revista superficies primavera

116
1

Upload: superficies

Post on 25-Mar-2016

218 views

Category:

Documents


1 download

DESCRIPTION

 

TRANSCRIPT

Page 1: Revista superficies primavera

1

Page 2: Revista superficies primavera

2

Page 3: Revista superficies primavera

3

se você quer participar da próxima edição de Super-fícies, ou ver seu trabalho divulgado em nosso blog, envie-nos um e-mail com um pequeno texto e suas [email protected].

Visite também o nosso blog: revistasuperficies.com.br

M A N D A - P R A - C Á

Page 4: Revista superficies primavera

4

Indice

08

1658

editorial

avesso

pix

copa dos invisíveis, por Pierre Souza

6006

ensaios

O que lixo digital tem a ver com pulsão sexual?

erros e acasos da fotografia de Dirceu

Maués

negativo

Page 5: Revista superficies primavera

5

60

6264 114

memória

ensaios

varal

lambe-lambe,fotografia e muitashistórias

dicas de arte narua e na internet

102superfícies

106únicas

cidades censuradasreveladas em palavras e pixels

negativo

Page 6: Revista superficies primavera

6

Em meio ao emaranhado de imagens que flutuam na rede, Superfícies emerge com uma nova proposta: jogar luz sobre projetos fotográ- ficos que apresentam um caráter autoral e ex-perimental, capazes de valorizar os processos, a concepção e o tempo próprio de cada imagem. A revista busca compartilhar fotografias que in-corporam em sua poética, temas e questões que povoam a contemporaneidade seja a partir da técnica utilizada e/ou do conteúdo fotografado. Neste primeiro exemplar, Superfícies não apresenta tema específico, mas inaugura uma série de edições que tem como proposta ques-tionar os processos de produção da sociedade e da própria imagem. Algumas perguntas atraves-sam o conteúdo desta edição: Como temos ocupa-do os espaços? Como temos lidado com o tempo? Aonde foi parar a duração? Para dar início a essa publicação, a editoria “Avesso“ apresenta o trabalho “Copa dos invisíveis”, onde o artista Pierre Souza, se apropria da fotografia para construir um gesto poético-político-social-artístico no espaço urbano. Mais à frente, a editoria “Pix”, traz um artigo do

PROCESSOS jornalista Bernardo Carneiro, que faz uma relação en-tre a geração de lixos digitais fotográficos e a pulsão sexual, a partir da proposta do pensador Antonio Quinet. Em “Negativo”, é a vez de Superfícies mostrar de forma prática, como a fotografia pode se valer dela mesmo e de outras tecnologias para question-ar os seus próprios processos [ou a ausência deles]. Na editoria “Memórias”, a revista repensa os tempos de fotografia analógica a partir da história de um lambe-lambe de Belo Horizonte relata-da por uma de suas netas. Rodrigo Campanella coroa a edição com um texto sobre os mecanis-mos de censura à cidade e um registro fotográfi-co que revelam as dinâmicas deste fenômeno. Além das matérias, os leitores vão encon-trar ao longo da revista oito ensaios fotográficos selecionados para compor a primeira edição. A partir de um intenso processo de encontro, con-versa e escolha desses fotógrafos e suas obras, Su-perfícies busca dar destaque a novas produções que muitas vezes se encontram invisíveis em meio a grande quantidade de imagens em circulação.

Pode mergulhar em Superfícies. Boa leitura!

Page 7: Revista superficies primavera

7

Editorial

PROCESSOS jornalista Bernardo Carneiro, que faz uma relação en-tre a geração de lixos digitais fotográficos e a pulsão sexual, a partir da proposta do pensador Antonio Quinet. Em “Negativo”, é a vez de Superfícies mostrar de forma prática, como a fotografia pode se valer dela mesmo e de outras tecnologias para question-ar os seus próprios processos [ou a ausência deles]. Na editoria “Memórias”, a revista repensa os tempos de fotografia analógica a partir da história de um lambe-lambe de Belo Horizonte relata-da por uma de suas netas. Rodrigo Campanella coroa a edição com um texto sobre os mecanis-mos de censura à cidade e um registro fotográfi-co que revelam as dinâmicas deste fenômeno. Além das matérias, os leitores vão encon-trar ao longo da revista oito ensaios fotográficos selecionados para compor a primeira edição. A partir de um intenso processo de encontro, con-versa e escolha desses fotógrafos e suas obras, Su-perfícies busca dar destaque a novas produções que muitas vezes se encontram invisíveis em meio a grande quantidade de imagens em circulação.

