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1 O PAC-Manguinhos: política urbana, usos e representações da cidade 1 Mila Henriques Lo Bianco Orientação: Mariana Cavalcanti (CPDOC/FGV) 2 Resumo: A implementação do Programa de Aceleração do Crescimento, desde 2008, em Manguinhos, região do subúrbio carioca, vem alterando as dinâmicas sócio-espaciais até então vigentes no local. Se em relação ao grande volume de investimento, o programa se apresenta como uma ação inédita na favela; no que concerne à política de urbanização e integração social, ele corresponde ao acúmulo de experiências adquiridas pela máquina pública e pela sociedade civil ao longo da história da cidade do Rio de Janeiro. Com base em entrevistas semi-estruturadas e trabalho de campo, este estudo, de cunho etnográfico, busca compreender de que forma a população local está vivenciando essas novas intervenções e de que maneira essa política urbana informa sobre a cidade do Rio de Janeiro como um todo. Palavras-chave: Programa de Aceleração do Crescimento, favela, Manguinhos, urbanização, etnografia, espaço público, política urbana. Introdução: Favela é cidade 3 A experiência do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) no Complexo de Manguinhos constitui objeto de estudo privilegiado para a reflexão sobre o desenvolvimento da cidade do Rio de Janeiro 4 . De um lado, a compreensão da história e da realidade social da região se remete à história da cidade como um todo, às políticas e aos projetos urbanos formulados e nela implementados. Por outro lado, as premissas teóricas do PAC sobre a urbanização de favelas demonstram a incorporação definitiva, 1 Este trabalho começou a ser formulado no âmbito da pesquisa “Bringing the State Back into the Favelas of Rio de Janeiro: Understanding changes in community life after a disarmament and pacification process”, ainda em andamento e desenvolvida por Marcelo Burgos, Mariana Cavalcanti, Mário Brum, Mauro Amoroso, Luis Fernando Almeida Pereira e Janice Perlman. Nela trabalho como assistente de pesquisa de Mariana Cavalcanti no estudo de caso sobre Manguinhos. Desse modo, grande parte do material teórico e empírico aqui articulado se beneficia de um esforço e de uma reflexão intelectual coletiva que vêm sendo realizada desde junho de 2011. 2 Dulce Pandolfi (IBASE e CPDOC/FGV) também foi examinadora deste Trabalho de Conclusão de Curso, finalizado em dezembro de 2011. 3 Frase constantemente proferida por Hebert José de Souza, o Betinho, no âmbito de seus trabalhos realizados no Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (IBASE). 4 O termo ‘complexo’ – e a demarcação espacial correspondente a ele – foi adotado pelo PAC, embora provoque estranhamento nos moradores, os quais não se referem a Manguinhos como tal. Segundo relatos de uma moradora, que têm trajetória de liderança, essa denominação ‘Complexo de Manguinhos’ foi adotada pelo Estado, em especial pela polícia, à ocasião da ampliação e do fortalecimento das facções criminosas nas favelas, a fim de melhor identificálas – e vigiálas em seus pontos de venda e suas áreas de atuação.

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Page 1: O PAC-Manguinhos: política urbana, usos e representações ... · 1" " O PAC-Manguinhos: política urbana, usos e representações da cidade 1 Mila Henriques Lo Bianco Orientação:

1    

O PAC-Manguinhos: política urbana, usos e representações da cidade 1

Mila Henriques Lo Bianco

Orientação: Mariana Cavalcanti (CPDOC/FGV)2

Resumo: A implementação do Programa de Aceleração do Crescimento, desde 2008, em Manguinhos,

região do subúrbio carioca, vem alterando as dinâmicas sócio-espaciais até então vigentes no local. Se em

relação ao grande volume de investimento, o programa se apresenta como uma ação inédita na favela; no

que concerne à política de urbanização e integração social, ele corresponde ao acúmulo de experiências

adquiridas pela máquina pública e pela sociedade civil ao longo da história da cidade do Rio de Janeiro.

Com base em entrevistas semi-estruturadas e trabalho de campo, este estudo, de cunho etnográfico, busca

compreender de que forma a população local está vivenciando essas novas intervenções e de que maneira

essa política urbana informa sobre a cidade do Rio de Janeiro como um todo.

Palavras-chave: Programa de Aceleração do Crescimento, favela, Manguinhos, urbanização, etnografia,

espaço público, política urbana.

Introdução: Favela é cidade3

A experiência do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) no Complexo

de Manguinhos constitui objeto de estudo privilegiado para a reflexão sobre o

desenvolvimento da cidade do Rio de Janeiro4. De um lado, a compreensão da história e

da realidade social da região se remete à história da cidade como um todo, às políticas e

aos projetos urbanos formulados e nela implementados. Por outro lado, as premissas

teóricas do PAC sobre a urbanização de favelas demonstram a incorporação definitiva,                                                                                                                          1   Este   trabalho   começou   a   ser   formulado   no   âmbito   da   pesquisa   “Bringing   the   State   Back   into   the  Favelas   of   Rio   de   Janeiro:   Understanding   changes   in   community   life   after   a   disarmament   and  pacification   process”,   ainda   em   andamento   e   desenvolvida   por   Marcelo   Burgos,   Mariana   Cavalcanti,  Mário   Brum,  Mauro   Amoroso,   Luis   Fernando   Almeida   Pereira   e   Janice   Perlman.   Nela   trabalho   como  assistente   de   pesquisa   de   Mariana   Cavalcanti   no   estudo   de   caso   sobre   Manguinhos.   Desse   modo,  grande   parte   do   material   teórico   e   empírico   aqui   articulado   se   beneficia   de   um   esforço   e   de   uma  reflexão  intelectual  coletiva  que  vêm  sendo  realizada  desde  junho  de  2011.    2  Dulce  Pandolfi  (IBASE  e  CPDOC/FGV)  também  foi  examinadora  deste  Trabalho  de  Conclusão  de  Curso,  finalizado  em  dezembro  de  2011.      3   Frase   constantemente   proferida   por  Hebert   José   de   Souza,   o   Betinho,   no   âmbito   de   seus   trabalhos  realizados  no  Instituto  Brasileiro  de  Análises  Sociais  e  Econômicas  (IBASE).    4  O  termo  ‘complexo’  –  e  a  demarcação  espacial  correspondente  a  ele  –  foi  adotado  pelo  PAC,  embora  provoque   estranhamento   nos  moradores,   os   quais   não   se   referem   a  Manguinhos   como   tal.   Segundo  relatos   de   uma   moradora,   que   têm   trajetória   de   liderança,   essa   denominação   ‘Complexo   de  Manguinhos’   foi   adotada   pelo   Estado,   em   especial   pela   polícia,   à   ocasião   da   ampliação   e   do  fortalecimento  das   facções  criminosas  nas   favelas,  a   fim  de  melhor   identificá-­‐las  –  e  vigiá-­‐las  em  seus  pontos  de  venda  e  suas  áreas  de  atuação.    

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pelo Estado, das idéias de integração e de participação social, ao longo de muito tempo

defendidas por setores intelectuais e por movimentos sociais.

Desse modo, esse estudo busca, por meio do PAC-Manguinhos, analisar a favela

– ou uma política para a favela – não com o objetivo de compreendê-la em si mesma,

mas com intuito de a partir dela pensar a cidade do Rio de Janeiro e seu espaço urbano.

Se a própria máquina pública produz políticas que pressupõem a integração via

urbanização e trabalho social não se trata mais de continuarmos debatendo criticamente

sobre a dicotomia cidade/favela ou asfalto/favela. Antes disso, esse trabalho se constrói

a partir da premissa de que favela é cidade, na medida em que ao estudá-la, aprendemos

mais sobre o lugar em que vivemos e sobre a sociedade que somos5.

Pela primeira vez em sua história, Manguinhos recebe investimentos e

intervenções desse vulto. Até então, a maioria das ações do Estado não passaram de

obras pontuais e limitadas. Os motivos para a região não ter sido abarcada pelo

Programa Favela-Bairro, por exemplo, criado pelo prefeito César Maia em 1993,

revelam como as especificidades locais impõem uma série de dificuldades à ação do

Estado. Inicialmente, o programa contemplava apenas favelas de médio porte e por

Manguinhos ser um conjunto de favelas, ou seja, de grande porte, não se enquadraria.

No entanto, em sua segunda fase, o Favela-Bairro ampliou o número de

domicílios e ainda assim a região não foi beneficiada pela política6. “Segundo [Lu]

Petersen (2009) Manguinhos apresentava “problemas muito complicados”, com

bolsões de pobreza, alta densidade demográfica, o que acarretaria demolição de

                                                                                                                         5  “A  denominação  ‘favela’  (...)  está  relacionada  a  um  determinado  conjunto  de  características.  Refere-­‐se  a  um  espaço  constituído  por  habitações  aglomeradas,  em  geral,  ilegais,  instaladas  em  locais  com  poucas  vias  carroçáveis  e  vários  becos  e  vielas  com  serviços  públicos  precários  (água,  luz,  esgotamento  sanitário  e  pluvial,  escola,  atendimento  médico,  transporte,  lazer).  A  grande  maioria  das  construções  encontra-­‐se  fora  dos  padrões  estabelecidos  como  formais  para  moradias,  utilizando  material  com  características  de  provisoriedade,  contrapondo-­‐se  à   ‘cidade   legal”   (p.  45).  Ver  COSTA,  Renato  Gama-­‐Rosa  e  FERNANDES,  Tânia  Maria.  História  de  Pessoas  e  Lugares:  memórias  das  comunidades  de  Manguinhos.  Rio  de  Janeiro:  Editora  FIOCRUZ,  2009.    6  O  Favela-­‐Bairro  consistiu  em  uma  política  de  urbanização  de   favelas   implementada,  em  duas  etapas  entre   1995   e   2000,   durante   o   primeiro  mandato   do  prefeito   César  Maia   (1993-­‐1997)   e   seu   sucessor-­‐aliado,  Luis  Paulo  Conde  (1997-­‐2001).  O  programa  contava  com  financiamento  do  Banco  Interamericano  de   Desenvolvimento   (BID).   Seus   objetivos   de   redução   do   déficit   urbano   e   de   integração   social  contribuíram   de   forma   significativa   para   a   consolidação   do   paradigma   da   urbanização   como   política  adequada  a  ser  realizada  nas  favelas  –  em  oposição  às  políticas  de  remoção,   largamente  adotadas  nas  primeiras   décadas   do   século   XX   e   ao   longo   da   Ditadura   Militar   (1964-­‐1988),   em   especial   durante   o  governo  Carlos  Lacerda  (1960-­‐1965)  no  estado  da  Guanabara.  Para  informações  mais  detalhadas  sobre  o   assunto   ver   BURGOS,   Marcelo   Baumann.   Dos   Parques   Proletários   ao   Favela-­‐Bairro:   as   políticas  públicas  nas  favelas  do  Rio  de  Janeiro.   In.  ALVITO,  Marcos  e  ZALUAR,  Alba  (org.).  Um  século  de  favela.  Rio  de  Janeiro:  Editora  FGV,  2006.      

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moradias, e com o tráfico de drogas dos mais “truculentos” da cidade. [M.] Garrido

(2009) (...) acrescenta que Manguinhos exigia alternativas de engenharia muito

complexas, ressaltando a peculiaridade do solo, a extrema ocupação, inclusive em

áreas não edificantes, a necessidade de drenagem do terreno e de construção de

elevatória que conduzisse o esgoto sanitário para uma estação de tratamento, além da

necessidade de reassentamento de parte das famílias”. 7Assim, observa-se que os

desafios que estão sendo enfrentados pelo PAC não são poucos, muito menos simples.

Embora ambos os programas possuam características e objetivos distintos, eles

se situam em um longo processo de mudança no tratamento pelo Estado da questão das

favelas nas cidades brasileiras. Se ao longo da história (e em certo ponto até hoje) as

favelas foram vistas como um “problema” a ser solucionado, após muita luta e com a

redemocratização –, isto é, o resgate dos direitos políticos e civis – esses espaços (dentre

eles, muitos já consolidados) foram incorporados oficialmente nos mapas das cidades e

em suas regiões administrativas. Uma iniciativa importante nessa direção foi a

aprovação do Estatuto da Cidade em 2001, cuja regulamentação do uso da propriedade

urbana a partir da regularização fundiária e do usocapião (adotado pelo governo federal

desde 2000) garante a permanência das classes populares nas áreas por elas ocupadas8.

