regulação das outorgas de radiodifusão no brasil

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Regulação das outorgas de Radiodifusão no Brasil.

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  • ESTUDO

    Cmara dos DeputadosPraa 3 PoderesConsultoria LegislativaAnexo III - TrreoBraslia - DF

    REGULAO DAS OUTORGAS DERADIODIFUSO NO BRASIL

    UMA BREVE ANLISE

    Cristiano Aguiar LopesConsultor Legislativo da rea XIV

    Cincia e Tecnologia, Comunicao e Informtica

    ESTUDODEZEMBRO/2009

  • 2SUMRIO

    1. Histria da regulao ................................................................................................................................32. As modalidades de outorga .....................................................................................................................6

    2.1 Radiodifuso comercial ......................................................................................................................82.2 Radiodifuso educativa.......................................................................................................................82.3 Radiodifuso comunitria ..................................................................................................................9

    3. As tentativas de reforma ....................................................................................................................... 113.1 Tentativa 1 ........................................................................................................................................ 113.2 Tentativa 2 ........................................................................................................................................ 123.3 Tentativa 3 ........................................................................................................................................ 13

    4. Concluses .............................................................................................................................................. 155. Sugestes ................................................................................................................................................. 206. Referncias bibliogrficas ..................................................................................................................... 30

    2009 Cmara dos Deputados.Todos os direitos reservados. Este trabalho poder ser reproduzido ou transmitido na ntegra, desde quecitados o autor e a Consultoria Legislativa da Cmara dos Deputados. So vedadas a venda, a reproduoparcial e a traduo, sem autorizao prvia por escrito da Cmara dos Deputados.

    Este trabalho de inteira responsabilidade de seu autor, no representando necessariamente a opinio daCmara dos Deputados.

  • 3REGULAO DAS OUTORGAS DE RADIODIFUSONO BRASIL UMA BREVE ANLISE

    Cristiano Aguiar Lopes

    1. HISTRIA DA REGULAO

    Em toda a histria da regulao da radiodifuso no Brasil, houve umagrande centralizao das atribuies de outorga e de renovao de outorgas no PoderExecutivo Federal. Trata-se de uma tradio consolidada h muito tempo seu incio pode serprecisamente datado em 1931, quando o governo federal baixou o primeiro decretoespecificamente para regrar a radiodifuso. Tratava-se do Decreto 20.047, de 27 de maio de1931, promulgado pelo ento presidente Getlio Vargas, que determinava a competnciaexclusiva do Governo Federal para regulamentar a telegrafia, a radiotelegrafia e as atividadesde radiodifuso.

    Todos esses servios, incluindo a radiodifuso, foram considerados deinteresse nacional e deveriam ter como objetivo principal levar informao, educao e cultura populao. O decreto garantiu ainda o direito autoral na radiodifuso e criou a ComissoTcnica de Rdio que, entre outras funes, deveria garantir a coordenao das frequncias.

    Posteriormente, em 1932, surgiu um regulamento especfico para aexecuo do que era ento chamado Servios de Rdio Comunicao. Era o Decreto n21.111, de 1 de maro de 1932, que pela primeira vez definiu regras e procedimentos para aoutorga de rdios. Todo o captulo IV do regulamento (arts.16 a 22) era destinado aoprocesso a seguir na outorga de concesses e permisses. At 1962, esse regulamento,juntamente com o decreto 20.047, foram as principais peas legais da radiodifuso, queestabeleceram algumas das regras fundamentais que valeram nesse perodo, como porexemplo:

    - prazo de concesso de 10 anos;

    - renovaes a juzo do governo;

    - mnimo de 2/3 de diretores brasileiros, em empresasobrigatoriamente nacionais;

  • 4- tempo mximo de publicidade na programao de 10%, com tempomximo de 30 segundos para cada insero;

    - intransferibilidade, direta ou indireta, da concesso;

    - proibio de estabelecimento de qualquer convnio, acordo ou ajustecom outras companhias ou empresas de comunicao sem prviaaprovao do Governo;

    A Constituio de 1934 deu status constitucional ao papel centralizadorda Unio na outorga e renovao de outorgas de radiodifuso. O inciso VIII do seu art. 5

    determinava como competncia privativa da Unio explorar ou dar concesso aos servios detellegraphos e radiocommunicao. Assim, firmava-se o entendimento da aplicabilidade dotrusteeship model, modelo segundo o qual existe responsabilidade governamental em organizar deforma racional o espectro radioeltrico, podendo o prprio Estado operar os servios deradiodifuso, ou transferir esta responsabilidade a um agente privado, por meio de umaoutorga pblica. Tambm se consolidava um modelo de gesto de espectro muito semelhanteao command-and-control norte americano, que condicionava a utilizao de ondas de rdio emisso de uma licena, na qual esto estabelecidos os termos nos quais se far esse uso(LIMA e RAMOS, 2006).

    As constituies seguintes de 1937, 1946, 1967 e 1988 mantiveram aexclusividade do Governo Federal nas outorgas de radiodifuso, bem como o trusteeship model eo commandand-control. Porm houve alterao nos procedimentos de outorga as maisimportantes acrescidas pela Constituio de 1988, com destaque para a repartio entreExecutivo e Legislativo da responsabilidade de outorgar e de renovar outorgas de radiodifuso.(SIMIS, 2006).

    Com o passar dos anos, os Decretos 20.047 e 21.111 foram alterados ecomplementados por diversas outras leis e decretos. Com isso, criou-se um cipoal regulatriode difcil entendimento, composto por peas orientadas por polticas muitas vezes divergentese conflitantes. Essa realidade deixou evidente a necessidade de uma consolidao do marcoregulatrio do setor, por meio de uma nova legislao para as telecomunicaes, incluindo aradiodifuso. O incio da consolidao, que culminaria na promulgao de um cdigo, teveincio em 1953, com a apresentao do Projeto de Lei do Senado n 36, de 1953. O projetotramitou por quatro anos no Senado, at ser enviado Cmara dos Deputados. Aqui, aproposio foi renumerada como PL 3.549/1957. Mais cinco anos de discusses foramnecessrios para que finalmente fosse aprovado o Cdigo Brasileiro de Telecomunicaes (Lein 4.117, de 1963), que tratava dos meios de comunicao eletrnica, da telefonia e de outrastecnologias de transmisso de dados.

  • 5Em 1967, houve significativas alteraes no Cdigo Brasileiro deTelecomunicaes, inseridas no texto legal por meio do Decreto-Lei 236, de 1967. J vivamoso perodo do regime militar, e estas alteraes procuravam inserir na legislao decomunicaes alguns preceitos considerados estratgicos para a segurana nacional. Do pontode vista das outorgas de radiodifuso, as alteraes mais importantes foram a imposio delimites de propriedade, a criao da modalidade educativa de televiso e de rdio e oendurecimento das regras para transferncia direta ou indireta da propriedade.

    No mesmo ano de 1967, uma importante novidade foi a criao doMinistrio das Comunicaes, por meio do Decreto-Lei 200, de 25 de fevereiro de 1967, umdos marcos da grande reforma administrativa posta em prtica pelo governo militar. ODecreto estabeleceu que o Conselho Nacional de Telecomunicaes, ento responsvel pordiversas atividades da rea das telecomunicaes e da radiodifuso entre elas as outorgas erenovaes de outorgas passava a integrar como rgo normativo, de consulta, orientao eelaborao da poltica nacional de telecomunicaes a estrutura do Ministrio dasComunicaes.

    Um longo tempo se passou at que em 1988, a nova Constituio Federalalterou significativamente as regras sobre outorga e renovao de outorga de radiodifuso. ACarta Magna de 88 reafirmou a competncia da Unio para explorar, diretamente ou por meiode outorga a terceiros, os servios de radiodifuso. Tambm reforou as previses relativas sobrigaes educativas e culturais que os meios de comunicao, com destaque para o rdio e ateleviso, deveriam ter.

    Porm a Constituio Federal no se restringiu a cristalizar conceitos jexistentes. Houve algumas alteraes bastante significativas. A maior delas, sem dvida, foiatacar a histrica centralizao da competncia pela outorga de radiodifuso pelo PoderExecutivo Federal, fazendo com que o Congresso Nacional tambm fizesse parte da anlisedesses processos. A competncia do Congresso Nacional para a apreciao dos atos deoutorga e de renovao de outorga de radiodifuso ficou expressa em duas passagens daConstituio Federal: no inciso XII do art. 49, que estabelece como competncia exclusiva doCongresso Nacional apreciar os atos de concesso e renovao de concesso de emissoras derdio e televiso; e nos 1o, 2o, e 3 do art. 223, no quais se l que o Congresso Nacionalapreciar os atos de concesso, permisso e autorizao para o servio de radiodifuso; que ano-renovao de concesso ou permisso depender de aprovao de no mnimo doisquintos do Congresso Nacional, em votao nominal; e que o ato de outorga ou de renovaosomente produzir efeitos legais aps deliberao do Congresso Nacional. Desde ento, maisde 6 mil processos desse tipo foram analisados pela Cmara e pelo Senado Federal.

  • 6Com a reforma das telecomunicaes, que extinguiu o monoplio estatalsobre o setor e abriu caminho para a privatizao do sistema Telebrs, surgiu um novo ator naradiodifuso: a Agncia Nacional de Telecomunicaes (Anatel), criada em 1997. Embora aLei Geral de Telecomunicaes (Lei 9.472, de 16 de julho de 1997) tenha explicitamenteexcludo a outorga dos servios de rdio e de televiso da jurisdio da agncia, mantendo essaatribuio no Ministrio das Comunicaes, a Anatel passou a controlar algumas funes dosetor de radiodifuso que antes eram do ministrio. As mais importantes delas, a elaborao egesto dos planos de canais e a fiscalizao da utilizao do espectro radioeltrico.

