reflexoes sobre a problematica da lavagem de dinheiro · pdf file6 resumo a presente...

120
1 Juliana Vieira Saraiva de Medeiros Reflexões Sobre a Problemática da Lavagem de Dinheiro Universidade Metodista de Piracicaba Mestrado em Direito Piracicaba 2007

Upload: lebao

Post on 16-Feb-2018

231 views

Category:

Documents


1 download

TRANSCRIPT

Page 1: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

1

Juliana Vieira Saraiva de Medeiros

Reflexões Sobre a Problemática da Lavagem de Dinhei ro

Universidade Metodista de Piracicaba

Mestrado em Direito

Piracicaba

2007

Page 2: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

2

Juliana Vieira Saraiva de Medeiros

Reflexões Sobre a Problemática da Lavagem de Dinhe iro

Dissertação apresentada à Banca Examinadora do Curso de Pós Graduação em Direito da Universidade Metodista de Piracicaba, como exigência parcial à obtenção do título de Mestre em Direito. Orientadora: Dra. Ana Lucia Sabadell

Universidade Metodista de Piracicaba Piracicaba

2007

Page 3: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

3

Reflexões Sobre a Problemática da Lavagem de Dinhei ro

Juliana Vieira Saraiva de Medeiros

BANCA EXAMINADORA

.................................................................... Profa. Ana Lucia Sabadell

Orientador(a)

................................................................... Prof. Antonio Isidoro Piacentin

................................................................... Profa. Maura Roberti

Page 4: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

4

À minha mãe Rosa Maria Vieira de

Medeiros, que de algum lugar está sempre a

me proteger;

Ao meu pai Walter Saraiva, por ser um

vencedor.

Page 5: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

5

Agradecimentos

Em primeiro lugar, devo agradecer ao meu pai, Walter Saraiva de Medeiros, além de meus

irmãos Rafael e André, ao meu filho Henrique e ao meu esposo Gilberto por tudo que

conquistei até hoje e por toda convivência harmônica que uma família deve ter.

À professora Ana Lucia Sabadell, orientadora sempre prestativa, sempre acessível, por toda

ajuda dispensada e pela paciência na elaboração do trabalho.

Aos professores do Curso de Mestrado em Direito, pela convivência rica e pelo aprendizado

valioso.

Agradeço também imensamente ao Professor Antonio Isidoro Piacentin e a Professora

Maura Roberti, membros da banca, pela valiosa contribuição.

À amiga Nilce Maciel, que desde os tempos de graduação, sempre estimulou minha

vocação para a pesquisa do direito e nunca negou ajuda quando foi preciso.

Ao amigo Cássio Vinícios Prestes, pelo incentivo e idéias sugeridas ao longo do curso de

mestrado.

Às secretárias do Curso de Mestrado, Angelise, Dulce e Sueli, as quais com palavras e

gestos, nos ofertaram o necessário incentivo, sempre bem vindo para quem se dispõe a

realizar trabalho que, embora gratificante, requer alentado esforço físico e intelectual.

Por fim, a todos os amigos, de hoje e de sempre, Mônica, Marisa, Maria Fernanda, Maria

Aparecida Nóbrega, Selenita, Rafaela, Ráldina, Vânia, Glória, Simone, Celeste, Beth, Ana,

Cláudia, André, Ricardo, Gilberto, Reinaldo, enfim, a estes e àqueles que não foram

nominados, mas que fazem parte da minha vida.

Page 6: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

6

Resumo

A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de

lavagem de dinheiro, regulado em nosso ordenamento jurídico na lei n. 9613/98.

Esse crime pode ser definido como o processo ou conjunto de operações mediante

o qual os bens ou o dinheiro resultantes de atividades delitivas, ocultando tal

procedência, integram-se no sistema econômico e financeiro. O estudo será iniciado

com a análise do crime organizado: um fenômeno criminoso diretamente relacionado

à prática da lavagem de dinheiro. Neste aspecto, há várias convenções e tratados

internacionais que sugerem a criminalização da lavagem de dinheiro como um

instrumento para a eliminação das organizações criminais. Um dos mais importantes

documentos sobre esse assunto é a Convenção de Viena, datada em 1988, na qual

há regras estabelecidas para os países signatários. Devido ao comprometimento

internacional, a lei n. 9.613/98 definiu o crime e muitas disposições acerca do

procedimento criminal e do direito administrativo. No crime descrito no artigo 1º, há a

apresentação de uma lista taxativa de crimes precedentes que poderão dar ensejo a

lavagem de dinheiro. Dessa forma tentaremos abordar os aspectos mais relevantes

da Lei 9.613/98, enfocados à luz do Direito Penal e Processual Penal, sem o

desconhecimento da força das normas constitucionais sobre todo o ordenamento

jurídico vez que adotado modelo processual penal balizado pelo Estado Democrático

de Direito.

Page 7: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

7

Abstract

The goal of this study is to research the crime of money laundering which was

described in the Law n. 9.613/98. This crime can be defined as the concealment,

disguise of the true nature, source, location, movement of assets derived from certain

crimes as provided for in the article 1 of the above-mentioned Law. The limits of the

study of such crime are related to the exam of anterior unlawful activities. Therefore,

the analysis is started with the organized crime: a criminal phenomenon directly

related to money laundering practice. In that sense, there are several international

conventions and treaties, which suggest the criminalization of money laundering as

an instrument to eliminate the criminal organizations. One of the most important

documents with regard to this subject is the Convention of Viena dated as of 1988, in

which there are rules established to its parties. In view of such international

commitment, the Law 9.613/98 has defined a crime and many dispositions regarding

to criminal procedure and administrative right. In the crime described in the article 1,

there is the presentation of a restricted list of anterior unlawful activities which able to

generate assets subject to money laundering. Of this form we will try to approach the

aspects most excellent of Law 9,613/98, focused to the light of Criminal the Criminal

law and Procedural, without the unfamiliarity of the force of the constitutional ruleses

on all the legal system time that adopted criminal procedural model marked out with

buoys by the Democratic State of Right.

Page 8: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

8

Sumário

1. Introdução ............................................................................................................11

2. Lavagem de dinheiro: aspectos de política crimin al e conceituação

2.1.Conceito de lavagem de dinheiro – Precisões terminológicas.............................15

2. 2.As fases do processo de lavagem......................................................................17

2.3. Conceito..............................................................................................................20

3. Aspectos políticos criminais do tema ................................................................22

3.1. Lavagem de dinheiro e sua relação com a criminalidade

organizada.................................................................................................................22

3.2. Globalização e o delito de lavagem de dinheiro..................................................27

3.3. Métodos empregados no branqueamento de capitais........................................29

4. Tratamento Jurídico do branqueamento de capitais ........................................32

4.1. A criação de um regime internacional regulador do delito de lavagem de

dinheiro.......................................................................................................................32

4.1.1.Convenção das Nações Unidas sobre drogas de 1988 – Convenção de

Viena..........................................................................................................................33

4.1.2. Convenção do Conselho da Europa sobre o branqueamento de

1990............................................................................................................................35

4.1.3.A diretiva da Comunidade Européia..................................................................36

4.1.4. O Grupo de Ação Financeira GAFI..................................................................38

Page 9: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

9

4.1.5.As iniciativas da Organização dos Estados Americanos para afrontar a

problemática da lavagem de dinheiro........................................................................39

5. O delito de lavagem de dinheiro no Brasil .........................................................41

5.1. Legislação sobre lavagem no Brasil....................................................................43

5.1.1 Lei 9.613 de 03.03.1998....................................................................................43

5.2.2.Lei 10.701 de 09.07.2003..................................................................................50

6. O bem jurídico protegido pelo crime de lavagem d e dinheiro .........................52

6.1. Do bem jurídico: Conceito...................................................................................52

6.1.1.Conclusão sobre o conceito de bem jurídico no direito penal...........................58

6.2. O bem jurídico tutelado no delito de lavagem de dinheiro .................................59

6.2.1. O mesmo bem jurídico protegido pelo crime antecedente ou proteção

preventiva dos bens jurídicos tutelados no rol de crimes

antecedentes..............................................................................................................60

6.2.2. Administração da Justiça..................................................................................62

6.2.3. Ordem econômica............................................................................................65

6.2.4. Pluralidade de bens .........................................................................................72

6.2.5. Ausência de bem jurídico ................................................................................73

7. Tipo Objetivo e crime Antecedente ....................................................................75

7.1.Objeto material do crime de lavagem de dinheiro................................................75

7.2.Crime antecedente:O problema do delito prévio..................................................78

7.2.1. Tipos de crimes antecedentes na Lei 9.613/98 ( com as alterações das leis

10.467/2002 e 10.701/2003) .....................................................................................78

Page 10: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

10

7.2.2.O problema da acessoriedade em relação ao delito de lavagem.....................81

7.2.3. Crime antecedente cometido no estrangeiro...................................................83

7.2.4. A problemática da prova do delito prévio ........................................................84

7.2.5. Indícios suficientes da existência do crime antecedente – considerações em

relação ao art. 2º, § 1º, da Lei 9.613/98.................................................................... 86

8. Tipo subjetivo .......................................................................................................90

8.1. Lavagem de dinheiro: Tipo doloso......................................................................90

8.2. Grau de conhecimento do crime antecedente....................................................92

8.3. O sujeito ativo do crime de Lavagem de Capitais...............................................95

9. Conclusões . .........................................................................................................98

Referências ............................................................................................................110

Page 11: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

11

1. Introdução

O crime organizado, a lavagem de dinheiro e a corrupção são elementos de

grande atualidade, pautando as políticas públicas da maioria das nações e

inserindo-se entre temas de destaque na construção da dogmática e da política

criminal.

A globalização e o desenvolvimento da economia internacional criaram novos

desafios para a sociedade. Nesse contexto, a lavagem de dinheiro passou a ser

objeto de interesse crescente no âmbito da economia mundial. Logo, o combate a

esse tipo de ação assumiu fundamental importância em razão das conseqüências

financeiras e sociais deles advindas. 1

A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do

crime de lavagem de dinheiro, identificando a influência das recomendações

internacionais no ordenamento jurídico brasileiro, e analisando os aspectos da Lei

9.613/1998, enfocados à luz do Direito Penal e Processual Penal, sem o

desconhecimento da força das normas constitucionais sobre todo o ordenamento

jurídico vez que adotado modelo processual penal balizado pelo Estado Democrático

de Direito.

Trata-se de lei que na verdade não foi idealizada em território nacional. Teve

discussão por longo período na comunidade internacional a partir da constatação

das graves conseqüências causadas pela lavagem de dinheiro, derivada

principalmente do trafico ilícito de entorpecentes.

1 Nesse sentido, segundo José de Faria Costa: “ a lavagem de dinheiro mostra-se como um novo passo no processo contemporâneo de criminalização. Afinal, é recente a necessidade de criar infração penal, a qual caracterize a ocultação ou dissimulação de bens provenientes do tráfico ilícito de entorpecentes e crimes afins”. FARIA COSTA, José de. O branqueamento de Capitais – Algumas reflexões à luz do direito penal e da política criminal. Direito Penal Económico e Europeu: textos Doutrinários. Coimbra: Editora Coimbra, 1999, p. 320.

Page 12: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

12

A desaprovação geral sobre o fenômeno da lavagem de dinheiro traduziu-se

não apenas na aprovação de medidas legislativas por parte de diferentes países,

senão também na adoção de iniciativas em nível internacional com o objetivo de

impulsionar uma harmonização das legislações dos mais diversos países.2

Foi em uma Convenção das Nações Unidas, realizada em Viena, Áustria, em

1988, que foram adotadas as primeiras medidas para o combate do narcotráfico e

lavagem de dinheiro. O objetivo do documento internacional era atacar o tráfico de

entorpecentes através do lucro ilícito obtido pela atividade. Aos países signatários

caberia reprimir e combater a reciclagem da riqueza proveniente do tráfico de

entorpecentes, conforme estabelecera a Convenção. Seu objetivo era dar “efetiva

aplicação ao clássico princípio da justiça penal universal que fixa seus parâmetros

em conformidade com os tratados e convenções firmados como estratégia de uma

política criminal transnacional”.

O Brasil ratificou a Convenção de Viena através do decreto nº 154, de 26 de

junho de 1991.

O legislador pátrio compreendeu a lavagem de forma mais ampla que a

Convenção de Viena. O legislador pátrio optou por vários crimes antecedentes, ao

invés apenas do tráfico de drogas. O rol do art. 1. º da Lei 9.613/98 traz os seguintes

delitos: tráfico ilícito de substâncias entorpecentes ou drogas afins; terrorismo e seu

financiamento; contrabando ou tráfico de armas, munições ou material destinado à

sua produção; extorsão mediante seqüestro; crimes contra a administração pública;

crimes contra o sistema financeiro nacional; crimes praticados por organização

2 O tratamento jurídico dispensado ao delito em estudo, será exposto no quarto capítulo, onde serão apontados os principais instrumentos internacionais que regulam o tema. Em seguida, apresentaremos alguns comentários á lei 9.613/1998, que regulou a lavagem de dinheiro no Brasil.

Page 13: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

13

criminosa; crimes praticados por particular contra a administração pública

estrangeira.3

Também será objeto desta dissertação, precisamente no sexto capítulo, um

estudo sobre a teoria do bem jurídico, dentro dos limites didáticos cabíveis ao

trabalho. Assim, modela-se um conceito de bem jurídico em suas dimensões

dogmática e político-criminal. Por entender ser insuficiente um conceito puramente

dogmático, aplica-se o conteúdo político-criminal para a determinação do bem a ser

tutelado, traçando-se as bases de legitimação para a incriminação de uma lesão a

um interesse.

O sétimo capítulo apresenta as teorias doutrinárias que buscam explicar o

bem jurídico tutelado. Parte da doutrina concentra seus argumentos na ordem

econômica; outra, na administração da justiça, além de apresentar outros

posicionamentos. Cada teoria será desenvolvida, com seus respectivos

fundamentos, visando à posterior crítica fundamentada acerca de suas idéias.

Nos capítulos subseqüentes passaremos a analisar itens pertinentes ao tipo

objetivo do delito de lavagem, em especial a problemática do delito prévio. Serão

discutidos temas polêmicos tais como: o da acessoriedade em relação ao delito de

lavagem; o grau de execução do delito prévio; a questão do crime antecedente

praticado no estrangeiro; a independência do processo e julgamento do crime de

lavagem em relação ao processo e julgamento do crime antecedente; e a questão

da possibilidade da denuncia ser instruída com “indícios suficientes da existência do

crime antecedente”.

No oitavo e último capítulo será analisado o tipo subjetivo do delito de

lavagem. Desde logo, cumpre ressaltar que a Lei 9613/1998 contém tão somente 3 Em outros países, como veremos mais adiante, estabeleceu-se um método mais abrangente em relação aos delitos prévios, incluindo, por exemplo, todos aqueles provenientes de qualquer crime grave.

Page 14: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

14

tipos dolosos, já que inexiste modalidade culposa. Ainda neste item analisaremos o

grau de conhecimento do crime antecedente e o momento deste conhecimento.

Esclarecemos, finalmente, que o presente trabalho não tem como escopo o

debate pontual dos aspectos processuais da lei de lavagem de capitais, bem como

as penas cominadas4 ao referido delito.

4 As penas são bastante severas. Serão de reclusão, variando de três a dez anos, com previsão de multa (preceito secundário do art. 1º). Além disso, a pena poderá ser aumentada de um a dois terços, conforme o §4º do art. 1º. A resposta penal é, portanto bastante pesada e limitará uma série de benefícios processuais. Resta saber se o estabelecimento de um quantum tão elevado contribuirá para criação efetiva de um efeito preventivo geral. Como demonstra a experiência internacional evitar a impunidade e aplicar efetivamente a lei e seus regulamentos é algo mais importante do que a previsão de altas penas como artifício preventivo.

Page 15: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

15

2. Lavagem de dinheiro: aspectos de política crimin al e conceituação.

2.1 Conceito de lavagem de dinheiro - Precisões ter minológicas

A expressão lavagem de dinheiro (money laundering) teve origem na década

de vinte, nos Estados Unidos, época em que as máfias norte-americanas criaram

uma rede de lavanderias, para ocultar a origem ilícita do dinheiro obtido com suas

atividades criminosas. Já em âmbito judicial, o termo lavagem foi empregado pela

primeira vez em 1982, em um tribunal dos Estados Unidos, no curso de um processo

que denunciava a lavagem de dinheiro oriundo do tráfico de cocaína colombiana.5

É de se observar que não é uniforme a terminologia empregada entre os

diversos países. Como exemplos, anote-se que na França e na Bélgica fala-se

blanchiment d’argent; na Itália riciclaggio del denaro; na Espanha blanqueo de

capitales ou blanqueo de dinero; em Portugal branqueamento de dinheiro.6

Alguns doutrinadores criticam esta terminologia alegando que não obedece a

um rigor técnico exigível na construção de um tipo legal, sendo uma expressão

popularesca, oriunda do linguajar das ruas, razão pela qual sua utilização poderia

ser adequada para figurar na página policial do noticiário jornalístico, mas não em

um dispositivo integrante do ordenamento jurídico de um país.7

5 BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitales. Navarra: Arazandi, 2ªed, 2002, p.86. 6 BARROS, Marco Antonio de. “Lavagem” de Capitais e obrigações civis correlatas. São Paulo:Editora Revista dos Tribunais, 2004, p. 22-30. 7 Cfr: ÁLVAREZ PASTOR, Daniel e EGUIDAZU, Fernando Palacios. La prevención del blanqueo de capitales. Pamplona : Arazandi, 1998., p.41 BAJO FERNÀNDEZ, Miguel. Derecho Penal Economico, Proteción Penal y Cuestiones Político Criminales, en Hacia un Derecho Penal Europeo – Jornadas en Honor del Profesor Klaus Tiedemann. Madrid: Boletín Oficial del Estado, Serie Derecho Publico, nº4, 1995, p.146;BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitales. Navarra: Arazandi, 2ªed, 2002, p.82-84.

Page 16: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

16

Seguindo esta orientação, alguns autores sugerem outras expressões para

substituir os termos “lavagem” ou “branqueamento”, tais como: regularização,

reconversão, reinvestimento e normalização de capitais de origem delitiva.8

O legislador brasileiro optou pelo nomen iuris crimes de lavagem ou ocultação

de bens, direitos e valores (Lei 9.613/1998), fundamentando a escolha em duas

razões9. Primeiro, a lavagem de dinheiro estaria “consagrada no glossário das

atividades financeiras e na linguagem popular, em conseqüência de seu emprego

internacional10 (money laundering)” e segundo porque se optasse pelo termo

“branqueamento” sugeriria a “interferência racista do vocabulário, motivando estéreis

e inoportunas discussões”.11

Percebe-se, no entanto, que o texto legal não repetiu o neologismo “lavagem

de dinheiro”, e sim lavagem de “bens, direitos e valores”, com claro intuito de ampliar

a aplicação da lei penal.

Na seqüência, passaremos a analisar as fases ou técnicas empregadas no

processo de lavagem, sistematizadas pela doutrina e por organizações

internacionais.

8 Nesse sentido: Diéz Ripollés, Vidales Rodríguez, Ruiz Vadillo , Blanco Cordero, Abel Souto. 9 Essas justificativas encontram-se na Exposição de Motivos n. 692, de 18.12.1996, publicada no Diário do Senado Federal, de 25.11.1997, p.25.671. 10 Entre os instrumentos internacionais, assumidos pelo Brasil, que empregam o termo lavagem estão: A XXII Assembléia Geral da Organização dos Estados Americanos, realizada na Bahamas, entre 18 e 23.05.1993, representantes brasileiros aprovaram O Regulamento Modelo sobre delitos de lavagem relacionados com o tráfico ilícito de drogas e delitos conexos, elaborado pela Comissão Interamericana para o Controle do abuso de Drogas – CICAD. Em dezembro de 1994, na reunião da “Cúpula das Américas”, em Miami, o governo brasileiro firmou o Plano de Ação, com a finalidade de ratificar a aludida Convenção de Viena e sancionar como ilícito penal “a lavagem de dinheiro de rendimentos gerados por todos os crimes graves”; Na Conferência Ministerial sobre a Lavagem de Dinheiro e Instrumento do Crime, em 02.12.1995 na cidade de Buenos Aires, assinou-se a Declaração de Princípios, quanto à tipificação da lavagem, fazendo-se alusão a delitos graves relacionados, ou não, com o tráfico de drogas. 11 PITOMBO, Antonio Sergio A. de Moraes. Lavagem de dinheiro: a tipicidade do crime antecedente. São Paulo: Editora revista dos tribunais, 2003, p. 21.

Page 17: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

17

2.2. As fases do processo de lavagem

A observação prática dos mecanismos12 que empregam as organizações

criminais para a lavagem de dinheiro permitiu aos doutrinadores distinguirem três

fases: conversão ou ocultação, dissimulação ou mascaramento e integração.13

A conversão, também chamada de ocultação, é a fase na qual o dinheiro,

obtido diretamente com a atividade criminosa, passa por sua primeira

transformação, visando a conseguir uma menor visibilidade.14

Os agentes criminosos procuram desembaraçar-se materialmente das

grandes somas de dinheiro que foram geradas ilicitamente. Aqui a preocupação é

despersonalizar o proveito do crime fazendo-o desaparecer de sua posse direta.

O montante arrecadado é normalmente trasladado a uma zona ou local

distinto daquele em que se arrecadou, em continuação, costuma utilizar o sistema

financeiro, os bancos, corretores de bolsas, casa de câmbio, o mercado de jóias e

obras de arte etc.15

A segunda fase denomina-se dissimulação ou mascaramento. A função

principal desta fase consiste em distanciar ao máximo o dinheiro de sua origem,

12 Sobre técnicas de lavagem praticadas e investigadas por unidades de inteligência financeira internacionais, recomenda-se a leitura das publicações do COAF: Cem casos de lavagem de dinheiro, Grupo EGMONT-FIU em ação e financiamento do terrorismo – 20 casos coletados pela GAFI e EGMONT, cujos textos são disponibilizados em : http://www.coaf.gov.br 13 Cfr. Entre outros: FARIA COSTA, José de. O branqueamento de Capitais – Algumas reflexões à luz do direito penal e da política criminal. Direito Penal Económico e Europeu: textos Doutrinários. Coimbra: Editora Coimbra, 1999, p. 305; SOUTO, Miguel Abel. El blanqueo en la normativa internacional. Serviço de Publicación e intercambio Científico da Universidade de Santiago de Compostela, 2002, p. 28-30; BARROS, Marco Antonio de. “Lavagem” deCapitais e obrigações civis correlatas. São Paulo:Editora Revista dos Tribunais, 2004, p.43; PINHEIRO, Luís Góes. O branqueamento de capitais e a globalização. Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 12, nº.4, outubro-dezembro – 2002. Coimbra: Editora Coimbra, 2002, p. 608; PITOMBO, Antonio Sergio A. de Moraes. Lavagem de dinheiro: a tipicidade do crime antecedente. São Paulo: Editora revista dos tribunais, 2003, p. 81; GOMES, Luiz Flavio; OLIVEIRA, William Terra de; CERVINI, Raúl. Lei de Lavagem de Capitais. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998, p. 83; BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitales. Navarra: Arazandi, 2ªed, 2002;PODVAL, Roberto. O bem jurídico do delito de lavagem de dinheiro. Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo: Editora revista dos Tribunais, nº 24, ano 6, 1998, p. 212. 14 PASTOR, Daniel Alvarez; PALACIOS, Fernando Eguidazu. La prevención del blanqueo de capitales. Aranzandi, 1998, p. 45 ess. 15 Ibidem.

Page 18: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

18

apagando os vestígios de sua obtenção, razão pela qual é usual o recurso à

superposição e combinação de complicadas operações financeiras16, o que torna

extremamente difícil para as autoridades, detectar estes fundos.17 Quanto mais

transações são feitas, mais o capital ganha aparência de lícito. Este processo

também é conhecido como mimetização.

Nesta etapa, a conduta se reveste de várias e sucessivas operações e

transações econômico-financeiras, realizadas inclusive para os chamados paraísos

fiscais18, feitas com o emprego de meios eletrônicos e com o propósito de disfarçar e

diluir a ilícita origem do dinheiro sujo, sendo então utilizadas muitas contas

bancárias, investimentos diversificados, aplicações em bolsas, envolvendo a

participação de pessoas físicas e jurídicas empenhadas em camuflar os ativos

ilícitos.19

Finalmente, o dinheiro deve retornar ao circuito financeiro legal, sendo esta a

terceira fase chamada de integração.

A integração consiste em reinserir os lucros e os bens criminalmente obtidos

na economia legal, sem levantar suspeitas ou outorgar-lhes uma aparência de

legitimidade em relação a sua origem. Assim, os procedimentos de integração

situam os valores obtidos com a lavagem na economia de tal forma que, integrando-

se no sistema bancário, aparecem como produto normal de uma atividade

comercial.20

16 Sobre técnicas de mascaramento, ver em Eduardo Fabian Caparros. El delito de balnqueo de capitales. Colex, 1998, p. 123. 17 RODRIGUEZ, Caty Vidales. Los delitos de receptación y legitimación de capitales en el Código Penal. Valencia: Tirant lo blanch, 1997, p. 74. 18 Paraíso fiscal é a denominação atribuída ao país que não interfere ou, quando muito, interfere minimamente, no plano tributário, nas atividades e transações comerciais e financeiras de caráter internacional, permitindo que elas se realizem em seu território, sem que, de tais operações, se origine a costumeira obrigação de recolhimento de tributo. São países de baixa tributação. 19 BARROS, Marco Antonio de. “Lavagem” de Capitais e obrigações civis correlatas. São Paulo:Editora Revista dos Tribunais, 2004, 43. 20 BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitales. Navarra: Arazandi, 2ªed, 2002, p. 58-59.

Page 19: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

19

Dentre os métodos empregados, os mais conhecidos pelas autoridades, são:

a venda de bens imóveis, criação de empresas de fachada21, empréstimos

simulados, emissões de faturas falsas de importação e exportação, comercio

cruzado etc.22

No Brasil, o mecanismo mais utilizado para a lavagem de capitais é o das

contas CC5 (contas para não residentes no país). Todo dinheiro ilícito é remetido

para uma conta com nome fictício em um paraíso fiscal, às vezes, passando antes

por algum centro financeiro norte-americano como Nova Iorque e Miami. Abre-se em

seguida uma conta de não residente no Brasil, em banco autorizado, e transfere-se

o dinheiro do paraíso fiscal para o Brasil. Um representante aqui no nosso país, que

pode ser o próprio dono do capital ou algum intermediário, movimenta a conta

normalmente. 23

Outro tipo de artifício é a utilização de cheques pré-datados, que hoje estão

sendo usados em uma nova modalidade de lavagem24. Nestas operações estão

envolvidas empresas de factoring25, constituídas para comprar cheques pré-datados

emitidos no comércio e depositá-los em contas CC5. São cheques de pequeno valor

para escapar da fiscalização do Banco Central, que não exige registro de depósitos

em contas CC5 abaixo de R$10.000,00. Duas cidades são apontadas como

principais centros desse tipo de lavagem: Foz do Iguaçu-PR e Ponta Porá- MS. Um 21 Empresa de fachada é uma organização que só existe na aparência e que participa, ou apresenta participar, do comércio legal. A empresa de fachada pode ate ser uma empresa legítima, que mescla recursos ilícitos com sua própria receita. 22 Sobre estas técnicas ver em , Javier Zaragoza Aguado, Prevencion y represion del blanqueo de capitales. Madrid, Consejo General del Poder Judicial, 2000, p. 134-141. 23 GOMES, Luiz Flavio. Lavagem de capitais como expressão do direito penal globalizado. Estudos criminais em homenagem a Evandro Lins e Silva (Criminalista do Século). São Paulo: Editora Método, 2001, p. 227-231. 24 DUARTE, Maria Carolina de Almeida. A Globalização e os crimes de lavagem de dinheiro: a utilização do sistema financeiro como porto seguro. Ciências Penais – Revista da associação brasileira de professores de ciências penais, ano 1, 2004. São Paulo: Revista dos tribunais, 2004, p. 25 Factoring é a denominação dada a atividade exercidas pelas empresas legalizadas pelos órgãos competentes do governo, que atuam antecipando o faturamento de estabelecimentos comerciais, tais como cheque pré-datados, duplicatas e outros faturamentos. As empresas de factoring antecipam ao comerciante, o seu faturamento, pagando por eles, um valor menor que o de face dos títulos, este diferencial, que é o ganho da factoring é chamado de deságio.

Page 20: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

20

terceiro exemplo são casos de empréstimo internacionais e doações a projetos

sociais e municipais. Prefeitos do interior do país têm recebido propostas de

empréstimos a juros simbólicos ou até de doação de milhões de dólares para

financiar obras sociais. Quem assina são as organizações não-governamentais

(ONGs), entidades filantrópicas ou empresas interessadas em investimentos no

terceiro mundo. Por trás desta generosidade, o governo brasileiro identificou uma

rede especializada em lavagem de dinheiro26.

Vale ressaltar que a maior parte do dinheiro é lavado por mecanismos ainda

desconhecidos pelo poder público. Quando se descobre uma modalidade de

ocultação, a criminalidade já migrou para outro método ainda mais complexo.27

Feitas as considerações sobre as práticas empregadas, discutiremos a seguir

o conceito do delito de lavagem de capitais.

