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Edição Especial Concursos PúblicosTRANSCRIPT
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Tribunal de Contas doEstado de Minas Gerais
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VIII
Especialistas escrevem sobreaspectos relevantes dosconcursos públicos, abordandoseus fundamentos, finalidadee pontos controversos.
Doutrina:
Professor Jair Eduardo Santanadestaca a importância docontrole dos concursospúblicos pelo Tribunal de Contas.
Entrevista:
De vez em quando Deus me tira a poesia.
Olho pedra, vejo pedra mesmo.
O mundo, cheio de departamentos,
não é a bola bonita caminhando solta no espaço. (...)
Adél
ia P
rado
FICHA CATALOGRÁFICA
ISSN 0102-1052
Publicação do Tribunal de Contas do Estado de Minas GeraisAv. Raja Gabaglia, 1.315 — LuxemburgoBelo Horizonte — MG — CEP: 30380-435
Revista: Edifício anexo — (0xx31) 3348-2142Endereço eletrônico: <[email protected]>
Site: <www.tce.mg.gov.br>
As matérias assinadas são de inteira responsabilidade de seus autores.
Solicita-se permuta. Exchange is invited. Pidese canje. On demande l’échange. Man bittet um Austausch. Si richiede lo scambio.
Projeto gráfico: Alysson Lisboa Neves — MTB/0177-MG — [email protected]
Capa, contracapa e diagramação:Unika.com Editora
Poema da primeira folha: Paixão. PRADO, Adélia.
Poesia Reunida. Siciliano, 1991. 4ª ed., 1995.
Impressão e acabamento:Rona Editora Gráfica
FICHA CATALOGRÁFICA
Revista do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais. Ano 1, n. 1 (dez. 1983- ). Belo Horizonte: Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, 1983 -
Periodicidade irregular (1983-87) Publicação interrompida (1988-92) Periodicidade trimestral (1993- )
ISSN 0102-1052
1. Tribunal de Contas — Minas Gerais — Periódicos 2. Minas Gerais — Tribunal de Contas — Periódicos.
CDU 336.126.55(815.1)(05)
TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAIS
CONSELHOWanderley Geraldo de Ávila
Presidente
Antônio Carlos Doorgal de AndradaVice-Presidente
Adriene Barbosa de Faria AndradeCorregedora
Eduardo Carone CostaConselheiro
Elmo Braz Soares Conselheiro
Sebastião Helvecio Ramos de CastroConselheiro
Gilberto DinizConselheiro em exercício
AUDITORIA
Edson Antônio ArgerGilberto Diniz
Licurgo Joseph Mourão de OliveiraHamilton Antônio Coelho
MINISTéRIO PúbLICO DE CONTAS
Glaydson Santo Soprani MassariaProcurador-Geral
Maria Cecília Mendes BorgesProcuradora
Cláudio Couto Terrão Procurador
COMPOSIÇÃO DO PLENO*
Conselheiro Wanderley Geraldo de Ávila — PresidenteConselheiro Antônio Carlos Doorgal de Andrada — Vice-Presidente
Conselheira Adriene Barbosa de Faria Andrade — CorregedoraConselheiro Eduardo Carone Costa
Conselheiro Elmo Braz SoaresConselheiro Sebastião Helvecio Ramos de Castro
Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz
*As reuniões do Tribunal Pleno ocorrem às quartas-feiras, 14h.
Diretor da Secretaria-Geral: Marconi Augusto Fernandes de Castro BragaFones: (31) 3348-2204 [Diretoria]
(31) 3348-2128 [Apoio]
COMPOSIÇÃO DA PRIMEIRA CÂMARA*
Conselheiro Antônio Carlos Doorgal de Andrada — PresidenteConselheira Adriene Barbosa de Faria Andrade
Conselheiro em Exercício Gilberto DinizAuditor Relator Edson Antônio Arger
Auditor Relator Licurgo Joseph Mourão de Oliveira
*As reuniões da Primeira Câmara ocorrem às terças-feiras, 14h30.
Diretora da Secretaria: Joeny Oliveira Souza FurtadoFones: (31) 3348-2585 [Diretoria]
(31) 3348-2281 [Apoio]
COMPOSIÇÃO DA SEGUNDA CÂMARA*
Conselheiro Eduardo Carone Costa — PresidenteConselheiro Elmo Braz Soares
Conselheiro Sebastião Helvecio Ramos de CastroAuditor Relator Gilberto Diniz
Auditor Relator Hamilton Antônio Coelho
*As reuniões da Segunda Câmara ocorrem às quintas-feiras, 10h.
Diretora da Secretaria: Mônica da Cunha RodriguesFones: (31) 3348-2415 [Diretoria]
(31) 3348-2189 [Apoio]
TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAIS
CORPO INSTRUTIVODIRETORIA-GERAL DE CONTROLE ExTERNO
Cristina Márcia de Oliveira Mendonça Fone: (31) 3348-2370
DIRETORIA DE CONTROLE ExTERNO DO ESTADOValquíria de Sousa Pinheiro
Fone: (31) 3348-2223
DIRETORIA DE ASSUNTOS ESPECIAIS E DE ENGENHARIA E PERÍCIACristiana de Lemos Souza Prates
Fone: (31) 3348-2516
DIRETORIA DE CONTROLE ExTERNO DOS MUNICÍPIOSConceição Aparecida Ramalho França
Fone: (31) 3348-2255
DIRETORIA-GERAL DE ADMINISTRAÇÃORodrigo Gatti Silva
Fone: (31) 3348-2101
DIRETORIA DE GESTÃO DE PESSOASFlávia Maria Gontijo da Rocha
Fone: (31) 3348-2120
DIRETORIA DE PLANEJAMENTO, ORÇAMENTO E FINANÇASIsabel Rainha Guimarães Junqueira
Fone: (31) 3348-2220
DIRETORIA ADMINISTRATIVA E DE SERVIÇOSLanglebert Alvim da Silva
Fone: (31) 3348-2402
DIRETORIA DA TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃOArmando de Jesus Grandioso
Fone: (31) 3348-2308
DIRETORIA DA SECRETARIA-GERALMarconi Augusto F. Castro Braga
Fone: (31) 3348-2204
DIRETORIA DA ESCOLA DE CONTASRenata Machado da Silveira Van Damme
Fone: (31) 3348-2698
GAbINETE DA PRESIDêNCIAFátima Corrêa de Távora
Chefe de GabineteFone: (31) 3348-2481
Antônio Rodrigues Alves JúniorAssessor
Fone: (31) 3348-2312
REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAISEdição Especial — ano XXVIII
Revista do
Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais
DIRETOR
CONSELHEIRO ANTôNIO CARLOS DOORGAL DE ANDRADA
VICE-DIRETOR
AUDITOR LICURGO JOSEPH MOURãO DE OLIVEIRA
SECRETÁRIA
MARIA TEREzA VALADARES COSTA
ORGANIZAÇÃO E ELAbORAÇÃO
CAROLINA PAGANI PASSOSCLÁUDIA COSTA DE ARAÚJO
LUCIANA MENICUCCI DE MIRANDA PROCÓPIO
- PESQUISA -BERNARDO GONTIJO BIRCHAL
EQUIPE TÉCNICA
ALINE TOLEDO SILVAELIANA SANCHES ENGLER
LÍVIA MARIA BARBOSA SALGADOREGINA CÁSSIA NUNES DA SILVA
- REVISÃO -LEONOR DUARTE FADINI
MARIA JOSÉ DE ARAÚJO RIOSMARIA LÚCIA TEIXEIRA DE MELO
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Entr
evis
taREVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAISEdição Especial — ano XXVIII
O Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, dando continuidade à publicação de edições
especiais da Revista do TCE, iniciada com a revista “A Lei 8.666/93 e o TCEMG”, lança seu
segundo número da série com o título “Concursos Públicos”.
Uma vez mais, o Tribunal, seguindo as diretrizes da gestão do Conselheiro Presidente Wanderley
Ávila, no biênio 2009-2010, busca concretizar seu papel pedagógico, apresentando aos
jurisdicionados esta Revista especial toda dedicada ao tema concursos públicos, com conteúdo
eminentemente orientador, dado inexistir hoje, no Brasil, lei geral — e, muitas vezes, lei própria
de cada ente federado — que aborde o tema e estabeleça as balizas para atuação dos gestores.
Esta revista, elaborada por servidores deste Gabinete e pela Comissão de Jurisprudência e
Súmula, sob a coordenação da Vice-Presidência, está organizada em quatro seções:
A primeira traz entrevista com o Juiz de Direito de entrância especial, Jair Eduardo Santana,
buscando delinear o entendimento do Judiciário mineiro acerca de pontos polêmicos
relacionados aos concursos públicos.
A segunda seção dedica-se à doutrina, trazendo seis artigos elaborados por estudiosos da
temática, a saber: Conselheiro Sebastião Helvecio, Membro do Tribunal de Contas do Estado
de Minas Gerais; Procurador Cláudio Couto Terrão, Membro do Ministério Público de Contas do
Estado de Minas Gerais; Professora Cristiana Fortini, Procuradora-Geral Adjunta do Município
de Belo Horizonte; Professor Fabrício Motta, Membro do Ministério Público de Contas dos
Municípios de Goiás; Professor Florivaldo Dutra de Araújo, Procurador da Assembleia Legislativa
do Estado de Minas Gerais; e Professora Raquel Melo Urbano de Carvalho, Procuradora do
Estado de Minas Gerais.
A terceira seção reúne, de forma sistematizada e comentada, a jurisprudência produzida pelo
TCEMG a partir da edição da Instrução Normativa n. 05/2007, que, na sua redação original,
instituiu, a órgãos e entidades das Administrações Direta e Indireta dos Poderes do Estado e
Apresentação
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REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAISEdição Especial — ano XXVIII
dos Municípios, a obrigatoriedade de comunicar ao Tribunal de Contas a realização de concurso
público para admissão de pessoal, encaminhando para análise o edital do concurso, a legislação
atinente e o demonstrativo de ocupação das vagas dos cargos efetivos/empregos públicos do
quadro de pessoal na data imediatamente anterior à elaboração do edital.
Nessa seção serão apresentados os julgados mais significativos da Corte de Contas
mineira, dispostos de modo a respeitar a ordem cronológica em que os atos que compõem
o procedimento do concurso público devem se realizar, servindo de verdadeiro guia aos
gestores, a fim de que possam verificar, passo a passo, as etapas da realização dos concursos
em seus órgãos e entidades.
A quarta e última seção, nomeada “Anexos”, apresenta uma série de leis, decretos e decisões
de tribunais superiores acerca da matéria, que visam guiar os jurisdicionados na realização dos
seus concursos públicos.
Dado que a fonte de pesquisa desta edição é principalmente a jurisprudência do Tribunal de
Contas mineiro, é imprescindível que os gestores busquem a constante atualização, verificando
novos julgados, seja por esta Corte ou por outros Tribunais do país, propondo e fomentando
a discussão do tema e de novas teses sobre conceitos e entendimentos que, porventura,
necessitem ser revisitados.
Como afirmado quando da primeira edição especial da Revista do TCE, a efetiva democratização
da jurisprudência é possível mediante a construção do conhecimento, o qual somente se
consolida e se renova por meio de um processo dialógico.
Conselheiro Antônio Carlos Doorgal de AndradaDiretor da [email protected]
REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAISEdição Especial — ano XXVIII SUMÁRIO
Entrevista
Professor Jair Eduardo Santana 13
Doutrina
A legitimação da escolha das forças da ação administrativaSebastião Helvecio Ramos de CastroDélia Mara Monteiro 29Reserva de vagas na administração pública para as pessoas com deficiência:ação afirmativa e concurso públicoCláudio Couto TerrãoRachel Campos Pereira de Carvalho 43Ponderações sobre a prova de títulos nos concursos públicos Cristiana FortiniVirginia Kirchmeyer Vieira 56Direitos fundamentais e concurso públicoFabrício Motta 68Concurso público e direito à nomeação: nem tanto ao mar, nem tanto à terraFlorivaldo Dutra de Araujo 86Aspectos relevantes do concurso público Raquel Melo Urbano de Carvalho 101
Concursos públicos na jurisprudência do Tribunal de Contas
Considerações iniciais 151Fase Interna 153Fase Externa 156
Da Publicidade 156 Das Inscrições 158
Período de inscrições 158Taxa de inscrição 159Vícios nas inscrições 164Inscrições de estrangeiros 165
Das inscrições de pessoas com deficiência e reserva de vagas 167Das disposições gerais do edital 174Das vagas 174Dos cargos 176
Exceção à criação de cargos por meio de lei 180Requisitos e exigências para o acesso aos cargos 182
Escolaridade mínima exigida 182 Tempo de experiência profissional 183
REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAISEdição Especial — ano XXVIII
Das provas 186Orientações gerais à realização das provas 187Tipos de provas 189
Da divulgação dos resultados provisórios 194Dos recursos 194 Dos Critérios de desempate 196 Do resultado final e homologação do certame 198Do Prazo de validade do concurso 199
Procedimentos após a homologação 200Da nomeação 200Da verificação de impedimentos à posse 202Da posse 205
Considerações finais 209
Anexos
Decisões do STF 215Repercussão geral em recurso extraordinário 598.099/MS 215Agravo regimental no agravo de instrumento 769.433/CE 222 Mandado de segurança 26.310-5/DF 226Repercussão geral em recurso extraordinário 572.499-9/SC 233Agravo regimental no recurso extraordinário 584.444/DF 239
Decisões do STJ 243Recurso especial 1.143.717/DF 243Mandado de segurança 8.482/DF 250Agravo regimental no agravo de instrumento 1.291.819/DF 259Agravo regimental no recurso em mandado de segurança 22.730/ES 265
Legislação federal 273Decreto Federal 6.944/2009 273Decreto Federal 3.298/1999 286
Legislação estadual 289Decreto Estadual 42.899/2002 289Lei Estadual 11.867/1995 294Lei Estadual 13.392/1999 295Lei Estadual 13.801/2000 296
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taREVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAISEdição Especial — ano XXVIII
Entrevistaw
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REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAISEdição Especial — ano XXVIII
REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAISEdição Especial — ano XXVIII
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REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAISEdição Especial — ano XXVIII
EnTREvisTa PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA
O entrevistado da Edição Especial da Revista do TCE, ano XXVIII, é Jair Eduardo
Santana. Nascido em São Paulo, obteve o título de mestre em Direito do Estado pela
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), em 1992, com dissertação
intitulada “Competências legislativas municipais”, sob a orientação do Professor
Celso Ribeiro Bastos. Juiz de Direito de entrância especial na Circunscrição Judiciária de Belo
Horizonte é, ainda, Professor da Escola Judicial Desembargador Edésio Fernandes, do Tribunal
de Justiça do Estado de Minas Gerais e de cursos de pós-graduação. Palestrante e conferencista
em diversos Estados brasileiros, nosso entrevistado possui diversas obras e artigos publicados em
revistas especializadas, demonstrando profundo conhecimento do Direito Público, sobretudo,
licitações, agentes políticos e concursos públicos. E foi exatamente este último tema, concursos
públicos, o foco da entrevista com o Professor cujas respostas aos questionamentos formulados
e reflexões lançam luzes sobre pontos polêmicos desta seara.
REVISTA DO TCE — Qual a visão de Vossa
Excelência sobre o papel do Judiciário
na concretização dos dispositivos
constitucionais que regem a realização de
concursos públicos?
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA —
Precisa ficar bem esclarecido que as regras
constitucionais relativas ao concurso público se
materializam no sentido de bem instrumentalizar
o Poder Público para a consecução das suas
atividades finalísticas e acessórias.
Por outras palavras, os elementos orgânicos
governamentais se corporificam, via de regra,
em estruturas físicas nas quais se alocam bens
ARqUIVO PESSOAL
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REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAISEdição Especial — ano XXVIII
REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAISEdição Especial — ano XXVIII
e outros meios para a prática das funções que lhe são próprias. Estou
falando da materialização de um poder, como se diz em linguagem
corrente. E, para exemplificar, cito um tribunal de justiça. Esse poder
(ou função judicial) assume forma real por meio de prédios, pessoas
e outros instrumentos que, juntos, cumprem a missão de julgar; além
de outras, constitucionalmente previstas.
Pensemos que a engrenagem toda não funcionaria se essas estruturas
não contassem com o elemento humano. Calha repetir o que sempre
faço questão de evidenciar: a tão buscada eficiência da Administração
Pública está, antes de tudo, nas pessoas que a integram e não apenas
nas outras dimensões orgânicas do Estado.
Considerando esse ponto de vista, tenho comigo que o tema concurso
público é, assim, extremamente sensível e importante para o nosso
setor já que dele dependem, em grande parte, os resultados que
serão produzidos para a sociedade.
REVISTA DO TCE — Considerando o aumento, nos últimos anos, das
políticas afirmativas para a inclusão de minorias, como Vossa Excelência
analisa a utilização da chamada discriminação lícita em concursos
públicos? Vossa Excelência reconhece distorções nessa política de
inclusão que possam redundar numa discriminação inversa?
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA — A matriz constitucional
aplicável aos concursos públicos imanta o secular princípio isonômico,
não obstante a redação do inciso I (art. 37, CF/88) referenciar, na
parte primeira, a questão da acessibilidade irrestrita.
quando se pretende, assim, favorecer desfavorecidos, minorias
ou alguma categoria específica de pessoas, dando-lhes tratamento
diferenciado, há sempre o risco de se transitar em zona proibida ou
aparentemente vedada.
Lembro-me de um caso que ficou famoso, ocorrido em Santa Catarina,
onde o Poder Público criou cotas para afrodescendentes em concurso
para provimento de cargos de auxiliar administrativo. Em situações
assim, o Judiciário é chamado para controlar eventuais desbordamentos
dessas políticas públicas de inclusão e, como é esperado, discute-
4“[...] a tão buscada eficiência da Administração Pública está, antes de tudo, nas pessoas que a integram e não apenas nas outras dimensões orgânicas do Estado.”
REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAISEdição Especial — ano XXVIII
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taREVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAISEdição Especial — ano XXVIII
se essa possibilidade contrastada com a proibição de discriminação
racial (que é um outro valor prestigiado na Constituição Federal).
Mas o sistema legal permite a discriminação e, nesse caso, ela é lícita.
Para que assim seja, no entanto, o fator desigualador (ou discrímen)
há de ser tolerado pela Constituição Federal.
Enfim, definir com precisão qual seja o conteúdo jurídico da isonomia
é a grande e tormentosa questão.
REVISTA DO TCE — Vossa Excelência acredita na possibilidade de
mitigação da previsão legal de que, para o acesso a determinados
cargos, o candidato deva apresentar ficha de antecedentes criminais?
Por exemplo, o fato de um candidato ter cumprido pena por crime de
menor potencial ofensivo e outro que tenha cumprido pena por crime
de roubo, ambos deveriam ser reprovados em prova de capacitação
moral, comumente exigida nos concurso de ingresso às academias
de polícia? E qual é o seu o posicionamento em face das figuras
despenalizadoras para esses casos, como a suspensão condicional do
processo, transação penal, na qual nunca se chegará a um juízo de
certeza sobre a materialidade, autoria e culpabilidade?
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA — A pergunta é quase um
turbilhão que agita e funde diversos valores, sob dimensões plurais.
Talvez por isso seja muito instigante. Mas separemos as coisas. Começo
lembrando que o concurso público se realiza em prol da coletividade.
Ele existe, em resumo, para suprir as demandas do Poder Público
mediante a materialização instrumental de recursos humanos dentro
da Administração. É a forma mais adequada para captação da força
de trabalho do Estado.
De outra parte, todos sabemos que a Administração Pública está guiada
por vetores intransponíveis, dentre eles a moralidade administrativa.
quando se pensa, assim, em investigação social e bons antecedentes
de candidatos a cargos públicos, o que se está fazendo? Entendo
que, no caso, estamos buscando a densificação daquela moralidade
administrativa que é exigida pela Constituição Federal. E não tenho
dúvida da preponderância necessária do coletivo sobre o individual.
4“Começo lembrando que o concurso público se realiza em prol da coletividade. [...] É a forma mais adequada para captação da força de trabalho do Estado.”
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REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAISEdição Especial — ano XXVIII
REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAISEdição Especial — ano XXVIII
O administrador tem que atuar com muita cautela na aferição desse
quesito para não ferir direitos individuais. E nesse passo é perfeitamente
legítimo ao Poder Judiciário, no exercício de suas competências
constitucionais, exercer o controle da razoabilidade dos motivos
declinados pela Administração Pública para excluir o candidato de
concurso público, por reputá-lo desmerecedor de confiança.
De qualquer forma, a austeridade desmedida da Administração Pública
e os frequentes equívocos cometidos em detrimento a candidatos são
abrandados pelo Judiciário no dia a dia.
Não se pode deixar de lembrar que no sistema brasileiro punitivo há
institutos que tratam da reabilitação do condenado, da presunção da
inocência, e de outros tantos que integram uma região impenetrável
pelo Poder Público. O próprio sistema punitivo não tem mais, como
tinha no passado próximo, apenas caráter retributivo. Hoje, fala-se
muito em reinserção, ressocialização e em temas afins.
Nesse contexto há de se equalizar as diretrizes do sistema punitivo
com aquelas existentes para o concurso público porque inegavelmente
há pontos convergentes.
Ou seja, o casuísmo e as especificidades de uma dada situação de
fato é que ditarão as normas de incidência e a resolução concreta.
REVISTA DO TCE — Em sede de concursos públicos, seria cabível o
princípio do non reformatio in pejus, especialmente nos casos em
que o candidato avia recurso em face de nota obtida em questão
discursiva? Em caso afirmativo, como conciliar esse princípio
com a finalidade precípua dos concursos, que é justamente
selecionar aqueles candidatos que obtenham melhor desempenho
nas avaliações? E como Vossa Excelência enxerga a atuação do
Judiciário nessa seara?
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA — Penso que o norte da avaliação
numa prova discursiva esteja parametrizado por alguns princípios que
aqui já relatei; princípios constitucionais que subordinam o atuar da
Administração Pública e que sobrepairam ao interesse particular.
4“[...] há de se equalizar as diretrizes do sistema punitivo com aquelas existentes para o concurso público porque inegavelmente há pontos convergentes.”
REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAISEdição Especial — ano XXVIII
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taREVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAISEdição Especial — ano XXVIII
A reformatio in pejus talvez demande explicação. Havendo um
recurso (e nem pensemos apenas na esfera judicial) do candidato,
a autoridade competente (que poderia até ser da instância judicial)
reforma a situação anterior desfavoravelmente ao candidato. A
questão é saber se esse fenômeno poderia acontecer em concursos
públicos em detrimento de algum candidato.
Imagino que o instituto tem aplicação obrigatória no caso. Exatamente
em razão dos princípios que são carregados pelo tema. Porém, há de
se excepcionar eventual previsão normativa em contrário.
Recorde-se que a Lei n. 9.784/99 estabelece que não cabe reformatio
in pejus na revisão de processos de que resultem sanções. Mas esse
parece não ser o caso do recurso de prova discursiva.
REVISTA DO TCE — Qual o fundamento para que nos concursos das
chamadas carreiras jurídicas, como a Magistratura e o Ministério Público,
exija-se do candidato, no ato da inscrição definitiva, a comprovação de
três anos de atividade jurídica? Tal exigência, extraída das alterações
promovidas pela Emenda Constitucional n. 45/2004, não confrontaria
com o princípio da ampla acessibilidade aos cargos públicos e com o fato
de que, em verdade, a experiência serve ao exercício do cargo, sendo
inócuo exigir-se tal requisito na inscrição definitiva, quando sequer há
certeza de que o candidato será de fato aprovado?
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA — Não vejo qualquer
inconsistência entre a previsão constitucional e os fluxos
procedimentais que dela derivam para que se exija do candidato a
experiência anterior em atividade jurídica.
Nesse ponto específico, confesso-me contaminado por pensamento
particular e entendo indispensável que haja conjugação bem afinada
dessa experiência anterior com o fator idade mínima. Acho até bem
flexíveis as normas vigentes.
Permito-me resgatar uma ideia própria que externei num dos meus
livros,1 a propósito desse enfoque. Eu escrevi que a atividade de
realização do Direito há que somar diversos saberes; é imprescindível 1 SANTANA, Jair Eduardo. Direito, justiça e espiritualidade. Belo Horizonte: Inédita, 2000.
4“[...] a atividade de realização do Direito há que somar diversos saberes; é imprescindível que o operador jurídico esteja consciente de que vive, em toda a materialização jurídica, uma dinamização emocional [...] A compreensão desses elementos é necessária para que se consiga uma justiça que não está nos códigos e que nem mesmo integra a grade curricular das casas de ensino.”
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REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAISEdição Especial — ano XXVIII
REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAISEdição Especial — ano XXVIII
que o operador jurídico esteja consciente de que vive, em toda a
materialização jurídica, uma dinamização emocional relacionada
com medos, ódios, competição, amor, defesa e demais sentimentos
humanos. A compreensão desses elementos é necessária para que
se consiga uma justiça que não está nos códigos e que nem mesmo
integra a grade curricular das casas de ensino.
No particular caso do julgador, recordo que a decisão neutra é um grande
mito. Simplesmente porque o processo de julgar (decidir) é realizado
por alguém que é naturalmente sensível, emotivo e até intuitivo.
Muitos atributos relacionados a isso tudo que eu disse não são
facilmente encontráveis nos muito jovens e inexperientes.
REVISTA DO TCE — Muitas críticas apontam para a pouca idade
de juízes e promotores, em especial quando cotejada com a
importância e o rol das atividades a serem desempenhadas nos
referidos cargos. Vossa Excelência entende que, nesses casos,
seria justificável, juridicamente, a fixação de uma idade mínima
para o desempenho dessas funções?
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA — Acabei avançando um pouco
sobre isso na resposta anterior. E parece ter ficado claro que eu
entendo indispensável a maturidade para o exercício dessas tão nobres
funções. Entendo, assim, procedentes tais críticas e indispensável a
fixação de idade mínima.
Aproveito para decantar mais essa ideia e dizer que o fator idade
se atrela à bagagem de cada indivíduo, revelando a sua própria
experiência. É temeroso para a sociedade se o julgador (no caso de
concursos para a Judicatura), por inexperiência, não souber distinguir
o Direito da Justiça. Esta não se confunde com aquele, embora se
relacionem estreitamente.
A compreensão do Direito, no particular caso, perpassa pelo
autoconhecimento de quem é aplicador das regras; o Direito não se
resume a um conjunto de normas que, somadas e confrontadas, dão a
solução para um caso concreto. quem se esquece da noção do justo,
desdenha o fato e o valor, fixando-se puramente na regra jurídica.
4“É temeroso para a sociedade se o julgador (no caso de concursos para a Judicatura), por inexperiência, não souber distinguir o Direito da Justiça. Esta não se confunde com aquele, embora se relacionem estreitamente.”
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Entr
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taREVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAISEdição Especial — ano XXVIII
Enfim, há certos saberes que estão associados à maturidade. É o que
penso há mais de duas décadas.
Se não for impertinente mencionar, esse é outro aspecto que já me
levou a publicar um outro trabalho escrito denominado Limites da
decisão judicial na colmatação de lacunas — perspectiva social da
atividade judicante.2
REVISTA DO TCE — Vossa Excelência acredita ser vedado o controle
judicial do perfil psicológico exigido pela Administração para avaliar
candidatos em exame psicoténico? Nesse contexto, na opinião de
Vossa Excelência, qual seria a melhor forma de se tornar os exames
psicotécnicos mais objetivos?
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA — Falando em gênero,
recordemos que o concurso público visa aparelhar o Estado do ponto
de vista humano e instrumental. O sujeito é que, após um determinado
certame, assume porção (maior ou menor) do poder político estatal
para realizar os fins públicos.
Esse relacionamento entre o sujeito e o Estado (no aspecto do
exercício do poder) é algo que há séculos fascina o ser humano. A
história da humanidade está permeada por exemplos de que não
temos uma relação muito pacífica com o poder político.
Por isso não é irracional aferir-se o equilíbrio emocional do candidato
e outros aspectos relativos ao psicotécnico. Porém, o Poder
Judiciário não tem tolerado procedimentos arbitrários, subjetivos
e sem suporte legal.
Nesse contexto, a melhor maneira de objetivar tais exames é tornar as
suas regras mais transparentes; e prévias, para conhecimento geral.
Não é raro discutir-se em juízo regras de concursos públicos que entendem
que o resultado do psicotécnico não é passível de recurso (revisão).
REVISTA DO TCE — Qual o posicionamento de Vossa Excelência
sobre os chamados cadastros de reserva, considerando a nova
2 SANTANA, J. E. Limites da decisão judicial na colmatação de lacunas — perspectiva social da atividade judicante. Belo Horizonte: Inédita, 1998.
4“[...] não é irracional aferir-se o equilíbrio emocional do candidato e outros aspectos relativos ao psicotécnico. [...] Nesse contexto, a melhor maneira de objetivar tais exames é tornar as suas regras mais transparentes; e prévias, para conhecimento geral.”
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REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAISEdição Especial — ano XXVIII
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orientação jurisprudencial no sentido de que os candidatos,
aprovados dentro do número de vagas ofertadas, têm direito
à nomeação no prazo de validade do concurso, e não mera
expectativa de direito? E os concursos que preveem prazo
de validade extremamente exíguo, também seriam passíveis
de questionamento ao fundamento de que funcionam como
subterfúgio a essa orientação jurisprudencial? Vossa Excelência
teria alguma sugestão para o controle dessas situações?
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA — Esse tema é tormentoso. No
passado recente, o candidato aprovado mantinha a expectativa de
nomeação até a expiração do prazo de validade do concurso. Havia
uma nefasta dependência para a materialização do direito do candidato
que, com a evolução da jurisprudência, se consolidou no sentido que
se há concurso, há vaga e, consequentemente, direito à nomeação.
O cadastro de reserva acaba se transformando, na realidade,
num meio termo entre a situação antiga e o entendimento mais
vanguardeiro. Mas não se poderá, por certo, tolerar que o expediente
se transforme numa fórmula para driblar os propósitos do concurso
ou os interesses do candidato.
Nesse ponto, acho muito importante que todos os órgãos de
controle — destaco os Tribunais de Contas, o Judiciário, o Ministério
Público (sem prejuízo do controle social) — estejam mais atentos
à etapa interna dos concursos. Ali é que devem estar estampadas,
justificadas e motivadas todas as ações que foram desencadeadas
em relação ao certame.
A etapa interna revelará toda a demanda da Administração Pública,
em torno da necessidade de certa força de trabalho, a justificar
a instauração do certame, explicitará motivadamente todas as
circunstâncias que assim devam ser feitas, além de mostrar que a
decisão de gasto (aumento da despesa) estará suportada pelo poder
de gasto (compatibilidade e adequação orçamentária).
REVISTA DO TCE — A Constituição Federal prevê que os cargos,
empregos e funções públicas são acessíveis aos estrangeiros, na
4“[...] acho muito importante que todos os órgãos de controle — destaco os Tribunais de Contas, o Judiciário, o Ministério Público (sem prejuízo do controle social) — estejam mais atentos à etapa interna dos concursos.”
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forma da lei. Considerando que se trata de norma de eficácia
limitada, que o Estatuto do Estrangeiro não versa sobre a matéria
e que não há norma geral da União sobre concursos públicos, para
Vossa Excelência, de quem seria a competência para regular a
matéria? Edital de concurso poderia dispor nesse sentido?
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA — Sim, concordo que a norma
constitucional não tenha autoaplicabilidade e seja dependente da edição
de regra subalterna. Ou seja, está dito na CF/88 que a acessibilidade de
estrangeiros aos cargos demanda regulação em lei formal.
Entendo que todas as esferas de governo (União, Estados,
Municípios...) tenham competência legislativa para dispor sobre a
matéria específica, não havendo reserva para a pessoa política central
(União). Estou dizendo que o tema não está contemplado no art. 23
da CF/88, embora haja conexões por ali. Tenho para mim que o tema
é tipicamente de Direito Administrativo (legislação de pessoal), mas
há que se ter cuidado para não invadir os assuntos do art. 23 da
CF/88, que pertencem exclusivamente à União.
Se não houver lei formal disciplinando o assunto, não há como o
edital tratar disso.
REVISTA DO TCE — Qual o seu posicionamento sobre a possibilidade
de controle, pelos Tribunais de Contas, dos editais de concurso
público, considerando que os atos de admissão de pessoal estão
sujeitos à atuação das Cortes de Contas?
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA — Do ponto de vista constitucional,
é perfeitamente possível esse controle prévio. Pelo que sei, há norma
estadual mineira obrigando o exame prévio, pela Corte de Contas, do
certame deflagrado (concurso). Isso não só aprimora o concurso como
valoriza o caráter pedagógico da atuação do controle externo. Analisar
tão somente o edital do concurso é medida boa; avaliar toda a etapa
interna, incluindo o edital, seria ótimo.
De qualquer sorte, essa pergunta é um verdadeiro presente para
a sociedade porque permite destacar a importância do concurso
(enquanto mecanismo de arregimentação de pessoal no setor público)
4“Analisar tão somente o edital do concurso é medida boa; avaliar toda a etapa interna, incluindo o edital, seria ótimo.”
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e o imenso trabalho que possui a Corte de Contas para zelar pela
eficácia dessa medida, em sua latitude mais ampla.
E quando digo isso, não estou me reportando apenas a aspectos relativos
à legalidade, moralidade, eficiência, etc., embutidos nos concursos. O
papel da Corte de Contas, no caso, é por demais transcendente.
Sei do esforço da própria Corte de Contas para realizar esse mister.
Espero haja sempre vontade na Casa e recursos disponíveis para uma
atuação incisiva sobre essa demanda. Os benefícios são imediatos e
os ganhos sociais infinitos.
REVISTA DO TCE — Muitas pessoas alegam que a estrutura que
envolve a admissão de pessoal, mediante concurso público, protege
servidores improdutivos, mesmo após a implantação do procedimento
de avaliação periódica, o que contraria os princípios do interesse
público e da eficiência. Para Vossa Excelência, o que pode ser
feito para que a estabilidade não se torne um manto protetor aos
maus servidores? Como transformar a avaliação periódica em um
instrumento eficaz na observância de princípios constitucionais?
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA — O recrutamento de pessoal por
concurso público é feito para atender os interesses da Administração
(e da sociedade), como já dissemos aqui. Não teria sentido um grande
acautelamento no momento de ingresso, em diversos sentidos, e um
desdenho qualitativo em momento posterior.
A estabilidade adquirida após o estágio probatório não impede
a contínua avaliação do servidor. Essa avaliação, legalmente
recomendada aliás, deve ser efetiva; ela tem que sair do formalismo
genérico para ganhar ares de realidade concreta.
Nunca acreditei, no entanto, que esse ingrediente (a avaliação pura
e simples) pudesse surtir efeitos automáticos. Sempre defendi que a
questão da avaliação funcional estivesse atrelada ao cumprimento de
metas, apresentação de resultados e, sobretudo, ganhos (gratificação
ou equivalente) de produtividade. Haveria mais interesse tanto do
avaliador quanto do avaliado. Não seria interessante pensarmos mais
nesse aspecto?
4“Sempre defendi que a questão da avaliação funcional estivesse atrelada ao cumprimento de metas, apresentação de resultados e, sobretudo, ganhos (gratificação ou equivalente) de produtividade. Haveria mais interesse tanto do avaliador quanto do avaliado.”
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taREVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAISEdição Especial — ano XXVIII
REVISTA DO TCE — A Resolução n. 80 do CNJ declarou a vacância
dos serviços notariais e de registro ocupados em desacordo com
as normas constitucionais e determinou a realização de concursos
públicos para o preenchimento das vagas. Todavia, muitos Estados
ficaram inertes em relação à citada determinação. Para Vossa
Excelência, quais medidas podem ser tomadas para a efetivação
desta Resolução?
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA — O CNJ está mostrando que a
reforma trazida pela Emenda Constitucional n. 45 era mesmo necessária.
É claro que haverá ainda muitas idas e vindas em relação ao controle
e atuação do Conselho Nacional, o que se justifica pela própria pouca
idade desse mesmo Conselho (o CNJ, ainda muito novo).
De qualquer modo, em breve estarão vazios os espaços hoje ocupados
irregularmente. E onde houver descumprimento da Resolução n. 80/CNJ,
surge a possibilidade de responsabilização da autoridade competente.
Objetivamente, o CNJ tem diversos canais de comunicação
para deflagrar procedimentos visando ver cumpridas as suas
determinações.
A propósito, lembro que o ato normativo que rege a espécie é uma
Resolução; não se trata de simples recomendação.
REVISTA DO TCE — O Presidente do TCU, Ministro Ubiratan Aguiar, em
entrevista concedida a esta Revista, abordou a questão da relação
entre o Poder Judiciário e os Tribunais de Contas. Sustentou a
necessidade de maior integração, mediante a construção de pontes
institucionais. Como Vossa Excelência enxerga essa questão?
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA — Ouso ir além da proposta
feita pelo nobre Ministro Ubiratan Aguiar.
Há tempos propago a necessidade de criação de círculos institucionais
concêntricos.
As minhas pesquisas científicas e acadêmicas me propiciaram
concluir que as funções governativas devem estar, todas, alinhadas
4“O CNJ está mostrando que a reforma trazida pela Emenda Constitucional n. 45 era mesmo necessária.”
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e relacionadas, atuando não apenas em sinergia, mas sobretudo de
forma sincrônica e sistêmica.
Nos meus sugeridos círculos concêntricos, como sugere a visualização
hipotética semelhante a uma rosácea, haverá setores reservados e
setores comuns para as estruturas orgânicas e entidades constitucionais
de destaque.
O curioso, em minhas experiências, é que quanto mais aprofundo
a pesquisa localizo mais setores compartilhados do que setores
reservados. Isso me mostra que o alinhamento estratégico das funções
governativas é mesmo uma necessidade inadiável.
Desde sempre me incomodou a sobreposição de funções e de gastos
públicos, sem o controle dos respectivos custos, diante de metas
opacas ou inexistentes. Ou seja, esse debate deveria ser aprofundado e
poderia ter início a partir das discussões dos planos orçamentários.
REVISTA DO TCE — No julgamento do Agravo Regimental no Recurso
Extraordinário 598.759, DJ 27/10/2009, o acórdão consignou que
“o Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento de que, em
situações excepcionais, é possível a remarcação de prova física,
em atendimento ao princípio da isonomia”. Comente o afirmado.
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA — O público talvez nem imagine
o quanto chega ao Judiciário envolvendo o assunto prova física em
concursos públicos. Há situações das mais interessantes.
A situação posta na decisão mencionada é bem simples e de facílima
compreensão.
A Administração Pública declarou inapta uma concursanda que nem
mesmo se submeteu a avaliação física exigida para a espécie. E ela não
fez a dita prova de aptidão em razão de ter dado à luz na época do exame.
Faltou bom senso ao administrador. Pensemos em termos práticos. Como
a concursanda, logo após o parto, poderia realizar uma prova física?
E se estivesse a concursanda em final de gestação? Pensemos no 8o
mês de gravidez. Alguém submeteria essa grávida a um teste de
4“As minhas pesquisas científicas e acadêmicas me propiciaram concluir que as funções governativas devem estar, todas, alinhadas e relacionadas, atuando não apenas em sinergia, mas, sobretudo, de forma sincrônica e sistêmica.”
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esforço físico (corrida, flexões, exercícios abdominais, rastejamento,
escaladas, etc.)? Chega a ser engraçado...
É óbvio que o teste teria que ser remarcado. E assim foi decidido pela
Justiça que homenageou a isonomia, mais uma vez.
REVISTA DO TCE — Quando da realização de concursos públicos, muito se
discute a respeito da cobrança de taxas de inscrição. Qual a opinião de
Vossa Excelência sobre esse tema? Ainda tratando de taxas de inscrição,
como Vossa Excelência enxerga a previsão contida na Lei Estadual n.
13.392, de 07/12/1999, segundo a qual a isenção da taxa de inscrição
do concurso público somente será concedida aos desempregados,
mediante comprovação por meio da Carteira de Trabalho?
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA — A realização de um concurso
público envolve uma enorme gama de providências e nem sempre a
Administração Pública tem condições de, sozinha, arcar com toda
essa demanda. Ou seja, sempre há geração de gastos e, não raro, a
contratação de terceiros para se desincumbir da tarefa.
Esse cenário agita diversos apontamentos.
A cobrança de taxa de inscrição pode ser medida necessária a suprir
os enormes custos derivados do certame. A etapa interna do concurso
(à qual já me referi) irá mostrar a magnitude desse universo. E já
anunciará não apenas a legalidade da medida (cobrança) quanto a
solução encontrada para tratar do tema. Como cobrar, quanto cobrar,
de quem cobrar, o que fazer com a receita, como tratar o déficit
de ingressos, se houver, dentre outros tantos, são todos temas que
devem ser visualizados previamente pela Administração responsável
por realizar o certame.
Isso tudo para não se falar do processo de escolha da empresa ou
entidade que realizará o certame (contratação direta? licitação?
nesse caso, pregão?). Devemos estar atentos a esse importante
aspecto porque muito se pode discutir sobre isso.
O fato é que a realização do concurso tem um determinado custo (que
representará para a Administração um determinado gasto ou despesa).
4“Alguém submeteria essa grávida a um teste de esforço físico (corrida, flexões, exercícios abdominais, rastejamento, escaladas, etc.)? [...] É óbvio que o teste teria que ser remarcado. E assim foi decidido pela Justiça que homenageou a isonomia, mais uma vez.”
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A receita advinda do certame não deveria ser estimada para gerar
lucro, mas tão somente estabelecida para suportar as respectivas
despesas. Registro que os valores das taxas têm regime público e
devem ser direcionados ao Tesouro; jamais poderiam ser objeto de
ajuste de risco com entidades promotoras e executoras de concursos
públicos. Permitir trânsito desses recursos por contas particulares
(privadas) não é boa medida.
Enfim, tive oportunidade de publicar artigo que enfrenta essas
questões complexas. Se for de interesse, ele está publicado em
revistas especializadas e disponível em meu site pessoal.3
Acho que a Lei n. 13.392, de Minas Gerais, é sábia ao instituir a
isenção para quem não pode custear a inscrição. O edital deve bem
disciplinar a operacionalização do tema para não gerar inconsistências
e criar ambiente para que o direito seja de fato exercido. A norma
não posta em mão única para favorecer apenas o candidato. Ela
favorece também os interesses da Administração. É regra de mão
dupla, portanto.
3 <www.jairsantana.com.br>artigos>direito administrativo>Licitação>. Empresa Promotora de Concursos Públicos. Contratação Direta. Regime Jurídico da Taxa de Inscrição. Considerações.
4“[...] a realização do concurso tem um determinado custo (que representará para a Administração um determinado gasto ou despesa). A receita advinda do certame não deveria ser estimada para gerar lucro, mas tão somente estabelecida para suportar as respectivas despesas.”
Por: Carolina Pagani Passos, Cláudia Costa de Araújo, Leonardo de Araújo Ferraz, Luciana Menicucci de Miranda Procópio e Maria Tereza Valadares Costa
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Sebastião Helvecio Ramos de Castro
Doutor em Planejamento, Administração e Políticas Públicas
pela UERJ/UFJF. Médico pela UFJF. Bacharel em Direito.
Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais.
Délia Mara Monteiro
Bacharel em Direito pela UFMG. Especialista em Direito Público pela
PUC Minas. Professora de Direito Administrativo, Direito Tributário
e Processos Constitucionais da Unifenas/BH. Técnica em Controle
Externo I do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais.
Resumo: O presente trabalho aborda o concurso público como instrumento de realização dos
princípios que regem a Administração Pública, principalmente, do princípio democrático. Para
além de uma conquista formal, a Constituição da República de 1988 garantiu o implemento de
significativos ganhos sociais e proporcionou modificações na Administração Pública. O concurso
público passou a ser obrigatório não apenas à primeira investidura, mas toda vez que haja
provimento originário, proporcionando a moralidade e a impessoalidade na Administração
Pública, assim como a licitude da despesa destinada a cobrir os gastos com pessoal.
Palavras-chave: Concurso público. Profissionalismo e eficiência do corpo administrativo.
Legitimidade do acesso ao serviço público.
Abstract: This paper discusses the public examination as an instrument of accomplishment
of the principles that rule Public Administration and especially the principle of democracy.
More than a formal achievement, the Constitution of 1988 pledged to implement significant
A legitimação da escolhadas forças da ação administrativa
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social gains and provided changes to the Public Administration. The public examination became
mandatory not only for the first office, but required every time there is an original provision, in
order to get the morality and impersonality in Public Administration, as well as the lawfulness
to cover personnel expenses.
Keywords: Public examination. Professionalism and efficiency in the administrative body.
Legitimacy to public service access.
1 Introdução
Os servidores públicos constituem uma espécie do gênero agentes públicos, que, em termos
bem simples, são pessoas físicas que prestam serviço ao Estado. Neste trabalho, focalizam-se
os servidores públicos titulares de cargos efetivos e os empregados públicos, pois são agentes
públicos que têm vínculo profissional com a Administração Pública e que ingressam no serviço
público através de concurso. A Constituição da República dedica várias normas para disciplinar
essas categorias, entre as quais a exigência de concurso público para o acesso aos quadros da
Administração Pública, nos termos do art. 37, II.
Ao declarar a ampla acessibilidade para o provimento de cargos e empregos públicos através do
concurso, a Constituição da República consagra os princípios da igualdade, da impessoalidade e
da moralidade, uma vez que todos que satisfaçam os requisitos legais têm iguais oportunidades
de disputar cargos e empregos na administração pública direta e indireta. Busca-se, com a regra
do concurso público, recrutar para a Administração Pública os profissionais mais competentes e
com maior aptidão para exercer o serviço público.
Pretendeu a Constituição de 1988 promover um serviço público profissional e sério, que não
sofresse influência das constantes alternâncias de poder inerentes ao regime republicano. Essa
diretriz fortalece a ação dos órgãos e entidades da Administração Pública, refletindo-se na
qualidade do serviço público.
Por questões metodológicas, neste artigo, quando as referências ao servidor público titular
de cargo efetivo e ao empregado público destinarem-se às duas categorias indistintamente,
utilizar-se-á a expressão agente público.
2 O Estado manifesta-se através do agente público
A noção de Estado é uma criação do homem. O Estado de Direito nasceu depois das revoluções
burguesas do século XVIII, que baniram o Estado Absolutista. A novidade do Estado de Direito foi
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subjugar totalmente a ação do Estado a um quadro normativo, impositivo para todos, Estado
e indivíduos. Segundo o Professor Celso Antônio Bandeira de Mello1, o Estado de Direito foi
resultante da confluência de duas vertentes de pensamento: o pensamento de Rousseau e o
pensamento de Montesquieu.
O pensamento de Jean Jacques Rousseau se apoiava na ideia de igualdade, de soberania popular.
Sendo todos os homens iguais, todo o poder a eles pertenceria. O Estado receberia parcelas do
poder deferidas pelos vários indivíduos. A justificação do poder não seria mais algum direito
divino ou derivado da força, mas, pelo contrário, seria resultante direta da vontade consoante
dos vários indivíduos componentes do todo social. Percebe-se, na ideia da soberania popular, o
conceito de democracia. O pensamento de Montesquieu fundava-se na observação de um fato:
todo aquele que tem poder tende a abusar dele. Para que os governos não se transformassem
em tiranias, seria preciso, então, que o poder detivesse o poder, porque esse se expande até
onde encontra limites.
Sendo abstrato o conceito de Estado, para que exista ação estatal, é preciso que existam pessoas
físicas que ajam em seu nome. Ainda na lição do Mestre Celso Antônio Bandeira de Mello2:
Então, para que tais atribuições se concretizem e ingressem no mundo natural é necessário o concurso de seres físicos, prepostos à condição de agentes. O querer e o agir desses sujeitos é que são, pelo Direito, diretamente imputados ao Estado (manifestando-se por seus órgãos), de tal sorte que, enquanto atuam nesta qualidade de agentes, seu querer e seu agir são recebidos como o querer e o agir dos órgãos componentes do Estado; logo, do próprio Estado. Em suma, a vontade e a ação do Estado (manifestada por seus órgãos, repita-se) são constituídas na e pela vontade e ação dos agentes; ou seja: Estado e órgãos que o compõem se exprimem através dos agentes, na medida em que ditas pessoas físicas atuam nesta posição de veículos de expressão do Estado. (grifos no original)
Aí está a importância da escolha da pessoa que vai atuar profissionalmente como depositária
da vontade e da ação do Estado. A seleção do profissional implica atribuir a ele a realização das
atividades-fim ou das atividades-meio postas sob a competência de determinado ente federativo.
Certamente, para que alguém atue, de forma contínua, em nome do Estado, desempenhando
as suas funções, é preciso estar legitimado para tanto.
É o concurso público o instrumento que vai legitimar a indicação daquele capacitado para
exercer o munus público. É a forma de escolher objetivamente — por critérios determinados
1 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 16. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2003. p. 29.
2 Ob. cit., p. 130.
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previamente, que não favoreçam uns em detrimento de outros — que discrimina os mais
qualificados para as atribuições que vão executar.
Como importam, cada vez mais, os efeitos e resultados da atuação administrativa, a
responsabilidade de se proceder à escolha do profissional é severa. Não basta instaurar um
concurso público, é preciso que atenda aos princípios da Administração Pública e que as provas
tenham um nível de complexidade compatível com as atribuições do cargo ou do emprego que
o concurso visa preencher.
Após a Emenda Constitucional n. 19/1998, que introduziu o princípio da eficiência no caput do
art. 37, a atividade administrativa deve ser eficiente, produzindo resultados concretos para
o conjunto da sociedade. Como ressalta Celso Antônio Bandeira de Mello, “entre nós nunca
é demais fazer ressalvas óbvias”3. Exigência dessa envergadura demanda, necessariamente,
a existência de um quadro de pessoal qualificado que possa responder de forma desejável às
demandas.
3 A realização do princípio democrático na escolha do agente
Com as mudanças sociais ocorridas nas últimas décadas do século passado, a consciência dos
direitos fundamentais tornou-se mais perceptível. As relações da Administração Pública com
os administrados tornaram-se diferentes. O Direito Administrativo também evoluiu e adquiriu
feição menos autoritária, procurando resolver as divergências entre o Estado e os cidadãos de
forma consensual.
De toda forma, observa-se que o Direito Administrativo fornece instrumentos para que o
agente público possa realizar as atribuições que a lei lhe determinou. Tanto é assim que o ato
administrativo possui atributos inexistentes no ato jurídico próprio às relações privadas, no
intuito de permitir à Administração Pública que proceda com o necessário para satisfazer o
interesse público.
O agente público exerce a função administrativa e usa de certas prerrogativas para cumprir o
seu dever legal. Imprescindível, portanto, que esse agente esteja habilitado, da forma como
a Constituição determina, para manejar as prerrogativas que o Direito Público lhe confere. O
concurso público proporciona a legitimação necessária ao servidor público.
Como ensina Diogo de Figueiredo Moreira Neto4,
3 Ob. cit., p. 112.
4 MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Mutações do Direito Público. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 56.
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[...] a democracia [...] continua a ser a opção de concentração, atribuição, distribuição, admissão, exercício e controle de poder que tem comprovadamente apresentado as melhores condições históricas de se adaptar às circunstâncias; de sobreviver, latente, quando necessário; de ressurgir flamante das ditaduras e, sobretudo, de satisfazer o anseio de liberdade inato ao homem.
Certamente, a superação da escolha subjetiva dos agentes públicos é assunto consolidado no
Brasil, haja vista que o órgão de cúpula do Poder Judiciário, o Supremo Tribunal Federal5, no
exercício do controle da Administração Pública e como guardião da Constituição, em recentíssima
decisão, ainda não publicada, declarou a inconstitucionalidade de lei do Estado do Tocantins,
como se pode verificar, in verbis:
STF derruba lei que criou 35 mil cargos comissionados em Tocantins e dá 12 meses para estado realizar concursos
O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu, na tarde desta quinta-feira (10/06/2010), o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4125 e considerou inconstitucional a Lei tocantinense 1.950/2008, que criou cerca de 35 mil cargos comissionados. Os ministros decidiram, ainda, conceder ao estado de Tocantins o prazo de 12 meses para substituir todos os servidores comissionados por servidores aprovados em concursos públicos.
O julgamento teve início na tarde de ontem, quando a relatora do caso, ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, reconheceu a inconstitucionalidade da norma questionada, e propôs que fosse estipulado um prazo para que o estado se adequasse à Constituição Federal, provendo os cargos com aprovados em concurso público, para que a administração pública estadual não sofresse solução de descontinuidade.
Na sequência do julgamento nesta quinta, todos os ministros acompanharam a relatora quanto à inconstitucionalidade da norma. Também foi unânime, entre os ministros presentes, o entendimento de que foi afrontosa a atitude do governador cassado de Tocantins, Marcelo Miranda, que, segundo os ministros, editou essa lei em agosto de 2008 com o claro intuito de substituir normas semelhantes que o STF tinha acabado de declarar inconstitucionais no julgamento das ADIs 3232, 3983 e 3990. Para o ministro Celso de Mello, o ato de Miranda seria uma verdadeira transgressão, que poderia até mesmo caracterizar crime de responsabilidade. Trata-se de um caso patológico, concluiu o ministro ao acompanhar o voto da relatora.
Divergência
Apenas os ministros Marco Aurélio e Cezar Peluso discordaram da relatora quanto à modulação dos efeitos da decisão. Para estes ministros, que também
5 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Notícias STF. Acesso em 19/06/10: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe. asp?idConteudo=154187>.
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consideraram a norma inconstitucional, a decisão do STF “há de ser observada
de imediato”, conforme frisou o ministro Marco Aurélio.
O presidente da Corte arrematou que o estado deveria apenas verificar quais
cargos se enquadram no que prevê o inciso IX do artigo 37 da Constituição Federal
de 1988, que dispõe sobre a possibilidade de “contratação por tempo determinado
para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público”, para
não causar descontinuidade nos serviços essenciais prestados pelo estado.
Comunicação
Além de declarar a inconstitucionalidade da norma e dar o prazo de 12 meses para
o estado realizar concurso público para substituir os comissionados, os ministros
concordaram em comunicar a decisão, oficialmente, ao Ministério Público (MP)
estadual e ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), para que essas
instituições possam atuar de forma incisiva para coibir atos dessa natureza, agindo
na defesa destes princípios fundamentais, nas palavras do ministro Gilmar Mendes.
A escolha do servidor público deve ser feita de forma impessoal, objetiva e democrática. A
justificação ética do servidor público, ao manejar os poderes para realizar a ação administrativa,
está na legitimidade do seu acesso ao serviço público. O concurso seleciona, democraticamente,
pois qualquer pessoa pode candidatar-se ao cargo público, inclusive os estrangeiros, nos termos
da lei, conforme dispõe o art. 37, I, da Constituição Cidadã.
Portanto, o concurso público é o meio técnico através do qual a Administração Pública seleciona
as forças da ação administrativa de forma moral, eficiente e meritória, assim como propicia
oportunidade a todos os que atendam os requisitos da lei, fixados de acordo com a complexidade
do cargo ou emprego. Pelo concurso público, afastam-se os ineptos e apaniguados.
A decisão do Supremo Tribunal Federal, referente ao Estado de Tocantins, sinaliza no sentido de
que os entes federados, que possuam em seus quadros agentes públicos admitidos irregularmente,
devem tomar providências para regularizar as admissões, realizando o concurso público a fim
de selecionar seu pessoal de forma adequada ao ordenamento jurídico.
A questão da admissão irregular precisa ser enfrentada e resolvida, pois provoca despesas
ilegítimas e vai repercutir mais tarde. Além das normas constitucionais sobre concurso
público, há, também, aquelas referentes à aposentadoria concedida pelo Regime Próprio de
Previdência do Servidor, admitida apenas aos servidores titulares de cargos efetivos da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações,
nos exatos termos do art. 40 da Constituição da República, com redação dada pela Emenda
Constitucional n. 20/98.
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As exceções quanto à necessidade de admissão por concurso público para a concessão de
aposentadoria no Regime Próprio de Previdência Social são: (a) os servidores estatutários,
admitidos até 05 de outubro de 1988, que não tenham cumprido, naquela data, o tempo
previsto para aquisição da estabilidade no serviço público, de acordo com o Parecer GM
030/02, que possui força vinculante na esfera federal, em conformidade com o disposto
no art. 40, § 1º, da Lei Complementar n. 73/93, do então Advogado-Geral da União, Gilmar
Ferreira Mendes6:
Nessa medida, são alcançados por tal regime (RPPS) os servidores estáveis, como também aqueles estabilizados nos termos do art. 19 do ADCT e aqueles que, mantidos no serviço público e sujeitos ao regime estatutário, não preenchem os requisitos mencionados na referida disposição transitória, alcançando, portanto, os estáveis e efetivados, os estáveis e não efetivados e os não estáveis nem efetivados. (grifo nosso)
Portanto, o exame da admissão do servidor público é extremamente importante na análise
da legalidade dos atos de aposentadoria. Após a Emenda Constitucional n. 20/98, o art. 40 da
Constituição da República passou a exigir, para a aposentadoria, que o servidor seja titular de cargo
efetivo, cujo acesso se dá após a aprovação em concurso público. Apesar da exigência, a Constituição
da República reconheceu o direito de estabilização do servidor não concursado no art. 19 do ADCT, e
tal direito foi estendido aos servidores estatutários que foram admitidos até 05/10/1988, na esfera
federal, por força do parecer vinculante da Advocacia-Geral da União GM-30/2002.
4 A evolução do Estado e a coerência do concurso público com os novos paradigmas dessa evolução
O Estado não é mais o tutor exclusivo do interesse público, cuja supremacia conferia-lhe
prerrogativas exercidas de forma autoritária. O Poder Público passa a ter nova configuração.
Odete Medauar7 ensina:
A atividade de consenso/negociação entre Poder Público e particulares, mesmo informal, passa a assumir papel importante no processo de identificação e definição de interesses públicos e privados, tutelados pela Administração.
O Direito Administrativo muda-se de intérprete autoritário do interesse público para mediador
de interesses públicos. Ainda na lição da Professora Odete Medauar8:
6 BRASIL. Advocacia-Geral da União. Parecer GM 030/02, de 04/04/2002. Brasília: Diário Oficial da União Eletrônico, de 03/04/2003. Disponível em: <www.agu.gov.br>. Acesso em 19/02.
7 MEDAUAR, Odete. O direito administrativo em evolução. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1992. p. 202.
8 Ob. cit., p. 202.
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A Administração deixa de deter a exclusividade no estabelecimento do interesse público; a discricionariedade se reduz, atenua-se a prática da imposição unilateral e autoritária de decisões. A Administração volta-se para a coletividade, passando a conhecer melhor os problemas e aspirações da sociedade. A Administração passa a ter a atividade de mediação para dirimir e compor conflitos de interesse entre as várias partes ou entre estas e a Administração. Daí decorre um novo modo de agir, não mais centrado sobre o ato como instrumento exclusivo de definição do interesse público, mas como atividade aberta à colaboração dos indivíduos. Passa a ter relevo o momento do consenso e da participação.
Também, Medauar9, na segunda edição de seu livro, de 2003, expressa:
Tais fatores levam à atenuação do exercício solitário do poder administrativo por parte do autor do ato, ocorrendo uma espécie de democracia de atos. Contribuem para essa atenuação: o compartilhar com a sociedade na identificação ou conciliação de interesses, a tendência à fixação de vínculos para a discricionariedade e a tendência apontada por Amselek, de direção jurídica não autoritária das condutas: ao lado de comandos jurídicos, de tipo tradicional, encontram-se recomendações, diretrizes. Assim, além dos atos decorrentes do exercício de poderes imperativos, a Administração emite outras modalidades de atos, resultantes de consenso, acordo, negociação, e decorrentes da própria vontade dos administrados, embora se continue a indicar a unilateralidade como característica comum a todos.
Os dois pilares do Direito Administrativo, a supremacia do interesse público e a indisponibilidade
deste, adquirem nova feição. A supremacia do interesse público único, monolítico, passa a
ser a prevalência de determinados interesses públicos, desde que todos sejam sopesados e
ponderados e haja a motivação explícita das razões do atendimento a alguns interesses em
detrimento dos demais. Diogo de Figueiredo Moreira Neto10 ensina:
Em consequência, como já se tem difundido, não é mais validamente possível referir-se a um princípio da supremacia do interesse público, muito menos erigi-lo a característica diferenciadora do Direito Administrativo, porque os interesses que devem prevalecer em qualquer Direito Público de países civilizados são, antes e acima de tudo, os afetos às pessoas, que, não por outro motivo, se encontram expressos nas declarações de princípios fundamentais das Constituições — e hoje, também de tratados comunitários — que lhes atribuem hierarquias positiva e axiológica subordinantes da ação administrativa do Estado. (grifos do autor)
A ação estatal, hoje, incorpora o reconhecimento do pluralismo da sociedade. O processo de
identificação daquilo que possa ser o interesse público — o grande parâmetro orientador e
legitimador de determinada ação estatal — já passa a incluir uma série de outros elementos
9 MEDAUAR, Odete. O direito administrativo em evolução. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 205.
10 MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Mutações do direito público. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 358.
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antes não contemplados. Assim, uma ação estatal pode afigurar-se harmônica com o interesse
público, tendo em conta a dimensão temporal do hoje e caso evidencie indesejável a esse
mesmo interesse amanhã. Em tempos de Estado Democrático de Direito, o monitoramento
do atendimento do interesse público deve se apresentar mais complexo, e disso decorrerá
exigência maior por parte daqueles que agem em nome do Estado.
As pessoas que compõem as forças da ação administrativa têm que ser selecionadas de forma
a incorporar as exigências da nova feição do Estado e a corresponder aos desafios do serviço
público, que não se contenta, apenas, com o desempenho baseado no respeito ao princípio da
legalidade, mas exige resultados positivos para o serviço público e satisfatório atendimento ao
cidadão. É o dever da boa administração, da doutrina italiana11.
A Constituição da República de 1988 aboliu o adjetivo da expressão primeira investidura,12
constante da Constituição anterior, assim, tornou obrigatório o concurso para o ingresso em
carreira diferente daquela na qual o servidor ingressara por concurso. Ficou, igualmente, afastada
a possibilidade de escolha do agente público com base unicamente em títulos, como autorizado
na Constituição de 1946.
Com a nova Constituição, pregou-se o fim dos privilégios aos servidores e empregados públicos,
exigindo-se deles profissionalismo e capacitação suficientes para dar suporte à nova feição
do Estado. Tal excelência foi alcançada pelo nível de complexidade dos concursos públicos
que selecionam os mais capazes para a admissão no serviço público. Dessa forma, o concurso
público afigura-se como meio idôneo para escolher o profissional afinado com o novo paradigma
do Estado, inaugurado com a Constituição Cidadã.
5 O controle da legitimidade do concurso público
Para que a admissão no serviço público possa ser considerada regular, é preciso que o edital de
concurso, ato normativo administrativo que vai reger o procedimento seletivo, seja elaborado
em observância às disposições constitucionais e orientações jurisprudenciais. Aos Tribunais de
Contas cabe a realização do controle sobre os editais, pois a Constituição da República13, no seu
art. 71, III, estabelece a competência para apreciação da legalidade dos atos de admissão.
11 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 32. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 106.
12 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, art. 37, II: A investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração; (Redação dada pela Emenda Constitucional n. 19, de 1998).
13 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, art. 71, III: Apreciar, para fins de registro, a lega- lidade dos atos de admissão de pessoal, a qualquer título, na administração direta e indireta, incluídas as fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, excetuadas as nomeações para cargo de provimento em comissão, bem como a das concessões de aposentadorias, reformas e pensões, ressalvadas as melhorias posteriores que não alterem o fundamento legal do ato concessório;
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O Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais regulamentou a matéria, por meio da IN n.
05/2007, alterada pelas IN n. 04/08 e 08/09, fixando os critérios e procedimentos acerca da
remessa de documentos e informações necessárias à apreciação da legalidade para fins de
registro e controle dos atos de admissão de pessoal da administração direta e indireta do Estado
e dos Municípios.
Apresenta-se, a seguir, como parâmetro para elaboração de um edital de concurso público,
estudo técnico, elaborado pela antiga Diretoria de Análise de Atos de Admissão, acerca dos
itens que deveria conter um edital de concurso público apto a selecionar candidatos para
compor os quadros da Administração Pública. As sugestões, a seguir, não são nem exaustivas
nem impositivas:
Deverão constar do edital de concurso público, no mínimo, as seguintes
informações:
I — Preâmbulo contendo a identificação do órgão ou entidade que promove o
concurso, descrição sucinta do objeto do concurso, a legislação regulamentadora
da matéria e indicação da instituição realizadora do certame;
II — Objeto e finalidade do concurso público;
III — Descrição dos cargos/empregos oferecidos no concurso, com a respectiva
especificação, área de atividade ou especialidade, indicando o número de vagas
oferecidas, vencimento ou salário fixado para referência inicial e jornada de
trabalho;
IV — Referência expressa, no corpo do edital, da legislação regulamentadora
da matéria e do percentual de cargos ou empregos reservados às pessoas
portadoras de deficiência, bem como os critérios para sua admissão, e indicação
do respectivo quantitativo numérico, por cargo, no quadro relativo às vagas
oferecidas no concurso;
V — Lei de criação do cargo, emprego público ou carreira, e seus regulamentos,
bem como o regime jurídico a que será submetido o servidor;
VI — Descrição das atribuições do cargo ou emprego público;
VII — Indicação do nível de escolaridade exigido para a posse no cargo ou emprego;
VIII — Indicação precisa dos locais, horários e procedimentos de inscrição, bem
como das formalidades para sua confirmação;
IX — Valor da taxa de inscrição e hipóteses de devolução da taxa de inscrição em
caso de cancelamento, suspensão ou anulação do concurso público;
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X — Hipóteses de isenção de taxa de inscrição e orientações para a apresentação
do seu requerimento, conforme legislação aplicável;
XI — Indicação da documentação a ser apresentada no ato de inscrição e quando da
realização das provas, bem como do material de uso não permitido nesta fase;
XII — Enunciação precisa das disciplinas das provas e dos eventuais agrupamentos
de provas, fazendo constar do edital as referências bibliográficas;
XIII — Indicação das prováveis datas de realização das provas;
XIV — Número de etapas do concurso público, com indicação das respectivas
fases, seu caráter eliminatório ou eliminatório e classificatório, e indicativo
sobre a existência e condições do curso de formação, se for o caso;
XV — Formas de publicidade das listagens de classificação final e parcial, se houver;
XVI — Informação de que haverá gravação em caso de prova oral ou defesa de
memorial;
XVII — Fixação dos critérios de classificação e de desempate, observando-se,
como primeiro critério de desempate, o disposto na Lei Federal n. 10.741, de
01/10/2003;
XVIII — Exigência, quando cabível, de exames médicos específicos para a carreira
ou de exame psicotécnico ou sindicância da vida pregressa;
XIX — Fixação do prazo de validade do concurso e da possibilidade de sua
prorrogação;
XX — Disposições sobre o processo de elaboração, apresentação, julgamento,
decisão e conhecimento do resultado de recursos e fixação de prazos para sua
interposição em cada etapa do concurso; e
XXI — A escolaridade mínima e a experiência profissional, quando exigidas,
deverão ser comprovadas no ato de posse no cargo ou emprego, vedada
a exigência de comprovação no ato de inscrição no concurso público ou em
qualquer de suas etapas, ressalvado o disposto em legislação específica.
Regulado por um edital de disposições claras e precisas, sobre as condições e os requisitos para
que o candidato possa se inscrever, garantindo-lhe total compreensão quanto aos requisitos
exigíveis para o exercício do cargo ou emprego pleiteado, evitando o uso de expressões
genéricas e de duplo sentido, sempre em observância ao princípio da segurança jurídica, o
concurso público pode ser considerado regular, o que vai resultar em admissões das forças de
ação administrativa de forma legítima.
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6 A admissão por concurso legitima a despesa pública com pessoal
Os cargos e empregos públicos têm que ser preenchidos de forma legítima, tendo em vista o
cumprimento de suas atribuições por servidor ou empregado públicos, da forma determinada
constitucionalmente no art. 37, II, ou seja, por meio do concurso público.
Na administração direta, o provimento de cargos é de competência do chefe do Executivo,
que o faz pessoalmente, mediante decreto, ou delega tal prerrogativa a auxiliar imediato. Na
administração indireta, o provimento de cargos e empregos se dá por meio de seus dirigentes,
nos termos previstos em seus atos constitutivos.
O pagamento de subsídios e remunerações aos agentes públicos tem regulamentação na
Constituição da República. Pelo inciso X do art. 37, alterado pela Emenda n. 19/98, a remuneração
dos servidores públicos somente pode ser fixada ou alterada por lei específica, observada a iniciativa
privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de
índices. Pelo art. 39, § 1º, a fixação dos padrões de vencimento e dos demais componentes do
sistema remuneratório observa a natureza, o grau de responsabilidade e a complexidade dos cargos
componentes de cada carreira, os requisitos para a investidura e as peculiaridades dos cargos.
O art. 169 da Constituição da República dispõe que a despesa com pessoal ativo e inativo
da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites
estabelecidos em lei complementar. Regulamentando o dispositivo, a Lei Complementar n.
101, de 04/05/2000, estabelece, em seu art. 19, que a despesa total com pessoal, em cada
período de apuração e em cada ente da Federação, não pode exceder os percentuais da receita
corrente líquida, de 50% para a União e de 60% para Estados e Municípios. Também, no art. 22,
firma sanções para o caso de descumprimento dos limites instituídos.
Todo esse arcabouço normativo tem como finalidade garantir a legalidade da despesa pública
referente ao pagamento de pessoal. O percentual do montante destinado a remunerar as forças
da ação administrativa alcança metade, ou mais da metade, da receita corrente líquida do ente
da Federação e representa valor significativo, que tem de ser apresentado aos Tribunais de
Contas nas prestações de contas. O concurso público, como forma de legitimação das admissões
no serviço público, estabelece também a legalidade da despesa com pessoal.
7 Conclusão
Sendo abstrato o conceito de Estado, para que exista ação estatal é preciso que existam pessoas
físicas que ajam em seu nome. Daí a importância da escolha da pessoa que vai atuar profissionalmente
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como depositária da vontade e da ação do Estado. A seleção do profissional implica atribuir a ele
a realização das atividades-fim ou das atividades-meio postas sob a competência de determinado
ente federativo. Certamente, para que alguém atue de forma contínua em nome do Estado,
desempenhando as suas funções, é preciso estar legitimado para tanto. É o concurso público o
instrumento que vai legitimar a indicação daquele capacitado para exercer o munus público.
O concurso público é o meio técnico pelo qual a Administração Pública seleciona as forças da
ação administrativa de forma moral, eficiente e meritória, assim como, propicia oportunidade
a todos os que atendam os requisitos da lei, fixados de acordo com a complexidade do cargo ou
emprego. Pelo concurso público, afastam-se os ineptos e apaniguados.
O exame da admissão do servidor público é extremamente importante na análise da legalidade
dos atos de aposentadoria. Após a Emenda Constitucional n. 20/98, o art. 40 da Constituição
da República passou a exigir, para a aposentadoria, que o servidor seja titular de cargo efetivo,
cujo acesso se dá após a aprovação em concurso público. Apesar da exigência, a Constituição da
República reconheceu o direito de estabilização do servidor não concursado, no art. 19 do ADCT,
e tal direito foi estendido aos servidores estatutários que foram admitidos até 05/10/1988, na
esfera federal, por força do parecer vinculante da Advocacia-Geral da União GM-30/2002.
A Constituição da República de 1988 aboliu o adjetivo da expressão primeira investidura,
constante da Constituição anterior, assim, tornou obrigatório o concurso para o ingresso em
carreira diferente daquela na qual o servidor ingressara por concurso. Ficou, igualmente,
afastada a possibilidade de escolha do agente público com base unicamente em títulos, como
autorizado na Constituição de 1946.
Regulado por edital contendo disposições claras e precisas, dispondo sobre as condições e os
requisitos para que o candidato possa se inscrever, garantindo-lhe a total compreensão quanto
aos requisitos exigíveis para o exercício do cargo ou emprego pleiteado, evitando o uso de
expressões genéricas e de duplo sentido, sempre em observância ao princípio da segurança
jurídica, o concurso público vai ser considerado regular, o que vai resultar em admissões das
forças de ação administrativa de forma legítima.
O percentual do montante destinado a remunerar as forças da ação administrativa alcança
metade, ou mais da metade, da receita corrente líquida do ente da Federação e representa
valor significativo que tem de ser apresentado aos Tribunais de Contas nas prestações de contas.
O concurso público, como forma de legitimação das admissões no serviço público, estabelece
também a legalidade da despesa com pessoal.
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Referências
BANDEIRA DE MELLO, Oswaldo Aranha. Princípios gerais do direito administrativo. Rio de Janeiro: Forense, 1979. v. I.
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2003.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.
DI PIETRO, Maria Sylvia zanella. Direito administrativo. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2010.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2006.
MEDAUAR, Odete. O direito administrativo em evolução. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1992.
MEDAUAR, Odete. O direito administrativo em evolução. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.
MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo. Rio de Janeiro: Forense, 2005.
MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Mutações de direito público. Rio de Janeiro: Renovar, 2006.
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Cláudio Couto Terrão
Graduado em Ciência da Computação e em Direito. Procurador
do Ministério Público de Contas do Estado de Minas Gerais.
Ex-Procurador Federal. Ex-Procurador do Ministério Público de
Contas do Município de Goiânia.
Rachel Campos Pereira de Carvalho
Graduada em Direito e especialista em Direito Público. Técnica
do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais.
Ninguém é igual a ninguém. Todo o ser humano é um estranho ímpar. (Carlos Drummond de Andrade)
Democracia? É dar, a todos, o mesmo ponto de partida. Quanto ao ponto de chegada, isso depende de cada um.(Mário quintana)
Resumo: Este estudo objetiva refletir sobre a promoção da política constitucional de reserva de
vagas, nos concursos públicos, às pessoas com deficiência. A análise é realizada à luz da igualdade
jurídica, que justifica a promoção de ações afirmativas para equiparar tais pessoas aos demais
indivíduos inseridos na sociedade. Isso decorre da Constituição e deve ser operacionalizado por
meio de lei geral ou específica de cada ente federado, abordando-se os respectivos critérios
de concretização. Conclui-se que a operacionalização deve ser analisada no caso concreto,
levando-se em conta a solução mais compatível com a isonomia.
Reserva de vagas na administração pública para as pessoas com deficiência: ação afirmativa e concurso público
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Palavras-chave: Ações afirmativas. Pessoas com deficiência. Princípio da igualdade. Concurso
público. Reserva de vagas. Operacionalização.
Abstract: This work intends to reflect on constitutional policies to promote the reservation
for disabled in public examination. The analysis is realized under equality rights, in order to
equalize disabled people to the other people of society. This policy results from the Brazilian
Constitution and must be executed by general or specific law, of the political person, with its
promotion’s criteria. The “operationalization” must be analysed in each case, adopting the
more equal and compatible solution.
Keywords: Affirmative actions. Disabled people. Equality principle. Public examination. Vacancy
allocation. “Operationalization”.
1 Introdução
As ações afirmativas surgiram no direito norte-americano, em razão da necessidade de
favorecer algumas minorias socialmente inferiorizadas, “juridicamente desigualadas, por
preconceitos arraigados culturalmente e que precisavam ser superados para que se atingisse
a eficácia da igualdade preconizada e assegurada constitucionalmente na principiologia dos
direitos fundamentais”.1 Já o tema concurso público ganha especial atenção da doutrina e da
jurisprudência à medida que a sociedade avança rumo à efetivação do princípio republicano. Com
a organização e o fortalecimento das instituições de controle, bem como do desenvolvimento
do senso crítico do corpo social, a comunidade tende a identificar e repudiar as ações que não
se compatibilizam com o Estado Democrático de Direito, exigindo condutas estatais compatíveis
com os fundamentos e objetivos fundamentais da República.
Dentre as inúmeras atividades estatais, a proteção à pessoa com deficiência insere-se na
promoção da dignidade da pessoa humana e tem vistas a reduzir as desigualdades sociais,
em homenagem ao princípio da isonomia. Isso basta para que se possa sentir a importância
do debate relacionado às ações do Estado com vistas à especial atenção a esses indivíduos
historicamente marcados pela exclusão social.
Nesse contexto de sedimentação do instituto concurso público, meio tão republicano para
provimento da demanda de pessoal na Administração Pública, e da discriminação positiva
promovida pelo Estado, surge o presente estudo, no sentido de refletir sobre a operacionalização
da aplicação da política constitucional de proteção à pessoa deficiente no que se refere à
reserva de vagas nos concursos públicos.1 ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Ação afirmativa — o conteúdo democrático do princípio da igualdade jurídica. Revista Trimestral de Direito Público, São Paulo, n. 15, p. 87, 1996.
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2 O conteúdo jurídico do princípio da isonomia e a reserva de vagas em concurso público às pessoas com deficiência
Como bem propugnou José Afonso da Silva, a igualdade constitui o signo fundamental da
democracia. Nessa linha de princípios, a Constituição da República proclamou em seu art. 5°,
caput, que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-
se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”, positivando, dentre outros, o princípio
da igualdade ou isonomia. Isso quer dizer que o Estado brasileiro tem como valor norteador o
princípio de que a igualdade jurídica vigorará nas relações dos indivíduos entre si e nas relações
entre Estado e indivíduos.
Com efeito, todo o sistema constitucional brasileiro é hoje construído de modo a dar, no mínimo,
sustento à atuação estatal em conformidade com a isonomia material ou substancial, traduzida
na máxima2 de tratar os desiguais na medida de sua desigualdade.
Mas nem sempre foi assim. A igualdade foi gradativamente inserida no contexto social. Na era
medieval, os direitos eram atribuídos de forma dependente do status social que o indivíduo
ocupava. No Estado Liberal, nasce a ideia aritmética da igualdade, impondo o tratamento
igualitário aos membros da comunidade política. Nele, todos devem ser tratados de forma
igualitária pela lei (isonomia formal). Por sua vez, a igualdade sustentada na garantia dos direitos
sociais, econômicos, coletivos ou difusos, vem com o paradigma do Estado Social de Direito,
que desloca a preocupação estatal para o bem-estar do cidadão. E é no direito constitucional
contemporâneo que se verifica alteração sensível do princípio da igualdade, como tratado pelo
Professor Álvaro Ricardo de Souza Cruz,3 de cuja obra extrai-se a seguinte nota:
Avançando mais 50 (cinquenta) anos, vamos nos deparar com um novo Constitucionalismo, cuja síntese alterou sensivelmente o significado do princípio da igualdade, pois passou a centrar-se no princípio da dignidade humana. A pessoa humana não pode mais ser vista de forma abstrata e distante, tornando-se um ser concreto/palpável. O programa normativo densifica-se nas múltiplas facetas e diferenciações da humanidade, particularizando-se na defesa dos hipossuficientes, especialmente das minorias étnicas e sociais.
2 Em sua Oração aos Moços, Rui Barbosa escreveu: “A regra da igualdade não consiste senão em aquinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade. O mais são desvarios da inveja, do orgulho, ou da loucura. Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real. Os apetites humanos conceberam inverter a norma universal da criação, pretendendo, não dar a cada um, na razão do que vale, mas atribuir o mesmo a todos, como se todos se equivalessem.”
3 CRUz, Álvaro Ricardo de Souza. O direito à diferença. Ações afirmativas como mecanismo de inclusão social de mulheres, negros, homossexuais e pessoas portadoras de deficiência. 3. ed. Belo Horizonte: Arraes, 2009. p. 11.
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Como bem afirmou Cármen Lúcia Antunes Rocha,4 era necessária a promoção constitucional de
uma remodelação da concepção adotada pelo sistema normativo democrático para inserir no
contexto jurídico uma igualdade efetiva, ou seja, uma igualdade promotora da igualação.
Desse modo, a noção moderna de igualdade transcende o conteúdo formal e o conteúdo
material,5 com vistas à concepção focada “no exame dos pressupostos procedimentais que
devem ser cumpridos no discurso de produção do Direito”,6 consubstanciados na participação
do cidadão nas práticas estatais.
Com efeito, a igualdade deve ser interpretada de forma a atingir os objetivos fundamentais
da República, missão a que todo o Estado está adstrito. Assim é que, no plano de busca pela
efetivação do princípio da isonomia, surgem as ações afirmativas, consideradas políticas de
Estado com o escopo de minimizar o prejuízo social, econômico e político imposto em virtude
da diferença na condição humana de determinados indivíduos.
As ações afirmativas podem ser entendidas como medidas públicas e privadas, coercitivas ou voluntárias, implementadas na promoção/integração de indivíduos e grupos sociais tradicionalmente discriminados em função de sua origem, raça, sexo, opção sexual, idade, religião, patogenia física/psicológica etc.7
A consonância entre as ações afirmativas e o conteúdo jurídico da igualdade restou trabalhada de
forma brilhante pelo Professor Celso Antônio Bandeira de Mello,8 segundo a construção da ideia de
que as discriminações no mundo fenomênico são compatíveis com o princípio da isonomia, à medida
que há correlação lógica compatível com o sistema constitucional entre o elemento identificado
como fator de discriminação e a discriminação estabelecida no tratamento jurídico diversificado.
Nessa linha de ideias, o fator de discriminação não poderá consistir em singularização atual
e definitiva a destinatário determinado, devendo ainda residir na pessoa, situação ou coisa a
ser discriminada. Isso quer dizer que a lei não poderá estabelecer critério de discriminação
de forma individual, singularizando o destinatário. Noutro giro, “é inadmissível, perante a
isonomia, discriminar pessoas ou situações ou coisas (o que resulta, em última instância, na
discriminação de pessoas) mediante traço diferencial que não seja nelas mesmas residentes”.9
A ocorrência desta hipótese acarretaria afronta ao princípio da isonomia. 4 ROCHA, op. cit., p. 86.
5 A igualdade formal consiste na igualdade perante a lei, ao passo que a igualdade material significa tratar igualmente quem é igual, proibindo, por via transversa, o tratamento desigual aos iguais. É a isonomia material que justifica a elaboração de regras que criam tratamentos desiguais para equiparar os desiguais.
6 ROCHA, op. cit., p. 11.
7 ROCHA, op. cit., p. 163.
8 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 1994.
9 BANDEIRA DE MELLO, op. cit., p. 29.
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A legitimidade do tratamento diferenciado depende ainda do vínculo lógico entre o discrímen
e a desequiparação procedida, ou seja, deve haver entre o fator discriminador e a medida
desigualadora justificativa racional para atribuir o específico tratamento jurídico.
Como último requisito de validação da ação afirmativa em conformidade com o princípio da
isonomia, deve o vínculo de pertinência acima delineado ser compatível e protegido pelo
sistema constitucional vigente.
Em nosso estudo, o fator de discriminação consiste na existência de pessoas com deficiência. A
ação afirmativa em exame trata-se da reserva de vagas nos concursos públicos aos deficientes.
A correlação entre o discrímen e a medida adotada consiste no fato de que as pessoas que por
alguma razão são consideradas deficientes carregam ao longo da vida maior dificuldade de
inserção no meio social, de acesso ao estudo, à cultura, ao trabalho, enfim, são pessoas que
possuem uma vida inegavelmente mais complicada do que as demais.10 A compatibilidade com
o sistema constitucional vigente é evidente, uma vez que a própria Constituição estabelece
em diversas normas a política de proteção à pessoa deficiente, além de trazer norma expressa
quanto à necessidade de concreção dessa política no âmbito da Administração Pública.
Partindo desse princípio, conclui-se que a ação afirmativa de reservar vagas nos concursos
públicos às pessoas com deficiência não só é compatível com o princípio da isonomia, como
consiste em uma das formas de promover a igualdade jurídica entre indivíduos.
3 As regras de competência e a operacionalização da reserva de vagas
No plano geral, o art. 23, II, da Constituição da Republica decretou como competência comum de
todos os entes federados a proteção e garantia das pessoas com deficiência. Em outras palavras,
a obrigação de promover ações afirmativas de equiparação das pessoas com deficiência é tanto
da União quanto dos Estados, Distrito Federal e Municípios. Trata-se de competência material,
que reflete o dever do Poder Público de agir por meio da disponibilização de serviços públicos
adequados às especiais necessidades, tais como transporte, educação,11 acesso prioritário à
saúde, inserção no mercado de trabalho etc.
No que se refere à competência legislativa, a atribuição de criar normas legais de proteção e
integração social das pessoas com deficiência restou conferida à União, aos Estados e ao Distrito 10 Para corroborar esta assertiva, extrai-se da obra do Professor Álvaro Ricardo de Souza Cruz, já citada, que apenas 200 mil brasileiros com deficiência, dentro de um universo de 9 milhões em idade economicamente ativa, possuem emprego regular (com carteira assinada).
11 Nas palavras de Álvaro Ricardo de Souza Cruz, “No campo educacional, qualquer portador de deficiência tem direito à educação pública e gratuita, inclusive em sistema próprio de educação especial, adequada às suas necessidades, como se depreende do art. 2°, I, da Lei n. 7.853/89, do art. 58 da Lei n. 9.394/96 e do art. 24 do Decreto n. 3.298/99. Entende-se por educação especial a modalidade oferecida preferencialmente na rede regular de ensino para o educando com necessidades especiais, constituindo-se num processo flexível, dinâmico e individual, ligado às necessidades de cada pessoa com deficiência.”
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Federal, nos termos do art. 24, XIV, da Constituição, na forma de competência concorrente.
Isto significa que a União editará normas gerais que estabeleçam a política positiva em prol da
pessoa deficiente, cabendo aos Estados exercer a competência complementar ou, na ausência
de normas gerais, a competência plena.12
Aos Municípios, por fim, a Constituição atribuiu a competência exclusiva de legislar sobre os
assuntos de interesse local, além da competência suplementar à legislação federal e estadual,
no que couber, conforme o art. 30, incisos I e II. Assim, as ações legislativas municipais
destinadas à proteção das pessoas deficientes devem ser desenvolvidas em razão desta previsão
constitucional.
Além da política geral de promoção dos deficientes, na qual está inserida a adequada inserção
no mercado de trabalho, deve ser salientado que há na Constituição regra específica para
admissão de pessoal no âmbito da Administração Pública. Ou seja, partindo da premissa de que
a Constituição da República estabelece em seu art. 37, VIII, que “a lei reservará percentual dos
cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de
sua admissão”, o Estado tem a obrigação de implantar, por meio de lei, a política de integração
da pessoa com deficiência nos quadros da Administração Pública.
Assevere-se que a concretização dessa política dar-se-á no âmbito de cada entidade (União,
Estados, Distrito Federal e Municípios), como parcela de competência exclusiva para organizar sua
estrutura administrativa, sempre por meio de lei, seja geral (a exemplo do estatuto dos servidores
de determinado ente que estabelece a forma de implantar a ação afirmativa) ou específica (lei
que cria os cargos ou empregos e já estabelece quantos deles serão reservados).
A doutrina e a jurisprudência se dividem quanto à técnica legal de reserva de vagas a ser
adotada para atender ao comando do art. 37, VIII, da Constituição da República. Em regra,
tem-se defendido que a lei deverá prever se a reserva ocorrerá por cargo ou emprego oferecido
no certame ou por cargo ou emprego previsto no quadro de pessoal existente no órgão. A
interpretação literal do dispositivo conduz ao raciocínio de que a reserva pretendida pela
Constituição seja por quadro de pessoal:
Art. 37. [...]
VIII — a lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão; (CR, 1988, grifo nosso).
12 A depender do que a União produziu em termos de lei sobre o tema determinado: havendo lei federal, a competência é suplementar; inexistindo ela, é plena a competência.
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Nesse contexto, pergunta-se: como cada entidade política poderá operacionalizar a reserva
de vagas para dar efetividade ao mandamento constitucional? A reserva por cargo ou emprego
dar-se-á à razão das respectivas vagas oferecidas no certame ou do total de vagas existentes
para determinado cargo ou emprego no quadro de pessoal do ente ou órgão promovedor do
concurso? No primeiro caso, a sistemática consiste em aplicar o coeficiente de reserva toda vez
que a Administração Pública promover um certame. Apuram-se as vagas que serão oferecidas
e sobre elas aplica-se o percentual de reserva fixado pela lei. No segundo caso, considera-se
o total de vagas criadas no quadro de pessoal, aplicando-se o percentual de reserva sobre o
montante de cada cargo ou emprego que compõe o quadro de pessoal. A partir daí, o órgão
ou ente passa a ter números fixos de vagas reservadas, modificáveis tão somente a partir da
alteração do próprio quadro.
