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1 UNIVERSIDADE FEDERAL DO TOCANTINS CAMPUS UNIVERSITÁRIO DE ARAGUAÍNA CURSO DE LICENCIATURA EM GEOGRAFIA ADRIANO DIAS GOMES KARAJÁ REVITALIZAÇÃO DAS PINTURAS CORPORAIS: UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A EDUCAÇÃO ESCOLAR DO POVO KARAJÁ-XAMBIOÁ O trabalho apresentado ao Curso de Licenciatura em Geografia, como requisito obrigatório para a aprovação na disciplina de Trabalho de Conclusão de Curso. Orientador: Prof. Dr. Francisco Edviges Albuquerque ARAGUAÍNA 2017

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO TOCANTINS

CAMPUS UNIVERSITÁRIO DE ARAGUAÍNA

CURSO DE LICENCIATURA EM GEOGRAFIA

ADRIANO DIAS GOMES KARAJÁ

REVITALIZAÇÃO DAS PINTURAS CORPORAIS: UMA

CONTRIBUIÇÃO PARA A EDUCAÇÃO ESCOLAR DO POVO

KARAJÁ-XAMBIOÁ

O trabalho apresentado ao Curso de

Licenciatura em Geografia, como requisito

obrigatório para a aprovação na disciplina de

Trabalho de Conclusão de Curso.

Orientador: Prof. Dr. Francisco Edviges

Albuquerque

ARAGUAÍNA

2017

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ADRIANO DIAS GOMES KARAJÁ

REVITALIZAÇÃO DAS PINTURAS CORPORAIS: UMA

CONTRIBUIÇÃO PARA A EDUCAÇÃO ESCOLAR DO POVO

KARAJÁ-XAMBIOÁ

O Trabalho apresentado ao Curso de

Licenciatura em Geografia, como requisito

obrigatório para a aprovação na disciplina de

Trabalho de Conclusão de Curso.

Orientador: Prof. Dr. Francisco Edviges Albuquerque

BANCA EXAMINADORA

APROVADO EM: _____/_______/______

_____________________________________________________________

Prof. Dr. Francisco Edviges Albuquerque/UFT

Colegiado de Letras

(Orientador)

_______________________________________________________________

Prof. Dr. Jean Carlos Rodrigues/UFT

Colegiado de Geografia

(Membro Interno)

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AGRADECIMENTOS

Em memória de minha mãe Deuzuita Karajá, que sempre dizia a mim que “a única coisa

que ela poderia nos dar era a educação, porque era de graça”. E nessa caminhada da

vida mesmo com tão poucos recursos nos deu o seu melhor.

Aos meus irmãos, Avanilson Karajá, Simone Karajá, Simayra Karajá, Anderlan Karajá,

Marleys Karajá, MaylaneKarajá,Welder Karajá e Kaylane Karajá.

Minha avó (mãe) Violeta Karajá, se cheguei até aqui foi por que Deus ouviu suas

orações, sou grato a tudo que me ensinou.

Meus três pequenos filhos, Bruna Karajá, Adrian Levi e meu bebezinho Ana Clara, por

compreender a minha ausência durante esse período de estudo.

Aos meus tios (a), pelos conselhos e ajuda quando foi preciso.

Em memória de meu tio Jucelino Karajá, que sempre me ouvia fala de meus projetos e

apoiava. E por tudo que me ensinou durante sua passagem aqui na terra.

Ao meu orientador Prof. Dr. Francisco EdvigesAlbuquerque, pela sua valiosa amizade e

orientação.

Raquel Palmeira, por ser essa pessoa maravilhosa, companheira, amiga, hoje namorada,

amanhã noiva e futura esposa.

Os Professores Indígenas Augusto Kuraha Karajá e José Iran Telokura Karajá, por

apoiar este e outros trabalhos.

Eliene Santos, afinal são 4 anos me suportando todos os dias, me mostrou o valor de

uma amizade leal, e que sozinho não chegaremos a lugar algum.

NelderOliveira Chaves, Prof. Dr. Jean Carlos Rodrigues. quedesde o início apóia todos

os meus projetos e ajuda a executar todos, um amigo incrível que sempre está exposto a

ajudar.

E principalmente a Deus por ter proporcionado a oportunidade e sabedoria para a

realização deste trabalho.

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LISTA DE ABREVIATURAS

DSEI – Distrito Sanitário Especial Indígena

INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio

Teixeira

MEC – Ministério da Educação

RCNEI – Referencial Curricular Nacional Para as Escolas Indígenas

UFG – Universidade Federal do Goiás

FUNASA – Fundação Nacional da Saúde

SPI – Serviço de Proteção ao Índio

FUNAI – Fundação Nacional do Índio

LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

PNE -Plano Nacional deEducação

SEDUC – Secretaria de Educação e cultura

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LISTA DE FIGURA

Figura 01. Mapa da T.I Karajá Xambioá .....................................................05

Figura 02. Grafismo do Povo inỹ (Karajá, Javaé e Xambioá) .....................14

Figura 03. Mito da origem das pinturas corporais do povo Xambioá..........16

Figura 04. Pintura Hãwyy uri riti ................................................................18

Figura 05. Pintura do Sõsõ ..........................................................................19

Figura 06. Pintura do Jyre ...........................................................................19

Figura 07. Pintura da Haru ..........................................................................20

Figura 08. Pintura Otubunỹ .........................................................................20

Figura 09.Pintura Txaõhi ............................................................................21

Figura 10. Pintura Hawyynimaraha ............................................................21

Figura 11. Novas Pinturas Corporais ..........................................................22

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“Se achamos que nosso objetivo aqui, na nossa

rápida passagem pela Terra, é acumular riquezas,

então não temos nada a aprender com os índios.

Mas se acreditamos que o ideal é o equilíbrio do

homem dentro de sua família e dentro de sua

comunidade, então os índios têm lições

extraordinárias para nos dar.”

Cláudio Villas-Bôas

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RESUMO Essa pesquisa parte da premissa da análise da realidade e da historicidade dos usos dos grafismos do povo Karajá-Xambioá, fazendo um apanhado histórico e cultural da representatividade e da interface entre o grafismo e território na composição cultural desse povo. O povo Karajá-Xambioá, também conhecido como Karajá do Norte ou Irarumahadu (povo de baixo), pertencente ao tronco linguístico Macro-Jê, e família língua Karajá, possui uma população aproximada de 543 (DSEI 2016) indígenas, distribuídos em quatro aldeias; Xambioá, Kurehê, WariLỹtỹ e Hawa Tamara. O grafismo possui sentidos diversos, não somente na vaidade, mas na busca pela estética perfeita, mas pelos valores que são considerados e transmitidos através da arte dos traços tradicionais, os desenhos, por sua vez, representam a pele de animais existente da região. Com isso, o grafismo é distribuído entre homens, mulheres e crianças. O contato com o não indígena causou danos a história desse povo, quase perdeu sua identidade cultural, deixando de praticar seus rituais, dentre eles a sua pintura corporal, os indígenas mais novos já não pintavam mais seu corpo, e assim algumas dessas pinturas desapareceram. A pesquisa propõe um resgate sobre a cultura da “arte indígena” tendo como princípio norteador o foco a ser estudado, especificamente o grafismo corporal do povo Karajá – Xambioá, contribuindo para a manutenção e registro das pinturas, além de ser também uma importante peça para a educação escolar indígena do povo, assegurando as memórias e os traços para as futuras gerações. PALAVRAS-CHAVE: Pinturas corporais; Karajá – Xambioá; Grafismo.

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Abstract

This research starts from the premise of the analysis of the reality and the historicity of the uses of the Karajá-Xambioá people's graphics, making a historical and cultural representation of the representativeness and the interface between graphics and territory in the cultural composition of these people. The Karajá-Xambioá people, also known as Karajá do Norte or Irarumahadu (people from below), belonging to the Macro-Jê linguistic trunk and the Karajá language family, have a population of approximately 543 (DSEI 2016) indigenous, distributed in four villages; Xambioá, Kurehê, Wari Lỹtỹ and Hawa Tamara. Graphism has different senses, not only in vanity, but in the search for perfect aesthetics, but for the values that are considered and transmitted through the art of traditional traits, the drawings, in turn, represent the animal skin existing in the region. With this, the graphic is distributed among men, women and children. The contact with the non-indigenous caused damage to the history of this people, almost lost its cultural identity, no longer practicing its rituals, among them its body painting, the younger natives no longer painted their body, and some of these paintings disappeared. The research proposes a rescue on the culture of "indigenous art", having as guiding principle the focus to be studied, specifically the corporal drawing of the Karajá - Xambioá people, contributing to the maintenance and registration of the paintings, besides being also an important piece for the indigenous school education of the people, ensuring the memories and traits for future generations.

Keywords: Body paints; Karajá-Xambioá; Graphics.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.................................................................................................... 01

CAPÍTULO I

1.AspectosHistóricos do povo Karajá Xambioá..............................................................04

1.1.Grafismo do Povo Karajá-Xambioá......................................................................... 11

CAPÍTULO II

2.Processo de revitalização do grafismo na T.I Karajá-Xambioá.................................. 15

2.1O grafismo................................................................................................................ 17

2.2. Educação escolar na T.I.Karajá-Xambioá................................ ............................. 22

CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................... 28

GLOSSÁRIO............................................................................................................... 29

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................... 31

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INTRODUÇÃO

O povo Karajá-Xambioá também conhecido por Karajá do Norte está localizado

a margem direita do Rio Araguaia no município de Santa Fé do Araguaia, demarcada

em 03 de novembro de 1997com uma área de 3.326.3502 há, (três mil, trezentos e vinte

e seis hectares, trinta e cinco ares e dois centiares) de floresta amazônica, considerada

área de transiçãoe distribuída em quatro aldeias: Xambioá, Kurehê,Wary-Lỹtỹ e Hawa

Tamara, e uma população de 543 habitantes segundo dados do DSEI/FUNASA (2016).

