revista sesctv - junho de 2012

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1 junho/2012 - edição 63 sesctv.org.br CINEMA CICLO TRAZ A VIDA DOS CATADORES DE RESÍDUOS RECICLÁVEIS MÚSICA ARTHUR VEROCAI RETOMA DISCO EXPERIMENTAL DE 1972 INSTRUMENTAL O ROCK DO GRUPO CAMARONES ORQUESTRA GUITARRÍSTICA FOTO: MARCOS PRADO

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Em entrevista, a museóloga Fernanda Coelho comenta a importância do processo de arquivamento das obras audiovisuais. A jornalista Maria Zulmira de Souza escreve, no artigo, sobre televisão, sustentabilidade e inclusão.

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junho/2012 - edição 63sesctv.org.br

CinemaCiClo traz a vida dos Catadores de

resíduos reCiCláveis

músiCaarthur veroCai retoma disCo

experimental de 1972

instrumentalo roCk do grupo

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em julho

@sesctvyoutube.com/sesctv

Direção: Silvio Tendler

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destaques da programação 4

entrevista - Fernanda Coelho 8

artigo - Maria Zulmira de Souza 10

Aquecimento global, derretimento das geleiras dos polos, desastres climáticos, ameaça de falta d’água potável no mundo são assuntos cada vez mais presentes na pauta das discussões sobre o meio ambiente. Esse debate já tem alterado a rotina das pessoas e ampliado a consciência para ações concretas, desde as mais individuais até as que repercutem nas esferas sociais e governamentais.

No campo audiovisual, o assunto também inspira documentários e produções de ficção. Neste mês, o SESCTV apresenta o ciclo de cinema Inclusão e Sustentabilidade, com filmes de curta, média e longa duração que abordam o tema. Com foco na rotina dos catadores de materiais recicláveis e dos moradores de rua, o ciclo traz a pluralidade de olhares de cineastas e produtores em torno da relação do homem com o meio ambiente, com enfoque nos grandes centros urbanos. A cada filme, revelam-se histórias e personagens, sensibilizando e humanizando o telespectador para as mais diversas dimensões e recortes dessa temática. Dentre os filmes presentes no ciclo estão os documentários Boca do Lixo, de Eduardo Coutinho, e Estamira, de Marcos Prado.

A faixa musical apresenta, neste mês, espetáculo inédito com o arranjador e maestro Arthur Verocai. Sob a regência de Verocai, banda e orquestra interpretam repertório do disco de 1972, que mistura referências do jazz, da bossa nova e da música erudita. O Instrumental Sesc Brasil também exibe programas inéditos todas as segundas, às 22h, com destaque para o Camarones Orquestra Guitarrística, grupo do Rio Grande do Norte que apresenta composições próprias de rock instrumental.

A Revista do SESCTV deste mês traz entrevista com a museóloga Fernanda Coelho, integrante da equipe de preservação do acervo audiovisual da Cinemateca Brasileira. O artigo da jornalista e consultora de meio ambiente Maria Zulmira de Souza aborda a relação entre a TV e a pauta da sustentabilidade. Boa leitura!

Danilo Santos de MirandaDiretor Regional do SESC São Paulo

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FOTO DA CAPA: Filme Estamina,

direção de Marcos Prado

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MUSICAL

Experimentalismo revisitado

MuSiCAl

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Em 1972, Arthur Verocai, já conhecido dos músicos brasileiros por seu trabalho como compositor e arranjador, decide gravar seu primeiro álbum solo e homônimo. Reúne composições próprias, ricas em referências do jazz, da bossa nova e da música erudita, e lança um álbum experimental. A repercussão desse projeto é pequena e o próprio músico trata de encostá-lo. “Eu tinha bronca do disco; ele ficou meio esquecido na minha cabeça”, lembra Verocai.