Em 2003, por sua vez, a criação do Ministério das Cidades representou outra grande

conquista da luta no direito pela moradia e à cidade.

Mesmo com esses inegáveis avanços no âmbito legislativo e institucional rumo

ao desenvolvimento de uma cidade mais democrática (no sentido amplo do termo),

observa-se que “a favela continuou a ser tratada por órgãos específicos (...) que

elaboravam e implementavam programas igualmente específicos”.9 Nessa direção, a

partir de um estudo etnográfico, esse trabalho tem como objetivo analisar a forma como

o PAC-Manguinhos está sendo experimentado pela população local e questionar em que

medida essa política urbana pode ser tomada como “nova”, no sentido de transformar as

condições de vida dos moradores da região, auxiliando na redução das desigualdades

sócio-espaciais tão fincadas no processo de formação da cidade do Rio de Janeiro.                                                                                                                          7  COSTA,  Renato  Gama-­‐Rosa  e  FERNANDES,  Tânia  Maria.  História  de  Pessoas  e  Lugares:  memórias  das  comunidades  de  Manguinhos.  Rio  de  Janeiro:  Editora  FIOCRUZ,  2009.  8   “Em  entrevista  ao   Jornal   do  Brasil,   Ermínia  Maricato  afirma  que  o   estatuto   “mexe   em  uma  questão  nodal  da  sociedade  brasileira  que  é  o  patrimonialismo”,  dado  o  grande  lucro  especulativo  e  fundiário  nas  mãos  de  poucos,  e  apresenta  uma  das  soluções  para  a  questão  habitacional  nas  cidades  brasileiras,  que  seria  baratear  o   custo  da   terra  para   torná-­‐la  acessível  à  população  empobrecida”.   (p.  67)  Ver  COSTA,  Renato   Gama-­‐Rosa   e   FERNANDES,   Tânia   Maria.   História   de   Pessoas   e   Lugares:   memórias   das  comunidades  de  Manguinhos.  Rio  de  Janeiro:  Editora  FIOCRUZ,  2009  9  Idem.    

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Em outras palavras, busca-se relativizar as premissas e o discurso oficial da

participação cidadã e da integração social contrapondo-os à forma como a política vem

de fato sendo implementada e de que maneira os indivíduos estão a vivenciando. O

paradoxo entre o esforço, cada vez maior, de planejar uma cidade integrada e a

continuidade na produção de políticas públicas diferenciadas para a favela e para a

cidade (como se fosse possível separá-las) emerge como a questão de pano de fundo

deste trabalho.

Por meio de trabalho de campo e da realização de entrevistas semi-estruturadas,

procura-se refletir até que ponto os diferentes espaços e equipamentos construídos pelo

PAC são capazes de produzir novas formas de interação no espaço público da favela.

Embora ainda seja cedo para constatar impactos mais duradouros na região, já é

possível observar que as obras realizadas no antigo terreno do Departamento de

Suprimentos do Exército (DSUP) configuram um novo espaço público da favela,

destituindo-o da lógica de domínio territorializante do tráfico (suas sociabilidades e

violência, nos momentos de incursões policiais).

No entanto, seus equipamentos ainda são pouco divulgados e utilizados pela

população local, de modo em que seus efeitos sobre o espaço da favela permanecem

restritos à área na qual estão fixados. No que concerne às intervenções mais pontuais –

como construção de praças, quadras, “parquinhos” – espalhadas pelas diferentes áreas

de Manguinhos, verifica-se um processo inverso, cujas intervenções realizadas são

reapropriadas pelo tráfico e depredadas devido ao uso voltado para o consumo de

drogas, dentre outros. As intervenções urbanísticas e sociais realizadas pelo Estado

esbarram, portanto, na questão do controle territorial da região por uma facção

criminosa. E, assim, a área do DSUP se assemelha a uma “bolha” isolada, do resto de

Manguinhos, não havendo integração entre esse espaço e os demais da favela.

Em primeiro lugar, uma contextualização de Manguinhos é feita a partir de suas

condições sócio-econômicas e de seu processo de formação, articulados às ações do

Estado empreendidas na cidade. Em seguida, apresentam-se algumas premissas teóricas

do PAC, em especial, naquilo que concerne à urbanização de favelas. Dando

prosseguimento, com base em material de mídias tradicionais e alternativas, e em

pesquisas já realizadas sobre o assunto, procura-se recapitular o processo de negociação

entre lideranças e militantes locais e as diferentes instâncias do governo em torno do

PAC. E, enfim, toma-se a “fala” dos moradores da região para saber sobre suas opiniões

e expectativas em relação ao impacto dessa política em suas vidas.

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1. Manguinhos e sua história na cidade: a precariedade enquanto reflexo da

presença-ausente do Estado.10

“Como território em disputa, Manguinhos vive a eterna busca de sua vocação e suas

funções na cidade ao longo da história, que passam do lixão ao bairro industrial e área de

transição para alocação de removidos”11.

1.1 Conjuntura sócio-econômica atual

A região de Manguinhos, localizada no subúrbio carioca, constitui-se por um

conjunto de 11 comunidades12 que juntas, somam uma população em torno de 53 mil

habitantes. Em 1988, Manguinhos tornou-se um bairro oficial da cidade. Sua área é

delimitada pela Rua Leopoldo Bulhões, Avenida dos Democráticos, Linha Amarela,

pelo rio Faria Timbó e o rio Jacaré, pelo Canal do Cunha e pelo campus da Fundação

Oswaldo Cruz (FIOCRUZ). Esses rios são hoje verdadeiras valas de esgoto e fonte de

contaminação de doenças de toda sorte, contribuindo para que Manguinhos ocupe o

lugar de segunda região mais poluída do Rio de Janeiro. Originalmente, essa área

correspondia a um extenso manguezal, beirando a Baía de Guanabara, que foi ao longo

do seu processo de ocupação sendo aterrado13.

Essa especificidade de seu terreno de várzea, somada à precariedade das

condições de vida da população local, até hoje, se apresenta como um problema

recorrente na vida dos moradores, devido à grande freqüência de rachaduras nas

estruturas das casas, infiltrações e inundações. Manguinhos possui o 5º pior Índice de

Desenvolvimento Humano (IDH)14 e ocupa a 150ª posição num total de 158 bairros

                                                                                                                         10  As  informações  que  compõem  essa  seção  foram  extraídas  em  grande  parte  de  COSTA,  Renato  Gama-­‐Rosa   e   FERNANDES,   Tânia   Maria.   História   de   Pessoas   e   Lugares:   memórias   das   comunidades   de  Manguinhos.   Rio   de   Janeiro:   Editora   FIOCRUZ,   2009.   E   artigo   dos   mesmos   autores,   Comunidades   de  Manguinhos:   imagens   da   história   de   favelas.   (projeto   da   pesquisa   disponível   em  http://www.conhecendomanguinhos.fiocruz.br/).    11  Idem.    12   Nessa   pesquisa,   seguindo   a   escolha   feita   por   COSTA   e   FERNANDES   (2009),   o   universo   social  trabalhado   engloba   12   comunidades,   tendo   em   vista   a   incorporação   de   Vila   União,   devido   sua  proximidade   espacial   e   sócio-­‐cultural   em   relação   a  Manguinhos,   além   de   também   estar   incluída   nas  obras  do  PAC.  Oficialmente,  entretanto,  essa  área  pertence  à  Benfica.    13  Aterramento  este  que  foi  decorrente,  em  grande  medida,  de  lixo  e  materiais  de  fontes  diversas.    14   Ver   TRINDADE,   Cláudia   Peçanha.   O   Programa   de   Aceleração   do   Crescimento:  Infraestrutura/Urbanização   de   Favelas.   Rio   de   Janeiro,   2007.   O   IDH   foi   criado   em   1990,   pelos  economistas  Amartya  Sen  e  Mahbub  ul  Haq  e  é  utilizado  para  medir  o  grau  de  desenvolvimento  humano  

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contabilizados pelo Índice de Desenvolvimento Social (IDS)15. Segundo o Censo 2010,

10,83% dos seus domicílios não possuem coleta de lixo – sendo este o pior índice do

Rio de Janeiro; 6,28% das pessoas com 5 ou mais anos são analfabetos – 6º pior índice;

34% da população com 10 anos ou mais viviam com até um salário mínimo; e a renda

média mensal corresponde a R$ 424,26 – 5º pior da cidade16.

Além disso, Manguinhos (junto ao Jacarezinho) é conhecido como um dos

redutos mais antigos e fortalecidos do Comando Vermelho, facção criminosa de tráfico

de drogas que mantém a população local sob seu julgo e leis próprias. Não por acaso, a

mídia se refere, muitas vezes, à região como “Faixa de Gaza”.

1.2 Projetos urbanos e políticas públicas para a região

Tendo em vista esse quadro alarmante de condições de vida precárias e de

pobreza, as localidades de Manguinhos, embora bastante heterogêneas entre si,

apresentam como uma de suas fortes marcas a exclusão social. A conformação desses

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                     entre   os   países,   distinguindo-­‐os   entre   desenvolvidos   e   em   desenvolvimento.   Esse   índice,   no   entanto,  também  é  utilizado  em  escalas  menores,   como  no  caso  de  diferenciar   regiões  dentro  de  uma  mesma  cidade.  Seu  cálculo,  desde  2010,  é  feito  a  partir  da  média  geométrica  entre  três  índices:  (1)  expectativa  de  vida  ao  nascer,  (2)  índice  de  Educação  (índice  de  anos  médios  de  estudo  e  índice  de  anos  esperados  de   escolaridade)   e   (3)   índice   de   renda   (Produto   Interno   Bruto   per   capta   –   paridade   do   poder   de  compra).  Ver  http://pt.wikipedia.org/wiki/%C3%8Dndice_de_Desenvolvimento_Humano.    15  O   IDS,   inspirado   no   IDH,   foi   criado   para   dar   conta   das   dimensões   do   urbano,   revelando   assim  não  apenas   a   situação   sócio-­‐econômica,   mas   também   urbanística.   Ao   utilizar-­‐se   de   unidades   geográficas  menores,   o   índice   fornece   informações   mais   precisas   sobre   as   diferenças   intraurbanas.   Os   10  indicadores  foram  construídos  a  partir  de  Censo  2000,  realizado  pelo  IBGE.  São  eles,  “Dimensão  Acesso  a  Saneamento  Básico:  (1)  percentagem  dos  domicílios  com  serviço  de  abastecimento  de  água  adequada  –  aqueles  que  têm  canalização  interna  e  estão  ligados  à  rede  geral;  (2)  percentagem  dos  domicílios  com  serviço  de  esgoto  adequado  –  aqueles  que  estão   ligados  à   rede  geral;   (3)  percentagem  dos  domicílios  com   serviço   adequado   de   coleta   de   lixo   –   aqueles   que   dispõem   de   coleta   direta   ou   indireta   de   lixo;  Dimensão   Qualidade   Habitacional:   (4)   número   médio   de   banheiros   por   pessoa;   Dimensão   grau   de  escolaridade:  (5)  percentagem  de  analfabetismo  em  maiores  de  15  anos;  (6)  percentagem  dos  chefes  de  domicílio  com  menos  de  quatro  anos  de  estudo;  (7)  percentagem  dos  chefes  de  domicílio  com  15  anos  ou  mais  de  estudo;  Dimensão  Disponibilidade  de  Renda:   (8)   rendimento  médio  dos  chefes  de  domicílio  em  salários  mínimos;  (9)  percentagem  dos  chefes  de  domicílio  com  renda  até  dois  salários  mínimos;  (10)  percentagem   dos   chefes   de   domicílio   com   rendimento   igual   ou   superior   a   10   salários   mínimos.   (Ver  CAVALLIERI,   Fernando   e   LOPES,   Gustavo   Peres.   Índice   de   Desenvolvimento   Social:   Comparando   as  realidades  microurbanas   da   cidade   do   Rio   de   Janeiro.   In   Armazém   de   Dados.   Instituto   de  Urbanismo  Pereira   Passos,   abril   de   2008.   (disponível   em  http://www.armazemdedados.rio.rj.gov.br/arquivos/2247_%EDndice%20de%20desenvolvimento%20social%20_%20ids.PDF).    16   Dados   apresentados   por   Dulce   Pandolfi   (CPDOC/FGV,   IBASE)   na   ocasião   de   sua   palestra   sobre  pesquisa   realizada   pelo   IBASE   em   conjunto   com   a   Fundação   Getúlio   Vargas   (FGV)   acerca   do   PAC-­‐Manguinhos,  no  I  Seminário  dos  Estudantes  de  Pós-­‐Graduação  em  Ciências  Sociais  do  Estado  do  Rio  de  Janeiro  (SEPOCS),  realizado  entre  os  dias  28  de  novembro  e  2  de  dezembro  de  2011.      

