retrospectiva histórica da didática e o educador - fichamento (inaldo junior)

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ALBUQUERQUE, Maria Jaques de. Retrospectiva Histórica da Didática e o Educador. In: Revista Educação: Teorias e Práticas, Universidade Católica de Pernambuco, ano 2, nº 2,  págs. 38 a 60, dez, 2002. 1 Sobre a autora Marluce Jaques de Albuquerque possui graduação em Pedagogia pela Universidade Federal de Pernambuco (1972) e mestrado em Educação pela Universidade Federal de Pernambuco (1989). Atualmente é professora adjunto III da Universidade Católica de Pernambuco e  pesquisadora do PIBIC/UNICAP. Aposentada do Departamento de Psicologia e Orientação Educacional do Centro de Educação da Universidade Federal de Pernambuco. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Didática, Avaliação, Pesquisa e Prática Pedagógica, atuando principalmente nos seguintes temas: formação de professores, prática  pedagógica, prática avaliativa, concepções de avaliação, ambiente virtual de aprendizagem.  Esquema do texto por tópico  Perspectivas históricas e sua influência no âmbito da didática;  O sistema educacional no Brasil e a didática;

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ALBUQUERQUE, Maria Jaques de. Retrospectiva Histrica da Didtica e o Educador. In: Revista Educao: Teorias e Prticas, Universidade Catlica de Pernambuco, ano 2, n 2, pgs. 38 a 60, dez, 2002.

Sobre a autoraMarluce Jaques de Albuquerque possui graduao em Pedagogia pela Universidade Federal de Pernambuco (1972) e mestrado em Educao pela Universidade Federal de Pernambuco (1989). Atualmente professora adjunto III da Universidade Catlica de Pernambuco e pesquisadora do PIBIC/UNICAP. Aposentada do Departamento de Psicologia e Orientao Educacional do Centro de Educao da Universidade Federal de Pernambuco. Tem experincia na rea de Educao, com nfase em Didtica, Avaliao, Pesquisa e Prtica Pedaggica, atuando principalmente nos seguintes temas: formao de professores, prtica pedaggica, prtica avaliativa, concepes de avaliao, ambiente virtual de aprendizagem.

Esquema do texto por tpico

Perspectivas histricas e sua influncia no mbito da didtica; O sistema educacional no Brasil e a didtica; A didtica no Brasil-colnia; A didtica no Imprio e na Primeira Repblica; A didtica aps a 1 guerra mundial; Nova fase da educao e a construo da concepo da didtica; A didtica e o Golpe Militar; Fase Fnix da didtica; Perspectivas atuais; Consideraes finais;

Perspectivas histricas e sua influncia no mbito da didtica

A Didtica nasceu no sculo XVII, onde a burguesia era classe emergente. Em meados desse sculo, Comenius escreveu a Didtica Magna. A burguesia se serviu destes procedimentos didtico-metodolgicos para se consolidar como classe ascendente. (39 e 40)A obra de Comenius possua carter teolgico e tambm era influenciada pela nova abordagem das Cincias Naturais Modernas. Sua meta era ensinar tudo a todos com economia de tempo e fadiga, com agrado e solidez. (39 e 40)

No sculo XVIII, perodo da revoluo burguesa, Rousseau critica tanto a didtica de Comenius quanto sua adaptao ideologia burguesa. Ele critica as relaes sociais e culturais, e prope uma educao individual para a superao dessas relaes corrompidas a fim de recuperar a natureza do homem, que boa. (40)

Ele acreditava que a educao nos d tudo o que no temos ao nascer e que necessitamos quando adulto, sem interferir no desenvolvimento natural do homem. Essa educao vem da natureza (desenvolvimento fisiolgico natural), dos homens (uso do desenvolvimento natural) e das coisas (a experincias que se tem dos objetos). (40)

De Rousseau pode-se extrair os seguintes princpios didticos: respeitar ao desenvolvimento natural dos indivduos; interferir o mnimo possvel; no impor contedos, mas proporcionar um ambiente em que o aluno realiza as prprias descobertas. (40)

No sculo da consolidao do modo de produo capitalista, sculo XIX, as ideias de Comenius e Rousseau no mais atendiam as necessidades do momento. A Burguesia precisava de uma pedagogia cientfica para fundamentar uma escola eficiente, instrumentalizar-se culturalmente e difundir a sua viso de mundo. Ento surge Herbart defendendo a ideia de que a pedagogia se fundamenta na tica e na psicologia. (41)

