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1 REVISTA DE MANGUINHOS | DEZEMBRO DE 2010

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ntre as mudanças significativas que o Brasil experimentará nos pró-ximos anos, a transformação do perfil demográfico da populaçãobrasileira figura, de fato, como um dos grandes desafios para ocampo da saúde pública. Deverão ocorrer mudanças significativasno quadro de morbimortalidade, com a configuração de uma situ-

ação epidemiológica com a sobreposição de doenças crônico-degerenativas einfecciosas, além de problemas decorrentes de causa externas. Por isso, a pro-posição de políticas públicas para essas questões torna-se um imperativo.

Entre as prioridades da agenda da Presidência da Fiocruz, podemos ci-tar a parceria com o governo do Estado do Rio de Janeiro na elaboração deuma proposta para o futuro Centro de Estudos sobre o Envelhecimento. OCentro atuará na atenção especializada aos idosos naquilo que se refere àorganização da assistência e à promoção da saúde para esta faixa etária,assim como em pesquisas e implantação de protocolos clínicos neste campo.Por indicação do Ministério da Saúde, a Fiocruz também coordenará a elabo-ração da proposta de um futuro Instituto Nacional de Neurociências, tema, damesma forma, amplamente associado à população idosa.

Esta edição da Revista de Manguinhos traz como principal destaquealgumas das pesquisas e frentes de ação da Fiocruz no segmento da saúde doidoso. Dos estudos sobre os agravos degenerativos da saúde associados aoenvelhecimento e combinados com a ocorrência de doenças infecciosas, pas-sando por programas de assistência a idosos e pelas ofertas de ensino, aFundação acumula boas experiências para compartilhar.

Compartilhar, por sinal, talvez seja um dos verbos que melhor traduz aforma de relacionamento da nossa instituição com os movimentos sociais ecomo este trabalho contribui para reafirmarmos o compromisso com umasociedade menos desigual. É o que destaca a reportagem sobre o trabalhoque a Escola Politécnica desenvolve junto a diferentes segmentos de traba-lhadores e movimentos sociais de base popular.

A combinação de ação social, sustentabilidade e ciência também é amarca do projeto do Campus da Mata Atlântica, onde numa área de 5 mi-lhões de metros quadrados na Zona Oeste da cidade do Rio do Janeiro come-çamos a implantar um modelo de ocupação que prioriza a preservação, aproteção e a recuperação de patrimônios ambientais e culturais, visando con-solidar um território saudável e sustentável. Convido-os a conhecer um dosmais novos campi da Fiocruz e seu projeto inovador de ocupação e utilização.

A seguir, confiram também algumas das mais recentes contribuições daFiocruz: um novo medicamento contra a malária; estudos sobre os efeitos dosagrotóxicos; pesquisa sobre as percepções públicas a respeito das drogas;jogos como forma divertida para falar sobre assuntos sérios como a Aids; ecomo a Fundação está desenvolvendo uma grande pesquisa sobre a saúde dobrasileiro, fundamental para as ações de governo.

Boa leitura.

Paulo Gadelha

Presidente da Fundação Oswaldo Cruz

EDITORIAL

E

Corredor do Castelo Mourisco

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Institucional18

Bioinformática

Saúde da criança16

6 Notas

10 Toxicologia

Pesquisadores discutemefeitos dos agrotóxicos

Computadorescomo aliadosControle da esquistossomoseconta com novas ferramentas

8

A vez daMata AtlânticaNovo campus combinahistória, ciência, ação sociale sustentabilidade

Desde o berçoLeitura na UTI neonatalauxilia desenvolvimento infantil

ÍNDICE

13 Comportamento

Pesquisa avalia conhecimentossobre as drogas

14 Divulgação científica

Jogos como Zig-Zaids eCélula Adentro sãodiversão garantida

PresidentePaulo Ernani Gadelha Vieira

Vice-presidente de Ambiente,Atenção e Promoção da SaúdeValcler Rangel Fernandes

Vice-presidente deGestão e DesenvolvimentoInstitucionalPedro Ribeiro Barbosa

Vice-presidente de Ensino,Informação e ComunicaçãoMaria do Carmo Leal

Vice-presidente de Pesquisa eLaboratórios de ReferênciaClaude Pirmez

Vice-presidente de Produçãoe Inovação em SaúdeCarlos Augusto Grabois Gadelha

Chefe de GabineteFernando Carvalho

Coordenadoria de ComunicaçãoSocial/Presidência

REVISTA DE MANGUINHOSNº 22 - DEZEMBRO/2010

Coordenação: Wagner de Oliveira

Edição: Fernanda Marques eWagner de Oliveira

Redação e reportagem: FernandaMarques, Mariana Sá, Marina Bittencourt,Pamela Lang, Renata Moehlecke, RicardoValverde e Wagner de Oliveira

Colaboradores: Alexandre Matos,Cristiane Albuquerque, Cristiane D’Avila,Elisa Batalha, Fabíola Tavares, FilipeLeonel, Igor Cruz, Irene Kalil, JamersonCosta, João Paulo Soldati, Marcelo Neves,Marina Schneider, Miriam Ribas, RenataFontoura e Talita Rodrigues

Projeto gráfico e edição de arte:Guto Mesquita, Rita Alcantarae Rodrigo Carvalho

Fotografia: Peter Ilicciev e Arquivo CCS

Administração: Diego Oliveira

Secretaria: Inês Campos

Auxiliar administrativo: Daniel Lima

Autorizada a reprodução de conteúdosdesde que citada a fonte.

O que você achou desta edição da Revista deManguinhos? Mande seus comentários para:

Av. Brasil, 4.365 - Manguinhos -Rio de Janeiro - RJ - CEP: 21045-900

www.fiocruz.br/ccsemail: [email protected]: 55 (21) 2270-5343

Impressão: Premier

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Sociedade

Capa

Vida e obrade HermannSchatzmayrEm 2010, o Brasil perdeu umde seus maiores virologistas

Fio da história40

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Mais um passoNovo medicamentocontra malária temmenos efeitos colaterais

Medicamentos23

PirâmideinvertidaCrescimento da proporçãode idosos no país coloca novosdesafios à saúde pública

15 Ensino

Livros reforçam a formaçãode técnicos de laboratório

22 Pesquisa

Ministério da Saúde e IBGEfarão raio X da saúde dosbrasileiros

Lado a ladoFiocruz está emconstante diálogo comos movimentos sociais

36 Experimentação animal

Fiocruz investe na ciência dobem-estar dos animais emcativeiro

38 Resenhas

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CAPA:Arte de Guto Mesquitasobre foto de KirkSmith (www.sxc.hu)D

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NOTAS

Comunicação,democracia e cidadania

Políticas de comunicação, democra-cia e cidadania são os assuntos de umsuplemento temático lançado pela Re-vista Eletrônica de Comunicação, In-formação & Inovação em Saúde(Reciis) da Fiocruz. A ideia de lançaruma edição sobre políticas de comuni-cação nasceu no seminário preparató-rio da 1ª Conferência Nacional deComunicação, promovido pelo Institutode Comunicação e Informação Científi-ca e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz)em agosto de 2009. O suplemento – quereúne artigos originais e de revisão, en-saios e resenhas – pode ser acessadoem www.reciis.icict.fiocruz.br.

Colaboração paradoenças negligenciadas

A GlaxoSmithKline (GSK) e a Fio-cruz anunciaram um acordo de coo-peração para pesquisar e desenvolvermedicamentos inovadores para o tra-tamento de enfermidades que afetampessoas que vivem nos países maispobres do mundo, as chamadas doen-ças negligenciadas. Com a assinaturado acordo, que envolve a unidade daGSK em Tres Cantos, na Espanha, aFundação ampliará a parceria quemantém com a empresa. Inicialmen-te, a colaboração focará em doençade Chagas e leishmanioses, pela ex-periência que a Fiocruz tem nessasáreas e a necessidade de novas inter-venções contra essas moléstias. O Cen-tro de Desenvolvimento Tecnológicoem Saúde (CDTS/Fiocruz) será o pon-to focal do acordo, mas outras unida-des da Fundação também serãoincluídas na parceria.

A vez da nanotecnologia

Detectar a variação e a distribui-ção genética das espécies do gêneroLeishmania no Brasil, para gerar infor-mações necessárias no rastreamento,na identificação e na vigilância da do-ença, foi o objetivo do trabalho apre-sentado pelo Laboratório de Pesquisasem Leishmanioses do Instituto OswaldoCruz (IOC/Fiocruz) em evento científi-co recente na Holanda. O estudo ana-lisou a sequência de DNA de quatrogenes a partir de 97 isolados deLeishmania de oito espécies dosubgênero L. (Viannia) de diversas re-giões do Brasil e também de outrospaíses das Américas.”Nosso trabalho

A Fiocruz realizou em novem-bro o 7º Seminário Internacional deNanotecnologia, Sociedade e MeioAmbiente. Ao longo de três dias,os cerca de 300 participantes discu-tiram os avanços da nanomedicina,os desafios da nanotoxicologia e dananorregulação, bem como os re-quisitos para a formação de recur-sos humanos na área. Físicos,químicos, biólogos, médicos, enge-nheiros, sociólogos e especialistasdos mais variados campos do conhe-cimento apresentaram seus traba-lhos e diferentes pontos de vista, em

debates voltados à construção danecessária interdisciplinaridade emnanotecnologia. Espaço de diálogosdemocráticos, o evento abordou be-nefícios e riscos dos nanomateriais;colocou lado a lado pesquisadoresdas ciências naturais e humanas; edeu voz a representantes da indús-tria e entidades sindicais. O objetivoera popularizar um tema que, em-bora ainda pareça muito restrito àacademia, diz respeito a todos - es-tima-se que já existam no mercadocerca de mil produtos de consumocom componentes nanotecnológicos.

busca contribuir para a compreensãodo padrão de distribuição da diversi-dade genética do parasita no territóriobrasileiro, numa dimensão ecológicae geográfica”, afirma Mariana CôrtesBoité, que desenvolve a pesquisa comoseu projeto de doutorado no Progra-ma de Pós-Graduação em BiologiaCelular e Molecular do IOC. “Os resul-tados do projeto, somados a dadosecoepidemiológicos, permitirão buscarcorrelações entre genótipos e regiõesespecíficas”, explica. Os dados poderãoser associados ao desenvolvimento clí-nico da doença, contribuindo para o aper-feiçoamento das medidas de controle.

Mapa da diversidade genética de Leishmania

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A partir de agora, a Bibliotecade Saúde Pública do Instituto de Co-municação e Informação Científicae Tecnológica em Saúde (Icict/Fio-cruz) disponibiliza a todos os usuá-rios com deficiência visual oucegueira completa um conjunto deequipamentos que facilitam o aces-

O presidente Luiz Inácio Lula daSilva e o ministro da Saúde, José Go-mes Temporão, visitaram as instalaçõesda futura fábrica de antirretrovirais queo governo brasileiro está doando aogoverno de Moçambique, a partir deacordo de cooperação estratégica en-tre os dois países, firmado em2008. Pela Fiocruz estive-ram presentes o presiden-te Paulo Gadelha, avice-presidente de En-sino, Informação e Co-municação, Maria doCarmo Leal, e o diretordo Instituto de Tecno-logia em Fármacos(Farmanguinhos), HayneFelipe da Silva - a unida-de da Fundação é responsá-vel pela implantação da fábrica emMoçambique. O governo de Moçam-bique ficou encarregado de realizar asobras de restauração do local escolhi-do para montar a fábrica. Quando asinstalações estiverem prontas, o Minis-tério da Saúde brasileiro, por meio deFarmanguinhos/Fiocruz, enviará todos

Acessibilidade para leitores especiaisso à informação em saúde. Dentroda biblioteca, os usuários encontra-rão uma impressora em braile, umampliador de imagem e tela, e umleitor de texto digital. Esta é a pri-meira biblioteca especializada doRio de Janeiro a adquirir este tipode equipamento.

Fiocruz lança sitedo Centro Colaboradorda Opas/OMS

A Vice-Presidência de Ambi-ente, Atenção e Promoção da Saú-de da Fiocruz lançou o site doCentro Colaborador em SaúdePública e Ambiental da Organiza-ção Pan-Americana da Saúde daOrganização Mundial da Saúde(Opas/OMS). A Fundação foi de-signada Centro Colaborador no iní-cio de 2010, após um processo desete anos de negociações com aOMS. Por meio do Centro, a Fio-cruz compartilha com outros paí-ses e regiões do mundo suaexperiência em diagnóstico, inter-venção, formação e educação emquestões do meio ambiente rela-cionadas à saúde pública. O sitewww.fiocruz.br/omsambiental traznotícias sobre a atuação da Funda-ção como Centro Colaborador e so-bre o trabalho em rede dos centroscolaboradores da OMS no Brasil eno mundo. A Fiocruz é uma das ins-tituições com mais centros colabo-radores no mundo. Além de seragora, como um todo, um Centroem Saúde Pública e Ambiental, trêsoutros centros já atuam em áreasespecíficas - o Laboratório de Refe-rência Nacional para Leptospirosedo Instituto Oswaldo Cruz (IOC), oCentro Colaborador para Educaçãode Técnicos em Saúde da EscolaPolitécnica de Saúde JoaquimVenâncio (EPSJV) e o Núcleo de As-sistência Farmacêutica da EscolaNacional de Saúde Pública (Ensp).

os equipamentos que comporão o la-boratório. Durante a visita, as autori-dades viram em funcionamento umaemblistadeira – máquina que molda eembala comprimidos. Ela foi cedida porFarmanguinhos/Fiocruz para que se ini-cie a capacitação de profissionais no

manuseio desses equipamen-tos. “O mais importante

que vamos colocar aquinão são as máquinas.Vamos transferir umaplataforma tecnoló-gica que vai permitira Moçambique se li-vrar da dependênciano campo da produ-

ção de genéricos parao tratamento da Aids. É

uma nova maneira de coo-peração. Juntos, vamos construir

essa planta, estamos transferindo co-nhecimento. E isso tem um valor ines-timável”, afirmou o ministro Temporão.Moçambique está entre os dez paísesmais afetados pelo vírus HIV no mun-do, com um índice de prevalência de15% entre adultos.

O Brasil tem mais de mil sítios ar-queológicos conhecidos, localizados prin-cipalmente no litoral entre o Rio deJaneiro e Santa Catarina. Com o objetivode conhecer melhor e comparar os acha-dos, o Museu Nacional da UniversidadeFederal do Rio de Janeiro (UFRJ), em par-ceria com o grupo de paleopatologia epaleoparasitologia da Escola Nacional deSaúde Pública (Ensp/Fiocruz), está reali-

Fábrica de antirretrovirais em Moçambique

zando a pesquisa Sambaquis: médios,grandes e monumentais - Estudo sobreas dimensões dos sítios arqueológicos eseu significado social. Os sambaquis sãoconstruções de restos de conchas e ter-ras, principalmente para fazer enterrodos mortos. No Rio de Janeiro, são re-lativamente pequenos. No Sul, che-gam a 60 metros de altura por 400metros de extensão.

Sambaquis brasileiros

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Computadores contra a

Projetos interdisciplinaresdemonstram que abioinformática pode poupartempo e recursos nas pesquisasde novos medicamentos

esquistossomose

EJamerson Costa

m 2005, quando começou o doutorado, Rosân-gela Silqueira Hickson desafiava a si mesma. For-mada em engenharia mecânica, com mestradosem computação e em técnicas nucleares, apos-tava que conseguiria compreender temas especí-

ficos da biologia. Ela teria que fazer isso de alguma forma,porque só assim seria possível levar adiante a proposta sugeridapor seu orientador, o pesquisador da Fiocruz Minas GuilhermeOliveira. “Ele tinha uma linha de pesquisa em bioinformáticae achei interessante seguir este caminho”, explica. Assim sur-giu um projeto para novas drogas contra a esquistossomose. Aexpectativa é de que soluções para esta doença milenar pos-sam ser obtidas a partir de testes feitos em computador.

BIOINFORMÁTICA

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Causada por parasitos do gêneroSchistosoma, a doença é responsávelpor mais de 11 mil óbitos por ano nomundo, número que pode estar subes-timado, pois grande parte dos casosnão é notificada aos órgãos de saúde.Anualmente, cerca de 200 milhões depessoas são infectadas em pelo me-nos 75 países das regiões tropicais esubtropicais do planeta. Isso coloca aesquistossomose como a segundaparasitose que mais infecta o homem,atrás somente da malária. No Brasil, écausada pela espécie Schistosomamansoni e preocupa, especialmente,nas comunidades ribeirinhas do país.

