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Raphael Padula INFRA-ESTRUTURA I: TRANSPORTES Fundamentos e propostas para o Brasil

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Raphael Padula

INFRA-ESTRUTURA I:

TRANSPORTES

Fundamentos e propostas para o Brasil

Raphael Padula

TRANSPORTES

Fundamentos e propostas para o Brasil

Fevereiro de 2008

Clóvis Nascimento

C ésar B enjamin

C onfea - Super intendência de C omunicação e Market ingDia log C omunicação e Eventos

Luana Lima

C oronár io Editora Gráf ica Ltda

C oordenação

E dição

Produção Executiva

Ar te da capa

E ditoração e diagramação

Impressão

© R aphael Padula , 2008D i r e i t o s a d q u i r i d o s p e l o C o n s e l h o F e d e r a l d e E n g e n h a r i a ,

A r q u i t e t u r a e A g r o n o m i a - C o n f e awww.confea .org .br

S ér ie Pensar o Bras i l e C onstruir o Futuro da Nação

1 a edição, fevereiro de 2008Tiragem: 5000 exemplares

P125i Padula , R aphael

Transportes – fundamentos e propostas para o Bras i l . - Bras í l ia : C onfea , 2008.

215p. – (Pensar o Bras i l - C onstruir o Futuro da Nação)

1.Transporte – Infra-estrutura . I . Títu lo. I I . S ér ie

Sumário

ApresentaçãoIntrodução

I. FundamentosInfra-estrutura de transportes: importância, objetivos e ações • Os modais de transporte e a intermodalidade • Logística e produtividade

II. Situação dos transportes no BrasilA matriz de transportes • Transporte de cargas • Transporte de passageiros • Logística • Analisando os modais • Transporte rodoviário • Transporte ferroviário • Transporte aquaviário • Transporte dutoviário • Transporte aéreo • Financiamento da infra-estrutura de transportes: Estado versus mercado

III. Eixos viários e um plano de açãoUm plano de ação nos transportes • O planejamento de transportes no atual governo: o PNLT e o PAC • Os eixos viários e um plano de obras • Os espaços viários continentais e territoriais • Principais eixos viários e plano da ação viário • Irrigação econômica • Indução ao desenvolvimento • Penetração nos espaços territoriais da cordilheira dos Andes e do litoral Pacífico • Ações complementares

IV. Considerações gerais sobre a integração sul-americana e a IIRSAO quadro geral • A Iniciativa para a Integração da Infra-Estrutura Regio-nal Sul-Americana (IIRSA)

V. Breves considerações finais

Bibliografia

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Apresentação

Chegamos ao terceiro livro da nossa série sobre problemas brasi-leiros, produzidos pelo Projeto Pensar o Brasil e Construir o Futuro da Nação. Os dois primeiros tratavam de regiões: Amazônia, soberania e desenvolvimento sustentável, de Márcio Henrique Monteiro de Castro, e Semi-Árido, uma visão holística, de Roberto Malvezzi. Neste, destacamos a Matriz de Transportes, um segmento fundamental da infra-estrutura.

A escolha dos temas, com alternância de território e setores, não é casual. Depois de mais de vinte anos em que predominaram ampla-mente os debates sobre questões monetárias e financeiras, é hora de voltarmos a prestar atenção às características permanentes da Nação. Muito mais do que as movimentações do capital volátil, a população, a economia física, a disponibilidade de recursos naturais, o Estado e a posição do país na geopolítica mundial são os elementos decisivos para se pensar a necessária retomada de um projeto nacional. Debruçados sobre esses temas, verificamos a cada passo quanto resta a fazer.

Os descaminhos da história do Brasil estão registrados fisicamente na infra-estrutura de transportes. Durante séculos ela serviu, basica-mente, para ligar regiões exportadoras aos portos, de modo a apoiar o envio de matérias-primas, minérios e alimentos para o sistema in-ternacional. Este era o nosso lugar. No século XX, ela foi alterada pela implantação da indústria automobilística, que demandava estradas de rodagem, e pela construção de Brasília, que finalmente criou um pólo interior para onde passaram a convergir os caminhos.

A herança desse tempo ainda predomina. Até hoje, a modalidade rodoviária, cara e poluente, responde por mais de 95% do transporte de passageiros e por mais de 60% do transporte de cargas. Permaneceram atrofiadas as potencialidades dos modos ferroviário e aquaviário, que, no entanto, poderiam ter papel central nos deslocamentos interiores de um país-continente dotado de gigantescas bacias hidrográficas. A inter-

modalidade – um dos segredos de uma matriz eficiente – deixa, assim, de existir. Os prejuízos se contam em bilhões, todos os anos. Raphael Padula cita, neste trabalho, um estudo da Universidade Federal do Rio de Janeiro, de 2002, que traz uma informação chocante: ao longo das cadeias produtivas, as empresas brasileiras mantêm em torno de US$ 118 bilhões parados em excesso de estoque, por causa das ineficiências do setor de transportes.

A inércia de uma matriz de transportes é enorme. Alterá-la exige investimentos gigantescos e de longo prazo. Isso remete, inevitavelmen-te, ao papel do Estado, pois, agindo por si, o setor privado não tem nem escala nem visão de conjunto, no espaço e no tempo, para liderar tama-nha transformação. No último período da nossa história, porém, o Es-tado brasileiro perdeu capacidade de investimento e abriu mão de suas funções estratégicas. O último Plano Viário Nacional data de 1973.

Muitos consideram que essa inação é virtuosa. Mas ela fere de morte toda a economia nacional. O setor de transportes, por exemplo, não produz produtos, produz a própria produtividade. Nenhuma em-presa, isoladamente, pode superar gargalos assim.

Ao entregar esta série de textos sobre o Brasil aos profissionais do Sistema, a professores e estudantes, a jornalistas, a parlamentares e ou-tras autoridades, o Confea espera contribuir para a elevação da qualida-de dos debates, tendo em vista construir o futuro da Nação.

Brasília, fevereiro de 2008

Marco Túlio de MeloPresidente do Confea

Clovis F. Nascimento FilhoCoordenador do Projeto Pensar o Brasil e Construir o Futuro da Nação

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O Brasil é um país continental, com aproximadamente 8,5 milhões de km2, dotado de grande extensão de vias hídricas potencialmente nave-gáveis e 7.500 km de costa atlântica. Abriga regiões diversas, tanto em termos de condições geográficas quanto econômicas e sociais. Seu ter-ritório equivale a 47% da América do Sul. Seu produto interno bruto (PIB) ultrapassa a metade do produto da região.

A infra-estrutura de transportes é fundamental para o desenvol-vimento de um país com essas dimensões. É um elemento-chave para constituir um mercado interno integrado e também para ligá-lo ao mer-cado externo. É vital para a eficiência de toda a economia: investimentos em transportes, ao diminuírem custos e distâncias, não criam produtos, criam a própria produtividade. Têm grandes efeitos multiplicadores em toda a cadeia produtiva, propiciando o desenvolvimento de setores eco-nômicos e de regiões. Por tudo isso, e por sua natureza pública, o setor precisa fazer parte das políticas de Estado. Não pode ser conduzido ao sabor de interesses privados.

Introdução

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Ao longo da nossa história, o oceano Atlântico desempenhou um papel integrador. A colonização portuguesa estabeleceu pontos de cone-xão no litoral, a partir dos quais o interior do continente foi explorado e ocupado. Não havia preocupação em integrar entre si os núcleos urba-nos e/ou econômicos do próprio país: as ligações Norte-Sul, por exem-plo, nunca foram estimuladas, pois a principal preocupação era facilitar a exportação de riquezas para a Europa. A comunicação entre regiões se fazia pelo mar ou, em menor escala, pelas bacias hidrográficas. A infra-estrutura viária e de comunicações foi articulada a partir dos portos, tendo em vista a exportação, e assim continua, predominantemente, até hoje.

Até a década de 1930, a cabotagem foi o principal modal para o transporte de cargas a granel. As rodovias passaram a receber grandes investimentos a partir dessa década, o que possibilitou sua rápida ex-pansão e sua predominância, desde então, na matriz de transportes. Nas três preocupações centrais da chamada Era Vargas (1930-1990) – inte-gração, industrialização e urbanização –, o incremento do transporte rodoviário era considerado fundamental, fosse para integrar mercados com rotas mais modernas, fosse para desenvolver o interior do país. A cabotagem e os demais modais perderam participação na movimenta-ção de cargas. Entre 1928 e 1955, a malha rodoviária cresceu cerca de 400%, enquanto a malha ferroviária, por exemplo, cresceu apenas 20%.

A construção de Brasília procurou mudar esse eixo de transportes voltado para fora. Instalou-se um pólo irradiador de vias de conexão por dentro do continente, criando-se uma alternativa ao transporte pela via marítima, que se mostrou frágil durante a Segunda Guerra Mundial, quando navios brasileiros foram torpedeados na costa nordestina.

Pretendia-se mais do que isso. Com o ciclo da industrialização, no segundo governo Vargas, era necessário expandir o dinamismo do eixo Sul-Sudeste, de modo a envolver as regiões Centro-Oeste, Norte e Nor-deste. Brasília encontra-se no centro geográfico do país, que também é o

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centro das nossas três principais bacias hidrográficas: Paraná-Prata, São Francisco e Amazonas (Tocantins-Araguaia). A necessidade de compa-tibilizar a rápida industrialização (na qual o nascente complexo metal-mecânico desempenhava um papel central) e a integração do interior do país gerou o estímulo às rodovias e a concentração espacial e funcional da renda, principalmente em benefício das regiões Sudeste e Sul.

A implantação da indústria automobilística na década de 1950 determinou a consolidação e a prevalência do transporte rodoviário. Esse modal – caracterizado pela agilidade, flexibilidade e capacidade de pronta resposta – passou a predominar na nossa matriz de transportes, possibilitando o deslocamento de cargas para regiões mais distantes.

Hoje, a modalidade rodoviária responde por mais de 95% da ma-triz de transporte de passageiros e mais de 60% da matriz de transporte de cargas. É mais cara, em relação aos modais ferroviário e aquaviário, o que torna necessário reestruturar toda a matriz, tendo em vista o futuro. No entanto, tal não se faz: há quase duas décadas prevalece a falta de planejamento e de investimentos, com ampla predominância de uma visão de curto prazo que privilegia necessidades de mercado, desvincu-lada de qualquer visão estratégica. Os problemas do setor se aprofunda-ram, dificultando qualquer mudança estrutural.

O último Plano Viário Nacional foi elaborado em 1973. Precisa ser totalmente revisto, de preferência com um processo participativo que envolva a sociedade brasileira. Independentemente disso, é necessário apresentar desde logo um conjunto de projetos estruturais que são im-prescindíveis para o desenvolvimento equilibrado do país e para o for-talecimento do mercado interno.

O sistema de transportes na América do Sul também se caracteriza por articular as regiões de forma frágil e precária. A interligação entre os centros produtores e consumidores é ruim. A infra-estrutura está voltada para fora, privilegiando a exportação de commodities primárias. Assim como no Brasil, as poucas e precárias conexões existentes se dão

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predominantemente pelo modal rodoviário, o que faz dos transportes um obstáculo significativo – maior que as tarifas aduaneiras – à integra-ção dos mercados da região.

Este estudo pretende organizar uma visão geral do setor de trans-portes no Brasil, identificando os principais problemas e as principais causas desses problemas. Faremos comparações com países com carac-terísticas geográficas similares às do Brasil, ou seja, países continentais, principalmente os Estados Unidos, que podem ser considerados um padrão nesse setor. Também destacaremos a principal causa da situa-ção atual: a postura do Estado, seus baixos investimentos e a falta de planejamento, que perduram por quase duas décadas.

Nosso enfoque priorizará o transporte de cargas e suas principais modalidades, os transportes rodoviário, ferroviário e aquaviário. Adi-cionalmente, abordaremos de forma breve os demais modais e o trans-porte de passageiros. Sugeriremos políticas e um plano de ação para melhorar a eficiência o setor. Buscaremos uma visão ampla, abordando aspectos econômicos e sociais, privilegiando o crescimento do país com distribuição de renda no contexto de um planejamento integrado e de longo prazo. A criação, desenvolvimento e fortalecimento de um grande e integrado mercado interno, reunindo todos os brasileiros e garantindo condições dignas de vida em um Brasil indivisível, será a maior herança para os nossos filhos.

Poucos países dispõem da extensão e da potencialidade territorial, econômica e populacional brasileira. Poucos possuem uma coesão cul-tural, social, histórica e de solidariedade humana como nós. Somos um país raro, um dos últimos países que podem obter uma inserção sobe-rana no atual cenário internacional e ajudar outros a também obtê-la, especialmente por meio da integração sul-americana.

Um novo ciclo de desenvolvimento deve enfrentar o desafio de integrar plenamente todas as regiões, reestruturando a matriz de trans-portes, de modo a estabelecer vias de comunicação adequadas à integra-

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ção desse arquipélago de espaços geográficos chamado Brasil. E deve ir mais além, propondo a integração física de todos os espaços da América do Sul.

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Infra-estrutura de transportes: importância, objetivos e açõesNo mundo moderno, países continentais só conseguem sobreviver se são capazes de assumir a própria identidade. Para isso, é essencial que possuam redes próprias de transportes, de energia e de comunicações, submetidas ao interesse da sociedade. Nosso ponto de partida, pois, é a necessidade de realizar uma integração nacional por meio de uma rede que dê a cada cidadão a certeza da mobilidade, da transformação pro-dutiva e da capacidade criativa, preservando a identidade nacional.

Investimentos em infra estrutura física são elementos fundamen-tais de uma política de Estado. Transportes, energia e comunicações fornecem externalidades para toda a economia, viabilizando os demais setores e, conseqüentemente, o desenvolvimento econômico e social do país. Investimentos em infra-estrutura não geram produtos, geram a própria produtividade. A oferta de infra-estrutura deve andar na frente da demanda, para que não existam impedimentos e gargalos ao desen-volvimento de setores e regiões.

IFundamentos

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A infra-estrutura de transportes possibilita: (a) abrir novos merca-dos para os produtores e obter maior escala de produção, resultando em menores custos por causa de economias de escala e ganhos de produti-vidade; (b) levar o desenvolvimento econômico a novas regiões; (c) di-minuir custos e favorecer a competitividade dos produtos; (d) aumentar a eficiência da economia como um todo; (e) promover oportunidades para a ampliação e o florescimento de empreendimentos.

Em síntese, os transportes reduzem os custos de produção e circu-lação, dinamizando a economia; ampliam as possibilidades de abasteci-mento interno, aumentando o consumo de produtos e serviços. No caso brasileiro, os investimentos e a reestruturação da matriz de transportes possibilitarão reduzir o chamado custo Brasil. Também possibilitarão o aumento da renda disponível para os trabalhadores, funcionando como política social, graças à diminuição dos custos de transporte na forma-ção dos preços da cesta básica.

A importância das obras de infra-estrutura, e especificamente de transportes, nos remete a dois grandes ícones do desenvolvimento de nosso tempo, a Inglaterra e os Estados Unidos. Ambos os países fizeram amplo uso de vias de comunicação e transportes para interligar suas economias. Sabiam da importância de um sistema de infra-estrutura adequado.

Alexander Hamilton, primeiro secretário do Tesouro dos Estados Unidos, foi um homem fundamental na construção da nação, um dos “pais fundadores”. Em seu Relatório sobre as manufaturas de 1791, sub-metido ao Congresso, Hamilton afirma que melhorar o setor de trans-portes diz respeito “a todos os interesses de um país” e, principalmente, àqueles ligados ao desenvolvimento industrial:

Dificilmente encontrar-se-á algo mais bem concebido para ajudar as manufaturas da Grã-Bretanha do que o melhora-

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mento das estradas públicas desse reino e o grande progresso obtido ultimamente na abertura de canais. Quanto ao primei-ro, os Estados Unidos ainda deixam muito a desejar; para o segundo, apresentam facilidades incomuns.1 (...) Dificilmente haverá empreendimento que mereça mais atenção dos gover-nos locais, e seria desejável que não houvesse qualquer dúvida sobre a faculdade de o governo nacional prestar ajuda direta, no contexto de um plano geral. Este é um dos melhoramentos que poderiam ser realizados mais eficazmente pelo conjunto do que por uma ou várias partes da União. Existem casos nos quais haverá o perigo de se sacrificar o interesse geral em be-nefício de presumidos interesses locais (...).2

Para Hamilton, uma oferta adequada de infra-estrutura de trans-portes, ao diminuir o custo, permite que partes remotas de um país es-tejam mais próximas das cidades, fomentando a produção, e, por isso, constituindo “o maior de todos os melhoramentos”.

Nas suas palavras:

Os transportes fomentam o cultivo de áreas remotas, que, em geral, são as mais extensas do país. Beneficiam a cidade, por romper o monopólio das zonas rurais situadas nas suas vizi-nhanças. São vantajosos, inclusive, para estas partes do país, pois, embora introduzam alguns produtos rivais nos velhos mercados, abrem aos seus produtos muitos novos mercados.3

1 Hamilton, 1791, p.109.2 Op.Cit. pp.109-110.3 Op.Cit. p.110.

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Friedrich List, economista alemão que lançou a idéia da União Aduaneira Nacional dos Estados Alemães (Zollverein), ao chegar aos Estados Unidos se encantou ao ver aquela grande nação se edificando em torno de um sistema de transportes, com ferrovias sendo construí-das em conexão com portos, ligando o país de costa a costa. No Prefácio de seu Sistema nacional de economia política, de 1841, ele reconhece a importância de um sistema integrado de transportes, valoriza sua ex-periência nos Estados Unidos e prevê que esse país seria uma grande nação:

Eu já sabia da importância dos meios de transporte sob o ân-gulo da teoria do valor; observara apenas o efeito dos negócios de transporte em casos particulares e só com respeito à ex-pansão do mercado e à redução dos preços de bens materiais. Só agora comecei de fato a considerar isso do ponto de vista da teoria das forças produtivas e do seu efeito total como um sistema nacional de transportes – conseqüentemente, com sua influência sobre a totalidade da vida mental e política, das relações sociais, da produtividade e do poder das nações. Só agora reconheço a relação recíproca que existe entre o poder industrial e o sistema nacional de transportes: um não pode se desenvolver ao máximo sem o outro.

A partir dessa experiência, List começou a imaginar uma Alema-nha unificada e ligada por um sistema ferroviário – projeto no qual tra-balhou –, assim como uma Europa totalmente ligada e vinculada à Ásia. Costa (2003, p. 138) afirma:

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O melhor exemplo do tipo de grandes obras que devem inspi-rar os povos de toda a América do Sul é a rede de canais e fer-rovias transcontinentais construídas nos Estados Unidos no século XIX. Obras assim cumprem o objetivo de criar as bases econômicas e físicas do crescimento sustentado, mediante a integração.

Esse raciocínio deve ser aplicado a um país continental, como o Brasil.

Ao discutirmos um sistema de transporte, é importante atentarmos para o que o filósofo alemão Gottfried Wilhelm Leibniz (1646-1716) chamou “economia física” e seus desdobramentos sobre os poderes pro-dutivos de uma nação. Nessa concepção, um adequado sistema de trans-portes é fundamental para que uma economia opere de forma eficiente, liberando recursos (capital e energia, por exemplo) para serem utiliza-dos em outros setores e objetivos, favorecendo os poderes produtivos da nação. Um sistema de transportes mais eficiente mimetiza o progresso tecnológico, pois “de forma não-linear e geralmente incomensurável – mas muito real –, a infra-estrutura adiciona eficiência e produtividade ao setores que produzem bens” (Darc Costa, 2003, p. 136).

Os transportes constituem um fator importantíssimo para o su-cesso de programas sociais e econômicos. Um programa ou plano para o setor deve priorizar a integração territorial, pois é a partir do con-tínuo espacial que se constrói a identidade nacional. Adicionalmente, deve induzir ao desenvolvimento, não somente da economia vista como um todo, mas de áreas geográficas específicas (regiões, municípios, ci-dades), já que a infra-estrutura é o elemento articulador do processo de geração de riqueza. Finalmente, tem que irrigar os espaços congestiona-dos, oferecendo saídas e canais que possibilitem o livre fluxo de merca-dorias, permitindo a circulação de bens e serviços e, conseqüentemente,

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atendendo as exigências de consumo dos cidadãos. Sendo capaz de au-mentar a produtividade da economia nacional, a política de transpor-tes, em um país com as dimensões do Brasil, tem que buscar três ações obrigatórias: induzir o desenvolvimento, integrar os mercados e irrigar economicamente os espaços.

A atividade de indução ao desenvolvimento pressupõe que se estabeleça uma estrutura viária de acesso a um espaço geográfico, co-locando-o como instrumento de geração de riqueza e ocupação desse território. É usual que esse tipo de ação seja demandado por áreas mais isoladas e/ou menos desenvolvidas. No Brasil, três regiões são prioritá-rias para ações de indução ao desenvolvimento no setor de transportes: Centro-Oeste, Norte e Nordeste. Todas podem ser consideradas regiões de fronteira.

A atividade de irrigação econômica pressupõe construir novas passagens viárias em áreas de fluxo saturado ou superar os engarrafa-mentos de canais sobreocupados, facilitando e/ou descongestionando o acesso à área geográfica. Esse tipo de ação tende a ser demandado por áreas mais desenvolvidas (como pólos econômicos e metrópoles), que, por seus efeitos polarizadores – atraindo recursos e atividades, por exemplo –, incorrem em deseconomias de concentração. A irrigação econômica é uma questão central para a matriz de transportes do Brasil. As ações prioritárias, neste caso, localizam-se na região Sudeste, respon-sável por mais de 50% da produção de transportes no Brasil.

A atividade de integração de mercados pressupõe a ligação viária entre mercados (produtores e/ou consumidores) já existentes, de forma a permitir o fluxo de pessoas, bens e mercadorias, dando valor comer-cial aos excedentes de produção existentes em cada mercado. Esta ação costuma ser demandada por áreas mais desenvolvidas. Vem sendo utili-zada a concepção de corredores de integração, que pretendem interligar macromercados delimitados por regiões definidas. Integrar as regiões, por meio de corredores de integração, significa construir um complexo

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de facilidades que começa em um eixo de transportes, mas acrescenta outros insumos à atividade econômica: estradas alimentadoras, termi-nais e pátios intermodais, armazenagem nas propriedades, terminais portuários especializados etc.

Em uma região (ou país) agrícola onde cada família produz prin-cipalmente para subsistência, somente uma parte destina-se à troca e quase não existem transportes de bens e passageiros, não há interesses econômicos privados que justifiquem investimentos em infra-estrutura, mas sim interesses sociais e econômicos voltados para induzir o desen-volvimento.

O setor de transportes demanda fortemente a indústria (constru-ção civil, metal-mecânica, eletroeletrônica etc.), tanto durante a implan-tação, quanto na operação e gerenciamento. Os projetos são intensivos em capital, geram grande quantidade de empregos com baixa qualifi-cação e têm longo período de maturação. O planejamento de qualquer empreendimento deve ser exaustivo, inclusive no que diz respeito ao impacto sobre o meio ambiente, para que as várias condicionantes que cercam o projeto não criem graves distorções.

Infra-estrutura de transportes deve ser pensada dentro do concei-to de capital social básico, isto é, aquele grupo de atividades de apoio sem as quais os setores de produção primário, secundário e terciário não conseguem funcionar. Os resultados macroeconômicos e setoriais (microeconômicos), decorrentes de sua deficiência, são fartamente co-nhecidos.

Por ter implicações na cadeia produtiva e atuar de forma a ligar os setores e atividades econômicas, interligando a micro e a macroecono-mia, com efeitos multiplicadores por todo o sistema econômico e em sua eficiência e competitividade (no todo e nas partes), podemos defi-nir a infra-estrutura de transportes como um setor que atua com efeitos polinômicos sobre a economia. Por isso, merece atenção especial da boa administração pública. O transporte de cargas é essencial para a compe-

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titividade do país. Toda a sociedade deve colaborar para aperfeiçoá-lo, sob a atuação planejada e orquestrada do Estado.

A matriz de transportes, a integração dos modais, a oferta e a efi-ciência do sistema logístico são fundamentais para o desenvolvimento. Delas dependem as cadeias produtivas modernas, que são determinan-tes para a competitividade e eficiência de um país, região, setor ou em-presa. Os transportes de uma nação devem ser considerados como um ativo precioso, merecedor de cuidados de manutenção, conservação e reparação, assim como de permanente monitoramento, avaliação e pla-nejamento. Conforme List (1841) ressalta, o sistema de transportes e a infra-estrutura em geral compõem as forças produtivas de uma nação e são fundamentais para sua riqueza e poder, real ou potencial, atual ou futuro.

Em todo o mundo, inclusive no Brasil, a atividade de transportes é um serviço de utilidade pública, concedido pelo Estado. A atuação da empresa privada deve ser coordenada pelo setor público. O crescimen-to sustentado da economia depende da oferta e da qualidade da infra-estrutura. No caso dos transportes, é necessário que o sistema apresente disponibilidade, confiabilidade, segurança e baixos custos para os usu-ários.

As operações em infra-estrutura de transportes possuem três fases bem caracterizadas:

(a) Construção ou ampliação, que pressupõe necessariamente o atendimento de objetivos econômicos ou estratégicos.

(b) Manutenção ou conservação, destinada a manter a adequada conservação das vias, em condições técnicas e operacionais favoráveis. Essa operação se aplica a trechos desgastados e deteriorados, mas em boas condições. Tem caráter permanente e visa a assegurar a vida útil das vias, conforme o projeto original.

(c) Restauração, que visa a preparar as vias para um novo período de vida útil, restabelecendo as condições originais em trechos que neces-

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sitam adição ou substituição, total ou parcial, de sua estrutura. Aplica-se em trechos em condições regulares, ruins ou péssimas.

Nas rodovias destaca-se também a operação de reconstrução, que vai além da restauração, pois se aplica a trechos totalmente destruídos, em péssimas condições, que exigem trabalhos que englobam base, leito e subleito.

Em todas essas operações, os benefícios, claramente explicitados e mensurados, devem ser superiores aos custos envolvidos. Evidentemen-te, qualquer interrupção nas atividades de conservação reduz a vida útil da via, antecipando a necessidade de restauração (ou reconstrução). Por sua vez, se a atividade de restauração deixa de ser executada na época oportuna, será necessário recuperar ou reconstruir completamente a infra-estrutura, gerando maiores custos do que os necessários à preven-ção. Esta, infelizmente, é a realidade da matriz de transportes brasileira, que será tratada com detalhes no próximo capítulo.

Por causa do abandono do planejamento e dos baixos níveis de investimento no setor há duas décadas, 75% das rodovias encontram-se em condições comprometidas, classificadas pela Confederação Na-cional dos Transportes (CNT) como péssimas, ruins ou regulares. As estradas em boas condições estão concentradas nas regiões Sul e, princi-palmente, Sudeste e/ou fazem escoamento de commodities para portos, o que tende a gerar efeitos polarizadores e acentuar a nossa condição primário-exportadora.

O custo de manutenção de um quilômetro de estrada é R$ 180 mil, o de restauração é de R$ 420 mil e o de reconstrução é de R$ 750 mil, em média. Como se vê, restaurar é aproximadamente 2,4 vezes mais caro que conservar; reconstruir é mais de quatro vezes mais caro que con-servar e quase duas vezes mais caro que restaurar. Fazer uma coisa ou outra pode gerar diferenças de bilhões no orçamento da infra-estrutura de transportes.

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Investimentos para recuperar rodovias R$ / kmReconstrução 750.000Restauração 420.000Manutenção 180.000

A definição dos objetivos estratégicos para construir ou ampliar uma via requer o apoio da sociedade, para que os custos programados sejam entendidos e aceitos pela população. Os setores privado e público usam critérios diferentes para decidir sobre a localização dos investi-mentos: o empresário privado dá maior peso à rentabilidade, enquanto a esfera pública deve levar em conta a utilidade social; além da análise de custos e benefícios econômicos, deve avaliar os custos e os benefí-cios dos investimentos para a sociedade e a Nação como um todo.4 A questão do financiamento é fundamental. Conforme aponta Darc Costa (2003, p.136):

No ambiente econômico, prevalece a contabilidade de custos, decorrente das teses econômicas liberais. É comum encobrir-se de mistério o verdadeiro papel da infra-estrutura. Do ponto de vista da contabilização de custos, o investimento em infra-estrutura não se paga sozinho, nem poderá pagar-se com as quotas dos usuários.

Seria desejável que os usuários arcassem com os custos de investi-mento, manutenção e operação, cobrando-se que os poderes conceden-

4 Ignácio Rangel, Elementos de economia do projetamento. São Paulo: Bienal, 1987.

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tes e os operadores prestassem os serviços com eficiência, mas essa situ-ação não é usual. Na maioria das vezes, o Estado realiza a intermediação por meio de uma política de subsídio explícito (direto) ou implícito (cruzado). O sucesso de uma política de transportes reside em como se faz essa intermediação. Os princípios básicos de intermediação do Esta-do devem garantir: (a) aproveitamento da capacidade ociosa existente; (b) política tarifária que faça a tarifa refletir o custo do serviço utiliza-do; (c) suprimento de recursos suficientes para garantir o crescimento do setor de um modo compatível com o desenvolvimento econômico e social do país.

O gráfico a seguir dá uma idéia do valor estratégico da produção de transportes para o Brasil. Historicamente, o crescimento dos trans-portes cargas é maior do que o crescimento dos principais agregados reais da economia – o PIB, o PIB agrícola e o PIB industrial –, pois ne-cessidade da produção de meios de transporte tem superado as taxas de crescimento da produção em geral.

Crescimento da produção de cargas e dos principais agregados reais (ano base 1970 = 100)

Produto Real Industrial

Cargas

Produto Real Agropecuário

Produto Real Total

1974 1978 1982 1985 1988 1991

400

300

200

100

Fonte: Anuários Estatísticos do Geipot.

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Esse comportamento está relacionado, principalmente, com o crescimento da distância média dos transportes, que evoluiu de 267 km em 1970 para 612 km em 2004. A distribuição geográfica das necessida-des de transportes está mais concentrada na região Sudeste, responsável por mais de 50% do total brasileiro.

Nos últimos quinze anos, nosso país optou por não realizar pla-nejamento de longo prazo nem referenciar-se em um projeto nacional. É um erro. É necessário que voltemos a ter um planejamento amplo, com interconexões entre as políticas macroeconômica, setorial, regio-nal etc. A infra-estrutura é um instrumento fundamental para o desen-volvimento de setores e regiões. Além disso, o Estado neoliberal e suas agências não conseguiram exercer com eficiência nem mesmo a função mínima de controle do setor, o que contribui para acentuar a desastrosa situação em que está a infra-estrutura de transportes no Brasil.

Os modais de transporte e a intermodalidadeOs modais de transporte são: rodoviário, ferroviário, dutoviário, aqua-viário e aéreo, com características diferenciadas. Por isso, é fundamen-tal planejar um sistema de transporte integrado. A complementaridade entre os diferentes modais e a intermodalidade devem ser aproveitadas em toda a sua potencialidade, o que exige apoio logístico adequado e eficiente.

O núcleo de maior dinamismo do setor de transportes rodoviá-rios encontra-se nas empresas que realizam esse serviço. Essa predo-minância deve-se à maior flexibilidade operacional, espacial e de nível de serviço que esse modal possui, bem como à maior agressividade de seus operadores, que respondem rapidamente às demandas. O modal rodoviário é dominante tanto nos transportes de cargas quanto nos transportes urbanos de passageiros, mas cabe destacar a importância crescente, em algumas grandes cidades e regiões metropolitanas, do transporte sobre trilhos.

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Raph a el Pa du l a

O modal ferroviário caracteriza-se, especialmente, pela capacida-de de transportar grandes volumes com elevada eficiência energética, principalmente em casos de deslocamentos em médias e grandes dis-tâncias. Apresenta, ainda, maior segurança em relação ao modal rodo-viário, com menor índice de acidentes e menor incidência de furtos e roubos. Possui elevado custo fixo de implantação e manutenção, mas baixo custo variável de uso. O transporte de cargas predomina nessas operações. São cargas típicas do modal ferroviário: produtos siderúrgi-cos, grãos, minério de ferro (mais de 60% do volume total transportado pelas ferrovias no Brasil), cimento e cal, adubos e fertilizantes, derivados de petróleo, calcário, carvão mineral e clínquer, além de contêineres.

O transporte aquaviário usa rios, lagos e oceanos. O subsetor hi-droviário (ou de transporte fluvial) usa rios navegáveis; o subsetor marí-timo divide-se em transporte de cabotagem, realizado na costa brasilei-ra ou entre países vizinhos, e navegação de longo curso, referente a rotas internacionais e a serviços de alimentação de linhas (serviço de feeder, que é o transbordo de carga internacional para posterior distribuição ao longo da costa, realizado em pequena escala no Brasil).

O transporte aéreo se dedica a passageiros e a carga de alto valor agregado e pequeno volume.

O transporte dutoviário movimenta combustíveis e minérios, atra-vés de minerodutos (sal-gema, minério de ferro e concentrado fosfá-tico), oleodutos (transportando petróleo, óleo combustível, gasolina, diesel, álcool, GLP, querosene, nafta e outros produtos) e gasodutos (gás natural).

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Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

O transporte multimodal de cargas é aquele que duas ou mais modalidades de transporte, desde a origem até o destino5.

Custos comparativos dos modais de transporteModal US$ centavos/ ton. kmAéreo 14.0

Rodoviário 4.0 - 5.0Ferroviário 0.3 - 1.0Dutoviário 0.1 - 0.3

Balsa e rebocador 0.12 - 0.18Cargueiro 0.06 - 0.24

Navio graneleiro 0.02 - 0.04 Fonte: Consultoria DLC.

Custos comparativos dos modais de transporteModal Custo = R$/1000 TKUAéreo 1.762

Rodoviário 213Aquaviário 70Dutoviário 54Ferroviário 36

Fonte: Lima, 2006. TKU = tonelada por quilômetro útil.

5 Segundo a ANTT, o Operador de Transporte Multimodal assume a responsabili-dade pela execução dos contratos de transporte multimodal, “O OTM é a pessoa jurídica con-tratada como principal para a realização do Transporte Multimodal de Cargas, da origem até o destino, por meios próprios ou por intermédio de terceiros. O OTM poderá ser transportador ou não. O exercício da atividade do OTM depende de prévia habilitação e registro na ANTT. Caso o OTM deseje atuar em âmbito internacional, deverá também se licenciar na Secretaria da Receita Federal.” (www.antt.gov.br)

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Raph a el Pa du l a

Os modais de transportes têm custos diferentes, como mostra a tabela acima, que usa dados internacionais. Conforme podemos obser-var, o rodoviário é de longe o de maior custo, se comparado com o fer-roviário e o aquaviário. A situação do Brasil, altamente concentrado no modal rodoviário (mais de 60%) e com pouca participação dos modais ferroviário e aquaviário, revela a necessidade de reestruturar a matriz de transportes, que compromete a competitividade da nossa economia. O Brasil precisa de uma infra-estrutura de transportes menos onerosa. É preciso privilegiar aspectos de intermodalidade, para que o transporte de cargas obtenha menores custos, utilizando diferentes modais, con-forme o caso. Os modos ferroviário e aquaviário de carga devem receber ênfase crescente na matriz brasileira.

Se quisermos obter o máximo de produtividade e rentabilidade em nosso desenvolvimento interno e nosso comércio exterior, precisamos (a) aproveitar a multiplicidade de nossas vias naturais, representadas pelo extenso litoral e as bacias interiores, integrando-as por modais de maior capacidade, como navegação de cabotagem e fluvial, além de fer-rovias; e (b) buscar a integração dos espaços de tráfego condominiais de que participamos e dos outros que atendam aos interesses estratégicos do Brasil e de nações vizinhas.

O planejamento da matriz de transportes é o principal instrumen-to para superarmos nossas deficiências. Sem esse planejamento, que deve definir programas e projetos de curto, médio e longo prazos, os imediatismos do mercado continuarão a reproduzir, ano a ano, os erros do passado, agravando o quadro já existente.

São notórias as características desejáveis de uma matriz de trans-portes eficiente. Em primeiro lugar, ela deve concentrar-se em modais de menor custo. É preciso que exista uma oferta adequada de portos eficientes, interligados a outros modais por boas vias de acesso, com alta capacidade de armazenagem e baixo tempo de espera para atraca-ção das embarcações; que as ferrovias sejam eficientes, com materiais de

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rodagem e equipamentos modernos e freqüentemente renovados, inter-ligadas a outros modais com ampla estrutura logística, com tamanho de bitolas padronizado, possibilitando a interligação em todo o território nacional, com acesso aos portos e implantação de contorno de cidades; que as hidrovias tenham todo o seu potencial aproveitado e desenvol-vido para navegação interior, com embarcações adequadas; que a cabo-tagem seja amplamente utilizada, com bons navios; que os aeroportos sejam dotados de capacidade adequada à demanda de passageiros e de cargas, integrados aos demais modais de transporte; que as rodovias es-tejam em boas condições; que haja integração intermodal apoiada por um sistema de logística eficiente, com alta produtividade, baixos custos e oferta adequada, contando ainda com o desenvolvimento de operado-res logísticos.

