artigo antonio carlos valadares lavagem de dinheiro

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MATÉRIA DE CAPA POR UM SISTEMA MAIS EFICIENTE DE COMBATE À LAVAGEM DE DINHEIRO E m 2012, o Senado Federal terá a oportunidade de realizar significativa reforma da Lei nº 9.613/98, que dispõe sobre o combate à lavagem de dinheiro. A experiência de mais de treze anos de sua vigência fez o País constituir estrutura e cultura institucionais básicas para o combate a essa modalidade delituosa. Agora, não restam dúvidas de que precisamos aperfeiçoar a legislação, buscando compatibilizá-la com os compromissos inter- nacionais assumidos pelo Brasil e tornar mais eficientes a prevenção e a repressão à lavagem de dinheiro. A reforma da Lei nº 9.613/98 começou a tramitar no Senado Federal em 2003, com a proposição do Projeto de Lei do Senado nº 209/03, de nossa autoria. À proposta foram apensados o PLS nº 48/05, do Senador Antero Paes de Barros, o PLS nº 193/06, do Senador Romero Jucá, e o PLS nº 225/06, da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito dos Correios, que muito contribuíram para a ampliação e o aprimoramento das discussões rela- tivas ao tema. Nesse sentido, também se mostrou de fundamental importância, para a elaboração de uma lei mais eficiente, a participação de especialistas e ins- tituições, notadamente aquelas que compõem a Estra- tégia Nacional de Combate à Corrupção e Lavagem de Dinheiro (ENCCLA). “O Senado Federal, ao analisar o Substitutivo ao PLS nº 209/03, com as alterações promovidas pela Câmara dos Deputados, está em condições de dar efetiva resposta à sociedade, oferecendo ao País uma lei atualizada, ampliada e forte, para o combate à criminalidade.” PIXMAC POR ANTONIO CARLOS VALADARES 26 REVISTA JURÍDICA CONSULEX - ANO XVI - Nº 361 - 1º DE FEVEREIRO/2012

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Page 1: Artigo antonio carlos valadares lavagem de dinheiro

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POR UM SISTEMA MAIS EFICIENTE DE COMBATE à

LAVAGEM DE DINHEIRO

Em 2012, o Senado Federal terá a oportunidade de realizar significativa reforma da Lei nº 9.613/98, que dispõe sobre o combate à lavagem de dinheiro. A experiência de mais de treze anos de sua vigência fez

o País constituir estrutura e cultura institucionais básicas para o combate a essa modalidade delituosa. Agora, não restam dúvidas de que precisamos aperfeiçoar a legislação, buscando compatibilizá-la com os compromissos inter-nacionais assumidos pelo Brasil e tornar mais eficientes a prevenção e a repressão à lavagem de dinheiro.

A reforma da Lei nº 9.613/98 começou a tramitar no Senado Federal em 2003, com a proposição do Projeto

de Lei do Senado nº 209/03, de nossa autoria. À proposta foram apensados o PLS nº 48/05, do Senador Antero Paes de Barros, o PLS nº 193/06, do Senador Romero Jucá, e o PLS nº 225/06, da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito dos Correios, que muito contribuíram para a ampliação e o aprimoramento das discussões rela-tivas ao tema. Nesse sentido, também se mostrou de fundamental importância, para a elaboração de uma lei mais eficiente, a participação de especialistas e ins-tituições, notadamente aquelas que compõem a Estra-tégia Nacional de Combate à Corrupção e Lavagem de Dinheiro (ENCCLA).

“O Senado Federal, ao analisar o Substitutivo ao PLS nº 209/03, com as alterações promovidas pela Câmara dos Deputados, está em condições de dar efetiva resposta à sociedade, oferecendo ao País uma lei atualizada, ampliada e forte, para o combate à criminalidade.”

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26 revista JUrÍDiCa ConsUlex - ano xvi - nº 361 - 1º De fevereiro/2012

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Page 2: Artigo antonio carlos valadares lavagem de dinheiro

Após cinco anos de tramitação, o Projeto foi aprovado pelo Plenário do Senado, na forma do Substitutivo formu-lado pelo Senador Pedro Simon, que enfrentou a questão de forma bastante ampla. Na Câmara dos Deputados, foram mais três anos para que o Plenário daquela Casa aprovasse o texto que, agora, retorna ao Senado Federal para votação definitiva. Nesta etapa, a Casa Legislativa de origem pode adotar uma de três alternativas: aprovar integralmente o Substitutivo da Câmara dos Deputados; rejeitá-lo e manter o texto anteriormente aprovado pelo Senado Federal; ou compor um texto que combine, dispositivo por dispositivo, o que entender mais adequado dentre as redações aprovadas pelas respectivas Casas. O debate sobre a matéria já alcançou um bom nível de amadurecimento para que essa etapa final possa transcorrer de maneira rápida e responsável.

