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JULHO 2011 3
EDITORIAL
Nos termos do artigo 6.º do Estatuto da OTOC é da responsabilidade dos profissionais o envio das declarações fiscais, pelos meios definidos.
Competindo aos TOC esta tarefa, fica a cargo da admi-nistração fiscal, DGCI e DGITA, a criação e disponibi-lização dos meios necessários ao cumprimento daquela obrigação.A inexistência de tais ferramentas implica que repen-semos a definição de um novo quadro temporal que possibilite o cumprimento das obrigações.No passado dia 19 de maio, a Ordem, atendendo às alte-rações introduzidas na Contabilidade pelo SNC e, neces-sariamente, também nos meios e forma de envio das de-clarações fiscais, alertou o Ministério das Finanças para a necessidade de repensar o termo dos prazos legalmente estabelecidos para o envio das declarações modelo 22 do IRC, modelo 3 do IRS segunda fase e a declaração anual de informação contabilística e fiscal (IES).Após a tomada de posse dos atuais responsáveis pela Secretaria de Estado dos Assuntos Fiscais (SEAF), a Or-dem enviou um ofício solicitando-lhes uma reunião, tendo como objetivo analisar questões diversas e per-tinentes para a profissão, entre as quais a necessidade de ser fixada uma nova data para o envio da IES. Até ao momento a mencionada reunião não foi marcada. Mesmo num encontro preparatório solicitado, o chefe de gabinete do SEAF, segundo informaram os repre-sentantes da Ordem, ainda não tinha elementos con-clusivos com vista a uma tomada de decisão quanto ao prazo para o envio da IES.Posteriormente, através de comunicado, a Secretaria de Estado veio tornar público a fixação de uma nova data para entrega da IES – 16 de setembro. Na informação mencionava-se a audição de um conjunto de entida-des interessadas na IES mas, curiosamente ou não, não houve um mínimo de preocupação em ouvir os técni-cos oficiais de contas, ou seja, os profissionais que irão executar aquela declaração.
Saliente-se que a necessidade de alteração do prazo nada tem a ver com os profissionais, mas sim com os serviços públicos da DGCI, que têm a responsabilidade de elaborar os respetivos formulários eletrónicos.Não faz qualquer sentido e carece de uma explicação convincente a razão pela qual se define uma data de termo sem que se conheça minimamente a data de iní-cio. A fixação da nova data é de uma enorme insensi-bilidade quanto aos direitos de qualquer profissional e, diga-se em abono da verdade, de qualquer cidadão, pois inclui o mês de agosto, período tradicional de fé-rias das famílias portuguesas.Há pessoas que têm as suas férias marcadas, pelas quais pagaram elevados valores, não podendo por seu livre arbítrio proceder à respetiva alteração. Perante o cená-rio descrito, a Ordem manifesta a sua desilusão quan-to ao comportamento do novo responsável pela SEAF e manifesta a sua intenção de, logo que conhecida a disponibilidade dos formulários eletrónicos, intentar uma providência cautelar junto do respetivo tribunal, no sentido de inviabilizar procedimentos contraorde-nacionais pelo envio da IES até ao dia 30 de setembro.Em termos práticos, a negligência de alguns respon-sáveis da administração fiscal – a quem competiria a definição dos formulários eletrónicos – , não pode nem deve ser repercutida contra os técnicos oficiais de con-tas, o que de maneira alguma a Ordem aceitará, pois isso é verdadeiramente incompreensível.
IncompreensívelA. Domingues de Azevedo
Bastonário
A fixação da nova data é de uma enorme
insensibilidade quanto aos direitos de
qualquer profissional e, diga-se em abono da
verdade, de qualquer cidadão
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FICHA TÉCNICA SUMÁRIO
ANO XIIREVISTA N.º 136 • JULHO 2011 06
Rogério M. Fernandes Ferreira em entrevista
21
2.º Encontro Luso-Brasileiro decorreu em Lisboa
34
Lugar ao TOC com Acácio Augusto Gonçalves
Artigos de acordocom a nova grafia
da língua portuguesa
PropriedadeOrdem dos Técnicos Oficiais
de Contas
Avenida Barbosa
du Bocage, 45
1049-013 Lisboa
Contribuinte n.º 503 692 310
Telefone: 217 999 700
DirectorA. Domingues de Azevedo
Directores adjuntosArmando Marques
Jaime dos Santos
Filomena Moreira
Manuel Vieira de Sousa
Ezequiel Fernandes
Rita Cordeiro
Editor-geralRoberto Ferreira
RedaçãoJorge Magalhães
Nuno Dias da Silva
Design e paginaçãoDuarte Camacho
Telma Ferreira
FotografiaJoão Miguel Rodrigues
Rui Manuel Teles
SecretariadoRaquel Carvalho
Colaboram nesta ediçãoA. Domingues de Azevedo
António Carlos dos Santos
João Carlos Fonseca
Joel Vicente
Messias Carvalho
Paulo Jorge Seabra dos Anjos
Rodrigo António Chaves da Silva
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PublicidadeDepartamento
de Comunicação
e Imagem da OTOC
Produção editorial e revisãoDepartamento
de Comunicação
e Imagem da OTOC
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ImpressãoSogapal
ExpediçãoLuter - Publicidade
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Tiragem61 196 exemplares
Depósito legalN.º 150317/00
ISSN1645-9237
Os artigos publicados são
da exclusiva responsabilidade
dos seus autores.
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SUMÁRIO
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NOTÍCIAS14 Entre o colapso e a salvação - Conferência «E Depois da Troika?»
18 O talento não tem género - 2.º Encontro Mulher na profissão
21 Pontes que a Contabilidade tece - 2.º Encontro Luso-Brasileiro
24 ISEG institui «dia» Rogério Fernandes Ferreira | Conferência a 21 de setembro | Estágio profissional para acesso à profissão
26 Encontro Nacional dos TOC no Algarve | Ordem e AFP assinam protocolo de cooperação | XI Prolatino realiza-se no Porto
28 Conferência «A Soma das Partes» em Aveiro | Bastonário defende «revolução» na contabilidade do Estado
29 Encontro na cidade natal de Luca Pacioli | Documentação da formação na «Pasta TOC»
30 Sem acesso às declarações eletrónicas | Reunião em Luanda a 8 de agosto | Certificação de qualidade de TOC
LIVROS32 Regime Contributivo para a Segurança Social | Manual de auditoria | Direito tributário
ORDEM NOS MEDIA33 Imprensa e redes sociais
OPINIÃO38 Só dependemos de nós
GABINETE DE ESTUDOS40 A nova proposta de diretiva sobre a matéria coletável consolidada comum em sede de imposto sobre as sociedades
CONTABILIDADE 46 Regime de exigibilidade numa base de caixa
51 XBRL: linguagem universal para a informação financeira
53 A falência e a contabilidade
FISCALIDADE55 O técnico oficial de contas e as normas antiabuso
60 Pela flexibilização da tributação do petróleo
DIREITO62 A desvirtuação do subsídio de desemprego e a viabilidade da Segurança Social
CONSULTÓRIO TÉCNICO66 Perguntas e respostas
O presidente do Tribunal de Contas participou na Conferência «E Depois da Troika?»
ENTREVISTA
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ENTREVISTA
Rogério M. Fernandes Ferreira tira a radiografia ao estado da Fiscalidade nacional, analisando à lupa as relações entre a administração tributária e os contribuintes, a
fragmentação do sistema fiscal, as implicações do memorando da troika e o famigerado imposto extraordinário.
Por Nuno Dias da Silva
Objetivo no diagnóstico, pru-dente na ação. O grande pro-blema do fisco português é
mais de prática e menos de teoria. É esta a leitura genérica de Rogério M. Fernandes Ferreira que aponta diver-sas fragilidades ao sistema fiscal por-tuguês, mas diz que esta não é a altura indicada para operar «grandes rasgos e inovações estruturais». O fiscalista acrescenta que o nosso sistema, por ser moderno, «não carece de refor-mas», mas deve ser «estruturalmente aberto» e ter presente o novo contexto da economia globalizada. Ainda as-sim, este especialista em Direito Fis-cal critica a «opacidade excessiva» do sistema devido aos regimes especiais e de exceção que dotam o imposto de imprevisibilidade, bem como a in-terpretação e aplicação da lei fiscal. Profundo conhecedor da lógica de re-lacionamento entre a "máquina" fiscal e os contribuintes, Rogério M. Fer-nandes Ferreira afirma ser imperioso «recolocar o contribuinte cumpridor em primeiro lugar», recentrando-o no sistema, e minimizando o «lado perverso da informatização» da ad-ministração tributária, que acaba por
reduzir as obrigações fiscais a «meras equações aritméticas».O presidente da Associação Fiscal Portuguesa, que recentemente rubri-cou um protocolo de colaboração com a Ordem, refere ainda que a carga tri-butária está no «limiar do comportá-vel», sendo ainda possível recuperar «agentes económicos que vivem à margem do sistema». Sobre as impli-cações fiscais do memorando de en-tendimento com a troika, o fiscalista acredita que «pode transformar-se numa bênção», dotando o sistema de mais transparência e clareza.
TOC – A Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas e a Associação Fiscal Portu-guesa (AFP), entidade a que preside, rubricaram no mês passado um pro-tocolo de colaboração. Qual é o alcan-ce prático desse entendimento para os Técnicos Oficiais de Contas?
Rogério M. Fernandes Ferreira – A AFP tem vindo a promover e a cele-brar protocolos com diversas enti-dades e instituições, portuguesas e estrangeiras, nomeadamente de na-tureza universitária, e com associa-
ções congéneres e outras entidades, incluindo as ordens profissionais, como a dos revisores de contas, ad-vogados, economistas e, agora, tam-bém dos técnicos oficiais de contas – que era a que faltava. Trata-se de formalizar e promover uma rela-ção que vem de trás, num protocolo, muito simples e aberto, de coopera-ção e de divulgação das actividades próprias e comuns. A AFP detém ex-periência acumulada de muitos anos, desde a sua fundação, em 1965. E de-tém o prestigio decorrente dos seus notáveis membros fundadores e dos seus atuais associados, que há pou-co atingiram o número "mítico" dos 1 000, incluindo o dos titulares dos seus órgãos associativos ao longo de todos estes anos, mormente dos seus presidentes como Marcelo Caetano, Bernardo Mendes de Almeida, Pitta e Cunha, Rodrigues Pardal ou Paz Ferreira. É quem representa Portugal na mais prestigiada associação fiscal internacional, a International Fiscal Association, bem como no Instituto Latinoamericano de Derecho Tributá-rio, do qual é também membro fun-dador. A OTOC, os técnicos oficiais
Sistema fiscal é uma «manta de retalhos»
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ENTREVISTA
de contas e a profissão terão acesso bem mais directo a toda esta experi-ência acumulada na Fiscalidade por-tuguesa e internacional e um muito mais fácil contato com todos os seus conceituados fiscalistas, das diversas academias e escolas, do Direito, da Economia, da Gestão, da Revisão de Contas, da administração tributária e da Contabilidade e que colaborarão com muito gosto nas atividades da OTOC e em prol da profissão de TOC que tenham que ver e estejam rela-cionadas com a Fiscalidade.
TOC – As duas entidades acordaram criar um Observatório Fiscal Portu-
guês permanente de forma a monito-rizar a evolução e as novidades legis-lativas em termos tributários. Qual a pertinência desta iniciativa?
R.F.F. – Cá está uma das primeiras e das mais importantes atividades que resolvemos promover, desde já, em comum, reunindo em cinco grupos alguns dos mais conhecidos e con-ceituados especialistas, nos domí-nios da tributação do rendimento, do consumo e do património e da justiça fiscal e da Fiscalidade comparada e internacional e que, aqui, virá a con-tar também com o Professor Pasquale Pistone, um velho mas jovem ami-
go (que fala português) da AFP e que certamente monitorizará e fará re-comendações pertinentes em um ou dois importantes momentos de cada um dos próximos anos.
TOC – Defendeu anteriormente que a fraude e a evasão fiscais devem ser combatidas com rapidez e qua-lidade de resposta da administra-ção tributária e dos tribunais e pela cooperação internacional. Não crê que há um longo caminho a per-correr nestes domínios?
R.F.F. – É inegável que nos últimos anos, através do maior recurso à
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ENTREVISTA
informatização e ao cruzamento de dados, temos assistido a um com-bate cada vez mais eficaz à fraude e evasão fiscais. Neste domínio, o trabalho desenvolvido pela admi-nistração tributária, e a aposta na informatização dos serviços têm resultado numa melhoria substan-cial no combate a este problema. Sucede que este combate tem in-cidido principalmente sobre con-tribuintes que já se encontram no sistema informático, sendo exer-cido um maior controlo e pressão sobre estes, nomeadamente atra-vés de vários serviços do Estado que deveriam estar mais integra-
dos. Onde eu gostava de ver maior ênfase neste combate era no esforço em trazer para dentro do sistema to-dos aqueles que ainda estão fora, na economia dita informal ou paralela e que de acordo com indicadores e es-tudos económicos se situa, em Por-tugal, acima dos 20 por cento do PIB. Para além das medidas impostas pela troika, não defendo, nem creio que sejam necessárias, grandes alte-rações nem reformas tributárias de fundo. De resto, o grupo de trabalho que coordenei no âmbito do Estudo da Política Fiscal limitou-se a reco-mendar, no seu relatório “Competi-tividade, Eficiência e Justiça do Sis-tema Fiscal”, de 2009, ajustamentos ao nível dos procedimentos, com propostas concretas mas que não promovem alterações estruturais, nem reformas, mas que certamen-te serão, se concretizadas, muito úteis, acabando com interpretações divergentes, procedimentos dúbios e ineficientes, assim gerando mais certeza, segurança e confiança aos agentes económicos e nos operado-res, aqui incluindo a própria admi-nistração tributária, magistratura judicial e do Ministério Público e, principalmente, nos contribuintes, empresas e pessoas individuais, portuguesas e estrangeiras.
TOC – Defende, por isso, parcimónia em termos de reformas tributárias…
R.F.F. – Não parece ser esta altura propícia para grandes rasgos e ino-vações estruturais ao nível tributário cabendo ao sistema fiscal a sua princi-pal função: cobrar impostos, os legal-mente devidos. O atual quadro legal conhecerá por si só um salto quali-tativo significativo se as medidas re-comendadas no relatório do grupo de trabalho forem postas em prática. Há uma evidente dificuldade e receio de
dar razão ao contribuinte e são mui-tas as situações de litígio que resultam dos actuais instrumentos de cobrança coerciva. Este recentrar do sistema no contribuinte parece-me igualmente essencial, mas nada se faz de repente.
TOC – É consensual que a máquina fiscal apurou a eficiência da sua res-posta, mas criaram-se novos entra-ves no relacionamento entre os con-tribuintes e o Fisco. Considera que se regrediu na ótica dos direitos e garan-tias dos contribuintes?
R.F.F. – Parece-me essencial reco-locar o contribuinte cumpridor em primeiro lugar. Este é, talvez, o lado perverso da informatização da Ad-ministração tributária, que, sem o filtro do elemento humano, tende a reduzir as obrigações tributárias a meras equações aritméticas. E esta redução, conjugada com défice or-çamental, propicia e pode potenciar atropelos a direitos e garantias dos contribuintes, situação que, de resto, é comummente referida e tida como parte relevante do acréscimo de efi-ciência que há pouco referia. Parece--me, por isso, central melhorar a re-lação da administração fiscal com os contribuintes. Creio que estamos no limiar da carga tributária compor-tável, já nos 50 por cento das taxas nominais de impostos sobre o rendi-mento pessoal, sendo essencial não aumentar a carga e a pressão fiscal por outras vias, declarativas, aces-sórias e de contexto. Devemos sim recuperar, como já referi, os agentes económicos que vivem à margem do sistema fiscal, para dentro do mes-mo, assim se aumentando a base de contribuintes e a dispersão da pres-são de forma mais justa, porque mais abrangente. Evitar aumentar a pres-são fiscal sobre os contribuintes mais visíveis e cumpridores parece-me
PERFIL
Rogério M. Fernandes Fer-
reira é o exemplo claro de que
"filho de peixe sabe nadar",
seguindo as pisadas do seu
pai, referência incontornável
da Contabilidade e da Fiscali-
dade e membro honorário da
Ordem. Aos 47 anos é sócio e
coordenador da área de prá-
tica de Direito Fiscal do maior
escritório de advogados do
país. Foi secretário de Estado
dos Assuntos Fiscais do XIV
Governo Constitucional.
Licenciado em Direito, pós-
-graduado em Estudos Euro-
peus e mestre em Direito Fiscal
na menção das Ciências Jurídi-
co-Económicas pela Faculda-
de de Direito da Universidade
Católica Portuguesa. É docen-
te universitário em diversas
instituições e integrou várias
comissões e grupos de traba-
lho no Ministério das Finanças.
É ainda presidente da histórica
Associação Fiscal Portuguesa.
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ENTREVISTA
ser fulcral. Impõe-se criatividade e engenho na procura destas receitas, seja pela recuperação menciona-da, seja pela tributação ambiental e dos consumos supérfluos e de luxo. Parece-me existir ainda alguma margem para aumentar impostos relacionados com a componente am-biental e com os consumos de deter-minados bens. E parece igualmente importante a revisão dos critérios de avaliação do desempenho da admi-nistração tributária, onde os critérios quantitativos apresentam ainda uma ponderação exagerada, podendo propiciar algum atropelo de direitos e garantias dos contribuintes. Mais critérios de avaliação de cariz quali-tativo permitirão repor maior equi-líbrio nas relações entre administra-ção tributária e contribuintes.
TOC – À semelhança do que aconte-ceu no sector da Justiça, o Fisco tem ganho um inusitado protagonismo em termos mediáticos nos últimos anos, nomeadamente na imprensa especializada. O maior interesse que o tema suscita na opinião pública tem, no lado inverso da moeda, exposto com mais clareza as suas fragilidades e deficiências?
R.F.F. – A transparência a que me referia, prende-se exactamente com a exposição das fragilidades e defi-ciências inerentes ao sistema fiscal. Não me parece que se resumam na administração tributária, apesar de me parecer natural que a sua atuação e alguns excessos cometidos lhe atri-buam maior visibilidade. Mas o prin-cipal problema e as principais fragili-dades e deficiências do sistema fiscal português devem-se à ausência de uma política fiscal concreta, decla-rada e consensual, a ausência de um entendimento alargado quanto às fi-nalidades e aos objetivos das diversas
políticas fiscais. Sem a assunção clara e declarada de uma política fiscal de longo prazo, a administração tributá-ria acaba por ficar ela própria, refém dos objectivos de curto prazo que lhe vão sendo acometidos pelos suces-sivos governos e pela própria admi-nistração tributária. E isto adquire agora contornos bem mais evidentes no contexto económico que Portugal atravessa, e em que a pressão orça-mental para a obtenção de receita se faz sentir de forma ainda mais sig-nificativa. Por isso mesmo me parece importante a revisão dos critérios de avaliação da atuação.
TOC – Uma das novidades do progra-ma do novo governo prende-se com a «revisão do sistema fiscal», seguindo ao encontro do que foi proposto no “Relatório do Grupo para o Estudo da Política Fiscal, Competitividade, Eficiência e Justiça do Sistema Fiscal”, iniciativa em que foi um dos parti-cipantes. Que principais alterações defende como prioritárias e em que impostos especificamente?
R.F.F. – O Programa Fiscal do novo governo é baseado na troika, no Pro-grama de Apoio Económico e Fi-nanceiro a Portugal e nas medidas do Memorando de Entendimento e aponta como objectivos a prosse-guir a simplificação dos impostos e o alargamento da base tributável, a melhoria da eficácia da administra-ção tributária e o reforço no combate à economia e à fraude e evasão fiscais. São bons objetivos e que contribuem para a eficiência e a transparência do sistema fiscal. Estou muito de acordo,
em particular, com a proposta de que o aumento da receita fiscal ocorra, sobretudo, por via da eliminação ou da redução de deduções, benefícios e isenções fiscais, o que, redundando nesse alargamento da base tributá-vel, contribuirá para um sistema fis-cal bem mais simples e transparente, nomeadamente ao nível dos impostos sobre o rendimento. Na tributação do património, a par dos agravamentos que irão ocorrer por via da redução e eliminação do número de isenções, creio ser bem prioritária a reavaliação geral do património imobiliário, uma vez que a maior parte dos prédios ur-banos se encontra ainda por avaliar, gerando situações de desigualdade inaceitáveis ao fim de 10 anos da re-forma. E em sede de IVA também julgo bem adequada a redução das isenções e as alterações a introduzir nas tabe-las das taxas reduzida e intermédia. Já tenho mais dúvidas na introdução de um regime de caixa aplicável nas duas situações aí referidas. E o reforço dos recursos inspetivos da adminis-tração tributária permitirá também melhorar o combate à economia pa-ralela. São alterações, em geral, que apontam no sentido adequado e que, estou certo, se bem concretizadas e em tempo oportuno, resultarão num salto qualitativo.
TOC – Que soluções devem ser im-plementadas para que não tenhamos «mais do mesmo», ou seja, uma justi-ça tributária ainda mais lenta face ao incremento da litigância?
R.F.F. – No relatório do Grupo de Tra-balho que já lhe referi estão indicadas
O sistema fiscal português é moderno e não carece de mais e
mais reformas, muito menos das profundas ou ditas estruturais
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ENTREVISTA
várias propostas e recomendações específicas, algumas aliás já concre-tizadas, e que visam precisamente evitar alguns casos de aparente arbi-trariedade, decorrentes, por exemplo, da exigência de impostos já pagos, por falta ou erro de averbamento dos pa-gamentos, do envio de notificações a solicitar pagamentos quando a dívida se encontra suspensa, de ameaça de penhoras e de penas pecuniárias em situações em que não há, efectiva-mente, incumprimento da lei, de pe-dido de colaboração com a ameaça de coimas em situações em que o desti-natário do pedido não está legalmen-te obrigado a prestá-la, de penhoras, nomeadamente contas bancárias, em que o executado toma delas conheci-mento pela instituição bancária, de bens ou direitos em valor manifes-tamente desnecessário ou excessivo
em relação à dívida em execução e de decisões dos tribunais favoráveis aos contribuintes que demoram tempo demasiado a serem cumpridas. Mas foram aí ainda apontadas algumas outras situações como, por exemplo, a falta de resposta em tempo útil aos pedidos de informação e reclama-ções, entre outras prestações devidas aos contribuintes, o receio da admi-nistração tributária em dar razão ao contribuinte, ou a adopção pelo Fisco e, em particular, da Inspeção Tributá-ria, de interpretações de normas em discordância com a prática comuni-tária e, em especial, com a que decor-re das decisões do Tribunal de Justiça da União Europeia. Parece-me que se deverão encontrar meios que, em concreto, garantam aos contribuin-tes o conhecimento tempestivo do andamento e da localização dos seus
processos e que reforcem a imagem da administração tributária na defesa da legalidade, através da utilização dos meios preventivos e repressivos mais adequados, em esforço de articulação entre os diversos serviços da Direção--Geral dos Impostos e da Segurança Social, entre si e com as várias Dire-ções de Serviços.
TOC – É um crítico das alterações fiscais operadas em Portugal, apon-tando-as como factores que contri-buem para a desagregação dos vários sistemas de impostos. Tal como fazer leis, mexer na arquitectura tributária tornou-se um desporto nacional, dei-xando o sistema fiscal fragmentado?
R.F.F. – O sistema fiscal português é moderno e não carece de mais e mais reformas, muito menos das profundas
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ou ditas estruturais. Necessita bem mais de estabilidade normativa, e organizativa, e de simplificação, le-gislativa e administrativa. A esta-bilidade fiscal é um tema que me é caro, enquanto chamada de atenção permanente. O sistema fiscal por-tuguês tem sido refém da opacidade decorrente da proliferação dos regi-mes especiais e de exceção. A "manta de retalhos" em que se tornou é visí-vel e dificulta muitíssimo a previsi-bilidade do imposto devido à inter-pretação e aplicação da lei fiscal. Sem esse referencial superior que norteie as intervenções legislativas e admi-nistrativas que sejam as necessárias o sentido de justiça e a certeza e a segurança do sistema fiscal acabam irremediavelmente comprometidos.
TOC – Na sua opinião, poderemos, com estas medidas/reformas estar a promover uma redução do inves-timento e do próprio crescimento nacional?
R.F.F. – A decisão de investimento atende a factores como a estabili-dade e a segurança jurídicas, bem mais do que à pressão fiscal global ou a incentivos fiscais. Mas a agilidade da tramitação administrativa e tri-butária, a possibilidade e facilidade de obter informações vinculativas (rulings) e a rede de convenções para eliminar a dupla tributação existente são bem importantes também.
TOC – A falta de consenso político tem impedido a existência de uma estra-tégia fiscal coerente, inviabilizando o uso da fiscalidade como uma arma para um país inserido num mundo global e altamente competitivo?
R.F.F. – A globalização trouxe mui-tos desafios às economias ocidentais. Abriu os mercados internacionais ao
Estamos no limiar da carga tributária comportável, já nos 50
por cento das taxas nominais de impostos
sobre o rendimento pessoal
comércio global e também colocou em concorrência directa países e ge-ografias até há muito pouco tempo, espacial e economicamente, distan-tes. Isto comporta oportunidades, mas também implica ameaças e a primeira é a erosão das bases de tri-butação nacionais. Este novo quadro lança enormes desafios às políticas fiscais. E o sistema fiscal português deve ser estruturalmente aberto e ter presente estas novas realidades da economia globalizada. E não me refi-ro apenas às leis fiscais, mas à própria administração tributária. Agilizar a "máquina" tributária e tornar mais célere a justiça fiscal é, em minha opinião, um bom ponto de partida. TOC – O imposto extraordinário que incidirá sobre o subsídio de Natal dos portugueses vai agravar, ainda mais, o peso da carga que os portugueses suportam. Independentemente da situação crítica que Portugal atra-vessa, admite que o Estado, de há unos a esta parte, ficou «viciado» nas receitas provenientes dos impos-tos pagos pelos contribuintes, descu-rando, por exemplo, o acautelar do desequilíbrio orçamental do lado da despesa?
R.F.F. – O novo imposto foi anun-ciado como imprescindível para o esforço de consolidação orçamental e para cumprimento dos objetivos assumidos perante a UE e o FMI, mas estamos a aguardar agora pelo anún-cio de medidas estruturais comple-mentares de redução da despesa pú-blica, prometidas para finais do mês
de agosto. Não me surpreende nada o recurso ao aumento dos impostos. A receita fiscal continuará certamente a estar, durante os próximos anos, no cerne da política orçamental. A rigi-dez atribuída à estrutura da despesa pública a isso obriga. Não me surpre-ende nada, por isso, que, a par de al-guma redução da despesa pública, a receita fiscal seja crucial no combate ao défice, seja por via do reescalona-mento dos impostos sobre o rendi-mento, seja através das alterações às tabelas de IVA, ou ainda por via das reavaliações imobiliárias. Haverá certamente margem para explorar alguns outros impostos sobre com-ponentes ambientais ou sobre con-sumos específicos e não essenciais, como por exemplo o café ou os refri-gerantes. A margem para eventuais aumentos da carga fiscal começa, porém, a ser reduzida.
TOC – Que avaliação faz do memo-rando da troika em termos fiscais?
R.F.F. – O sistema fiscal português, sendo moderno, padece ainda de opacidade excessiva, decorrente da proliferação de regimes especiais e de exceção, que tornam muito difícil a previsibilidade do imposto e a in-terpretação e aplicação da lei fiscal. A preocupação central deve residir nas dificuldades inerentes a esta incapa-cidade de alinhamento, no sistema fiscal português, de instruções pre-cisas, claras e transparentes. Neste plano, a troika pode transformar--se numa benção. Os ajustamentos e as alterações que exige e potencia
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ENTREVISTA
no âmbito fiscal, como os relativos à redução estrutural de benefícios e incentivos fiscais que já mencionei, incluindo eliminação de isenções e os “cortes” a efectuar nas deduções, a reavaliação geral do património imobiliário, a alteração das taxas re-duzida e intermédia – a caminho da taxa única? – do IVA, a integração dos serviços de cobrança dos impostos e da Segurança Social, oferecem-nos uma clara oportunidade para pen-sar, parar, reduzir e eliminar regimes especiais e excecionais que prolifera-ram sem real justificação económica ou social, fomentando, por esta via, a transparência e, principalmente, a estabilidade das leis e dos réditos fis-cais. Resta saber se um Governo de coligação terá a unidade e a coerência necessárias, como desejamos todos, para concretizar todas as difíceis me-didas que se impõem.