2.3. Conceito

No item anterior, observamos que para concretizar o branqueamento de

capitais, as organizações delituosas utilizam variados métodos que têm sido

catalogados pelos doutrinadores como fases da lavagem. O conhecimento de tais

etapas nos permite definir um conceito para o crime em questão.

Entende-se por lavagem de dinheiro o processo composto por fases

realizadas sucessivamente (ocultação, dissimulação e integração), através do qual o

26 JB Online, disponível em <http:jbonline.terra,com.br>. Acesso em: 3 dez. 2001. 27 Sobre o esquema de lavagem nos paraísos fiscais: Lavanderia no exterior. Disponível em: http://revistaepoca.globo.com/Epoca/0,,EPT1018118-3771,00.html , acesso 26/05/2006.

Page 21: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

21

dinheiro, bens ou valores, sempre de origem ilícita28, integram-se ao sistema

econômico legal com aparência de terem sido obtidos de forma lícita. 29

Como conseqüência desse processo temos a incriminação da conduta

depender, entre outros aspectos, do exame da procedência criminosa dos bens.

Apenas ocorrerá lavagem de dinheiro, quando for encoberta a origem desses bens,

produto ou proveito de um dos crimes antecedentes previstos no art. 1º da Lei

9.613/98. 30

Conceituado o crime, passaremos no próximo item a analisar os aspectos

político-criminais que envolvem o crime de branqueamento de capitais e sua estreita

ligação com a delinqüência organizada.

28 No Brasil a Lei 9613/98, em seu artigo 1º estabelece um rol taxatixo dos delitos prévios. 29 PITOMBO, Antonio Sergio A. de Moraes. Lavagem de dinheiro: a tipicidade do crime antecedente. São Paulo: Editora revista dos tribunais, 2003, p. 21-36. 30 Ibidem.

Page 22: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

22

3. Aspectos político-criminais do tema.

3.1. Lavagem de dinheiro e sua relação com a crimin alidade organizada

A criminalidade organizada movimenta grandes somas de dinheiro, mas que

são inutilizáveis desde que possam deixar pistas relativas à sua origem. Da

necessidade de ocultar e reinvestir o dinheiro obtido, ora para financiar novas

atividades criminosas, ora para aquisição de bens diversos, surge a lavagem de

dinheiro com o fim último de evitar o descobrimento da cadeia criminal e a

identificação de seus autores.31

O desenvolvimento da criminalidade organizada, pelo menos nas últimas

décadas, ocorreu paralelamente a um grande processo mundial de mudanças,

consistente no crescimento de um importante mercado mundial de trabalho,

mercadorias e capitais de caráter ilegal. Armas, drogas, informações industriais e

militares, dinheiro de origem ilícita, materiais radioativos e órgãos humanos, são

entre outros, bens cujo intercâmbio em nível mundial tem gerado um novo setor na

atividade econômica. São bens e serviços que são procurados pelo público, mas

que se encontram proibidos e como existe no mercado uma demanda eles, sua

obtenção se faz de maneira ilícita. Foi neste contexto que se desenvolveram as

organizações delituosas.32

31 Sobre a relação crime organizado e lavagem de dinheiro confrontar entre outros: PASTOR, Daniel Alvarez; PALACIOS, Fernando Eguidazu. La prevención del blanqueo de capitales. Aranzandi, 1998, p. 54; MAIA, Rodolfo Tigre. O Estado desorganizado contra o crime organizado. Rio de Janeiro: Editora Lumem Júris, 1997, p.23; CASTELLAR, João Carlos. Lavagem de Dinheiro - A Questão do Bem Jurídico. Rio de janeiro: Revan, 2004, p.120; BLANCO CORDERO, Isidoro. Criminalidade Organizada y Mercados Ilegales. GUZKILORE – Caderno del Instituto Vasco de Criminologia, n.º 11 – San Sebastian, 1997, p.39-40; INESTA, Diego Gómez. El delito de blanqueo de capitales en derecho español. Barcelona: Cedecs, 1996, p.77-113. 32 BLANCO CORDERO, Isidoro. Criminalidade Organizada y Mercados Ilegales. EGUZKILORE – Caderno del Instituto Vasco de Criminologia, n.º 11 – San Sebastian, 1997, p.77-113.

Page 23: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

23

O Grupo de Ação Financeira (GAFI) revela que as principais fontes de ganhos

ilegais são o tráfico de drogas e os delitos econômicos. Também esclarecem que

grande parte do dinheiro de origem ilegal que ingressa no sistema financeiro,

procede da criminalidade organizada.33

As associações criminosas se caracterizam, na atualidade, por sua elevada

complexidade em nível organizacional, que as convertem em autênticas empresas

criminais, as quais adotam os modelos e estruturas desenvolvidas pelo mundo da

indústria e dos negócios. Tais estruturas têm uma orientação empresarial e

capitalista, e por isso costuma-se dizer que o dirigente do grupo organizado é

também um empresário.34

Em termos conceituais, o crime organizado pode ser caracterizado pela soma

dos seguintes elementos: hierarquia estrutural, planejamento empresarial, claro

objetivo de lucros, uso de meios tecnológicos avançados, recrutamento de pessoas,

divisão funcional de atividades, conexão estrutural ou funcional com o poder público

e/ou com o poder político, oferta de prestações sociais, divisão territorial das

atividades, alto poder de intimidação, alta capacitação para a fraude, conexão local,

regional, nacional ou internacional com outras organizações etc. 35

Os lucros do crime organizado são de tal forma avultados que seu

reinvestimento pode conduzir a desvios e condicionamentos no mercado financeiro,

33 Disponível em www.fazenda.gov.br em 15.10.2005. 34 FARIA COSTA, José de. O branqueamento de Capitais – Algumas reflexões à luz do direito penal e da política criminal. Direito Penal Económico e Europeu: textos Doutrinários. Coimbra: Editora Coimbra, 1999, p.303-310. 35 FARIA COSTA, José de. O branqueamento de Capitais – Algumas reflexões à luz do direito penal e da política criminal. Direito Penal Económico e Europeu: textos Doutrinários. Coimbra: Editora Coimbra, 1999, p. 303-313; ZARAGOZA AGUADO, Javier Alberto. Prevencion y represion del blanqueo de capitales. Madrid, Consejo General del Poder Judicial, 2000.

Page 24: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

24

levando por vezes ao domínio de setores inteiros da economia, e mesmo, com

crescida gravidade, ao controle de certos Estados, por via da corrupção.36

A ONU estima que o crime organizado movimenta em todo o mundo de 2% a

5% do Produto Interno Bruto (PIB) global, um volume de recursos que pode ser

estimado em cerca de US$ 2 trilhões, dos quais, US$1,3 trilhões ingressam no

sistema financeiro para fins de lavagem. 37

Dos US$ 2 trilhões movimentados pelo crime organizado, US$ 1 trilhão está

diretamente associado à corrupção38. O narcotráfico é responsável por um montante

que varia entre US$ 300 bilhões e US$ 400 bilhões, sendo que esse mesmo valor é

associado ao tráfico de armas. O restante equivale a roubo de cargas, contrabando

e tráfico de seres humanos. 39

Essas altas somas de capital, obtidas pelas organizações criminosas,

passaram a circular entre os países, acarretando a ampliação da conexão entre o

crime organizado, a fácil ocultação do resultado econômico dos crimes e a inserção

do dinheiro, de origem ilícita, na economia legal.40

No caso brasileiro, nos últimos anos, tornou-se pública a insuficiência

estrutural dos poderes públicos e do sistema legislativo, para o combate do crime

organizado. Notícias sobre grandes casos de corrupção pública, movimentações

ilícitas de capitais, utilização indevida de verbas públicas e fundos de campanhas

36 BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitales. Navarra, Arazandi, 2ªed, 2002, p. 39. 37 Dados divulgados pelo representante das Nações Unidas no Brasil, Giovanni Quaglia, disponível em: www.unodc.org/brazil/pt/press_release_2004-10-03.html Acesso em 01/05/2007. 38 Diante desses dados verificamos uma mudança no panorama global relacionado ao crime organizado, a maior parte do dinheiro lavado vem da corrupção e não mais do tráfico ilícito de drogas, nos moldes ditados pela Convenção de Viena de 1988. No Brasil dados levantados pela Controladoria Geral da União demonstram que 70% do dinheiro lavado no país são provenientes da corrupção. MACHADO, Maira Rocha; REFINETTI, Domingos Fernando. Lavagem de dinheiro e Recuperação de ativos: Brasil, Nigéria, Reino Unida e Suíça. São Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 111 e ss. 39 Dados disponíveis em www.unodc.org/brazil/pt/press_release_2004-10-03.html Acesso em 01/05/2007. 40 PELLEGRINI, Angiolo; COSTA JUNIOR, Paulo José. Criminalidade Organizada. São Paulo: Jurídica Brasileira, 1999, p. 55 .

Page 25: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

25

políticas tornaram-se freqüentes.41 Segundo a doutrina, a insuficiência normativa,

representada pela falta de tipos penais específicos, favorece a impunidade.42

A lei 9034/95, não obstante tratar exatamente das infrações cometidas por

membros de organizações criminosas, não define o que vem a ser esta modalidade

criminosa, razão pela qual se tornou inviável a aplicação do conceito.43

Doutrinadores brasileiros, quase que unanimemente44, reconhecem que o

artigo 1º da lei 9034/9545 viola o princípio da legalidade. Definir uma figura criminosa,

nos termos do artigo 5º, inc. XXXIX, da Constituição Federal, consiste em explicitar

com marcos precisos os contornos do tipo, e estruturar com clareza as condutas

delituosas para que possam ser facilmente compreendidas por seu destinatário. Se

o legislador emprega, na construção típica, termos genéricos e indefinidos, corre-se

o sério risco de estabelecer a insegurança do cidadão, por transferir ao juiz,

incumbência do legislador. E, nada mais inseguro, que deixar sob a

responsabilidade de cada juiz, a tarefa de dar a moldura do tipo penal. O princípio da

anterioridade da norma penal obriga a que a lei (clara e inequívoca) delimite o

41 Revista Veja: edição 1779 de 27/11/02; edição 1782 de 18/12/02, edição 1838 de 28/01/04, edição 1877 de 27/10/04, edição 1937 de 28/12/05. 42 TERRA DE OLIVIRA, William. A criminalização da lavagem de dinheiro – aspectos penais da lei 9.613/88. Revista Brasileira de Ciências Criminais, ano 6, n. 23, julho-setembro, 1998, p. 113-115.. São Paulo: RT, 1988, 313 e ss. 43GOMES, Luis Flavio; CERVINI, Raúl. Crime organizado – Enfoques criminológico, jurídico (lei 9034/95) e político criminal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 229-240. 44 Cf. OLIVEIRA, Willian Terra de. O crime de lavagem de dinheiro, em Boletim IBCCRIM, n.º 65, edição especial – abril/1998. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1988, p. 112 e ss; PELLEGRINI, Angiolo; COSTA JUNIOR, Paulo josé. Criminalidade Organizada. São Paulo: Jurídica Brasileira, 1999, p. 55; HIRECHE, Gamil Föppel. Análises Criminológicas das Organizações Criminosas. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2005; GOMES, Abel Fernandes, PRADO, Geraldo e DOUGLAS, William, Crime organizado, Rio de Janeiro: Impetus, 2000; MAIA, Carlos Rodolfo Tigre., O Estado desorganizado contra o crime organizado, Rio de Janeiro: LAmen Júris, 1997.; SIQUEIRA FILHO, Élio W., Repressão ao crime organizado, Curitiba: Juruá, 1995; FERNANDES, Antonio Scarance, Crime organizado e a legislação brasileira, in Justiça penal, v. 3. São Paulo: RT, 1995.; TENÓRIO, Igor e LOPES, Inácio C. D, Crime organizado, Brasília: Consulex, 1995; ZAFFARONI, Raúl Eugenio. Crime organizado:uma categorização frustrada”. Discursos Sediciosos. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1996, e CIRINO DOS SANTOS, Juarez. Crime organizado, disponível em: http:// www.cirino.com.br/artigos-crime.htm, 20/10/2006. 45 Lei 9034/95, artigo 1º Esta lei define e regula meios de prova e procedimentos investigatórios que versem sobre ilícitos decorrentes de ações praticadas por quadrilha ou bando ou organizações criminosas de qualquer tipo .

Page 26: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

26

âmbito do proibido previamente.46 Sem lei prévia é impossível a incidência de

qualquer medida restritiva aos direitos e liberdades fundamentais. 47

Por outro lado, alguns autores afirmam que a Convenção das Nações Unidas

contra a Delinqüência Organizada Transnacional (Convenção de Palermo), ratificada

no Brasil pelo Decreto n. 5.015, de 12/03/2004, conceituou em seu art. 2º, a, grupo

criminoso organizado, sendo assim, absolutamente possível aplicar tal dispositivo e

com isso conceituar “organização criminosa”, tanto para efeitos da Lei 9.034/95

como para Lei 9.613/1998.48

Ainda neste contexto, importante ressaltar que a ciência criminológica, já

conta com estudos sobre as organizações criminosas, mas o apelo à criminologia

para conceituação do crime, também seria um expediente de socorro que

desrespeita o princípio constitucional da legalidade.49

46 Segundo Luiz Flávio Gomes: “Cuida-se, portanto, de um conceito vago, totalmente aberto, absolutamente poroso. Considerando-se que (diferentemente do que ocorria antes) o legislador não ofereceu nem sequer a descrição típica mínima do fenômeno, só nos resta concluir que, nesse ponto, a lei (9.034/95) passou a ser letra morta. Organização criminosa, portanto, hoje, no ordenamento jurídico brasileiro, é uma alma (uma enunciação abstrata) em busca de um corpo (de um conteúdo normativo, que atenda o princípio da legalidade).Se as leis do crime organizado no Brasil (Lei 9.034/95 e Lei 10.217/01), que existem para definir o que se entende por organização criminosa, não nos explicaram o que é isso, não cabe outra conclusão: desde 12.04.01 perderam eficácia todos os dispositivos legais fundados nesse conceito que ninguém sabe o que é. São eles: arts. 2º, inc. II (flagrante prorrogado), 4º (organização da polícia judiciária), 5º (identificação criminal), 6º (delação premiada), 7º (proibição de liberdade provisória) e 10º (progressão de regime) da Lei 9.034/95, que só se aplicam para as (por ora, indecifráveis) "organizações criminosas". É caso de perda de eficácia (por não sabermos o que se entende por organização criminosa), não de revogação (perda de vigência). No dia em que o legislador revelar o conteúdo desse conceito vago, tais dispositivos legais voltarão a ter eficácia. Por ora continuam vigentes, mas não podem ser aplicados.(Crime organizado: que se entende por isso depois da Lei nº 10.217/01? (Apontamentos sobre a perda de eficácia de grande parte da Lei 9.034/95). Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 56, abr. 2002. Disponível em <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2919>. Acesso em: 30 abr. 2007.)

47 Cf. SILVA FRANCO, Alberto. Crime Organizado, em Leis Penais Especiais e sua interpretação jurisprudencial. São Paulo: Revista dos tribunais, 2002; GOMES, Luiz Flávio. Crime organizado: que se entende por isso depois da Lei n. 10.217, de 11.04.01? (Apontamentos sobre a perda de eficácia de grande parte da Lei 9.034/95). Disponível na internet: http://www.ibccrim.org.br , 26.10.2001. 48 Nesse sentido cfr. entre outros: MENDRONI, Marcelo Batlouni. Crime de Lavagem de Dinheiro. São Paulo: Atlas, 2006, p.51; CAPEZ, Fernando, Curso de direito Penal, volume 4: legislação penal especial.São: Paulo: Saraiva, 2007, p. 585; BONFIM, Márcia Monassi Mougenot; BONFIM, Edílson Mougenot. Lavagem de dinheiro. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 58. 49 SILVA FRANCO, Alberto. Crime Organizado, em Leis Penais Especiais e sua interpretação jurisprudencial. São Paulo: Revista dos tribunais, 2002, ; GOMES, Luiz Flávio. Crime organizado: que se entende por isso depois da Lei n. 10.217, de 11.04.01? (Apontamentos sobre a perda de eficácia de grande parte da Lei 9.034/95). Disponível na internet: http://www.ibccrim.org.br , 26.10.2001

Page 27: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

27

Enfim, concluímos que malgrado a ONU tenha definido o que é organização

criminosa e este conceito tenha sido ratificado pelo Brasil através de um tratado,

nada adiantou para suprir a lacuna normativa relacionada ao Direito Interno, pois

somente a lei ordinária, válida em sentido formal e material, pode dispor sobre

matéria criminal.50 Permanece, então, a violação ao princípio da legalidade. Resta

deduzir que a Lei 9.034/95 produz somente efeitos políticos e meramente

simbólicos51.52

3.2. A globalização e o delito de lavagem de dinhei ro

A globalização é um mecanismo social dinâmico que torna globais os espaços

econômicos, culturais e informativos que antes se estruturavam, primacialmente, em

nível nacional. Trata-se de um fenômeno, sobretudo financeiro, no qual as nações

passam a formar um único mercado mundial, independente de fronteiras e

diferenças econômicas.53

Os processos de globalização econômica refletiram decisivamente na

expansão da delinqüência econômica em geral e na conseqüente extensão das

condutas de lavagem de dinheiro, pois toda vez que pretendam encobrir a origem

das ingentes quantidades de dinheiro que possuem, encontrarão o terreno propício

50 HIRECHE, Gamil Föppel. Análises Criminológicas das Organizações Criminosas. Op. Cit. p. 86-87. 51 Sobre eficácia e adequação das normas jurídicas cf. SABADELL, Ana Lucia. Manual de sociologia jurídica: introdução a uma leitura externa do direito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 3ª edição, 2005. 52 Sobre a função simbólica do direito penal e suas relações com a criminalidade organizada Gamil Föppel expõe: “Com as novas leis – que impõem, ordinariamente, limitações aos Direitos Fundamentais, vende-se para a Sociedade uma imagem de controle, trabalha-se com o lado ideológico das pessoas, busca-se dar uma satisfação com algo verdadeiramente inexistente. É um discurso gongórico, falacioso, ardiloso e falso. Para que se compreenda melhor, iludem-se as pessoas – explorando o seu lado de angústia e de preocupação com a violência – com a promessa de que, com novas leis, a criminalidade diminuiria.”. 53 FARIA COSTA, José de. O fenômeno da globalização e o direito penal econômico. Revista brasileira de ciências criminais, n.34,2001, p.11. São Paulo: Revista dos tribunais, 2001, 650-665.

Page 28: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

28

num mercado global caracterizado pela elevada volatilidade dos movimentos de

capitais e pelo potencial tecnológico moderno.54

Podemos apontar três causas da globalização econômica: em primeiro lugar,

a aceleração do ritmo da abertura econômica e dos intercâmbios de mercadorias e

serviços; em segundo lugar, a liberalização dos mercados de capitais; e, finalmente,

a revolução das comunicações e da informática, que proporciona o suporte

tecnológico para que uma massa crescente de capitais navegue pelo ciberespaço.55

Também podemos apontar, como aspecto da globalização, a integração

supranacional consistente no estreitamento das relações entre as diversas nações,

cuja aspiração é lograr um mercado comum entre vários países, com livre tráfego de

pessoas, capitais,serviços e mercadorias, e a conseqüente eliminação das barreiras

internas e outros obstáculos ao livre comércio.56

É nesse contexto que aparecem também novas formas delitivas e uma

diferenciada concepção da delinqüência, que já não se identifica com a

criminalidade tradicional associada à marginalidade de rua, mas que aparece

caracterizada pelas idéias de organização, transnacionalidade e poder econômico.

Deste modo, o direito penal “da globalização” oferece como paradigma o

delito econômico organizado que tem, como autores, poderosos personagens

plenamente adaptados a nossa sociedade, que utilizam - se de interpostos agentes

para a execução material do crime, e estão sempre dispostos a corromper

servidores públicos e governantes.57

54 BLANCO CORDERO, Isidoro. Criminalidade Organizada y Mercados Ilegales. EGUZKILORE – Caderno del Instituto Vasco de Criminologia, n.º 11 – San Sebastian, 1997, p. 70-91. 55 ESTEFANÍA, Joaquín. La nueva economía. La globalización. Madrid: Editora Debate, 1996, p 14 e ss. 56 Ibidem. 57 PÉREZ. Carlos Martínez-Buján. Instrumentos Jurídicos Frente a la globalización de los Mercados (En el ejemplo del blanqueo de capitales). El Derecho Penal Ante la Globalización. Editorial COLEX, 2002, p. 202.

Page 29: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

29

Com o aparecimento dessas novas formas delitivas, podemos constatar que

os processos de globalização econômica e de integração entre as nações não só

trouxe vantagens e celeridade nas transações financeiras e avanços tecnológicos,

mas também incidiu na expansão da delinqüência econômica e no aumento das

condutas de lavagem de dinheiro.58

Portanto, devido à dimensão “globalizadora” do delito de lavagem, se impõe

uma estratégia comum de intervenção legislativa entre as nações, pois não se pode

pensar em resolver tal problema de forma isolada dentro de cada país. 59

Mais adiante veremos como estes fatores influenciaram na criação de um

regime internacional regulador do delito de lavagem, através de tratados

internacionais com a participação de vários países propostos a combater essa

problemática.

3.3. Métodos empregados no branqueamento de capitai s

Os avanços consideráveis das tecnologias transformaram os fluxos mundiais

da informação e o modo de fazer negócios. A Internet e o seu alcance mundial, a

sofisticação crescente do setor bancário e outras evoluções tecnológicas criaram

novas oportunidades para os grupos criminosos organizados mais sofisticados. A

utilização fraudulenta de cartões de crédito ou de débito, por exemplo, tornou-se um

negócio em escala global.60

58 Ibidem. 59 SOUTO, Miguel Abel. El blanqueo en la normativa internacional. Serviço de Publicación e intercambio Científico da Universidade de Santiago de Compostela, 2002, p. 44 e ss. 60 Cfr. entre outros, BATISTA, Carlos Roberto Rodrigues. A globalização da internet e a proliferação do crime de informática. Revista do Conselho Nacional de política criminal e penitenciária, julho a dezembro de 2000, nº 14. Brasília, 2000, p. 98-102; GOMES, Luiz Flavio. Lavagem de capitais como expressão do direito penal globalizado p. 226-230.; GOMES, Luiz Flavio; OLIVEIRA, William Terra de; CERVINI, Raúl. Lei de Lavagem de Capitais. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998.

Page 30: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

30

Os dados disponíveis sugerem que o crime econômico e financeiro continuou

a crescer rapidamente, principalmente sob efeito das novas tecnologias de

informação, do aumento das operações bancárias por via eletrônica e da expansão

dos serviços da Internet.61

A globalização permitiu ao capital internacional uma enorme facilidade para

movimentar-se no mercado mundial. Paraísos fiscais e o sistema financeiro

internacional com seu alto grau de liberalização, além de contribuir para alta

volatilidade do dinheiro, acrescentaram a possibilidade do anonimato. A grande rede

mundial de computadores, a Internet, dinamizou todos esses fatores criando um

cenário deveras estimulante para a prática da lavagem de dinheiro.62

A proliferação do comércio eletrônico conduziu, por sua vez ao nascimento

de novos meios de pagamentos. Utiliza-se a expressão ciberpagamento para

descrever sistemas que facilitam a transferência de valores financeiros, isto é,

moeda digital. Esses avanços podem alterar toda a forma de processamento das

transações financeiras e toda a operação do sistema de pagamentos financeiros.

Esta nova tecnologia irá provocar a alteração de alguns princípios

fundamentais que hoje estão associados a uma sociedade orientada para a moeda.

As transações poderão ser feitas via Internet ou através de cartões inteligentes que,

diferentemente dos cartões de crédito ou cartões de débito, contêm um microchip

que armazena valor no cartão. Alguns ciberpagamentos aproveitam ambos os

sistemas, e nestes, o elemento comum é que foram criados para dar, às partes

envolvidas na transação, uma forma imediata conveniente, segura e potencialmente

61 Sobre os ciberdelitos cfr. OLIVEIRA, Edmundo. Cyberspace e o crime organizado transnacional, em Notáveis do Direito Penal, livro em homenagem ao emérito professor doutor René Ariel Dotti. Brasília: Consulex, 2006, p. 130 e ss. 62PINHEIRO, Luís Góes. O branqueamento de capitais e a globalização. Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 12, nº.4, outubro-dezembro – 2002. Coimbra: Editora Coimbra, 2002., p. 603-613.

Page 31: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

31

anônima de transferir valores financeiros. Uma vez, plenamente implementada,

essa tecnologia irá impactar a vida de usuários em todo o mundo e prestar

benefícios facilmente visíveis para o comércio legítimo. Mas, irá também ter o

potencial de facilitar o movimento internacional de recursos ilícitos.63

Com o advento do banco em domicílio e dos ciberpagamentos, sucede um

decréscimo das transações realizadas face a face. Há, portanto, uma preocupação

especial com a incapacidade de as instituições financeiras reconhecerem

efetivamente seus clientes no mundo potencialmente anônimo do sistema de

pagamento sem papel. E o impacto disto é relevante nos métodos tradicionais de

vigilância e análise de documentos financeiros.64

Eficientes pela velocidade e seguros pelo anonimato, os ciberpagamentos

guardam estas características positivas do ponto de vista do público, e também das

autoridades incumbidas de repressão aos crimes de lavagem, que não querem ver

esses sistemas ameaçados. Entretanto, as referidas características tomam esses

sistemas igualmente atraentes para aqueles que os usam para fins ilegais. E o

maior grau de anonimato, ao mesmo tempo que dá segurança, também dificulta

ainda mais as investigações que visam a detectar as atividades ilegais.65

63 Ibidem. 64 BARROS, Marco Antonio de. “Lavagem” de Capitais e obrigações civis correlatas. São Paulo:Editora Revista dos Tribunais, 2004, 42-81. 65 Ibidem.

Page 32: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

32

4. Tratamento jurídico do branqueamento de capitais

Depois de apontarmos a ligação da lavagem de capitais com as associações

delituosas, e a expansão desse tipo de criminalidade relacionada à globalização,

faz-se necessário estudarmos quais as iniciativas internacionais que surgiram na

tentativa de coibir a problemática dessa prática delituosa.

4.1. A criação de um regime internacional regulador do delito de lavagem de dinheiro.

A transnacionalidade do fenômeno da lavagem de dinheiro fez com que os países

identificassem quão relevante seria combater tal espécie de crime de maneira mais

uniforme, com o objetivo de implementar maior cooperação internacional em matéria

criminal.

A necessidade de recorrer à cooperação internacional passou a ser

fundamental, pois freqüentemente organizações criminosas ligadas à lavagem de

dinheiro, operam fora do controle e da soberania de uma nação, tornando difícil a

atuação unilateral de um Estado no combate a este problema.66

Nos anos oitenta essa cooperação internacional focou-se principalmente no

objetivo de perseguir o produto e o proveito dos crimes obtidos pelas organizações

criminosas, por meio do trafico ilícito de drogas.67

No entanto, atualmente, a atenção não se volta exclusivamente ao tráfico de

entorpecentes, mas a todas aquelas atividades criminosas que produzem grandes

quantias de dinheiro.68 66 GUALTIERI, S David; Bassiouni, M. Cherif. Mecanismos internacionales de control de las ganancias procedentes de actividades ilícita - Revista de Derecho penal y criminologia, nº6. Madri 1996, 302-312. 67 BLANCO CORDERO, Isidoro. Criminalidade Organizada y Mercados Ilegales. EGUZKILORE – Caderno del Instituto Vasco de Criminologia, n.º 11 – San Sebastian, 1997, p. 98-101.

Page 33: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

33

Entre as iniciativas internacionais voltadas à problemática da lavagem de

dinheiro, a pioneira foi a Recomendação adotada em 27.06.1980 pelo Comitê de

Ministros do Conselho da Europa, que objetivava impor deveres aos

estabelecimentos bancários, tutelando a transparência das atividades bancárias,

com finalidade de combater a reciclagem dos produtos delitivos.69

No entanto, em outubro de 1986, os Estados Unidos da América editaram o

Money Laundering Act Control, tipificando a conduta criminosa que deveria ser

precedida de determinada atividade ilegal, dentre as quais as listadas no United

States Code, titulo 18, seção 1.956.70

Passaremos a analisar os instrumentos internacionais que vieram a

regulamentar o delito em questão.

4.1.1. Convenção das Nações Unidas contra o trafico ilícito de entorpecentes e de substâncias psicotrópicas – Convenção de Viena – 1988.

A ONU, a partir dos anos 80, começa a desenvolver estudos e a elaborar

instrumentos jurídicos para enfrentar a problemática da lavagem de dinheiro

relacionada, naquela época, ao dinheiro oriundo do tráfico de drogas.

Dentre os inúmeros instrumentos que foram confeccionados nesse sentido,

merece inicial destaque a Convenção das Nações Unidas contra o tráfico ilícito de

entorpecentes e substâncias psicotrópicas, conhecida por "Convenção de Viena",

realizada em dezembro de 1988, considerada um marco no combate à lavagem de

68 Atualmente constata-se que a maior parte do dinheiro lavado no mundo é proveniente da corrupção, dos US$ 2 trilhões movimentados pelo crime organizado, US$ 1 trilhão está diretamente associado à corrupção. Dados disponíveis em www.unodc.org/brazil/pt . Acesso em 25/10/2005. 69 SOUTO, Miguel Abel. El blanqueo en la normativa internacional. Serviço de Publicación e intercambio Científico da Universidade de Santiago de Compostela, 2002, p. 80-88. 70 PITOMBO, Antonio Sergio A. de Moraes. Lavagem de dinheiro: a tipicidade do crime antecedente. São Paulo: Editora revista dos tribunais, 2003, p. 39-48.

