razão sensível e complexidade na formação de professores · 2018-01-18 · uma aproximação à...

Razão sensível e Complexidade na FoRmação

de pRoFessoRes

Desafios transdisciplinares

EDITORA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIÁS

PresidenteHaroldo Reimer (Reitor)

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Revisão LinguísticaPatrícia Maria Ferreira

Marilza Vanessa Rosa SuannoCarla Conti de Freitas

Organização

Anápolis, GO2016

Razão sensível e Complexidade na FoRmação

de pRoFessoRes

Desafios transdisciplinares

R278

Razão sensível e complexidade na formação de professores: desafi os transdisciplinares / Organizado por Marilza Vanessa Rosa Suanno; Carla Conti de Freitas – Anápolis: Editora UEG, 2016 .322 p .

ISBN: 978-85-5582-008-3

1 . Educação . 2 . Formação docente . 3 . Transdisciplinaridade . 4 . Interdisciplinaridade . 5 . Práticas pedagógicas . I . Universidade Estadual de Goiás . II . Título .

CDU 371 .13

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Sumário

Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7Prefácio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13

1 Pesquisa de natureza complexa e transdisciplinar na formação de professores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17

Marilza Vanessa Rosa Suanno Yara Fonseca de Oliveira e Silva

2 A educação numa perspectiva transdisciplinar: uma articulação entre a literatura, a história, a memória, o tempo e o espaço . . . . . . . . . . . . . . . . . 49

Alessandra Carlos Costa Grangeiro

3 Os sete saberes na sala de aula: ressignificando práticas pedagógicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79

Valéria Rosa da Silva Carla Conti de Freitas

4 Emoção, cognição e corporeidade: os sete saberes necessários à educação do futuro na sala de aula do

presente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 109 João Henrique Suanno

5 Educação e diversidade: uma relação de alteridade nas práticas escolares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 151

Marlene Barbosa de Freitas Reis Cristiane Rosa Lopes

6 Inovação e criatividade no campo da docência: de-safios e possibilidades de ruptura com o paradigma

tradicional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 167 Lindalva Pessoni Santos Cláudia do Nascimento

7 Cine formação: transdisciplinaridade e interdisciplinaridade na relação entre cinema e educação . . . 203 Osvaldo José Sobral

8 Um diálogo transdisciplinar entre a pedagogia e a geografia sobre a formação de educadores

ambientais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 225 Lívia Costa de Andrade

9 A sustentabilidade e a política nacional de resíduos sólidos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 255

Ana Paula da Costa Oliveira Abadia de Lourdes da Cunha

10 Ressignificando os paradigmas da Educação Física 269 Maria Cristina de Freitas Bonetti Poliana Cristina da Silva

11 Aspectos inovativos do curso de pós-graduação Lato Sensu em Transdisciplinaridade e Interdisciplinari-dade na Educação e suas contribuições para a for-

mação de professores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 299 Carla Conti de Freitas Patrícia Maria Ferreira Valéria Rosa da Silva

Sobre os autores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 313

Todo fim é um começo . . . assim nasce essa obra, tecida por várias mãos e acolhida por muitos corações, como as experiências de sentir-pensar que vivemos no decor-

rer dos dois anos da Primeira Turma do curso de Pós-gradu-ação Lato Sensu Transdisciplinaridade e Interdisciplinaridade na Educação, realizado na Universidade Estadual de Goiás, Câmpus Inhumas . Cada capítulo desse livro traz um traçado daquilo que os autores realizaram como professores, motiva-dos pela temática de cada eixo do currículo do referido curso, que contribui para a confecção desse produto que espera inspi-rar e motivar outras pessoas envolvidas com a docência .

No capítulo Pesquisa de natureza complexa e transdisci-plinar na formação de professores, Marilza Vanessa Rosa Suanno e Yara Fonseca de Oliveira e Silva apresentam reflexões e fundamentações sobre pesquisa científica, que orientaram o processo de produção dos Trabalhos de Conclusão de Curso – TCC . O capítulo contempla considerações sobre pesquisa e suas interfaces com a Complexidade, a Transdisciplinaridade, a subjetividade, a abordagem qualitativa, o Método antimétodo da Complexidade (SUANNO, 2015), a pesquisa (auto)biográfica e a história de vida/formação/trabalho docente no processo de elaboração dos referidos trabalhos .

Apresentação

8 Razão sensível e Complexidade na formação de Professores

O capítulo A educação numa perspectiva transdisciplinar: uma articulação entre a literatura, a história, a memória, o tempo e o espaço, de Alessandra Grangeiro, tem como objetivo apresentar algumas reflexões no que diz respeito ao ensino da Literatura no Ensino Superior . A autora propõe algumas refle-xões sobre a relação entre literatura, história, memória, tempo e espaço . Para isso, utiliza algumas obras de William Faulkner que fazem parte da saga de Yoknapatawpha, que evidencia as transformações sociais nesse espaço . Portanto, nessa ficção, podem ser exploradas as dimensões histórica, econômica e sociológica da sociedade, especialmente, as do sul dos Estados Unidos . Dessa forma, os conceitos de subjetividade, tempo, memória, espaço e história serão construídos a partir de olha-res distintos, pois distintos são os sujeitos, docente e discentes, envolvidos nesse processo de aprendizagem .

No terceiro capítulo, Os sete saberes na sala de aula: ressig-nificando práticas pedagógicas, as autoras Valéria Rosa da Silva e Carla Conti de Freitas apresentam e discutem propostas de práticas pedagógicas inspiradas nos Sete Saberes Necessários à Educação . Recorrendo às variadas linguagens, as autoras apre-sentam o referencial teórico que subjaz às práticas pedagógicas apresentadas, defendendo que considerar os sete saberes no cotidiano da sala de aula possibilita o questionamento de práti-cas institucionalmente consolidadas . As autoras ressaltam, ainda, que a sala de aula deve ser um espaço que promove a conjugação da cultura científica com a cultura humanística, por meio da religação dos saberes .

O professor João Henrique Suanno traz no capítulo IV, intitulado Emoção, Cognição e Corporeidade: os sete saberes necessários à educação do futuro na sala de aula do presente,

9Apresentação

uma aproximação à prática pedagógica dos Sete Saberes Neces-sários à Educação do Futuro, apresentados por Edgar Morin, com propostas de ações que seguem essa temática para com alunos e também com toda a equipe pedagógica da escola, que podem ser realizadas em um encontro pedagógico de planeja-mento, por exemplo . As ações propostas visam o trabalho dos três aspectos título do capítulo: a emoção, a cognição e a corpo-reidade . O objetivo é, então, contribuir para que o professor possa se sentir mais tranquilo para elaborar suas próprias estratégias de ação a partir do que vai encontrar no texto, sabendo que cada um, nesse caso o professor, tem o seu jeito de fazer acontecer a magia do ensino e da aprendizagem .

O capítulo Educação e Diversidade: uma relação de alteri-dade nas práticas escolares aborda a necessidade de ressignifi-cação das práticas educacionais, que ainda são orientadas por um pensamento padronizador, homogeneizador e monocultu-ral . As autoras, Marlene Reis e Cristiane Rosa Lopes, apontam a diversidade e o exercício da alteridade como eixos centrais na construção de um novo paradigma educacional, que venha favorecer a formação de sujeitos capazes de dialogar com as diversidades que caracterizam o ser humano nas suas diferen-tes dimensões . Neste sentido, discutem a interdisciplinaridade e a transdisciplinaridade como perspectivas epistemológicas e metodológicas indispensáveis para a construção desse novo paradigma educacional, que deve proporcionar interações criativas, solidárias e éticas entre as diferenças presentes nos contextos escolares .

Inovação e criatividade no campo da docência: desafios e possibilidades de ruptura com o paradigma tradicional, das autoras Lindalva Pessoni Santos e Cláudia do Nascimento,


apresenta reflexões acerca dos fundamentos teórico-práticos da inovação e da criatividade vivenciada por essa turma . A proposta do curso foi de religar as diferentes dimensões da vida e as diferentes dimensões constitutivas do ser humano que foram fragmentadas pelo paradigma tradicional . Contra-pondo a essa lógica, o que se analisou no eixo Relato de expe-riências educacionais contemporâneas foi a possibilidade de elaborar práticas educativas que rompam com este paradigma por meio dos fundamentos teórico-práticos da criatividade e da inovação .

O capítulo Cine Formação: transdisciplinaridade e inter-disciplinaridade na relação entre cinema e educação descreve as contribuições do eixo Cine Formação para alunos do curso e para a comunidade . Apresenta, ainda, uma discussão sobre transdisciplinaridade e interdisciplinaridade na educação; um conceito de cinema como “sétima arte”; análises fílmicas, bem como possíveis procedimentos para a realização destas; e, contribuições do cinema para a formação acadêmica, profissional e pessoal .

O capítulo Um diálogo transdisciplinar entre a pedagogia e a geografia sobre a formação de educadores ambientais, de Lívia Costa Andrade, busca esclarecer sobre a necessidade cada vez mais iminente sobre a formação de educadores ambientais conscientes e bem preparados didaticamente para contribuir com o rompimento deste paradigma separatista em que se encontra imersa nossa sociedade contemporânea . Não há mais como adiar a tão sonhada transformação planetária, almejada por todos nós, mas para tanto, há que se ter uma ação efetiva que possibilite tal mudança . Dessa forma, é estabelecido aqui, um diálogo entre pesquisadores das áreas da Geografia e da

11Apresentação

Pedagogia, sob uma ótica transdisciplinar, buscando uma arti-culação de ideias e propostas de efetivação para que estes educadores possam ter bases sólidas em sua formação acadê-mica, visando conscientização e ação, para que em suas profis-sões, tornem-se agentes de transformação educacional e consequentemente social . Esta é uma proposta pautada trajetó-ria profissional e acadêmica da autora, que almeja trazer uma contribuição à inserção da transdisciplinaridade nas Institui-ções de Ensino Superior .

Ana Paula da Costa Oliveira e Abadia de Lourdes da Cunha, no capítulo A sustentabilidade e a política nacional de resíduos sólidos, sugerem que nos dias atuais a palavra “Susten-tabilidade” faz parte do nosso cotidiano, seja em noticiários, em bate papo com amigos, nas escolas . E questionam: Mas, afinal de contas, o que é sustentabilidade? O que significa na prática a sustentabilidade? A preocupação com o desenvolvi-mento sustentável em consonância com o cumprimento das normativas legais representam a possibilidade de garantir mudanças no cidadão e a formação de uma consciência ambiental que fundamenta-se na nova ética ecológica, em que um sujeito bem informado e consciente, torna-se exemplo para aqueles que ainda não desenvolveram essa atitude .

Em Ressignificando os paradigmas da Educação Física, Maria Cristina de Freitas Bonetti e Poliana Cristina da Silva discutem a prática do docente da Educação Física que foi o prin-cipal foco de interesse para propor práticas educativas transdis-ciplinares . O estudo das autoras visa analisar, principalmente, o que diz respeito à cultura corporal de movimento, em seus aspectos do desenvolvimento motor, cognitivo e afetivo, aliados à arte da cultura popular e demonstrar a importância de desen-


volver práticas corporais diversificadas, abrangendo diferentes habilidades e as mesmas devem estar em consonância com as teorias da Complexidade e da Transdisciplinaridade .

No capítulo Aspectos inovativos do curso de pós-gradua-ção Lato Sensu em Transdisciplinaridade e Interdisciplinari-dade na Educação e suas contribuições para a formação, Carla Conti de Freitas, Patricia Maria Ferreira e Valéria Rosa da Silva apresentam o que consideram como aspectos inovativos do curso, destacando a inter-relação entre as atividades suge-ridas . Para isso, trazem os relatos dos alunos construídos após experiências oferecidas pelo curso por meio de seus eixos, possibilitando uma reflexão acerca da contribuição do curso tanto para a criação e disseminação de conhecimento quanto para formação transdisciplinar dos professores, desta-cando a necessidade de a universidade se reinventar em propostas simples, porém inovadoras .

Esta obra marca o encerramento da primeira turma do curso de pós-graduação Lato Sensu em Transdisciplinaridade e Interdisciplinaridade na Educação e abre outras possibilida-des, entre elas a de tornar público o trabalho realizado e a de contribuir com estudos sobre complexidade e transdisciplina-ridade na educação .

Carla Conti de Freitas

Prefácio

A transdisciplinaridade e complexidade são necessida-des do tempo atual, que é de reaproximação de aspec-tos parciais, tanto do pensamento filosófico, quanto

das teorias da mente e da ciência como um todo . Esse objetivo contemporâneo está associado ao rompimento com as visões simplificadoras, que, por séculos, dividiram o conhecimento em partes, seguindo uma estrutura que separa razão e emoção, corpo e alma, negando a dualidade das coisas . A dualidade é a propriedade ou caráter duplo dos fenômenos que contém em si duas naturezas opostas que são dimensões da mesma reali-dade, seu caráter duplo contém em si duas naturezas opostas, mas na realidade inseparáveis .

Na superação dessa lógica que separa os opostos e onde não cabem o isso e o aquilo, razão e emoção é que se apresenta a obra “Razão sensível e complexidade na formação de professores: desa-fios transdisciplinares”, organizada por Marilza Vanessa Rosa Suanno e Carla Conti de Freitas . Não se trata apenas de um projeto editorial, mas de uma obra que resulta do diálogo entre professores do Programa de Pós-Graduação Lato Sensu Transdisciplinaridade e Interdisciplinaridade na Educação, da Universidade Estadual de Goiás – UEG/Câmpus Inhumas, na construção de uma proposta orientada por uma razão sensível . Nela, os autores assumem que a


transdisciplinaridade, em sua multidimensionalidade, deve buscar construir processos de ensino e de aprendizagem, que tenham como ponto de partida o sujeito e a articulação deste com uma formação conceitual, afetiva, humana que seja crítica e reflexiva .

A formação de professores alicerçada em um paradigma da complexidade da transdisciplinar traz como desafio superar a fragmentação dos saberes e enfrentar as ambiguidades e contradições que nos condicionaram a pensar de forma disci-plinar e desconectada da situação presente, existencial e concreta da realidade . Em questão está uma mudança atitudi-nal e epistemológica, pois mudar um determinado conceito exige, por sua vez, mudanças de outros correlacionados, dando lugar a uma rede de conceitos (sistema) .

Reconhecemos que não se trata de questão fácil, o próprio Edgar Morin ao se referir a Complexidade afirma que “no primeiro momento ela chega como um nevoeiro, como confu-são, como incerteza ( . . .) . Ela é obstáculo, ela é desafio . Depois quando avançamos pelas avenidas da complexidade, percebe-mos que existem dois núcleos ligados, um núcleo empírico e um núcleo lógico . O núcleo empírico contém de um lado as desordens e as eventualidades e de outro lado as complicações e confusões, as multiplicações proliferantes . O núcleo lógico, sob um aspecto, é formado pelas contradições que devemos necessariamente enfrentar e, no outro, pelas indecidibilidades inerentes a lógica” . (2008, p . 188) .

Após dizer que lidar com a complexidade não é fácil, Morin antecipa dois imperativos complementares no desafio da comple-xidade: (a) o uso estratégico – artístico da dialógica e (b) o de pensar de forma organizacional, relacional, entendendo que o pensamento complexo é extremamente elaborado e que percorre

15Prefácio

avenidas apontadas com rigor . Esse pensar organizacional deve incluir a relação auto-eco-organizadora, ou seja, a relação intima com o meio ambiente, a relação parte-todo e o princípio de recursividade . O autor afirma que um salto na direção do pensa-mento Complexo será capaz de promover mudanças nas rela-ções humanas e um grande salto civilizacional e histórico .

No âmbito da escola e da formação de professores, assu-mir a complexidade implica romper com o paradigma reducio-nista, fragmentário, mas isso não significa o abandono das disciplinas, ou que se abandonem os processos de ensino e de aprendizagem por meio da assimilação consciente e crítica dos conteúdos historicamente acumulados . O que é imperativo sob o paradigma da complexidade é que os contextos educativos busquem dialogar sobre os conteúdos, os saberes, os conheci-mentos de forma articulada, com rigor científico e organiza-cional, a fim de possibilitar a ampliação da consciência e uma nova percepção da realidade .

A presente obra se apresenta como uma excelente referên-cia para pensar essas questões . Boa Leitura!

Ana Cristina Souza dos SantosProfessora e Pesquisadora da Universidade Federal

Rural do Rio de Janeiro – UFRRJ Coordenadora do Programa de Pós-graduação em Educação

em Ciências e Matemática/UFRRJProfessora no Programa de Pós-graduação em Educação Agrícola/UFRRJ

Fundadora do LEPTRANS – Laboratório de Estudos e Pesquisas Transdisciplinares

MORIN, Edgar . Ciência com consciência . 11a ed . Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2008 .

PESqUISA DE NATUREzA COMPLExA E TRANSDISCIPLINAR NA

FORMAçãO DE PROFESSORES

Marilza Vanessa Rosa SuannoYara Fonseca de Oliveira e Silva

As pontuações que compõem esse capítulo visam clarear a construção do conhecimento do Programa de Pós-Graduação “Transdisciplinaridade e Interdisciplinari-

dade na Educação”, realizado na Universidade Estadual de Goiás (UEG), Câmpus Inhumas . Esse Curso de Pós-Graduação Lato Sensu realizado pela UEG faz parte da pós-graduação Lato-Sensu, lugar institucional e prioritário de pesquisa, portanto, conside-rado referência de compromisso do conhecimento na formação continuada do professor e, ainda lugar em que se consolida o papel da ciência, do ensino e da pesquisa na universidade .

Dessa forma, esse estudo conta a proposta das professoras-autoras desse curso que lecionaram o eixo temático “Pesquisa em educação na perspectiva da Complexidade e da Transdisci-plinaridade” e optaram por orientar os pós-graduandos(as) para que na elaboração do Trabalho de Conclusão de Curso – TCC, em formato de artigo científico, contempla-se o sujeito, subjetividade, história de vida, os motivos, os interesses, os desejos e as intencionalidades da pesquisa do TCC .

1


As leituras e reflexões realizadas durante esse curso trata-ram de apresentar a Complexidade (MORIN, 2008) e a relação entre sujeito-objeto/fenômeno, para os acadêmicos de diversas áreas de conhecimento (pedagogos, licenciados, psicólogos, matemáticos, músicos, administradores, fisioterapeutas e outros) . O intuito era propiciar formação continuada para o exercício da docência seja para atuação na educação básica ou na educação superior .

Para tanto, seu corpo docente propôs, a partir de orienta-ções coletivas, uma forma de acompanhar a construção do conhecimento com base na escrita narrativa, como prática de investigação-formação, por entender que essa escrita conforme Souza (2006, p . 135) “potencializa no sujeito o contato de sua singularidade e o mergulho interior do conhecimento de si”, e com isso poderia remeter o acadêmico a ancorar sua produção de conhecimento nos recursos experienciais produzidos no decorrer de sua vida, de sua formação, a partir de suas marcas acumuladas para potencializar a sua formação continuada . Com isso, cada professor-orientador se colocou à disposição de um aluno para acompanhar e contribuir com o desenvolvi-mento do trabalho coletivo .

A proposta desse capítulo é sinalizar aos acadêmicos algu-mas formas de pensar a preparação e elaboração do documento que retrate uma pesquisa de natureza complexa e transdiscipli-nar, a qual valoriza a subjetividade, a abordagem qualitativa e a complexidade do ser humano e da realidade (PAUL, 2013; SUANNO, 2015) .

O estudo é de cunho bibliográfico e tem como base a pesquisa qualitativa complexa e transdisciplinar na educação que valoriza a reintrodução do sujeito, sua subjetividade e a

19Pesquisa de natureza complexa e transdisciplinar

ampliação da consciência do pesquisador sobre si, sobre a educação e sobre o trabalho docente .

O documento se compõe de duas partes, além dessa intro-dução e das conclusões provisórias . A primeira parte expõe uma breve revisão de literatura acerca da construção de conhe-cimento e ao mostrar a evolução do conhecimento científico, especificamente o das ciências humanas revela que em seu desenvolvimento novas e diferentes visões paradigmáticas são construídas para perceber o sujeito e a realidade da sua época, de seus contextos socioculturais, político e econômico . A segunda parte apresenta as reflexões da experiência desenvol-vida na disciplina em questão com o objetivo de mostrar a importância da pesquisa, da construção do conhecimento na evolução do acadêmico no sentido de se tornar protagonista de seu processo de aprendizagem .

1.1 O Método antimétodo da Complexidade e a reintrodução do sujeito: reflexões sobre a pesquisa complexa e transdisciplinar

Essa seção trata de apresentar a perspectiva da pesquisa complexa e transdisciplinar que busca perceber e compreender o fenômeno investigado em sua dinâmica e interatividade, para tal o pesquisador poderá vir a utilizar-se de múltiplas estraté-gias de pesquisa, múltiplos instrumentos de coleta de informa-ções e em etapas complementares na tentativa de apreender as diversas dimensões do fenômeno e estabelecer a relação entre as partes e o todo, relações multidimensionais, multirreferenciais e autorreferenciais .


O desafio posto aos pós-graduandos para a construção do conhecimento em seu TCC a partir da Epistemologia da Complexidade precisaria em primeiro momento que o acadê-mico partisse da compreensão tida nas aulas, durante o curso, que a complexidade valoriza a pluralidade de perspectiva e sua potencial possibilidade de religação e complemetaridade .

Em seguida o acadêmico para essa construção importaria a compreensão dos diferentes paradigmas existentes no campo educacacional, sejam de inspiração positivista, subjetivista e dialética, a fim de discutir a relação sujeito-objeto . Assim, dissemos que estamos diante de uma crise de paradigmas e, ainda que essa discussão de diferentes paradigmas não chegasse a um consenso e esteja longe de terminar, seria possível acor-dar que, conforme aponta Boaventura Santos (1989) chegamos ao fim de um ciclo de hegemonia da ordem científica e não se busca uma ciência unificada, mas um conjunto de galerias temáticas, base de um conhecimento transdisciplinar .

Ao compreender a existência das diversas perspectivas epistemológicas do campo educacional, em que se fazem presentes diferentes paradigmas, que consequentemente reflete uma visão de sociedade e de educação . Seria possível iniciar o trabalho escrito e, para isso, importa retomar e refle-tir sobre os conteúdos discutidos nas diferentes disciplinas para encaminhar sua construção, identificar o seu objeto de estudo e a sua curiosidade, seu problema para em seguida adotar uma perspectiva que lhe daria sustentação teórica para a criação do seu conhecimento .

O momento posterior surgia pós essa compreensão, em que os acadêmicos desenvolveriam suas pesquisas a partir de uma postura consciente que a fragmentação do conhecimento feito


na escola e ou sala de aula não atende mais às necessidades da sociedade atual . O que significou dizer que a educação já não suporta mais calcar sua pesquisa com base na ciência moderna, a partir do paradigma tradicional (cartesiano) em que prevale-ceu a lógica, a racionalidade que propunha a decomposição do pensamento em partes e que refletiu no campo educacional em um modelo de ensino que entendeu o conhecimento como linear, sequencial e, assim, fragmentou a visão do objetivo e subjetivo se fazendo simplificador, pois reduziu o todo às partes para melhor compreendê-lo (PIETROBON, 2006) .

Diante disso a proposta do curso era que o TCC, o conhe-cimento do acadêmico fosse construído a partir da pesquisa complexa e transdisciplinar que não guia-se pelo método, em sentido cartesiano, mas guia-se pelo “Método in vivo” (MORIN, 1998), ou seja, o “Método antimétodo da Complexidade” (SUANNO, 2015) um caminho a ser criado pelo pesquisador ao problematizar o fenômeno investigado no processo de pesquisa, envolto em incertezas e pelos limites de suas possibi-lidades de tradução da realidade por meio,

O “Método in vivo” (MORIN, 1998) caracteriza-se por ser multidimensional, multirreferencial e autorreferen-cial tendo emergido a partir da atitude investigativa de se privilegiar múltiplos procedimentos e abordagens [ . . .] que favoreceram a emergência dos dados e das informações que me permitiram apreender [o fenô-meno investigado], sob diversas dimensões, como aprendi com Morin (1998) ao descrever sua pesquisa, realizada no ano de 1965, em Plozévet/Finisterra (SUANNO, 2015, p . 50) .


Diante da proposta de apreender o fenômeno investigado sob diversas dimensões a questão que surge sempre para o acadêmico nesse momento é, mas como fazer, por qual cami-nho desenvolver para chegar ao fim desse TCC? Uma possível resposta seria que a escolha do método depende da sua teoria que explica o seu problema e que se encontra em uma determi-nada realidade, contexto e situação .

Para tanto, ofereceu-se dentre os diversos estudiosos e suas teorias as reflexões e orientações de Edgar Morin em torno do método, da relação complexa entre sujeito e objeto/fenômeno e dos princípios operadores1 do pensamento complexo na pesquisa . Assim, o pesquisador ao buscar promover em si a reforma do pensamento pode vir a se inspirar e criar sua estratégia de pesquisa a partir do Método antimétodo da Complexidade (SUANNO, 2015) . E talvez, ao guiar-se pelo seu problema inves-tigativo possa buscar pensar complexo, vivenciando uma ação perceptivamente guiada2 na ecologia da ação. Uma estratégia de

1 Morin (2005) propõe como operadores do pensamento os princípios: a) princípio sistêmico-organizacional, b) princípio hologramático, c) princípio retroativo, d) princípio recursivo, e) princípio dialógico, f) princípio auto--eco-organizador ou autoprodução e g) princípio da reintrodução do sujeito cognoscente no processo de construção do conhecimento . Moraes e Valente (2008, p . 9-10) propõem mais três princípios: a) princípio ecológico da ação, b) princípio da enação e c) princípio ético .

2 Para Moraes (2007, p . 34) apoiada em Varela, Thompson e Rosch (1997) “pode-mos também afirmar que a ação docente é sempre uma ação perceptivamente guiada, isto é, algo que se desenvolve, a cada instante, a partir do que acontece nas estruturas sensório-motoras do sujeito vivente, a partir de sua percepção e capacidades construídas a todo instante, de acordo com o que acontece no ambiente de aprendizagem . Assim, o saber docente, embora dependente das estruturas internas do sujeito aprendente, não pode estar separado do que acontece no ambiente e do sabor de cada experiência desenvolvida, pois es-tão acoplados em termos de energia, matéria e informação que circulam no ambiente . Esta compreensão facilita o nosso entendimento de que o SABER e o FAZER DOCENTES, “com sabor”, acontecem a partir de processos em


pesquisa criativa e de adaptação permanente (MORIN, 1998) pautada no rigor científico e não na rigidez do método carte-siano; pois não visar construir verdades, mas conclusões provi-sórias e abertas . Dito de outro modo:

A complexidade não tem metodologia, mas pode ter seu método [ . . .] O método complexo pede para pensar-mos nos conceitos, sem nunca dá-los por concluídos, para quebrarmos as esferas fechadas, para restabelecer-mos as articulações entre o que foi separado, para tentarmos compreender a multidimensionalidade, para nunca esquecermos as totalidades integradoras . É a concentração na direção do saber total, e, ao mesmo tempo, é a consciência antagônica e, como disse Adorno, “a totalidade é a não verdade” . A totalidade é, ao mesmo tempo, verdade e não verdade, e a complexi-dade é isso: a junção de conceitos que lutam entre si (MORIN, 2008b, p . 192) .

situações de co-deriva natural (MATURANA; VARELA, 1995) . Tais situações têm muito mais a ver com processos de abertura e com um devir não previsto anteriormente, do que com um processo de natureza fechada e predetermina-da . A atuação docente está muito mais próxima de um fluir em uma rede de configurações auto-eco-reguladoras, do que de um processo de ajuste a uma realidade educacional prévia, fixa e predeterminada . Desta forma, o saber do-cente é parte integrante de um mundo que existe em comunhão e que é, ao mesmo tempo, aparentemente estável e mutante . Um mundo onde o docente e o ambiente de aprendizagem estão verdadeiramente co-implicados . Conse-quentemente, docente e discente evoluem juntos, revelando assim que o meu saber docente também evolui em comunhão com o saber e o sabor experien-cial discente, vivenciando uma relação de interdependência docente/discente . Assim, a evolução do meu ser docente é sempre um processo em co-evolução, no qual eu só me realizo como tal na vivência experiencial com os meus alu-nos . Portanto, independente do nível em que ocorra e das pessoas envolvidas, nossa evolução, como profissionais da educação, nunca acontece de maneira individual, mas, sim, coletiva” .


A pesquisa complexa e transdisciplinar pode integrar e articular diferentes metodologias de pesquisa na produção do conhecimento, pois:

A transdisciplinaridade valoriza a abertura e a potencial integração de metodologias de pesquisa na produção do conhecimento, que permitam ampliar o olhar e a percep-ção do pesquisador e do pesquisado, bem como a apreen-são das relações entre saberes disciplinares, saberes não disciplinares, objetividades e subjetividades, ao investi-gar um fenômeno . A pesquisa transdisciplinar tem a particularidade de colocar em diálogo as contradições, as epistemologias, os métodos, as metodologias de pesquisa, o que gera dificuldades e desafios, que impulsionam o pensar complexo, no sentido de promover ligação, seja entre: objetos disciplinares; abordagens objetivas e subjetivas; saberes acadêmicos e saberes não acadêmi-cos; métodos quantitativos e qualitativos; perspectivas consciente e inconsciente (SUANNO, 2015, p . 53)

Na perspectiva complexa e transdisciplinar a metodologia de pesquisa é compreendida como uma estratégia na busca pela compreensão da complexidade do fenômeno (SUANNO, 2015), ou seja, “a estratégia é a arte de utilizar as informações que aparecem na ação, de integrá-las, de formulá-las, de formular esquemas de ação e de estar apto para reunir o máximo de certezas para enfrentar as incertezas” (MORIN, 2008b, p . 192) .

A pesquisa de natureza complexa e transdisciplinar valo-riza a investigação de temas pertinentes e fundamentais para a humanidade e significativos para o pesquisador, assim pode guiar-se por:


princípios de uma Sociologia do Presente (MORIN, 1998), centrada no fenômeno investigado, no estudo das realidades presentes, no mundo atual, nas crises do presente, nos processos e nas relações que emergem, bem como no acoplamento de conhecimentos e saberes em rede, podendo, potencialmente, ligar saberes acadê-mico-científicos aos saberes da tradição, ou saberes não acadêmicos3 (SUANNO, 2015, p . 51)

Almeja-se que o pesquisador ao pesquisar, na perspectiva complexa e transdisciplinar, amplie sua consciência sobre o fenô-meno pesquisado e simultaneamente modifique seu modo de pensar, de perceber, de compreender e de sentir a teia de questões implicadas na pesquisa . E que ao viver esse processo de pesquisa possa quem sabe ampliar os seus níveis de consciência e os seus níveis de percepção sobre os níveis de realidade.

O acadêmico pesquisador em sua relação com o fenômeno pesquisado é um protagonista implicado que cria o caminho investigativo ao investigar, e não controla o caminho a priori com definições fixas de método e metodologias, mas planeja metodologicamente a pesquisa, mantendo-se aberto para

3 Saberes e conhecimentos não acadêmicos são saberes da tradição, saberes cul-turais, artísticos, experienciais, saberes territoriais, saberes de movimentos so-ciais, ONGs, trabalhadores, cooperativas, governo, dentre outros . De acordo com Sommerman (2012, p . 141) uma das características, que distinguem a in-terdisciplinaridade da transdisciplinaridade é “a não presença de conhecimen-tos não-acadêmicos na interdisciplinaridade” e “a presença de conhecimentos não-acadêmicos” na transdisciplinaridade . Sommerman (2012) constata que a interdisciplinaridade e a transdisciplinaridade operam articulações entre sa-beres acadêmicos e conhecimentos não-acadêmicos, mesmo que as finalidades do pensamento e saberes acadêmicos ocidentais atuais não valorizem o pensam-ento mitológico, filosófico e teológico, estes continuam fazendo parte das finali-dades do conhecimento humano de maneira mais geral .


então, viver a aventura que o caminho, as percepções, os ines-perados lhe apresentar . Pauta-se nos conhecimentos científicos e disciplinares, mas também, valoriza o diálogo entre os conhe-cimentos das diferentes disciplinas e áreas do conhecimento, associando se necessário para compreender o problema inves-tigativo, bem como religa e ecologiza saberes científicos, sabe-res das tradições, saberes estéticos e saberes tácitos . Para Paul (2013, p . 187) “a metodologia transdisciplinar será pertinente quando houver a exigência de ligar os saberes acadêmico-cien-tíficos aos saberes não acadêmicos, tradicionais, religiosos, experienciais, autoformativos e ecoformativos” .

Esta perspectiva refuta a divisão cartesiana entre sujeito e objeto, rompe com as dicotomias, fragmentações e linearida-des ao valorizar o sujeito, o conhecimento do sujeito, os proces-sos cotidianos vividos pelo sujeito na produção de si, na produ-ção de conhecimentos científicos e de conhecimentos tácitos considerando o mais alto grau de liberdade, autonomia e autenticidade, amparados nos princípios da transdisciplinari-dade, que são: rigor científico, abertura e tolerância/respeito .

A metodologia de pesquisa, criada pelo pesquisador, deve ser uma elaboração decorrente da associação entre o nível de percepção e de lógica do discurso do pesquisador . Para Paul (2013) o ‘nível de realidade’ do fenômeno é fruto da articulação entre nível de percepção e tipo de pensamento do sujeito .


1.2 Pesquisa guiada pelo sujeito e pelo seu problema investigativo

Para Suanno (2015) apresenta-se como pertinente que a pesquisa possa se guiar pela questão problema, pela pergunta que expresse a busca do pesquisador no processo de compreen-são do fenômeno investigado . Assim, o método e a metodolo-gia são construídos pelo pesquisador a partir do problema investigativo (AMADO, 2013) com liberdade, autonomia, auto-ria e autenticidade . E por considerar a subjetividade, a aborda-gem qualitativa e a complexidade é que a pesquisa transdisci-plinar e complexa valoriza e considera na pesquisa a história de vida e a auto-ecoformação .

De acordo com Suanno (2015) em uma pesquisa complexa e transdisciplinar apresenta-se como uma estratégia pertinente guiar-se pela problematização4, ou seja, elaborar a metodologia da pesquisa a partir do problema investigativo, do modo de pensar, perceber e viver o processo investigativo inspirado na Epistemologia da Complexidade e nos princípios da Transdisciplinaridade .

O pesquisador quando guia sua pesquisa pela pergunta/questão problema aponta para uma abertura investigativa (AMADO, 2013), pois se coloca na busca pela compreensão do fenômeno pesquisado, por meio do problema investigativo, ao invés de valer-se do método cientifico (materialismo histórico dialético; fenomenologia; complexidade) e seus princípios de regulação da relação sujeito/objeto em defesa de territórios

4 Guiar-se pela pergunta, pelas questões problema da pesquisa, pelo problema investigativo .


disciplinares, epistemológicos e metódicos . Amado (2013, p . 67) considera que a pesquisa ao dirigir-se pela pergunta, aponta para uma abertura investigativa, mais centrada nos problemas e na tentativa de resolvê-los, do que em defesa de territórios disciplinares . Suanno (2015) valoriza as reflexões de Amado (2013) e de Casanova e Berliner (1997, p . 57):

a investigação educativa parece estar mais forte, porém não necessariamente mais sã . Mais forte, porque os investigadores aprenderam a começar não com um método, mas com uma pergunta . E a questão/pergunta/problema investigativo pode ser respondida utilizando perspectivas múltiplas, cada uma delas proporcio-nando diferentes tipos de compreensão (CASANOVA e BERLINER, 1997, p . 57) .

Ao guiar-se pelo problema investigativo o pesquisador pode se deparar com múltiplas referências e múltiplas dimen-sões e categorias de análise que podem ser tecidas juntas para pensar e compreender o fenômeno investigado .

Assim, colocar em diálogo diferentes compreensões, pela diferença, pela contradição, pela distinção da angu-lação do olhar investigativo pode suscitar um movi-mento, de complementaridade de conhecimento ou, de coexistência de percepções, o que amplia as interpreta-ções e as relações na pesquisa, na produção do conheci-mento, na leitura e consciência de mundo . Cunha (2000), ao propor o ensino como pesquisa, em processos forma-tivos, argumenta que “as respostas não importam tanto quanto as perguntas e ambas são sempre múltiplas” . Moraes (2008, p . 161), baseada em Bonill e Calaffel


(2007), propõe perguntas mediadoras e destaca que uma pergunta bem elaborada possibilita dinamicidade, dialo-gia, contextualização, recursividade, processos de auto-organização, emergência e autonomia . Assim, pesqui-sar e apreender, por meio de perguntas mediadoras, demandam a elaboração de questões que levem à aber-tura, a um modo de pensar e sentipensar imbricado em razão, emoção, imaginação, corporeidade e intuição, com sensibilidade e criatividade, capaz de auxiliar na ampliação da consciência de si, do mundo e do conheci-mento (SUANNO, 2015, p . 55)

Suanno (2015) analisa que para Amado (2013) o para-digma emergente, o paradigma da complexidade, seja uma terceira via para a investigação em educação, uma opção frente à oposição e guerra de paradigmas nesta área do conhe-cimento . O autor considera, também, que colocar a pergunta no centro da investigação é esperar que as respostas não sejam simples e nem imediatas . No entanto, este tipo de pesquisa, pautada no paradigma emergente, na complexidade e na transdisciplinaridade, coloca-se a serviço do aperfeiçoamento da condição humana, em cooperação com outras pessoas, outros projetos científicos e projetos de outros territórios (culturais, locais, planetários) . E que as respostas, destas pesquisas, serão marcadas pelas incertezas inerentes à complexidade do fenômeno educativo, que demanda uma racionalidade complexa .


1.3 Emergem experiências em Programa de Pós-Graduação com pesquisas autobiográficas, narrativas e memoriais de formação: em busca da reintrodução do sujeito, da subjetividade e do sentido perdido.

Essa seção mostra a estrutura do curso em questão e a importância de TCC a partir da autobiografia . A proposta durante as aulas tinha o objetivo de sinalizar essa abordagem metodológica (histórias de vida), mesmo ouvindo e viven-ciando as dificuldades dessa escrita pelo acadêmico, pois lidar com a sua subjetividade, escrever sobre o resgate de sua vida escolar e refletir sobre os acontecimentos era algo complicador para a maioria . E agora . . . diversas perguntas diante do papel e da necessidade de escrever assolavam os acadêmicos .

As questões discutidas em sala de aula entre professoras e acadêmicos permearam indagações como: seria correto escrever de acordo com essa proposta e as exigências da cientificidade, da tradição acadêmica? Como pesquisar e elaborar a escrita do TCC pela via da complexidade? Como mostrar a potencialidade de um TCC a partir da escrita (auto) biográfica?

As respostas buscavam mostrar a potencialidade e a ferti-lidade de realiar pesquisa a partir dessa metodologia . Pois, a escrita deveria partir do individual para chegar ao social, às questões de interesse de investigação relacionadas à educação escolar ou que contemple a atuação do professor alcança o que destaca Finger (1988), a construção da biografia educativa provocaria a tomada de consciência que poderia ser emancipa-dora para o acadêmico .

O sentido dessa escrita na perspectiva do acadêmico seria considerada fértil a medida que o acadêmico poderia ter cons-


ciência das suas questões latentes e ao fazer esse exercício toma-ria consciência e poderia atribuir sentido a sua prática pedagó-gica e ou sua relação com a profissão de professor . Assim, a partir da história de vida profissional ou acadêmica do pós-graduando seria possível articular ao seu tema de estudo .

Outra potencialidade do uso das histórias de vida na formação continuada é o fato de trazer “da periferia para o centro a pessoa do professor e sua experiência profissional, acompanhando o movimento de retorno do sujeito nas pesqui-sas em ciências humanas” (PASSEGI, 2006, p . 204), com isso, os pós-graduandos poderiam compreender “o processo de conhecimento e de aprendizagem que estão implicados nas suas experiências ao longo da vida” (SOUZA, 2006) .

A proposta de estimular a construção das histórias de vida dos acadêmicos e provocar a reflexão de suas experiências possibilitaria no decorrer do processo de orientação, na maio-ria dos acadêmicos, uma nova forma de pensar e sentir a sua própria prática pedagógica e ou sua formação de profissional da educação .

Outra motivação que explicava o sentido da escrita de um documento pessoal era a possibilidade do acadêmico mostrar como se constituía a subjetividade instaurada em cada um desse (futuros) profissionais, de resgatar as experiências educa-tivas formais e não formais, de enriquecer a prática pedagógica desse acadêmico, possibilitando a reflexão e a reelaboração da síntese de conhecimento construído no decorrer da trajetória do sujeito e, portanto, do profissional . Conforme afirma Souza (2006, p . 136) as “biografias educativas permitem adentrar num campo subjetivo e concreto, através do texto narrativo, das representações de professores sobre as relações ensino


aprendizagem, sobre a identidade profissional, os ciclos de vida”, assim, o pós-graduando poderia entender os sentidos da sua atuação no contexto escolar .

Diante da potencialidade de produzir pesquisa nessa pers-pectiva de autobiografias e tendo condições de elaborar um fértil TCC o convite foi lançado aos acadêmicos . Tendo como proposta resgatar a prática pedagógica e apresentar o valor e o significado dessas para a formação continuada do professor, por acreditar que as histórias de vida possam acrescer e contri-buir com a formação e a prática pedagógica do professor . Pois, entende-se que a produção de conhecimento de cada um dos pós-graduandos a partir de suas vivências possibilitaria o desenvolvimento de uma docência que de fato contribuísse com a formação continuada de professores da educação pública goiana no sentido de avançar para uma prática mais integra-dora e menos fragmentada e reducionista .

1.4 Sobre o Curso de Pós-Graduação Lato Sensu Transdisciplinaridade e Interdisciplinaridade na Educação e o Trabalho de Conclusão de Curso – TCC com abordagem de história de vida em formação

O Curso de Pós-Graduação Lato Sensu Transdisciplinari-dade e Interdisciplinaridade na Educação da UEG/Câmpus Inhumas (SUANNO, et al., 2014) tem por objetivos gerais: a) compreender e analisar a educação a partir dos princípios e das reflexões ontológicas, epistemológicas e metodológicas da Complexidade, da Transdisciplinaridade e da Interdisciplinari-dade; b) potencializar a construção de práxis transformadoras, nos diferentes níveis de escolarização . E por objetivos específi-


cos: a) vivenciar processos reflexivos e dialógicos de construção conceitual; de relação entre teoria, prática e percepção do sujeito sobre: paradigma educacional emergente; Complexidade; pensa-mento complexo; Interdisciplinaridade; Transdisciplinaridade; auto-hetero-ecoformação; docência transdisciplinar; didática transdisciplinar; formação cultural e estética; b) viabilizar novos caminhos para a criação, realização e avaliação de práticas peda-gógicas integradoras vinculadas à dinâmica complexa da vida, à complexa condição humana e aos problemas e crises de nosso tempo, elaborando, assim, propostas capazes de ressignificar o paradigma educacional vigente e concretizar princípios, meto-dologias e estratégias de docência transdisciplinar; c) analisar e produzir projetos educacionais de caráter interdisciplinar e transdisciplinar capazes de responder às necessidades humanas inscritas na dinâmica da vida (indivíduo/sociedade/natureza), bem como na multidimensionalidade do ser humano e no desenvolvimento da consciência e da ciência .

O projeto de curso se justifica pela necessidade de: a) compreensão e vivência do paradigma educacional emergente; b) transformação da realidade educacional por meio de proces-sos de formação de professores pautados na Complexidade, Transdisciplinaridade, Interdisciplinaridade e Ecoformação; b) criação de práxis que atendam às demandas sociais, individuais e culturais; c) fortalecimento das relações entre os professores universitários e os professores da educação básica da região .

O Curso emerge vinculado e em consonância com os Acordos de Adesão assinados entre Universidade Estadual de Goiás/UEG e a Universidade de Barcelona/UB, a saber Acordo de Adesão à Rede Internacional de Escolas Criativas – RIEC (13/06/2012), e Acordo de Adesão à Rede Internacional de


Ecologia dos Saberes – RIES (18/06/2012) coordenados pela Profa . Dra . Marilza Vanessa Rosa Suanno e pelo Prof . Dr . João Henrique Suanno .

O curso foi organizado em torno de eixos temáticos tendo articulado atividades de ensino-pesquisa-extensão, em pers-pectiva inter/transdisciplinar, a fim de viabilizar processos auto-hetero-ecoformativos (PINEAU, 2008) . Os eixos temáti-cos foram ministrados, de modo colaborativo, tendo dois professores (as) lecionando juntos em cada eixo temático, no intuito de ampliar os olhares, as percepções, os argumentos e as contribuições para pensar complexo sobre os temas em reflexão no curso .

As aulas foram espaço de diálogo, no formato de mesa de discussão, de metodologias ativas participativas, de análise de relatos de experiências, de estudo de textos teóricos, de rela-tos dos pós-graduandos sobre suas compreensões e suas práticas de ensino e pesquisa . Cada eixo temático tinha uma questão problematizadora que impulsionava as reflexões do eixo, bem como momentos de fruição e sensibilização esté-tica com reflexão literária e artística . Cada dia do curso iniciava com um momento de encontro, de troca de partilha, um café da manhã organizado por um rodízio de pequenos grupos de pós-graduandos (as) .

Compuseram os eixos temáticos do Curso de Pós-Gradua-ção (SUANNO, et al., 2014):

1. Paradigma moderno e Paradigma educacional emergente

2. Complexidade e Pensamento complexo


3. Currículo e organização do conhecimento em perspectiva transdisciplinar e interdisciplinar

4. Saberes necessários para a educação do presente e do futuro

5. Sujeito, subjetividade e pesquisa interdisciplinar/transdisciplinar

6. Docência Transdisciplinar 7. Educação e diversidade 8. Educação e sustentabilidade 9. Formação cultural e estética 10. Relato de experiências educacionais contemporâneas 11. Docência universitária 12. Pesquisa em educação na perspectiva da complexidade e

da transdisciplinaridade13. Cine formação

E cada um dos respectivos eixos temáticos tiveram, respectivamente, as seguintes questões problematizadoras:

1. O que caracteriza o paradigma emergente? Quais as rupturas com o paradigma moderno?

2. O que caracteriza a epistemologia da complexidade? E quais são os operadores cognitivos do pensamento complexo propostos por Edgar Morin e quais são seus movimentos?

3. O que é currículo e como este se organiza em perspectiva transdisciplinar e interdisciplinar?

4. Quais as bases transdisciplinares e interdisciplinares para pensar processos educativos e os saberes necessários para a educação do presente e do futuro?


5. Quais são perspectivas de pesquisa contemporâneas que promovem a reintrodução do sujeito cognoscente e assim valorizam o sujeito e sua subjetividade no conhecimento produzido?

6. O que caracteriza o trabalho docente transdisciplinar e interdisciplinar?

7. Como rever a educação a partir das reflexões da diversidade, do multi/interculturalismo e da ética do gênero humano?

8. Como recriar a vida privada e coletiva a partir da perspectiva transdisciplinar e sustentável?

9. Como potencializar a razão sensível na formação humana por meio da formação estética?

10.O que aprendemos com escolas que criam outras vias para a formação do humano? O que caracterizam os relatos de experiência estudados?

11. Como ressignificar e reorganizar o trabalho do professor universitário a partir das reflexões da transdisciplinaridade e da interdisciplinaridade?

12.O que caracteriza a ciência, a pesquisa e o conhecimento contemporâneo?

13.O que aprendemos com os documentários e filmes assistidos? Como é a experiência de dialogar sobre os documentários e filmes assistidos com a comunidade local?


Trabalho de Conclusão de Curso – TCC com abordagem de história de vida em formação

Nesta especialização a escrita científica complexa e trans-disciplinar depende do pós-graduando(a) pesquisador (a), ou seja, dos seus interesses e motivações, de seu nível de percep-ção, lógica, pensamento, bioantropologia, linguagem, cultura, estilo de escrita escolhido, relação com os fundamentos onto-lógicos, epistemológicos, metodológicos no processo de pesquisa ao buscar pensar complexo (multidimensional, multirreferencial, autorreferencial) e transdisciplinar o fenô-meno investigado .

Assim, o pesquisador pode lançar mão, caso desejem, de metodologias de pesquisa que considerem: narrativas, estudos auto(biográfico), memórias, memoriais, relatos biográficos, experiências de vida e de formação, narrativa de si, escrita de si, autointerpretação, relato biográfico, ensaio5, história de vida/formação/trabalho/pesquisa, dentre outros tipos de pesquisa que contribuam na tomada de consciência reflexiva sobre si, sobre seu trabalho, sobre sua formação e sobre suas práxis docente fruto da entre teoria, prática e ação transformadora .

No Curso de Pós-Graduação Lato Sensu Transdisciplinari-dade e Interdisciplinaridade na Educação, conforme dito ante-riormente, o artigo científico contempla-se na introdução a origem da pesquisa . Para tal solicitou-se que fosse explicitado a relação entre a história de vida-formação-trabalho do pesquisa-dor pós-graduando e a origem do tema e do problema investiga-

5 Michel de Montaigne (1533-1592) inaugurou um gênero literário, o ensaio e as suas obras são clássicos da filosofia moderna .


tivo da pesquisa do TCC, articulando assim sujeito, subjetivi-dade, história de vida e os motivos, os interesses, os desejos e as intencionalidades que fizeram emergir a pesquisa do TCC .

No intuito de promover um processo de tomada de cons-ciência si, ou seja, um processo de reflexão sobre a própria história articulando vida, formação e trabalho, um olhar sobre as oportunidades e as restrições pelas quais passou em sua história e em que medida a educação básica, a formação em nível superior e o curso de pós-graduação o mobilizaram .

No intuito de contribuir com o processo de reflexão dos pós-graduandos as professoras do eixo temático orientaram a leitura de bibliografias sobre pesquisa, subjetividade e história de vida . E formularam algumas questões problematizadoras e mediadoras para impulsionar a reflexão do pós-graduando para iniciar a escrita de sua história de vida-formação-traba-lho, ou seja, a escrita das narrativas de si contemplando seu memorial autobiográfico reflexivo, para então refletir sobre sua vinculação ao tema e problema de sua pesquisa de TCC . A título de exemplo, as professoras apresentaram aos pós-graduandos o desafio de escrever sobre si mesmo a partir de questões como as que seguem:

• Quem eu sou?• O que é minha cara? • O que me caracteriza? • De onde venho? • Onde cresci? • Como é minha família?• Quais são as principais características da minha

personalidade?


• Onde estudei? • Do que gosto? • O que sei? • O que eu gosto de fazer?• Quais seus principais valores? • O que me deixa indignado? • Luto pelo quê? • Sonho com o quê?• Onde trabalho? • Como trabalho? • Como vivo?• Com o que desejo trabalhar? • Onde gostaria de trabalhar? • Como me vejo como professor(a)? • Quais foram os momentos e experiências

significativos na minha história de vida que contribuíram na constituição de quem eu me tornei?

• O que pretendo realizar na educação? • Como foi o meu processo de formação intelectual–

profissional?• Como nos tornamos professor?• Como nos relacionamos com o conhecimento e com

a vida?• O que tem no meu percurso de vida que me

identifica com este curso que eu estou fazendo?• Em que este curso me transforma e transforma

também o meu jeito de ver a educação, o processo educativo e meu modo de trabalhar na educação?

• O que gostaria de pesquisar?• O que gostaria de alcançar na vida?


• Quais as atitudes que desejo desenvolver? • Quais experiência significativamente me marcaram

na educação?• Como posso explicar essa experiência

transdisciplinarmente?• Como a minha formação superior e a pós-graduação

me mobilizou enquanto pessoa e docente? • Essa experiência formativa provocou mudanças em

meu sentipensar, agir e sonhar?• O que é fundamental no trabalho docente? • Na relação com os alunos?• Na relação com o conhecimento?• Na relação com a vida?• Quando me vejo transdisciplinar?• Quando me percebo atuando de maneira

transdisciplinar na educação?• Como intervenho transdisciplinarmente com meus

alunos?• O que compreendo por complexidade e

transdisciplinaridade na educação? • Como ensinar de modo transdisciplinar? • Como pensar complexo? • Como criar ensino a partir dos sete saberes?• Em que os sete saberes me transforma enquanto

pessoa?• Em que os sete saberes me transforma enquanto

profissional da minha área?• Em que os sete saberes me transforma enquanto

cidadão social-planetário?


• Como melhorar sua vida e de todos? Como contribuir para viabilizar a ecologia integral (ecologia mental, ecologia ambiental, ecologia sociopolítica)?

• O que permitiu a emergência de mudanças internas em mim? E nos outros com os quais convivo e trabalho?

• O que potencialmente gerou transformações na minha realidade biopsicossociais e ambientais?

• Com a sua história de vida, onde pretende chegar na vida pessoal e na vida profissional?

• Como se vê, na sua caminhada, daqui a uns 5, 10 ou 15 anos?

• Outros .

A escrita de si visa elaborar uma tomada de consciência e impulsionar a reflexão sobre a própria formação e o processo de produção do TCC explicitando na introdução do artigo o vinculo entre os motivos e as motivações que levaram a tal pesquisa, bem como é esperado que em anexo haja uma redação detalhada sobre a história de vida-formação-trabalho do pós-graduando . Ao conhecermos o sujeito que pesquisa potencialmente podere-mos compreender um pouco mais seus motivos, vínculos, limi-tes e possibilidades frente ao fenômeno investigado .

Pesquisa auto(biográfica) e história de vida em processos tripolar de auto-hetero-ecoformação podem contribuir para tomada de consciência, geração de motivos e motivações para transformar a si mesmo, a realidade e o trabalho docente .

A auto-hetero-ecoformação é um componente da forma-ção considerado como um processo tripolar guiado pela auto-


formação (si); heteroformação (os outros/currículo/instituição/professores) e ecoformação (as formações em ambiente de aprendizagem, com os pares) . Os três polos da formação, ou seja, autoformação/heteroformação/ecoformação oportunizam processos distintos e se complementam .

Desde a década de 1980 (PINEAU, 2008) as histórias de vida têm sido utilizadas como abordagem de pesquisa e abor-dagem de formação, e nesta especialização, compõe parte inte-grante tanto da formação de professores, como do processo de pesquisa e elaboração do trabalho de conclusão de curso . As histórias de vida vão além de uma proposição de heteroforma-ção, mas uma legítima oportunidade de autorreflexão e autoformação .

Para Pineau (2008) as histórias de vida permitem:

aos sujeitos reunirem e ordenarem os seus diferentes momentos de vida espalhados e dispersos no decurso dos anos, a história de vida os faz construir um tempo próprio que lhes dá uma consistência temporal especí-fica . A construção e a regulação desta historicidade pessoal são talvez as características mais importantes da autoformação, as que a fundamentam dialetica-mente, ativando e talvez mesmo criando o processo unificador da dupla pluralidade exposta mais acima . Daí a grande importância da história de vida para a construção e o conhecimento da autoformação .

A autoformação pode ser compreendida como a constru-ção de um sistema de relações pessoais com diferentes pessoas, espaços, culturas, oportunidades, sensibilidades, percepções, uma potencial cosmogonia singular (FINGER, 1984), uma


estrutura relacional e particular do eu-mundo, da relação indivíduo-natureza-sociedade .

Na busca por ampliar a concepção de formação a auto-ecoformação, a auto-hetero-ecoformação apontam para as múltiplas relações entre o ser e a ampliação da percepção humana sobre os níveis de realidade . O processo de auto-hetero-ecoformação apontam para um processo ativo, vivencial, de tomada de consciência e de ação do sujeito, em uma dinâmica relacional permanente, dialética-dialógica, plural e incerta .

As histórias de vida em formação, enquanto uma corrente de pesquisa-ação-formação existencial (PINEAU, 2006), valo-riza o poder de reflexão do sujeito sobre a construção da sua própria vida, e aposta em novas artes formadoras da existência (FOUCAULT, 1984) . Por meio de práticas auto-reflexivas e meditativas, de construção de sentidos e sensibilidades, o sujeito busca tomar consciência de si, transformar a si mesmo e modificar-se enquanto ser humano único e singular, buscando ser capaz de “fazer de sua vida uma obra que traz certos valores estéticos e respondem a certos critérios de estilo (FOUCAULT, 1984, p . 12)” .

Múltiplas são as abordagens que nos últimos 35 anos que tem trabalhado com a tripolarização entre vida/pesquisa/formação . Pineau (2006) apresenta um quadro interessante de diferenciação dentre tais abordagens e autores:


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Em contextos de pesquisa e de formação, as práxis de autoformação e de ecoformação têm possibilitado ampliar a participação “dos indivíduos na construção de sentido de suas vidas” (PINEAU, 2006, 341) .

Os processos de formação, a partir de correntes das histó-rias de vida em formação, modificam-se os eixos e as relações de poder nos processos formativos . Da centralidade na atuação do professor-ativo sobre um aluno-passivo e da centralidade na memorização de conteúdos e na construção de conceitos, para o redimensionar do processo formativo rumo a autofor-mação e a ecoformação, ou seja, processos que valorizam a tomada de consciência sobre si; a possibilidade de si reinventar; de redirecionar rumos da vida; de construir autonomia; de criação de espaços de diálogo; de assunção da corresponsabili-dade do estudante sobre a própria aprendizagem e a aprendiza-gem do coletivo, tendo assim, o professor o importante papel mediador dialógico ao orientar pessoas nas suas relações com a vida, com a tomada de consciência sobre si, com o conheci-mento e com a própria formação na dinâmica da vida . Ou seja,

seguindo as opções de seus membros, a corrente das histórias de vida em formação pode fazer dessas práti-cas uma arte poderosa de autonomização ou, ao contrá-rio, de submissão dessas pessoas . O futuro das histó-rias de vida se inscreve assim nas oscilações de um desafio bioético tenso entre o paradigma do comando e do controle e aquele da autonomização . Ele é incerto e não resolvido . Porém nessas lutas de poder pelo acesso aos saberes sobre a vida, seu domínio representa um meio vital estratégico para construir sentido e produzir sua vida (PINEAU; LE GRAND, 2002, p . 122) .


Conclusões provisórias

Não há garantias de que processos de auto-ecoformação sejam bem sucedidos, mas há uma aposta de que é possível um processo singular e participativo, que modifique as pessoas e as comunidades via ampliação de motivos de aprendizagem, de sensibilidades e percepções que contribuam para a ampliação da consciência sobre a própria história e suas aprendizagens, bem como para o fortalecimento de compromissos com a cida-dania planetária, a democracia, a pluralidade de metamorfoses necessárias para transformar o mundo .

Emergem novas concepções e ações formativas a partir da Epistemologia e Ontologia da Complexidade, bem como tem sido criados apontamentos sobre as relações entre história de vida, escrita científica e formação de professores .

As professoras dessa disciplina ao investir na preparação do pós-graduando para a pesquisa científica com base nas histórias de vida entendem que podem contribuir para alcançar as finali-dades da pós-graduação na formação de um professor-pesquisa-dor que busca pensar complexo e transdisciplinar .

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A EDUCAçãO NUMA PERSPECTIVA TRANSDISCIPLINAR: UMA ARTICULAçãO

ENTRE A LITERATURA, A HISTÓRIA, A MEMÓRIA, O TEMPO E O ESPAçO

Alessandra Carlos Costa Grangeiro

Este trabalho tem como objetivo apresentar algumas reflexões no que diz respeito ao ensino da Literatura no Ensino Superior . Propomos, então, algumas refle-

xões sobre a relação entre literatura, história, memória, tempo e espaço . Para isso, utilizaremos algumas obras de William Faulk-ner que fazem parte da saga de Yoknapatawpha1, que evidencia as transformações sociais nesse espaço . Assim, nossa abordagem será a partir de uma perspectiva contextual, global, multidimen-

1 Esse condado é uma criação ficcional de Faulkner . No condado de Yoknapa-tawpha está a região fértil do delta, excelente para caçadas . Nele se encontra Jefferson, com sua cadeia, sua praça pública e suas velhas casas . A cidade de Jefferson é formada, inicialmente, em sua maioria, por escoceses e irlande-ses . De acordo com a explicação de Faulkner, em Faulkner in the University, o nome Yoknapatawpha deve ser pronunciado York-na-pa-TAW-pha . Essa pa-lavra, ainda segundo ele, é uma palavra da tribo Chickasaw e significa “água corre devagar sobre terra plana” . As obras que se referem à saga são as se-guintes: Sartoris (1929), O som e a fúria (1929), Absalão, Absalão (1936), Os invencidos (1938), O povoado (1940), Desça Moisés (1942), Réquiem para uma freira (1951), A cidade (1957) e A mansão (1959) . A leitura dessas obras dei-xa entrever um mundo social em mutação, pois há a ascensão e a queda de grandes famílias como, por exemplo, os Compsons, os Sartoris, os McCaslins representantes do Velho Sul, versus os Snopes, representantes do Novo Sul .

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sional e complexa, conforme nos aponta Morin (2011), visto que a obra de Faulkner incorpora seu contexto individual, fami-liar e histórico . Portanto, nessa ficção, podem ser exploradas as dimensões histórica, econômica e sociológica da sociedade, especialmente, as do sul dos Estados Unidos . Dessa forma, os conceitos de subjetividade, tempo, memória, espaço, história e tempo serão construídos a partir de olhares distintos, pois distintos são os sujeitos, docente e discentes, envolvidos nesse processo de aprendizagem . Nossa base teórica para discussão da memória é Henri Bergson e Maurice Halbswachs .

Atualmente, por uma série de fatores, dentre os quais a intensidade de conflitos humanos e a instabilidade do meio ambiente, o processo educativo tem sido repensado para que, por meio dele, possa haver uma intervenção significativa na sociedade . Por isso, muitos documentos têm sido elaborados como, por exemplo, a Carta da Terra que, dentre outros objeti-vos, procura gerar uma sociedade global sustentável; a Carta da Ecopedagogia que aponta a sustentabilidade como um princí-pio interdisciplinar reorientador da educação; a Carta da Trans-disciplinaridade que aponta a multidimensionalidade da trans-disciplinaridade e leva em conta as concepções de tempo e de história . Todas essas discussões pressupõem as reflexões de Edgar Morin (2011) e as nossas reflexões também considerarão essas discussões . O problema que se põe diante de nós é o seguinte: em meio a tantas mudanças e demandas da sociedade, como pensar uma metodologia que dê conta da articulação dos conteúdos de Literatura com a sociedade e com a subjetividade dos discentes? Sendo assim, nossos apontamentos reafirmarão a importância da abordagem do conhecimento a partir de uma perspectiva transdisciplinar .

51A educação numa perspectiva transdisciplinar

Tendo em vista as considerações, este trabalho tem por objetivo apresentar uma leitura da ficção de William Faulkner2 na perspectiva do pensar complexo na educação e isso gerará algumas reflexões no que diz respeito ao ensino da Literatura, no Ensino Superior, que não deve se desvincular nem da socie-dade, nem do indivíduo, mas, ao contrário, deve promover uma ampliação do conhecimento histórico e dos sujeitos envol-vidos, visto que, na tessitura da obra, elementos históricos e subjetivos se articulam . Além disso, esse ensino não deve se restringir aos limites da sala de aula, ao contrário, as reflexões feitas em sala de aula deverão ser úteis para promoção do diálogo e da transformação da sociedade .

Para alcançarmos nossos objetivos, abordaremos as seguintes questões: os pensamentos de Bergson e Halbwachs sobre, respectivamente, a memória individual e coletiva; a rela-ção estreita existente entre literatura e história, bem como a multiplicidade do tempo; as transformações sociais no velho sul dos Estados Unidos e sua consequente mudança de valores; a fluidez do tempo e a permanência do espaço; a relação entre

2 William Faulkner é um dos maiores escritores norte-americanos do século XX . Nasceu em New Albany em 25 de setembro de 1897 e morreu em Byhalia, em 6 de julho de 1962 . Foi ganhador do prêmio Nobel de Literatura em 1949, do National Book Awards em 1951 e, por duas vezes, do Pulitzer, em 1955 e em 1962 . O nascimento de Faulkner se deu trinta anos após a Guerra de Secessão . Antes dessa guerra, o Sul dos Estados Unidos era caracterizado por uma rígi-da estrutura social, construída basicamente por brancos de origem europeia e protestante . Eles alcançaram a supremacia econômica pela escravidão dos negros . A Guerra de Secessão faz o império do Sul, fortemente marcado pelo cultivo do algodão, desmoronar . Durante um período de quatro anos, o Sul foi devastado pelo exército do Norte e sua economia sofreu modificações signifi-cativas . Faulkner, por descender de uma família sulista ilustre que tinha pode-res políticos, pôde sentir muito profundamente a derrocada da aristocracia .


o ensino, a pesquisa e a extensão e, por fim, faremos as consi-derações finais .

Nossa pesquisa é bibliográfica e de campo, visita à Cidade de Goiás: aos museus para que fosse evidenciado aos alunos como é possível a “permanência” do tempo por meio da preser-vação dos espaços . Seu desenvolvimento, portanto, necessitou de abordagens teórica, crítica e histórica .

2.1 Fios trançados e enredados: a memória coletiva

Segundo Maria Cândida Moraes, (2014, p . 37) o conheci-mento transdisciplinar é:

produto de uma tessitura complexa, dialógica e autoe-co-organizadora, é tecido nos interstícios, nas tramas, na intersubjetividade dialógica, nos meandros da pluralidade de percepções e significados emergentes, a partir de uma dinâmica complexa presente nos fenô-menos, eventos e processos constitutivos da realidade da vida .

Essa tessitura complexa aponta para o que é essencial na transdisciplinaridade que é a epistemologia da complexidade . A realidade é complexa, pois elementos distintos a compõem e complexos são os sujeitos que percebem essa realidade . O resul-tado disso é a necessidade da passagem do conhecimento “de um nível de realidade a outro” (MORAES, 2014, p . 37) . Por isso, uma abordagem transdisciplinar do conhecimento é sempre aberta e, portanto, ultrapassa as fronteiras das discipli-nas que fracionam o conhecimento da realidade como um todo . Assim, na nossa abordagem será essencial a articulação


dos conhecimentos de Literatura, História e Memória . Ainda de acordo com Moraes (2014, p . 37-38):

a educação fundada na transdisciplinaridade, na multi-dimensionalidade humana, vai além do racionalismo clássico e recupera a polissemia dos símbolos, reco-nhece a importância das emoções, dos sentimentos e afetos, a voz da intuição ao colocá-la em diálogo com a razão e com a emoção subjacente .

A abordagem da obra de William Faulkner irá além do racionalismo . Os sujeitos envolvidos na leitura se permitiram emocionar e expor seus sentimentos e afetos . Nesse passo, a razão e a emoção se encontram e se fortalecem no processo de leitura .

As reflexões de Bergson3 sobre a memória dizem respeito à nossa duração interior, que é o nosso movimento interno ininterrupto, e esse movimento, que é um tempo indivisível, uma sucessão incessante, traz consigo a memória que tem a capacidade de trazer o passado ao presente . Esse movimento em que uma percepção presente traz à tona imagens do passado é o que mais nos interessa em Bergson e, por isso, o escolhemos como base teórica para este capítulo . das personagens, pois ele dá conta dos aspectos sucessivos e simultâneos dessa duração, o que converge para a concepção de tempo singular múltiplo . Sendo assim, o estudo de Bergson possui uma perspectiva

3 Seu pensamento se inscreve entre as últimas décadas do século XIX e as pri-meiras do XX e, portanto, foi o primeiro a observar e a levantar questiona-mentos acerca da insuficiência do método positivista, predominante na época, para lidar com fenômenos que dizem respeito ao homem e à sua realidade interior . Em Bergson, encontramos respaldo teórico para compreendermos a duração interior


individual, subjetiva . Nesse caso, embora importante para alcançarmos nossos objetivos neste trabalho, não teríamos suporte teórico para pensarmos as questões históricas articula-das à subjetividade das personagens, ou seja, não há em Berg-son uma teorização que dê conta das relações interpessoais dos sujeitos que lembram, e, por isso, recorremos a Halbwachs, filósofo que faz parte da tradição da sociologia francesa4 e que foi aluno de Bergson, para pensarmos a memória como fenô-meno não só individual, mas também social .

Para Halbwachs, há uma impossibilidade de pensar o problema da recordação e da localização das lembranças desvinculado de contextos sociais reais, pois estes servem de “baliza” à reconstrução da memória . As lembranças coletivas variam de acordo com os diversos grupos e surgem diversas interpretações diferentes de acordo com a percepção e vivência dos diferentes grupos, visto que se localizam em tempos e espaços distintos . Um trecho de Absalão, Absalão evidencia essa afirmação: “a única que se sabe é que todos os fios estão trançados e enredados, um no caminho do outro . É como se cinco ou seis pessoas tentassem fazer um tapete no mesmo tear e cada uma quisesse tecer e bordar nele o seu modelo” (FAULK-NER, 1981, p . 112) . A análise da memória, aqui, pressupõe uma definição do tempo . Este não é mais homogêneo e uniforme, como em Platão, Aristóteles e Newton . Com Halbswachs, a sociologia francesa incorpora a revolução einsteiniana .

Esse teórico evoca o depoimento de testemunhas que só tem sentido quando pertence a um mesmo grupo social, pois

4 O estudo desse sociólogo acerca da estrutura da memória teve um grande im-pacto em Marc Bloch, um dos fundadores da Escola dos Anais .


pressupõe a vivência dos mesmos eventos . Estes eventos são o contexto de referência dos indivíduos . Nesse sentido, o “eu” e sua duração se relacionam ao mesmo tempo aos aspectos vivos e materiais da lembrança e aos aspectos da reconstrução do passado . Todo esse processo de reconstrução do passado envolve a memória individual, conforme Bergson, mas esta está inserida em diferentes contextos e faz parte das redes pessoais múltiplas em que nos inserimos .

A Literatura e a História: multiplicidade de tempo

Nossa consciência, portanto, não é solitária, e a memória coletiva se manifesta de forma mais intensa nos momentos de maiores perturbações sociais . Destacaremos, nesse ponto, um dentre os vários fragmentos de Absalão, Absalão que apontam para momentos de perturbações . Esse fragmento se refere à Judith, durante a Guerra Civil americana . Um outro momento bem explícito que se refere à Guerra Civil americana que pode ser destacado é o que se segue:

Porque durante algum tempo naquele último verão – este último verão, ou melhor, outono, pois a escola abrira outra vez e ela até iniciara seu segundo ano na tal Academia desperdiçando outro ano entre as pare-des decadentes onde Miss Melissa Hogganbeck ainda ensinava obstinadamente aos poucos presentes que não apenas a História ameriacana mas toda a História ainda não havia alcançado o Natal de 1865, pois embora o general Lee (e outros soldados também, incluindo o próprio avô dela) tivesse se rendido, a guerra não termi-nara e na verdade os próximos dez anos mostrariam


que mesmo aquelas rendições simbólicas haviam sido um erro – ele sentou o tempo suficiente para fazer um balanço . (FAULKNER, 1997b, p . 224)

Outros momentos de grandes perturbações sociais que também foram amalgamados à ficção faulkneriana são os da Primeira e Segunda Guerra Mundial, conforme podemos ler no fragmento abaixo:

Porque mesmo que eles tivessem arrumado melhor as coisas, de forma mais prática: que 1944 tivesse aconte-cido em 1943 ou adiar a eleição para mais um ano, ou que de fato os japoneses desistissem em 1945 também e todos os sujeitos arrebentados do distrito eleitoral esti-vessem de volta a casa a tempo, ainda assim não have-ria um número suficiente deles e em última análise tudo o que Devries teria seriam os herdeiros do mesmo grupo de iludidos politicamente desorganizados [ . . .] . (FAULKNER, 1999, p . 252) .

Em momentos de perturbações sociais, os acontecimentos tendem a ser recordados por um número maior de pessoas, visto que catástrofes sociais transformam gerações . As lembranças dos acontecimentos se relacionam com as reflexões acerca do que poderia ter sido diferente ou não . Quando se recorda o passado, pensa-se no que teria sido se as ações tives-sem sido distintas ou reconforta-se com a certeza de que mesmo se as ações tivessem sido diferentes, os resultados seriam os mesmos .

O problema da duração e do tempo, nessa perspectiva, se afasta do pensamento filosófico tradicional e é visto a partir da


pluralidade, multiplicidade real dos tempos sociais . Para completar nosso conhecimento de um evento, testemunhas o reforçam ou o enfraquecem . Ainda assim muitos fatos perma-necem incompreendidos . A afirmação da lembrança dos outros reforça a nossa confiança na veracidade da nossa recordação, portanto, nossas lembranças são coletivas, pois são recordadas por outros, mesmo que os acontecimentos sejam pessoais .

Mas os grupos não são duradouros, pois as transforma-ções sociais provocam deslocamentos, por isso é muito comum outras pessoas reconstruírem para outros eventos dos quais eles não fizeram parte, mas que são significativos para a comu-nidade em que estão inseridos . Foi por meio de seu primo Gowan e de seu tio Gavin que Charles Mallison ouviu a maio-ria das histórias de Jefferson, especialmente a história sobre a família Snopes, registrada na trilogia O povoado, A cidade e A mansão . Assim nos relata Mallison (1997, p . 9):

Eu ainda não era nascido e assim era o primo Gowan quem estava ali e com idade suficiente para ver e lembrar e mais tarde me contar quando eu tivesse idade para entender as coisas […] então eles mandaram Gowan para ficar com a gente e ir à escola em Jefferson até que voltassem . “A gente” era meu avô e minha mãe e meu pai e o tio Gavin até então . Isso era o que Gowan sabia até eu nascer e crescer o suficiente para também ficar sabendo . Assim, quando digo “nós” e “nós acháva-mos”, quero dizer Jefferson e o que Jefferson achava .

Nesse caso, a duração da memória está relacionada à dura-ção do grupo . No tempo de Mallison, a memória coletiva de Jefferson está muito relacionada à saga, aos acontecimentos


que envolvem a ascensão dos Snopes, os novos ricos que conquistaram o espaço anteriormente preenchido pela aristo-cracia . Sobre a questão da memória relacionada ao grupo é interessante relembrar a história da família de Sutpen, que se encontra em Absalão, Absalão, e é retomada por Rosa Cold-field, última do grupo a vivenciar alguns acontecimentos junto à família dele . Ela encontra em Quentin um interlocutor muito atento, pois o problema do incesto presente na família de Sutpen é o seu grande dilema .

Para que uma lembrança seja reconhecida e reconstruída é preciso que tenhamos feito parte e continuemos a fazer parte de uma mesma sociedade . Passagens em Absalão, Absalão evidenciam que vizinhos e negros também estão entre os que reconstroem a memória coletiva por fazerem parte do grupo social: “os vizinhos contaram que ele passava o dia atrás de uma veneziana levemente entreaberta, como um vigia no seu posto, tendo como arma a imensa Bíblia da família, em vez de um mosquete” (FAULKNER,1981, p . 71) . E então a história foi contada pelos negros: “sobre como, na noite anterior ao Natal tinha havido uma discussão [ . . .]” (p . 69) . Nesse sentido, perce-bemos que a história vai ganhando novos sentidos, uma vez que outras vozes que presenciaram outros acontecimentos contribuem . Sobre essa questão da reconstrução da memória individual a partir da memória dos outros, Halbwachs (2006, p . 39) diz o seguinte:

Para que nossa memória se aproveite da memória dos outros, não basta que estes nos apresentem seus teste-munhos: também é preciso que ela não tenha deixado


de concordar com as memórias deles e que existam muitos pontos de contato entre uma e outras para que a lembrança que nos fazem recordar venha a ser recons-truída sobre uma base comum . Não basta reconstituir pedaço a pedaço a imagem de um acontecimento passado para obter uma lembrança . É preciso que esta reconstrução funcione a partir de dados ou de noções comuns que estejam em nosso espírito e também no dos outros, porque elas estão sempre passando destes para aquele e vice-versa, o que será possível somente se tiverem feito parte e continuarem fazendo parte de uma mesma sociedade, de um mesmo grupo . Somente assim podemos compreender que uma lembrança seja ao mesmo tempo reconhecida e reconstruída .

O primeiro plano de memória de um grupo diz respeito às lembranças dos eventos e das experiências que marcaram a maioria do grupo social . Nesse caso, diversos grupos compar-tilham experiências semelhantes tal como é o caso da família de Rosa e de Quentin . Quentin, antes que Rosa lhe contasse a história da família dela, já a conhecia, visto que seu avô foi o melhor amigo de Sutpen e foi a ele que Sutpen fez várias confi-dências . O avô de Quentin contou muito dessa história a seu filho, pai de Quentin, que, por sua vez, a contou a Quentin e este para o seu amigo de quarto em Harvard, Shreve . E há sempre circunstâncias que despertam as lembranças, no caso de Quentin, conforme vimos, era o incesto .

De acordo com o que temos notado, as ideias de Halbwa-chs estão muito relacionadas à questão da memória coletiva . Entretanto, isso não o faz desconsiderar a individual . Ao contrário, embora faça claramente a distinção entre as duas,


demonstra que elas, longe de se excluírem, se complementam . Segundo ele, cada memória individual é um ponto de vista em relação à coletiva e a sucessão das lembranças individuais se explica pelas mudanças que se produzem em nossas relações com os diversos ambientes coletivos .

Interessante observarmos a questão da construção das obras de Faulkner no que concerne ao ponto de vista . Este não é único, ou seja, não tem um único narrador que organiza o caminho a ser percorrido pelo leitor e o faz conhecer acerca de todos os acontecimentos, inclusive os passados, que envolvem as vidas das personagens . Ao contrário, há o esfacelamento da voz narrativa e facilmente, portanto, podemos identificar, em cada voz, uma consciência individual que possui um ponto de vista em relação à coletiva . Outra observação que é relevante concernente a essa citação de Halbwachs é a questão do caráter sucessivo das lembranças . Estas são sucessivas em função das mudanças que ocorrem nas relações sociais . A reconstituição de forma geral da saga de Yoknapatawpha nos permite obser-var que, à medida que as transformações ocorrem, muda o que é lembrado entre as personagens .

Na realidade, a memória individual e a coletiva estão liga-das por fios tênues e entrecruzados . A primeira não é fechada e isolada, pois para evocar o passado pessoal é preciso recorrer a lembranças de outras pessoas que fazem parte do mesmo grupo . Embora seja inteiramente pessoal, autobiográfica, recebe ajuda da memória coletiva . Nesse caso, notamos que a nossa vida pessoal faz parte da história em geral e é o que ocorre com as personagens de Faulkner, uma vez que os acon-tecimentos de suas vidas se relacionam aos acontecimentos da história em geral e, nesse caso, a acontecimentos que são verí-


dicos e fazem parte da história dos Estados Unidos da América . Já a segunda é aumentada por meio das conversas entre as pessoas, entre os grupos que vivem em um dado ambiente histórico-social e também por meio de leituras . Nesse caso, o indivíduo toma conhecimento de experiências que não são diretamente suas, mas do passado do grupo ao qual pertence . Conforme vimos, para dar conta da sua gigantesca obra, foi o que Faulkner fez, ou seja, ele juntou à sua vivência, à experiên-cia de sua família, histórias que ouviu de pessoas mais velhas e ainda leu muito sobre as histórias do velho Sul .

As transformações sociais do velho sul e a mudança de valores

A observação acerca das transformações ocorridas no Sul dos Estados Unidos, e que são possíveis de serem apreendidas nos limites da saga de Yoknapatawpha, sem que essa tenha compromissos com a veracidade histórica, facilmente se veri-fica a perpetuação e/ou a renovação constante da história . O que ocorre é que concepções, valores elaborados por um grupo, gradativamente vão se transformando a partir da ascensão de outros grupos que possuem outras concepções e outros valo-res . O que significa dizer que velhos valores recuam e novos assumem o lugar deles e evidentemente o modo de vida, as ações e relações humanas se transformam também e, regra geral, os momentos de transição entre esses valores são os momentos de maiores conflitos .

Sobre a questão de novos grupos que surgem com novas ideias, não podemos deixar de apontar a personagem Emily, do conto Uma rosa para Emily . Emily, depois da morte de seu pai, manteve a porta de sua casa aberta enquanto existiam jovens


que gostariam, incentivadas, por certo, pelas mães e avós, de aprender a pintar em porcelanas . Quando os valores começam a mudar, começam a desaparecer as alunas de Emily, até se extinguirem por completo; a partir disso, não há mais motivos para sua porta permanecer aberta:

Desde aquela época, sua porta ficara fechada, exceto no decorrer de um período de seis ou sete anos, quando ela, quarentona, dava aulas de pintura em porcelana . Insta-lara, num aposento do andar térreo, o atelier onde as filhas e netas dos contemporâneos do Coronel Sartoris lhe eram enviadas com a mesma regularidade e dentro do mesmo espírito com que as mandavam à igreja, nos domingos, munidas de uma moedinha de vinte centavos para a hora da coleta . Nesse ínterim, Miss Emily se vira dispensada do pagamento de impostos .A nova geração tornou-se, então, a espinha dorsal e a alma da cidade, as alunas cresceram e dispersaram-se, e não lhe mandaram as filhas com as caixinhas de tinta, os aborrecidos pincéis e os modelos recortados das revistas ilustradas femininas . A porta fechou-se sobre a última aluna e ficou fechada desde então . Quando a cidade adotou a distribuição gratuita do correio, Miss Emily foi a única pessoa que se negou a consentir que fixassem um número de metal acima de sua porta e uma caixa postal ao lado . Não houve argu-mento que a convencesse . (FAULKNER, 19 __, p . 305) .

Há uma citação de Halbwachs (2006, p . 90) que facilmente poderíamos, com algumas ressalvas, atribuí-la a Emily:


Chegará um momento em que, olhando à minha volta, não encontrarei senão um número pequeno dos que viveram e pensaram comigo e como eu antes da guerra, em que compreenderei, como algumas vezes tive a sensação e a inquietude, que novas gerações brotaram em cima da minha e que uma sociedade que em grande medida me é estranha por suas aspirações e costume tomou o lugar dessa a que me ligo mais estreitamente – e meus filhos, mudando de ponto de perspectiva, se surpreenderão ao descobrir de repente que estou muito longe deles e que, por meus interesses, minhas idéias e minhas lembranças, eu estava muito perto de meus pais, eles e eu certamente estaremos sob a influência de uma ilusão inversa: não estarei tão longe deles, pois meus pais não estão assim tão longe de mim – mas, conforme a idade e também as circunstâncias, nos espantamos sobretudo com as diferenças e semelhanças entre as gerações que ora se fecham sobre si mesmas e se afastam uma da outra, ora se juntam e se confundem .

As ressalvas que devemos fazer são as seguintes: não have-ria de chegar o tempo em que Emily encontraria um número pequeno dos que viveram e pensaram como ela . Esse tempo já havia chegado . Emily, por não se identificar à nova geração, se fechou em sim mesma e, literalmente, dentro de sua casa . Emily não teve filhos e sua morte sem deixar descendentes facilmente pode representar a implacabilidade da geração que veio para ficar . Uma geração em que as moças não mais pinta-vam em porcelana, mas já pouquíssimos anos depois da morte de Emily, por volta de 1938, próximo, portanto à Segunda Guerra Mundial, trabalhavam em fábricas onde fazem aviões,


como era o caso de Linda Snopes, filha de Eula Varner, esposa de Flem Snopes: “Vou embora . Tenho um emprego, numa fábrica na Califórnia onde fazem aviões para serem mandados à Europa” (FAULKNER, 1997, p . 199) .

Ainda sobre as transformações em Jefferson, queremos destacar um fragmento que evidencia que a Guerra Civil (entre o Sul e o Norte) e a Reconstrução feita, pelo Norte, no Sul foram essenciais nesse processo . Mais uma vez apontamos para a irrupção da história oficial dos Estados Unidos nos limites da ficção de Faulkner (1964, p . 164):

– Voltou para casa e viu que as chances de sua descen-dência estavam exatamente onde os filhos haviam se encarregado de mandá-la, sua plantação estava arrui-nada, os campos alqueivados, sem nenhuma cultura, apenas com uma boa plantação de ervas daninhas e impostos e arrecadações e multas decretadas pelos marechais dos Estados Unidos, e outras assim, todos os seus pretos tinham ido embora, conforme os Ianques providenciaram .

Este trecho se refere à Sutpen e à destruição da sua proprie-dade na ocasião da guerra . Todo seu império estava destruído e, além das dificuldades provocadas pela guerra, da plantação arruinada, dos campos alqueivados, sem cultura e cheia de ervas daninhas, havia uma série de impostos e de multas que deviam ser pagas aos marechais dos Estados Unidos . Quere-mos ainda mencionar Emily nesse contexto, pois ela enfrentou dificuldades semelhantes a essa de Sutpen, além da semelhança que queremos destacar no que diz respeito ao pagamento de impostos, no fragmento retirado do conto de Emily há uma


explicitação maior acerca das mudanças sofridas pelo Sul em função do processo de Reconstrução conduzido sob a liderança do Norte, conforme vemos no fragmento a seguir:

Quando a geração seguinte, com suas idéias modernas, deu, por sua vez, prefeitos e intendentes municipais, essa concessão provocou alguns descontentamentos . No primeiro dia do ano, dirigiam a Miss Emily uma notificação de impostos . Fevereiro chegou, sem trazer resposta . Enviaram-lhe uma carta oficial, pedindo-lhe para passar, quando pudesse, no gabinete do delegado . (FAULKNER, 19__, p . 300) .

A dificuldade de Emily com os impostos talvez tenha sido maior que a de Sutpen, pois ela tinha a isenção total deles feita pelo coronel Sartoris . Ele, coronel Sartoris, relatou uma histó-ria acerca de um empréstimo feito pelo pai de Emily para justi-ficar sua decisão . O certo é que Emily acreditou que a decisão do coronel Sartoris teria validade na geração seguinte com “suas ideias modernas” . Entretanto não teve, pois a nova gera-ção, com vistas à reconstrução o velho Sul, estava ávida por impostos e não se interessava pelas decisões do coronel Sarto-ris . Mas Emily, até morrer, não abriu mão de sua isenção e, depois de muitas notificações, uma delegação se dirigiu à casa dela . Ela a recebeu, mas insistiu em dizer que tinha a isenção e, por isso, não pagaria nenhum imposto e pediu a eles que procu-rassem o coronel Sartoris, que, nesse tempo, fazia dez anos que havia morrido .


Memória: fluidez do tempo x permanência do espaço

Depois dessas considerações sobre as transformações do velho Sul que podem ser apreendidas nos limites da saga de Yoknapatawpha, desejamos apontar algumas questões que marcam a oposição que há entre Bergson e Halbwachs . Para o primeiro o passado é conservado por inteiro em nossa memó-ria . Já para o segundo esse passado é reconstruído por nós, pois o que subsiste não são as imagens prontas, mas, relacionadas à sociedade, indicações importantes para a reconstrução de partes de nosso passado que pode ser reconstituído de forma incompleta e essa incompletude pode ser mais bem preenchida com a memória de outros que pertencem ao nosso grupo . Faze-mos a reconstrução do nosso passado a partir das linhas já marcadas por nossas lembranças e pelas dos outros . Sob essa perspectiva, Halbwachs aponta que há várias memórias coleti-vas e uma só história, e porque há várias memórias coletivas, há uma representação coletiva do tempo .

As dificuldades para a precisão de datas fazem com que o panorama espacial seja mais definidor no processo das lembran-ças do que o tempo . Além disso, há de se considerar a existência de um tempo que é coletivo, plural e não único, embora não se possa negar que a vida social em seu conjunto decorre de um tempo dividido em anos, meses, dias, horas . Nesse ponto, enten-demos que o posicionamento de Bergson acerca do tempo único e plural é bastante relevante . Para ele, a pluralidade de tempos evidenciada na teoria da relatividade, longe de descartar o tempo único, o pressupõe . Assim vemos que o tempo se apresenta concomitantemente de forma linear e de forma simultânea . A linearidade é própria do tempo físico, do tempo calendário, mas


a simultaneamente é própria das ciências sociais, especialmente da antropologia, e a história incorpora tanto a linearidade quanto a simultaneamente assim como o romance moderno e, no caso específico, os de Faulkner .

O tempo social é diferente para os diversos grupos, embora a divisão tradicional da duração esteja em harmonia com o ritmo da natureza . É diferente porque diferentes são os calen-dários . Nos distintos calendários, o tempo é expresso de acordo com os diferentes valores, costumes etc ., mas, quando há inte-ração entre os grupos, esses valores podem se fundir e se trans-formar ou ainda um tempo antigo pode subsistir ao lado do tempo novo, como são os casos de Emily e de Rosa Coldfield, que incorporam valores que estão sendo substituídos . Como a estrutura do romance também aponta para a simultaneidade, ou seja, a estrutura mimetiza também a pluralidade de tempos e de valores . Esse desejo de permanência está expresso na memória que o grupo guarda do espírito de seus fundadores . Nesse caso, consideramos a obra monumental de Faulkner como uma tentativa de permanência dos valores do Sul . Ele não permitiu que as histórias do velho Sul caíssem no esqueci-mento, mas ele eterniza, cristaliza esses acontecimentos em suas obras . Entretanto, não faz isso de forma nostálgica e reacionária . O velho Sul foi eternizado, mas sua obra também apreende as transformações pelas quais o velho Sul passou . Ainda deve-se ressaltar que ele sabe fazer o registro dessas transformações sociais de forma a apreender todas as nuances do processo, visto que ele registra os vestígios deixados pela velha sociedade . Vejamos mais uma citação do conto “Uma rosa para Emily”, que muito bem ilustra essa questão dos vestí-gios que são deixados pelos tempos antigos:


Era um casarão quadrado, de madeira, outrora branco, decorado de cúpulas, de flechas, de balcões, no estilo pesadamente frívolo da época de 1870, situado na rua que já tinha sido a mais distinta da cidade . Mas as gara-gens e as debulhadoras de algodão, multiplicando-se em derredor, acabaram por fazer desaparecer até os nomes augustos daquele bairro . A casa de Emily era única, levantando sua decrepitude teimosa e faceira acima dos vagões de algodão e das bombas de gasolina . (FAULKNER, 19__, p . 300) .

Esse momento de permanência de vestígios do passado dentro de uma sociedade que passa por transformações, como era o caso do condado de Yoknapatawpha de forma geral e de Jefferson de forma particular, faz com que a memória se multi-plique em vias distintas, pois distintos são os grupos que convi-vem entre si . São períodos que se superpõem num dado momento histórico e não passam de um para o outro de forma sucessiva e linear, mas convivem um com o outro e, portanto, aparecem de forma simultânea . Nesse caso são, portanto, tempos múltiplos que conservam contextos distintos, valores distintos . No espaço moderno sempre se encontrarão vestígios do antigo e são esses vestígios que permitirão a reconstrução da memória relacionada a esse tempo . Rosa Coldfield morreu sem deixar descendentes . Sua história e a de sua família fica-ram bem conhecidas por Quentin, que também morreu . Mas antes de morrer, Quentin contou, recontou e reconstruiu essa história junto ao seu amigo Shreve . Por tudo que temos discu-tido, vemos que a memória desse grupo tenderá a se extinguir, embora ela permaneça enquanto há alguém que tenha vivido


com esse grupo . Shreve não fazia parte do grupo, mas as histó-rias do velho Sul alcançaram outros lugares . Ainda assim, pela permanência do relato oral essa memória se extinguirá .

Além da dificuldade da precisão de datas, o que faz o espaço ser mais definidor na reaparição das lembranças é a sua permanência, a sua estabilidade . Todas as ações do grupo estão relacionadas ao espaço . Disso resulta que as imagens espaciais desempenham um papel importante na memória coletiva; a cadeia do condado é um exemplo disso . Quando há mudanças no ambiente material, no espaço, por certo há mudanças nas relações entre os grupos . Mink Snopes, depois de ficar 38 anos na prisão, estranha o espaço . Este era completamente diferente daquele que ele havia visto 38 antes:

A estrada estava com tráfego intenso, mas fluía bem agora, os carros grandes, novinhos, e os caminhões tão grandes como vagões de trem; não mais caminhonetes empoeiradas que teriam lhe oferecido carona, mas agora veículos de gente rica e apressada que nunca tinha visto um homem andando sozinho de macacão . (FAULKNER, 1997, p . 216) .

Outro momento que evidencia essa transformação de Jefferson é a seguinte:

As ruas de Jefferson agora estavam asfaltadas e graças a isso mais famílias novas, de engenheiros e empreiteiros e como a do garoto Riddell, que nos proporcionou aquele feriado há dois anos, tinham se mudado para Jefferson . Uma dessas famílias não tinha nenhuma criança mas tinha um Cadillac e a esposa tinha um


cachorrinho que eles diziam ter custado quinhentos dólares, o único cão com valor acima de cinqüenta dólares [ . . .] . (FAULKNER, 1997, p . 283) .

A cidade de Jefferson já não era a mesma; as ruas agora estavam asfaltadas . O espaço possui grande importância nessa interação entre os indivíduos, pois a geração que somente conheceu a cidade de Jefferson asfaltada irá ampliar seu conhe-cimento da cidade, pelas lembranças compartilhadas por aque-les que a conheceram antes dessa transformação . Sobre a importância do espaço para a memória coletiva, assim se manifesta Halbwachs (2006, p . 170):

[ . . .] não há memória coletiva que não aconteça em um contexto espacial . Ora, o espaço é uma realidade que dura: nossas impressões se sucedem umas às outras, nada permanece em nosso espírito e não compreende-ríamos que seja possível retomar o passado se ele não estivesse conservado no ambiente material que nos circunda . É ao espaço, ao nosso espaço – o espaço que ocupamos, por onde passamos muitas vezes, a que sempre temos acesso e que, de qualquer maneira, nossa imaginação ou nosso pensamento a cada instante é capaz de reconstruir – que devemos voltar nossa aten-ção, é nele que nosso pensamento tem de se fixar para que essa ou aquela categoria de lembranças reapareça .

Visto que o tempo é fluido, seu curso não pode ser parado, resta-nos, então, a imobilidade do espaço que evoca, via memó-ria, acontecimentos que ficaram no passado . Na tentativa de fazer durar os valores do velho Sul, Faulkner não hesita em criar


um espaço, mundo imaginário, o condado de Yoknapatawpha e a cidade de Jefferson . A estabilidade desse espaço nos dá a ilusão de permanência e faz as personagens encontrarem o passado no presente . E esta é a verdadeira condição da memória: fazer perdurar o que é efêmero, o que é transformado pelo tempo .

2.2 O ensino, a pesquisa e a extensão e suas etapas

Conforme vimos anteriormente, o ensino de Literatura não é desvinculado da História e o estudo da memória perpassa todas as discussões, visto que é por meio dela que podemos conhecer o passado . Assim, numa perspectiva do pensar complexo da educação, os alunos entram em contato com a Literatura e percebem como ela apreende contextos históricos, bem como suas transformações, em seus limites . Além disso, por se tratar da memória, o ensino de Literatura, dentro a partir desse foco, desperta os alunos para suas memórias indi-viduais e coletivas e, assim, esse ensino cria um vínculo entre os alunos e seus familiares de outra geração, como avós e tios, por exemplo, além de moradores antigos das cidades, em espe-cial seus fundadores, em que vivem . Essas memórias coletivas sempre passam pela história do lugar e isso faz com que os alunos se percebem como parte da história do lugar . Assim tem sido o ensino de Literatura no Câmpus de Inhumas . Para que ele se concretize, o ensino de Literatura de sala de aula é articulado às pesquisas realizadas sobre memória e ao projeto de extensão que faz com que essas discussões cheguem à comu-nidade, interajam com ela e criem produtos resultantes de todos os trabalhos como é o caso de textos literários que foram produzidos pelos alunos em que aparecem elementos históri-


cos de suas respectivas cidades, bem como um documentário sobre a Cidade de Goiás e a poestisa Cora Coralina que eviden-cia o que apontamos anteriormente acerca dos diferentes olha-res e, portanto, dos diferentes pontos de vista das pessoas envolvidas na história .

Os projetos “A ascensão do romance: seus antecedentes, seus desafios e sua evolução”, e “Altas literaturas x literatura popular: diálogos e convergências” possuem uma relação estreita entre si no que diz respeito à memória cultural e histó-rica . Participaram deles um público composto por cerca de 110 pessoas de diferentes níveis sociais e de diferentes idades, visto que são alunos do Ensino Fundamental, Médio e asilos e os alunos do curso de Letras, do câmpus de Inhumas . Os alunos foram divididos em grupos e puderam escolher o público que trabalhariam, bem como a cidade, visto que vivem em distin-tas cidades, próximas à de Inhumas . Por conta disso, cada grupo elaborou um subprojeto à parte .

Trabalho semelhante foi realizado no Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Transdisciplinaridade e Interdisci-plinaridade na Educação, no eixo Formação Cultural e Esté-tica . Esse eixo foi desenvolvido por meio das seguintes questões problematizadoras: Que relação há entre subjetividade, tempo, memória, espaço e história? Que pergunta você formularia para saber mais de Cora nesse espaço, Cidade de Goiás, que se funde com ela? Para responder a essas questões os alunos escreveram um texto relatando suas experiências com o ensino da Literatura dentro da perspectiva transdisciplinar, ou seja, relatando como foi a experiência de um ensino que não se desvincula da sua própria vivência, experiência e memória e, além disso, incluiu o conhecimento do espaço, no caso a Cidade


de Goiás, para ampliação do seu universo cultural e existencial no que diz respeito ao contexto histórico e pessoal da autora estudada no eixo, no caso Cora Coralina .

Estes projetos consideraram as diretrizes do Projeto Peda-gógico do Curso de Letras do Câmpus de Inhumas . Dessa forma, com do desenvolvimento deles, espera-se formar profes-sores com potencial intelectual, crítico e reflexivo, visto que sua metodologia procura contemplar os eixos de formação investigativa, profissional, cultural e prático-profissional .

Assim, as oficinas de leitura e de criação literária propor-cionaram uma atuação teórico-prática, visto que as oficinas foram ministradas aos acadêmicos de Letras e estes, por sua vez, as ministraram para alunos das redes municipal e estadual e asilos . As oficinas ministradas nos asilos tiveram um objetivo bastante específico em relação às demais, uma vez buscou-se verificar os elementos históricos presentes nas memórias dos velhos que dizem respeito ao povoamento da região, muito significativo por ser rota para a capital do estado, que era a Cidade de Goiás . As oficinas foram realizadas por meio de 10 encontros, marcados pela afetividade e informalidade e todo processo de ensino-aprendizagem foi permeado pelas expe-riências dos sujeitos envolvidos . Os encontros se desenvolve-ram por meio das seguintes estratégicas e metodologias:

1. Exercícios de biografia ficcional: interação, produção e compartilhamento;

2. Criação de personagens capazes de grandes feitos: interação, produção e compartilhamento;

3. Criação de narradores: interação, produção e compartilhamento;


4. Criação do tempo e do espaço: interação, produção e compartilhamento;

5. Leituras e discussões de textos literários;6. Aulas expositivas, permeadas pela interação dos

alunos, sobre obras literárias;7. Rodas de leituras literárias, dramatizadas

Partindo-se do pressuposto de que é essencial à literatura uma relação com a sociedade, sem deixar de lado seus elemen-tos estéticos, essa proposta de oficina procurou observar se o contexto cultural do estado de Goiás, assim como o do sul dos Estados Unidos na obra de William Faulkner, apareceu como motivação para a produção e apreciação das obras escritas e/ou lidas durante as oficinas . Todos os resultados dos trabalhos foram apresentados em evento próprio SIMEXT – Simpósio de Extensão, no Câmpus de Inhumas, com muitas apresentações culturais e comidas típicas do Estado de Goiás, com vistas à divulgação e fortalecimento da cultura goiana .

Considerações Finais

William Faulkner escolheu a permanência de um tempo distante nos limites de sua obra e isso resulta da consciência que possui no que diz respeito à preservação do passado para as novas gerações . Assim, seus temas, a partir de uma ética e de uma posi-ção diante do mundo e da criação poética, articula tempos histó-ricos distintos . Nesse sentido, o ficcionista restabelece os vínculos que as personagens têm com a cidade e com a região das quais fazem parte . A ficção de Faulkner é o espaço onde se articulam as relações entre tempo, memória, história e espaço .


As leituras que foram feitas acerca das mudanças de para-digmas atuais que apontam para a necessidade de mudanças na educação, bem como as leituras das obras de William Faulk-ner e as pesquisas feitas na Cidade de Goiás nos mostraram como é possível tornar a aprendizagem no Ensino Superior mais significativa . Essa significação acontece quando se adota uma perspectiva que contempla a complexidade da sociedade, a do objeto estudado e a dos sujeitos envolvidos . A relevância do ensino se alcança quando, no processo de aprendizagem, o sujeito consegue articular sua vivência às reflexões que estão sendo feitas em sala de aula e/ou em espaços fora dela .

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OS SETE SABERES NA SALA DE AULA: RESSIGNIFICANDO PRÁTICAS

PEDAGÓGICAS

Valéria Rosa da SilvaCarla Conti de Freitas

Oh finos homens de Haddam, Por que imaginais pássaros dourados?

Acaso não vedes o pássaro-preto Rondando os pés

das mulheres tão perto?1

(Wallace Stevens, 1967)

(...) vi através das vidraças da escola, no claro azul do céu, por cima do Morro do Livramento, um papagaio de papel, alto e largo, preso de uma corda imensa, que bojava

no ar, uma coisa soberba. E eu na escola, sentado, pernas unidas, com o livro de leitura e a gramática nos joelhos. – Fui um bobo em vir – disse eu ao Raimundo.

(Machado de Assis, 1996)

Um passarinho pediu a meu irmão para ser sua árvore. Meu irmão aceitou de ser a árvore daquele passarinho.

No estágio de ser essa árvore, meu irmão aprendeu de sol, de céu e de lua mais do que na escola.

(Manoel de Barros, 2000)

A ciência pode classificar e nomear os órgãos de um sabiá, mas não pode medir seus encantos. A ciência não pode calcular quantos cavalos de força existem nos encantos

de um sabiá. Quem acumula muita informação perde o condão de adivinhar: divinare. Os sabiás divinam.(Manoel de Barros, 2000)

1 Texto original em inglês: O thin men of Haddam, /Why do you imagine gold-en birds? /Do you not see how the blackbird/Walks around the feet/Of the women about you?

3


Mas a educação pode ajudar a nos tornarmos melhores, se não mais felizes, e nos ensinar a assumir a parte prosaica e viver a parte poética de nossas vidas.

(Edgar Morin, 2001)

As epígrafes escolhidas para este capítulo, guardados os contextos em que foram produzidas, podem suscitar a reflexão sobre o distanciamento que existe entre aquilo que a escola ensina e a realidade da vida . Isso parece contribuir para refor-çar a ideia de que a escola é um lugar preterido em relação a outras atividades oferecidas fora dela .

Metaforizando Stevens (1967), na busca pelos “pássaros dourados”, a escola deixa de considerar “o pássaro-preto” que ronda “os pés das mulheres tão perto”, ou seja, o conhecimento científico, embasado em um “currículo dourado” não contex-tualizado e transmitido de maneira fragmentada não leva em conta o mundo conectado em que vivemos e nem o contexto local . Daí, pode-se depreender a importância de as ações educativas considerarem o contexto em que vivem seus alunos, evidenciando que um ensino integrado às diferentes realidades faz mais sentido . Por outro lado, práticas pedagógicas isoladas da realidade podem não ser significativas para o aluno .

Talvez por esse motivo, Pilar, o protagonista do “conto de escola” de Machado de Assis (1996), tenha se arrependido de ter ido à escola naquele dia: “fui um bobo em vir” . Para o pequeno, a escola era uma espécie de prisão, em oposição à liberdade que era avistada pelas vidraças . Ele, certamente, parecia mais feliz com a ideia de estar do lado de fora da escola . Como descreve Machado de Assis, o cenário do “papagaio de papel” no céu azul e claro, era para Pilar “uma coisa soberba”, opondo-se ao cenário da escola que, certamente, mostrava-se

81Os sete saberes na sala de aula

enfadonho para Pilar . Vale ressaltar que, apesar de Machado de Assis retratar uma realidade do século XIX, essa situação ainda é bastante recorrente atualmente .

Manoel de Barros (2000), por meio de sua maestria com a linguagem, traz à tona a importância de se considerar a prática, a experiência e a vivência na escola . O estágio de “ser a árvore daquele passarinho” proporcionou mais aprendiza-dos “de sol, de céu e de lua” do que a própria escola . Dentre as várias interpretações possíveis para esses versos, podemos inferir que se aprende mais com a vivência do que com a teoria apenas; teoria essa que, em nome de uma ciência frag-mentada, tem espaço privilegiado na escola, sufocando ques-tões mais amplas e complexas do mundo contemporâneo . Assim, a ciência, por não considerar a complexidade, é inca-paz de “medir os encantos de um sabiá”, limitando-se a “clas-sificar e nomear seus órgãos” .

Diante das questões problemáticas levantadas até agora por meio das epígrafes sobre a escola e o processo educativo, a esperança parece surgir nas palavras de Edgar Morin (2001), que nos lembra que a educação pode contribuir, também, para a formação do ser humano . Nesse sentido, o papel da educação não se restringe à mera transmissão de conhecimentos, mas ao envolvimento de uma “cultura que permita compreender nossa condição e nos ajude a viver, e que favoreça, ao mesmo tempo, um modo de pensar aberto e livre” (MORIN, 2001, p . 11) .

Mas, como pensar essas questões mais amplas e comple-xas na prática pedagógica? Como ressignificar as práticas pedagógicas para um ensino mais significativo? Como deve ser o agir docente diante dessa complexidade? O que deve ser considerado?


Diante dessa problemática, o objetivo deste texto é refletir sobre possíveis ressignificações da prática pedagógica, conside-rando o pensamento complexo e os sete saberes necessários para a educação (MORIN, 2000) . Para isso, serão apresentadas ações pedagógicas realizadas no curso de Letras do câmpus Inhumas da Universidade Estadual de Goiás (UEG) . Essas ações foram realizadas nos anos de 2014 e 2015 .

3.1 O pensamento complexo e os saberes necessários à educação: possibilidades para a prática pedagógica

O pensamento complexo se propõe a religar os conheci-mentos dispersos, exigindo uma nova postura do sujeito diante da dinâmica dos sistemas vivos planetários, o que implica recusar a cisão entre as ciências e as humanidades e, mais que isso, entre as ciências da natureza e a cultura (MORIN, 2001) . Em outras palavras, o pensamento complexo tem como proposta a união dos conhecimentos fragmentados e dos aspectos presentes no universo . Na escola, isso significa repen-sar a compartimentalização das disciplinas, bem como a rela-ção do conhecimento científico com o conhecimento para a vida, criando uma atmosfera inter e transdisciplinar .

Nessa perspectiva, Morin (2000) propõe um conjunto de sete saberes que constituem eixos e, ao mesmo tempo, caminhos que se abrem a todos os que pensam e fazem educação . Nas pala-vras do autor, a proposta dos sete saberes “não é um tratado sobre o conjunto das disciplinas que são ou deveriam ser ensina-das” . O objetivo é expor problemas centrais ou fundamentais que não são considerados nos currículos educacionais e que são necessários para se ensinar no próximo século .


Os sete saberes propostos por Morin são: 1) as cegueiras do conhecimento: o erro e a ilusão; 2) os princípios do conhe-cimento pertinente; 3) ensinar a condição humana; 4) ensinar a identidade terrena; 5) enfrentar as incertezas; 6) ensinar a compreensão; e 7) a ética do gênero humano .

Portanto, os sete saberes não são conteúdos disciplinares específicos, mas tratam de problemas essenciais relacionados aos sete buracos negros da educação, “completamente ignorados, subestimados ou fragmentados nos programas educativos, geralmente desconsiderados pela escola” (MORIN, 2000, p . 13) .

Concordamos com Petraglia (2012) que esses saberes, se incorporados à prática pedagógica, podem servir como subsí-dios para o enfrentamento de limitações do processo de ensino e aprendizagem que são geradas, sobretudo, pela frag-mentação dos conhecimentos . Nesse contexto, entendemos que práticas pedagógicas que considerem os sete saberes, por serem mais significativas para o aluno, podem contribuir para a aproximação da escola com a realidade . Compreende-mos, ainda, que são saberes relevantes e necessários ao bem viver e à formação de sujeitos mais felizes e comprometidos com uma política de civilização .

As cegueiras do conhecimento: o erro e a ilusão

Em todo e qualquer conhecimento, há o risco do erro e da ilusão e é papel da educação tornar isso evidente . Para Morin (2000), o processo de conhecer não é mero reflexo das coisas ou do mundo externo, pois todas as percepções são, ao mesmo tempo, traduções e reconstruções cerebrais com base em estí-mulos ou sinais captados e codificados pelos sentidos . Isso


justifica os erros de percepção, como, por exemplo, o fato de um mesmo objeto, observado por pessoas diferentes, provocar diferentes interpretações .

Quantos sofrimentos e desorientações foram e ainda são causados por erros e ilusões (o caso da catástrofe do Mar de Aral e os debates sobre a Primeira Guerra Mundial, por exem-plo) . Assim, o dever principal da educação é de armar cada um para o combate vital para a lucidez (MORIN, 2000) . Portanto, o problema da cegueira do conhecimento não deve ser um problema restrito aos filósofos, é um problema de todos e deve ser considerado nas práticas pedagógicas com o intuito de desconstruir práticas naturalizadas que são tidas como verda-des absolutas . Ademais, cabe à escola propiciar uma atmosfera que permita problematizar o “conhecimento do conheci-mento”, conscientizando os alunos sobre o risco do erro e da ilusão, como na música dos Engenheiros do Hawaí “Um dia me disseram que as nuvens não eram de algodão/Um dia me disse-ram que os ventos à vezes erram a direção/E tudo ficou tão claro/ Num intervalo da escuridão” .

Os princípios do conhecimento pertinente

Os princípios de um conhecimento pertinente dizem respeito à desfragmentação do conhecimento, visando a uma articulação que considere o contexto, o global, o multidimen-sional e o complexo .

Como pontua Morin (2000), o conhecimento das infor-mações ou dos dados isolados é insuficiente, portanto, é preciso situá-lo em um contexto para que adquira sentido . Sem contex-tualização, o conhecimento fica solto e desconectado, como é


narrado na fábula Os cegos e o elefante, apresentada por Almeida (2014) .

Segundo esta fábula, havia cinco cegos que não conhe-ciam o elefante e um dia foram levados ao animal . Cada cego começou a apalpá-lo e a dizer o que percebia . O primeiro cego, ao tocar as patas do elefante, achou que ele era parecido com grossas colunas; o segundo apalpou a tromba do animal e pensou que ele era sinuoso e flexível como uma cobra; o terceiro, pegando na cauda do elefante, imaginou ser um chicote; o quarto, tateando as presas, pensou ser um bastão maciço; o último cego, em contato com as orelhas do elefante, afirmou que ele mais parecia um leque maleável . As percep-ções que os cegos tiveram de cada uma das partes apalpadas do elefante – grossas colunas, cobra, chicote, bastão e leque – se articuladas, formariam um elemento estranho, que, na verdade, não representa nada . Nas palavras de Almeida (2014, p . 139), “o elefante foi conhecido pelos cegos de maneira disjuntiva; eles conceberam um ponto de vista a partir da vista de um ponto, sem que se elaborassem metapontos de vista capazes de alargar a visão e ampliar o foco” .

Esta fábula, metaforicamente, ilustra como se processa o conhecimento quando apresentado de forma fragmentada e descontextualizada . O resultado é “um elemento estranho” que não faz sentido para o aluno, desestimulando a aprendizagem . Assim, é papel da escola religar os saberes, contextualizando-os, com vistas a desenvolver oportunidades para um pensar complexo capaz de ampliar a visão e expandir as expectativas sobre determinado fenômeno .

Outro ponto que se torna invisível na compartimentaliza-ção dos saberes é a consideração do global, que pressupõe a


necessidade de se apreender as relações e influências entre as partes e o todo e entre o todo e as partes de um fenômeno, como nos versos do poema de Gregório de Matos:

O todo sem a parte não é todo, A parte sem o todo não é parte, Mas se a parte o faz todo, sendo parte, Não se diga, que é parte, sendo todo .

Assim como um holograma, que traz em cada parte a totalidade da informação que representa, cada indivíduo contém, de maneira hologrâmica, o todo do qual faz parte e que ao mesmo tempo faz parte dele . Portanto, há que se consi-derar a ideia de totalidade presente em cada indivíduo singular e a consequência de suas ações no todo em que vive .

Segundo Morin (2000, p . 37), “o todo tem qualidades ou propriedades que não são encontradas nas partes, se estas esti-verem isoladas umas das outras, e certas qualidades ou proprie-dades das partes podem ser inibidas pelas restrições prove-nientes do todo”, por isso a constatação de Marcel Mauss, citado por Morin (2000) de que “é preciso recompor o todo” . Reiterando a fábula dos cegos e o elefante, percebemos que é preciso, efetivamente, recompor o todo para conhecer as partes, contextualizando-as, para não incorrer em interpreta-ções distorcidas da realidade .

O conhecimento pertinente deve reconhecer, ainda, o caráter multidimensional do ser humano, que é, ao mesmo tempo, biológico, psíquico, social, afetivo e racional . A escola parece não reconhecer essa multidimensionalidade do ser humano ao enfatizar apenas o lado racional na aprendizagem .


Retomando, metaforicamente, os versos de Manoel de Barros, a ciência não se preocupa em “medir os encantos de um sabiá” .

Por fim, o conhecimento pertinente deve enfrentar a complexidade, o complexus, que é tecido junto, que diz respeito às interligações presentes na natureza e na sociedade e à junção entre unidade e multiplicidade .

Nessa perspectiva, a escola tem por finalidade possibilitar condições de aprendizagem que considerem as categorias contexto, global, multidimensional e complexo, pois, dessa maneira, o conhecimento torna-se pertinente para o aluno, criando condições para a compreensão das questões mais amplas da sociedade e uma possível intervenção para a preven-ção e solução de problemas, exercendo, assim, uma cidadania crítica . Para que isso seja possível, a escola deve valorizar práti-cas inter e transdisciplinares que favoreçam a construção cola-borativa do conhecimento .

Ensinar a condição humana

Ensinar a condição humana na perspectiva do pensa-mento complexo diz respeito a entender o humano, compreen-dendo sua unidade na diversidade e vice-versa, sem que uma ideia apague a outra . Em outras palavras, é preciso conceber a unidade do múltiplo e a multiplicidade do uno . Trata-se de refletir sobre a complexidade humana, considerando os consti-tuintes biológicos, psicológicos e socioculturais e essa reflexão implica em discutir a relação triádica entre indivíduo, socie-dade e espécie humana .

Se ensinadas na escola, essas perspectivas possibilitam a compreensão da relação entre indivíduo e sociedade, condu-


zindo à tomada de consciência sobre o respeito à diversidade e o cuidado com as questões socioambientais que afetam a todos os seres humanos, já que estamos embarcados em uma aven-tura comum nessa era planetária (MORIN, 2000) . Decorre, daí, a noção de interdependência, necessidade do cuidado por relações saudáveis entre os seres humanos e desses com o meio ambiente, em vista do trato das realidades de vida e desenvol-vimento de condições desejáveis (Sá, CARNEIRO, LUZ, 2013) .

Além disso, vale ressaltar a importância desse saber na prática pedagógica para que os professores possam compreen-der melhor seus alunos, entendendo-os como seres biológicos, psíquicos, afetivos, sociais e intuitivos e, sob essa ótica, reco-nhecendo suas subjetividades e problemas pessoais no ato educativo (Sá, CARNEIRO, LUZ, 2013) .

Ensinar a identidade terrena

Este saber nos remete a uma profunda reflexão sobre a rela-ção do homem com o planeta . Para Morin (2000), o que dificulta essa relação do homem com o mundo é o pensamento fragmen-tado, que atrofia a capacidade de contextualizar, globalizar e de compreender a multidimensionalidade e a complexidade do mundo, o que remete à reforma do pensamento .

Com a mundialização, “o mundo torna-se cada vez mais um todo . Cada parte do mundo faz, mais e mais, parte do mundo e o mundo, como um todo, está cada vez mais presente em cada uma de suas partes” (MORIN, 2000, p . 67) . Dessa maneira, para o melhor e o pior, cada ser humano, rico ou pobre, do Sul ou do Norte, do Leste ou do Oeste, traz em si, sem saber, o planeta inteiro . A mundialização é ao mesmo


tempo evidente, subconsciente e onipresente . Sá, Carneiro, Luz (2013, p . 165) pontuam que

tal processo de mundialização caracteriza-se por uma unificação conflituosa, permeada por interesses políticos e econômicos que impõem uma globalização cultural, afetando os modos de pensar e viver das sociedades diver-sas do mundo, gerando conflitos socioculturais; e além do mais, o mercado mundial dominador visa essencialmente ao lucro e não à qualidade de vida planetária .

“Aquilo que porta o pior perigo traz também as melhores esperanças: é a própria mente humana, e é por isso que o problema da reforma do pensamento tornou-se vital” (MORIN, 2000, p . 75) .

Enfim, todos os humanos, desde o século XX, vivem os mesmos problemas fundamentais de vida e de morte e estão unidos na mesma comunidade de destino planetário, por isso, “é necessário aprender a ‘estar aqui’ no planeta”, pontua Morin (2000, p . 76), o que significa “aprender a viver, a dividir, a comu-nicar, a comungar; é o que se aprende somente nas – e por meio de – culturas singulares” . O autor alerta, ainda, que “a união planetária é a exigência racional mínima de um mundo enco-lhido e interdependente . Tal união pede a consciência e um senti-mento de pertencimento mútuo à Terra” (MORIN, 2000, p . 75) .

Nessa perspectiva, cabe à escola propiciar uma educação cidadã e planetária, perpassando todos os conteúdos curricu-lares, possibilitando o desenvolvimento de uma consciência ecológica e sociocultural, relacionada à conservação dos ambientes de vida, e a uma aceitação da diversidade cultural, reconhecendo-se a unidade na diversidade .


Corroborando essa ideia, Freitas (2010, p . 21) alerta que, se consideradas no âmbito escolar, “essas questões permitem uma constante reflexão sobre a ação humana na Terra e suas conse-quências” . A autora acrescenta que isso possibilita uma espe-rada conscientização “para que as mudanças necessárias sejam implementadas com o objetivo de promover melhores condi-ções de vida a partir das relações estabelecidas neste ambiente” .

Assim, a escola parece ser um lugar privilegiado para ensinar a identidade terrena, buscando construir nos educandos a consciência de que o Planeta Terra é único e que precisa ser preservado sob pena de autodestruição da humanidade, tornando impossível a habitação para as gera-ções presentes e futuras .

Enfrentar as incertezas

A sociedade contemporânea é marcada pela incerteza, pela constatação de que o futuro é imprevisível e, consequente-mente, compreende-se “a incerteza irremediável da história humana” que foi e “continua a ser uma aventura desconhecida” (MORIN, 2000, p . 79) . Resta-nos, então, aprender a enfrentar a incerteza, uma vez que vivemos em uma sociedade complexa que se caracteriza por mudanças rápidas, em que os valores são ambivalentes e tudo é interligado, como sugerem os versos de Gregório de Matos:

( . . .) Mas no Sol, e na Luz falte a firmeza, Na formosura não se dê constância, E na alegria sinta-se tristeza .


( . . .) A firmeza somente na inconstância .

Para enfrentar a incerteza, duas questões precisam ser consideradas: 1) a consciência da aposta contida na decisão e 2) a estratégia (MORIN, 2000) . Feita a escolha refletida de uma decisão, é necessário ter consciência da incerteza que faz dessa decisão uma aposta, sujeita ao risco de perder ou ganhar, tornando-se um desafio, a partir do qual entra em cena a estra-tégia . A estratégia consiste na elaboração de um cenário de ação que examina o que é certo e o que é incerto, provável e improvável em uma dada situação, ou seja, a estratégia consi-dera as condições externas, o contexto de ação .

Há que se considerar, ainda, nesse enfrentamento da incer-teza, o surgimento do novo que, justamente por ser novo, não pode ser previsto e, como na música de Belchior, por mais que amemos o passado e não queiramos ver, “o novo sempre vem” (BELCHIOR, 1974) . O novo pode trazer a evolução, que “é fruto do desvio bem-sucedido cujo desenvolvimento transforma o sistema onde nasceu: desorganiza o sistema, reorganizando-o” (MORIN, 2000, p . 81) e toda evolução é desorganizadora e, ao mesmo tempo, reorganizadora em seu processo de transforma-ção ou de metamorfose . Assim, o novo pode também trazer a destruição que, por sua vez, pode trazer novos desenvolvimen-tos, a exemplo dos avanços da técnica, da indústria e do capita-lismo que levaram à destruição de civilizações tradicionais .

Diante disso, cabe à escola ensinar que o conhecimento é “a navegação em um oceano de incertezas, entre arquipéla-gos de certezas” (MORIN, 2000, p . 86) e, por isso, é provisó-


rio e passível de desconstruções e reconstruções, devendo ser problematizado sempre .

Ensinar a compreensão

Ensinar a compreensão deve ser uma das finalidades da educação, uma vez que o problema da compreensão tornou-se crucial para a humanidade . Morin (2000) apresenta duas formas de compreensão: a compreensão intelectual ou objetiva e a compreensão humana intersubjetiva . A primeira implica apreen-der em conjunto o texto e seu contexto, o todo e as partes, o múltiplo e o uno . Nesse sentido intelectual, a compreensão está relacionada à inteligibilidade e à explicação . Já a segunda forma de compreensão ultrapassa a dimensão intelectual e implica um processo de intersubjetividade . Assim, “o outro não apenas é percebido objetivamente, é percebido como outro sujeito com o qual nos identificamos e que identificamos conosco, o ego alter que se torna alter ego (MORIN, 2000, p . 95) . A compreensão humana intersubjetiva deve, então, incluir um processo de empatia, de identificação e de projeção .

A partir desse ponto de vista, cabe à escola abordar as relações interpessoais entre o eu e o o tu – entendendo que o eu se torna EU na relação com o TU, ou seja, a totalidade da exis-tência se constrói na relação EU-TU (BUBER, 2001) – no sentido de conscientizar os educandos sobre a importância da compreensão humana, por meio da qual firma-se a solidarie-dade intelectual e moral da humanidade .

É papel da escola, ainda, criar espaços para que sejam discutidos e problematizados temas críticos como diversidade cultural, racismo, tolerância religiosa, respeito às minorias,


violência contra a mulher e tantos outros temas que dão margem a atitudes preconceituosas originadas de uma convic-ção absoluta de verdade que “aniquila qualquer possibilidade de compreensão de outra ideia” (MORIN, 2000, p . 99) . Por meio da problematização desses temas, é possível ampliar o olhar dos educandos, levando-os a relativizar a verdade dos fatos, a evitar o “espírito redutor” (MORIN, 2000, p . 98) e a compreender o ser humano de maneira complexa .

A ética do gênero humano

O sétimo saber postulado por Morin compreende o gênero humano a partir de uma concepção complexa formada pela tríade indivíduo-sociedade-espécie em que cada sujeito é coprodutor do outro, isto é, o indivíduo pertence à espécie humana e, na interação com outros indivíduos, produz a socie-dade que, por sua vez, retroage sobre os indivíduos .

Para uma boa convivência em sociedade, faz-se necessário o reconhecimento do outro como ser humano em condições de igualdade democrática . O sentimento democrático é um valor fundamental no processo educativo, na medida em que favo-rece a relação respeitosa entre indivíduo e sociedade – enten-dendo cada pessoa como cidadão, sujeito responsável e deten-tor de direitos . Nesse contexto está o respeito à diversidade sociocultural, o que exige busca de consenso nos conflitos mediante o diálogo, para salvaguardar a vida democrática (Sá, CARNEIRO, LUZ, 2013) .

Assim, a escola deve ser concebida como um espaço que ensine a respeitar e que respeite os direitos humanos, tendo a ética do conhecimento e a ética da responsabilidade como caminhos .


3.2 Práticas pedagógicas inspiradas nos sete saberes: algumas possibilidades

Considerar os sete saberes nas práticas pedagógicas não é tarefa fácil . Trata-se de um desafio, primeiramente, porque requer um desejo pessoal de mudança que nos leva a refletir sobre nossas concepções de ensino e de educação para, então, querer fazer diferente . Em segundo lugar, há que se considerar os conteúdos previstos no currículo, bem como o envolvimento de outros professores para um trabalho interdisciplinar, da direção da escola, dos pais, enfim, de todos os envolvidos nos processos educativos . Como pontua Morin (2000, p . 20), “a reforma do ensino deve levar à reforma do pensamento, e a reforma do pensamento deve levar à reforma do ensino .

A seguir, apresentamos alguns exemplos do que se mostrou possível em nossas práticas pedagógicas, sem pretensões de oferecer receitas prontas a serem seguidas . O que fizemos foi uma tentativa de incorporar os sete saberes em nossas práticas .

Contando histórias para conviver com as diferenças

O contexto da ação pedagógica apresentada é o 4º ano do curso de Letras do câmpus Inhumas da Universidade Estadual de Goiás – UEG . A disciplina em questão é Orientação para o Estágio Supervisionado em Língua Inglesa II . De acordo com o planejamento, o conteúdo a ser abordado naquele dia era “A elaboração dos projetos de estágio” . O objetivo da aula era sugerir temas a serem abordados nas aulas de estágio de inglês no ensino médio . Para isso, escolhemos ler a história infantil


“Papai!”, de Philippe Corentin (2008)2 . Trata-se de um livro de literatura infantil, que aborda o medo que as crianças têm de dormir sozinhas, imaginando monstros embaixo da cama . Vamos, aqui, recuperar partes da história para melhor explici-tarmos nossos objetivos com a aula .

A aula iniciou-se com a contação da história de maneira interativa . Nas primeiras páginas do livro, aparecem, numa mesma cama, “duas criaturas” que, ao se darem conta da presença um do outro, ficam estancadas pelo terror de tal forma que só conseguem encarar a companhia que está ao lado como ameaça e gritar: “Papai!”, como ilustra a figura a seguir:

Figura 1: ilustração do livro “Papai!”

Nesse momento da leitura, movidas pelo desejo de envolver os alunos, perguntamos de quem era o grito . A grande maioria respondeu que era do “monstro” . Continuamos a leitura da história . Na página seguinte, aconteceu o inesperado:

2 Este livro foi disponibilizado gratuitamente no ano de 2014 pela Fundação Social do Banco Itaú .



O grito, na verdade, era do “monstro” e não do menino . Os alunos ficaram surpresos ao perceber que “o monstro” era, na verdade, o menino, sob aquele ponto de vista . Demos conti-nuidade à contação da história sem interrupções .

No decorrer da história, o autor explora a perspectiva de cada um dos personagens . Primeiramente, sob o ponto de vista do “monstro” que, assustado com o menino, chama pelo pai que o atende prontamente . O autor apresenta, então, uma família de “monstros” que esbanja amor e carinho em relação ao filho .



A outra metade do livro explora a perspectiva do menino que, assustado com o “monstro”, também grita pelo pai . Do mesmo modo, o autor nos conduz a uma atmosfera familiar repleta de amor e carinho, mas dessa vez, sob o ponto de vista do menino .

Ao longo da história, percebe-se que o drama enfrentado por cada um dos personagens consiste num medo infundado, pois se dá em virtude da falta de conhecimento que nenhuma das criaturas se preocupa em preencher . No entanto, no final da história, as personagens parecem ter superado o medo e optam pela “boa convivência”, conforme a ilustração:



Ao término da leitura, propusemos alguns questionamen-tos: quem é o “monstro” da história? E se o monstro do qual você tem medo também tivesse medo de você? E se ele também tivesse uma mãe que o acalenta e um pai que dá um beijo de boa noite antes de dormir? O que te levou a perceber o dife-rente como um “monstro”?

As discussões trouxeram à tona as seguintes percepções: podemos parecer diferentes aos olhos de outra pessoa; a iden-tificação de quem é o “monstro” depende, na verdade, do ponto de vista de cada um; “os monstros” não são tão diferentes assim; os limites entre o sonho e o despertar são bastante sutis, quase imperceptíveis .

As discussões elucidam a ideia de Morin (2000) de que o ato de conhecer é uma tradução e reconstrução e não um reflexo fiel da realidade . Este conhecimento, ao mesmo tempo tradução e


reconstrução, comporta a interpretação, o que introduz o risco do erro na subjetividade do conhecedor, de sua visão do mundo e de seus princípios de conhecimento . Daí os numerosos erros de concepção e de ideias que sobrevêm a despeito de nossos controles racionais, podendo criar esteriótipos .

Corroborando o pensamento de Morin (2000) – defen-dido no primeiro saber – de que é papel da educação identificar a origem de erros, ilusões e cegueiras, perguntamos aos alunos o que os levou a pensar que o grito era do “monstro” e não do menino . As respostas podem ser assim resumidas: devido à aparência estranha da personagem de cor esverdeada que, em nosso contexto, parece ser esteriótipo de “monstro”, por ser uma criatura diferente .

Essa discussão remete-nos à ideia de imprinting cultural e normalização, apresentadas por Morin . Segundo o autor, o imprinting é um termo proposto por Konrad Lorenz para dar conta da marca indelével imposta pelas primeiras experiências do animal recém-nascido (como ocorre com o filhote de passa-rinho que, ao sair do ovo, segue o primeiro ser vivo que passe por ele, como se fosse sua mãe), como na história O patinho feio ou no desenho de Walt Disney Cornélio, o leão cordeirinho3. O imprinting cultural marca os humanos desde o nascimento, primeiro com o selo da cultura familiar, em seguida, da esco-lar, depois, prossegue na universidade ou na vida profissional . Assim, a seleção sociológica e cultural das ideias raramente obedece à sua verdade; pode, ao contrário, ser implacável na

3 Trata-se da história de um leão que, por ser criado entre ovelhas, comportava--se como ovelha e não se via como leão . Disponível em https://www .youtube .com/watch?v=-Ieh8pVZEow


busca da verdade, devido à normalização que elimina o que poderia ser contestado (MORIN, 2000) .

As discussões que emergiram da contação da história susci-taram, ainda, reflexões sobre a nossa identificação com o outro e a abertura ao diferente, remetendo-nos ao sexto saber postulado por Morin (2000) – ensinar a compreensão . Conforme nos lembra o autor, apesar dos inúmeros avanços do nosso século, a incompreensão em relação ao ser humano ainda permanece . Grande parte dessa incompreensão deve-se ao fato de olharmos para o outro com um espírito reducionista, reduzindo toda a sua complexidade a uma característica apenas, geralmente negativa (MORIN, 2000) . Há que se enxergar o outro como um ser complexo, num processo de intersubjetividade (conforme mencionado anteriormente) . Afinal, ninguém temerá “mons-tros” se a diferença não for vista como ameaça .

As discussões remeteram-nos, também, à ética do gênero humano, o sétimo saber . Conviver com a diversidade, respeitar o direito do outro de ser diferente é um ato democrático . Como já dissemos antes, para uma boa convivência em sociedade, faz-se necessário o reconhecimento do outro como ser humano em condições de igualdade democrática . Mas e quando o outro parece ser “um monstro”? Morin (2000) reconhece que não é fácil exercer a ética do gênero humano, a antropoética, que, para ele, só é possível por meio de um pensamento complexo .

Por meio da simplicidade dessa história, acreditamos que foi possível conscientizar os alunos de que todo conhecimento é passível de erro e ilusão, portanto, é preciso questionar o porquê de pensarmos como pensamos, problematizando o conhecimento do conhecimento . Além disso, as discussões levaram-nos a repensar a compreensão humana e a ética do


gênero humano . Não buscamos “pássaros-dourados” (fazendo alusão aos versos de Stevens, mencionados na epígrafe), tenta-mos considerar o “pássaro-preto” que ronda os nossos pés, isto é, não foi preciso elaborar um projeto grandioso para abordar os saberes em nossa prática . Trabalhamos dentro das possibili-dades de tempo e espaço, sem desconsiderar as previsões de conteúdos curriculares . O que pensamos ter feito diferente foi a escolha de um texto que possibilitou diferentes percepções sobre uma mesma situação e a valorização da problematização e do conflito em relação a isso . Temos consciência de que não esgotamos todas as possibilidades que a história permite, terminamos a aula com o sentimento de que poderíamos ter problematizado outras questões, mas, por outro lado, sentimos que nossa prática foi ressignificada .

Acreditamos que discutir essas questões com alunos em processo de formação inicial de professores mostra-se muito relevante, pois, por meio da tomada de consciência sobre as cegueiras do conhecimento, a necessidade da compreensão e da ética do gênero humano torna-se mais evidente a importân-cia da reflexão contínua sobre a prática docente . Assim, ao elaborarem os projetos de estágio para as aulas de inglês do ensino médio, acreditamos que, de alguma maneira, esses futuros professores abordarão esses saberes em suas aulas .

Cine-formação: filme “Escritores da liberdade”

A ação pedagógica que vamos apresentar nesta seção mostra-se bastante relevante para a discussão das teorias abor-dadas neste capítulo, pois se trata de uma atividade interdisci-plinar, elaborada colaborativamente, envolvendo as seguintes


disciplinas do curso de Letras: Didática (2º ano); Psicologia (2º e 3º ano); Orientação para o estágio supervisionado em língua inglesa I (3º ano); e Orientação para o estágio supervisionado em língua inglesa II (4º ano) .

O fio condutor da aula foi o filme “Escritores da liberdade” (2006), no qual uma jovem e idealista professora – Gruwell (Hilary Swank) – chega a uma escola de um bairro pobre e encontra um cenário de constante tensão racial entre os alunos . Assim, para fazer com que eles aprendam e também falem mais de suas complicadas vidas, a professora lança mão de métodos diferentes de ensino . Aos poucos, os alunos vão reto-mando a confiança em si mesmos, aceitando mais o conheci-mento, e reconhecendo valores como a tolerância e o respeito ao próximo4 .

Após os alunos assistirem ao filme, com o áudio em inglês e as legendas em português, com direito a pipoca, foram propostas as seguintes questões para discussão:

De acordo com Freire (1991),

a natureza da prática educativa, a sua necessária diretivi-dade, os objetivos, os sonhos que se perseguem na prática não permitem que ela seja neutra, mas política sempre . É a isto que eu chamo de politicidade da educação, isto é, a qualidade que tem a educação de ser política . A questão que se coloca é saber que política é essa, a favor de quê e de quem, contra o quê e contra quem se realiza .

4 Mais informações disponíveis em http://www .adorocinema .com/filmes/fil-me-60975/


• Considerando que a ação educativa nunca é uma ação neutra, como você percebe o caráter político da educa-ção no filme?

• Como você vê a representação de diferentes grupos culturais/étnicos/raciais no filme? Quais são as opções do educador, em uma sociedade de classes, na qual há dominantes e dominados?

Pessoa, Urzêda-Freitas (2012, p . 60) defendem que

é preciso que os professores estimulem o questiona-mento das práticas discursivas que bloqueiam a voz das minorias, dos diferentes . Apenas com essa atitude, teremos a oportunidade de fazer uso da linguagem para destruir e/ou reescrever esses processos que tanto afetam as sociedades contemporâneas .

Que ações da professora, no filme, valorizam a voz das minorias (representadas, no filme, pelos alunos)?

Para Arendt (1989),

a educação é, também, onde decidimos se amamos nossas crianças o bastante para expulsá-las a seus próprios recur-sos, e tampouco arrancar de suas mãos a oportunidade de empreender alguma coisa nova e imprevista para nós, preparando-as em vez disso com antecedência para a tarefa de renovar um mundo comum .

Considerando que o drama vivido pela professora, no filme, representa os dramas vividos pelos professores no contexto educacional brasileiro quando se sentem na responsa-


bilidade de interferir e ajudar a mudar a condição humana do outro, quais as suas sensações e reações, enquanto (futuro/a) educador/a, diante do sucesso, ou seja, quando investe no outro e consegue bons resultados? E do fracasso?

1) A professora Erin, no filme, tenta “dar aula” segundo o modelo tradicional, que não funciona com alunos indi-ferentes ao propósito da escola eminentemente ensi-nante . Uma aluna questiona para que serve aprender tal conteúdo abstrato considerado inútil para melhorar sua vida real; outro dirá que o fato de ela ser professora “branca” não é suficiente para ele respeitá-la . Que atitu-des da professora respondam essas questões imprescin-díveis na escola contemporânea? Como professor/a, você faria diferente?

2) Quais elementos de Escritores da Liberdade você achou mais significativos? Destaque e fale sobre algum .

3) Miep Gies (personagem real) tem papel relevante no filme . Fale a respeito dela .

4) O que caracteriza um herói na sua opinião? Exemplifi-que um herói da sua vida .

Das discussões, surgiram importantes questões que perpassam os saberes defendidos por Morin . Em suma, as reflexões versaram sobre: a) o caráter político da educação, entendendo que é preciso considerar a ética do gênero humano, que implica um princípio de democracia; b) a importância de os espaços escolares servirem de cenários para a problematiza-ção de práticas naturalizadas, para que verdades absolutas sejam contestadas, com vistas à justiça social; c) o entendi-


mento de que e escola deve ensinar, além dos conhecimentos acadêmico-científicos, valores humanos; d) a compreensão de que as práticas pedagógicas que não consideram a realidade do aluno e que não servem para melhorar sua vida real devem ser ressignificadas .

Analisando essas questões, percebemos que nossa ação pedagógica interdisciplinar foi além dos conhecimentos científicos, provocando nos alunos profundas ref lexões sobre a profissão docente e o papel da educação na socie-dade contemporânea . Por esse motivo, consideramo-na uma ação transdisciplinar .

Ao final da atividade, nós, professores, ficamos encanta-dos com o teor das discussões voltadas para a realidade . Senti-mos, também, que os alunos ficaram encantados com a ação pedagógica da professora do filme e com a nossa atitude de nos juntarmos para discutir um tema tão importante sob diferen-tes pontos de vista . Como nos versos de Manoel de Barros: “que a importância de uma coisa não se mede com fita métrica nem com balanças nem barômetros etc . / Que a importância de uma coisa há que ser medida pelo encantamento que a coisa produza em nós”, acreditamos que o ensino também se mede pelo encantamento .

Considerações finais

Considerar os sete saberes no processo educativo permite uma concepção transdisciplinar que implica a religação dos saberes, propondo uma mudança paradigmática que supere as práticas institucionalmente consolidadas e promovendo a conjugação da cultura científica com a cultura humanística .


Tanto na abordagem teórica sobre os sete saberes necessá-rios à educação quanto nas práticas pedagógicas aqui analisadas procuramos construir metapontos de vista, estabelecendo a rela-ção entre o conhecimento científico e outras formas de expres-são humana, como a poesia, a música, a literatura e o cinema, pois corroboramos a ideia de Petraglia (2012) de que a utilização de linguagens variadas contribui para atingir resultados mais satisfatórios no processo de ensino e aprendizagem .

Defendemos que a sala de aula deve ser um espaço proble-matizador, porém agradável, que provoque empatia e estimule a criatividade, deixando de ser enfadonho, técnico e acumula-tivo . Afinal, como apresentamos na epígrafe, “quem acumula muita informação perde o condão de adivinhar: divinare” (BARROS, 2000) . Um ensino que enfatiza o acúmulo de infor-mações leva à perda do “condão de adivinhar”, da “varinha mágica” que transforma a realidade, fazendo perder também o encanto . É preciso “divinare”, dimensão somente alcançada por aqueles que aceitam o desafio de ser como os “sabiás”, pois os sabiás “divinam” .

ReferênciasALMEIDA, Cleide Rita Silvério de . É possível exercer uma prática educativa baseada no pensamento complexo? In: MORAES, Maria Cândia; SUANNO, João Henrique (orgs .) . O pensar complexo na educação: sustentabilidade, transdisciplinaridade e criatividade . Rio de Janeiro: Wak editora, 2014 .

ASSIS, Machado de . Conto de Escola . In: Contos . São Paulo: Paz e terra, 1996 .

BARROS, Manoel de . Ensaios fotográficos . Rio de Janeiro: Editora Record, 2000 .

BUBER, Martin . Eu e Tu. Tradução e introdução de Newton Aquiles von Zuben . 5 .ed . São Paulo: Centauro, 2001 .


FREITAS, Carla Conti de . Sustentabilidade no Ensino Superior: uma prática transdisciplinar na formação de professores . Goiânia: Kelpes, 2010 .

MORIN, Edgar . Os sete saberes necessários à educação do futuro . São Paulo: Cortez; Brasília, DF: UNESCO, 2000 .

______ . A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento . Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001 .

PETRAGLIA, Izabel . Educação e Complexidade: os sete saberes na prática pedagógica . In: MORAES, Maria Cândida; ALMEIDA, Maria da Conceição de (orgs .) . Os sete saberes necessários à educação do presente: por uma educação transformadora . Rio de Janeiro: Wak Editora, 2012 .

Sá, Ricardo Antunes de; CARNEIRO, Sonia Maria Marchioratto; LUZ, Araci Asinelli da . A escola e os sete saberes: reflexões para avanços inovadores no processo educativo . In: Revista da FAEEBA – Educação e Contemporaneidade, Salvador, v . 22, n . 39, p . 159-169, jan ./jun . 2013 .

STEVENS, Wallace . The palm at the end of the mind: selected poems and a play . New York: Vintage Books, 1967 .

EMOçãO, COGNIçãO E CORPOREIDADE:OS SETE SABERES NECESSÁRIOS à EDUCAçãO DO FUTURO NA SALA

DE AULA DO PRESENTE

João Henrique Suanno

A ambição da complexidade é relatar articulações que são destruí-das pelos cortes entre disciplinas, entre categorias cognitivas e entre tipos de conhecimento. De fato, a aspiração à complexidade tende para o conhecimento multidimensional. Não se trata de dar todas as informações sobre um fenômeno estudado, mas de respeitar as suas diversas dimensões... (Edgar Morin)

A velocidade de transformações sociais, pessoais e ambientais que temos e sofremos atualmente nos leva à necessidade de buscarmos novos contextos

educacionais a fim de formarmos o cidadão que atenda à essas necessidades de convivência ética e responsável com as outras pessoas e com todos os tipos de ambientes no qual convive e, também, com aqueles ambientes nos quais não convivem, nem sequer sabe da sua existência, mas entende que a corresponsa-bilidade por ele também é sua .

A educação, por meio de suas práticas pedagógicas docentes (SUANNO, 2014a), metodologias de ensino (SUANNO, 2013) que procuram facilitar os processos de aprendizagem com mudança de consciência a fim de uma

4


mudança atitudinal no sentido de atuar em benefício do todo, atuando nas partes, entendendo que tudo está interligado, e paradigmas que sustentam essa nova visão de educação, auxi-lia na construção de um alicerce que sustente o ser em seu processo de auto-formação, a partir da hetero e da eco-forma-ção (SUANNO, 2013a, 2014b) entendendo que os três proces-sos de formação acontecem imbricados um ao outro, e que estão separados aqui, apenas didadicamente .

A auto-formação é o transformação que acontece no indi-víduo a partir de sua tomada de consciência acerca dos valores que lhe são caros, adquiridos por meio da hetero-formação, a qual acontece nas relações sociais desse indivíduo com os demais que lhe cercam, mesmo que não em uma ação de rela-ção direta, mas que também são significativos, desde que tragam atitudes observáveis e que interagem com o pensa-mento do indivíduo, em um ambiente qualquer, como todo ambiente onde possa se encontrar com o outro, pessoa que tem uma significância para esse indivíduo, seja esse ambiente o social, o familiar, a natureza, o rural ou o urbano, como também o virtual, o subjetivo, onde vaga na fantasia dos dese-jos e ali se depara com seus valores e ética e se transforma (SUANNO, 2013b), sendo percebida a todo momento quando em relação novamente com o outro pode atuar, diferentemente de antes, e ser um contribuidor com outrem . Desta maneira, a parte é influenciada pelo todo, mas influencia também, a todo o momento, realizando trocas organizadoras de auto-forma-ção, heteroformação e ecoformação .

Essa capacidade de aprendizagem e autotransformação (SUANNO, 2007) de si mesmo em uma pessoa que se autosu-pera em suas ações diárias consigo mesmo e com os outros, é

111Emoção, cognição e corporeidade

acrescida quando esse indivíduo tem um olhar multidimensio-nal sobre a realidade e os fatos, e faz uma leitura multirreferen-cial sobre o que lhe acontece e observa .

Para tal, é imprescindível que os alunos estejam prepara-dos para o enfrentamento das múltiplas realidades que encon-trarão pela frente e os sete saberes necessários à educação do futuro, propostos por Edgar Morin, segundo Werthein (2000, p . 12) “constituem eixos e, ao mesmo tempo, caminhos que se abrem a todos os que pensam e fazem educação, e que estão preocupados com o futuro das crianças e adolescentes” . Os sete saberes são: 1 – As cegueiras do conhecimento: o erro e a ilusão, 2 – Os princípios do conhecimento pertinente, 3 – Ensinar a compreensão humana, 4 – Ensinar a identidade terrena, 5 – Enfrentar as incertezas, 6 – Ensinar a compreensão e 7– A ética do gênero humano .

O objetivo deste capítulo é aproximar à prática pedagógica (SUANNO, 2014a) do professor e da professora que atua direta-mente em sala de aula, algumas sugestões de metodologias de ensino que auxiliem no trabalho dos sete saberes com os alunos (SUANNO, 2013) . Assim, partamos para o primeiro saber:

4.1 As cegueiras do conhecimento: o erro e a ilusão

Cabe ao professor ser um condutor do processo metodoló-gico investigativo, no qual motive práticas inovadoras (SUANNO, 2010b)na aquisição do conhecimento do aluno a considerar-se sujeito ativo nesse processo . Na ensinagem, o professor se relaciona com vários sujeitos cognitivos, cada um com seu modo de pensar e agir . Promover espaços que permi-tam o envolvimento de todos para o reconhecimento de si em


processo metacognitivo, relacionando ainda a emoção e a corporeidade é uma maneira de lidar com os erros e a ilusão .

Assim, a dança e os ritmos trabalham com o movimento, a corporeidade e a subjetividade de cada sujeito envolvido no processo, pois cada pessoa tem seu sua maneira de agir, de aprender e participar de uma mesma metodologia empregada pelo professor . No entanto, cada aluno requisitará, interna-mente, uma organização da nova experiência se ser vivida e uma reorganização de estruturas cognitivas já construídas, a fim de construir e ampliar seus níveis de realidade e de percep-ção sobre a experiência mediatizada pelo professor . Cada indi-víduo faz suas reorganizações a partir da mesma experiência vivenciada, amplia seu olhar, seus sentidos e suas percepções, imprimindo outras relações com o objeto no seu rol de conhe-cimento em construção .

A importância do papel do professor nesse momento é o de ser o angustiador por meio de perguntas motivadoras do questionamento por parte do aluno e consequente bisca de saídas para tais perguntas que, ao mesmo tempo, geram outras e mais outras iniciando um processo auto motivador da curiosidade pela aprendizagem . Esses questionamentos poderão ser a respeito das relações estabelecidas anteriores à experiência vivida e dizer o que ainda não era percebido e agora o é, e perceber que aquilo que não era percebido como o novo não era errado, mas apenas uma maneira de pensar diversa do que é agora .

A fim de se lidar com a aprendizagem, entender o erro como parte do processo de construção do conhecimento se faz imprescindível . Temos várias formas de aprender e ensaio e erro é uma delas . Da mesma forma a escola deve perceber-se


em processo de construção do seu próprio conhecimento e, em seu processo, ainda deve lidar com os erros advindos das tenta-tivas de acerto, como parte da transformação intrínseca de si mesmo, também como sujeito aprendente . Percebemos, muitas vezes, unidades escolares que cobram o acerto, discriminando, intolerantemente, o erro dos seus alunos e não percebem os erros que acontecem consigo mesmas, nas suas relações inter-pessoais, na organização de seus papéis desempenhados por seus atores sociais, no desempenho de suas funções organizati-vas e outros .

Perceber-se como unidade escolar em processo é aceitar-se errando como parte da busca do acerto e contribui para que possa entender seu aluno como o outro que pode auxiliar holo-gramaticamente nessa auto-organização . Não se pode deixar o aluno se iludir ao pensar que o erro trás somente algo bom, isso seria uma ilusão, mas que ele traz suas consequências, e que diante delas surgem novas possibilidades de reflexão para tentar acertar e repensar os fatos que o circundam, ampliando os níveis de percepção e os níveis de realidade, para tentar acertar, procurar agir de diferentes modos, com outras atitu-des, com outras pessoas e com o meio .

A realidade da escola pode e deve ser compartilhada por todos aqueles que vivem e convivem dentro do ambiente escolar, inclusive os alunos, para aqueles assuntos que podem ser ajuda-dos por eles na busca de uma possível solução (SUANNO, 2013b) . Uma determinada dificuldade pode ter diversas opiniões e sugestões de resolução de maneiras diferentes não estão errados, mas em conjunto possibilitam saídas que, porventura, dantes não foram vistas isoladamente por uma única pessoa . Aqui, a importância do trabalho grupal ainda é evidenciada e experien-


ciada na aprendizagem cooperativa, além dos conhecimentos pré-existentes . O sentimento coletivo de serem, cada um dos atores da escola, membros pertencentes, contribuidores da vida em comum, os tornam corresponsáveis como também protago-nistas, cada um deles, dessa vida em comum . O exercício da racionalidade, aliada ao sentimento de zelo e cuidado pelo outro são vividos interligada e inseparavelmente, dando vazão ao sentipensar (MORAES & TORRE, 2004) .

A proposta pode ser apresentada ao corpo docente no planejamento podemos apresentar o grupo o trabalho como o erro e a ilusão em várias vertentes, por exemplo, vídeos, apre-sentando e discutindo formas de trabalhar que o aluno possa ser ouvido mediante ao conteúdo, destacando o erro faz parte da aprendizagem e deve ser visto como uma forma de aprender e possibilitando que o grupo também apresente ideias para trabalhar os sentidos do erro e da ilusão . Desse modo, o exercí-cio de pensar e repensar as práticas da escola, dentro e além das reuniões coletivas de planejamento, avalições ou colegia-dos e conselhos de classe se torna um momento de meta análise do processo metacognitivo de aprendizagem da própria escola .

A partir do momento em que a escola se coloque nesse novo patamar de questionar-se e de encarar seus problemas com seguida busca de possíveis soluções, poderíamos pergun-tar: Como poderia o professor poderia auxiliar seus alunos nesse mesmo processo? Uma maneira poderia ser conside-rando os níveis de conhecimento, realidade e percepção de seus alunos, evitando o pensamento fragmentador desses conhecimentos, buscando a complementaridade entre o que aparentemente poderiam ser pensamentos opostos entre alunos, auxiliando-os a se perceberem complementares aos


seus companheiros e amigos de classe, ou seja, o que o outro possui diferente de um o enriquece, o motiva, o complementa e auxilia à noção de que ninguém é tudo, bom em tudo e sabe tudo, ajudando a desenvolver o pensamento de que em um momento ou outro, necessitamos uns dos outros e de seus conhecimentos, e as relações de aceitação podem, quem sabe, se ampliarem .

Diante de uma perspectiva transdisciplinar (SUANNO, 2010a), uma metodologia que auxilie o aluno à aceitação do seu erro e ilusão como elemento motivador à sua superação como etapa, não imprescindível, mas natural à caminhada de todas as pessoas, é a troca de experiências que possibilite o surgi-mento de outras ideias e à construção, reconstrução e recondu-ções de saberes a partir de uma aprendizagem cooperativa, por meio do sentipensar (MORAES & TORRE, 2004) . Os recursos utilizados podem ser os mais variados como a música, a inter-net, o celular, considerando essas ferramentas como um auxí-lio ao professor e deixando de lado a ilusão que elas não irão contribuir com o ensino e aprendizagem .

O professor precisa envolver o aluno no processo de aprendizagem dando oportunidade ao aluno de participar da construção do conhecimento, lhe dando autonomia para que ele dê sugestões e respeitando as opiniões dadas, onde as meto-dologias utilizadas consigam atender ás necessidades do aluno possibilitando que ele participe construindo de sua própria aprendizagem . Pode também olhar para o erro como possibili-dade de aprendizagem, compreendendo que o erro está direta-mente ligado ao processo de construção do conhecimento, sendo ele mais uma forma de aprofundar, ou descobrir outra maneira de aquisição do saber, levando o aluno a ser autor e


coautor do seu processo de aquisição do conhecimento como sujeito complexo, com todas as possibilidades inclusas, sendo elas cognitivas, emocionais e corporais . O aluno, capaz de unir a cognição e a emoção na construção do seu conhecimento, favorece o processo de aprendizagem e valoriza a sua realidade interna, sua subjetividade, vinculando-a ao aprendido, dando um significado pessoal .

Uma roda de conversa onde cada um expõe suas expe-riências, uma a cada vez, pode ser uma prática de trabalho pedagógico e o professor pode propor, nessa situação, uma abertura de pensamento em relação às experiências do colega, de forma a refletirem, na história de cada um, o seu erro e a sua ilusão de acerto e de certeza, colocando-se no lugar do outro, exercitando também a capacidade empática de todos os seus alunos . Esse trabalho de roda de conversa, realizado também com a equipe gestora da escola, pode ser a motivadora da refle-xão de seus erros e ilusões, aceitando as incertezas e construir a flexibilidade necessária para um fazer pedagógico transdisci-plinar e complexo .

Possibilitar que os alunos em sala de aula, assim como professores em sala ou em reuniões de planejamento, e também as coordenações e direção das unidades escolares, verbalizem sobre seus processos de entrar em contato com seus erros em momentos e situações diversas um do outro, e como puderam reorganizarem-se para que pudessem buscar possíveis soluções para o enfrentamento de realidades adversas ou não, aproxi-mam as pessoas como semelhantes, diminuindo também a fantasia de que alguém possa ter mais erros, dúvidas e ilusões em quantidade menor que outros, e a entender que não o são desta forma, mas de maneiras diferentes em cada pessoa


(SUANNO, 2013c) . Reconhecer que um indivíduo busca supe-rar-se no enfrentamento de suas fraquezas, ou de seus erros e ilusões, é incentivar a autonomia da superação e o encoraja-mento no crescimento pessoal de cada colega ou aluno . Assim, as pessoas se apoderam de si mesmas como parceiros de si mesmo e dos outros no crescimento pessoal e social .

Trabalhar com o erro e a ilusão com a equipe escolar não é uma tarefa simples, contudo não é impossível . Pensamos que, para realizar tal processo faz-se preciso avançar gradativa-mente durante os encontros com toda a equipe, ou seja, apre-sentar metodologias que auxiliem na tomada de consciência da comunidade escolar em geral .

Para que a aprendizagem dos alunos ocorra nas perspecti-vas citadas anteriormente – cognição, emoção e corporeidade – faz-se necessário que o professor entenda que essas dimen-sões estão intimamente tecidas juntas, à forma de uma trama de tecido . Não tem como desvincular uma perspectiva da outra, porque quando se trata de serem humanos, tudo é complexo e não existem estratégias prontas e acabadas no que se refere às metodologias aplicadas em sala de aula . A aula não deve ser dada, mas se se façam aulas dialogadas, com a partici-pação ativa dos alunos, que devem ter a oportunidade de trazer para os encontros diários um pouco de suas histórias de vida para relacionar-se com os conhecimentos que serão discutidos . Em uma perspectiva cognitiva transdisciplinar (SUANNO, 2010a) deve-se levar em conta a vivência do aluno, suas expe-riências vividas, contextualizar conteúdos estudados sabendo que ele é um sujeito de emoção e assim devemos considerá-lo como parte do processo, ou seja, como terceiro incluído, vendo-o como um ser de afetividade, de problemas, de alegrias


e de vários sentimentos que fazem parte da sua vida cotidiana e afetam, diretamente, seu processo de aprendizagem como sujeito completo, que aprende de forma ampla e completa, por meio do corpo, das emoções e da razão .

Por meio de uma práxis educativa baseada nos pressu-postos do pensamento complexo e da transdisciplinaridade, ou seja, com atitudes que provocam a emancipação do sujeito, da criatividade (SUANNO, 2012), um ser aberto ao diálogo, que tenha consciência de o erro é parte do processo de aprendizagem de todas as pessoas e da sua construção do conhecimento . E preciso ser criativo e buscar religar saberes tendo como ponto de partida o desenvolvimento integral do sujeito, ref letindo e primando por uma prática que envolva a sensibilidade, a emoção, o corpo, os sentimentos e o pensa-mento demonstrando aos alunos que somos seres em perma-nentes questionamentos e transformações . Ainda se destaca que o ser humano é um ser complexo e não pode agir baseando-se somente na razão, ou na emoção, ou no erro e na ilusão, é preciso que haja equilíbrio entre todos eles, levando-se em conta a corporeidade, a razão e a emoção .

A fim de levar o aluno a perceber que muitas vezes traba-lhamos muito centrados em nossas próprias ilusões, que come-temos erros, até mesmo os já cometidos, e não percebemos que a solução pode estar em admitir esses nossos erros e que abrir mão das ilusões, ou certezas, que temos, nos auxiliam a apren-der em conjunto, aprendizagens significativas . Assim, esse aluno, por meio desta, assim como de outras tantas formas de trabalhar do professor, pode se aproximar da compreensão da necessidade da convivência compartilhada responsável para a parte e para o todo .


4.2 Os princípios do conhecimento pertinente

Esse saber traz o aluno como sujeito integrante do processo de aprendizagem por meio do conhecimento prévio onde o papel do professor nesse saber é o de contextualizador e articu-lador do global e da parte, de modo que auxilie o aluno à multirreferencialidade e à multidimensionalidade, tornando a sua aprendizagem rica e significativa e, portanto mais complexa . O aluno aprende a religar os saberes, fazer conexões e ter abertura para o que é novo . A necessidade deum conheci-mento contextualizado auxilia os alunos a serem capazes de apreender os objetos em relação com o todo, com sua comple-xidade e seu conjunto .

A partir do conhecimento pertinente, busca-se mostrar para os alunos as relações e o contexto de diversas áreas, não só dentro da escola . Por isso, há a necessidade de buscar e ajudar os alunos a perceberem as relações e o contexto de diversas áreas, não só dentro da escola, mas também do mundo do lado de fora dos muros escolares . O conhecimento pertinente diz respeito também à religar o que está fragmentado para que faça sentido não só para o aluno, mas para o professor e para a insti-tuição como um todo .

Não podemos continuar educando com os métodos de ontem os alunos que viverão no amanhã . A fragmenta-ção do conhecimento nos levou a modelos de formação também fragmentados e dispersos, em que às vezes são privilegiadas as formas, os conteúdos, as burocracias, a despeito do próprio sentido da formação, que é o cres-cimento pessoal, o desenvolvimento da consciência


comunitária, os valores ético-profissionais, a convivên-cia e a cidadania . A formação sob o olhar transdiscipli-nar converte-se em ecoformação, isto é, em formação integradora daquilo que nos rodeia, incluindo o meio natural do qual fazemos parte . Influenciamos o tempo que nos influencia . As sociedades passadas basearam a educação no conteúdo e na disciplina . As gerações futuras devem centrar sua atenção nos referenciais culturais e de valor (saberes e metas), no reconheci-mento para extrair o melhor de cada um, na autotélica ou desfrute do desempenho das tarefas (emocional) e na polivalência dos recursos, das estratégias e dos siste-mas de valorização . Educar para o futuro é educar a partir da vida . Somente a partir dela poderemos reen-cantar novamente professores e alunos . (TORRE, PUJOL e MORAES, 2013, p . 86)

Considerando o sujeito composto por corpo, mente e emoção, cada aluno traz de sua casa uma história de vida para além da escola, que afetam seu comportamento e sua aprendi-zagem, a escola, e nela a figura de cada professor, quando consi-dera essencial a pertinência do conhecimento para a formação do ser (SUANNO, 2011) . O conhecimento com sentido inclui cada aluno-indivíduo-cidadão no processo de autoconstrução de sua aprendizagem .

O modo de trabalhar multidimensionalmente e multirrefe-rencialmente, aliado ao trabalho cognitivo, emocional e corpo-reificado, promove um saber com conexões entre as distintas disciplinas, integrando múltiplas fontes . O processo de aprendi-zagem torna-se significativo ao sujeito-aluno, onde poderá


compreender, inclusive, a relação entre os saberes, contextualizá-los ao seu cotidiano e provoca o repensar de suas ações .

O trabalho com o conteúdo ensina na sala de aula deve refletir o contexto global, uma vez que, dentro da escola espera-se a contextualização entre as disciplinas e, principalmente, a religação das diversas disciplinas para além delas mesmas, onde se encontra o lugar do ser humano, que se encontra entre, no meio e além das disciplinas . A religação das disciplinas pode provocar dentro da equipe gestora da escola, relações entre as partes e o todo, deixando de ser saberes desunidos, divididos e compartimentados, para se tornarem saberes reli-gados, integrados e ampliados .

Atividades Alunos

O professor que utiliza questões da realidade do aluno, religando-a ao conhecimento científico com sentido e signifi-cado para esses alunos, possibilitando novas relações de pensamento com a sua vida, os ambientes, as pessoas e com outros saberes . Essas realidades dos alunos são relatadas por eles mesmos . O aluno é auxiliado a perceber que tudo o que acontece no mundo tem relação com as ações de cada pessoa e isso leva a pensar que cada um de nós tem uma imensa responsabilidade com o que pensamos, fazemos e dizemos em todos os lugares, com todas as pessoas, em uma relação entre pensamento-matéria-energia .

Conversas informais com os alunos auxiliam os alunos a compreender problemas que acontecem no mundo e é impor-tante esse exercício de reflexão, afinal, ajudar os alunos a exer-citar o pensamento é uma das grandes funções da escola .


O convívio social, familiar, ecológico e planetário são, assim, trabalhados e interligados nas escolas .

Quando o professor contextualiza os conteúdos por meio de infográficos, os alunos podem visualizar de maneira inte-ressante e prazerosa as mais diversas realidades em imagens ilustradas de maneira colorida, divertida, repleta de informa-ções e bastante motivadora . Faz-se interessante lembrar que, em um infográfico, não se faz necessária intervenção total do professor para a interpretação das informações para os alunos . A estratégia de construção de um infográfico, torna facilitada a compreensão por meio de informações claras, sem grandes textos, imagens ilustrativas dos textos contex-tualizada e as pessoas que o veem se identificam com a quali-dade das mensagens nele contidas . Os conteúdos são multidi-mensionais, globais e planetários e dos alunos se aproximam um contexto relacional entre o todo e cada parte, e a parte com o todo .

Uma atividade como a leitura de poemas, relacionando o poema e buscando significações com a vida cotidiana com seus acontecimentos, depois relacionando os poemas lidos por cada aluno . Aqueles que possuírem significados seme-lhantes e aqueles que se pode provocar as relações de signifi-câncias é uma atividade que poderia ser a continuidade da leitura realizada dos poemas, analisando assim, as relações mútuas entre os colegas .

Uma outra atividade com alunos que estão em processo de alfabetização pode ser a família construir a lista do super-mercado com a redação dessa lista feita pela criança . Ela se sentirá importante por fazê-la e entenderá a participação conjunta familiar em uma atividade diária onde a presença


dela pode contribuir para a construção de um clima de relacio-namento familiar positivo .

Quando cada aluno traz um assunto de seu interesse, ele procura dar de si para o grupo ao qual pertence . Um levanta-mento de assuntos realizados pelo professor, com a participa-ção dos alunos, pode ser o início de um debate para se conhe-cer o que já se sabe sobre o mesmo e, então, ampliar esse conhecimento por meio de conversas paralelas dirigidas ou não, e depois socializadas com a sala toda .

Atividades com a equipe pedagógica

Com a equipe escolar, trabalhar esse saber pode ser algo muito agradável onde, a partir de um assunto previamente escolhido, ou escolhido por todos, que o professor faça a contextualização para que ele perceba que o que ele propõe ao seu aluno, deve fazer sentido para ele também . Uma ativi-dade que poderia auxiliar, e que até acontecem em algumas escolas, mas sem essa intencionalidade, é planejar disciplinas que, aparentemente, não têm nada a ver uma com a outra, de forma a encontrarem onde podem ser complementares e terem algum ponto em comum, um ou vários e não eram percebidos . Trabalhar com disciplinas que tenham, declara-damente, algo em comum é bem mais fácil, porém trabalhar com a disciplina diversa da sua é algo que cada professor tem que fazer um exercício de abertura e flexibilidade para aceitar propostas de outra área que não a sua e, também, tolerância e empatia para abrir mão de alguns de sues pensamentos e propostas e praticar a escuta sensível, colocando-se no lugar de outras pessoas .


Iniciar com o grupo da equipe escolar um grupo de estu-dos sobre temas que cada membro traga e é discutido o assunto, textos, reportagens, exemplos, além da possibilidade de ter presente outra pessoa, um terceiro incluído a esse grupo, que possa ser o motivador de conversas e diálogos, em uma roda dinâmica, onde a abertura, a tolerância ao outro e a flexibili-dade possam ser exercitada por todos .

Aqui a atividade com a leitura dos poemas sugerida para com os alunos, pode acontecer, também, com os docentes, onde buscariam as relações com as práticas pedagógicas exer-cidas por cada um e o que cada poema sugere de transforma-ções nessas práticas, ou mesmo o que despertam de criativi-dade para novas práticas (SUANNO, 2012, 2014a) . Nessa atividade busca-se a religação dos saberes tão fragmentados, e exercitada a tentativa de buscar sentidos outros daqueles que já são realizados cotidianamente . Não é uma atividade muito simples mas, com o despertar do desejo de participação de cada docente, com boa vontade, ele se perceberá em uma nova senda de possibilidades de ações pedagógicas .

4.3 Ensinar a condição humana

O professor pode levar o aluno a compreender a condi-ção humana tomando consciência de sua posição no mundo, se encontrar como ser humano e se situar dentro da socie-dade e sua cultura, considerando o homem em todas as suas dimensões .

Esse saber está relacionado a auxiliar os alunos a entende-rem que todos somos seres que pertencentes ao universo e que não podemos nos desvincular dele ao tratar o sistema como


exterior e isolado de cada pessoa . Ensinar a condição humana é pensar na multidimensionalidade de cada ser, com sua complexidade toda, pois somos físicos e biológicos, psíquicos e culturais, sociais e históricos, financeiros e relacionais, racio-nais e instintivos etc .

À medida que se afasta das outras pessoas, se afasta de sua própria essência humana, de sua humanidade, que se apresenta cada vez mais fragmentada, resultado percebido nas mais diversas enfermidades de cunho sócio-emocional, como a depressão e a solidão . O ser humano é um ser relacional em sua natureza biológica e social, já que não conseguiria chegar à vida adulta por si só, sem a assistência de seu semelhante . Os saberes não estão sendo só compartimentados pelas e nas disci-plinas que nos são ensinadas na escola, mas o são também pelas pessoas que não religam a razão e a emoção, o afeto e o trabalho, a família e as tarefas cidadãs, o lazer e o social, e ainda pedem que sejamos mais razão, ou mais emoção, quando não nos pedem que sejamos apenas uma coisa em determina-dos momentos .

Os conteúdos devem ser trabalhados de forma a contribuir com a valorização da identidade do ser humano em sua dimen-sionalidade sapiens, faber, demens e saccer . Preservar a espécie humano é conteúdo a ser trabalhado também, já que todos somos parte da natureza, do planeta, assim como a valorização das várias etnias supõe a relevância do humano e da vida .

Habitamos a Terra criando maneiras de não apenas colher os frutos das árvores e pescar os peixes dos rios, mas também de lavrar a terra e dar nomes e significados aos frutos da terra e dos rios . [ . . .] para a


ave que pousa num galho, a árvore é a sombra, o abrigo, a referência no espaço e o fruto . Para nós, seres da natureza habitantes da cultura, ela é tudo isso e é bem mais . É um nome, ou vários, e é uma lembrança, um objeto de estudo, uma tecnologia de cultivo e de aproveitamento, uma teoria filosófica, uma forma de crença ou fé . É a pluralidade “disto” por ser uma imagem carregada dos afetos, e é o objeto da tela de um pontor, a conta na caderneta de um lenhador, uma futura ponte sobre um rio, um poema, o lugar de um túmulo, uma possível morada de um deus, ou mesmo uma própria divindade que por um instante divide com um povo indígena uma fração de seu mundo terreno . (BRANDÃO, 2015, p . 125)

Nos remete à nossa identidade que, ao longo da vida, passa por crises, conflitos e transformações . Relembrar que ao apren-derem o que a escola se propõe a ensinar, é estar ciente de que esta construção é em conjunto, aproveitando o potencial de cada um, professor e alunos, além da equipe escolar .

Atividades Alunos

Trabalhar a condição humana com os alunos, e também com a equipe de docentes e gestão da escola, é entrar em contato, em primeiro lugar, com a sua própria humanidade de professor, de pessoa, de cidadão, de ser humano que se rela-ciona com outros seres humanos e que, somente posterior-mente, é realizado um trabalho com o vínculo de professor e aluno . Um trabalho pautado no respeito e na afetividade, na escuta sensível, na afeição e na amorosidade . Isso implica, irre-


mediavelmente, à uma reflexão e, quem sabe, à uma mudança de comportamento frente à realidade vivida pelos alunos .

Mostrar aos alunos que o convívio com o que está à nossa volta pode ser agradável, ou não, sendo que cabe à todos apren-der a cuidar não somente da natureza humana e questões ambientalistas, mas também saber como cuidar desde a aparên-cia pessoal, e se preocupar com aquele que nem se conhece, o que consiste em se entender como humano e reconhecer as outras pessoas como ele próprio, com virtudes e qualidades, e outros que merecem ser superadas em uma luta diária .

Dentre as atividades a serem sugeridas, a foto linguagem é uma metodologia muito interessante para ser utilizada tanto com alunos, como com professores . Apresentar imagens de pessoas que se situam em diferentes contextos, com realidades diversas e que demonstram ter que lidar com diferentes adversi-dades e outras situações que demonstrem equilíbrio nas relações com o mundo, com o meio e com as demais pessoas, e solicitar que possam dizer o que sentem quando vislumbram cada cena, contar o que estas pessoas devem estar sentindo, pensando, que atitudes poderiam tomar, que saídas poderiam encontram, o que cada cena tem a ver com cada aluno ou professor da equipe docente, ou gestora, semelhanças com as pessoas mostradas, diferenças, sentimentos que passam e aqueles não gostariam de pensar, são formas de se trabalhar a condição humana de maneira muito eficiente para que as pessoas envolvidas na ativi-dades possam se sentirem corresponsáveis na construção dos mais diversos climas em que habita, convive e se relaciona, ou planeja estar, com outros humanos .

Apresentar os poemas de Cora Coralina, por exemplo, ou de outra pessoa qualquer, seria uma possibilidade para se traba-


lhar a condição humana de maneira muito intensa, pois esses poemas retratam a importância do ser, de sua passagem pela vida no decorrer dos anos, a sua identidade em meio à sociedade e à diversidade cultural, fazendo que o aluno compreenda a posi-ção que ocupa, e sua importância, no mundo .

Atividades em que os alunos possam estar em frente aos seus colegas e interagir com eles, precisando da ação conjunto para o desempenho de uma tarefa, reconhecendo o que o outro tem de bom para contribuir nesse momento, e notar o que esse outro tem que precisa ser percebido com tolerância e abertura de convivência . Não precisa ser proposta uma atividade de conhe-cimento específico, mas algo que proporcione interação e o contato, de preferência em roda, onde todos ficam de frente para todos, com a possibilidade de acesso aos olhares de cada um .


Auxiliar a equipe escolar a pensar a importância de ser trabalhar e enxergar o ser humano com um olhar mais sensí-vel, que consiga ver o conhecimento com mais consciência e não apenas disciplinarmente, com uma intencionalidade de evidenciar a junção entre o social e o humano, a pensar que todos temos qualidades e defeitos que precisam ser considera-dos nas relações com outros humanos, e que o desenvolvi-mento da flexibilidade, tolerância e abertura para o que é diverso de cada um de nós, seja um exercício diário e constante em qualquer ambiente em que nos encontremos .

Outra atividade que se pode fazer, dentre tantas outras possíveis e não exploradas aqui, para se trabalhar com a equipe gestora é provocar uma roda de diálogo com o tema sobre a


posição do homem no mundo, a consequência das atitudes tomadas em benefício ou não da humanidade, e ir se aproxi-mando vagarosamente da importância das atitudes de cada um de nós para a humanidade que coexiste com cada um de nós, no meio em que estamos . Essa tomada de consciência sobre a importância da ecologia das ações sobre aqueles outros que nos percebe como exemplos de suas ações, nos leva a perce-ber a importância de repensarmos o que fazemos, dizemos e pensamos, já que temos uma relação intrínseca entre energia, matéria e informação, que estão acopladas umas às outras e nos traduzem como pessoas, nos mostrando, às claras, para todos, o que somos e como sentimos . Perceber que todos somos humanos dentro das nossas particularidades, mesmo perten-cendo ao todo, sociedade e planeta, nos ajuda a reconhecer a diversidade cultural e entender que não é possível separar o homem do meio em que ele está .

Pensar a própria atitude perante si mesmo e os outros pode auxiliar cada participante a refletir sobre suas ações . Pode-se iniciar com cada participante escrever um grande desejo, um sonho que deseja ver realizado a nível pessoal . Cada participante coloca esse desejo dentro de um balão, o enche e o amarra, mantendo-o cheio . Após todos estarem cheios e amar-rados, todos se dirigem para um espaço aberto, que pode ser o meio da sala onde se encontram, e devem procurar manter seu balão no ar . Ao perceber que um colega está com o dele em perigo de cair no chão, deve ajudá-lo a mantê-lo no ar, não deixando o seu cair, e isso deve ser feito andando pela sala, pois não se pode ficar parado . Cuidar do seu sonho e ajudar o outro a cuidar do dele dá um significativo sentido de cooperação no alcance dos objetivos de cada um, e ainda faz perceber que,


para atingirmos nossos objetivos, temos sempre alguém nos nossos caminhos, alguns esbarram e nos exigem maiores cuidados, mas outros nos ajudam a segurar e seguir em frente . Ambos os participantes nos ajudam a crescer como humanos, e a superar nossas fraquezas .

4.4 Ensinar a identidade terrena

Para ajudar o aluno a entender a identidade terrena o professor deve valorizar o mundo do qual o aluno faça parte, mas sem negar a globalização da qual todos fazemos parte, ajudando o aluno a perceber o uno e o múltiplo do qual é pertencente . O uno percebendo-se como pessoa em constante processo de construção e reconstrução, em relação consigo mesmo e com seus conteúdos internos, em constante retroa-ções e recursões resultantes também de suas relações sociais vividas e sentidas, influídas pela sua subjetividade também em movimento contínuo de reorganizações . O múltiplo, no sentido do perceber-se inserido no todo, sentindo-se corres-ponsável na construção de ambientes adequados para o bom conviver, lembrando que esse bom conviver implica cuidar dos vários ambientes do qual participa, seja o ambiente externo exemplificado pelos meios urbanos, rurais, selvagens e naturísticos, com todas as suas derivações, e o ambiente interno, reflexo intensamente interativo das retroações e recursões que ocorrem em relação ao lado externo e as trans-formações que acontecem cognitivamente, com esse ser humano alcançando outros níveis de percepção e de reali-dade . Fatos responsáveis pela espelhagem do seu estado de humor, de humanidade, de afeto e sensibilidade pelo que é de


si e pelo que é do outro, seja este outro, outro ser humano, ou outro ser, seja animal, vegetal, mineral ou pertencente à zona do sagrado pela relação, quanticamente semelhantes em suas origens energéticas transformadas .

[ . . .] em nossas interações cotidianas com o mundo externo e interno temos história, sentimentos momen-tâneos, valores anteriores, características do alvo da interação e milhares de outros fatores que intervêm naturalmente na relação, podendo levar ou não à cons-trução de determinados valores e ações específicas . (ARAÚJO & PUIG, 2007, p . 30)

Os personagens dentro da escola, assim como aqueles que estão do lado de fora dela, precisam alcançar o entendimento de que cada um de nós fazemos parte desse mundo como auto-res responsáveis pelas nossas ações . A aproximação dessa compreensão deve ultrapassar a teoria e ir além, estar no meio delas e passar por entre as abordagens teóricas e se aproximar, cada vez mais, da prática de ações que sejam, também resulta-dos, de aprendizagens que elevem o nível de percepção e o nível de realidade das pessoas envolvidas no processo educativo . Ao pensar estratégias de ações com seus alunos, o professor, mesmo que não perceba, aprende novamente o mesmo conteúdo, reformulado e, se adequado à teria da complexidade e da transdisciplinaridade, se percebe envolto na responsabili-dade de ser e se tornar, cada vez mais, um exemplo, primeiro para si mesmo, depois, e como consequência, para os outros, mesmo que não intencional .

Perceber-se parte do todo, planeta e sistema ao qual pertence, ajuda o aluno a perceber que é necessário preservá-lo


e a colaboração mútua entre cada habitante dessa casa terra em que somos temporários e que ela sobrevive a todos, nos remete a pensar que planeta deixaremos para nossos descendentes consanguíneos e planetários . Os indivíduos, habitantes terre-nos que somos todos nós, precisamos refletir sobre as nossas ações em cada meio em que (com)vivemos .

Lembrar o aluno que estamos em uma era de grandes transformações, informações e mídias que acabam nos impe-dindo de ver o mundo, fazendo que ampliem o olhar esse novo contexto em que o ser humano precisa ver além, conseguindo contextualizar e pensar em suas ações diante do global é uma ação transdisciplinar (SUANNO, 2010a) que o professor tem com seus alunos . Conscientizar os estudantes de que nossas ações refletem em fatos que irão se voltar diretamente a nós é pensar sobre a ecologia da ação, sobre como proceder, primei-ramente com o pensamento, posteriormente com as próprias ações e suas repercussões para o mundo e para nós mesmos . Preservar e cuidar do meio ambiente é preservar e cuidar da espécie humana . Vivenciamos, diariamente, as consequências dos nossos atos como poluição que destrói a camada de ozônio e efeito estufa .

Atividades Alunos

Para ensinar a identidade terrena o professor pode se utili-zar de algumas técnicas que ajudem seus alunos a entenderem que todos estamos interligados uns aos outros, e que nossas ações estão vinculadas, em nossas atitudes e repercussões, em uma ligação entre energia, matéria e informação, quanticamente interligados . A partir de debates, que podem ser iniciados com a


exibição de curtos filmes disponibilizados na internet, que trazem esse conteúdo de fácil compreensão e, além do mais, de agradável visualização e interação com quem os assiste .

A compreensão de que ninguém está sozinho e solto no mundo, e que estamos interligados, em uma co-dependência um dos outros, auxilia-o a entender a necessidade de flexibili-dade e abertura, além aceitação da diversidade e enfrentamento às adversidades (SUANNO, 2013c) do caminho na companhia daqueles que nos são caros e/ou que o são sem ao menos saber-mos, até então, disso .

Com o trabalho de conteúdos que declarem uma corres-ponsabilidade global sobre, por exemplo, o cuidado sobre as águas, os alunos se aproximam da compreensão de serem agentes facilitadores ou complicadores dos processos de conservação, ou destruição, do planeta . Outra ideia é trabalhar com documentários que retratem a degradação do planeta e a dificuldade de auto-organização de seu equilíbrio natural .

Os diálogos informais ou dirigidos de como agir diante das coisas do mundo e as repercussões que estas ações tem sobre ele mesmo e sobre cada um dos habitantes deste planeta-casa chamado Terra, ajuda o aluno a se perceber compromis-sado com os resultados que vem acontecendo decorrente do uso inconsequente e não sustentável dos recursos naturais . Em uma atividade assim, pode-se levantar ações que cada um pode ter em forma de contribuição pessoal para a sua própria transformação responsável e, assim, se tornar exemplo para outras pessoas .

Se o aluno entender que ele faz parte do mundo como um todo, é leva-lo a entender que está em suas mãos a responsabi-lidade por tudo o que faz, por si mesmo, e pelo outro também .


Não sabemos o que cada aluno se tornará profissionalmente, mas podemos ajudar a formar cidadãos conscientes para que, seja o que ele se formar e se profissionalizar, e trabalhar com recursos naturais, ou outros que tem os naturais na sua trans-formação para tal, possam ser conscientes do seu uso come-dido e responsável . Terão conhecimento de que o desperdício do que é produzido é o desperdício de tudo o que foi utilizado na produção desse material ou produto . Se cada aluno se responsabilizar pela limpeza diária da sala de aula, ou um grupo de alunos, e fazer a relação disso com a limpeza da casa onde vivem e estender isso para a casa-planeta onde vivemos todos, ajuda a perceber que, muitas vezes, temos que limpar a sujeira dos outros, já que nem todos estão com esse nível de percepção e nível de realidade desenvolvidos, o suficiente, para que percebem que suas ações complicam os processos de manutenção do planeta como uma casa limpa e auto-sustentá-vel para vivermos .

Atividades Equipe

Apresentar para a equipe pedagógica, em uma reunião de planejamento, por exemplo, imagens que abordam alguns problemas emergentes que não são responsabilidade de uma só pessoa, mas de todos que habitam esse planeta, onde todos partimos da realidade presente rumo ao mesmo destino: um planeta melhor para vivermos nessa geração e, principalmente, para geração futuras . Essa técnica, como já apresentada ante-riormente, é a fotolinguagem . Esta técnica pode ser utilizada de várias maneiras, em situações diferentes e tem um grande poder de assimilação do conteúdo trabalhado, pois trabalha a


imagem como significante e possibilita tantos comentários quanto significados expressados por quem dela participa .

Outra atividade é rever a história da Cigarra e da Formiga . Relacionar o trabalho das formigas com o trabalho e as ações de cada um dos seres terrenos: Com cada um fazendo a sua parte, o todo (planeta) sentirá a diferença pouco a pouco . Reco-nhecer-se como elemento facilitador ou complicador da evolu-ção da qualidade de vida do planeta, é perceber-se com identi-dade vinculada à Terra .

Uma metodologia para ser usada com a equipe pedagó-gica da escola é esclarecer que todos precisam conscientizar os alunos que os fatos que eles deflagram com seus comporta-mentos são recorrentes e voltam para eles mesmos, de outra maneira . O trabalho com infográficos sobre o consumo da água, também com os professores e equipe pedagógica, é uma maneira de tentar conscientizar sobre o consumo excessivo das produções alimentícias, têxteis e outras .

4.5 Enfrentar as incertezas

O conhecimento não está pronto, está sempre em constru-ção, ou seja, nunca está acabado, ou o assimilamos pronto, assim como, às vezes, se nos aparece . Isso nos faz lembrar que as incertezas estão presentes na vida de qualquer pessoa, e podem acontecer a qualquer momento, assim como já ocorre com todos nós .

Saí decorre a necessidade de destacar, em qualquer educação, as grandes interrogações sobre nossas possi-bilidades de conhecer . Por em prática essas interroga-


ções constitui o oxigênio de qualquer proposta de conhecimento, assim como o oxigênio matava os seres vivos primitivos até que a vida utilizasse esse corruptor como desintoxicante, da mesma forma a incerteza, que mata o conhecimento simplista, é o desintoxicante do conhecimento complexo . De qualquer forma, o conhe-cimento permanece como uma aventura para a qual a educação deve fornecer o apoio indispensável . (MORIN, 2010, p . 29)

Ter esse saber presente em nossos pensamentos faz perce-ber que para aprender temos que reflexionar e questionar nossas certezas, para dar espaço para os novos conhecimentos, ou seja, tem que haver flexibilização em cada indivíduo para encarar os momentos de indagação que se nos aproxima de tempos em tempos e nos faz repensar aquilo que acreditamos e, nesses momentos, reorganizamos nossas crenças nas pessoas, nas teorias, nas sociedades, nas leis e tantas outras .

Enfrentar as incertezas se faz necessário para que todos saibamos que ela nos ronda em todos os momentos e que tudo pode mudar, pois o imprevisto e o inesperado tem suas ocorrên-cias naturais na vida de cada pessoa . Precisamos aprender a conviver com o imprevisível, com aquilo que não está ao nosso alcance, pois sabemos que dos planos que fazemos para nossa vida, muitos não se realizam a contento, ou mesmo nem se reali-zam . São inúmeros os imprevistos, que caracterizam as incerte-zas de todo processo, que acontecem também no trabalho do professor . Quantos planejamentos fazemos e não conseguimos realizar . . . No mundo, quantos acontecimentos surgem e trans-formam sociedades de tal forma que não prevíamos anterior-


mente . . . Ao pensar sobre essas e outras incertezas do mundo e do trabalho, proporcionará ao professor, pensar em outras estra-tégias de trabalho para seu ofício, contribui para que as mentes de todos nós fiquem acesas e tolerantes com os acontecimentos que podem mudar os rumos de uma aula, por exemplo .

Atividades com os alunos

Ajudar os alunos a romper com suas certezas pensando que o que é incerto é certo, é imprescindível para entender que possamos nos perceber em desenvolvimento de estruturas cognitivas que nos auxiliem a enfrentar as adversidades com flexibilidade e abertura, sem nos desestabilizarmos física e emocionalmente . Respeitar a opinião dos outros, sabendo que não tem como saber o que surgirá das outras pessoas, é condi-ção sine qua non para se trabalhar as incerteza humana (SUANNO, 2013c) .

Refletir também sobre as certezas do passado, na ciência, nas sociedades, nas famílias e nas concepções e crenças de cada pessoa, é um caminho de que perceber que tudo muda e evolui de um estágio para outro com grau de complexificação imedia-tamente superior ao anterior .

As rodas de conversa são sempre ótimas metodologias de trabalho quando o interesse é dialogar sobre determinado assunto, com a participação de todos, onde cada participante vê o outro e se interage com o olhar, com os gestos, com as conversas e com as energias produzidas no conjunto desse grupo . Faz-se interessante, nessas rodas, iniciar o diálogo com exemplos de fatos que estão mudando no planeta, como eram e como estão hoje, e que certezas podemos ter para o futuro da


humanidade . Será que podemos ter certeza do que virá a acon-tecer se continuarmos a nos comportar do jeito que estamos hoje? Qual a responsabilidade de cada um de nós para com o planeta que vivemos? E outras tantas indagações que cada professor pode promover com sua turma, de acordo com as emergências de cada grupo, em cada vivência .

Uma atividade teatral com os alunos também é interes-sante para se vivenciar e mostrar aos demais alunos as emer-gências na vida de cada um de nós . Com o tema saúde, pode-ria-se apresentar um cena onde um feliz torcedor de futebol se emociona com seu time, vibra com seus gols e sua vitória e, de repente, horas depois de assistir ao jogo, sofre um infarto que o levaria ao hospital e, posteriormente, se recuperaria . Mas pode-ria ser que não . . .


Usar que questionamentos contraditórios para refletir sobre a mesma situação é uma forma de se trabalhar esse saber com a equipe pedagógica . Ao se expor uma situação problema, em uma reunião qualquer, e perguntar sobre as diversas possi-bilidades de saídas para uma situação problema específica, pode-se pedir ao professor, ou pessoa da gestão da escola que estiver presente na reunião, isso pensando que todos terão essa oportunidade, que outra saída para essa situação, o professor que sugeriu uma, pode sugerir, agora outra, para que se solu-cionasse tal situação .

Questionar também uma saída encontrada com uma situação do tipo: E se o que planejou desse errado? O que você faria? Que outras possibilidades teria? Que outras saídas para


essa situação problema? O que poderia acontecer para dar errado? Como lidar com essas situações? As perguntas não precisam ser, necessariamente, essas . Pode-se elaborar outras, de outras formas, mas com o mesmo sentido de desestabilizar o pensamento de quem elabora uma saída de um problema, para repensar o que acabou de ser pensado, reorganizando-se, pois do futuro nada sabemos . No futuro ainda não estamos, pois assim que ele chega já se torna presente e o que ainda nem sabemos o que é, se torna futuro desse presente que, anterior-mente, era ele mesmo .

Outra atividade que podemos trabalhar com a equipe pedagógica é a análise de alguns livros, histórias ou reporta-gens, ou entrevistas, onde o assunto sobre as mudanças no mundo serão as temáticas . Com professores que tenham esses assuntos trabalhados em equipe, formaremos uma avalanche de comentários, os mais diversos, com os alunos . Ao inserir esses conteúdos nos conteúdos disciplinares que irão ser traba-lhados em cada disciplina, amplia-se o olhar e a força para o enfrentamento das incertezas cresce e amadurece, suportando, mais e melhor, o aparecimento das emergências .

Uma atividade também é sempre interessante quando fazemos é o GV-GO . Separemos o grupo em dois e para um deles separaríamos fatos, acontecimentos e a realidade que se nos mostra, ou nos mostraram, como verdades únicas e acaba-das . Para o outro grupo, sempre pensando em 50% dos inte-grantes do grupão em cada grupo menor, ficariam com pesqui-sas que vieram e quebraram com essas verdades . O primeiro grupo faz um círculo de diálogo no centro do outro grupo que, também em círculo, do lado de fora do primeiro, irá assistir ao desenrolar da discussão, sem intervir e sem fazer comentários


entre seu próprio grupo . Ao terminar o período de tempo dado à discussão, que pode ser de 20 minutos, um pouco mais ou um pouco menos, o primeiro grupo toma o lugar do segundo e vice-versa . Inicia-se agora a roda de diálogo do segundo grupo e o primeiro assiste da mesma forma que o anterior . Depois disso, abre-se um grande círculo de diálogo para comentários do que assistiram do outro grupo, que podem ser feitos sem separação de grupos, obedecendo-se apenas que um partici-pante não seja atropelado pelo outro, e isso é tarefa do mediador .

Deve-se destacar a importância do professor estar sempre pesquisando, se atualizando para conversar com seus alunos sobre as coisas da sua disciplina e sobre as coisas do mundo, interligando saberes, religando-os .

4.6 Ensinar a compreensão

A fim de combater a incompreensão existente nas escolas, onde as disciplinas brigam com outras e áreas que não se enten-dem umas com as outras, ensinar a compreensão vai no sentido de contribuir para o desenvolvimento desta habilidade desde a mais tenra idade .

Ter uma boa capacidade empática faz-se necessário para se ensinar e se aprender sobre a compreensão humana . Capaci-dade empática traduz-se pela capacidade de colocar-se no lugar do outro e olhar o mundo como se tivesse os olhos da outra pessoa, buscando entender o seu pensamento e a sua contradi-ção, além de também saber ouvir e falar nas horas certas .

Pressupõe alteridade, o cuidado como outro e o diálogo é fundamental e preciso para ensinar ao aluno o respeito às dife-


renças, e aceitar as opções escolhidas por seus semelhantes, evitando assim comportamentos preconceituosos que são pautados, simplesmente, em não entender e não aceitar o que diverso de si mesmo, pois todos possuem o seu direito de esco-lha e devem ser respeitados por isso .

Não somos humanos porque somos seres racionais, repito aqui uma velha fórmula já nossa conhecida . Nós nos tornamos humanos porque como indivíduos, grupos e comunidades, somos seres aprendentes . Não somos seres coletivos, somos seres sociais . Não somos seres da posse e da acumulação, e devemos não esque-cer que elas são a nossa barbárie, a perda de nosso rumo e o nosso desvio . Somos seres da troca e da reci-procidade, e elas são a nossa origem e o nosso destino . (BRANDÃO, 2015, p . 125)

Escutar o outro e ouvir o que ele tem a nos acrescentar é um dos objetivos quando se trabalha a compreensão humana com as pessoas (SUANNO,M .V .R ., 2014) . É uma forma de resgatar valores esquecidos em nossa sociedade e que precisa-mos nos recorrer a eles na convivência diária . Treinar a empa-tia é algo essencial a se fazer desde criança, auto-analisando-se e aprendendo a não fazer julgamentos precoces sem conhecer os fatos e as pessoas .


Ensinar o aluno a ser solidário e a entender que o colega precisa, de vez em quando, de que o socorram em suas necessi-dades e dificuldades, assim como cada um de nós, mesmo que


não queiramos . Usar com os alunos a metodologia da história de vida faz-se interessante porque provoca em cada aluno o contato consigo mesmo, seu passado e seu presente, suas inten-ções de futuro e, ao relatar ao grupo da sala de aula, percebere-mos que os valores, qualidades, sonhos e outras tantas coisas do outro, nos são diferentes e diversas e, mesmo assim, podere-mos conviver harmoniosamente com todos .

Ajudar o aluno a perceber que o colega, assim como todas as pessoas, precisar ter seus direitos preservados e respeitados em seu espaço . Por meio do jogo da Batalha Naval, podemos falar sobre invadir espaços dos outros, descobrir suas fraque-zas e derrotar as pessoas . Um sentido de brincadeira em um jogo agradável de jogar, mas que afetam emocionalmente e psicologicamente quando procuramos fazer esse jogo se tornar realidade na vida daqueles que convivem conosco . Usar o jogo como iniciador de uma conversa sobre como se sentiram inva-didos ao serem descobertos na brincadeira, e como se sentiram invadidos quando não respeitaram seus espaços e invadiram a vida dos alunos em momentos diferentes .

Brincar com os alunos de gincana, onde as tarefas devam ser realizadas em duplas, e cada pessoa da dupla deve relacio-nar-se com sua parceria nas atividades a serem desenvolvidas com sucesso . Esta oportunidade pode ser aproveitada pelo professor para dizer sobre as incertezas que ocorrem, como o fracasso perante o desejo do sucesso, que todos querem, e também que compreender as dificuldades do outro e as suas próprias, é um caminho para auto-superar-se .



Trabalhar juntos é algo que está estritamente ligado à compreensão humana . Se relacionar com o outro no ambiente do trabalho é exercitar a capacidade de flexibilizar-se perante as intervenções do outro, é ter sentimento de abertura para escutar ativamente as opiniões e sugestões que vem de tantos outros quanto sejam aqueles que estivem em processo relacional dentro de uma escola, ou mesmo outro lugar de convivência . Exercitar a mediação, a todo momento, como capacidade de intervir de forma a valorizar as participações e interesses dos colegas é algo que nem todas as pessoas tem desenvolvido, mas que podem exercitarem-se para desenvolver . E desenvolver significa querer transformar-se para saber convier melhor com as outras pessoas e consigo mesmo .

Podemos pensar em trabalhar a compreensão humano com a equipe pedagógica, gestora e coordenações, pedindo-os que reflitam sobre suas ações e os resultados delas . Será que todas foram acertadas? E o que não foi acertado? Como reagi-mos? Entender e sermos tolerantes com os nossos próprios erros nos ajuda a entender que as outras pessoas precisam do mesmo gesto de abertura com elas .

Algumas perguntas poderiam ser feitas para a equipe pedagógica, solicitando que ela responda cada uma das pergun-tas refletindo sobre as suas próprias ações, como por exemplo: Como eu aprendo a compreender meus alunos? Sou compreen-sivo com meus alunos? Sou compreensivo com meus erros e não sou com os erros dos outros? Sou compreensivo no cole-tivo da unidade escolar? Essas perguntas contribuem, como exercício, de perceber-se, conhecer-se e reconhecer-se na presença de si mesmo e dos outros .


Trabalhar com a equipe pedagógica a dinâmica do Desejo Secreto é muito interessante . Cada pessoa da equipe escreve uma ação a ser realizada por outra pessoa, sem saber para quem é, pois será realizado um sorteio do tipo amigo secreto . Fica a critério daquele que escreverá a ação escolhida, seja ela cantar, pagar um mico, imitar alguém etc . ao ser realizada a escolha dos papéis com as atividades escritas por todos, passa-se à abertura das mesmas e cada um à sua vez, cumpre o que está no papel . É uma forma de também se trabalhar a alteri-dade, e isso aparece quando fazem a análise das tarefas cumpri-das . Se foi fácil ou não, se foi vergonhoso ou não . Pode-se perguntar quem escrever e perguntar a ele se ele faria, com tranquilidade, o que escreveu como tarefa para o outro .

4.7 Ensinar a ética do gênero humano

Para ensinar a ética do gênero humano é preciso entender que ela é respeito mútuo e que deve permear todas as nossas ações, porém ter consciência de que há situações na vida que nos colocam em conflito sobre ser ou não ser ético . Essa é uma decisão de cada um!

Aprender a sermos sensíveis em relação às ações do próximo é algo essencial para aprendermos a ética do gênero humano . Essa sensibilidade nos ajuda a entender que a nossa humanidade é também composta de erros e acertos, e que ao entrarmos em contato com os nossos erros, percebermo-nos falíveis e capazes de também nos transformarmos, superando-nos a cada dia em pessoas melhores .

As pessoas precisam entender que, ao se trabalhar a cons-ciência e sua evolução, é também atuar diretamente sobre a


ética das pessoas, assim como as ações das pessoas, considerar o humano como pleno de humanidade, valorizando o caráter e as emoções . Trocar ideias com as pessoas que estão perto, subsidiadas pela ajuda do professor consciente do seu papel, subsidia também os alunos a treinarem suas concepções de vida e experimentarem sentimentos e exercícios de ética .

Partindo dos primeiros valores construídos pela criança, à medida que ela form crescendo, interagindo de forma cada vez mais complexa com o mundo natural, social e cultural em que vive, inúmeros outros valores vão se construindo e, muitas vezes, se contrapondo . Na fase adulta, cada ser humano já construiu uma infinidade de valores que, organizados em um sistema, se combinam em uma intrincada e complexa rede de relações, motivando as condutas de acordo com o contexto em que são solicitados juízos e/ou ações . (ARAÚJO & PUIG, 2007, p . 32)

Podemos buscar no humano elementos que podem evidenciar a capacidade de compreensão demonstrando que a ética deve fazer parte das situações do cotidiano de todas as pessoas, em que precisam incorporar a ética na consciência e no espírito humano para que nossas atitudes possam estar explicitadas em nossos relacionamentos, buscando a valoriza-ção da sensibilidade de cada um .


O júri simulado é uma forma muito boa de se trabalhar a ética com os alunos . É utilizado para refletir sobre defender seu ponto de vista, discutir valores de cada indivíduo e a relação entre o que é valor para o outro e que eu tenho que defender . Aceitar a defesa de alguém que contrapõe o seu ponto de vista


e seus próprios valores é um exercício e tanto para se trabalhar este saber .

Realizar um amigo secreto, onde cada aluno produza uma carta para o colega que tirou, destacando as suas qualidades e em seguida expor para a turma . O respeito é trabalhado e o zelo com o outro, ao mesmo tempo em que a diferença é evidenciada e valorizada no sentido de perceber-se diferente do outro é perceber-se complementar ao outro, e entender que não há duas pessoas que sejam exatamente iguais .

Respeitar nos outros as diferenças é demonstrar pensa-mento de tolerância à diferença e isso pode ser trabalhado quando se discute fatos com os quais não concordamos . Dessa forma o professor pode propor discussões que suscitem pensa-mentos opostos e que, durante essas discussões inverter papéis, de acusação e de defesa de uma determinada ideia . Essa inver-são leva o aluno a um conflito entre seus próprios sentimentos e os sentimentos dos outros .

Outra atividade é solicitar aos alunos que escrevam um texto onde contam sobre si mesmos, dando destaque para o que sentem, o que desejam, consultando e destacando a sua subjetividade . Depois pedir que cada aluno leia sua própria escrita e reflita sobre o que pensa sobre determinadas coisas .


Analisar músicas com temática social-familiar é uma atividade que pode ajudar a equipe a repensar seus valores pessoais . Música como Pais e Filhos ou Eduardo e Mônica, do grupo Legião Urbana, ou a música Minha Alma, do grupo O Rappa, ou outra com o mesmo conteúdo ou não, pode suscitar


nas pessoas lembranças de fatos, momentos da vida pessoal, familiar ou social, ocorridos consigo mesmo ou com os outros, cenas que chocaram suas concepções, ajudam a reflexão desses fatos da vida e o desenvolvimento de um sentimento ético, assim como uma postura coerente com ela .

Propor para as equipes, práticas de solidariedade, como por exemplo, trocar ideias para os planejamentos, trazendo materiais para ajudar os colegas . Ter uma postura mais sensível e aberta para o diálogo com sua equipe, criando estratégias sutis que leve a pensar e repensar as suas ideias .

ReferênciasARAÚJO, Ulisses F . e PUIG, Josep Maria . Educação e Valores: pontos e contrapontos . São Paulo: Summus, 2007 .

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MORAES, Maria Cândida & TORRE, Saturnino de la . Sentipensar: fundamentos e estratégias para reencantar a educação . Petrópolis – RJ: Vozes, 2004 .

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SUANNO, Marilza Vanessa Rosa . Outra finalidade para a educação: emerge uma didática complexa e transdisciplinar. In: ZWIEREWICZ, Marlene. Criatividade e inovação no ensino superior: experiências latino-americanas e européias em foco . Universidade da Paraíba, 2013 .

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TORRE, Saturnino de la, PUJOL, Maria Antónia e MORAES, Maria Cândida . Documentos para transformar a educação: um olhar complexo e transdisciplinar . Rio de Janeiro: Wak Editora, 2013 .

WERTHEIN, Jorge . Apresentação à Edição Brasileira . In: MORIN, Edgar . Os sete saberes necessários à educação do futuro . Tradução de Catarina Eleonora F . da Silva e Jeanne Sawaya ; Revisão técnica de Edgard de Assis Carvalho . – 2 . ed . – São Paulo: Cortez; Brasília, DF: UNESCO, 2000 .

EDUCAçãO E DIVERSIDADE: UMA RELAçãO DE ALTERIDADE NAS

PRÁTICAS ESCOLARES

Marlene Barbosa de Freitas Reis Cristiane Rosa Lopes

A educação é o instrumento mais eficaz de forma-ção individual e coletiva, e pode possibilitar que as pessoas consigam compreender melhor a si mesmas

e aos contextos em que vivem, sendo dessa forma, um suporte para ações e transformações pessoais, sociais e planetárias . A escolarização, como espaço de educação formal, é a princi-pal responsável pela preparação das novas gerações, exercendo, assim, papel fundamental na lida com as incertezas e crises das sociedades contemporâneas, cada vez mais complexas, multi-culturais e desiguais .

São inúmeros e variados os problemas e desafios que o planeta está enfrentando, e os conhecimentos já elaborados e experimentados não estão dão conta de responder à complexi-dade dos tempos atuais . É uma crise generalizada, na qual os problemas educacionais estão interligados aos problemas globais .

Moraes (1996) explica que o grande problema da educa-ção no momento decorre do modelo da ciência que inf luen-cia suas teorias do conhecimento e da aprendizagem, das

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quais originam-se as práticas pedagógicas desenvolvidas na escola . É através do modelo da ciência que a relação das pessoas com a natureza e com a própria vida é explicada e o mundo é compreendido .

A educação ainda mantém suas bases, meios e fins anco-rados no velho paradigma da ciência da modernidade, que é criticada por Santos (1999, 2006), principalmente sob o ponto de vista sócio-político de suas características coloniais, que impuseram a racionalidade técnico-instrumental (do Ocidente/do Norte) não apenas como forma única de conhecimento, mas também como uma forma de discurso legitimador da globalização . Esse discurso desqualifica as formas de conheci-mento que chegam do não-ocidente (o Oriente/o Sul), deslegi-timando as práticas sociais que as sustentam e, consequente-mente, promovendo a exclusão social dos que as promovem .

A consequência desta herança monocultural do saber, isto é, da consideração do conhecimento científico ocidental como única forma de saber rigoroso, como única explicação possível da realidade, foi a invisibilidade de partes importantes dessa realidade . As “explicações alternativas da metafísica, da astro-logia, da religião, da arte ou da poesia” (SANTOS, 1987, p . 52), assim como as práticas sociais baseadas em conhecimentos populares, indígenas e camponeses, não foram reconhecidas como formas de saber válidas, causando “um empobrecimento irreversível do horizonte e das possibilidades de conhecimento” (SANTOS, 1999, p . 329) .

Os efeitos da monocultura do saber foram particular-mente danosos no tocante à educação, pois o “reconhecimento desigual dos modos diversos de apropriação e aplicação dos saberes” (SODRÉ, 2012, p . 22) implicou no privilégio do modo

153Educação e diversidade

hegemônico de ensinar e aprender . Para o autor, a monocul-tura do saber pode ser responsabilizada pela violência presente nas escolas, que são frequentadas por alunos pertencentes a classes menos favorecidas economicamente ou a famílias de imigrantes, como também pela ineficiência do ensino e pelo alto índice de evasão escolar .

O mal-estar vivenciado atualmente nas escolas pelos educadores e pelos alunos demanda que haja uma ressignifi-cação da educação . Não é possível enfrentar a crise da escola de um modo superficial, “que tenta reduzi-la à inadequação de métodos e técnicas, à introdução das tecnologias da infor-mação e da comunicação de forma intensiva, ou ao ajuste da escola à lógica do mercado e da modernização” (CANDAU, 2014, p . 35) . A escola, por ser uma instituição representativa da ciência da modernidade, vive uma crise que se situa em um nível mais profundo . É uma crise paradigmática . Conforme explica Moraes (1996),

Uma ciência do passado produz uma escola morta, dissociada da realidade, do mundo e da vida . Uma educação sem vida produz seres incompetentes, inca-pazes de pensar, de construir e reconstruir conheci-mento . Uma escola morta, voltada para uma educação do passado, produz indivíduos incapazes de se auto-conhecerem como fonte criadora e gestora de sua própria vida, como indivíduos autores de sua própria história e responsáveis pela sua trajetória de vida . (MORAES, 1996, p . 58)

A cultura escolar dominante na atualidade continua a ser a mesma da escola do passado, que tinha como horizonte


um projeto de universalidade, de construção de uma identi-dade nacional, ou seja, de uma cidadania e cultura idênticas a todos . Para tanto, tratava “os sujeitos da educação como iguais” e os chamava a “adquirir uma cultura comum” (CANDAU, 2014, p . 35) . Fundamentada na matriz político-social e epistemológica da modernidade, essa cultura esco-lar priorizava “o comum, o uniforme, o homogêneo, consi-derados como elementos constitutivos do universal” (CANDAU, 2012, p . 83) .

Vários autores, de diferentes áreas teóricas e metodológi-cas, têm apontado a necessidade de ruptura com o pensa-mento padronizador, homogeneizador e monocultural, que geralmente orienta a educação . Moraes (2014), Morin (2007) e Santos (2009), dentre outros, destacam a urgência de uma renovação epistemológica a partir da abertura à diversidade de saberes . Candau (2010), Furtado (2012) e Reis (2013), com discussões alinhadas à necessidade de inclusão, propõem uma reinvenção de práticas escolares centradas na diversi-dade e no exercício da alteridade .

5.1 Diversidade: significados e práticas

A expressão “diversidade”, na concepção de Moehlecke (2009), pode indicar tanto a percepção da própria variedade humana, física, social e ambiental existente em nossa socie-dade, como um conjunto múltiplo e complexo de significados como, por exemplo, o multiculturalismo .

Já para Reis (2013) diversidade pode ser entendida como um processo de ruptura com o modelo de educação que segrega e exclui aqueles que não se enquadram nos padrões estabeleci-


dos pela sociedade, ou seja, “diversidade é tratada como valor, característica natural do ser humano, variedade e convivência de pessoas, de ideias diferentes, no mesmo espaço das salas de aula de ensino regular onde a heterogeneidade deve se sobre-por a homogeneidade” (REIS, 2013, p . 69) .

Ora, se pensamos e defendemos que diversidade é um valor humano e não uma categoria de classificação, diversidade é o reconhecimento e o respeito à diferença, à riqueza dos múltiplos olhares e das diversas maneiras de ser e de pensar do ser humano que é complexo e constituído por identidades . É o princípio de que somos diferentes em todas as dimensões, o que implica no reconhecimento e no respeito pelo que faz de uma pessoa ser diferente de todos os demais: o simples fato de ser humano (REIS, 2013) .

Candau (2008, p . 50) faz uma alerta de que devemos “colo-car ênfase no reconhecimento das diferenças e, para garantir a expressão das diferentes identidades culturais presentes num determinado contexto, garantir espaços em que estas possam se expressar” . Isso nos dá o direito de afirmarmos as diferenças e não de oprimir, silenciar e negá-las como vimos historica-mente presenciando .

Mas como lidar com a diversidade nas salas de aulas? Candau (2010) propõe um modelo de educação que parta da diferença como proposta pedagógica, e que valorize a diversi-dade por entendê-la como princípio das relações humanas . Desta forma, a escola deve ser compreendida como uma orga-nização multicultural, na qual a diversidade é abordada de forma positiva, sem buscar adequar o que é diferente a padrões de unicidade ou segregá-lo em categorias marginalizadas por serem consideradas fora do padrão dominante .


Proporcionar uma interação construtiva entre as diferen-ças presentes no contexto escolar é um desafio, pois essa inte-ração pressupõe a superação de conflitos . De acordo com Feriotti (2007), o que define a qualidade da interação são a finalidade e a forma com as quais se faz o enfrentamento dos conflitos . A finalidade não deve ser o estabelecimento de primazia de um dos lados em detrimento do outro, acabando com o conflito através da força, da negação ou do silenciamento do outro . Em outras palavras, uma diferença não deve ser aniquilada por outra em decorrência de relações de poder, que venham a determinar qual diversidade será aceita ou não como valor universal .

Devemos, ao contrário, buscar em nossas práticas peda-gógicas a construção de trocas e interações que sejam criativas, solidárias e pacíficas com a diversidade . O conflito entre as diferenças dever ser entendido e tratado como uma possibili-dade de novas descobertas, de superação de fronteiras, de reco-nhecimento do outro como outro, com valores e potencialida-des . Não deve haver, portanto, o desejo de controle, de colonização ou de homogeneização cultural .

Desta forma, cabe destacar que se reconhecemos que a sociedade é multicultural e marcada pela diversidade, é preciso romper a visão egocêntrica para pensar no “outro”, como possibilidade para construir e estabelecer uma convivência mais harmoniosa pelo exercício da alteridade . Segundo Furtado (2012, p . 1), o termo “alteridade possui o significado de se colo-car no lugar do outro na relação interpessoal com considera-ção, valorização, identificação e dialogar com esse outro” . Desse modo, a relevância deste encontro do “eu com o outro” está no processo da troca, da relação dialógica e do despertar


de que as diferenças não só nos enriquecem, mas ampliam nossa consciência planetária .

Neste sentido, “o foco da ética é o movimento de acolhida do outro e não de posse ou domínio . Não se trata de negar a racionalidade, mas a possibilidade de uma nova forma de abor-dagem da mesma” conforme também pontua Costa e Diez (2012, p . 08) .

Exercer a alteridade nas relações que estabelecemos com o outro é condição fundamental para novas concepções, pois o “reconhecimento do outro como constituinte, parte integrante de si, deve ultrapassar os muros da teoria, para que a alteridade seja reconhecida, nas situações e acontecimentos cotidianos, como um valor social e educacional dos mais relevantes”, conforme nos alerta Furtado (2012, p . 6) .

Nesta perspectiva da necessidade de reinvenção das práti-cas escolares e a formação de professores tem papel central como eixo propulsor de um novo paradigma educacional, que favoreça a formação de sujeitos capazes de dialogar com as diversidades presentes em todas dimensões envolvidas na construção de relações humanas éticas .

5.2 Formação de professores: perspectivas interdisciplinares e interculturais

A questão da formação docente para lidar com as múlti-plas dimensões que caracterizam a aprendizagem e a constru-ção de conhecimentos significativos tem sido discutida por autores como Freire (1996), Candau (2008, 2012), Canen (2001), Moraes (1996) e Libâneo (2001), que abrem espaço para diálo-gos sobre questões que ampliam o significado de que ensinar e


aprender estão limitados à ação mecânica, de um lado do professor que ensina, e do outro, do aluno que aprende .

Ao contrário disso, e, diante da convicção que “os fatos contemporâneos ligados aos avanços científicos e tecnológicos, à globalização da sociedade, à mudança dos processos de produção e suas conseqüências na educação, trazem novas exigências à formação de professores” (LIBÂNEO, 2001, p . 76), é preciso pensar na atuação do professor reorientada por novos olhares e novas posturas epistemológicas que rompam com a velha tradição monocultural e estática deste processo . Afinal, “quem forma se forma e re-forma ao formar e quem é formado forma-se e forma ao ser formado” conforme pontua Freire (1996, p . 23), ao compreender que esta relação é uma via de mão dupla .

Ensinar e aprender são movimentos dialéticos, dialógicos que se fundem numa ação consciente e transformadora da prática . Por isso mesmo, é práxis problematizadora da reali-dade . É consciente e intencional para que possa promover possíveis intervenções e mudanças nesta realidade, que deve ser considerada uma realidade “multidimensional, estruturada por múltiplos níveis, ao invés do nível único, da realidade unidimensional do pensamento clássico”, conforme muito bem define Nicolescu (2002, p . 51) .

Segundo Candau (2012), nossa formação histórica está marcada pela eliminação física do “outro” ou por sua escravi-zação, que também é uma forma violenta de negação de sua alteridade” . Pensada desta maneira, essa concepção exige formação e atuação de professores, balizada por novas manei-ras de enxergar o outro, de lidar com o outro, que “vá além dos aspectos cognitivos, abarcando também o mundo emocional


do sujeito, promovendo a evolução de sua consciência” (NICO-LESCU, 2002, p . 105), ou seja, novas maneiras de ver e de entender a realidade .

Vimos presenciando o discurso de que a multiculturali-dade e a diversidade existem nas salas de aulas, contudo ainda não se constrói uma identidade cultural . O sujeito pertencente aos grupos minoritários, como por exemplo, o negro e o homossexual são meramente tolerados . Seus conceitos, cultu-ras e desejos além de ignorados, são tidos como desvios das polarizações e das concepções hegemônicas normativas que permeiam o universo escolar .

Para desconstruir tais concepções que engendram a educação, urge uma formação de professores, tanto inicial quanto continuada, que transcenda a perspectiva monocultu-ral e unilateral do pensamento de modo que os professores sejam despertados para uma educação intercultural, interdis-ciplinar e inclusiva que rompa com os muros dos saberes, com a fragmentação epistemológica que os separa .

Uma formação de professores reflexivos, mais humana, mais inclusiva, com consciência e sensibilidade social e que compreende um projeto humano emancipatório (PIMENTA, 1999), capaz de enxergar nas diferenças e nas singularidades dos discentes, possibilidades de enriquecimentos mútuos e de ruptura com os “muros” pedagógicos e epistemológicos que segregam, excluem e classificam os seres humanos reforçando preconceitos e estereótipos .


5.3 Interculturalidade e interdisciplinaridade

Nessa lógica, “uma proposta imbuída por uma perspec-tiva intercultural crítica, poderia permitir uma rica interlocu-ção para o avanço de uma preparação docente coadunada” (CANEN, 2001, p . 223) com os propósitos de uma educação centrada “na e para” a diversidade humana .

A interculturalidade na prática pedagógica implica em repensar os espaços das salas de aula que historicamente foram formatados sob a lógica etnocêntrica de que a cultura ideal, universal e verdadeira é a cultura que domina os modos de ser e de pensar, nossos valores como superiores aos das demais culturas que são negadas e silenciadas, sobretudo quando se trata da produção do conhecimento . Portanto, desconstruir essa lógica monocultural é desconstruir a supremacia do eu sobre o outro .

Nesta mesma linha de pensamento, uma outra maneira de promover articulação e interação entre as diferentes áreas de conhecimento é a organização dos saberes de forma interdisci-plinar, o que demanda a ruptura de barreiras e a construção de diálogo entre essas diferentes áreas .

No entanto, bem sabemos que para desconstruir o para-digma da compartimentalização dos saberes que ainda permeia sobremaneira os cursos de formação de professores, o desafio urge na desconstrução de práticas de valorização da homoge-neidade que fundamenta nossas concepções pedagógicas . Tal perspectiva exige um novo olhar e uma proposta pedagógica interdisciplinar que valoriza e redimensiona desde o processo do planejamento do professor até a forma da avaliação da aprendizagem . Exige “mudar as bases de partida de um racio-


cínio, as relações associativas e repulsivas entre alguns concei-tos iniciais, o conceito angular, a idéia maciça e elementar que suporta todo o edifício intelectual” (MORIN, 2002, p . 82) .

A interdisciplinaridade busca ampliar a compreensão da relação entre sujeito-sociedade-conhecimento nas interações entre professor-aluno, aluno-aluno e professor-professor, estabe-lecendo elos de reciprocidade e de reflexão mútua num ambiente de ensino/aprendizagem dinâmico e vivo . Neste sentido, o aluno é visto como sujeito possuidor de culturas e de conhecimentos, que deve ser respeitado dentro de suas possibilidades e de seus limites . Um sujeito ativo no seu processo de formação e na histó-ria que está sendo construída no seu dia-a-dia .

Numa proposta interdisciplinar, portanto, os sujeitos envolvidos devem abrir espaço para o diálogo, para as diferen-ças e para a troca recíproca de experiências . Ou seja, faz-se necessário “despojar-se de preconceitos, questionar os valores arraigados no consciente e transcender à busca do ser maior que está dentro de nós mesmos . É sentir-se livre para poder fa lar e, principalmente ouvir . Ouvir você e o outro”, conforme nos lembra Fazenda (1994, p . 77) .


O século XXI vivencia uma crise de paradigma, isto é, uma crise do humano nas suas diversas relações . Por isso, podemos afirmar que vivemos um paradoxo: as diferenças que caracterizam a essência humana têm historicamente promo-vido conflitos entre os homens .

Urge, pois a necessidade de se repensar e resgatar valores humanos necessários ao convívio social, bem como possibilidades


para que tais valores sejam internalizados e exteriorizados de forma a minimizar o campo de tensões instaurado na busca de um (com)viver com as diferenças . Muitas vezes a intolerância e até mesmo a repulsa pelas pessoas diferentes do padrão esperado e imposto socialmente é marcada pela violência exacerbada .

Tais demandas sociais conclamam por um profissional capaz de se ajustar às novas exigências da sociedade, do conhe-cimento, dos meios de comunicação e dos diversos universos culturais . Um profissional com nova identidade reflexiva que constrói e reconstrói o cotidiano da sua sala de aula

Um olhar sobre a realidade de práticas pedagógicas mostra que ainda é incipiente o desenvolvimento de experiências volta-das para a efetivação de práticas interculturais, interdisciplina-res no ensino brasileiro . Fato que nos mobiliza a refletir e buscar novos olhares epistemológicos que podem sustentar e fortalecer nossos conhecimentos para lidar com a diversidade que caracte-riza o ser humano nas suas diferentes dimensões: físicas, sociais, culturais, econômicas, afetivas, etc . (REIS, 2009) .

Desse modo, a educação e a formação de professores não podem mais se omitir em relação aos conflitos culturais e as práticas discriminatórias nas instituições educacionais e na sociedade como um todo . Precisamos renovar nossas propos-tas educativas transformando-as em práticas que acolhem as multiplicidades culturais e concebem as diferenças como possibilidades de aprendizagem . Uma prática pedagógica que busque a alteridade, a pluralidade de culturas onde todos poderão ser tratados mediante suas necessidades e especifici-dades . Uma educação mais justa que atenda, de fato, toda diversidade de classes sociais, gêneros, sexualidades, raças e etnias, dentre outras .


Nessa direção, a interdisciplinaridade e a transdisciplina-ridade abrem novas perspectivas epistemológicas e metodoló-gicas, que são essenciais para uma mudança de paradigma educacional, indispensável para promoção de diálogos inter-culturais mais humanos e produtivos nos contextos escolares .

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INOVAçãO E CRIATIVIDADE NO CAMPO DA DOCÊNCIA: DESAFIOS E

POSSIBILIDADES DE RUPTURA COM O PARADIGMA1 TRADICIONAL

Lindalva Pessoni SantosCláudia do Nascimento

Este capítulo apresenta reflexões acerca dos fundamentos teórico-práticos da inovação e da criatividade, viven-ciada por uma turma em um dos Eixos do Curso de

Pós-Graduação Lato Sensu intitulado Transdisciplinaridade e interdisciplinar na educação, realizado pela Universidade Esta-dual de Goiás, Câmpus Inhumas, no ano de 2015 . A proposta do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu foi de religar as dife-rentes dimensões da vida e as diferentes dimensões constitu-tivas do ser humano que foram fragmentadas pelo paradigma tradicional . A visão dicotomizada do paradigma tradicional ou moderno compõe um sistema de ideias que resultou em um modo de ver e explicar o mundo; seus princípios determinaram em grande parte concepções e práticas no campo da educação gerando uma visão fragmentada do conhecimento, das atitu-des de ensinar e aprender, das ações e reações frente ao que a

1 “Um paradigma rege a maneira como pensamos e o modo como usamos a nossa lógica . É aquilo que rege a ordem do nosso discurso, dos nossos pensa-mentos e ações” (MORAES, 2004, p . 19) .

6


pessoa é ao que a pessoa faz e como ela conhece . Contrapondo essa lógica fragmentária e excludente, o que se pontuou neste capítulo, foi a possibilidade de elaborar práticas educativas que rompam com este paradigma por meio dos fundamentos teórico-práticos da criatividade e inovação . Para dar respaldo a essa discussão dialogou-se com autores que, na elaboração de suas teorias, estão provocando uma ruptura com o antigo paradigma e construindo a base para um novo, intitulado de paradigma emergente: Moraes; Torre (2004), Moraes (2014); Torres; Zwierewicz (2009, 2013), Suanno (2013, 2014), Suanno (2014, 2015), entre outros .

O ditado popular: “faça o que digo, mas não o que eu faço” tem perdido força mediante as exigências da corporeificação do exemplo . No ato de educar, o exemplo de pais ou responsá-veis perante os filhos, dos professores com seus alunos, dos chefes, ou outra liderança com sua equipe produz efeitos mais profundos pelas experiências proporcionadas que pelo discurso bem articulado de quem o profere .

Um educador somente pode proferir palavras, defender fundamentos, proclamar valores e empreender práticas que ele mesmo as incorpora com propriedade . Desse modo, um profes-sor, só poderia falar sobre ruptura paradigmática, inovação e criatividade por meio, exatamente, de uma ruptura nas concep-ções e práticas por ele adotadas em suas aulas .

Os fundamentos teórico-práticos dessa perspectiva, no campo educacional, estão diretamente ligados à ruptura com o paradigma educacional vigente num movimento que demarca a passagem de uma educação transmissora em uma educação transformadora fundamentada em princí-pios como o diálogo, a valorização e respeito ao outro e aos

169Inovação e criatividade no campo da docência

seus diferentes saberes . Nesse sentido, a preocupação em definir ações que desenvolvam competências que qualifi-quem não somente para vida profissional, mas para vida em que a tríade natureza/sociedade/indivíduo seja entendida como um todo integrado .

Esse processo de transição paradigmática já pode ser percebido em pesquisas, concepções e práticas no ensino supe-rior por meio de indícios e/ou rupturas com elementos que apontam para a proposição de uma nova dinâmica educacio-nal fundamentada nos princípios do paradigma emergente . Torre e Zwierewicz (2009) discutem a questão da superação do paradigma tradicional por meio de um ensino universitário inovador e criativo . Segundo os autores, o ensino universitário está em um momento de transformação e em busca de um novo sentido .

Uma formação docente que implica ruptura com o para-digma educacional vigente e se alicerça nos fundamentos teóri-co-práticos da inovação e da criatividade precisa aliar o dito e o vivido, pois, segundo Freire (1996, p . 38) “[ . . .] as palavras a que falta a corporeidade do exemplo pouco ou quase nada valem [ . . .]” .

Desse modo, este capítulo buscou apresentar e refletir acerca de uma proposta no campo da formação docente expe-renciada por uma turma, em um dos Eixos do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu intitulado Transdisciplinaridade e interdisciplinaridade na educação, realizado pela Universidade Estadual de Goiás (UEG), Câmpus Inhumas .

A experiência relatada ocorreu em 2015, no Eixo: Relato de experiências educacionais contemporâneas, que teve como questão mobilizadora investigar escolas, universidades, profes-


sores que buscam outras vias para a formação do humano num movimento que transcende o convencional.

Para qualificar e certificar esta experiência como uma prática testemunhal do dizer sobre ruptura paradigmática, tendo como fundamentos a inovação e criatividade no campo educacional, buscou-se no paradigma emergente, conceitos e práticas que definissem mais claramente esta proposta e seus desdobramentos efetivos . Assim sendo, considerou-se que muitos deles foram estudados e vivenciados durante as aulas . O conceito sentipensar, apresentado por Moraes e Torre (2004), por exemplo, define com propriedade a integração que ocorreu no Eixo entre os conceitos a serem trabalhados, as ações a serem empreendidas, a interação, a mediação e a comunicação entre os atores sociais envolvidos no processo de construção do conhecimento .

A par disso, este estudo foi organizado em duas partes . Primeiro apresentou-se uma reflexão acerca do papel da universidade, situando a UEG Câmpus Inhumas como um lócus desta proposta de mudança paradigmática para além da docência universitária, levando para a perspectiva humana de busca por ações afirmativas que atuem na comunidade . Em seguida, por meio das concepções do sentipensar, considera-ram-se as ações e práticas vivenciadas em sala durante o Curso de Pós-Graduação Lato Sensu, partido dos relatos de experiên-cias de sala e para além desta .


6.1 A UEG e o Câmpus Inhumas: construindo marcos que indicam que é possível exercer uma prática educativa a partir do paradigma educacional emergente2

O que dizer inicialmente da universidade no contexto dessa discussão? Qual seu papel na sociedade? O que faz pensar que ela pode ser o centro dispersor de novas ideias, de novos conceitos, de novas práticas, de articulação e certificação de um novo paradigma? Quais as ações empreendidas em termos de rompimento com o paradigma moderno, ou mesmo, como andam as discussões sobre este paradigma e a emergência de outro? Como isso tem refletido nos cursos de formação dos docentes em nossas universidades em nível de graduação e pós-graduações Lato Sensu e Stricto Sensu? O que se tem feito, pensado, articulado em prol da construção de outro sistema de ideias que resulte efetivamente em novas concepções e práti-cas? Que fôlego e intenção têm as universidades em promover uma reforma paradigmática, começando pelo seu interior? A universidade tem desenvolvido ações, projetos, práticas que sirvam como prática testemunhal de um dizer inovador e cria-tivo que indica uma transição paradigmática?

É possível nas últimas décadas encontrar apontamentos, discussões e pesquisas sobre o paradigma moderno e suas implicações no modo de pensar e fazer educação na universi-

2 “O paradigma educacional emergente apresenta desafios de reconfiguração e re-organização dos conhecimentos, das relações e do estilo de vida . Neste sentido emergem proposições como: a) novo modo de pensar, rompendo com a line-aridade e a fragmentação do conhecimento, na busca de pensar complexo; b) ampliação da formação, em perspectiva auto-eco-heteroformação; c) criação de processos de ensino e de aprendizagem em perspectiva transdisciplinar; d) no-vas perspectivas de ser e de ser professor (a)” (SUANNO, 2014, p . 205) .


dade e no ensino superior, bem como captar um movimento indicativo de transição paradigmática, não somente a nível conceitual, mas epistemo-metodológico, proveniente, especial-mente, da análise de ações consideradas criativas e inovadoras no campo da docência .

A Universidade Estadual de Goiás, por exemplo, é uma instituição recentemente estruturada e é organizada como uma universidade multicampi . O Câmpus Inhumas foi criado em 1999, conta com dois Cursos de licenciatura presencial, no turno noturno: Pedagogia e Letras; treze Cursos de Extensão; e, em períodos intercalados e às vezes concomitantes oferece Cursos de Pós-Graduação Lato Sensu . Atualmente, conta com uma turma em Transdisciplinaridade e Interdisciplinaridade em educação (2015/2016), tendo concluído a primeira em dezembro de 2015, uma turma de Pós-Graduação Lato Sensu em Linguagem, Cultura e Ensino (2016/2017) . Está prevista para o início do segundo semestre a 6ª turma de Pós-Gradua-ção Lato Sensu em Docência Universitária .

Apesar do Câmpus de Inhumas ser um espaço acadê-mico com pouquíssima idade, ele tem feito um movimento em busca de promover uma ruptura com o paradigma domi-nante no campo da formação docente por meio de discus-sões, encontros, eventos, curso de extensão, publicações, ações e projetos imbuídos dos princípios e fundamentos do paradigma emergente, do pensamento complexo, da interdis-ciplinaridade e transdisciplinaridade .

Almeida (2014) questiona: É possível exercer uma prática educativa baseada no pensamento complexo? A autora escla-rece que sempre que se apresenta uma abordagem teórica surgem as indagações sobre como utilizá-la na prática .


Este relato pautou-se em ações afirmativas em decorrência das experiências significativas, articuladas e vivenciadas por professores, acadêmicos e comunidade que estão tendo a opor-tunidade de experimentar a tão questionada relação teoria e prática . Neste caso, a perspectiva real de uma docência subsi-diada pelos princípios e fundamentos do pensamento complexo, da interdisciplinaridade e transdisciplinaridade .

A origem desse movimento remota a data de 13 de junho de 2012 em que foi firmado Acordo de Adesão da Universidade Estadual de Goiás – UEG, representada pelo coordenador Prof . Dr . João Henrique Suanno, junto à Rede Internacional de Esco-las Criativas: construindo a escola do século xxI – RIEC, sob a coordenação geral do Prof . Dr . Saturnino de la Torre (Catedrá-tico Emérito da Universidade de Barcelona, vinculado ao Grupo de Investigação e Assessoramento Didático – GIAD do Departa-mento de Didática e Organização Educativa da Universidade de Barcelona. Para o desenvolvimento da pesquisa foram compostas duas equipes de pesquisadores: professores universitários, estu-dantes de graduação e pós-graduação, as equipes são coordena-das no Estado do Tocantins pela Profa . Maria José de Pinho – UFT e no Estado de Goiás pela Prof . João Henrique Suanno (UEG– ESEFEGO), Profa . Marilza Vanessa Rosa Suanno (UEG– Câmpus Inhumas/ UFG) e posteriormente pela Profa . Lindalva Pessoni Santos (UEG– Câmpus Inhumas em 2013) .

A primeira experiência empreendida no Câmpus Inhu-mas – UEG, a partir do paradigma emergente, foi em 2013, com uma turma do 8º Período, do Curso de Pedagogia3 na

3 A referida proposta também foi desenvolvida pela professora Marilza Rosa Suanno, no Curso de Pedagogia– UFG onde também é professora de Estágio Supervisionado .


disciplina Estágio Supervisionado em Docência nas Séries Iniciais, com a orientação da professora Marilza Rosa Suanno . A proposta de estágio foi desenvolvida na Escola Estadual de Tempo Integral João Lobo Filho nas turmas 3º e 5º ano do ensino fundamental . De acordo a professora, a proposta de estágio, proporcionou uma oportunidade singular para os acadêmicos do Curso de Pedagogia e os alunos do campo, uma vez que o objetivo foi:

[ . . .] promover práxis complexa e transdisciplinar em torno do metatema ‘Cooperação internacional pelas águas’ . No intuito de construir um modo de pensar problematizado, relacional, que busca religar conheci-mentos em perspectiva interdisciplinar e transdiscipli-nar (multidimensional, multirrefrencial, autorreren-cial), construindo pensamentos, relações e mediações pedagógicas com potencial transformador de si mesmo, do social e da relação homem– natureza-sociedade (SUANNO, 2014, p . 205) .

A primeira experiência de docência transdisciplinar emergente desenvolvida no/pelo estágio foi uma oportunidade para os acadêmicos e para o campo de estágio (alunos, profes-sores, grupo gestor, pais) de experimentar um processo de ensino e de aprendizagem que transcendesse as gaiolas disci-plinares . Partindo de uma questão mobilizadora/problemati-zadora, esta ação proporcionou o pensar complexo e transdis-ciplinar, utilizando metodologias ativas, dialógicas, interativas em que o aluno foi coautor das propostas desenvolvidas a partir das concepções de Projeto de trabalho (HERNáNDEZ, 1998 apud SUANNO, 2014) .


Desta forma, afirmou-se que:

Ao longo do projeto de trabalho as aulas foram parti-cipativas, dialógicas e desenvolvidas por meio de metodologias ativas; situações-problemas; problema-tização da temática; pesquisa; interpretação (de docu-mentários, animes, fotos, infográficos, gráficos, gráfi-cos, mapas, letras de músicas, histórias em quadrinhos, charges, lendas, textos jornalísticos, narrativas, letras de músicas, histórias em quadrinhos, charges, lendas, textos jornalísticos, narrativas, livros literários); produção textual; teatro de fantoches; dramatizações; escuta musical e jogos interpretativos (SUANNO, 2014, p . 208) .

Para coroar esta primeira experiência de docência trans-disciplinar, com o incentivo, apoio e organização da professora Marilza Suanno, publicou-se um livro que reunia Projetos, práticas pedagógicas, poemas, desenhos, relatos de experiên-cias das pessoas que estiveram direta e indiretamente envolvi-das nas atividades do estágio (do grupo gestor, alunos, profes-sores, pessoas da comunidade da escola, além dos relatos dos grupos de Estágio) . Nesse sentido, convém ressaltar que por meio desses relatos foi possível perceber a perplexidade dos alunos estagiários diante da proposta da referida professora e ao mesmo tempo a satisfação em vivenciar a possibilidade inovadora de um ensino transdisciplinar . Tais relatos também foram apresentados no II Seminário de Estágio e IV Mostra de Curtas na Educação Infantil4 organizados pela Coordenadora

4 Este Evento marca a culminância dos Estágios do Curso de Pedagogia em docên-cia na educação infantil e nas series iniciais dos 6º e 8º períodos respectivamente .


de Estágio e professoras de Estágio da UEG/ Câmpus Inhumas no referido ano .

Em 2014, a perspectiva da docência transdisciplinar se ampliou muito no Câmpus Inhumas . Inicialmente com a elaboração e desenvolvimento da II Proposta de Estagio Trans-disciplinar nas séries iniciais do ensino fundamental, desta vez em duas Escolas, com o envolvimento de todos os professores5 dos 7º e 8º períodos; bem como em função da proposta e início do Projeto de Pós-Graduação em Lato Sensu em transdiscipli-naridade e interdisciplinaridade na educação de autoria da professora Marilza Rosa Suanno (et al.) .

Para compor o quadro docente desta especialização, foi organizado um Curso de Extensão, no Câmpus, para estudo, reflexão e planejamento da articulação dos Eixos do Curso . Na ocasião, os professores vivenciaram processos reflexivos e dialógicos de construção conceitual referente ao paradigma emergente, ao pensamento complexo, à complexidade, à inter-disciplinaridade, entre outros que faziam parte do arcabouço teórico do referido projeto .

Desse modo, é preciso considerar que o processo de ações voltadas para uma proposta transdisciplinar desenvolvidas

5 “Em síntese, nas diferentes disciplinas, os acadêmicos do 4º ano de Pedagogia da UEG/Inhumas tiveram a oportunidade de pensar, discutir e refletir sobre a temática “Cidades sustentáveis: por uma Inhumas Sustentável”, percebendo as interfaces, as diversas realizações e as contradições que a compõem . E a partir desta oportunidade de pensar complexo e transdisciplinar sobre a temática, na disciplina de Estágio, construiu o planejamento e o desenvolvimento dos projetos de trabalho, desenvolvido nas escolas com crianças dos anos iniciais do ensino fundamental . O trabalho de estágio foi organizado e pensado, arti-culando-se com as outras disciplinas do Curso de Pedagogia . Este projeto se desenvolveu em duas escolas da cidade de Inhumas, sendo elas: Escola Estadu-al de Tempo Integral João Lobo Filho e a Escola Municipal Professora Cleide Campos (SUANNO et al, 2015, p . 115-116) .


pela UEG Câmpus Inhumas ganhou duas frentes: o Projeto de Especialização, que para ser desenvolvido contou com um projeto de extensão que formasse os professores que atuariam na especialização; e as atividades desenvolvidas no campo de estágio pelos alunos e professores do 7º e 8º períodos do curso de Pedagogia .

O estreitamento da parceria da UEG Câmpus Inhumas com a escola campo – Escola Estadual de Tempo Integral João Filho – em 2014, por meio do Estágio, fez com que seus projetos fossem ressignificados, ampliados e alguns certificados como transdisciplinares . Esse processo resultou na apresentação de trabalho no I RIEC – Goiânia e VI INCREA Barcelona .

Como parte da II Proposta de Estagio foi organizado o I Fórum Internacional sobre cidades sustentáveis, educação e tecnologia. Neste evento foi apresentado um pôster e uma mesa redonda com os professores do curso de Pedagogia intitulados de: “Cidades sustentáveis: reflexões e proposições do projeto inter/transdisciplinar do Curso de Pedagogia da UEG/Inhu-mas;” proposta de trabalho integrada entre as disciplinas do 7º e 8º período que resultou na publicação de um artigo: Cidades sustentáveis e escolas sustentáveis: projeto inter/transdiscipli-nar . Todo esse processo foi compartilhado com os acadêmicos do Câmpus, no III Seminário de Estágio e V Mostra de Curtas na Educação Infantil .

Em 2015 a proposta de docência transdisciplinar já não causava tanto espanto, uma vez que os acadêmicos, professo-res e comunidade já conheciam a proposta por meio dos eventos realizados pelo Câmpus Inhumas, bem como pelo desenvolvimento do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Transdisciplinaridade e interdisciplinaridade na educação


que contribuiu muito para ampliar esta discussão . Neste ano, o metatema da III Proposta de Estágio Transdisciplinar foi “Escola Sustentável e práxis emergente” .

A proposta de Estágio para o ano de 2015 apresentou como um de seus objetivos sensibilizar alunos, professores e comuni-dade a pensar complexo e refletir sobre questões emergentes . Outro movimento foi promover junto aos alunos e professores da escola campo, ações sustentáveis como: gotejamento, compos-tagem, coleta seletiva e reaproveitamento de resíduos; práticas estas que se iniciaram na escola e se estenderam à comunidade . Este trabalho também foi apresentado IV Seminário de Estágio e VI Mostra de Curtas na Educação Infantil .

Em 2015, também alguns dos trabalhos propostos e desen-volvidos no/pelo Estágio transdisciplinar foram publicados em dois importantes livros que apresentam projetos criativos e relatos de experiência fundamentados na teoria da complexi-dade, interdisciplinaridade e transdisciplinaridade .

Todo esse movimento promovido pela UEG Câmpus Inhumas vai ao encontro do pensamento de Almeida (2014) que afirma sobre a possibilidade como um devir, um processo, nem pronto, nem acabado, mas construído fora do território racional que acreditamos ser o único possível . E foi nesse devir que esta experiência foi construída, fora de qualquer território que privilegia apenas o razão em detrimento da emoção, das múltiplas linguagens, da sensibilidade, do corpo, da alma .


6.2 Educar em e para sentipensar: uma prática testemunhal do dizer

ASSUNTO: ENCONTROBom dia, quero nesta manhã ensolarada relatar com muito alegria o encontro que tive ontem com a turma da Pós, designo de encontro, pois o termo aula poderia de certa forma remeter ao simples cumprimento de carga horária correspondente a mais um dos eixos que compõe o Curso; ontem, ao iniciar o Eixo Relato de experiências educacionais contemporâneas com a proposta de discutir criatividade e inovação nas práti-cas educativas atuais fui agraciada, bem como toda a turma, com demonstrações autênticas de criatividade, inovação, sensibilidade, aprendizagem; experimenta-mos literalmente o sentipensar, conceito criado por Saturnino de La Torre (1999), conseguimos trabalhar ao mesmo tempo o pensamento e o sentimento de forma que possibilitou uma implicação ao mesmo tempo crítica, ativa e criativa por parte dos alunos . Penso ser impossível encontrar palavras que consigam descrever com riqueza de detalhes o que foi vivido ontem, porém desejo transformar nosso encontro de ontem em um relato de experiência, pois pode servir para estimular novas práticas criativas e inovadoras! Abraços a todos! (e-mail enviado por Lindalva Pessoni Santos para postrans-inter@googlegroups .com em 20/09/15 às 10:52 ) .

Esse excerto acima tem uma história que, de certa forma, começou a ser gestada em 2013 com a primeira experiência de estágio transdisciplinar proposto pela professora Marilza


Suanno, conforme foi descrito no item anterior, e se amplia no Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em transdisciplinaridade e interdisciplinaridade na educação em 2014/2015 .

O curso foi estruturado em treze Eixos de 30 horas cada um, que se articulam entre conceitos e práticas . Este capítulo propõe apresentar e refletir uma proposta alicerçada nos fundamentos teórico-práticos da inovação e da criatividade experenciada no Eixo: Relato de experiências educacionais contemporâneas .

Este relato não tem a pretensão de se transformar em um modelo, em uma receita de como usar determinadas estraté-gias, visto que:

Cada momento é único e cada experiência também é única, implicando processos auto-organizadores que, a cada instante, modificam as estruturas dos sistemas vivos . Envolvem, portanto, a corporeidade do apren-diz, o que significa que as emoções que circulam são também muito importantes ao especificarem domínios operacionais . Assim, como educadores precisamos ter maior consciência da importância dos momentos, das experiências e circunstâncias criadas, do clima que está presente e saber que, por mais que nos preocupemos em criar circunstâncias semelhantes às anteriormente criadas, aquelas jamais se repetem .Isto porque apren-dizagem e conhecimento possuem uma inscrição corporal que é sempre específica, complexa, datada, apoiada na interação sensorial que ativa pensamentos, sentimentos e emoções que circulam no campo energé-tico e vibracional criado pelas circunstância (MORAES, 2004, p . 48) .


A questão desafiadora ao trabalhar este Eixo foi organizar uma proposta que servisse de parâmetro para análise de práti-cas educativas inovadoras e criativas . A proposta era conhecer e analisar diferentes experiências (por meio de vídeos, entre-vistas ou visitas) projetos de trabalho interdisciplinares e trans-disciplinares, ecoformadores e identificar o que os caracteri-zam como inovadores e criativos .

A proposta para o Eixo ficou estruturada em três encon-tros: – visita ao ECOCENTRO – IPEC– Pirenópolis; estudo e análise dos fundamentos epistemo-metodológicos de práticas educativas inovadoras e criativas; análise de vídeos com relatos de experiências transdisciplinares, interdisciplinares e de ecoformação, projetos e práticas identificados com potencial criativo e inovador pelo INCREA e Rede Internacional de Escolas Criativas – RIEC .

Embora a visita ao Ecocentro estivesse agendada, proble-mas técnicos impediram que esta acontecesse de acordo com a previsão . Desta forma, houve a necessidade de inversão da proposta do 2º encontro para o 1º .

Essa mudança resultou em uma redução significativa do número de alunos no 1º encontro do Eixo . Uma hipótese levan-tada para a baixa frequência foi a de que a perspectiva que a proposta do dia não atingiria as expectativas que tinham sido geradas quanto ao como fazer diferente no campo das práticas educativas fora do que se conhece do paradigma dominante .

Mas como alcançar estes propósitos? O como é sempre a chave que transforma a utopia em realidade, o possí-vel e factível . É o domínio didático que nós traduzimos como sendo estratégia. A estratégia é a ferramenta ou o


caminho para converter os objetivos ou as metas em realizações, o veículo que possibilita a mudança [ . . .] (MORAES; TORRE, 2004, p . 8) .

A inversão da proposta gerou uma apreensão para o início do Eixo . No entanto, o encontro iniciou com uma dinâmica e um texto de Luiz Barco, intitulado Onde anda a imaginação? De acordo com Barco (1998, p . 90) “em lugar de incentivar a diferença e a criatividade, as escolas muitas vezes acabam fazendo com que as crianças pensem igual” . Sua conclusão é resultado de um trabalho, por ele consid-erado muito criativo, de um menino de oito anos que tinha que representar a história dos Reis Magos em uma folha dividida em quatro partes . O menino, no lugar da represen-tação o trivial – três reis, três camelos, três presentes, e um menino na manjedoura – colocou quatros balões com os seguintes dizeres: Onde será? Eu acho que é por aqui! Parece que é ali! Chegamos! O professor Barco, uma semana depois de entrar em contato com esta história teve que substituir o professor de criação publicitária e propôs o mesmo trabalho para os alunos; e o resultado foi: 53 desenhos praticamente iguais, três camelos, três presentes, e um menino na manje-doura, apenas um estudante apresentou algo diferente: ele desenhou uma estrela, uma coroa, um presente, e escreveu a palavra PAZ .

A mesma dinâmica foi repetida na turma de Pós-Gradua-ção Lato Sensu para provocar a discussão do Eixo que tinha como um dos objetivos discutir inovação e criatividade das práticas educativas; praticamente o resultado foi o mesmo: muitas coroas, muitos reis, muitos presentes, muitas estrelas,


muitos meninos na manjedoura . Apenas um foi em forma de um poema . Os desenhos foram expostos e analisados com alguns apontamentos dos alunos e em seguida foi feita a leitura do texto: Onde anda a imaginação? O riso foi quase geral quando leram o resultado do trabalho do professor Barco e perceberam que o mesmo ocorrera com eles, ou seja, a padro-nização, a uniformização dos desenhos .

Tal dinâmica atendeu o propósito que era sensibilizar os alunos, criar um ambiente descontraído e ao mesmo tempo instigador, propício para a construção de conhecimentos e princípios que ressignificassem o sentido de ensinar e aprender no mundo atual .

Desse modo, a perspectiva experienciada naquele momento, era de refletir a respeito da homogeneidade, bem como para pensar em estratégias inovadoras que contribuís-sem para fomentar a criatividade dos alunos . Sobre tais ques-tões, Moraes (2014) afirma que:

[ . . .] esta nova maneira de pensar e compreender a reali-dade requer por sua vez, estratégias metodológicas abertas ao imprevisto, ao inesperado, às emergências, às superações das dicotomias e polaridades existentes . Exigem estratégias flexíveis e multidimensionais para compreensão dos movimentos, para o desenvolvi-mento de estratégias inovadoras e criativas, capazes de descrever e abarcar o comportamento das unidades complexas . O importante é não esquecer que qualquer objeto jamais pode ser aprisionado por uma única explicação da realidade e o mundo jamais poderá ser enclausurado em um único discurso ou nível da reali-dade (MORAES, 2014, p . 32) .


Para continuar a desenvolver a proposta do dia, os alunos foram desafiados a organizar-se em grupo, num total de seis, para explorar e compartilhar com os colegas as lições a serem apreendidas com os seis interlocutores que foram escolhidos para discussão sobre inovação e criatividade . Eles deveriam ler os textos na parte restante da manhã e a tarde compartilhar com os colegas . No entanto, para se preparem para apresentar os textos lidos, receberam uma orientação: não poderia ser uma apresentação somente em forma de um discurso referente aos conceitos, mas deveria ser espelhado nas palavras de Freire (1996, p . 52-53) que nos ensina que: “[ . . .] não posso apenas falar bonito sobre razões ontológicas, epistemológicas e políticas da Teoria . O meu discurso sobre a Teoria deve ser o exemplo concreto, prático, da teoria . Sua encarnação [ . . .]” . Sendo assim, deveriam compartilhar os princípios e os conceitos sobre inovação e criatividade por meio de práticas inovadoras que ultrapassassem as razões epistemológicas da teoria .

Os grupos se espalharam pelo Câmpus com o intuito de encontrar inspiração para dividir com seus colegas os concei-tos, sentimentos, emoções e ações interativas, reconstrutivas que transcendesse o tempo/espaço daquele Eixo e, realmente, efetivasse a proposta que era discutir e vivenciar práticas educativas inovadoras e criativas .

Os alunos sentiram-se implicados e motivados na perspec-tiva de elaborar estratégias que propiciassem a apropriação do conhecimento em um cenário em que o rigor cientifico não apla-casse os sentimentos e a criatividade . A estruturação dos traba-lhos se fizeram a partir de exemplos, de imagens e construção de imagens, de performance, de ilustrações, de encenações, de poema . A proposta dos grupos, na verdade se fundamentava,


[ . . .] em uma transcendência que sinaliza que já é tempo de maior liberdade do espírito humano, tempo em que nenhuma racionalidade cientifica será capaz de apri-sionar a emoção, o sentimento e a criatividade do ser humano em nome de uma objetividade que conspira contra a sua própria inteireiza (MORAES, 2004, p . 23) .

A maioria dos grupos, após a exploração de seus temas, delineou com muita autonomia as estratégias que utilizariam para compartilhar com os colegas . Sem determinação prévia e nem exposição de formas, diferentes estratégias foram traça-das, um verdadeiro festival dos sentidos (MORAES, TORRE, 2004) foi arquitetado . As propostas traziam em si as diferentes dimensões da vida e as diferentes dimensões constitutivas do ser humano: razão e emoção, objetividade e subjetividade, conhecimento científico e senso comum, matéria corporal e espírito, ordem e desordem, entre outros .

O primeiro grupo, composto por quatro alunas6, encenou uma Roda de Entrevista– com uma entrevistadora e três entre-vistadas – para compartilhar os pontos de observação e crité-rios de análise estabelecidos por Nascimento (2013) em uma pesquisa em que ela busca estabelecer parâmetros de uma efetiva prática educativa transdisciplinar . Perguntas e respostas fluíam em um diálogo aberto e interativo . Houve um encadea-mento de ideias não linear, mas circular, em que as considera-ções e ponderações eram feitas com a intenção de chegar até o público que assistia, neste caso, o restante da turma que ainda não tinha explorado o conteúdo daquele texto . A escolha, na

6 Eliete Dias dos Santos, Kátia Nazaré Andrade Oliveira, Karollyne Fernandes Camilo, Raimunda Maria Dantas .


forma de explorar o assunto do texto demonstrou que o grupo tinha consciência que:

Se traduzirmos a vida como consequência exclusiva de uma dinâmica linear fica difícil entender a emergência da consciência, da intuição, a sinergia, a criatividade, o papel das emoções e dos sentimentos na produção do conhecimento e no desenvolvimento da aprendizagem [ . . .] (MORAES, 2004, p . 29) .

Essa estratégia escolhida pelo grupo energizou os demais que, mesmo estando com suas propostas articuladas, mostra-ram-se mais confiantes na questão que para “conhecer não é preciso, portanto, apenas uma operação mental, mas é toda uma ativação de pensamentos, raciocínios que tem como base as emoções e sentimentos vividos em determinadas circuns-tâncias” (MORAES, 2004, p . 48) .

Na sequência, um grupo composto por quatro integrantes7, articulou por meio do lançamento de questões, o trabalho de compartilhar as lições de Navarrra (2012) sobre as necessidades de formação atuais . Utilizando inicialmente as perguntas formu-ladas pelo próprio autor “[ . . .] Como são esses jovens? Como vivem? Como aprendem? Em que ambiente se desenvolvem a juventude de hoje?” (NAVARRRA, 2012, p . 79) reflexões e outros questionamentos foram sendo gerados sobre as incertezas, os valores duvidosos, o princípio do prazer imediato, a não exclusi-vidade do conhecimento pelo professor no contexto atual . Nesse sentido, considerou-se que perguntas geram muito mais apren-

7 Bibiane de Souza Costa Leão, Juliana Guerino Silva, Vanessa Aparecida Perei-ra Gonçalves, Nilce de Fátima Morais Albino .


dizagem do que respostas prontas, pois incita o outro a se colo-car como sujeito do processo de construção do conhecimento e corresponsável por sua formação e a dos outros .

A definição das perguntas geradoras é fundamental para a motivação, para estimular a criatividade e a própria atitude indagadora . A cultura inovadora e cria-tiva deve estimular a formulação de perguntas, a obser-var e relacionar para perguntar [ . . .] (ZWIEREWICZ, 2013, p . 164) .

O objetivo do grupo era sensibilizar os colegas para a necessidade de outro modelo de formação docente, por um outro currículo, por uma outra didática . De acordo com Navarra (2012, p . 84) temos que ensinar o conhecimento cien-tífico que está em toda parte, ensinar o desejo de aprender, mas “além disso, temos que transmitir valores como responsabili-dade, compromisso, solidariedade em uma cidadania global, a prática cotidiana no esforço do estudo e do trabalho” .

O terceiro grupo, composto por três alunas8, colaborou com as reflexões propostas pelo Eixo, a partir do texto de Suanno (2014) que discute: A escola que desenvolve seu poten-cial criativo. Este lançou como estratégia entregar para cada colega um fragmento do texto . Assim à medida que um aluno lia o fragmento, outro deveria identificar o fragmento comple-mentar . O trabalho de cada dupla era compor a sentença e discutir entre si e depois, no coletivo, sobre as aprendizagens decorrentes da formulação . Como os alunos ainda não tinham conhecimento do texto e sua organização supunha-se que os

8 Aureni Maria Leite, Cristiane de Almeida Vilela, Elisangela Lopes de Oliveira .


fragmentos poderiam ser recompostos ser sem necessaria-mente como estavam no original; isso não só ocorreu como era a intenção do grupo que organizou a proposta .

A perspectiva, de acordo com a explicação do próprio grupo, era fugir da linearidade, da memorização e repetição de qualquer frase pronta e possibilitar novas relações e conexões além do que o texto já propunha . Desse modo, ressaltou-se que a não linearidade e a ausência de preocupação com o comple-mento original dos fragmentos, possibilitou a construção e articulação sobre a importância de ser ter hoje escolas criativas que possibilitem aos alunos uma aprendizagem criativa (SUANNO, 2014) . As concepções foram ressignificadas pelos alunos que arquitetaram novos arranjos para compreender o desenvolvimento desse processo .

As concepções existentes dentro de cada um de nós se revelam também em nossa maneira de conhecer, de aprender e de educar . Se acreditarmos que nada é predeterminado, que a participação do sujeito é funda-mental, que não existe um mundo anterior à percepção do observador e que a subjetividade e a objetividade estão intimamente relacionadas, então daremos maior valor às experiências, prestaremos maior atenção às relações estabelecidas, as diferentes conversações, aos diálogos e às emergências que surgem nos diferentes ambientes que frequentamos ou criamos (MORAES, 2004, p . 23) .

Na sequência das apresentações, as reflexões seguiram no sentido de buscar respostas para os questionamentos do texto: o que dizer sobre adversidade, resiliência e criatividade: uma


articulação oportuna? (SUANNO, 2013) . Esse foi o quarto tema explorado e compartilhado por um trio9 que, assim como os outros, também buscaram inovação e criatividade como forma de ampliar as possibilidades de responder a questão mobilizadora/ problematizadora do Eixo .

Dando continuidade ao clima de cumplicidade e corres-ponsabilidade para as aprendizagens coletivas, o grupo insti-gou os colegas a pensar nos elementos provocadores de inércia ou enfrentamento diante das adversidades pessoais e profissio-nais que todo ser humano passa ao longo da vida .

Esse questionamento foi uma forma de revivar conheci-mentos, posturas, atitudes, emoções, sentimentos, ações e reações frente às crises pessoais, sociais, econômicas e políticas que serviram como oportunidade para elaboração de saídas criativas e inovadoras . Para exemplificar o enfretamento e superação, o grupo convidou colegas para dar depoimentos de ordem pessoal e/ou profissional para ilustrar a discussão .

As adversidades, se percebidas como oportunidades de crescimento, podem ser de um novo ciclo e carregar forças de renovação, criação e inovação . Em momento de crise, em situações de grandes conflitos, caso a postura do sujeito, ou instituição, seja de enfrenta-mento e criatividade, o que é elaborado, quase sempre, é inovador (SUANNO, 2013, p . 31).

As emoções desencadeadas pelos depoimentos não só ilustraram a discussão como reafirmaram a necessidade do

9 O grupo foi composto por: Jin Joel Momonuki, Josiany Machado Rodrigues, Marta Morais Camelo .


reconhecimento da inteireza humana como resultado de uma unidade indivisível em que corpo e mente, razão e emoção não se fragmentam no processo de construção do conhecimento .

Como educadores, temos que pensar seriamente nestas questões se pretendemos educar visando à inteireza humana, onde pensamentos, emoções, intuições e sentimentos estejam em constate diálogo em prol da evolução da consciência humana . Portanto, é necessá-rio que busquemos novas teorias, novas referências que explicitem, como maior clareza, as questões epistemo-lógicas imbricadas no ato de educar (MORAES, TORRES, 2004, p . 55) .

A esta altura do nosso primeiro encontro todos já estavam envolvidos num clima de emoções . Tantos conhecimentos ressignificados e a emergência de novas possibilidades no campo educativo, capazes de “[ . . .] reencantar educando e educador em um processo compartilhado de construção da aprendizagem, tanto do discente como do docente” (MORAES, TORRES, 2004, p . 7) . Porém, ainda faltavam dois grupos que também iriam contribuir para as reflexões propostas para aquele dia e para o Eixo .

O quinto grupo, também um trio10, ficou com a responsa-bilidade de socializar com os colegas Ecoformação e transdisci-plinaridade na Rede de Escolas Criativas (TORRE, SILVA, 2014) . O texto apresenta uma reflexão sobre o fato de que educar para a criatividade requer uma reforma paradigmática, uma reforma de pensamento e uma profunda transformação

10 O grupo foi composto por: Marcelo Santos Mendes, Samara Santos Tavares Lemes, Vanessa dos Reis Xavier .


na educação . Eles esclarecem, ainda, sobre a origem e ações da Rede Internacional de Escolas Criativas (RIEC) e outros núcleos que pesquisam esse movimento .

O conteúdo do texto foi transformado pelo grupo em um poema (anexo 01) que foi declamado por uma das integrantes em uma performance emocionante . Em seguida, foi entregue para cada aluno, fragmentos do poema em um formato de uma folha de uma árvore juntamente com um formato de fruto que deveria ser preenchido de acordo com as interpretações dadas ao fragmento recebido . A conclusão do trabalho foi a monta-gem de uma grande árvore que simbolizava o desenvolvimento de propostas educativas criativas e inovadoras, fruto do esforço de grupos de pesquisadores, professores e, naquele momento, dos alunos da Especialização que em um movimento coletivo buscava articular e implementar propostas que rompessem com o paradigma tradicional .

O conceito de Escola Criativa pode adotar múltiplas tendências e manifestações . Não é algo fechado e está-tico . Antes de tudo é um processo, um movimento que vai evoluindo em harmonia e com repercussão em outras instituições, grupos e coletivos . Por isso é impor-tante considerar o marco teórico que enraíza este movi-mento que estamos descrevendo e, que estes contam com pessoas semeadoras e polinizadoras em vários países da América Latina (TORRE, SILVA, 2014, p . 41) .

Os alunos e professores da Especialização em transdisci-plinaridade e interdisciplinaridade na educação, da UEG, Câmpus Inhumas, contribuem para este movimento de pessoas semeadoras e polinizadoras de uma educação que compartilha


conhecimento sem desconsiderar as emoções, os sentimentos, a responsabilidade consigo, com outro e com o planeta como um todo; uma educação integrada, fruto da conjunção de múltiplas linguagens . Essa era perspectiva do Curso, “[ . . .] o desenvolvimento de estratégias didáticas que privilegiem dife-rentes tipos de linguagem, que estimulem desafios, vivências, curiosidades, promovam iniciativas, enfim, estratégias que colaborem para o desenvolvimento da autonomia [ . . .]” . (MORAES, TORRES, 2004, p . 47) .

Para fechar o trabalho do primeiro encontro do Eixo, um trio11 compartilhou o texto de Schimidt Neto (2013), intitulado A fotolinguagem como metodologia transdisciplinar. Para apre-sentar o texto, os componentes usaram e abusaram de imagens instigantes e enigmáticas como forma de sensibilizar os cole-gas sobre esta metodologia que é pouca utilizada uma vez que há supremacia da linguagem oral e escrita na formulação de ideias, conceitos, aprendizagens .

Para Schimidt Neto (2013, p . 105) “o pensamento simbó-lico, portanto, trabalha com a complexidade da realidade e mostra os seus diferentes planos de significado e de interpreta-ção [ . . .]” . Esse foi o objetivo do grupo, provocar diferentes possibilidades de interpretação de um determinado objeto, ir além da aparência, interpretar, projetar, relacionar, comparar, transcender e problematizar a questão da constituição da reali-dade numa visão binária .

Encerramos o dia com a sensação de que apreendemos fundamentos e estratégias essenciais para reencantar a educa-

11 O grupo foi composto por: Amanda Ruany Pires de Sousa, Jordania D'Vila Ferreira, Thaís Marques Cabral .


ção (MORAES, TORRES, 2004) e que é possível exercer uma docência pautada no rigor científico sem desconsiderar a sensi-bilidade, os sentimentos, as emoções, a alegria, o prazer de ensinar e de aprender . As vivências do dia serviram de parâ-metro para o grupo compreender que:

Através de estratégias de sentipensar se produzirá a prática de integração e da integridade, da escuta inclu-siva e da ênfase no cuidar do ser, a partir do fazer mais coerente com o pensamento e o sentimento . Alinhando pensamentos, emoções, sentimentos e ações com algo mais elevado de nós mesmos, então a vida se tornará mais rica, plena, cheia de significados e sentido [ . . .] . (MORAES, TORRES, 2004, p . 69) .

Esses sentimentos foram expressos pelos alunos na devo-lutiva recebida por email e que está registrado no início deste tópico:

Bom Dia professora Lindalva!! Foram momentos incrí-veis realmente . Infelizmente quem não foi perdeu essa experiência, pois não mais será repetida . Pode ter outras, melhores ou piores, mais igual, impossível . Felicitações à todos que vivenciaram conjuntamente esse momento!!! (Jin Joel Momonuki Para postrans-in-ter@googlegroups .com 20/09/15 às 12:08) Foi ímpar! (Nilce de Fátima Morais Albino . para postrans-inter@googlegroups .com 20/09/15 às 13:58)Parabéns, a aula foi muito emocionante eu e Zélia viemos para Goiânia comentando o quanto o grupo esta rico no conhecimento do sentirpensar, todos sabá-dos estamos vivendo momentos de riqueza em nossas


vidas . (Eliete Dias dos Santos para postrans-inter@googlegroups .com 20/09/15 às 6:53) Professora Lindalva, o nosso encontro de sábado real-mente tinha tudo para ser uma catástrofe, por não irmos a Pirenópolis, estávamos um tanto frustrados, mas a sensibilidade de sua maestria e a interação de todos da turma fez acontecer um encontro inesquecível para todos que ali estavam . . . Sei que o pensar complexo e o sentirpensar estavam gritando na aula de sábado, por isso tanta criatividade e tanta inspiração . . . Realmente foi ótimo . . . Bom dia a todos . . . (Marcelo Mendes para postrans-inter@googlegroups .com 21/09/2015, 9:00)

Os demais professores que também atuam nesta Pós-graduação, também comentaram a mensagem do email numa demonstração de carinho e cumplicidade do grupo com a efetivação da proposta do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu, que objetiva novos caminhos para a criação e realização de práticas pedagógicas integradoras vinculadas à dinâmica complexa da vida e à complexa condição humana .

Que bom, Lindalva!!! Precisamos fazer um relato do que vivemos com essa turma, embora eu acredite que o que está inscrito em nós seja muito difícil de traduzir em palavras! Beijos e bom domingo a todos! (Carla Conti para postrans-inter@googlegroups .com 20/09/15 às 12:43)Parabéns, Lindalva . (Cristina Bonetti para postrans-n-ter@googlegroups .com 20/09/15 às 1:08 )Que bela tradução para o seu sentirpensar compa-nheira . . . Parabéns pela condução desse encontro e já estou na torcida para registrar esse relato!! (Yara


Fonseca para postrans-nter@googlegroups .com 20/09/15 13:40)

Os dois encontros que se seguiram a este, foram destina-dos a análises de diferentes relatos de experiências (da Educa-ção Infantil a Pós-graduação), de projetos de trabalho interdis-ciplinares e transdisciplinares, ecoformadores que foram captadas pela Rede Internacional de Escolas Criativas – RIEC e INCREA . Estes, por sua vez, atuam na pesquisa de inovação e criatividade no campo das práticas educativas . Além destas, outras práticas foram identificadas pelos alunos que souberam, com propriedade, identificar elementos e princípios defendidos pelo paradigma emergente .

A visita ao Econcentro não ocorreu devido à incompatibi-lidade de datas disponíveis do local e o calendário do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu, mas nem por isso o grupo deixou de analisar e reconhecer sua proposta inovadora e criativa .

Para fechar o ciclo de discussões, o grupo voltou à questão mobilizadora/problematizadora do Eixo: O que aprendemos com escolas que criam outras vias para a formação do humano? O que caracterizam os relatos de experiência estudados? Desta forma, cada um expressou por meio de um relato escrito, suas expectativas, seus desejos, suas emoções, seus sentimentos e suas conquistas a partir da proposta do Eixo . Essa atividade foi mais uma forma de mostrar o que foi vivido e aprendido, agora por meio de uma outra linguagem – a escrita . Um registro como forma de produzir memória e fazer história, sem nenhum propósito de quantificar ou atribuir qualquer valor numérico, pois como nos disse sabiamente a professora Carla Conti o que está inscrito em nós seja muito difícil de traduzir em palavras.


Algumas considerações

A discussão apresentada aqui por meio do relato de expe-riência deixa clara a urgência da busca de religar as diferentes dimensões da vida e as diferentes dimensões constitutivas do ser humano que foram fragmentadas pelo paradigma tradicio-nal . A visão dicotomizada do paradigma tradicional determi-nou, em grande parte, concepções e práticas no campo da educação gerando uma visão fragmentada do conhecimento, das atitudes de ensinar e aprender, das ações e reações frente ao que a pessoa é ao que a pessoa faz e como ela conhece .

A hegemonia deste paradigma fez obscurecer outras formas de pensar, sentir e agir; fez desacreditar alternativas, experiên-cias, conhecimentos que não fossem certificados pela ciência .

Esse relato de experiência vem contrapor essa lógica frag-mentária e excludente, sinalizando a possibilidade de efetivar práticas educativas que rompam com este paradigma por meio de fundamentos teórico-práticos da criatividade e inovação a nível, não do discurso, mas de ações concretas .

O relato traz exemplos reais como o projeto transdiscipli-nar e interdisciplinar proposto e desenvolvido no Estágio de Pedagogia, da UEG Câmpus Inhumas que rompeu com a lógica e os limites da disciplinaridade, dos exercícios de memó-ria e dos conhecimentos acabados . Possibilitou aos alunos dos campos e os acadêmicos, condições de adquirir, investigar e refletir temas emergentes, e por meio de um pensamento complexo, religar conhecimentos e desenvolver ações e práticas transformadoras .

O Curso de Pós-Graduação Lato Sensu, através de seus eixos integrados, buscou implementar esta proposta . O Eixo


Relato de experiência contemporâneas projetou a possibilidade dos alunos de vivenciarem um dos ensinamento de Freire (1996, p . 38) ) que “ensinar exige a corporeificação das palavras pelo exemplo” . Desse modo, ensinar conceitos como criativi-dade, inovação, metodologias ativas, sentipensar só acontecem por meio de uma prática testemunhal do dizer . A fusão que ocorreu entre pensar, sentir e agir como modo de interpretar a realidade, se materializou em trocas efetivas de emoções, senti-mentos, conhecimentos e ações que se consolidaram por meio de uma metodologia ativa (participante) em que os sujeitos envolvidos se expressaram durante o ato educativo como o são: seres multidimensionais, inteiros .

[ . . .] . Não adianta apenas ficarmos mais uma década discutindo essas questões apenas em nível teórico, reconhecendo a necessidade de novos paradigmas em educação e na ciência em geral . É preciso que a discus-são paradigmática alimente as práticas institucionais no sentido de consolidar reformas programáticas capa-zes de serem levadas adiante (MORAES, 2014, p . 25) .

Essa reconfiguração na formação docente exige empreen-der a busca de um novo paradigma que leve em consideração as relações, as conexões e as interações entre ciência, consciên-cia, homem, natureza e sociedade . A perspectiva de mudança e inovação carece entre outras coisas de uma reforma do pensa-mento (MORIN, 1999) e a abertura para perceber outras possi-bilidades além do que está posto pelo paradigma dominante .


Referências ALMEIDA, Cleide Rita Silvério de . É possível exercer uma prática educativa baseada no pensamento complexo? In: MORAES, Maria Cândida; SUANNO, João Henrique (orgs .) . O pensar complexo na educação. Rio de Janeiro: Walk Editora, 2014 .

BARCO, Luiz . Onde anda a imaginação . Superinteressante, São Paulo, v . 5, p . 90-90, 1998 .

FREIRE, Paulo . Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa . 8 . ed . Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996 .

MORAES, Maria Cândida e TORRE, Saturnino de la . Sentipensar: fundamentos e estratégias para reencantar a educação . Petrópolis –RJ: Vozes, 2004 .

MORAES, Maria Cândida . Pressupostos teóricos do sentipensar . In: MORAES, Maria Cândida; TORRE, Saturnino de la . Sentipensar: fundamentos e estratégias para reencantar a educação . Petrópolis –RJ: Vozes, 2004 .

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MORIN, Edgar . Por uma reforma do pensamento . In: PENA, Alfredo; NASCIMENTO, Elimar Pinheiro . O pensar complexo de Edgar Morin e a crise da modernidade . Rio de Janeiro: Garamond, 1999 .

NAVARRA, Joan Mallart i . Ecoformação e Transdisciplinaridade: fundamentos para elaboração de um currículo do século XX em uma didática humanista . SUANNO, Marilza Vanessa Rosa e RAJADELL, Núria Puiggròs (Org .) . Didática e formação de professores: perspectivas e inovações . Goiânia: CEPED Publicações e PUC Goiás, 2012 . ISBN 978-85-64604-03

NASCIMENTO, Patrícia Limaverde . Parâmetros para análise-síntese de práticas educativas . In: SUANNO, Marilza Vanessa Rosa; DITTRICH, Maria Glória; PUJOL, Maria Antónia . (Org .) . Resiliência, Criatividade e Inovação: potencialidades transdisciplinares na educação . 1ª ed . Goiânia: UEG/Ed . América, 2013 .


SCHMIDT NETO, álvaro . A fotolinguagem como metodologia transdisciplinar . In: SUANNO, Marilza Vanessa Rosa; DITTRICH, Maria Glória; PUJOL, Maria Antónia . (Org .) . Resiliência, Criatividade e Inovação: potencialidades transdisciplinares na educação . 1ª ed . Goiânia: UEG/Ed . América, 2013

SUANNO João Henrique . Adversidade, Resiliência e criatividade: uma articulação oportuna? In: SUANNO, Marilza Vanessa Rosa; DITTRICH, Maria Glória; PUJOL, Maria Antónia . (Org .) . Resiliência, Criatividade e Inovação: potencialidades transdisciplinares na educação . 1ª ed . Goiânia: UEG/Ed . América, 2013 .

SUANNO, João Henrique . A escola que desenvolve seu potencial criativo . In: SILVA,Vera Lúcia de Souza; SCHROEDER, Edson (orgs) . Novos Talentos – processos educativos em ecoformação . Blumenau: Editora Legere, 2014 .

SUANNO, Marilza Vanessa Rosa . Estágio transdisciplinar na formação de professores . In: SILVA,Vera Lúcia de Souza; SCHROEDER, Edson (orgs) . Novos Talentos – processos educativos em ecoformação . Blumenau: Editora Legere, 2014 .

______ . Projeto integrador inter/transdisciplinar: dimensões sustentáveis na formação do Pesagogo e na parceria com as Escolas Campos de Estágio . In: PINHO, Maria José de; SUANNO, MarilzaVanessa Rosa; SUANNO, João Henrique; FERRAZ, Elzimar Pereira Nascimento (orgs) .Complexidade, interdisciplinaridade e transdisciplinaridade na educação superior . Goiânia: Editora Espaço Acadêmico, 2015 .

TORRE, Saturnino de la; ZWIEREWICZ, Marlene . Projeto inovar com outra consciência . In: TORRE, Saturnino e ZWIEREWICZ, Marlene (coord .) . Uma escola para o século xxI: escolas criativas e resiliência na educação . Florianópolis: Insular, 2009 .

TORRE, Saturnino de La; SILVA,Vera Lúcia de Souza . Ecoformação e transdisciplinaridade na rede de escolas criativas .In: SILVA,Vera Lúcia de Souza; SCHROEDER, Edson (orgs) . Novos Talentos – processos educativos em ecoformação . Blumenau: Editora Legere, 2014 .

ZWIEREWICZ, Marlene . Projetos criativos ecoformadores– PCE: Uma via metodologica desde e para o paradigma da complexidade . In: TORRE, Saturnino de la; ZWIEREWICZ, Marlene SILVA,Vera Lúcia de Souza .; PUJOL, Antonia María (Orgs .) .Inovando na sala de aula . Instituições transformadoras . Blumenau: Nova Letra, 2013 .


ANExO

ESCOLAS CRIATIVASAutoria: Marcelo S. Mendes; Vanesssa R. xavier; Samara T. Lemes (alunos da Especialização em Transdisciplinaridade e interdisciplinaridade na educação, UEG, Câmpus Inhumas, em 2015)

Morin propõe a reconstrução do conhecimentoIdentificando a transformação da educação, com a reforma do pensamentoVários grupos se motivaram para esse desenvolvimentoUniram forças para esse movimento

Construir escolas criativas é contribuir com a educação,Auxiliar na consciência, nos valores e na criação .Abrir para novas pessoas, grupos e instituição .Sem preocupar com crenças, línguas, gênero, ou opção .

Queremos assim:Fazer com que os docentes busquem se informar,Toda a comunidade inserida como num lar .A pesquisa e a criação estimular,Encontros locais, regionais e internacionais realizar,As entidades merecedoras, diplomar e certificar,Ter grupo de referencia para se espelhar,Canais de comunicação para todas se comunicar,Incentivar o intercâmbio, concursos e assessorias para nos aprofundar .


Então, o que entendemos por Escola criativas?Essas são instituições educativas que transcendem o ponto de partida,Reconhecem, valorizam alunos e professores e os motiva!Busca de todas as formas, qualidade e uma vida inventiva .

Instiga, auxilia, leva e libera para criar .Habilita, ensina, proporciona para viver . Se importa com o humano e o ambiental,Fazendo instituições vivas, recriar, valorizar e transformar .

(Poema baseado em TORRE, Saturnino de La; SILVA,Vera Lúcia de Souza . Ecoformação e transdisciplinaridade na rede de escolas cria-tivas .In: SILVA,Vera Lúcia de Souza; SCHROEDER, Edson (orgs) . Novos Talentos – processos educativos em ecoformação . Blumenau: Editora Legere, 2014 .)

CINE FORMAçãO: TRANSDISCIPLINARIDADE E

INTERDISCIPLINARIDADE NA RELAçãO ENTRE CINEMA E EDUCAçãO

Osvaldo José Sobral

O presente capítulo tem como tema o “cine formação” . E, como problematização da pesquisa foi elaborada a seguinte questão-problema: Quais são as contri-

buições de um projeto de “cine formação” para alunos de um Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Transdisciplinaridade e Interdisciplinaridade na Educação e para a comunidade?

O objetivo geral desta investigação foi compreender as contribuições de um projeto de “cine formação” para alunos de um Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Transdisciplinari-dade e Interdisciplinaridade na Educação e para a comunidade em geral . E, os objetivos específicos foram: 1) discutir a respeito da transdisciplinaridade e interdisciplinaridade na educação; 2) conceituar o cinema, como “sétima arte”; 3) apresentar uma concepção de análise fílmica, bem como possíveis procedi-mentos para realização desta; e, 4) analisar as contribuições do cinema para a formação acadêmica, profissional e pessoal, por intermédio do Cine Formação .

7


Como metodologia desta pesquisa foi realizada uma revisão de literatura, mediante o levantamento bibliográfico sobre o cinema, bem como de temáticas como: interdiscipli-naridade, transdisciplinaridade, complexidade, criatividade, sustentabilidade, ecoformação1, diversidade, alteridade, empatia, dentre outras .

A partir dessas abordagens teórico-epistemológicas, buscou-se uma fundamentação teórica em autores como: Jullier e Marie (2012); Kemp (2011); Morin (2000); Rego (2001); Sobral (2011); Suanno J . (2014); Suanno M . (2014); Suanno et al. (2014); Young (2014), dentre outros . E, ainda, utilizou-se a análise fílmica e a descrição do procedimento metodológico do eixo Cine Formação do curso de pós-graduação, Lato Sensu, Especialização em Transdisciplinaridade e Interdisciplinari-dade na Educação da Universidade Estadual de Goiás (UEG), Câmpus Inhumas, ocorrida durante um ano, entre os meses de setembro de 2014 e setembro de 2015 .

Para tanto, este trabalho acadêmico-científico tem como proposta de contribuição para a ampliação do conhecimento na área da educação refletir a respeito dos seguintes tópicos: transdisciplinaridade e interdisciplinaridade na educação; a “sétima arte”, o cinema; análise fílmica; Cine Formação – transdisciplinaridade e interdisciplinaridade em educação; e, Cine Formação – as contribuições do cinema para a formação acadêmica, profissional e pessoal .

1 “A ecoformação, nutrida pela transdisciplinaridade, se fundamenta na afetivi-dade que permeia a vida, na construção coletiva de saberes e no compartilhar de experiências e sentimentos” (SUANNO, J . 2014, p . 175) .

205Cine formação

7.1 Transdisciplinaridade e Interdisciplinaridade na Educação

O eixo Cine Formação – do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Transdisciplinaridade e Interdisciplinaridade na Educação, da UEG, Câmpus Inhumas – foi concebido como um procedimento metodológico e recurso didático-capaz de combinar o ensino com a extensão, e promover um processo que envolve o pensamento, o sentimento e a ação por intermé-dio do diálogo a respeito de filmes, documentários e anima-ções, e assim construir conhecimentos, atitudes e projetos na comunidade local . Neste sentido, o Cine Formação foi ideali-zado como uma

estratégia de formação integradora via ensino com exten-são, que tem o intuito de ajudar a pensar-sentir-agir por meio do diálogo sobre documentários e filmes e assim construir conhecimentos, atitudes e projetos na comuni-dade local . É uma estratégia de formação, que visa desperta o pensamento crítico, a criatividade, a capaci-dade de análise, de intervenção na vida cotidiana e de sensibilização do ser humano para a condição humana . Promove um tipo de aprendizagem integradora que conjuga cinema, conhecimento e percepção multissen-sorial . (SUANNO et al., 2014, p . 5, grifado no original) .

O Cine Formação vislumbra despertar o pensamento crítico, a criatividade, a capacidade de análise complexa, de intervenção na vida cotidiana e de sensibilização do ser humano para a condição humana . E, ainda, pretende promo-ver um processo de ensino e aprendizagem integrador que


associa o cinema, o conhecimento sistematizado, buscando estimular a percepção humana, mediante a elucidação multis-sensorial . Corroborando com esta compreensão, Morin (2000, p . 20) acredita que “o conhecimento não é um espelho das coisas ou do mundo externo . Todas as percepções são, ao mesmo tempo, traduções e reconstruções cerebrais com base em estímulos ou sinais captados e codificados pelos sentidos” .

É necessário que os professores que atuam desde a Educa-ção Infantil até o Ensino Superior, desenvolvam concepções e atitudes fundamentadas em uma abordagem complexa, inter e transdisciplinar, com base em uma perspectiva de ecoforma-ção continuada e profissionalização docente . A partir de seus papeis de mediadores “[ . . .] na dinâmica das interações inter-pessoais e na interação [dos alunos] com os objetos do conhe-cimento” (REGO, 2011, p . 115), os professores tenham condi-ções de promover2 – em todas as relações estabelecidas nos espaços nos quais trabalham com processos de ensinagem e aprendizagem – “movimentos de religação e interligação dinâ-mica e entre o todo-parte e parte-todo na busca pela superação da totalidade fragmentada e do reducionismo” (SUANNO, M . 2014, p . 108) . E, que consigam, ainda, mediar uma compreen-são que possa traduzir para seus alunos as condições para construírem, ou reconstruírem, a capacidade de alteridade, empatia e respeito, com uma percepção focada na criatividade, complexidade, diversidade, subjetividade e sustentabilidade das relações consigo mesmo, com os outros e com o mundo .

2 “Dar impulso a; trabalhar a favor de; favorecer o progresso de; fazer avançar; fomentar [ . . .] Ser a causa de; causar, gerar, provocar, originar [ . . .] Diligenciar para que se realize, se efetue, se verifique [ . . .]” (FERREIRA, 1999, p . 1 .648) .

207Cine formação

7.2 A Sétima Arte, o Cinema

“O cinema é uma forma de arte particularmente eloquente, recorrendo a extraordinárias imagens em movimento e a sons vibrantes para conectar os cineastas à audiência por meio do celuloide e dos sentidos” (YOUNG, 2014, p . 17) . Nesta aborda-gem, o cinema pode ser compreendido, também, como

[ . . .] uma manifestação artística contemporânea por meio do som e da imagem em movimento . Por inter-médio da câmera cinematográfica, ele permite captar uma sociedade complexa, múltipla e diversificada, que combina de forma inovadora, arquitetura (cenários originais e reconstituídos), engenharia (som, efeitos sonoros e outros), informática (efeitos digitais), dança (coreografias), história (reconstituição de outras épocas e fatos históricos), literatura (roteiros adaptados e originais), a música (trilha sonora), psicologia (dramas, conflitos e dimensões de personalidade das persona-gens), moda (figurino) e artes (fotografia, direção de arte etc .), dentre outras . E, com a mesma eficiência, ele cria novas e insólitas realidades, numa imaginação infinita e plástica, que só encontra correspondente nos sonhos . [ . . .] . (SOBRAL, 2011, p . 165) .

Não obstante, “o cinema não oferece apenas entreteni-mento, é também ‘a sétima arte’ .” (BERGAN, 2009 apud SOBRAL, 2011, p . 165, grifado no original) . Nesta perspectiva, ainda, segundo Sobral (2011, p . 165),

assim como a literatura, ele possui o extraordinário poder, próprio da obra de arte, de tornar presente o


ausente, próximo o distante, entrecruzando realidade e sonho, verdade e fantasia, reflexão e devaneio, alterando de maneira lúdica o tempo e o espaço . No cinema, a genialidade dos diretores, a criatividade dos roteiristas, a inventividade dos técnicos e a expressividade dramática ou cômica dos atores podem desvelar-se e ofertar-se, plenamente, à plateia, sem distinção de classe social, crença, etnia, idade, gênero e orientação sexual .

Nessa premissa, após apresentar uma concepção de cinema como uma das mais importantes manifestações artísti-cas humanas, cabe indagar: “Será que alguma forma de arte se espalhou tão rapidamente ou de um modo tão universal quanto o cinema?” (KEMP, 2011, p . 8) .

7.3 Análise Fílmica

A pesquisa desenvolvida para o desenvolvimento deste capítulo não tem condições de responder à questão levantada por Kemp (2011) . Não obstante, é possível acreditar que a expe-riência cinematográfica (assistir filmes) se constitui – para muitas pessoas, sobretudo os cinéfilos – uma das mais prazero-sas e instigantes fruições artísticas (película) e literárias (rotei-ros), passíveis de serem analisadas .

Destarte, um dos objetivos específicos deste capítulo é apresentar uma concepção de análise fílmica, bem como possí-veis procedimentos para realização desta, torna-se necessário apresentar uma compreensão do conceito de “análise” . Sendo assim, vale descrever a definição de Ferreira (1999, p . 130):

209Cine formação

1. Ato ou efeito de analisar . 2. Separação ou desagrega-ção das diversas partes constituintes de um todo; decomposição [ . . .] . 3. Exame de cada parte de um todo, tendo em vista conhecer sua natureza, suas proporções, suas funções, suas relações, etc . [ . . .] . 4. [ . . .] O resultado da análise [ . . .] . 5. Estudo pormenorizado; exame, crítica: [ . . .] de uma obra de arte . (grifado no original) .

Nessa compreensão, analisar um filme é realizar um exame pormenorizado e crítico das partes que constituem o todo de uma obra de arte fílmica, decompondo-a no intuito de perceber, para além de sua estrutura, suas funções e relações . E, para Jullier e Marie (2012, p . 7; 15),

nem sempre conseguimos explicar porque determi-nada passagem de um filme não sai de nossa cabeça . Apenas sabemos que nos toca, nos agrada ou nos surpreende . As cenas se sucedem e somos apanhados em nossa emoção . Certamente isso não é apenas uma questão de intuição do diretor, exige rigor, técnica e compreensão ou familiaridade com as paixões huma-nas . [ . . .] .Muitas razões podem ser invocadas para comprar uma entrada de cinema ou ficar diante da televisão durante todo o tempo em que ela transmite um filme . Mas a mais comum, aquela que justifica que milhares de pessoas fiquem duas horas sentadas sem se mexer com os olhos fixados em fantasmas animados e tagarelas, é o prazer . Os grandes sucessos da história do cinema sem dúvida se prestam à reflexão, instruem acerca da situação do mundo, mas antes de tudo dão satisfação . [ . . .] . (grifado no original) .


A análise fílmica tem se apresentado como um recurso didático-pedagógico e metodológico essencial na dinâmica das salas de aulas, para quaisquer disciplinas, das diversas áreas do conhecimento, e em todos os níveis de ensino, desde a Educa-ção Infantil, passando pelo Ensino Fundamental e Médio, até o Ensino Superior, na graduação e pós-graduação lato e stricto sensu . Neste entendimento, ainda, de acordo com Jullier e Marie (2012, p . 15-16; 17),

para “ler o cinema” não existe um código indecifrável, receita milagrosa ou método rígido . Aliás, muitos filmes exigem menos ser lidos como mensagens cifra-das do que ser sentidos, experimentados carnalmente, ou quase . [ . . .] . [ . . .] todos os filmes merecem ser analisados [ . . .] os “velhos filmes” ou os filmes “de arte” não são os únicos candidatos possíveis a esse exercício . [ . . .] Qualquer que seja o filme, mesmo aquele que o mundo todo concorda em qualificar de “droga”, pode ser objeto de estudo . Só que o proveito corre o risco de ser menor do que em se tratando de uma obra-prima . . . (grifado no original) .

E, para tanto, a análise fílmica torna-se um instrumento atualizado, coerente e relevante, e, portanto, necessário para se realizar uma proposta de Cine Formação, especialmente, na perspectiva da complexidade e da interdisciplinaridade e transdisciplinaridade .

211Cine formação

7.4 Cine Formação: transdisciplinaridade e interdisciplinaridade na educação

Esta proposição de Cine Formação parte de uma concep-ção criativa, ecoformadora, fundamentada na complexidade, interdisciplinaridade e transdisciplinaridade, e com ênfase na relação entre Cinema e Educação . Com este propósito, foram elencados dezessete filmes3, entre longas-metragens, curtas-metragens, animações e documentários, passíveis de serem exibidos e analisados dentro do procedimento metodológico deste eixo, conforme o Quadro 1 .

Quadro 1: Filmes Elencados para uma Proposta de Cine Formação4

Ficha Técnica Temáticas Específicas

1 . Doze Homens e Uma Sentença (12 Angry Men, EUA, 1957) . Direção: Sid-ney Lumet . Elenco: Henry Fonda, Lee J . Cobb, Martins Balsan e Robert Web-ber . 95 min .

Alteridade, empatia, preconceito ét-nico-cultural, pensamento complexo, raciocínio crítico, argumentação, per-suasão, formação de convencimento, percepção, subjetividade, criatividade, transdisciplinaridade, interdisciplin-aridade, dentre outras .

3 A lista dos filmes foi organizada, também, com as indicações da Profa . Ma-rilza Vanessa Rosa Suanno (Às Margens do Rio Sagrado – Water, Canadá/Índia, 2005); Profa . Cristiane Rosa Lopes (Flor do Deserto – Desert Flower, Reino Unido/áustria/Alemanha, 2009) e (Janela da Alma – Seelenfenster, Bra-sil, 2001), que indicou as temáticas específicas deste; e Profa . Valdirene Alves de Oliveira (Tarja Branca – Brasil, 2013) .

4 Disponível em: <http://www .adorocinema .com/filmes/numero-cinemas/> . Acesso em: 3 jan . 2016 .



2 . Ponto de Mutação (Mindwalk, EUA, 1990) . De: Bernt Capra . 110 min . Com: Liv Ullmann, John Heard, Sam Waterston e Ione Skye . 110 min .

Ciência Moderna e a Ciência Emer-gente (Pós-Moderna), finalidade da ciência, paradigma da complexidade, visão mecanicista x visão sistêmica, sustentabilidade, teia de relações .

3 . Uma Lição de Vida (Wit, Inglaterra, 2001) . De: Mike Nichols . Com: Emma Thompson, Eileen Atkins, Audra Mc-Donald, Christopher Lloyd e Jonathan M . Woodward . 100 min .

Disciplinaridade, pedagogia, relação professor-aluno, relação médico-pa-ciente, relação saúde-doença, paradig-ma médico tradicional, humanização em ambientes médicos, atendimento humanizado, humanização dos ambi-entes profissionais, processo de morte e morrer, razão x sensibilidade, dentre outras .

4 . Janela da Alma (Seelenfenster, Bra-sil, 2001) . De: João Jardim e Walter Carvalho . 73 min .

Transdisciplinaridade, condição hu-mana, não-linearidade, relações para-doxais, emoção / sensibilidade / ima-ginação, diversidade, níveis de percep-ção, dentre outras .

5 . Aos Treze (Thirteen, EUA/Inglat-erra, 2003) . De: Catherine Hardwicke . Com: Holly Hunter, Evan Rachel Wood, Nikki Reed, Jeremy Sisto e Deborah Kara Unger . 100 min .

Crise na adolescência, iniciação se-xual, sexo sem proteção, exposição às drogas, apelo da mídia, automutilação, conflitos familiares, abandono e falta de limites, negligência e omissão pa-terna, vínculo materno etc .

6 . às Margens do Rio Sagrado (Wa-ter, Canadá/India, 2005) . De: Deepa Mehta . Com: Seema Biswas, Lisa Ray, John Abraham e Sarala Kariya-wasam . 110 min .

Cultura, multiculturalismo, intercul-turalidade, patriarcalismo/ machismo, relações de gênero, repressão/submis-são da mulher, exploração sexual, iso-lamento social, dentre outras .

7 . Escritores da Liberdade (Freedom Writers, EUA, 2007) . De: Richard La-Gravenese . Com: Hilary Swank, Pat-rick Dempsey, Scott Glenn e Imelda Stauton . 120 min .

Educação libertadora, formação acadêmica: produção textual forma-ção estética: literatura, papel mediador do professor, relato de experiência em campo de concentração nazista, den-tre outras .

213Cine formação


8 . A Partida (Okuribito, Japão, 2008) . De: Yojiro Takita . Com: Tsutomu Ya-mazaki, Kazuko Yoshiyuki e Taro Ishi-da . 130 min .

Relação mestre (professor) e aprendiz (aluno), processo de profissionaliza-ção, dignificação da profissão, dig-nidade profissional, morte & vida, for-mação estética musical, sensibilidade, delicadeza, dentre outras .

9 . Flor do Deserto (Desert Flower, Reino Unido / áustria / Alemanha, 2009) . De: Sherry Hotmann . 120 min .

Cultura, multiculturalismo, intercul-turalidade, níveis de percepção, condi-ção humana, direitos humanos, dentre outras .

10 . Mary & Max (Mary and Max, Aus-trália, 2009) . Direção: Adam Elliot . 90 min .

Solidão, isolamento social, transtor-nos de personalidade, relações inter-pessoais sustentáveis, orientação sexu-al, dentre outras .

11 . Preciosa (Precious – based on the novel push by Sapphire, EUA, 2009) . De: Lee Daniels . Com: Cabourey Sidibe, Mo’Nique, Paula Patton, Mari-ah Carey e Lenny Kravitz .

Educação e diversidade, inclusão so-cial, educação inclusiva, problemas e dificuldades de aprendizagem, discri-minação étnico-racial, padrões estéti-cos, abuso sexual infantil, DST/AIDS, dentre outros .

12 . As Melhores Coisas do Mundo (Brasil, 2010) . De: Laís Bodanzky . Com: Francisco Miguez, Fiuk, Denise Fraga, Zé Carlos Machado . 100 min .

Adolescência, iniciação sexual, crise familiar, separação, homoafetividade, relações de gênero, bullying, droga-dição, tentativa de suicídio, família--escola-sociedade, relação professor--aluno, poder e assédio etc .

13 . Lixo Extraordinário (Waste Land, Reino Unido/Brasil, 2010) . De: Lucy Walker . Documentário com artista plástico, fotógrafo e pintor brasileiro Vic Muniz . 95 min .

Visão sistêmica, sustentabilidade, reciclagem de material descartável, cooperação, trabalho, arte, dentre out-ras .

14 . Minhas Tardes Com Margueritte (La Tête en Friche, França, 2011) . De: Jean Becker . Com: Gérard Depardieu, Gisèle Casadesus, Sophie Guillemin e Maurane . 82 min .

Relação que promove mudança, for-mação estética: literatura processo de aprendizagem, senescência, gentileza, beleza, amizade, dentre outras .



15 . A Separação (Jodaeiye Nader az Simin, Irã, 2012) . De: Asghar Farhadi . Com: Peyman Moaadi, Leila Hatami, Sareh Bayat, Shahab Hosseini . 120 min .

Multiculturalismo, interculturalidade, relações de gênero, família, mediação, conciliação, arbitragem, dentre outras .

16 . Depois de Lúcia (Después de Lucía, México/França, 2012) . De: Mi-chel Franco . Com: Tessa Ia, Hernán Mendoza e Gonzalo Vega Sisto . 100 min .

Perda, luto, frustração, negligência, omissão, relação entre família e escola, violência na/da escola e bullying .

17 . Tarja Branca (Brasil, 2013) . Docu-mentário nacional de Cacau Rhoden . 80 min .

Cultura, pluralidade cultural, patrimô-nio cultural, qualidade de vida, bem--estar, fruição, lazer, dentre outras .

Apresentada essa relação de filmes, vale destacar que cinco deles foram exibidos para a comunidade acadêmica da UEG, Câmpus Inhumas – formada por alunos e professores dos cursos de graduação em Letras – Português/Inglês e Peda-gogia e de pós-graduação, Lato Sensu, em Transdisciplinari-dade e Interdisciplinaridade na Educação – durante os anos letivos de 2014 e 2015 .

Dentre os dezessete filmes elencados, foram exibidos os seguintes: “Ponto de Mutação” (Mindwalk, 1990), “Aos Treze” (Thirteen, 2003), “Escritores da Liberdade” (Freedom Writers, 2007), “Preciosa” (Precious, 2009)5 e “As Melhores Coisas do Mundo” (2010) . E, após cada exibição ocorreram análises fílmicas, no formato de debate, mediados pelos professores presentes .

5 Longa-metragem exibido e analisado (debatido) no eixo Educação e Diversi-dade, conduzido pelas professoras Dra . Marlene Barbosa de Freitas Reis e Dra . Cristiane Rosa Lopes, do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Transdisci-plinaridade e Interdisciplinaridade na Educação, da UEG – Câmpus Inhumas .

215Cine formação

7.5 Breve análise dos filmes selecionados na pesquisa

Dentre os dezessete filmes elencados nesta investigação acadêmica, foram selecionados dois, para breve apreciação dos filmes na perspectiva da interdisciplinaridade, transdisciplina-ridade e complexidade, apenas como ilustração de análise fílmica, na perspectiva do eixo Cine Formação . Tal proposta se justifica pela impossibilidade da realização de análises mais abrangentes e aprofundadas – como, por exemplo, do ponto de vista psicológico, na qual se pudesse traçar o perfil de persona-lidade dos personagens –, em função de não ser a proposta deste trabalho acadêmico .

Partindo-se deste princípio, os critérios utilizados nesta seleção foram filmes cujos enredos tivessem como contexto a vida escolar, com ênfase no processo de ensino e aprendizagem e nas relações entre professor e aluno, sendo um filme nacional e outro estrangeiro . E, ainda, que tivessem sido exibidos e debatidos pela comunidade acadêmica .

Nesse sentido, pela premissa da complexidade, da inter-disciplinaridade e transdisciplinaridade “uma escola que trabalha com um projeto criativo ecoformador favorece a responsabilidade, a autonomia, o sentido crítico, a capacidade de tomar decisões, a busca de soluções para os problemas, bem como a criatividade” (SUANNO, J . 2014, p . 180) . Portanto, também, em consonância com a reflexão acerca da “formação do cidadão do século XXI”, de Suanno, J . (2014, p . 180),

a vinculação da escola na formação de um cidadão consciente da sua participação no mundo em que vive continua em pauta . A consciência ecoformadora, trans-


disciplinar e criativa são suportes para ações, interven-ções e transformações pessoais, sociais e planetárias baseadas na ética e na corresponsabilidade, na organi-zação de dias melhores, mais generosos e agradáveis para as gerações futuras .

Nessa perspectiva, a seguir, serão analisados os dois filmes selecionados para a proposta de “análise fílmica” (FERREIRA, 1999; JULLIER; MARIE, 2012), que são: “As Melhores Coisas do Mundo” (Brasil, 2010) e “Escritores da Liberdade” (Freedom Writers, EUA, 2007) .

As Melhores Coisas do Mundo

Esse terceiro longa-metragem dirigido por Laís Bodanzky – baseado nos livros “Mano”, da série “Cidadão Aprendiz”, dos autores Gilberto Dimenstein e Heloisa Prieto – deve ser motivo de orgulho para qualquer brasileiro, cinéfilo ou não . As qualida-des do filme vão desde a escolha da trilha sonora, passando pelo desenvolvimento do enredo, a escolha do elenco e sua direção .

Essa obra fílmica nacional, que não fica devendo a nenhuma produção cinematográfica realizada fora do Brasil, ainda, apresenta uma atualizada e relevante diversidade temá-tica, envolvendo temas como: comportamento do adolescente na atualidade; virgindade; iniciação sexual; sexo com proteção; timidez; popularidade na escola; paixão de aluna por profes-sor; uso de tecnologias; blog pessoal (diário público); blogs de fofoca da escola; bullying e cyberbullying; crise familiar; divór-cio; orientação sexual (hetero e homossexualidade); amizade; apaixonar-se; professor referência (formador de opinião);

217Cine formação

participação da família na escola; decepção amorosa; depres-são e suicídio na adolescência6 .

O filme narra a história de Mano (o estreante Francisco Miguez), um adolescente de quinze anos, e tem como cenário os conflitos de sua família, seu contexto escolar e suas relações sociais, envolvendo amizade, sexo e namoro . Mano está apren-dendo a tocar guitarra com Marcelo (Paulo Vilhena), pois deseja chamar a atenção de uma garota . Seus pais, Camila (Denise Fraga) e Horácio (Zé Carlos Machado), estão se sepa-rando, o que afeta tanto ele quanto seu irmão mais velho, Pedro (Fiuk) . E, sua melhor amiga e confidente é Carol (a, também, estreante Gabriela Rocha), que está apaixonada pelo professor Artur (Caio Blat) .

Mediante a essas situações, Mano precisa lidar com a separação dos pais, o novo relacionamento do pai, o desejo afetivo-sexual e as relações com os colegas de escola, em momentos que transitam entre diversão e tensões típicas da adolescência, na atualidade, que incluem o bullying, no qual ele, inicialmente, é o causador e, posteriormente, a vítima .

Enfim, é preciso destacar a relação entre professor e aluno que aparece duas vezes nesta história, com educadores que ensinam, para além de seus conhecimentos específicos, atitu-des e valores, e pelos quais são reconhecidos como modelos que adolescentes precisam . O primeiro é o professor Marcelo que dá aulas de violão, e ensina Mano a abraçar a música para tocar a tão sonhada e poderosa guitarra e conquistar a garota . E, o segundo, Artur, que é um professor de física que inspira

6 As pesquisas indicam que as meninas “tentam” mais que os meninos, mas eles quando o fazem são mais bem-sucedidos . (BERGER, 2013) .


seus alunos com aulas dinâmicas e planejadas de forma adequada àquele grupo de adolescentes .

Escritores da Liberdade

O filme é baseado na história real de Erin Gruwell (Hilary Swank), filha de Steve Gruwell (Scott Glenn) e casada com Scott Casey (Patrick Dempsey), que no ano de 1994 era uma profes-sora novata, interessada em lecionar Língua Inglesa e Literatura para uma turma de adolescentes resistentes ao ensino conven-cional, na escola Woodrow Wilson (em Long Beach, Califórnia) . Alguns de seus alunos estavam matriculados na escola como parte do cumprimento pena judicial, e todos são reféns de gangues, traficantes e/ou, simplesmente, do preconceito e discri-minação exercida contra estrangeiros e negros, seja na própria escola ou nos bairros periféricos onde moravam .

Nesse contexto, com disposição para superar os desafios, Erin, ainda, muito inexperiente como professora, mas dotada de ideais e convicções, luta contra um sistema tradicionalista de ensino, representado pela diretora Margaret Campbell (Imelda Staunton) e seus colegas fechados, dispostos a conti-nuarem sua prática tradicional . Portanto, para lidar com uma turma composta de alunos “problemáticos”, e que reproduzem a violência sofrida no cotidiano de seus guetos, praticando o preconceito e a discriminação entre eles mesmos, ela precisou, também, despir-se todas as suas preconcepções e abraçar, lite-ralmente, o desafio de ensinar aqueles adolescentes absoluta-mente carentes de atenção, afeto e respeito .

A “sala 203” era um grupo composto, majoritariamente, por latinos, asiáticos e afro-americanos, que se relacionavam,

219Cine formação

basicamente, mediante uma percepção etnocêntrica mutua, formada a partir de estereótipos . A partir desta premissa exaustivamente desafiadora, Erin apresenta a seus alunos um recorte da história, demonstrando a eles como a propaganda nazista – agenciada pelo Terceiro Reich, na Alemanha, no período entre os anos de 1933 e 1945 –, promoveu o precon-ceito e discriminação antissemita utilizando, especialmente, a divulgação de informações e caricaturas estereotipadas sobre judeus, principalmente, mas, também, ciganos, homossexuais, dentre outros . Sendo assim, ela demonstrou como a intolerân-cia e o ódio ao diferente resultou no holocausto, com o genocí-dio de milhares de seres humanos em campos de concentra-ção . E, por intermédio de relatos sobre Miep Gies (1909-2010, personagem vivida por Pat Carroll), a austríaca que protegeu Anne Frank (1929-1945, que era alemã de origem judia), e um encontro com a esta, ela ensina aos alunos a respeito de valores como alteridade, empatia, respeito, tolerância e diversidade .

Enfim, com a intenção de fazer o seu trabalho da melhor maneira possível, com extrema dedicação, paciên-cia, afeição, criatividade e competência, Erin faz o que poucos se atreveriam e de uma maneira empolgante, que envolve os alunos e lhes ensina o poder do trabalho coletivo, a partir do respeito às diferenças interpessoais e à diversi-dade humana . Deste modo, ela inspira seus “rebeldes” alunos e oferece a eles a possibilidade de se expressarem por intermédio da escrita de diários e da produção textual, ensi-nando-os a investir em seus sonhos, proporcionando a eles a recuperação suas vidas desfeitas, e promovendo uma reforma educacional em toda a comunidade .


7.6 Cine Formação: as contribuições do cinema para a formação acadêmica, profissional e pessoal

Retomando a proposta de que o Cine Formação – na perspectiva da transdisciplinaridade e interdisciplinaridade na Educação – possa contribuir, não somente para a forma-ção acadêmica e profissional, mas, também, pessoal de sujei-tos que estejam envolvidos na experiência, Young (2014, p . 173) afirma que

se quisermos influenciar pessoas, o cinema é uma maneira de alcançar esse objetivo . Se usados adequa-damente como ferramenta de comunicação, os filmes podem educar as pessoas em uma vasta gama de assun-tos – linguagem oral, história, política, como lidar com a dor da morte de um ente querido e assim por diante . O poder latente das imagens visuais pode ser aprovei-tado e moldado tendo em mente qualquer meta educa-cional, terapêutica ou moral .

Nesse entendimento, o Cinema se constituiu, historica-mente, em uma das mais acessíveis, de baixo custo e enrique-cedoras possibilidades de diversão e entretenimento . E, nas últimas quatro décadas, ele, também, vem se estabelecendo como um importante recurso didático-pedagógico e metodo-lógico para se mediar o conhecimento sistematizado, que a Escola e a Universidade têm a oferecer, tanto a aos alunos como a toda comunidade ao seu redor .

O cinema é hoje um comunicador de mitos . É o mais ágil e, talvez, aquele que tem uma linguagem mais

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próxima das representações pictóricas da vida mental, tanto no plano de vigília como no da vida onírica . Ainda que se mantendo virtual nos filmes, a imagem ganha objetivação e um certo grau de realidade . Dificilmente um filme não veicula mitos, sejam coletivos ou indivi-duais . Por definição, os mitos estão para a coletividade como os sonhos para o indivíduo . Mas há mitos mais pessoais, ou mais referidos a pequenos grupos, que outros . Uma observação mais atenta permitirá também estabelecer certas conexões entre os mitos que instru-mentam a cultura de uma época e o êxito de certas pelí-culas, nas quais algumas tragédias modernas ganham maior transparência . (ZUSMAN, 1994, p . 10) .

Existe a utilização de “ferramentas de análise” com mais ênfase nos recursos cinematográficos, como os apresentados por Jullier e Marie (2012): uso da fotografia, da iluminação e das cores; posicionamento e movimento da câmera; enquadra-mento; foco; extensão dos planos (próximo, médio, distante ou geral); close-up; som; trilha sonora; dentre outros . Todavia, também, existem outras possibilidades de análise fílmica como a psicanalítica freudiana, apresentada na citação de Zusman (1994) – ou, ainda, a perspectiva lacaniana, que vem sendo muito utilizada no estudo de diversas áreas do conhecimento, inclusive na Educação, para além da Psicanálise .

Por conseguinte, é possível realizar análise fílmica a respeito do perfil psicológico, dos traços de personalidade e da conduta comportamental dos personagens por intermédio de outras abordagens advindas da Psicologia . E, também, empreender análises fílmicas acerca do contexto social e histó-


rico-cultural no enfoque antropológico, sociológico, histórico, filosófico, educacional, dentre outros, além do psicológico .


Ao finalizar este trabalho acadêmico-científico foi possí-vel considerar – em consonância com a questão elaborada na problematização e o objetivo definido inicialmente, que é o de um projeto de “cine formação” para alunos de um Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Transdisciplinaridade e Inter-disciplinaridade na Educação e para a comunidade acadêmica, como um todo, deixam contribuições essenciais para todos os envolvidos . E, ainda, que não tenha sido possível a realização da experiência extensionista com a comunidade inhumense em geral, em função de limitações espaço-temporais e logísti-cas, tal proposta se apresenta como um excelente recurso didá-tico-pedagógico e metodológico para o atual contexto educa-cional brasileiro, permeado por problemas estabelecidos historicamente e, por isto mesmo, complexos e desafiadores .

Tal experiência está relacionada, especialmente, à capacidade de vislumbrar o ser humano e o mundo por um prisma inter e transdisciplinar, complexo e criativo, com uma visão ecológica, fundamentada em relações sustentáveis – consigo mesmo, com o outro e com o mundo –, e baseadas no respeito à diversidade e no desenvolvimento do exercício da alteridade e empatia .

Finalmente, vale enfatizar, também, a contribuição esté-tica – haja vista a condição de Arte, conforme apresentado no desenvolvimento deste capítulo – e de fruição que o Cinema costuma ter a competência de oferecer a cinéfilos ou a qualquer pessoa que se disponibilize de vivenciar uma experiência cine-

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matográfica . Tais contribuições têm o potencial de enriquecer o ser humano em suas três dimensões psicológicas – afetiva (sensações, emoções e sentimentos), cognitiva (intelecto, memória, raciocínio etc .) e volitiva (vontade, desejo e prazer) –, oferecendo recursos potencializadores para a vida acadêmica, profissional e pessoal .

ReferênciasAS MELHORES Coisas do Mundo . Direção: Laís Bodanzky . Produção: Gullane Filmes . Roteiro: Luis Bolognesi . Intérpretes: Francisco Miguez; Gabriela Rocha; Fiuk; Denise Fraga; Zé Carlos Machado . Brasil: Warner Bros, 2010 . 1 DVD (105 min .), som dolby surround 2 .0, colorido .

BERGER, Kathleen Stassen . Adolescência: o desenvolvimento psicossocial . In: ______ . O Desenvolvimento da Pessoa: da infância à terceira idade . 5 . ed . Rio de Janeiro: LTC, 2013, p . 279-295 .

ESCRITORES da Liberdade . Direção e Roteiro: Richard LaGravenese . Produção: Danny DeVito, Michael Shamberg e Stacey Sher . Intérpretes: Hilary Swank, Patrick Dempsey, Imelda Staunton, Scott Glenn e April L . Hernandez . Estados Unidos: Paramount Pictures, 2007 . 1 DVD (122 min .), color ., legendado .

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda . Novo Aurélio Século xxI: o dicionário da língua portuguesa . 3 . ed . Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999 .

JULLIER, Laurent; MARIE, Michel . Lendo as Imagens do Cinema . São Paulo: Senac São Paulo, 2012 .

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REGO, Teresa Cristina . Pressupostos Filosóficos e Implicações Educacionais do Pensamento Vygotskiano . In: ______ . Vygotsky: uma perspectiva histórico-cultural da educação . 22 . ed . Petrópolis, RJ: Vozes, 2011, p . 85-118 .


SOBRAL, Osvaldo José . Ensaio Sobre Cinema: uma perspectiva psicossocial da sétima arte . REVELLI – Revista de Educação, Linguagem e Literatura da UEG-Inhumas, v . 3, n . 2, p . 164-169, out . 2011 . Disponível em: <http://www .revista .ueg .br/index .php/revelli/article/ view/2886/1839> . Acesso em: 18 jan . 2015 .

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ZUSMAN, Waldemar . Apresentação . In: ______ . Os Filmes que Eu Vi com Freud . 5 . ed . Rio de Janeiro: Imago, 1994, p . 9-13 .

UM DIÁLOGO TRANSDISCIPLINAR ENTRE A PEDAGOGIA E A GEOGRAFIA SOBRE A FORMAçãO DE EDUCADORES

AMBIENTAIS

Lívia Costa de Andrade

Na medida em que os homens, dentro de sua socie-dade, vão respondendo aos desafios do mundo, vão temporalizando os espaços geográficos e vão fazendo história de sua própria atividade criadora (FREIRE, 1982, p . 23) .

Fazendo uma análise sobre o pensamento de Paulo Freire, acima citado, percebe-se que a sociedade atual, é um reflexo da ação humana sobre o meio físico,

cultural e social . Todavia, na busca de responder aos desafios do mundo, e muitas vezes a desafios pessoais, o ser humano acabou por modificar tanto o planeta onde vive que as ques-tões sociais e ambientais tornaram-se cada vez mais comple-xas e desiguais .

O indivíduo precisa começar a aprender uma nova forma de convivência com seus semelhantes e natureza, uma vez que faz parte dela, e para isso a Educação Ambiental passa a ser

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uma necessidade emergente e imprescindível, segundo a UNESCO1, para a continuidade da espécie humana .

Em seu texto A Universidade Pública sob nova perspectiva, Chauí (2003), realiza sua introdução através de uma reflexão sobre o papel da Universidade como instituição social, e sobre as demandas que a mesma recebe ao exercer tal função, tais quais controvérsias de opiniões, atitudes, projetos que refor-çam as divisões e contradições também sociais .

Barnett (1999), nessa mesma linha de reflexões, inicia seu pensamento em sua obra A Universidade em uma era de super-complexidade, trazendo os mesmos apontamentos e eluci-dando, que a universidade encontra-se em processo de “morte” para que possa “ressuscitar” .

Ressalta ainda que as Instituições de Ensino Superior (IES), ao mesmo tempo em que tentam reforçar alguns de seus valores “ancestrais”, por outro lado se mostram isentas deles . Começa então a velha história de que “os fins justificam os meios”, o que acaba por fragilizar ainda mais o papel social da universidade enquanto instituição .

Nesta esfera, começa a delinear-se o que o autor chama de supercomplexidade, pois mesmo não querendo abrir mão de valores do passado, a universidade se vê na obrigação de mostrar desempenho .

Analisando os pensamentos de Chauí (2003), Barnett (1999) e Freire (1982), pode-se perceber como os três enfatizam a influência humana na “temporalidade” dos espaços não só geográficos, como também culturais e em nosso caso, educa-cionais, e podemos ainda fazer uma análise da relação dialética

1 Organização Educacional Científica e Cultural das Nações Unidas .

227Um diálogo transdisciplinar entre a pedagogia e a geografia

deste processo: o indivíduo evolui, a infra-estrutura (tecnolo-gia, sistema econômico e sistema produtivo) avança em uma velocidade meteórica, enquanto a superestrutura (sistema de valores pessoais, sistema educacional, sistema cultural e os paradigmas dominantes) não acompanha a mudança destas forças produtivas que exigem uma nova maneira de posiciona-mento do relacionamento humano, o que vem a gerar as diver-sas crises contemporâneas, segundo Migliori (1999, p . 30) “Existe uma relação de interdependência entre o indivíduo e a sociedade . Existe um movimento .”

Chauí (2003) reforça ainda a necessidade de se levar a sério a ideia de formação, fazendo uma análise epistemológica, filosófica, sociológica e até mesmo antropológica do termo, para constatação de que “( . . .) só há formação quando há obra de pensamento e que há obra de pensamento quanto o presente é apreendido como aquilo que exige de nós o trabalho da inter-rogação, da reflexão e da crítica ( . . .)” (2003, p . 12) .

Há que se refletir como esta distorção de valores gera inúmeros desgastes, em todos os níveis que se possa pensar, e no presente trabalho, o foco será a crise ambiental vivenciada por todos e conseqüentemente, a necessidade de educadores ambientais preparados para encarar os novos paradigmas que vêm se apresentando na sociedade atual .


8.1 Referências Históricas sobre a questão Ambiental na Geografia

Por mais complexas que possam ser as relações dessa humanidade conturbada com seu planeta em via de deterioração, não será possível atingir um conheci-mento geográfico apenas no econômico, por mais determinante do social que ele seja . (C .F .A . Monteiro, 1984 apud Mendonça 1998)

Embora desde a origem da geografia possam ser detecta-dos aspectos voltados a discussão ambiental, hoje em dia a preocupação com estas questões passa a ser “ponto sem retorno”, conforme expressão em voga na física quântica .

Como fundador dos métodos de observação de quase todos os setores da geografia física em meados do século XIX, Alexander Von Humbold muito contribuiu para o desencadea-mento de um pensamento sobre ambientalismo; com forma-ção naturalista, fundou a geografia botânica baseada na fisio-nomia das plantas e das suas relações com o solo e o clima, criou e aplicou os dois princípios que fizeram da geografia uma ciência peculiar e que mais tarde, De Martone veio a chamar de: Princípio da Causalidade (ou Interdependência) e Princípio da Geografia Geral (ou Comparada) .

Em sua principal obra, denominada “O Cosmo”, fez uma grande reflexão sobre os dados colhidos em suas viagens pela Europa, América Central, México, Colômbia e Venezuela . Teorizou tanto os dados qualitativos quanto os quantitativos, dando ênfase aos últimos em função de sua preocupação metó-dica . Nestes dados continham importantes observações e


constatações da natureza e sua influência, dentro do que se propôs a observar .

Ainda no século XIX, Carl Ritter, juntamente com Humbold, vem alavancar o surgimento da geografia moderna . Uma vez que o planeta já estava mais do que mapeado, a geografia poderia se ocupar com algo mais do que mapeamento . Nessa perspectiva, Ritter desenvolve o princípio da Analogia, ou Geografia Geral, onde se procu-rava analisar as diversas paisagens da terra comparando suas semelhanças e diferenças .

Apesar de ser contemporâneo a Humbold, Ritter, devido à sua formação acadêmica voltada para a Filosofia e a História, preocupou-se muito com a necessidade de que a geografia tivesse seu saber científico sistematizado e organizado, por perceber que a mesma, da forma como estava, retratava um grande aglome-rado de dados, porém sem bases teóricas e científicas .

Sobre a somatória de conhecimentos e empenhos, estes dois pioneiros Mendonça (1998, p . 24) teoriza:

Juntando os dois conhecimentos, lançaram a ciência geográfica, tendo como objetivo a compreensão dos diferentes lugares através da relação dos homens com a natureza, sendo que para isso era necessário o conheci-mento dos aspectos físicos –naturais das paisagens, assim como dos humanos sociais . Percebe-se assim que nascia uma ciência preocupada diretamente como que hoje se entende, de forma geral, por meio ambiente .

Mas numa continuidade histórica, é pertinente destacar ainda outros geógrafos que também deixaram suas marcas nesta ciência e muito contribuíram para sua evolução . Dentre eles


podemos citar Ratzel, que ao dar continuidade à produção geográfica trouxe a tona a perspectiva de descrição e análise de lugares onde a natureza e os indivíduos encontravam-se dissocia-dos, e dentro de uma reflexão determinista, buscou enfatizar a influência local sobre o humano, em uma tentativa de “( . . .) esca-motear a dominação cultural”, nas palavras de Mendonça (1998) .

Em contraposição ao determinismo cultural de Ratzel, surge La Blache, trazendo uma imensa e marcante contribui-ção ao pensamento geográfico . Numa abordagem possibilista, procura realizar uma abordagem regional (diferentemente dos teóricos anteriores), enfatiza a distinção entre os elementos físico-naturais e os humanos-sociais das paisagens . Em seu pensamento, La Blache considerava o meio físico como base para o desenvolvimento das sociedades .

Surge então a figura de De Martonne, aproveitando a dicotomia de La Blache sobre meio físico e humano, aprofunda seus estudos na abordagem dos elementos naturais das paisa-gens, criando assim a Geografia Física .

Para Mendonça (1998, p . 26) “( . . .) fica compreendido que a geografia física é a parte da geografia que se ocupa do trata-mento da temática ambiental por estar ligada à abordagem do quadro natural do planeta .”

De Martonne, numa evolução de seus estudos chega ainda a dividir a geografia física em: geomorfologia, climatologia, biogeografia e a hidrografia . O interessante é que, mesmo nesse avançar teórico/científico, fica clara a fragmentação que estes sub-ramos da geografia traziam, dentro de uma perspectiva claramente positivista, pois não havia qualquer inter-relação entre as diferentes paisagens analisadas .


Importante faz-se destacar o empenho de E . Reclus, no final do século XIX, em tentar produzir uma geografia com caráter ambientalista . Este procurou ligar o pensamento polí-tico marxista à ciência que pretende ligar homem e natureza . A grande questão é que, num mundo eminentemente positi-vista, sua teoria (bem como o marxismo) não eram bem acei-tos, vindo a ser editada somente nos anos 60 do século XX .

Mas traçando ainda uma linha temporal, por volta da década de cinquenta do século XX, acompanha-se o surgi-mento da Geografia Crítica, já com bases marxistas, que traz uma grande crítica à Geografia Clássica e à Geografia Quanti-tativa, através da dialética e do materialismo histórico, demons-trando sua força ao incentivar a atuação concreta da sociedade em prol do processo de transformação social .

Com esta mudança de perspectiva trazida pela Geografia Crítica, percebemos na Geografia Física uma preocupação cada vez maior com o processo de degradação ambiental, passando assim a estudar o efeito da ação humana sobre a natureza .

A degradação ambiental tem sido tratada pela Geogra-fia Física contemporânea . Esse caráter Ambientalista diferente do Ambientalismo que caracterizou a Geografia Lablachiana, mostrando a necessidade de compreender a organização social e sua interferência nos processos naturais, provocando sua degradação, tem sido cobrado aos geógrafos físicos .Essa necessidade levou os geógrafos físicos a interarem dos processos de organização e transformação sociais que se relacionam com seu objeto de estudo, fazendo com que houvesse uma aproximação com as ciências humanas (SOUZA & MARIANO, 1999, p . 85) .


Nesse sentido, cada vez a Geografia vai assumindo um caráter construtivista, e propondo uma base mais sólida ao realizar seus estudos próximos às Ciências Humanas, o que fortalece a ideia de um pensamento geográfico ambientalista, focado nos impactos da sociedade sobre a natureza .

8.2 O Posicionamento Geográfico e a questão ambiental

Pensando geograficamente sobre questões ambientais, faz-se, necessária, primeiramente, a análise de certos concei-tos . Um deles, diretamente ligado à temática em questão é o conceito de Natureza . Lenoble (1969, p . 367) faz uma interes-sante definição de natureza que nos leva a pensar na complexi-dade do termo: “( . . .) Toda a ideia de natureza pressupõe, com efeito, uma complexa aliança de elementos científicos (o que são as coisas?), morais (que atitude deve tomar o homem perante o mundo?), religiosos (a natureza é o todo ou é a obra de Deus?) . Morin (1988, p . 222) segue nessa linha de pensa-mento refletindo a complexidade dessa questão:

( . . .) A natureza não é desordem, passividade, meio amorfo: é uma totalidade complexa e o autor vai além, demonstrando a interação homem/natureza: ( . . .) o homem não é uma entidade isolada em relação a essa totalidade complexa: é um sistema aberto, com relação de autonomia/dependência organizadora no seio de um ecossistema .

Morin, em seu pensamento complexo, reforça que o ponto de diferença entre o ser humano e os demais animais é a cultura, pelo fato de que esta tem um papel civilizador . Ao


mesmo tempo em que nasce num ambiente natural, este ser também está inserido em um ambiente sócio cultural .

Na busca de definir Meio Ambiente, não poderia deixar de destacar quão incorporada esta palavra tornou-se cotidiano dos habitantes de nosso planeta, principalmente ganhando grande repercussão em função da mídia, que a todo o momento ressalta as questões ambientais que estamos vivenciando .

Reigota (2007, p . 14) ao analisar meio ambiente e as repre-sentações sociais, traz a definição:

( . . .) o lugar determinado ou percebido, onde os elemen-tos naturais e sociais estão em relações dinâmicas e em interação . Essas relações implicam processos de criação cultural e tecnológica e processos históricos e sociais de transformações do meio natural e construído .

Sauvé (1997) traça uma linha histórica para a concepção social de ambiente . Segundo a autora, esta, no princípio do século XX, era vista prioritariamente como natureza . No avançar das décadas e das evoluções tecnológicas e indus-triais, a autora demonstra que ambiente passa a ser visto como recurso (pela obtenção de matéria prima), e ainda seguindo a trajetória linear da autora, no início da década de setenta, surge a concepção de ambientconceber: ambiente como projeto comunitário, o que, de acordo com a autora, reforça a viabilidade de mudança de atitude das pessoas com o ambiente e seus lugares .

Dessa forma, pode-se perceber como os conceitos se inte-ragem, criando um processo de unicidade, de interdependên-cia, de conexão . No intuito de ratificar este pensamento, Santos


(1996, p . 48) considera que há indicações de que “ . . . não há mais sentido, nos dias atuais, para a clássica e rígida separação entre homem, mundo natural e mecânico”

Definidos estes dois conceitos, torna-se possível a percep-ção de quão integrados humanidade e natureza encontram-se, delineando o posicionamento de meio ambiente . Só que existe uma grande reflexão, que pauta o objeto de estudo em questão: a degradação ambiental .

Os impactos ambientais, são inúmeros, tornam-se cada vez mais visíveis e tangíveis . A natureza não está mais conse-guindo absorver o crescimento tecnológico desenfreado e toda a consequência que vem junto aos sistemas produtivos que o sustenta, bem como as desigualdades sociais geradas pela apro-priação da riqueza socialmente produzida .

( . . .) a consagração do imperialismo capitalista e socia-lista em nível mundial nos anos sessenta – setenta do século XX fizeram com que ocorresse uma grande disparidade de condições de vida do homem, amea-çando a natureza, fonte de recursos para a continui-dade do processo produtivo . Estas ameaças à natureza e à sociedade criaram condições para o surgimento dos movimentos sociais organizados, formados por grupos de pacifistas e ecologistas em países desenvolvidos (SOUZA & MARIANO, 1999 p . 85) .

Os autores teorizam sobre algumas possibilidades às constantes ameaças à natureza, que fazem parte de nossa histó-ria presente .

Ora, a Física, baseada no poder científico que a norteia há muito pontua claramente que para toda ação existe uma


reação correspondente, e nesse caso específico não poderia ser diferente .

Um dos maiores paradigmas tradicionais está se desfa-zendo: que os recursos naturais são inesgotáveis. Tem ocor-rido constantemente de nascentes secarem, espécies animais serem extintas, inundações e deslizamentos acontecerem . . .

Isto decorre em função do peso do paradigma separatista . Cunha (2003) apoia-se muito no pensamento de Santos (2002) . Traz importantes reflexões sobre a ruptura deste “paradigma da visão única” (como a autora o chama) demonstrando que a inserção de um novo paradigma, que venha a propor a dinami-cidade da relação entre tudo e todos, trará uma ruptura episte-mológica, e este processo é carregado de subjetividades, conse-quentemente gerarão novas e importantes experiências .

Nesta gama de “acidentes ambientais” pode-se, na sua tota-lidade, perceber a autoria de seres humanos, o que leva a uma reflexão sobre percepção, educação e consciência . Será que existe um fator que conecte as competências cognitivas e técnicas dos seres humanos às competências sociais e humanas?

Boaventura de Souza Santos levanta que, fundada na razão metonímica, houve uma desfiguração acerca da compreensão de mundo que hoje a humanidade tem . Em face dessa inadequação resulta-se uma enorme pobreza de expe-riência, que diferente de uma expressão de carência, pode ser caracterizada como expressão da “arrogância de não querer ver, muito menos valorizar a experiência que nos cerca, apenas porque está fora da razão com que a podemos identificar e valorizar .” (2003, p . 245)

De uma interface feita por Souza Santos entre: sociologia das ausências e sociologia das emergências, mediada pelo


trabalho de tradução, o autor crê que nos é permitido o desen-volvimento de uma alternativa à “razão indolente”, uma vez analisando que não é possível conceber “justiça global sem justiça cognitiva global”, visto que a humanidade precisa desenvolver uma racionalidade complexa, que permita a percepção do todo no lugar das partes .

Souza (2003) defende ainda que somente no presente reside a possibilidade de mudança, pois somente este é o tempo que temos nas mãos . Deve haver um confronto entre as expe-riências impostas pela hegemonia, repleta de ausências e as possibilidades da reinvenção de um presente que nos propor-cione um futuro guiado pelas emergências, “tornado coerente pelo trabalho da tradução” .

Conforme visto anteriormente, não é recente a discus-são sobre Meio Ambiente . Na Conferência Internacional sobre o Meio Ambiente, realizada na cidade do Rio de Janeiro em 1992, vários assuntos foram debatidos, e numa busca por soluções, acontecimentos importantes foram se desdobrando . Dentre eles podemos citar o Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis, a ref le-xão sobre o documento que deu origem à Carta da Terra, que propõe diretrizes para preservação planetária, bem como se difundiu o conceito de “Desenvolvimento Susten-tável” e “Sociedades Sustentáveis”, trazendo assim, novas contribuições à Geografia, como analisaram os autores acima citados, e como bem o vem endossar Ross:

Assim, sobre a égide do conceito de “espaço total” e no princípio que norteia o desenvolvimento sustentável, as diretrizes que envolvem as pesquisas da Geografia apli-


cada, no que concernem especificamente as relações sociedade-natureza, certamente devem voltar-se para um espectro maior de análises, objetivando não só o entendimento das potencialidades humanas, das fragi-lidades dos sistemas ambientais naturais, como também das fragilidades socioculturais das sociedades humanas (ROSS, 2006 p . 20) .

É importante ressaltar aqui que apesar das inúmeras potencialidades humanas, comportamento das pessoas vem sendo “moldado” há séculos pela luta por sobrevivência, mas, principalmente pela inculcação alienadora proveniente de uma educação tradicional . Estes aspectos foram deixando as pessoas numa espécie de “torpor”, que simplesmente levou a sociedade a desconsiderar noções extremamente importantes, até mesmo para a continuidade da espécie, principalmente no que tange à degradação ambiental .

Assim pensando, dentro de um processo dialético, ao mesmo tempo em que a educação pode ser utilizada como um espaço de reprodução, se bem direcionada e focada, principal-mente, pode ser encarada como um espaço de resistência, e dessa forma surge uma necessidade pontual de profissionais que contemplem, nesta segunda espera de educação, uma postura ativa diante dos desafios globais .

Segundo Cavalcanti (2008, p . 19):

A geografia busca, assim, estruturar-se para ter um olhar mais integrador e aberto, ao mesmo tempo, às contribuições de outras áreas da ciência e às diferentes especialidades em seu interior; um olhar mais compreensivo, mais sensível às explicações do senso


comum, ao sentido dado pelas pessoas para suas práti-cas espaciais .

A autora ainda menciona Suertegaray (2000) fazendo uma análise da complexidade de Morin, e alertando sobre a necessi-dade da superação, por parte da geografia de muitas dualida-des como

( . . .) natureza/sociedade, natureza/cultura/ tempo/espaço, cidade/campo, local/global, lugar/mundo, teoria/prática, conhecimento/ação, técnica/poesia, ensino/pesquisa, ensino/aprendizagem, bacharel/professor, geografia física/geografia humana (CAVALCANTI, 2008, p . 19) .

Dessa forma, cada vez mais, percebe-se na Geografia novos olhares para seu objeto de estudo: a relação homem/natureza . A dicotomia antes evidenciada nos estudos geográ-ficos passa a ficar cada vez mais tênue, desfazendo-se ao surgimento de cada novo estudo, de cada nova linha de pesquisa .

Almeida (2008, p . 50-51) demonstra como foram traça-dos “Percursos de Renovação e Reconstrução” geográficos com o advento da Geografia Cultural, reforçando a tese de complexidade e unificação das relações e interações:

Uma das mais marcantes características da geografia cultural contemporânea é a percepção de que o conhe-cimento é múltiplo e situacional, de que existem muitas maneiras de ver e ler a paisagem . ( . . .) crescem os estu-dos sobre o “outro” e a alteridade . ( . . .) Questões acerca de significados, representações, a elaboração de um sentido próprio baseado em lugar nas sociedades multi-


culturais são, atualmente, um foco unificador em geografia cultural .

Pode-se perceber que, com o advento da Geografia Cultu-ral, cada vez mais a fragmentação vai perdendo espaço na geografia, enfatizando a unicidade . Dessa forma torna-se viável a promoção de uma Educação Ambiental de maior qualidade e eficácia, levando em consideração todos os aspectos concer-nentes ao Meio Ambiente e seus reflexos . E através desta inter-face entre geografia/ educação, vai-se delineando a possibili-dade da estruturação de uma Educação Ambiental permeada por ambas as contribuições, visando mais do que uma mudança do comportamento humano, mais uma mudança do pensa-mento humano .

8.3 A Necessidade da Formação de Educadores Ambientais

Neste panorama contemporâneo, torna-se cada vez mais urgente a formação de educadores que possam contribuir com uma educação desinibidora, que possibilite aos educandos a compreensão de que ninguém deve ser o objeto de qualquer educação e sim sujeito dela, conforme Freire (1982) .

O educador, dentro deste processo, passa a atuar como mediador do processo ensino/aprendizagem, como aquele indivíduo que, através de processos de ensinagem eficientes, segundo Anastasiou (2002) . Nesta perspectiva “( . . .) a ação de ensinar é definida na relação com a ação de aprender, pois, para além da meta que revela intencionalidade, o ensino desen-cadeia necessariamente a ação de aprender .” (2002, p . 205) .


É importante a percepção de que o processo de ensina-gem é estabelecido por uma parceria consciente entre docente e discente, uma vez que permeia a ação de ambos, e assim sendo, esta perspectiva precisa ser estabelecida na relação acadêmica, através de um contrato que costuma ser firmado nos planos de ensino, ou seja, no planejamento e no compar-tilhamento do mesmo com as pessoas que também são agen-tes de ensinagem .

Paulo Freire, em sua vasta obra, coloca o diálogo como ponto principal para “a tarefa comum de saber agir”, fazendo com que os inviáveis “monólogos”, provenientes de uma educa-ção conservadora, pudessem pouco a pouco ir caindo em desuso, na medida em que os profissionais da educação come-çassem a despertar para esta nova realidade educacional .

Todavia, mesmo com diretrizes claras do MEC2, formali-zadas pelos PCN’s3, muitas grades, ou matrizes curriculares que norteiam a formação de educadores em suas mais difusas áreas de atuação, demonstram certa dificuldade em acompa-nhar uma mudança de posicionamento e conseqüentemente de estruturação de seus eixos curriculares para atenderem às dire-trizes do MEC, principalmente na transversalização dos temas propostos, que deveriam gerar propostas interdisciplinares . Numa análise mais profunda, deveriam ir além da interdisci-plinaridade para atenderem a uma nova demanda planetária em suas mais amplas necessidades . Deveriam basear-se na Transdisciplinaridade .

2 Ministério da Educação e Cultura .3 Parâmetros Curriculares Nacionais .


Compreendendo estas premissas, percebe-se que as IES precisam transformar o conhecimento científico em saber escolar, trazendo para a prática pedagógica uma relação que favoreça a apreensão dos discentes, e formando ainda uma interconexão entre as diversas disciplinas que formam as matrizes ou mesmo as grades curriculares .

Enfocando aqui a formação de educadores ambientais, urge a articulação de indivíduos que sejam capazes de corres-ponder aos objetivos educacionais traçados pela UNESCO, em seu relatório Delors, publicado em 1998 .

Magalhães (2009), aprofunda a necessidade de se trabalhar na formação universitária as competências propostas pela UNESCO no relatório Delors – aprender a aprender (competên-cia cognitiva), aprender a fazer (competência técnica), aprender a conviver (competência humana) e aprender a ser (competência social) . Reforça ainda os outros dois pilares que trazem em si a necessidade do desenvolvimento da competência transdiscipli-nar, propostos na Conferência Transdisciplinar, ocorrida em Zurique: aprender a antecipar e aprender a participar .

A autora discorre também sobre a necessidade de que, conhecimentos como estes possam ser agregados à formação docente, para que esta visão única possa ir sendo desmistifi-cada em um processo contínuo e reflexivo como é o momento da formação profissional .

Faz-se necessária uma articulação entre reflexão e ação, levando os educandos a realizarem de forma consciente a esco-lha de como agir frente aos desafios criados pela própria huma-nidade, e que agora recaem sobre ela novamente, pois tudo no mundo se encontra interligado, conectado por laços fortes, nesse sistema vivo que é nosso planeta .


Os futuros educadores precisam estar atentos para o forta-lecimento de uma conexão entre as ações individuais e as leis e princípios da sustentabilidade de vida, assim já enfocava Engels há 150 anos:

( . . .) nós seres humanos, não somos “alguém fora da natureza”, mas nós, por nossa carne, nosso sangue e nosso cérebro, pertencemos à natureza, encontramo-nos em seu seio, e todo o nosso domínio sobre ela consiste em que, diferentemente dos demais seres, somos capazes de conhecer suas leis e aplicá-las de uma maneira adequada . Com efeito, aprendemos cada dia a compreender melhor as leis da natureza e a conhecer tanto os efeitos imediatos como as consequências remotas de nossa intromissão no curso natural de seu desenvolvimento . ( . . .) E quanto mais isso seja uma realidade, mais os homens sentirão e compreenderão sua unidade com a natureza, e mais inconcebível será essa ideia absurda e antinatural de antítese entre o espí-rito e a matéria, o homem e a natureza, a alma e o Corpo (ENGELS, 1975, p . 71-72) .

É preciso que a educação superior incorpore esta noção da unidade do ser humano com a natureza e sua dependên-cia dela para que especialmente, nos conteúdos voltados para as licenciaturas, esta relação se evidencie, pois será exatamente dali que sairão os futuros educadores, e estes precisam estar totalmente conectados com a realidade desta interconexão e dependência, bem como com todos os desa-fios que ela vem trazendo .


Esta conexão não pode ficar apenas girando em torno de análises e estudos vagos, mas precisa apontar soluções criati-vas, promovendo assim um intercâmbio de idéias inovadoras que possam contribuir para a mudança de mentalidade que incorpore a cidadania planetária, como diz Morin (2000) .

Nesta mudança de mentalidade, é preciso incorporar a referência de Santos, ao abordar a unicidade do tempo, que denomina o planeta como uma “inteligência universal” . O autor cita Marx ao discorrer sobre a natureza como “corpo inorgânico do homem”, apontando a unicidade do tempo .

Há quem prefira dizer que o tempo se unifica, mas não é disso que se trata . O que realmente se dá, nestes nossos dias, é a possibilidade de perceber a sua simul-taneidade . O evento é uma manifestação corpórea do tempo histórico, algo como se a chamada flecha do tempo apontasse e pousasse num ponto dado da super-fície da terra, povoando-o com um novo acontecer . Quando no mesmo instante, outro ponto é atingido e podemos conhecer o acontecer que ali se instalou, então estamos presenciando uma convergência de momentos e sua unicidade se estabelece através das técnicas atuais de comunicação (SANTOS, 1999, p . 156-157) .

Ao percebermos a simultaneidade dos eventos, percebe-mos uma quebra do paradigma separatista, que por sua vez, tende a trazer a necessidade de uma nova identidade planetá-ria, onde esta “convergência de momentos” possa tornar-se um instrumento benéfico e ampliador da inteligência universal .


8.4 A Transdisciplinaridade como abordagem metodológica na formação de Educadores Ambientais

Humberto Mariotti (2000), baseado no pensamento complexo de Morin, propõe cinco saberes que equivalem a um sistema de valores, e constituem a essência de uma outra maneira de ser e de estar no mundo através de um pensamento que pode-mos chamar de Ecossistêmico . São estes saberes: saber ver; saber esperar; saber conversar; saber amar e saber abraçar .

Mariotti (2000, p . 321) sintetiza em duas frases uma proposta de ação que deixa muito claro o que é possível com um novo pensar:

A mão estendida é o início do abraço, isto é o ponto de partida para o pensamento complexo, o marco inaugu-ral do longo processo na busca da espiritualidade . ( . . .) Estou falando de algo que possa livrar-nos de um padrão de vida, segundo o qual, em muitos casos, a palavra é separada do real, a justiça se preocupa menos com o sofrimento dos homens do que com a letra da lei, e esta, em muitos casos, busca verdades que pouco ou nada tem a ver com o cotidiano das pessoas .

Nestas metas está implícito um sistema de valores . Compreendê-los, exercitá-los e vivenciá-los nas escolas é desa-fio da educação, e aqui enfatizamos o papel do educador ambiental para esta missão .

Se a educação pretende atingir esta meta, capaz de propor a sustentabilidade no planeta, precisa rapidamente encarar este desafio de implantação da proposta transdisciplinar, que real-mente contribui para formar sujeitos mais conscientes e prepa-


rados para transformar a realidade atual, abarcando e indo além da proposta transformadora, preconizada por Paulo Freire .

No documento da UNESCO “Que Universidade para o amanhã? – em busca de uma evolução transdisciplinar nas Universidades”, encontram-se propostas fundamentadas e claras para a inserção desta evolução nas Instituições de Ensino Superior .

Formando profissionais com uma consciência mais aberta e ética, será dado um grande passo para mudar o mundo . Mas indo além, e formando educadores com uma visão transdisci-plinar, será realizado um trabalho de base, formando agentes diretos de transformação e intervenção benéfica na crise contemporânea e suas diversas facetas .

O processo de formação docente é de fundamental impor-tância para a construção dos conhecimentos, habilidades e atitudes deste indivíduo, que sairá dele habilitado para exercer este ofício . Dessa forma, cabe à universidade estar atenta às inovações pedagógica, como propõe Souza (2009) .

Os responsáveis pelo processo de formação docente, segundo a autora acima citada, precisam estar atentos à complexidade que envolve o processo de ensinagem .

Os alunos acabarão sendo um reflexo de sua formação, reproduzindo-a em sua prática docente posterior .

Nesta mesma perspectiva de desenvolvimento humano, Maturana e Rezepka(2000), trazem em sua obra Formação e Capacitação Humana, uma experiência sobre a formação de professores, onde utilizaram uma “Proposta reflexiva em torno da tarefa educativa”, em que analisam a formação e a capacita-ção humana .


Dentro de sua reflexão, os autores conceituam estas duas “classes distintas de fenômenos” e buscam, à luz da biologia do amor (proposta por Maturna), estabelecer uma relação de soli-dariedade entre estas tarefas, consideradas muitas vezes, distintas, por parte dos educadores .

Os autores enfatizam que o processo educacional neces-sita de vivências, muito mais que explicações, e que se os profis-sionais que atuam no papel de educadores, não conseguirem exemplificar aquilo que ensinam, nada será incorporado por seus alunos .

Questionam que as tão em voga dificuldades de aprendi-zagem e de comportamento são na verdade ausência de amor, de aceitação .

O amor, por exemplo, é o domínio de condutas relacio-nais através das quais o outro surge como um legítimo outro em convivência com alguém; e a agressão é o domínio dos comportamentos relacionais através dos quais o outro é negado como um legítimo outro em convivência com alguém . (MATURANA E REZEPKA, 2000, p . 15)

Nicolescu (2000), físico teórico do Centro Nacional de Pesquisas da França, fundador e presidente do Centro de Estu-dos e Pesquisas Transdisciplinares, demonstra em suas obras toda a amplitude que a abordagem transdisciplinar vem trazer, não só para a educação, mas seu impacto para o mundo .

Diante do exposto, evidencia-se a necessidade de que a Educação se envolva neste processo de intervenção educacio-nal/social, formalizados pela lógica transdisciplinar . E o papel das IES torna-se cada vez mais importante para a


mudança deste paradigma . De uma forma geral já é latente a necessidade de mudança de propostas teórico/metodológica que permeiem a formação dos futuros profissionais que ali se encontram . Mas de uma forma específica, segundo nosso objeto de estudo, na formação de educadores ambientais, urge que as IES se preocupem com a formação não só de seus educandos, mas também de seus docentes, aliando nesta seara também, uma proposta transdisciplinar .

Cabe ao professor à viabilização de uma construção de saberes que abranjam mais que as competências cognitivas e técnicas, tão reforçadas historicamente, mas que vem propor-cionando muitos equívocos sociais . Neste sentido, há que se trabalhar tessituras, ou seja, integrar saberes, correlaciona-los, interligá-los .

Dando continuidade a esta análise, faz-se imprescindível a percepção sobre a conexão entre ensino e aprendizagem . Os dois estão diretamente ligados, de forma indissociável, daí a necessidade de dinamização de processos de ensinagem na universidade, conforme Anastasiou (2003) citada por Souza (2009) .

Isaias (2006) demonstra que sem a formação continuada, sem um espaço para a reflexão sobre os processos de ensina-gem, o ensino superior será constantemente palco para “profes-sores explicadores”, para conteúdos fragmentados e propostas desconectadas, já que muitos docentes universitários imagi-nam ser sua função o mero repasse (através das aulas expositi-vas) de conteúdo . Isto traz um grande prejuízo a todos os alunos inseridos no contexto do Ensino Superior, todavia, aos futuros professores (e aos futuros educadores ambientais, neste caso específico), pode-se perceber quão grande é este desafio,


visto que cria um modelo equivocado do que se constitui o processo educativo .

Nestes cursos de pedagogia (ou docência) universitária, que ainda se encontram em fase de “tímido despertar”, as bases teórico-metodológicas específicas à docência devem ser contex-tualizadas, alinhando na formação docente as quatro compe-tências que a UNESCO propõe no Relatório Delors (1998) – mencionadas anteriormente .

Cavalcanti (2008, p . 30) aponta algumas metas educacio-nais: “Deve-se ter como meta, nesse campo, formar indivíduos mais abertos, mais sensíveis, e ao mesmo tempo mais informa-dos, mais velozes e mais críticos .”

Crema (2009) traz em sua obra Pedagogia Iniciática propõe parâmetros que possibilitem a quebra de padrões impostos através de práticas pedagógicas que desenvolvam a inteligência simbólica e arquetípica do indivíduo, levando à inserção de dinâmicas sistêmicas nos currículos a fim de possi-bilitar melhores relações interpessoais .

Também Medina e Santos (1999) ao alicerçarem a análise teórica sobre Educação Ambiental e suas possibilidades, visam a capacitação inicial de multiplicadores através de processos didáticos que abordem uma metodologia de caráter participa-tivo para a formação de educadores ambientais nas IES .

Neste âmbito é mais do que a urgente necessidade de preparação e comprometimento do corpo docente, precisa haver envolvimento das IES para que estas ações formativas saiam do campo de projetos e se viabilizem enquanto oportu-nidade, enquanto ação formativa . Na docência é preciso que se leve em conta: mediação de conceitos e práticas, refletir sobre as atribuições que o ato de ensinagem envolve, sobre a práxis


educativa, sobre as múltiplas dimensões que docentes e discen-tes encontram-se imersos e ainda, sobre o senso indissociável de ética que esta profissão carrega em seu âmago .

Dentro deste processo de tensões e desafios, Isaias e Bolzan (2008) trazem a necessidade da construção da professo-ralidade, termo que denota o processo de busca e orientação para a construção da identidade docente e das atribuições que a mesma traz em seu escopo .

Para que seja viável a construção desta professoralidade, é urgente que os cursos de pedagogia universitária sejam possi-bilitados pelas próprias IES, e um caminho interessante para que isto ocorra é a busca da faculdade de educação, locus adequado para a viabilização e dinamização da proposta .

As reflexões e abordagens de Moraes (2004), fortalecem teoricamente esta proposta transdisciplinar através de seus estudos sobre as implicações epistemológicas de princípios trazidos pela Física Quântica e pela Teoria da Complexidade de Morin (1996) . Ao consolidar um quadro epistêmico mais amplo, o Pensamento Ecossistêmico proposto pela autora aponta a necessidade de reintegração do meio ambiente à cons-ciência antropológica, uma condição essencial para o desen-volvimento do sentimento de cidadania planetária .

Chega a hora de uma conscientização do processo de inserção social e política, onde a natureza é processo de educa-ção e não produto, como demonstra o processo histórico/ social . O relatório Delors (1998) destaca claramente as tensões a serem ultrapassadas: a tensão entre o global e o local, entre o universal e o singular, entre tradição e modernidade (envol-vendo aqui a problemática de como construir a autonomia em dialética com a liberdade e evolução do outro), a tensão entre


soluções a curto e em longo prazo, entre a competição e a igual-dade de oportunidades, entre o extraordinário desenvolvi-mento dos conhecimentos e as capacidades de assimilação do homem e finalmente, a tensão entre o espiritual e o material . Estas tensões devem e precisam ser tratadas na educação, atra-vés da ação efetiva de um profissional da área que traga em sua prática educativa os enfoques aqui desenvolvidos .

Assim, a partir de uma ação educativa mais ampla, que inclui vários níveis da ação humana, se promove a formação de um indivíduo responsável e co-criador da realidade em que vive – um indivíduo capaz de respon-der por suas ações, de se responsabilizar pelo seu próprio auto-desenvolvimento, participando do seu ambiente social e natural, e desta forma constituindo sua realização pessoal, ao mesmo tempo em que garante a Vida em qualidade para todos (OLIVEIRA, 2007, p . 23) .


Toda esta reflexão aqui traçada, há muito vem sendo desenvolvida com toda a propriedade nas propostas de Freire (1979), ao afirmar ainda que uma discussão de valores não pode em hipótese alguma, escapar de uma reflexão sobre as relações meio-fim no processo social, e ainda, uma discussão sobre a educação, tampouco pode escapar desta relação que se traduz em afirmações sobre a importância da formação humana para a constituição de uma sociedade justa . Freire propõe ainda que os valores sociais desejados estejam associa-dos à ação educativa e por ela são reproduzidos, e a estratégia


da ação educativa, que é o currículo, deve ter, portanto, como finalidade, o direcionamento do comportamento dos indiví-duos que passam pelo sistema educacional para compreende-rem a unidade básica da vida .

É mister que, através de uma consciência de Cidadania Planetária, o ser humano desperte para seu papel na natureza, no espaço e no tempo . Aliando Transdisciplinaridade à Forma-ção de Educadores, dentro de uma perspectiva geográfica, com certeza, a formação de educadores ambientais obterá muito mais êxito e abrangência de ação .

Não é difícil, após acompanhar todo um percurso histórico da Geografia perceber os avanços brilhantes que até aqui chega-ram, sempre na busca de compreensão da interação do homem com a natureza . Na continuidade de avançar cada vez mais, pode a Transdisciplinaridade fomentar na formação docente a compreensão da máxima “a unidade na diversidade” .

Na esperança de que poder contribuir com essa nobre tarefa, conclui-se aqui este diálogo transdisciplinar entre a Peda-gogia e Geografia na Formação de Educadores Ambientais .

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A SUSTENTABILIDADE E A POLíTICA

NACIONAL DE RESíDUOS SÓLIDOS

Ana Paula da Costa OliveiraAbadia de Lourdes da Cunha

A ação humana tem gerado grandes impactos no meio ambiente através do consumo exacerbado, do desper-dício e da destinação inadequada dos resíduos sólidos

e dessa forma o termo sustentabilidade encontra-se no topo das discussões e das agendas políticas .

Importante destacar que se faz necessária a formação de uma consciência ambiental que fundamenta-se na nova ética ecológica, em que um cidadão bem informado e consciente, torna-se exemplo para aqueles que ainda não desenvolveram essa atitude .

Nesse sentido ao receber o convite para compartilhar conhecimento com os alunos do curso de Pós-Graduação Lato Sensu Transdisciplinaridade e Interdisciplinaridade na Educa-ção da UEG Câmpus Inhumas, a oportunidade veio como forma de divulgar as legislações pertinentes sobre resíduos sólidos, sobre educação ambiental e consumo consciente .

A metodologia adotada na palestra foi a participativa, pois visava à participação do cidadão e da cidadã na solução dos

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problemas a qual está mais próxima de metodologias que permitam questionar dados e ideias sobre um tema específico, propor soluções e apresentá-las publicamente .

Na visão de Reigota (2014, p . 67) a metodologia participa-tiva pressupõe que o processo pedagógico seja aberto, demo-crático e dialógico e que aconteça,

[ . . .] entre todos, ou seja, entre os próprios alunos e alunos e os professores e a administração da escola com a comunidade em que vivem, com a família e a sociedade em geral .

Para a concepção da palestra e consequentemente a escrita deste capítulo, foi utilizada a pesquisa bibliográfica, na qual foram consultados artigos científicos, publicados em anais de congressos, em revistas científicas com classificação Qualis, dentre outras fontes . Para Fonseca (2002, p . 32) a pesquisa bibliográfica é feita a partir do levantamento de referências teóricas já analisadas, e publicadas por meios escritos e eletrô-nicos, como livros, artigos científicos, páginas de web sites . Acrescenta que qualquer trabalho científico inicia-se com uma pesquisa bibliográfica, que permite ao pesquisador conhecer o que já se estudou sobre o assunto . Existem ainda pesquisas científicas que se baseiam unicamente na pesquisa bibliográ-fica, procurando referências teóricas publicadas com o objetivo de recolher informações ou conhecimentos prévios sobre o problema a respeito do qual se procura a resposta, que é o caso desse capítulo .

Por ser a Educação Ambiental um tema interdisciplinar, privilegia a compreensão do tema de forma global e propor-

257A sustentabilidade e a política nacional de resíduos sólidos

ciona o intercâmbio de experiências dos professores, dos alunos, envolvendo também a comunidade local . Sabe-se que os estudos sobre Educação Ambiental e a interdisciplinaridade são iniciativas relativamente novas, estudos esses realizados nas últimas décadas do século XX, portanto, contemporâneos . No discurso contemporâneo sobre educação de modo interdis-ciplinar, podemos visualizar que quando se refere à educação ambiental essa premissa se faz em uma assertiva política que de acordo com Garcia deve ser mediada pelos educadores:

[ . . .] a educação ambiental deve ser uma concepção totalizadora de educação e que é possível quando resulta de um projeto político pedagógico orgânico, construído coletivamente na interação escola e comu-nidade, articulando com os movimentos populares organizados comprometidos com a preservação da vida em seu sentido mais profundo . (apud GUIMA-RÃES, 2000, p . 68) .

Desse modo, o saber ambiental leva o homem de forma utópica a buscar novos posicionamentos numa perspectiva de valorização dos diálogos acerca dessa temática numa proposta reflexiva entre os diversos saberes e sua integração . Em relação à questão ambiental, deve ter uma postura de “pensar/ação” Leff (2001) levantando questionamentos quanto à reformula-ção de ideologias, de valores, e saberes numa reconfiguração de identidades e conhecimentos, que rompe com paradigmas até então formulados e constroem ou estabelecem novos paradig-mas que segundo Leff (2001, p . 188) o “saber ambiental trans-forma o conhecimento para construir uma nova ordem social” .


Importante destacar que sendo a universidade um espaço para discussão, diálogo e troca de conhecimentos, necessário se fez a abordagem do tema, para maior esclare-cimento além de posicionar cada cidadão no importante papel que deverá desempenhar nessa empreitada, em prol da sustentabilidade que vai muito além das vertentes ambientais, econômicas e sociais .

Mas o questionamento que se faz é o que se tem feito pra combater essa destruição? Desde quando estamos discutindo sustentabilidade? O que é sustentabilidade? Quais as legisla-ções brasileiras pertinentes ao tema? Qual o papel do cidadão frente a toda essa problemática ambiental .

Destaca-se como primordial o papel da educação ambiental para conscientização e mudança de hábitos em relação aos princípios da normativa legislativa e sua respon-sabilização desde a geração dos resíduos até a destinação ambientalmente adequada .

9.1 Histórico da Sustentabilidade e da Política Nacional de Resíduos Sólidos

Ao analisarmos o desenvolver da história sobre a susten-tabilidade, percebemos que as questões ambientais sempre estiverem em pauta e discussão, seja primeiramente pelos pesquisadores, Ong’s e posteriormente pelos grandes líderes mundiais .

O termo “desenvolvimento sustentável” surgiu na Confe-rência das Nações Unidas sobre o meio Ambiente Humano, ocorrida em 1972, na Suécia, cujo relatório foi publicado somente em 1987, sob o título “Nosso futuro Comum” . Pode-se


afirmar que essa conferência também conhecida como Relató-rio Brundtland, apresentou um novo olhar sobre o desenvolvi-mento, definindo-o como o “processo que satisfaz as necessi-dades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades” .

O relatório apontava para a incompatibilidade entre desenvolvimento sustentável e os padrões de produção e consumo, trazendo à tona mais uma vez a necessidade de uma nova relação “ser humano-meio ambiente” . Ao mesmo tempo, esse modelo não sugeria a estagnação do crescimento econômico, mas sim essa conciliação com as questões ambien-tais e sociais .

O conceito de desenvolvimento sustentável foi firmado na Agenda 21, documento elaborado na Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Eco 92), definindo as bases para a preservação do meio ambiente em seu território, e possibilitando o desenvolvimento sustentável .

No ano de 2012, foi realizada a Conferência Mundial sobre o Desenvolvimento Sustentável (Rio+20) que avançou na compreensão do conceito de sustentabilidade e instituiu o documento “O Futuro que Queremos”, reafirmando a efetivi-dade do princípio do desenvolvimento sustentável, conciliando meio-ambiente, equidade social e exigências econômicas .

Pertinente à legislação brasileira, a preocupação ambien-tal se apresentou como um princípio constitucional desde 1988, cabendo ao poder público e toda a coletividade defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações .

[…] Art . 225 . Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do


povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá– lo para as presentes e futuras gerações (Art . 225, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988) .

A Política Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS, instituída pela Lei Federal nº . 12 .305/10 e regulamentada pelo Decreto Federal nº . 7 .404/10 preenche uma lacuna no ordenamento jurí-dico, contribuindo para a busca do desenvolvimento sustentável e para a concretização de nosso Estado de Direito Ambiental .

Nesse sentido, despontou a PNRS com seus princípios, objetivos, instrumentos, sujeitos para a efetivação do desenvol-vimento sustentável em consonância com a aplicação de políti-cas públicas destinadas à regulação do gerenciamento dos resí-duos sólidos, com vistas a qualidade de vida do Planeta Terra e de seus habitantes .

9.2 Educação Ambiental como Instrumento de Conscientização

A Conferência Intergovernamental de Tbilisi, na Antiga União Soviética, é considerada um dos principais eventos sobre Educação Ambiental do Planeta . Esta conferência foi organi-zada a partir de uma parceria entre a UNESCO e o Programa de Meio Ambiente da ONU – PNUMA e, deste encontro, saíram às definições, os objetivos, os princípios e as estratégias para a Educação Ambiental no mundo .

No Brasil foi promulgada a Lei nº . 9 .975/99, que dispõe sobre a Educação Ambiental e determina em seus Arts . 1º e 2º que,


[ . . .] Art . 1o Entendem-se por educação ambiental os processos por meio dos quais o indivíduo e a coleti-vidade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade .Art . 2o A educação ambiental é um componente essen-cial e permanente da educação nacional, devendo estar presente, de forma articulada, em todos os níveis e modalidades do processo educativo, em caráter formal e não-formal .

A Educação Ambiental é demonstrada em vários momen-tos dentro da Política Nacional de Resíduos . Dentre os princí-pios da PNRS, está o da “cooperação entre as diferentes esferas do Poder Público, o setor empresarial e demais segmentos da sociedade”, sendo previsto no artigo 6º, inciso VI .

Ao abordar o tema Educação Ambiental, sob a ótica da sustentabilidade frente a presente crise ambiental, Leff (2008, p . 167) indica que “os desafios da sustentabilidade nos levam a refletir sobre a necessidade de transformar os processos produ-tivos a partir dos princípios do saber e da racionalidade ambiental” . Desse modo, a Educação Ambiental recupera,

[ . . .] O seu caráter crítico, libertário e emancipatório, propiciando a emergência de um saber ambiental, promovendo uma ética de alteridade que abre os canais a um diálogo de saberes e a uma política da diferença . Já não basta transmitir as ciências normais, os conheci-mentos úteis e os saberes bem conhecidos, porque a


crise ambiental tem desequilibrado o conhecimento e tem deslocado o local da verdade para dar lugar às verdades que estão por vir e para nos questionarmos sobre os limites da verdade frente ao inefável da vida (LEFF, 2008, p . 168) .

Reigota (2014, p 14 .) menciona que a Educação Ambiental deve ser compreendida como educação política no sentido de que “reivindica e prepara os cidadãos e as cidadãs para exigir e construir uma sociedade com justiça social, cidadanias (global e local), autogestão e ética nas relações sociais e com a natureza” .

Busca-se o desenvolvimento de uma consciência crítica em relação à educação ambiental sob as questões desejáveis, tais como: questões sociais, econômicas, culturais, políticas e acima de tudo as questões tecnológicas que estão à frente de todas as mudanças propostas e desejáveis . Leva-se em conside-ração que educação ambiental busca a compreensão da reali-dade como totalidade de modo a captar todos os aspectos e possibilidades em relação ao meio sócio histórico . Interage com o processo educativo por ser um processo que se desen-volve gradativamente, portanto inacabada, podendo ser trans-formada em uma orientação heurística, realizada pelos princí-pios epistemológicos de estudos com descrições, ilustrações e avaliações interdisciplinares .

Situar a educação ambiental no contexto social, permite uma maior visibilidade que abre portas para diálogos necessá-rios para a emancipação dos sentidos do ser, para que exerça seu papel de agente de transformação da realidade, na promo-ção de uma reflexão crítica quanto sua postura de vida . É nesse desejo que situa a educação ambiental no contexto social, inde-


pendentemente do tempo e do lugar . Sendo então, fundamen-tal a orientação quanto aos espaços e sociedades em transição considerando, portanto que não existem sociedades estáveis .

Ressalte-se nesse sentido o desafio metodológico interdis-ciplinar, mencionado por Carvalho (2014, p . 129) que os proble-mas ambientais ultrapassam a “especialização do saber”, pois para entender a problemática ambiental é necessário que a equipe seja formada de vários profissionais de várias áreas que atuam em conjunto e buscam formas interdisciplinares de cooperação entre si e de compreensão a realidade .

Nesse sentido, importante destacar que nos caminhos do entendimento da educação ambiental na visão interdisciplinar, não existe “receita pronta” e que a construção de práticas inova-doras não se dá pela reprodução, mas pela criação, readaptação e, sobretudo no caso da interdisciplinaridade, por novas rela-ções na organização do trabalho pedagógico .

Vale observar que o que se busca com o ensino da Educa-ção Ambiental é construir nos cidadãos e cidadãs uma cultura ecológica que compreenda a natureza e a sociedade como dimensões relacionadas e que não devem ser pensadas em separadas, independente ou autônoma, seja nas decisões gover-namentais ou nas ações da sociedade civil .

O cidadão deve compreender o importante papel que exerce frente à problemática da geração dos resíduos sólidos, desde a sua geração até a destinação ambientalmente adequada e os impactos desse consumo desenfreado e da produção de novos produtos frente à escassez dos recursos naturais .

Na Carta de Belgrado foram definidos seis objetivos rela-cionados à Educação Ambientais, dentre eles: a conscientiza-ção; o conhecimento; o comportamento; a competência; a


capacidade de avaliação e a participação . Esses objetivos ressal-tam a importância de levar os indivíduos a adquirir uma compreensão do meio ambiente de forma global e se ver inse-rido nessa relação e analisar a sua participação de forma crítica na problemática ambiental .

Importante destacar a Encíclica “laudato Si”, em que o Papa faz um apelo convocando a todos para um desafio de proteger a “Nossa Casa Comum”, unindo toda a família humana em busca de um desenvolvimento sustentável e inte-gralizado, pois ainda há tempo de mudar e Boff complementa o pensamento que a “Casa humana, não é mais o estado-nação, mas a Terra como pátria/mátria comum da humanidade . . . e agora está se reencontrando num mesmo lugar: no planeta Terra unificado” (BOFF, 1999, p . 27) e que existe apenas um único caminho que é a consciência planetária, com base em princípios éticos e morais em prol do meio ambiente (LIMA, 2015, p . 111) .

9.3 Consumo Sustentável sob a Ótica da Política Nacional de Resíduos Sólidos

Vivemos na era em que titulamos de “Era do Consumo”, na qual a justificativa dada para o avanço técnico e tecnológico baseia-se na elevação do nível de consumo . Observa-se uma preocupação quanto à capacidade dos ecossistemas suporta-rem as ações causadas pelas atividades humanas, tanto no fornecimento dos recursos quanto na absorção dos resíduos dessas atividades .

A discussão sobre a relação entre o consumo e meio ambiente vem ganhando cada vez mais importância e influen-


cia no desenvolvimento de políticas públicas contemporâneas sob a vertente da sustentabilidade e surge como resposta à crise ambiental e à urgência em rever as atitudes diante dos recursos finitos do planeta .

O cerne da questão da sustentabilidade está sob o enfoque do conceito de qualidade de vida, que pode ser definido como “grau de satisfação e realização de um indivíduo no seu processo de vida” (CORTEZ; Ortioga, 2010, p . 19) . Os hábitos de consumo observados nesta última década foram decisivos para a situação a qual nos deparamos .

Essas mudanças comportamentais de consumo trouxe-ram como consequência a produção descontrolada de vários tipos de produtos, muitos dos quais já programados para dura-rem pouco, como os intitulados de “obsolescência progra-mada”, que já programam uma vida curta do produto, tendo como problema o aumento exponencial do descarte e consumo de mais novos produtos .

Importante destacar que a responsabilidade referente às questões ambientais são compartilhadas entre o Poder Público e toda a coletividade, conforme preceituado no art . 225 da CF e determina os sujeitos que estão sob a observância da PNRS, conforme determinado no art . 1º da lei n . 12 .305/10, sendo abrangidos os sujeitos pessoa física e jurídica de direito público e privado . As normativas legislativas atuam em consonância ao determinarem o papel de todos na busca pela conservação e preservação dos recursos naturais que são finitos e determina-rem penalidades aos descumpridores deste dispositivo .

Dentre os princípios da PNRS, ressalte-se o do desenvol-vimento sustentável, a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida do produto e o que considero um dos mais impor-


tantes que se refere ao direito da sociedade à informação e ao controle social . Além desses, importante mencionar acerca dos objetivos da PNRS que aborda a proteção da saúde pública e a qualidade de vida; a não geração, redução, reutilização, recicla-gem e tratamento dos resíduos sólidos, bem como a disposição final ambientalmente adequada e o estímulo à adoção de padrões sustentáveis de consumo e bens de serviços .

Os princípios e objetivos da PNRS retratam a importância da participação dos cidadãos e cidadãs nessa luta em prol da conservação e preservação dos recursos naturais, demonstrando que a partir do consumo consciente, evitando o desperdício de produtos, a reutilização dos resíduos para a fabricação de novos materiais e principalmente a disposição final ambientalmente adequada essas ações podem iniciar na transformação de uma sociedade que “pensa global e agi local” (REIGOTA, 2014, p . 18) .

Ao compartilhar o conhecimento sobre a problemática ambiental, observa-se imprescindível explicar sobre a dinâ-mica da coleta seletiva, sobre a separação dos resíduos sólidos e orgânicos, sobre tempo de decomposição, sobre ciclo de vida do produto, inserindo de forma clara e objetiva o cidadão na dinâmica da PNRS .

Um dos caminhos para que os cidadãos se tornem mais responsáveis e comprometidos com o meio ambiente seria fornecer informações sobre as conexões entre suas atitudes, as opções de consumo e estilo de vida e a degradação ambiental . Será preciso instituir uma mudança nas atitudes sociais e culturais, de modo que a liberdade pessoal de utilização dos recursos naturais seja compreendido por um sentimento de responsabilidade compartilhada, a fim de promover o bem-es-tar de toda a humanidade, incluindo o das gerações futuras .



Para tanto, conclui-se que sendo o conhecimento algo inacabado, a educação ambiental é capaz de propor dinâmicas e vivências sociais que podem levar a mudanças tanto indivi-duais quanto coletivas . De modo local e global, propondo uma abordagem interativa e crítica na busca de soluções desses problemas com o meio ambiente .

Para que tenhamos um meio ambiente adequado para as presentes e futuras gerações, com qualidade de vida, livre de poluição e desperdício conforme previsto nas legislações brasi-leiras, importante ressaltar a participação do Poder Público e de toda a coletividade na busca desse meio ambiente ecologica-mente adequado .

Nesse sentido, depende de cada um de nós, cumprirmos ou descumprirmos as legislações pertinentes ao tema, mudar-mos o modo de consumir e voltarmos a nos entender que faze-mos parte desse meio ambiente, pois o homem necessita da natureza para sobreviver, porém não pode-se afirmar o contrá-rio . A natureza já demonstrou e demonstra que consegue sobreviver sem a participação do ser humano .

Importante mais uma vez destacar o magnífico trabalho do Santa Papa Francisco, que convoca a todos para cuidarmos do planeta e o intitula “Nossa Casa Comum”, demonstrando a participação de todos na preservação do meio ambiente e na manutenção da raça humana .


ReferênciasBRASIL . Constituição da República Federativa do Brasil: Texto Constitucional promulgado em 5 de outubro de 1998 . Brasília: Senado Federal, Subsecretarias de Edições Técnicas, 2010 .______ . Presidência da República . Lei n .º 9 .975, de 27 de abril de 1999 . Dispõe sobre a educação ambiental, Institui a Política Nacional de Educação Ambiental e dá outras providências . Disponível em: <http://www .planalto .gov .br/ccivil_03/leis/197995 .htm> . Acesso em: fev . 2016 .______ . POLÌTICA NACIONAL DE RESÌDUOS SÒLIDOS . Lei n . 12 .305 de 02 de agosto de 2010 . Disponível em: http://www .planalto .gov .br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/lei/112305 .htm . Acesso em:5 agos . 2016 .BOFF, Leonardo . Saber cuidar: ética do humano – compaixão pela terra . Petrópolis, RJ: Vozes, CARVALHO, Isabel Cristina de Moura . Educação ambiental: a formação do sujeito ecológico . 2 ed . São Paulo: Cortez, 2014 .CARTA ENCÍCLICA LAUDATO SI – Disponível em: < http://w2 .vatican .va/content/francesco/pt/encyclicals/documents/papa-francesco_20150524_enciclica-laudato-si .pdf> . Acesso em: out . 2015CORTEZ, Ana T . C ., ORTIGOZA, Sílvia A . G ., Consumo Sustentável: conflitos entre necessidade e desperdício . São Paulo: Editora Unesp, 2007 .FONSECA, J . J . S . Metodologia da pesquisa científica . Fortaleza: UEC, 2002 .GUIMARÃES, M . Educação ambiental: no consenso um embate? Campinas, São Paulo: Papirus, 2000 .LEFF, Enrique . Complexidade, interdisciplinaridade e saber ambiental . Olhar de professor, Ponta Grossa, 14(2): 309-335 2011 . Disponível em http://www .revistas2 .uepg .br/index .php/olhardeprofessor______ . Saber ambiental: sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder . Petrópolis: Vozes, 2008 .LIMA, Fabrício Wantoil . A Bíblia e o Direito: princípios ambientais . Leme: CL EDIJUR, 2015 .REIGOTA, Marcos . O que é Educação Ambiental . São Paulo: Brasiliense, 2014 .RIO + 20, CONFERÊNCIA DAS NAÇÔES UNIDAS SOBRE DESENVOLVIMENTO SUSTENTáVEL . Sobre a Rio +20. Disponível em: <http://www .rio20 .gov .br/sobre_a_rio_mais_20 .html> . Acesso em: 10 fev . 2016 .

RESSIGNIFICANDO OS PARADIGMAS

DA EDUCAçãO FíSICA

Maria Cristina de Freitas BonettiPoliana Cristina da Silva

Este capítulo tem a finalidade de apresentar alguns momentos da criança, as quais se incluem na formação do docente de Educação Física . A prática do docente da

Educação Física foi o principal foco de interesse para propor práticas educativas transdisciplinares . O estudo visa analisar, principalmente, o que diz respeito à cultura corporal de movi-mento, em seus aspectos do desenvolvimento motor, cognitivo e afetivo, aliados à arte da cultura popular . O principal objetivo é demonstrar a importância de desenvolver práticas corporais diversificadas, abrangendo diferentes habilidades e as mesmas devem estar em consonância com as teorias da Complexidade e da Transdisciplinaridade . Deste modo, busca-se identificar os processos de estruturação e preparação das aulas nas faixas etárias propostas, assim como identificar os sujeitos que as integram, bem como os papéis que desempenham os professo-res e gestores da escola .

Nossa intenção, é apresentar uma síntese da construção coletiva que visou compartilhar saberes e reflexões norteado-

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ras na edificação da proposta do Estágio Supervisionado IV (2014/1), do NEPE (Núcleo de Estudo de Prática de Ensino), do Câmpus ESEFFEGO – Universidade Estadual de Goiás (UEG), realizada por discentes do Curso de Educação Física e supervi-sionada pela autora do capítulo . Nesta proposta, foram demons-tradas as prováveis possibilidades da Cultura Corporal de Movimento no âmbito escolar e a interconexão com a pedago-gia criativa, mediante a realização de práticas artísticas, pré-desportivas e lúdicas, em um contexto de uma escola da rede pública de ensino, localizada no setor Leste Vila Nova, na cidade de Goiânia/GO . É importante ressaltar que esta proposta se estabeleceu a partir deste estágio e este aborda o ensino na Educação Infantil da I Fase do Ensino Fundamental e esta fase abrange a faixa etária de 6 a 11 anos . A ação dos estagiários embasou-se no Projeto Político Pedagógico (PPP, 2001, p . 16) do Colégio Estadual onde foi realizado o estágio, e este tem como referência a

[ . . .] busca de fundamentações teóricas e práticas de outras instituições escolares, visando o despertar do espírito crítico sobre as ideologias dominantes, cons-truindo sua base filosófica com base na verdade e posi-cionando-se de maneira justa, democrática e participa-tiva diante dos fatos ocorridos no dia a dia .

Contudo, percebemos que a escola apresentava dificulda-des para executar essa função, e que o corpo discente pouco se envolvia com o corpo docente, fazendo com que o diálogo ficasse prejudicado . Ao verificar as carências locais, a proposta se embasou nos estudos sobre a transculturalidade a partir das

271Ressignificando os Paradigmas da Educação Física

danças tradicionais dos povos aliada à pedagogia das Danças Circulares Sagradas . Nesta pedagogia, podemos fazer um paralelo com a teoria transdisciplinar ao compreender a dança como arte do corpo . Esta arte tem um lugar importante na educação criativa, uma vez que a dança, como arte corporal, dialoga com o desenvolvimento integral do ser humano e esta se coloca presente e possibilita perceber a beleza, emoções, sentimentos, percepções e insights, tanto pessoais quanto cole-tivo (grupo) e, desta forma, a arte dançada proporciona ao indivíduo uma percepção melhor de si e do outro . Isso acon-tece na roda e nesta não há hierarquia .

Durante a construção deste trabalho, o grupo de estagiá-rios apresentou a sua primeira proposta no I RIEC – Rede Internacional de Escolas Criativas (2014), que aconteceu em Goiânia . Como finalização desta proposta, foi escrito um Trabalho de Conclusão do Curso de Educação Física pela co-autora do capítulo e supervisionado pela autora .

Diante disso, é importante pensar e compreender como se expressam as dimensões da cultura popular, as quais se ressignificam por meio de atividades lúdicas e criativas, envolvendo a psicomotricidade e seus elementos vinculados à arte, bem como compreender o papel do profissional de Educação Física, no desenvolvimento das crianças na primeira fase do ensino fundamental . A metodologia se inseriu na fenomenologia, a qual expressa às atitudes na forma de pensar, sentir e agir dos envolvidos . Da mesma forma, o estudo abarcou pesquisa documental e de campo, partindo de uma análise de cunho qualitativo de caráter descritivo e participativo . Foi aplicada a técnica de coleta de dados e observação participante, entrevistas do tipo semi estruturada


e questionário de perguntas abertas . Neste sentido, esses conhecimentos, ao serem compartilhados e divulgados tornam visíveis subjetividades pedagógicas que norteiam futuras possibilidades de ensino da Educação Física, especial-mente na I Fase do Ensino Fundamental .

Este capítulo propõe, ainda, uma breve historiografia sobre os paradigmas da Educação Física e, desta forma, buscar na atualidade um paradigma que não seja excludente, nem na polaridade do atleta-herói; ou na busca de um ser apenas saudável e perfeito, nem em relação ao privilégio da cultura subalterna, a qual encontra eco na Educação Física Popular e no Materialismo Histórico Dialético . É importante salientar que o pêndulo dos paradigmas na historiografia da Educação Física sempre penderam para os extremos . O estudo que origi-nou este capítulo partiu do caminho acadêmico da autora desde 1976, no qual esta passou por diversas formas de ensino e teorias de aprendizagem no campo da Educação Física .

Ao conviver na diversidade de ideologias acadêmicas, percebemos os distintos espaços de resistência aos desafios que surgiam nas últimas décadas, no segundo Milênio . A partir da década de 1990, emergia na Educação Física um grupo de professores autodenominados como “Coletivo de Autores” (1992), e este se transformou em arautos de uma “Nova Era” da Educação Física . Por outro lado, no mesmo período, surgiu com muita força um movimento internacional voltado para o paradigma holístico, o qual, no Brasil, foi liderado por Pierre Weill e a criação da Universidade Internacional da Paz (UNIPAZ), no Distrito Federal . Na sequência, a partir da UNIPAZ-DF, entramos em contato com novas teorias educa-cionais, bem como tivemos acesso ao Manifesto da Transdisci-


plinaridade (NICOLESCO, 1999) e aos principais articulado-res do novo paradigma que surgia .

Concomitantemente, no mesmo período em que prati-quei frequentação platônica na UNIPAZ-DF, entrei em contato com a Pedagogia das Danças Circulares Sagradas (1994), tornando-me uma das pioneiras deste movimento no Brasil . Ao aprofundar-me nesta seara, escrevi a minha Tese de Doutorado e tive como co-orientadora e membro da banca examinadora a Drª Maria-Gabriele Wosien que, junto com seu pai Bernhard Wosien, criou esta Pedagogia1 . Devido a este fato, enraizei-me nos estudos das danças tradicionais dos povos exploradas nesta Pedagogia e, assim, fazer um paralelo e reforçar o trabalho que desenvolvo sobre os folguedos e as danças da cultura popular tradicional do Brasil, conteúdo que ministro, desde 1983, na UEG .

Por fim, na investigação e na prática pedagógica de uma síntese da minha proposta de trabalho, na qual agrego a cultura popular tradicional e urbana, fui convidada para integrar a equipe de professores do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu Transdisciplinaridade e Interdisciplinar na Educação, do Câmpus Inhumas (UEG) .

Em busca de uma integração inclusiva, sem divisão de classe social ou econômica, bem como reverenciando a astúcia dos saberes e fazeres do povo proponho a urgência de que a Educação Física olhe para os novos paradigmas da educação que envolvem uma inovação na consciência cultural, a partir de inter-relações necessárias para a autoconstrução do ser

1 A Pedagogia da Dança Circular Sagrada foi desenvolvida por Bernhard Wosien em parceria com a sua filha Maria-Gabriele Wosien, a partir do curso de Danças Sagradas para professores na Fundação Findhorn – Escócia, em 1976 .


humano . Neste paradigma, a arte corporal se faz presente e proporciona outros níveis de realidade .

10.1 Educação Física: Criatividade e o Mundo da Criança

Na educação infantil é importante disponibilizar o maior número de experiências possíveis, apresentando e rearran-jando um novo mundo, a partir de experiências anteriores que proporcionam uma reflexão sobre sua realidade . Nesse mundo singular, a criança começa a se relacionar com o meio social e físico, ajudando no desenvolvimento e abertura para novos experimentos . Para estimular o intelecto e o físico é preciso que os professores e responsáveis, ofereçam desafios e vivên-cias diversificadas . Neste sentido, nos reportamos a Pujol (2008, p . 347), que afirma:

A possibilidade de levar em consideração todas e cada uma das abordagens que os alunos vão realizando ao longo de suas próprias experiências escolares não é uma tarefa fácil . Deixar de ter razão e saber estimular a participação, a reflexão e a inter-relação de saberes significa saber vencer resistências que, aos poucos, fazem parte da nossa própria idiossincrasia docente .

A educação física consegue isso de uma forma muito prazerosa através de jogos, brincadeiras, esportes, danças etc, fazendo com que o desenvolvimento motor, cognitivo e sócio afetivo sejam estimulados e trabalhados em um meio sociocul-tural que é a escola . Por outro lado, os docentes da Educação Física Infantil precisam aprender que existe uma complexidade com relação à interpretação de cada criança, a partir do


problema proposto, uma vez que elas inter-relacionam a sua explicação com as suas próprias vivências e experiências, como também observando e ouvindo os demais . Assim elas transfor-mam e ampliam seus conhecimentos sobre o tema proposto .

Ao entrar em contato com o mundo da criança, levando-se em consideração toda sua bagagem cultural e social vivida anteriormente, é possível elencar os subsídios da Cultura Corporal de Movimento dos escolares, promovendo uma ressignificação da infância e da interação social, que foi esva-ziada nos últimos anos em nossa sociedade; além de proporcio-nar um maior entendimento em relação às características históricas e culturais dos conteúdos abordados .

A criatividade, na abordagem de diversas práticas da Cultura Corporal de Movimento, deve ser incentivada a fim de provocar novos estímulos, experiências e criação de movimen-tos inventados pelas crianças . Por sua vez, Carneiro (2013, p . 134) afirma: “As crianças ficam inibidas e acuadas, acostu-mando-se muito mais a copiar modelos do que criar e isso tem sido uma falha no processo educacional” . Entende-se que educar corporalmente uma criança exige também ensiná-la o porquê de se movimentar, e instigá-la a descobrir outras possi-bilidades, a partir do movimento apreendido . Assim, ela sai da imobilidade e encontra sua originalidade e singularidade .

Portanto, nesta proposta com a Educação Infantil, objeti-vamos proporcionar às crianças experiências motoras e cultu-rais para desenvolver a criatividade, compreensão e execução dos movimentos das práticas corporais abordadas das mais variadas possibilidades, com o intuito de auxiliar no desenvol-vimento das habilidades do controle motor e sócio afetivo das crianças, mediante atividades lúdicas, artísticas e jogos simbó-


licos, adaptados para faixa etária proposta . Neste sentido, encontramos ressonância em Carneiro (2013, p . 135), que diz:

A arte auxilia o desenvolvimento da criatividade nos alunos, prática essa que não costuma ser estimulada, pois criar é fazer algo novo, inesperado que envolve a descoberta e não pode ser previsto . Ao mesmo tempo criar, por vezes, se antagoniza com o comodismo encontrado em grande parte dos docentes, porque supõe transformar, o que não é fácil na Universidade .

Ao se transformar ao longo do tempo, a Educação Física tornou-se um importante componente educativo, pedagógico e cultural, sofrendo, assim, diversas influências significativas, desde a sua implantação como prática pedagógica nas institui-ções escolares . A Educação Física passou por diversas tendên-cias e também por várias formas de abordagens, abrangendo em seu potencial pedagógico toda uma estrutura curricular voltada para o movimento corporal, sendo assim, é uma disci-plina da área da linguagem, conhecida como “arte viva do movimento” (GALLARDO, 2009, p . 19), pois o ser humano está em constantes transformações diante do próprio desen-volvimento motor, físico, cognitivo, afetivo e psicossocial, ou seja, nas suas relações socioculturais .

Além disso, a abrangência da Educação Física no seu aspecto da arte, em especial a dança tradicional dos povos, possibilita trabalhar com linguagens não convencionais, ao mesmo tempo em que a criança agrega elementos culturais da sua própria comunidade, na qual ela é incentivada a valorizar e integrar as características do contexto em que vive . Desta forma, além de estimular a criatividade das crianças pela diver-


sidade cultural, também contribui para estimular a originali-dade e a melhoria da qualidade de ensino e da produção dos alunos, que são apreciadas e valorizadas por todos .

As discussões em torno da criança e da importância de intervir em sua formação desde os primeiros anos de vida vêm ao longo da história recente ganhando terreno, conforme destaca Borba (2005, p . 79):

As crianças passam a ser vistas como integrantes de um grupo social específico e como atores sociais competentes, capazes de formular interpretações sobre o mundo, sobre si e sobre os outros . [ . . .] constroem significações, formas próprias de ação e de relação com seus pares, constituindo suas culturas próprias nos espaços e tempos em que convivem cotidianamente . [ . . .] e se constituam como um grupo social específico .

Propõe-se, então, a elaboração de práticas pedagógicas criativas, as quais o educador, segundo Pujol (2008, p . 349): “deve ser capaz de transformar um universo, que muitas vezes vai sem direção de uma fase de evolução à outra, em um sistema estreitamente interconectado, que se constrói a partir da infor-mação que foi gerada anteriormente” . Esta atuação é entendida como a ação do professor, no espaço de sala de aula e deve acontecer de uma forma criativa . Esse desempenho demonstra a consideração para com a criança enquanto ser social na pers-pectiva de contribuir com o seu desenvolvimento concreto e de forma integral .

Dessa forma, é preciso estimular a criatividade e esta se desenvolve na interação de aspectos da realidade e de suas rela-ções com o imaginário da criança; isso porque a junção desses


dois aspectos auxilia na cognição simbólica do movimento, uma vez que este se materializa na realidade por meio da vivên-cia da criança, no processo criativo . Para que as mudanças aconteçam faz-se necessário a ressignificação do olhar para a Educação Física, na qual não se visa apenas o biológico ou o sensível, mas sim integrar todas as possibilidades do ser humano para uma melhor educação . Esta visão é respaldada por Pujol (2008, p . 349), que afirma:

Quando reduzimos as aulas a uma simples atividade motriz, estamos oferecendo uma forma de atuar e dominar suas potencialidades corporais, mas se quere-mos ir além, devemos inter-relacionar tudo aquilo que possa influenciar no pensamento e na aprendizagem mais globalizada e integral, temos de ser capazes de aproveitar o movimento para descobrir forças internas, formas de comunicação, domínio do espaço, coordena-ção motriz, possibilidades comunicativas, formas de expressão, práticas reflexivas, participação coletiva, entre outras .

Neste sentido, a criatividade se insere no aspecto cultural, social e na liberdade de expressão do aluno, além da reflexão do mesmo em relação à realidade na qual está inserido . Ao projetar seu mundo interior no meio em que vive, ele se torna flexível e busca novas alternativas para ressignificar e inovar a sua realidade .

Se o foco da educação é o indivíduo, a aprendizagem e a construção do conhecimento devem demonstrar, então, a importância da prática pedagógica voltada para o desenvolvi-mento humano . Uma educação que favoreça a busca de dife-


rentes alternativas que ajudem as pessoas a aprender, a viver e a conviver, dentre outras questões, beneficia as relações sociais, ao mesmo tempo em que possibilita mais harmonia . Este processo de aprender torna-se algo natural e dinâmico (MORAES, 1997) . No paradigma tradicional, a organização educacional de ensino era regida por uma organização buro-crática, hierarquizada e com pouca proximidade dos alunos, que são os sujeitos mais envolvidos na ação de ensino .

Na atualidade, a educação apresenta o sujeito no foco da ação, fazendo com que haja uma proximidade do mesmo com as ações dentro da escola e com as reflexões propostas . O aluno se mostra um ser em construção, com a necessidade de apren-der e fazer desta aprendizagem algo permanente, podendo futuramente repassar esse conhecimento adquirido .

Um indivíduo que aprende conhece o mundo de uma maneira específica, dependendo dos estímulos que foram oferecidos durante a sua vida . Assim, ele deixa de ser objeto e passa a ser o sujeito da ação da aprendizagem e da transforma-ção da sociedade, a partir do que lhe foi ensinado .

Por sua vez, a possibilidade de construir vivências transcul-turais mediante danças tradicionais dos povos é um exercício na contemporaneidade, no qual objetiva-se demonstrar as possibi-lidades da Cultura Corporal de Movimento, por meio das práti-cas pedagógicas criativas, para a ampliação do repertório socio-cultural de escolares . Esta prática não poderá ser dissociada de novas linguagens da corporeidade, de impregnação de seus diálogos para interconexões com o público participante e, mais ainda, dos fragmentos lúdico-artísticos e significativos de distin-tos momentos da história da Educação Infantil . Estes devem ser recuperados e reinventados na perspectiva da ‘Escola Criativa’ .


Por fim, entendendo que o corpo é constituído a partir das relações que se estabelece com o mundo, assim como das expe-riências culturais que se acumula ao longo da vida acreditamos que as práticas corporais participam dessa construção . Veicu-lam significados e sentidos aos sujeitos, contribuindo para um processo educativo que deve colaborar para o desenvolvimento infantil não só no nível motor, mas levando em consideração o sujeito como um todo . Assim, situamos os jogos simbólicos, as cantigas, os folguedos, os brinquedos e as brincadeiras tradi-cionais, bem como as várias abordagens da ginástica, dos ritmos regionalizados, da dança da cultura popular e dos jogos pré-desportivos como sendo objetos de comunicação e produ-ção cultural . Busca-se, assim, dar sentido a essa atividade liga-das aos aspectos culturais em que o sujeito está inserido .

10.2 Historiografia dos Paradigmas da Educação Física

Na Grécia Clássica, encontramos filósofos como Sócrates e Aristóteles que possuíam uma visão integral do homem, na qual era importante a relação harmônica entre intelecto e aspecto físico . Assim, o corpo não era separado da alma . Desta forma, o cidadão grego cultivava ações pautadas na estética, bem como nas práticas que fortaleciam a sua inteligência . Por outro lado, Platão partia de uma visão em que o homem se fragmentava, uma vez que ele considerava que o corpo era impuro e contaminava a alma .

As discussões da fragmentação do ser humano, assim como as diversas concepções do corpo em relação à alma perpassaram por vários períodos históricos . Ainda hoje exis-tem discussões sobre o tema . Esses estudos, conforme as suas


concepções se modificavam, eram incorporados conceitos culturais, históricos e sociais que se faziam presentes em cada sociedade . Por sua vez, neste processo, a partir de fatores deter-minantes, a Educação Física ganhou forma e passou a justifi-car-se por si mesma, tornando-se uma disciplina .

Em meados dos séculos XVIII e XIX a Educação Física teve basicamente a influência do militarismo e da medicina, resultando em uma educação física ou prática corporal, com o objetivo do corpo de servir, traduzindo o sujeito como razão e o corpo sempre como objeto . A partir daí, é possível considerar os estudos de pesquisadores que difundem determinado olhar a respeito da história da Educação Física Brasileira e, desta forma, assim consideram as suas principais tendências: Higie-nista; Militarista; Pedagogicista; Competitivista e Popular .

Em muitos momentos da “História do Corpo”, este não é visto como soma da educação integral . Este se constituiu mediante a educação intelectual, moral e física . Neste sentido, o corpo se comporta seguindo as necessidades produtivas, sanitárias, morais e de adaptação social de um corpo dócil que não possui liberdade de expressão .

Nesse contexto, é compreensível que a tradição educacio-nal brasileira tenha situado, desde a década de 1920, a Educa-ção Física como uma atividade complementar e relativamente isolada nos currículos escolares, com objetivos, em geral deter-minados de fora para dentro: treinamento pré-militar, eugenia, nacionalismo, preparação de atletas etc . De acordo com Betti (2002, p . 74):

A Educação Física Higienista é marcada pela questão da saúde, tendo como objetivo a formação de indiví-


duos fortes, sadios, disposto à ação . Agindo com o papel de saúde individual e também de saúde coletiva, com o projeto de assepsia social . Desta forma os conteú-dos aplicados devem disciplinar os hábitos fazendo com que se afastem de tudo que possa danificar a saúde e a moral, sendo um problema para a vida coletiva .

Na mesma linha de pensamento, Junior (1998, p . 17) reforça que a Educação Física Higienista é uma concepção que se preocupa em erigir a Educação Física como agente de sanea-mento público, na busca de uma “sociedade livre das doenças infecciosas e dos vícios deteriorados de saúde e do caráter do homem do povo” . Por sua vez, o Estado se utiliza, então, da disciplina para um controle da saúde pública, fazendo com que a população, ou seja, os alunos das instituições educacionais seguissem um modelo de educação higienista para a formação de um corpo produtivo visando a economia do país .

Da mesma forma, a Educação Física Militarista assume as tendências européias de ideologias que preconizam elementos da visão higienista e estes estão exacerbados nos seus funda-mentos, atuando como uma selecionadora no desenvolvimento dos cidadãos nas suas atividades sociais e profissionais . A insti-tuição militar, com reflexo na Educação Física, praticava exer-cícios físicos sistematizados, trazendo consigo o tecnicismo . A saúde, a virilidade e força representadas na educação higienista continua atuando nesta tendência, renovada com uma pers-pectiva nacionalista/patriótica .

Ambos os modelos de Educação Física citados acima não fazem alusão à problemática da mesma como uma atividade educativa, ou seja, como disciplina inerente nos currículos


escolares . Por outro lado, nos encontramos com a Educação Física Pedagogicista, entre 1945 e 1964 e esta se comporta como uma prática educativa, tendo como objetivo a competência de promover a chamada educação integral .

No entanto, ao nos depararmos com a Educação Física Competitivista, observamos que ela reflete fundamentos da Educação Física Militarista, uma vez que está a serviço de uma hierarquização e elitização social . Seu principal objetivo é a superação individual a partir da competição, respaldada por Júnior (1988, p . 20), ao afirmar que: “A Educação Física Compe-titivista volta-se, então, para o culto do atleta-herói; aquele que a despeito de todas as dificuldades chegou ao pódio” . Desta feita, esse paradigma faz com que o ensino se volte para o “culto do atleta-herói” e não para a construção do indivíduo como um ser em construção e com sede de conhecimento .

A Educação Física Popular se sustenta quase que exclusi-vamente numa teorização, fortalecida de geração em geração pelos trabalhadores deste país, inserida no Movimento Operá-rio e Popular . Baseada em uma Educação Física autônoma dos trabalhadores, ou seja, aquela que luta contra a classe domina-dora . A educação dos trabalhadores se organiza de forma a fortalecer o movimento de organização das classes populares para o embate das classes dominantes que comandam o sistema de opressão . De acordo com Junior (1998, p . 21):

Ela preconiza, antes de tudo, a ludicidade e a coopera-ção . Neste sentido, o desporto, a dança, a ginástica etc assumem um papel de promotores da organização e mobilização dos trabalhadores . E, mais que isso, a Educação Física serve então aos interesses daquilo que


os trabalhadores historicamente vêm chamando de “solidariedade operária” .

Na visão de estudiosos do tema, a Educação Física, pautada na tendência Popular almejou mudar o paradigma da Educa-ção Física, saindo do competitivismo para a ludicidade, a soli-dariedade e a organização e mobilização dos trabalhadores na tarefa de construção de uma sociedade efetivamente democrá-tica . Acreditando que depois de um longo período, desde a tendência Pedagogicista, o aluno passa a ser parte do processo, sendo ouvido, podendo sugerir e criticar .

No entanto, é preciso muito cuidado com esta visão, uma vez que falta preparo tanto para os professores quanto para os alunos em formação . Outro fator é que a Educação Física Popu-lar tem por objeto o ser social e as práticas corporais significa-tivas ficam em segundo plano, além de não considerarem os métodos, uma vez que, equivocadamente, estes são considera-dos militaristas . O que vemos são estudantes de Educação Física despreparados para trabalhar com o corpo e o lúdico . É um “laisse faire” disfarçado de práticas mal feitas .

Com tantas mudanças ao passar dos anos, fica claro a necessidade de reformulação, a partir da construção de um novo paradigma baseado em um modelo educacional capaz de gerar novos ambientes de aprendizagem, no qual o ser humano seja compreendido na sua totalidade e na sua multidimensio-nalidade . Além disso, um ambiente como a escola precisa levar em consideração os aspectos físicos, biológicos, mentais, psico-lógicos, espirituais, culturais e sociais do ser humano .

Neste milênio, é urgente que a Educação Física reinvente um paradigma que reflita um novo modelo educacional, ao


mesmo tempo em que abdica do lado tradicional, fragmentado e estático, buscando algo que seja dinâmico e que acompanhe a evolução do mundo da ciência, no qual, através do avanço da física, principalmente da física quântica, muitos paradigmas tradicionais estão sendo revistos e reavaliados . Neste sentido, nos reportamos aos pressupostos de Morais (1997, p . 17), que preconiza a busca de:

Um paradigma que reconhecesse a interdependência existente entre os processos de pensamentos e de cons-trução do conhecimento e o ambiente geral, que cola-borasse para resgatar a visão de contexto, que não sepa-rasse o indivíduo do mundo em que vive e de seus relacionamentos, que os promovesse como seres inter-dependentes, reconhecendo a vida humana entrelaçada com o mundo natural .

Sendo assim, visamos uma proposta educacional voltada para o lado humano na sua instrumentalização e transforma-ção . Ao mesmo tempo em que o aluno possa compreender a importância do pensar crítico e criativo, podendo contribuir para o mundo e sua evolução . Desta forma, marcando o processo desse novo paradigma aqui apresentado, promove-mos a necessidade da didática do aprender a aprender, como objetivo maior de todo processo pedagógico, independente-mente de suas especificidades, possibilitando o sujeito a encon-trar sua autonomia . Neste sentido, nos reportamos a Pedro Demo (2010, p . 33), que afirma:

O que marcará a modernidade educativa é a didática do aprender a aprender, ou do saber pensar, englo-


bando, num só todo, a necessidade de apropriação do conhecimento disponível e seu manejo criativo e crítico ( . . .) . A competência que a escola deve consolidar e sempre renovar é aquela fundada na propriedade do conhecimento como instrumento mais eficaz para emancipação das pessoas .

Assim, esse novo paradigma não se contentará em ser um mero transmissor de conteúdos . Ele será responsável por construir e reconstruir conhecimentos, ou seja, o desenvolvi-mento da autonomia . Os recursos utilizados deverão contri-buir para o crescimento da criança com ela mesma e em suas relações sociais .

10.3 Uma Proposta Transdisciplinar para um Paradigma da Cultura Corporal de Movimento

Ao propor uma ação transformadora, na qual o aluno está inserido como um sujeito em construção, depara-se com a necessidade do mesmo sentir e pensar o conhecimento, de uma forma que seja apreendida a partir das teorias da transdiscipli-naridade nas suas diferentes relações . De acordo com Baserab Nicolescu (1999) são três os princípios que sustentam essa teoria, mediante conceitos e metodologia . O primeiro demonstra que a vida é complexa; o segundo é que existem níveis de realidade diversos e o último nos remete ao terceiro incluído . De acordo com Ferreira (2009, p . 5): “Para a transdisciplinaridade, a vida não é simples, mas complexa, visto que a vida é uma teia [ . . .]” . Esta afirmação demonstra a dinamicidade da vida, na qual o viver se constitui a partir de diversas referências e dimensões .


As diferentes possibilidades da interpretação de movi-mentos, no qual o ser humano interage com os meios físico, social e cultural em que vive demonstram a complexidade da realidade da Cultura Corporal de Movimento . Na perspectiva biológica, essa interação, mediante constante troca de matéria/energia e informação é um aspecto fundamental para a sobre-vivência e desenvolvimento de todo e qualquer sistema vivo .

Destarte, os movimentos se constituem verdadeiramente como um aspecto crítico, visto que possibilitam ao ser humano agir sobre o meio ambiente para alcançar objetivos desejados ou satisfazer suas necessidades . Todos esses avanços no conhe-cimento sobre aprendizagem, desenvolvimento e controle motor e as suas implicações no processo ensino aprendizagem podem ser compreendidos como níveis de realidade diversos, mesmo porque eles continuam válidos e consistentes .

Os conteúdos dessa abordagem, no seu aspecto físico, devem obedecer a uma sequência fundamentada no desenvol-vimento motor: fase dos movimentos fetais, fase dos movi-mentos espontâneos e reflexos, fase dos movimentos funda-mentais, fase de combinações de movimentos fundamentais e movimentos culturais determinados . De acordo com Tani et al (1988 p . 13): “O movimento é reconhecido como sendo objeto de estudo e aplicação da Educação Física seja qual for a área de atuação, é inegável a sua contribuição ao desenvolvimento global do ser humano, desde que estes trabalhos sejam adequa-dos” . Por sua vez, o professor de Educação Física deve estar apto para entender a complexidade das mútuas interações a partir do desenvolvimento motor de seus alunos, em conso-nância com as suas realidades únicas do seu mundo simbólico e afetivo .


Pode-se entender a complexidade, considerando o que está por trás dos acontecimentos, dos fenômenos, das ações e das inte-rações, bem como avaliando os elementos inseparavelmente como o sujeito e o objeto . No entanto, o objeto não se reduz a uma única visão . Do mesmo modo, Morais (2010) afirma que a complexidade [ . . .]”exige a aceitação da diferença, o reconhecimento da plurali-dade, da diversidade, das diferentes leituras de mundo, das diver-sas linguagens com as quais os indivíduos interpretam os fenôme-nos constitutivos da realidade” . Neste sentido, nos reportamos ao simbolismo e este cogita a complexidade da realidade ao mostrar suas diferentes interpretações mediante a polissemia do símbolo, que exprime um objeto com várias faces .

Outro desafio da teoria transdisciplinar é compreender o terceiro princípio e este, de acordo com Schimidt Neto (2013, p . 111), assim se manifesta:

O terceiro incluído se faz presente na partilha de dife-rentes pontos de vista, que apesar de antagônicos, também se complementam a partir do diálogo que se estabelece entre as diferentes tendências . Esse nos parece um elemento fundamental nessa dinâmica, uma vez que as organizações educacionais e empresa-riais sofrem cada vez mais com problemas de comuni-cação entre as pessoas .

Ao considerar que a criança está em processo de forma-ção, faz-se necessário apresentar diferentes pontos de vista que, mesmo antagônicos, eles se complementam de maneira sutil e sensível, ao mesmo tempo em que possibilita uma confortável postura de se colocar no lugar do outro e perceber que existem outras realidades .


No trabalho com os estagiários, que originou este capí-tulo, utilizamos as danças tradicionais dos povos, base da ‘Pedagogia das Danças Circulares Sagradas’ . Estas danças são compostas por uma multiplicidade de códigos e símbolos que revelam o caminho trilhado pelo ser humano desde tempos primevos, mostrando como o seu comportamento e a sua construção cultural estão em constante mutação, revelando a complexidade da criação .

Ao se desenvolver com uma linguagem lúdica, a dança tradicional dos povos revela sua construção e desconstrução na perenidade do tempo . Os registros encontrados no corpo, com sua peculiar dramaturgia e subjetividade, com a qual compreende a narrativa coreográfica, o tempo e o seu lugar no espaço, faz com que o corpo se movimente a partir do diálogo de experiências profundas nos processos de experimentação desvendadas nos interditos das memórias encontradas nas gestas divinizadas e musicalizadas .

Sobre a dimensão do sagrado encontrado nestas danças como manifestação artístico-transcendente centrada no corpo como espaço sagrado, assim se expressa Bernard Wosien (2000, p . 25-26):

No caminho da mestria da dança cheguei à conclusão básica de que a dança, como a manifestação artística mais antiga do homem, é um caminho esotérico . O trabalho do bailarino acontece no seu instrumento, ou seja, no seu próprio corpo . Trata-se do trabalho a partir da base, a partir do interior da imagem perfeita de Deus . Segundo a frase esotérica: “Assim embaixo como em cima”, o trabalho está nos fundamentos de nossa auto-compreensão, no ser humano como imagem de Deus .


O que as memórias do corpo refletem são as dimensões subjetivas que povoam o imaginário e provocam a travessia sobre conceitos regulados por interesses de outras instâncias, indo além das possibilidades, encontrando, assim, a singular presença em que a vida é celebrada e reinventada, como afirma Bernhard Wosien (2000, p . 35): “Através da dança, como num jogo dos jogos, que celebra o instante num eterno retorno, essencialmente se alcança e se anima a festa e a celebração”. O corpo em movimento reproduz gestas de códigos de sentido impreciso, no qual a união do lúdico com o sagrado e com o lírico se reorganiza em êxtase dançado .

A história da jornada do ser humano, no seu caminho de individuação, explorada em atos performáticos da Dança Circular Sagrada, remeteu a situações, sensações e sentimentos que só pode ser refletida se for procurada a síntese pessoal . Este caminho induz à revisão dos arquétipos masculinos e femini-nos, que são personagens de nós próprios, permitindo a síntese entre o humano e o divino .

Desta forma, ao problematizar as distintas relações do mundo, tanto do contexto das realidades locais, como das realidades globais, a criança percebe a diversidade, incorpora seus conteúdos e religa saberes ao conquistar espaços do seu próprio corpo, mediante a compreensão das suas emoções que se manifestam através da arte da dança tradicional dos povos, inclusive com o sagrado que existe em todos os seres e assim pode se reconectar com a natureza e a própria divindade .

A partir de paradigmas que proporcionam ao aluno sentir e pensar o conhecimento, de forma que estes sejam alcançados a partir da multidimensionalidade do ser humano, nos repor-tamos a Crema (1997), uma vez que, na sua visão, a Educação


deve ser voltada para o ser integral, ajudando assim o aluno a encontrar seu centro, a encontrar suas virtudes e habilidades . Grande parte dessa função é depositada no professor como peça principal na articulação do processo pedagógico .

Sendo assim, o aluno será educado a partir de uma proposta direcionada à ação/reflexão sem excluir a dimensão emocional e espiritual . Interagindo o sentir e o pensar permite que o docente possa educar restabelecendo a integridade humana, onde pensamentos, ações e emoções estejam em diálogo imutável . A aprendizagem é um processo no qual o organismo, ao realizar vivências e experiências pode modificar a sua conduta, resultando em uma prática final no processo de ensino e aprendizagem . A aprendizagem leva a ocorrência de transformações plásticas no cérebro . Essas mudanças, não trazem apenas novos conhecimentos, mas uma ligação com as disciplinas do arco do saber, excluindo assim disciplinas de conhecimentos unificados e suas fragmentações .

A transformação plástica é de difícil mudança, pois no cérebro reptílico, localizado no talo cerebral, acontecem os registros como rotinas, rituais, hábitos etc . . . por isso existe difi-culdade de modificação, já que essa nova proposta é marcada pelo conceito motriz e matriz da transformação . Aprender com o cérebro remete a um aprendizado com os dois hemisfé-rios do cérebro, exercitando diferentes codificações .

Por isso é necessário ampliar os estímulos e situações oportunizando estratégias, sendo estas visuais, criativas, multissensorial, motoras e sociais . A visão transdisciplinar possibilita ir além do que é ensinado no universo acadêmico, e assim nos reportamos a Pujol (2008, p . 347), que afirma:


Para estimular e promover a aprendizagem que seja capaz de inter-relacionar e interatuar todas e cada uma das disciplinas transformando-as em um todo, é preciso planejar cenários que tornem isso possível . A possibili-dade que tem o ser humano de reorganizar suas próprias atuações, de compartilhar com outros docentes, de pesquisar sobre algumas das ações realizadas, faz com que continuamente se possa cogitar criar cenários dife-rentes e que cada um deles leve a uma forma de atuar e de responder a situações diversas .

Neste sentido, a cultura de movimento utilizada como linguagem corporal se faz importante dentro da escola, pois a mesma, sendo trabalhada de forma positiva, pode ocasionar diferentes estímulos para a aprendizagem e a utilização do cérebro como um todo, fazendo da aula e do conteúdo algo interativo com outros conhecimentos, o que resulta em um sujeito/aluno beneficiado por uma prática positiva . De acordo com Moraes (2004, p . 56):

Sob o olhar autopoiético de Maturana, toda realização humana se explica a partir da linguagem o que não ocorre no seu âmbito não se poderia chamar de realiza-ção humana . Por vez, a linguagem somente existe atra-vés de um processo de interações recorrentes que surgem em nossa corporeidade a partir do acopla-mento estrutural que existe entre o indivíduo e o meio .

Assim, a linguagem que se constrói através da corporei-dade faz com que a relação entre o meio e o aluno aconteça a partir do fluido de conversas e interações sociais . Isso faz com que o gesto seja inerente à vida dos alunos . O gesto, por muitas


vezes, fala mais do que a linguagem verbal . Portanto, a educa-ção das crianças pede professores comprometidos, oportuni-zando às crianças um aproveitamento de todas as suas poten-cialidades, além de instigar os estímulo gestual e verbal para intervir nas situações que se apresentem na escola e na vida .

Síntese Conclusiva

A escola é um lugar que pode ser transformado em um espaço de crítica cultural, estimulando o estudante à compreen-são de que tudo que acontece como natural e inevitável precisa ser questionado e pode ser transformado . Desta forma, encon-tramos o multiculturalismo e neste podemos inserir o prefixo “trans” e assim compreendemos o sentido transcultural nas danças tradicionais dos povos, a partir de um olhar sutil para as várias culturas nas quais existe um jogo das diferenças . Neste jogo as regras são definidas nas batalhas sociais por atores que preconizam determinados valores e condutas .

Entende-se que a educação, os currículos escolares e a formação dos professores não podem mais omitir a questão multi/ inter e transcultural dentro do contexto escolar . Muito menos ter um olhar estático . Na visão de Werneck (2008, p . 429), o multiculturalismo “pode consistir na justaposição ou presença de várias culturas em uma mesma sociedade e também na relação entre elas” . Ao ampliar as similaridades das várias culturas que estão interconectadas, o prefixo “trans” atravessa e vai além e, desta forma, percebemos que existe uma rede de relações onde tudo é Um .

Por sua vez, a formação acadêmica é apenas um primeiro estágio de uma longa jornada de conhecimento . No entanto,


muitos egressos não se sentem preparados quando saem da universidade .

Neste capítulo, colocamos a resposta de um estagiário sobre a formação oferecida pela universidade no curso de licen-ciatura em Educação Física . Questionamos a possibilidade de este aluno desenvolver uma pratica pedagógica criativa . Assim ele se posicionou:

[ . . .] Sim, acredito estar preparado a desenvolver uma prática criativa, não vou dizer que é fácil, porém as pedagogias expostas pela entidade em que formei e as experiências obtidas me prepara para uma atuação mais crítica . Proporcionou-me a perceber as transfor-mações que rodeia a sociedade, e a partir da Educação Física discutir, e proporcionar ao aluno a chance de observar os elementos que moldam a sociedade vigente [ . . .]

A partir da resposta deste entrevistado, percebemos que a “crítica” é o foco principal nesta instituição, porém, muitas vezes, a crítica por ser imposta e muitas vezes avaliada ofusca a criatividade . A criatividade vem como algo natural, a partir de uma expressão, formando a identidade do aluno de acordo com suas vivências . Segundo Torre e Moraes (Apud SUANNO, 2013), o conceito de criatividade é emocional e vivencial, onde a sociedade passa por uma grande mudança de sociedade industrial para sociedade de informação . Vendo de forma cole-tiva, a educação é um espaço de grande comunicação e de transformação onde ela pode ser mais criativa .

Nesse processo, de acordo com Alencar & Fleith (2003, p . 98): “a criatividade não ocorre por acaso, senão profundamente


influenciada por fatores ambientais, considerando os momen-tos de criação como resultados de complexas circunstâncias sociais” . A partir disso, devemos também entender que como profissionais atuantes na área da educação, faz-se necessário qualificá-los profissionalmente de maneira que possam desen-volver seu trabalho pedagógico de forma competente e coerente com os novos paradigmas .

Dentre os diversos conhecimentos tratados, questiona-mos os estagiários sobre a importância de trabalhar temas que abrangem várias culturas (multiculturalismo e trancultura-lismo) na educação infantil, uma vez que, de acordo com os PCN’s, um dos itens fala sobre a Pluralidade Cultural na Educação . Como resposta, obtivemos a seguinte colocação: [ . . .] Para os alunos é interessante apreender as várias culturas, vivenciar e respeitar as particularidades de cada cultura . Perce-ber os reflexos históricos que influenciaram determinada cultura, observar o que ainda resta dela, quais reflexos a inova-ção tecnológica perpetua sobre tal [ . . .] . Outro estagiário assim se coloca:

É de grande valia trabalhar o multiculturalismo, até porque está em uma sociedade com inúmeras diferen-ças, sejam em aspectos sociais, políticos, educacionais, regionais, etc . O multiculturalismo vem de forma que mostra ao aluno as várias expressões de nossa socie-dade, onde a partir desses aspectos ele pode conhecer as variadas faces, e pode lidar com elas de forma abran-gente e não sendo apenas centrado em uma e precon-ceituoso com as outras [ . . .] .


A formação do povo brasileiro se deu mediante a composi-ção das várias etnias que dialogaram entre si nos primeiros períodos da nossa colonização . No contexto sociocultural, a escola, em um país como o Brasil, está inserida em uma diversi-dade cultural imensa . Porém, como observado, nem sempre as crianças são apresentadas a sua própria cultura regional e a reali-dade encontrada é de exclusão de vários grupos sociais, gerando uma série de problemas, dentre os quais, o fracasso escolar .

A escola é um lugar que pode ser convertido em um espaço de apreciação cultural, estimulando a crianças à compreensão das suas singularidades, garantindo, desta forma, os funda-mentos e a manutenção das atuações educativas, as quais permitem compreender não só o progresso, mas também o crescimento individual e coletivo .

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ASPECTOS INOVATIVOS DO CURSO DE PÓS-GRADUAçãO LaTo SEnSu EM TRANSDISCIPLINARIDADE E

INTERDISCIPLINARIDADE NA EDUCAçãO E SUAS CONTRIBUIçÕES PARA A FORMAçãO

DE PROFESSORES

Carla Conti de Freitas Patrícia Maria Ferreira Valéria Rosa da Silva

A criação do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Transdisciplinaridade e Interdisciplinaridade na educação considerada um aspecto inovativo da univer-

sidade e alimenta a discussão sobre caminhos para a forma-ção do professor, em especial a formação transdisciplinar de professores dos diferentes níveis de ensino . A discussão sobre os aspectos inovativos gera uma motivação para o incremento na publicação e divulgação do que acontece nos cursos de formação de professores, seja em graduação ou pós-graduação, e contribui na promoção da gestão do conhecimento produ-zido nos cursos de licenciatura . A relevância de se promover a gestão do conhecimento está na constatação de que, embora o conhecimento produzido na área de licenciatura seja disse-minado em eventos e publicações da área, contribuindo para a

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divulgação no local, não há uma sistemática divulgação entre os pares no intuito de possibilitar novas pesquisas e discussões sobre o principal interesse da área que é o ensino .

Estudos sobre a inovação e gestão do conhecimento na área de educação e formação de professores se iniciaram na Universi-dade Estadual de Goiás/Câmpus Inhumas por meio do projeto de pesquisa “A gestão do conhecimento e a formação de profes-sores: aspectos inovativos das atividades da universidade” (FREITAS, 2013), cujo objetivo é analisar o papel das atividades da universidade na criação e difusão do conhecimento na área de formação de professores . Para isso, as ações do referido projeto de pesquisa consideraram a produção e a disseminação de conhecimento relacionadas às ações extensionistas, aos projetos de pesquisa, aos projetos de ensino – especialmente as atividades advindas do projeto de estágio supervisionado dos cursos de Letras e Pedagogia –, e ao curso de pós-graduação Lato Sensu Transdisciplinaridade e Interdisciplinaridade na Educação, cujo foco é a formação continuada de professores .

Ao longo desses anos, pode-se considerar como resultado desse projeto de pesquisa a implantação do Observatório de Ideias da UEG (FREITAS, 2014; 2015), a criação do Núcleo de Pesquisa (REIS, 2015), a produção de trabalhos de conclusão de curso sobre a temática (PRADO, 2015), entre outros, conside-rando que cada uma dessas ações contribui para a construção e divulgação do conhecimento na área de educação e formação de professores e representa um aspecto inovativo das ativida-des da universidade .

Nesse sentido, este capítulo tem como objetivo apresentar o que consideramos aspectos inovativos do curso de pós-graduação Lato Sensu em Transdisciplinaridade e Interdisci-

301Aspectos inovatidos do curso de Pós-gradução Lato Sensu

plinaridade na Educação, considerando a inter-relação entre as suas atividades de ensino, pesquisa e extensão e a sua relevân-cia na criação de conhecimentos na área de formação de profes-sores, contribuindo para a construção de novos conhecimentos que visam solucionar os problemas da realidade educacional por meio da formação continuada de professores .

Para isso, foi realizada uma pesquisa sobre os aspectos inovativos do curso de Pós-graduação Transdisciplinaridade e Interdisciplinaridade na Educação expressos no projeto inicial (SUANNO et al, 2014) e nos relatos dos participantes sobre o curso, que constam nos trabalhos de conclusão de curso da primeira turma, encerrada no final de 2015 .

Como referencial teórico, serão apresentados os conceitos sobre a gestão do conhecimento (SILVA, 2006, 2013; FREITAS, 2015; REIS, 2015) e a formação do professor transdisciplinar (MORAES, 2010), considerando que o curso se destina à capa-citação/formação de professores .

A composição deste capítulo traz, além desta introdução, uma apresentação sobre os pressupostos teóricos que embasa-ram o estudo, uma descrição metodológica e a análise do projeto de curso e dos relatos dos participantes sobre o curso . Como conclusão, apresentamos uma reflexão acerca da contri-buição do curso de pós-graduação para a criação e dissemina-ção de conhecimento na área de formação de professores, destacando os diferenciais do projeto .

Fundamentação Teórica

A gestão de conhecimento produzido na universidade tem reflexo imediato na produção de novos conhecimentos, pois


traz à tona o que a universidade produz e disponibiliza para novas pesquisas . Na área de educação e formação de professo-res, disponibilizar os conhecimentos produzidos pelos pares motiva a ampliação de uma rede de conhecimentos que, ao despertar novos interesses, possibilita a solução de problemas, gerando inovações na área .

Ao considerar a relevância da gestão do conhecimento, nesse caso, na área de educação e formação de professores, promovemos uma ampliação do conhecimento e uma releitura das atividades de ensino, pesquisa e extensão da universidade e da inter-relação entres elas, criando novas práticas e novas formas de ensinar, aprender e entender o processo de formação de professores . Nesse sentido, os estudos sobre gestão do conhecimento destacam seu aspecto “transversal e interdisci-plinar” (SILVA, 2013) .

A formação de professores, em especial a formação do professor transdisciplinar torna-se relevante, pois a

a transdisciplinaridade é uma nova forma de ver e entender a natureza, a vida e a humanidade, isto é, uma nova abordagem científica e cultural e que a transdisci-plinaridade veio como questionadora da abordagem disciplinar e criadora de uma nova forma de pensar, pois, na abordagem disciplinar o conhecimento ofer-tado é fragmentado, dividido em disciplinas, já na abordagem transdisciplinar, o conhecimento é proposto de forma única, para assim o sentido para a existência do universo, da vida e da espécie humana seja encontrado . (FERREIRA; FREITAS, 2015, p . 3)


Moraes (2010) considera, em relação à formação docente na atualidade, que “o perfil desejado é, portanto, de um docente capaz de discernimento, de atitude crítica diante dos proble-mas; é um sujeito pesquisador, interdisciplinar e/ou transdisci-plinar em suas atitudes, pensamentos e práticas” (MORAES, 2010, p . 181) . O docente, para Ferreira e Freitas (2015, p . 4), “é aquele que trabalha em coletividade . Quando se fala em coleti-vidade espera-se não só englobar outros professores em seus projetos, mas pensar em um projeto que envolva os alunos e o ambiente escolar, proporcionando a autoformação, a hetero-formação e a ecoformação” . Entendemos que

esses elementos fundamentais para a formação na abordagem transdisciplinar são apresentados como polos primordiais para o processo formativo dentro da abordagem transdisciplinar, pois a auto, a hetero e a ecoformação auxiliam na efetivação da aprendiza-gem do aluno, ou seja, são dimensões que oferecem respectivamente, apropriação do sujeito de sua própria formação, apropriação dos outros na ação educativo-formativa da pessoa e, por último, forma-ção do meio ambiente material (FERREIRA; FREI-TAS . 2015, p . 4) .

Em relação ao docente e a prática transdisciplinar, Moraes (2010, p . 179) sugere que o docente seja “um sujeito mais atento aos processos auto-organizadores de seus alunos, capaz de olhar para eles e identificar suas necessidades básicas, de intuir suas angústias e de converter tudo isto em subsídios para as atividades de ensino e aprendizagem”, pois o perfil transdisci-plinar docente desejado é de um ser capaz de discernir, ter


atitude crítica diante dos problemas, ser pesquisador, interdis-ciplinar (MORAES, 2010) .

Metodologia

A pesquisa realizada sobre os aspectos inovativos do curso de Pós-graduação Transdisciplinaridade e Interdisciplinari-dade na Educação relaciona-se às atividades do projeto de pesquisa Gestão do Conhecimento e formação de professores: aspectos inovativos das atividades da universidade (FREITAS, 2013) que buscou descrever e analisar as práticas de ensino, pesquisa e extensão que se caracterizam como inovadoras das atividades da universidade . Durante o desenvolvimento da referida pesquisa, foram registradas e analisadas atividades relacionadas ao ensino na graduação, em especial ao Estágio Supervisionado (FERREIRA; FREITAS, 2015); à extensão universitária (PRADO, 2015; PRADO; FREITAS, 2015); à pesquisa, com o projeto de Reis (2015), entre outros, caracteri-zadas a partir de seus aspectos inovativos . Desta forma,

a pesquisa sistematizou e disponibilizou as informa-ções/conhecimento advindos das ações sobre formação de professores da UEG/Câmpus Inhumas que permi-tem o registro e a constante reflexão sobre a relevância da relação entre as atividades de ensino, pesquisa e extensão da universidade sobre a formação de profes-sores, motivando outros estudos que considerem essa temática (FREITAS, 2013) .

Em relação às atividades de ensino e formação de profes-sores, citamos o curso de Pós-graduação Lato Sensu Trans-


disciplinaridade e Interdisciplinaridade na educação, consi-derado um projeto diferenciado e que traz aspectos inovativos para a atividade de ensino relacionada à formação de profes-sores . Para a proposta deste capítulo, foram consideradas as características expressas no projeto inicial (SUANNO et al, 2014) e relatos dos participantes sobre o curso . Quanto às características do curso, podemos citar como inovadoras as seguintes: organização do currículo por eixo temático moti-vado por uma questão problematizadora; a realização de cada eixo por dois professores do curso e eventuais convidados especialistas na temática; a utilização de linguagens variadas na metodologia dos professores e o desenvolvimento das atividades realizadas em ambientes externos à da sala de aula . Quanto aos relatos dos alunos, caracterizados como uma atividade de reflexão e produção sobre as vivências realizadas durante curso, consideramos os que foram apresentados como parte do trabalho de conclusão do curso . A partir disso, analisamos se a participação e a reflexão sobre as referidas atividades indicam uma mudança na forma de pensar a prática docente dos participantes do curso e, ao mesmo tempo, se os aspectos considerados inovativos contribuem de fato com os objetivos do curso e com o processo de formação dos professores .


Aspectos inovativos e sua relação com a formação dos professores

Organização do currículo por eixos temáticos, motivados por uma questão problematizadora

A organização curricular por eixos temáticos traz a possibilidade de discussão entre os temas e conteúdos de forma circular, pois os eixos não são desenvolvidos de forma compacta e sequente . Eles se interligam e se complementam, proporcionando uma ampliação dos conceitos e vivências por meio da colaboração entre eles . Os relatos dos participantes ilustram a percepção deles quanto à mudança na forma de pensar a docência em decorrência de organização do currí-culo por eixos temáticos:

cada eixo passado me mostrou que, com atitudes inovadoras, podemos fazer a diferença nas salas de aula . Temos que deixar o aluno fazer parte do processo do conhecimento, pois a ação transdisciplinar propõe integrar o sujeito como protagonista do seu conheci-mento, sendo assim, ele deve fazer conhecer e compreender o objeto estudado, para colocar seus sentimentos e angústias sobre o seu aprendizado . (Participante C)

A questão problematizadora, motivadora de cada eixo, possibilitou que os professores conhecessem o ponto principal de discussão de cada eixo que aconteceu concomitante ao seu . Isso possibilitou o resgate de conceitos e aprofundamento de estudos que eram comuns aos eixos .


Dois professores em cada eixo

A realização de cada eixo temático por dois professores também pode ser considerado um aspecto inovativo deste curso . A decisão de que cada eixo pudesse ser ministrado por dois professores trouxe um enriquecimento ao curso em pelo menos dois aspectos: um exercício de colaboração entre os pares e a possibilidade de compartilhar os conhecimentos de diferentes áreas relacionados aos conteúdos e temas do referido eixo . No trecho a seguir, a impressão de uma participante sobre as atitudes reconhecidamente transdisciplinares, como essa de professores de áreas diferentes ou afins contribuírem para a discussão de um tema:

A cada eixo trabalhado, consigo perceber que muitas das minhas atitudes eram transdisciplinares, mas não tinha essa consciência; e o pouco que conheci já posso mudar outras atitudes que não eram transdisciplina-res . Afirmo isso porque foi a partir desse curso que pude conhecer mais sobre o ser humano, mas não digo ser humano homem, mas sim o real sentido do SER HUMANO, aprendi que a convivência é necessária, que tenho que questionar e acima de tudo provocar, instigar as pessoas a minha volta . (Participante B)A partir das propostas de trabalho dos professores, éramos provocados a pensar fora da caixa, a se libertar das barreiras epistemológicas enraizadas em nós e ainda atuar com esta nova postura em nosso local de trabalho: a sala de aula . (Participante A)


A utilização de linguagens variadas na metodologia dos professores

Outro aspecto que consideramos inovativo é a metodolo-gia utilizada nas aulas . Os professores buscaram utilizar linguagens variadas durante os eixos temáticos, a saber: música, teatro, vídeos, poesias, imagens, histórias infantis, filmes de curta-metragem, paródias, textos literários, dança e outras . Nas palavras de uma aluna, os professores se preocuparam em “utilizar recursos e linguagens diferenciadas, pensando na individualidade de cada aluno” (Participante C) .

Nesse sentido, Petraglia (2012, p . 136), ressalta que para se articular os saberes necessários a se aprender e ensinar na escola, “é importante que o professor considere as peculiarida-des de cada sujeito estudante, já que cada um é um universo de possibilidades e perspectivas” . Isso significa considerar “os diferentes tipos de inteligências, hábitos, vivências, histórias de vida, culturas que precisam ser instigadas de maneiras diver-sas” (PETRAGLIA, 2012, p . 136) .

As impressões de uma aluna foram que a metodologia utilizada pelos professores foram “quase uma explosão sinesté-sica” (Participante C) . Outro aluno ressalta como o uso de linguagens variadas possibilita maior participação nas aulas: “não há como ficar só na plateia, o palco está para todos . O espetáculo nunca morre, pois os atores (professores e estu-dantes) estão sempre em cena, em produção e reprodução de um processo que não pode parar” (Participante D) .


Atividades realizadas em ambientes externos à sala de aula

Da realização de atividades em ambientes externos à sala de aula, destacamos o processo de reflexão e da disposição para a mudança na forma de pensar a prática docente que pode resultar em uma efetiva prática docente transdisciplinar . Essas atividades incluem as realizadas no pátio, nos arredores do Câmpus, nos eventos científicos e nas visitas à Cidade de Goiás e a Goiânia .

Os diferentes cenários experimentados, as diferentes culturas compartilhadas nos proporcionaram o enten-dimento de que a educação tradicional com seus rígi-dos métodos de transmissão e memorização de conteúdo foi importante a seu tempo, não há evolução sem que haja um início, as transformações acontecem a partir do que já existe do que já é real, portanto diante dos novos significados e novos desafios da educação, mostra-se necessário a mudança . (Participante A)

Como parte da articulação entre os eixos, foram realiza-das atividades externas em conjunto . No trecho a seguir, desta-camos a percepção da participante quanto às atividades desen-volvidas em outros espaços, com o intuito de promover a compreensão da dimensão dos espaços de e para aprendiza-gem, que não se limitam à sala de aula .

Sem dúvida duas das maiores experiências vivenciadas nessa pós não ocorreram dentro das quatro paredes da sala de aula . Visitar a Cidade de Goiás, Patrimônio Histórico da Humanidade, proporcionou aos alunos


um mergulho real na história, pois viram com os próprios olhos as belezas que a antiga capital reserva a seus visitantes . Ver as ruas de pedra, andar sobre elas e compreender o seu significado para a História e mora-dores foi enriquecedor, vivenciar emoções que foram lidas em livros foi uma experiência marcante, compreender as casas de parede meia e ir além do que se vê, enxergá-las cochichando umas com as outras promoveu um sentido mais profundo do que fora estu-dado até ali . A visita ao Circo Laheto foi um mergulho no encanto do circo, foi trazer à memória momentos marcantes da infância, ressignificar objetos e situações vivenciadas e poder experimentar as atrações do circo . Todos os alunos que participaram do evento enquadra-ram a experiência como fantástica, nenhum foi o mesmo dali em diante . (Participante A)


Como conclusão, a contribuição desse curso de pós-gradua-ção para a criação e disseminação de conhecimento se dá a partir de duas situações . A primeira, da compreensão sobre a necessi-dade de a universidade se reinventar, criando novas formas de resolver os problemas impostos pela atualidade . A segunda, o quanto a formação transdisciplinar dos professores pode contri-buir na realização de atividades inter-relacionadas e na articula-ção entre ensino, pesquisa e extensão .

Os resultados das pesquisas sobre gestão de conhecimento e os aspectos inovativos das atividades da universidade, gera-dos a partir de projetos de pesquisa realizadas desde 2013 na


Universidade Estadual de Goiás, Câmpus Inhumas, compõem um acervo de novos conhecimentos que quando disponibiliza-dos para a comunidade, geram outros saberes, destacando a capacidade da universidade de se reinventar e contribuir na formação das pessoas, fazendo com que elas sejam capazes de agir no contexto em que vivem para assim solucionarem os problemas, baseados na ética e nos valores humanos .

ReferênciasFREITAS, Carla Conti de Freitas . Gestão do conhecimento e a formação de professores: aspectos inovativos das atividades da universidade . Projeto de Pesquisa: Universidade Estadual de Goiás, 2013 .

______ . A implantação do Observatório de Ideias da UEG . Relatório de Estágio Pós-Doutoral . Porto/ Portugal: Universidade do Porto, 2014 .

______; SILVA, Armando Malheiro . The implementation of “Observatório de Ideias da UEG – Information Management in Education and Training” . Anais do 12th International Conference On Information Systems & Technology Management – CONTECSI . São Paulo: USP, 2015, p . 4097-4104 .

FERREIRA, Patrícia Maria; FREITAS, Carla Conti . Professoras de Estágio do Curso de Letras: aspectos inovativos de uma prática transdisciplinar . XII Congresso Nacional de Educação EDUCERE . Curitiba: PUC-PR, 2015 .

MORAES, Maria Cândida . Complexidade e transdisciplinaridade na formação docente . In:

MORAES, Maria Cândida; NAVAS, Juan Miguel Batalloso (org) . Complexidade e transdisciplinaridade em educação: teoria e prática docente . Rio de Janeiro: Wak, 2010 .

PETRAGLIA, Izabel . Educação e Complexidade: os sete saberes na prática pedagógica . In: MORAES, Maria Cândida; ALMEIDA, Maria da Conceição de . Os sete saberes necessários à Educação do presente: por uma educação transformadora . Rio de Janeiro: Wak Editora, 2012 .

REIS, Marlene Barabosa de Freitas . Relatório de Estágio Pos-Doutoral . Porto/Portugal: Universidade do Porto, 2015 .


SILVA, Armando Malheiro . A informação: da compreensão do fenômeno e construção do objeto científico . Porto/Portugal: Afrontamento, 2006 .

______ . A Gestão da Informação como área Transversal e Interdisciplinar: Diferentes perspectivas e a importância estratégica da “tipologia informacional” . Goiânia: Senai/Fatesg . Coletânea Luso-Brasileira 4, 2013 .

SUANNO, Marilza Vanessa Rosa; FREITAS, Carla Conti de; GRANGEIRO, Alessandra; MELO, Kenia; REIS, Marlene; OLIVERIA, Valdirene; JUNQUEIRA, Lilian . Transdisciplinaridade e Interdisciplinaridade na Educação . Projeto de Pós-Graduação Lato Sensu . Universidade Estadual de Goiás, 2014 . Disponível em: www .prp .ueg .br

PRADO, Alinny . Evento científico e a formação de professores: caso do ENFOPLE – Encontro sobre Formação de Professores de Línguas Estrangeiras . Trabalho de Conclusão de Curso de Letras . Inhumas/Goiás: Universidade Estadual de Goias, 2015 .

______; FREITAS, Carla Conti . Evento Científico na Formação de Professores: entre a exigência curricular e a construção do conhecimento . Anais do XI Encontro sobre formação de professores de línguas estrangeiras . Inhumas/Goiás: Universidade Estadual de Goiás, 2015, p . 161-169)

Sobre os autores

ALESSANDRA CARLOS COSTA GRANGEIROalessandraccosta@gmail .com Professora do Curso de Letras da Universidade Estadual de Goiás – UEG . Doutora em Letras e Linguística pela Universidade Federal de Goiás (2011) . Mestre em Letras e Linguística pela Universidade Federal de Goiás (1999) . Graduação em Letras pela Universidade Federal de Goiás (1995) . Parecerista ad hoc da UEG e Membro do Conselho Editorial da REVELLI – Revista de Educação, Linguagem e Literatura (UEG Câmpus Inhumas) . Professora do Programa de Pós-Graduação Lato Sensu Transdisciplinaridade e Interdisciplinaridade na Educação (UEG Câmpus Inhumas) . Tem experiência na área de Letras, com ênfase em Literatura Brasileira e Americana, atuando, numa perspectiva transdisciplinar, principalmente nos seguintes temas: tempo, espaço, memória e história . A ênfase da atuação é a interação entre a cultura erudita e a popular com a interlocução da comunidade da qual os alunos fazem parte, promovendo a inter-relação entre a cultura, a história e a obra literária . Lattes: http://lattes .cnpq .br/1523980928704200

CARLA CONTI DE FREITASProfessora do Curso de Letras e Diretora do Câmpus Inhumas da Universidade Estadual de Goiás . Pós-Doutorado na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, Doutora em Políticas Públicas, Estratégica e Desenvolvimento, UFRJ/UEG (2013), Mestre em Letras e Linguística pela Universidade Federal de Goiás (2003), Especialista em Psicopedagogia, Avaliação Instituição e Docência Universitária


e Graduada em Letras Português/Inglês pela Universidade Federal de Goiás . Membro do Grupo de Pesquisa EGESI (CNpQ/UEG) . Professora do Programa de Pós-Graduação Lato Sensu Transdisciplinaridade e Interdisciplinaridade na Educação (UEG – Câmpus Inhumas) . Tem experiência na área de Educação, atuando principalmente nos seguintes temas: Educação Superior, Formação de Professores, Transdisciplinaridade, Sustentabilidade, Gestão do Conhecimento . Lattes: http://lattes .cnpq .br/5357556016311932

CLÁUDIA DO NASCIMENTO claudia_pedagogia2012@hotmail .com Graduada em Pedagogia (2015-UEG); Especialista em Educação Especial Inclusiva (2015-AVM Faculdade Integrada); Logística Empresarial com Ênfase em Operações Logísticas (2008-SENAI-FATESG); Planejamento de Transportes (2005-CEFET-GO) .Lattes: http://lattes .cnpq .br/5257409231727952

CRISTIANE ROSA LOPEScrisrosalopes@gmail .com Professora do Curso de Letras da Universidade Estadual de Goiás – UEG . Doutora em Letras e Linguística pela Universidade Federal de Goiás (2008) . Doutorado sanduíche realizado na Universidade de Birminghan – Inglaterra (2005) . Mestre em Letras e Linguística pela Universidade Federal de Goiás (2002) . Graduação em Letras pela Universidade Federal de Goiás (1996) . Membro do Conselho Editorial da REVELLI – Revista de Educação, Linguagem e Literatura (UEG Câmpus Inhumas) . Membro do Grupo de Pesquisa Ensino e Aprendizagem de Língua Estrangeira (UFG) coordenado pelo Dr . Francisco José Quaresma de Figueiredo e pela Dra . Maria Cristina Faria Dalacorte Ferreira . Professora do Programa de Pós-Graduação Lato Sensu Transdisciplinaridade e Interdisciplinaridade na Educação (UEG Câmpus Inhumas) . Professora do Programa de Pós-Graduação Lato Sensu Linguagem, Letramento e Cibercultura na Educação Básica (UEG Câmpus Belos) . Tem experiência na área

315Sobre os autores

de Linguística Aplicada, atuando principalmente nos seguintes temas: Ensino de Línguas, Formação de Professores, Educação Intercultural, Educação das Relações Étnico-Raciais . Lattes: http://lattes .cnpq .br/5818321410864812

JOãO HENRIqUE SUANNO suanno@uol .com .br Professor da Universidade Estadual de Goiás – UEG . Pós-Doutor em Educação pela Universidade de Barcelona – 2014 . Doutor em Educação pela Universidade Católica de Brasília (2013) . Doutorado sanduíche realizado na Universidade de Barcelona (2011/2012) . Mestre em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (2006) . Graduação em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (1991) . Membro do Grupo de Pesquisa ECOTRANSD – Ecologia dos Saberes e Transdisciplinaridade (UCB) coordenado pela Dra . Maria Cândida Moraes . Membro do Grupo de Pesquisa em Rede Internacional Investigando Escolas Criativas e Inovadoras (UFT) coordenado pela Dra . Maria José de Pinho e Dr . João Henrique Suanno . Membro da Rede Internacional de Ecologia dos Saberes: uma comunidade de conhecimento para uma nova consciência – RIES (Coord . UCB/Brasil e UB/Espanha) e da Rede Internacional de Escolas Criativas: construindo a escola do século XXI – RIEC (Coord . UB/Espanha e Unibave/Brasil) . Professor do PPGSS Interdisciplinar em Educação, Linguagem e Tecnologias – MIELT/UEG . Professor do Programa de Pós-Graduação Lato Sensu Transdisciplinaridade e Interdisciplinaridade na Educação (UEG – Câmpus Inhumas) . Tem experiência na área de Educação, atuando principalmente nos seguintes temas: Criatividade, Práticas Educativas Criativas, Escola Criativa, Formação de Professores, Epistemologia da Complexidade, Transdisciplinaridade, Interdisciplinaridade, Ecoformação . Lattes: http://lattes .cnpq .br/0083918417985786


LINDALVA PESSONI SANTOS lindalpessoni@yahoo .com .br Professora titular da Universidade Estadual de Goiás, Câmpus Inhumas e professora da Rede Estadual de Educação do Estado de Goiás . Mestre em Educação pela UFG (2011); Especialista em Formação sócio– econômica do Brasil (2002-UNIVERSO); Linguagem e Matemática das séries iniciais do Ensino Fundamental (1997-UFG); Planejamento Educacional (1993-UNIVERSO); graduada em Pedagogia (1989-UFG) . Membro do Grupo de Pesquisa em Rede Internacional Investigando Escolas Criativas e Inovadoras (UFT) coordenado pela Dra . Maria José de Pinho e Dr . João Henrique Suanno (UEG) e coordenadora do Projeto de Pesquisa Escolas criativas e inovadoras . Parecerista da REVELLI – Revista de Educação, Linguagem e Literatura da (UEG-Inhumas) e Cadernos de Educação, Tecnologia e Sociedade do Instituto Federal de Ciência e Tecnologia de Goiás, Câmpus Inhumas . Professora do Programa de Pós-Graduação Lato Sensu Transdisciplinaridade e Interdisciplinaridade na Educação e Linguagem, Cultura e Ensino (UEG-Câmpus Inhumas) . Tem experiência na área de Educação, atuando principalmente nos seguintes temas: ensino superior, formação docente, práticas pedagógicas, avaliação, educação infantil, gestão escolar, educação interdisciplinar e transdisciplinar . Lattes: http://lattes .cnpq .br/8331676592474890

MARIA CRISTINA DE FREITAS BONETTI mcbonetti@gmail .comLicenciada em Educação Física (Eseffego-UEG), Mestre e Doutora em Ciências da Religião (PUC-Goiás) . Pós-doutoranda em História (PPFH-UFG) . Professora da Universidade Estadual de Goiás (DES IV), onde atua, além do Ensino, na Pesquisa (PRP) e na Extensão (PRE) . Professora do Programa de Pós-Graduação Lato Sensu Transdisciplinaridade e Interdisciplinaridade na Educação (UEG Câmpus Inhumas) . Tem experiência na área de Festas e Danças da Cultura Popular Tradicional e Patrimônio Imaterial, com ênfase em Danças Regionais do Brasil, atuando principalmente nos

317Sobre os autores

seguintes temas: Danças populares e Folclóricas de Goiás, Festas da Religiosidade Popular em Goiás, Multiculturalismo, Memória, Tradição, Identidade e Performances Culturais . Atua em Círculo de Mulheres com ênfase nas Danças Circulares Sagradas e Sagrado Feminino . Membro participante do International Dance Council– CID/UNESCO, e Conselheira do Conselho de Patrimônio Histórico, Artístico e Ambiental do município de Goiânia . Focalizadora de Danças Circulares Sagradas . Analista em Cultura na Secult Municipal– Goiânia . Bolsista FAPEG– Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás, do edital 10/2010 . Lattes: http://lattes .cnpq .br/4951445474151712

MARILzA VANESSA ROSA SUANNO marilzasuanno@uol .com .br Professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás – UFG . Doutora em Educação pela Universidade Católica de Brasília (2015) . Doutorado sanduíche realizado na Universidade de Barcelona (2011/2012) . Mestre em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (2006) . Graduação em Pedagogia pela Universidade Federal de Goiás (1994) . Membro do Grupo de Pesquisa ECOTRANSD – Ecologia dos Saberes e Transdisciplinaridade (UCB) coordenado pela Dra . Maria Cândida Moraes . Membro do Grupo de Pesquisa em Rede Internacional Investigando Escolas Criativas e Inovadoras (UFT) coordenado pela Dra . Maria José de Pinho e Dr . João Henrique Suanno . Membro da Rede Internacional de Ecologia dos Saberes: uma comunidade de conhecimento para uma nova consciência – RIES (Coord . UCB/Brasil e UB/Espanha) e da Rede Internacional de Escolas Criativas: construindo a escola do século XXI – RIEC (Coord . UB/Espanha e Unibave/Brasil) . Membro do Núcleo de Formação de Professores da Faculdade de Educação (UFG) . Professora do Programa de Pós-Graduação Lato Sensu Transdisciplinaridade e Interdisciplinaridade na Educação (UEG – Câmpus Inhumas) . Tem experiência na área de Educação, atuando principalmente nos seguintes temas: Educação Básica, Educação Superior, Didática, Formação de Professores,


Estágio Supervisionado, Epistemologia da Complexidade, Transdisciplinaridade, Interdisciplinaridade . Lattes: http://lattes .cnpq .br/7736117519324293

MARLENE BARBOSA DE FREITAS REISmarlenebfreis@hotmail .com Professor da Universidade Estadual de Goiás – UEG . Pós-doutora em Gestão da Informação e Conhecimento pela Universidade do Porto, Portugal (2015) . Doutorado em Políticas Públicas, Estratégias e Desenvolvimento pela UFRJ (2013) . Mestrado em Ciências da Educação Superior pela Universidad de La Habana – Cuba (2003) . Graduação em Pedagogia pela Universidade Federal de Goiás (1989) . Professora aposentada da Secretaria Estadual de Educação de Goiás onde atuou 28 anos como professora e coordenadora pedagógica da Educação Básica . Foi bolsista da FAPEG (Fundação de Amparo à Pesquisa no Estado de Goiás) no período de junho de 2011 a outubro de 2013 . Foi Coordenadora Adjunta de Pesquisa e Pós Graduação da Universidade Estadual de Goiás, Câmpus Inhumas . Atualmente é professora titular da Universidade Estadual de Goiás, Regime de Tempo Integral de Dedicação à Docência e à Pesquisa (RTIDP) . Docente do quadro permanente do Mestrado Interdisciplinar em Educação, Linguagem e Tecnologias (MIELT) . Professora do Programa de Pós-Graduação Lato Sensu Transdisciplinaridade e Interdisciplinaridade na Educação (UEG – Câmpus Inhumas) e Coordenadora do Curso de Pedagogia na UEG, Câmpus Inhumas . Bolsista do Programa de Bolsa de Incentivo ao Pesquisador (BIP) da UEG . . Parecerista ad hoc da UEG e Membro do Conselho Editorial da REVELLI – Revista de Educação, Linguagem e Literatura da UEG-Inhumas . Membro do grupo de pesquisa "Formação de professores e saberes pedagógicos " cadastrado no Diretório dos Grupos de Pesquisa no Brasil, CNPq . Tem experiência na área de Educação, com ênfase em ensino, coordenação pedagógica e pesquisa . Atua principalmente nos seguintes temas: Políticas públicas, Formação de Professores, Didática e prática de ensino, Diversidade, Educação inclusiva, política educacional, prática pedagógica . Lattes: http://lattes .cnpq .br/9396555981788500

319Sobre os autores

OSVALDO JOSé SOBRALsobral .osvaldo@gmail .com Professor da Faculdade de Inhumas – FacMais . Professor da Universidade Estadual de Goiás (UEG), Câmpus Inhumas . Professor do Programa de Pós-Graduação Lato Sensu Transdisciplinaridade e Interdisciplinaridade na Educação (UEG, Câmpus Inhumas) . Mestre em Educação pelo Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação, da Universidade Federal de Goiás – UFG (2008) . Especialista em Docência Universitária, pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás – PUC-GO (2001) . Graduação em Psicologia pela PUC-GO (1994) . Tem experiência na área de Educação, atuando principalmente nos seguintes temas: Psicologia da Educação – Desenvolvimento e Aprendizagem, Educação e Diversidade, Cinema e Educação, Metodologia Científica, Pesquisa em Educação, Formação de Professores e Representações Sociais . Lattes: http://lattes .cnpq .br/9288222324283511

POLIANA CRISTINA DA SILVALicenciada em Educação Física (Eseffego-UEG/2015) . Lattes:

VALéRIA ROSA DA SILVAvaleriarosa .vr@gmail .com Mestre em Estudos Linguísticos pela Universidade Federal de Goiás (UFG) . Professora efetiva da Universidade Estadual de Goiás (UEG) em regime de Tempo Integral de Dedicação à Docência e à Pesquisa (RTIDP) . Professora dos Programas de Pós-Graduação Lato Sensu: Transdisciplinaridade e Interdisciplinaridade na Educação e Docência Universitária (UEG – Câmpus Inhumas) . Pesquisas e publicações nas áreas de Formação de Professores, Letramento Crítico, Bilinguismo e Educação Bilíngue . Lattes: http://lattes .cnpq .br/1341445501293413


YARA FONSECA DE OLIVEIRA E SILVA yarafonsecas09@gmail .comProfessora da Universidade Estadual de Goiás – UEG . Doutora em Políticas Públicas, Estratégias e Desenvolvimento (UFRJ/PPED/UEG, 2014), Pós-doutora pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto – Portugal . Mestre em Educação pela Universidade Federal de Goiás (FE/UFG, 2005) . Especialista em Psicopedagogia (ULBRA/RS, 1998) e em Avaliação Institucional (UEG/GO, 2005) . Graduada em Pedagogia (PUC-GO, 1988) . Atua como professora titular do Câmpus Aparecida de Goiânia (UEG) em Regime de Tempo Integral de Dedicação à Docência e à Pesquisa (RTIDP), no Mestrado Interdisciplinar em Educação, Linguagem e Tecnologias (MIELT/UEG), Professora dos Programas de Pós-Graduação Lato Sensu: Transdisciplinaridade e Interdisciplinaridade na Educação e Docência Universitária (UEG – Câmpus Inhumas), de Gestão Estratégica em Logística (UEG – Câmpus Senador Canedo) e do MBA em Gestão de Negócios (Câmpus Aparecida de Goiânia – UEG) . Experiência na área de Educação e pesquisadora dos temas: políticas públicas, políticas educacionais, formação de professores .Lattes: http://lattes .cnpq .br/1269420694190937

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIáSBR-153 – Quadra área, Km 99 – 75 .132-903 – Anápolis-GO

www.ueg.br / Fone: (62) 3328-1181

2016Impresso no Brasil / Printed in Brazil

SOBRE O LIVRO Formato: 15x21cm Tipologia: Minion Pro Papel de Miolo: Off-Set 75g Papel de Capa: Cartão Supremo Número de Páginas: 322 Tiragem: 500 Impressão: O X da Cultura

CAPA Obra: Fluir criativo Artista plástica: Maria Glória Ditrich Técnica: Óleo sobre tela Dimensões: 80x90cm Data de criação: 2013

razão sensível e complexidade na formação de professores · 2018-01-18 · uma aproximação à...

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