Pode mergulhar em Superfícies. Boa leitura!

Page 8: Revista superficies primavera

Avesso

A obra de arte no meio urbano é de livre acesso e estimula infinitas leituras e experimen-

tações estéticas em pessoas de diferentes cama-das sociais e faixas etárias. Interessa-me promover

um engajamento maior da arte com o meio so-cial de maneira que possa transformar o cotidi-ano dos indivíduos, gerando questionamentos e reações acerca dos problemas e conflitos que

compartilhamos no mundo moderno.

No trabalho Copa dos Invisíveis, de maio de 2012 essas questões que me estimulam se fazem pre-

sentes. No trabalho procuro colocar em evidência, moradores da cidade de Belo Horizonte, que de

alguma forma foram vítimas dos processos de gentrificação e limpeza social gerada pelas de-

mandas da Copa do Mundo 2014. Trabalhadores informais, moradores de rua, prostitutas, habi-

tantes de favelas e aglomerados, todos eles seres humanos que tiveram seus direitos violados.

Muitos perderam seus lares, espaços de trabalho e sua dignidade.

COPA dos

8

Page 9: Revista superficies primavera

Este projeto surge nas ruas na forma de uma contra propaganda à instituição FIFA. A fotografia e seu desdobramento se fazem fundamentais no processo de criação e construção do trabalho. Em um primeiro momento, convido esses cidadãos atingidos a posarem para uma fotografia. Na pose, erguem como campeões uma réplica da taça Fifa, taça que é entregue ao país vencedor do torneio. Mas ao invés do orgulho da vitória, os moradores ao erguerem a taça Fifa mostram sua indignação, revolta e tristeza diante da situação que se encontram.

Em um segundo momento, na instância digital, recorto os moradores das fotografias e amplio as suas imagens em impressões de tamanho real. Em seguida recoloco essas imagens nas ruas, e os cidadãos voltam a habitar os espaços dos quais foram expulsos, retornando em muros, viadutos, paredes de casas derrubadas, lugares antes fre-quentados por eles. Ao reabitar o meio urbano ao lado da taça Fifa, esses cidadãos de papel eviden-ciam quem realmente perde e quem ganha com a Copa do Mundo.

9

Page 10: Revista superficies primavera

10

Page 11: Revista superficies primavera

11

Page 12: Revista superficies primavera

12

Page 13: Revista superficies primavera

13

Page 14: Revista superficies primavera

14

Page 15: Revista superficies primavera

15

Pierre Souza é artista plástico e residente do Programa Bolsa Pampulha, em Belo Horizonte (MG).

*

Page 16: Revista superficies primavera

Ensaios

16

Page 17: Revista superficies primavera

17

maputo“Fotografar é a coisa que mais gosto de fazer, desde criança. Na época, minha mãe dizia que eu arrumei ‘um hobby muito caro’, por causa da compra de filmes e revelação”. Pelo menos este problema de Melissa foi resolvido com a invenção dos dispositivos digitais. A descoberta de programas de edição de imagens tam-bém trouxe mais alegria pra vida dessa mineira residen-te em Maputo, Moçambique. A jovem, que tem gosto por experimentações cromáticas, aplicação de filtros e fusões de imagens, nunca fez um curso na área, mas já coleciona fotografias de lugares por onde andou, como Portugal, África do Sul, Japão e China.

Em Maputo, onde vive há um ano e nove meses com o marido, Melissa revela neste ensaio as entranhas de um local em crescimento, que ganha pouco a pouco cara de cidade grande. Apesar dos arranha-céus em construção e da aparência de progresso, faltam serviços básicos à população, como transporte público com mínima qualidade e oferta regular de água e luz para as periferias da cidade. O paradoxo é logo ali.