Os Karajá Xambioá são classificados segundo Rodrigues (1986) como pertencentes ao

tronco linguístico Macro-Jê, e à família linguística Karajá, é falante do Inỹrybè (fala do

povo Inỹ).

O povo Xambioá preserva o meio em que vive utilizando recursos naturais

necessários para sua sobrevivência, com um solo propicio para a agricultura de

subsistências utilizando o sistema de roça de toco, a coleta de frutos, além da caça e

pesca que são atividades essenciais para a alimentação do povo. Matem cerca de 85%

de seu território preservado, uma vasta floresta em sua grande maioria ainda virgens,

possuem uma rica biodiversidade dividida entre várias espécies de animais e plantas,

banhado pelo Rio Araguaia os Xambioá tiram grande parte de sua alimentação das

águas, uma base alimentar entre peixes e tartarugas.

Para garantir o território a margem do Rio Araguaia o povo Xambioá tem em

sua história relatos de guerras com diversos grupos indígenas, como os Kayapó, Xikrin,

Metuktire os Apinayé e os Akwem (Xerente) e os já extintos Irã-amrãire, no século XIX

(TORAL, 1992), cujas aldeias encontravam-se instaladas em pontos do baixo Araguaia,

depois de anos de conflitos esses povos já temendo o Xambioá saíram das margens do

rio e procuraram outros territórios ao centro do Norte Goiano e outros fugiram para o

estado do Pará.

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Depois dos conflitos alguns Xambioá subiram o rio Araguaia, outros

permaneceram para garantir a permanência do território, os indígenas que subiram rio a

cima chegando ate a ilha do bananal e se autodenominaram Karajá, mesmo distante esse

povos estão ligados não somente pelo tronco lingüístico, mas por laços familiares, anos

mais tarde surge o povo javaé uma extensão deste mesmo povo, assim deu origem ao

povo Inỹ tronco lingüístico macro jê. A ramificação de um povo mostra que a luta pelo

território foi gratificante, hoje podemos dizer que apenas o povo Karajá é o único povo

indígena que predominam as margens do rio Araguaia, a historia mostra que para ser o

único povo predominante sobre o rio, os Xambioá e suas ramificações travaram árduas

batalhas contra outros povos indígenas e ate mesmo contra o governo.

Anos mais tarde a partir das primeiras décadas século XVIII iniciou-se o

processo de ocupação econômica de Goiás, com base na exploração aurífera que se

desenvolvera segundo a orientação da política mercantilista do estado Absolutista

portuguesa, de São Paulo saiam as Bandeiras que, buscava índios cada vez mais

escassos, chegavam com frequência até o extremo norte de Goiás, região do

estreito,quando os bandeirantes chegaram ao então norte Goiano, este território, já era

habitado por diversos grupos indígenas. Naquela época, ao verem suas terras invadidas,

muitos foram os que entraram em conflito com os bandeirantes e colonos, em lutas que

resultaram no massacre de milhares de indígenas, aldeamentos oficiais ou migração para

outras regiões. (TORAL, 1992)

Cabe reporta que durante a luta pela a existência e permanência do seu território

frente aos conflitos de ocupação, acredita que o ultimo conflito ocasionou perdas

irreparáveis ao povo, devidos o forte contato muitos indígenas morreram em confronto

comas guarnições militares e bandeirantes, todos fortemente armado com armas de fogo

enquanto os indígenas estava com seus arcos e flechas,muitos indígenas subiram o rio

Araguaia, os que permaneceram se auto denominaram anos mais tarde de Xambioá,

nome devido sua localização esta próximo ao vilarejo que recebe o mesmo nome.

TORAL chama atenção quando diz que o povo Karajá - Xambioá ao longo do

século XIX entrou em conflito não mais com outros povos indígenas, agora a luta era

contra os bandeirantes e as guarnições militares que adentravam cada vez mais o Norte

Goiano, e em meio a esse conflito o povo Xambioá perdeu muitos guerreiros, pois era

impossível lutar contra os armamentos que esses traziam com eles. Os indígenas

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usavam arco e flecha desta forma enquanto os outros usavam fuzil sendo visíveis os

massacres, desta forma foi preciso ceder ao governo, para não ser mais povo que

poderia entra em extinção na luta pelo seu território. (TORAL, 1992)

“Os Karajá de Xambioá, são tradicionais habitantes da região do baixo Araguaia,

no século XIX, quando surgem as primeiras notícias esclarecedoras sobre sua

localização, encontravam se definitivamente separados dos demais Karajá (apenas

alguns bandos percorriam a região ao norte da ponta setentrional da Ilha) e das suas

grandes aldeias. Contatos entre os Karajá Xambioá e os Karajá e os Javaé, já nesse

período, eram bastante raros, mas não inexistentes, devido à sua alta mobilidade, até o

séc.XIX os Karajá Xambioá haviam tido contato com os tori (homens brancos) através

dos assaltos de paulistas às suas aldeias ocorridas durante o séc.XVII e cuja relação está

nos registros de expedições escravagistas no séc.XVIII”.(TORAL, 1992)

“A partir do final do séc. XIX em diante os efeitos dos choques com guarnições militares dos “presídios” construídos na região para vigiá-los e garantir a navegação, da repressão promovida por missionários capuchinhos aliados à violenta aparição de epidemias causaram o desmoronamento de sua população e uma mudança na composição dos grupos. Cerca de aproximadamente 2.000 pessoas em 1842 declinam para 1.350 em 1887, 60 em 1940 e 40 pessoas em 1959, o número mais baixo que jamais atingiram, depois desse declínio surgem então o SPI – Serviço de Proteção ao Índio, que preocupado com o baixo numero de Xambioá, fez algo inesperado introdução o povo Guarany e com o casamento o povo começa a se reerguer.”(TORAL, 1992)

É notório que o povo Xambioá entrou num processo de perda de sua cultura logo

após a introdução de outros indígenas, hoje esse povo passa por um longo processo de

revitalização, já não se falava mais a língua materna, não usava mais os grafismos esses

que são símbolo de força, as comidas típicas já não era mais visto na aldeia, a redução

populacional levou o SPI a tomar medidas drásticas e que anos mais tarde essas

medidas causariam perdas quase que irreparáveis, anos depois é possível ver o problema

causado por essa e outras decisões tomada pelo Serviço de Proteção ao Índio.

Surge então o conflito interno entre família para que fosse assumir o poder

supremo sobre o povo Xambioá, as diversas famílias, cada uma com lideranças

independentes, passaram a entrar em atritos, que se traduziam em brigas, discussões,

acusações de feitiçaria e assassinatos. Segundo depoimento de Lao, cacique do grupo

em 1982, num só dia foram mortos dois velhos, uma mulher e uma criança. A quase

impossibilidade de convívio, aliada a impraticabilidade do porto da aldeia Kabiriryà

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atracassem de grandes embarcações, foram suficientes para seu abandono pela quase

totalidade de seus habitantes. (TORAL, 1992)

“Essa ligação aos antigos grupos locais, geralmente compostos por uma única família extensa, permaneceu através da preservação dos nomes de seus líderes, agora transformados em “sobrenome” dos atuais Karajá - Xambioá um nome completo típico, hoje em dia, compõe-se de: (1) prenome em português, (2) prenome em Karajá, (3) “sobrenome” familiar (i.é, o nome do líder familiar ancestral) e (4) “sobrenome” étnico “Karajá”. Como exemplo temos,os nomes das duas principais lideranças em 1988: Maria FloripesTxuodeseAchurêkarajá e José BororiTxebware Karajá, descendentes dos antigos chefes de família chamados, respectivamente, Achurê e Txebware. Os líderes fundadores dos grupos de descendência atuais nasceram por volta do final do século passado, como o pai de Manuel Achurê, Antônio Achurê.”(TORAL, 1992. p 32)

Em meio a tantos conflitos interno para saber qual família ficaria no poder, no

ano de 1984 a família achurê se rompe formando então duas na ocasião Maria Violeta

filha de Manoel Achurê se unir a família txebware, e no ano de 1985 essas duas famílias

desce o rio e fica acampada na praia, quando encontra um lugar adequado eles fazem

uma roça e alguns meses depois passaria ser a nova aldeia cujo nome Kurehê, em

homenagem ao um ancião do povo. Essa por sua vez serviria de suporte para a criação

de mais duas aldeias, hoje Maria Violetas que criou a terceira aldeia cujo nome é Wari–

Lỹtỹ, cria agora uma quinta aldeia que recebe o nome do seu pai Aldeia Manoel Achurê

e que a principio somente seus filhos e netos que residem nesta aldeia

Anos depois do contato com não indígena o povo foi perdendo parte de sua

identidade, para o indígena sua língua, crenças, religião em fim sua cultura e visto como

identidade, essa o povo Xambioá estava perdendo devido ao forte contato, um erro

causado pelo SPI quando permitiu a entrada e casamento de não indígenas com

indígenas, a historia chama atenção para um detalhe importante, quando falado que o

povo Xambioá quase foi extinto devido a uma serie de mortes por causas de doenças, o

SPI na época trouxe outro povo indígena o Guarany e permitindo aos não indígenas

acesso ao povo.