Page 34: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

34

dinheiro.71

Além de exigir pela primeira vez que os Estados contratantes incriminassem

a lavagem de dinheiro procedente do tráfico de drogas, estabeleceu, também,

disposições sobre cooperação internacional para facilitar investigações judiciais e

extradição, e, ainda, reafirmou o princípio segundo o qual o sigilo bancário não deve

impedir as investigações penais no âmbito da cooperação internacional.72

A partir dessa normativa, aprovada em Assembléia Geral das Nações

Unidas, e que contou com a participação de 106 países – o que confere um grande

poder político a tal documento - foram introduzidos, nos ordenamentos das Nações

signatárias, tipos penais de lavagem, bem como foram modificadas algumas poucas

normas já existentes. Os meios de investigação e regras sobre confisco, extradição

e assistência judicial também foram influenciados por essa normativa.73

Ainda que a doutrina tenha apontado alguns defeitos no texto final da

Convenção, os elogios superaram as críticas, especialmente por ter propagado a

tipificação da lavagem de dinheiro, influenciando outros textos internacionais e

legislações que, em muitos casos, reproduziram fielmente a íntegra do texto.74

No Brasil, a Convenção de Viena foi ratificada através do Decreto n. 154,

de 26.6.1991.

71 SOUTO, Miguel Abel. El blanqueo en la normativa internacional. Serviço de Publicación e intercambio Científico da Universidade de Santiago de Compostela, 2002, p 105-113. 72 Ibidem. 73 BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitales. Navarra, Arazandi, op. Cit. p. 89-91. 74 SOUTO, Miguel Abel. El blanqueo en la normativa internacional. Serviço de Publicación e intercambio Científico da Universidade de Santiago de Compostela, 2002, 127 ess.

Page 35: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

35

4.1.2. Convenção do Conselho da Europa relativa à l avagem - Convenção de Estrasburgo de 1990

A Convenção do Conselho da Europa relativa à lavagem, seguimento,

embargo e confisco dos produtos do delito, também conhecida por "Convenção de

Estrasburgo", foi aprovada em setembro de 1990 e entrou em vigor somente em 10

de setembro de 1993, em razão de problemas com o número de ratificações.75

Ademais ordenar medidas eficazes de combate a crimes graves, a

Convenção exigiu que os signatários criminalizassem a lavagem de dinheiro e

estabelecessem medidas legais de embargo e confisco, com o objetivo de privar

os delinqüentes do proveito econômico do crime. Outrossim, forneceu uma

definição de produto, bens, instrumentos, confisco e delito principal e preencheu

alguns vazios que impediam a assistência judicial recíproca no âmbito penal.76

A título de novidade, ampliou o catálogo de delitos prévios a outros crimes

que geram proveito econômico, afastando a exclusividade do narcotráfico disposta

na Convenção de Viena. Também deixou a critério das Partes, a punição ou não do

autor do crime de lavagem de dinheiro que também praticou o crime antecedente.77

A relevância da Convenção se evidencia, quer pelas novidades que

introduziu, como a ampliação do rol de crimes antecedentes à lavagem, quer pela

imprescindível preocupação em impor, com o emprego de métodos eficazes e

efetivos, a perda do produto do crime, sabidamente um dos mais importantes e

eficazes instrumentos de combate a estes tipos de conduta.78

75 SANTIAGO, Rodrigo. O branqueamento de capitais e outros produtos do crime. Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 9, fasc.3º, julho-Setembro,1999. Coimbra:Coimbra, 107-111. 76 PITOMBO, Antonio Sergio A. de Moraes. Lavagem de dinheiro: a tipicidade do crime antecedente. São Paulo: Editora revista dos tribunais, 2003, 47-48. 77 BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitales. Navarra, Arazandi, op. Cit. 90-98. 78 Ibidem.

Page 36: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

36

4.1.3. Diretiva da Comunidade Européia

Um outro instrumento que deve ser conhecido é a Diretiva 308/ 1991 que foi

aprovada pelo Conselho das Comunidades Européias, em 10 de junho de 1991, e

estabeleceu medidas para prevenir e dificultar a utilização do sistema financeiro na

lavagem de dinheiro.

A Diretiva tem caráter obrigatório79 para os Países-membros e objetiva

harmonizar as respectivas legislações no tocante à previsão de regras mínimas de

prevenção à lavagem de dinheiro, tutelando o sistema financeiro e assegurando o

mercado único.80

Embora tenha tipificado novamente a lavagem de dinheiro e previsto medidas

de cunho penal, enfocou principalmente o aspecto preventivo, através de imposição

de deveres às entidades de crédito, às instituições financeiras e aos profissionais ou

categorias de empresas que exerçam atividades suscetíveis de serem utilizadas no

processo de lavagem, como, por exemplo, cassinos e agentes imobiliários. Em

síntese, com o emprego de medidas administrativo-financeiras, pretendeu dificultar

e prevenir a utilização dessas entidades na lavagem de dinheiro.81

Dentre outras medidas relevantes impostas às instituições financeiras e

demais implicados, destacam-se a obrigatoriedade de identificação de clientes, a de

comunicação de operações suspeitas e a de não realização de ditas transações

suspeitas.82

O instrumento em análise conseguiu operar modificações nas diversas

79 Ao contrário das medidas contidas na Declaração dos Princípios da Basiléia de 1988 e das Recomendações do Grupo de Ação Financeira Internacional (GAFI). 80 ARÁNGUEZ SÁNCHEZ, Carlos. El delito de blanqueo de capitales. Madrid, Marcial Pons, 2000, p. 226-228. 81 SOUTO, Miguel Abel. El blanqueo en la normativa internacional. Serviço de Publicación e intercambio Científico da Universidade de Santiago de Compostela, 2002, 253-269. 82 Ibidem.

Page 37: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

37

legislações dos países da Comunidade Européia, quer no aspecto preventivo, quer

no repressivo, evidentemente pela necessidade e eficiência de sua normativa. Aliás,

embora obrigatória somente no âmbito da Comunidade Européia, as determinações

dessa Diretiva foram parcialmente trasladadas ao direito brasileiro, mais

concretamente ao Capítulo V, da nossa Lei de Lavagem de Dinheiro.83

4.1.4. Grupo de Ação Financeira Internacional (GAFl )

O Grupo de Ação Financeira Internacional (GAFI)84 foi criado em 1989 pelo

grupo dos sete países mais industrializados (G-7)85, para combater a lavagem de

dinheiro. Assim é que, em abril de 1990, e já com a adesão de outros Estados,

foram publicadas 40 Recomendações86 que regulam conjuntamente questões

penais, financeiras e de cooperação internacional, sem caráter obrigatório, como a

própria denominação indica, fato que, ao contrário do que se pode interpretar, não

retira sua força e respeitabilidade, uma vez que se trata de instrumento modelo

para ações internacionais. Outras organizações e organismos internacionais,

como o FMI, INTERPOL, EUROPOL, Comissão Européia e Conselho de

Cooperação do Golfo, participam, como observadores, das reuniões plenárias do

Grupo. Vale salientar que o Brasil é membro do GAFI desde junho de 2000.87

As quarenta Recomendações foram atualizadas pela primeira vez em 1996 e,

em junho de 2003, uma redação nova foi aprovada em Berlim, depois de 11 de

83BONFIM, Márcia Monassi Mougenot; BONFIM, Edílson Mougenot. Lavagem de dinheiro. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 20-22. 84 Financial Action Task Force (FATF) 85 Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão e Reino Unido. 86 Estas recomendações constituem guias para o controle da lavagem de ativos em matéria legal, financeira e de controle e fiscalização FATF-GAFI, disponível em www.fazenda.gov.br/coaf/portugues/sobrecoaf/GafiFatf.htm 87 ROLDÁN, José Maria. La cooperación em materia de lucha contra el blanqueo a nivel internacional: El GAFI, em Prevención y represión del blanqueo de capitales. Consejo General del Poder Judicial. Madrid, 2000, 58 e ss.

Page 38: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

38

setembro de 2001, em um plenário extraordinário sobre o financiamento do

terrorismo, realizado em Washington. O Grupo aprovou, em outubro de 2001, um

conjunto de oito Recomendações especiais com a finalidade de combater o

financiamento dos atos terroristas e organizações terroristas. Agora, portanto, as

recomendações do Grupo se aplicam também ao terrorismo.88

Dentro dessas Recomendações, incumbe ressaltar aquela que amplia o rol

de delitos prévios, retirando a exclusividade do narcotráfico, prevista na Convenção

de Viena, e a que enfatiza uma efetiva cooperação administrativa internacional,

sem prévia interferência judicial, imprescindível para um combate eficaz às

condutas em estudo.89

O Grupo produz informes anuais sobre o tema, realiza intercâmbios visando

a constatar problemas dos Estados nesta área, bem como revisa suas

Recomendações e as novas técnicas de lavagem de dinheiro detectadas

mundialmente, além de identificar os países que não a combatem, ou seja, atua

técnica (faz estatísticas, revisão das Recomendações etc.) e politicamente, ao expor

no cenário político e econômico internacional os países que se omitem no combate

à lavagem de dinheiro. Incentiva, também, a criação de organismos similares no

âmbito regional, como o GAFISUD (Grupo Regional da América do Sul).90

Entre esses informes, o GAFI elabora e divulga uma lista de países e

territórios considerados não cooperantes, por que implementaram de forma

insuficiente, ou não implementaram, medidas efetivas de combate à lavagem.91 Esse

organismo recomenda que seus países membros bem como todos aqueles

88 Ibidem. 89 ZARAGOZA AGUADO, Javier Alberto. Prevencion y represion del blanqueo de capitales. Madrid, Consejo General del Poder Judicial, 2000, p. 290 e ss 90 BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitales. Navarra, Arazandi, op. Cit 92-99. 91 Os critérios para inclusão de um país no rol dos não cooperantes foram definidos em reunião plenária do GAFI/FATF, realizada em Paris, em setembro de 2001. No mesmo sentido, a Carta Circular 002/01 do COAF.

Page 39: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

39

comprometidos com a prevenção e combate à lavagem de dinheiro, examinem, com

redobrada atenção, às operações financeiras e comerciais que envolvam os

chamados países não cooperantes.92

4.1.5. As iniciativas da Organização dos Estados Am ericanos (OEA)

A Organização dos Estados Americanos (OEA) também propôs ações

dirigidas a solucionar os problemas oriundos do tráfico de drogas e da lavagem de

capitais.

Na conferência do OEA sobre tráfico de entorpecentes que ocorreu no Rio

de Janeiro, do dia 22 a 26 de abril de 1986, criou-se a Comissão Interamericana

para o Controle do Abuso de Drogas, CICAD, responsável por desenvolver e

realizar propostas para aumentar a efetividade da prevenção do abuso do álcool.93

No ano 1990 os representantes dos Estados membros da OEA adotaram em

Ixtapa, México, a Declaração e o Programa de Ixtapa, no que se estabeleceu a

necessidade de qualificar como delito, toda atividade referente à lavagem de ativos

relacionada com o tráfico ilícito de drogas e de facilitar à identificação, o

rastreamento, a apreensão, o confisco dos ativos procedentes de tal delito. Com

este antecedente foi que se adotou, em 1992, o Regulamento Modelo da CICAD

sobre Delitos Relacionados com o tráfico ilícito de drogas e Delitos Conexos. Dito

regulamento foi modificado em 1997 para servir às Unidades de Inteligência

Financeiras como uma ferramenta idônea para o combate à lavagem de ativos, e

em 1999 para ampliar o tipo da lavagem de ativos, que agora aceita como delitos

prévios não só o tráfico ilícito de drogas, senão outros delitos graves, pelo que

92 Atualmente, os países e territórios considerados como não cooperantes são: Filipinas, Guatemala, Ilhas Cook, Indonésia, Myanmar, Nauru e Nigéria. Dados disponíveis em : http://www1.oecd.org/fatf/NCCT_en.htm. Acesso em: 23/03/2005. 93 Ibidem.

Page 40: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

40

mudou sua denominação a Regulamento Modelo sobre Delitos de Lavagem

Relacionados com o Tráfico Ilícito de Drogas, e outros Delitos Graves, CICAD.94

No aludido Regulamento Modelo, caracteriza-se produto e se assenta que a

lavagem de dinheiro mostrar-se-ia delito autônomo ao trafico ilícito de

entorpecentes e infrações penais conexas.95

Na XXII Assembléia Geral da Organização dos Estados Americanos,

realizada nas Bahamas, entre 18 e 23.05.1993, representantes brasileiros

aprovaram o Regulamento Modelo sobre delitos de lavagem relacionados com o

tráfico ilícito de drogas e delitos conexos, elaborado pela Comissão Interamericana

para o Controle do Abuso de Drogas – CICAD.96

Expostos estes importantes tratados internacionais que regulamentaram a

problemática do branqueamento de dinheiro, iniciaremos o estudo da legislação

pátria sobre o tema.

94 Disponível em www.cicad.org, El delito de lavado de activos como delito autônomo.22/08/2005. 95 PITOMBO, Antonio Sergio A. de Moraes. Lavagem de dinheiro: a tipicidade do crime antecedente. Op. Cit. p.48-52. 96 Exposição de motivos 692, de 18.12.1996. Diário do senado Federal, 25.11.1997, p. 25.671.

Page 41: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

41

5. O delito de lavagem de dinheiro no Brasil

Anteriormente já tivemos a oportunidade de analisar que um dos maiores

problemas causados pelas atividades de grupos envolvidos com a lavagem de

dinheiro, tais como os que praticam a corrupção, o tráfico de drogas, de armas, de

pessoas, de órgãos, a sonegação de impostos ou fraudes contra entidades públicas

é a grande geração de riqueza, cujo destino é o sistema financeiro internacional,

como em todas as demais atividades que geram capital, seu destino é o sistema

financeiro internacional. No interior deste sistema, a linha que divide o espaço

territorial, do espaço extraterritorial, deixou de existir com nitidez e rigor de outros

tempos, graças ao desenvolvimento de centros financeiros offshore97, e mais

recentemente, devido ao comércio eletrônico e às facilidades das movimentações

financeiras online.98

Diante deste quadro, o intercâmbio de informações de natureza bancária e

financeira99 passa a ser o elemento-chave das estratégias de intervenção penal,

que têm sido formuladas em âmbito internacional, para lidar com crimes geradores

de benefícios materiais.100

O Brasil, no ano de 1991, assume de modo definitivo, o compromisso de

elaborar lei nos moldes ditados pela Convenção de Viena, diante da promulgação

deste tratado, por meio do Decreto 154, de 26 de junho de 1991.101

A partir de então, o governo brasileiro torna-se signatário de outros 97 Sociedade offshore, também conhecidas por sociedades não residentes, têm por principal característica o fato de não exercerem qualquer tipo de atividade comercial no país onde têm sua sede social. Localizam-se normalmente em paraísos fiscais. 98 BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitales. Navarra, Arazandi, 90 e ss. 99 Podemos notar que toda esta preocupação com a troca de informações de natureza bancária nas investigações criminais, está registrada nas convenções internacionais da ONU, como na Convenção Contra o Trafico Ilícito de Entorpecentes e Substâncias Psicotrópicas de 1988, na Convenção, na Convença para Supressão do Financiamento do Terrorismo de 1999, e na Convenção Contra o Crime Organizado Transnacional de 2003. 100 BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitales. Navarra, Arazandi, 90 e ss. 101 Ibidem.

Page 42: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

42

documentos plurilaterais entre nações da América, como da conta a Exposição de

motivos 692, de 18.12.1996.102

O tratado de Cooperação Jurídica em matéria penal, entre Brasil e Suíça, foi o

mais recente ratificado pelo Brasil, no dia 12 de setembro de 2006. O principal

objetivo do acordo é combater as mais diferentes formas de crime organizado

transnacional, tornando mais eficientes a investigação e a respressão de delitos,

facilitando a troca de informações e permitindo maior agilidade nas decisões, para

combater crimes de lavagem de dinheiro, evasão fiscal, tráfico de drogas, de armas

e de pessoas. Os Ministérios da Justiça de ambos os países passam a centralizar os

pedidos de cooperação em casos de investigações internacionais e se

comprometem a facilitar os processos de tomada de depoimentos, entrega de

documentos, registros e provas (administrativas, bancárias, financeiras, comerciais e

societárias), restituição de bens e valores, busca pessoal e domiciliar, confisco de

produtos de delitos e intimação de atos processuais.103

O Brasil, além da ratificação de convenções internacionais, incorporou a

permanente atualização do sistema antilavagem de dinheiro tal como elaborado

pelo Grupo de Ação Financeira sobre Lavagem de Dinheiro (GAFI), constituindo

impulso à expansão do intercâmbio de informações bancárias. Exemplo disso é a

atuação da unidade de inteligência financeira, o COAF104 (Conselho de Controle de

Atividades Financeiras), que vinculado ao Ministério da Fazenda, se dedica, entre

outras coisas, a centralizar, processar e filtrar as comunicações de transações

suspeitas de lavagem, efetuadas pelos operadores do setor financeiro, e

encaminha-las aos órgãos de persecução penal, quando houver indícios da prática

102 Disponível em www.planalto.gov.br . 103 Disponível em: www.senado.gov.br, 10/09/2006 104 O COAF foi criado pela lei 9613/98 e os dispositivos sobre o intercâmbio de informações bancarias relevantes à sua atuação encontram-se na Lei complementar 105/2001.

Page 43: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

43

de crime. Estas informações são também objeto de intercâmbio com unidades de

inteligência financeira de outros países.105

5.1. Legislações sobre lavagem no Brasil

5.1.1 Lei 9613 de 03.031998

Diante da pressão exercida pelos organismos internacionais para que as

nações formulassem normas para reprimir o branqueamento de capitais, o legislador

brasileiro, passados quase sete anos da ratificação da Convenção de Viena, editou

a lei 9613, de 3 de março de 1998, introduzindo em nosso ordenamento jurídico o

delito de lavagem de dinheiro.106

Constata-se que a legislação pátria, a respeito da tipificação do delito em

estudo, foi movida por influência de legislação externa107. Neste caso estamos

diante fenômeno denominado empréstimo jurídico.108

O empréstimo jurídico ocorre quando há uma assimilação voluntária de

determinadas normas provenientes do direito de outros países. Esse fenômeno é

comum nos países que se encontram em fase de desenvolvimento e adotam

105 Segundo relatório publicado pela COAF, a troca de informações com outra unidades de inteligência financeira dispensa tratado ou acordo, mas mesmo assim o COAF firmou acordo com 12 países: Argentina, Bélgica, Bolívia, Colômbia, Coréia, Espanha, França, Guatemala, Panamá, Paraguai, Rússia, Tailândia e Ucrânia e esta negociando a assinatura com a Albânia, Antilhas Holandesas, Austrália, Bulgária, Indonésia e Venezuela. 106 GOMES, Luiz Flavio. Lavagem de capitais como expressão do direito penal globalizado. Estudos criminais em homenagem a Evandro Lins e Silva (Criminalista do Século). São Paulo: Editora Método, 2001. 107 Inúmeros tópicos da exposição de motivos da lei 9613/98 remetem claramente a influência de legislações estrangeiras na elaboração da mesma. Alguns destes tópicos: 37,39,45,56,96102,103,111,115 e 132. 108 Sobre o tema empréstimo jurídico cfr. SABADELL, Ana Lucia. Manual de sociologia jurídica: introdução a uma leitura externa do direito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 3ª edição, 2005, p. 106-108.

Page 44: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

44

instrumentos jurídicos de outras nações mais desenvolvidas, na tentativa de

modernizar as estruturas locais.109

É de se ressaltar que o empréstimo deve ser precedido de um estudo

detalhado das experiências estrangeiras110, pois só assim o país receptor terá

condições de adaptar a legislação estrangeira às necessidades locais, como

também identificar eventuais causas de ineficácia ou inadequação da mesma.111

A conveniência e oportunidade de se realizar o empréstimo jurídico parte da

exigência de aprimoramento da ordem jurídica local, normalmente encabeçada pela

força política dominante em dada comunidade. Destarte, afasta-se o modelo

legislativo ultrapassado, insuficiente para satisfazer a necessidade do país receptor,

valendo-se da vivência de outras nações mais desenvolvidas. Amolda-se, então, o

ordenamento jurídico, às novas necessidades da sociedade.112

No caso brasileiro, além da pressão exercida por instituições internacionais

para que o legislador pátrio tipificasse a lavagem de capitais, a integração de

normas estrangeiras para elaboração da Lei de Lavagem de Dinheiro (Lei 9.613/98),

também adveio da constatação da prática reiterada dessa conduta no país, na maior

parte ligadas a casos de corrupção. O “Caso dos Precatórios"113, que tanta difusão

teve na mídia, revelou duas realidades: de um lado, a existência de condutas lesivas

aos interesses da Nação, e de outro, uma grande impunidade, certamente

109 SABADELL, Ana Lucia. Manual de sociologia jurídica: introdução a uma leitura externa do direito. Op. Cit. 106-108. 110 Diz o tópico n.º 136 da Exposição de Motivos da lei 9613/98 : que antes de chegar ao presente estagio, tivemos oportunidade de discutir a matéria com órgão e especialistas estrangeiros (Suíça, Inglaterra e Estados Unidos da América. 111 SABADELL, Ana Lucia. Manual de sociologia jurídica: introdução a uma leitura externa do direito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 3ª edição, 2005, p. 106-108. 112 Ibidem. 113 Sobre o Caso dos Precatórios e casos de corrupção ocorridos na época da elaboração da lei de lavagem de dinheiro; Raposa agitada, disponível em: http://www.terra.com.br/istoe/politica/146732.htm ; No ar, o show dos precatórios. Revista Isto é, 19 de março de 1997; Um prefeito encurralado. Revista Isto é, 26 de março de 1997; Guerra dos dossiês, Revista Isto é, 2 de abril de 1997; Quem se lembra do caso dos Precatórios? Disponível em: http://cartamaior.uol.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=12664. Acesso em 28/05/2006.

Page 45: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

45

potencializada pela falta de uma legislação específica e de políticas públicas

preparadas para o problema.114

No entanto, passados quase dez anos da vigência da Lei de Lavagem de

Dinheiro no Brasil, o combate a este tipo de criminalidade tem se mostrado

ineficiente.115As razões para esta situação são várias, entre elas as deficiências da

lei 9613/98, que dificulta sua aplicabilidade pois não há ainda uma cooperação

internacional116 eficaz e rápida, como também a colaboração da própria justiça

interna.117

Sem a pretensão de analisar minuciosa e detidamente as disposições penais

da lei nesta breve oportunidade, cabem ao menos os seguintes comentários:118

Fundamentalmente, ela define o crime de lavagem de dinheiro (art. 1º),

representado pela conduta daquele que oculta, dissimula a natureza, origem,

114 Sobre a realidade da lavagem de dinheiro no Brasil, reportagem do Jornal do Brasil: "Dois terços dos recursos mantidos por brasileiros no exterior estão em paraísos fiscais. São US$ 40,127 bilhões, dinheiro equivalente aos valores de mercado da fabricante de automóveis Ford e do banco Santander, somados. Estes são os dados oficiais, do próprio Banco Central, e parte desse montante tem origem perfeitamente legítima. Na verdade, a fortuna verde-amarela que transita pelo exterior é bem maior. O Brasil figura numa incômoda 20ª posição no ranking dos principais países de origem do dinheiro sujo, remetendo ao exterior anualmente US$ 16,7 bilhões para serem lavados. No topo da lista, os Estados Unidos, com 46,3% de todos os recursos ilícitos do planeta, com US$ 1,32 trilhão. Em todo o mundo, são movimentados clandestinamente US$ 2,85 trilhões.” Reportagem do Jornal do Brasil, por KISCHINHEVSKY, Marcelo, em 13/07/2003. Disponível em: www.mre.gov.br/portugues/noticiario/nacional/selecao_detalhe.asp?ID_RESENHA=1994 Acesso em 01/05/2007. 115 Sobre o tema : ELUF, Luiza Nagib. Lavagem de Dinheiro. O Estado de São Paulo, 16 de junho de 2005; Lavagem de dinheiro, O Estado de São Paulo, 27 de junho de 2005; Lavagem de Dinheiro, O Estado de São Paulo, 13 de novembro de 2005Ainda sobre o tema Uma tese de mestrado defendida por Gerson Luís Romantini, na Unicamp, em 2003, traça um quadro não muito positivo das ações do órgão. De acordo com ele, das mais de 18 mil notificações de operações suspeitas recebidas pelo Coaf entre 1998 (quando a lei da lavagem foi promulgada) e 2002, apenas duas haviam sido encaminhadas à Polícia Federal até 31 de novembro de 2002 e nenhuma ao Ministério Público até 29 de agosto de 2002. Os números são relativos às instituições de São Paulo, estado que, segundo Romantini, mais gera comunicações ao Coaf., disponível em: http://www.unicamp.br/unicamp/unicamp_hoje/ju/julho2003/ju218pg03.html. 116 Sobre as dificuldades na cooperação penal internacional, e a posição do STF nas decisões sobre quebra de sigilo em cartas rogatória Cf. MACHADO, Maira Rocha; REFINETTI, Domingos Fernando. Lavagem de dinheiro e Recuperação de ativos: Brasil, Nigéria, Reino Unida e Suíça. São Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 111 ess. 117 O Coaf, em seu relatório apresentado em 2005, afirma que ocorreram avanços no combate a lavagem nos últimos anos, estes dados esta disponíveis em: https://www.fazenda.gov.br/coaf/portugues/sobrecoaf/RelAtividades2005.pdf , 10/11/2006. 118 Para a análise das legislações brasileiras sobre lavagem, Leis 9613/98 e 10.701/2003, observamos a falta de material para estudo, as poucas obras que tratam do tema foram elaboradas na época da entrada em vigor das leis, o que torna difícil principalmente a análise da eficácia dessas normas em nosso ordenamento jurídico.

Page 46: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

46

localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores

provenientes, direta ou indiretamente, de determinados crimes, estabelecendo um

rol de delitos precedentes, que é taxativo: tráfico ilícito de entorpecentes ou drogas

afins; terrorismo; contrabando ou tráfico de armas, munições ou material destinado à

sua produção; extorsão mediante seqüestro; crimes contra à administração publica,

inclusive a exigência, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, de qualquer

vantagem, como condição ou preço para prática ou omissão de atos administrativos;

crimes contra o sistema financeiro nacional; crimes praticados por organizações

criminosas. (artigo 1º caput, e incisos I a VIII)

O artigo 1º, § 5º da lei, alvo de críticas pelos doutrinadores, introduziu a figura

da delação premiada, possibilitando ao juiz deixar de aplicar ou substituir a pena do

agente que colabora com a Justiça para a elucidação do crime.119

São criadas disposições processuais próprias: o procedimento é o comum

(art. 394 e segs. do CPP), sem defesa preliminar; a competência é basicamente

estadual, salvo nos casos em que exista interesse da União, ou quando o crime

antecedente for do âmbito da Justiça Federal; existe independência processual entre

a persecução penal da lavagem e dos crimes antecedentes (processos separados),

bastando indícios dos crimes anteriores para que a denúncia possa ser oferecida;

inexistência da suspensão do processo ao réu citado por edital, tal como previsto no

artigo 366 do CPP; proibição da concessão da fiança ou liberdade provisória,

estando no âmbito discricionário do juiz a decisão sobre a apelação em liberdade;

está prevista uma medida cautelar inaudita altera pars; a apreensão e seqüestro de 119 Sobre a delação premiada no crime de lavagem Cfr. entre outros: OLIVEIRA, Willian Terra de. O crime de lavagem de dinheiro, em Boletim IBCCRIM, n.º 65, edição especial – abril/1998. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1988, p. 112 e ss; BARROS, Marco Antonio de. “Lavagem” de Capitais e obrigações civis correlatas. São Paulo:Editora Revista dos Tribunais, 2004, p. 225; CALLEGARI, André Luís. Problemas pontuais da lei de lavagem de dinheiro. Em Revista brasileira de ciências criminais, n. 31, ano 8, julho-setembro de 2000, p.184 e ss. São Paulo: revista dos tribunais, 2000; MAIA, Rodolfo Tigre. Lavagem de Dinheiro, São Paulo: Malheiros, 2004, p. 121-122.

Page 47: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

47

bens ilícitos, protraindo-se o contraditório; será possível o confisco de bens no caso

de condenação final, invertendo-se o ônus da prova, já que caberá ao condenado

provar a "licitude" dos bens, ou seja, caso não possa demonstrar sua origem lícita

perderá seus direitos.120 (artigos 2º ao 6º)

A partir do artigo 9º da Lei, contém regras de cunho administrativo destinadas

a tornar eficientes o combate à lavagem, envolvendo desde o controle de atividades

financeiras até a fixação de obrigações às pessoas físicas e jurídicas que atuem em

atividades que envolvam grandes somas de dinheiro.121

Ainda, é criado o COAF (Conselho de Controle de Atividades Financeiras)

que irá coordenar, disciplinar e centralizar as ações contra a lavagem de dinheiro.