    Uma importante alterao legal ocorreu em 1995, quando o Decreto n1.720 (revogado pelo Decreto n 2.108, de 1996) mudou diversos pontos do regulamento dosservios de radiodifuso, quase todos relativos poltica de concesses e permisses de rdio eTV. A mudana mais importante foi o estabelecimento de que, a partir daquele momento, aoutorga de radiodifuso comercial seria precedida de procedimento licitatrio, observadas asdisposies legais e regulamentares. preciso lembrar que, em toda a histria da radiodifusobrasileira at ento, as outorgas eram dadas discricionariamente, e de maneira no onerosa,com exceo do recolhimento de algumas taxas de servio. A exigncia de licitao, contudo,atingiu apenas a radiodifuso comercial. A radiodifuso educativa seguiu sem exigir apublicao de edital, tampouco a realizao de procedimento licitatrio.

    Em 1998, finalmente, surgiu a Lei n 9.612, de 19 de fevereiro, queinstituiu o servio de radiodifuso comunitria, ltima lei de maior importncia para asoutorgas de radiodifuso a ser promulgada. A lei denomina o servio de radiodifusocomunitria como o de radiodifuso sonora em FM, operada em baixa potncia e coberturarestrita, outorgada a fundaes e associaes comunitrias, sem fins lucrativos, com sede nalocalidade de prestao de servio.

    2. AS MODALIDADES DE OUTORGA

    Todas as atividades de anlise dos processos de outorga e de renovaode outorga de radiodifuso no Executivo, no importa em que modalidade, so compartilhadaspor dois rgos: o Ministrio das Comunicaes e a Presidncia da Repblica. No ministrio,concentra-se a maior parte dos trmites necessrios outorga ou renovao. J a Presidnciatem uma responsabilidade de carter menos tcnico e mais poltico embora tambm atue nareviso dos processos, na elaborao das mensagens presidenciais e no encaminhamento dosprocessos para o Congresso Nacional.

    No Ministrio das Comunicaes, toda a instruo dos processos ocorreno Departamento de Outorgas de Servios de Radiodifuso da Secretaria de Servios deComunicao Eletrnica. Para os processos de outorga e renovao de outorga de emissoras

  • 7comerciais e educativas, existe uma estrutura compartilhada, composta por duas coordenaesgerais: a de regime legal de outorgas, que cuida da anlise jurdica; e a de engenharia deoutorgas, que avalia os processos do ponto de vista tcnico. J os processos de radiodifusocomunitria, por terem um volume muito superior aos de radiodifuso comercial e educativa,so analisados por uma coordenao especfica, que os avalia tanto do ponto de vista jurdicoquanto de engenharia.

    Finalizada a anlise no Departamento de Outorgas de Servios deRadiodifuso, os processos so enviados para a Consultoria Jurdica, rgo de assessoria ecoordenao jurdica de todo o Ministrio. A Consultoria responsvel pela reviso dosprocessos, saneamento das eventuais pendncias ainda existentes e elaborao dos atos aserem assinados pelo ministro das comunicaes. J na Presidncia da Repblica, aresponsabilidade pela anlise dos processos da Casa Civil.

    Figura 1 fluxo de tramitao dos processos de radiodifuso

    Fonte: Relatrio preliminar da Subcomisso Especial destinada a analisar mudanas nas normas de apreciao dosatos de outorga e renovao de concesso, permisso ou autorizao de servio de radiodifuso sonora e de sons eimagem.

    Legendas: CCTCI Comisso de Cincia e Tecnologia, Comunicao e Informtica / CCJC Comisso deConstituio e Justia e de Cidadania / CCT Comisso de Cincia, Tecnologia, Inovao, Comunicao eInformtica.

    * Os processos passam duas vezes pela CCJC. Na primeira, analisada a constitucionalidade e a juridicidade daproposio. Na segunda, elaborada a redao final.

    A seguir, descrevemos mais detalhadamente como se d o processo deoutorga de radiodifuso em cada uma das modalides hoje existentes.

    Ministrio dasComunicaes

    CasaCivil

    Cmara dosDeputados

    SenadoFederal

    CasaCivil

    CCTCI

    CCJC*

    CCJC*

    CCT

  • 82.1 Radiodifuso comercial

    A entidade que deseja obter uma outorga de radiodifuso comercial deveprovocar o Ministrio das Comunicaes, solicitando a abertura de edital para o servio e alocalidade pretendidos. Contudo, ainda que exista um canal disponvel, a deciso sobre a aberturaou no de um procedimento licitatrio discricionria do ministro. Caso o ministrio opte porpublicar um edital, h algumas regras a serem observadas.

    O edital deve indicar, entre outros: o objeto da licitao; o valor mnimoda outorga; condies de pagamento; relao de documentos necessrios habilitao; e critriospara julgamento das propostas tcnicas e de preo. Tambm deve haver no edital indicao decritrios objetivos para a gradao da pontuao, sendo vedada a comparao entre propostas. Asconcorrncias ocorrem em trs etapas. A primeira a fase de habilitao e, caso o candidatocumpra todas as exigncias do edital, passa fase seguinte. Na segunda etapa, so analisadas aspropostas tcnicas e, por ltimo, as propostas financeiras.

    Somente so classificadas para a etapa seguinte, na qual ocorre a anlise ejulgamento da proposta de preo, as entidades que atendam s condies mnimas estabelecidaspara cada um dos quesitos da proposta tcnica e que somem, no mnimo, uma determinadapontuao total. Esse limite mnimo para a pontuao tcnica total varia de acordo com acategoria do servio que est sendo licitado. O clculo da pontuao atribuda proposta depreo pela outorga varia de grupo para grupo, de acordo com frmulas que levam em conta ovalor mnimo estabelecido no edital e o valor ofertado pelo proponente.

    2.2 Radiodifuso educativa

    Os trs principais documentos que regram a outorga de rdios e TVseducativas so o Decreto-Lei 236, de 28 de fevereiro de 1967, o Decreto n 2.108, de 24 dedezembro de 1996, e a Portaria Interministerial n 651, de 15 de abril de 1999. Estes documentosestabelecem que a radiodifuso educativa o Servio de Radiodifuso Sonora (rdio) ou de Sonse Imagens (TV) destinado transmisso de programas educativo-culturais, que, alm de atuar emconjunto com os sistemas de ensino de qualquer nvel ou modalidade, vise educao bsica esuperior, educao permanente e formao para o trabalho, alm de abranger as atividades dedivulgao educacional, cultural, pedaggica e de orientao profissional.

    Podem pleitear a outorga para a execuo de servios de radiodifusocom fins exclusivamente educativos as pessoas jurdicas de direito pblico interno, inclusiveuniversidades, que tero preferncia para a obteno da outorga, e fundaes institudas porparticulares e demais universidades brasileiras. admitida, na radiodifuso educativa, apenas atransmisso de programas educativo-culturais. Os programas de carter recreativo, informativoou de divulgao desportiva podero ser considerados educativo-culturais se neles estiverem

  • 9presentes elementos instrutivos ou enfoques educativo-culturais identificados na suaapresentao.

    Ressalte-se que, por fora do 1 do inciso XV do art. 13 do Decreto n2.108, de 1996, dispensvel a licitao para a outorga de servio de radiodifuso com finsexclusivamente educativos. No h um procedimento especfico para a outorga estabelecido nalegislao, sendo a escolha dos agraciados com concesses e permisses discricionria do ministrodas comunicaes.

    2.3 Radiodifuso comunitria

    A radiodifuso comunitria no Brasil nasceu com a publicao da Lei9.612, de 19 de fevereiro de 1998, que institui o Servio de Radiodifuso Comunitria no Brasil ed outras providncias. A lei regulamentada pelo Decreto 2.615, de 03 de junho de 1998 e pelaNorma Complementar 001/04, do Ministrio das Comunicaes.

    So competentes para a prestao desse servio as fundaes eassociaes comunitrias, sem fins lucrativos, com sede na localidade de prestao do servio.Tais entidades devem ser legalmente institudas e devidamente registradas, com dirigentesbrasileiros natos ou naturalizados h mais de 10 anos, maiores de 21 anos ou emancipados esignatrios de documento no qual se comprometam ao fiel cumprimento das normasestabelecidas para o servio de radiodifuso comunitria. Esses dirigentes no podem serintegrantes de quadros de scios e de administradores de qualquer modalidade de servio deradiodifuso ou de televiso por assinatura.

    Outra exigncia que a entidade tenha, em seus estatutos, o objetivo deprestar os servios de radiodifuso comunitria. Tambm necessrio que a fundao ouassociao seja efetivamente plural, aberta a todos os anseios da comunidade que representa, eno apenas a determinado grupo ou casta dominante. O estatuto social das entidades deradiodifuso comunitria deve garantir o ingresso, como associado, de qualquer cidadodomiciliado na rea de execuo do servio. A entidade deve, ainda, contar com um ConselhoComunitrio, composto por no mnimo cinco integrantes representativos da comunidadeatendida, cujo objetivo acompanhar a programao da emissora. Ela tambm proibida demanter vnculos que a subordinem ou a sujeitem a gerncia, administrao, domnio, comando ouorientao de qualquer outra entidade mediante compromissos ou relaes financeiras, religiosas,familiares, poltico-partidrias ou comerciais. Do mesmo modo e com o mesmo intuito, vedadaa cesso ou arrendamento das emissoras dos servios de radiodifuso comunitria, bem como dehorrios de sua programao.

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    O processo de outorga de radiodifuso comunitria se inicia com aentrega, por parte da interessada, de um formulrio de demonstrao de interesse. Nesseformulrio, devem ser dadas informaes como o nome da entidade, seu CNPJ, endereo,telefone, endereo pretendido para a instalao da rdio, nome e CPF do representante legal eendereo para correspondncia.