É importante uma regulação eficiente, na qual o poder concedente opere com uma visão estratégica e econômica de longo prazo e as agên-cias reguladoras atuem de acordo com o interesse público.

Infelizmente, como poderemos observar ao longo deste livro, o quadro de infra-estrutura de transporte no Brasil está muito longe dessa descrição.

Logística e produtividadeLogística é o conjunto integrado das operações de planejamento, trans-porte, armazenagem, controle de estoques, distribuição e tecnologia da informação, que unem os centros produtores aos centros distribuidores. A logística se enquadra no âmbito da superestrutura, mas age de forma complementar à infra-estrutura.

Até o fim da Segunda Guerra Mundial, a logística sempre esteve associada às atividades militares, principalmente a estratégia de deslo-

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Raph a el Pa du l a

camento de recursos.6 Por isso, no dicionário Aurélio, uma das defini-ções de logística é “a parte da arte da guerra que trata do planejamento e da realização de: projeto e desenvolvimento, obtenção, armazenamento, transporte, distribuição, reparação, manutenção e evacuação de mate-rial para fins operativos ou administrativos”. Contudo, no período do após-guerra, com os avanços tecnológicos e as novas necessidades das economias, a idéia de logística foi ampliada e passou a ser adotada in-clusive por empresas.

A infra-estrutura logística exige ação conjunta de todas as esferas executivas – União, Estados e Municípios –, de empresas privadas, coo-perativas, associações de produtores e outras entidades da sociedade ci-vil, visando a superar problemas existentes no interior de microrregiões, cidades, distritos etc. Representam ações de logística a construção, ma-nutenção e gestão de estradas alimentadoras, pátios e terminais, além de armazenagem dentro das propriedades. No Brasil, os principais produ-tos que utilizam o sistema logístico são: minerais, metal-metalúrgicos, químicos, petroquímicos, automotivos, alimentícios, farmacêuticos e eletro-eletrônicos.

Um sistema logístico adequado tem baixos custos, disponibilidade de unidades de armazenamento (portos secos, pátios, terminais etc.), facilidade de operação e tecnologia apropriada. A produtividade desse sistema é fundamental para a competitividade e a produtividade de toda a economia.

6 Desde a antiguidade, na era Antes de Cristo, líderes militares utilizavam a logística em guerras - que eram geralmente longas e geralmente distantes, demandavam grandes deslo-camentos de recursos e, consequentemente, umas organização e execução logística.

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A matriz de transportesTransporte de cargasAtualmente, o setor de transportes equivale a 6,4% do PIB. Segundo a Confederação Nacional dos Transportes (CNT), operam nele cerca de 40 mil empresas transportadoras, empregando 2,5 milhões de trabalha-dores, e existem mais de 300 mil transportadores autônomos.

As duas últimas décadas foram marcadas pelo abandono de um projeto nacional, e, conseqüentemente, pela falta de investimentos e de planejamento. Nesse período, houve aumento de custos e acentuada de-terioração da infra-estrutura.

As principais características da matriz brasileira de transportes de cargas são: alta concentração no modal rodoviário, que responde por mais de 60% dos transportes; baixa integração entre os modais; altos custos logísticos; má qualidade do sistema rodoviário; dificuldades de acesso aos portos; baixa utilização das vias navegáveis e do transporte de cabotagem. Esse quadro resulta em elevados custos logísticos, esti-

IISituação dos transportes no Brasil

3 4

Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

mados entre 16% e 20% do PIB, quando comparados a 9,8% nos Estados Unidos e a 12% na Europa.

O Brasil possui um sistema de logística de transportes pouco de-senvolvido, que gera perdas de competitividade ao longo de toda a ca-deia produtiva por causa dos custos incorridos, que funcionam como uma espécie de “imposto” adicional sobre o preço dos bens. O sistema é caracterizado por falta de infra-estrutura de apoio e por investimentos precários em corredores de transporte. Em 2002, havia no Brasil 250 terminais de transporte, contra 3 mil nos Estados Unidos. Estimativas (CNT/CEL-Coppead 2002) apontam que as empresas brasileiras man-têm em torno de 118 bilhões de dólares parados em excesso de estoque, ao longo das cadeias produtivas, por causa das ineficiências do setor de transportes. Se o setor operasse de forma mais eficiente, segura e con-fiável, bilhões de reais estariam disponíveis para serem investidos em outras atividades, gerando emprego e renda.

O desequilíbrio aparece na concentração no modal rodoviário, mais custoso em relação aos modais ferroviário e aquaviário, com parti-cipação de mais de 60% na produção de transportes de cargas, em tone-ladas por quilômetro útil (TKU). Os modais ferroviário e o aquaviário têm participação em cerca de 21% e 14%, respectivamente.

Matriz de transportes de cargas - 2006 Modal Participação (%) Milhões TKU

Rodoviário 61,1 485.625Ferroviário 20,7 164.809Aquaviário 13,6 108.00Dutoviário 4,2 33.300

Aéreo 0,4 3.169Total 100 794.903

Fonte: Boletim estatístico CNT, jan/2007.

3 5

Raph a el Pa du l a

Matriz de Transportes de CargasParticipação dos Modais (%)

Aéreo

Dutoviário

Aquaviário

Rodoviário

Ferroviário

20,7%61,1%

13,6%4,2%0,4%

Matrix de Transportes de CargasParticipação dos modais (%)

Fonte: Boletim estatístico CNT, jan/2007.

As participações em termos de movimentação de cargas, em to-neladas, seguem a concentração no modal rodoviário, responsável por mais de 50% das cargas movimentadas, como mostra a tabela a seguir.

Volume transportado (em toneladas)

Modal Total %Rodoviário 934.408.939 52Ferroviário 431.804.306 24Aquaviário 429.305.802 23,9Aeroviário 1.229.679 0,07

Fonte: Boletim estatístico CNT, jan/2007.

A estrutura da matriz de transportes brasileira incide diretamente, de forma desfavorável, na competitividade dos produtos nacionais. A composição da matriz de transportes de cargas é relativamente estável,

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Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

principalmente pela falta de investimentos e a concentração dos poucos recursos públicos no modal rodoviário. No entanto, pode-se identificar desde 1996 – após as privatizações – um ligeiro crescimento na parti-cipação do modal ferroviário no total de cargas movimentadas (tonela-das), com maior crescimento de movimentação em relação aos outros modais.

Evolução do transporte de cargas por modalidade (bilhões de TKU)

AnosModalidades

Aéreo Ferroviário Aquaviário Rodoviário Dutoviário Total1969 0.2 25.0 22.7 72.8 nd 120.71975 0.5 58.9 31.7 132.1 6.9 230.21981 1.1 79.4 42.4 204.7 11.1 338.71987 1.5 120.0 90.5 310.6 19.7 532.91990 1.8 120.3 102.6 313.2 20.9 558.82000 2.4 156.0 103.4 470.9 33.2 765.92004 * 1 206 105 512 39 863

Fonte:Anuários Estatísticos do Geipot, CNT, CEL-Coppead.

* Valores de 2004 aproximados

Crescimento do volume de cargas transportado pelos diferentes modais

Ferroviário Rodoviário Aquaviário Total1996-2004 6,1% 3,8% 2,3% 4,1%1999-2004 8,0% 1,8% 2,1% 3,2%

Fonte: ANTF.

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Raph a el Pa du l a

Porcentagem do PIB investido em transportes (governo federal)

0,30%

0,25%

0,20%

0,15%

0,10%

0,05%

0,00%

Porc

enta

gem

do

PIB

Ano

1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004

Fonte: Apresentação da CNT para o PNLT. Disponível em www.centran.eb.br/plano_logistica

A produção de transportes no Brasil deve ser reestruturada para uma matriz intermodal. O desequilíbrio na matriz atual não vem sendo tratado de forma adequada pelos governos. Nos últimos vinte anos, os investimentos públicos em transportes têm sido insignificantes: de 1995 a 2005, em média, foram 0,2% do PIB. Além disso, tais investimentos foram concentrados no modal rodoviário, mantendo-se estável a matriz de transportes existente, desbalanceada: desde 1995, mais da metade dos recursos investidos no setor se direcionaram ao modal rodoviário; esse percentual ultrapassou 70% em 1998, 80% em 2002 e chegou a 90% em 2005. Considerando-se somente os três principais modais – rodovi-ário, aquaviário e ferroviário –, o rodoviário tem sido privilegiado com mais de 70% dos recursos.

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Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

Distribuição dos investimentos em transportes (governo federal)

Rodoviário Ferroviário Aquaviário Aéreo Outros

1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

100%

90%

80%

70%

60%

50%

40%

30%

20%

10%

0%

Fonte: Apresentação da CNT para o PNLT. Disponível em www.centran.eb.br/plano_logistica

Nos últimos vinte anos, a política de transportes e a ação do Es-tado têm sido afetadas pelo predomínio das doutrinas neoliberais, que retiram do planejamento o seu verdadeiro papel. Ao estimularem a ação atomizada e microeconômica, contribuem para desorganizar o setor. Além disso, subordinam os investimentos em transportes à contabili-dade de custos.

É fundamental estabelecer um planejamento para o setor que di-recione os investimentos com recursos públicos, inclusive a poupança compulsória alocada às agências federais de financiamento, conforme um prévio e criterioso estudo de viabilidade técnico-econômica do em-preendimento e de seus efeitos sobre a economia, garantindo também a redução dos custos e a melhor execução das obras. É preciso que se-jam constituídos fundos setoriais, pois a Constituição Federal de 1988 acabou com o Fundo Nacional de Transportes, o que prejudicou as

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Raph a el Pa du l a

condições do setor. A maior parte dos recursos da Contribuição de In-tervenção no Domínio Econômico (CIDE) fica sem uso ou é usada em outras despesas, como a formação de superávit primário pelo governo. São recursos que deveriam ser investidos no setor de transportes.

Destinação dos recursos da CideDestinação dos Recursos da CIDE

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

Não Utilizado

Transporte

Outras Despesas

2002 2003 2004 2005Ano Fonte: Siafi.

A comparação da matriz de transportes brasileira com a matriz de outros países continentais, com condições geográficas similares, ilustra mais facilmente a distorção e suas conseqüências sobre a produção na-cional, em termos de custos e competitividade, diante da concorrência internacional.

Considerando-se apenas os principais modais – ferroviário, ro-doviário e aquaviário –, constatamos uma significativa participação do modal ferroviário em alguns países, às vezes de forma predominante. A Rússia se destaca, com o transporte ferroviário atingindo 81% de participação, enquanto o rodoviário tem somente 8% e o hidroviário 11%. Com a exceção da Rússia e do México, que tem uma matriz de transportes mais similar à do Brasil – com 55 % concentrada no modal rodoviário –, nos demais países mostrados na tabela a participação das rodovias fica em torno de 40% (entre 37% na China e 46% no Canadá).

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Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

No longo prazo, é preciso que o Brasil se aproxime de uma matriz como a dos Estados Unidos, com 40% das cargas transportadas no modal fer-roviário, 20% no rodoviário e 40% no aquaviário – considerando-se so-mente esses modais.

Comparação internacional de matriz de transportes – divisão entre os principais modais* em 2003

Ferroviário %

Rodoviário %

Hidroviário %

Extensão territorial terrestre**

(milhões km)Rússia 81 8 11 17,0

Canadá 46 43 11 9,2Austrália 43 53 4 7,6

EUA 43 32 25 9,2China 37 50 13 9,6Brasil 24 52 14 8,5

México 11 55 34 2,0* Sem considerar os modais aéreo e dutoviário. ** Sem considerar as áreas cobertas por

águas. Fonte: ANTT, elaborado pela Trevisan (Análise Trevisan, 2005).

Comparação internacional de matizes de transportes principais modais (% 2003)

R Hidroviário

Ferroviário

Rodoviário

0 20 40 60 80 100

México

Brasil

China

EUA

Austrália

Canadá

Rússia

11

24

37

43

43

46

81

55

52

50

32

53

43

8

34

14

13

25

4

11

11

4 1

Raph a el Pa du l a

Comparando diretamente o Brasil com os Estados Unidos, ob-servamos uma diferença muito acentuada na participação do modal rodoviário. Nos Estados Unidos, esse modal participa com 22,7 % da produção de transporte, percentual muito distante dos mais de 60 % no Brasil. Lá, a participação conjunta dos transportes ferroviário (36,3%) e aquaviário (16,8%) ultrapassa 55%. Esses modais de menor custo, que predominam na matriz norte-americana, não chegam a 35% no Brasil. Outra nítida diferença é a participação do modal dutoviário: 24% nos Estados Unidos contra 4,2% no Brasil. Os Estados Unidos são um país continental com dutos ligando e cruzando todo o território, enquanto no Brasil não há grande uso de dutos (normalmente usados para trans-porte de gás, petróleo, minérios e grãos).

Comparação da matriz de transportes de Brasil e Estados Unidos

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

0,2%0,4%

13,6%16,8%

4,2%

24,0%20,7%

36,3%

61,1%

22,7%

” Brasil

EUA

Aéreo Hidroviário Dutoviário Ferroviário Rodoviário

Fonte: Apresentação da CNT para o PNLT, p. 9.

Disponível em www.centran.eb.br/plano_logistica.

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Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

A discrepância existente entre a matriz de transportes brasileira e uma matriz ideal, com maiores participações dos modais ferroviário e aquaviário – como a dos países que mostramos acima –, atinge di-retamente a competitividade e a eficiência da nossa economia. O pro-duto agrícola brasileiro, por exemplo, é onerado em cerca de 40% do seu valor. Isso afeta negativamente tanto a renda do produtor brasileiro quanto a dos consumidores, principalmente os mais pobres, pois afeta os preços dos bens que formam a cesta básica.

Uma forma de mensurar a produtividade do transporte de cargas é medida pela tonelada por quilômetro útil (TKU) produzida por empre-gado no setor. Esta medida é importante para revelar a ineficiência do setor no Brasil, principalmente quando comparado aos Estados Unidos. Os gráficos abaixo, retirados do estudo CNT/CEL-Coppead (2002), re-velam que o Brasil tem menor produtividade em cada modal. A produ-tividade do modal rodoviário no Brasil é 33% da registrada nos Estados Unidos; a do ferroviário é de aproximadamente 44%, e a do aquaviário é de aproximadamente 48%.

Produtividade dos modais (106 TKU/empregado)

0%

5%

10%

15%

20%

25%

Hidroviário Ferroviário Rodoviário

17,1

8,2 9,3

21,2

0,6 1,8

” Brasil

EUA

Fonte: CNT/CEL, 2002, p. 17. Elaborado a partir de dados do Geipot 2001; IBGE/1998; Bureau of Transportation Statistics e Bureau of Labor Statistics.

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Raph a el Pa du l a

Como a matriz de transportes do Brasil é muito concentrada no modal menos produtivo, o rodoviário, a matriz como um todo é bem menos produtiva do que cada modal visto em separado, quando compa-rada com os Estados Unidos. A produtividade do sistema de transporte de cargas é de somente 22% em relação à norte-americana (1 para 4,5). A matriz brasileira apresenta um desempenho pior em termos de pro-dutividade por mão-de-obra empregada.

Produtividade do setor de transportes de carga (106 TKU/empregado)

0%

1%

2%

3%

4%

5%

1,0

4,5 Brasil

EUA

Fonte: CNT/CEL, 2002, p. 18.

O estudo CNT/CEL (2002) também apresentou a produtividade do transporte de cargas em relação aos outros setores da economia bra-sileira, tendo os Estados Unidos como parâmetro (equivalente a 100%). Revelou que o setor também apresenta um baixo desempenho quando observado desse ângulo. Conforme revela o gráfico abaixo, entre os se-tores analisados, o setor de transportes só supera os setores de processa-mento de alimentos (18%) e varejo de alimentos (14%).

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Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

0% 20% 40% 60% 80% 100%

Benchmark - EUA

Siderurgia

Transporte Aéreo

Telecomunicações

Bancos de Varejo

Montadoras

Construção Civil

Autopeças

Transporte de Cargas

Proc. Alimentos

Varejo Alimentos 14%

18%

22%

22%

35%

36%

40%

45%

47%

68%

100%

Produtividade de mão-de-obra por setor

Fonte: CNT/CEL, 2002, p.18.

Uma maneira de analisar a oferta de transportes no Brasil é a partir

do índice de densidade de infra-estrutura, calculado pela relação entre a extensão (em km) de infra-estrutura ofertada e a área territorial do país (em km2). O desbalanceamento da matriz de transportes tem também como causa a baixa disponibilidade dos demais modais – ferroviário e aquaviário, tanto de cabotagem quanto hidroviário –, assim como suas limitações operacionais, o que faz com que eles não apresentem alternativas em relação ao modal rodoviário, mais flexível e dinâmico. A densidade de transporte dos modais revela a discrepância na oferta, favorecendo, de longe, o modal rodoviário.

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Raph a el Pa du l a

0%

4%

8%

12%

16%

20%17,3

5,6

3,4

Rodoviário Hidroviário Ferroviário(rodovia asfaltada) (rios navegáveis)

Densidade de Transporte

km/1000 km�

Fonte: CNT/CEL, 2002, p. 41.

O estudo CNT/CEL 2002 comparou a densidade da infra-estrutu-ra brasileira com a de outros países continentais. A comparação mostra que a oferta nacional de transporte é a menor: 26,4 km de extensão de vias para 1 mil km2 de área territorial do país, menos que a metade do México (57,2), por exemplo. O mesmo estudo aponta que a densidade dos Estados Unidos é de 447 km de vias para 1 mil km2 de área, muito maior que a dos demais países analisados. No gráfico, chama a atenção também a baixa densidade do modal ferroviário e a baixa utilização do transporte hidroviário na matriz brasileira.

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Fonte: CNT/CEL 2002

Além da pequena quantidade da infra-estrutura ofertada, a quali-dade da infra-estrutura está comprometida. Da extensão total de rodo-vias nacionais, 88% não são pavimentadas e, das pavimentadas, 75% são classificadas como péssimas, ruins ou deficientes pela CNT (Pesquisa Rodoviária CNT 2006). O modal ferroviário apresenta altos índices de acidentes, quando comparados com outros países.1

O setor de transportes de carga também é prejudicado pela defi-ciência de oferta e qualidade de infra-estrutura de apoio, com poucos e ineficientes terminais intermodais, que são fundamentais para a inter-conexão e a coordenação entre modais. A partir dos números de termi-nais aquaviários e ferroviários, o estudo CNT/CEL estima que existem 250 terminais intermodais no Brasil, enquanto nos Estados Unidos eles chegam a 3 mil. Lá, além disso, a eficiência operacional de cada terminal é muito maior.

O Brasil está dividido em cinco regiões. A articulação inter-regiões é bastante deficiente, centrada basicamente no modal rodoviário, nas

1 A situação dos modais de transporte serão tratadas nas próximas seções.

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Raph a el Pa du l a

poucas e extensas rodovias federais. A articulação entre as regiões se organizou em torno dos antigos caminhos do Brasil colônia. As vias de circulação foram reestruturadas de modo a facilitar a drenagem da produção econômica em direção aos portos, ao comércio exterior. A circulação interior praticamente inexiste. Dados do governo federal apontam que mais de 50% da circulação de cargas está na Região Su-deste, o que corresponde à sua maior participação na distribuição dos fatores econômicos. No Brasil, a divisão geográfica de natureza regional tem uma clara e perfeita contrapartida quando justaposta ao conceito de mercados. Daí a importância que a atividade de transportes ainda pode exercer para a integração das regiões.

A recuperação e a ampliação da malha viária devem refletir a im-portância do setor de transporte para o processo de desenvolvimento, assim como para promover a correção dos desequilíbrios regionais. A integração regional deve ser a primeira prioridade de um plano de go-verno nessa área.

A falta de planejamento e controle do setor de transportes levará a um colapso – o que alguns já chamam “apagão” dos transportes ou “paradão”, em alusão à crise de energia elétrica ocorrida no governo Fer-nando Henrique. Os principais sintomas são: frota rodoviária e material rodante ferroviário envelhecidos (caminhões com mais de 18 anos e lo-comotivas com idade média superior a 25 anos); estradas em condições inadequadas, 75% das quais com qualidade comprometida (deficiente, ruim ou péssima); baixa oferta de infra-estrutura ferroviária; baixíssi-ma oferta de terminais intermodais (multimodais); e hidrovias pouco utilizadas.

Maior concentração da matriz de transportes no modal rodoviário, menos eficiente em termos energéticos, e menor concentração no mo-dal ferroviário, mais eficiente, tendem a fazer o Brasil menos eficiente em termos energéticos nesse setor, principalmente quando comparado aos Estados Unidos.

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Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

Visto como um todo e usando-se como critério os gastos de BTUs (British Termal Unit) para cada dólar gerado do PIB, o setor de trans-portes brasileiro apresenta um índice de aproveitamento energético 29% maior que o dos Estados Unidos (CNT/CEL, 2002, p. 24). Aproveitamos menos as fontes não-renováveis de energia no setor, o que incide no nível de emissão de poluentes, no custo dos bens, nas contas externas e na dependência de combustíveis. O nível de emissão de poluentes do setor de transportes brasileiro supera amplamente o norte-americano, em termos de óxidos de nitrogênio e monóxido de carbono, principais poluentes relacionados à combustão de veículos. O baixo nível de ma-nutenção e o envelhecimento da frota tendem a agravar essa diferença.

Fonte: CNT/CEL 2002, p. 24.

Transporte de passageirosEmbora o nosso principal foco seja o transporte de cargas, é importante abordar algumas questões sobre a matriz de transportes de passagei-ros. A concentração do transporte de passageiros no modal rodoviário é muito maior do que a que apontamos no transporte de cargas: nesse caso, a participação das rodovias ultrapassa 90% do total.

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Raph a el Pa du l a

Matriz de transporte de passageiros

Modalidade Pass. x km %Aérea 29.7 4.9

Ferroviária 10.7 1.8Metroviária 4.4 0.7Rodoviária 561.0 92.6Aquaviária ... ...Dutoviária - -

Total 605.8 100.0Fonte: Anuários estatísticos Geipot e Consultoria DLC.

Analisando por número de passageiros transportados, tanto urba-nos quanto de longa distância, a participação rodoviária supera 75% do total. Essa marca se mantém se analisarmos apenas o transporte urbano, mas diminui pouco mais de 10% se analisarmos apenas o transporte de longa distância. Quanto ao modal ferroviário, vale ressaltar sua insigni-ficante participação no transporte de passageiros a longa distância e sua baixa participação no transporte urbano. No transporte de longa distân-cia, é importante observar uma participação relativamente mais elevada do transporte aéreo, que tem crescido nos últimos anos, enfrentando problemas e restrições pela falta de planejamento e de investimentos.2

2 Utilizamos o Boletim CNT 2005 (dez/2005) para análise do número de passageiros transportados por ser o último número do Boletim que ofereceu dados sobre transporte ro-doviário urbano. Os dados são referentes a 2005.

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Transporte de passageiros

ModalPassageiros

transportados (milhões)*

% do total

Rodoviário Interestadual/Internacional

132,8 2,71%

Rodoviário urbano** 3.582,3 73,02%Ferroviário longa

distância 1,7 0,03%

Ferroviário urbano*** 1.114,8 22,73%

Aéreo 75 1,51%TOTAL 4.905,6 100%

Fonte: Boletim CNT dez/2005.

*Valores aproximados.

** Acumulado por ano nas principais cidades brasileiras (Belo Horizonte, Goiânia, Fortale-za, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo).

*** Metro-ferroviário.

Transporte de passageiros urbano

ModalPassageiros

transportados (milhões)

% do total

Rodoviário urbano 3.582,3 76,27%Ferroviário urbano 1.114,8 23,73%

Total urbano 4.697,1 100%

Fonte: Boletim CNT dez/2005.

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Raph a el Pa du l a

O número de empresas atuantes no modal rodoviário é bem supe-rior ao dos demais. Conforme observamos, isto se deve principalmente à prioridade dada a esse modal, bem como ao baixo custo de entrada e alto custo de saída no setor de transporte rodoviário de cargas. Em ter-mos globais, os transportes interestaduais e intermunicipais rodoviários geram mais de 500 mil empregos indiretos. O transporte aéreo gera 35 mil empregos diretos e 245 mil empregos indiretos.

Empresas e autônomos

Modal

RodoviárioFe

rrov

iário

Aér

eo

Passageiros

Tran

spor

tado

ras

Cam

inho

neiro

s

Fret

amen

to

Urb

ano

Inte

rest

adua

l /In

tern

acio

nal

N.° de empresas/

autônomos110.942 618.409 8 12 3.808 6.119 222

Fonte: Boletim CNT dez/2005.

A racionalização dos transportes públicos de passageiros (coleti-vos) gera maior eficiência econômica, pois reduz os custos, e favorece a qualidade de vida da população, principalmente nos grandes centros urbanos. Embora o automóvel possa ser visto como fonte de conforto individual e sua produção gere empregos, impostos e desenvolvimento, a racionalização do transporte de massa é mais importante para o bem público. A oferta de transporte de massa, sua acessibilidade e grau de in-tegração, bem como seu custo, são importantes para a qualidade de vida por ter reflexos diretos em congestionamentos, acidentes, poluição do ar, ruídos e custo urbano, principalmente em áreas mais concentradas.

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Segundo o estudo Transporte de passageiros da CNT/Coppead-UFRJ de 2002 (p. 56), “as variáveis mais importantes para os usuários na escolha do modal para realizar suas viagens são preço, tempo de via-gem, viagens diretas, atendimento, flexibilidade, conforto e segurança. A procura por viagens diretas (não-utilização de integração com ônibus, trem, metrô e barcas) tem várias causas, principalmente o desconforto da integração e uma quase nula vantagem tarifária.”

O transporte público deve ser encarado como serviço de utilida-de pública. Além de afetar a qualidade de vida da população, seu custo incide diretamente nos salários reais dos trabalhadores. Grande parce-la do preço da tarifa é utilizada para pagar as gratuidades e subsidiar viagens de longa distância, nas quais os governos não subsidiam nem gratuidades nem passagens normais. Caso não houvesse gratuidade, a tarifa poderia ser menos da metade da atual. Como os governos não pa-gam as gratuidades, estas recaem sobre as tarifas cobradas aos usuários pagantes, em sua maioria trabalhadores.

Falta de planejamento e falta de prioridade ao transporte público levam ao caos urbano nos transportes, ao surgimento dos chamados transportes “alternativos” (clandestinos ou não) e ao crescimento do nú-mero de automóveis (flexibilidade e disponibilidade), para quem pode arcar com os custos. Aumentam o número de veículos automotores em circulação, os congestionamentos e a poluição. O resultado final é dimi-nuir a qualidade de vida e reduzir a eficiência econômica. No transporte de passageiros, maior ênfase deveria ser dada à intermodalidade, aos transportes de massa de menor custo, ao planejamento e à idéia de que o transporte é um serviço de utilidade pública que incide pesadamente no custo de vida da população de renda mais baixa.

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Raph a el Pa du l a

LogísticaO sistema logístico do Brasil apresenta problemas de produtividade e de custos, que se refletem diretamente na competitividade, na eficiência e nos custos da economia como um todo. A comparação entre os custos logísticos no Brasil e nos Estados Unidos, países continentais, revela a necessidade de ações para aumentar a eficiência do setor.

Em 1997, havia 35 operadoras com receita anual de R$ 1 bilhão. Em 2005, já existiam 118 operadoras que empregam 79 mil pessoas, com receita anual de R$ 16,4 bilhões. A tendência é de crescimento no setor. Conforme observamos no capítulo 1, os principais produtos que utilizam logística são: minérios, metal-metalúrgicos, químicos, petro-químicos, automotivos, alimentícios, farmacêuticos e eletro-eletrôni-cos. Nossas mercadorias são muito carregadas por custos logísticos, que são um fator importante no “custo Brasil”. Temos que evoluir para nos tornar mais competitivos.

O custo logístico no Brasil foi de R$ 225,5 bilhões em 2004, equiva-lente a 12,8% do PIB. O custo com transportes são os mais importantes. Correspondem a 60% dos custos logísticos, seguidos pelos custos de es-toque, que equivalem a 30,5%. Vale ressaltar o impacto da concentração no modal rodoviário, cujos custos responderam por 6,1% do PIB, ou R$ 109,5 bilhões, quase a metade dos custos logísticos em 2004, conforme dados do Centro de Estudos Logísticos da Coppead-UFRJ.

Os custos variáveis são importantes nos fretes. Conforme obser-vamos, os fretes se relacionam mais diretamente aos custos variáveis e não chegam a remunerar os custos fixos. A alta do preço do barril de petróleo incide diretamente nos custos, no preço do óleo diesel e também dos pneus, impactando os fretes e a margem de negociação por parte dos autônomos.

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Custo logístico no Brasil 2004

Custo Valor em R$ bi % do PIBCusto total (R$) de

transporte 135,5 7,7

Rodoviário 109,5 6,1 Ferroviário 7,5 0,4 Aquaviário 12,5 0,7

Aéreo 2,1 0,1 Dutoviário 3,9 0,2Custo de estoque 69,8 3,9

Custo de armazenagem

11,7 0,7

Custo administrativo 8,5 0,5Custo Logístico Total 225,5 12,8

Fonte: Centro de Estudos Logísticos / Coppead-UFRJ.

Segundo dados do CEL/Coppead, referentes a 2004, o custo de armazenagem foi estimado em R$ 11,7 bilhões, igual a 0,7% do PIB, e o custo administrativo em R$ 8,5 bilhões, 0,5% do PIB.3 O custo de estoque, equivalente a 1/3 do custo logístico, foi estimado em R$ 69,8 bilhões, equivalente a 3,9% do PIB. É importante salientar que o custo financeiro (custo de capital) de estoque está relacionado à taxa de juros básica da economia (taxa Selic), que nesse ano foi de 16,25%, em mé-dia.4

3 LIMA, Maurício P. (2006). “Custos logísticos na economia brasileira”. In Revista de Tecnologia, Janeiro/2006. Rio de Janeiro: Coppead – UFRJ.4 Idem.

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Raph a el Pa du l a

O Brasil tem uma taxa de juros alta. A média da taxa de juros no-minal em 1996 foi de 27,15% ao ano, caindo para 16,44% ao ano em 2004 – e alcançou 12,75% ao ano no início de 2007. Se compararmos com os Estados Unidos, a taxa de juros nominal média foi de 5,27% ao ano em 1996 e caiu para 1,38% ao ano, alcançando 5,25% ao ano em 2007. Isso fez com que o custo de estoque, como proporção do produto interno bruto no Brasil, fosse quase o dobro do registrado nos Estados Unidos em 2004: 3,9% contra 2,1%. Este é um dos principais fatores explicativos do maior custo logístico em relação ao PIB no Brasil em comparação com os Estados Unidos.5 O custo administrativo (em rela-ção ao PIB) também foi quase o dobro – 0,5% contra 0,3% – e o custo de transportes, principal custo logístico (também em relação ao PIB), foi o que registrou maior diferença entre Brasil e Estados Unidos: 54%.

Custo de logística comparado: Brasil x EUA (em % do PIB - 2004)

Brasil EUATransporte 7,7 5,0

Estoque 3,9 2,1Armazenagem 0,7 0,7Administração 0,5 0,3Total em 2004 12,8 8,1

Fonte: Centro de Estudos Logísticos da Coppead-UFRJ.

5 LIMA, Maurício P. (2006).

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Porcentagem de custos logísticos em relação ao PIB:Brasil x EUA (2004)

R

Ó

R

Fonte: CEL/Coppead-UFRJ - www.centrodelogistica.com.br

Matriz de transporte de cargas e custos comparados em dólar - 2004:* Brasil x EUA

MODAL BRASIL EUA% de carga

**US$/1000 T

Km% de carga US$/1000 T

KmAéreo 0,1 602 0,4 898

Dutoviário 4,5 18 15,1 9Aquaviário 12,2 24 15,5 9Rodoviário 59,3 73 29,5 274Ferroviário 23,8 12 39,6 17

* Foram usados para o cálculo valores e dólares de 2004, em média R$ 2,93/US$.

** Calculado com base em TKU.

Fonte: Lima, 2006 - a partir de dados do Geipot, Fipe e CEL/Coppead-UFRJ.

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Lima (2006) chama a atenção para a considerável diferença entre os valores do frete rodoviário do Brasil e dos Estados Unidos. Isso se deve às cargas, ao perfil de rotas e à situação do mercado rodoviário, que são bastante diferentes nos dois países. Nas palavras de Lima (2006, p. 68): “Enquanto no Brasil predomina o transporte de produtos agrícolas em distâncias relativamente longas nesse modal [rodoviário], nos Esta-dos Unidos ele está voltado ao transporte de produtos de mais alto valor agregado [bens industriais] e à complementação dos outros modais por uma ponta rodoviária de menor distância.” O autor ressalta o excesso de oferta de transporte rodoviário no Brasil, diferente da escassez de motoristas nos Estados Unidos.

No modal aéreo há pouca diferença, embora o custo do Brasil seja um pouco menor. Já no transporte dutoviário, a diferença em favor dos Estados Unidos é grande, por causa de economias de escala – grandes dutos, transportando grandes volumes em longas distâncias – e do me-nor custo de capital (taxa de juros). Os Estados Unidos também se des-tacam pelo amplo uso do transporte aquaviário, contando com grandes composições para transportar grandes volumes a menor custo.

O custo do transporte ferroviário é menor no Brasil – 12 dólares contra 17 dólares por 100 T/Km. No entanto, conforme Lima (2006) observa, se a Companhia Vale do Rio Doce for retirada do cálculo, o valor passa a ser praticamente o mesmo nos dois países (16,93 dólares). A CVRD opera para si mesma, a preço de custo, com alta produtividade e grande volume.

Lima assinala (2006, p. 69): “Mesmo considerando a composição da matriz de transportes dos dois países, em 2004 o custo médio de se transportar uma tonelada por 1 mil km era menor no Brasil que nos Estados Unidos.” O custo de transporte é maior no Brasil (7,5%) que nos Estados Unidos (5,1%), em relação ao PIB, por causa da “relação entre a movimentação de carga e o tamanho da economia”. Pois, “enquanto a economia americana é praticamente vinte vezes maior que a nossa, eles

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só movimentam sete vezes mais cargas que o Brasil”. Para Lima, isso se deve ao alto valor agregado das mercadorias transportadas e à maior participação do setor de serviços em relação ao PIB nos Estados Unidos. Nossa estrutura produtiva baseada na produção de commodities (bens primários e/ou de baixo valor agregado, não-intensivos em tecnologia) nos leva a realizar grandes transporte de cargas de baixo valor agregado e mantém baixa a participação do setor de serviços.

Dois fatores determinantes nos custos de transportes e logísticos brasileiros são sua concentração no modal rodoviário e a falta de in-termodalidade – especialmente em comparação com os Estados Uni-dos. Mesmo com fretes baratos, o setor rodoviário não é competitivo em transportes de longa distância, em relação aos modais ferroviário e aquaviário. A intermodalidade dá a opção de usar no transporte de mer-cadorias, no momento certo, o modal mais adequado em termos de cus-tos – como ocorre nos Estados Unidos. É preciso que o Brasil implante um sistema de transportes intermodal e aproveite toda a potencialidade da intermodalidade, com amplo apoio de oferta logística eficiente.

O CEL/Coppead realizou uma pesquisa em que perguntava pela prioridade entre “redução de custos” versus “melhoria de serviços”. Para 55% dos entrevistados do setor, a redução de custo é prioridade em re-lação à melhora dos serviços (para 22,5%, ambos têm prioridade igual e para 22,5% a prioridade é a melhora de serviços). Já nos Estados Uni-dos, os resultados foram: 26% para prioridade igual, 35% para redução de custos e 39% para serviços como principal prioridade em relação à redução de custos.

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Brasil x EUA, 2004Prioridade: redução de custos x melhora de serviços (2004)

Brasil EUAPrioridade Igual 22,5% 26,0%

Prioridade redução de custos 55,0% 35,0%Prioridade melhora de serviços 22,5% 39,0%

Fonte: CEL/Coppead-UFRJ; www.centrodelogistica.com.br

Os principais problemas do setor são: (a) oferta inadequada, com escassez de espaço para armazenamento de grãos nas áreas produtoras; (b) gargalo nas estradas de aproximação aos portos, especialmente no caso de Santos; (c) estradas de rodagem em más condições, precisando de grande volume de investimento em restauração e manutenção; (d) frota de caminhões com idade média alta (estimada em cerca de deze-nove anos); (g) estradas de ferro pouco rentáveis e com necessidades de investimentos significativos; (h) utilização precária do transporte aqua-viário e da navegação de cabotagem.