4

Page 18: Revista superficies primavera

18

Page 19: Revista superficies primavera

19

MAPUTO

Page 20: Revista superficies primavera

20

PRÉDIOS

Page 21: Revista superficies primavera

21

PRÉDIOS

JANELAS

Page 22: Revista superficies primavera

22

Page 23: Revista superficies primavera

23

Page 24: Revista superficies primavera

24

FEIRA

MAPUT

Page 25: Revista superficies primavera

25

Page 26: Revista superficies primavera

26ISUZU

Page 27: Revista superficies primavera

27ISUZU

Page 28: Revista superficies primavera

28

TRAVESSIAEm plena efervescência digital, Isadora tinha olhos para

os processos analógicos. A jovem estudante do curso de Ciências Sociais da Universidade de Brasília, gosta

de imaginar cada foto tirada depois do filme terminado. Passa tempo memorando o momento congelado e re-

construindo cada detalhe até o momento da revelação. Belo Horizonte encantou Isadora e fez com que seu

olhar artesanal se voltasse para o movimento das ruas e para a intensidade de sua rotina.

A série Travessia foi feita em plena Praça Sete, centro da capital mineira, e ganha esse nome pelo fato de Isadora

ter priorizado as dinâmicas de corpos e olhares que se desdobram nos cruzamentos de sinais. “Quis registrar

o que pra mim representa muito da vida moderna, das cidades, o corre-corre do cotidiano, o anonimato dos

espaços públicos, a falta de interesse das pessoas pelas pessoas que cruzam seus caminhos, uma sobrecarga de

estímulos, visuais, sonoros, de várias naturezas. Pensei em tudo isso enquanto tirava as fotos”, comenta.

por Isadora Cardoso

4

Page 29: Revista superficies primavera

29TRAVESSIA 1

Page 30: Revista superficies primavera

30

TRAVESSIA 2

Page 31: Revista superficies primavera

31

TRAVESSIA 2

TRAVESSIA 3

Page 32: Revista superficies primavera

32

TRAVESSIA 4

Page 33: Revista superficies primavera

33

Page 34: Revista superficies primavera

34 TRAVESSIA 5

Page 35: Revista superficies primavera

35 TRAVESSIA 5

Page 36: Revista superficies primavera

36

Page 37: Revista superficies primavera

37

TRAVESSIA 6

Page 38: Revista superficies primavera

38

temporada de compras

Gestos e comportamentos que se manifestam no es-paço urbano são o ponto de partida dos trabalhos de

Wenderson Fernandes, que tem se lançado em pro-duções independentes e autorais. Para o fotógrafo de Belo Horizonte, a expressão do conceito, da ideia, im-

porta mais do que a fotografia em si, e é esse processo de investigação e busca que lhe permite perceber os

fenômenos ao seu redor. Em seu trabalho Temporada de Compras, Wenderson registra um fenômeno comum

entre a população de rua das grandes cidades: a troca de carroças manufaturadas por carrinhos de compra.

Nas palavras do próprio autor, “essa atitude acaba por subverter ícones do capitalismo, ao deslocar um objeto

tão marcante, e ao mesmo tempo provoca um estra-nhamento quando os vemos cheios de embalagens

vazias, caixas e outros vestígios da nossa sede por con-sumir”. Nesse sentido, Wenderson consegue trazer à

tona um fenômeno ambíguo, em que aqueles que se encontram em situação de exclusão pela ausência do poder de compra, se apropriam e subvertem um dos

maiores símbolos do consumo.

por Wenderson Fernandes

4

Page 39: Revista superficies primavera

39

TEMPORADA DE COMPRAS 6

Page 40: Revista superficies primavera
Page 41: Revista superficies primavera
Page 42: Revista superficies primavera

42

TEMPORADA DE COMPRAS 8

TEMPORADA DE COMPRAS 4

Page 43: Revista superficies primavera

43

TEMPORADA DE COMPRAS 7

Page 44: Revista superficies primavera

44

Page 45: Revista superficies primavera

45

TEMPORADA DE COMPRAS 5

Page 46: Revista superficies primavera

46

TEMPORADA DE COMPRAS 11

Page 47: Revista superficies primavera

47

Page 48: Revista superficies primavera

48

DAY DREAMERSNo chão de uma sala, sobre a mesa de trabalho, em cima de uma bicicleta ou em praças públicas. O fo-

tógrafo francês Eric Leleu, hoje fixado em Xangai, descobriu por meio das lentes de sua câmera um

fenômeno social que revelam aspectos de uma China contemporânea: o ato de dormir durante o dia. Depois

de fotografar cochilos em Xanghai, Pequim, Guangzhou e Hong Kong durante quatro anos, ele concluiu que as noções de espaço público e privado no oriente se mis-

turam radicalmente. As ruas se tornam uma extensão das casas e a privacidade é compartilhada sem temor.

