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Livros Grátis

http://www.livrosgratis.com.br

Milhares de livros grátis para download.

Presidente da República Fernando Henrique Cardoso

Ministro da Educação e do Desporto Paulo Renato Souza

Secretário Executivo Luciano Oliva Patrício

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO

SECRETARIA DE EDUCAÇÃO FUNDAMENTAL

COLEÇÃO DE LIVROS DIDÁTICOS DO

REFERENCIAL CURRICULAR NACIONAL

PARA AS ESCOLAS INDÍGENAS:

informações para o professor

Presidente da República: Fernando Henrique Cardoso

Ministro da Educação e do Desporto: Paulo Renato Souza

Secretário Executivo: Luciano Oliva Patrício

COLEÇÃO DE LIVROS DIDÁTICOS DO REFERENCIAL CURRICULAR NACIONAL PARA AS ESCOLAS INDÍGENAS:

informações para o professor

Editor Luís Donisete Benzi Grupioni

Com a colaboração de André Toral, Bruce Albert, Denise Fajardo Grupioni,

Ismael Tressmann. Jussara Gruber. Kléber Gesteira e Matos, lydia Poleck. Manana Kawall Leal Ferreira.

Nietta Lindenberg Monte e Sílvia Lúcia Bigonjal Braggio.

Capa Fernando Secchi

Projeto gráfico/editoração Vera Feitosa

Brasília. 1998

Secretária de Educação Fundamental: Iara Glória Areias Prado

Diretora do Departamento de Política da Educação Fundamental: Virgínia Zélia de Azevedo Rebeis Farha

Coordenadora Geral de Apoio às Escolas Indígenas: Ivete Maria Barbosa Madeira Campos

MEC/SEF/DPEF Coordenação Geral de Apoio às Escolas Indígenas

Esplanada dos Ministérios, Bloco L, Sala 615 70047-902, Brasília - DF Tel: (061) 224-9598 e (061) 410-8630 Fax: (061) 321-5864

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Grupioni, Luís Donisete Benzi (Editor) Coleção de livros didáticos do referencial curricular

nacional para as escolas indígenas: informações para o professor / Luís Donisete Benzi Grupioni (Editor) - Ministério da Educação e do Desporto, Secretaria de Educação Funda­mental, Departamento de Política da Educação Fundamental, Coordenação de Apoio às Escolas Indígenas.

Brasília: MEC/SEF/DPEF/CGAEI, 1998 42p.:il.

1. Educação escolar indígena. 2. Livro didático.

CDU 371.671.1

índice

Apresentação 7

Geografia indígena 9

O Livro das Árvores 13

Xanetawa Parageta - Histórias das Nossas Aldeias 16

Yama Ki Hwërimamouwi thë ã oni - Palavras escritas para nos curar 19

Pangyjej Kue Sep - A nossa língua escrita no papel 23

Adornos e Pintura Corporal Karajá 26

Atlas Geográfico Indígena do Acre 29

Aprendendo Português nas Escolas da Floresta 30

Txopai e Itôhã 35

O tempo passa e a história fica 37

"Madikauku - os dedos das mãos": Matemática e Povos Indígenas no Brasil 40

Apresentação

O programa de apoio à produção de material didático para as esco­las indígenas da Secretaria de Educação Fundamental foi desenvolvido tendo em vista a escassez de material em língua indígena que contemplasse as reais necessidades dos diversos povos indígenas brasileiros, e que levassem em conta os aspectos culturais, lingüísticos e demais saberes.

Como parte da política implementada pelo Ministério da Educação e do Desporto para a educação escolar indígena está o apoio técnico e financeiro aos cursos de formação de professores indígenas e à produção e publicação de material didático-pedagógico a ser utilizado nas escolas indígenas. Dos livros pu­blicados pela SEF para as escolas indígenas foram selecionados os que atendes­sem a cada área do conhecimento trabalhada no Referencial Curricular Nacio­nal para as Escolas Indígenas.

A produção de textos para as escolas indígenas concretiza-se com a publicação de livros de qualidade, que resultam direta ou indiretamente dos cursos de formação de professores indígenas. Em tais cursos, desenvolvem-se idéias de construção de material didático, onde os professores expressam e re­gistram as diferentes formas de linguagem, partindo de seus conhecimentos étni­cos, com a orientação de profissionais experientes nessas atividades.

Apresentamos, assim, esta coleção de livros elaborados por professo­res de diferentes etnias, pretendendo oferecer referências, exemplificando como é possível a construção de material didático de qualidade adequado a cada comunidade indígena, e ao mesmo tempo, iniciar um intercâmbio entre os dife­rentes povos e escolas indígenas do país.

Secretaria de Educação Fundamental

Geografia indígena

GEOGRAFIA INDÍGENA

Parque Indígena do Xingu Projeto de Formação de Professores

Indígenas do Parque Indígena do Xingu ISA/MEC/PNUD

São Paulo, 1996, 63 págs.

O livro - O livro "Geografia Indígena -Parque Indígena do Xingu" foi escrito e de­senhado pelos professores índios do Parque Indígena do Xingu e das Terras Indígenas Kapôt/Jarina e Mekangotire, envolvidos no "Curso de Formação de Professores Indí­genas do Parque Indígena do Xingu para o Magistério (2° Grau)". Ele é o resultado de um conjunto de atividades didáticas de geografia, coordenadas pelo geógrafo Re­nato Antonio Gavazzi, durante o III Curso de Formação de Professores índios, realizado no final do inverno de 1995 nos Postos Indíge­nas Pavuru e Diauarum. Na época, o curso estava sob coordenação da Associação Vida e Ambiente, mas a publicação foi en­caminhada para edição pelo MEC, quan­do o Instituto Socioambiental assumiu o ge­renciamento do programa de formação dos professores indígenas, em 1996.

Dividido em quatro capítulos (O que é geografia?, O mundo no universo, Geogra­fia da Área Indígena e O que é cidade?), o livro contém textos, desenhos, pergun­tas e exercícios preparados pelos profes­sores índios para uso nas escolas indígenas do PIX. Escrito em português, o livro regis­tra a reflexão dos professores indígenas sobre os seus conhecimentos étnicos e so­bre os novos conhecimentos adquiridos durante o curso e sintetiza, em textos e desenhos, um novo saber geográfico.

O projeto - O Programa de Formação de Professores Indígenas do Parque Indígena do Xingu para o Magistério tem como ob­jetivo formar 53 professores indígenas dos povos Kuikuro, Kalapalo, Matipu, Nahukuá, Mehinako, Waurá, Aweti, Kamaiurá, Trumai, Suiá, Kaiabi, Yudjá, Tapaiuna e Panará, que lecionam atualmente para cerca de 850 alunos, entre crianças e adolescentes, em 30 escolas em funcionamento.

O Programa de Formação teve início em 1994 com a Associação Vida e Ambi­ente, com apoio da Rainforest Foundation da Noruega. Em 1996 passou a ser geren­ciado pelo Instituto Socioambiental. Até novembro de 1998, nove cursos foram re­alizados, sendo que sete contaram com a parceria financeira do Ministério da Educa­ção e do Desporto. O programa se realiza através de dois cursos anuais ministrados por especialistas -lingüistas, antropólogos, matemáticos e educadores- e de acom­panhamento pedagógico às escolas indí­genas nos períodos intermediários entre os cursos. O Programa tem impulsionado o estudo das línguas indígenas faladas no Parque do Xingu e a produção de ortogra­fias, que permitam o ensino da língua indí­gena nas escolas e a produção de materi­al didático-pedagógico diferenciado. Até este momento, quatro livros foram edita­dos com apoio do MEC (Geografia Indíge­na, em 1996, Tisakisü, em 199, Kamajura Jemo'etap, em 1988 e Livro de História, em

1998), e outros 5 estão em fase de publica­ção.

O Programa, reconhecido em 1998 pelo Conselho Estadual de Educação do Mato Grosso, tem uma duração prevista de 6 anos e pretende capacitar os professo­res indígenas como educadores e pesqui­sadores de suas culturas, de forma que eles se tornem os agentes do processo de ensi­no e aprendizado de suas escolas e sejam capazes de formular e conduzir currículos próprios, adaptados à sua realidade. Para isso, o Programa tem investido no estudo, por parte dos professores indígenas, de suas línguas nativas e no desenvolvimento da escrita nessas línguas, de forma a garantir o uso da língua indígena ao longo de todo o processo educacional, como disciplina em si e como instrumento de ensino em todas as outras disciplinas do currículo es­colar. Temas como preservação dos recur­sos naturais, melhoria de saúde e qualida­de de vida, invasão de madeireiros, garim­peiros, pescadores e caçadores, alternati­vas econômicas e relacionamento com a sociedade envolvente, em especial a dos municípios vizinhos, têm sido tratados nos cursos visando uma integração da escola no cotidiano dos grupos indígenas do Par­que do Xingu. O Programa de Formação dos Professores está articulado com dois outros programas existentes dentro do Par­que do Xingu: o de formação de agentes indígenas de saúde, promovido pela Uni­d a d e de Saúde e Meio Ambien te da

UNIFESP, e o de alternativas econômicas e fronteiras, promovido pelo ISA.