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territórios se deu por meio de uma combinação de fatores, como resultado de políticas

habitacionais de remoção implementadas na cidade e na própria favela – por motivo de

obras pontuais de urbanização ou locais de risco –, e em decorrência do deslocamento

de populações oriundas de outras favelas que sofreram com incêndios e inundações,

além dos migrantes da região Nordeste do país17. Em diversos momentos, o Estado

percebeu a região “como um espaço estratégico para o crescimento da cidade e

consolidação dos subúrbios, especialmente destinados a atividades industriais”.18

No entanto, poucas intervenções urbanísticas, políticas sociais e habitacionais

foram de fato concretizadas ali. As principais e poucas intervenções urbanísticas na

região se limitam à retificação dos rios Jacaré e Faria-Timbó, a abertura da Avenida

Leopoldo Bulhões e da Rua Carlos Chagas, o aterramento de parte da área do mangue, a

construção de alguns conjuntos habitacionais, assim como obras pontuais, em geral,

voltadas para o saneamento básico. O que, por sua vez, contribuiu para o agravamento

dos problemas das condições de vida, mediante adensamento populacional – que seguiu

uma lógica de ocupação informal, permeada por diversos conflitos e tensões entre os

moradores.

Em 1927, duas propostas semelhantes foram apresentadas para Manguinhos.

Uma se inseria no Plano de Melhoramento para o Rio de Janeiro, desenvolvido por

Alfred Agache e a outra se baseava no projeto de urbanização já formulado pela

Empresa de Melhoramentos desde 1922. “Os dois planos destacavam o crescimento das

favelas e propunham a construção de vilas operárias, incluindo Manguinhos, além da

construção de vias de acesso à cidade”.19 Sua destinação de bairro industrial era

justificada devido sua proximidade com o centro da cidade e a zona portuária. Já na

gestão do prefeito Henrique Dodsworth (1937-1945), foi apresentado, em 1943, o

projeto Park-way Faria Timbó, o qual previa a construção de vias na região com

“padrões menos retilíneos e mais adaptados às condições topográficas locais, tirando

partido da natureza”.20 No governo Carlos Lacerda (1960-1965), por sua vez, através

do Plano Doxiadis, também se previa a consolidação da região como área industrial e

residencial.                                                                                                                          17  A  inauguração  gradativa  da  Avenida  Brasil,  ao  longo  da  década  de  1940,  permitiu  acesso  facilitado  à  região  de  diversas  áreas  da  cidade,  e   também  contribuiu  para  um  aumento  populacional   significativo.  Nos  anos  1950,  esta  passaria  por  obras  de  duplicação,  ganhando  a  conformação  atual.    18  COSTA  e  FERNANDES,  2009.  19  Idem.    20  Idem.  

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Embora a idéia de construção de uma zona industrial tenha perpassado diversos

governos e projetos, sua efetivação se deu muito mais pela iniciativa privada do que por

investimentos oriundos de políticas públicas. Na região instalaram-se diversas

instituições públicas e privadas, dentre elas, a própria FIOCRUZ, Empresa de Correios

e Telégrafos (ECT), Light, Abrigo Cristo Redentor, Empresa Brasileira de

Telecomunicações (Embratel), Companhia Nacional de Abastecimento (Conab),

Cooperativa Central de Produtores de Leite (CCPL), Refinaria de Petróleos de

Manguinhos S.A., Souza Cruz21, dentre outras. Nas últimas três décadas, entretanto,

com a crise econômica que abarcou a cidade do Rio de Janeiro, a intensificação do

controle territorial de facções criminosas nas favelas e a conseqüente escalada da

violência nessas áreas, muitas indústrias, empresas e fábricas foram desativadas e outras

mudaram de endereço.

Esse processo de desindustrialização modificou, ao longo do tempo, a paisagem

urbana desse subúrbio, cujos ex-galpões e fábricas, tornados ruínas industriais, foram

sendo ocupados por desabrigados ou interessados na possibilidade de ganho de moradia

legal ou indenização – uma vez que o governo abarcasse o local com alguma política

habitacional ou de urbanização22. As ditas fronteiras entre favela e asfalto passaram a

ser cada vez menos perceptíveis, na medida em que esses espaços foram sendo

incorporados ao espaço das favelas, reapropriados e reconfigurados como favelas-

fabris23.

1.3 Processos de ocupação e configuração das diferentes áreas de Manguinhos

Do contexto atual de ocupações e da expansão das favelas no espaço urbano, a

composição das áreas que hoje compõem Manguinhos remonta ao início do século XX

com a ocupação de terras públicas ou de antigas fazendas. O então Instituto Oswaldo

Cruz (IOC) também contribuiu para as primeiras ocupações de áreas contíguas a ele, por                                                                                                                          21  Após  negociação  com  o  governo,  o  espaço  da  antiga   fábrica  Souza  Cruz  –   localizada  no  cruzamento  das  Avenidas  Dom  Hélder  Câmara  e  dos  Democráticos  –  está  sendo  transformado  na  Cidade  da  Polícia,  projeto  –  que  estava  previsto  para  ser  concluído  em  Dezembro  de  2011,  porém,  ainda  em  andamento  –  de  transferência  de  todas  as  delegacias  especializadas  para  a  região.      22  Verificou-­‐se  esse  mesmo  tipo  de  estratégia  na  ocupação  de  locais  de  risco.  O  poder   instaurado  pelo  tráfico,  por  sua  vez,  também  facilitou  esse  processo  de  ocupações.    23   Termo   cunhado   por   Blank,   Cavalcanti   e   Fontes   em   CCPL:   Favela   Fabril,   pesquisa   ainda   em  desenvolvimento  que  aborda  de  forma  instigante  esse  fenômeno  relativamente  recente,  nessa  região,  das  ocupações  de  antigos  espaços  fabris.    

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parte de seus funcionários que, na época, encontravam grandes dificuldades de

locomoção até a região devido às condições de transporte esparsas e precárias. Ainda

que os processos de ocupação distingam-se bastante uns dos outros, a história de

Manguinhos é permeada até hoje pela história da luta pelo direito à moradia, ou melhor,

pelo direito à cidade. Muitas de suas áreas se formaram a partir de políticas de remoção

de favelas empreendidas por diferentes governos, cujo objetivo, em geral, era a

transferência das classes populares, habitantes da área central da cidade ou da Zona Sul

para regiões mais distantes e menos valorizadas pelo mercado imobiliário – o que se

traduzia em grande parte na falta de infraestrutura e serviços básicos.

De acordo com Costa e Fernandes (2009), é possível identificar cinco momentos

marcantes na origem das diferentes áreas de Manguinhos. O primeiro corresponde à

ocupação, no início do século XX, do Parque Oswaldo Cruz (ou Morro de Amorim ou

Amorim), que se deu em uma encosta próxima à FIOCRUZ. Esse núcleo habitacional se

constituiu pela migração de outras partes da cidade, por funcionários da FIOCRUZ e

por imigrantes portugueses – “à semelhança de outros bairros do subúrbio carioca,

como a Penha e Bonsucesso”.24 Atualmente, essa área distingue-se bastante das demais

localidades de Manguinhos, assemelhando-se mais a um bairro de classe média, com

relativa infraestrutura e disponibilidade de serviços. Assim como a Vila União, o

Amorim é comandado por milícia e talvez por conta disso, abrigue sedes de empresas

de segurança privada.

O segundo momento de ocupação se deu no início da década de 1940, no Parque

Carlos Chagas, conhecido por Varginha25. A população que se formou era oriunda de

diversas outras regiões da cidade e de fora dela. Embora houvesse projeto urbanístico

proposto para essa área desde os anos 1920, este se resumiu apenas à retificação e

aterramento do litoral, modificando a configuração de manguezal. “Essa comunidade

não apresenta as características atuais comuns às favelas no que se refere ao

arruamento com becos e ruelas estreitas, devido a um processo de remoção garantida

pelos próprios moradores, que impedem a ocupação desordenada”26 – além de contar

com uma certa área verde, em geral, inexistentes em favelas estabelecidas em terrenos

planos. Segundo relatos informais, a Varginha corresponde a uma das áreas mais

“tranqüilas” de Manguinhos.

                                                                                                                         24  COSTA  e  FERNANDES  (2009).    25  Esse  nome  se  deu  em  virtude  do  terreno  que  era  uma  espécie  de  vargem  que  enchia  muito  de  água.    26  COSTA  e  FERNANDES  (2009).    

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A ocupação do Parque João Goulart, da Vila Turismo, do Conjunto Habitacional

Provisório (CHP-2) e da Vila União, no decorrer da década de 1950, marcam o terceiro

momento significativo da constituição de Manguinhos27. A partir de então, o fluxo de

ocupação da região é impulsionado pelo processo de industrialização (planejado desde

1920, mas só então alavancado com o pós-guerra) e pela abertura de importantes vias de

acesso, como a Rua Leopoldo Bulhões, a Avenida Brasil, a Rio-Bahia e a Rio-São

Paulo, que facilitaram a circulação de mercadorias e pessoas pelo espaço urbano.

O CHP-2 – hoje também reconhecido pela população local pelo nome de Coréia

– era composto por prédios que foram construídos em 1951. Entre 1972 e 1973, porém,

estes foram demolidos por ocasião de enchentes que abalaram suas estruturas, deixando-

os condenados para habitação. No momento atual, essa área constitui-se por casas de

alvenaria em geral de um ou mais andares. Já o Parque João Goulart, também com

instalações de caráter provisórias – e que em alguns casos até hoje se mantêm – possuía

barracões de tábuas corridas e telha francesa, cuja aparência assemelhava-se a vagões de

trem28.

Essa localidade se apresenta como área de risco, pois além de ser atravessada

pela adutora da Cedae, também abriga torres de eletricidade da Light29. Atualmente,

CHP-2 e João Goulart são considerados por moradores áreas “complicadas” de

Manguinhos, pois além do tráfico estar presente massivamente, com bocas durante o dia

e “feiras” de drogas à noite, ali se instalou a cracolândia – a qual alterou profundamente

as sociabilidades locais. Embora boa parte da região já tenha sido pavimentada por

obras do PAC, há ainda escombros e entulhos de casas esvaziadas, deixados na região,

que precarizaram ainda mais o ambiente30.

A Vila União, por sua vez, surgiu em 1955 com investimento do governo federal

na construção de conjuntos habitacionais destinados a funcionários da Casa da Moeda e                                                                                                                          27  Ao  final  dessa  década,  em  1959,  também  foram  realizadas,  em  Manguinhos,  as  obras  de  retificação  do  rio  Faria-­‐Timbó  e  a  construção  da   Igreja  São  Daniel,  o  Profeta   -­‐  projeto  assinado  por  Oscar  Niemeyer.  Atualmente,   a   Igreja   está   fechada   ao   público   em   situação   de   extrema   precariedade   e   falta   de  conservação.  Não  se  sabe  por  que  sua  reforma  não  foi  incluída  nas  obras  do  PAC  na  região.    28  Essa  configuração  foi  narrada  por  uma  moradora  antiga  da  região  em  CORREA  e  FERNANDES  (2009).    29  Acidentes   com  a   adutora   já   ocorreram  e,   ao   final   da  década  de  1990,   parte  da  população   local   foi  removida   para   conjuntos   habitacionais   construídos   às   margens   da   Leopoldo   Bulhões   como   veremos  mais  a  diante.    30  Alguns  se  tornaram  “bocas”  de  venda  de  droga  ou  ponto  para  vigília  do  tráfico  sobre  o  território.  A  demolição  de  casas  sem  a  intervenção  de  obras  urbanísticas  logo  em  seguida  produz  um  efeito  perverso  às  ações  do  Estado  na  favela,  na  medida  em  que  desconfigura  espaços  de  sociabilidade  locais,  deixando  espaços  vazios  e  de  ruínas  propícios  às  atividades  do  tráfico  ou  de  usuários  de  drogas.  Esse  cenário,  por  sua   vez,   torna   o   ambiente   ainda   mais   precário   e   violento.   Essa   situação   é   discutida   em   maior  profundidade  nas  seções  posteriores  deste  estudo.    