Trata-se de órgão multidisciplinar, do qual participam o Ministério da Fazenda,

Banco Central, Comissão de Valores Mobiliários, Polícia Federal e Ministério das

Relações Exteriores.122 (artigo 14º)

É preciso ressaltar que essa lei tornou-se alvo de muitas críticas, sobretudo

pelas lacunas que apresenta. Uma delas diz respeito do crime de terrorismo, na qual

nos deparamos com uma lacuna autêntica, ou seja, aquela que se dá quando a lei

não apresenta uma resposta, quando a partir dela uma solução não pode ser

encontrada. O ordenamento jurídico brasileiro não tipifica como crime o terrorismo,

nem mesmo a Constituição Federal dá essa definição, portanto essa lacuna

inviabiliza a configuração do crime de lavagem derivado de terrorismo.123

120 PITOMBO, Antonio Sergio A. de Moraes. Lavagem de dinheiro: a tipicidade do crime antecedente. São Paulo: Editora revista dos tribunais, 2003, p. 63-66. 121 OLIVEIRA, Willian Terra de. O crime de lavagem de dinheiro, em Boletim IBCCRIM, n.º 65, edição especial – abril/1998. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1988, p. 112 ess184 e ss. 122 Ibidem. 123 Sobre a inclusão do crime de terrorismo no rol dos crimes antecedentes ao delito de lavagem Cfr. entre outros: CALLEGARI, André Luís. Problemas pontuais da lei de lavagem de dinheiro. Em Revista brasileira de ciências criminais, n. 31, ano 8, julho-setembro de 2000, 184 e ss. São Paulo: revista dos tribunais, 2000; BARROS, Marco Antonio de. “Lavagem” de dinheiro. São Paulo: Juarez de Oliveira, 1998; BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Lei n. 10.701 de 9 de julho de 2003: análise inicial das alterações da lei de lavagem de dinheiro. Boletim IBCCRIM. São Paulo, v.11, n.129, p. 8-9, agosto de 2003.

Page 48: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

48

O mesmo ocorre no art1º VII que elenca, como delito antecedente, os crimes

praticados por organização criminosa. Assim como no crime de terrorismo, não

existe definição exata sobre organização criminosa, cuja expressão é encontrada na

lei 9034/95, que dispõe sobre meios operacionais para prevenção e repressão de

ações praticadas por organizações criminosas.124

A intenção do legislador era de punir as condutas dessas organizações

envolvidas em lavagem, mas ao manter o tipo penal aberto – organizações

criminosas de qualquer tipo – nenhum passo importante deu para reavivar a

aplicação da lei 9034/95.125

Em outras palavras, em princípio, toda e qualquer infração penal praticada por

organização criminosa, que represente um acréscimo ao patrimônio dos seus

componentes e que seja objeto de operação ou transação utilizada para ocultar ou

dissimular a origem ilícita, configura o crime de lavagem. Porém, tal qual sucede

com o terrorismo, é de ser considerada inócua a figura correspondente ao inc. VII do

art. 1.° da Lei de Lavagem, visto desatender ao com ando constitucional que

assegura o direito à liberdade, por não haver crime sem lei anterior que o defina,

nem pena sem prévia cominação legal (art. 5º, inc. XXXIX, CF) Nullum crimen nulla

poena sine praevia lege.126

A omissão é desconcertante, organizações criminosas existem, suas

estruturas e formas de operacionalização dos ilícitos, tal como já foram descritas

124 Cf. MAIA, Rodolfo Tigre. Lavagem de Dinheiro, São Paulo: Malheiros, 2004, 109 e ss. PODVAL, Roberto. Lavagem de dinheiro (lei 9.613/98), em Leis Penais Especiais e sua interpretação jurisprudencial, vol. 2. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 2098-2109.; OLIVEIRA, Willian Terra de. O crime de lavagem de dinheiro, em Boletim IBCCRIM, n.º 65, edição especial – abril/1998. São Paulo. 125 CALLEGARI, André Luís. Problemas pontuais da lei de lavagem de dinheiro. Em Revista brasileira de ciências criminais, n. 31, ano 8, julho-setembro de 2000, p 184 e ss. São Paulo: revista dos tribunais, 2000. 126 BARROS, Marco Antonio de. “Lavagem” de Capitais e obrigações civis correlatas. São Paulo:Editora Revista dos Tribunais, 2004, p. 122-124.

Page 49: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

49

anteriormente127, são do conhecimento das autoridades constituídas, mas enquanto

perdurar a pendência legislativa, não será possível eliminar o efeito negativo que a

situação provoca, no âmbito, aos crimes de lavagem.

Assim, por ora, impossível a punição da lavagem quando o crime antecedente

for o crime organizado ou o terrorismo, por não haver na legislação pátria definição

dessas condutas.

Quanto aos dispositivos processuais, a inaplicação do art. 366 do CPP (Lei

9613/98 art. 2º, § 2.º) é inconstitucional, porque todo acusado conta com o direito

certo de ser informado pessoalmente da acusação.128Ao abdicar da aplicação do

artigo 366 do CPP na lavagem de dinheiro, o legislador viola preceito

constitucional.129

Também a restrição aos benefícios da fiança, da liberdade provisória e da

interposição de recurso de apelação em liberdade pela lei 9.613/98 é considerada

pela doutrina, como violação do princípio constitucional da presunção de

inocência.130

127 Sobre a lacuna na definição de organizações criminosas, na Lei 9034/95, vide Capítulo I, item 2.1 supra. 128 GOMES, Luiz Flavio. Lavagem de capitais como expressão do direito penal globalizado. Estudos criminais em homenagem a Evandro Lins e Silva (Criminalista do Século). São Paulo: Editora Método, 2001, p. 233-235. 129 Art. 5.º, inc. LV, da Constituição Federal que estabelece “Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes 130 Cf. SABADELL, Ana Lucia. Problemas de tipificação do delito de lavagem de dinheiro na legislação brasileira, em projeto elaborado no âmbito das atividades de pesquisa da Faculdade de Direito da Universidade Metodista de Piracicaba, 2004; PODVAL, Roberto. Lavagem de dinheiro (lei 9.613/98), em Leis Penais Especiais e sua interpretação jurisprudencial, vol. 2. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.

Page 50: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

50

5.1.2 Lei 10.701, de 09.07.2003 A lei n. 10.701, de 09.07.2003, acrescentou e alterou dispositivos da Lei n.

9.613, de 3 de março de 1998, que dispõe sobre os crimes de lavagem ou ocultação

de bens.131

A primeira alteração trazida pela nova lei foi a inclusão do financiamento do

terrorismo entre os delitos considerados precursores do crime de lavagem de

dinheiro (art. 1º, inc. II). Tal inclusão restará inócua, pois como observamos no item

anterior o ordenamento jurídico brasileiro não tipifica como crime o terrorismo e

também nada prevê sobre o seu financiamento. Desse modo a aplicação deste

artigo continua obsoleta, pois enquanto não houver uma lei que defina o ato de

terrorismo em face ao princípio da legalidade, ninguém poderá ser denunciado por

tal infração.132

Outra modificação ditada pela lei 10.701/03 foi a inclusão do parágrafo 3º, no

artigo 14 da lei 9.613/98, nos seguintes termos: O COAF poderá requerer aos

órgãos da Administração Pública as informações cadastrais bancárias e financeiras

de pessoas envolvidas em atividades suspeitas.

A crítica que aqui se faz é ao conceito atividades suspeitas, por ser

extremamente genérico e impreciso. Quais seriam estas suspeitas que permitiram

ao Coaf, requerer informações financeiras?

Alguns autores apontam que o legislador deveria ter deixado claro que essa

quebra do sigilo bancário e financeiro poderia ser requisitada pelo Coaf, mediante

131 Art. 5.º, inc. LV, da Constituição Federal que estabelece “Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”. 132 BARROS, Marco Antonio de. “Lavagem” de Capitais e obrigações civis correlatas. São Paulo:Editora Revista dos Tribunais, 2004, p. 171 e ss.

Page 51: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

51

prévia autorização judicial, quando houvesse indícios suficientes de que a pessoa

estaria envolvida em atividades ilícitas de lavagem de dinheiro.133

Para a aplicação do tipo penal, ditado pelas leis acima referidas, torna-se

necessário investigar e reconhecer o bem jurídico resguardado pela lavagem de

dinheiro.

133 BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Lei n. 10.701 de 9 de julho de 2003: análise inicial das alterações da lei de lavagem de dinheiro. Boletim IBCCRIM. São Paulo, v.11, n.129, p. 8-9, agosto de 2003.

Page 52: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

52

6 - Do Bem Jurídico

6.1 Bem Jurídico: Conceito

A elaboração dogmática da teoria do bem jurídico conta com uma evolução

de dois séculos de duração, e ainda hoje é considerada uma das questões mais

difíceis do direito penal.134

Não obstante a dificuldade de se determinar a noção do bem jurídico é certo

que a missão do direito penal, admitida pela maioria dos doutrinadores modernos, é

a de proteção de tais bens, delimitando seus limites.135 Este princípio de exclusiva

proteção de bens jurídicos constitui um limite fundamental ao exercício do ius

puniendi do Estado.

A tutela jurídico-penal só faz sentido quando o Estado impõe normas penais

que objetivam um interesse relevante. Sem interesses penalmente relevantes, não

há tutela, e estes traduzem-se através dos bens jurídicos.

Ao afirmamos que toda incriminação visa a defender um bem jurídico, o seu

conceito pode ser entendido tanto de uma perspectiva dogmática, quanto de uma

perspectiva político criminal, ou, para usar a conhecida terminologia de Hassemer136,

tanto de uma perspectiva imanente ao sistema, quanto transcendente ao sistema.137

134 Nesse sentido cfr. entre outros: PODVAL, Roberto. O bem jurídico do delito de lavagem de dinheiro. Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo: Editora revista dos Tribunais, nº 24, ano 6, 1998, p. 210. 135 Ibidem. 136 HASSEMER, Theorie und Soziologie dês verbrechens. Ansätze zu einer praxisorientierten Rechtsgutslehre, apud BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitales. Navarra: Arazandi, 2ªed, 2002, p. 154. 137 Mir Puig contrapõe o sentido político-criminal do bem jurídico ou de lege ferenda ao sentido dogmático ou de lege lata.

Page 53: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

53

De uma perspectiva dogmática (intra-sistemática138 ou imanente ao sistema)

entende-se o bem jurídico como o escopo da norma penal, isto é, o bem jurídico não

é apenas o objeto da tutela, é a verdadeira essência da norma penal. Neste aspecto,

observa-se que o tipo parte da norma, e esta se faz do bem jurídico139. Deste modo,

dentro do contexto do princípio da legalidade, a norma é o limite para identificar-se o

bem jurídico tutelado.

O bem jurídico, analisado na presente visão, é o interesse protegido por

determinada norma, e onde houver uma norma, haverá um tal interesse. Por isso, o

direito penal estrutura-se em bens jurídicos que podem ser extraídos das normas do

sistema jurídico-penal.

Ainda dentro de uma visão dogmática muito se discute sobre quais as

conseqüências jurídicas da adoção da teoria do bem jurídico. 140

Para fundamentar a adoção de tal teoria podemos apontar duas correntes. A

primeira sustenta que o bem jurídico desempenha uma importante função na

interpretação jurídica. No âmbito dessa visão, ele tem uma importante função como

meio de interpretação teleológica no direito penal.141

A função interpretativa do conceito do bem jurídico, na interpretação

teleológica da norma, é de importância para a verificação de outra dimensão do

delito: a efetiva lesão ao bem. Apesar de uma conduta cumprir o pressuposto fático

legal (antijuridicidade formal), não haverá tipicidade se o bem jurídico pretensamente

protegido não sofrer lesão (antijuridicidade material). Cumpre à função teleológica, a

interpretação do fato concreto para verificação da real lesão ao bem tutelado. O

intérprete, além de verificar, da perspectiva ex ante, a existência de uma conduta

138 SABADELL, Ana Lucia; DIMOULIS, Dimitri e MINHOTO, Laurindo Dias. Direito social, regulação econômica e crise do Estado. Rio de Janeiro: Revan, 2006, p. 52. 139 JESCHECK, Hans-Heinrich. Tratado de Derecho Penal, 4. edição. Granada: Comares, p. 236 e ss. 140 SABADELL, Ana Lucia; DIMOULIS, Dimitri e MINHOTO, Laurindo Dias. Op cit, p. 52. 141 Ibidem, p.53.

Page 54: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

54

lesiva em abstrato, necessita confirmar, ex post, se a lesão ou o perigo de lesão

incorporam-se ao telos da norma.142

Já a outra corrente rejeita a interpretação teleológica, partindo da idéia do

princípio da legalidade, sustenta que o legislador apenas descreveu aquilo que

desejou descrever, e não cabe ao aplicador da norma analisar as intenções do

legislador. Isso não é relevante no âmbito penal, pois não se admite introduzir

exceções recorrendo a uma hipotética vontade do legislador ou a uma danosidade

social. 143

A principal crítica ao conceito dogmático é a possibilidade do legislador, ad

nutum, eleger bens jurídicos, muitas vezes divorciados de qualquer ofensa a valores

consagrados pela sociedade e não necessariamente relevante ao direito penal.

Dessa forma, surgem inúmeros caminhos para o processo de criminalização, uma

vez que a vontade do legislador pode estabelecer o que pode ou não ser tutelado

pelo direito penal.

Ademais, um conceito meramente dogmático impõe a necessidade de

elaboração de um tipo penal, de maneira a compreender-se o bem jurídico

protegido, sem maiores complicações hermenêuticas. A ratio legis da norma

incriminadora deve ser clara e delimitada, dentro do princípio fundamental da

legalidade.

A lei de lavagem de dinheiro é exemplo das dificuldades de uma análise

puramente dogmática. A mera leitura de seus tipos penais, sem considerar as

finalidades propostas pelo legislador, não nos permite compreender os objetivos de

política criminal delineados pelo legislador.

142 GIMBERNAT ORDEIG, Enrique. Conceito e método da ciência do direito penal. Trad. José Carlos Gobbis Pagliuca. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2002. p. 79. 143 SABADELL, Ana Lucia, op cit p. 53.

Page 55: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

55

Em suma, é fácil constatar a crise pela qual passa a teoria do bem jurídico se

analisada apenas sob o ponto de vista dogmático. Para dar maior efetividade e

legitimidade, ao direito penal faz-se necessário considerar também, o conceito

político-criminal de bem jurídico. A construção político-criminalmente orientada do

bem jurídico será o complemento da orientação dogmática.144

Extrai-se dupla função do conceito político-criminal de bem jurídico, já que

serve para limitar as sanções do direito penal aos comportamentos prejudiciais, bem

como para justificar a ampliação145 da proteção penal aos novos interesses sociais

que estão a surgir146.

A política criminal situa o direito penal em uma realidade social. Por ser a

criminalidade mutável, é necessária a adoção de critérios político-criminais para

haver harmonia entre a realidade fática e o ordenamento jurídico-penal.

Para o direito penal acompanhar a evolução social, o legislador deve valer-se

de orientações político-criminais para buscar a eficácia máxima da norma.

Diante da evolução criminológica, o grande desafio do legislador penal é estar

atento às novas formas de criminalidade permitidas pela globalização, de maneira a

não desrespeitar os princípios da intervenção mínima e da subsidiariedade147. A

mera proliferação de comportamentos que frustrem as expectativas sociais, não dá

ao legislador, e muito menos ao operador do direito, a possibilidade de abertura para

a expansão do direito penal. Somente com medidas coerentes de política criminal

144 GRECO, Luis. Princípio da ofensividade e crimes de perigo abstrato. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v. 49, p. 92, jul./ago. 2004, p. 98. 145 Como exemplos desta ampliação estão a preservação do meio ambiente, o bom funcionamento das telecomunicações, a proteção dos usuários de informática, a capacidade funcional da economia, a conservação do material genético humano, a eficaz utilização da energia nuclear, entre outros. 146 BUSTOS RAMIRES, Juan J.; HORMAZÁBAL MALARÉE, Hermán. Lecciones de derecho penal. Madrid: Trota, 1997. v. 1, p. 61. 147 Sobre a relevância do Princípio da Intervenção Mínima em nosso ordenamento jurídico Cfr. ROBERTI, Maura. A intervenção Mínima como Princípio no Direito Penal Brasileiro. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2001, p. 53 e ss.

Page 56: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

56

será possível cuidar das novas faces da criminalidade sem dilatar a repressão

estatal por meio da lei penal.148

Importante destacar, no entanto, que a concepção político-criminal de bem

jurídico não restou imune às críticas da doutrina, a qual aponta, entre outras, que o

legislador, muitas vezes em nome de uma “política criminal” de proteção de bens

jurídicos, elabora cada vez mais tipos penais, como estratégia de buscar a solução

dos conflitos sociais. Acarreta, assim, a perda da finalidade do direito penal, já que

está a tutelar bens jurídicos irrelevantes, tuteláveis por outros meios, desrespeitando

o princípio da intervenção mínima.149

Entretanto, afastam-se os críticos dessa corrente, pois fazer-se referência ao

conceito político-criminal de bem jurídico,não implica conceder ao legislador a total

liberdade de escolher e tutelar aquilo que pretende. É indispensável ponderar

valores e delimitar a atuação do direito criminal para evitar arbitrariedades. Assim,

queremos um bem jurídico capaz de restringir o poder de incriminar do legislador, e

a solução encontrada por grande parte da doutrina150, é definir o bem jurídico com

arrimo na Constituição.151

Dessa forma, estaríamos diante de um conceito político-criminal de bem

jurídico vinculante para o legislador, já que ele seria extraído da Constituição

Federal.

Da adoção desse critério surge outro problema, pois sendo a Constituição

necessariamente aberta, se inúmeros valores, mesmo conflitantes, encontram

acolhida em seu bojo, como se afirmar uma limitação ao legislador?

148 MARTINELLI, João Paulo Orsini. O bem jurídico tutelado pela lei de lavagem de capitais. Tese apresentada na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo – USP. São Paulo, 2007, p. 43. 149 Ibidem p. 46. 150 Cfr. GOMES, Luiz Flavio, Norma e bem jurídico no direito penal. São Paulo: Revista dos tribunais, 2002, p. 96; BATISTA, Nilo, Introdução critica ao direito penal brasileiro, 4 ed. Rio de Janeiro: Revan, 1999,p. 130; PRADO, Luiz Regis. Bem jurídico penal e constituição. São Paulo: Revista dos tribunais, 2003, p. 90. 151 GRECO, Luis. Op. Cit p.101.

Page 57: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

57

A solução se assenta nos princípios constitucionais, notadamente no da

lesividade, subsidiariedade ou da ultima ratio152 e da proporcionalidade, pois nem

tudo o que a Constituição acolhe em seu texto pode ser objeto de tutela penal.

Importante distinguir, primeiramente, entre princípios constitucionais e bens

reconhecidos pela Constituição, pois os princípios constitucionais são limites às leis

penais, mas os bens reconhecidos pela Carta Magna (propriedade, saúde pública,

por exemplo) não o são. Destarte, a não menção de alguns bens na Lei Maior, não

reflete necessariamente sua desclassificação na escala de valores penais, uma vez

que os limites à criminalização estão nos princípios constitucionais, e não nos bens

arrolados em seu texto.153

Ademais, nem todos os bens constitucionais são de tal relevância ao

funcionamento do ordenamento jurídico que mereçam a distinção do direito penal. A

Constituição Federal, por meio de seus princípios, estabelece não um rol taxativo de

bens penalmente relevantes, mas uma orientação político-criminal ao legislador.

152 Sobre o princípio da subsidiariedade Maura Roberti ensina: “A intervenção subsidiária do Direito Penal é um postulado limitador do jus puniendi, de fundamento político-criminal, que sugere aos Poderes Públicos o uso cuidadoso e cautelosos dos recursos gravosos penais, precisamente porque o Estado Democrático de Direito dispõe de outros meios eficazes e de menor custo social. O Direito Penal é um dos meios de ação de que a sociedade dispõe para lutar contra a criminalidade, porém ele possui um papel limitado no combate. O Estado Moderno, por outro lado, dispõe de um verdadeiro arsenal de meios extrapenais para cumprir com eficácia sua função protetora da ordem social; em conseqüência não será legitimado a lançar mão de meios de especial severidade, como os penais, e sim cabe utilizar com êxito meios de natureza não-penal, que são, consequentemente, menos devastadores”. ROBERTI, Maura. A intervenção Mínima como Princípio no Direito Penal Brasileiro. Op. Cit. 102. 153 Sobre o tema ensina Reale Junior, que o “direito penal está limitado negativamente pela Constituição, devendo ater-se aestes princípios, não violando os valores constitucionais, mas sim por eles pautando-se” (REALE JR.,Miguel. Instituições de direito penal: parte geral. Rio de Janeiro: Forense, 2002. v. 1, p. 27).

Page 58: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

58

6.1.1. Conclusão sobre o conceito de bem jurídico n o direito penal

É indiscutível a importância da fixação de um bem jurídico para que a norma

penal tenha legitimidade. Os doutrinadores, majoritariamente, não reconhecem uma

norma penal que não tenha em seu escopo a proteção de algum bem jurídico

relevante. Todavia, só se admite um bem jurídico se preenchidos alguns requisitos,

tais como a observância dos princípios da intervenção mínima, subsidiariedade, da

proporcionalidade e da lesividade.

Como visto, um conceito de bem jurídico meramente dogmático não se

mostra capaz de explicar a tutela penal de todas as normas. Necessário se faz,

portanto, adotar um conceito político-criminal que auxilie o legislador a eleger os

bens que merecem proteção.

Não se pode esquecer, entretanto, que este conceito deve estar arrimado na

Constituição, mas não se limita meramente a refletir os valores que esta consagra,

uma vez que somente os valores fundamentais podem justificar a gravidade da

intervenção penal.

Finalmente podemos conceituar o bem jurídico como um conjunto de valores

essenciais ao desenvolvimento do homem e da sociedade, cuja proteção jurídico-

penal seja imprescindível à sua manutenção, dentro de um contexto de legalidade.

Nos capítulos seguintes, serão analisados os eventuais bens jurídicos

tutelados pela lei 9.613/98.

Page 59: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

59

6.2. O bem jurídico tutelado no delito de lavagem d e dinheiro

Delimitado o conceito de bem jurídico passaremos a estudar qual é o objeto

de proteção no delito de lavagem de dinheiro.

Devemos inicialmente esclarecer que se trata de tema que gera uma série de

controvérsias doutrinárias, não apenas entre os juristas brasileiros, mas também

entre os estudiosos estrangeiros154. São tantos os posicionamentos quanto ao bem

jurídico protegido pela referida lei, que geram teorias antagônicas. Alguns autores

sustentam a inexistência de um interesse digno de proteção155 e outros afirmam ser

um delito pluriofensivo, ou seja, resguardam vários bens jurídicos156.

O presente capítulo busca a análise das principais teorias do bem jurídico da

lavagem de dinheiro, com os argumentos utilizados por seus adeptos. Dentre as

principais correntes doutrinárias que assumem um bem jurídico a ser tutelado pela

lei de lavagem, encontram-se as seguintes: a) o mesmo bem jurídico protegido pelo

crime antecedente ou proteção preventiva dos bens jurídicos tutelados no rol de

crimes antecedentes; b) ordem econômica e sistema financeiro; c) Administração da

Justiça; d) pluralidade de bens jurídicos.

154 Cf. : PASTOR, Daniel Alvarez; PALACIOS, Fernando Eguidazu. La prevención del blanqueo de capitales. Aranzandi, 1998, p. 233; CASTELLAR, João Carlos. Lavagem de Dinheiro - A Questão do Bem Jurídico. Rio de janeiro: Revan, 2004; INESTA, Diego Gómez. El delito de blanqueo de capitales en derecho español. Barcelona: Cedecs, 1996, p. 152; BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitales. Navarra: Arazandi, 2ªed, 2002; PODVAL, Roberto. O bem jurídico do delito de lavagem de dinheiro. Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo: Editora revista dos Tribunais, nº 24, ano 6, 1998, p. 212; GOMES PAVÓN, Pilar. El bien jurídico protegido em la receptación, blanqueos de dinero y encobrimientos, 1994, p. 123. 155 Neste sentido: João Carlos Castellar, Lavagem de Dinheiro - A Questão do Bem Jurídico. Rio de janeiro: Revan, 2004; MARTINELLI, João Paulo Orsini. O bem jurídico tutelado pela lei de lavagem de capitais. Tese apresentada na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo – USP. São Paulo, 2007, p. 54. 156 MAIA, Rodolfo Tigre. Lavagem de Dinheiro. Op. Cit. 57-60.

Page 60: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

60

6.2.1 O mesmo bem jurídico protegido pelo crime ant ecedente ou proteção preventiva dos bens jurídicos tutelados no rol de c rimes antecedentes

Esta primeira corrente sustenta que se protege o mesmo bem jurídico tutelado

pelo crime antecedente, objetivando com o tipo de lavagem de dinheiro evitar que,

com a utilização dos bens, se facilite a prática de delitos prévios. Entende-se aqui

que o objetivo do legislador não é evitar a lavagem de dinheiro em si, mas a prática

do crime antecedente.

Esse pensamento fundamenta-se no primeiro movimento de caracterização

dos crimes antecedentes que ocorreu logo após a Convenção das Nações Unidas

contra o tráfico ilícito e de substâncias psicotrópicas, a chamada Convenção de

Viena, de 20.10.1988, onde os países membros da ONU aprovaram a Resolução

que os obrigava a dotar seu ordenamento jurídico de leis para criminalizar a lavagem

de capitais oriundos do tráfico de entorpecentes. Sendo assim, a criminalização da

lavagem de dinheiro surge como uma forma de coibir o avanço crescente e

incontrolável do tráfico de drogas, já que, mesmo diante de leis penais cada vez

mais severas, tal criminalidade persistia e se aperfeiçoava. Dessa forma, passou-se

a punir a finalidade do tráfico, ou seja, o lucro.157

Enquanto o objetivo inicial das legislações era seguir as recomendações da

Convenção de Viena, criminalizando a lavagem de dinheiro para conter o tráfico de

entorpecentes, o bem jurídico tutelado, era também o mesmo bem jurídico do trafico,

qual seja, a saúde pública.158

157 BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitales. Op. Cit. 153 e ss. 158 PODVAL, Roberto. O bem jurídico do delito de lavagem de dinheiro. Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo: Editora revista dos Tribunais, nº 24, ano 6, 1998, p. 212.

Page 61: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

61

Todavia, com ampliação do rol dos delitos antecedentes, modificou-se o bem

jurídico tutelado, que deixou de ser exclusivamente a saúde pública, passando a ter

limites mais amplos.159

Após essa alteração, alguns autores160 passaram a sustentar que o bem

jurídico seria o somatório de todos os bens protegidos pelos crimes precedentes, ou

seja, seria o conjunto de todos os bens jurídicos tutelados por crimes susceptíveis

de gerar lucro.161

Essa concepção é equivocada por almejar criar um supertipo, cuja função

seria atuar nas hipóteses de ineficácia de outro tipo penal, o que implicaria a própria

negação da idéia de tipo. Cada situação, socialmente valiosa, merece a tutela do

respectivo tipo individualizador da conduta proibida.162

Outro argumento contra essa posição apresentado por parte dos

doutrinadores é a falta de clareza dogmática no plano da causalidade. Se o bem

jurídico antecedente já foi lesado, eventual punição pela lavagem equivaleria a

retroceder o nexo causal, pois o resultado lesivo (lesão ao bem jurídico do crime

anterior) apareceria antes da própria conduta do agente. O bem jurídico já se

encontra lesado, apesar da conduta do agente – lavar dinheiro – chegar

posteriormente.163

159 Ibidem. 160 Entre os doutrinadores brasileiros que sustentam ser o bem jurídico do delito de lavagem o mesmo protegido no delito prévio: GRECO FILHO, Vicente. Tipicidade, bem jurídico e lavagem de valores. In: COSTA, José de Faria; SILVA, Marco Antonio Marques da (Coords.). Direito penal especial, processo penal e direitos fundamentais: visão luso-brasileira. São Paulo: Quartier Latin, 2006. p. 159-160. MACHADO, Maíra Rocha. Internacionalização do direito penal: a gestão de problemas internacionais por meio do crime e da pena. São Paulo: Ed. 34; Edesp, 2004. p. 127. 161 GODINHO, Jorge Alexandre Fernandes. Do crime de “Branqueamento”de Capitais – Introdução e Tipicidade. Coimbra: Livraria Almedina, 2001, p.208. 162 PITOMBO, Antônio Sergio A. de Moraes. “Lavagem” de dinheiro – A tipicidade do crime antecedente. São Paulo: RT, 2003, p. 74. 163 DIONYSSOPOULOU, Athanassia, apud MARTINELLI, João Paulo Orsini. O bem jurídico tutelado pela lei de lavagem de capitais. Tese apresentada na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo – USP. São Paulo, 2007, p. 54.

Page 62: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

62

Enfim, através de uma análise intra-sistemática, concordamos que seria

inviável considerar a super proteção do bem jurídico do crime antecedente, porque o

nexo de causalidade entre ação e resultado experimentaria uma real inversão

valorativa. A ordem natural do delito apresenta o resultado lesivo posterior à conduta

do agente, o que não acontece para esta teoria. Quando o resultado lesivo (lesão ao

bem jurídico do crime antecedente) vier antes da conduta do agente (lavar dinheiro)

a própria teoria do delito perde sua consistência lógica.