Os autores e usuários do livro - O Par­que Indígena do Xingu abriga, em seus 2.642.003 hectares no estado de Mato Grosso, uma surpreendente variedade de grupos indígenas, diferenciados dos pon­tos de vista étnico, lingüístico e Sócio-Cultu­ral. São quinze povos, com uma popula­ção estimada em 3.496 pessoas (EPM/97), distribuídos em 32 aldeias.

Procedendo do norte até o extremo sul do Parque, encontramos os Suyá e os Tapayuna, falantes de línguas do tronco Jê; os Kayabi e os Juruna, povos Tupi do alto curso do Xingu; os Ikpeng (Txikão), grupo Karibe, e os Trumai, falantes de uma língua isolada. Até recentemente, também vivi­am no Parque, os Panará, que reconquis­tando parte de seu território tradicional, mudaram-se para a TI Panará, localizada no Pará.

Na porção meridional do Parque, na bacia dos rios formadores do Xingu, sobre­vive até hoje um conjunto de povos que ao longo de séculos constituiu uma socie­dade intertribal com uma organização so­cial e traços culturais compartilhados. Esta região, conhecida como Alto Xingu, é tam­bém uma unidade geográfica e ecológi­ca, protegida pelo leque dos rios Kuluene, Kuliseu, Batovi, Ronuro e Von den Steinen e pelas serras Formosa, a oeste, e do Ron-

cador, ao les­te, pelo Cha-padão mato-grossense, ao sul, e pelas cor rede i ras do Xingu, ao norte. Foi para essa região que confluí-ram em suces­sivas migrações e deslocamentos grupos Tupi como os Kamayurá e os Aweti; gru­pos Aruak, co-mo os Yawalapiti, os Mehi-nako e os Waurá e grupos Karibe como os Nahukwá, os Matipu, os Kalapalo e os Kuikuro. No Alto Xingu foi se formando uma rede de intensas trocas matrimoniais, co­merciais e cerimoniais. Rituais como o Kwarup, o Yamurikumalu, o Javari continu­am agrupando as aldeias em grandes fes­tas coletivas que recriam periodicamente os laços de alianças entre unidades soci­ais que prezam sua autonomia numa con­vivência sempre realimentada. Esse pro­cesso ainda hoje conduz as mudanças da sociedade alto xinguana e suas estratégi­as políticas de convivência interna e exter­na, face a outros povos indígenas e face aos brancos.

Os conhecimentos disponíveis sobre a história do Alto Xingu, até o final do sécu­lo XIX, fundamentam-se em pesquisas ar­queológicas e em relatos da memória oral

indígena. A história escrita pelos brancos começa com as viagens do etnógrafo ale­mão Karl Von den Steinen no final de 1800. Foi ele quem apontou para o mundo a ri­queza cultural da região. Nos anos 40, a Expedição Roncador-Xingu, liderada pelos irmãos Villas Boas marcou o contato defi­nitivo com o universo dos brancos e com a presença do Estado. O território a l to xinguano foi fechado e demarcado pelo processo de criação do Parque, processo que se desenrolou do início dos anos 50 até 1978. Para os índios, cuja população já ti­nha sofrido sucessivas baixas demográficas, em decorrência das violentas incursões dos bandeirantes nos séculos XVIII e XIX e das epidemias que acompanharam todas as fases do contato, a criação do Parque sig­nificou proteção, dependência e um terri­tório com fronteiras definitivas. Deste foram, todavia, excluídas áreas com valor históri­co e cosmológico, e hoje grandes fazen­das formam um anel de desmatamentos e queimadas. Os riscos de contaminação das nascentes do Xingu, que estão todas fora dos limites do Parque, invasões de madeireiros, garimpeiros, pescadores e caçadores, novas necessidades de consu­mo impostas pelo contato e o confinamen-to nos limites do Parque são os desafios atu­ais para os povos xinguanos.

O Livro das Arvores O livro - "O Livro das Árvores", editado pela Organização Geral dos Professores Ticuna Bilíngües, contou com a part icipação de cerca de 200 professores indígenas, envol­vidos no Curso de Formação de Professo­res Ticuna - habi l i tação para o magisté­rio. Organ izado pe la art ista p lás t ica Jussara Gomes Gruber, o livro reúne de­senhos e textos coletivos preparados pe­los professores durante as etapas do cur­so de formação. O livro faz parte de um projeto intitulado "A natureza segundo os Ticuna", que teve início em 1987, e que tem como objetivo a realização de regis­tros, levantamentos e pesquisas, além de desenhos, sobre a fauna e a flora regionais, que possam compor materiais didático-pedagógicos para as escolas ticuna.

"O livro das Árvores" apresenta a inten­sa e rica relação dos Ticuna com as árvo­res que formam a floresta, com enfoque especial para o valor e o significado das várias espécies importantes para a sobre­vivência física e cultural do grupo. Mais que um livro de botânica, trata-se, na verda­de, de uma memória das árvores, onde os professores Ticuna registraram, nos textos e nas imagens, conhecimentos práticos e va­lores simbólicos. O livro foi premiado pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Ju­venil, em 1997, como melhor livro informa­tivo e melhor projeto editorial.

Jussara Gomes Gruber (Org.) Projeto Educação Ticuna Organização Gerai dos

Professores Ticuna Bilíngües Benjamin Constant 1997, 96 págs.

O projeto - A Organização Geral dos Pro­fessores Ticuna Bilíngües (OGPTB) foi cria­da em dezembro de 1986. Ela é a res­ponsável pelo curso de fo rmação dos professores Ticuna, que funciona no Cen-tro de Formação de Professores Ticuna -Torü Nguepataü ("nossa casa de estu-dos"), localizado na aldeia de Filadélfia, município de Benjamin Constant (AM). O Centro foi planejado pelos professores e construído em 1993, dispondo de salas de aula, bibl ioteca e alojamentos para os cursistas. Durante o período letivo, o Centro abriga duas salas de aula de alu­nos da 5° e 7° séries, e nos períodos de férias, de janeiro/fevereiro e julho, acon­tecem os cursos de formação dos pro­fessores Ticuna.

O Curso de Formação de Professores Ticuna - Habilitação para o Magistério teve início em 1993 e, a partir desta, data fo­ram realizadas 10 etapas. Em 1996,212 pro­fessores ticuna concluíram o 1° grau com qualificação para o magistério. Este curso foi reconhecido pelo Conselho Estadual de Educação do Amazonas em 1997, fican­do a OGPTB autorizada a emitir os certifi­cados de conclusão.

O Curso de Formação, que integra o Projeto Educação Ticuna, envolve uma série de atividades desenvolvidas com a participação dos alunos/professores índios, tais como a organização de materiais di-dático-pedagógicos e a preparação de

um currículo diferenciado para as escolas ticuna, além de sub-projetos voltados para as áreas de saúde, meio ambiente e cultu­ra. O Curso é ministrado por professores com experiência em educação indígena, procedentes de universidades e outras ins­tituições de ensino do país.

Na produção de materiais didáticos, os professores recebem orientação sobre metodologia de pesquisa e part ic ipam de oficinas para produção de textos e desenhos. Além de "O livro das Árvores", foram preparados outros materiais para uso nas escolas: "Manua l da Escrita -Ngiã Tanaütch icünaagü" , "Livro do Pro­fessor" para ap l icação do Manual da Es­crita, "A Matemática do Meu Dia", e "Ma­nual de Saúde - Doenças Sexualmente Transmissíveis e Aids". Estão em prepara­ção outros 10 livros, o Livro dos Peixes e o Dicionário Ticuna/Ticuna e Ticuna/Portu­guês.

O Projeto Educação Ticuna abrange professores e escolas dos municípios de Benjamin Constant, Tabatinga, São Paulo de Olivença, Amaturá e Santo Antônio do Içá. Nesses municípios existem 92 escolas e cerca de 7.000 alunos ticuna. O Projeto tem apoio do Fundo Internacional do De­senvolvimento Agrícola - FIDA, Ministério da Educação e do Desporto, Fundação Naci­onal do índio, além da colaboração de algumas prefeituras municipais do Amazo­nas.

Os autores e usuários do livro - Os Ticuna vivem no Brasil, na Colômbia e no Peru. No Brasil, estão localizados no esta­do do Amazonas, ao longo do rio Solimões, nos seus afluentes e ilhas. Atualmente cons­tituem o mais numeroso grupo indígena do país, com aproximadamente 28.000 pes­soas, e suas aldeias, cerca de 100, locali­zam-se em terras dos municípios de Benja­min Constant, Tabatinga, São Paulo de Olivença, Amaturá, Santo Antônio do Içá, Fonte Boa, Anamã e Beruri.