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aos ex-combatentes da Segunda Guerra Mundial. Oficialmente, essa área pertence à

Benfica, mas seu contexto sócio-espacial está atrelado mais a Manguinhos, haja vista

sua inclusão nas intervenções do PAC. Diferentemente do restante de Manguinhos, seus

prédios possuem estruturas boas e seus apartamentos são espaçosos e bem divididos,

tendo de 2 a 3 quartos, com sala, banheiro, cozinha e área de serviço. Os moradores

também possuem toda a documentação de suas moradias regularizadas. Esses fatores

fazem com que o local se assemelhe mais a um bairro formal de classe média, classe

média baixa. No entanto, em seu entorno, casas irregulares foram construídas e ali

também exercem poder sobre o território, grupos paramilitares.

O quarto e quinto momentos de ocupação, enfim, se deram nas décadas de 1990

e nos anos 2000 respectivamente. A Prefeitura, em parceria com o governo do estado,

construiu os conjuntos habitacionais Nelson Mandela e Samora Machel às margens da

Leopoldo Bulhões, com financiamento do Banco Internacional para a Reconstrução e

Desenvolvimento (BIRD).31 “O terreno foi adquirido pela prefeitura em permuta com a

Embratel”32. A transferência dos moradores para o conjunto teve que ser feita antes da

conclusão completa das obras devido à ameaça de invasão do terreno por outras

pessoas, vítimas das enchentes de 1988 e do incêndio que ocorreu no Parque João

Goulart em 1989. Em 1995, outra parte desse terreno da Embratel foi ocupado

ilegalmente, dando origem à Mandela de Pedra, uma das áreas mais precárias de

Manguinhos e em processo de remoção atualmente33. Em 2001, outra área denominada

Samora II se formou, e, no ano seguinte, surgiu Vitória de Manguinhos, resultante da

invasão dos galpões abandonados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).

A atuação do tráfico em Mandela é bastante ostensiva e há incursões policiais

com uma certa freqüência na região. Por ter sido uma área planejada urbanisticamente,

as casas possuem boa estrutura e as ruas são todas pavimentadas, com a existência de

comércio e espaços públicos, como praças. No entanto, no decorrer dos anos, verificou-

se um processo de verticalização, assim como de ampliação das casas, os chamados

“puxadinhos”, o que propiciou o estrangulamento do sistema de esgotamento sanitário,

dentre outros problemas de infraestrutura.

                                                                                                                         31  Instituição  pertencente  ao  Banco  Mundial.    32  COSTA  e  FERNANDES  (2009).    33  Nesse  mesmo  ano,  “em  função  da  desocupação  dos  barracões  no  Parque  Carlos  Chagas,  onde  viviam  famílias   vítimas   do   incêndio   de   1989,   surgiu   uma   pequena   área   denominada   Greenville”.   (Idem).   A  disposição  espacial  da  área,  com  um  único  local  de  entrada,  faz  com  que  o  tráfico  não  atue  ali,  pois  não  há   pontos   de   fuga,   no   caso   de   operações   policiais.   O   que   torna   a   região  mais   tranqüila   do   que   suas  imediações.    

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Assim, não é possível compreender a história de Manguinhos sem refletir sobre

a própria história da cidade do Rio de Janeiro e das ações do Estado nela empreendidas.

Se, de um lado, a falta de concretização dos planos e projetos criados para a região (leia-

se investimentos públicos), ou melhor, a aparente ausência e negligência do Estado

contribuíram para seu crescimento desordenado e para sua precária infraestrutura; por

outro, foi a partir de determinadas concepções de cidade e de políticas urbanas

implementadas pelo Estado, ou seja, através da presença ativa do Estado, que

Manguinhos se constituiu como “depósito de gente” 34 – de pessoas que não deveriam

permanecer em seus locais de origem, mas que não por acaso lá poderiam se instalar.

Nesse sentido, a construção de conjuntos habitacionais provisórios que se

tornaram permanentes, assim como as ações constantes de remoções internas – de áreas

de risco ou contempladas por obras pontuais – apontam a provisoriedade como uma

característica ou traço permanente na história de Manguinhos. Provisoriedade esta que

contribui apenas e ainda mais para a precarização da vida de pessoas que se vêem, a

todo o momento, desafiadas pela ação do Estado a reformular suas trajetórias

(subjetivas e materiais) em outro lugar35. Com o anúncio do PAC em 2007, Manguinhos

vive, desde então, um momento de reformulação, recebendo um alto investimento com

obras de grande vulto que vão desde a urbanização da região, com pavimentação,

esgotamento sanitário e vias de transporte até a construção de equipamentos públicos e

de conjuntos habitacionais. As obras geram impactos positivos e negativos na vida da

população local o que acarreta em opiniões e expectativas diversas em relação ao

andamento do programa. Dependendo da forma como este seja conduzido, da sua

continuidade e da cooperação entre as instâncias federativas, mudanças significativas

podem ocorrer na condição de vida local.

Essa possibilidade, no entanto, esbarra em uma série de entraves e conflitos

difíceis de serem superados, como no caso do forte poder do tráfico de drogas sobre o

território e a população, e a extrema pulverização das lideranças locais, que além de

estarem envolvidas em diferentes alianças políticas com partidos e políticos

profissionais, são comandadas pelos “chefes” do tráfico. Desse modo, a participação da                                                                                                                          34  Expressão  cunhada  por  um  morador  da  região,  o  qual  entrevistei.      35  É  importante  ressaltar  que  esse  desafio  na  maioria  das  vezes  se  apresenta  em  forma  de  ameaça  a  um  mínimo   de   estabilidade   adquirido   através   de  muito   esforço,  mas,   em  muitos   casos,   também   aparece  como  possibilidade  de  melhora  de  vida,  pela  aquisição  de  moradia  ou  recebimento  de  indenização,  tal  qual   já  mencionado.   E,   em  outros,  observa-­‐se  ainda  a   formação  de  um  mercado   imobiliário   informal,  constituído  na  medida  em  que  determinada  área  é  contemplada  por  políticas  habitacionais.  

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população na implementação e na fiscalização do PAC é esvaziada, em parte, devido à

falta de demandas locais que tenham sido coletivamente formuladas.

2. As premissas do PAC como política de desenvolvimento e de urbanização de

favelas36

O Programa de Aceleração do Crescimento, lançado em 2007, pelo governo do

Presidente da República Luis Inácio Lula da Silva, enquanto um programa de

desenvolvimento, busca além de promover a aceleração do crescimento econômico

(como o próprio nome já diz), o aumento do emprego e a melhoria das condições de

vida dos brasileiros. Suas medidas destinam-se a incentivar o investimento privado,

aumentar o investimento público em infra-estrutura e remover obstáculos –

burocráticos, administrativos, normativos, jurídicos e legislativos – ao crescimento37.

Dentre suas premissas, a expansão de investimento em infra-estrutura se

apresenta como condição para: a aceleração do desenvolvimento sustentável com a

eliminação dos gargalos para o crescimento da economia; o aumento da produtividade e

a superação dos desequilíbrios regionais e das desigualdades sociais.

Seus projetos de infra-estrutura atuam em três eixos distintos: logístico,

energético e social e urbano. Os critérios de seleção para os projetos correspondem ao

forte potencial para gerar retorno econômico e social, à recuperação de infra-estrutura

existente e à conclusão de projetos em andamento. Os principais atores envolvidos no

processo são a Casa Civil e a Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da

República como coordenadoras centrais; o Ministério das Cidades como gestor; a Caixa

Econômica Federal e o BNDES como agente operador e financeiro; os estados e

municípios como proponentes e agentes executores38.

Tendo em vista os aspectos mais gerais do PAC, para os propósitos desta

pesquisa, faz-se necessária uma descrição mais detalhada das premissas teóricas

governamentais voltadas para o eixo social e urbano, mais especificamente, naquilo que

se refere ao processo de urbanização de favelas, isto é, de intervenção em assentamos

                                                                                                                         36   Essa   seção   se   baseia,   sobretudo,   na   publicação   Urbanização   de   Favelas:   a   experiência   do   PAC   –  Ministério   das   Cidades,   Secretaria   Nacional   de   Habitação   –   Brasília,   2010   e   na   apresentação   PAC:  programa  de  Aceleração  do  Crescimento  2007-­‐2010  –  Brasília,  2007  (ambos  disponíveis  para  download  em  www.cidades.gov.br).    37  Ver  PAC:  programa  de  Aceleração  do  Crescimento  2007-­‐2010  –  Brasília,  2007  (www.cidades.gov.br)  38  Ver  Urbanização  de  Favelas:  a  experiência  do  PAC  –  Ministério  das  Cidades,  Secretaria  Nacional  de  Habitação  –  Brasília,  2010  (www.cidades.gov.br).  

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precários39. O conceito dessa intervenção se sustenta em cinco pilares. Primeiramente, a

(1) integração urbana diz respeito à preocupação de se superar as condições de

precariedade por meio da incorporação dessas áreas à cidade formal, dotando-as de

infra-estrutura básica, com construção de equipamentos e serviços públicos. Em

seguida, a (2) moradia digna volta-se para o desadensamento e o reordenamento da

ocupação, implicando no remanejamento ou no reassentamento da população para

outros locais40. Além da participação contínua dos envolvidos no processo, o governo

deve esforçar-se para que o local de reassentamento seja próximo ao de origem. O

governo deve atentar, também, para prováveis indenizações das famílias ou para a

necessidade de produzir unidades habitacionais de uso misto – residência e comércio –

para que não haja diminuição das condições de sobrevivência das famílias. A aquisição

de imóveis usados para recuperação ou modificação de uso pode ser uma alternativa

mais econômica à construção de novas unidades41.

Já o terceiro aspecto da intervenção, (3) a regularidade fundiária, se aplica a

partir de duas ações, a identificação e comprovação da titularidade e a garantia dos lotes

gerados. “O objetivo final da regularização é fazer com que as unidades habitacionais

ou lotes decorrentes da intervenção, reflitam compromisso de constituição de direito

real sobre o imóvel em favor das famílias beneficiadas”42. A fim de garantir esse direito

a regularização inclui dois procedimentos indispensáveis: a regularização patrimonial,

por meio da qual assegura-se juridicamente a posse ou propriedade pelo registro no

Cartório de Registro de Imóveis (CRI); e a regularização urbanística mediante a

adequação à legislação urbana – podendo exigir inclusão do assentamento em Zonas de

Especial Interesse Social (ZEIS) por lei municipal. A Lei nº 11.977 de 2009 representa,

dessa forma, importantes avanços na regularização fundiária, na medida em que busca

conferir maior agilidade e efetividade aos processos, sobretudo, àqueles que estão

                                                                                                                         39   “A   precariedade   caracteriza-­‐se   por   vários   aspectos:   pela   irregularidade   fundiária   e/ou   urbanística;  pela   deficiência   da   infra-­‐estrutura;   pela   ocupação   de   áreas   sujeitas   a   alagamentos,   deslizamentos   ou  outros  tipos  de  risco,  pelos  altos  níveis  de  densidade  dos  assentamentos  e  das  edificações  combinados  à  precariedade   construtiva   das   unidades   habitacionais;   pelas   enormes   distâncias   percorridas   entre   a  moradia   e   o   trabalho   associadas   a   sistemas   de   transportes   insuficientes,   caros   e   com   alto   nível   de  desconforto   e   insegurança;  além  da   insuficiência  dos   serviços  públicos   em  geral,   principalmente  os  de  saneamento,  educação  e  saúde”.  Idem.      40  Idem.    41   Nos   casos   em   que   as   famílias   permanecem   na  moradia,   as  melhorias   habitacionais   apresentam-­‐se  como  uma  forma  de  se  aproveitar  os  investimentos  já  realizados  pelos  moradores.  As  questões  no  caso  de   permanência   se   deslocam   para   a   resolução   da   insalubridade,   insegurança,   padrão   mínimo   de  edificação  e  quantidade  de  cômodos.    Idem.    42  Idem.    

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circunscritos no interesse social. Além disso, essa lei confere maior autonomia às

prefeituras nos casos de licenciamento urbanístico e ambiental43.

A (4) inclusão social é realizada por meio do trabalho social que também se

constitui por duas frentes: mediações sociais que assegurem a participação da população

local e suas associações e o desenvolvimento sócio-econômico propiciado por ações

educativas e pela qualificação profissional44. Para que isto ocorra é preciso buscar a

articulação com outros programas governamentais, como os do Ministério da Cultura.