Defendendo a técnica da reserva por vaga oferecida no concurso, no julgamento do Mandado
de Segurança n. 11.983-DF, o ministro do Superior Tribunal de Justiça Arnaldo Esteves Lima,
aduziu que:
A norma constitucional dirige-se aos cargos e empregos públicos, quer dizer, o percentual a que se refere deve incidir sobre as vagas disponíveis. [...] entendo que Constituição Federal assegura a reserva de vagas aos candidatos portadores de deficiência, e não determinada proporção a cada número de aprovados como regulares. Em outras palavras, o percentual legal incide sobre a quantidade de vagas existentes, e não proporcionalmente de acordo com o número de candidatos aprovados, a contar do 1° colocado (grifo nosso).
No mesmo sentido de que a reserva opera-se por cargo ou emprego oferecido no certame,
colacione-se a ementa do julgado do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais:
Edital de Concurso Público. Reserva de vagas para deficientes. “O segundo apontamento refere-se ao disposto no subitem 3.1.1 que estabelece: ‘... a cada cinquenta contratações — quarenta e nove serão candidatos aprovados na lista geral e uma será de candidato da lista especial’. Cumpre observar que se faz necessária a retificação desse item, uma vez que o percentual fixado deve ser para cada cargo discriminado e não para a lista geral. Percursando o tema na jurisprudência, constata-se que os Tribunais têm assumido postura atenta e vigilante no cumprimento do comando constitucional insculpido no art. 37, VIII (CF/88), segundo o qual a lei reservará percentual dos cargos e empregos para as pessoas portadoras de deficiência, definindo, também, os critérios de sua admissão. Para dar atendimento aos anseios oriundos do princípio da igualdade, cabe à Administração fixar nos editais de concurso público o percentual das vagas para cada cargo destinado aos portadores, sob pena de ineficácia do dispositivo.” (Edital de Concurso Público n. 772.034. Relator Conselheiro
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Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 26/02/2009, grifo nosso).
Por outro lado, a tese da reserva de vagas por quadro de pessoal é defendida pelo Ministro Cesar
Peluso, que, no bojo do Mandado de Segurança n. 25.074, concluiu:
[...] o que assegura a Constituição é que os portadores de deficiência têm direito de ocupar determinado número de cargos e empregos públicos, considerados em cada quadro funcional, segundo a percentagem que lhes reserve a lei, o que só pode apurar-se no confronto do total dos cargos e dos empregos, e não, é óbvio, perante o número aleatório de vagas que se ponham em cada concurso13 (grifo nosso).
Obviamente, cabe ao respectivo ente, mediante lei, estabelecer a técnica a ser operacionalizada,
sempre de modo a garantir a máxima concretude ao comando constitucional de inserção social
da pessoa com deficiência. Todavia, na hipótese de não haver previsão legal, é preciso contar
com o bom senso do administrador público que irá sistematizar o provimento desses cargos ou
empregos. Cabe a ele decidir motivadamente, no caso concreto, qual forma de operacionalização
irá adotar, bem como as questões que surgirem diante da adoção de uma ou outra técnica. Isso
porque, de uma forma ou de outra, na ausência de lei, somente o exame do caso concreto
pode oferecer subsídios para a conclusão acerca da melhor técnica para a fixação da reserva de
vagas. Em qualquer hipótese, deve ser sempre privilegiado o princípio da isonomia.
Conquanto pareça ser mais consentânea com a norma constitucional a técnica da reserva por
cargo ou emprego em cada quadro funcional, não tem sido essa a opção operacional da maioria
das entidades políticas. Em Minas Gerais, por exemplo, a Lei Estadual n. 11.867, de 28 de julho
de 1995, determina que 10% dos cargos e empregos públicos, em todos os níveis, devem ser
reservados às pessoas com deficiência. Entretanto, ao pormenorizar essa regra, pelo Decreto
Estadual n. 42.257, de 15 de janeiro de 2002, optou-se por aplicar a reserva sobre o total de
vagas oferecidas no edital do concurso público.
Com efeito, havendo a reserva por quadro, a aplicação do coeficiente destinado aos portadores
de deficiência resultará em número fixo de cargos ou empregos reservados. Preenchido aquele
número específico, a renovação dos ocupantes das vagas reservadas só ocorrerá a partir de sua
vacância. Nesse caso, seria possível, sem ferir o princípio da isonomia, não se reservar vagas
aos deficientes em certo concurso, desde que a razão prevista pela lei para o quadro permaneça
estabilizada em função dos servidores ativos. Ou, a contrário senso, e em aparente prejuízo aos
candidatos não deficientes, reservá-las no certame em número exato (uma, duas, três vagas
etc.), que pode até mesmo ser maior que o fixado para a ampla concorrência.
13 Extraído do inteiro teor do acórdão do Mandado de Segurança n. 26.310.
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A questão do arredondamento é outro ponto que tem gerado polêmica quanto à operacionalização
da aplicação do coeficiente de reserva utilizado pela Administração Pública para a admissão de
pessoas com deficiência.
No âmbito da União, a Lei n. 8.112/1990 estabeleceu em seu art. 5°, § 2°, como reserva de
vagas o coeficiente de até 20%. Na mesma linha de princípios, regulamentando a lei que dispõe
sobre a Política Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência,14 o Decreto n.
3.298/1999, por meio de seu art. 37, § 1°, assegurou à pessoa com deficiência a reserva do
mínimo de 5% em face da classificação obtida. Assim é que a Administração Pública federal está
adstrita ao parâmetro mínimo de 5% e máximo de 20% na escolha do coeficiente de reserva de
vagas nos concursos que promover. Vale dizer, resultando a aplicação do percentual em número
fracionado, arredonda-se este para o primeiro inteiro subsequente.
O Professor Álvaro Ricardo de Souza Cruz assevera ser “importante destacar que tal percentual
não é fixo para os demais entes federativos, que podem seguramente modificá-los se assim o
desejarem.”15 A bem da verdade, ainda que o parâmetro adotado pela União como razoável para a
reserva (mínimo de 5% e máximo de 20%) não seja de aplicação obrigatória aos órgãos dos demais
entes da Federação, na prática, este limite tem sido utilizado como referência de razoabilidade
da regra de destinação fixada no caso concreto, independentemente da esfera estatal.
Em Minas Gerais, a lei fixa o coeficiente de reserva em 10% e o correspondente arredondamento
de números fracionados para o primeiro inteiro subsequente, quando a fração for maior que
cinco décimos, desprezando-se a fração, quando ela for menor que cinco décimos, como se
vê, verbis:
Art. 1° — Fica a administração pública direta e indireta do Estado obrigada a reservar 10% (dez por cento) dos cargos ou empregos públicos, em todos os níveis, para pessoas portadoras de deficiência.
§ 1° — Sempre que a aplicação do percentual de que trata este artigo resultar em número fracionário, arredondar-se-á a fração igual ou superior a 0,5 (cinco décimos) para o número inteiro subsequente e a fração inferior a 0,5 (cinco décimos) para o número inteiro anterior.
Em que pese haver previsão específica quanto ao arredondamento das vagas reservadas às
pessoas com deficiência tanto na esfera federal quanto no âmbito do Estado de Minas Gerais, a
aplicação desse critério ainda é bastante controversa, dividindo a doutrina e a jurisprudência.
14 Lei n. 7.853/1989.
15 CRUz, op. cit., p. 216-217.
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Há quem entenda que o critério da reserva de vagas deve observar a máxima concretude do
comando constitucional capitulado na art. 37, VIII, razão pela qual, resultando a aplicação
do coeficiente em número fracionário, deve-se sempre arredondá-lo para o número inteiro
imediatamente posterior.
No bojo do julgamento do Recurso Extraordinário n. 227.299-1, em busca da máxima efetividade
da norma constitucional capitulada no art. 37, VIII, o Supremo reconheceu o arredondamento
na forma como previsto no Decreto Federal n. 3.298/1999, na hipótese em que a lei municipal
havia fixado o coeficiente de reserva, sem prever expressamente a regra do arredondamento.
Assim, determinou que o número resultante em fração fosse arredondado para o primeiro inteiro
subsequente. Na mesma linha de princípios, tem-se a ementa do julgado do Tribunal de Contas
do Estado de Minas Gerais, verbis:
Edital de concurso público. Reserva de vagas para deficientes físicos. No tocante
às vagas de deficiente entendo que a redação conferida aos editais de concurso público deve primar pelo atendimento às exigências aplicáveis à disciplina afeta à participação dos candidatos com deficiência, pois é imperiosa a obediência da exigência constitucional de reserva das vagas, tendo em vista a necessidade de serem implantadas as ações sociais afirmativas. Neste
sentido deverá ser observado que nas hipóteses de mais de uma vaga para cada cargo, a Administração deverá promover a reserva para os candidatos com necessidades especiais. A regra de interpretação que determina que se confira a máxima efetividade às normas constitucionais, com a finalidade de
não permitir que os cidadãos com necessidades especiais fiquem aguardando o
eventual surgimento de vagas dentro do prazo de validade do concurso. (Edital
de Concurso Público n. 804.159. Relator Conselheiro Eduardo Carone Costa.
Sessão do dia 10/09/2009, grifo nosso).
O grande problema da aplicação dessa regra reside no fato de que muitas vezes o arredondamento
na forma delineada acima resultará em aplicação de coeficiente bastante superior ao fixado
em lei. Os críticos dessa corrente afirmam que se deve aplicar, antes de tudo, a regra do
amplo acesso, em privilégio à igualdade, sob pena de transformar a ação afirmativa em meio
ilegal de discriminação ou desequiparação inversa. A regra geral consubstancia-se na igualdade
de participação e ampla concorrência, sendo exceção a reserva das vagas, cujo quantum é
imperativo que seja previsto por lei. É o que se extrai do julgamento do Mandado de Segurança
n. 26.310-5, de cujo voto condutor destaca-se o seguinte:
Entender-se que um décimo de vaga ou mesmo quatro décimos, resultantes da
aplicação de cinco ou vinte por cento, respectivamente, sobre duas vagas, dão
ensejo à reserva de uma delas implica verdadeira igualização, olvidando-se que a
regra é a não distinção entre candidatos, sendo exceção a participação restrita,
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consideradas vagas reservadas. Essa conclusão levaria os candidatos em geral a concorrerem a uma das vagas e os deficientes, à outra, majorando-se os percentuais mínimo, de cinco por cento, e máximo, de vinte por cento, para cinquenta por cento. O enfoque não é harmônico com o princípio da razoabilidade.
No mesmo julgado, colaciona-se a fala do Ministro Cezar Peluso, segundo a qual a interpretação
pelo arredondamento a despeito da lei atribui uma exceção à Constituição, verbis:
A norma deixa de ser exceção para atender situações particularíssimas, que só a lei pode regular nos pormenores circunstanciais, para admitir que, em todos os concursos, quando não se possa atingir o percentual mínimo nela previsto, se chegue arbitrariamente até a metade das vagas do concurso o que significa outra regra, de caráter geral.
Esse é o contexto do julgado do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, cuja ementa
colaciona-se a seguir:
Edital de concurso público. Reserva de vagas para deficientes. Nessa esteira, entendemos que poderá haver o arredondamento previsto na lei estadual, todavia tal prática não pode resultar em privilégios que conflitem com o princípio da igualdade entre os demais candidatos, uma vez que a interpretação teleológica deve ser direcionada a proporcionar tratamento igualitário e superioridade de tratamento, não podendo, portanto, com o arredondamento acarretar reserva de vagas superiores ao limite máximo estabelecido. (Edital de Concurso Público n. 781.132. Relator Conselheiro Sebastião Helvecio. Sessão do dia 14/05/2009, grifo nosso).
Conclui-se que a questão do arredondamento deve ser resolvida no caso concreto, aplicando-
se a regra que melhor favoreça a concretude da política nacional de inserção social da pessoa
deficiente. Uma boa saída para a situação concreta é a que nos propõe o Professor Adilson Abreu
Dallari,16 in verbis:
Diante de qualquer dúvida, seja quanto à interpretação de qualquer norma disciplinadora do concurso, seja quanto ao atendimento de qualquer requisito estabelecido, o norte do intérprete e aplicador da lei sempre deverá ser o princípio da isonomia. A melhor solução sempre será, sem dúvida, aquela mais condizente com o princípio da isonomia.
Ressalte-se que a polêmica sobre o arredondamento e a dificuldade de sua operacionalização
fica razoavelmente reduzida quando se adota a regra de reserva de vagas por quadro funcional,
de tal sorte que também por esse motivo é que essa técnica melhor se adequa à efetivação
16 DALLARI, Adilson Abreu. Princípio da isonomia e concursos públicos. In: MOTTA, Fabrício. (Coord.). Concurso público e Constituição. Belo Horizonte: Fórum, 2005.
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do comando constitucional de discriminação positiva de deficientes. É que a razão entre o
coeficiente legal e o quantum de vagas (livres ou ocupadas) resultará em número fixo, de forma
bastante compatível com o princípio da razoabilidade. Isso facilitará o controle social e externo
sobre a efetividade da proteção aos portadores de deficiência. Para a concretude dessa política
afirmativa, antes da fixação do critério por lei, compete a cada ente conhecer a sua realidade
e estabelecer o percentual de reserva que, naquele determinado tempo e local, atenderá o
comando insculpido no inciso VIII do art. 37 da Constituição da República.
4 Conclusão
Este estudo teve como objetivo a reflexão acerca da operacionalização da reserva de vagas
em concursos públicos aos candidatos com deficiência, no contexto do princípio da igualdade
e da consequente medida de igualação consubstanciada na política positiva imposta pela
Constituição Federal.
Destacou-se de forma breve a trajetória do princípio da igualdade jurídica da era medieval até
os dias de hoje, quando ele ganha uma concepção material, voltada à superação do isolamento
ou da diminuição social a que estão sujeitas as minorias. A partir daí, a isonomia ganha uma
conotação ativa, impondo ao Estado atitudes perante a marginalização social, por meio de
ações concretas, que sejam capazes de produzir efeitos equiparatórios.
Como a igualdade jurídica não se satisfaz mais tão somente com a vedação a tratamentos
discriminatórios, a reserva de vagas em concurso público aos deficientes serviu como uma das
possibilidades de concretização dos objetivos fundamentais da República.
Com efeito, a efetivação da política de reserva depende de lei que estabeleça o coeficiente
de destinação e regule a sua aplicação. Como se abordou, o percentual no âmbito federal
deverá obedecer ao limite mínimo de 5% e máximo de 20%, arredondando-se para o primeiro
inteiro subsequente o resultado fracionado. Por sua vez, os cargos e empregos da Administração
Pública do Estado de Minas Gerais terão a reserva para os candidatos com deficiência de 10%,
sendo que o número fracionário resultante somente será arredondado para o primeiro inteiro
se restar maior que cinco décimos.
Uma das questões mais controversas reside na utilização ou no desprezo do arredondamento. Isso
porque o arredondamento poderá, por vezes, resultar em número de vagas reservadas superior
ao limite previsto na lei, o que muitos reputam como discriminação inversa ou ilegal. Outrossim,
a não aplicação do arredondamento poderá resultar na ineficácia do comando constitucional de
reserva, mantendo os deficientes alijados do concurso público.
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Destacou-se também a sistemática de operacionalização da referida reserva, que pode ocorrer por
meio de lei geral ou específica de competência exclusiva de cada entidade política. Essa lei poderá
prever que o coeficiente de reserva seja aplicado sobre as vagas oferecidas no concurso ou sobre
cada cargo ou emprego público do quadro de pessoal do ente ou órgão promovedor do concurso.
Por fim, conclui-se pela necessidade de avaliar a eficácia da política no caso concreto, advertindo
que a escolha da reserva por quadro funcional parece a que melhor proporciona o acesso
aos cargos e empregos públicos pelas pessoas com deficiência, dando concretude ao comando
constitucional e mitigando ao máximo as disfunções operacionais. O importante é que se leve
em conta a solução que melhor se coaduna com a isonomia.
Referências
BARBOSA, Rui. Oração aos Moços. Disponível em <http://www.culturabrasil.org/aosmocos.htm>
BARROS, Maria Magdala Sette de. Portadores de deficiência e o concurso público. Disponível em <www.http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2639>. Acesso em 23/jun/2010.
CRUz, Álvaro Ricardo de Souza. O direito à diferença. As ações afirmativas como mecanismo de inclusão social de mulheres, negros, homossexuais e pessoas portadoras de deficiência. 3. ed. Belo Horizonte: Arraes, 2009.
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 1995.
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26. ed. São Paulo: Malheiros, 2009.
MOTTA, Fabrício. A reserva de vagas nos concursos públicos para os portadores de deficiência — análise do art. 37, inc. VIII, da Constituição Federal. In: MOTTA, Fabrício (coord.). Concurso público e Constituição, Belo Horizonte: Fórum, 2005.
ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Ação afirmativa — o conteúdo democrático do princípio da igualdade jurídica. Revista Trimestral de Direito Público, São Paulo, n. 15, p. 87, 1996.
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 30. ed. São Paulo: Malheiros, 2008.
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Cristiana Fortini
Doutora em Direito Administrativo pela UFMG. Presidente
do Instituto Mineiro de Direito Administrativo. Procuradora-
Geral Adjunta de Belo Horizonte. Professora da Faculdade
de Direito da UFMG e de diversas outras instituições.
Coordenadora da área de Direito Administrativo da Escola
Superior da OAB/MG.
Virginia Kirchmeyer Vieira
Mestre em Direito Administrativo pela UFMG. Especialista em
Direito Municipal pelo JN&C IDM. Gerente de Atividades em
Controle Externo da Procuradoria Geral de Belo Horizonte.
Co-coordenadora do Curso de Especialização em Direito
Municipal do CEAJUFE.
Resumo: O concurso público para ingresso em cargo ou emprego público, nos termos da
Constituição de 1988, dá-se por meio de provas ou provas e títulos, observada a natureza
e a complexidade do cargo ou emprego. Caberá à lei fixar as situações que demandarão a
análise de títulos. A fase de títulos assume feição ancilar, pelo que apenas os aprovados poderão
ter os títulos apreciados. O princípio da proporcionalidade é de indeclinável observância na
apreciação dos títulos.
Palavras-chave: Concurso público. Provas. Títulos. Caráter complementar. Proporcionalidade.
Ponderações sobre a prova de títulos nos concursos públicos
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Abstract: Public examinations used for hiring public servants or employees of public companies,
as demanded by the 1988 Brazilian Constitution, consist of written and/or oral tests, or tests
and professional qualifications evaluation, in accordance with the nature and complexity of
the function to be performed. The functions that require professional qualifications should
be defined by a statute. Only those approved in the written and/or oral tests may have their
qualifications evaluated. The principle of proportionality is the mandatory observation in
assessing professional qualifications within public examinations.
Keywords: Public examinations. Tests. Professional qualifications evaluation. Supplementary
character. Proportionality.
1 Concurso: contornos constitucionais
A Constituição da República de 1988 elegeu o concurso público como a via exclusiva para a
investidura em cargo público e emprego público efetivos. Não é por outra razão que o Supremo
Tribunal Federal decidiu que os modos derivados de investidura não teriam sido acolhidos pela
nova ordem jurídica.1
O art. 37, II, da CR previu que a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação
prévia em concurso público de provas ou provas e títulos, ressalvadas as nomeações para cargo
em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração.
A Emenda Constitucional n. 19/98, que entabulou a Reforma Administrativa, acrescentou que o
concurso de provas ou provas e títulos será definido de acordo com a natureza e a complexidade
do cargo ou emprego público, na forma prevista em lei.
Com esse regramento, o Texto Constitucional coroou o Estado Democrático de Direito, permitindo
a todos que desejam atuar de forma efetiva e permanente para o Poder Público concorram em
igualdade de condições.
Nesse viés, o inciso V, do mesmo art. 37, determina que as funções de confiança sejam exercidas
com exclusividade por servidores efetivos, ou seja, concursados. Define, também, que os cargos
em comissão destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento, devendo
ser ocupados por servidores de carreira, nos casos, condições e percentuais mínimos delimitados
por lei. Tudo isso como forma de salvaguardar a regra da ampla e prévia seleção pública.
1 Chamam a atenção o Recurso Extraordinário n. 209.174-0, relatado pelo eminente Ministro Sepúlveda Pertence e a Adin n. 1.150-2, relatada pelo eminente Ministro Moreira Alves, ambos a combater provimentos de cargo público por via oblíqua, desvir-tuada do comando do art. 37, II.
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As exceções à imperativa regra estão registradas na Constituição da República, no mencionado
inciso II, do art. 37 (cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração) e no
inciso IX, do mesmo dispositivo constitucional, esta última na hipótese de contratação por tempo
determinado, para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público. Além dessas,
também escapam à regra de concurso público as nomeações para os cargos vitalícios de Ministros ou
Conselheiros de Tribunais de Contas (art. 73, § 2°, c/c art. 84, XV) e de Magistrados dos Tribunais
(Ministros do STF, art. 101; STJ, art. 104; TST, art. 111-A e STM, art. 123, VI). Ainda prescinde de
concurso público a nomeação de um quinto dos cargos de Magistrados de segunda instância (art. 94)
e, em caráter temporário, dos Ministros do TSE (art. 119) e dos Juízes dos TREs (art. 120).
Constata-se, pois, que o concurso público não constitui faculdade do administrador, mas
obrigação imposta pela Constituição da República, cuja inobservância, além das ressalvas
constitucionais, implicará a nulidade do ato e a punição da autoridade responsável (art. 37,
§ 2°, CR/88).
O concurso público encontra suporte nos princípios constitucionais que regem a Administração
Pública, especialmente nos princípios da impessoalidade, moralidade e eficiência.
Com base nesses princípios, a Administração Pública busca, para o exercício das funções
públicas, aquele que estiver mais bem preparado, a partir de regras claras e isonômicas, sem
nenhum tipo de favoritismo.
O Texto Constitucional não definiu o modus operandi do procedimento seletivo, transferindo
o mister à lei, a ser editada por cada ente federativo, observados, é claro, os contornos
constitucionais.
2 A previsão da fase de títulos
Para a seleção do seu pessoal efetivo, a Administração Pública deve submeter os candidatos ao
concurso de provas ou de provas e títulos. É o que prescreve o inciso II do art. 37 da Constituição
da República.
A vigente Constituição admite duas modalidades de concurso: aquele em que há apenas
as provas e a segunda modalidade em que, para além das provas, analisam-se os títulos. A
última modalidade será implementada de acordo com a complexidade e natureza do cargo e
emprego.
A decisão sobre a realização de concurso público de provas e títulos, a afastar o concurso
público em que há apenas as provas, competirá como regra ao legislador infraconstitucional,
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a quem caberá concluir pela necessidade, mais do que a simples conveniência, de se valorar a
vida profissional e intelectual do candidato.2
O legislador, responsável pela definição das exigências que devem ser cumpridas pelos candidatos
no que concerne ao sexo, à idade, ao grau de instrução, também assume o ônus de estabelecer,
ou não, a fase de títulos. Não se olvide que a liberdade que a Constituição da República lhe
confere no art. 37, II, não traduz autorização para que o legislador crie a fase de títulos
em concursos a envolver cargos e empregos cuja natureza e baixa complexidade das tarefas
dispensam a aferição da vida profissional e intelectual dos postulantes. Importa reconhecer
que a impessoalidade é princípio reitor a conduzir os certames. A previsão da fase de títulos
quando injustificável, à luz da simplicidade dos afazeres correlatos ao cargo e ao emprego,
poderá acarretar, em última análise, privilégio àqueles que possuem melhor histórico, embora
irrelevante tal fato para a boa execução das tarefas públicas.
O edital, instrumento condutor do certame, estará adstrito à coloração que a lei atribuir à fase
de títulos, espelhando, portanto, a valoração realizada prematuramente pelo legislador. Assim,
da mesma forma que se inadmitem restrições relativas à idade e à formação profissional, entre
outras, fora as situações contempladas na lei, não prospera a fase de títulos acaso inexistente
lei que assim prescreva.
O Supremo Tribunal Federal por inúmeras vezes condenou regras editalícias que impunham
fixação de limite de idade ou que estabeleciam altura mínima via edital, reconhecendo a
reserva legal.3 Da mesma forma, o Supremo Tribunal Federal pacificou o entendimento de que a
validade do exame psicotécnico condiciona-se, entre outras coisas, à previsão em lei, além de
repudiar que experiência profissional esteja prevista exclusivamente no edital.4
A ausência de uma lei de concursos,5 que deveria ser editada não pela União, mas por cada
um dos entes federados,6 em que pese poder significar algum grau de prejuízo na condução
2 A própria Constituição da República estabelece a obrigatoriedade da apreciação dos títulos em alguns casos. É o que ocorre com o concurso público para a Magistratura (art. 93, I), para o Ministério Público (art. 129, § 3°), para a Advocacia Pública (arts. 131, § 2° e 132, caput), Defensoria Pública (art. 134, § 1°), Magistério (art. 206, V) e, finalmente, para as atividades notarial e de registro (art. 236, § 3°).
3 RE 559.823—AgR Relator Joaquim Barbosa; RE 559.171—AgR Relatora Ministra Cármen Lúcia; RE 558.833—AgR Relatora Ministra Ellen Gracie. Sobre altura mínima, vide AI 723.748—AgR Relator Ministro Eros Grau.
4 Sobre a ilegalidade de fixação de experiência profissional apenas no edital, vide RE 558.833— AgR Relatora Ministra Ellen Gracie. Sobre exame psicotécnico, vide AI 625.617 AgR Celso de Mello.
5 Tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei n. 252/2003, que regulamenta o art. 37, II, da CR/88, dispondo sobre normas gerais relativas a concursos públicos no âmbito da administração direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Apensados ao PL n. 252/2003 também tramitam os PL n. 1.716/1999, PL n. 2.945/2004, PL n. 745/2007, PL n. 985/2007, PL n. 1.009/2007 e PL n. 6.837/2010, que disciplinam a mesma matéria. Referido projeto tem sua origem no Senado Federal (PL n. 109/1989), o que enseja discussão sobre a constitucionalidade, em virtude de a matéria ser de iniciativa privativa do Chefe do Executivo (art. 61, § 1°, inciso II, alínea c, CR/88). O TJDFT julgou inconstitucional, em 10/10/2006, a Lei Complementar Distrital n. 3703/2005, que estabelecia normas sobre provas de concursos públicos, por violação à Lei Orgânica do Distrito Federal, que estabelece ser a matéria de iniciativa privativa do Governador do Distrito Federal (ADI 2006 00 2 007291-8 — 0007291-75.2006.807.0000 / Acórdão n. 258354).
6 Em verdade, a possibilidade de se editar uma lei geral de concursos públicos é objeto de polêmica já que o assunto relativo a pessoal é matéria que se insere na autonomia assegurada a cada ente da federação.
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dos referidos certames, porque eliminaria discussões que não raramente batem às portas
do Judiciário, não impede que se estabeleçam as exigências para o provimento de cargos e
empregos nas leis responsáveis pela sua criação. Em verdade, ainda que a lei geral exista não
lhe será permitido exaurir o tratamento da matéria, fixando de antemão todos os casos em que
os títulos deveriam ser apreciados ou ainda discorrer sobre o que deveria ser compreendido
como tal. À citada lei cumpriria traçar diretrizes, sem esgotar a disciplina sobre a matéria,
diante da necessidade de se avaliar casuisticamente cada cargo e emprego. A lei criadora do
cargo fixaria a fase de títulos.
A previsão legal a favor da fase de títulos não esgota a previsão, dado que ao edital cumprirá
estabelecer o que será computado como títulos, definindo, ainda, a pontuação a ser atribuída
a cada documento, o momento e a forma da apresentação.
O candidato tem o direito de conhecer de antemão a forma como a banca examinadora avaliará
os documentos, evitando a possibilidade de que a decisão ocorra sem apreço aos princípios da
moralidade e da impessoalidade.
Previsões editalícias que não estabeleçam satisfatoriamente o que será admitido como
título, permitindo à banca examinadora espaço exageradamente amplo e retirando do
candidato o direito de previamente conhecer os critérios que serão empregados, não se
amoldam à ordem jurídica.
Nesse sentido, os critérios para a avaliação dos títulos têm que ser definidos de forma clara
e objetiva, para que todos os concursandos tenham conhecimento das regras previamente ao
início do procedimento seletivo.
Esta foi a orientação do egrégio TRF-4a Região, quando decidiu que “a análise de títulos requer
a adoção de critérios objetivos, a fim de evitar que paire qualquer dúvida acerca da qualificação
de cada candidato”, não sendo “dado à Administração poder discricionário para agregar maior
ou menor valor ao título” (Remessa Ex Officio em MS n. 1999.04.01.018.974-5/RS, Relator
Desembargador Federal Paulo Afonso Brum Vaz, 3a Turma, DJ, 20/09/2000).
Nesse mesmo diapasão, a ilustre Ministra Laurita Vaz afirmou que a fixação de critérios para
avaliação dos títulos, “após a apresentação dos títulos pelos concorrentes (...) malfere os
princípios da moralidade, finalidade e impessoalidade” (STJ — RMS 18.022-MG, 5a Turma, DJ,
05/09/2005).
E, ainda, o eminente Ministro Gilson Dipp assevera que mesmo
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esclarecimento, posterior, de dúvida interpretativa concernente à natureza dos trabalhos jurídicos publicados a serem aceitos no Concurso, [...] tão somente após o início da Prova de Títulos, quando a Administração já estava em poder dos títulos de todos os recorrentes, ofende os princípios da moralidade administrativa e impessoalidade (STJ — RMS 17.8678-MG, 5a Turma, DJ, 14/06/2004).
Entende o colendo Superior Tribunal de Justiça, destarte, que a mera alteração de critérios para
julgamento dos títulos, após a apresentação de tais títulos, configura ofensa à moralidade e à
impessoalidade. Por maior razão, há que se reconhecer idêntica violação quando se faz, não mera
alteração, mas a própria fixação dos critérios de avaliação e pontuação, “quando a Administração
já estava em poder dos títulos de todos os concorrentes” (Ministro Gilson Dipp).
3 Do princípio da proporcionalidade na prova de títulos
Tão importante quanto a identificação da necessidade ou não da realização da prova de títulos
é o estabelecimento da sua extensão no contexto do certame.
Tem-se que para ambas as tarefas, definição da existência da prova de títulos e a pontuação a lhe
ser reservada, o legislador e o gestor público devem valer-se do princípio da proporcionalidade,
para que se reconheçam formações e experiências relevantes para a Administração Pública e
não se atribuam pontos demasiados a títulos corriqueiros.
A eminente Ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha7 ensina que para se adotar o princípio da
proporcionalidade, é importante ter em mente a existência de hierarquia entre os princípios
constitucionais, que eles são condicionantes uns dos outros e, ainda, ressalta:
O que se nota é que somente com esta atenção se chegará à Justiça material buscada concretamente, pois a Constituição existe exatamente para cumprir tal função básica e não para ser objeto de elocubrações sem face ou força na realidade.
Também se deve anotar ser frequente a referência encontrada, especialmente na jurisprudência constitucional, da diferença entre princípios e subprincípios constitucionais, numa ideia exata e mais fecunda da imprescindibilidade de se fazer valer o princípio da proporcionalidade entre eles para se concluir pela interpretação correta a ser conferida ao tema constitucional cuidado.
Os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, eficiência, economicidade,
razoabilidade, finalidade, dentre outros, devem estar atrelados aos atos decisórios do certame,
a fim de serem estabelecidos critérios claros e objetivos, sob pena de nulidade.
7 ROCHA, Carmén Lúcia Antunes. Princípios constitucionais da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 1994, p. 52-54.
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A imperiosidade de se ter como base o princípio da proporcionalidade para definição da existência
e limites da prova de títulos evidencia-se, sobretudo, no inafastável cumprimento dos demais
princípios constitucionais na execução do concurso.
Segundo Weida zancaner,8 os princípios da proporcionalidade e razoabilidade também devem
nortear os concursos públicos, cujos desatendimentos os macula.
Neste caso específico é bom lembrar que o art. 37, II, da Constituição Federal ao determinar que a ‘investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego’, expressamente assumiu o princípio da proporcionalidade para nortear os concursos públicos.
Também não pode ser considerado válido concurso público que exige dos concursandos capacitação física não compatível com o exercício da profissão que motivou a abertura do concurso. O mesmo se dá quando a exigência de capacitação técnico-profissional for excessiva para o desempenho de um dado cargo.
Na avaliação de títulos, o candidato entrega os documentos comprobatórios da sua formação
profissional e intelectual, que usualmente dizem respeito à formação acadêmica, experiência
profissional, publicações de livros, artigos, premiações, aprovações em outros concursos de
mesma natureza, dentre outros que tiverem pertinência com as atribuições a serem exercidas.
A pontuação dos títulos é sempre limitada, como exemplo, ao número de certificados de
formação (até “x” pós-graduações), à idade do trabalho acadêmico (publicações nos últimos
“x” anos), à área (especializações na área “x”), tudo em consonância com a natureza do cargo
ou do emprego públicos, com a finalidade de se atender ao interesse público.
A apresentação dos títulos não é fase eliminatória, mas é condicionante à classificação. No
entanto, com os títulos, o cenário do concurso pode ser alterado, sobretudo se a diferença
da pontuação das provas ocupar as casas decimais, o que, em última análise, pode levar à
eliminação.
A jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que o Poder Judiciário não pode substituir
a banca examinadora de concurso público ou mesmo se imiscuir nos critérios de correção
de provas e atribuição de notas, visto que o controle jurisdicional restringe-se à legalidade
do concurso.
No entanto, o Poder Judiciário deve, igualmente, utilizar-se do princípio da proporcionalidade
para afastar, desde o início, os critérios descabidos e ambíguos.8 zANCANER, Weida. In: MOTTA, Fabrício (Coord.). Concurso público e constituição. Belo Horizonte: Fórum, 2005, p. 167.
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4 A fase de títulos: seu caráter complementar
Da leitura da Constituição da República se extrai, sem grande esforço, a posição subalterna da
fase de títulos.
Não bastasse o fato de o art. 37, II, admitir concurso público sem a análise de títulos, mas afirmar
a imprescindibilidade das provas em certame dessa natureza, a investigação sobre a finalidade a
que se destina a referida regra eliminaria qualquer discussão que ainda pudesse ser travada.
Com efeito, se o concurso público é procedimento dedicado a homenagear a impessoalidade, a
moralidade e eficiência, permitindo, sem qualquer forma de prestígio pessoal, a demonstração
de conhecimento pelos interessados em ocupar cargos públicos efetivos ou empregos públicos
efetivos, não seria permitido apontar os futuros servidores estatutários de cargo efetivo e
empregados públicos a partir da mera aferição de sua bagagem intelectual e profissional,
porque, em regra os mais jovens seriam prejudicados, assim como também o seriam aqueles
que por razões sócio-econômicas tiveram menores chances de abastecer seu currículo.
O eminente Ministro Carlos Britto sobre a análise de títulos afirmou:
Servem tão somente como critério de classificação dos candidatos, até porque se ostentassem natureza eliminatória, fariam com que os candidatos carecedores de densos currículos (os mais jovens e mais pobres, principalmente) já entrassem para a prova de conhecimento com a obrigação de saber mais do que os outros. E é intuitivo que tal obrigação antecipada de saber mais lesionaria o princípio da igualdade.
Também não se pode ignorar que os títulos podem revelar, no máximo, e a depender da sua
natureza, apenas o conhecimento presumido.
Desde logo se percebe que a análise dos títulos não tem o condão de identificar o candidato
portador de maior conhecimento. As provas, e apenas elas, permitem inferir quão preparado
o concorrente está. Não é por outra razão que a Constituição da República inadmite concurso
público limitado à investigação e valoração dos títulos, exigindo, ao revés, provas em todo
concurso público. Os títulos, ainda que possam revelar experiências, a depender do que venha
a ser reconhecido como título hábil em dado certame, não traduzem o mecanismo correto para
a avaliação do mérito.
Por isso, a avaliação dos títulos assume caráter acessório, complementar e ancilar quando
comparada às provas de conhecimento.
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Cretella Júnior corretamente afirmou que “a prova de títulos nada mais é do que uma das fases
do procedimento seletivo maior — o concurso de provas e títulos — não tendo, assim, o caráter
autônomo do concurso de títulos, tão só.”9
Logo, os títulos devem ser analisados na hipótese de o candidato ter logrado êxito nas provas.
Isso porque, como se extrai da Constituição da República, que prevê concurso público de provas
ou de provas e títulos, estes não estão inseridos nas provas.
Assim, sob pena de ofender não apenas a regra constitucional, mas os princípios que a inspiram,
a apreciação dos títulos de determinado candidato condiciona-se à sua aprovação nas provas.
E, como salienta Diogenes Gasparini,10 o concurso de provas e títulos caracteriza-se por
submeter o candidato a provas escritas e eventualmente orais “e considerar os títulos por ele
apresentados como fator de classificação.”
Isso porque a apresentação de títulos em concursos públicos tem como finalidade valorar a
experiência profissional e o aspecto intelectual do candidato, a formação acadêmica na área
específica de atribuição do cargo e a realização de pesquisas e elaboração de trabalhos técnicos,
mas não pode ser tomada como elemento de aprovação ou desaprovação de candidatos no
certame, sob pena de violação aos princípios norteadores do próprio certame.
A doutrina também é indiscrepante no sentido de que
o concurso de provas e títulos, se observarmos com lógica e coerência o intento constitucional, indica que os candidatos devem ter seu conhecimento medido pelas provas a que se submeterem, porque esse é o objetivo delas.
E mais:
a titulação dos candidatos não pode servir como parâmetro para a aprovação ou reprovação no concurso público, pena de serem prejudicados seriamente aqueles que, contrariamente a outros candidatos, e às vezes por estarem em início de profissão, ainda não tenham tido a oportunidade de obterem esta ou aquela titulação. Entendemos, pois, que os pontos atribuídos à prova de títulos só podem refletir-se na classificação dos candidatos e não em sua aprovação ou reprovação. Só assim é possível considerar o concurso de provas e títulos compatível com o princípio da impessoalidade inscrito no art. 37 da CF.11
9 CRETELLA JUNIOR, José. Comentários à Constituição de 1988. Rio de Janeiro: Forense Universitária, v. 4, 1991, p. 2.178.
10 GASPARINI, Diogenes. In: MOTTA, Fabrício (Coord.). Concurso Público e Constituição. Belo Horizonte: Fórum, 2007, p. 34.
11 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 19 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 512.
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Paulo Roberto Ferreira Motta e Raquel Dias da Silveira,12 no artigo publicado em obra que
homenageia o Professor Pedro Paulo de Almeida Dutra, lecionam sobre a análise dos títulos:
O exame de títulos encerra o reconhecimento formal por parte da Administração Pública dos méritos dos candidatos que procuraram obter uma formação adicional àquelas exigidas pelo edital. Neste caso, o concurso público na modalidade de provas e títulos é um poderoso incentivo à qualificação dos indivíduos, sendo elogiável que o Estado assim atue.
Todavia, o concurso público nesta modalidade não pode desvirtuar o escopo maior do certame seletivo, qual seja o de selecionar, isonomicamente, os melhores candidatos. Assim sendo, o edital deverá, com precisão, declarar os títulos que serão aceitos, bem como a pontuação de cada um. A razoabilidade e a proporcionalidade deverão ser observadas com rigor. [...] O exame e a atribuição de títulos deverão guardar sempre caráter classificatório (grifos nossos).
Outro não é o entendimento do Colendo Supremo Tribunal Federal a respeito da matéria:
CONCURSO PÚBLICO — TÍTULOS — REPROVAÇãO. Coaduna-se com o princípio da razoabilidade constitucional conclusão sobre a circunstância de a pontuação dos títulos apenas servir à classificação do candidato, jamais definindo aprovação ou reprovação. Alcance emprestado por Tribunal de Justiça à legislação estadual, em tudo harmônico com o princípio da razoabilidade, não se podendo cogitar de menosprezo aos critérios da moralidade e da impessoalidade (STF, AI n. 194.188 AgR/RS, Relator Ministro Marco Aurélio, j. em 30/03/98, DJ de 15/05/1998, p. 48).
No julgado acima, relativamente à pontuação dos títulos, ressaltou o eminente relator que,
conforme assentou o Colegiado, estes somente servem à classificação do candidato, jamais à definição de tê-lo como aprovado ou reprovado. Foi esse o sentido dado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul à norma de regência, ou seja, ao artigo 20 e §§ da Constituição Estadual, preceitos que exsurgem consentâneos com a razoabilidade constitucional, levando-se em conta a exigência inserta no artigo 37, inciso II, da Carta da República.
O exame de títulos possui uma função que será sempre acessória, adjacente, não podendo
superar a fase de provas, sob pena de se romper a regra constitucional.
O Governo Federal editou o Decreto n. 6.944, de 21 de agosto de 2009, que estabelece medidas
organizacionais para o aprimoramento da administração pública federal direta, autárquica e
12 MOTTA, Paulo Roberto Ferreira; SILVEIRA, Raquel Dias da. In: FORTINI, Cristiana (Org.). Servidor público: estudos em homenagem ao Professor Pedro Paulo de Almeida Dutra. Belo Horizonte: Fórum, 2009, p. 332-333.
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fundacional, dispondo sobre normas gerais relativas a concursos públicos. Os §§ 1° e 2° do art.
13 do referido decreto13 determinam que a prova de títulos seja posterior à prova escrita, o que
reafirma seu caráter secundário.
5 Síntese conclusiva
O concurso público é regra constitucional inafastável, tendo apenas como exceção a nomeação
para cargos em comissão, de livre nomeação e exoneração, e a contratação por tempo
determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público.
A avaliação de títulos não se faz isoladamente, quando adotada nos concursos públicos, constitui
fase final classificatória, quando o candidato já ultrapassou todas as provas previstas para a
seleção do cargo ou emprego público em que pretende ingressar.
A doutrina e a jurisprudência pátria não dão azo ao abrandamento da regra constitucional, ao
contrário, reforçam a sua imperatividade ao exigirem o rigoroso cumprimento, como forma de
materializar os princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade, eficiência,
economicidade, razoabilidade e finalidade.
A prova de títulos premia os candidatos com melhor formação e experiência, mas não pode
servir de instrumento de favoritismo ou perseguições, razão pela qual os critérios de avaliação
têm que ser objetivos, claros, prévios e, sobretudo, proporcionais.
Referências
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 25 ed. São Paulo: Malheiros, 2008.
BRUNO, Reinaldo Moreira; DEL OMO, Manolo. Servidor público: doutrina e jurisprudência. Belo Horizonte: Del Rey, 2006.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 19 ed. Rio de Janeiro. Lumen Juris, 2008.
CRETELLA JÚNIOR, José. Comentários à Constituição de 1988. Rio de Janeiro: Forense Universitária, v. 4, 1991. p. 2.178.
CUNHA JÚNIOR, Dirley. Controle judicial das omissões do poder público. São Paulo: Saraiva, 2004.
13 Art. 13. O concurso público será de provas ou de provas e títulos, podendo ser realizado em duas etapas, conforme dispuser a lei ou o regulamento do respectivo plano de carreira.
§ 1° quando houver prova de títulos, a apresentação destes deverá ocorrer em data a ser estabelecida no edital, sempre poste-rior à da inscrição no concurso, ressalvada disposição diversa em lei.
§ 2° A prova de títulos deverá ser realizada como etapa posterior à prova escrita e somente apresentarão os títulos os candidatos aprovados nas etapas anteriores ou que tiverem inscrição aceita no certame.
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DI PIETRO, Maria Sylvia zanella. Direito administrativo. 23 ed. São Paulo: Malheiros, 2010.
FORTINI, Cristiana (Org.); MOTTA, Paulor Roberto Ferreira; SILVEIRA, Raquel Dias da. Servidor público: estudos em homenagem ao professor Pedro Paulo de Almeida Dutra. Belo Horizonte: Fórum, 2009, p.332-333.
GASPARINI, Diogenes. Concurso público e constituição. Fabrício Motta (Coord.). Belo Horizonte: Fórum, 2005, p. 34.
MADEIRA, José Maria Pinheiro. Servidor público na atualidade. 4. ed. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2006.
MOTTA, Paulo Roberto Ferreira; SILVEIRA, Raquel Dias da. In: FORTINI, Cristiana (Org.). Servidor público: estudos em homenagem ao Professor Pedro Paulo de Almeida Dutra. Belo Horizonte: Fórum, 2009, p. 332-333.
ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais dos servidores públicos. São Paulo: Saraiva, 1994.
zANCANER, Weida. In: MOTTA, Fabrício (Coord.). Concurso público e constituição. Belo Horizonte: Fórum, 2005, p. 161-168.
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Fabrício Motta
Procurador do Ministério Público junto ao TCM GO. Professor
de Direito Administrativo da UFG. Doutor em Direito do
Estado (USP) e Mestre em Direito Administrativo (UFMG).
Resumo: O artigo analisa o instituto do concurso público, entendido como procedimento que efetiva
o direito fundamental de concorrer, em igualdade de condições, aos cargos e empregos públicos
permanentes. O regime jurídico dos concursos é sucintamente investigado para que, em momento
posterior, sejam sugeridas novas linhas de atuação para o controle externo dos concursos.
Palavras-chave: Concurso público. Direito fundamental. Isonomia. Controle externo.
Abstract: The following article analyzes the public examination, understood as a proceeding
which materializes the fundamental right to compete, under equal conditions, for available
public offices. The legal regimen of such contests should be briefly investigated in order to
suggest new proceedings for external control on the contests.
Keywords: Public examination. Fundamental Law. Isonomy. External control.
Introdução
O presente artigo objetiva fornecer elementos hábeis ao reconhecimento, no sistema constitucional
brasileiro, de um direito fundamental de concorrer, em condição de igualdade, aos cargos efetivos e
empregos públicos. Após breve notícia histórica, o estudo investiga, no texto constitucional, o suporte
para a existência do direito fundamental referido, bem como os destinatários e titulares desse direito.
Em tópicos posteriores, são analisadas as consequências jurídicas de se erigir o direito de amplo acesso
Direitos fundamentais e concurso público
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— que se materializará por meio da realização do procedimento do concurso público — ao status de
direito fundamental. Finalmente, à guisa de conclusão, são anotadas algumas proposições específicas
para o controle externo dos concursos, realizado pelos Tribunais de Contas.
1 Escorço histórico: ampla acessibilidade e concurso público nas Constituições brasileiras
As primeiras Constituições brasileiras colocaram o princípio da ampla acessibilidade entre as
normas de direitos fundamentais. Com efeito, estabelecia a Constituição do Império de 25 de
março de 1824:
Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte:
[...]
XIV. Todo o cidadão pode ser admittido aos Cargos Publicos Civis, Politicos, ou Militares, sem outra differença, que não seja dos seus talentos, e virtudes.
A primeira Constituição republicana, de 24 de fevereiro de 1891, seguia no mesmo rumo:
Art. 72. A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
§ 2° — Todos são iguais perante a lei. A República não admite privilégios de nascimento, desconhece foros de nobreza e extingue as ordens honoríficas existentes e todas as suas prerrogativas e regalias, bem como os títulos nobiliárquicos e de conselho.
Art. 73. Os cargos públicos civis ou militares são acessíveis a todos os brasileiros, observadas as condições de capacidade especial que a lei estatuir, sendo, porém, vedadas as acumulações remuneradas.
A Constituição Republicana de 1934 trazia dispositivo semelhante, mas alojado em título próprio,
não constante do rol explícito de direitos e garantias fundamentais, intitulado Funcionários
públicos.1 Já a Constituição de 1937, muito embora exalasse autoritarismo, reintroduziu a
questão no rol das normas de direitos fundamentais, prescrevendo: “Art. 122 [...], 3°, os cargos
1 “Art. 168. Os cargos públicos são acessíveis a todos os brasileiros, sem distinção de sexo ou estado civil, observadas as condições que a lei estatuir.”
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públicos são igualmente acessíveis a todos os brasileiros, observadas as condições de capacidade
prescritas nas leis e regulamentos.”
As Cartas posteriores trouxeram poucas alterações, mantendo, no essencial, o princípio
localizado em seção específica destinada aos funcionários públicos ou ao Executivo.
Por seu turno, a primeira menção explícita a concurso público no constitucionalismo brasileiro
ocorreu com a edição da Constituição de 1934. Com efeito, o art. 170, 2°, da Constituição
de 1934, determinava que “a primeira investidura nos postos de carreira das repartições
administrativas, e nos demais que a lei determinar, efetuar-se-á depois de exame de sanidade
e concurso de provas ou títulos”. O art. 158 da mesma Carta vedava “a dispensa do concurso de
títulos e provas no provimento dos cargos do magistério oficial, bem como, em qualquer curso,
a de provas escolares de habilitação, determinadas em lei ou regulamento”.
Na Constituição de 10 de novembro de 1937, havia regra semelhante, diferente da anterior
somente no tocante à não exigência expressa de exame de sanidade.2 Na Constituição de 1946,
houve mudança que a aproximou da Carta de 1934. Segundo o art. 186, “A primeira investidura
em cargo de carreira e em outros que a lei determinar efetuar-se-á mediante concurso,
precedendo inspeção de saúde.”
A Carta de 1967 iniciou a sistemática mais próxima do regramento atual. Estabeleciam os
parágrafos 1° e 2° do art. 95: “§ 1° A nomeação para cargo público exige aprovação prévia
em concurso público de provas ou de provas e títulos. § 2° Prescinde de concurso a nomeação
para cargos em comissão, declarados em lei, de livre nomeação e exoneração.” Por último, a
Emenda Constitucional n. 1, de 17 de outubro de 1969, admitiu a possibilidade da dispensa de
concurso público para a primeira investidura em cargo público, nos casos indicados em lei.3 A
Constituição republicana de 1988, como se sabe, estabelece que os cargos, empregos e funções
públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei, assim
como aos estrangeiros, na forma da lei, e que a investidura em cargo ou emprego público
depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo
com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas
as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração (art.
37, incisos I e II).
2 “Art. 156. O Poder Legislativo organizará o Estatuto dos Funcionários Públicos, obedecendo aos seguintes preceitos desde já em vigor: [...] b) a primeira investidura nos cargos de carreira far-se-á mediante concurso de provas ou de títulos.”
3 “Art. 97. Os cargos públicos serão acessíveis a todos os brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei. § 1° A primeira investidura em cargo público dependerá de aprovação prévia, em concurso público de provas e títulos, salvo os casos indicados em lei. § 2° Prescindirá de concurso a nomeação para cargos em comissão, declarados em lei, de livre nomeação e exoneração.”
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2 O direito fundamental de concorrer, em igualdade de condições, às posições públicas com vocação permanente
O Estado brasileiro é não somente um Estado Democrático de Direito, mas um Estado
Constitucional, pautado pela centralidade da Constituição e por sua irresistível força normativa.
Nesse Estado, a relevância da concretização dos direitos fundamentais cresce substancialmente
em razão de uma mudança de enfoque. Com efeito, no estudo do curso evolutivo do Estado de
Direito, partindo do chamado Estado Liberal, é possível perceber uma mudança na concepção
inicial dos direitos fundamentais, negativista e subjetiva, a qual intentava tão somente limitar
a atuação do Estado para garantir a liberdade individual. Absorvendo influências do processo de
democratização e do advento do Estado Social,4 os direitos fundamentais deixam de ser meros
limites negativos ao exercício do poder político para direcionarem e condicionarem as ações
positivas do Estado, passando a incidir, inclusive, nas relações entre particulares. Passam a
ser vistos, então, em uma dupla dimensão: no plano jurídico-objetivo, constituindo normas de
competência negativa para os poderes públicos, proibindo fundamentalmente as ingerências
destes na esfera jurídica individual; e no plano jurídico-subjetivo, consistindo no poder de
exercer positivamente direitos (liberdade positiva) e de exigir omissões dos poderes públicos,
de forma a evitar agressões lesivas a direitos por parte dos mesmos (liberdade negativa).5
Nas Constituições brasileiras de 1824 e 1937, o princípio da ampla acessibilidade constava
expressamente no rol de direitos e garantias fundamentais. Resta-nos investigar, na Constituição
Federal de 1988, o assento constitucional do direito fundamental de concorrer, em igualdade
de condições, aos cargos e empregos públicos (posições públicas com vocação permanente),
em razão da inexistência de referência explícita no rol dos direitos e garantias fundamentais.
Inicialmente, calha atentar para a adoção de um conceito materialmente aberto de direitos
fundamentais na Constituição brasileira, ao reconhecer a existência desses direitos, mesmo
formalmente fora do catálogo, mas decorrentes do regime e dos princípios adotados pela
Constituição (art. 5°, § 2°).6
O primeiro alicerce do direito fundamental repousa no binômio república – democracia.7 O regime
republicano-democrático é marcado pela titularidade do poder conferida aos cidadãos, e de
4 VIEIRA DE ANDRADE, José Carlos. Os direitos fundamentais na Constituição portuguesa de 1976. 3. ed. Lisboa: Almedina, 2006, p. 45.
5 CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 7.ed. Coimbra: Almedina, 2003, p. 408.
6 No entendimento de Ingo Sarlet, “a citada norma traduz o entendimento de que, para além do conceito formal de Constituição (e de direitos fundamentais), há um conceito material, no sentido de existirem direitos que, por seu conteúdo, por sua substância, pertencem ao corpo fundamental da Constituição de um Estado, mesmo não constando no catálogo. Neste contexto, importa salientar que o rol do art. 5°, apesar de exaustivo, não tem cunho taxativo” (SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fun-damentais. 3.ed. rev. atual. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003, p. 86).
7 Paulo Bonavides identifica o direito à democracia e os direitos dela decorrentes como integrantes da quarta geração dos direitos fundamentais (BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional, 7.ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 524-526).
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tal assertiva decorre o direito de participar ativamente do exercício e do controle das funções
estatais. Para esta visão, é preciso afastar a concepção reducionista da democracia meramente
representativa e encará-la, como propõe Canotilho,8 como um princípio complexo, que possui
várias dimensões. Importa, mais diretamente, que se encare o reflexo do princípio democrático
enquanto princípio de organização, que espraia seus efeitos não somente sobre a organização do
Estado, mas também sobre a organização e funcionamento da Administração Pública.
O segundo alicerce do direito fundamental de que se trata é o direito fundamental à igualdade,
previsto genérica e firmemente no art. 5° de nossa Constituição.9 Canotilho anota parâmetros
necessários para a identificação da isonomia material ou igualdade justa: a) a consideração do
princípio da igualdade como um direito apenas de natureza negativa é francamente insuficiente;
b) não basta invocar uma proibição geral de arbítrio no estabelecimento de critérios para as
discriminações; c) é imprescindível analisar a natureza, o peso e os fundamentos ou motivos
justificadores das soluções diferenciadas.10 Ao princípio geral da isonomia constante do art. 5°
soma-se, para a Administração, a previsão do art. 37, que determina a obediência ao princípio
da impessoalidade. Rechaçando a possibilidade de simples identificação entre isonomia e
impessoalidade,11 algumas manifestações deste último princípio podem ser colacionadas: a) o
princípio objetiva não permitir que o administrador se privilegie, pois deste privilégio nasce o
prejuízo de toda a sociedade;12 b) o princípio traduz a orientação finalística de toda e qualquer
atividade da Administração, impedindo a mera intenção de privilegiar ou prejudicar qualquer
cidadão ou qualquer grupo; c) essa orientação finalística — ou primado da finalidade — faz com
que as vontades pessoais sejam irrelevantes na composição da vontade da Administração. O
princípio isonômico, em apertada síntese, determina um equânime tratamento dos cidadãos,
de acordo com sua situação pessoal, não havendo amparo para tratamento injustificadamente
privilegiado ou desfavorecido por parte do Estado. A dimensão do princípio que ora se encarece
é a igualdade de oportunidade, de todos, na disputa por cargos e empregos públicos.
Em conclusão parcial, é possível afirmar que “o direito fundamental de concorrer, em igualdade
de condições, aos cargos efetivos e empregos públicos, é decorrente do regime republicano-
8 CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 7. ed. Coimbra: Almedina, 2003, p. 290.
9 “Art. 5° Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.”
10 CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 7. ed. Coimbra: Almedina, 2003, p. 429.
11 “A relação principal enfatizada na impessoalidade é a do agente administrativo com a Administração Pública e, em especial, com o Poder Público, em cujo exercício todos os privilégios podem ser angariados por maus agentes. Vê-se, pois, que ambos (impessoalidade e igualdade) são princípios de observância obrigatória da Administração Pública, mas o da impessoalidade o é em caráter exclusivo, vale dizer, não desborda da esfera estatal, tendo aí o seu espaço de incidência. Na verdade, estes dois princípios recobrem realidades diferentes, sendo o conteúdo da igualdade jurídica mais amplo e dotado de primariedade que se desdobra, conforme afirmou-se anteriormente, dentre outros, no princípio da impessoalidade administrativa” (ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 1994, p. 153).
12 Ibidem, 1994, p. 153.
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democrático e do princípio da igualdade.” Tratando-se de direito fundamental, será importante
precisar suas características.
3 Âmbito de proteção e funções
O direito fundamental, que se efetivará com a realização do procedimento administrativo
denominado concurso público, abrange cargos e empregos públicos. Sabe-se que as funções
públicas não são precedidas de concurso público ou porque somente podem ser ocupadas por
servidores efetivos (concursados, obviamente, nos termos do art. 37, inciso V), em se tratando
de funções de confiança, ou porque a realização do concurso poderia obstar a proteção
temporária de interesse público excepcional (art.37, inciso IX). Não é demais relembrar que o
art. 37 alcança as administrações direta e indireta, muito embora devam aplicar seus princípios
todas as entidades que, de uma forma ou de outra, se beneficiem de relações jurídicas com o
poder público.
Conquanto direito derivado do direito fundamental à igualdade, é mister identificar uma
primeira função do direito tratado neste tópico: impedir a discriminação injustificada dos
cidadãos aptos à disputa de cargos e empregos públicos.
A dimensão objetiva deste direito permite, dentre outras consequências, reconhecer a existência
de direito fundamental à organização e ao procedimento.13 Na lição de Konrad Hesse,
Para poder cumprir sua função, direitos fundamentais requerem, em primeiro lugar, geralmente em proporção mais ou menos vasta, regulações de organização e procedimento, especialmente claro, por exemplo, na liberdade de associação. Criá-las é tarefa da organização, que não pode restringir-se a normatizações materiais. Simultaneamente, direitos fundamentais, por sua vez, influem sobre o direito de organização e procedimento que, deste modo, contribui para a realização e asseguramento dos direitos fundamentais.14
Como esclarece Gilmar Ferreira Mendes, utiliza-se a expressão direito fundamental à organização
e ao procedimento para
[...] designar todos aqueles direitos fundamentais que dependem, na sua realização, tanto de providências estatais com vistas à criação e conformação de órgãos, setores ou repartições (direito à organização), como de outras,
13 “A dimensão objectiva também é pensada como estrutura produtora de efeitos jurídicos, enquanto complemento e suplemento da dimensão subjectiva, na medida em que se retiram dos preceitos constitucionais efeitos que não se reconduzem totalmente às posições jurídicas subjectivas que reconhecem, ou se estabelecem deveres e obrigações, normalmente para o Estado, sem a correspondente atribuição de ‘direitos’ aos indivíduos” (VIEIRA DE ANDRADE, José Carlos. Os direitos fundamentais na Constitui-ção Portuguesa de 1976. 3. ed. Lisboa: Almedina, 2006, p. 115).
14 HESSE, Konrad. Elementos de Direito Constitucional da República Federal da Alemanha. Trad. Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris, 1998, p. 288.
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normalmente de índole normativa, destinadas a ordenar a fruição de determinados direitos ou garantias, como é o caso das garantias processuais-constitucionais (direito de acesso à justiça, direito de proteção judiciária, direito de defesa).15
Com efeito, o cumprimento do dever de proteger os cidadãos de intromissões indevidas dos
poderes públicos, dos particulares e de outros Estados, pode exigir a criação de organizações
estatais e também de procedimentos. Para alcançar eficácia, o direito fundamental em análise
carece de organização jurídica das condições, meios e procedimentos aptos a realizá-los. Dessa
forma, fica clara a importância do concurso público, enquanto procedimento administrativo
indispensável à eficácia do direito fundamental de disputar, em igualdade de condições, os
cargos e empregos públicos. Não há que se falar, portanto, em um direito fundamental ao
concurso público. O concurso público, ao contrário, é o procedimento de operacionalização do
direito fundamental antes comentado.
O direito fundamental estabelece não somente um direito objetivo de se disputar certames,
mas determina a existência de um dever público de realizá-los, de forma isonômica, sempre
que o interesse público o exigir. Esse assunto será aprofundado no tópico seguinte.
4 Destinatários e titulares
No ordenamento brasileiro, as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm
aplicação imediata, por força do art. 5°, § 1°, da Constituição. Essa norma ampara a vinculação
de todos os poderes públicos à otimização dos direitos fundamentais, acarretando-lhes forte
compromisso com sua eficácia.16 Este entendimento é reforçado com a observância dos
fundamentos e objetivos da República, constantes dos artigos que inauguram a Constituição. A
conclusão não pode ser outra: pode-se afirmar que, no limite de suas atribuições constitucionais,
Executivo, Legislativo e Judiciário estão jungidos à observância, proteção e implementação dos
direitos fundamentais.
A precisão da medida dessa vinculação da Administração aos direitos fundamentais, por seu
turno, apresenta-se revestida de maior complexidade. Contudo, algumas consequências
15 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 8.
16 São corretas as conclusões de Ingo Wolfgang Sarlet “[...] cada ato (qualquer ato) dos poderes públicos deve tomar os direitos funda-mentais como ‘baliza e referencial’. Importante, ainda, é a constatação de que o preceito em exame fundamenta uma vinculação isenta de lacunas dos órgãos e funções estatais aos direitos fundamentais, independentemente da forma jurídica mediante a qual são exercidas essas funções. [...] Por esse motivo é que se aponta para a necessidade de todos os poderes públicos respeitarem o âmbito de proteção dos direitos fundamentais, renunciando, em regra, a ingerências, a não ser que apresente justificativa que as autorize. Do efeito vinculante inerente ao art. 5°, § 1°, da CF, decorre, num sentido negativo, que os direitos fundamentais não se encontram na esfera de disponibilidade dos poderes públicos, ressaltando-se, contudo, que numa acepção positiva, os órgãos esta-tais se encontram na obrigação de tudo fazer no sentido de realizar os direitos fundamentais”. (SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 3.ed. rev. atual. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003, p. 343).
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jurídicas do compromisso com a eficácia podem ser estabelecidas, sem qualquer pretensão
de classificação ou exaurimento. Inicialmente, cabe associar a vinculação da Administração às
modalidades de eficácia mais pacificamente aceitas para os princípios constitucionais, quais
sejam, interpretativa e negativa.17 Em atenção à primeira modalidade, deve-se asseverar que
a interpretação e aplicação das leis e demais atos normativos deve guardar conformidade
com o direito fundamental, privilegiando uma intelecção que otimize sua aplicação. Essa
consequência ganha feições relevantes no condicionamento da discricionariedade administrativa,
podendo as normas relativas aos direitos fundamentais comprimir ou mesmo reduzir a zero a
discricionariedade, se houver, no caso concreto, apenas um modo de realização do direito
fundamental.18 Pode-se citar, como exemplo, a necessidade de privilegiar a interpretação que
conduza à realização do concurso público quando existir confronto com cargo em comissão,
livremente provido.19 A eficácia negativa, por sua vez, impede que sejam praticados atos ou
editadas normas que se oponham aos direitos fundamentais. Esta modalidade de eficácia impõe
o dever de controlar leis e atos normativos inferiores que trouxerem prescrições em sentido
diverso ao sinalizado pelo direito fundamental.
Conclui-se, portanto, que o Estado-Administração é o principal destinatário do direito
fundamental tratado, incumbindo-lhe imprimir eficácia ao direito por meio da realização
de concursos públicos e também, do combate às situações que contribuem para retardar ou
impossibilitar sua realização.
Por sua vez, os titulares do direito são, em sentido amplo e na forma do caput do art. 5°, os
brasileiros e estrangeiros residentes no país. Em situações concretas de violação podem ser
verificados titulares determinados.
Em se tratando de direito fundamental, há que se impor como consequência jurídica o
reconhecimento de sua eficácia irradiante consistente, sobretudo:
na existência de um dever de otimização imposto a todo o Estado (Executivo, Legislativo, a)
Judiciário e órgãos não vinculados formalmente a nenhum dos poderes);20
17 Luís Roberto Barroso identifica as três modalidades mais relevantes de eficácia associadas aos princípios: eficácia positiva (seu objetivo é reconhecer àquele que seria beneficiado pela norma ou atingido pela realização de seus efeitos direito subjetivo a esses mesmos efeitos); eficácia interpretativa (os princípios orientam a interpretação das regras em geral para que o intérprete opte, dentre as possíveis exegeses para o caso, por aquela que realize melhor o efeito pretendido pelo princípio constitucional pertinente); e eficácia negativa (autoriza que sejam declaradas inválidas todas as normas ou atos que contravenham os efeitos pretendidos pela norma) (BARROSO, Luís Roberto. Curso de direito constitucional contemporâneo. São Paulo: Saraiva, 2009). No mesmo sentido, BARCELLOS, Ana Paula de. A eficácia jurídica dos princípios constitucionais: o princípio da dignidade da pessoa humana. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.
18 VIEIRA DE ANDRADE, José Carlos. Os direitos fundamentais na Constituição portuguesa de 1976. 3. ed. Lisboa: Almedina, 2006, p. 240.
19 Dois exemplos comumente verificáveis: a existência de concursado aprovado para cargo efetivo, aguardando nomeação, enquan-to encontra-se provido cargo em comissão com atribuições idênticas ou assemelhadas, ou ainda servidor contratado, temporaria-mente, para o desempenho das funções respectivas.
20 Na correta conclusão de Ingo Sarlet, “se, portanto, todas as normas constitucionais sempre são dotadas de um mínimo de eficá-
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na possibilidade de aplicabilidade direta e imediata, vinculando órgãos e entidades públicas b)
e particulares;
em sua consideração como parâmetro hermenêutico e valores superiores de toda a ordem c)
constitucional e jurídica, direcionando e condicionando todo processo de interpretação e
aplicação para que seja buscada a maior eficácia possível.
5 Conformação legal
A conformação legal assume essencial importância diante da necessidade de criação, por lei,
dos cargos públicos e dos empregos públicos na administração direta, e também da correlação
entre a complexidade do concurso e a natureza das atribuições respectivas, também legalmente
estabelecida. Nas duas situações, evidentemente o conteúdo das leis estará sujeito a cotejo
obrigatório com as disposições constitucionais. Ao mesmo tempo, é desejável que se edite lei
— de iniciativa do Poder Executivo — para normatizar os procedimentos mínimos relativos à
organização do concurso público.
6 O concurso público
A realização de certame competitivo, prévio ao acesso aos cargos e empregos públicos,
objetiva realizar os princípios consagrados em nosso sistema constitucional, notadamente
os princípios da democracia e isonomia, e efetiva-se por meio de processo administrativo.
Utilizando este mecanismo, são atendidas também as exigências do princípio da eficiência,
neste momento entendido como a necessidade de selecionar os mais aptos para ocupar as
posições em disputa e proporcionar uma atuação estatal otimizada. O acesso aos cargos e
empregos públicos deve ser amplo e democrático, precedido de um procedimento impessoal
onde se assegurem igualdade de oportunidades a todos interessados em concorrer para
exercer os encargos oferecidas pelo Estado, a quem incumbirá identificar e selecionar os
mais adequados, mediante critérios objetivos.
Como série de atos ligados tendente a selecionar, de forma impessoal, os mais aptos a ocuparem
cargos ou empregos públicos, o concurso público é marcado pelo conflito de interesses entre
os concorrentes e, eventualmente, entre qualquer destes e a Administração. Desta maneira,
o concurso público caracteriza-se inicialmente como procedimento administrativo do qual
cia, no caso dos direitos fundamentais, à luz do significado outorgado ao art. 5°, § 1°, de nossa Lei Fundamental, pode afirmar-se que aos poderes públicos incumbem a tarefa e o dever de extrair das normas que os consagram (os direitos fundamentais) a maior eficácia possível, outorgando-lhes, neste sentido, efeitos reforçados relativamente às demais normas constitucionais, já que não há como desconsiderar a circunstância de que a presunção da aplicabilidade imediata e plena eficácia que milita em favor dos direitos fundamentais constitui, em verdade, um dos esteios de sua fundamentalidade formal no âmbito da Constituição” (SARLET, op. cit., 2003, p. 259).
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podem resultar processos administrativos, desde que caracterizadas situações demandantes de
participação dos interessados em contraditório.21
Estas situações decorrem dos conflitos de interesses que ficam em estado de latência em
procedimentos competitivos, como concursos e licitações. Nesse sentido, à possibilidade de
existência de um procedimento sem questionamentos ou litigiosidade direta, contrapõe-se
hipótese diversa, marcada pela litigiosidade (entendida como conflito resistido de interesses)
entre concorrentes ou entre estes e o poder público na disputa por uma situação jurídica
determinada. Enfim, havendo controvérsia entre candidatos ou entre qualquer destes e a
Administração, existe a possibilidade de atingir a esfera jurídica de determinada pessoa por uma
decisão administrativa desfavorável e por isso, com fundamento no art. 5°, LV, da Constituição
Federal, exige-se o processo administrativo.22
A caracterização do concurso como processo administrativo determina a aplicação de uma
série de princípios constitucionais e legais. De se realçar, imediatamente, que a Constituição
assegurou como garantia fundamental aos acusados em geral e aos litigantes em processo
administrativo o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes. Na
mesma esteira, a lei que regula o processo administrativo na administração pública federal —
Lei n. 9.784/99, aplicável, ainda que subsidiariamente, aos concursos públicos — determina
ainda a obediência a outros princípios não referidos explicitamente pela Constituição, mas
identificáveis no sistema constitucional.
Analisando regra constante da Constituição Portuguesa, Gomes Canotilho e Vital Moreira anotam
com precisão:
A regra constitucional do concurso consubstancia um verdadeiro direito a um procedimento justo de recrutamento, vinculado aos princípios constitucionais e legais (igualdade de condições e oportunidades para todos os candidatos, liberdade das candidaturas, divulgação atempada dos métodos e provas de selecção, bem como dos respectivos programas e sistemas de classificação, aplicação de métodos e critérios objectivos de avaliação, neutralidade na composição do júri, direito de recurso). O concurso assente num procedimento justo é também uma forma de recrutamento baseado no mérito, pois o concurso serve para comprovar competências.23
21 Percebe-se que comungamos com a concepção doutrinária que apregoa ser processo espécie do gênero procedimento, este, por sua vez, encarado como forma de explicitação de competências. O processo traria como nota particular a necessidade de contraditório. (BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. Princípios constitucionais do processo administrativo disciplinar. São Paulo: Max Limonad, 1998, p. 47).
22 BACELLAR FILHO, idem, p. 67.
23 CANOTILHO, J. J. Gomes; MOREIRA, Vital. Constituição da República Portuguesa anotada. v. 1. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 661.
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6.1 Organização e realização do concurso público — cautelas para se buscar a máxima efetividade do direito fundamental
O concurso público objetiva, como visto, selecionar os candidatos mais aptos à ocupação de
cargos efetivos e empregos públicos. Em se tratando da seleção de pessoas para servir a sociedade
exercendo funções — deveres — públicas, o certame deve ser planejado e organizado para que
a reposição da força de trabalho esteja sempre adequada, quantitativa e qualitativamente, à
natureza e complexidade das atividades, aos objetivos e às metas institucionais da Administração
Pública.24 Nesse sentido, o planejamento constitui etapa fundamental para o pleno êxito do
concurso público.
Sem qualquer pretensão de exaurimento, algumas providências importantes na fase de
planejamento dos certames podem ser enunciadas. Os órgãos e entidades que planejam realizar
algum certame devem verificar, como providências preliminares:
— o número de cargos e empregos vagos;
— quantos servidores comissionados, contratados por prazo determinado e terceirizados
desempenham funções legalmente atribuídas a cargos efetivos (deve-se aproveitar a realização
do concurso para regularizar essas situações);
— quais são as reais necessidades quantitativas da Administração (em havendo necessidade de
criação ou extinção de cargos, deve ser elaborado o projeto de lei respectivo);
— a existência de concurso anterior com prazo de validade ainda não expirado e com candidatos
aprovados ainda não nomeados;
— a possibilidade de obediência aos requisitos fiscais para a futura nomeação dos aprovados
(determinados pela Constituição e pela Lei de Responsabilidade Fiscal);
— o perfil necessário aos candidatos para o desempenho das atividades, bem como a adequação
desse perfil à descrição legal das atribuições dos cargos e empregos;
— a conveniência de se executar diretamente ou terceirizar a execução do concurso;
— normatização das atribuições da comissão de concurso, da banca(s) examinadora(s) e de
qualquer órgão com competência para atuar no certame.
24 Nesse sentido a correta previsão da Portaria n. 450, de 6 de novembro de 2002, do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão.
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7 À guisa de conclusão — breves notas sobre a atuação dos Tribunais de Contas no controle externo dos concursos públicos
Em virtude da ligação indissolúvel entre Controle e Estado Democrático de Direito, nossa Constituição
é farta ao estabelecer meios de se controlar a Administração Pública. Deve ser destacado como
grande conquista da sociedade em geral a ampliação das atribuições e poderes conferidos aos
Tribunais de Contas. As Cortes de Contas são órgãos autônomos e independentes, que auxiliam e
fiscalizam os três poderes, sem subordinação de nenhuma espécie a qualquer deles.
O controle efetuado pelos Tribunais de Contas, ao contrário de outros, transcende a mera
atestação da legalidade da gestão financeira. Abrange a avaliação dos objetivos de políticas de
governo, a mensuração dos seus resultados, a comparação entre custos e benefícios e uma série
de outras análises primordiais para o equilíbrio entre as crescentes necessidades sociais e os
parcos recursos públicos. Ultrapassada a perspectiva legalista que preza tão somente a subsunção
do fato às prescrições da lei, o controle realizado pelos Tribunais de Contas deve, ao priorizar
a fiscalização da implementação, execução e fiscalização dos serviços e das políticas públicas,
possibilitar a realização de transformações sociais. Esta visão leva em conta a prioridade que,
necessariamente, deve revestir o compromisso com a efetivação dos direitos fundamentais e
com o alcance dos objetivos da República.
No que toca especificamente ao controle dos concursos públicos, a ação fiscalizadora dos
Tribunais de Contas encontra um primeiro amparo no art. 71, inciso III, da Constituição Federal,
segundo o qual compete às Cortes de Contas
apreciar, para fins de registro, a legalidade dos atos de admissão de pessoal, a qualquer título, na administração direta e indireta, incluídas as fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, excetuadas as nomeações para cargo de provimento em comissão, bem como a das concessões de aposentadorias, reformas e pensões, ressalvadas as melhorias posteriores que não alterem o fundamento legal do ato concessório.
Não se necessita de qualquer esforço hermenêutico para concluir que o controle da legalidade
da admissão pressupõe a verificação do procedimento seletivo prévio à admissão de pessoal, ou
seja, do concurso público, em se tratando de cargos efetivos e empregos públicos.
Em razão do que antes foi exposto, a análise do concurso não deve ser meramente formal. Ao
contrário, em razão do dever de se fiscalizar a legitimidade (art. 70, caput) de qualquer atuação
da Administração que implique envolvimento com recursos públicos, o espectro de atuação dos
Tribunais de Contas abrange a verificação do respeito aos princípios e valores constitucionais,
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transcendendo, como visto, a mera atestação formal. O controle dos concursos, em outras
palavras, abrange o mérito dos atos administrativos, e não somente a legalidade, se utilizarmos
a concepção tradicional.25 Com o intuito de provocar o debate, é possível elencar brevemente
três importantes possibilidades de controle que se abrem aos Tribunais de Contas:
7.1 Análise prévia dos instrumentos convocatórios (editais)
A solicitação prévia de editais para análise apresenta-se como importante instrumento preventivo,
destinado a evitar a ocorrência de violações ao ordenamento. Trata-se de atuação semelhante à
constante do § 2° do art. 116 da Lei de Licitações.26 É conveniente,27 contudo, que exista previsão
na lei orgânica ou regimento interno de cada Corte. Essa previsão legislativa proporciona maior
segurança jurídica à Corte e, sobretudo, ao gestor público. Em todas as situações, a atuação
do Tribunal de Contas deve ser efetivada em tempo razoável para não obstaculizar a realização
do certame nos prazos programados pela Administração. Os jurisdicionados ficam obrigados a
adotar as medidas corretivas determinadas pelo Tribunal,28 sob pena de sustação do certame,
determinação posterior de anulação e, em última análise, negativa de registro das admissões
decorrentes. Para as situações urgentes, em que exista possibilidade de lesão iminente ao
ordenamento e ao interesse público, devem ser utilizados os instrumentos de atuação cautelar
que podem suspender a realização do concurso.
7.2 Imposição do dever de realizar o concurso
Em se tratando de direito fundamental, há vinculação obrigatória dos Tribunais de Contas à sua
efetivação. Com efeito, a concretização do direito fundamental de concorrer, em igualdade de
condições, aos cargos efetivos e empregos, depende não somente do controle do concurso, mas
25 Em apaixonante estudo, João Batista Gomes Moreira propugna a superação das dicotomias típicas do pensamento cartesiano e ligadas ao Estado Liberal (público e privado; sujeito e objeto; legalidade e mérito; abstrato e concreto; geral e individual) em prol de um novo paradigma que aceite a abertura e a permeabilidade do sistema jurídico. Para o autor, é imperativo o abandono das classificações fechadas e matemáticas e sua substituição por fórmulas flexíveis, que permitam a identificação de pontos inter-mediários em uma diversidade relativa com relação aos extremos. “No liberalismo predominou a ideia de classificação fechada, com vistas à preservação da segurança individual, ‘um valor essencialmente estático e conservador’, enquanto que no Estado Social e democrático o interesse maior é por justiça e igualdade material, que exigem flexibilidade. A classificação fechada é conservadora da estabilidade, enquanto que o pensamento tipológico facilita os movimentos sociais” (MOREIRA, João Batista Gomes. Direito administrativo: da rigidez autoritária à flexibilidade democrática. Belo Horizonte: Fórum, 2005, p. 88).
26 Art. 116, § 2° “Os Tribunais de Contas e os órgãos integrantes do sistema de controle interno poderão solicitar para exame, até o dia útil imediatamente anterior à data de recebimento das propostas, cópia de edital de licitação já publicado, obrigando-se os órgãos ou entidades da Administração interessada à adoção de medidas corretivas pertinentes que, em função desse exame, lhes forem determinadas.”
27 Na ausência de lei e mesmo de norma que trate explicitamente do poder de requisição, defende-se a competência implícita para a requisição do edital. A esse respeito, confira nosso estudo específico na obra Função normativa da Administração Pública (Editora Fórum, 2007).
28 Estabelece a Constituição Federal: “Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete: [...] IX — assinar prazo para que o órgão ou entidade adote as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, se verificada ilegalidade”.
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sobretudo da imposição do dever de realizá-los. No exercício de suas atribuições constitucionais
ordinárias, em verificando a burla ao concurso público, deve o Tribunal de Contas impor a
realização do concurso para fazer cessar a ofensa ao ordenamento.
A burla ao concurso costuma materializar-se, sobretudo, na existência de terceirizados,
temporários ou comissionados desempenhando atribuições legalmente acometidas a servidores
efetivos. Não obstante, também se entende necessária a imposição do concurso quando existe
número de cargos em comissão superior ao número de cargos efetivos. Com efeito, sabe-se que
o acesso a algum cargo ou empregos público, como regra, depende de aprovação em concurso
público. Cargos em comissão constituem exceções constitucionalmente previstas para as funções
de direção, chefia e assessoramento. Para essas hipóteses, presumiu o constituinte que o critério
objetivo de seleção, mediante concurso, não seria o adequado em razão da necessidade de um
vínculo de confiança para o desempenho transitório de determinadas funções. Ainda que assim
seja, é evidente que os cargos efetivos devem predominar, numericamente, sobre os cargos
em comissão. Em outras palavras, afronta qualquer senso de razoabilidade e mesmo de lógica
admitir que o número de cargos transitórios de direção, chefia e assessoramento possa superar
o número de cargos permanentes e efetivos.29 Cargos em comissão existem para funções que
possuem mais ligação com governo do que com Estado, pois este é permanente e não pode ser
sempre reconfigurado a cada mudança de governo.
Nesta linha de raciocínio, recentemente decidiu o Supremo Tribunal Federal:
AGRAVO INTERNO. AÇãO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ATO NORMATIVO MUNICIPAL. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. INCOMPATIBILIDADE ENTRE O NÚMERO DE SERVIDORES EFETIVOS E EM CARGOS EM COMISSãO.
I — Cabe ao Poder Judiciário verificar a regularidade dos atos normativos e de administração do Poder Público em relação às causas, aos motivos e à finalidade que os ensejam. II — Pelo princípio da proporcionalidade, há que ser guardada correlação entre o número de cargos efetivos e em comissão, de maneira que exista estrutura para atuação do Poder Legislativo (Recurso Extraordinário n. 365.368-7 Relator: Ministro Ricardo Lewandowski, 22/05/2007).30
Em síntese, com fundamento na Constituição da República, corretamente entendeu o Supremo
Tribunal Federal, em julgado já citado, “há que ser guardada correlação entre o número de cargos
efetivos e em comissão.” Em outras palavras, como exceções, os cargos em comissão não podem
29 Utilizando o ditado popular, estaria materializada uma situação de muito cacique para pouco índio.
30 Destacou em seu voto o eminente Relator: “[...] Ademais, forçoso, ainda, reconhecer a ofensa ao princípio da moralidade, eis que, dos 67 funcionários da Câmara de Vereadores de Blumenau, 42 são de livre nomeação, e apenas 25 são cargos de provimento efetivo. A professora Maria Sylvia Zanella di Pietro, ao discorrer sobre o princípio da moralidade do ato administrativo afirma que é necessário exigir a proporcionalidade entre os meios e os fins a atingir, entre os sacrifícios impostos à coletividade e os benefícios por ela auferidos.”
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predominar no quadro de Pessoal de cada órgão ou entidade; devem existir em quantidade inferior
ao número de cargos efetivos. Essa conclusão é imposta pela observação do art. 37, incisos I, II
e V da Constituição, e sobretudo pela verificação do conteúdo dos princípios constitucionais da
moralidade, impessoalidade e eficiência, constantes do caput do mesmo art. 37.
A proporcionalidade entre o número de cargos efetivos e comissionados deve ser aferida em
cada situação concreta, de forma a resguardar — e mesmo possibilitar — o atendimento do
interesse público. Por essa razão, não é possível estabelecer, a priori, um limite exato para
o número de cargos comissionados. Também convém anotar que oportunamente deve ser
realizado um criterioso exame acerca da natureza de cada cargo em comissão para verificar
sua compatibilidade com a Constituição.31
Em todas as situações, deve ser estabelecido prazo razoável para a realização do certame. O
cumprimento desta obrigação pode ser ajustado por meio de termo de ajustamento de gestão,
instrumento idealizado e difundido por Luciano Ferraz.32 O gestor deve ainda ser alertado sobre
a possibilidade de penalização em razão da possível incidência em infrações administrativas
legalmente estabelecidas, além da caracterização de ato de improbidade.
7.3 Fiscalização da nomeação dos candidatos aprovados
O concurso materializa-se em uma sequência de atos interligados destinados a identificar
os mais aptos para ocupar cargos efetivos e empregos públicos. Ao iniciar um procedimento
seletivo, a Administração exterioriza a necessidade de prover cargos ou empregos. Há, mais que
isso, uma clara manifestação de intenção da Administração de prover as posições permanentes
em disputa. Como o concurso não pode ser somente mais uma via para o aumento das receitas
públicas, é um contrassenso imaginar-se um certame concluído sem que os aprovados sejam,
afinal, nomeados ou contratados. Tratar-se-ia de um absurdo desperdício de esforços, tempo e
dinheiro. Não obstante, situações como essa caracterizariam um total desrespeito à confiança
depositada pelo candidato na boa fé e sinceridade da Administração, ferindo de morte o
princípio da moralidade.33
31 O STF reiteradamente tem considerado inconstitucionais normas que afrontam o art.37, V, da Constituição: “Lei estadual que cria cargos em comissão. Violação ao art. 37, incisos II e V, da Constituição. Os cargos em comissão criados pela Lei n. 1.939/1998, do Estado de Mato Grosso do Sul, possuem atribuições meramente técnicas e que, portanto, não possuem o caráter de assessora-mento, chefia ou direção exigido para tais cargos, nos termos do art. 37, V da Constituição Federal. Ação julgada procedente”. (ADI 3.706, Relator Ministro Gilmar Mendes, julgamento em 15/08/07, DJ de 05/10/07).
32 FERRAz, Luciano. Termo de ajustamento de gestão e o alerta previsto no art. 59, § 1°, da Lei de Responsabilidade Fiscal: dez anos depois. In: CASTRO, Rodrigo Pironti Aguirre de. Lei de Responsabilidade Fiscal: ensaios em comemoração aos 10 anos da Lei Complementar n. 101/00. Belo Horizonte: Fórum, 2010.
33 Além de ferir os princípios da eficiência, boa-fé e da confiança recíproca. Em razão da estrutura dos princípios, sabe-se, a ofensa a algum deles dificilmente ocorre de forma individualizada.
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Essas breves considerações trilham sentido oposto ao tradicional entendimento de que os
candidatos aprovados em concurso público possuem mera expectativa de direito à nomeação
para os respectivos cargos ou empregos. A questão não é meramente semântica ou acadêmica.
Com efeito, o entendimento tradicional ofereceu amparo para situações de completo
desvirtuamento do instituto do concurso público. Incremento na receita e proveito político, por
exemplo, são propósitos escusos que podem recomendar a realização de um concurso, mas não
a nomeação ou contratação dos aprovados.
Em boa hora, contudo, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça evoluiu para acompanhar
o entendimento doutrinário mais avançado de que existe direito adquirido à nomeação dos
candidatos aprovados em concurso, para as vagas oferecidas e durante o prazo de validade. O
entendimento hoje vigente naquela Corte determina que:
o candidato aprovado dentro do número de vagas previsto no edital do certame não tem a)
mera expectativa de direito, mas verdadeiro direito subjetivo à nomeação para o cargo a
que concorreu e foi classificado (RMS 23331/RO; Relatora: Ministra Maria Thereza de Assis
Moura; DJe 05/04/2010);34
o não preenchimento de todas as vagas ofertadas dentro do prazo de validade do concurso, b)
em razão da eliminação de candidato inicialmente habilitado dentro do número previsto em
edital, gera o direito subjetivo à nomeação do candidato classificado na posição imediatamente
subsequente na lista de classsificados (RMS 27575/BA; Relator: Ministro Napoleão Nunes Maia
Filho, DJe 14/09/2009).
não tem direito subjetivo à nomeação o candidato que é aprovado acima das vagas previstas c)
em edital de concurso cujo quadro ficou completo com a nomeação dos aprovados iniciais
(RMS 13963/PB; Relatora: Ministra. Maria Thereza de Assis Moura, DJe 12/05/2008). No
mesmo sentido, a criação de novas vagas, durante o prazo de validade do concurso público,
não garante o direito à nomeação àqueles que foram aprovados fora das vagas originalmente
previstas no edital do certame, por se tratar de ato discricionário da Administração, não
havendo falar em direito adquirido, mas tão somente em expectativa de direito. (AgRg no
RMS 26947/CE; Relator: Ministro Felix Fischer; e EDcl no REsp 824299/RS; Relator: Ministro
Arnaldo Esteves Lima, DJe 02/06/2008).
As possibilidades de atuação dos Tribunais de Contas na fiscalização das nomeações e contratações
decorrentes da realização de concursos são múltiplas e bastante importantes. Inicialmente,
cabe ao órgão controlador verificar a existência de situações irregulares que, mesmo à égide
34 No mesmo sentido: RMS 27311/AM, RMS 27508/DF, AgRg NO RMS 22568/SP, RMS 26.507/RJ, AgRg no RMS 30308, RMS 26447/MS, RMS 27575/BA, MS 10381/DF, e RMS 30459/PA).
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do entendimento anterior, amparavam o reconhecimento de direito subjetivo à nomeação dos
aprovados. Nesse sentido, esse direito pode ser reconhecido quando há inversão de ordem
classificatória e também quando se verificar contratação por prazo determinado, em comissão
ou de agente terceirizado para desempenhar funções legalmente atribuídas a cargo efetivo.