Os Ticuna falam uma língua conside­rada isolada, que não mantém semelhan­ça com nenhuma outra língua indígena. Sua característica principal é o uso de di­ferentes alturas na voz, peculiaridade que a classifica como uma língua tonai. Os Ticuna estão organizados em clãs, ou "na­ções", agrupados em metades, que regu­lam os casamentos. Membros de uma metade devem casar-se com pessoas da metade oposta, e seus filhos herdam o clã do pai. Numa das metades agrupam-se os clãs com nomes de aves: mutum, maguari, arara, japó, etc. Na outra metade estão os clãs que possuem nomes de plantas e de animais, como o buriti, jenipapo, avaí, onça, saúva.

As primeiras notícias sobre a presença dos Ticuna na região do alto rio Solimões datam da metade do século XVII. Os con­tatos com os brancos, todavia, acentua­ram-se a partir das últimas décadas do sé­

zando, direta e indiretamente, a força de trabalho indígena. Após o declínio da ex­ploração da seringa, os Ticuna retornaram às suas atividades agrícolas tradicionais, in­tegrando-se, gradativamente, à economia regional. Hoje em dia, constituem os princi­pais fornecedores de farinha de mandio­ca e de frutas para os mercados das cida­des da região.

Apesar do longo contato com os brancos e das formas de dominação, ex­ploração e aculturação impostas pelas frentes de expansão e pelas diferentes mis­sões religiosas em atuação entre eles, os Ticuna mantêm viva sua língua e sua orga­nização social. Desde 1980, os Ticuna vêm lutando pelo reconhecimento oficial de suas terras. Já foram homologadas 14 áre­as, num total de 1.272.742 ha no Amazo­nas.

culo passado, quando suas terras foram maciçamente ocupadas por seringalistas e comerciantes que aí se esta-b e l e c e r a m para extrair a borracha, utili-

Xanetawa Parageta Histórias das

Nossas Aldeias

Comunidade Tapirapé MARI/MEC/PNUD

São Paulo/Brasília, 1996, 112 págs.

O livro - O livro "Xanetawa Parageta-His­tórias das nossas aldeias" reúne histórias pesquisadas sobre o território tradicional dos Tapirapé pelos alunos da Escola Esta­dual de Primeiro Grau Tapirapé, em 1992. O projeto foi coordenado pelo antropólo­go André Amaral de Toral e pelos indige-nistas Eunice Dias de Paula e Luiz Gouvêa de Paula.

Os Tapirapé encontram-se envolvidos num processo de recuperação territorial e, preocupados com o pouco conhecimen­to das novas gerações a respeito de seu território tradicional, as lideranças deste grupo indígena, utilizaram-se da escola como veículo para recuperação desse co­nhecimento. Excursões, organizadas a partir da escola e orientadas por mem­bros mais velhos da comunidade, tenta­ram minorar o pouco conhecimento dos mais jovens a respeito das terras do gru­po. Convertidos em autores e pesquisado­res, os alunos reuniram parte do acervo da memória tribal sobre a terra em que vive­ram nos últimos dois séculos e com elas compuseram este livro.

O projeto - Em 1973, o casal de indigenis-tas Luís e Eunice Gouvêia de Paula, apoia­do pela Prelazia de São Félix, instalou-se na aldeia Tapirapé, atendendo o pedido do grupo indígena por ensino feito ao bispo D. Pedro Casaldaliga. O trabalho iniciou-se

com estudos sobre a língua e a grafia e prosseguiu até a elaboração de um currí­culo diferenciado e próprio para a escola Tapirapé. Foi o primeiro currículo diferencia­do de uma escola indígena reconhecido. Hoje a "Escola Estadual de Primeiro Grau Tapirapé" conta com professores indígenas formados na escola. Todos os Tapirapé em idade escolar aprendem a ler e escrever em sua própria língua e em português.

A elaboração do livro visou a valoriza­ção do conhecimento da história do terri­tório tradicional Tapirapé, estimulando con­sultas aos membros mais velhos do grupo e às atividades de pesquisa realizadas no espaço da escola. Ao mesmo tempo, o li­vro serve de subsídio para a reflexão da comunidade sobre a situação atual de seu território, d i vu lgando suas demandas territoriais aos membros mais jovens e junto a órgãos do governo.

O trabalho de feitura do livro iniciou-se com a pesquisa dos alunos com seus pa­rentes mais velhos. Muitos deles, nesse pro­cesso, recuperaram parte da memória de sua família sobre parcialidades de seu ter­ritório tradicional. Juntando todas essas vi­sões parciais reuniu-se um bom material sobre a totalidade do território. Depois que fizeram a pesquisa com os mais velhos, os textos foram trabalhados em grupos pelos alunos, que se encarregaram de juntar e sistematizar as versões individuais em uma só e ilustrar as histórias. O resultado desse

primeiro trabalho foi digitado e apresenta­do aos alunos para alterações em novem­bro de 1995 e setembro de 1996.

Uma vez editado, com o apoio do Mi­nistério da Educação e do Desporto e do Mari - Grupo de Educação Indígena da USP, o livro foi distribuído aos Tapirapé. Ele é um estímulo para novas pesquisas e con­versas, além de ser material de leitura na língua do grupo atualmente utilizado na escola. Para o público mais amplo, o livro é um testemunho da antigüidade da pre­sença dos Tapirapé no Serra do Urubu Bran­co e o registro poético da memória desse povo sobre o local onde viveram. Anima­dos com o livro e sua repercussão junto a comunidade, os professores Tapirapé já es­tão em fase de finalização de um novo li­vro. O novo livro dedica-se a registrar os cantos religiosos do grupo e traz, também, uma descrição de suas festas e rituais mais importantes. Está sendo organizado e será editado pelos próprios Tapirapé. Xanefawa Parageta abriu o caminho: outras obras vêm vindo na mesma trilha.

Os autores e usuários do livro - Os Ta­pirapé são um povo de língua da família Tupi-Guarani que habitam terras no Estado do Mato Grosso, próximo à foz do rio Tapi­rapé com o Araguaia. Por volta de 1900, acredita-se que os Tapirapé somavam cer­ca de 1.500 pessoas. Eles passaram a ter contato regular com a sociedade brasilei­ra a partir de 1950, quando se estabelece-

desapareceram. Quando em 1952, a Mis­são das Irmãzinhas de Jesus, a pedido do bispo dominicano de Conceição do Ara­guaia, instalou-se entre eles, para prestar assistência na área de saúde, a população estava reduzida a cerca de 50 pessoas.

Na década de 60, toda a região do Mato Grosso começou a ser ocupada por grandes companhias agropecuárias e fa­zendas que avançaram sobre os territórios indígenas. A 30 km da aldeia cresceu o po­voado de Santa Terezinha, depois transfor­mado em município. Posseiros foram em­purrados pelas novas fazendas para den­tro do território indígena, na época ainda não demarcado. Só em 1983, a Terra Indí­gena Tapirapé-Karajá foi demarcada, com a extensão de 66.166 ha, nos municípios de Luciara, Comodoro e Santa Terezinha.

Hoje, o grupo experimenta um vigoro­so processo de recuperação populacional: somam 363 pessoas e estão envolvidos num processo de recuperação de suas ter-

c a ç a e coleta. Decididos a recuperar a área e cansados de esperar uma ação por parte da Funai, os Tapirapé procuraram for­talecer sua presença no local que culmi­nou com a re-instalação de uma aldeia, chamada Tapi'itawa, que havia sido aban­donada devido a um ataque dos Kayapó em 1947. Ali edificaram uma aldeia no es­tilo tradicional: um círculo de casa tendo ao centro a takara, a casa dos homens. Esse local, que constitui o "coração" do ter­ritório tradicional Tapirapé, é denso de sig­nificado afetivo, religioso e histórico. Seus habitantes vêm sofrendo hostilidade decla­rada de fazendeiros da região e da popu­lação regional contrária ao reconhecimen­to deste território, que recentemente foi declarado como de posse permanente dos Tapirapé. A demarcação física do território Tapirapé já foi concluída. Falta ain­da a retirada dos ocupantes. Os Tapirapé estão confiantes que conseguirão, em bre­ve, recuperar seu território tradicional.

ras tradicionais. Em 1993, os Tapirapé reocuparam uma parcela de seu território, in­vadido por fazendas, no mu­nicípio de Confresa e Santa Teresinha, no extremo norte do Mato Grosso. Esse territó­rio, conhecido como Terra In­dígena Urubu Branco, vinha sendo util izado nos últimos anos pelos Tapi rapé pa ra

ram junto a um posto indíge­na do antigo Serviço de Pro­teção aos índios (SPI), na foz do rio que leva o nome da tri­bo, no noroeste do estado de Mato Grosso. Na época , em função do conta to , do apa­recimento de epidemias e em conseqüênc ia de a ta­ques de grupos indígenas vizinhos, os Tapirapé quase

Esco/a dos Watoriki theripe Programa de Educação de CCPY

CCPY/MEC/PNUD São Paulo, 1997, 92 págs.

