resumo da concepção aristotélica de phrónesis lima vaz

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Resumo da concepção Aristotélica de Phrónesis Para Aristóteles a práxis tem em sua estrutura uma teoria (conhecimento intelectual específico). Portanto, trata-se de uma teoria prática, pois não se faz presente em razão de si mesma, mas em razão do exercício do agir. A teoria prática obedece uma metodologia e tem um tipo de certeza que atendem às suas características originais e não podem pretender o rigor da teoria que objetiva o necessário e universal. Uma teoria da práxis ou uma teoria que absorve a práxis ao seu âmbito seria inconcebível para Aristóteles, pois a práxis é relativizada pelo “bem humano”: o que pode ser realizado e possuído pelo homem. Aristóteles não prescinde do procedimento metódico e da exatidão conceptual próprios da ciência ao elaborar a teoria prática. Portanto, o saber prático está em função de sermos bons e é concebido por Aristóteles como um retorno à empiricidade do ethos, mas não como um empirismo do senso comum, considerando que o seu núcleo conceptual é a prónesis. Portanto, a phrónesis é uma sabedoria prática concebida como uma estrutura dianoética fundamental do agir ético. Logo, o conceito aristotélico de phrónesis coloca a teoria como intrínseca e constitutiva da práxis. Aristóteles considera o campo da racionalidade prática, no qual são trocadas as linhas de uma práxis animada intrínseca por uma forma de saber, como o lugar da tarefa ou do operar próprio do homem. O operável (érgon) humano não pode estar contido em esferas particulares ou em atividades comuns a outros tipos de vida (vegetativas ou sensistivas). Oe érgon (operar) só pode ser propriamente humano se for referente à parte da psyché capaz de regulação racional. Portanto, o érgon é a atividade imanente da alma segundo a virtude mais excelente e mais perfeita. A práxis aristotélica contém dois pontos fundamentais: “as coisas humanas” e “segundo a virtude”: “As coisas humanas”: realidade (múltipla e mutável) e ethos histórico (uno e permanente);

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Resumo da concepção Aristotélica de Phrónesis

Para Aristóteles a práxis tem em sua estrutura uma teoria (conhecimento

intelectual específico). Portanto, trata-se de uma teoria prática, pois não se faz

presente em razão de si mesma, mas em razão do exercício do agir. A teoria

prática obedece uma metodologia e tem um tipo de certeza que atendem às

suas características originais e não podem pretender o rigor da teoria que

objetiva o necessário e universal.

Uma teoria da práxis ou uma teoria que absorve a práxis ao seu âmbito

seria inconcebível para Aristóteles, pois a práxis é relativizada pelo “bem

humano”: o que pode ser realizado e possuído pelo homem.

Aristóteles não prescinde do procedimento metódico e da exatidão

conceptual próprios da ciência ao elaborar a teoria prática. Portanto, o saber

prático está em função de sermos bons e é concebido por Aristóteles como um

retorno à empiricidade do ethos, mas não como um empirismo do senso

comum, considerando que o seu núcleo conceptual é a prónesis.

Portanto, a phrónesis é uma sabedoria prática concebida como uma

estrutura dianoética fundamental do agir ético. Logo, o conceito aristotélico de

phrónesis coloca a teoria como intrínseca e constitutiva da práxis.

Aristóteles considera o campo da racionalidade prática, no qual são

trocadas as linhas de uma práxis animada intrínseca por uma forma de saber,

como o lugar da tarefa ou do operar próprio do homem.

O operável (érgon) humano não pode estar contido em esferas

particulares ou em atividades comuns a outros tipos de vida (vegetativas ou

sensistivas). Oe érgon (operar) só pode ser propriamente humano se for

referente à parte da psyché capaz de regulação racional. Portanto, o érgon é a

atividade imanente da alma segundo a virtude mais excelente e mais perfeita.

A práxis aristotélica contém dois pontos fundamentais: “as coisas

humanas” e “segundo a virtude”:

“As coisas humanas”: realidade (múltipla e mutável) e ethos

histórico (uno e permanente);

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“Segundo a virtude”: movimento essencial da psyché humana

voltada para a excelência e para o bem do próprio ato segundo a

medida da razão.

A razão é a medida do perfeito, do que é fim em si mesmo.

A estrutura da práxis segundo Aristóteles e o espaço da sua operação é

o ethos que nasce na polis, no qual estão presentes de uma lado as “coisas

humanas” e do outro a “virtude”. Este campo é o campo do logos prático ou da

atividade prática da psyché, que é regida pelo logos. A práxis é a intersecção

entre ethos e Arete e define o campo onde o logos imanente ao ethos se

explicita em logos refletido da Arete e que contém a razão da sua excelência e

de sua obra própria. Assim, o perfila da Arete na perspectiva do ethos desenha

a figura das virtudes éticas, enquanto que o perfil da Areté na perspectiva da

própria Arete e do seu logos explícito, são as virtudes dianoéticas.

A phrónesis é a virtude da reta razão, estabelece a média entre os

extremos para as virtudes éticas e é a primeira das virtudes dianoéticas. Por

meio dela, o logos regula e ordena o fluxo contingente das ações singulares.

Ao apontar no homem sábio a existência da phrónesis, Aristóteles evidencia,

na realidade das “coisas humanas”, a dialética estabelecida entre o implícito

vivido do ethos e o explícito pensado da Ética ou da ciência prática. Tal

dialética rompe o círculo vicioso que opõe a prática e a definição e do qual

nasce a aporia dos diálogos “socráticos” de Platão.

Para Platão, a prática da virtude contém o saber da sua definição e a

definição da virtude é a abstração da sua prática. É necessário praticá-la para

defini-la e defini-la para praticá-la. A ética como ciência quebra a distância

entre o abstrato e o concreto. A Ética platônica coloca o logos como lugar da

realidade realíssima, que é a realidade ideal. Aristóteles coloca na excelência

do varão sábio a realização concreta da idéia do Bem como forma e, nela, a

norma existencial da virtude. Assim ele leva a termos a profunda aspiração do

grego à perfeição como forma acabada na sua pela e irradiante atualidade.

Desta maneira, sendo embora a virtude um meio termo entre extremos, e

sendo a phrónesis, como primeira virtude dianoética, uma virtude da razão

calculadora, Aristóteles não situa a virtude entre a estática e circunspeta. Ao

contrário, é a seu modo um “extremo” (akrótes), é a perfeição mesma do agir

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elevando-se com proporção e harmonia sobre os extremos viciosos do excesso

e do defeito. É uma enérgeia (excelência para o bem do próprio ato) da forma

do agir humano, levando a práxis à plenitude da sua atualidade, que a virtude

se refere ao tipo de modelar do phrónimos e a mesótes se define em relação

ao agente e aos ingredientes da sua ação. A práxis virtuosa se orienta para a

transcendência do domínio das “coisas humanas” e a phrónesis dá lugar à

inteligência especulativa (nous) e a práxis eleva-se à beatitude da

contemplação (theoría).

O conceito aristotélico de práxis, situado no campo aberto pela ontologia

platônica do Bem, estrutura-se de acordo com o dinamismo imanente da Arete

própria do agente que opera sob a regência do logos.