Não obstante, a Corte de Contas deve monitorar o prazo de validade dos concursos para que,
na iminência de seu término, possa verificar se existem aprovados ainda não contratados ou
nomeados. Nessas situações, a efetivação das admissões deve ser determinada à Administração,
salvo nas hipóteses em que esta comprovar ao órgão de controle a existência de fato impeditivo
superveniente.35
O ideal, contudo, é que o órgão controlador ajuste com o órgão ou entidade controlada um
cronograma para as nomeações ou contratações, dentro do prazo de validade do concurso.
Esta medida afigura-se razoável por aplacar a justificada ansiedade dos aprovados e, mais
que isso, por permitir à Administração cumprir o seu dever com transparência e de acordo
com as reais necessidades do serviço público. O que se quer evitar, em última análise, é que a
inércia da Corte de Contas permita que o concurso público seja realizado desconectado de sua
vocação essencial: identificar os mais aptos para que, nomeados ou contratados, possam servir
o público, e não servir-se dele.
Referências
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CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 7. ed. Coimbra: Almedina, 2003, p. 408
FERRAz, Luciano. Termo de ajustamento de gestão e o alerta previsto no art.59, §1°, da Lei de Responsabilidade Fiscal: dez anos depois. In: CASTRO, Rodrigo Pironti Aguirre de. Lei de Responsabilidade Fiscal: ensaios em comemoração aos 10 anos da Lei Complementar n. 101/00. Belo Horizonte: Fórum, 2010.
35 Como a extrapolação dos limites para gastos com pessoal estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal, por exemplo. É claro que esse argumento não seria admissível diante de uma situação irregular em que já exista desembolso de recursos para paga-mento do nomeado ou contratado em desacordo com o ordenamento.
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Florivaldo Dutra de Araújo
Professor Associado de Direito Administrativo na UFMG.
Procurador da Assembleia Legislativa de MG.
Resumo: Até a promulgação da Constituição de 1988, prevalecia a tese de que o candidato
aprovado em concurso público, mesmo dentro do número de vagas previstas no edital, não
possuía direito à nomeação, constituindo prerrogativa discricionária do poder público o
provimento, ou não, dos cargos em disputa. Na vigência da nova Constituição, ganhou muitos
adeptos a tese de que os aprovados para as vagas previstas têm direito subjetivo à nomeação. O
presente texto analisa as posições conflitantes e conclui que o mais consentâneo com a ordem
constitucional vigente é o reconhecimento da obrigatoriedade, em princípio, da nomeação
dos aprovados para as vagas em disputa, que deixará de existir caso a administração pública
demonstre fundamento adequado e suficiente para não nomear.
Palavras Chave: Cargo público. Emprego público. Concurso público. Nomeação.
Abstract: Until the promulgation of the Brazilian Constitution of 1988, the prevailing conception
was that a person who has gone through a public examination had no right to be admitted,
even if the public office has not been fulfilled, as established in the public edit. In the new
Constitution, the conception is that those persons have the right to be admitted. The present
work analyzes the struggled positions and concludes that, in accordance to the present Brazilian
Constitutional order, is the recognition of the presumptuous right to be called, unless the public
administration shows adequate and sufficient reason for the denial of the nomination.
Keywords: Public office. Public employment. Public examination. Admission.
Concurso público e direito à nomeação:nem tanto ao mar, nem tanto à terra
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1 Introdução
Até a promulgação da Constituição Federal (CF) de 1988, a jurisprudência e a doutrina nacionais
afirmavam, quase em uníssono, que o candidato aprovado em concurso público, mesmo dentro
do número de vagas previstas no edital, não possuía qualquer direito à nomeação, constituindo
prerrogativa discricionária do poder público o provimento, ou não, dos cargos em disputa.
No regime da nova Constituição, muitas vozes passaram a defender tese oposta, ou seja, a de
que os aprovados para as vagas previstas têm direito subjetivo à nomeação, sendo essa um ato
vinculado da administração pública.
O presente texto tem o objetivo de realizar breve análise da questão e apontar a solução que
nos parece a mais consentânea com o regime constitucional em vigor e que não se localiza
em nenhum dos dois extremos da polêmica, mas numa posição intermediária, que busca tanto
resguardar os direitos dos cidadãos, quanto a boa administração pública.
2 Panorama da matéria antes da Constituição Federal de 1988
Em relação ao tema em foco, a síntese do pensamento amplamente dominante até a promulgação
da CF de 1988 acha-se consagrada na Súmula 15 do Supremo Tribunal Federal (STF), aprovada
em 13/12/1963: “Dentro do prazo de validade do concurso, o candidato aprovado tem o direito
à nomeação, quando o cargo for preenchido sem observância da classificação.”
Essa, portanto, era a única hipótese admitida pacificamente para o surgimento do direito à
nomeação. A propósito da Súmula 15, tornou-se costumeiro afirmar que os classificados em
concurso público, às vagas existentes, teriam “direito a não serem preteridos”. Há nisso, na
verdade, uma redução da ideia contida na referida Súmula, que consagra mesmo o direito à
nomeação, decorrente do fato de que, ao preencher os cargos com pessoas não legitimadas
a tanto, a administração pública evidencia a necessidade do provimento, desaparecendo a
possibilidade de um juízo de conveniência e oportunidade acerca do tema.1
Nas demais situações, permanecia apenas uma expectativa de direito, cabendo à administração
pública decidir, discricionariamente, se nomeava ou não o aprovado, mesmo no limite de vagas
anunciado pelo edital.2
1 A propósito, observa com pecuciência Celso Antônio Bandeira de Mello: “Não é exato supor-se que o candidato aprovado em concurso tem, apenas, como habitualmente se diz, unicamente o direito a não ser preterido. Na verdade, tem direito a ser nomeado, quando preterido, o que é coisa diversa. Com efeito, uma coisa é ter direito meramente de impedir ou anular nomeação efetuada com preterição de concursado aprovado e outra coisa é ter direito de obter, para si, a nomeação, por ter sido preterido.” E mais adiante: “[...] não é preterição que determina o direito à nomeação, mas o que se encontra subjacente à preterição, isto é, a definição, pelo Poder Público, do momento havido como oportuno para preencher o cargo.” (Regime constitucional dos servidores da administração direta e indireta, 1991, p. 76.)
2 Nesse sentido, exemplifique-se com os seguintes arestos do STF: RMS 4.643, Rel. Min. Henrique d’Avila, Tribunal Pleno, DJ
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Com a jurisprudência dominante, fazia coro a doutrina, como se pode exemplificar com a lição
de Hely Lopes Meirelles:
Vencido o concurso, o primeiro colocado adquire direito subjetivo à nomeação com preferência sobre qualquer outro, desde que a Administração se disponha a prover o cargo, mas a conveniência e oportunidade do provimento ficam à inteira discrição do Poder Público.3
É interessante observar que, em pronunciamentos de diversos ministros do STF, desde antes da
edição da Súmula 15, também se proclamava que outro fator implicaria o direito à nomeação
dos aprovados às vagas em disputa: seria o caso de previsão, em lei ou regulamento, de prazo
para que a administração pública procedesse ao preenchimento dos cargos.
No julgamento dos Embargos à Apelação Cível 7.387 (DJ 05/10/1954), fez-se registrar na
ementa, da lavra do Ministro Orozimbo Nonato:
Exausto o prazo de validade do concurso, não pode o concorrente alegar direito adquirido ao fito de reclamar a nomeação, pois que apenas lhe assiste, no caso, uma spes iuri, ainda na fórmula da antiga Introdução do Código Civil, a não ser que aquele direito encontre nascente em texto de lei ou no caso de preterição ilegal, quando, no prazo de validade do concurso, ocorre nomeação indébita (grifo nosso).
Podem ser encontrados outros julgados com essa mesma ressalva, como o Recurso Extraordinário
(RE) 64.798, assim ementado: “A discrição do Poder Executivo no prover dos cargos administrativos
existe, salvo quando a lei ou regulamento marcam prazo para o provimento. Direito líquido e
certo à nomeação.” (Relator Ministro Gonçalves de Oliveira, publicado em 21/08/1968).4
Essa segunda hipótese de direito à nomeação surgiu apenas em decisões específicas do STF, sem
se transformar em conteúdo de Súmula de Jurisprudência.
3 Estado da questão na vigência da Constituição Federal de 1988
3.1 Decisões do Superior Tribunal de Justiça
Como registrado, na vigência da CF de 1988 houve paulatina ampliação da tendência ao
reconhecimento do direito à nomeação ao classificado, em concurso publico, às vagas disputadas.
22/10/1959; MS 16.182, Rel. Min. Evandro Lins, Tribunal Pleno, DJ 16/03/1967; MS 18571, Rel. Min. Adalício Nogueira, Tribunal Pleno, DJ 09/05/1969; RE 116.044, Rel. Min. Djaci Falcão, 2a Turma, DJ 09/12/1988.
3 Direito administrativo brasileiro, 2006, p. 436. No mesmo sentido, exemplifique-se também com a doutrina de CRETELLA JÚ-NIOR, Direito administrativo brasileiro, 2000, p. 495.
4 Nesse caso, embora a ementa faça referência ao Poder Executivo, quer-se dizer administração pública, pois se cuidava de no-meação a cargo do Tribunal de Justiça de Goiás e a Lei de Organização Judiciária, segundo o acórdão, previa o prazo de sete dias para a nomeação.
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No âmbito do Superior Tribunal de Justiça (STJ), corte criada pelo novo Texto Constitucional,
há vários acórdãos reconhecendo o direito subjetivo à nomeação dos candidatos aprovados em
concurso público.5 Mas a questão é polêmica nesse Tribunal, havendo outras muitas decisões
reafirmando a existência de mera expectativa de direito para tais aprovados.6
Algumas das decisões favoráveis ao direito subjetivo à nomeação podem levar a equívoco, uma
vez que, inapropriadamente, chegam a dizer que haveria jurisprudência pacífica no STJ em
prol da nova tese, o que é refutado pela constatação de várias decisões que se orientam pelo
sentido da Súmula 15 do STF.7
O STJ também tem exarado diversas decisões nas quais reconhece o direito à nomeação de
candidatos aprovados para vagas anunciadas em editais de concursos, quando se verifica o exercício,
em situações precárias, das atribuições correspondentes aos cargos disputados no concurso.8
3.2 Decisões do Supremo Tribunal Federal
No STF, não se observa tendência significativa de reconhecimento de direito subjetivo à nomeação
como simples decorrência da aprovação em concurso. Contudo, além de se manter a Súmula 15,
ali também se evoluiu para a ampliação das hipóteses em que a nomeação se faz obrigatória.
O STF já apontou no sentido de se reconhecer direito à nomeação quando comprovada a
necessidade do preenchimento de cargos públicos e a arbitrariedade da recusa em provê-los
com os aprovados às vagas em disputa em concurso público homologado.
5 Confiram-se as seguintes decisões: RMS 15.034/RS, Rel. Min. Felix Fischer, quinta Turma, DJ 29/03/2004 p. 255; RMS 15.420/PR, Rel. Min. Paulo Gallotti, Sexta Turma, DJe 19/05/2008; RMS 15945/MG, Rel. Min. Paulo Medina, Sexta Turma, DJ 20/02/2006, p. 361; RMS 19.216/RO, Rel. Min. Paulo Medina, Sexta Turma, DJ 09/04/2007 p. 266; RMS 19.922/AL, Rel. Min. Paulo Medina, Sexta Turma, DJ 11/12/2006 p. 423; RMS 20.718/SP, Rel. Min. Paulo Medina, Sexta Turma, DJe 03/03/2008; RMS 26507/RJ, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, quinta Turma, DJe 20/10/2008; RMS 27.311/AM, Rel. Min. Jorge Mussi, quinta Turma, DJe 08/09/2009; AgRg no RMS 30.308/MS, Rel. Min. Felix Fischer, quinta Turma, DJe 15/03/2010.
6 Nesse sentido, confiram-se as seguintes decisões: RMS 4.125/SP, Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, Sexta Turma, julgado em 20/09/1994, DJ 31/10/1994 p. 29527; RMS 1.854/RS, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, Segunda Turma, julgado em 28/09/1994, DJ 19/12/1994 p. 35293; RMS 6.766/MG, Rel. Min. José Dantas, quinta Turma, julgado em 18/06/1996, DJ 05/08/1996 p. 26375; MS 4.355/SP, Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, Terceira Seção, julgado em 26/06/1996, DJ 16/09/1996 p. 33663; REsp 93.428/ BA, Rel. Min. Vicente Leal, Sexta Turma, julgado em 17/09/1996, DJ 21/10/1996 p. 40305; RMS 6.941/RJ, Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, Sexta Turma, julgado em 25/11/1996, DJ 17/02/1997 p. 2172; MS 4.362/DF, Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, Terceira Seção, julgado em 09/04/1997, DJ 04/08/1997 p. 34646; RMS 8.187/TO, Rel. Min. Felix Fischer, quinta Turma, julgado em 03/06/1997, DJ 30/06/1997 p. 31047; REsp 43.739/RS, Rel. Min. Edson Vidigal, quinta Turma, julgado em 01/09/1998, DJ 21/09/1998 p. 218; RMS 10.009/MG, Rel. Min. Vicente Leal, Sexta Turma, julgado em 06/10/1998, DJ 09/11/1998 p. 178; RMS 9.635/RJ, Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, Sexta Turma, julgado em 23/02/1999, DJ 29/03/1999 p. 232; RMS 10.838/PB, Rel. Min. Vicente Leal, Sexta Turma, julgado em 10/09/2002, DJ 21/10/2002 p. 398; MS 9.909/DF, Rel. Ministra Laurita Vaz, Terceira Seção, julgado em 09/03/2005, DJ 30/03/2005 p. 131; RMS 19.614/SP, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, quinta Turma, julgado em 15/09/2005, DJ 17/10/2005 p. 320; RMS 25.601/SP, Rel. Min. Felix Fischer, quinta Turma, julgado em 27/03/2008, DJe 05/05/2008.
7 A expressão jurisprudência pacífica é utilizada pelo Min. Paulo Medina, como Relator do RMS 20.718/SP e do RMS 19.922/AL.
8 Nesse sentido, as seguintes decisões: REsp 653.445/BA, Rel. p/ Acórdão Min. Haroldo Rodrigues, Sexta Turma, DJe 19/04/2010; RMS 16.489/PR, Rel. Min. Og Fernandes, Sexta Turma, DJe 10/11/2008; RMS 18.338/MS, Rel. Min. Felix Fischer, quinta Turma, DJ 29/11/2004 p. 353; RMS 13.719/TO, Rel. Min. Jorge Scartezzini, quinta Turma, DJ 26/04/2004 p. 177; REsp 237.712/RS, Rel. Min. Vicente Leal, Sexta Turma, DJ 15/05/2000 p. 215; REsp 154.584/RN, Rel. Min. Gilson Dipp, quinta Turma, DJ 07/02/2000, p. 171.
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No julgamento do RE 192.568, a Segunda Turma do STF decidiu como se registra na ementa do
acórdão, lavrado pelo Relator, Ministro Marco Aurélio:
O princípio da razoabilidade é conducente a presumir-se, como objeto do concurso, o preenchimento das vagas existentes. Exsurge configurador de desvio de poder, ato da administração pública que implique nomeação parcial de candidatos, indeferimento da prorrogação do prazo do concurso sem justificativa socialmente aceitável e publicação de novo edital com idêntica finalidade (DJ 13/09/1996).
Outra circunstância já reconhecida pelo STF, deflagradora do direito à nomeação é a recusa ao
chamamento dos aprovados em vagas disputadas em concurso, simultaneamente à contratação
precária de pessoas para exercer as mesmas atribuições objeto do concurso realizado. Nesse
sentido, as decisões do STF no RE 273.6059 e no RE 419.013.10
Decisão do STF também por vezes mencionada é a relativa ao Recurso em Mandado de Segurança
(RMS) 23.657 (DJ 09/11/2001), cujo relator foi o Ministro Marco Aurélio e de cuja ementa consta a
seguinte afirmação: “O anúncio de vagas em edital de concurso gera o direito subjetivo dos candidatos
classificados à passagem para a fase subsequente e, alfim, dos aprovados, à nomeação.”
Contudo, o caso julgado nesse processo guarda uma particularidade. É que as normas editalícias
previam um Curso de Formação como segunda fase do certame, ao qual teriam acesso os
candidatos classificados nas posições correspondentes ao dobro do número de vagas previstas.
Mas também se previa que os candidatos aprovados na primeira fase poderiam participar da
segunda fase para fins de provimento não só das vagas já fixadas, mas daquelas estabelecidas
em outros editais que viessem a ser publicados. Com base nisso, aberto novo concurso e negado
o direito de continuidade na disputa dos candidatos aprovados na primeira etapa do certame
anterior, ambas as Turmas do STF entenderam que esses candidatos tiveram ferido seu direito
de precedência e determinaram que ele fosse observado. Assim, a Primeira e a Segunda Turmas 9 “Recurso extraordinário. Administrativo. Concurso público. 2. Acórdão que negou provimento à apelação, assentando a inexis-
tência de direito subjetivo à nomeação de candidatos aprovados em concurso para provimento de cargo de Professor Assistente. 3. Criação de dois cargos de Professor Assistente no Departamento de Filosofia e Teoria Geral do Direito, quando se encontrava em pleno curso o tempo de eficácia do concurso público. Ocorrência de contratação de professores e renovação de contrato. 4. Precedente da Turma no RE 192.569-PI, em que se assegurou a nomeação de concursados, eis que existentes vagas e necessida-de de pessoal. 5. Constituição, art. 37, IV. Prequestionamento verificado. 6. Recurso extraordinário conhecido e provido.” (RE 273.605, Relator Min. Néri da Silveira, Segunda Turma, DJ 28/06/2002, p. 143).
10 “CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO: CONCURSO PÚBLICO. DIREITO À NOMEAÇãO. SÚMULA 15 — STF. I. — A aprovação em concurso público não gera, em princípio, direito à nomeação, constituindo mera expectativa de direito. Esse direito surgirá se for nomeado candidato não aprovado no concurso, se houver o preenchimento de vaga sem observância de classificação do candidato aprovado (Súmula 15 — STF) ou se, indeferido pedido de prorrogação do prazo do concurso, em de-cisão desmotivada, for reaberto, em seguida, novo concurso para preenchimento de vagas oferecida no concurso anterior cuja prorrogação fora indeferida em decisão desmotivada. II. — Precedentes do STF: MS 16.182/DF, Ministro Evandro Lins; (RTJ 40/02) MS 21.870/DF, Ministro Carlos Velloso, DJ de 19/12/94; RE 192.568/PI, Ministro Marco Aurélio, DJ de 13/09/96; RE 273.605/SP, Ministro Néri da Silveira, DJ de 28/06/02. III. — Negativa de seguimento ao RE. Agravo não provido.” (RE 419.013 AgR, Relator Min. Carlos Velloso, Segunda Turma, DJ 25/06/2004, p. 59). Observe-se que, embora a tese da ampliação das hipóteses de direi-to à nomeação tenha sido reafirmada, nesse caso os pretendentes à nomeação tiveram negado o pedido, porque os julgadores entenderam que os fatos não se aproximavam dos precedentes mencionados na ementa do acórdão.
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julgaram, respectivamente, o RMS 23.538 e o RMS 23.040, em ambos reconhecendo o direito
de os candidatos aprovados na primeira fase do primeiro concurso serem preferencialmente
chamados para o Curso de Formação e, se aprovados, para o preenchimento de novos cargos
vagos, em face de candidatos aprovados em concurso subsequente.11 No voto proferido no RMS
23.657, o Ministro Marco Aurélio cita esses dois julgamentos anteriores.
Portanto, a frase que o Ministro Marco Aurélio fez constar na ementa do RMS 23.657, no
sentido de decorrer direito subjetivo à nomeação de anúncio de vagas em edital, deve ser
contextualizado, pois as determinações específicas contidas nos editais relativos ao analisado
Concurso para Fiscal do Trabalho é que levaram a maioria dos Ministros de ambas as Turmas a
julgar que os impetrantes tinham direito a concorrer e, se aprovados em Curso de Formação,
serem nomeados preferencialmente às vagas posteriormente surgidas. Não houve, ainda nesses
julgados, reconhecimento do STF a um genérico direito subjetivo de aprovado em concurso à
nomeação às vagas anunciadas.
No tocante à previsão legal ou regulamentar de direito de nomeação, em sentido contrário
ao que se decidira em algumas ocasiões anteriores à CF de 1988, sobrevieram decisões do STF
afirmando que nem mesmo disposição normativa pode restringir a discricionariedade conferida
constitucionalmente à administração pública para decidir pela conveniência e oportunidade de
nomeação de candidatos aprovados em concursos públicos.
Trata-se de acórdãos versando sobre o art. 77, VII, da vigente Constituição do Estado do Rio
de Janeiro, que dispunha: “a classificação em concurso público, dentro do número de vagas
obrigatoriamente fixado no respectivo edital, assegura o provimento no cargo no prazo máximo
de cento e oitenta dias, contado da homologação do resultado.”
No julgamento do RE 229.450, o STF, em Sessão Plenária, por maioria de votos, declarou
incidentalmente inconstitucional essa norma. O relator, Ministro Maurício Correia, fundamentou
seu voto na citada Súmula 15; no princípio da separação dos Poderes (CF, art. 2°), que vedaria
11 Confiram-se as ementas: “Concurso Público para Fiscal do Trabalho: caso em que, pelos editais que o disciplinaram, os candidatos habilitados na primeira fase, ainda que não classificados dentro do número de vagas inicialmente oferecidas, passaram a consti-tuir ‘cadastro de reserva’, a serem chamados para a segunda fase, visando ao preenchimento de vagas posteriormente abertas dentro do prazo de validade do concurso: preferência sobre os candidatos habilitados na primeira fase de concurso ulterior-mente aberto: precedente.” (RMS 23.538, Relator Min. Sepúlveda Pertence, DJ 17/03/2000, p. 33). “1. Mandado de segurança. Recurso ordinário. 2. Segurança requerida contra ato do Ministro de Estado do Trabalho, por candidatos aprovados na primeira fase do concurso de Fiscal do Trabalho. Direito a serem convocados para a segunda etapa do concurso, consistente no Programa de Formação, considerando regra contida no edital. 3. Previsão expressa, em segundo edital, de que os candidatos selecionados na primeira etapa poderiam participar da segunda fase do certame para fins de provimento de vagas também estabelecidas em outros Editais que venham a ser publicados. 4. Não fica a Administração impedida de iniciar outro concurso público; não pode-rá, entretanto, preterir os candidatos já aprovados na primeira fase do anterior, quanto à convocação para a segunda etapa, observada a ordem de classificação. 5. Recurso ordinário conhecido e provido para deferir o mandado de segurança, ficando, em consequência, a autoridade coatora impedida de nomear candidatos aprovados em posterior concurso de Fiscal do trabalho, enquanto não se concluir o primeiro concurso aludido com a convocação dos impetrantes à segunda etapa — Programa de For-mação. Consoante o edital, a conclusão do concurso pressupõe a realização de sua segunda etapa.” (RMS 23.040, Relator Min. Néri da Silveira, DJ 17/12/1999, p. 380).
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semelhante imposição, por norma estadual, ao Poder Executivo; além da correlata iniciativa
privativa desse Poder no tocante às leis veiculadoras do regime jurídico dos servidores públicos
(CF, art. 61, § 1°, II, c).
Já o Ministro Ilmar Galvão considerou que a norma fluminense também ofendia o art. 37, IV, da
CF,12 com a seguinte consideração:
A meu ver, esse dispositivo do inciso IV do art. 37 define, de modo exaustivo, o direito do candidato aprovado em concurso: primeiramente, o de ter observada, com rigor, na nomeação ou admissão, a ordem de classificação; e, em segundo lugar, o de não ser preterido, dentro do prazo de validade do certame, por candidato aprovado em novo concurso.
No mesmo sentido, o Ministro Néri da Silveira entendeu que a restrição ofenderia a
discricionariedade decorrente do sistema constitucional:
Então, se vem uma norma menor e estabelece a obrigatoriedade de prover os cargos que tenham sido indicados em edital, realmente é uma restrição que torna difícil ao administrador inclusive conduzir os negócios públicos, porque determinada conjuntura pode desaconselhar o provimento dos cargos.
Posteriormente, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 2.931, proposta
contra essa norma fluminense, o STF reiterou a posição anterior e declarou o dispositivo
inconstitucional. O relator, Ministro Ayres Britto, acolheu em seu voto o argumento de que o
juízo de conveniência e oportunidade para a nomeação decorre do art. 37, incisos I a IV, da
CF. Desses dispositivos, o Relator extrai diversas considerações em favor de sua conclusão, das
quais destacamos as seguintes:
[...] pode-se afirmar que é por direto desígnio constitucional que o tema dos concursos públicos vem imbricado com o tema da discricionariedade administrativa. Daí que, abrir ou deixar de abrir um concurso público; ofertar o número de vagas e preencher, dentro daquelas criadas por lei; fixar o prazo de até dois anos para o respectivo edital; prorrogar ou não esse prazo, também por até dois anos e uma única vez; arregimentar ou não os candidatos aprovados, enfim, tudo jaz sob tal discricionariedade de cada qual dos entes estatais federais. O que a ela escapa já é o dever de observar o citado direito de precedência que assiste aos candidatos aprovados em concurso imediatamente anterior, com prazo de validade ainda em aberto, caso a Administração resolva nomear ou contratar qualquer dos aprovados no certame subsequente.
12 É o seguinte o texto desse dispositivo “IV — durante o prazo improrrogável previsto no edital de convocação, aquele aprovado em concurso público de provas ou de provas e títulos será convocado com prioridade sobre novos concursados para assumir cargo ou emprego, na carreira”.
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[...] esse regime especificamente constitucional é ditado pela natureza das atividades administrativas, que, bem mais próximas do cotidiano da população, primam pela sua cambiância ou mutabilidade. Implica dizer: as circunstâncias que presidem a abertura de um concurso público ficam sempre sujeitas a variação, não raras vezes de forma intensa e a curto prazo, inclusive no plano da disponibilidade dos recursos orçamentários. Donde aquilo que se revelava oportuno e conveniente num primeiro instante poder mudar de configuração num segundo e imediato momento.
Mais recentemente, outro importante julgamento do STF ocorreu no processo relativo ao RE
227.480, interposto pelo Ministério Público contra decisão do Tribunal Regional Federal da
2a Região, que deferira mandado de segurança a candidatos aprovados em concurso público,
considerando irregular que deixasse escoar prazo de validade do respectivo certame e se
preenchessem as vagas por outra forma de provimento — no caso, por concurso interno.
A ementa do acórdão referente ao RE 227.480 dá a impressão de que a Primeira Turma do
STF teria reconhecido amplíssimo direito subjetivo à nomeação dos aprovados em concursos
públicos, que se estenderia não apenas às vagas previstas no edital, mas também àquelas que
viessem a surgir posteriormente.
Confira-se, primeiramente, a ementa, da lavra da Ministra Cármen Lúcia:
1. Os candidatos aprovados em concurso público têm direito subjetivo à nomeação para a posse que vier a ser dada nos cargos vagos existentes ou nos que vierem a vagar no prazo de validade do concurso.
2. A recusa da Administração Pública em prover cargos vagos quando existentes candidatos aprovados em concurso público deve ser motivada, e esta motivação é suscetível de apreciação pelo Poder Judiciário.
No entanto, a orientação da primeira parte da ementa não foi comungada pela maioria da
Turma julgadora, mas apenas pelo Ministro Marco Aurélio.
Os Ministros Menezes Direito, relator originário, e Ricardo Lewandowski quedaram vencidos,
entendendo pela aplicação, no caso, do sentido restrito da Súmula 15.
O Ministro Ayres Britto foi, nesse julgamento, a voz de desempate e, ao mesmo tempo,
representativa de um meio termo entre as duas outras correntes formadas na Turma
julgadora.
Inicialmente, Ayres Britto ratificou o entendimento expresso no julgamento da ADI 2.931, no
sentido de “não haver direito adquirido à nomeação”, dado que “alterações fáticas (restrições
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orçamentárias, por exemplo) podem ensejar mudança de planos” pela administração pública.
Mas ressalvou: “[...] o querer da Administração constitui-se numa vontade qualificada, porquanto
pública. A mudança de planos, portanto, é de vir acompanhada de uma justa causa. Ora, ‘querer
discricionário’ não se confunde com vontade arbitrária.”
No caso específico, Ayres Britto verificou que “passados apenas quinze dias do fim do prazo de
validade do certame [...] foi aberto concurso interno (!)13 destinado à ocupação dessas vagas, por
ascensão funcional.” Por isso, concluiu pela ofensa aos incisos II e IV do art. 37 da CF, o que gerou
aos requerentes o direito à nomeação. Considerou esse caso como semelhante ao que fora objeto
do RE 192.568 e, por isso, votou pela negativa de provimento ao recurso do Ministério Público.
Portanto, constata-se que, dos cinco Ministros da Primeira Turma, três posicionaram-se pela
inexistência de direito subjetivo à nomeação como simples decorrência de aprovação em
concurso público. Mas um deles — Ayres Britto — verificou, no caso específico em julgamento,
que o direito à nomeação nascera da irregularidade no provimento dos cargos que haviam sido
objeto do concurso.
Além disso, a própria Relatora, nas discussões que acompanharam a votação, ressalvou que não
se pode falar, em tais casos, em “direito adquirido à nomeação”, explicando: “Eu não falo em
direito adquirido, eu falo em direito subjetivo à nomeação, porque o direito subjetivo pode ser
afrontado por uma nova circunstância da Administração que o impeça e, então, não haveria um
ilícito da Administração.”
3.3 Manifestações doutrinárias
Também na doutrina verifica-se a intensificação da polêmica sobre o tema após a promulgação
da vigente Carta Constitucional.
De um lado, autores como Régis Fernandes de Oliveira,14 José dos Santos Carvalho Filho15 e
os já mencionados Hely Meirelles e Cretella Júnior, a sustentar, em sentido restritivo, a mera
expectativa de direito à nomeação.
Noutro campo, o crescente número de pronunciamentos doutrinários em prol da ampliação do
reconhecimento do direito à nomeação, para além do explicitado na Súmula 15 do STF.
13 A exclamação do Ministro Ayres Britto explica-se pela inconstitucionalidade do provimento originário por meio de concurso interno, por ofensa ao art. 37, II, da CF, conforme Súmula 685 do STF: “É inconstitucional toda modalidade de provimento que propicie ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em concurso público destinado ao seu provimento em cargo que não inte-gra a carreira na qual anteriormente investido.”
14 Servidores públicos, 2004, p. 48-49.
15 Manual de direito administrativo, 2007, p. 560.
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Di Pietro, por exemplo, observa que:
Se o Poder Público realiza concurso, que é um procedimento oneroso, é porque necessita de pessoal para preenchimento dos cargos vagos. Não tem sentido e contraria o princípio da razoabilidade o Poder Público deixar de nomear os candidatos aprovados em consonância com o edital.16
4 Delimitação do direito à nomeação, em face da Constituição de 1988
Da análise das várias decisões que vêm sendo exaradas pelos Tribunais Superiores em matéria
de concurso público e nomeação, entendemos ser possível alcançar uma visão crítica a respeito
das posições em confronto e extrair a posição que nos parece a mais adequada ao resguardo
dos diversos interesses em jogo.
Por um lado, entendemos que o Texto Constitucional não contém dispositivo algum que,
expressamente ou mesmo de modo implícito, obrigue a administração pública a sempre nomear
os aprovados em concursos públicos; nem os aprovados dentro do número de vagas anunciadas,
tampouco para novas vagas surgidas no prazo de validade do certame.
A CF de 1988, no art. 37, prevê o concurso público como procedimento obrigatório para
investidura em cargo ou emprego público (inc. II), regula o prazo máximo de validade
do concurso (inc. III) e, durante esse prazo, garante a prioridade para a convocação dos
aprovados em certame anterior sobre aqueles que tenham logrado êxito em concurso
posterior (inc. IV).
Por outro lado, deve-se considerar que, se a administração pública anuncia em edital a
necessidade do preenchimento de cargos ou empregos públicos, há uma presunção de que
o tenha feito do modo adequado, ou seja, em harmonia com os princípios constitucionais;
no caso, particularmente os de legalidade, moralidade, eficiência (CF, art. 37) e
economicidade (CF, art. 70).
Vale dizer: presume-se que o órgão deflagrador do concurso tenha examinado as suas reais
necessidades de pessoal e tenha efetivamente constatado que as atividades administrativas
estejam a exigir incremento de mão de obra. Donde ser legítimo e razoável esperar que os
aprovados para as vagas em disputa venham a ser nomeados, salvo modificação da situação
fática que ensejou o concurso ou reavaliação, também adequada, dessa situação.
16 Direito administrativo, 2009, p. 527. No mesmo sentido: FERRAz, Luciano. Concurso público e direito à nomeação. In: MOTTA, Fabrício. Concurso público e Constituição, 2007, p. 252; MOTTA, Paulo Roberto Ferreira; SILVEIRA, Raquel Dias da. Concurso pú-blico. In: FORTINI, Cristiana (org.), Servidor público: homenagem ao Professor Pedro Paulo de Almeida Dutra, 2009, p. 333-335; TOURINHO, Rita. O Concurso público no ordenamento jurídico brasileiro, 2008, p. 94-96.
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Há que se afastar, portanto, as duas posições extremadas que se apresentam nesse tema. Não
se pode dar à administração pública a discricionariedade de, após realizado concurso válido,
simplesmente deixar transcorrer in albis o seu prazo de validade, sem nomear os aprovados para
as vagas disputadas. No outro extremo, supor que, de todo concurso homologado decorra direito
inafastável de nomeação aos aprovados, ou aos classificados às vagas em disputa, desconhecendo
a possibilidade de superveniência de circunstâncias inexistentes ou não sopesadas no momento
da realização do concurso, seria colocar o interesse público em plano secundário, para atentar
apenas ao interesse individual dos candidatos.
Entre esses dois equivocados extremos, tende a consolidar-se a correta posição intermediária,
que aponta para a obrigatoriedade, em princípio, de nomeação dos aprovados, que deixará de
existir caso a administração pública venha a demonstrar fundamento adequado e suficiente
para justificar a decisão de não nomear.
Trata-se de solução já conhecida no direito brasileiro e expressamente prevista em lei para
matéria semelhante. Referimo-nos à normatização dada pela Lei Federal 8.666, de 21/06/1993,
para a hipótese de a administração pública realizar licitação e depois verificar circunstância
indicadora de que a contratação seria desnecessária ou negativa ao interesse público.
Com efeito, o art. 49 da Lei 8.666/1993 dispõe:
A autoridade competente para a aprovação do procedimento somente poderá revogar a licitação por razões de interesse público decorrente de fato superveniente devidamente comprovado, pertinente e suficiente para justificar tal conduta, devendo anulá-la por ilegalidade, de ofício ou por provocação de terceiros, mediante parecer escrito e devidamente fundamentado.
Essa norma deriva, de modo lógico e necessário, do Texto Constitucional. Em havendo ilicitude,
o dever de declará-la impõe-se pela necessidade de cumprimento do princípio da legalidade (CF,
art. 37, caput). Já a revogação pressupõe licitação válida, em face do conhecimento disponível
ao administrador no momento em que a deflagra e realiza. Circunstâncias supervenientes,
contudo, podem indicar a desnecessidade da contratação, autorizando a administração a
revogar a licitação, mediante ato motivado, no qual se demonstrem os fatos alegados, como
causas suficientes para a mudança de comportamento.
O mesmo direcionamento deve nortear a conduta do poder público após a classificação dos
candidatos aprovados em concurso público. Subsiste, portanto, em favor dos aprovados às vagas
anunciadas em edital, a presunção relativa de que serão nomeados. Se decidir de modo diferente,
a administração pública deverá motivar esse ato, demonstrando as novas circunstâncias pelas
quais se decidiu pela não nomeação.
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É crescente a defesa de tal orientação, a exemplo da lição de Justen Filho: “Se promoveu
concurso público, homologando o resultado, o Estado apenas pode deixar de promover a
contratação mediante motivação satisfatória. Essa motivação não pode restringir-se à invocação
da titularidade de uma competência discricionária.”17
Caso a administração pública não expresse sua decisão em ato motivado, caberá aos candidatos
interessados o ingresso em juízo para requerer nomeação, bastando alegar que foram classificados
para as vagas anunciadas, uma vez que subsiste a presunção favorável à sua investidura nos
cargos ou empregos disputados.
Por outro lado, se a administração exarar a necessária decisão motivada e os interessados
não concordarem com os fundamentos, os interessados poderão impugná-los em ação judicial
proposta para requerer a nomeação.
O ônus de provar mudança nas circunstâncias, que justifiquem não nomear os classificados às
vagas anunciadas, é da administração pública, pois foi ela própria quem, ao realizar o concurso,
criou a presunção da necessidade de preenchimento dessas vagas.
Do contrário, permanecerão os candidatos aos certames públicos sujeitos ao capricho dos
administradores do momento, que poderão, entre outras arbitrariedades, até mesmo utilizar-se
do concurso como forma oblíqua de arrecadação, por meio do valor recolhido com as inscrições.
Aos candidatos, além da perda patrimonial, ficará o prejuízo moral de submeter-se à via crucis
do concurso e, mesmo classificados às vagas, verem todo o esforço feito em vão.
Por outro lado, em ocorrendo circunstâncias de interesse público, que apontem a impossibilidade
ou a desnecessidade de preenchimento das vagas anunciadas, os princípios de legalidade,
moralidade e eficiência legitimam a não nomeação dos classificados. Essas condições não podem
ser arroladas a priori, senão de modo meramente exemplificativo, tendo em vista que o suceder
do tempo e dos fatos trazem fatores não previsíveis, ou de consequências que não se podem
antecipar. Assim, podem ser mencionadas, como exemplos de hipóteses justificadoras da não
nomeação: a ultrapassagem dos limites de gasto com pessoal (CF, art. 169; Lei Complementar
101/2000, art. 19), a queda na arrecadação, o aumento inesperado de gastos em algum campo
e a superveniência de maior necessidade de incremento de pessoal em outro setor.
17 Curso de direito administrativo, 2005, p. 592. No mesmo sentido, Juliana Brina Corrêa Lima de Carvalho: “Não há possibilidade de escolha, para a Administração, entre nomear ou não os aprovados. Ou há motivo superveniente que exija a não nomeação, e deve-se, obrigatoriamente, não convocar os aprovados; ou não há motivo para não convocá-los e, portanto, devem estes ser no-meados.” (Controle Jurisdicional dos Atos de Prorrogação de Concurso Público e de Nomeação dos Candidatos Aprovados, Boletim de Direito Administrativo, v. 23, n. 3, mar. 2007, p. 353). Também admitindo a não nomeação em face de novas circunstâncias: MELO, Cristina Andrade, Direito subjetivo à nomeação do candidato aprovado em concurso público dentro do número de vagas: análise da evolução jurisprudencial desde o Enunciado n. 15 da Súmula do STF, Direito Público: Revista Jurídica da Advocacia-Geral do Estado de Minas Gerais, v.6, n.1-2, jan./dez. 2009, p. 62; LIMA, Rodrigo Mello da Motta. Aprovação em concurso público e direito à nomeação, Fórum Administrativo: Direito Público, v. 9, n. 106, dez. 2009, p. 22-23.
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A ocorrência de tais circunstâncias pode ser questionada pelos interessados, cabendo ao Poder
Judiciário decidir a matéria, com base na motivação exposta pela administração pública, em
confronto com os argumentos dos requerentes e as provas produzidas no processo.
5 Proposições legislativas
Tramitam no Congresso Nacional várias proposições legislativas que visam a obrigar a
administração a nomear candidatos aprovados às vagas previstas em editais de concursos
públicos, e até mesmo a vagas surgidas após a realização do certame.
O Projeto de Lei (PL) 122/2008 já foi aprovado terminativamente na Comissão de Constituição
e Justiça do Senado e encontra-se em tramitação na Câmara dos Deputados, onde recebeu o
número 6.582/2009. A esse PL foram apensados os Projetos de Lei 4.973/2005, 4.109/2008,
6.778/2010 e 6.991/2010, todos propostos por Deputados Federais e tendo a mesma matéria
por objeto. No Senado ainda tramita o PL 153/2008.
O PL 6.582/2009 visa a alterar a Lei 8.112, de 11/12/1990, que contém o regime jurídico dos
servidores públicos federais, acrescentando ao art. 12 um § 3°, que teria a seguinte redação:
Os candidatos aprovados em concurso público, no limite das vagas disponibilizadas no edital, têm direito à nomeação no período de validade do concurso, desde que existam cargos vagos suficientes, respeitadas a Lei Complementar n. 101, de 4 de maio de 2000, e a lei orçamentária de cada ano.
Contudo, o PL 6.582/2009 e os Projetos que lhe foram apensados, bem como o PL 153/2008, por
serem de iniciativa de parlamentares, padecem todos do mesmo vício de inconstitucionalidade
formal: ofendem o art. 61, § 1°, II, c, da CF, que reserva ao Presidente da República a iniciativa
de lei que verse sobre o regime jurídico e o provimento de cargos públicos no âmbito federal.18
Nesse sentido, há várias decisões do STF, inclusive os citados acórdãos proferidos em face do
art. 77, VII, da Constituição do Rio de Janeiro.
Além disso, na senda do que foi decidido pelo STF em face dos mencionados processos ADI
2.931 e RE 229.450, os projetos de lei também padecem de inconstitucionalidade material,
ao pretender estabelecer uma obrigatoriedade a priori para nomeação, sem preservar a
necessária flexibilidade que a administração necessita ter para examinar, caso a caso, a eventual
superveniência de circunstâncias indicadoras da não nomeação, em prol do interesse público.
18 “Art. 61. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da República e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição. § 1° — São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que: [...] II — disponham sobre: [...] c) servidores públicos da União e Territórios, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria; [...].”
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A fim de se preservar o equilíbrio entre os interesses dos concursados e da coletividade, o
correto seria explicitar, em texto legal obediente ao processo legislativo constitucional, regra
que previsse o direito à nomeação dos aprovados às vagas anunciadas no edital, mas ressalvasse
à administração pública a faculdade de não nomear, desde que explicitasse essa decisão em ato
administrativo, no qual se indicassem as razões justificadoras de tal deliberação.
6 Conclusão
Desde suas origens, o Direito Administrativo, embora tenha conferido importantes garantias dos
cidadãos em face do poder público, também preocupou-se em conferir à administração pública
vasto campo de discricionariedade, muitas vezes, de tão largo e injustificado, ensejador do
amesquinhamento dos direitos individuais e coletivos.
Felizmente a história do Direito Administrativo tem sido também a da paulatina exclusão desses
excessos de discricionariedade. O risco pode estar no extremo oposto, pois alguma margem de
flexibilidade poderá ser necessária, em muitos casos, para a preservação de interesses públicos
juridicamente protegidos.
No campo da investidura aos cargos e empregos públicos, a preocupação em buscar-se a justa
medida entre o interesse individual dos candidatos aprovados e as cambiantes necessidades
públicas é bom exemplo do equilíbrio a que se pode chegar, na medida em que se supera o culto
à discricionariedade a priori, para se passar a exigir atos razoáveis, coerentes e motivados da
administração pública.
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MELO, Cristina Andrade. Direito subjetivo à nomeação do candidato aprovado em concurso público dentro do número de vagas: análise da evolução jurisprudencial desde o Enunciado n. 15 da Súmula do STF. Direito Público: Revista Jurídica da Advocacia-Geral do Estado de Minas Gerais, v. 6, n. 1-2, p. 62, 53-63, jan. dez. 2009.
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Raquel Melo Urbano de Carvalho
Procuradora do Estado de Minas Gerais. Professora de Direito
Administrativo. Mestre em Direito Administrativo pela
Faculdade de Direito da UFMG.
Resumo: Considerando os diversos modos de exercício das funções públicas pelo Estado
brasileiro, cumpre definir o alcance da regra constitucional que tornou obrigatória a realização
de concurso público. É preciso combater os reiterados descumprimentos do art. 37, II, da
Constituição, a fim de que se tornem realidade as inúmeras vantagens do instituto como forma
de seleção de pessoal pelo Estado. Definir o momento em que se exigirá prova dos requisitos de
inscrição e dos requisitos do cargo, bem como os limites das exigências editalícias, é tarefa a
ser realizada à luz da normatização jurídica, incluídos princípios como o da proporcionalidade,
com contornos delineados pela doutrina e jurisprudência contemporâneas.
Palavras-chave: Realização de Concurso Público pela Administração. Obrigatoriedade. Alcance
da norma insculpida no art. 37, II da CR. Requisitos de inscrição e requisitos do cargo. Momento
da comprovação. Limites das exigências editalícias. Princípio da proporcionalidade.
Abstract: Considering the ways of Brazilian exercise the public functions, the scope of
constitutional provision that made public concurrence mandatory must be defined. The repeated
breaches of item II of the article 37, of the Brazilian Constitution should be opposed in order to
turn into reality the many advantages of the institute as a means of personnel selection by the
State. Defining the moment to file evidences for entrance and job requirements, as long as the
limits of the edict requirements, is a task to be undertaken following the legal rules related to
the legal institute, including principles such as proportionality, with outlined countours based
on contemporary doctrine and jurisprudence.
Aspectos relevantes do concurso público
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Keywords: Opening of public examination by State Administration. Obligatoriness. Meaning of
item II of article 37 of the Brazilian Constitution. Enrollment and office requirements. Time
for enrollment evidence. Public notice reqired limits. Proportionality principle.
1 O regime de pessoal no Estado brasileiro e a obrigatoriedade do concurso público
O Estado, quando exerce as competências que lhe são impostas pelo ordenamento, necessita
valer-se de um quadro de pessoal capaz de exteriorizar vontades e realizar comportamentos
que satisfaçam as necessidades da coletividade. São necessários profissionais que, além da
realização pessoal, componham uma estrutura voltada para a realização do interesse público
primário. Historicamente, vários são os modelos adotados para o vínculo firmado entre os
trabalhadores públicos e a Administração. Em alguns deles prevalecem elementos privados,
que aproximam o vínculo daquele que se estabelece no mercado de trabalho empresarial. Em
outros predomina a ideia de um profissional encarregado basicamente de servir ao público,
com foco maior nas demandas coletivas a serem satisfeitas, em desfavor das necessidades
individuais do trabalhador. Não há dúvida que a adoção de um modelo ou de outro depende
da própria concepção de Estado adotada em cada país, com consagração na ordem jurídica de
determinada ideologia inspiradora das opções sociais.
No Brasil, malgrado renovada e recente controvérsia doutrinária, atribui-se majoritariamente
ao texto constitucional a opção pelo modelo de uma burocracia profissionalizada, submetida
ao regime jurídico de direito público, com ênfase na valorização do mérito e da eficiência
administrativa. O fato de a Constituição de 1988 ter optado pela expressão servidor público
e não mais funcionário público, o caráter obrigatório dos planos de carreira (art. 39, caput
da CR, com vigência restaurada em razão da liminar proferida pelo STF na ADI n. 2.135-4)
e as regras consagradas em dispositivos constitucionais como os incisos I, II e IX do art. 37
evidenciariam a consagração do regime jurídico administrativo como aquele incidente, em
regra, no vínculo funcional estabelecido entre o Poder Público e o seu quadro de pessoal.
Não se trata de enquadrar o servidor como um trabalhador que teria menos direitos e mais
obrigações, mas apenas de reconhecer que a supremacia do interesse público primário justifica
a exclusão do regime contratual e a adoção do regime unilateral estatutário.
Conforme entendimento predominante, o exercício das competências permanentes, comuns e
típicas das pessoas jurídicas de direito público políticas ou administrativas se dará, em regra,
por servidores submetidos ao regime jurídico estatutário. Nesse regime, os direitos e obrigações
dos servidores são fixados, unilateralmente, pelo Poder Legislativo da esfera federativa a cujo
quadro de pessoal se vincula o servidor. Em outras palavras, o ente federativo (União, Estado-
membro, Município ou DF), por meio do seu Poder Legislativo (Congresso Nacional, Assembleia
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Legislativa, Câmara de Vereadores ou Assembleia Distrital), editará leis que veiculem o estatuto
o qual estabelecerá direitos e deveres dos servidores encarregados do exercício das atividades
típicas da própria pessoa federativa, bem como das suas autarquias e fundações públicas.
A ideia fundamental é a de que atividades típicas, essenciais e rotineiras imputadas às pessoas
públicas adequam-se ao regime estatutário, senão vejamos: a natureza da função a ser exercida é
pública, a natureza do recurso utilizado como contraprestação do trabalho é pública, os fins a serem
atendidos são públicos, logo as normas regulamentadoras da relação devem ser públicas. O regime
estatutário e o escalonamento de cargos efetivos propiciam a formação de uma carreira, estando
os seus membros a salvo da descontinuidade governativa e das ásperas angústias relacionadas à
subsistência incerta na velhice. Com efeito, só quem detém o controle do próprio sustento mantém
altivo o domínio da sua vontade, donde se conclui que o regime estatutário evita oscilações entre
os extremos deletérios pró-Estado e pró-indivíduo e protege carreiras de deveres austeros para
o bem estar da coletividade e eficácia dos direitos fundamentais. Ademais, institucionaliza-se a
independência e são minimizados os efeitos deletérios da política episódica, estando os servidores
livres de viver em sobressalto a cada mudança de governo. O mérito de assegurar a permanência
na Administração é garantia que só o regime estatutário dá e em favor dos servidores efetivos
que cumpram determinados requisitos constitucionais. Nesse contexto, contorna-se o risco de
se degenerar em partidarismo, com hábitos de concussão e imoralidade o exercício de atividade
pública fundamental como a representação dos órgãos, autarquias e fundações públicas.1
Com base em tais razões defende-se o acerto da adoção do regime estatutário como regra
para o quadro de pessoal da Administração Pública, ressalvadas exceções consagradas de
modo expresso no ordenamento, como é o caso, v.g., dos titulares dos serviços notariais
e de registro (art. 236 da CR), dos empregados das empresas públicas e sociedades de
economia mista (art. 173, § 1°, II, da CR) e dos contratados para necessidades temporárias de
excepcional interesse público (art. 37, IX, da CR). Excluídas as exceções fixadas em dispositivos
específicos, a regra seria a incidência do regime estatutário. Trata-se da adoção do modelo
francês segundo o qual a situação legal constituída para os trabalhadores públicos implica
incidência de disposições legais e regulamentares a que os agentes, assim que incorporados
ao serviço público, sujeitam-se.
Nesse modelo, o ato de nomeação, levado a efeito unilateralmente pelo Poder Público, é que
instaura a relação jurídica estatutária. A sua prática pela Administração submete-se a determinadas
condições específicas fixadas na Constituição e na legislação vigente em cada país.
1 Nesse sentido, confiram-se: ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais dos servidores públicos. São Paulo: Sa-raiva, 1999, p. 120-121; FREITAS, Juarez. Concurso público e regime institucional: as carreiras de Estado. In: MOTTA, Fabrício (Coordenador). Concurso público e constituição. Belo Horizonte: Fórum, 2007, p. 127-219; ANASTASIA, Antonio Augusto Junho. Regime jurídico único do servidor público. Belo Horizonte: Del Rey, 1990, p. 51; SILVA JÚNIOR, Arnaldo. Dos servidores públicos municipais. Belo Horizonte: Del Rey, 2009, p. 28.
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No direito brasileiro, o ato de nomeação para cargos comissionados é levado a efeito livremente,
ou seja, consoante a discricionariedade do agente público competente para o ato de provimento.2
O inciso II, do art. 37, da Constituição da República deixa evidente, em sua parte final, que
a nomeação e exoneração para cargos comissionados é livre. Daí se infere que dependem da
confiança que a autoridade nomeante detém, ou não, no servidor comissionado, sendo imperiosa
a observância de limites constitucionais como é o caso do princípio da moralidade.3 Apesar de
certa a necessidade de cumprimento de normas principiológicas de status constitucional, as
atividades de assessoramento, direção e chefia das pessoas de direito público (federativas ou
administrativas) que tenham sido enfeixadas em cargos comissionados não dependem de prévia
aprovação em concurso público para o seu exercício.4
Situação diversa ocorre com os servidores a serem providos em cargos efetivos que, conforme
lição doutrinária, são aqueles predispostos a receberem ocupantes em caráter definitivo e
permanente:
Os cargos de provimento efetivo são predispostos a receberem ocupantes em caráter definitivo, isto é, com fixidez. Constituem-se na torrencial maioria dos cargos públicos e são providos por concurso público de provas ou de provas e títulos.5
2 Exceção se encontra no ordenamento em relação aos dirigentes das agências reguladoras, providos em cargos comissionados. No âmbito federal, satisfeitos integralmente os pressupostos do art. 4° da Lei n. 9.986, de 18/07/2000, é indispensável atender o procedimento estabelecido no art. 5° do mesmo diploma. Nos termos do citado art. 5°, as autoridades em comento devem ser escolhidas “pelo Presidente da República e por ele nomeados, após aprovação pelo Senado Federal, nos termos da alínea f do inciso III do art. 52 da Constituição Federal”. A investidura dos dirigentes das agências reguladoras depende, assim, da participação de diversos órgãos, uma vez que cabe ao Presidente da República indicar a autoridade, ao Senado Federal aprovar o nome indicado, ou não, e, enfim, ao Presidente da República a nomeação. Somente depois deste trâmite é cabível a posse e o início do exercício do mandato pelo dirigente.
Observe-se que, embora os cargos de diretoria tenham sido legalmente qualificados como cargos comissionados de direção, o que implicaria livre nomeação pelo administra dor competente nos termos do art. 37, II, da Constituição, certo é que o art. 5° da Lei Federal n. 9.986 exige a intervenção do Poder Legislativo, pois necessária a prévia apro vação do Senado antes da nomeação do dirigente da agência.
Cum maxima venia dos entendimentos em sentido contrário, não se entende razoável que o dirigente de uma agência reguladora, para ser nomeado para o cargo comissionado que exercerá, dependa da manifestação de vontade do Poder Legislativo, mesmo porque a parte final do inciso II, do art. 37 da CR prevê a livre nomeação na espécie. Assim sendo, atendidos os pressupostos legais necessários ao exercício do cargo comissionado, cabe à autoridade administrativa competente designar o dirigente, afigurando-se ofensivo ao art. 2° da CR admitir a intervenção do Legislativo.
Referido entendimento pessoal contraria posição proclamada pelo Su premo Tribunal Federal ao indeferir a suspensão cautelar de dispositivo de lei estadual que condicionava a nomeação de dirigente de agência reguladora local à prévia aprova ção da As-sembleia Legislativa: “Diversamen te dos textos constitucionais anteriores, na Constituição de 1988 — à vista da cláusula final de abertura do art. 52, III —, são válidas as normas legais, federais ou locais, que subordinam a nomeação dos dirigentes de autar-quias ou fundações públicas à prévia aprovação do Senado Federal ou da Assem bleia Legislativa: jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal.” (ADI-MC n. 1.949-RS, relator. Ministro. Sepúlveda Pertence, Pleno do STF, DJU de 25/11/2005, p. 05)
Com a posição adotada na ADI n. 1.949, da qual respeitosamente se diverge, o Supre mo Tribunal Federal passou a entender que a redação da alínea f do inciso III, do art. 52, da CR tornou lícita a intervenção preliminar do Senado na escolha dos titulares dos cargos de direção das agências reguladoras, não havendo ofensa ao equilíbrio entre os poderes exigido pelo art. 2° da Constitui-ção, nem mesmo à parte final do inciso II, do art. 37, da CR.
3 Com igual linha de raciocínio, tem-se o posicionamento de Cármen Lúcia Antunes Rocha (ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princí-pios constitucionais dos servidores públicos. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 178).
4 Consagrando tal posicionamento, o Supremo Tribunal Federal na ADI 3.210-PR, rel Min. Carlos Velloso, 11/11/2004, Plenário do STF, Informativo do STF, n. 369.
5 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 20. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 280
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A regra geral é a de que cargos efetivos apenas podem ser providos após realização de concurso
público. Ressalvadas exceções com assento constitucional6, é imperioso observar a determinação
genericamente fixada no art. 37, II, da Constituição da República:
II – a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;
Do transcrito dispositivo decorre a obrigatoriedade do concurso público não só para os cargos efetivos sujeitos ao regime estatutário vinculante das pessoas públicas (entes federativos, autarquias e fundações públicas), mas também os empregos públicos existentes na estrutura da Administração. Destarte, devem obediência à regra que impõe a realização de concurso público também os empregados das sociedades de economia mista e empresas públicas. Embora não se submetam ao regime estatutário, mas sim ao regime celetista, desde a redação originária do art. 173, § 1° da CR, certo é que a celebração do contrato de trabalho entre tais pessoas privadas integrantes da administração indireta e o seu pessoal depende da realização preliminar de certame seletivo, por força do art. 37, II, da Constituição.
Referido posicionamento vem sendo aplicado mesmo quando se trata de empresa pública e sociedade de economia mista exploradora de atividade econômica:
O art. 37, caput, inciso II, da Carta Magna, não deixa qualquer dúvida quanto à necessidade da realização de concurso público para a admissão de pessoal nas empresas públicas.
A Administração Pública Indireta (autarquias, fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista) deve observar, na contratação de pessoal, o instituto moralizador do concurso público.
Até mesmo as empresas públicas, que exploram atividade econômica e se sujeitam ao regime próprio de direito privado, com relação às obrigações trabalhistas, submetem-se à exigência prevista na Carta Magna, art. 37, II, uma vez que essa submissão apenas significa que nas relações com seus empregados essas entidades devem observar o regime previsto na Consolidação das Leis do Trabalho, bem como porque o regime trabalhista não é incompatível com a realização de concurso público.7
6 Para alguns cargos vitalícios há exceções dispostas na Constituição. Assim ocorre na esfera do Poder Judiciário (ex: Ministros do Supremo Tribunal Federal — art. 101 da Constituição) e no âmbito do Tribunal de Contas (ex: Ministros do Tribunal de Contas da União — art. 73, §§ 1° e 2° da Constituição). Com efeito, além dos cargos vitalícios de Ministros e Conselheiros dos Tribunais de Contas, também se excluem da exigibilidade de concurso público os titulares de cargos vitalícios de magistrados do STF, STJ, TST, STM e STE (biênio), além daqueles oriundos do quinto constitucional e titulares do cargo de Juiz do TRE. Não se ignore que a Emenda Constitucional n. 51, de 14/02/2006, fixou que agentes comunitários de saúde e agentes de combate às endemias podem ser recrutados através de processo seletivo público. Malgrado divergência sobre o regime de tal recrutamento após a edição da Lei n. 11.350, de 05/10/2006 que fala em processo seletivo de provas e provas e títulos, é comum a não realização de concurso público tal como disposto no art. 37, II, da CR e regulamentado em nível infraconstitucional.
7 REO n. 94.01.24368-9-MG, rel. Juiz Leão Aparecido Alves, 3a Turma Suplementar do TRF 1a Região, DJU de 16/05/2002, p. 113
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Não se ignora, contudo, que ocorreu significativa controvérsia a propósito da necessi dade de
concurso público, no que pertine à admissão de pessoal nas paraestatais explora doras de atividade
econômica. Parte da doutrina entendeu que a imposição do regime jurí dico de direito privado pelo
inciso II, do § 1°, do art. 173 seria exceção à regra do art. 37, II, da Constituição.7 Posicionamentos
doutrinários neste sentido levaram algumas empresas públicas e sociedades de economia mista
à não realização de concursos públicos, após 1988, antes de firmar contratos de trabalho com os
seus empregados. O Tribunal de Contas da União, em mais de uma oportunidade, recusou registro
aos referidos contratos. Tais atos de controle do TCU tiveram sua constitucionalidade discutida
em sede de manda dos de segurança impetrados junto ao Supremo Tribunal Federal. Apenas ao
julgar o Man dado de Segurança n. 21.322-DF, o Pleno do STF pacificou a questão entendendo
ser necessária a realização de concurso público, inclusive pelas paraestatais exploradoras de
atividade econômica, conforme decisão publicada no DJU de 23/04/1993.
A partir da publicação do citado decisum, entendeu-se não haver justificativa válida para amparar
contratações de pessoal por empresas públicas ou sociedades de economia mista, sem prévia
realização de concurso público. É certo, entretanto, que a jurisprudên cia dos Tribunais Superiores
vem demonstrando condescendência com as contratações viciadas ocorridas após a promulgação
da Constituição (05/10/1988) e a data da publicação do julgado do STF que, pelo Pleno, pacificou
o entendimento de que a regra do art. 37, II, da CR vinculava também as paraestatais sujeitas
ao regime de direito privado por força art. 173, § 1°, II, da CR (23/04/1993).
O Supremo Tribunal considerou que, como entre 05/10/1988 (data da promulgação da CR)
e 23/04/1993 (data da publicação da decisão do Pleno do STF relativa ao MS n. 21.322-DF),
havia dúvida no país a propósito da necessidade de a exploradora de atividade eco nômica
realizar concurso público antes de contratar seus empregados, pelo que afirmou ser incabível
declarar a nulidade das admissões de pessoal inconstitucionais realizadas nesse período. O
STF, com base nos princípios da segurança jurídica e da boa-fé objetiva, terminou por dar
eficácia erga omnes à decisão do MS n. 21.322-DF que pacificou a interpretação relativa aos
arts. 37, II, e 173, § 1°, II, da CR.8
Assim sendo, as contratações de empregados públicos feitas por qualquer empresa pública
ou sociedade de economia mista após 23/04/1993, sem concurso público, é incons titucional
8 “INFRAERO: Admissão sem concurso público. Em virtude das específicas e excepcionais circuns tâncias do caso e em observação aos princípios da segurança jurídica e da boa-fé dos impetrantes, o Tribunal concedeu mandado de segurança contra ato do Presidente do TCU que, em acórdão proferido no julgamento de Prestação de Contas da INFRAERO, relativas ao exercício de 1991, determi-nara a ela que adotasse providênci as para regularizar 366 admissões realizadas sem concurso público, sob pena de nulidade das mesmas. Considerou-se que o TCU teria convalidado a situação dessas admissões em outro acórdão, publicado em 3/12/92, no qual julgara regulares as contas da INFRAERO, relativas ao exercício de 1990, e apenas recomendara que não fossem efetuadas admissões futuras sem a realização de concurso público. Entendeu-se que, à época das contratações, havia dúvida acerca da necessidade de concurso público para provimento de cargos em empresas públicas e sociedades de economia mista, em face do art. 173, § 1°, da CF, e, ainda, que tal controvérsia teria sido dirimida apenas com a decisão do STF no MS 21322/DF, DJU de 23/04/93, termo a partir do qual haveriam de se tornar nulas as admissões de pessoal do TCU, e não 06/06/90, data de publicação da primeira deliberação do TCU sobre a matéria.” (MS n. 22.357-DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 27/05/2004, Pleno do STF, Informativo do STF, n. 349; transcrições do voto condutor do acórdão no Informativo do STF, n. 351).
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e merece repúdio imediato no controle de juridicidade dos comportamentos administrativos.
As realizadas em desconformidade com o art. 37, II, da CR, entre 05/10/1988 e 23/04/1993
estabilizaram-se em razão da segurança jurídica e da confiança legí tima dos terceiros em face
dos comportamentos administrativos.9
É mister enfrentar, ainda, o regime de contratação temporária fixado no art. 37, IX, da CR,
no tocante à necessidade, ou não, de concurso público. Para tanto, cumpre esclarecer que a
Constituição somente admite tal regime nos casos de contratação por tempo determinado que
sejam enumerados em lei para atender necessidade temporária de excepcional interesse público.
A determinabilidade temporal do vínculo, a temporariedade da necessidade que o justifica e
a excepcionalidade do interesse público presente na espécie deixam claro que o contexto não
se coaduna com a realização prévia de concurso público. Contratos temporários não foram
concebidos para o atendimento de necessidades permanentes e fixas das pessoas administrativas,
mas para satisfazer demandas extraordinárias, temporárias e que consubstanciam interesse
excepcional da coletividade. Sendo assim, a sua natureza ímpar, fora do ordinário e limitada
no tempo deixa evidente a impropriedade de se impor como obrigatório o concurso público.
O fato de o art. 37, II, da Constituição exigir concurso público apenas para cargos e empregos
públicos10 corrobora o entendimento de que os contratados temporários, meros exercentes de
função pública, não necessitam de aprovação prévia em concurso público.11
Não é raro, contudo, que órgãos e entidades administrativas realizem processo seletivo
simplificado ou concurso simplificado, antes da celebração dos contratos temporários com base
no art. 37, IX, da Constituição. Trata-se de um procedimento administrativo formal, que observa
normas regulatórias veiculadas por um edital, observando formalidades mínimas e requisitos
essenciais como, por exemplo, a existência de recursos orçamentários, a publicação do aviso do
certame seletivo, a autuação regular com numeração das páginas do processo, e a motivação
dos atos praticados. Embora não haja qualquer exigência constitucional que torne obrigatório
tal procedimento simplificado, nenhum óbice impede a sua realização como mecanismo de
preservação da impessoalidade, eficiência e moralidade públicas, mormente se evidente que
não há inconveniência à luz da necessária celeridade administrativa.
Segundo Diogenes Gasparini, os objetivos evidentes desse procedimento seletivo simplificado
são dar atendimento ao princípio da igualdade e selecionar os melhores candidatos para a
execução dos excepcionais serviços desejados, ao que acresce:
9 Ag. Reg. no RE n. 348.364-RJ, rel. Min. Eros Grau, 1a Turma do STF, DJU de 11/03/2005.
10 Os cargos comissionados foram ressalvados na parte final do inciso II, do art. 37 da CR, conforme já elucidado in retro.
11 “A regra é a admissão de servidor público mediante concurso público: C.F., art. 37, II. As duas exceções à regra são para os cargos em comissão referidos no inciso II do art. 37, e a contratação de pessoal por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público. CF, art. 37, IX. Nessa hipótese, deverão ser atendidas as seguintes condições: a) previsão, em lei, dos cargos; b) tempo determinado; c) necessidade temporária de interesse público; d) interesse público excep-cional.” (ADI n. 2.229-ES, rel. Min. Carlos Velloso, Pleno do STF, DJU de 25/06/2004, p. 3).
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O concurso simplificado é um procedimento administrativo de seleção de candidatos ao preenchimento das funções necessárias à execução de serviços marcados pela temporariedade e necessidade de excepcional interesse público. Essa, portanto, sua natureza jurídica. É procedimento administrativo formal e como tal deve respeitar as fases e atos previstos em regulamento ou no próprio edital que o instaura e o regula. Concurso simplificado não significa certame sem regras procedimentais, sem segurança jurídica, portanto, absolutamente informal. Um mínimo procedimental deve existir, sob pena de violação do princípio da igualdade e, por que não, da segurança jurídica. Esse mínimo ou está indicado em regulamento ou está mencionado no edital. O desrespeito a essa formalidade, quando não convalidável, torna nulo o concurso simplificado.12
Denota-se que não só as contratações temporárias vêm ocorrendo mediante procedimentos
seletivos simplificados, mas também outros recrutamentos em que não há obrigatoriedade de
realização de concurso público, consoante regra do art. 37, II, da CR. Assim ocorre com os
serviços sociais autônomos e com entidades como a OAB que, nos termos da decisão exarada
pelo STF na ADI n. 3.026-DF, não se sujeita à exigência de concurso público para admissão dos
contratados sob o regime trabalhista.13 Nesses casos, não há impedimento algum a que se adote
um procedimento simplificado antes da contratação do pessoal necessário ao exercício das
atividades administrativas.
Não se confunda procedimento seletivo simplificado — empregado nos casos em que não é
obrigatória a realização de concurso público, mas a Administração opta por uma modalidade
de avaliação procedimental capaz de viabilizar uma escolha técnica e eficiente — com
seleção interna ou concurso interno. A praxe da seleção interna era comum nos quadros da
Administração Pública antes de 1988, ao argumento de que o texto constitucional anterior
apenas exigia concurso público antes da primeira investidura em cargo ou emprego público.
Sendo assim, servidores providos em determinados cargos públicos candidatavam-se a outros
cargos, com atribuições diversas e por vezes mais complexas, sem se submeter à concorrência
aberta com todos os cidadãos, mas somente disputando com quem também já integrava os
quadros da Administração. Como essa nova investidura pretendida não era a primeira, afastava-
se a exigência constitucional de concurso público que, como tal, fosse aberto à participação
de qualquer interessado que preenchesse os requisitos legais. Do concurso interno apenas
participavam os que já eram titulares de cargos escalonados em carreira, integrantes do quadro
de pessoal do Estado. Isso impedia o amplo acesso de brasileiros que cumpriam os requisitos
legais, mas que não viam abertas as possibilidades de competição, como observa a doutrina:
Passavam-se dezenas de anos sem que determinados cargos fossem postos à concorrência pública de interessados a neles se investir porque se definia o seu
12 GASPARINI, Diogenes. Concurso público – imposição constitucional e operacionalização. In: MOTTA, Fabrício (Coord.). Concurso público e constituição. Belo Horizonte: Fórum, 2007, p. 45.
13 ADI n. 3.026-DF, rel. Min. Eros Grau, Plenário do STF, DJU de 29/09/2006, p. 31.
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provimento pela denominada ‘seleção interna’, restrita a quem já integrava a Administração Pública. Logo, interessados estranhos aos quadros administrativos não tinham oportunidade de a eles concorrer.14
Atualmente, não remanesce qualquer dúvida quanto à inadmissibilidade dos denominados concursos
internos, uma vez que a Constituição de 1988 determina no inciso II, do art. 37 que “a investidura
em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou
de provas e títulos”. Em outras palavras, tanto a primeira investidura como os provimentos
derivados submetem-se em regra à necessidade de aprovação em concurso público, admitindo-se
como exceções apenas as hipóteses consagradas no texto da CR. Excluídos os casos excepcionais
expressamente previstos na Constituição (ex: promoção ou aproveitamento), impõe-se a realização
de concurso aberto a todos os interessados que satisfaçam os requisitos normativos determinados
pelo Poder Público, donde se infere a inconstitucionalidade das chamadas seleções internas.
Em relação aos agentes políticos detentores de mandato eletivo (ex: prefeitos, deputados
federais), tem-se que os mesmos são recrutados mediante eleição. Por serem componentes
do governo que mantém vínculo político com o Estado, a sua investidura não se dá mediante
concurso público, mas através de eleição ao final de que, se vencedores, lhes será atribuído um
mandato para regular exercício.
Dentre os particulares colaboradores do Poder Público (concessionários, permissionários,
titulares de serviços notariais e de registro, leiloeiros, tradutores e intérpretes públicos), o
regime jurídico aplicado a alguns exclui a observância de concurso público; em outros casos,
o certame seletivo é obrigatório. Assim, por exemplo, é imperiosa a realização de licitação
prévia em relação aos concessionários de serviços públicos (art. 175 da CR), o que exclui o
concurso público como meio próprio de seleção dos contratados pela Administração. Já no caso
dos serviços notariais e de registro, o art. 236, § 3°, da Constituição prevê que “O ingresso
na atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos, não se
permitindo que qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de
remoção, por mais de seis meses”. Nesse caso, o próprio STF já assentou que “para se tornar
delegatária do Poder Público, tal pessoa natural há de ganhar habilitação em concurso público
de provas e títulos, não por adjudicação em processo licitatório, regrado pela Constituição
como antecedente necessário do contrato de concessão ou de permissão para o desempenho
de serviço público”.15 O concurso será realizado pelo Poder Judiciário, com a participação
da Ordem dos Advogados do Brasil, do Ministério Público, de um notário e um registrador,
consoante regra do art. 15, da Lei Federal n. 8.935/94.
14 ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais dos servidores públicos, op. cit., p. 203.
15 ADI n. 3.151, rel. Min. Carlos Britto, Pleno do STF, julgamento em 08/06/2005.
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De tais ponderações, podem ser extraídas algumas conclusões preliminares:
— considerando-se a administração direta das pessoas federativas (União, Estados-membros,
Municípios e Distrito Federal), suas autarquias e fundações públicas, a regra geral é a exigência
de concurso público para provimento dos cargos efetivos, ressalvadas exceções constitucionais,
nos termos do art. 37, II, da Constituição da República;
— ainda no tocante à administração direta das pessoas federativas (União, Estados-membros,
Municípios e Distrito Federal), suas autarquias e fundações públicas, não é necessária a realização
de concurso público para provimento de cargos comissionados, nem para contratações por
tempo determinado para atender necessidade temporária de excepcional interesse público, por
força do art. 37, II e IX, da Constituição da República;
— quanto ao pessoal das empresas públicas e sociedades de economia mista, é necessária
a realização de concurso público antes da celebração de contratos de trabalho entre tais
entidades e seus empregados públicos; em razão das decisões prolatadas pelo STF nos Man-
dados de Segurança n. 21.322-DF e 22.357-DF, as contratações de empregados públicos feita
por empresa pública ou sociedade de economia mista entre 05/10/1988 e 23/04/1993, sem
realização prévia de concurso público, estabilizaram-se em razão da segurança jurídica e da
confiança legí tima dos terceiros em face dos comportamentos administrativos;
— os agentes políticos que exercem mandatos eletivos são recrutados por eleição (e não por
concurso público); os concessionários e permissionários de serviço público são contratados após
regular procedimento licitatório (e não por meio de concurso público); os serviços notariais e
de registro apenas são delegados a pessoas naturais após aprovação em concurso público, nos
termos do art. 236, § 3°, da Constituição da República e das normas gerais veiculadas na Lei
Federal n. 8.935/94;
— nos casos em que não há obrigatoriedade constitucional de realização de concurso público,
conforme exigido pelo art. 37, II, da CR, nenhum óbice há em promover um procedimento
seletivo simplificado com o objetivo de, mediante um rito célere, viabilizar contratações em
que sejam asseguradas a igualdade e a escolha dos melhores candidatos interessados em firmar
vínculo com o Estado;
— após a Constituição de 1988, não se admitem seleções internas em que a disputa por cargos
e empregos públicos restringe-se aos servidores já integrantes dos quadros da Administração,
tendo em vista a regra segundo a qual, ressalvadas exceções constitucionais, qualquer investidura
deve ser antecedida de concurso aberto à disputa de todos os que cumpram os requisitos legais,
em estrito cumprimento ao inciso II, do art. 37, da CR.
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2 Evolução histórica, vantagens e desafios
Malgrado seja juridicamente possível fixar os contextos em que, no Brasil, é obrigatória a realização de concurso público, ainda remanesce como desafio constante para formação do quadro de pessoal da Administração estabelecer os contornos do procedimento capaz de viabilizar a seleção dos profissionais que exercerão as competências públicas.
Historicamente, várias foram as formas utilizadas pelo Estado para a escolha dos seus agentes, ultimando o concurso como o procedimento que, no século XXI, firma-se como o predominante para a avaliação dos melhores candidatos disponíveis para integrar as fileiras do Estado. Antes da sua estabilização nesse espaço, o sorteio, a sucessão hereditária, o arrendamento, a compra e venda e a nomeação absoluta e relativa possuíam maior espaço, sendo analisados pela doutrina, atenta aos seus aspectos conceituais e especificidades históricas.16
O sorteio como processo de inspiração divina, teve seu uso restrito, pois foi mais acolhido para o preenchimento de cargos de natureza política do que para os cargos efetivos. Foi muito utilizado na Antiguidade clássica e, em especial, pelos gregos de Esparta e de Atenas, onde ficou famoso pelas circunstâncias em que decidiu a sorte de cargos de importância capital no mundo greco-latino. Apresentava-se sob duas espécies: o sorteio simples, que se aplicava indistintamente às pessoas que antes passavam por um processo seletivo, e o sorteio condicionado, aplicado a pessoas que reuniam determinadas condições, apreciáveis dentre os que poderiam ser escolhidos para o preenchimento dos cargos públicos.
O sistema de compra e venda foi adotado na Idade Média a partir de Carlos VII de França, chegando-se a criar órgão público destinado à realização dessas transações tendo os cargos públicos por objeto. Da França, o modelo irradiou-se para a Alemanha, Espanha e Itália. Nessa estrutura, concebia-se o Estado como dono do cargo e, nessa qualidade, o Poder Público o vendia ao particular interessado em ser empregado da Administração. O modelo transformou o cargo público em objeto de valor econômico e foi usado como fonte de receita. Apresentava inúmeros inconvenientes, dentre os quais se destaca o fato de assegurar os postos públicos aos mais ricos e não aos mais capazes, o que comprometia a eficiência dos serviços. A isso se acresce os problemas da transmissão hereditária que também viabilizava a má prestação dos serviços, pois o herdeiro varão nem sempre era detentor da mesma capacidade e comprometimento do antecessor que comprara o cargo. A delegação das atividades a terceiros, sem qualquer controle público, afastava o mínimo de segurança no tocante à realização eficiente das funções.
Na Idade Média, não só a sucessão hereditária afigurou-se como mecanismo de ingresso no serviço público, mas também o arrendamento foi usado pelo Estado como mecanismo para
16 MAIA, Márcio Barbosa; qUEIROz, Ronaldo Pinheiro. O regime jurídico do concurso público e o seu controle jurisdicional. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 3-6.
GASPARINI, Diogenes. Concurso público — imposição constitucional e operacionalização In: MOTTA, Fabrício (Coord.). Concurso público e constituição. Belo Horizonte: Fórum, 2007, p. 13-16.
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ceder os cargos públicos a terceiros. No caso do arrendamento, os particulares não adquiriam o cargo como no sistema de compra e venda, nem o tinham definitivamente incorporado em seu patrimônio por força de sucessão hereditária. Nesse outro sistema, alugava-se o cargo por prazo determinado, mediante uma contrapartida pecuniária. Também aqui identifica-se que o cargo público converte-se em mercadoria, com todos os inconvenientes inerentes a esse modelo.
No tocante à designação por uma autoridade governamental de alguém para ocupar um cargo público sem interferência de outro poder, a doutrina qualificou o ato como nomeação absoluta. Os riscos de arbítrio, clientelismo e favoritismos indevidos afiguravam-se manifestos na espécie. No caso de a nomeação depender do cumprimento de determinadas exigências legais, com sujeição ao crivo de outra autoridade ou poder, tem-se a denominada nomeação condicionada, ainda hoje presente na realidade administrativa. Assim ocorre, por exemplo, com a nomeação dos Ministros do Supremo Tribunal Federal ou com a designação dos dirigentes das agências reguladoras, ambos atos de competência do Presidente da República, após crivo do Congresso Nacional.
No Brasil, a eleição direta pelos cidadãos não é utilizada para a escolha de servidores públicos integrantes do quadro da Administração. Restringe-se como mecanismo de escolha de alguns agentes políticos que exercerão mandatos, no exercício de função de governo. Em algumas atividades administrativas, a doutrina indica a escolha mediante eleição indireta, como no caso da eleição do reitor de uma universidade, advertindo para o entendimento jurisprudencial de inconstitucionalidade da norma que rege a matéria.
Nesse contexto, não há dúvida que o concurso público apresenta-se como a melhor forma de
recrutamento de agentes. Como elucida Diogenes Gasparini, ao concluir a retrospectiva histórica,
o concurso público sobressai-se como o processo de recrutamento menos inconveniente,
na medida em que não constitui um sistema meramente aleatório como o sorteio; não trata o cargo público como objeto mercantil ou de sucessão hereditária, como o arrendamento, a compra e venda e a herança; não adota como critério de escolha do agente público a valoração puramente discricionária e de natureza eminentemente político-econômica, como a livre nomeação e a eleição.17
Além dessas vantagens, é certo que o concurso público é um espaço aberto à sociedade que
viabiliza integração nos quadros do Estado, donde se conclui tratar-se de um instrumento de
concretização do princípio democrático. Com efeito, o concurso admite a inserção de novos
atores sociais que podem ser provenientes da classe média ou das camadas mais pobres da
população, o que resultará em mobilidade social pelo critério merecimento. Principalmente o
concurso viabiliza a participação dos cidadãos na expressão da vontade pública, o que torna
realidade na própria estrutura do Estado a multiplicidade típica do mundo pós-moderno18. 17 GASPARINI, op. cit., p. 6.
18 Cármen Lúcia Antunes Rocha assevera que o próprio princípio republicano atrai a participação dos cidadãos: “Assim, não se podem prover cargos públicos sem a sua oferta a todos os cidadãos, aos quais se garanta o direito de aceder a eles desde que
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Ademais, exclui critérios subjetivos irrelevantes para a Administração e enseja que sejam privilegiados elementos objetivos com base em que o Poder Público selecionará o profissional que de fato é capaz de atender as necessidades estatais.19 Com isso, reduzem-se os riscos de discriminações ilícitas, dos apadrinhamentos clientelistas que ocorrem através de indicações exclusivamente políticas. Combate-se a cultura do empreguismo e do exercício de cargo como um favor que merece retribuição política. Busca-se uma blindagem em face dos chamados trens da alegria, ainda comuns na realidade administrativa contemporânea.20 Evitam-se critérios desproporcionais que significam favores e privilégios de alguns interessados em desfavor de outros candidatos, muitas vezes mais capacitados para o exercício da função pública. quando se assegura competitividade efetiva em um procedimento idôneo, permite-se que a escolha da Administração se dê conforme o paradigma do mérito, com apuração objetiva do merecimento. Nesse contexto, a igualdade real deixa de ser um discurso teórico e se torna uma norma concretizável no cotidiano jurídico do Estado. É Adilson Abreu Dallari quem pontua:
O concurso público somente interessa aos fracos, aos desprotegidos, àqueles que não contam com o amparo dos poderosos capazes de conseguir cargos ou empregos sem maiores esforços. A realização de concursos públicos sempre terá uma forte oposição daqueles que dispõem de meios para prover cargos e funções por outros meios.21
Sob essa perspectiva, o concurso público não apenas densifica, mas concretiza princípios como
a moralidade, igualdade, eficiência e impessoalidade, na medida em que instala uma disputa
aberta aos interessados que preencham as condições mínimas ao exercício da função estatal.
Nessa competição, o objetivo é afastar pessoas despreparadas e admitir a integração daqueles
profissionais que demonstram melhores condições para a atividade administrativa. Para tanto,
o Estado avalia o conhecimento dos candidatos e suas aptidões pessoais, de modo a selecionar
aqueles que podem melhor exercer as competências públicas.
Não se trata, à obviedade, de um mecanismo imune a falhas ou necessidade de aperfeiçoamento.
Ao contrário, a complexidade inerente ao procedimento exige que sejam identificados os
riscos de vícios, a fim de que possam ser superados mediante adoção de elementos técnicos
que concretizem as vantagens, excluídas eventuais ilicitudes. O desafio consiste exatamente
cumpridas as condições legais determinadas e necessárias para o seu bom desempenho, em benefício do interesse público. [...] Sendo a res publica, ao povo (público) compete participar da estrutura que realiza os interesses da coletividade.” (ROCHA, Cár-men Lúcia Antunes. Princípios constitucionais dos servidores públicos, op. cit. p. 147).
19 “O concurso público é o procedimento administrativo que tem por fim aferir as aptidões pessoais e selecionar os melhores candi-datos ao provimento de cargos e funções públicas. Na aferição pessoal o Estado verifica a capacidade intelectual, física e psíquica dos interessados em ocupar funções públicas, e no aspecto seletivo, são escolhidos aqueles que ultrapassam as barreiras opostas no procedimento.” (Apelação Cível n. 1.0313.09.274012-2/001, rel. Des. Dárcio Lopardi Mendes, TJMG, DJMG de 12/01/2010)
20 O TRF da 4a Região já assentou que “A realização de concurso público impõe-se como forma de evitar a prática de condutas que, além de violar o princípio da impessoalidade, violam a própria moralidade administrativa, dando ensejo à condenável prática do nepotismo.” (Agravo de Instrumento n. 2008.04.00.031721-3-RS, rel. Des. Alexandre Gonçalves Lippel, 4a Turma do TRF da 4ª Região, D.E. de 13/07/2009).
21 DALLARI, Adilson Abreu. Princípio da isonomia e concursos públicos. In: MOTTA, Fabrício (Coord.). Concurso público e constitui-ção. Belo Horizonte: Fórum, 2007, p. 88.
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em alcançar os objetivos do instituto (tratamento isonômico, seleção dos profissionais mais
aptos), com observância de normas principiológicas como devido processo legal, supremacia do
interesse público, proporcionalidade, verdade material, dentre outros integrantes do regime
jurídico administrativo. Independentemente da monta que tal desafio representa, afigura-se
irrepreensível a conclusão do professor Romeu Felipe Bacellar Filho:
Se o concurso público não é, segundo pensam alguns, a melhor forma de recrutamento de pessoal para a Administração Pública, representa, seguramente, a melhor opção até agora concebida, possibilitando, seu democrático procedimento, a todos que reúnam as condições exigidas ampla participação na competição.22
Com efeito, se é verdade que a escolha dos melhores candidatos nem sempre coincide com o
provimento acertado de bons servidores públicos, não há dúvida que tem-se o concurso público
como ferramenta indispensável para o início da profissionalização, donde resulta clara a importância
de ser aprimorado e a necessidade de o conjugá-lo com outros mecanismos que irão assegurar o
desenvolvimento do mérito potencial, como a avaliação de desempenho, a promoção na carreira.23
A efetiva compreensão da relevância e essencialidade do concurso público impedirá o crescimento
dos mais diversos meios de burla à sua exigência. A doutrina vem destacando as criativas formas
usadas para se afastar a regra do art. 37, II, da Constituição: a) terceirizações ilícitas de mão de
obra e inclusão direta em folha de pagamento por serviços prestados, em razão de determinação
verbal de autoridade pública, atraindo os termos do Enunciado 363 do TST; b) desvirtuamento
do contrato de estágio que, celebrado sem processo de seleção, incorpora estagiário para suprir
deficiência de pessoal da Administração, com exercício de competências próprias de servidores;
c) desvirtuamento do cooperativismo cuja estrutura passa a ser utilizada para intermediar
contratação de mão de obra pelo Poder Público, com flagrante prejuízo dos trabalhadores
cujos direitos são recusados ao argumento de que se trata de cooperados; d) desvirtuamento
de cargos comissionados e funções comissionadas que, em vez de se referir a atribuições de
direção, chefia e assessoramento, abrangem competências técnicas permanentes das pessoas
administrativas; e) celebração de convênios com associações comunitárias, uso de projetos
sociais como Bolsa Trabalho ou de trabalho voluntário remunerado (regulado pela Lei Federal
n. 9.608/98) para incorporar agentes encarregados do exercício de competências rotineiras dos
órgãos e entidades administrativas, sem a satisfação dos pressupostos específicos a cada uma
das figuras; f) contratações temporárias abusivas que inobservam as exigências do art. 37, IX,
da Constituição da República; g) formas de provimento derivado inadmitidas após a Constituição
de 1988, porquanto não excepcionadas no texto constitucional da regra estabelecida no inciso
22 BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. O concurso público e o processo administrativo. In: MOTTA, Fabrício (Coord.). Concurso público e constituição. Belo Horizonte: Fórum, 2007, p. 73.
23 SILVEIRA, Raquel Dias. Profissionalização da função pública. Belo Horizonte: Fórum, 2009, p. 113-114.
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II, do art. 37; h) realização de concursos de fachada ou viciados com fraudes diversas, muitas
vezes realizados com quebra de sigilo ou com o intuito exclusivo de regularizar situações ilegais
pregressas; i) anulação de concurso sob o pretexto de ilegalidade em situações nas quais vício algum
encontra-se presente ou não nomeação dos aprovados nos certames, sem qualquer justificativa
capaz de amparar a inércia estatal; j) contratação administrativa de atividades públicas inseridas
em atribuições afetas a cargos e empregos públicos, ausente qualquer excepcionalidade que a
justifique24; l) atribuição de efetividade, por lei, a servidores admitidos sem concurso público, ao
argumento de que a segurança jurídica justifica sua permanência nos quadros da Administração,25
mesmo diante de clara inconstitucionalidade originária do vínculo; m) descumprimento da regra
segundo a qual representação judicial e consultoria dos entes públicos deve ocorrer por meio
de advogados públicos admitidos mediante concurso, titulares de cargos de provimento efetivo
organizados em carreira, de modo que possam, em cada caso, analisar os subsídios técnicos que
lhes sejam apresentados e aviar o pronunciamento competente sobre a matéria.
Sobre os dois últimos itens, cabem ponderações específicas que elucidem os seus contornos e
habituais equívocos. Em se considerando que os cargos públicos são criados por lei, dotados
intrinsecamente da ideia de permanência no seu exercício, clara é a diversidade do regime
jurídico daqueles que o exercem em relação àqueles que foram contratados pelo regime da CLT
ou temporariamente, para atendimento de necessidade de excepcional interesse público.