O livro - O livro 'Yama ki hwerimamouwi the ã oni - Palavras escritas para nos cu­rar" reúne cinco cartilhas bilíngües Yano-mami-Português, produzidas na Escola dos Watoriki theri pe ("habitantes da serra do vento forte"), no período de 25 de maio a 17 de junho de 1996, no âmbito dos proje­tos de educação e de saúde desenvolvi­dos pela Comissão Pró-Yanomami (CCPY), com o apoio do Ministério da Educação e do Desporto. As cinco cartilhas versam so­bre as epidemias dos brancos, o mal da malária, o mal da gripe, o mal da tosse e as dores de dentes.

A e laboração das cartilhas contou com a participação de quatro jovens alfa­betizados, Joseca, Cláudia, Geraldo e Tenosi, todos fluentes na escrita do Yano-mami; dos líderes da comunidade Lourival Yanomami e Davi Kopenawa; e de quatro assessores não-índios: Deise Francisco (mé­dica), Ana Isabel Dias (dentista), Maria Edna de Brito (educadora) e Bruce Albert (antropólogo). Além de propiciar conhe­cimentos básicos sobre questões de saú­de relevantes para aquela comunidade, a produção das cartilhas teve como obje­tivo incentivar os alunos a produzirem tex­tos na sua própria língua, gerando materi­al de leitura para o processo de alfabeti­zação em curso na escola daquela comu­nidade.

Yama ki hwérimamouwi the ã oni -

Palavras escritas para nos curar

O projeto - A Comissão Pró-Yanomami tem como objetivo a defesa dos direitos, da cultura e das terras dos Yanomami da Amazônia Brasileira. Em 1978, quando foi criada, a CCPY desenvolveu uma grande campanha pela demarcação do território dos Yanomami. Paralelamente colocou ênfase na defesa da vida deste povo indí­gena através de um programa de saúde desenvolvido na área. Para dar aos Yano­mami condições de enfrentar o contato, a CCPY iniciou em 1995 a implantação de um projeto de educação integrado, que além da alfabetização, visa a formação de monitores de saúde e professores entre os próprios índios.

O projeto de educação tem como objetivo principal a oferta de subsídios e mecanismos para a implantação de uma política educacional que valorize a cultu­ra yanomami e ao mesmo tempo prepare esse povo para uma convivência digna com a sociedade brasileira mais ampla. O projeto visa, num primeiro momento, intro­duzir o processo de alfabetização para que os Yanomami possam ler e escrever em sua língua materna, concomitantemente com o aprendizado oral do português. Num se­gundo momento, visa passar da escrita em Yanomami para a escrita em português.

O projeto, que conta com apoio do Ministério da Educação e do Desporto, UNICEF e Earth Love Fund, iniciou-se na al­deia dos Watoriki theri pe, sub-grupo Yano-

mami, que conta com uma população de 101 pessoas, das quais quase a metade tem menos de 10 anos de idade. Este pro­jeto foi estendido em 1998 para as aldeias da região vizinha do rio Toototobi e alto Demini (Balawaú).

Os autores e usuários do livro - Os Ya­nomami são um povo da floresta amazô­nica, cuja população é estimada em 22 mil pessoas, habitando um território no oes­te do Maciço das Guianas, região de fron­teira entre o Brasil e a Venezuela. No Brasil, este território compreende parte dos Esta­dos de Roraima e Amazonas. Aqui eles so­mam cerca de 10.500 pessoas, distribuídos em aproximadamente 220 comunidades, numa área contínua de 9.419.108 ha.

O termo Yanomami é usado de ma­neira genérica para designar o conjunto cultural e territorial constituído pelo grupo indígena como um todo. No plano lingüís­tico designa uma família de quatro línguas subdivididas em vários dialetos.

Os Yanomami praticam a caça, pes­ca, coleta e, em menor grau, agricultura. Habitualmente uma casa Yanomami abri­ga de 30 a 150 moradores, podendo che­gar a 300. Os grupos locais podem ser cons­tituídos por uma ou várias casas comunitá­rias, que mantém entre si intenso contato, consolidado por relações econômicas, matrimoniais, rituais ou de aliança política. Da movimentação entre as aldeias ou con­junto de aldeias depende a dinâmica e o

equilíbrio da vida econômica e social das comunidades Yanomami. Essa movimen­tação envolve, freqüentemente, contatos intensos e prolongados entre aldeias que distam de um a cinco dias ou mais de via­gem a pé pela floresta, ou mais raramente de canoa.

As cerimônias em homenagem aos mortos (reahu) atraem grande número de hóspedes de aldeias próximas e distantes. Podem durar uma semana ou mais, pre­cedidas por caçadas coletivas, feitas pe­los anfitriões e pelos visitantes, muitas dan­ças, pajelanças, prantos, brincadeiras, jo­gos e desafios. São ocasiões para troca de notícias e de objetos, para casamentos, re­feições abundantes, definição de alianças políticas e resolução das divergências.

A tradição oral indígena e o relato de expedições científicas enviadas a essa re­gião comprovam a presença yanomami nesta área pelo menos desde o fim do sé­culo XVIII. A partir da década de 50 insta-

bre a existência de ouro, cassiterita e ou­tros minérios na região, dando início a uma verdadeira corrida a essas riquezas. A par­tir de 1987 a invasão dos garimpeiros che­gou a 40 mil, levando malária, pneumonia, fome e morte a 20% dos Yanomami.

Em 1978 foi criada a Comissão pela Cri­ação do Parque Yanomami (CCPY), com sede em São Paulo, que inicia uma cam­panha nacional e internacional pela de­marcação das terras Yanomami contra uma primeira tentativa de desmembra­mento do território Yanomami pelo gover­no militar da época.

No final da década de 1980, o gover­no federal começa a implantar o proje­to Calha Norte, para a proteção de uma extensa faixa ao longo da fronteira ama­zônica brasileira. O território Yanomami é f ragmentado e demarcado em 19 pe­quenas ilhas não contíguas, inseridas numa reserva florestal destinada à explo­ração econômica. Enquanto isso, fome e

morte alastram-se nas aldei­as Yanomami.

Em 1991, o governo fede­ral realizou uma operação de retirada dos garimpeiros e a terra Yanomami foi reconhe­cida e demarcada fisicamen­te como um território contí­nuo. Em maio de 92, o presi­dente da República homolo­gou a demarcação do terri-

lam-se em terras Yanomami várias missões religiosas, en­tre elas a Missão Salesiana, a Missão Consolata, a Missão Evangé l i ca da Amazôn ia (Meva) e a Missão Novas Tri­bos do Brasil. Na década de 70 a rodovia Perimetral Norte corta o território Yanomami, e são também divulgados os re­sultados do Projeto Radam so-

tório e, neste mesmo ano, recomeçou a invasão dos garimpeiros e eles ainda con­tinuam na área, ilegalmente, ainda que em número menor que na corrida ao ouro (1987-1989).

Em 1998, o mega-incêndio que atingiu o centro-oeste e o norte do país também consumiu parte da floresta dos Yanomami. Hoje, projetos de colonização contíguos à área indígena estão avançando sobre o território demarcado, abrindo caminho para a invasão de colonos.

Pangyjej Kue Sep A nossa língua escrita

no papel

Escola Zoró da Barreira / Depto. para Assuntos Indígenas do Conselho

de Missão entre índios (COMIN/IECLB) I NEIRO

Parque Indígena Aripuanã, 1994, 97págs.v

O livro - O livro "Pangyjej Kue Sep-Anos­sa língua escrita no papel" contém textos elaborados por Xinepusat Waratã Zoró, com a colaboração de Xinepukujkap Zoró e de outros alunos da Escola Zawãkej Alakit (Escola Zoró da Barreira). Ilustrado por Mbedurap Zoró, o livro foi organizado por Ismael Tressmann, indigenista que viveu cerca de um ano e meio entre este grupo indígena.

O livro, todo escrito em língua Zoró, destina-se à alfabetização de adultos e à formação de professores indígenas. Temas como o artesanato, a construção das malocas, a floresta, os animais, a roça, a alimentação, as festas, as músicas, a guer­ra, a pajelança, o casamento e a história do contato deste povo Tupi-Mondé com os não-índios são tratados no livro. Foi o pri­meiro livro didático editado pelo MEC den­tro da linha de apo io à p rodução de matérias didát ico-pedagógicos para as escolas indígenas.