Três décadas depois, o disco é redescoberto por rappers e DJs norte-americanos, que passam a recriar o trabalho do brasileiro. Uma gravadora da Califórnia entrou em contato comigo, pelo site, para relançar o disco. Ele foi lançado em vinil, o que me deu certa divulgação lá”, conta. Dessa vez, a repercussão é imediata: em 2009, o disco recebe um concerto em Los Angeles, no qual Verocai dirige uma orquestra de 30 músicos para uma plateia lotada.

Percebendo o potencial da retomada deste trabalho, Verocai apresenta-se também em concertos no Brasil, e chama a atenção de um público jovem. “Convidei músicos que participaram do primeiro disco: o Robertinho (da Silva, percussionista); o Nivaldo (Ornellas, saxofonista); a Célia (cantora); o Luiz Alves (baixista)”. Também foram convidados, além de seu filho Ricardo Verocai, que toca piano elétrico, outros antigos parceiros de Verocai, como as cantoras Clarisse Grova e Jurema Gonçalves de Cândia.

Ao grupo, juntou-se ainda uma orquestra de cordas e sopros. “É impressionante que, trinta e tantos anos depois, haja esse resgate para relançar o disco, diz o

percussionista Robertinho Silva. “É muito gratificante ver o que está acontecendo agora, é como se fosse uma pintura. Uma coisa, quando é bem feita, ultrapassa o tempo. O bom é ver o público jovem se interessando pelo trabalho dele, especialmente os DJs”, diz o saxofonista Nivaldo Ornellas.

Neste mês, o SESCTV exibe o concerto gravado no Sesc Pinheiros, capital paulista, sob a regência de Arthur Verocai. No espetáculo, banda e orquestra interpretam músicas compostas por ele, em versões instrumentais e cantadas, como: Sylvia; Dedicado a Ela; Pelas Sombras; e Na Boca do Sol, sucesso dentre os DJs nos Estados Unidos. Verocai assume o microfone para cantar Caboclo. Danilo Caymmi faz participação especial com voz e flauta na música Okê Arô, composta em parceria com Verocai. A direção para televisão é de Camila Miranda.

arthur veroCai retoma projeto de 1972 e apresenta espetáCulo Com influênCias do jazz, da Bossa nova e da músiCa erudita

arthur verocaiDia 16/06, às 21hHorários alternativos: 17/06, às 20h; 22/06, às 23h; 25/06, às 14h; 30/06, às 19h

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CINEMA

Vidas recicladas

Foto

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Nos grandes centros urbanos como São Paulo, em que a coleta seletiva ainda não ultrapassa 1,5% do total do lixo produzido, adquire relevância o trabalho dos chamados catadores, muito embora fiquem eles fora das estatísticas oficiais. Profissionais autônomos, os catadores recolhem papel, papelão, alumínio, ferro e tantos outros resíduos recicláveis, dessa forma contribuindo para a limpeza da cidade. Muitas vezes, sua motivação perpassa a questão financeira e a falta de perspectivas no mercado formal: encontram ali a oportunidade de garantir seu sustento. “Os pobres fazem reciclagem sem saber, muitas vezes, que estão prestando um serviço”, afirma o catador Claudinei Alvarenga, que aprendeu com o pai a reconhecer, dentre tudo o que é descartado, o que ainda tem valor de mercado. Ele é a personagem central do documentário Efeito Reciclagem, filme inédito que o SESCTV exibe neste mês, como parte do ciclo de cinema Inclusão e Sustentabilidade. Com filmes de ficção e documentários – de curta, média e longa duração –, a programação também inclui o premiado Estamira, com direção de Marcos Prado, que apresenta a história de uma mulher portadora de distúrbios mentais, vítima da violência doméstica, e que vive há mais de 20 anos num aterro sanitário no Jardim Gamacho, no Rio de Janeiro. O longa recebeu, dentre outras premiações, o Grande Prêmio de Cinema de Direitos Humanos de Nuremberg 2005.