6.2.2 A Administração da Justiça

Para um segmento doutrinário164 significativo, o bem jurídico protegido pelo

delito de lavagem de capitais seria a administração da justiça165, pois os

comportamentos incriminados no delito em questão vulneram o interesse Estatal em

identificar a proveniência dos bens e os sujeitos ativos de ilícitos que os geraram,

em desestimular a sua prática, em reprimir a fruição de seus produtos e em lograr a

punição dos seus detentores, e dessa forma podem afetar o funcionamento regular

da Justiça.166

Ao punir a lavagem de dinheiro, tenta-se impedir que o produto do ilícito

possa ser transformado e dissolvido no meio social, evitando assim, seu confisco,

bem como a identificação da autoria e materialidade do crime antecedente. O

legislador ao definir os crimes prévios aptos a provocar punição por lavagem está,

164 Nesse sentido na doutrina pátria Cfr: Rodolfo Tigre Maia; Roberto Podval; Nelson Jobim. Entre os doutrinadores estrangeiros que seguem esta corrente Cfr: Isidoro Blanco Cordero; Bacigalupo Zapater; Fabián Caparrós; Faraldo Cabana; M. Zanchetti; J. Ackermann; H. Otto. 165 Ensina Magalhães Noronha que, alcançando-se como bem jurídico, a “administração da justiça” se tem por escopo proteger a atuação, o desenvolvimento normal da instituição, tutelando-a contra fatos atentatórios à sua atividade, autoridade e à própria existência, isto é, contra fatos que a negam e postergam. NORONHA, E Magalhães. Direito Penal. Vol. 4. São Paulo: Editora Saraiva, 17ª edição, 1985. 166 MAIA, Rodolfo Tigre. Lavagem de Dinheiro, São Paulo: Malheiros, 2004, p.57.

Page 63: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

63

em termos de política criminal, tentando evitá-los. Incriminar a lavagem é a forma de

dificultar a proliferação de tais crimes, em razão dos malefícios reais que esses

crimes trazem a sociedade.167

Outro aspecto, ressaltado pelos defensores desta corrente, é que o crime de

lavagem seria uma espécie de favorecimento real, por ser criado para proteger a

administração da justiça que se encontra incapaz de punir os responsáveis pelos

crimes antecedentes, em razão do auxílio prestado aos criminosos.168

Sustentam ainda que o delito de lavagem se assemelha ao favorecimento

real169, pois ao ocultar-se impede-se o cumprimento da função de descobrir e

perseguir os delitos. Seria uma modalidade sui generis de favorecimento real em

que o bem jurídico tutelado é a administração da justiça, reprimindo as condutas

perturbadoras de tal função ao ajudar a encobrir um delito precedente.170

Entre as críticas que se fazem a respeito de tal corrente, está a que diz

respeito à afirmada similaridade com o delito de favorecimento real. Se verdadeira a

relação gênero-espécie entre ambas infrações, dever-se-ia se assentar que o crime

de lavagem não seria típico, se cometido pelo autor do crime antecedente, por não

se punir o auxilium post delictum, realizado por aquele que praticou o próprio delito

anterior, seja como autor ou partícipe.171 Ademais, quase todas as disposições

internacionais sobre lavagem sancionam a intervenção do autor ou partícipe do

167 PODVAL, Roberto. O bem jurídico do delito de lavagem de dinheiro. Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo: Editora revista dos Tribunais, nº 24, ano 6, 1998, p. 219. 168 GODINHO, Jorge Alexandre Fernandes. Do crime de “Branqueamento”de Capitais – Introdução e Tipicidade. Coimbra: Livraria Almedina, 2001, p 101-109. 169Oportuno lembrar, que o tipo subjetivo do crime de favorecimento real diferencia-se do crime de lavagem de dinheiro, uma vez que no primeiro basta a vontade do agente de prestar auxílio ao criminoso, com o fim de assegurar-lhe o proveito do crime, enquanto na lavagem a intenção do agente deve ser a de, além de ocultar o produto do crime cometido por terceiros, dar-lhe aparência idônea, reintegrando-lhe no mercado como se tivesse obtido licitamente. 170 GOMES PAVÓN, Pilar. El bien jurídico protegido em la receptación, blanqueos de dinero y encobrimientos, 1994. 171 Ibidem.

Page 64: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

64

delito prévio pelas posteriores condutas de lavagem, sem utilizar o delito de

favorecimento.172

Outro ponto que deve ser observado é que o ordenamento jurídico pátrio já

tutelou a Administração da Justiça nos tipos descritos nos artigos 338 ao 359 do

Código Penal, entre os quais incluem o favorecimento real (artigo 349). Sendo

assim, considerar uma tutela em dobro a este bem jurídico não está de acordo com

o direito penal mínimo proposto pela maioria dos doutrinadores.173

No entanto, a maior crítica aos defensores dessa idéia fundamenta-se no

desaparecimento do fim limitador do ius puniendi, inerente ao conceito de bem

jurídico. Sob o fundamento “administração da justiça”, pode-se criar direito penal,

submisso a qualquer tendência ideológica174.

O bem jurídico não pode ser admitido de forma tão genérica, sob o risco de

extinguir-se a garantia que este oferece. Ele põe-se como sinal da lesividade

(exterioridade e alteridade) do crime que o nega, revelando e demarcando a ofensa.

Essa materialização da ofensa, de um lado contribui para a limitação legal da

intervenção penal, e de outro a legitima175.

Na doutrina estrangeira, entre os países onde prevalece esta corrente, estão

a Itália176, Suíça177 e Alemanha178.

172 CALLEGARI, André Luís. Lavagem de Dinheiro. Op. Cit. p. 141-150. 173MARTINELLI, João Paulo Orsini. O bem jurídico tutelado pela lei de lavagem de capitais. Op. Cit., p. 68. 174 PITOMBO, Antônio Sergio A. de Moraes. “Lavagem” de dinheiro – A tipicidade do crime antecedente. São Paulo: RT, 2003, p. 79. 175 BATISTA, Nilo. Introdução crítica ao direito penal brasileiro. Rio de Janeiro: Revan, 1990. 176 O artigo 648 bis do código penal italiano tutela diretamente “as investigações sobre a procedência delitiva dos bens: investigações através das quais a justiça pretende golpear aos autores dos delitos base. Cfr. ZANCHETTI, Mario.Il riciclaggio di denero proveniente da reato. Milão: Giuffré,1997, p. 388. 177 Segundo ACKERMANN, o artigo 305 bis da lei penal helvética protege a administração da justiça suíça e extrangeira em sua função de localizar os produtos delitivos , descobrir sua origem e confisca-los. ACKERMANN apud SOUTO, Miguel Abel. El blanqueo en la normativa internacional. Serviço de Publicación e intercambio Científico da Universidade de Santiago de Compostela, 2002, p. 297. 178 A doutrina dominante afirma que numero 1 do § 261 StGB protege a administração da justiça interior em sua tarefa de eliminar as conseqüências jurídicas dos delitos, enquanto o numero 2 do § 261 StBG tutelaria tanto o bem jurídico afetado pelo delito prévio como a administração da justiça estatal. SOUTO, Miguel Abel. El blanqueo en la normativa internacional.op. cit., p. 296.

Page 65: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

65

6.2.3 Ordem socioeconômica

Para uma grande parcela da doutrina179, o legislador, por meio da lei de

lavagem de dinheiro, pretende tutelar a ordem socioeconômica, visando a proteger a

circulação de capitais lícitos, mantendo a competitividade legal de mercado, sem a

presença de dinheiro oriundo de crimes. 180

Justifica-se a proteção penal da ordem socioeconômica, sob o fundamento de

que, no caso específico da lavagem de dinheiro, o sujeito passivo é a comunidade

em geral, devido às profundas alterações do sistema econômico e financeiro que

distorcem os pressupostos básicos de convivência social. Neste caso o sistema

econômico é concebido como um conjunto coerente de instituições jurídicas e

sociais que garantem e realizam o equilíbrio econômico.181

O crime de lavagem causa lesão à economia amplamente considerada,

atingindo o poder estatal na existência da manutenção econômica estabelecida pelo

Estado, atingindo essa ordenação no seu conjunto ou nos ramos particulares, como

pressuposto necessário da capacidade do Estado para realizar suas tarefas

econômicas.182

O desenvolvimento das organizações criminosas, por uma parte, e dos

instrumentos monetários eletrônicos, por outra, mudou o panorama da lavagem de

dinheiro. A globalização da economia aumentou significativamente com o

desenvolvimento dos mercados e com a redução dos controles nas fronteiras, e este

179 Nesse sentido cfr. entre outros: CERVINI, Raúl; GOMES, Luiz Flávio ; OLIVEIRA, William Terra. Lei de Lavagem de Capitais. São Paulo, op. Cit. p. 321-323; VERÇOSA, Haroldo Malheiros Duclerc. A lavagem ou ocultação de dinheiro e de outros bens e a atividade empresarial. RDM, n. 113, jan-mar, 1999, p.81; SOUZA NETO, José Laurindo de. Lavagem de Dinheiro: comentários à Lei 9.613/1998. Curitiba: Juruá, 1999, p. 99; PITOMBO, Antônio Sergio A. de Moraes. “Lavagem” de dinheiro – A tipicidade do crime antecedente.Op. cit. p. 77. 180 MARTINELLI, João Paulo Orsini. O bem jurídico tutelado pela lei de lavagem de capitais. Op. Cit., p. 56. 181 SLAIBI FILHO, Nagib. Anotações à constituição de 1988 – aspectos fundamentais. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1989, p.383. 182 Eb. Schmidt apud. COSTA ANDRADE, Manuel da. A nova lei dos crimes contra a economia (dec.-Lei nº 28/84, de 20 de janeiro) `a luz do conceito de” bem jurídico”.Coimbra: Coimbra Editora, 1998, p. 395.

Page 66: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

66

processo de globalização beneficia as organizações criminosas que desenvolvem

mecanismos de lavagem que lhes permitem injetar rápida e discretamente nos

mercados mundiais o capital que resulta de atividades ilícitas. Neste contexto, o

dinheiro em processo de lavagem gera movimentos rápidos de capital e, portanto,

participa nos movimentos especulativos. O processo de globalização é aproveitado

pela empresa criminosa que mediante a diversidade de técnicas pode dissimular as

manobras tendentes à lavagem de ativos.183

É importante considerar que a lavagem de dinheiro pode potencialmente

impor custos à economia mundial, por ter capacidade de prejudicar as operações

econômicas dos países corrompendo o sistema financeiro e reduzindo a

credibilidade no complexo financeiro internacional, causando a instabilidade do

sistema e por conseqüência reduzindo a taxa de crescimento da economia

mundial.184

Também se constatou que a lavagem de capitais gera a perda da confiança

no mercado, pois investidores estrangeiros tendem a evitar investir em mercados

associados à lavagem de dinheiro e à corrupção.185

Para a ampliação de suas atividades delitivas e a conseqüente consolidação

de sua estrutura organizacional, a criminalidade organizada acaba por participar na

econômica legal, através de operações financeiras e da constituição de entidades e

empresas destinadas a receber fluxo de capitais, que passarão a ser utilizados em

atividades de comércio, indústria, agenciamento ou intermediação. Esse

financiamento ilegal acaba por contaminar a normalidade do contexto econômico,

pois produz uma situação de intensa desigualdade entre investidores lícitos e

183 FABIÁN CAPARRÓS, Eduardo. El delito de lanqueo de capitales. Madrid: Colex, 1998, p. 220. 184 Disponível em www.cicad.org, El delito de lavado de activos como delito autônomo.22/08/2005 185 PITOMBO, Antônio Sergio A. de Moraes. “Lavagem” de dinheiro – A tipicidade do crime antecedente. São Paulo: RT, 2003, p. 80.

Page 67: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

67

aqueles que buscam sua força em capitais de origem ignorada. 186 É criada uma

competição desleal e um profundo desconhecimento da realidade do mercado, o

que, ao final, irá produzir um nefasto efeito sobre as bases da economia,

comprometendo a estabilidade econômica e a normalidade política que dela

deriva.187

Um claro exemplo do impacto que a lavagem de capitais produz sobre a

concorrência entre empresas nos oferece a doutrina italiana: se dois bancos locais

operam na mesma cidade, aquele que permitir usar sua organização para branquear

dinheiro desfrutará de maior fluxo monetário e poderá empregar as comissões

obtidas através do capital ilícito, para reduzir os custos de outras prestações,

enquanto a entidade financeira que tenha especial cuidado em não ser utilizada para

operações de lavagem, corre o risco de oferecer serviços com valores menos

atrativos do que a do banco concorrente.188

Afirma-se que a presença de organizações delitivas desanima os planos dos

investidores que pretendem incorporar capitais legais em qualquer setor da

economia. Por conseqüência, quanto maior foi a incorporação de capitais ilegais,

maior será o estado de corrupção da política189, da economia e das instituições

administrativas.190

186 GOMES, Luiz Flavio; OLIVEIRA, William Terra de; CERVINI, Raúl. Lei de Lavagem de Capitais. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998, p. 321. 187 Neste sentido Díez Ripollés sutenta que as organizações criminosas levam a cabo atuações de monopólio e oligopólio, as quais repercutem em todos os setores da livre concorrência, desde os mecanismos de formação ou determinação de preço ata a salvaguarda dos direitos dos consumidores. DÍEZ RIPOLLÉS, J, Alternativas a la actual legislación sobre drogas. Valencia:: Tirant lo Blanch, 1993,p. 392. 188 UBERTAZZI, L. Riciclaggio e concorrenza sleale. Apud SOUTO, Miguel Abel. El blanqueo en la normativa internacional.op. cit., p. 329. 189Conforme salienta Eduardo Araújo da Silva, o crime organizado apresenta um alto poder de corrupção em virtude da acumulação de riquezas que se direcionam às várias instâncias formais de controle, bem como aos integrantes das altas esferas do Poder Executivo, aos responsáveis pelos processos legislativos, com a finalidade de paralisar qualquer medida limitadora de suas atividades. Dois fatores favorecem o crime organizado e, via de conseqüência, a corrupção se alastra nos países fragilizados por suas atuações. O primeiro é a forma de organização empresarial com emprego de técnicas avançadas de atuação, pois estas funções são distribuídas de acordo com os sistemas jurídicos dos diversos países. O segundo é que o crime organizado tem uma atividade que dificulta a percepção da fronteira entre ilegalidade e a sociedade,

Page 68: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

68

Um dos maiores perigos para os países em desenvolvimento é aceitar fundos

para “beneficiar” sua economia, sem ter em conta a possível origem ilegal destes.

Desta forma se permite que o crime organizado comece a penetrar em seu sistema

bancário e legal. Com isso, estes grupos organizados podem infiltrar-se nas

instituições financeiras, adquirir o controle destas e posteriormente de setores da

economia, tudo isso muitas vezes com o suborno de servidores públicos. Em última

instância, o poder econômico e político das organizações criminosas podem debilitar

as instituições democráticas de governo.191

Em tese defendida na Unicamp, Gerson Luis Romantini192 aponta as

inúmeras conseqüências negativas causadas pela lavagem de dinheiro, tanto na

economia nacional como na mundial. O autor afirma, entre outros aspectos, que a

transparência e a saúde dos mercados financeiros são elemento-chave para um

bom funcionamento das economias, que, no entanto, podem ser negativamente

afetados pela injeção de dinheiro ilícito, resultante da lavagem de dinheiro. Afirma

ainda, que esse dinheiro de origem ilícita pode ser usado para corromper pessoas

que tomam decisões sobre o funcionamento do mercado financeiro dos países, e

com isso a credibilidade perante o público, tão necessária para o funcionamento das

instituições financeiras, pode ser rapidamente perdida.

A propósito, o FMI – Fundo Monetário Internacional – resumiu o potencial

impacto macroeconômico da lavagem de dinheiro, como podendo dar lugar a: a)

variações na demanda monetária que aparentemente não guardam relação com os

confundindo as vítimas e responsáveis, dificultando as investigações criminais. Acrescente-se a estes fatores um fato incontestável, no mundo globalizado, que é a velocidade com que se transferem valores, por meio de técnicas informáticas, sociedades fictícias e contas correntes secretas, fora de investigações. ARAUJO DA SILVA, José. Crime Organizado. São Paulo: Atlas, 2003, p. 28. 190 PITOMBO, Antônio Sergio A. de Moraes. “Lavagem” de dinheiro – A tipicidade do crime antecedente. São Paulo: RT, 2003, p. 85. 191 Cfr. BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitales. Op. Cit., p.198; ARÁNGUEZ SÁNCHEZ, Carlos. El delito de blanqueo de capitales. Madrid, Marcial Pons, 2000, p. 100. 192 ROMANTINI, Gerson Luis. Odesnvolvimento institucional do combate à lavagem de dinheiro no Brasil desde a Lei 9613/98. Campinas – Unicamp, 2003, p. 42 e ss.

Page 69: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

69

câmbios observados nas variáveis econômicas; b) volatilidade dos juros e do câmbio

como causa das transferências transfronteiriças inesperadas de fundos; c) maior

instabilidade dos passivos e maiores riscos para a valoração dos ativos das

entidades financeiras, o que origina um risco sistêmico para a estabilidade do setor

financeiro e a evolução monetária em geral; d) efeitos adversos sobre a arrecadação

tributária e a dotação de recursos públicos devido ao falseamento dos dados sobre a

renda e a riqueza; e) efeito de contágio sobre as transações legais devido ao temor

dos interessados por um possível envolvimento delitivo.193

Tais constatações levam a identificar a violação a valores resguardados pela

Constituição Federal, artigo 170, IV e V, os quais vão conferir substância aos bens

jurídicos, protegidos pelo tipo de lavagem de dinheiro.

Diante do exposto, percebe-se que não é sem motivos que documentos

internacionais fazem alusão às más conseqüências oriundas da lavagem de capitais

à economia de vários países e ao sistema financeiro mundial. A Convenção de

Viena dispõe que as altas somas de dinheiro oriundos do narcotráfico permitem a

criminalidade organizada invadir, contaminar e corromper as atividades comerciais e

financeiras lícitas; também o Grupo de Ação Financeira assinala na terceira parte de

suas recomendações, a necessidade de conter a lavagem de dinheiro para proteger

o funcionamento do sistema financeiro, tanto nacional como internacional, e ainda,

na mesma linha a Diretiva 91/308 da Comunidade Européia, adverte que usar

entidades creditícias e instituições financeiras para fins de branqueio causa um sério

perigo para solidez e estabilidade destas instituições, assim como para credibilidade

do sistema financeiro, ocasionando com isso a perda de confiança do público.194

193 BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitalse. Op. Cit., p.198 194 SOUTO, Miguel Abel. El blanqueo en la normativa internacional.op. cit., p. 340.

Page 70: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

70

Alguns autores, criticando essa corrente que define o bem jurídico tutelado

pelo delito de lavagem como sendo a ordem socioeconômica, afirmam que a

utilização dos recursos econômicos obtidos de forma ilegal, longe de ser maléfico,

constitui mola propulsora de determinadas economias195, podendo inclusive em

alguns momentos trazer benesses à sociedade196.

Contudo, quem examina os danos causados à economia nos países

dominados por essas práticas delitivas, como por exemplo, a Colômbia197, verifica

que as organizações criminosas chegaram a tal proporção, que contrastam com a

soberania do Estado.198

Outros doutrinadores199 sustentam que um dos benefícios gerados pela

circulação do dinheiro ilegal seria o pagamento de tributos, porém o cumprimento

das obrigações fiscais, na lavagem de dinheiro, dá-se, exclusivamente, em função

da necessidade de disfarçar a ilicitude, não chamando a atenção das autoridades

públicas quanto ás operações realizadas200. Sendo assim, a perspectiva das

195 Alguns autores afirmam que a lavagem pode ser benéfica para ordem socioeconômica dos paraísos fiscais, cujas variáveis econômicas dependem de um setor financeiro que “fecha os olhos” para origem dos bens. Cfr. DEL CARPIO DELGADO, Joana. El delito de blanqueo de bienes em el nuevo código Penal. Valencia: Tirant lo Blanch, 1997, p. 79 e 80. VIDALES RODRÍGUEZ, C. Los delitos socioeconômicos em el Código Penal de 1995: la necesidad de su delimitación frente a los delitos patrimoniales em EPC, nº XXI, 1998, p.26. 196 É a opinião de Podval : “ ...Em muitos casos a entrada de dinheiro da economia informal (negra) na economia formal pode trazer inúmeros benefícios, seja para ordem social, seja para ordem econômica. Não fosse questões de cunho absolutamente moral, não se haveria como negar que a entrada de capital que estava fora da economia permite, de imediato, ao Estado obter, sobre esta capital, os impostos, o que socialmente é benéfico”. PODVAL, Roberto. O bem jurídico do delito de lavagem de dinheiro. Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo: Editora revista dos Tribunais, nº 24, ano 6, 1998, p. 212. 197 Cfr. RIVERA LLANO, Abelardo. Colômbia, dentro do labirinto da violência.- O narcotráfico e a marginalização – repressão ou prevenção?Alternativas. RBCC, n.1, jan.mar.1993. São Paulo: RT, 1993, p.7-15. 198 Cfr. RIVERA LLANO, Abelardo. Colômbia, dentro do labirinto da violência, 199 Cfr. . BAJO FERNÀNDEZ, Miguel. Derecho Penal Economico, Proteción Penal y Cuestiones Político Criminales, en Hacia un Derecho Penal Europeo – Jornadas en Honor del Profesor Klaus Tiedemann. Madrid: Boletín Oficial del Estado, Serie Derecho Publico, nº4, 1995, p. 74 – 76; SUÁREZ GONZÁLEZ. Blanqueo de capitales y merecimIento de pena: consideraciones críticas a la luz de la legislación española. Revista Chilena de Derecho. Facultad de Derecho de la Pontifica Universidad Católica de Chile, vol. 22, n. 2, mayo – agosto de 1995, p.239-241. 200 Geralmente, para a lavagem de dinheiro, os proprietários declaram uma receita muito superior à que foi, efetivamente, obtida sem que haja a possibilidade de ser verificada a veracidade da declaração, ainda mais se for lembrada a satisfação do fisco tão somente com o recolhimento do tributo.

Page 71: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

71

imaginadas vantagens tributárias constitui eufemismo; afinal, expressa atenuação

quanto à gravidade da lavagem de dinheiro, cuja nocividade social resta evidente201.

Enfim, outra crítica que se faz sobre o bem jurídico ordem econômica é que

tal expressão teria significado muito aberto, fazendo com que desapareça a função

de filtro legitimador e deslegitimador da intervenção penal202, o que geraria

insegurança jurídica.

Para sustentar tal posição, utilizam as mesmas argumentações que negam o

crime econômico e o Direito Penal Econômico, criando barreiras na aferição dos

bens jurídicos a eles inerentes.203

No entanto, deve-se entender a expressão “ordem econômica” como o

conjunto de normas da Constituição dirigente, voltado à conformação da ordem

econômica204. A ordem econômica constitui a referência constitucional de valores

essenciais (livre-iniciativa, propriedade, proteção ao consumidor, etc), que sofrem

violações, em determinadas circunstâncias graves, tornando-se merecedores da

atuação da lei penal.

201 PITOMBO, Antônio Sergio A. de Moraes. “Lavagem” de dinheiro, op. Cit., p.91. 202 PODVAL, Roberto. O bem jurídico do delito de lavagem de dinheiro. Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo: Editora revista dos Tribunais, nº 24, ano 6, 1998, p. 212. 203 PITOMBO, Antônio Sergio A. de Moraes. “Lavagem” de dinheiro, op. Cit., p.91. 204 GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 2.ed. São Paulo: RT, 1991, p. 91.

Page 72: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

72

6.2.4 Pluralidade de bens.

Parte da doutrina205 sustenta que o delito de lavagem tem natureza

pluriofensiva, pois a conduta de lavar dinheiro não prejudica somente a ordem

socioeconômica, mas também o funcionamento da administração da justiça.206

Ainda sustentando esta posição, alguns autores asseveram que os capitais

decorrentes do crime organizado, ao inserir-se nos circuitos econômicos lícitos,

põem em perigo a própria soberania do Estado. Por isso consideram que o bem

jurídico tutelado é plural. Seria a lei de lavagem um instrumento de persecução

sobre fatos que atingem diversos interesses da sociedade, e todos esses interesses

são importantes que merecem a tutela penal por meio do delito de lavagem de

capitais.207

Todavia, critica-se esta corrente, uma vez que a opção pela pluralidade de

bens jurídicos seria uma “válvula de escape” diante da dificuldade de legitimar um

único bem jurídico.208

Sustenta-se, por fim, que é preferível definir um único interesse que cumpra a

missão de justificar a intervenção penal, pois a mescla de objetos heterogêneos de

proteção podem gerar insegurança jurídica.209

205 Encontramos também na doutrina estrangeira, principalmente italiana e espanhola, vários autores que seguem esta corrente afirmando que os bens protegidos no crime de branqueio são a ordem socioeconômica e a administração da justiça entre eles: CORNETA, SEMINARA, BLANCO LOZANO, VIDALES RODRÍGUEZ. 206 Esta corrente doutrinal teve origem na Alemanha, encabeçada por LAMPE que observou que com a incriminação do branqueio se protege, junta a circulação financeira e legal, a administração da justiça estatal em sua tarefa de reparação e salvaguarda da comunidade frente ao delito. SOUTO, Miguel Abel. El blanqueo en la normativa internacional. op. cit., p. 357. 207 MARTINELLI, João Paulo Orsini. O bem jurídico tutelado pela lei de lavagem de capitais. Tese apresentada na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo – USP. São Paulo, 2007, p. 71. 208 Ibidem. 209 Cfr. ARÁNGUEZ SÁNCHEZ, Carlos. El delito de blanqueo de capitales. Madrid, Marcial Pons, 2000, p. 102.

Page 73: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

73

6.2.5. Ausência de bem jurídico

Nos tópicos anteriores analisamos posicionamentos doutrinários que embora

divergentes defendem existir um bem jurídico tutelado pela lei de lavagem de

dinheiro. Neste tópico, em contrapartida, ver-se-á a corrente na qual doutrinadores

afirmam não existir um bem jurídico merecedor de tutela penal na referida lei.210

Para justificar esta posição, asseveram que todas as condutas descritas como

sendo de lavagem de dinheiro, podem encontrar vestimenta típica em outros

dispositivos penais211, tais como a receptação ou favorecimento real. Além disso, o

Estado não pode impor dupla proteção a um mesmo bem jurídico, sob pena de ferir

o princípio do ne bis in idem.212

Alegam, ainda, que sendo o Direito Penal a ultima ratio da política de controle

social, sua intervenção só será legítima quando insuficientes outros meios de abrigo

a bens jurídicos, a serem exercidos por outros ramos do direito. E, no caso

específico da lavagem de dinheiro, bastaria a administração pública213 valer-se do

exercício do poder de polícia das autoridades competentes, já que suficiente para

evitar os possíveis danos que o ingresso de dinheiro, bens ou valores obtidos

ilicitamente e sem controle fiscal pudesse causar no mercado financeiro,

comprometendo a economia do país.214

210 Na doutrina pátria defendem esta corrente: CASTELLAR, João Carlos. Lavagem de Dinheiro - A Questão do Bem Jurídico. Rio de janeiro: Revan, 2004, p.176 e MARTINELLI, João Paulo Orsini. O bem jurídico tutelado pela lei de lavagem de capitais, op. Cit., p. 72-73. 211 Nesse sentido Cfr. SUÁREZ GONZÁLEZ. Blanqueo de capitales y merecimIento de pena: consideraciones críticas a la luz de la legislación española. Revista Chilena de Derecho. Facultad de Derecho de la Pontifica Universidad Católica de Chile, vol. 22, n. 2, mayo – agosto de 1995, p.239-241. 212 MARTINELLI, João Paulo Orsini. O bem jurídico tutelado pela lei de lavagem de capitais. Op. Cit., p. 72. 213 No Brasil os órgãos da administração pública que exercem o controle e a fiscalização das operações financeiras e do mercado de capitais são: Banco Central do Brasil; Comissão de Valores Imobiliários (CVM); Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF). 214 GODINHO, Jorge Alexandre Fernandes. Do crime de “Branqueamento”de Capitais – Introdução e Tipicidade. Coimbra: Livraria Almedina, 2001, p. 149.

Page 74: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

74

Finalmente, por uma ótica de ponderação de interesses, se discute a

necessidade de tipificar a lavagem de dinheiro, considerando que as vantagens da

referida incriminação poderiam ser inferiores aos prejuízos acarretados: menor

autonomia das partes nas transações financeiras, lesão à intimidade pessoal,

vulneração da privacidade das transações financeiras, assim como o regime

sancionador.215

215 FABIÁN CAPARRÓS, Eduardo. El delito de lanqueo de capitales. Madrid: Colex, 1998, p. 220.

Page 75: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

75

7. Tipo Objetivo e Crime Antecedente

7.1. Do objeto material do Crime de lavagem de dinh eiro O artigo 1º da Lei 9613/98 traz três formas básicas de cometimento do

crime: ocultar ou dissimular bens de proveniência criminosa (art.1º caput); converter,

adquirir ou transferir tais bens, com fim de oculta-los ou dissimulá-los (art.1º, § 1º, I,II

e III) e utilização de bens, na atividade financeira, sabidamente ilícitos (art.1º,§2º,I e

II).

Essas condutas delituosas recaem sobre “bens, direitos ou valores”, que são

reconhecidos como objeto material da infração penal.

Como percebemos o legislador penal não faz menção expressa ao “dinheiro”,

configurando-se o objeto material de maneira mais ampla, estando o dinheiro

incluído na expressão bens e na projeção econômica financeira dos conceitos de

direitos e valores.