“A integração das intervenções físicas com o trabalho social e a efetivação da

regularização fundiária são condições essenciais para a sustentabilidade das

intervenções de urbanização”45. Por fim, (5) o componente ambiental tem como

objetivo mitigar os impactos ambientais das obras, realocar as famílias de áreas de risco,

recuperar as áreas desocupadas e criar programas de educação ambiental – como parte

das funções do trabalho social. Para que tais ações ocorram, a participação de órgãos de

controle ambiental no processo de fiscalização das obras e do programa mostra-se

fundamental.

Os investimentos para a urbanização de favelas do PAC foram

proporcionalmente distribuídos à dimensão da precariedade habitacional em cada região

do país. O que difere os recursos do PAC de outros investimentos precedentes em

projetos de intervenção em favelas, como no caso do Programa Favela-Bairro, é o fato

de originarem do Tesouro Público, não necessitando de empréstimos privados ou de

organismos internacionais e evitando, assim, a geração de dívidas46. Além dos recursos

da União, as contrapartidas estaduais e municipais compõem os investimentos.

“Atualmente encontram-se alocados R$ 21, 4 bilhões em intervenções em favelas com

                                                                                                                         43  Idem.    44  No  caso  do  Trabalho  Social  do  PAC-­‐Manguinhos,  a  essas  duas  dimensões   incorpora-­‐se  uma  terceira,  de  elaboração  de  um  “retrato”  das  comunidades  envolvidas,  com  cadastro  dos  moradores  residentes  da  área,  suas  necessidades,  deficiências  e  problemas  retratados,  isto  é,  um  Censo  Domiciliar  e  Empresarial.  (Ver  PAC   Social   –   Plano   de  Ocupação   Social   nas   favelas,   Escritório   de  Gerenciamento   de   Projetos   do  Governo  (EGP-­‐Rio)  e  Secretaria  Estadual  de  Assistência  Social  e  Direitos  Humanos  –  apresentação  Fórum  da  Cidadania  –  IBASE  –  11/05/2009).        45   “Item  obrigatório   [o   trabalho   social]  nos  projetos  habitacionais  geridos  pelo  Ministério  das  Cidades,  visa  promover  a  autonomia,  o  protagonismo  social  e  o  desenvolvimento  da  população  beneficiária,  por  meio  de  ações  de  participação,  mobilização  e  organização  comunitária,  educação  sanitária  e  ambiental  e  atividades  ou  ações  de  geração  de  trabalho  e  renda  destinadas  à  população  diretamente  beneficiada”.  Ver   Urbanização   de   Favelas:   a   experiência   do   PAC   –   Ministério   das   Cidades,   Secretaria   Nacional   de  Habitação  –  Brasília,  2010  46   Ver   TRINDADE,   Cláudia   Peçanha.   O   Programa   de   Aceleração   do   Crescimento:  Infraestrutura/Urbanização  de  Favelas.  Rio  de  Janeiro,  2007.  

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16    

recursos do PAC em 785 contratos (...). Esses recursos irão proporcionar a melhoria

das condições de habitabilidade de mais de 1,8 milhão de pessoas”47.

3. Processo de implementação e negociação do PAC-Manguinhos entre o governo

e as lideranças locais.

O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) foi lançado em janeiro de

2007 pelo governo federal “como proposta de retomada de investimento público”48 a

partir de investimentos federais, estaduais e municipais em grandes obras de

infraestrutura. Dos 3,9 bilhões investidos no estado do Rio de Janeiro, 860 milhões

seriam destinados à urbanização das favelas do Complexo do Alemão, Manguinhos,

Rocinha, Cantagalo e Pavão-Pavãozinho – o chamado PAC-Favelas 49. Em março de

2008, Lula e o governador do estado Sérgio Cabral visitaram as referidas comunidades

para assinatura de ordem para o início das obras.

No mês seguinte, o PAC-Manguinhos começou sob responsabilidade do

consórcio formado pelas empreiteiras Andrade Gutierrez (60%), EIT (20%) e Camter

(20%)50. Sendo a instância estadual e a municipal as executoras do projeto, aquela ficou

responsável pelas “grandes obras de eixo viário, elevação da linha férrea, construção

do maior número de equipamentos sociais e unidades habitacionais”, enquanto esta se

encarregou das “principais intervenções nas partes internas das localidades com obras

de saneamento básico, construção de creches e postos de saúde da Família”51. As

propostas apresentadas para a região correspondem à instalação de sistema de

esgotamento sanitário; sistema de abastecimento de água potável; instalações

hidrosanitárias/ 350 unidades; contenção e proteções de canais; drenagem de águas

fluviais; recuperação ambiental; terraplanagem e pavimentação do sistema viário;

iluminação pública; elevação da via férrea de passageiro e carga52; estação intermodal;

                                                                                                                         47  Ver  PAC:  programa  de  Aceleração  do  Crescimento  2007-­‐2010  –  Brasília,  2007  (www.cidades.gov.br).  48  Ver  TRINDADE,  2007.  49  Dados  extraídos  da  apresentação  da  pesquisa  sobre  o  PAC-­‐Manguinhos  realizada  pelo  IBASE  em  2009.  (http://www.youtube.com/watch?v=owZ7x7ypMoY&feature=related).    50   Ver   Eduardo   Sá.   Uma   visão   do   PAC   Em   Manguinhos   (http://pig2010.blogspot.com/2010/02/uma-­‐visao-­‐do-­‐pac-­‐em-­‐manguinhos.html).    51  Ver  TRINDADE,  2007.  52   Essa   obra   é  motivo   de   grande   polêmica   entre   os  moradores   não   apenas   pela   sua   centralidade   no  projeto,   em   termos   de   custeio   e   esforços,   como   também   por   não   a   elegerem   de   suma   importância,  quando  comparada  à  urgência  por  moradia  adequada  e  por  obras  de  saneamento.      

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implantação do parque linear urbano; construção de 1774 unidades habitacionais53;

aquisição de 75 unidades habitacionais; alojamentos provisórios; regularização

fundiária; uma escola de ensino médio, creches, biblioteca e centro de referência da

juventude54.

No que concerne às 14 comunidades contempladas pelo projeto, nem todas

pertencem à delimitação do bairro ou do Complexo de Manguinhos, mas mesmo assim

foram incluídas devido à proximidade e às condições igualmente precárias. São elas,

CCPL e Favela Vila Vitória (Chupa-Cabras); e as que compõem Manguinhos são,

Favela Comunidade Agrícola de Higienópolis, Favela Vila São Pedro, Favela Parque

Oswaldo Cruz (Morro do Amorim), Favela Vila Turismo, Favela Vila União, Conjunto

Habitacional Provisório 2 (CHP-2), Favela Parque João Goulart, Favela Parque Carlos

Chagas (Varginha), Conjunto Nelson Mandela (Mandela 1), Conjunto Samora Machel

(Mandela 2), Favela Mandela de Pedra (Mandela 3), Favela Embratel (Nova Mandela/

Samora II) e Vitória de Manguinhos (CONAB)55. O valor total estipulado ao PAC-

Manguinhos era de R$ 328,3 milhões56. Essas obras de infraestrutura estariam aliadas a

estratégias de desenvolvimento sustentável da região a partir de um Trabalho Social

realizado pelo poder público e as lideranças locais.

Nos anos de 2008, 2009 e 2010, a partir de artigos, pesquisas qualitativas e

quantitativas realizadas, matérias de jornais, revistas e informações disponibilizadas nos

sites do Laboratório Territorial de Manguinhos e do Fórum da Cidadania, observou-se

intenso debate entre a sociedade civil, lideranças comunitárias de Manguinhos e órgãos

públicos quanto ao andamento das obras do PAC. A falta de informação

disponibilizada, a inexistência de um projeto executivo – daí a dificuldade e

discordância entre os números divulgados – e a necessidade da participação da

população local no processo de decisão, implementação e fiscalização do projeto deram

a tônica das discussões.                                                                                                                          53  Este  número  foi  obtido  após  muita   luta  do  movimento  social  de  Manguinhos,  como  aponta  Patrícia  Evangelista,   ex-­‐secretária   executiva   do   Fórum   do  Movimento   Social   de  Manguinhos.   De   acordo   com  Cláudia  Trindade,  o  número  de  unidades  habitacionais  divulgados  variou  de  546  em  outubro  de  2007  a  1944  em  junho  de  2008.  No  que  diz   respeito  ao  tamanho,   foi  apresentada  uma  casa-­‐modelo  de  72m²  construída  na  entrada  do   conjunto,  posteriormente,  demolida.   Em  seguida,  diferentemente  dos  42m²  anunciados  para  os  apartamentos,  constatou-­‐se  que  estes  medem  37m².    54  IBASE,  2009.    55  Segundo  relatos  informais,  a  CONAB  entrou  e  saiu  do  calendário  de  obras  inúmeras  vezes,  de  modo  em   que   até   hoje   os   moradores   desconhecem   o   que   ficou   definido   para   o   local,   que   seria   todo  reassentado  para  dar  lugar  a  um  viaduto.    56  Em  fevereiro  de  2009  esse  valor  foi  atualizado  para  R$  368  milhões  (TRINDADE,  2007).    

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Em janeiro de 2008, movimentos sociais de Manguinhos apresentaram a

Proposta de Regimento Interno do Comitê de Acompanhamento do PAC-Manguinhos.

Neste documento, propuseram que o Comitê fosse composto por representantes das

secretarias estaduais, municipais e federais; das Associações de Moradores, dos poderes

legislativos municipal e estadual, de órgãos técnicos especializados (Conselho Regional

de Engenharia e Arquitetura; Fundação Oswaldo Cruz e das Universidades Estadual e

Federal do Rio de Janeiro – UERJ e UFRJ) e do Ministério Público e da Defensoria

Pública do Estado do Rio de Janeiro57. Outro projeto que surgiu em abril, com intuito

de criar mais um canal de participação da população local no processo de urbanização,

foi o PAC das favelas: documentação fotográfica e memória territorial.  Em parceria

com profissionais do projeto Imagens do Povo na Maré, organizado pelo Observatório

das Favelas, o projeto visava construir uma memória social do PAC 58.

Neste mesmo ano (2008), artigo escrito por pesquisadores da FIOCRUZ apontou

o PAC-Manguinhos como uma promessa e como esperança para a região na medida em

que sua mobilização “não está dissociada da luta por redução de violências no local,

[sendo] mais uma frente de luta conjunta pela restituição do estado de direito em

Manguinhos, que não está restrita apenas à violência provocada pelo crime ou pela

repressão ao tráfico de drogas, mas para todas as formas de violências que destituem a

população de seus direitos de cidadania, por exemplo, a falta de moradia, educação,

trabalho e mesmo a forma como as instituições de segurança pública tratam a

                                                                                                                         57   Dentre   as   atribuições   do   Comitê   estavam:   “contribuir   com   a   fiscalização   de   todo   o   processo   de  contratação   de   mão-­‐de-­‐obra   (...)   de   forma   a   avaliar   os   critérios   a   serem   utilizados,   (...)   zelar   pela  aplicação   da   legislação   trabalhista   vigente   e   pela   qualificação   funcional   e   cidadã   dos   trabalhadores.  Contribuir   com   a   fiscalização   de   todo   o   processo   de   compra   e   contratação   (e   subcontratação)   de  produtos   e   serviços   (terceirização),   zelando   pela   qualidade   dos   mesmos,   mas   também   sempre   que  possível,   e   eficiente,   propugnando   pela   contratação   de   produtos   e   serviços   disponíveis   nos   bairros   de  Manguinhos   e/ou   em   seu   entorno   (...).   Propor   melhorias   (modificações   no   Projeto   e   em   seu  detalhamento,  nos  editais  e  nos  processos  de  licitação  e  contratação  de  produtos  e  serviços  para  atender  às   demandas   sócio-­‐comunitárias   e   promover   o   Desenvolvimento   Local   Equitativo...   Participar   (...)   da  realização  de  todas  as  etapas  de  Estudos  de  Impacto  Social  e  Ambiental  e  Licenciamento  Ambiental,  de  forma   retroativa   inclusive   ao   Licenciamento   já   concedido   (revisão   deste).   Fiscalizar,   avaliar   e  encaminhar,  aos  órgãos  competentes,  denúncias  de  irregularidades  na  execução  do  PAC-­‐Manguinhos...  (Ver  documento  na  íntegra  em  www.conhecendomanguinhos.fiocruz.br).      58  De  acordo  com  o  projeto,  os  jovens  locais,  após  receberem  curso  de  fotografia,  produziriam  “painéis  dos  impactos  e  resultados  das  obras  de  urbanização  previstas  nas  comunidades  selecionadas,  colhendo  vivências   e   percepções   de   seus   moradores   ao   longo   de   todo   o   processo”.   Às   imagens   seriam  acrescentados   registros   orais   para   a   montagem   de   um   banco   de   dados   disponibilizado   em   site  interativo,   com   objetivo   de   fortalecer   “relações   de   pertencimento   com   o   bem   público”.   No   entanto,  atualmente,  não  há  nem  imagens,  nem  depoimentos  no  site  do  projeto,  ainda  que  tenha  sido  publicada  uma  versão  impressa  com  as  fotos.    Ver  http://www.memoriasdopac.org.br/.    