O povo Xambioá passa por um processo de revitalização, visto que o SPI tem

sua contribuição para que esse povo passe por esse processo, por que se ao invés de

introduzir o povo Guarany e os não indígenas, por que então não introduziram o Karajá

que pertence ao mesmo tronco lingüístico, acredito que se tivesse ocorrido desta forma

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o Xambioá não estaria passando por essa revitalização. Já no ano 2000 depois do erro a

então FUNAI trouxe uma família de Karajá da ilha do Bananal, essa família juntos com

os mais velhos e a participação da escola tem resgatado a dignidade do povo através de

sua cultura.

Podemos nos reportar ao calendário do povo xambioá para conhecermos o ciclo

de vivência, lembrando que esse povo se baseia também pela enchente e seca do rio, no

período de seca o xambioá deixa suas aldeias e passam a morar nas praias, mantendo

assim um ciclo cultural dos seus ancestrais, que usavam as praias como forma de

proteção contras os ataques de outros povos que não sabiam usar utilizar se do rio. Já no

período de cheia do rio eles retornam para suas aldeias para o cuidado com suas roças, e

das demais atividades matinais da aldeia. Dessa forma o povo usa seu calendário da

seguinte forma:

Janeiro – debòahãdu – mês do início do ano.

Fevereiro – beèmyhỹkỹahãdu – mês das grandes enchentes.

Março– beòratyaahãdu – mês da média enchente.

Abril– behetxiahãdu - mês em que o rio começa a baixar.

Maio– wyratỹmyraahãdu – mês do início do verão.

Junho– wyratỹmyraahãdu – mês do início da derrubadadas roças.

Julho– otu sina dele ahãdu – mês em que o tracajá começa a botar ovos na praia.

Agosto– otuniberesènaahãdu – mês em que as tartarugas começam sua desova na.

Setembro – asideriònõirasaahãdu – mês em que o ipê amarelo floresce.

Outubro– biuahãdu – início as primeiras chuvas.

Novembro – hãbunõetèsònaahãdu – mês do caju.

Dezembro – ura nõirasaahãdu – mês em que as mangas estão florescendo.

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CAPÍTULO I

1. HISTÓRIA DO POVO KARAJÁ XAMBIOÁ

A Terra Indígena Xambioá, para além de considerável extensão do Rio Araguaia

e de todo o território de matas e cerrado circundantes, é composta atualmente por quatro

aldeias: Xambioá, Wary-Lỹtỹ, KurehêeHawa-Tymara, e recentemente a Indígena Maria

Violeta Achurê Karajá em uma reunião seus filhos e netos apresentou a proposta da

criação de uma quinta aldeia por nome de Manoel Achurê, todas essas aldeias são

constituídas predominantemente por famílias Karajá Xambioá, mas também por um

grande número de famílias Guarani Mbyá. Muitas são ainda as famílias constituídas

através de casamentos interétnicos entre indígenas e não indígenas.

“A presença de não indígenas, assim como a do povo Guarani foi, em

determinado momento, crucial para o restabelecimento quantitativo do povo Karajá-

Xambioá, quando de sua maior redução populacional, em 1960, quando chegaram a

apenas 40 pessoas” (TORAL, 2001, p. 4). “Contudo, se por um lado a presença não

indígena contribuiu com a manutenção física do povo Xambioá, através de casamentos

Inter étnicos, por outro lado, contribuiu também com mudanças significativas em seus

costumes e tradições étnicos” (TORAL, 1992, p. 31).

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FIGURA 01. Mapa da T.I. Karajá Xambioá

Fonte. FUNAI, 2017.

“O Xambioá está nas margens do Rio Araguaia há pelo menos quatro séculos, as

primeiras informações sobre a localização do grupo, que datam do final do século XVI,

caracterizaram como habitantes do baixo e médio curso desse rio, ou seja, o Xambioá

nunca se afastou daquilo que consideram seu território tradicional, mesmo depois da

ocupação de uma boa parte dele pelos brasileiros, a fundação de núcleos pioneiros no

alto Araguaia serviu como um fator a mais para o estabelecimento de aldeias nessa

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região, alguns grupos locais, numericamente insignificantes, viviam no baixo curso de

alguns de seus afluentes.”(TORAL, 1992)

Por várias vezes seus territórios foram ameaçados por outros povos indígenas, as

guerras sempre constantes estavam dizimando alguns povos, visto que diante de tanto

conflito e temendo a extinção alguns povos tiveram que deixar as margens do Rio

Araguaia e buscar o centro do território que anos mais tarde passaria ser conhecido

como norte Goiano e depois Estado do Tocantins, (dados do livro Economia e

Escravidão na Capitania de Goiás, Gilka Vasconcelos de Salles, Cegraf) encontrou

média de 08 mil índios.

“Depois de expulsarem outros povos indígenas das proximidades de seu

território, e anos mais tardes os bandeirantes quase levaram esse povo à extinção na

busca por índios escravos, os Xambioá entraram em confronto com as guarnições

militares do já norte Goiano e em forma de vingança os indígenas destruíram o presídio

de santa Maria construído para garantir a navegação dos padres e navegadores que

utilizava o Rio Araguaia para se locomover. Anos mais tarde, o Karajá-Xambioá se

torna o único povo absoluto nas margens do Rio Araguaia, e logo a briga interna fez

desse povo guerreiro se dividir, um grupo subiu o rio e passou a ter seu território na ilha

do bananal no Estado do Tocantins, outro grupo também foi ate a ilha, mas por não

estarem, mas as margens do rio ele se autodenominaram de Javaé, e os Xambioá

permaneceram no mesmo lugar onde residem hoje.”(TORAL, 1992)

Em meio a esses conflitos ouve um relato na historia onde os Xambioá forma

aliança com outro povo indígena, os Xerente que anos depois se autodenominaria

Akwem, passa a luta desta vez ao lado dos Xambioá para garantir o território, juntos

criaram diversas estratégia de batalhas dentro e fora do rio Araguaia, os indígenas

atacavam as embarcações apenas para mostra sua força e dizer que este lugar já tem

dono. O governo então passa a atacar mais uma vez os indígenas, dizimando aldeias e

ate mesmos povos, desta forma os guerreiros indígenas atacaram o presídio de Santa

Maria sendo considerado na época um grande massacre aos padres que ale morava.

Toral cgama atenção desta vez para os diversos nomes que o povo Xambioá

recebeu ao longos dos anos, No passado foram conhecidos por Karajá do Norte, entre os

demais grupos de língua Karajá são conhecidos como ixybiowa ou ainda de

irarumahãdu ("turma de baixo"), em oposição aos demais, chamados de ibòòmahãdu

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("turma do alto"), conforme sua localização ao longo do Rio Araguaia, os membros do

grupo indígena quase nunca utilizam a palavra Xambioá para se autodenominarem.

"Xambioá" que vem de ixybiowa ("amigo do povo") que era como se chamava uma

aldeia que existiu na foz do rio de mesmo nome, a montante do atual Posto Indígena.

Especulativamente, pode-se supor que o nome tenha sido aplicado a todos seus

habitantes e, posteriormente, a todos os Karajá de Xambioá, mais comumente serve

como designação da atual região da cidade de Xambioá.(TORAL, 1992. p. 33)

“Para o povo Karajá a água é vida, é como o sangue que corre em suas

veias, por issoa forte relação deste com a água. E também, os relatos

mitológicos de que o povo Karajá surgiu das águas. [...] Nesse sentido, os

Karajá faz suas múltiplas leituras, visto que os mitos não pertencem a um

determinado tempo ou espaço, mas a sua história, e, também, são heranças

e representam à imagem e os pensamentos do povo” (ALVES, 2009, p. 25 e

27).

O mito de origem dos Karajá conta que eles moravam em uma aldeia no fundo

do rio, onde viviam e formavam a comunidade dos BerahatxiMahadu, ou povo do fundo

das águas, satisfeitos e gordos, habitava um espaço restrito e frio, interessado em

conhecer a superfície, um jovem Karajá encontrou uma passagem, inỹsedena, lugar da

mãe da gente (TORAL, 1992 p. 7). Fascinado pelas praias e riquezas do Araguaia e pela

existência de muito espaço para correr e morar, o jovem reuniu outros Karajá e subiram

até a superfície.

Tempos depois, encontraram a morte e as doenças, tentaram voltar, mas a

passagem estava fechada, e guardada por uma grande cobra, por ordem de Koboi, chefe

do povo do fundo das águas resolveu então se espalhar pelo Araguaia, rio acima e rio

abaixo. Com Kynyxiwe, o herói mitológico que viveu entre eles, conheceu os peixes e

muitas coisas boas do Araguaia, depois de muitas peripécias, o herói casou-se com uma

moça Karajá e foi morar na aldeia do céu, com base no mito surge então o povo Karajá-

Xambioá.

“Devido à perda de população e à mudança nas suas condições de vida em geral,

os Karajá - Xambioá simplificaram sua vida cerimonial, mantiveram, no entanto, suas

festas de iniciação masculina, realizadas anualmente no dia 19 de Abril, o Dia do Índio,

nesse cerimonial, que marca a passagem de grau de idade de "meninos" para a de

"rapazes", a aldeia é visitada por representações de kàralahuni, "espíritos de guerreiros

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Kayapó" (mortos em combate com os Karajá do Norte atual Xambioá), que se associam

aos inicia dos espíritos protetores. Os kàralahuni são alimentados pelas famílias dos

iniciando, que lhes preparam o korotxu, bolo de beiju recheado com pedaços de peixe,

assim como os demais grupos de língua Karajá, os Karajá - Xambioá enfatizam a

iniciação masculina realizando-a, igualmente, no auge para o final da estação das

chuvas”. (TORAL,1982 p 12).