A própria Convenção de Viena fornece uma espécie de interpretação

autêntica desses objetos materiais: “por bens se entendem os ativos de qualquer

tipo, corpóreos ou incorpóreos, móveis ou imóveis, tangíveis ou intangíveis, e os

documentos ou instrumentos legais que confirmam a propriedade ou outros direitos

sobre os ativos em questão”.

Na realidade já bastaria a utilização da expressão “bens”, que por sua

amplitude, abarcaria “direitos e valores”. O que o legislador pátrio provavelmente

pretendeu foi enfatizar a abrangência e o alcance do objeto substancial, deixando

claro que todo e qualquer produto, direta ou indiretamente resultante das atividades

Page 76: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

76

ilícitas previstas e ligadas às noções de bens, direitos e valores, pode caracterizar a

prática da infração penal.216

Sendo “bens” elemento normativo217 do tipo para que sua aplicação não

vulnere o princípio da legalidade em seu corolário taxatividade, é primordial que sua

interpretação observe estritamente o conteúdo jurídico tradicionalmente atribuído em

nosso ordenamento jurídico.

Vale ressaltar que não são todos os bens aptos a serem objeto da conduta

típica em análise, pois a lei, de forma expressa, assentou a necessidade de lhes

reconhecer a proveniência ilícita, ou seja, trata-se exclusivamente dos bens

oriundos, direta ou indiretamente, de infração penal. Isto é: só podem ser objeto da

lavagem produto ou proveito de infrações penais anteriores.218

Outro ponto a considerar é que nem todo comportamento econômico do

agente criminoso que dá causa a proveito da infração penal anterior, constitui o

delito de lavagem. Posterior á consumação da infração penal pode ser post factum

não punível, mero exaurimento, representando a obtenção do resultado pelo agente.

É a hipótese do agente que compra bem imóvel, depois de obter vantagem indevida,

mediante, por exemplo, a prática de corrupção passiva, registrando a propriedade no

próprio nome e residindo no local. Impossível vislumbrar o enquadramento do fato á

previsão do artigo 1º da Lei 9.613/98, por razões objetivas ou subjetivas,

evidentes.219

216 MAIA, Carlos Rodolfo Tigre. Lavagem de Dinheiro – Lavagem de ativos provenientes de crime. São Paulo: Editora Malheiros, 1999, 1ªedição. 217 Há certo risco no abuso de elementos normativos e na liberdade de interpretá-los, motivo pelo qual se lhes deve encontrar o significado, mais restrito, sempre a contar da própria ordenação jurídica. Sobre este tema: BETTIOL, Giuseppe. Direito Penal. Tradução: P.J. da Costa Jr. E A. Silva Franco. 2ªed. São Paulo:RT, 1977. 218 CALLEGARI, André Luis. Problemas pontuais da lei de lavagem de dinheiro. Revista brasileira de ciências criminais, nº31, ano 8, 2000, p.187-188. 219 PITOMBO, Antônio Sergio A. de Moraes. “Lavagem” de dinheiro – A tipicidade do crime antecedente.Op. cit. p. 108.

Page 77: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

77

Será necessário distinguir as condutas voltadas a conseguir proveito do crime

daquelas destinadas a ocultar e dissimular a origem ilícita dos bens, pois, muito

embora o produto de lavagem de capitais seja proveniente do crime antecedente,

nem todo comportamento econômico do delinqüente que dá causa a proveito da

infração penal, anterior constitui crime de lavagem de dinheiro.220

220 Ibidem, p. 109.

Page 78: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

78

7.2. Do Crime antecedente

7.2.1 Tipos de crimes antecedentes na Lei 9.613/98 (com as alterações das leis 10.467/2002 e 10.701/2003) No crime de lavagem de dinheiro, prevista no artigo 1º, caput da Lei 9.613/98,

o substantivo crime faz parte da descrição do fato típico, logo podemos concluir que

a técnica legislativa adotada tornou o crime antecedente elementar do tipo221, por

isso sua ausência exclui a configuração típica.222

E não é qualquer crime que vai ensejar a proveniência ilícita, posto que o

legislador brasileiro limitou o rol de crimes antecedentes à lavagem de dinheiro,

embora existam verdadeiros numerus clausus de delitos anteriores ( art. 1º da lei

9.613/98).223 Constam no rol da das infrações prévias os delitos de tráfico ilícito de

entorpecentes ou drogas afins, terrorismo e seu financiamento224; de contrabando ou

tráfico de armas, munições ou material destinado a sua produção; extorsão

mediante seqüestro; os crimes contra a Administração Pública, inclusive a exigência,

para si ou para outrem, direta ou indiretamente, de qualquer vantagem, como

condição ou preço para a prática ou omissão de atos administrativos; os delitos

contra o sistema financeiro nacional; os praticados por organização criminosa e

aqueles cometidos por particular contra a Administração Pública estrangeira225.

Essa opção legislativa de limitar o rol dos delitos prévios vem sendo criticada

por muitos autores, que alegam: a) não ter previsto infrações que usualmente dão

221 D’AVILA, Fabio Roberto. A certeza do crime antecedente como elementar do tipo nos crimes de lavagem de capitais. Em Boletim IBCCRIM, ano 7, n º 79, 1999, p.3-4. 222 É a posição majoritária adotada entre entre eles: � D’AVILA, Fabio Roberto. A certeza do crime antecedente como elementar do tipo nos crimes de lavagem de capitais. Op. Cit.p.3-4; � PITOMBO, Antônio Sergio A. de Moraes. “Lavagem” de dinheiro – A tipicidade do crime antecedente.Op. cit. p. 108; BONFIM, Márcia Monassi Mougenot; BONFIM, Edílson Mougenot. Lavagem de dinheiro. Op. Cit. p. 53-56; BARROS, Marco Antonio de. “Lavagem” de Capitais e obrigações civis correlatas.Op. cit. p. 93-96; BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitales. Op. Cit., p.234-236. 223BARROS, Marco Antonio de. “Lavagem” de Capitais e obrigações civis correlatas.Op. cit. p. 93-96; 224 Redação dada pela Lei 10.701 de 9.7.2003. 225 Artigos 337-B, 337-C e 337-D, incluídos pela lei 10.467, de 11.6.2002.

Page 79: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

79

ensejo à lavagem de capitais, como a sonegação fiscal e a contravenção por jogo do

bicho; b) que o estabelecimento de um rol taxativo dificulta a repressão da lavagem,

pois muitas vezes o dinheiro lavado é proveniente de outros delitos não catalogados;

c) ao deixar de estabelecer uma forma mais ampla e genérica de crimes

antecedentes, o legislador se vê obrigado a manter uma extraordinária atenção

sobre novos acontecimentos delitivos, pois o surgimento de novas formas de

criminalidade irá obrigar a ampliação e a atualização do rol estabelecido nos incisos

I a VII do art. 1º da referida lei.226

No direito comparado prevalece a orientação de que a lavagem de capitais

incide sobre bens originados de um delito prévio. No entanto a técnica para eleger

quais serão esses delitos podem variar em cada país. A doutrina identificou a

existência de dois modelos para classificar os delitos prévios: por um lado, está um

modelo de um catálogo que restringe a abrangência a alguns delitos indicados e, por

outro, o modelo mais amplo consistente em indicar uma categoria específica de

delitos ou abranger todos os delitos, sem delimitação. 227

Muitos países optaram por não estabelecer um rol especifico, preferindo

apenas exigir que a lavagem de dinheiro esteja relacionada com delitos

considerados graves228. São exemplos destas nações: a Alemanha, Áustria, Bélgica,

Espanha, Irlanda, Holanda, Itália, Reino Unido, Suécia. A França abre esta

possibilidade para qualquer crime ou delito, não condicionado à gravidade. 229

226 É a posição sustentada por: William Terra. Lei de Lavagem de Capitais. Op. Cit. p.332-333; CASTILHO, Ela Wiecko V. de. Crimes antecedentes e lavagem de dinheiro, em RBCCRIM, nº 47, março-abril de 2004, p. 49; BONFIM, Márcia Monassi Mougenot; BONFIM, Edílson Mougenot. Lavagem de dinheiro. Op. Cit. p. 53-56. 227 BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitales. Op. Cit., p.225. 228 As legislações penais destes países costumam definir quais são os delitos graves estabelecendo os parâmetros de pena dentro dos quais se encaixam. TERRA, William de Oliveira. Lei de Lavagem de Capitais. Op. Cit. p. 332. 229 MAIA, Carlos Rodolfo Tigre. Lavagem de Dinheiro – Lavagem de ativos provenientes de crime. Op. Cit. p. 69; BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitales. Op. Cit., p. 224-226.

Page 80: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

80

Seguindo a mesma linha adotada pela legislação brasileira, ou seja,

enumerando um rol taxativo de crimes antecedentes, encontra-se a legislação

portuguesa, que considera como delitos prévios à lavagem: o trafico de

entorpecentes, terrorismo, trafico de armas, extorsão de fundos, rapto, lenocínio e

corrupção.230

Vale ressaltar que, embora a lei brasileira tenha optado por estabelecer um rol

taxativo de infrações, ao incluir entre estas todo crime praticado por organização

criminosa (art. 1º, inciso VII da Lei 9.613/98), acabou ampliando este rol.

Com isso verificamos que a inabilidade do legislador criou uma situação

absurda, isto é, qualquer que seja o crime antecede poderá ser apto a gerar a

punição por lavagem, bastando para tanto que tenha sido praticado por organização

criminosa.

Esta má técnica legislativa ampliou demasiadamente o tipo, incidindo no

mesmo erro das legislações estrangeiras que não definiram delitos antecedentes

específicos, considerando como tais qualquer tipo de infração. Nem toda ação

delitiva de uma organização criminosa equivale à lavagem de dinheiro. Ademais, o

legislador não define o que se entende por organização criminosa. 231

O simples fato de a infração penal acarretar produto ou proveito econômico

não significa que deva incluir-se entre os crimes antecedentes, importa identificar-lhe

especial lesividade, conciliável ou superior àquela auferida pelo bem jurídico de

lavagem de capitais. Além disso, o princípio da taxatividade estabelece a elaboração

230 MAIA, Carlos Rodolfo Tigre. Lavagem de Dinheiro – Lavagem de ativos provenientes de crime. Op. Cit. p. 69. 231 Vide item 4.1.1 supra.

Page 81: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

81

de números clausus quanto aos delitos prévios, pois a falta de delimitação resulta

interpretações amplas e imprecisas.232

7.2.2 O problema da acessoriedade em relação ao del ito de lavagem de capitais.

Conforme já ressaltado, o crime de lavagem de capitais, necessariamente

decorre de uma prática ilícita anterior, sendo que no caso brasileiro essas condutas

ilícitas estão taxativamente elencadas no artigo 1º incisos I a VII da lei 9613/98, isso

é, somente ocorrerá o crime de lavagem, se anteriormente ocorrer uma conduta

criminosa, razão pela qual afirma-se o caráter subsidiário ou acessório233 do

branqueamento.234

No entanto, essa acessoriedade do crime de lavagem em relação ao delito

prévio é limitada, uma vez que basta que o fato anterior seja típico e antijurídico, não

se exigindo que o mesmo seja culpável. Portanto, empregam-se as mesmas

conclusões que decorrem do princípio da acessoriedade limitada, desenvolvido para

se determinar a responsabilidade do partícipe235: é necessário que o autor tenha

cometido um fato típico e antijurídico.236

232PITOMBO, Antônio Sergio A. de Moraes. “Lavagem” de dinheiro – A tipicidade do crime antecedente.Op. cit. p. 96-97. 233 Essa é a posição majoritária entre os doutrinadores nacionais e estrangeiros, no entanto, sustentado posição diversa entre autores brasileiros : William Terra sustentando que o crime de lavagem é um delito autônomo, e não meramente acessório a crimes anteriores, por possuir estrutura típica independente, pena específica, conteúdo de culpabilidade própria e por não constituir uma forma de participação post-delectum. No mesmo sentido entre os doutrinadores espanhóis Gómez Iniesta. 234 Cf. SANTIAGO, Rodrigo. O Branqueamento de capitais e outros produtos do crime, em Revista portuguesa de ciências criminais, ano 4, fasc. 4, outubro-dezembro, 1994; PODVAL, Roberto. Lavagem de dinheiro (lei 9.613/98), em Leis Penais Especiais e sua interpretação jurisprudencial, vol. 2. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002 p. 2100 e ss. 235 PIERANGELLI, José Henrique. Escritos jurídicos penais. São Paulo:RT, 1992, p.62. 236 CALLEGARI, André Luis. Problemas pontuais da lei de lavagem de dinheiro. Op. Cit. p.188.

Page 82: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

82

Essa classe de acessoriedade é a que se pode depreender do art.2º § 1º, da

Lei 9613/98, que dispõe “serão punidos os fatos previstos nesta lei, ainda

desconhecido ou isento de pena o autor daquele crime”.237

Podemos concluir que o legislador deixou firmada a irrelevância da

reprovação do sujeito ativo do crime anterior, para a configuração do crime de

lavagem de capitais. O desconhecimento, quanto a autoria, somente impede a

aplicação da pena do delito prévio. E a expressão isento de pena significa exclusão

da culpabilidade, subsistindo o injusto.238

Insiste-se, sem embargo, que se houver exclusão da tipicidade ou se

estiverem presentes quaisquer das causas de exclusão da ilicitude do delito prévio,

não será possível sancionar as condutas de lavagem de dinheiro.

Situação diversa ocorre com as causas excludentes de culpabilidade, legais

ou supralegais, pois ainda que reconhecidas no crime antecedente, estas não

interferem na configuração do delito de lavagem de dinheiro.239 O mesmo sucede

com as causas extintivas da punibilidade240, com as escusas absolutórias e as

imunidades pessoais.241

237 Ibidem. 238 238 BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitales. Op. Cit., p.234-240. 239 No mesmo sentido o artigo 180, § 4º, que dispõe que “a receptação é punível, ainda que desconhecido ou isento de pena o autor do crime de que proveio a coisa”. 240 Com exceção da anistia e da abolitio criminis, que diferenciam-se das demais causas extintivas da punibilidade, por afetarem a própria tipicidade do crime anterior. PITOMBO, Antônio Sergio A. de Moraes. “Lavagem” de dinheiro – A tipicidade do crime antecedente.Op. cit. p. 122. 241 Neste sentido: BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitales. Op. Cit., p.234-236; . PITOMBO, Antônio Sergio A. de Moraes. “Lavagem” de dinheiro – A tipicidade do crime antecedente.Op. cit. p. 121-122; CALLEGARI, André Luis. Problemas pontuais da lei de lavagem de dinheiro. Op. Cit. p.188.

Page 83: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

83

7.2.3. Crime antecedente cometido no estrangeiro. Devido à afirmada transnacionalidade242 da lavagem de capitais, muitas vezes

a reciclagem dos bens é freqüentemente realizada em um país distinto daquele onde

ocorreu o delito prévio. 243

Desta constatação, surgem inúmeras dificuldades considerando os casos em

que o crime antecedente foi praticado no exterior e a lavagem de dinheiro cometida

em território brasileiro.244

O art. 2º, II, da Lei 9.613/98, estabelece a independência do processo e

julgamento do crime antecedente pela jurisdição estrangeira, no entanto, não exclui

a exigência de reconhecer, na apuração do crime de lavagem, a existência material

do crime prévio ocorrido no exterior.

Indagam-se que critérios devem ser analisados, para se definir se a conduta

praticada no estrangeiro constitui crime antecedente apto a ser objeto do crime de

lavagem no Brasil e se crime antecedente deve estar tipificado em ambos os países

de forma similar.

Para solucionar essas questões, prevalece na doutrina o entendimento de

que o crime antecedente deve estar tipificado tanto no país estrangeiro de sua

realização, quanto no país em que se realizou a lavagem, v.g., Brasil, ainda que

tenha diferente nomen iuris, classificação ou pena. Aplica-se o princípio da dupla

incriminação, previsto no artigo 7º, § 2º, “b”, do Código Penal brasileiro, também

exigido para fins de extradição. É imperativo, portanto, que o fato prévio esteja

tipificado também no país onde ocorreu, sob pena de se punir um crime de lavagem

242 Vide itens 3.1 e 3.2 supra. 243 BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitales. Op. Cit., p.244-249. 244 CALLEGARI, André Luis. Problemas pontuais da lei de lavagem de dinheiro. Op. Cit. p.195.

Page 84: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

84

cujos bens ou valores procedam de uma conduta lícita.245 E, com base no princípio

da acessoriedade limitada, sustentada anteriormente246, é suficiente que o delito

prévio praticado no exterior seja típico e antijurídico em ambas as legislações, sendo

indiferente se concorrem ou não causas de exclusão da culpabilidade ou da

punibilidade.247

7.2.4. A problemática da prova do delito prévio Nos capítulos anteriores tivemos a oportunidade de esclarecer que a Lei

9.613/98, estabeleceu o que a doutrina denomina de tipo deferido, ou seja, a

configuração do crime de lavagem fica condicionada a existência de um delito

antecedente, in casu, previamente restrito àqueles elencados no artigo 1º, em seus

incisos I a VII.

No entanto, observamos que a doutrina se divide ao comentar a relação entre

estes dois preceitos: o tipo penal deferido e o tipo penal antecedente. Segundo

alguns autores, por ser o crime de lavagem um delito autônomo, não estaria

condicionado ao processo ou julgamento do crime antecedente, exigindo para a

subsunção típica do crime de lavagem, apenas a constatação de sérios indícios da

existência do crime antecedente248. Outros autores entendem que haveria

necessidade de certeza da ocorrência do crime anterior, para condenação por

245 PITOMBO, Antônio Sergio A. de Moraes. “Lavagem” de dinheiro – A tipicidade do crime antecedente.Op. cit. p. 123-124; DEL CARPIO DELGADO, Joana. El delito de blanqueo de bienes em el nuevo código Penal. Op. Cit. p. 150. 246 Vide capitulo 7.2.2 supra. 247 BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitales. Op. Cit., p.244-249. 248 GOMES, Luiz Flavio; OLIVEIRA, William terra de; CERVINI, Raúl. Lei de Lavagem de capitais. Op. Cit. p. 333, 334 e 356.

Page 85: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

85

suposta lavagem, pois a incerteza do crime prévio acarretaria a incerteza quanto a

um dos elementos do tipo, impossibilitando, assim, a sua adequação legal. 249

Acreditamos ser correta a segunda posição, pois a técnica legislativa adotada

tornou o crime antecedente elementar do tipo previsto no artigo 1º da lei de lavagem,

condicionando-o a sua verificação250. A certeza jurídica, quanto à existência do fato

anterior permite deduzir que a lavagem de capitais possa ter ocorrido. Mas, um fato

que revela, por via indireta, o crime antecedente não tem o condão de verificar a

ocorrência da lavagem de dinheiro.

Consideramos que meros indícios da ocorrência do crime anterior são

insuficientes para justificar uma condenação por lavagem de capitais. O legislador

condicionou a subsunção do delito de lavagem à existência de um “crime”

antecedente, e considera-se crime, por sua vez, toda ação ou omissão que atenda,

no mínimo, aos elementos de tipicidade e antijuridicidade, não se exigindo a

culpabilidade por disposição expressa na Lei de Lavagem (artigo 1º, § 1º). 251

Assim, no caso de reconhecer-se, em relação ao delito prévio, a ausência de

tipo subjetivo ou ocorrência de alguma causa excludente da tipicidade ou da

antijuridicidade, acarretaria a inexistência do crime antecedente e, por conseguinte,

na absoluta impossibilidade de subsunção típica do crime de lavagem, pela ausência

da elementar típica “crime”.

249 D’AVILA, Fabio Roberto. A certeza do crime antecedente como elementar do tipo nos crimes de lavagem de capitais. Op. Cit. p.3-4; PITOMBO, Antônio Sergio A. de Moraes. “Lavagem” de dinheiro – A tipicidade do crime antecedente.Op. cit. p. 128-132; MENEZES, Lino Edmar de. Crime de lavagem de dinheiro (Lei 9.613/98): reflexões. Boletim dos Procuradores da República, ano 3, n. 32, p. 24, dez. 2000. 250 Nesse sentido: 100.005.2003.009940-0 Apelação Criminal - Paraná/RO (3ª Vara Criminal) Relatora: Desembargadora Zelite Andrade Carneiro - Lavagem de dinheiro. Crime antecedente. O delito de lavagem de dinheiro exige à sua configuração a prova, ou ao menos indícios suficientes, de que os valores advenham da prática de fato típico e antijurídico. 251 Sobre a opção legislativa em não incluir a culpabilidade no crime anterior vide item 8.2 supra

Page 86: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

86

Enfim, a consideração de meros “indícios” seria incapaz de elucidar a

ocorrência de uma justificante, o que poderia acarretar o absurdo de se ter uma

lavagem de bens procedentes de uma ação em consonância com o direito. 252

Indícios são elementos de probabilidade, não de certeza, havendo grande

margem para o engano judicial, para o erro, custos que são absolutamente

injustificáveis ou sequer tolerados com base em teorias ou ideologias de justiça.253

7.2.5 Indícios suficientes da existência do crime a ntecedente – considerações em relação ao art. 2º, § 1º, da Lei 9.613/98 Como analisado anteriormente em itens anteriores, a configuração do crime

de lavagem de capitais exige, necessariamente, a ocorrência de um delito

precedente, os quais foram especificados taxativamente no art. 1º da Lei de

Lavagem.

Dentro deste contexto, a lei buscou disciplinar, justamente, a influência do

crime antecedente no momento do oferecimento da inicial acusatória, positivando

uma exigência: indícios suficientes254 da existência do crime antecedente.

Prevista no Capítulo II – Disposições Processuais Especiais – da Lei

9.613/98, assim está redigida a regra do §1º do seu artigo 2º: A denúncia será

instruída com indícios suficientes da existência do crime antecedente, sendo

puníveis os fatos previstos nesta lei, ainda que desconhecido ou isento de pena o

autor daquele crime.

252 PODVAL, Roberto. Lavagem de dinheiro (lei 9.613/98), em Leis Penais Especiais e sua interpretação jurisprudencial. Op. Cit. p.2100. 253 FERRAJOLI, Luigi. Derecho y Razón, Teoria del Garantismo Penal, 2ª. Ed., Madri: Editorial Trotta, 1997, p. 353-381. 254 Tal emprego não é novidade no ordenamento pátrio, podendo se conferir a regra do art. 312 do CPP, que regula os requisitos da prisão preventiva. Este comando ao referir-se a autoria exige indício suficiente.

Page 87: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

87

Interpretando o conteúdo do citado artigo, concluímos que além de estar

instruída com elementos probatórios referentes ao ilícito de lavagem, a peça

inaugural deverá vir calcada de indícios da existência do crime antecedente255. Ato

contínuo, ao receber a denúncia o juiz deve fundamentar a sua decisão consignando

estar convencido da ocorrência do crime de lavagem e de sua autoria, bem como,

da existência de indícios256 suficientes da prática do crime antecedente.

Sem que existam sérios indícios da ocorrência do delito prévio a denúncia

não pode ser recebida pelo juiz, e isto por faltar justa causa para o início do

processo257. Um dos principais remédios processuais para evitar acusações

infundadas é a exigência de suporte probatório mínimo, a denominada justa

causa.258

Sérios Indícios, segundo a doutrina, correspondem àqueles plenamente

acreditados e não meras conjecturas ou suspeitas259. Além disso, os indícios devem

ser provados, como é óbvio, por provas lícitas e legalmente obtidas.260

Complementando, basta a demonstração de indícios suficientes da existência

do crime antecedente, sendo dispensável apontar a autoria. Nem mesmo os indícios

desta são cobrados pela lei, por conseguinte a autoria desconhecida ou incerta do

255 “Denúncia – Crime de “lavagem” de dinheiro – Artigo 1º, §1º., Ic.c o §4º da Lei 9.613/98 – Inépcia – Admissibilidade – Vaga narrativa do fato típico – Não individualização das condutas inerentes à transformação do patrimônio ilícito em lícito – ordem concedida” (TJSP – 1ª Cam. Crim. – HC 278.695 – 3 – SP – rel. Dês. Andrade Cavalcanti – j. 22.03.1999 – v.u. – RT, n. 768, p.575). 256 O código de Processo Penal dá a definição de indícios: considera-se indicio a circunstancia conhecida e provada, que, tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se a existência de outra ou outras circunstâncias (art. 239, CPP) 257 Cfr. GOMES, Luiz Flavio. Lavagem de capitais como expressão do direito penal globalizada. Op. Cit. p. 232. 258 Conforme Afrânio Silva Jardim “ é necessário um suporte probatório mínimo em que se deve lastrear a acusação, tendo em vista que a simples instauração do processo penal já atinge o chamado “status dignitatis” do imputado. ( Direito Processual Penal, 8ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 54.) 259 Cfr. MONTAÑES PARDO, Miguel Angel. La presunción de inocencia. Madri: Arazandi, 1999, p. 106 e seguintes; ZARAGOZA AGUADO, Javier Alberto. Prevencion y represion del blanqueo de capitales. Madrid, Consejo General del Poder Judicial, 2000, p.292. 260 Segundo Luiz Flávio Gomes “...não são quaisquer indícios vagos, imprecisos ou obscuros que já justificam o surgimento do processo: alei exige “indícios suficientes”, isto é razoáveis, prováveis.” GOMES, Luiz Flavio; OLIVEIRA, William terra de; CERVINI, Raúl. Lei de Lavagem de Capitais. Op. Cit. p. 356.

Page 88: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

88

delito prévio não constitui impedimento para o ajuizamento da ação por crime de

lavagem. 261

A irrelevância da confirmação da autoria do crime antecedente, de certa

forma, não é novidade no nosso sistema penal, pois há semelhante disposição

cuidando da punição destinada ao receptador. A receptação é punível, ainda que

desconhecido ou isento de pena o autor do crime de que proveio a coisa (art. 180,

§4º, do CP).

Por fim, importante reafirmar que, para uma sentença condenatória por

lavagem de dinheiro, necessário se faz a formação do convencimento jurisdicional

seguro a respeito da existência do crime, ou seja, necessário se faz a comprovação

da tipicidade e antijuridicidade do crime antecedente262. Nesta etapa do processo, os

indícios, por si só, não dão a necessária sustentação ao juízo condenatório.

A demonstração da ocorrência do delito precedente caracteriza uma questão

prejudicial263 do próprio mérito da ação penal em que se apura a conduta de

lavagem. Desse modo, ao fundamentar a sentença condenatória, o juiz tem o dever

funcional de abordar essa questão, afirmando estar convencido da existência do

crime anterior, apontando as provas dos autos que o levaram a formar essa

convicção. No processo criminal de lavagem não se julga o delito prévio, mas é

indispensável mencionar, de forma expressa, que ele de fato ocorreu. Exige-se que

o juiz forme seu convencimento, embasado na prova segura da existência do crime

261 BARROS, Marco Antonio de. “Lavagem” de Capitais e obrigações civis correlata. Op. Cit. p. 222. 262 Vide item 7.2.2 supra. 263 O artigo 2º, II, da Lei 9.613/98 disciplina a separação dos processos (delito prévio e delito de lavagem), no entanto ela deve ser interpretada com cautela, pois a reunião de processos pode ser determinada, sempre que as circunstâncias do caso concreto afastem a ocorrência de prejuízos para persecutio in judicio. Enfim, as regras de fixação de competência pela conexão ou continência do CPP, não foram derrogadas pela lei 9.613/98, podendo ser aplicadas aos processos de lavagem, desde que inexistam óbices e prejuízos. Neste sentido cfr. PITOMBO, Antônio Sergio A. de Moraes. “Lavagem” de dinheiro – A tipicidade do crime antecedente.Op. cit. p. 125-128; , Rodolfo Tigre. Lavagem de Dinheiro. Op. Cit. p.120.

Page 89: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

89

precedente que poderá ser efetivada no próprio processo de lavagem ou em outro,

em que se apure o crime antecedente. 264

Antes da sentença final, não podem existir dúvidas quanto à existência do

crime básico. Enfim, não deve restar incerteza sobre a existência de um fato típico e

antijurídico antecedente. Na dúvida, a solução do processo criminal atenderá à

máxima in dúbio pro réu, absolvendo-se o imputado por falta de provas.

264 Cfr. BARROS, Marco Antonio de. “Lavagem” de Capitais e obrigações civis correlata. Op. Cit. p. 224; CALLEGARI, André Luis. Problemas pontuais da lei de lavagem de dinheiro. Op. Cit. p. 87-100.

Page 90: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

90

8. Tipo Subjetivo

8.1 Lavagem de Dinheiro: tipo doloso Desde logo, cumpre ressaltar que a Lei 9.613/1998 contém, tão somente,

tipos dolosos, posto que o legislador brasileiro não previu a modalidade culposa265.

O Código Penal brasileiro adotou a regra da excepcionalidade do crime culposo (art.

