resenha o abutre
TRANSCRIPT
Autor:
Rogério Marques Benedito Júnior1
Resenha crítica do filme “O Abutre”
Maputo
2015
1 Estudante de licenciatura em jornalismo na Escola de Comunicação e Artes da Universidade
Eduardo Mondlane em Maputo. Ex – colaborador da antena nacional da Rádio Moçambique e da
Commonwealth Games (www.futurenews.org.uk).
1. TÍTULO DO FILME:
O Abutre/ Nightcrawler
2. RESUMO
O Abutre, com título original: Nightcrawler é um filme policial americano
com drama e suspense2, escrito e dirigido por Dan Gilroy. Jake Gyllenhaal é o
protagonista do filme, que na peça identifica-se por Louis Bloom. Foi lançado em
17 de Outubro de 2014 pela Open Road Films e conta a história de um jovem que,
depois de tantas tentativas de entrar pelo mundo de emprego formal, decide
enveredar pelo jornalismo criminal independente. Para tal, Louis Bloom corre,
diariamente, em busca de registar crimes e acidentes a fim de vender para os
veículos interessados.
3. COMENTÁRIO CRÍTICO
O filme retrata vários aspectos ligados à comunicação, especificamente, ao
jornalismo. Os temas candentes são, logo a partida, a difícil tarefa de uma inserção
no mercado de trabalho formal aos recém-formados; ética no apuramento dos
factos e a rotina produtiva. Dito de outra maneira, o filme é uma autêntica crítica
aos temas como: Ética e deontologia profisional, Rotina Produtiva bem como o
Mercado de Trabalho.
Temos um personagem que procurando uma carreira, a todo o custo, para
aprender e evoluir, embora, sem nenhuma formação jornalística, arrisca ser um
freelancer sobre assuntos voltados à criminalidade e aos acidentes de grande
impacto. É um indivíduo com vazio de conhecimentos práticos e técnicos da área.
Trabalha de forma autónoma, sendo ele próprio, apurador e o gatekeeper das
peças que produz.
Por outro lado, Claudemir Hauptmann3 defende que a técnica é, via de regra,
um problema ético na medida em que esta surge para reduzir o tempo de
2 http://pt.wikipedia.org/wiki/Nightcrawler
3 Jornalista, professor universitário, especialista em Assessoria de Comunicação e Marketing pela
FAG in: O indivíduo, a técnica e um vazio ético no jornalismo.
apuramento dos jornalistas dado a lógica comercial das empresas jornalísticas.
Aqui impera a seguinte equação; produzir mais, num tempo cada vez menor e com
menos custos.
Um cenário igual acontece no filme O Abutre. Louis Bloom, como forma de
responder a demanda de produzir mais, ganhar mais dinheiro e manter-se no
mercado, buscou na técnica a garantia de sua sobrevivência oferecendo, por isso,
quantidade mascarada de qualidade. Tal como refere Hauptmann, os homens se
valem de seus valores morais e éticos para usarem as técnicas fazendo com que
estas deixem de ser neutras como deviam. No caso do filme em destaque, o
protagonista, para conseguir fazer boas imagens exclusivas, extrapolava as linhas
éticas, criando dessa forma, um falso acontecimento.
Para se manter no mercado, sem nenhum concorrente, o protagonista chega
até a tirar vida dos seus adversários. Com isso pretendia ser ele o líder em
imagens exclusivas de crimes e acidentes e, consequentemente, ganhar mais
dinheiro. Tirar vida de alguém é considerado crime e dá direito a prisão. Esta parte
do filme é uma forma de repúdio a práticas desta natureza, visto que, os jornalistas
actuais, imbuídos pela visão de transformação da notícia em produto comercial,
encaram-se como adversários e nunca como meros construtores parciais da
realidade, isto é, todos querem ser os primeiros a publicar a qualquer preço.
Louis Bloom, perguntado se queria ser repórter por Nina da emissora de Tv
Kwala, canal no qual vendia as suas imagens respondeu dizendo: Eu quero ser
dono de uma empresa e dono da câmara, mas para tal devo ter dinheiro. Esta
resposta ilustra com clareza que os que tem poder económico, para além de
assegurarem os meios de produção, querem também influenciar no produto. Em
outros campos isso pode ser passível com sucesso. Mas em jornalismo, quando os
detentores do poder económico – donos da empresa – interferem no produto
jornalístico (noticia, reportagem, editorial, entrevista, etc), deturpam os pilares
principais desta profissão nomeadamente: informar e educar.