A efetividade, antes e depois de 1988, é a situação jurídica daqueles servidores que titularizam
cargos cujo provimento condiciona-se à prévia aprovação em concurso público. Portanto, é
inconstitucional, em qualquer época, a absorção, enquadramento ou transposição do regime
celetista ou temporário para o regime estatutário por emenda, lei ou decreto contrário à Lei
Maior. Afinal, os institutos da estabilidade e efetividade não se confundem e a efetividade
somente é adquirida mediante aprovação em concurso26, sendo vedada a sua atribuição por lei27,
por decreto ou por qualquer outro mecanismo que não o êxito em regular seleção pública.28
Os Tribunais, em diversas oportunidades, têm afastado a vigência de dispositivos das Constituições
Estaduais e das Leis Orgânicas Municipais que outorgaram efetividade após certame seletivo interno.
Isso porque está o legislador limitado à ordem constitucional vigente, devendo obedecer aos princípios
e regras preestabelecidos na Constituição da República. Não se ignore que o provimento de cargo
efetivo dar-se-á mediante aprovação prévia em concurso público, em que devem ser estabelecidos 24 SOARES, Evanna. Percalços na implementação do concurso público. Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 2253, 1/set./2009. Dis-
ponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=13424>. Acesso em: 08/maio/2010.
25 RMS n. 25.652-PB, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 5a Turma do STJ, DJe de 13/10/2008.
26 RE n. 181.883-CE, rel. Min. Maurício Correa, 2a Turma do STF, DJU de 27/02/98, p. 18.
27 ADI n. 2.433-RN, rel. Ministro Maurício Corrêa, STF, Informativo do STF, n. 238.
28 Apelação Cível n. 1998.01.00.048843-7, rel. Juiz João Carlos Mayer Soares, 1a Turma Suplementar do TRF 1ª Região, DJU de 10/04/2003, p. 66. No mesmo sentido, confira-se: ROMS n. 14.806-RO, rel. Min. Gilson Dipp, 5a Turma do STJ, DJU de 02/08/2004, p. 421; ADI 106-RO, rel. p/ acórdão Min. Gilmar Mendes, 10/10/2002, Informativo do STF, n. 285, e ADI 1.573-SC, rel. Min. Sydney Sanches, Plenário do STF, Informativo do STF, n. 297.
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critérios objetivos, visando, assim, a proteger a moralidade administrativa, ao evitar-se a concessão
de privilégios a alguns agentes, em detrimento de outros. A finalidade do concurso é viabilizar que,
em cada caso, se perquira os requisitos normativos do ordenamento fixados de acordo com a natureza
e complexidade da função a ser exercida, atendidos os princípios constitucionais de regência. Não
pode haver privilégios, nem mesmo em favor de agentes que tenham vínculos anteriores firmados
sem a necessidade de realização de certame seletivo.29 É imperioso oferecer igual oportunidade de
acesso a todos os eventuais interessados que demonstrem a aptidão necessária para o exercício de
cargos efetivos, garantindo-se, presumivelmente, nos específicos concursos públicos, a admissão do
melhor servidor para o exercício das novas funções.
Tais premissas também devem ser observadas quando se analisa o modo de estruturação da advocacia
pública no país. O art. 131 da Constituição foi expresso ao determinar que a Advocacia-Geral da União
é quem representa a União, judicial e extrajudicialmente, tendo sido editada a Orientação Normativa
AGU n. 28, de 09 abril de 2009, que consagrou a exclusividade das atividades de consultoria jurídica e
assessoramento no Poder Executivo Federal aos membros da AGU. O § 2° do art. 131 da CR estabelece
que “O ingresso nas classes iniciais das carreiras da instituição [...] far-se-á mediante concurso público
de provas e títulos”. Decorre da literalidade do art. 132 da CR que a advocacia pública dos Estados-
membros se dará por procuradores organizados em carreira, admitidos na carreira por concurso
público de provas e títulos (forma de provimento inerente aos cargos públicos de provimento efetivo),
que exercerão a representação judicial e a consultoria jurídica do Estado.
É dever irrenunciável observar o que fixaram os arts. 131 e 132 da CR. Não se admite que sejam previstas
formas insuficientes de realização das prescrições constitucionais e legais ou que sejam arbitrariamente
criados mecanismos diversos de satisfação das regras vigentes. Tem-se o dever de normatizar e agir
com suficiência para concretizar os ditames constitucionais. Qualquer omissão administrativa afigura-se,
pois, violadora do dever de agir proporcional. qualquer normatização contrária ao que determina regra
constitucional expressa mostra-se viciada, merecendo repúdio imediato as tentativas de manipulação
infraconstitucionais. qualquer pessoa, para realizar uma dada atividade em nome de ente federativo
ou entidade administrativa, precisa demonstrar que, nos termos das normas constitucionais e legais,
poderia estar investida da autoridade necessária à sua realização.
Especificamente sobre a previsão de competências de representação judicial e consultoria
jurídica das pessoas públicas, manifesta é a inconstitucionalidade das regras que não guardam
correspondência com o texto da Constituição da República, quando a isto estavam obrigadas,
seja em razão do princípio da simetria, seja em razão de determinação expressa na CR. Não
se admitem contratos administrativos cujos objetos sejam a representação judicial e atividade
de consultoria, ainda que não se ignore a possibilidade de haver situações excepcionais no
29 RE n. 148.113-PA, rel. Min. Moreira Alves, DJU de 01/12/95, p. 41.687 e ADI n. 248-RJ, rel. Min. Celso de Mello, DJU de 08/04/94). No mesmo sentido: ADI-MC n. 1.350, rel. Min. Celso de Mello, DJU de 06/09/96 e ADI-MC n. 1.251, rel. Min. Celso de Mello, DJU de 22/09/95.
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cotidiano da advocacia pública que, em determinados momentos históricos, exigem soluções
específicas. Tais situações devem ser tratadas com a natureza que lhes é própria: a de exceção.
E exceção pertinente a um determinado momento institucional do órgão, com a transitoriedade
inerente ao tipo de realidade em questão. Afinal, trata-se do exercício de competências típicas
do Estado, inadequadas para transferência ao mercado por via contratual, mormente se há
regra que exige provimento de cargo público após aprovação em concurso, em cujas atribuições
inserem-se as atividades cuja contratação pretende-se junto ao setor privado.
No tocante aos cargos comissionados cujas atribuições sejam equivalentes às dos cargos efetivos de
advogados públicos, tem-se a sua inconstitucionalidade. A viabilidade estabelecida na regra geral do
art. 37, V, da Constituição de que a atividade de assessoramento se realize por meio de servidores
providos em cargos comissionados não prevalece na seara do assessoramento jurídico. Isso porque a
assessoria e consultoria jurídicas foram preceituadas em normas específicas do texto constitucional
(arts. 131 e 132 da CR). É regra de hermenêutica basilar aquela segundo a qual normas específicas
prevalecem sobre normas gerais estabelecidas em um diploma de mesma hierarquia. Assim sendo,
as regras dos arts. 131 e 132 da CR, específicas para o assessoramento e consultoria jurídicas,
prevalecem sobre a norma geral do art. 37, V, da CR, que se refere ao assessoramento em todas as
searas, viabilizando-o por meio de cargos comissionados e funções gratificadas. A predominância
dos arts. 131 e 132 da CR conduz à exclusividade em favor da advocacia pública institucionalizada,
cujos quadros sejam compostos mediante concurso público regular.
Não há dúvida que a advocacia pública deve ser exercida exclusivamente por efetivos aprovados
em regular concurso público. O entendimento jurisprudencial prevalecente sobre a questão é
de que os únicos cargos que podem ser ocupados por comissionados são o de chefia (se a lei
estadual não prever que seja da carreira) e seu substituto. Os demais cargos são obrigatoriamente
privativos de procuradores públicos. Não foi em outro sentido o inteiro teor do parecer exarado
pelo MPF na ADI n. 4.261 interposta pela associação (ANAPE) em defesa da exclusividade da
carreira no exercício da advocacia pública. Citam-se, ainda, as decisões proferidas nas ADIs n.
159, 881, 1.679, 2.581, 2.682 pelo Supremo Tribunal Federal.
A interrupção de comportamentos múltiplos e reiterados que demonstram recalcitrância em
tornar concreta a exigência do concurso público em diversas searas, inclusive de natureza
jurídica, depende de convencimento a propósito da regra do art. 37, II, da Constituição da
República, das normas legais que regulam o instituto em cada esfera da federação, bem como
dos princípios constitucionais expressos e implícitos. O fato de o concurso ser um procedimento
que dificulta hábitos nepotistas arraigados na cultura administrativa e se mostrar como um
caminho ao final de que bons servidores podem se integrar ao quadro de agentes públicos
corrobora a necessidade de torná-lo prática corriqueira e escorreita no Estado, ensejando a
indispensável profissionalização técnica da Administração.
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3 Requisitos exigíveis no concurso público: reserva legal, discricionariedade administrativa e proporcionalidade
Considerando-se que o concurso público é o procedimento pelo qual a Administração afere
as aptidões dos interessados em integrar seu quadro de servidores ou empregados públicos,
é certo que as exigências editalícias são lícitas apenas se viabilizam esse legítimo propósito
seletivo. É inadmissível que sejam impostos requisitos que não possuam qualquer relação com
as atribuições estatais em questão. Daí porque se afirma que os requisitos devem se mostrar
necessários enquanto instrumentos de escolha dos candidatos, sendo clara a sintonia com as
atividades do cargo ou emprego público.
No ordenamento brasileiro, tem-se a imposição do princípio da reserva legal relativa, donde se infere
que, originariamente, qualquer restrição ou prerrogativa precisa estar veiculada em lei. Aplicando-
se tal premissa aos concursos públicos, pode-se concluir que a exigência de requisitos aptos a excluir
determinados candidatos e manter outros no certame deve estar fixada em norma legal. Isso porque
trata-se de uma inovação primária que implica imposição de limites na esfera subjetiva individual dos
interessados, além de regular a atuação administrativa. Consequentemente, é indispensável que a
sua previsão originária não conste exclusivamente de atos normativos e concretos da Administração
Pública, mas seja oriunda da vontade exteriorizada pelo Poder Legislativo, no exercício da sua
função típica. Se é certo que a Constituição remete à lei, o estabelecimento dos requisitos de
acesso ao cargo, emprego e função pública, “todo brasileiro tem o direito de aceder ao cargo,
emprego ou função pública, somente a lei pode limitar, condicionar ou restringir o exercício deste
direito”.30 A lei deve ser editada conforme a distribuição constitucional de competências legislativas.
Os arts. 1°, 18, 25 e 30 da CR evidenciam a autonomia política dos entes federativos, donde se
resulta a competência preliminar de cada pessoa federativa para editar leis próprias que regerão
os respectivos certames seletivos. No entanto, é certo que determinadas matérias sujeitam-se à
competência de um único ente, em razão de expressa norma constitucional que assim estabelece.31
O fundamental, em cada caso, é que sejam respeitados os limites da distribuição de competência
legislativa levada a efeito pelo texto constitucional.
Parte da doutrina elucida que decorre da própria redação do art. 37, I, da Constituição, o
condicionamento do acesso aos cargos públicos à satisfação dos requisitos legais. Ao comentar o
citado dispositivo, Cármen Lúcia Antunes Rocha pontua que, ressalvada a Constituição de 1937,
tem-se no constitucionalismo brasileiro a garantia de que somente lei formal, elaborada pelo
Legislativo segundo o processo previsto na CR, poderia ser fonte de condicionamento do acesso ao 30 ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais dos servidores públicos, op. cit., p. 420.
31 Atentando para tal especificidade, o TRF da 4a Região já assentou a necessidade de cumprir não somente o disposto nos arts. 22, XVI, e 37, I, da CF, no sentido de que cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requi-sitos estabelecidos em lei, mas também de observar “a competência privativa da União para legislar sobre as condições para o exercício de profissões”. (Apelação/Reexame Necessário n. 2009.70.01.003196-5, rel. Des. Maria Lúcia Luz Leiria, 3ª Turma do TRF da 4ª Região, D.E. de 10/02/2010)
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cargo, emprego ou função pública. “Ato administrativo, ainda que de natureza normativa, não serve
à observância do ditame constitucional, por não se confundir com a espécie lei.”32 A advertência
dá-se relativamente à intolerância de que um diploma legal se omita em impor determinada
exigência, delegando ao edital a possibilidade de regular a matéria em sua integralidade.33
Embora seja certo que a previsão originária deva estar veiculada em lei, se um determinado
requisito nela está consagrado, tem-se como admissível que o órgão ou autoridade competente
exerça poder regulamentar ou regulatório, nos estritos limites da normatização técnica cabível
na espécie. Assim têm atuado órgãos como o Conselho Nacional de Justiça, ao editar a Resolução
n. 75, de 12/05/2009, e o Conselho Nacional do Ministério Público, ao editar a Resolução n. 40,
de 26/05/2009. Não se olvide de regulamentos como o veiculado no Decreto Federal n. 6.944, de
21/08/2009, que buscou padronizar o procedimento dos concursos públicos no âmbito federal.
O fundamental é que o órgão ou a autoridade que exerce o poder regulamentar ou regulatório
aja com fundamento em regra que lhe outorgue competência para tanto e detalhe os requisitos
estipulados em norma aprovada pelo Poder Legislativo. O fenômeno da deslegalização não admite
que o Parlamento transfira todo o poder normativo do Estado para o chefe do Executivo e demais
autoridades administrativas, mas permite que o detalhamento técnico de requisitos legais ocorra
na esfera do poder regulamentar e regulatório. Assim sendo, excluída a instituição de exigências
não consagradas previamente em regra legal, admite-se o tratamento técnico da matéria em sede
normativa de natureza administrativa. Por isso, é legítimo, por exemplo, que uma lei preveja a
necessidade de realização de teste de aptidão física (para um cargo no qual vigor e força são
essenciais) e que o edital fixe os mecanismos por meio dos quais essa avaliação ocorrerá, bem
como a composição das bancas encarregadas do exame e o procedimento a ser observado na
espécie. A lei inova primariamente quando impõe o requisito da aptidão física. O edital regula a
matéria tecnicamente quando operacionaliza a aferição do requisito legal. Respeita-se a inovação
como atributo legal e se autoriza a pormenorização discricionária pela Administração.34
Assim sendo, denota-se que os requisitos exigidos no concurso público sujeitam-se à previsão legal
originária35, bem como admitem normatização técnica de natureza administrativa pelos órgãos e
autoridades competentes. A dificuldade em definir, em cada caso, os limites da fixação primária na lei,
e, da pormenorização discricionária pela Administração, encontrará mais um subsídio importante na
32 ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais dos servidores públicos. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 158-159.
33 “É válida a limitação de idade em concurso público para ingresso às Forças Armadas, desde que prevista em lei em sentido formal. Precedentes.” (Ag. Regimental no REsp n. 748.271-RS, rel. Min. Laurita Vaz, 5ª Turma do STJ, DJe de 09/02/2009) Nesse mesmo sentido: REsp n. 1.067.538-RS, rel. Min. Jorge Mussi, 5a Turma do STJ, DJe de 03/08/2009.
34 “A definição dos critérios utilizados para se alcançar o perfil do candidato, de acordo com as atividades que serão exercidas, é feita de forma discricionária pela Administração, que, com base na oportunidade e conveniência do momento, estabelece as diretrizes a serem seguidas na escolha dos candidatos.” (RMS n. 24.940-PE, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 5a Turma do STJ, DJe de 20/10/2008).
35 “Pode o legislador, observado o princípio da razoabilidade, estabelecer requisitos para a investidura em cargo, emprego ou função.” (ADI n. 1.326-SC, rel. Min. Carlos Velloso, DJU de 26/09/1997, p. 47.475).
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decisão a ser exarada pelo Pleno do Supremo Tribunal Federal na Repercussão Geral no RE n. 600.885-
RS.36 Esclareça-se, contudo, que a Corte Suprema já admitiu a possibilidade de a lei reservar à norma
infralegal o detalhamento de requisitos do cargo.37 Também os demais Tribunais vêm assentando não
ser adequado pretender que toda a normatização dos requisitos do concurso esteja fixada em lei em
sentido formal, sob pena de se tornar impossível ao Poder Público reger os seus concursos.38
Em todas as esferas, os requisitos legais devem guardar correspondência com a natureza das
atribuições inerentes ao cargo ou emprego público a que se referem. Trata-se da observância
do princípio da proporcionalidade, o qual exige critérios seletivos adequados, necessários e
proporcionais em sentido estrito.
Há adequação quando uma determinada medida consiste no meio certo para levar à finalidade
almejada. Os meios utilizados pelo Estado devem ser próprios em face do fim público perseguido
na espécie. Sendo assim, não se pode exigir uma característica de um candidato quando aquele
aspecto não é meio de selecionar o melhor profissional de que a Administração necessita. Se a
exigência é casuística, arbitrária e desvirtuada do fim público que se deve alcançar, clara é a
inadequação do critério discriminatório imposto pela Administração.
Não se trata de aferir se o requisito é o menos oneroso ou se há equilíbrio entre os custos
(exclusão de determinados) e os benefícios (administrativos) que lhe são intrínsecos. Aqui,
analisa-se se o meio — critério discriminatório capaz de excluir ou manter candidatos no certame
—, ou não, próprio para levar o Estado à finali dade pretendida. Se houver inadequação absoluta,
ou seja, se o requisito não conduzir de modo algum ao resultado buscado que é a seleção de um
profissional adequado, o critério editalício é desproporcional. Assim ocorre se, por exemplo, em
um concurso para bibliotecária de uma escola pública, a Administração exige que os candidatos
submetam-se a teste de força e resistência física. Já em situações diversas, se a análise do
requisito viabiliza de alguma forma que o fim seja alcançado, tem-se presente a adequação.
É o que se tem quando o mesmo teste de aptidão física é exigido para o provimento de cargos
policiais, cujas atribuições exigem um mínimo de vigor, força e resistência.
36 Discute-se no RE n. 600.885-RS se a lei pode atribuir, ou não, ao edital de concurso a definição de requisitos essenciais ao exercício do cargo. Em 25/03/2010, pediu vista o Ministro Ricardo Lewandowski, após a Ministra Relatora Cármen Lúcia negar provimento ao recurso da União e o Ministro Dias Toffoli dar-lhe provimento.
37 “A Lei n. 9.421/96 deixa à definição dos tribunais a distribuição dos cargos de analista, sem impor a admissibilidade de todo e qualquer diploma de curso superior. A exigência de certa especialidade é estabelecida ante as necessidades da Corte, ob-servado o que previsto na lei que haja criado tais cargos.” (RMS n. 25.294-DF, rel. Min. Marco Aurélio, 1a Turma do STF, DJE de 18/12/2008).
38 “Firme-se a suficiência da clara exigência em observância ao princípio da legalidade dos atos administrativos, caput daquele mesmo art. 37, evidentemente para a qual não sendo único a veicular suas disciplinas, o diploma de lei estrito senso, nem aqui colhendo teria ditado a mesma Carta da Nação, inciso X, de seu art. 142, somente a lei prescreveria sobre os requisitos ao con-curso público, ali repousando mensagem diversa, a cuidar do ingresso em sentido de investidura e demais atos dali por diante, pena de se impedir ao Poder Público reger seus concursos segundo critérios como o em foco, suficientemente normatizado, em plano infralegal, assim em consonância com o vigente Texto Supremo, como destacado. Sem qualquer sentido obrigar-se a parte agravante a admitir em seus quadros figura — tão merecedora, registre-se, do elementar respeito, que a todos mortais endere-çável, por certo — que objetivamente não atende a elemento formador que de efetiva relevância, ao cargo em tela, a estatura. Precedentes.” (Agravo de Instrumento n. 2007.03.00.082141-3, rel. Juiz Convocado Silva Neto, 2a Turma do TRF 3a Região, DJF3 de 17/12/2009, p. 240).
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O fato de um requisito ser adequado não é bastante. Além de conduzir minimamente para o fim (juízo
de adequação), é preciso que se faça a exigência mais suave possível, satisfeito o mínimo de que a
Administração necessita. Destarte, é preciso que o Estado, ao optar pelo critério discriminatório,
imponha a menor restrição capaz de levar à seleção do profissional que exerça adequadamente as
atribuições públicas. O ponto a ser identificado refere-se à determinação de qual é o mínimo capaz
de atender a demanda estatal. qual é a menor restrição decorrente de um requisito editalício
que satisfaz a necessidade seletiva do Estado? É esse meio mais suave que se mostra como critério
discriminatório necessário. Além desse limite, tem-se ofensa à proporcionalidade. Com base nesse
raciocínio, entendeu-se, por exemplo, que exigir experiência jurídica mínima de três anos para o
candidato interessado em disputar o cargo de magistrado é a forma mais suave de se assegurar um
mínimo de maturidade e competência na carreira. Não se restringiu excessiva ou desnecessariamente
o direito à participação dos candidatos, mas, ao contrário, foram observados limites proporcionais à
consecução da finalidade pública pretendida.
Por fim, é preciso que se determine a relação custo/benefício do requisito exigido em face do
conjunto de interesses em jogo, de modo a ponderá-la mediante o exame dos eventuais danos e dos
resultados benéficos viáveis na espécie. O que se investiga, portanto, é se o resultado da exigência
editalícia é proporcional à restrição imposta aos interessados no cargo ou emprego público. Em
outras palavras, analisam-se os meios empregados pelo Estado à luz do fim público que justifica
a sua intervenção. Em relação às exigências adequadas e necessárias, tem-se como improvável
que um requisito constranja desproporcionalmente a esfera de um determinado candidato, em se
considerando a necessidade pública primária de formar um quadro minimamente eficiente. Nesse
contexto, se a Administração constrange de modo proporcio nal a esfera jurídica de um candidato
em face do bem comum que assim justifica, não há qualquer vício sob este aspecto.
A proporcionalidade em sentido estrito, portanto, traduz a ponderação que deve haver entre
o gravame imposto (exclusão dos candidatos que não satisfaçam os requisitos exigidos) e o
benefício trazido (formação de um quadro de pessoal capaz de bem exercer as competências
estatais). O que se tem em vista, aqui, é aferir o equilíbrio entre os eventuais danos causados
aos interessados nos cargos ou empregos públicos e as vantagens decorrentes do atingimento
da finalidade pública (seleção adequada dos agentes). Como já se esclareceu, em princípio,
afigura-se razoável a carga coativa que exclui candidatos que não satisfazem as necessidades
públicas e o benefício social presente quando se viabiliza a formação de um competente quadro de
agentes públicos. Não há dúvida de que o grau de importância da promoção do fim (agentes públicos
competentes) justifica a restrição causada por critérios discriminatórios adequados e necessários
(com a exclusão daí decorrente de alguns candidatos).39 A supremacia do interesse social justifica a
39 “Em concurso para o cargo de Médico da rede pública de saúde, existe pertinência lógica entre as atribuições do cargo pretendi-do e a exigência de que os candidatos optassem por uma área de especialização em que deveriam ter residência médica ou título de especialista, ambos no campo escolhido. Tendo em vista que o candidato não demonstrou preencher os requisitos exigidos em edital, inviável a posse no cargo de Médico/Medicina Intensiva.” (REsp n. 1.109.505-RJ, rel. Min. Jorge Mussi, 5a Turma do STJ, DJe de 29/06/2009).
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constrição imposta a eventuais interessados em disputar o concurso. Basta, para tanto, um exame global e contextualizado do comportamento administrativo, de modo a evidenciar que se trata do meio comprovadamente menos danoso e mais equilibrado na espécie.
Nesse contexto, denota-se que a proporcionalidade, nos concursos públicos, sustenta a exigibilidade de requisitos adequados, necessários e que se justificam à luz das necessidades administrativas.40 Justifica a exclusão de exigências formais inócuas, as quais não significam resguardo do interesse público. Com efeito, a interpretação do instrumento convocatório dos certames seletivos não pode levar à exigências anódinas e que não consubstanciam proteção do bem comum.41 Afinal, nenhuma praxe administrativa que não encontra fundamento em dispositivo legal ou em exigência razoável pode levar ao rigorismo de se desclassificar um candidato que deixou de cumprir um formalismo despiciendo à realização da finalidade pública em questão. Caso contrário, ter-se-ia um excesso incompatível com o caráter competitivo do certame e com a necessidade de eficácia na atuação estatal.
Se os requisitos previstos em lei respeitam a exigência da proporcionalidade, é mister que os atos normativos editados pela Administração, como o edital, deles não se afaste, sob pena de nulidade. Afinal, “o edital é um ato administrativo e, como tal, deve jungir-se à lei, sob pena de violação ao princípio da legalidade.”42
4 Requisitos de inscrição e requisitos do cargo público
A doutrina define que requisitos de inscrição são as exigências reclamadas pela Administração
para participação do candidato no concurso público. É requisito de inscrição, portanto, a
exibição da carteira de identidade que viabiliza a identificação do interessado na disputa.
Já os requisitos do cargo dizem respeito à natureza das funções a serem exercidas e não 40 O TRF da 4ª Região, a esse propósito, já assentou que “A imposição de exigências coerentes com a natureza do cargo público a
ser ocupado não fere o princípio da razoabilidade ou da isonomia, antes o prestigia.” (Apelação Cível n. 2005.70.00.016423-9, rel. Des. Marga Inge Barth Tessler, 4a Turma do TRF da 4a Região, D.E. de 03/01/2009).
41 Segundo Weida zancaner, “os concursos públicos que exigirem dos interessados conhecimentos muito mais amplos do que os neces-sários para o exercício da profissão ou atividade em razão das quais foram instituídos devem ser considerados inválidos por desa-tenderem o princípio da proporcionalidade e, consequentemente, o da razoabilidade.” (zANCANER, Weida. O concurso público e os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. In: MOTTA, Fabrício (Coord.). Concurso público e constituição. Belo Horizonte: Fórum, 2007. p. 167). A jurisprudência, em situações semelhantes, vem assentando: “IV — A doutrina e a jurisprudência pátrias são uníssonas no sentido de que o princípio da razoabilidade (proporcionalidade) é elemento componente da juridicidade cometida à Administração Pública. Não se admite que a Administração cumpra a finalidade legal se adota medida discrepante do razoável. Há de se valer, também, dos valores de justiça absorvidos pelo sistema jurídico. Na aplicação de toda e qualquer norma de edital, para que seja esta considerada legal e juridicamente escorreita, imprescindível a observância de adequação racional, reta e justa, a fim de se evitar que, sob o pálio da legalidade estrita, avalize-se a conduta ofensiva aos demais princípios norteadores dos atos da Administração. V — Não se mostra razoável que a Administração imponha condições de caráter eliminatório que desprezem o que o Direito positivo brasileiro vem consagrando em face das diversas situações jurídicas que disciplina: a possibilidade da justificativa fundada em caso fortuito ou força maior.” (Apelação Cível e Reexame Necessário n. 20010110811059, Acórdão n. 172.555, relator Desembargador Wellington Medeiros, 3a Turma Cível do TJDF, julgamento em 10/03/2003, DJ de 21/05/2003 p. 98)
“A comprovação da habilitação profissional tem por finalidade verificar se o candidato possui as competências e habilidades necessá-rias ao adequado desempenho da função, não sendo dado ao Administrador impor restrições indevidas que desbordem da finalidade pretendida pela lei.” (Apelação Cível n. 2008.71.003196-0, rel. Des. Valdemar Capeletti, 4a Turma da 4a Região, DE de 24/08/2009).
42 Apelação em Mandado de Segurança n. 1999.03.99.088131-8, rel. Des. Federal Cotrim Guimarães, 2a Turma do TRF da 3a Região, DJF3 de 12/11/2009, p. 204.
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ao procedimento seletivo levado a efeito pela Administração.43 São requisitos do cargo, por
exemplo, o nível de escolaridade e a idade mínima para o seu exercício.
A propósito do momento em que podem ser exigidos os requisitos de inscrição e os requisitos do
cargo, identificam-se dois posicionamentos a respeito da matéria. A primeira corrente defende
que o candidato deve comprovar os requisitos de inscrição no início do certame e os requisitos
do cargo somente quando, já aprovado, for nomeado. A segunda corrente entende que ambos
os requisitos podem ser exigidos já no momento inicial da inscrição.
Os que sustentam a primeira posição afirmam que, se a Administração exigir requisitos do
cargo no momento da inscrição, estará contrapondo-se ao princípio da ampla acessibilidade.
Isso porque candidatos aptos a comprovar o atendimento de tais exigências ao fim do certame
e que não estão em condições de fazê-lo na fase inicial serão excluídos, reduzindo-se a
competitividade sem qualquer ganho efetivo para o Poder Público. Não haveria, pois, equidade
em exigir habilitação no momento de inscrição, exigência que se qualifica como prematura e
desnecessária. A ideia é da legitimidade de participação daqueles que tenham condições plenas
de exercer o cargo no momento da investidura.
Adotando essa linha de raciocínio, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 266 segundo a
qual “O diploma de habilitação legal para o exercício do cargo deve ser exigido na posse e não
na inscrição para o concurso público.” Também assim entendera a 2ª Turma do STF ao fixar que
“A habilitação legal para o exercício do cargo deve ser exigida no momento da posse.”44 Também
parte da doutrina vem sustentando que requisitos como idade mínima, dentre outros, é condição
de provimento no cargo e não de inscrição no certame.45 Invoca-se que dispositivos legais como o
art. 5°, da Lei Federal n. 8.112 estabelecem requisitos para investidura em cargo público como
nacionalidade brasileira, gozo de direitos políticos, quitação com obrigações militares e eleitorais,
idade mínima de 18 anos, aptidão física e mental. Considerando que os dispositivos tratam de
investidura em cargo público e não de inscrição no concurso, irrazoável exigir a observância dos
requisitos legais dos cargos e dos empregos indistintamente no ato de inscrição dos candidatos.46
Em sentido diverso, tem-se entendimento segundo o qual a Administração Pública não pode
depender de probabilidades, sendo risco significativo admitir a participação de candidatos
43 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 11. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 526.
44 RE n. 184.425-6-RS, rel. Min. Carlos Velloso, 2a Turma do STF, DJU de 12/06/98. Confira-se, ainda: RE n. 423.752-MG, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1a Turma do STF, DJU de 10/09/2004 p. 59 e RMS n. 11.904-MG, rel. Min. Felix Fischer, STJ, julgamento em 13/11/2001.
45 SOUSA, Éder. Concurso público: doutrina & jurisprudência. Belo Horizonte: Del Rey, 2000, p. 66.
46 MAIA, Márcio Barbosa; qUEIROz, Ronaldo Pinheiro. O regime jurídico do concurso público e o seu controle jurisdicional, op. cit., p. 99-100.
Confira-se, ainda: MC n. 15.648-SP, rel. Min. Og Fernandes, 6a Turma do STJ, DJe de 10/05/2010.
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que se inscrevem sem atender os requisitos do cargo. Isso porque tais candidatos, mesmo
se aprovados, estarão impedidos de tomar posse, sendo comum o seu esforço em protelar
o momento da nomeação, o que esvazia a eficiência e coloca em risco a própria segurança
jurídica.47 Ademais, invoca-se que outros interessados podem se abster de atender a convocação
administrativa por não contarem, no momento da inscrição, com os requisitos exigidos, sendo
certo que o resultado do certame poderia ser outro se tivessem pensado na possibilidade de
virem a cumpri-los posteriormente, o que implica significativo gravame à segurança jurídica.48
Adotando o segundo posicionamento, tem-se que o Supremo Tribunal Federal, ao decidir a
ADI n. 1.040-DF, assentou que “a lei pode impor condições para inscrição em concurso público
desde que não sejam desarrazoadas”, sendo legítima a exigência, quando da inscrição, do
requisito objetivo da experiência profissional, indicativo da aquisição de maturidade pessoal.49
Também em idêntico sentido, o entendimento majoritário exarado na ADI n. 3.460-DF quando,
por maioria, o STF fixou que o momento da comprovação do requisito de atividade jurídica
“deve ocorrer na data da inscrição no concurso, de molde a promover maior segurança jurídica
tanto da sociedade quanto dos candidatos”, tendo ficado vencido o Ministro Carlos Britto
segundo quem “a comprovação dos requisitos deve dar-se na data da posse no cargo, tendo em
conta ser o requisito temporal exigido para o ingresso, sinônimo de investidura, na carreira”.50
O entendimento majoritário exarado pelo Supremo Tribunal Federal corresponde à posição já
defendida doutrinariamente pela agora Ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha:
Somente pode ser provido o cargo por alguém em condições de nele investir-se, e as condições para a investidura são examinadas no certame. Daí ter-se entendido, geralmente, que, exigidas as condições para a inscrição, deverão elas ser cumpridas naquela oportunidade. Se omitida uma informação relativa, por exemplo, a determinada habilitação legal, mesmo que não tenha requerido a apresentação de comprovação do seu atendimento pelo interessado, haverá ele de estar quite com aquela exigência, podendo a entidade administrativa considerar nula a inscrição e todos os atos que se lhe seguem se comprovada a carência posteriormente.51
Observe-se que as mencionadas decisões do Supremo Tribunal Federal referiram-se a requisito
específico biênio ou triênio de experiência profissional em se tratando de específica carreira jurídica, 47 SOUSA, Luís Marcelo Cavalcanti de. Controle judiciário dos concursos públicos. São Paulo: Método, 2007, p. 56-57.
48 ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais dos servidores públicos. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 218.
49 No referido julgado o STF considerou legítima a exigência de dois anos de bacharelado para ingresso na carreira do Ministério Público Federal (ADI n. 1.040-DF, rel. orig. Min. Néri da Silveira, rel. p/ acórdão Min. Ellen Gracie, 11/11/2004, Plenário do STF, Informativo do STF, n. 369).
Confira-se, adotando orientação semelhante, a Apelação em Mandado de Segurança n. 2001.61.00.002733-3, rel. Juiz convocado em auxílio Rubens Calixto, 3a Turma do TRF 3a Região, DJF3 09/06/2009.
50 Nesse caso, o STF admitiu a exigência de três anos de atividade jurídica (privativas de bacharel de direito) para o Ministério Público já no momento da inscrição (ADI n. 3.460-DF, rel. Min. Carlos Britto, Pleno do STF, julgada em 31/08/06, Informativo do STF, n. 438).
51 ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais dos servidores públicos. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 217.
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a saber, o Ministério Público. Daí surgirem entendimentos segundo os quais prevaleceria a posição
consagrada no Enunciado n. 266 do STJ, à exceção das hipóteses em que o STF houver manifestado,
expressamente, em sentido diverso.52 A esse propósito, algumas considerações mostram-se cabíveis:
Embora seja certa a necessidade de obediência às decisões do STF a propósito do momento em
que se afigura adequada a exigência de requisitos durante o concurso público, nos casos em
que já transitadas em julgado, pede-se redobrada vênia para dissentir da posição proclamada
pela Corte Suprema. Em princípio, não se mostra razoável que a Administração exija prova, no
início do concurso, de requisitos que, presentes no momento da nomeação, viabilizarão que se
ultime a investidura no cargo. Sempre que cabível, essa comprovação deve ser postergada para o
momento subsequente à nomeação e anterior à posse, com garantia de ampla competitividade e
atendimento tempestivo da necessidade administrativa. Com efeito, o Estado não precisa de um
candidato de concurso que tenha determinado nível de escolaridade ou experiência profissional;
ele necessita de um servidor que atenda tais pressupostos quando do início do exercício do
cargo ou do emprego público. A correção de tal premissa decorre das regras legais vigentes que
não impõem prova dos requisitos para participação nos processos seletivos, mas apenas para o
exercício do cargo. Sendo assim, não há que se falar em discricionariedade da Administração para
escolher o momento em que tal exigência se fará. A regra é que os requisitos do cargo não serão
comprovados quando da inscrição, mas sim após ultimado o concurso, quando da investidura.
O risco de o concurso ser protelado em razão de eventual esforço de candidatos interessados
em cumprir determinados requisitos no futuro é facilmente superável mediante providências
administrativas tomadas pelo Poder Público em defesa da celeridade e da eficiência. Não há
que se falar em risco para a segurança jurídica, uma vez que o Estado pode, em juízo ou na
via administrativa, garantir o andamento tempestivo do certame. quanto à possibilidade de
o resultado do concurso ser diferente, pelo fato de outros candidatos não imaginarem que
poderiam cumprir os requisitos posteriormente, é certo que um edital que já preveja o momento
correto para que se faça essa prova (não a inscrição, mas após a nomeação e antes da posse)
não criará expectativas passíveis de frustração. Isso porque as normas regulatórias do concurso
já disporão sobre o atendimento de requisitos quando da investidura, dispensada comprovação
durante as provas do concurso. qualquer interessado que atentar para a norma editalícia,
52 “2. Consolidou-se nesta Corte (Súmula 266/STJ), bem como no Supremo Tribunal Federal, entendimento segundo o qual, exceto nos concursos para a Magistratura e Ministério Público, por força do disposto na EC 45/2004 (ADI n. 3460/DF, Rel. Min. Carlos Britto, DJ 15/6/2007), o diploma ou habilitação legal para o exercício do cargo deve ser exigido na posse e não na inscrição para o concurso público.” (Ag. Regimental no Ag. de Instrumento n. 959.629-DF, rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6a Turma do STJ, DJe de 18/12/2009).
“Assim, concluiu o Min. Relator não ser aplicável o enunciado da Súmula n. 266-STJ a concursos públicos relativos às carreiras da magistratura (art. 93, I, CF/1988) e do Ministério Público, em vista da interpretação do STF, na ADI n. 3.460-DF, ao disposto no art. 129, § 3°, da CF/1988, o qual se identifica com o teor do art. 93, I, CF/1988. Contudo essa conclusão não implica revisão do enunciado da Súmula. n. 266-STJ em relação a outras carreiras para as quais se deve analisar a legislação infraconstitucional pertinente. Com essas considerações a Seção negou provimento ao recurso.” (RMS n. 21.426-MT, rel. Min. Felix Fischer, STJ, julgamento em 14/02/2007, Informativo do STJ, n. 310).
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saberá que apenas quando da investidura, após findas as provas do concurso, deverá comprovar
os requisitos do cargo, sendo eventual abstenção sua escolha livre e consciente de vontade.
Ausentes evidências de comprometimento da segurança jurídica ou da eficiência, não se vislumbra
qualquer razão para sustentar uma medida (exigir prova dos requisitos do cargo quando da
inscrição no concurso) cujo resultado será principalmente a redução da competitividade e da
própria eficiência do certame, sem qualquer ganho efetivo para a Administração Pública.
Não se ignoram situações peculiares que podem se delinear em searas específicas. Há concursos
para cargos e empregos públicos objeto de grande interesse por centenas e milhares de
candidatos. É comum que se realizem etapas sucessivas de avaliação, sendo impossível avaliar
as provas de todos os candidatos que obtiveram o mínimo na etapa anterior. Assim, não é raro
que num universo de 10.000 candidatos que se submetam à primeira etapa de um concurso
(prova fechada), 2.000 obtenham a aprovação conforme a pontuação mínima fixada no edital.
Diante da inviabilidade de manter os 2.000 candidatos, com correção da respectivas provas,
na segunda fase (prova aberta), pode a Administração estabelecer um número máximo de, por
exemplo, 400 candidatos a serem convocados para a etapa subsequente ou 400 provas a serem
corrigidas pela banca examinadora. Nesses casos, a participação na segunda fase de um número
significativo de candidatos que não tenham condições de cumprir os requisitos do cargo quando
da investidura pode, sim, comprometer a competitividade do certame. Trata-se de um contexto
específico em que se justifica uma providência da Administração capaz de afastar os riscos para
a segurança jurídica e eficiência do certame.
Há quem entenda que a única providência possível seria aferir, já no momento da inscrição,
todos os requisitos do cargo comprováveis de plano, como a experiência profissional, o nível
de escolaridade ou a idade mínima. Em linha de raciocínio diversa, há quem entenda que a
providência adequada seria exigir de todos os candidatos, quando da inscrição, declaração de
que cumprem os pressupostos do cargo. No caso de inveracidade da declaração, objetivamente
aferida pelo órgão competente, a qualquer momento pode ser excluído do certame o candidato.
Afinal, cabe à Administração vetar, nesses casos, a participação do interessado no concurso,
ao verificar a impossibilidade de implemento dos requisitos no período limite para a assunção
do cargo público.53 Em se tratando de declaração falsa, certo é que o candidato, além da
conduta desleal com a Administração, incorreu em crime de falsidade ideológica. O potencial
sancionatório de natureza penal e administrativa em face da sua conduta ilícita implicaria
reduzido risco à segurança jurídica e competitividade do certame, pois os candidatos temeriam
a incidência de penalidades futuras. Obter-se-ia, assim, equilíbrio entre a ampla participação
dos candidatos e a necessidade de segurança jurídica na espécie.53 MAIA, Márcio Barbosa; qUEIROz, Ronaldo Pinheiro. O regime jurídico do concurso público e o seu controle jurisdicional, op. cit., p. 100.
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É Luís Marcelo Cavalcanti de Sousa quem aduz que não se pode admitir como lícita ou moralmente
válida a conduta do candidato que apresenta declaração falsa em concurso público:
Note-se que, nesse caso, o candidato poderá ser eliminado do certame, não apenas porque não atendia aos requisitos, mas também porque poderá ser preso em flagrante pela comissão do concurso, em razão de ter praticado o delito de falsidade ideológica. Não se trata aqui de penalizar o candidato que responde a processo criminal — o que é repelido pelo STF — mas de eliminação de candidato preso em flagrante delito.54
Ainda sobre essa matéria, cumpre atentar para algumas especificidades de determinados concursos,
como aqueles destinados a prover cargos vitalícios de magistrados. Nos termos da Resolução n. 75,
editada pelo CNJ, tem-se a inscrição preliminar (ou provisória) e a definitiva no certame.
A inscrição preliminar é realizada com uma breve lista de documentos e uma declaração do candidato de que é bacharel em Direito, admitindo ainda que, até a inscrição definitiva, atenderá ao requisito de atividade jurídica, apontando possíveis deficiências e aceitando as condições do certame. O momento para efetiva apresentação dos documentos que comprovam as condições do edital é a inscrição definitiva, realizada após a segunda etapa do concurso, preparando os candidatos para a terceira fase. 55
O que se denota é a manifesta condescendência com a exigência de requisitos do cargo quando
da inscrição definitiva, sempre que a última ocorrer nas etapas finais da seleção. Nesses casos,
não é comum discussão sobre a necessidade de se postergar tal juízo para o momento da
investidura, mesmo porque a antecipação da análise encontra fundamento na necessidade de
efetividade do certame, com exclusão de candidatos que, ao final, sequer apresentam condições
de serem empossados. Permanece em questão, entretanto, a situação dos candidatos que não
logram comprovar os requisitos quando da inscrição definitiva, mas podem fazê-lo quando da
nomeação e posse. Pedindo renovadas vênias àqueles que sustentam a legitimidade da exclusão
do interessado nessa hipótese, entende-se irrazoável impedir a investidura de candidato que
obteve aprovação em todas as etapas do certame e, no início do exercício do cargo ou emprego,
terá comprovadamente condições de atender a legislação vigente, malgrado isso ainda não seja
realidade quando da inscrição definitiva.56
54 SOUSA, Luís Marcelo Cavalcanti de. Controle judiciário dos concursos públicos. São Paulo: Método, 2007. p. 60.
55 MARINELLA, Fernanda. Servidores públicos. Niterói: Impetus, 2010, p. 54.
56 Seguindo essa linha de raciocínio, já se encontram alguns julgados: “A exigência de idade mínima é requisito para a investidura no cargo, em face da natureza das atribuições a serem desempenhadas. Entendimento da Súmula 266/STJ. IV — A Lei n. 8.112/90 deve ser aplicada por analogia no caso em tela, porquanto o regime de trabalho dos funcionários da CEF é o da CLT, apesar da exi-gência de concurso público. O art. 5° da referida lei é taxativo ao determinar os requisitos básicos para provimento em emprego público, como o de Técnico Bancário. V — No exercício de suas prerrogativas, o Administrador Público pode dispor validamente das condições e regras que irão regular e determinar a realização do concurso, mas deve respeitar os princípios da legalidade e da proporcionalidade. VI — O edital, ao estabelecer a necessidade de que o candidato, no ato da inscrição, comprove idade míni-ma de 18 (dezoito) anos, contraria o princípio constitucional da isonomia, principalmente porque o fator de discrimen utilizado
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5 Requisitos objetivos e subjetivos do concurso público
A doutrina define os requisitos objetivos como aqueles que guardam pertinência com as funções
do cargo ou emprego (como é o caso da exigência de títulos e provas de conhecimento) e os
requisitos subjetivos como aqueles que dizem respeito à pessoa do candidato (escolaridade,
aptidão psicológica e boa conduta).57
Dentre os requisitos subjetivos, ainda não se encontra posição uníssona que possa ser observada,
indistintamente, nos concursos no que tange a exigências como, altura, sexo, idade e peso.
Primeiramente, cumpre reiterar que qualquer desses critérios só pode ser exigido se a natureza
das atribuições do cargo ou emprego assim justificar. É exatamente a análise das situações
em que se justifica, ou não, uma exigência dessa natureza que enseja controvérsia em cada
hipótese específica. Afinal, nem sempre é clara, objetiva e absoluta a compreensão a propósito
da adequação, necessidade e razoabilidade de um critério discriminatório. A própria análise
sobre a natureza das atribuições do cargo ou do emprego pode estar inserida em um espaço de
discricionariedade que implica liberdade de a Administração eleger uma dada característica
como essencial, ou não, para um cargo ou emprego público. Fixar se o Estado limitou-
se ao espaço discricionário que lhe foi reservado ou se ultrapassou tais fronteiras para agir
arbitrariamente consiste verdadeiro desafio para administradores e controladores da legalidade
estatal. A despeito das dificuldades inerentes à tarefa, impõe-se especificar, em cada contexto,
as razões aptas a justificar, ou não, o estabelecimento editalício de um requisito como condição
para o exercício da função pública em questão.
No tocante à altura, é certa a necessidade de que haja um mínimo de correlação dessa exigência
com a própria função a ser exercida. Para alguns cargos das carreiras policiais civis e militares, a
jurisprudência vem assentando a razoabilidade de o edital prever o requisito da altura. Assim já
ocorreu com cargos de agente de polícia, delegado da policia civil, policiais militares e sargentos
da aeronáutica, hipóteses em que se entendeu legítimo o exame médico antropométrico em que se
avaliou a altura mínima do candidato.58 Já nos casos de serviços técnicos e de natureza burocrática,
é destituído de justificação lógica. VII — Ilegalidade na eliminação do impetrante, porquanto este teve sua inscrição deferida, mesmo tendo dezessete anos à época, e implementou o requisito da idade antes da data de admissão. VIII — Remessa oficial improvida. Apelação improvida.” (Apelação em Mandado de Segurança n. 1999.03.99.067668-1, rel. Desembargadora Federal Regina Costa, 6a Turma do TRF da 3a Região, DJF3 de 30/11/2009, p. 263).
57 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 11. ed., op. cit., p. 525.
58. “Admite-se a fixação de altura mínima, prevista em lei, como condição para o exercício das funções do cargo de Soldado, por se tratar de exigência que guarda correlação com a natureza do cargo.” (Apelação Cível n. 1.0024.08.042927-7/002, rel. Des. Heloisa Combat, 7ª Câmara Cível do TJMG, DJMG de 14/08/2009).
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. INGRESSO NA POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE MINAS GERAIS. EXAMES PRE-LIMINARES DE SAÚDE. ALTURA MÍNIMA. LEGALIDADE. — Dada a natureza do cargo, o importante papel social exercido e os riscos a que o Policial Militar está sujeito, não se pode falar — na esteira do art. 37, II, da Constituição Federal — em ilegalidade ou violação de princípios em razão da exigência de aprovação em exame médico oftalmológico, para aferição de acuidade visual, como con-dição para admissão. — Não ilegalidade em exigir-se, na lei e no edital de seleção de candidatos para o ingresso na Polícia Militar,
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mesmo em se tratando de carreiras policiais, o entendimento é o da inadmissibilidade da exigência,
porquanto ausente característica das atribuições que embasem requerer tal condição.59
Em relação à imposição de limite de idade, um dos parâmetros mais relevantes sobre a matéria
é a Súmula 683 do Supremo Tribunal Federal: “O limite de idade para a inscrição em concurso
público só se legitima em face do art. 7°, XXX, da Constituição, quando possa ser justificado
pela natureza das atribuições do cargo a ser preenchido.” O referido enunciado supera o
entendimento segundo o qual não seria admissível restringir, em razão da idade, inscrição em
concurso para cargo público. O próprio STF havia estipulado tal inadmissibilidade em sede de
ato administrativo na antiga Súmula 14. Atualmente, não remanesce qualquer dúvida quanto
à legitimidade de se exigir que candidatos se enquadrem em determinada faixa etária quando
essa discriminação é razoável em face das atribuições do cargo ou do emprego público. Tal
juízo positivo no tocante à legitimidade de imposição de limites mínimo e máximo já ocorreu no
tocante a cargos do Ministério Público, ao quadro de oficiais do Corpo de Bombeiros Militar, bem
como a cargos das carreiras militares e das Forças Armadas.60 Cumpre observar o entendimento
segundo o qual o ato de emancipação faz cessar a incapacidade relativa e habilita a pessoa para
os atos da vida civil, inclusive posse após regular aprovação em concurso público.61
o exame médico antropométrico no qual se avalia a altura mínima do candidato. — Hipótese na qual o ato de desqualificação da autora-candidata foi legal, pois, esta não possui altura mínima legalmente exigida no edital.” (Apelação Cível n. 1.0702.03.079684-2/001, rel. Des. Alberto Vilas Boas, 1a Câmara Cível do TJMG, DJMG de 22/05/2009)
“MANDADO DE SEGURANÇA — AGRAVO DE INSTRUMENTO — CONCURSO PÚBLICO PARA SARGENTO DA AERONÁUTICA — ESTATURA MÍNI-MA DE 1,55 M A SE SITUAR CONSENTÂNEA COM OS CONTORNOS DO CASO VERTENTE E COM O ORDENAMENTO — AUSENTE DESEJADO DISCRÍMEN — PROVIMENTO AO AGRAVO FAzENDÁRIO. Deve se ter em mira que não se está a se cuidar de burocrático serviço, aqui ou ali exercível, mas do cargo de Sargento da Aeronáutica, função das mais proeminentes e para a qual claramente exigido um mínimo de porte ou estatura física/altura, 1,55 m, inerente aos multifários misteres a tanto correspondentes, público o pertinente edital e portanto inescondível nenhuma a surpresa. Assentada a isonomia na dispensa de tratamento equivalente aos que se encontrem em equânime situação, tanto quanto de diferenciado, aos em situação distinta, caput do art. 5°, Lei Maior, ausente se revela a almejada mácula sobre o dogma em questão, ao contrário, do cenário em tela se extrai sua estrita observância, pois conjugado deve ser tal ângulo com o cargo em disputa por público concurso, por seus peculiares contornos.” (Agravo de Instrumento n. 2007.03.00.082141-3, rel. Juiz Convocado Silva Neto, 2a Turma do TRF 3a Região, DJF3 de 17/12/2009, p. 240).
59. “Concurso público. Altura mínima. Requisito. Tratando-se de concurso para o cargo de escrivão de polícia, mostra-se desarrazo-ada a exigência de altura mínima, dadas as atribuições do cargo, para as quais o fator altura é irrelevante. Precedente (RE 150.455, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 07/05/99).” (RE n. 194.952-MS, rel. Min. Ellen Gracie, 1a Turma do STF, DJU de 11/10/2001, p. 18).
60 “Pode a lei, desde que o faça de modo razoável, estabelecer limites mínimo e máximo de idade para ingresso em funções, emprego e cargos públicos. Interpretação harmônica dos arts. 7°, XXX, 37, I, 39, § 2°, II. – O limite de idade, no caso, para inscrição em concurso público e ingresso na carreira do Ministério Público do Estado de Mato Grosso – vinte e cinco e quarenta e cinco anos – é razoável, portanto não ofensivo à constituição, art. 7°, XXX, ex vi do art. 39, § 2°, III. – Precedentes do STF: RMS 21.033-DF, RTJ 135/958; 21.046; RE 156.404-BA; RE 157.863-DF; RE 175.548-AC; RE 136.237-AC; RE 146.934-PR; RE 156.972-PA. IV. – R.E. conhecido, em parte, e provido na parte conhecida.” (RE n. 184.635-MT, rel. Min. Carlos Velloso, 2a Turma do STF, DJU de 04/05/01, p. 35).
“Não é inconstitucional a imposição de limite máximo de idade para admissão a quadro de oficiais de Corpo de Bombeiros Militar (CF, art. 42, §§ 9° e 11, no texto original).” (RE n. 176.081-RJ, rel. Min. Octávio Gallotti, 1a Turma do STF, DJU de 18/08/2000, p. 93).
“Este Superior Tribunal de Justiça tem concluído pela possibilidade de previsão em edital de limites de idade mínimo e máximo para o ingresso nas carreiras militares, em razão da atividade exercida, desde que haja lei específica determinando a incidência de tal limitação.” (RMS n. 18.759-SC, rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6a Turma do STJ, DJe de 01/07/2009) No mesmo sentido: Ag. Regimental no REsp n. 980.644-RS, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 5a Turma do STJ, DJe de 14/12/2009).
61 “CONCURSO PÚBLICO. REqUISITO DE IDADE. SUPRIMENTO DE INCAPACIDADE RELATIVA. O ato de emancipação, promovido pelos pais, fez cessar a incapacidade relativa da parte impetrante, habilitando-a para prática de todos os atos da vida civil, inclusive, o de tomar posse em cargo, para o qual foi nomeada. Inteligência do art. 5°, parágrafo único, I, da Lei n. 10.406, 10/1/2002. Supri-
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Ainda no tocante aos limites etários, cumpre esclarecer que, para cargos cujas atribuições são de
natureza intelectual, técnica e/ou operacionais, como é o caso das funções de magistério e de fiscalização
tributária, os Pretórios decidem pela inconstitucionalidade de se utilizar tal critério.62 Em alguns casos,
a jurisprudência inclusive determinou que o Poder Público indenizasse os prejuízos de quem se viu
impedido de participar do certame seletivo.63 À obviedade, tal condenação só se afigura possível nas
situações em que houver prova dos elementos necessários à responsabilização civil do Estado.
Um dos aspectos que também merece ser enfrentado refere-se ao disposto no art. 27 da Lei
Federal n. 10.741/03: “Na admissão do idoso em qualquer trabalho ou emprego, é vedada a
discriminação e a fixação de limite máximo de idade, inclusive para concursos, ressalvados os
casos em que a natureza do cargo o exigir.” Não se entende que tal regra pode ser interpretada
como uma proibição genérica e absoluta à fixação de limite máximo etário. Com efeito,
há situações em que as atribuições exigem vigor e características ausentes nas idades mais
avançadas. Do mesmo modo que determinadas funções requerem um mínimo de maturidade
e experiência incompatíveis com a juventude, há outras que exigem força e aptidões já em
declínio com o passar dos anos. Sendo assim, consiste discriminação razoável excluir do
certame candidatos que não satisfazem as condições necessárias ao exercício do cargo ou do
emprego público. Não pode o art. 27 da Lei Federal n. 10.741 ser compreendido, pois, como
uma blindagem impeditiva da fixação de limite máximo etário em todos os concursos públicos.
Nos casos em que se mostrar razoável, é cabível impedir que pessoas acima de determinada
faixa de idade disputem o cargo ou o emprego público em questão.
Denota-se, ainda, que o parágrafo único do art. 27 do referido Estatuto do Idoso prescreve, como
primeiro critério de desempate em concurso público, a idade, dando-se preferência aos candidatos
de idade mais avançada. Não há dúvida de que se trata de dispositivo legal veiculador de uma ação
do o requisito da idade. Inteligência do inc. V do art. 5° da Lei n. 8.112, de 11/12/1990, e do item 5, c, do Edital n. 025/2008.” (Remessa Ex Officio em Ação Cível n. 2009.71.20.000124-0, rel. Desembargador Federal Márcio Antônio Rocha, 5a Turma do TRF da 4a Região, D.E. de 16/11/2009).
62 “RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. IMPOSIÇãO LEGAL DE LIMITE MÁXIMO DE IDADE PARA INGRESSO NA CARREIRA DO MAGISTÉRIO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Fere o princípio constitucional da isonomia a previsão em norma infraconstitucional de limite máximo de idade para ingresso na carreira do magistério. 2. Hipótese não prevista na norma constitucional. Recurso extraordinário conhecido e provido.” (RE n. 212.066-RS, rel. Min. Maurício Corrêa, 2a Turma do STJ, DJU de 12/03/1999, p. 18).
“CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO PARA FISCAL DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. IDADE MÁXIMA DE 35 ANOS PARA INSCRIÇãO. AUSÊNCIA DE PERTINÊNCIA LÓGICA. DISPENSA DA LIMITAÇãO ETÁRIA PARA SERVIDORES OCUPANTES DE CARGOS NOS ÓRGãOS DA ADMINISTRAÇãO FEDERAL DIRETA OU DE AUTARqUIA FEDERAL. VIOLAÇãO AO PRINCÍPIO DA ISONOMIA. PRECEDENTES DESTE TRIBUNAL. APELAÇãO E REMESSA OFICIAL IMPROVIDAS. 1. Limite máximo de 35 anos de idade estabelecido no art. 3° da Lei n. 6.334/76, para inscrição em concurso público para ingresso no cargo de Fiscal de Tributos. Irrazoabilidade da discriminação erigida pela lei, pois não há pertinência lógica entre a exigência de idade máxima de 35 anos e o ingresso na carreira de Fiscal Tributário. 2. A mesma lei, em seu § 4°, traz outra discriminação odiosa, ao dispensar o limite de idade para os servidores de órgãos da Administração federal direta ou de autarquia federal, ferindo de morte o princípio da igualdade. 3. Apelação e remessa oficial improvidas.” (Apelação em Mandado de Segurança n. 94.03.014577-3, rel. Juiz convocado Jairo Pinto, Turma Suplementar da 1a Seção do TRF da 3ª Região, DJF3 de 22/12/2009, p. 27).
63 “CONCURSO PÚBLICO. IDADE MÍNIMA. DANOS MATERIAIS. São devidos danos materiais pela União Federal, por exigir ilicitamente o requisito de idade mínima em edital de concurso público para técnico do Tesouro Nacional, impedindo, dessa forma, a parti-cipação da recorrente na segunda etapa do certame.” (REsp n. 642.008-RS, rel. Min. Castro Meira, 2a Turma do STJ, julgado em 10/08/2004, Informativo do STJ, n. 217).
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afirmativa. Hoje em dia é comum a adoção de técnicas administrativas e legais cujo resultado seja
a inclusão equânime, ou por meio de preferências (por exemplo, reserva de vagas em concursos,
critérios de desempate), ou por meio de políticas de aperfeiçoamento e capacitação (por exemplo,
projetos de formação profissional para popu lação de baixa renda com dificuldade de acesso à
educação). É Leila Pinheiro Bellintani quem invoca as lições do Ministro Joaquim Barbosa, para
definir ações afirmativas como um conjunto de políticas públicas e privadas de caráter compulsório,
facultativo ou voluntário, con cebidas com vistas ao combate da discriminação racial, de gênero, por
deficiência física e de origem nacional, bem como para mitigar os efeitos presentes da discrimi nação
praticada no passado, tendo por objetivo a concretização do ideal de efetiva igualdade de acesso
a bens fundamentais como a educação e o emprego. Com base em tais ponderações, estabelece
as ações afirmativas como mecanismos “que têm por escopo fomentar a igualdade substancial
entre os membros da comunidade que foram socialmente preteridos, valendo-se, para tanto, da
possibilidade de inserir discrimi nações positivas”. Destarte, quando um dispositivo legal fixa como
critério de desempate em concurso público a maior idade dos candidatos, está-se diante de uma
discriminação positiva cujo objetivo é combater uma determinada desigualdade fática indesejada.
Há quem entenda que se trata de regra inconstitucional na medida em que o referido benefício
deveria se assentar em comprovada discriminação negativa anterior. Ou seja, para se privilegiar
os mais idosos nas seleções públicas, seria preciso comprovar que as dificuldades de inserção no
mercado nessa faixa etária são mais acentuadas do que entre os mais jovens e não apenas uma
dificuldade comum a um país ainda com elevados e generalizados índices de desemprego. Sem
o suporte fático — prova da discriminação indevida da categoria a ser beneficiada (o que, no
caso ocorreria mediante evidência da maior exclusão dos mais velhos no mercado de trabalho)
— não haveria sustentáculo para a discriminação positiva (preferência para nomeação em caso
de empate, nos concursos públicos).
Em outro sentido, pontua-se que a mera preferência do art. 27, parágrafo único da Lei Federal
n. 10.741/03 não é técnica capaz de facilitar a inserção dos idosos no mercado de trabalho,
donde resulta a inadequação da medida. Considerando-se que há ofensa à proporcionalidade
sempre que o Estado escolhe, por lei ou por ato administrativo, um meio inapto a conduzir ao
fim desejado, seria inconstitucional a regra legal em comento.
Embora por caminhos diversos, ambos argumentos conduzem à inadmissibilidade da idade
como critério de desempate, privilegiando-se os mais velhos. Seriam ofensivas à isonomia e à
eficiência tanto a regra legal como as normas editalícias nesse sentido. Ademais, invoca-se a
inconstitucionalidade formal do referido projeto de lei, porquanto de iniciativa parlamentar
em contrariedade à competência privativa do Presidente da República na espécie.64
64 SOUSA, Luís Marcelo Cavalcanti de. Controle judiciário dos concursos públicos. São Paulo: Método, 2007, p. 39.
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Denota-se que há significativa tendência de considerar inconstitucional material e formalmente
a ação afirmativa do art. 27 do Estatuto do Idoso. Afirma-se que como o objetivo do concurso
é escolher os melhores candidatos interessados na disputa de cargos e empregos públicos
não se afigura razoável usar a idade mais avançada como critério de desempate. O adequado
seria dar preferência ao concorrente que apresentasse aptidão em aspecto essencial ao cargo,
considerando a natureza das suas atribuições.
É preciso frisar, entretanto, que o princípio que obriga a Administração a escolher os melhores
candidatos e aquele que enseja a preferência dos mais velhos em caso de empate não são
incompatíveis. Ao contrário, vislumbra-se como teoricamente possível que se harmonizem na
formação do conceito da igualdade material próprio em cada realidade específica. O tratamento
diferenciado estabelecido no art. 27, parágrafo único admite, em abstrato, o atendimento do
interesse público primário que está sim presente quando, na formação de um quadro de pessoal
capaz tecnicamente, inserem-se categorias indevidamente excluídas, como os idosos. Em primeiro
plano, não se trata de incorporar agente público com aptidões insuficientes, pois os candidatos
foram aprovados no certame, classificados na mesma posição quando do resultado final. O que está
em questão é, diante de candidatos com igual aptidão, escolher prioritariamente o mais velho.
Ademais, para que a referida escolha preferencial ocorra, é necessário que haja prova induvidosa
de uma discriminação social que atinja mais seriamente os idosos do que, por exemplo, os mais
jovens e ainda inexperientes no mercado de trabalho. Trata-se de um dado concreto que sequer
é aferível a partir de normas jurídicas. Avaliado tal elemento sociológico e havendo prova da
discriminação prévia em desfavor dos mais velhos, a preferência de nomeação dos idosos é meio
capaz de combater a desigualdade preliminar. Afinal, nomear um candidato mais velho e não o
mais novo, estando ambos empatados, é medida que realiza o fim de inserção social dos idosos.
Reitera-se, contudo, que tal tratamento diferenciado apenas não infringirá a Constituição,
em especial o princípio da isonomia, se se mostrar clara a necessidade da ação afirmativa na
espécie. E isso, como já se esclareceu, depende de um juízo técnico a propósito do mercado de
trabalho brasileiro que não resulta do teor das normas jurídicas que tratam da matéria.
Em um Estado Democrático de Direito, no qual é preciso que haja representação da multiplicidade
e garantia de dignidade a todas as parcelas da sociedade, impõe-se que a lei e os comportamentos
administrativos busquem beneficiar categorias em condições desfavoráveis, indevidamente
excluídas de situações essenciais à própria sobrevivência. A mutação produzida no conteúdo
do princípio da igualdade, a partir da adoção da ação afirmativa (ou discriminação positiva),
implicou que da própria isonomia pudes sem resultar condutas práticas como implantação de
programas governamentais, leis, ações particulares e comportamentos públicos em virtude dos
quais fossem asseguradas às minorias sociais oportunidades de cargos, espaços sociais, políticos,
econômicos etc. Como assevera Francisco Chaves dos Anjos Neto:
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Ora, para uma sociedade que pretende se passar como verdadeiramente igualitária, é preciso ter presente o sentido de elidir com mais ênfase as desigualdades artificialmente criadas de que são vítimas os mais desvalidos, preconceituosamente afastados das melhores oportunidades de vida por força de situações que nada têm a ver com sua maior ou menor disposição de vencer, senão por conta de um quadro econômico-social do qual sempre se viram distantes, à vista mesmo de uma discriminação historicamente conhecida. [...] Portanto, mais do que propiciar uma igualdade meramente formal, a ordem é assegurar uma igualdade em termos fático-substanciais, não mais se justificando, em pleno século XXI, um discurso que nem mesmo se pode apontar como liberal burguês, senão um retorno às discriminações nobiliárquicas do ancien regime [...].65
Nesse modelo, o interesse público primário em um concurso público não se reduz exclusivamente
à seleção dos melhores candidatos, mormente quando ao se fazer essa escolha é possível,
simultaneamente, promover a inserção de uma parcela da população indevidamente discriminada,
em razão do avançado da idade. Trata-se de uma função social inerente aos comportamentos
públicos, mormente em se tratando de contratações trabalhistas firmadas pela Administração ou de
atos de nomeação por ela praticados. Permite-se reiterar que a validade da medida requer evidência
da sua necessidade a partir de uma realidade discriminatória prévia no mercado de trabalho.
quanto à discriminação pertinente ao sexo, em princípio é obrigatória a livre disputa entre
homens e mulheres no tocante aos cargos e empregos públicos. É certo, no entanto, que a
natureza de determinadas atribuições justifica o seu exercício somente por pessoas do sexo
feminino, sendo cabível restringir, em alguns casos, aos indivíduos do sexo masculino. A adoção
do fator sexo como fator discriminatório que mantém ou exclui candidatos do certame depende
da pertinência evidente entre esse elemento e os objetivos buscados com o desempenho das
funções inerentes ao cargo para o qual se faz a seleção. Assim ensina Cármen Lúcia Antunes
Rocha quando define como inaceitável juridicamente a exigência de ser do sexo masculino na
hipótese do cargo de juiz, embora razoável impor que uma delegada de delegacia de mulheres
seja do sexo feminino.66 Também o STF já se pronunciou no sentido da não ofensa à isonomia
em relação à distinção entre sexos em contextos específicos.67
No que tange à exigência de peso ou índices de massa corporal nos concursos, frisa-se a
necessidade de verificar se a exigência de peso ou IMC mínimo e/ou máximo é realmente
65 ANJOS NETO, Francisco Chaves dos. Princípio da probidade administrativa: regime igualitário no julgamen to dos agentes políti-cos. Belo Horizonte: Del Rey, 2004, p. 173-174.
66 ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais dos servidores públicos, op. cit., p. 116 e 210.
67 “EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. MILITARES DA AERONÁUTICA. CRITÉRIOS DIFERENCIADOS DE PROMOÇãO PARA MI-LITARES DO SEXO FEMININO E MASCULINO: POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE VIOLAÇãO AO PRINCÍPIO DA ISONOMIA. I. — A adoção de critérios diferenciados para a promoção de militares masculinos e femininos da Aeronáutica não ofende o princípio da isonomia, porquanto esses militares integram carreiras distintas, regidas por estatutos próprios. II. — Agravo não provido.” (Ag. Reg. no RE n. 316.882-DF, rel. Min. Carlos Velloso, 2a Turma do STF, DJU de 14/10/05, p. 21)
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compatível com a função a ser exercida na espécie. A doutrina tem assentado que a situação é
delicada e deve ser aferida casuisticamente, havendo posição que aprioristicamente entende a
exigência como inconstitucional:
Ao contrário, me parece que discriminações envolvendo altura e sexo, por exemplo, são razoáveis justamente pelo caráter de definitividade que possuem. Já o peso do candidato é algo muito relativo e variável. O candidato pode ganhar peso rapidamente depois de empossado, assim como pode emagrecer. De qualquer forma, fica o registro.68
Embora seja claro o caráter variável dessa exigência, isso, por si só, não é elemento suficiente para
excluí-lo como requisito para o exercício de determinados cargos públicos. O mesmo se afirma quanto
ao fato de a Administração não exigir dos servidores a manutenção das condições necessárias para a
realização das atribuições após a conclusão do procedimento de investidura. O fato é que a doutrina
e a jurisprudência admitem a exigência de peso mínimo e máximo quando se trata, por exemplo, de
funções específicas das carreiras policiais.69 Afirma-se que, se é lícito estabelecer limite mínimo de
peso, o mesmo se pode fazer em relação ao limite máximo, de modo a excluir portador de obesidade.
“Se não é conveniente contratar um policial muito magro — por necessidade de intimidação física,
manuseio de armamento, imobilização e condução de presos —, também não interessa contratar
policial demasiadamente pesado, por razões óbvias.”70 Daí se admitir a exclusão de candidato que, no
exame antropométrico, apresenta índice de massa corpórea superior ao exigido.71
Em relação à escolaridade que os candidatos devem comprovar, já se advertiu para a competência
privativa da União para legislar sobre determinadas searas.72 Se a lei impuser um nível mínimo 68 SOUSA, Luís Marcelo Cavalcanti de. Controle judiciário dos concursos públicos. São Paulo: Método, 2007, p. 92.
69 “CONCURSO PÚBLICO — CURSO DE FORMAÇãO DE SOLDADO DA POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL — LIMITE MÍNIMO DE PESO EXIGIDO EM EXAME DE SAÚDE E ANTROPOMÉTRICO PELO EDITAL — POSSIBILIDADE — EXIGÊNCIA qUE SE ENTENDE RAzOÁVEL EM FACE DAS ATRIBUIÇÕES DO CARGO DE SOLDADO DA POLÍCIA MILITAR — RECURSO IMPROVIDO 1. A discriminação feita em edital de concurso público não se considera ilegal se o fator de discrimen guardar relação de pertinência lógica com a situação fática do caso concreto. 2. Pode, assim, ser previsto, em edital de concurso público, limite mínimo de peso aos concor-rentes, para o ingresso no cargo de soldado da Polícia Militar do Estado do Mato Grosso do Sul, em razão das atribuições a serem exercidas pelo candidato aprovado. Precedentes desta Corte.” (RMS n. 11.885-MS, rel. Ministro Paulo Medina, 6a Turma do STJ, DJU de 07/11/2005, p. 382).
70 SOUSA, Luís Marcelo Cavalcanti de. Controle judiciário dos concursos públicos. São Paulo: Método, 2007, p. 92.
71 Apelação Cível n. 1.0024.04.286115-3/002, rel. Desembargador Geraldo Augusto, 1a Câmara Cível do TJMG, julgamento em 08/08/2006, DJMG de 25/08/2006.
Registra-se, contudo, não se tratar de posição uníssona nos Tribunais, mormente quando a exigência não encontra amparo em dispositivo legal: “MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO PARA PMMG. CANDIDATO ELIMINADO POR TER ÍNDICE DE MASSA CORPORAL ACIMA DO MÁXIMO EXIGIDO PARA INGRESSO NA CARREIRA. RELATÓRIO DE INAPTIDãO DESPROVIDO DE FUNDAMENTA-ÇãO. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA RAzOABILIDADE, LEGALIDADE E ACESSIBILIDADE AOS CARGOS PÚBLICOS. SEGURANÇA CONCEDI-DA. — O fato de o candidato estar, supostamente, acima do índice de massa corporal mínimo exigido no edital, desserve, em linha de princípio, como motivo bastante para a sua pronta eliminação, se terá ele, na fase dos testes físicos, oportunidade de comprovar a sua perfeita aptidão física para o exercício do cargo almejado. — A possibilidade de mera resolução estabelecer índices mínimos e máximos de massa corporal, tal como ocorre In casu, cria obrigação não prevista em lei, ferindo o princípio da legalidade.” (Apelação Cível n. 1.0525.07.121975-8/002, rel. Desembargador Armando Freire, 1a Câmara Cível do TJMG, DJMG de 10/07/2009).
72 Apelação/Reexame Necessário n. 2009.70.01.003196-5, rel. Des. Maria Lúcia Luz Leiria, 3a Turma do TRF da 4a Região, D.E. de 10/02/2010.
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de escolaridade, com reiteração em norma editalícia, é imprescindível que haja comprovação
do requisito para fins de investidura. Nos casos em que a lei faz determinada exigência e o
edital impõe requisito diverso, cumpre assegurar a investidura do candidato que comprovou a
exigência legal.73 Se o candidato provar nível superior ao exigido, sendo clara a abrangência de
todo o conhecimento e conteúdo inerente ao nível inferior requerido pelo Poder Público, faz
jus a ser empossado. A jurisprudência tem acentuado que a formação superior em uma área
de conhecimento habilita o titular à atuação em área técnica afim, donde se conclui que “Se
o candidato possui formação superior na área de conhecimento pertinente ao cargo público
para o qual prestou concurso, ele possui habilitação profissional suficiente e adequada para
tomar posse, ainda que o edital do certame tenha exigido apenas formação de nível técnico”.
Afinal, ao exigir prova de habilitação profissional o que a Administração busca é verificar se o
candidato possui competências necessárias ao adequado desempenho da função. Diante dessa
prova, restrições indevidas são intoleráveis, pois desbordam a finalidade jurídica presente na
espécie.74 Na verdade, afastam-se todas as formalidades inócuas para o objetivo de verificar as
habilidades do candidato no tocante às atribuições públicas. Assim, já se determinou reserva de
vaga para candidato cujo processo de revalidação de diploma obtido no exterior ainda não se
concluíra, sendo necessário observar o prazo máximo fixado em norma administrativa.75
73 “DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. PROFESSOR DE 1° E 2° GRAUS. NOMEAÇãO E POSSE. REqUISITO DO EDITAL. NãO PREENCHIMENTO. EXIGÊNCIA DE HABILITAÇãO ESPECÍFICA. VIOLAÇãO DA LEI DE DIRETRIzES E BASES DA EDUCAÇãO. CANDIDATA POSSUIDORA DE LICENCIATURA EM CIÊNCIAS, CURSO SUPERIOR EM PROCESSAMENTO DE DADOS, PÓS-GRADUAÇãO EM COMPUTAÇãO E SISTEMAS DIGITAIS E EXPERIÊNCIA NO MAGISTÉRIO. 1. É cediço que o edital é a lei do concurso público, preestabelecendo normas que devem ser observadas pela administração pública e pelos candidatos para a garantia da isonomia de tratamento e igualdade de condições de ingresso no serviço público. 2. No entanto, o edital é um ato administrativo e, como tal, deve jungir-se à lei, sob pena de violação ao princípio da legalidade. 3. O art. 62 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, vigente ao tempo do concurso, estabelece a necessidade de curso superior com licenciatura para a docência na educação básica. Ou seja, a lei não exige habilitação específica. 4. Ademais, o art. 61 da citada lei estabelece como fundamen-tos da formação de profissionais da educação a associação entre teoria e prática, inclusive mediante a capacitação em serviço; e o aproveitamento da formação e experiências anteriores. 5. O fato de a apelada não preencher requisito do edital, qual seja, o bacharelado, com licenciatura, em ciências da computação ou matemática com ênfase em processamento de dados não é fato impeditivo para a sua posse, tendo em vista que demonstrou conhecimento teórico ao lograr aprovação em concurso público, bem como por possuir curso superior em tecnologia de processamento de dados e pós-graduação em computação e sistemas digitais. A licenciatura, ainda que não específica em computação ou processamento de dados, confere à apelada habilitação para a docên-cia. Tudo isso, aliado à experiência anterior no magistério da disciplina de informática, implica preenchimento, pela apelada, das exigências da Lei de Diretrizes e Bases da Educação. 6. Hipótese em que as qualificações da apelada determinam a posse no cargo em questão. 7. Apelação e Reexame Necessário improvidos. (Apelação em Mandado de Segurança n. 1999.03.99.088131-8, rel. Desembargador Federal Cotrim Guimarães, 2a Turma do TRF da 3a Região, DJF3 de 12/11/2009, p. 204).
74 Apelação Cível n. 2008.71.02.003196-0, rel. Des. Valdemar Capeletti, 4a Turma do TRF da 4a Região, D.E. de 24/08/2009.
“ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. SERVIDOR. CANDIDATO qUE POSSUI qUALIFICAÇãO SUPERIOR À EXIGIDA PARA O PROVI-MENTO DO CARGO. Em se pondo a exigência de nível técnico, com dada especialidade, resta satisfeito o requisito por alguém que, mesmo não tendo frequentado o específico curso técnico, tenha formação de nível superior na mesma área, não sendo razoável impedir o acesso a cargo público de quem possui qualificação técnica superior à exigida para o desempenho da função.” (Apelação/Reexame necessário n. 2008.71.00.022698-4, rel. Des. Alexandre Gonçalves Lippel, 4a Turma do TRF da 4a Região, D.E. de 08/06/2009).
75 “PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. RESERVA DE VAGA. DIPLOMA. PROCESSO ADMINISTRATIVO DE REVALI-DAÇãO. — Fere os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade a negativa de nomeação de candidato aprovado em primeiro lugar em concurso público, possuidor dos títulos de Doutor (fls. 20) e participante de Programa de Pós-Doutorado (fls. 36-38) em instituições brasileiras reconhecidas, pelo mero aspecto formal de não ter sido concluído seu processo de revalidação de diploma de graduação, obtido no exterior. — Mesmo que não tenha sido juntado aos autos a comprovação da abertura e do andamento do proces-so de revalidação do diploma do autor, não há porque suspender a decisão agravada. — A Resolução CNE/CES n. 01/2002, estabelece o prazo de seis meses para a conclusão do processo administrativo de revalidação, sendo obrigatória sua observância. Assim, não há, em tese, o alegado risco de escoamento do prazo de validade do concurso.” (Agravo de Instrumento n. 2008.04.00.036615-7, rel.
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Além de se determinar uma escolaridade mínima para acesso ao cargo ou emprego público, é
possível valorizar formação específica em uma das etapas do concurso público: aquela destinada à
avaliação dos títulos. Registre-se que analisar a titulação dos candidatos é exame cuja conveniência
permanece sob critérios de escolha discricionária da Administração. Caso se afigure oportuno tal
juízo, é possível valorizar obtenção de diplomas, realização de pesquisas, experiências profissionais,
magistério em cursos diversos, publicações acadêmicas e técnicas. Os títulos devem ter pertinência
com a natureza das atribuições públicas em tese e não podem suprimir a importância das provas
realizadas previamente. A doutrina reconhece não ser incomum concurso em que as provas não
possuem peso significativo, de tal forma que nelas qualquer candidato será aprovado, deslocando-
se a disputa para a avaliação dos títulos, cujo peso implica flagrante desvio de poder. Tais certames
podem até se transformar em concursos de efetivação ao valorar com pontuação elevada o exercício
de cargo público anterior, manipulação que deve ser rigorosamente combatida:
É perfeitamente admissível que o tempo de serviço público seja um título valorizado, mas somente se for um entre diversos outros títulos. Também é admissível que o tempo de serviço prestado na própria entidade que realiza o concurso possa ter alguma pontuação, mas não a ponto de resultar em reserva de vaga e desde que não configure desvio de poder; uma força disfarçada de burlar a isonomia que deve presidir o concurso. [...] Em qualquer caso, o rol de títulos a serem considerados e a valorização de cada um deve manter uma correlação com as funções do cargo ou emprego em disputa.76
Nos casos de a valoração dos títulos não ter relevância em face dos atributos do cargo ou do
emprego público, tem-se claro o comprometimento do princípio constitucional da isonomia,
conforme já decidiu o Supremo Tribunal Federal em mais de uma oportunidade.77 Os Tribunais
têm feito prevalecer o princípio do informalismo no tocante à prova dos títulos, de modo a
evitar solenidades inócuas relativamente à comprovação documental cabível na espécie.78
No que tange ao psicotécnico, tem-se que o exame destina-se a aferir as condições psíquicas do
interessado no exercício do cargo ou emprego público. Um dos mais significativos desafios para
o Estado é definir como ultimar essa avaliação com rigor técnico e cuidado científico essenciais
Desembargador Federal Sérgio Renato Tejada Garcia, 4a Turma do TRF da 4a Região, D.E. de 10/08/2009).
76 DALLARI, op. cit., p. 117-118.
77 “Ação direta de inconstitucionalidade. Art. 17, I e II, da Lei n. 12.919, de 29 de junho de 1998, do Estado de Minas Gerais. 2. Concurso público de ingresso e remoção nos serviços notarias e de registro. 3. Apresentação dos seguintes títulos: a) tempo de serviço prestado como titular, interino, substituto ou escrevente em serviço notarial e de registro (art. 17, I); b) apresentação de temas em congressos relacionados com os serviços notariais e registrais (art. 17, II). 4. Violação ao princípio constitucional da isonomia. 5. Precedentes: ADI n. 3.522/RS; ADI 3.443/MA; ADI n. 2.210/AL. 6. Medida cautelar julgada procedente.” (MC-ADI n. 3.580-MG, rel. Min. Gilmar Mendes, Pleno do STF, DJU de 10/03/2006)
78 “ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. CONFERÊNCIA DE PONTOS. PROVA DE TÍTULOS. Comprovado o exercício de atividade laboral pelo candidato, através de declaração do ente público perante o qual prestou serviço, é desproporcional a desconside-ração do referido título, em face da ausência de cópia da CTPS, quando todos os dados relativos a esse documento constar da declaração apresentada.” (Remessa Ex Officio em Ação Cível n. 2008.71.10.003331-6, rel. Desembargador Federal Sérgio Renato Tejada Garcia, 4a Turma do TRF da 4a Região, D.E. de 23/11/2009).
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para sustentabilidade do juízo a se realizar. Ao se referir aos testes psicológicos desenvolvidos
cientificamente, a doutrina se vale do Manual de elaboração de documentos decorrentes de
avaliação psicológica, veiculado na Resolução n. 7/03 do Conselho Federal de Psicologia, segundo
o qual os resultados dos exames devem considerar e analisar os condicionantes históricos e
sociais e seus efeitos no psiquismo. O art. 1° da mencionada Resolução estabelece que, para
fins de seleção de candidatos a avaliação psicológica é “um processo, realizado mediante o
emprego de um conjunto de procedimentos objetivos e científicos, que permite identificar
aspectos psicológicos do candidato para fins de prognóstico do desempenho das atividades
relativas ao cargo pretendido.”79
Além da complexidade inerente à construção científica dos testes e do desafio de buscar precisão e
normatização nessa seara, é preciso enfrentar a ausência de testes específicos para cargos e empregos
públicos. As informações a serem obtidas nessa fase devem ter pertinência com as atribuições
estatais em seu contexto administrativo específico, indicando eventuais incompatibilidades da
estrutura psicológica dos candidatos em relação ao perfil necessário e objetivamente indicado na
espécie.80 No setor de segurança pública, reiterados vêm sendo os entendimentos de que é razoável
aferir a compatibilidade do temperamento do candidato, mediante critérios objetivos, em face das
obrigações do cargo.81 Identificar, em abstrato, aspectos psicológicos que são incongruentes com
as funções públicas objeto de seleção consubstancia um desafio constante para a Administração.
Exatamente na tentativa de viabilizar o sucesso dessa tarefa a Súmula 35 da Advocacia Geral da
União enunciou que “o exame psicotécnico a ser aplicado em concurso público deverá observar
critérios objetivos, previstos em edital, e estará sujeito a recurso administrativo.”
Parte da doutrina entende que a objetividade do psicotécnico não implica divulgação de todo o perfil
profissiográfico no edital do concurso público, sob pena de se frustrar a própria finalidade para a
qual se predestina tal avaliação. O entendimento é de que a divulgação prévia poderia sugerir aos
candidatos a adoção de comportamentos induzidos e direcionados para a adequação de sua conduta
aos parâmetros adrede estabelecidos pela equipe de psicólogos.82 Assim sendo, a indicação dos critérios
de avaliação não abrangeria a divulgação detalhada do perfil profissiográfico e seria suficiente para
79 MAIA; qUEIROz, op. cit., p. 124.
80 MAIA; qUEIROz, op. cit., p. 125-126.
81 “PROCESSUAL CIVIL. CONCURSO PÚBLICO. EXAME PSICOLÓGICO. VALIDADE. PROVA PERICIAL. LIVRE CONVENCIMENTO DO JUIz. CRITÉRIOS DE CONVENIÊNCIA E OPORTUNIDADE DA ADMINISTRAÇãO INTERFERÊNCIA DO PODER JUDICIÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. 1. O art. 37, I, da CF/88, possibilita o ingresso aos cargos públicos dos brasileiros que preencherem os requisitos estabelecidos em lei. 2. A Lei n. 4.878/1965 dispôs, em relação ao cargo público de Agente da Polícia Federal, no inciso VII do art. 9°, ser requisito para a matrícula na Academia Nacional de Polícia ‘possuir temperamento adequado ao exercício da função policial, apurado em exame psicotécnico realizado pela Academia Nacional de Polícia’. 3. O E. STJ já firmou o entendimento no sentido de se admitir, como requisito para a investidura em determinados cargos públicos, a aprovação do candidato em exame psicológico/psicotéc-nico, desde que a avaliação se dê mediante critérios cientificamente objetivos, permitindo ao candidato a eventual interposição de recurso. [...] 6. A conveniência e a oportunidade do ato que não recomendou o autor ao cargo público não se sujeitam à ingerência do Poder Judiciário, a quem compete, tão somente, o controle da legalidade e da constatação da existência ou não de vícios de nulidade. 7. Precedentes do STF e do STJ.” (Apelação Cível n. 2003.61.05.004024-0, relator Desembargador Federal Márcio Moraes, 3a Turma do TRF da 3a Região, DJF3 de 03/03/2009, p. 272).
82 MAIA; qUEIROz, op. cit., p. 126-127.
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assegurar a publicidade requerida na espécie.83 Embora não se admita sigilo,84 os detalhes do perfil
profissiográfico remanescem pois, como elementos do julgamento administrativo.
O Supremo Tribunal Federal vem entendendo que é inadmissível avaliação de candidato,
em psicotécnico, sem um grau mínimo de objetividade, ou com fulcro em critérios não
revelados, até mesmo por impedir o acesso ao Judiciário em razão de eventual lesão
de direito individual pelo uso desses critérios.85 A ideia é de que o exame que emprega
critérios puramente subjetivos é nulo, sendo inapto para excluir candidatos do certame.86
Considerando-se que os critérios devem ser claros e dotados de cientificidade,87 não se pode
admitir mera realização de entrevista.
É posição assente nas Cortes Superiores que o psicotécnico, para ser legítimo, deve estar
previsto em lei. A Súmula 686 do STF expressamente consagrou que somente por lei se pode
sujeitar a exame psicotécnico a habilitação de candidato a cargo público. É certa a incidência
dessa premissa também para empregos públicos, sendo reiterados os julgados que veiculam a
reserva legal nessa matéria.88
Se há previsão legal e os critérios são objetivos e não sigilosos, cumpre assegurar a presunção
de legitimidade do juízo técnico realizado pelos profissionais da comissão. Sem prova de
irregularidade administrativa, é inadmissível manter na disputa um candidato que foi reprovado
por não possuir condição psicológica indispensável ao exercício das funções públicas.89 Insta
reiterar que o ônus da prova, nesse caso, incumbe ao candidato, interessado em suprimir os
efeitos do laudo. Caso não logre êxito em demonstrar vícios nos exames psicológicos realizados,
é mister que prevaleçam as conclusões técnicas afirmadas no certame.90
83 A jurisprudência, com maior rigor, vem acentuando a necessidade da publicidade mínima, inclusive impugnando a cientificidade dos testes cujos resultados tornar-se-iam inócuos com a sua observância: “5. No Estado Constitucional Democrático de Direito não há mais espaço para critérios secretos, especialmente quando eles restringem a acessibilidade aos cargos públicos, direito este consagrado no art. 37, I, da Constituição da República. Os critérios utilizados em concursos públicos devem ser amplamente divulgados. Além disso, se a publicização dos critérios dos exames psicotécnicos permitir que os candidatos treinem as respos-tas mais adequadas, certamente o referido exame não poderia gozar da credibilidade que se lhe atribui, pois, nesse raciocí-nio, ele não seria capaz de aferir as verdadeiras aptidões e condições psicológicas do candidato avaliado.” (Apelação Cível n. 2005.71.00.040755-2, relator Desembargador Valdemar Capeletti, 4a Turma do TRF da 4a Região, D.E. de 19/10/2009).