    Uma vez cadastrada a demonstrao de interesse, a fase seguinte apublicao de aviso de habilitao. Esse o dispositivo utilizado pelo Ministrio dasComunicaes para informar sociedade a disponibilidade de canal para a prestao dos serviosde radiodifuso comunitria nas localidades listadas. No apenas as entidades que apresentaram ademonstrao de interesse, mas qualquer outra interessada pode ingressar com a documentaorequerida e participar do processo seletivo basta que elas tenham como local pretendido para ainstalao do sistema irradiante coordenadas que estejam na mesma rea includa no Aviso deHabilitao.

    Aps a publicao, as entidades interessadas tm, em mdia, 45 dias paraapresentar toda a documentao requerida. Uma vez terminado o prazo, inicia-se a fase dehabilitao, durante a qual o Ministrio das Comunicaes ir analisar a documentao enviadapelas entidades, luz das exigncias estabelecidas em lei. Caso esteja tudo em ordem, inicia-se afase concorrencial do processo. Caso no esteja, o Ministrio envia exigncias aos concorrentes,para que sejam sanadas as pendncias existentes. No caso de no cumprimento das exigncias, asentidades tm seus processos arquivados.

    Iniciada a fase concorrencial, analisada a existncia de concorrentespara uma mesma outorga de radiodifuso comunitria. Caso, em determinada rea de execuodo servio, apenas uma entidade atenda aos requisitos exigidos na legislao, ela declaradavencedora. Nesse caso, o processo segue diretamente para a fase de aprovao de projeto tcnico.Contudo, se na mesma rea de execuo do servio, mais de uma entidade atender aos requisitosna legislao, o ministrio tentar promover o entendimento entre elas, objetivando que seassociem. No havendo acordo o que ocorre na maioria dos casos a deciso se d por meio daanlise do critrio de representatividade. Recebe a autorizao a entidade que acumular maispontos nas manifestaes de apoio, que so enviadas ainda durante a fase de habilitao. Taismanifestaes de apoio so formadas por abaixo-assinados da comunidade a ser atendida peloservio ou por associaes representativas dessa comunidade. Havendo igual representatividadeentre as entidades habilitadas, a escolha se d por sorteio.

    Vencida a fase concorrencial e escolhida a entidade que ir prestar osservios de radiodifuso comunitria, inicia-se a fase de apresentao de projeto tcnico. Trata-sedo projeto para a instalao da estao que ser analisado por engenheiros do Ministrio dasComunicaes. Estando o projeto de acordo com as especificaes, ser expedida a autorizaopara executar o Servio de Radiodifuso Comunitria.

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    Aps essa expedio, que est a cargo do ministro das comunicaes, necessrio ainda, conforme estabelece o artigo 223 da Constituio Federal, em seu pargrafo 1o,combinado com o art. 64, pargrafos 2 e 4 e com o inciso XXI do art. 49, que o CongressoNacional aprove a autorizao. Contudo, com a edio da Medida Provisria 2.143-33/01, oMinistrio das Comunicaes fica autorizado a expedir licena provisria de funcionamento sentidades de radiodifuso comunitria autorizadas, caso o Congresso Nacional no delibere sobrea matria em um prazo de 90 dias. A outorga de radiodifuso comunitria vlida por 10 anos,podendo ser renovada por iguais perodos.

    3. AS TENTATIVAS DE REFORMA

    3.1 Tentativa 1

    Somente no primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso, com areforma das telecomunicaes posta em prtica a partir de 1995, o assunto ganhou ateno egerou uma proposta concreta para a criao de uma nova legislao de radiodifuso. bemsabido que a ideia original do governo FHC, diversas vezes defendida publicamente pelo seuento Ministro das Comunicaes, Srgio Motta, era elaborar uma Lei Geral de Comunicao,que deveria resultar em um aparato legal nico tanto para telecomunicaes como pararadiodifuso, revogando assim completamente o Cdigo Brasileiro de Telecomunicaes. ,portanto, nesse momento que podemos situar nosso primeiro surto de discusses sobre umanova legislao de radiodifuso.

    Esse primeiro surto regulatrio foi rapidamente debelado. O golpe inicialna proposta foi a esdrxula Emenda Constitucional N 8, promulgada em 15 de agosto de 1995.Desde ento, a fria letra da lei separa telecomunicaes de radiodifuso ainda que qualqueretimlogo possa garantir que telecomunicao significa comunicao distncia, e quequalquer engenheiro possa confirmar que a radiodifuso uma espcie de comunicao distncia. O resultado foi uma regra legal sem par em todo o mundo e o mais interessante, comstatus de norma constitucional (RAMOS, 1997, p. 176-177).

    A previso constitucional se tornou fato no momento em que a AgnciaNacional de Comunicaes originalmente pensada pelo governo FHC no vingou, dando lugar Agncia Nacional de Telecomunicaes (Anatel). A estratgia poltica que orientou o governoFHC naquele momento foi a de vo-se os anis, ficam os dedos. Sabia-se que era politicamenteinvivel, quele momento, reformar as telecomunicaes e a radiodifuso ao mesmo tempo.Havia um interesse hegemnico de privatizar o sistema Telebrs e de reformular a legislao detelecomunicaes, porm o mesmo no se podia falar em relao radiodifuso. A atuao doslobbys de radiodifusores, bem como a resistncia de membros do governo e, principalmente, doParlamento terminou por sepultar qualquer tentativa de reforma na radiodifuso. Resultado:

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    separao das telecomunicaes da radiodifuso e a edio de uma Lei Geral deTelecomunicaes1 que manteve praticamente intactos os preceitos do Cdigo Brasileiro deTelecomunicaes referentes ao rdio e televiso.

    3.2 Tentativa 2

    Porm uma vez efetivada a reforma das telecomunicaes, retomou-se oprojeto de reforma do aparato legal da radiodifuso brasileira. Superada a fase de formulao dasnovas regras para a telefonia brasileira, que levaram privatizao do Sistema Telebrs, o governoFHC se via livre para tentar, mais uma vez, apresentar uma nova Lei Geral de Comunicao.Dessa vez, o foco era apenas a radiodifuso, e a 1 verso do anteprojeto de lei gestada doMinistrio das Comunicaes (Minicom) passou a se chamar Lei Geral de ComunicaoEletrnica de Massa - ainda que esse nome sugira um espectro de atuao muito maior do que oda radiodifuso2.

    Eram os idos de 2000 e Fernando Henrique Cardoso estava em seusegundo mandato. Aps muitas e muitas discusses que geraram pelo menos seis diferentesverses de anteprojetos , finalmente em 2001, durante a gesto de Pimenta da Veiga noMinistrio, o texto do que poderia vir a ser a Lei Geral de Comunicao Eletrnica de Massafoi colocado em consulta pblica3. No nos centraremos aqui na anlise de natimortos bastaressaltar que as seis verses se centravam em dois grandes grupos: um que tinha como planejadordas polticas para o setor o Ministrio das Comunicaes e como implementador a AgnciaNacional de Telecomunicaes; e outro, no qual o Ministrio atuava tanto como planejador comoimplementador (GODOI, 2000, p. 3-7). Esse segundo grupo, ao que consta, foi o vencedor dadisputa interna no Executivo, j que o anteprojeto colocado em consulta pblica dava plenospoderes ao Ministrio no que concerne radiodifuso.

    Mais uma vez, ps-se em movimento a gigantesca mquina de lobbys dosradiodifusores, bem como os interesses pessoais de membros do Executivo e Legislativo ligados radiodifuso, e o resultado foi o engavetamento do anteprojeto. A medida da fora desses lobbys,capazes at mesmo de liquidarem um projeto de tamanha importncia ainda em seu nascedouro,pode ser dada pela atuao dos empresrios de radiodifuso quando da promulgao do CdigoBrasileiro de Telecomunicaes. Naquela ocasio, o ento presidente Joo Goulart vetou 46 itensdos 129 artigos da Lei 4.117/62 todos esses itens de interesse dos radiodifusores. Porm aatuao dos radiodifusores foi to intensa que fez com que o Congresso Nacional derrubasse

    1 Lei 9.472, de 16 de julho de 1997.2 Para fins didticos, entende-se por radiodifuso a transmisso de rdio e televiso em sinal aberto, realizada porestaes de rdio e por geradoras ou retransmissoras de televiso. J o termo comunicao eletrnica abarca noapenas a radiodifuso, mas tambm a TV por assinatura e todas as outras formas de transmisso eletrnica decontedo de udio ou de audiovisual, no importando a plataforma utilizada.3 Consulta Pblica posta em prtica pela Portaria MC n 331, de 21 de junho de 2001.

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    todos os vetos, fazendo com que a Lei fosse sancionada exatamente como prevista (ALMEIDA,1993, p. 51)(MATHIAS, 2003, p. 124 e 125). De l para c, o poder de articulao dosempresrios de radiodifuso aumentou consideravelmente, devido primordialmente suaorganizao em torno da Associao Brasileira de Emissoras de Rdio e Televiso (Abert), o quenos leva a crer que o episdio dos vetos foi apenas o incio de uma vitoriosa carreira de pressespolticas.

    Alm desse entrave, h tambm aquele estabelecido pela ntima relaoentre polticos profissionais e a radiodifuso, que faz com que diversos membros do Executivo edo Legislativo tenham interesse pessoal em evitar qualquer tipo de reforma na legislao deradiodifuso. A utilizao da radiodifuso como instrumento para a manuteno de oligarquiasregionais no poder um fenmeno quase to antigo quanto a consolidao do rdio e da televisono Brasil. Hoje, por exemplo, estima-se que 45% das emissoras de rdio comerciais ou educativasdo Pas estejam sob o controle de polticos (MOREIRA, 2001, p. 15). Alm disso, estimativascomo a do professor aposentado Vencio Lima, da Universidade de Braslia, do conta de quepelo menos 23% dos congressistas brasileiros esto ligados a redes e veculos de comunicao.Para Vencio, a bancada da comunicao impede que qualquer reforma na regulao da mdiaseja aprovada no Brasil.