Saltam nas imagens os corpos tombados, rendidos ao sono, que se equilibram nos objetos e na própria com-

posição do frame, garantindo o momento solene de descanso durante o dia. O peso do sono revelam ainda aspectos sobre o modo de vida vivenciado nas grandes

cidades daquele país, onde a cidadãos se engajam em uma extensa jornada de trabalho, capaz de exaurir as forças e o tempo. O registro sociológico e fotográfico

deve virar livro em breve.

por Eric Leleu

4

Page 49: Revista superficies primavera

49

por Eric Leleu

DAY DREAMER 1

Page 50: Revista superficies primavera

50

Page 51: Revista superficies primavera

51

DAY DREAMER 8

Page 52: Revista superficies primavera

52

Page 53: Revista superficies primavera

53

DAY DREAMER 13

Page 54: Revista superficies primavera

54

DAY DREAMER 2

Page 55: Revista superficies primavera

55

Page 56: Revista superficies primavera

56

Page 57: Revista superficies primavera

57

DAY DREAMER 22

Page 58: Revista superficies primavera

DO LIXO DIGITAL FOTOGRÁFICOou DA PULSÃO IMAGÉTICA/SEXUAL

Satisfação constante e ausência de satisfação é o paradoxo da pulsão, formulado pelo psiquiatra e psicanalista Antonio Quinet, que inspira elocubrações pseudopsicanalíticas a respeito do recente fenôme-no social da produção do lixo fotográfico digital. A ânsia pelo registro de imagens digitais talvez seja fruto de uma ne-cessidade de ser visto, de marcar uma existência, de tornar-se indivíduo. O sujeito cartesiano morreu, existir nos dias atuais não significa pensar, basta ser visto. Toneladas de gigabytes com rostinhos adesivos, típicos de fotos de colunas sociais, são a marca registrada do lixo digital fotográfico, para o qual não se encontra comprador, nem entre os mais especializa-dos. Assinalar a existência por meio de imagens e representações sem-pre esteve presente na História, seja em pinturas rupestres, em peles de animais, em papiros, em paredes, em esculturas, em grandes rochas, em telas e fotografias. A pulsão imagética levou o homem a aprimorar sua capacidade de expressão e hoje clica-se freneticamente. É tão fácil, bara-to e acessível. A libido está para a pulsão sexual assim como a necessidade de ser alguém está para a pulsão imagética. A pulsão sexual leva, de um modo geral, à produção de fluidos e a pulsão imagética gera o lixo digital.

Pix

Bernardo Carneiro*

58

Page 59: Revista superficies primavera

ou DA PULSÃO IMAGÉTICA/SEXUAL Bernardo Carneiro*

Simples assim, basta deletar, ou talvez não. Desejos sempre satisfeitos e nunca satisfeitos é o paradoxo que nos mantém vivos. Gozo total sig-nificaria a morte (QUINET), logo é mais seguro não atingir o gozo pleno. Cada vez mais os rostos serão fotografados e as paisagens continuarão sendo coad-juvantes, apenas para mostrar a capacidade financeira de chegar a lugares paradisíacos, da moda, chiques, intelectualóides, aventureiros, despojados ou seja lá o que possa representar algum lugar qualquer. Mes-mo a negação das categorias citadas também é uma espécie de afirmação de status: “não sou e não vou em nenhum destes lugares das fotos, o meu mundo é diferente”. Outra parafilia recente da pulsão imagética con-siste em fotografar pratos solicitados em restaurantes ou bares. Marca-se presença com a comida, seja pela excentricidade, pelo suposto preço, beleza, sabor requintado ou coragem de comer algo bem esquisito. Quando voltarmos a fotografar parentes e amigos mortos, hábito em alguns países nos primeiros anos da fotografia, será necessário muito mais do que psi-canálise para tentar entender tal prática. Provavelmente as fotos sejam usadas para iden-tificação no além, e para saber como era o morto em suas últimas horas na terra. Aquele que chamar estas futuras imagens de lixo digital correrá o risco de ser enquadrado em crime hediondo.