84 RE n. 265.261-PR, relator Min. Sepúlveda Pertence, STF, julgamento em 13/02/2001, Informativo do STF, n. 217, Agravo Regi-mental no Agravo de Instrumento n. 1.043.110-GO, rel. Min. Nilson Naves, 6a Turma do STJ, DJe de 03/08/2009 e REsp n. 442.964-PR, rel. Min. Fernando Gonçalves, STJ, julgamento em 17/09/2002, Informativo do STJ, n. 147.
85 Ag. Reg. no AI n. 57.944-DF, rel. Min. Cezar Peluso, 1a Turma do STF, DJU de 15/10/2004, p. 7.
86 REsp n. 442.964-PR, rel. Min. Fernando Gonçalves, julgado em 17/09/2002, Informativo do STJ, n. 147.
87 RMS n. 25.596-RO, rel. Min. Jorge Mussi, 5a Turma do STJ, DJe de 03/08/2009.
88 Agravo Regimental no Agravo Regimental no REsp n. 773.288-DF, rel. Min. Celso Limongi, 6a Turma do STJ, DJe de 01/02/2010 e RE n. 232.571-7-RS, rel. Min. Carlos Velloso, STF, DJU de 05/02/99 e Ag. Regimental no RE n. 334.311-RN, rel. Min. Carlos Velloso, 2ª Turma do STF.
89 Apelação Cível n. 2002.61.00.012208-5, rel. Desembargadora Federal Consuelo Yoshida, 6ª Turma do TRF da 3a Região, DJF3 de 09/10/2009, p. 257.
90 2. A prova da invalidade do psicotécnico não pode ser presumida, nem invocada a partir de alegações e situações abstratas e genéricas, exigindo, ao contrário, exame específico quanto à forma e conteúdo da avaliação, através de avaliação de perito ou
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Além do psicotécnico, a investigação sobre a capacitação moral do candidato é realizada em
alguns concursos públicos. Com fulcro na moralidade administrativa, afere-se a idoneidade do
comportamento do candidato que exercerá funções nas quais é indispensável boa conduta e que,
portanto, impõem ao Estado o ônus de verificar se o interessado merece confiança da sociedade.
Não há dúvida que são descabidas investigações sigilosas, com informações cujo teor se recuse
ciência ao candidato quando da decisão administrativa final. Isso porque a própria Súmula 684
do STF prevê a inconstitucionalidade do veto não motivado à participação de candidato em
concurso público. As garantias constitucionais da motivação e da publicidade tornam obrigatório
que sejam indicadas razões suficientes para embasar eventual exclusão de candidato a que
faltem as condições morais mínimas para o cargo.
Se é verdade que não mais se toleram investigações sociais reservadas que sigilosa e arbitrariamente
concluam pela incapacidade moral de um candidato, é igualmente inadmissível atribuir ao princípio
da presunção de inocência na esfera penal vinculação obrigatória absoluta na seara administrativa.
Com efeito, é certo que sem provas robustas e coesas não pode haver condenação penal, cabendo ao
Poder Judiciário ultimar o juízo definitivo sobre a matéria. Isso não significa que a Administração está
impedida, antes de concluído o julgamento penal, de aferir em sede administrativa a compatibilidade,
ou não, do comportamento do candidato para fins de admitir sua vinculação a cargo ou emprego público.
Em primeiro plano, cumpre atentar para o princípio da independência das instâncias penal, civil,
administrativa e de improbidade administrativa.91 Outrossim, o fato de um candidato submeter-se à
investigação ou ação penal não pode servir para suspender o exercício de competência administrativa
durante o concurso público, pelo que não é lícito excluir o dever de a banca examinadora avaliar
o comportamento pregresso dos candidatos à luz da moralidade. A banca, nesse caso, não está
realizando prejulgamento algum, mas somente formando o convencimento administrativo que lhe
cabe, exarando decisão nos estritos limites da competência pertinente ao concurso público.
profissional habilitado nesta área do conhecimento científico, mesmo porque leigos não podem afirmar que o teste de Zulliger, a que se referem os autos, é eivado de subjetividade. [...] 4. Os autores, na verdade, sequer cuidaram de instruir adequadamente a ação para demonstrar o que alegaram. Não se sabe se houve omissão processual ou se, de fato, sequer foram elaborados os pareceres técnicos de psicólogos contratados, o que, de qualquer forma, conduz, invariavelmente, a uma conclusão única, a de que não pode ser invalidada a reprovação psicotécnica com meras alegações ou sem a comprovação técnica autorizada de subjetivismo na aplicação dos testes psicotécnicos. Essencial ressaltar que os próprios autores protestaram pelo julgamento antecipado da lide, considerando suficiente o estado da instrução que, como se encontra, conduz à inevitável improcedência do pedido formulado. 5. Se os recursos foram genéricos, ou ainda despidos de comprovação técnica, na impugnação à avaliação psicotécnica, não se pode esperar uma análise com especificidades, além dos limites e do conteúdo da insurgência, como de-cidiu a r. sentença, ao confrontar os julgamentos administrativos. A impugnação, tanto administrativa como judicial, ao exame psicotécnico não foi respaldada, porém, em elementos científicos, capazes de revelar a inadequação, insuficiência ou erro na elaboração ou aplicação dos exames, embora fosse exclusivamente dos autores o ônus da prova do fato constitutivo do direito alegado (art. 333, I, CPC). (Embargos Infringentes n. 2001.03.99.017634-6, rel. Desembargador Federal Carlos Muta, 2a Seção do TRF da 3a Região, DJF3 de 17/12/2009, p. 78).
Confira-se, ainda: Apelação Cível n. 2005.61.00.018260-5, rel. Juiz convocado Valdeci dos Santos, 3a Turma do TRF da 3a Região, DJF3 de 04/08/2009, p. 112.
91 “CANDIDATO POR MÁ CONDUTA. CARREIRA POLICIAL. CONSTITUCIONALIDADE E LEGALIDADE. AGRAVO IMPROVIDO. 1. É constitu-cional e legal a eliminação de candidato a concurso público para ingresso na carreira policial pela caracterização de má conduta na investigação sumária da vida pregressa, sendo irrelevante posterior absolvição no juízo criminal, tendo em vista o princípio da incomunicabilidade das instâncias.” (Agravo Regimental no RMS n. 23.819-RO, rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 5a Turma do STJ, DJe de 15/06/2009).
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Ao realizar tal tarefa, deve agir de modo a assegurar ampla defesa e contraditório aos candidatos,
cumprindo o mínimo da atuação dialética e motivada que se espera de atos administrativos
praticados no bojo de procedimento seletivo de pessoal. Cautelas dessa natureza são
indispensáveis não apenas para o estrito cumprimento de normas constitucionais, mas também
por se tratar de uma matéria complexa, com zonas conceituais de difícil delineamento,
ensejadoras de certa margem de discricionariedade,92 sendo essencial evitar o arbítrio por
parte da autoridade avaliadora. Adilson Abreu Dallari adverte:
Maus antecedentes não se confundem com antecedentes criminais, nem, muito menos, com condenação criminal ou punição administrativa. Reputação ilibada é algo bastante complexo, insuscetível de aferição apenas por meio da exibição de certidões negativas. Uma vida pregressa irregular, tumultuada, inclusive quanto aos aspectos econômico e familiar, o envolvimento em uma pluralidade de ocorrências policiais, a participação como réu em uma pluralidade de ações de improbidade, revelam, no mínimo, uma dificuldade de relacionamento e uma significativa diferença em relação ao que se costuma designar como pessoa de bons antecedentes.93
Denota-se, na jurisprudência, confusão entre a presença de bons antecedentes e a presunção
de inocência vigente no âmbito do direito penal. Independente de juízos realizados pela banca
examinadora, mediante ampla defesa e motivação, afirma-se que a presunção de inocência
vigente durante o inquérito e ação penal tem o efeito de assegurar bons antecedentes ao
candidato que deve ser mantido no concurso.
Embora seja certo que a existência de inquérito ou ação penal, isoladamente, é elemento
insuficiente para excluir qualquer candidato de um concurso público94, é igualmente correto
que, diante de elementos aptos a comprometer a idoneidade moral de alguém interessado
no exercício de funções públicas, é dever da Administração promover a análise devida, com
observância das normas constitucionais incidentes na espécie. Nem mesmo a suspensão ou
extinção da ação em virtude de lapso prescricional são capazes de afastar o dever de o Poder
Público avaliar a presença das condições morais mínimas do candidato. O Superior Tribunal de
Justiça já assentou que “É constitucional e legal a eliminação de candidato a concurso público 92 “O conceito de idoneidade moral e social é subjetivo, constituindo-se em ato discricionário da administração pública, sendo
vedado ao Judiciário interferir no julgamento, cabendo-lhe apenas verificar a legalidade do ato impugnado.— A apreciação do conceito de idoneidade, tratando-se de seleção para cargos na Polícia Militar, pode e deve ser mais rígida.” (Apelação Cível n. 1.0382.08.084767-8/001, rel. Desembargador Wander Marotta, 7a Câmara Cível do TJMG, DJMG de 06/02/2009).
93 DALLARI, op. cit., p. 116.94 “RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. EXCLUSãO DE CANDIDATO, EM
VIRTUDE DE AÇãO PENAL CONTRA ELE INSTAURADA. OFENSA AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇãO DE INOCÊNCIA. ART. 5°, INC. LVII, DA CF/88. 1. O Supremo Tribunal Federal formou compreensão segundo a qual: Viola o princípio constitucional da presunção da inocência, previsto no art. 5.°, LVII, da Constituição Federal, a exclusão de candidato de concurso público que responde a inquérito ou ação penal sem trânsito em julgado da sentença condenatória. (AgRg no RE 559.135/DF, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, DJe de 12/6/2008) 2. Seguindo a mesma linha de raciocínio, em acórdão relatado pela eminente Ministra Maria Thereza de Assis Moura nos autos do Recurso em Mandado de Segurança n. 11.396/PR (DJe 3/12/2007), asseverou este Superior Tribunal de Justiça que: Por força do disposto no art. 5°, inc. LVII, da CR/1988, que não limita a aplicação do princípio da presunção de inocência ou da não culpabilidade ao âmbito exclusivamente penal, também na esfera administrativa deve ser referido princípio observado. 3. Desse modo, incorre em manifesta inconstitucionalidade o ato que, por motivos de inidoneidade moral lastreados na existência de ação penal, afastou o impetrante do concurso de que participava, impedindo-o de prosseguir nas etapas restantes.” (RMS n. 13.546-MA, rel. Min. OG Fernandes, 6a Turma do STJ, DJe de 30/11/2009).
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para ingresso na carreira policial pela caracterização de má conduta na investigação sumária
da vida pregressa, sendo irrelevante posterior absolvição no juízo criminal, tendo em vista o
princípio da incomunicabilidade das instâncias.”95
Especificamente no tocante à transação penal, os Tribunais sustentam a impossibilidade de
ter efeitos civis e implicar reincidência ou caracterização de maus antecedentes, sendo certo
que o registro apenas se dá para impedir deferimento do mesmo benefício, sendo inepto
para o escopo de embasar exclusão de candidato a cargo público do procedimento seletivo.96
Reitera-se, contudo, que ter o indivíduo aceito transação penal não pode significar supressão
da competência investigatória da banca examinadora do concurso. O próprio STJ já definiu
que “Em decorrência da independência entre as instâncias, no entanto, é possível a apuração
administrativa do fato objeto da transação penal e, por consequência, a aplicação da sanções
correspondentes”.97 Denota-se que, paulatinamente, os órgãos administrativos e de controle
judicial convencem-se da importância da aferição pertinente à correção moral dos candidatos,
mormente em setores fundamentais do Estado.98
A aptidão física somente pode ser imposta como condição de exercício de cargo ou emprego
público apenas quando as atribuições em tese exigirem esforço físico. Daí a ideia predominante
que o teste que a afere deve ter caráter exclusivamente eliminatório, devendo-se observar, ainda,
a exigência de reserva legal.99 Afigura-se comum exigir um mínimo de força física em cargos das
carreiras policiais, cujo exercício implica condicionamento superior ao de um indivíduo comum
que atua em outras atividades.100 Os resultados dos testes presumem-se legítimos, conforme 95 Agravo Regimental no RMS n. 23.819-RO, rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 5ª Turma do STJ, DJe de 15/06/2009.
96 “PROCESSUAL CIVIL. AÇãO ORDINÁRIA. CONCURSO PÚBLICO. POLICIAL RODOVIÁRIO FEDERAL. NOMEAÇãO E POSSE. INVESTIGAÇãO SOCIAL. PRÉVIA TRANSAÇãO PENAL. 1. Conforme se depreende do Edital, o recorrente foi aprovado, no Curso de Formação Pro-fissional, o que indica que obteve êxito também na etapa anterior, exigida para inscrição no Curso. 2. A motivação administrativa para a exclusão foi o enquadramento da conduta do recorrente na hipótese de uso de drogas de qualquer espécie. Ora, ainda que se admitisse ser válida a consideração da transação penal, para o fim aqui tratado, há que se considerar que não ficou lá cons-tatado ou sequer afirmado o uso de entorpecentes, mas tão somente a posse de pequena quantidade de cocaína, que, segundo relato feito à autoridade policial, quando da lavratura do termo circunstanciado, destinava-se a uma amiga. Sendo assim, mesmo que se tivessem por sacramentados os fatos descritos no termo, a conduta não se enquadraria na previsão normativa, e, à luz da teoria dos motivos determinantes dos atos administrativos, a eliminação do candidato não poderia subsistir. 3. A transação penal não pode gerar reincidência, maus antecedentes ou efeitos civis, somente devendo ficar registrada com vistas a evitar que o benefício seja conferido novamente em menos de cinco anos. 4. Levando em consideração os princípios da presunção da inocência/não culpa e do devido processo legal, tenho que não é válida a exclusão de candidato a cargo público única e exclusi-vamente com fundamento em medida congênere.” (Agravo de Instrumento n. 2009.04.00.028341-4, rel. Desembargadora Marga Inge Barth Tessler, 4ª Turma do TRF da 4ª Região, DE de 05/10/2009).
97 RMS n. 28.851-AC, rel. Ministro Felix Fischer, 5a Turma do STJ, DJe de 25/05/2009.98 “AGRAVO REGIMENTAL. SUSPENSãO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. AGENTE DE POLICIA CIVIL. INVESTIGAÇãO SOCIAL. — A
investigação social em relação a candidatos ao cargo de Agente de Policial Civil não é menos importante que as provas escrita e prática. Sob esse enfoque, a nomeação de candidatos sub judice reprovados naquela fase do concurso pode, sim, acarretar danos à ordem e à economia públicas se confirmada a legalidade das reprovações.” (Agravo Regimental na Suspensão de Segurança n. 1.877-BA, rel. Min. Cesar Asfor Rocha, Corte Especial do STJ, DJe de 05/02/2009).
99 MAIA; qUEIROz, op. cit., p. 117.100 “DIREITO ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. INVALIDAÇãO DAS REGRAS DO TESTE DE APTIDãO FÍSICA. 1. A Instrução n.°
03/2004 não fere o princípio da isonomia e da razoabilidade. Na verdade, esta norma veio ajustar a proporcionalidade da desi-gualdade física entre homens e mulheres, dando efetividade ao princípio constitucional da isonomia, assegurando tratamento desigual aos desiguais, na exata medida de suas desigualdades. 2. O juízo entende que a realização de uma barra fixa é o mínimo que se pode exigir de uma candidata que almeja ocupar o cargo de Agente da Polícia Federal. A função de policial está sujeita a diversos dissabores e imprevistos, exigindo do policial condicionamento físico superior ao do humano comum para os exercícios de suas atividades. 3. Cada concurso possui suas regras próprias, estabelecidas por intermédio de edital, cujas exigências são
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atributo inerente aos atos administrativos, sendo necessária prova em sentido contrário capaz
de lhe afastar os efeitos.101
Algumas controvérsias surgem quando se trata da viabilidade, ou não, de se fazer segunda chamada para exame de capacidade física, na hipótese de contusão ou alterações fisiológicas impedir o candidato de se submeter ao exame na data designada pela Administração. Há quem defenda a legitimidade de se fixar uma nova oportunidade para o candidato realizar o teste e, em sentido contrário, posicionamentos que sustentam a exclusão do candidato como a consequência da não realização do exame na data aprazada.
Parte da doutrina invoca a inaplicabilidade do critério simultaneidade às provas de capacidade física como fundamento capaz de sustentar a designação de uma nova data para o teste. A ideia é a de que a própria natureza das provas (corrida, impulsão horizontal, barra fixa e natação) demonstra que a sua realização não precisa ser simultânea entre todos os candidatos. Logo, cabe à Administração distribuir os candidatos em diversas baterias e aplicar os testes conforme um cronograma previamente estipulado pela comissão de concurso. Nesse contexto, seria imperioso que a Administração estipulasse “uma nova data ou um novo horário para a realização dos testes dos candidatos que, justificadamente, ficaram temporariamente impossibilitados de se submeter às provas de capacidade física na ocasião prefixada na regra editalícia, observado, em cada caso, o postulado magno da razoabilidade.”102 Enumeram-se decisões do Supremo Tribunal Federal em que se afirmou a necessidade de se beneficiar candidato com adiamento de prova física no caso de força maior.103 A doutrina refere-se a outros julgados em que o candidato foi acometido de doença poucos dias antes da prova e, portanto, teve assegurado o direito de fazer o teste físico em data posterior, de modo a concorrer em condições de igualdade sob o aspecto da higidez física (não seria razoável que um candidato doente concorresse com aquele saudável): “No caso em apreço, mais do que decidir o caso concreto, o STF afirmou: ‘o candidato que, por motivo estranho a sua vontade, não estiver em condições normais de saúde na data aprazada para o teste físico, tem direito ao seu adiamento’.” 104
São também indicadas decisões da Corte Suprema em que foi adiado teste físico de candidata grávida, cujo parto ocorrera dias antes do teste, ao argumento de que fixar data posterior, nesse caso, “não afronta o princípio da isonomia nem consubstancia qualquer espécie de privilégio. A própria situação peculiar na qual a agravada se encontrava requeria, por si só, tratamento diferenciado”.105 Especialmente no tocante à gravidez, o entendimento tem sido no sentido de que seria injustiça não deferir segunda chamada às candidatas. A doutrina pontua que:
estabelecidas de acordo com as peculiaridades do cargo público a ser provido.” (Apelação Cível n. 2004.70.03.007465-0, rel. Desembargadora Federal Marga Inge Barth Tessler, 4a Turma do TRF da 4ª Região, D.E. de 17/08/2009)
101 Apelação Cível n. 2005.71.02.001457-2, rel. Desembargador Federal Valdemar Capelleti, 4ª Turma do TRF da 4a Região, D.E. de 14/09/2009.
102 MAIA; qUEIROz, op. cit., p. 118-119.
103 “CONCURSO PÚBLICO — PROVA DE ESFORÇO FÍSICO — FORÇA MAIOR — REFAZIMENTO — PRINCÍPIO ISONÔMICO. Longe fica de implicar ofensa ao princípio isonômico decisão em que se reconhece, na via do mandado de segurança, o direito de o candidato refazer a prova de esforço, em face de motivo de força maior que lhe alcançou a higidez física no dia designado, dela participando sem as condições normais de saúde.” (RE n. 179.500-RS, relator Min. Marco Aurélio, 2a Turma do STF, DJU de 15/10/1999, p. 22).
104 SOUSA, op. cit., p. 101-102.
105 Agravo no RE n.376.607-DF, rel. Min. Eros Grau, 2a Turma do STF, DJU de 05/05/06, p. 35.
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Em linha de princípio, as alterações fisiológicas e psicológicas decorrentes da gravidez são circunstanciais e não autorizam a exclusão sumária das candidatas grávidas, do certame, por ocasião das provas de capacidade física. Entendimento contrário conduziria a uma flagrante injustiça, na medida em que a condição de grávida funcionaria como uma espécie de punição, comprometendo a efetividade do princípio da paridade que deve existir entre homens e mulheres no tocante a direitos e obrigações.106
Insta observar, contudo, decisões do Superior Tribunal de Justiça que afastam a possibilidade de novos testes, sob pena de comprometimento da isonomia, até mesmo considerando normas editalícias que vedam tratamento diferenciado em razão de alterações fisiológicas e psicológicas, tais como gravidez ou lesões musculares.107 Entende-se que obstáculos que impossibilitam o comparecimento do candidato deve levar à sua eliminação sumária, sendo inviável pretender-se uma segunda chamada na espécie.108
Especialmente no caso de adiamento pretendido na hipótese de contusões, vem se afirmando que a lesão no momento do teste ou quando lhe antecede é evidência de que o candidato não suporta, fisicamente, as exigências da prova. Exclui-se, assim, a ideia de caso fortuito, sendo necessário desclassificar os candidatos que não estavam devidamente condicionados e, assim, não apresentam as condições mínimas para o exercício do cargo. Desarrazoado o tratamento diferenciado entre os candidatos, sendo mister afastar o agendamento de nova data para a realização do exame físico.109 O mesmo se afirma na hipótese de impedimentos decorrentes de acidentes que vitimem candidatos ou procedimentos cirúrgicos cuja necessidade surgiu às vésperas da prova física.110
Não há dúvida que se está diante da necessidade de equilibrar a prerrogativa da Administração e direitos dos candidatos. Deve-se reconhecer que é inadmissível pretender adequar um certame público com as implicações complexas e múltiplas inerentes ao concurso a todas as pretensões individuais, mormente quando desarrazoadas em face do interesse coletivo presente na espécie. Assim, de fato não há que se fixar novo teste para candidato que, por falta de condicionamento, apresentou lesão que o impediu de submeter-se ao exame na data aprazada. Também não se vislumbra razoável comprometer a prática dos atos subsequentes do concurso, com comprometimento das necessidades públicas e pretensões de todos os demais candidatos, com o fim exclusivo de aguardar a recuperação do candidato acometido por doença. A própria supremacia do interesse público de levar a termo, com eficiência, proporcionalidade
106 MAIA; qUEIROz, op. cit., p. 100 e 122.
107. “1. O Superior Tribunal de Justiça possui jurisprudência uniforme no sentido de que, havendo previsão editalícia que veda a realização de novo teste de aptidão física, não se pode dispensar tratamento diferenciado a candidato em razão de alterações fisiológicas temporárias, em homenagem ao princípio da igualdade que rege os concursos públicos. Precedentes.
2. O simples fato de o excelso Pretório não ter adotado o mesmo posicionamento deste Superior Tribunal de Justiça não impede esta Corte de dar a interpretação que entender mais correta a uma norma infraconstitucional.” (Agravo Regimental no REsp n. 752.877-DF, rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6a Turma do STJ, DJe de 01/02/2010).
108 Agravo Regimental no RMS n. 28.340-MS, rel. Min. Jorge Mussi, 5a Turma do STJ, DJe de 19/10/2009.
109 RE n. 351.142-RN, rel. Min. Ellen Gracie, 3a Turma do STF, DJU de 01/07/2005, p. 88 e Apelação/Reexame Necessário n. 2005.60.00.000685-0, rel. Desembargadora Federal Cecilia Marcondes, 3a Turma do TRF da 3a Região, DJF3 de 08/09/2009.
110 Apelação Cível n. 1.0024.08.306843-7/001, rel. Desembargadora Vanessa Verdolim Hudson Andrade, 1a Câmara Cível do TJMG, DJMG de 01/06/2010.
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e tempestividade, a avaliação estatal justifica a exclusão do candidato. O fundamental é que se assegure, em cada situação concreta, a prevalência do interesse social de ver selecionado o melhor quadro de servidores para a Administração, sem sacrifício injustificado dos direitos individuais dos interessados, inclusive com consagração constitucional. Observe-se, em cada realidade, que o princípio da juridicidade impõe a submissão da Administração ao edital do concurso qualificando-o como lei interna, pelo que a previsão genérica de impossibilidade de realização de prova de segunda chamada, deve ser observada, até mesmo como garantia da isonomia.111 O seu afastamento só se justifica diante de situação em que haja clara recusa pública ao cumprimento de direito protegido constitucionalmente.
Ainda em relação à situação física dos candidatos, a Administração exige como condição para investidura em cargo ou emprego público, que os interessados apresentem condições mínimas de saúde, de modo que possam exercer as atribuições estatais. O objetivo é evitar que pessoas claramente incapazes para o exercício da função pública típica sejam para isso designadas. A esse propósito, cumpre atentar para a impossibilidade de a Administração, ao fixar as condições mínimas de saúde necessárias ao exercício do cargo ou emprego público, excluir da disputa todo e qualquer deficiente físico ou candidato doente. À obviedade, inúmeras doenças e limitações físicas em nada impedem o exercício de funções estatais, promovidas as competentes adaptações. Daí a doutrina afirmar que não é qualquer doença que permitirá a desclassificação de candidato aprovado em concurso, mas sim aquela que o impeça de trabalhar e que seja, concomitantemente, incurável:
Com efeito, não é lícito desclassificar o candidato aprovado em todas as etapas do certame por motivo de qualquer doença. A desclassificação será cabível se não houver comprovadamente, perspectiva de cura, ou se o interesse público o exigir.112
É preciso que haja evidência da incompatibilidade da doença ou limitação do candidato com a atividade pública em questão, sendo inadmissível exclusão com base em laudo pericial vago, com considerações abstratas que demonstram a não motivação técnica suficiente.113
Ademais, é indispensável que os critérios utilizados para excluir candidatos do certame equivalham àqueles utilizados para determinar a aposentadoria por invalidez dos servidores públicos. Não se pode admitir que uma doença ou limitação impeça acesso a cargo ou emprego público e, simultaneamente, viabilize a readaptação de um servidor já integrado ao quadro de pessoal do Estado, não sendo caso de aposentadoria por invalidez. Em outras palavras, a limitação ou doença do candidato do concurso apenas pode excluí-lo da disputa se a mesma característica implicar inaptidão de quem já é servidor público. Se a limitação do candidato é
111 Apelação Cível n. 1.0024.08.171346-3/002, rel. Desembargadora Maria Elza, 5ª Câmara Cível do TJMG, DJMG de 03/03/2010.
112 SOUSA, Éder. Concurso público: doutrina & jurisprudência. Belo Horizonte: Del Rey, 2000, p. 70-71.113 “DIREITO ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. EXAME MÉDICO. EXCLUSãO
DE CANDIDATO DE FORMA DESMOTIVADA. NãO CABIMENTO. RECURSO PROVIDO. 1. É incabível a eliminação de candidato conside-rado inapto em exame médico em concurso público por motivos de ordens abstrata e genérica, situadas no campo da probabilida-de. Impõe-se que o laudo pericial discorra especificamente sobre a incompatibilidade da patologia constatada com as atribuições do cargo público pretendido.” (RMS n. 26.101-RO, rel. Ministro Arnaldo Esteves, 5a Turma do STJ, DJe de 13/10/2009).
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irrelevante para o trabalho público em questão, é inviável desclassificá-lo.114
Vem crescendo o entendimento de que o serviço público deve estar tecnologicamente preparado para
o desempenho de atividades por agentes deficientes que têm necessidades especiais, até mesmo como meio de assegurar a efetiva isonomia e acessibilidade aos cargos públicos.115 Afinal, se a limitação do servidor não implicasse restrição alguma em sua condição física, sequer se qualificaria como deficiência. Se se trata de deficiência, trata-se de algum tipo de restrição em face de um paradigma indicado como comum e em relação ao qual são avaliadas situações diversas. O que é imperioso é verificar se a limitação é compatível com o cargo ou emprego público. Se o for, é imperioso manter o interessado na competição prevista no inciso II do art. 37 da CR. Caso contrário, cabe o seu afastamento do certame.116
Somente diante de cada situação específica, considerando-se o conteúdo das atribuições da função pública em questão, será possível aferir se uma determinada exigência pertinente à boa saúde do candidato é constitucional, porquanto relativa à condição física indispensável ao exercício do cargo ou emprego público, ou inconstitucional, visto que ignora possibilidade de se promover readaptações, excluindo indevidamente indivíduos aptos ao exercício dos deveres estatais. A formação do juízo a propósito da compatibilidade da deficiência com as obrigações públicas dependerá de um juízo técnico muitas vezes oriundo de profissionais de mais de uma seara da ciência. Impõe-se uma análise cautelosa, com fulcro no bom senso, numa perspectiva includente indispensável ao Estado Democrático de Direito e na supremacia do interesse coletivo que requer o exercício adequado das competências administrativas por um quadro de pessoal múltiplo, amplo e integrado por diversas categorias de uma mesma sociedade.
É o administrativista Fabrício Motta quem frisa o direito de o deficiente se inscrever nos concursos públicos em igualdades de condições com os demais candidatos, devendo-se obedecer a isonomia no tocante ao conteúdo das provas, à avaliação e aos critérios de aprovação, à
114 “ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. CARTEIRO. EXCLUSãO DE CANDIDATO. LIMITAÇÕES FÍSICAS. PERÍCIA TÉCNICA. POSSI-BILIDADE DE REALIzAÇãO DO TRABALHO. APROVAÇãO DO CANDIDATO. IMEDIATA CONTRATAÇãO. SÚMULA 15 DO STJ. 1. Restando constatado, em perícia judicial médica, que o tipo de limitações físicas do autor não o impede de praticar as atividades relacio-nadas ao trabalho de carteiro, não encontra guarida a eliminação do candidato aprovado em concurso público para provimento de cargos de Carteiro I” (Apelação Cível n.2008.70.01.001339-9, rel. Desembargadora Federal Marga Inge Barth Tessler, 4ª Turma do TRF da 4ª Região, DE de 18/01/2010).
“ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. POLÍCIA MILITAR. CANDIDATO. TATUAGEM. CICATRIz REFRATIVA. EXAME MÉDICO. REPRO-VAÇÃO. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. VIOLAÇÃO. A existência de tatuagem não configura, por si só, motivo suficiente para eliminação de candidato, em sede de concurso para ingresso em uma das carreiras da Polícia Militar, por flagrante ofensa ao princípio da razoabilidade. Demonstrando o candidato possuir perfeita acuidade visual, a mera cicatriz refrativa, decorrente de cirurgia corretiva, não pode ser empecilho para que prossiga no concurso para a polícia militar. V.V.” (Apelação Cível n. 1.0702.06.305932-4/002, rel. Desembargador Maurício Barros, 6ª Câmara Cível do TJMG, DJMG de 06/11/2009).
115 RMS n. 18.401-PR, rel. Min. Paulo Medina, 6ª Turma do STJ, DJU de 02/05/2006, p. 390.
116 “CONCURSO. JUIz DO TRABALHO. DEFICIENTE FÍSICO. INDEFERIMENTO. INSCRIÇãO. O Ministério Público ofereceu denúncia contra juíza do TRT/2ª Região que, à época, era também presidente da comissão para realização de concurso para ingresso na magistratura do trabalho e contra a secretária da referida comissão, codenunciada. O candidato, portador de sequelas de pa-ralisia cerebral, decorrente de traumatismo de parto, teve sua inscrição definitiva indeferida pela presidente do certame, por entender serem incompatíveis com o exercício do cargo de juiz do trabalho as necessidades especiais do candidato. O motivo do indeferimento da inscrição, que impede a realização da prova do concurso, foi devidamente motivado no que se refere à real incompatibilidade entre as deficiências e as funções do cargo público. Restou caracterizada a justa causa para o óbice ao cargo, o que afasta a tipicidade da conduta da denunciada. Reputado atípico o indeferimento da inscrição do candidato pela denunciada detentora da prerrogativa de foro, não se pode admitir como delituosa a simples emissão de declaração retratando o óbice à realização das provas do certame. A Corte Especial rejeitou a denúncia.” (Apn 324-SP, rel. Min. Gilson Dipp, Corte Especial do STJ, j. em 04/05/2005, Informativo do STJ, n. 245).
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nota mínima exigida para todos os demais candidatos e ao horário e ao local de aplicação das provas. Para que tal igualdade material se realize, cabe, em determinadas situações, que se estabeleçam condições diferenciadas para a realização das provas. Não se trata de admitir exigências descabidas de razoabilidade, mas de ensejar, por exemplo, o uso do método braille para deficientes visuais. Tais medidas que demandam tratamento diferenciado nos dias do concurso implicam requerimento do interessado já no ato de inscrição:
Também poderá ser requerido tempo adicional para realização das provas, se houver necessidade, devendo o pedido estar acompanhado de justificativa e parecer emitido por especialista da área de sua deficiência.117
O deferimento de tais providências depende de prova induvidosa da sua necessidade como meio de assegurar a igualdade real entre os candidatos, sendo comum controvérsias sobre os contornos que assumem situações específicas em determinados certames. Tais divergências existem desde a caracterização de uma limitação como deficiência até as medidas que se justificam na espécie.
Quanto à caracterização da deficiência, a jurisprudência já divergiu acentuadamente a propósito de limitações como a visão monocular e ainda não se pacificou no tocante à deficiência auditiva unilateral. O Ministro Carlos Britto, ao analisar a matéria pertinente à visão monocular, assentou que o campo de acuidade visual do indivíduo, na melhor das hipótese, reduz-se à metade do que o de uma pessoa que enxerga com os dois olhos, o que justifica a ação afirmativa cujo objetivo é compensar fatores de uma desigualdade factual, procedimento típico em uma sociedade fraterna idealizada na Constituição.118 O STJ pacificou na Súmula 377 que o portador de visão monocular tem direito de concorrer, em concurso público, às vagas reservadas aos deficientes, donde se infere claro o enquadramento dessa limitação visual como deficiência para fins de disputa seletiva. Referido entendimento vem sendo proclamado mesmo quando não há específica regra legal enumerando a visão monocular como deficiência para determinados certames.119
Em relação à deficiência auditiva, entende-se que significativa redução de capacidade para o desempenho da atividade, tomando-se por referência o padrão normal para o ser humano, caracteriza deficiência.120 Devem ser respeitados os limites técnicos fixados em lei e nos atos normativos da Administração, reguladores dos percentuais de surdez aptos a enquadrar um indivíduo como deficiente, ou não. Embora legítimo que a legislação passe a considerar comprometimento auditivo bilateral como elemento essencial à caracterização da deficiência, é certo que, se o edital admitia inicialmente como deficiente o portador de comprometimento auditivo unilateral,
117 MOTTA, Fabrício. A reserva de vagas nos concursos públicos para os portadores de deficiência — análise do art. 37, inc. VIII, da Constituição Federal. In: ________ (Coord.). Concurso público e constituição. Belo Horizonte: Fórum, 2007, p. 205-206.
118 RMS n. 26.071-DF, rel. Min. Carlos Britto, STF, julgamento em 27/02/2007, Informativo do STF, n. 457.
119 MS n. 2008.03.00.032124-0, rel. Anna Maria Pimentel, Órgão Especial do TRF da 3ª Região, DJF3 de 09/06/2009, p. 89.
Confira-se, ainda: RMS n. 22.613-RS, rel. Min. Jorge Mussi, 5ª Turma do STJ, DJe de 03/11/2009 e RMS n. 19.257-DF, rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 5ª Turma do STJ, julgamento em 10/10/2006, Informativo do STJ, n. 300.
120 Apelação Cível n. 2007.71.18.001623-3, rel. Sérgio Renato Tejada Garcia, 4a Turma do TRF da 4a Região, D.E. de 18/12/2009.
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é indispensável a republicação do ato normativo da Administração com o objetivo de adaptar à mutação legal, sob pena de ofensa à publicidade e à vinculação ao instrumento convocatório.121
6 Considerações finais
Denota-se das ponderações aviadas que o concurso público é um instituto essencial à
concretização da moralidade, impessoalidade e eficiência no acesso aos cargos e empregos
públicos. Falta ao Poder Legislativo dos entes federativos exercer, de modo exaustivo, o poder
de normatizar originariamente os aspectos procedimentais e requisitos cujas observâncias são
fundamentais para a seleção do pessoal adequado à Administração.
É preciso, ainda, adesão dos órgãos e entidades administrativas ao instituto, sem o equívoco de encará-lo como um procedimental inimigo a ser superado e não realizado. O caminho é abandonar os diversos expedientes ainda hoje adotados como instrumentos de burla à exigência consagrada no art. 37, II, da Constituição da República. Para tanto, é mister superar dificuldades basilares na compreensão do instituto que ainda enseja controvérsias no tocante a aspectos fundamentais como, por exemplo, a etapa em que serão exigidos os requisitos do cargo. Definir se o momento adequado é o da inscrição ou o da investidura requer aprofundamento nos objetivos do certame, que exigem preservação da competitividade e exclusão de comportamentos cujo único resultado seja comprometer a efetiva e segura escolha pública.
Incumbe aos administradores e aos controladores da legalidade administrativa, aferir a proporcionalidade de cada um dos requisitos indicados no edital como critérios discriminatórios aptos a manter ou afastar interessados no exercício futuro do cargo ou emprego público. Para tanto, é mister que atentem para conteúdos técnicos de outras ciências, bem como para as discussões contemporaneamente travadas na doutrina e jurisprudência administrativa, a fim de coadunar tais aspectos com as normas do ordenamento de regência e, assim, ensejar uma escolha pública justa, eficiente e que se enquadre na perspectiva de um Estado Democrático de Direito.
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121 REsp n. 1.124.595-RS, rel. Min. Eliana Calmon, 2a Turma do STJ, DJe de 20/11/2009.
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1 Considerações iniciais
Trata-se o concurso público de procedimento que se desenvolve mediante uma série encadeada
de atos administrativos, inaugurados quando a Administração verifica a necessidade de admissão
de servidores para ocupar cargos efetivos e empregos públicos, de acordo com a demanda que
se lhe apresenta.
O concurso não é, pois, um ato, mas um procedimento, ou seja, um conjun-to de atos administrativos interligados e realizáveis segundo certa cronologia previamente estabelecida, destinados à obtenção de um só resultado final: a seleção, dentre os vários candidatos, daqueles que melhor possam atender ao interesse público.1
O instituto do concurso público é divisado por princípios fundamentais, mais especialmente o
da moralidade administrativa, da igualdade e o da impessoalidade. Ampara-se, também, dado
a seu caráter eminentemente concorrencial, no princípio da competitividade.2
A apreciação dos editais de concursos públicos pelo Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais
encontra-se amparada no inciso V do art. 76 da Constituição Estadual e no art. 3°, inciso XXXI, da Lei
Complementar n. 102/2008. Inicialmente, a Instrução Normativa n. 05/2007, alterada pela Instrução
Normativa n. 04/2008, regulamentava a matéria. Hoje, essa última Instrução Normativa estatui a
remessa por meio eletrônico do quadro informativo de pessoal admitido por concurso público, a fim
de que a apreciação desses atos possa ser realizada de maneira mais célere e concomitante.
Dessa forma, no termos do art. 5° da IN n. 04/2008, os Poderes, os Órgãos e Entidades das
Administrações Direta e Indireta do Estado e dos Municípios deverão encaminhar, ao Tribunal
de Contas, editais de concurso público para admissão de pessoal, devidamente publicados, acompanhados da legislação atinente, do precitado quadro eletrônico devidamente preenchido,
1 GASPARINI, Diogenes. Concurso Público — Imposição constitucional e operacionalização. In: MOTTA, Fabrício (coord.). Concurso público e Constituição: Fórum, 2007.
2 O princípio da competitividade nos concursos públicos foi mencionado por Diógenes Gasparini no II Seminário de Direi-to Administrativo do Tribunal de Contas do Município de São Paulo. Disponível em: <http://www.tcm.sp.gov.br/legislacao/doutrina/14a18_06_04/diogenes_gasparini1.htm>. Márcio Barbosa Maia e Ronaldo Pinheiro de queiroz também tratam deste princípio na obra O Regime jurídico do concurso público e o seu controle jurisdicional. São Paulo: Saraiva 2007, p. 27-29
Concursos públicos na jurisprudência do Tribunal de Contas
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com antecedência mínima de 60 (sessenta) dias da data de início das inscrições do concurso, sob pena de suspensão e/ou aplicação de multa diária.
Contudo, ainda que a remessa dos editais à Corte de Contas se dê somente após a sua publicação, tal qual ocorre com os procedimentos licitatórios, também os concursos públicos devem ser precedidos de uma fase interna, imprescindível para a regularidade, legalidade e efetividade do certame que se deflagrará, fase que, do mesmo modo, pode e deve ser objeto de análise deste Tribunal por ocasião da admissão de novos servidores.
Destarte, o concurso público pode ser decomposto em, pelo menos, duas grandes fases: a interna e a externa.
A fase interna é etapa fundamental para o êxito do certame, já que é nesse momento que a Administração planeja o concurso, norteada por suas necessidades e possibilidades. É nessa fase que se verificam a existência de vagas, a necessidade de criação de novos cargos, as disponibilidades orçamentárias, a contratação da empresa que executará o concurso ou a decisão pela execução direta, a elaboração do edital, que é o documento fundamental à segurança dos candidatos e da Administração, uma vez que veicula todo o regramento do concurso etc.
A chamada fase externa, por seu turno, é inaugurada quando da publicação do edital, momento a partir do qual se faz o chamamento a todos os interessados em concorrer aos cargos e/ou empregos públicos listados no ato convocatório, mediante inscrição, desde que atendam a requisitos minimamente exigíveis para tanto.
Essa fase também incorpora a etapa efetivamente concorrencial do certame, a qual diz respeito à aplicação dos exames propriamente ditos, mediante provas de diversas naturezas: objetivas, discursivas e dissertativas, orais, de capacidade física, de habilidades específicas e exame psicotécnico, todas elas parametrizadas por princípios e preceitos acordes à Constituição.
Finalmente, após a realização das provas e apreciação de eventuais recursos, passa-se à etapa de classificação dos candidatos e, uma vez verificada a absoluta regularidade do certame, com a apreciação e julgamento de todos os recursos submetidos à comissão organizadora, pode-se proceder à homologação do concurso.
A homologação é o ato, de competência da autoridade superior, por meio do qual se verifica e ratifica a legalidade e regularidade de todo o procedimento. Também se consubstancia como marco a partir de quando o certame poderá, enfim, produzir os efeitos a que finalisticamente se destina: nomear os candidatos aos cargos e/ou empregos públicos disponibilizados, selecionados como os melhores para o desempenho de atribuições no seio da Administração Pública.
Colocadas em linhas gerais as fases e etapas que compõem os concursos públicos, apresentam-se, a seguir, com maior detalhamento, os atos pertinentes e inafastáveis à realização de qualquer certame, acompanhados de jurisprudência selecionada dentre as decisões já proferidas pelo Tribunal de Contas mineiro acerca da matéria.
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2 Fase interna
Na fase interna do procedimento, setores da Administração apresentam justificativas sobre as
dificuldades da prestação adequada dos serviços em virtude da falta de pessoal, deflagrando a
necessidade de se proceder ao levantamento do número de vagas disponíveis, tendo em vista a
legislação que regulamenta o quadro de pessoal do Poder, órgão ou entidade. Em um segundo
momento, é imprescindível que se verifique a existência de disponibilidade orçamentária e, em
caso positivo, a autoridade competente poderá autorizar a abertura do certame.
Edital de Concurso Público. Procedimento Administrativo. “O procedimento ad-ministrativo, que precede a publicação do instrumento convocatório destinado ao preenchimento de cargos públicos, deve contemplar a elaboração de estudos técnicos nos quais são registradas, dentre outras condições, a necessidade de provimento dos cargos oferecidos, a capacidade financeira para o pagamento de pessoal e a previsão em lei dos referidos cargos públicos. Ademais, não se pode olvidar que o comportamento do administrador público é regido pelo prin-cípio da presunção de legitimidade, incutindo nos administrados a confiança nas relações jurídicas firmadas na esfera pública.” (Edital de Concurso Público n. 796.953. Rel. Conselheiro Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 03/09/2009.)
Edital de Concurso Público. Emprego Público. “Realça-se, outrossim, questão outra de igual importância e já pacificada neste Tribunal quanto à necessidade de que os empregos públicos sejam criados por lei. A MGS trata-se de empresa pública integrante da Administração Pública indireta e, nessa condição, subme-te-se aos comandos constitucionais estabelecidos nos incisos I e II e no caput do art. 37 da Lei Maior. Portanto, ao deflagrar o procedimento administrativo para a realização do certame, é imprescindível a demonstração da criação legal dos empregos e da mesma forma a disponibilidade das respectivas vagas ofere-cidas.” (Edital de Concurso Público n. 778.666. Rel. Conselheiro em Exercício
Licurgo Mourão. Sessão do dia 14/05/2009.)
O administrador deve também atentar aos prazos fixados na Lei Eleitoral — Lei Federal n.
9.504/97 — que impõe, em seu art. 73, V, proibição aos agentes públicos para nomear, contratar
ou de qualquer forma admitir servidor público, na circunscrição do pleito, nos três meses que
o antecedem e até a posse dos eleitos, sob pena de nulidade de pleno direito, ressalvada a
nomeação dos aprovados em concursos públicos homologados até o início daquele prazo.
Concurso Público. Abertura. Lei Eleitoral. “Depreende-se do dispositivo [art. 73, V, da Lei Federal n. 9.504/97], numa interpretação literal, que nos três meses que antecedem ao pleito, isto é, julho de 2008 até a posse dos eleitos, janeiro de 2009, não se pode nomear, contratar ou qualquer forma de admissão, demissão, etc., sob pena de nulidade do ato, observando-se que as proibições não alcan-çam os servidores de livre nomeação ou exoneração; nomeação para os cargos do Judiciário, Ministério Público, Tribunais de Contas ou órgãos da Presidência da República; nomeação ou contratação de serviços públicos essenciais e, ainda, as transferências ou remoções de militares, polícia civis e agentes penitenciá-
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rios. Mas, a melhor exegese é a interpretação sistêmica, levando em conta os princípios, vetores também da Lei de Responsabilidade Fiscal, os preceitos e princípios constitucionais, entre os quais, o da moralidade, da legitimidade e da eficiência, bem como em sintonia com a sistemática constitucional de integra-ção entre os processos de planejamento e orçamento. Na interpretação dessas regras, recomenda-se ao intérprete não se ater à literalidade do texto legal, isto é, não entabular interpretação em tiras da lei, mas interpretá-la em harmonia com os princípios constitucionais e demais princípios e normas jurídicas de direi-to financeiro e orçamentário. Acresça-se a este entendimento as regras contidas no Manual de Orientações aos Agentes Públicos, para as eleições de 2008, do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, item IX, que assim dispõe: “Os atos que permitam a efetivação das contratações já autorizadas poderão ocorrer mesmo no período de cento e oitenta dias anteriores ao final do mandato presidencial, desde que as despesas delas decorrentes já estejam previstas na Lei Orçamentária Anual, e com a prévia e expressa autorização do Chefe do Poder Executivo, nos termos da alínea “d”, inciso V, art. 73, Lei n. 9.504, de 1997.” (Ofício-Circular n. 46 da Secretaria de Recursos Huma-nos, do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão). Nesse contexto, as disposições do parágrafo único do art. 21 da Lei de Responsabilidade Fiscal, Lei Complementar 101/2000, bem como do art. 73 da Lei 9504/1997, não têm o condão de impedir a prática de atos que venham resultar em solução de continui-dade da Administração Pública, ou mesmo daqueles que garantam o exercício de situações autorizadas nas leis orçamentárias.” (Consulta n. 758.478. Rel. Conse-lheiro Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 10/09/2008. Grifo no original.)
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Nessa esteira, a Administração, conforme a situação que o caso concreto lhe apresente e de
acordo com suas possibilidades, optará pela realização do concurso público por meios próprios
(execução direta) ou por intermédio de outro órgão ou entidade (execução indireta).3 Se optar
pela execução indireta, deverá iniciar processo licitatório para a contratação dos serviços
relativos à execução do concurso público, sendo permitida a dispensa de licitação, no caso de
contratação de órgão ou entidade que integre a Administração Pública e que tenha sido criado
para esse fim específico, desde que o preço contratado seja compatível com o praticado no
mercado (art. 24, XIII, da Lei n. 8.666/93).4
Edital de Concurso Público. Contratação de Empresa Realizadora do Certame. “Em face da existência de indícios de irregularidades na contratação da em-presa realizadora do certame, deverão ser desentranhados os documentos a fls. 162/233 e autuados com a natureza de Contrato, nos termos do art. 161 da Resolução n. 12/2008 — RITCEMG, sendo os referidos autos distribuídos a esta relatoria em razão da prevenção. (Edital de Concurso Público n. 766.242. Rel.Conselheiro Antônio Carlos Andrada. Sessão do dia 04/05/2009.)
3 MAIA, Márcio Barbosa e qUEIROz, Ronaldo Pinheiro de. O Regime jurídico do concurso público e o seu controle jurisdicional. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 82-83.
4 No mesmo sentido, ver decisão do Tribunal de Contas da União 011.348/2002-5.
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3 Fase externa
3.1 Da Publicidade
O edital de concurso público deve ser amplamente divulgado à coletividade, não podendo tal
divulgação ser restrita a determinado órgão ou entidade pública ou privada. A ampla divulgação
do edital, além de atender ao princípio da publicidade insculpido no art. 37 da CR/88, garante:
a) a ampliação da concorrência através do maior número de candidatos; b) o amplo acesso a
cargos públicos; c) a possibilidade de controle pela população em geral.
A divulgação do edital deve ocorrer no quadro de avisos da Prefeitura, no site e, ainda, deverá o
órgão publicá-lo na Imprensa Oficial e em jornais de grande circulação, garantindo-se a observância
ao princípio da ampla competitividade. Da mesma forma, todos os demais atos relativos ao concurso
público devem ser divulgados pelos mesmos meios utilizados para a divulgação do edital.
Edital de Concurso Público. Publicidade. “O [edital] (...) dispõe sobre as formas nas quais se darão as publicações alusivas ao concurso público e não menciona a afixação dos atos pertinentes ao certame nos quadros de avisos da Prefeitura Municipal. Entendo que a ampla publicidade dos atos pertinentes ao certame devem estar simultâneas nos meios de divulgação mencionados no [edital] (...), em consonância com os princípios insertos no caput do art. 37 da Constituição da República.” (Edital de Concurso Público n. 804.634. Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 11/11/2009.)
Edital de Concurso Público. Publicidade. “Ademais, no que tange à divulgação dos atos do concurso, a orientação desta Corte de Contas para que o princípio da publicidade atinja efetivamente seus fins é no sentido de que o ato inaugu-ral do certame, bem como suas retificações devem contar com todas as formas possíveis de divulgação, quais sejam: afixação no quadro de avisos da Prefeitu-ra, divulgação na internet e publicação em jornal oficial ou outro de grande cir-culação na região. A medida se faz necessária por considerar que esta é a opor-tunidade de se dar notícia à sociedade da existência do concurso, razão pela qual deve haver a mais ampla divulgação possível.” (Edital de Concurso Público n. 798.815. Rel. Conselheiro Sebastião Helvecio. Sessão do dia 1°/10/2009.)
Edital de Concurso Público. Publicidade. “Destarte, de forma a atender a obri-gatoriedade da ampla divulgação dos atos relativos ao concurso público, de-verá a Administração adequar as cláusulas editalícias relativas à publicidade, prevendo a divulgação no quadro de avisos da Prefeitura, no site e, ainda, publicá-lo na imprensa oficial e em jornais de grande circulação. Tal medida é de cunho obrigatório para que seja resguardado o princípio da competitivi-dade, inerente aos concursos públicos, não se tratando de ato discricionário da Administração.” (Edital de Concurso Público n. 797.240. Rel. Conselheiro Antô-nio Carlos Andrada. Sessão do dia 29/09/2009. Grifo no original.)
Edital de Concurso Público. Publicação dos Atos do Certame. “O edital (...) esta-belece que as decisões relativas ao certame serão divulgadas no quadro de avisos
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da Prefeitura Municipal (...). Observa-se que o quadro de avisos é o meio mais restrito de publicidade. Todavia, considerando que a publicidade dos atos refe-rentes ao certame deve ser a mais ampla possível, necessário se faz a previsão de mais um meio de divulgação, seja por meio da internet, seja por meio de publica-ção em jornal de grande circulação, viabilizando, assim, o acesso às informações para aqueles que não residem na sede do Município.” (Edital de Concurso Público n. 790.718. Rel. Conselheiro Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 02/07/2009.)
Edital de Concurso Público. Publicidade do Edital. “Não obstante a inclusão da obrigatoriedade da divulgação do certame em jornal de maior circulação do Município, o gestor justificou que não procedeu à publicação determinada por esta Corte de Contas pelo fato de o órgão de imprensa mais próximo distar 100 Km [do Município] (...). Informou, ainda, que o Edital foi divulgado através de carro de som, distribuição de panfletos e pela rádio de (...) Município próxi-mo. Entretanto, a divulgação em jornal de grande circulação é imprescindível para se conferir ao certame uma ampla competitividade, atingindo um número maior possível de candidatos.” (Edital de Concurso Público n. 767.768 . Rel. Conselheiro Antônio Carlos Andrada. Sessão do dia 04/05/2009.)
Edital de Concurso Público. Publicidade dos Atos. Arbitrariedade. “Frisa-se, ain-da, que não pode o Edital reservar à Comissão Supervisora do Concurso “o direi-to de utilizar-se de qualquer outro meio de comunicação que julgar necessário, independente de prévio aviso”, como consta no [edital] (...) porquanto traduz arbitrariedade da empresa organizadora e da Administração contratante, ful-minando os princípios da transparência e da ampla defesa e contraditório, até porque (...) o preceito alcança todo e qualquer ato referente ao concurso, es-tando, ainda, em contradição com outras condições do Edital atinentes à publi-cidade”. (Edital de Concurso Público n. 771.232. Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 17/03/2009.)
Além disso, é necessário observar um prazo razoável entre a publicação do edital, a abertura
das inscrições e a realização das provas, sob pena de se frustrar o comparecimento de possíveis
interessados em participar do concurso público.
Edital de Concurso Público. Prazo. Publicação do Edital. “Entre as ilegalidades verificadas, salta aos olhos a insuficiência dos prazos mediados entre a divulgação do certame, a abertura das inscrições e a realização das provas, o que, certamente, dificulta o acesso dos potenciais interessados às informações editalícias, restando, pois, prejudicados os princípios da razoabilidade, publicidade e universalidade. Vejamos. Pela forma com que foi dada publicidade às disputas, evidencia-se a prática de duas irregularidades, quais sejam, prazo insuficiente de divulgação e inadequação do meio, uma vez que a publicação dos Editais ocorreu apenas no quadro de avisos da Prefeitura (...), não tendo sido comprovada, nos autos, a mais ampla divulgação que deveria ser conferida aos concursos, conforme informado no ofício remetido pelo Prefeito, com a publicidade na imprensa oficial escrita ou mesmo de grande circulação, o que atrairia, sem dúvida alguma, o maior número de concorrentes (...). Demais disso,
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para o primeiro certame, decorreram apenas 2 (dois) dias entre a divulgação do
edital e o início das inscrições, sendo que, para a segunda disputa, o interstício
foi somente de 4 (quatro) dias. Tais prazos, por serem extremamente exíguos,
comprometem, no meu juízo, a lisura dos procedimentos porquanto impedem o
alcance do objetivo da disputa que é justamente a escolha de candidatos aptos
a desempenhar a função pública.” (Edital de Concurso Público n. 769.709. Rel.
Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 03/03/2009.)
3.2 Das inscrições
3.2.1 Período de inscrições
O prazo fixado para a realização das inscrições não pode ser irrisório, devendo ser observado um
período razoável para garantir o acesso de um número maior de candidatos ao concurso.
Edital de Concurso Público. Período de Inscrição. “Alteração do período das
inscrições (...), que devem ser realizadas durante o lapso mínimo de 30 (trinta)
dias.” (Edital de Concurso Público n. 791.789. Rel. Conselheiro Eduardo Carone
Costa. Sessão do dia 16/07/2009.)
Edital de Concurso Público. Período de Inscrição. “De fato, embora não haja lei tratando especificamente desta questão, o prazo para as inscrições deve ser
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fixado em consonância com os princípios do amplo acesso ao concurso público e da competitividade. Dessa forma, e mormente considerando que no caso foca-do nem mesmo há previsão para inscrição via internet, pode-se concluir que o prazo fixado pelo Edital (...) é insuficiente. Determina-se, assim, que esse pra-zo seja ampliado para 30 (trinta) dias, prazo esse razoável para que o acesso ao concurso seja o mais amplo possível.” (Edital de Concurso Público n. 761.383. Rel. Conselheiro Antônio Carlos Andrada. Sessão do dia 14/10/2008.)
O edital também não pode impor obstáculos desnecessários para a realização das inscrições, tais
como realizá-las somente de forma presencial, em horários restritos ou inadequados, proibição
de realizá-las por procurador etc.
Edital de Concurso Público. Inscrição pela Internet e por Procuração. “O Edital previu somente como forma de inscrição a presencial, excluindo a inscrição via internet ou por procuração. Ressalte-se, neste particular, que a possibilidade de inscrição via internet é sempre devida, pois possibilita o acesso de um maior número de candidatos, bem como deve ser admitida a inscrição por procuração, tendo em vista a hipótese de impossibilidade do próprio candidato fazer sua ins-crição. Por essa razão, a Administração deverá adequar o Edital, prevendo tam-bém a inscrição via internet e por procuração.” (Edital de Concurso Público n. 797.240. Rel. Conselheiro Antônio Carlos Andrada. Sessão do dia 29/09/2009.)
Edital de Concurso Público. Inscrição pela Internet e Necessidade de Acesso a Computadores. “(...) restrição ao acesso dos candidatos às inscrições, por ser a internet o único meio para realização destas. (...) a isenção de responsabi-lidade por inscrição via internet, como previsto no [edital] (...), somente é válida se as falhas não forem de responsabilidade dos entes organizadores do concurso, devendo, portanto, ser acrescido ao texto a ressalva referida. (...) violação ao princípio da ampla acessibilidade de cargos, empregos e funções públicas (...) [em] subitens (...) que prevêem que o cartão de inscrição deverá ser impresso pelo candidato, já que nem todos os candidatos possuem acesso aos computadores” (Edital de Concurso Público n. 787.590. Rel. Conselheiro Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 09/07/2009.)
Edital de Concurso Público. Inscrições pela Internet Atrelada ao Principio da Acessibilidade. “(...) a possibilidade de inscrição, também, por via ele-trônica não comprometeria, mas, sim, privilegiaria os princípios da aces-sibilidade de todos ao ingresso no serviço público e, por conseguinte, da isonomia, posto que à luz da realidade regional e, em se tratando dos cargos oferecidos no Certame, notadamente, o de Técnico Contábil, essa exigência mostra-se razoável por se inserir no estágio tecnológico atual que vivemos.” (Edital de Concurso Público n. 767.249. Rel. Conselheira Adriene Andrade. Sessão do dia 16/12/2008.)
3.2.2 Taxa de inscrição
O valor da taxa de inscrição deve corresponder ao valor necessário para cobrir os gastos com
a realização do certame pela entidade responsável pela organização do concurso, adotando-
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se critérios de razoabilidade e proporcionalidade.5 A fixação de valores exorbitantes afasta
possíveis candidatos, reduzindo a ampla competitividade no certame.
Edital de Concurso Público. Taxa de Inscrição. “Considero ser oportuno esclarecer os critérios de cálculo do valor da taxa de inscrição, sobretudo diante de cargos de mesmo nível de escolaridade com diferentes valores fixados no edital, pelo que, em futura abertura de vista, deverá o gestor ser chamado a justificar a discrepân-cia ou, não havendo motivação para o tratamento desigual, retificar o edital, igua-lando as taxas de inscrição para o mesmo grau de escolaridade. (Edital de Concurso Público n. 786024. Rel. Conselheira Adriene Andrade. Sessão do dia 16/06/2009.)
Edital de Concurso Público. Taxa de Inscrição. Valores Fixados. “Há que se es-clarecer que o valor da inscrição deve ser correspondente ao valor necessário ao custeio do concurso, de forma proporcional e razoável. Os valores constan-tes do “quadro IV”, do Edital (...), apenas guardam correspondência com os valores da remuneração, sendo que não há nos autos qualquer comprovação de que efetivamente correspondem ao custeio do concurso. Ademais, a adoção de valores exacerbados, como o fixado para o cargo de médico (R$ 303,50), frus-tra o amplo acesso ao Concurso Público, protegido pelo ordenamento jurídico pátrio. Dessa forma, determina-se a revisão dos valores estabelecidos e, se for o caso, sua alteração, com a devida justificativa pela administração municipal dos valores necessários ao custeio do certame.” (Edital de Concurso Público n. 761.383. Rel. Conselheiro Antônio Carlos Andrada. Sessão do dia 14/10/2008.)
O edital deve assegurar que, em hipóteses como cancelamento, suspensão, adiamento do
concurso ou outras situações inesperadas, o valor pago será restituído ao candidato.
Edital de Concurso Público. Devolução da Taxa de Inscrição. “Examinando o edital, verifica-se que foi previsto (...) que a taxa de inscrição, uma vez paga, não será devolvida sob hipótese alguma, salvo no caso de não realização do Concurso. Ocorre que, com a modificação produzida por meio do 2° adendo, a devolução da referida taxa foi ampliada para os casos de exclusão de algum cargo oferecido, cancelamento ou suspensão do concurso e demais situações inesperadas que a Comissão Especial de Concurso julgar pertinente. A esse res-peito, cumpre enfatizar que os acréscimos introduzidos na cláusula editalícia atinentes à exclusão do cargo ofertado no certame e ao seu cancelamento estão, na verdade, alcançados pela regra geral de não realização do concurso, pelo que não há alteração substancial a ser considerada. Com relação à devo-lução da taxa na hipótese de suspensão da disputa, é necessário ressaltar que, optando a Administração por essa possibilidade, deve ser fixado, no instrumen-to convocatório, que a devolução ocorrerá depois de determinado prazo, sob pena de ficar, desde logo, obrigado a ressarcir a verba que, como é cediço, tem por finalidade custear as despesas do concurso, que poderia, no caso, ver-se frustrado por falta de recurso para sua realização. A título de elucidação, res-salto que, no âmbito do Estado de Minas Gerais, a Lei n. 13.801/00, que dispõe sobre a devolução da taxa de inscrição em concurso público não realizado,
5 MAIA, Márcio Barbosa e qUEIROz, Ronaldo Pinheiro de. O Regime jurídico do concurso público e o seu controle jurisdicional. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 97.
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prevê, nos termos do § 1° do art. 1°, que o ressarcimento ocorrerá no prazo de até 60 (sessenta) dias contados da publicação do ato de suspensão. quanto à possibilidade de devolução a juízo da Comissão de Concurso diante de situações inesperadas, é de se frisar que, tendo em vista a subjetividade da norma, não é caso de agasalhar a modificação realizada no edital porquanto pode desaguar em tratamento diferenciado aos candidatos. Ressalto que a devolução da taxa paga a título de inscrição deve ocorrer quando a Administração der causa ao evento e, possibilitar o seu manejo a critério da comissão de concurso, pode ensejar o ressarcimento também na hipótese de interesse exclusivo do próprio candidato, gerando, ainda, a quebra da isonomia que deve nortear o proce-dimento. (...)” (Edital de Concurso Público n. 803.968. Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 03/11/2009.)
Edital de Concurso. Devolução da Taxa de Inscrição. “No que se refere ao item 6 de meu Relatório, acerca do direito à devolução do valor pago a título de inscrição, estabelecido no (...) Edital, entendo que essa disposição deve ser alterada a fim de assegurar que, em hipóteses inesperadas, tais como a não realização ou suspen-são do concurso, o candidato faça jus à restituição do valor pago, sob pena de se configurar enriquecimento ilícito por parte da Administração.” (Edital de Concurso Público n. 801.873. Rel. Conselheira Adriene Andrade. Sessão do dia 22/09/2009.)
Edital de Concurso Público. Pagamento da Taxa de Inscrição Fora do Prazo Es-tabelecido. “Estabelece o [edital] (...), que as taxas de inscrições feitas pela Internet, com pagamentos efetuados após a data estabelecida no item 2 do mesmo capítulo, não serão devolvidas ao candidato. Tal dispositivo não pode prosperar. Se por um possível equívoco de candidato, ocorrer pagamento da taxa de inscrição realizada por via da internet após o prazo, tal inscrição não será válida, mas os valores pagos deverão ser devolvidos ao candidato. A propó-sito, a possibilidade de ocorrer pagamento fora do prazo estabelecido no Edital, pode ser impedida pela inserção no sistema gerencial do programa eletrônico [de] mecanismo que impeça o recebimento, pela instituição bancária, de paga-mento após a data de vencimento, como normalmente ocorre em pagamentos de outras naturezas por essa modalidade. O que não se mostra aceitável é que o sistema permita o pagamento fora do prazo estipulado, com apropriação pela Administração de tais valores sem que tal pagamento cumpra a finalidade pretendida. Caso persista o comando atual, fica evidente o enriquecimento sem causa da Administração, por recebimento de quantia sem a devida contra-prestação, pelo que é imprescindível o estabelecimento das excepcionalidades em que se admita a devolução.” (Edital de Concurso Público n. 793.843. Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 25/08/2009.)
Edital de Concurso Público. Devolução da Taxa de Inscrição. “(...) a redação do [edital] (...) deve ser alterada para determinar a devolução do valor da taxa de inscrição também em casos de suspensão do concurso, uma vez que não foi trazida aos autos legislação municipal específica e [que] as hipóteses de devo-lução da taxa de inscrição previstas no edital (...) não atenderam à legislação estadual que trata desta matéria, diploma legal que deve ser aplicado subsi-diariamente.” (Edital de Concurso Público n. 790.718. Rel. Conselheiro Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 02/07/2009.)
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A previsão da isenção da taxa de inscrição para participação no concurso público aos
hipossuficientes é obrigatória, em cumprimento ao Princípio da Isonomia, inserido no artigo 5°,
caput da CR/88. Observa-se que a isenção não deve ser concedida somente aos desempregados,
mas também a todos que não possam arcar com o pagamento da taxa de inscrição, sem que
comprometa o sustento próprio e de sua família, independente de estar empregado ou não.6
O edital deverá fixar o período para requerimento da isenção e os critérios e documentos
necessários para a aquisição dessa prerrogativa, sem exigências desmedidas. Em caso de
indeferimento, há que se resguardar o direito ao contraditório e à ampla defesa ao candidato.
Edital de Concurso Público. Isenção de Taxa de Inscrição. Exigência de Renda Mensal Familiar Igual ou Inferior a Um Salário Mínimo. “Alegou o órgão técnico (...) que, apesar de existir previsão no instrumento convocatório de isenção da taxa de inscrição, tal disposição não atende aos princípios da isonomia e da ampla acessibilidade aos cargos, empregos e funções públicas, em virtude de vincular o candidato à condição de receber renda familiar mensal [igual] ou inferior a um salário mínimo. Com efeito, para que efetivamente se possibilite o cumprimento do objetivo da isenção da taxa de inscrição, deverá ser incluída no Edital cláusula que possibilite ser beneficiado pela isenção aquele que comprovadamente seja hipossuficiente, ou seja, sofra limitações financeiras de modo que o pagamento da inscrição venha a comprometer o próprio sustento ou de sua família, ainda que receba renda familiar igual ou superior ao salário mínimo. Assim, a Adminis-tração deverá adequar o item indicado, a fim de possibilitar a participação no certame daqueles que, em razão de limitações de ordem financeira, não podem pagar a taxa de inscrição.” (Edital de Concurso Público n. 797.073. Rel. Conse-lheiro Antônio Carlos Andrada. Sessão do dia 15/09/2009.)
Edital de Concurso Público. Exigência de Documento Autenticado para Isenção da Taxa de Inscrição. “(...) o [edital] exige do candidato apresentação de de-claração de que se encontra desempregado, não exerce atividade como autô-nomo, não participa de sociedade profissional e que não pode arcar com o custo da respectiva taxa, sem prejuízo do sustento próprio e da família, sob pena de responsabilidade civil e criminal, impondo apresentação de tal declaração por cópia autenticada. Entendo que exigir do candidato documento por cópia e com o plus da autenticação, o qual pode ser apresentado em seu original, fere o princípio da razoabilidade, pelo que deve ser modificada tal exigência.” (Edital de Concurso Público n. 793.843. Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 25/08/2009.)
Edital de Concurso Público. Isenção de Taxa de Inscrição Apenas para Desemprega-dos. “(...) a isenção de taxa de inscrição prevista no edital ofende os princípios da isonomia e ampla acessibilidade, já que não deve se restringir aos desempregados, mas [a] todos aqueles que em razão de ordem financeira não possam arcar com a referida taxa sem comprometer o sustento próprio.” (Edital de Concurso Público n. 787.590. Rel. Conselheiro Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 09/07/2009.)
6 O Estado de Minas Gerais prevê que a isenção será concedida àqueles que comprovem a condição de desempregado, mediante apresentação da Carteira de Trabalho ou documento similar (vide Lei n. 13.392/1999 na seção “Anexos”).
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Edital de Concurso Público. Isenção da Taxa de Inscrição. “(...) a ausência de pre-visão no edital dos pedidos de isenção de pagamento no valor da taxa de inscrição enfatiza (...) que o dispositivo editalício contraria o princípio constitucional da iso-nomia, devendo ser reformado pelo responsável pelo ato convocatório, com vistas a viabilizar a gratuidade da taxa de inscrição para aqueles que comprovarem carência de recursos. Anoto que, nos termos da decisão liminar proferida pelo Conselho Na-cional de Justiça, consoante nota divulgada em 18 de setembro de 2008, no sítio do órgão na internet, o Conselheiro José Adonis Callou de Araújo Sá, no Procedimento de Controle Administrativo (PCA) 200810000022657, aplicou jurisprudência consoli-dada nos Tribunais pátrios, no sentido de que os candidatos a concurso público têm direito a solicitar isenção ou redução da taxa de inscrição, com a devida comprova-ção legal de situação econômico-financeira.” (Edital de Concurso Público n. 781.348. Rel. Conselheiro Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 18/06/2009.)
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3.2.3 Vícios nas inscrições
O edital não deve conter cláusula que determine a exclusão sumária do candidato em decorrência
de declarações falsas ou inexatas constantes da ficha de inscrição, bem como da apresentação
de documentos falsos. Em verdade, qualquer sanção em vista de dados falsos ou inexatos
somente poderá ser aplicada se garantido o contraditório e a ampla defesa ao declarante,
nos termos do art. 5°, inc. LV, da CR/88, salientando que, caso a inexatidão seja passível de
correção, esta deverá ser determinada.
Edital de Concurso Público. Garantia do Exercício do Contraditório e da Ampla Defesa em Caso de Fraude. “Dispõe o [edital] que, se verificada a ocorrência de informações fraudulentas ou cometimento de qualquer tipo de fraude, a qualquer tempo, poder-se-á anular a inscrição, prova ou nomeação do candidato, sem, con-tudo, prever a obrigatoriedade do devido processo administrativo com a garantia do contraditório e da ampla defesa. A falha deverá ser sanada, com inclusão no texto do edital da possibilidade do exercício do contraditório e da ampla defesa, em caso de a prestação de informações falsas ou a ocorrência de fraude ter sido ve-rificada após quaisquer das hipóteses mencionadas.” (Edital de Concurso Público n. 793.843. Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 25/08/2009.)
Edital de Concurso Público. Cancelamento da Inscrição. “‘A declaração falsa ou inexata dos dados constantes na ficha de inscrição, bem como a apresentação de documentos ou informações falsas ou inexatas, determinará o cancelamento da inscrição e anulação de todos os atos decorrentes, em qualquer época, sem prejuízo da adoção das medidas judiciais cabíveis, assegurado o direito de re-curso junto à Comissão do Concurso Público, que será decidido em 48 (quarenta e oito) horas, em conformidade com o princípio da ampla defesa e do contra-ditório (art. 5°, LV, CF/88) ’. Não obstante a previsão do direito de recurso, a cláusula citada feriu o princípio constitucional da razoabilidade, posto que, a ocorrência de uma informação inexata, mas passível de correção, não justifica-ria o cancelamento da inscrição.” (Edital de Concurso Público n. 792.330. Rel. Conselheiro Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 25/06/2009.)
Edital de Concurso Público. Informação Inexata na Inscrição. Cancelamento. “Verifica-se que tal dispositivo viola o princípio da razoabilidade, tendo em vista que, conforme explicitado no relatório técnico, “a ocorrência de uma informação inexata, mas passível de correção, não justifica o cancelamento da inscrição”. Novamente, embora não haja lei tratando especificamente desta questão, todo edital de concurso público deve se pautar nos princípios que re-gem a Administração Pública, em especial, nesse caso, o princípio da razoabili-dade. Dessa forma, pode-se concluir que a determinação contida no (...) Edital em análise, apresenta-se de forma desproporcional, devendo ser reformada.” (Edital de Concurso Público n. 787.756. Rel. Conselheiro Antônio Carlos Andra-da. Despacho proferido em 19/06/2009.)
Salienta-se, ainda, que possíveis erros no envio das inscrições, por falhas técnicas que impossibilitem
a transmissão dos dados, não têm o condão de imputar qualquer responsabilização ao candidato.
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Edital de Concurso Público. Erro no Envio das Inscrições. “a disposição alusiva à responsabilização de candidato por eventual erro no envio das inscrições realiza-das via internet, seja por motivos de ordem técnica dos computadores, falhas de comunicação, congestionamento das linhas de comunicação, bem como outros fa-tores que impossibilitem a transferência dos dados para a inscrição, em atenção ao princípio da razoabilidade, foi devidamente retificada” (Edital de Concurso Público n. 803.696. Rel. Conselheiro Sebastião Helvecio. Sessão do dia 25/02/2010.)
Edital de Concurso Público. Preenchimento Inexato das Inscrições. “Tem-se por desarrazoada a previsão do [edital] (...), segundo o qual serão excluídos os can-didatos em virtude do preenchimento inexato do requerimento de inscrição. Ora, parece claro que o indivíduo, no ato de inscrição, possa cometer deslizes por falta de atenção o que, de modo algum, é fundamento para sua exclusão na par-ticipação do certame. Casos mais graves, todavia, poderão sujeitar-se a sanção dessa espécie, desde que se garantam o contraditório e a ampla defesa, conso-ante se esposou alhures. Sendo assim, deverá ser revista a disposição do [edital] (...), a fim de que se sujeitem à eventual sanção aqueles que, comprovadamen-te, tenham agido dolosamente, fornecendo informações e declarações falsas à Administração, garantindo-lhes, mesmo assim, meios de defesa e o contraditório, devendo, ainda, se inserir no dispositivo prazo, a fim de que o candidato possa proceder à correção dos dados errôneos.” (Edital de Concurso Público n. 799.551. Rel. Conselheiro Antônio Carlos Andrada. Despacho proferido em 25/02/2010.)
Nesse tocante, há de se salientar que disposições recorrentemente constantes em editais de concursos, no sentido de que os candidatos, ao efetuarem sua inscrição, acatam por completo as normas editalícias e a legislação pertinente somente terão guarida caso seja mencionada a legislação aplicável à espécie,
porquanto o candidato deve ter o pleno conhecimento das regras a que estará submetido.
Edital de Concurso Público. Ausência de Legislação para Conhecimento e Com-preensão dos Candidatos. “Verifica-se [em dois subitens do edital] (...) que a inscrição do candidato implicará completa aceitação das normas e condições estabelecidas no Edital e na legislação pertinente (...). Os referidos subitens estabelecem condição subjetiva inserida no contexto da cláusula específica para a inscrição, eis que não mencionam a legislação a que se refere, não sendo possível que o candidato aceite irrestritamente as condições estabelecidas em ‘todas as normas’. Necessário se faz citar, no corpo do Edital, quais são essas normas, para pleno conhecimento e perfeita compreensão de potenciais candi-datos ao certame.” (Edital de Concurso Público n. 793.843. Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 25/08/2009.)
3.2.4 Inscrições de estrangeiros
A inscrição de estrangeiros poderá ser prevista, desde que observados os preceitos constitucionais
acerca da acessibilidade aos cargos públicos por não nacionais (art. 12, § 3°, incisos V e VI da
CR/88), além daquilo que estiver previsto em lei.
Edital de Concurso Público. Inscrição de Estrangeiros em Concursos Públicos. “O (...) Edital estabelece como requisito para inscrição no concurso ‘Ser brasileiro
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nato, naturalizado ou em processo de naturalização’. A esse respeito, cabe res-saltar que o inciso I do art. 37 da Constituição da República, ao preconizar que os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros incluiu o natu-ralizado e o português equiparado, sendo-lhes vedado o acesso apenas aos cargos públicos elencados no § 3° do art. 12 da Constituição. Fundamental, portanto, deixar claro no edital que, no ato de posse, o candidato deverá demonstrar sua condição de naturalizado, nos termos da Lei n. 6.815/80 — Estatuto do Estrangeiro, a não ser que haja previsão em lei municipal, admitindo a possibilidade do acesso de estrangeiro a cargo público. Verifica-se que não consta, nos autos, legislação do Município que estabeleça essa condição.” (Edital de Concurso Público n. 780.461. Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 06/10/2009.)
Edital de Concurso Público. Admissão de Estrangeiros em Concurso Público. “No que tange à participação de estrangeiros em concurso público, necessário se faz a regu-lamentação legal, eis que a norma esculpida no art. 37, inciso I da Lei Magna Federal tem eficácia limitada. Assim, necessário se faz a apresentação da lei municipal que regulamenta a admissão de estrangeiro em concurso. Esclareça-se que, na hipótese de ausência de norma legal reguladora, a disposição contida no (...) edital, que es-tabelece os requisitos para a investidura nos cargos, deve excluir a possibilidade de participação de estrangeiro no concurso.” (Edital de Concurso Público n. 794.391. Rel. Conselheiro Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 10/09/2009.)
Edital de Concurso Público. Inscrição de Estrangeiros. “O (...) Edital (...) prevê a possibilidade da inscrição para o concurso para o ‘estrangeiro na forma da lei’. Como bem ressaltou o órgão técnico (...): ‘(...) a Administração deverá apresen-tar a Lei Municipal que regulamenta a admissão de estrangeiro em seus quadros de pessoal, ou rever a disposição contida no (...) Edital (...), em comento, sobre-tudo por se vislumbrar a possibilidade de um estrangeiro inscrever-se no concur-so, ser aprovado e ser frustrada sua posse por falta de amparo legal.’ Assim sen-do, deverá a Administração Pública anexar a Lei que regulamenta a admissão de estrangeiro ou suprimir essa previsão editalícia.” (Edital de Concurso Público n. 761.383. Rel. Conselheiro Antônio Carlos Andrada. Sessão do dia 14/10/2008.)
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3.3 Das inscrições de pessoas com deficiência e reserva de vagas
O sistema constitucional vigente prevê como regra a reserva de vagas às pessoas com deficiência
em todos os concursos públicos destinados ao ingresso de pessoal na Administração, conforme
dispõe o inc. VIII do art. 37 da Constituição da República de 1988.
Nesse sentido, o edital deve conter cláusula que estabeleça o percentual de vagas reservadas
às pessoas com deficiência, para cada cargo ofertado no concurso, com expressa referência à
legislação que trata do assunto. Insta salientar que cada ente da federação é competente para
legislar sobre a questão das vagas reservadas. No entanto, a ausência de legislação específica
não exime o órgão realizador do concurso de estabelecer no edital o mencionado percentual,
observando-se o princípio da razoabilidade, de forma a atender ao preceito constitucional.
Edital de Concurso Público. Reserva de Vagas para Deficientes Físicos. “Analisa-do o Edital e à vista das informações prestadas pelo Órgão Técnico, bem como do parecer do Órgão Ministerial, constatei a existência de falhas que compro-metem a legalidade do certame as quais passo a relatar.
O (...) edital prevê que pessoas portadoras de deficiência não poderão se inscrever no concurso, devido à incompatibilidade da deficiência com as atribuições do cargo.
Vê-se que as pessoas portadoras de deficiência foram excluídas, de plano, de participar do concurso público devido à alegação genérica de incompatibilidade contida [no edital] (...). Tal disposição contraria, até, o Decreto Municipal n. 6935/04, que regulamenta a instituição Guarda Municipal (...), o qual estabele-ce no inciso V de seu art. 12, como critério de admissão de candidato ao cargo, ‘ter sanidade física e mental, comprovadas por meio de testes físicos, exames médicos e psicológicos’.
A exclusão do candidato possuidor de deficiência, na fase da inscrição, sem verificar se há ou não compatibilidade entre a deficiência e as atribuições do cargo, bem assim aptidão para o seu exercício, não se coaduna com as normas protetoras dos interesses jurídicos de portadores de necessidades especiais, contidas tanto no inciso VIII do art. 37 quanto no inciso XXXI do art. 7° da Cons-tituição da República, in verbis:
‘art. 37
(...)
VIII— a lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão;
Art. 7°
(...)
XXXI — proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de
admissão do trabalhador portador de deficiência’.
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Deve o Poder Público proporcionar eficácia aos comandos constitucionais, fixan-do, em lei, o quantitativo de vagas reservadas e definindo os critérios de admis-são, restringindo, se for o caso, a participação de portadores de deficiência.
Sem lei, em sentido formal, que estabeleça restrições à investidura de portado-res de deficiência para o cargo de Guarda Municipal, impossível ao texto edita-lício impô-las, principalmente, se restritivas ao preenchimento de cargos.
No presente caso, a aferição da compatibilidade da deficiência do portador de necessidades especiais com o cargo a ser desempenhado poderá ser verificada na realização da prova física e durante o curso de formação.
Conforme estabelecido na Carta Magna, um dos fundamentos da República Fe-derativa do Brasil é a dignidade da pessoa humana (inciso III do art. 1º), tendo como um de seus objetivos fundamentais ‘promover o bem de todos, sem pre-conceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de dis-criminação’ (inciso IV do art. 3°), além de declarar, expressamente, que ‘todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza’ (art. 5°, caput).
Essa igualdade prescrita no texto constitucional deve estar refletida na legis-lação infraconstitucional o que não se percebe no ato normativo citado e no edital de concurso, violando os princípios constitucionais de igualdade e aces-sibilidade aos cargos públicos.
O [edital] (...) ao dispor sobre os critérios de desempate, não privilegiou a apli-cação do Estatuto do Idoso pelo fato de a legislação do Município (...) estabe-lecer a idade máxima para o candidato ingressar no cargo de Guarda Municipal, qual seja, trinta anos.
Se o limite etário encontra previsão em lei, em sentido formal, o mesmo não acontece com a exigência de altura mínima, que se encontra prevista (...) [em] Decreto (...). Como o Decreto não é ato normativo hábil para impor condições restritivas para parti-cipação em concurso, a previsão editalícia (...) é ilegal.” (Edital de Concurso Público n. 881.820. Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 09/03/2010.)
Edital de Concurso Público. Vagas Reservadas para Deficientes Físicos. “De acordo com o entendimento adotado na decisão liminar, para fazer cumprir o comando constitucional inserto no inciso VIII do art. 37 da Carta Federal, o concurso patrocinado (...) deveria tornar clara a distribuição do percentual de cargos reservados aos candidatos portadores de deficiência, de modo a impedir a subjetividade no critério de eleição, já que o Edital os considerou de maneira global, o que compromete, por via de consequência, o conhecimento prévio das vagas colocadas à disposição dos interessados, sejam elas para clientela geral ou especial, uma vez que na realização da inscrição deve ser indicada a opção pelo cargo/nível/área de conhecimento/atuação/especialidade/município. Eis a cláusula que regulamente a distribuição das mencionadas vagas:
‘A cota de vagas reservadas aos candidatos portadores de deficiência está conti-da no total de vagas oferecidas e distribuídas neste concurso, por cargo e nível, conforme aponta o quadro de Vagas do Anexo a deste Edital’.
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Assim, a prevalecer a regra editalícia, considerando que a inscrição é, também, por especialidade, como os candidatos poderão participar do certame sem saber quais vagas estão disponíveis e quais estão reservadas já que o ato convocatório não disponibiliza previamente tais informações? Veja-se o caso dos médicos, por exemplo, para os quais o Edital reservou 50 (cinquenta) das 500 (quinhen-tas) vagas, sem definir a especialidade, sabendo todos que esses profissionais só podem atuar de acordo com a habilitação específica, que possui, sob pena de exercício ilegal da profissão. Como determinado médico, deficiente físico, especialista em cardiologia, poderá inscrever-se nessa condição, não lhe sendo dado a conhecer, de início, se sua especialidade será contemplada ou não com a reserva de vagas, e, a Administração, ao final, decidir por eleger um médico oftalmologista? Sem sombra de dúvida, tal procedimento frustra o caráter com-petitivo do certame e, sobretudo, o comando constitucional sobre a matéria.
Dessa feita, a reserva de vagas para a clientela especial deve ser realizada, tendo em vista a especialidade do cargo, observando o percentual eleito pela Lei Estadual n. 11.867/95, que regulamenta a espécie, no patamar de 10% (dez por cento), aplicando, todavia, o arredondamento previsto no Decreto Federal n. 3.298/95, que dispõe sobre a política nacional para integração da pessoa portadora de deficiência, diploma legal esse que melhor consagra a inclusão social proclamada pela Constituição da República e que também foi invocado pela Administração para reger o certame, ex vi do disposto no [edital], a saber: ‘(...) Das vagas destinadas e das que porventura vierem a ser criadas durante o prazo de validade do concurso, 10% serão destinadas a candidatos portadores de deficiência, na forma da Lei Estadual n. 11.867, de 28 de julho de 1995 e do Decreto Federal n. 3.298, de 20 de dezembro de 1999 e suas alterações.’” (Edital de Concurso Público n. 797.648 Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 27/10/2009.)
Edital de Concurso Público. Aplicação do Percentual Previsto no Edital sobre o quantitativo de Vagas Oferecidas. “(...) a porcentagem de 10% (dez por cento) prevista no edital como reserva para deficientes deverá ser aplicada sobre o quantitativo de vagas oferecidas para cada cargo, observando-se a prevalência da regra expressa no edital, sem prejuízo de eventual regra implícita dela de-corrente, ainda que para isso seja necessário o recurso ao critério de arredon-damento.” (Edital de Concurso Público n. 772.593. Rel. Conselheiro Elmo Braz. Sessão do dia 27/08/2009.)
Edital de Concurso Público. Reserva de Vagas para Deficientes Físicos. “O [edi-tal] (...) estabelece: ‘(...) a cada cinquenta contratações — quarenta e nove serão de candidatos aprovados na lista geral e uma será de candidato da lista especial.’ Cumpre observar que se faz necessária a retificação deste item, uma vez que o percentual fixado deve ser para cada cargo discriminado e não para lista geral. Percursando o tema na jurisprudência, constata-se que os Tribunais têm assumido postura atenta e vigilante no cumprimento do comando consti-tucional insculpido no art. 37, VIII [da CR/88], segundo o qual a lei reservará percentual dos cargos e empregos para as pessoas portadoras de deficiência, definindo, também, os critérios de sua admissão. Para dar atendimento aos an-
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seios oriundos do princípio da igualdade, cabe à Administração fixar nos editais de concurso público o percentual das vagas para cada cargo destinado aos por-tadores, sob pena de ineficácia do dispositivo.” (Edital de Concurso Público n. 772.034. Rel. Conselheiro Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 26/02/2009.)
Edital de Concurso Público. Ausência de Reserva de Vagas para Deficientes Físicos. “(...) [no que se refere] às vagas destinadas a portadores de necessidades espe-ciais, o Edital não lhes reservou vagas, haja vista que foi oferecida apenas 1 (uma) vaga para cada cargo. No entanto, (...) assegurou o direito de se inscreverem no presente concurso, àqueles que são portadores de deficiência compatíveis com as atribuições do cargo. Com efeito, entendo que o inciso VIII do art. 37 da Constitui-ção da República, que dispõe, in litteris: ‘a lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão’ condiciona o ingresso de pessoas deficientes ao serviço público, desde que as atribuições dos cargos sejam compatíveis com a deficiência de que são portadoras. (...) a Carta Editalícia (...) admite a inscrição de candidatos porta-dores de deficiências especiais, sem contudo, definir, objetivamente, os requisitos, condições e a forma em que se dará o ingresso no serviço público, o que poderia gerar dúvidas nos participantes, tornando-se, assim, cristalino que essa obscurida-de não poderá prosperar no caso ora em exame.” (Edital de Concurso Público n. 767.249. Rel. Conselheira Adriene Andrade. Sessão do dia 16/12/2008.)
Ressalta-se que a aplicação do percentual fixado nem sempre resultará em um número inteiro, devendo
o edital deixar claro em quais hipóteses se admite o arredondamento. Também deverá ser estabelecida
no edital a ordem de convocação das pessoas com deficiência, em relação às vagas existentes quando da
realização do certame, bem como àquelas que surgirão dentro do período de validade.