As ações de integração nacional e intermodal devem ser acom-panhadas de outros investimentos, como estradas alimentadoras, ter-minais e pátios intermodais, armazenagem nas propriedades, terminais portuários especializados etc. A intervenção governamental poderá contar com expressiva participação do setor privado no investimento direto e/ou na montagem de esquemas de financiamento.

A infra-estrutura logística deve receber apoio e financiamento para a construção de armazéns coletores por proprietários, por coope-rativas e por associações de produtores, estabelecendo-se como meta a construção de uma capacidade de 70 milhões de toneladas até 2010. Todas as cidades devem ter, pelo menos, uma unidade armazenadora para realizar todo o processamento, a limpeza e a secagem da produção

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agrícola local. Além disso, todos os armazéns pertencentes à União e a suas empresas, com características típicas de armazenagem coletora, deveriam ser identificados e integralmente transferidos a associações de produtores e/ou cooperativas localizadas na sua área de influência. Isso exigiria recursos da ordem de R$ 1,8 bilhão em oito anos.

Analisando os modaisTransporte rodoviárioConforme observamos no primeiro capítulo, as empresas de transportes rodoviário são o núcleo de maior dinamismo do setor, respondendo por mais de 60% da produção de transportes de cargas. Essa predominância deve-se à maior flexibilidade operacional, espacial e de nível de serviço, bem como à maior agressividade de seus operadores. O modal rodoviá-rio também é dominante nos transportes urbanos de passageiros.

Desde 1995, a Confederação Nacional do Transporte (CNT) reali-za anualmente a Pesquisa Rodoviária, que fornece o perfil da oferta de infra-estrutura desse modal. A pesquisa analisou 84.382 km de rodovias pavimentadas em 2006. Seguindo os resultados, consideraremos os as-pectos de conservação, segurança e conforto ao usuário das rodovias brasileiras pavimentadas: pavimentação, sinalização e geometria.

A infra-estrutura rodoviária cresceu sob condução e investimentos estatais. As formas de gestão dessa infra-estrutura se dividem entre a gestão estatal e a concessionada. A primeira pode se basear em recursos públicos federais e/ou estaduais para realizar as diferentes ações, como ampliação, conservação e manutenção, restauração e reconstrução. Já na gestão concessionada, a responsabilidade por essas ações fica delegada a terceiros, que geralmente utilizam a cobrança de pedágios, sob fiscaliza-ção do Estado, o qual também pode adotar pedágios em suas vias.

Hoje, há pedágios em 6,2% da extensão do modal rodoviário bra-sileiro, formando a maior malha pedagiada do mundo. A malha rodo-viária concessionada no Brasil em meados de 2007 atingia 10.825 km

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Raph a el Pa du l a

– 9.739 km administrada pela iniciativa privada e o restante pelas ope-radoras –, com 37 concessões, assim divididas: seis rodovias federais, trinta estaduais e uma municipal. As concessões prevêem serviços de apoio aos usuários: socorro médico, socorro mecânico, telefonia, câma-ras de TV. Evidentemente, o setor privado tem interesse em atuar nas rodovias de maior tráfego e maior importância econômica.

O quadro geral da malha rodoviária nacional mostra os seguintes números:

Extensão da malha rodoviária (km)

Pavimentada Não Pavimentada TotalFederal 57.933 14.777 72.710

Estadual transitória 17.049 7.277 24.326

Estadual 98.377 109.963 208.340Municipal 22.735 1.281.965 1.304.700

Total 196.094 1.413.982 1.610.076Fonte: Boletim Estatístico CNT, janeiro de 2007.

A malha rodoviária nacional possui 1.610.076 km, das quais aproxi-madamente 88% são não pavimentados. Há 173 terminais rodoviários.

O estado geral de conservação da malha rodoviária brasileira é ruim, apresentando índices desfavoráveis significativos. Este é o princi-pal entrave ao modal. A Pesquisa Rodoviária CNT 2006 constatou que 12,2% da extensão pesquisada se encontram em péssimas condições, 24,4% em condições ruins e 38,4% em condições regulares. Isto significa que 75% da extensão analisada têm alguma restrição, sendo classificados como regulares, ruins ou péssimos. Somente 25% da extensão avaliada são classificados como bons (14,2%) ou ótimos (10,8%).

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Estado Geral das RodoviasEstado geral % %

Ótimo 10,825

Bom 14,2Regular 38,5

75Ruim 24,4Péssimo 12,1

Péssimo

Ruim

Ótimo

Bom

Regular

24,4%

12,1%10,8%

14,2%

38,5%

Fonte: CNT, Pesquisa Rodoviária 2006.

Extensão total analisada: 84.200 km.

As condições do pavimento são muito importantes, pois influen-ciam a segurança, o tempo e os custos de transporte. Segundo a ava-liação da CNT (Pesquisa Rodoviária, 2006), 45,5% dos pavimentos são classificados como ótimos ou bons (37,6% ótimos e 8% bons). É procu-pante porém que mais da metade (54,5%) sejam classificados de modo insatisfatório, na condição de regulares (35,6%), ruins (12,6%) ou pés-

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Raph a el Pa du l a

simos (6,2%). Isso quer dizer que o índice para condição do pavimento é desfavorável.6

As condições de sinalização são um dos aspectos mais importantes para a segurança das rodovias, que podem amenizar outros aspectos ruins. A análise da CNT (2006) aponta que 31,4% da extensão pesqui-sada são classificados como regulares e 38,9% estão em estado crítico – 20,2% são ruins e 18,7 são péssimas. Ou seja, 70,3% das rodovias apresentam alguma restrição, o que representa um índice desfavorável. Somente 29,7% estão em condições favoráveis – 19,4% avaliadas como ótimas e 10,3% como boas.

As condições de geometria da via têm impacto na segurança e na fluidez das vias rodoviárias.7 A grande maioria da extensão pesquisa-da foi considerada em más condições, 25,7% foram classificadas como péssimas, 28,7% como ruins e 24,1% como regulares. Isto significa que 78,4% se enquadram nesse perfil restritivo. Além disso, a CNT (Pesquisa Rodoviária CNT 2006, p. 39) constata que 89,7% das rodovias nacionais são formadas por pistas simples de mão dupla e 40,5% não têm acos-tamento. Somente 21,6% se enquadram na classificação boa (15,2%) ou ótima (6,4%) em termos de geometria da via. Conforme a Pesquisa Rodoviária CNT 2006 (p. 39) relata: “Além da ausência de acostamento em grandes extensões, é grande o percentual de trechos com acosta-

6 Os critérios de avaliação de pavimento da Pesquisa CNT (CNT, 2006, pp.36-37), , de forma bem sintética, foram os seguintes: “a. A avaliação é feita da observação das condições do pavimento a cada seguimento de até 10 quilômetros de extensão que compõe a extensão total pesquisada; b. Em cada segmento o avaliador assinala a presença de um ou mais grupos de defeitos predominantes na superfície do segmento. (...)”, c. Identificação da predominância de algum grupo de defeitos sobre um segmento de 10 km de extensão.7 Na avaliação da geometria das vias, a metodologia usada pela Pesquisa CNT (2006, p.39) foi a seguinte: “a pista simples será avaliada como tendo boas condições gerais de segu-rança quando possuir: acostamento sem mato, faixas centrais e/ou faixas laterais visíveis ou desgastadas; a pista simples será avaliada como tendo condições gerais de segurança ruins quando o seu acostamento for tomado pelo mato ou for inexistente, independente da condição da sinalização horizontal; ou quando a sinalização horizontal não existir. ”.

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mentos destruídos ou desgastados, que comprometem as condições de uso para refúgio de veículos e/ou para realização de manobras evasivas de emergência. A ausência de faixas adicionais de subida (terceira faixa) em vários trechos de pistas simples com aclives longos e acentuados se reflete, também, no resultado da avaliação.”

O gráfico abaixo apresenta de forma resumida as características da malha rodoviária nacional e revela os índices desfavoráveis, que têm reflexos negativos nos custos, no tempo gasto e na segurança do setor.

Resumo das características avaliadas das rodovias

Fonte: CNT – Pesquisa Rodoviária 2006, p. 40.

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Raph a el Pa du l a

Indicações da Pesquisa % KmPavimento em estado crítico (regular, ruim, péssimo) 54,6 45.950

Sinalização com problemas 70,3 59.309Sem acostamento 40,5 34.168

Placas encobertas por mato 1,3 1.119Trechos com afundamentos, ondulações ou buracos 8,6 7.228

Predominância de pista simples de mão dupla 89,7 75.696Fonte: Boletim estatístico CNT, janeiro/2007, baseado em dados da Pesquisa Rodoviária

CNT 2006.

Pontos Críticos

Erosão na pista 119Defensas destruídas 80

Queda de barreira 14Ponte caída 4

Buraco grande 69Total 286

Fonte: Boletim estatístico CNT, janeiro/2007.

Deve-se ressaltar que a capacidade de suporte do pavimento in-flui na durabilidade. De acordo com a Pesquisa Rodoviária CNT 2006, o país pouco utiliza, como alternativa, pavimentos com maior suporte (como os pavimentos de concreto ou pavimentos rígidos). As condi-ções do pavimento influem na segurança e eficiência do transporte, in-cidindo no tempo e no custo de transporte (velocidade e fluidez). Havia obras em apenas 5,1% da extensão pesquisada.

O mapa brasileiro das rodovias classificadas, retirado da Pesquisa Rodoviária CNT 2005, além de revelar as condições comprometidas da malha rodoviária nacional, mostra que a quase-totalidade das vias em

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boas ou ótimas condições estão concentradas nas regiões Sul e Sudeste (área de maior grau de desenvolvimento), no polígono São Paulo-Rio de Janeiro-Belo Horizonte-Brasília e ligadas a portos (caminhos para exportação). Este cenário revela uma estrutura viária em boas condi-ções “voltada para fora” e para o escoamento de commodities de baixo valor agregado e tecnológico, em um país continental com muitas regi-ões cujo desenvolvimento ainda precisa ser induzido.

Estado geral das rodovias por regiões

Fonte: CNT – Pesquisa Rodoviária 2006

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Raph a el Pa du l a

Estado geral das rodovias

Fonte: Pesquisa Rodoviária CNT 2006, p. 100.

O gráfico revela que o percentual de rodovias em boas ou ótimas condições também é desfavorável nas regiões Sul e Sudeste, sendo in-

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Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

ferior a 50% (36% no Sudeste e 39% no Sul). Esse percentual é ainda menor nas demais regiões: 12% no Norte, 10% no Nordeste e 21% no Centro-Oeste. Essas regiões demandam maior oferta de infra-estrutura, principalmente para desafogar, atenuar ou eliminar efeitos de aglomera-ção e concentração. No entanto, uma melhor oferta nessas regiões tende a acentuar efeitos polarizadores, concentrando riqueza ali, e a dificultar (ou mesmo afastar impossibilitar) objetivos de desenvolvimento regio-nal em favor das regiões menos favorecidas e da integração nacional. A oferta rodoviária atual favorece um desenvolvimento desequilibrado e concentrado.

É interessante analisar de forma separada a malha rodoviária, dife-renciando aquela que continua sob gestão estatal e aquela que está sob regime de pedágios.

Apenas 16,9% da extensão de rodovias pesquisadas sob gestão do Estado estão em condições de conservação favoráveis – 12,2% boas e 4,7% ótimas. Esses números revelam o estado deteriorado das rodovias: 83,1% de enquadram nas classificações péssimo (14%), ruim (27,4%) ou regular (41,7%).

A Pesquisa Rodoviária CNT 2006 considerou as rodovias pedagia-das, administradas por órgãos estaduais ou por concessionárias,8 ana-lisando 10.825 km, e mostrou que o cenário se inverte. Em condições favoráveis encontram-se 79,8% da extensão das rodovias analisadas – 52,1% classificadas como ótimas e 27,6% como boas; somente 20,2% dos trechos registram condições de conservação com restrições – 0,2% péssimas, 3,7% ruins e 16,3% regulares. Em pavimento e sinalização, por exemplo, essas vias são consideradas ótimas em 84,3% e 78,5% dos casos, respectivamente – contra 30% e 10,8% para as rodovias sob ges-tão do Estado e não pedagiadas.

8 Consideradas rodovias concedidas pela União, sob fiscalização da ANTT, e ro-dovias federais delegadas aos estados.

6 9

Raph a el Pa du l a

Extensão Federal

Estado Geral Km %Ótimo 4.427 7,7

23,5Bom 9.075 15,8

Regular25.696 44,7

76,512.636 22,0Péssimo 5.628 9,8

Total 57.462 100,0

Extensão sob Gestão Estatal

Estado Geral Km %Ótimo 3.452 5,2

19,7Bom 8.998 14,5

Regular 30.642 34,780,3Ruim 20.162 24,8

Péssimo 10.303 20,8Total 73.557 100,0

Fonte: Boletim Estatístico CNT, janeiro/2007.

7 0

Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

Classificação geralExtensão pedagiada sob gestão terceirizada ou estatal

27,6%

52,1%

3,7% 0,2%

16,3%

Péssimo

Ruim

Ótimo

Bom

Regular

Fonte: CNT – Pesquisa Rodoviária 2006.

Esses números podem passar a idéia de que o Estado não tem re-cursos para administrar as rodovias. Tais recursos estariam no setor pri-vado, de modo que os pedágios e as concessões seriam a melhor forma de financiar e ofertar transportes adequados. No entanto, o problema está na prioridade que o orçamento estatal concede aos gastos financei-ros. Além disso, a extinção do Fundo Rodoviário Nacional, a partir da promulgação da Constituição de 1988, pode ser considerado um marco no desarranjo das finanças do setor.

A avaliação desfavorável do estado de conservação da malha rodo-viária nacional, com 75% de sua extensão comprometidos, mostra a ne-cessidade de grandes investimentos na infra-estrutura rodoviária brasi-leira – ampliação, manutenção, conservação e restauração. Por causa da concentração da produção de transportes nesse modal, a eficiência e a competitividade da economia, como um todo, fica prejudicada. Melho-rar a oferta de infra-estrutura rodoviária no Brasil significa aumentar a produtividade da economia. Além disso, é preciso privilegiar os as-pectos de integração nacional e de intermodalidade. O atual estado da

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Raph a el Pa du l a

infra-estrutura rodoviária dificulta acessos às regiões menos favorecidas e contribui para promover um desenvolvimento desequilibrado entre regiões.

A Pesquisa Rodoviária CNT 2006 (p.141) afirma: “Ao analisar os resultados da pesquisa, é possível concluir que as deficiências na infra-estrutura rodoviária comprometem a integração com as demais moda-lidades, gerando restrições operacionais e dificultando o crescimento da intermodalidade. Todo crescimento econômico do país tem que ser precedido por uma situação favorável dos sistemas de transportes, o que requer melhoras significativas na rede atual, além da expansão do siste-ma rodoviário nacional.”

A oferta de infra-estrutura deve andar à frente da demanda, para que não existam gargalos ao crescimento da economia. A CNT (Pesqui-sa Rodoviária CNT 2006) estima em R$ 22,2 bilhões por ano os inves-timentos necessários para que o sistema rodoviário alcance um padrão adequado de segurança e desempenho (0,9% do PIB, considerando-se a metodologia de cálculo do PIB adotada em 2007 pelo IBGE). Para conservação e manutenção adequadas, são necessários investimentos anuais da ordem de R$ 1,3 bilhão (0,05% do PIB na metodologia atual). São valores irrisórios, se comparados aos gastos financeiros do Estado.

Investimentos necessários para conservação das rodovias

Km R$/km/Ano R$/AnoPista simples 75.696 14.250 1.078.668.000,00

Pista dupla 8.686 24.000 208.464.000,00Total 84.382 38.250 1.287.132.000,00

Fonte: Pesquisa Rodoviária CNT 2006.

7 2

Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

Investimentos necessários para recuperar o pavimento

Km R$/km TotalReconstrução 5.217 750.000 3.912.750.000

Restauração 40.733 420.000 17.107.860.000Manutenção 6.712 180.000 1.208.160.000

Total 52.662 22.228.770.000 Fonte: Pesquisa Rodoviária CNT 2006.

Os recursos da Contribuição de Intervenção no Domínio Econô-mico (CIDE), que deveriam ser investidos em obras de infra-estrutura, têm sido direcionados para outros gastos. Embora insuficientes, esses recursos seriam importantes.

O impacto da matriz de transportes brasileira sobre o custo dos fretes reflete-se no envelhecimento da frota cargueira. O setor de transportes rodoviário de cargas apresenta pequenas barreiras à entrada e grandes barreiras à saída, o que permite o aumento da oferta. Além dessas, as principais causas da ampla oferta do transporte rodoviário de cargas são o alongamento das jornadas de trabalho (excessivas), os aumentos no peso dos carregamentos (sobrepeso), a baixa manuten-ção e renovação da frota e a inadimplência fiscal do setor. O aumento da oferta contribui para abaixar o valor relativo dos fretes, o que gera barreiras à saída, baixa renovação e manutenção insuficiente da frota. A falta de fiscalização rodoviária de pesos de carga, com a inoperância ou a paralisação de 91% dos postos de pesagem, leva ao aumento da oferta e à degradação da malha rodoviária.

7 3

Raph a el Pa du l a

Fonte: CNT/Coppead, 2002, p. 36.

Geralmente, o preço do frete cobre os custos variáveis, mas não remunera os custos fixos (principalmente os de investimento, como de-preciação e financeiro). Isso ocorre principalmente com os transporta-dores autônomos. Segundo o estudo conjunto CNT/Coppead de 2002, nesse ano a idade média da frota seria de 17,5 anos, com 76% dos veículos com mais de dez anos. A projeção para 2012 é de 20,9 anos. Tal situação não é sustentável no médio e no longo prazos.

Um frete rodoviário artificialmente baixo funciona como um obs-táculo à intermodalidade, comprometendo o vigor do setor e a sustenta-bilidade da economia, o que gera externalidades negativas. O gráfico da próxima página, retirado do estudo elaborado pela CNT/CEL-Coppead 2002, mostra o baixo preço dos fretes para transporte de cargas fechadas em longas distâncias e sua diferença negativa em relação aos custos-padrão do setor.9 Essa diferença leva o transportador a adotar medi-

9 Não foram considerados na curva de custos a depreciação dos caminhões e o custo de oportunidade do capital investido no caminhão.

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Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

das como sobrecarga e jornada de trabalho excessiva, que diminuem os custos, ampliam a oferta e, ao mesmo tempo, deprimem o preço dos fretes, formando um ciclo vicioso.10 Outras conseqüências do aumento inadequado da oferta são altos índices de acidentes, excessiva emissão de poluentes, engarrafamentos e excessivo consumo de combustíveis.

Os baixos investimentos em manutenção da frota de veículos são causa e conseqüência dos preços baixos dos fretes. O estudo CEL/Co-ppead mostra que os custos médios de manutenção (peças, mão-de-obra, pneus e óleo) por km rodado são da ordem de R$ 0,23; estimati-vas da CNT indicam que os autônomos gastam, em média, somente R$ 0,16. O quadro torna-se ainda pior ao constatarmos que quanto mais velho o veículo, menores são os investimentos em manutenção.

R$ p

or 1

000

TKU

Valor do Frete Rodoviário (R$ / Ton*Km)

Custo = 64

Preço Médio = 45“gap”

Rota (Km)

0 200 400 600 800 1000 1200 1400 1600

200

150

100

50

0

Fonte: CNT/CEL, 2002, p. 33.

10 No caso específico do transportador autônomo, conforme chama a atenção o estudo CNT/CEL 2002, ele enfrenta barreiras à entrada muito pequenas, simplesmente pos-suir a habilitação e o caminhão, e altas barreiras à saída, diante das condições do mercado de trabalho brasileiro, com alto desemprego formal (acima de 10%) e difícil alocação de mão-de-obra com baixa qualificação (poucos anos de educação).

7 5

Raph a el Pa du l a

Altas barreiras de saída

Pequenas barreiras de entrada

O c

írcul

o vi

cios

o do

tr

ansp

orte

rodo

viár

io

O círculo vicioso do transporte rodoviário de cargas

Baixo valor dos fretes

Aumento da oferta

Baixa renovaçãobaixa manutenção

Sobrepeso e excesso de jornada

Fonte: retirado do CNT/CEL, 2002, p. 34.

Média de gastos com manutenção em R$/km(por faixa de ano de fabricação)

0,161 0,1570,171 0,161 0,161

0,096

0,138

Abaixo 75 75 a 80 80 a 85 85 a 90 90 a 95 95 a 99 Acima 99

Fonte: CNT/CEL 2002, p. 37.

Os motoristas de transporte rodoviário de carga trabalham em longas jornadas, o que aumenta a oferta e diminui a qualidade do servi-

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Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

ço, pois influencia para baixo o valor do frete e aumenta a insegurança nas estradas. Não há regras que limitem o tempo de percurso.

Fonte: CNT/CEL, 2002, p. 39.

A segurança no transporte rodoviário tem sido precária no Brasil. A cada ano, são registrados em torno de 200 mil acidentes e 34 mil mor-tes nas estradas, números que superam os países da Europa e os demais da América Latina. Além dos fatores humanos, perdem-se aproximada-mente R$ 7,3 bilhões por ano.

Há dificuldades para organizar dados referentes a acidentes nas rodovias no Brasil, pois apenas as ocorrências em rodovias federais po-liciadas – 60% do total – estão disponíveis. Houve uma queda contínua, ao longo de quatro anos, após a introdução do Novo Código Brasileiro de Trânsito (1997), registrando-se uma queda total de quase 20% até 2001. Embora o número de acidentes ainda seja menor em 2004 que em 1997, desde 2001 os registros passaram a oscilar com tendência para cima e já registram alta de quase 10%.

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Raph a el Pa du l a

Evolução do total de acidentes em rodovias federais(Brasil)

116.385

124.372 115.429

102.576 104.863

108.881112.457

1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004

Novo Código Brasíleiro de Trânsito

140.000

120.000

100.000

80.000

60.000

40.000

20.000

0

Fonte: DPRF

Fonte: CEL-Coppead. Disponível em: www.centrodelogistica.com.br.

Acidentes em rodovias federais(Brasil)

Acidentes envolvendo veículos de carga

Acidentes Gerais

108881112457

50597

40107

2001 2002 2003 2004

120

100

80

60

40

20

0

Fonte: DPRF

Fonte: CEL-Coppead. Disponível em: www.centrodelogistica.com.br.

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Segundo dados do CEL-Coppead, os veículos de carga respondem por algo em torno de 35% dos acidentes em rodovias federais, concen-trados principalmente nas regiões Sudeste e Sul. A BR-116 e a BR-101 são as rodovias mais perigosas para o transporte de carga, responsáveis por 23% e 17% dos acidentes, respectivamente.

Segundo dados do CEL-Coppead, o índice de mortes para cada 10 mil acidentes no Brasil é aproximadamente 14 vezes maior que o dos Estados Unidos. As mortes por mil quilômetros de rodovia chegam a ser 32 vezes maiores que a dos países desenvolvidos.

(T

Fonte: CEL-Coppead. Disponível em: www.centrodelogistica.com.br.

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Raph a el Pa du l a

Fonte: CEL-Coppead. Disponível em: www.centrodelogistica.com.br.

A forma mais freqüente de acidente com caminhões é o tomba-mento, com 47% dos casos. A probabilidade de ocorrência aumenta com a velocidade do veículo, o peso da carga, as curvas acentuadas, o sobrepeso e as longas jornadas de trabalho. Em quase a metade dos ca-sos, alguma condição desfavorável na via contribuiu para o acidente.

Como vimos, as perdas com acidentes no transporte rodoviário de cargas chegam a R$ 7 bilhões.11 Em 2005, os prejuízos com roubos de carga foram de R$ 0,7 bilhão, valor dez vezes menor. O número de ocorrências de roubos cresceu 14% ao ano entre 1999 e 2002 e começou a cair desde então. Caiu cerca de 12% até 2005, mas nesse ano ainda re-gistrava números maiores que os de 1999, com crescimento acumulado de 1,4% no período.

11 Considerados também os prejuízos à vida, ao patrimônio e ao veículo.

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Número de ocorrências e roubos/furtos de carga no Brasil

Ano Ocorências de roubos/furtos de cargas

Tx de cresc. anual

1999 10.500 -2000 11.100 6%2001 11.400 3%2002 11.950 5%2003 11.800 -1%2004 11.700 -1%2005 10.650 -9%

10.50011.100 11.400 11.950 11.800 11.700

10.650

Tx de Cresc. 1999 - 2005 = 1,4%

Ocorrências

1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

14.000

12.000

10.000

8.000

6.000

4.000

2.000

0

* Dados estimados - rodovias e áreas urbanas

Fonte: CEL-Coppead, Indicadores de Transporte Rodoviário, disponível em: www.centro-delogistica.com.br.

Os prejuízos causados por roubos e furtos de carga têm sido cres-centes no período de 1999 a 2005, acumulando um crescimento de 66,7% no período e alcançando R$ 700 milhões. É interessante ressaltar que o maior número de roubos e furtos (77%), e a maior parte dos pre-juízos (71%), concentram-se na região Sudeste, a mais desenvolvida e com maior movimentação de cargas.

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Raph a el Pa du l a

Prejuízos com roubos e furtos de carga no Brasil (R$ milhões)

Ano Prejuízos por roubos/furtos de cargas

Tx de cresc. anual

1999 420 -2000 500 19%2001 550 10%2002 575 5%2003 630 10%2004 700 11%2005 700 0%

420500

550 575630

700 700

Tx de Cresc. 1999 - 2005 = 66,7%

R$ Milhões

1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

1.000

800

600

400

200

0

* Dados estimados - rodovias e áreas urbanas

Fonte: CEL-Coppead, Indicadores de Transporte Rodoviário, disponível em: www.centro-delogistica.com.br.

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Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

Roubos/furtos de cargas por região - 2005

RegiãoOcorrências da roubos/

furtos de cargasPrejuízos por roubo/furtos

de cargasNo. % R$ Milhões %

Centro-oeste 341 3 38 5Nordeste 812 8 67 10

Norte 270 3 19 3Sudeste 8.164 77 500 71

Sul 1.078 10 76 11

Fonte: CEL-Coppead, Indicadores de Transporte Rodoviário. Disponível em: www.centrodelogistica.com.br.

Esse número de ocorrências se reflete em custos de seguro e geren-ciamento de risco e podem influenciar os trajetos, alongando distâncias e diminuindo a produtividade do setor. É preciso um combate enérgico e integrado das polícias, com fluxo de informação e serviço de inteli-gência, para combater (evitar e recuperar) os roubos de carga no Brasil.

Por fim, a fiscalização (peso, velocidade, sonegação fiscal etc.) e a regulação ineficiente no transporte rodoviário de carga, modal com maior dificuldade de fiscalização, diminuem as barreiras à entrada, ao mesmo tempo que aumentam a flexibilidade e o dinamismo, a falta de segurança e de confiabilidade, a tendência ao envelhecimento da frota, a maior emissão de poluentes e, sobretudo, as ineficiências. O quadro aci-ma, retirado do estudo CNT/CEL 2002, compara os itens regulatórios no Brasil, nos Estados Unidos e na Espanha, indicando a necessidade de se avançar para uma maior e mais efetiva regulação e fiscalização do setor, a fim de aumentar a eficiência e a segurança.

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Raph a el Pa du l a

Itens Regulatórios EUA Espanha BrasilRegistro Nacional ✓ ✓ •

Requisitos Adicionais à Habilitação ✓ ✓ •Responsável Técnico • ✓ •

Frota Mínima para Registro • ✓ •Área Mínima de Terminais • ✓ •

Vistoria VeicularAnual ✓ - ✓*

>1 Ano - ✓ -

Autorização de Transporte Contigenciada • ✓ •

Limitação de Idade Máxima de Frota • • •Limitação do Tempo de Direção ✓ ✓ •

Peso Máximo por Eixo ✓ ✓ ✓*

Publicação de Tarifas de Frete ✓ • •Monitoramento de Faixa de Fretes ✓ ✓ •

• Inexistente. *No caso do Brasil alguns itens possuem leis específicas, porém não são efetivos na prática. Fonte: CNT/CEL, 2002, p. 69.

Os principais desafios do modal rodoviário são: aumento dos in-vestimentos públicos para ofertar estradas de qualidade, principalmente nas regiões com piores índices, realizando obras que serão apresentadas em outro capítulo; atrair recursos privados para atuar de forma sinér-gica com os investimentos estatais; estabelecer fiscalização e regulação eficiente no setor, tanto em relação às empresas transportadoras quanto em relação às empresas concessionárias; estimular a renovação da frota de caminhões.

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Transporte ferroviárioA primeira estrada de ferro do Brasil foi inaugurada pelo imperador dom Pedro II em 1854, ligando o Rio de Janeiro a Petrópolis (a baía de Guanabara à serra da Estrela), com 14,5 km de extensão. Foi construída por iniciativa do barão de Mauá, que via no transporte ferroviário um meio fundamental para promover o desenvolvimento do país. O Impé-rio incentivou a construção de ferrovias, cujas características marcam até hoje a malha ferroviária nacional: utilização de diferentes tamanhos de bitolas, o que dificulta a integração operacional entre as ferrovias e a formação de um sistema nacional integrado;12 estradas de ferro com traçados excessivamente extensos e sinuosos, localizadas de forma dis-persa e isolada ao longo do território, em geral ligando a produção ao exterior.

A Rede Ferroviária Federal S.A. (RFFSA) foi criada em 1957, for-talecendo o investimento estatal e a expansão no setor. Malgrado a ex-pansão tenha sido importante, muitas das características acima apon-tadas se mantiveram e surgiram outros problemas, de que trataremos a seguir.

Há décadas prevalece o abandono no transporte ferroviário, o que gerou um modal pouco competitivo, com vias permanentes, material rodante e superestrutura degradados. O país possui baixa densidade fer-roviária – ou seja, uma malha ferroviária pequena em relação ao territó-rio –, um sistema segregado e com dificuldades de integração, defasado em equipamentos e material rodante, com bitolas estreitas e diferentes, e com baixa capacidade dos terminais. É preciso aumentar a malha fer-roviária, de modo a alcançar as regiões produtoras, e integrá-la com os

12 Bitola é a distância entre os trilhos de uma via-férrea. No Brasil, as bitolas mais comuns são: a bitola métrica (1 m de largura), a bitola larga (1,60 m de largura), a bitola internacional (1,435 m de largura), e ainda existem bitolas mistas. Quanto à última, contém ambas as bitolas citadas anteriormente, onde usam-se três trilhos: um lateral, comum a ambas as bitolas, um central para a bitola métrica e o outro lateral para a bitola maior.

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Raph a el Pa du l a

demais modais, o que só se tornará possível se retomarmos o planeja-mento de longo prazo, tanto para o setor de transportes quanto para a economia como um todo.

O processo de privatizações buscou reverter esse quadro, a fim de ampliar a oferta e melhorar os serviços e a produtividade do setor, sob o argumento de que os recursos para investimentos eram escassos no Es-tado e abundantes na iniciativa privada. Assim, o transporte ferroviário passou a fazer parte do Programa Nacional de Desestatização na década de 1990, com a inclusão da RFFSA (Decreto n.º 473, 10/03/92). Em me-ados da década, o controle operacional foi repassado às empresas con-cessionárias, que se tornaram responsáveis pela manutenção e o investi-mento nas malhas. Além dessa concessão, foram firmados contratos de arrendamento dos ativos de cada uma das malhas da RFFSA – que está extinta pela Medida Provisória nº 353, de 22 de janeiro de 2007.

Os objetivos do modelo de desestatização, segundo descreve o Ministério dos Transportes (www.transportes.gov) eram: desonerar a União, fomentar investimentos e aumentar a eficiência operacional. Para o leilão de concessões, o sistema foi dividido em seis submalhas re-gionais (mapa abaixo): Malha Oeste, abrangendo a SR-10 (Bauru), com 1.621 km; Malha Centro-Leste, reunindo SR-2 (Belo Horizonte), SR-7 (Salvador) e SR-8 (Campos), com 7.080 km; Malha Sudeste, reunindo SR-3 (Juiz de Fora) e SR-4 (São Paulo), 1.674 km; Estrada de Ferro Te-reza Cristina, abrangendo a SR-9 (Tubarão), com 164 km; Malha Sul, reunindo SR-5 (Curitiba) e SR-6 (Porto Alegre), com 6.586 km; e Malha Nordeste, reunindo SR-1 (Recife), SR-11 (Fortaleza) e SR-12 (São Luis), com 4.534 km. Essa divisão gerou conseqüências danosas para a inte-gração das malhas e os trajetos de longa distância.

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Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

Submalhas Regionais

ALL

FCAEFVM

MRS

Novoeste

Ferroban

FCN

A atividade de regulação e fiscalização das concessionárias, em ter-mos de serviços e exploração da infra-estrutura, é atribuição da ANTT. 13

13 Entre 1998-2001, esta função foi desempenhada pela Secretaria de Transportes Terrestres do Ministério dos Transportes.

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Raph a el Pa du l a

A malha ferroviária brasileira totaliza 29.706 km, das quais 28.225 km estão sob administração de empresas concessionárias, principal-mente nas regiões Sul, Sudeste e Nordeste, atendendo parte do Centro-Oeste e Norte do país. São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul concentram grande parte da malha ferroviária. Em 2006, o modal teve participação de cerca de 20% no transporte de carga, 24% na movimen-tação de carga e 2% na matriz de passageiros, incluindo o transporte metroviário e ferroviário. O sistema ferroviário nacional é o maior da América Latina, em termos de carga transportada, mas representa so-mente 1/3 do total da malha canadense e sua extensão é bem menor que a da Argentina (34 mil km). O transporte de passageiros em longa distância praticamente inexiste.

É necessário aumentar a participação do modal ferroviário na ma-triz brasileira. Os modais devem atuar na matriz de forma complemen-tar, dentro do conceito de intermodalidade, e não de forma concorrente. Atualmente, os fretes baixos do setor rodoviário prejudicam o aumento da participação do modal ferroviário. Conforme destaca a Pesquisa Fer-roviária CNT 2006 (p. 3), “em outros países com dimensões continen-tais semelhantes ao Brasil e com expressivos setores agrícolas e mineral, as ferrovias têm uma participação entre 40% e 50% no transporte de cargas”.

A densidade ferroviária é definida pelo número de quilômetros de ferrovias dividido por cada 1 mil quilômetros quadrados de extensão territorial de um país (km/1.000km2). No Brasil, a densidade é de 3,4, o que representa uma malha insignificante, principalmente se compa-rarmos com a densidade de um país desenvolvido e continental como os Estados Unidos: 29,8 (dados de 2002, CNT). A oferta ferroviária é muito menor que a rodoviária, que apresenta uma densidade de vias igual a 17,3. Além da baixa oferta, o setor apresenta problemas de viabi-lidade econômica de algumas ferrovias que permanecem com alto grau de subutilização.

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Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

O modal ferroviário é pouco integrado a outros modais, em gran-de parte pelo número insuficiente e ainda reduzido de terminais de in-tegração. As diversas esferas estatais (União, estados e municípios) e as concessionárias devem fazer um esforço comum, em parcerias com os clientes, para aumentar a quantidade de terminais. Além de mostrar a baixa densidade ferroviária brasileira, o mapa também mostra que ela resulta de uma restrição histórica do transporte ferroviário a corredores de exportação. Nos Estados Unidos, com densidade significativamente maior, privilegia-se a concepção de integrar todo o território nacional: população, produção e mercados.

Conforme aponta a Pesquisa Ferroviária CNT 2006 (p. 111), “mo-dificações que envolvem ajustes no atual sistema tributário e na legis-lação e utilização de contêineres, assim como incentivos fiscais para a criação de terminais intermodais, são necessárias para melhorar a in-tegração das ferrovias com outras modalidades. (...) O pequeno fluxo entre as concessionárias indica que o embaraço ao transporte de longa distância ainda é significativo.”

É possível aumentar a participação das ferrovias na matriz de transporte brasileira, no médio e longo prazos, com os investimentos que as empresas concessionárias têm realizado em modernização e me-lhora do material rodante e do desempenho operacional, e também com investimentos do governo federal na ampliação da malha. Prosseguem as obras em trechos da ferrovia Norte-Sul e a construção da Transnor-destina, previstas no Programa de Aceleração do Crescimento.

No Brasil, o transporte ferroviário responde principalmente pelos fluxos de minerais na região Norte, de produtos minerais e matérias-primas industriais na região Sudeste, de grãos na região Sul e em partes da região Centro-Oeste e da região Sudeste, e combustíveis na região Nordeste. O minério de ferro responde por 63% do volume total trans-portado pelas ferrovias.

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Raph a el Pa du l a

Principais produtos movimentadosMil TU - Ano 2004

Minério de ferro 63%Produção agrícola 3%

Soja e farelo de soja 8%Granéis minerais 2%

Indústria siderúrgica 7%Combust./ Deriv. Petr. / Álcool 2%

Carvão/Coque 4%Outros 11%

Ano

Min

ério

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Soja

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l

Out

ros

Tota

l

1997 168.950 9.290 16.310 10.950 2.770 5.690 10.990 27.340 252.2901998 167.040 11.620 15.480 11.380 7.090 6.060 10.200 31.870 260.7401999 163.540 11.870 16.240 11.470 7.550 5.970 8.240 34.830 259.7102000 183.930 17.030 19.000 12.570 7.430 7.030 7.700 35.880 290.5702001 184.580 17.675 19.966 12.105 14.317 6.159 8.495 41.953 305.2512002 192.852 28.083 24.002 11.526 7.559 6.367 8.433 42.170 320.9922003 203.517 31.865 25.521 12.706 8.818 8.349 7.684 47.741 346.2012004 239.112 29.090 27.932 13.309 10.471 8.784 7.807 41.271 377.776

Fonte: CEL-Coppead, Indicadores de Transporte Ferroviário.

Para o governo, os resultados das privatizações no setor ferroviário foram: cerca de R$ 1,7 bilhão com os leilões das malhas; cerca de R$ 2,2 bilhões em pagamentos trimestrais de concessão e arrendamento dos bens operacionais à União (0,4% do PIB por ano); R$ 466 milhões na

9 0

Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

arrecadação da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (0,02% do PIB por ano); fim de déficits nas operações das malhas da ordem de US$ 300 milhões por ano (0,026% do PIB). Hoje, o setor gera 30 mil empregos.14

De forma geral, o sistema segue sucateado, tal como foi transferido para as concessionárias. As questões fundamentais do setor dependem de ações do Estado e de um planejamento amplo e integrado do sistema de transportes em geral e da infra-estrutura. As operações das conces-sionárias geraram algumas melhoras em termos de modernização do sistema, o que se refletiu em ganhos de desempenho operacional nas malhas concedidas. Alguns índices melhoraram: aumentou a produtivi-dade do pessoal, diminuiu o número de acidentes, cresceu a movimen-tação e a participação no total movimentado de cargas no país, cargas antes transportadas por outros modais (como granéis agrícolas) foram atraídas e a presença de cargas mais nobres, como contêineres e produtos de alto valor agregado, aumentou. Também houve um aumento de 10%, decorrente do uso da intermodalidade. Para a Pesquisa Ferroviária CNT 2006 (p.15), “esses resultados refletem substancial melhora e moderni-zação do sistema, o que atraiu usuários e concessionárias e possibilitou investimentos substanciais em material rodante e em vias permanentes”. Ressurgiram empresas industriais, de consultoria e de logística, ligadas ao setor. Segundo a pesquisa, “em 1991, por exemplo, foram fabricados apenas seis vagões, contra 7.500 em 2005. Com essa alta demanda (...) houve uma revitalização da indústria ferroviária nacional” (idem).

A malha ferroviária nacional é formada por doze malhas conces-sionadas (onze para empresas privadas e uma para empresa pública), duas industriais locais privadas e uma operada pelo Estado no Amapá. Quatro das doze malhas são administradas pela América Latina Logís-tica S.A. (ALL): Ferroban, Ferronorte, Novoeste e ALL.

14 Dados da Pesquisa Ferroviária CNT 2006.

9 1

Raph a el Pa du l a

Malhas Ferroviárias da RFFSA Concedidas

Malhas concessionadas

Novoeste - Ferrovia Novo Oeste S.A.FCA - Ferrovia Centro-Atlântica S.A.MRS Logística S.A.FTC - Ferrovia Teresa Cristina S.A.ALL - América Latina Logística do Brasil S.A.CFN - Companhia Ferroviária do NordesteEFVM - Estrada de Ferro Vitória à Minas EFC EFC - Estrada de Ferro CarajásFerroban - Ferrovias Bandeirantes S.A.Ferropar - Ferrovia Paraná S.A.*Ferronorte - Ferrovias Norte Brasil S.A.Ferrovia Norte-Sul - Valec (empresa pública)

Malhas Industriais Privadas**

EFT - Estrada de Ferro TrombetasEFJ - Estrada de Ferro Jari

Estado do Amapá Estrada de Ferro do Amapá* Concedida a empresa pública do estado do Paraná. ** Ambas no estado do Pará, a primeira atendendo a demanda da indústria de minério e a segunda à de celulose.

Tabela 2 - Resultados das ferrovias depois das concessões

Resultados do Setor 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Produção Ferroviária (bilhões de TKU) 137,0 141,0 138,2 153,0 160,8 166,8 180,5 201,6 221,8

Volume de Transportado 252,9 258,5 255,0 286,8 289,9 314,2 334,7 367,0 391,9

Índice de Acidentes 75,5 69,3 64,9 53,1 39,4 35,5 33,6 30,4 32,9

Investimentos das Concessionárias

(R$ milhões)398,1 386,1 537,6 617,4 766,0 667,7 1.088,8 1.957,8 3.114,3

Investimentos da União (R$ milhões) 162,0 113,0 45,0 56,0 58,0 56,0 35,0 8,0 44,0

Total de Investimentos (R$ milhões)

560,1 499,1 582,6 673,4 824,0 723,7 1.965,8 1.965,8 3.157,6

Fonte: ANTF (2006)

9 2

Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

Resultados do setor de transporte ferroviário pós-concessão

1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

3.500

3.000

2.500

2.000

1.500

1.000

500

-

Produção ferroviária(bilhões de TKU)

Volume transportado(bilhões de TKU)

Índice de acidentes

Total de investimentos(R$ milhões)

Fonte: Pesquisa Ferroviária CNT, 2006.

A tabela mostra que as empresas concessionárias aumentaram sig-nificativamente os investimentos no setor, gerando aumento na deman-da pelo transporte ferroviário e ganhos de desempenho operacional nas malhas concedidas. Em alguns casos, o transporte ferroviário de cargas passou a ser uma alternativa ao modal rodoviário, embora muito sen-sível à variação na tarifa de transportes. No entanto, ainda há muito a fazer para que se alcance um desempenho operacional satisfatório.

A produção de transportes do setor ferroviário cresceu 61,9% no período pós-concessão, entre 1997 e 2005 – 7,7% ao ano. O volu-me transportado cresceu aproximadamente 55% no mesmo período – 6,9% ao ano. O índice de acidentes diminuiu em 56,5% – redução de 7% ao ano. Os investimentos das concessionárias aumentaram 782%, os da União diminuíram 73% e o investimento total no setor aumentou 563,7%, entre 1997 e 2005 – 97,7%, 9,1% e 70% ao ano, respectivamente. O produto médio aumentou em cerca de 180% entre 1997 e 2005.

Dos investimentos realizados no modal, o maior tem sido em ma-terial rodante (65% em 2004) seguido de superestrutura (19%). Os in-vestimentos em infra-estrutura têm sido baixos: 4% em 2004 (dados do CEL-Coppead).

9 3

Raph a el Pa du l a

O custo do frete cobrado pelas operadoras nas ferrovias é 50% mais barato que o do transporte rodoviário. A alternativa ferroviária é importante para agentes, como empresas petroquímicas, que lidam com matérias-primas que, além de perigosas, são transportadas em grandes volumes.

Apesar dos investimentos e do aumento do número de vagões, ín-dices importantes tiveram resultados negativos no período pós-conces-são, como a produtividade média dos vagões e das locomotivas, medida pela relação entre produção de transporte de carga total ferroviária e o somatório de vagões (ou de locomotivas) em tráfego na malha ferrovi-ária brasileira.

É importante que as ferrovias liguem a produção a todo o país e aos portos, principalmente a produção agrícola colhida em regiões mais distantes; além disso, podem ser construídos pequenos trechos que li-guem a linha principal a locais de produção. O papel da ferrovia não deve ser apenas (ou prioritariamente) transportar commodities para portos. Os meios de transporte devem ser um instrumento para superar nossa condição de país subdesenvolvido, produtor e exportador de bens de baixo valor agregado e baixa intensidade tecnológica, construindo uma inserção internacional soberana e geradora de ganhos para toda a sociedade. Além daqueles que dão acesso a portos, é preciso construir corredores que interliguem todo o país, conectando centros consumi-dores e produtores de produtos industriais de alto valor agregado e tam-bém commodities industriais e produtos primários. É preciso atender às demandas das áreas do Cerrado no Centro-Oeste, Nordeste, Triângulo Mineiro e porções da região Norte, por causa do crescimento de sua produção agrícola, o que demanda investimentos altos. Essa concepção deve ser estendida à integração física da América do Sul.

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Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

Produto Médio*R$/Mil TKU

1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

6055504540353025201510

50

17,614,0 16,4

15,6

22,8

40,044,8

46,2 49,1

Tx de Cresc. 1997 - 2005 = 179,9%

*∑ das receitas brutas das ferrovias / ∑ da produção do transporte de carga das ferrovias

Fonte: CEL-Coppead, Indicadores de Transporte Ferroviário.

Ano Produto Médio Taxa de Cescimento Anual

1997 17,6 -1998 14,0 -20,1%1999 15,6 11,1%2000 16,4 5,6%2001 22,8 38,7%2002 40,0 75,5%2003 44,8 11,9%2004 46,2 3,1%2005 49,1 6,5%

Análises: CEL/COPPEAD

9 5

Raph a el Pa du l a

Ano

Mat

eria

l Rod

ante

Infr

a-Es

trut

ura

Supe

rest

. Via

Pe

rman

ente

Tele

com

unic

açõe

s/

Sina

lizaç

ão

Ofic

inas

Cap

acita

ção

de

Pess

oal

Veíc

ulos

Ro

dovi

ário

s

Out

ros

Inve

stim

ento

s

Tota

l

1997 112.977 15.486 64.304 10.384 1.040 461 0 148.393 353.045

1998 122.457 35.097 100.221 14.435 3.914 738 0 31.807 308.714

1999 244.255 85.779 101.212 24.297 5.542 258 1.783 14.457 477.583

2000 329.418 44.616 140.488 29.799 13.578 2.095 2.400 109.120 671.514

2001 243.345 122.909 328.766 41.806 8.361 1.019 2.226 61.938 810.415

2002 261.685 48.556 173.540 49.885 7.817 1.421 2.682 80.109 625.695

2003 604.441 60.928 184.260 66.134 26.165 2.285 1.748 126.010 1.071.971

2004 1.222.083 72.981 364.268 37.795 34.142 2.524 4.075 151.762 1.889.630

2005 2.064.000 202.200 746.900 59.000 0 0 0 305.600 3.377.700

Fonte: CEL-Coppead, Indicadores de Transporte Ferroviário.

Produtividade dos vagões*

Mil TKU/vagão

1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004

3.000

2.500

2.000

1.500

1.000

500

0

2.570 2.557 2.597 2.416 2.526

2.1872.437 2.526

Tx de Cresc. 1997 - 2004 = -14,9%

*∑ da produção do transporte de carga das ferrovias /

∑ dos vagões em tráfego na malha brasileira

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Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

Mapa do Sistema Ferroviário Nacional

Ferrovias Existentes

Ferrovias Planejadas

AMÉRICA LATINA LOGÍSTICA

FERROESTE

FERROVIA TEREZA CRISTINA

FERRONORTE

ESTRADA DE FERRO DOAMAPÁ

E.F. TROMBETAS E.F. JARI

ESTRADA DE FERROCARAJÁS

CIA. FERROVIÁRIADO NORDESTE

FERROVIANORTE-SUL

FERROVIA CENTROATLANTICA

FERROVIA VITÓRIA-MINAS

MRS LOGÍSTICA

FERROBAN

FERROVIA NOVOESTE

Principais Ferrovias

Fonte: www.transportes.gov.br

Os principais problemas da malha ferroviária nacional referem-se a (1) gargalos logísticos e operacionais, (2) problemas em áreas urbanas, (3) malhas dispersas e não integradas, com divisão de áreas regionais e difi-culdade de circulação entre concessionárias e (4) diversidade de bitolas.

9 7

Raph a el Pa du l a

Velocidade média comercial

km/hora

2000 2001 2002 2003 2004

30,0

25,0

20,0

15,0

10,0

5,0

0,0

19,322,3

22,7

20,222,5

Tx de Cresc. 2000 - 2004 = 4,6%

Ano Velocidade média comercial

Taxa de crescimento anual

2000 19,3 -2001 22,3 15,3%2002 22,7 1,6%2003 22,5 -0,6%2004 20,2 -10,1%

Fonte: ANTT

Análises: CEL/COPPEAD

Fonte: CEL-Coppead, Fonte: CEL-Coppead, Indicadores de Transporte Ferroviário. de Transporte Ferroviário.

9 8

Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

Velocidade média de percurso

km/hora

2000 2001 2002 2003 2004

35,030,025,020,015,010,0

5,00,0

28,6 29,7

30,3

29,130,5

Tx de Cresc. 2000 - 2004 = 1,7%

Ano Velocidade de percurso

Taxa de crescimento anual

2000 28,6 -2001 29,7 3,6%2002 30,3 2,0%2003 30,5 0,9%2004 29,1 -4,6%

Fonte: ANTT

Análises: CEL/COPPEAD

Fonte: CEL-Coppead, Fonte: CEL-Coppead, Indicadores de Transporte Ferroviário. de Transporte Ferroviário.

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Raph a el Pa du l a

Total de locomotivas em tráfego na malha

Unidades

1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004

2.500

2.000

1.500

1.000

500

0

1.3651.518

1.551

1.6551.888 2.5412.150

1.950

Tx de Cresc. 1997 - 2004 = 86,2%

Ano Total de Locomotivas

Taxa de Cescimento Anual

1997 1.365 -1998 1.518 11,2%1999 1.551 2,2%2000 1.655 6,7%2001 1.888 14,1%2002 1.950 3,3%2003 2.150 10,2%2004 2.541 18,2%

Fonte: Ministério dos Transportes (1997 - 2000) e ANTT (2001 - 2004)

Análises: CEL/COPPEAD

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Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

Distância percorrida pelas ferrovias

km

1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

600

500

400

300

200

100

0

548 547 539 534 531570

545529546

Tx de Cresc. 1997 - 2005 = 4,1%

Fonte: CEL-Coppead, Fonte: CEL-Coppead, Indicadores de Transporte Ferroviário. de Transporte Ferroviário.

Ano Distância média Taxa de crescimento anual

1997 548 -1998 547 -0,1%1999 539 -1,6%2000 534 -0,8%2001 531 -0,5%2002 546 2,7%2003 529 -3,0%2004 545 2,9%2005 570 4,7%

Análises: CEL/COPPEAD

A velocidade de deslocamento das composições é muito lenta. Parte do sistema tem velocidade máxima permitida abaixo de 50 km/h, tornando o modal pouco competitivo para clientes que exigem tempos

1 0 1

Raph a el Pa du l a

curtos de deslocamento. A baixa velocidade gera ciclos longos e, con-seqüentemente, a necessidade de uma frota maior, imobilizando o ma-terial rodante por períodos incompatíveis com uma operação eficiente e rentável; além disso, reduz a capacidade da linha, por causa do maior tempo de bloqueio da via. As concessionárias acabam operando somen-te na sua própria malha, onde os custos são menores. Este problema está diretamente associado aos traçados antigos, sinuosos e longos, e às construções também antigas, com muitos pontos crônicos de estran-gulamento – os chamados gargalos de infra-estrutura – que ocorrem principalmente em grandes áreas urbanas.

Segundo a Pesquisa Ferroviária CNT 2006 (p. 54), “parte da atual malha ferroviária brasileira, por causa da tecnologia usada na época de construção, quando os traçados contornavam as montanhas para evitar a construção de pontes, resultou em uma malha composta por muitas rampas, principalmente na acidentada topografia da região litorânea. Esta característica, somada à utilização da bitola métrica, gera limita-ções na velocidade operacional em determinados trechos, tornando as viagens mais lentas e restringindo o limite de carga que os vagões trans-portam.”

A retificação de trechos críticos demanda soluções onerosas, cujos recursos só podem vir do Estado. Para áreas urbanas são necessárias obras variantes, desvios, contornos e novos acessos a portos.

Como resultado dos diversos problemas no setor, hoje o modal é competitivo em curtas distâncias, enquanto, por suas características estruturais, ele deveria ser ideal para longas distâncias. Existem barrei-ras ao aumento das distâncias de transporte: dificuldades nos grandes centros urbanos, restrições impostas pelos acordos de tráfego mútuo e direito de passagem e diferenças entre o frete ferroviário e o rodoviário (que não são proporcionais para as grandes viagens).

Não há um sistema ferroviário nacional. Anteriormente às conces-sões, a malha ferroviária já existia de forma dispersa e isolada. A divisão

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Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

do “sistema” ferroviário nacional em submalhas regionais, no processo de concessões, criou dificuldades de circulação entre concessionárias – impostas pelos acordos de tráfego mútuo e o direito de passagem – e diminuiu a competição nas malhas regionais, situação agravada pelos gargalos. Tudo resulta em baixas velocidades e na impossibilidade de viagens longas. Além disso, a diversidade de bitolas nas ferrovias bra-sileiras prejudica a integração da malha, pois inexiste um padrão único (que não o métrico, de velocidade mais baixa) que possibilite a interli-gação entre as malhas. As regras de tráfego mútuo e direito de passagem favoreceram essa espécie de monopólio regional das submalhas e não viabilizam a utilização integrada da malha ferroviária nacional como um sistema único.

Conforme descreve a Pesquisa Ferroviária CNT 2006 (2006, p. 16), “no acesso ao principal porto brasileiro, o porto de Santos – por onde circulam, além dos trens de carga, também os trens de passageiros – es-sas ineficiências são ampliadas, aumentando as dificuldades de conexão entre as concessionárias, já agravada pelas diferentes bitolas”.

De fato, embora tenham ocorrido melhoras em indicadores e no desempenho, ainda existem entraves que impedem o crescimento da participação do setor na matriz de transportes brasileira. Para as fer-rovias superarem seus gargalos físicos e operacionais, é necessário que haja grandes investimentos que só podem ser realizados pelo Estado, seja pelo seu gasto direto, seja pela concessão de linhas de crédito às concessionárias. Isso conflita com o grande argumento para a desestati-zação, que foi a escassez de recursos no setor público e a existência deles no setor privado.

1 0 3

Raph a el Pa du l a

Densidade média de tráfego

Vagões/km

1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004

4,00

3,00

2,00

1,00

0,00

1,89 1,96

2,02

2,57 2,363,31

2,542,37

Tx de Cresc. 1997 - 2005 = 74,8%

*∑ dos vagões em tráfego nas ferrovias / ∑ quilometragem das linhas das ferrovias

Ano Densidade média de tráfego

Taxa de crescimento anual

1997 4,86 7,7%1998 5,02 3,1%1999 4,92 -1,9%2000 5,45 10,6%2001 5,70 4,7%2002 5,98 4,9%2003 6,42 7,3%2004 7,23 12,6%2005 7,79 7,7%

Análises: CEL/COPPEAD

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Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

Densidade média de tráfego

Milhões de TKU/km

1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

10,009,008,007,005,004,003,002,001,000,00

4,86

5,02

4,92

5,455,70

7,237,79

6,425,98

Tx de Cresc. 1997 - 2005 = 60,2%

*∑ da produção do transporte de carga das ferrovias / ∑ quilometragem das linhas das ferrovias (28.445 km)

Fonte: CEL-Coppead, Fonte: CEL-Coppead, Indicadores de Transporte Ferroviário. de Transporte Ferroviário.

Ano Densidade média de tráfego

Taxa de crescimento anual

1997 1,89 -1998 1,96 3,7%1999 2,02 3,0%2000 2,57 27,2%2001 2,36 -8,1%2002 2,37 0,3%2003 2,54 7,3%2004 3,31 30,1%

Análises: CEL/COPPEAD

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Raph a el Pa du l a

A malha ferroviária do Brasil possui uma série de gargalos físicos e logísticos que comprometem a competitividade, a eficiência e a capa-cidade da própria malha e dos corredores de transporte ferroviários. Os principais gargalos de infra-estrutura são:

1. Construções irregulares às margens das vias, prejudicando di-retamente o desempenho operacional e a segurança: trata-se de gran-des entraves, principalmente quando estão em áreas estratégicas e con-gestionadas. A maioria desses problemas ocorre em grandes centros urbanos: Belo Horizonte, Rio de Janeiro e Santos são consideradas as áreas mais críticas. Nas zonas urbanas, as composições diminuem a ve-locidade média de 40 km/h para 5 km/h. Muitas vezes as comunidades invadem a faixa de domínio, instalando cercas, áreas de lazer (bancos, quadras esportivas e praças), ruas paralelas às linhas ou até moradias (inclusive sobre túneis). O problema tem raízes na história da formação e da urbanização das cidades brasileiras que surgiam ao longo de linhas férreas. Planos diretores seriam importantes instrumentos para evitar esse gargalo.

2. Excesso de passagens em nível crítico nas malhas, o que contri-bui para a baixa velocidade média dos trens – em torno de 25 km/h – e afeta o desempenho operacional do transporte de cargas. Ao longo da malha concedida, existem 12.400 passagens de nível, das quais 2.503 são classificadas como críticas, por sua localização inadequada, com elevada ocorrência de acidentes, sinalização inadequada ou deficiente. Há casos de passagens clandestinas.

3. Expansão e integração da malha ferroviária nacional. É preciso que sejam realizadas obras para integrar efetivamente e expandir a ma-lha para os mercados de carga existentes no país: Ferronorte (Ferrovia Norte Brasil); Ferrovia Norte-Sul; eixo ferroviário Uberlândia-Itumbia-ra – Rio Verde – Jataí-Mineiros – Alto Araguaia (conectando o Sul de Goiás e o Mato Grosso aos portos de Santos, Itaguaí e Vitória); Nova Transnordestina.

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Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

Principais projetos de expansão indicados pelas concessionárias Projetos Ferroviários Valor Estimado (milhões R$)

Nova Transnordestina (construção de 1.159,0 Km e remodelação de 721,0 Km) 4.588

Ferrovia Leste-Oeste/ BA 2.167Ferrovia Litorânea/ ES 658

Construção do trecho Alto Araguaia - Rondonópolis/ MT (236,0 Km) 500

Ampliação da Malha Ferroviária em Santa Catarina (842,6 Km) 1500

Total Geral 9.413Fonte: ANTF (2006)

4. Gargalos logísticos, com pouca capacidade de acesso aos portos e corredores com limitada capacidade ferroviária. Esses gargalos estão localizados principalmente nas áreas urbanas, ocorrendo conflitos do tráfego ferroviário com veículos e pedestres. A Pesquisa Ferroviária aponta algumas obras a serem realizadas: “Construção de variantes no corredor Paranaguá (ALL); aconstrução do Ferroanel de São Paulo e expansão do Ferronorte até Rondonópolis; construção de variantes em Minas Gerais (Patrocínio – Prudente de Morais e a travessia de Belo Horizonte) e construção da variante Litorânea Sul”, no Espírito Santo (p. 24). Essas obras esperam investimentos públicos ou a formação de parcerias com o setor privado.

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Projetos prioritários para solucionar gargalos logísticosProjetos Ferroviários Valor Estimado (milhões R$)

Segregação de linha de carga na Região Metropolitana de São Paulo 150

Remoção de invasões de faixa de domínio (Rio de Janeiro, Santos e Belo

Horizonte)81

Travessia de Barra Mansa/ RJ 32Ferroanel de São Paulo - Tramo Norte

(PPP) 850

Variante da Serra do Tigre, entre Patrocínio e Prudente de Moras (PPP) 1.425

Contorno Ferroviário São Félix - Cachoeira/ BA 111

Contorno de Vila Velha 99Variante Camaçari - Aratu/ BA 99

Desvio Guarapuava - Ipiranga/ PR (PPP) 450

Acesso ao Porto de Santos 29Sinalização de passagens de nível

municipais no Estado de São Paulo 20

Remoção de invasões na faixa de domínio no Estado de São Paulo 20

Implantação do Pólo Logístico de Campo Grande, junto ao novo

Contorno50

Ampliação do Ramal de Siderópolis (12 Km) 8

Viaduto/ trincheira em Criciúma/ SC 18Total Geral 19

Fonte: ANTF (2006)

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5. Diferenças de bitolas. Existem seis tipos de bitola, quando o ideal é que o país possua apenas um. Essa diferença causa problemas de integração e eficiência, pois muitas vezes a carga tem que mudar de trem para seguir viagem, pois o trem anterior não é compatível com o trecho seguinte a ser percorrido. Existem, ainda, malhas com mais de uma bitola, como podemos observar na tabela abaixo. Se, por aproxima-ção, dividirmos a classificação de bitolas somente entre métrica, larga e mista, a participação desses tipos de bitola em relação à extensão total ferroviária fica a seguinte: 82,1% métrica, 16% larga e 1,9% mista.

6. Falta de oferta para o setor. O crescimento da demanda pelo transporte ferroviário e o conseqüente aumento da produção do setor acarretam a necessidade de comprar material rodante e equipamentos. A falta oferta para reposição de suprimentos da via permanente e de material rodante é mais um problema.

Um dos maiores entraves à indústria e aos investimentos em infra-estrutura é o custo de capital (taxa de juros), que tem sido muito alto em termos nominais, reais e internacionais, o que inviabiliza financia-mentos de longo prazo e faz com que os capitais sejam atraídos para as operações financeiras; é preciso que os juros sejam reduzidos acentua-damente. É preciso, também, que o Estado tenha políticas de estímulo à indústria ferroviária e elimine taxas sobre a importação de componen-tes ferroviários quando estes não são produzidos internamente.

Embora a desestatização tenha se baseado na idéia de que o setor privado teria recurso que eram escassos no setor público, as concessio-nárias clamam por linhas de crédito diferenciadas do BNDES – muitas privatizações do setor contaram com financiamento do banco – e recla-mam da exigência de bens como garantia, pois os ativos das ferrovias pertencem à União.

Consideradas como negócio, as ferrovias são muito vulneráveis à taxa de juros, pois são investimentos com retorno de longo prazo, com alta dependência de capital e baixa rentabilidade. O reajuste da dívida

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relacionada à concessão é feito pelo IGP-DI mais 12%, uma taxa muito alta para os padrões internacionais.

Comparando dados do setor ferroviário no Brasil com os Estados Unidos, um país considerado padrão, encontram-se diferenças notáveis, mostrando o quanto o Brasil ainda tem por fazer. Em 2003, o investi-mento por extensão da malha ferroviária foi três vezes maior nos Es-tados Unidos que no Brasil; em 2004, a receita bruta por vagão foi o triplo da nossa e a densidade média de tráfego em relação à do Brasil, se medida pelo somatório da produção de transporte de carga das ferro-vias dividido pelo somatório da quilometragem de extensão das vias, foi de 2,4 vezes (se medida pelos vagões em tráfego nas ferrovias dividido pelo somatório da quilometragem de extensão das vias férreas foi de 0,9 vezes); em 2005, a produção de transporte de cargas foi doze vezes maior que a brasileira. Ou seja, os Estados Unidos têm uma produção de transportes muito maior, utilizando menos vagões, o que indica a maior produtividade dos vagões. Além disso, a distância percorrida pe-las ferrovias nesse país foi 2,5 vezes maior que as brasileiras.

Produção do transporte de carga do modal ferroviário: Brasil x EUA

Ó

Fonte: CEL-Coppead.

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Receita bruta por vagão: Brasil x EUA

Ó

Fonte: CEL-Coppead.

Investimento por extensão da malha: Brasil x EUA

Ó

Fonte: CEL-Coppead.

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Densidade média de tráfego: Brasil x EUA

Ó

Fonte: CEL-Coppead.

Densidade média de tráfego: Brasil x EUA

Ó

Fonte: CEL-Coppead.

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Distância percorrida pelas ferrovias: Brasil x EUA

Ó

Fonte: CEL-Coppead.

O estudo CNT/CEL-Coppead 2002 comparou o nível de investi-mentos por quilômetro de linha das concessionárias brasileiras com o investido pelas empresas nos EUA, constatando que o primeiro é apenas 1/3 do segundo. Esse número se torna mais grave quando se sabe que os investimentos no Brasil são necessários para recuperar e expandir a ma-lha, enquanto nos EUA eles são necessários somente para manutenção.

1997 1998 1999 2000 Brasil EUA

1566110968

692710778

11084

33816

3161434205

3731432132

Média 1997 - 2000:U$ por Km de linha

Investimentos privados:U$ por Km de linha

Fonte: CNT/CEL, 2002, p.46.

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As concessionárias e algumas análises de especialistas, como a da Pesquisa Ferroviária CNT 2006, apontam a necessidade de o poder concedente ajustar os contratos de concessão e arrendamento, rever-tendo os pagamentos de arrendamento em investimentos voltados para recuperar e expandir as malhas ferroviárias. Sem embargo, vimos que a expansão do sistema ferroviário deve ser feita de forma estratégica e planejada pelo Estado, com padronização do tamanho das bitolas, ten-do em vista a formação de um sistema ferroviário nacional integrado em todo o território nacional, privilegiando a intermodalidade. Para tanto, o poder concedente deve retomar o planejamento de longo prazo e mudar sua postura financista. As condições e a expansão do sistema ferroviário não podem ficar nas mãos (e ao gosto) do mercado, pois esse setor é estratégico e seu desenvolvimento depende de um planejamento centralizado e harmônico.

Conforme afirma o estudo CNT/CEL-Coppead 2002, “a definição de metas de produção e de acidentes não tem viabilizado um aumento da eficiência no transporte ferroviário; metas relacionadas com o de-sempenho operacional poderiam suprir esta lacuna”, principalmente no que diz respeito à integração da malha nacional.

Como se vê, apesar de algumas melhoras, a malha ferroviária ainda opera distante das condições ideais. A partir do quadro descrito acima, podemos destacar os seus principais desafios: (a) aumentar a participa-ção do modal na matriz de transportes brasileira, privilegiando aspectos de intermodalidade e integração regional sul-americana; (b) melhorar e expandir a oferta de infra-estrutura das malhas; (c) formar um sistema ferroviário nacional, com visão integrada de cadeia logística; (d) ampliar e reformar o material rodante, vagões e locomotivas, com participação de clientes e empresas de locação; (e) superar os gargalos logísticos e operacionais, principalmente nas áreas urbanas (ações de curto prazo); (f) expandir a ferrovia Norte-Sul entre Aguiarnópolis (Tocantins) e Pal-mas (Tocantins), num trecho de 496 km; (g) implantar a ferrovia Nova

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Transnordestina (para a integração regional do país); (h) melhorar e ampliar a oferta de superestrutura (terminais multimodais, terminais de transbordo); (i) melhorar o problema de acesso a portos, principalmen-te Santos (São Paulo) e Itaguaí (Rio de Janeiro), prejudicado principal-mente por problemas de integração de malhas e tráfego compartilhado, tal como ocorre em Paranaguá (Paraná) e São Luís (Maranhão).15

Segundo a Pesquisa Ferroviária CNT 2006 (p. 111), “o setor ferro-viário privado calcula a necessidade de investir cerca de R$ 1,5 bilhão na construção das principais variantes – linhas alternativas que evitam os traçados antigos que apresentam fortes subidas e sinuosidades”. Nós estimamos que aproximadamente R$ 3,5 bilhões sejam necessários para a solução dos problemas de curto e médio prazo do setor. É preciso que os recursos da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico sejam utilizados no setor e, principalmente, que o Estado volte a investir pesadamente em transportes, priorizando a produção e o desenvolvi-mento econômico e social de forma planejada, pensando o médio e lon-go prazos. Os investimentos privados devem atuar de forma sinérgica nesse processo.

Transporte aquaviárioO transporte aquaviário percorre rios, lagos e oceanos. O subsetor hi-droviário (ou de transporte fluvial) utiliza rios navegáveis. O subsetor marítimo divide-se entre o transporte de cabotagem, realizado na costa ou entre países vizinhos, e a navegação de longo curso, referente a rotas internacionais e a serviços de feeder (alimentação de linhas).

O modal aquaviário brasileiro é pouco competitivo. Na navegação internacional a bandeira brasileira é cada vez menos significativa, acar-retando maior dispêndio de divisas para pagamento de fretes em nosso

15 Os dois principais acessos (corredores) ferroviários ao Porto de Santos são: Santos/Bauru/Três Lagoas/Campo Grande/Corumbá, com bitola métrica; e Santos/Campinas/Santa Fé do Sul/Alto Araguaia, com bitola larga.

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comércio exterior. A navegação interior só é importante na região Nor-te, tendo pequena participação relativa nas demais regiões por causa da rigidez operacional e/ou a baixa adequação geoeconômica (ressalve-se a importância crescente da hidrovia Tietê-Paraná). A navegação de cabo-tagem se ocupa, essencialmente, de granéis líquidos e sólidos.

Em um país com as dimensões continentais e costeira do Brasil (mais de 8.500 km de litoral), com abundância de rios, o modal aqua-viário deveria ser um importante instrumento de transporte interior e exterior, de cargas e de passageiros. É um fator fundamental para o de-senvolvimento do país e deve ser explorado em toda a plenitude, tanto no transporte marítimo de longo curso quanto no hidroviário e no de cabotagem. O transporte aquaviário participa somente com 13,4% da matriz de transportes de cargas do Brasil.

PortosOs portos são o elo de ligação para o transporte de longo curso e de cabotagem. No Brasil, a movimentação internacional de cargas é con-centrada no transporte marítimo, que responde por 90% do total. Por isso, a situação operacional dos portos é fundamental no transporte e na logística de comércio exterior, devendo ter como características agi-lidade e segurança, com fluxo de informações. No atual cenário, em que predominam as cadeias globais de produção, o sistema de transportes e logística – sua eficiência, qualidade, prazo, segurança, confiabilidade e desempenho – é importantíssimo e pode até determinar a competi-tividade de produtos e países. É preciso promover o setor para que a produção nacional circule pelo país e alcance o mundo de forma com-petitiva.

A Lei de Modernização dos Portos (Lei 8.630/93), de 1993, per-mitiu maior participação da iniciativa privada na operação dos portos. Como reflexo disso, os investimentos em equipamento e melhoras de infra-estrutura em geral têm aumentado, principalmente por causa dos

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investimentos privados. A produtividade dos portos tem crescido. No entanto, muitos problemas foram criados e outros não foram (e nem po-dem ser) resolvidos pelo setor privado. É necessário rever a lei. O cres-cimento das exportações nos últimos anos pressiona a demanda por in-fra-estrutura a custos competitivos (capacidade e agilidade), o que exige investimentos. Caso eles não ocorram, permanecem custos excessivos, principalmente no transporte internacional. Com o sucateamento sofri-do pela marinha mercante nacional, no período das privatizações, com Fernando Collor e principalmente com Fernando Henrique Cardoso, o aumento do comércio reflete-se diretamente no aumento de custos de frete e no direcionamento de divisas para esses pagamentos. Somente no governo Lula a marinha mercante voltou a ter maior atenção e in-vestimentos.

O principal tipo de carga transportado nos portos brasileiros são granéis sólidos (60% do total). O movimento de cargas gerais tem cres-cido continuamente, inclusive em participação no total de carga trans-portada, por causa do aumento do transporte de contêineres. 16Na mo-vimentação de contêineres, em 2005, em unidades (20’ e 40’), destaca-se o porto de Santos (SP) com 40,44% do total movimentado, aumentando sua participação em relação ao ano anterior (36,17%) (Antaq, 2005).

Cerca de 70% do transporte marítimo correspondem à movimen-tação de minério de ferro (35,83%), petróleo (12,19%), derivados de petróleo (9,98%), soja (4,37%), açúcar (2,31%), adubos e fertilizantes (2,16%), produtos siderúrgicos (1,63%), trigo (0,96%), farelo de soja (0,87%) e milho (0,2%) (Antaq, 2005).

16 O transporte de contêiner se dá através de navios de grande porte, conhecidos como pora-contêineres, e criou o conceito dos portos concentradores (hub ports), que redis-tribuem a carga por navios menores em linhas alimentadoras (feeders lines).

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Movimentação de Cargas – 2001-2005Ano Valor absoluto (mi de t) Valor percentual

Granéis sólidos

Granéis líquidos

Carga geral Total Taxa de

cresc.Granéis sólidos

Granéis líquidos

Carga geral

2001 289 164 53 506 - 57% 32% 10%

2002 302 163 64 529 4,5% 57% 31% 12%2003 336 162 73 571 7,9% 59% 28% 13%2004 370 167 85 621 8,7% 60% 27% 14%2005 393 164 93 650 4,7% 60% 25% 15%

Fonte: Antaq, Anuário Estatístico Portuário 2005. Disponível em www.antaq.gov.br.

O transporte de cabotagem não tem sido relevante. Participa com aproximadamente 23,12% na movimentação de cargas, o que represen-ta uma ligeira redução em relação à participação em 2004 (23,91%). Isso significa apenas 5,7% da movimentação total de cargas na matriz de transportes nacional e 14% das movimentações de embarcações. Ou seja, a movimentação é praticamente estável, com tendência de queda na participação relativa. A movimentação de cargas por cabotagem cresceu 1,71% em 2004 e 1,14% em 2005 (Antaq, 2005).

O transporte marítimo de longo curso participa com 72,84% das cargas (17,2% da matriz nacional) e 58% das embarcações, com partici-pação e movimentação crescentes. Em 2005, a navegação de longo curso cresceu 5,8% em relação a 2004, em movimentação de cargas. Outras navegações cresceram 4,3% em 2005, mantendo a participação no total de movimentação de carga em torno de 4%.

É necessário aumentar o transporte de cabotagem, que é de baixo custo, tem enorme potencial e deve ser mais usado em países com as condições geográficas do Brasil, além de poder desempenhar importan-te papel na integração física e regional sul-americana. O Brasil possui portos com vocação para a cabotagem.

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Movimentação de cargas por tipo de navegação2000 - 2005 (milhões de t)

2000 2001 2002 2003 2004 2005

800

600

400

200

0

Movimentação de cargas por tipo de navegação 2000 - 2005 (milhões de t)

Longo curso TotalCabotagem Outras Navegações

485

332

13518

507348

13722

429

371

121

571

411

13723

620

447

14825

649

437

15026

137

Fonte: Antaq, Anuário Estatístico Portuário 2005. Disponível em www.antaq.gov.br.

Participação dos tipos de navegações no transporte aquaviário - 2005

Cabotagem

Outras Navegações

Longo curso73%

23%

4%

Participação dos tipos de Navegações no Transporte Aquaviário - 2005

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Movimento de embarcações nos portos – 2001-2004 (unidades)

2001 2002 2003 2004

35.000

30.000

25.000

20.000

15.000

10.000

5.000

0

Tx de Cresc. 2001 - 2004 = 4,0%

28.23130.472

27.12329.367

17.104

8.1394.124

15.296

8.071

3.756

15.867

9.801

4.804

14.210

10.018

4.003

Longo curso TotalCabotagem Outras Fonte: Antaq, 2004, elaboração CEL-Coppead.

Volumes operados (em milhões de toneladas)

Ano Granel Sólido

Granel Líquido Carga Geral Total

1992 183,9 123,2 33,5 340,52004 369,6 166,6 84,6 620,7

Variação Acumulada 201% 35,2% 152,3% 82,3%

Variação Anual 9,6% 2,5% 8,0% 5,1%

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Movimentação de carga por natureza e tipo de porto 2004 ( em t mil)

Natureza da Carga Portos %

Terminais de Uso

Privativo% Total Geral %

Granéis Sólidos 122.862 33,2 246.749 66,8 369.611 59,6

Granéis Líquidos 38.386 23,0 128.169 77,0 166.555 26,8

Carga Geral 67.061 79,3 17.493 20,7 84.554 13,6

Total 228.310 36,8 392.411 63,2 620.721 100,0Fonte: Apresentação do BNDES para o PNLT, p.8.

Disponível em www.centran.eb.br/plano_logistica

Em 2005, o porto de São Sebastião (SP) foi o mais importante do setor de cabotagem, com 28% de participação, seguido de Aratu (BA) com 13%, Belém (PA) com 7,5%, Angra dos Reis (RJ) com 5,3%, Santos (SP) com 5,2%, Vila Conde (PA) com 4,8%, São Francisco do Sul (SC) com 4,7%, Rio de Janeiro (RJ) com 4,4% e Manaus (AM) com 3,5%. Na navegação de longo curso, os nove portos/terminais que mais movimen-taram em 2005 concentram 81,79% do total movimentado no Brasil.

Os investimentos da União nos portos têm sido insuficientes e re-lativamente estáveis ao longo dos anos, com uma queda acentuada em 2003. Dos R$ 240 milhões autorizados no Orçamento de 2006 para a “agenda portos”, somente R$ 59 milhões (menos de 25%) haviam sido ordenados até outubro, e nem mesmo esse montante havia sido execu-tado. A marinha mercante foi privilegiada com maiores investimentos e atenção no governo Lula, aumentando em mais de 100% entre 2002 e 2003, primeiro ano de mandato. No entanto, esse segmento parte de um nível muito baixo, por causa do abandono e do sucateamento nos go-vernos anteriores, que tentaram extingui-lo. Ele ainda demanda muitos

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cuidados, investimentos e políticas específicas, como políticas de finan-ciamento e industriais. O transporte hidroviário segue com investimen-tos insignificantes.

Movimentação de longo curso: total de cargas nos principais portos em 2005

Porto Cargas em t ParticipaçãoTubarão (ES) 97.574.691 20,63%Itaqui (MA ) 78.658.411 16,63% Itaguaí (RJ) 65.665.071 13,88% Santos (SP) 64.062.571 13,54%

Paranaguá (PR) 26.778.239 5,66% Praia Mole (ES) 16.264.827 3,44% Ponta Ubu (ES) 15.526.697 3,28%

Rio Grande (RS) 12.535.278 2,65% S. Fco. do Sul (SC) 9.828.471 2,08%

Fonte: Antaq, Anuário Estatístico Portuário 2005.

Investimentos (realizados) da União - 2000 - 2004 (R$ mil)

2000 2001 2002 2003 2004Rodoviário 1.840.281 2.310.072 1.653.570 712.450 960.038

Portuário 179.028 180.811 133.639 44.718 172.770Ferroviário 59.812 70.909 72.185 34.805 69.138

Marinha Mercante 186.627 150.960 298.649 611.742 696.126

Hidroviário Interior 70.239 103.805 50.151 7.255 37.016

Fonte: Ministério da Fazenda, Ministério do Planejamento, Siafi.

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A operação dos portos se dá sob administração pública ou privati-va/privada.17 A administração dos portos, denominada Autoridade Por-tuária, pode ser exercida pela União ou por concessionárias. Os portos apresentam diferentes procedimentos administrativos, que diferenciam seus processos, serviços e custos. A Pesquisa Aquaviária CNT 200618 mostrou que, para os agentes marítimos (armadores e embarcadores), a eficiência/velocidade operacional é o principal motivo para escolher um tipo de terminal (45,7% das respostas), seguido pelo custo (16,4%). A pesquisa constatou que a eficiência operacional é apontada como o maior atrativo em portos privados/privativos.

No entanto, os terminais públicos predominam em quase todos os tipos de carga. Apenas a movimentação de contêineres predomina nos terminais privados/privativos, por causa da maior disponibilidade de equipamentos e recursos (74,2% das movimentações contra 24,8% em terminais públicos). Segundo a opinião dos agentes, os problemas que foram classificados como graves e muito graves na avaliação da pesquisa foram o excesso de burocracia (76,7%), o elevado custo da mão-de-obra (71,1%) e a falta de financiamento para investimentos em infra-estrutu-ra portuária (59,5%).

O excesso de burocracia é um dos principais problemas nos por-tos brasileiros e reduz sua competitividade. Os tributos e a burocracia

17 Segundo a Pesquisa Aquaviária CNT 2006 (p.22), “podemos considerar que os ter-minais públicos são aqueles administrados por governos estaduais, municipais ou por órgão vinculado ao Ministério dos Transportes. Já os terminais privativos são instalações portuárias exploradas por empresas privadas, dentro ou fora da área do porto organizado, utilizadas na movimentação e/ou armazenagem de cargas destinadas ou provenientes do transporte aqua-viário. Estes podem ser de uso misto, para a movimentação de cargas próprias ou de terceiros, ou de uso exclusivo, para movimentação somente de carga própria, localizados em áreas pri-vadas, desta forma, também denominados terminais privados”.18 A Pesquisa Aquaviária CNT 2006, Portos Marítimos: Longo Curso e Cabotagem, analisou os principais fatores de infra-estrutura destes subsetores do transporte aquaviário, a partir de entrevistas com agentes marítimos (armadores e embarcador). A Pesquisa selecionou 227 empresas, atuantes em 12 estados e 15 portos.

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alfandegária aumentam os custos e dificultam o desembaraço. É preciso racionalizar os processos e investir em informatização. Dentre os agen-tes marítimos entrevistados na Pesquisa CNT 2006, 75% classificaram a burocracia nos portos como grande ou muito grande.

Os custos portuários são elevados e os investimentos privados não resultam em baixas tarifas. Não há concorrência intraportos, que deveria pressionar os preços para baixo. O setor está sujeito a práticas econômicas abusivas e a práticas de cartel. As altas tarifas não têm sido revertidas em investimentos, públicos ou privados.

O custo da mão-de-obra tem sido um gargalo à competitividade dos portos, onerando o custo total, com excesso de trabalhadores e ser-viço de qualidade apenas regular. Segundo a Antaq, o custo da mão-de-obra responde por duas a cinco vezes o custo da infra-estrutura. De acordo com a Pesquisa Aquaviária CNT 2006 (p.31), “em geral os custos com pessoal são 2,3 vezes maiores que os relacionados à infra-estrutura. No caso específico de terminais públicos, esse valor chega a ser cinco vezes maior. Os portos brasileiros são excessivamente caros por causa dos custos com pessoal. (...) Os serviços de praticagem e rebocadores re-presentam 30% a 50% o custo total.” É preciso haver uma adequação no número e no treinamento dos trabalhadores, de acordo com cada porto. Para a Pesquisa CNT, tal quadro sugere a necessidade do fortalecimento do Órgão Gestor de Mão-de-Obra Portuária Avulsa.19 O sindicato do setor, organizado e forte, é uma das razões para a rigidez no número de trabalhadores. As Companhias Docas, órgãos federais, apesar de terem reduzido seus quadros, ainda são deficitárias, principalmente por causa de passivos trabalhistas.

19 Segundo a Pesquisa CNT (p.50), o OGMO “opera no âmbito de cada porto com a finalidade de cadastrar, registrar e treinar a mão-de-obra dos trabalhadores portuários; admin-istrar o fornecimento de mão-de-obra para os operadores portuários; estabelecer o número de vagas; arrecadar junto aos operadores os encargos sociais e previdenciários, bem como a remuneração devida aos trabalhadores”.

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Cada tipo de terminal apresenta uma estrutura de despesas varia-da. Segundo a Pesquisa Aquaviária CNT 2006 (2006, p. 29), “as despe-sas com práticos (24,4%), rebocadores (21,4%) e mão-de-obra avulsa (19,0%) são os principais componentes de despesas nos portos, segui-dos pela utilização de infra-estrutura (19%), que engloba tanto a parte terrestre quanto a marítima e a de estocagem. A operação no terminal marítimo representa apenas 8,3% da despesa portuária.”

Com o sucateamento da marinha mercante brasileira e o recente crescimento do comércio exterior, a opção tem sido usar navios de ban-deira estrangeira, o que gera significativos custos de frete internacional e pesa nos custos de transporte de longo curso.

É preciso melhorar o tempo de espera nos portos brasileiros, prin-cipalmente para navios de granéis sólidos e contêineres. Para os casos de navios de carga geral solta, granéis sólidos, contêineres e granéis líqui-dos (ou seja, exceto P.C.C./Ro-ro e Passageiros), mais de 30% dos navios esperam mais de seis horas por berço de atracação (para contêineres, essa percentagem é de quase 50% e para granéis sólidos, de 54,3%). Esse tempo de espera resulta em falta de eficiência, custos extras e atrasos no tempo de entrega. A maior parte do tempo médio atracado dos navios (desde a atracação até a partida) ficou entre 12 e 24 horas para navios de contêineres (43,7%), P.C.C./Ro-ro (41,7%) e granéis líquidos (29,4%). No caso de navios de granéis sólidos, mais de 20% ficam mais de 60 horas.

O tipo de carga mais carente de linhas regulares é o de contêineres. O problema tem origem no forte crescimento do transporte de contêi-neres: 136% na movimentação de contêineres nos últimos cinco anos, passando de 2,5 milhões de TEUs em 2000 para quase 5,9 milhões em 2005. O crescimento da demanda por esse transporte não foi acompa-nhado de uma oferta adequada.

A falta de regularidade na dragagem dos berços e canais de nave-gação, adequando o calado de ambos para acesso e atracação, tem sido

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um dos grandes problemas da infra-estrutura portuária. A ausência de dragagens, que em alguns portos não são realizadas há quase cinco anos, tem prejudicado a profundidade dos canais. Ao reduzir os cala-dos, isso limita o acesso de navios de grande porte e torna impossível ou muito caro o desembarque da carga. Essas obras são de responsabili-dade da Autoridade Portuária, pois os operadores dos portos recolhem taxas específicas para financiá-las. Têm sido dragados adequadamente os principais portos nos estados de Santa Catarina, Espírito Santo, Rio de Janeiro, Ceará, Paraíba e Maranhão. Nos demais, esse problema é muito grave.

Além das condições dos portos, também são importantes as con-dições dos acessos – terrestres e aquaviários – aos portos, que também apresentam problemas de qualidade da infra-estrutura. Anteriormente, tratamos dos problemas dos modais rodoviário e ferroviário. O acesso rodoviário, além de inadequado, é de má qualidade (mal conservado). Segundo a Pesquisa CNT 2006 (2006, p. 41), os principais problemas de acesso rodoviário, além da má conservação das vias, são: passagens em áreas urbanas, engarrafamentos de veículos de carga, roubos de carga, falta de duplicação e opções de vias de acesso, falta de estacionamen-to para espera, sinalização, pedágios e burocracia excessiva. Os acessos ferroviários – apesar da oferta ser, em geral, adequada – também são mal conservados e mal integrados. Os problemas apontados na Pesquisa CNT 2006 (p.43) são: conservação da malha e dos terminais ferroviá-rios, travessia por áreas urbanas,20 carência de linhas, falta de ramais para os portos, falta de equipamentos e horários de operação. Os acessos aquaviários têm problemas na profundidade de canais, pela ausência de dragagem regular. Também são relevantes os problemas de profundida-de e disponibilidade de berço de atracação e sinalização/balizamento. A

20 Conforme a Pesquisa (idem) assinala: “Destaca-se que a travessia por áreas urba-nas ocorre no entorno do porto organizado, o que dificulta sua ampliaçao e a construção de retroáreas e áreas de espera para os veículos de carga”.

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dragagem de canais e berços representa o principal problema de acesso aquaviário aos portos, e o acesso é determinante para a competitividade dos portos.

É preciso integrar o transporte marítimo aos demais modais. Para isso, são imprescindíveis a melhora nos acessos e o aumento da ofer-ta e qualidade de infra-estrutura, assim como a qualidade e eficiência dos serviços dos portos. Também é fundamental expandir retro-áreas e armazéns (capacidade de armazenamento dos portos), sobretudo para contêineres, aumentando a disponibilidade logística, o que demanda grandes investimentos públicos e privados, tanto de empresas explo-radoras quanto de usuários. Os pátios e áreas de armazenagem apre-sentam problemas de disponibilidade e conservação, pela falta de in-vestimentos, que são de responsabilidade da Autoridade Portuária, que recolhe taxas e recebe incentivos dos governos para isso. Os retroportos (ou retro-áreas) também apresentam problemas de disponibilidade e conservação.

É preciso investir no aumento da capacidade e eficiência dos portos brasileiros. Os equipamentos de transbordo (guindastes móveis, portêi-neres, transtêineres, sistemas de recepção e expedição, ship-loaders etc.) precisam de grandes investimentos. Com capacidade logística e efici-ência, os portos podem operar com economias de escala na produção, reforçando a intermodalidade. O aumento na movimentação de contêi-neres mostra a necessidade de modernização e de aumento da oferta de equipamentos nos portos brasileiros, e, conseqüentemente, do aumento significativo dos investimentos.

Sob políticas adequadas e direcionadas para tal fim, os portos po-dem dinamizar as economias regionais. São importante instrumento de desenvolvimento. O porto de Santos, o principal do país, por exemplo, apresenta gravíssimos problemas de acesso, com gargalo nas estradas de aproximação e problemas de acessos ferroviários, de conservação e de dificuldades de conexão entre as malhas de diferentes concessionárias.

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Movimentação anual de contêineres – em TEUs

2002 2003 2004 2005

Porto

Qua

ntid

ade

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ento

Qua

ntid

ade

Cre

scim

ento

Qua

ntid

ade

Cre

stim

ento

Qua

ntid

ade

Santos 1.230.599 26,8% 1.560.963 22,4% 1.910.532 18,7% 2.267.921Rio

Grande 452.548 13,2% 512.331 20,6% 617.808 9,3% 675.516

Itajaí 334.746 39,4% 466.771 20,8% 564.012 14,9% 647.796Paranaguá 271.219 14,3% 309.931 21,7% 377.125 11,4% 420.318

Rio de Janeiro 270.046 19,0% 312.349 7,2% 344.487 -5,5% 325.380

São Francisco

do Sul257.925 9,3% 281.887 -2,9% 273.787 6,1% 290.440

Outros 714.856 14,8% 820.413 86,9% 1.533.057 -14,5% 1.310.569Total 3.531.939 21,0% 4.273.645 19.6% 5.113.198 16,1% 5.937.940

Fonte: Pesquisa Aquaviária CNT 2006, p. 48.

Existe uma centralização das decisões administrativas nas Compa-nhias Docas. Estas devem ser financeiramente saudáveis e administra-das de forma profissional, tendo em vista o desenvolvimento do porto, o aumento da capacidade de gestão e de investimento. É preciso rever o papel da Antaq, que deve ser voltado a objetivos públicos.

Uma série de desafios, de curto, médio e longo prazo, está coloca-da ao Estado para a operação eficiente dos portos, pois o setor privado não reúne condições ou interesse de enfrentá-los. Tais desafios são: (a) racionalização de processos burocráticos, informatização e dimensio-namento e treinamento de mão-de-obra; (b) realização de operações re-gulares e de investimentos em manutenção: na criação e especialização

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de berços, na dragagem, na expansão de retro-áreas para contêineres e em armazéns, aumentando a disponibilidade logística, com moderni-zação e aquisição de equipamentos, principalmente os de transbordo (guindastes móveis, portêineres, transtêineres, sistemas de recepção e expedição, ship-loaders etc.); (c) melhora de infra-estrutura e de acessos rodoviários, ferroviários e aquaviários, e ações de integração dos portos aos demais modais; (d) construção de novos terminais; (e) revisão do marco regulatório e saneamento das Companhias Docas, para torná-las auto-sustentáveis e financeiramente saudáveis, com gestão profissional, voltada ao desenvolvimento do porto; (f) abertura de financiamentos direcionados para modernizar e aumentar a capacidade dos portos, as-sim como para solucionar os demais problemas que demandam uso de recursos, objetivando acompanhar o crescimento de demanda e, princi-palmente, fazer a oferta andar à frente da demanda.

Essas ações de integração devem ser acompanhadas de outros in-vestimentos, como estradas alimentadoras, terminais e pátios intermo-dais, armazenagem nas propriedades, terminais portuários especializa-dos etc. A intervenção governamental nessas ações poderá vir a contar com expressiva participação do setor privado como investidor direto e/ou na montagem de esquemas de financiamento que as viabilizem.

Uma questão a ser resolvida é a integração de um dos vértices do polígono São Paulo – Rio de Janeiro – Belo Horizonte – Brasília à malha viária internacional. O complexo portuário Rio de Janeiro – Sepetiba é a melhor solução. Ali, há uma importante área geográfica, compreendi-da pelas baixadas Fluminense e de Sepetiba, para a instalação de áreas alfandegárias de armazenagem, serviços de enchimento de contêineres e pré-despacho. Os portos do Rio de Janeiro e de Sepetiba precisam ser reaparelhados e recuperadas as vias de interconexão entre eles, os “por-tos secos” e os corredores de transporte.

O porto de Itaguaí, na baía de Sepetiba, é o único no Atlântico Sul com águas profundas e abrigadas pela baía, ou seja, capaz de receber

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gigantescos navios porta-contêineres – que hoje fazem comércio com a Ásia –, tornando-se um grande concentrador de cargas industriais e in-serindo o Brasil nas rotas internacionais de comércio de mais alto valor (cargas industriais), que atualmente se restringem ao Hemisfério Norte. Sua localização é privilegiada, pois, em um raio de 500 km de Itaguaí concentram-se 70% do PIB brasileiro. Esse porto, além de reduzir o gas-to anual do Brasil com frete internacional, aumentaria a competitivi-dade da indústria brasileira.21 Os gargalos estão no acesso rodoviário e ferroviário. É preciso completar o arco rodoviário e adaptar/padronizar bitolas de ferrovias. 22

Marinha mercanteO aumento do fluxo de comércio (exportações e importações) leva o Brasil a ter maiores gastos com frete e aluguel de equipamentos. Em 2006, foram gastos US$ 6,5 bilhões em fretes marítimos. Eles refle-tem o sucateamento da marinha mercante,23 grande transportadora

21 Apesar de seu potencial para cargas industriais, o complexo portuário atualmente movimenta carvão, minério de ferro e alumina, e tem um terminal de contêineres (carga in-dustrial), encontrando-se subaproveitado, com ocupação de apenas 35% da área, devido a en-traves logísticos, a serem resolvidos, e pressões políticas (especialmente em favor de Santos). No entanto, já atrai para a sua proximidade a instalação de grandes projetos industriais, com empresas privadas interessadas (como a Vale do Rio Doce) que podem investir em obras de infra-estrutura – com investimento podendo chegar a 569 milhões de reais - atuando de forma sinérgica no porto.22 O governo federal deve efetivar a obra de duplicação da BR-101 no trecho Santa Cruz e Itacuruçá, obra de 22,6 km orçada em R$147 milhões, que é parte do arco rodoviário que ligará o porto às rodovias BR-040, BR-116 e BR-101 – o Dnit não tem conseguido levar a frente esta obra. Toda obra do arco rodoviário está orçada em R$570 milhões. Quanto ao gargalo ferroviário, a malha ferroviária da FCA em Minas Gerais e Goiás tem bitola estreita, enquanto a linha MRS em Barra Mansa é mais larga, demandando então a construção de uma linha com bitola estreita entre Barra Mansa e Itaguaí. Vale lembrar que estas obras têm efeitos multiplicadores e impactos sociais na região, gerando emprego e renda.23 A marinha mercante é o conjunto de navios e outras embarcações destinadas a exercer atividades comerciais, realizando, entre outras atividades, transporte de mercadorias e de passageiros e apoio à exploração de recursos marítimos.

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de riquezas do país, iniciado na década de 1990 com o governo Collor e aprofundado no processo de privatização com o governo Fernando Henrique Cardoso, que incluiu o Lloyd Brasileiro no Plano Nacional de Desestatização.24

Nas décadas de 1970 e 1980, o Brasil tinha uma grande marinha mercante e grandes armadores. O Lloyd Brasileiro, que transportava mercadorias para todo o mundo, é o maior exemplo. A indústria de construção naval brasileira era a segunda maior construtora de navios do mundo, atrás do Japão. Em 1983, por exemplo, direcionou 64% de sua produção para o mercado externo, gerando divisas de US$ 286 mi-lhões. O transporte aquaviário de longo curso cresceu a taxas elevadís-simas. O Lloyd, com mais de cem anos de existência, sempre foi o pilar da marinha mercante nacional, seguido da Frota Nacional dos Petro-leiros (Fronape, atual Transpetro). A empresa, rentável e competitiva, tinha receita considerável. Na década de 1990, a frota nacional passou por uma trágica redução e foi sucateada. Grandes companhias faliram e estaleiros fecharam. Perdeu-se todo o desenvolvimento tecnológico acumulado durante os anos anteriores. A entrega de navios nos estalei-ros nacionais diminuiu drasticamente desde 1980, de 1,2 milhão de TPB (tonelada de porte bruto) para menos da metade em 1990 e menos de 1/4 em 1996. Os empregos na indústria de construção naval, de mais de 30 mil trabalhadores, reduziu-se para menos de 10 mil em 1995 (Fonte: CNT/CEL, 2002, p. 52).

Atualmente, a marinha mercante nacional vive uma nova fase. O setor está sendo puxado pela expansão da exploração de petróleo, prin-

24 Em 1991, Collor baixou uma Medida Provisória para liquidar o Lloyd. No entanto, os sindicatos fortemente organizados, através da Federação dos trabalhadores, conseguiram a reversão da MP no Congresso Nacional. Com uma emenda no texto, a mudança feita seria em favor da aberta de uma linha de crédito do Fundo da Marinha Mercante para o Lloyd, e não seu dissolvimento ou liquidação. Em 1995, José Serra, o então Ministro do Planejamento e Presidente do Conselho Nacional de Desestatização, baixou uma resolução colocando o Lloyd a liquidação no Plano Nacional de Desestatização.

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cipalmente na bacia de Campos (Rio de Janeiro), e pelas novas políticas governamentais, que privilegiam a indústria nacional nas encomendas ao setor e aumentam significativamente os investimentos da União, ainda insuficientes. A exploração de petróleo tem demandado novas e mais modernas embarcações de apoio marítimo, e a frota da Transpetro, agora o maior armador da América Latina, demanda crescente renova-ção, especialmente para atender especificações internacionais.25 O papel do BNDES no financiamento é fundamental, abrindo linhas de crédito para a construção de novas embarcações em estaleiros nacionais. O sis-tema de incentivo para construção naval baseia-se nos financiamentos especiais concedidos pelo Fundo de Marinha Mercante (FMM), sob exi-gência de que os navios sejam construídos em estaleiros nacionais.26 É necessário recuperar o Lloyd Brasileiro para que sejam criados empre-gos na área marítima e na área de produção naval, reduzindo os gastos com fretes internacionais.

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Entrega de navios em estaleiros nacionais (em 1000 TPB)

25 Devido à necessidade da frota da Transpetro atender novas especificações interna-cionais, que seus navios deixarão de atender no curto prazo.26 O Fundo de Marinha Mercante (FMM) tem como origem a taxa de renovação da marinha mercante (TRMM), de 25%, cobrada sobre o valor do frete das importações, assim como do retroalimentação das amortizações das embarcações financiadas. O FMM financia os principais clientes, armadores nacionais e as empresas estatais de petróleo e mineração, da indústria de construção naval.

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obra

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Número de empregados na construção naval

Fonte: CNT/CEL, 2002, p. 52.

CabotagemEsse setor não tem tido uma participação adequada na matriz de trans-porte. Além disso, vem perdendo importância gradativamente.

R

Ó

Fonte: Antaq. Séries estatísticas. Disponível em www.antaq.gov.br.

Em 2005, segundo a Pesquisa Aquaviária CNT 2006 (2006, p.73), “24 empresas atuaram na navegação de cabotagem, operando 131 em-barcações próprias (petroleiros, graneleiros, cargueiros e portacontêi-neres, entre outros), e foram realizados 1.399 afretamentos de embar-

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cações estrangeiras”. Os fatores mais importantes para a atratividade do segmento são: nível de serviço oferecido ao usuário, qualidade dos serviços, confiabilidade, regularidade e continuidade, tempo de trânsito das mercadorias, freqüência e fretes compatíveis com as cargas e com o mercado. As principais empresas do setor, que operam cabotagem de carga geral, são a Aliança e a Docenave.

A Pesquisa conseguiu entrevistar 87,7% de um universo amostral de 122 empresas cadastradas nos bancos de dados de clientes das em-presas de navegação de cabotagem de carga geral. Dessas, 65,4% utili-zam regularmente o transporte de cabotagem, 17,8% eventualmente e 16,8% já o utilizaram, mas não o utilizam mais (Pesquisa Aquaviária CNT 2006, 2006, p. 74). Estas últimas apontaram como principais mo-tivos para terem deixado de usar o modal: altos custos do frete, baixa freqüência de linhas e grande incidência de avarias.

Os principais produtos transportados por cabotagem são alimen-tos, produtos químicos e inflamáveis, celulose e papel, eletroeletrôni-cos, materiais de construção, produtos de higiene e limpeza, produtos metalúrgicos, veículos e autopeças, móveis e utensílios domésticos, em-balagens e vasilhames, rações, madeira e derivados, minérios, bebidas, calçados e confecções, borracha e plásticos.

O transporte de cabotagem é mais utilizado em conjunto com ou-tros modais – só 4,7% dos entrevistados pela CNT utilizavam apenas o modal –, e sua maior utilização se dá na região Sudeste, que tem mais infra-estrutura para integração entre os modais. Essa utilização conjun-ta dos modais de transporte mostra suas complementaridades, o que pode ser fomentado, no caso da cabotagem, com melhora nos serviços oferecidos (como coleta, entrega e gerenciamento de carga), nos siste-mas de comunicação, no sistema logístico e na operação e eficiência dos portos.

No Brasil, as tarifas do transporte por cabotagem para longas dis-tâncias tendem a ser mais competitivas que as de outros modais, prin-

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cipalmente para cargas de baixo valor agregado. O setor se direcionou para o transporte de novos tipos de carga nos últimos anos, aumentan-do a participação no transporte de carga geral. Com os crescentes pro-blemas do transporte rodoviário (frota envelhecida, segurança etc.) e os altos custos gerados por pedágios, o transporte de cabotagem tem sido uma alternativa. Algumas empresas de navegação passaram a investir no setor, que apresenta uma série de entraves.

Um obstáculo ao crescimento é a baixa disponibilidade de navios de cabotagem de contêineres. Segundo estudo CNT/CEL-Coppead 2002 (p. 50), “apesar do recente crescimento do número de navios porta-con-têineres que realizam o transporte na costa brasileira, o número ainda baixo de saídas semanais nas principais rotas é apontado por alguns embarcadores como limitante ao maior uso deste modal. (...) Quando se compara o número de saídas semanais, em rotas que os navios con-correm com caminhões, na costa brasileira e na costa européia, verifica-se maior saída no mercado europeu.” Nos contêineres, geralmente são transportados produtos de alto valor agregado, para os quais os custos de espera são altos.

O desempenho dos portos é fundamental para o transporte de ca-botagem. Como vimos, há uma série de desafios a vencer. Apesar da melhora em alguns portos, a infra-estrutura portuária é um dos entra-ves ao desenvolvimento da cabotagem. Entretanto, a melhora na eficiên-cia levou ao crescimento do “transporte de mercadorias em rotas como Santos – Manaus e Fortaleza – Buenos Aires”, como atesta a Pesquisa Aquaviária CNT 2006 (2006, p. 73).

Com o crescimento do transporte de cabotagem, alguns portos começaram a apresentar gargalos de infra-estrutura no carregamento e descarregamento de contêineres. O sucateamento da marinha mer-cante nacional também resultou em entrave ao setor, pois as empresas nacionais, com problemas de produção e financeiros, deixaram de ser fornecedoras adequadas de navios.

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A tarifa do setor de cabotagem agrega o valor do frete e serviços prestados nos portos (movimentação de mercadorias e entrada e saída de navios). Segundo a Pesquisa CNT 2006, 54,2% dos clientes de em-presas de cabotagem entrevistados têm percepção positiva em relação à evolução de reduções tarifárias, o dobro da percepção negativa, de 27,1%. No entanto, a própria pesquisa revela que “o excesso de tarifação foi considerado muito grave por 50,5% dos entrevistados e moderado por 29,9%. O excesso de burocracia, a carência de linhas regulares e a ineficiência nos portos foram classificados como fatores muito graves (37,3%, 39,3% e 38,3%) e moderados (38,3%, 35,5% e 36,5%)”.

É importante que sejam ofertadas linhas regulares e freqüentes. Segundo a Pesquisa CNT 2006 (p. 101-104), “nos últimos anos, o trans-porte por cabotagem passou a operar com linhas regulares e freqüências constantes, apesar de ainda insuficientes. Parte do aumento da movi-mentação nos últimos três anos pode ser explicado pela maior confia-bilidade do serviço. (...) As freqüências fixas quinzenais não atendem às necessidades de cargas perecíveis, que necessitam de prazo máximo de quatro dias”. É preciso aumentar a freqüência das linhas. Os proble-mas dos portos, tratados acima, e a baixa freqüência das linhas afetam a competitividade da cabotagem.

Um dos principais fatores de insatisfação dos clientes do segmen-to, apontado na Pesquisa CNT 2006 (p. 83), foi o tempo de operação e liberação de cargas, considerado lento por 49,5% dos entrevistados. Quanto aos prazos de entrega, 50,5% afirmam que as empresas os cum-prem, 40,2% que nunca cumprem, e 1,9% que cumprem parcialmente.

Segundo o estudo CNT/CEL-Coppead 2002, um grande problema no setor de cabotagem é o desbalanceamento entre a movimentação de fluxos de cargas entre regiões: ela é maior nos fluxos sul-norte e menor nos fluxos norte-sul. Para o estudo, “os serviços de feeder – transbordo de carga internacional em hub ports para posterior distribuição ao longo da costa –, que ainda acontecem em pequena escala no Brasil, podem

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ajudar no aumento dos fluxos do Norte e Nordeste para o Sul e Sudeste, sempre que o hub port de transbordo for no Norte ou Nordeste. Pode-se citar o porto de Suape, por seu grande calado e infra-estrutura de terra, como um potencial hub port da região Nordeste”.

A Pesquisa Aquaviária CNT 2006 chama a atenção para o poten-cial de crescimento do setor, pois os percentuais de carga transportados hoje são na maioria inferiores a 50% (ver tabela). De acordo com a pes-quisa (p. 98-99): “As empresas que utilizam a cabotagem, na maioria (57,0%), transportam menos de 25% da sua carga total por cabotagem. Apenas 17,7% transportam mais de 50% da carga por cabotagem e só 2,8% transportam de 96% a 100% da carga por cabotagem. (...) Ao ava-liar a evolução, nos últimos três anos, da quantidade de carga transpor-tada por cabotagem, 30,9% das empresas informaram que mantiveram o mesmo volume de carga, 21,5% aumentaram de 6% a 25% do volume, 16,8% aumentaram menos de 5%. Apenas uma empresa (0,9%) aumen-tou o volume em mais de 100% nos últimos três anos. Apenas duas das 107 empresas pesquisadas (1,9%) informaram que reduziram o volume de carga transportado por cabotagem.”

Há amplo espaço para que a cabotagem cresça, somente observan-do os clientes que já utilizam ou utilizaram o setor, desde que sejam melhorados os fatores que mais influenciam na decisão de contratá-la. É preciso realizar investimentos para aumentar a participação da ca-botagem na matriz de transportes nacional, para que ela seja utilizada plenamente, pois é adequada à geografia do Brasil e da América do Sul. O Estado é o agente que possui os recursos e as forças para alavancar esse desenvolvimento.

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Problemas do segmento/ Fatores que inibem a expansão

Excesso de burocracia

Excesso de tarifação

Carência de linhas regulares

Ineficiência no seu porto

Muito grave 37,3% 5,5% 39,3% 38,3%Moderado 38,3% 29,99% 35,5% 36,5%

Pouco grave 12,2% 6,5% 13,1% 12,1%NS/ NR 12,2% 3,1% 12,1% 13,1%

Total 100,0% 100,0% 100,0% 100,0%Fonte: Pesquisa Aquaviária CNT 2006, p.102.

Condições para ampliar o serviçoEntrevistas Percentual

Menor custo de frete 59 40,4%Freqüência das linhas 25 17,1%

Maior confiabilidade dos prazos 17 11,6%Maior nível de segurança da carga 12 8,2%

Rede de agências mais amplas 4 2,7%Manor nível de avarias 3 2,1%

Melhor comunicação/informação sobre a carga 2 1,4%

Maior oferta de serviços complementares 1 0,7%Melhora na armazenagem da carga 1 0,7%

Outro 7 4,8%NS/NR 15 10,3%

Total 146 100,0%Fonte: Pesquisa Aquaviária CNT 2006, p.101.

Segundo a Pesquisa Aquaviária CNT 2006 (p. 104), para a cabo-tagem ampliar sua atuação “serão necessários investimentos em infra-

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estrutura logística, ampliação da estrutura e facilidades portuárias, simplificação dos procedimentos de transbordo, harmonização dos procedimentos das autoridades intervenientes e maior articulação com outros modais, (...) construção de novas embarcações nacionais para a navegação de cabotagem, ao custo estimado de US$ 4,5 bilhões”.

Transporte HidroviárioAs hidrovias apresentam o mais baixo custo de manutenção e implemen-tação. É um tipo de transporte que consome menos óleo diesel, sendo mais econômico (inclusive em gastos com frete) e menos poluente. Suas vantagens aparecem, especialmente, em transporte a longas distâncias. O impacto ambiental da construção de uma infra-estrutura hidroviária também é menor em relação à construção de rodovias e ferrovias, por causa da utilização de uma via (o rio) já existente. A implementação de hidrovias sempre está relacionada com programas de desenvolvimento a serem implantados nas regiões banhadas pelas bacias. A infra-estrutu-ra gerada pela implantação de uma grande hidrovia favorece o aumento da produção e a geração de empregos, com melhor qualidade ambiental. No Brasil, o transporte hidroviário está fortemente ligado a uma política de usos múltiplos e integrados de recursos hídricos.

O número de quilômetros percorridos com um litro de combustí-vel ao levar uma tonelada revela a eficiência energética do modal: 25 km para o transporte rodoviário, 85 km para o ferroviário e 218 km para o hidroviário. Conseqüentemente, a emissão de poluentes (hidrocarbo-netos, monóxido de carbono e óxido nitrogênio) é significativamente menor nas hidrovias.

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Emissão de Poluentes *

Modo Hidrocarbonetos Monóxido de carbono Óxido nitroso

Empurrrador 0,09 0,20 0,53Trem 0,46 0,64 1,83

Caminhão 0,63 1,90 10,17Fonte: Agência de Proteção Ambiental (EUA). * Libras de poluentes emitidos no transpor-

te de 1 tonelada de carga por 1 mil milhas.

O Brasil possui uma grande rede hidroviária, mas não utiliza o modal em toda a sua potencialidade. Os rios navegáveis requerem inter-venções, como dragagem, construção de terminais, represamento, cons-trução de eclusas, canais para rios sinuosos etc. O Brasil possui cerca de 43 mil km de rios, dos quais 28 mil km são navegáveis, mas apenas 10 mil km de hidrovias são utilizados, caracterizando uma subutilização dos rios e do modal, que apresenta grande potencial de crescimento, desde que haja intervenções nos rios e construção de infra-estrutura em terra (terminais hidroviários).

As principais hidrovias brasileiras são: hidrovias da bacia amazô-nica, formada pelo trecho ocidental, navegável por embarcações maríti-mas, pela hidrovia do Solimões e pela hidrovia do Madeira; hidrovia do Tocantins e Araguaia; hidrovia do São Francisco; hidrovia do Paraguai; hidrovia Paraná – Tietê, onde se destaca o ramo norte; hidrovias do Sul, formadas pelos rios Jacuí e Taquari; hidrovias do Nordeste, de menor porte no cenário nacional, formadas pelos rios Parnaíba, Mearim e ou-tros.

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Rede hidroviária brasileira por bacias

Bacia EstadosExtensão aproximada (Km) Principais rios e

lagosNavegáveis Potenciais Total

Amazônica

AM, PA, AC, RO, RR

e AP

18.300 724 19.024

Amazonas, Solimões, Negro, Branco, Madeira,

Purus, Juruá, Tapajós, Teles

Pires, Juruena, Mamoré e

Guaporé

Nordeste MA e PI 1.740 2.975 4.715

Mearim, Pindaré, Itapecuru, Balsas

e Parnaíba

Tocantins / Araguaia

TO, MA e

GO2.200 1.300 3.500

Tocantins, Araguaia e das

Mortes

São Francisco

MG, BA, PE

e SE1.400 2.700 4.100

São Francisco, Grande e

Correntes

Leste MG, ES e RJ 0 1.094 1.094

Doce, Paraíba do Sul e

Jequitinhonha.

Tiête / Paraná

SP, PR e SC 1.900 2.900 4.800

Paraná, Tietê, Paranaíba,

Grande, Ivaí e Ivinheima.

ParaguaiMT,

MS e PR

1.280 1.815 3.095

Paraguai, Cuiabá, Miranda, São

Lourenço, Taguari e Iaurú.

1 4 1

Raph a el Pa du l a

Bacia EstadosExtensão aproximada (Km) Principais rios e

lagosNavegáveis Potenciais Total

Sul RS 600 700 1.300Jacuí,Taquarí,

Lagoa dos Patos e Lagoa Mirim.

Uruguai RS e SC 0 1.200 1.200 Uruguai e Ibicuí (potenciais)

Total 27.420 15.408 42.828

Fonte: Administração das Hidrovias e Ministérios dos Transportes.

São necessários investimentos para reverter esse quadro e garantir maior participação desse modal, tão vantajoso, na matriz de transportes brasileira. Além disso, apesar de o transporte hidroviário ter elevado potencial integrador, nossas hidrovias caracterizam-se por poucas e precárias interligações, com hidrovias dissociadas umas das outras.

Das principais bacias, quatro têm potencial internacional: Amazô-nica, Tietê-Paraná, Paraguai e Uruguai. A bacia Amazônica é a maior do mundo em termos de extensão e a mais importante bacia brasileira em movimentação de cargas, com mais de 25 milhões toneladas/ano trans-portadas – mais de 80% do total transportado no país por esse modal. Geograficamente, esse transporte favorece a região amazônica, mas eco-nomicamente ela não é a mais desenvolvida, pois ali não há mercados produtores e consumidores de peso. O transporte pelos rios tem papel fundamental no desenvolvimento da Amazônia.

Os principais corredores hidroviários brasileiros são: Madeira, São Francisco, Araguaia – Tocantins, Tapajós – Teles Pires, Tiête – Paraná, Paraguai – Paraná, Taquari – Jacuí. Esses corredores estão bem distribu-ídos pelo país. No entanto, a maioria dos rios está distante dos centros produtores e geralmente não têm ligações até os portos marítimos.

A navegação interior é a modalidade de transporte que tem rece-bido menor investimento do Estado (1,8% do total do irrisório valor in-

1 4 2

Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

vestido em transportes entre 1995-2001). Em 2002, foram investidos em hidrovias R$ 50,2 milhões, 2,25% do total investido em transportes (R$ 2,2 bilhões). Em 2003, o investimento foi de R$ 29,6 milhões, 1,44% do investido em transportes (R$ 2,0 bilhões). Em 2004, o investimento em hidrovias foi de 2% (R$ 63,2 milhões) do total investido em transportes (R$ 2,2 bilhões).27 Durante o governo Lula, a média de investimentos em hidrovias em relação ao total investido em transportes, no período de 2002 a 2004, foi de 1,9%, e a modalidade continuou esquecida. A infra-estrutura do setor é insuficiente. Comparado-o aos demais mo-dais, o modal hidroviário é o que necessita de menores investimentos em infra-estrutura, apesar de gerar melhores resultados econômicos.

Existem vinte portos de navegação interior. Operam no sistema hidroviário nacional 150 empresas. A frota estimada operante é de 1,5 milhão de toneladas de porte bruto (TPB). São transportadas 25,2 mi-lhões de toneladas de carga por ano, 22,2 bilhões de t/km/ano, com mais de R$ 500 milhões gerados em frete anualmente.

O desenvolvimento do setor hidroviário ajuda a intermodalidade, pois os terminais hidroviários desempenham funções de transferência e armazenamento de carga. Sua oferta, capacidade e eficiência estão inti-mamente relacionados com a competitividade desse meio de transporte. A rede rodoviária vicinal de alimentação das hidrovias é um dos garga-los do escoamento de carga. A exploração plena de vários modais pode criar externalidades econômicas relevantes na produção e exportação de bens e na geração de empregos qualificados. Com a eficiente utiliza-ção das hidrovias, o país será capaz de diminuir o preço dos produtos que fazem parte da cesta básica e obter vantagens competitivas signi-ficativas no mercado internacional. E, ao possibilitar a mobilidade da produção em diversas áreas, induzindo o desenvolvimento nas regiões,

27 Dados: Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão; Ministério dos Trans-portes e CEL-Coppead.

1 4 3

Raph a el Pa du l a

o transporte hidroviário trabalha em favor da diminuição de pressões de migração sobre as áreas urbanas.

Movimentação de cargas por bacias (2000-2002) – em tonelada

Hidrovias

Mov

imen

taçã

o 20

00(t

)

Mov

imen

taça

o 20

01(t

)

Mov

imen

taçã

o 20

02(t

)

Varia

ção

no B

iêni

o 20

00/2

001

Varia

ção

no B

iêni

o 20

01/2

002

Varia

ção

no T

riêni

o 20

00/2

002

Bacia Amazônica - Amazônia

Ocidental

4.246.636 4.780.884 7.689.270 12,60% 60,80% 81,00%

Bacia Amazônica - Amazônia

Oriental

13.718.530 15.980.257 15.980.257 16,40% 0,0% 16,40%

Bacia do Nordeste 187.180 211.359 205.144 12,91% -6,21 9,59%

Bacia do São

Francisco58.766 60.631 75.009 3,17% 23,71% 27,64%

Bacia do Tocantins -

Araguaia2.400 0 0 - - -

Bacia do Paraguai 1.911.326 1.632.521 2.178.744 -14,59% 33,46% 13,99%

Bacia do Tietê - Paraná

1.531.920 1.991.600 2.042.522 30,01% 2,56% 33,33%

Bacia do Sudeste 407.139 638.769 642.538 56,89% 0,59% 57,82%

Total 22.063.897 25.296.021 28.813.484 14,65% 13,91% 30,59%Fonte: Administração das Hidrovias.

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Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

O Brasil possui apenas 58 terminais hidroviários, número insigni-ficante quando comparado com os 1.137 terminais registrados nos Esta-dos Unidos, que, além disso, operam com eficiência muito maior que os brasileiros. O Brasil ainda tem poucas conexões intermodais, limitando assim a capacidade de soluções em termos de logística de transportes.

A legislação ambiental e as questões jurídicas associadas criam incertezas para investimentos no setor, por causa da demora em solu-cionar questões de impactos ambientais. Tais impasses se tornam um importante entrave ao maior aproveitamento das vias navegáveis. Uma ação importante no setor é que os Relatórios de Impacto Ambiental28 sejam adequados, para que não ocorram interferências nos processos, decorrentes do acúmulo de ações, e para que haja maior agilidade nes-sas questões.

É preciso que sejam realizadas obras de desenvolvimento de infra-estrutura hidroviária nos rios Madeira, São Francisco, Tocantins – Ara-guaia, Tietê – Paraná e Tapajós – Teles Pires. Já no programa Brasil em Ação, do governo Fernando Henrique, eram previstos investimentos nas quatro primeiras vias, mas eles não foram realizados. As obras de infra-estrutura na hidrovia Tocantins-Araguaia, importantíssima para o escoamento da produção do Centro-Oeste brasileiro, diminuindo cus-tos de transporte em quase 60%, ainda não saíram do papel, por ques-tões ambientais.29 A hidrovia Tapajós – Teles Pires também continua sem funcionar.

28 Estudos exigidos pela resolução 001/86 do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA) para que as Secretarias Estaduais de Meio Ambiente pré-aprovem projetos de grande impacto ambiental.29 A hidrovia Tocantins-Araguaia faz parte do projeto do Corredor de Transporte Multimodal Centro-Norte, com integração entre os modais hidro-rodo-ferroviário, junto com a BR-153 (rodovia Belém-Brasília) e a Ferrovia Norte-Sul. A hidrovia liga regiões do Mato Grosso aos portos do Maranhão e do Pará. O projeto incorpora novas áreas agrícolas e de exploração de atividades de turismo e lazer do Centro-Oeste. Estima-se que a via estimulará a incorporação de quase 30 milhões de hectares ao sistema produtivo, com um potencial de gerar 73 milhões de toneladas de grãos, principalmente soja, milho e arroz.

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Raph a el Pa du l a

Uma questão importante para a eficiência da navegação interior é maximizar a utilização de comboios, ou seja, as composições de barcaças mais empurrador, medidos por toneladas. Os “comboios tipos” indicam as dimensões da embarcação a ser utilizada, tendo em vista o dimen-sionamento das obras de engenharia nas vias. No Brasil, os comboios tipos utilizados nas obras são extremamente acanhados. É necessário que se desenvolvam novos comboios tipos compatíveis com a realidade. Como exemplo das limitações das vias, pode-se citar a hidrovia Tietê, caracterizada por ter pequeno vão entre os pilares de pontes e restri-ções de calado em alguns trechos. Abaixo, a tabela demonstra como são acanhados os comboios tipos no Brasil, principalmente se comparados com os do rio Mississipi, nos Estados Unidos.

Capacidade dos comboios tiposPrincipais hidrovias do Brasil e rio Mississipi (EUA)

Capacidade do comboio projetada (t)

Distância aproximada (km)

Araguaia – Tocantins 2.000/2.500 1.250São Francisco 2.000/2.500 1.400

Tietê – Paraná 2.400/4.800 730Tapajós – Teles Pires 7.500 1.050

Paraguai – Paraná 18.000/22.000 1.900Madeira 18.000/24.000 1.150

EUAUpper Mississipi 18.000/22.500 1.050Lower Mississipi 36.000/60.000 1.650

Fonte: Administração das Hidrovias, Ministério dos Transportes, CEL-Coppead, CNI.

A tabela sobre custos de implantação de hidrovias mostra como eles são baixos. O custo unitário médio de implantação por quilômetro é

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Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

de R$ 173,3 mil. O menor custo unitário por quilômetro encontra-se na hidrovia do Paraná (R$ 5 mil) e o maior na hidrovia Tocantins-Araguaia (R$ 344 mil). Dos doze custos unitários por quilômetro, apresentados na tabela, sete são menores que R$ 100 mil. O custo de implantação total das vias apontadas na tabela é de aproximadamente R$ 2,4 bilhões para 13,8 mil quilômetros de vias. No modal rodoviário, os custos por quilômetro são de R$ 750 mil para reconstrução, R$ 420 mil para res-tauração, R$ 180 mil para manutenção, e a malha rodoviária demanda mais de R$ 20 bilhões para manutenção, restauração e reconstrução, com uma média de R$ 422 mil por quilômetro.

Custos de implantação de hidrovias Exemplos nacionais

R$ médios de 2002

HidroviaCusto de

Implantação R$ 1.000,00

Trecho beneficiado km

Custo unitário de implantação R$ 1.000,00/km

Branco-Negro 38.000 750 50,7Guaporé-Madeira 891.500 3.056 291,7

Capim-Guamã 15.300 372 41,1Marajó 42.000 306 137,3

Teles Pires - Tapajós 255.000 1.043 244,5Tocantins - Araguaia 1.047.098 3.040 344,4

Parnaíba 55.00 820 67,1Grande - São

Francisco 22.280 1.841 12,1

Paraguai 6.500 1.275 5,1Paraná 15.000 1.060 14,2

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Raph a el Pa du l a

Lagoa Mirim - Taquari 7.500 260 28,8

2.395.178 13.823 173,3Fonte: Paulo Sérgio Oliveira Passos, “Hidrovias como fator de integração nacional”. Apre-

sentação à CNI, disponível em http://www.cni.org.br/empauta/hidrovia.

No passado, a priorização de investimentos fez com que o trans-porte rodoviário predominasse e impedisse o desenvolvimento dos de-mais modais, incluindo o transporte hidroviário. Mas as recentes ne-cessidades econômicas e ambientais apontam que as hidrovias são uma alternativa com amplas vantagens. O desenvolvimento do setor aqua-viário permitirá diminuir os custos de manutenção e conservação da infra-estrutura rodoviária e diminuir os acidentes, ao diminuir pressões de demanda de transporte de carga sobre a malha rodoviária nacional. No caso do transporte de passageiros, as hidrovias permitem deslocar grandes quantidades de pessoas a um custo muito menor, viabilizando e universalizando a mobilidade de usuários potenciais.

O principal desafio é desbloquear os investimentos estatais em infra-estrutura para mudar o quadro histórico de privilégio do modal rodoviário. Esses investimentos devem ser direcionados, entre outros fatores, para dragagem, renovação e aumento de oferta de equipamen-tos, melhora dos acessos terrestres (rodoviário e ferroviário) e marítimo, implementação de hidrovias e maior utilização do potencial não utiliza-do do transporte hidroviário, terminais fluviais intermodais, sinalização fluvial, oferta e capacidade logística.

As ações de políticas públicas devem se direcionar também ao estí-mulo da indústria de construção naval e da marinha mercante nacional, do transporte de cabotagem e da utilização e aproveitamento de vias navegáveis. É preciso usar os comboios tipos máximos como referência para obras de engenharia, sempre que possível, em função da vida útil da obra.

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Entre os gargalos operacionais do setor, destacam-se: dimensiona-mento e custo de mão-de-obra nos portos, informatização dos proce-dimentos, racionalização dos processos burocráticos, racionalização e superação de impasses referentes a aspectos legais e à legislação ambien-tal, desatando os nós para uma ação governamental eficiente, estímulo a operações de cabotagem, transbordo, e serviços de feeder e navegação interior.

Transporte dutoviárioA Europa e os Estados Unidos são cruzados por grandes malhas de du-tos, uma das formas mais econômicas de transporte para grandes volu-mes, principalmente óleo, gás natural e derivados, especialmente quan-do comparados com os modais rodoviário e ferroviário. Esse modal tem sido pouco relevante no Brasil: participa com apenas 4,2% da produção de transportes nacional, movimentando combustíveis e minérios. Nos Estados Unidos, ele participa com 24% na matriz de transportes.

A atual infra-estrutura de transporte dutoviário no Brasil é inci-piente, diante da dimensão do país. A Transpetro, subsidiária da Petro-bras, é a principal responsável pelos dutos nacionais, com mais de 10 mil km de dutos que interligam todas as regiões do Brasil.

O Brasil tem pouco mais de 7 mil km de extensão de oleodutos, que têm vazão nominal de mais de 524 milhões de toneladas por ano e transportaram pouco mais de 240 milhões de toneladas de combustíveis em 2005. Os principais dutos estão localizados em Macaé (RJ).

O Brasil possui três minerodutos, com uma extensão total de 567 km e uma vazão nominal de 19,5 milhões de toneladas/ano. Eles trans-portaram pouco mais de 17 mil toneladas de carga em 2005, das quais quase 90% correspondem ao mineroduto de Mariana (MG) a Ponta do Ubu (ES), da empresa Samarco. O Brasil possui pouco mais de 5,7 mil km de gasodutos em seu território, com vazão nominal de 32,3 milhões de toneladas de gás/ano; foram transportadas quase 15 milhões de tone-

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Raph a el Pa du l a

ladas de gás em 2005. Dos 10 mil km de dutos operados pela Transpetro, 7 mil são utilizados para o transporte de petróleo, derivados, biocom-bustível, gás liquefeito de petróleo (GLP), petroquímicos e outros re-nováveis líquidos. Em 2005, os oleodutos da Transpetro transportaram 640 milhões de metros cúbicos por ano de petróleo, derivados e etanol, o que representou um crescimento de 1,5% em relação ao ano anterior.

O Brasil possui mais de 7,6 mil km de gasodutos instalados, ex-tensão insignificante quando comparada à malha da Argentina (12,4 mil km) e, principalmente, dos Estados Unidos (450 mil km) – sendo o primeiro um país de extensão bem menor que o nosso. Existem dois grandes sistemas de gasodutos não interligados, a malha Sudeste e ma-lha Nordeste, além do gasoduto Brasil-Bolívia.

Extensão dos gasodutos no território nacional

Gasoduto Extensão (km) OperadoraSistema de gasodutos do Sudeste (SE) 1.358 Transpetro

Sistema de gasodutos do Espírito Santo (ES)

146 Transpetro

Sistema de gasodutos do Nordeste Setentrional (NE-SET)

1.011 Transpetro

Sistema de gasodutos do Nordeste Meridional (NE-MER)

244 Transpetro

Gasoduto Brasil - Bolívia 2.593 TBGGasoduto Uruguaiana (RS) - Porto

Alegre (RS)50 TBS

Bolívia - Mato Grosso 283 GasocidenteTotal 5.685

Fonte: AETT 2006.

1 5 0

Pe n s ar o Bra si l : Tran sp or tes

O país desperdiça gás natural: 15 milhões de m³ diários não são utilizados, embora estejam disponíveis, por falta de infra-estrutura para levá-los aos consumidores. Isso representa mais da metade da quantida-de importada da Bolívia (26 milhões de m³/dia) e quase 1/3 da produção nacional. Dos 48,5 milhões de m³ por dia de produção nacional, 31% são desperdiçados: 8,2 milhões são reinjetados nos campos e outros 6,8 milhões são queimados todos os dias. Grande parte da produção diária de 9,7 milhões de m³ da bacia do Amazonas é reinjetada (5,9 milhões de m³) e outra parte é queimada (2,5 milhões de m³) por falta de condições físicas de escoamento da produção e pela baixa demanda na região. Há um alto nível de queima de gás associado nas bacias, pois, em muitos casos, prevalece a idéia de que a produção é insuficiente para justificar o investimento necessário à sua recuperação.30

A produção brasileira de gás mais que dobrou nos últimos dez anos, com destaque para as bacias do Amazonas e de Campos. É impor-tante viabilizar uma alternativa de consumo em larga escala do gás pro-duzido nos campos de Urucu, que permanece sendo reinjetado, o que deverá ocorrer com a construção dos gasodutos Urucu – Porto Velho e Urucu – Manaus. A construção deste já foi iniciada, o que permitirá a utilização do gás nas termoelétricas dessas capitais, assim como no parque industrial da Zona Franca de Manaus. As construções desses dois gasodutos permaneceram no papel por problemas de licenciamen-to ambiental, de financiamento e de falhas nas licitações. Isso representa grandes entraves ao desenvolvimento do setor.

Comparando os dados do planejamento estratégico da Petrobras e as previsões da Agência Nacional de Petróleo (ANP) para a entrada de

30 O gás natural apresenta uma característica muito particular em relação aos demais combustíveis, visto que, com a tecnologia atual, seu estado físico gasoso não permite estoca-gem de grandes volumes a custos competitivos.

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Raph a el Pa du l a

novos campos em produção,31 é possível inferir que o aumento de pro-dução, acrescido do fornecimento importado da Bolívia, será suficiente para atender a demanda prevista até 2010, desde que se resolva a questão do transporte do gás, pois aproximadamente 20% da produção ocorre-rá na bacia do Amazonas. Ademais, as reservas estão concentradas na região Sudeste, enquanto o incremento do consumo envolverá outras regiões, o que reforça a necessidade de ampliar a malha de transportes. A produção da bacia de Santos permitirá um abastecimento mais tran-qüilo do mercado doméstico desde que seja completada a interligação das malhas regionais, o que poderá ser feito tanto pela construção do Gasene (ligando a malha Sudeste à malha Nordeste) ou pelo gasoduto que virá da Venezuela e cruzará o Brasil, chegando até a Argentina (Ga-soduto do Sul).

Por causa da falta de infra-estrutura de transportes de gás, o Brasil depende demasiadamente da importação de gás da Bolívia, que abastece metade do consumo nacional e 70% do consumo de São Paulo. Nenhum gasoduto foi construído desde o ano 2000. O último foi o Brasil-Bolívia. Questões ambientais e de gestão têm sido obstáculos, paralisando pro-jetos. O Plano de Negócios da Petrobras 2007-2011 prevê a construção de dutos e a redução da dependência externa para 30%. São investi-mentos de US$ 6,5 bilhões, dos quais US$ 4,5 bilhões estão previstos no próprio plano. Os projetos relacionados a esses investimentos são: Gasene (perna norte), gasoduto Urucu-Coari-Manaus, manutenção da infra-estrutura de transporte de gás natural, malha de gás do Sudeste,

31 As previsões da ANP, baseadas nos campos com planos de desenvolvimento já aprovados, é que o nível de concentração de produção na Bacia de Campos, já inferior ao existente no caso do petróleo, deverá se reduzir sensivelmente quando a Bacia de Santos entrar em operação. Os principais campos que entrarão em produção são: Rio Juruá (2007) na Bacia do Solimões (Região norte); Manati (2007) na Bahia; Bacia do Espírito Santo (2007); e Bacia de Santos (2008), com um volume inicial de produção de 12 milhões m³ por dia. Algumas destas previsões resultam de um plano da Petrobras que busca reduzir a dependência do gás boliviano e alcançar auto-suficiência em gás até 2009.

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ampliação do Gasbel, ampliação do trecho sul do gasoduto Brasil-Bolí-via (escoamento do gás natural liquefeito, GNL), malha de gasodutos do Nordeste e investimentos em GNL.

Plano de antecipação da produção nacional de gás natural (Plangas)

Plangas 2007 2008-2010Oferta Milhão m³/dia 1,0 38,2

Investimento R$ bilhões 2,8 25,0Fonte: PAC – Ministério da Fazenda.

Algumas obras de transporte merecem destaque: a construção de um gasoduto que ligará Campinas (SP) a Japeri (RJ) e permitirá levar gás da bacia de Campos para São Paulo; o Gasene, interligando as re-giões Sudeste e Nordeste, que permitirá ligar as malhas do país, solu-cionando o problema de déficit de gás no Nordeste com a transferência do excedente do Sudeste; as construções dos gasodutos Urucu – Porto Velho e Urucu – Manaus, acima mencionados.

A concentração em poucas regiões produtoras e poucos centros consumidores mostra a necessidade de se instalar uma malha densa de gasodutos. Atualmente, há um excedente de oferta de gás nas regiões Sudeste (gás associado da bacia de Campos) e Sul. Tal situação poderá agravar-se, pois o gás da bacia de Santos duplicará a atual reserva brasi-leira de gás natural.

A carência de gás na região Nordeste poderá ser superada pelo incremento da produção do campo de Manati (bacia de Camamu – Al-mada, na Bahia) e por investimentos na ampliação da malha de trans-porte de gás da região, como o projeto Malhas Nordeste, o gasoduto Sudeste – Nordeste, conhecido pela sigla Gasene (permitindo transferir excedentes de gás da região Sudeste para o Nordeste) e, principalmente,

1 5 3

Raph a el Pa du l a

pela construção do gasoduto do Sul.32

Os desequilíbrios regionais de oferta e demanda de gás mostram que a unificação da malha de gasodutos em escala nacional produzi-ria benefícios ao sistema, não apenas em termos de abastecimento, mas também de confiabilidade e flexibilidade.

A construção de dutos para transporte de combustíveis fica a cargo de decisões do setor de energia e não de transportes, mais especifica-mente a Petrobrás. Assim, o aumento da participação do transporte du-toviário depende predominantemente de decisões do setor de energia. Segundo especialistas, o Brasil já poderia ter alcançado a auto-suficiên-cia em gás natural e ter uma infra-estrutura dutoviária mais desenvolvi-da e mais densa, não dependendo de importação de gás da Bolívia – que abastece mais da metade do consumo nacional –, o que não ocorreu por causa da atenção concentrada da Petrobrás na auto-suficiência em petróleo.

Transporte aéreoEsse tipo de transporte se dedica a passageiros e a carga de alto valor agregado e pequeno volume, respondendo por somente 0,4% de parti-cipação na matriz nacional de transportes de cargas e a cerca de 5% do transporte de passageiros.

O planejamento do transporte aéreo sempre foi feito de forma se-parada em relação aos demais modais de transporte. Tendo prevalecido a visão de que a infra-estrutura desse modal é voltada para questões militares, o setor, que é serviço de utilidade pública, foi tratado de forma separada dos outros modais, sendo submetido antes ao Ministério da

32 Na região Norte há reservas importantes de gás natural, quase integralmente re-injetados, dada a inexistência de gasodutos de transporte interligando a região produtora aos mercados consumidores. O principal mercado consumidor desse gás será a geração termoelé-trica, visto que as usinas do sistema isolado consomem, hoje, basicamente óleo diesel e óleo combustível.

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Aeronáutica e atualmente ao Ministério da Defesa, enquanto os demais modais ficaram submetidos ao Ministério dos Transportes. O Depar-tamento de Aviação Civil (DAC) foi criado em 1931, diretamente vin-culado ao Ministério de Viação e Obras Públicas, tendo sido vinculado depois ao Ministério da Aeronáutica. Assim, o planejamento e o desen-volvimento do setor sempre estiveram voltados ao próprio sistema de aviação civil, sendo pouco ligados à integração com os demais modais e com outros setores da vida nacional (Martins, 2007).

A criação da Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuá-ria (Infraero), em 1972 (Lei 5.862), teve como objetivo aumentar a efi-ciência do sistema aeroportuário nacional, por meio de uma empresa pública que administrasse, operasse e explorasse comercial e industrial-mente os aeroportos, desafogando os demais órgãos que tinham essas atribuições entre muitas outras (o Departamento de Aviação Civil e os comandos regionais da Força Aérea).

O Plano Nacional de Viação, de 1973, foi o último plano abrangen-te que incluiu com o setor aéreo em uma estratégia multimodal, integra-da aos demais setores de transportes. O Plano Nacional de Logística de Transportes (PNLT), previsto, deve traçar metas de investimento e de-senvolvimento para o setor aéreo, dentro da lógica da intermodalidade. A cultura de planejamento no Brasil, que separa o transporte aéreo dos demais modais, deve mudar.

Ao longo da história do transporte aeroviário no Brasil, mais es-pecificamente a partir da década de 1960, tem ocorrido um movimen-to das empresas de transporte aéreo para reduzir o número de portos servidos, por causa da oferta de infra-estrutura e/ou da rentabilidade econômica, e dos avanços tecnológicos nas aeronaves. Ao contrário, os órgãos governamentais responsáveis, principalmente a partir dos obje-tivos de Estado estabelecidos no regime militar, trabalhavam por um sistema de transporte aéreo com metas de integração nacional e de de-senvolvimento regional. Por exemplo, em 1976, o DAC dividiu o ter-

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Raph a el Pa du l a

ritório nacional em cinco regiões para implantar o Sistema Integrado de Transporte Aéreo Regional (Sitar), para ser operado por empresas regionais sob regime de monopólio.33

O financiamento, a execução e o controle dos investimentos pla-nejados e demandados em infra-estrutura aeroportuária são graves problemas. As tarifas aeroportuárias, por si só, não remuneram as ope-rações ou geram recursos suficientes para o desenvolvimento de infra-estrutura, o que criava dificuldades para os investimentos da Infraero, de estados e de municípios. Os recursos para financiar o desenvolvi-mento da infra-estrutura aeroportuária devem vir dos cofres da União ou dos Estados.

Para resolver a questão do financiamento de infra-estrutura, foi criado, em 1989, o Adicional de Tarifa Aeroportuária (Ataero), recolhi-do pelo Ministério da Aeronáutica e pela Infraero. Esses recursos de-veriam ser investidos no reaparelhamento, aperfeiçoamento, reforma e expansão dos aeroportos e aeródromos brasileiros (Martins, 2007). No entanto, conforme Martins (2007, p. 18), não havia nenhuma especifi-cação na legislação quanto à destinação dos recursos do Ataero, que fi-cava a cargo da Infraero, inexistindo “registro de aplicação dos recursos com a finalidade que a lei previa”. Somente em 1992 a lei federal 8.399 especificou que 80% dos recursos seriam utilizados pelo governo federal no sistema aeroviário federal. Posteriormente, em 1998, uma alteração instituiu que desses 80%, 41,5% seriam para a Infraero e 38,5% para o Comando da Aeronáutica (receita do Fundo Aeronáutico). Os 20% restantes ficariam a cargo dos estados, a serem aplicados em “aeropor-tos e aeródromos de interesse regional ou estadual, bem como na con-

33 Segundo Martins (2007, p.13), “As empresas nacionais exploravam redes domésti-cas que se estendiam por todo o território do país e algumas rotas internacionais, para as quais tivessem designação. As redes domésticas ligavam entre si as capitais dos estados, o Distrito Federal – Brasília, e alguns pólos de desenvolvimento turístico ou econômico regional, tais como Porto Seguro, Foz do Iguaçu e Petrolina. A infra-estrutura de apoio a essas redes era exclusivamente de aeroportos da INFRAERO”.

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secução de seus planos aeroviários”, constituindo o suporte financeiro do Programa Federal de Auxílio a Aeroportos (Martins, 2007, p. 19). A lei determinava controle sobre o emprego desses recursos, exigindo convênios que incluíssem cláusula de definição de contrapartida das partes, do DAC e de governos estaduais, correspondendo ao percentual de recursos a serem alocados por cada uma, para a realização das obras conveniadas, de acordo com os planos aeroviários estaduais. Já os 80% restantes, destinados a aeroportos federais, não possuem o mesmo con-trole ou exigências de contrapartidas. Portanto, são vulneráveis ao mau emprego dos recursos, como a construção de centros comerciais nos aeroportos em detrimento da infra-estrutura e de equipamentos.

Segundo Martins (2007, p. 23), um dos grandes problemas do se-tor aéreo é a “falta de dispositivos normativos de controle que permitam ao governo assegurar que os investimentos em infra-estrutura obede-çam ao planejamento aprovado para essas estruturas. Embora a lei do Programa Federal de Auxílio a Aeroportos incluísse um dispositivo de controle para o desenvolvimento dos aeroportos de interesse estadu-al, definidos nos planos aeroviários estaduais, deixava uma lacuna para aqueles discriminados como de interesse federal.”

Evolução da produção de transporte operacional

AnoDoméstica Internacional

Cargas (t Km) Crescimento Cargas (t /Km) Crescimento2001 754.331.212 - 1.342.191.318 -2002 742.650.656 - 2% 1.406.340.949 5%2003 702.926.624 -5% 1.503.540.711 7%2004 796.614.525 13% 1.652.528.708 10%2005 898.072.116 13% 1.708.577.621 3%

Fonte: ANAC e DAC, anuários estatísticos de vários anos.

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A produção operacional total de transportes de cargas (contando doméstico e internacional) em 2005 foi de cerca de 2,6 bilhões de tone-ladas. O Sudeste concentra mais de 50% dessa movimentação, incluindo cargas domésticas e internacionais, que apresenta uma tendência contí-nua de crescimento. A capacidade aproveitada pelo tráfego doméstico e internacional, ou seja, a produção de transportes aéreos demandada em relação à ofertada – incluindo cargas, correio e bagagem transportada –, variou entre cerca de 70% e cerca de 80% durante 2005, encerrando esse ano com 72% de capacidade aproveitada. Considerando esses números e a capacidade dos terminais, observamos que, se não forem realizados os devidos investimentos, em três anos haverá uma crise no transporte aéreo de cargas. Os investimentos previstos, se executados, garantirão a normalidade do setor até 2015.

Em 2005, 569 mil toneladas de carga foram transportadas pelos 32 terminais de logística de carga da rede Infraero. O maior terminal, em concentração de volume de cargas, é o do Aeroporto Internacional de São Paulo/Guarulhos, que movimentou 219 mil toneladas em 2005. Em seguida, vem o Aeroporto Internacional de Viracopos/Campinas, tam-bém em São Paulo, e, de longe, os aeroportos Internacional de Manaus (AM) e do Galeão (RJ) (www.infraero.gov.br).

Um dos principais problemas do transporte aéreo nacional, tanto de cargas quanto de passageiros, é sua concentração em alguns aeropor-tos (como os do estado de São Paulo), enquanto outros se encontram subutilizados (como o do Galeão).

O Plano Diretor do Aeroporto Internacional de Viracopos/Campinas prevê, no longo prazo, a realização de obras que permitirão atender a uma demanda de 55 milhões de passageiros por ano e um total de 470 mil operações de pouso e decolagem, considerando-se a construção da segunda pista. Os terminais de logística terão capacidade para processar até 720 mil toneladas de carga aérea por ano. Esse projeto pretende transformar Viracopos no grande aeroporto da terminal São

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Paulo e no principal centro cargueiro da América Latina (www.infraero.gov.br).

O Brasil precisa de um plano aeroviário concebido dentro de uma lógica de integração intermodal de transportes e de integração nacio-nal. Os recursos do Estado são fundamentais para a realização de inves-timentos e a solução dos principais problemas de desenvolvimento de infra-estrutura aeroviária, que vão além dos recursos que as tarifas seto-riais podem financiar. Também é fundamental que a questão do contro-le do emprego dos recursos do Ataero seja resolvida. O transporte aéreo, como serviço de utilidade pública, deve estar sob responsabilidade dire-ta, estratégica e planejada do Estado.

Financiamento da infra-estrutura de transportes: Estado versus mercadoConforme observamos nas seções anteriores, a solução dos problemas de infra-estrutura de transportes no Brasil depende de investimentos que, pelas dimensões e os interesses envolvidos, só o setor público tem condições de realizar. O capital privado tem interesse em investir no setor, mas de forma limitada. Esse interesse pode ser usado de forma sinérgica pelo Estado, combinando recursos privados e investimentos públicos. O envolvimento do setor privado deve se dar sob a regulação de agências públicas (tarifas, serviços, investimentos etc.) que defendam o interesse da sociedade e não somente o das empresas, como tem sido feito pelas agências, como a ANTT, criadas desde o processo de deses-tatização.

A questão essencial do financiamento da infra-estrutura de trans-portes depende de uma ação integral e planejada do Estado, com a cons-tituição de fundos para infra-estrutura de transportes e a mobilização de recursos. A Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), cobrada nos combustíveis para a realização de investimentos no setor, tem sido desviada de sua função original desde que foi criada,

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sendo usada pelo governo para fazer superávit primário. Devemos ob-servar, no entanto, que os recursos da Cide equivalem a apenas 0,4% do PIB, montante pequeno perto do investimento anual necessário para manter e restaurar a infra-estrutura de transportes do Brasil (2,0% do PIB). A média dos últimos dois governos também não corresponde a esse número.

Investimento em infra-estrutura de transportes como percentagem do PIB:

Governo FHC (média) 0,3Governo Lula (média) 0,2

% do PIB arrecadada através da CIDE (2005) 0,4Necessário estimado para restauração e manutenção 2,0

Fontes: Ministério do Planejamento, Siafi, STN, e estimativas próprias.

No quadro atual, a parceria com o setor privado é desejável nas ações voltadas para promover a integração e possível nas de irrigação. Mas essa mesma parceria é impossível na atividade de indução ao de-senvolvimento, que cabe ao Estado. Bem conduzida, a atuação privada tende a gerar sinergias com a atuação do Estado.

O crescimento da economia, em um país subdesenvolvido como o Brasil, está diretamente relacionado aos investimentos públicos e, principalmente, aos recursos estatais em infra-estrutura. A origem dos problemas do setor de transportes está na falta de investimentos e de planejamento do Estado. Os investimentos têm diminuído nas últimas duas décadas até se tornarem insignificantes, agravando a situação. Os recursos do Estado (37% do PIB arrecadados em tributos) têm sido prioritariamente direcionados para a formação de superávit primário (4,9% do PIB em 2005, mais de R$ 90 bilhões) e para o pagamento de ju-ros da dívida (8,1% do PIB, aproximadamente R$ 160 bilhões em 2005),

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restando 0,6% do PIB para investimentos em geral e 0,3% do PIB para investimentos em infra-estrutura de transportes.

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Um plano de ação para o setor demanda investimentos anuais estimados em torno de 2% do PIB. As taxas de investimento medío-cres dos governos anteriores são a principal causa da situação precária da infra-estrutura de transportes. Os governos Fernando Henrique e Lula não investiram nem mesmo o necessário para manter e restaurar a malha existente. Obras importantes não foram realizadas. É neces-sário construir novas vias nos diversos modais e reestruturar a matriz de transportes. Além disso, a falta de uma visão de longo prazo tem privilegiado investimentos no setor rodoviário e em regiões mais desen-volvidas, concentrados principalmente no escoamento da produção de commodities primárias.

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Ainda que a situação desejável fosse que os usuários arcassem com todos os custos de investimentos, de manutenção e de operação, tal si-tuação não é usual. É o Estado, na maioria das vezes, que realiza a in-termediação por meio de uma política de subsídio explícito (direto) ou implícito (cruzado). O sucesso de uma política de transportes também reside nessa intermediação estatal, que deve ser feita de modo a garan-tir: (i) aproveitamento da capacidade ociosa existente; (ii) política tari-fária que faça com que a tarifa reflita o custo do serviço utilizado; (iii) suprimento de recursos para executar uma intervenção que garanta o crescimento do setor e o desenvolvimento econômico e social do país.

No caso das concessões de ferrovias e rodovias, a atuação da ANTT tem-se voltado aos interesses privados, e não aos interesses nacionais, com fiscalização inefetiva e concessão de privilégios. No arrendamento da Rede Ferroviária Federal (RFFSA), observamos não só o descumpri-mento de compromissos de investimento por parte das empresas pri-vadas – levando ao sucateamento das ferrovias e mesmo devoluções à RFFSA – como também o uso de organismos estatais de fomento, como o BNDES, para atender as necessidades de recursos das empresas con-cessionárias.

O setor de transportes demanda fortemente a indústria (constru-ção civil, metal-mecânica, eletroeletrônica etc.) tanto durante sua im-plantação, quanto na sua operação e gerenciamento. Seus projetos são intensivos em capital, geram grande quantidade de empregos (muitos com com baixa qualificação), modificam o meio ambiente e apresentam longo período de maturação. Assim, investimentos em infra-estrutura de transportes geram demanda direta (efeitos na cadeia produtiva), em-pregos diretos e indiretos e renda, tendo efeitos multiplicadores sobre a demanda e os investimentos em toda a economia. O planejamento de qualquer empreendimento deve ser exaustivo e definidor, para que as várias condicionantes que cercam o projeto não se exacerbem a ponto de criar distorções.

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É necessário que voltemos a ter um planejamento amplo, com in-terconexões com as políticas macroeconômicas, setoriais, regionais etc. A infra-estrutura é um instrumento para o desenvolvimento de setores e regiões. Mas, com a combinação de política monetária conservado-ra e ausência de planejamento, os investimentos em infra-estrutura de transportes passaram a ser residuais em relação ao orçamento federal, sendo encarados como gastos. A aplicação desses recursos ficou mais sujeita a questões políticas (como disputas internas, disputas por recur-sos e favorecimentos) do que a questões técnicas e estratégicas.

A disponibilidade de novos recursos permitirá executar um pro-grama de obras compatível com as necessidades de um novo ciclo virtu-oso de crescimento e desenvolvimento econômico, assegurando maior economia e racionalidade nos dispêndios públicos.

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Um plano de ação nos transportesO Brasil é um país com ampla experiência e tradição em planejamento, que vem desde o governo Getúlio Vargas, no Estado Novo, com o Plano Especial de Obras Públicas e Aparelhamento da Defesa Nacional (1939), que enfatizou, entre outros, o setor de transportes. O planejamento foi um instrumento estratégico para o desenvolvimento do país na chama-da Era Vargas (que vai do próprio Vargas a, pelo menos, 1980), espe-cialmente o de longo prazo e mais especificamente durante o regime militar. Foi um recurso amplamente utilizado no após-guerra em países desenvolvidos e subdesenvolvidos, entre os quais se destacam a França, o Japão e, atualmente, a China com seus planos qüinqüenais. Dentre os planos confeccionados ou executados no Brasil, na Era Vargas, temos: Missão Cooke (1942-1943), Plano de Obras e Equipamentos (1943), Plano Salte – Saúde, Alimentação, Transportes e Energia (1951), Mis-são Abbink (1951-1953), Plano de Metas (1956), Plano Trienal (1963), Plano de Ação Econômica do Governo (1964), Plano Decenal (1067),

IIIEixos viários e um plano de ação

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Plano Estratégico de Desenvolvimento (1967), I Plano Nacional de De-senvolvimento (1972), II Plano Nacional de Desenvolvimento (1975), III Plano Nacional de Desenvolvimento (1980).

O último Plano Viário Nacional para o Brasil foi elaborado em 1973 (houve uma tentativa de se fazer outro em 1985). Necessita, pois, ser revisto, dando lugar a um novo plano. É necessário apresentar ao país um conjunto de projetos estruturais a serem realizados em quatro anos. Eles são imprescindíveis para implementar as reformas que pro-pomos e constituir um mercado interno pujante. Mais ainda: o processo de planejamento deve ser permanente, com controles, constantes avalia-ções e estabelecimento de metas renovadas.

O Brasil precisa de um plano nacional de desenvolvimento que trate a infra-estrutura de forma integrada e seja complementado por planos regionais e setoriais. Mas o planejamento pressupõe que o Es-tado tenha controle sobre as variáveis fundamentais para executá-lo, o que não condiz com a postura vigente, que deixa a condução de variáveis fundamentais (como taxa de câmbio, fluxos de capitais e investimentos) nas mãos do mercado.

Um plano para o setor de transportes deve privilegiar: (a) a re-estruturação (racionalização) da matriz de transportes brasileira, com diminuição dos custos de transporte, (b) a intermodalidade, (c) a in-tegração nacional e a integração sul-americana, (d) a promoção do de-senvolvimento nacional, a formação de um amplo mercado interno e o fortalecimento da identidade nacional.

Como observamos, os corredores de transporte não podem limitar-se a ligar a produção de commodities de baixo valor agregado e baixa intensidade tecnológica ao exterior, o que reforça a nossa condição primário-exportadora. O planejamento de transportes e a concepção de corredores de transporte devem trabalhar em favor do desenvolvimento do país e levar em conta aspectos econômicos, regionais, sociais, tecno-lógicos, demográficos, ambiental, logísticos, entre outros.

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O planejamento de transportes no atual governoO Plano Nacional de Logística de Transportes (PNLT)O planejamento de transportes no segundo governo Lula está contido no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), um programa de governo a ser executado entre 2007-2010, e no PNLT, um plano de Esta-do com foco no médio e longo prazo. O Centro de Excelência em Enge-nharia de Transportes (Centran), criado de parceria entre os ministérios do Planejamento, dos Transportes e da Defesa, incorpora uma visão de transportes desenvolvimentista, na linha aqui proposta.

Segundo o Centran (http://www.centran.eb.br/), o objetivo do PNLT é “desenvolver, formalizar e perenizar uma base de dados e ins-trumentos de análise, sob a óptica logística, para dar suporte ao plane-jamento de intervenções públicas e privadas na infra-estrutura e na or-ganização dos transportes, de modo a que o setor possa contribuir para atingir metas econômicas, sociais e ecológicas do país, em horizontes de médio a longo prazo, rumo ao desenvolvimento sustentado”.

Segundo o Centran, o PNLT privilegia aspectos participativos e a necessidade e vantagem da intermodalidade. Segundo Renaud Barbosa da Silva (2007),1 “o PNLT deve subsidiar a elaboração do Plano Pluria-nual (PPA) nos níveis estratégico e tático, cabendo ao Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes (DNIT) a gestão dos proje-tos nas modalidades rodoviária, ferroviária e aquaviária, privilegiando a integração intermodal, forma racional para reduzir os custos internos de transportes e promover crescimento e desenvolvimento”.

O PNLT prevê a necessidade de investimentos anuais no setor de transportes de 0,4% do PIB ao ano no período 2008-2023, e afirma que essa meta se enquadra na realidade das contas do governo. É uma per-centagem insignificante, diante das urgentes necessidades do país. Além

1 Renaud Barbosa da Silva. “Infra-estrutura de transportes: estratégias, táticas e op-erações”. In Revista Conjuntura Econômica – FGV, abril de 2007.

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disso, esses investimentos de médio e longo prazos não incluem os in-vestimentos de curto prazo em manutenção, conservação e recuperação, previstos nos programas do DNIT, que indicam uma demanda de recur-sos da ordem de R$ 2 bilhões por ano até 2015 (período coberto pelos dois próximos PPAs). Caso os investimentos do programa do DNIT e os previstos no PNLT venham a ser realizados, isso resultaria em 0,5% do PIB ao ano até 2015 – cerca de R$ 115 bilhões, no total.

Esses investimentos estão muito aquém dos 2% do PIB ao ano que foram propostos aqui como necessários para um programa eficaz. Es-tão muito abaixo dos investimentos (como proporção do PIB) de paí-ses como China, Tailândia, Índia, Rússia, Venezuela e Argentina, entre outros, que investem entre 4% e 6% do PIB. Investimentos anuais de 0,5% do PIB só surtiriam efeitos na matriz de transportes e na econo-mia nacional a partir de 2020, o que privaria o país de um crescimento acelerado, vigoroso e equilibrado desde já.

Contudo, o PAC atropelou o PNLT e incluiu alguns de seus proje-tos mais urgentes.

O Programa de Aceleração do CrescimentoO PAC pode ser considerado um programa de governo, enquanto o PNLT pode ser considerado um plano de Estado. Anunciado no início do segundo governo Lula (2007), tem como objetivo impulsionar inves-timentos na economia e garantir para o Brasil um crescimento de 4,5% em 2007 e de 5% a partir de 2008.

A previsão de investimentos totais do PAC para 2007 é de cerca de R$ 16 bilhões. O governo colocou como coração do PAC o investimento de R$ 11,3 bilhões no projeto piloto de investimentos (PPI), que não depende de autorização parlamentar, mas só de decisão do governo, e é deduzido do superávit primário. R$ 4,6 bilhões já estão autorizados pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2007, e a diferença deverá ser obtida por meio de nova alteração na LDO. O PPI corresponde a

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0,5% do PIB, maior que o PPI do ano passado, que foi de 0,2% do PIB. As leis propostas pelo governo no âmbito do PAC estão avançando no Congresso. No primeiro trimestre de 2007, o governo gastou R$ 500 milhões com obras do PPI, menos de 5% do orçamento total previsto para o ano, o que deve comprometer as metas. A demora na execução de projetos pode fazer com que os recursos previstos no PPI não sejam totalmente gastos. Técnicos estimam que se atinja, no máximo, 0,4% do PIB em 2007. Com o desconto dos 0,5% do PIB alocados no PPI, o superávit primário do governo alcançaria 3,75%, já que a previsão é de 4,25% do PIB. No primeiro trimestre do ano, o superávit bateu recordes, chegando a 4,9% do PIB.

O PAC prevê investimentos de R$ 58,3 bilhões para o setor de infra-estrutura logística de 2007 a 2010, sendo R$ 13,4 bilhões já no pri-meiro ano. A parcela correspondente a desembolsos diretos do Estado equivale a 11,7%. O restante vem de empresas estatais e do setor privado – ou seja, depende das avaliações sobre a taxa de juros e a taxa interna de retorno (TIR) dos investimentos, além de alterações em marcos re-gulatórios. Para a execução dos investimentos do PAC estão previstos R$ 34 bilhões do Orçamento Geral da União e o financiamento de R$ 17 bilhões pelo BNDES. No geral, o PAC privilegia a participação do inves-timento privado na infra-estrutura logística e depende demasiadamente desse tipo de investimento para obter sucesso, o que gera incertezas. Essa dependência leva à necessidade de se adotar outras medidas, que serão mencionadas no fim desta seção.

Se supusermos que a proporção de 11,7% será aplicada em 2007, o Estado deverá investir em torno de R$ 1,6 bilhão. Também em 2007, estão previstos investimentos de R$ 8,1 bilhões no modal rodoviário, cerca de 60% do total do ano. Estima-se que 50 mil km precisam de manutenção, recuperação e reconstrução, com custo estimado de R$ 250 mil por km, o que indica a necessidade de R$ 12,5 bilhões, quantia muito além da prevista.

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Os outros modais precisam de ainda mais investimentos, pois, além de resolver os problemas que já existem, devem aumentar a participação na matriz de transportes nacional. Dos R$ 58,3 bilhões de investimentos totais previstos para os quatro anos, 57,3% (R$ 33,4 bilhões) são para o setor rodoviário, enquanto para os demais modais foram direcionados os seguintes recursos: ferrovias com R$ 7,9 bilhões (13,5%), portos R$ 2,6 bilhões (4,6%), aeroportos R$ 3 bilhões (5,1%), hidrovias R$ 0,7 bi-lhão (1,3%), marinha mercante com R$ 10,6 bilhões (18,2%).

Previsão de investimentos em infra-estrutura logística do PAC(R$ milhões)

MODAL 2007 2008-2010 TOTALRodovias 8.086 25.352 33.437 Ferrovias 1.666 6.197 7.863

Portos 684 1.979 2.663 Aeroportos 878 2.123 3.001

Hidrovias 280 455 735 Marinha Mercante 1.779 8.802 10.581

TOTAL 13.373 44.907 58.280 Fonte: PAC

MODAL QTDE Portos 12

Hidrovias 67 portosHidrovias 1 eclusa

Aeroportos 20 Fonte: PAC.

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MODAL KMRodovias 45.337

Invest. Público 42.090 Invest. Privado 3.247

Recuperação 32.000 Adequação/Duplicação 3.214

Construção 6.876 Ferrovias 2.518

Invest. Público 211 Invest. Privado 2.307

Fonte: PAC.

Segundo o PAC, os objetivos dos projetos são: “aumento da efi-ciência produtiva em áreas consolidadas; indução ao desenvolvimento em áreas de expansão de fronteira agrícola e mineral; redução de desi-gualdades regionais em áreas deprimidas; integração regional sul-ame-ricana”.

Previsão de investimentos em transportes 2007-2010por regiões (em R$ bilhões)

REGIÃO INVESTIMENTO TOTAL Norte 6,2

Nordeste 7,3Sudeste 6,1

Sul 3,9Centro-Oeste 3,5

Projetos especiais 28,4TOTAL 55,4

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O PAC dividiu os investimentos por região, sendo a região Sudeste a mais privilegiada na previsão de recursos. Acima, temos os investi-mentos por região; abaixo, a lista de obras.

Região Norte: BR-364-AC: construção e pavimentação Sena Madureira – Feijó – Cru-zeiro do Sul.BR-319-AM: restauração, melhoramentos e pavimentação Manaus – Porto Velho.BR-163-MT–PA: pavimentação Guarantã do Norte – Rurópolis – Santa-rém, incluindo o acesso a Miritituba (BR-230-PA).BR-230-PA: pavimentação Marabá – Altamira – Medicilândia – Ruró-polis.BR-156-AP: pavimentação Ferreira Gomes – Oiapoque.Construção da ferrovia Norte-Sul: Araguaína – Palmas.Ampliação do Porto de Vila do Conde.Construção das eclusas de Tucuruí.Construção de terminais hidroviários na Amazônia.

Região Nordeste:BR-101-Nordeste (RN-PB-PE-AL-SE-BA): duplicação e adequação de capacidade.Natal: entroncamento BR-324 (Feira de Santana).BR-230-PB: duplicação João Pessoa – Campina GrandeBR-135-PI-BA-MG: pavimentação Jerumenha – Bertolínea – Eliseu Martins.Construção de trechos entre a divisa PI-BA e a divisa BA-MG; pavimen-tação.Divisa BA-MG – Itacarambi.BR-116-BA: execução de ponte sobre o rio São Francisco – divisa PE-BA.

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BR-116-324-BA: Salvador – Feira de Santana – divisa BA-MG (parceria público-privada)Contorno de São Félix – Cachoeira.Variante ferroviária Camaçari – Aratu.Ferrovia Nova Transnordestina – obra privada e financiamento público.Recuperação e ampliação dos berços 101 e 102 do porto de Itaqui.Construção do berço 100 do porto de Itaqui.Dragagem dos berços 100 ao 103 do porto de Itaqui.Duplicação do acesso rodoviário ao porto de Itaqui e BR-135.Duplicação do acesso rodoviário ao porto de Pecém e BR-222, Caucaia – Pecém.Melhorias no terminal salineiro de Areia Branca.Construção de novo acesso rodoferroviário ao porto de Suape.Construção da via expressa portuária ao porto de Salvador.Dragagem e derrocagem na hidrovia do rio São Francisco (Pirapora – Juazeiro – Petrolina) e acesso ferroviário ao porto de Juazeiro.

Sudeste:Arco rodoviário do Rio de Janeiro, incluindo a BR-101-RJ.BR-101-ES: adequação de capacidade na divisa RJ-ES (incluindo o con-torno de Vitória)BR-381-MG: adequação de capacidade e duplicação da Belo Horizon-te – Governador Valadares, incluindo o contorno de Belo Horizonte, subtrecho Betim– Ravena (em pista dupla).BR-153-365-MG: duplicação da divisa GO-MG – Trevão – Uberlândia.BR-040-MG: Duplicação do trevo de Curvelo – Sete Lagoas.BR-050-MG: Conclusão da duplicação da Uberaba – Uberlândia e du-plicaçãoUberlândia – Araguari.BR-262-MG: duplicação Betim – Nova Serrana.

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BR-265-MG: Pavimentação Ilicínea – São Sebastião do Paraíso.Rodoanel de São Paulo – Trecho Sul.Adequação da linha férrea no perímetro urbano de Barra Mansa e cons-trução de pátioConstrução do contorno ferroviário de Araraquara.Ferroanel de São Paulo – Tramo Norte – SP – MRS-privado (REFC).Construção das avenidas perimetrais do porto de Santos – margem di-reita (Santos) e margem esquerda (Guarujá).Dragagem de aprofundamento no canal de acesso, bacia de evolução e junto ao cais do porto de Santos.Derrocagem junto ao canal de acesso ao porto de Santos.Contenção do cais do porto de Vitória.

Região Sul:BR-101-SUL (SC-RS): duplicação Palhoça – Osório.BR-116-RS: programa Via Expressa (Região Metropolitana de Porto Alegre).BR-386-RS: duplicação Tabaí – Estrela.BR-392-RS: duplicação Pelotas – Rio Grande, inclusive contorno de Pe-lotas.BR-158-RS: pavimentação Santa Maria – Rosário do Sul.BR-470-SC: duplicação da Navegantes – Blumenau – entroncamento de acesso a Timbó.BR-280-SC: duplicação da São Francisco do Sul – Jaraguá do Sul.BR-282-SC: pavimentação da Lajes – Campos Novos – São Miguel – Paraíso.BR-153-PR: pavimentação Ventania – Alto do Amparo.Construção da segunda ponte internacional sobre o rio Paraná em Foz do Iguaçu.BR-116-PR: adequação do contorno leste de Curitiba.Construção do contorno de São Francisco do Sul.

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Construção do contorno de Joinville.Ampliação da capacidade do corredor ferroviário do oeste do Paraná (privado).Ampliação dos molhes e dragagem de aprofundamento do porto de Rio Grande.Construção e recuperação de berços do porto de Paranaguá.Construção e recuperação de berços do porto de São Francisco do Sul.Construção da via expressa portuária do porto de Itajaí.

Centro-Oeste:BR-163-364-MT: duplicação Rondonópolis – Cuiabá – Posto Gil.BR-158-MT: pavimentação Ribeirão Cascalheira – divisa MT-PA.BR-364-MT: pavimentação Diamantino – Campo Novo dos Parecis.BR-242-MT: Pavimentação Ribeirão Cascalheira – Sorriso.BR-158-MS-SP: construção da Ponte Paulicéia – Brasilândia.BR-070-GO: duplicação da divisa DF-GO – Águas Lindas.BR-060-DF-GO: conclusão da duplicação Brasília – Anápolis.BR-153-GO: conclusão da duplicação Aparecida de Goiânia – Itumbiara.Construção da Ferrovia Norte-Sul: Anápolis (porto seco) - Uruaçu (con-cessão).Construção do trecho da Ferronorte: Alto Araguaia – Rondonópolis (obra privada com financiamento do BNDES).Dragagem e derrocagem na hidrovia do Paraná–Paraguai.

Programas Especiais (investimento total de R$ 24,6 bilhões):RodoviasConservação de 52 mil km de rodovias, R$ 1,7 bilhão.Manutenção e recuperação de rodovias, R$ 8,0 bilhões.Estudos e projetos para 14.500 km de rodovias, R$ 1,0 bilhão.Controle de peso – implantação e operação de 206 postos, R$ 666 mi-lhões.

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Sistema de segurança em rodovias, R$ 1,1 bilhão.Sinalização de 72 mil km de rodovias, R$ 470 milhões.

PortosPrograma de dragagem nos portos, R$ 1,1 bilhão.MarítimosPrograma de modernização da Marinha Mercante, R$ 10,6 bilhões.Projetos rodoviáriosBR-153: divisa MG/SP – divisa SP/PR, 321,6 km.BR-116: Curitiba – divisa SC/RS, 412,7 km.BR-393: Divisa MG/RJ – entroncamento BR-116 (via Dutra), 200,4 km.BR-101: Divisa ES/RJ – ponte Rio – Niterói, 320,1 km.BR-381: Belo Horizonte – São Paulo, 562,1 km.BR-116: São Paulo – Curitiba, 401,6 km.BR-116-376-101: Curitiba – Florianópolis, 382,3 km.

O programa também prevê investimentos em infra-estrutura dos aeroportos, no valor total de R$ 3 bilhões entre 2007 e 2010, visando a aumentar a capacidade de transporte de cargas e de passageiros. A efetivação desses investimentos e a regulamentação das aplicações são necessárias para que não ocorra uma crise no transporte de cargas aére-as e para tentar superar a crise no transporte de passageiros, juntamente com outras medidas.

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Investimentos do PAC em aeroportos (R$ milhões)

Fonte 2007 2008-2010 TOTAL Infraero 305 664 969

Orçamento Geral da União 573 1.459 2.032 TOTAL 878 2.123 3.001

Meta de ampliação da capacidade

Capacidade Número aeroportos Atual Acréscimo até

2010 Milhões de

passageiros/ano 20 118 40,3

Mil toneladas/ano 4 100 191

Conclusão de obras em andamento:Boa Vista, ampliação da Capacidade para 330 mil passageiros/ano.Macapá, ampliação da capacidade para 700 mil passageiros/ano.Fortaleza, construção do terminal de cargas e da torre de controle.Natal, construção do aeroporto de São Gonçalo do Amarante.João Pessoa, ampliação da capacidade para 860 mil passageiros/ano.Guarulhos, implantação, adequação, ampliação e revitalização do siste-ma de pátios e pistas.Congonhas, segunda etapa da reforma e modernização do terminal de passageiros e construção da torre de controle.Santos Dumont, ampliação da capacidade para 8,5 milhões de passa-geiros/ano.Vitória, ampliação da capacidade para 2,1 milhões de passageiros/ano.Goiânia, ampliação da capacidade para 2,1 milhões de passageiros/ano.

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Novas obrasParnaíba, ampliação e reforço de pátio e pista.Recife, construção de quatro pontes de embarque.Salvador, readequação do acesso ao aeroporto.Vitória, construção do novo terminal de cargas.Confins, ampliação do estacionamento de veículos em mais setecentas vagas.Guarulhos, ampliação da capacidade para mais 12 milhões de passagei-ros/ano.Tom Jobim, recuperação e revitalização dos sistemas de pistas e do ter-minal de cargas.Curitiba, ampliação da pista e ampliação do terminal de cargas em mais 5 mil m².Florianópolis, ampliação da capacidade para 2,7 milhões de passagei-ros/ano.Porto Alegre, implantação do novo complexo logístico do aeroporto e ampliação da pista de pouso e decolagem.Cuiabá, complementação da reforma do terminal de passageiros.Brasília, ampliação da capacidade para 11 milhões de passageiros/ano.

O PAC também prevê medidas para estimular o investimento pri-vado, do qual depende diretamente. Algumas das medidas de estímulo ao financiamento são: criação do Fundo de Investimento em Infra-Es-trutura com recursos do FGTS (R$ 5,0 bilhões); redução da TJLP (de 9,75% para 6,5%); redução dos spreads do BNDES (para financiamento de investimentos em infra-estrutura, logística e desenvolvimento urba-no). Entre as chamadas melhoras do ambiente de investimento, há medi-das relacionadas à questão ambiental, ao incentivo ao desenvolvimento regional (com recriação da Sudam e da Sudene) e medidas de aperfei-çoamento do marco regulatório e do sistema de defesa da concorrência, entre outras. O PAC também contempla: medidas de aperfeiçoamento

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do sistema tributário, bem como de desoneração do investimento, so-bretudo em infra-estrutura e construção civil, para incentivar o investi-mento privado; desoneração de obras de infra-estrutura (suspensão da cobrança de Pis/Cofins para novos projetos); desoneração dos Fundos de Investimento em Infra-Estrutura (isenção de imposto de renda).

Os eixos viários e um plano de obras.2 Os espaços viários continentais e territoriaisO Brasil ocupa aproximadamente 47% do território sul-americano, tem fronteiras com a quase-totalidade dos países (exceto Chile e Equador), e sua economia corresponde a mais de 50% do PIB continental. Segundo uma óptica exclusiva de transportes, o continente é composto de sete grandes espaços de tráfego, basicamente determinados por suas caracte-rísticas físico-geográficas (Costa e Padula, 2007): Litoral Atlântico; Pla-nalto Brasileiro; Bacia do Prata; Cordilheira Andina; Litoral do Pacífico; Planície Amazônica; Orenoco/Caribe.

O Brasil tem controle absoluto sobre os dois primeiros, participan-do de forma marcante da gestão condominial da bacia do Prata e da pla-nície Amazônica. Permanece aberta a possibilidade de utilizar os demais, como espaço de tráfego, graças a interesses econômicos e estratégicos de países vizinhos que também pretendem um estreitamento de relações conosco e a criação da Comunidade Sul-Americana de Nações.

A infra-estrutura de transportes do continente privilegia o comér-cio exterior, voltada para os portos, e se concentra no modal rodoviário. Um novo ciclo de desenvolvimento, que pretenda superar as deficiên-cias do atual modelo, deve enfrentar o desafio de integrar plenamente todas as regiões, reconstituindo a matriz de transportes, de modo a esta-belecer vias de comunicação adequadas à integração desse arquipélago de espaços geográficos diferenciados chamado Brasil. E deve ir além,

2 Esta seção foi retirada, com algumas alterações, de Costa e Padula, 2007.

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propondo a integração física de todos os espaços da América do Sul.Aproveitar a multiplicidade de nossas vias naturais, representadas

pelo extenso litoral e as bacias interiores, integrando-as por meio de modais de maior capacidade – navegação de cabotagem e fluvial, além de ferrovias –, bem como buscar a integração entre os espaços de tráfego condominiais de que participamos e dos outros que atendam a interes-ses estratégicos nossos e de nações vizinhas é necessário para obtermos o máximo de produtividade e de rentabilidade no desenvolvimento in-terno e no comércio exterior.

O planejamento da matriz de transportes é o principal instrumen-to de superação de nossas deficiências. Com a ausência de um planeja-mento para infra-estrutura e, em especial, para o setor de transportes, que defina programas e projetos de curto, médio e longo prazo, os ime-diatismos do mercado vão reproduzir, ano a ano, os erros do passado e agravar o quadro já existente.

Principais eixos viários e plano da ação viárioA integração de mercadosComo observamos, a articulação inter-regiões é bastante deficiente no Brasil. Baseia-se no modal rodoviário e se organizou seguindo os an-tigos caminhos do Brasil colônia, em direção aos portos. A circulação interior é bem mais difícil. Mais de 50 % da circulação de cargas situam-se na região Sudeste. Tal divisão regional corresponde perfeitamente à distribuição dos mercados.

A integração regional deve ser prioridade de um plano de governo na área de transportes. A recuperação da malha viária reflete a impor-tância do setor para o processo de desenvolvimento. Como suporte para o macroplanejamento de um programa de transportes, deve-se adotar o conceito de corredores de integração, que pretendem interligar os ma-cromercados delimitados pelas regiões. Eles significam um complexo de facilidades que tem início em um eixo de transportes, mas que acrescen-

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ta outros insumos à atividade econômica, como estradas alimentadoras, terminais e pátios intermodais, armazenagem dentro das propriedades, terminais portuários especializados etc.

São os seguintes corredores de integração prioritários: (a) Sul – Sudeste, a ser recuperado e reestruturado; (b) Sudeste – Nordeste, a ser recuperado e reestruturado; (c) Centro-Oeste – Sul, a ser construído; (d) Centro-Oeste – Sudeste, a ser recuperado e reestruturado; (e) Cen-tro-Oeste – Norte, a ser construído; (f) Nordeste – Norte, a ser cons-truído; (g) Nordeste – Centro-Oeste, a ser recuperado, reestruturado e ampliado.

Dois desses corredores passam pelo Planalto Brasileiro (Sul – Su-deste, Sudeste – Nordeste), três passam também pelo Litoral Atlântico (Sul – Sudeste, Sudeste – Nordeste, Nordeste – Norte), outros três en-volvem a ligação dos espaços de tráfego da Bacia do Prata e do Planalto Brasileiro (Centro-Oeste – Nordeste e Centro-Oeste – Sul), outro liga os espaços de tráfego da Bacia Amazônica e da Bacia do Prata (Centro-Oeste – Norte) e, finalmente, o último liga a Bacia Amazônica e o Pla-nalto Brasileiro (Nordeste – Norte).

A partir de alternativas estudadas, propomos um plano em infra-estrutura de transportes a ser levado a cabo em quatro anos de governo. Ele reúne um conjunto de ações, além das obras que vêm sendo reali-zadas de forma inadequada pelo atual governo e de outras que estão contidas no PAC:

A. No espaço de tráfego do Planalto Brasileiro (Sul – Sudeste e Sudeste – Nordeste):A.1. Ligação Sul – Sudeste:A.1.1. Duplicação das rodovias que ligam Porto Alegre – Florianopólis – Itajaí – Joinville – Curitiba – São Paulo, incluindo trecho da BR-101;A.1.2- Reaparelhamento do sistema ferroviário que interliga a região Sul à Sudeste, em especial o corredor São Paulo – Curitiba – Porto Alegre –

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Uruguaiana, inclusive o trecho Ferroban;A.2. Ligação Sudeste – Nordeste:A.2.1. Restauração da BR-116;A.2.2. Reaparelhamento do trecho ferroviário Salvador – Belo Horizon-te e do ramal Corinto – Pirapora;A.2.3. Restauração da navegabilidade no rio São Francisco entre Pirapo-ra e Juazeiro – Petrolina;

B - No espaço de tráfego do Litoral Atlântico (Norte – Nordeste, Nor-deste – Sudeste, Sudeste – Sul):B.1. Atuação na melhora dos seguintes portos: Vila do Conde, Itaqui, Fortaleza, Cabedelo, Suape, Aratu, Itaguaí (Sepetiba), Santos, São Fran-cisco do Sul, Itajaí e Rio Grande, preparando-os também para a cabota-gem. Alguns portos estão subutilizados, como Itaguaí, enquanto outros estão sobrecarregados, como Santos. A questão portuária deverá ser prioritária, pois a nova Lei dos Portos adicionou problemas novos sem resolver os existentes. Além das ações visando a fortalecer e recapacitar as companhias Docas, bem como eliminar a excessiva intermediação existente na atividade portuária, deverá ser estudada a especialização de alguns portos, tornando-os cativos de determinados fluxos de mercado-rias, de modo a aumentar a racionalidade de sua operação e seu projeto, incentivando a intermodalidade;B.2. Reaparelhamento dos meios flutuantes da navegação de cabotagem. É fundamental reequacionar o transporte naval, remodelando a concep-ção de embarcações, que devem ser padronizadas para prestar serviços de cabotagem.B.3 - Recuperar o Lloyd Brasileiro de sua insolvência gerencial e crise financeira, especializando-o em cabotagem. O estreitamento de relações entre o Lloyd e as operadoras resultantes da antiga Rede Ferroviária Fe-deral é fundamental para viabilizar essas empresas como operadoras de transporte intermodal.

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C. Na ligação dos espaços de tráfego da Bacia do Prata e do Planalto Brasileiro:C.1. Ligação Centro-Oeste – Nordeste.C.1.1. Restauração da BR-020 (Brasília – Fortaleza) e da BR-242 (Brasí-lia – Salvador);C.1.2. Continuidade da expansão da ferrovia Norte-Sul, de modo a interligá-la com a malha ferroviária do Sudeste, com a construção de ramais ferroviários e de conexões intermodais. C.2. Ligação Centro-Oeste – Sul.C.2.1. Ampliação da Ferroeste, em construção pelo governo do estado do Paraná, com a interligação Cascavel – Maracaju e o reaparelhamento da interligação Maracaju – Campo Grande.C.3. Ligação Centro-Oeste – Sudeste.C.3.1. Prolongamento da Ferronorte, interligando Santa Fé do Sul – Cuiabá.C.3.2. Reaparelhamento da Ferrovia Novoeste (Bauru – Campo Gran-de).

D. Na ligação dos espaços de tráfego da Bacia do Prata e da Bacia Ama-zônica:D.1. Ligação Centro-Oeste – Norte.D.1.1. Restauração e pavimentação das BR-070, BR-158 e PA-150, ligan-do Cuiabá – Barra do Garças – Belém;D.1.2. Restauração e pavimentação da BR-364, ligando Cruzeiro do Sul – Rio Branco – Porto Velho – Cuiabá;D.1.3. Restauração e pavimantação da BR-163, ligando Sinop – Cuiabá – Campo Grande;D.1.4. Restauração da BR-318, ligando Manaus a Porto Velho.

E. Na ligação dos espaços de tráfego da bacia Amazônica e do planalto Brasileiro

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E.1. Ligação Nordeste – Norte.E.1.1. Prolongamento da ferrovia Nova Transnordestina em direção ao eixo da ferrovia Norte-Sul e em direção ao oeste baiano. Essa ferrovia possibilitará a integração transversal de toda a zona de expansão da fron-teira agrícola dos cerrados do Norte, do Nordeste e Centro-Oeste (sul do Pará, Maranhão, Piauí e Ceará, norte do Tocantins, oeste da Bahia, norte de Minas, através dos projetos A.2.2 e A.2.3, acima indicados), possibilitando o reforço das rotas de abastecimento de produtos agrí-colas para as populações das regiões Nordeste e Norte do Brasil. Além disso, devem ser construídos portos para realizar a ligação entre essa ferrovia e a de Carajás com a hidrovia do Araguaia-Tocantins.