Os povos de língua Karajá se veem como pertencentes a parentelas de vivos

(wasỹ) e de mortos (wabàdè), de acordo com Toral(1982), ‘todo o território Karajá se

relaciona intimamente às parentelas dos mortos que o ocuparam, reconhecidas pelos

nomes de seus líderes ancestrais masculinos”, as parentelas de vivos que o ocupam

evocam os nomes desses seus ancestrais para justificarem direitos a parcelas desse

território. Os Karajá organizam-se basicamente em famílias extensas, partes de

parentelas com expressão territorial, organizadas em facções com elevado potencial de

fissão em relação à comunidade onde vivem, suas menores aldeias são formadas por

apenas uma família extensa, onde geralmente o sogro vive acompanhado pelas famílias

dos genros; as grandes, por uma reunião de parentelas formadas por diversas famílias

extensas, os componentes dessas parentelas também costumam apresentarem-se

espalhados por diversas aldeias, o que impede a existência de hostilidade entre estas.

O Karajá - Xambioá, como os demais grupos de língua Karajá, marca o que

corresponderia às nossas estações do ano pelo regime das águas do rio: "início da

enchente", período entre o fim das enchentes e início da vazante quando o rio fica

estacionado (behetxi), "tempo das praias novas" (vazante) e "tempo das praias"

(estiagem). Suas manifestações religiosas, formas de organização social e política, bem

como suas atividades de subsistência encontram-se centradas na sua relação com o rio

durante o ciclo de estações. Cada estação pressupõe um ritmo e atividades sociais bem

definidas. O tempo da chuva e do estio não marca apenas regimes de subsistência bem

diferenciados, mas também a chegada e partida de seres sobrenaturais esperados e

recebidos pelos grupos de Língua Karajá ao longo do ano e os movimentos de reunião e

dispersão dos habitantes das aldeias, que resultam em formas sociais singulares no

tempo das chuvas e do estio. (TORAL,1992 p. 14).

O povo Xambioá estabelece divisão social entre os gêneros desta forma defini

socialmente os papéis dos homens e mulheres, aos homens cabe à defesa do território, a

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abertura das roças sendo que essas roças são feitas em capoeiras próximo as aldeia, e

com a prática da coivara, são cultivados o milho, a mandioca, a batata, a banana, a

melancia, o cará (inhame), o amendoim, o feijão e recentemente o arroz, e realizam

também a coleta do mel silvestre, as pescarias familiares ou coletivas, as construções

das casas de moradia, as discussões políticas formalizadas na Casa de Aruanã ou praça

dos homens, a negociação com a sociedade nacional e a condução das principais

atividades rituais, já que eles equivalem simbolicamente à importante categoria dos

mortos.

As mulheres são responsáveis pela educação dos filhos até a idade da iniciação

para os meninos e de modo permanente para as meninas, pelos afazeres domésticos,

como cozinhar, colher produtos da roça, a atividade de coleta atualmente se limita a

diversas frutas sazonais tais como o murici, a marmelada, bacaba, macaúba e anajá em

dezembro, do açaí em agosto e do cajá em fevereiro, além dessas espécies nativas, o

grande número de mangueiras existentes na aldeia fornece-lhes boa quantidade de frutos

nos meses de dezembro e janeiro, pelo cuidado com o casamento dos filhos,

normalmente gerenciado pela as avós, pela confecção das bonecas de cerâmica, que se

tornaram uma importante renda familiar fomentada pelo contato, além da pintura e

ornamentação das crianças, das moças e dos homens para os rituais do grupo. (LIMA

FILHO, 2006, p.144 e 145).

O Povo Xambioá prefere a monogamia e o divórcio é censurado pelo grupo, se a infidelidade do homem casado se torna pública, os parentes masculinos da mulher abandonada castigam severamente o infrator perante toda a aldeia, numa grande ação dramática, que pode tomar proporções maiores com o acirramento de ânimos entre os grupos domésticos envolvidos, resultando inclusive em queima da casa da família do marido. As mulheres de vida sexual pública, uma vez casada e com suas unidades domésticas próprias, deixam de receber comentários reprovadores da comunidade, já que a constituição da família é um referencial cultural importante para os Karajá. (SILVA eGRUPIONI, 2001, p.242).

Na infância, a criança fica a maior parte do tempo com a mãe e avós. Entretanto,

a diferença entre os gêneros ganha maior proporção quando o menino chega à idade de

sete a oito anos e tem o lábio inferior perfurado com osso de guariba, depois, ao

alcançar a faixa entre dez a doze anos de idade, o menino passa por uma grande festa de

iniciação masculina denominada Hetohokỹ ou Casa Grande, eles são pintados com a

tinta preparado do jenipapo e ficam confinados durante sete dias numa casa ritual

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chamada de Casa Grande. Os cabelos são cortados e ele é chamado de jyre ou ariranha,

na primeira menstruação, a moça passa a ser vigiada pela avó materna, ficando isolada,

a sua aparição pública, quando está bem enfeitada com pinturas corporais e enfeites

plumárias para dançar com os Aruanãs, é muito prestigiada pelos homens

(TORAL,1982 p. 20).

O casamento do povo Xambioá deixou de ser aquele arranjado pelas avós dos

pretendentes, preferencialmente da mesma aldeia, os casamentos tradicionais só podem

ser realizados quando os jovens estão aptos a ter relações sexuais, os casamentos são

proibidos entre parentes próximos até os primos de primeiro grau, e no casamento é

comum à ida do rapaz para a casa da moça, o que pode ser precipitado se algum parente

masculino, da parte dela, surpreende algum encontro do casal às escondidas. O homem,

uma vez casado, passa a morar na casa da mãe da esposa, seguindo a regra matrilocal,

quando a família se torna numerosa, o casal faz uma casa própria, mas anexa àquela de

onde saiu, caracterizando espacialmente a família extensa.

Durante anos duas famílias lutaram para ficar no poder, mas já não está no

controle político interno do povo, a família achurê e txebuaré, na aldeia Xambioá esta

no poder (cacique) a família temassari e há também vestígios da família achurê e

txebuaré, já na aldeia Kurehê não há vestígios das grandes famílias do povo Xambioá,

na aldeia Wari-Lỹtỹ o poder está nas mãos da família Lawari, nesta mesma aldeia

encontra-se remanescentes da família Achurê e família Mahunawi, aldeia Hawa Tamara

está no poder a família txebuaré, há os descendentes da família achurê. Recente a

matriarca da família achurê decidiu fazer uma aldeia só com os seus membros

familiares, a principio essa criação trata a família a preservação do nome Achurê.

O Povo Xambioá ao longo de sua história e de seus contatos com o não indígena

teve perdas importantes para a continuação de seu povo, deixando de praticar alguns

rituais de sua cultura, os casamentos com o não indígena vem causando grande impacto

no contexto histórico e cultural deixado pelos antepassados, à tecnologia que deveria ser

usada pelo povo para garantir a preservação através da criação de um acervo cultural,

teve efeito contrário despertando o interesse dos mais jovens para o uso dessa

tecnologia e deixando sua cultura, esse povo que tanto lutou para garantir sua

permanência em seu território, hoje continua à luta para manter sues traços históricos

nesse mesmo território.

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O povo Karajá-Xambioá passou por dois períodos que foram cruciais para a

continuidade de sua existência. O primeiro período foi quando o povo ainda lutava pelas

margens do Rio Araguaia, teve conflitos com outros povos indígenas e não indígena,

chegando à beira da extinção, o Xambioá aceitou a introdução de outro povo indígena,

os Guarani que chegaram com a finalidade de não deixar chegar à extinção do povo

Xambioá. O segundo momento é a introdução de pessoas não indígenas dentro das

famílias tradicionais do povo causando um grande impacto cultural, pois desse contato

que o Xambioá foi deixando sua língua materna e outros traços de sua origem. Se por

um lado a presença não indígena contribuiu com a manutenção física do povo Karajá

Xambioá, no outro houve uma grande perca linguística extremamente latente e

prejudicial.

1.1 GRAFISMOS DO POVO KARAJÁ-XAMBIOÁ Os povos indígenas como originários da nossa terra, exerceram e ainda exercem

grande influência nos hábitos alimentares, na língua, no trato e na sabedoria. A cultura

que atravessou grandes impactos, ainda tem um grito em manter-se viva, na sua arte, no

seu espaço e no seu pedido de respeito. Os grafismos são uma grande representação

artística dos povos indígenas, e seus usos não estão ligados somente à vaidade, ou na

busca pela estética perfeita, mas pelos valores que são considerados e transmitidos

através desta arte. Segundo RCNEI:

Além de outras funções, as produções artísticas dos povos indígenas

são um meio de comunicação da cultura, da vida social e da visão do

mundo. Por intermédio dos objetos, das danças, da pintura corporal e

dos cantos, são transmitidas e/ou registradas as lembranças, os

acontecimentos dos mitos, as referências de parentesco, a existência e

aspectos dos seres sobrenaturais (RCNEI, 1998. p. 288).

Mesmo com a tecnologia dentro das aldeias, alto padrão de infra-estrutura das

escolas dentro dos territórios indígenas e seu suporte pedagógico são possíveis observar

que a forma de ensinar os traços das pinturas corporais continua sendo o método

tradicional, os anciãos desenham um determinado grafismo no chão e em seguida

pedem às crianças que repitam o mesmo desenho, ao andar pela aldeia é possível ver

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algumas pinturas nas paredes das casas, no chão e ate em caule de árvores, sendo assim

notável que esse método de ensino é utilizado ate os dias de hoje.