Edital de Concurso Público. Reserva de Vagas para Deficientes Físicos. “(...) verifica-se que para os cargos em que existe apenas 01 (uma) vaga, esta foi destinada aos portadores de deficiência. Nesse caso, destinou-se 100% (cem por cento) das vagas à clientela especial, o que vulnera a norma de regência. Isso porque, nos termos de reiteradas decisões pretorianas, somente nos casos em que exista mais de uma vaga para determinado cargo, deve-se fazer a reserva para os portadores de deficiência, ainda que o percentual legalmente previs-to seja inferior a um, hipótese em que a fração deve ser arredondada para o número inteiro subsequente. Havendo apenas uma vaga para determinados cargos, não há [em que se] falar em fração, e, consequentemente, reserva para portadores de deficiência física.” (Edital de Concurso Público n. 778.835. Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 10/11/2009.)
Edital de Concurso Público. Reserva de Vaga para Deficientes Físicos. Arredonda-mento. “Do exposto, defluem as seguintes premissas acerca do arredondamento dos números fracionários obtidos da aplicação do percentual de reserva: a uma, não se pode admitir que as normas constitucionais sejam letra morta, especial-mente em se considerando que a não contemplação da garantia constitucional assegurada aos portadores de deficiência dá-se em razão de injustificada mora legislativa e, a duas, a máxima efetividade da norma constitucional, todavia,
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não pode autorizar a discriminação inversa — que faz cair por terra toda ideia de igualdade material que subjaz às ações afirmativas — verificada quando do arre-dondamento obtém-se a reserva de 100% ou 50% das vagas, por exemplo. Assim, o arredondamento deverá ser buscado sempre, já que a regra preceituada na Cons-tituição é de que haja a reserva de cargos e empregos. Contudo, o arredonda-mento será obstado nos casos em que o valor inteiro, obtido a partir dele, supere o limite máximo de reserva parametrizado a partir de nossas reflexões, qual seja, 20%. De outra parte, sempre que possível, não se pode arredondar o número de vagas para baixo de sorte que não se respeite o mínimo de 5%. Nesses termos, em resumo, a questão do arredondamento deve ser entendida sob a perspectiva deste intervalo de 5% a 20%. Não se pode admitir que o arredondamento faça com que o número inteiro de vagas disponibilizadas fique aquém do mínimo (5%) ou além do máximo (20%).” (Edital de Concurso Público n. 797.240. Rel. Conselheiro Antônio Carlos Andrada. Sessão do dia 29/09/2009.)
Edital de Concurso Público. Fixação das Vagas Reservadas. Arredondamento. “Além disso, não foi definido no (...) edital o percentual de vagas que serão destinadas às pessoas portadoras de necessidades especiais, para cada cargo oferecido no concurso.
Sob esse aspecto, o art. 37, inciso VIII da Constituição Federal, prescreve que ‘A lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas porta-doras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão’. No âmbito federal, a Lei n. 7.853/89 estabeleceu o mínimo de 5% (cinco por cento) de vagas e a Lei n. 8.112/90 fixou o máximo de 20%.
Em princípio, considera-se como parâmetro razoável a aplicação do limite mínimo de 5% (cinco por cento) e do máximo de 20% (vinte por cento). Outrossim, a apli-cação dos percentuais fixados em lei pode resultar em número fracionado, ou não perfazer o mínimo de uma vaga em determinados casos concretos. Em situações como essas, é necessário o arredondamento do número fracionado, desde que esse arredondamento não extrapole os limites de 5% (cinco por cento) e 20% (vinte por cento) adotados como parâmetro razoável, sob pena de discriminação inversa e consequente desrespeito à Constituição Federal.” (Edital de Concurso Público n. 803.051. Rel. Conselheira Adriene Andrade. Sessão do dia 1º/09/2009.)
Edital de Concurso Público. Reserva de Vagas para Deficientes Físicos. “Adequação
de reserva de vagas ao percentual previsto no [instrumento convocatório] (...), vis-
to que embora o texto do edital fixe a reserva de vagas dentro do limite, prevê em
seu quadro IV (...), um número de vagas que corresponde a um percentual muito
superior em praticamente todos os cargos. Assim deve incluir a cláusula que esta-
beleça [que] caso não haja nomeação e posse conjunta de todos os aprovados, a
cada 19/20 de candidatos sem deficiência aprovados, o último vigésimo será nome-
ado oriundo da lista de candidatos com deficiência aprovados, independentemente
de sua classificação geral, respeitando-se a ordem de classificação da lista dos
candidatos aprovados com deficiência.” (Edital de Concurso Público n. 784.696.
Rel. Conselheiro Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 21/05/2009.)
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Edital de Concurso Público. Reserva de Vagas para Deficientes Físicos. “Nessa es-
teira, entendemos que poderá haver o arredondamento previsto na lei estadual,
todavia tal prática não pode resultar em privilégios que conflitem com o princípio
da igualdade entre os demais candidatos, uma vez que a interpretação teleológica
deve ser direcionada a proporcionar tratamento igualitário e não superioridade de
tratamento, não podendo, portanto, com o arredondamento acarretar reserva de
vagas superiores ao limite máximo estabelecido.” (Edital de Concurso Público n.
781.132. Rel. Conselheiro Sebastião Helvecio. Sessão do dia 14/05/2009.)
No tocante às pessoas com deficiência e a instrumentalização da sua participação no concurso
público, o edital, obrigatoriamente, deverá estabelecer como será a entrega do laudo médico,
que deverá se dar da forma mais ampla possível: pessoalmente, pelo correio, por meio de
procurador etc. Salienta-se que para a caracterização da deficiência, o ente realizador do
concurso deverá contar com equipe multidisciplinar, de preferência composta por três membros,
inclusive algum profissional da carreira almejada, amparada em critérios de verificação que
respeitem a Classificação Internacional de Doenças (CID).7
Edital de Concurso. Laudo Médico de Pessoa Deficiente. “Nos termos do (...) do instrumento convocatório, o candidato portador de deficiência deverá enviar via Correio, com AR por meio de SEDEX, o laudo médico atestando a espécie e grau ou nível de deficiência. No entanto, considerando que a única forma de entrega do laudo médico acarreta um ônus para o candidato, entendo que o edital deverá também prever a hipótese de entrega do laudo pessoalmente na sede da Prefeitura. (Edital de Concurso Público n. 799.551. Rel. Conselheiro Antônio Carlos Andrada. Despacho proferido em 04/11/2009.)
Edital de Concurso Público. Laudo Médico de Pessoa Deficiente. “No tocante às irregularidades detectadas no edital, consoante pronunciamentos do Órgão Técnico e Ministério Público junto ao Tribunal de Contas (...), as retificações procedidas atendem, parcialmente, o entendimento deste Tribunal, eis que, [o edital] (...) deverá (...) [facultar] a entrega do laudo médico pessoalmente e também pelo correio, independentemente da forma como a inscrição é efeti-vada, presencial ou pela internet.” (Edital de Concurso Público n. 798.815. Rel. Conselheiro Sebastião Helvecio. Sessão do dia 1°/10/2009.)
O edital poderá conter cláusula vedando que a deficiência alegada quando da realização
do concurso público seja arguida para fins de aposentadoria, ressalvados os casos em que a
deficiência sofrer agravamento imprevisível.
Edital de Concurso Público. Aposentadoria de Servidor Portador de Deficiência Pública em face da Deficiência Arguida. “(...) [o edital] estabelece: ‘Após a investidura do candidato no cargo, a deficiência não poderá ser arguida para justificar a concessão de aposentadoria’. [Referida] (...) restrição necessita ser ressalvada para os casos em que a deficiência eventualmente sofrer agravamento imprevisível à época do concurso ou
7 MAIA, Márcio Barbosa e qUEIROz, Ronaldo Pinheiro de. O Regime jurídico do concurso público e o seu controle jurisdicional. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 221
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do provimento do cargo, sob pena de tornar-se impossível a aposentadoria do servidor, por esse motivo, causando-lhe manifesto, ou até irreparável, prejuízo. A inviabilida-de de aposentadoria, como prevista no Edital, poderá concorrer para surgimento de situação de difícil, ou até de impossível solução. É que, na hipótese de constatação da impossibilidade de permanência do servidor no cargo em face de imprevisível agra-vamento da deficiência, e que se mostre inviável seu remanejamento, o servidor não poderá desempenhar função de qualquer cargo na Administração Pública, não poden-do, também, se aposentar, por vedação expressa da norma de regência. A propósito, no âmbito do Estado de Minas Gerais, regra invocada por analogia, caso não exista dispositivo legal municipal a disciplinar a matéria, a questão é tratada na Lei Estadual 11.867 de 28/07/1995, dispondo o parágrafo 4°, de verbo ad verbum: ‘Art. 4° A pessoa portadora de deficiência beneficiada por esta Lei não poderá invocar sua deficiência para requerer aposentadoria ou pensão, salvo em caso de agravamento daquela, im-previsível à época do provimento do cargo.’ Conclui-se, pois, que a regra do item sob análise é restritiva e cerceia direito universal de servidor, que tem direito à aposen-tadoria nas hipóteses aqui ventiladas, pelo que não pode prevalecer tal cláusula sem a necessária ressalva.” (Edital de Concurso Público n. 793.843. Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 25/08/2009.)
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3.4 Das disposições gerais do edital8
Para além do regramento de inscrição, a Administração deverá fazer constar no edital uma série de outras previsões que estabelecem direitos e obrigações dos candidatos e da Administração Pública. É salutar que este instrumento traga em profundo nível de detalhamento todas as normas específicas que regulamentarão o certame, buscando ser fonte bastante para resolução de conflitos:
Edital de Concurso Público. Detalhamento das regras do certame. “Nesse senti-do, faz-se necessário apontar que o concurso público é um procedimento admi-nistrativo que tem por fim selecionar os melhores candidatos ao provimento de cargos, empregos e funções públicas, garantindo aos interessados em ingressar no serviço público igualdade de condições na disputa pelas vagas. O edital deve conter todas as normas específicas do certame, necessárias para orientação dos candidatos e, ainda, ser suficiente para solucionar eventuais conflitos decorren-tes da competição”. (Edital de Concurso Público n. 799.550. Rel. Conselheira Adriene Andrade. Sessão do dia 11/08/2009.)
O nome da empresa, entidade, instituição ou órgão responsável pela organização e realização do concurso devem ser divulgados de forma clara a todos os candidatos, assim como o respectivo endereço, telefone de contato e endereço eletrônico.
Em se tratando de concurso organizado por empresa privada ou outro órgão ou entidade que integre a Administração Pública e tenha sido criado para esse fim específico, é imprescindível que a Administração mantenha devidamente arquivado todo o procedimento administrativo que resultou nessa contratação, a fim de que os órgãos de controle possam efetivar a fiscalização desses atos.
Tais medidas têm em comum o objetivo de buscar evitar que haja favorecimentos, que refletem ofensa ao princípio da impessoalidade, e facilitar a verificação da regularidade dos atos e contrato firmado para execução do concurso.
Pelas mesmas razões, é necessário, sob pena de tardio controle, que sejam identificados e divulgados os nomes dos componentes da comissão organizadora do certame e da banca examinadora, especialmente nos casos em que há provas orais, com ampla divulgação, a fim de que qualquer impedimento e suspeição possam ser arguidos a tempo e modo.
3.5 Das vagas
O edital deve dispor claramente sobre o número de vagas a serem preenchidas, destacando do número geral de vagas disponíveis para cada cargo aquelas que devem ser reservadas às pessoas com deficiência, conforme o percentual nele previsto ou em conformidade com a lei de cada ente federado, que, se existente, deve também ser citada.
Ainda com relação à previsão de vagas do certame, ante a nova orientação jurisprudencial dos Tribunais Superiores,9 é recomendável que a Administração insira, no tópico que venha a 8 MAIA, Márcio Barbosa e qUEIROz, Ronaldo Pinheiro de. O Regime jurídico do concurso público e o seu controle jurisdicional. São
Paulo: Saraiva, 2007, p. 91-94
9 Vide tópico “Da Nomeação”.
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tratar do número de vagas disponibilizadas, a previsão de que os candidatos aprovados serão nomeados, inclusive, para as vagas que surgirem no decorrer do prazo de validade do concurso, expressão que, de certo modo, vinculará a Administração, mesmo que ela tenha apenas previsto em edital a formação de cadastro de reserva:
Edital de Concurso Público. Vagas Previstas. “(...) no tocante às vagas ofertadas no concurso, deverá a autoridade administrativa apresentar ao Tribunal os es-clarecimentos alusivos à formação de cadastro de reserva, consoante previsto no Anexo I do edital. Tal justificativa se faz necessária uma vez que, no Anexo II (quadro de Provimento Efetivo) (...) há indicação do número previsto para os cargos nele listados.” (Edital de Concurso Público n. 810.212. Rel. Conselheiro Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 04/02/2010.)
Edital de Concurso Público. Procedimento Administrativo. “Nos últimos tempos, no entanto, tem sido cada vez mais comum a realização de concursos públi-cos com vagas para a formação de cadastro de reserva. Na verdade, a oferta de vagas para cadastro de reserva é uma medida perspicaz da Administração Pública. Isso porque, na verdade, neste tipo de concurso nenhuma vaga está sendo oficialmente prometida. O candidato aprovado passa a fazer parte de um cadastro de reserva, ou seja, se houver necessidade, o mesmo será convocado. A tendência é que este tipo de concurso seja cada vez mais frequente, pois uma recente decisão do STJ determinou que a Administração Pública é obrigada a preencher o número de vagas prometidas em um edital de concurso público. Como sabemos que o orçamento público nem sempre é suficiente e muitas ve-zes ocorrem sérios problemas por falta de dinheiro, esta obrigatoriedade faz com que a Administração Pública passe a cada vez mais convocar concursos para formação de cadastro de reserva. Recorre-se à realização de concurso para formação de cadastro de reserva quando a administração, embora possa prever a vacância de um cargo, não pode, contudo, determinar com precisão a data de sua ocorrência, como ocorre nos casos de servidores ativos com direito à aposentadoria voluntária. No entanto, deve ter como certo que tais situações devem ser tratadas como exceções e, portanto, necessitam ser justificadas pela Administração” (Edital de Concurso Público n. 796.953. Rel. Conselheiro Eduar-do Carone Costa. Sessão do dia 03/09/2009.)
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3.6 Dos cargos
Verificada a quantidade de vagas disponíveis, de acordo com o que a Administração tenha apurado na fase interna que precede a execução do concurso propriamente dito, o edital deverá trazer informações sobre os cargos a que essas vagas correspondem, esclarecendo o seu regime jurídico e a sua lei de criação ou outra norma competente que o tenha criado.
A descrição do cargo deve ser minuciosa, contemplando, no mínimo, a enumeração de suas funções, carga horária, regime jurídico e vencimento, além da lei de criação.
REGIME JURÍDICO
Edital de Concurso Público. Previsão do Regime Jurídico. “Destaco de início que não se previu no edital a que regime jurídico será submetido o servidor aprova-do no concurso, o que é de fundamental importância. O candidato deve ter co-nhecimento prévio do citado regime, com vistas à aferição de seu interesse em ingressar nos quadros da Administração”. (Edital de Concurso Público n. 777850. Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 26/05/2009.)
LEI DE CRIAÇÃO E ATRIbUIÇÕES DO CARGO
Edital de Concurso Público. Lei de Criação do Cargo. “Não se encontram dis-criminadas, no edital, o qual também não faz remissão à legislação reguladora da espécie, as atribuições dos cargos postos em disputa e tampouco foram disponibilizados (...) os requisitos para realização da prova prática, critérios e formas de avaliação, estando ali estabelecido que a divulgação ocorrerá, opor-tunamente, em edital próprio.
quanto à ausência de divulgação das atribuições dos cargos é de se frisar que, além de comprometer o exercício da fiscalização a título de controle externo, fulmina a lisura do certame, porquanto se trata de informação essencial tanto para o candidato como para a Administração porque poderá cobrar do servidor o cumprimento rigoroso das tarefas que assumiu, defendendo, com proprieda-de, o inafastável interesse público.
Os critérios de aferição da habilidade dos candidatos devem ser disponibiliza-dos previamente, de forma objetiva e compatível com as atribuições dos cargos a fim de se evitarem avaliações com base em considerações de ordem pessoal e impertinentes de modo que sejam sopesados apenas os conhecimentos neces-sários ao desempenho das atribuições inerentes aos cargos.
A publicização das atribuições dos cargos e a prévia definição dos critérios e formas de aferição das habilidades dos candidatos na prova prática são impres-cindíveis para lisura do certame”. (Edital de Concurso Público n. 780.461. Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 06/10/2009.)
Edital de Concurso Público. Resolução da Câmara Municipal. Criação de Cargos. “Preliminarmente, cumpre ressaltar que, analisando os instrumentos normati-vos encaminhados pela Câmara Municipal (...), em especial a Resolução n. 02,
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em confronto com a Constituição da República e a Lei Orgânica do Município, verifico a ocorrência de divergência quanto à forma de criação dos cargos ofe-recidos no Edital em mesa, a qual precisa ser sopesada para que não haja com-prometimento da legalidade das contratações pretendidas. Senão vejamos:
Os cargos públicos postos em disputa não foram criados por lei, mas sim [por] (...) Resolução (...), baixada pelo Legislativo Municipal (...), a qual institui a estrutura administrativa da Câmara de Vereadores (...). A esse respeito, devo registrar que a organização básica do serviço público se faz, essencialmente, por lei. Conforme nos ensina o insuperável Hely Lopes Meirelles, no clássico Direito Administrativo Brasileiro, da Editora Malheiros, a Constituição, ao per-mitir a acessibilidade dos cargos públicos a todos os brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei, quer dizer que todo cargo público só pode ser criado e modificado por norma legal aprovada pelo Legislativo. Conforme a irrefutável definição do sobredito mestre, ‘Cargo público é o lugar instituído na organização do serviço público, com denominação própria, atribuições e responsabilidades específicas e estipêndio correspondente, para ser provido e exercido por um titular, na forma estabelecida em lei’. A criação de cargos, por lei, não pode, todavia, ser vista em bloco nos Poderes dos diversos níveis de governo, haja vista os enunciados de alguns dispositivos constitucionais que tratam da matéria, como nos ensinam outros administrativistas de escol como Diogenes Gasparini e Celso Antônio Bandeira de Mello, especificamente aqueles concernentes aos serviços auxiliares do Legislativo, caso em que se criam os respectivos cargos por resolução, na inteligência do disposto nos incisos IV do art. 51 e XIII do art. 52 da Lei Maior da República, porquanto se referem à com-petência privativa da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.
Desse modo, poder-se-ia, num primeiro momento, admitir que a Resolução (...) da Câmara Municipal (...) fosse instrumento normativo hábil para criar os cargos ofere-cidos no certame em apreço. Ocorre, porém, que a Lei Orgânica do Município (...) não tratou tal atribuição como competência privativa da Câmara de Vereadores, pelo contrário, impôs, consoante se comprova no inciso XI do art. 35, a participação do Chefe do Poder Executivo no processo de criação dos cargos públicos, in verbis:
‘Art. 35 — Compete à Câmara Municipal, com a sanção do Prefeito, dispor sobre todas as matérias de competência do Município e, especialmente: (...)
XI — criar, transformar e extinguir cargos, empregos e funções públicas e fixar os respectivos vencimentos, inclusive os dos serviços da Câmara;’ (grifo nosso)
É a própria Lei Orgânica, portanto, lei formal e material de cuja feitura não parti-cipa o Executivo, nos termos do que dispõe o caput do art. 29 da Constituição Fe-deral, que exige a criação dos cargos mediante lei, pelo que não se poderia fazê-lo por intermédio da Resolução. E não é apenas o inciso XI do art. 35 da sobredita Lei Orgânica que determina seja a criação dos cargos públicos, até mesmo os do Legis-lativo, realizada por intermédio de lei. O inciso II do art. 33 estabelece expressa-mente que à Mesa compete, dentre outras atribuições, propor projetos que criem ou extingam cargos nos serviços da Câmara e fixem os respectivos vencimentos. O art. 49, por sua vez, ao enumerar as competências exclusivas da Mesa da Câmara,
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estatui que é dela a iniciativa das leis que organizam os serviços administrativos da Câmara, a criação, transformação ou extinção de seus cargos, empregos e funções e fixam a respectiva remuneração conforme se vê no inciso II.
Na seção destinada aos Servidores Públicos, o art. 106 determina que a criação de cargos ou empregos públicos dependerá de lei, que lhes fixará o vencimento ou remuneração, bem como as condições para o seu preenchimento e atribui-ções ou tarefas típicas.
Nessa mesma seção, entretanto, o art. 110, destinado apenas aos servidores do Poder Legislativo, preceitua, nos termos do parágrafo único, que “Os cargos de serviço administrativo da Câmara Municipal serão criados por resolução, bem como a fixação de seu vencimento, respeitada a lei de diretrizes orçamentárias e a previsão de dotação orçamentária própria no orçamento anual”.
Assim, constata-se haver conflito de normas entre as disposições constantes na própria Lei Orgânica do Município (...) quanto ao diploma jurídico apto a disci-plinar a criação dos cargos do Poder Legislativo em que pese a maioria de seus dispositivos indicar a lei como espécie mais adequada.
A dissonância dos conteúdos normativos aqui colacionados necessita ser ponderada para não macular o concurso em andamento na Câmara Municipal, sendo certo que, se por um lado, a Constituição Federal permite a regulamentação da matéria por meio de resolução, consoante a competência privativa lançada nos arts. 51 e 52, não é menos certo que o legislador local optou pela adoção da lei quando disciplinou, na Lei Orgânica, as competências e atribuições do próprio Poder Legislativo.
Vale aqui transcrever o antigo provérbio que acabou sendo considerado verda-deira máxima do Direito segundo a qual ‘quem pode o mais, pode o menos’ para ressaltar que é perfeitamente possível regular, por lei, matéria que seja de alçada da resolução, tendo em vista ser aquela norma de hierarquia superior. A recíproca, portanto, não é verdadeira, ou seja, aquilo que deve ser normati-zado por lei não pode ser disciplinado por resolução. Dessa feita, considerando que os cargos postos em disputa foram criados por resolução, (...) pairando, assim, dúvida, quanto à sua legalidade, o exame do presente Edital exige toda a cautela possível para que não haja vício nas contratações almejadas.
O fato de ter vindo aos autos a Lei Municipal (...), que fixa a remuneração dos cargos ofertados, aprovada, a propósito, após a deflagração do certame, já que é datada de 17/02/09 e o Edital é de 07/01/09, com publicação em 13/01/09, não modifica os apontamentos aqui aduzidos uma vez que faz remissão aos car-gos criados pela Resolução (...), que não passou, dada a sua natureza jurídica, pelo crivo do Executivo.” (Edital de Concurso Público n. 771.232. Rel. Conse-lheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 17/03/2009.)
CARGA HORÁRIA
Edital de Concurso Público. Carga Horária. “Necessário se faz, também, seja altera-da a carga horária estabelecida para os cargos de Enfermeiro e Enfermeiro do PSF, de forma a se adequar aos moldes previstos pela lei municipal.” (Edital de Concurso Público n. 805.505. Rel. Conselheiro Sebastião Helvecio. Sessão do dia 12/11/2009.)
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TABELA DE VENCIMENTOS
Edital de Concurso Público. Fixação dos Vencimentos. “Contudo, a legislação enca-minhada, fixadora dos vencimentos dos cargos ofertados no certame, não guarda conformidade com o art. 51, IV e 52, XII da Constituição Federal vigente. É que, nos termos constitucionais, a fixação da remuneração dos servidores administrativos do Poder Legislativo se dá por meio de Lei. Somente a remuneração dos membros do Poder Legislativo, no caso, os Vereadores, é fixada por Resolução, sendo que os vencimentos dos servidores dependem de lei em sentido estrito. A matéria encon-trou tratamento diferenciado na Emenda Constitucional 19, de 1998, responsável pela alteração do art. 48 da Lei Maior. Anteriormente à reforma da Administração propiciada pela Emenda Constitucional 19, era da competência privativa do Po-der Legislativo a fixação da remuneração de seus servidores, mediante ato nor-mativo próprio — Resolução —, consoante estabeleciam os arts. 51, IV, e 52, XII, da Constituição da República. Contudo, com o advento da emenda constitucional mencionada, que impõe sua observância, ficou assentado que somente mediante lei específica, de iniciativa privativa de cada caso, poderia ser fixada ou alterada a remuneração dos servidores públicos. A Câmara Municipal (...) não observou o processo legislativo indicado pela Constituição Federal para criação de lei. A ausência de submissão da deliberação legislativa ao Chefe do Poder Executivo denota manifesta violação ao princípio da legalidade. O ato normativo, enca-minhado pelo Presidente da Câmara Municipal, expedido pela Mesa da Câmara do Poder Legislativo, não se trata de lei, em que pese a denominação do ins-trumento como tal, com indicação numérica, bem como a informação na parte final acerca da data da promulgação, o que denota indício de fraude no processo legislativo. Assim, considerando que os vencimentos indicados no edital relativos aos cargos ofertados, não tem amparo legal, já que não teve sua fixação subme-tida ao processo legislativo regular; considerando que o provimento de cargo está atrelado à instituição dos respectivos vencimentos, entendo caracterizado vício de origem, razão pela qual voto pela irregularidade do Edital de Concurso Público (...), devendo o Presidente da Câmara Municipal (...) adotar as providências ne-cessárias à anulação do certame, resguardado o direito aos candidatos inscritos da devolução da taxa de inscrição.” (Edital de Concurso Público n. 786.164. Rel. Conselheiro Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 29/10/2009.)
Edital de Concurso Público. Vencimentos dos cargos. “Insta notar que, confor-me apontado (...) [no] meu Relatório, os autos não foram instruídos com toda a documentação e legislação necessária e pertinente à análise do respectivo Edital, como o não encaminhamento da tabela de vencimentos atualizada da Prefeitura, que impossibilitou aferir a regularidade dos valores dos salários es-pecificados no Anexo I do instrumento editalício; ausência da Lei 935/2005, que prejudicou a análise da legalidade do cargo de Técnico em Higiene Dental, bem como a falta de lei que disponha sobre a escolaridade exigida para os cargos de Auxiliar de Serviços II — serviço de água, borracheiro, mecânico, recepcio-nista/telefonista, farmacêutico e médico cardiologista, por não ter sido dado tratamento à referida matéria.” (Edital de Concurso Público n. 789.665. Rel. Conselheira Adriene Andrade. Sessão do dia 26/05/2009.)
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3.6.1 Exceção à criação de cargos por meio de lei
Com relação à exigência de se exibir no edital a lei criadora dos cargos cujas vagas estão em
disputa, necessário fazer um aparte no que toca ao quadro de empregos das empresas públicas,
sociedades de economia mista e demais entidades sob controle direto ou indireto do Estado.
Acerca da situação específica dessas entidades, o Tribunal de Contas do Estado de Minas
Gerais entende que a criação de cargos nos quadros dessas entidades nem sempre terão como
instrumento a edição de lei, conforme se depreende do seguinte trecho de parecer do Ministério
Público de Contas:
Edital de Concurso Público. Criação de Cargos. Desnecessidade de edição de lei.
“É bem verdade que o Supremo Tribunal Federal (STF) vem decidindo, há muito,
que as empresas estatais prestadoras de serviço público, embora formalmente
criadas sob a roupagem de empresa pública ou de sociedade de economia mista,
têm em regra natureza jurídica de autarquia e que, por isso, sofrem maior inci-
dência do regime jurídico administrativo, submetendo-se mais sensivelmente à
influência dos princípios e regras de direito público, a exemplo da afetação espe-
cial de seus bens, da submissão a regime especial de execução dos bens afetados,
da obrigação de manter serviço adequado, da política tarifária etc.
Também é verdade, conforme doutrina do ministro Eros Grau, que tanto as em-
presas prestadoras de serviço público como as que intervêm na atividade eco-
nômica em sentido estrito submetem-se mais rigidamente a regras e princípios
próprios do regime jurídico administrativo, no que tange ao regime estrutural
e funcional interno. Ou seja, apenas quanto ao regime funcional externo da
empresa estatal exploradora de atividade econômica estrito senso é que have-
ria maior flexibilidade para sua atuação, em virtude da incidência necessária
de outros princípios constitucionais, entre eles o da livre concorrência que se
impõe à atividade privada, como determina aliás o § 1° do art. 173 da CF.
Dessas duas considerações, consolidadas no precedente firmado pelo STF, no
julgamento da ADIn 1642-3, podemos afirmar então que cabe ao Executivo de-
flagrar, através da iniciativa privativa de lei, o processo que irá consubstanciar-
se no regime jurídico estrutural das sociedades de economia mista, ou seja, na-
quilo que tange à delimitação de seu formato institucional, seja ela prestadora
de serviço público ou não, e ainda atuar em posição de supremacia aos demais
acionistas no âmbito do regime jurídico funcional interno dessas empresas, pois
tais matérias situam-se no espaço restrito de sua prerrogativa constitucional.
Ademais, sem embargo de as Recorrentes serem empresas prestadoras de serviços
públicos (art. 175, CF), e não empresas exploradoras de atividade econômica em
sentido estrito (art. 173, § 1°, CF), quadra salientar mais uma vez que os serviços
a serem por elas prestados não são de competência exclusiva da entidade política
que as instituiu, uma vez que tais serviços são de competência municipal, e não de
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competência estadual. Não se trata, portanto, de opção política do Estado de Minas
Gerais para prestação direta ou indireta de um serviço público de sua competência,
mas de uma opção político-administrativa desse Estado de concorrer com a iniciativa
privada na obtenção de concessão para prestação de serviço público municipal.
Por tal razão, embora prestem serviços públicos, entendemos estarem presentes dois elementos fundamentais à submissão dessas empresas a um regime jurídico mais flexível: a não dependência econômico-financeira da entidade política a qual se vincula e o fato de que elas precisam concorrer com empresas privadas para a obtenção da concessão pública a ser conferida pelos municípios.
Assim, a instituição do ‘quadro de empregos das empresas públicas, sociedades de economia mista e demais entidades sob controle direto ou indireto do Esta-do’ por lei ordinária, deve se restringir aos casos em que essas entidades forem dependentes do Estado, pouco importando, portanto, que sejam prestadoras de serviço público ou que intervenham na atividade econômica em sentido estrito, porque nesse caso estaremos diante de verdadeiras entidades autárquicas, re-fletindo simetricamente o modelo federal instituído para essas entidades.
Resta claro, portanto, em virtude do espaço de interpretação até aqui deline-ado, que o art. 61, X, da Constituição do Estado de Minas Gerais comportaria ao menos duas interpretações possíveis, dentre as quais uma que pode ser con-siderada inconstitucional, embora as outras possam ser consideradas constitu-cionais. Dessa forma, entendemos razoável a aplicação da técnica da interpre-tação conforme a Constituição, sem redução de texto, a fim de preservar as interpretações que sejam compatíveis e evitar uma desnecessária ou imprópria declaração de inconstitucionalidade do dispositivo.
Nesse sentido, a norma deve ser interpretada de modo a não alcançar as em-presas independentes, ou seja, aquelas que não são subvencionadas pelo Poder Público para as despesas de custeio, pois que para isso são adequadamente remuneradas pelas tarifas decorrentes dos serviços prestados, embora possam receber recursos do orçamento de investimento da entidade a qual se vincula.
Portanto, independentemente da existência de lei instituidora do quadro de pessoal das ora Recorrentes, parece-nos suficiente para validar a instituição do concurso público deflagrado o ato de governo consubstanciado na autorização da Câmara de Coordenação Geral, Planejamento e Gestão, porque pautado na delegação operada pelo Decreto 43.227, de 24 de março de 2003.
Ressalte-se, por óbvio, que essa interpretação não retira do Tribunal de Contas o poder de aferir a adequação dessas contratações com as necessidades da entidade, especialmente no que tange ao número de empregos criados, embora não se trate mais de controle da legalidade formal, restrito a simples subsunção do total de va-gas oferecidas ao quantitativo definido pela lei. Trata-se evidentemente de controle muito mais complexo porque volvido à apreciação da legitimidade dos atos, e que juntamente com a tutela exercida pelo Poder Executivo sobre os atos da administra-ção indireta, deverá contê-los aos exatos limites autorizados pelo ordenamento.”
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(Parecer do Ministério Público de Contas. Procurador Cláudio Couto Terrão. Au-tos do Recurso Ordinário n. 772.587. Rel. Conselheiro Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 15/07/2009.)
3.6.2 Requisitos e exigências para o acesso aos cargos
Independentemente do instrumento por meio do qual se crie determinado cargo ou emprego
público, é com a verificação dos requisitos constantes da norma legal que os candidatos e outros
interessados poderão acessar quais são as exigências mínimas para que se possa pretender
àquela determinada vaga.
De modo geral, o edital deverá exigir do candidato aquilo que guarde correspondência com o
exercício das funções inerentes ao cargo/emprego público e que esteja previsto em norma de
regência daquele cargo e de seu regime jurídico, que deverão, por sua vez, enumerar requisitos
que tenham pertinência com o exercício das funções.10
Todo o resto que extrapole essas exigências legais deverá ser objeto de apuração.
Edital de Concurso Público. Exigências no Ato de Inscrição. Razoabilidade. “O [edital] (...) estabelece como condição para admissão dos candidatos a apre-sentação da caderneta de vacinação dos filhos com idade entre 1 e 5 anos. Tal requisito não tem pertinência com o exercício dos cargos disponibilizados no concurso público. Não se questiona a importância da vacinação de crianças com idade entre 1 e 5 anos, mas daí a condicionar a admissão do candidato à sua comprovação por meio da apresentação dessa caderneta, não me parece razo-ável, até porque o candidato aprovado cumpriu todas as exigências atinentes à disputa, existindo outros meios de se implementar esta política de saúde que não por meio da regra do [edital] (...)”. (Edital de Concurso Público n. 780.461. Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 06/10/2009.)
Edital de Concurso Público. Condições Exigidas no Ato da Inscrição. “(...) as condi-ções exigidas no ato de inscrição contrariam o princípio da igualdade, bem como a jurisprudência esposada pelo STJ expressa na Súmula n. 266. Assim (...) [o] edital (...) [deve ser alterado] para definir que as condições arroladas serão exigidas na data da posse, e não no momento da inscrição.” (Edital de Concurso Público n. 790.718. Rel. Conselheiro Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 02/07/2009.)
3.6.2.1 Escolaridade mínima exigida
Do mesmo modo, a escolaridade mínima exigida para preenchimento dos cargos/empregos
públicos será parametrizada pela lei de criação, uma vez que deverá guardar correspondência
com as atribuições do cargo.
Além da lei de criação, as exigências de escolaridade devem obedecer às normas que
regulamentam o exercício das categorias profissionais. 10 MAIA, Márcio Barbosa e qUEIROz, Ronaldo Pinheiro de. O Regime jurídico do concurso público e o seu controle jurisdicional. São
Paulo: Saraiva, 2007, p. 102
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Edital de Concurso Público. Escolaridade. “Foram detectadas divergências en-tre os requisitos de escolaridade constantes no edital e aqueles previstos nas leis de criação dos cargos. Nesse aspecto, deverão ser procedidas as necessárias adequações desses requisitos para os cargos de Agente Comunitário de Saúde, Agente de Saúde e Auxiliar de Farmácia, Professor e Motorista da ambulância.” (Edital de Concurso Público n. 805.505. Rel. Conselheiro Sebastião Helvecio. Sessão do dia 16/11/2009.)
Edital de Concurso Público. Escolaridade. “Segundo o órgão técnico, (...), pode-se constatar que há divergência entre o Edital e a Lei (...), tendo em vista que o cargo de Recepcionista requer tão somente a escolaridade ‘Ensino Fundamental’, sendo que o Edital exige que o candidato tenha concluído o ‘Ensino Médio’.
Além disso, segundo a Lei (...), os cargos de Auxiliar de Limpeza (Saúde), Locu-tor e Contínuo requerem escolaridade ‘Ensino Fundamental’, sendo exigido no Edital apenas a conclusão da 1a a 4a séries do ‘Ensino Fundamental’.
Dessa forma, deve ser revisto o Edital, no que diz respeito a tais divergências.” (Edital de Concurso Público n. 793.481. Rel. Conselheiro Antônio Carlos Andra-da. Sessão do dia 29/09/2009.)
Entende-se que quaisquer exigências que limitem a acessibilidade a determinado cargo devem
estar expressamente previstas em lei, isso porque, desse modo, a exigência limitadora,
submetida ao crivo de um processo legislativo, goza de presunção de constitucionalidade.
Por essa razão, requisitos que estabeleçam o limite de idade, de altura mínima e de tempo de experiência
profissional deverão estar amparados em normas, preferencialmente, na lei de criação do cargo.
Edital de Concurso Público. Altura Mínima. “Se o limite etário encontra previsão em lei, em sentido formal, o mesmo não acontece com a exigência de altura mínima, que se encontra prevista no art. 2º do Decreto n. 7724/06. Como o Decreto não é ato normativo hábil para impor condições restritivas para parti-cipação em concurso, a previsão editalícia contida no subitem 9.1, alínea “f”, é ilegal.” (Edital de Concurso Público n. 811.820. Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 09/02/2010.)
Edital de Concurso Público. Limite de Idade. “Não restou demonstrada a lega-lidade da imposição do limite de idade para os cargos de vigia e operário (item 1, fls. 03-04). Nesse aspecto, em não existindo suporte legal para justificar o limite de idade em razão das atribuições do cargo, deverá tal exigência ser excluída.” (Edital de Concurso Público n. 803.696. Rel. Conselheiro Sebastião Helvecio. Sessão do dia 22/10/2009.)
3.6.2.2 Tempo de experiência profissional
Edital de Concurso Público. Comprovação da Experiência Profissional. “O [edital] (...), na redação original, considerava para fins de comprovação de experiência profissional (...) os serviços prestados tanto na Administração Pública quanto na iniciativa privada, divergindo, entretanto, do Anexo (...), que somente pontua
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a experiência profissional do candidato na Administração Pública, o que por si só já comprometia a pontuação da prova de títulos. Para os candidatos aos cargos de Médico III, Profissional de Enfermagem II, IV e VI, Analista de Gestão e Assistência à Saúde I e III e Técnico Operacional de Saúde II.
Com a alteração (...) [do edital] pela errata publicada no Minas Gerais de 10/06/09, vê-se que foi modificada a forma de comprovação da experiência profissional, não restando evidenciada a possibilidade de computar a experiên-cia na iniciativa privada, ao passo que o Anexo (...) pontua apenas o tempo de serviço prestado em órgãos ou entidades da Administração Pública Direta ou In-direta, Municipal, Estadual ou Federal, ferindo, pois, o princípio constitucional da isonomia já que não considera título a experiência profissional na iniciativa privada, mas tão somente na esfera pública.
A esse respeito, [o órgão] (...) alega que a adoção do critério previsto no Edital teve como fundamento a recomendação acostada aos autos (...), exarada pela Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público à Superintendente do Hospital Municipal Odilon Behrens, por ocasião da publicação do Edital (...), uma vez que o ato convocatório pontuava somente o tempo de serviço prestado à Administração Direta e Indireta do Município de Belo Horizonte, em desacordo com os princípios constitucionais da isonomia, legalidade e impessoalidade, de-vendo ser eliminado esse critério ou, alternativamente, agregada a possibilida-de de computar a experiência profissional no âmbito Estadual e Federal, nada se referindo ao setor privado.
Ressalta, por fim, que, na hipótese em exame, ‘o fator de discrímen se justifica em razão da busca por profissionais especializados que atuem junto ao serviço público e contém experiência no trato dos usuários do SUS e das rotinas de tra-balho dos hospitais públicos’.
Sem razão, contudo, o defendente.
Conforme ponderou o Ministério Público junto ao Tribunal, a atribuição de pon-tos para os candidatos que comprovarem experiência profissional está contida nas prerrogativas da Administração Pública e confere efetividade ao princípio constitucional da eficiência. Contudo, a possibilidade de computar a experiên-cia na esfera pública, em detrimento da obtida na iniciativa privada, macula o princípio da isonomia, garantido constitucionalmente no caput do art. 5° da Lei Maior da República.
É que o critério eleito no Edital em mesa cria verdadeira reserva de mercado para os candidatos possuidores de experiência profissional na área pública, o que o ordenamento jurídico pátrio não permite, consoante ponderou, a propó-sito, a 2a Promotoria de Justiça da Defesa da Saúde ao alertar que as jurispru-dências do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal de Justiça de Minas Gerais mostram ser inaceitável a aferição de pontos, tendo em vista o mero exercício de função pública, tratando-se de vantagem e privilégio concedidos à determi-nada classe de pessoas em detrimento dos concorrentes em geral.
Conforme orientação doutrinária lançada pelo Prof. Fabrício Motta, in Concurso público e Constituição, 1a edição, Belo Horizonte: Fórum, 2007, p. 34, a despei-to de entender que não devem ser considerados como títulos os anos de efetivo exercício no serviço público e muito menos se somente levar em conta o presta-do à entidade promotora do certame, conforme decidiu o TJSP ao julgar incons-
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titucional resolução da Assembléia Legislativa de São Paulo (Boletim da AASP, n. 2.313, p. 2.633), crê que ‘De fato, no concurso público para a nomeação de médico nada obsta que tanto o tempo da atividade privada como da pública seja considerado como título. Mas será ilegal se na atividade privada não existir correspondente atividade’, o que, em princípio, não é o caso dos autos.
Paradigma que pode ser invocado para corroborar o entendimento ora abraçado re-fere-se ao RE 221966/DF, Relator Ministro Marco Aurélio, mediante o qual o Supremo Tribunal Federal decidiu que vulnera o princípio isonômico validar-se, como título, a prestação dos serviços de advocacia a pessoa jurídica de direito público e não fazê-lo no tocante à iniciativa privada, conforme excerto que trago à colação:
‘(...) Não fora este aspecto, tem-se mais que se acabou por colocar em plano secundário o princípio isonômico, ao estabelecer-se a pontuação de 12 pontos para o exercício de cargo técnico jurídico em órgãos da administração pública federal, estadual ou municipal, deixando-se de adotar idêntico procedimento para os tomadores de serviços situados no âmbito da iniciativa privada. Ora, no caso, o exercício profissional no cargo técnico jurídico de advogado não varia conforme se trate de pessoa jurídica de direito público ou pessoa jurídica de direito privado como é, por exemplo, o Banco Itaú S/A, para qual exerceu a Impetrante a advocacia. O fator de discriminação não é socialmente aceitável, não se mostra proporcional e razoável considerados os objetivos da Carta da República e, até mesmo, a experiência buscada quando se empresta pontuação ao exercício da advocacia.’
Por essas razões, determino que seja excluída a possibilidade de pontuar experi-ência profissional na prova de títulos, quer na esfera pública, quer na esfera par-ticular ou, alternativamente, que se considere a experiência profissional na ini-ciativa privada nos mesmos moldes do previsto para o setor público, procedendo-se as devidas adequações do Anexo (...).” (Edital de Concurso Público n. 789.736. Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 22/09/2009.)
No caso da experiência profissional de 03 (três) anos para provimento nas carreiras jurídicas da Magistratura e do Ministério Público, a exigência foi prevista em nível constitucional, em decorrência das alterações promovidas pela Emenda Constitucional n. 45 nos artigos 93, inciso I e 129, § 3º da CR/88. De se notar que as alterações promovidas pela indigitada emenda, referem-se exclusivamente aos cargos de juízes e membros do Ministério Público, havendo necessidade, portanto, de que para outras carreiras haja previsão em lei do tempo de experiência que deve ser observado.
Edital de Concurso Público. Exigência de Prática Jurídica. Previsão Legal. “No que tange ao item 20 do meu Relatório, que versa sobre [determinados subitens do edital] (...), os quais apontam a necessidade de o candidato comprovar o exercício de 2 (dois) anos de prática jurídica, entendo que tal exigência não encontra amparo na Constituição da República ou na Lei Complementar Esta-dual n. 65/2003, posto que a Emenda Constitucional n.º 45/2004 prevê essa condição, apenas, para a Magistratura e para o Ministério Público, não havendo esta previsão, sequer na lei que organiza a Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais.” (Edital de Concurso Público n. 760.740. Rel. Conselheira Adriane
Andrade. Sessão do dia 02/12/2008.)
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3.7 Das provas
Sobre as provas, o edital poderá trazer, de início, data provável para sua realização, a fim de que os candidatos possam se programar. Contudo, a confirmação dessa data, assim como a definição do local e horário para realização, deverão ser acertados e comunicados a todos os candidatos com período razoável de antecedência, de preferência logo após o encerramento das inscrições.
É recomendável que a instituição responsável pela realização do processo seletivo procure comunicar pessoalmente todos os candidatos inscritos, remetendo correspondência ao endereço por eles indicado quando da inscrição.
De toda sorte, a comunicação pessoal via correio constitui-se num plus, devendo a Administração promover a publicidade desses dados por meios usuais e obrigatórios, como já consignado, a saber: jornais oficiais, jornais de grande circulação e internet — no site organizador e no site oficial da entidade ou ente federado promotor do concurso.
O edital do concurso deverá especificar, preferencialmente em destaque, orientações gerais aos candidatos para o dia em que se realizarem as provas: horário de chegada com antecedência, porte de documentos e objetos permitidos e necessários para a realização das provas (caneta, lápis, borracha, etc.), assim como os objetos cujo porte será proibido, tempo de duração total das provas etc.
À vista desses regramentos e proibições, a Administração estabelecerá as sanções para aqueles que infringirem as regras estipuladas no edital.
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3.7.1 Orientações gerais à realização das provas
Todas as etapas do certame, com a natureza das provas e número de candidatos convocados às etapas subsequentes, deverão estar dispostas no edital.
É de fundamental importância que se esclareça quais provas terão caráter eliminatório ou classificatório, a pontuação mínima exigível para aprovação do candidato e continuidade nas próximas etapas, assim como o número total de questões de cada prova, valoração de cada questão e os critérios para a apuração da nota final e para a classificação dos candidatos.
Edital de Concurso Público. Fases do Certame. Caráter das Provas. “Apesar de constar no preâmbulo do edital que o concurso público será de provas e títulos, o [edital] (...) estabelece que o certame será realizado em etapa única. Ademais, verifica-se que, além das provas objetivas de múltipla escolha, serão atribuídos pontos por tempo de serviço e pelos certificados apresentados (...). Assim sendo, necessário sejam especificadas, no instrumento convocatório, as fases do certame, detalhando o caráter eliminatório ou classificatório de cada uma delas, devendo também ser explicitados, em itens próprios, os prazos e condições para a apresen-tação da respectiva documentação comprobatória.” (Edital de Concurso Público n. 805.505. Rel. Conselheiro Sebastião Helvecio. Sessão do dia 12/11/2009.)
No que tange ao conteúdo a ser exigido dos candidatos na realização das provas, o edital deve dispor, obrigatoriamente, sobre o conteúdo programático, o qual, como já se delineou acima, tem de guardar correspondência com as atribuições de cada cargo/emprego público. É possível enumerar no edital o conteúdo que será exigido de todos os candidatos, de forma indistinta, assim como as matérias específicas de cada cargo.
A indicação de bibliografia, por sua vez, não é cogente para Administração — trata-se de faculdade. Mas, uma vez indicada bibliografia, recomendável fazer constar do texto do edital que ela é apenas sugerida, resguardado à Administração o direito de seguir a orientação doutrinária de outros autores.
Edital de Concurso Público. Anulação de questões do Certame. “(...) o [edital] (...) deve ser alterado para que especifique que a anulação de qualquer questão do certame, seja por recurso administrativo ou por decisão judicial, resultará em benefício de todos os candidatos, ainda que estes não tenham recorrido ou ingressado em juízo.” (Edital de Concurso Público n. 790.718. Rel. Conselheiro Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 02/07/2009.)
Edital de Concurso Público. Conteúdo das Provas. “A disposição contida no (...) edital, no sentido de que as provas poderão abordar outros conteúdos para além dos previstos no Anexo (...), que trata exatamente do programa das pro-vas, deverá ser excluído, porquanto a enumeração das matérias e pontos que serão abordados em cada prova é vinculativa para a Administração, assim como a bibliografia também o será.” (Edital de Concurso Público n. 792.200. Rel. Con-selheiro Antônio Carlos Andrada. Despacho proferido em 16/06/2009.)
quanto à realização das provas, o edital não pode conter restrições absurdas aos candidatos,
que os sujeitem a situações intimidatórias ou representem rigores demasiados.
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Edital de Concurso Público. Realização das Provas. “Relativamente ao item (...)
do Edital, acerca da realização das provas, (...) que dispõe sobre a permanên-
cia obrigatória dos últimos 3 (três) candidatos no recinto da realização da prova
objetiva e da prova prática, ‘até que o último candidato entregue sua prova,
devendo esses três candidatos saírem juntos e, caso algum candidato se recuse
a permanecer no recinto, considerar-se-á excluído do concurso’, entendo que
essa exigência deverá ser revista, à luz dos princípios da Administração Pública,
em especial, da razoabilidade e isonomia.
Releva notar que a Administração possui liberdade para fixar os critérios e nor-
mas previstas no Edital, especialmente, em relação às condições de realização
da prova, para tanto, deve estabelecer condições que busquem selecionar os
melhores candidatos ao provimento de cargos, empregos e funções públicas,
garantindo aos interessados em ingressar no serviço público, igualdade de con-
dições na disputa pelas vagas, em obediência ao inciso I, art. 37, da Carta
da República, in litteris: ‘Art. 37. A administração pública direta e indireta
de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Mu-
nicípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: I — os cargos, empregos e
funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos es-
tabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei’.
Nesse contexto, entendo que a exigência contida no (...) Edital mostra-se restri-
tiva e ofende o princípio da isonomia, posto que não é razoável excluir do cer-
tame candidato que se recuse a permanecer no local da prova, até que o último
candidato finalize sua prova, devendo ser alterada.” (Edital de Concurso Público
n. 769.107. Rel. Conselheira Adriene Andrade. Sessão do dia 16/12/2008.)
O edital deverá prever, ainda, a possibilidade da realização das provas em condições especiais
por candidatos que comprovem tal necessidade.
Edital de Concurso Público. Realização das Provas em Condições Especiais. “Não
há previsão no texto do edital para a realização de prova por candidato não
portador de deficiência que necessite de condições especiais para tal. Não há,
também, previsão para candidata lactante que necessitar amamentar durante a
realização da prova em sala reservada. Deve ser previsto expressamente no tex-
to, de forma a evitar futuros questionamentos.” (Edital de Concurso Público n.
765.773. Rel. Conselheiro Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 20/11/2008.)
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3.7.2 Tipos de provas11
De maneira geral, a Administração poderá lançar mão dos seguintes tipos de prova como critério à seleção de seus candidatos:
— provas objetivas: mais comumente utilizadas, servem, em geral, como primeira avaliação de candidatos, seja em concursos de etapa única ou em outros constituídos de mais etapas. Pode ser fixada uma pontuação mínima para considerar-se determinado candidato aprovado.
Recomenda-se que esse tipo de avaliação esteja alicerçada em critérios objetivos e impessoais, com questões de múltipla escolha nas quais haja o menor espaço para interpretações subjetivas.
Como será objeto de maior detalhamento no tópico que trata dos critérios de desempate, as questões referentes a diferentes matérias poderão ter pesos diferenciados, privilegiando aquelas matérias que estejam mais relacionadas com o exercício das funções.
— provas discursivas ou dissertativas: diferentemente das provas objetivas de múltipla escolha, 11 MAIA, Márcio Barbosa e qUEIROz, Ronaldo Pinheiro de. O Regime jurídico do concurso público e o seu controle jurisdicional. São
Paulo: Saraiva, 2007, p. 104-134
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quando se pretende que a questão tenha apenas uma resposta correta, nas provas discursivas,
cuja finalidade é aferir o conhecimento do candidato com mais profundidade, deve ser perseguida
a resposta correta e mais adequada.
No caso dessa espécie de prova, é de fundamental importância que se dê atenção aos critérios de
correção, que devem ser claros, objetivos e, se possível, previamente divulgados aos candidatos,
a exemplo dos descontos decorrentes da inobservância do padrão da Língua Portuguesa.
Necessário, ainda, que se divulgue a banca examinadora e se providencie a abertura de vista
da correção, oportunidade na qual os candidatos poderão apreciar as razões de correção dos
examinadores, que, por isso, deverão estar devidamente fundamentadas.
— provas orais: em respeito aos princípios da publicidade, impessoalidade e do contraditório,
essas espécies de prova devem ser realizadas em sessão pública e gravadas. O candidato que
queira dela decorrer deverá ter acesso à gravação.
Como as demais avaliações, deve estar alicerçada em critérios objetivos, evitando-se o subjetivismo.
Também a banca avaliadora deverá ter o nome de seus componentes divulgados com antecedência.
Edital de Concurso Público. Gravação de Provas Orais. “quanto às disposi-ções acerca das provas orais, (...) que versam sobre a possibilidade de o examinador optar ora por questões objetivas ora por trabalhos simulados, bem como sobre a faculdade de ser exigido comentário sobre texto legal, conforme disposto (...) [no] Edital, reputo como graves essas condições, em face de ausência de objetividade e do tratamento diferenciado entre os candidatos. Relativamente ao subitem (...) que versa sobre a gravação das provas orais exclusivamente pela Comissão do Concurso, entendo que merece reparo, devendo a (...) [entidade] estabelecer todas as condições e requisitos que possibilitem a gravação das provas orais, também, pelos presentes, devendo, contudo, acautelar-se para que essa prerrogativa não dificulte o transcorrer das provas e não traga prejuízo para os candidatos e para o Órgão”. (Edital de Concurso Público n. 760.740. Rel. Conselheira Adriane Andrade. Sessão do dia 02/12/2008.)
Edital de Concurso Público. Prova Oral. Critérios Objetivos. “(...) descum-primento do entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que o exame dos atos da banca examinadora e das normas do edital de concurso público, pelo Judiciário, restringe-se aos princípios da legalidade e da vinculação ao edital, merecendo reparo, portanto, o item (...) da carta convocatória em exame que estabelece: ‘nas provas orais, a avaliação para cada conteúdo valerá 10 (dez) pontos, a critério dos respecti-vos examinadores’. Essa disposição denota ausência de definição metodoló-gica para avaliação do conteúdo do exame, bem como sua valoração, o que redunda irregular.” (Edital de Concurso Público n. 760.740. Rel. Conselheira Adriene Andrade. Sessão do dia 02/12/2008.)
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— provas de habilidade específica: exigíveis somente quando se mostrar necessário aferir a habilidade do candidato para desempenho das atribuições do cargo (ex.: ao cargo de professor, ministrar aula; prova de digitação, etc.). Não deve ser sigilosa.
— provas de capacidade física: de caráter eliminatório, visa verificar se o candidato apresenta os requisitos físicos minimamente exigíveis ao desempenho das funções do cargo — por essa razão, os critérios dessa avaliação deverão sempre estar em consonância com as atribuições que serão exercidas pelo futuro servidor.
— provas de avaliação psicológica: também têm caráter eliminatório. É direito dos candidatos o acesso ao laudo psicológico bem como o esclarecimento acerca do método de avaliação utilizado, a fim de possibilitar eventual impugnação do exame.
Além disso, esse tipo de prova deverá estar previsto em lei formal.
Edital de Concurso Público. Exame Psicotécnico. Previsão em Lei. “Todavia, no
que diz respeito à previsão de avaliação psicológica para os cargos de Agente
Patrimonial, Educador Infantil e Professor de Pré a quarta sem respaldo legal,
trata-se de vício grave, contrário à ordem constitucional. Com efeito, dispõe
o inciso I do art. 37 da CR/88: ‘I — os cargos, empregos e funções públicas são
acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei,
assim como aos estrangeiros, na forma da lei’. Do dispositivo legal transcrito,
surge a possibilidade de aferição da situação individual de cada concorrente
mediante exames específicos de acordo com a necessidade da administração,
como o médico, o físico e o psicotécnico. Entretanto, o requisito deve estar
expresso na lei que regula o certame ou na que fixa os pressupostos de pre-
enchimento do cargo, sendo inadmissível a imposição meramente editalícia,
em resoluções e demais atos regulamentares infralegais.” (Edital de Concurso
Público n. 770.584. Rel. Conselheiro Antônio Carlos Andrada. Sessão do dia
16/06/2009.)
Edital de Concurso Público e Representação. Avaliação Psicológica do Candida-
to. “Entendo que a avaliação psicológica prevista no (...) Edital configura-se
como grave irregularidade, devendo ser eliminada, por ausência de previsão
na Lei Complementar Estadual n. 65/2003 (...). Cabe-me ressaltar o entendi-
mento do Superior Tribunal de Justiça acerca da impossibilidade de previsão
de psicotécnico quando não houver lei autorizativa anterior, consubstanciada
no Agravo Regimental em Mandado de Segurança n. 2007/0261958-7, publi-
cado em 18/08/2008, segundo a qual o psicotécnico só tem sua legalidade
subordinada a três pressupostos: previsão legal, cientificidade dos critérios
adotados e poder de revisão. Nessa mesma esteira de entendimento é a orien-
tação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal, em sua Súmula n. 686.”
(Edital de Concurso Público n. 760.740. Rel. Conselheira Adriene Andrade.
Sessão do dia 02/12/2008.)
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— provas de títulos: essa espécie de prova somente poderá ter caráter classificatório. Os títulos
que serão aceitos e sua respectiva pontuação — com a previsão do máximo de pontuação por
cada espécie de título — devem estar dispostos previamente no edital de convocação.
Edital de Concurso. Percentual fixado para valoração de título. Razoabilidade. “Os subitens 6.2.1 e 6.2.2 do edital estabeleceram a possibilidade de se atribuir pontuação para tempo de serviço aos servidores estáveis da Prefeitura de (...) na forma do § 1º do art. 19 do ADCT da CR/88, na ordem de 01 (um) ponto por ano efetivamente trabalhado até o máximo de 20 (vinte) pontos.
Seguindo a linha de raciocínio do representante do Ministério Público (fls. 63), também entendo que não há vedação para que o edital estabeleça pontuação para os servidores estáveis em razão do ADCT da CR/88, contudo, entendo não ser razoável a pontuação estabelecida, considerando que corresponde a 20% da soma geral da pontuação da prova objetiva, que perfaz 100 (cem) pontos.
Nesse esteio, caso seja mantida a pontuação máxima prevista, estar-se-á diante de uma situação de privilégio àqueles que possuem tal titulação, criando verdadeira desigualdade àqueles que não tiveram vida pública pregressa no Município de (...).
Por essa razão, há que se proceder à revisão do referido dispositivo, reduzindo-se para 10% o quantitativo de pontos atribuídos aos títulos em relação ao soma-tório global das provas objetivas. (Edital de Concurso Público n. 799.551. Rel. Conselheiro Antônio Carlos Andrada. Despacho proferido em 22/09/2009.)
Decerto, os títulos válidos deverão ser aqueles que guardam pertinência com as atribuições
públicas a serem exercidas. De igual modo, o procedimento para entrega dos títulos deverá ser
antecipadamente estabelecido, fixando-se o local, período e o horário.
Edital de Concurso Público. Prova de Títulos. Princípio da Isonomia. “Conforme
ponderou o Ministério Público junto ao Tribunal, a atribuição de pontos para os
candidatos que comprovarem experiência profissional está contida nas prerrogati-
vas da Administração Pública e confere efetividade ao princípio constitucional da
eficiência. Contudo, a possibilidade de computar a experiência na esfera pública,
em detrimento da obtida na iniciativa privada, macula o princípio da isonomia,
garantido constitucionalmente no caput do art. 5° da Lei Maior da República.
É que o critério eleito no edital em mesa cria verdadeira reserva de mercado
para os candidatos possuidores de experiência profissional na área pública, o
que o ordenamento jurídico pátrio não permite, consoante ponderou, a propó-
sito, a 2a Promotoria da Defesa da Saúde, ao alertar que as jurisprudências do
Supremo Tribunal Federal e do Tribunal de Justiça de Minas Gerais mostram ser
inaceitável a aferição de pontos, tendo em vista o mero exercício de função
pública, tratando-se de vantagem e privilégio concedidos à determinada classe
de pessoas em detrimento dos concorrentes em geral.
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Conforme orientação doutrinária lançada pelo Prof. Fabrício Motta, in Concurso público e Constituição, Belo Horizonte: Fórum, 2007, p. 34, a despeito de enten-der que não devem ser considerados como títulos os anos de efetivo exercício no serviço público e muito menos se somente levar em conta o prestado à entidade promotora do certame, conforme decidiu o TJSP ao julgar resolução da Assembléia Legislativa de São Paulo, (Boletim da AASP, n. 2313, p. 2633), crê que ‘De fato, no concurso público para nomeação de médico nada obsta que tanto o tempo da ati-vidade privada como da pública seja considerado como título. Mas será ilegal se na atividade privada não existir correspondente atividade’, o que, em princípio, não é o caso dos autos”. (Edital de Concurso Público n. 797.648. Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 27/10/2009.)
Edital de Concurso Público. Prova de Títulos. Critérios de Apuração. “No que tange ao item 11 de meu Relatório, entendo que incide equívoco [em subitem] (...) do Edital, uma vez que atribui pontuação máxima aos títulos apresentados pelos candidatos independentemente de sua graduação e número, em descon-formidade ao disposto [em outro subitem do edital] (...), que especifica, em campos próprios de seu quadro, os títulos, as especificações de cada um deles, a forma de comprovação e a pontuação máxima.
O (...) edital estabelece que a pontuação máxima dos títulos corresponde ao dobro do critério estabelecido, ou seja, 02 (dois) certificados para cada titulação, restan-do evidente que deve ser observada a espécie e a quantidade de títulos apresenta-dos, bem como a atribuição de pontos deve ser efetuada caso a caso, conforme o título, fixando-se o valor de acordo com o critério estabelecido no edital e, ainda, devem ser atribuídos os pontos tendo em vista a quantidade de titulação apresen-tada dentro do limite máximo fixado no edital”. (Edital de Concurso Público n. 796.113. Rel. Conselheira Adriene Andrade. Sessão do dia 1º/09/2009.)
Edital de Concurso Público. Prova de Títulos. Critérios Objetivos para Pontuação. “No que concerne aos itens (...) de meu Relatório, que versam sobre (...) [deter-minados subitens do edital] (...) entendo que (...) deve ser excluída ou alterada a sua redação, a fim de ser considerado, como título, a participação em banca examinadora de concurso público para cargos privativos de bacharel em direito.
De igual modo deve ser excluída a mencionada alínea (...), que trata da avaliação de publicação de trabalho jurídico de autoria exclusiva do candidato, caso seja considerado de significativo valor pela Comissão do Concurso, uma vez que o critério de avaliação denota subjetividade”. (Edital de Concurso Público n. 760.740. Rel. Conselheira Adriene Andrade. Sessão do dia 02/12/2008.)
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3.8 Da divulgação dos resultados provisórios12
O edital de concurso deve ter todos os seus atos publicados em jornal oficial, jornais de grande circulação ou de circulação local e internet — no site organizador e no site oficial da entidade ou ente federado promotor do concurso.
Dentre os atos cuja publicação é cogente, incluem-se alterações do edital, alterações da data de realização das provas, avisos sobre resultado de recursos e também a listagem dos classificados, etapa a etapa, assim como a convocação para as etapas posteriores e o local onde essas informações estarão disponíveis com maiores detalhes.
3.9 Dos recursos
O edital não pode se furtar em prever e regulamentar a interposição de recursos administrativos. Embora se trate de direito constitucionalmente assegurado, permite-se que a Administração limite a interposição de recurso em cada fase, de modo a evitar entraves do certame.
Importante que estejam bem esclarecidos os prazos para interposição assim como para a divulgação dos resultados, mencionando-se o meio pelo qual se dará essa divulgação.
Edital de Concurso Público. Anulação de questões da Prova. “Mister se faz constar do edital que a anulação de qualquer questão do certame, seja por recurso administra-tivo ou por decisão judicial, resultará em benefício de todos os candidatos, ainda que
12 MAIA, Márcio Barbosa e qUEIROz, Ronaldo Pinheiro de. O Regime jurídico do concurso público e o seu controle jurisdicional. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 134
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estes não tenham recorrido ou ingressado em juízo.” (Edital de Concurso Público n. 803.696. Rel. Conselheiro Sebastião Helvecio. Sessão do dia 22/10/2009.)
Edital de Concurso Público. Anulação de questões da Prova. “(...) a anulação de qualquer questão do certame seja por recurso administrativo ou por deci-são judicial, resultará em benefício de todos os candidatos, ainda que estes não tenham recorrido ou ingressado em juízo.” (Edital de Concurso Público n. 801.112. Rel. Conselheiro Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 1°/10/2009.)
Edital de Concurso Público. Impossibilidade de Recurso Contra questões da Pro-va. (...) consta no [edital] (...) que ‘somente serão aceitos recursos contra questões de prova baseados, exclusivamente, nas referências bibliográficas in-dicadas neste edital’, contrariando o princípio da razoabilidade, visto que as ci-tadas referências bibliográficas devem ser consideradas apenas como sugestões e não como única fonte de estudo. (Edital de Concurso Público n. 796.065. Rel. Conselheiro Elmo Braz. Sessão do dia 27/08/2009.)
Edital de Concurso Público. Interposição de Recurso: Meios de Apresentação do Re-curso e Prazos. “(...) sobre interposição de recurso alusivo ao certame, não trazem previsão de que sua interposição poderá ser feita por meio de procurador. Estabe-lece o [edital] (...) que os recursos interpostos em desacordo com as especificações contidas naquele capítulo não serão avaliados. Destarte, não estando prevista a interposição de recurso por meio de procurador, o candidato poderá ter seu recurso não conhecido, por não resguardar estrita obediência àqueles comandos. Constata-se, ainda, que no [instrumento convocatório] (...), estabeleceu-se o prazo de 5 (cinco) dias após a concretização do evento para interposição de recurso, não ten-do sido especificado se dias corridos ou úteis. Tal dispositivo cerceia o direito ao contraditório e ampla defesa constitucionalmente garantido, já que tal prazo pode ficar reduzido para 2 (dois) dias, se o evento que lhes disser respeito ocorrer, por exemplo, em uma quinta-feira, na hipótese de se verificar feriado na sexta-feira. Impõe-se, pois, inserção no texto de regra que estabeleça que o dies a quo tenha início no primeiro dia útil subsequente ao evento.” (Edital de Concurso Público n. 793.843. Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 25/08/2009.)
Edital de Concurso Público. Interposição de Recursos. “Necessária se faz a alteração das disposições relativas à interposição de recursos, eis que a forma estabelecida no instrumento convocatório é restritiva. Nesse sentido necessário se faz a (...) inserção de cláusula que determine que os recursos poderão ser interpostos contra todas as decisões e resultados do presente certame, regulamentando o local, horário, e a forma de interposição, explicitando-se, ainda, o prazo em dias úteis e a possibilidade de interposição também pelo correio, averiguando-se sua tempestividade pela data da postagem, com aviso de recebimento.” (Edital de Concurso Público n. 790.718. Rel. Conselheiro Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 02/07/2009.)
Edital de Concurso Público. Anulação de questões do Certame. “(...) o subitem (...) deve ser alterado para que especifique que a anulação de qualquer questão do certame, seja por recurso administrativo ou por decisão judicial, resultará em benefício de todos os candidatos, ainda que estes não tenham recorrido ou ingressado em juízo.” (Edital de Concurso Público n. 790.718. Rel. Conselheiro
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Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 02/07/2009.)
Edital de Concurso Público. Interposição de Recursos. “Não é suficiente, pois, a alteração produzida pela Câmara Municipal no (...) Edital retificado (...), referente à divulgação dos resultados, provisório e final, bem assim do gabarito oficial. É necessário ampliar o alcance do princípio da publicidade ao máximo e não só nas hipóteses assentadas nos subitens (...), os quais não foram corri-gidos, mas, também, em outras cláusulas como, por exemplo, a (...) que con-diciona a contagem do prazo recursal à divulgação do gabarito oficial no qua-dro de aviso da Câmara, o que reduz, sensivelmente, a interposição de apelos de candidatos de outras localidades. Esse mesmo problema ocorre no subitem (...) que restringe a contagem de qualquer prazo à publicação no mencionado quadro de aviso. (Edital de Concurso Público n. 771.232. Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 17/03/2009.)
Edital de Concurso Público. Interposição de Recursos. “quanto aos recursos, constata-se a impossibilidade de interposição (...) [em diversos subitens do edi-tal] (...), o primeiro referente ao indeferimento da isenção da taxa de inscrição e os demais relativos à inscrição, qualificação e compatibilidade com as atribui-ções do cargo para o candidato portador de deficiência física. O impedimento à pretensão recursal fere o princípio da ampla defesa e contraditório, consagrado no inciso LV do art. 5° da Lei Maior da República razão pela qual as sobreditas normas editalícias não podem prevalecer.
Ainda com relação aos recursos, convém ressaltar que o (...) instrumento con-vocatório estabelece que as decisões sobre a qualificação do candidato por-tador de deficiência e sua compatibilidade com as atribuições do cargo serão dadas de ‘forma terminativa’, expressão que, à luz do Direito, significa pôr fim à contenda sem julgamento de mérito, causando estranheza o seu emprego no contexto da mencionada cláusula que, sequer, permite a interposição de recur-so. Haveria, no caso, verdadeiro bis in idem quanto à inobservância do direito do candidato, uma vez que não teria ele nem mesmo o mérito da sua condição apreciado pela Equipe Oficial Multiprofissional, decisão esta irrecorrível. (Edital de Concurso Público n. 771232. Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 17/03/2009.)
Edital de Concurso. Recurso por Procuração. “O [edital] (...) estabelece que não serão recebidos recursos por procuração. A impossibilidade de interposição de recursos, por procurador, cerceia, a meu juízo, não só o direito do contradi-tório assegurado pela Carta Política ao candidato, como também a atuação de profissional do direito, por exemplo, eventualmente contratado para tal fim.” (Edital de Concurso Público n. 771.232. Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 17/03/2009.)
3.10 Dos Critérios de desempate
A previsão dos critérios de desempate deverá constar do edital, podendo ser adotados como critérios os pesos diferenciados às provas específicas de cada cargo, a idade, dando-
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se preferência, nesse último caso, ao candidato mais idoso, conforme estabelece a Lei n. 10.741/03:
Edital de Concurso Público. Critérios de Desempate. “Necessário se fazem ade-quações no [edital] (...) para contemplar a previsão de primeiro critério de desem-pate em favor do candidato com idade igual ou maior que 60 (sessenta) anos nos termos do Estatuto do Idoso — Lei n. 10.741/2003. Caso persista o empate, terá preferência, entre os maiores de sessenta anos, o de maior idade, facultando-se a manutenção ao final do quesito “for mais idoso”. (Edital de Concurso Público n. 804.328. Rel. Conselheiro Sebastião Helvecio. Sessão do dia 22/10/2009.)
Edital de Concurso Público. Critérios de Desempate. “(...) o primeiro deverá corresponder sempre ao candidato que for mais idoso, a teor do disposto no Parágrafo único do art. 27 da Lei federal n. 10741/2003, seguido daquele que obtiver maior pontuação na prova específica.” (Edital de Concurso Público n. 791.789. Rel. Conselheiro Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 16/07/2009.)
Edital de Concurso Público. Critério de Desempate. “Em relação às demais fa-lhas apontadas pela Diretoria Técnica, merece destaque o disposto no item 3 de meu relatório, uma vez que o critério de desempate por maior idade, previsto no (...) Edital em análise, fere o Estatuto do Idoso, que beneficia as pessoas com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos, e não o candidato de maior idade, conforme consta do edital.
Com efeito, o Estatuto do Idoso, Lei Federal n. 10.741/2003 estabelece que o critério de desempate deve-se aplicar ao idoso envolvido e, havendo mais de um, ao de idade mais avançada, não devendo se estender aos demais candida-tos, como se infere da leitura de seu art. 27, parágrafo único, in verbis:
‘Art. 27 Na admissão do idoso em qualquer trabalho ou emprego, é vedada a discriminação e a fixação de limite máximo de idade, inclusive para concursos, ressalvados os casos em que a natureza do cargo o exigir.
Parágrafo único: O primeiro critério de desempate em concurso público será a idade, dando-se preferência ao de idade mais elevada.’” (Edital de Concurso Pú-blico n. 786.024. Rel. Conselheira Adriene Andrade. Sessão do dia 16/06/2009.)
Edital de Concurso Público. Critérios de Desempate. Idade. “Em relação ao critério de desempate entendeu o órgão técnico (...) que, nos termos da Lei Federal n. 10.741/03, Estatuto do Idoso, esse critério somente pode ser aplicado no caso do candidato idoso, segundo definição da referida Lei. Entretanto, o fato de se esta-belecer explicitamente este critério para idosos não quer significar sua vedação para os não idosos, exatamente pelo fato de que não há diploma legal que impeça tal critério. (...) a idade como fator de desempate representa critério objetivo de aferição e afasta, de vez, o arbítrio do administrador.” (Edital de Concurso Público n. 770.550. Rel. Conselheiro Antônio Carlos Andrada. Sessão do dia 05/05/2009.)
Edital de Concurso Público. Critério de Desempate. “O [edital] (...) prescreve, como fator de desempate, sorteio público. A forma ali prescrita não estabe-
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lece o modo pelo qual será realizado tal sorteio, ferindo, dessarte, o direito
constitucional da transparência e da impessoalidade. Portanto, imperioso que
o edital estabeleça a forma pela qual se dará o sorteio mencionado naquele dis-
positivo.” (Edital de Concurso Público n. 771.232. Rel. Conselheiro em Exercício
Gilberto Diniz. Sessão do dia 17/03/2009.)
3.11 Do resultado final e homologação do certame
O resultado final do certame somente é divulgado após a apreciação de todos os recursos
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interpostos e decisão da Administração, devidamente publicada. A partir desse momento, divulga-se a listagem final dos classificados.13
Verificada a regularidade e legalidade do certame, a autoridade superior promotora do concurso poderá homologá-lo, momento a partir do qual são produzidos os efeitos a que qualquer disputa dessa espécie se destina: convocação dos aprovados, por ordem de classificação, nomeação e posse, desde que respeitados os prazos e exigências legais e/ou fixadas no edital para realização desses dois últimos atos.
No caso de pendência de questionamentos judiciais que impliquem incertezas quanto à classificação final dos candidatos a determinados cargos, poder-se-á proceder à homologação do concurso no tocante aos cargos não questionados, restando pendente a homologação daqueles que estejam sendo discutidos judicialmente.
3.12 Do Prazo de validade do concurso
Disposição comum a todos editais de concurso público é o estabelecimento de seu prazo de validade, assim como a menção à possibilidade de sua prorrogação. Consoante o art. 37, incisos III e IV, da CR/88, a Administração poderá prever um prazo de até 02 (dois) anos, prorrogável por igual período.
A importância dessa disposição editalícia é limitar no tempo os efeitos, após a homologação, de determinado certame, fixando o lapso temporal durante o qual a Administração estará obrigada a nomear os candidatos aprovados aos cargos já previstos e àquelas que surgirem no decorrer do período de validade, observando-se a ordem de classificação.
Edital de Concurso Público. Prazo de Validade. “Vê-se [em item do edital] (...) que o concurso terá validade por 2 (dois) anos a contar de sua publicação, po-dendo ser prorrogado por igual período a critério da Prefeitura Municipal (...). Já [outro subitem] (...) trata da convocação dos candidatos aprovados no cer-tame, os quais, no prazo de 5 (cinco) dias, contados da homologação, deverão firmar termo de compromisso de seu interesse no provimento do cargo.
Não se vislumbra no texto editalício, todavia, regra a disciplinar o direito sub-jetivo do candidato aprovado à posse, no limite das vagas, dentro do prazo de validade do concurso, uma vez que mera assinatura do termo de compromisso não lhe garante, efetivamente, o direito à posse.
Nesse sentido, meu entendimento alinha-se àquele esposado pelo Dr. Glaydson Santo Soprani Massaria, Procurador do Ministério Público junto ao Tribunal, (...), ‘... há que se reconhecer que a Administração Pública tem a obrigação de prover todos os cargos/empregos ofertados no edital de concurso público, sendo a nomeação/convocação um direito público subjetivo do candidato.’
O entendimento jurisprudencial hodierno pode ser sintetizado pelos termos da ementa de recente decisão a seguir carreada proferida pelo Colendo STJ, no Recur-so Ordinário em Mandado de Segurança n. 2006/0194632-1, 6ª T. — Rel. Min. Jane
13 MAIA, Márcio Barbosa e qUEIROz, Ronaldo Pinheiro de. O Regime jurídico do concurso público e o seu controle jurisdicional. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 135-136
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Silva (Desembargadora Convocada do TJMG), julgado em 12/6/08 e publicado no DJ em 25/8/08, verbis: ‘EMENTA — RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATO. NOMEAÇãO. NÚMERO CERTO DE VAGAS. PREVISãO. EDITAL. NECESSIDADE DE PREENCHIMENTO. DIREITO LÍqUIDO E CERTO. CARACTERIzAÇãO. RECURSO PROVIDO. 1. Em conformidade com a jurispru-dência que vem se firmando na 3a Seção do STJ, o candidato aprovado em concurso público, dentro do número de vagas previstas em edital, possui direito líquido e certo à nomeação, e, não mera expectativa de direito. 2. Consoante precedentes da 5a e 6a Turmas do STJ, a partir da veiculação, pelo instrumento convocatório, da necessi-dade de a Administração prover determinado número de vagas, a nomeação e posse, que seriam, a princípio, atos discricionários, de acordo com a necessidade do serviço público, tornam-se vinculados, gerando, em contrapartida, direito subjetivo para o candidato aprovado dentro do número de vagas previstas em edital. 4. Recurso ordi-nário conhecido e provido, para conceder a ordem apenas para determinar ao Estado de Minas Gerais que preencha o número de vagas previstas no Edital.’
Esse Tribunal agasalha a tese sobredita, conforme julgados em casos análogos, como no Processo 771.232 de minha relatoria, acolhido à unanimidade pelos Con-selheiros Antônio Carlos Andrada e Adriene Andrade, em sessão de 17/03/09.
Impõe-se, portanto, a adequação do Edital, de modo a explicitar o direito subjetivo à posse de candidato aprovado no concurso em análise, dentro do número de vagas ofertados e prazo de validade do certame.” (Edital de Concurso Público n. 793.843. Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 25/08/2009.)
4 Procedimentos após a homologação
4.1 Da nomeação
Nomeação é ato por meio do qual a Administração convoca determinado candidato para ocupar
um cargo de provimento efetivo ou em comissão.
Os Tribunais Superiores têm se manifestado no sentido do direito subjetivo à nomeação para
o cargo, quando o candidato é aprovado no limite do número de vagas definido no edital.14 Na
mesma linha, vem seguindo o TCEMG, como se verifica nos seguintes julgados:
Edital de Concurso Público. Direito à Nomeação. “O candidato aprovado dentro do limite de vagas previstas no edital, durante o prazo de validade do certame, tem direito subjetivo à nomeação para o cargo a que concorreu e foi habilita-do, ressalvadas as hipóteses decorrentes de fatos supervenientes, devidamente motivados, pertinentes e suficientes para justificar tal medida. Em tais situa-ções, deve ser ressaltado que a existência posterior de caso fortuito e força
14 No STJ, vem sendo consolidado entendimento no sentido de que os candidatos aprovados dentro do número de vagas previstas em edital têm direito à nomeação. Neste sentido, citam-se os seguintes julgados: RMS 15.034, Rel. Min. Felix Fischer, quinta Tur-ma, DJ 29/03/2004; RMS 19.216, Rel. Min. Paulo Medina, Sexta Turma, DJ 09/04/2007; RMS 20.718, Rel. Min. Paulo Medina, Sexta Turma, DJ 03/03/2008; AgRg no RMS 22568, Rel. Min. Paulo Gallotti, Sexta Turma, DJ 27/04/2009; RMS 23331, Rel. Min. Maria Thereza Assis Moura, Sexta Turma, DJ 05/04/2010; RMS 31.611, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, DJ 17/05/2010; RMS 21.323, Rel. Min. Maria Thereza Assis Moura, Sexta Turma, DJ 21/06/2010. No STF, ver as decisões: RE 192.568, Rel. Min. Marco Aurélio, Segunda Turma, DJ 13/09/1996; RE 273.605, Rel. Min. Néri da Silveira, Segunda Turma, DJ 28/06/2002; RE 227.480, Relatora para o acórdão Ministra Cármen Lúcia, Primeira Turma, DJ 21/08/2009.
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maior que afete diretamente e de forma significativa a capacidade econômica do ente público afasta a invocação de direito subjetivo por parte dos habilita-dos dentro do número de vagas.” (Edital de Concurso Público n. 796.953. Rel. Conselheiro Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 03/09/2009.)
Edital de Concurso Público. Direito à Nomeação. “Alteração da parte inicial do quesito de ‘a aprovação e a classificação geram apenas expectativa de direito a nomeação (...)’ para ‘a aprovação e a classificação geram direito a nomeação para os candidatos aos cargos efetivos aprovados dentro do numero de vagas ofe-recidas’, haja em vista os entendimentos majoritários do Supremo Tribunal Fede-ral e do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema.” (Edital de Concurso Público n. 791.789. Rel. Conselheiro Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 16/07/2009.)
Edital de Concurso Público. Direito à Nomeação. “A jurisprudência pátria tem decidido no sentido de que [com] a aprovação em concurso público, dentro dos limites de vagas previstas no edital, o candidato deixa de ter mera expectativa de direito para adquirir direito subjetivo à nomeação. Nesse sentido, necessária se faz a alteração do subitem (...) para constar que: ‘todos os cargos oferecidos neste edital serão obrigatoriamente preenchidos dentro do prazo de validade do concurso havendo candidatos habilitados’.” (Edital de Concurso Público n. 790.718. Rel. Conselheiro Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 02/07/2009.)
Edital de Concurso Público. Direito à Nomeação. “É meu dever registrar, ainda, que a norma editalícia previu, nas disposições gerais, (...) que a ‘Aprovação e a classificação geram, para os candidatos aprovados dentro do número de vagas especificadas para cada cargo, o direito à nomeação, ficando reservado à Câmara Municipal o direito de realizá-las no período de validade do concurso público, de acordo com a necessidade dos serviços e as disponibilidades admi-nistrativas, orçamentárias e financeiras.’
Essa questão precisa ser analisada com afinco, tendo em vista que, na moderna interpretação do Poder Judiciário e dos Tribunais de Contas, bem assim, da dou-trina dominante, o candidato aprovado em concurso público, dentro do número de vagas oferecidas, tem direito subjetivo à nomeação, não se tratando, pois, de mera expectativa de direito como se entendia outrora.
A propósito, o Supremo Tribunal Federal, em recente julgado, professou claramen-te o entendimento de que é dever da Administração prover os cargos públicos dis-ponibilizados por meio de concurso porque a convocação lançada mediante edital vincula, a seus termos, não só os candidatos, mas a própria Administração.
Conforme se vê, no pronunciamento da Ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, Relatora para o acórdão do RE 227.480/RJ, de 16/09/2008, é de indagar: pode a Administração ‘decidir-se pelo provimento do cargo posto em disputa median-te concurso, valer-se de sua competência para deliberar sobre a conveniência e oportunidade do provimento, deflagrar processo seletivo que envolve gastos (com pessoal, com material, com publicidade, etc.) e que envolve resposta dos interessados que se submetem às provas, que se afastam, muitas vezes, de seus afazeres, quando não de seus trabalhos para se preparar para o certame e de-
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pois, singelamente, ‘mudar de idéia’ sem ter de responder por isso? quer-se dizer que a Administração pode deliberar sobre o provimento e, posteriormente, decidir que ‘não era bem isso o que ela desejava e considerava social e adminis-trativamente necessário e melhor’?’
A reposta colhida de mencionado decisum é não e, a meu juízo, esta é, sem sombra de dúvida, a melhor solução para o problema uma vez que a Adminis-tração tem o dever de preencher todas as vagas ofertadas no edital dentro do prazo de validade do concurso.” (Edital de Concurso Público n. 771232. Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 17/03/2009.)
4.2 Da verificação de impedimentos à posse
O edital não poderá conter restrições à investidura no cargo, excetuando-se aquelas que possuem amparo na legislação local, desde que guardem consonância com as normas constitucionais. Cite-se, como exemplo, a exigência de que o candidato apresente declaração de que não tenha sido demitido por quaisquer falhas graves comprovadas mediante processo administrativo e/ou sindicância.
Edital de Concurso Público. Servidor Demitido do Serviço Público. “Fez-se ne-cessária a alteração do edital, (...) por não se admitir que a dispensa, exone-ração ou demissão anterior em virtude de processo administrativo, de ex-ser-vidor público municipal, estadual ou federal, impeçam o candidato de tomar posse em outro emprego público, sob pena de ver-se punido perpetuamente. Nesse aspecto, óbice poderá haver, somente, se ao candidato anteriormente demitido do serviço público foi imputada a pena proibitiva de nova admissão em cargo/emprego público, na forma do estatuto ao qual era submetido.” (Edital de Concurso Público n. 778.666. Rel. Conselheiro Sebastião Helvecio. Sessão do dia 17/12/2009.)
Edital de Concurso Público. Ex-Servidor Demitido por Justa Causa. “O [edital] (...) estabelece que ex-servidores de quaisquer órgãos da Administração Públi-ca que tenham sido demitidos por justa causa, por sentença transitada em jul-gado, não serão admitidos, independentemente de sua aprovação/classificação no concurso. Tal dispositivo cria uma espécie de pena perpétua para servidores demitidos nas condições sobreditas, o que fere aos mais comezinhos princípios do Estado Democrático de Direito. (...). Para eventual candidato ex-servidor público, entretanto, demitido por justa causa, mesmo por sentença transitada em julgado, cuja data de demissão tenha superado tais prazos, não pode existir óbice à sua admissão, se aprovado e classificado, sob pena de manifesta ofensa ao princípio constitucional do amplo acesso a concursos públicos.” (Edital de Concurso Público n. 778.835. Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Ses-são do dia 10/11/2009.)
Edital de Concurso Público. Ex-servidor Demitido ou Destituído do Cargo em Co-missão. “(...) as exigências estabelecidas para investidura em cargos públicos devem estar previstas em lei. A título de exemplo, menciona-se a Lei Federal n. 8.112/90, Estatuto do Servidor Público Federal, que explicitamente menciona os casos de restrição à investidura, no caso de servidor demitido: ‘Art.137. A demis-
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são ou a destituição de cargo em comissão, por infringência do art. 117, incisos IX e XI, incompatibiliza o ex-servidor para nova investidura em cargo público federal, pelo prazo de 5 (cinco) anos. Parágrafo único. Não poderá retornar ao serviço público federal o servidor que for demitido ou destituído do cargo em co-missão por infringência do art. 132, incisos I, IV, VIII, X e XI.’ Dessa forma, o edital de concurso público para cargos federais poderá incluir tal restrição, bem como outras previstas nos demais diplomas legais sobre o assunto. Como se observa, o ente federativo detém competência legislativa para fixar os requisitos que en-tender pertinentes para investidura em cargo público, desde que em consonân-cia com normas e princípios constitucionais. O Município (...), por sua vez, não editou lei prevendo essas restrições enumeradas no (...) Edital (...), razão pela qual deverão ser suprimidas do ato convocatório.” (Edital de Concurso Público n. 770.584. Rel. Conselheiro Antônio Carlos Andrada. Sessão do dia 16/06/2009.)
A exigência de idoneidade moral como condição para investidura em cargo público deve levar
em consideração a natureza, as condições e as atribuições do cargo.
Agravo. Exigência Legal da Certidão Negativa de Antecedentes Criminais. “É cla-ro que a presunção de inocência está inserida na nossa Carta Magna para que o Estado não esmague as pretensões, sonhos e direitos daqueles que injustamente são acusados. No caso específico tratado nestes autos, entendo que razão assiste ao agravante e ressalto que para qualquer outro cargo público, não apenas para este que ora analisamos, deve-se resguardar a premissa do interesse público, exi-gindo que todos aqueles que venham a ocupá-los estejam ao abrigo de qualquer acusação que coloque em dúvida sua idoneidade e honestidade, devendo-se in-verter a equação, para que o acusado, em sede própria e no momento convenien-te, demonstre que as acusações que pesem sobre ele são infundadas.” (Agravo n. 808.722. Rel. Conselheiro Elmo Braz. Sessão do dia 11/11/2009.)