O projeto - O Projeto de Educação Esco­lar entre os Zoró, realizado em parceria com o Núcleo de Educação Indígena de Rondônia, está inserido dentro de uma uni­dade maior, o PROARI (Projeto de Assesso­ria ao Parque Indígena Aripuanã). Os tra­balhos de assessoria estão voltados para as áreas de educação, saúde e apoio jurí-

dico, e incluem além dos Zoró, os vizinhos, Cinta-Larga.

O objetivo principal do Projeto de Edu­cação é a formação de professores indí­genas, dentro da proposta de uma edu­cação intercultural, comunitária, bilíngüe, específica e diferenciada. A proposta do projeto é fazer com que a educação es­colar seja somada aos processos educati­vos próprios da sociedade Zoró e criar con­dições para que a própria comunidade indígena possa gerir a sua escola.

Entre 1993 e 1994, o trabalho em edu­cação escolar seguiu as seguintes etapas: coleta de dados e pequenas descrições e análises da língua; proposta de uma es­crita, em co laboração com os educan­dos; alfabetização de algumas pessoas do grupo; e realização de dois encontros/ cursos para a e laboração de textos na língua. O resultado desse trabalho foi o livro "Pangyjej Kue Sep - A nossa língua escrita no papel" e a publ icação de um Caderno de Preparação para a Escrita. A proposta do livro partiu dos próprios índi­os que desejavam um material acessível que abordasse seus etno-conhecimentos e sua cosmologia e que lhes permitisse exer­citar a leitura.

A imp lan tação da Escola Zawãkej Alakit foi igualmente uma iniciativa dos pró­prios Zoró. Com o aumento do número de alunos, o barracão improvisado foi substi­tuído por um espaço físico mais amplo,

construído com recursos da própria comu­nidade.

Os autores e usuários do livro - Os Zoró se autodenominam Pangyjej, que significa "nós comemos carne moqueada". Povo de língua da família Mondé, pertencem ao complexo Tupi-Mondé, do qual também fazem parte os povos Cinta Larga, Gavião, Mondé, Surui, Aruá, todos de Rondônia, e os Arara do Beiradão (MT).

Vivem na Terra Indígena Zoró, no mu­nicípio de Aripuanã, Rondônia, entre os rios Branco e Roosevelt/14 de Abril, tributários da margem direita do rio Madeira. A área localiza-se no Parque Indígena Aripuanã, que abriga ainda os Cinta Larga e os Surui. Algumas famílias Zoró vivem na Área Indí­gena Igarapé Lourdes junto ao povo Ga­vião e outras entre os vizinhos Cinta Larga, na Área Indígena Roosevelt.

Os Zoró distribuem-se em vários grupos locais semi-nômades, autônomos em ter­mos políticos e econômicos, que falam uma mesma língua e comparti lham um mesma cosmovisão. Hoje somam cerca de 300 pessoas.

A penetração e avanço da socieda­de nacional naquela região a partir dos anos 60, e mais intensivamente na déca­da de 70, ocasionou uma enorme depo-pulação, perda de parcelas do território tradicional e outras conseqüências nega­tivas que perduram até hoje. Os Zoró es-

tabeleceram seus primeiros contatos amistosos com pe­ões das fazendas próximas em 1976. Na época, estima-se que eles eram umas 800 pessoas. Em outubro do ano seguinte um grupo Zoró, se­guido pelos demais, aceitou o contato com uma frente de atração da Funai. O contato oficial ocasionou a perda da autonomia política e econômica, a seden-tarização dos diferentes grupos locais numa única aldeia, além de impor o cultivo de grandes roçados para a produção de ex­cedentes.

Entre 1978 e 1981, os Zoró foram con­vertidos por missionários da Novas Tribos, por meio da pregação de pastores Gaviões (de Rondônia) e passaram a professar uma forma de evangelismo fundamentalista. Al­guns tornaram-se pastores dessa nova igre­ja e passaram a considerar manifestações diabólicas os antigos ritos, danças, festas, mitos e pajelança. Por volta do início dos anos 90, os Zoró se "desconverteram". Vol­taram, então, a fazer guerra, tomar chicha fermentada, fazer festa, dançar e procu­rar novamente o velho pajé Paiô, para que se encontrassem com os seres invisíveis e realizassem os rituais de cura.

Em outubro de 1991, a Área Indígena Zoró foi homologada com 352.000 ha. Em setembro de 1992, posseiros invasores fo-

ram retirados da área. Sem as­sistência, nem para cuidar dos doentes, os Zoró, influenciados por seus vizinhos Suruí e Cinta Larga, se dividiram e cederam às pressões das madeireiras, que abriram estradas dentro da área indígena e estão de­vastando o território para a re­tirada do mogno.

Adornos e Pintura Corporal Karajá

Coleção Textos Indígenas - Série Cultura Programa de Educação Indígena para o Estado do Tocantins - Convênio Governo

do Estado do Tocantins/Funai/UFG Goiânia, 1994, 47 págs.

O livro - O livro ''Adornos e Pintura Corpo­ral Karajá" integra a coleção "Textos Indí­genas - Série Cultura", editada pelo Pro­grama de Educação Indígena para o Es­tado do Tocantins, por meio do convênio estabelecido entre o governo do Estado do Tocantins, Funai e Universidade Federal de Goiás. Organizado pela lingüista Lídia Poleck, o livro reúne textos e ilustrações pre­paradas por professores Karajá, durante a VI etapa do Curso de Capaci tação de Pro­fessores Indígenas, realizado no município de Formoso do Araguaia, no Estado do To­cantins, em setembro de 1992. Os textos e os desenhos foram elaborados pelos pro­fessores para dar suporte a uma exposição de artefatos sobre "festas", que o projeto de e d u c a ç ã o realizou em Goiânia, no Museu Antropológico da UFG, em come­moração ao Dia Internacional dos Museus.

O livro apresenta um inventário co­mentado das pinturas realizadas pelos Karajá e Javaé tanto para uso diário quan­to para os dias de festa, bem como sobre o uso de adornos corporais.

O projeto - O Projeto de Educação Indí­gena para o Estado do Tocantins, que con­ta com apoio financeiro do MEC, envolve professores indígenas das etnias Karajá, Javaé, Xambioá, Xerente, Krahô e Apinayé. Teve início em 1991 por meio de um con­vênio entre o Museu Antropológico da Uni-

versidade Federal de Goiás, a Secretaria de Educação do Estado do Tocantins e a Funai.

O primeiro curso de capaci tação, re­alizado entre 1991 e 1993, envolveu uma primeira turma de 38 professores de 37 co­munidades diferentes, que participaram de sete etapas de cursos. O segundo curso de capac i tação iniciado em 1994 envolve uma segunda turma de 47 professores in­dígenas que participaram de 6 etapas de cursos. Em maio de 1997 iniciou-se o ter­ceiro curso de capaci tação, envolvendo uma terceira turma de 19 professores, que já participaram de duas etapas com um total de 168 horas de aulas.

Além dos cursos de capac i tação, o projeto envolve acompanhamento dos professores nas aldeias, preparação de ex­posições sobre os grupos indígenas do Tocantins para a sociedade envolvente e produção de material didático-pedagógi­co elaborado pelos próprios índios. Em prin­cípio estes materiais têm sido elaborados nos cursos, mas de acordo com a aborda­gem pedagógica do projeto eles deverão ter uma produção contínua, envolvendo alunos, e textos coletados pelos professo-res-pesquisadores junto às suas comunida­des. São textos onde se preservam as especificidades das línguas indígenas, tan­to estruturais quanto estilísticas, o que só é possível a partir do momento em que os índios são os produtores de seus textos. A

forma como desenvolveram estes textos nos cursos está intrinsecamente ligada à prática pedagógica e às futuras decisões de encontrar-se um espaço para a língua escrita em suas comunidades.

Os materiais editados pelo Projeto, dentro da coleção intitulada Textos Indíge­nas, estão distribuídos em três séries: Cultu­ra, Natureza e Receituário. Além do livro "Adornos e Pintura Corporal Karajá", já fo­ram publicados os seguintes títulos: "Recei­tas Krahô e Apinajé", "Cobras da Área Xerente", "Festas Indígenas Xerente", "Pei­xes da Área Xerente", Festas Krahô", "His­tória de Aruanã".

Nas comunidades indígenas do Tocan­tins há escolas onde são oferecidos cursos até a 4° série: são ao todo 56 escolas onde lecionam 87 professores indígenas que atendem 2.078 alunos. No que se refere especificamente aos Karajá, há cinco es­colas indígenas na Ilha do Bananal, onde lecionam 23 professores que atendem 425 alunos.