*Jornalista e fotógrafo, 48 anos, carioca, naturalizado mineiro, casado e pai do Guilherme (8 anos), ex-profissional de hotelaria, ex-guia de turismo, ex-professor de História, ex-pesquisador em projeto de História Oral com bolsa da FAPERJ, ex-protético espe-cializado em Ortodontia, quase aluno da Escola Nacional de Circo e quase monge beneditino.

59

Page 60: Revista superficies primavera

Negativo

poéticas do acaso

60

O tempo, a luz e uma câmera arte-sanal são os insumos de trabalho de Dirceu Maués, fotógrafo, artista e paraense, que trocou a câmera industrial e o trabalho como fotojornalista para se lançar no universo da duração. Dirceu fabrica suas próprias “pin holes” e a cada novo trabalho é surpreendido pelos experimentos for-jados por próprias mãos. Com pequenas câmeras feitas de madeira, Dirceu de-safia a lógica de produção de imagens no tempo contemporâneo, convidando seu público a uma reflexão sobre os pro-cessos relacionados ao ato fotográfico. Entre suas produções, des-taque para a imersão realizada no tradicional mercado de Belém, o Ver-o-peso. Após um ano de pesquisas e experimentos fotográficos no local,

Page 61: Revista superficies primavera

61

Dirceu se lançou em uma tentativa de mixar tecnologias: animou as imagens colocandos-as em sequência, numa tomada de 360 graus. Para isso, o artis-ta se valeu de 45 câmeras pin hole, dois amigos e 4 horas de fotografias tiradas. Outros trabalhos, como “Do so-nho que eu não acordei” e “Em um lugar qualquer - Outeiros” continuam a revelar o rompimento de Dirceu com o tratado de uma imagem perfeita. O fotógrafo as-sume sua busca por uma estética marcada por vazamentos de luz, pela presença de grãos, por ruídos inesperados, pelo pre-cariedade. Em sua poética do acaso, Dir-ceu não nega a tecnologia, mas se apro-pria dela para revelar uma imagem viva, artesanal e humana, e delatar o movimen-to impensado de produção de imagens.

as fotos foram tiradas durante oficinas de pin hole realizadas por Dirceu

Page 62: Revista superficies primavera

Memória

Em um típico almoço de domingo começam as histórias:“Eu e o Primo trabalhávamos com o papai no parque de lambe-lambe. Não era essa moleza o que esses dois pegaram não!”. Contava em meio a gargalhadas meu pai, segundo mais velho dos quatro filhos homens do meu avô Severino, sem contar o Primo, que no fim das contas era mesmo um irmão. “Não importava o quanto chovesse, tinha que ir fazer foto no parque. E se aparecesse algum cliente? Aí eu segurava o teto da barraca do lambe-lambe de um lado e a água que acumulava em cima, caía no Primo que não segurava direito lá do outro lado!”. E a família toda ria.“E ainda tinha que cortar a chapa de uma for-ma que o sujeito meio torto, parecesse endi-reitado, pra mandar pra moça que só namora-va trocando cartas”, contava o Primo. “E se ele tinha olho preto, mas escrevia pra outra que tinha olho azul da cor do céu? Tinha que co- lorir o retrato do jeito que ele queria! Naquela época não tinha filme colorido. Seu avô nos ensinou a colocar o papel celofane na água pra soltar a tinta. A gente ia com o pincel pra

Severino no parque municipal, em Belo Horizonte (MG). As imagens

foram cedidas pela família.

62

*Sarah é jornalista e neta de Severino

Page 63: Revista superficies primavera

colorir do jeito que o cliente pedia. Se o dia estava feio, a gente coloria o céu de azul, se a dona estava com um vestido vermelho, a gente coloria, se o menino estava segurando um carrinho amarelo, mas preferia um verde, a gente coloria também”.Em meio a tantas histórias repetidas ao longo dos anos, meu avô ficava sentado na cadeira de sempre, apenas rindo de tudo aquilo que meus tios contavam e vendo a cara de curio-sos dos netos. Pensando agora, imagino que ele deveria mesmo era pensar: “mas esses meninos são muito exagerados. Se tivessem passado metade dos perrengues que pas-sei...”.Depois que ele faleceu, perguntei para a minha avó onde é que “Seu Severino” tinha aprendido a fotografar. Ela respondeu mais ou menos assim: “Ah minha filha, pelo que sei, apareceu uma máquina de tirar retrato lá no Congo (PB) e ninguém conseguia entender como funcionava. Até que seu avô, curioso como ele só, resolveu que ia aprender a usar a máquina. E aprendeu mesmo!”