Voto-vista. Agravo. Edital de Concurso Público. Verificação de Idoneidade Moral. “Com todas essas considerações, portanto, o que ora se propõe é a adoção de uma postura intermediária, mantendo-se a exigência editalícia quanto às certidões de antecedentes criminais, acrescendo-se um parágrafo no sentido de que qualquer decisão que exclua candidato em razão de suposta inidoneidade moral deverá vir fundamentadamente motivada. Mesmo porque, ressalte-se, a exigência imposta pelo instrumento convocatório apresenta-se respaldada em dispositivo do Esta-tuto dos Militares do Estado de Minas Gerais — Lei n. 5301 e, pelo que se tem conhecimento, está plenamente em vigor. (...) Dessa forma, a simples existência de uma certidão positiva não tem o condão de excluir automaticamente o can-didato. É dizer, não se pode permitir uma correlação objetiva entre a existência formal de inquérito e inidoneidade moral.” (Voto-vista no Agravo n. 808.722. Rel. Conselheiro Antônio Carlos Andrada. Sessão do dia 11/11/2009.)
Edital de Concurso Público. Certidão Negativa de Antecedentes Criminais. “O [edital] (...) estabelece como condição para contratação que o candidato não registre antecedentes criminais e encontre em pleno exercício de seus direitos civis e políticos. Cumpre registrar, também, que o edital exige (...) a apresen-tação de Certidão Negativa de Antecedentes Criminais, fornecida pelo cartório
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criminal. Verifica-se que o inciso I do art. 37 da Lei Maior estabelece que os
cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros e estran-
geiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei. No entanto, quanto
à restrição de acesso a cargo público ao candidato que registra antecedentes
criminais, cumpre esclarecer que a suspensão dos direitos políticos decorre de
disposição contida no inciso III do art. 15 da Constituição da República, in ver-
bis: ‘Art. 15. É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspen-
são só se dará nos casos de: III — condenação criminal transitada em julgado,
enquanto durarem seus efeitos’. Conforme informado pelo órgão ministerial,
a condenação criminal transitada em julgado suspende o gozo dos direitos po-
líticos enquanto durarem seus efeitos. Salientou que o exercício dos direitos
políticos constitui condição para investidura em cargo público. Nesse aspecto,
a condenação criminal, por suspender o gozo de tais direitos, acaba por impe-
dir o candidato que apresenta antecedentes criminais a tomar posse em cargo,
emprego ou função pública. É importante salientar que os efeitos penais de
certidão criminal só abrangem os últimos cinco anos a contar da extinção da
punibilidade ou cumprimento de pena. Dessa forma, caso o candidato tenha an-
tecedentes criminais, mas se encontra em pleno exercício de seus direitos civis
e políticos, em princípio, não poderá haver óbice à sua contratação.” (Edital
de Concurso Público n. 796.116 Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz.
Sessão do dia 01/09/2009.)
Edital de Concurso Público. Restrição de Participação em Concurso Público por
Suposta Falta de Idoneidade. “(...) qualquer que seja a restrição que se fizer
à participação em um concurso público por suposta falta de idoneidade, que
não seja declarada em sentença transitada em julgado do Poder Judiciário,
não tem nenhuma validade diante do dispositivo da Constituição Federal, que
se sobrepõe a todas essas interpretações ou elucubrações a que V.Exa. se refe-
re, porque se trata da garantia dos direitos das pessoas. Ninguém que não foi
condenado não pode ser antecipadamente tido como que ‘será condenado’.”
(Edital de Concurso Público n. 794.713. Rel. Conselheiro Elmo Braz. Adendo do
Cons. Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 20/08/2009.)
Edital de Concurso Público. Restrição de Participação em Concurso Público por Su-
posta Falta de Idoneidade. “(...) é uma liberdade fundamental, uma garantia fun-
damental do cidadão de que eventuais restrições a seu direito, inclusive de parti-
cipar de concursos públicos, sejam apreciadas em definitivo pelo Poder Judiciário.
Se assim não for, nós estaremos, de forma transversa, inclusive, fomentando um
estado de denuncismo, uma prática de um estado policialesco que obviamente não
se coaduna com o Estado Democrático. Bastará, tão somente, que cheguem diver-
sas denúncias ou situações outras ainda não esclarecidas e julgadas em definitivo
pelo Poder Judiciário para que a pessoa tenha o seu direito de acesso aos cargos
públicos obstaculizado.” (Edital de Concurso Público n. 794.713. Rel. Conselheiro
Elmo Braz. Adendo do Cons. Licurgo Mourão. Sessão do dia 20/08/2009.)
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4.3 Da posse
Com o ato de posse, aperfeiçoa-se a relação entre Estado e nomeado, conforme magistério
de Celso Antonio Bandeira de Mello (in Curso de direito administrativo, 25.. ed. São Paulo:
Malheiros, 2007, p. 1028). É neste momento que o candidato assente com o ato de nomeação e
é investido, efetivamente, nas funções atinentes àquele determinado cargo.15
Edital de Concurso Público. Requisitos para Investidura. “Verifica-se no [edital] (...), (...) [no] título ‘Dos requisitos para investidura no cargo’, a exigência para o candidato de ‘possuir, na data da inscrição, idade mínima de 18 (dezoito) anos completos’ (...).
Tal disposição é incompatível com o comando do próprio título, que dispõe sobre as exigências para a investidura no cargo e, ainda, prejudica o potencial candidato que na data da inscrição não tenha completado a idade de 18 anos, e, no entanto, na ocasião da posse já a teria atingido.” (Edital de Concurso Público n. 791.123. Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 24/11/2009.)
Edital de Concurso Público. Requisitos para Investidura. “Não podem prosperar as disposições estabelecidas pelo [edital] (...), in verbis:
‘O candidato deverá declarar no ato da inscrição, que possui os pré-requisitos exigidos para o cargo a que concorre.’
Tal previsão editalícia contraria o entendimento jurisprudencial dominante, se-gundo o qual a comprovação dos requisitos exigidos em concurso público deve ocorrer na data da posse e não por ocasião da inscrição, etapas distintas que de igual forma devem ser tratadas, não podendo constituir óbice à inscrição.” (Edital de Concurso Público n. 805.505. Rel. Conselheiro Sebastião Helvecio. Sessão do dia 12/11/2009.)
Edital de Concurso Público. Impossibilidade na Exigência de Documentos no Momento da Inscrição. “Foi exigido no [edital] (...), como requisito para inscri-ção, a comprovação de idade de 18 (dezoito) anos completos e, ainda, que o candidato possua documentos comprobatórios da escolaridade e pré-requisitos exigidos para o cargo pretendido. Tais exigências afrontam o princípio da igual-dade e cerceiam o direito de participação em concurso público, uma vez que o candidato que no momento da inscrição não completou a idade e não possua a documentação mencionada, mas que terá tais condições implementadas na data da posse, fica impedido de participar do concurso por impossibilidade cria-da pelo Edital, alusivo à sua inscrição.” (Edital de Concurso Público n. 793.843. Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 25/08/2009.)
Releva registrar que é no ato de posse que deverão estar atendidos todos os requisitos referentes
e exigíveis para as funções do cargo, com sua competente verificação antes que o novo servidor 15 Vale anotar, ainda, a lição de Márcio Cammarosano, mencionada na mesma obra de Bandeira de Mello: “(...) o provimento diz
respeito ao cargo, enquanto a investidura é concernente à pessoa. O cargo é provido, alguém é investido. A distinção decorre, portanto, do ângulo de observação: se tenho em vista o cargo, refiro-me ao provimento; se a pessoa que o titulariza, refiro-me à investidura”.
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entre em exercício. Os documentos atestatórios das exigências devem guardar pertinência
com o princípio de razoabilidade, sendo vedadas exigências desmedidas ou que impliquem em
formalismo exacerbado.
Edital de Concurso Público. Documentos para a Posse. “(...) Observa-se que a
regra contida no [edital] (...) é restritiva, uma vez que não serão aceitos pro-
tocolos dos documentos solicitados por ocasião da posse.
O dispositivo supra cerceia o direito do candidato, como na hipótese da falta de algum documento por motivos alheios a sua vontade. À guisa de exemplo, documento que deva ser emitido pela própria Administração e que por qualquer motivo não tenha sido disponibilizado em tempo hábil, não poderá tal falta ser atribuída ao concorrente.
A esse respeito, o art. 1º da Lei n. 9.051/95 estabelece, in verbis:
‘As certidões para a defesa de direitos e esclarecimentos de situações re-queridas aos órgãos da administração centralizada ou autárquica, às empre-sas públicas, às sociedades de economia mista e às fundações públicas da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, deverão ser expe-didas no prazo improrrogável de quinze dias, contado do registro do pedido no órgão expedidor.’
Sabe-se, entretanto, que poderá ocorrer hipótese em que o preceito legal so-bredito não se cumpra por razões da morosidade da máquina pública, o que não pode ser tributado aos concorrentes.” (Edital de Concurso Público n. 811.974. Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 23/02/2010.)
Edital de Concurso Público. Requisitos para Posse. “Deve-se precisar as condi-ções e requisitos para inscrição e posse, incluída a documentação exigível, evi-tando-se, dessa forma, quaisquer questionamentos quanto aos requisitos para o exercício do cargo, na alusão de disposições genéricas como ocorre na espécie na referência, a expressa do início do tópico destacado, ou seja, ‘além da do-cumentação exigida pela legislação vigente’.” (Edital de Concurso Público n. 791.789. Rel. Conselheiro Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 16/07/2009.)
Edital de Concurso Público. Exigências da Nomeação. “Nesse sentido, releva notar que a parte final (...) [de] subitem (...) do edital está eivada de subjeti-vidade, ao permitir que a Administração possa exigir dos candidatos, no ato da posse, a apresentação de outros documentos, além dos previstos (...) [em outro subitem do edital], que trata dos requisitos para o provimento dos cargos do quadro Permanente de Servidores da Prefeitura Municipal (...).
Os subitens (...) assim dispõem, in verbis:
‘(...) Por ocasião da posse, será exigido do nomeado que demonstre o atendimento aos requisitos de provimento e, bem assim, que apresente: ‘declaração de bens na forma da Lei Federal n. 8.730/93; declaração negativa de acumulação de cargo público; prova de gozo de boa saúde física e mental ou da condição expressa’;
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‘(...) Não serão aceitos protocolos dos documentos solicitados e poderão ser exigidos pela Prefeitura Municipal, no ato da posse, outros documentos, além dos acima relacionados’
No que se refere ao disposto nos subitens supramencionados, depreende-se que deveria ser atribuído caráter taxativo ao rol (...), garantindo segurança jurídica aos candidatos, uma vez que os mesmos poderão ser surpreendidos com a sub-missão a exigências despropositadas, em veemente afronta aos princípios cons-titucionais da proporcionalidade e da razoabilidade.” (Edital de Concurso Públi-co n. 794.038. Rel. Conselheira Adriene Andrade. Sessão do dia 07/07/2009.)
Edital de Concurso Público. Comprovação de Exigências na Posse. “quanto ao item 19 do meu Relatório, releva notar que o (...) Edital deverá ter a redação alterada, posto que as exigências ali contidas devem ser comprovadas na data da posse e não na data da inscrição preliminar, consoante entendimento do Su-perior Tribunal de Justiça, na Súmula n. 266, in verbis: “nos termos de pacífica jurisprudência desta Corte, em se tratando de concurso público, a escolarida-de, porque diz respeito ao desempenho da função, somente deve ser exigida no momento da posse”. (Edital de Concurso Público n. 760.740. Rel. Conselheira Adriene Andrade. Sessão do dia 02/12/2008.)
Situação peculiar, contudo, observa-se nos casos dos concursos para as chamadas carreiras
jurídicas, Magistratura e Ministério Público. Nos casos desses cargos, os candidatos devem
comprovar os requisitos para investidura no ato de inscrição definitiva, quando ainda não
encerradas todas as etapas do concurso, conforme decidido na ADI n. 3460, oportunidade em
que o Supremo Tribunal Federal entendeu constitucional a exigência de que a comprovação de
03 (três) anos de prática jurídica se desse quando da realização da inscrição.
Edital de Concurso Público. Exigências para Posse. Razoabilidade. “Nesse sentido,
reputo como desarrazoada a exigência prevista no (...) Edital, por determinar que o
candidato aprovado apresente, na data da posse, o original e a fotocópia do compro-
vante de Contribuição Sindical, quando pago, bem como parecer favorável emitido
pelo Procurador Jurídico do Município, desestimulando os candidatos e restringindo a
ampla participação dos mesmos, acarretando prejuízos graves ao certame.
As exigências supramencionadas constituem uma afronta aos princípios da razo-
abilidade, legalidade e universalidade, posto que não há amparo legal para que
se estabeleça a apresentação de Contribuição Sindical e de parecer favorável
emitido pelo Procurador Jurídico como condições para que se efetive a posse.
Tais exigências estão, ainda, eivadas de ilegalidade, por estabelecerem critério
subjetivo para seleção e, ainda, por ofenderem os princípios da idoneidade e
da presunção de inocência”. (Edital de Concurso Público n. 790.874. Rel. Con-
selheira Adriene Andrade. Sessão do dia 24/11/2009.)
Edital de Concurso Público. Exigências para Posse. Necessidade de Amparo Le-
gal. “quanto ao item 12 de meu relatório, (...) considero irregular a exigência
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de apresentação, no ato de posse, de certidão de nascimento de filhos menores de 14 anos, uma vez que inexiste respaldo legal para tal disposição, devendo tal exigência ser retirada do edital.
Cumpre observar que a certidão de nascimento dos filhos menores de 14 anos deve ser apresentada após a posse, por se tratar de benefício remuneratório”. (Edital de Concurso Público n. 796.113. Rel. Conselheira Adriene Andrade. Ses-são do dia 1°/09/2009.)
Edital de Concurso Público. Exigência de Documentos além Daqueles Relacionados no Edital. “No que diz respeito à posse, dispõe o [edital] (...) que poderão ser exi-gidos outros documentos do candidato nomeado, além daqueles relacionados (...), o que não pode prevalecer, devendo o edital explicitar, previamente, a documenta-ção a ser exigida do candidato para posse.” (Edital de Concurso Público n. 793.843. Rel. Conselheiro em Exercício Gilberto Diniz. Sessão do dia 25/08/2009.)
Edital de Concurso Público. Condições Exigidas no Ato da Inscrição Definitiva. “(...) as condições exigidas no ato de inscrição contrariam o princípio da igual-dade, bem como a jurisprudência esposada pelo STJ expressa na Súmula n. 266. Assim (...) os itens [do edital] (...) devem ser alterados para definir que as condições arroladas serão exigidas na data da posse, e não no momento da inscrição.” (Edital de Concurso Público n. 790.718. Rel. Conselheiro Eduardo Carone Costa. Sessão do dia 02/07/2009.)
Há que se observar a razoabilidade no prazo fixado a fim de que o nomeado compareça à
Administração para, efetivamente, tomar posse no cargo, a exemplo do que determina a Lei
Federal n. 8.112, cujo prazo apontado para posse é de 30 (trinta) dias.16
Edital de Concurso Público. Prazo para a Posse. “Não constando dos autos le-gislação municipal que trate da matéria, mister se faz seja alterada a redação do [edital] (...), haja vista a exiguidade do prazo estabelecido para o candidato tomar posse no cargo, qual seja de 05 (cinco) dias corridos a contar da data da convocação.” (Edital de Concurso Público n. 803.696. Rel. Conselheiro Sebas-tião Helvecio. Sessão do dia 22/10/2009.)
Efetivado o ato de posse, o servidor estará apto a iniciar o efetivo exercício das funções do
cargo, necessitando, para tanto, observar o prazo legal fixado pelo respectivo ente, sob pena de,
em expirado o indigitado lapso temporal sem que o servidor empossado tenha se apresentado
ao serviço, promover-se a sua exoneração.17
16 Art. 13, §§ 1º e 6º da Lei n. 8.112/90
17 Na Lei n. 8.112/90, v. art. 15, § 2º e art. 34, inciso II.
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5 Considerações finais
Na ausência de norma geral que discipline a matéria e submeta a seus parâmetros todos os entes
da Federação e suas respectivas entidades e órgãos, pretendeu-se, com o presente estudo,
lançar luzes e destacar os diversos atos e etapas que constituem um concurso público.
Intentou-se, outrossim, dirimir dúvidas acerca de pontos polêmicos da matéria, especialmente
por apresentar decisões desta Corte em face de casos concretos efetivamente verificados em
editais de concursos públicos no Estado de Minas Gerais, analisados a partir de 2008, ano em
que foi editada a Instrução Normativa n. 04/2008.
De toda sorte, ainda que esta pesquisa tenha se pretendido a mais ampla possível, os casos
concretos, quando da análise de futuros atos convocatórios, certamente poderão levar esta
Corte a novas reflexões e novos entendimentos.
Sendo assim, para elaborar seus respectivos editais de concurso público, caberá aos
jurisdicionados acompanhar a evolução do entendimento do Tribunal de Contas do Estado de
Minas Gerais, cujas decisões sempre buscarão traduzir a correta aplicação dos princípios e
regras que regem a Administração Pública, diante do caso concreto que se lhe apresente.
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Anexos4
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A presente seção apresenta uma série de leis, decretos e
decisões de tribunais superiores, acerca da matéria tratada
nesta Revista Especial, que visam servir de subsídio e guiar
os jurisdicionados na realização dos seus concursos públicos.
A organização da matéria está disposta de forma que, na primeira
parte, constem as decisões paradigmáticas do Supremo Tribunal
Federal e do Superior Tribunal de Justiça e, na segunda, a legislação
federal e mineira.
Algumas decisões do STF evidenciam o reconhecimento da repercussão
geral de determinados assuntos, em que pese ainda estar em análise
o mérito das questões.
Observe-se que nem toda legislação está na íntegra por tratar
também de matérias não atinentes a concurso público.
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SUPREMO TRIbUNAL FEDERAL
REPERCUSSÃO GERAL EM RECURSO ExTRAORDINÁRIO 598.099 MATO GROSSO DO SUL
RELATOR ORIGINÁRIO: MIN. MENEZES DIREITO
RELATOR PARA O ACÓRDÃO: MIN. GILMAR MENDES
RECTE. (S): ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL
PROC. (A/S) (ES): PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL
RECDO. (A/S): RôMULO AUGUSTO DUARTE
ADV. (A/S): ANA KARINA DE OLIVEIRA E SILVA E OUTRO (A/S)
EMENTA
DIREITO ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. 2. Direito líquido e certo à nomeação do
candidato aprovado entre as vagas previstas no edital de concurso público. 3. Oposição ao
poder discricionário da Administração Pública. 4. Alegação de violação dos arts. 5°, inciso LXIX
e 37, caput e inciso IV, da Constituição Federal. 5. Repercussão Geral reconhecida.
Decisão: O Tribunal reconheceu a existência da repercussão geral da questão constitucional
suscitada. Não se manifestaram os Ministros Cezar Peluso, Cármen Lúcia, Ellen Gracie e
Joaquim Barbosa.
Brasília, 24 de abril de 2009.
Ministro GILMAR MENDES — (ART. 38, II, RISTF)
Presidente e relator para acórdão
Documento assinado digitalmente.
Decisões do STF
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REPERCUSSÃO GERAL EM RECURSO ExTRAORDINÁRIO 598.099-5 MATO GROSSO DO SUL
DIREITO ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATO APROVADO ENTRE AS VAGAS
PREVISTAS NO EDITAL. DIREITO À NOMEAÇãO. PODER DISCRICIONÁRIO DA ADMINISTRAÇãO
PÚBLICA. EXISTÊNCIA DE REPERCUSSãO GERAL.
O Estado do Mato Grosso do Sul interpõe recurso extraordinário, com fundamento na alínea “a”
do permissivo constitucional, contra acórdão da quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça,
assim ementado:
RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. DIREITO À NOMEAÇãO. CANDIDATO APROVADO ENTRE AS VAGAS PREVISTAS NO EDITAL. DIREITO LÍqUIDO E CERTO RECURSO PROVIDO.
1. A aprovação do candidato no limite do número de vagas definido no Edital do concurso gera em seu favor o direito subjetivo à nomeação para o cargo.
2. As disposições contidas no Edital vincula as atividades da Administração, que está obrigada a prover os cargos com os candidatos aprovados no limite das vagas previstas. A discricionariedade na nomeação de candidatos só incide em relação aos classificados nas vagas remanescentes.
3. Não é lícito à Administração, no prazo de validade do concurso público, simplesmente omitir-se na prática dos atos de nomeação dos aprovados no limite das vagas ofertadas, em respeito aos investimentos realizados pelos concursantes, em termos financeiros, de tempo e emocionais, bem com às suas legítimas expectativas quanto à assunção do cargo público.
4. Precedentes desta Corte Superior: RMS 15.034/RS e RMS 10.817/MG.
5. Recurso Ordinário provido (fl. 130).
Opostos embargos de declaração (fls. 134 a 145), foram rejeitados (fls. 169 a 174).
Em preliminar formal e devidamente fundamentada, o Estado recorrente sustenta que a
discussão acerca da obrigação da Administração Pública nomear os candidatos aprovados
dentro do número de vagas oferecidas no edital do concurso público apresenta relevância
jurídica e econômica ao impor à Administração a obrigação de contratar pessoal além das suas
necessidades, implicando, consequentemente, aumento desnecessário das despesas públicas.
Destaca que o tema aqui examinado apresenta “alta sensibilidade social e jurídica que transcende
os interesses intersubjetivos das partes envolvidas na relação processual concreta” (fl. 182) e
tem, igualmente, o condão de apresentar efeito multiplicador de demandas no Poder Judiciário.
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No mérito, sustenta contrariedade aos artigos 5°, inciso LXIX, e 37, caput e inciso IV, da
Constituição Federal, uma vez que “não há qualquer direito líquido e certo à nomeação daqueles
aprovados, o que decorre de uma equivocada interpretação da sistemática constitucional
adotada em torno do tema” (fl. 185).
Aduz que as referidas normas constitucionais têm por escopo “preservar a autonomia da
Administração Pública, conferindo-lhe margem de discricionariedade para aferir a real
necessidade de nomeação de candidatos aprovados em concurso público” (fl. 188).
Concluiu acenando que o cumprimento da ordem emanada do acórdão atacado impõe a
nomeação de candidato sem que seja observada a ordem classificatória do certame.
Considero que matéria constitucional presente nestes autos extrapola o interesse subjetivo
das partes, na medida em que se discute a limitação do poder discricionário da Administração
Pública em favor do direito de nomeação dos candidatos que lograram aprovação em
concursos públicos e que estão classificados até o limite de vagas anunciadas no edital que
regulamenta o certame.
A questão possui repercussão, notadamente, no aspecto social ao atingir diretamente o interesse
de relevante parcela da população que participa dos processos seletivos para ingressar no
serviço público.
Afeta, também, a Administração Pública Federal, Estadual e Municipal que, a partir da decisão
emanada por esta Suprema Corte, poderá elaborar e realizar os concursos públicos ciente da
extensão das obrigações que possui em relação aos candidatos aprovados e incluídos no rol das
vagas ofertadas no processo seletivo.
Assim, considero presente a repercussão geral.
Brasília, 3 de abril de 2009.
Ministro MENEZES DIREITO
Relator
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REPERCUSSÃO GERAL EM RECURSO ExTRAORDINÁRIO 598.099-5 MATO GROSSO DO SUL
RELATOR: MIN. CEZAR PELUSO
RECORRENTE (S): ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL
PROCURADOR: PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL
RECORRIDO (A/S): RôMULO AUGUSTO DUARTE
ADVOGADO (A/S): ANA KARINA DE OLIVEIRA E SILVA E OUTRO (A/S)
PRONUNCIAMENTO
CONCURSO PÚBLICO — EDITAL — VAGAS
ANUNCIADAS — DIREITO SUBJETIVO À
NOMEAÇÃO — RECURSO ExTRAORDINÁRIO —
REPERCUSSÃO GERAL — CONFIGURAÇÃO.
1. O Gabinete assim revelou as balizas deste recurso extraordinário:
Eis a síntese do que discutido no RE nº 598.099-5/MS, da relatoria do Ministro Menezes Direito, inserido no sistema eletrônico da repercussão geral em 03.04.2009.
O Superior Tribunal de Justiça deu provimento a recurso ordinário em mandado de segurança para determinar a nomeação do ora recorrido, aprovado e classificado em concurso público na 82ª posição, no cargo de Agente Auxiliar de Perícia da Polícia Civil de Mato Grosso do Sul. Consignou não ser lícito à administração, no prazo de validade do certame, deixar de nomear candidato aprovado dentro do número de vagas ofertadas no edital (no caso, 111 vagas), tendo em conta os investimentos realizados, em termos financeiros, emocionais e de tempo, bem como as legítimas expectativas em assumir o cargo público. Entendeu haver discricionariedade quanto à nomeação de candidatos apenas em relação àqueles classificados nas vagas remanescentes.
Embargos declaratórios foram desprovidos.
No extraordinário, interposto com alegada base na alínea “a” do permissivo constitucional, o Estado de Mato Grosso do Sul articula com transgressão dos artigos 5°, inciso LXIX, e 37, cabeça e inciso IV, do Diploma Maior. Sustenta, à luz do princípio da eficiência e da autonomia administrativa, possuir margem de discricionariedade para aferir a real necessidade de provimento de cargos, não havendo que se
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falar em direito subjetivo, líquido e certo, à nomeação de candidato aprovado
em concurso público. Assevera que entendimento contrário conduz à inversão
de valores, porquanto colocaria em supremacia o interesse privado e pessoal dos
concursados. Aduz ter a Corte de origem desatendido a ordem classificatória do
certame ao determinar a nomeação do impetrante em detrimento dos candidatos
mais bem posicionados que não recorreram ao Poder Judiciário.
Sob o ângulo da repercussão geral, afirma que a questão jurídica trazida
se apresenta relevante do ponto de vista econômico, social e jurídico,
ultrapassando os interesses subjetivos das partes. No campo econômico, a
relevância da matéria estaria demonstrada pelo dever de eficiência na gestão
de recursos materiais e humanos do Estado dentro dos limites das necessidades
e possibilidades orçamentário-financeiras. Em âmbito social e jurídico, o tema
constitucional debatido teria o condão de apresentar efeito multiplicador de
demandas judiciais bem como envolveria todos os entes da Federação.
Abaixo a manifestação do Ministro Menezes Direito:
‘DIREITO ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATO APROVADO ENTRE AS VAGAS PREVISTAS NO EDITAL. DIREITO À NOMEAÇãO. PODER DISCRICIONÁRIO DA ADMINISTRAÇãO PÚBLICA. EXISTÊNCIA DE REPERCUSSãO GERAL.
O Estado do Mato Grosso do Sul interpõe recurso extraordinário, com fundamento na alínea “a” do permissivo constitucional, contra acórdão da quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, assim ementado:
RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. DIREITO À NOMEAÇãO. CANDIDATO APROVADO ENTRE AS VAGAS PREVISTAS NO EDITAL. DIREITO LÍqUIDO E CERTO. RECURSO PROVIDO.
1. A aprovação do candidato no limite do número de vagas definido no Edital do concurso gera em seu favor o direito subjetivo à nomeação para o cargo.
2. As disposições contidas no Edital vinculam as atividades da Administração, que está obrigada a prover os cargos com os candidatos aprovados no limite das vagas previstas. A discricionariedade na nomeação de candidatos só incide em relação aos classificados nas vagas remanescentes.
3. Não é lícito à Administração, no prazo de validade do concurso público, simplesmente omitir-se na prática dos atos de nomeação dos aprovados no limite das vagas ofertadas, em respeito aos investimentos realizados pelos concursantes, em termos financeiros, de tempo e emocionais, bem com às suas legítimas expectativas quanto à assunção do cargo público.
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4. Precedentes desta Corte Superior: RMS 15.034/RS e RMS 10.817/MG.
5. Recurso Ordinário provido (fl. 130).
Opostos embargos de declaração (fls. 134 a 145), foram rejeitados (fls. 169 a 174).
Em preliminar formal e devidamente fundamentada, o Estado recorrente sustenta que a discussão acerca da obrigação da Administração Pública nomear os candidatos aprovados dentro do número de vagas oferecidas no edital do concurso público apresenta relevância jurídica e econômica ao impor à Administração a obrigação de contratar pessoal além das suas necessidades, implicando, consequentemente, aumento desnecessário das despesas públicas.
Destaca que o tema aqui examinado apresenta “alta sensibilidade social e jurídica que transcende os interesses intersubjetivos das partes envolvidas na relação processual concreta” (fl. 182) e tem, igualmente, o condão de apresentar efeito multiplicador de demandas no Poder Judiciário.
No mérito, sustenta contrariedade aos artigos 5º, inciso LXIX, e 37, caput e inciso IV, da Constituição Federal, uma vez que não há qualquer direito líquido e certo à nomeação daqueles aprovados, o que decorre de uma equivocada interpretação da sistemática constitucional adotada em torno do tema (fl. 185).
Aduz que as referidas normas constitucionais têm por escopo preservar a autonomia da Administração Pública, conferindo-lhe margem de discricionariedade para aferir a real necessidade de nomeação de candidatos aprovados em concurso público (fl. 188).
Concluiu acenando que o cumprimento da ordem emanada do acórdão atacado impõe a nomeação de candidato sem que seja observada a ordem classificatória do certame.
Considero que matéria constitucional presente nestes autos extrapola o interesse subjetivo das partes, na medida em que se discute a limitação do poder discricionário da Administração Pública em favor do direito de nomeação dos candidatos que lograram aprovação em concursos públicos e que estão classificados até o limite de vagas anunciadas no edital que regulamenta o certame.
A questão possui repercussão, notadamente, no aspecto social ao atingir diretamente o interesse de relevante parcela da população que participa dos processos seletivos para ingressar no serviço público.
Afeta, também, a Administração Pública Federal, Estadual e Municipal que, a partir da decisão emanada por esta Suprema Corte, poderá elaborar
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e realizar os concursos públicos ciente da extensão das obrigações que possui em relação aos candidatos aprovados e incluídos no rol das vagas ofertadas no processo seletivo.
Assim, considero presente a repercussão geral.
Brasília, 3 de abril de 2009.
MINISTRO MENEzES DIREITO
Relator’
2. Muito embora haja pronunciamento do Tribunal no sentido do acórdão proferido na origem,
revela-se a necessidade de sedimentação da jurisprudência. O Pleno deve manifestar-se sobre
a existência, ou não, do direito subjetivo à nomeação de candidatos aprovados em concurso
público quando, no edital do certame, anunciam-se vagas de forma específica e, com isso,
arregimentam-se cidadãos para a elas concorrerem.
3. Tal como fez o relator, Ministro Menezes Direito, admito a configuração da repercussão geral.
4. Publiquem.
Brasília, 16 de abril de 2009.
Ministro MARCO AURéLIO
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SUPREMO TRIbUNAL FEDERAL
15/12/2009 SEGUNDA TURMA
AG. REG. NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 769.433 CEARÁ
RELATOR: MIN. EROS GRAU
AGTE. (S): ESTADO DO CEARÁ
PROC. ((A/S) (ES)): PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DO CEARÁ
AGDO. (A/S): JEFFERSON LOPES CUSTÓDIO
ADV. (A/S): JEFFERSON LOPES CUSTÓDIO
EMENTA
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO.
DELEGADO DA POLÍCIA CIVIL. INqUÉRITO POLICIAL. EXCLUSãO DO CERTAME. VIOLAÇãO DO
PRINCÍPIO DA PRESUNÇãO DE INOCÊNCIA.
O Supremo Tribunal Federal fixou entendimento no sentido de que viola o princípio constitucional
da presunção de inocência a exclusão de candidato de concurso público que responde a inquérito
ou ação penal sem trânsito em julgado da sentença condenatória. Precedentes.
Agravo regimental a que se nega provimento.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo
Tribunal Federal, sob a Presidência da Senhora Ministra Ellen Gracie, na conformidade da ata
de julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em negar provimento ao
agravo regimental, nos termos do voto do Relator.
Brasília, 15 de dezembro de 2009.
Ministro EROS GRAU
Relator
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15/12/2009 SEGUNDA TURMA
AG. REG. NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 769.433 CEARÁ
RELATOR: MIN. EROS GRAU
AGTE. (S): ESTADO DO CEARÁ
PROC. ((A/S) (ES)): PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DO CEARÁ
AGDO. (A/S): JEFFERSON LOPES CUSTÓDIO
ADV. (A/S): JEFFERSON LOPES CUSTÓDIO
RELATÓRIO
O SENHOR MINISTRO EROS GRAU: Neguei seguimento ao agravo de instrumento nos seguintes termos:
DECISÃO: Trata-se de agravo de instrumento contra decisão que negou seguimento a recurso extraordinário interposto com fundamento no artigo 102, III, “a”, da Constituição do Brasil em oposição ao acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, assim ementado [fls. 200-201]:
‘CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. PRELIMINAR DE INADEqUAÇãO DA VIA ELEITA. CONCURSO PÚBLICO. PROVA DE TÍTULOS. ACUSAÇãO DE FRAUDE. INqUÉRITO POLICIAL ARqUIVADO. PRINCÍPIO DA PRESUNÇãO DE INOCÊNCIA. ORDEM DE SEGURANÇA CONCEDIDA.
— A documentação trazida ao bojo dos autos, com o ajuizamento da ação mandamental, afigura-se mais que suficiente à demonstração do direito líquido e certo do impetrante. Desincumbiu-se fielmente de seu ônus de produzir prova pré-constituída.
— Não cabe ao Poder Público, em se tratando de condutas penalmente relevantes, usurpar as funções institucionais do Poder Judiciário, a quem compete, isoladamente, o julgamento de fatos dessa magnitude.
— Em concurso público, é vedada a exclusão de candidato, a pretexto de responder ou haver respondido a inquérito policial já arquivado, por fatos tipificados abstratamente como crimes, porquanto sobre essas condutas incide o princípio da presunção de inocência.
— Nulo é o ato administrativo que inobserva esta imposição.
Ordem concedida’.
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2. Alega-se, no recurso extraordinário, ofensa ao disposto no artigo 5°, caput, LIII e LVII, da CB/88.
3. O agravo não merece provimento. O acórdão recorrido está em consonância com o entendimento fixado por esta Corte no sentido de que a exclusão de candidato de concurso público por estar respondendo a ação penal, sem condenação definitiva com trânsito em julgado, fere o princípio constitucional da presunção de inocência. Nesse sentido, colaciono os seguintes precedentes:
‘EMENTA: Agravo regimental em recurso extraordinário. 2. Recurso que não demonstra o desacerto da decisão agravada. 3. Concurso público. Polícia Militar. Candidato respondendo a ação penal. Exclusão do certame. Violação ao princípio da presunção da inocência. 4. Ausência de prequestionamento quanto aos demais artigos suscitados. Incidência das Súmulas 282 e 356 do STF. 5. Agravo regimental a que se nega provimento.’ [RE n. 487.398-AgRg, Relator o Ministro Gilmar Mendes, Segunda Turma, DJ 30.6.06].
‘CONCURSO PÚBLICO — CAPACITAÇãO MORAL — PROCESSO-CRIME EM ANDAMENTO. Surge motivado de forma contrária à garantia constitucional que encerra a presunção da não-culpabilidade ato administrativo, conclusivo quanto à ausência de capacitação moral, baseado, unicamente, na acusação e, portanto, no envolvimento do candidato em ação penal’ [RE n. 194.872, Relator o Ministro Marco Aurélio, Segunda Turma, DJ 2.2.01].
‘CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. POLÍCIA MILITAR. CANDIDATO. ELIMINAÇÂO. INVESTIGAÇãO SOCIAL. ART. 5º, LVII, DA CF. VIOLAÇãO. I - Viola o princípio constitucional da presunção da inocência, previsto no art. 5º, LVII, da Constituição Federal, a exclusão de candidato de concurso público que responde a inquérito ou ação penal sem trânsito em julgado da sentença condenatória. Precedentes. II - Agravo regimental improvido.’ [RE n. 559.135-AgR, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, DJ 13.6.08].
Nego seguimento ao agravo com fundamento no artigo 21, § 1°, do RISTF.
2. O agravante alega que “[...] o Recorrido foi eliminado do certame por fraude quanto à
originalidade e autoria de determinadas obras apresentadas pelo candidato para efeito de prova
de títulos. Vê-se, portanto, que a eliminação não se deu por violação ao princípio da presunção
de inocência, mas por fraude perpetrada na própria seleção da qual participava” [fl. 298].
3. Assevera que “ora, é inaceitável a permanência em concurso de delegado da polícia civil, de
candidatos que respondam por ilícitos perpetrados na própria seleção” [fl. 298].
4. Requer o provimento do agravo regimental para que o extraordinário tenha regular
seguimento.
É o relatório.
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AG. REG. NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 769.433 CEARÁ
VOTO
O SENHOR MINISTRO Eros Grau (Relator): Os argumentos deduzidos pelo agravante são
insuficientes para desconstituir os fundamentos da decisão agravada.
2. Tal e qual demonstrado na decisão objurgada, o acórdão recorrido está em consonância com
o entendimento fixado por esta Corte no sentido de que a exclusão de candidato de concurso
por estar respondendo a ação penal, sem condenação definitiva, com trânsito em julgado, fere
o princípio da presunção de inocência. Nesse sentido transcrevo os seguintes precedentes:
EMENTA: Agravo regimental em recurso extraordinário. 2. Recurso que não demonstra o desacerto da decisão agravada. 3. Concurso público. Polícia Militar. Candidato respondendo a ação penal. Exclusão do certame. Violação ao princípio da presunção de inocência. 4. Ausência de prequestionamento quanto aos demais artigos suscitados. Incidência das Súmulas 282 e 356 do STF. 5. Agravo Regimental a que se nega provimento. [RE n. 487.398-AgR, Relator o Ministro Gilmar Mendes, Segunda Turma, DJ 30.6.06] [grifei].
CONCURSO PÚBLICO — CAPACITAÇãO MORAL — PROCESSO-CRIME EM ANDAMENTO. Surge motivado de forma contrária à garantia constitucional que encerra a presunção da não-culpabilidade ato administrativo, conclusivo quanto à ausência de capacitação moral, baseado, unicamente, na acusação e, portanto, no envolvimento do candidato em ação penal [RE n. 194.872, Relator o Ministro Marco Aurélio, Segunda Turma, DJ 2.2.01] [grifei].
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. POLÍCIA MILITAR. CANDIDATO. ELIMINAÇãO. INVESTIGAÇãO SOCIAL. ART. 5°, LVII, DA CF. VIOLAÇãO. I — Viola o princípio constitucional da presunção da inocência, previsto no art. 5º, LVII, da Constituição Federal, a exclusão de candidato de concurso público que responde a inquérito ou ação penal sem trânsito em julgado da sentença condenatória. Precedentes. II — Agravo regimental improvido. [RE n. 559.135-AgRg, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, DJ 13.6.08] [grifei].
Nego provimento ao agravo regimental.
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SUPREMO TRIbUNAL FEDERAL
20/09/2007 TRIBUNAL PLENO
MANDADO DE SEGURANÇA 26.310-5 DISTRITO FEDERAL
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
IMPETRANTE (S): CLEUMI LUIz DE ALMEIDA
ADVOGADO (A/S): ANDRÉ FRANCISCO NEVES SILVA DA CUNHA E OUTRO (AS)
IMPETRADO (A/S): PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA
EMENTA
CONCURSO PÚBLICO — CANDIDATOS — TRATAMENTO IGUALITÁRIO. A regra é a participação dos
candidatos, no concurso público, em igualdade de condições.
CONCURSO PÚBLICO — RESERVA DE VAGAS — PORTADOR DE DEFICIÊNCIA — DISCIPLINA E
VIABILIDADE. Por encerrar exceção, a reserva de vagas para portadores de deficiência faz-se nos
limites da lei e na medida da viabilidade consideradas as existentes, afastada a possibilidade
de, mediante arredondamento, majorarem-se percentagens mínima e máximas previstas.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em
sessão plenária, sob a presidência da ministra Ellen Gracie, na conformidade da ata de julgamento
e das notas taquigráficas, por maioria e nos termos do voto do relator, em indeferir o mandado
de segurança, vencido o ministro Menezes Direito e a ministra Cármen Lúcia. Votou a Presidente.
Ausentes, justificadamente, os ministros Carlos Britto, Joaquim Barbosa e Eros Grau
Brasília, 20 de setembro de 2007.
Ministro MARCO AURéLIO
Relator
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20/09/2007 TRIBUNAL PLENO
MANDADO DE SEGURANÇA 26.310-5 DISTRITO FEDERAL
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
IMPETRANTE (S): CLEUMI LUIz DE ALMEIDA
ADVOGADO (A/S): ANDRÉ FRANCISCO NEVES SILVA DA CUNHA E OUTRO (AS)
IMPETRADO (A/S): PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA
RELATÓRIO
O SENHOR MINISTRO MARCO AURéLIO — Em jogo faz-se concurso público voltado ao
preenchimento de cargos de serviços notariais e de registro do Distrito Federal, mais
especificamente, a reserva de vagas destinadas a portadores de deficiência — inciso VIII do
artigo 37 da Constituição Federal. O edital veiculado não previu a citada reserva.
Alega o impetrante que o número de cargos vagos não pode afastar a incidência do preceito
constitucional. Afirma também que, não ocupadas quatro serventias, duas delas não teriam sido
ofertadas para preenchimento em razão de encontrar-se uma em fase de extinção e outra em
disputa judicial. Evoca o § 3° do artigo 236 da Constituição Federal, para dizer da impropriedade
de se manterem serventias vagas por mais de seis meses. Cita, então, a Lei n. 7.853/89,
que disciplina a matéria, e o Decreto que a regulamentou — n. 3.298/99 —, a estabelecer o
arredondamento de frações para o número inteiro. Assim, assevera que, levando em conta o
percentual de cinco por cento relativo à reserva para a disputa das vagas por portadores de
deficiência, ter-se-ia a fração de quatro décimos arredondada para uma vaga. Articula, ainda,
com o disposto na Lei n. 8.112/90, que prevê a percentagem de vinte por cento. Então, baseado
em cálculos, revela que, quer considerado o número de duas vagas, quer o de quatro, haveria
sempre a reserva de uma vaga para atendimento dos ditames constitucionais. Sustenta que, ao
concluir de forma diversa, o Conselho Nacional de Justiça teria colocado em segundo plano o
que assegurado mediante preceito de envergadura maior.
O pedido formulado na inicial de folha 2 a 21, acompanhada das peças de folha 22 a 91, objetivou
a concessão de medida acauteladora para suspender, até o julgamento final deste mandado de
segurança, o concurso público, vindo-se, alfim, a declarar a insubsistência do ato do Conselho
Nacional de Justiça, procedendo-se à correção do edital, para contemplar a mencionada reserva.
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À folha 93, despachei determinando fossem solicitadas informações. Daí o ofício de folha 98 a
101, mediante o qual se encaminharam documentos. O Conselho concluiu pela impossibilidade
de reserva tendo em conta o número de vagas ofertado, o que acabaria por viabilizar o
preenchimento da metade das existentes.
A Procuradoria Geral da República emitiu o parecer de folha 265 a 268 pelo indeferimento da
ordem, consignando a necessidade de serem sopesados valores. Eis a síntese da peça:
MANDADO DE SEGURANÇA. DECISãO DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA qUE CONCLUIU PELA DESNECESSIDADE DE RESERVA, AOS PORTADORES DE DEFICIÊNCIA, DE UMA DAS DUAS VAGAS DE TABELIãO OFERECIDAS NO TJDFT, APLICAÇãO DO PERCENTUAL LEGAL qUE IMPORTARIA, NO CASO CONCRETO, DISTORÇãO DA POLÍTICA PÚBLICA DE INCLUSãO SOCIAL. DESIGUALDADE EM PREJUÍzO DA GRANDE MAIORIA DOS CONCORRENTES E DESRESPEITO AO LIMITE MÁXIMO DE RESERVA DE VAGAS.
Ante o edital de folha 274, em que revelado encontrar-se o concurso na fase final, indeferi
a medida acauteladora e preconizei a inclusão do processo em pauta, com preferência, para
julgamento.
É o relatório.
VOTO
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO (RELATOR) — Reconheço a existência de precedente deste
Plenário agasalhando a tese sustentada pelo impetrante. No Recurso Extraordinário n. 227.299-1/
MG, relatado pelo ministro Ilmar Galvão, a Corte defrontou-se com situação concreta em que,
oferecidas oito vagas, a percentagem de cinco por cento prevista na legislação local como própria
à reserva de vagas aos portadores de deficiência desaguou em quatro décimos. Prevaleceu a
óptica da necessidade de sempre conferir-se concretude ao inciso VIII do artigo 37 da Constituição
Federal. Presente esteve, conforme o voto do relator que se encontra às folhas 32 e 33, o disposto
no Decreto n. 3.298/99, que regulamentou a Lei nº 7.853/89. O tema, porém, merece reflexão,
reexaminando-se o entendimento que acabou por prevalecer, até mesmo com o meu voto.
A regra é a feitura de concurso público, concorrendo os candidatos em igualdade de situação —
inciso II do artigo 37 da Carta da República. O inciso VIII do mesmo artigo preceitua que “a lei
reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência
e definirá os critérios de sua admissão”. A Lei n. 7.853/89 versou a percentagem mínima de
cinco por cento e a Lei n. 8.112/90 veio a estabelecer o máximo de vinte por cento de vagas
reservadas aos candidatos portadores de deficiência física.
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Ora, considerado o total de vagas no caso — duas —, não se tem, aplicada a percentagem mínima
de cinco ou a máxima de vinte por cento, como definir vaga reservada a teor do aludido inciso
VIII. Entender-se que um décimo de vaga ou mesmo quatro décimos, resultantes da aplicação de
cinco ou vinte por cento, respectivamente, sobre duas vagas, dão ensejo à reserva de uma delas
implica verdadeira igualização, olvidando-se que a regra é a não-distinção entre candidatos,
sendo exceção a participação restrita, consideradas vagas reservadas. Essa conclusão levaria
os candidatos em geral a concorrerem a uma das vagas e os deficientes, à outra, majorando-se
os percentuais mínimos, de cinco por cento, e máximo, de vinte por cento, para cinqüenta por
cento. O enforque não é harmônico com o princípio da razoabilidade.
Há de se conferir ao texto constitucional interpretação a preservar a premissa de que a regra
geral é o tratamento igualitário, consubstanciando exceção a separação de vagas para um
certo segmento. A eficácia do que versado no artigo 37, VIII, da Constituição Federal pressupõe
campo propício a ter-se, com incidência do percentual concernente à reserva para portadores
de deficiência sobre cargos e empregos públicos previsto em lei, resultado a desaguar em
certo número de vagas, e isso não ocorre quando existentes apenas duas. Daí concluir pela
improcedência do inconformismo retratado na inicial, razão pela qual indefiro a ordem.
O ExCELENTÍSIMO SENHOR MINISTRO MENEZES DIREITO:
Senhora Presidente, o Ministro Marco Aurélio fez referência a um precedente da Corte, de que
foi Relator o Ministro Ilmar Galvão, em sentido oposto.
Vou pedir vênia ao Ministro Marco Aurélio para ficar com esse precedente. O meu temor é que
se nós utilizarmos esse raciocínio poderemos dar ensejo a que, nos concursos futuros, também
se crie esse tipo de óbice, quando, na verdade, a disciplina constitucional é mandatória,
determina que nos concurso públicos deve reservar-se vaga específica para os deficientes.
A SRA. MINISTRA ELLEN GRACIE (PRESIDENTE) — No máximo vinte por cento.
O ExCELENTÍSIMO SENHOR MINISTRO MENEZES DIREITO:
Se tem dois, três, quatro, cinco, seis, sete não importa, tem de ser reservada.
O SR. MINISTRO MARCO AURÉLIO (RELATOR) — Vossa Excelência me permite só uma
ponderação?
O ExCELENTÍSIMO SENHOR MINISTRO MENEZES DIREITO:
Claro, com muito prazer.
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O SR. MINISTRO MARCO AURÉLIO (RELATOR) — Se pelo menos existisse indício de fraude, ou
seja, guardando-se vagas para não haver destinação a portadores de deficiência, não teria a
menor dúvida em conceder a ordem.
A SRA. MINISTRA ELLEN GRACIE (PRESIDENTE) — São serventias raras, que vão vagando ao
longo do tempo. Por exemplo, os cartórios. Vamos esperar que haja vaga de vinte cartórios para
poder, então, abrir o edital?
O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO — A Constituição é textual a respeito: diz que a lei
reservará o percentual. Logo, não se pode extrair do texto constitucional um número arbitrário
de vagas.
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO (RELATOR) — A reserva é de um mínimo de cinco. Ter-
se-ia um décimo de vaga e o arredondamento desse décimo para um inteiro, chegando-se não à
percentagem, à observância da percentagem de cinco por cento, mas de cinquenta por cento.
O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO — E com o agravante do fato de que tal interpretação, com
o devido respeito, atribui a uma exceção da Constituição amplitude tal que transforma a regra,
a ponto de se dividir o número de vagas em concurso. Isto é, a norma deixa de ser exceção para
atender situações particularíssimas, que só a lei pode regular nos pormenores circunstanciais,
para admitir que, em todos os concursos, quando não se possa atingir o percentual mínimo nela
previsto, se chegue arbitrariamente até a metade das vagas do concurso, o que significa outra
regra, de caráter geral.
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI — Senhora Presidente, eu também queria
aproveitar para lembrar um precedente já julgado neste Plenário, o Mandado de Segurança nº
25.074, de que foi Relator o eminente Ministro Cezar Peluso, no qual ele conclui:
(...) o que assegura a Constituição é que os portadores de deficiência têm direito
de ocupar determinado número de cargos e de empregos públicos, considerados
em cada quadro funcional, segundo a percentagem que lhes reserve a lei, o que
só pode apurar-se no confronto do total dos cargos e dos empregos, e não, é
óbvio, perante o número aleatório de vagas que se ponham em cada concurso.
Quer dizer, é preciso examinar esse percentual que fixa a lei de acordo com o total de cargos
existentes na administração numa determinada categoria, porque senão, realmente, se abrirmos
a cada concurso vagas para os deficientes, de repente esse número previsto na lei acaba sendo
ultrapassado.
A SRA. MINISTRA ELLEN GRACIE (PRESIDENTE) — Ministro Menezes Direito.
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O ExCELENTÍSIMO SENHOR MINISTRO MENEZES DIREITO:
Então, Senhora Presidente, pedindo vênia ao eminente Relator, entendo que se deve manter
a disciplina constitucional que determina a reserva do número de vagas para os deficientes.
Como a lei estabelece o percentual — o percentual aplicado pela lei resulta nesse percentual
indicado pelo Ministro Marco Aurélio —, mas, a meu sentir, isso não justifica a explicitação de
que, porque seria cinquenta por cento, não se daria a deficientes.
Portanto, peço vênia a Sua Excelência e mantenho o meu entendimento para conhecer do
mandado de segurança e dar a ordem em parte, porque eles estão pedindo, pelo que verifiquei,
mais do que o possível.
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20/09/2007 TRIBUNAL PLENO
MANDADO DE SEGURANÇA 26.310-5 DISTRITO FEDERAL
TRIBUNAL PLENO
MANDADO DE SEGURANÇA 26.310
VOTO
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LúCIA — Senhora Presidente, também vou pedir vênia ao nobre
Relator, mas vou acompanhar a divergência no sentido de manter, no concurso, as vagas para
deficientes, conforme determina a Constituição.
VOTO
O SR. MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI — Senhora Presidente, vou pedir vênia ao eminente
Ministro Carlos Alberto Direito e acompanhar o eminente Relator, pelos motivos já apontados.
DISTRITO FEDERAL
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SUPREMO TRIbUNAL FEDERAL
REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO ExTRAORDINÁRIO 572.499-9 SANTA CATARINA
RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA
RECORRENTE (S): MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
RECORRIDO (A/S): UNIãO
ADVOGADO (A/S): ADVOGADO-GERAL DA UNIãO
INTERESSADO (A/S): RODRIGO CARLOS CORREA E OUTRO(A/S)
ADVOGADO (A/S): JOãO CARLOS CASTILLO E OUTRO(A/S)
EMENTA
CONSTITUCIONAL. ARTIGO 142, § 3°, INCISO X, DA CONSTITUIÇãO DA REPÚBLICA: LEI SOBRE
INGRESSO NAS FORÇAS ARMADAS. ARTIGO 9° DA LEI N. 11.279/2006. LIMITE DE IDADE: FIXAÇãO
EM EDITAL. MANIFESTAÇãO PELA EXISTÊNCIA DE REPERCUSSãO GERAL.
Reconhecida a repercussão sobre o tema relativo à constitucionalidade do art. 9º da Lei n.
11.279/2006, que atribui ao edital de concurso público para ingresso nas forças armadas a
fixação das condições de escolaridade, preparo técnico e profissional, sexo, limites de idade,
idoneidade, saúde, higidez física e aptidão psicológica, à luz do disposto no art. 142, § 3º, inciso
X, da Constituição da República.
Decisão: O Tribunal reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional
suscitada, vencido o Ministro Gilmar Mendes. Não se manifestou o Ministro Cezar Peluso.
Ministra CÁRMEN LúCIA
Relatora
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REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO ExTRAORDINÁRIO 572.499-9 SANTA CATARINA
MANIFESTAÇÃO
CONSTITUCIONAL. ARTIGO 142, § 3°, INCISO X, DA
CONSTITUIÇãO DA REPÚBLICA: LEI SOBRE INGRESSO NAS
FORÇAS ARMADAS. ART. 9° DA LEI N. 11.279/2006. LIMITE
DE IDADE: FIXAÇãO EM EDITAL. MANIFESTAÇãO PELA
EXISTÊNCIA DE REPERCUSSãO GERAL.
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA — (Relatora):
1. Recurso extraordinário interposto contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região
proferido nos termos que seguem:
ADMINISTRATIVO. MILITAR. INSCRIÇãO NO CONCURSO DE ADMISSãO DO CURSO DE FORMAÇãO DE SOLDADOS FUzILEIROS NAVAIS. LIMITE DE IDADE.
Impetrantes que não satisfazem aos limites de idade estabelecidos pelo Edital de Convocação para o concurso de Admissão à Turma I/2007 do Curso de Formação de Soldados Fuzileiros Navais.
Aplicação do art. 142, § 3º, inc. X, da CR/88, e da Lei 11.279/06, que dispõe sobre o ensino na Marinha.
2. Há relevância jurídica no tema e este não está restrito aos interesses subjetivos da causa.
O art. 142, § 3º, inc. X, da Constituição da República dispõe que a lei disporá sobre o ingresso
nas Forças Armadas, os limites de idade, a estabilidade e outras condições de transferência do
militar para a inatividade, os direitos, os deveres, a remuneração, as prerrogativas e outras
situações especiais dos militares, consideradas as peculiaridades de suas atividades, inclusive
aquelas cumpridas por força de compromissos internacionais e de guerra.
No entanto, o art. 9º da Lei n. 11.279/2006 dispõe que a matrícula nos cursos que permitem
o ingresso na Marinha dependerá de aprovação prévia em concurso público, cujo edital
estabelecerá as condições de escolaridade, preparo técnico e profissional, sexo, limites de
idade, idoneidade, saúde, higidez física e aptidão psicológica requeridas pelas exigências
profissionais de atividade e carreira a que se destinam.
A questão, no caso concreto, está em saber se poderia o legislador delegar o cuidado da
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s do
STF
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matéria para o edital do concurso, cujo feitor passaria a ter a responsabilidade para fixar os
limites de idade para ingresso na Marinha. É que a Constituição determinou necessária lei como
instrumento mediante o qual se pudesse fixar esta limitação.
Entretanto, o tema não se restringe ao caso concreto e se traduz numa questão jurídica de
grande alcance, qual seja, saber se pode o legislador delegar para outro instrumento normativo
disciplina normativa que a Constituição reserva materialmente à lei formal.
3. Pelo exposto, manifesto-me pela existência de repercussão geral do tema constitucional
suscitado no recurso extraordinário.
Brasília, 26 de setembro de 2008.
Ministra CÁRMEN LúCIA
Relatora
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REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO ExTRAORDINÁRIO 572.499-9 SANTA CATARINA
RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA
RECORRENTE (S): MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
RECORRIDO (A/S): UNIãO
ADVOGADO (A/S): ADVOGADO-GERAL DA UNIãO
INTERESSADO (A/S): RODRIGO CARLOS CORREA E OUTRO(A/S)
ADVOGADO (A/S): JOãO CARLOS CASTILLO E OUTRO(A/S)
PRONUNCIAMENTO
RECURSO ExTRAORDINÁRIO — CONCURSO — LIMITE DE
IDADE — REGÊNCIA — LEI VERSUS EDITAL — DELEGAÇÃO —
REPERCUSSÃO GERAL.
1. A Assessoria assim retratou as balizas deste extraordinário:
Eis a síntese do que discutido no Recurso Extraordinário n. 572.499-9/SC, da
relatoria da Ministra Cármen Lúcia, inserido no sistema da repercussão geral
em 26.9.2008.
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região proveu parcialmente pedido formulado
em apelação, assentando a constitucionalidade de requisito mínimo de idade
estabelecido em edital para concorrer a cursos quer permitem o ingresso na
Marinha. Eis a síntese do acórdão:
ADMINISTRATIVO. MILITAR. INSCRIÇãO NO CONCURSO DE ADMISSãO DO CURSO DE
FORMAÇãO DE SOLDADOS FUzILEIROS NAVAIS. LIMITE DE IDADE.
Impetrantes que não satisfazem aos limites de idade estabelecidos no Edital de
Convocação para o Concurso de Admissão à Turma I/2007 do Curso de Formação
de Soldados Fuzileiros Navais.
Aplicação do art. 142, § 3º, inc. X, da CR/88, e da Lei n. 11.279/06, que dispõe
sobre o ensino na Marinha.
No extraordinário interposto com alegada base na alínea “a” do permissivo constitucional, o
Ministério Público Federal articula com a transgressão do inciso X do § 3º do artigo 142 da Lei
Fundamental. Assevera ter a Carta Magna atribuído à lei a fixação de limites de idade para o
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ingresso nas Forças Armadas, sendo inconstitucional a norma legal que permite a delimitação pelo edital do concurso. Aduz existir, na espécie, verdadeira reserva legal em sentido formal.
Sob o ângulo da repercussão geral, argumenta a relevância da questão constitucional debatida do ponto de vista jurídico. Afirma não poder o Legislativo abdicar de competência própria, delegando ao Executivo a função de legislador.
Abaixo, a manifestação da ministra Cármen Lúcia, relatora, que se pronunciou pela existência de repercussão geral:
MANIFESTAÇÃO
EMENTA: CONSTITUCIONAL. ARTIGO 142, § 3º, INCISO X, DA CONSTITUIÇãO DA REPÚBLICA: LEI SOBRE INGRESSO NAS FORÇAS ARMADAS. ARTIGO 9º DA LEI N. 11.279/2006. LIMITE DE IDADE: FIXAÇãO EM EDITAL. MANIFESTAÇãO PELA EXISTÊNCIA DE REPERCUSSãO GERAL.
A SENHORA MINISTRA CARMEN LÚCIA — (Relatora)
1. Recurso extraordinário interposto contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região proferido nos termos que seguem:
‘ADMINISTRATIVO. MILITAR. INSCRIÇãO NO CONCURSO DE ADMISSãO NO CURSO DE FORMAÇãO DE SOLDADOS FUzILEIROS NAVAIS. LIMITE DE IDADE.
Impetrantes que não satisfazem aos limites de idade estabelecidos pelo Edital de Convocação para o concurso de Admissão à Turma I/2007 do Curso de Formação de Soldados Fuzileiros Navais.
Aplicação do art. 142, § 3º, inc. X, da CR/88, e da Lei 11.279/06, que dispõe sobre o ensino na Marinha’.
2. Há relevância jurídica no tema e este não está restrito aos interesses subjetivos da causa.
O art. 142, § 3º, inc. X da Constituição da República dispõe que a lei disporá sobre o ingresso nas Forças Armadas, os limites de idade, a estabilidade e outras condições de transferência do militar para a inatividade, os direitos, os deveres, a remuneração, as prerrogativas e outras situações especiais dos militares, consideradas as peculiaridades de suas atividades, inclusive aquelas cumpridas por força de compromissos internacionais e de guerra.
No entanto, o art. 9º da Lei n. 11.279/2006 dispõe que a matrícula nos cursos que permitem o ingresso na Marinha dependerá de aprovação prévia em concurso público, cujo edital estabelecerá as condições de escolaridade, preparo técnico e profissional, sexo, limites de idade, idoneidade, saúde, higidez física e aptidão psicológica requeridas pelas exigências profissionais de atividade e carreira a que se destinam.
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A questão, no caso concreto, está em saber se poderia o legislador delegar
o cuidado da matéria para o edital do concurso, cujo feitor passaria a ter a
responsabilidade para fixar os limites de idade para ingresso na Marinha. É que
a Constituição determinou necessária lei como instrumento mediante o qual se
pudesse fixar esta limitação.
Entretanto, o tema não se restringe ao caso concreto e se traduz numa questão
jurídica de grande alcance, qual seja, saber se pode o legislador delegar para
outro instrumento normativo disciplina normativa que a Constituição reserva
materialmente à lei formal.
3. Pelo exposto, manifesto-me pela existência de repercussão geral do tema
constitucional suscitado no recurso extraordinário.
Brasília, 26 de setembro de 2008.
Ministra CÁRMEN LúCIA
Relatora
2. Reitero o que venho consignando sobre a importância do instituto da repercussão geral, devendo-
se resistir à tentação, no exame, de formar juízo sobre a procedência ou improcedência do que
revelado nas razões do extraordinário. Cumpre encará-lo com largueza. O instrumental viabiliza a
adoção do entendimento pelo Colegiado Maior, com o exercício, na plenitude, do direito de defesa.
Em princípio, é possível vislumbrar-se grande número de processos, mas, uma vez apreciada a
questão, a eficácia vinculante do pronunciamento propicia a racionalização do trabalho judiciário.
No caso, a toda evidência, trata-se de tema a ser elucidado pelo Supremo considerados quer o
instrumental próprio para a regência da matéria, quer o alcance desta à luz da Constituição,
quer a delegação verificada.
3. Tal como fez a relatora, admito a repercussão geral.
4. À Assessoria, para acompanhar, no sistema, o incidente.
5. Publiquem.
Brasília, 2 de outubro de 2008.
Ministro MARCO AURéLIO
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SUPREMO TRIbUNAL FEDERAL
02/03/2010 SEGUNDA TURMA
AG. REG. NO RECURSO ExTRAORDINÁRIO 584.444 DISTRITO FEDERAL
RELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA
AGTE.(S): DISTRITO FEDERAL
ADV.(A/S): PGDF — ISABEL PAES DE ANDRADE BANHOS
AGDO.(A/S): SUzANA OLIVEIRA DEL BOSCO TARDIN
ADV.(A/S): ANDERSON NAzARENO RODRIGUES
EMENTA
AGRAVO REGIMENTAL. CONCURSO PÚBLICO. EXAME DE APTIDãO FÍSICA. REALIzAÇãO DE NOVO
EXAME. MOTIVO DE FORÇA MAIOR.
A decisão agravada está em harmonia com o entendimento firmado neste Tribunal, no sentido
de ser possível a realização de novo exame de aptidão física, em virtude de motivo de força
maior que tenha alcançado a higidez física do candidato no dia do teste. Agravo regimental a
que se nega provimento.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os ministros do Supremo Tribunal Federal,
em Segunda Turma, sob a Presidência do Ministro Cezar Peluso, na conformidade da ata de
julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em negar provimento ao
recurso de agravo, nos termos do voto do relator.
Brasília, 02 de março de 2010.
Ministro JOAQUIM BARBOSA
Relator
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02/03/2010 SEGUNDA TURMA
AG. REG. NO RECURSO ExTRAORDINÁRIO 584.444 DISTRITO FEDERAL
RELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA
AGTE.(S): DISTRITO FEDERAL
ADV.(A/S): PGDF — ISABEL PAES DE ANDRADE BANHOS
ADV.(A/S): SUzANA OLIVEIRA DEL BOSCO TARDIN
ADV.(A/S): ANDERSON NAzARENO RODRIGUES
RELATÓRIO
O SENHOR MINISTRO JOAQUIM BARBOSA (Relator): É este o teor da decisão com que dei
provimento ao recurso extraordinário (fls. 301/302):
Trata-se de recurso extraordinário (art. 102, III, a, da Constituição) interposto de acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, cuja ementa tem o seguinte teor (fl. 168):
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. CONCURSO PÚBLICO. EXAME MÉDICO. CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR. MEDIDA CAUTELAR. PRECARIEDADE. PROVISORIEDADE. ACESSORIEDADE. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. CONEXãO. IMPOSSBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO.
1. Em certame público, diante de situação excepcional, caracterizável como “caso fortuito” ou “motivo de força maior”, a realização dos exames médicos em outra oportunidade não tem o condão de prejudicar os demais concorrentes ou a administração pública.
(...)
No recurso extraordinário, aponta-se a violação do disposto no art. 37, I e II da Carta Magna. Argumenta-se que ‘Ao aderir às normas do certame, o autor se sujeitou a todas as exigências do edital, não podendo, depois, pleitear tratamento diferenciado contra literal disposição expressa e pública da lei interna a que se obrigou’.
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se, por ocasião o julgamento do RE 179.500 (rel. min. Marco Aurélio, DJ 15.10.1999), no sentido da possibilidade de, por motivos de força maior, os testes de aptidão física serem refeitos.
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CONCURSO PÚBLICO — PROVA DE ESFORÇO FÍSICO — FORÇA MAIOR — REFAzIMENTO — PRINCÍPIO ISONôMICO.
Longe fica de implicar ofensa ao princípio isonômico decisão que se reconhece, na via do mandado de segurança, o direito de o candidato refazer a prova de esforço, em face de motivo de força maior que lhe alcançou a higidez física no dia designado, dela participando sem as condições normais de saúde.
No mesmo sentido, em decisão monocrática, o AI 315.870 (rel. min. Celso de Mello, DJ 19.10.2005) e o RE 376.607 (rel. min. Eros Grau, DJ 08.08.2005).
No caso dos autos, caracteriza-se motivo de força maior a justificar a realização de novo exame os problemas temporários de saúde a recorrida comprovados por atestado médico.
Do exposto, nego seguimento ao recurso extraordinário.
Dessa decisão interpõe-se o agravo regimental em que se reitera a alegação de ofensa ao art.
37, I e II, da Constituição.
Mantenho a decisão agravada e submeto o presente agravo à apreciação da Turma.
É o relatório.
VOTO
O SENHOR MINISTRO JOAQUIM BARBOSA (Relator): Sem razão a parte agravante.
Com efeito, a decisão agravada está em perfeita harmonia com o entendimento firmado neste
Tribunal, no sentido de ser possível a realização de novo exame de aptidão física, em virtude de
motivo de força maior que tenha alcançado a higidez física do candidato no dia do teste.
Nesse sentido, confiram-se os seguintes julgados:
CONCURSO PÚBLICO — PROVA DE ESFORÇO FÍSICO — FORÇA MAIOR — REFAzIMENTO — PRINCÍPIO ISONôMICO.
Longe de implicar ofensa ao princípio isonômico decisão em que se reconhece, na via do mandado de segurança, o direito de o candidato refazer a prova de esforço, em face de motivo de força maior que lhe alcançou a higidez física no dia designado, dela participando sem as condições normais de saúde. (RE 179.500, rel. min. Marco Aurélio, Segunda Turma, DJ 15.10.1999)
EMENTAS: 1. RECURSO. Extraordinário. Inadmissibilidade. Concurso Público. Prova de esforço físico. Força maior. Refazimento. Ausência de razões novas. Decisão mantida. Agravo regimental improvido. Nega-se provimento ao agravo
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regimental tendente a impugnar, sem razões novas, decisão fundada em questão assente na Corte.
2. RECURSO. Agravo. Regimental. Jurisprudência assentada sobre a matéria. Caráter meramente abusivo. Litigância de má fé. Imposição de multa. Aplicação do art. 577, § 2º, cc. arts. 14, II e III, e 17, VII, do CPC. quando abusiva a interposição de agravo, manifestamente inadmissível ou infundado, deve o Tribunal condenar o agravante a pagar multa ao agravado. (RE 412.435-AgR, rel. min. Cezar Peluso, Segunda Turma, DJ 06.11.2006).
Do exposto, nego provimento ao agravo regimental.
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Decisões do STJ
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
RECURSO ESPECIAL N. 1.143.717 — DF (2009/0107674-4)
RELATOR: MIN. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO
RECORRENTE: FABRÍCIO BASSETTI MORAES
ADVOGADO: JOSÉ DE CASTRO MEIRA JUNIOR E OUTRO(S)
RECORRIDO: UNIãO
EMENTA
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. CONCURSO PÚBLICO. AGENTE DA POLÍCIA FEDERAL.
INVESTIGAÇãO SOCIAL. EXCLUSãO DO CANDIDATO DO CURSO DE FORMAÇãO. OFENSA AO
PRINCÍPIO DA PRESUNÇãO DE INOCÊNCIA.
1. Afronta o princípio constitucional da presunção de inocência (art. 5°, LVII, da Carta Magna), a
imediata exclusão de candidato do concurso público que, na fase de investigação social, esteja
respondendo a ação criminal, cuja decisão condenatória não transitara em julgado. Precedentes
do STJ: REsp. 795.174/DF, Rel. Min. LAURITA VAz, DJU 01/03/2010 e REsp. 414.933/PR, Rel.
Min. ARNALDO ESTEVES LIMA, DJU 06/08/2007; e do STF: AgRg no AI 769.433/CE, Rel. Min.
EROS GRAU, DJU 12/02/2010 e AgRg no RE 559.135/DF, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, DJU
13/06/2008.
2. No transcurso do presente processo, o candidato foi absolvido da ação penal à qual respondia,
nos termos do art. 386, VI, do CPP, já tendo o acórdão transitado em julgado.
3. Recurso conhecido e provido para cassar o acórdão recorrido, restabelecendo a sentença
monocrática.
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ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da qUINTA TURMA do Superior
Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por
unanimidade, conhecer do recurso e lhe dar provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro
Relator. Os Srs. Ministros Jorge Mussi, Felix Fischer, Laurita Vaz e Arnaldo Esteves Lima votaram
com o Sr. Ministro Relator.
Brasília/DF, 04 de maio de 2010 (Data do Julgamento).
Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO
Relator
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RECURSO ESPECIAL N. 1.143.717 — DF (2009/0107674-4)
RELATOR: MIN. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO
RECORRENTE: FABRÍCIO BASSETTI MORAES
ADVOGADO: JOSÉ DE CASTRO MEIRA JUNIOR E OUTRO(S)
RECORRIDO: UNIãO
RELATÓRIO
1. Trata-se de Recurso Especial interposto por FABRÍCIO BASSETTI MORAES, com fundamento
nas alíneas a e c do art. 105, III, da Constituição Federal, no qual se insurge contra acórdão
proferido pelo egrégio Tribunal Regional Federal da 1a. Região, assim ementado:
CONCURSO PÚBLICO. AGENTE DE POLÍCIA FEDERAL. INVESTIGAÇãO SOCIAL. INIDONEIDADE MORAL PELA EXISTÊNCIA DE CONDENAÇãO CRIMINAL POR ESTELIONATO E DÍVIDAS ORIUNDAS DE EMISSãO DE CHEqUES SEM PROVISãO DE FUNDOS. ABSOLVIÇãO SUPERVENIENTE NO ÂMBITO CRIMINAL EM RAzãO DE FALTAS DE PROVAS E FUNDADA DÚVIDA NO ELEMENTO SUBJETIVO DO TIPO PENAL. EXCLUSãO DO CURSO DE FORMAÇãO. LEGALIDADE.
1. O art. 37, inciso II, da Constituição da República, preceitua que a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração.
2. A exigência sob discussão (de idoneidade moral inatacável) é legal, com previsão no art. 8º, inciso I, do Decreto-Lei n. 2.320, de 26 de janeiro de 1967: Art. 8º. São requisitos para a matrícula em curso de formação profissional, apurados em processo seletivo, promovido pela Academia Nacional de Polícia: I-ter procedimento irrepreensível e idoneidade moral inatacável, avaliados segundo normas baixadas pela Direção-Geral do Departamento de Polícia Federal.
3. O impetrante foi excluído do concurso público para o provimento de cargos de Agente de Polícia Federal em virtude de dois motivos constantes dos registros de sua investigação social, a saber: dívidas decorrentes de emissão de três cheques sem provisão de fundos e condenação criminal pela prática do crime de estelionato.
4. A condenação criminal do candidato por crime de estelionato em primeira instância decorreu da apresentação por parte do impetrante de petição de ação cautelar não ajuizada ao Serviço de Proteção do Crédito — SPC, mas protocolada em cartório judicial como ajuizada, com o objetivo de retirar o
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nome de terceiro daquele cadastro, com fulcro em Lei estadual que dispunha sobre a exclusão do registro enquanto se discutia o débito em ação judicial.
5. Consta, ainda, no relatório do acórdão que julgou a apelação criminal que tal procedimento foi reiterado por meio de aditamento da ação cautelar, petição com protocolo do cartório, que, todavia, não foi reconhecido por funcionário o seu carimbo ali aposto.
6. O impetrante até a presente data, mesmo acusado por duas vezes de ter se utilizado de expediente ardiloso para retirar o nome de cliente do SPC, não comprovou o ajuizamento regular de ação que discutia o débito que originou a inscrição no cadastro restritivo de crédito.
7. Não obstante a superveniente absolvição criminal por faltas de provas e dúvida quanto ao elemento subjetivo da conduta do agente suficientes para a condenação criminal, o Conselho de Ensino da Academia Nacional de Polícia, no momento de aferição do procedimento irrepreensível e idoneidade moral, com fulcro no art. 8º, inciso I, do Decreto-Lei 2.320/1967, identificou condenação criminal em desfavor do impetrante em razão do crime de estelionato, fato grave que maculou a conduta social do candidato, a ensejar a necessária exclusão do concurso.
8. Ademais, as instâncias penal e administrativa são independentes, exceto a absolvição criminal por negativa de autoria ou pela inexistência do fato, hipóteses que a instância administrativa se vincularia ao juízo penal, o que não é caso dos autos.
9. Apelação da União provida para declarar legal a exclusão do impetrante do concurso público para provimento do cargo de Agente de Polícia Federal.
10. Remessa oficial prejudicada.
2. Alega o recorrente violação ao art. 8º, I, do Decreto Lei 2.320/87, regulamentado pelo art. 8º
da Instrução Normativa 001/2004-DGP/DPF, e ao art. 1° da Lei 1.533/51, sustentando que a sua
exclusão do certame desrespeitou o princípio da presunção de inocência insculpido no inciso LVII
do art. 5° da Constituição Federal. Aponta também afronta ao princípio da proporcionalidade,
vez que são graves as consequências — exclusão do concurso público ao qual foi aprovado em
todas as etapas - tomadas por fatos não comprovados contra a pessoa do candidato. Colaciona
precedentes jurisprudenciais no intuito de obter uniformização dos mesmos.
3. É o relatório.
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RECURSO ESPECIAL N. 1.143.717 — DF (2009/0107674-4)
RELATOR: MIN. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO
RECORRENTE: FABRÍCIO BASSETTI MORAES
ADVOGADO: JOSÉ DE CASTRO MEIRA JUNIOR E OUTRO(S)
RECORRIDO: UNIãO
VOTO
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. CONCURSO PÚBLICO. AGENTE DA POLÍCIA FEDERAL. INVESTIGAÇãO SOCIAL. EXCLUSãO DO CANDIDATO DO CURSO DE FORMAÇãO. OFENSA AO PRINCÍPIO DA PRESUNÇãO DE INOCÊNCIA.
1. Afronta o princípio constitucional da presunção de inocência (art. 5º, LVII, da Carta Magna), a imediata exclusão de candidato do concurso público que, na fase de investigação social, esteja respondendo a ação criminal, cuja decisão condenatória, não transitara em julgado. Precedentes do STJ: REsp. 795.174/DF, Rel. Min. LAURITA VAz, DJU 01/03/2010 e REsp. 414.933/PR, Rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA, DJU 06/08/2007; e do STF: AgRg no AI 769.433/CE, Rel. Min. EROS GRAU, DJU 12/02/2010 eAgRg no RE 559.135/DF, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, DJU 13/06/2008.
2. No transcurso do presente processo, o candidato foi absolvido da ação penal à qual respondia, nos termos do art. 386, VI, do CPP, já tendo o acórdão transitado em julgado.
3. Recurso conhecido e provido para cassar o acórdão recorrido, restabelecendo a sentença monocrática.
1. O recorrente insurge-se contra sua exclusão, às vésperas de completar o Curso de Formação,
do Concurso Público Nacional para o Cargo de Agente da Polícia Federal, em virtude dos fatos
apontados na fase de investigação social, quais sejam:
a) Inadimplência relativa a três cheques nos valores de R$ 139,65, R$ 133,00 e R$ 232,40;
b) Condenação por estelionato no processo nº 024.03.018569-9, da 7ª Vara Criminal de Vitória-ES.
2. Ocorre que, no tocante ao fato mais grave, ou seja, a condenação por estelionato, bem
destacou o Magistrado sentenciante que, no transcurso do presente processo, o impetrante
comprovou — docs. de fls. 138/162 —, que fora absolvido pelo Tribunal de Justiça do Estado do
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Espírito Santo, nos termos do art. 386, VI, do CPP, já tendo o acórdão transitado em julgado em
27/02/2008.
3. Vê-se que a Ação Penal não conduziu o impetrante à condenação, configurando, portanto,
afronta ao princípio da inocência a exclusão do candidato do concurso público amparada no
fato de, na investigação social, ter sido verificado que o impetrante responde a processo penal,
sem sentença condenatória transitada em julgado.
4. Nesse sentido, citem-se os seguintes julgados da Suprema Corte:
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. DELEGADO DA POLÍCIA CIVIL. INqUÉRITO POLICIAL. EXCLUSãO DO CERTAME. VIOLAÇãO DO PRINCÍPIO DA PRESUNÇãO DE INOCÊNCIA. O Supremo Tribunal Federal fixou entendimento no sentido de que viola o princípio constitucional da presunção de inocência a exclusão de candidato de concurso público que responde a inquérito ou ação penal sem trânsito em julgado da sentença condenatória. Precedentes. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no AI 769.433/CE, Rel. Min. EROS GRAU, DJU 12/02/2010).
* * *
EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. POLÍCIA MILITAR. CANDIDATO. ELIMINAÇãO. INVESTIGAÇãO SOCIAL. ART. 5º, LVII, DA CF. VIOLAÇãO.
I — Viola o princípio constitucional da presunção da inocência, previsto no art. 5º, LVII, da Constituição Federal, a exclusão de candidato de concurso público que responde a inquérito ou ação penal sem trânsito em julgado da sentença condenatória. Precedentes.
II — Agravo regimental improvido. (AgRg no RE 559.135/DF, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, DJU 13/06/2008).
5. Outro não é entendimento desta Corte Superior acerca do tema:
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. CONCURSO PÚBLICO. ALEGAÇãO DE OFENSA À INSTRUÇãO NORMATIVA ANP N.º 03/98. INVIABILIDADE. INVESTIGAÇãO SOCIAL. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. INOCÊNCIA DO CANDIDATO. AÇãO PENAL. INÉPCIA DA DENÚNCIA. PRINCÍPIO DA PRESUNÇãO DE INOCÊNCIA. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N.º 83 DESTA CORTE.
1. A alegação de ofensa a instrução normativa não enseja a abertura da via do apelo nobre, porquanto tal ato normativo não se enquadra no conceito de lei federal para a finalidade prevista no art. 105, inciso III, alínea a, da Carta Magna.
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2. Não havendo sentença condenatória transitada em julgado, o princípio da presunção de inocência resta maculado, ante a eliminação de candidato a cargo público, ainda na fase de investigação social do certame, por ter sido verificada a existência de inquérito ou ação penal.
3. Estando o acórdão recorrido em sintonia com a jurisprudência desta Corte, incide, na espécie, o óbice da Súmula n.º 83 do Superior Tribunal de Justiça.
4. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido. (REsp. 795.174/DF, Rel. Min. LAURITA VAz, DJU 01/03/2010).
* * *
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. CONCURSO PÚBLICO. INVESTIGAÇãO SOCIAL. EXCLUSãO DE CANDIDATO EM RAzãO DE PROCESSO CRIMINAL JÁ EXTINTO PELA PRESCRIÇãO RETROATIVA. IMPOSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA PRESUNÇãO DE INOCÊNCIA. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E IMPROVIDO.
1. Em observância ao princípio da presunção de inocência — art. 5º, LVII, da Constituição Federal, não se admite, na fase de investigação social de concurso público, a exclusão de candidato em virtude de processo criminal extinto pela prescrição retroativa. Tal fato não tem o condão de afetar os requisitos de procedimento irrepreensível e idoneidade moral.
2. Recurso especial conhecido e improvido. (REsp. 414.933/PR, Rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA, DJU 06/08/2007).
6. Por maior razão não se mostra razoável a exclusão do impetrante do concurso público em
virtude da inadimplência em relação aos cheques devolvidos nos valores de R$ 139,65, R$ 133,00
e R$ 232,40, já tendo decorrido alguns anos dos fatos (fls. 89), bem como tendo demonstrado o
impetrante, nos dados emitidos pelo SERASA, que atualmente nada consta contra ele (fls. 163).
Vale destacar, ainda, que se trata de um candidato que logrou êxito na 1ª fase do certame,
tendo participado de quase todo o Curso de Formação, haja vista que sua exclusão deu-se às
vésperas da sua conclusão.
7. Ante o exposto, conheço do recurso e dou-lhe provimento para cassar o acórdão recorrido,
restabelecendo in totum a sentença monocrática.
8. É como voto.
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SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
MANDADO DE SEGURANÇA N. 8.482 — DF (2002/0075633-8)
RELATOR: MIN. ARNALDO ESTEVES LIMA
IMPETRANTE: ANDRÉ PÖLKING
ADVOGADO: MINISTRO DE ESTADO DA AGRICULTURAPECUÁRIA E ABASTECIMENTO
LITIS. PAS: CLÁUDIO PINTO CORRÊA
ADVOGADO: JOSÉ ANTôNIO DE AzEREDO LEMOS E OUTRO
EMENTA
CONSTITUCIONAL. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. PODER JUDICIÁRIO. AFERIÇãO DE PARÂMETROS DE LEGALIDADE. POSSIBILIDADE. CONCURSO PÚBLICO PARA PROVIMENTO DO CARGO DE FISCAL FEDERAL AGROPECUÁRIO. EDITAL 1/2001. CRITÉRIO REGIONALIzADO. PORTADOR DE DEFICIÊNCIA. OBSERVÂNCIA DO PERCENTUAL DE VAGAS EM CADA TURMA DE CONVOCAÇãO PARA O CURSO DE FORMAÇãO. ART. 37, VIII, DA CONSTITUIÇãO FEDERAL. ART. 5º, § 2º, DA LEI 8.112/90. ART. 37, § 2º, DO DECRETO 3.298/99. ILEGALIDADE. AUSÊNCIA. SEGURANÇA DENEGADA.
1. É possível a impetração de mandado de segurança para aferir parâmetros de legalidade da Administração na aplicação das normas constitucionais, legais e do edital em concurso público. Hipótese em que não se aprecia aspectos relacionados à conveniência e oportunidade do ato administrativo. Preliminar de impossibilidade jurídica do pedido rejeitada.
2. A Constituição Federal, em seu art. 37, inc. VIII, assegura reserva de percentual de vagas aos candidatos portadores de deficiência para provimento de cargo ou emprego público. Nos termos do art. 5º, § 2º, Lei 8.112/90, o percentual máximo a ser observado é de 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas no certame.
3. No Concurso Público para Provimento de Vagas no Cargo de Fiscal Federal Agropecuário, regido pelo Edital 1/2001-MA, de 14/10/2001, foi reservado o percentual de 5% (cinco por cento) por especialidade/área aos portadores de deficiência e prevista a convocação dos candidatos aprovados na primeira etapa em 2 (duas) turmas para participação do Curso de Formação (segunda etapa).
4. Ante a peculiaridade desse certame, realizado de forma regionalizada e com a formação de 2 (duas) turmas distintas para a segunda etapa, mostra-se razoável a interpretação conferida pela Administração às regras do edital, ao determinar a observância do referido percentual em cada turma, separadamente.
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5. Hipótese em que o impetrante, que concorreu às vagas destinadas aos não-deficientes, embora tenha participado do Curso de Formação por força de liminar concedida nos Autos do MS 8.205/DF, deixou de ser nomeado porque convocados 3 (três) candidatos portadores de deficiência na segunda turma, considerando que o cálculo do percentual gerou a fração de 2,2 (dois vírgula dois) e, por força do Decreto 3.298/99, deve ser observado, nesses casos, o número inteiro subsequente.
6. Os portadores de deficiência figuram em lista própria de classificação em concurso público. Por conseguinte, não obstante possam atingir média inferior aos demais candidatos, e ainda serem convocados e nomeados, essa circunstância não demonstra, por si só, preterição. Precedente.
7. Segurança denegada.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da TERCEIRA SEÇãO do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, denegar a segurança, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Nilson Naves, Felix Fischer, Hamilton Carvalhido, Paulo Gallotti, Laurita Vaz, Paulo Medina e Hélio quaglia Barbosa.
Brasília (DF), 10 de agosto de 2005 (Data do Julgamento).
Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA
Relator
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MANDADO DE SEGURANÇA N. 8.482 — DF (2002/0075633-8)
RELATÓRIO
MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA:
Trata-se de mandado de segurança impetrado por ANDRÉ PÖLKING em desfavor do MINISTRO DE ESTADO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA e ABASTECIMENTO, em que busca a anulação dos atos de: a) convocação de candidatos para o curso de formação do concurso público para provimento no cargo de Fiscal Federal Agropecuário (segunda etapa); b) homologação dos resultados do certame; e c) nomeação do candidato portador de deficiência Cláudio Pinto Corrêa para ocupar referido cargo na cidade de Jaguarão/RS.
O impetrante narra que foi aprovado, em segundo lugar, no concurso em referência, na especialidade Engenheiro Agrônomo, área de Vigilância Agropecuária, para o Município de Jaguarão-RS, e que, para todo País, foram previstas 54 (cinquenta e quatro) vagas, sendo 5% (cinco por cento) destinadas aos portadores de deficiência, conforme item 4.1 do Edital do certame, o que representaria 3 (três) vagas.
Relata que, no entanto, foram convocados 4 (quatro) candidatos portadores de deficiência para o Curso de Formação, da seguinte forma: a) primeira turma, 11 (onze candidatos), sendo 1 (um) portador de deficiência; b) segunda turma, os 43 (quarenta e três) remanescentes, sendo 3 (três) portadores de deficiência.
Argumenta que extrapola o limite fixado pelo edital do concurso a convocação do 4º (quarto) colocado da relação dos portadores de deficiência, o litisconsorte CLÁUDIO PINTO CORRÊA, que obteve nota inferior ao impetrante, para preencher a segunda vaga prevista para o Município de Jaguarão/RS. Sustenta que, em virtude dessa preterição, impetrou o Mandado de Segurança 8.205/DF, também distribuído a este Relator, no qual obteve liminar que lhe garantiu participação na segunda etapa do certame. Defende que a autoridade impetrada, ciente de que estava sub judice a vaga em discussão, não deveria ter homologado o resultado e nomeado o candidato em referência.
O Ministro de Estado da Agricultura, Pecuária e Abastecimento prestou informações. Defende, em preliminar, ser incabível o mandado de segurança em razão da impossibilidade jurídica do pedido por entender, em síntese, que inexiste ato coator, porquanto a Administração teria agido “em conformidade com os preceitos legais pátrios, não causando, assim, lesão a qualquer direito do impetrante” (fl. 213).
Argumenta, quanto ao mérito, que, prevendo o concurso em tela a realização de curso de formação “em duas turmas distintas e absolutamente desvinculadas que, consequentemente, ensejaram nomeações em épocas diversas, reservou-se 5% das vagas existentes em cada turma,
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separadamente” (grifos do original — fl. 214). Assim, segundo afirma, para a segunda turma, em relação a qual o impetrante se insurge, foram convocados 44 (quarenta e quatro) candidatos, pelo que foram reservadas 3 (três) vagas para os portadores de deficiência, considerando que o cálculo de 5% (cinco por cento) gerou uma fração de 2,2 (dois vírgula dois).
Sustenta que o “fato de o Edital n. 14/2002-MA, de 19 de março de 2002, ter colocado a vaga do impetrante como sub judice não impede o regular encerramento do certame e a eventual nomeação dos candidatos” (fl. 214). Aduz a impossibilidade de se pleitear, em mandado de segurança, efeitos retroativos pretéritos, conforme Súmula 271/STF, e que acolher o pedido violaria o princípio da igualdade. Ao final, requer a denegação da ordem (fls. 209/215).