O ciclo apresenta o universo dos catadores de materiais recicláveis e de moradores de rua, em abordagens que aproximam o telespectador dessas personagens, através de suas histórias, seus relatos e suas experiências. Exibido na primeira semana de junho, quando se celebra o Dia Mundial do Meio Ambiente, a programação propõe um enfoque humano do tema, sensibilizando o olhar para esses atores sociais, e tirando-os do ciclo de invisibilidade e exclusão a que estão submetidos.

Também serão exibidos os filmes Boca do Lixo (1992; 48’), de Eduardo Coutinho, que acompanha pessoas em busca de objetos e comida num ponto de escoamento de lixo em São Gonçalo (RJ); À Margem do Lixo (2008; 84’) e À Margem da Imagem (2003; 72’), ambos de Evaldo Mocarzel, sobre a rotina de catadores de materiais recicláveis em São Paulo. A apresentação do ciclo é feita pela socióloga Elizabeth Grimberg. Confira programação completa no quadro.

CiClo de Cinema reúne filmes de fiCção e doCumentários soBre o Cotidiano dos Catadores

CiNEMA

inclusão e sustentabilidade(Ciclo de Cinema)De 05/06 a 09/06, às 23h

vidas no lixo Dir.: Alexandre StocklerBoca do lixo Dir.: Eduardo CoutinhoDia 05/06

as Coisas que moram nas Coisas Dir.: Bel Bechara e Sandro SerpaÀ margem do lixo Dir.: Evaldo MocarzelDia 06/06

gigante de papelão Dir.: Bárbara TavaresÀ margem da imagem Dir.: Evaldo MocarzelDia 07/06

estamira Dir.: Marcos PradoDia 08/06

efeito reciclagem Dir.: Sean WalshDia 09/06

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A voz das guitarrasINStrUMENtAL

Guitarras, baixo, bateria e teclado. A clássica formação das bandas de rock ganha novos contornos na primeira década do milênio. Jovens músicos brasileiros têm assumido outras referências em seus trabalhos e testado a criação de grupos sem vocalistas. “São uma novidade da nossa cena musical as bandas de rock instrumental. Algo que não havia quando o rock estourou no Brasil, nos anos 1980, e também não apareceu na década de 1990, mas tem vindo com bastante força neste começo de milênio”, analisa o jornalista José Flávio Júnior.

É o caso da Camarones Orquestra Guitarrística, banda formada em 2009 por músicos potiguares. O nome é uma referência à cidade de Natal, onde nasceram e se conheceram. “Lá, o potiguar é o ‘comedor de camarão’. Botamos o nome Camarones para homenagear a cidade”, afirma o tecladista e compositor Anderson Foca. Ele conta que a banda começou a ser formatada em 2008, então para um projeto pontual. “A gente tem um estúdio e está sempre tratando com vários músicos da cidade. Começou a tocar temas de desenho animado, de filmes, essas coisas que estão no inconsciente popular de todo o mundo”, diz.

O projeto amadureceu e o grupo decidiu continuar, mantendo a convicção da ausência de vocais. “A ideia de uma orquestra guitarrística é que a gente queria fazer uma banda instrumental pop que tivesse a melodia da voz, só que feita pelas guitarras”, explica

instrumental sesC Brasil

a baixista Ana Morena. Além do rock, principal referência no trabalho da banda, também é possível identificar a influência do reggae e do ska. “A gente já viajou muito o Brasil inteiro e tem contato com várias bandas, que acabam nos influenciando mesmo”, ressalta Ana.

Para Anderson Foca, essa mistura é bem-vinda no trabalho do grupo. “A gente não tem muito apego com estilos de música. A própria música instrumental já dá a liberdade de fazer o que quiser. O cara que gosta de música instrumental espera que você faça isso. Ele não quer algo convencional ou igual o tempo todo”, acredita.