De acordo com Claudemir Hauptmann a individualidade prevalece sobre o
colectivo. É passível de verificar isso no trecho do filme em que o actor principal,
Bloom, afirma ser ele sozinho quem melhorou a colocação da emissora Tv Kwala
na audiência. Medina (2002), citado por Huptmann, afirma que a imprensa, nos
dias que correm, especializou-se no fazer afastando-se do diálogo e perdendo a
capacidade de dar significado para os seus conteúdos.
“Se os meios são de comunicação, que se encare então o que é
comunicar, interligar. O maior obstáculo é o dirigismo com que se
executam as tarefas de comunicação social.”
Portanto, trabalhar sozinho significa liberdade e pressão. Liberdade de
inventar as noticias ou não e pressão de cumprir com o deadline. Com isso a
possibilidade de se passar por cima do código ético é maior. Resumindo, ele não
dialoga, é autoritário e monologo, e de outra forma ele dialoga e é democrático.
Na passagem do filme em que o repórter – protagonista –, supostamente,
flagra um assassinato de uma família inteira por “aparentes” assaltantes observa-
se um comportamento de invasão de privacidade. Pois o que se nota é que, logo
depois do crime, o jornalista entra na casa e faz uma filmagem pormenorizada de
todos os detalhes da casa e das pessoas assassinadas. Como se não bastasse a
emissora compra a peça e veicula em “primeira mão”, sem antes de os policiais
terem tomado conhecimento do assunto. Foi uma informação vaga, sem a resposta
das clássicas perguntas: como? e o porquê? Reforçando este pensamento,
Bernardo Kucinski ressalta que é um fato actualmente que, dentro de limites cada
vez mais amplos, cada um tem o direito de agir e pensar como quiser. Por isso,
entre as muitas dicotomias da ética jornalística de hoje, vivemos a mais básica de
todas: a do individualismo versus o código de ética.
Eugénio Bucci, ensina-nos que a ética, não é conjunto de posturas nem as
generalidades superficiais dos códigos de ética. Ética é a essência do bom
jornalismo ao moldar o carácter dos profissionais, de forma a levá-los sempre a
atender a função pública e social de divulgar tudo que é de interesse da sociedade,
de forma correcta. Bucci quer, com isso dizer que para a efectivação plena da ética
é fundamental a participação exemplar e coerciva da empresa em moldar o
comportamento do jornalista a fim de apurar os factos nos trâmites éticos. Para se
chegar a este estágio é preciso que as empresas tenham empatia para difundir
assuntos que, de facto, interessam a sociedade e que pode, de certa forma,
influenciar as dinâmicas sociais no bom sentido do termo. Não é possível que os
jornalistas mudem, enquanto a as empresas continuarem na mesma perspectiva.
Deve ser uma transição conjunta e paralela.
4. CONCLUSÃO
Com o advento do capitalismo, no século passado, os indivíduos e as empresas
passaram por uma reforma estrutural, usando um sistema de produção de
mercadorias, centrado sobre a relação entre propriedade privada do capital e o
trabalho assalariado sem posse de propriedade, esta relação formando um eixo
principal de um sistema de classes.
A adopção de modelos comerciais pelos mídia é um perigo para a ética.
Todo o cidadão tem direito a informação4. As empresas jornalísticas devem existir
para fechar esta lacuna e não apenas para gerar emprego, fortunas e erguer
impérios.
O carácter do protagonista, aliada a este último princípio, foi um dos principais
factores que muitas vezes cegava os seus olhos e racionalidade. Com isso
prevalecia o individualismo, na medida em que o repórter deixava de se importar
pelas repercussões negativas trazidas por uma peça mal apurada. É preciso
pensar sempre em o que reportar e como reportar.
4 Declaração Universal dos Direitos do Homem, Art. 19
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
HAUPTMANN, Claudemir O indivíduo, a técnica e um vazio ético no jornalismo.
Faculdade Assis Gurgacz- FAG. 7p
http://pt.wikipedia.org/wiki/Nightcrawler: Acesso em 18 de Maio de 2015