O projeto trabalha, de um lado,com as proteínas do Schistosoma e, deoutro, com milhares de compostos quí-micos num banco de dados. Na verda-de, os pesquisadores não manipulamtubos de ensaio com os materiais bio-lógicos e químicos – eles operam comestruturas tridimensionais, virtuais, pro-duzidas por modelagem computacio-nal. Assim, a estrutura tridimensionalde cada proteína do parasito é contra-posta à estrutura tridimensional de cadacomposto do banco de dados. Oobjetivo é prever qual seria a atividadedos compostos sobre as proteínas, paraidentificar alvos suscetíveis no parasitoe novas drogas potenciais contra ele.

Inicialmente, com a participaçãoda Fiocruz Minas e da FaculdadeInfórium de Tecnologia de Belo Hori-zonte, os pesquisadores contavam compouco mais de 200 computadores paraa realização do trabalho. Se mantives-sem esta estrutura, o projeto demora-ria de cinco a dez anos para serconcluído. Entretanto, os cientistas jáplanejam que, no segundo semestrede 2011, o projeto esteja na fase fi-nal. Isso porque eles passaram a con-tar com a colaboração da multinacionalIBM, por meio do World CommunityGrid (WCG).

A principal contribuição do WCGvem de um software que permite, deforma simples, realocar milhares decomputadores ao redor do planetapara o desenvolvimento de estudos ci-entíficos. Qualquer pessoa no mundopode entrar no site do WCG, fazer odownload do programa e instalá-lo em

seu computador pessoal. A partir daí,sempre que a máquina estiver liga-da, sendo usada ou não, sua capaci-dade de processamento ociosa serácanalizada para a realização de pes-quisas. Isso resulta em economia detempo e recursos, já que a capacida-de de processamento é multiplicada,possibilitando a realização de traba-lhos abrangentes em genômica. “Otrabalho envolve, hoje, mais ou me-nos 300 mil computadores conveni-ados com a IBM, em todo o mundo,o que inclui muitas máquinas domés-ticas”, lembra Rosângela.

“O que consome a computação éa modelagem. É tentar encaixar a es-trutura computacional de um compos-to na estrutura computacional de umaproteína. E isso requer poder compu-tacional de primeira. Aí entra o WCG”,explica o chefe do Laboratório deParasitologia Celular e Molecular daFiocruz Minas e coordenador do Cen-tro de Excelência em Bioinformática,Guilherme Oliveira. “Não temos ne-nhum pressuposto sobre qual proteínaé um bom alvo e simplesmente testa-mos todas, de um banco de dados gi-gantesco. O que é muito mais baratodo que um trabalho experimental”.

As experiências em laboratóriosão igualmente importantes, mas oprojeto só entra na fase de bancadadepois que as proteínas e os compos-tos mais promissores forem identifi-cados pelas predições no computador.O método computacional possibilita,ainda, a descoberta de drogas contraoutras doenças. “A esquistossomosevira um modelo. Se o projeto der cer-to, a chance de funcionar com outroorganismo multicelular é maior. En-tão, estamos testando, de fato, uma

Conheça oWorld Community Grid:

www.worldcommunitygrid.org

nova abordagem, que pode ser útilpara novas espécies”, argumenta Oli-veira. A Fiocruz Minas participa deoutras duas atividades que visam de-senvolver novos medicamentos paraesquistossomose pela abordagem dabioinformática: o SETtReND, um con-sórcio internacional que inclui três ins-tituições brasileiras e seis europeias;e um projeto em parceria com a Uni-versidade da Califórnia em São Fran-cisco, nos Estados Unidos.

Projetos laboratoriais

Além dos três trabalhos em bioin-formática desenvolvidos pela FiocruzMinas, projetos continuam sendo rea-lizados no ambiente pioneiro para es-tudo da esquistossomose na unidade.“Atualmente, estamos testando umaassociação de drogas. Pegamos umadroga usada hoje no Brasil contra essaparasitose e associamos com outra dro-ga, clinicamente empregada para ou-tra finalidade. O intuito é verificar seacontece uma ação sinérgica”, contao vice-chefe do Laboratório de Esquis-tossomose da Fiocruz Minas, NaftaleKatz, autor de livros considerados re-ferências mundiais sobre o assunto. Aoserem associadas, as drogas podemaumentar sua capacidade de debelaro parasito. Por outro lado, tambémpode haver diminuição da atividade –um dado importante para pacientesque estejam tomando medicamentospara mais de uma doença.

Software permite realocarmilhares de computadorespara o desenvolvimento deestudos científicos

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TOXICOLOGIA

Impulso naeconomia,impactona saúde

Filipe Leonel

Brasil é hoje o maior con-sumidor de agrotóxicosdo mundo. Desde 2006,o país só ficava atrás dosEstados Unidos. Em 2008,

foi alçado ao primeiro lugar do ranking,após uma safra recorde de soja, milhoe algodão. Esse mercado de alimen-tos movimenta aproximadamente US$

Impulso naeconomia,impactona saúde

Importância crescentedo agronegócio revela anecessidade de ações devigilância e controle dosefeitos nocivos dos agrotóxicos

7 bilhões por ano e representa algoem torno de 42% a 45% de todas asexportações nacionais, segundo esti-mativas de pesquisadores da EscolaNacional de Saúde Pública (Ensp/Fio-cruz). Não surpreende, portanto, queexista uma tendência ao aumento douso de substâncias químicas no meiorural – mais de 1 bilhão de litros deagrotóxicos foram jogados nas lavou-ras em 2009. Esse cenário requer vigi-lância e controle, pois os agrotóxicostêm sido associados a prejuízos para asaúde humana e ambiental. Em ou-tras palavras, a importância que oagronegócio adquiriu na economia enas finanças do Brasil funciona tam-bém como um alerta para as institui-

ções de saúde sobre as consequênciase riscos da exposição aos agrotóxicos.

Entre as instituições que trabalhampara detectar e combater esses riscos,destaca-se o Centro de Estudos da Saú-de do Trabalhador e Ecologia Humana(Cesteh/Ensp), que desenvolve trabalhospara avaliar a exposição ocupacional eambiental aos agrotóxicos e os diferen-tes aspectos da contaminação por essassubstâncias. Segundo o pesquisadorWanderlei Antônio Pignati, doutor emsaúde pública pela Ensp e professor daUniversidade Federal de Mato Grosso(UFMT), os impactos são negativos parao trabalhador, que aplica diretamenteos produtos químicos; para sua família,que mora dentro das plantações, na pe-

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riferia da cidade; e também para o am-biente, por causa da contaminação daságuas dos rios e daquelas armazenadasem poços artesianos.

Os efeitos para a saúde humana po-dem ser divididos em dois grupos: agu-dos e crônicos. Os primeiros ocorremquando os indivíduos, em geral trabalha-dores, se expõem a uma concentraçãoalta de agrotóxicos em um curto espaçode tempo. As consequências mais co-muns são distúrbios nervosos e estoma-cais, tonteiras, desmaios, dores decabeça, enjoos e, em alguns casos, ata-ques cardíacos e falências pulmonares.

Por outro lado, existem os efeitoscrônicos, decorrentes de doses maisbaixas do agente químico, mas por um

longo período de tempo. Não há umepisódio de intoxicação tão grave, po-rém a substância vai se acumulandono organismo do indivíduo e seus efei-tos podem ser sentidos em cinco, dez,quinze ou mesmo trinta anos após aexposição. Nesses casos, os sintomasmais comuns são os cânceres e asdisfunções endócrinas – muitas vezesnão diretamente relacionados à expo-sição aos agrotóxicos, mas sim ao con-sumo de produtos contaminados.“Essa contaminação de populaçõesnão diretamente expostas ocorre prin-cipalmente pela alimentação. Atual-mente, dois tipos de organocloradosainda têm o uso permitido em lavou-ras, o endossulfan e o dicofol. Neste

ano, no entanto, a Anvisa colocou emconsulta pública a retirada do endos-sulfan”, afirma a pesquisadora doCesteh Paula Sarcinelli.

Entre os vários estudos realizadospelo Cesteh sobre o assunto, destaca-se uma pesquisa segundo a qual mu-lheres que trabalhavam na agriculturaapresentavam risco estatisticamentemaior de gerar filhos com peso abaixodo normal. Esse trabalho analisou osprontuários médicos de uma localida-de agrícola no interior do Estado doRio de Janeiro. Outras pesquisas maisrecentes abordam a legislação nacio-nal de água para consumo humano eas formas de contaminação dos agro-tóxicos. “Falamos de substâncias

Virgínia Damas/Ensp

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lipossolúveis, altamente persistentes noorganismo e no ambiente, e a exposi-ção tem sido associada, em diversosestudos, à diminuição do desempenhoreprodutivo e ao comprometimento dosistema imunológico, além de proble-mas endócrinos e câncer”, diz Paula.“Esses compostos ficam armazenadosno tecido adiposo e são transferidospara o bebê durante a amamentação”,acrescenta.

Uma breveretrospectiva

No Brasil, a década de 1950 marcao começo do uso de agrotóxicos em es-cala comercial para a agricultura. Nessaépoca, esses produtos eram emprega-dos para o controle de pragas, não ha-via grande quantidade de princípiosativos e menos de 10% dos agricultoresos utilizavam. Contudo, entre o final dadécada de 1960 e o início dos anos 1970,em razão do aumento na demanda daprodutividade agrícola e do desenvolvi-mento de escolas e cursos de agrono-mia, aconteceu a primeira grandeexpansão dos agrotóxicos no país. É oque explica o pesquisador CestehFrederico Peres da Costa. “Profissionaiseram estimulados a utilizar materiais quí-micos nas lavouras e a promover um au-mento no comércio dessas substâncias.Além disso, no decorrer da década de1970, políticas governamentais passa-ram a associar o crédito rural ao consu-mo de agrotóxicos”, conta.

Já na década de 1980, devido àmecanização dos processos produtivos

e ao fenômeno de urbanização, houvecerto arrefecimento da agricultura na-cional. “Nos anos 90, por conta de to-dos os problemas econômicos quevivemos, a agricultura manteve umabaixa. O Brasil, porém, exerceu umaliderança no crescimento da produçãoagrícola já no final dessa década, emfunção do ressurgimento das agênciasde pesquisa ligadas à agricultura. Issofoi concomitante ao aumento no uso dosagrotóxicos”, explica Peres. “De qual-quer forma, o marco para que o Brasilatingisse a posição de principal consu-midor desses produtos foi a autorizaçãodo plantio de soja transgênica no país,em 2004”, lembra o pesquisador.

Ações de saúde

Em 2007, o Ministério da Saúdecriou o Grupo de Trabalho para a Im-plantação do Plano Integrado de Açõesde Vigilância em Saúde Relacionadaa Riscos e Agravos Provocados porAgrotóxicos. Composto por pratica-mente todos os órgãos e secretariasdo Ministério e liderado, na Fiocruz,pelos pesquisadores Josino Moreira eFrederico Peres, o grupo propõe açõesque visam estabelecer diretrizes parapráticas de vigilância de riscos e agra-vos. Ele busca também promover me-didas preventivas e de controle do usode agrotóxicos, bem como contribuirpara a construção e efetivação de umsistema de vigilância integrado, quepermita ao SUS monitorar e controlarsituações de risco à saúde humana re-lacionadas aos agrotóxicos.

Um grupo de pesquisa da Ensp, co-ordenado por Frederico Peres, desen-volve um trabalho voltado às criançasde áreas agrícolas. Segundo o pesqui-sador, a grande maioria das escolasrurais do país tem aulas até o quintoano do ensino fundamental (a antigaquarta série). “A partir desse momen-to, a criança tem duas opções: ou con-segue transporte para ir até a cidade eterminar o estudo ou começa a ajudaros pais na lavoura. Nossa ideia, portan-to, foi criar materiais que pudessem ser

Além disso, a Agência Nacional deVigilância Sanitária (Anvisa) coordenao Sistema Nacional de VigilânciaToxicológica, que regulamenta, anali-sa, controla e fiscaliza produtos e servi-ços que envolvam risco à saúde. Ainstituição faz a avaliação toxicológicapara fins de registro dos agrotóxicos ea reavaliação de moléculas já registra-das; normatiza e elabora regulamen-tos técnicos e monografias sobre osingredientes ativos dos agrotóxicos; co-ordena o Programa de Análise de Resí-duos de Agrotóxicos nos Alimentos e aRede Nacional de Centros de Informa-ção Toxicológica; e promove ações decapacitação em toxicologia no SistemaNacional de Vigilância Sanitária.

Segundo Frederico Peres, quantomaior for o número de agentes quími-cos lançados no ambiente, maior seráa probabilidade não só das pragas cri-arem resistência a esses produtos, mastambém de substâncias cada vez maisfortes serem encontradas no mercado.“Minha esperança é que, associadosaos incentivos para as grandes cadei-as exportadoras agrícolas, haja estímu-los proporcionais de auxílio ao pequenoprodutor. Isso inclui programas de di-versificação de culturas e apoio às ini-ciativas agroecológicas, bem comoaumento nos fundos setoriais e nas ver-bas destinadas a pesquisas e ações desaúde para o enfretamento dos efei-tos nocivos dos agrotóxicos”, destacao pesquisador. “Tenho percebido que,mesmo de uma forma tímida, estamosavançando”.

apresentados nas escolas”, conta. Arevista em quadrinhos Descobrindo aagricultura com o jovem Neno, porexemplo, conta a história de um meni-no que aprende a ajudar o pai agricul-tor. Outro exemplo é a fotonovelaMenina veneno, sobre uma jovemagricultora que abusa dos agrotóxicose acaba intoxicada. Além disso, a pes-quisadora do Cesteh Rosane Curi de-senvolveu o Jogo dos Amigos do MeioAmbiente, que educa e diverte crian-ças e adolescentes tratando de temascomo meio ambiente, trabalho agríco-la, agrotóxicos e saúde humana.

Educar para prevenir

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Igor Cruz

valiar o conhecimento dapopulação de Curitiba(PR) sobre o uso de dro-gas foi o objetivo de umestudo realizado pelo pes-

quisador Francisco Inácio Bastos, do La-boratório de Informação em Saúde doInstituto de Comunicação e Informa-ção Científica e Tecnológica em Saú-de (LIS/Icict/Fiocruz). A pesquisa, queserá publicada na revista SocialNetworks, dos Estados Unidos, revelaque, quanto maiores são o estigma ea discriminação sobre uma determina-da droga, mais complicado é seu en-tendimento por parte da população.

O estudo, fruto de uma parceria en-tre pesquisadores da Fiocruz, da Uni-versidade Federal de Minas Gerais(UFMG), da Universidade de São Pau-lo (USP) e da Universidade de Prince-ton, nos Estados Unidos, é consideradoum ‘teste’ para o inquérito de âmbitonacional, previsto para 2011. A pesquisafoi encomendada pela Secretaria Na-cional de Políticas sobre Drogas (Senad)e avaliará o consumo de drogas, de ummodo geral, em todo o Brasil.

Para realizar o estudo, que contoucom a participação de 300 usuários dedrogas e mais de mil moradores deCuritiba, o grupo coordenado por Bas-tos utilizou duas metodologias: entre-vistas para estimação direta e indireta.As entrevistas para estimação diretaforam feitas com os próprios usuáriose abordaram os hábitos de uso. Já nasindiretas, os entrevistados respondiamsobre os hábitos e características deterceiros. Além disso, foi elaborado umjogo de tabuleiro para fomentar a par-ticipação dos usuários de drogas napesquisa. “Acreditamos que o mode-lo de questionário tende a cansar os

O que a população sabesobre uso de drogas?Quanto maior o estigma, menor o entendimento, mostra pesquisa realizada em Curitiba

entrevistados. Neste sentido, criamosum jogo para que os usuários partici-passem da pesquisa da melhor maneirapossível”, explica Bastos.

De acordo com o pesquisador, umdos dados mais interessantes da pes-quisa é que, ao participarem das en-trevistas, as pessoas tendem a omitiro uso de drogas quando as conside-ram mais problemáticas. “A maconha,por exemplo, por ser considerada umadroga mais branda, aparece com mui-to mais frequência em nossas estima-tivas de uso. Já o crack e a pasta basede cocaína não aparecem tão comu-mente. Daí a importância de fazer umestudo como este, pois queríamos, jus-tamente, saber como as pessoas per-cebem as drogas, tanto usuários comoa população em geral”, justifica.

