repensando a tradição: a variabilidade estilística na arte...

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127 Revista do Museu de Arqueologia e Etnologia, São Paulo, 17: 127-147, 2007. ste artigo discute a variabilidade estilística na arte rupestre do norte mineiro e sudoeste baiano no período interme- diário de representações, a partir de uma centena de sítios arqueológicos estudados entre 2001 e 2006 (Mapa 1). 1 Os abrigos analisados se distribuem por uma região que cobre cerca de 17.000km 2 no sudoeste da Bahia (municípios de Serra do Ramalho, Coribe, Cocos, Carinhanha e Feira da Mata) e extremo norte de Minas Gerais (Montalvânia, Itacarambi e Januária). A classificação estilística foi o critério adotado nesta pesquisa para buscar compreen- der o desenvolvimento das manifestações rupestres nesta região, para identificar novas expressões e para organizar a arte rupestre regional em cronologia relativa, acreditando que uma seqüência estilística detalhada poderia ser melhor cotejada à seqüência arqueológica estratigráfica regional, favorecendo, assim, as correlações entre arte rupestre e demais testemunhos de atividades humanas pré- históricas. Para definir os estilos regionais foram privilegiadas características temporais das figuras (cronologia relativa); de inscrição no espaço (da escolha do suporte à inserção dos abrigos na paisagem, observando os atributos físicos e visuais recorrentes nos suportes, abrigos e áreas onde ocorrem as figuras de cada estilo); e gráficas (temática, morfologia, associações preferenciais, tratamento técnico etc.), buscando focar a análise igualmente Repensando a tradição: a variabilidade estilística na arte rupestre do período intermediário de representações no alto-médio rio São Francisco Loredana Ribeiro* RIBEIRO, L. Repensando a tradição: a variabilidade estilística na arte rupestre do período intermediário de representações no alto-médio rio São Francisco. Revista do Museu de Arqueologia e Etnologia, São Paulo, 17: 127-147, 2007. Resumo: Este artigo apresenta os principais resultados das análises estilístico- comparativas realizadas em sítios rupestres do norte mineiro e sudoeste baiano: [1] uma periodização hipotética para a arte rupestre regional; [2] a caracterização da distribuição e uso do espaço pelos estilos atribuídos ao período intermediário de ocupação dos suportes; e [3] a caracterização de aspectos gráficos desses estilos, cujo aparecimento e desaparecimento demarcam as rupturas de padrão observadas. Aliada aos resultados da pesquisa empírica, a discussão final sobre a noção de tradição arqueológica reflete sobre as implicações metodológicas desse conceito na arqueologia da arte rupestre. Palavras-chave: Arte rupestre – Brasil central – Tradição arqueológica – Análises estilísticas. E (*) Setor de Arqueologia, MHN/UFMG ([email protected]) (1) Projeto de tese de doutoramento desenvolvido no MAE/ USP com financiamento da Fapesp (Ribeiro 2006).

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Revista do Museu de Arqueologia e Etnologia, São Paulo, 17: 127-147, 2007.

ste artigo discute a variabilidadeestilística na arte rupestre do norte

mineiro e sudoeste baiano no período interme-diário de representações, a partir de uma centenade sítios arqueológicos estudados entre 2001 e2006 (Mapa 1).1 Os abrigos analisados sedistribuem por uma região que cobre cerca de17.000km2 no sudoeste da Bahia (municípiosde Serra do Ramalho, Coribe, Cocos, Carinhanhae Feira da Mata) e extremo norte de MinasGerais (Montalvânia, Itacarambi e Januária).

A classificação estilística foi o critérioadotado nesta pesquisa para buscar compreen-

der o desenvolvimento das manifestaçõesrupestres nesta região, para identificar novasexpressões e para organizar a arte rupestreregional em cronologia relativa, acreditandoque uma seqüência estilística detalhada poderiaser melhor cotejada à seqüência arqueológicaestratigráfica regional, favorecendo, assim, ascorrelações entre arte rupestre e demaistestemunhos de atividades humanas pré-históricas. Para definir os estilos regionaisforam privilegiadas características temporaisdas figuras (cronologia relativa); de inscriçãono espaço (da escolha do suporte à inserçãodos abrigos na paisagem, observando osatributos físicos e visuais recorrentes nossuportes, abrigos e áreas onde ocorrem asfiguras de cada estilo); e gráficas (temática,morfologia, associações preferenciais, tratamentotécnico etc.), buscando focar a análise igualmente

Repensando a tradição: a variabilidade estilística na arte rupestre do períodointermediário de representações no alto-médio rio São Francisco

Loredana Ribeiro*

RIBEIRO, L. Repensando a tradição: a variabilidade estilística na arte rupestre doperíodo intermediário de representações no alto-médio rio São Francisco. Revistado Museu de Arqueologia e Etnologia, São Paulo, 17: 127-147, 2007.

Resumo: Este artigo apresenta os principais resultados das análises estilístico-comparativas realizadas em sítios rupestres do norte mineiro e sudoeste baiano:[1] uma periodização hipotética para a arte rupestre regional; [2] a caracterizaçãoda distribuição e uso do espaço pelos estilos atribuídos ao período intermediáriode ocupação dos suportes; e [3] a caracterização de aspectos gráficos desses estilos,cujo aparecimento e desaparecimento demarcam as rupturas de padrão observadas.Aliada aos resultados da pesquisa empírica, a discussão final sobre a noção detradição arqueológica reflete sobre as implicações metodológicas desse conceitona arqueologia da arte rupestre.

Palavras-chave: Arte rupestre – Brasil central – Tradição arqueológica –Análises estilísticas.

E

(*) Setor de Arqueologia, MHN/UFMG([email protected])(1) Projeto de tese de doutoramento desenvolvido no MAE/USP com financiamento da Fapesp (Ribeiro 2006).

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Mapa 1. Localização da região da pesquisa e delimitação aproximada das concentrações de sítios estudados.

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em todos estes aspectos da arte rupestre e nãoapenas em seus marcadores gráficos.

A pesquisa teve como ponto de partida osrepertórios temáticos caracterizados nastradições rupestres descritas nos últimos vinteanos que podem ser encontrados na região emestudo: tradições Agreste, Nordeste, SãoFrancisco e Complexo Montalvânia (Guidon1981; Isnardis 2004; Martin 1997; Pessis 1989,2003; Pessis e Guidon 2000; Prous 1989;Ribeiro e Isnardis 1996-97; Silva e Ribeiro1996; Schmitz e outros 1997, entre outros). Asmanifestações regionais de cada um dessespadrões gráficos foram inicialmente agrupadasem momentos (ou níveis) crono-estilísticos derealização, definidos pela cronologia relativa easpectos gráficos das figuras. Posteriormente, osmomentos pertencentes a cada repertóriotemático foram comparados entre si, em buscade elementos (gráfico-temáticos, cronológicos eespaciais) que confirmassem sua classificaçãoindependente ou que articulassem mais de ummomento de realização de figuras na composi-ção de um estilo (para descrições detalhadas dosestilos identificados, ver Ribeiro 2006: 164-229). Assim, dos doze estilos regionais definidosnesta pesquisa, três deles foram atribuídos pelatemática à Tradição Agreste, três à Tradição SãoFrancisco, dois ao Complexo Montalvânia e umà Tradição Nordeste, enquanto três outros nãoforam atribuídos a nenhum dos repertóriosgráficos descritos.