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população local”59. Por outro lado, alguns aspectos do projeto davam razões para gerar

uma série de desconfianças. A primeira delas, de que o PAC se resumisse a uma política

de segurança pública. Uma segunda apreensão concerne à elevação da via férrea, como

a obra mais cara dos investimentos, diante de uma situação de necessidades urgentes na

área de habitação e saneamento. Outro fator de desconfiança refere-se à falta de

informações sobre as reais ações em Manguinhos e das remoções decorrentes de obras,

como a abertura de via que ligue a Leopoldo Bulhões à Avenida Brasil60.

As ambigüidades em torno das obras do PAC permaneceram ao longo do ano.

Em discurso por ocasião do Fórum da Cidadania, em novembro de 2008, Patrícia

Evangelista, então secretária executiva do Fórum do Movimento Social de Manguinhos,

denunciou o descumprimento do poder público ao Estatuto da Cidade, fundamentado

em especial pela “(1) garantia do direito às cidades sustentáveis (direito á terra

urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, a infraestrutura urbana, ao transporte e

aos serviços públicos); e pela (2) gestão democrática por meio da participação da

população na formulação e na execução de projetos de desenvolvimento urbano”61. De

acordo com ela, até então, a prefeitura e o governo do estado não haviam criado canais

de participação local, sendo o diálogo quase inexistente, o que já se evidenciava pela má

execução de obras devido ao desconhecimento dos problemas locais. A rede de esgotos,

por exemplo, está sendo conectada com a rede de água pluvial, que é despejada nos rios

da Baía de Guanabara. Haveria a necessidade de maior integração entre as políticas do

PAC e do Programa de Despoluição da Baía de Guanabara (PDBG)62.

Outra crítica proferida voltou-se à extensiva utilização de indenizações como

política habitacional, o que “não garante o direito à moradia digna destas pessoas,

                                                                                                                         59   Ver   PIVETTA,   Fátima   e   PORTO,   Marcelo   Firpo.   PAC-­‐MANGUINHOS:   Como   promessa,   como  desconfiança,  como  esperança.  (texto  escrito  como  contribuição  ao  GTPAC/ENSP-­‐FIOCRUZ,  2008).    60  No  local  vivem  3  mil   famílias  e  foi  dito  que  apenas  1936  famílias  seriam  realocadas.  Dessa  forma  os  autores  questionam:  “Todas  as  famílias  em  áreas  de  risco  serão  realocadas?  Esta  política  de  “melhoria”  no   sistema   viário,   ligando   as   duas   ruas   citadas   acima,   vai   melhorar   em   quê   a   qualidade   de   vida   da  população   do  Município   do   Rio   de   Janeiro,   já   que   este   trecho   quase   não   é   utilizado   por   ter   fama   de  “Faixa  de  Gaza”?  A  abertura  das  vias  será  feita  então  para  facilitar  as  operações  policiais  nesta  área  por  conta  dos  agentes  do  Estado?”.    61  http://www.pactopelacidadania.org.br/    62   Segundo   Marcelo   Salles,   em   matéria   publicada,   em   2009,   na   Revista   Caros   Amigos   sobre   o   PAC-­‐Manguinhos,  “a  principal  crítica  dos  moradores  foi  a  instalação  dos  esgotos,  que  reaproveitou  o  sistema  de   água   construído   pelos   moradores   na   formação   da   comunidade:   vai   tudo   para   o   mesmo   lugar...  Quando  chove,  disseram,  que  continua  entupindo  tudo.  Moradores  que  trabalham  em  obras  apontaram  inadequações   no   projeto,   como   a   utilização   de   canos   pequenos,   o   que   deverá   apenas   postergar   os  problemas”.    

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incentivando a reprodução de formas irregulares de ocupação do solo urbano para fins

de moradia, mas também a especulação imobiliária”. Esse quadro de pouca

participação e imposição de projeto caracterizou a ação do poder público mediante a

população e as lideranças de Manguinhos, na medida em que o governo do estado se

eximiu de instituir o Comitê de Acompanhamento do PAC-Manguinhos (7 meses

passada sua proposição)63. O governo utilizou-se de uma “norma infra-legal para

recuar de uma proposta que encontra amparo no Estatuto das Cidades”. Além de se

desobrigar a instituir o Comitê, o governo também não apresentou nenhuma outra

proposta, “restringindo a participação ao acompanhamento indireto, via ‘trabalho

social’”.

Reivindicações semelhantes são encontradas no Dossiê-Manifesto de 11 meses

do PAC Manguinhos pelo respeito ao princípio da Gestão Democrática do Estatuto da

Cidade, realizado pelo Fórum Social de Manguinhos e outras organizações em 3 de

fevereiro de 200964. O documento denuncia a inconstitucionalidade do Trabalho Social

como mediador da relação entre poder público e sociedade civil, que se pressupõe que

deva ser direta. Essa mediação é realizada por “agentes privados, diretamente

interessados nos resultados do processo (‘redução de custos), contratados, sem

legitimação social, pelo Consórcio de empreiteiras responsável pelas intervenções de

engenharia, sem um mínimo de articulação e integração intersetorial e

intergovernamental”. Além do déficit de informação do processo, o Trabalho Social

também contratou ‘lideranças’ sem reconhecer seu protagonismo e tampouco ofereceu

qualificação adequada aos trabalhadores da região para atender às demandas por

profissionais nas obras e nos demais postos de trabalho gerados pelos investimentos; a

contratação de profissionais residentes de Manguinhos também não estava sendo

priorizada tal como acordado65.

Outras críticas mais pontuais, mas não menos significativas, dizem respeito ao

atraso na divulgação dos resultados do Censo Manguinhos. Mesmo sem saber como o

Censo iria atuar, as negociações em torno do desalojamento das famílias já estavam

sendo feitas. No processo de remoção já em curso, o documento afirma que, duas                                                                                                                          63  Essa  proposta  redigida  pelo  Fórum  veio  em  resposta  à  sugestão  do  próprio  vice-­‐governador  em  4  de  agosto   de   2007,   na   Quadra   da   Escola   de   Samba   Unidos   de   Manguinhos,   quando   prometeu   a  implantação  imediata  de  um  Conselho  de  Acompanhamento  do  PAC-­‐Manguinhos.    64   Ver   documento   na   íntegra   em   http://www.anf.org.br/2009/02/dossie-­‐manifesto-­‐de-­‐11-­‐meses-­‐do-­‐pac-­‐manguinhos/.      65  Idem.    

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dezenas das famílias que moravam nas imediações das adutoras da Companhia Estadual

de Águas e Esgotos (Cedae), no CHP-2, “foram expulsas de suas moradias sob a

ameaça de três ‘Caveirões’ (veículo blindado de uso militar da PM), coagidas a aceitar

uma ‘indenização’ pela Cedae”. Na comunidade de Nova Mandela, também há relatos

de que um novo documento invalidando um anterior induz no processo de

reassentamento à opção pela indenização coercitivamente. O dossiê sugere que seja

priorizada a política de compra assistida com reassentamento (regularização fundiária)

em detrimento das indenizações, que devem ser apenas aplicadas quando o sujeito de

direito manifestar interesse66.

De um modo geral, as negociações das obras polarizaram-se entre a Secretaria

de Obras do Governo do Estado do Rio de Janeiro e o Fórum do Movimento Social para

o Desenvolvimento Equitativo e Sustentável de Manguinhos (FMDES)67. Apesar da

Secretaria Municipal de Habitação demonstrar interesse pelo Trabalho Social em sua

apresentação sobre o PAC-Manguinhos68, Cláudia Trindade aponta que a ação da

prefeitura caracterizou-se pelo seu silêncio tanto em relação aos moradores quanto ao

governo do estado e a Caixa Econômica no detalhamento de informações69.

A criação do Comitê de Acompanhamento das Obras se deu, finalmente, como

fruto das negociações entre o Fórum e a Secretaria Estadual de Obras70. Para muitos

moradores, porém, ele serve apenas como instrumento de cooptação, chapa branca71. Já

                                                                                                                         66   Diversas   outras   reclamações   são   feitas,   como   no   caso   da   política   educacional   do   PAC,   cujos  investimentos  não  contribuirão  para  resolver  os  principais  problemas  da   localidade:  o  restrito  número  de   vagas  para  o   ensino   fundamental   e   educação   infantil   (em  quantidade  e   em  qualidade).   Sem  essas  melhorias,  o  Fórum  questiona,  de  que  forma  os  jovens  chegarão  à  Luiz  Carlos  da  Vila  –  escola  de  Ensino  Médio  construída  pelo  PAC.    67  Constituído  em  maio  de  2007.    68   Nesta   apresentação   a   secretaria   estabelece   para   o   trabalho   social,   “Criar   comissões   de  acompanhamento   de   obras   e   conselhos   comunitários   representativos;   estabelecer   canais   de   diálogo  entre  órgãos  envolvidos  e  demais  parceiros;  mobilizar  organização  e  gestão  comunitária;  esclarecer  os  moradores  que  residem  em  locais  que  serão  ocupados  pelos  projetos  de  urbanização  sobre  as  formas  de  indenizações  e/ou  aquisições  assistidas   (compra  de  casas);   reuniões  com  moradores,   técnicas  sociais  e  equipe   de   obras;   dinâmicas   de   grupo;   oficinas   educativas;   capacitação   para   acampamento   das  intervenções”.  (download:  http://www.pactopelacidadania.org.br/).      69  Ver  em  TRINDADE,  Claudia;  COSTA,  Renato  Gama-­‐Rosa  e  FERNANDES,  Tânia  Maria.  Memória  e  conflitos  sociais  no  espaço  urbano  –  Manguinhos/Rio  de  Janeiro.  Rio  de  Janeiro:  XIII  Encontro  de  História  Anpuh,  2008.  70   Esse   processo   envolveu   muitos   conflitos   entre   as   partes.   Se,   por   um   lado,   o   Fórum   conseguiu  aumentar  o  número  de  unidades  habitacionais  a  serem  construídas;  por  outro,  a  Secretaria  conseguiu  mudar   o   regimento   interno   do   Comitê,   limitando   sua   atuação   e   seu   poder   fiscalizador.   Ver   em  TRINDADE,  COSTA  e  FERNANDES,  2008.    71   Matéria   de   Marcelo   Salles   publicada   na   Revista   Caros   Amigos   em   2009.   (download:  http://www.pactopelacidadania.org.br/).      

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para Ruth Jurberg, coordenadora do Trabalho Social do PAC para o Governo do Estado

do Rio de Janeiro, “apesar das reuniões serem abertas à comunidade, os moradores

não comparecem. Apenas três ou quatro lideranças comunitárias participam”72. Em

outra ocasião, ela reconhece a carência de informação sobre as obras e fala dos esforços

na criação de “canteiros itinerantes” para “levar informação mais qualificada ao

próprio morador, e não somente através da liderança”. Havia também a vontade de se

criar um jornal que fale das obras e das ansiedades e desejos da população. Enquanto

essas medidas não fossem criadas, o morador poderia encontrar informações no canteiro

social ou nas reuniões do próprio Fórum de Manguinhos.

O censo domiciliar do PAC-Manguinhos realizado pelo governo do estado foi

divulgado em junho de 2009. O Complexo de Manguinhos somaria então 31.432

moradores distribuídos em 11.444 imóveis. Dentre as demandas da população local, o

saneamento básico apareceu como a principal com 15,2%. “Em seguida, aparecem

ampliar a residência (8,5%), área de lazer (7,2%), saúde pública (5,7%), iluminação

pública (5,7%), abastecimento de água potável (5,1%), pavimentação (4,2%),

educação/escola/curso (3,7%) e obra residencial (3,3%). O item segurança pública

aparece em décimo lugar representando 3,1% na lista de prioridades”73.