    3.3 Tentativa 3

    Durante o governo Lula, vimos o reincio das discusses sobre a possvelelaborao de um anteprojeto para a Lei Geral de Comunicao Eletrnica de Massa. Mas dessavez o caminho que levou a essas discusses foi um pouco mais tortuoso do que o das tentativasanteriores do governo FHC. Por isso, cabe uma breve explanao sobre os fatos que levaram oExecutivo a aventar a possibilidade de reformulao das leis sobre comunicao eletrnica demassa no Pas.

    Inicialmente, essa reformulao da legislao no constava dentre asmetas do governo Lula para as comunicaes. No apenas o programa de campanha do entocandidato Lula, em 2002, mas tambm a atuao do Ministrio das Comunicaes em seuprimeiro ano de governo deixavam claros que no estava nos planos do Executivo proporqualquer alterao na legislao de comunicao social eletrnica no Brasil. A gesto MiroTeixeira no Ministrio das Comunicaes deu prioridade praticamente absoluta questo doacmulo de processos de radiodifuso comunitria, bem como ao resgate de poder ministerialsobre as telecomunicaes. Na primeira verso de Plano Plurianual do governo Lula o PPA2004-2007, cuja parte de comunicaes foi elaborada na gesto do ex-ministro e hoje deputadoMiro Teixeira - havia to somente a previso do programa Gesto da Poltica deComunicaes. Ou seja, o PPA indicava que o arcabouo legal da comunicao eletrnica demassa permaneceria inalterado.

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    Contudo, na gesto de Euncio Oliveira no Ministrio, retomou-se a ideiade propor uma nova legislao para o setor. O documento Balano de Atividades 2004publicado pelo Minicom trouxe como meta para 2005, em sua pgina 9, a elaborao de novalegislao para os servios de comunicao de massa. O objetivo dessa nova legislao, aindasegundo o documento, era a modernizao do aparato legal com vistas a uma maior agilidadenas atividades de radiodifuso, alm da criao de mecanismos que permitam melhor fiscalizaodo contedo difundido pela comunicao eletrnica. De fato, na primeira reviso do PPA4,realizada no segundo semestre de 2004, ratificou essa inteno, ao inserir no plano o programaReformulao da Poltica de Comunicao Eletrnica, cujo produto final deveria ser umanteprojeto de lei para o setor.

    A sbita alterao de rumos da estratgia governamental em relao scomunicaes, primordialmente do Ministrio das Comunicaes, tem sua origem em umainiciativa externa ao Ministrio: a apresentao de um anteprojeto para a criao da AgnciaNacional do Cinema e do Audiovisual (Ancinav). Esse anteprojeto pretendia instalar uma novaagncia reguladora, ligada ao Ministrio da Cultura (MinC), que substituiria a Agncia Nacional deCinema (Ancine) e teria como funes primordiais implementar a poltica de cinema eaudiovisual, regular e fiscalizar o mercado desses setores, alm de arrecadar e aplicar recursosoriundos de diversas taxas.

    Uma minuta desse anteprojeto esteve em consulta pblica no stio doMinC entre os dias 11 de agosto e 1 de outubro de 2004. No faremos uma anlisepormenorizada do anteprojeto, visto que excede as intenes a qual nos propusemos com esteestudo5. Contudo, h que se ressaltar duas caractersticas primordiais dessa proposta. Primeira:caso aprovado o anteprojeto e instalada a Ancinav, a nova agncia iria exercer importantesfunes na regulao do mercado de televiso, tanto por assinatura quanto aberta. Ainda queapenas de maneira reflexa, j que o mercado de cinema o objeto primordial a ser regulado pelaAncinav, a televiso aberta deixaria de ser um assunto de exclusiva responsabilidade, no mbitodo Executivo, do Ministrio das Comunicaes. Da vem a segunda caracterstica primordial doanteprojeto: diversas atribuies que hoje so exercidas pelo Minicom, como por exemplo parteda fiscalizao de contedo das emissoras de televiso, seriam transferidas para a Ancinav, o queredundaria em perda de importncia poltica do Ministrio.

    Assim, a proposta de criao de um anteprojeto para uma Lei Geral deComunicao Eletrnica de Massa surgiu em meio a essa discusso sobre a criao Ancinav, emgrande parte devido a um conflito intra-estatal acerca da definio de responsabilidades no queconcerne ao controle governamental sobre a televiso aberta. Com o bombardeio orquestrado 4 Disponvel em http://www.planobrasil.gov.br/texto.asp?cod=46. Acesso em 10/12/2009.5 Anlise desse tipo pode ser encontrada em AGUIAR, C., Anlise da criao da Agncia Nacional de Cinema e doAudiovisual, in EPTIC, v. VII, No. 1, p. 54-70, 2005. Disponvel no seguinte endereo:http://www.eptic.com.br/arquivos/Revistas/VII,n.1,2005/CristianoAguiar.pdf.

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    pela mdia contra a proposta de criao da Ancinav, ela terminou perdendo fora, esmaecendo evindo a falecer

    Portanto, nada aconteceu, e a divergncia regulatria hoje um dosmaiores problemas da comunicao eletrnica de massa brasileira segundo algunslevantamentos, o cipoal de leis, decretos, portarias e normatizaes que formam o marco legal dascomunicaes j passa de 70 diplomas legais em vigncia (GODOI, 2004, p. 12). Acrescente-seque a espinha dorsal da legislao de comunicao eletrnica de massa composto por umCdigo de 1962, um regulamento de 1963 e um Decreto-lei de 1967. Desde ento, houve poucasmudanas. Essas inovaes, contudo, mantiveram praticamente intacto o velho modelo, e asmudanas ocorridas na comunicao eletrnica de massa esto sendo ditadas por fatoresbasicamente de mercado (BOLAO, 2001, p. 6). desnecessrio ressaltar, portanto, que se tratade uma legislao bastante desatualizada, j completamente inadequada atual realidadetecnolgica das comunicaes. Como tambm bvio que o resultado da divergncia e doarcasmo que marcam nossa legislao de comunicaes uma realidade na qual existe um virtualmercado livre. Na prtica, desse modo, como se no houvesse lei alguma.

    4. CONCLUSES

    justamente esse arcasmo legislativo, que faz com que a letra da leipouco tenha de til a acrescentar realidade atual, o que beneficia sobremaneira os atuaisdetentores da propriedade sobre a radiodifuso brasileira. O termo propriedade, por sinal, umparadoxo entre realidade e previso legal. De acordo com a jurisprudncia da nossa legislao deradiodifuso, seguindo a tradio dos Estados Unidos sobre o tema, adotam-se no Brasil ocritrio de interesse pblico, ou public interest standard no original, e o trusteeship model, queteria uma traduo prxima a modelo fiducirio. Os concessionrios de radiodifuso, de acordocom esses preceitos, seriam meros usurios de um bem pblico o espectro radioeltrico que distribudo racionalmente pela autoridade reguladora, com vistas maximizao da utilidade deseu uso. Os empresrios seriam, portanto, fiducirios do pblico e, por isso, deveriam utilizar essebem pblico em benefcio do interesse coletivo. (ALMEIDA, 1993, p. 14-20)

    Porm no bem isso que ocorre, ainda que a nossa ConstituioFederal estabelea claramente que o critrio de interesse pblico seja a regra. Diz o Art. 221 daConstituio:

    Art. 221. A produo e a programao das emissoras de rdio e televisoatendero aos seguintes princpios:

    I preferncia a finalidades educativas, artsticas, culturais e informativas;II promoo da cultura nacional e regional e estmulo produo

    independente que objetive sua divulgao;

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    III regionalizao da produo cultural, artstica e jornalstica, conformepercentuais estabelecidos em lei;

    IV respeito aos valores ticos e sociais da pessoa e da famlia.

    Nossa atual legislao - primordialmente o Cdigo Brasileiro deTelecomunicaes - bem como as autoridades reguladoras da radiodifuso so incapazes de fazercom que os preceitos de interesse pblico presentes na Lei Maior sejam de fato cumpridos. Alegislao estabelece to somente um controle incrivelmente burocrtico, rgido e ineficiente dasatividades de radiodifuso do Pas. Centra-se quase que exclusivamente na gesto do espectro e napoltica de concesses. Os controles de propriedade so falhos, no existem mecanismos paraefetivo acompanhamento da programao das emissoras de rdio e televiso e, adicionalmente,boa parte dos preceitos do CBT est tecnologicamente ultrapassada e j se tornou letra morta com a digitalizao da comunicao eletrnica, processo j em curso no Pas, esse arcasmo legalse torna ainda mais intenso.

    O resultado que, de fato, os radiodifusores hoje tm a propriedadesobre um bem pblico, e o utilizam a seu bel-prazer, sem grandes interferncias pblicas ouestatais em suas estratgias de mercado. As atividades de radiodifuso se encontram, portanto, emum patamar bastante prximo da auto-regulamentao. O resultado que os proprietrios dosmeios de comunicao podem promover, sem qualquer tipo de reao do Estado, uma grandeconcentrao de mercado, por meio de propriedade cruzada, de concentrao horizontal e dodomnio vertical de todas as etapas da cadeia de valor das comunicaes. Na esteira dessaconcentrao, vem tambm um excesso de poder poltico depositado nas mos dosconcessionrios de radiodifuso, que utilizam em larga escala seus meios de comunicao para apromoo de determinadas causas prprias e para a manipulao da opinio pblica. E paramanterem esse estado de falta de regulamentao, que at hoje lhes tem sido assaz benfico, atmesmo um suposto direito de propriedade sobre o espectro radioeltrico licitado j foi levantadopor empresrios de comunicao, com vistas manuteno do status quo (AMARC, 2000). Nemmesmo o mais liberal dos liberais seria capaz de defender ideia to estapafrdia. Uma supostapropriedade sobre o espectro radioeltrico s poderia ser posta em prtica em detrimento de umoutro preceito liberal to importante quanto o da propriedade o da liberdade de expresso.