A análise regional buscou então compararentre si as características dos estilos identificadosem três dimensões: no tempo, no espaço e em seusmarcadores gráficos. Possíveis afiliações culturaispodem ser melhor discutidas com a observação derelações significativas entre estilos em mais de umadestas dimensões do que a partir de relaçõesobservadas em apenas uma delas – seja, porexemplo, a temporal ou a gráfico-temática, a maisutilizada.2 A observação de padrões envolvendo os

mesmos estilos nas três categorias de variação podefavorecer a elaboração de periodizações hipotéticasda arte rupestre regional, associando-a aos demaisitens do registro arqueológico.

Adiante se apresenta a seqüência cronológi-co-estilística disponibilizada pelos trabalhoscontínuos da equipe do Setor de Arqueologiacom a arte rupestre do norte mineiro, apontan-do-se os limites observados nessa organização ea necessidade de mudanças na orientação daspesquisas para obtenção de resultados maisabrangentes. Posteriormente é discutida umaperiodização hipotética elaborada para a arterupestre regional (Ribeiro 2006), na qual asinformações cronológicas disponíveis (dataçõesabsolutas e relativas, superposições e pátinas)são utilizadas para inserir os estilos rupestresintermediários na seqüência regional de ocupa-ção humana pré-histórica e balizar cronologica-mente os padrões observados nas formas deutilização do espaço e na variação gráfica dessaarte rupestre. A partir de então, as discussõessão focadas em características da distribuição euso do espaço e em aspectos gráficos dasmanifestações rupestres do período intermediá-rio, cujo aparecimento e desaparecimentodemarcam as rupturas de padrão observadas.

A discussão desenvolvida aqui sugere queseria mais proveitoso deixarmos temporariamentede lado as amplas categorizações culturais ebuscarmos antes compreender o registro rupestredas ocupações pré-históricas em suas particularida-des temporais e espaciais, para depois observarcomo suas especificidades se alinham. Juntamentecom os resultados da pesquisa empírica, adiscussão final sobre a noção de tradiçãoarqueológica pretende refletir sobre asimplicações metodológicas do uso desse conceitona arqueologia da arte rupestre, implicações queindependem de conhecermos ou aplicarmosvoluntariamente as noções de cultura subjacentes.

1. A arte rupestre regional no Holocenomédio: seqüências estilístico-sucessória eestratigráfica dos abrigos

A região norte de Minas Gerais e osudoeste da Bahia tem sido alvo de estudos

(2) Análise inspirada na proposta de Hodder (1986) eHodder e Hutson (2003) de organizar e inquirir o registroarqueológico a partir de quatro dimensões da variação,correspondentes ao tempo, ao espaço, à unidade deposicionale à tipologia, para favorecer a elaboração de um contextoarqueológico mais amplo.

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arqueológicos de equipes da UFMG, daUNISINOS, da UCG e do IAB, desde os anosde 1970. Ao passo que a ocupação humanaregional recebia datações muito recuadas(cerca de 12-11.000 AP) já na primeira décadade escavações, um rico e diversificado registrorupestre foi desde então identificado e classifi-cado em tradições e unidades estilísticas (Prous1996-97; Prous e outros, 1980, 1984; Ribeiro1996-97; Schmitz e outros 1984 e 1997; Seda2003; Silva 2002; por exemplo).

Como na maior parte das pesquisasdisponíveis sobre arte rupestre brasileira, estesestudos foram norteados pela organização eclassificação temática, definindo tradiçõesrupestres (a unidade classificatória maior) ecompletando essas caracterizações através daidentificação de sub-tradições, estilos ou fácies(categorias menores, geralmente componentesde uma tradição). De modo geral, as tradiçõesrupestres foram definidas a partir da repetiçãode traços temáticos – o que indicaria continui-dade cultural e corresponderia a códigos ourepertórios partilhados por grupos separadosno espaço, no tempo ou em ambos (Calderón1970; Martin 1997; Pessis e Guidon 2000;Prous 1999a). A variação interna às tradições,as sub-tradições, estilos ou fácies, normalmenteapresenta diferenças sutis de definição, e temsido descrita principalmente através dostratamentos gráficos (morfologias e técnicas) esupressões/ampliações na representação dostemas tradicionais, tal como ocorrem notempo (cronologia relativa) e/ou no espaço(distribuição geográfica).

Destas equipes que atuam ou atuaram naregião norte mineira e sudoeste baiana, a doSetor de Arqueologia da UFMG foi uma dasque mais se envolveu com a caracterização eorganização de seqüências estilístico-sucessóriasregionais (Isnardis 2004; Prous 1989, 1992;Ribeiro e Isnardis 1996-97; Ribeiro 2003;Silva e Ribeiro 1996, entre outros). De acordocom esses trabalhos, a seqüência das tradiçõesrupestres identificadas no norte de MinasGerais pode ser esquematizada no Quadro 1 ebrevemente descrita conforme segue.

As figuras pioneiras crresponderiam a umaexpressão regional da Tradição Agreste, com

antropomorfos realistas e grafismos geométri-cos, pouco freqüentes nos abrigos e em poucasfiguras por sítio, definindo o período antigo derepresentações rupestres. Sobre elas encontra-ríamos figuras geométricas, de armas e outrostemas da Tradição São Francisco, descritos emvários estilos, além de pinturas e gravuras deseres antropomorfos, geométricos, armas e pésdo Complexo Montalvânia. Não é clara aordem de sucessão entre os conjuntos degrafismos São Francisco e Montalvânia, devidoà raridade de superposições e aos sinais dealternância entre estilos desses repertóriostemáticos distintos, mas alguns pesquisadoresacreditam que as vistosas figuras São Franciscopossam ter começado a ser pintadas antes dasfiguras Montalvânia e que estas últimas apareçamde modo intrusivo em painéis sanfranciscanos(Isnardis 2004; Prous 1996-97). De todo modo,ambos os repertórios são inseridos no períodointermediário da arte rupestre regional. Posterior-mente, na transição para o período recente deexpressões rupestres, aparecem novos grafismosde seres vivos (principalmente zoomorfos,antropomorfos e vegetais cultivados), passíveis deserem atribuídos à Tradição Agreste pela temáticarealista e o característico detalhamentoanatômico dos seres vivos, pintados sobre osestilos sanfranciscanos e Montalvânia. Sobre asfiguras de seres vivos realistas, manifestaçõesregionais da Tradição Nordeste, além de umasucessão de grafismos não atribuídos ou deocorrência apenas local, vários deles comrepresentações de cultígenos, ocupam os supor-tes rochosos do norte de Minas Gerais.