Embora a segurança pública não apareça como demanda prioritária no censo, em

pesquisa realizada no início deste mesmo ano pelo IBASE, em conjunto com a

Fundação Getúlio Vargas, 57, 5% dos entrevistados acreditam que o PAC favela só irá

dar certo se acabar com o tráfico. Entretanto, 68% dos moradores acham que o PAC vai

colaborar na redução da violência74. Já nos grupos focais, os jovens de Manguinhos

“avaliam com certo ceticismo a redução da violência e tem receios sobre a

interferência do tráfico no programa”; e os adultos “são unânimes ao afirmar que os

projetos de intervenção urbana precisam ser acompanhados de forte política de

segurança pública. Falam espontaneamente que são favoráveis à presença do Exército

em suas localidades, a fim de garantir ordem e minimizar riscos de conflitos. Entendem

que apenas obras não resolverão o problema da violência, percebido como um dos

                                                                                                                         72  Matéria  de  Elaine  Ramos,  O  PAC  no  II  Fórum,  11.05.2009.  (http://www.pactopelacidadania.org.br/).    73   Matéria   publicada   no   jornal   O   Globo   em   04.06.2009   (disponível   em:  http://oglobo.globo.com/rio/mat/2009/06/04/governo-­‐do-­‐estado-­‐divulga-­‐censo-­‐do-­‐pac-­‐no-­‐alemao-­‐em-­‐manguinhos-­‐756200971.asp)  74  Survey  realizado  pela  FGV  Opinião:  Dimensões  da  cidade:  Favela  e  Asfalto.  Maio  2009.  Nessa  mesma  pesquisa,  a  Segurança  Pública  despontou  como  pior  serviço,  contrapondo,  assim,  os  resultados  obtidos  pelo  Censo  do  PAC.      

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mais graves da localidade”75. Assim, observa-se que a percepção da situação de

violência e da necessidade de uma política para transformá-la varia de acordo com a

forma pela qual o tema é abordado – se isoladamente ou atrelado a outras questões mais

palpáveis e cotidianas voltadas para a melhoria das condições de vida da população.

Ainda nesta mesma pesquisa, os moradores de Manguinhos elencaram como

principais objetivos do PAC: em primeiro lugar, construir casas populares; em seguida,

construir escolas, creches/ saneamento, esgoto; e, em terceira posição, hospitais e

escolas novamente. Como outra informação interessante aparece a alta expectativa dos

moradores de Manguinhos em relação ao cumprimento dos objetivos do PAC, que se

contrapõe a certo ceticismo dos moradores do dito “asfalto”. No entanto, no Grupo

Focal realizado pelo IBASE, o ceticismo e o receio de que seja “mais uma maquiagem,

sem continuidade e com fins eleitoreiros” também aparece entre as opiniões dos

moradores de Manguinhos.

Em abril de 2010, o FMDES escreveu outro manifesto por ocasião da 4ª

Conferência da Cidade do Rio de Janeiro com intuito de debater os prejuízos ocorridos

em Manguinhos em decorrência das chuvas dos dias 5 e 6 do mesmo mês. Não apenas

as comunidades não atendidas pelo PAC sofreram com enchentes, mas, “no caso das

habitações construídas pelo PAC no DESUP, em terreno baixo, as chuvas subiram

mais de 40 cm dentro das casas fazendo com que os moradores perdessem tudo que

estivesse nessa altura”76.

No manifesto, o Fórum relembra que, nos primeiros encontros relacionados às

obras do PAC, havia advertido a EMOP quanto à topografia do terreno escolhido para

construção de casas ser propícia à ocorrência de enchentes. Seus representantes, porém,

não foram ouvidos pelo poder público. Desse modo, o Fórum evidenciou mais uma vez

a falta de participação dos representantes locais e a necessidade de inclusão dos mesmos

no processo de decisão, tendo em vista a história e as particularidades locais que

precisam ser levadas em consideração na implementação dos projetos de urbanização.

                                                                                                                         75  Grupos  Focais:  síntese  dos  resultados.  O  que  pensam  os(as)  cariocas  sobre  o  PAC-­‐Favelas?  Equipe  do  Pacto  pela  Cidadania.   (download:  http://www.pactopelacidadania.org.br/).  No  Survey,  a  violência  aqui  também  se  refere  à  violência  policial,  uma  vez  que  22,1%  dos  moradores  afirmaram  já  tê-­‐la  sofrido.        76   Manifesto   do   Fórum   do   Movimento   Social   de   Manguinhos   para   o   Desenvolvimento   Equitativo   e  Sustentável   para   a   4ª   Conferência   da   Cidade   do   Rio   de   Janeiro.   (download:  http://www.conhecendomanguinhos.fiocruz.br/)  

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4. Percepções sobre o PAC-Manguinhos: os usos dos equipamentos públicos e as

expectativas da população local quanto à finalização e ao impacto das obras77.

As obras do PAC-Manguinhos, até agora realizadas, têm produzido efeitos

variados sobre a configuração dos espaços de sociabilidade na favela. A construção da

elevação da linha férrea, por exemplo, está em andamento, de modo em que todos os

dias, há uma equipe trabalhando no local. O trânsito da Leopoldo Bulhões, por conta

disso, foi alterado. No entanto, não se sabe quando ela será concluída78. Na região do

CHP-2, uma rua inteira de casas foi removida, para a construção de uma creche, já

inaugurada, às margens da Avenida dos Democráticos. Nesta área e no Parque João

Goulart, uma série de intervenções de pavimentação, asfaltamento das ruas, realização

do esgotamento sanitário, construção de praças e quadras de esporte foi realizada. Há,

entretanto, reclamações constantes, por parte dos moradores de que ainda ocorrem

alagamentos na região, por ocasião de fortes chuvas, o que revela a inadequação das

obras realizadas79.

Em grande parte dos espaços construídos, como no caso das praças de concreto,

com mesas e bancos, e quadras, não se vê ninguém os utilizando. Em uma quadra, no

Parque João Goulart, observa-se o acúmulo de lixo e, próximo dali, a cracolândia, onde

homens, mulheres e crianças se drogam durante o dia todo. Ao lado de outra obra do

PAC, um “parquinho” com brinquedos, encontra-se o rio Jacaré, sem urbanização e

contenção às suas margens, com um cheiro de esgoto muito forte. Em ambos os casos, a

percepção da presença de recente intervenção estatal contrasta com um entorno marcado

por sua ausência, devido às atividades ilegais praticadas e à situação de extrema

precariedade e abandono. As obras, dessa forma, passam a sensação de artificialidade e

inadequação total ao contexto desses lugares. Não se vê qualquer integração entre as

                                                                                                                         77  Nesta  seção  me  baseio,  sobretudo,  no  trabalho  de  campo  e  nas  entrevistas  semi-­‐estruturadas  com  a  população   local,   que   realizei   em   parceria   com   Kristina   Rosales,   Gleide   Guimarães   e   Consuelo  Nascimento,  sob  coordenação  de  Mariana  Cavalcanti  no  âmbito  da  pesquisa  sobre  as  UPPs,  já  citada  no  início  deste  artigo.    78   Embaixo  da  elevação  está  prevista  a   construção  de  uma  espécie  de   “shopping”  popular,  mas  ainda  não  há  indícios  do  início  das  obras.    79  Numa  casa   localizada  em  frente  à  creche  do  CHP-­‐2,  construída  pelo  PAC,  observa-­‐se  que,  diante  de  seu  portão,  toda  a  rua  foi  pavimentada  recentemente.  Entretanto,  no  seu  interior,  há  marcas  na  parede,  mais  ou  menos  na  altura  de  pouco  mais  de  meio  metro,  que  segundo  a  moradora,  corresponde  ao  nível  de  água  que  enche  quando  há   chuvas   fortes.   Segundo   relato  de  outros  moradores,   regiões  onde  não  “enchiam”   tanto,   após   as   obras   do   PAC   passaram   a   encher,   pois   não   foram   feitas   pavimentações  adequadas  com  escoamento  e  drenagem.  

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obras e seu entorno. Em vez delas tornarem o ambiente mais agradável, acabam por

enfatizar ainda mais sua condição de pobreza e violência.

Nessa mesma área de Manguinhos (o Parque João Goulart), uma série de

famílias foram removidas dali e as casas, semi-demolidas. O intuito da remoção é a

construção no local de uma grande área de lazer e circulação, denominado Parque

Metropolitano de Manguinhos, uma espécie de rambla. Mas, segundo moradores, já se

passou um bom tempo desde as remoções e nada, até então, fora realizado no local. O

lugar, portanto, além de toda a precariedade já imposta pela falta de infraestrutura,

torna-se ainda mais decadente devido à existência desse espaço vazio deixado, não

ocupado, ou melhor, desocupado. Grande parte das casas não foram sequer

completamente destruídas, deixando-se destroços por todos os lados e casas demolidas

pela metade – entre as quais algumas viraram “boca” de venda de droga.

Em diversas outras áreas de remoção, observa-se a mesma situação, em que as

casas são destruídas, mas todos os destroços permanecem, não são recolhidos e deixam

o ambiente com um aspecto muito pior. No que concerne às remoções, em decorrência

das obras, muitas famílias já foram atingidas em diversas áreas de Manguinhos. No

entanto, os relatos dos moradores são muito divergentes em relação uns aos outros, não

parecendo haver qualquer padrão na forma como se dão essas realocações. Uma jovem

moradora me afirmou que sua família não pôde optar entre aluguel social, compra

assistida ou indenização, sendo esta última a única possibilidade dada pelo governo. Ela

afirma ainda que foram dados apenas 10 dias para que eles saíssem da casa, após a

entrega do cheque.

Já outro morador afirma que lhe deram alguns meses para sair do local e que ele

pôde escolher entre as três opções de financiamento, optando pela indenização. Em um

terceiro caso, ainda, outra moradora reclamou quanto ao tratamento dado aos moradores

pelos agentes da prefeitura que vão fazer as ações de despejo, dizendo que estes

colocavam muita pressão para que os moradores saíssem. Ela afirma que se não tivesse

emprego fixo e economias, não teria arranjado nenhum outro lugar para morar com o

baixo valor da indenização80. De um modo geral, os moradores reclamam sobre a falta

                                                                                                                         80  Na  CCPL  –   favela   localizada  ao   lado  do  espaço  do  DSUP  de  Manguinhos  que   será   implodida  para  a  construção   de   conjunto   habitacional   no   âmbito   do   PAC   –   o   processo   de   desocupação   do   terreno  demorou   muitos   meses   devido   às   dificuldades   impostas   pelo   sistema   de   aluguel   social.   Segundo  moradores,  a  EMOP  atrasou  diversas  vezes  o  aluguel  social  e,  por  conta  disso,  muitos  tiveram  que  voltar  a  ocupar  o   local.  Além  disso,  muitos  afirmam  que  pessoas,  que  nunca  moraram  no   local,  estão  sendo  contempladas  com  um  apartamento.  Já,  de  acordo  com  a  presidente  da  associação,  muitos  moradores  mesmo  recebendo  o  aluguel  social  voltaram  para  o  local,  com  intuito  de  usar  o  dinheiro  para  outros  fins.    

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de informações em relação a todo o programa do PAC. Uma moradora do CHP-2

contou: “quando eu vi, O PAC já estava. Quando eu me dei conta... já vi só os buracos

quebrando, já era o PAC ali, tirando as casas. Para mim o PAC não teve muito impacto

não”.

Outro efeito negativo das obras do PAC são as rachaduras que estão aparecendo

na casa das pessoas, que segundo moradores, resultaram no impacto no solo provocado

pelas máquinas pesadas. Em uma casa do Parque João Goulart, a moradora apreensiva

diz já ter feito reclamações inúmeras vezes à associação de moradores e à prefeitura

sobre a situação de alto risco de desabamento que se encontra sua casa, mas até agora

não lhe deram nenhuma resposta sobre o que será feito. Para piorar sua situação, ela

utiliza a mesma casa como salão de beleza, sendo esta sua única fonte de renda. As

rachaduras, de fato, estão espalhadas por diversas paredes e cômodos, chegando a

larguras suficientes para se encaixar um cabo de vassoura81.

Numa outra direção, no terreno no qual se localizava o antigo Departamento de

Suprimentos do Exército (DSUP), às margens da Avenida Dom Hélder Câmara82, o

PAC construiu um “novo” espaço público, completamente diverso daquele existente até

então na favela. O espaço foi todo urbanizado, com pista para caminhada, gramado,

árvores, parques de areia, bancos, latas de lixo, postes de iluminação, etc. Crianças

circulam e brincam por ali livremente e adultos caminham e correm, além de

permanecerem no local. O tráfico não atua ali e há sensação de segurança, tanto que

mesmo ocorrendo confrontos em Manguinhos entre policiais e traficantes, não tem

problema algum continuar no DSUP83. Assim, esse espaço produz uma certa sensação

de “bolha” em relação ao resto de Manguinhos.