63

**

Page 64: Revista superficies primavera

Ensaios

64

Page 65: Revista superficies primavera

65

equadorMaria Portaluppi é natural de Quito, Equador, e hoje reside em São Paulo, onde estuda Pós Graduação em Fotografia. Além das experiências em produtoras de publicidade e TV, Maria também se dedica a projetos autorais, de cunho documental e conceitual. A penum-bra é tema constante de suas imagens.

A forma como a fotógrafa se relaciona com a ausência de luz denotam aspectos próprios de sua estética, que hora põe à mostra, hora esconde em meio às dinâmicas dos espaços. Os detalhes e as texturas captadas mes-mo em ambientes pouco iluminados fazem parte das cenas curiosas, quase cinematográficas reveladas por Maria. Jogos de luz e sombra quase calculados, se reve-lam naturais, espontâneos. E é nesta ambiguidade que sua fotografia se posiciona, revelando seu percurso por um Equador que só pode ser conhecido a partir de sua escuridão.

por Maria Portaluppi

4

Page 66: Revista superficies primavera

66

Page 67: Revista superficies primavera

67

CADEATE. EQUADOR

Page 68: Revista superficies primavera

68

CUENCA. EQUADOR

Page 69: Revista superficies primavera

69

Page 70: Revista superficies primavera

70

Page 71: Revista superficies primavera

71

EL CAJAS. EQUADOR

Page 72: Revista superficies primavera

72

LIMONES. EQUADOR

Page 73: Revista superficies primavera

73

Page 74: Revista superficies primavera

74

Page 75: Revista superficies primavera

75

QUITO. EQUADOR

Page 76: Revista superficies primavera

76

Músicana pele

Transformar notas musicais em fotografias. Essa foi a ideia de Luiz Rodrigues, logo quando voltou da In-

glaterra e se fixou em Londrina, no Paraná. Enquanto olhava para a própria tatuagem, um trecho da música

“Let it be”, dos Beatles, surgiu a ideia do ensaio que ganhou grande repercussão na rede. Luiz entregava

às pessoas canetas para que escrevessem em alguma parte do corpo, versos de suas letras preferidas e logo

em seguida fotograva.

O que era para ser um álbum de 20 fotos, virou uma fanpage com mais de 3 milhões de visualizações, 7 mil

curtidas e mais de 800 fotos. Tudo foi feito sem finan-ciamento algum. Com o retorno positivo, Luiz resolveu

publicar um livro com as imagens . Mas mais do que uma boa repercussão, Luiz carrega com ele as histórias

e a conexão que estabeleceu com várias pessoas graças a este projeto.

por Luiz Rodrigues

4 MÚSICA: PAPAGAIO

DO FUTURO, DE ALCEU VALENÇA

Page 77: Revista superficies primavera

77

MÚSICA: PAPAGAIO

DO FUTURO, DE ALCEU VALENÇA

Page 78: Revista superficies primavera

78

Page 79: Revista superficies primavera

79

MÚSICA: A VIDA É DOCE,DE LOBÃO

Page 80: Revista superficies primavera

80

MÚSICA: SPEED OF SOUND, DE COLDPLAY

Page 81: Revista superficies primavera

81

Page 82: Revista superficies primavera

82

MÚSICA: DANIEL NA COVA DOS LEÕES , DE RENATO RUSSO

Page 83: Revista superficies primavera

83

Page 84: Revista superficies primavera

84

Page 85: Revista superficies primavera

85

MÚSICA: NINGUÉM = NINGUÉM,DE HUMBERTO GESSINGER

Page 86: Revista superficies primavera

86

surrealPor 20 anos, o polonês Dariusz Klimczak, morador de

uma vila próxima ao mar Báltico, fotografou a realidade. Mas há dez anos, ele se cansou do ofício e iniciou seu

trabalho com fotomontagens. Apesar de suas imagens serem constantemente associadas à um mundo sem

regras, Darius prefere criar imagens surrealistas que ex-pressem aspectos de proximidade com o mundo real.