TOC – Integra a lista dos futuros «juízes» da arbitragem fiscal, o novo sistema para a resolução alterna-tiva de litígios no sector tributário que vai arbitrar casos que envolvam montantes não superiores a 10 mi-
lhões de euros. Será este o princípio do caminho para fazer a justiça tri-butária que tarda?
R.F.F. – A ausência de formalidades especiais e o facto de se pautar pelo princípio da autonomia dos árbitros na condução do processo, fazem da arbitragem uma via alternativa de resolução de litígios tributários assu-midamente mais flexível e tenden-cialmente mais célere, o que pode permitir potenciar algum desconges-tionamento dos tribunais tributários e mais alguma celeridade na justiça, mas não creio que isto seja certo ou uma decorrência necessária da arbi-tragem tributária.
TOC – Como reage aos que dizem que este «tribunal» foi constituído ape-nas para resolver “mega-processos” envolvendo grandes grupos econó-micos, deixando de fora as bagatelas jurídicas?
R.F.F. – A inoperância do contencio-so tributário e o aumento da descon-fiança do contribuinte relativamente às decisões tributárias, tantas vezes
escudadas em meras decisões de for-ma, impunha a ponderação de meios alternativos para a resolução dos con-flitos tributários, como a mediação, a conciliação ou a própria arbitragem fiscal. Partimos de uma situação ca-racterizada por processos parados durante vários anos e condenados a uma prescrição apenas impedida pela intervenção do legislador com sucessi-vos factos interruptivos e suspensivos. Não obstante os assinaláveis progres-sos verificados com a informatização tributária, a par do recrutamento de novos juízes, ou da divisão das com-petências dos tribunais tributários em vários níveis de especialização, estas medidas são de execução demorada e de difícil concretização, não são diri-gidas à resolução tempestiva dos pro-cessos exponenciais pendentes. Não estou certo, mas espero, que, apesar de mais onerosos, o recurso aos tribu-nais arbitrais não seja restringido a es-ses “mega-processos” a que se refere, mas que o recurso à arbitragem possa ser percepcionado como uma via útil ou adequada e alternativa à resolução, sem recurso, de litígios emergentes nas relações tributárias.
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NOTÍCIAS
Quis o acaso que uma conferência
sobre o futuro do projeto euro-
peu, a moeda única e o estados-
-membros coincidisse com o dia da inde-
pendência dos Estados Unidos da América.
A 4 de julho, mas na capital portuguesa,
um pouco mais de meio milhar de técnicos
oficiais de contas congregaram-se num
dos auditórios do Centro de Congressos
de Lisboa para ouvir com toda a atenção o
que eminentes banqueiros, gestores, eco-
nomistas e catedráticos tinham para par-
tilhar sobre uma temática que não descola
do topo da atualidade. Na iniciativa con-
junta da Ordem e do IDEFF as primeiras
palavras pertenceram aos responsáveis
máximos de ambas as instituições.
Domingues de Azevedo destacou a im-
portância de eventos desta natureza para
compreender o alcance das soluções para
retirar Portugal da difícil situação em que
se encontra. O Bastonário salientou a céle-
bre frase que pronunciou John F. Kennedy,
apelando aos seus compatriotas para que
se mobilizassem para reabilitar o seu país.
Por seu turno, o presidente do IDEFF apro-
veitou para pegar na efeméride do dia,
para sublinhar que acontecimentos que ti-
veram epicentro nos Estados Unidos, como
o discurso de Martin Luther King ou a elei-
ção de Barack Obama, deviam constituir
uma «força motivadora» num momento
«particularmente turbulento» e de «des-
crença democrática». As recentes revoltas
nas praças do mundo árabe ou os tumultos
nas ruas de Atenas são, no entendimento
de Paz Ferreira, sinais preocupantes e que
significam que os cidadãos protestam «por
estarem cada vez mais distanciados das
decisões políticas».
Mesmo cercados pelo turbilhão, Eduardo
Paz Ferreira deixou uma mensagem de es-
perança, em alusão ao emblemático slogan
criado para a campanha presidencial de
Obama: «Não desistimos. Sim, porque nós
podemos». O presidente do IDEFF termi-
nou com uma ode à capacidade histórica
dos portugueses para «reagir perante os
acontecimentos negativos, encontrando
forças onde por vezes elas não existem».
Estava dado o pontapé de saída para uma
intensa jornada de debate. Oradores de
mão cheia esgrimiram os prós e os contras
do memorando da troika, as respetivas im-
plicações para os portugueses e o futuro
da Europa num contexto de tremenda ad-
versidade.
Uma iguaria indigesta
Num painel moderado por Maria João
Gago, jornalista do «Jornal de Negócios»,
Guilherme d’ Oliveira Martins foi o pri-
meiro a explanar os seus argumentos. O
presidente do Tribunal de Contas afirmou
que a atual situação política portuguesa,
com as três mais importantes forças polí-
ticas a avalizarem o documento da troika,
pode «fazer a diferença» relativamente à
Grécia. Nem de propósito, no mesmo dia
em que se realizou esta conferência, a
presidência europeia passava para mãos
polacas. Oliveira Martins, um profundo
conhecedor das temáticas envolvendo as
instituições e os povos do «velho continen-
te», defendeu que a Europa para funcionar
em harmonia precisa de «mais articulação
e uma voz monetária». Recordando pa-
lavras de Sousa Franco, o presidente do
Tribunal de Contas referiu ser imperioso
«garantir o equilíbrio económico e mone-
tário na Europa».
Sobre a atual situação portuguesa, Oli-
veira Martins declarou temer que o nosso
país possa vir a ser alvo da denominada
«tática do salame». Este «engenho» gas-
tronómico, que de delicioso só parece ter
o nome, visa cortar (ou eliminar, para usar
uma expressão mais apropriada) em pe-
quenas fatias da União Europeia os países
mais problemáticos, casos de Portugal, Ir-
landa e Grécia, não prejudicando o todo,
onde Alemanha e França pontificam como
locomotivas. Enquanto esse cenário não
passa de uma mera especulação, o orador
defendeu, de modo a cumprir os “manda-
mentos” da troika, introduzir «mecanismos
de reorganização e descentralização» do
setor público. Trata-se de uma prática de-
fendida por Oliveira Martins, como forma
de «disciplina e aproximação» do Estado
aos cidadãos.
A palavra seguinte ficou a cargo de um
banqueiro. Faria de Oliveira, presidente
Entre o colapso e a salvaçãoPortugal “guiado” pelos mandamentos da troika numa Europa à deriva
JULHO 2011 15
NOTÍCIAS
da Caixa Geral de Depósitos, deixou no
ar um leve aroma a teoria da conspiração
contra Portugal, quando disse que «há 8
meses a nossa banca era das mais sólidas
da Europa». O panorama alterou-se. Ra-
dicalmente. Os bancos portugueses estão
agora no olho do furacão e em permanen-
te ansiedade, ao sabor do instável humor
das agências de rating. O ex-ministro do
Comércio e Indústria prosseguiu a sua in-
tervenção reconhecendo que daqui para a
frente «seguramente vamos viver pior»,
mas que este caminho pode ser uma via
para «reencontrar os cidadãos e a política.
Todas as atenções estão viradas para nós.
Estamos a ser rigorosamente escrutinados
e temos de cumprir o nível de execução do
programa definido», rematou Faria de Oli-
veira. Pelo mesmo diapasão afinou Carlos
Costa Pina, secretário de Estado do Tesou-
ro cessante. «Portugal tem de fazer o seu
trabalho de casa na consolidação das con-
tas públicas e mesmo assim isso pode não
ser suficiente». O ex-governante acrescen-
tou que «deu-se mais atenção ao défice,
quando devíamos ter estado mais centra-
dos na dívida pública». Sobre a realidade
europeia, Costa Pina sustentou ainda que
mais de metade do financiamento dos es-
tados-membros devia ser «neutral». Rela-
tivamente às PME, preconizou um «esforço
de diversificação», fomentando as expor-
tações para outros pontos do Globo, por
forma de iludir as consequências negativas
que resultaram para Portugal do alarga-
mento a leste da União Europeia.
O gestor António Ramalho adaptou a cé-
lebre teoria dos «3 F’s» do Estado Novo de
uma forma clara e compreensível a todos:
«Dos 3 D’s de Dívida, Défice e Despesa»,
teremos de passar rapidamente, após
a troika, para «os 3 C’s de Competitivi-
dade, Crescimento e Confiança». Como
primeiro passo para atingir este desígnio
o membro da direção do Milleniumbpc,
defendeu o «urgente reconhecimento
por parte dos mercados internacionais e
a assunção por parte do nosso país dos
compromissos assumidos».
Miguel Moura e Silva definiu como o «cá-
lice da troika» o trago amargo da receita
que todos estamos a provar. O profes-
sor da Faculdade de Direito de Lisboa
mostrou-se partidário que o nosso país
«vá mais longe» no entendimento firma-
do com a UE, BCE e FMI, nomeadamen-
te introduzindo reformas no âmbito da
concorrência e integração económica. O
docente referiu que o nosso país está em
«desvantagem concorrencial» face a ou-
tros dos seus parceiros.
Muitos problemas, várias contabilidades
Depois da pausa para o almoço, foi tem-
po de ouvir uma das mais aguardadas
intervenções. Cru, mas genuíno, Silva
Lopes mostrou-se igual a si próprio. «A
vida para os pobres vai ser impossível»,
atirou, para começar a sua alocução,
apoiada por uma enorme profusão de da-
dos estatísticos e projeções que pela sua
crueldade poderiam ser de molde a fazer
parar a digestão logo após a refeição.
«Pessimista inveterado», como se defi-
niu, o ex-ministro das Finanças referiu ser
«quase impossível» a subida das expor-
tações para os 6,5 por cento ao ano pre-
vista no documento da troika. Contudo,
a revelação-choque aconteceu quando
Silva Lopes afirmou que talvez o primeiro
resgate de 78 mil milhões de euros não
seja suficiente para salvar o nosso país. A
comparação com os gregos veio célebre:
«Nas finanças públicas somos melhores
do que a Grécia. Quanto ao resto, somos
iguais ou piores». O ambiente na sala fi-
cou ao nível do ar condicionado que cir-
culava na sala. Frio. Sorrisos, só mesmo
amarelos. Mas como o pessimismo de
Silva Lopes não tem fundo, o orador aler-
tou ainda para a pressão que «os que se
manifestam na rua e os que se manifes-
tam nos gabinetes» vão fazer para deixar
tudo na mesma. «O Estado não tem pul-
so para controlar as empresas públicas»,
concluiu.
O fiscalista António Carlos dos Santos ba-
seou a sua apresentação no traçar de ce-
nários prováveis para a grande tormenta
que ameaça a nau portuguesa e a grande
nau europeia. O membro do Gabinete de
Estudos da Ordem referiu que as decisões
tomadas num contexto de complexidade
e incerteza, como o que vivemos, têm
uma margem acrescida de risco. O pre-
ço da energia e dos bens alimentares, as
convulsões geopolíticas permanentes e
o futuro do euro, foram apenas algumas
das condicionantes elencadas pelo ex-se-
cretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
António Carlos dos Santos considerou o
memorando da troika um «desastrezi-
nho» em termos fiscais, por ter sido «de-
senhado a regra e esquadro» e criticou a
política de privatizações prevista por este
16 TOC 136
NOTÍCIAS
governo. «As privatizações do século XXI
serão basicamente de passivos», disse.
Sérgio Gonçalves do Cabo debruçou-se
sobre o futuro de Portugal na Zona Euro,
sustentando a sua exposição em exausti-
vos quadros estatísticos sobre a evolução
da dívida pública. No ar ficou a dúvida:
«Reforma-se Portugal ou a União Euro-
peia?». Ninguém soube dar a resposta.
Mas o professor da Faculdade de Direito
avançou com uma tendência que se con-
solida, que perante a inexistência de um
projeto europeu, «os Estados estão a re-
gressar às fronteiras».
No tempo dedicado a algumas perguntas
colocadas pelo moderador, Paulo Ferrei-
ra, editor de economia da RTP, Silva Lo-
pes voltou a colocar o dedo na ferida no
que diz respeito ao método contabilístico
adotado: «A contabilidade nacional e pú-
blica não chegam, porque deixam muitos
aspetos excluídos. Mas não tenho dúvi-
das que a contabilidade nacional é me-
lhor do que a pública. O pior é que temos
andado a resolver problemas mudando o
tipo de contabilidade empregue».
De Espanha veio Juan Velarde, juiz do
Tribunal de Contas do país vizinho. O
magistrado criticou o enorme dese-
quilíbrio da Espanha face ao exterior e
defendeu ser impossível recuperar com-
petitividade sem introduzir reformas no
mercado laboral e na educação. A «alta
dependência dos bancos alemães na eco-
nomia espanhola» é um fator que «faz
aumentar a importância» do vizinho ibé-
rico, disse Velarde.
Sem papas na língua, o juiz referiu que o
modelo autonómico existente em Espa-
nha em muito contribuiu para o aumento
das despesas do Estado, representando
cerca de 40 por cento destas. Visando os
políticos que muito falam e pouco fazem,
Velarde citou o filósofo Ortega Y Gasset,
que chegou a viver em Portugal, para ilus-
trar a inoperância da classe: «É impossível
salvar uma civilização quando esta ficou
sob o domínio dos demagogos».
Portugal e Grécia:
descubra as diferenças
Cristina Sofia Dias veio do centro da
Europa para descrever como lá se vê a
crise de cá. A adida financeira de Por-
tugal na REPER está há 3 anos e meio
em Bruxelas e é da opinião que o termo
PIG’S (porcos em inglês), sigla que sig-
nifica P de Portugal, I de Irlanda e G de
Grécia, é desafiador e «há que tudo fazer
para que não fique associado à imagem
do nosso país». Como emigrante que é,
Cristina Dias reconheceu a sua nostalgia
por estar longe do país que a viu nascer
e lançou um toque a reunir: «Quando es-
tamos fora de Portugal, sentimos muitas
saudades e um apego que dentro de por-
tas por vezes não está presente».
Nelson Machado, presidente do Active-
Bank, conhece bem a realidade heléni-
ca. Viveu em Atenas quatro anos, entre
2002 e 2006, quando presidiu à sucursal
do BCP naquele país. Da Grécia dos mo-
numentos e dos cruzeiros, foi um passo
até aos tumultos e aos cocktail-molotov.
Todavia, diz quem sabe, que as duas rea-
lidades concretas são bem distintas: «O
setor privado grego tem menos dívidas
que o português, mas o setor público é
um horror, é a verdadeira Grécia negra.
Ninguém paga impostos, a corrupção é
endémica, as empresas públicas estão
em roda livre e maquilham-se as con-
tas. Para além disso, os serviços públicos
portugueses são de qualidade incompa-
ravelmente superior».
Professor da Universidade da Madeira,
Ricardo Cabral assentou a sua interven-
ção na premissa de que «a crise da dívida
soberana é uma crise da balança de pa-
gamentos e da dívida externa». Em ter-
mos de política fiscal, o docente propôs
uma descida do IVA para níveis próximos
dos praticados em Espanha.
O diretor do «Jornal de Negócios», Pe-
dro Santos Guerreiro, foi o moderador
que lançou o painel final sobre o futu-
ro da União Europeia. Da eternamente
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NOTÍCIAS
eurocética «Velha Albion» veio Stuart
Holland, ex-político e conselheiro de
Willy Brandt, Jacques Delors e António
Guterres. Para este britânico, a dívida
soberana é o «nó górdio» que há que
resolver, partindo de um reforço da coo-
peração entre os estados. As críticas fo-
ram muitas e os tiros em várias direções.
Primeiro para os executivos: «Deviam
governar em vez de deixarem as agên-
cias de rating decidirem». Depois para
o banco central: «Porque é que todos
conhecem o Banco Mundial e ninguém
conhece o Banco Central Europeu?»
Paulo Pitta e Cunha, professor da Facul-
dade de Direito de Lisboa, é reconheci-
damente um dos académicos que mais
posições antagónicas tem manifestado
relativamente ao projeto europeu. E dis-
se de sua justiça: «Nos primeiros anos de
União Monetária esta iniciativa era um
must que devia ser seguida e foram acei-
tes de forma acrítica as estruturas e os
desequilíbrios evidenciados pela moeda
única». Recuando ao processo de inte-
gração, Pitta e Cunha recorda ter acon-
selhado um «wait and see». Ninguém lhe
deu ouvidos.
Olvidados os apelos à precaução, é ago-
ra tempo de balanço. Como se chegou
aqui? Pitta e Cunha argumenta que o
«espírito europeu entrou em declínio»
por falta de solidariedade «intraeuro-
peia» e pelo acentuar da clivagem entre
países de pequena e grande dimensão.
À deriva e sem perfume
Recorrendo a uma expressão que diz
tudo, o docente sintetizou que a Europa
de agora perdeu «le perfum d’aventure».
Viriato Soromenho-Marques fez pergun-
tas pertinentes e deu respostas eloquen-
tes. O filósofo político especialista em
questões europeias, assestou as baterias
contra o centralismo alemão: «É preciso
acabar com a cacofonia institucional da
União Europeia, que coloca todo o poder
em Berlim. Para além disso, a Alemanha
é incompetente para liderar a Europa».
Apontando o Tratado de Lisboa como o
grande responsável por não existir uma
«liderança europeia genuína», Sorome-
nho-Marques acrescentou que a Europa
oscila entre a «grandeza passiva ou a
indigência», o mesmo é dizer entre a sal-
vação e o colapso. Sobre Portugal o ce-
nário não é mais risonho. O catedrático
denuncia que aderimos à integração sem
ter plano «B» caso corresse mal. «Não
temos cenário de retirada em caso de
implosão do euro e da União».
João Ferreira do Amaral é atualmente
um dos grandes defensores da saída de
Portugal da zona euro, pese embora,
sublinha, não ter sido contrário à ade-
são à moeda única. O professor do ISEG
partilha da visão que a Europa está
«gravemente ferida, esperemos que não
de morte». Ferreira do Amaral refere
que «acabou na prática o princípio da
igualdade entre Estados, com a hege-
monia da Alemanha sobre os demais»,
desenhando uma «guerra norte/sul» de
consequências imprevisíveis.
A eventual saída de Portugal do euro, re-
conhece, seria um «processo penoso» e
que acarretaria «sacrifícios importantes».
Pragmático, Ferreira do Amaral acha que
a retirada é o caminho, basicamente por
o nosso país ter ficado desapossado de
qualquer instrumento para lidar com uma
situação desta natureza. «Lembro-me
que em 2002 e 2003, a crise estalou na
Argentina e as convulsões acabaram por
ser redentoras. Desceu o desemprego e
aumentou o crescimento».
O relógio já batia quase as 7 horas,
mas a plateia não arredava pé. Talvez
porque o futuro dos portugueses e a
identidade dos europeus está em jogo
como nunca esteve. Foi duro o banho de
realidade. Pelo que já aí está e para o
que se aproxima.
Reportagem disponível em:
www.youtube.com/user/OrdemTOC
18 TOC 136
NOTÍCIAS
Nas sociedades antigas tudo
girava em torno da mulher.
Ela era o centro da sociedade,
era a fonte da vida, figura omnipresen-
te nas representações iconográficas da
época. Esse estatuto, quase natural,
foi, com o passar do tempo, esmore-
cendo. Nos tempos modernos a mulher
adquire, de novo, um inusitado prota-
gonismo, diferenciando-se por aspetos
relacionados com a sua sensibilidade
particular. Contudo, há ainda um longo
caminho a percorrer. O êxito de algu-
mas mulheres nas suas carreiras é ain-
da olhado de soslaio.
Depois da primeira edição realizada em
Santa Maria da Feira, em outubro de
2007, a Ordem relançou o debate no
Centro Cultural de Belém.
Na abertura, Domingues de Azevedo
começou por afirmar que foi «intenção
da Ordem promover um debate sério
sobre a oportunidade das mulheres»,
nomeadamente as que exercem a
profissão de técnico oficial de contas.
«Ainda existe alguma estigmatização
relativamente ao conciliar dos papéis
profissional e pessoal do sexo femi-
nino», acrescentou o Bastonário, que
lembrou o quão difícil é equilibrar, sem
prejuízo para qualquer uma das ver-
tentes, a maternidade e o trabalho,
ambas entendíveis à luz de uma forma
de realização pessoal. Sobre a sensível
temática do justo impedimento, o Bas-
tonário anunciou que conta, até final
do ano, apresentar à Assembleia da
República, uma «solução compaginá-
vel» entre o cumprimento das obriga-
ções declarativas e a vida pessoal das
profissionais. «Imaginem a situação
em que uma profissional, no último dia
para cumprir uma obrigação declara-
tiva, precisa de dar apoio ao seu filho
que está no hospital. É preciso ter bom
senso em situações desta natureza»,
referiu o responsável máximo da enti-
dade reguladora da profissão.
O Bastonário congratulou-se ainda pelo
facto de as mulheres já serem a maioria
dos membros que integra a Ordem. Dos
74 mil inscritos, 53 por cento pertencem
ao sexo feminino, registando-se uma in-
versão da tendência, visto que em 1996,
ainda ao tempo da Câmara, o numero
de mulheres TOC não superava 40 por
cento do total.
O único herói interessante
do século XXI
Ana Bela Pereira da Silva foi a oradora
do primeiro painel da manhã, subordina-
do ao tema «A empresa no feminino».
A presidente da Associação Portugue-
sa de Mulheres Empresárias (APME)
debruçou-se sobre a evolução do papel
do sexo feminino na gestão de empre-
sas. «É preciso recuar até ao pós-guerra
para registar uma viragem no acesso
O talento não tem género2.º Encontro Mulher na Profissão
JULHO 2011 19
NOTÍCIAS
da mulher ao mundo empresarial. Com
a morte de maridos, pais e irmãos, elas
“herdaram”os negócios.» Empresárias à
força, esse movimento acabou por tor-
nar-se «libertador», na opinião de Ana
Bela Pereira da Silva. «A partir desse
momento a mulher, que nunca tinha sido
educada para tal, capacita-se do seu ca-
ráter empreendedor e afirma-se através
de características de gestão e lideranças
superiores ao próprio homem e que radi-
cam em razões neuro-fisiológicas e acer-
vo cultural», concretizou a empresária.
Questionada pela moderadora, a jor-
nalista Ana Martins, da RTP, a presi-
dente da APME, salientou que estudos
científicos revelam que as mulheres
têm a parte da inteligência emocional
mais desenvolvida do que os homens.
As tensões que se geram entre ambos
os sexos, são evidentes. «As mulheres
também desejam o poder e têm compe-
tência para o fazer», acrescentou Ana
Bela Pereira da Silva.
Maria de Jesus Barroso, presidente
da Pro Dignitate, Fundação de Direitos
Humanos, efetuou uma exposição de
improviso, fértil em histórias do passa-
do em citações de autores celebrados.
Como mote, a ex-primeira dama repes-
cou uma frase proferida pelo celebrado
escritor espanhol, Arturo Pérez-Reverte:
«A mulher é o único herói interessante
do século XXI.» O acesso a novas car-
reiras e a direção de empresas de forma
competente são, para Maria Barroso, as
marcas distintivas dos tempos que vive-
mos. «Antes do período das guerras as
mulheres não podiam ser magistrados
ou diplomatas. O acesso à educação e
à liberdade deram um impulso enorme
na ascensão da mulher», acrescentou.
«Não queremos ir contra os homens,
queremos ir com os homens, mas com as
mesmas prorrogativas. Enquanto isso,
quereremos, nos nossos pequenos mun-
dos, ir marcando diferença com atitudes
e comportamentos», disse ainda.
No pingue-pongue de questões, Ana
Martins voltou a interrogar Ana Bela
Pereira da Silva sobre o plano das con-
quistas do sexo feminino: «Tudo é tão
recente a esse nível que vamos ter de
esperar até que os valores sedimentem
na cultura civilizacional», referiu. Certo
é que a vida privada é fundamental para
o desempenho profissional: «Quando
não estamos bem na vida privada, isso
reflete-se na produtividade laboral. Nos
nossos pequenos mundos importa ir
marcando diferença com atitudes e com-
portamentos», declarou a empresária.
«O talento não tem género. No caso
dos técnicos oficiais de contas, as suas
decisões são de crucial importância e é
preciso colocar nos lugares-chave pes-
soas com capacidade».
Conciliar profissão e família:
uma luta constante
Helena Garrido moderou o segun-
do painel dedicado aos «Desafios da
mulher». A subdiretora do «Jornal de
Negócios» saudou a oportunidade da
iniciativa, apesar de esta «não ser uma
iniciativa muito popular e mediática».
Profissional há duas décadas, Isabel
Carvalho revela que no tempo que leva
de atividade nunca sentiu na pele qual-
quer discriminação. A oradora do painel
«A mulher e a profissão de TOC» come-
20 TOC 136
NOTÍCIAS
çou por destacar que os profissionais da
contabilidade e da fiscalidade têm uma
função de suporte à gestão, não dis-
putando com frequência os lugares de
gestão de topo. Isabel Carvalho identi-
ficou alguns campos problemáticos da
profissão; a ética, a escala e a classe
heterogénea. «O não cumprimento do
dever de lealdade e os honorários pra-
ticados», são obstáculos que devem ser
ultrapassados. Pelo lado mais animador,
Isabel Carvalho salientou a crescente
notoriedade e valorização do papel dos
TOC, «enquanto bússola dos empresá-
rios e protagonistas centrais do Estado
fiscal e social», cujo dinheiro dos impos-
tos é calculado e declarado pelos TOC.
Isabel Carvalho criticou, de forma gené-
rica, o modo de atuar da classe a que
pertence: «Temos tendência em com-
padecer-nos com os nossos clientes, ao
contrário de outras classes profissio-
nais». Em contraponto, a profissional
salientou as amplas qualidades da nova
geração de técnicos oficiais de contas.
«Não há muito tempo, o TOC era um
“clínico geral”, existia uma grande dis-
persão de saberes. Com as alterações
profundas operadas na legislação, o
caminho da especialização revelou-se
fundamental e os colégios da especiali-
dade introduzidos pela Ordem são disso
prova. Devemos apostar fortemente na
diferenciação do serviço prestado».
Isabel Carvalho concluiu a sua interven-
ção partilhando com os presentes um
pouco da «luta constante» para conciliar
profissão e família: «O mês de maio é
particularmente exigente. Temos decla-
rações fiscais para entregar e, em simul-
tâneo, tenho de acompanhar as ativida-
des letivas e ex-curriculares da minha
filha que está a concluir o ensino básico.
Se o equilíbrio prevalecer sobre o “jogo
do empurra”, tudo será mais fácil.»
Mundo mais global e feminino
A conselheira da Comissão Europeia,
Maria João Rodrigues, trouxe ao even-
to a apresentação do novo perfil que
emerge num mundo empresarial «mais
global e feminino.» A ex-ministra do
Trabalho afirmou que, no âmbito da
nova geração de empresas é visível um
ascendente das mulheres. Aproveitando
a presença de brasileiros na sala, Maria
João Rodrigues, uma assídua visitante
daquele país em deslocações em trabalho,
assegurou que o Brasil «é um bom exem-
plo de criatividade social» e, nesse sen-
tido, deve ser fomentado o «estreitar de
laços entre a Europa e a América Latina».
Sobre o papel dos técnicos oficiais de
contas na dinâmica empresarial, a soció-
loga referiu que numa lógica de «empre-
sas em rede», o fluxo de relações entre
os profissionais e os clientes/fornecedo-
res está em transformação, com reper-
cussões ao nível da dinâmica económica.
«A contabilidade não é algo de neutro.
Os padrões de contabilidade refletem es-
colhas com alcance económico e social»,
disse. Sem se deter, a antiga governante
do executivo de António Guterres, frisou
como «marca distintiva» da contabilida-
de, o seu «alcance para melhorar a qua-
lidade de vida dos cidadãos.»
O evento matinal não terminaria sem
um momento de poesia a cargo de Ma-
ria Barroso. A ex-primeira dama recitou
dois poemas de Sophia de Mello Breyner.
Reportagem disponível em:
www.youtube.com/user/OrdemTOC
Dois novos livros - Os dois Encontros que decorreram no
passado dia 11 contaram com a apresentação de dois novos
livros da autoria de técnicos oficiais de contas. «Só vivemos
duas vezes» é o título da obra autobiográfica de Ana Martins
Silva, com a chancela da editora Guerra e Paz, apresentado
durante o intervalo do encontro «Mulher na profissão.»