    Contudo, o que os radiodifusores parecem no ver que o arcasmo e adivergncia regulatria de nossa legislao redundar, em pouco tempo, em malefcios para elesprprios. Vejamos por exemplo o que ocorreu aps a aprovao da Emenda Constitucional n36, que abriu a possibilidade de investimentos estrangeiros em empresas jornalsticas e deradiodifuso sonora e de sons e imagens, at um limite de 30% do capital total e do capitalvotante. Os principais objetivos dessa emenda foram possibilitar a capitalizao das empresas demdia por meios alternativos aos emprstimos, alm de trazer novos investimentos para o setor.Passados mais de sete anos da promulgao da emenda, no h notcias de investimentosestrangeiros de peso em nossas maiores empresas de radiodifuso aberta. A melhor explicao

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    para essa ausncia de investimentos que o arcasmo da nossa legislao tem provocadoinsegurana nos investidores, alm de ser um fator que dificulta o controle da concorrncia nosetor e o estabelecimento de regras que possam beneficiar novos entrantes. Da podemos concluirque a ausncia de marcos legais confiveis para a comunicao eletrnica de massa est aestabelecer um entrave aos investimentos nas comunicaes, o que obviamente pssimo para osempresrios do setor.

    Alm disso, o excesso de burocracia e a falta de estrutura do Ministriodas Comunicaes fazem com que a tramitao de processos, desde os mais complexo, como porexemplo as outorgas, at os mais simples, como uma banal mudana de endereo de umaempresa de radiodifuso, demorem consideravelmente. E essa demora prejudicial a todos. Aosempresrios que tm processos de primeira outorga em tramitao no Executivo, e suportamgrandes prejuzos com os atrasos na efetiva entrada no ar de suas emissoras. s empresas que jdetm outorga, e precisam contratar consultorias para elaborar seus intrincados processos derenovao de outorga. E principalmente populao, que v a universalizao dos servios deradiodifuso esbarrar na incapacidade do poder pblico de dar vazo aos pedidos de outorgas deradiodifuso

    justamente com vistas garantia da universalizao, da liberdade deexpresso e de um ambiente regulatrio propcio atrao de investimentos que se faz necessriauma nova regulamentao para o setor de radiodifuso, de modo que se possa tirar essa atividadeda auto-regulao e traz-la de volta ao domnio pblico. Parece-nos claro que a comunicaoeletrnica no , e continuar no sendo por um bom tempo, um ambiente de competioperfeita, no qual a auto-regulao e as foras de mercado sejam suficientes para garantir seu plenofuncionamento. Outras questes no relacionadas diretamente ao mercado mas igualmenteimportantes so as referentes ao contedo, primordialmente as ligadas diversidade cultural, regionalizao da programao e produo independente, que so de fundamental importncianas discusses sobre um novo marco legal para a comunicao eletrnica de massa.

    E j que estamos falando de uma atividade pblica, posta em prtica peloEstado, nada melhor do que buscar no prprio Estado os argumentos necessrios para que seestabelea uma nova regulamentao para a comunicao eletrnica. Vejamos, por exemplo, oentendimento apresentado no relatrio do grupo de trabalho interministerial que redundou nodocumento Anlise e Avaliao do Papel das Agncias Reguladoras no Atual ArranjoInstitucional Brasileiro. De acordo com esse documento, a regulao econmica refere-sequelas intervenes cujo propsito mitigar imperfeies, como a existncia de monoplionatural, e assim melhorar o funcionamento do mercado. Busca-se, desse modo, a maximizaoda eficincia em mercados caracterizados pela concentrao de poder econmico e naqueles ondeas barreiras entrada so significativas. Essas so definies clssicas da regulao e, ao queindica, esto a orientar a poltica governamental em vigor.

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    Ora, quem duvida que, na comunicao eletrnica, h considerveisimperfeies de mercado, concentrao de poder econmico e as barreiras entrada sosignificativas? exceo das pequenas rdios locais, os demais negcios de comunicaoeletrnica, principalmente quando organizados em rede, apresentam todas essas caractersticascitadas. Mais ainda: as externalidades e assimetrias de informao e poder so marcantes nessesetor, o que justifica ainda mais a necessidade de regulao. Isso porque em um mercado quetende concentrao, so conseqncias imediatas, alm de menor concorrncia, a existncia deum menor nmero de fontes de informaes, a reduo da pluralidade de contedos e, em ltimainstncia, um decrscimo significativo da liberdade de expresso (BAGDIKIAN, 2004). Ummonoplio sobre a radiodifuso, portanto, significa um monoplio sobre a seleo de notcias, adisseminao de informaes e, em ltima instncia, sobre a construo da esfera pblica(MIGUEL, 2004, p. 94)6.

    Adicionalmente, h um desafio ainda maior: pluralidade de informaes eliberdade de expresso no podem ser idealmente providas pelo mercado, mesmo quando ele perfeito. E nisso at mesmo papas do liberalismo, como Giovanni Sartori, esto de acordo.Inicialmente, Sartori acreditava piamente que, se uma notcia falsa ou incompleta fosse veiculada,em um mercado competitivo seus concorrentes iriam rapidamente suprir essa falta, em busca dobenefcio prprio, porm atuando reflexamente em benefcio do pblico (SARTORI apudMIGUEL, 2004, p. 98). Porm o prprio Sartori abandonou essa ideia e, em escritos maisrecentes, demonstram como os meios de comunicao, primordialmente a televiso, atuam deforma intensa em busca de benefcios polticos e econmicos prprios. Muitas vezes, essesbenefcios so comuns a todos os meios de comunicao, o que termina por eliminar qualquerpossibilidade de competio e contraditrio.

    Essa conjuno de interesses dos vrios organismos de mdia bastanterecorrente, e teorias da comunicao j bastante antigas, muito anteriores a Sartori, j adenunciavam. A Escola de Frankfurt e todo o seu legado sobre a teoria crtica e a indstriacultural, por exemplo, j deixavam claro, ainda nas dcadas de 40 e 50, o aspecto mercantil damdia privada, que as unia em torno de diversos ideais comuns o maior deles a manuteno docapitalismo, fonte do qual sorviam seus ganhos. Mais recentemente, teorias da comunicaocomo a de agenda-setting, enquadramento, priming, cultivo dentre outras tm ressaltado no apenasuma importncia econmica, mas tambm na definio do debate poltico da mdia, bem como naconstruo da esfera pblica e, reflexamente, tambm ressaltam uma conjuno de interesses

    6 O autor, em seu texto, referia-se a todos os veculos de comunicao, no apenas comunicao eletrnica.Contudo, levando-se em conta que a televiso e o rdio so os principais veculos de comunicao do Pas, estandopresentes em praticamente todos os lares e sendo os mais eficientes instrumentos de formao da opinio pblicabrasileira, pode-se concluir que a sua assertiva pode ser perfeitamente utilizada quando estamos falandoespecificamente de comunicao eletrnica.

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    das empresas de mdia que leva uniformizao de discursos e ausncia de pluralidade ecompetio, ainda que haja diversidade de fontes. Eis, portanto, mais um argumento para seregular as comunicaes: toda vez que h um desequilbrio democrtico, exatamente como ocorrena mdia, existe a necessidade de regulao por parte da sociedade (GODOI, 2004, p. 4).

    Desse modo, mais do que incentivar a competio de mercado, deverde uma legislao de comunicaes estimular tambm formas de comunicao alternativas aomercado, com vistas efetiva pluralidade de informaes e debelao do desequilbriodemocrtico. Essas formas alternativas, que operam de forma complementar s emissorascomerciais e ao sistema estatal, so extremamente necessrias porque: preservam valores frgeis,que na maioria das vezes so ignorados pela mdia comercial; divulgam de forma independentefatos polticos que no so adequados ideologia das emissoras comerciais ou estatais; e tmgrande apelo local, servindo desse modo como contraponto massificao promovida pelosmeios de comunicao de grande porte (LINS, 2002, p. 13-17).

    Mais uma vez, a nossa Constituio Federal foi sbia, e antevendo essedever, estabeleceu o seguinte:

    Art. 223. Compete ao Poder Executivo outorgar e renovar concesso,permisso e autorizao para o servio de radiodifuso sonora e de sons e imagens,observando o princpio da complementaridade dos sistemas privado, pblico e estatal.(grifo nosso).

    Ora, o que quis dizer o constituinte com o princpio dacomplementaridade? Que a mdia, aqui especificamente a comunicao eletrnica, no deveriaficar a cargo exclusivamente da explorao privada. Como j demonstramos anteriormente, ummodelo exclusivamente privado de explorao no capaz de promover uma plena liberdade deexpresso, o que suscita a responsabilidade do Estado em regular o setor, com vistas promoodo bem pblico. Mais que isso: no basta ao Estado promover as condies necessrias livrecompetio e o combate ao oligoplio e monoplio, como estabelece o pargrafo 5 do art. 120da Constituio Federal. necessrio que ele incentive formas alternativas explorao dacomunicao eletrnica pelo mercado, seja por meio de emissoras de rdio e televiso estatais,seja por aparatos miditicos de acesso pblico, como a radiodifuso comunitria.