O SESCTV exibe, neste mês, espetáculo com a banda Camarones Orquestra Guitarrística no Instrumental Sesc Brasil, dia 18/06, às 22h. Além de Ana Morena, no baixo, e Anderson Foca, no teclado, o grupo conta com Leo Martínez e Karina Monteiro, nas guitarras, e com Artur Porpino, na bateria. Também neste mês serão exibidos programas inéditos com Jaime Alem, dia 04/06; Alexandre Gismonti, dia 11/06; e Marcos Frederico, dia 25/06.

Direção artística para TV: Max Alvim.

Camarones orquestra guitarrístiCa propõe roCk no qual as guitarras assumem o papel dos voCais

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Segundas feiras, às 22h

jaime alemDia 04/06

alexandre gismontiDia 11/06

Camarones orquestra guitarrísticaDia 18/06

marcos fredericoDia 27/06

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alumiaDireção: Andrea Ferraz e Carol VergolinoDia 16/06, às 19h

doCumentário

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DoCUMENtárIo

Luzes do sertão

Município de Custódia, sertão pernambucano, 340 quilômetros de Recife. No sítio São Francisco, vinte famílias constroem sua vida, tendo em comum a falta d’água, o trabalho cotidiano no campo e a ausência de energia elétrica – dificuldades enfrentadas com coragem e otimismo, e realidade que não trocam pela rotina da cidade grande.

Pautados pela luz natural, eles falam de seus sonhos. Não desejam a riqueza, mas rezam para preservar a saúde e cumprir, assim, as tarefas diárias: cultivar pequenas plantações, criar animais e queimar lenha para fabricar carvão. Temem a Deus, embora reconheçam serem pouco frequentes suas visitas à igreja. Alheias aos benefícios e aos problemas dos grandes centros urbanos, essas pessoas mostram outras formas de interpretar conceitos como riqueza, felicidade ou casamento. Casam-se cedo e têm muitos filhos – seis, dez, catorze, embora nem todos cheguem à fase adulta. Medo da morte? Não há como temer o inevitável, mas se puderem adiá-la...

Em 2006, as cineastas Andrea Ferraz e Carol Vergulho visitaram o sítio São Francisco, onde registraram o depoimento de alguns de seus moradores e fizeram um retrato da vida no local, apresentado no documentário Alumia, que o SESCTV exibe neste mês.

As imagens do filme foram captadas sem recursos artificiais de iluminação, aproveitando-se somente a luz do sol, da lua e dos candeeiros usados por eles

ao cair da noite. Eles abrem sua casa, contam sua história e filosofam a respeito do amor, da solidão, do fim do mundo e da vida depois da morte. E do que fariam com a chegada da energia elétrica, fato concretizado apenas seis meses após as filmagens. O poeta João Cabral de Melo Neto, citado na abertura do documentário, resume: “Não há falhas que ver / muito menos o que tombar: / há apenas essa gente / e minha simpatia calada”.

doCumentário alumia retrata a vida no sítio são franCisCo, no sertão de pernamBuCo

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ENtrEvIStA

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Vida longa à obra audiovisual

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“do ponto de vista da informação, a maior ameaça no mundo digital

é a oBsolesCênCia teCnológiCa”

Como se define um material de acervo audiovisual e como nasce a ideia de cinemateca? Hoje o termo que se usa é audiovisual, porque os suportes se diversificaram: há filmes, vídeos, documentos digitais, internet. Mas antes, o termo usado para esse acervo era cinemateca ou filmoteca, porque a natureza era a película. Qualquer obra audiovisual organizada de determinada maneira, e possível de se reproduzir, é um documento audiovisual e, portanto, pode estar num arquivo. Os arquivos audiovisuais têm histórico diferente dos museus. Várias cinematecas do mundo nasceram dos clubes de cinema, porque compreendiam esse acervo como uma forma de arte e não apenas como entretenimento. Na passagem do cinema mudo para o sonoro, os clubes de cinema começam a ir atrás dos filmes mudos e percebem que muitos já haviam desaparecido. Esses grupos tomam consciência da perda que o cinema já estava sofrendo. Surgem as cinematecas e o pensamento de arquivo, como uma fonte histórica. Hoje, sabe-se que houve no mundo uma perda de 80% do acervo de cinema mudo; e no Brasil, de 92%.