Além de conjuntos habitacionais para moradores removidos de outras áreas de

Manguinhos, ele é composto por diversos equipamentos públicos que funcionam, uns

mais do que outros, relativamente bem. Ocupam o espaço a escola Luiz Carlos da Vila,

a Biblioteca-Parque de Manguinhos, um Centro de Referência da Juventude, o Canteiro

                                                                                                                         81   A   fim   de   acompanhar   a   situação   dos   moradores   com   casas   rachadas,   funcionárias   da   Secretaria  Municipal  de  Assistência  Social  visitam  as  residências  para  criar  um  cadastro.  Elas  afirmam  que  embora  muitas  casas  possam  ter  piorado  por  conta  das  obras,  outras  já  deveriam  estar  rachadas  muito  antes  das  obras   começarem.   Sua   atuação   de   cadastramento   e   acompanhamento   não   garante   a   solução   da  questão,  pois  esta  requer  a  articulação  de  outras  áreas  da  Prefeitura.  82  Ou  seja,  num  local  bem  à  vista  daqueles  que  passam  de  carro  ou  de  metrô.    83   Essa   sensação   é   relativizada   alguns   metros   adiante,   no   terreno   ao   lado,   onde   estão   os   conjuntos  habitacionais,  pois  além  de  não  haver  movimento  de  transeuntes  devido  à  falta  de  comércio,  também  não   há   policiamento   e   nem   a   “chefia”   do   tráfico,   o   que   deixa   alguns   moradores   receosos   com   a  possibilidade  de  assaltos.      

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Social do PAC, um Centro de Apoio Jurídico (CAJ) – ainda desativado, um Centro de

Geração de Renda (CGR), uma Academia do Idoso, uma Farmácia Popular, uma

Unidade de Pronto Atendimento 24h (UPA), uma Clínica de Saúde da Família (CSF), a

Casa da Mulher, um POUSO – onde dentro funciona também um Ponto de Economia

Solidária. A maioria dos equipamentos é gerida pelo governo do estado84, porém, por

diferentes secretarias, que não possuem em geral um planejamento de atividades

articuladas. Isso se traduz na falta de comunicação entre os equipamentos e de uma ação

conjunta para a região.

Segundo a ex-coordenadora do CRJ, é necessário haver maior articulação com a

iniciativa privada, pois as verbas são limitadas para as atividades. Além disso, seria

preciso realizar um certo trabalho de conscientização com os jovens para que se

interessassem mais a participar das atividades e dos cursos oferecidos no local. Ela e um

funcionário da biblioteca afirmam que muitos dos moradores acham que o espaço e os

equipamentos não são destinados a eles, por ser um local limpo, novo, bem estruturado

e urbanizado – diferentemente das outras áreas de Manguinhos.

O funcionário da biblioteca, que também foi morador a vida inteira de

Manguinhos, classifica esse desconhecimento e esse estranhamento dos moradores com

o local como “preconceito”. “Tem aquele medo, aquele preconceito. “Não, lá é um

lugar muito bonito, eu não vou porque eu não estou com um tênis legal, não estou com

uma calça legal...” As pessoas têm esse preconceito. Então, elas acabam não vindo,

acabam não vindo aqui, por achar que só tem pessoas... E é dentro da favela assim,

ainda tem isso. Então, elas acham o local só para rico, só para pessoas de, sei lá... Elas

têm esse preconceito pela beleza do local. Elas não acham que aquilo é para elas”.

Para um morador e liderança informal antiga de Manguinhos, envolvido com

atividades culturais, não há interesse, por parte dos equipamentos, em se inserirem

completamente na comunidade. Ele afirma que é preciso sair de dentro dos

equipamentos e adentrar a comunidade, realizando atividades em seu interior. Desse

modo, ele diz que há sim interesse em se manter certa distância do resto de

Manguinhos. Ele, assim, reivindica que “a biblioteca não é do Estado. A biblioteca é

um direito da comunidade”.

Já um agitador cultural – que conhece muito bem Manguinhos e trabalha há

muitos anos em um colégio estadual localizado na Avenida dos Democráticos – diz ser

                                                                                                                         84  À  exceção  do  POUSO  e  do  Ponto  Solidário,  ambos  coordenados  pela  Prefeitura,  e  da  Farmácia  Popular  que  está  sob  responsabilidade  do  governo  federal.    

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favorável aos projetos do PAC, pois pior do que está Manguinhos não poderá ficar.

Mesmo assim, ele atenta para a importância de conhecer bem o lugar onde será

desenvolvido qualquer projeto, a fim de atender às necessidades e especificidades

locais. Em grande medida, ele acredita que isso não seja ainda feito com o cuidado

necessário pelo Estado.

A distância de suas casas ou trajetos diários aparece na fala de muitos moradores

como motivo para não utilizarem os equipamentos. No entanto, essa distância não se

refere ao espaço físico, uma vez que muitas vezes não precisariam caminhar mais de 10

minutos para chegar até o local. Há, nesse sentido, uma distância simbólica reforçada

pelo estabelecimento de microterritorialidades no interior da favela. A violência, por sua

vez, também faz com que muitos moradores evitem sair de suas casas ou fiquem

transitando pela favela. Ao perguntar para jovens do Jacarezinho, favela vizinha de

Manguinhos, se freqüentavam a biblioteca, eles responderam, “ah, não... Lá é

Manguinhos”85.

Ainda assim, a mudança no dia-a-dia daqueles que já utilizam os equipamentos,

principalmente no caso da biblioteca, é inegável. Além de ser muito bem equipada, com

computadores e um bom acervo de livros, ela possui um espaço agradável, colorido e

lúdico, com salas de vídeo, aulas de música e de reuniões, além de um teatro-cinema

digital. Assim, uma funcionária da biblioteca, também moradora de Manguinhos, afirma

que “a biblioteca muda, muda mesmo [a vida de quem a freqüenta]. Tipo assim, a

criança que nem tinha descarga em casa... Na ludoteca, as atividades que fazem ali são

maravilhosas. Essas crianças conseqüentemente vão chamando os amigos deles. O

pessoal do hip-hop foi um movimento espontâneo e hoje em dia eles estão se

organizando86... Isso tudo é uma coisa de ir na biblioteca, sabe?! Os pais ficam

seguros, “eu estou indo na biblioteca””.

Considerações Finais

                                                                                                                         85   Nota-­‐se   que   essa   distância   não   se   traduz,   por   exemplo,   no   comércio,   já   que   moradores   de  Manguinhos  têm  o  hábito  de  ir  ao  Jacarezinho  para  fazerem  suas  compras.  Desse  modo,  essa  distância  além  de  estar   relacionada   às  microterritorialidades   criadas,   também  diz   respeito   à   necessidade  de   se  estabelecer   um   novo   trajeto,   um   novo   hábito   no   cotidiano   desses   moradores   para   que   passem   a  freqüentar  os  equipamentos.    86  Há  um  grupo  de  jovens  b-­‐boys  que  costuma  se  encontrar  e  treinar  as  danças  ao  lado  da  biblioteca.    

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A partir das potencialidades e limitações do projeto aqui discutidas, ainda é cedo

para se mensurar os reais impactos que o PAC produzirá na região de Manguinhos e em

seu entorno. Se a partir das experiências daqueles que vivenciam e se utilizam dos

novos equipamentos já é notável a existência de certo otimismo em relação ao futuro,

devido às novas oportunidades de vida que lhes são oferecidas; para a grande maioria da

população local, esses empreendimentos, ainda pouco notados, não modificaram em

nada suas condições de vida e seu cotidiano.

Em grande medida, as intervenções urbanísticas e os equipamentos construídos

possuem seus efeitos limitados e dissuadidos pela permanência do controle territorial do

tráfico de drogas e pelas sociabilidades por ele mantidas, como no caso do uso aberto e

ininterrupto de drogas – tendo sua expressão máxima nas cracolândias e na população

de “craqueiros” que circula por todas as áreas da comunidade. No novo conjunto

habitacional da Embratel, por exemplo, localizado da Avenida Leopoldo Bulhões, a

polícia em operação encontrou uma boca de fumo, que contava com telhado e sofá para

a permanência dos traficantes87. Essas freqüentes incursões policiais a fim de combater

o tráfico, por sua vez, também perpetuam a situação de insegurança e de violência, a

qual também inibe e cerceia as possibilidades de uso do espaço público na favela.

Nesse sentido, a inauguração da Cidade da Polícia e de uma futura Unidade de

Polícia Pacificadora (UPP) na região, dependendo da forma como sejam

implementadas, talvez possam, acompanhadas do PAC e de seu trabalho social,

melhorar as condições de vida locais. Caso contrário, corre-se o risco de que, com o

tempo, todas as obras e projetos realizados até então sejam novamente incorporados ao

restante da favela. Isso ocorrerá na medida em que as intervenções forem sendo

precarizadas, pela sua falta de manutenção, pela ocupação informal que se perpetua e

pela atuação do tráfico, a qual favorece todo esse cenário.

No entanto, se em grande medida a presença do tráfico dificulta a mudança de

perspectiva de vida local, não se trata aqui de colocá-lo como o algoz ou bode

expiatório da sociedade, já que este também é fruto da forma como a própria sociedade

se articulou na cidade do Rio de Janeiro. O Estado possui uma parcela de

responsabilidade fundamental no estado do quadro atual, através de seu planejamento e

                                                                                                                         87   “Polícia   destrói   boca   de   fumo   durante   operação   em   Manguinhos”,   O   Globo,   04.11.2011  (http://br.noticias.yahoo.com/pol%C3%ADcia-­‐destr%C3%B3i-­‐boca-­‐fumo-­‐durante-­‐opera%C3%A7%C3%A3o-­‐manguinhos-­‐115200872.html)    

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de suas políticas urbanas implementadas na cidade ao longo dos anos88. Por conta disso,

para além dos avanços legislativos e discursivos alcançados, o cumprimento dos

paradigmas da integração e da participação social ao longo da realização do PAC ainda

é colocado em xeque e muito criticado pela população local – haja vista a reclamação

constante em relação à falta de informações sobre o programa.

Em 03 de novembro de 2011, O DIA Online, publica uma matéria sobre graves

problemas técnicos encontrados nas obras do PAC:

“Solução de moradia para quem vivia na Favela de Manguinhos, os apartamentos do Programa

de Aceleração do Crescimento (PAC) na comunidade já apresentam problemas. Nas paredes e

no teto dos imóveis do Condomínio João Nogueira, rachaduras que surgem a cada dia revelam

a fragilidade da obra. Nos corredores dos edifícios, entregues em maio de 2009, fissuras nas

escadas aumentam a sensação de insegurança. A instabilidade dos muros de proteção que

balançam com simples apoiar de braços, dando a impressão de que vão desabar, também

preocupa. Assim como as infiltrações, que estão por toda a parte”89.

A aparição dessas rachaduras nos novos apartamentos construídos pelo PAC

torna-se motivo de preocupação e desconfiança em relação à durabilidade dos efeitos

dessa política. Estas sugerem, antes disso, a continuidade das desigualdades de

qualidade e montante de investimento público que é feito pela cidade e que,

conseqüentemente, reproduzem as suas desigualdades sócio-espaciais. Daí, que a

manutenção da formulação de políticas públicas específicas para favelas, em vez de

compensar uma situação de segregação, em grande medida, a perpetua.

As rachaduras, nesse sentido, estão presentes na vida da população de

Manguinhos de diversas formas: seja por efeito das condições do solo, seja como efeito-

perverso das obras do PAC ou como resultado direto da falta de qualidade nas

construções, por ele, realizadas. Em outras palavras, as rachaduras aparecem nas casas

como fruto, de um lado, da ausência do Estado; e, por outro, de uma presença, do

mesmo, determinada e diferenciada daquela que se faz nas demais áreas mais ricas da

cidade.

                                                                                                                         88   Não   entrarei   aqui   nas   questões   de   políticas   de   segurança   pública   que,   como   se   sabe,   também  contribuíram  para  o  desenvolvimento  do  tráfico  de  drogas  nas  favelas,  tal  qual  se  encontra  atualmente.    89  “Rachaduras  nos  prédios  do  PAC  em  Manguinhos”,  O  DIA,  03.11.2011  (http://odia.ig.com.br/portal/rio/html/2011/11/rachaduras_nos_predios_do_pac_em_manguinhos_203764.html)    

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