Essa seqüência sugeria que três gruposculturais, representados graficamente pelastradições Agreste, São Francisco e Montalvânia,seriam os responsáveis pelo registro rupestreanterior à introdução das representaçõesrealistas de vegetais cultivados na região. Essasucessão cultural poderia ter se dado entre12.000 AP (data das primeiras ocupaçõeshumanas conhecidas) e 3-2.000 AP (períodoque corresponde a uma datação disponívelpara figura recente de uma dessas tradições –São Francisco – e à presença de vestígiosinquestionáveis de agricultura nas camadasarqueológicas).

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A partir destes três padrões temáticos daarte rupestre, propõe-se agora discutir asrelações entre esta seqüência estilístico-culturale os padrões tecnológicos observados noregistro arqueológico das camadas estratigráficasdos abrigos nesse intervalo de quase dez milanos.

A estratigrafia dos abrigos do nortemineiro mostra a predominância de umpadrão tecnológico lítico inicial, associado àTradição Itaparica, que é bruscamente substitu-ído em 9.500 AP. O outro padrão lítico quecomeça a ser encontrado em camadas arqueo-lógicas do norte de Minas Gerais e do sudoesteda Bahia dessa época é acompanhado, noPeruaçu, pelos primeiros vestígios datados dearte rupestre na região, em 9-7.000 AP, e desepultamentos nos abrigos ao menos desdecerca de 7.000 AP (Fogaça 2001; Prous 1996-97; Prous e Schlobach 1997; Rodet 2006;Schmitz e outros 1989). A datação relativapara a arte rupestre regional indica que entre 9-7.000 AP um bloco se desprendeu do teto daLapa do Boquete, foi coberto por incisões,depois por gravuras, depois por cupules, efinalmente quase totalmente soterrado (Prous1999b).

Ainda que a datação do bloco enterradoesteja no intervalo definido pelas evidênciasseguras de arte rupestre mais antiga no Brasil(Pessis 1999; Prous 1999b), ela não permiteafirmar que essa atividade apenas tenha tidoinício nesse período de 9-7.000 AP. É possívelque a arte rupestre já fosse anteriormentepraticada, todavia de modo pouco intensivo,deixando assim vestígios arqueologicamentemenos visíveis. As mudanças no padrãotecnológico lítico e o novo uso (ou intensifica-ção no uso) de abrigos rochosos para sepultaros mortos podem ter sido acompanhados nãopela introdução da arte rupestre, mas por uminvestimento nessa atividade suficientementemaior que em épocas anteriores para deixarindicadores arqueológicos mais visíveis.

As manifestações Agreste pioneiras,caracterizada por poucas figuras (às vezes umaou duas), sem superposições ou diferença depátina e presentes em poucos sítios, evocamuma prática esporádica da arte rupestre (já

sugerido por Isnardis 2004), que deixariavestígios arqueológicos menos numerosos etalvez arqueologicamente menos visíveis. Mas araridade de informações para estas ocorrênciasgráficas mais antigas impede maiores avançosna análise, elas tanto podem ter sido pintadaspor grupos pós-lascadores Itaparica queocuparam a região, quanto por grupos contem-porâneos a essa indústria lítica, não há aindacomo atribuir.

Já para os estilos posteriores às figurasAgreste, atribuídos à Tradição São Francisco eao Complexo Montalvânia, existem informa-ções mais numerosas, tanto cronológicas,quanto espaciais e gráficas, que permiteminferências hipotéticas de contextualizaçãodessa arte rupestre no restante do registroarqueológico.

As gravuras do bloco enterrado sãoredes, anéis concêntricos, linhas sinuosas ebiomorfos, que aparecem às centenas empainéis expostos de gravuras e pinturas doComplexo Montalvânia (Ribeiro 2006). Assuperposições entre essas gravuras e pintu-ras são raríssimas (cada qual ocupa umsuporte específico, como se verá adiante) edentre os poucos casos conhecidos há tantogravuras muito erodidas subpostas avestígios de pinturas, quanto gravuras quese superpõem a pinturas. Na seqüência daarte rupestre, além do ComplexoMontalvânia, o outro conjunto mais recenteque as pinturas Agreste é a Tradição SãoFrancisco. Tal como acontece entre asgravuras e pinturas Montalvânia, não hásegurança na ordem sucessória entre osestilos sanfranciscanos e Montalvânia.Geralmente, as pinturas São Francisco eMontalvânia ou não se superpõem entre siou o fazem em alternância. Fortes distin-ções de pátinas em figuras de um mesmopainel de gravuras ou pinturas Montalvâniae a presença de três estilos sanfranciscanosque se superpõem entre si, sugerem que asexecuções dos grafismos dos dois repertóri-os temáticos se deram ao longo de muitotempo. Tanto nos estilos São Franciscoquanto naqueles Montalvânia, há evidênciasde que essas representações continuaram a

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ser realizadas até o período agricultor.3 Umadatação direta por AMS do pigmento deum grafismo atribuído aos estilos sanfranciscanosintermediário ou recente resultou na idade2.680 ± 180 AP (Russ e outros 1990), epinturas que sugerem cultígenos aparecementre os grafismos menos patinados de ume outro repertório.

Ambos os conjuntos gráficos mostramgrande investimento na prática de arte rupestre.Nos estilos São Francisco, esse investimento éevidenciado na sua variação estilística e notratamento visual dado aos painéis, por vezesmuito altos, repletos de figuras grandes,coloridas e elaboradas. Nos estilos Montalvânia,o investimento está no uso intenso de painéis eabrigos. São essas figuras que ocupam o maiornúmero de sítios dentre os aproximadamente150 estudados em trabalhos recentes na região:são 125 abrigos com figuras Montalvânia,contra cerca de 60 abrigos com ocorrênciassanfranciscanas (Isnardis 2004, tabelas 1 e 2;Ribeiro 2006, anexo 1). São também essasfiguras que se apresentam em painéis quemostram um horror vacui em sua composição,onde, virtualmente, todo o suporte é ocupado,por vezes com milhares de figuras.

Em resumo, existem elementos cronológicosdiretos e indiretos que permitem uma atribui-ção hipotética dos estilos sanfranciscanos eMontalvânia ao intervalo entre 9-7.000 e 3-2.000 AP, sem que haja elementos conclusivospara ordenar sucessoriamente estes doisrepertórios temáticos entre si. Nos abrigosregionais, as camadas arqueológicas dessaépoca costumam ser perturbadas por fossasposteriores (sepultamentos, “silos”, “postes”),mas o registro arqueológico de sedimentosintactos de alguns sítios sugere continuidadeao longo de boa parte deste período paravários autores (Prous 1996-97; Prous e outros1996-97; Schmitz e outros 1996; Rodet 2006,etc.). Do mesmo modo, as análises gráficas e

espaciais sugerem continuidade e conectividadeentre dois repertórios, sugerindo que asdescrições anteriores da Tradição São Francis-co e do Complexo Montalvânia possam estarseparando manifestações aparentadas, no lugarde caracterizar comunidades culturais distintas.