Por isso, o fotógrafo busca representar as proporções, a direção da luz e a sombras sem distorções.

Através de suas imagens, Dariusz quer contar história, criar mundos imaginários a partir da sensibilidade,

da intuição e do subconsciente. Problemas pessoais, experiências, música, leituras, relacionamentos com

as pessoas, detalhes arquitetônicos são elementos que estimulam o processo criativo do artista. Nota-se

a influência da pintura no uso das cores e na textura assumida pelos elementos gráficos que compõe seu trabalho, que chega a ser definido por ele, como um

tributo à história da arte.

por Dariusz Klimczak

4

Page 87: Revista superficies primavera

87

por Dariusz Klimczak

HERBALIFE

Page 88: Revista superficies primavera

88

Page 89: Revista superficies primavera

89

LAND OF BUTTONS

Page 90: Revista superficies primavera

90

SZCZOTECZKI

Page 91: Revista superficies primavera

91

Page 92: Revista superficies primavera

92

Page 93: Revista superficies primavera

93

NON IRON

Page 94: Revista superficies primavera

94

EX-FOTOO trabalho de Rafael Carneiro, “Ex-fotos” começa em uma sala de um hospital público de Belo Horizon-te, onde há 70 anos morreu o beato Padre Eustáquio conhecido em todo o Brasil. O espaço é mantido in-tacto e recebe até hoje visitas de pessoas de diversos lugares que expressam seu testemunho público de fé e gratidão, conhecidos como ex-votos, através da cola-gem de retratos 3x4 em uma das paredes do pequeno quarto. “As imagens encontram-se em uma disposição errática e fortuita, formando um mosaico de íncrivel significação antropológica e poética”, comenta o autor da obra.

No espaço em que se encontram, as fotos são então acrescidas de um novo sentido, superando a condição de simples ferramentas de comunicação visual ao se tornarem ex-votos fotográficos, permeadas por um pro-cesso de ressignificações e pela passagem do tempo. “Imagens de pessoas desconhecidas, feitas por fotógra-fos diversos, interagem entre si, com o ambiente e com os que ali circulam. O tempo torna-se o grande agente modificador desses retratos. As imagens envelhecem e mofam, lentamente se esvaem, ganhando materiali-dade, deixando de ser fotos”, define Rafael.

por Rafael Carneiro

4

Page 95: Revista superficies primavera

95EX-FOTO 1

Page 96: Revista superficies primavera

96EX-FOTO 2

Page 97: Revista superficies primavera

97EX-FOTO 3

Page 98: Revista superficies primavera

98

EX-FOTO 4

Page 99: Revista superficies primavera

99

EX-FOTO 6

Page 100: Revista superficies primavera

100EX-FOTO 7

Page 101: Revista superficies primavera

101EX-FOTO 8

Page 102: Revista superficies primavera

retalhospúblicos

espelhospartidos

por Rodrigo Campanella*102

Page 103: Revista superficies primavera

por Rodrigo Campanella*103

Superfícies

Com a câmera nas mãos, uma pou-co discreta Hasselblad analógica e elétri-ca, fotografo a fachada de um edifício de várias torres em Vitória. O porteiro se aproxima e pergunta se tenho permissão para fazer as fotos. Explico que fotografo os novos prédios da cidade e que não tenho intenção de entrar, registro apenas a fachada. Ele retruca – “Acho que isso que você está fazendo é proibido”. En-quanto isso, duas câmeras sobre a porta envidraçada do edifício vigiam a rua, todas as horas do dia, enviando ima-gens para um monitor na guarita. Sem qualquer questionamento. Com a câmera nas mãos, uma pou-co discreta Hasselblad analógica e elétri-ca, fotografo a fachada de um edifício de várias torres em Vitória. O porteiro se aproxima e pergunta se tenho permissão para fazer as fotos. Explico que fotografo os novos prédios da cidade e que não tenho intenção de entrar, registro apenas a fachada. Ele retruca – “Acho que isso que você está fazendo é proibido”. En-quanto isso, duas câmeras sobre a porta envidraçada do edifício vigiam a rua, todas as horas do dia, enviando ima-gens para um monitor na guarita. Sem qualquer questionamento.