    Finalmente, um outro fato que faz com que seja urgente a reviso dosmarcos legais da comunicao eletrnica brasileira a digitalizao da transmisso da TV e dordio. Mais do que mero avano tecnolgico, esse processo de digitalizao est criando um novoparadigma para esses meios de comunicao. Em um cenrio de convergncia tecnolgica, noqual a TV e o rdio digital so utilizados em toda a sua potencialidade de interatividade e de ofertade servios, a radiodifuso se confundir com as redes de telecomunicaes, ao ponto de integrarredes nicas de transmisso de dados. Ao contrrio do que existe hoje, a radiodifuso serbaseada em um ambiente multisservio, no qual a interatividade permitir uma completa alterao

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    do conceito de telespectador e de ouvinte, que passar a ser um usurio de uma plataformadigital de comunicao e informao. Pode-se prever, desse modo, uma ruptura significativa como modelo atual do setor de radiodifuso, o que exigir debate sobre o estabelecimento de umapoltica pblica que possa tornar a comunicao eletrnica um agente universalizador dacomunicao. Assim, a digitalizao criar uma nova realidade no campo das comunicaes, o quetrar novas diretrizes para a reviso das leis e regulamentos desse setor.

    5. SUGESTES

    Ao Estado, portanto, resta a nobre e difcil misso de regular ascomunicaes sem estabelecer qualquer tipo de censura ou entrave ao seu desenvolvimento. necessrio combater o domnio de um sistema de comunicaes majoritariamente privado mas,ao mesmo tempo, no se pode estabelecer qualquer barreira livre circulao de informaes e livre iniciativa. fato que a informao no pode ser tratada exclusivamente como mercadoria,mas tambm fato que a informao tem grande valor comercial, e qualquer tipo de entraveestabelecido ao comrcio da informao , em ltima instncia, uma afronta livre iniciativa pecado mortal em um pas cujo modo de produo o capitalista. Adicionalmente, o Estado deveser capaz de antever as implicaes do avano tecnolgico nas comunicaes, por meio de umacapacidade de foresight7 muito bem articulada.

    Como equilibrar regulao e liberdade? Como fazer com que as restriestragam somente o bem pblico, e no uma ameaa livre circulao de informaes? E comotornar reais esses objetivos em um ambiente incrivelmente dinmico, marcado por constantesinovaes tecnolgicas? Mais uma vez, nossa Constituio Federal tem a resposta: controle social.O excesso de interferncia do Estado nas comunicaes no nada saudvel no por acaso,praticamente todos os governos totalitrios surgidos na era das comunicaes tiveram, como umde seus principais instrumentos, a manipulao dos cidados por meio de aparatos estatais demdia. Na direo oposta, a lenincia do Estado na regulao das comunicaes gera totalitarismona mesma medida, mas nesse caso um totalitarismo de mercado, senhor absoluto dos aparatos dedisseminao de informaes.

    Assim, fundamental que a legislao de comunicaes estabeleaformas de controle social sobre as comunicaes no um controle direto, no qual um comitformado por Velhinhas de Taubat se arvore o direito e a crena de poder estabelecer aspolticas de comunicao em nome de toda a sociedade. Mas um controle estabelecido porformas alternativas de comunicao e por canais de participao direta da sociedade naformulao das polticas pblicas de comunicao. Ou seja, um controle feito bem menos por

    7 Termo aqui utilizado como a capacidade do Estado de antever e avaliar o impacto de suas polticas pblicas nocenrio futuro.

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    proibies, e muito mais por competio entre a lgica mercantil das comunicaes e a lgicano-mercantil, formada primordialmente por canais pblicos de comunicao.

    Na atualidade, em que se estabelece uma nova organizao social j pr-batizada como Sociedade do Conhecimento, uma regulao que possa estabelecer uma maiordemocratizao das comunicaes essencial. Hoje, os aparatos comunicacionais so o mbitoprimordial nos quais se d a trnsito de informaes, de forma cada vez mais eficiente. Garantir olivre acessos s comunicaes, portanto, significa estabelecer meios para que os cidados possamser destinatrios do insumo mais importante das sociedades contemporneas: o conhecimento(CASTELLS, 1999). E o caminho para esse livre acesso est, antes de mais nada, noestabelecimento de meios de participao social na elaborao de polticas pblicas decomunicao, bem como na prestao de servios de comunicao.

    Tendo por base tais premissas, sugerimos as seguintes aes:

    a) Consolidao e simplificao da legislao de comunicaes

    Atualmente, o aparato legal sobre as comunicaes est absurdamentedisperso em uma infinidade de leis, decretos, resolues, normas e outros diplomas legais. Umanova legislao para a comunicao eletrnica de massa, portanto, deve ser capaz de agregar todoesse sem nmero de normas atualmente dispersas, com vistas ao aumento da eficinciagovernamental em suas atividades de regulao. Assim, no apenas o Cdigo Brasileiro deTelecomunicaes e suas posteriores alteraes devem ser revistos, mas tambm: as normas sobreTV por assinatura (Lei no. 8.977/95 e alteraes TV a Cabo; Norma n. 2/94, alterada pelaNorma No. 2/97 MMDS8; Decreto 2.196/97, alterado pelo Decreto 3.896/01 DTH9,Decreto 95.744/88, alterado pelo Decreto 95.815/88 Televiso por Assinatura10); sobreretransmisso e repetio de televiso (Decreto 5.371/05, alterado pelo Decreto 5.413/05); deradiodifuso comunitria (Lei 9.612/98), entre outros. No se trata de uma lista exaustiva aquiforam citados somente os principais diplomas legais que regulamentam os servios decomunicao eletrnica, mas h tambm diversos outros que tambm tratam, ainda que apenasreflexamente, do assunto. Alm disso, essencial que a nova legislao simplifique as regras atuaisde outorga em todas as modalidades de servios de comunicao eletrnica principalmente daradiodifuso comunitria -, de modo a centrar as atividades do Ministrio das Comunicaes nomais na ritualstica da outorga, mas sim no acompanhamento do contedo veiculado pelos meiosde comunicao eletrnica.

    8 Multipoint Multichannel Distribution System, ou Sistema de Distribuio Multiponto Multicanal transmisso de sinaispor microondas.9 Direct to Home, ou Direto para Casa transmisso via satlite digital na banda Ku.10 Transmisso via canal UHF codificado.

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    b) Fortalecimento do Conselho de Comunicao Social

    O Conselho de Comunicao Social (CCS) foi uma grande vitria dossetores progressistas do Congresso Nacional que, quando da elaborao da Constituio Federalde 1988, fizeram constar no Art. 224 da Carta Magna que tal conselho seria criado como rgoauxiliar do Congresso Nacional. A regulamentao desse conselho foi estabelecida pouco depois,por meio da Lei no. 8.389/91. Infelizmente, as divergncias polticas, a falta de consenso sobre omodelo de conselho a ser implementado e o fato de jamais ter havido a insero do debate sobreas comunicaes entre as prioridades do Congresso fez com que a instalao do CCS se desseapenas recentemente, e de maneira descontinuada, j que h anos o conselho est inativo por faltade instalao de seu colegiado. , portanto, uma instituio ainda bastante jovem, que buscaespao na esfera pblica e uma identidade prpria.

    Contudo, ainda que curta e inconstante, a experincia do CCS mostraque ele detm potencialidades, porm carece de maior poder para que possa se estabelecer comoum ator influente na definio das polticas pblicas de comunicao. necessrio, portanto,dotar o conselho de maior poder, para que ele no seja um mero ente consultivo do CongressoNacional, e sim um ente determinante das polticas pblicas de comunicao. Portanto, legislaodeveria englobar os preceitos estabelecidos pela Lei 8.389/91, revogando-a e dotando o conselhode poder conclusivo em relao aos projetos de lei relativos ao setor de comunicaes emtramitao no Congresso Nacional, bem como poder de iniciativa para a proposio de polticaspblicas de comunicaes.

    c) Criao de meios institucionais para o acolhimento e apreciaode opinies oriundas da sociedade no que concerne ao acompanhamento da atuao dasconcessionrias, permissionrias e autorizatrias de comunicao eletrnica de massa

    Uma das principais chagas do nosso atual modelo de comunicaes aquase no existncia de canais que possam ser utilizados pelos cidados para o seu controleefetivo. No que se refere ao contedo da programao, os nicos canais legalmente estabelecidos,no mbito do Executivo, dedicados a essa tarefa so o Departamento de Justia, Classificao,Ttulos e Qualificao, rgo do Ministrio da Justia que trata da classificao indicativa decontedos audiovisuais; e o Departamento de Acompanhamento e Avaliao de Servios (DAAS)da Secretaria de Servios de Comunicao Eletrnica, integrante da estrutura do Ministrio dasComunicaes. O primeiro tem uma funo bastante restrita e pouco pode acrescentar aoacompanhamento de contedos na comunicao eletrnica brasileira. E o segundo, cujo escopode atuao mais amplo, tem atuado como uma mera repartio burocrtica (em sua acepopejorativa), bastante sucateada, que mal consegue dar conta das inmeras denncias contraprestadores dos servios de radiodifuso que chegam diariamente ao ministrio.