Em julho de 1998 foi iniciado um Proje­to de Formação envolvendo os professo­res indígenas das três turmas que deverá habilitá-los como professores da 1° fase do 1° grau, dentro de uma proposta educaci­onal diferenciada, bilíngüe, específica e intercultural.

Os autores e usuários do livro - Os Karajá contam hoje com uma população

vivem na margem do rio Javaé, na Área Indígena Boto Velho, município de Pium (GO); os Xambioá, que habitam as mar­gens do rio Araguaia, Al Xambioá, no mu­nicípio de Araguaína, extremo norte de Tocantins; e os Karajá, que vivem em 18 aldeias na ilha do Bananal, no Parque indí­gena do Araguaia (TO). Há ainda famílias Karajá que moram no estado de Mato Grosso (Al Tapirapé-Karajá, Al São Domin­gos e Al Aruanã ll); em Goiás (Al Aruanã I e III); e no Pará (Al Maramanduba e na Al Karajá Santana do Araguaia), além de ou­tras áreas ainda não regularizadas.

A história de contato dos Karajá com a sociedade envolvente foi sempre mar­cada por lutas de resistência desse povo pela posse de suas terras, pela preserva­ção de sua cultura e identidade étnica. É provável que esse contato tenha se iniciar do no século XVI e XVII. Os documentos históricos registram inúmeros conflitos dos índios com invasores de seus territórios, prin-

Os Karajá compõem uma sociedade de pescadores e coletores, com uma produção agrícola pequena. Mora­dores das praias do Araguaia, acabaram por especializar-se como fornecedores de peixes e de mantas de pirarucu salgados no comércio regional. Exímios artesãos, pro­duzem grandes quantidades de bonecas de argila, mudialmente conhecidas.

Os Karajá organizam-se em famílias extensas. A chefia tradicional é exercida pelo hyri, xamã, que possui dotes de vidência e poder de cura. Realizam vários e elaborados rituais, dos quais se destacam a festa de Hetohoky, que assinala a fase de iniciação do menino na sociedade Karajá, e a festa de Arauanã, realizada para agradar os espíritos.

estimada em 1.600 pessoas, a maior parte dos quais vive no Parque Indígena do Araguaia, Tocantins. A língua Karajá, per­tencente ao tronco macro-jê, é falada por toda a comuni­dade, exceto algumas pou­cas crianças de pais com ca­samentos mistos.

Os Karajá dividem-se em três sub-grupos: os Javaé, que

cipalmente com explorado­res de ouro. Esse contato vai se acelerar a partir dos anos 50 e 60, sobretudo após a cri­ação de Brasília, e hoje tende a ser mais destrutivo pela abertura de estradas na Ilha do Bananal e pelo estabele­cimento da hidrovia do Ara­guaia.

Atlas Geográfico Indígena do Acre

Projeto de Autoria da Comissão Pró-índio do Acre CPI-AC Rio Branco, J 996, 62 págs.

O livro - O livro "Atlas Geográfico Indíge­na do Acre" foi preparado pelos professo­res Apurinã, Ashaninka, Jaminawa, Kaxina-wa, Katukina, Manchineri, Shawãdawa e Yawanawa, do Acre, durante cinco cursos de geografia realizados entre 1993 e 1996, dentro do Programa de Formação de Pro­fessores Indígenas, desenvolvido pela Co­missão Pró-índio do Acre (CPI-AC) desde 1983. Organizado pelos geógrafos Renato Antonio Gavazzi e Márcia Spyer Resende, este é o oitavo livro didático na área de geografia de autoria indígena publicado dentro do projeto "Uma experiência de au­toria".

Com textos e ilustrações realizadas pelos professores indígenas, o Atlas congre­ga diversas informações sobre o estado do Acre e sua ocupação por índios e não-ín-dios. Divisão política, hidrografia, ocupação indígena, relevo, transporte e comércio, caça e pesca, extrativismo, pecuária são alguns dos temas tratados nos diferentes textos e mapas do Acre, elaborados com fino acabamento pelos professores indíge­nas em seu domínio da cartografia, das técnicas de desenho e de registro históri-co-geográfico como conteúdo curricular de sua formação. Este livro, assim como o próximo, fazem parte do mesmo projeto descrito a partir da página 31.

Aprendendo Português nas Escolas da Floresta

Projeto de Autoria da Comissão Pró-índio do Acre

MEC/UNESCOICPI-AC Rio Branco, 1997, 77 págs.

O livro - O livro "Aprendendo Português nas Escolas da Floresta" apresenta textos, desenhos e atividades voltados ao ensino do português, elaborados em 1993 pelos professores índios do Projeto de Autoria da Comissão Pró-índio do Acre, durante o 12o

Curso de Formação na Área de Estudo de Línguas e Pedagogia. O livro contém tex­tos e desenhos de professores Apurinã, Ashaninka, Jaminawa, Kaxinawa, Katukina, Manchineri, Shawãdawa e Yawanawa. Organizado pela lingüsta Tereza Maher, com a participação das educadoras Vera Olinda Sena e Nietta Monte, o livro foi edi­tado pelo Ministério da Educação e do Desporto em 1997.

Trata-se de um material de pós-alfa-betização em português como segunda língua, voltado aos alunos das escolas da floresta, para ampliar sua fluência lingüís­tica oral e escrita. O livro, construído pelos professores a partir de situações de uso da língua portuguesa que consideram co­muns e que necessitam de um enfrenta­mento discursivo que favoreça sua relação intercultural, está dividido em duas partes: falando português na aldeia e falando por­tuguês na c idade. A primeira é voltada para crianças e jovens, com um domínio incipiente do português, que desejam ou têm que interagir com não-índios (asses­sores, vizinhos regionais, etc) em suas al-

déias. A segunda destina-se a jovens e adultos, mais fluentes no português, e que precisam se comunicar nas cidades em si­tuações diversas como tirar documentos, negociar produtos, votar, etc.

O projeto - Em princípios do ano de 1983 a Comissão Pró-índio do Acre deu início ao Projeto "Uma Experiência de Autoria" que visa possibilitar a formação continuada de professores indígenas das etnias Kaxinawá, Katukina, Kaxarari, Ashaninka, Manchineri, Jaminawá, Shawãdawa, Yawanawá, Apu-rinã e Poyanáwa, todas localizadas no Acre. Inaugurava-se, nesta época, uma re­novação nos modelos de educação esco­lar no país e no continente, resultado do momento histórico representado pelos "no­vos Tempos dos Direitos": os processos de demarcação de terras indígenas na região vinham acompanhados pela necessidade de substituição dos sistemas de dependên­cia e integração, representados pelas es­colas das agências missionárias e governa­mentais, por novas formas de pensar e fa­zer educação escolar indígena. Para tal mudança, jovens indígenas eram escolhi­dos, por suas comunidades, para serem formados e, ao mesmo tempo, iniciarem experiências de alfabetização bilíngüe de seus parentes, cujas terras, na época, esta­vam em processo de demarcação.

O projeto vem realizando, desde en­tão, a formação permanente de um gru­po de mais de 60 professores indígenas; a

elaboração, por uma equipe de assesso­res e professores indígenas, de currículos bilíngües e interculturais para as escolas e para os cursos de magistério indígena; a produção e publicação de quase uma centena de materiais didáticos e para-di-dáticos elaborados nos cursos de forma­ção pelos professores indígenas e seus as­sessores, para uso nas escolas; o acompa­nhamento e assessoria permanente a es­tes professores nas escolas das aldeias pela equipe de educadores da entidade, de forma a possibilitar-lhes a continuidade de sua formação à distância. Por tais carac­terísticas e linhas de trabalho, a marca re­gistrada do projeto acreano, envolvendo pesquisa e criação pedagógica, tem sido o conceito de "autoria".

Durante todos os cursos de formação oferecidos pela CPI-AC, os professores in­dígenas desenham e escrevem, em suas diversas línguas, recentemente grafadas e em português, livros nas diversas áreas de estudo de seu currículo (matemática, lín­guas, geografia, história, ciências) que são imediatamente editados pela entidade para serem utilizados ao longo do ano le­tivo em suas respectivas escolas, até se­rem renovados por novos materiais nos próximos anos. Desta forma, o projeto conta com um extenso acervo de materi­ais didáticos e de literatura de autoria indí­gena, que vêm sendo referência importan­te para os novos programas de educação escolar no Brasil.

Estes livros, escritos desde a década de 80, em português e nas diversas línguas envolvidas no programa, referem-se a te­mas como suas "Histórias de Hoje e de An­tigamente" (1984); suas "Escolas da Flores­ta" (1984); sua cultura material, "Fábrica do índio" (1985); suas músicas, "Nuku Mimawa" (1994); suas diversas abordagens da geo­grafia, "Geografia Jaminawa", "Geografia Manchineri", "Geografia Yawanawá", "Ge­ografia Kaxinawá" (1995); sua relação com outras literaturas indígenas e não-indígenas, "Antologia da Floresta" (1996); suas mitolo­gias pesquisadas entre os velhos e reunidas em livros como "Shenipabu Miyui" (1996) e "Noke Shoviti" (1998); totalizando hoje 57 publicações de uma nova literatura indí­gena em sua fase atual de aquisição e uso da escrita com a concomitante valoriza­ção dos mecanismos tradicionais de oralidade.