COMPORTAMENTO

A

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DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA

P

João Paulo Soldati, CristianeAlbuquerque e Marina Schneider

ara ser divertida, todabrincadeira tem que tergraça. Os jogos Zig-Zaidse Célula Adentro, desen-volvidos pelo Instituto

Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), apostamnessa estratégia para ensinar assuntossérios. É ciência rimando com apren-der e brincar ao mesmo tempo.

Zig-zagueandoe aprendendo

Lançado em 1991 no formato detabuleiro, o jogo Zig-Zaids ganhou arede, com versão digital e atualizadadisponível para download gratuito. Ojogo – indicado para maiores de 12anos – pode ser utilizado em escolas,no ambiente familiar, em espaços nãoformais de ensino, nos serviços de saú-de e espaços de lazer.

A nova versão teve bom desempe-nho na avaliação de alunos de escolasdo Rio de Janeiro. “Constatamos que,em vez da ênfase na ideia de fatalida-de, aspectos como prevenção, noçõesde solidariedade e informações sobrea ação do HIV e do sistema de defesado organismo foram ressaltados pelosestudantes. Os alunos aprovaram o jogoe demonstraram grande curiosidadepelo uso de computadores, indicandoo potencial de recursos multimídias

como estratégia de ensino”, afirma apesquisadora Simone Monteiro, chefedo Laboratório de Educação em Ambi-ente e Saúde do IOC.

Uma viagem pelasestruturas celulares

Se a onda é entrar pelo mundo ce-lular, boa viagem! O Célula Adentro éum jogo de tabuleiro, com quatro du-plas e um desafio: solucionar casossobre biologia celular, molecular e fisi-ologia. Trata-se de um projeto desen-volvido pelo IOC em parceria com oInstituto de Biologia da Universidade

Federal Fluminense (UFF) e com oapoio financeiro da Faperj e do CNPq.

O jogo é formulado a par-tir da abordagem

do aprendizadopela solução de

problemas e per-mite que os estu-

dantes entendam,de forma lúdica,

como os cientistasconstruíram alguns

conceitos fundamen-tais relacionados às cé-

lulas. Para isso, elesdevem agir como investi-

gadores, simulando o mé-todo científico ao formular

perguntas e chegar a respos-tas. “A ideia é que eles

coletem, discutam e interpretem pis-tas para decifrar questões científicas”,explica a pesquisadora do IOC eidealizadora do projeto, CarolinaSpiegel.

O Célula Adentro foi avaliado e apro-vado por jovens em escolas e universi-dades públicas e privadas do Rio deJaneiro: 94% dos entrevistados declara-ram que gostariam de jogar novamen-te, porque consideravam o jogo divertidoe bom para o aprendizado. “Os resulta-dos apontam para uma boa aceitaçãodo jogo como estratégia de ensino porparte dos entrevistados, não apenas porseu caráter lúdico, mas também pelodesenvolvimento de importantes habili-dades, pois estimula o raciocínio, gera oentrosamento e troca de idéias entre osalunos”, afirma Carolina.

Para baixar os jogos,acesse os sites:

celulaadentro.ioc.fiocruz.bre www.ioc.fiocruz.br

Clique no link Educação em Saúde,depois em Jogos Educativos.

Divirta-se!

Brincadeira sériaJogos como Zig-Zaids e Célula Adentro são diversão garantida nãosó para crianças, mas também para marmanjos que adoram ciência

Divulgação IOC

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Talita Rodrigues

ma iniciativa pioneiravem ajudar a suprir a ca-rência de livros didáticosvoltados para a formaçãode técnicos de laborató-

rio em saúde. Trata-se da coleção Con-ceitos e métodos para a formação deprofissionais em laboratórios de saú-de, composta por cinco livros educati-vos, resultado de uma parceria entrea Escola Politécnica de Saúde JoaquimVenâncio (EPSJV) e o Instituto OswaldoCruz (IOC), duas unidades da Fiocruz.

O objetivo da coleção é auxiliar do-centes da área na definição e no trata-mento curricular de seus cursos,

de nível técnico em saúde da própriaFiocruz. “Os livros poderão ser usadostambém pelos profissionais na banca-da, no trabalho diário do laboratório,porque são obras de fácil consulta, comuma linguagem técnica mais simples”,diz Etelcia. Para Luzia, a elaboração domaterial traz outro diferencial importan-te. “Alguns dos autores são egressosde cursos técnicos do IOC e da EPSJV.Portanto, entendem a necessidade dosalunos em sala de aula”, enfatiza.

Os temas tratados nos cinco volu-mes da coleção foram definidos combase nas disciplinas abordadas noscursos desenvolvidos na EPSJV e noIOC. Após a definição dos temas e dosautores, foram realizadas oficinas comos 69 profissionais que participam dolivro para delinear o foco.

Conteúdo

Já foram publicados o primeiro e oquarto volumes da coleção. A previsão éque os outros três livros fiquem prontospara o início do ano letivo de 2011. Oprimeiro volume é composto por cincocapítulos que tratam de biossegurança eboas práticas laboratoriais; conceitos etécnicas básicas aplicadas em laborató-rio; microscopia; animais de laboratório;e fundamentos em química experimen-tal. O quarto volume aborda temas rela-cionados a imunologia, virologia,bacteriologia e micologia.

Além de estarem disponíveisna íntegra nos s i tes da EPSJV(www.epsjv.fiocruz.br) e do IOC(www.ioc.fiocruz.br), os l ivrospodem ser adquiridos em várias livra-rias, entre elas a da Abrasco e a daBiblioteca de Ciências Biomédicas daFiocruz, ambas no campus da Funda-ção em Manguinhos, além da livrariavirtual da Escola Politécnica, acessí-vel pelo site.

Livros didáticos paratécnicos de laboratórioObjetivo da coleção é auxiliar na definição e no tratamento curricular dos cursos

tornando-se obras de referência para aformação dos profissionais em laborató-rios. E tem dado certo: o primeiro volu-me da coleção já está sendo usado pelosalunos da habilitação em análises clíni-cas do curso técnico de nível médio emsaúde da EPSJV e do curso técnico su-perior profissional de biodiagnóstico, quea Escola desenvolve em Cabo Verde, naÁfrica, junto com a universidade públi-ca local. A obra também é usada nocurso técnico em pesquisa em biologiaparasitária do IOC.

A ideia da coleção, organizada porEtelcia Molinaro (EPSJV), Luzia Caputoe Regina Amendoeira (IOC), nasceu danecessidade de produzir um materialque atendesse aos alunos dos cursos

ENSINO

U

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A

SAÚDE DA CRIANÇA

Irene Kalil

lguns bebês, desde o nas-cimento, precisam de tra-tamento diferenciado, emunidades de terapia inten-siva (UTIs) neonatais, o que

inclui a utilização de tecnologias de úl-tima geração responsáveis por garan-tir sua sobrevivência nos primeiros diasou meses de vida. Como tornar essecenário de intervenções cirúrgicas eaparelhos, repleto de luzes e ruídosestressantes até para os adultos, maishumano e propício ao desenvolvimen-to físico e emocional das crianças? Pen-sando nisso, o Instituto Fernandes Figueira(IFF/Fiocruz), por meio do projeto Biblio-teca Viva em Hospitais e do Departa-mento de Neonatologia, criou o projetoLeitura para recém-nascidos em berçá-rio de alto risco, pioneiro no país. E ainiciativa, que completa agora cincoanos, tem se revelado bem-sucedida.

Projeto de leitura para bebêsinternados em UTI neonatalfortalece vínculos familiares eauxilia na formação de novosapaixonados por livros

Paixão quevem de berço

O papel dos voluntários é fundamental para o sucesso da iniciativa

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A pedagoga e coordenadora doBiblioteca Viva, Magdalena Oliveira,conta que resistiu à ideia de levar aleitura para os bebês internados por-que ainda buscava bases teóricas quetratassem de seus benefícios para essesegmento. “Depois de me aprofundarno tema, concluí que o vínculo e aestimulação precoces enriqueciam orelacionamento mãe e filho, e que es-ses elementos poderiam vir também pormeio da literatura”, ressalta Madá,como é carinhosamente conhecida.

A cumplicidade de alguns profis-sionais da unidade, como a neonato-logista Olga Bomfim, funcionou comomotor para iniciar o trabalho. “A prá-tica já permeava grande parte do hos-pital e, embora não existisse ummodelo de leitura dentro de uma UTIneonatal, esta seria uma oportunida-de de oferecer outro aspecto deinteração com o recém-nascido e suafamília. Todo bebê depende de estí-mulo, mesmo que não seja prematu-ro e não esteja internado. Por isso,todas as possibilidades de impulsionarseu desenvolvimento e dar carinho,atenção e cuidado devem ser apro-veitadas”, lembra a médica, uma dasprincipais incentivadoras do projeto.

O papel dos voluntários também foie continua sendo fundamental para osucesso da iniciativa. A jornalista AnaLins, uma das primeiras pessoas a fa-zer leituras na UTI neonatal do IFF, falacom carinho dessa atividade. “Leio paraos bebês desde que começou o proje-to. Houve várias situações em que sentique eles ficaram confortáveis com aminha voz, em que conseguimos esta-belecer uma troca. Eu sempre saiomuito feliz, pois aqui a gente dá o quetem de melhor, aqui a gente está in-teira”, relata. Para a professora apo-sentada Lúcia Carrilho, que há cincoanos atua no Biblioteca Viva, o maiordesafio de ler para bebês é que o pú-blico não escolhe o que quer ouvir. “Ovoluntário seleciona o livro pela intui-ção. Eu, por exemplo, adoro ler poesiapara os bebês”, explica. Uma das ca-racterísticas mais instigantes desse tra-balho é que não existe rotina. “Cadadia é uma descoberta, uma emoçãodiferente”, aponta Ana.

Atualmente, a leitura para recém-nascidos já integra o dia-a-dia do IFF,recebendo o apoio de médicos, enfer-meiros, fisioterapeutas e das famílias dascrianças internadas. Cinco vezes porsemana, nove voluntárias leem nos ber-çários de alto risco e intermediário (umaespécie de “pré-alta”) do Instituto.Cada uma delas registra, por escrito,suas impressões diárias. As observaçõesgeram relatórios qualitativos sobre oimpacto que a leitura causa nesses pa-cientes tão especiais. “À medida queos adultos perceberam o interesse dosbebês, esse momento passou a fazerparte da rotina. Agora tudo aconteceem perfeita integração. A leitura faz par-te do nosso cotidiano e caminhamos naperspectiva do cuidado ampliado, inte-grando pessoas, procedimentos e açõesimportantes para o desen-volvimento do recém-nas-cido com qualidade”,afirma Olga Bomfim.

A iniciativa tambémalcançou visibilidade naci-onal. Em 2007, foi indicadaao Prêmio Vivaleitura, pro-movido pelo Ministério daEducação, Ministério daCultura e organizações in-ternacionais de educaçãoe patrocinado pela Funda-ção Santillana. Ficou entreos cinco finalistas em suacategoria, destinada a so-ciedades, ONGs, pessoasfísicas, universidades/facul-dades e instituições soci-ais. A coordenadora doBiblioteca Viva acreditaque, mesmo carente de pesquisas queavaliem seus resultados, a leitura naUTI neonatal tem conseguido atingirseu objetivo principal, isto é, transfor-mar a experiência da internação numprocesso menos doloroso e mais acon-chegante, colaborando para o fortale-cimento do vínculo dos bebês com suasfamílias.

Ao longo desses cinco anos, cen-tenas de recém-nascidos foram bene-ficiados pelas sessões de leitura ealguns deles, que cresceram e retor-nam ao IFF periodicamente para con-sultas, tornaram-se frequentadores

assíduos do espaço destinado ao pro-jeto – uma simpática e colorida salinhasituada no segundo andar do prédiohospitalar. As crianças fazem da leitu-ra seu entretenimento preferido en-quanto aguardam o atendimento nosambulatórios do Instituto.

Kaio Pinto parece não ter esqueci-do o contato inicial com a literatura,quando esteve internado na UTIneonatal do IFF em seus primeiros diasde vida. A mãe dele, Altacy Mendes,lembra que, na primeira vez em que avoluntária perguntou se podia ler parao seu filho, ela indagou, incrédula: “Eele entende alguma coisa, moça?”Mas o menino ficou com os olhos gru-dados no livro e a impressão foi de queele prestava atenção à história lida.Hoje, aos 4 anos, ele é prova de que a

leitura para recém-nascidos alcançouhorizontes mais amplos do que a metainicial, estreitando vínculos familiarese formando crianças que gostam de ler.Pelo menos uma vez por mês, Kaio vol-ta ao Instituto para consultas de acom-panhamento. Ao chegar, ele mesmoprocura a salinha de leitura. “O quemais tenho em casa é livro. Comprei acoleção toda daquele escritor famoso,o Monteiro Lobato. E o chão do meuquarto é cheio de livros. O Kaio esco-lhe o que ele quer ouvir e pede: ‘lê pramim?’”, relata Altacy, orgulhosa doseu pequeno e ávido leitor.

Da esquerda para a direita, as voluntárias Ana Linse Lúcia Carrilho, a neonatologista Olga Bonfim e acoordenadora do Biblioteca Viva, Magdalena Oliveira

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INSTITUCIONAL

ERicardo Valverde

m 1900, quando o Institu-to Soroterápico Federal –embrião da atual Fiocruz –foi criado, ocupou umaantiga fazenda no bairro

de Manguinhos. Hoje, 110 anos depois,a história se repete: a Fundação come-ça a instalar um novo campus em umaárea que no passado também foi origi-nalmente uma fazenda com grandeprodução agrícola e que tinha o açúcarcomo principal fonte de receitas. É oCampus Fiocruz da Mata Atlântica(CFMA), uma área de 5 milhões demetros quadrados situada em Curicica,na região de Jacarepaguá, na ZonaOeste do Rio de Janeiro. Segundo osociólogo e cientista político GilsonAntunes, coordenador-executivo do pro-grama de implantação do novo campus,esta “é uma excelente oportunidadepara se estabelecer uma ocupação ba-seada nos princípios da sustentabilidade,tanto para os investimentos da Fiocruzno CFMA quanto nas suas relações como meio ambiente natural e socialmen-te construído, que o envolve, contribu-indo para a melhoria das condições devida da população remanescente daépoca em que existia a extinta ColôniaJuliano Moreira, para deficientes men-tais”. O coordenador-executivo afirma

Rumo à Mata Atlântica

que os planos para o espaço são ambi-ciosos, porque incluem a instalação denúcleos das diversas unidades da Fun-dação no CFMA, que em seu interiorpreserva uma extensa área de MataAtlântica – daí o seu nome –, com flo-restas, rios, cachoeiras e trilhas. “Que-remos obter o certificado ISO 14.000,que atesta a qualidade ambiental naocupação. No Brasil, apenas a Univer-sidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisi-nos) tem o certificado”.

A relação da Fiocruz com o localcomeçou em 2003, quando recebeuo chamado Setor 1 (o maior e maisbem preservado), com cessão precá-ria. Em 2007 a cessão foi consolidadapor 50 anos e dois anos depois teveinício o processo de doação definitivada área à Fiocruz, com previsão deconclusão ainda para 2011 – para issoainda falta a regularização fundiária eurbana das populações que moram noperímetro do CFMA, que está sendofeita com R$ 7 milhões em recursosdo Plano de Aceleração do Crescimen-to (PAC). Tais populações serão inte-gradas à malha urbana da cidade apartir da redefinição do limites doCFMA. Os demais setores são o 2,onde funcionava a Juliano Moreira; o3, que foi cedido à Secretaria de Ha-bitação para assentar pessoasdesabrigadas; o 4, vendido pelo Exér-

cito e que será transformado em umbairro; o 5, onde está instalado o Hos-pital Rafael Pedro Souza; e o 6, noqual está o Centro Hélio Fraga.

Em 2004, uma portaria da Presi-dência da Fiocruz definiu três eixos deatuação do então Campus Jacarepa-guá 1, atual Campus Fiocruz da MataAtlântica: fitomedicamentos, patri-mônio cultural da saúde e biodiversi-dade e saúde. Em 2005, foi criado oPrograma de Implantação do Campusde Jacarepaguá: fez-se a articulaçãopara desenvolver o Plano Diretor e oPlano de Regularização Fundiária eestabeleceu-se o sistema de gerencia-mento ambiental.

Além desses objetivos, o Programade Implantação do Campus articulouações para conhecer o novo território,elaborar projetos de captação de recur-sos externos e promover articulaçõescom outras instituições para viabilizar aimplantação do CFMA.