«Regime fiscal das depreciações e amortizações», de André
Alpoim de Vasconcelos e Cristina Pinto, foi apresentado duran-
te o II Encontro Luso-Brasileiro. A obra tem um caráter inova-
dor e foi editada pela Areal.
JULHO 2011 21
NOTÍCIAS
Pontes que a Contabilidade tece2.ºEncontro Luso-Brasileiro
Sob o tema genérico «Separados
pelo Atlântico, unidos pela Conta-
bilidade», teve lugar o 2.º Encon-
tro Luso-Brasileiro de Contabilidade que
decorreu na tarde do dia 11 no Centro
Cultural de Belém. Resultante de uma
parceria entre a Ordem dos Técnicos Ofi-
ciais de Contas e o Conselho Federal de
Contabilidade do Brasil, foi uma oportu-
nidade para técnicos oficiais de contas e
contadores trocarem experiências e per-
ceberem, afinal, que muitas são já as pon-
tes que a Contabilidade vai tecendo entre
os dois lados do oceano.
Desse mesmo espírito foi dada conta na
sessão de abertura. «Esta é uma parceria
que surge com naturalidade e que tem to-
das as condições para ajudar a construir
coisas maravilhosas», sustentou o Basto-
nário da Ordem, Domingues de Azevedo.
Uma dessas realizações é a transferência
de conhecimentos de Portugal e do Brasil
para os restantes países de língua oficial
portuguesa e que está já em marcha.
«Essa é uma das nossas missões: parti-
lhar as nossas experiências com os outros
países que falam português», afirmou Ju-
arez Carneiro, presidente do CFC.
O tema primeiro do encontro foi dedica-
do à profissão. Leonel Pontes, membro do
Conselho Superior da Ordem, moderou o
painel que apresentou quatro oradores
(dois de cada lado do Atlântico). Rui Al-
meida falou sobre «O TOC e as empresas
em Portugal» apresentando uma carac-
terização breve sobre a forma como os
profissionais exercem, por norma, a sua
atividade: ou como trabalhadores inde-
pendentes (em geral nas micro e peque-
nas entidades) ou como trabalhadores
por conta de outrem (usualmente em
pequenas, médias e grandes entidades).
Estes profissionais, habitualmente, estão
encarregues de planificar, organizar e
coordenar a contabilidade, assumindo a
responsabilidade pela regularidade técni-
ca contabilística e fiscal, bem como pela
supervisão dos atos declarativos para a
Segurança Social. Daqui resulta, defen-
deu o orador socorrendo-se da mitologia
grega, «mais do que os 12 trabalhos de
Hércules.»
José Martônio apresentou a versão brasi-
leira. Mas preferiu debruçar-se sobre nú-
meros: 490 230 profissionais ativos, sendo
288 665 homens e 201 565 mulheres. Da-
quele total, 199 743 são técnicos (com for-
mação média) e 290 487 contadores (com
formação superior). Tudo para abarcar
uma realidade com cerca de cinco milhões
e 200 mil micro e pequenas empresas.
Outros números que caracterizam a pro-
fissão no Brasil: cerca de 82,5 por cento
dos profissionais situam-se na faixa etá-
ria dos 31 aos 59 anos; 61 por cento têm
curso superior; 24,3 por cento têm um
rendimento mensal entre os 4 200 e 8 400
reais (entre 1 900 e 3 800 euros); 70 por
cento têm mais de 15 anos de experiên-
cia; 39 por cento são proprietários ou só-
cios de escritórios de Contabilidade.
O presidente da Fundação Brasileira de
Contabilidade avançou ainda com um dado
curioso: cerca de 50 por cento das empre-
sas encerram a sua atividade antes de com-
pletarem dois anos de vida. Porquê? Um
dos fatores é, precisamente, a ausência de
aconselhamento contabilístico e fiscal…
22 TOC 136
NOTÍCIAS
A sociedade como cliente
Da organização contabilística em Portugal
e no Brasil se ocuparam os dois oradores
seguintes. José Azevedo Rodrigues apre-
sentou a forma como a contabilidade está,
atualmente, estruturada em Portugal, não
deixando de notar que «não se justificam
tantos SNCzinhos», sendo esta fragmen-
tação apontada como parte do desalinha-
mento de Portugal com o sistema interna-
cional. Para se ter um ideia mais precisa:
POC-P, POC-E, POC-S, PC-FIM, PC-FII, PC-
-FCR, PC-FP, POCAL, POCISSSS...
Este docente universitário realçaria ainda
a necessidade de aprofundamento da par-
ceria do TOC com o empresário, aconse-
lhando os profissionais a serem «menos
operacionais, abandonando a posição de
agentes da área fiscal e tributária e mais
geradores de informação.» Azevedo Rodri-
gues lembrou ainda que as novas exigên-
cias profissionais terão de conter, entre ou-
tras, «visão alargada, não se restringindo
apenas a temas contabilísticos e fiscais» e
ética e responsabilidade inquestionáveis:
«Os TOC devem divulgar informação de
forma a não enganar os utilizadores. Só
assim se gera a confiança», afiançou.
Uma coisa é clara: «A Contabilidade é a
única fonte de informação financeira cre-
dível.» Os novos desafios passarão, no
entender de Azevedo Rodrigues, por uma
«cultura de cooperação» e por «estabe-
lecer relações de confiança, implemen-
tar modelos de transparência, promover
processos de comunicação e desenvolver
competências das pessoas.»
Maria Clara Bugarim, um nome bem conhe-
cido dos TOC, efetuou uma curta viagem
histórica pelas primeiras manifestações
contabilísticas conhecidas no Brasil, prove-
nientes da era paleolítica, passando depois
pela chegada dos portugueses e de Pero
Vaz de Caminha, «o primeiro contador es-
trangeiro a aportar em terras brasileiras.»
Após a publicação do célebre Decreto-Lei
n.º 9 295/46, que dispõe sobre a Lei de Re-
gência da profissão de contabilista, o Bra-
sil passou a ter uma ferramenta legal para
enquadramento da profissão. Hoje, a situ-
ação é bem diferente. Em breve, o acesso à
profissão estará apenas disponível a quem
tenha um curso superior e seja aprovado
num exame de acesso à profissão elabora-
do pelo CFC, a exemplo do que já sucede,
há alguns anos, em Portugal.
Clara Bugarim deu ainda conta dos últi-
mos progressos que o Brasil tem realizado
no sentido de adotar as normas interna-
cionais de contabilidade, sendo exemplo
disso mesmo a criação recente do Grupo
Latino-Americano dos Normatizadores
Contábeis, e que tem como presidente um
brasileiro: Juarez Domingues Carneiro. «O
Brasil está disposto a aceitar a normaliza-
ção contabilística mas não está na disposi-
ção de aceitar tudo o que o IASB pretende.
O Brasil tem força suficiente para bater o
pé», assegurou, em tom enérgico, a ex-
-presidente do CFC que defendeu ainda
que «a boa fiscalização não pode ser cor-
porativa porque o nosso principal cliente é
a sociedade.»
O criador de frangos
«O profissional criador de valor» foi o mote
escolhido para o segundo e último painel.
Moderado por António Nabo, membro do
Conselho Superior, teve a participação de
José Pedro Farinha e Juarez Domingues
Carneiro. O primeiro falou sobre as expe-
riências de criação de valor em Portugal,
não sem antes definir com clareza o con-
ceito: «Criamos valor quando o benefício
excede o custo», afirmou, deixando bem
JULHO 2011 23
NOTÍCIAS
claro que a criação de valor «não é receber
uma avença ao fim do mês.»
Ainda antes de relatar a experiência do
amigo “gestor de sucesso” mas com pouca
paciência para prestar atenção às mensa-
gens que uma contabilidade organizada
poderia fornecer, o orador lamentou que o
TOC seja visto muitas vezes «como cobra-
dor de impostos. O TOC não pode ser visto
como um agente do Estado.»
Num registo humorado, Farinha debruçou-
-se sobre as características qualitativas
que a contabilidade deve possuir, fazendo
sucessivos paralelos com a “estória” do
amigo que herdou do pai a gestão de uma
empresa que se dedica à criação de frangos:
compreensibilidade, relevância, fiabilidade e
comparabilidade. Trocando por miúdos: a
informação útil tem que ser compreensível
para os utilizadores, sendo o mais impor-
tante stakeholder, e por vezes esquecido, a
própria empresa. A não esquecer: deve ser
em português e não em contabilês.
José Pedro Farinha, usando uma vez mais
uma linguagem metafórica, adiantou ain-
da que a «contabilidade não deve ser vista
como um retrovisor, que nos evidencia o
que está para trás, mas como um GPS, que
nos mostra o caminho.»
Há sempre, contudo, o reverso da medalha.
Para que tudo funcione, a informação terá
que ser oportuna e em tempo útil e estará
permanentemente sujeita ao crivo da análi-
se do custo-benefício. Na “estória” apresen-
tada, o amigo acabou rendido à informação
que o orador, todos os meses, até ao dia 20,
lhe enviava e não regateou, sequer, o facto
de lhe cobrarem mais cem euros. A razão:
a informação valia ouro. Por isso, sintetizou
Farinha, «não faz sentido pouparmos na
contabilidade ou ter regimes mais simplifi-
cados, como alguns pretendem.»
Contabilidade globalizada
Juarez Carneiro falou da evolução da con-
tabilidade e das suas diferentes fases, clas-
sificando a atual como a da «contabilidade
globalizada.» E num mundo assim, no qual
os contabilistas «precisam de se adaptar
à mudança e ter capacidade de assimilar
e acompanhar os avanços tecnológicos» a
importância da profissão, garantiu o presi-
dente do CFC, «é fundamental para o pro-
cesso decisório.» Aliás, o orador brasileiro
foi mais longe e garantiu mesmo que «nun-
ca iremos encontrar um bom profissional
desempregado.»
A sustentar este otimismo, Juarez Carneiro
deixou a certeza de que «estamos entre as
cinco ou seis classes de profissionais mais
procuradas no mundo.» Isto é possível por-
que «o novo profissional da contabilidade é
ativo, preocupado em passar informações
cada vez mais precisas e eficazes aos seus
clientes e ajudando os gestores nas toma-
das de decisão.»
O 2.º Encontro Luso-Brasileiro não termi-
naria sem que o bastonário assinalasse que
«muitas das preocupações que a Ordem
tem vindo a demonstrar ao longo dos anos,
como a insistência na formação e a neces-
sidade de se criar um novo profissional, não
são um exclusivo da realidade portuguesa,
como aqui ficou demonstrado.»
Em jeito de conclusão, Domingues de Aze-
vedo deixou um alerta à navegação lusa:
«Numa profissão como a nossa nunca sa-
bemos, vamos sabendo. Ou os TOC com-
preendem a necessidade e inevitabilidade
da informação e do seu papel junto das
empresas ou então, a médio prazo, outras
profissões o tentarão fazer por nós.»
Reportagem disponível em:
www.youtube.com/user/OrdemTOC
24 TOC 136
NOTÍCIAS
O Instituto Superior de Economia e Ges-
tão (ISEG) decidiu perpetuar o nome
de Rogério Fernandes Ferreira, mestre
de muitas gerações de gestores e eco-
nomistas. A 12 de julho de cada ano,
data da morte do membro honorário da
Ordem, vai realizar-se uma conferência
com o seu nome, nas instalações daque-
le estabelecimento de ensino superior.
João Duque, presidente do Conselho
Diretivo do ISEG e também ele discípulo
de Rogério Fernandes Ferreira, afirmou
na primeira conferência que a iniciativa
constitui «uma continuidade ao trabalho
realizado pelo professor» nas diversas
áreas profissionais que abraçou.Rogério
Fernandes Ferreira pertenceu à Ordens
dos TOC, dos ROC, dos Advogados e
dos Economistas e foi um humanista
«generoso, humilde, frugal, paciente e
contra a guerra», como foi definido na
ocasião.
Num auditório compostos por fa-
miliares, amigos e muitos seguido-
res, foi destacado pelo seu filho,
Rogério M. Fernandes Ferreira, a
faceta menos conhecida do profes-
sor: «Era guloso e gostava muito de
chocolates.»
Associaram-se a esta iniciativa, o
Bastonário Domingues de Azevedo
e representantes das ordens a que
pertenceu o notável académico.
ISEG institui «dia» Rogério Fernandes Ferreira12 de julho é a data escolhida
A Ordem dos Técnicos Oficiais de
Contas, em colaboração com o
CEGE/ISEG e a OROC, organiza no
dia 21 de setembro uma conferência
de homenagem ao Professor Rogério
Fernandes Ferreira, altura em que
será entregue o galardão ao vence-
dor de mais uma edição do prémio
que leva o nome do membro hono-
rário da Ordem. O evento realiza-se
no Auditório Cardeal António Me-
deiros na Universidade Católica
Portuguesa, em Lisboa. O programa
e as inscrições estão disponíveis no
sítio da Ordem.
Conferência a 21 de setembroOTOC, ISEG e OROC homenageiam Rogério Fernandes Ferreira
Estágio profissional para acesso à profissãoAlterações no RIEEP
Um dos requisitos obrigatórios no
acesso à profissão de TOC é a rea-
lização com aproveitamento de um
estágio profissional ou curricular nos
termos regulamentados pela Ordem,
segundo a alínea f) do artigo 15.º do
EOTOC. O Regulamento de Inscrição,
Estágio e Exame Profissionais (RIEEP)
refere as condições em que um está-
gio profissional deve funcionar.
O Decreto-Lei n.º 66/2011, de 1 de
junho, vem agora estabelecer «as
regras a que deve obedecer a rea-
lização de estágios profissionais
incluindo os que tenham como obje-
tivo a aquisição de uma habilitação
profissional legalmente exigível para
o acesso ao exercício de determina-
da profissão.» A disposição legal
acima referida revela uma preocu-
pação com questões formais, nome-
adamente no que diz respeito à ela-
boração de um contrato de estágio
e a duração do mesmo. Assim, en-
tendeu a Ordem que, considerando o
determinado no Decreto-Lei, alterar
as seguintes disposições do RIEEP: o
n.º 2 do artigo 12.º do RIEEP passa-
rá a ter as seguinte redação: «A re-
muneração do estágio rege-se pelas
disposições legais aplicáveis.»
O n.º 4 do artigo 28.º do RIEEP
passará a ter a seguinte designa-
ção: «Os candidatos dispensados
do estágio nos termos da alínea a)
do n.º 1, devem requerer a inscrição
na Ordem no prazo máximo de dois
anos após a data da conclusão da
base académica que permite a can-
didatura ou após a data de conclu-
são do mestrado ou doutoramento,
para os candidatos que prossigam
os seus estudos em áreas ligadas à
profissão.»
26 TOC 136
NOTÍCIAS
Encontro Nacional dos TOC no Algarve
Ordem e AFP assinam protocolo de cooperação
Na primeira quinzena de setembro
A festa-convívio dos Técnicos Oficiais
de Contas ruma este ano ao Algarve.
O Encontro Nacional dos TOC será re-
alizado no distrito de Faro na primeira
quinzena de setembro. Depois de nos úl-
timos anos terem sido contemplados os
distritos de Viana do Castelo, Coimbra,
Évora e Lisboa, chega agora a vez da
organização ficar a cargo de um grupo
de profissionais do sul do país. A data e
o respetivo local serão anunciados bre-
vemente no sítio da Ordem.
A entidade reguladora da profissão
de técnico oficial de contas e a As-
sociação Fiscal Portuguesa (AFP) ru-
bricaram a 15 de junho um protocolo
de colaboração que visa o intercâm-
bio alargado de ideias e experiências
com vista ao progresso da fiscalidade
portuguesa. À luz deste documento,
a OTOC pode proceder, através dos
meios próprios de comunicação de
que dispõe, à divulgação junto dos
seus membros das iniciativas promo-
vidas pela AFP, presidida por Rogério
M. Fernandes Ferreira. Por seu turno,
a AFP pode possibilitar aos membros
da OTOC condições especiais de ins-
crição nas iniciativas de formação que
promove.
O conteúdo integral do protocolo en-
contra-se disponível no sitio da Ordem.
A Ordem organiza no dia 23 de se-
tembro, no Seminário de Vilar, no
Porto, o XI do Prolatino, o congres-
so internacional de contabilidade do
mundo latino. Esta edição vai coin-
cidir com a entrega do Prémio In-
ternacional Professor Lopes de Sá,
o académico e professor catedrático
brasileiro que faleceu o ano passado.
Trata-se, pois, de uma edição dupla-
mente especial que pretende reforçar
o intercâmbio de conhecimentos en-
tre profissionais de nações amigas e
com muitas afinidades, contribuindo
para o progresso da contabilidade.
Estão previstos três painéis, um so-
bre a teoria neopatrimonialista e dois
sobre a contabilidade. Estão confir-
mados no encontro vários oradores
de nacionalidade brasileira, entre os
quais o presidente do Conselho Fe-
deral de Contabilidade, Juarez Do-
mingues Carneiro. O presidente da
Câmara Municipal do Porto, Rui Rio,
também vice-presidente da Mesa da
Assembleia Geral da Ordem, estará
presente no encerramento da sessão.
O Prolatino é um movimento cultural,
idealizado e impulsionado por António
Lopes de Sá, que pretendeu respon-
der ao ritmo transformador exercido
pelas novas tecnologias na profissão
contabilística, nomeadamente em ter-
mos da necessidade de atualização
constante de conhecimentos. As dez
edições anteriores realizaram-se nas
seguintes cidades: Baía, Belo Hori-
zonte, São Luís do Maranhão, Poço de
Caldas, Recife, São Paulo, Gramado e
Urbalândia, no Brasil; Santa Maria da
Feira e Lisboa, em Portugal.
O programa e as inscrições para o XI
Prolatino estão disponíveis no sítio da
Ordem. Os profissionais poderão par-
ticipar mediante o pagamento de 50
euros. Para efeitos do controlo de qua-
lidade serão atribuídos 12 créditos.
XI Prolatino realiza-se no PortoCongresso internacional do mundo latino regressa a Portugal
Intercâmbio alargado de ideias e experiências
JULHO 2011 27
NOTÍCIAS
28 TOC 136
NOTÍCIAS
Bastonário defende «revolução» na contabilidade do EstadoEm colóquio realizado no ISCAL
O Bastonário da Ordem participou no dia
12 de julho num colóquio sobre Contabi-
lidade e Gestão, promovido pelo Instituto
Superior de Contabilidade e Administração
de Lisboa (ISCAL). Domingues de Azevedo
presidiu ao painel sobre o tema «Respon-
sabilidade social e o anexo», tendo como
fio condutor a ideia que «a verdade da in-
formação contabilística é determinante na
sustentabilidade social e das empresas».
O Bastonário lamentou que «as empresas
continuem a ser vistas quase exclusiva-
mente como fontes de rendimento, menos-
prezando o seu contributo para a estabi-
lidade da sociedade», ao mesmo tempo
que rareia um enquadramento jurídico do
papel das empresas e da responsabilidade
patrimonial na comunidade.
O responsável máximo da instituição re-
guladora da profissão salientou que se
não fosse o técnico oficial de contas a
«garantir a fiabilidade da informação», a
situação seria muito pior. «Há casos claros
que demonstram um grande amadorismo.
Dou dois exemplos: falar só no anexo é
reduzir a importância da responsabilida-
de social. Por outro lado, os políticos que
querem baixar a Taxa Social Única (TSU)
em quatro por cento não conseguem expli-
car para onde vai esse dinheiro…». Sem se
conter, Domingues de Azevedo qualificou
de «bandalheira» o que se passa na con-
tabilidade na administração pública, coe-
xistindo, ao mesmo tempo, a contabilidade
digráfrica e unigráfica. «Nos relatórios e
contas da administração pública, parece
tudo bem à primeira vista, o embrulho está
bem feito, mas quando se analisa o docu-
mento em detalhe é que é o pior».
Perante isto, lançou o repto: «Teremos de
lançar um debate a breve trecho na socie-
dade com vista a operar uma revolução na
contabilidade do Estado e dos serviços que
dele dependem.»
Tentações e pressões
No auditório da mais antiga escola por-
tuguesa da área, Domingues de Azevedo
não escondeu a sua indignação por pre-
tenderem lançar o descrédito nos profis-
sionais da contabilidade e da fiscalidade,
recorrendo a uma máxima que vem ga-
nhando terreno: «Os advogados dizem,
os contabilistas fazem». O Bastonário re-
futou categoricamente
esta visão. «O TOC
não é uma mas-
sa disforme que
adquire a
forma que
cada um lhe
quer dar».
Regressando ao
tema do anexo, Do-
mingues de Azevedo
afirmou que deve ser basi-
camente «compreensível. O
anexo, só por si, não faz a
contabilidade, mas é um aces-
sório de informação contabilísti-
ca.» O Bastonário denunciou ainda
a «tentação», acentuada em momentos
de crise de «exercer pressões» junto dos
TOC para que estes façam «alguns mala-
barismos». O exemplo flagrante é o IVA
dedutível em carros de turismo. Domin-
gues de Azevedo admitiu que «ser ético
com barriga vazia é muito complicado»,
mas apelou aos profissionais para perma-
necerem firmes aos valores do rigor e da
credibilidade.
Conferência «A Soma das Partes», em AveiroA 19 de setembro, no Centro Cultural
Depois do êxito da primeira confe-
rência «A Soma das Partes», reali-
zada em Faro, em meados de julho,
a organização conjunta da Ordem,
TSF, DN e JN ruma a norte, mais
concretamente até Aveiro. O Centro
Cultural da cidade dos moliceiros
recebe no dia 19 de setembro a se-
gunda edição da conferência subor-
dinada ao tema «As economias regio-
nais como fator de desenvolvimento».
Esta sessão manterá o modelo da con-
ferência realizada no Algarve. Durante
uma manhã, técnicos oficiais de contas,
empresários, autarcas e "forças vivas"
da região vão debater questões pre-
mentes no âmbito da fiscalidade, do
empreendedorismo e do investimen-
to. Está já assegurada a presença de
Ângelo Correia, administrador de
empresas, e dos deputados eleitos
pelo círculo parlamentar de Aveiro.
O programa completo e as inscri-
ções encontram-se disponíveis no
sítio da Ordem. Para efeitos do Con-
trolo de Qualidade são atribuídos 6
créditos aos TOC.
JULHO 2011 29
NOTÍCIAS
Encontro na cidade natal de Luca PacioliOrdem esteve representada em Itália
A Comissão de História da Contabili-
dade (CHC) da Ordem, representada
por Lúcia Lima Rodrigues (presidente) e
Joaquim Cunha Guimarães (vogal), bem
como o Conselho Diretivo, re-
presentado pelo vice-presiden-
te, Armando Marques, partici-
param na II Conferência Inter-
nacional «Before and After Luca
Pacioli», que decorreu de 17 a
19 de junho, em Sansepolcro (a
cidade natal de Pacioli), Peru-
gia e Florença.
As diversas intervenções inci-
diram sobre as múltiplas face-
tas da vida e obra de frei Luca
Pacioli. Destaque para Alan
Sangster, que participou no 3.º
Encontro de História da Con-
tabilidade, em Lisboa e Braga,
tendo apresentado nessa al-
tura o método didático usado
por Pacioli, que proferiu desta
vez uma palestra salientado
as contribuições do «pai» da
contabilidade para o ensino da
partida dobrada nas universi-
dades e para o ensino nas es-
colas de ábaco.
Uma questão que ficou sem
resposta na conferência é a da aplica-
ção/ligação da «divina proporção» à
contabilidade/partidas dobradas. Dis-
cutiu-se também até que ponto a «di-
vina proporção» pode ser aplicada nos
cálculos da contabilidade, tendo surgido
pontos de vista contraditórios entre os
académicos de pendor mais socioló-
gico e os de pendor mais matemático.
Outro ponto a merecer reflexão é o de
não ter surgido até hoje um método que
substitua o das partidas dobradas. Com
efeito, apesar de, novamente com o
recurso à matemática, se terem desen-
volvido algumas teorias contabilísticas,
ainda não apareceu um desenvolvimen-
tro teórico satisfatório que substitua o
método das partidas dobradas, fato que
evidencia a importância do mé-
todo e da obra prima de Pacioli.
Destaque ainda para a comuni-
cação de Esteban Hernandez, o
professor espanhol que preside
à Comissão de História da Con-
tabilidade da AECA e que esteve
presente no último Encontro de
História da Contabilidade, reali-
zado em Portugal.
Na mesa redonda sobre «Con-
tabilidade e história: é a história
da contabilidade um caminho
privilegiado na investigação his-
tórica?», salientou-se a impor-
tância e necessidade das contas
e da contabilidade em todas as
atividades humanas.
A presidente da CHC, Lúcia
Lima Rodrigues, e o docente
do ISCAC, Miguel Gonçalves,
participaram numa sessão pa-
ralela, tendo apresentado os
temas «The role of the state in
the development of accounting
in the portuguese-brazilian em-
pire: 1750-1822» e «On the interrela-
tion between accounting education and
the state: the teaching of accounting at
the Oporto school of commerce (1802-
1837», respetivamente.
Documentação da formação na «Pasta TOC»Eventual e segmentada de julho
Para uma consulta mais célebre e uni-
ficada dos documentos de apoio apre-
sentados pelos formadores nas ses-
sões de formação em sala, a Ordem
disponibiliza na «Pasta TOC» conteú-
dos que interessam a todos os profis-
sionais que frequentaram essas ações.
Para ter acesso, basta entrar na sua
«Pasta TOC» e clicar no tópico «For-
mação», podendo aceder a toda a do-
cumentação relativa a sessões deste e
de anos anteriores. As apresentações
da formação eventual e segmentada
de julho são os documentos mais re-
centes disponibilizados.
30 TOC 136
NOTÍCIAS
Certificação da qualidade de TOC
Reunião em Luanda a 8 de agosto
Sem acesso às declarações eletrónicas
Consequências dos atrasos na entrega da IES
No âmbito do projeto «Transferência de conhecimentos»
Incumprimento do artigo 10.º do Estatuto
Devido ao atraso na entrega da IES em
2011, as instituições financeiras estão a
solicitar às empresas balanços e demons-
tração de resultados do exercício de 2010.
Nos termos das disposições estatutárias,
a responsabilidade pela elaboração das
demonstrações financeiras e da sua regu-
laridade contabilística e fiscal, é dos téc-
nicos oficiais de contas, sendo assinadas
também pelo correspondente órgão de
gestão ou empresário em nome individual.
A certificação da qualidade profissional dos
técnicos oficiais de contas, nos termos do
disposto no artigo 6.º do Estatuto, faz-se
quando usados meios de informação ele-
trónicos, através do uso de uma password,
gerada pelo sistema informático das decla-
rações eletrónicas e, quando usados meios
de informação em suporte de papel, através
de assinatura e aposição de vinheta certi-
ficadora da qualidade, emitida pela Ordem
dos Técnicos Oficiais de Contas.
Os documentos que não respeitem aque-
las normas não vinculam os técnicos ofi-
ciais de contas quanto ao seu conteúdo,
nem mesmo quanto à eventual assunção
de responsabilidade pela sua aderência à
realidade patrimonial que transmitem nem
mesmo quanto à sua regularidade técnica
contabilística e fiscal.
A Ordem, em parceria com o Conse-
lho Federal de Contabilidade do Bra-
sil, tem vindo a desenvolver um pro-
jeto denominado por «Transferência
de conhecimentos» que consiste em
implementar e apoiar nos países de
língua oficial portuguesa o ensino da
Contabilidade, Fiscalidade, a criação
de estruturas de regulação profissio-
nal, bem como a implementação de
formação contínua.
Atendendo ao grau de evolução e de-
senvolvimento de cada país, dar-se-á
prioridade a Angola e Moçambique.
Encontra-se agendada uma primeira
reunião com diversas individualida-
des de Angola que se realizará a 8 de
agosto, em Luanda, com o objetivo de
dar a conhecer o mencionado projeto
e, se possível, iniciar a sua implemen-
tação no terreno. Aguardam-se con-
tactos de outros países para se dar
igualmente início à implementação do
projeto.
De acordo com o estipulado no artigo
10.º do Estatuto da Ordem dos Técni-
cos Oficiais de Contas, até ao dia 30
de setembro de cada ano e nos trinta
dias imediatos ao início ou cessação
da responsabilidade por contabilida-
des, os profissionais devem comunicar
à Ordem a identificação das empresas
por cuja contabilidade são responsá-
veis, indicando o volume de negócios
do ano a que respeitam. No caso de
início de atividade, o volume de ne-
gócios a indicar é o mencionado na
declaração de início de atividade. Nos
restantes casos, é o total dos provei-
tos, conforme definição constante do
mencionado artigo 10.º.