Por este elenco de realizações, o Pro­jeto de Autoria tem sido reconhecido como um dos principais modelos pedagógicos possíveis para a Educação Escolar não só no Brasil como em outros países da Améri­ca Latina, promovendo importante papel na discussão das políticas públicas a serem traçadas para as populações indígenas. Como resultado de sua trajetória histórica, a CPI/AC conquistou a aprovação e regu­lamentação dos currículos das escolas e dos cursos de magistério pelo Conselho Estadual de Educação do Acre em 1993 e

1997 respectivamente, tendo promovido, desde seus primórdios, importantes e pio­neiras parcerias entre órgãos federais e es­taduais como a Funai, Ministério da Educa­ção e do Desporto, Secretaria de Educa­ção, algumas universidades brasileiras e or-ganizações-não governamentais de cará­ter civil.

Hoje existem no Acre mais de 110 es­colas indígenas regularizadas, a maioria delas desenvolvendo seus currículos dife­renciados sob a responsabilidade dos pro­fessores índios em processo de formação no magistério, lecionando para cerca de 2.500 alunos. Apoia-se, assim, a permanên­cia das populações indígenas em suas ter­ras e sua preparação para o uso e a con­servação destes territórios, em ações inte­gradas de educação escolar, meio ambi­ente e saúde.

Os autores e usuários do livro - Foi na década de 70, que os índios do Acre e Su­doeste do Amazonas passaram a ser re­conhecidos como grupos étnicos diferen­ciados, com o apoio de ações de indi-genistas de entidades civis e religiosas e com a instalação da Funai no Estado. Até então, o governo e vários segmentos da sociedade, desconheciam a existência de índios naquela região, sendo estes identificados como caboclos e integrados em sua maioria como mão de obra nas frentes extrativistas (borracha e castanha)

que chegaram à região nos finais do sécu­lo passado.

Hoje, existem 27 terras indígenas, com diferentes situações de regular ização fundiária, totalizando cerca de 13% da ex­tensão total do estado. Nelas vivem apro­ximadamente 10 mil índios das etnias Apu-rinã, Ashaninka, Jaminawa, Kaxinawa, Katukina, Manchineri, Yawanawa, Kulina, Shawanawa, Shanenawa, Poyanawa, Jamamadi, Nukini, Kaxarari, além de vári­os outros grupos ainda isolados. Esses gru­pos falam línguas pertencentes a três fa­mílias lingüísticas: Aruak, Pano e Arawá.

A exploração e a ocupação, por bra­sileiros e por peruanos, das extensas áreas de florestas banhadas pelas bacias forma­doras dos altos rios Purús e Juruá no Acre, desenrolou-se a partir das duas últimas décadas do século XIX. A partir deste perí­odo, ocorreu a penetração de duas fren­tes de expansão extrativistas: uma, itineran-te e de curta duração, ganhou forma atra­vés das atividades dos caucheiros perua­nos, que visavam a exploração do caucho e de outros produtos florestais (peles de animais e madeira-de-lei); outra, maciça e duradoura, constituída por brasileiros que passaram a trabalhar nos seringais abertos nos altos rios incidentes, na faixa territorial que viria a constituir posteriormente o Terri­tório Federal do Acre.

Os integrantes dessas duas frentes ex­trativistas praticamente cercaram as popu­

entes dos altos rios. Este período inicial de conquista dos seringais foi marcado por sangrentos enfrentamentos entre os mem­bros dessas populações nativas tanto com os nordestinos quanto com os caucheiros peruanos. A estes enfrentamentos e suas trágicas conseqüências deu-se o nome de correrias. Os caucheiros freqüentemente se aproveitaram de tradicionais conflitos inter-tribais, aliando-se a uma das partes, forne­cendo armamento, munição e outros pro­dutos industrializados para que se realizas­sem as correrias e fossem escravizados os membros das populações derrotadas.

A inserção das populações indígenas nos seringais administrados por patrões se-ringalistas regionais se estende até meados da década de 70 e é vista por seus mem­bros como o tempo do cativeiro. Os inte­grantes dessas populações passaram a ser indistintamente denominados de caboclos e a sofrer forte discriminação no interior dos seringais. Os seringueiros cariús se viram

lações nativas, pe r tencen tes aos t roncos l i n g ü í s t i c o s Pano e Aruak, que t rad i c io ­na lmente ha­bitavam as ter­ras firmes e as margens dos igarapés, aflu-

atrelados aos barracões dos patrões, sen­do obrigados a pagar renda pela utiliza­ção das estradas de seringa, e roubados nos preços da borracha e das demais mer­cadorias. Eram proibidos de praticar festas e rituais de suas tradições culturais, assim como de atualizar importantes aspectos de suas formas próprias de organização soci­al e política.

Em 1975, a Divisão de Estudos e Pes­quisas da Funai realizou os primeiros levan­tamentos fundiários, demográficos, sócio-econômicos e culturais das populações in­dígenas que habitavam os rios Envira, Murú, Humaitá, Tarauacá e Jordão. Como des­dobramento desse levantamento e, prin­cipalmente, do acirramento dos conflitos pela posse da terra no Acre, a Funai cons­tituiu equipes de trabalho para realizar, no ano de 1977, as primeiras identificações de terras indígenas em diferentes rios e micro-regiões do Estado. Até às demarcações fí­sicas das áreas indígenas do Acre, os di­versos grupos étnicos locais receberam pequenos montantes de recursos para o financiamento das safras extratívista e agrí­cola, através de distintos projetos de orga­nização de cooperativas, intermediados pela CPI-AC junto a entidades governa­mentais e agências humanitárias estrangei­ras.

Nesses primeiros anos, a estruturação das cooperativas serviu de base para a conquista e a ocupação produtiva dos se­

ringais incidentes nas áreas indígenas, as­sim como para a reorganização política, econômica e social dos grupos familiares extensos que integravam as populações indígenas. A partir de 1982-83, as lideran­ças começaram a participar das assem­bléias indígenas e começaram a exigir a agilização da demarcação de suas terras, o financiamento de suas safras extrativistas e agrícolas e a capac i tação de membros dos próprios grupos para a execução de programas educacionais e sanitários a se­rem desenvolvidos em suas áreas.

Nasce assim o Projeto "Uma Experiên­cia de Autoria", como forma de atender a solicitação das lideranças indígenas na sua luta pela libertação dos patrões e de ou­tros agentes formais do violento contato até então promovido nesta região. É o iní­cio dos novos Tempos dos Direitos, onde a escola passa a ocupar um lugar estratégi­co fundamental.

Txopai e Itôhã

Kanátyo Pataxó Programa de Implantação das Escolas

Indígenas de Minas Gerais MEC/UNESCO/SEE-MG

Belo Horizonte, 1997, 24 págs.

O livro - O livro "Txopai e Itôhã" reúne uma história contada por Apinhaera Pataxó e es­crita e desenhada por Kanátyo Pataxó. É a história do começo dos tempos, do primei­ro índio que surgiu na terra, Txopai, e do surgimento da nação Pataxó. O livro foi editado pelo Programa de Implantação das Escolas Indígenas de Minas Gerais e pu-blicado pelo Ministério da Educação e do Desporto em 1997. Destina-se a um públi­co infantil, Pataxó ou não.

Os autores e usuários do livro - Os Pata­xó têm uma longa história de contato com diferentes segmentos da sociedade brasi­leira. Por força do contato abandonaram sua língua original, da qual conservam al­gumas palavras, e expressam-se apenas em português. Pertencem a família lingüís­tica Maxakali, tronco Macro-Jê.

São originários do sul da Bahia, onde atualmente estão nove dentre os dez terri­tórios Pataxó. Expulsos de sua aldeia origi­nal, Barra Velha, por causa da criação do Parque Florestal do Monte Pascoal pelo IBDF, alguns Pataxó vieram para Minas Ge­rais na década de 80. Residem atualmen­te, junto a alguns Pankararu e Krenak, no Posto Indígena Guarani, no município de Carmésia.

O artesanato é a principal atividade dos Pataxó. Vivem também da agricultura

de subsistên­cia e da cria­ção de ani­mais. Os Pata-xó estão vi­vendo um in­teressante e vigoroso pro­cesso de re­c o n s t r u ç ã o de sua identi­

dade étnica. Como parte deste processo deve ser entendido o uso de seus nomes indígenas, a realização do ritual do Auê, a criação de cantos rituais na língua Pataxó e a reconstrução de seu acervo mitológi­co.