Questões como essa sugerem que umaflexibilização dos critérios de classificação,adaptando-os às contingências contextuais daarte rupestre em estudo, permite explorarmelhor o potencial informativo da arte rupestre.Perspectivas que abordam a arte rupestre comomanifestação ou reflexo de regras culturaispodem ser questionadas em favor da afirmaçãodo estilo como produção, atuação e manipula-ção de orientações e modulações culturais,onde repertórios temáticos tradicionais podemser criados, combinados e modificados. Issopermite expandir os critérios classificatórios,desvinculando a análise da arte rupestre derígidos padrões temáticos pré-determinados.Pensar que os estilos São Francisco e os estilosMontalvânia se relacionavam a distintascomunidades de autores embotava o estudodas associações e dos diálogos observadosentre estas representações, restringindo aexplicação a contatos indiretos entre os autoresdos estilos, através de figuras preexistentes nosabrigos ocupados. Também reduzia a visibilida-de de oposições sutis em diversos aspectos docomportamento destes estilos, da seleçãotemática à distribuição espacial, como sediscute adiante.

2. A domesticação do meio ambiente: paisa-gens complexas São Francisco e Montalvânia

Cerca de 200 km separam o sítio maissetentrional na região da pesquisa daquele maismeridional. As áreas entre eles são compostaspor um diversificado contexto físico, no qualsão conhecidas atualmente mais de duascentenas de sítios com arte rupestre (Ribeiro2006). Estes sítios se distribuem por áreas compaisagens naturais muito distintas, especialmen-te no que diz respeito a seus relevos calcários erecursos hídricos. Existem marcadas diferençasno grau de evolução cárstica local e os recursos

(3) Os vestígios inquestionáveis de agricultura na região sãodatados de cerca de 2.000 AP, mas a idade estimada para oinício do cultivo de vegetais na região do Peruaçu é 4.000AP, a partir de negativos de fossas de “silos” (Prous 1996-97).

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hídricos se distribuem regionalmente emvariados níveis de abundância e acessibilidade(Bitencourt e Rodet 2002; Baggio Filho 1991;Rodet e outros 2005) e as áreas em estudoapresentam um mosaico de formações vegetaispertencentes aos domínios do cerrado e dacaatinga. A diversificada configuração bio-físicada região permite estudar sítios arqueológicosrupestres de variada inserção na topografialocal e regional, com diferentes tamanhos emorfologias e implantados em cenáriosnaturais que podem ser bastante distintos deuma área a outra. Os grupos de praticantes daarte rupestre São Francisco e Montalvâniadomesticaram estes cenários naturais de modoradical e exclusivo no contexto rupestre donorte mineiro e sudoeste baiano.

A geomorfologia das áreas em estudo podeser descrita desde aquela que apresenta umcarste menos evoluído (Peruaçu) até a queapresenta relevo cárstico mais residual(Montalvânia), com a Serra do Ramalhoocupando uma posição intermediária entreestes dois extremos regionais de evoluçãocárstica. O Peruaçu oferece paisagens fechadas(a largura do cânion principal não ultrapassa150 m), com horizonte dominado por altasescarpas e suntuosas entradas de cavernas.Montalvânia, pelo contrário, pode ser descritapor seus belos cenários descobertos, comcampos de lapiás a perder de vista, abrigos ecavernas magníficos, porém abertos emescarpas que não nos fazem tombar a cabeçapara trás para serem admiradas. Na Serra doRamalho as formas cársticas são modestas,ainda que grandiosas e exuberantes cavernascom rios subterrâneos guardem mistérios depadres e aventureiros que nelas entraram enunca mais saíram – são paisagens entremeadasde espaços abertos e fechados.

Como a colonização humana na região éposterior à formação desses relevos, pode-seconsiderar que as populações pré-históricasdepararam com paisagens cársticas similares àsque atualmente nos encantam a vista. Diferen-tes contextos hídricos e florísticos tambémpodem (e podiam) ser encontrados na região,configurando, por um lado, fontes alternativase relativamente próximas de recursos alimenta-

res e, por outro, delimitando fluidamente cadauma das áreas através de característicasambientais particulares.

A primeira evidência da importantetransformação do meio cárstico regionalpromovida pela arte rupestre dos estilos SãoFrancisco (SF) e Montalvânia (M) está naquantidade de abrigos utilizados para pintar ougravar as figuras desses estilos, especialmente aspinturas Montalvânia, e em sua dispersãoespacial (Prancha 1). São 130 abrigos ocupa-dos por figuras dos cinco estilos atribuídos aestes repertórios temáticos, dentre os cerca de150 estudados em pesquisas sistemáticas dosúltimos anos (Isnardis 2004; Ribeiro 2006;Ribeiro e Isnardis 1996/97; Silva e Ribeiro1996), número ainda sem par em outrosperíodos da seqüência estilístico-sucessóriaregional. Enquanto os abrigos com figurasMontalvânia se distribuem de norte a sul naregião (inclusive aparecendo nos sítios maissetentrional e mais meridional indicados noMapa 1), os abrigos ocupados por figurassanfranciscanas se concentram em áreas comcaracterísticas específicas no carste regional(Prancha 1).

Cada estilo tem suporte ou suportespreferenciais, que muitas vezes foram despreza-dos ou timidamente ocupados pelos outros(Prancha 2). As pinturas de todos os estilosSão Francisco estão principalmente em painéisaltos e destacados; as pinturas Montalvâniaestão geralmente em painéis discretos, coloca-dos sobre superfícies de média altura, irregula-res e compartimentadas; as gravuras aparecemnos suportes naturalmente polidos que estãoem pisos nas zonas de penumbra dos abrigosou nas bases de paredes. As diferenças desuporte preferencial são tão marcadas que,excluindo as seqüências sanfranciscanas emalguns sítios do Peruaçu (por exemplo estilosSF1, SF2 e SF3 bem representados na Lapa doRezar) não se conhece ainda nenhum painelque tenha sido igualmente utilizado por doisou três destes estilos combinados (MG, MP,SF1, SF2 e SF3). Na Lapa do Gigante(Montalvânia), essa compartimentalizaçãopreferencial dos suportes foi evidenciadagraficamente através de linhas paralelas pinta-

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Prancha 1. Distribuição espacial dos estilos São Francisco e Montalvânia.

das, acompanhadas por pontos gravados. Asgravuras são encontradas na parte inferior dossuportes, abaixo das linhas, enquanto acimadelas estão as pinturas sanfranciscanas, rarasfiguras Montalvânia, e grafismos mais numero-sos de outros estilos (Ribeiro 1996-97).