Suas concepes pedaggicas dizem: o esprito nasce desprovido de faculdades que vai se compondo de representaes que vm do exterior; que as experincias passadas aliceram novas experincias; a educao se d pela instruo cujos fins so: moral e intelectual; a melhor maneira de formar o aluno despertar seu interesse mltiplo; o ensino percorre o itinerrio: preparao, apresentao, associao, generalizao e aplicao. (41 e 42)Segundo Ghiraldelli, as etapas de ensino de Herbart conquistou o mundo nas redes pblicas de ensino que comearam a se expandir, embora excluindo o interesse das camadas populares. (42)

Os filhos dos trabalhadores que desfrutavam do ensino das escolas herbartianas ameaavam a burguesia dominante. Porque eles pretendiam chegar s universidades. Foi nesse contexto que surge o movimento da Escola Nova de John Dewey acusando a escola tradicional de ineficiente, no cientfica e medieval. A Burguesia apoiou a Escola Nova, e negou a pedagogia que ela mesma havia apoiado antes. (42)

A Escola Nova buscava ser cientfica adotando o mtodo de pesquisa em laboratrio, isto , aquele que envolvia atividade, problema, dados, hipteses e experimentao, como mtodo didtico. Segundo Ghiraldelli isso desestruturou o trabalho em sala de aula. Saviani afirma que esse movimento colocou em segundo plano os resultados da aprendizagem. (43)

Todos esses acontecimentos influenciaram a evoluo do sistema educacional brasileiro. (43)

O sistema educacional no Brasil e a didtica

A didtica no Brasil-colnia

O sistema educacional montado pelos jesutas servia de manuteno do domnio da coroa portuguesa. Os colgios e seminrios difundiam o cristianismo e subjugava pacificamente os indgenas e tornava dceis os escravos. (43)

Os jesutas adotaram o plano de educao Ratio Studiorum. Eles tentaram adapt-lo realidade local, principalmente Manoel Nbrega, mas isso no foi possvel porque contrariava a prpria ordem religiosa. (44)

A formao de professores era cuidadosa. Os colgios possua uma extensa hierarquia. A fiscalizao do ensino era intensa. A fidelidade aos documentos originais era rgida. Os mtodos de motivao e disciplina eram os melhores da poca. O mtodo de instruo era baseado na memorizao. Eles tinham o princpio de tornar o ensino fcil, gradual, perfeito e definido. (44 e 45)

Em 1759, a expulso dos jesutas por Marques de Pombal gerou uma decadncia no sistema educacional brasileiro, pois o ensino desorganizou-se em aulas avulsas. (45)

Em 1808, com a vinda da famlia real ao Brasil, surgiram algumas escolas adaptadas s condies e interesses locais do momento. (45)

A didtica no Imprio e na Primeira Repblica

A igreja continuava a controlar as instituies de ensino reproduzindo a ideologia da classe dominante. (45)

Com a nova Constituio de 1891, o ensino secundrio passa a ser competncia da Unio, enquanto o ensino primrio e a formao do magistrio primrio, responsabilidades dos estados. So Paulo foi um dos pioneiros na organizao da educao pblica e se tornou referncia para outros estados. (46)

A maioria dos responsveis pelo sistema escolar paulista tinham estudados nos Estados Unidos, onde as teorias educacionais de Herbart eram bem aceitas. Por isso a pedagogia herbartiana exerce grande influncia no Brasil. Exceto MG, BA, PE e DF que tinham seus prprios sistemas escolares e tinham influncias francesas da pedagogia europeia. (46)

S as populaes urbanas desfrutavam desses sistemas ensino primrio. As populaes rurais se serviam de poucas escolas e professores improvisados. (46)

A didtica aps a 1 guerra mundial

Aps a 1 guerra mundial novas condies mundiais de vida poltica e econmica reorientaram os processos educacionais. Na dcada de 20 comeou a repercutir no Brasil o movimento da Escola Nova. Vrias tentativas de renovao dos processos educacionais foram feitas. (47)

O processo de urbanizao, o xodo rural e a instruo como requisito bsico para o trabalho aumentou a demanda procura de escolas. O pequeno nmero de escolas gera um grande problema: quantidade x qualidade do ensino. (47)

A Didtica era compreendida por um conjunto de regras que orientavam o trabalho dos futuros docentes. Mas a prtica e teoria estavam separadas. (47)

Nova fase da educao e a construo da concepo da didtica

Na dcada de 30 foi criado o Ministrio da Educao. Em 1932 lanado o Manifesto dos Pioneiros da Educao Nova em defesa do ensino pblico e gratuito. Livros sobre novas ideias de ensino comearam a ser publicados. (47)