O Programa de Implantação doCampus Fiocruz da Mata Atlântica(PICFMA) é um programa interdisci-plinar com um modelo de ocupação queprioriza a preservação, a proteção e arecuperação dos patrimônios ambien-tal e cultural, consolidando um territó-rio saudável e sustentável. O novocampus da Fiocruz tem cerca de 5 mi-lhões de metros quadrados – uma área

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está iniciando os levantamentos arque-ológicos. É um território rico em termosda história de ocupação humana. Já fo-ram encontradas, por exemplo, peçascomo machados e outros objetos pro-duzidos por indígenas que habitavam aregião séculos atrás”. Da lista de sítiosarqueológicos constam ainda um cemi-tério, uma senzala, uma igreja, a sededa antiga fazenda e outros. O local estátombado pelos órgãos de defesa do pa-trimônio histórico.

Segundo Antunes, atualmente es-tão em andamento os seguintesprojetos e ações: Programa de Fitote-rápicos (horto e viveiro); FarmáciaViva; Programa de Preservação doPatrimônio Histórico da Saúde – Arqui-vo, Pesquisa e Patrimônio Edificado;Programa de Biodiversidade e Saúde(levantamento florístico e parâmetrosambientais); Programa de Implantaçãodo CFMA; integração com as açõesdo PAC Colônia, orçado em R$ 142milhões; Plano Diretor de ocupação; Pla-no de Regularização Fundiária e Siste-ma de Gerenciamento Ambiental;Projeto Cidades Saudáveis; Desenvolvi-mento de Tecnologias Sociais; Núcleode Educação Não-formal em Saúde eAmbiente para crianças das comunida-des (com a ONG Viva Rio); recuperaçãodo Pavilhão Agrícola e do paisagismodo entorno; e restauração da floresta. O

Viva Rio atua como parceiro na áreasocial, colaborando em projetos de edu-cação, na regularização fundiária e noNúcleo de Convívio.

A leishmaniose também está empauta no local. O Instituto Oswaldo Cruztem pesquisadores no campus estudan-do a enfermidade. Os dados da prefei-tura informam que 68% dos casos dadoença na região de Jacarepaguá ocor-riam no território da antiga JulianoMoreira. Com orientação e capacita-ção para o manejo ambiental correto,esse número vem sendo reduzido.

Um projeto em andamento é o De-senvolvimento Comunitário e Educa-ção para a Sustentabilidade, quepromove atividades para capacitação,geração de emprego e renda, consci-entização ambiental, de apoio ao pro-cesso de regularização fundiária dasocupações existentes no local, buscan-do a melhoria da qualidade de vidada população de baixa renda. Entreas ações desenvolvidas pelo projetoestão a capacitação de jovens para aconservação ambiental, ações de re-cuperação ambiental (nas matas, en-costa e rios), implantação de sistemasde coleta seletiva de lixo, formação dejovens agentes ambientais, além doseventos ambientais (informação,mobilização, pesquisas e monitora-mento) junto às comunidades.

um pouco maior que o principal campusda Universidade Federal do Rio de Ja-neiro (UFRJ), na Ilha do Fundão, e bemmaior que o campus da Fundação emManguinhos, que tem por volta de 800mil metros quadrados. “A intenção éconstruir nas áreas de clareiras, áreasdegradadas planas, que representamcerca de 8% do território do CFMA.Estas áreas serão destinadas às edifi-cações, paisagismo, vias urbanas, áre-as de convivência e estacionamentos.O restante será objeto de ações de res-tauração ambiental, ou seja, mais de90% do CFMA serão dedicados aorestabelecimento da complexidade dobioma Mata Atlântica”, afirma Antunes.

Unidades começam a fazerplanos para o CFMA

Antunes diz que algumas unidadesda Fiocruz, como o Instituto de Tecnolo-gia em Fármacos (Farmanguinhos), aEscola Politécnica de Saúde JoaquimVenâncio (EPSJV), o Instituto FernandesFigueira (IFF) e o Instituto Oswaldo Cruz(IOC) já demonstraram interesse em ins-talar núcleos no CFMA, sendo que oprimeiro já estabeleceu uma área deprodução de fitomedicamentos comhortos e processamento primário dasplantas. “A Casa de Oswaldo Cruz(COC) fez o levantamento do patrimôniohistórico e arquitetônico do campus e

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Olimpíadas 2016itada no documento ofici-al da candidatura cariocaao Comitê Olímpico Inter-nacional (COI) por sua re-levância e importância

estratégicas para o país, que cada vezmais fortalece seu papel no cenáriomundial, a Fiocruz aparece comprojetos para os campi de Manguinhose da Mata Atlântica. Em relação aocampus Mata Atlântica, a inserção daFiocruz no legado dos Jogos se referea projetos sociais e estruturantes quecontribuam para a plena realização dasatividades da Fundação na região eajudem a recuperar o local. Dentro docampus será feita a revitalização doNúcleo Histórico Rodrigues Caldas e arecuperação de outras edificações.Também será construído um centro derecepção e feita a recuperação doComplexo Zanine (o horto-escola). Sãoações que permitirão à Fiocruz execu-tar os seus planos de ocupação da área,que é de importância vital e estratégi-ca para o futuro da instituição.

Além do legado social, na região docampus Mata Atlântica haverá o lega-do ambiental, com a recuperação deáreas de floresta e a criação de um par-que ecológico que integrará os dois va-les do lugar. Como o campus está situadoa pouco mais de quatro quilômetros dasede do Comitê Olímpico Brasileiro(COB), na Barra, também servirá deapoio ao chamado Complexo Olímpico.Ainda no entorno do campus MataAtlântica deverão ser erguidos um com-plexo educacional e uma vila olímpica,beneficiando a população.

Coleta de lixoCFMA, que faz divisa como Parque Estadual da Pe-dra Branca, está numa re-gião que sofre grandeimpacto da expansão urba-

na. Portanto, o Programa de Implanta-ção do Campus Fiocruz da MataAtlântica desenvolve três projetos a res-peito do lixo produzido pelas comuni-dades no interior do território e tambémno seu entorno imediato e nas áreasinternas, especificamente o PavilhãoAgrícola – sede do PICFMA. O Projetode Coleta Seletiva no Pavilhão Agríco-la tem por objetivo separar os resíduossólidos recicláveis gerados pelo funcio-namento da Fiocruz e encaminhá-lospara doação à cooperativa de catadoresBarracoop, em Jacarepaguá. O projetofoi lançado com palestras para esclare-cer dúvidas quanto à utilização doscoletores já instalados. A equipe deGestão e Educação Ambiental doPICFMA pretende realizar mensalmen-te palestras e oficinas para informar,esclarecer e apresentar os resultados dacoleta seletiva para todos os usuáriosdo Pavilhão Agrícola.

Outro projeto em desenvolvimen-to trata da construção de abrigos paradepositar o lixo das comunidades no

interior do CFMA. Algumas residênci-as não contam com a coleta feita deporta em porta pela Companhia Mu-nicipal de Limpeza Urbana (Comlurb)e nem com a varredura feita pelosgaris. Isto causa acúmulo de lixo nasvias sem nenhum tratamento, aumen-tando a quantidade de vetores causa-dores de várias doenças. A iniciativatambém é resultado de parceria como Viva Rio. Os moradores construirãoos abrigos em pontos estratégicos decada comunidade para o acondiciona-mento adequado do lixo até o momen-to da coleta.

O terceiro projeto é o ColetaSeletiva Solidária na Colônia JulianoMoreira, que consiste em estruturar aimplantação da coleta seletiva de re-síduos sólidos no território da Colôniae será realizado em parceria com aBarracoop, o Instituto Municipal deAssistência à Saúde Mental JulianoMoreira (IMASJM), a empresa dereciclagem de embalagens Recicoletae a Associação de Moradores da Flo-resta da Pedra Branca. A Barracoopalocará, duas vezes por semana, umPosto de Troca de Recicláveis em umponto estratégico entre as comunida-des locais. Os materiais recicláveis se-rão a moeda de troca para a obtençãode alimentos não perecíveis.

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O CFMA abrigaedificações históricas,como o Aqueduto

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O fim da ColôniaJuliano Moreira

o início dos anos 80, apóslongo processo de deteri-oração, a colônia iniciouuma transformação doseu modelo assistencial,

em consonância com a Reforma Psi-quiátrica que vinha ocorrendo em di-versos países. Foram abolidos oeletrochoque, as lobotomias e o abu-so de neurolépticos. Novas interna-ções de longa permanência deixaramde ser aceitas e assistência a novospacientes em crise passou a ser feitapelo Hospital Jurandyr Manfredini, es-pecialmente criado para este fim.

Administrada pelo governo fede-ral desde sua criação, a instituição foimunicipalizada em 1996, de acordocom os preceitos do Sistema Único deSaúde (SUS) e passou a chamar-se Ins-tituto Municipal de Assistência à Saú-de Juliano Moreira. O principal eixodo trabalho desenvolvido é o progra-ma de desinstitucionalização, quepromove a transferência progressivade pacientes para fora das instala-ções hospitalares. Aqueles com mai-or autonomia mudam-se para asresidências terapêuticas, onde pas-sam a viver com outros usuários deserviços de saúde mental, receben-do ajuda financeira do poder público(bolsas de incentivo à desinstitucio-nalização oferecidas pela SecretariaMunicipal de Saúde e pelo Ministé-rio da Saúde). Outros vivem nos la-res de acolhimento – grandes casas,resultantes das reformas havidas nosantigos pavilhões do Instituto que,em vez de enfermarias, contam hojequartos para duas ou três pessoas,com banheiros privativos, copa, co-zinha e sala de estar coletivas anti-gos pavilhões.

O Instituto também abriga, nassuas dependências, o Museu Bispo doRosário, responsável pela guarda emanutenção de todo o acervo do ar-tista, que viveu na instituição por 50anos, além de manter um calendáriode exposições temporárias de artistascontemporâneos destacados.

Regularizaçãofundiária

antiga Colônia JulianoMoreira, situada em Jaca-repaguá, na Zona Oestedo município do Rio de Ja-neiro, foi inaugurada como

instituição psiquiátrica em 29 de mar-ço de 1924, em terras da antiga Fa-zenda do Engenho Novo. Sua criaçãodecorreu da transferência, para as ter-ras desapropriadas da fazenda, das an-tigas colônias de alienados da Ilha doGovernador. Por muito tempo, a Colô-nia Juliano Moreira foi referência na-cional em atenção à saúde mental.Dos anos 20 aos 80, funcionava comodestino final para pacientes conside-rados irrecuperáveis. Na década de 60chegou a abrigar cerca de 5 mil pes-soas. “As antigas colônias da Ilha doGovernador foram transferidas para Ja-

carepaguá porque o bairro estava setornando um balneário para a classemédia, portanto o governo decidiu le-var os alienados, como eram chama-dos à época, para Jacarepaguá, entãouma localidade muito distante do cen-tro urbano da cidade”, afirma Antunes.

A distância foi o que fez com mui-tos parentes de pacientes e funcioná-rios da colônia, passassem a construircasas no entorno, porque com issoevitavam grandes deslocamentos deida e volta. “Hoje, calculamos os des-cendentes desses moradores originais,na área administrada pela Fiocruz, emcerca de 900 pessoas. São 215 famíli-as”, diz o coordenador.

As residências dessas pessoas estãosendo objeto da regularização fundiáriano CFMA - cinco comunidades serãobeneficiadas, já que as famílias recebe-rão a titulação dos terrenos, mediante adelimitação física do lote em que viveme o cadastramento. “Vamos também fa-zer a implantação e o reconhecimentode logradouros (endereço, número enome de rua), com titulação dos proprie-tários dos lotes. Esta regularizaçãofundiária estará associada à regulariza-ção urbanística”, observa Antunes. Eleacrescenta que será superada a situaçãode assentamento informal, atualmentesubordinada à Fiocruz, “Após a regulari-zação a área passará a integrar a malhaurbana, sob gestão da Prefeitura”.Antunes adianta que os lotes não pode-rão ser divididos e nem vendidos, paraevitar a favelização.

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Visite o site do projetode planejamento da PNS:

www.pns.icict.fiocruz.br

Cristiane d’Avila

aplicação de inquéritospara a avaliação da saúdeda população é práticaincipiente nos países emdesenvolvimento. No Bra-

sil, o Ministério da Saúde tem feito es-forços com o intuito de formularquestionários amostrais. Um dos exem-plos é a condução do Suplemento deSaúde da Pesquisa Nacional por Amos-tra de Domicílio (Pnad) em 1998, 2003e 2008. Contudo, o país até hoje nãorealizou uma pesquisa, em âmbito na-cional, que apure informações neces-sárias à formulação de políticas na áreade promoção, vigilância e atenção àsaúde dos brasileiros. Tal carência estásendo superada com a elaboração dasdiretrizes da Pesquisa Nacional de Saú-de (PNS), a ser feita em 2012/2013. APNS será uma parceria entre o Minis-tério da Saúde e o Instituto Brasileirode Geografia e Estatística (IBGE).

Coordenado pela pesquisadoraCélia Landmann, do Laboratório de In-formação em Saúde do Instituto deComunicação e Informação Científicae Tecnológica (LIS/Icict/Fiocruz), o gru-po científico responsável pela condu-ção das diretrizes da PNS foi criado em2009, após promulgação de uma por-taria do Ministério da Saúde. Desde

então, foi constituído o Comitê Gestorda PNS, que congrega profissionais doMinistério, da Secretaria de Vigilânciaem Saúde (SVS) e da Fiocruz.

Ao grupo científico, do qual partici-pam também pesquisadores da Univer-sidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj)e do Ministério da Saúde, cabe elabo-rar o questionário da PNS, que conterámódulos sobre morbidades, estilo devida, saúde do idoso, saúde bucal e saú-de da mulher. “O questionário é inova-dor, muito extenso e sofisticado. Iremosapurar aspectos que geralmente não sãoverificados nos inquéritos. Além disso, aPNS vai incorporar o novo Sistema Inte-grado de Pesquisas Domiciliares do IBGE,que, entre outras vantagens, permitiráo uso de informações da Pnad sobre ascondições socioeconômicas do entornodomiciliar”, explica Célia Landmann.

Segundo a pesquisadora, o proces-so de elaboração da PNS está sendofeito em quatro etapas. A primeira, jáfinalizada, consistiu na consulta a pes-quisadores nacionais e internacionais,com experiência em participação eminquéritos, e representantes das áreastécnicas do Ministério da Saúde. Osconsultores responderam a questõesrelativas ao planejamento da PNS, in-cluindo informações sobre conteúdo eforma de condução do inquérito. A se-gunda, iniciada em setembro deste ano,

consiste na elaboração de um estudopreliminar, na Região Integrada de De-senvolvimento do Distrito Federal (Ride/DF), que indicará a metodologia ade-quada para a aplicação na PNS. Emoutras palavras, é um teste para verifi-car como a população aceita o questi-onário, o tempo de duração dasentrevistas, a linguagem apropriada.

A terceira etapa, já em execução,é uma consulta pública sobre a PNS.“Para essa etapa criamos um site doprojeto de planejamento da PNS, paraque toda a sociedade participe da ela-boração e acompanhe todo o processoda pesquisa. Lá temos um Fale Conos-co, aberto a sugestões de itens a se-rem incluídos no questionário”, explicaCélia. Por fim, a quarta etapa será umprojeto piloto da pesquisa, conduzidopor profissionais do IBGE, em 2012.

Pesquisa de âmbito nacional a serrealizada a cada cinco anos, a partirde 2012, em 60 mil domicílios do país,a PNS prevê duas frentes de ação si-multâneas: a coleta de informações apartir de entrevistas domiciliares e indi-viduais; e a realização de exames desangue, aferição de pressão arterial emedição de peso, altura e circunferên-cia de cintura. Profissionais do IBGEserão encarregados da amostragem eexecução do trabalho de campo, en-quanto os exames laboratoriais e a co-leta de sangue ficarão a cargo detécnicos do Ministério da Saúde. A aná-lise e a divulgação dos dados serão re-alizadas pelas duas instituições.

Para Célia Landmann, a parceriaconcreta de trabalho entre a academia,as áreas técnicas do Ministério da Saú-de e o IBGE representa um avanço. “APNS será não só a grande oportunida-de de progredir obtendo informaçõesessenciais para a formulação de políti-cas na área de promoção, vigilância eatenção à saúde, como também deampliar o conhecimento sobre as desi-gualdades em saúde, subsidiando a ori-entação das políticas de saúde para oalcance de maior equidade. Neste con-texto, é com muito prazer que convi-damos todos a participarem do processode planejamento da PNS”, conclui apesquisadora.

