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Direito Civil
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REGISTRO CIVIL DAS PESSOAS NATURAIS Este material foi construído com base nas obras / aulas dos seguintes autores: EBS, MARTHA El. Legislação Notarial e de Registros Públicos comentadas. Salvador: Jus Podivm, 2018; LOUREIRO, Luiz Guilherme. Registros Públicos: Teoria e Prática. Jus Podivm, 2018. NETO, Mario de Carvalho Camargo; OLIVEIRA, Marcelo Salaroli de. Registro Civil das Pessoas Naturais: parte geral e registro de nascimento. São Paulo: Saraiva. CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Informativos Esquematizados (https://www.dizerodireito.com.br). TARTUCE, Flavio. Manuael de Direito Civil. CASSETARI, Christiano. Multiparentalidade e Parentalidade Socioafetiva: Efeitos Jurídicos. São Paulo: Atlas, 2017. PEREIRA, Caio Mario da Silva. Instituições de Direito Civil: Direito de Família. Rio de Janeiro: Forense, 2017.
Adoc ̧ão. Investigação de paternidade. Negatória de paternidade.
Reconhecimento de filhos. Substituição e destituição do poder familiar.
Guarda. Curatela. Tutela. Lei Federal no 8.069/90 - Dispõe sobre o Estatuto da
Criança e do Adolescente e dá outras providências; Lei Federal no 8.560/92 -
Regula a investigação de paternidade dos filhos havidos fora do casamento e
dá outras providências.
ADOÇÃO
1. Em que consiste a adoção e quais atos geram no Registro Civil das Pessoas Naturais?
Adoção é um ato jurídico em sentido estrito, que depende sempre de uma
decisão judicial constitutiva, por meio do qual se cria um vínculo jurídico
irrevogável de pai e filho(a) ou de mãe e filho(a), cujos efeitos são exatamente
os mesmos decorrentes de uma filiação biológica. Uma vez concedida a
adoção por sentença, há reflexos diretos no RCPN, pois tal fato dará origem a
um novo registro de nascimento, cancelando-se o anterior, no caso de criança
ou adolescente; ou, ainda, ser averbado no registro de nascimento, no caso de
adotando maior de idade.
A adoção do maior se dá por averbação no assento original, sem que haja o
cancelamento deste nem a lavratura de um novo assento. Essa regra era
contemplada no art. 10, III do Código Civil de 2002, que embora tenha sido
revogado, continua a ser aplicado pela doutrina e jurisprudência, eis que esse
ato não tem caráter assistencial e depende da concordância do adotado.
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Ademais, sendo a adotando maior de idade, a manutenção do seu registro
original garante maior segurança jurídica. Assim, sendo o rol das averbações
meramente exemplificativo, a revogação do inciso em questão não impede a
manutenção do procedimento antigo, que é o mais condizente com a disciplina
que envolve a matéria.
2. A adoção é um negócio jurídico ou um ato jurídico stricto sensu?
Prevalece o entendimento de que a adoção é um ato jurídico stricto sensu
(art. 185 do CC/2002), pois os seus efeitos são apenas fixados em lei, tese que
deve ser tida como majoritária. Em reforço, valem as palavras de Paulo Lôbo,
para quem “a adoção é ato jurídico em sentido estrito, de natureza complexa,
pois depende de decisão judicial para produzir seus efeitos. Não é negócio
jurídico unilateral.
Entretanto, há quem suscite a tese de tratar-se de um negócio jurídico
(Tartuce), eis que a adoção depende de iniciativa da parte, do exercício da
autonomia privada pelo adotante. Para reforçar, lembre-se que a adoção não
pode ser imposta, como ocorre com o reconhecimento de filho. Sem falar que,
na adoção de pessoa com idade superior a 12 anos, há a necessidade de se
ouvir o adotado. A questão, em suma, é controversa.
3. É possível que os avós de uma criança a adotem?
Em regra, não é possível a adoção de netos por seus avós, por vedação
expressa no ECA (Art. 42). Porém, o STJ possui precedente admitindo essa
adoção em caráter excepcional.
Admitiu-se, excepcionalmente, a adoção de neto por avós, tendo em vista
as seguintes particularidades do caso analisado: os avós haviam adotado a
mãe biológica de seu neto aos oito anos de idade, a qual já estava grávida do
adotado em razão de
abuso sexual; os avós já exerciam, com exclusividade, as funções de pai e
mãe do neto desde o seu nascimento; havia filiação socioafetiva entre neto e
avós; o adotado, mesmo sabendo de sua origem biológica, reconhece os
adotantes como pais e trata a sua mãe biológica como irmã mais velha; tanto
adotado quanto sua mãe biológica concordaram expressamente com a adoção;
não há perigo de confusão mental e emocional a ser gerada no adotando; e
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não havia predominância de interesse econômico na pretensão de adoção.
STJ. 3ª Turma. REsp 1448969-SC, Rel. Min. Moura
Ribeiro, julgado em 21/10/2014 (Info 551).
4. Imagine que dois irmãos cuidem, conjuntamente, de uma criança desde o seu nascimento, até que decidem requerer a adoção dessa criança. É possível que irmãos adotem conjuntamente uma criança?
Em regra, não é possível a adoção por irmãos.
Pelo texto do ECA, a adoção conjunta somente pode ocorrer caso os
adotantes sejam casados ou vivam em união estável. No entanto, a 3ª Turma
do STJ relativizou essa regra do ECA e permitiu a adoção por parte de duas
pessoas que não eram casadas nem viviam em união estável. Na verdade,
eram dois irmãos (um homem e uma mulher) que criavam um menor há alguns
anos e, com ele, desenvolveram relações de afeto. STJ. 3ª Turma. REsp
1217415-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado
em 19/6/2012.
5. É possível adoção póstuma?
SIM. Desde que o procedimento de adoção tenha sido iniciado em vida e
que o adotante tenha manifestado de modo inequívoco a sua vontade de
adotar.
ECA, Art. 42. § 6o A adoção poderá ser deferida ao adotante que, após
inequívoca
manifestação de vontade, vier a falecer no curso do procedimento, antes de
prolatada
a sentença.
Há um precedente no STJ no sentido de que é possível a adoção póstuma
ainda que não iniciado o processo, desde que o adotante, ainda em vida,
tivesse manifestado inequivocamente a vontade de adotar o menor (STJ. 3"
Turma. REsp 1.217.415-RS, Rei. Min. Nancy Andrighi, julgado em 19/6/2012).
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6. Um adolescente teve o seu registro de nascimento feito no Cartório de registro civil de Curitiba/PR. Todavia, esse menor foi adotado e os adotantes residem em Londrina/PR. O mandado judicial foi encaminhado para o Cartório de Curitiba/PR. Neste caso, o novo registro de nascimento poderá ser feito em Londrina/PR?
SIM. Em Curitiba será feita a averbação do cancelamento do registro de
nascimento original do adotado. Sendo que, a requerimento dos adotantes, o
novo registro poderá ser feito no cartório da comarca de residência, mediante
outro mandado judicial direcionado ao registrador de Londrina.
Art. 47, § 3, ECA. A pedido do adotante, o novo registro poderá ser lavrado
no Cartório do Registro Civil do Município de sua residência.
7. O que é a chamada “adoção à brasileira”? É permitida no ordenamento jurídico brasileiro?
“Adoção à brasileira” ou “adoção à moda brasileira” ocorre quando o homem
ou a mulher declara, para fins de registro civil, um menor como sendo seu filho
biológico, sem que isso seja verdade. Formalmente, esta conduta não é
permitida no Brasil, além de ser crime dar parto alheio como próprio (Art. 242,
CP).
8. Caso o pai registral se arrependa da “adoção à brasileira” realizada, ele poderá pleitear a sua anulação?
NÃO. O pai que questiona a paternidade de seu filho registral (não
biológico), que ele próprio registrou conscientemente, está violando a boa-fé́
objetiva, mais especificamente a regra da venire contra factum proprium
(proibição de comportamento contraditório). Para que seja possível a anulação
do registro, é indispensável que fique provado que o pai registrou o filho
enganado (induzido em erro), ou seja, é imprescindível que tenha havido vício
de consentimento.
(...) O reconhecimento espontâneo da paternidade somente pode ser
desfeito quando demonstrado vício de consentimento; não há como desfazer
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um ato levado a efeito com perfeita demonstração da vontade, em que o
próprio pai manifestou que sabia perfeitamente não haver vínculo biológico
entre ele e o menor e, mesmo assim, reconheceu-o como seu filho. (...) (STJ.
3a Turma. REsp 1229044/SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em
04/06/2013).
9. André foi adotado à brasileira por João. Após sua maioridade, conhece seu pai biológico Pedro e deseja que seu registro de nascimento seja alterado, para que se retire André como pai e passe a constar apenas Pedro. É possível?
SIM. É possível o reconhecimento da paternidade biológica e a anulação do
registro de nascimento na hipótese em que pleiteados pelo filho adotado
conforme prática conhecida como “adoção à brasileira. O direito da pessoa ao
reconhecimento de sua ancestralidade e origem genética insere-se nos
atributos da própria personalidade. O direito do filho de buscar o
reconhecimento do estado biológico de filiação constitui direito personalíssimo,
indisponível e imprescritível, consubstanciado no princípio constitucional da
dignidade da pessoa humana (STJ. REsp 833.712/RS). A prática conhecida
como “adoção à brasileira”, ao contrario da adoção legal, não tem a aptidão de
romper os vínculos civis entre o filho e os pais biológicos, que devem ser
restabelecidos sempre que o filho manifestar o seu desejo de desfazer o liame
jurídico advindo do registro ilegalmente levado a efeito, restaurando-se, por
conseguinte, todos os consectários legais da paternidade biológica, como os
registrais, os patrimoniais e os hereditários.
O filho tem direito de desconstituir a denominada "adoção à brasileira" para
fazer constar o nome de seu pai biológico em seu registro de nascimento,
ainda que preexista vínculo socioafetiva de filiação com o pai registral.
STJ. 3a Turma. REsp 1.417.598-CE, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino,
julgado em 17/12/2015 (Info 577).
10. Um dos princípios aplicáveis à adoção é o do rompimento do vínculo com a família de origem. O(a) doutor(a) se recorda de alguma exceção a esse princípio?
Em regra, com a adoção há o rompimento do vínculo com os pais e os
parentes consanguíneos de origem. Todavia, o parágrafo 1 do artigo 41 do
Estatuto da Criança e do Adolescente excepciona esse princípio ao estabelecer
que, se um dos cônjuges ou concubino adota o filho do outro, mantém-se os
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vínculos de filiação com a família do pai ou da mãe consanguíneos e demais
parentes de origem.
11. O que é adoção unilateral?
A adoção unilateral ocorre quando o pai ou a mãe do menor morre, é
destituído do poder familiar ou, então, quando não há pai registral. Tal adoção
irá substituir, para todos os efeitos, a linha biológica originária do adotado e
ocorre independentemente de consulta ao grupo familiar estendido, cabendo
tão-só́ ao cônjuge supérstite decidir sobre a conveniência, ou não, da adoção
do filho pelo seu novo cônjuge/companheiro.
12. É possível a revogação da adoção unilateral?
Em regra, a adoção é irrevogável. Todavia, há precedente do STJ no sentido da flexibilização da irrevogabilidade da adoção unilateral no melhor interesse do adotando, desde que haja uma análise individualizada por parte do Poder Judiciário e os motivos alegados sejam justificáveis. A razão de ser da proibição da revogação da adoção existe para proteger o menor adotado, buscando colocá-ló a salvo de possíveis alternâncias comportamentais de seus adotantes, rupturas conjugais ou outras atitudes que recoloquem o menor adotado novamente no limbo sócio emocional que vivia antes da adoção. Por outro lado, se a revogação tem por objetivo proteger os interesses do adotado, então, nesta hipótese, poderia ser flexibilizada a restritiva regra fixada no art. 39 § 1o, do ECA.
No caso de adoção unilateral, a irrevogabilidade prevista no art. 39, § 1o do
Estatuto da Criança e do Adolescente pode ser flexibilizada no melhor
interesse do adotando. STJ. 3a Turma. REsp 1.545.959-SC, Rel. Min. Ricardo
Villas Boas Cueva, Rel. para acórdão Min. Nancy Andrighi, julgado em
6/6/2017 (Info 608).
13. É possível a adoção unilateral do filho biológico da companheira homoafetiva?
SIM, considerando que, se esta possibilidade é prevista para os casais
heteroafetivos, também deve ser estendida aos homoafetivos. A Min. Nancy
Andrighi afirma que, se determinada situação é possível à faixa heterossexual
da população brasileira, também o é à fração homossexual, assexual ou
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transexual. STJ. 3a Turma. REsp 1.281.093-SP, Rel. Min. Nancy Andrei,
julgado em 18/12/2012.
14. Se no curso de uma ação de adoção conjunta, um dos cônjuges desistir do pedido e o outro falecer sem ter manifestado expressamente sua vontade em adotar unilateralmente, pode o juiz na sentença conceder a adoção póstuma unilateral?
NÃO. O § 5o do art. 42 do ECA prevê ̂ a chamada adoção póstuma, que ocorre quando o pretenso adotante morre no curso do processo, antes de proferida a sentença, sendo permitida a finalização do processo. Para isso, no entanto, é indispensável que o de cujus tenha manifestado inequivocamente sua de vontade de adotar. Além disso, o pedido inicial foi de adoção conjunta e um dos requisitos exigidos para este tipo de adoção é a necessidade de concordância do casal para adotar. Tratando-se de adoção em conjunto, um cônjuge não pode adotar sem o consentimento do outro. O consentimento deve ser mútuo. Portanto, o juiz não pode conceder a adoção póstuma unilateral neste caso.
Se, no curso da ação de adoção conjunta, um dos cônjuges desistir do pedido e outro vier a falecer sem ter manifestado inequívoca intenção de adotar unilateralmente, não poderá́ ser deferido ao interessado falecido o pedido de adoção unilateral post mortem. STJ. 3a Turma. REsp 1.421.409-DF, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 18/8/2016 (Info 588).
15. Que ato deve ser praticado no registro civil no caso de sentença de concessão de adoção unilateral?
No caso de adoção unilateral, não será feito um novo registro, mas tão somente a averbação do novo genitor no registro existente.
IV Jornada de Direito Civil - Enunciado 273. Tanto na adoção bilateral quanto na unilateral, quando não se preserva o vínculo com qualquer dos genitores originários, deverá ser averbado o cancelamento do registro originário de nascimento do adotado, lavrando-se novo registro. Sendo unilateral a adoção, e sempre que se preserve o vínculo originário com um dos genitores, deverá ser averbada a substituição do nome do pai ou mãe naturais pelo nome do pai ou mãe adotivos.
16. A adoção de pessoa maior de 18 anos é regida pelo ECA?
SIM. A adoção de pessoas maiores de 18 anos é regida pelo ECA, no que couber, já que o Código Civil trata do tema em apenas um único dispositivo (art. 1.619 do CC).
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17. O fato de o pai biológico não concordar com a adoção de seu filho maior de 18 anos é motivo suficiente para que ela não aconteça?
NÃO. A adoção de pessoa maior de idade não depende do consentimento de seus pais, eis que ela já detém capacidade plena para o exercício da autonomia da vontade, não sendo aplicado o art. 45 do ECA.
A adoção de pessoas maiores de 18 anos é regida pelo ECA. No entanto, no caso, não se aplica a exigência do caput do art. 45 do ECA porque o § 1o do mesmo artigo afirma que esse consentimento do pai é dispensado caso ele tenha sido destituído do poder familiar. O poder familiar termina quando o filho atinge a maioridade STJ. 3a Turma. REsp 1.444.747-DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 17/3/2015 (Info 558).
18. É possível a adoção por escritura pública para os maiores de 18 anos?
Não. Hoje, todas as adoções se processam na forma do ECA e devem
decorrer de procedimentos judiciais.
IV Jornada de Direito Civil - Enunciado 272. Não é admitida em nosso
ordenamento
jurídico a adoção por ato extrajudicial, sendo indispensável a atuação
jurisdicional, inclusive para a adoção de maiores de dezoito anos.
19. Imagine que em seu registro civil de pessoas naturais comparece uma pessoa e lhe apresenta uma escritura pública de adoção lavrada em 1999, quando o adotado tinha 19 anos, e que, por desleixo próprio, não tinha sido ainda levada para o cartório. O(A) Doutor(a) pode aceitar essa escritura pública para a prática de algum ato nesta data?
SIM. Em que pese não ser mais possível a lavratura de escritura pública de
adoção, deve-se atentar para o princípio do tempus regit actum, que assegura
a validade dos deste ato notarial lavrado à época em que era permitido por lei.
Assim, é possível que essa adoção por escritura pública seja averbada no
registro de nascimento (Art. 102, 3° da Lei n° 6.015/73).
20. Recentemente, o CNJ publicou o Provimento 63, que, dentre outros assuntos, trata sobre a certidão de nascimento no caso de pessoa adotada. O(A) Doutor(a) se recorda de alguma peculiaridade trazida por este provimento?
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O provimento estabelece que a certidão de inteiro teor, ainda que requerida
pelo próprio interessado, deve dispor sobre todo o conteúdo registral, mas dela
não deverá constar a origem biológica, salvo por determinação judicial (Art. 2º,
§ 1º).
21. No que consiste a adoção simples? Explique.
Adoção simples é aquela feita por por escritura pública, sob a égide do
CC/1916, que era possível para os maiores de idade (Lei 6697/79). Após
entrada em vigor do CC/02, todavia, não mais se admite adoção simples.
22. Doutor(a), em que consiste a adoção “intuitu personae”? Tem previsão em nosso ordenamento?
A adoção intuitu personae ocorre quando os próprios pais biológicos
escolhem, durante a gravidez ou depois do parto, a pessoa que irá adotar
seu filho, bem como, para criança maior de dois anos, em que haja
vínculo afetivo entre adotantes e adotando. Há um projeto de Lei do Senado
Federal n. 369/2016, que visa alterar o Estatuto da Criança e do Adolescente
para dispor sobre adoção na modalidade intuitu personae. Recentemente, em
30/03/2020, o CNJ emitiu uma Nota Técnica nos autos 0008369-
46.2019.2.00.0000, no sentido de que este PL agride o princípio do superior
interesse da criança e do adolescente, além de subverter o Sistema Nacional
de Adoção e Acolhimento, o respeito à ordem de habilitação e a lógica do
serviço de acolhimento familiar. Segundo o CNJ, o destacado Projeto de Lei
acaba por estimular o desrespeito ao CNA. Em que pese o regramento legal
vigente, casos há em que as pessoas têm acesso direto à criança, sem
interferência do Poder Judiciário, deixando para trás todos os habilitados à
adoção que aguardam na fila do SNA. O SNA se configura como proteção não
só para as crianças e adolescentes, mas também para toda a sociedade,
exigindo-se prévia habilitação para adoção, com respeito à ordem cronológica
do ingresso no sistema. No entanto e, infelizmente, não são raros os casos de
tentativa de venda de bebês disfarçadas de adoção. Existe o grande risco de
legitimar judicialmente o acesso irregular a crianças por parte de pessoas que
deliberadamente irão burlar o SNA, com o objetivo de reduzir o prazo de
espera (em regra longo) para o regular acesso à criança. Notórios são os
casos noticiados de venda de crianças, situação que poderá ser “regularizada”
com a presença de genitores e adotantes em Juízo, para comprovação de
amizade e convívio. A alteração legislativa proposta em nada auxiliará o grupo
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das adoções necessárias e, além disso, colocará em risco o SNA, na medida
em que poderá criar verdadeira corrida à obtenção direta de crianças para fins
de adoção intuito personae
(https://www.cnj.jus.br/pjecnj/ConsultaPublica/DetalheProcessoConsultaPublica
/documentoSemLoginHTML.seam?ca=8829a4139775d855f83c63e3a2521ee32
51334e534b914060271bb04a4ee1c52a9974f9960d2cc16d49bbaafdbca96bd39
b484d172d84d8e&idProcessoDoc=3922315).
23. Doutor(a), na adoção de criança cuja genitora detém o poder familiar e é absolutamente incapaz, com apenas 15 anos de idade. Seria possível a adoção?
O art. 45 e §§ do ECA exige o consentimento dos pais ou representante
legal do adotando, menor de 18 anos, salvo se forem os pais desconhecidos ou
tenham sido destituídos do poder familiar através de procedimento próprio
previsto nos arts. 155 a 163 do ECA. Heloisa Helena Barboza questiona este
consentimento por genitores incapazes, por tratar-se de pessoas que ainda não
têm aptidão de fato para reger sua própria pessoa e bens. Para ela, não se
deve admitir a adoção de criança ou adolescente, filho de pessoa que não
tenha atingido a maioridade civil. Sugere, nesta hipótese, a suspensão ou
perda do poder familiar, uma vez verificados os seus pressupostos.
A jurisprudência tem entendido que a existência de vício no consentimento
dos pais, por si só, não nulifica a adoção já realizada, sendo constatada a boa-
fé dos adotantes (REsp 1.199.465/DF). Destaca-se também o Enunciado 259
da III Jornada de Direito Civil do STJ, que determina que “a revogação do
consentimento não impede, por si só, a adoção, observado o melhor interesse
do adotando”.
24. A Lei 12.010/2009 tornou obrigatório o procedimento de “Habilitação para a Adoção” e determinou a criação e implementação dos cadastros estaduais e nacional de crianças e adolescentes em condições de serem adotados e de pessoas habilitados à adoção. O(a) Doutor(a) se recorda de alguma exceção à inclusão do adotante neste cadastro?
O legislador de 2009 dispensou a habilitação e a inclusão do adotante no
cadastro em três hipóteses: I – se tratar de pedido de adoção unilateral; II – se
for formulada por parente com o qual a criança ou o adolescente mantenha
vínculos de afinidade e afetividade; III – quando oriundo o pedido de quem
detém a tutela ou guarda legal de criança maior de 3 (três) anos ou
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adolescente, desde que o lapso de tempo de convivência comprove a fixação
de laços de afinidade e afetividade, e não seja constatada a ocorrência de má-
fé́ ou qualquer das situações previstas nos arts. 237 ou 238 do ECA (§ 13 do
art. 50 do ECA).
25. A partir de quando a adoção produz efeitos?
➔ Em regra, a adoção produz efeitos a partir do trânsito em julgado da
sentença. Todavia, no caso de adoção cujo adotante vier a falecer no curso do
procedimento, ela retroagirá à data do óbito.
➔ ECA, Art. 47. § 7o A adoção produz seus efeitos a partir do transito em
julgado da
sentença constitutiva, exceto na hipótese prevista no § 6o do art. 42 desta Lei,
caso em que tera força retroativa a data do óbito.
➔ ECA, Art. 42. § 6o A adoção poderá ser deferida ao adotante que, após
inequívoca manifestação de vontade, vier a falecer no curso do procedimento,
antes de prolatada a sentença.
26. Candidato, fale sobre o direito à identidade genética no contexto da adoção.
Ao consagrar o princípio da dignidade da pessoa humana como um dos
fundamentos do Estado Democrático de Direito, a Constituição Federal, dentre
os direitos fundamentais, incluiu o direito à identidade genética como clausula
geral de tutela de todas as manifestações essenciais da personalidade
humana. Recentemente, a Lei n° 8.069/1990, com a nova redação introduzida
pela Lei n° 12.010/2010, incluiu o art. 48 do ECA, em que ficou autorizado ao
filho adotivo buscar a sua origem: “o adotado tem direito de conhecer sua
origem biológica, bem como de obter acesso irrestrito ao processo no qual a
medida foi aplicada e seus eventuais incidentes, após completar 18 (dezoito)
anos”. O parágrafo único do mesmo artigo 48 do ECA permitiu o acesso ao
processo ao adotado menor de 18 anos, a seu pedido, assegurada orientação
e assistência jurídica e psicológica.
27. Em que consiste a adoção consentida?
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O art. 166 do ECA, com a nova redação da Lei no 12.010/2009,
regulamentou a adoção consentida; esclarece o parágrafo 1o que, na hipótese
de concordância dos pais, esses serão ouvidos pela autoridade judiciaria e pelo
representante do Ministério Publico, tomando-se por termo as declarações”. O
legislador determinou que “o consentimento dos titulares do poder familiar será́
precedido de orientações e esclarecimentos prestados pela equipe
interprofissional da Justiça da Infância e da Juventude, em especial, no caso de
adoção, sobre a irrevogabilidade da medida” (§ 2o do art. 166 do ECA). Este
consentimento deve ser colhido pela autoridade judiciária competente em
audiência, presente o Ministério Público, garantida a livre manifestação de
vontade e esgotados os esforços para manutenção da criança ou do
adolescente na família natural ou extensa (§ 3o do art. 166 do ECA). É exigido
o consentimento prestado por escrito, que não terá́ validade se não for
ratificado na audiência (§ 4o do art. 166 do ECA). Este consentimento é
retratável até a data da audiência, bem como os pais podem exercer o direito
de arrependimento até a data da sentença de destituição do poder familiar (§ 5º
do art. 166 do ECA) e só́ terá́ valor se for dado após o nascimento da criança
(§ 6o do art. 48). Não se pode confundir as hipóteses de dispensa da
habilitação (§ 13 do art. 50 do ECA) que também envolvem a concordância dos
genitores, mas cujo fundamento é a dispensa da formalidade da prévia
habilitação. Alerte-se que a nova lei, inclusive, exige que “as gestantes ou
mães que manifestem interesse em entregar seus filhos para adoção serão
obrigatoriamente encaminhadas à Justiça da Infância e da Juventude.” A lei
não proíbe a adoção consentida; pretende que este procedimento seja
acompanhado de cuidados especiais, 166 do ECA).
INVESTIGATÓRIA DE PATERNIDADE
28. É possível o reconhecimento forçado de filho?
SIM. O reconhecimento forçado ocorre por ação judicial de investigação de
paternidade, quando o juiz declara, em sentença, a filiação, caso em que a
averbação em registro público deve se dar por mandado.
29. Sobre a ação investigatória de paternidade, qual a sua natureza jurídica e existe algum prazo legal para a propositura da ação?
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A ação investigatória tem natureza declaratória e por envolver estado de
pessoas e a dignidade humana não está sujeita a prazos decadenciais, sendo
um direito indisponível do investigante.
Art. 27, ECA. O reconhecimento do estado de filiação é direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, podendo ser exercitado contra os pais ou seus herdeiros, sem qualquer restrição, observado o segredo de Justiça.
Para as situações envolvendo maiores, igualmente, a inexistência de prazo decadencial ou prescricional para a propositura da ac ̧ão de investigação do vinculo filial é confirmada pela Súmula 149 do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual: “É imprescritível a ação de investigação de paternidade, mas não o é a da petição de herança”.
30. Em que consiste a ação avoenga?
Destacada Decisão do Superior Tribunal de Justiça reconheceu a possibilidade de os netos proporem a ação investigatória contra o avo ̂ quando já́ falecido o suposto pai. O Acórdão considera válida a pretensão dos filhos substituindo o pai, em investigar a filiação deste, junto ao avô (relação avoenga), dirigindo a lide contra os herdeiros, especialmente em face da nova Constituição.
Em outro caso, a 3a Turma do STJ decidiu que os netos não teriam legitimidade para propor ação declaratória de paternidade em nome da mãe falecida, objetivando o reconhecimento de vínculo socioafetivo entre ela e seus supostos avós, quando em vida a genitora tinha plena capacidade civil, mas não requereu o reconhecimento da filiação. O Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze observou que o caso era diferente dos precedentes da Corte, na medida em que os irmãos pediam exclusivamente o reconhecimento do vínculo socioafetivo da mãe com o casal, sem formular pretensão de igual sentido a seu favor. Dessa forma, a Turma reconheceu que os autores não teriam legitimidade processual para ingressar com a demanda, mas esclareceu que eles poderiam ingressar com outra ação, desde que em nome próprio, destacando que “o direito ao reconhecimento judicial de vínculo paternal, seja ele genético ou socioafetivo, é pessoal, podendo ser transferido entre filhos e netos apenas de forma sucessiva”.
31. Em que consiste a averiguação oficiosa de paternidade? Qual sua natureza jurídica?
Não havendo reconhecimento voluntário e não incidindo a presunção de
filho havido na constância do casamento, o registro será realizado constando
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apenas o nome da mãe, que poderá indicar quem seria o suposto pai, para que
seja averiguado oficiosamente. A averiguação oficiosa de paternidade tem
natureza jurídica de jurisdição voluntária, de modo que se o suposto pai não
concordar com a paternidade, o juiz não pode determinar compulsoriamente
que ele seja declarado como genitor da criança. Portanto, a “averiguação
oficiosa de paternidade” não se confunde com um processo judicial de
investigação de paternidade. A averiguação oficiosa, apesar de ser feita
perante um juiz, é um procedimento de natureza administrativa (não é um
processo judicial) (artigo 2º, Lei n. 8.560/92).
É dever do registrador remeter ao juiz a declaração de paternidade para fins de averiguação oficiosa.
32. E o que deve ser feito pelo registrador caso a mãe não queira declarar quem seja o suposto pai?
O Oficial do Registro Civil irá registrar o recém-nascido apenas em nome da
mãe e deverá, em seguida, remeter ao juízo competente a certidão de
nascimento da criança, mesmo sem as informações necessárias para
identificação do suposto pai. O Oficial deverá adotar a providência do art. 2º da
Lei nº 8.560/92 mesmo que a mãe não queira ou não informe nada sobre o
suposto pai. É recomendável que o registrador colha declaração da mãe de
que está ciente da faculdade de indicar e que não deseja fazê-lo.
33. O juiz, ao receber a certidão do Oficial, poderá obrigar a mãe a fornecer informações sobre o suposto pai da criança?
NÃO. A mãe não é obrigada a fornecer informações sobre quem seja o
suposto pai da criança. Diante disso, o juiz poderá extinguir o procedimento
administrativo, encaminhando os autos ao representante do Ministério Público
para que intente a ação competente, se cabível.
O juiz tem a discricionariedade de extinguir, por falta de provas, o
procedimento de averiguação oficiosa, que tem a natureza de jurisdição
voluntária, quando reputar inviável a continuidade do feito. Neste caso, será
ainda possível a propositura de ação de investigação da paternidade. STJ. 3ª
Turma. REsp 1376753/SC, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em
01/12/2016.
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34. O Provimento 16 do CNJ procurou dar mais efetividade a essa averiguação oficiosa. À luz desse provimento, é possível que o filho maior de idade se valha desse procedimento? Em qualquer RCPN?
Sim. O filho maior de idade poderá se valer de igual faculdade,
comparecendo pessoalmente perante qualquer oficial de registro civil das
pessoas naturais, o qual deverá providenciar o preenchimento do termo, do
qual constarão os dados fornecidos pelo filho maior, e colherá sua assinatura,
firmando-o também. Após, remeterá o termo ao Juiz competente,
acompanhado da certidão de nascimento. Toda essa sistemática não será
utilizada se já pleiteado em juízo o reconhecimento de paternidade, razão pela
qual constará, ao final do termo, declaração da pessoa interessada de que isso
não ocorreu.
35. João ajuizou ação investigatória de paternidade em face de José, seu suposto pai, que se recusou a fazer o exame de DNA. O juiz, diante da recusa, julgou a demanda procedente e reconheceu que João é filho de José. Decorridos alguns anos, as diferenças entre João e José se evidenciaram e então José resolveu ingressar com a ação negatória de paternidade, pedindo a relativização da coisa julgada e a realização do exame de DNA. A pretensão de José merece prosperar?
Não. Embora a jurisprudência majoritária admita a relativização da coisa
julgada em casos de investigação de paternidade, essa flexibilização somente
é possível quando o exame de DNA não pôde ser feito na ação originária. Não
se aplica, portanto, para os casos em que o investigado recusou-se a
submeter-se ao exame de DNA.
NEGATÓRIA DE PATERNIDADE
36. O Código Civil garante ao marido o direito de contestar a paternidade do filho nascido de sua esposa. Como compatibilizar essa previsão com a técnica de reprodução assistida?
Havendo emprego da técnica de reprodução heteróloga, a presunção de
paternidade passa a ser absoluta ou iure et de iure, conforme o Enunciado n.
258 do CJF/STJ (“não cabe a ação prevista no art. 1.601 do Código Civil se a
filiação tiver origem em procriação assistida heteróloga, autorizada pelo marido
nos termos do inc. V do art. 1.597, cuja paternidade configura presunção
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absoluta”). Aplicação da máxima que veda o comportamento contraditório,
relacionada à boa-fé objetiva, em proteção ao filho (venire contra factum
proprium). Partindo para a prática, em 2017, surgiu sentença seguindo tais
premissas, afastando a possibilidade de pai homoafetivo, que havia planejado
e autorizado a técnica de reprodução assistida com seu companheiro,
renunciar à paternidade. A decisão foi prolatada pelo juiz corregedor da 2.ª
Vara de Registros Públicos da Comarca de São Paulo, Marcelo Benacchio, em
12 de abril de 2017 (Processo 1010250-76.2017.8.26.0100).
Todavia, no que concerne à contestação da paternidade pelo marido da
mãe resultante da inseminação homóloga, entende Caio Mário como possível,
desde que pai comprove, com o exame de DNA, que o profissional ou o
hospital utilizaram sêmem que não foi o seu.
37. A ação negatória de paternidade pode ser proposta pelos herdeiros do pai falecido?
NÃO. Determina o parágrafo único do artigo 1601 que se estende aos
herdeiros o direito de prosseguir na ação. O que o legislador pretende é que,
iniciada a ação e vindo o Autor a morrer na pendência da lide, os seus
sucessores, legítimos ou testamentários, podem continuar mediante o
procedimento da substituição processual. O pressuposto da legitimatio
reconhecida aos herdeiros é, portanto, a ação ter sido proposta.
38. Doutor(a), imagine a seguinte situação: Maria foi casada com João até agosto de 2018. Logo após o divórcio, conheceu José, com que teve um rápido relacionamento, pois José mudou-se para outra cidade em outubro do mesmo ano. Antes dele ir embora, Maria anunciou-lhe estar grávida, sem saber precisar de quantas semanas. A criança nasceu então em 22 de abril de 2019 e mesmo diante das circunstâncias que não levavam à certeza da paternidade, José registrou a criança como seu filho, com receio de ser exposto publicamente. Durante o pré-natal ficou constatado que a concepção ocorrera por volta do dia 16 de julho de 2018, quando Maria ainda era casada com João. Passados alguns meses, José, desconfiando que não era o pai da criança, entrou em contato com um laboratório para fazer o exame de DNA, porém morreu drasticamente em um acidente de veículo. Diante desse caso, esclareça se os herdeiros de José podem propor alguma ação para desconstituir essa paternidade.
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De acordo com o artigo 1601 do CC/02, a ação negatória de paternidade é de legitimação exclusiva do marido da mulher, suposto pai. Portanto, trata-se de legitimidade exclusiva, de modo que os herdeiros não poderiam propor ação negatória. Todavia, cabe aos herdeiros a ação anulatória de registro civil com fundamento no artigo 1604 do CC/02 (Art. 1.604. Ninguém pode vindicar estado contrário ao que resulta do registro de nascimento, salvo provando-se erro ou falsidade do registro), que, de acordo com a doutrina e jurisprudência majoritária, pode ser manejada por qualquer pessoa que tenha legítimo interesse em demonstrar a existência de erro ou falsidade do registro civil (STJ, RESP 1.238.393/SP).
39. Diferencie ação negatória de paternidade da ação anulatória de registro civil.
Para se desconstituir a relação de filiação, em princípio, podemos identificar
dois tipos de ações: a “negatória da paternidade” e a “ação de anulação do
registro civil”. Segundo o art. 1.604 do Código de 2002, que “ninguém pode
vindicar estado contrário ao que resulta do registro de nascimento, salvo
provando-se erro ou falsidade do registro”. Previu, também o art. 1o da Lei no
8.560/1992 a irrevogabilidade do reconhecimento voluntário dos filhos nascidos
fora do casamento. No entanto, o art. 113 da Lei no 6.015/1973 (Lei de
Registros Públicos) previa a possibilidade de as “questões de filiação serem
decididas em processo contencioso para anulação ou reforma do assento”.
Assim, a ação que visa desconstituir a paternidade ou maternidade inscrita no
registro ou reforma do assento de nascimento tem fundamentos próprios.
Exige- se que se prove “erro ou falsidade” das declarações nele contidas,
conforme determinam os arts. 1.604 e 1.608. No que concerne à “ação
anulatória do registro civil” tem-se admitido um leque maior de legitimados.
Assim reconheceu o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro a legitimidade dos
avós paternos para anulação por falsidade ideológica da paternidade. Da
mesma forma, reconheceu o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul a
legitimidade dos irmãos do Falecido, tios do menor, para promoverem a
anulação do assento do nascimento do sobrinho, por alegada fraude ou
simulação.
Confrontando a filiação havida da relação ou não de casamento, ve ̂-se bem
que o novo Código mantém a identificação da paternidade em decorrência de
“presunções”. Mas estas diferem. Enquanto o status legitimatis de filho
contentava-se simplesmente com a prova do casamento, a condição de filho
permite hoje comprovar um fato certo, do qual se pode induzir a relação
jurídica. O artigo 1599, por exemplo, reconhece que a prova da impotência do
cônjuge ilide a presunção de paternidade. Portanto, pode-se fundar a ação
negatória da paternidade com a comprovação da impotência coeundi dentro do
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período legal da concepção do filho. Consolidou-se em nosso sistema jurídico a
possibilidade do pai ou mãe exercerem o direito personalíssimo de negar a
existência de um vínculo de filiação que se formou por força de uma presunção
legal (art.1597, CC).
40. É possível ação negatória de maternidade? Cite exemplos.
No que concerne à maternidade, deve-se ter presente a possibilidade de
outras pessoas, além da mãe, poderem declarar o nascimento no registro civil.
Determina o art. 52 da Lei no 6.015/1973, com as alterações promovidas pela
Lei no 13.112, de 30 de março de 2015, como obrigados a fazer declaração de
nascimento: “1o) o pai ou a mãe, isoladamente ou em conjunto, observado o
disposto no § 2o do art. 54; 2o) no caso de falta ou de impedimento de um dos
indicados no item 1o, outro indicado, que terá o prazo para declaração
prorrogado por 45 (quarenta e cinco) dias; 3o) no impedimento de ambos, o
parente mais próximo, sendo maior achando-se presente; 4o) em falta ou
impedimento do parente referido no número anterior os administradores de
hospitais ou os médicos e parteiras, que tiverem assistido o parto; 5o) pessoa
idônea da casa em que ocorrer, sendo fora da residência da mãe; 6o)
finalmente, as pessoas encarregadas da guarda do menor”. A referida lei
buscou viabilizar que a mulher, em igualdade de condições, pudesse proceder
ao registro de nascimento do filho. Este é o motivo principal que levou o
legislador de 2002, no art. 1.608, recepcionando a regra do art. 356 do Código
Civil de 1916, a autorizar a mãe a contestar a maternidade provando a
falsidade do termo ou as declarações nele contidas.
De acordo com o artigo 1608 do CC/02, a mãe também pode negar a
maternidade, provando a falsidade do termo ou das declarações nele contidas.
Pode-se, portanto, contestar a maternidade, provando-se que aquela pessoa
não é a que nasceu da mulher (falta de identidade); ou que a mulher não teve
aquele filho, ou nunca teve filho nenhum (simulação de parto); ou a substituição
do recém-nascido. Trata-se de ação imprescritível e que pode ser intentada por
quem tenha ou prove ter legitimo interesse.
41. Em que consiste a ação de vindicação do estado de filiação?
A “ação de vindicação do estado de filiação”, que é imprescritível, pode ser
intentada pelo filho enquanto viver, passando aos seus herdeiros, se morre
incapaz; ou cabe ainda, a estes, continuá-la, se falece na pendência da lide.
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São extremos desta ação: a) o casamento dos pais; b) a data do nascimento,
verificada a coincidência da sua concepção com o casamento dos pais; c) a
identidade da pessoa em relação à criança nascida daquele casamento. A
prova desses extremos será feita com certidão do casamento dos pais, assento
de nascimento do filho, outros meios que a supram: registro hospitalar, escritos
da família, testemunhas, e ainda outros dados técnicos.
RECONHECIMENTO DE FILHOS
42. Quais as formas possíveis para o reconhecimento de filiação espontâneo?
O reconhecimento espontâneo de filho pode se dar das seguintes formas: i)
no momento do registro de nascimento; ii) por escritura pública ou escrito
particular com firma reconhecida; iii) por testamento; iv) por manifestação
expressa e direta perante o juiz, mesmo que em processo que não trate do
tema ( 1.609, CC/2002).
43. Qual o conceito jurídico de reconhecimento de filhos e suas características essenciais?
O reconhecimento de filho é ato jurídico em sentido estrito, unilateral,
personalíssimo, formal e incondicional, que envolve manifestação de vontade,
livre e consciente, por agente capaz que deve ser feita na forma da lei.
44. Fale sobre os efeitos do ato de reconhecimento de paternidade e esclareça se são ex tunc ou ex nunc.
Ao filho reconhecido são atribuídos direitos, faculdades e deveres de ordem
pessoal e patrimonial. Sujeita-se ao poder familiar dos genitores que o tiverem
reconhecido. Mas não será admitido no lar do que o tiver reconhecido, sem a
anuência do outro cônjuge (Código Civil, art. 1.611), o que atende à orientação
do art. 165, I, do Estatuto da Criança e do Adolescente, ao exigir a
concordância expressa do cônjuge ou companheiro nas hipóteses de
colocação em Lar Substituto (Guarda, Tutela e Adoção), já que se pretende
uma convivência familiar sem atritos. A regra do art. 1.612 determina que “o
filho reconhecido, enquanto menor, ficará sob a guarda do genitor que o
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reconheceu, e, se ambos o reconheceram e não houver acordo, sob a de quem
melhor atender aos interesses do menor”. Em decorrência do ato de
perfilhação, o filho passa a usar o nome paterno. Verificando o reconhecimento
e comprovada a impossibilidade de o filho prover a própria subsistência,
impõe-se aos pais o dever de alimentar.
Regra geral, pode-se afirmar que o ato de identificação de paternidade tem
efeito retro-operante, todavia a retroação dos seus efeitos encontra um limite
intransponível: o respeito às situações jurídicas definitivamente constituídas.
Desta sorte, sempre que o efeito retro-operante do reconhecimento encontrar
permeio, esta barreira não a poderá transpor, para alcançar os efeitos
passados das situações de direito, salvo expressa decisão judicial transitada
em julgado. Decorre daí a natureza declaratória da sentença que reconhece a
paternidade.
45. Em que consiste o principio da veracidade da filiação?
Este é um princípio citado por Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona Filho e que,
segundo estes, consiste na ideia de que o ordenamento não deve criar óbices
para se reconhecer a verdadeira vinculação entre pais e filhos. A ideia é se
permitir a discussão da paternidade e da maternidade de quem quer que seja,
o que também importa no direito ao conhecimento da origem genética. Citam
como exemplo deste principio o disposto no artigo 1601 do CC/2002.
46. O(a) Doutor(a) procederia a um registro de nascimento declarado por um pai que tem apenas 16 anos?
SIM. O reconhecimento de filho é ato personalíssimo, que não admite
influência externa, de maneira que não se deve exigir representação ou
assistência para a prática deste ato. Por ter 16 anos, portanto, o pai pode,
sozinho, declarar sua vontade em reconhecer o registrando como seu filho.
Esse entendimento se baseia em sua capacidade para testar, adquirida aos 16
anos. Logo, se pode reconhecer filho por testamento, pode também o fazer por
declaração no momento do registro.
CNJ, Provimento 12, artigo 5º, § 2º: “O reconhecimento da paternidade pelo
pai relativamente incapaz independerá da assistência de seus pais ou tutor
[...]”.
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CNJ, Provimento 16, artigo 6º, § 4º: “O reconhecimento de filho por pessoa
relativamente incapaz independerá de assistência de seus pais, tutor ou
curador.”
CNJ, Provimento 26, artigo 5º, § 2º: “O reconhecimento da paternidade pelo
pai relativamente incapaz independerá da assistência de seus pais ou tutor
[...]”.”
47. Uma pessoa maior de 18 anos, porém relativamente incapaz, sujeito a curatela, necessita da assistência de seu curador para proceder ao reconhecimento extrajudicial de paternidade?
NÃO. O Estatuto do Deficiente não deixa dúvidas em seu artigo 85: a
curatela só afeta os atos de natureza negocial, sendo o curatelado plenamente
capaz para os atos de natureza pessoal e familiar, como é o caso do
reconhecimento de filiação. O Provimento 16 do CNJ, em seu artigo 6°, §4°,
segue tal entendimento, dispensando a
assistência para o reconhecimento de filho por relativamente incapaz.
48. O(A) Doutor(A) sustenta esse mesmo raciocínio para o caso do pai declarante menor de 16 anos?
NÃO. Por ser menor de 16 anos, o pai é absolutamente incapaz e não pode
declarar o nascimento, nem ser representado na prática deste ato, dependendo
de decisão judicial para que possa constar como pai no registro (entendimento
majoritário).
Provimentos 12 e 26 da Corregedoria Nacional da Justiça do CNJ, com a
mesma redação em seus respectivos artigos 5º, § 2º: “[...] O reconhecimento
da paternidade pelo absolutamente incapaz dependerá de decisão judicial, a
qual poderá ser proferida na esfera administrativa, pelo próprio juiz que tomar a
declaração do representante legal”.”
CUIDADO – Nas Normas do RJ, é possível o reconhecimento por menos de
16 anos desde que representado (Art. 744).
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49. A anuência da genitora do menor é necessária para a averbação do reconhecimento de paternidade?
O tema suscita discussão, isso porque de acordo com o Código Civil, a
anuência da mãe não é requisito para a produção de efeitos do
reconhecimento voluntário de paternidade, eis que por ser direito da
personalidade, é assegurado ao reconhecido impugnar essa paternidade nos
quatro anos que se seguirem à sua maioridade ou a sua emancipação (Art.
1614, CC/02). Todavia, o CNJ editou o Provimento 16 e estabeleceu em seu
artigo 7° que no caso do filho menor é necessária a anuência também da mãe.
Dessa forma, dado o caráter vinculante dos atos regulamentares do CNJ para
o oficial de registro, deve-se recolher também a anuência da mãe nos casos
em que o reconhecimento se der sob a égide do provimento em questão.
50. Então no caso da mãe do menor não dar a anuência, impede-se a averbação? Pode-se afirmar então que essa anuência é condição de eficácia do reconhecimento voluntário?
No caso da ausência da anuência da mãe, o registrador deve sustar o ato
de averbação e encaminhar para análise do juiz corregedor, que pode suprir a
anuência (Art. 7º, § 2º, Provimento 16, CNJ). Não se trata de condição de
eficácia do reconhecimento, pois este é apto para surtir efeitos jurídicos, sendo
a anuência apenas condição para a averbação.
51. E no caso de maior de idade, a ausência do seu consentimento acarreta a inexistência ou nulidade do reconhecimento?
Caio Mário sempre considerou que a anue ̂ncia é complementar ao ato e
indispensável o seu consentimento. Recente orientação do Superior Tribunal
de Justiça tem considerado a sua nulidade. Samir José Caetano Martins,
reportando-se a
inúmeros autores nacionais, considera que o consentimento do filho maior
constitui condição de validade do reconhecimento, pelo que sua falta conduz à
nulidade.
52. Fale sobre a presunção de paternidade decorrente do casamento.
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De acordo com o Código Civil, o filho nascido em qualquer período
compreendido entre os cento e oitenta dias do início da convivência conjugal e
os trezentos dias do fim da sociedade conjugal presume-se como sendo do
marido. Essa presunção se verifica mediante a apresentação da certidão de
casamento no ato do registro da criança. Essa presunção decorre do dever de
fidelidade no casamento (artigo 1.566, I, do CC), cuja lógica é a de que os
cônjuges mantêm relações sexuais exclusivamente entre si. Trata-se da
máxima do Direito romano de que pater is est quaem justae nuptiae
demonstrant (pai é aquele indicado pelo casamento).”
53. Essa presunção tem caráter absoluto ou relativo? Por que?
Essa presunção tem caráter relativo (iuris tantum), podendo ser afastada
quando apresentada prova em contrário, como no caso do artigo 1.599 do
Código Civil, que prevê que “a prova da impotência do cônjuge para gerar, à
época da concepção, ilide a presunção da paternidade”, ou no caso de exame
de DNA que afaste a paternidade do marido da mãe. Deste caráter relativo,
extraiu-se a regra do Provimento 28 da Corregedoria Nacional de Justiça do
CNJ que, com o intuito de evitar que a presunção imponha a inclusão no
registro de algo que não corresponde à realidade, reconheceu no § 4º de seu
artigo 9º que: “o genitor que comparecer para o registro declarar, sob as penas
da lei, que estava separado de fato de seu cônjuge ao tempo da concepção,
não se aplica a presunção prevista”.
54. Qual paternidade deve prevalecer no caso de haver a presunção decorrente do casamento e o reconhecimento de filho no momento do registro por outro que não seja o marido da mãe? Por que?
Deve prevalecer a paternidade daquele que reconhece o filho no momento
do registro, em detrimento da presunção imposta pela lei, no caso de a genitora
afirmar que se encontrava separada de fato do seu marido no momento da
concepção.
Há autores, todavia, como Mario de Carvalho Camargo Neto, que defendem
que o reconhecimento do terceiro deve sempre prevalecer, por ser relativa a
presunção legal de paternidade e pelo fato de que o reconhecimento de filho no
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ato do registro pode ser realizado independentemente do estado civil dos pais,
mesmo que sejam casados com outras pessoas1.
55. Imagine que um casal viva em união estável e que haja escritura pública declaratória desse fato. Durante a união, a mulher engravidou. Porém, antes mesmo que a criança viesse a nascer, seu companheiro faleceu. Passados 239 dias do falecimento, a criança nasceu e a mãe procurou o seu cartório para proceder ao registro do nascimento da criança, pretendendo que constasse o nome do seu companheiro falecido como o pai. Como o(a) doutor(a) deve proceder?
É possível o registro da criança com a paternidade estabelecida por
presunção, à luz do que estabelece o Código Civil para o casamento.
A respeito do tema, merece destaque a decisão da 3a Turma do STJ, tendo
como Relator o Ministro Massami Uyeda, que estendeu a presunção de
concepção dos filhos na constância do casamento prevista no art. 1.597, II, do
CC/2002 à união estável. A decisão foi fundamentada com base no
reconhecimento da união estável como entidade familiar, que permite a
interpretação sistemática do referido dispositivo, para que passe a contemplar,
também, a presunção de concepção dos filhos na constância de união estável.
No caso julgado, o companheiro da mãe havia falecido 239 (duzentos e trinta e
nove) dias antes ao nascimento da criança, ou seja, dentro da esfera de
proteção conferida pelo inciso II do art. 1.597, do Código Civil, que presume
concebidos na constância do casamento os filhos nascidos nos trezentos dias
subsequentes, entre outras hipóteses, em razão de sua morte. Na decisão, o
Relator chamou atenção para os requisitos para a constituição da união
estável: “convivência duradoura e pública, ou seja, com notoriedade e
continuidade, apoio mútuo, ou assistência mútua, intuito de constituir família,
com os deveres de guarda, sustento e de educação dos filhos comuns, se
houver, bem como os deveres de lealdade e respeito”. Assim, configurando-se
a união estável, é aplicável a presunção de concepção dos filhos na constância
da relação, em consonância ao texto constitucional (art. 226, §3o) e ao Código
Civil (art. 1.723), que conferiram ao instituto da união estável a natureza de
entidade familiar.
1 “Jornal da ARPEN-SP, ano 10, n. 84, fev. 2009. Disponível no site: http://www.arpensp.org.br/principal/index.cfm?tipo_layout=BC1&pagina_id=107.”
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56. O reconhecimento póstumo de paternidade biológica pode dar-se na via extrajudicial?
São poucos os julgados que enfrentam o tema, porém os que existem sobre
o assunto são no sentido da impossibilidade reconhecimento de paternidade
post mortem na via extrajudicial. Os principais fundamentos para essa vedação
são os de que o reconhecimento póstumo só pode ser alcançado mediante
investigação de paternidade, motivo pelo qual deve ser objeto de ação própria
na vara de família, bem como por se tratar da busca da verdade real, que deve
ser alcançada por meio do exame de DNA. Segundo STJ, o direito de
reconhecer voluntariamente a prole é personalíssimo e, portanto,
intransmissível aos herdeiros, de modo que a investigação de paternidade após
a morte do suposto pai somente pode dar-se na via judicial.
Questiona-se: se a jurisprudência fundamenta a investigação de paternidade
após a morte com a necessidade do exame de DNA, não faz sentido não
permitir que esse reconhecimento seja feito por escritura pública se houver
exame de DNA confirmatório da paternidade e não houver litigio entre os
herdeiros.
57. Recentemente, o CNJ disciplinou o reconhecimento da paternidade socioafetiva. Além deste provimento, essa espécie de reconhecimento tem fundamento legal?
SIM. A socioafetividade é contemplada pelo art. 1.593 do Código Civil, que prevê: Art. 1.593. O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem. Ao falar em "outra origem", o legislador permite que a paternidade seja reconhecida com base em outras fontes que não apenas a relação de sangue. Logo, permite a paternidade com fundamento no afeto. Assim, a paternidade socioafetiva é uma forma de parentesco civil de acordo com o Código Civil de 2002.
58. Quais os requisitos para que se reconheça a paternidade socioafetiva?
Para que seja reconhecida a filiação socioafetiva, é necessário que fiquem demonstradas duas circunstâncias bem definidas: a) vontade clara e inequívoca do apontado pai ou mãe socioafetivo de ser reconhecido(a), voluntária e juridicamente, como tal (demonstração de carinho, afeto, amor); e b) configuração da denominada “posse de estado de filho”, compreendida pela doutrina como a presença (não concomitante) de tractatus (tratamento, de parte à parte, como pai/mãe e filho); nomen (a pessoa traz consigo o nome do apontado pai/mãe); e fama (reconhecimento pela família e pela comunidade de
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relação de filiação), que naturalmente deve apresentar-se de forma sólida e duradoura. STJ. 3a Turma. REsp 1.328.380-MS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 21/10/2014 (Info 552).
59. Imagine que uma pessoa maior de idade faleça sem ter a paternidade socioafetiva reconhecida, embora essa fosse de conhecimento de todos e o falecido tivesse convivido com seu pai socioafetivo desde o seu nascimento. Triste por não ter feito este reconhecimento quando seu filho ainda era vivo, o pai resolve ingressar com um pedido judicial de reconhecimento de paternidade socioafetiva post mortem. Poderá o juiz conceder esse pedido?
NÃO. Como o filho já era maior de idade, é essencial o seu consentimento
para que haja o reconhecimento da paternidade socioafetiva. Em razão da
impossibilidade da manifestação de vontade em virtude do falecimento, a
referida ação não tem como prosperar.
É imprescindível o consentimento de pessoa maior para o reconhecimento
de filiação post mortem. STJ. 3ª Turma. REsp 1688470-RJ, Rel. Min. Nancy
Andrighi, julgado em 10/04/2018 (Info 623).
60. É possível o reconhecimento de paternidade socioafetivo póstumo?
SIM. É possível o reconhecimento da paternidade socioafetiva post mortem,
ou seja, mesmo após a morte do suposto pai socioafetivo.
STJ. 3a Turma. REsp 1.500.999-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva,
julgado em 12/4/2016 (Info 581).
Neste caso, a ação de reconhecimento de paternidade deve ser proposta
em face dos herdeiros do falecido.
61. No caso de reconhecimento de paternidade socioafetiva extrajudicial, de acordo com o Provimento 63 do CNJ, de quem é a competência para tanto? Quais requisitos necessários?
O Provimento 63 do CNJ possibilita que o reconhecimento de paternidade
socioafetiva se dê diretamente em qualquer cartório de registro civil das
pessoas naturais. Portanto, tanto o oficial da serventia em que consta o
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assento de nascimento, quanto qualquer outro oficial de registro civil no país
são competentes para o procedimento de reconhecimento de filiação
socioafetiva (Art. 11). Os requisitos para que alguém requeira a paternidade ou
maternidade socioafetiva são: i) ser maior de 18 anos; ii) ser, pelo menos, 16
anos mais velho que o filho a ser reconhecido; iii)não ser irmão ou ascendente
do filho a ser reconhecido ; iv) não haver discussão judicial sobre o
reconhecimento da paternidade ou de procedimento de adoção; v) ser
unilateral.
62. Há direito de arrependimento no reconhecimento de filiação socioafetiva?
NÃO. O reconhecimento de filiação socioafetiva é irretratável e irrevogável
(Art. 10, § 1º, Provimento 63).
63. Então, Doutor(a), esse reconhecimento de paternidade é de caráter absoluto?
Embora seja irrevogável, não é absoluto, pois é possível a sua
desconstituição por sentença judicial transitada em julgado nas hipóteses de
vício de vontade, fraude ou simulação (Art. 10, § 1º, Provimento 63).
64. É comum no nosso país que as mães que têm filhos muito novas deixem suas crianças aos cuidados dos avós, para que possam seguir suas vidas, estudar, trabalhar. Em muitos casos, os avós são mais pais que os próprios pais. Posso então dizer que o provimento 63 do CNJ veio para albergar essas situações e possibilitar o reconhecimento de filiação socioafetiva dos avós em relação aos seus netos?
NÃO. O provimento 63 do CNJ veda expressamente que os ascendentes
reconheçam a paternidade ou a maternidade socioafetiva (Art. 10, § 3º).
65. Por que, Doutor(a), o(a) senhor(a) acha que o CNJ estipulou esta proibição?
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Há proibição expressa também em relação à adoção (ECA, Art. 42). E a
doutrina aponta duas razões pelas quais o legislador resolveu editar essa
norma proibitiva:
1) Na prática, verificava-se que, em regra, a adoção do neto pelos avós ocorria
para atender interesses econômicos, pois o objetivo principal era fazer com que
os avós, quando morressem, deixassem a pensão para o adotado; 2)
Constatou-se que essa modalidade de adoção provocava uma quebra da
harmonia familiar e uma confusão psicológica do adotando, já que aqueles que
eram seus avós passavam a ser seus pais e o seu pai (ou mãe) transformava-
se em irmão(ã), causando um suposto conflito na cabeça da
criança/adolescente. Assim, como a filiação socioafetiva gera os mesmos
efeitos que a adoção, já que não existe diferença de filiação quanto a origem,
pode-se afirmar que essa vedação pelo CNJ tem as mesmas causas
apontadas pela doutrina citadas anteriormente.
Todavia, há precedente no STJ que permitiu a adoção de neto pelos avós, o que pode vir a ocorrer em relação à filiação socioafetiva, em prol princípios da proteção integral e da garantia do melhor interesse do menor.
66. Quais documentos devem instruir o pedido administrativo de filiação socioafetiva e como deve proceder o oficial ao receber o pedido?
O pedido deve ser instruído com o documento oficial de identificação com
foto do requerente e com a certidão de nascimento do filho, ambos em original
e cópia. O registrador deve verificar minuciosamente a identidade do
requerente, mediante coleta de sua completa qualificação e assinatura. Deve,
ainda, conferir com rigor os documentos pessoais apresentados pelo
requerente, cujas cópias devem ser arquivadas na serventia, juntamente com o
termo assinado. Caso o reconhecido seja menor, o oficial deve proceder à
colheita da assinatura do pai e da mãe do reconhecido. E se o reconhecido já
for maior de doze anos, deve também consentir com o reconhecimento. Após
deferir o pedido, o oficial deve proceder à averbação à margem do assento de
nascimento, se for de seu cartório, ou enviar o procedimento para o registro
civil em que consta o nascimento (Art. 11).
67. Se no processamento do reconhecimento de filiação socioafetiva o oficial suspeitar de fraude, como deve proceder?
O oficial deve recusar a prática do ato, motivando a sua decisão, e
encaminhar o pedido ao juiz competente nos termos da legislação local (Art.
12).
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68. Se no procedimento de reconhecimento de filiação socioafetiva de adolescente com 14 anos de idade, os seus pais não forem localizados, o registrador pode processar normalmente o pedido e averbar o reconhecimento?
NÃO. A anuência dos pais é sempre necessária quando o reconhecido for
menor de idade, ainda que este também precise conceder a sua anuência.
Portanto, na falta dos pais do menor, o registrador deverá apresentar o caso ao
juiz competente nos termos da legislação local (Art. 11, § 6º, Provimento 63).
69. Admite-se a pluriparentalidade no RCPN? Como?
Sim. É possível que haja mais de um pai ou de uma mãe no registro da
criança, desde que limitado a dois (Provimento 63, CNJ. Art. 14).
70. É possível que alguém busque ser reconhecido como filho biológico de determinado pai e, ao mesmo tempo, continue como filho socioafetivo de outro?
SIM. A paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro público, não
impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante baseado na
origem biológica, com os efeitos jurídicos próprios. STF. Plenário. RE
898060/SC, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 21 e 22/09/2016 (Info 840).
Art. 15. O reconhecimento espontâneo da paternidade ou maternidade
socioafetiva não obstaculizará a discussão judicial sobre a verdade biológica
(Provimento 63).
71. Doutor(a), imagine a seguinte hipótese: comparecem em seu cartório de registro civil um casal, sendo a mãe biológica de uma adolescente de 13 anos e seu marido. Este declara que deseja reconhecer a paternidade socioafetiva dessa adolescente e informa que seu pai biológico é falecido. Considerando o caso apresentado, o doutor(a) faria o procedimento de reconhecimento de paternidade socioafetivo administrativamente? Comente.
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Cuidando-se o reconhecido de criança ou adolescente, os §§ 3° e 4° do art.
11 do Provimento CNJ nº 63/2017 condicionam o reconhecimento da
paternidade ou da maternidade socioafetivos à anuência de ambos os
genitores, com submissão do requerimento ao Juiz competente na
impossibilidade de apresentação da anuência (§ 3º. Constarão do termo,
além dos dados do requerente, os dados do campo FILIAÇÃO e do filho que
constam no registro, devendo o registrador colher a assinatura do pai e da mãe
do reconhecido, caso este seja menor). A manifestação da anuência de
ambos os genitores é requisito para a averbação da paternidade
socioafetiva, em se tratando de criança e adolescente, em razão da
incapacidade total (criança) ou parcial (adolescente) para exercer os atos da
vida civil e, mais, dos relevantes efeitos decorrentes da paternidade e também
da filiação. Em razão disso, o fato da genitora exercer o poder familiar com
exclusividade, em razão da morte do pai biológico, não afasta a incidência
do § 3° do art. 11 do Provimento CNJ nº 63/2017, com remessa do
requerimento ao Juízo competente para que delibere diante da
impossibilidade de se obter a anuência do pai biológico da adolescente
que neste caso concreto, pela sua idade, é totalmente incapaz para exercer
pessoalmente os atos da vida civil, como previsto do art. 3° do Código Civil
(CGJSP - RECURSO ADMINISTRATIVO: 110456902.2018.8.26.0100.
LOCALIDADE: São Paulo DATA DE JULGAMENTO: 24/05/2019 DATA
DJ: 11/06/2019. RELATOR: Geraldo Francisco Pinheiro Franco .
72. Doutor(a), em um reconhecimento de paternidade de um filho menor, feito sob a condição da mãe da criança casar-se com esse que declarante. Esse reconhecimento produz efeitos? E a condição é inexistente, inválida ou ineficaz?
O reconhecimento de paternidade produz efeitos, todavia a condição é
considerada ineficaz, de acordo com o Artigo 1613, CC/02. O ato de
reconhecimento deve ser puro e simples.
PODER FAMILIAR, GUARDA, TUTELA
73. O Poder Familiar é entendido como um poder-dever e deve ser interpretado à luz da Constituição Federal. Cite alguns dos deveres inerentes ao poder familiar.
https://www.kollemata.com.br/provimento-cnj-63-2017-rcpn-certidao-nascimento-casamento-obito-paternidade-socioafetiva-reproducao.htmlhttps://www.kollemata.com.br/provimento-cnj-63-2017-rcpn-certidao-nascimento-casamento-obito-paternidade-socioafetiva-reproducao.htmlhttp://www.lexml.gov.br/urn/urn:lex:br:federal:lei:2002-01-10;10406
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Destacam-se os deveres de convívio, de cuidado, de criação e educação
dos filhos, de manutenção dos filhos menores, proporcionando-lhe os
alimentos.
74. À luz da Constituição Federal, concebendo-se a autoridade parental como um dever, é possível pleitear danos morais em razão do abandono afetivo pelos pais?
As responsabilidades parentais envolvem os direitos fundamentais da
criança e do adolescente presentes no art. 227 da Constituição Federal,
destacando, especialmente, o direito à convivência familiar e comunitária. A 3a
Turma do STJ, em decisão inovadora, decidiu pela possibilidade da
condenação dos pais ao pagamento de dano moral em decorrência do
abandono afetivo do filho. O fundamento do Acórdão baseou-se no dever de
cuidado decorrente do disposto no art. 227 da CF/88 e na ocorrência de uma
ilicitude civil sob a forma de omissão, tendo em vista que o non facere, que
atinge bem juridicamente tutelado – o necessário dever de criação, educação e
companhia – importa em vulneração da imposição legal, fazendo com que haja
a possibilidade de se pleitear compensação por danos morais por abandono
psicológico. A Relatora Ministra Nancy Andrighi esclarece que é “indiscutível o
vínculo não apenas afetivo, mas também legal que une pais e filhos, sendo
monótono o entendimento doutrinário de que, entre os deveres inerentes ao
poder familiar, destacam-se o dever de convívio, de cuidado, de criação e
educação dos filhos, vetores que, por óbvio, envolvem a necessária
transmissão de atenção e o acompanhamento do desenvolvimento
sociopsicológico da criança. E é esse vínculo que deve ser buscado e
mensurado, para garantir a proteção do filho quando o sentimento for tão tênue
a ponto de não sustentarem, por si só, a manutenção física e psíquica do filho,
por seus pais.
75. Como instituto de proteção e defesa da pessoa e bens dos filhos e da família, as relações oriundas do poder familiar sistematicamente se desdobram em duas ordens de princípios: os relativos à pessoa do filho e, os outros, de cunho patrimonial. Poderia diferenciar e exemplificar esses princípios?
Em relação aos princípios relativos à pessoa do filho, tem-se a previsão do
artigo 1634 do CC/02.
Art. 1.634. Compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos
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filhos: dirigir-lhes a criação e a educação; exercer a guarda unilateral ou compartilhada nos termos do art. 1.584 ; conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem; conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para viajarem ao exterior; conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para mudarem sua residência permanente para outro Município; nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar; representá-los judicial e extrajudicialmente até os 16 (dezesseis) anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento; reclamá-los de quem ilegalmente os detenha; exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição.
No que se refere aos princípios de ordem patrimonial, tem-se os artigos Art.
1.689 (O pai e a mãe, enquanto no exercício do poder familiar: são
usufrutuários dos bens dos filhos; têm a administração dos bens dos filhos
menores sob sua autoridade) e Art. 1.691 (Não podem os pais alienar, ou
gravar de ônus real os imóveis dos filhos, nem contrair, em nome deles,
obrigações que ultrapassem os limites da simples administração, salvo por
necessidade ou evidente interesse da prole, mediante prévia autorização do
juiz).
76. Em 2014, foi promulgada a Lei 13.010/2014, conhecida como “Lei Menino Bernardo”, que alterou o Estatuto da Criança e do Adolescente. O(a) Doutor(a) se recorda do que trata essa lei?
Essa lei estabelece o direito da criança e do adolescente de serem educados e cuidados sem o uso de castigos físicos ou de tratamento cruel ou degradante, como formas de correção, disciplina, educação ou qualquer outro pretexto, pelos pais, pelos integrantes da família ampliada, pelos responsáveis, pelos agentes públicos executores de medidas socioeducativas ou por qualquer pessoa encarregada de cuidar deles, tratá-los, educá-los ou protegê-los. Inicialmente, o projeto ficou conhecido como “Lei da Palmada” e, infelizmente, só obteve e ̂xito em sua aprovação após o falecimento de Bernardo Boldrini, que, aos 11 anos, órfão de mãe e vítima de violência física e psicológica empreendida pelo pai e pela madrasta, foi pessoalmente procurar auxílio no Fórum da Comarca de Tre ̂s Passos, no estado do Rio Grande do Sul, e que inspirou a nova designação. A referida lei incluiu o art. 18-A ao ECA, que definiu “castigo físico” como uma ac ̧ão de natureza disciplinar ou punitiva aplicada com o uso da forc ̧a física sobre a crianc ̧a ou o adolescente que resulte em sofrimento físico ou lesão, e “tratamento cruel ou degradante” como a conduta ou forma cruel de tratamento em relação à criança ou ao adolescente que humilhe, ameace gravemente ou ridicularize.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm#art1584
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77. De acordo com a Lei “Menino Bernardo”, a quais sanções estão sujeitos os agentes que castigarem fisicamente ou tratem seus filhos de modo cruel ou degradante? E a quem compete aplicar essas sanções?
Estão sujeitos às sanções cominadas pelo art. 18-B do ECA, quais sejam: (i) encaminhamento a programa oficial ou comunitário de proteção à família; (ii) encaminhamento a tratamento psicológico ou psiquiátrico; (iii) encaminhamento a cursos ou programas de orientação; (iv) obrigação de encaminhar a criança a tratamento especializado; (v) advertência. A competência para a aplicação dessas sanções é do Conselho Tutelar.
78. Doutor(a), imagine o seguinte caso: O(a) senhor(a) é tabelião de notas e comparece em seu cartório uma pessoa que deseja lavrar uma escritura pública de doação de um imóvel para um adolescente, de 17 anos, que está sob poder familiar. O doador lhe disse expressamente que não quer que esse imóvel seja usufruído pelos pais do donatário. Como resolver a situação se o poder familiar implica, regra geral, a administração e usufruto dos bens dos menores por seus pais?
A escritura de doação deve ser com a cláusula de impedimento para usufruto e administração dos pais, reservando este direito para outrem, incluindo, nesta hipótese, a necessidade de designação de um curador especial para tal fim. Lembrar que essa cláusula não afasta o poder familiar, mas apenas o poder de administração e usufruto desse bem específico.
79. Diferencie guarda alternada de guarda compartilhada. A guarda alternada está prevista em nosso ordenamento?
A legislação brasileira prevê o instituto da guarda compartilhada desde
2008, quando entrou em vigor a Lei n. 11.698, que alterou a redação do § 1° do
art. 1.583 do Código Civil. Tal norma dispõe que se compreende por guarda
compartilhada a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e
deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes
ao poder familiar dos filhos comuns. Com a edição da nova lei da guarda
compartilhada, Lei n. 13.058, de 2014, manteve-se a definição do instituto,
porém modificou-se o § 2° do referido artigo, a fim de determinar que, na
guarda compartilhada, o tempo de convívio com os filhos deve ser dividido
de forma equilibrada com a mãe e com o pai. Assim, se anteriormente à Lei
n. 13.058, de 2014, já havia confusão acerca dos institutos da guarda
compartilhada e da guarda alternada, após o novo texto legal, que impõe o
compartilhamento da custódia física, a situação se agravou, pois muitos juristas
os citam como se tratassem de um único instituto. Ressalta-se que a guarda
alternada não está prevista no ordenamento jurídico brasileiro, e que
consiste no exercício exclusivo alternado da guarda por um período
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determinado. Portanto, é importante diferenciar os institutos, pois o que se
busca na divisão do tempo de convívio dos filhos com os pais na guarda
compartilhada é a convivência da criança com ambos os genitores,
proporcionando o fortalecimento dos vínculos afetivos, e permitindo tanto à
mãe quanto ao pai que participem efetivamente na criação e educação de seus
filhos, de forma igualitária. Cabe lembrar que tal divisão deve ser feita
consideradas as condições fáticas e os interesses dos filhos. Na modalidade de
guarda alternada, "existe um revezamento em períodos exclusivos de guarda,
cabendo ao outro o direito de visitas", conforme lecionam Pablo Stolze
Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho em sua obra Novo Curso de Direito Civil,
(v. 6, Ed. Saraiva, 2012, p. 609). Podemos concluir que, na guarda alternada,
permanecem os efeitos da guarda exclusiva, apenas viabilizando a cada
genitor, por períodos proporcionalmente considerados, 50% (cinquenta por
cento) do tempo a cada qual, entregando ao outro o direito de visitação
regulamentada, e que a expressão "tempo de convívio de forma equilibrada"
foge ao conceito de guarda alternada, porquanto entrega o exercício
permanente das principais decisões acerca dos filhos a ambos, e a
proporcionalidade é para a guarda física, uma vez que os pais estão
separados.
Enunciado 604, Jornada de Direito Civil: “A divisão, de forma equilibrada, do
tempo de convívio dos filhos com a mãe e com o pai, imposta na guarda
compartilhada pelo § 2° do art. 1.583 do Código Civil, não deve ser confundida
com a imposição do tempo previsto pelo instituto da guarda alternada, pois esta
não implica apenas a divisão do tempo de permanência dos filhos com os pais,
mas também o exercício exclusivo da guarda pelo genitor que se encontra na
companhia do filho”.
80. É possível a emissão de certidão de nascimento constando a averbação da perda do poder familiar, sem autorização judicial?
O caso em questão trata de averbação de destituição de poder familiar, cuja
publicidade deve ser dada na certidão do assento eventualmente pleiteada,
com base no princípio da publicidade dos registros públicos, e tendo em vista
que não há vedação legal expressa nesse sentido na Lei de Registros
Públicos, no Novo Código Civil ou no Estatuto da Criança e do Adolescente
(CGJSP - PROCESSO: 29.333/2004
LOCALIDADE: Tatuapé DATA DE JULGAMENTO: 12/08/2004).
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81. Tendo em vista o modo de designação, a tutela pode ser testamentária, dativa e legítima. Diferencie-as.
Tutela testamentária. A nomeação do tutor é uma prerrogativa dos pais, mas
não é arbitrário o seu exercício. Faz-se em testamento ou codicilo. Quando se
realiza pelo pai ou pela mãe, é mister esteja um ou outro no exercício do poder
familiar ao tempo de sua morte. Nula, ainda, a nomeação se o testamento não
prevalecer. Qualquer dos pais pode faze ̂-lo, mas somente prevalecerá a
designação se ao tempo de sua morte já for falecido ou incapaz o outro, uma
vez que a morte de um deles importa em que a patria potestas concentra-se no
outro. Lícita é a designação de mais de um tutor, mas neste caso, servirão na
ordem das nomeações, e na falta ou impedimento um de outro. Feita a
nomeação por uma das pessoas mencionadas no art. 1.729 (pai, mãe),
independe de confirmação ou aprovação judicial. O munus da tutela repousa
na confiança do designante, e pode recair em parente ou estranho, de ambos
os sexos. Independe de confirmação judicial e pode subordinar-se a termo ou
condição, ad certum tempus, ex certo tempore, sub conditione.
Tutela legítima. Não havendo tutor nomeado pelos pais, incumbe a tutela
aos parentes consanguíneos do menor, na ordem prevista no art. 1.731, a
saber: I – Aos ascendentes, preferindo o de grau mais próximo ao mais remoto
(inciso I do art. 1.731); II – Aos colaterais até terceiro grau, preferindo os mais
próximos aos mais remotos, e, no mesmo grau, os mais velhos aos mais
moços; em qualquer dos casos, o juiz escolherá entre eles o mais apto a
exercer a tutela em benefício do menor (inciso II do art. 1.731).
Tutela dativa. Na forma do art. 1.732, compete ao juiz a nomeação de tutor:
I – na falta de tutor testamentário ou legítimo; II – quando estes forem excluídos
ou escusados da tutela; III – q