O artigo 10.º é o único meio que a Or-
dem tem, para o exercício da sua fun-
ção reguladora, de conhecer a atividade
do profissional, para efeitos de enqua-
dramento nos artigos 8.º e 9.º do men-
cionado Estatuto.
Também o acesso à internet usando a
qualidade de TOC, tem por base, como
não podia deixar de ser, uma relação dos
profissionais que é enviada à DGITA pela
Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas.
Quem não se encontra identificado junto
da Ordem como responsável por qualquer
contabilidade, informação que é da exclu-
siva responsabilidade dos técnicos oficiais
de contas, não tem necessidade, naquela
qualidade, de aceder às declarações ele-
trónicas, podendo faze-lo, não na qualida-
de profissional, mas sim na de cidadão.
Assim, a partir do próximo dia 30 de
setembro, a relação dos técnicos ofi-
ciais de contas que não se encontrem
identificados junto da Ordem como res-
ponsáveis por contabilidades, deixarão
de integrar aquela lista, o que implica
que não tenham acesso às declarações
eletrónicas na qualidade de TOC, mas
apenas como cidadãos.
19 de setembroAveiro
32 TOC 136
LIVROSLIVROS
Auditoria
e controlo interno
A evolução global das economias e
a complexidade crescente dos pro-
cessos de trabalho têm obrigado as
organizações, em geral, e as afetas
ao setor público, em particular, à
implementação de sistemas de con-
trolo interno que permitam mitigar
o risco inerente a fatores contingen-
ciais. Nelson Marçal e Fernando Luís
Marques debruçam-se sobre a es-
sência das decisões de gestão mais
eficientes e eficazes. Na primeira
parte do livro, os autores abordam
no âmbito do controlo interno, a te-
mática da cultura de qualidade e da
excelência organizacional. Na se-
gunda metade, apontam o caminho
a percorrer no âmbito da auditoria
interna. Nelson Marçal é docente
do ISLA em Santarém, Leiria e Vila
Nova de Gaia. Fernando Marques
desempenha funções de chefe de
divisão de gestão financeira no mu-
nicípio de Ourém.
Título: Manual de Auditoria e Controlo Interno no Setor PúblicoAutor: Nelson Marçal e Fernando Luís MarquesEditora: Edições Sílabo, 182 páginas
Direito Tributário
Desde a publicação da anterior edi-
ção deste livro, da autoria do juiz
conselheiro Jorge Lopes de Sousa,
ocorreram inúmeras mudanças da
legislação aplicável ao procedimen-
to e processo tributário, desde as
constantes modificações à Lei Geral
Tributária e ao Código de Procedi-
mento e de Processo Tributário, até
às transformações dos regimes de
custas, dos recursos em processo
civil e da ação executiva, que são de
aplicação direta ou subsidiária. Na
presente edição (a 6.ª) atualizaram-
-se anotações e comentários, com
atenção especial à jurisprudência
do Supremo Tribunal Administra-
tivo e às necessidades quotidianas
dos tribunais tributários. Global-
mente, o resultado materializou-
-se em cerca de mais 600 páginas
do que as que compunham os dois
volumes da anterior edição. Por
razões de ordem prática, optou-se
por repartir o livro em quatro volu-
mes, sendo este o primeiro.
Título: Código de Procedimento e de Processo Tributário – I Volume (Anotado e comentado)Autor: Jorge Lopes de SousaEditora: Áreas Editora, 800 páginas
Regime
Contributivo
para a Segurança
Social
Numa sociedade civil em constan-te mudança, em que a evolução, o confronto social e político são permanentes, em que os norma-tivos legais são contínuos o que leva ao desconhecimento e à sua não aplicação atempada, com as enormes inconveniências daí resul-tantes, entendeu o autor agrupar a legislação vigente sobre o «Novo Regime Contributivo para a Segu-rança Social», apenas num manual, de forma rápida e de fácil acesso para todos os interessados nas im-plicações da vertente laboral face aos desafios. Atualizado e de fácil acesso, a obra contém 25 questões de índole prática, indo ao encontro do que o autor procurou, desde a primeira hora: conceber um «livro prático, funcional e de bolso». Faria Fartaria é docente universi-tário, mestre em Ergonomia e Se-gurança do Trabalho e licenciado em Direito.
Título: Novo Regime Contributivo para a Segurança Social – Anotado e comentado Autor: Faria Fartaria Editora: Áreas, 360 páginas
34 TOC 136
LUGAR AO TOC
O técnico oficial de contas tem as suas funções definidas no Estatuto. A versão oficial
é clara. Mas a prática esconde ou-tras tarefas. A experiência de Acácio Gonçalves é disso testemunha. «Um casal jovem, meu cliente, sempre foi muito pontual nos pagamentos. Apa-reciam sempre juntos. Cheguei a co-mentar com os meus colaboradores como era bom ver um casal dar-se tão bem. Certo dia, apareceram no escritório e disseram-me que que-riam fazer alterações na sociedade.
Iam divorciar-se. Tentei perceber melhor porque é que estavam a to-mar tal decisão. Conversámos, con-versámos e acabaram convencidos de que, pelo facto de surgirem pro-blemas, não significava, de imediato, que se recorresse ao divórcio. Ainda hoje estão juntos.»Este e outros relatos de problemas, confidências, confusões e intimida-des tem este técnico oficial de contas de Mirandela para contar. É a prova, certamente comum a muitos profis-sionais, de que há mais vida para além
da Contabilidade na relação com os clientes. «Numa cidade pequena, o TOC não trata apenas da contabilida-de. Há uma confiança mútua que ul-trapassa, e muito, tudo isso.»É uma das vantagens, porque tam-bém existem, de viver num meio mais pequeno, longe do bulício das grandes cidades do litoral. «Tenho clientes há mais de 30 anos, estão comigo desde início. Numa cida-de como Mirandela, o cliente e o TOC, por norma, têm uma relação de amizade. Nas grandes cidades as
O mirandês pedagogo e confidente Por Jorge Magalhães
JULHO 2011 35
LUGAR AO TOC
Nome Acácio Augusto
Gonçalves
TOC n.º 1 181
Distrito/R. Autónoma Bragança
Empresa Acácio Augusto
Gonçalves
Localização Mirandela
N.º colaboradores 4
Clientes 85
pessoas, por vezes, nem se conhe-cem.» Outra vantagem: «Não é por aparecer alguém a dizer que lhes faz mais barato que eles vão mudar, porque existem outros valores que não têm preço.»É verão, julho, e no nordeste trans-montano as temperaturas estão con-tidas. Não abusam dos termómetros e não corroboram o velho adágio dos «nove meses de inverno e três de in-ferno.» Acácio Gonçalves está sentado no gabinete do seu escritório, situado numa zona tranquila da cidade. Na sala do lado trabalham os quatro co-laboradores (uma delas é TOC) que o acompanham e labutam pela regula-ridade técnica, contabilística e fiscal
dos 85 clientes (65 com contabilidade organizada; 20 em regime simplifica-do) que compõem o seu portfolio. É aí, entre perguntas e sucessivos fla-shes que inicia uma viagem pelo pas-sado e recorda os primeiros passos, aos 17 anos no mundo contabilístico, quando nos intervalos das aulas ia até ao escritório do seu cunhado para o ajudar nas “escritas”. Foi nessa firma que o contabilista de serviço lhe in-cutiu o gosto pela Contabilidade e foi aí que o seu destino profissional se revelou, apesar de se ter ainda inscri-to na Faculdade de Direito do Porto. Um passo em falso, potenciado pela chamada, em outubro de 1974, para o serviço militar (obrigatório) por onde andaria dois anos. Chegou a estar mo-bilizado para o Ultramar mas acabou por não embarcar, graças «às mani-festações das mães portuguesas.»
Primeiros anos de muito sacrifício
Tempo perdido? Pelo entusiasmo e nostalgia com que fala dessa época, percebe-se que não. «Na tropa fazia sessões de dinamização cultural. Era furriel e com mais quatro gra-duados, andávamos, de aldeia em aldeia, a fazer reuniões com as po-pulações, uma vez que a figura do regedor tinha desaparecido. Percor-remos todas as aldeias dos concelhos de Valpaços e Chaves.»O que era, em meados dos anos 70, em pleno PREC, um militar dina-mizador cultural? «Fazíamos o le-vantamento das necessidades das aldeias. Se conseguíssemos fazer alguma coisa, avançávamos. Por exemplo, em Alturas do Barroso le-vámos água canalizada até à popu-lação. E olhe que foi necessário abrir dois ou três quilómetros de valas…»Terminado o serviço militar, veio o trabalho. Começou numa empre-sa de materiais de construção civil, já como contabilista, «uma espécie
de gerente da firma». Estávamos em 1976 e Acácio Gonçalves por ali ficaria dez anos. Inscreveu-se na Direção-Geral de Contribuições e Impostos mas, simultaneamente, começou «a ter umas escritas» por fora. Foram tempos de «grande sa-crifício», confessa. Fazia as contabi-lidades ao sábado e domingo, com a ajuda da mulher. «Tivemos muitos, mas muitos fins de semana que não saímos à rua. Era a forma de conse-guirmos ganhar mais algum.»Em 1985, Acácio Gonçalves deu o passo decisivo. Saiu da empresa e estabeleceu-se por conta própria. Uma aposta ganha que, contudo, continua a exigir muitas horas de labuta e infindável afinco. «Começo muitas vezes o meu dia de trabalho às 5.30, seis da manhã. Termino por volta das 20 horas. Às vezes, tenho ainda que trabalhar aos sábados.»
A pedagogia do TOC
Feita a retrospetiva, o TOC mirandês concentra-se no presente e nas nuvens negras que divisa no futuro. «Ain-da na semana passada estive a tratar do encerramento de três firmas. Uma das condições para o relançamento da economia é o consumo. Se as pessoas não consomem, os meus clientes não fazem negócio e começam a fechar.» Possuidor de uma carteira ampla e he-terogénea, que abarca diversos ramos de atividade, Acácio Gonçalves come-ça a sentir da parte de alguns clientes dificuldade em pagar a avença. «Há negócios que estão muito parados. Há quem já tenha começado a despedir…»Mas, apesar das dificuldades, Acácio Gonçalves não aceita qualquer um. «Interessam-me clientes que estejam cientes que têm de cumprir as suas obrigações fiscais e que paguem a tem-po e horas. Que me interessa alguém que não paga IVA, IRS ou Segurança Social? Só me vai trazer problemas…»
36 TOC 136
LUGAR AO TOC
Num meio pequeno, as empresas re-fletem essa realidade. Oitenta por cento da sua carteira de clientes são microempresas e nem sempre a aten-ção dada à contabilidade foi a mais indicada. «A mentalidade dos nossos empresários era complicada, tacanha. Pouco ou nada ligavam aos balanços. As novas gerações já estão mais aten-tas. Querem ver os balanços, balance-tes, demonstrações dos resultados…» Uma mudança que se deve também «ao longo trabalho pedagógico fei-to com os clientes. É fundamental sensibilizá-los para a importância da contabilidade e para as informações que ela pode dar e que são essenciais para a sobrevivência da empresa. Isto demora anos e custou-me também al-gumas zangas.»Um trabalho paciente, de altos e bai-xos que, apesar de tudo, não lhe deixa os amargos de boca das «constantes alterações legislativas. É impressio-nante o volume de alterações a que estamos sujeitos», desabafa. «Temos de nos atualizar permanentemente.» Para isso, Acácio Gonçalves conta, de sobremaneira, com a formação que a OTOC disponibiliza. «É, sem dúvida, uma coisa boa, essencial. Termino o ano com 200 ou mais créditos…»
Pontuações e défices
Apesar de reconhecer o «trabalho fantástico» que a Ordem tem desen-volvido, nem tudo o que dela imana o deixa satisfeito. Como bom trans-montano, é frontal: «Gostaria que a Ordem atentasse melhor na pontua-ção. Porquê? Há quem tenha escritó-rios com quatro ou cinco colaborado-res há 20 ou 30 anos e nenhum deles é TOC. Isso dá-lhes uma pontuação muito elevada. Como é que vão fazer? Despedir pessoal para aceitarem um TOC? Abdicar dos clientes? A Ordem deve ter isto em conta e introduzir as alterações necessárias a acautelar
estas situações. Felizmente, não te-nho esse problema, mas conheço em Mirandela vários desses casos. E pelo país fora deve haver muitos mais.»Mas há nuvens bem mais pesadas so-bre o horizonte. É o caso da hipótese que a Europa estuda (?) de simplificar os procedimentos contabilísticos, so-bretudo para as empresas de menor dimensão. «Cerca de 80 por cento do tecido empresarial de Trás-os-Mon-tes são microempresas. Repare bem, não falamos sequer de pequenas em-presas. Se uma ideia dessas avançar, ficamos, pura e simplesmente, sem emprego. Das 85 empresas que tenho, ficaria com dez ou 12.»Apesar destas agruras, Acácio Gon-çalves parece ter a continuidade do negócio assegurada. O filho está a ter-minar a licenciatura que lhe poderá
dar acesso à profissão mas o futuro, não tem dúvidas, será complicado. Basta olhar para as dívidas dos Esta-dos. «Um país é como uma empresa. Qual é o grande problema das em-presas? É chegarem ao fim do ano e apresentarem défice. Se uma empre-sa, sistematicamente, apresenta três ou quatro por cento de défice, ao fim de dez ou 15 anos, tem já uma dívida apreciável. É o que acontece com os países.» Por isso, defende este trans-montano, o caminho é só um: «Os países não deviam ter défice. Não po-dem depender de empréstimos para pagar outros empréstimos. Têm que apresentar saldo positivo. Doutra for-ma, não vão a lado algum. O défice estará, em permanência, a crescer, apesar de todos os sacrifícios que nos pedem.» Alguém duvida?
«Os países não deviam ter défice. Não podem depender de
empréstimos para pagar outros empréstimos. Têm que ter
saldo positivo. Doutra forma, não vão a lado algum.»
MAIO 2011 37
Plano de formação segmentada, eventual, permanente, distância e reuniões livres 2011
FORMAÇÃO
JULHO
Ligação contabilística
com a legislação laboral
Seg1611 | 16 horas | 24 créditos
IVA | Localização das operações
e serviços tributáveis
Seg1711 | 12 horas | 18 créditos
Empresas municipais | Constituição e
obrigações contabilísticas e fiscais
Dis2111 | 12 horas | 18 créditos
NCRF 22 | Contabilização
dos subs. do Governo
e divulgação de apoios do Governo
Dis2211 | 8 horas | 12 créditos
Reunião livre
RL1211 | 2 horas | 3 créditos
Reunião livre
RL1311 | 2/4 horas | 3/6 créditos
SETEMBRO
NCRF 22 | Contabilização dos subsídios
do governo e divulgação de apoios do
Governo
Seg1811 | 8 horas | 12 créditos
POCAL | Plano Oficial de Contabilidade
das Autarquias Locais
Per0111 | 24 horas | 36 créditos
Contencioso tributário
Per0211 | 24 horas | 36 créditos
Ligação contabilística com a legislação
laboral
Dis2311 | 16 horas | 24 créditos
Análise de balanços e estudo de
indicadores económico e financeiros
Dis2411 | 16 horas | 24 créditos
NCRF para as entidades sem fins
lucrativos
Dis2511 | 16 horas | 24 créditos
Código Fiscal de Investimento
Dis2611 | 16 horas | 24 créditos
IVA | Localização das operações
e serviços tributáveis
Dis2711 | 12 horas | 18 créditos
Reunião livre
RL1411 | 2 horas | 3 créditos
Reunião livre
RL1511 | 2/4 horas | 3/6 créditos
OUTUBRO
NCRF para as entidades do sector
não lucrativo
Seg2611 | 16 horas | 24 créditos
NCRF 10 | Custo dos empréstimos
obtidos
Seg2011 | 8 horas | 12 créditos
Contabilidade orçamental na
Administração Pública
Dis2811 | 16 horas | 24 créditos
Estruturação de um quadro de bordo de
apoio à gestão (balanced scorecard)
Dis2911 | 12 horas | 18 créditos
Contencioso tributário
Dis3011 | 24 horas | 36 créditos
POCAL | Plano Oficial de Contabilidade
das Autarquias Locais
Dis3111 | 24 horas | 36 créditos
NCRF 17 | Ativos biológicos - Aspetos
contabilísticos e fiscais
Dis3511 | 16 horas | 24 créditos
NCRF 19 | Contratos de construção
Dis3611 | 16 horas | 24 créditos
Reunião livre
RL1611 | 2 horas | 3 créditos
Reunião livre
RL1711 | 2/4 horas | 3/6 créditos
NOVEMBRO
Código de Insolvência
Seg2111 | 16 horas | 24 créditos
Estruturação de um quadro de bordo de
apoio à gestão (balanced scorecard)
Seg2211 | 12 horas | 18 créditos
Dissolução, liquidação,
fusão e cisões de sociedades
(aspetos contabilísticos e fiscais)
Seg2311 | 16 horas | 24 créditos
NCRF 28 | Benefícios dos empregados
Dis3211 | 8 horas | 12 créditos
Código dos Contratos Públicos
Dis3311 | 12 horas | 18 créditos
Reunião livre
RL1811 | 2 horas | 3 créditos
Reunião livre
RL1911 | 2/4 horas | 3/6 créditos
DEZEMBRO
Reunião livre
RL2011 | 2/4 horas | 3/6 créditos
* Consulte os conteúdos programáticos no sítio da Ordem
38 TOC 136
OPINIÃO
Só dependemos de nós
D esloquei-me recentemente ao Brasil, tendo estado presente em eventos em São Salva-dor da Baía a convite do Centro Regional de
Contabilidade daquele Estado e participado na reu-nião trimestral do CILEA, onde desempenho uma das vice-presidências daquela organização.Para além de Portugal, estavam ainda representan-tes do país anfitrião, bem como de Espanha, Argen-tina, Chile, Bolívia, Colômbia, França e Itália.Os temas em debate foram diversos: a influência da fiscalidade na contabilidade, as normas interna-cionais de contabilidade para as pequenas e médias empresas e a utilização dos meios de comunicação na informação contabilística.Nos debates que atingiram um nível de grande qualidade, Portugal interveio em todos os painéis. O evento permitiu, em diversos domínios, conhe-cer a situação vivida em cada país, bem como com-parar o estado da profissão em Portugal com outras realidades.Uma vez mais, tivemos o grato prazer de confirmar que a profissão no nosso país tem um fio condutor, um rumo e uma orientação que a coloca, em termos de dinâmica, na vanguarda, muito embora haja di-ferenciações significativas de atitude e responsabi-lidade dos profissionais.Um aspeto ficou claro para os participantes: é ne-cessário uma nova visão para a profissão, no sentido de que ela corresponda efetivamente às necessida-des específicas do tecido empresarial de cada país, numa perspetiva não apenas de elaborar a conta-bilidade, mas também a sua reconversão em mais--valias para as empresas e empresários.Essa tem sido, desde há muito tempo, a nossa conce-ção profissional em Portugal, exigindo, no entanto, uma mudança radical na forma como muitos técni-cos oficiais de contas veem e exercem a sua atividade.
Tenho-o dito, vezes sem conta, que a construção e a credibilidade é algo que não se decreta nem se conquista, constrói-se todos os dias com o trabalho, atitude e dedicação dos TOC no consolidar de uma profissão melhor.Provavelmente, não será para os meus dias, já que a mudança de mentalidades é, por vezes, um proces-so que se estende por gerações, mas tenho uma fé e uma convicção profundas que num futuro não mui-to distante teremos uma profissão muito diferente da que hoje existe.
Temos tido bons e estimulantes exemplos que me levam a cimentar esta minha crença, restando ape-nas solicitar que nunca se desista desse objetivo, pois ele é o único caminho capaz de nos conduzir a um porto seguro.Só uma profissão assente em valores deontológi-cos, qualitativos e de responsabilidade será capaz de singrar neste complexo, íngreme e, por vezes, violento processo de crescimento pelo qual teremos obrigatoriamente de passar.A indiferença, nalguns casos até provocação, como por vezes os profissionais têm sido tratados pelo poder político – numa primeira análise os que mais têm a beneficiar com uma profissão altamente res-ponsável; a tradicional, diria quase endémica, pro-
Só uma profissão assente em valores
deontológicos, qualitativos e de
responsabilidade será capaz de singrar
neste complexo, íngreme e, por vezes,
violento processo de crescimento
A. Domingues de Azevedo
JULHO 2011 39
OPINIÃO
pensão dos TOC para se dividirem em correntes ou tendências, fazendo da profissão uma espécie de “quintinha” a que cada um se candidata para a orientar a seu bel-prazer; a forma como se visiona a profissão antevendo-se facilidades no que é bem difícil de gerir; a venda de conceitos facilitistas, num processo onde tem que imperar o rigor, não são indicadores capazes de animar os espíritos. Só o tempo e a perseverança serão preciosas ajudas para quem venha a assumir a responsabilidade de con-duzir esta profissão.Mas esta luta não pode ser, apenas, de um homem ou mulher. Os líderes têm que ir à frente, indicando o rumo por onde se deve caminhar.Nesse percurso alguns ficam para trás, procedi-mentos, atitudes e pensamentos têm que se modi-ficar, pois a vida é inexorável e os mais fracos ou se preparam antecipadamente ou não aguentarão o ritmo.Não julguem que os problemas que vivemos são ex-clusivos dos portugueses. Eles são comuns a muitos outros países e a credibilidade que em vários deles
hoje a profissão goza é algo que ninguém lhes deu, mas que todos, a pulso, tiveram que conquistar.Em Portugal, por exemplo, levantam-se por vezes vozes manifestando-se contra o artigo 24.º da LGT ou 8.º do RGIT. No Brasil, quando se prova que as contraordenações têm por base comportamentos ir-regulares dos profissionais, as multas emitidas são por eles pagas e não pelos sujeitos passivos.Nos termos do Código Civil brasileiro, quando a in-formação contabilística é adulterada pelos “conta-dores”, estes profissionais podem ser responsabili-zados pelo pagamento das dívidas aos credores da empresa, com base no erro cometido. Então, compreenderemos melhor quando afirmo que ninguém dá nada a ninguém. Tudo aquilo que temos e ambicionamos, teremos que ser nós mesmos a conquistar.É nessa conquista, nessa satisfação do dever cum-prido que se exorta os profissionais a dependerem de si mesmos, pois conforme diz o nosso povo «quem boa cama fizer, nela se deitará.»Em nome de um futuro melhor.
40 TOC 136
GABINETE DE ESTUDOS
A nova proposta de diretiva sobre a matéria coletável
consolidada comum em sede de imposto sobre as sociedades
Em 2001, num importante estudo da Comissão sobre a fiscalidade direta das em-
presas no mercado interno - SEC (2001) 1681-, que se propunha sa-lientar as diferenças entre os níveis efetivos de tributação das empre-sas e identificar as medidas fiscais que poderiam prejudicar as ativi-dades económicas transfronteiras no mercado interno, surge, pela primeira vez, de forma consis-tente, a ideia da necessidade de se criar, no plano europeu, uma Ma-téria Coletável Comum Consolida-da do Imposto sobre as Sociedades (MCCC), dirigida, sobretudo, para as atividades das empresas que operam na União Europeia (UE). De facto, da existência, nesta ma-
téria, de 27 sistemas fiscais distin-tos no quadro do mercado interno hoje em dia decorreriam diversas consequências, entre as quais as seguintes:- A obrigatoriedade das empresas atribuírem os lucros a cada juris-dição na base do princípio da livre concorrência (arm’s length), com contabilidades separadas (transa-ção por transação), decorrente da disciplina dos preços de transfe-rência (art. 9.º da Convenção Mo-delo da OCDE), considerada por muitos operadores económicos como o maior obstáculo ao merca-do interno;- A relutância dos Estados mem-bros (EM) em permitirem a dedu-ção das perdas ocorridas em em-presas associadas quando os lucros não estejam sujeitos às regras de incidência desse mesmo EM;- A possibilidade das reorganiza-ções transfronteiras originarem a tributação de mais-valias ou de duplas tributações;- A provável existência de situa-
ções de dupla tributação decorren-tes de conflitos de direitos de tri-butação entre os EM.Tudo isto, a que acrescem outros fatores (regras distintas de de-terminação da material coletável e de cobrança, desconformidade entre os acordos de dupla tribu-tação, relativa ineficácia das di-retivas «mães e filhas», «fusões e cisões» e «juros e royalties»), im-plicaria um acréscimo de custos de cumprimento para as empresas e uma diminuição da sua eficiência e competitividade, nomeadamen-te perante as empresas japonesas e americanas. De facto, a existência de 27 siste-mas fiscais distintos afeta as de-cisões de investimento relativa-mente ao lugar, ao tipo e à fonte de financiamento e não garante uma eficiente alocação de recursos, em contradição, aliás, com o dispos-to no art.º 2.º do Tratado da União Europeia (TUE). Além disso, os EM, para protegerem as suas bases tributárias, introduzem frequen-
Em março último a Comissão apresentou, finalmente, uma proposta, mas subsistem muitas dúvidas e a oposição de alguns Estados. O "esqueleto", de qualquer forma, parece estar montado.
Artigo recebido
em junho de 2011
Por António Carlos
dos Santos *
JULHO 2011 41
GABINETE DE ESTUDOS
temente dispositivos, como certas medidas antiabuso, que violam as liberdades económicas fundamen-tais definidas no TUE. Os Serviços da Comissão sempre defenderam que um dos principais obstáculos à atividade económi-ca transfronteiras era a ausência de total consolidação (de ganhos e perdas) das empresas no terri-tório da UE. Tal facto favorecia os investimentos domésticos em des-favor dos investimentos em outros EM, favorecia os investimentos nos EM de maior dimensão, as grandes empresas em comparação com as pequenas e influenciava a opção entre um estabelecimento estável e uma subsidiária. A solução para este estado de coisas implicava, segundo a Comissão, que as empresas de um grupo pu-dessem calcular o seu rendimento de acordo com um único conjunto de regras e que fossem estabeleci-das contas consolidadas para fins fiscais, com eliminação dos efeitos potenciais da tributação das tran-
sações internas efetuadas dentro do grupo. De fora ficaria a fixa-ção das taxas que permaneceria no espaço de soberania dos EM. Para já, o importante seria criar uma MCCC para a tributação das atividades económicas no quadro da UE e desenvolver um meca-nismo de repartição ou imputação apropriado dessa MCCC a aprovar pelos EM.
A proposta de março
Após intenso trabalho realizado por um grupo de natureza con-sultiva com vários subgrupos téc-nicos, a Comissão anunciou para 2008 uma proposta de diretiva sobre a MCCC, com as seguintes características: uma base har-monizada alargada de tributação,
com consolidação e mecanismo de repartição, em que a definição das taxas permanecia no plano esta-dual; um regime opcional para as empresas (mas obrigatório para os EM), uma administração do im-posto centrada no princípio já co-nhecido do IVA do balcão único (one-stop shop) e a criação de um procedimento de comitologia para o exercício de poderes de aplicação pela Comissão. Essa proposta im-plicaria, nomeadamente, a deter-minação do rendimento tributável relativamente a cada membro do grupo, a determinação do rendi-mento do grupo (consolidação) e a imputação aos EM do rendimento assim determinado. Por outro lado, ela deveria orientar-se por um conjunto de princípios gerais de
Acabam eventuais retenções na fonte nas relações
intraeuropeias no seio do grupo, eventuais custos tributários
de reestruturação de empresas e quaisquer formas de
tributação à saída das fronteiras
42 TOC 136
GABINETE DE ESTUDOS
tributação (capacidade contributi-va, igualdade, certeza e segurança, simplicidade, neutralidade), cuja concretização e articulação, po-rém, nem sempre seriam fáceis. Em 16 de março de 2011, a Comis-são apresentou finalmente a sua proposta de diretiva. Segundo a exposição de motivos ela contém «um sistema de regras comuns para calcular a matéria coletável das sociedades com re-sidência fiscal na UE e das sucur-sais situadas na UE de sociedades de países terceiros.» Este «quadro fiscal comum prevê regras para o cálculo dos resultados fiscais a tí-tulo individual de cada socieda-de (ou sucursal), a consolidação desses resultados quando existi-rem outros membros do grupo e a repartição da matéria coletável consolidada por cada Estado mem-bro elegível.» Acabam eventuais retenções na fonte nas relações intraeuropeias no seio do grupo, eventuais custos tributários de re-estruturação de empresas e quais-quer formas de tributação à saída das fronteiras (exit tax). Visa-se, deste modo, evitar fenó-menos de sobretributação e de du-pla tributação, tal como decorre de um princípio de neutralidade, diminuir os encargos administrati-vos e os custos de cumprimento das obrigações fiscais pelas empresas.