Participam, juntamente com outros povos indígenas localizados no Estado de Minas Gerais, do Programa de Implanta­ção das Escolas Indígenas de Minas Ge­rais, descrito a partir da página 38.

O tempo passa e a história fica

índios Xacriabá Programa de Implantação das Escolas

Indígenas de Minas Gerais MEC/UNESCO/SEE-MG

Belo Horizonte, 1997, 95 págs.

O livro - O livro "O tempo passa e a histó­ria fica" reúne textos e ilustrações realiza­das pelos professores Xacriabá que parti­cipam do Curso de Formação do Progra­ma de Implantação das Escolas Indígenas de Minas Gerais. Durante dois anos, os pro­fessores realizaram pesquisas sobre as tra­dições do povo Xacriabá em suas aldeias. Histórias e casos de seus pais, avós e tios foram ouvidos, gravados e transcritos. Este trabalho resultou em tipos diferentes de tex­tos: narrativas em versos e em prosa de fa­tos importantes na vida da comunidade, e coletâneas de contos tradicionais, que pertencem ao universo ficcional do sertão mineiro.

O livro foi editado pelo Programa de Implantação das Escolas Indígenas de Mi­nas Gerais e publicado pelo Ministério da Educação e do Desporto em 1997.

Os autores e usuários do livro - Os Xa­criabá contam hoje com uma população de 6.000 pessoas. Pertencem ao tronco Macro-Jê, família Akwén, embora hoje fa­lem apenas o português. Tinham como ter­ritório tradicional uma grande extensão de terras nos estados de Minas Gerais, Bahia e Goiás. Foram a ldeados na Missão de Monsenhor São João no início do século XVIII juntamente com diversos outros gru­pos, prevalecendo a identidade Xacriabá.

drado como tentativa de genocídio. Apenas após estes assassinatos a área foi homologada e os invasores retirados.

Hoje vivem na Terra Indígena Xacria-bá, demarcada em 1979 e homologada em 1 987, com 46.415 ha, nos municípios de Itacarambi e de São João das Missões, ao norte de Minas Gerais, a 800 km de Belo Horizonte. Distribuem-se em cerca de 30 aldeias, afastadas entre si e dirigidas por um cacique geral. Cada aldeia tem seu representante, eleito pela comunidade e indicado pelo cacique geral. As mu­lheres cuidam dos trabalhos domésticos e ajudam os homens a trabalharem na terra e a cuidarem dos animais. Aos ho­mens cabe, além dos trabalhos de sub­sistência, a condução da vida política do grupo. Realizam tradicionalmente o Toré

e o consumo de uma bebida preparada com a casca da raiz de uma árvore co­nhecida como Jurema.

Vivem da agricultura de subsistência e da criação de gado. Castigados pelas inconstâncias do clima, os Xacriabá, como todos os habitantes da região, índios ou não, sofrem as conseqüências da seca constante.

O projeto - O Programa de Implantação das Escolas Indígenas de Minas Gerais teve início em 1993, com a realização de dois encontros de educação indígena. Seu ob­jetivo é a criação de escolas indígenas no Estado de Minas Gerais e a formação de 66 professores indígenas para atuar nas es­colas Krenak, Pataxó, Xacriabá e Maxaka-li. Esses professores atendem hoje 1364 cri­anças Xacriabá, 321 Maxakali, 61 Pataxó e 35 Krenak em 11 escolas indígenas nucle-adas. Participam do programa, além da Secretaria de Educação de Minas Gerais, a Universidade Federal de Minas Gerais, A FUNAI e o Instituto Estadual de Florestas (IEF).

A coordenação do programa é com­posta por um Conselho de Representantes formado por dois membros de cada uma das quatro etnias, três representantes da Secretaria de Educação e de um repre­sentante da FUNAI, IEF e UFMG. Além de visar a construção de uma proposta de educação escolar indígena específica e diferenciada para c a d a um dos quatro grupos envo lv idos, o p r o g r a m a tem

Em 1728, receberam do governo uma do­ação de terra, da qual atualmente resta apenas um terço e pela qual tiveram que lutar muito para conservar a sua posse.

Em 1987, na aldeia Sa-pé, foram mor­tos três Xacria-bá, entre eles olíder Rosalino Gomes de Oli­veira. O mas­sacre, cometi­do por grilei­ros, foi enqua-

como objetivo habilitar os professores in­dígenas, através de um curso de magis­tério, viabilizar o ingresso dos professores indígenas no quadro de professores do Es­tado de Minas Gerais e publicar material didático-pedagógico para uso nas esco­las indígenas.

O Curso de Formação é realizado no Parque Estadual do Rio Doce e nas própri­as áreas indígenas. Os módulos desenvol­vidos no Parque são semestrais, com 192 horas-aula cada e abrangem áreas de sa­ber relacionadas ao português, matemáti­ca, ciências naturais, geografia, história, educação física e educação artística. Os módulos desenvolvidos nas áreas indíge­nas tratam de cultura, língua e uso do terri­tório indígena, específicos para cada povo. Orientados por assessores, os professores desenvolvem atividades de pesquisa, lei­tura e escrita nas aldeias e são acompa­nhados por supervisores.

O Programa de Implantação das Es­colas Indígenas de Minas Gerais tem tam­bém como meta incentivar e propiciar a produção escrita dos índios para uso nas escolas indígenas. Até este momento fo­ram editados, em parceria com o Ministé­rio da Educação e do Desporto, "O povo Pataxó e sua história" (1997), "Coisa tudo na língua Krenak" (1997), "Plantas Medici­nais: fonte de esperança e mais saúde" (1997) e "O livro que conta histórias de an­tigamente" (1998). Além dos livros, quatro

vídeos-documentários estão sendo elabo­rados sobre os grupos indígenas de Minas Gerais para subsidiar o ensino de primeiro e segundo graus desenvolvidos nas esco­las mineiras.

Madikauku - os dez dedos das mãos:

Matemática e Povos Indígenas no Brasil

Manana Kawall Leal Ferreira MEC/SEF

Brasília, 1998, 177págs.

O livro - O livro "Madikauku - os dez dedos das mãos: matemática e povos indígenas no Brasil" é uma publicação do Ministério da Educação e do Desporto, concebida especialmente para acompanhar a cole­ção de livros didáticos do Referêncial Na­cional Curricular para as Escolas Indígenas. De autoria de Mariana Kawall Leal Ferreira, do Mari-USP, o livro conta com introdução de Ubiratan D'Ambrósio.

O livro procura contribuir para o estu­do da matemática nas escolas indígenas do país. O estudo da matemática, por par­te dos povos indígenas, é visto como algo imprescindível nos dias de hoje, quando o contato intercultural entre os diferentes po­vos, e entre estes povos e a sociedade envolvente, tornou-se inevitável. Trata-se de uma proposta pedagógica, cuja finalida­de é levar para a sala de aula a pluralida­de de idéias matemáticas, expressas em atividades do cotidiano. O livro traz suges­tões didáticas para os professores desen­volverem trabalhos de pesquisa e exercí­cios em educação matemática, mostran­do como transformar resultados matemá­ticos em conteúdos e material de ensino.

O livro, fartamente ilustrado, está divi­dido em duas partes. A primeira parte, "A matemática é uma criação humana", aborda diferentes invenções que, ao lon­go da história, as sociedades lançaram

mão para classificar e ordenar o mundo, dando-lhe sentido. Os povos desenvolve­ram modos próprios para se orientar no espaço, contar, calcular, reconhecer e medir as formas do universo. Disto resul­taram formas culturalmente distintas de manejar quantidades, números, medidas, formas e relações geométricas. Compos­ta por quatro capítulos, esta parte enfoca concepções matemáticas de quatro po­vos indígenas: Juruna, Palikur, Xavante e Kayabi.

Na segunda parte, "Números, contas e mapas", trabalha-se com idéias matemá­ticas do sistema numérico decimal, das quatro operações fundamentais e das idéi­as de legenda, escala, perímetro e área. Traz informações sobre os algarismos indo-arábicos, a escrita e o valor posicionai dos números. Oferece sugestões para lidar com estas idéias matemáticas, a partir de situa­ções do dia-a-dia, como o cotidiano na far­mácia e a necessidade de se entender o traçado dos mapas.

Assim estruturado, o livro mostra que existem muitas matemáticas, isto é, que cada sociedade tem uma maneira espe­cífica e própria de entender o mundo que a cerca, articulando formas também es­pecíficas e próprias de contar e manejar quantidades. Pretende-se que o livro, cuja elaboração foi encomenda pelo Ministé­rio da Educação e do Desporto, seja um subsídio para que professores indígenas de

várias regiões do país possam discutir a im­portância do estudo da matemática e de sua relação com outras áreas do currículo escolar.

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