O Ministério Público Federal, pelo Subprocurador-Geral ANTôNIO AUGUSTO CÉSAR, opinou, preliminarmente, pela citação do candidato Cláudio Pinto Corrêa (fls. 252/258).
O Ministro JORGE SCARTEzzINI, então Relator, deferiu a cota ministerial e determinou a citação do litisconsorte passivo necessário.
Em sua contestação, Cláudio Pinto Corrêa alega inexistir violação a direito líquido e certo do impetrante e que, em cada uma das duas turmas, “haveria de ser respeitado o percentual destinado aos portadores de deficiência, de 5% do total de cada uma” (fl. 302). Aduz a existência de erro na Portaria 20, de 24/01/2002, que decorreu do resultado final do concurso, referente à primeira turma, que trouxe o nome do candidato João César zanella, em vaga destinada a portador de deficiência, que optara por Anápolis-GO. Todavia, segue afirmando o contestante, Anápolis-GO não está relacionada na 1ª Turma para a vaga da especialidade disputada por esta via, o que é revelado pelo quadro integrante do Edital 1/2001. Adiante sustenta que, desse erro material, “juridicamente irrelevante, decorreu a nomeação posterior dos qUATRO DEFICIENTES, acima referidos, entre os quais o contestante” (fl. 304). Ao final, pleiteia a denegação da segurança.
O Ministério Público Federal, pelo Subprocurador-Geral PAULO EVALDO COSTA, em nova manifestação, opina pela denegação da ordem (fls. 412/420).
É o relatório.
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MANDADO DE SEGURANÇA N. 8.482 — DF (2002/0075633-8)
EMENTA
CONSTITUCIONAL. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. PODER JUDICIÁRIO. AFERIÇãO DE PARÂMETROS DE LEGALIDADE. POSSIBILIDADE. CONCURSO PÚBLICO PARA PROVIMENTO DO CARGO DE FISCAL FEDERAL AGROPECUÁRIO. EDITAL 1/2001. CRITÉRIO REGIONALIzADO. PORTADOR DE DEFICIÊNCIA. OBSERVÂNCIA DO PERCENTUAL DE VAGAS EM CADA TURMA DE CONVOCAÇãO PARA O CURSO DE FORMAÇãO. ART. 37, VIII, DA CONSTITUIÇãO FEDERAL. ART. 5º, § 2º, DA LEI 8.112/90. ART. 37, § 2º, DO DECRETO 3.298/99. ILEGALIDADE. AUSÊNCIA. SEGURANÇA DENEGADA.
1. É possível a impetração de mandado de segurança para aferir parâmetros de legalidade da Administração na aplicação das normas constitucionais, legais e do edital em concurso público. Hipótese em que não se aprecia aspectos relacionados à conveniência e oportunidade do ato administrativo. Preliminar de impossibilidade jurídica do pedido rejeitada.
2. A Constituição Federal, em seu art. 37, inc. VIII, assegura reserva de percentual de vagas aos candidatos portadores de deficiência para provimento de cargo ou emprego público. Nos termos do art. 5º, § 2º, Lei 8.112/90, o percentual máximo a ser observado é de 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas no certame.
3. No Concurso Público para Provimento de Vagas no Cargo de Fiscal Federal Agropecuário, regido pelo Edital 1/2001-MA, de 14/10/2001, foi reservado o percentual de 5% (cinco por cento) por especialidade/área aos portadores de deficiência e prevista a convocação dos candidatos aprovados na primeira etapa em 2 (duas) turmas para participação do Curso de Formação (segunda etapa).
4. Ante a peculiaridade desse certame, realizado de forma regionalizada e com a formação de 2 (duas) turmas distintas para a segunda etapa, mostra-se razoável a interpretação conferida pela Administração às regras do edital, ao determinar a observância do referido percentual em cada turma, separadamente.
5. Hipótese em que o impetrante, que concorreu às vagas destinadas aos não-deficientes, embora tenha participado do Curso de Formação por força de liminar concedida nos autos do MS 8.205/DF, deixou de ser nomeado porque convocados 3 (três) candidatos portadores de deficiência na segunda turma, considerando que o cálculo do percentual gerou a fração de 2,2 (dois vírgula dois) e, por força do Decreto 3.298/99, deve ser observado, nesses casos, o número inteiro subsequente.
6. Os portadores de deficiência figuram em lista própria de classificação em concurso público. Por conseguinte, não obstante possam atingir média inferior aos demais candidatos, e ainda serem convocados e nomeados, essa circunstância não demonstra, por si só, preterição. Precedente.
7. Segurança denegada.
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VOTO
MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA (Relator):
Inicialmente, tenho que a preliminar de impossibilidade jurídica do pedido, arguida pela
autoridade impetrada em suas informações, além de se confundir com o próprio mérito da
impetração, não prospera. Na hipótese sob exame, o impetrante busca tão-somente aferição
de parâmetros de legalidade da Administração relativos à observância dos dispositivos
constitucionais, legais e do próprio edital do certame, e não aspectos relacionados à oportunidade
e conveniência. Assim, não há nenhum óbice à apreciação da causa pelo Poder Judiciário.
É oportuno registrar, desde logo, que não verifico o equívoco apontado pelo litisconsorte Cláudio
Pinto Corrêa, em sua contestação. O candidato João César zanella foi corretamente convocado
para compor a primeira turma do Curso de Formação (fl. 182) porque fora classificado em 1º
lugar, nacionalmente, nas vagas destinadas a portadores de deficiência (fl. 178). Desse modo, a
convocação deu-se corretamente, conforme informou a autoridade impetrada.
Consoante se verifica no breve relatório, a hipótese revela discussão a respeito das vagas
destinadas a portadores de deficiência em concurso público concebido de forma regionalizada.
No caso, cuida-se do Concurso Público para Provimento de Vagas no Cargo de Fiscal Federal
Agropecuário, regido pelo Edital 1/2001-MA, de 14/10/2001, e que compreende duas etapas:
1ª) prova objetiva, de caráter eliminatório, e de avaliação de títulos, de caráter unicamente
classificatório; 2ª) Curso de Formação, de caráter unicamente eliminatório.
O impetrante, André Pölking, e o litisconsorte, Cláudio Pinto Corrêa, concorreram na
especialidade Engenheiro Agrônomo, área Vigilância Agropecuária, para a qual estavam
previstas 54 (cinquenta e quatro) vagas, conforme (item 2.1.1.1 — fl. 115).
Por ser regionalizado, o candidato deveria fazer uma única opção de cidade de lotação (item 3.2
— fl. 118), em relação à qual concorreriam às vagas. Ambos escolheram a cidade de Jaguarão/
RS, onde havia 2 (duas) vagas.
O edital do certame ainda previu que as vagas estariam distribuídas em 2 (duas) turmas para
participação no Curso de Formação (segunda etapa), conforme quadro ali constante (item 3.1
— fls. 118/126); e que, para cada especialidade/área haveria reserva de 5% (cinco por cento)
aos portadores de deficiência, conforme Decreto 3.298/99 (item 4.1 — fl. 127).
Conforme o Quadro de fls. 120/121, foram convocados para primeira turma 10 (dez) candidatos),
sendo 1 (um) deficiente e, para segunda turma, 44 (quarenta e quatro) candidatos, sendo 3
(três) portadores de deficiência. Ressalto, nesse ponto, a imprecisão do impetrante, que afirmou
haverem sido chamados 11 (onze) e 43 (quarenta e três), respectivamente. Essa incorreção,
todavia, não modifica o cerne da controvérsia, consoante veremos adiante.
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O impetrante sustenta que seriam destinadas aos portadores de deficiência 3 (três) vagas, calculando-se o percentual de 5% (cinco por cento) em relação ao total de vagas previstas para a especialidade/área em discussão, qual seja, 54 (cinquenta e quatro), e não 4 (quatro) vagas, conforme ocorrido.
De acordo com as informações prestadas pela autoridade impetrada, a convocação de 4 (quatro) candidatos portadores de deficiência deu-se em razão da observância do percentual de 5% (cinco por cento) em cada turma, separadamente, quer dizer, 1 (um) para a primeira turma, para qual foram chamados 10 (dez) candidatos, e 3 (três) para a segunda, em que foram convocados 44 (quarenta e quatro) aprovados na primeira fase. Daí, em resumo, a controvérsia.
Registro, ainda, que a 1ª (primeira) vaga para a cidade de Jaguarão/RS foi preenchida por Luis Carlos Brenner, que restou melhor classificado do que o impetrante, ou seja, em 1º (primeiro) lugar (fl. 143), e foi convocado, por essa razão, na primeira turma para o Curso de Formação (fl. 179).
A Constituição Federal resguarda o direito de o portador de deficiência ingressar no serviço público, prevendo a reserva de vagas, consoante preconiza o seguinte dispositivo:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
....................................................................................................
VIII — a lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão.
A Lei 8.112/90, por sua vez, define o percentual máximo a ser observado na hipótese, qual seja, 20% (vinte por cento), conforme se verifica abaixo:
Art. 5º. São requisitos básicos para investidura em cargo público:
....................................................................................................
§ 2º Às pessoas portadores de deficiência é assegurado o direito de se inscrever em concurso público para provimento de cargo cujas atribuições sejam compatíveis com a deficiência de que são portadoras; para tais pessoas serão reservadas até 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas no concurso.
Por fim, dispõe o Decreto 3.298, de 20/12/1999, que, havendo fração como resultado do cálculo para a observância do percentual de vagas destinado aos portadores de deficiência, deve ser observado o número inteiro subsequente. Veja o seguinte dispositivo:
Art. 37. Fica assegurado à pessoa portadora de deficiência o direito de se inscrever em concurso público, em igualdade de condições com os demais candidatos, para provimento de cargo cujas atribuições sejam compatíveis com a deficiência de que é portador.
................................................................................................
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§ 2º Caso a aplicação do percentual de que trata o parágrafo anterior resulte em número fracionado, este deverá ser elevado até o primeiro número inteiro subsequente.
Em que pesem as razões expostas pelo impetrante, entendo que a autoridade impetrada, ao convocar 4 (quatro) candidatos portadores de deficiência, procurou dar efetividade às normas constitucional e legal, quer dizer, não atuou com ilegalidade, tendo em vista a preocupação em relação ao caráter teleológico da norma. Por conseguinte, não existe direito líquido e certo de o impetrante ser amparado no presente mandamus.
Como visto, a peculiaridade do caso em exame reside na circunstância de que o próprio edital do certame previa a convocação em 2 (duas) turmas, estipulando expressamente a quantidade de candidatos em cada uma delas. Nesse cenário, mostra razoável a interpretação conferida ao edital. A convocação de apenas 2 (dois) candidatos portadores de deficiência na segunda turma do Curso de Formação, conforme pretende o impetrante, conduziria ao entendimento de que não se estaria cumprindo a Constituição Federal, a Lei 8.112/90, o Decreto 3.298/99 e o edital, porquanto seria reduzido até o número inteiro imediatamente anterior à fração de 2,2 (dois vírgula dois), considerando o total de 44 (quarenta e quatro) candidatos convocados.
Nesse sentido, apresenta-se o parecer do Ministério Público Federal, lavrado pelo Subprocurador-Geral PAULO EVALDO COSTA, segundo o qual “incensurável foi a reserva de 5% das vagas existentes em cada turma, separadamente” (fl. 419).
Ademais, na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum, nos termos do art. 5º da Lei de Introdução ao Código Civil.
No tocante ao argumento do impetrante, de que o litisconsorte Cláudio Pinto Corrêa atingiu na primeira fase do certame média inferior à sua, é oportuno ressaltar que esse fato decorre do critério adotado em concurso público, segundo o qual os portadores de deficiência figuram em lista própria de classificação. Assim, não há como comparar, para efeitos de convocação e nomeação, a nota de ambos. Confira, a respeito, o seguinte julgado:
ADMINISTRATIVO — CONCURSO PÚBLICO — MÉDICO VETERINÁRIO — ÁREA VIGILÂNCIA AGROPECUÁRIA — CONVOCAÇãO DE CANDIDATA DEFICIENTE PARA CURSO DE FORMAÇãO — INOBSERVÂNCIA DA CLASSIFICAÇãO DOS APROVADOS NO CERTAME E CONSEqÜENTE PRETERIÇãO DE CANDIDATO COM NOTA FINAL SUPERIOR — INOCORRÊNCIA — NORMAS DO EDITAL OBSERVADAS — CUMPRIMENTO À GARANTIA CONSTITUCIONAL DA RESERVA DE PERCENTUAL DE CARGO PÚBLICO AO PORTADOR DE DEFICIÊNCIA FÍSICA REGULADA PELA LEI N. 8.112/90 E PELO DECRETO N. 3.298/99 — INEXISTÊNCIA DE DIREITO LÍqUIDO E CERTO — SEGURANÇA DENEGADA.
I — A Constituição Federal, em seu art. 37, inciso VIII assegura aos portadores de deficiência física a reserva de percentual dos cargos e empregos públicos. A Administração regula a situação através da Lei nº 8.112/90 e do Decreto n. 3.298/99, estabelecendo que serão reservadas até 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas no concurso, bem como que o número de vagas correspondente
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à reserva destinada à pessoa portadora de deficiência deve estar inserta no Edital, respectivamente.
II — Estatui o brocardo jurídico: “o edital é a lei do concurso”. Desta forma, estabelece-se um vínculo entre a Administração e os candidatos, igualmente ao descrito na Lei de Licitações Públicas, já que o escopo principal do certame é propiciar a toda coletividade igualdade de condições no ingresso ao serviço público. Pactuam-se, assim, normas preexistentes entre os dois sujeitos da relação editalícia. De um lado, a Administração. De outro, os candidatos. Com isso, é defeso a qualquer candidato vindicar direito alusivo à quebra das condutas lineares, universais e imparciais adotadas no certame.
III — O candidato portador de deficiência física concorre em condições de igualdade com os demais não-portadores, na medida das suas desigualdades. Caso contrário, a garantia de reserva de vagas nos concursos para provimento de cargos públicos aos candidatos deficientes não teria razão de ser.
IV — No caso dos autos, a candidata deficiente participou do processo seletivo em efetiva igualdade de condições com todos os demais, na medida em que: foi submetida a todas as etapas do certame, estava sujeita ao alcance de pontuação mínima nas provas objetivas, bem como à aprovação no Curso de Formação, dentre várias outras exigências insertas no Edital. Assim sendo, o item que impõe a participação dos portadores de deficiência em igualdade de condições com os demais candidatos, não pode ser interpretado de maneira absoluta.
V — O tratamento relativamente diferenciado, ou por outro lado, a “preferência” que se dá aos deficientes físicos foi o modo que encontrou o legislador constituinte de minorar o déficit de que são acometidos. A convocação da candidata deficiente para participar do Curso de Formação, ao invés do impetrante, consiste na obediência às normas que regem a situação.
VI — Segurança denegada. (MS 8.411/DF, Rel. Min. GILSON DIPP, Terceira Seção, DJ de 21/6/2004, p. 160).
Com efeito, os portadores de deficiência figuram em lista própria de classificação em concurso público. Por conseguinte, não obstante possam atingir média inferior aos demais candidatos, e ainda serem convocados, essa circunstância não demonstra, por si só, preterição.
Desse modo, tem-se, em resumo, que o impetrante, que concorreu às vagas destinadas aos não-deficientes, embora tenha participado do Curso de Formação por força de liminar concedida nos autos do MS 8.205/DF, deixou de ser nomeado porque convocados 3 (três) candidatos portadores de deficiência, considerando que o cálculo do percentual, na segunda etapa, gerou a fração de 2,2 (dois vírgula dois) e, por força do Decreto 3.298/99, deve ser observado, nessa hipótese, o número inteiro subsequente.
Ante o exposto, denego a segurança. Custas ex lege. Sem condenação ao pagamento de honorários advocatícios, conforme Súmula 105 do Superior Tribunal de Justiça.
É o voto.
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SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
AgRg no AGRAVO DE INSTRUMENTO N. 1.291.819 — DF (2010/0050737-0)
RELATOR: MIN. HUMBERTO MARTINS
AGRAVANTE: UNIãO
AGRAVADO: LEANDRO DO ESPÍRITO SANTO CARNEIRO
ADVOGADO: CLÁUDIO PEREIRA DE JESUS E OUTRO(S)
EMENTA
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL — CONCURSO PÚBLICO — EXAME PSICOTÉCNICO — AUSÊNCIA
DE OBJETIVIDADE — ANULAÇãO — NECESSIDADE DE NOVO EXAME.
1. A legalidade do exame psicotécnico em provas de concurso público está condicionada à
observância de três pressupostos necessários: previsão legal, cientificidade e objetividade dos
critérios adotados, e possibilidade de revisão do resultado obtido pelo candidato.
2. Declarada a nulidade do teste psicotécnico, em razão da falta de objetividade, deve o
candidato submeter-se a novo exame.
Agravo regimental parcialmente provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros
da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça: “A Turma, por unanimidade, deu parcial
provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do (a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a).”
Os Srs. Ministros Herman Benjamin, Mauro Campbell Marques, Eliana Calmon e Castro Meira
votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 08 de junho de 2010 (Data do Julgamento).
Ministro HUMbERTO MARTINS
Relator
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SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
AgRg no AGRAVO DE INSTRUMENTO N. 1.291.819 — DF (2010/0050737-0)
RELATOR: MIN. HUMBERTO MARTINS
AGRAVANTE: UNIãO
AGRAVADO: LEANDRO DO ESPÍRITO SANTO CARNEIRO
ADVOGADO: CLÁUDIO PEREIRA DE JESUS E OUTRO(S)
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO HUMBERTO MARTINS (Relator):
Cuida-se de agravo regimental interposto pela UNIãO contra decisão monocrática de minha
relatoria que negou provimento ao agravo de instrumento decorrente de decisão que obstou a
subida do recurso especial, com fundamento no art. 105, III, “a” e “c” da Constituição Federal,
contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, assim ementado (fl. 79e):
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PARA PROVIMENTO DE VAGAS NO CARGO DE POLICIAL RODOVIÁRIO FEDERAL — EDITAL Nº 1/2002. EXAME PSICOTÉCNICO. CONSIDERAÇãO DE EXAMES ANÁLOGOS ANTERIORES. IMPOSSIBILIDADE. INAPLICABILIDADE DA TEORIA DO FATO CONSUMADO. DILAÇãO PROBATÓRIA EM SEDE DE MANDADO DE SEGURANÇA. IMPOSSIBILIDADE. SUBJETIVIDADE DO EXAME CONFIGURADA.
1. Alega o apelante que o exame deve ser anulado por falta de assinatura do laudo pelo responsável técnico da avaliação, bem como devido à ausência de motivação. Entretanto, não assiste razão ao apelante. Observe-se que o documento colacionado pelo impetrante (fls. 97/101) não é o laudo técnico, tratando-se de mera síntese dos resultados do Exame Psicotécnico, conforme previsto no item 5.5.1, do edital nº 12/2002-PRF (fl. 91).
2. Diz também que a sua aprovação em exames psicotécnicos realizados em concursos anteriores deve ser levada em consideração. Entretanto, não assiste razão ao apelante quanto a este argumento, haja vista a necessidade de exame específico para o cargo ao qual concorre.
3. Alega ainda que concluiu o Curso de Formação Profissional e que isso lhe faz ser aplicada a Teoria do Fato Consumado. Entretanto, é importante salientar que o fato de haver, o impetrante, concluído o Curso de Formação, em decorrência
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de decisão judicial, não lhe garante a investidura no cargo. Mesmo porque a nomeação e posse de candidato que esteja sub judice, somente ocorrerá após o trânsito em julgado da decisão, conforme entendimento do c. Superior Tribunal de Justiça.
4. Porém, no que diz respeito à subjetividade do exame, entendo que assiste razão ao apelante. A realização do exame psicotécnico, para o cargo pretendido pelo impetrante, é exigido por lei. Entretanto, in casu, efetivamente carece de objetividade. Observe-se que não é possível extrair o caráter objetivo dos critérios de avaliação constantes do item 7.3 do Edital nº. 1/2002-PRF (fl. 24), e itens 5.2, 5.5.1 do Edital nº. 12/2002-PRF (fls. 91/92). Assim, o edital exige que o candidato tenha um perfil profissiográfico para o exercício do cargo, mas não diz explicitamente qual é esse perfil. Inviável, pois, a exigência de adequação do candidato a ‘perfil profissiográfico’ sigiloso, não previsto em lei e nem especificado no edital.
5. APELAÇãO PROVIDA.
A ementa da decisão agravada guarda os seguintes termos (fl. 153e):
ADMINISTRATIVO — EXAME PSICOTÉCNICO — CARGO DE POLICIAL RODOVIÁRIO — PRECEITOS CONSTITUCIONAIS — MATÉRIA AFETA AO STF — CRITÉRIO DA OBJETIVIDADE DO EXAME — DESCUMPRIMENTO RECONHECIDO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM — PRETENSãO DE REEXAME DE PROVAS — AGRAVO DE INSTRUMENTO IMPROVIDO.
Alega a agravante que “o TRF não determinou que, ante a nulidade do primeiro psicotécnico
realizado, se fizesse outra prova, agora atendendo aos parâmetros corretos.” (fl. 163e). Aduz
que, mesmo sendo declarado nulo o exame psicotécnico, o autor não tem o direito de passar
diretamente a outras fases, ou mesmo à sua nomeação, antes de realizar novo exame.
Pugna, por fim, caso não seja reconsiderada a decisão agravada, para que se submeta o presente
agravo à apreciação da Turma.
O agravado, instado a manifestar-se, requer a manutenção da decisão, por seus próprios
fundamentos.
É, no essencial, o relatório.
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AgRg no AGRAVO DE INSTRUMENTO N. 1.291.819 — DF (2010/0050737-0)
EMENTA ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL — CONCURSO PÚBLICO — EXAME PSICOTÉCNICO —
AUSÊNCIA DE OBJETIVIDADE — ANULAÇãO — NECESSIDADE DE NOVO EXAME.
1. A legalidade do exame psicotécnico em provas de concurso público está condicionada à
observância de três pressupostos necessários: previsão legal, cientificidade e objetividade dos
critérios adotados, e possibilidade de revisão do resultado obtido pelo candidato.
2. Declarada a nulidade do teste psicotécnico, em razão da falta de objetividade, deve o
candidato submeter-se a novo exame.
Agravo regimental parcialmente provido.
VOTO
O ExMO. SR. MINISTRO HUMBERTO MARTINS (Relator):
Merece parcial provimento o agravo regimental.
Embora não mereça reparos a decisão agravada quanto à aplicação da Súmula 7/STJ, no
tocante à carência de objetividade do exame — fato reconhecido pelo Tribunal de origem
mediante análise do material probatório dos autos —, com razão a União quanto à necessidade
da realização de novo exame.
Com efeito, o Superior Tribunal de Justiça possui entendimento segundo o qual, declarada a
nulidade do teste psicotécnico, deve o candidato submeter-se a novo exame.
Ressalte-se que mesmo que o candidato seja aprovado no curso de formação da Academia Nacional
da Polícia Federal, permanece a necessidade da realização de novo teste psicotécnico.
Nesse sentido:
RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. POLÍCIA CIVIL DO ESTADO DA PARAÍBA. EXAME PSICOTÉCNICO. AUSÊNCIA DE CARÁTER OBJETIVO NA CORREÇãO. NãO CONHECIMENTO DAS RAzÕES qUE LEVARAM À REPROVAÇãO DA RECORRENTE. NULIDADE DO EXAME. CONTROLE DE LEGALIDADE E RAzOABILIDADE DO PODER JUDICIÁRIO. ADOÇãO DE PERFIL PROFISSIOGRÁFICO EM qUE SE DEVAM ENCAIXAR OS CANDIDATOS. IMPOSSIBILIDADE. VIOLAÇãO DA EXIGÊNCIA DE CRITÉRIOS OBJETIVOS. PEDIDO PARA RECONHECER A APROVAÇãO DA RECORRENTE. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE REALIzAÇãO DE NOVO EXAME. PRECEDENTE.
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1. A exigência do exame psicotécnico é legítima, autorizada que se acha na própria
Constituição da República, ao preceituar que ‘os cargos, empregos e funções
públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos
em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei;’ (art. 37, inciso I, da
Constituição Federal).
2. O exame psicotécnico, cuja principal característica é a objetividade de seus
critérios, indispensável à garantia de sua legalidade, deve ter resultado que
garanta a publicidade, bem assim a sua revisibilidade. Inadmissível, portanto, o
caráter sigiloso e irrecorrível do referido exame.
3. O critério fixado no ‘perfil profissiográfico’, previsto no item 11.3 do edital,
é elemento secreto, desconhecido dos próprios candidatos, e, portanto,
incontrastável perante o Poder Judiciário, o que o fulmina de insanável nulidade,
excedendo, assim, a autorização legal.
4. O fato de ser reconhecida a ilegalidade da correção do exame psicotécnico
não exime a candidata de se submeter a novo exame, não podendo prosperar sua
pretensão de ser diretamente nomeada ao cargo. Precedente.
5. Recurso parcialmente provido para reconhecer a nulidade do teste psicotécnico
da Recorrente, devendo ela ser submetida a novo exame.
(RMS 19.339/PB, Rel. Ministra Laurita Vaz, quinta Turma, julgado em 19.11.2009,
DJe 15.12.2009.)
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL.
CONCURSO PÚBLICO. EXAME PSICOTÉCNICO. CARÁTER SIGILOSO E IRRECORRÍVEL.
ANULAÇãO. NECESSIDADE DE NOVO EXAME. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. APLICAÇãO
DA SÚMULA 83/STJ.
1. O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento de que, declarada a
nulidade do teste psicotécnico em razão de seu caráter sigiloso e irrecorrível, deve
o candidato submeter-se a novo exame.
2. ‘Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do
Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida’ (Súmula 83/STJ).
3. Agravo regimental improvido.
(AgRg no REsp 1125760/RJ, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta
Turma, julgado em 24.11.2009, DJe 14.12.2009.)
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇãO. OMISSãO E CONTRADIÇãO. NãO
OCORRÊNCIA. CANDIDATO APROVADO NO CURSO DE FORMAÇãO. NULIDADE DO
EXAME PSICOTÉCNICO. NOVO EXAME. NECESSIDADE.
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1. A Eg. quinta Turma, acolhendo o pedido alternativo, deu parcial provimento
ao recurso especial, para determinar a realização de novo exame psicotécnico,
não obstante ter sido mantido o acórdão recorrido apenas no tocante ao
reconhecimento da nulidade do primeiro exame psicotécnico.
2. O fato de a candidata ter freqüentado e logrado aprovação no curso de formação
da Academia Nacional da Polícia Federal, não tem o condão de afastar a necessidade
da realização de novo teste psicotécnico.
3. É inequívoco que a candidata, a despeito de ter concluído o curso de formação,
não preencheu as exigências legais contidas no edital do certame, sendo certo
que sua eventual permanência no cargo, sem a aprovação do teste psicotécnico,
configurar-se-ia um estado de flagrante ilegalidade, que não pode ser tolerada.
4. Logrando aprovação no novo teste psicotécnico, a candidata tem o direito de
ingressar no cargo, sem a necessidade de se submeter a novo curso de formação, em
face da aplicação, nessa hipótese, da “Teoria do Fato Consumado”, cuja aplicação em
matéria de concurso público não pode prescindir do preenchimento das exigências
legalmente previstas.
5. Embargos de declaração rejeitados.
(EDcl no REsp 670.104/PR, Rel. Ministra Laurita Vaz, quinta Turma, julgado em
17.10.2006, DJ 4.12.2006 p. 360.)
A propósito, ainda, os seguintes precedentes: RMS 29.087-MS, DJe 1º.6.2009; REsp 925.909-PE,
DJe 29.9.2008; RMS 19.339-PB, DJe 15.12.2009, e REsp 384.019-RS, DJ 26.6.2006. RMS 23.436-
GO, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 27.4.2010.
Ante o exposto, dou parcial provimento ao agravo regimental, tão somente para, mantida a
nulidade do exame psicotécnico em razão da falta de objetividade, reconhecer a necessidade
de o candidato submeter-se a novo exame.
É como penso. É como voto.
Ministro HUMbERTO MARTINS
Relator
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SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
AgRg no RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA N. 22.730 — ES
(2006/0204792-3)
RELATORA: MIN. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA
AGRAVANTE: MARIA CLÉLIA DA COSTA ALMEIDA
ADVOGADO: MôNICA PERIN ROCHA E OUTRO
AGRAVADO: ESTADO DO ESPÍRITO SANTO
PROCURADOR: CEzAR PONTES CLARK E OUTRO(S)
EMENTA
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ORDINÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO.
CONCURSO PÚBLICO. REEXAME, PELO PODER JUDICIÁRIO, DOS CRITÉRIOS DE CORREÇãO DAS
qUESTÕES DA PROVA OBJETIVA. IMPOSSIBILIDADE. qUESITO SOBRE A EC 45/2004, EDITADA
POSTERIORMENTE À PUBLICAÇãO DO EDITAL. VIABILIDADE DA EXIGÊNCIA. PRECEDENTES.
1. Firmou-se na Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça entendimento de que, em regra,
não compete ao Poder Judiciário apreciar critérios na formulação e correção das provas. Com
efeito, em respeito ao princípio da separação de poderes consagrado na Constituição Federal,
é da banca examinadora desses certames a responsabilidade pela sua análise. Ausência de
demonstração, no caso, de ofensa aos princípios da legalidade e da moralidade.
2. De acordo com a jurisprudência desta Corte é cabível a exigência, pela banca examinadora
de concurso público, de legislação superveniente à publicação do edital, quando este não
veda expressamente tal cobrança. Desse modo, previsto no edital o tema alusivo ao “Poder
Judiciário”, é possível o questionamento sobre a Emenda Constitucional 45/2004, promulgada
justamente com o objetivo de alterar a estrutura do Judiciário pátrio.
3. Agravo regimental improvido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os
Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça: “A Turma, por unanimidade, negou
provimento ao agravo regimental, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora.” Os Srs.
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Ministros Og Fernandes, Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP) e Haroldo Rodrigues
(Desembargador convocado do TJ/CE) votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Presidiu o julgamento a Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura.
Brasília, 20 de abril de 2010 (Data do Julgamento).
Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA
Relatora
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AgRg no RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA N. 22.730 — ES
(2006/0204792-3)
RELATORA: MIN. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA
AGRAVANTE: MARIA CLÉLIA DA COSTA ALMEIDA
ADVOGADO: MôNICA PERIN ROCHA E OUTRO
AGRAVADO: ESTADO DO ESPÍRITO SANTO
PROCURADOR: CEzAR PONTES CLARK E OUTRO(S)
RELATÓRIO
MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA (Relatora):
Trata-se de agravo regimental, interposto por Maria Clélia da Costa Almeida, contra decisão
monocrática por mim proferida, que restou assim ementada:
RECURSO ORDINÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. REEXAME, PELO PODER JUDICIÁRIO, DOS CRITÉRIOS DE CORREÇãO DAS qUESTÕES DA PROVA OBJETIVA. IMPOSSIBILIDADE. qUESITO SOBRE A EC 45/2004, EDITADA POSTERIORMENTE À PUBLICAÇãO DO EDITAL. VIABILIDADE DA EXIGÊNCIA. PRECEDENTES. RECURSO A qUE SE NEGA SEGUIMENTO.
Reitera a parte agravante, nas razões do regimental, que as questões 06, 11 e 30 da prova
objetiva do concurso para o cargo de Escrevente Juramentado de 1º e de Entrância Especial, ao
qual se submeteu, padecem de invalidade, porquanto ofendidos os princípios constitucionais
da Administração Pública.
Afirma, ainda, que os itens 27 e 28 também devem ser anulados, já que o conteúdo programático
do edital não contemplava as matérias neles inseridos, em patente ofensa ao princípio da
legalidade.
É o relatório.
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AgRg no RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA N. 22.730 — ES
(2006/0204792-3)
EMENTA
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ORDINÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO.
CONCURSO PÚBLICO. REEXAME, PELO PODER JUDICIÁRIO, DOS CRITÉRIOS DE CORREÇãO DAS
qUESTÕES DA PROVA OBJETIVA. IMPOSSIBILIDADE. qUESITO SOBRE A EC 45/2004, EDITADA
POSTERIORMENTE À PUBLICAÇãO DO EDITAL. VIABILIDADE DA EXIGÊNCIA. PRECEDENTES.
1. Firmou-se na Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça entendimento de que, em regra,
não compete ao Poder Judiciário apreciar critérios na formulação e correção das provas. Com
efeito, em respeito ao princípio da separação de poderes consagrado na Constituição Federal,
é da banca examinadora desses certames a responsabilidade pela sua análise. Ausência de
demonstração, no caso, de ofensa aos princípios da legalidade e da moralidade.
2. De acordo com a jurisprudência desta Corte é cabível a exigência, pela banca examinadora
de concurso público, de legislação superveniente à publicação do edital, quando este não
veda expressamente tal cobrança. Desse modo, previsto no edital o tema alusivo ao “Poder
Judiciário”, é possível o questionamento sobre a Emenda Constitucional 45/2004, promulgada
justamente com o objetivo de alterar a estrutura do Judiciário pátrio.
3. Agravo regimental improvido.
VOTO
MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA (Relatora):
Pleiteia a recorrente a anulação das questões 06, 11, 27, 28 e 30 da prova objetiva do concurso
público para o preenchimento de cargo de Escrevente Juramentado de 1º e de Entrância
Especial, ao fundamento de que alguns itens do gabarito estariam incorretos, e de que outros
envolveriam matéria não prevista no programa estabelecido no edital do concurso.
No que refere à possibilidade de anulação de questões de provas de concursos públicos, firmou-
se na Terceira Seção deste Superior Tribunal de Justiça entendimento de que, em regra, não
compete ao Poder Judiciário apreciar critérios na formulação e correção das provas. Ademais,
em respeito ao princípio da separação de poderes consagrado na Constituição Federal, é da
banca examinadora desses certames a responsabilidade pelo seu exame.
Nesse sentido, confira-se julgado da Seção competente para apreciar os feitos relativos a
servidores públicos:
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EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO E
PROCESSUAL CIVIL. CONCURSO PÚBLICO. qUESTÕES OBJETIVAS. ANULAÇãO.
IMPOSSIBILIDADE. SUBSTITUIÇãO À BANCA EXAMINADORA. LIMITE DE ATUAÇãO
DO PODER JUDICIÁRIO.
Não compete ao Poder Judiciário, atuando em verdadeira substituição à banca
examinadora, apreciar critérios na formulação de questões; correção de provas
e outros, muito menos a pretexto de anular questões e, principalmente, em sede
de recurso especial. Limite de atuação. Embargos rejeitados. (EREsp 338.055/
DF, Rel. Min. JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, TERCEIRA SEÇãO, DJ 15/12/2003)
Excepcionalmente, contudo, em havendo flagrante ilegalidade de questão objetiva de prova
de concurso público, bem como ausência de observância às regras previstas no edital, tem-se
admitido sua anulação pelo Judiciário por ofensa ao princípio da legalidade. Acerca do tema,
seguem os seguintes precedentes desta Corte:
Concurso público (juízes). Banca examinadora (questões/critério). Erro
invencível (caso). Ilegalidade (existência). Judiciário (intervenção).
1. Efetivamente — é da jurisprudência —, não cabe ao Judiciário, quanto a
critério de banca examinadora (formulação de questões), meter mãos à obra,
isto é, a banca é insubstituível.
2. Isso, entretanto, não é absoluto. Se se cuida de questão mal formulada — caso
de erro invencível —, é lícita, então, a intervenção judicial. É que, em casos
tais, há ilegalidade; corrigível, portanto, por meio de mandado de segurança
(Constituição, art. 5º, LXIX).
3. Havendo erro na formulação, daí a ilegalidade, a Turma, para anular a
questão, deu provimento ao recurso ordinário a fim de conceder a segurança.
Maioria de votos. (RMS 19062/RS, Rel. Ministro NILSON NAVES, SEXTA TURMA,
DJ 03.12.2007)
RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO PARA PROVIMENTO
DE CARGO DE AUDITOR EXTERNO DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO. PROVA
PRÉ-CONSTITUÍDA. FALTA. DIREITO LÍqUIDO E CERTO. INEXISTÊNCIA. REVISãO E
ANULAÇãO DE qUESTÕES DE PROVA. IMPOSSIBILIDADE.
(...)
2. De acordo com a pacífica compreensão desta Corte, é vedado ao Poder Judiciário
a reapreciação dos critérios usados pela Administração na formulação, correção e
atribuição de notas em provas de concursos públicos, devendo limitar-se à análise
da legalidade e da observância das regras contidas no respectivo edital.
3. Recurso ordinário a que se nega provimento. (RMS 18.314/RS, Rel. Min. PAULO
GALLOTTI, SEXTA TURMA, DJ 19/6/2006)
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Ressalte-se que o Supremo Tribunal Federal perfilha igual orientação, conforme se verifica do
seguinte julgado de sua Primeira Turma:
Concurso público: controle jurisdicional admissível, quando não se cuida de aferir da correção dos critérios da banca examinadora, na formulação das questões ou na avaliação das respostas, mas apenas de verificar que as questões formuladas não se continham no programa do certame, dado que o edital — nele incluído o programa — é a lei do concurso. (RE 434.708, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 9/9/2005)
quanto ao reexame de provas de concursos públicos, cumpre ainda trazer à baila as seguintes
considerações de José dos Santos Carvalho Filho:
Conquanto não possa o Judiciário aferir os critérios adotados pela banca examinadora
na solução das questões discursivas, é absolutamente legítimo que confronte as
questões com o programa do concurso, tendo em vista que este faz parte do edital.
Se questão formulada não se insere na relação dos pontos constantes do programa,
está contaminada de vício de legalidade e se torna suscetível de invalidação na
via administrativa ou na judicial. Aqui não se cuida de controle de mérito, nem
de substituir valoração reservada ao administrador; cuida-se, isto sim, de controle
de legalidade sobre o edital, ato de natureza vinculada, sendo, pois, permitido ao
Judiciário exercê-lo em toda a sua plenitude. (“Manual de Direito Administrativo”,
17ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, p. 551).
Desse modo, na esteira dos precedentes e do escólio transcritos, não cabe ao Poder Judiciário interferir nos critérios de avaliação da banca examinadora, a menos que, do exame da questão impugnada pelo candidato, apresente-se formulação dissociada dos pontos constantes do programa do certame, ou teratológica, de forma que impossibilite a análise e a consequente resposta do concursando.
No caso em análise, verifica-se desde logo que, diante da orientação jurisprudencial e doutrinária acima referida, agiu corretamente o Tribunal de origem ao não acolher a irresignação contida no writ quanto à nulidade das questões 06, 11 e 30, pois, nesse ponto, o que pretende a impetrante, ao alegar a incorreção no gabarito de tais itens, é o reexame, pelo Poder Judiciário, dos critérios de avaliação adotados pela banca examinadora, ou seja, uma indevida interferência na formulação das questões e na avaliação das respostas.
Por outro lado, alega a recorrente que também devem ser anuladas as questões 27 e 28 da prova objetiva, ao argumento de que elas versavam sobre a Emenda Constitucional 45/2004, norma editada após a publicação do edital e, por isso, não contemplada no programa de disciplinas exigidas pela banca examinadora. A Corte a quo, ao apreciar tal alegação, acentuou que referidas questões 27 e 28 da prova objetiva efetivamente traziam indagação sobre a Emenda Constitucional 45/2004, que disciplinou a reforma do Poder Judiciário. O edital do certame, por
sua vez, relativamente à disciplina Direito Constitucional, assim determinava:
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1. Poder Judiciário.
2. Organização do Estado. Administração Pública. Servidores Públicos.
De se ressaltar, outrossim, que o instrumento convocatório não vedava a exigência de legislação
editada posteriormente a sua publicação.
Assim posta a questão, entendo que também nesse ponto agiu com acerto a Corte
capixaba ao indeferir o mandado de segurança, uma vez que, previsto no edital o tema
alusivo ao “Poder Judiciário”, o questionamento sobre a Emenda Constitucional 45/2004
— promulgada justamente com o objetivo de alterar a estrutura do judiciário pátrio
— evidentemente não contempla situação de flagrante divergência entre a formulação
contida nas questões 27 e 28 do exame objetivo e o programa de disciplinas previsto no
instrumento convocatório.
Impende assinalar, ainda, que esta Corte possui entendimento no sentido da legitimidade
da exigência, pela banca examinadora de concurso público, de legislação superveniente à
publicação do edital, quando este não veda expressamente tal cobrança.
Nesse sentido, confiram-se os seguintes julgados, tirados de processos semelhantes ao presente:
ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. EXIGÊNCIA DE MATÉRIA SUPERVENIENTE AO EDITAL. VIOLAÇãO AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. NãO-OCORRÊNCIA. RECURSO IMPROVIDO.
1. Orienta-se a jurisprudência no sentido de que ao Poder Judiciário compete a análise das questões pertinentes à legalidade do edital e ao cumprimento das suas normas pela banca examinadora. Em regra, não cabe o exame do conteúdo das questões formuladas em concurso público.
2. Hipótese em que ao se exigir do candidato conhecimento a respeito da Emenda Constitucional 45/04, promulgada posteriormente à publicação do edital, a banca examinadora não se desvinculou do conteúdo programático e, por conseguinte, não violou o princípio da legalidade, conferindo, ainda, prazo razoável, superior a 3 (três) meses, para que o candidato se preparasse adequadamente para as provas.
3. Recurso ordinário improvido. (RMS 21.743/ES, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, qUINTA TURMA, julgado em 09.10.2007, DJ 05.11.2007 p. 292)
RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. PROVA OBJETIVA. VIOLAÇãO AO PRINCÍPIO DA VINCULAÇãO AO EDITAL. INOCORRÊNCIA. CONTROLE JURISDICIONAL. LIMITES. INEXISTÊNCIA DE DIREITO LÍqUIDO E CERTO. RECURSO DESPROVIDO.
1. O fato de a Emenda à Constituição que prevê a reforma do Poder Judiciário ter entrada em vigor após a publicação de edital não inviabiliza a formulação
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de questões a seu respeito, tendo em vista que o seu conteúdo apresenta pertinência com aquele previsto no edital.
2. A formulação de questões de prova de concurso as quais contemplem o conteúdo programático previsto no edital não configura afronta aos princípios da legalidade e da vinculação ao edital.
3. Consoante já manifestou este Tribunal, em termos de interpretação das normas editalícias de concurso público, a competência do Poder Judiciário limita-se ao exame do princípio da vinculação ao edital. Cabe ao administrador o poder-dever de se valer da discricionariedade na escolha do conteúdo das questões, desde que se restrinja ao conteúdo previsto no edital. Não há, em consequência, direito líquido e certo a amparar as recorrentes. Recurso ordinário desprovido. (RMS 21.650/ES, Rel. Ministro PAULO MEDINA, SEXTA TURMA, julgado em 22.08.2006, DJ 02.10.2006 p. 314)
Na hipótese vertente, articulou-se à candidata quesito sobre assunto previsto no edital do
concurso público, não havendo, quanto a isso, qualquer ilegalidade a ser sanada por meio deste
mandado de segurança.
Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.
É como voto.
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Legislação Federal
DECRETO FEDERAL 6.944/2009
21/08/2009 EXECUTIVO
Ementa: Estabelece medidas organizacionais para o aprimoramento da administração pública
federal direta, autárquica e fundacional, dispõe sobre normas gerais relativas a concursos
públicos, organiza sob a forma de sistema as atividades de organização e inovação institucional
do Governo Federal, e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPúbLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso VI, alínea
“a”, da Constituição, DECRETA:
CAPÍTULO I
DAS MEDIDAS PARA O FORTALECIMENTO DA CAPACIDADE INSTITUCIONAL
Seção I
Das Disposições Gerais
Art. 1º Para fins deste Decreto, considera-se fortalecimento da capacidade institucional o conjunto de
medidas que propiciem aos órgãos ou entidades da administração pública federal direta, autárquica
e fundacional a melhoria das suas condições de funcionamento, compreendendo as de caráter
organizacional, que lhes proporcionem melhor desempenho no exercício de suas competências
institucionais, especialmente na execução dos programas do Plano Plurianual — PPA.
§ 1º As medidas de fortalecimento da capacidade institucional observarão as seguintes diretrizes:
I — organização da ação governamental por programas;
II — eliminação de superposições e fragmentações de ações;
III — aumento da eficiência, eficácia e efetividade do gasto e da ação administrativa;
IV — orientação para resultados;
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V — racionalização de níveis hierárquicos e aumento da amplitude de comando;
VI — orientação para as prioridades de governo; e
VII — alinhamento da proposta apresentada com as competências da organização e os resultados
que se pretende alcançar.
§ 2º O fortalecimento da capacidade institucional será alcançado por intermédio:
I — da criação e transformação de cargos e funções, ou de sua extinção, quando vagos;
II — da criação, reorganização e extinção de órgãos e entidades;
III — da realização de concursos públicos e provimento de cargos e empregos públicos;
IV — da aprovação e revisão de estrutura regimental e de estatuto;
V — do remanejamento ou redistribuição de cargos e funções públicas; e
VI — da autorização para contratação temporária de excepcional interesse público, nos termos
da Lei nº 8.745, de 9 de dezembro de 1993.
Art. 2º As propostas sobre matéria de que trata o § 2º do art. 1º serão encaminhadas ao Ministério do
Planejamento, Orçamento e Gestão e, quando couber, submetidas à apreciação da Casa Civil da Presidência
da República, nos termos do disposto no Decreto no 4.176, de 28 de março de 2002, e deverão conter:
I — justificativa da proposta, caracterizando-se a necessidade de fortalecimento institucional,
demonstrando o seu alinhamento com os resultados pretendidos, em especial no que se refere
aos programas do PPA;
II — identificação sucinta dos macroprocessos, produtos e serviços prestados pelos órgãos e entidades; e
III — resultados que se pretende alcançar com o fortalecimento institucional e indicadores para
mensurá-los.
Parágrafo único. O Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão analisará as propostas com
base nas diretrizes relacionadas no art. 1º, cabendo-lhe emitir parecer sobre sua adequação
técnica e orçamentária, bem como propor ou adotar os ajustes e medidas que forem necessários
à sua implementação ou prosseguimento.
Art. 3º O órgão ou entidade deverá apresentar as propostas de que tratam os incisos I e II do § 2º do
art. 1º, quando acarretarem aumento de despesa, até o dia 31 de maio de cada exercício, de modo
a compatibilizá-las com o projeto de lei orçamentária anual para o exercício subsequente.
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Seção II
Dos Documentos e Informações a serem encaminhados
Art. 4º Para avaliação do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, as propostas de que trata o § 2º do art. 1º deverão ser acompanhadas dos documentos abaixo relacionados:
I — aviso do Ministro de Estado sob cuja subordinação ou supervisão se encontrar o órgão ou entidade;
II — minuta de exposição de motivos, quando for o caso;
III — minuta de projeto de lei ou decreto, e respectivos anexos, quando for o caso, observado o disposto no Decreto no 4.176, de 2002;
IV — nota técnica da área competente; e
V — parecer da área jurídica.
Art. 5º quando a proposta acarretar aumento de despesa, em complementação à documentação prevista no art. 4º, deverá ser encaminhada a estimativa do seu impacto orçamentário-financeiro, no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois exercícios subsequentes, observadas as normas complementares a serem editadas pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão.
§ 1º A estimativa de impacto deverá estar acompanhada das premissas e da memória de cálculo utilizadas, elaboradas pela área técnica competente, que deverão conter:
I — o quantitativo de cargos ou funções a serem criados ou providos;
II — os valores referentes a:
a) remuneração do cargo ou emprego, na forma da legislação;
b) encargos sociais;
c) pagamento de férias;
d) pagamento de gratificação natalina, quando for o caso; e
e) demais despesas com benefícios de natureza trabalhista e previdenciária, tais como auxílioalimentação, auxilio-transporte, auxílio-moradia, indenização de transporte, contribuição a entidades fechadas de previdência, FGTS e contribuição a planos de saúde; e
III — indicação do mês previsto para ingresso dos servidores ou empregados no serviço público.
§ 2º Para efeito da estimativa de impacto deverá ser considerado o valor correspondente a vinte e dois por cento para os encargos sociais relativos ao Plano de Seguridade Social do Servidor Público — PSS e o adicional de um terço de férias a partir do segundo ano de efetivo exercício.
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Art. 6º Os órgãos e entidades deverão encaminhar, ainda, outros documentos e informações
definidos em ato do Ministro de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão.
Seção III
Das Estruturas Regimentais, Estatutos e Regimentos Internos dos Órgãos e Entidades
Art. 7º quando da publicação das estruturas regimentais e dos estatutos dos órgãos e entidades
da administração direta, autárquica e fundacional, para fins de classificação de seus cargos em
comissão e funções de confiança, considerar-se-á a nomenclatura padrão e o nível correspondente
do cargo ou função, na forma a ser estabelecida em ato do Ministro de Estado do Planejamento,
Orçamento e Gestão.
Art. 8º Na proposta de aprovação ou revisão de suas estruturas regimentais ou estatutos, os
órgãos e entidades deverão tomar como referência, para cálculo da despesa com pessoal, o
custo unitário efetivo expresso em DAS — Unitário, constante do Anexo I.
Parágrafo único. As disposições estabelecidas no caput não se aplicam às instituições federais
de ensino e ao Banco Central do Brasil.
Art. 9º Os órgãos e entidades que decidirem pela edição de regimento interno deverão publicá-
lo no Diário Oficial da União, em absoluta consonância com o decreto que aprovar a respectiva
estrutura regimental ou estatuto.
§ 1º Poderá haver um único regimento interno para cada Ministério ou órgão da Presidência
da República, abrangendo todas as unidades administrativas integrantes de sua estrutura
regimental, ou regimentos internos específicos para cada unidade administrativa, a critério do
Ministro de Estado correspondente.
§ 2º As autarquias e fundações terão apenas um regimento.
CAPÍTULO II
DO CONCURSO PúbLICO
Seção I
Das Disposições Gerais
Art. 10. Fica delegada competência ao Ministro de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão
para autorizar a realização de concursos públicos nos órgãos e entidades da administração
pública federal direta, autárquica e fundacional e decidir sobre o provimento de cargos e
empregos públicos, bem como expedir os atos complementares necessários para este fim.
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§ 1º A delegação prevista no caput não se aplica para efeito de ingresso:
I — nas carreiras de Advogado da União, de Procurador da Fazenda Nacional e de Procurador
Federal, cujos atos serão praticados pelo Advogado-Geral da União;
II — na carreira de Defensor Público da União, cujos atos serão praticados pelo Defensor Público-Geral; e
III — na carreira de Diplomata, cujos atos serão praticados pelo Ministro de Estado das Relações
Exteriores.
§ 2º Prescinde de autorização do Ministro de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão o
provimento de cargo docente e contratação de professor substituto, observado o limite que cada
universidade federal se encontra autorizada a manter em seu quadro docente, conforme norma
conjunta dos Ministros de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão e da Educação.
§ 3º Nas hipóteses dos incisos I a III do § 1º, os atos ali referidos dependerão de manifestação
do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, emitida previamente à realização do
concurso, que confirme a existência de disponibilidade orçamentária para cobrir as despesas
com o provimento dos cargos.
Art. 11. Durante o período de validade do concurso público, o Ministério do Planejamento, Orçamento
e Gestão poderá autorizar, mediante motivação expressa, a nomeação de candidatos aprovados e
não convocados, podendo ultrapassar em até cinquenta por cento o quantitativo original de vagas.
Art. 12. Excepcionalmente o Ministro de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão poderá
autorizar a realização de concurso público para formação de cadastro reserva para provimento futuro,
de acordo com a necessidade, de cargos efetivos destinados a atividades de natureza administrativa,
ou de apoio técnico ou operacional dos planos de cargos e carreiras do Poder Executivo federal.
Art. 13. O concurso público será de provas ou de provas e títulos, podendo ser realizado em
duas etapas, conforme dispuser a lei ou o regulamento do respectivo plano de carreira.
§ 1º quando houver prova de títulos, a apresentação destes deverá ocorrer em data a ser
estabelecida no edital, sempre posterior à da inscrição no concurso, ressalvada disposição
diversa em lei.
§ 2º A prova de títulos deverá ser realizada como etapa posterior à prova escrita e somente
apresentarão os títulos os candidatos aprovados nas etapas anteriores ou que tiverem inscrição
aceita no certame.
§ 3º Havendo prova oral ou defesa de memorial, deverá ser realizada em sessão pública e
gravada para efeito de registro e avaliação.
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§ 4º A realização de provas de aptidão física exige a indicação no edital do tipo de prova, das
técnicas admitidas e do desempenho mínimo para classificação.
§ 5º No caso das provas de conhecimentos práticos específicos, deverá haver indicação dos
instrumentos, aparelhos ou das técnicas a serem utilizadas, bem como da metodologia de
aferição para avaliação dos candidatos.
§ 6º É admitido, observados os critérios estabelecidos no edital de abertura do concurso, o
condicionamento da aprovação em determinada etapa à, simultaneamente, obtenção de nota
mínima e obtenção de classificação mínima na etapa.
§ 7º No caso da realização do concurso em duas etapas, a segunda será constituída de curso ou
programa de formação, de caráter eliminatório e classificatório, ressalvada disposição diversa
em lei específica.
§ 8º quando o número de candidatos matriculados para a segunda etapa ensejar a formação de
mais de uma turma, com início em datas diferentes, o resultado será divulgado por grupo, ao
término de cada turma.
Art. 14. A realização de exame psicotécnico está condicionada à existência de previsão legal
expressa específica e deverá estar prevista no edital.
§ 1º O exame psicotécnico limitar-se-á à detecção de problemas psicológicos que possam vir a
comprometer o exercício das atividades inerentes ao cargo ou emprego disputado no concurso.
§ 2º É vedada a realização de exame psicotécnico em concurso público para aferição de perfil
profissiográfico, avaliação vocacional ou avaliação de quociente de inteligência.
Art. 15. O valor cobrado a título de inscrição no concurso publico será fixado em edital, levando-
se em consideração os custos estimados indispensáveis para a sua realização, e ressalvadas as
hipóteses de isenção nele expressamente previstas, respeitado o disposto no Decreto nº 6.593,
de 2 de outubro de 2008.
Art. 16. O órgão ou entidade responsável pela realização do concurso público homologará e
publicará no Diário Oficial da União a relação dos candidatos aprovados no certame, classificados
de acordo com Anexo II deste Decreto, por ordem de classificação.
§ 1º Os candidatos não classificados no número máximo de aprovados de que trata o Anexo II, ainda
que tenham atingido nota mínima, estarão automaticamente reprovados no concurso público.
§ 2º No caso de realização de concurso público em mais de uma etapa, o critério de reprovação
do § 1º será aplicado considerando-se a classificação na primeira etapa.
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§ 3º Nenhum dos candidatos empatados na última classificação de aprovados serão considerados
reprovados nos termos deste artigo.
§ 4º O disposto neste artigo deverá constar do edital de concurso público.
Art. 17. Na autorização do Ministro de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão para
realização de concurso público ou na manifestação de que trata o § 3º do art. 10, será fixado
prazo não superior a seis meses para o órgão ou entidade publicar o edital de abertura de
inscrições para realização do certame.
§ 1º Para as instituições federais de ensino vinculadas ao Ministério da Educação, o prazo referido
no caput será contado a partir da publicação do ato do Ministro de Estado da Educação que
realizar a distribuição, entre essas entidades, das vagas autorizadas.
§ 2º Findo o prazo de que trata o caput, sem a abertura de concurso público, ficará sem efeito
a autorização concedida pelo Ministro de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão ou a
manifestação de que trata o § 3º do art. 10.
Seção II
Do Edital do Concurso Público
Art. 18. O edital do concurso público será:
I — publicado integralmente no Diário Oficial da União, com antecedência mínima de sessenta
dias da realização da primeira prova; e
II — divulgado no sitio oficial do órgão ou entidade responsável pela realização do concurso
público e da instituição que executará o certame, logo após a sua publicação.
§ 1º A alteração de qualquer dispositivo do edital deverá ser publicada no Diário Oficial da União
e divulgada na forma do disposto no inciso II.
§ 2º O prazo de que trata o inciso I poderá ser reduzido mediante ato motivado do Ministro de
Estado sob cuja subordinação ou supervisão se encontrar o órgão ou entidade responsável pela
realização do concurso público.
Art. 19. Deverão constar do edital de abertura de inscrições, no mínimo, as seguintes informações:
I — identificação da instituição realizadora do certame e do órgão ou entidade que o promove;
II — menção ao ato ministerial que autorizar a realização do concurso público, quando for o caso;
III — número de cargos ou empregos públicos a serem providos;
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IV — quantitativo de cargos ou empregos reservados às pessoas com deficiência e critérios para
sua admissão, em consonância com o disposto nos arts. 37 a 44 do Decreto nº 3.298, de 20 de
dezembro de 1999;
V — denominação do cargo ou emprego público, a classe de ingresso e a remuneração inicial,
discriminando-se as parcelas que a compõem;
VI — lei de criação do cargo, emprego público ou carreira, e seus regulamentos;
VII — descrição das atribuições do cargo ou emprego público;
VIII — indicação do nível de escolaridade exigido para a posse no cargo ou emprego;
IX — indicação precisa dos locais, horários e procedimentos de inscrição, bem como das
formalidades para sua confirmação;
X — valor da taxa de inscrição e hipóteses de isenção;
XI — orientações para a apresentação do requerimento de isenção da taxa de inscrição, conforme
legislação aplicável;
XII — indicação da documentação a ser apresentada no ato de inscrição e quando da realização
das provas, bem como do material de uso não permitido nesta fase;
XIII — enunciação precisa das disciplinas das provas e dos eventuais agrupamentos de provas;
XIV — indicação das prováveis datas de realização das provas;
XV — número de etapas do concurso público, com indicação das respectivas fases, seu caráter
eliminatório ou eliminatório e classificatório, e indicativo sobre a existência e condições do
curso de formação, se for o caso;
XVI — informação de que haverá gravação em caso de prova oral ou defesa de memorial;
XVII — explicitação detalhada da metodologia para classificação no concurso público;
XVIII — exigência, quando cabível, de exames médicos específicos para a carreira ou de exame
psicotécnico ou sindicância da vida pregressa;
XIX — regulamentação dos meios de aferição do desempenho do candidato nas provas, observado
o disposto na Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003;
XX — fixação do prazo de validade do concurso e da possibilidade de sua prorrogação; e
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XXI — disposições sobre o processo de elaboração, apresentação, julgamento, decisão e
conhecimento do resultado de recursos.
Parágrafo único. A escolaridade mínima, e a experiência profissional, quando exigidas, deverão
ser comprovadas no ato de posse no cargo ou emprego, vedada a exigência de comprovação no
ato de inscrição no concurso público ou em qualquer de suas etapas, ressalvado o disposto em
legislação específica.
CAPÍTULO III
DO SISTEMA DE ORGANIZAÇÃO E INOVAÇÃO INSTITUCIONAL
DO GOVERNO FEDERAL — SIORG
Art. 20. Ficam organizadas sob a forma de sistema, com a designação de Sistema de Organização
e Inovação Institucional do Governo Federal — SIORG, as atividades de desenvolvimento
organizacional dos órgãos e entidades da administração direta, autárquica e fundacional do
Poder Executivo Federal, com as seguintes finalidades:
I — uniformizar e integrar ações das unidades que o compõem;
II — constituir rede colaborativa voltada à melhoria da gestão pública;
III — desenvolver padrões de qualidade e de racionalidade;
IV — proporcionar meios para melhorar o desempenho institucional e otimizar a utilização dos recursos disponíveis; e
V — reduzir custos operacionais e assegurar a continuidade dos processos de organização e inovação institucional.
Parágrafo único. Para os fins deste Decreto, consideram-se funções básicas de organização e inovação institucional:
I — definição das competências dos órgãos e entidades e das atribuições de seus dirigentes;
II — organização e funcionamento da administração federal;
III — estabelecimento de programas de melhoria do desempenho dos órgãos e entidades;
IV — geração, adaptação e disseminação de tecnologias de inovação;
V — racionalização de métodos e processos administrativos;
VI — elaboração de planos de formação, desenvolvimento e treinamento do pessoal envolvido na área de abrangência do sistema; e
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VII — disseminação de informações organizacionais e de desempenho da gestão administrativa.
Art. 21. São integrantes do SIORG todas as unidades administrativas incumbidas de atividades
de organização e inovação institucional da Administração direta, autárquica e fundacional do
Poder Executivo federal, observada a seguinte estrutura:
I — órgão central: o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, por intermédio da
Secretaria de Gestão;
II — órgãos setoriais: as Secretarias-Executivas ou equivalentes, assessoradas pelas unidades
administrativas responsáveis pela área de organização e inovação institucional dos Ministérios
e órgãos integrantes da Presidência da República; e
III — órgãos seccionais: diretorias administrativas ou equivalentes, que atuam na área de
organização e inovação institucional, nas autarquias e fundações.
§ 1º As unidades setoriais e seccionais do SIORG subordinam-se tecnicamente ao órgão central
do Sistema, para os estritos fins deste Decreto, sem prejuízo da subordinação administrativa
decorrente de sua posição na estrutura do órgão ou entidade em que se encontrem.
§ 2º Caberá às unidades setoriais a articulação com as unidades seccionais a elas vinculadas,
com o objetivo de contribuir para a integração sistêmica do SIORG.
Art. 22. Ao órgão central do SIORG compete:
I — definir, padronizar, sistematizar e estabelecer, mediante a edição de enunciados e instruções,
os procedimentos atinentes às atividades de organização e inovação institucional;
II — estabelecer fluxos de informação entre as unidades integrantes do Sistema e os demais
sistemas de atividades auxiliares, visando subsidiar os processos de decisão e a coordenação
das atividades governamentais;
III — gerar e disseminar tecnologias e instrumental metodológicos destinados ao planejamento,
execução e controle das atividades de organização e inovação institucional;
IV — orientar e conduzir o processo de organização e de inovação institucional;
V — analisar e manifestar-se sobre propostas de:
a) criação e extinção de órgãos e entidades;
b) definição das competências dos órgãos e entidades, e das atribuições de seus dirigentes;
c) revisão de categoria jurídico-institucional dos órgãos e entidades;
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d) remanejamento de cargos em comissão e funções de confiança;
e) criação, transformação e extinção de cargos e funções; e
f) aprovação e revisão de estrutura regimental e de estatuto
VI — promover estudos e propor a criação, fusão, reorganização, transferência e extinção de órgãos e entidades; e
VII — administrar o cadastro de órgãos e entidades do Poder Executivo Federal.
Art. 23. Às unidades setoriais e seccionais do SIORG compete:
I — cumprir e fazer cumprir as normas de organização e inovação institucional expedidas pelo órgão central;
II — propor ações e sugerir prioridades nas atividades de organização e de inovação institucional da respectiva área de atuação;
III — acompanhar e avaliar os programas e projetos de organização e inovação institucional, informando ao órgão central;
IV — organizar e divulgar informações sobre estrutura regimental, estatuto, normas, rotinas, manuais de orientação, regimentos internos, instruções e procedimentos operacionais;
V — elaborar e rever periodicamente os documentos normativos necessários ao bom andamento das atividades de organização e inovação institucional, segundo padrões e orientação estabelecidos;
VI — normatizar, racionalizar e simplificar instrumentos, procedimentos e rotinas de trabalho;
VII — desenvolver padrões de qualidade e funcionalidade destinados à melhoria do desempenho dos trabalhos e dos serviços prestados; e
VIII — promover ações visando eliminar desperdício de recursos.
Art. 24. O suporte às atividades de organização e inovação institucional contará com um sistema informatizado que conterá o cadastro oficial sobre as estruturas, as competências e os cargos em comissão e funções de confiança dos órgãos e entidades integrantes do SIORG.
Art. 25. Para fins de integração, os sistemas abaixo relacionados deverão utilizar a tabela de órgãos do sistema informatizado de apoio ao SIORG como única referência para o cadastro de órgãos e unidades administrativas:
I — Sistema Integrado de Administração de Recursos Humanos — SIAPE;
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II — Sistema Integrado de Administração de Serviços Gerais — SIASG;
III — Sistema Integrado de Dados Orçamentários — SIDOR;
IV — Sistema de Informações Gerenciais e de Planejamento — SIGPLAN;
V — Sistema Integrado de Administração Financeira — SIAFI;
VI — Sistema de Concessão de Passagens e Diárias — SCDP; e
VII — Sistema de Administração dos Recursos de Informação e Informática — SISP.
Parágrafo único. O disposto no caput aplica-se aos sistemas sucedâneos, aos subsistemas destes e aos sistemas de uso corporativo do Poder Executivo Federal que vierem a ser instituídos.
CAPÍTULO IV
DAS DISPOSIÇÕES FINAIS
Art. 26. As propostas submetidas ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, para
fins do disposto no § 2º do art. 1º poderão ser devolvidas ao Ministério de origem caso o
encaminhamento não obedeça as disposições deste Decreto.
Art. 27. Serão divulgadas por extrato, no sítio eletrônico do Ministério do Planejamento,
Orçamento e Gestão, as demandas de fortalecimento da capacidade institucional enviadas pelos
órgãos e entidades, suas justificativas e o impacto orçamentário resultante, quando houver.
Art. 28. O Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão expedirá os atos complementares
necessários à aplicação deste Decreto, cabendo-lhe dirimir as dúvidas porventura existentes.
Art. 29. Aos concursos públicos autorizados até a data da publicação deste Decreto aplicam-se as
disposições do Decreto nº 4.175, de 27 de março de 2002, e os procedimentos complementares
estabelecidos pelo Ministro de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão.
Parágrafo único. Opcionalmente, o órgão ou entidade poderá aplicar as disposições deste
Decreto aos concursos públicos autorizados anteriormente à sua data de publicação.
Art. 30. O art. 8º do Decreto nº 5.378, de 23 de fevereiro de 2005, passa a vigorar com a
seguinte redação:
“Art.8º ..........................................................................................................
III — representantes de órgãos e entidades da administração pública, assim como de entidades
privadas com notório engajamento em ações ligadas à qualidade da gestão e à desburocratização,
conforme estabelecido pelo Ministro de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão.
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§ 1º Os membros a que se referem o caput, titulares e suplentes, serão indicados pelos dirigentes
dos órgãos ou entidades representados e designados pelo Ministro de Estado do Planejamento,
Orçamento e Gestão.
§ 2º O mandato dos membros do Comitê Gestor será de dois anos, permitida a recondução.” (NR)
Art. 31. Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 32. Ficam revogados:
I — o Decreto nº 92.360, de 4 de fevereiro de 1986;
II — o parágrafo único do art. 1º e os arts. 2º a 4º do Decreto nº 1.351, de 28 de dezembro de 1994;
III — o Decreto nº 3.134, de 10 de agosto de 1999;
IV — o Decreto nº 3.716, de 3 de janeiro de 2001;
V — o Decreto nº 4.175, de 27 de março de 2002;
VI — o Decreto nº 4.567, de 1º de janeiro de 2003;
VII — o Decreto nº 4.896, de 25 de novembro de 2003;
VIII — o § 1º do art. 3º do Decreto nº 4.748, de 16 de junho de 2003;
IX — o art. 2º e o Anexo II ao Decreto nº 5.452, de 1º de junho de 2005;
X — o art. 2º do Decreto nº 6.097, de 24 de abril de 2007; e
XI— o Decreto nº 6.133, de 26 de junho de 2007.
Brasília, 21 de agosto de 2009; 188º da Independência e 121º da República.
LUIz INÁCIO LULA DA SILVA
Paulo Bernardo Silva
Este texto não substitui o publicado no DOU de 24.8.2009
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DECRETO FEDERAL 3.298/1999
20/12/1999 EXECUTIVO
Ementa: Regulamenta a Lei nº 7.853, de 24 de outubro de 1989, dispõe sobre a Política Nacional
para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, consolida as normas de proteção, e dá
outras providências.
O PRESIDENTE DA REPúbLICA, no uso das atribuições que lhe confere o art. 84, incisos IV e
VI, da Constituição, e tendo em vista o disposto na Lei nº 7.853, de 24 de outubro de 1989,
DECRETA:
(...)
CAPÍTULO VII
DA EQUIPARAÇÃO DE OPORTUNIDADES
(...)
Seção IV
Do Acesso ao Trabalho
(...)
Art. 37. Fica assegurado à pessoa portadora de deficiência o direito de se inscrever em concurso
público, em igualdade de condições com os demais candidatos, para provimento de cargo cujas
atribuições sejam compatíveis com a deficiência de que é portador.
§ 1º O candidato portador de deficiência, em razão da necessária igualdade de condições,
concorrerá a todas as vagas, sendo reservado no mínimo o percentual de cinco por cento em
face da classificação obtida.
§ 2º Caso a aplicação do percentual de que trata o parágrafo anterior resulte em número
fracionado, este deverá ser elevado até o primeiro número inteiro subsequente.
Art. 38. Não se aplica o disposto no artigo anterior nos casos de provimento de:
I — cargo em comissão ou função de confiança, de livre nomeação e exoneração; e
II — cargo ou emprego público integrante de carreira que exija aptidão plena do candidato.
Art. 39. Os editais de concursos públicos deverão conter:
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I — o número de vagas existentes, bem como o total correspondente à reserva destinada à
pessoa portadora de deficiência;
II — as atribuições e tarefas essenciais dos cargos;
III — previsão de adaptação das provas, do curso de formação e do estágio probatório, conforme
a deficiência do candidato; e
IV — exigência de apresentação, pelo candidato portador de deficiência, no ato da inscrição, de
laudo médico atestando a espécie e o grau ou nível da deficiência, com expressa referência ao
código correspondente da Classificação Internacional de Doença — CID, bem como a provável
causa da deficiência.
Art. 40. É vedado à autoridade competente obstar a inscrição de pessoa portadora de deficiência em
concurso público para ingresso em carreira da Administração Pública Federal direta e indireta.
§ 1º No ato da inscrição, o candidato portador de deficiência que necessite de tratamento
diferenciado nos dias do concurso deverá requerê-lo, no prazo determinado em edital, indicando
as condições diferenciadas de que necessita para a realização das provas.
§ 2º O candidato portador de deficiência que necessitar de tempo adicional para realização das
provas deverá requerê-lo, com justificativa acompanhada de parecer emitido por especialista
da área de sua deficiência, no prazo estabelecido no edital do concurso.
Art. 41. A pessoa portadora de deficiência, resguardadas as condições especiais previstas neste Decreto,
participará de concurso em igualdade de condições com os demais candidatos no que concerne:
I — ao conteúdo das provas;
II — à avaliação e aos critérios de aprovação;
III — ao horário e ao local de aplicação das provas; e
IV — à nota mínima exigida para todos os demais candidatos.
Art. 42. A publicação do resultado final do concurso será feita em duas listas, contendo, a
primeira, a pontuação de todos os candidatos, inclusive a dos portadores de deficiência, e a
segunda, somente a pontuação destes últimos.
Art. 43. O órgão responsável pela realização do concurso terá a assistência de equipe multiprofissional
composta de três profissionais capacitados e atuantes nas áreas das deficiências em questão, sendo
um deles médico, e três profissionais integrantes da carreira almejada pelo candidato.
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§ 1º A equipe multiprofissional emitirá parecer observando:
I — as informações prestadas pelo candidato no ato da inscrição;
II — a natureza das atribuições e tarefas essenciais do cargo ou da função a desempenhar;
III — a viabilidade das condições de acessibilidade e as adequações do ambiente de trabalho na
execução das tarefas;
IV — a possibilidade de uso, pelo candidato, de equipamentos ou outros meios que habitualmente
utilize; e
V — a CID e outros padrões reconhecidos nacional e internacionalmente.
§ 2º A equipe multiprofissional avaliará a compatibilidade entre as atribuições do cargo e a
deficiência do candidato durante o estágio probatório.
Art. 44. A análise dos aspectos relativos ao potencial de trabalho do candidato portador de
deficiência obedecerá ao disposto no art. 20 da Lei no 8.112, de 11 de dezembro de 1990.
(...)
Brasília, 20 de dezembro de 1999; 178º da Independência e 111º da República.
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Legislação Estadual
DECRETO ESTADUAL 42.899/2002
17/09/2002 EXECUTIVO
Aprova o Regulamento Geral de Concurso Público para investidura em cargo ou emprego público da administração direta ou indireta do Poder Executivo do Estado de Minas Gerais.
O GOVERNADOR DO ESTADO DE MINAS GERAIS, no uso de atribuição que lhe confere o artigo 90, inciso VII, da Constituição do Estado, DECRETA:
Art. 1º Fica aprovado o Regulamento Geral de Concurso Público para investidura em cargo ou emprego público da administração direta e indireta do Poder Executivo do Estado de Minas Gerais, que com este se publica.
Art. 2º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 3º Revogam-se as disposições em contrário, em especial, o Decreto 34.706, de 18 de maio de 1993, o Decreto nº 35.967, de 25 de agosto de 1994 e o Decreto nº 39.403, de 22 de janeiro de 1998.
Palácio da Liberdade, em Belo Horizonte, aos 17 de setembro de 2002.
REGULAMENTO GERAL DE CONCURSO PúbLICO
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES PRELIMINARES
Art. 1º Este Regulamento fixa as diretrizes e normas para realização de concurso público para investidura em cargo ou emprego público da administração direta e indireta do Poder Executivo do Estado de Minas Gerais.
Art. 2º A aplicação deste Regulamento é da responsabilidade dos seguintes órgãos e entidades, aos quais compete:
I — Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão — SEPLAG:
a) formalizar à Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão — SEPLAG — pedido fundamentado de promoção de concurso público, devidamente acompanhado da legislação pertinente e do número de vagas ofertadas do seu quadro de cargos;
b) orientar os procedimentos relativos ao processamento do concurso público;
c) elaborar o edital do concurso público com participação da SEPLAG;
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d) exercer a coordenação, supervisão e o acompanhamento do concurso público;
e) verificar a existência de prévia aprovação de verba no orçamento do órgão ou entidade solicitante do concurso público como garantia das despesas previstas;
f) zelar para que o concurso público seja realizado dentro dos prazos previstos em edital atendendo às necessidades de pessoal do órgão ou entidade solicitante;
g) homologar concurso público da administração direta.
II — órgãos da administração direta e entidades da administração indireta:
a) formalizar à Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão — SEPLAG — pedido fundamentado de promoção de concurso público, devidamente acompanhado da legislação pertinente e do número de vagas ofertadas do seu quadro de cargos;
b) proporcionar, quando solicitado, dados, informações e apoio para a realização de concurso público;
c) elaborar o edital do concurso público com participação da SEPLAG;
d) assumir o ônus da publicação no órgão oficial dos Poderes do Estado de quaisquer atos relativos à realização de concurso público de seu interesse.
CAPÍTULO II
DA REALIZAÇÃO DE CONCURSO PúbLICO
Art. 3º A realização de concurso público obedecerá ao número de vagas ofertado e, quanto à abrangência, poderá ser:
I — local — quando as vagas forem distribuídas por município ou localidade;
II — regional — quando a oferta de vagas obedecer à região administrativamente definida;
III — geral — quando as vagas ofertadas estiverem distribuídas exclusivamente por quadro setorial.
Art. 4º Nos concursos públicos locais ou regionais, o edital poderá prever reaproveitamento de candidato classificado para localidade ou região diferente daquela em que ele se inscreveu, desde que comprovada a existência de vaga nessa localidade ou região para qual não haja candidato classificado.
Art. 5º O prazo de validade do concurso público será de até 2 (dois) anos, prorrogável uma vez, por igual período.
Art. 6º O candidato aprovado em concurso público de provas ou de provas e títulos será convocado com prioridade sobre novos concursados para assumir cargo ou emprego público, durante o prazo improrrogável previsto no edital de convocação.
CAPÍTULO III
DO EDITAL
Art. 7º O edital, instrumento convocatório que contém normas específicas do concurso público, deverá ter ampla publicidade, observado o disposto no artigo 1º da Lei nº 13.088, de 11 de janeiro de 1999.
Parágrafo único. A divulgação do concurso público será feita na forma de publicação do edital em seu inteiro teor no Órgão Oficial dos Poderes do Estado.
Art. 8º O edital para concurso público conterá:
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I — número de ordem em série anual;
II — nome do órgão ou entidade que promove o concurso público;
III — objeto e finalidade do concurso público;
IV — menção de que será regido por este Regulamento e legislação pertinente;
V — especificação da classe: natureza do trabalho, atribuições do cargo, nível de escolaridade exigido, vencimento fixado para a referência inicial do cargo ou emprego, jornada de trabalho, regime jurídico, número de vagas ofertadas;
VI — número de vagas ofertadas para portadores de deficiência observada a legislação pertinente;
VII — informações para inscrição: condições, preenchimento de formulário, data, horário, local, período, taxa, documentação exigida e disposições gerais;
VIII — informação sobre isenção da taxa de inscrição e documentação exigida para este fim;
IX — etapas do concurso público e número de questões por prova;
X — conteúdos programáticos, incluindo noções de direitos humanos nos termos da Lei nº 13.660, de 14 de julho de 2000, e a bibliografia sugerida;
XI — critérios de classificação;
XII — citação dos municípios onde serão realizadas as provas;
XIII — local de entrega de comprovante de títulos, se for o caso;
XIV — definição dos atos administrativos a serem publicados no órgão oficial dos Poderes do Estado;
XV — direito de petição e procedimentos sobre recursos;
XVI — definição dos responsáveis para decidir sobre os recursos interpostos;
XVII — modelo de formulário para interposição de recursos;
XVIII — prazo de validade do concurso público;
XIX — outras indicações específicas e peculiares.
Parágrafo único. O formulário de inscrição conterá obrigatoriamente campo destinado ao número do Cadastro de Pessoa Física — CPF do candidato.
CAPÍTULO IV
DA INSCRIÇÃO
Art. 9º A inscrição se efetivará mediante o cumprimento dos requisitos exigidos pelo respectivo edital.
Art. 10 Não é permitida inscrição condicional, sob qualquer pretexto, para fins de concurso público.
Art. 11 O candidato deverá satisfazer as seguintes condições, dentre outras que o edital venha a estabelecer, para se inscrever em concurso público:
I — ser brasileiro nato ou naturalizado;
II — estar em dia com as obrigações militares e eleitorais;
III — ter, no mínimo, dezoito anos completos na data de investidura, se aprovado, classificado e nomeado para o cargo ou emprego público;
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IV — possuir a escolaridade completa ou habilitação exigida para o provimento do cargo ou emprego público, adquirida em instituição de ensino oficial ou legalmente reconhecida, conforme previsto no edital do concurso.
Art. 12 qualquer falsidade ou inexatidão de dados, apurada a qualquer tempo, acarretará a anulação da inscrição do candidato, bem como de todos os atos dela decorrentes, sem prejuízo da ação penal cabível.
Art. 13 O período para inscrição em concurso público terá o prazo de permanência mínimo de 5 (cinco) dias úteis, contados da data de abertura de inscrição.
Art. 14 O comprovante de inscrição será entregue ao candidato nos termos do edital.
Art. 15 A inscrição em concurso público implicará o conhecimento e a aceitação das normas estabelecidas no edital correspondente.
CAPÍTULO V
DAS PROVAS E DA CLASSIFICAÇÃO
Art. 16 A seleção do candidato será realizada por meio de provas ou de provas e títulos.
Art. 17 As provas deverão realizar-se no prazo mínimo de trinta dias após a data e encerramento das inscrições.
Art. 18 O horário marcado para o início e a duração de cada prova serão únicos, ainda que o concurso público seja realizado em localidades, municípios ou regiões diversos, observado o horário oficial de Brasília - DF.
Art. 19 O candidato que deixar de comparecer a qualquer prova será considerado desistente, não havendo, em hipótese alguma, segunda chamada.
Art. 20 O candidato será eliminado do concurso público se incorrer nas seguintes situações:
I — deixar o local de realização da prova sem a devida autorização;
II — tratar com falta de urbanidade examinadores, seus auxiliares, fiscais ou autoridades presentes;
III — estabelecer comunicação com outros candidatos ou com pessoas estranhas por qualquer meio;
IV — tentar utilizar-se de livros, notas, impressos, qualquer meio de comunicação e informação eletrônica, salvo aquele expressamente permitido no respectivo edital.
CAPÍTULO VI
DA PUbLICIDADE
Art. 21 O Estado dará ampla publicidade ao edital de concurso público, nos termos da Lei nº 13.088, de 11 de janeiro de 1999.
§ 1º Serão publicados, obrigatoriamente, no órgão oficial dos Poderes do Estado:
I — o edital do concurso público na íntegra;
II — os atos administrativos, relativos ao concurso, assegurando:
a) igual acesso às informações relativas ao concurso a todos os candidatos;
b) publicidade das decisões sobre os recursos interpostos;
c) homologação do concurso público;
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III — a relação dos candidatos aprovados no concurso público, em ordem de classificação final, bem como as aprovações parciais em etapas, conforme estabelecido em edital.
CAPÍTULO VII
DO DIREITO DE PETIÇÃO
Art. 22 O candidato terá o prazo de dois dias úteis, a contar do dia subsequente da publicação de ato relativo ao concurso público, para interposição de recurso administrativo, nos termos do edital.
Art. 23 O recurso será dirigido ao órgão ou entidade que promover o concurso público ou à organização responsável pela sua realização conforme estabelecido em instrumento jurídico próprio cujo procedimento para esse fim constará do respectivo edital.
Art. 24 No exercício do direito de petição o candidato deverá apresentar as razões ou fundamentos objetivos que justifiquem a solicitação de modificação do ato ou da decisão, em modelo de formulário para interposição de recurso constante do respectivo edital.
Art. 25 Os prazos estabelecidos neste Regulamento Geral são preclusivos, contínuos e comuns a todos os candidatos.
CAPÍTULO VIII
DAS DISPOSIÇÕES FINAIS
Art. 26 A homologação do concurso público dar-se-á no prazo mínimo de 30 (trinta) dias úteis, contados da data de publicação da classificação final dos candidatos aprovados. (Revogado pelo Decreto 44.388/2006)
Art. 27 O percentual de vagas dos cargos ou empregos públicos para provimento por portadores de deficiência é o fixado na Lei nº 11.867, de 28 de julho de 1995, observadas as especificidades das atribuições do cargo ou emprego público, citadas em edital de concurso público.
Art. 28 O servidor público que atuar em qualquer etapa de concurso público poderá receber honorário, desde que fora da jornada de trabalho de seu cargo ou emprego, conforme legislação pertinente.
Art. 29 A Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão — SEPLAG e o órgão ou a entidade solicitante de concurso público poderão recorrer a profissionais de reconhecida capacidade técnico-profissional para compor banca examinadora, se necessário.
Art. 30 Nos casos em que lei específica exigir, integrarão a banca examinadora membros da Procuradoria-Geral do Estado, Ordem dos Advogados do Brasil - Seção Minas Gerais, Procuradoria-Geral da Fazenda Estadual e Defensoria Pública do Estado.
Art. 31 O candidato comprovadamente desempregado ficará isento do pagamento de taxa de inscrição em concurso público do Estado, nos termos da Lei nº 13.392, de 7 de dezembro de 1999.
Art. 32 Os casos omissos serão resolvidos pelo Secretário de Planejamento e Gestão, ouvidos, se necessário, a Advocacia-Geral do Estado, a Comissão instituída para acompanhar o concurso público e o órgão ou a entidade destinatário do concurso público.
Art. 33 Este Regulamento Geral de Concurso Público não se aplica às empresas públicas, às sociedades de economia mista, à Polícia Civil, à Polícia Militar e ao Corpo de Bombeiros Militar.” (nr)
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LEI ESTADUAL 11.867/1995
28/07/1995 EXECUTIVO
Ementa: Reserva percentual de cargos ou empregos públicos, no âmbito da administração pública do estado, para pessoas portadoras de deficiência.
Vide:
Lei nº 15259, de 27/7/2004•
O Povo do Estado de Minas Gerais, por seus representantes, decretou e eu, em seu nome, sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º Fica a administração pública direta e indireta do Estado obrigada a reservar 10% (dez por cento) dos cargos ou empregos públicos, em todos os níveis, para pessoas portadoras de deficiência.
§ 1º Sempre que a aplicação do percentual de que trata este artigo resultar em número fracionário, arredondar-se-á a fração igual ou superior a 0,5 (cinco décimos) para o número inteiro subsequente e a fração inferior a 0,5 (cinco décimos) para o número inteiro anterior.
§ 2º Para os fins do disposto no “caput” deste artigo, pessoa portadora de deficiência é aquela que apresenta, em caráter permanente, disfunção de natureza física, sensorial ou mental que gere incapacidade para o desempenho de atividade, dentro de um padrão considerado normal para o ser humano.
§ 3º A comprovação da deficiência será feita sem ônus, por meio de laudo, emitido após perícia realizada por junta médica oficial.
Art. 2º A investidura em cargo ou emprego público de que trata o artigo anterior depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, obedecida a ordem de classificação específica para as pessoas portadoras de deficiência e observados os prazos de validade do concurso e a compatibilidade da deficiência com o exercício da atividade.
Parágrafo único. O edital do concurso público deverá especificar, em separado, a habilitação necessária ao exercício de atividade e o número de vagas destinadas as pessoas portadoras de deficiência, considerando-se o percentual definido no artigo 1º desta Lei.
Art. 3º Se as vagas destinadas a pessoas portadoras de deficiência não forem preenchidas, serão elas ocupadas pelos demais candidatos, obedecida a ordem de classificação.
Art. 4º A pessoa portadora de deficiência beneficiada por esta Lei não poderá invocar sua deficiência para requerer aposentadoria ou pensão, salvo em caso de agravamento daquela, imprevisível à época do provimento do cargo.
Art. 5º O disposto nesta Lei não exime o candidato portador de deficiência dos exames de saúde pré-admissionais e regulares para o serviço público.
Art. 6º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 7º Revogam-se as disposições em contrário, especialmente a Lei nº 2.538, de 23 de dezembro de 1961.
Dada no Palácio da Liberdade, em Belo Horizonte, aos 28 de julho de 1995.
Eduardo Azeredo — Governador do Estado
Data da última atualização: 03/12/2007
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LEI ESTADUAL 13.392/1999
07/12/1999 EXECUTIVO
Ementa: Isenta o cidadão desempregado do pagamento de taxa de inscrição em concurso
público do Estado.
O Povo do Estado de Minas Gerais, por seus representantes, decretou e eu, em seu nome,
sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º Fica isento do pagamento da taxa de inscrição em concurso público do Estado o cidadão
comprovadamente desempregado.
§ 1º O candidato comprovará a condição de desempregado mediante a apresentação da Carteira
de Trabalho e Previdência Social ou de documento similar, no ato da inscrição.
§ 2º Constarão no edital do concurso as informações relativas à isenção da taxa de que trata
esta lei e aos documentos exigidos para comprovação de desemprego.
Art. 2º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 3º Revogam-se as disposições em contrário.
Palácio da Liberdade, em Belo Horizonte, aos 07 de dezembro de 1999.
Itamar Franco — Governador do Estado
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LEI ESTADUAL 13.801/2000
26/12/2000 EXECUTIVO
Ementa: Dispõe sobre a devolução de taxa de inscrição em concurso público não realizado.
O Povo do Estado de Minas Gerais, por seus representantes, decretou e eu, em seu nome,
sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º A taxa de expediente relativa à inscrição em concurso público para investidura em cargo
ou emprego público da administração direta ou indireta do Estado será devolvida ao candidato
na hipótese de cancelamento ou suspensão do processo seletivo.
§ 1º A devolução ocorrerá no prazo de até sessenta dias contados da publicação, no órgão oficial
dos Poderes do Estado, do ato de cancelamento ou suspensão do concurso.
§ 2º Sobre o valor a ser devolvido incidirá correção monetária a partir de seu desembolso pelo
candidato.
§ 3º É facultado ao candidato o aproveitamento do valor da taxa de que trata o caput deste
artigo ao se inscrever em concurso que substitua o cancelado ou suspenso.
Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação, e seus efeitos incidem sobre os
concursos públicos cujos editais tenham sido publicados anteriormente.
Art. 3º Revogam-se as disposições em contrário.
Palácio da Liberdade, em Belo Horizonte, aos 26 de dezembro de 2000.
Itamar Franco — Governador do Estado
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TCEREVISTA DO
Tribunal de Contas doEstado de Minas Gerais
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ção
Espe
cial
- an
o XX
VIII
Especialistas escrevem sobreaspectos relevantes dosconcursos públicos, abordandoseus fundamentos, finalidadee pontos controversos.
Doutrina:
Professor Jair Eduardo Santanadestaca a importância docontrole dos concursospúblicos pelo Tribunal de Contas.
Entrevista: