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Revista Direito e Práxis
E-ISSN: 2179-8966
Universidade do Estado do Rio de
Janeiro
Brasil
de Moraes Alfonsin, Betânia
A ordem jurídico-urbanística nas trincheiras do Poder Judiciário
Revista Direito e Práxis, vol. 7, núm. 14, 2016, pp. 421-453
Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Rio de Janeiro, Brasil
Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=350945825016
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RiodeJaneiro,Vol.07,N.14,2016,p.421-453BetâniadeMoraesAlfonsinetal.DOI:10.12957/dep.2016.22951|ISSN:2179-8966
A ordem jurídico-urbanística nas trincheiras doPoderJudiciárioThelegal-urbanorderinthejudicialtrenches
BetâniadeMoraesAlfonsinetal
ArtigodeautoriacoletivadoGrupodePesquisaemDireitoUrbanísticodaFaculdadedeDireitodaFundaçãoEscolaSuperiordoMinistérioPúblico (FMP),coordenadoporBetâniadeMoraesAlfonsin,ProfessoradaFaculdadedeDireitodaFMPeDoutoraemPlanejamento Urbano e Regional pelo IPPUR/UFRJ ([email protected]). Equipe depesquisa: Aline Alves Rocha, Graduanda em Ciências Jurídicas e Sociais pela PUCRS([email protected]);FernandaPeixotoGoldenfum,BacharelaemCiênciasJurídicaseSociaispelaPUCRS,EspecialistaemDireitoMunicipalpelaESDM/FMPeAnalistadaDefensoria Pública do Rio Grande do Sul ([email protected]); LuisaAlmeida Amin, Bacharela em Ciências Jurídicas e Sociais pela FMP([email protected]); Pedro Prazeres Fraga Pereira, Bacharel em CiênciasJurídicas e Sociais pela FMP e Mestrando em Direito pela UFRGS([email protected]); Stéfanie Berthold, Graduanda em Ciências Jurídicas eSociaispelaFMP([email protected]);eVicentedeAzevedoBastianCortese,BacharelemCiênciasJurídicaseSociaispelaFMPeMestrandoemDireitopelaUFRGS([email protected]).
Artigorecebidoeaceitoemmaiode2016.
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Resumo
OartigoapresentaosresultadosdeumapesquisarealizadajuntoaoTribunal
de Justiça do Rio Grande do Sul acerca da receptividade da nova ordem
jurídico-urbanística brasileira em demandas julgadas entre 2011 e 2015. Os
achadosindicamqueumapeculiarformadeativismojudicialépraticadapelo
tribunal,jáqueaefetividadedoEstatutodaCidademostrou-semaiorquando
o Poder Público se encontra no polo passivo das ações e menor quando
particulares têmodireitodepropriedadequestionadoem juízo. Talmaneira
seletiva de aplicar a lei implica em um fortalecimento do “modelo
proprietário”emdetrimentodoparadigmaemergente.A investigação revela
que o desconhecimento da nova ordem jurídico-urbanística por parte tanto
dos litigantesquantodosmagistradostambémexplicaabaixaefetividadedo
EstatutodaCidadenastrincheirasdoPoderJudiciário.
Palavras-chave: Nova ordem jurídico-urbanística; Estatuto da Cidade; Poder
Judiciário.
Abstract
This article presents the results of a survey on the receptiveness of the
Brazilian new legal-urbanorder involving the decisions of theRioGrandedo
Sul Court of Appeals between 2011 and 2015. The findings indicate that a
particular form of judicial activism is practiced by the court since the
effectiveness of the City Statute was higher when public authorities are
defendants in the lawsuits and lower when individuals have the right of
ownershipquestioned incourt.Suchselectivewaytoapplythe law impliesa
strengthening of the “proprietary model” to the detriment of the emerging
paradigm. The survey suggests that lack of knowledge about the new legal-
urban order on the part of both litigants and magistrates explains the low
effectivenessoftheCityStatuteinthejudicialtrenches.
Keywords:Newlegal-urbanorder;CityStatute;Judiciary.
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Introdução
A produção de cidades na América Latina, marcada pela convivência de
processos legais e ilegais de acesso à terra, embora tenha sido regida pelo
DireitoCivilaolongodequasetodooséculoXX,experimentouumamudança
nopadrãoderegulação,especialmentenaúltimadécadadoséculopassadoe
naprimeiradécadadoséculoXXI.1
No Brasil, a construção de uma nova ordem jurídico-urbanística
começa em 1988, com a promulgação da Constituição Federal2, e tem seu
marcolegaldetalhadoem2001,comoEstatutodaCidade3.Ocasobrasileiroé
merecedor de pesquisa. O país conquistou um marco legal avançado, que
previu efeitos jurídicos concretos para o desatendimento do princípio da
funçãosocialdapropriedadee introduziuodireitoàcidadenoordenamento
jurídicopátrio.Noentanto,anovaordemjurídico-urbanísticaparececonviver,
ainda hoje, com a antiga ordem civilista, aqui denominada de “modelo
proprietário”, paradigma comprometido com uma concepção de direito de
propriedadedecaráterabsoluto,exclusivo,individualeperpétuo.
Opresenteartigoprocuraenfrentaroproblemadaefetividadedessa
novaordemjurídico-urbanísticanoBrasil,notadamentenoquedizrespeitoao
âmbito do Poder Judiciário. Tal agenda de pesquisa emerge de duas
constatações aparentemente contraditórias: (i) sendo a política urbana de
competência municipal (art. 30, VIII e art. 182 da Constituição Federal), os
poderesExecutivoeLegislativodosmunicípiostêmtratadode incorporar,ao
menosminimamente, asdiretrizese instrumentosdoEstatutodaCidadeem
1Exemplos representativosde talmudança sãoos casosdeColômbiaeBrasil, que vemsendoestudados internacionalmente como experiências emblemáticas da emergência do DireitoUrbanístico na América Latina. Para uma excelente retrospectiva do processo de reformajurídicaede reformaurbananaColômbia,emqueaantigaordemcivilistadeu lugaràLeydeReformaUrbanade1988eàLeydeDesarrolloTerritorialde1997,verMALDONADOCOPELLO,Maria Mercedes. El proceso de construccióndel sistema jurídico colombiano: entre reformaurbana y ordenamiento territorial. In: FERNANDES, Edesio; ALFONSIN, Betânia (Orgs.).DireitoUrbanístico:estudosbrasileirose internacionais.BeloHorizonte:DelRey,2006,p.25-58.Paraumestudomaisaprofundadodotema,verALFONSIN,Betânia.Apolíticaurbanaemdisputa:desafios para a efetividade de novos instrumentos em uma perspectiva analítica deDireitoUrbanístico Comparado. Tese de Doutorado. Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano eRegionaldaUniversidadeFederaldoRiodeJaneiro.RiodeJaneiro,2008.2BRASIL.ConstituiçãoFederal,ConstituiçãodaRepúblicaFederativadoBrasil,de05deoutubrode1988.3BRASIL.EstatutodaCidade,LeiFederalnº10.257,de10dejulhode2001.
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seus planos diretores e na legislação urbanística decorrente4; (ii) apesar da
massiva incorporação de novos instrumentos à legislação urbanística
municipal, os conflitos territoriais envolvendo posse e propriedade, muitas
vezes com ordens judiciais de despejo cumpridas de maneira bastante
violenta,sãofrequentesemtodoopaís5.
Considerando tal paradoxo eo papel preponderante do Poder
Judiciárionassituaçõesdedespejosforçados,estapesquisa,realizadaaolongo
de2015,tomouporobjetodeanáliseoacervojurisprudencialdoTribunalde
JustiçadoRioGrandedoSul(TJRS),afimdeverificaremquemedidaoEstatuto
daCidadefoiaplicadoemcasosconcretos,considerandotemas-chavedonovo
paradigma,comoodireitoàcidadeeodireitoàmoradia.Trabalhou-secoma
hipótesedeque,apesardosavanços legislativosrepresentadospeloEstatuto
da Cidade, a jurisprudência do tribunal selecionado revelaria a existência de
uma disputa de fundo em torno da política urbana, na qual o paradigma
civilista teria hegemonia, em desfavor da nova ordem jurídico-urbanística
brasileira.
A investigação demonstrou que tal disputa paradigmática
efetivamenteexiste,masquea formacomooEstatutodaCidadeéaplicado
(ou não) pelo TJRS está longe de ser uniforme e depende de vários outros
fatores envolvidos nos casos concretos. Em muitos casos analisados
identificou-seumaespéciedeativismojudicialbastantesingular,adicionando
complexidadesàsconclusõesdapesquisa.Emboraaanáliseconfirmequehá
umatransiçãoparadigmáticaaindaemcursona regulaçãodapolíticaurbana
no Brasil, percebe-se que o avanço jurisprudencial é lento, assistemático e
evoluide formadistintaconformeapresençadeatorespúblicosouprivados
noscasosconcretos.
No decorrer deste trabalho serão discutidos os traços característicos
do paradigma civilista, bem como aqueles próprios da nova ordem jurídico-4Paraumaavaliaçãodosnovosplanosdiretoresbrasileirosea incorporaçãodasdiretrizesdaPolítica Urbana e dos novos instrumentos urbanísticos pelas leis municipais ver: SANTOSJÚNIOR,OrlandoAlvesdosSantos;MONTANDON,DanielTodtmann(Orgs.).OsplanosdiretoresmunicipaisPósEstatutodaCidade:balançocríticoeperspectivas.RiodeJaneiro:LetraCapital,2011.5Ver análise de um caso notório e de negativa repercussão internacional emKONZEN, Lucas.Conflictos urbanos y activismo judicial en Brasil: el caso Pinheirinho. In AZUELA, Antonio;CANCINO, Miguel Angelo (Orgs). Jueces y conflictos urbanos en América Latina. IRGLUS:México,2014.p.223-246.
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urbanística(seções1e2);aquestãodoativismojudicialnocontextodoBrasil
(seção 3); a metodologia da pesquisa empírica (seção 4); e o conteúdo dos
acórdãosselecionadosapartirdaspalavras-chaveutilizadas(seções5a9).Ao
final,sãoapresentadasasconclusõesdapesquisa.
1.Oparadigmacivilistaou“modeloproprietário”nodireitobrasileiro
Nodomíniodaregulaçãodosusosdaterra,ahistóriabrasileiraémarcadapor
certo descompasso entre as grandes inovações legislativas e o conjunto de
práticas sociais subjacentes. Tal desarmonia entre textos e contextos, ainda
que carregue múltiplas e distintas explicações ao longo dos diferentes
capítuloshistóricosnacionais,persisteatéosdiasdehoje, tendono instituto
dapropriedadeumexemploprivilegiado.
Uma dessas grandes inovações deu-se com a promulgação da
ConstituiçãoFederal,responsávelporinaugurarumnovoparadigmanaforma
de se compreender juridicamente os contornos do direito de propriedade e,
por consequência, os direitos à cidade e à moradia. Visando destacar o
significado dessa mudança paradigmática, cabe dedicar algumas linhas à
descriçãosumáriadasgenealogiasdasformasderegulaçãodosusosdaterra
no Brasil, anotando seus traços mais marcantes. Ainda que não se trate de
incursão histórica de maior fôlego, este olhar para trás contribui para a
adequada compreensão dos desafios contemporâneos colocados ao Direito
Urbanísticobrasileiro.
Comefeito,pode-sedizerquevingounoBrasil,atémeadosdoséculo
XIX, a velha tradiçãododireito comumeuropeu, comemanações legislativas
quase integralmente provindas do além-mar, ainda que sempre adaptadas e
ressignificadas a partir das particularidades locais. No âmbito do direito de
propriedade as coisas não foram diferentes. Ainda que cercada de
particularidades locaisediferençasdecisivasemrelaçãoàrealidadeeuropeia
medieval6,aexistênciadecaracterísticaspré-modernasnaregulaçãodosusos
6Para uma excelente síntese sobre o direito de propriedade na ordem jurídicamedieval, verGROSSI,Paolo.Históriadapropriedadeeoutrosensaios.RiodeJaneiro:Renovar,2006.
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da terra também se verificou no Brasil. Ao longo da empresa colonial e de
parte importantedoperíodo imperial,apolíticadeterrasnopaís incorporou
um misto de institutos feudais e mercantis carregados de flexibilidade,
precariedade e informalidade, cujos contornos iam se adaptando às
transformaçõesdemográficasesocioeconômicaspelasquaispassavaoBrasil.
Tal processo de modernização vinha acompanhado de mudanças
profundasnosfundamentosdagestãodavidapública,incidindonaformacom
queseconcebiaepraticavaodireito.Esseethospermeadopeloracionalismo
iluminista característico do ideário liberal-republicano que marcava o novo
desenhopolíticodopaísencontroudesdobramentonaconformaçãododireito
de propriedade. A propriedade passa a ser concebida como um direito
absoluto,pleno, tendencialmenteperpétuoeessencialmenteprivado,nãose
sujeitandoalimitaçõesexternas,conferindoaseutitularumaposiçãojurídica
praticamente imune a limitações ou interferências externas 7 .Tal ideário
reconfiguraodireitodepropriedade, “[...] a talpontoqueumdosprincipais
elementosconstitutivosdasnascentesentidadespolíticasburguesaséamais
rígida proteção a eventuais ataques ao ‘sagrado’ e ‘absoluto’ direito de
propriedade – e isso tanto da parte do Estado quanto de outros
particulares”8.Éaessadoutrinaquesedesignapor“modeloproprietário”9.
Se essas concepções de propriedade já ecoavam na produção dos
juristasbrasileirosdoséculoXIX,o reflexonodireitopositivosó se fezsentir
como adventoda Lei de Terras10, ummarco jurídicode inserçãodopaís no
círculo capitalista moderno. O diploma legal transparece ao menos três
objetivos: a contenção de ocupações informais de terras devolutas, a
formalizaçãodaspropriedadespormeiodetitulaçõeseofomentodamãode
obraimigrantenaslavouras.Ébemverdade,porém,queaLeideTerraspouco
alterou as relações de dominação há muito estabelecidas, ainda que tenha
servidopara legitimá-las a partir de novas bases jurídicas.Dopontode vista
jurídico, tais relações, até entãomarcadas pelos laços de cunho pessoal e à
7HESPANHA,AntonioManuel.Direitoluso-brasileironoAntigoRegime.Florianópolis:FundaçãoBoiteux,2005.p.87-89.8FONSECA, RicardoMarcelo. A Lei de Terras e o advento da propriedademoderna no Brasil.AnuarioMexicanodeHistoriadelDerecho,v.17,2005.p.104.9Segue-seaalcunhaempregadaporHESPANHA,AntonioManuel,Op.cit.,p.92.10BRASIL.LeideTerras,Leinº.601,de18desetembrode1850.
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mercêdosdesígniosdacoroa,passamaassumirao longodesteprocessode
modernização formas ditadas pelos proprietários e dependentes do
mercado11.Os ecos desse liberalismo pátrio relativo à propriedade, ainda se
fazem sentir com indesejável constância na práxis jurídico-política referente
aos conflitos urbanos, constituindo o denominado paradigma civilista,
plasmadonasdisposiçõesdoCódigoCivil12.
2.Oparadigmadanovaordemjurídico-urbanísticabrasileira
A Constituição Federal de 1988 é apontada por muitos estudiosos como o
marco fundadordoDireitoUrbanísticobrasileiro, jáquepelaprimeiravezna
história constitucional da República se deu visibilidade à questão urbana.13O
capítulo da Política Urbana foi resultado da Emenda Popular da Reforma
Urbana, frutodeumamploprocessodemobilizaçãodediversasentidadese
movimentossociaisàépocadaAssembleiaNacionalConstituinte.Maisde130
mil assinaturas foram coletadas em todo o país visando incluir vinte e três
artigossobrepolíticadedesenvolvimentourbanonaConstituição.Emfunção
do conteúdo inovador da proposta, a emenda foi mutilada nos debates
constituintes hegemonizados pelo bloco de centro-direita conhecido como
“Centrão”,restandonaConstituiçãoapenasosarts.182e183.14
O teor progressista do capítulo da Política Urbana, no entanto, foi
preservado. Segundo as disposições constitucionais, o tratamento do direito
de propriedade, quando o mesmo recair sobre um imóvel urbano, fica
submetido à disciplina do Plano Diretor do município e deve ser exercido
objetivando o pleno cumprimento das funções sociais da cidade e da
propriedade. Além disto, foram incluídos instrumentos capazes de conferir
efeitos jurídicos ao princípio da função social da propriedade, como o
parcelamento e edificação compulsórios, o Imposto Predial e Territorial
11FONSECA,RicardoMarcelo,Op.cit.,p.122.12BRASIL.CódigoCivil,LeiFederalnº.10.406,de10dejaneirode2002.13Cf., por exemplo, os textos reunidosemMATTOS, LianaPortilho (Org.).Estatuto da CidadeComentado.BeloHorizonte:Mandamentos,2002.14ParaumresgatedoprocessodeconstitucionalizaçãodapolíticaurbananoBrasil,verBASSUL,José Roberto. Estatuto da Cidade: quem ganhou? Quem perdeu? Brasília: Senado Federal,2005.
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Urbanoprogressivonotempoeadesapropriaçãocompagamentoemtítulos
dadívidapúblicadosterrenosnãoedificados,nãoutilizadosousubutilizados.
Por fim,umanovamodalidadedeusucapiãofoi introduzidanoordenamento
jurídico,baseando-senautilizaçãofamiliardoterrenopara finsdemoradiae
reduzindo para cinco anos o prazo prescricional para aquisição do domínio.
Todavia,muitas das disposições contidas no capítulo da Política Urbana não
eram autoaplicáveis e demandavam a aprovação de uma lei federal
regulamentandoamatéria.
Por isso,a lutadomovimentopela reformaurbanacontinuouapósa
promulgação da Constituição Federal, visando fazer com que o Congresso
NacionalexaminasseeaprovasseoprojetodeleidoEstatutodaCidade,oque
sóveioaocorrerem2001.Pelaradicalmudançapromovidanotratamentodo
direito de propriedade urbana no Brasil e na regulação da política urbana,
representando uma verdadeira ruptura paradigmática, o Estatuto da Cidade
consolidouuma“novaordemjurídico-urbanística”,termocunhadoporEdésio
Fernandes e amplamente utilizado pelos doutrinadores do Direito
Urbanístico.15
AsrazõespelasquaisoEstatutodaCidademarcaaemergênciadeuma
nova ordem jurídico-urbanística passam pelas características deste diploma
legal: a) ruptura com o modelo civilista anterior à Constituição de 1988 e
abandono do “modelo proprietário” no qual o direito de propriedade é
exercido pelo proprietário com exclusividade e com prevalência da função
econômicadobem;b)submissãodapropriedadeurbana,tantopúblicaquanto
privada,aoprincípiodafunçãosocialdapropriedade;c)urbanismoassumido
como uma função pública e a cidade percebida como um bem coletivo; d)
indicaçãode instrumentos jurídicos, tributárioseurbanísticosparagarantira
efetividade de princípios e diretrizes da política urbana; e) Plano Diretor
reconhecido como lei ordenadora da política urbana, a ser elaborado com
ampla participação popular e competente para fixar critérios e instrumentos
paraqueosterrenosurbanosatendamasuafunçãosocial;f)democratização
da gestão da política urbana; g) emergência de diversos direitos difusos e
15FERNANDES, Edesio. Do Código Civil de 1916 ao Estatuto da Cidade: algumas notas sobre atrajetóriadoDireitoUrbanísticonoBrasil.In:MATTOS,LianaPortilho(Org.).EstatutodaCidadeComentado.BeloHorizonte:Mandamentos,2002.p.31-64.
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coletivos. Quanto à última característica, destacam-se o direito à cidade
sustentávelcomodireitocoletivodoshabitantesdascidades,entendidocomo
umfeixededireitosurbanosligadosàinfraestruturaeaosserviços,aliadoao
direito à preservação do meio ambiente; o direito à regularização fundiária
quegarantaodireitoàmoradiadigna,atravésdausucapiãourbanacoletivaou
individuale/oudaconcessãodeusoespecialparafinsdemoradia,conformea
ocupação tenha se dado em área privada ou pública, respectivamente; e o
direitoà justadistribuiçãodosônusebenefíciosdoprocessodeurbanização,
com recuperação pela coletividade da valorização imobiliária decorrente dos
investimentosdoPoderPúblico.
Considerando que antes da promulgação do Estatuto da Cidade os
municípiosexerciamapolíticaurbanatendopormarco legaloCódigoCivil,a
lei que fixa a pedra angular do Direito Privado, o giro paradigmático em
direção ao Direito Público é notável. A propriedade deixa de ser assunto de
interessedaórbitadoproprietárioparatornar-seumtemadedebatecoletivo,
visandooplenoatendimentodasfunçõessociaisdacidade.
Ainda que os comandos tanto dos arts.182 e 183 da Constituição
Federal quanto do Estatuto da Cidade estejam dirigidos prioritariamente ao
PoderExecutivomunicipal(jáqueomunicípioéoentefederativocompetente
paraaexecuçãodaPolíticaUrbana)eaoPoderLegislativomunicipal(jáqueas
Câmaras de Vereadores devem aprovar o Plano Diretor), também o Poder
Judiciário deve observá-los. Da nova ordem jurídico-urbanística brasileira
também resta claro que, ao analisar questões relacionadas à propriedade
urbana (seja ela pública ou privada), deve o julgador atentar para o que
estabelece a lei do plano diretor de cadamunicípio, que estabelece como a
propriedadeurbanaatenderáasuafunçãosocial.
Em períodos de transição paradigmática, como o que atravessa o
direito de propriedade urbana no Brasil, com a emergência da nova ordem
jurídico urbanística, é bastante comum que movimentos de avanços
institucionais, políticos, sociais e jurisprudenciais caminhem lado a lado com
eventuais recuos, reveladores da influência exercida, ainda, pelo antigo
paradigma.É justamenteafimdeverificaremquemomentodetaltransição
encontra-se o TJRS que se decidiu analisar a sua jurisprudência. Antes de
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apresentar a metodologia seguida na pesquisa, entretanto, é necessário
abordar, aindaque sucintamente,aquestãodoativismo judicialnocontexto
brasileiro.
3.Aquestãodoativismojudicial
O ativismo judicial é definido, nas palavras de Luís Roberto Barroso, como
“uma participação mais ampla e intensa do Judiciário na concretização dos
valores e fins constitucionais, commaior interferêncianoespaçode atuação
dosoutrosdoisPoderes”16.Emseguida,deixandoclaroquenãopretendelistar
exaustivamenteoscasosemqueseobservaareferidaconduta,Barrosoafirma
queestesincluem:
(i) a aplicação direta da Constituição a situações nãoexpressamente contempladas em seu texto eindependentementedemanifestaçãodo legisladorordinário; (ii)a declaração de inconstitucionalidade de atos normativosemanadosdolegislador,combaseemcritériosmenosrígidosqueos de patente e ostensiva violação da Constituição; (iii) aimposição de condutas ou de abstenções ao Poder Público,notadamenteemmatériadepolíticaspúblicas.17
No mesmo sentido, Lucas Konzen utiliza definição que muito se
aproximadavisãoarticuladaporBarroso,quandose refereao fenômenodo
ativismo como um dos resultados da nova ordem jurídico-urbanística na
atuaçãojurisdicionaldoEstadobrasileiro:
[…]fenômenodoativismojudicialarespeitodosdireitossociais,sobretudo saúde e educação, o qual se relaciona com osurgimento de novas doutrinas sobre a eficácia jurídica dasnormas constitucionais. É dizer, um esforço de criaçãojurisprudencialdeinterpretaçõesinovadorasdodireitopositivo.18
16 BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, ativismo judicial e legitimidadedemocrática.(Syn)thesis,,v.5,n.1,p.23-32,2012.p.25-26.17BARROSO,LuísRoberto,Opcit.,p.25-26.18KONZEN,Lucas,Op.cit.,p.225.
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A referênciaa tais textos servepara ilustraro significadoatualmente
dominante no Brasil (e no mundo do direito continental de maneira geral)
acerca do ativismo judicial. A judicialização de matérias que guardavam
originariamente natureza exclusivamente política (advinda no Brasil das
mudanças impostas pela nova ordem constitucional que seguiu a
redemocratização), inserida no novo paradigma dogmático e político do
constitucionalismo ocidental de fins do século XX servem para explicar essa
compreensão.Comefeito,talinovaçãolevouàcrisedaconcepçãoclássicada
separaçãodepoderes,namedidaemqueoPoderJudiciárioassumiuopapel
deprotagonistanaconcretizaçãodosconteúdosdaConstituiçãoecontrolador
doslimitesdaliberdadedeconformaçãodoPoderLegislativo.19
É natural, portanto, que a atuação desmedida do Judiciário no
desempenhodesuasnovas funções,ofensivaàesferadeatuaçãodosoutros
Poderes (ativista, portanto) seja identificada comoumaexacerbaçãodeuma
atuação que se pretende proativa e progressista, como são as posturas
comissivasdefinidaspelosautoresreferidos.
O conceito de ativismo judicial que se pretende adotar aqui, no
entanto,diferedaqueleadotadodemaneiracorrente,talcomopelosautores
referidos.Issoporqueahipótesequeinformaapresentepesquisapressupõea
existência de instrumentos legais consolidados pelo Estatuto da Cidade, que
regulamenta de maneira exaustiva as disposições normativas relativas à
PolíticaUrbanadefinidapelaConstituiçãoFederal.
Aoutrapremissaquecompõeahipóteseaquiapresentada,ademais,é
aquela segundo a qual o Poder Judiciário serve de instrumento ao
conservadorismo civilista, em ofensa, precisamente, não só às disposições
normativasdeordemconstitucional,mastambém(oquemaisimportaparaa
adjetivação de sua postura como ativista) à liberdade de atuação do Poder
Legislativo,quesofrecomonãoreconhecimentodesuaproduçãonormativae
oesvaziamentodesuasfunçõeseprerrogativas.
Assim, não se pretende demonstrar um exemplo de ativismo judicial
decorrente de “uma participação mais ampla e intensa do Judiciário na
19Cf.BARROSO,LuísRoberto.Neoconstitucionalismoeconstitucionalizaçãododireito:otriunfotardio do direito constitucional no Brasil. Revista de Direito Administrativo, v. 240, p. 1-42,2005.
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concretizaçãodosvaloresefinsconstitucionais”,oude“umesforçodecriação
jurisprudencial de interpretações inovadoras do direito positivo”, mas, pelo
contrário, um ativismo judicial decorrente do apego à antiga ordem civilista,
em detrimento da inovação realizada no plano do direito positivo em
harmoniacomaordemconstitucionalvigente.
É importante referir, quanto a isso, que a adoção do conceito de
ativismo judicial na designação de uma postura conservadora e omissiva do
PoderJudiciário(conservadoraporquetendenteàmanutençãodeumestado
decoisas;omissivaporquerealizadaapartirdeumnãofazer–nocaso,coma
nãoaplicaçãodalegislaçãoespecíficaexistente)nãoéinovadora.Emverdade,
pormaisestranhaquepossaparecerà luzdocontextodoconstitucionalismo
atual,éexatamenteessaanaturezadasprimeirasmanifestaçõesdeativismo
judicialreconhecidaspeladoutrina20.
Oquesepretendedemonstrarapartirdaanálisedajurisprudênciado
tribunal selecionado, portanto, é a não recepção pelo Poder Judiciário do
Estatuto da Cidade, especialmente no que tange aos direitos à cidade e à
moradia.Talopçãoérealizadaemfavordautilizaçãodeumparadigmacivilista
na resolução de conflitos, inviabilizando, por sua vez, a concretização da
políticaurbanaconsolidadanotextoconstitucionalemaniatandooLegislativo
atravésdaneutralizaçãodesuaproduçãonormativa.
4.Metodologiadapesquisa
A investigação realizada trabalhou com ométodo de abordagem hipotético-
dedutivo,jáqueotrabalhoorientou-seporumahipótesedepesquisabastante
20Essa informação é trazida pelo próprio Barroso em seu artigo, ao citar o casoDred Scott v.Sanford(1857),querepresentaaprimeiravez,desdeocélebreMarburyv.Madison(1803),emqueaSupremaCorteestadunidensefoideencontroaumatodeoutropoder(dessavez,umatonormativodoCongressodosEUA).Cf.BARROSO,LuísRoberto,2012,Op.cit.,p.27.Nocaso,aCorte deixou de aplicar oMissouri Compromise, que vedava a escravidão em algumas partesdesteestado,demaneiraa rejeitaroapelodeDredScott,umhomemnegroescravizadoquepretendiater,combaseemtallei,asualiberdadereconhecida.Ofundamentolegalparatanto,foi adita incapacidadeadprocessumdonegro. Tratou-se,pois,dousodeumargumentodenatureza processual com o objetivo de negar vigência à lei existente, ofendendo a esfera deatuação do Poder Legislativo. Cf. RODRIGUES, Lêda Boechat. A Corte Suprema e o direitoconstitucionalamericano.RiodeJaneiro:CivilizaçãoBrasileira,1992,p.66;eUSSupremeCourt,DredScottv.Sandford,60U.S.393,1856.
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clara.A jurisprudênciadoTJRSseriacapazderevelarumafiliaçãodotribunal
aoparadigmacivilistaemdetrimentodoparadigmada“novaordemjurídico-
urbanística” ao analisar e julgar situações envolvendo conflitos urbanos e
instrumentos previstos na legislação. Além disso, ainda que eventualmente
provocado pelas partes a analisar a incidência de princípios, diretrizes e
instrumentos de política urbana estabelecidos pela Constituição Federal,
Estatuto da Cidade, planos diretores e leis municipais capazes de assegurar
efetividade à nova ordem, o TJRS optaria, majoritariamente, por aplicar a
ordemcivilistaconsubstanciadapeloCódigoCivileCódigodeProcessoCivilna
análisedoscasosconcretos21.
Ométodohipotético-dedutivopressupõeanecessidadedeverificara
conformidade dos pressupostos teóricos, fatos e achados científicos com a
hipótesepreliminarmenteadotadapelainvestigação.Assim,ahipótesepoderá
ser corroborada, refutada ou, finalmente, alterada, dado que os achados
científicossãosempreprovisórios;tratam-sedeconjecturasenãopodemser
vistos como absolutos ou indiscutíveis22. Coerentemente com o método de
abordagem adotado, a hipótese originalmente formulada foi parcialmente
alterada pela pesquisa jurisprudencial realizada, o que será detalhado nas
conclusões.
Comométodo de procedimento, adotou-se o estudo de caso, posto
que a jurisprudência analisada nesta investigação restringe-se a um único
TribunaldeJustiça,odoEstadodoRioGrandedoSul,bemcomofoirecortada
temporalmente, abarcando somente os acórdãos de 2011 a 2015. A
justificativa para a escolha metodológica deste tribunal relaciona-se não
apenas ao local de inserção geográfica do Grupo de Pesquisa em Direito
UrbanísticodaFMP,mastambémacertosensocomumjurídicoquepregaser
o TJRS um dos tribunais mais progressistas do Brasil. Quanto ao marco
temporal,optou-seporanalisarajurisprudênciadotribunalapósumadécada
devigênciadoEstatutodaCidade,visandoafastarapossibilidadedealegação
21BoapartedosacórdãosanalisadosnestainvestigaçãoobservaaindaoCódigodeProcessoCivilde1973.Recentemente,porém,ocorreuaipromulgaçãodonovoCódigodeProcessoCivil de2015.Cf.BRASIL.CódigodeProcessoCivil de 1973. Leinº5.869,de11de janeirode1973;eBRASIL.CódigodeProcessoCivilde2015.Leinº.13.105,de16demarçode2015.22Sobreametodologiacf.POPPER,Karl.Alógicadapesquisacientífica.SãoPaulo:Cultrix,1993;Conjecturas e refutações: o progresso do conhecimento científico. Brasília: Editora da UNB,1994.
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dequeosdesembargadoresdoTJRSpoderiamaindanãoconhecero teorda
novalei.Tallinhadeargumentaçãoseriaindefensável,vistoque,entre2001e
2011,dezanossepassaram,temposuficienteparaqueoEstatutodaCidade
fosseconhecidoeassimiladoemsuaspotencialidadesinovadoras.
Em relação às palavras-chave adotadas para fins de pesquisa
jurisprudencial,foramselecionadascategoriasreputadascomocentraisparao
DireitoUrbanístico,relacionadasaocapítulodaPolíticaUrbanadaConstituição
Federal, bem como às diretrizes preconizadas pelo Estatuto da Cidade e aos
instrumentosdanovaordemjurídico-urbanísticabrasileira.Aspalavras-chave
pesquisadasnosistemadebuscadoTJRSforamasseguintes:“funçãosocialda
propriedadeurbana”,“funçõessociaisdacidade”,“direitoàcidade”,“direitoà
moradia”,“planodiretor”e“usucapiãourbanaespecial”.
Os resultados da análise dos julgados selecionados a partir dessas
palavras-chave foram um tanto surpreendentes, levando a conclusões com
grande poder explicativo acerca do que ocorre nas trincheiras do Poder
Judiciário.Nasseçõesqueseseguem,passa-seàdiscussãodecadaumadessas
categorias, anotando-se sua importância para o Direito Urbanístico;ao
detalhamentodapesquisajurisprudencialrealizadaemrelaçãoacadaumadas
palavras-chave; e, finalmente, à análise dos acórdãos identificados como
representativosdaposiçãomajoritáriadoTJRSsobrecadaumdessestemas.
5.Pesquisacomapalavra-chave“planodiretor”
Osplanosdiretoresrevestem-sedeumaimportânciacentralnapolíticaurbana
brasileira.Conformejásublinhado
[...] desde a Constituição Federal de 1988, os planos diretores,tidoscomotradicionais instrumentosdeordenamento territorialdos municípios brasileiros, alteraram significativamente o seupapel.Istoporqueocapítulo“DaPolíticaUrbana”daConstituiçãoFederal outorgou a execução de tal política aos municípios eestabeleceu que a função social da propriedade urbana écumpridaquandoamesmaatendeàsexigênciasfundamentaisdeordenação da cidade expressas pelo Plano Diretor. Embora adisposição, a princípio, possa parecer inócua, acarreta imensaresponsabilidade aos municípios, que passam a ser os
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responsáveis pelo planejamento urbano da cidade e pordeterminarasregrasparauso,parcelamentoeocupaçãodecadaporção do território urbano, de tal forma a fazer com que acidadecomoumtodoatendatambémàssuasfunçõessociais23.
Trata-se, portanto, de uma categoria estratégica na verificação da
maneira como o TJRS vem analisando os casos em que instrumentos do
Estatuto da Cidade são debatidos. A pesquisa em relação à palavra-chave
“planodiretor”,buscadadeformaisolada,resultaem1.230acórdãos.Quando
“plano diretor” é combinado a “Estatuto da Cidade”, o resultado chega a21
acórdãos que interessam diretamente à presente investigação. Deste total
foramexcluídosaquelesquetratavamdematériaprocessualequefugiamdo
marcotemporalfocadonainvestigação,restandoselecionados10acórdãos.
Namaiorpartedosacórdãosanalisadosoprincipaltemadebatido,em
sededeAçõesCivisPúblicas, diz respeitoà ausênciadeparticipaçãopopular
duranteoprocessodeelaboraçãodoplanodiretor,violandooprocedimento
estabelecidopeloEstatutodaCidadee inobservandoumdospilaresdanova
ordem jurídico-urbanística brasileira que é a gestão democrática da política
urbana. Neste tipo de ação, o TJRS tem adotado uma posição claramente
identificadacomoparadigmaestabelecidopeloEstatutodaCidade,anulando
os planos diretores aprovados sem participação popular e condenando os
municípios a retomar o processo de elaboração dos mesmos tomando as
providências necessárias para garantir a participação como, por exemplo, a
realizaçãodeaudiênciaspúblicas.
EmblemáticodestaposiçãodoTJRSéoacórdãoexaradonaApelação
Cível70057716334.Nocaso,oMunicípiodeSapirangaapeloudizendoquejá
tinha tomado providências e realizado as audiências públicas exigidas pelo
EstatutodaCidade,masnãotinhaculpasepoucaspessoascompareceram.O
que chama atenção nesta decisão é o fato de que todos os dispositivos do
Estatuto da Cidade relacionados à matéria foram colacionados no voto do
relatore,maisdoqueisso,osargumentosdoentemunicipalforamafastados,
adotando-seoparecerdoMinistérioPúblicoquedizia,inverbis:
23ALFONSIN, Betânia deMoraes. Planejamento urbano e plano diretor no contexto de gestãodemocráticapós-EstatutodaCidade.RevistaBrasileiradeDireitoUrbanístico,v.1,n.1,p.33-49,2015.p.36.
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No presente caso, ao que tudo indica, não foi atendida anecessáriaparticipaçãodopúbliconoprocessodeelaboraçãodoplanoaprovadopelaCâmara.Pela documentação acostada, percebe-se que foram realizadasduasaudiênciaspúblicas,nosdias03e10dedezembrode2010,ambas na sede da Câmara de Vereadores, situada no centro dacidade [...] À primeira, compareceram 77 pessoas, número queincluipessoaldaprefeitura,enquantoqueasegundacontoucomapresençade50participantes. Tais números são insignificantespara ummunicípio de quase 75.000 habitantes. Por outro lado,nãofoirealizadaqualqueraudiênciaououtrotipodeconsultanosbairrosmaisafastados.Sabe-se que o tema plano diretor é extremamente complexo eque o povo brasileiro ainda não está acostumado a participarativamente das questões públicas. Mas não tendo a requeridademonstradoasformasutilizadasparadivulgaçãodasaudiências,nãohácomopresumirquefoidadaamplaepréviapublicidadeaoato.24
Valedestacarcomoaexigênciadeparticipaçãopopularéaferidacom
radicalidade, mencionando o relator que “os depoimentos das testemunhas
são consistentes e enfáticos, demonstrando que os grupos de trabalho, que
deveriam auxiliar na elaboração do Plano Diretor, foram criados apenas em
caráter formal”25.Finalmente, cabe salientar que voto do relator censura a
realização de audiências públicas meramente homologatórias, salientando
que“aparticipaçãopopularnasaudiênciaspúblicasfoireduzida,semvotações,
com apenas aprovação de um projeto global previamente digitado”26. Além
disto,foimantidaamultadiária,fixadapelajuízadeprimeirograu,enquantoo
município não cumprisse com a obrigação de reelaborar o Plano Diretor
observandoplenamenteoEstatutodaCidade.
Assimcomonesteacórdão, emváriosoutros, envolvendomunicípios
atémesmodemédioporte,amesmaorientação jurisprudencial foiadotada,
fixando o entendimento de ser necessária a observância da participação
popularnaelaboraçãodoplanodiretor.Aanálise,portanto,levaacrerquea
novaordemjurídico-urbanísticaéacatadapeloTJRSnestescasos.Observa-se,
noentanto,queoréuéumentepúblico,nocaso,ummunicípio.Oachadode
24RIOGRANDEDOSUL.TribunaldeJustiçadoRioGrandedoSul.2ªCâmaraCível.ApelaçãoCível70057716334.Relator:JoãoBarcelosdeSouzaJúnior.PortoAlegre,16deabrilde2014.25RIOGRANDEDOSUL.TribunaldeJustiçadoRioGrandedoSul.2ªCâmaraCível.Op.cit.26RIOGRANDEDOSUL.TribunaldeJustiçadoRioGrandedoSul.2ªCâmaraCível.Op.cit.
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pesquisa deve ser levado em consideração nas conclusões da investigação,
emboradevasercotejado,paratanto,comoutroscasosemqueosdetentores
do título de propriedade não são entes estatais, a exemplo de conflitos
territoriais envolvendo posse e propriedadeem ações de usucapião especial
urbanaparafinsdemoradia.
6. Pesquisa com as palavras-chave “direito à cidade” e “função social da
cidade”
O direito à cidade é o núcleo internacionalmente reconhecido do Direito
Urbanístico, é um direito coletivo dos habitantes da cidade que engloba
direitos civis, políticos, econômicos, sociais, culturais, urbanísticos e
ambientais,objetivandoadistribuiçãoequitativa,universal,justa,democrática
e sustentável dos recursos oferecidos pelas cidades 27 .Faz-se presente na
ConstituiçãoFederal (arts.182e183),noEstatutodaCidade(art.2º, I)eem
diversasleisurbanísticas.Afunçãosocialdacidade,porsuavez,interessaaos
habitantesdacidadecomomeiodeconcretizarodireitoàcidade,exigindoa
adoção de políticas de desenvolvimento urbano a fim de ordenar o espaço
garantindo qualidade de vida aos habitantes da cidade (art. 182, caput, da
ConstituiçãoFederal).
Pesquisou-se acórdãos do TJRS, de 2011 a 2015, que contivessem a
palavra-chave “direito à cidade”, e, de forma surpreendente, não foram
encontradas decisões que abordassem esta temática. Constatou-se, com a
pesquisa, que a ausência de acórdãos reflete a provável ausência de
judicializaçãododireitoàcidade,categoriaqueestánocentrodanovaordem
jurídico-urbanística. A omissão na atuação de órgãos como a Defensoria
Pública e oMinistério Público, que têma função institucional de defender a
ordem urbanística, incentiva, inadvertidamente, este tribunal a manter o
2727A Carta Mundial pelo Direito à Cidade é documento chave no processo de mobilizaçãointernacionalpelo reconhecimento,pelasNaçõesUnidas,dodireitoàcidadecomoumdireitohumano. Embora proposta pormovimentos sociais, foi capaz de incluir o direito à cidade nocentrodaagendaurbanaaserdebatidapelaConferênciaHABITATIII,queserealizaemQuito,em outubro de 2016. Cf. CARTA MUNDIAL PELO DIREITO À CIDADE. Disponível emhttp://www.forumreformaurbana.org.br/biblioteca/59-biblioteca/manifestos-e-cartas/211-carta-mundial-pelo-direito-a-cidade.Acessoem:22demar.2016.
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“modeloproprietário”,queprivilegiaosdireitosdosproprietários,aoinvésde
exigir o cumprimento de seus deveres, olvidando-se que toda a propriedade
devecumprirasuafunçãosocial.
Por outro lado, concluiu-se que a jurisprudência vem, pontualmente,
aplicando a nova ordem jurídico-urbanística em detrimento do paradigma
civilista para discutir, por exemplo, questões ligadas às funções sociais da
cidade, e reconhecendo, pouco a pouco, essa inovadora categoria à qual o
direitoàcidadeestáintimamentearticulado.Pesquisou-se,portanto,acórdãos
destetribunalqueapresentassemapalavra-chave“funçãosocialdacidade”.A
busca resultou em 41 acórdãos, sendo que apenas 11 efetivamente
abordavam a temática da função social da cidade, como é o caso da Ação
DiretadeInconstitucionalidade7005393006128.Escolheu-seestejulgadopara
fins de análise por ser o mais recente emais relevante dentre aqueles que
mencionamatemáticadafunçãosocialdacidade.
Nestejulgamento,realizadopeloÓrgãoEspecialdoTJRS,foideclarada
a inconstitucionalidade de Lei Complementar doMunicípio de Porto Alegre,
por ter sido editada sem participação popular, exigida constitucionalmente,
para deliberar sobre proposta de alteração do plano diretor, em especial,
sobredesafetaçãodeáreasverdesparausohabitacionale transformaçãode
Áreas de Proteção de Ambiente Natural e Áreas de Ocupação Rarefeita em
Áreas Especiais de Interesse Social,não observando o art. 177, §5º, da
ConstituiçãoEstadual,29eosarts.1º,caput,e§único,e29,XII,daConstituição
Federal. O Município afirmou que a participação popular foi promovida
quando o Projeto de Lei foi encaminhado ao Conselho Municipal do Plano
Diretor de Desenvolvimento Urbano Ambiental. Ocorre que a participação
desteConselhonãoéaúnicaformadeparticipaçãodemocrática,portratar-se
deórgãoconsultivo,constituídoporindicaçõesdamunicipalidadeesistemade
representação popular, sendo indispensável a realização de audiências,
discussõesouconsultaspúblicas,sobpenadeviolaroprincípioconstitucional
daparticipaçãopopularnoplanejamentourbano(arts.29,XII,30,VIII,e182,
28RIOGRANDEDOSUL.TribunaldeJustiçadoRioGrandedoSul.ÓrgãoEspecial.AçãoDiretadeInconstitucionalidade70053930061.Relator: JoãoBarcelosdeSouzaJunior. Julgadoem18demaio2015.29RIOGRANDEDOSUL.ConstituiçãoEstadual,ConstituiçãodoEstadodoRioGrandedoSul,de03deoutubrode1989.
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daConstituiçãoFederal,177,§5º,daConstituiçãoEstadual;e2º,II,e40,§4º,
doEstatutodaCidade).
OdebateentreosmembrosdoÓrgãoEspecial foisobreaeficáciada
decisãosobreainconstitucionalidade,sedesdeoajuizamentodaação,apartir
do julgamentooudo trânsitoem julgado. Entendendoqueamodulaçãodos
efeitos para o ajuizamento da ação resultaria em uma decisão de difícil
execução, foi decidido, pormaioria, que seria eficaz a partir do julgamento,
para preservaras situações fático-jurídicas criadas e consolidadas pela lei
declarada inconstitucional. A discussão acerca das funções sociais da cidade
restourestritaàdicçãolegaldotermonaConstituiçãoFederalenoEstatutoda
Cidade, não havendo, no acórdão analisado, maior desenvolvimento do seu
conteúdo.Detodaforma,odebateexigiuqueosmembrosdoÓrgãoEspecial
semanifestassem sobre a temática, o que demonstrou desconhecimento de
muitosmagistradossobreoDireitoUrbanístico.
7.Pesquisacompalavra-chave“funçãosocialdapropriedadeurbana”
Odireitoàpropriedadenãopodeservistocomoumdireitoapenasindividual,
tendoemvistaacaracterísticaintrínsecaimpostapelaConstituiçãoFederalde
quedevecumprirumafunçãosocial.30Porém,apesardetalentendimento,na
análisedecomooTJRSinterpretaasnormas–tantoasconstitucionaisquanto
asespeciaisdoEstatutodaCidade–percebe-sequeosefeitosjurídicosqueo
princípio da função social da propriedade deveria gerar nos casos concretos
muitas vezes não se verificam pela interpretação equivocada das normas
existentesedevidoàhegemoniado“modeloproprietário”.31
Utilizando a palavra-chave “função social da propriedade urbana” a
primeira busca elencou 3.210 acórdãos. Eliminando os relativos ao IPTU
progressivoeoutrosqueversavamsobre temasestranhosàanálise, abusca
30SILVA,JoséAfonsoda.DireitoUrbanísticoBrasileiro.4.ed.SãoPaulo:Malheiros,2006.31ALFONSIN, Jacques Távora.Das legalidades injustas às (i)legalidades justas: estudos sobredireitos humanos, sua defesa por assessoria jurídica popular em favor de vítimas dodescumprimentodafunçãosocialdapropriedade.PortoAlegre:ArmazémDigital,2013.
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depurada elencou 41 acórdãos, dos quais apenas quatro fazem referência à
novaordemjurídico-urbanísticaemsuafundamentação.
Dois desses acórdãos merecem uma análise mais detalhada. A
ApelaçãoCível70065098865 foi escolhida tendoemvistapriorizarnão sóas
disposiçõesdoCódigoCivil,mastambémdaConstituiçãoFederaledoEstatuto
daCidade,enfatizandoodireitoàmoradiaaoinvésdodireitoàpropriedade.O
casotratadeumaaçãodeusucapiãoespecialparafinsdemoradiareferentea
um imóvel pertencente auma incorporadora imobiliária. Coma sentençade
procedência, a empresa alegou em apelação que a autora não preenchia os
requisitosparaausucapiãopretendida.Porém,oTJRSmanteveasentençae
embasouadecisãonaConstituiçãoFederal,noCódigoCivil enoEstatutoda
Cidade, explicando que tal modalidade de usucapião visa sancionar o
proprietário que não cumpre a função social da propriedade. Chama a
atenção,ainda,ofatodorelatordoacórdãodefenderqueodireitoàmoradia
deve se sobrepor ao mero direito à propriedade, por se tratar de direito
fundamentalimplicitamenteligadoàdignidadedapessoahumana:
OdireitoàmoradiaprevistonaConstituiçãoFederaléessencialàefetivação do princípio da dignidade da pessoa humana e doacessoàterraurbanaerural,bemcomoaotrabalho.Aoladodaalimentação, a habitação figura no rol das necessidades maisbásicas do ser humano. Para cada indivíduo desenvolver suascapacidadeseatéseintegrarsocialmente,éfundamentalpossuirmoradia.Trata-se de questão relacionada à própria sobrevivência, poisdificilmente se conseguiria viver por muito tempo exposto aosfenômenos naturais, sem qualquer abrigo. O provimento dessanecessidade passa evidentemente pelo espaço físico, pelo"pedaçodeterra",masemrazãodoprocessodecivilizaçãoacabasempreporrequerermaisdoqueisso.32
JáoAgravoInternoemAgravodeInstrumento70047281241priorizou
odireitodoproprietárioemdetrimentododireitoàmoradia.Trata-sedecaso
envolvendoumareintegraçãodeposseemfacedeumaocupaçãotratadapelo
tribunalcomo“invasãocoletivaurbana”.Nostermosdaementadojulgado,os
magistrados entenderam que segurança jurídica exige reconhecer a
“prevalênciadodireitodopossuidor,emdetrimentododireitodosinvasores,
32RIOGRANDEDOSUL. Tribunal de JustiçadoRioGrandedo Sul. 17ªCâmaraCível.ApelaçãoCível70065098865.Relator:GiovanniConti.Julgadoem13ago.2015.
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namedidaemquepresentesos requisitosdoart. 927doCPC, aindaqueos
esbulhadoresnãotenhamoutrolocalpararesidir”.33Osjulgadores,aocotejara
pretensãodoproprietáriodereaveracoisaeadosocupantesdepermanecer
noimóvelparafinsdemoradia,revelamumdesprezopeloprincípiodafunção
socialdepropriedade.
8.Pesquisacompalavra-chave“usucapiãoespecialurbana”
A usucapião especial urbana para fins de moradia é um dos principais
instrumentos garantidores da segurança da posse de milhares de famílias
brasileiras.Concebidoparadarefetividadeà função socialdapropriedade,o
instrumento opera umaprescrição aquisitiva pela qual o posseiro que deu à
terraumafunçãosocial (moradia)adquireapropriedadedeformaoriginária,
jáqueoproprietárionãoseopôsàposse.Emboraoinstrumentoexistadesde
apromulgaçãodaConstituiçãoFederal(art.183),aoregulamentá-looEstatuto
da Cidade (arts. 9º a 14) introduziu a modalidade de usucapião coletiva,
legitimando as composses de famílias de baixa renda em áreas de ocupação
irregularconsolidada.
Utilizando-senabuscaotermo“usucapiãoespecialurbana”tem-se91
acórdãos, sendo que o Estatuto da Cidade é referido em 13. Apenas nove
detêm-se sobre a questão do cumprimento dos requisitos para que seja
reconhecidaaaquisiçãopelaposse.Destetotal,quatroforamdesconsiderados
naanálise,poistratamdequestõesprocessuaisincidentais.
Umdosrequisitosprevistosparaausucapiãoespecialurbanarefere-se
ao tamanho do imóvel. Neste sentido, aomenos três acórdãos sustentam a
impossibilidadedequeausucapiãoespecialurbanasedênoscasosemqueos
imóveisocupadostenhamáreasuperiora250m²,mesmoquandoopossuidor
pretendaterreconhecidaaaquisiçãodapropriedadepelousodeáreainferior
33RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. 18ª Câmara Cível. AgravoInternoemAgravodeInstrumento70047281241.Relator:NelsonJoséGonzaga.Julgadoem29mar.2012.
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aototaldolote34.Percebe-seareticênciadotribunaleminterpretaroEstatuto
daCidadedemaneirasistemáticaecondizentecomoobjetivodeassegurara
posseàquelesquefaçamcumprirafunçãosocialdeimóveisurbanos.
Dos acórdãos que não fazem referência ao Estatuto da Cidade, dois
chamam a atenção por destacarem o princípio da função social da
propriedade. Na Apelação Cível 70043753961, foi reformada a sentença de
primeiro grau que julgou procedente uma ação reivindicatória, acolhendo a
exceção de usucapião especial urbana arguida pela defesa, na forma da
Constituição Federal e do art. 1.240 do Código Civil.No caso, o objeto de
disputa era um apartamento localizado em um edifício abandonado que se
encontrava ocupado. O acórdão cita parecer do Ministério Público que fez
referência à função social da propriedade, que estaria sendo descumprida
pelosproprietários.Éoqueselênovotodarelatora:
Há contradições relevantes da parte dos autores a formar aconvicçãodeque:1)oprédionãofoiesvaziadoparaumareforma,massimplesmentedesativado(descumprindoafunçãosocialquecumpre à propriedade desempenhar); […] 4)caracterizou-se oabandonodoprédio,atalpontodeosautoresmencionaremmaisde uma “invasão” e não lograramapresentar prova documentalsegura nem mesmo prova testemunhal acerca de quandoocorreramesuascircunstâncias[...].35
Já a Apelação Cível 70054589924impressionapelodesconhecimento
dosmagistradosquantoaoconceitodafunçãosocialdapropriedade.Nocaso,
o colegiado manteve, de forma unânime, a decisão de primeiro grau que
determinara a imissão de posse de um apartamento, afastando a tese
defensivadademandadaemexceçãodeusucapiãoespecialurbana.Nocaso,o
princípio da função social da propriedade não é compreendido na sua
dimensão social,mas,muitopelo contrário,numaperspectivaprivatista. Isto
é,aoinvésdesertomadocomoumprincípiodelimitaçãododireitoindividual
34RIOGRANDEDOSUL. Tribunal de JustiçadoRioGrandedo Sul. 20ªCâmaraCível.ApelaçãoCível70062599519.Relator:CarlosCiniMarchionatti.Julgadoem17dez.2014;RIOGRANDEDOSUL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. 18ª Câmara Cível. Apelação Cível70043395045.Relator:Nelson José Gonzaga. Julgado em 22ago. 2013;RIO GRANDE DO SUL.Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. 18ª Câmara Cível. Apelação Cível70043903145.Relator:NelsonJoséGonzaga.Julgadoem15set.2011.35RIOGRANDEDOSUL. Tribunal de JustiçadoRioGrandedo Sul. 17ªCâmaraCível.ApelaçãoCível70043753961.Relatora:LiegePuricelliPires.Julgadoem12abril.2012.
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àpropriedade,emfavordointeressepúblicoquantoaomododeusodebens
imóveis, o princípio é visto como exemplo de garantia do cidadão contra o
Estado. Em resposta ao tópico da demandada em que o pedido de
manutençãonapossedo imóvelera justificadopelo fatodeosdemandantes
nãoteremcumpridoafunçãosocial,orelatorreferiu:
Emquepeseosargumentosdosapelantes,dequeapropriedadeurbanadeve serprotegidapeloEstado,atendendoa sua funçãosocial,oreferidoprincípionãopermiteasupressãodainstituiçãodapropriedadeprivada.A função social da propriedade constitui, pois, uma garantia àpessoa, que não pode ser privada do seu patrimônio de formaarbitrária. Porém, tratando-se de bem particular, com posseprecária por parte dos requeridos, nos termos dessafundamentação,afastoapretensão36.
Em síntese, é possível perceber a reticência do TJRS em utilizar o
EstatutodaCidadecomofundamentolegalemdiscussõesqueversemsobrea
modalidadedausucapiãoespecialurbana.Nessesentido,importareferirqueé
significativa a interpretação dada pelo tribunal no tocante ao tamanho dos
imóveis aos quais se aplica a usucapião especial urbana e a dificuldade no
manejodeconceitoselementaresdanovaordemjurídico-urbanística,talqual
oprincípiodafunçãosocialdapropriedade.
9.Pesquisacompalavra-chave“direitoàmoradia”
Odireitoàmoradiaadequadafoiconsagradopelacomunidade internacional,
especialmente pelo Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e
Culturais (PIDESC), adotado pela Organização das Nações Unidas em 196637.
Como objetivo de conceituar o direito àmoradia adequada previsto no art.
11.1doPIDESC,oComitêdeDireitosEconômicos,SociaiseCulturaislançouo
ComentárioGeralnº4,demonstrandoqueestedireitodeveser interpretado
deformaampla,nosentidodegarantirquetodasaspessoastenhamacessoa
36RIOGRANDEDOSUL. Tribunal de JustiçadoRioGrandedo Sul. 19ªCâmaraCível.ApelaçãoCível70054589924.Relator:EduardoJoãoLimaCosta.Julgadoem18jun.2013.37 Ver o Decreto que internalizou o PIDESC. BRASIL. Pacto Internacional sobre DireitosEconômicos,SociaiseCulturais.Decretonº.591,de06dejulhode1992.
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um lar e a uma comunidade seguros para viver em paz, com dignidade e
saúde.Ainda,oComitêexplicitouseteelementosquedevemser respeitados
para que a moradia seja qualificada como adequada: a) segurança legal da
posse;b)disponibilidadedeserviços,materiais,facilidadeseinfraestrutura;c)
custoacessível;d)habitabilidade;e)localização;ef)adequaçãocultural38.
Alémdisso,posteriormente,oComitêeditouoComentárioGeralnº7,
assegurandoatodasaspessoas,seassimoptarem,odireitodepermanecerno
local onde fixaram habitação, ainda que irregularmente. Nos casos
excepcionais de remoção, que se justificam apenas em razão de relevante
interesse coletivo, os Estados têm o dever de tomar certas precauções e
providências,demodoaobservarosdireitosfundamentais,garantiracessoa
remédios legais contra o despejo ou deslocamento forçado e indenizar
eventuais danos que os atingidos venhama sofrer39.Oportuno ressaltar que
este Comentário “incumbiu os governos de garantir alternativa de moradia
àqueles que sofreram despejo, sejam legais ou ilegais”40, de forma que,
concomitantemente ao processo de remoção, elabore-se um plano de
reassentamento.Alémdeprover o auxílio necessário àmudança, os Estados
restam obrigados a assegurar uma nova moradia aos atingidos antes da
execuçãodaremoção.
Neste contexto, o direito à moradia integra o rol de direitos sociais
fundamentaisestabelecidosnaConstituiçãoFederal, incumbindoaoEstadoa
sua promoção, viabilização e proteção. 41 Já no tocante à normativa
infraconstitucional, foi o Estatuto da Cidade que integrou expressamente o
direito à moradia ao direito à cidade sustentável, prevendo diversos
instrumentosurbanísticosa seremutilizadospeloPoderPúblicocomvistasà
sua concretização evidenciando que não há como falar em ordenação das
cidades, função social da propriedade, e, em última análise, em direito à
cidade,semfalaremmoradiaadequada.
38ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais.ComentárioGeraln.4,de13dedezembrode1991.39ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais.ComentárioGeraln.7,de20demaiode1997.40CARMONA,PauloAfonso.Cursodedireitourbanístico.SãoPaulo:Juspodivm,2015.P.281.41AindaqueaConstituiçãoFederalde1988contemple implicitamenteodireitoàmoradiaemdiversos dispositivos, a moradia passou a integrar o rol do art. 6º por força da EmendaConstitucionaln.26/2000.
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Em relação aos resultados da pesquisa jurisprudencial, inicialmente,
buscou-se apenas o termo “direito à moradia”, o que resultou em2.430
acórdãos,sendopouquíssimosrelacionadosàaplicaçãoounãodoEstatutoda
Cidade. A maior parte versava sobre a impenhorabilidade de imóveis
residenciais, considerados bens de família. Em face disso, pesquisou-se o
termocombinadocom“planodiretor”,encontrando-seseteacórdãos.
Para uma análise mais detalhada, selecionou-se a Apelação Cível
70041790338, interposta contra sentença que julgou procedente ação
demolitóriaajuizadapeloMunicípiodeTrêsCoroas,condenandoademandada
ao cumprimento de obrigação de fazer, consistente na demolição de sua
edificação,onderesidiacomsuafilhaeseusnetos.Novoto,orelatormantém
adecisãodeprimeirograu,sustentandoqueoimóvelestálocalizadoemÁrea
de Preservação Permanente (APP), não tendo respeitado o estabelecido no
Plano Diretor e no Código de Obras Municipal, assim como as Leis de
ParcelamentodoSoloeoCódigoFlorestal.Alega,ainda,queaedificaçãoestá
situada em área de risco, não podendo prevalecer, nesse caso, o direito à
moradia 42 . Note-se, primeiramente, que a referida decisão ignora a
possibilidadede regularizaçãodemoradia localizadaemáreadepreservação
permanenteprevistanoart.54daLeidoProgramaMinhaCasa,MinhaVida.43
Ademais, ignora o direito à moradia adequada, uma vez que, ao impor à
família da apelante a demolição damoradia, deixa de obrigar oMunicípio a
garantir os direitos fundamentais das pessoas atingidas pela remoção,
inclusiveodeproporcionarmoradiadignaemoutrolocal.
Também foi selecionada uma decisão mais recente, o Agravo de
Instrumento70065581704,interpostonobojodeumaaçãodemolitória.Salta
aos olhos o desconhecimento do tribunal quanto à possibilidade de
regularização de habitações precárias construídas em APPs. Entenderam os
magistrados pela impossibilidade de regularização das construções
clandestinas, impondo a sua demolição. Restou expresso na decisão que o
42RIOGRANDEDOSUL. Tribunal de JustiçadoRioGrandedo Sul. 21ªCâmaraCível.ApelaçãoCível70041790338.Relator:FranciscoJoséMoesch.Julgadoem17ago.2011.43Emtese,nasAPPsnãopoderiahaverocupaçãohumana.Cf.BRASIL.LeidasÁreasdeProteçãoPermanente.LeiFederalnº.12.651,de25demaiode2012.Noentanto,passou-seaadmitir,por interesse social,queosmunicípiospromovama regularização fundiáriadeassentamentoshumanosconsolidadosdebaixarendaemAPPs.Cf.BRASIL.LeidoProgramaMinhaCasa,MinhaVida.Leinº.11.977,de07dejulhode2009.
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direitoàmoradianãoéabsoluto,masantessesubordinaàsregraspostasnas
leisdeproteçãoambientalenasposturasmunicipais,que,nocaso,nãoforam
atendidas.44
Daanálisedasdecisões,percebeu-sequeoTJRSignoraapossibilidade
deregularizaçãofundiáriaemAPPseque,mesmocomopassardosanos,não
houveaatualizaçãodajurisprudência.Naprática,talentendimentoacabapor
violarodireitohumanoàmoradiaadequada.
Consideraçõesfinais
Apesquisajurisprudencialconduzàconclusãodeque,aindaqueoEstatutoda
Cidade tenha sido promulgado há 15 anos, a regulação da política urbana
brasileira atravessa uma fase que pode ser caracterizada como de transição
paradigmática. As trincheiras do Poder Judiciário são um campo privilegiado
paraaavaliaçãodoestágioemqueseencontrataldisputaparadigmática.
Daanáliserealizadanapresenteinvestigaçãoconclui-seaindaque:
a) A recepção da nova ordem jurídico-urbanística pelo
TJRS,emboraexista,étímidaetranspareceumaclarahegemoniado
“modelo proprietário”, que pode ser percebida por opções feitas
pelosmagistradosao julgaroscasosconcretosemqueassituações
objetodeanálisesãoreguladasaomesmotempopeloCódigoCivile
pelo Estatuto da Cidade. A tendência, na maior parte dos casos
analisados, é a de citar os dispositivos do Código Civil ou da
Constituição Federal, desprezando a regulação do Estatuto da
Cidade.Taltendênciaficaclara,porexemplo,nasdiscussõessobreo
atendimento da função social da propriedade em conflitos
envolvendoposseenamaiorpartedasaçõesdeusucapiãoespecial
urbana;
b) A“fuga”doEstatutodaCidadenafundamentaçãodos
acórdãos implica em uma invisibilização da nova ordem jurídico
44RIOGRANDEDOSUL. Tribunalde JustiçadoRioGrandedoSul. 3ªCâmaraCível. Agravo deInstrumento70065581704,Relator:NelsonAntônioMonteiroPacheco.Julgadoem13jul.2015.
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urbanística,noquepoderia ser caracterizadocomoumaespéciede
“ativismo judicial às avessas”, jáque,majoritariamente, asdecisões
negamdensidadejurídicaaoEstatutodaCidade,legislaçãovigentee,
na maior parte das vezes, de evidente aplicabilidade aos casos
analisados;
c) Essa peculiar forma de ativismo judicial revela uma
“naturalização”do“modeloproprietário”,seguidapela ideiadeque
a concretização de direitos sociais deve se dar exclusivamente por
meiodaatuaçãodoPoderExecutivo.Exemplificativamente,constata-
sequeareceptividadedoEstatutodaCidadeémaiorquandonopolo
passivoencontra-seoPoderPúblico, como fica clarodaanálisedos
casosemqueplanosdiretoresforamaprovadossemarealizaçãode
audiências públicas, Nestes casos em que o resultado da prestação
jurisdicional constitui obrigações endereçadas ao Poder Público,a
posturatípicadoTJRSédeacataranovaordemjurídico-urbanísticae
condenarosmunicípios.Note-se, noentanto, que, nesta situação,o
“modeloproprietário”nãoestásendopropriamentequestionado;
d) A ausência de acórdãos referindo categorias como
“direitoàcidade”éaltamentereveladoradodesconhecimentodesse
direito coletivo dos habitantes das cidades não só pelos
desembargadores do TJRS, mas também dos operadores jurídicos
quepromovemadefesadecomunidadesdebaixarendaemconflitos
territoriais ou emoutras demandas envolvendoos direitos urbanos
abarcados pelo direito à cidade. Se não há decisões envolvendo
“direitoàcidade”,pode-seinferirquehápoucaspetiçõesreferindoo
tema e que, portanto, a Defensoria Pública e o Ministério Público
tambémseomitemnapromoçãodanovaordemjurídico-urbanística;
e) A escassez de debates envolvendo o Direito
Urbanístico também é, possivelmente, fruto da escassa oferta de
conteúdosdeDireitoUrbanísticonasdisciplinasdoscursos jurídicos
nopaís.Semformaçãonaárea,osmagistradosquechegamaoTJRS
aplicama legislação civil que conhecem.O currículo das faculdades
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de Direito tem, certamente em boamedida, responsabilidade pela
hegemoniado“modeloproprietário”noâmbitodoPoderJudiciário;
f) Umreflexoda lentidãocomqueoparadigmadanova
ordem jurídico-urbanística difunde-se no seio do Poder Judiciário
podeseridentificadonacatalogaçãodoscasosenvolvendoquestões
urbanísticaspeloDepartamentodeBibliotecaedeJurisprudênciado
TJRS. Para fins de classificação dos acórdãos envolvendo Direito
Urbanístico, as decisões são catalogadas como “Direito Público não
especificado”ou, emalguns casos, como “DireitoAdministrativo”.O
expediente revela uma marginalização e invisibilização do Direito
Urbanístico na jurisprudência do TJRS, distorcendo resultados e
dificultandoarealizaçãodeinvestigaçõescientíficas.
Finalmente,conclui-sequeanovaordemjurídico-urbanísticabrasileira
aindatemumlargocaminhoapercorreratéviraserreconhecida,judicializada
e efetivamente aplicada nas trincheiras do Poder Judiciário. Essa conclusão
derivada constataçãodequeas transiçõesparadigmáticasprofundasnão se
dão com a mera aprovação de uma lei, mas que dependem,
fundamentalmente, de mudanças em uma cultura jurídica ainda bastante
influenciadapelo“modeloproprietário”.A transiçãodeummodelocentrado
no direito de propriedade para um modelo centrado na função social da
propriedadepromoveumarupturajurídica,social,econômicaeculturalmuito
profunda,limitandoospoderesdosproprietárioseaumentandoospoderesdo
PoderPúbliconaconduçãodeumapolíticaurbanavoltadaparaagarantiade
umacidadeparatodosetodas.
Uma triste comparação histórica pode ilustrar as resistências
encontradaspelanovaordem jurídico-urbanísticaparasuaplenaefetividade.
Como se sabe, a aboliçãodaescravaturanoBrasil foi levadaa cabopela Lei
Áurea em 1888, mas não faltaram proprietários de escravos a reclamar a
violaçãodeseus“direitosadquiridos”e,aindahoje,maisdecemanosdepois,
osfiscaisdoMinistériodoTrabalholocalizamtrabalhoescravoemfazendasdo
interiordoBrasil. Talveza rupturaparadigmáticaqueanovaordem jurídico-
urbanística promove em relação ao “modelo proprietário” seja de idêntica
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envergadura, o que explicaria a resistência enfrentada pela nova ordem nas
instâncias judiciais. Esta é uma importante agenda de pesquisa no Brasil,
inclusiveparaqueseefetiveatuteladodireitoàcidade,centrodanovaordem
jurídico-urbanística.
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RIOGRANDEDO SUL. Tribunal de Justiça do RioGrande do Sul. 17ª Câmara
Cível.ApelaçãoCível70043753961.Relatora: LiegePuricelliPires. Julgadoem
12abril.2012.
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RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.18ª Câmara
Cível.AgravoInternoemAgravodeInstrumento70047281241.Relator:Nelson
JoséGonzaga.Julgadoem29mar.2012.
RIOGRANDEDO SUL. Tribunal de Justiça do RioGrande do Sul. 18ª Câmara
Cível.ApelaçãoCível70043395045.Relator:NelsonJoséGonzaga.Julgadoem
22ago.2013;
RIOGRANDEDO SUL. Tribunal de Justiça do RioGrande do Sul. 18ª Câmara
Cível.ApelaçãoCível70043903145.Relator:NelsonJoséGonzaga.Julgadoem
15set.2011.
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em18jun.2013.
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Cível.ApelaçãoCível 70062599519.Relator: CarlosCiniMarchionatti. Julgado
em17dez.2014
RIOGRANDEDO SUL. Tribunal de Justiça do RioGrande do Sul. 21ª Câmara
Cível.ApelaçãoCível70041790338.Relator:FranciscoJoséMoesch.Julgadoem
17ago.2011.
RIOGRANDEDOSUL.TribunaldeJustiçadoRioGrandedoSul.2ªCâmaraCível.
ApelaçãoCível70057716334.Relator: JoãoBarcelosdeSouza Júnior. Julgado
em16deabril2014.
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. 3ª Câmara
Cível.AgravodeInstrumento70065581704,Relator:NelsonAntônioMonteiro
Pacheco.Julgadoem13jul.2015.
RIOGRANDEDOSUL.TribunaldeJustiçadoRioGrandedoSul.ÓrgãoEspecial.
AçãoDiretade Inconstitucionalidade70053930061.Relator: JoãoBarcelosde
SouzaJunior.Julgadoem18demaio2015.
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