Harmonização parcial
Estamos perante uma proposta de harmonização fiscal, cuja base jurídica é o artigo 115.º do TFUE, mas de uma harmonização par-cial que não interfere com a defi-nição de taxas nem com as contas financeiras das empresas. Os EM mantêm pois o poder de definir as taxas, salvaguardando-se um espaço de concorrência fiscal e de
definição do nível de receita de imposto sobre as sociedades para financiarem as despesas públicas, bem como as suas próprias regras contabilísticas. Esta proposta de diretiva integra--se na Estratégia Europa 2020, para um crescimento inteligente, sustentável e inclusivo, visando incentivar o crescimento e o em-prego bem como a investigação e o desenvolvimento. Por isso, todas as despesas referentes a I&D são dedutíveis. Prevê-se que ela seja complementada por uma propos-ta relativa ao regime da Sociedade Privada Europeia.A proposta é extensa e complexa, contendo 136 artigos e estando di-vidida em 18 capítulos relativos ao âmbito de aplicação, aos conceitos fundamentais, à opção pelo siste-ma, ao cálculo da matéria coletável, aos prazos e quantificação, à depre-ciação dos ativos fixos, às perdas, às disposições relativas à entrada e à saída do sistema, à consolidação, à entrada e saída do grupo, à reor-ganização empresarial, às relações entre o grupo e outras entidades, às transações entre empresas asso-ciadas, às regras antiabuso, às en-tidades transparentes, à repartição da matéria coletável consolidada, à administração e procedimentos e às disposições finais. A proposta de diretiva estabelece um sistema de regras comuns para o cálculo da matéria coletável das
sociedades com residência fiscal na UE e das sucursais de sociedades de países terceiros situadas na União.A material coletável é calculada com base nos réditos (proventos das vendas e transações) líquidos, subtraindo-se os réditos isentos, os encargos dedutíveis (todos os custos de vendas e despesas, líqui-dos de IVA dedutível, incorridos pelo contribuinte para obter ou ga-rantir o rendimento) e outros ele-mentos dedutíveis (como uma de-dução proporcional relativamente à depreciação dos ativos fixos). Os réditos, encargos e elementos dedutíveis deverão ser, em regra, contabilizados no âmbito do exer-cício fiscal em que foram gerados ou incorridos. Os défices não poderão ser objeto de reporte para trás, mas em con-trapartida poderão ser indefinida-mente reportados para os exercí-cios seguintes (ao contrário do que dispõe o memorando da troika que limita esse benefício a três anos).A proposta reconhece, no seu con-siderando n.º 6, que «a consolida-ção é um elemento essencial» da proposta pois ela é «a única forma de combater os principais obstácu-los fiscais com que se deparam as sociedades da União», ao permi-tir «eliminar as formalidades dos preços de transferência e a dupla tributação intragrupo.» Acresce que «as perdas incorridas pelos contribuintes são automatica-
Não há prazo previsto para a sua eventual entrada em vigor.
Nem admira que tal aconteça: este prazo deverá ser longo,
dada a importância da matéria e a resistência de alguns EM
(como o Reino Unido e a Irlanda.)
JULHO 2011 43
GABINETE DE ESTUDOS
mente compensadas com os lucros gerados por outros membros do mesmo grupo.» Os lucros e per-das apenas serão considerados no caso da sua efetiva concretização. Recorde-se, a propósito, que em Portugal não existe hoje um regi-me geral de tributação pelo lucro consolidado. A proposta contém ainda a exis-tência de regras para a distribui-ção de resultados entre os EM onde as empresas do grupo estejam es-tabelecidas, bem como a existên-cia de um balcão único inspirado na experiência do IVA, de forma a que os problemas fiscais e as obri-gações acessórias sejam tratados junto de uma única administração tributária.
Dois regimes distintos?
O regime da MCCC é, porém, op-cional para as empresas. A pro-posta não impõe este regime às empresas que não pretendam expandir-se para fora do territó-rio nacional em que operam. Isto significa que cada EM pode estar confrontado com a aplicação de dois regimes distintos, o nacional e o europeu.A sociedade principal exerce a opção pela MCCC em nome dos membros elegíveis para o grupo, sendo essa uma decisão de «tudo ou nada»: uma vez exercida a op-ção pela tributação do grupo não é possível deixar de fora uma sub-sidiária elegível. A partir de então essa empresa (designada por con-tribuinte) deixa de estar sujeita às regras nacionais relativas ao IRC em tudo que seja regido por normas comuns. Apenas se excluem as em-presas em insolvência ou processos de liquidação e as que se dediquem ao shipping e estejam sujeitas a im-posto sob a tonelagem.
Entre nós são elegíveis, quanto à forma, as sociedades comerciais ou civis sob forma comercial, coope-rativas e empresas públicas cons-tituídas de acordo com o direito português e sujeitas a IRC. Para se optar pela consolidação fis-cal – de 100 por cento - é necessá-rio definir o que, para este efeito, se entende por grupo, isto é, importa delimitar as fronteiras ou o perí-metro do grupo.Como se sabe, não existe um con-ceito uniforme de grupo, mesmo em sede fiscal, entre os EM. Entre nós, o conceito de grupo está pre-visto no Título VI do Código das Sociedades Comerciais («socieda-des coligadas») e também no CIRC (artigos 69.º a 71.º) a propósito do regime especial de tributação dos grupos de sociedades. No plano da UE, encontramos dis-tintos conceitos de grupo pois esta-mos perante um conceito funcional, construído em função dos proble-mas que visa resolver. Assim, temos o conceito de grupo para efeito das diretivas «mães e filhas» e «juros e royalties», o conceito do artigo 11.º da Diretiva de Consolidação do IVA de 2006, não utilizado por Portugal, e o conceito de grupo no quadro da IAS (NIC n.º 27.º ).Desde os trabalhos preparatórios tornava-se claro que o conceito de grupo deveria ser construído tendo em conta critérios que simbolizas-sem uma forte integração econó-mica e empresarial. Esses critérios, agora recebidos na proposta, eram os do controlo, da propriedade e do direito aos lucros.
A consolidação no grupo
A consolidação estende-se à maté-ria coletável de todas as entidades elegíveis para o grupo, estabeleci-mentos estáveis (EE) ou subsidiá-
rias, sendo obrigatória para quem optou pelo sistema da MCCC. A participação no grupo (e, con-sequentemente, a consolidação) é determinada de acordo com os critérios do controlo e da proprie-dade que visam garantir um alto grau de integração económica. O primeiro exige que a sociedade--mãe seja titular, em relação às so-ciedades filiais elegíveis, imediatas ou subfiliais, do direito de exercer mais de 50 por cento dos votos da sociedade controlada. O segundo que a sociedade-mãe possua mais de 75 por cento do capital ou mais de 75 por cento dos direitos à dis-tribuição dos lucros. Um contribuinte «residente» for-ma um grupo com todos os seus EE situados noutros EM, com todos os EE situados num EM das suas filiais elegíveis residentes num Estado terceiro, com todas as suas filiais elegíveis residentes num ou mais EM, com outros contribuintes re-sidentes que sejam filiais da mes-ma sociedade, residente num país terceiro e que preencha as condi-ções formais necessárias (ou seja, quanto a Portugal, que adopte uma forma semelhante às sociedades comerciais ou civis sob a forma co-mercial, cooperativas e empresas públicas).Para definir o perímetro do grupo (e, consequentemente, da consolidação) no caso das subfiliais (filiais media-tas) aplicam-se as seguintes regras:- Quando a sociedade-mãe atinja o limite máximo relativa aos di-reitos de voto respeitantes às filiais imediatas e subfiliais (isto é, 51 por cento), presume-se que a socieda-de-mãe detém 100 por cento desses direitos;- O direito a lucros e a propriedade do capital calculam-se multipli-cando as participações detidas pe-
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GABINETE DE ESTUDOS
las filiais intermédias em cada ní-vel. Devem ser tidos em conta neste cálculo os direitos de propriedade que correspondam a 75 por cento ou menos, direta ou indiretamente detidos pela sociedade, incluindo os direitos da sociedade residente num Estado terceiro. Exemplificando: se a titularidade da sociedade-mãe "A" em relação à filial "B" a titularidade (direta e indireta) dos direitos de voto é direta (A->B): - 75 por cento dos direitos de voto ou mais, contaria como 100 por cento (sem necessidade de compensação dos acionistas minoritários);- 50 por cento ou menos, contaria como 0 (podendo pôr-se a questão de saber se os direitos dos acionis-tas minoritários ficariam suficien-temente protegidos).Se a titularidade de "A" em relação a "B" é indireta, por ser efetuada através de "B" e "C" (A->B->C->D), multiplicam-se as percentagens devotos detidas pelos participantes intermédios na cadeia de integra-ção. Assim, se A->100 por cento B –> 80 por cento C->80 por cento D, A detém 64 por cento de D (80x80), abaixo dos 75 por cento exigidos. Exige-se, no entanto, que os li-miares de 50 por cento e de 75 por cento acima referidos sejam observados ao longo do exercício fiscal, sob pena da sociedade em falta ter que abandonar o grupo. Além disso, deve esta sociedade pertencer ao grupo por um perí-odo mínimo de nove meses. Es-tes poderão resultar do somatório dos meses em anos civis diferen-tes (por exemplo, cinco meses em 2011 e quatro em 2012).
Proposta com um futuro incerto
Qual será o futuro desta proposta?É incerto, pois há problemas técni-cos e políticos a resolver.
Há certamente aspetos técnicos insuficientemente densificados ou clarificados na proposta de dire-tiva (como o conceito de estabe-lecimento estável). Há áreas não especificamente cobertas (a rela-ção do regime com os acordos de dupla tributação). Há soluções que são, por certo, discutíveis (assim, por exemplo, a existência de duplo limite de participação -75 por cen-to e 50 por cento - que complica a noção de grupo). Mas há que reco-nhecer que são aspetos suscetíveis de melhoria e que houve um gran-de esforço de apresentar uma so-lução para problemas importantes com uma certa coerência.Por isso, o destino da proposta de-penderá de questões de natureza política, em particular do futuro da área do euro e da própria União Europeia e este, por razões que não compete aqui analisar, não se pre-vê fácil.Não há prazo previsto para a sua eventual entrada em vigor. Nem admira que tal aconteça: este pra-zo deverá ser longo, dada a impor-tância da matéria e a resistência de alguns EM (como o Reino Uni-do e a Irlanda, entre outros) rela-tivamente a certas componentes da proposta (nomeadamente, a compensação de lucros e perdas e o mecanismo de imputação de receitas a EM). A fragilidade po-lítica e financeira de alguns EM, derivada da atual crise das dívidas soberanas, talvez venha a tornar a sua oposição à proposta de diretiva menos sustentável. Neste contexto, uma possibilidade será a sua aprovação em duas fases, na primeira eliminando-se os pon-tos em que pode existir maior de-sacordo (embora com clara dimi-nuição da importância da diretiva) ou, como ocorre frequentemente,
concedendo-se aos EM opositores certas derrogações ou prazos mais alargados para a adoção do regime. Outra será a sua aprovação, mesmo que não se verifique a unanimi-dade requerida para a decisão no Conselho, ao abrigo da cooperação reforçada, bastando para tal a sua adoção por nove EM (artigos do 20.º do Tratado da União Europeia e 326.º a 334.º do Tratado de Fun-cionamento da União Europeia). Teríamos, então, mais um domínio em que a construção europeia se-ria efetuada a duas velocidades.Uma coisa é certa: a pura e sim-ples rejeição da diretiva deixará tudo na mesma, sem resolução dos obstáculos (reais) que ela se propõe analisar. O grande debate nacional que a proposta merece só agora come-çou. A proposta beneficia ou não as empresas portuguesas? Traz ao Estado português problemas gra-ves na arrecadação de receitas? Alarga ou diminui o espaço do planeamento fiscal não desejável? Eis questões que devem ser ana-lisadas com cuidado, em diálogo entre o poder político e a admi-nistração tributária com o tecido empresarial, com a concertação social e os parceiros sociais, com as universidades e com os centros de investigação. As questões em jogo são demasia-do importantes para serem dei-xadas exclusivamente a decisões unilaterais.
* Professor da UAL
Membro do GEOTOC e do IDEFF
Jurisconsulto
Este texto tem por base uma conferência
organizada em Lisboa
pela consultora Ernst & Young,
em 18 de maio de 2011
46 TOC 136
CONTABILIDADE
Regime de exigibilidade numa base de caixa
A 1 de abril de 2009 foi pu-blicada a Lei n.º 15/2009, que vem estabelecer um
regime especial em termos de IVA para os sujeitos passivos que exer-çam a atividade de transporte ro-doviário nacional de mercadorias. Esta lei já tinha sido anunciada em 2008, tendo vindo a ser exigi-da pelos agentes deste setor, assim como pelas suas associações re-presentativas.Esta sondagem foi efetuada com o objetivo de apurar se este regime optativo tem vindo a ser colocado em prática, e se tem vindo a ser bem aceite pelos sujeitos passivos desta atividade.
Apesar da enorme reivindicação, este trabalho mostra-lhe, com base numa sondagem a empresas nacionais de transporte rodoviário de mercadorias, que a Lei n.º 15/2009
não foi bem aceite pelas empresas do setor.
Metodologia do inquérito
Foi utilizada uma aplicação infor-mática onde foi adicionado o inqué-rito. Esta aplicação funciona num site onde foi criada uma conta de utiliza-dor para o efeito. Esta aplicação per-mite adicionar endereços de e-mail, de forma a enviar o inquérito que será disponibilizado para o utilizador através de um link. Assim que o in-quérito seja terminado, as respostas ficam armazenadas no site em causa.De acordo com o Instituto de Mobili-dade e dos Transportes Terrestres, o total de empresas no ramo do trans-porte rodoviário de mercadorias, em junho de 2009, era de 8 804, sendo esse o total a considerar em termos de população, não sendo, no entan-to, possível determinar se todas estas empresas praticam somente o trans-porte rodoviário nacional.Em termos de amostra foram selecio-nadas 281 empresas, através da reco-lha de endereços em diversas páginas na Internet.
A percentagem de respostas obti-das foi de 38 por cento, sendo que os motivos poderão ser os seguintes: - Endereços de e-mail inativos ou desatualizados;- Pouca disponibilidade dos fun-cionários desta área, que laboram num ritmo muito acelerado;- Caixas do correio eletrónico que reencaminham mensagem para spam ou lixeira, não mostrando a mensagem claramente;- Utilizadores com receio de que a mensagem pudesse ser um vírus.Foi possível obter estas informa-ções pois, dada a dificuldade na recolha de respostas, foram efe-tuados aproximadamente 80 te-lefonemas, pedindo a colaboração dos inquiridos e confirmação de endereços.
Breve análise
aos elementos da amostra
A amostra utilizada para a reali-zação deste estudo foi aleatória e
Artigo recebido
em maio de 2011
Por Sónia Ferreira*
JULHO 2011 47
CONTABILIDADE
0
10
20
30
40
50
60
IlhasSulCentroNorte
25
57
21
3
Figura 1: Inquiridos por zona geográfica
Qual o montante de proveitos obtidos em 2009?
45
33
17
9
2
0
10
20
30
40
50
Figura 2: Inquiridos por volume de proveitos
< 2 000 000€
2 000 000€ - 10 000 000€
10 000 000€ - 50 000 000€
50 000 000€ - 100 000 000€
> 100 000 000€
103
3
106
175
0
50
100
150
200
Semresposta
TotalNãoSim
Efetuam transporte rodoviário nacional?
Figura 3: Quantidade de empresas de transporte rodoviário nacional de mercadorias
constituída por 281 empresas do ramo de atividade do transpor-te rodoviário de mercadorias, que exercem a sua atividade em terri-tório nacional.Numa primeira análise dos ele-mentos recolhidos, foram inquiri-das 25 empresas da zona Norte, 57 da zona Centro, 21 da zona Sul e 3 das Ilhas, conforme pode ser veri-ficado na figura 1. Em termos percentuais, a zona Centro é a zona geográfica com maior representatividade, com 53,8 por cento, de seguida a zona Norte, com 23,6 por cento, sendo que a zona Sul está pouco abai-xo com 19,8 por cento e, com me-nos representatividade, as ilhas, com 2,8 por cento. Uma justifica-ção para a fraca representação das ilhas poderá dever-se à sua zona geográfica, que não é tão propícia ao desenvolvimento económico e à própria criação ou deslocalização de empresas.O volume de proveitos obtidos é uma questão importante para ana-lisarmos o tipo de empresas em causa. As entidades inquiridas fo-ram maioritariamente pequenas empresas, 43 por cento, na medida em que o volume de proveitos obti-do em 2009 foi inferior a dois mi-lhões de euros, conforme poderá ser verificado na figura 2.
Análise dos dados obtidos
A questão a ser tratada, em pri-meiro lugar, é questionar acerca da atividade exercida das empresas
inquiridas. Este ponto é essencial, pois terá sempre de ser tido em conta que são cumpridos os requi-sitos indicados na Lei n.º 15/2009.Assim, é possível visualizar na figura 3 que, dos inquiridos que responderam ao inquérito, apenas três não efetuavam transporte ro-doviário nacional de mercadorias, visto que se dedicavam totalmente ao transporte internacional.Das empresas inquiridas, 97,2 por cento prestavam serviços de transporte rodoviário de merca-dorias em território nacional. É um fator importante a ter em con-ta, na medida em que o regime de exigibilidade aprovado pela Lei n.º 15/2009 só pode ser aplicado para esta atividade prestada em territó-rio nacional.Para termos noção do tipo de em-presas que representam a amostra, é fundamental saber se a prestação de serviços de transporte rodoviá-rio é efetuado a título principal ou não. Das empresas inquiridas, a maioria efetua principalmente esta atividade, sendo que apenas 17 por cento efetuam a atividade, mas de forma secundária. Esta questão de ter ou não o co-nhecimento da lei, contribui para apurarmos se as empresas desco-nheciam que tinham a hipótese de aderir a este regime, sendo que tal poderia ter influenciado a sua opção ou não. É visível que apro-ximadamente 90 por cento das empresas tinha conhecimento da lei, sendo que na figura 6 pode ser
É visível o descontentamento das empresas com este regime,
pois a maioria depreende que não traz valor acrescentado.
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CONTABILIDADE
Sim89,6%
Não10,4%
2,8%
Semresposta
Comresposta
NãoSim
97,2%
verificado que 83 por cento não optaram, enquanto 17 por cen-to optaram pelo regime em 2009, sendo que quem não optou em 2009 também não o fez em 2010. Assim, o fator desconhecimento da lei não foi significativo para a sua não opção.É visível que a maioria das empre-sas, resolveram não optar por este regime, sendo que foi efetuada outra questão de forma a apurar o quão vantajoso foi a aprovação deste regime, conforme poderá ser verificado na figura 8. Quanto às empresas que exerce-ram o direito de opção, em 2009, foram 18, sendo que a sua locali-zação geográfica é mais signifi-cativa nas empresas situadas na zona Centro do nosso país.Após a análise da figura 7, pode afirmar-se que as empresas que optaram por este regime são pe-quenas empresas, na medida em
que a maioria efetuou faturação inferior a dois milhões de euros. A definição de pequena e média empresa (PME) está determinada no Dec.-Lei n.º 372/2007, de 6 de novembro. Foi no art.º 2.º que ficou estabelecido que estas empresas são definidas de acordo com os se-guintes critérios:- A categoria das micro, pequenas e médias empresas (PME) é cons-tituída por empresas que empre-gam menos de 250 pessoas e cujo volume de negócios anual não ex-cede 50 milhões de euros ou cujo balanço total anual não excede 43 milhões de euros.- Na categoria das PME, uma pe-quena empresa é definida como uma empresa que emprega menos de 50 pessoas e cujo volume de ne-gócios anual ou balanço total anual não excede 10 milhões de euros.- Na categoria das PME, uma mi-croempresa é definida como uma
empresa que emprega menos de dez pessoas e cujo volume de ne-gócios anual ou balanço total anual não excede dois milhões de euros.Era ainda essencial ter acesso ao número de empregados para en-quadrar corretamente estas em-presas, mas dado não ser possível, não se especificou o seu tipo dentro da categoria das PME.No que respeita à vantagem em ter-mos de regime, as empresas inqui-ridas assinalaram essencialmente como nada vantajoso, 52 por cento, conforme poderá ser verificado na figura nº 8.É visível o descontentamento das empresas com este regime, pois a maioria depreende que não traz valor acrescentado. Este regime foi tão reivindicado pe-las empresas e agora de nada serve? Afinal o que não está a resultar?É importante analisar os motivos para tal, sendo que foi efetuada
Figura 5: Análise aos inquiridos com conhecimento da Lei n.º 15/2009
Têm conhecimento da Lei n.º15/2009?
Figura 4: Percentagem de empresas de transporte rodoviário nacional de mercadorias
37,7%
62,3%
JULHO 2011 49
CONTABILIDADE
Nada52%
Pouco27%
Razoável15%
2%
4%
0
20
40
60
80
100
0
20102009Não
2
0
8814
Figura 8: Análise em termos de vantagem do regime percentual
Figura 7: Faturação em 2009 das empresas que optaram pelo regime
Figura 6: Análise em termos de opção pelo regime de exigibilidade
Opção pelo regime de exigibilidade? Qual o montante de faturação de acordo com o regime de exigibilidade?
Quão vantajoso é o regime?
uma pergunta aberta, de modo a apurar as causas para este cenário desastroso.Das desvantagens apresentadas, as mencionadas em maior número foram: o acréscimo de burocracia e controlo, aumento dos custos relacionados com todas estas al-terações e o facto dos programas informáticos não estarem devida-mente preparados. Uma das desvantagens menciona-da maioritariamente foi a pressão por parte dos clientes para que os seus fornecedores não aderissem a este regime, pois teriam difi-culdades em cumprir os prazos de pagamento acordados. Os motivos apresentados que indi-ciam o regime como vantajoso são:Beneficia a tesouraria e facilita todo o processo de cobranças;Permite a entrega do imposto ao Estado aquando do recebimento efetivo da fatura.
Após a apresentação de tantos efei-tos negativos, é visível o descon-tentamento no setor. A maioria dos inquiridos que indicam o regime como vantajoso, apenas menciona a questão de entrega do impos-to quando realmente já o recebeu, mas a maioria revela que os prazos de pagamento estabelecidos são impraticáveis, o que dificulta todo este processo. Existe uma ressal-va na lei que permite a utilização de um prazo para além de 30 dias, quando estabelecido contratual-mente. A questão é que, mesmo es-tabelecidos 60 ou 90 dias, mesmo esses prazos, na realidade, não são cumpridos. Tudo passa pelo cum-primento dos prazos mas, numa época de crise como a que estamos a atravessar, é difícil para as em-presas cumprir os prazos de paga-mento, pois os seus clientes tam-bém não pagam dentro do prazo e acontece o efeito bola de neve.
Conclusões
Apesar da enorme reivindicação por um regime de exigibilidade de caixa, após a análise dos resultados obtidos, é possível concluir que o regime não foi bem aceite pelas em-presas do setor, sendo visível que nem todos partilhavam do mesmo descontentamento no momento de reivindicar por este regime.Assim, é possível concluir que a criação deste regime não foi de en-contro às expectativas das organi-zações deste setor, sendo que não teve grande aplicação prática.Não obstante, foi publicado no «Diário da República» a 30 de ju-lho de 2010, uma recomendação efetuada ao Governo (n.º 82/2010) pela Assembleia da República, para que se criasse um regime de exi-gibilidade de caixa, simplificado e facultativo, com aplicação às mi-croempresas, que não beneficiem de isenção de imposto.
Optaram?
Freq
uênc
ia
Freq
uênc
ia
1
18
1
Muitovantajoso
Vantajoso
< 2 000 000€2 000 000€ - 10 000 000€10 000 000€ - 50 000 000€50 000 000€ - 100 000 000€> 100 000 000€
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CONTABILIDADE
Esta recomendação tem por base o n.º 5 do art.º 166.º da Constituição da República, sendo que pretende ainda que este regime tenha ape-nas em conta a data de pagamen-to das despesas a montante e das operações efetuadas pelo sujeito passivo a jusante, para determi-nação do imposto a entregar ao Estado, com o objetivo de exer-cer uma vantagem em termos de tesouraria. Pretende-se que este regime seja disponibilizado ape-nas para as microempresas (e não PME, conforme referido pelo mo-vimento «IVA com recibo»), de-vendo obedecer a determinadas normas:- O IVA apenas se torna exigível no momento do efetivo recebimento;- O IVA apenas se torna dedutível no momento do efetivo pagamento;- Apenas possam ficar abrangidos pelo regime, sujeitos passivos que não tenham um volume de negó-cio anual superior a dois milhões de euros (microempresas de acor-do com o Dec.-Lei n.º 372/2007, de 6 de novembro).É desta forma que se caminha, lentamente, para a criação de um regime numa base de caixa apro-priado para as microempresas. É uma realidade que regimes seme-lhantes têm vindo a ser adotados em outros países da UE, mas será que pelo facto de ser optativo terá o mesmo fim que o regime para a
atividade de transporte rodoviá-rio nacional de mercadorias? Do meu ponto de vista, seria razoável pensar que o legislador não estava a perder o seu tempo, sendo que deveriam ser definidas estratégias tendo em conta o contexto práti-co. Deveria existir um período de adaptação, de forma a serem pre-parados meios, como os sistemas informáticos, consciencializar o meio empresarial a não pressionar no sentido inverso, para que não se limitem a contestar sem apre-sentar soluções apropriadas. Para ser possível a adoção de um regime generalizado, em termos de exigibilidade de IVA, para as PME seria necessário, em primeiro lugar, obter uma aprovação da UE, dado ser um imposto de caráter comunitário e a legislação comu-nitária prevalecer face à nacional. No art.º 27.º da Sexta Diretiva, Di-retiva 77/388/CEE, de 17 de maio de 1977, já era evidenciada a opção dos Estados membros introduzi-rem medidas especiais derroga-tórias desta diretiva, de forma a simplificar a cobrança do imposto ou evitar fraudes ou evasões fis-cais. Contudo, essas medidas não devem influenciar significativa-mente o montante de imposto de-vido no estádio de consumo final. Esta diretiva foi reformulada e re-vogada pela Diretiva 2006/112/CE, de 28 de novembro de 2006, pas-
sando esta temática a figurar no art.º 365.º.De acordo com a Diretiva 2010/45//UE do Conselho, de 13 de julho de 2010, que altera a Sexta Diretiva do Conselho, de 28 de novembro de 2006, permite a introdução de um regime facultativo numa base de caixa, tendo como objetivo me-lhorar as dificuldades das peque-nas e médias empresas. No entan-to, é novamente essencial que tais medidas não produzam efeitos ne-gativos nos fluxos de tesouraria no que toca às receitas do IVA. Foi então introduzido o art.º 167.º--A que estabelece o limite para aplicação deste regime de 500 mil euros quanto ao volume de negócios, podendo os Estados membros aumentá-lo para dois milhões de euros, após consulta do Comité do IVA. As PME em Portugal são a maior fatia do mercado económico, cerca de 99,6 por cento. Portanto, a apli-cação deste regime iria influenciar claramente a nossa receita fiscal, sendo que julgo ser óbvia a ob-tenção de uma resposta negativa da UE, a uma proposta para este sistema generalizado, para as PME portuguesas.
Nota: Este artigo é parte integrante da dissertação com o tema:
«O Regime de Exigibilidade de caixa no IVA», elaborada para conclusão
do mestrado em Contabilidade no ISCAL, sob a orientação científica
de Clotilde Celorico Palma, doutora na área científica de Direito.
Bibliografia disponível em www.otoc.pt
(Documentação – Downloads)
*Licenciada e mestre
em Contabilidade pelo ISCAL
TOC n.º 85 479
Uma das desvantagens mencionada maioritariamente foi a
pressão por parte dos clientes para que os seus fornecedores
não aderissem a este regime, pois teriam dificuldades em
cumprir os prazos de pagamento acordados.