Um raio X da saúdedos brasileirosGrupo científico lança site para consulta pública sobre aPesquisa Nacional de Saúde (PNS), a ser realizada em 2012/2013

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Célia Landmann:a sociedade podeparticipar da elaboraçãoe acompanhar o processoda pesquisa

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OAlexandre Matos

Instituto de Tecnologiaem Fármacos (Farman-guinhos/Fiocruz) está de-senvolvendo um produtoinovador para combater a

malária. O sal híbrido Mefas é uminsumo farmacêutico ativo (IFA) resul-tante da combinação de duas substân-cias: artesunato e mefloquina. O novofármaco representa uma evolução notratamento da doença que mais matano mundo. O estudo tem a colabora-ção do Laboratório de Malária daFiocruz Minas.

Atualmente, Farmanguinhos pro-duz o ASMQ, formulação em dose fixacombinada de artesunato e mefloquina,medicamento mais indicado pela Orga-nização Mundial da Saúde (OMS) parao tratamento da malária. Apesar dacomprovada eficácia do ASMQ, o pa-ciente não está livre de efeitos colate-rais. Para aliviar esses possíveisdesconfortos, pesquisadores da área desíntese orgânica do instituto, lideradospela pesquisadora Núbia Boechat, tra-balham no novo sal híbrido.

Estudos têm mostrado que oMefas é mais eficaz contra a maláriado que os medicamentos artesunato emefloquina, tanto usados separada-mente quanto sob a forma do ASMQ.Além disso, segundo Núbia, o Mefascausa menos efeitos colaterais, pois osal híbrido não apresentou toxicidademesmo quando utilizado em dose 100vezes superior à necessária.

Outra vantagem é que o Mefasconsegue curar a malária com meta-de da dose do ASMQ, de acordo comtestes feitos em animais. “Espera-setambém que haja uma redução nocusto de desenvolvimento e produçãodo medicamento, tendo em vista que

as dificuldades técnicas poderão serminimizadas pela utilização de apenasum IFA, o que não ocorre no ASMQ,no qual são utilizados dois IFAs”, ex-plica a coordenadora.

Já começou a ser realizado em ani-mais o estudo comparativo da biodis-ponibilidade, teste que avalia o graude absorção da substância pelo orga-nismo e, consequentemente, sua dis-ponibilidade no local de ação. SegundoNúbia, a meta agora é encontrar umparceiro – empresa farmacêutica ouentidade financiadora internacional –que viabilize a realização dos estudosfinais para se chegar ao produtoregistrado. Após essa etapa, o fármacoserá disponibilizado à população pormeio do Sistema Único de Saúde (SUS)e a outros países endêmicos, tal comohoje se faz com o ASMQ.

Doença dos trópicos

A malária é uma doença transmi-tida pela picada da fêmea do mos-quito Anopheles, infectada porPlasmodium. Estudos da Iniciativa

Novo sal híbrido diminui efeitos colaterais e vaigerar economia na produção de medicamento

Medicamentos para Doenças Negli-genciadas (DNDi) mostram que amalária é a doença que mais matano mundo. Atinge, principalmente,países pobres da América Latina, daÁfrica e do sudeste asiático. O baixopoder econômico das populações des-sas áreas é responsável pelo desinte-resse da indústria farmacêutica eminvestir em novos fármacos, dificultan-do o acesso a tratamentos adequa-dos e eficazes.

De acordo com dados do Ministé-rio da Saúde, só em 2009, foram maisde 300 mil casos de malária confirma-dos no Brasil. Os números ainda im-pressionam, mas as estatísticas jáforam muito piores. Com a introduçãodo ASMQ, houve uma redução dequase 50% de casos nos últimos anos.

Com o apoio do DNDi, Farman-guinhos deu um passo importante nodesenvolvimento do ASMQ. Cada em-balagem contém dois comprimidos,num esquema simples e prático. OASMQ é o primeiro medicamento decombinação em dose fixa com prazode validade de três anos, o que facili-ta a distribuição nos centros de saúderurais. Após sua introdução em muni-cípios da Região Norte do país, o nú-mero de pacientes caiu quase 70% emum ano. Registrou-se, ainda, uma que-da superior a 60% nas hospitalizaçõespor malária no mesmo período. A ex-pectativa é que o Mefas seja mais umpasso para a eliminação da doença.

Mais eficáciacontra a malária

MEDICAMENTOS

Núbia Boechat: o sal híbridonão apresentou toxicidade mesmoquando utilizado em dose 100vezes superior à necessária

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Com o envelhecimento dapopulação brasileira, é precisofazer frente às doençascrônicas sem enfraquecer ocombate às infecciosas, alémde promover ações depesquisa, ensino e assistênciaem saúde do idoso

Novosvelhosdesafios

Elisa Batalha, Fabíola Tavares,Jamerson Costa e Talita Rodrigues

dosos - indivíduos com 60anos ou mais - são o seg-mento da população bra-sileira que mais cresce.Dados do primeiro balan-

ço do Censo 2010, feito pelo InstitutoBrasileiro de Geografia e Estatística(IBGE) e divulgado em agosto, confir-mam o que muitos analistas já apon-tam há mais tempo: que o Brasil estáenvelhecendo. O alargamento da par-te de cima da pirâmide demográfica éexplicado por uma relação entre a di-minuição do ritmo de crescimento dapopulação e o aumento da expectati-va de vida, que, juntos, contribuem paraampliar a proporção de idosos no país.

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CAPA

Kirk Smith / www.sxc.hu

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Estimativas recentes, realizadas apartir das Pesquisas Nacionais porAmostragem de Domicílio (Pnad), apon-tam que a porcentagem atual de ido-sos na população brasileira seria de11,3%, o que equivaleria a, aproxima-damente, 19 milhões de pessoas. Em1980, existiam 16 idosos para cada 100crianças no Brasil. Em 2008, essa pro-porção era de 24,7 idosos para cada100 crianças. A expectativa é que onúmero de idosos ultrapasse o de cri-anças antes da metade deste século.

Esse novo cenário coloca desafiospara a saúde pública. O processo detransição da estrutura etária no país éacompanhado pelo aumento da ocor-rência de doenças crônicas, ao mesmotempo em que persistem as doençasinfecciosas. Muitos avanços já foramobtidos no sentido de controlar as do-enças infecciosas – principalmente porconta da vacinação, que possibilitou aerradicação da varíola e da poliomieli-te, assim como o fim da transmissãoendêmica do sarampo e da rubéola. Noentanto, ainda existe muito trabalho aser feito. Assim, delineia-se um quadrodesafiador, no qual é preciso fazer fren-te ao crescimento das doenças crônicassem enfraquecer o combate às infecci-osas. Nesse contexto, a Fiocruz reafir-ma seu compromisso com a promoçãoda saúde dos brasileiros, mantendo-secomo referência para o enfrentamentode novos e antigos problemas.

Mito ou verdade?

A ideia de que as doenças infecci-osas estão em declínio deve serrelativizada. Segundo a publicação doMinistério da Saúde Doenças infeccio-sas e parasitárias: guia de bolso (8ª edi-ção), de fato, a situação epidemiológicadas doenças transmissíveis tem apre-sentado mudanças significativas nas úl-timas décadas, mas não se pode falarem declínio. Trata-se de um quadrocomplexo que envolve três grandes ten-dências: doenças transmissíveis comtendência declinante (difteria, coque-luche, tétano acidental, doença de Cha-gas, febre tifóide, oncocercose, filariose[ver box na página seguinte] etc); do-enças transmissíveis com quadro de per-sistência (tuberculose, hepatites virais,

leishmaniose, leptospirose etc) e doen-ças transmissíveis emergentes ereemergentes (influenza A (H1N1),Aids, dengue etc).

“As doenças infecciosas, mesmocom os progressos recentes emprofilaxia, diagnóstico e tratamento ea redução de casos e óbitos, continu-am ocorrendo em todos os países comvariáveis frequências e padrões clíni-cos, se apresentando sob formas ra-ras ou desconhecidas, além daemergência de novas doenças por di-ferentes agentes infecciosos e condi-ções, matando ou incapacitando eonerando os sistemas de saúde”, afir-ma o parasitologista Mauro Marzochi,pesquisador sênior do CNPq no Insti-tuto de Pesquisa Clínica Evandro Cha-gas (Ipec/Fiocruz). “Isso precisa serenfrentado a começar por um plane-jamento sistêmico da rede pública eprivada, capaz de controlar os dife-rentes níveis de atenção à saúde noâmbito do diagnóstico clínico elaboratorial. Esse planejamento poderáatender, de um lado, à necessidadedo controle ou erradicação das doen-ças preveníveis por imunização e, deoutro, à vigilância de novas doençastransmissíveis que surgem ou ressur-gem, requerendo, em ambos os gru-pos, uma atenção clínico-laboratorialpermanente e qualificada”.

Hoje o desafio é duplo: manter ocontrole às doenças infecciosas numcenário de novas necessidades associ-adas ao envelhecimento da popula-ção. A assistência aos idosos – numcontexto onde não se pode excluir aocorrência paralela de doençastransmissíveis e crônico-degenerativas– requer uma série de cuidados relati-vos a manuseio clínico e interaçõesmedicamentosas. É comum os idososapresentarem mais de uma patologiaao mesmo tempo e, consequentemen-te, seram mais vulneráveis a doençasinfecciosas que assumem, então, umcaráter oportunista. Além disso, o fatode utilizarem frequentemente associ-ação de medicamentos aumenta o ris-co de efeitos adversos – até porque,em geral, os testes clínicos de novasdrogas não consideram as especifici-dades da população idosa.

O diagnóstico diferencial é outraquestão-chave. “A leishmaniosecutânea, mais comum em jovens, ago-ra também aparece em idosos. Mas,às vezes, se confunde esse diagnósti-co com doenças frequentes em pesso-as com mais de 60 anos, como úlcerasvaricosas e câncer de pele. Diante deum idoso com gânglios e emagreci-mento, o médico pode pensar em do-ença degenerativa, mas isso não excluia leishmaniose”, exemplifica o derma-tologista Armando Schubach, chefe doLaboratório de Vigilância em Leishma-nioses do Ipec.

“Até hoje existem médicos com di-ficuldade de atribuir os sintomas a umainfecção pelo HIV quando o paciente temmais de 60 anos de idade”, acrescentaa infectologista Sandra Wagner, do La-boratório de Pesquisa Clínica em DST/Aids do Ipec. Sobre envelhecimento eAids, há duas situações: de um lado,indivíduos que contraem o HIV e sãodiagnosticados após os 50 anos de ida-de; do outro, indivíduos portadores dovírus desde mais jovens que estão enve-lhecendo. Graças a um tratamento maiseficaz, os portadores do HIV têm umaexpectativa de vida maior e podem setornar idosos que convivem com o vírus,configurando-se a Aids como uma do-ença, ao mesmo tempo, infecciosa ecrônica. Observam-se, ainda, quadros deinfecção pelo HIV associados a hiperten-são, diabetes ou outras doenças comunsem pessoas mais velhas. “Seria interes-sante um olhar multiprofissional sobre oenvelhecimento”, recomenda Sandra,destacando, ainda, que portadores doHIV tendem a apresentar doença dege-nerativa até dez anos antes do que umapessoa sem o vírus.

“Quando se fala em declínio, a sen-sação é de que as doenças infecciosasestariam desaparecendo e não éexatamente isso. O que existe é umamudança de perfil”, diz o infectologistaAlejandro Hasslocher, chefe do Labora-tório de Pesquisa Clínica em Doença deChagas do Ipec. “Antes, a populaçãoenvelhecia menos e a mortalidade dasdoenças infecciosas era muito alta. Hoje,as pessoas envelhecem com doenças in-fecciosas crônicas e com comorbidadesassociadas à idade”, resume.

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Quando o assunto é o con-trole de doenças parasitári-as, um bom exemplo é afilariose linfática. Atualmen-te, no Brasil, segundo a li-

teratura, a doença é restrita à RegiãoMetropolitana do Recife, com registrosde casos na capital pernambucana, emOlinda e em Jaboatão dos Guararapes.Comparando-se os dados dos últimosdois anos com os de 2000, pode-se afir-mar que a transmissão dessa parasitosevem se reduzindo no Recife e em Olinda.Nas duas cidades, o Serviço de Refe-rência Nacional em Filarioses da

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O exemplo da filariose

Projeto pioneiroem Bambuí

questão das comorbida-des, em que agravos de-generativos da saúdeassociados ao envelheci-mento se combinam com

doenças infecciosas, tem sido avalia-da em idosos de Bambuí. Foi nesta ci-dade mineira que o Instituto OswaldoCruz criou, em meados do século 20,um posto avançado para o desenvol-vimento de pesquisas relativas à do-ença de Chagas – lá foram feitos osestudos iniciais que mostraram ser pos-sível o controle da transmissão dessadoença, causada pelo protozoárioTrypanosoma cruzi. Hoje Bambuí abri-ga um projeto pioneiro na AméricaLatina para investigar os determinantesdas condições de saúde e bem-estarde idosos com baixo nível socioeconô-mico. Este estudo de coorte – quandouma determinada parcela da popula-ção é escolhida para ser analisada eacompanhada progressivamente – vemsendo relizado pela Fiocruz Minas des-de 1997, com seguimentos anuais de1.600 idosos, que correspondem a92% do total da população com 60anos ou mais na cidade.

Os primeiros resultados em Bambuímostraram que a prevalência de do-enças e fatores de risco cardiovascu-

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lares (como hipertensão arterial,dislipidemia, diabetes mellitus e doen-ça coronariana), de distúrbio do sonoe de sintomas depressivos era seme-lhante à observada entre idosos resi-dentes em países de alta renda. Outrasinvestigações revelaram que a preva-lência da doença de Chagas na popu-lação idosa de Bambuí era muito alta,refletindo a exposição à infecção peloT. cruzi em fases precoces da vida.Estudos posteriores, então, vêm mos-trando que essa carga dupla de doen-ças tem impacto significativo nascondições de saúde dos idosos.

Cerca de 70 publicações em revis-tas indexadas foram realizadas com osresultados da coorte de Bambuí e apro-ximadamente 30 teses ou dissertaçõesforam defendidas. Ao longo dos anos,o projeto recebeu diversos prêmios,sendo considerado referência em es-tudos sobre envelhecimento em paí-ses de média renda.

Uma publicação recente mereceuum editorial na edição de novembroda revista Stroke. O artigo de pesqui-sadores da Fiocruz Minas mostrou queo risco de morte por acidente vascularcerebral (AVC), em dez anos, é duasvezes maior entre idosos infectadospelo T. cruzi, independentemente dosfatores de risco cardiovasculares tradi-cionais. Segundo o editorial, o estudo“proporciona um novo ângulo sobre asdevastadoras consequências da doen-ça de Chagas. Finalmente, depois de

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Fiocruz Pernambuco tem contribuídopara o controle da doença por meiodo monitoramento dos casos positivos,da formação de recursos humanos ede outras ações estratégicas.

No Recife, em 2003, a prevalênciade filariose linfática (número de paci-entes novos e antigos) era de 62 casospara cada 100 mil habitantes. Hoje, éde um caso para cada 100 mil habi-tantes. Em Olinda, a adoção de umplano de eliminação da doença dimi-nuiu a prevalência de 24 para doiscasos em cada 100 mil moradores,entre os anos de 2005 e 2009.

Para o coordenador do Serviço deReferência Nacional em Filarioses,Abraham Rocha, esses avanços no Reci-fe e em Olinda apontam no sentido docontrole com vistas à erradicação da in-fecção, mas todo o investimento feitopode tornar-se em vão se os municípiosvizinhos não adotarem medidas de com-bate. “Não sabemos qual a situação dadoença em outras cidades da Região Me-tropolitana do Recife porque elas não fa-zem investigação epidemiológicasistematicamente. O declínio do númerode infectados é decorrente da atuaçãopermanente das gestões municipais, que

nos últimos sete anos combatem a fila-riose de forma mais intensa. Entretantoé importante a adoção de um projeto me-tropolitano de ações integradas”, avalia.

A filariose linfática, transmitida pormosquitos Culex, é uma infecção para-sitária que pode levar a sequelasincapacitantes e deformações. Rochadestaca que, mesmo ocorrendo a in-terrupção da transmissão, é imprescin-dível manter a vigilância epidemiológicaainda por vários anos – migrações in-ternas e deslocamentos internacionaisde indivíduos infectados podem causara reintrodução da doença.