De modo geral, as alturas médias dossuportes preferenciais e a maior ou menor

exposição dos painéis distinguem estes estilosentre si conforme apresentado na Tabela 1.

Um padrão marcante, no que diz respeitoaos sítios densamente utilizados pelos estilosSão Francisco é a ausência de representaçõesigualmente numerosas dos estilos Montalvâniae vice-versa. O mesmo vale para a ocupaçãomais intensa dos abrigos para receber

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grafismos dos estilos Montalvânia em pintura egravura: onde há um não costuma haver ooutro. Por outro lado, em todas as áreas dapesquisa podem ser encontrados abrigos ondepainéis com figuras Montalvânia ou SãoFrancisco foram reutilizados por estilosposteriores. Não se observam, no comporta-mento dos estilos recentes, padrões de ausên-cia ou baixa freqüência de figuras dos estilossanfranciscanos ou Montalvânia nos abrigosescolhidos (Ribeiro 2006: 269-299).

Ao contrário dos suportes escolhidos, ascaracterísticas físicas dos abrigos regionais quecomportam cada uma das manifestaçõessanfranciscanas e Montalvânia variam bastante(por exemplo, tamanho da área abrigada,posição nas vertentes, tipo de piso e proximida-de com a água). Os atributos físicos dosabrigos rochosos não permitem estabelecergrandes associações entre abrigos e estilos, sejapor atração ou rejeição. Mas características dospainéis de arte rupestre e das paisagens natu-rais onde se encontram os abrigos utilizadospermitem-no, levando a crer que o uso dosabrigos para pintar ou gravar pudesse serguiado mais por uma identificação entrerepresentação rupestre, suporte rochoso emeio circundante do que propriamente porcaracterísticas dos abrigos rochosos. Tãoimportante quanto as diferenças entre ospainéis desses estilos (localização, altura eexposição dos painéis e certa exclusividade, nospainéis e nos abrigos, de um estilo em relaçãoaos outros) é o contraste que se define entreesses painéis e as paisagens naturais nas quaisse inserem os abrigos escolhidos.

Os painéis Montalvânia em gravura epintura são encontrados em zonas de certomodo subterrâneas no interior dos sítios: são

pisos no fundo dos abrigos, tetos baixos eescalonados, reentrâncias das paredes, peque-nas cavidades nos maciços rochosos. Muitosdos locais que receberam estas figuras parecemsinalizar pontos de captação sazonal ousubterrânea de água (abrigos com reservatóriosnaturais, zonas de forte gotejamento, sítios nasbases de encostas onde correm águas temporá-rias; além de sítios vizinhos a fendas verticaisque interceptam o lençol freático e em entra-das de cavernas com acesso ao lençol ou componto de ressurgência hídrica). Os painéisMontalvânia parecem ser mais numerososonde as paisagens cársticas são mais evoluídas epobres em exuberantes paisagens subterrâneas,como as áreas de relevos abertos e dissecadosde Montalvânia e setores sudoeste e nordesteda Serra do Ramalho. Esta arte rupestre seassocia às zonas mais profundas dos abrigosrochosos ou visualmente menos acessíveis,conjugando painéis geralmente discretos oupouco evidentes a relevos abertos e formascársticas superficiais muito evidentes. Se vemosa arte rupestre como forma de apropriação doespaço, a prática do estilo Montalvânia emgravuras talvez possa ser relativa a um contextomuito particular de ritualização das conexõesentre os grupos humanos locais e as paisagenssubterrâneas: com esse estilo, as figuras nãosão colocadas sobre a rocha (tinta sobre osuporte), mas retiradas da rocha dos fundosdos abrigos ou na base das paredes – umafigura gravada é o resultado de pontos derocha retirados no suporte.

Já os painéis sanfranciscanos são destaca-dos nos abrigos, geralmente em suportes altose bem visíveis, e são mais numerosos em áreasde exuberantes formações subterrâneas, ondemuitas vezes estão nas entradas de grutas. Os

Tabela 1

São Francisco (SF1, SF2 e SF3)

Montalvânia em pinturas (MP)

Montalvânia em gravuras (MG)

altos ou médio-altos

médios e médios-baixos(tetos escalonados)

baixos (piso) oubaixos-médios (base de paredes)

Altura relativa dos painéis Exposição relativa dos painéis

Muito visíveis

discretos ou muito discretos

discretos (zonas de penumbra)

Estilos

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sítios sanfranciscanos estão em posiçõestopográficas elevadas (Montalvânia) ou emáreas com relevos fechados e imponentes(como os cânions do Peruaçu e do MorroFurado, além do setor sudeste da Serra doRamalho). Também é possível ver uma associa-ção entre os locais onde estão os painéissanfranciscanos e a disponibilidade de águapermanente em superfície. Assim é que amaioria dos sítios está em cânions ainda ativosou desativados nas últimas décadas (Peruaçu,Minará, Morro Furado, Boqueirão, Bomfimetc.). Esta arte rupestre que salta à vista estáassociada justamente a ambientes cujas forma-ções rochosas precisam ser descobertas aospoucos, na medida em que se caminha entre altasvertentes de cânions ou se atravessa cavernasprofundas, escuras ou pouco iluminadas.

As inversões entre as características visuaisdos estilos, dos suportes escolhidos e daspaisagens onde se inserem os abrigos sugeremque os contrastes e as similaridades entre osestilos Montalvânia e São Francisco possamfazer parte, de modo complementar, de umamesma apropriação e transformação do meioambiente. Paisagens culturais são construídasatravés das relações entre pessoas e o espaço,autores como Ingold (1995, 2000); Hodder(1999); Hodder e Hutson (2003) e outros têmdefendido que o espaço é qualitativamenteexperienciado, e que nossas visões de mundosão criadas no engajamento prático e cotidianocom o meio circundante. A atuação da arterupestre Montalvânia e São Francisco naconstrução da paisagem talvez incluísserealizações gráficas com atributos opostos aalgumas características naturais do meiocárstico. Eventualmente, essa oposição podiaestar relacionada a uma inversão simbólica quefavorecesse a apropriação humana e socializa-ção do meio ambiente rochoso.

Tomando em conjunto as distribuiçõesespaciais dos estilos sanfranciscanos e Montalvânianesta região, observa-se um padrão de uso etransformação do espaço radicalmente diferen-te daquele definido pelas expressões rupestrespioneiras. Os abrigos onde estes estilosintermediários ocorrem são muito maisnumerosos e seus painéis costumam ser

densamente ocupados por pinturas ou gravu-ras, ao contrário do padrão anterior, caracteri-zado por poucas figuras em poucos sítios. Essepadrão também não ocorre nos períodosposteriores da seqüência estilística regional,onde as expressões tendem a aparecer em áreasgeográficas bem menores e nunca em tãonumerosos abrigos ou figuras (Ribeiro 2006:269-299).