Havia duas tendncias: uma que visava somente a ampliao do sistema e outra que defendia a renovao qualitativa. Os mtodos de ensino renovados valorizariam as descobertas e o meio natural e social. (48)

A Constituio de 1934 estabelece a necessidade da elaborao de um Plano Nacional da Educao para coordenar e supervisionar as atividades de ensino. (48)Entre 1931 e 1932 foi estabelecida a Reforma de Francisco de Campos. O ensino comercial foi organizado. Foi adotado para o ensino superior o regime universitrio. A primeira universidade brasileira foi organizada. (48)

A origem da disciplina Didtica para formao de professores mrito da criao da Faculdade de Filosofia Cincias e Letras da USP, em 1934. (48)

A Constituio de 1937 acrescentou o ensino profissionalizante para as classes menos privilegiadas. E os sindicatos e indstria devem a partir de ento criar escolas de aprendizagem em sua especializao para os filhos dos empregados. (48)

Percebe-se uma dualidade do sistema educacional brasileiro deste contexto. As escolas de elites preocupavam-se em formar os dirigentes e as tcnicas, os comandados. Reproduzindo a estrutura de classes capitalistas que estavam se consolidando. (49)

Ansio Teixeira um nome importante, pois foi um grande terico e realizador da educao brasileira. Publicou muitos trabalhos, fez reformas de ensino, impulsionou cursos de ps-graduao etc. (49)

Na dcada de 1930 houve a instituio da Didtica como curso e disciplina, com durao de um ano. Em 1941, ela passa a ser um curso independente realizado aps o bacharelado. Em 1946 a Didtica perde seus qualitativos geral e especficos deixando de ser curso independente. (49)

Na ditadura, os debates educacionais ficaram estagnados e os educadores condicionados s posies polticas do Estado. (50)

Com a redemocratizao do pas e a promulgao da Constituio de 1946, iniciou-se a discurso da Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional que substituiriam as leis obsoletas do governo de Vargas. A LBD s foi sancionada em 1961. (50)No fim da dcada de 50 a Didtica faz o discurso da Escola Nova, marcado pela valorizao da criana, tentando superar a escola tradicional. Sua proposta baseia-se em princpios de individualizao, liberdade iniciativa e autonomia. uma didtica de base psicolgica. Defende as ideias de: aprender fazendo; aprender a aprender; ateno s diferenas individuais; e estudam-se mtodos e tcnicas de ensino. (50)

A Escola Nova via apenas os problemas educacionais do lado de dentro e ignorava a realidade poltica, econmica e social do pas, do lado de fora. (50)

Segundo Saviani, entre 1930 e 1960 predominou a concepo humanstica com avano da verso moderna em detrimento da verso tradicional. Depois de 1960 a concepo humanstica cede lugar tecnicista, que predomina a partir de 1969. (51)

A didtica e o Golpe Militar

Depois do Golpe de 1964, a educao foi vinculada Segurana Nacional. O modelo poltico-econmico refora o controle, a represso e o autoritarismo. (52)

Entre 1960 e 1968 a Pedagogia nova entrou em crise, abrindo espao para uma tendncia tecnicista. A Didtica concebida como estratgia para o alcance dos produtos do progresso de ensino-aprendizagem. A viso empresarial penetra na educao. As tcnicas assumem o centro do ensino. (52)

O sistema educacional brasileiro era estigmatizado pela influncia dos acordos MEC/USAID (influncia de educadores americanos). O Conselho Federal de Educao implantou a disciplina Currculos e Programas nos cursos de Pedagogia que sobreps os contedos da Didtica. (52)

Os contedos de Didtica centram-se na organizao do ensino. O papel do professor era meramente executar os objetivos instrucionais, de estratgias de ensino e modelos de avaliao. (52 e 53)

Tanto a pedagogia tecnicista quanto a escola nova concordam com a neutralidade do tcnico, isto , a desvinculao dos meios e fins, no entanto, isso gerava uma formao acrtica do aluno e atendia aos interesses dos donos dos meios de produo. (53)

A partir de 1974, a abertura do regime poltico autoritrio, estudos esclareceram as funes reais da poltica educacional do governo, as teorias crtico-reprodutivistas. Os professores se decepcionaram, pois no adiantava melhorar o ensino uma vez que a escola era aparelho ideolgico do Estado. Por isso a Didtica assumiu o discurso reprodutivista. (53)