101 anos de negligência, é o momen-to de promover mais pesquisas e re-duzir os efeitos desta doença. É a horade propor ações, triagens clínicas eestudos, como os de Bambuí, que po-derão contribuir para uma mudança decurso nos rumos da doença”. O traba-lho é assinado pela coordenadora doNúcleo de Estudos em Saúde Públicae Envelhecimento (Nespe/Fiocruz Mi-nas), Maria Fernanda Lima e Costa, ecolaboradores.

Outro fruto recente do trabalho emBambuí é um artigo da Fiocruz Minasescolhido entre os vencedores do 4º Prê-mio em Pesquisa da Sociedade Brasileirade Geriatria e Gerontologia, concedidoem 2010. O médico Marco Polo DiasFreitas, aluno de doutorado do Progra-ma de Pós-Graduação em Ciências daSaúde, mostrou que, a médio prazo, orisco de desenvolver hipertensão arterialé mais alto entre idosos com baixos ní-veis do chamado ‘bom colesterol’ (HDL).

coortes brasileiras. O trabalho é feitopor um consórcio de instituições quecontempla a realização da genotipa-gem de cerca de 6 mil participantes.A coorte de Bambuí é parte desse con-sórcio e deverá produzir resultados quelevem a um melhor conhecimento dainteração entre genética e ambientenas condições de saúde dos idosos. Jáo Elsi-Brasil é um estudo de coortenacional para verificar os determi-nantes, a longo prazo, das condiçõesde saúde e bem-estar da populaçãoidosa. Ele será parte de um consórciointernacional do qual participam Esta-dos Unidos, Inglaterra, China, Índia epaíses europeus.

Consultor da Secretaria de Vigilân-cia em Saúde (SVS) do Ministério daSaúde e da Rede Interagencial de In-formações para a Saúde (Ripsa), oNespe realiza, ainda, análises da situ-ação de saúde dos idosos com basenos dados das Pnad. O objetivo é exa-minar as tendências das condições desaúde e dos usos de serviços de saúdepor idosos brasileiros. Os resultadosrevelam melhorias em algumas dimen-sões, mas não em todas. Mudançasmarcantes vêm sendo observadas nosperfis de uso dos serviços, provavel-mente em consequência de um cres-cimento da atuação do Sistema Únicode Saúde (SUS) nesse segmento.

Avaliar os serviços de saúde é tam-bém o objetivo de um projeto desen-volvido pela Fiocruz Pernambuco. A

O

Muito alémde Bambuí

Nespe/Fiocruz Minas – re-ferência nacional e inter-nacional nessa área – éresponsável por outras ini-ciativas, como o Projeto

Epigen-Brasil e o Projeto Elsi-Brasil. OEpigen-Brasil aborda a epidemiologiagenômica de doenças complexas em

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pesquisa Avaliação de serviços deatenção básica à saúde para diabéti-cos e hipertensos no âmbito do Pro-grama Saúde da Família (PSF) estásendo realizada em 33 municípios, dis-tribuídos em todas as regiões do esta-do, incluindo as cidades de maior porte,como Recife (capital), Caruaru (Agres-te) e Petrolina (Sertão).

Hipertensão e diabetes são doisproblemas importantes entre idosos.Segundo o site da campanha Eu sou12 por 8, “com o avanço da idade,ocorre um aumento progressivo na fre-quência de hipertensão arterial (oupressão alta); após os 80 anos a maio-ria das pessoas possui pressão acimado limite normal”. E o site do Ministé-rio da Saúde coloca idade superior a45 anos entre os fatores de risco paradiabetes. As duas são doenças crônico-degenerativas que exigem acompa-nhamento regular, idealmente a cadatrês meses, para prevenir complicaçõesgraves, como a doença renal entre osdiabéticos e o infarto nos hipertensos.

Observações preliminares apontamque poucas cidades conseguem cum-prir todas (ou quase todas) as ações

de assistência clínica e farmacêuticapreconizadas pelo Ministério da Saú-de para a atenção básica. Com oapoio do Institut de Recherche pour leDéveloppement (IRD), da França, doInstituto de Medicina Integral Profes-sor Fernando Figueira e da Universida-de Federal de Pernambuco, a pesquisaenvolveu entrevistas com cerca de 800pacientes de cada doença e 600 pro-fissionais do PSF e das unidades bási-cas de saúde.

Um dos achados do estudo se re-fere ao exame que mede a taxa dehemoglobina glicada, teste que permi-te conhecer o nível de glicemia do di-abético nos últimos três meses.Constatou-se que poucas equipes doPSF encaminham os pacientes paraserem submetidos ao exame porquefaltam laboratórios da rede próprios ouconveniados para atender à demanda.

Embora a pesquisa ainda não es-teja concluída, já é possível identificaralgumas características dos municípi-os. “No Recife, existem equipes boase ruins; há postos que funcionam beme outros não. Nestes os entrevistadosse queixaram da falta de médicos e

de medicamentos. Já no interior asequipes costumam ser incompletas efaltam serviços de referência”, afirmaa pesquisadora Annick Fontbonne, doIRD, que coordena o estudo junto comEduarda Cesse, da Fiocruz Pernam-buco. Os resultados da pesquisa per-mitirão identificar nós críticos eformular propostas para aperfeiçoar efortalecer as práticas da atenção bási-ca para a hipertensão arterial e diabe-tes mellitus tipo 2 no estado.

H

Saúde do idoso:prioridade

á menos de 20 anos, o im-pacto do envelhecimentoda população sobre a saú-de pública era um tema deestudo pouco frequente

nos centros de pesquisa brasileiros. Hoje,no entanto, as abordagens acadêmicassobre a terceira idade avançam e dãorespaldo à implantação de políticaspúblicas direcionadas aos idosos. O in-teresse pelo tema no Brasil representauma mudança de paradigma, já que

Em comemoração ao Dia do Idoso, celebrado em 27 desetembro, a Fiocruz promove uma semana de atividadesque incluem shows de ciência, oficinas e peças teatrais

Divulgação COC

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ações de saúde pública no país apenasrecentemente passaram a contemplareste crescente segmento da população.No Brasil, foi a partir da década de 1990que a população idosa passou a serobjeto de pesquisas e ações de formamais sistemática. Desse modo, o paístoma um rumo semelhante ao de na-ções desenvolvidas economicamente,onde a vida na terceira idade recebecuidados mais abrangentes.

A saúde do idoso é um tema quejá foi incorporado às prioridades da Fio-cruz, que se destaca não só pela pro-dução de pesquisas sobre o assunto,mas também na transformação doconhecimento gerado em ações depromoção da qualidade de vida naterceira idade. Os exemplos são mui-tos. Entre eles pode-se citar o artigoViolência contra a pessoa idosa: análi-se de aspectos da atenção de saúdemental em cinco capitais, publicadoem setembro na revista Ciência & Saú-de Coletiva. O trabalho investigou as-

pectos da atenção à saúde mentalofertada à pessoa idosa vítima de vio-lência nos municípios de Curitiba, Riode Janeiro, Brasília, Recife e Manaus.Os resultados sinalizam providênciasnecessárias para melhor a qualidadeda assistência. “Conclui-se pela neces-sidade de maiores investimentos pú-blicos: na melhoria da qualidade dainformação; na adequação da estru-tura física dos serviços; na capacita-ção/habilitação dos profissionais paraatenderem às especificidades de saú-de do idoso”, diz o artigo, assinadopor pesquisadoras do Centro Latino-Americano de Estudos de Violência eSaúde da Escola Nacional de SaúdePública (Claves/Ensp/Fiocruz).

O Claves é parceiro da SecretariaEspecial de Direitos Humanos da Pre-sidência da República no ObservatórioNacional do Idoso – “um dispositivode observação, acompanhamento eanálises das políticas e estratégias deação de enfrentamento da violência

contra a pessoa idosa”, segundo oportal da iniciativa. O Observatório re-presenta também “um espaço perma-nente e interativo de intercâmbio deinformações entre as equipes dos Cen-tros de Atenção e Prevenção à Violên-cia contra a Pessoa Idosa e demaisusuários”. Os Centros estão entre asestratégias previstas no Plano de Açãopara o Enfrentamento da Violênciacontra a Pessoa Idosa (2007-2010),resultado do esforço conjunto do go-verno federal, dos movimentos sociaise do Conselho Nacional dos Direitosdos Idosos (CNDI).

O presidente do CNDI para obiênio 2008-2010 é um pesquisador daEnsp: José Luiz Telles, que tambémcoordena a Área Técnica de Saúde doIdoso da Secretaria de Atenção à Saú-de do Ministério da Saúde. Por meiodesta Área Técnica, o Ministério tempromovido o Curso de Aperfeiçoamen-to em Envelhecimento e Saúde daPessoa Idosa, convênio com a Ensp,

Divulgação COC

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na modalidade a distância, assinadoem 2008. Até outubro de 2010, havi-am sido capacitados 500 profissionaisde nível superior que atuam no SUS,nas regiões Norte e Nordeste. Visandoàs regiões Sul, Sudeste e Centro-Oes-te, renovou-se o convênio para a ca-pacitação de 2 mil profissionais, sendomil em 2011 e mais mil em 2012.

Telles é também responsável pelomódulo de saúde do idoso que, em2010, pela primeira vez, foi ministra-do no âmbito do curso de especializa-ção em saúde mental e atençãopsicossocial da Ensp. “Temos de pen-sar os cuidados ao idoso não apenasvoltados para sua medicalização, mastambém em novas oportunidades devida, uma vez que o idoso acaba fi-cando cada vez mais isolado na socie-dade”, diz o coordenador do curso,Paulo Amarante.

Atenta a essas novas necessidades,a Fiocruz também oferece, anualmen-te, desde 2007, um curso presencial deatualização profissional no cuidado aoidoso dependente, por meio da EscolaPolitécnica de Saúde Joaquim Venâncio(EPSJV). O objetivo é formar profissio-nais que possam atuar junto a idososna rede de serviços, na própria famíliae na comunidade, conforme previsto naPolítica Nacional de Saúde da PessoaIdosa, que apresenta preocupações es-

pecíficas com os indivíduos em situa-ção de fragilidade ou vulnerabilidadesocial. A ideia é qualificar os alunos paraum cuidado que garanta ao idoso omáximo possível de autonomia. O con-teúdo do curso inclui temas como en-velhecimento humano e saúde do idoso;estratégias de cuidado para idosos de-pendentes com ênfase no auxílio paraatividades da vida diária; aspectos éti-cos, morais e culturais do cuidado (in-cluindo os direitos dos idosos); e causasda dependência na velhice.

Para o coordenador do curso daEPSJV, Daniel Groisman, um dos prin-cipais desafios do curso é produzir co-nhecimento e elaborar metodologiase materiais educativos que contribu-am para o fortalecimento das açõesdestinadas à qualificação de trabalha-dores de nível médio e fundamentalem saúde do idoso. “Ainda existe pou-co conhecimento sistematizado sobreo assunto e há necessidade de estu-dos que tematizem o trabalho doscuidadores formais e informais, comvistas à sua valorização e reconheci-mento social”, explica. O curso temduração de três meses e meio,totalizando 200 horas-aula, que inclu-em 88 de prática profissional, realiza-da em instituições gerontológicasconveniadas. Para participar, é preci-so ter ensino fundamental completo.

A saúde do idoso na Fiocruz temmúltiplas abordagens, com ações quecombinam pesquisa, ensino e assistên-cia. Neste aspecto, destaca-se o tra-balho do Programa de Atenção àSaúde do Idoso do Centro de SaúdeEscola da Ensp, que busca compreen-der e suprir as necessidades dos ido-sos residentes na comunidade deManguinhos, bairro da Zona Norte doRio de Janeiro onde está localizada asede da Fundação. Anualmente, emcomemoração ao Dia do Idoso, cele-brado em 27 de setembro, o progra-ma, em parceria com o Museu da Vida– espaço de integração entre ciência,cultura e sociedade da Casa deOswaldo Cruz (COC/Fiocruz) –, promo-ve uma semana de atividades gratui-tas especialmente preparadas para opúblico da terceira idade. Circuito his-tórico no trenzinho da ciência, peçasteatrais, shows de ciência, contadoresde histórias, palestras e oficinas com-põem a programação, que busca in-tegrar os idosos e suas famílias. É maisuma prova de que a Fiocruz tem comoobjetivo a atenção integral à saúdedo idoso, que vai do conhecimentocientífico às políticas públicas, da ca-pacitação de recursos humanos à pro-moção da assistência, incluindo atéatividades que combinam entreteni-mento e educação.

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O mito dasdoenças crônico-degenerativasapenas em idososProblema atinge criançase exige reformulação domodelo de assistência

Marcelo Neves

uando se pensa em doen-ças crônico-degenerativas omais comum é associá-lasapenas aos idosos e àprojeção de envelhecimen-

to da população. Entretanto, elas tam-bém podem ocorrer na infância e, pornão se levar em conta essa possibilida-de, oportunidades de prevenção e tra-tamento podem estar sendo perdidas,com prejuízos para a população e o pró-prio SUS. Nos hospitais, o número decrianças internadas tem aumentado, exi-gindo maior investimento em recursoshumanos e financeiros na rede públicade saúde destinados a esta população.

Os pesquisadores Maria ElisabethMoreira, coordenadora da Unidade dePesquisa Clínica do Instituto FernandesFigueira (IFF/Fiocruz), e Marcelo Goldani,da Universidade Federal do Rio Grandedo Sul, em artigo recém-publicado narevista Ciência & Saúde Coletiva, desta-cam que o acesso a tecnologias moder-nas permitiu o aumento da sobrevida decrianças que antes não chegariam à ida-de adulta, criando assim uma nova rea-lidade para a saúde pública. “Amortalidade infantil caiu; as taxas dealeitamento materno e o acesso às va-cinas e ao pré-natal aumentaram”, ana-lisam. Segundo os autores, em paísesdesenvolvidos, 90% das crianças nasci-das com doenças crônicas já alcançama idade adulta, o que demanda grandeinvestimento em tecnologias.

Por outro lado, o número de par-tos prematuros e a incidência de obe-sidade também aumentaram. “Aprevalência de obesidade na infânciavem aumentando. Em alguns locais jáchega a 30%. Se nada for feito, estageração de crianças obesas poderá ser

a primeira em dois séculos que teráuma expectativa de vida menor do quea de seus pais”, alertam os pesquisa-dores. Para eles, boa parte do proble-ma poderia ser resolvida apenas comprevenção e promoção da saúde.

Para Maria Elisabeth, a prevençãodas doenças crônico-degenerativas ain-da na infância pode ser determinantepara viabilizar o sistema de saúde nofuturo, em função dos altos custos de-mandados para tratamento. “Uma dro-ga mal usada na infância pode, porexemplo, comprometer para semprea função renal, predispondo a doen-ças renais precoces na vida adulta, quevão demandar um grande investimen-to dos serviços de saúde”, explica.

Apontado pelo Mais Saúde, o Pro-grama de Aceleração do Crescimento(PAC) da Saúde, como problema críti-co a ser combatido até 2011, as doen-ças crônico-degenerativas aumentamos gastos com internações, que repre-sentam R$ 11,3 milhões ao ano parao SUS. E boa parte deste valor podeestar sendo usado para cuidar de cri-anças e jovens.

Aluna que acaba de concluir omestrado profissional em saúde da cri-ança e da mulher do IFF, Josélia Duarteanalisou o perfil dos pacientes interna-dos nas pediatrias dos quatro maioreshospitais da rede pública da cidade doRio de Janeiro, no período de janeiro adezembro de 2008. Das 170 interna-ções analisadas, mais da metade dascrianças internadas nas enfermarias depediatria eram portadoras de doençascrônicas. “Identificamos a necessidade

de reorganização dos serviços pediátri-cos visando garantir estrutura e proces-sos de cuidado adequados para omanejo, o tratamento e o acompanha-mento de pacientes com histórico dereinternações, internações prolongadase necessidades de cuidado multidisci-plinar”, explica a orientadora da pes-quisa, Maria Auxiliadora Gomes.