Diante dos últimos acontecimentos no do povo Xambioá, com a partida de

alguns aciões para o outro mundo e junto com eles toda uma história cultural do povo

surge então à preocupação de resgatar a pintura corporal do povo Karajá-Xambioá. As

pinturas corporais baseiam nos elementos da natureza, os que também representam a

pele de animais existente da região, e todas possuem historias próprias, e são

distribuídos entre homens, mulheres e crianças, cada um com sua própria pintura

corporal. Depois de sofrer um forte impacto através do contato com a população não

indígena, o povo quase perdeu sua língua materna, deixando de praticar seus rituais,

dentre eles a sua pintura corporal, depois do contato os indígenas mais novos já não

pintavam mais seu corpo, e assim algumas dessas pinturas desapareceram.

Durante o trabalho de pesquisa foi possível perceber que o grafismo por mais

beleza que possua seus traços como sabemos possuem aspectos da natureza, mas as

histórias que cada pintura trás consigo somente os anciões sabem contar, no povo

Xambioá todos sabem fazer algum tipo de pintura, mas não sabem falar a cerca dela. Há

mais de 23 anos iniciou-se o processo de revitalização da cultura do povo, porém nota-

se que caminha a passos lentos, e é possível verificar que houve algumas mudanças,

mas ainda existe muito a ser feito, à pintura corporal que foi esquecida por falta de

registro, hoje necessita de uma atenção especial.

A pintura corporal do povo Karajá-Xambioá não é divida por clãs, como ocorre

entre outros povos indígenas, ela e divida entre feminino e masculino, identificando

quem é cada membro entre o povo. Em um ritual de aruanã uma criança tem seu corpo

todo pintado com a tinta extraída do jenipapo, e assim todos sabem que aquela criança

éresponsável por buscar a alimentação do aruanã, e somente ela tem acesso à casa dos

homens, e quando um Xambioá faz uma lista sobre seus olhos, significa que ele esta

preparado para a guerra, essa por sua vez já não é usada mais.

O menino Karajá quando deixa a infância tem que participar do Hetohokỹ e ele

passa a usar uma única pintura durante a festa, ele pinta todo o corpo com tinta de

jenipapo e raspa seu cabelo, então o menino passar a ser conhecido como jyre,dessa

forma as pessoas com quem ele está participando da festa não o consideram mais um

weryry (menino) ele é considerado jyre (menino jovem) e a pintura que ele usa significa

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pintura da ariranha. No período em que a criança está em jyre ele tem funções, enquanto

os homens estão na casa do Hetohokỹ, faz tudo para os mais velhos como buscar água,

lenha, comida e etc, e as mulheres da aldeia mandam recado para os homens através

jyre, enquanto ele estiver de jyre e proibido o uso de outra pintura, porque para o

Karajá, Javaé e Xambioá são nesse período que o menino está terminando a infância.

(SINVALDO KARAJÁ 1994 p. 16)

De acordo com Fénelon Costa, (1968), a pintura corporal é significativa para o

grupo, na puberdade, os jovens de ambos os sexos submetiam-se à aplicação do

omorura, dois círculos tatuados nas faces onde a mistura da tinta do jenipapo com a

fuligem do carvão era aplicada sobre a face sangrada pelo dente do peixe-cachorra, hoje

devido ao preconceito da população das cidades ribeirinhas, os jovens apenas desenham

os dois círculos na época dos rituais. A pintura do corpo, realizada pelas mulheres,

processa-se diferentemente nos homens, de acordo com as categorias de idade, sendo

utilizado o sumo do jenipapo, a fuligem de carvão e o urucum, alguns dos padrões mais

comuns são as listas e faixas pretas nas pernas e nos braços as mãos, os pés e as faces

recebem pequeno número de padrões representativos da natureza, de modo especial, a

fauna.

As pinturas são feitas pelas mulheres nos corpos de seus filhos e de seu marido,

e representam como cada um está se sentindo naquele dia, ou seja, é um meio de

comunicação entre eles. Nos dias comuns, essas pinturas são simples, mas quando tem

festejos, ou nos combates, ela é requintada, chegando a cobrir a testa, as faces e o nariz.

A pintura garante sorte na caça, na guerra, na pesca ou na viagem. As pinturas estão

presentes nas bonecas, nesses padrões das pinturas, encontram-se além das pinturas

corporais, representativas da idade, estrutura familiar, ofício e festividades, referências à

fauna da região e à mitologia dos antepassados.

No que se refere à reprodução da memória coletiva, é importante reportar a

Toral (1992, p. 206), que chama a atenção para o fato de que a pintura corporal, por

exemplo, estaria a principio inspirada em um tempo mítico ideal dos “antigos”, pois os

desenhos teriam sido obtidos pelo herói mitológico Kynyxiwe que tem um papel central

na mitologia Karajá. O conjunto de mitos envolvendo esse personagem é fundamental

para o entendimento das figuras modeladas e pintadas pelas ceramistas. A antropóloga

Edna Luísa Taveira observou:

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São vários os padrões usados caracterizando-se pela combinação de

linhas horizontais e verticais, numa composição geométrica de gregas

quátricas. Os desenhos, pelos nomes que lhes são dados, representam

partes do corpo, da fauna terrestre e aquática: formiga, cobra, urubu,

morcego, peixe, tartaruga, mas nunca o animal no todo. Podem

ocorrer também motivos ornamentais interpretados como elementos

da natureza: “caminho sem fim”, “forquilha”, etc. O único motivo

ornamental que foge a essa regra encontra-se na decoração de alguns

potes, pratos cerimoniais, figuras fantásticas e maracás nos quais

aparece representada a máscara de Aruanã(...)a prática do desenho,

portanto, se insere no processo educativo Karajá, que impõe normas

de uso conforme idade, sexo e papel social”(TAVEIRA, 2002, p. 25).

Atualmente novos grafismos foram apresentados ao povo Xambioá, são

unificações de duas ou mais pinturas, dando surgimento à outra pintura corporal. Há

também os grafismos emprestados dos outros povos Inỹ, os Karajá da Ilha do Bananal e

os Javaé, que pelo processo de revitalização existe um contato mais próximo com a

cultura destes. Essas são pinturas corporais sofreram pequenas modificações e, por esse

motivo, ainda são pouco conhecidas dentro do povo Xambioá.

Esses novos grafismos ainda não receberam nomes, nem classificações

juntamente com suas distribuições. As classificações e suas respectivas distribuições

dividem-se em: Masculino (weryry, jyré, bódu, weryrybó, jyýtyhỹ) e Feminino (ijadomỹ,

e hawyý). Os encarregados de nomear, classificar e fazer a distribuição das pinturas na

cultura é os anciões, por ser considerada a autoridade acima dos demais membros da

aldeia.

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Figura 02. Grafismo do Povo inỹ (Karajá, Javaé e Xambioá)

Fonte: (Silva. 2014 p. 42)

Segundo Ribeiro (1987), embora aparentemente geométricos ou abstratos, os grafismos

são na verdade ‘figurativos’, na medida em que caracteriza um objeto por um traço

básico definidor da forma e, portanto, classificados como desenhos semânticos,

contendo um motivo central e elementos acessórios ou apêndices. Cabe ressaltar que os

grafismos dos Karajá chamam a atenção pelo fato de usarem traços peculiares da

natureza e por esse motivo ocorre uma subdivisão do uso entre gêneros dentro do povo.

O grafismo indígena chamaa atenção não somente pelo fato da pintura corporal,

mas também pela sua utilização em objetos utilitários, como a cerâmica e as cestarias,

que também são uma forma de decoração e significado. Essa estética guarda segredos

sobre cada linha que projeta um grafismo trazendo características únicas e distintivas

para cada artesanato, como uma espécie de identidade cultural.

Para garantir a existência de seus territórios cada povo possuíam seus guerreiros,

homens fortes e velozes que tinham única função a de defender seus seu povo, sua casa,

seu território, na ocasião o grafismo tinha a finalidade de identificar quem era esses

guerreiros, recebendo por sua vez seus próprios desenhos, símbolos esses que tinha em

suas místicas as benças dos espíritos desta forma só os guerreiros poderiam usar tal

desenho, passando a ser de uso exclusivo. O grafismo de um povo simboliza a força de

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seu território, através dos significados por trás de cada desenho a fauna e flora se

destaca dando origem a maioria dos desenhos grafismo esses que identifica também a

rica biodiversidade do território.

As dimensões simbólicas do território de um povo é demonstrado no universo da

sua própria cultura, com base nessa premissa, fica claro que o território dialoga com a

identidade local de cada povo indígena. Partindo desse pressuposto, SANTOS, 2002,

trazem uma discussão que nos leva entender acerca do território simbólico, afirmando

que “O território não é apenas o resultado da superposição de um conjunto de sistema

natural e um conjunto de sistema de coisas criadas pelo homem”. (SANTOS, 2002,

p.47), visto que o indígena modifica o lugar onde vive, caracterizando este mesmo

espaço de acordo com os aspectos de sua cultura.

Com base nessa caracterização o território não representa simplesmente um

espaço delimitado por fronteira, contudo, resulta ao processo de construção e

transformação do espaço geográfico, baseado em relações de trabalho, de comunicação,

de emoções entre outros, nas palavras de Raffestin, uma “... prisão original e o território

é a prisão que os homens constroem para si” (1993, p.144). Dessa forma, o território

pode ser visto como um elemento da organização social, uma forma de poder, um meio

pelo qual ele se realiza, a partir desta noção, Raffestin ressalta a função da

“territorialidade”. Esta é um conglomerado múltiplo do “vivido” territorial pelos

membros de um grupo social ou de uma sociedade (1993, p. 159), as relações acima

citadas nos leva crer que o território simbólico para os povos indígenas esta relacionado

à sua cultura, esse conjunto estabelece-se uma tríade de territorialidade cultural.

