação da lei seja desproporcional entre pessoas de diferentes raças e de diferentes riquezas e fortalece um ciclo de perpetuação de opressão e violência racial, invisibilizada no seio da sociedade, tornando o sistema de punição estatal realmente punitivo apenas para negros e pobres, criminalizando as próprias existências desses. Como Flauzina (2006) aponta:

A questão gira em torno do fato de que assumir o racismo enquanto variável central na estruturação do empreendimento de controle social penal redundará necessariamente em caracterizar sua movimentação como genocida. Mais: a partir desse tipo de constatação estão abertas as portas para que se acesse um projeto de Estado de extermínio da popula-ção negra que atravessa todas as áreas da intervenção institucional.A recusa a se pensar o sistema penal a partir do tipo de perspectiva que propomos serve, portanto, necessariamente à manutenção dos projetos hegemônicos, na construção de um discurso funcional ao sistema. (FLAUZINA, 2006, pp. 137 – 139).

É preciso, portanto, que se fale do projeto atual de punição, tão silenciado por todos, e que só corrobora números absurdos de desproporcionalidade e violência institucionalizada. Somente por meio de uma abordagem de raça e da conscien-tização sobre um modelo que pune apenas setores marginalizados, as políticas públicas de segurança e direitos humanos dos Estados alcançarão a capacidade de garantir que toda pessoa tenha protegidas sua liberdade e segurança pessoais (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1966).

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