Pesquisa e assistência

O IFF desenvolve pesquisa e ofe-rece assistência a crianças portadorasde doenças crônico-degenerativas,provocadas ou não pela condição ge-nética do paciente. No Departamentode Genética Médica do Instituto, omaior volume de atendimentos intra-hospitalares em patologias crônico-de-generativas tem sido para as doençasde depósito lisossômico (distúrbios me-tabólicos e hereditários raros), comoas mucopolissacaridoses (que podemcausar danos neurológicos irreversíveise deformidades ósseas que limitam pro-gressivamente as articulações) e a do-ença de Pompe (associada à miopatiaprogressiva, dificuldade de respiração,hipertrofia cardíaca e desenvolvimen-to motor prejudicado). A equipe daárea de genética, em conjunto com oDepartamento de Pediatria, tambémé responsável pela coordenação naci-onal do Programa de OsteogêneseImperfeita (condição caracterizada porgrande fragilidade óssea e fraturas re-correntes que levam a deformidades),sendo o IFF referência nacional para otratamento dessa doença.

No bairro da Zona Norte do Rioonde se localiza a sede da Fiocruz, oIFF realiza um projeto no âmbito da ini-ciativa Teias – Escola Manguinhos, quevisa constituir um território integrado desaúde com um modelo participativo degestão. A intenção do projeto é fazerum levantamento de quem são e comovivem crianças e adolescentes portado-res de doenças crônicas residentes nacomunidade de Manguinhos. “A partirdessas informações, a ideia é facilitar eviabilizar o cuidado qualificado paraeste público, para que ele tenha me-lhor qualidade de vida e o seu direito àsaúde contemplado”, diz a pesquisa-dora do IFF Martha Moreira.

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A serviço dosmovimentos sociaisLado a lado com eles, Escola Politécnica da Fiocruz contribuipara promover a saúde e a educação, na cidade e no campo

SOCIEDADE

Talita Rodrigues

utar por uma sociedademenos desigual, em quea saúde e a educação pú-blica sejam universais: épara isso que a Escola Po-

litécnica de Saúde Joaquim Venâncio(EPSJV/Fiocruz) vem se aproximandocada vez mais dos movimentos soci-ais. “Nosso projeto de escola entendeque a educação é um projeto de soci-edade e de transformação das desi-gualdades sociais. Lutamos para reduziras injustiças e ampliar o acesso a polí-ticas públicas. A associação com osmovimentos sociais é uma decorrên-cia, coerente com o nosso trabalho emodo de pensar. Entendemos que asaúde e a educação públicas são di-reitos dos trabalhadores e, por isso,queremos qualificar melhor a pauta deluta deles”, explica a diretora daEPSJV, Isabel Brasil.

LFotos Divulgação EPSJV

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Mas o que são esses movimentossociais? Virgínia Fontes, professora-pes-quisadora da EPSJV e da UniversidadeFederal Fluminense (UFF), responde:“A Escola vem trabalhando com mo-vimentos sociais de base popular quese organizam para lutar por direitos,contra as desigualdades sociais e con-tra as iniquidades no âmbito da edu-cação e da saúde”. Alguns exemplossão o Movimento dos TrabalhadoresRurais Sem Terra (MST), colônias depescadores e sindicatos. “O Estado bra-sileiro foi sempre mais permeável à so-ciedade civil quando ela representaentidades patronais ou com forte vín-culo empresarial. Portanto, açõescomo essas representam apenas opagamento de uma dívida histórica queo Estado tem com a população brasi-leira, composta majoritariamente portrabalhadores”, defende Virgínia, des-tacando que essa é uma função urgen-te, legítima e necessária de instituiçõescomo a Fiocruz.

Construção coletiva

As propostas de cursos são sem-pre construídas em conjunto com osmovimentos sociais. “Temos aprendi-do muito, particularmente na aproxi-mação com o MST e seu métodopedagógico, que tem ajudado a quali-ficar o nosso projeto politécnico”, ob-serva a vice-diretora de Ensino eInformação da EPSJV Márcia ValériaMorosini. Ela destaca que um dos ins-trumentos metodológicos utilizadospara fazer a integração entre teoria eprática é a alternância entre o tempoescola, quando são realizadas as au-las dos cursos, e o tempo comunida-de, intervalo entre as etapas dos cursos,quando os alunos socializam os conhe-cimentos aprendidos nas aulas e reali-zam pesquisas e trabalhos de campopara aprofundar os ensinamentos. Aexperiência com o MST fez com que otempo escola passasse a ser divididoem tempos educativos (tempo leitura,tempo reflexão escrita, tempo cultura,entre outros), que incluem não só osconteúdos do programa do curso, mastambém atividades de formação geral.

O Curso de Especialização Técni-ca em Políticas Públicas de Saúde para

a População do Campo é um exem-plo de formação para trabalhadores demovimentos sociais construída pelaEPSJV em conjunto com os integran-tes dos movimentos. A primeira dastrês etapas foi realizada em junho de2010; a segunda ocorreu em novem-bro deste ano; e a conclusão está pre-vista para fevereiro de 2011. O cursofaz parte do projeto Formação de Con-selheiros de Saúde para o Campo, fi-nanciado pela Secretaria de GestãoParticipativa do Ministério da Saúde,e tem, como educandos, 40 integran-tes do MST, do Movimento dos Peque-nos Agricultores e do Movimento dasMulheres Camponesas. “Durante otempo comunidade, os alunos estãofazendo uma pesquisa de campo so-bre os sistemas de saúde locais. Essasinformações serão sistematizadas nasaulas para que eles possam compre-ender a organização dos sistemas desaúde onde vivem”, explica o profes-sor-pesquisador da EPSJV André Burigo,que integra a coordenação político-pedagógica do curso junto com Valé-ria Carvalho e André Dantas.

Em 2011, a EPSJV vai dar início aoCurso de Especialização (pós-gradua-ção) em Trabalho, Educação e Movi-mentos Sociais. “Os alunos serãotrabalhadores rurais”, explica PauloAlentejano, que coordenará o cursojuntamente com Virgínia Fontes. Estáem andamento o processo para que após-graduação tenha financiamento doPrograma Nacional de Educação naReforma Agrária (Pronera) do InstitutoNacional de Colonização e ReformaAgrária (Incra).

Todas essas ações da EPSJV têmsido também processos formativospara os profissionais da Escola. “O pri-meiro encontro com o método peda-gógico do MST é um choque cultural.A forma de organização do tempo es-colar é diferente, a gestão do cursoenvolve os alunos, todos são respon-sáveis pelo processo educativo. Issoalimenta a reflexão dos nossos profis-sionais. Eles têm um projeto de socie-dade muito próximo do nosso e issoalimenta a produção da Escola”, dizAndré Burigo. “A qualificação é mú-tua. Nós oferecemos nossos conheci-

mentos e eles nos qualificam em ques-tões como a saúde no campo, meioambiente, necessidades na área desaúde e da educação”, observa Már-cia Valéria.

Pesquisar para ensinar

O trabalho com movimentos soci-ais impõe desafios tão específicos que,para montar os primeiros cursos, foipreciso desenvolver pesquisas sobre arealidade dessa população e suas de-mandas. “Precisávamos saber como oMST entendia a saúde, o processo saú-de-doença e que tipo de formação elesbuscavam. Eles não querem só um trei-namento, querem uma formação quealie a luta política a questões de saú-de e meio ambiente. Buscam tambémuma formação humana parecida coma oferecida pela EPSJV”, diz o vice-diretor de Pesquisa e Desenvolvimen-to Tecnológico da EPSJV, MaurícioMonken, que coordenou, em 2006, apesquisa cujos resultados deram a basepara a proposta do Curso de Especiali-zação Técnica de Nível Médio em Saú-de Ambiental para a População doCampo, concluído em 2009. Na últi-ma etapa, os alunos apresentaram aspropostas de intervenção, elaboradasno decorrer do curso: muitos implan-taram total ou parcialmente os projetos— como a criação de fossas, a defesadas fontes de água e outras ações desaneamento — em suas localidades.O financiamento desse curso foi possí-vel a partir da cooperação técnico-ci-entífica firmada entre a CoordenaçãoGeral de Vigilância Ambiental em Saú-de da Secretaria de Vigilância em Saú-de do Ministério da Saúde e avice-presidência de Ambiente, Aten-ção e Promoção da Saúde da Fiocruz.Apesar da experiência, a necessidadede aprender antes de formar não aca-bou. A EPSJV está desenvolvendo,atualmente, outra pesquisa para sub-sidiar a realização de cursos em as-sentamentos de Santa Catarina e doCeará — desta vez, com recursos deum edital Fiocruz e CNPq.

As especificidades no trabalho comos movimentos sociais não aparecemapenas nos projetos de construção dosplanos de curso, mas também em

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questões práticas como a documenta-ção escolar e alojamento para os alu-nos, que vêm de várias partes do país.“No caso do MST, uma das dificulda-des é obter os documentos escolaresdaqueles que, por estarem acampa-dos (e não assentados), já estudaramem muitos lugares diferentes. Fazemostodo o esforço para não excluir essaspessoas dos processos de formação.Quando os cursos são nacionais, é pre-ciso também ter condições de aloja-mento e o Centro de ReferênciaProfessor Hélio Fraga da Escola Nacio-nal de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz)tem sido um grande parceiro nosso”,diz Márcia Valéria.

Agentes comunitários:da cidade e da aldeia

Além da militância do campo, aEPSJV também tem ações articuladascom movimentos sociais urbanos. Umadelas é com o Sindicato dos AgentesComunitários de Saúde (Sindacs) domunicípio do Rio de Janeiro. “O apoioda EPSJV na organização dos trabalha-dores da nossa categoria colaborou paraque a Associação Municipal dos Agen-tes Comunitários de Saúde (Amacs) setransformasse no Sindacs, em feverei-ro de 2010. Com o sindicato, temosmais representatividade”, diz o presi-

dente do Sindacs, Ronaldo Moreira. Ainiciativa de criar o sindicato ganhouforça após um seminário promovido pelaEPSJV em 2009, que contou com tra-balhadores de todo o município e dis-cutiu, principalmente, aspectos dalegislação e da regulamentação do tra-balho dos agentes comunitários de saú-de (ACS), com ênfase na necessidadede organização da categoria.

A EPSJV tem buscado apoiar tam-bém a luta dos ACS pelo direito à for-mação. Como uma das estratégias, aEscola desenvolve, em parceria com aSecretaria Municipal de Saúde e Defe-sa Civil do Rio de Janeiro (SMSDC) e oCentro de Saúde - Escola GermanoSinval Faria da Ensp, um projeto-pilotode formação técnica desses trabalha-dores. Os alunos do curso são ACS quetrabalham na região de Manguinhos,na cidade do Rio de Janeiro, e serão osprimeiros do estado a receberem a for-mação completa, quando o curso forconcluído, em 2011. A EPSJV está,atualmente, discutindo com o Sindacs,a Escola Técnica Izabel dos Santos e aSMSDC a possibilidade de expansãodessa formação técnica para todos osACS do município do Rio de Janeiro.

Na outra ponta do Brasil, na regiãodo Alto do Rio Negro, organizações elideranças indígenas, coordenadas pela

Federação das Organizações Indígenasdo Rio Negro (Foirn), protagonizam lu-tas parecidas: pela formação profissio-nal e elevação da escolaridade de seusagentes de saúde. Por isso, com umaproposta pioneira que contextualiza arealidade indígena com a formaçãotécnica, integrada à ampliação da es-colaridade, a EPSJV iniciou em 2009 oCurso Técnico de Agente ComunitárioIndígena de Saúde, em parceria com aFiocruz Amazônia. O objetivo é qualifi-car 250 agentes comunitários indíge-nas de saúde, resgatando as tradições,valorizando e sistematizando seus sa-beres sobre a saúde. Os cursos de ensi-no fundamental e médio dos agentesficaram a cargo da Secretaria Munici-pal de Educação de São Gabriel da Ca-choeira e da Secretaria Estadual deEducação do Amazonas.

A formação técnica em meio am-biente integrada ao ensino médio volta-da para jovens e adultos e umaespecialização técnica em gestãosociopolítica do território são dois outroscursos que estão sendo desenvolvidospela EPSJV em conjunto com organiza-ções de movimentos sociais. Nesse caso,os envolvidos são, especificamente, aspopulações de Manguinhos e Jacarepa-guá, no Rio de Janeiro. Os planos decurso serão um dos resultados de um

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projeto financiado com recursos doEdital de Cooperação Social lançadopela Presidência da Fiocruz em 2009.Essas ações, no entanto, não acabamcom o projeto. Ao contrário: a EPSJVcriou um grupo de trabalho que vaiatuar permanentemente com essesmovimentos, buscando fortalecer o de-senvolvimento territorial sustentável eas iniciativas comunitárias.

Territórios urbanos

A pesquisa científica socialmen-te engajada não gerou só cursos naEPSJV. O recém-lançado documentá-rio Território de Sacrifício ao Deus doCapital: o caso da Ilha da Madeira,por exemplo, foi produzido a partirdo trabalho realizado com duas as-sociações de pescadores da Ilha daMadeira, no Rio de Janeiro. O pro-fessor-pesquisador da EPSJV Marce-lo Bessa desenvolveu uma pesquisasobre o passivo ambiental gerado poruma indústria na região. O filme, quemostra como a vida na ilha foiafetada com a chegada de grandesempreendimentos econômicos, foisugerido pelos moradores e feitocom a participação deles em ofici-nas e no roteiro do documentário,que está disponível no site da EPSJV(www.epsjv.fiocruz.br).

Recentemente, a EPSJV voltou aestar atenta a essa região. Dessa vez,movimentos sociais estão denuncian-do uma situação de risco generaliza-do à saúde da população provocadopor um complexo siderúrgico instala-do em Santa Cruz. A Fiocruz, pormeio da EPSJV e da Ensp, participoude uma missão de solidariedade e in-vestigação das evidências de risco àsaúde ambiental e da população daregião. “Identificamos uma situaçãode vulnerabilidade socioambiental. Ainfluência da empresa é tão grande,que, apesar das denúncias de polui-ção, é ela que desenvolve, por exem-plo, ações de educação ambientalnas escolas — naturalmente, semabordar os impactos causados porela”, explica o professor-pesquisadorda EPSJV Alexandre Pessoa, que par-ticipou da missão. No momento, estásendo elaborado um dossiê técnicopara subsidiar a investigação do casopelo Ministério Público.

Agrotóxicos

Outra frente de trabalho relacio-nada às lutas dos movimentos sociaisé o combate ao uso de agrotóxicos.Em setembro, a EPSJV organizou, jun-to com a Vice-Presidência de Ambi-ente, Atenção e Promoção da Saúde

Jornada dosSem-Terrinha

Em 2010, a etapa regionalda 13ª Jornada Nacional dosSem Terrinha ocorreu na EPSJV,de 9 a 11 de outubro. Estudan-tes e trabalhadores da EPSJVparticiparam das oficinas reali-zadas durante o encontro, quereuniu 140 crianças de famíli-as acampadas ou assentadas.Além disso, os professores tra-balharam, em sala de aula,com os alunos da Escola, o con-teúdo da matéria sobre esco-las rurais publicada pelaRevista Poli especialmentepara o evento.

da Fiocruz e a Via Campesina, o Se-minário Nacional contra o Uso deAgrotóxicos, que contou com repre-sentantes de mais de 30 movimentossociais, universidades e entidadesambientalistas. O evento discutiu os pro-blemas (especialmente os de saúde)causados pelo modelo de agronegócioadotado pelo Brasil, hoje o maior con-sumidor de agrotóxicos do mundo.

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EXPERIMENTAÇÃO ANIMAL

T

Pequenos brinquedos,

Miriam Ribas

odos os animais devem:ser livres de fome e sede;ser livres de desconfortotermal e físico; ser livresde medo e estresse; ser

livres de dor e doenças; e ter liberda-de para expressar seus comportamen-tos naturais. Estes são os cincoprincípios básicos da ciência do bem-estar dos animais que vivem em cati-veiro. O assunto é polêmico, pois aprópria palavra cativeiro, por si só, jápode causar a impressão de descon-forto. Mas o fato é que, com medidassimples, é possível, sim, promover obem-estar desses animais. Quem ga-rante é o biólogo Miguel Ângelo Brück,do Centro de Criação de Animais deLaboratório (Cecal/Fiocruz).

Brück dedica-se a estabelecer con-dições para uma melhor qualidade devida dos animais criados e mantidospela Fiocruz para fins de pesquisabiomédica, o que inclui, por exemplo,desenvolvimento de novos medica-mentos e vacinas. Para gerar um am-biente agradável e interativo, queatenda às necessidades físicas, cogni-tivas, sensoriais, sociais e nutricionaisdos bichos, uma importante ferramen-ta é o enriquecimento ambiental, queviabiliza a quebra da rotina nas colô-nias e já é utilizada em diferentes uni-dades da Fundação.