As diferenças nos graus de pátina dasfiguras Montalvânia em gravura e pintura,assim como as superposições entre os estilossanfranciscanos, são evidências de grandeintervalo cronológico englobando este conjun-to de representações. Esses elementos indicamtambém o uso repetido dos mesmos locaispara pintar e gravar, na maioria das vezes emrelativo respeito preservacionista às ocorrênci-as pré-existentes. A possibilidade do desenvolvi-mento de diferentes estilos de arte rupestreassociados a setores/características especiais dapaisagem, bem como sua manipulação porlongo tempo, evoca um alto investimento naprática da arte rupestre que por sua vez podeser indício de grande importância sócioculturaldesta atividade. A paisagem construída porestes estilos é fortemente domesticada e podeter sido configurada num contexto temporalamplo e de maior fixação regional de gruposhumanos.

3. Diálogos internos: as similaridades e oscontrastes entre os estilos São Francisco eMontalvânia

Assim como a observação das relaçõesespaciais entre os estilos São Francisco eMontalvânia, a discussão de suas relaçõesgráficas sugere que estes dois repertóriostemáticos podem ser melhor compreendidosse analisados como complementares.

Uma relativa liberdade de trânsito entre asorientações estilísticas Montalvânia e SãoFrancisco pode ser observada em painéis dediversos abrigos da região e algumas vezes tornadifícil a atribuição das figuras. Freqüentemente,as formas geométricas que participam dasassociações temáticas Montalvânia são simila-

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res a formas atribuídas à Tradição São Francis-co (Jácome e Ribeiro 2001; Ribeiro 2006: 241-257). Nas pinturas, onde as associações se dãoparticularmente com formas angulares, asfiguras mais geométricas que participam dastransformações são “redes”, “pentes”, “grades”,ziguezagues e losangos encadeados, figurasmuito comuns nos painéis sanfranciscanos,onde entretanto são mais elaboradas, maiores eem policromia.

As comuns “cirandas” de antropomorfosesquemáticos Montalvânia são composiçõesonde se repetem elementos geométricosmínimos (anéis, bastonetes, losangos...)articulados por algum detalhe anatômico(braços, pernas, cabeça, dedos). A repetição deelementos geométricos mínimos é o princípiogeral de composição das figuras sanfranciscanasiniciais (SF1) e a combinação de diferentesformas geométricas elementares é recorrentenas figuras do estilo posterior (Prancha 3).Elementos comuns aparecem de modoassistemático nos estilos sanfranciscanos SF1e SF2 e nas pinturas e gravuras Montalvânia,mas são as figuras sanfranciscanas maisrecentes (SF3), de ocorrência restrita aocânion do Peruaçu, que apresentam demodo muito mais contundente elementoscaracterísticos de ambos os conjuntos(Ribeiro 2006: 252-257).

As análises comparativas entre os estilosMontalvânia e São Francisco (detalhadas emRibeiro 2006: 241-268, 2007) permitiramobservar uma especialização temático-estilísticaprópria a cada um dos repertórios temáticos,com os estilos sanfranciscanos primando pelasbelas e elaboradas figuras geométricas bicrômicase policrômicas, enquanto as figuras Montalvâniasão principalmente relativas a figuras geométri-cas simples, seres antropomorfos com maiorou menor esquematismo e objetos. Ao mesmotempo, temas (como as cirandas ou as armas,por exemplo), tratamento gráfico (monocromia,bicromia, uso de pincéis ou dedo, técnicas depreenchimento etc.) associações temáticas(como antropomorfos e armas, antropomorfose figuras losangulares) e trocadilhos gráficos(geometrização da figura antropomorfa ou vice-versa) similares podem aparecer em painéis de

todos estes estilos (Prancha 3). A conexãoentre as duas tendências estilísticas é dadaprincipalmente pelos elementos geométricosmínimos (triângulos, losangos, anéis...),congregados na composição das figuras SãoFrancisco e desagregados nas composiçõesesquemáticas Montalvânia em pintura egravura. Chamei estas relações estilísticas dediálogos internos porque – avaliando junta-mente as semelhanças e diferenças entre ascaracterísticas gráficas destes estilos, suainserção na seqüência sucessória relativa e noespaço, considerando aí suportes típicos, osabrigos e as áreas onde ocorrem em maiorfreqüência – parece mais produtivo tomarestas expressões como relativas a um únicosistema de representações visuais do que comoestilos de tradições culturais distintas.

Os resultados da pesquisa levam adefender a necessidade de refletirmos sobre anoção de tradição rupestre que utilizamos noestudo da arte rupestre brasileira. A discussãoe elaboração de uma metodologia adequada àpesquisa deste registro arqueológico passa,antes, por uma avaliação da viabilidadeconceitual das categorias que aplicamos. Nocaso brasileiro, onde tradição arqueológica ecultura são noções indissociáveis, precisamosao menos conhecer os conceitos de culturasubjacentes às categorias classificatórias emuso para que possamos definir em quemedida estas categorias são válidas para ocontexto arqueológico em análise e quereformulações são possíveis ou necessáriaspara ajustar as formulações conceituais e apesquisa empírica.

4. Tradição e cultura na arqueologia brasileira

O conceito de tradição arqueológica foitrazido ao Brasil por Betty Meggers e CliffordEvans, coordenadores dos projetos arqueológi-cos de larga escala da década de 1960, como oPRONAPA (Programa Nacional de PesquisasArqueológicas) e o PROPA (Programa dePesquisas Paleoindígenas). Com o objetivo defornecer um quadro geral das culturas arqueo-lógicas brasileiras em curto prazo, através

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destes programas4 foram realizadas prospecçõesem várias partes do território brasileiro (Prous1992).

A primeira ordenação da arte rupestrebrasileira, seguindo o estabelecimento decronologias relativas e absolutas e sistematiza-ção dos dados empíricos nos conceitos de fasee tradição, foi desenvolvida em 1970 porValentin Calderón (1970). Entretanto, suaspesquisas com a arte rupestre não tiveramseqüência ou repercussão e, de fato, osprimeiros estudos acadêmicos de arte rupestrebrasileira foram marcados pela presençaestruturalista das Missões ArqueológicasFranco-Brasileiras, que começaram suasatividades na mesma época. Rapidamente, asclassificações da arte rupestre em tradiçõescaracterizadas por padrões de similaridadetemática e gráfica, seriam adotadas pelosarqueólogos das Missões de Minas Gerais e doPiauí, além de pesquisadores independentes.