JULHO 2011 51
CONTABILIDADE
XBRL: linguagem universal para a informação financeira
por volta de 1998, Charles Hoffman elaborou diversos protótipos de re-latórios financeiros e programas de auditoria codificados em XML (eX-tensible Markup Language) mas desde logo se apercebeu que esta lingua-gem de marcação extensível é bas-tante geral e limitada para as suas intenções [Hof01]. Dessa forma, com o apoio da AICPA (American Institute of CPA)e de mais 12 empresas líderes em auditoria e informática, decide criar uma linguagem apropriada para o reporte financeiro.
A origem
O XBRL surge, portanto, da lin-guagem mãe XML mas direcionado para a área financeira. Esta lingua-gem mãe é já conhecida e utilizada por várias instituições portuguesas como «uma nova forma de entrega de obrigações declarativas de natu-reza contabilística, fiscal e estatísti-ca» [Ies07]. Atualmente, as empre-sas nacionais podem comunicar os seus relatórios financeiros ao Banco de Portugal, Ministério das Finanças e da Administração Pública, Minis-
tério da Justiça e Instituto Nacional de Estatística de forma automática, sem custos ou recursos adicionais e sem muito esforço através do XML. Estas vantagens são alcançadas pe-las empresas que possuam siste-mas integrados de gestão (ERP) ou simples sistemas de contabilidade (Sage, Primavera, etc.) que incor-poram a capacidade de exportar os relatórios financeiros no formato XML tal como definido no Portal das Finanças [Efi03]. Estamos, assim, perante uma situa-ção ideal em que a máquina perten-cente a uma empresa comunica com a máquina de uma instituição regu-ladora sem que haja intervenção hu-mana e que [Alv01]: - Reduz a necessidade de introdu-zir a informação financeira mais do que uma vez, reduzindo o risco de erros na introdução de informação e eliminando a necessidade de in-troduzir a informação manualmen-te para vigorar em vários formatos, diminuindo dessa forma o custo de preparar e distribuir a informação financeira;
A sigla XBRL representa, no inglês, eXtensible Business Reporting Language. Numa
possível tradução para o português podemos ter XBRL como uma lin-guagem de reporte financeiro ex-tensível. É uma linguagem, pois é um padrão uniforme de comunica-ção entre duas máquinas, que nor-malmente comunicam informação de reporte financeiro e tem a possi-bilidade de ser estendida à medida das necessidades de reporte dos seus utilizadores. A ideia de criar esta nova lingua-gem surgiu a partir de Charles Hoff-man, um auditor nos Estados Unidos (CPA – Certified Public Accountant), que considerou os processos de re-porte financeiro da altura bastante repetitivos e tediosos. Inicialmente,
Os benefícios das linguagens de marcação para a comunicação de informação financeira são reconhecidos por muitos reguladores a nível mundial.
O XBRL surge como a linguagem mais apropriada.
Artigo recebido
em maio de 2011
Por Joel Vicente*
52 TOC 136
CONTABILIDADE
- Aumenta a eficiência da Internet, como a primeira fonte de informa-ção financeira e vai de encontro às necessidades atuais dos investi-dores e outros utilizadores de in-formação financeira ao indicar in-formação precisa para a tomada de decisões. Contudo e, mesmo perante estes benefícios que as linguagens de marcação possuem, a linguagem XML usada desta forma tem a des-vantagem de ser uma linguagem proprietária. No caso acima referi-do, para a aplicação IES, os ficheiros XML a serem utilizados foram defi-nidos e estruturados de uma forma rígida. Uma outra instituição re-guladora pode definir e estruturar outros ficheiros XML de uma outra
forma, havendo depois dois forma-tos diferentes de XML. O XBRL sur-ge no sentido de criar uma definição e estrutura universal de ficheiros para recolha de informação finan-ceira criando-se assim um padrão específico e apropriado. Um pouco por todo o mundo, as entidades reguladoras têm vindo a mandatar o XBRL como o formato de recolha e arquivamento de rela-tório financeiros [Xbp11]. Nos EUA, a FDIC (Federal Deposit Insurance Corporation) usa-o para recolha de relatórios de conformidade. A SEC (Securities and Exchange Commission) usa o XBRL para a recolha de infor-mação financeira de mais de nove mil empresas americanas. Na China, a CSRC (China Securities Regulatory
Commission) também usa o XBRL para a recolha de informação finan-ceira de empresas cotadas em bolsa. A nível Europeu será usado pela EBA (European Banking Authority) para cumprimento dos relatórios que se fixam em três pilares e 25 princípios básicos sobre contabilidade e super-visão bancária, exigidos pelo Acor-do de Capital de Basileia II. E mesmo aqui ao nosso lado, em Espanha, as empresas têm de reportar em XBRL à CNMV (Comisión Nacional del Mer-cado de Valores). Os benefícios das linguagens de marcação para a comunicação de in-formação financeira são evidentes e muitos reguladores já o reconhece-ram. Contudo, a linguagem de repor-te financeiro extensível, o XBRL, é a linguagem mais apropriada a usar.
Bibliografia disponível para consulta em
www.otoc.pt (Documentação – Downloads)
*TOC n.º 61 334
A SEC (Securities and Exchange Commission) usa o XBRL
para a recolha de informação financeira de mais de nove mil
empresas americanas.
JULHO 2011 53
CONTABILIDADE
A falência e a ContabilidadeO que é a falência? Como é que a contabilidade a analisa? Quando o capital próprio
desaparece e as dívidas aumentam, ao mesmo tempo que o ativo diminui, chega-se ao limite…
ções que a personalidade jurí-dica possui produzindo assim a situação de «passivo a desco-berto», na qual há uma proemi-nência das dívidas sobre os in-vestimentos.A contabilidade, por sua vez, possui a missão de estudar os fenómenos patológicos e, por mais que a falência seja consi-derada um processo de Direito - como ocorre nas recuperações da atividade empresarial, regu-ladas pela lei 11 011 de 2001 -, ela não deixa de se incluir naquele género de acontecimentos que chamamos de «fenómenos pa-trimoniais».Considera-se que a situação com-portamental desse fenómeno muito se relativiza com as varia-ções do grupo conhecido como «Património líquido». Francisco D`auria considerava-o como dife-rencial (in «Primeiros Princípios de Contabilidade Pura», São Pau-lo; Companhia Editora Nacional, 1959, p. 361).
Nos estados de falência das fun-ções dinâmicas do património, existe uma variação desse grupo relacionada diretamente com a resultabilidade (lucro ou prejuízo) como dizia Ceccherelli: «A varia-bilidade positiva ou negativa do capital é o sinal característico da dinamização da impresa e o sinto-ma fundamental da sua eficiência ou deficiência: a mensuração lí-quida que, por necessidade práti-ca, colhe o subsídio de uma fun-ção teórica que periodicamente se determina, é o total de uma soma, constituída de fundo líquido, au-mentado pelos lucros produzidos ou diminuído pelos prejuízos so-fridos.» (Ceccherelli, Alberto, «Il Linguaggio dei Bilanci: Forma-zione e interpretazione dei Bilanci Commerciali», 5.º ed. Firenze, Fe-5.º ed. Firenze, Fe-lice Le Monnier, 1950, p. 82 e 83).De uma maneira ostensiva, num primeiro momento (ver gráfico 1), considera-se uma estrutura patrimonial, com ativo, dívidas e capital próprio (estágio 1).
O estado de insuficiência das funções patrimo-niais que provoca insol-
vência, ou a perda do espaço do ativo, chama-se falência.A falência é matéria de estudo para as ciências naturais, tal como para as ciências sociais. Nas ciências naturais - como a bio-logia - ela é uma situação que gera a morte ou a inexistência do ente. Nas ciências sociais, elas tomam um vulto maior, sendo objeto do Direito, da Administração e da Contabilidade, que despendem a tal fenómeno complexos estudos.Para o direito, o estado falimen-tar é o que representa a inefi-ciência dos bens de posse em cumprir a extinção das obriga-
Artigo recebido
em março de 2011
Por Rodrigo António
Chaves da Silva*
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CONTABILIDADE
Na medida em que ocorre a insu-ficiência dos poderes funcionais do património, existe um cres-cimento das dívidas, e uma di-minuição do património líquido (estágio 2).Este estado, quando progressi-vo, produz uma igualdade entre as dívidas e os investimentos (estágio 3).Num último momento, as dívidas chegam a ser maiores que os com-ponentes do capital; neste caso a massa já está falida, e em detrimen-to de sua composição (estágio 4).Pode também dizer-se que, nes-ta última situação, a massa já está falida, porque não existe capital diferencial.O comportamento patrimonial que revela deficiência das fun-ções patrimoniais classifica-se na ordem daqueles fenómenos entendidos como “irracionais”, produzidos pelos superinvesti-mentos, superfinanciamentos, improdutividade, lentidão circu-latória, queda de vendas, evolu-ção das dívidas, juros financeiros passivos, risco, descapitalização e muitos outros. Quando a massa já está falida – per-dendo o seu próprio espaço - a ten-dência é a morte da célula social.Mas, tudo se percebe pelo diferen-cial que chamamos de «património líquido»; sempre que ele existir é como se expressasse uma «folga do ativo»; a sua redução é concernen-te ao aumento das dívidas.Tal como Ceccherelli pregava so-bre a operacionalidade e variação do diferencial, com relação à efi-ciência funcional dos resultados da empresa.Portanto, é uma lei geral que «as reduções e aumentos do capital próprio, provindas de elementos naturais e substanciais, condi-
zem com a eficiência ou deficiên-cia das funções patrimoniais.»Também é uma regra eterna que «toda a vez que houver uma va-riação negativa do capital pró-prio, na mesma intensidade do aumento das dívidas, ou toda a ocasião em que acontecer uma variação positiva do capital, na mesma intensidade de uma evo-lução das dívidas, com conco-mitante redução do ativo, num comportamento temporal cons-tante, a empresa estará em estado de falência.»É por leis que a contabilidade se guia. Na medida que o capital próprio desaparece e as dívidas aumentam, ao mesmo tempo em que o ativo diminui, existirá a falência das funções.
Os débitos denotam as dívidas; a variação do património líquido a conclusão da operação do capital; e as alterações do ativo represen-tam os meios de funcionalidade. Estes três itens derivados e dis-tintos da massa patrimonial ex-pressam os panoramas dos esta-dos da empresa e, possivelmente, a possibilidade de investir nas suas ações, quando são socieda-des de capital aberto.Portanto, a análise contabi-listíca orienta também a deci-são dos acionistas neste aspeto fundamental.
*Contador
Docente da Univiçosa
e da Associação Comunitária
de Raul Soares (ASSECRAS)
Comportamento patrimonial da falência
Estágio 1
Gra
ndez
as
Estágio 2 Estágio 3 Estágio 4
Capital próprio
Dívidas
Ativo
JULHO 2011 55
FISCALIDADE
O técnico oficial de contas e as normas antiabuso
As normas antiabuso encon-tram a sua raison d´être no comportamento evasivo e
fraudatório dos sujeitos passivos em matéria fiscal e na necessidade de estabelecer meios de reação ade-quados por forma a garantir o cum-primento do princípio da igualdade na repartição da carga tributária e na prossecução da satisfação das necessidades financeiras do Estado e de outras entidades públicas.De forma sucinta, este trabalho analisa e identifica os principais aspetos relacionados com as nor-mas antiabuso.
Enquadramento legal
O legislador criou normas antia-buso para combater a utilização
É inerente à racionalidade económica a minimização dos impostos a pagar. Há várias vias para atingir esse objetivo. Este trabalho analisa os principais aspetos
relacionados com as normas antiabuso.
artificiosa de formas jurídicas para conseguir uma redução ou elimi-nação do imposto a pagar.Para devido enquadramento des-tas normas, o n.º 2 do artigo 63.º do Código do Procedimento e Pro-cesso Tributário (CPPT), considera normas antiabuso quaisquer nor-mas legais que consagrem a ine-ficácia perante a administração tributária de negócios ou atos jurí-dicos celebrados ou praticados com manifesto abuso das formas jurídi-cas de que resulte a eliminação ou redução dos tributos que de outro modo seriam devidos.Com a integração de cláusulas an-tiabuso na nossa ordem jurídica, a administração fiscal pode, se devi-damente comprovado e justificado, desconsiderar as figuras jurídicas utilizadas pelos contribuintes e tributar de acordo com a realidade económica subjacente.O artigo 38.º n.º 2 da Lei Geral Tri-butária estabelece uma cláusu-la geral antiabuso, nos seguintes termos: «São ineficazes no âmbito
tributário os atos ou negócios jurí-dicos essencial ou principalmen-te dirigidos, por meios artificio-sos ou fraudulentos e com abuso das formas jurídicas, à redução, eliminação ou diferimento tem-poral de impostos que seriam de-vidos em resultado de factos, atos ou negócios jurídicos de idêntico fim económico, ou à obtenção de vantagens fiscais que não seriam alcançadas, total ou parcialmen-te, sem utilização desses meios, efetuando-se então a tributação de acordo com as normas aplicáveis na sua ausência e não se produzin-do as vantagens fiscais referida.»Nos nossos códigos fiscais existem várias cláusulas especiais antia-buso como, por exemplo, as regras sobre preços de transferência (ar-tigo 63.º do Código do IRC); a não dedução como custo fiscal dos pa-gamentos feitos a pessoas ou enti-dades sujeitas a um regime fiscal claramente mais favorável (artigo 65.º do Código do IRC), imputação aos sócios residentes em território
Artigo recebido
em junho de 2011
Por Paulo Jorge
Seabra dos Anjos*
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FISCALIDADE
nacional dos lucros obtidos por so-ciedades não residentes sujeitas um regime fiscal mais favorável (artigo 66.º do Código do IRC), as regras sobre subcapitalização (artigo 67.º do Código do IRC); a simulação de negócios jurídicos (artigo 39.º n.º 1 da LGT), entre outras.Os requisitos materiais da cláusula geral antiabuso são: - A utilização pelo contribuinte de um negócio jurídico artificioso ou com abuso de forma jurídica que tem como fim único ou determi-nante evitar a tributação que seria devida caso tivesse sido utilizado um negócio ou ato de substância económica equivalente;- A intenção da lei em tributar aquela situação concreta.A lei separa a existência de um ne-gócio jurídico artificioso que ape-nas existe por razões essencial-mente fiscais da situação do abuso de forma jurídica que consiste na escolha, para fins exclusivamente fiscais, de uma forma jurídica que, em circunstâncias normais, não seria utilizada. Mas o requisito es-sencial da cláusula geral antiabuso está relacionado com o fim essen-cial ou principal do negócio, ou seja, a desconsideração do negó-cio jurídico em causa para efeitos de tributação depende da prova de que o negócio visa exclusivamente fins fiscais.O n.º 9 do artigo 63.º do CPPT exi-ge que a fundamentação da admi-nistração fiscal para aplicar esta disposição contenha os seguintes elementos:«a) A descrição do negócio jurídico celebrado ou do ato jurídico reali-zado e da sua verdadeira substân-cia económica;b) A indicação dos elementos que demonstrem que a celebração do negócio ou prática do ato tiveram
como fim único ou determinante evitar a tributação que seria devida em caso de negócio ou ato de subs-tância económica equivalente;c) A descrição dos negócios ou atos de substância económica equiva-lente aos efetivamente celebrados ou praticados e das normas de in-cidência que se lhes aplicam.»
Os deveres do TOC no âmbito
do planeamento fiscal abusivo
Desde a entrada em vigor do De-creto-Lei n.º 29/2008, as empre-sas e consultores tributários são obrigados a comunicar ao diretor--geral dos Impostos os esquemas ou atuações de planeamento fiscal com vista à obtenção de vantagens fiscais. O objetivo deste normativo é claro: combater a fraude e a eva-são fiscal, em particular, o planea-mento fiscal abusivo.O referido diploma prevê a divul-gação pública de esquemas ou atu-ações de planeamento fiscal, como forma de prevenção da fraude e evasão fiscais. Recentemente, fo-ram publicados na página da Inter-net da DGCI os seguintes:- Utilização de uma sociedade gestora de participações sociais (SGPS) como veículo para a inte-gração de ativos no património de uma sociedade residente em terri-tório português;- Criação artificial de menos-va-lias no âmbito do apuramento dos resultados da partilha de uma so-ciedade; - Aplicação do regime de elimi-nação da dupla tributação eco-nómica aos lucros distribuídos por sociedade residente em país terceiro mediante a interposição de uma sociedade residente em Estado membro da União Euro-peia (UE) originando dupla não tributação de lucros distribuídos
e o apuramento de menos-valias artificiais;- Criação de uma estrutura de fi-nanciamento intragrupo recorrendo a veículos constituídos para o efeito;- Prestação de garantias através de sucursal financeira exterior cons-tituída na zona franca da Madeira;- Aproveitamento dos benefícios da Diretiva 2003/49/CE do Conse-lho, de 3 de junho, em matéria de retenções na fonte sobre royalties;- Venda de bens seguida de celebra-ção de contrato com o vendedor;- Operação de aumento de capital de uma sociedade residente reali-zada previamente à alienação de partes sociais para reduzir a tribu-tação das mais-valias;- Cedência de ramo de atividade para aproveitar a dedução de pre-juízos fiscais;- Aproveitamento abusivo de con-venção para evitar a dupla tributação;- Encargos de financiamento de uma operação de aquisição das par-tes de capital de uma sociedade su-portados pela entidade adquirida;- Operação de titularização de cré-ditos futuros;- Utilização abusiva da figura da doação.Como se vê, a maior parte destes esquemas envolve a participação de grupos de sociedades e incide principalmente sobre a utilização indevida de prejuízos fiscais. As PME, dada a sua dimensão mais re-duzida, não terão o mesmo acesso a este tipo de planeamento fiscal.
Jurisprudência
A 10 de dezembro de 2007, a Comis-são Europeia apresentou uma rele-vante comunicação relativa à apli-cação de normas antiabuso na área da tributação direta na União Euro-peia e em relação a países terceiros1, tendo relembrado as definições e os
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FISCALIDADE
Na medida em que os contribuintes não tenham recorrido a
práticas abusivas, os EM não podem impedir o exercício dos
direitos de livre circulação simplesmente por causa de níveis
de tributação inferiores em outros EM.
princípios chave da jurisprudência do TJCE (Tribunal de Justiça das Co-munidades Europeias):Evasão e abuso de direito – No to-cante à evasão e abuso, vem salien-tar que o Tribunal sustentou que uma pessoa que, normalmente, es-taria numa situação abrangida pelo direito comunitário pode perder os direitos nele previstos caso procure abusar dos mesmos. Contudo, estes casos são excecionais, só existindo abuso quando, apesar do cumpri-mento formal das condições esta-
belecidas nas regras comunitárias pertinentes, o objetivo das mes-mas não é alcançado e há intenção de obter uma vantagem através da criação artificial das condições para a obter.2 Esta jurisprudência do TJCE foi, em especial, aplicada à legislação comunitária sobre resti-tuições à exportação e ao IVA. Critérios de identificação de «ex-pedientes puramente artificiais» – O TJCE identificou diversos fatores que, só por si, não são suficientes para constituir expedientes abusi-
vos, ou seja, puramente artificiais. Nomeadamente, defendeu-se que o simples facto de uma empresa sub-sidiária se encontrar estabelecida noutro EM (Estado membro) não pode, só por si, ser tratado como originando evasão fiscal3 e que o facto de as atividades realizadas por um estabelecimento secundá-rio noutro EM poderem ser igual-mente realizadas pelo contribuinte a partir do território do seu EM de origem não garante a conclusão de que existe um expediente pura-mente artificial.4 O TJCE confirmou também expressamente que o ob-jetivo de minimizar a carga fiscal de uma empresa é, em si, uma con-sideração comercial válida, desde que as disposições adotadas com vista à sua realização não levem a transferências de lucros artificiais.5
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FISCALIDADE
Na medida em que os contribuintes não tenham recorrido a práticas abusivas, os EM não podem impe-dir o exercício dos direitos de livre circulação simplesmente por causa de níveis de tributação inferiores em outros EM. Para se justificarem as regras antia-buso devem limitar-se a situações em que haja outro elemento de abu-so. Na sua jurisprudência recente, o TJCE deu uma orientação mais ex-plícita sobre os critérios para dete-tar práticas abusivas, ou seja, expe-dientes puramente artificiais. Proporcionalidade – Para se deter-minar se uma operação consubs-tancia um expediente puramente artificial, a regulamentação nacio-nal antiabuso pode incluir critérios de «porto seguro» (safe harbour), de forma a visar situações em que a probabilidade de abuso seja mais elevada. De forma a garantir que as operações e os estabelecimentos genuínos não sejam indevidamen-te sancionados, é imperativo que, quando se presumir a existência de um expediente puramente artifi-cial, o contribuinte tenha a opor-tunidade, sem ser sujeito a restri-ções administrativas indevidas, a apresentar provas de qualquer justificação comercial que possa existir para essa disposição. O grau em que o ónus da prova de que as suas operações tinham objetivos comerciais de boa-fé pode recair no contribuinte só pode ser deter-minado caso a caso. A este respeito, a Comissão considera que o ónus da prova não deve recair unicamente no contribuinte e que se deve ter em conta a capacidade de cum-primento geral por parte do con-tribuinte e o tipo de disposição em questão. É essencial, em sua opi-nião que, no sentido da proporcio-nalidade, o resultado da respetiva
avaliação pela administração fiscal possa ser submetido a um controlo jurisdicional independente. Além disso, os ajustamentos ao rendi-mento tributável em consequência da aplicação das regras antiabuso devem limitar-se ao âmbito que seja atribuível ao expediente pura-mente artificial.No que respeita à jurisprudência, subordinada ao tema em análise, em Portugal temos o recente acór-dão do Tribunal Central Adminis-trativo Sul.6
Segundo este acórdão um dos li-mites à liberdade de gestão empre-sarial, é o da subsistência e manu-tenção do sistema fiscal visando a satisfação das necessidades finan-ceiras do Estado e demais entida-des públicas no quadro de uma re-partição justa do rendimento e da riqueza criados (cfr. art.º 103, n.º 1, da Constituição da República), es-tabelecendo a lei, para tanto, me-canismos de planeamento fiscal, ao mesmo tempo que visa prevenir a ocorrência de situações de evasão e fraude fiscais por razões de justiça social nessa medida se justificando a adoção de decisões de limitação legítima de direitos, liberdades e garantias em confronto.Sendo certo que a liberdade de ges-tão fiscal tem a sua expressão nas liberdades de iniciativa económica e de empresa, contempladas nos art.os 61, 80, al. c), e 86, da Cons-tituição da República, também o é que a legitimação da liberdade das empresas, guiando-se pelo
planeamento fiscal, passa, nome-adamente, pela escolha da forma e organização da empresa (por exemplo, empresa individual/em-presa societária, estabelecimento estável/sociedade afiliada), do fi-nanciamento (por exemplo, autofi-nanciamento, heterofinanciamen-to, recurso a suprimentos), do local da sede da empresa, afiliadas e es-tabelecimentos estáveis, da políti-ca de gestão de défices e da política de reintegrações e amortizações. Todavia, a liberdade de gestão fis-cal das empresas, vista pelo lado do Estado, concretiza-se no prin-cípio da neutralidade fiscal, o qual tem clara expressão no art.º 81, al. f), da Constituição (após a revisão efetuada pela Lei Constitucional 1/2005, de 12 de agosto), norma em que se estabelece como incumbên-cia prioritária do Estado assegu-rar o funcionamento eficiente dos mercados, de modo a garantir a equilibrada concorrência entre as empresas, a contrariar as formas de organização monopolista e a re-primir os abusos de posição domi-nante e outras práticas lesivas do interesse geral.Assim, não estando, nem podendo estar em causa a liberdade de esco-lha do contribuinte na conforma-ção dos seus negócios, ou, dito de outro modo, não estando em causa o exercício da sua autonomia priva-da, o que se limita é a possibilidade de a vontade do contribuinte ser relevante no que respeita ao grau da sua oneração fiscal, pelo que a
Dentro dos limites da lei e do direito, o sujeito passivo pode
escolher as formas menos onerosas de tributação tendo
como limite da sua pretensão minimizadora a fraude à lei.
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FISCALIDADE
interpretação da norma constante do art.º 38.º, n.º 2, da LGT, sufraga-da por este Tribunal vai de encon-tro ao prescrito na Constituição da República Portuguesa.
Exemplo concreto
Em 10 de outubro de 2004, por escritura pública de cessão de quotas da sociedade “XPTO”, Manuel Couto adquire quota de 45 mil euros, representativa de 45 por cento do seu capital (sociedade por quotas, com um capital social de 100 mil euros) pelo valor nominal.Em 27 de janeiro de 2006, por ou-tra escritura de cessão de quotas da mesma sociedade, Manuel Couto adquire uma outra quota de 10 mil euros, pelo seu valor nominal, fi-cando detentor de duas quotas, uma de 45 mil euros e outra de 10 mil eu-ros, representando 55 por cento do capital da sociedade “XPTO”.Os restantes 45 por cento do capital social estão dispersos por quatro sócios.Em 8 de novembro de 2009 os cinco sócios da “XPTO” transformam a so-ciedade por quotas em sociedade anó-nima, com um capital de 100 mil eu-ros, representado por 100 mil ações.Em 19 de novembro de 2009, por contrato de compra e venda, Ma-nuel Couto alienou 45 mil ações que detinha na “XPTO” por 350 mil euros. Das operações descritas resultou uma mais-valia considerável uma vez que a participação adquirida por 45 mil euros foi valorizada em 305 mil euros.Manuel Couto, na sua declaração Modelo 3 do exercício 2009, declara a mais-valia obtida no Anexo G1 – mais-valias não tributadas, no qua-dro 4 – alienação onerosa de ações detidas durante mais de 12 meses, excluindo a mais-valia obtida, por
enquadramento da operação na alí-nea a) do n.º 2 do art.º 10.º do CIRS.Do exposto resulta a evidência de que a verdadeira substância eco-nómica da transformação da so-ciedade por quotas “XPTO” em sociedade anónima, corresponde à possibilidade de usufruto da alí-nea b) do n.º 6 do art.º 43.º do CIRS: «A data de aquisição de ações re-sultantes da transformação de so-ciedade por quotas em sociedade anónima é a data de aquisição das quotas que lhes deram origem.»Tendo em conta esta disposição le-gal, o sujeito passivo considerou que as ações (que resultaram da trans-formação) haviam sido adquiridas no mês de outubro de 2004 (data de aquisição das quotas).O sujeito passivo Manuel Couto, apoiando-se na «Transformação» das suas quotas em ações, fez re-cair sobre estas a data de aquisição das primeiras (outubro de 2004) e veio a usufruir da vantagem fiscal da exclusão de tributação das mais--valias, conforme art.º 10.º n.º 2, al. a) do CIRS.Assim, a mais-valia gerada foi zero, caso que não aconteceria se Manuel Couto não tivesse alienado ações mas antes quotas, que não beneficiam da exclusão legal.
Conclusão
É inerente à racionalidade econó-mica a minimização dos impostos a suportar, podendo utilizar-se várias vias para atingir tal deside-rato. Todavia, a fronteira de distin-ção entre elas nem sempre é fácil de vislumbrar. Nesse sentido, são se-guidas normalmente as vias da ges-tão ou planeamento fiscal da evasão ou elisão fiscal e da fraude fiscal.Através da racionalidade econó-mica procura-se a minimização dos impostos a pagar de um modo
totalmente legítimo e lícito, queri-do até pelo legislador, ou deixado à liberdade de opção do contribuin-te, como sejam os benefícios fis-cais e as alternativas fiscais, pelo que, dentro dos limites da lei e do direito, o sujeito passivo pode es-colher as formas menos onerosas de tributação tendo como limite da sua pretensão minimizadora a fraude à lei.Nesta temática, o papel do TOC as-sume especial relevância.