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CAPÍTULO II

2. Processo de revitalização do grafismo na T.I Karajá-Xambioá.

As pinturas corporais para os povos indígenas possuem sentidos diversos, não

somente na vaidade, ou na busca pela estética perfeita, mas pelos valores que são

considerados e transmitidos através desta arte e muitas dessas pinturas definem também

a localização territorial, sendo utilizada como uma forma de distinguir a divisão interna

dentro de um determinado povo indígena, mas nem sempre existiu o grafismo, o povo

xambioá possui uma lenda que diz respeito ao surgimento de cada pintura corporal.

Segundo alguns anciões, Kynyxiwe olhava para a terra e viu que o homem estava

sem vestes, então começou a pensar de que forma iria mudar aquela situação. Ao olhar

para os animais viu que cada um possuía traços diferentes, foi então que Kynyxiwe

pegou todos aqueles desenhos e colocou-os nos peixes. Em uma noite o índio saiu de

sua casa e olhou para o lago e viu que a água estava com luzes e foi então que ele viu

vários peixes com desenhos, então o homem no dia seguinte pegou aqueles símbolos e

começou a desenhar no chão, e depois de certo tempo passou a usar esses desenhos em

seu próprio corpo.

Figura 03. Mito da origem das pinturas corporais do povo Xambioá

Fonte:(Adriano Karajá. 2016 p. 40)

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Através do tempo, a pintura tornou-se parte da identidade do povo indígena, uma

realidade que não foi diferente com o povo Karajá-Xambioá, porém houve perda

gradual com o passar dos anos e com histórico de contato com o homem branco. O

casamento inter-étnico trouxe grande influência para o processo de perda da cultura de

modo geral, e no concernente a pintura, existiu um impacto direto, uma vez que os não

indígenas que entravam na aldeia por terem contraído matrimônio, não conheciam a

importância cultural dos grafismos, e assim influenciavam também suas respectivas

famílias a abandonarem o uso delas.

Esse processo de perda foi se acentuando com o passar do tempo, a entrada de outra

cultura passou a tornar-se cada vez mais notório e latente, e os grafismos antes

comumente vistos em quantidade e variedade foram sendo esquecidos e tornando-se

parte de uma lembrança de dias em que a cultura Xambioá era praticada com êxito.

No ano de 1999 a 2002 o Xambioá usava os grafismos apenas nas festas de 19 de

Abril, a festa do dia do índio, e depois dessa data não se era mais visto os indígenas com

seus corpos pintados, e quando se pintavam era comum ver apenas três pinturas entres

eles, além de listas nos braços e pernas, o acervo estava se perdendo por não se praticar

o mesmo. A saída dos mais novos para a cidade em busca de estudo acelerou o processo

de perda porque já não se pintavam devido à tinta do jenipapo demorar uma quantidade

considerável de dias para sair do corpo e eles teriam que retornar para a cidade e

sentiam vergonha de seus corpos desenhados.

Em 1994 durante sua fala um professor diz que no povo Xambioá não se

praticava mais nenhuma espécie de dança e nem pintura corporal, os métodos de

preservação da cultura eram vistos apenas no dia 19 de abril considerado o dia do índio,

nesse dia era possível ver e ouvir algumas músicas em inỹ, durante a fala do professor

reporto a algo que não se vê mais hoje no povo, antes da festa era escolhido pelos

lideres uma rainha, ela por sua vez fazia abertura das festividades, sendo motivo de

orgulho da família que tinha a rainha entre seus membros, a festa era sempre no dia 19

de abril, mas no dia 18 essa menina moça escolhida era levada ate a casa de uma anciã

para receber todos os adornos.

No ano de 1994 acontece um encontro de professores indígenas realizado pela

FUNAI, e na ocasião um professor Xambioá levanta então a voz e fala da sua

preocupação com a perda da língua do seu povo, e que era preciso fazer alguma coisa

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para reverter esse processo, diante do apresentado a FUNAI em parceria com a SEDUC

– Secretaria de Educação e cultura do estado do Tocantins iniciou no ano de 1996 o

processo de revitalização da cultura na T.I Karajá-Xambioá. A princípio vinham

professores da ilha do bananal para ministrarem aulas na língua materna, e esse

professor deveria trazer toda sua família, e assim sua esposa poderia auxiliar no ensino

cultural.

Mas esse processo levaria 10 anos para criar a primeira festa cultural, essa daria

suporte ao resgate e manutenção da história do povo, no ano de 2006 cria - se a festa do

peixe na aldeia Wari-Lỹtỹ, no ano de 2010 e surge a festa da tartaruga na aldeia

Xambioá eem 2015 a festa cultural na aldeia Hawa-Tamara. Tais eventos estão

associados à preservação e manutenção da cultura, proporcionando a recriação dos

pratos tradicionais e o surgimento de novos grafismos, hoje 23 anos depois que se deu

início a esse processo percebe-se que houve pouco avanço.

2.1 GRAFISMO

O Xambioá não reporta ao grafismo apenas como estética, mas a influência que o mesmo exerce sobre o território, usando em sua representatividade aspectos da natureza local, assim podendo demonstrar a rica biodiversidade que possuem em sua reserva, cada linha traçada possui uma história cosmológica dando força a preservação do grafismo.

Yri hèka wiribi iwitxiramy rỹira, kiatahè umy-ò roimyhỹre iny rièrymyhỹre yribo ratxireri,yri hèka aõnaõna rÿira riumytybynymy iny dèè rèlèmyhỹre, iròdu iròdu, tumyna tahè raninimyhỹre. Aõriti widỹỹ tahè aõni awirare, iny hèka raheto iruxeramy riwinymyhỹre, worèna bdèhèsi rỹimyhỹreu tahè rauhèmyhỹre, butumy taaõmydỹỹnana iny riuhèmyhỹre tule, Kia hèka iny bdèdỹỹnana rare. (Wahuká Karajá. 1994)

Tradução.

As pinturas corporais são diferentes umas das outras e cada pessoa conhece a pintura feita no corpo, a pintura representa os animais da região de acordo com suas representações recebem suas denominações. Nos momentos dos rituais os inỹ enfeitam o

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corpo com adornos e cocares de varias espécies, pintam o corpo e o rosto fazendo desenhos que tem deUtilizam esses enfeites somente nos dias de rituais e cerimônias.(Wahuká Karajá. 1994)

FIGURA 04. Pintura Hãwyy uri riti

Fonte:(Adriano Karajá. 2016 p. 60)

FIGURA 05. Pintura do Sõsõ

Imagem:( Karajá. 1994)

corpo com adornos e cocares de varias espécies, pintam o corpo e o rosto fazendo desenhos que tem denominações diferentes. Utilizam esses enfeites somente nos dias de rituais e cerimônias.(Wahuká Karajá. 1994)

FIGURA 04. Pintura Hãwyy uri riti

p. 60)

. Pintura do Sõsõ

Sõsõ, essa é a pintura do Pica Pau, era usada pelas moças apenas nas festas culturais, o Xambiopinta com a Sõsõ, não se sabe ao certo por que o povo parou de usar esse grafismo. (José Iran Karajá.2017)

Hãwyy uri riti, essa pintura é usada pelas moças na dança do Aruanã e na passagem da menina para moça, mas nem sempre teve esse significado, no passado esse mesmo grafismo era de uso apenas dos guerreiros, eles pintavam suas costa com essa pintura, dessa forma se reconhecia os guerreiros, e hoje ela deixou de ser masculina e passou a ser uma pintura feminina.Karajá.2017)

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corpo com adornos e cocares de varias espécies, pintam o corpo e nominações diferentes.

Utilizam esses enfeites somente nos dias de rituais e cerimônias.

Sõsõ, essa é a pintura do Pica Pau, era usada pelas moças apenas nas festas culturais, o Xambioá não se

não se sabe ao certo por que o povo parou de usar esse grafismo. (José Iran

Hãwyy uri riti, essa pintura é usada pelas moças na dança do Aruanã e na passagem da menina para moça, mas nem sempre teve

no passado esse mesmo grafismo era de uso apenas dos guerreiros, eles pintavam suas costa com essa pintura, dessa forma se reconhecia os guerreiros, e hoje ela deixou de ser masculina e passou a ser uma pintura feminina. (José Iran

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FIGURA 06. Pintura do Jyre

Imagem:( Jurandir Karajá. 1994)

FIGURA 07. Pintura

Imagem:( Kurikala Karajá. 1994)

Essa é a pintura do JYRE, são meninos escolhidos na aldeia durante as festividades, eles têm acesso à casa dos homens, sendo eles os responsáveis pelas mensagens. Os meninos têm seu corpo todo pintado de preto, raspa o cabelo e assim são diferenciados dos demais meninos, essa pintura só pode ser usada nas festas culturais, é uma pintura masculina.(José Iran Karajá.2017)

Haru, essa é a pintura do peixe Pacu, uma

pintura masculina de uso exclusivo dos

anciões, se pinta apenas as pernas em dias

de festas, essa pintura se associa bastante a

hawyynimaraha (jiboia) pintura feminina.

Haru e um desenho corporal inexistente no

povo Xambioá. (José Iran Karajá.2017)

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FIGURA 08. Pintura Otubunỹ

Fonte:(Adriano Karajá. 2016 p. 63)

FIGURA 09. Pintura Txaõhi

Fonte:(Adriano Karajá. 2016 p. 56)

Otubunỹ: essa é a pintura do

Jabuti, de uso exclusivo

feminino, mas andado nas

aldeias é possível observa que

os meninos também usam esse

grafismo. Podendo num futuro

próximo essa pintura se torna

unissex, de uso geral. (José

Iran Karajá.2017)

Txaõhi é uma pintura muito bonita e usada para pinta somente os rapazes, durante as festas tradicionais. (José Iran Karajá.2017)

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FIGURA 10. Pintura Hawyynimaraha

Fonte:(Adriano Karajá. 2016 p. 49)

FIGURA11. Novas Pinturas Corporais

Fonte:(Adriano Karajá. 2016 p. 67)

Para os Xambioá é muito importante àpreservação de sua cultura, pois ela é a

sua identidade, a língua, a forma de organização social, os rituais, os mitos, as formas

de expressão artística, as habitações, comidas típicas, mas tudo tem uma relação com o

meio ambiente. O surgimento de novos grafismos demonstra que o processo de

revitalização está no caminho certo.