As pesquisas da Missão ArqueológicaFrancesa com a arte rupestre brasileira começa-ram em 1971 (em Minas Gerais) e tinham porobjetivos a determinação estilística crono-geográfica, a caracterização dos temas ecomposições gráficas, e propostas de interpre-tação da arte rupestre, através das característi-cas próprias dos sítios e através da iconografiae mitologia indígenas (Laming-Emperaire eoutros 1974). Paralelamente às detalhadasmonografias de sítio, com análises de centenasde metros quadrados de decalques, classifica-ção e contagem de grafismos, iam sendopublicadas apresentações gerais dos abrigos eseus painéis rupestres, com acurado interessenas relações observadas das figuras entre si,com o sítio e entre este e o meio ambiente(Laming-Emperaire e outros 1974; Guidon1975; Prous e outros 1977). Procurava-seidentificar as regularidades na seleção doespaço gráfico para evidenciar as normas geraisseguidas em cada conjunto e a variaçãopermitida dentro dos padrões. Ainda quehouvesse uma abertura nesses trabalhos para

comparações etnográficas, assumia-se que atentativa de interpretação dos significadosdeveria ser precedida pela identificação deeventuais estruturas de organização dosgrafismos entre si e com a topografia local –dos suportes e dos abrigos (Prous 1977: 57).Termos como vocabulário, gramática, sistemasgráficos e regras sintáticas eram recorrentesnestas análises, que partiam de princípiostomados de empréstimo à lingüística. Buscava-se, por exemplo, identificar as relações sintáti-cas entre os grafismos – cor, posição nosuporte e/ou no sítio – com o auxílio degráficos estatísticos e tabelas tipológicas.

As tipologias desempenhavam um papeldestacado nos estudos estruturalistas da arterupestre na medida em que possibilitavam uminventário das figuras disponíveis ao uso ecombinação de temas pelos artistas rupestres.De modo geral, os inventários se apresentavamaos pesquisadores simpáticos ao estruturalismo(na arqueologia e na antropologia) como umaimportante ferramenta de evidenciação dapadronização cultural. O que a arqueologiaestruturalista buscava, era, em síntese, recons-truir as etapas sucessivas da evolução dasculturas humanas (Emperaire 1973: 129).Como a cultura material expressaria uma ordemsimbólica e inconsciente imposta pelos sereshumanos a determinadas áreas de suas vidas,inventariando detalhadamente os itens que acompunham e comparando inventários degrupos distintos seria possível identificar tanto avariabilidade cultural, a diversidade aparente,quanto a invariabilidade, estruturas inconscien-tes e universais do pensamento humano (Lévi-Strauss 1955). O objeto de estudo da arqueolo-gia estrutural era, portanto, a estrutura depensamento presente na mente dos sereshumanos que produziram o registro arqueológi-co (Renfrew e Bahn 2000: 446). Tais estruturasseriam como ante-projetos da produção dacultura material. Estariam manifestas nas cadeiasoperatórias, onde os processos técnicos seriam“organizados em cadeia por uma verdadeirasintaxe que dá às séries operatórias sua fixidez esutileza” (Leroi-Gourhan 1984: 117); estariamrefletidas também nas regras de composição dossítios rupestres (Leroi-Gourhan 1964).

(4) E da adesão a esta agenda metodológica por outrospesquisadores que não participavam do PRONAPA e PROPA.

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A atuação da escola francesa no Brasilcaracterizou-se por trabalhos regionais cominventários de sítios e determinação de seupotencial científico (Laming-Emperaire eoutros 1974) e estudo detalhado de poucossítios, tomados como típicos da unidade maiordesconhecida (Barreto 1999). Os sítiosescolhidos recebiam escavações de amplassuperfícies para reconstrução de solos deocupação e análises tecno-tipológicas deartefatos, principalmente líticos (idem, ibidem).Aplicada à arte rupestre, esta abordagemresultou em explorações de grandes áreaspassíveis de comparação, em sistemáticas eexaustivas reproduções de acervos gráficos eem classificações tipológicas de figuras. Existeuma evidente complementaridade entre osmétodos franceses de delimitação espaço-temporal através de seqüências regionaisfundadas na reconstrução minuciosa de pisosde ocupação (“reconstruções paleoetnográficas”,no dizer de Prous 1992: 16) e o estudoamostral de amplas regiões com sistematizaçãodos dados nas classificações em fases e tradi-ções defendidas pelos membros do PRONAPA.A noção de tradição arqueológica comocorrespondendo a conjunto de regras culturaiscuja aplicação inconsciente orienta a produçãoda cultura material, condizia com o interesseestruturalista em identificar, através de inventá-rios, os padrões culturais da pré-história. Destemodo, logo após as primeiras pesquisas, osarqueólogos das Missões Franco-brasileiraspassaram a adotar tanto intensivas prospecçõescom levantamentos mais rápidos, definidospor pequenas sondagens, coletas de superfíciee reprodução de acervos rupestres, quanto oagrupamento de seus dados em tradiçõesarqueológicas.5

A noção desde então vigente de tradiçãorupestre em muito se sustenta na idéia de queos conjuntos de temas representados com maisfreqüência na arte rupestre são manifestaçõesde repertórios culturais, distintos a partir dosrepertórios temáticos (Isnardis 2004: 46-47;Pessis e Guidon 2000: 21; Prous 1999a: 255etc.). Nesta abordagem, a arte rupestre éinterpretada como reflexo passivo da orienta-ção cultural de seus autores, onde as mudançasnos padrões de continuidade gráfica sãoindicativas de mudanças culturais. A noção detradição rupestre como repertório temático,por sua vez manifestação de repertório cultu-ral, está fortemente enraizada na arqueologiabrasileira desde a presença estruturalista nosprimórdios da pesquisa sistemática da arterupestre. No pensamento de Lévi-Strauss, degrande impacto nas análises da arte paleolíticaeuropéia desenvolvidas por Leroi-Gourhan(1965) e Laming (1962), a ordem simbólica dacultura pode ser inclusive reconstruída atravésde inventários. Lévi-Strauss sugeria queinventariando todos os costumes e crençasreais ou possíveis, poder-se-ia elaborar com osmesmos uma tabela periódica (como a doselementos químicos) agrupando-os em famílias,onde seria preciso apenas reconhecer aquelesefetivamente adotados pelas sociedades. Associedades humanas, assim como seus indiví-duos, não criariam costumes: escolheriamcombinações em um repertório ideal passívelde reconstrução (Lévi-Strauss 1955: 203).

A noção de tradição rupestre comorepertório temático também encontra suporteem outras correntes antropológicas, nãoestruturalistas. Ela também pode ser trabalha-da segundo a conceituação de Geertz decultura enquanto sistema simbólico público,

(5) A assinatura estruturalista da abordagem da arte rupestrebrasileira em seus primeiros anos, caracterizada pelos esforçosde identificação da estrutura orientadora dos acervosrupestres, manteve-se apenas nos trabalhos das equipes deProus e Vialou (que se envolveu com o tema nos anos de1980). Algumas das relativamente freqüentes monografias desítios rupestres das últimas décadas contemplam especialmenteas relações entre grafismos e entre estes e o espaço físico queocupavam, em busca da lógica que regia a distribuição das

figuras (ver, p. exemplo, Baeta e outros 1992; Laming-Emperaire e outros 1974; Ribeiro 1996/97; Vialou 1983-84,2005, entre outros). O grande investimento de Prous naelaboração das seqüências crono-estilísticas leva algunsarqueólogos (como Dias 2003: 11) a ignorarem a óticaestruturalista que ainda orienta seus trabalhos com arterupestre, descrevendo-os como redimensionados para asclassificações e seqüências estilísticas.