A lavagem de dinheiro é um dos estratagemas mais maléficos e eficazes no estímulo à expansão da crimina-lidade, especialmente do crime organizado e, em grande medida, da corrupção. Não é uma questão nacional, é uma “pandemia”, que aflige países desenvolvidos e emergentes. Quanto maior a soma de dinheiro que a atividade crimi-nosa obtém, mais complexa a tarefa de lhe dar procedência.

Lavar dinheiro tornou-se uma espécie de “ciência”, que mobiliza cérebros sofisticados a serviço da criminalidade. Alguns crimes como contrabando, tráfico de drogas, de armas ou de pessoas, corrupção e fraude, além das redes de prostituição, geram formidáveis quantias de dinheiro, que precisam adquirir origem aparentemente lícita, sem despertar a atenção das autoridades.

O Brasil, com muita lentidão, despertou para tal reali-dade, e agora busca dotar sua legislação de meios mais eficazes para esse combate.

A primeira grande inovação proposta pelo PLS nº 209/03 é a eliminação do limitado rol dos chamados crimes ante-cedentes. Ao invés dos oito crimes – ou grupo de crimes – elencados na Lei nº 9.613/98 (art. 1º), a lavagem de dinheiro poderá se referir a bens, direitos ou valores provenientes de qualquer crime ou contravenção penal. Com isso, a atuação dos sistemas de prevenção e repressão não estará mais adstrita a determinadas condutas, bastando que se verifique uma vantagem econômica obtida de forma ilícita, para dar início à investigação.

A segunda consiste na ampliação do número de pes-soas sujeitas a mecanismos de controle, via identificação de clientes, manutenção de registros e comunicação de operações financeiras. Busca-se, aqui, fortalecer o subsis-tema de prevenção. O Projeto, dependendo do ramo da atividade, inclui as pessoas físicas, entre elas, a exemplo das pessoas jurídicas, as prestadoras de serviços de asses-soria, consultoria, contadoria, auditoria, aconselhamento ou assistência em diversas áreas, citando-se compra e venda de imóveis, estabelecimentos comerciais ou industriais ou participações societárias de qualquer natureza; gestão de fundos, valores mobiliários ou outros ativos; abertura ou gestão de contas bancárias, de poupança, investimento ou de valores mobiliários; criação, exploração ou gestão

de sociedades de qualquer natureza, fundações, fundos fiduciários ou estruturas análogas; financeiras, societárias ou imobiliárias; alienação ou aquisição de direitos sobre contratos relacionados a atividades esportivas ou artísticas profissionais.

Além disso, estarão submetidas ao controle de fluxo financeiro as juntas comerciais e os registros públicos; pessoas físicas ou jurídicas que atuam na promoção, inter-mediação, comercialização, agenciamento ou negociação de direitos de transferência de atletas, artistas ou feiras, exposições ou eventos similares; empresas de transporte e guarda de valores; pessoas físicas ou jurídicas que comer-cializam bens de alto valor de origem rural ou intermediam a sua comercialização; e todas as filiais estrangeiras dessas empresas e das que já estavam sujeitas a controle pela atual Lei de Lavagem de Dinheiro.

A ampliação do controle sobre tais atividades se justifica não por uma questão de desconfiança, mas de segurança. Todas essas são lícitas e fundamentais para o desenvolvi-mento econômico do País, por isso mesmo, é preciso que o sistema público de controle consiga identificar e coibir quaisquer tentativas de exercê-las ilicitamente.

O PLS nº 209/03 promove, ainda, outras alterações rele-vantes na Lei nº 9.613/98, com a previsão expressa do poder do juiz determinar o bloqueio ou a alienação antecipada de bens, impedindo sua transferência e transformação em capital financeiro, ou sua utilização como meio de paga-mento; e a destinação, para os Estados, de bens, direitos e valores relacionados, direta ou indiretamente, à prática de crimes de competência das Justiças estaduais. A ampliação das possibilidades de cooperação internacional também merece destaque, pois é medida fundamental para o com-bate à ação do crime organizado.

Os métodos e técnicas empregados na lavagem de dinheiro se alteram conforme são aprimoradas as medidas de prevenção e combate ao crime. Por isso, a lei está em processo permanente de atualização. Nós, parlamentares, devemos estar atentos a isso. Precisamos manter um olho no texto escrito da lei, e outro na realidade social.

A melhor forma de combater o crime organizado é por meio do estrangulamento financeiro. Não basta – embora seja indispensável – efetuar a prisão dos agentes, pois estes são substituídos rapidamente e as organizações criminosas continuam agindo. Contudo, suprimindo os meios pelos quais a criminalidade atua, atinge-se o “coração” da orga-nização. A inteligência, aqui, é mais eficaz que a pólvora.

O Senado Federal, ao analisar o Substitutivo ao PLS nº 209/03, com as alterações promovidas pela Câmara dos Deputados, está em condições de dar essa resposta à sociedade, oferecendo ao País uma lei atualizada, ampliada e forte, para o combate à criminalidade.

ANTONIO CARLOS VALADARES é Senador da República (PSB-SE).

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