Segunda Candau, as crticas prtica pedaggica da dcada de 1970 foram proveitosas uma vez que, a falsa neutralidade do tcnico foi denunciada e se afirmou a impossibilidade de uma prtica pedaggica isenta de orientao social e poltica. Mas alguns autores negaram a dimenso tcnica docente, esquecendo-se as dimenses poltica, tcnica e humanas se exigem reciprocamente. (53 e 54)

Segundo Libneo, todo fazer pedaggico deveria englobar as trs dimenses saber ser, o saber e o saber fazer. O professor deve ter um posicionamento pessoal, deve dominar a cultura geral e os contedos e dominar a tcnica de ensinar. (54)

Fase Fnix da didtica

Durante a dcada de 1980 o pas enfrentou dificuldades por causa de sua situao socioeconmica. Perodo em que os professores reclamaram para si o direito e dever de participar da redefinio da poltica educacional. (54)Em 1982, realizou-se um seminrio, organizado pela PUC/RJ, de 16 a 19 de novembro: A Didtica em questo. O objetivo era revisar de forma crtica o ensino e a pesquisa em Didtica. (55)

Constatou-se que a Didtica no tinha contedo prprio, constitua-se de informaes fragmentadas, a teoria e prtica estavam desarticuladas, havia um consumismo de teorias importadas e no havia integrao entre as dimenses tcnica, humana e poltica. (55)

Nesse contexto, os professores se viram diante de duas possibilidades: manter a realidade ou denunciar o compromisso da Didtica em atender os interesses do estado e negar viso tecnicista da educao. Entretanto, sabe-se hoje que o compromisso poltico e a competncia tcnica se articulam na prtica pedaggica. (55)

Perspectivas atuais

A lei de 9394/96 compromete-se com uma educao e aprendizagem de qualidade. Essa lei assegura a autonomia da escola na definio de sua proposta pedaggica e o compromisso da escola em garantir a aprendizagem de todos os alunos. A lei tambm defende a flexibilidade e a liberdade como pressupostos necessrios para a educao bsica. (55 e 56)

Neste cenrio atual, a Didtica esclarece o papel scio-poltico da educao de acordo com os pressupostos de uma pedagogia transformadora: o de ir alm dos mtodos e tcnicas e associar escola e sociedade, teoria e prtica, contedo e forma, tcnico e poltico, ensino e pesquisa e professor e aluno. (56)

O professor deve ter conscincia de que o objeto da Didtica o como ensinar e isso est articulado prtica social, seu pressuposto e sua finalidade. Que MEDIADOR na construo do saber do aluno. importante que ele tenha conscincia das contradies que permeiam a prtica pedaggica e que tenha como principal compromisso a transformao social. Deve tambm, buscar prticas educativas que atendam maioria da populao. (56 e 57)

Os professores devem buscar metodologias alternativas que contemplem os princpios das competncias, habilidades e atitudes. Se conscientizar que no pode mais isolar-se na sala de aula e ministrar sempre a mesma aula, tornando-se obsoleto em meio a um mundo globalizado. (57)

Consideraes finais

Ensinar nas prximas dcadas exigir mudanas dos paradigmas convencionais de ensino atravs de contnuas revises, ampliaes e investigaes das formas vigentes de ensinar e aprender. (57)

O professor deve estar aberto mudanas, participar da construo, execuo e avaliao do projeto pedaggico de onde leciona, adaptar sua prtica s caractersticas da comunidade, considerar o panorama social do pas e do entorno da escola, considerar realidade do aluno, utilizar tcnicas e instrumentos diferentes de avaliao considerando os resultados e sempre avaliar e reavaliar sua prtica pedaggica. (57 e 58)

O educador s descobre-se capaz de ensinar quando pe em prtica o seu fazer pedaggico. Aprende-se a ser educador medida que se ame ensinar e se estude a respeito. O educador deve aceitar seu aluno como pessoa que tambm capaz de ensinar. O professor aprende ao mesmo tempo em que ensina. (58)

Para que os professores se transformem preciso entender o contexto poltico-social do ensino e entender como esse contexto distingue uma nova concepo de educao transformadora das tradicionais. A concepo transformadora ver o professor e aluno como agentes crticos na construo do seu saber. (58)

O professor precisa compartilhar suas convices com os alunos para juntos tomarem decises em relao prtica pedaggica. (59)

importante considerar que a transformao da sociedade no se d apenas dentro da escola, mas alm de seus muros. importante articular o trabalho em sala de aula com a transformao da sociedade. (59)1