Hawyynimaraha. Essa é a pintura da jiboia, que é usada para na pintura corporal feminina. (José Iran Karajá.2017)

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2.2 EDUCAÇÃO ESCOLAR NA T.I. KARAJÁ-XAMBIOÁ

Ao falarmos de educação, vale rememorar que se trata de um amplo processo

contínuo que existe na realidade das populações, sem restrição das experiências de

escolarização. Os locais de ensino nas aldeias não se restringem há apenas um espaço

especifica, os conhecimentos são naturalmente transmitidos na oralidade, no

aconselhamento dos mais velhos, em uma roda de conversa, nas pescarias, etc. Os

saberes são transmitidos constantemente, até mesmo na ausência de conversa se

transmite valores morais e éticos do convívio em geral. Segundo o professor Indígena

Augusto Kuraha Karajá, a inserção da educação escolarXambioáteve início no ano de

1972, com o ensino bilíngue ministrado pelo professor Daniel Hohori Karajá e a

professora Maria Floripes Txukodese Karajá, ambos casados que moravam na aldeia

Xambioá e ministravam aulas do pré à 4º serie nas seguintes disciplinas:

• Português em Karajá • Matemática em Karajá • Est. Sociais em Karajá • Ciências em Karajá • Atividades Diversificadas (Cultura Karajá)

A escola indígena naquele mesmo ano era organizada da seguinte forma;

a) ●Pré – Escolar • Pré – leitura • Pré – escrita • Atividades diversificadas (cultural)

b) 1ª a 2ª séries • Leitura em Karajá • Escrita em Karajá • Matemática em Karajá • Est. Sociais em Karajá • Atividade Diversificada (cultural) • Saúde, Educ. Artísticas em Karajá • Religião (opcional) • Português Oral

c) 3ª série – fase de transição • Leitura e Escrita em Karajá • Matemática em Português • Estudos Sociais em Português • Escrita Criativa em Karajá • Religião (opcional) • Português

Materiais usados nesta época;

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- Cartilhas em Karajá - Livro contendo textos e história Karajá - Livro de Matemática em Karajá e Português - Livro de Est. Sociais em Karajá e Português - Livro de ciências em Português

A língua Karajá como meio de instrução era adotada nos três primeiros anos

escolares, após esse período as crianças recebiam aulas somente em português, o que foi

um grande erro, pois ao se depararem com uma nova língua e com um novo

conhecimento ofertado através dos materiais didáticos distante de sua realidade

sociocultural e linguística, inicia-se um ensino diferenciado ao povo indígena Xambioá,

o decreto 58.824 de 14 de julho de 66, do presidente da república que promulga a

convenção 107 sobre a proteção e integração das populações Indígena e outras

populações tribais e semi – tribais, onde no artigo 48 diz; estende-se a população

indígena, com as necessárias adaptações o sistema de ensino em vigor no país, é notório

que esse ensino afetou o sistema de ensino do povo.

Anos depois de iniciar o ensino no povo Xambioá o professor Daniel retornou

para a ilha do bananal e a professora Txukodese faleceu dessa forma as atividades

educacionais do povo ficaram paradas. Com providências tomadas surgem então os

professores não indígenas e todas as atividades eram trabalhadas apenas em português,

surgindo aí o início do processo de perda da língua materna. Citando também o contato

com a guerrilha do Araguaia, dois casais chegaram até o povo e ali moraram por um

longo tempo, nesse intervalo a Dina passou a atuar na aldeia como professora e

enfermeira, e seu esposo Marcão não fazia nada, ficava viajando para Belém e sempre

saia com os homens para pescar e sempre fazia perguntas sobre o rio e a mata em torno

do rio.

O SPI (Serviço de Proteção ao Índio) que tinha o papel de proteger a cultura

indígena deixou esse processo ocorrer no povo, e podemos citar também a participação

da igreja católica nesse processo de perda, os padres por sua vez vinham atéas aldeias e

levavam os índios para estudarem em seus conventos estalados nas cidades vizinhas de

Conceição do Araguaia e Xambioá. Os casamentos interétnicos entre indígenas e não

indígenas resultaram também nesse processo que levou os indígenas a ter português

como primeira língua. Esses são fatores que poderiam ter sido evitados se o SPI

exercesse seu papel e não permitindo que circunstâncias como essas se estabelecessem.

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Anos depois o povo se deparou com mais um fato que também contribuiria para

a perda de cultura, os jovens vendo-se necessitados em deixar a aldeia e ir estudar na

cidade vivendo outra realidade, trouxe um choque cultural ocasionando um grave

problema, pois os indígenas que estavam deixando de usarseus grafismos por medo do

preconceito dentro das escolas do homem branco, por não praticarem mais seus rituais

na cidade foram deixando de falar sua língua materna e a usar apenas o português como

primeiras línguas ao retornarem para a aldeia esses indígenas só falavam em português e

não pintavam mais seus corpos porque tinha que retornar a cidade e a tinta demorava

dias para sair dos seus corpos, fato esse que teve peso no processo de perda da cultura.

A preservação da linguagem é uma forma de resistência, entretanto, a concepção

intercultural é recente, pois a trajetória da educação escolar indígena nos informa que de

maneira geral, a pretensão da escola era de integrar estas populações étnicas à sociedade

nacional. Contemporaneamente, nas aldeias da Terra Indígena Xambioá, as práticas

comunicativas em língua portuguesa, por exemplo, são as mais difundidas e têm se

firmado como as primeiras adquiridas por seus membros. O ensino de práticas

comunicativas em Inyrybè, como “segunda língua”, tem se restringido principalmente à

escola, uma vez que há um número muito pequeno de falantes de Inyrybè, em sua

grande maioria anciãos e anciãs que além de tudo, residem em aldeias diferentes, o que

dificulta ainda mais as interações sociais cotidianas (NASCIMENTO, 2012. p 85)

Atualmente, na Terra Indígena Xambioá, há três escolas de Ensino Fundamental

e um Centro de Ensino Médio Indígena, regidas pelo sistema estadual de ensino do

estado do Tocantins, muito embora funcionem sob a designação de escolas indígenas,

até anos recentes, com poucas e pontuais exceções, operaram excluindo os

conhecimentos indígenas em todas as suas dimensões, inclusive comunicativas,

fragmentando os conhecimentos e tratando o Inyrybècomo uma disciplina, assim analisa

os próprios professores indígenas. Em suas palavras: “Hoje, o ensino na escola Karajá

está focalizado nos conhecimentos ocidental, obedecendo aos critérios adotados pelos

colonizadores”. “Pouca atenção é dada para o aprendizado de suas realidades”.

(ALBURQUEQUE. 2012 p. 255)

A criação de duas unidades escolar do povo só foi lançada em 2001 no Diário

Oficial de nº 1.055 do governo estadual do Tocantins através do Decreto de Nº 1.196,

de 28 de maio do mesmo ano, legalizando através do seu processo de criação a Escola

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Indígena Manoel Achurê, estando localizado na aldeia Xambioá, e a Escola Indígena

WaxihôBedú na aldeia Kurehê. No Decreto de Nº 3.331 de 31 de março de 2008, o

governo lança através de seu Diário Oficial de nº 2.620 a criação de mais duas unidades

escolar no povo Xambioá, a escola indígena Taina hãkỹ estando localizada na aldeia

WariLỹtỹ e o Centro de Ensino Médio Karajá Xambioá. De acordo com tabela abaixo

no ano de 2017, o povo Xambioá possui 158 alunos devidamente matriculados nas suas

unidades de ensino.

1ª a 5ª 6ª a 9ª Ens. Médio Total CEMI -------- -------- 46 46 M. Achurê 19 12 ------- 31 Taina hãkỹ 16 19 ------- 35 WaxihôBedu 23 23 ------- 46 Total Geral ------- 158

O professor Indígena Paulo KumareKarajá do Povo Karajá Xambioá diz que, o

ensino na escola do povo está focalizado nos conhecimentos ocidentais, obedecendo aos

criteriosadotados pelos colonizadores, e pouca atenção é dada para o aprendizado de

suas realidades. Observa que a Constituição Federal de 88 garante no Art. 210. Serão

fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar

formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e

regionais. Aprofundando encontra se no inciso 2º O ensino fundamental regular será

ministrado em língua portuguesa, assegurada às comunidades indígenas também a

utilização de suas línguas maternas e processos próprios de aprendizagem.

Com base nesse argumento apresentado é notório observar que a estrutura

curricular do ensino fundamental para os anos iniciais de 1ª a 5ª ano para o ano de 2017

apresenta em seus componentes as seguintes disciplinas;

• Língua portuguesa • Arte • Educação Física • Matemática • Historia • Geografia • Redação • Língua Estrangeira – Inglês • Ensino Religioso

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Cabe informar que o ensino Religioso é facultativo ao aluno, sendo que a unidade

escolar deve propor outra atividade aos que optarem por outra disciplina. É importante

observar que a constituição de 88 assegura aos povos indígenas a utilização de sua

língua materna em seu próprio processo de aprendizagem, essa nova grade descumpre

esses valores indígenas dando ênfase ao ensino pregado pelos colonizadores quando o

objetivo era dizimar os povos e sua história.