*TOC n.º 55 712
Licenciado em Gestão de Empresas
Pós-graduado em Recuperação de Empresas
Notas1 Comunicação da Comissão ao Con-selho, ao Parlamento Europeu e ao Comité Económico e Social Europeu – «A aplicação de medidas antiabu-so na área da tributação directa» – na UE e em relação a países terceiros, COM/2007/0785 final. Esta Comunica-ção surge em sequência de uma Comu-nicação anteriormente apresentada, «Coordenar os sistemas de fiscalidade directa dos Estados membros (EM) no mercado interno.»2 Acórdão de 14 de dezembro de 2000, caso Emsland-Stärke Processo C-110/99, n.ºs 52-53, e Acórdão de 21 de fevereiro de 2006, caso Halifax, Proces-so C-255/02, n.ºs 74-75.3 Acórdão de 16 de julho de 1998, caso ICI, Processo C-264/96, n.º 26.4 Acórdão de 12 de setembro de 2009, Processo C-196/04, n.º 69.5 Acórdão de 12 de setembro de 2009, caso Cadbury, Processo, n.º 37.6 Acórdão do Tribunal Central Adminis-trativo Sul (processo 4255/10 de 15.02.2011 – Normas antiabuso – razão de ser e âm-bito de aplicação – caducidade – princípio da boa-fé – elementos das normas antia-buso – constitucionalidade das normas antiabuso ínsitas no art.º 38.º n.º 2 da LGT.
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FISCALIDADE
Pela flexibilização da tributação do petróleo
Existem três atores à volta do petróleo: Estado, em-presas petrolíferas e con-
sumidores (famílias e restantes empresas).Com o aumento do preço do pe-tróleo, o Estado arrecada mais receitas advenientes do seu con-sumo, mas o mesmo pode não se passar sobre os lucros das em-presas petrolíferas, devido às inúmeras possibilidades de se mitigar a sua tributação. As em-presas petrolíferas obtêm super-lucros pela capacidade de reper-cutirem nos consumidores todas as flutuações do preço do petró-leo. Por sua vez, os consumidores são ainda mais penalizados em virtude de terem de suportar os impostos especiais sobre o con-
sumo a ele associados, os quais são fixados independentemente da evolução do seu preço. Com a atual rigidez da tributação do petróleo, prejudica-se o cres-cimento económico, a poupança das famílias, a capacidade de in-vestimento das restantes empre-sas e aumenta-se a desigualdade na sociedade portuguesa. Assim sendo, defendo que se de-veria introduzir uma flexibiliza-ção da tributação do petróleo. A flexibilização deveria operar-se da seguinte forma: a partir de um determinado nível de preço do petróleo, os impostos espe-ciais sobre o consumo deveriam descer e, em contrapartida, os impostos sobre o rendimento das empresas petrolíferas deveriam aumentar progressivamente; in-versamente, abaixo desse nível de preço aumentavam-se os im-postos especiais sobre o consu-mo e diminuíam-se os impostos sobre o rendimento das petrolí-feras. Também o preço de refe-rência deveria ser flexível, em
função, por exemplo, do momen-to do ciclo económico.Desta forma, a política fiscal e orçamental seria de suporte à economia: aumenta-se a distri-buição da riqueza adveniente do petróleo, atenua-se os impactos nocivos das imprevisíveis flu-tuações do seu preço no resto da economia e o Estado nunca perdia receita fiscal, porque as reduções e aumentos das várias tipologias de impostos deveriam ser com-pensadas.Por outro lado, usa-se a política fiscal para influenciar compor-tamentos económicos: ao aumen-tar os impostos especiais sobre o consumo e diminuir os impostos sobre o rendimento das empresas petrolíferas em alturas de baixa de preço do petróleo, modera--se o seu consumo e mantém-se a capacidade de investimento das empresas petrolíferas; ao baixar os impostos sobre o consumo e aumentar os impostos sobre o rendimento das empresas pe-trolíferas em alturas de alta de
A partir de determinado nível de preço, os impostos deveriam descer e,
em contrapartida, aumentar a tributação sobre o rendimento das petrolíferas.
Artigo recebido
em junho de 2011
Por João Carlos Fonseca *
JULHO 2011 61
FISCALIDADE
preço do petróleo, atenua-se o esforço financeiro dos consumi-dores, mantendo a sua poupança e capacidade de investimento e desincentiva-se as empresas pe-trolíferas de aumentar os preços à sua vontade. Este modelo implica, necessaria-mente, uma reavaliação do actual modelo de fixação de preços, com
vista a impedir uma compensa-ção de redução de impostos espe-ciais sobre o consumo por um au-mento de preços, mantendo-se, consequentemente, o preço final praticamente inalterado.No fundo, através desta flexibili-zação contribuía-se para alcan-çar as três funções do Estado pre-conizadas por Richard Musgrave
(estabilização macroeconómica, redistribuição de rendimento e alocação de recursos), as quais, no atual contexto de crise econó-mica, financeira e social, se tor-nam ainda mais prementes.
* Doutorando em Economia
(UA/DEGEI)
TOC n.º 31 343
62 TOC 136
DIREITO
A desvirtuação do subsídio de desemprego e a viabilidade
da Segurança Social
É comum ouvir dizer, e nós acreditamos piamente, que a Segurança Social como ins-
tituição de Previdência tem os dias contados, por falta de fundos de re-serva que lhe permitam fazer face à cobertura social que lhe está atribu-ída; é o chamado problema da sus-tentabilidade da Segurança Social, o qual tenderá a agudizar-se tanto mais quanto maior for o desequilí-brio entre as receitas representadas pelas cotizações e contribuições e as despesas emergentes da cobertura de benefícios concedidos pela Se-gurança Social. Por isso, neste breve trabalho eliminamos certos custos suportados pelo Orçamento do Es-tado e iremos fixar a nossa análise na vertente do trabalhador por con-
ta de outrem, mais precisamente na abrangência do artigo 28.º do Có-digo dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social que refere: «A proteção social conferida pelo regime geral dos tra-balhadores por conta de outrem in-tegra proteção nas eventualidades de doença, parentalidade, desemprego, doenças profissionais, invalidez, ve-lhice e morte.»Desta série de eventualidades acei-tamos como não sujeitas a fraude a parentalidade, a invalidez, velhice e morte. As eventualidades da doença, desemprego e doenças profissionais são as que dão origem a mais abusos: a doença e a doença profissional pela facilidade com que as incapacidades temporárias são concedidas, a maior parte das vezes não correspondentes à realidade, enquanto o subsídio de de-semprego, pelos pressupostos exigi-dos por lei, se tornou em muitas situa-ções um verdadeiro negócio, saindo o trabalhador como único beneficiário. Lembrar-se-ão por certo que o traba-
lhador, despedido ilicitamente após 1975 e até 1/12/2003, recebia subsídio de desemprego e prestações interca-lares sem que este tivesse qualquer reflexo naquelas.A partir do Código do Trabalho de 2003, o n.º 3 do seu art.º 437.º passou a impor que o subsídio de desemprego auferido pelo trabalhador passasse a ser deduzido nas prestações interca-lares, ficando o respetivo reembolso a cargo do empregador, posição que já vínhamos defendendo desde 1984, no nosso «Direito do Trabalho e Nulidade do Despedimento», Almedina, 1984. Mas, não obstante isso, muitas vezes ainda, o negócio mantém-se: basta que o trabalhador e o empregador se conciliem antes da prolação da sen-tença; ninguém mais se preocupa em saber se houve ou não recebimento de subsídio de desemprego na pendência do processo judicial: o trabalhador continua a receber a indemnização e o subsídio de desemprego.Não há dúvida que o subsídio de de-semprego resulta de um seguro social
O subsídio de desemprego está repleto de vícios só admissíveis num país rico. Perceba as razões que levam o autor a sustentar esta opinião.
Artigo recebido
em julho de 2011
Por Messias Carvalho*
JULHO 2011 63
DIREITO
de desemprego, só que, como o mes-mo se encontra estruturado, o lesado, às vezes, diga-se a maior parte das vezes, é indemnizado duas e três ve-zes, pelo mesmo facto.
Os primeiros tempos
do subsídio de desemprego
Analisemos a evolução histórica da atribuição do subsídio de desempre-go em Portugal.Foi com a Lei n.º 2005, de 14 de março de 1945 que pela primeira vez se con-templou o subsídio de desemprego, cuja base XV dispunha o seguinte: «O pessoal das fábricas que cessarem a laboração por efeito de reorgani-zação industrial será distribuído em três grupos:Os inválidos terão direito a pensões de reforma ou invalidez, pagas pelas respetivas caixas de previdência, e, na falta ou insuficiência dessas pen-sões, ser-lhes-á prestada assistência adequada; os indispensáveis ao tra-balho serão admitidos nas empresas reorganizadas, e os demais serão co-locados nas indústrias a que se refere a primeira parte desta lei, devendo ser-lhes atribuído um subsídio tem-porário de desemprego, obtido por contribuição das empresas.»E assim se manteve, com este âmbito de aplicação, manifestamente limi-tado, até que, em 10 de agosto de 1962, é publicado o Dec.-Lei n.º 44 506 que passa a regulamentar o subsídio de desemprego duma forma mais es-pecífica, muito embora de âmbito restrito aos despedimentos coletivos por encerramento ou reorganização de empresas.No preâmbulo do referido diploma lê-se: «Será às instituições de pre-vidência e às próprias empresas que competirá, em larga medida, supor-tar os encargos decorrentes do au-xílio a conceder aos desempregados, mas precisamente porque se trata de
trabalhadores despedidos, também o fundo de desemprego é chamado a dar contribuição importante, como não poderia deixar de ser.»O respetivo âmbito de aplicação defi-nia-o o art.º 16.º nos seguintes termos: «O presente diploma aplica-se às empresas em curso de reorganização à data da sua publicação ou que, na mesma altura, estejam a proceder a despedimentos coletivos de pessoal.» Por sua vez o art.º 17.º determinava: «O pessoal do Fundo de Desenvolvi-mento da Mão de Obra será contratado pelo Ministro das Corporações e Pre-vidência Social de acordo com as ne-cessidades financeiras do organismo, podendo os funcionários públicos ser chamados ao desempenho de funções em regime de comissão de serviço.»Por aqui se vê uma preocupação na gestão de recursos humanos, inexis-tente na atualidade.Até aqui, como referido, o subsídio de desemprego era suportado através da contribuição das empresas e pelas respetivas caixas de previdência.O Dec.-Lei n.º 45 080, de 20 de ju-nho de 1963, veio introduzir o regi-me de quotizações para o fundo de desemprego.De acordo com o disposto nos artigos 1.º e 2.º foi estabelecido o pagamento da percentagem de um por cento so-bre as remunerações pagas, quer para empregadores quer para trabalhado-res, o qual teve a seguinte evolução até ser absorvido pela taxa social única:- Dec.-Lei n.º 237/70, de 25 de maio, que eleva os descontos para 1,5 por cento para o empregador;
- Dec.-Lei 169-C/75, de 31 de março, que eleva a percentagem de desconto para três por centop quer para o em-pregador quer para o trabalhador;- Dec.-Lei n.º 239/83, de 9 de junho, que eleva a percentagem para quatro por cento para o empregador e de 3,5 por cento para o trabalhador;- Dec.-Lei n.º 140-D/86, de 14 de ju-nho, que procede à redução de 0,5 por cento para empregadores e tra-balhadores com a respetiva entrada em vigor, assim se fixando em 3,5 por cento para os empregadores e em três por cento para os trabalhadores.
Regime do subsídio
de desemprego a partir de 1975
Através do Dec.-Lei n.º 169-D/75, de 31 de março, foi criado «um es-quema de subsídio de desemprego», sendo de realçar o seu âmbito pesso-al: «O subsídio é atribuído aos tra-balhadores por conta de outrem que sejam beneficiários ativos das caixas sindicais de previdência ou das cai-xas de reforma ou de previdência com entidades patronais contri-buintes ou que sejam sócios efetivos das casas do povo.Abrangem-se, assim, a generalida-de dos trabalhadores por conta de outrem, em qualquer atividade, in-cluindo os trabalhadores rurais.»Como condições para atribuição do subsídio de desemprego eram iden-tificadas a capacidade, a disponibi-lidade para o trabalho e a involunta-riedade do desemprego.Já esse diploma estipulava, para efeitos de controlo, que durante o
É inadmissível que um trabalhador receba 300 ou 400 mil euros
de compensação pela cessação do respetivo contrato
de trabalho e passe a receber, de seguida, subsídio de desemprego.
64 TOC 136
DIREITO
período de receção do subsídio, o trabalhador fosse obrigado a com-parecer nas datas e locais que lhe fossem determinados pelo centro de emprego da área da sua residência.Digna de realce para a época em que tal diploma foi publicado, pou-cos meses antes do chamado verão quente, era a exclusão – omitimos intencionalmente as outras -, feita na alínea e) do seu art.º 3.º, através da qual eram excluídos do âmbito de aplicação do diploma, «os trabalha-dores que, tendo recebido indem-nização por despedimento, se en-contrem desempregados há menos meses completos do que os corres-pondentes à divisão da indemniza-ção efetivamente recebida por me-tade do salário mínimo nacional, ou por este salário consoante se trate ou não de trabalhadores rurais.»Vemos por aqui, e esta é a parte que nos interessa para a análise que nos propomos fazer que, na realidade, o subsídio de desemprego tenderia a funcionar como uma forma de in-demnizar o trabalhador pela perda do emprego; porém, se pela perda do emprego tivesse sido indemni-zado pelo empregador, ver-se-ia excluído do recebimento de sub-sídio de desemprego nos preditos termos referidos na alínea e).Está aqui patente o cuidado do le-gislador em evitar que o trabalha-dor fosse indemnizado duas vezes pelo mesmo facto.Este Dec.-Lei n.º 169-D/75, de 31 de março, foi revogado pelo Dec.--Lei n.º 183/77, de 5 de maio, que no
seu art.º 4.º, n.º 1, a) manteve a ex-clusão do recebimento de subsídio de desemprego de quem houvesse recebido indemnização pelo des-pedimento: «Os trabalhadores que tenham recebido indemnizações relativas à última ou a anteriores cessações de contratos de traba-lho, mas apenas durante o número de meses completos que resultar da divisão dos montantes recebidos pelo salário com base no qual foram calculados.»Continua a notar-se uma preocupa-ção para que não haja acumulação da indemnização pelo despedimen-to com o recebimento de subsídio de desemprego, muito embora com bases de incidência diferentes para efeitos de carência, ou não recebi-mento de subsídio de desemprego.Estávamos pois, em 1977, e esta lú-cida e adequada exclusão manteve--se até à revogação do Dec.-Lei n.º 183/77, de 5 de maio, o que veio a ocorrer em 1985 através do Dec.-Lei n.º 20/85, de 17 de janeiro; aliás, este diploma veio acabar com esta e todas as situações de exclusão até aí inexistentes, que serviam como um crivo relativamente ao acesso ao subsídio de desemprego, face a situações que assim o justificavam. Deixou assim o subsídio de desem-prego de ser uma forma de indem-nização, a funcionar em determi-nadas situações como ocorre com a generalidade dos seguros, para se transformar num direito próprio, autónomo e de satisfação imediata, após requerimento.
Este foi, quanto a nós, o primeiro passo para a desvirtuação do subsí-dio de desemprego.
Evolução dos descontos
para a Segurança Social
Porém, antes de focarmos as causas nefastas dessa desvirtuação, com identificação da respetiva fonte, atentemos na evolução das percen-tagens verificadas nos descontos salariais que lhe tem servido de base de sustentação:- Em 1977, quando se previa para aque-le ano um défice na situação financeira da Segurança Social de 14 milhões de contos, cerca de 70 milhões de euros, foram as quotizações para a Segurança Social aumentadas de 6,5 e 17 por cento para 7,5 e 19 por cento, para trabalha-dor e empregador, respetivamente.- Em 1979, o Dec.-Lei n.º 513-M/79, de 26 de dezembro, procedeu a nova alteração, desta vez, para 8 e 20,5 por cento, respetivamente.- Em 1986, o Dec.-Lei n.º 140-D/86, de 14 de junho, procedeu a nova al-teração, desta vez, para 11 e 24 por cento, respetivamente, mediante absorção das quotizações e contri-buições até aí processadas, tendo a partir daí passado a denominar-se de TSU, por unificação dos descon-tos para a Segurança Social e do Fundo de Desemprego.- Em 1994, a Lei n.º 39-B/94, de 27 de dezembro, procedeu a nova alteração, desta vez através da re-dução de 0,75 por cento referente à parte contributiva da entidade patronal, que passou a ser de 23,25 por cento enquanto a quotização do trabalhador se manteve nos 11 por cento.- Em 1999, o Dec.-Lei n.º 199/99, de 8 de junho, procedeu a nova altera-ção da Taxa Social Única, manten-do as quotizações em 11 por cento e aumentando as contribuições para
Inadmissível também é que o trabalhador na situação de
desempregado receba de subsídio de desemprego um montante
de valor superior à retribuição recebida enquanto trabalhador.
JULHO 2011 65
DIREITO
- Em 1986, para uma receita contri-butiva na base de 11 e 24 por cento, teve-se um encargo, em milhares de euros, de 88 992,5;- Em 1994, para uma receita contri-butiva na base de 11 e 23,25 por cento teve-se um encargo, em milhares de euros, de 652 023,0;- Em 1999, para uma receita contri-butiva na base de 11 e 23,75 por cento teve-se um encargo, em milhares de euros, de 712 574,9;- Em 2009, na base das mesmas ta-xas contributivas, suportou-se um encargo, em milhares de euros, de 1 789 939,3.Tem, pois, de se concluir que o esque-ma contributivo é desajustado aos en-cargos suportados. Isto por um lado, enquanto, pelo outro, o subsídio de desemprego distribuído está, grande parte das vezes, desvirtuado, agra-vando de forma acentuada a estabili-dade financeira da Segurança Social.
Causas da desvirtuação
do subsídio de desemprego
Como causas para esta situação caóti-ca que se vive no mundo do emprego, aparece-nos como primeiro ponto de referência a rigidez da lei laboral em matéria de cessação do contrato de trabalho que é suscetível de ser ate-nuada com ligeiras alterações, sem pôr em causa princípios constitucio-nais; lembramo-nos, por exemplo, na existência da norma que prevê o pa-gamento dos vencimentos intercala-res depois de o trabalhador ter optado pelo recebimento da indemnização de antiguidade, assim se mantendo até trânsito em julgado; com custos exa-gerados sem ter como contrapartida a tutela de um direito ao emprego já que o trabalhador declarou não estar inte-ressado nele.Outra situação reside no facto de, muitas vezes, sem qualquer razão plausível, ser “negociado” o despedi-
Prestações de desemprego
Ano TotalSubsídio social de
desemprego
Subsídio de desemprego
1977 7 455,4 7 455,4 //
1978 16 529,1 16 529,1 //
1979 15 059,0 15 059,0 //
1980 22 400,2 22 400,2 //
1981 26 018,8 26 018,8 //
1982 30 014,6 30 014,6 //
1983 24 987,3 24 987,3 //
1984 43 988,0 43 988,0 //
1985 ┴ 62 446,0 ┴ 51 675,8 ┴ 10 770,3
1986 88 992,5 47 515,7 41 476,7
1987 99 168,2 50 420,1 48 748,2
1988 94 228,6 45 619,8 48 608,8
1989 103 877,4 46 386,1 57 491,3
1990 135 590,9 44 025,7 91 565,2
1991 207 175,2 60 953,5 146 221,7
1992 329 380,8 93 295,8 236 085,0
1993 541 742,7 136 334,4 405 408,3
1994 652 023,0 168 995,9 483 027,1
1995 682 351,8 193 227,7 489 124,1
1996 678 796,3 209 811,4 468 984,9
1997 659 753,3 202 783,8 456 969,5
1998 654 327,5 204 834,1 449 493,4
1999 712 574,9 216 377,8 496 197,0
2000 795 892,8 215 124,8 580 768,0
2001 863 054,6 232 402,6 630 651,9
2002 1 071 700,7 280 480,1 791 220,6
2003 1 451 202,2 338 261,2 1 112 941,0
2004 1 610 241,4 293 915,3 1 316 326,1
2005 1 709 019,0 302 074,0 1 406 945,0
2006 1 669 819,9 305 638,5 1 361 181,4
2007 1 518 137,0 312 796,9 1 205 340,1
2008 1 371 758,6 325 474,2 1 046 284,4
2009 1 789 939,3 436 162,4 1 353 776,9
Euro - Milhares
Fonte de dados: IGFSS/MTSSFonte: PORDATAÚltima actualização: 2011-01-14
23,75 por cento, que assim se man-tiveram até à presente data.A evolução dos custos com o subsídio de desemprego e o subsídio social de desemprego tem sido a que se demons-tra no quadro acima. Pelo exposto vemos que o sistema contributivo im-plementado ao longo dos anos, princi-palmente a partir de 1986, é despido de racionalidade adequada, sem levar na devida conta os valores galopantes dos custos efetuados com o subsídio de de-semprego, como por exemplo:
mento, servindo o subsídio de desem-prego como moeda de troca. Situações há em que o trabalhador au-fere subsídio de desemprego e desen-volve atividade profissional por con-ta de outrem ou por conta própria, à margem da administração quer fiscal quer social.Então, nos tribunais, são feitos os mais variados acordos tendo em vista que o empregador não seja obrigado a reem-bolsar a Segurança Social do subsídio de desemprego entretanto pago.É inadmissível que um trabalhador receba 300 ou 400 mil euros de com-pensação pela cessação do respetivo contrato de trabalho e passe a receber, de seguida, subsídio de desemprego.Inadmissível também é que o traba-lhador na situação de desempregado receba de subsídio de desemprego um montante de valor superior à retri-buição recebida enquanto trabalha-dor – não haverá, por certo, melhor maneira de criar o gosto pelo ócio; daí a dificuldade de contratar traba-lhadores no setor têxtil, do calçado e noutros em que se praticam salários baixos. Pelo exposto, e faça-se um melhor relacionamento entre a evolução das receitas e das despesas, terá de se concluir que o seguro de desempre-go instituído entre nós está eivado de vícios só admissíveis num país rico, que infelizmente não somos, por incapacidade e incompetência de quem tem ditado as regras do jogo, na medida em que a ciência do direi-to do trabalho não é de todos, muito embora o direito do trabalho a todos diga respeito.«É mais nefasto alimentar frugal-mente a ociosidade do que banquetear quem trabalha.»
*Advogado especialista em Direito do
Trabalho e Sócio fundador da MCSC & Asso-
ciados – Sociedade de Advogados, RL
66 TOC 136
CONSULTÓRIO
IRC - Estabelecimento estável
Uma empresa sediada em Fran-
ça e que se dedica à venda de
cortinados e afins, contratou um
trabalhador em Portugal para o
qual pretende efetuar os respeti-
vos descontos para a Segurança
Social e IRS. Foi pedido o número
de contribuinte como entidade
equiparada e procedeu-se à ins-
crição da empresa e do traba-
lhador na Segurança Social. Os
serviços deste organismo pedi-
ram de imediato a declaração de
início de atividade.
No serviço de finanças exigem a
menção e assinatura de um re-
presentante legal, com a respeti-
va morada em Portugal, ou uma
procuração.
Se a empresa fatura tudo direta-
mente de França para os clien-
tes, e os custos que vai ter com o
funcionário não vão ter qualquer
registo em Portugal, nem tem ne-
nhum bem por cá, será necessário
entregar o início de atividade e
ter o referido representante?
Temos uma entidade com determina-
das obrigações perante o Estado por-
tuguês, nomeadamente em termos de
retenção e entrega de tributos.
Relativamente à contratação do traba-
lhador, a entidade empregadora - enti-
dade francesa - independentemente de
possuir um estabelecimento estável em
território português, deverá registar-se
em Portugal, ou seja, possuir um núme-
ro de identificação fiscal português de
modo a cumprir obrigações não só ao
nível da Segurança Social como também
ao nível de retenção na fonte sobre ren-
dimentos da categoria A.
Para efeitos de proteção social conferi-
da pelo subsistema previdencial é obri-
gatória a inscrição dos trabalhadores
referidos no n.º 1 do artigo 28.º e das
respetivas entidades empregadoras,
quando se trate de trabalhadores por
conta de outrem, assim como devem ser
cumpridas as obrigações contributivas.
As entidades empregadoras são res-
ponsáveis pela inscrição no subsistema
previdencial dos trabalhadores ao seu
serviço.
Sem prejuízo do disposto nos instru-
mentos internacionais aplicáveis, a obri-
gatoriedade de inscrição no subsistema
previdencial é exigível aos trabalhado-
res que se encontrem a prestar serviço
em Portugal, pelo período a fixar por lei.
Para mais informações poderá consul-
tar o sítio da Segurança Social:
http://www.seg-social.pt/.
Relativamente à retenção na fonte dos
rendimentos de trabalho dependente,
em conformidade com o artigo 99.º do
CIRS, as entidades devedoras de ren-
dimentos de trabalho dependente, são
obrigadas a reter o imposto no mo-
mento do seu pagamento ou colocação
à disposição dos respetivos titulares.
Ao contrário do artigo 101.º, o artigo
99.º do CIRS, não limita a efetivação
de retenção na fonte às entidades com
contabilidade organizada.
Em conformidade com o n.º 3 do artigo
98.º do CIRS, as quantias retidas nos
termos do artigo 99.º devem ser en-
tregues até ao dia 20 do mês seguinte
àquele em que foram deduzidas.
De acordo com o artigo 119.º do CIRS,
as entidades devedoras de rendimen-
tos que estejam obrigadas a efetuar a
retenção, total ou parcial, do imposto,
deverão entregar aos sujeitos passivos,
até 20 de janeiro de cada ano, docu-
mento comprovativo das importâncias
devidas no ano anterior, incluindo,
quando for caso disso, as correspon-
dentes aos rendimentos em espécie que
lhes hajam sido atribuídos do imposto
retido na fonte, e entregar à Direção-
-Geral dos Impostos uma declaração
(modelo 10) relativa àqueles rendimen-
tos (artigo 119.º n.º 1 alínea c)) até final
do mês de fevereiro, (vide Ofício-Circu-
lado n.º 20 113/2006, de 25 de janeiro
da DSIRS).
Nesta circunstância, a entidade deverá
obter um número de identificação fiscal
português e nomear um representante,
em Portugal, para cumprir as obriga-
ções fiscais, nomeadamente as descri-
tas anteriormente nos termos do arti-
go 118.º do CIRC. Refira-se ainda que
o representante poderá ser o próprio
trabalhador.
resposta de março de 2011
JULHO 2011 67
CONSULTÓRIO
IVA em agências de viagens
Uma agência de viagens organiza
circuitos, pacotes turísticos e eventos
culturais e de lazer, sendo que cerca
de 80 por cento da sua faturação é
vendida a entidades e agentes tu-
rísticos estrangeiros, rondando pela
metade no mercado comunitário e o
restante a países terceiros.
Em sede de IVA, a agência regula-se
pelo Decreto-Lei n.º 221/85, isto é,
o valor tributável das prestações de
serviços efetuadas pelo sujeito pas-
sivo é a margem bruta (artigo 4.º do
referido Decreto-Lei), sendo que o
cliente contesta frequentemente o
excessivo valor de IVA a pagar, no-
meadamente porque no seu entender
as transações com «Outros merca-
dos» deveria estar isenta. O referido
Decreto-lei e os exemplos apresen-
tados nas diversas publicações sobre
o assunto apenas referem exemplos
práticos de agências nacionais que
vendem pacotes para o estrangeiro.
Porém, no presente caso é o inverso:
a agência em questão vende pacotes
internos para o exterior.
A título de exemplo, o mercado da
Noruega corresponde a cerca de
30 por cento das vendas da referida
agência, o que significa que se pode
estar perante dois cenários distintos
a considerar (vamos excluir o res-
tante IVA apurado para a regular
atividade da empresa e considerar a
taxa de 20 por cento, que estava em
vigor no primeiro semestre do ano
passado):
Hipótese 1
Vendas totais: 1 000 euros
Custo das vendas: 760 euros
Margem bruta: 240 euros
Lucro disponível: 200 euros
IVA (20%): 40 euros
Para facilitar, vamos excluir o mer-
cado da Noruega como se fosse o
único país de «Outros mercados»,
contribuindo com 30 por cento para
os rendimentos da agência. Teremos
a seguinte hipótese, tendo em conta
que os custos com estas operações
rondariam a mesma percentagem:
Hipótese 2
Vendas (excluindo Noruega):700 euros
Custo das vendas: 532 euros
Margem bruta: 168 euros
Lucro disponível: 140 euros
IVA (20%): 28 euros.
Resulta daqui que seria pago menos
IVA no final.
Este modelo e o raciocínio estão
corretos?
Os responsáveis pela agência di-
zem ter conhecimento de que mui-
tas agências de incoming incluem
os seus gastos com deslocação a
agentes e operadores no exterior,
bem com a feiras de turismo, em
«Custos das vendas».