18 do CP), somente podendo-se falar em crime culposo quando houver previsão

expressa na lei nesse sentido. 266

Ainda no âmbito do tipo subjetivo, discute-se sobre a compatibilidade do dolo

eventual267 e a lavagem de dinheiro, prevalecendo a posição268 da incompatibilidade

dessa forma de dolo ao delito de lavagem.269

O fundamento de tal negativa seria que a intencionalidade de ocultar ou

dissimular não dá abrigo à assunção de risco, ao contrário, exige ação com

conhecimento prévio do crime antecedente, conduzida a partir da decisão de

alcançar o resultado típico. 270

265 A Convenção de Estrasburgo facultou às partes a tipificação em seus ordenamentos da lavagem de dinheiro culposa, em casos onde o sujeito ativo deveria ter presumido que os bens eram produtos de um delito (artigo 6.3). O atual Código Penal da Espanha prevê a lavagem de dinheiro culposa (art. 301.3) realizada por imprudência grave. O Código Penal alemão, também penaliza a lavagem de dinheiro imprudente (§261 § 5 StGB), assim como o da Bélgica e o da Itália. 266 BITENCOURT, CEZAR Roberto. Tratado de Direito Penal: parte geral, volume1, 11ª edição. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 278-290 267 O dolo eventual, conceituado por PHILIPPS, ocorre quando o sujeito se decide conscientemente por um comportamento incompatível com as máximas e riscos vigentes no ordenamento jurídico. 268 Nesse sentido cfr. entre outros: PITOMBO, Antônio Sergio A. de Moraes. “Lavagem” de dinheiro – A tipicidade do crime antecedente.Op. cit. p. 137; CALLEGARI, André Luis. Problemas pontuais da lei de lavagem de dinheiro. Op. Cit. p. 157-158; BONFIM, Márcia Monassi Mougenot; BONFIM, Edílson Mougenot. Lavagem de dinheiro, op. Cit. p. 48; BARROS, Marco Antonio de. “Lavagem” de Capitais e obrigações civis correlata. Op. Cit. p. 100; SILVA, César Antonio da. Lavagem de dinheiro: uma nova perspectiva penal. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001, p. 51. 269 Já sob a ótica do direito espanhol percebe-se uma ampla aceitação da figura do dolo eventual nos crimes de branqueamento de capitais, previsto no artigo 301.2. Nesse sentido: Quintero Olivares; Silva Sanchéz; Fabián Caparrós; Blanco Cordero; Suárez Gonzáles . Já em relação ao artigo 301.1, percebe-se certa resistência com relação a aceitação de referida classe de dolo, em razão de conter, em sua redação, elementos subjetivos especiais. 270 BARROS, Marco Antonio de. Lavagem de dinheiro: implicações penais, processuais e administrativas. São Paulo: Oliveira Mendes, 1998, p. 46.

Page 91: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

91

No entanto, alguns doutrinadores271 afirmam que o elemento subjetivo dos

tipos admite tanto o dolo direto como o dolo eventual, já que a lei não faz restrições

quanto ao âmbito da intencionalidade, sendo fundamental, porém apurar se existe

uma mínima consciência sobre a ilicitude da conduta e sobre a origem espúria do

dinheiro em movimentação. Contudo, alegam que o dolo eventual somente poderá

ser admitido, se o sujeito estiver de alguma forma investido em uma posição de

garante em relação à evitabilidade do resultado. 272

Para asseverar essa posição, citam o seguinte exemplo: um diretor de uma

instituição financeira, que tem obrigação legal de comunicar operações suspeitas ao

Conselho de Controle de Atividades Financeiras – COAF – sabe que determinada

operação se presta ao procedimento de lavagem de dinheiro, e mesmo assim não

comunica tal fato às autoridades, ou ainda revela ao seu cliente que realizou a dita

comunicação, possibilitando um aperfeiçoamento da operação e um conseqüente

benefício ao operador.273

Através do apontado exemplo, chegam à ilação de que o funcionário, ao se

omitir do dever, inerente a posição ocupada, de se evitar o resultado típico, acabou

por atuar impelido pelo dolo eventual, face à assunção do risco, aplicando-se, com

isso, a regra disciplinada no art. 13, §2º, do Código Penal brasileiro.274

Concordamos com a posição da incompatibilidade do dolo eventual no delito

de lavagem de dinheiro. Com relação aos elementos subjetivos do tipo é admissível

somente o dolo direto, pois não é possível o autor cometer o delito apenas com a

probabilidade de que os bens sejam oriundos de um dos delitos prévios previstos na

271 Nesse sentido cfr. TERRA DE OLIVIRA, William. A criminalização da lavagem de dinheiro – aspectos penais da lei 9.613/1998, op. Cit. p.121; PEREIRA, Flavio Cardoso. Lavagem de Dinheiro: Compatibilidade com o dolo eventual? Em Revista Síntese de Direito Penal e Processo Penal nº31, Abril-Maio, 2005, p.41. 272 Ibidem. 273 TERRA DE OLIVIRA, William. A criminalização da lavagem de dinheiro – aspectos penais da lei 9.613/1998, op. Cit. p.121 274 PEREIRA, Flavio Cardoso. Lavagem de Dinheiro: Compatibilidade com o dolo eventual? Op. Cit., p.42.

Page 92: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

92

Lei 9.613/1998. Ainda que o legislador não tenha feito menção específica no tipo do

artigo 1º em relação ao conhecimento da origem ilícita dos bens, fez menção

expressa aos crimes dos quais tais bens são provenientes. Dessa forma, parece-nos

que só é possível a comissão do delito de lavagem quando o agente souber que os

bens provêm de um dos delitos previstos na lei. O dolo275 deve estar dirigido a essa

conduta, ou seja, o autor atua porque conhece a origem criminosa dos bens e

porque quer lhes dar aparência de licitude.

Por fim, observamos no Direito Comparado, que algumas legislações

buscaram solucionar estas controvérsias, criando modalidades culposas do crime,

ou mesmo explicitando no tipo, elementos normativos indicadores da viabilidade ou

não do dolo eventual. Assim, e.g., no dispositivo da legislação lusitana, fica clara a

inadmissibilidade diante da construção: Quem sabendo que os bens ou produtos são

provenientes da prática (...) (artigo 2º, 1).276

8.2 Grau de conhecimento do crime antecedente Como já se afirmou os bens, provenientes, direta ou indiretamente, de crime

antecedente (art. 1º, caput, da Lei 9.613/1998) mostram-se elemento constitutivo do

tipo e, via de conseqüência, objeto de conhecimento do autor, na lavagem de

dinheiro.

275 De modo sintético podemos afirmar que integram o dolo típico na lavagem de dinheiro: conhecer os bens; a ocorrência de crime antecedente; e a relação entre tais bens e o crime antecedente. 276 MAIA, Rodolfo Tigre. Lavagem de Dinheiro. Op. Cit. p. 87.

Page 93: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

93

O agente precisa, portanto, ter conhecimento da natureza espúria dos bens

(elemento cognitivo) e, mesmo assim, querer praticar a ação típica (elemento

volitivo), para que haja a configuração do tipo doloso da lavagem de dinheiro.277

A opção legislativa de enunciar as modalidades de crimes pressupostos,

especificando-os no próprio corpo do tipo objetivo, repercute ao nível subjetivo do

tipo, tornando-se mister que o autor atue com a consciência de que o objeto

substancial originou-se da prática de um dos crimes enumerados no dispositivo

legal.278

Entretanto, isso não significa, no juízo de reprovação da lavagem do dinheiro,

tomar-se, previamente como certo, o pleno entendimento do sentido negativo do

acontecimento que originou os bens, pelo sujeito ativo da lavagem de dinheiro.

Basta um conhecimento que reconheça o fato como sendo punível, que se medirá

de acordo com a esfera de um leigo, ou seja, a famosa asserção de Mezger da

“esfera valorativa do profano” 279. Dessa forma, embora se exija do agente um

conhecimento de que os bens ou valores procedem de um dos delitos prévios, não

se lhe exige um conhecimento técnico compatível com aquele que seria próprio de

um jurista, de um técnico no direito. 280 O importante é ter ciência da ocorrência de

277 PITOMBO, Antônio Sergio A. de Moraes. “Lavagem” de dinheiro – A tipicidade do crime antecedente.Op. cit. p. 141 278 Nesse sentido cfr. entre outros: PITOMBO, Antônio Sergio A. de Moraes. “Lavagem” de dinheiro – A tipicidade do crime antecedente.Op. cit. p. 137; CALLEGARI, André Luis. Problemas pontuais da lei de lavagem de dinheiro. Op. Cit. p. 157-158; BONFIM, Márcia Monassi Mougenot; BONFIM, Edílson Mougenot. Lavagem de dinheiro, op. Cit. p. 48; BARROS, Marco Antonio de. “Lavagem” de Capitais e obrigações civis correlata. Op. Cit. p. 100; SILVA, César Antonio da. Lavagem de dinheiro: uma nova perspectiva penal. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001, p. 51 279 Nesse sentido: ARRIETA, Andrés Martinez. Blanqueo de Capitales, in Carlos Granado Pérez (org.), La criminalidad organizada. Aspectos sustantivos, procesales y orgânicos. Madrid: Consejo General del Poder Judicial, 2001, p. 395; CAPARRÓS, Fabián A. Eduardo, Op. Cit., p. 395. 280 Nesse sentido cfr. entre outros: GODINHO, Jorge Alexandre Fernandes. Do crime de “Branqueamento”de Capitais – Introdução e Tipicidade. Op. Cit. p.208; BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitales, Op. Cit. P. 346-350.

Page 94: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

94

determinado fato, o qual originou os bens, aptos a serem objeto da conduta

subseqüente. 281

Muito embora sobrem dificuldades para apuração do conteúdo do

conhecimento, na persecutio criminis, deve-se procurar deduzi-lo a partir dos

elementos e das circunstâncias do comportamento externo.282

Quando o agente desconhece a origem criminosa dos bens, estará atuando

erroneamente sobre um dos elementos objetivos do tipo, portanto o tratamento

destinado a ele será o de erro de tipo. Sendo assim, se o erro for invencível, fica

excluído o dolo, já se o erro for vencível, não será possível a responsabilidade por

crime culposo, pois como foi apontado anteriormente, o legislador não previu essa

modalidade na Lei de lavagem de dinheiro (art. 20 do CP). Entretanto, a prática da

lavagem de dinheiro sem a consciência da antijuridicidade de tal conduta, se

inescusável, enquadra-se no erro de proibição do artigo 21 da lei repressiva.283

281 Em Portugal, onde a legislação segue o mesmo modelo de restringir os crimes antecedentes a um rol taxativo, também é majoritário este entendimento. Segundo Godinho “ O agente deverá saber que os bens resultam de uma certa espécie de crime constante do “catalogo”. Este conhecimento parece bastar-se com uma mera informação – v.g, se alguém comunica ao agente que os bens provém da prática de um crime de corrupção - , desacompanhado de qualquer conhecimento do substrato fático do crime precedente. Não seria político-criminalmente adequado exigir um conhecimento detalhado e pormenorizado do crime de onde derivam os bens – caso contrario só poucas condutas seriam puníveis. Não bastará porém o conhecimento de uma genérica proveniência ilícita porque a lavagem de capitais no direito português vigente não tem âmbito geral”. GODINHO, Jorge Alexandre Fernandes. Do crime de “Branqueamento”de Capitais – Introdução e Tipicidade. Op. Cit. p.208) “ 282 “Uno de los problemas que suele plantearse com mayor frecuencia, y que tiene um gran importancia practica, es la prueba de este conocimento por el sujeto. Como cualquier outro de los elementos que integran el âmbito interno de la persona, este solamente podrá manifestarse a través de elementos y circunstancias del comportamiento externo del que pueda inducirse dicho conocimento. A este respecto es curioso señalar como tanto la Convención de Viena como la Directiva 91/308/CEE hacen específica referencia a que tanto el conocimento, la intención o la motivación que tienen que ser elementos de lãs actividades ilícitas de blanqueo podrán inferirse de lãs circunstancias objetivas del caso” (ALVAREZ PASTOR, Daniel; EGUIDAZU PALACIOS, Fernado. La prevención del blanqueo de capitales. Pamplona: Aranzadi, 1998, p. 284-285.) 283 Nesse sentido cfr. entre outros: VERÇOSA, Haroldo Malheiros Duclerc. A lavagem ou ocultação de dinheiro e de outros bens e a atividade empresarial. RDM, n. 113, jan-mar, 1999, p.83; SOUZA NETO, José Laurindo de. Lavagem de Dinheiro: comentários à Lei 9.613/1998. Curitiba: Juruá, 1999, p. 99; PITOMBO, Antônio Sergio A. de Moraes. “Lavagem” de dinheiro – A tipicidade do crime antecedente.Op. cit. p. 137; SILVA, César Antonio da. Lavagem de dinheiro: uma nova perspectiva penal. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001, p. 51.

Page 95: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

95

Por fim, ainda sobre o enfoque do conhecimento da ocorrência do crime

antecedente, importante salientar que tal conhecimento deve ser anterior ou atual,

inexistindo tipicidade penal na hipótese de se apresentar posterior a realização da

conduta284 (dolo subseqüente). 285 Significa dizer que o sujeito ativo não pode aderir

ao crime, a posteriori, porque o ocultar e o dissimular exigem, no mínimo,

conhecimento atual.

8.3 O sujeito ativo do crime de Lavagem de Capitais Os delitos de lavagem de dinheiro são classificados como crimes comuns,

pois podem ser praticados por qualquer pessoa, já que a lei não exige que o sujeito

ativo preencha determinadas condições ou qualidades.

Contudo, discute-se na doutrina e na jurisprudência se o autor, co-autor ou

partícipe do crime antecedente, também pode ser responsabilizado pelo crime de

lavagem do dinheiro ou dos bens que auferiu com o primeiro delito.

Uma corrente minoritária de juristas não concordam que os responsáveis pelo

crime antecedente também respondam como sujeitos do crime posterior de

lavagem, alegando entre outros aspectos286 que o delito de lavagem constitui fato

posterior, não punível para o sujeito ativo do crime prévio. 287

284 No que tange ao crime de receptação a jurisprudência tem admitido. “Pode ocorrer a receptação mesmo sendo subseqüente o dolo do agente, isto é, ter adquirido ou recebido de boa-fé a coisa que posteriormente veio a saber tratar-se de produto de crime, mas não restitui ao dominus. (...)” (TJSC, 2ªC. Crim., Ap. 97.003584-5, rel. Dês. Álvaro Wandelli). 285 BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitales, op. Cit., p. 352-353. 286 Alguns doutrinadores alegam que não se poderia exigir outra conduta de quem praticou o crime antecedente, senão a de ocultar ou encobrir o produto deste delito (inexigibilidade de conduta diversa). No entanto acreditamos não ser cabível a aplicação da citada causa supralegal, pois não é razoável aceitar que a pretexto de não ser punido pelo crime anterior ou com o fim de tornar seguro o seu produto, o agente pratique novas infrações penais, lesionado outros bens jurídicos. É o entendimento de Palma Herrera "No tocante ao exercício legítimo de um direito, a própria existência desse direito de autofavorecimento já é questionável quando se realizam condutas que integram o conteúdo de injusto de outro tipo penal. O mesmo Rodríguez Mourullo

Page 96: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

96

Esse argumento apresentado para afastar os autores dos crimes

antecedentes do pólo passivo das ações penais de lavagem de dinheiro, pode ser

aplicado aos crimes de receptação e favorecimento, mas não ao delito de lavagem

de capitais. 288 Inexistindo qualquer restrição expressa no tipo penal, não há por que

restringir-se à autoria excluindo-se, os autores dos crimes pressupostos.

De se observar que o fato posterior não punível é conseqüência da aplicação

do princípio da consunção. Este princípio, contudo, exige identidade de bens

jurídicos. Na lavagem de dinheiro, o bem jurídico tutelado – ordem socioeconômica –

é diverso daqueles que são protegidos pelos vários crimes antecedentes (o

patrimônio; a Administração Pública; a saúde pública etc.). Não se pode falar, pois,

em fato posterior impune, por ausência de pelo menos um dos requisitos.

Por conseguinte, o sujeito ativo do crime de lavagem de capitais pode ser

qualquer pessoa, inclusive o autor, co-autor ou partícipe do delito antecedente. Este

é o entendimento predominante na doutrina brasileira. 289 No mesmo sentido, temos

recente decisão do Superior Tribunal de Justiça. 290

manifesta que o direito, conhecedor da natureza humana, renuncia a impor ao autor de um delito a obrigação de delatar-se, mas que isso não quer dizer que possibilite, através de qualquer conduta, inclusive aquclas que a lei ameaça com pena, e o autorize a invocar uma causa de isenção de responsabilidade. Assim, se o autor, para se auto-encobrir, executa uma nova figura delitiva, deverá responder pelo novo crime, enquanto a lei não estabeleça uma causa específica de isenção de responsabilidade" (ob. cit., pp. 379-380). 287 Sobre as posições a respeito desse tema cfr. BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitales, op. Cit., p. 479-516. 288 Nesse sentido cfr. entre outros: SÁNCHEZ, Emilio Jesus. Blanqueo de capitales em el sector bancario y corrupción: aspectos práticos. Salamanca: Ediciones Universidad de Salamanca, 2002, p.338; BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitales, op. Cit., p. 512-516; PALMA HERRERA, jose Manuel. Los delitos de blanqueo de capitales. Madri: Edersa, 1998, p.239-240; MAIA, Rodolfo Tigre. Lavagem de Dinheiro. Op. Cit. p. 89. 289 Nesse sentido cfr. entre outros: ; SOUZA NETO, José Laurindo de. Lavagem de Dinheiro: comentários à Lei 9.613/1998, op. Cit. p. 89-92; VERÇOSA, Haroldo Malheiros Duclerc. A lavagem ou ocultação de dinheiro e de outros bens e a atividade empresarial, op. Cit. p.83; ; BARROS, Marco Antonio de. “Lavagem” de Capitais e obrigações civis correlata. Op. Cit. p. 100; SILVA, César Antonio da. Lavagem de dinheiro: uma nova perspectiva penal. Op. Cit., p. 51; MAIA, Rodolfo Tigre. Lavagem de Dinheiro. Op. Cit. p. 92. 290 RHC 19.902 – 5ª TURMA – rel. Ministro Gilson Dipp. HC impetrado para anular o Acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região foi negado, mantendo-se a condenação do impetrante pela pratica dos crimes tipificados nos arts. 312, § 1º, c/c. art. 327, § 1º. E 297, inc. V, todos do Código Penal; art. 22, parágrafo único, da Lei n. 7.492/1986; art. 1º, incs. V e VI, § 1º, incs. I e II, e § 4º, da Lei n. 9.613/1998 e finalmente pelo delito previsto no art. 2º, inc. I, da Lei n. 8.173/1990, tudo na forma do art. 69 do CP (concurso material).

Page 97: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

97

Por fim, vale lembrar que a Convenção de Estrasburgo, no art. 6.2, "b", prevê

que as partes poderão, querendo, estabelecer que a lavagem de dinheiro não

poderá ser praticada pelo autor do crime antecedente. O Brasil, todavia, não fez esta

previsão, assim como Portugal, Espanha e Suíça. Já o Reino Unido e a Bélgica

expressamente afirmam que o autor do crime precedente pode também ser punido

pela lavagem de dinheiro. 291

291 Ainda nesse sentido, importante ressaltar que o Brasil ratificou o texto da convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, aprovado pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo nº 231, de 29 de maio de 2003, seguindo-se a expedição do decreto nº 5.015, de 12 de marco de 2004, que a promulgou, especificando que: “ (...) e se assim exigirem os princípios fundamentais do direito interno de um Estado Parte, poderá estabelecer-se que as infrações enunciadas no parágrafo 1 do presente artigo não sejam aplicáveis às pessoas que tenham cometido a infração principal” (art. 6º, ‘2’).

Page 98: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

98

9. Conclusões

O fenômeno da lavagem de capitais se encontra estreitamente vinculado à

criminalidade organizada, e fundamentalmente a uma de suas atividades delitivas

mais lucrativas: o tráfico de drogas. Sem embargo, as organizações criminosas não

limitam seu raio de ação exclusivamente a uma atividade criminal, mas diversificam

suas ações delitivas aproveitando ao máximo das oportunidades de enriquecimento

rápido que oferece o mercado global. Entre as atividades criminais as que mais

geram riquezas são: o tráfico de drogas, de armas, de materiais nucleares, o jogo

ilícito, o trafico de órgãos etc. Movidas fundamentalmente por motivos lucrativos, as

organizações delinqüentes atuam além das fronteiras nacionais, ostentam assim um

caráter transnacional, pelo que são denominadas “organizações criminais

transnacionais” (OCT). Os enormes benefícios obtidos serão reciclados mediante

sua introdução nos circuitos financeiros, para assim conseguir uma aparência de

legalidade.

Nesse contexto vale destacar que a criminalidade ligada à lavagem de

dinheiro se vale, não poucas vezes, de um dos piores males da atualidade que é o

da corrupção. Os indicadores de hoje mostram um dado alarmante: algo perto de

70% do dinheiro que se lava no Brasil corresponde a recursos provenientes, direta

ou indiretamente, da corrupção, sendo boa parte disso resultante de desvio de

patrimônio público.

A análise da realidade da lavagem de capitais permite deduzir uma série de

características do fenômeno. As atividades de lavagem de dinheiro se caracterizam

por um marcado caráter internacional das quais assistimos, nos últimos anos, a uma

crescente globalização. Ademais, se observa uma intensa tendência ao

Page 99: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

99

profissionalismo, seja pela especialização dos membros da organização criminal,

seja pelo emprego de profissionais externos. Como conseqüência da

profissionalização e da especialização, a lavagem se caracteriza na atualidade pelo

desenvolvimento de novos métodos cada vez mais complexos.

A lavagem é desenvolvida em três fases: conversão ou ocultação,

dissimulação ou mascaramento e integração. Cada uma destas etapas conta com

manobras específicas para atingir o objetivo final, ou seja, ter por lícito o produto de

um crime. O estudo da lavagem em três etapas é uma recomendação do GAFI

(Grupo de Ação Financeira sobre Lavagem de Dinheiro), criado em 1989 pelo G-7,

com a finalidade de examinar medidas, desenvolver políticas e promover ações para

combater a lavagem de dinheiro. Note-se que a denominação de cada fase não é

homogênea na doutrina.

Diversas são as técnicas utilizadas com a finalidade de ocultar a origem ilícita

do bem. Na primeira fase (ocultação ou conversão), uma das técnicas mais

conhecidas e utilizadas internacionalmente é o fracionamento de grandes quantias

em valores menores, que ao serem depositados em instituições financeiras não

ficam sujeitos ao dever de informar, determinado por lei, e, portanto, livram-se de

qualquer fiscalização. Podemos citar ainda a troca de moeda - compra de dólares

em pequenas quantidades, especialmente em locais turísticos, e o contrabando de

dinheiro em espécie. Também existe, a utilização de empresas de fachada, através

das quais o dinheiro lícito mistura-se com o ilícito. Na segunda fase (dissimulação),

em geral se realizam inúmeras operações financeiras, destacando-se as

transferências bancárias e eletrônicas, responsáveis pela movimentação de milhões

de dólares em transações internacionais. Um dos métodos mais avançados é a

venda fictícia de ações na bolsa de valores (o vendedor e o comprador, previamente

Page 100: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

100

ajustados, fixam um preço artificial para as ações de compra). É comum então, a

transformação dessas quantias em bens móveis e imóveis. Quanto aos primeiros,

costuma-se adquirir bens que possam ser postos em circulação rápida em diferentes

países, como ouro, jóias e pedras preciosas. Por fim, na terceira e última fase

(integração) destacam-se os negócios imobiliários, como um dos mecanismos mais

empregados.

Definimos a lavagem de capitais como o processo pelo qual os bens de

origem delitiva se integram no sistema econômico legal, com aparência de ter sido

obtido de forma lícita.

A lavagem de capitais é um fenômeno internacional. A comunidade

internacional e, em concreto, as organizações internacionais, não ficaram alheias a

este fenômeno e atuaram para intensificar a cooperação internacional em matéria

penal mediante a criação de instrumentos internacionais. O instrumento mais

importante, e que marcou o início das ações internacionais na luta contra a lavagem,

foi a Convenção das Nações Unidas Contra o Tráfico de Estupefacientes e

Substâncias Psicotrópicas de 1988, que tipificou a lavagem de capitais procedentes

de delitos relativos às drogas, e impôs como obrigação aos Estados parte,

sancionar penalmente a lavagem de capitais em seu ordenamento interno.

Com base neste instrumento, o Conselho da Europa, em 1990, elaborou a

Convenção sobre a lavagem, identificação, embargo e confisco dos benefícios

econômicos derivados do delito (Convenção Estrasburgo), que tipificou a lavagem

de forma praticamente idêntica à Convenção das Nações Unidas, mas ampliou o

catálogo de delitos prévios a outros crimes que geram proveito econômico,

afastando a exclusividade do tráfico de drogas.

Page 101: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

101

Existem outros inúmeros instrumentos internacionais, universais que regulam

o tema, entre os mais importantes podemos destacar: O Grupo de Ação Financeira

Internacional (GAFI); a Diretiva 308/1991 das comunidades Européias; A Convenção

de Palermo de 2000 e o Regulamento modelo sobre Delitos de Lavagem

relacionados com o Trafico de drogas e delitos Conexos, elaborado pela Comissão

Interamericana para Controle do Abuso de Drogas (CICAD).

Em âmbito nacional, no ano de 1991 o Brasil assume de modo definitivo, o

compromisso de elaborar lei nos moldes trazidos pela Convenção de Viena, diante

da promulgação desse tratado, por meio do Dec. 154, de 26.06.1991.

É importante ressaltar que, a partir de então, o governo brasileiro tornou-se

signatário de outros documentos plurilaterais, como dá conta a Exposição de

motivos 692, de 18.12.1996. Os compromissos assinados pelo Brasil, no âmbito da

lavagem de capitais são: O Regulamento modelo sobre Delitos de Lavagem

relacionados com o Trafico de drogas e delitos Conexos, elaborado pela Comissão

Interamericana para Controle do Abuso de Drogas (CICAD); Plano de Ação firmado

pelo Brasil em Miami, após reunião da Cúpula das Américas no âmbito da OEA, em

dezembro de 1994; Declaração de Princípios sobre Lavagem de Dinheiro, firmada

pelo Brasil em Buenos Aires, em dezembro de 1995; e Convenção das Nações

Unidas contra a Delinqüência Organizada Transnacional (Convenção de Roma),

ratificada pelo Dec. 231, de 30.05.2003.

Finalmente, passados quase sete anos da ratificação da Convenção de

Viena, foi editada a Lei 9613/1998, que além de tipificar os crimes de lavagem ou

ocultação de bens, direitos e valores, estabeleceu medidas de prevenção da

utilização do sistema financeiro para ilícitos previstos na lei, bem como criou o

Conselho de Controle de Atividades Financeiras - COAF, órgão que tem por

Page 102: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

102

finalidade “disciplinar, aplicar penas administrativas, receber, examinar e identificar

as ocorrências suspeitas de atividades ilícitas” (artigo 14, caput, da Lei 9613/1998)

fiscalizando, pois, as atividades financeiras que podem dar ensejo à lavagem de

dinheiro.

II

É indiscutível a importância da fixação de um bem jurídico para que a norma

penal tenha legitimidade. Os doutrinadores, majoritariamente, não reconhecem uma

norma penal que não tenha em seu escopo a proteção de algum bem jurídico

relevante. Todavia, só se admite um bem jurídico se preenchidos alguns requisitos,

tais como a observância dos princípios da subsidiariedade, da proporcionalidade e

da lesividade.

Como visto, um conceito de bem jurídico meramente dogmático não se

mostra capaz de explicar a tutela penal de todas as normas. Necessário se faz,

portanto, adotar um conceito político-criminal que auxilie o legislador a eleger os

bens que merecem proteção.

A análise do bem jurídico é um ponto fundamental para o estudo dos

elementos que integram a estrutura típica do delito de lavagem de dinheiro. Matéria

de especial polêmica, a doutrina está longe de restar pacífica quanto ao bem jurídico

nos delitos de lavagem de capitais.

No caso do Brasil, um fator a mais pode ser somado à dificuldade de se

identificar o bem jurídico protegido nas hipóteses de lavagem: o legislador não

incluiu esses delitos no Código Penal, ao contrário do que ocorreu na Espanha,

Itália, Alemanha etc., e, em regra, a doutrina parte da topografia legislativa do crime

para apontar o bem jurídico tutelado, ainda que seja para discordar do legislador.

Page 103: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

103

Dentre as principais correntes doutrinárias que se posicionam sobre o bem

jurídico a ser tutelado pela lei de lavagem encontram-se as seguintes: a) o mesmo

protegido pelo crime antecedente ou proteção preventiva dos bens jurídicos

tutelados no rol de crimes antecedentes; b) ordem socioeconômica; c) Administração

da Justiça; d) pluralidade de bens jurídicos; e) inexistência de um bem jurídico

tutelado pela lei de lavagem.

Um tratamento jurídico adequado exigiria construir esta figura sobre a base da

afetação da ordem socioeconômica, bem jurídico de caráter coletivo, estabelecendo

assim uma vinculação entre a lavagem de capitais e a influência que acarretam o

dinheiro e os bens de origem delitiva na economia legal. Em concreto, consideramos

que são elementos da ordem socioeconômica especialmente vulnerados, a livre

concorrência, a credibilidade, a estabilidade e a solidez do sistema financeiro.