Quais critérios são usados na escolha do material a ser arquivado? A princípio, não há seleção, você aceita tudo, porque você já começa tardiamente esse processo. Aceita-se tudo, porque é memória audiovisual e vai para um acervo audiovisual. Apenas com o surgimento da televisão, e especialmente após a década de 1950, com o videotape, é que se passa a trabalhar com a ideia de seleção, porque a produção de TV é diária e, portanto, muito volumosa. Hoje, por exemplo, já não se guardam sobras de filmes de ficção, o que vale é a obra finalizada. A discussão de seleção é mais recente.

Que fatores podem interferir na preservação do acervo audiovisual? Há duas camadas num acervo audiovisual: a física e a informação. Na física, falamos de dar longevidade ao suporte, o que envolve a maneira de manipular. A questão mais importante para ter sucesso nessa missão é climatizar a área de guarda. Do ponto de vista da informação, a maior ameaça no mundo digital é a obsolescência tecnológica. Em três anos, substitui-se o software. Em cinco, a mídia. Ou seja,

Fernanda Coelho é museóloga, especializada em arquivos

audiovisuais. Desde 1979, integra a equipe de preservação

do acervo da Cinemateca Brasileira. É graduada em

Cinema pela FAAP e pesquisadora da experiência brasileira

na conservação de acervos audiovisuais.

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em dez anos você perde aquele arquivo, porque já não tem mais o programa ou a player para acessá-lo. Então, a conservação física pode até ser garantida, mas o arquivo se perde por conta dos avanços tecnológicos.

Por ser um País de clima tropical, o Brasil tem desafios ainda maiores na conservação de acervos? O Brasil e todos os países de clima quente e úmido têm um problema extra para resolver. Nossa média anual de umidade relativa é de 70%. O fungo não se desenvolve com umidade inferior a 60%. Sabemos que nada é eterno. Todas as atitudes da equipe de preservação são para alongar essa obra e dar tempo para duplicá-la. Quando você não climatiza esse material, otimiza a velocidade de reação dos processos degenerativos. Se estamos num país cujo clima não é favorável e contamos com poucos recursos, é preciso ganhar tempo para a duplicação. Duplicando, eu estou salvando esse arquivo. Mas o processo de duplicação também implica uma perda natural pela migração de mídias. Por isso, quem trabalha com preservação sabe que não deve eliminar os originais, a menos que estejam em condições que ponham em risco o restante do acervo. O tempo é o maior teste. Então, é preciso ter cuidado. Não sou contra o mundo digital, mas cada objeto tem sua especificidade e é preciso compreender bem e tomar as atitudes corretas para preservar a longo prazo. Isso também ocorreu quando passamos do preto e branco para o colorido ou do cinema mudo para o sonoro.

A preocupação com preservação está presente entre os realizadores de obras audiovisuais? Essa preocupação é crescente, mas ainda é uma batalha junto aos produtores para que entendam que estamos na mesma cadeia. Uma obra preservada é ponto de partida para outras obras. Alguns cineastas, como o Cacá Diegues ou o Hector Babenco, sempre se preocuparam em deixar obras em arquivos. Os curta-metragistas também costumam levar suas obras para arquivos. Mas, de modo geral, não é uma relação tranquila, porque o pensamento de preservação a longo prazo conflita com interesses mais urgentes que estão presentes no lançamento de uma obra, como a distribuição. Uma master para arquivamento pode custar mais do que três cópias de fitas para distribuição. Com o orçamento enxuto do cinema brasileiro, se o produtor não se preocupou com a questão logo no início do processo, pode não contar com verba para essa finalidade. Mas sinto que nos últimos anos essa consciência também é crescente e que ficou, com o advento da tecnologia digital, ainda mais evidente.