Page 104: Revista superficies primavera

104

Nas últimas décadas do século XX, no Brasil contemporâneo, o discur-so da segurança, seduzindo através do medo, substitui a ideia de que a riqueza de uma cidade é diretamente proporcional à sua liberdade e var-iedade. Ainda assim, o eco da inse-gurança apenas multiplica sua força. A militarização das fachadas amplia o desejo e a sensação de carência por mais segurança, algo notável em Goiânia(GO) e Vitória(ES), as capitais retratadas dentro do projeto “cidades censuradas”. As imagens buscam fragmentos dessa cisão entre o es-paço público e o espaço privado, que resulta no impedimento do olhar nas cidades atuais. São recortes dessa linha de fronteira, que se deixam le-var entre o registro documental e um exercício de composição abstrata.

Page 105: Revista superficies primavera

105

* Rodrigo Campanella é mestrando em comunicação social pela UFMG e realiza projetos na área de fotografia urbana.

Page 106: Revista superficies primavera

106

Únicas

retrato

Page 107: Revista superficies primavera

107

Page 108: Revista superficies primavera

108

Renata ARA jornada é o destino2013Índia

Page 109: Revista superficies primavera

109

Page 110: Revista superficies primavera

110

Page 111: Revista superficies primavera

111

Lysandra CoulesTorn emotion2012Canadá

Page 112: Revista superficies primavera

112

Robim MartinsBelo Horizonte

Brasil

Page 113: Revista superficies primavera

113

Page 114: Revista superficies primavera

114

coletivo travessãoConectar moradores de bair-ros distantes através da arte. Com este objetivo, o Cole-tivo Travessão atua desde 2010 em centros culturais e coletivos da capital minei-ra. Por meio de oficinas que misturam artes gráficas e plásticas, intervenção urbana e poesia, os participantes dão vida a ideias e conceitos que passam a circular nas trasei-ras dos ónibus e estabelecer conexões entre comunidades.

revistatangerine

Em junho deste ano, o Nú-cleo de Design e Fotografia da UEMG lançou uma pu- blicação digital que aborda a fotografia como objeto do design e afirma suas inter-

faces com a arte. Tangerine é uma revista colaborativa

e tem como foco o compar- tilhamento de projetos ex-

perimentais produzidos por alunos e artistas. Acesse o

blog e saiba como enviar seu trabalho para Tangerine.

Page 115: Revista superficies primavera

115

Varal

Compartilhar a poesia que ocupa as cidades e estam-pam o concreto. Essa é a proposta do coletivo que procura dar visibilidade a frases, ilustrações e inter-venções que se expressam nos muros. O projeto é cola- borativo, e funciona como um banco vivo de imagens atu-alizadas pelos olhares aten-tos e dispostos a registrar os muros ocupados.

geografias imaginárias

Desvendar a Amazónia a partir de uma expedição

cinematogáfica. Essa é a ideia do projeto Geografias Imaginárias, que perpassa

diversos territórios do Norte do país, recolhendo histórias,

depoimentos e imagens. Pelo Facebook do projeto, é

possível acompanhar a expe-dição, apreciar as imagens e conhecer a realidade cultural

da região.

olhe os muros

Page 116: Revista superficies primavera

116

EXPEDIENTE

Revista elaborada pelas alunas do curso de comunicação/publicidade e propaganda da UFMG, Andrea Souza e Patrí-cia Ester Mendonça, orientadas pelo professor Bruno Guimarães Martins.

Projeto gráfico: Andrea Souza e Patrícia Ester Mendonça

Colaboradores: Pierre SouzaBernardo CarneiroSarah DutraRodrigo Campanella

Fotógrafos escolhidos desta edição:Darius KlimczakEric LeleuMaria PortaluppiIsadora CardosoLuiz RodriguesMelissa AmorimRafael CarneiroWenderson Fernandes

Agradecimentos:À Elias Santos Aos fotógrafos e todos as pessoas que nos enviaram seus trabalhos, mas que não foram selecionados para esta edição.