É preciso ressaltar que o Inỹrỹbè (língua Karajá), existem algumas palavras que

apresentam diferenças fonéticas entre a fala do homem e a da mulher, essa diferença faz

parte da cultura sendo obrigatório o uso da fala feminina pela mulher e da masculina

pelo homem, só quando vão reportar a fala de outra pessoa que utilizam o modo de falar

do outro gênero. Às vezes, também falam com os filhos conforme a fala de cada sexo

para que as crianças possam aprender e não se confundir há diferentes processos

fonológicos que marcam a diferença entre as falas do homem e da mulher e podem ser

averiguados em suas falas. O processo mais recorrente é a inserção do fonema /k/ em

algumas palavras na fala feminina, é cada vez maior a conscientização da necessidade

de preservação das línguas e culturas indígenas como forma de resgatar e manter a

identidade destes povos.

Para assegura esse processo de gênero na fala do povo Inỹ, é preciso volta ao

ano de 2013 quando a estrutura curricular do ensino fundamental para os anos iniciais

de 1ª a 5ª tinham em sua grade as seguintes disciplinas;

• Língua Portuguesa • Língua Indígena • Arte • Educação Física • Matemática • Ciências • Historia • Geografia • Cosmologia Indígena • História e Cultura indígena • Esporte e Lazer • Cotação de História e Produção Textual • Manifestações Culturais • Saúde Indígena • Educação Indígena

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Segundos relatórios da SEDUC/TO (2017),a grade curricular de 2013 a de 2017,

não apresenta uma estrutura adequada à realidade escolar de cada povo, dando

importância as manifestações socioculturais, valorizando o conhecimento próprio dos

indígenas. Para um povo que está num longo processo de revitalização, a escola tem

papel fundamental no resgate étnico e assim devolver a dignidade que esse povo perdeu.

Segundo ALBURQUEQUE, “O conhecimento da própria cultura como: da língua, dos

rios, das matas, dos animais, da culinária, das histórias, das pinturas e etc., servem de

base para um currículo específico e até como material didático para as escolas locais”.

(ALBURQUERQUE 2012 p. 267).

Assim, é perceptível a possibilidade de reafirmação e proposição de

metodologias que contemplem a prática e incentivo a valorização e reconhecimento dos

valores culturais de um povo e o melhor espaço para ocorrência dessas vivências

também se constitui dentro do processo de escolarização. Ademais, os avanços

conquistados, referente à educação escolar, vêm ganhando ao longo dos anos tratamento

que atende às especificações e detalhamentos nas leis subseqüentes como a Lei 9394,

LDB; Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nos artigos 78 e 79, o PNE;

Plano Nacional deEducação; Parecer n°14, entre outras. (ALBURQUEQUE 2012 p.

257)

O presente trabalho propôs oresgate e a revitalização sobre a cultura do povo

Karajá Xambioá, tendo como princípio norteador o foco a ser estudado, especificamente

o grafismo corporal deste povo, portanto, diante dessa premissa, pode-se dizer que este

trabalho se justifica pelo apoio que será dado aos professores e alunos indígenas, no

processo de ensino e aprendizagemna interface da revitalização das pinturas corporais,

uma contribuição para a educação escolar do povo Karajá-Xambioá. Buscou-se

identificar qual a influência que o grafismo exerce sobre o território indígena e foi

perceptível que as pinturas corporais ajudam a identificar a localização de cada povo

dentro do seu espaço. Durante a pesquisa foi observado que o povo Xambioá usa o Rio

Araguaia como a origem de sua existência, e cabe ressaltar que as pinturas corporais

surgiram de símbolos da natureza, e no passado elas demonstravam a força do povo

apenas pela forma de pintarem seus corpos. Os grafismos então não são apenas parte da

cultura do povo, mas está intrinsecamente ligado a sua identidade, a sua maneira de

viver, a sua concepção e a afirmação de quem realmente são.

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REFERENCIAL TEÓRICA

Nessa pesquisa serão utilizados como referenciais teóricos autores como:

ALBURQUERQUE (2013); BRAGGIO (1997) COSTA (2012); MELATTI (1993);

RIBEIRO (1994); TAVEIRA (2002); TORAL (1992); VIDAL (1977); dentre outros

Autores que se dedicaram e ainda dedicam a pesquisar sobre cultura indígena e a

cosmologia Karajá, será realizada também uma leitura sobre as leis que tratam

oficialmente da educação escolar indígena.

Pesquisa qualitativa de cunho etnográfico com visita à aldeia e se possível a

realização de entrevistas e observação, esse momento tem a finalidade de nos mostrar a

realidade e a necessidade desse povo no que diz respeito a historia de cada pintura. No

momento se configura como sendo muito importante esta pesquisa, pois o contato

direto como o objeto investigado possibilita ao o acadêmico uma compreensão do

mesmo. A proposta do projeto surgiu do interesse em contribuir com a Revitalização

das Pinturas Corporais: uma contribuição para a educação escolar do Povo Karajá-

Xambioá, situada em suas terras, visto que os alunos e professores indígenas e não

indígenas, dessas escolas não dispõem de material didático específico que auxilie nesse

processo.

O presente trabalho propõe um resgate sobre a cultura da “arte indígena” tendo

como principio norteador o foco a ser estudado especificamente o grafismo corporal na

pintura do povo Karajá – Xambioá. Portanto, diante dessa premissa, pode disse que este

trabalho se justifica pelo apoio que será dado aos professores e alunos indígenas, no

processo de ensino e aprendizagem na interface da revitalização das pinturas corporais,

uma contribuição para a educação escolar do povo Karajá-Xambioá.

O trabalho busca identificar qual a influência que o grafismo exerce sobre o

território indígena, as pinturas corporais ajudam a identificar a localização de cada povo

dentro do seu espaço, durante a pesquisa foi observado que o povo Xambioá usa o Rio

Araguaia como a origem de sua existência, cabe ressaltar que as pinturas corporais

surgiram de símbolos da natureza, e no passado elas demonstrava a força do povo

apenas pela forma de pintarem seu corpo, hoje essas pinturas tem outros significado

algumas foram recém criadas e outras deixara de existir.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho de conclusão do Curso teve por base o estudo relacionado ao

grafismo e sua contribuição para a educação escolar do Povo Karajá-Xambioá,

desenvolvendo um breve histórico e discussão a respeito do território e a influência que

o grafismo tem sobre o mesmo; destacando também as ações conflitantes de indígenas e

bandeirantes, e outros povos indígenas no século XIX; Aspectos Culturais para o povo

Karajá; Distribuição do Trabalho entre o homem e a mulher Karajá, sendo apresentados

também alguns aspectos culturais como: festas, rituais e o dia a dia do povo Karajá.

Com esse trabalho buscamos apresentar alguns aspectos relacionados ao contexto

históricos, culturais, territoriais e afazeres desse povo, para que assim se faça o registro

e que possamos conhecer um pouco da cultura e território do povo Karajá-Xambioá.

A pintura corporal para os povos indígenas possuem sentidos diversos, não

somente na vaidade, ou na busca pela estética perfeita, mas pelos valores que são

considerados e transmitidos através desta arte e muitas dessas pinturas definem também

a localização territorial, a pintura corporal é utilizada como uma forma de distinguir a

divisão interna dentro de uma determinada sociedade indígena.

O trabalho busca identificar qual a influência que o grafismo exerce sobre o

território indígena, as pinturas corporais ajudam a identificar a localização de cada povo

dentro do seu espaço, durante a pesquisa foi observado que o povo Xambioá usa o Rio

Araguaia como a origem de sua existência, cabe ressaltar que as pinturas corporais

surgiram de símbolos da natureza, e no passado elas demonstrava a força do povo

apenas pela forma de pintarem seu corpo, hoje essas pinturas tem outros significado

algumas foram recém-criadas e outras deixaram de existir.

Traz um levantamento das pinturas corporais usadas no Povo Karajá-Xambioá,

tais como livros, desenhos, gravuras, grafismos, pinturas corporais, para,

posteriormente, serem aplicadas como conteúdos disciplinares nas escolas de suas

aldeias pelos professores de língua materna e de português que será descrito os aspectos

que influencia no processo da Revitalização das Pinturas Corporais e suacontribuição

para a educação escolar do Povo Karajá-Xambioá.

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Faz um breve relato sobre o que é território simbólico para os povos indígenas

levando em consideração todos os aspectos relacionados à cultura, desta forma as

dimensões simbólicas do território de um povo são demonstradas no universo da sua

própria cultura, com base nessa premissa, fica claro que o território dialoga com a

identidade local de cada povo indígena. Desta forma observa que a caracterização do

território não representa simplesmente um espaço delimitado por fronteira, contudo,

resulta ao processo de construção e transformação do espaço geográfico, levando em

consideração os valores culturais existente no local.

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GLOSSÁRIO

HetohokỹCasa Grande

Jyre Menino Jovem

Omarura Círculos no rosto

Wasy Vivo

Wabadé Mortos

Korotxu Bolo Recheado

Karalahuni Espírito de Guerreiro

Kynyxiwe Deus

Inỹsedèna Lugar da Mãe

BerahatxiMahadu Povo do Fundo

Ixỹbiowa Povo Amigo

Ibòòmahãdu Turma do Alto

Irarumahãdu Turma de Baixo

Tori Não Indígena

InỹRubè Língua Karajá

Weryry Menino

HetohokỹCasa Grande

KàralahuniEspíritos de guerreiros

BóduRapaz Novo

weryrybóRapaz

jyýtyhỹRapaz Casado

ijadomỹ Moça

hawyýMulher

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Brasileira.OsKayapó-Xikrin do rio Cateté. São Paulo, Hucitec/Editora da Universidade

de São Paulo.