Do ponto de vista histórico e social, existe uma consciência de preservação de acervos audiovisuais como um patrimônio cultural? Não, mas isso também está mudando. E quando os produtores mudam, isso provoca uma mudança no público também, porque eles são formadores de opinião. Antes, era mais comum recebermos pessoas com arquivos audiovisuais da família para entregar à Cinemateca Brasileira (que passa a ser depositária), quase numa postura de se livrar dess e material. Hoje, a pessoa já entende esse acervo como um documento histórico com valor. E, no fundo, acho que esse comportamento reflete uma mudança do próprio Brasil com relação à sua memória e sua história.

Como se dá a relação entre preservação e o acesso ao acervo por pesquisadores, realizadores de audiovisual e a população em geral? Os pesquisadores, particularmente, reclamam da dificuldade de acesso. Entendo a reclamação deles, porque de fato muito material não está acessível. Mas arquivar não é só guardar e dar acesso. É preciso preservar, impedir que aquilo sofra danos. É uma responsabilidade que vai além. O processo de guardar, documentar, catalogar é complexo. Implica em indexar, colocar na base de dados, formar pessoas – porque não existe curso próprio para formar profissionais para preservação de audiovisual –, criar processos dentro do arquivo. Só depois de feito tudo isso é que você consegue dar acesso ao acervo. Além de ser um processo grande, é caro. E dar acesso, hoje, significa digitalizar o acervo, porque você não vai disponibilizar numa mídia que o pesquisador não consiga manipular. Não temos a situação ideal. Penso que o maior desafio dos arquivos de países como o nosso é o que fazer até conquistar esse ideal, qual passo dar agora, dentro das condições que se têm.

“uma master para arquivamento pode Custar mais do que três Cópias de

fitas para distriBuição. (...) se o produtor não se preoCupou Com

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verBa para essa finalidade”

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ArtIgo

tv, INCLUSão E SUStENtAbILIDADE O som marcante da vinheta anunciava: “Está no ar o Repórter Eco”. Era dia 10 de fevereiro de 1992 e o primeiro telejornal de meio ambiente da TV brasileira começava às oito horas, não da manhã, mas da noite. Parecia um sonho: um programa ambiental diário no horário nobre da TV Cultura. E a realidade – não diária, mas semanal – continua no ar até hoje nas tardes de domingo. Um exemplar raro no meio televisivo e uma conquista, não só para quem trabalha com a temática, mas para o público em geral. Muitos profissionais foram influenciados na escolha de sua carreira pelo programa, que acompanha a evolução do reconhecimento da importância da área no Brasil e no mundo. É apenas uma mostra, na imensidão de possibilidades que a televisão oferece. No universo da internet, então, esse cenário se amplia ainda mais. Nesses 20 anos, a sociedade passou a conviver cada vez mais no seu dia a dia com os reflexos do modelo de desenvolvimento que adotamos. A busca de práticas mais sustentáveis, por força do mercado e/ou da gravidade da saúde do planeta, fez com que as pautas ligadas à sustentabilidade frequentassem cada vez mais as telas das tevês: em programas de apelo popular, em tramas de novelas, em merchandising, nos programas de domingo, em reportagens esporádicas etc. Como consequência, quase todo o mundo já ouviu falar em sustentabilidade, mas poucos entendem realmente o que quer dizer, como pode ser usada na prática e o poder transformador de um conceito que mostra que tudo está interligado na teia da vida. Se a temática saiu um pouco das caixinhas, as abordagens variam de profundidade e qualidade. Num mesmo canal, um mesmo assunto recebe tratamentos absolutamente opostos: no telejornal, o elefante brinca e diverte os visitantes; e no programa ambiental, o animal está estressado pelos visitantes e pelas condições do cativeiro. Ainda há uma resistência das emissoras em entrar de cabeça no assunto, visto como complexo e “chato” para atrair audiência. Traduzir sustentabilidade para a linguagem televisiva nem sempre é uma tarefa fácil. Requer pessoas especializadas, mas que sabem que até a mais difícil equação matemática – quando tem relação com a vida real – pode transformar-se numa história fascinante a ser contada.