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    Esse modelo meramente reativo bastante ultrapassado e poucocontribui para uma efetiva participao social no controle das comunicaes. Em seu lugar, umanova legislao deveria prever um rgo inspirado no board of viewers (conselho de espectadores)britnico um grupo de representantes da sociedade civil ao qual cabe fazer avaliaes crticasperidicas do contedo veiculado pelas empresas de comunicaes e, com base nessas avaliaes,propor os rumos que as polticas nacionais de comunicao devem seguir. Tal proposta, portanto,transformaria o DAAS em um rgo efetivamente acompanhador e avaliador dos servios decomunicaes. Contudo, deve-se ter o cuidado de se evitar uma soluo imposta de cima parabaixo. essencial que qualquer rgo governamental cuja atribuio seja o acompanhamento eavaliao das comunicaes esteja sempre o mais aberto possvel sociedade.

    d) Digitalizao da radiodifuso que privilegie o acessodemocrtico aos canais de difuso de informaes

    Aps muito tempo discutindo exclusivamente os padres tecnolgicos aserem adotados na digitalizao da radiodifuso no Brasil o como fazer -, o Poder Pblicofinalmente se deu conta de que essa uma questo secundria. A pergunta primordial no ocomo, mas o que fazer. Seguindo essa tendncia, necessrio que os planejadores de polticaspblicas estabeleam os objetivos a serem alcanados com a digitalizao da radiodifuso. Adigitalizao trar uma grande gama de novas opes, no momento em que otimizar o espectroradioeltrico e abrir a possibilidade de se instalarem mias servios de radiodifuso. necessrio,portanto, que esse aumento de oferta no se d apenas de forma quantitativa, mas tambmqualitativa, de modo a promover um maior acesso de formas pblicas de prestao de servios deradiodifuso.

    e) Incentivo aos modelos alternativos explorao privada dascomunicaes

    No possvel estabelecer uma efetiva participao social nascomunicaes sem que a populao tenha acesso comunicao no apenas como receptora, mastambm como produtora e difusora de contedo. Contudo, o processo de mercantilizao dascomunicaes naturalmente excludente e alija o cidado do direito de ser participante ativo nascomunicaes. Desse modo, necessrio que a legislao possa devolver sociedade ao menosparte do controle sobre os meios de difuso de informaes. H diversas experincias em todo omundo estabelecidas a partir desse objetivo, porm consideramos que o modelo de comunicaocomunitria o mais efetivo deles. Esse modelo foi implantado no Brasil com a experincia dasrdios comunitrias, legalmente estabelecidas pela Lei 9.612/98. Hoje, h 3.842 entidadescomunitrias autorizadas a prestar esse tipo de servio no Pas11. necessrio consolidar essaexperincia, expandindo ainda mais o servio de radiodifuso comunitria, alm de estabelecer

    11 Dados referentes a 27 de outubro de 2009 Fonte: Ministrio das Comunicaes. http://www.mc.gov.br/wp-content/uploads/2009/08/rel_radcom_entidades_autorizadas_2009-10-27-11-37-01.pdf

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    novos servios desse tipo, como por exemplo o de TVs comunitrias demanda histrica dosmovimentos pela democratizao das comunicaes.

    f) Regionalizao da produo de contedos e incentivos produo independente

    A regionalizao da produo cultural e o incentivo produoindependente so bandeiras h muito defendidas pelos movimentos em prol da democratizaodas comunicaes. Hoje, o que vemos uma grande centralizao da produo de contedosmiditicos fenmeno batizado como Cultura da Vieira Souto, em aluso Avenida VieiraSouto, em Ipanema, cidade do Rio de Janeiro, que tanto mostrada em nossa teledramaturgia.Tal preocupao consta, inclusive, da nossa Constituio Federal, que estabelece nos incisos II eIII do seu Art. 221 o seguinte:

    Art. 221. A produo e a programao das emissoras de rdio e televisoatendero aos seguintes princpios:

    I (...)II promoo da cultura nacional e regional e estmulo produo

    independente que objetive sua divulgao;III regionalizao da produo cultural, artstica e jornalstica, conforme

    percentuais estabelecidos em lei.

    Infelizmente, a lei citada na Constituio no foi promulgada at hoje, oque mantm o contedo do Art. 221 como meramente programtico. H no Parlamentobrasileiro alguns projetos de lei que visam regulamentao do inciso III desse artigo, sendo queo que mais avanou foi o PL 256, de 1991, de autoria da deputada Jandira Feghali. As discussessobre esse Projeto de Lei se arrastaram por mais de 12 anos na Cmara dos Deputados at suaaprovao, e agora ele tramita no Senado Federal. essencial que finalmente se regulamente ospercentuais mnimos de regionalizao da produo, algo de suma importncia para ademocratizao das comunicaes e para o estmulo descentralizao do mercado essa,portanto, deve ser uma preocupao central da legislao. A tabela abaixo lista os projetos quetratam do tema que tramitam ou j tramitaram na Cmara dos Deputados e demonstra quantastentativas j foram feitas para que se regulamente a regionalizao e a produo independente nordio e na TV:

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    Tabela 1: Proposies legislativas na Cmara dos Deputados referentes regionalizao e produo independente

    na televiso:

    Proposio Autor Ementa SituaoPL 256/1991 Jandira Feghali Regulamenta o disposto no inciso III do artigo

    221 da Constituio Federal, referente regionalizao da programao artstica, cultural ejornalstica das emissoras de rdio e TV e doutras providncias NOVA EMENTA:Regulamenta o disposto no inciso III do artigo221 da Constituio Federal, referente regionalizao da programao cultural, artstica, ejornalstica e produo independente nasemissoras de rdio e TV e d outras providncias.

    Em deliberao noSenado Federal.Aguardando retorno

    PL 192/1991 Senado Federal Regulamenta o inciso III do artigo 221 daConstituio , que dispe sobre a regionalizaoda programao jornalstica , cultural e artstica derdio e televiso.

    Apensado ao PL1439/1991

    PL 506/1991 Nilson Gibson Dispe sobre a liberdade de manifestao dopensamento e informao e d outrasprovidncias.

    Apensado ao PL6054/1990

    PL 5517/2001 Waldir Pires Regulamenta o inciso III, do artigo 221 daConstituio Federal, que dispe sobre aregionalizao da programao jornalstica,cultural e artstica das emissoras de rdio.

    Apensado ao PL256/1991. Aguardadeliberao de recursocontra parecer contrrioda CCTCI sobre amatria.

    PL 654/1995 Padre Roque Regulamenta o Artigo 221 da ConstituioFederal, estabelecendo percentual minimo daprogramao diria das emissoras a ser destinada aprogramas com finalidades educativas, artsticas eculturais e d outras providncias.

    Proposio inativa

    PL 684/1991 Paulo Ramos Regulamenta o Artigo 221 da ConstituioFederal.

    Proposio inativa

    PL 845/1991 Mendona Neto Introduz modificaes na Lei 4117, de 27 deagosto de 1962, que institui o Cdigo Brasileirode Telecomunicaes.

    Proposio inativa

    PL 1194/1988 Jorge Arbage Disciplina as diverses e espetculos pblicos(artigo 221, pargrafos terceiro e sexto e artigo 221da constituio e artigo 65 do Ato das DisposiesConstitucionais Transitrias).

    Proposio inativa

    PL 2251/1989 Lidice da Mata Regulamenta o disposto no inciso III do Artigo221 da Constituio Federal referente regionalizao da progrmao artstica, cultural ejornalstica das emissoras de rdio e TV e doutras providncias.

    Proposio inativa

    PL 2756/1989 Maurlio Ferreira Lima Dispe sobre a promoo da cultura nacional eregional e a regionalizao da produo cultural,artstica e jornalstica na programao dasemissoras de rdio e televiso e d outrasprovidncias.

    Proposio inativa

    PL 2824/1989 Luiz Soyer Disciplina a regionalizao de programas nasemissoras de rdio e televiso Artigo 221, incisoIII da Constituio.

    Proposio inativa

    PL 3947/1989 Paulo Ramos Regulamenta o artigo 21 da constituio federal e Proposio inativa

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    Proposio Autor Ementa Situaod outras providncias.

    PL 4304/1989 Carlos Alberto Cao Estabelece diretrizes para a regionalizao daprogramao artstica e cultural das emissoras deteleviso.

    Proposio inativa

    PL 3919/1989 Mauricio Fruet Regula o disposto no inciso III do Artigo 221 daConstituio Federal.

    Proposio inativa

    PL 4305/1989 Carlos Alberto Cao Estabelece diretrizes para a regionalizao daproduo jornalstica em televiso.

    Proposio inativa

    PL 5212/1990 Bete Mendes Dispe sobre os recursos destinados industriacinematogrfica brasileira e d outras providncias.

    Proposio inativa

    PL 5803/1990 Rosario Congro Neto Disciplina, nos termos dos Artigos 220 e 221 daConstituio Federal, a produo, programao eresponsabilidade da informao atravs dosveculos de comunicao social e d outrasprovidncias

    Proposio inativa

    g) Estado, setor privado e sociedade promovam uma efetivauniversalizao do acesso s comunicaes

    Na mdia nacional, cerca de 90% dos lares brasileiros possuem pelomenos um aparelho de rdio e/ou televiso12. Alm disso, a cobertura de nossa maior rede deteleviso, a Rede Globo, de virtualmente 100% dos municpios do Pas. Contudo, essesnmeros encobrem algumas idiossincrasias do setor de radiodifuso. A primeira delas: na regioNorte, a mdia de lares com aparelhos de rdio e/ou televiso cai para cerca de 50% a 60%,mostrando que h uma grande disparidade regional no acesso a esses meios de comunicao. Asegunda: apenas cerca de 50% dos municpios brasileiros contam com alguma programao localde rdio e televiso13. E finalmente: em apenas 465 municpios h a disponibilidade de TV porassinatura (excetuando DTH, sistema por satlite disponvel em todo o territrio)14 sopotencialmente 90,8 milhes de pessoas que vivem em reas atendidas, porm o nmero efetivode assinantes um pouco inferior a 6,5 milhes15.