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concebido não como padrões concretos decomportamento, mas como mecanismos decontrole para governar o comportamento.Neste sistema simbólico, os significados sãoobjetivos, sociais e públicos, já em uso correntena comunidade quando nasce o indivíduo epermanecendo após sua morte, com modifica-ções (acréscimos, subtrações e outras alteraçõesparciais) das quais ele participou ou não (Geertz1989). Lévi-Strauss e Geertz disponibilizamdois conceitos de cultura que permitem discutire validar a aplicação da noção de tradiçãorupestre como repertório temático e cultural.

Mas existem outras concepções de culturaque não lidam com a idéia de repertório e quepermitem discutir uma noção de tradiçãorupestre e seu componente normativo sem serestringir aos repertórios temáticos.6 Tradiçãoarqueológica também pode ser discutida deacordo com a proposta de Marshall Sahlins, deestrutura na história e enquanto história, emque os conceitos culturais são utilizadosativamente para se engajar no mundo eadquirem novos conteúdos empíricos na ação,alterando a cultura enquanto a reproduzem(Sahlins 1999: 179 e ss). Essa noção de culturanão é marcada pela dicotomia entre continui-dade e mudança, ou estrutura e história, maspela síntese. Ela é interacional e dinâmica, uma“indissolúvel síntese de coisas como passado epresente, sistema e evento, estrutura e história”(Sahlins 1999: 193). A partir dela, os padrõesde similaridade podem passar a dividir aatenção com padrões de contrastes, buscandoconexões entre eles que sejam significativas deum padrão maior.

Essa formulação de cultura pode serpensada, por exemplo, na proposta de estilocomo qualidade histórica de Ian Hodder (1990).O estilo pelo qual Hodder se interessa nãoenvolve apenas uma prática social, mas todo

um modo de vida, no qual produção material,tensões sociais, subsistência, ideologia ecrenças religiosas estariam simbolicamentearticuladas. Potencialmente holísticas, noçõesde estilo como as propostas por Hodder(1990), Shanks e Thiley (1990) e outras quetêm surgido nas duas últimas décadas, nocontexto das discussões sobre os significadosda cultura material (Conkey 1987, 1990;Hodder 1982, 1986; Hodder e Hutson 2003 eoutros), permitem trabalharmos no sentido deestudos contextualizados da arte rupestre, nosquais ela possa ser mais facilmente associadaaos outros itens do registro arqueológico.

Considerações finais

O estudo da arte rupestre do alto médioSão Francisco, aqui apresentado em parte,sugere que as definições da Tradição SãoFrancisco e do Complexo Montalvâniaseparam, equivocadamente, expressões estilísticasde um mesmo sistema de representaçõesvisuais que pode ter se desenvolvido por longoperíodo, hipoteticamente durante boa parte doHoloceno. Abordar estas expressões a partir dedois repertórios temático-culturais distintosmascara a complexidade e intensidade daprática de arte rupestre que pode ser observa-da no período, ainda sem par nos momentosque a antecedem ou sucedem no contextográfico regional.

O componente normativo da noção deestilo aqui utilizada permite trabalhar com apossibilidade de identificar expressões rupestresque se alinhem culturalmente,7 todavia acredi-tando que uma categorização cultural maisampla (a definição de tradições rupestres) deveser um eventual resultado da pesquisa e nãodefinição apriorística. A tendência a buscarapenas os padrões de similaridade na arterupestre, não considerando que as diferençaspodem indicar conexão (Sahlins 2004), temnos levado a uma reconstrução pré-histórica

(7) De acordo com Conkey (1990) qualquer concepção deestilo tem, necessariamente, um caráter normativo.

(6) Algumas destas concepções, inclusive, não foram gestadasna antropologia, como é o caso da Biologia do Conhecer deMaturana (1997), segundo a qual, a cultura não é algo quese possui, mas uma rede de conversações que define ummodo de viver e de agir: um meio interacional do qual se fazparte e que justamente por isto alinha modos de agir(Castro 2003).

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em que rígidos repertórios temáticos sesucedem ou permanecem, evocando umaequivalente presença de grupos culturais queeventualmente não encontra correspondentenas camadas arqueológicas estratigráficas.

Para muitos, pode não ser satisfatória essalógica conceitual que sustenta a noção detradição rupestre e que permite nortear asanálises através de parâmetros fixos e estáticos.O que se defende não é o abandono da noçãode tradição arqueológica, mas a necessidade derefletir sobre ela e redefini-la, se for preciso,ampliando nesse exercício as perspectivas deanálise e as metodologias de estudo. A questãonão é se a arqueologia é capaz de identificar ediferenciar culturas do passado, mas queaspectos de culturas do passado queremosdiscutir através da arqueologia. Se buscarmos

similaridade, encontraremos. Se buscarmoscontrastes, encontraremos. Se buscarmosambos, talvez possamos construir um cenárioarqueológico de sociedades mais dinâmicas,onde as repetições e os contrastes constituís-sem e fossem constituídos em complexastradições.

Agradecimentos

Ao mestre André Prous, interlocutordesde o início; a Pedro Ignácio Schmitz, cujoscomentários sempre foram bons para pensar; aPaulo de Blasis, orientador estimulante juntoao MAE/USP e à Fapesp e a esta agência defomento, cuja bolsa de doutoramento concedi-da viabilizou o desenvolvimento das pesquisas.

RIBEIRO, L. Rethinking tradition: the rock art stylistic variability in the intermediateperiod of representations at the high-medium San Francisco River. Revista doMuseu de Arqueologia e Etnologia, São Paulo, 17: 127-147, 2007.

Abstract: This article presents the main results of the stylistic-comparativeanalysis carried through in rock art shelters at the north of the Minas Geraisand southwestern of the Bahia: [1] an hypothetical time-line for the regionalrock art occurrences, [2] the characterization of the distribution and use of thespace by the styles attributed to the intermediate period occupation ofsupports, and [3] the characterization of the graphical aspects of these styles,whose appearance and disappearance demarcates the observed ruptures ofpattern. Allied to the empirical research results, the final quarrel [4] reflect onthe methodological implications of the notion of archaeological tradition inrock art archaeology.

Keywords: Rock art – Central Brazil – Archaeological tradition – Stylisticsanalysis.

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Recebido para publicação em 4 de junho de 2007.

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