um nicho escondido

É geralmente no horário em que queremos ficar na cama que entram os programas que aprofundam o tema nas tevês abertas. Isso porque as emissoras de tevê ainda veem a sustentabilidade como um assunto à parte dos seus negócios. Se assim não fosse, teríamos cenários com materiais mais sustentáveis, programas de todas as editoras neutralizando as suas emissões entre outras tantas iniciativas possíveis no campo socioambiental. Com a sustentabilidade vista dessa forma, caímos nos jargões técnicos do tripé: econômico, social e ambiental. Deixamos de lado todo o potencial de ela ser inclusiva, mobilizadora e divertida. Sim, divertida! Outro dia fui entrevistar o físico e pensador Fritoj Capra para um novo projeto de programa de tevê, Sustentabilidade no Divã, que tem justamente a missão de tratar do assunto com bom humor. Capra influencia intelectuais e empresários com as suas pregações e práticas do pensamento sistêmico. Queria saber dele se o humor poderia aproximar as pessoas da sustentabilidade. Ele disse que sim, e falamos sobre a única passagem do seu famoso livro O Tao da Física, que trata do poder que uma piada tem para “iluminar” uma pessoa: “no segundo em que você entende uma piada, você experiencia um momento de iluminação”. A fala de Capra pode indicar uma direção para tornar a sustentabilidade mais palatável. O humor está em alta. Tem o poder de derreter barreiras, de tocar as pessoas. Depois de duas décadas de conscientização e informação do público sobre a gravidade da situação planetária e da necessidade de mudar comportamentos, talvez seja a hora de a sustentabilidade perder um pouco a sisudez da teoria e cair nas graças das práticas de bom humor. Nada mais sustentável, não?!

Maria Zulmira de Souza é jornalista, idealizadora do programa Repórter Eco, da TV Cultura. Foi idealizadora e diretora geral do Sustentáculos (TV Brasil) e editorialista do Ecoprático (TV Cultura). É diretora da Planetária Soluções Sustentáveis, especializada em conteúdos socioambientais, e editora de conteúdo do Globo Ecologia. Conselheira do Imaflora e Planeta Sustentável. E sonha em fazer o primeiro festival de humor (in)sustentável.

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o Cinema de Charlone

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prêmio aquisição sesCtv

O SESCTV exibe, neste mês, dois curtas-metragens que receberam o Prêmio Aquisição SESCTV na edição de 2011 do Festival Internacional de Curtas-metragens de São Paulo. O filme Onde você vai?, direção de Victor Fisch, apresenta a história de Elias e Sonia, um casal de idosos que vive preso à rotina pautada pelo relógio da sala. Dia 15/06, às 24h, . Em Ivan, a diretora Brigitte Sachs Kindi mostra o cotidiano do jovem Ivan de Souza, que complementa a renda familiar pedindo dinheiro nas ruas de São Paulo. Dia 24/06, às 20h, .

na Batida do samBa

O cotidiano das escolas de samba é tema do episódio inédito O Choro da Cuíca, da série Temporal. O programa mostra a força do samba para reunir diferentes gerações, e revela como os mais jovens se inspiram no trabalho dos mais antigos integrantes das escolas, da chamada Velha Guarda. O episódio vai até o berço das escolas Nenê de Vila Matilde, Vai-Vai e Águia de Ouro, em São Paulo. Direção de Kiko Goifman e Olívia Brenga. Dia 15/06, às 22h.

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viagem ao passado

Aos 80 anos de idade, Maria Tereza Palomares, moradora de São José dos Campos, no interior paulista, decide voltar para sua terra natal, na região de Granada (Espanha), em busca de seus familiares. A saga é acompanhada e registrada pelo documentarista Adilson Ruiz, no filme A Espanha de Maria, que o SESCTV exibe neste mês. Dia 15/06, às 23h.

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Eumir Deodato no

Dia 30/7, às 22h