O procedimento que o TOC em
questão segue é o de contabilizar
esses gastos em «Despesas de re-
presentação», isto é, não só não são
considerados estes valores no apu-
ramento da margem para cálculo
do IVA, como, no final do ano, es-
tão sujeitos a tributação autónoma.
Este procedimento está correto?
Será de ter em consideração que os
agentes económicos com sede ou dire-
ção efetiva em Portugal ficam sujeitos
à legislação em vigor em Portugal.
Atendendo a que as disposições cons-
tantes das diretivas europeias e, nes-
te caso concreto, o regime especial
das agências de viagens, não é dire-
tamente aplicável nos Estados mem-
bros, cada um destes Estados teve de
transpor os princípios gerais dessas
diretivas para a sua legislação interna
nos termos e prazos estabelecidos, o
que na legislação portuguesa foi con-
cretizado mediante a publicação do
Decreto-Lei n.º 221/85, de 3 de julho,
mais tarde alterado pelo Decreto-Lei
n.º 206/96, de 26 de outubro.
De acordo com este regime, o imposto
é cobrado ao utente, no país da sede
ou estabelecimento estável da agência
que presta o serviço, incidindo apenas
sobre a margem bruta, já que os servi-
ços que constituem o pacote turístico
são tributados, nos termos gerais, nos
países onde se efetuem, em resultado
da aplicação das regras normais de lo-
calização das prestações de serviços.
As normas deste diploma aplicam-se,
de acordo com o n.º 1 do seu artigo
1.º, às operações das agências de via-
gens e organizadores de circuitos tu-
rísticos, com sede em Portugal (ou es-
tabelecimento estável a partir do qual
sejam prestados os referidos serviços)
que atuem em nome próprio perante
os clientes e recorram, para a realiza-
ção dessas operações, a transmissões
de bens ou a prestações de serviços
efetuadas por terceiros.
Ainda de acordo com o artigo 1.º, se
as operações relativamente às quais
a agência de viagens recorre a tercei-
ros forem efetuadas por estes fora da
Comunidade, a prestação de serviços
da agência é assimilada a uma ativi-
dade de intermediário, isenta por for-
ça da alínea s) do n.º 1 do artigo 14.º
do CIVA.
Se as operações forem efetuadas na
Comunidade e fora dela, só é consi-
derada isenta a parte da prestação de
serviços da agência de viagens refe-
rente às operações realizadas fora da
Comunidade.
68 TOC 136
CONSULTÓRIO
Ou seja, ao contrário do que acontece
no regime geral do IVA, e nomeada-
mente no que à prestação de serviços
diz respeito, a condição do adquirente
não tem aqui qualquer relevância na
aplicação deste regime especial.
A aferição das operações que ficam,
ou não, sujeitas a imposto em Portugal
atendem a dois fatores (pressupondo
que estão reunidos os restantes requi-
sitos para aplicação deste regime):
- Que o prestador do serviço (agência
ou operador) tenha sede em Portugal,
ou estabelecimento estável a partir
do qual os serviços são prestados; e
- Que os serviços sejam realizados
dentro do espaço comunitário.
Sendo o caso, o serviço ficará sujeito
ao regime da margem, devendo o IVA
calculado ao abrigo do regime espe-
cial ser entregue nos cofres do Esta-
do português, independentemente da
qualidade do seu adquirente.
No caso em apreço, e dado que nos
refere tratarem-se de serviços in-
coming, ou seja, pacotes (turísticos)
internos, pressupomos que todos os
serviços a que se refere são presta-
dos em território português.
Assim sendo, e dado o operador ou
agência que presta o serviço (vende o
pacote turístico) ter sede em Portugal
todos os pacotes turísticos referentes
ao incoming, serão tributados à taxa
em vigor em Portugal, calculada com
base na margem bruta desses paco-
tes.
No que toca aos custos relevantes
para a determinação da margem,
refira-se que o artigo 6.º do diploma
determina que devem ser considera-
das «transmissões de bens e presta-
ções de serviços efetuadas por tercei-
ros para benefício direto do cliente.»
Ora, a participação de agentes (su-
pomos referir-se a trabalhadores da
agência em Portugal) em feiras de
turismo dificilmente será imputável
como «benefício direto do cliente»,
já que estes abrangem exclusivamen-
te as diretamente relacionadas com
a sua viagem e estadia (transporte,
alojamento, alimentação, guias, etc.).
A não aplicação destas regras por
parte dos sujeitos passivos portugue-
ses constitui uma transgressão das
normas nacionais, penalizável nos
termos da lei em vigor.
Em que medida é que o Estado portu-
guês está, ou não, a cumprir com os
procedimentos e orientações gerais
estabelecidos na legislação europeia
será matéria de direito, em última
instância, resolvido nos meios apro-
priados para o efeito, como é o caso
dos tribunais.
No entanto, a possibilidade da Co-
missão Europeia ter instaurado um
processo contra o Estado português
contra um eventual incumprimento na
transposição da legislação, não de-
termina, por si só, a não aplicabilida-
de das normas atualmente em vigor.
resposta de março de 2011
JULHO 2011 69
CONSULTÓRIO
Remuneração da gerência
Qual a remuneração mínima que
um gerente de uma sociedade
por quotas unipessoal deverá ter
em 2011? O valor da retribuição
será o do SMN ou um indexante
do IAS?
De acordo com o artigo 255.º do Có-
digo das Sociedades Comerciais, o ge-
rente tem direito a uma remuneração a
fixar pelos sócios.
Neste âmbito, e uma vez que os órgãos
sociais não se regem pela Lei do Código
do Trabalho, pode ser estipulado qual-
quer valor.
Para efeitos de Segurança Social e nos
termos da Lei n.º 110/2009, de 16 de
setembro - Código dos Regimes Con-
tributivos do Sistema Previdencial de
Segurança Social, há que atender ao
Capítulo I - Regimes aplicáveis a traba-
lhadores integrados em categorias ou
situações específicas - Secção I - Traba-
lhadores com âmbito material de prote-
ção reduzido - Subsecção I - Membros
dos órgãos estatutários das pessoas
coletivas e entidades equiparadas.
Nos termos do artigo 61.º «são obri-
gatoriamente abrangidos pelo regime
geral, com as especificidades previstas
na presente subsecção, na qualidade de
beneficiários, os membros dos órgãos
estatutários das pessoas coletivas e en-
tidades equiparadas, ainda que sejam
seus sócios ou membros.»
O artigo 63.º determina que são excluí-
dos do regime dos membros dos órgãos
estatutários das pessoas coletivas e
entidades equiparadas, os sócios que,
nos termos do pacto social, detenham a
qualidade de gerentes mas não exerçam
de facto essa atividade, nem aufiram a
correspondente remuneração (alínea b)
do artigo 63.º do Código Contributivo).
Importa ainda referir o disposto do ar-
tigo 64.º, que passaremos a transcrever:
«Artigo 64.º - Exclusão nos casos de
acumulação com outra atividade ou si-
tuação de pensionista
1 - São ainda excluídos do âmbito de
aplicação da presente subsecção os
membros de órgãos estatutários de
pessoas coletivas com fins lucrativos
que não recebam, pelo exercício da
respetiva atividade, qualquer tipo de
remuneração e se encontrem numa das
seguintes situações:
a) Sejam abrangidos por regime obrigató-
rio de proteção social em função do exer-
cício de outra atividade em acumulação
com aquela, pela qual aufiram rendimento
superior a uma vez o valor do IAS;
b) Sejam pensionistas de invalidez ou de
velhice de regimes obrigatórios de pro-
teção social, nacionais ou estrangeiros.
2 - Consideram-se regimes obrigató-
rios de proteção social, para efeitos
do número anterior, o regime geral de
segurança social dos trabalhadores por
conta de outrem, ainda que com âmbito
material reduzido, o regime de seguran-
ça social dos trabalhadores indepen-
dentes, o regime de proteção conver-
gente dos trabalhadores que exercem
funções públicas, o regime que abrange
os advogados e solicitadores, bem como
os regimes de proteção social estran-
geiros relevantes para efeitos de coor-
denação com os regimes de segurança
social portugueses.»
Fora das situações dos artigos 63.º e
64.º, a base de incidência contributiva,
para os sócios gerentes, corresponde ao
valor das remunerações efetivamente
auferidas, com o limite mínimo igual ao
valor do IAS - 419,22 euros - e o limite
máximo igual a 12 vezes o valor do IAS
- 5.030,64 euros. (artigo 66.º do Código
Contributivo).
resposta de março de 2011
70 TOC 136
CONSULTÓRIO
Trespasse
Como contabilizar um contrato
de trespasse efetuado aquando
da constituição de uma empresa,
tendo adquirido através do mes-
mo a exploração de um estabele-
cimento de mediação imobiliária,
contendo diversos equipamentos,
assim como listagem de todas as
angariações de clientes vendedo-
res de imóveis e de clientes com-
pradores.
Aplicando o POC, esta transação
seria contabilizada na rubrica de
«Imobilizações incorpóreas (tres-
passe)» e seria amortizada ao
longo de cinco anos. No entanto,
em SNC a situação descrita não
vem incluída nas características
de um ativo intangível da NCRF 6.
Qual o modo de contabilizar esta
transação?
Se aquisição do estabelecimento co-
mercial pela entidade for enquadrada
como uma concentração de atividade
empresarial, porque se está adquirir a
totalidade (ou parte) de um patrimó-
nio que constitua uma atividade, de-
verá ter o tratamento contabilístico
previsto na NCRF 14 - Concentrações
de atividades empresariais.
Esta NCRF prevê o método da compra
para a contabilização da concentra-
ção de atividade empresarial. Na prá-
tica, este método significará registar
todos os ativos identificáveis como se
de uma compra normal se tratasse e
os passivos identificáveis como se fos-
se normal assumir esses passivos.
Em termos de mensuração, a entida-
de deverá reconhecer todos os ativos
e passivos identificáveis pelos res-
petivos justos valores à data dessa
aquisição.
De acordo com a remissão prevista no
parágrafo 24 da NCRF 14, serão os pa-
rágrafos B16 e B17 do apêndice B da
IFRS 3 - «Concentrações de ativida-
des empresariais», que proporcionam
orientações adicionais sobre a deter-
minação dos justos valores dos ativos,
passivos e passivos contingentes iden-
tificáveis da adquirida para a finalidade
de imputar o custo de uma concentra-
ção de atividades empresariais.
Se existir uma diferença positiva entre
o custo de aquisição da concentração
da atividade empresarial (valor pago
adicionado de despesas adicionais) e
os justos valores dos ativos e passivos
identificáveis, haverá que reconhecer
essa diferença como um ativo intangí-
vel (goodwill).
Este goodwill não poderá ser amorti-
zado, ficando apenas sujeito a perdas
por imparidade.
Se existir uma diferença negativa (si-
tuação pouco normal) entre o custo
de aquisição da concentração da ati-
vidade empresarial (valor pago adi-
cionado de despesas adicionais) e os
justos valores dos ativos e passivos
identificáveis, deverá ser efetuada
uma reavaliação da identificação e
da mensuração dos ativos, passivos e
passivos contingentes identificáveis da
sociedade por quotas, e se se manti-
ver esse excesso, este deverá ser ime-
diatamente reconhecido como rendi-
mento do período.
Um exemplo de registos contabilísti-
cos poderá ser:
Pela aquisição de uma concentração
de atividade empresarial:
- Débito da conta 43 - Ativos fixos
tangíveis, pelo justo valor estabeleci-
do no diversos imóveis, equipamentos,
mobiliário, etc.;
- Débito da conta 441 - Goodwill, pelo
valor da diferença positiva entre o va-
lor pago (incluindo os custos direta-
mente relacionados) e os justos valo-
res dos ativos e passivos identificáveis
e registados;
- Débito da conta 44x - Carteira de
clientes, pelo justo valor dessa carteira;
- Débito da conta 31 - Compras, pelo
justo valor estabelecido referente aos
inventários;
- Débito da conta 21 - Clientes, pela
aquisição dos créditos de (justo valor);
Por contrapartida a,
- Crédito da conta 22 - Fornecedores,
pela assunção das dívidas de fornece-
dores (justo valor);
- Crédito de outra conta de passivo, pela
assunção de qualquer outro passivo;
- Crédito da conta de depósitos à or-
dem, pelo valor pago pela aquisição
da sociedade por quotas.
Em termos fiscais, este tipo de ope-
rações (concentrações de atividades
empresariais), independentemente da
forma legal que tiverem (fusão, aqui-
sição de partes de património, etc.),
têm um regime especial previsto nos
artigos 73.º a 78.º do CIRC.
Genericamente, este regime especial
prevê uma neutralidade fiscal, não
sendo considerado fiscalmente qual-
quer resultado derivado da transfe-
rência dos elementos patrimoniais
em consequência da concentração de
atividade empresarial para a entidade
contribuidora (neste caso, sociedade
por quotas), bem como qualquer mais
ou menos-valia de uma eventual par-
ticipação social da entidade beneficiá-
JULHO 2011 71
CONSULTÓRIO
ria, existente antes da concentração.
Todavia, para a aplicação deste regi-
me de neutralidade fiscal, o CIRC de-
termina que qualquer futuro resultado
tributável (venda, abate, etc.) relativo
aos elementos patrimoniais transferi-
dos é feito como se não tivesse exis-
tido a concentração, ou seja, pelos
valores (a custo histórico) registados
na entidade contribuidora antes da
concentração.
As depreciações ou amortizações so-
bre os elementos do ativo fixo tangí-
vel, do ativo intangível e das proprie-
dades de investimento contabilizadas
ao custo histórico transferidos são
efetuadas de acordo com o regime
que vinha sendo seguido na entidade
contribuidora.
E, os ajustamentos em inventários, as
perdas por imparidade e as provisões
que foram transferidos têm, para efei-
tos fiscais, o regime que lhes era apli-
cável na entidade contribuidora.
Na prática, para efeitos fiscais, o CIRC
não aceita a mensuração dos ativos e
passivos identificáveis na concentra-
ção de atividade empresarial pelo cri-
tério do justo valor (tal como previsto
na NCRF 14).
Este regime especial de neutralidade
não obriga à contabilização, na en-
tidade beneficiária, por esses custos
históricos, tal como acontecia até
31/12/2009. Com efeito, com as alte-
rações promovidas pelo Decreto-Lei
n.º 159/2009, os resultados tributá-
veis, depreciações, amortizações e
perdas por imparidade ao custo his-
tórico deverão ter um controlo extra
contabilístico no dossiê fiscal.
resposta de março de 2011
Método de equivalência patrimonial
Uma empresa registava em POC
todos as suas participações ao
custo histórico. Acontece que,
com o SNC, a empresa reajustou
as participações ao MEP. Veja-se
a seguinte situação: a empresa ti-
nha uma participação registada
na conta 41 pelo montante de 100
(custo histórico).
Como a 31 de dezembro de 2009
os capitais próprios da participada
eram negativos teve de ajustar-se
o valor da participação (57D /41C).
A participação fica a zero. É reco-
nhecida uma perda de imparidade
pelo facto dos capitais próprios
da participada estarem negati-
vos (57D/419 C). A meio do ano, a
empresa vai ceder metade da sua
participação. Como deve ser reco-
nhecida esta participação?
De acordo com o parágrafo 49 da NCRF
13 - Interesses em empreendimentos
conjuntos e investimentos em associa-
das, as perdas reconhecidas segundo
o método da equivalência patrimonial
que excedam o investimento do inves-
tidor em ações ordinárias são aplicadas
a outros componentes do interesse do
investidor numa associada pela ordem
inversa da sua antiguidade (por exem-
plo, prioridade na liquidação).
Significa que, se o investidor tiver ou-
tros componentes do investimento, por
exemplo, prestações suplementares de
capital ou prestações acessórias, de-
vem ser reduzidos esses valores.
Por seu turno, o parágrafo 50 da mesma
norma considera que, «depois de o inte-
resse do investidor ser reduzido a zero,
as perdas adicionais são tidas em conta
mediante o reconhecimento de um pas-
sivo, só na medida em que o investidor
tenha incorrido em obrigações legais
ou construtivas ou tenha feito paga-
mentos a favor da associada. Se poste-
riormente a associada relatar lucros, o
investidor retoma o reconhecimento da
sua parte nesses lucros somente após a
sua parte nos lucros igualar a parte das
perdas não reconhecidas.»
Significa isto que, se as perdas resul-
tantes da aplicação do MEP, reduzirem
o investimento a zero, apenas se reco-
nhece um passivo por contrapartida de
«outros gastos», se a empresa incorreu
em obrigações legais ou construtivas
(obrigações construtivas são aquelas
que resultam de acordos ou praticas em
possibilidade realista de retrocesso) ou
tenha feito pagamentos a favor da em-
presa associada.
Não sendo o caso, quando a quantia
do investimento é reduzida a zero,
pela aplicação do método da equiva-
lência patrimonial, interrompe-se a
sua aplicação.
Se, posteriormente, a associada re-
latar lucros, o investidor retoma o
reconhecimento da sua parte nesses
lucros somente após a sua parte nos
lucros igualar a parte das perdas não
reconhecidas.
A redução da participação a zero, re-
sultante da aplicação do método da
equivalência patrimonial, é diferente
do reconhecimento de uma perda por
imparidade. Com efeito, de acordo com
o parágrafo 51 da NCRF 13, tendo-
-se aplicado o método da equivalência
patrimonial e reconhecidas perdas da
associada de acordo com o parágrafo
49, o investidor deve determinar se é
necessário reconhecer qualquer perda
72 TOC 136
CONSULTÓRIO
por imparidade adicional com respeito
ao conjunto de interesses na associada.
Ou seja, deve verificar-se se é neces-
sário reconhecer qualquer perda por
imparidade, mas isso não significa que
seja necessário. Se as perspetivas fu-
turas da associada foram boas, não
haverá necessidade de reconhecer essa
imparidade.
Contudo, partindo do pressuposto que
essa imparidade foi reconhecida, o seu
registo contabilístico seria:
653 - Perdas por imparidade - Em inves-
timentos financeiros
a
41 - Investimentos financeiros
Salientamos ainda que, de acordo com
o parágrafo 52 desta norma, «dado que
o goodwill incluído na quantia escritura-
da de um investimento numa associada
não é reconhecido separadamente, a
totalidade da quantia escriturada do
investimento é testada quanto a impa-
ridade segundo a NCRF 12 - Imparidade
de ativos, comparando a sua quantia
recuperável (o mais elevado entre valor
de uso e justo valor, menos os custos de
vender) com a sua quantia escriturada.
Ao determinar o valor de uso do investi-
mento, uma entidade estima:
- A sua parte no valor presente dos futu-
ros fluxos de caixa estimados que se es-
pera que venham a ser gerados pela as-
sociada, incluindo os fluxos de caixa das
operações da associada e os proventos
da alienação final do investimento; ou
- O valor presente dos futuros fluxos de
caixa estimados que se espera que sur-
jam de dividendos a serem recebidos do
investimento e da sua alienação final.
Segundo pressupostos apropriados, am-
bos os métodos dão o mesmo resultado.
A quantia recuperável de um investi-
mento numa associada é avaliada para
cada associada, a menos que a asso-
ciada não gere influxos de caixa lar-
gamente independentes dos de outros
ativos da entidade.
Assim, o reconhecimento de uma (even-
tual) imparidade não é efetuada através
do registo 57 a 41, mas sim, 65 a 419.
O registo 57 a 41 decorre da aplicação
do método da equivalência patrimonial,
quando existe uma variação patrimonial
negativa na empresa participada, não
refletida em resultados. Este registo en-
contra-se relacionado com variações de
um período para outro e não pelo facto
dos capitais próprios da participada se
encontrarem negativos. Se estão nega-
tivos é, certamente, porque tem vindo a
acumular prejuízos.
Tendo aplicado o MEP pela primeira vez
na transição do POC para o SNC, o re-
gisto seria o seguinte, se o valor conta-
bilístico é superior à proporção da par-
ticipação nos capitais próprios:
5711 - Ajustamentos em ativos financei-
ros - Ajustamentos de transição
a
41 - Investimentos financeiros
Se a empresa participante aliena a to-
talidade ou parte da sua participação,
quando a participação está reduzida a
zero, resultante da aplicação do MEP, há
que reconhecer uma perda ou um ganho
com essa alienação.
12/27- Bancos/Outras contas a pagar
ou a receber
6862 - Gastos e perdas nos restantes
investimentos financeiros - Alienações
a
41 - Investimentos financeiros
No caso de a alienação gerar uma perda
12/27 - Bancos/Outras contas a pagar
ou a receber
a
41 - Investimentos financeiros
7852 Rendimentos e ganhos em subsi-
diárias, associadas e empreendimentos
conjuntos - Alienações
No caso de a alienação gerar um ganho
Seguido do registo:
Anulação da conta 571 - Ajustamentos
em ativos financeiros relacionados com
o método da equivalência patrimonial,
por contrapartida da conta 56 - Resul-
tados transitados, a débito ou a crédito,
dependendo da subconta da referida
conta 571 e do respetivo saldo.
resposta de março de 2011
JULHO 2011 73
CONSULTÓRIO
Ativos tangíveis
Uma entidade está a celebrar um con-
trato de aquisição de posições contra-
tuais para fornecimento de gás. O ob-
jeto da referida proposta é o seguinte:
- Aquisição das posições contratu-
ais do fornecedor atual já conside-
rados como clientes efetivos;
- Aquisição das atuais posições ne-
gociais ainda potenciais, considera-
das de clientes potenciais;
- Aquisição da propriedade da in-
fraestrutura logística para assegu-
rar os referidos fornecimentos:
- Rede de distribuição de gás;
- Reservatórios que abastecem os
fogos em causa;
- Bateria de garrafas para abaste-
cer os fogos.
Relativamente ao valor de aquisi-
ção das referidas aquisições de po-
sição contratual e respetivas infra-
estruturas associadas, ascenderá
aos 50 mil euros no total.
Como efetuar os registos contabilís-
ticos no sentido de ser possível sepa-
rar os ativos tangíveis e intangíveis,
tendo em consideração que o forne-
cedor irá emitir faturas em separado
para os respetivos itens.
Determinada entidade propõe-se
adquirir determinado negócio que
envolve posições contratuais efeti-
vas e potenciais, bem como infraes-
truturas logísticas. Pela descrição
efetuada, aparentemente a opera-
ção configura uma «concentração de
atividades empresariais», tal como
definida na NCRF 14, designadamen-
te nos parágrafos 4 a 9.
No entanto, o conteúdo desse nor-
mativo não nos parece muito rele-
vante no caso em apreço, porquan-
to todos os ativos adquiridos pela
entidade são identificáveis e indivi-
dualmente mensuráveis, e tanto as-
sim é que serão objeto de faturação
separada.
Interessa então, e de forma a res-
ponder à questão, identificar quais
os ativos fixos tangíveis e os in-
tangíveis.
Nos termos do parágrafo 6 da NCRF
7, são ativos fixos tangíveis os «itens
tangíveis que: a) sejam detidos para
uso na produção ou fornecimento de
bens ou serviços, para arrendamento
a outros, ou para fins administrati-
vos; e b) se espera que sejam usados
durante mais do que um período.»
Assim, da descrição efetuada e ad-
mitindo que se espera que sejam
usados durante mais do que um perí-
odo, consideramos como tangíveis a
rede de distribuição de gás, os reser-
vatórios que abastecem os fogos em
causa e a bateria de garrafas para
abastecer os fogos. É, em nosso en-
tendimento, irrelevante para a qua-
lificação como tangível o facto dos
ativos se encontrem em propriedade
alheia. Note-se ainda que este nosso
entendimento admite não estarmos
perante a concessão de um serviço
público.
No que respeita aos restantes itens
releva aqui sobretudo a seguinte fra-
se do parágrafo 8 da NCRF 6, que
refere que um ativo intangível «é um
ativo não monetário identificável
sem substância física.» As posições
contratuais, efetivas e potenciais,
quando adquiridas, configuram um
ativo [recurso económico, aconteci-
mento passado e benefícios econó-
micos futuros], não monetário [não
são dinheiro nem quantia a receber
em dinheiro] e sem substância física.
resposta de março de 2011
74 TOC 136
CONSULTÓRIO
Consolidação de contas
Um grupo que é constituído por
uma empresa mãe e diversas
empresas subsidiárias consolida
economicamente todas as em-
presas que domina fiscalmente
todas, exceto uma. De referir
que a percentagem de partici-
pação da holding do grupo é 100
por cento do capital de todas as
afiliadas. O motivo da exclusão
dessa empresa do perímetro de
consolidação fiscal é que apre-
sentou, em dois anos consecuti-
vos, prejuízos fiscais.
Com a nova legislação houve algu-
ma alteração que obrigue ou per-
mita a inclusão desta empresa no
perímetro de consolidação fiscal?
Relativamente ao perímetro de
consolidação económica, com a
entrada em vigor do SNC é obri-
gatória a inclusão no perímetro
de consolidação económica de
todas as empresas dominadas,
com algumas exclusões. Empre-
sas dominadas, mas inativas,
devem ser incluídas no períme-
tro de consolidação económica?
No caso de tal ser dispensável
por motivos de inatividade, essa
dispensa mantém-se mesmo que
a empresa tenha património re-
levante, nomeadamente imóveis?
Empresas que não sejam mate-
rialmente relevantes para a apre-
sentação da imagem do grupo
podem ser excluídas do períme-
tro de consolidação. Que critério
deve ser utilizado para definir
«materialmente relevante»?
Determinado grupo consolida contas
para efeitos contabilísticos e para
efeitos fiscais. No que diz respeito
à primeira questão, o artigo 69.º do
Código do IRC relativo ao âmbito e
condições de aplicação do regime
especial de tributação dos grupos de
sociedades mantém no seu n.º 4 al. c)
o seguinte preceito: «Não podem fa-
zer parte do grupo as sociedades que,
no início ou durante a aplicação do
regime, se encontrem nas situações
seguintes: c) Registem prejuízos fiscais
nos três exercícios anteriores ao do
início da aplicação do regime, salvo,
no caso das sociedades dominadas,
se a participação já for detida pela
sociedade dominante há mais de dois
anos». O OE 2011 não alterou este
preceito, e desconhecemos que outro
diploma o tenha feito.
No tocante à segunda pergunta, as úni-
cas exclusões do perímetro de consolida-
ção contabilístico são as mencionadas no
artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 158/2009, e
que não incluem qualquer exclusão por
inatividade.
Note que o SNC, à semelhança das IAS,
adota uma ótica inclusiva e não exclu-
siva, de forma a não dar argumentos
às entidades consolidantes para que
excluam entidades que não lhes inte-
resse da consolidação (por exemplo,
por apresentarem muito passivo ou
resultados negativos). É por este mo-
tivo que as entidades com atividades
dissemelhantes devem ser incluídas no
perímetro.
Assim, também as entidades inativas
devem ser incluídas no perímetro,
pois nenhum normativo permite a sua
exclusão.
Relativamente à última questão, refira-
-se que as normas não incluem crité-
rios quantitativos, apenas qualitativos.
A IAS 1 e as bases para apresentação
das demonstrações financeiras (em
anexo ao Decreto-Lei n.º 158/2009)
apresentam exatamente o mesmo con-
ceito de materialidade, referindo que
[parágrafo 7 da IAS 1] «as omissões
ou distorções de itens são materiais se
puderem, individual ou coletivamente,
influenciar as decisões económicas dos
utilizadores tomadas com base nas
demonstrações financeiras. A materia-
lidade depende da dimensão e da natu-
reza da omissão ou distorção ajuizada
nas circunstâncias que a rodeiam. A di-
mensão ou a natureza do item, ou uma
combinação de ambas, pode ser o fator
determinante.»
Uma das dificuldades da definição re-
sulta da ausência de orientação práti-
ca acerca de como utilizar o conceito
de materialidade. Esta é também uma
dificuldade que se apresenta aos au-
ditores que, contudo, dispõem das
orientações constantes da Interna-
tional Standards on Auditing (ISA) 320
Audit Materiality. Não obstante, nem
esta ISA, nem nenhuma outra norma
de auditoria ou de contabilidade pro-
porcionam definições quantitativas de
materialidade.
Alguns autores como Arens facultam
indicações do que poderá ser material-
mente relevante:
Julgamento preliminar de materialidade
(Arens et al., 9th Edition, pp.236)
Rubrica Mínimo Máximo
Earnings from operations
(resultados operacionais) 5% 10%
Current assets
(ativos correntes) 5% 10%
Total assets
(ativos totais) 3% 6%
Current liabilities
(exigível de curto prazo) 5% 10%
resposta de março de 2011
JULHO 2011 75
CONSULTÓRIO