A lavagem de capitais põe em perigo a livre concorrência sobre a que se

baseia o atual sistema de economia de livre mercado. Objetivo das organizações

criminosas, quando dispõe de capitais, é infiltrar-se na economia legal e alcançar

posições monopolísticas através da supressão de competidores. Os custos dos

recursos obtidos de forma delitiva são notadamente inferiores aos recursos obtidos

de forma lícita. As empresas carecem da possibilidade de recorrer a um

financiamento competitivo, e tem que financiar-se com as taxas correntes no

mercado, o que na hora de entrar na concorrência com as empresas ilegais supõe

que vão ser marginalizadas e, posteriormente, expulsada do mercado, que tende a

ser abarcado pela empresa ilegal de forma monopolística. A atividade econômica

tem sentido quando se garanta aos competidores se ater as mesmas regras. Este

equilíbrio se altera quando o competidor dispõe de uma fonte inesgotável de capitais

de origem delitiva. Tudo isto possibilita o controle de autênticos setores da economia

Page 104: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

104

por parte das organizações criminosas. Ademais, as tentativas para alcançar

posições monopolísticas no mercado e suprimir competidores são fatores

potencialmente geradores de corrupção, tanto na economia como na sociedade.

A incidência, na livre concorrência, tem um reflexo imediato em outros

princípios inspiradores da ordem econômica, em concreto, na estabilidade e solidez

do sistema financeiro. O emprego das atividades financeiras e de crédito para a

lavagem de bens de origem delitiva, pode produzir certas perturbações no sistema

financeiro e seus operadores. A injeção de grandes quantidades de dinheiro no

sistema financeiro pode transformar seu normal funcionamento, distorcendo os

fatores que possibilitam prever o comportamento futuro do mercado financeiro e

gerando desconfiança nos investidores.

O desenvolvimento regular de um mercado mundial de capitais depende da

plena confiança de seus participantes. Na medida em que cresce a percepção de

que o mercado está contaminado pelo dinheiro controlado por organizações

criminosas, essa confiança fica inevitavelmente abalada, tendendo a reagir de forma

mais dramática e gerando instabilidade.

A transparência e a saúde dos mercados financeiros são elementos chave

para um bom funcionamento das economias, que, no entanto, podem ser

negativamente afetados pela injeção de dinheiro ilícito, resultante da lavagem de

dinheiro. Ademais, esse dinheiro de origem ilícita pode ser usado para corromper

pessoas que tomam decisões sobre o funcionamento do mercado financeiro dos

países, e com isso, fazer esse mercado perder credibilidade perante o público,

credibilidade esta tão necessária para o funcionamento das instituições financeiras.

Além disso, devido ao caráter transnacional da lavagem de capitais, os países

que não implementarem controles efetivos contra tal prática acabam sendo

Page 105: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

105

marginalizados pelos demais , pois investidores estrangeiros tendem a evitar investir

em mercados associados à lavagem de dinheiro e à corrupção.

Importante ressaltar, que o GAFI – Grupo de Ação Financeira – elabora e

divulga uma lista de países e territórios considerados não – cooperantes, porque

implementaram de forma insuficiente, ou não implementaram, medidas efetivas de

combate à lavagem. Esse organismo recomenda que seus países membros, bem

como todos aqueles comprometidos com a prevenção e combate à lavagem de

dinheiro, examinem, com redobrada atenção, as operações financeiras e comerciais

que envolvam os chamados países não – cooperantes.

Diante dos fatos acima expostos, concluímos que a lavagem de dinheiro

acarreta inúmeros prejuízos à ordem econômico-financeira de um país, vulnerando a

livre concorrência, a estabilidade e a solidez do sistema financeiro, facilitando e

tornando efetiva a corrupção de agentes e funcionários da Administração Pública.

Assim, o bem jurídico que a lei protege é a própria ordem socioeconômica do país,

resguardando valores aferidos na Constituição Federal (artigos 170 a 192).

III

No delito de lavagem de dinheiro, os objetos materiais – bens, direitos e

valores – são elementos da estrutura típica através do qual giram todos os demais.

A própria essência da conduta de lavagem exige que recaia sobre bens, direitos ou

valores de procedência delitiva.

Requisito prévio dos bens objeto da lavagem é que procedam de um delito. É

necessário, portanto, que a lavagem de dinheiro se encontre conectada a um delito

prévio. A Lei 9.613/1998, que regula o crime de lavagem no Brasil define, em seu

artigo 1º, um rol taxativo dos delitos antecedentes, sendo considerados como tais os

Page 106: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

106

crimes de: tráfico ilícito de substâncias entorpecentes ou drogas afins; terrorismo e

seu financiamento; contrabando ou tráfico de armas, munições ou matéria destinado

a sua produção; extorsão mediante seqüestro; contra a Administração Pública;

contra o sistema financeiro nacional; praticado por organização criminosa e os

praticados por particular contra a administração pública estrangeira.

Discute-se se os elementos do conceito dogmático do delito devem concorrer

no delito prévio, para que a lavagem de dinheiro tenha relevância penal. A lavagem

é um delito acessório, que requer a existência de um delito prévio, o qual deve ser

típico e antijurídico, isto é, basta com a acessoriedade limitada. Existe, portanto,

uma dependência entre o delito prévio, em virtude da qual a sanção daquele,

depende da realização típica e antijurídica deste.

É irrelevante que o bem tenha sua origem em condutas consumadas ou

tentadas. A tentativa do crime antecedente dá margem à lavagem de capitais na

hipótese de tal conduta típica originar bens, aptos a serem ocultados, dissimulados

ou integrados à economia.

Em relação ao delito prévio cometido no estrangeiro, é preciso respeitar o

princípio da dupla incriminação, de forma que o mesmo há de encontrar-se também

sancionado no lugar de sua realização. É suficiente que seja típico e antijurídico em

ambas as legislações, sendo irrelevante, se concorrem ou não, causas de exclusão

da culpabilidade ou da punibilidade.

Para a condenação pelo crime de lavagem, o delito prévio deverá ser provado

por uma sentença de um juiz ou tribunal que declare a existência de um fato típico e

antijurídico, sem necessidade de que exista um autor individualizado.

Page 107: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

107

IV

A Lei 9.613/1998 contém, tão somente, tipos dolosos, posto que o legislador

brasileiro não previu a modalidade culposa. O Código Penal brasileiro adotou a regra

da excepcionalidade culposa (art. 18 do CP), somente podendo-se falar em crime

culposo, quando houver previsão expressa na lei nesse sentido.

Prevalece o posicionamento doutrinário de que os tipos penais descritos na

referida lei são característicos do dolo direto, havendo aqueles que entendam haver

a possibilidades do dolo eventual.

Concordamos com a posição da incompatibilidade do dolo eventual no delito

de lavagem de dinheiro, pois ainda que o legislador não tenha feito menção

específica no tipo do artigo 1º, em relação ao conhecimento da origem ilícita dos

bens, fez menção expressa aos crimes dos quais tais bens são provenientes. Dessa

forma, parece-nos que só é possível a comissão do delito de lavagem quando o

agente souber que os bens provêm de um dos delitos previstos na lei. O dolo deve

estar dirigido a essa conduta, ou seja, o autor atua porque conhece a origem

criminosa dos bens e porque quer lhes dar aparência de licitude.

O tipo subjetivo do delito doloso da lavagem de capitais reside na existência

do conhecimento de que os bens são provenientes de um crime antecedente, e esse

conhecimento integra o elemento cognoscitivo do dolo, não podendo ser

considerado elemento subjetivo do tipo.

O agente precisa, portanto, ter conhecimento da natureza espúria dos bens e,

mesmo assim, querer praticar a ação típica, para que haja a configuração do tipo

doloso da lavagem de dinheiro.

A opção legislativa de enunciar as modalidades de crimes pressupostos,

especificando-os no próprio corpo do tipo objetivo, torna mister que o autor atue com

Page 108: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

108

a consciência de que o objeto substancial originou-se da prática de um dos crimes

enumerados no dispositivo legal.

O conhecimento deve existir no momento do comportamento, isto é, tem que

ser atual; o conhecimento posterior o dolus subsequens não tem nenhuma

relevância jurídico-penal no âmbito da lavagem de capitais.

O erro, quanto à origem criminosa dos bens, elemento objetivo do tipo da

lavagem de dinheiro, exclui o dolo, nos termos do artigo 20, do Código Penal.

Entretanto, a prática da lavagem sem a consciência da ilicitude de tal conduta, se

inescusável, enquadra-se no erro de proibição do artigo 21, do Código Penal.

A Lei 9.613/1998, não menciona quem pode ser sujeito ativo do delito de

lavagem de capitais. Contudo, discute-se se o autor, co-autor ou partícipe do crime

antecedente pode ser responsabilizado pelo crime de lavagem do dinheiro ou dos

bens que auferiu com o primeiro delito.

No direito estrangeiro, em países como a França, Itália, Alemanha e Espanha,

inadmite-se que o autor do crime antecedente, seja também autor do crime de

lavagem. Nessas legislações, a lavagem é considerada pos factum impunível.

O fundamento desta corrente leva em conta a natureza jurídica da lavagem de

dinheiro, cuja semelhança com o tipo penal receptação, induz à caracterização

idêntica na estruturação dos tipos, tendo em consideração, principalmente, o

princípio da consunção, segundo o qual, existindo um ou mais ilícitos penais que

funcionam apenas como fases de preparação ou de execução de um outro, mais

grave que o primeiro, anteriores ou posteriores, mas sempre intimamente interligado

ou inerente, dependentemente, deste último, o sujeito ativo só deverá ser

responsabilizado pelo ilícito mais grave.

Este princípio, contudo, exige identidade de bens jurídicos. Na lavagem de

Page 109: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

109

dinheiro, o bem jurídico tutelado – ordem socioeconômica – é diverso daqueles que

são protegidos pelos vários crimes antecedentes (o patrimônio; a Administração

Pública; a saúde pública etc.). Não se pode falar, pois, em fato posterior impune, por

ausência de pelo menos um dos requisitos.

É o posicionamento adotado pelo Brasil, a exemplo do que ocorre nos países

da Common Law, onde há permissão de inclusão de quaisquer pessoas dentre os

autores da lavagem de dinheiro, inclusive o sujeito ativo dos crimes pressupostos.

Na hipótese de o agente que pratica o crime antecedente, também praticar

conduta tencionada à lavagem do capital proveniente, praticará também o crime

descrito na Lei 9.613/98, existindo assim, concurso material de crimes, nos termos

do art. 69 do Código Penal.

Page 110: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

110

REFERÊNCIAS

AGUADO CORREA, Teresa. El principio de proporcionalidad em derecho penal.

Madrid: Edersa, 1999.

ALBRECHT, Hans-Jörg. Criminalidad transnacional, comercio de narcóticos y lavado

de dinero. Trad. Oscar Julián Guerrero Peralta. Bogotá: Universidad Externado de

Colômbia, 2001.

ANDRADE, Manuel da Costa. A nova lei dos crimes contra a economia (Dec.-Lei

n.°28/84, de 20 de Janeiro). In: CORREIA, Eduardo e t al. Direito penal econômico e

europeu: textos doutrinários: problemas gerais. Coimbra: Instituto de Direito Penal

Econômico e Europeu, da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra;

Coimbra Ed.,1998. v. 1.

ANDREUCCI, Ricardo Antunes. Direito penal e criação judicial. São Paulo: Ed.

Revista dos Tribunais, 1989.

ARAUJO JUNIOR, João Marcelo. Dos crimes contra a ordem econômica. São Paulo:

Revista dos Tribunais, 1995

BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Lei n. 10.701 de 9 de julho de 2003: análise inicial das alterações da lei de lavagem de dinheiro. Boletim IBCCRIM. São Paulo, v.11, n.129, agosto de 2003

BARROS, Marco Antonio de. Lavagem de dinheiro: implicações penais, processuais

e administrativas. São Paulo: Oliveira Mendes, 1998.

BARROS, Marco Antonio de. “Lavagem” de Capitais e obrigações civis correlatas.

São Paulo:Editora Revista dos Tribunais, 2004

BATISTA, Nilo. Introdução crítica ao direito penal brasileiro. Rio de Janeiro:

Revan,1996.

Page 111: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

111

BATISTA, Carlos Roberto Rodrigues. A globalização da internet e a proliferação do

crime de informática. Revista do Conselho Nacional de política criminal e

penitenciária, julho a dezembro de 2000, nº 14. Brasília, 2000;

BETTI, Francisco de Assis. Aspectos dos crimes contra o sistema financeiro no

Brasil. Belo Horizonte: Del Rey, 2000.

BETTIOL, Giuseppe. Em tema de relações entre a política e o direito penal. In:

Estudos de direito penal e processo penal em homenagem a Nelson Hungria. Rio de

Janeiro: Forense, 1962. p. 85-92.

BIANCHINI, Alice. Pressupostos materiais mínimos da tutela penal. São Paulo: Ed.

Revista dos Tribunais, 2002.

BITENCOURT, Cezar Roberto. Código Penal comentado. São Paulo: Saraiva, 2002.

BITENCOURT, Cézar Roberto. Tratado de direito penal. 10. ed. São Paulo: Saraiva,

2006. v. 4.

______. Uma releitura do crime de receptação à luz da reforma penal de 1984.

Revista da Associação Brasileira de Professores de Ciências Penais, São Paulo,

ano 1, v. 0, p. 250-288, 2004.

BLANCO CORDERO, Isidoro. Criminalidade Organizada y Mercados Ilegales.

EGUZKILORE – Caderno del Instituto Vasco de Criminologia, n.º 11 – San

Sebastian, 1997.

BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitales. Navarra: Arazandi,

2ªed, 2002.

BONFIM, Márcia Monassi Mougenot; BONFIM, Edílson Mougenot. Lavagem de dinheiro. São Paulo: Malheiros, 2005. BORGES, Paulo César Corrêa. O crime organizado. São Paulo: Unesp, 2002.

Page 112: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

112

BOTTKE, Wilfried. Mercado, criminalidad organizada, y blanqueo de dinero en

Alemania. Trad. Soledad Arroyo Alfonso e Teresa Aguado Correa. Revista Penal das

Universidades de Huelva, Salamanca e Castilla-La Mancha, Salamanca, v. 2, p. 1-

15, 1998.

BRUNO, Aníbal. Direito penal: parte geral. Rio de Janeiro: Forense, 1956.

BUSTOS RAMÍREZ, Juan. Política criminal y estado. Revista Peruana de Ciencias

Penales, Lima, ano 3, n. 5, jan./jun. 1995.

CASTELLAR, João Carlos. Lavagem de dinheiro: a questão do bem jurídico. Rio de

Janeiro: Revan, 2004.

CASTILHO, Ela Wiecko V. de. O controle penal nos crimes contra o sistema

financeiro nacional. Belo Horizonte: Del Rey, 1997.

CERVINI, Raúl. Os processos de descriminalização. São Paulo: Ed. Revista dos

Tribunais, 2002.

______; OLIVEIRA, Willian Terra de; GOMES, Luiz Flávio. Lei de lavagem de

capitais. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1998.

CHOUKR, Fauzi Hassan. Bases para a compreensão e crítica do direito

emergencial. In:SHECAIRA, Sérgio Salomão (Org.). Estudos criminais em

homenagem a Evandro Lins e Silva. São Paulo: Método, 2001. p. 135-153.

COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de direito comercial. São Paulo: Saraiva, 2004.

COELHO, Yuri Carneiro. Bem jurídico-penal. Belo Horizonte: Mandamentos, 2003.

COSTA, José de Faria. A importância da recorrência no pensamento jurídico: um

exemplo:a distinção entre o ilícito penal e o ilícito de mera ordenação social. In:

Page 113: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

113

CORREIA, Eduardo et al. Direito penal econômico e europeu: textos doutrinários:

problemas gerais.Coimbra: Instituto de Direito Penal Econômico e Europeu, da

Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra; Coimbra Ed., 1998. v. 1, p. 109-

143.

COSTA JR., Paulo José da. Direito penal objetivo. Rio de Janeiro: Forense, 1989.

______; QUEIJO, M. Elizabeth; MACHADO, Charles M. Crimes do colarinho branco.

São Paulo: Saraiva, 2002.

CUNHA, Maria da Conceição Ferreira da. Constituição e crime: uma perspectiva da

criminalização e da descriminalização. Porto: Universidade Católica Portuguesa,

1995.

DAVIN, João. Branqueamento de capitais e a corrupção: aspectos práticos. In:

FERRÉ

DIAS, Jorge Figueiredo. Questões fundamentais de direito penal revisitadas. São

Paulo:Ed. Revista dos Tribunais, 1999.

DIAZ-MAROTO y VILLAREJO, Julio. Algunas notas sobre el delito de blanqueo de

capitales. Revista de Derecho Penal y Criminologia da UNED, Madrid, p. 471-497,

mar.2000.

DOTTI, René Ariel. Algumas reflexões sobre o direito penal dos negócios. Em:

Direito penal dos negócios – Crimes do colarinho branco. São Paulo: AASP, 1989.

DOTTI, René Ariel. A tutela penal dos interesses coletivos. Em: GRINOVER, Ada

Pellegrini (coord.). Tutela dos interesses difusos. São Paulo: Max Limonad, 1984.

DUARTE, Maria Carolina de Almeida. A Globalização e os crimes de lavagem de

dinheiro: a utilização do sistema financeiro como porto seguro. Ciências Penais –

Revista da associação brasileira de professores de ciências penais, ano 1, 2004.

São Paulo: Revista dos tribunais, 2004.

Page 114: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

114

ENTENDA a onda de violência em SP. Folha Online. Disponível em:

<http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u121459.shtml>.

ESTEFANÍA, Joaquín. La nueva economía. La globalización. Madrid: Editora

Debate, 1996

FABIÁN CAPARRÓS, Eduardo A. El delito de blanqueo de capitales. Madrid:

Editorial Colex, 1998.

FERRAJOLI, Luigi. Medidas de segurança e direito penal no estado democrático de

direito. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2001.

FIANDACA, Giovanni; MUSCO, Enzo. Diritto penale: parte generale. Bologna:

Zanichelli, 2005.

FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de direito penal. São Paulo: Bushatsky, 1978. v.

1.

FRANCO, Alberto Silva; STOCO, Rui (Coords.). Código Penal e sua interpretação

jurisprudencial. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2001. v. 2.

GODINHO, Jorge Alexandre Fernandes. Do crime de “Branqueamento”de Capitais – Introdução e Tipicidade. Coimbra: Livraria Almedina, 2001. GOMES PAVÓN, Pilar. El bien jurídico protegido em la receptación, blanqueos de dinero y encobrimientos, 1994 GOMES, Luiz Flávio. Estudos de direito penal e processo penal. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1999. ______. A lavagem de capitais como expressão do “direito penal globalizado”:

enfoque crítico. In: SHECAIRA, Sérgio Salomão (Org.). Estudos criminais em

homenagem a Evandro Lins e Silva. São Paulo: Método, 2001. p. 225-236.

______. Norma e bem jurídico no direito penal. São Paulo: Ed. Revista dos

Tribunais,2002.

______. Principio da ofensividade no direito penal. São Paulo: Ed. Revista dos

Tribunais, 2002.

Page 115: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

115

GRAU, Eros. A ordem econômica na constituição de 1988: interpretação e crítica.

São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1991.

GRECO, Luis. Princípio da ofensividade e crimes de perigo abstrato. Revista

Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v. 49, p. 89-147, jul./ago. 2004.

GRECO, Rogério. Curso de direito penal: parte geral. Niterói: Impetus, 2006.

GRECO FILHO, Vicente. Tipicidade, bem jurídico e lavagem de valores. In: COSTA,

José de Faria; SILVA, Marco Antonio Marques da (Coords.). Direito penal especial,

processo penal e direitos fundamentais: visão luso-brasileira. São Paulo: Quartier

Latin, 2006, p. 149-167.

GUALTIERI, S David; Bassiouni, M. Cherif. Mecanismos internacionales de control

de las ganancias procedentes de actividades ilícita - Revista de Derecho penal y

criminologia, nº6. Madri 1996

HASSEMER, Winfried. Critica ao derecho penal de hoy. Trad. Patrícia S. Ziffer.

Bogotá: Universidad Externado de Colômbia, 1997.

______. Fundamentos del derecho penal. Trad. Francisco Muñoz Conde e Luis

Arroyo Zapatero. Barcelona: Bosch, 1984.

______. Lineamentos de uma teoria personal del bien jurídico. Trad. Patrícia S.

Ziffer. Revista Doctrina Penal, Buenos Aires, ano 12, n. 45/48, 1989.

HIRSCH, Hans Joachim. Acerca del estado actual de la discussión sobre el

concepto de bien juridico. In: CONGRESSO INTERNACIONAL DE LA FACULTAD

DE DERECHO DE LA UNED: MODERNAS TENDENCIAS EM LA CIENCIA DEL

DERECHO PENAL Y EM LA CRIMINOLOGIA. Madrid, 2001. p. 371-387.

HUNGRIA, Nelson. Comentários ao Código Penal. Rio de Janeiro: Forense, 1958.

v. 7 e 9.

INESTA, Diego Gómez. El delito de blanqueo de capitales en derecho español. Barcelona: Cedecs, 1996.

Page 116: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

116

JAKOBS, Günther; CANCIO MELIÁ, Manuel. Derecho penal del enemigo. Madrid:

Civitas, 2003.

JESCHECK, Hans-Heinrich; WEIGEND, Thomas. Tratado de derecho penal: parte

general. Trad. Miguel Olmedo Cardenete. Granada: Comares Editorial, 2002.

JIMÉNEZ DE ASÚA, Luis. La ley y el delito, princípios de derecho penal. Buenos

Aires: Editorial Hermes, 1954.

Baden: Nomos Verlagsges, 1999.

LUISI, Luiz. Bens constitucionais e criminalizaçao, RCEJ, n. 4, jan.-abr.,1998.

_________Os princípios constitucionais penais. Porto Alegre: Fabris, 1991.

MAIA, Rodolfo Tigre. O Estado desorganizado contra o crime organizado. Rio de

Janeiro: Editora Lumem Júris, 1997

MACHADO, Maíra Rocha. Internacionalização do direito penal: a gestão de

problemas internacionais por meio do crime e da pena. São Paulo: Ed. 34; Edesp,

2004.

__________ & REFINETTI, Domingos Fernando. Lavagem de dinheiro e

recuperação de ativos: Brasil, Nigéria, Reino Unido e Suíça. São Paulo: Quartier

Latin, 2006.

MAGGIORE, Giuseppe. Derecho penal: parte especial. Trad. Ortega Torres. Bogotá,

1956. v. 3.

MARTINEZ-BUJÁN PÉREZ, Carlos. Derecho penal econômico: parte general.

Valencia:Tirant lo Blanch, 1998.

Page 117: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

117

MARTINS, A. G. Lourenço. Branqueamento de capitais: contra-medidas a nível

internacional e nacional. Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Lisboa, ano 9,

fasc. 3, p. 449-487, jul./set. 1999.

MENEZES, Lino Edmar de. Crime de lavagem de dinheiro (Lei 9.613/98): reflexões.

Boletim dos Procuradores da República, ano 3, n. 32, p. 24-26, dez. 2000.

MINISTÉRIO DA FAZENDA. Exposição de motivos n. 692/MJ. Disponível em:

<https://www.fazenda.gov.br/coaf/portugues/download/exposicao-motivos-

coafnet.PDF>.Acesso em: 30 abr. 2006.

Monitor das Fraudes. Disponível em:

<http://www.fraudes.org/clipread.asp?BckSt=1&CdClip=197>. Acesso em: 13 jun.

2006.

MUÑOZ CONDE, Francisco. Derecho penal: parte general. Valencia: Tirant lo

Blanch, 1999.

______. Presente y futuro de la dogmatica juridico-penal. Revista Penal da

Universidade de Salamanca, Salamanca, n. 5, p. 44-51, 2000.

OLIVEIRA, Edmundo. Cyberspace e o crime organizado transnacional, em Notáveis

do Direito Penal, livro em homenagem ao emérito professor doutor René Ariel Dotti.

Brasília: Consulex, 2006.

OLIVEIRA, Willian Terra de. O crime de lavagem de dinheiro, em Boletim IBCCRIM,

n.º 65, edição especial – abril/1998. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1988.

OLIVIRA, William Terra de.

__________A criminalização da lavagem de dinheiro – aspectos penais da lei

9.613/88. Revista Brasileira de Ciências Criminais, ano 6, n. 23, julho-setembro,

1998. São Paulo: RT, 1988.

PASTOR, Daniel Alvarez; PALACIOS, Fernando Eguidazu. La prevención del blanqueo de capitales. Aranzandi, 1998.

Page 118: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

118

PINHEIRO, Luiz Góes. O branqueamento de capitais e a globalização (facilidades

na reciclagem, obstáculos à repressão e algumas propostas de política criminal).

Revista Portuguesa de Ciências Criminais, Coimbra, ano 12, n. 4, p. 603-648,

out./dez. 2002.

PITOMBO, Antônio Sérgio A. de Moraes. Lavagem de dinheiro, a tipicidade do

crimeantecedente. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2003.

PODVAL, Roberto. O bem jurídico do delito de lavagem de dinheiro. Revista

Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, ano 6, n. 24, p. 209-222, out./dez. 1998.

PRADO, Luiz Regis. Bem jurídico-penal e constituição. São Paulo: Ed. Revista dos

Tribunais, 1997.

______. Comentários ao Código Penal. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2003.

______. Curso de direito penal brasileiro. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais,

2004. v. 2, v. 4.

QUAGLIA, Giovanni. Crime organizado internacional: narcotráfico, terrorismo e

lavagem de dinheiro. Nações Unidas. Escritório contra Drogas e Crime. Disponível

em: <http://www.unodc.org/brazil/pt/articles_speechs_UCB.html>. Acesso em: 20 jul.

2006.

QUEIROZ, Paulo de Souza. Direito penal: introdução crítica. São Paulo: Saraiva,

2001.

______. Do caráter subsidiário do direito penal. Belo Horizonte: Del Rey, 1998.

______. Funções do direito penal. Belo Horizonte: Del Rey, 2005.

REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. São Paulo: Saraiva, 1977.

REALE JR., Miguel. Crime organizado e crime econômico. Revista Brasileira de

Ciências Criminais, São Paulo, v. 4, p. 182-190, jan./mar. 1996.

______. Despenalização no direito penal econômico: uma terceira via entre o crime

e a infração administrativa? Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v.

28, p. 116-129, out./dez. 1999.

Page 119: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

119

______. Instituições de direito penal: parte geral. Rio de Janeiro: Forense, 2002. v.

1.

______. Problemas penais concretos. São Paulo: Malheiros Ed., 1997.

RELATÓRIO Global da Corrupção – América do Sul. Transparência Brasil.

Disponível em: <http://www.transparencia.org.br/docs/RelCorr2003.pdf>. Acesso em:

20 jul. 2006.

ROBERTI, Maura. A Intervenção Mínima Como Princípio no Direito Penal Brasileiro.

Porto Alegre: Sergio Fabris Editor, 2001.

ROSENTHAL, Sérgio. A lavagem de dinheiro e o crime organizado na França: o

fenômeno e o direito. Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, São

Paulo, n. 70, p. 15, 1998.

ROXIN, Claus. Política criminal e sistema jurídico-penal. Trad. Luis Greco. Rio de

Janeiro: Renovar, 2000.

_________. Que comportamentos pode o Estado proibir sob ameaça de pena? Sob

a legitimação das proibições penais. In:______. Estudos de direito penal. Trad. Luis

Greco.Rio de Janeiro: Renovar, 2006.

SABADELL, Ana Lucia. Manual de sociologia jurídica: introdução a uma leitura

externa do direito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 3ª edição, 2005.

_____________; DIMOULIS, Dimitri e MINHOTO, Laurindo Dias. Directo social,

regulação econômica e crise do Estado. Rio de Janeiro: Revan, 2006.

SANTIAGO, Rodrigo. O branqueamento de capitais e outros produtos do crime.

Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 9, fasc.3º, julho-Setembro,1999.

Coimbra: Coimbra.

Page 120: Reflexoes Sobre a Problematica da Lavagem de Dinheiro · PDF file6 Resumo A presente dissertação tem como objetivo a discussão da problemática do crime de lavagem de dinheiro,

120

SANTOS, Juarez Cirino dos. A moderna teoria do fato punível. Rio de Janeiro:

Freitas Bastos, 2000.

______. Novas hipóteses de criminalização. Instituto de Criminologia e Política

Criminal, Curitiba. Disponível em: <http://www.cirino.com.br>. Acesso em: 20 jun.

2006.

SILVA SÁNCHEZ, Jesús-Maria. A expansão do direito penal. Trad. Luiz Otavio de

Oliveira Rocha. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2002.

______. Reflexiones sobre las bases de la politica criminal. Revista do Instituto de

Pesquisas e Estudos da Faculdade de Direito de Bauru, Bauru, SP, v. 39, p. 13-23,

jan./abr. 2004.

SILVA, Ângelo Roberto Ilha da. Dos crimes de perigo abstrato em face da

constituição. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2003.

SOUTO, Miguel Abel. El blanqueo en la normativa internacional. Serviço de

Publicación e intercambio Científico da Universidade de Santiago de Compostela,

2002.

SUAREZ GONZALEZ, Carlos J. Blanqueo de capitales y merecimiento de pena:

consideraciones criticas a la luz de la legislación española. Cuadernos de Política

Criminal, Madrid, n. 58, p. 125-154, 1996.

TAVARES, Juarez. Teoria do injusto penal. Belo Horizonte: Del Rey, 2000.

TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios básicos de Direito Penal.4. ed. São Paulo:

Saraiva, 1991.

ZARAGOZA AGUADO, Javier Alberto. Prevencion y represion del blanqueo de

capitales. Madrid, Consejo General del Poder Judicial, 2000.

ZAFFARONI, Raúl Eugenio; PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito

Penal Brasileiro – Parte geral. 5. ed. São Paulo: RT, 2004.