Simples alterações na forma deapresentação dos alimentos que com-põem o cardápio dos animais, bemcomo o fornecimento de brinquedos eoutros objetos, trazem resultados ex-pressivos na quebra da rotina de umgrupo. A última campanha adotada noCecal foi recolher caixas de leite lon-ga vida vazias para a confecção de“picolés de fruta”, com a intenção detrabalhar nos primatas estímulosgustativos e táteis.

Medidas simplespromovem o bem-estar de animaiscriados em cativeiro

grandes resultados

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Em seu habitat natural, os animaisestão em constante busca por alimen-to, água, território, parceiro sexual eabrigo, entre outras necessidades. Asexperiências são renovadas diariamen-te, trazendo desafios, conquistas e sen-sações diferenciadas. Já nos ambientesartificiais, eles recebem alimentação,cuidados e toda a atenção de que pre-cisam – um zelo essencial, por um lado,mas, por outro, cerceador, pois impos-sibilita que os animais expressem todoo seu repertório comportamental. E éjustamente aí que entra o enriqueci-mento ambiental.

“Com técnicas específicas relacio-nadas ao comportamento, essa inicia-tiva minimiza situações de desconfortofísico e psicológico dos animais manti-dos em cativeiro”, diz Brück. Mas nãobasta colocar uma flor do lado de forado recinto ou apenas oferecer uma bolacolorida como brinquedo. O tipo deenriquecimento ambiental a ser adota-do depende de uma série de fatores,como idade, sexo, histórico dos ani-

mais, estrutura da instalação e propósi-to da intervenção.

Até bem pouco tempo atrás o tema“bem-estar animal” não tinha o trata-mento adequado nas instituições deensino e pesquisa científica, tanto pú-blicas quanto privadas. Em meados dosanos 90 foi possível notar um maior es-clarecimento sobre o tema no Brasil,inclusive da população civil, por meiodas organizações não governamentais.Na Fiocruz, a questão é abordada comoparte fundamental do processo de cri-ação de animais, sendo o Cecal umareferência no assunto. Técnicas diversi-ficadas de enriquecimento ambiental sefazem cada vez mais presentes no diaa dia dos profissionais que cuidam dosanimais da unidade.

Em fase de implantação nas colô-nias de roedores e coelhos do Cecal, oenriquecimento ambiental começa a seruma realidade tanto na criação quantona experimentação, já que a Comis-são de Ética de Uso de Animais (Ceua/Fiocruz) tem determinado seu uso nos

projetos de pesquisa da Fundação. “In-vestimentos em equipamentos adequa-dos, tecnologia e capacitação dosprofissionais que atuam na área sãoalgumas das ações que a Fiocruz jáimplantou nas unidades”, afirma Brück.Um grande exemplo é a patente doproduto “elos giratórios para enrique-cimento ambiental”, desenvolvido porBrück com participação direta do re-presentante do Núcleo de InovaçãoTecnológica (NIT/Cecal), Paulo AbílioVarela Lisboa.

O invento “elos giratórios para enri-quecimento ambiental” foi desenvolvi-do por Brück após anos de dedicação àscolônias de primatas do Cecal. O apa-relho tem como principal característicao giro independente dos elos, em fun-ção de uma peça de torção, o que pos-sibilita ao animal girar em direçõesopostas ou permanecer estático enquan-to outro brinca acima ou abaixo. É con-siderada uma forma ideal de atividadelúdica, que aumenta a interação dos gru-pos com segurança e criatividade.

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RESENHAS

Raça como questão

Marcos Chor Maioe Ricardo VenturaSantos (orgs.)314 p., R$ 38Editora Fiocruz

Trata-se de umacoletânea de en-saios organizada

pelos pesquisadores Marcos ChorMaio, da Casa de Oswaldo Cruz (COC/Fiocruz), e Ricardo Ventura Santos, daEscola Nacional de Saúde Pública(Ensp/Fiocruz). O livro Raça como ques-tão: história, ciência e identidades noBrasil propõe colocar o conceito raçana interface entre os três domínios emque vem sendo elaborado historica-mente: científico, político e social. Areflexão dos autores, harmônica, de-terminada e polêmica, começa em finsdo século 19, passando por temáticascomo pensamento higienista, estudosde mestiçagem, modelos de antropo-logia física, sistema de cotas e políti-cas atuais de racialização.

‘Nosso RemédioÉ a Palavra’

Edemilson Antunesde Campos191 p., R$ 25Editora Fiocruz

Baseado em umaprofunda investiga-ção etnográfica, olivro descreve o uni-verso cultural dos

Alcoólicos Anônimos no Brasil e tentacompreender o modo como as repre-sentações propostas permitem quehomens e mulheres ligados à institui-ção se estabilizem em relação ao ál-cool. ‘Nosso Remédio É a Palavra’: umaetnografia sobre o modelo terapêuticode Alcoólicos Anônimos é resultado datese de doutorado do autor, o profes-sor da Universidade de São Paulo (USP)Edemilson Antunes de Campos, e

O Brasil e ocapital-imperialismo.Teoria e história

Virgínia FontesEPSJV e EditoraUFRJ388 p., R$ 32

Parte da coleçãoPensamento crí-tico e assinadopela historia-

dora e professora-pesquisa-dora Virgínia Fontes, da EscolaPolitécnica de Saúde Joaquim Venâncio(EPSJV/Fiocruz) e da Universidade Fe-deral Fluminense (UFF), o livro propõeum retorno aos clássicos para compre-ender o papel desempenhado peloBrasil nas formas contemporâneas doimperialismo capitalista. Ancoradanum referencial marxista, a autorarevisita e atualiza o trabalho de Leninsobre imperialismo e recorre a Gramscipara entender, entre outras coisas, asociedade civil brasileira e o papel deuma burguesia “nacional”. As condi-ções de luta de classe no Brasil con-temporâneo e o aprofundamento dasrelações capitalistas brasileiras, marca-do por expropriações intensificadas,também são apresentados no livro.

Trabalho, educaçãoe correntes pedagógicasno Brasil

Marise RamosEPSJV e EditoraUFRJ290 p., R$ 22

A obra Traba-lho, educação ecorrentes pe-dagógicas no

Brasil: um estudo a partir daformação dos trabalhadores técnicosda saúde, da professora-pesquisadora

Educaçãoe trabalhoem disputano SUS

Márcia ValériaMorosiniEPSJV201 p., R$ 15

As políticas de educação profissionalem saúde também são tema do livroEducação e trabalho em disputa noSUS: a política de formação dos agen-tes comunitários de saúde, da profes-sora-pesquisadora da EPSJV/FiocruzMárcia Valéria Morosini. Por meio deuma análise rigorosa de vários docu-mentos, a autora revisa as etapas deformulação da política de formaçãodos agentes comunitários de saúdeentre 2003 e 2005. Baseada emGramsci e outros autores marxistas,ela discute conceitos como qualifica-ção profissional e trabalho simples. Olivro está disponível na íntegra no sitewww.epsjv.fiocruz.br.

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apresenta também investigações sobreassociações do tipo na França, o quepropicia ao leitor um fecundo distanci-amento do âmbito brasileiro e a des-coberta de suas especificidades.

da EPSJV/Fiocruz e da Universidade doEstado do Rio de Janeiro (Uerj) MariseRamos, apresenta uma sistematizaçãocrítica das concepções de educaçãoexistentes, passando por conceitoscomo o de politecnia e de ensino emserviço. Esse é o pano de fundo paraque, em seguida, a autora analise osreferenciais teóricos que orientam aspolíticas e práticas da educação pro-fissional em saúde no Brasil, com foconas Escolas Técnicas do Sistema Úni-co de Saúde (SUS).

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Diálogo sobre violência na escola

Impacto da violência nas escolas

Simone Gonçalves de Assis, PatríciaConstantino e Joviana Quintes Avanci (orgs.)

270 p., R$ 42

Editora Fiocruz(21) 3882-9039 / [email protected]/editora

Renata Moehlecke

romover uma cultura dedireitos humanos a partirdo estímulo ao debate datemática violência nas es-colas: este é o principal

objetivo do livro Impacto da violêncianas escolas – um diálogo com profes-sores, organizado pelas pesquisadorasSimone Gonçalves de Assis, PatríciaConstantino e Joviana Quintes Avanci,do Centro Latino-Americano de Estu-dos da Violência e Saúde Jorge Carelida Escola Nacional de Saúde Pública(Claves/Ensp/Fiocruz). Publicada pelaEditora Fiocruz, a obra reúne textos quetêm como base, por exemplo, as con-dições de trabalho na escola; a violên-cia familiar e como ela se reflete noâmbito escolar; as agressões entre osdiversos atores escolares; as represen-tações culturais das identidades degênero, sexuais e de cor de pele e suasrelações com formas de violência pre-sentes nas escolas; e os danos físicos,emocionais, comportamentais e

cognitivos evidenciados por crianças eadolescentes que sofrem abusos.

“Nesse livro queremos refletir so-bre as formas de violência presentesnas escolas brasileiras: tanto aquelasque se originam em diversos espaçossociais e invadem o espaço escolarquanto aquelas que na escola germi-nam e dão frutos que repercutem nocotidiano e na vida social de uma for-ma mais ampliada”, afirmam as pes-quisadoras na apresentação da obra.“A reflexão que procuramos estimularvisa a atingir professores e demais in-tegrantes da equipe escolar, que seveem aturdidos diante de problemasque não foram preparados para enfren-tar, ao longo dos anos de formaçãoacadêmica. Buscamos também sensi-bilizar os gestores do ensino público eprivado para a importância de se de-bater sobre a questão da violência nasescolas e sobre o papel a ser desem-penhado por cada um dos atores queconformam o sistema de ensino”.

Com linguagem didática, repleto dereferências bibliográficas e ilustrações,

o livro é dividido em nove capítulos, sen-do os dois primeiros dedicados às basesteóricas que norteiam todo seu conteú-do. “Trazemos algumas conceituaçõessobre violência que transitam nas áreasde educação, saúde e segurança públi-ca, sem a pretensão de dar ao leitor umaúnica definição ou uma ‘verdade abso-luta’. Pelo contrário, queremos que eleelabore criticamente a sua visão sobretema tão complexo e diversificado”,comentam as organizadoras.

A obra ainda chama atenção paraa importância da atuação da escola naprevenção da violência, enfatizando opapel que deve ser desempenhado porprofessores, direção e toda a equipeescolar como integrantes de uma redede proteção de crianças e adolescen-tes. “O último capítulo tem comoobjetivo estimular o professor a elabo-rar um plano de intervenção local paraprevenção e redução da violência naescola. São apresentados alguns exem-plos de programas bem sucedidos rea-lizados em vários países do mundo,inclusive no Brasil”, destacam.

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FIO DA HISTÓRIA

Uma vidadedicada àciência

Hermann e os pais, Otto e Zulmira

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ORenata Fontoura

ano em que o InstitutoOswaldo Cruz (IOC/Fio-cruz) e a Fiocruz come-moram 110 anos deexistência também ficará

marcado pela perda de um de seusmaiores expoentes. Com quase meioséculo dedicado à ciência nacional, ovirologista Hermann Schatzmayr mor-reu, aos 74 anos, no último mês dejunho. O pesquisador traçou um currí-culo que acompanhou a própria histó-ria da virologia no país: estudou apandemia de gripe de 1957-58 no Riode Janeiro; participou dos esforços deerradicação da varíola e de combate àpoliomielite no país; e produziu desta-

cados estudos em dengue, sendo in-clusive o responsável pelo isolamentodos vírus da dengue 1, 2 e 3 no Brasil.

Em razão das comemorações doaniversário do IOC, no dia 19 de maio,o virologista concedeu sua última en-trevista à equipe de comunicação doInstituto. “A primeira vez em que en-trei no campus da Fiocruz foi em 1955.Eu era representante de turma na uni-versidade e fui falar com o professorHugo de Souza Lopes. Saltei do ôni-bus, subi a rampa e as escadas ao ladoda Casa de Chá e olhei para cima. Vio castelo e tremi. Lembro da emoçãoque senti e até hoje me emociono”,contou o virologista. Além de declararseu amor e dedicação à ciência, ovirologista deixou clara sua preocupa-ção social. “Sempre trabalhei com focona doença, no doente e na carênciada nossa população”, disse.

Trajetória

Schatzmayr ingressou na Fiocruz em1961, onde atuou desde então, afas-tando-se apenas durante períodos noexterior para estudos. Criou o Departa-mento de Virologia no IOC, que deuorigem a diversos centros de referên-cia nacionais e internacionais. Ocupou

o cargo de presidente da Fio-cruz entre 1990 e 1992, quan-do criou o FioSaúde (plano de

Um dos virologistasde maior destaqueno país, HermannSchatzmayr teve papelfundamental no comba-te à varíola e à pólio eem estudos da dengue

saúde dos trabalhadores da Fundação).Membro da Academia Brasileira de Me-dicina Veterinária e da Academia Bra-sileira de Ciências, integrou várioscomitês internacionais da OrganizaçãoMundial da Saúde (OMS).

Carioca, filho de pai austríaco,Schatzmayr formou-se em medicinaveterinária na Universidade FederalRural do Rio de Janeiro na década de1950. Durante o curso, foi monitor dacadeira de microbiologia. Por sugestãode um dos professores, matriculou-seno curso de microbiologia da Universi-dade do Brasil (atual Federal do Rio deJaneiro) e tornou-se aluno da segundaturma. A capacitação lhe rendeu umaoportunidade como bolsista de virologiaem um laboratório da própria universi-dade. Neste período, estudou amostrasde uma grande epidemia de influenzaque houve no Rio entre 1957 e 1958.

Antes de chegar ao IOC, a trajetóriade Schatzmayr ainda incluiu atuaçõesem importantes centros de pesquisas– como a Universidade de Viena, naÁustria, onde publicou seus primeirostrabalhos científicos. Já no Instituto, aconvite do pesquisador Lauro Travas-sos, o virologista passou a integrar aequipe formada para atuar em umnovo laboratório que contemplaria es-tudos sobre a poliomielite, com o su-porte da OMS. “Eu era o únicopesquisador da área de virologia. No

O virologista foipresidente da Fiocruzentre 1990 e 1992

Jorge de Carvalho/Fiocruz

Arquivo pessoal

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laboratório, fazíamos isolamento do ví-rus da pólio, identificação, estudo desurtos e da resposta à vacina oral – avacina Sabin começava a ser usada.Pouco depois, o Brasil passou a impor-tar a Sabin concentrada e nós cuidá-vamos da diluição e da distribuição davacina para todo o país”, afirmou.

Pioneirismo

Em seguida, tornou-se coordena-dor da área de virologia do IOC, cargoque ocupou durante 30 anos. “Meucompromisso era fortalecer a virologia.Para isso, sempre integrava novos pes-quisadores e estimulava a equipe afazer cursos no exterior. Éramos umgrupo muito unido e atuante. Criamosos primeiros laboratórios de pólio, he-

patite e rubéola no Rio de Janeiro”,contou Schatzmayr.

Na década de 1980, quando a epi-demia de dengue já preocupava emalguns países da América Latina, de-dicou-se ao estudo do vírus, isolandopela primeira os tipos 1, 2 e 3 no Bra-sil. Nesta época, já contava com ocompanheirismo, também no labora-tório, da esposa Ortrud Monika Barth,pesquisadora da Fiocruz.

No final dos anos 1990, passou ainvestigar casos de poxvírus em animaise humanos. Trata-se da emergência deuma doença causada pelo vírus vacinalda varíola. Com isso, depois de muitosanos, voltou a estudar o vírus da vaci-na, projeto ao qual vinha se dedican-do atualmente.

Em 2009, lançou o livro A viro-logia no Estado do Rio de Janeiro –uma visão global, em parceria como pesquisador Maulori Cabral, daUniversidade Federal do Rio de Ja-neiro. A publicação, que Schatzmayrfez questão de disponibilizar gratui-tamente na internet, apresenta umaperspectiva global e histórica dessecampo de pesquisa no estado, des-de seus primeiros fatos registradosaté as epidemias modernas. Acessea obra em www.ioc.fiocruz.br, noitem Publicações. Além do legadoe da contribuição expressiva à pes-quisa científica, Hermann Schatz-mayr deixou gerações de alunos euma legião de admiradores dentroe fora da Fiocruz.

Leia mais sobre Schatzmayr (1936-2010)na seção Especiais da Agência Fiocruzde Notícias (www.fiocruz.br/ccs)

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