    Tais dados sugerem que a universalizao do acesso s comunicaes, emtodas as suas plataformas, um esforo que deve envolver Estado, setor privado e sociedade, nabusca de programas que possam promover a incluso social no campo da informao. Projetos deincluso, desse modo, devem estar presentes na legislao de comunicaes. preciso que essediploma legal estabelea mecanismos que possam diminuir as grandes desigualdades que existemno pas no que concerne ao acesso s comunicaes.

    12 PPA 2004-2007, programa Universalizao da comunicao eletrnica de massa.13 Fonte: Ministrio das Comunicaes14 Fonte: Anatel - Dados Estatsticos dos Servios de TV por Assinatura, julho de 2009. Disponvel emhttp://www.anatel.gov.br/Portal/verificaDocumentos/documento.asp?numeroPublicacao=232842&assuntoPublicacao=Dados%20Estat%EDsticos%20dos%20Servi%E7os%20de%20TV%20por%20Assinatura%20-%20Cap.%2001%20-%2038.%AA%20Edi%E7%E3o&caminhoRel=null&filtro=1&documentoPath=232842.pdf15 Fonte: Associao Brasileira de TV por Assinatura Levantamento Setorial Operadoras, 2 trimestre de 2009.Disponvel em http://www.abta.org.br/LinkClick.aspx?fileticket=Rf5UsEWkFs8%3d&tabid=109&mid=555

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    h) Controle de propriedade

    As atuais regras estabelecidas pelo Decreto-Lei 236/67 so insuficientespara se combater o monoplio e o oligoplio nas comunicaes, havendo, desse modo, umcontumaz desrespeito aos princpios constitucionais que probem a concentrao de mercado nosetor. Adicionalmente, a estranha interpretao que o Ministrio das Comunicaes d ao DL236/67 - ao fazer um controle de propriedade por scio e no por empresa -, bem como aformao de cadeias por meio de afiliadas ligadas s cabeas de rede apenas por meio de contratode cesso de programao potencializam ainda mais o monoplio e o oligoplio nascomunicaes brasileiras, notadamente na televiso.

    Um bom termmetro dessa concentrao pode ser dado pelos ndices deaudincia e pela participao das grandes redes de televiso no total de verbas do mercadopublicitrio destinada a anncios nessa mdia. Cabe ressaltar que, no ano de 2008,aproximadamente 58,8% das verbas totais de publicidade foram destinados televiso, algo queem valores absolutos significa um investimento em torno de R$ 14 bilhes dos R$ 23,3 bilhesinvestidos em publicidadade no Brasil16. A tabela abaixo traz os seguintes dados acerca deaudincia e distribuio de verbas de publicidade destinadas TV aberta:

    Tabela 2: Mercado de televiso no Brasil: audincia composta (sete dias da semana, das 7 s 24 horas) e distribuio

    de verbas publicitrias:

    Empresa Emissoras(participaosocietria)17

    Geradoras eafiliadas18

    Audincia19 Participao nasverbas

    publicitrias20

    Rede Globo 32 113 53,4% 75%SBT 10 97 21,3% 21%Record 12 68 7,6% ---Bandeirantes 21 47 5,2% ---Rede TV! --- --- 3,2% ---Outras --- --- 9,3% ---

    Junte-se a esse quadro a existncia de fortes traos de propriedadecruzada no mercado de comunicaes. De modo geral, os cabeas desses conglomerados, quedetm a posse de diversos aparatos de comunicao de massa (jornais, revistas, rdio, televiso,provedores de internet, etc.) so justamente esses grupos de mdia televisiva. Desse modo, pode-se inferir que a legislao de comunicaes deve ser capaz no apenas de minorar a concentrao 16 Fonte: Mdia Dados Brasil 2009, Grupo de Mdia de So Paulo.17 Fonte: Lima, 2001, p. 100.18 Fonte: Lima, 2001, p. 100.19 Fonte: Cadeia de Valor da TV aberta no Brasil Projeto Sistema Brasileiro de Televiso Digital, Modelo deImplantao, 2004, p. 18.20 Fonte: Sites institucionais das empresas.

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    no setor de comunicao eletrnica, notadamente na TV, como tambm em toda a comunicaosocial, tendo em vista a grande concentrao gerada pela propriedade cruzada dos meios.

    i) Mudana das regras de pontuao ponderada nas licitaes deradiodifuso comercial

    Nas concorrncias ocorridas entre os anos de 1997 e 2002, 93,48% dasentidades vencedoras foram aquelas que apresentaram a melhor proposta de preo. Em 1,77%dos casos, venceram aquelas que tinham tanto a melhor proposta tcnica quanto de preo. E emapenas 4,75% das concorrncias, venceu um grupo que no tinha a melhor proposta de preo,mas havia recebido melhor pontuao na avaliao tcnica (LOPES, 2008). Ou seja: de acordocom as regras atuais, dadas primordialmente pelo Decreto n 2.108, de 1996, h um predomnioabsoluto da proposta de preo como definidora do vencedor das concorrncias para a outorga deradiodifuso comercial.

    Com a preponderncia do critrio financeiro para a obteno deconcesses, esto sendo privilegiados empresrios que j atuam no setor, que dispem deexperincia e de recursos para operar novas emissoras. Com isso, esto sendo preteridos projetosque podem contribuir para uma maoir democratizao das comunicaes, para a melhoria daqualidade do contedo do rdio e da televiso e para a regionalizao da produo decomunicao eletrnica.

    Portanto, urgente uma reviso do sistema de avaliao das propostastcnicas e de preo nas licitaes de radiodifuso comercial. necessrio que o Poder Pblicoestabelea critrios que deem maior peso s propostas tcnicas, de modo a privliegiarempreendimentos que pretendam contribuir para a melhoria da qualidade do rdio e da televisono Pas.

    j) Estabelecimento de regras mais explcitas para a outorga deemissoras de radiodifuso educativa

    O Decreto-Lei n 236, de 27 de fevereiro de 2007, foi o primeirodiploma legal que previu a prestao dos servios de radiodifuso educativa. Em seu art. 13,estabeleceu o seguinte:

    Art. 13 A televiso educativa se destinar divulgao de programaseducacionais, mediante a transmisso de aulas, conferncias, palestras e debates.

    Pargrafo nico: A televiso educativa no tem carter comercial, sendo vedada atransmisso de qualquer propaganda, direta ou indiretamente, bem como o patrocniodos programas transmitidos, mesmo que nenhuma propaganda seja feita atravs dosmesmos.

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    Mais frente, o 2 do art. 14 estabelece que:

    Art. 14 (...)

    1 (...)

    2 A outorga de canais para a televiso educativa no depender da publicao doedital previsto no art. 34 do Cdigo Brasileiro de Telecomunicaes.

    Tornou-se, portanto, dispensvel a comunicao a eventuais interessadosde que o Poder Pblico pretendia outorgar uma determinada emissora de radiodifuso educativa.Lembre-se que, nesta poca, tambm no era necessria a realizao de licitao para a outorga deemissoras comerciais. Contudo, nesse ltimo caso, deveria haver uma publicao de edital,conclamando todos os interessados a apresentarem a documentao necessria, sendodiscricionria a deciso sobre quem seria agraciado com uma outorga.

    Posteriormente, em 1995, o Decreto n 1.720 (revogado pelo Decreto n2.108, de 1996) mudou diversos pontos do regulamento dos servios de radiodifuso, quase todosrelativos poltica de concesses e permisses de rdio e TV. A mudana mais importante foi oestabelecimento de que a partir daquele momento, a outorga de radiodifuso comercial seriaprecedida de procedimento licitatrio, observadas as disposies legais e regulamentares.

    A exigncia de licitao atingiu apenas a radiodifuso comercial. Aradiodifuso educativa seguiu sem exigir a publicao de edital, bem como a realizao deprocedimento licitatrio. O principal resultado foi a manuteno, na radiodifuso educativa, dautilizao de outorgas como moeda de barganha poltica algo que havia caracterizado tambm aradiodifuso comercial nas dcadas anteriores exigncia de licitaes.

    Uma srie de reportagens publicadas no ano de 2002 pelo jornal Folha deSo Paulo, por exemplo, mostrava que no governo de Fernando Henrique Cardoso haviam sidoautorizadas, at a data da publicao, 357 outorgas educativas sem licitao, sendo que pelomenos 23 foram para polticos. Posteriormente, em 2006, uma matria publicada pelo mesmojornal mostrava que sete concesses de TV e 27 permisses de rdios educativas haviam sidooutorgadas a fundaes ligadas a polticos.

    H, sem dvida, uma brecha criada pela inexistncia de critrios objetivospara a outorga de emissoras de radiodifuso educativa. Essa brecha termina por gerar umautilizao patrimonialista deste tipo de outorga, e este foi um dos motivos que levaram decisoda Justia Federal de Gois, por exemplo, de proibir novas outorgas sem licitao.

    Contudo, entendemos que a utilizao do critrio de licitaes, sob odomnio de uma melhor proposta financeira, refora a estrutura j vigente e mantm ofuncionamento da radiodiufuso sob bases comerciais. Com isso, fecham-se os espaos quedeveriam ser destinados a operaes alternativas da radiodifuso, que tenham no a busca pelo

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    lucro como principal motivador, e sim a prestao de um servio pblico de qualidade, voltadopara a disseminao de cultura, cidadania e educao.

    certo que algum mtodo concorrencial, mais democrtico e baseadono em propostas financeiras, mas tcnicas, necessrio na radiodifuso educativa. H que segerar tambm um modelo mais transparente, com critrios previamente estabelecidos para aavaliao das propostas apresentadas ao Poder Pblico pelos interessados em prestar os serviosde radiodifuso educativa. Tambm primordial que seja observada, de fato, a preferncia para aoutorga de rdios e TVs educativas a universidades e instituies de ensino, como determinaatualmente o Decreto-Lei n 236, de 1967.

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