Irrigação econômicaA questão da irrigação econômica é central para a matriz de transportes. Sob esse aspecto, as ações prioritárias localizam-se na região Sudeste, responsável por mais de 50% da produção de transportes no Brasil.A delimitação geográfica compreendida pelo polígono São Paulo – Rio de Janeiro – Belo Horizonte – Brasília demanda como prioritárias as seguintes ações:

A. Recuperação de ferrovias:A.1. Rio – São Paulo;A.2. Rio – Belo Horizonte;A.3. Campinas – Triângulo Mineiro – Brasília. B. Recuperação e duplicação dos seguintes trechos rodoviários:B.1. Rio – São Paulo (interligação com o trecho duplicado São Paulo – Queluz);B.2. São Paulo – Belo Horizonte;B.3. Belo Horizonte – Juiz de Fora – Rio.

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As obras mais urgentes no polígono são o anel rodoviário e o anel ferroviário de São Paulo, o arco rodoviário do Rio de Janeiro e o desen-volvimento e maior utilização do porto de Itaguaí.

Essas ações devem ser acompanhadas de outros investimentos, como estradas alimentadoras, terminais e pátios intermodais, armaze-nagem dentro de propriedades, terminais portuários especializados etc. A intervenção governamental poderá contar com expressiva participa-ção do setor privado como investidor direto e/ou como participante de esquemas de financiamento.

Uma questão a ser resolvida é a integração de um dos vértices des-se polígono à malha viária internacional. O porto de Itaguaí (Sepeti-ba) apresenta a melhor solução.3 O desenvolvimento desse porto, com grande potencial e hoje subutilizado, pode desafogar Santos, atualmente o principal porto do país. Devem ser reaparelhados os portos do Rio de Janeiro e de Sepetiba e o complexo portuário Rio de Janeiro – Sepetiba, e recuperadas as vias de interconexão entre eles, os “portos secos” e os corredores de transporte descritos acima.

O porto de Itaguaí enfrenta gargalos no acesso rodoviário e fer-roviário. É preciso completar o arco rodoviário e adaptar/padronizar bitolas de ferrovias. O governo federal deve efetivar a obra de duplica-ção da BR-101 no trecho entre Santa Cruz e Itacuruçá (22,6 km), orçada em R$ 147 milhões, que é parte do arco rodoviário que ligará o porto às rodovias BR-040, BR-116 e BR-101. O Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes (DNIT) não tem conseguido levar à frente essa obra. Todo o arco rodoviário está orçado em R$ 570 milhões. Quanto ao gargalo ferroviário, a malha ferroviária da FCA em Minas Gerais e

3 O porto de Itaguaí, na Baía de Sepetiba, é o único no Atlântico Sul com águas profundas e abrigadas pela baía, ou seja, capaz de receber gigantescos navios porta-contêiner – que hoje fazem comércio com a Ásia – e se tornar um grande concentrador de cargas industri-ais, inserindo o Brasil nas rotas internacionais de comércio mais alto valor (cargas industriais), que atualmente se restringem ao hemisfério Norte.

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Goiás tem bitola estreita, enquanto a linha MRS em Barra Mansa é mais larga, o que demanda a construção de uma linha com bitola estreita entre Barra Mansa e Itaguaí.

Indução ao desenvolvimentoTrês regiões são prioritárias para ações de indução ao desenvolvimento no setor de transportes: Centro-Oeste, Norte e Nordeste. Todas podem ser consideradas regiões de fronteira. As obras mais significativas para uma efetiva ação em curto prazo são:

A. Região Centro-Oeste:A.1. Recuperação e pavimentação do trecho da BR-158 entre Barra do Garças e Brasília;A.2. Recuperação do trecho ferroviário Campo Grande – Corumbá (fronteira com a Bolívia) da ferrovia Novoeste.

B. Região Norte:B.1. Implantação e consolidação da hidrovia Araguaia – Tocantins e de suas interligações com a estrada de ferro Carajás, com o trecho existente da ferrovia Norte-Sul e com o trecho ferroviário Norte-Nordeste a ser construído (Imperatriz – Suape).B.2. Recuperação da BR-230 entre Itaiutaba e Marabá.B.3. Recuperação da BR-163 entre Sinop e Itaiutaba.B.4. Recuperação dos trechos navegáveis dos rios da bacia Amazônica: Juruá (Cruzeiro do Sul – Eirunepé – Rio Solimões), Purus (Rio Branco – Lábrea – Rio Solimões), Japurá, Madeira (Porto Velho – Manicoré – Rio Amazonas), Negro (São Gabriel da Cachoeira – Manaus – Rio Amazonas/Solimões) e Teles Pires (viabilizando a navegação pela hidro-via Tapajós – Teles Pires). Construção da eclusa de Tucuruí.B.5. Recuperação e conclusão da BR-174, Manaus – Caracaraí – Boa Vista.

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B.6. Implantação da BR-210, entre Macapá – Caracaraí – São Gabriel da Cachoeira (parte do projeto Calha Norte).

C. Região Nordeste:A questão nordestina é uma questão nacional, e sua solução é funda-mental para se alcançar a integração territorial, social e econômica do Brasil. As políticas específicas de desenvolvimento exigirão uma atuação de grande envergadura na área de infra-estrutura, visando a superar as barreiras existentes. Além da Ferrovia Transnordestina, citada, devem ser desenvolvidas as seguintes ações:

C.1. Plano de recuperação do Semi-Árido: gestão dos recursos hídri-cos.C.1.1. Recuperação de todas as barragens e açudes implantados na re-gião.C.1.2. Implantação de barragens em todos os rios e cursos d’água pere-nes ou intermitentes, visando tanto a retenção das águas pluviais como a regulari-zação das cheias que periodicamente assolam a região.

C.2. Implantação e pavimentação da BR-226, ligando Marabá – Porto Franco – Presidente Dutra – Teresina – Crateús.C.3. Dentro do trecho da Companhia Ferroviária do Nordeste, constru-ção do trecho remanescente da ferrovia Transnordestina, ligando Sal-gueiro – Crato e Senador Pompeu – Piquet Carneiro – Crateús.C.4. Restauração e recuperação da ferrovia Crateús – Teresina – São Luís.C.5. Restauração e recuperação da ferrovia Crateús – Fortaleza.C.6. Restauração e recuperação da ferrovia Fortaleza – Iguatu/Arrojado – Souza/Mossoró – Campina Grande – João Pessoa – Recife.C.7 - Restauração do trecho ferroviário Recife – Macéio – Aracaju – Salvador.

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Essas obras devem ser realizadas por meio de mutirões de micro, pe-quenas e médias empresas regionais, sob a supervisão dos batalhões de engenharia do Exército. O Exército tem sido utilizado há décadas na construção de rodovias e ferrovias, e mais recentemente também em obras de infra-estrutura dos portos. Tal opção tem grande importância, pois é necessário realizar grande mobilização de pessoal e correta apli-cação dos recursos destinados.

Penetração nos espaços territoriais da cordilheira dos Andes e do li-toral PacíficoAs ações a serem desenvolvidas com essas funções precisam ser precedi-das de acordos diplomáticos. Tais acordos são perfeitamente possíveis, pois todos os países envolvidos têm interesse na maior integração da América do Sul.

A. Ligação ferroviária Centro-Oeste – Litoral Pacífico/Porto de Arica.A.1. Reconstrução e reaparelhamento do trecho ferroviário Corumbá – Santa Cruz de la Sierra.A.2. Construção do trecho Santa Cruz de la Sierra – Cochabamba.A.3. Construção e reaparelhamento do trecho existente no eixo Cocha-bamba – Arica.B. Ligação rodoviária Centro-Oeste/Norte – Litoral Pacífico/Peru.B.1. Expansão da BR-364, interligando Cruzeiro do Sul (AC) com a ci-dade de Puna (Peru), viabilizando o acesso ao Pacífico a partir da região Centro-Oeste e da região amazônica, abrangida pelos afluentes da mar-gem direita do Rio Solimões.

C. Interligação com o Sistema Rodo-Ferroviário do Cone Sul.C.1. Construção de ponte rodo-ferroviária sobre o rio Uruguai na cida-de de São Borja.C.2. Construção de ponte rodo-ferroviária na cidade de Uruguaiana.

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Ações complementaresO plano de ação apresentado exige ações conjuntas de todas as esferas – União, Estados e Municípios –, de empresas privadas, cooperativas, associações de produtores e outras entidades da sociedade civil, visan-do a superar outros problemas existentes no interior de micro-regiões, cidades, distritos etc.

Além disso, são necessárias as seguintes ações complementares:(a) Estradas alimentadoras: deve ser concedido apoio financeiro e

crédito complementar para a realização de obras de construção, recu-peração e remoção de pontos de estrangulamento de 50 mil km de ro-dovias vicinais. Os recursos, a serem mobilizados no período de quatro anos, atingem R$ 360 milhões;

(b) Pátios e terminais: devem ser identificadas e vendidas todas as áreas e edificações pertencentes à União e suas empresas que possam ser usadas para a instalação de equipamentos de infra-estrutura pelo setor privado, de modo a racionalizar processos produtivos integrados a redes de grande capacidade de transporte (ferrovias e hidrovias).

(c) Armazenagem dentro das propriedades: deve-se apoiar e finan-ciar a construção de armazéns coletores por proprietários, por coope-rativas e por associações de produtores, estabelecendo-se como meta a construção de 30 milhões de toneladas de capacidade até 2005. Esse programa de construção traz como condicionante implícita que todas as cidades tenham acesso, a pelo menos, uma unidade armazenadora lo-cal para realizar todo o processamento, limpeza e secagem da produção agrícola de seus produtores. Além disso, devem ser identificados todos os armazéns pertencentes à União e às suas empresas que possuam ca-racterísticas típicas de armazenagem coletora, para que sejam integral-mente transferidos para associações de produtores e/ou cooperativas localizadas em sua área de influência. A necessidade de recursos é de R$ 1,8 bilhão em oito anos.

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IV. Considerações gerais sobre a integração sul-americana e a IIRSA

O quadro geralA integração sul-americana passa pela construção de uma infra-estru-tura específica. Por causa de fatores históricos, geográficos, econômicos, políticos e culturais, as principais áreas de concentração econômica e populacional do continente estão distribuídas de forma heterogênea e dispersa, concentradas na faixa litorânea, voltadas para o comércio exterior. Inexistem, ou existem de forma muito inadequada, conexões viárias entre elas.1 A região é como um arquipélago, com escassas cone-xões realizadas por longas rodovias. Os modais ferroviário e aquaviário, mais baratos e característicos para transportes de grandes cargas e de longa distância, não são utilizados para integrar a região, ao contrário do que ocorre nos Estados Unidos e na Europa. O transporte de cabota-

1 As razões históricas, políticas e econômicas relacionam-se à nossa colonização, que formou economias agrário-exportadoras com sua geração de riqueza voltada para fora. A razão geográfica encontra-se em obstáculos naturais, por exemplo, a região da Amazônia e a Cordilheira dos Andes.

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gem, que deveria ser o principal modal para transporte de cargas entre regiões costeiras, não é amplamente utilizado. As ligações dependem do modal rodoviário, o que resulta em custos extraordinariamente eleva-dos. O potencial de comércio entre as principais áreas econômicas da região, especialmente entre as áreas do Atlântico e do Pacífico, não é devidamente explorado. O centro da região, área dotada de importantes recursos e ricos ecossistemas, não está devidamente ocupado e interli-gado ao restante do continente e ao mundo. O interior é praticamente despovoado. Exemplo disso é a região amazônica.2

A vasta dimensão do continente e a longa distância entre seus cen-tros exigem consideráveis fluxos de transportes de longa distância, pre-dominantemente realizados pelo modal rodoviário, gerando elevadíssi-mos custos ao comércio intra-regional. A conseqüência desses custos, que tanto atrapalham a integração sul-americana, é o baixo crescimento do PIB em diversas áreas, pela falta de uma integração adequada que gere sinergias. Estimamos que o PIB da região, como um todo, deixe de crescer em torno de 2% a cada ano pela falta de conexões adequadas, através de um sistema intermodal eficiente. O transporte realizado por ferrovias, cruzando e interligando o continente, e por cabotagem, ao longo da costa, são os mais racionais e devem ter peso crescente na ma-triz regional. Esses modais foram deixados de lado pela prioridade dada ao modal rodoviário em todos os países da região.

É necessário desenvolver um sistema de transportes eficiente que integre toda a região, irrigue regiões saturadas e induza o desenvolvi-mento e a ocupação de regiões subdesenvolvidas, subutilizadas, subo-cupadas e subexploradas. A América do Sul precisará investir muitos bilhões de dólares para construir sua integração física, base da integra-ção política, econômica, social e cultural. São necessárias construções

2 Exemplos de ecossistemas são: a Bacia Amazônica, os Cerrados, o Pantanal, o Cha-co, os Pampas.

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e/ou investimentos em redes de ferrovias, hidrovias, portos, marinha mercante, redes rodoviárias, transportes aéreo e terminais e armazéns para apoio intermodal, como destaca Darc Costa (2003).

Atualmente, a América do Sul tem as seguintes regiões econômi-cas principais: Norte-Nordeste do Brasil, Sul-Sudeste do Brasil, Noro-este Sul-Americano, Grande Buenos Aires-Montevidéu, Chile Central e países centrais (Paraguai e Bolívia). É preciso aumentar o comércio entre essas regiões, cuja potencialidade está subaproveitada.

Segundo Costa (2003, p.139), “a falta de uma rede continental de transporte manifestou-se clara e penosamente, em 1982, durante a Guerra das Malvinas, quando o Peru, a Venezuela e outros países, ao tentarem dar apoio logístico à Argentina, descobriram que não havia navios cargueiros que viajassem diretamente entre Caracas e Buenos Aires”.

Cerca de 60% da população da região moram nos países membros do Mercosul (Brasil, Paraguai, Uruguai e Argentina), na sua maior parte localizada em uma faixa estreita (cerca de 600 km) ao longo da cos-ta atlântica (mais de 7 mil km). Usados adequadamente, a cabotagem e o transporte hidroviário resultariam no aumento do comércio e no crescimento econômico. No Cone Sul, o Norte-Nordeste do Brasil seria ligado eficientemente à Grande Buenos Aires e a Montevidéu. O porto de Sepetiba (como superporto) deve fazer a ligação do polígono São Paulo – Rio de Janeiro – Belo Horizonte – Brasília com o mundo, com-plementado pela navegação fluvial e por malhas terrestres adequadas. Isto é importante para ligar o Sudeste brasileiro, região de maior peso econômico do Hemisfério Sul, à malha viária internacional e ao trans-porte de cabotagem na América do Sul. O comércio do Mercosul, feito predominantemente por rodovias, está concentrado no eixo Sudeste-Sul do Brasil – Grande Buenos Aires – Montevidéu. A Costa do Pacífico e a Costa Atlântica, mais distanciadas pela falta de vias intracontinentais adequadas, podem ter no transporte marítimo, passando pelo Panamá,

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uma alternativa mais imediata. Eixos hidro-ferroviários – com hidro-vias, navegação de cabotagem e alguns eixos ferroviários estratégicos que já existem ou estão em construção – são os meios que podem ser mobilizados mais rapidamente, com investimentos relativamente bai-xos, para um primeiro passo em direção a uma eficiente integração de transportes intermodal.3 Em prazo mais longo, é necessário construir um novo canal interoceânico. A partir dos eixos hidro-ferroviários, o Norte-Nordeste do Brasil e o rio da Prata, distanciados por cerca de 5 mil km, poderiam ser interligados de forma mais eficiente. O Norte-Nordeste do Brasil é uma região que deve ter seu desenvolvimento eco-nômico e social induzido com vias adequadas, interligando-a às demais regiões.

Essa região tem ligações com Peru, Colômbia e Equador por vias navegáveis costeiras e fluviais de longa distância, conectando-se direta-mente ao Noroeste da América do Sul e ao Pacífico; também se liga à região Amazônica, que a interliga ao Pacífico. Essas regiões, no entanto, têm um comércio insignificante entre si. Uma conexão importante é a do Centro-Oeste brasileiro com o Norte boliviano através do rio Madei-ra. Esse rio pode ter um papel fundamental na integração, induzindo o desenvolvimento em várias regiões. É preciso usar eixos bioceânicos, e não somente costeiros, ligando a Amazônia com HUB Ports no Atlânti-co e no Pacífico, com um porto de transbordo centro-amazônico.

O fluxo de comércio intra-regional tem crescido fortemente nos últimos anos, tanto entre países do Mercosul quanto entre países do Mercosul e da Comunidade Andina de Nações (CAN). O comércio do Brasil com os países da América do Sul cresceu aproximadamente 73% entre 2002 e 2005. Assim, necessita-se urgentemente de oferta de infra-estrutura adequada para atender às demandas de um comércio

3 VIVACQUA, P.A., Stehling, S.M.F. (2001). Corredor Atlântico do Mercosul, Integ-raçãoSul-Americana e Navegação – questões estratégicas. In III Ciclo de Comércio Exterior do Vale do Paraíba, p. 3. São Sebastião - SP.

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crescente e pujante. Os recursos gerados por uma integração multimo-dal eficiente pagariam com sobras, em termos econômicos e sociais, os investimentos em transportes.

O Brasil corresponde a 47,8% do território da América do Sul e tem mais da metade do PIB e da população do continente. A integração re-gional sul-americana passa pela integração do território brasileiro, como base do processo. Algumas questões e projetos são importantíssimos para a integração, como a utilização do rio Madeira e da bacia amazôni-ca, do transporte de cabotagem e de ferrovias transcontinentais, como a que liga a malha brasileira ao Peru, e também a ponte Brasil-Guiana. Projetos ferroviários importantes são: (1) a construção da ferrovia Pan-Americana, ligando Caracas a Buenos Aires, juntamente com a ferrovia Norte-Sul e com ferrovias troncais, como a que propomos ligando San-tos a Arica, interligando a região; (2) a Transcontinental Norte, ligando o porto de Suape (PE) a Iquito, no litoral pacífico do Equador; (3) a ferrovia do Conesul, ligando o Sudeste-Sul à Grande Buenos Aires. Para atender a demanda desses projetos, é necessário estimular e capacitar a indústria fornecedora de máquinas e equipamentos para o setor.

As rodovias também demandam altos investimentos para recupe-ração, manutenção e construção de novas vias.

É preciso mais que duplicar a capacidade de transportes da ma-rinha mercante e investir em portos, capacidade de armazenamento, equipamentos, vias de acesso etc. Os portos de Sepetiba e Arica devem fazer o papel de superportos regionais, no Atlântico e no Pacífico.

A América do Sul tem cerca de 85 mil km de ferrovias, enquan-to os Estados Unidos, já no fim do século XIX, tinha em torno de 120 mil km, o que revela a baixa densidade ferroviária do nosso continente. Além disso, a região possui seis tamanhos de bitolas, como se vê na ta-bela a seguir, o que prejudica a integração ferroviária. É uma herança da era colonial. É necessário uniformizar tudo, gradativamente, na bitola ótima (em termos de capacidade e velocidade) de 1,435 metros.

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Rede ferroviária sul-americana por bitola da via (em km)

Bitola em metros1,676 1,600 1,435 1,067 1,000 0,914

Argentina 20.545 - 2.772 - 10.655 -Bolívia - - - 3.538 - -

Brasil - 3.472 194 - 25.784 -Colômbia - - 150 - - 2.688

Costa Rica - - - 950 - -Chile 4.311 - - 341 3.958 -

Equador - - - 965 - -Paraguai - - 441 - - -

Peru - - 1.782 - - 345Uruguai - - 3.001 - - -

Venezuela - - 634 - - -Total 24.856 3.472 8..974 2.306 43.935 3.033

Fontes: Jane’s World Railways, 1994, elaborado por Costa, 2003, p. 140.

É preciso usar as hidrovias subutilizadas, integrando as bacias do Orinoco, do Amazonas e do Paraná, de modo a ligar a Venezuela (Ciu-dad Guayana) à Argentina (Grande Buenos Aires). A ligação da bacia do Prata com a bacia amazônica passa por intervenções para resolver problemas de corredeiras nos rios Madeira e Mamoré. A bacia do Prata demanda uma série de ações e intervenções, como construções de bar-ragens e eclusas. A construção de um novo canal interoceânico ligando o Atlântico ao Pacífico, permitindo o fluxo de embarcações modernas, também é importante.

Uma questão de grande relevância no transporte de cargas intra-regional é o gargalo nas aduanas, por causa da burocracia, gerando per-da de tempo e maiores custos. É preciso unificar os procedimentos da burocracia aduaneira com as seguintes medidas: unificação das legisla-

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ções, integração dos sistemas de informática, processos simultâneos (e não seqüenciais) de trabalho das autoridades que tratam da liberação de cargas, ampliação da capacidade dos portos secos (o que exige inves-timentos na ordem de bilhões de reais) e mais técnicos dos ministérios da Agricultura de cada país. O Mercosul, desde sua criação jurídica, em 1994, prevê a integração aduaneira e determina a criação de áreas integradas de controle nas fronteiras, visando a simplificar os processos burocráticos de passagem de cargas e pessoas, embora isso não tenha ocorrido de fato. A aprovação do Código Aduaneiro do Mercosul vai uniformizar procedimentos aduaneiros no bloco.

O principal ponto de passagem de cargas da América do Sul, entre Uruguaiana (Brasil) e Paso de los Libres (Argentina), onde o Mercosul estabeleceu em 1997 que haveria controle integrado, também sofre com os problemas de burocracia, que atingem principalmente as exportações brasileiras (Góes, 17/05/2007).4 Segundo Góes, a liberação das importa-ções foi unificada no lado brasileiro – com a instalação de autoridades de ambos os países, enquanto a liberação das exportações brasileiras, que deveria se concentrar no lado argentino, ainda passa por duas etapas. “A exceção são os caminhões que circulam no regime ‘porta-a-porta’, cuja documentação é desembaraçada na origem ou no destino.” Dados da empresa que administra o porto seco rodoviário de Uruguaiana, Eadi Sul, citados por Góes, mostram que 667 veículos passam por lá todos os dias, em média; aproximadamente 70% deles (exportação e impor-tação) são liberados no primeiro dia; o tempo médio de permanência dos caminhões na importação é de aproximadamente doze horas; na exportação, o tempo médio é de cerca de cinco horas; o tempo médio de permanência tanto em importações quanto em exportações é de aproximadamente oito horas. A previsão de melhora dessa situação está

4 Góes, Francisco. “Mercosul sofre com gargalo aduaneiro”. In Valor Econômico (jor-nal), 17/05/2007.

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prevista para 2008, com o aumento da capacidade do Complexo Termi-nal de Cargas (Cotecar), no lado argentino, que permitirá concentrar os trâmites burocráticos das nossas exportações.

A integração das regiões por um sistema de transportes eficiente geraria sinergias, formando um grande mercado interno regional, com maior comércio, mais emprego e maior crescimento econômico, além de produzir maior identidade regional, rompendo o isolamento entre regiões. As conseqüências quadro atual são conhecidas: ineficiência, ne-gócios não realizados, má ocupação do território, concentração demo-gráfica, efeitos de polarização e de repulsão. O sistema de transportes é um instrumento fundamental para impulsionar a industrialização em todos os países da região.

A Iniciativa para a Integração da Infra-Estrutura Regional Sul-Americana (IIRSA)A IIRSA foi criada na I Reunião de Presidentes da América do Sul, re-alizada em 2000, em Brasília. Seu objetivo é prover o continente de uma infra-estrutura adequada nas áreas de transportes, comunicações e energia, que serviria como base para a maior integração comercial e social da região. Os projetos deveriam ser implementados em dez anos. No Comunicado de Brasília, resultante do encontro, as seguintes afir-mações revelam os objetivos do projeto: (i) complementação e expansão de projetos existentes e identificação de novos projetos de infra-estru-tura favoráveis à integração; (ii) identificação de fórmulas inovadoras de apoio financeiro para os projetos de infra-estrutura, de maneira a estimular a participação de investidores privados e a mobilizar todos os recursos possíveis.

Embora uma agenda regional de projetos de infra-estrutura, ela-borada por doze países da América do Sul, possa representar um avanço no processo de integração, devemos analisar a IIRSA de forma cuidado-sa para tentar identificar a forma de integração que está proposta ali.

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Um plano de infra-estrutura de transportes pode trabalhar basi-camente para duas formas de integração: (a) para integrar a região no comércio global, reafirmando e acentuando nossa tendência primário-exportadora (ou exportadora de commodities), com uma boa infra-estrutura voltada para fora, com conexões entre centros produtores e consumidores voltados apenas para o litoral, sem ligações adequadas e eficientes entre si; (b) para realizar a integração regional, ligando centros produtores e urbanos da própria região, encurtando as distâncias com transportes multimodais eficientes e baratos, fomentando a produção industrial dos países da região e acelerando uma integração dinâmica, com vantagens competitivas na produção e comercialização de bens in-dustriais de alta intensidade tecnológica e valor agregado, além de ligar os países ao comércio internacional, garantindo, porém, uma inserção soberana. A primeira forma geralmente vem associada ao Estado neo-liberal: privilegia a participação do setor privado nos investimentos e sustenta o Estado mínimo.

Desde o início, a IIRSA foi tratada pelo governo brasileiro com uma visão estritamente técnica, e não político-estratégica. Sua condu-ção ficou a cargo de uma comissão interministerial, criada em 2001 pelo governo Fernando Henrique Cardoso, formada pelo Ministério do Pla-nejamento, que exerce a coordenação, e os ministérios dos Transportes, das Minas e Energia e das Comunicações; o Ministério das Relações Ex-teriores não foi incluído. Os trabalhos técnicos da IIRSA seriam orien-tados pelas prioridades estabelecidas pelos governos a partir de um conselho de ministros de planejamento e de infra-estrutura dos países participantes – o Comitê de Direção Executiva.

Inicialmente, os países apresentaram 335 projetos de infra-estrutu-ra, de diferentes graus de maturação e natureza, no valor total de US$ 38 bilhões (Couto, 2006, p. 63) – aproximadamente 1,6% do PIB do Brasil.

Seguindo a proposta de Eliezer Batista e aproveitando a experiên-cia brasileira de planejamento, a análise técnica do IIRSA privilegiou os

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seguintes eixos: eixo Andino, eixo Andino do Sul, eixo de Capricórnio, eixo da Hidrovia Paraguai-Paraná, eixo do Amazonas, eixo do Escudo Guayanés, eixo do Sul, eixo Interoceânico Central, eixo Mercosul-Chile, eixo Peru-Brasil-Bolívia (o mapa da região dividida por eixos está dis-ponível em www.iirsa.org). Além disso, a análise técnica também está dividida em processos setoriais a serem privilegiados: transporte multi-modal, transporte marítimo, transporte aéreo, tecnologias da informa-ção e comunicações, passagens de fronteira, instrumentos de financia-mento e integração energética.

A coordenação dos trabalhos e dos grupos técnicos (GTEs, respon-sáveis pela execução dos trabalhos) cabia a agências multilaterais de fo-mento, como o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), com grande influência norte-americana, a Corporação Andina de Fomento (CAF) e o Fundo para o Desenvolvimento da Bacia do Prata (Fonplata), que formariam o Comitê de Coordenação Técnica (CCT), estabelecido como secretaria-executiva. A partir do agrupamento de projetos realiza-do pelo GTE, o CCT, baseado em diagnósticos das principais atividades econômicas e de seus fluxos de comércio (reais e potenciais), realizava um processo técnico de hierarquização e priorização dos projetos da IIRSA. Além disso, o CCT era responsável por contratação de estudos e consultorias que orientassem a tomada de decisão dos países sobre os projetos e avanços do processo de integração física.

Segundo Couto (2006), essas delegações buscavam aproveitar a maior agilidade das agências, driblando restrições orçamentárias e le-gais dos Estados, o que permitiu o avanço e a continuidade do projeto, embora sem institucionalidade. Por outro lado, delegava-se demasiada influência às agências, que têm interesses próprios na região, especial-mente o BID.

Na III Reunião dos Presidentes da América do Sul, realizada em Cuzco, Peru, em 2004, foi consolidada a AIC, acordada pelos doze países da região, apresentando 31 projetos – 28 em transportes, um em energia

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e dois em comunicações – que seriam eleitos como prioritários para a integração física da região. Esses projetos seriam implantados entre 2005 e 2010. De acordo com o plano de ação confeccionado para a IIR-SA, eles teriam valores inferiores a 5 bilhões de dólares. Todos os países foram contemplados com pelo menos um projeto. Os 28 projetos na área de transportes se dividem da seguinte forma: 24 rodoviários, dois hidroviários, dois ferroviários e um dutoviário (o gasoduto Nordeste, identificado como projeto na área de energia). Assim, o IIRSA tende a reafirmar a predominância do modal rodoviário, de mais alto custo, dificultando a interconexão entre centros e a exploração de sinergias.

Uma visão estritamente técnica e a influência das agências multi-laterais determinaram o critério de análise e a seleção/hierarquização dos projetos. Conseqüentemente, também determinaram a Agenda de Implementação Consensuada (AIC) e o seu traçado viário, que é baseado nos impactos no aumento dos fluxos de comércio e da competitividade de bens e serviços existentes na região, bem como na atração de inves-tidores privados. Assim, o projeto – mais especificamente, a AIC – pri-vilegia uma visão estática no longo prazo, bem como a participação dos bancos multilaterais e da iniciativa privada, retirando os Estados das atividades de financiamento.

O traçado viário da AIC fortalece uma infra-estrutura voltada para fora, planejada para expandir a competitividade e as complementarida-des estáticas da região, perpetuando os países na condição de subde-senvolvimento. Assim não se promove uma integração industrializante baseada em ganhos recíprocos e dinâmicos de longo prazo, como ocor-reu na Europa. Dos 31 projetos apresentados na AIC, somente um já foi inaugurado, a ponte sobre o rio Acre (Brasil-Peru), que serve para escoar bens primários (principalmente a soja) para o Pacífico. Outros dez projetos estão em execução.

Parece que a AIC partiu do pressuposto de que o problema de infra-estrutura de transportes está resolvido no Brasil – o que está lon-

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ge da verdade. Nenhuma das obras de infra-estrutura que propomos aparece na AIC. Além disso, ela não apresenta projetos que liguem a Amazônia aos principais centros da região.

Pode-se notar, conforme Couto (2006, p. 68), que os reflexos do Estado neoliberal “se fizeram sentir também no âmbito das relações re-gionais (...). A formação do Mercosul, que previa integração industrial e desenvolvimento, foi deliberadamente desviada para questões mera-mente comerciais. E a integração física sul-americana com [Fernando Henrique] Cardoso admitia um papel reduzido aos Estados, delegando às agências regionais de desenvolvimento e à iniciativa privada o papel de incentivadores e executores do processo. (...) De fato, isso gerava, à primeira vista, algumas ambigüidades. A primeira delas diz respeito à delegação da secretaria-executiva às agências multilaterais: CAF, BID e Fonplata. Na mesma linha, nos trabalhos da iniciativa, chama a atenção a ausência do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), segundo maior banco de investimento do mundo e ator-cha-ve para a promoção da indústria nacional. Por outro lado, foi permitida a presença do BID, no qual é forte a influência norte-americana.”

Durante o predomínio de governos neoliberais na América do Sul, com o governo Fernando Henrique Cardoso no Brasil, a IIRSA e a AIC foram projetos de bancos multilaterais, e não de Estados, privilegiando a participação privada, trabalhando para a integração da região ao co-mércio internacional, uma infra-estrutura voltada para fora.

Quanto à questão do financiamento, ponto crítico do projeto, de-veria haver uma atuação conjunta do BNDES e da CAF, além da cria-ção do Banco del Sur e de fundos estruturais – por meio de consórcios entre os países, com contribuições proporcionais à posição econômica dos países da região. É necessário que os Estados da região mudem a postura neoliberal para que haja maiores recursos disponíveis para in-vestimento, especialmente em infra-estrutura, que tem efeitos multipli-cadores por toda a economia.

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O BNDES tem atuado a favor da integração física, com ações bila-terais. Em 2003, o BNDES e a CAF promoveram o primeiro seminário conjunto de co-financiamento de projetos para integração sul-americana, inserindo o BNDES no processo de integração física do continente e tra-tando de projetos não contemplados pela IIRSA (Couto, 2006, p. 69). 5

Além disso, o BNDES tem financiado exportações de bens e servi-ços de empresas brasileiras para a execução de vários projetos em países da América do Sul, como: tubos e serviços de engenharia para constru-ção de gasoduto na Argentina (US$ 237 milhões); vagões de metrô para o Chile (US$ 153 milhões); aviões da Embraer e construção da usina hidrelétrica de San Francisco no Equador (US$ 304 milhões); bens e serviços de engenharia para construção de estrada no Paraguai (US$ 77 milhões); a usina hidrelétrica La Vueltosa e linhas de metrô, entre outros, para a Venezuela (US$ 352 milhões).6

Essas formas de financiamento impulsionam a integração que de-fendemos, com uma visão estratégica de longo prazo, pois se destinam a bens e serviços de alto valor agregado e alta densidade tecnológica. Defendemos uma integração que gere ganhos recíprocos, na qual o Bra-sil deve desempenhar o papel de exportador de bens de capital e servi-ços, abrindo seu mercado às manufaturas dos demais países – tal como ocorreu na integração européia, com a Alemanha desempenhando o papel de pivô comercial.

Desde o início do governo Lula, o Brasil definiu como prioridade as relações diplomáticas e econômicas com os demais países da América

5 Primeiro Seminário Internacional de Co-financiamento BNDES/CAF: Prospecção de Projetos de Integração Sul-americana, que objetivava identificar projetos de infra-estrutura a serem financiados pelos dois organismos em todos os países da América do Sul, passando ao largo dos objetivos, da concepção adotada e do projeto da IIRSA. Devemos lembrar que o BNDES criou um departamento específico para tratar do assunto integração sul-americana (idem).6 Fonte: Palestra do então Ministro do Planejamento Guido Mântega, disponível em www.planejamneto.gov.br/arquivos_down/spi/iirsa/Guido_Mantega_IIRSA_23nov.PPT.

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do Sul, abandonando a simples retórica e a visão economicista prati-cadas pelo governo anterior.7 A integração física e o IIRSA têm toma-do um rumo mais coerente com a integração regional. As deficiências apontadas na AIC têm sido superadas, e os demais projetos presentes na IIRSA, que privilegiam uma integração estratégica com interliga-ções entre os principais centros regionais, têm sido contemplados pelos atuais governos da região, com o BNDES tendo maior participação no processo. Os governos tomaram as rédeas do processo de integração de transportes, suplantando a proeminência e os interesses dos bancos multilaterais e do capital privado.

7 A posição política do Governo se reflete já na formação do Ministério das Relações Exteriores e na própria estrutura do Itamaraty. O chanceler Celso Amorim, em seu discurso de posse do Ministério, defendeu o aprofundamento da integração entre os países da América do Sul. Na estrutura do Itamaraty, a América do Sul, que antes era acompanhada dentro do Departamento das Américas, ganhou uma subsecretaria específica, vinculada diretamente à Secretaria-Geral e, assim, ao Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, que sempre se declarou contrário à Área de Livre Comércio das Américas (ALCA) e favorável à integração sul-amer-icana. Para Guimarães (2002, p.146), em sua obra Quinhentos anos de periferia, a “América do Sul é a circunstância inevitável, histórica e geográfica do Estado e da sociedade brasileira”. Essa opção política se evidenciou em ações políticas logo nos primeiros meses de Governo Lula, como: a defesa de Hugo Chávez e participação na formação do Grupo dos Amigos da Venezuela; a primeira viagem de Lula como presidente eleito à Argentina e o apoio a Néstor Kirchner como candidato à presidência; nos financiamentos concedidos pelo BNDES para financiar obras de infra-estrutura à Venezuela; no compromisso da construção de uma ponte Brasil-Peru, entre os municípios de Assis Brasil (Acre) e Iñapari.

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V. Breves considerações finais

Ao longo deste estudo, observamos o quadro alarmante da infra-es-trutura de transportes no Brasil. Os grandes problemas apontados têm como origem um Estado que dá prioridade às finanças, e não à econo-mia produtiva. Daí decorre a falta de investimentos e de planejamento em transportes, um setor de interesse público e estratégico. A oferta de transportes deve andar sempre à frente da demanda para que não haja entraves ao desenvolvimento, ou seja, para que o país não perca oportu-nidades. Como vimos, investimentos realizados de forma desordenada tendem a agravar a situação. A existência de uma infra-estrutura vol-tada para fora, atendendo regiões produtoras de commodities de baixo valor agregado e baixa intensidade tecnológica, reforça a nossa posição histórica na divisão internacional do trabalho e exerce efeitos polariza-dores dentro do país.

A matriz de transportes brasileira apresenta demasiada concentra-ção no modal rodoviário: mais de 60% dos transportes de cargas e mais de 90% dos transportes de passageiros. Este é o modal mais caro e me-

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nos eficiente para transportes de longa distância e em grandes volumes, quando comparado aos modais ferroviário e aquaviário, que têm pe-quena participação na matriz de transportes de cargas: 20,7% e 13,6%, respectivamente. É necessário reestruturar a matriz de transporte de cargas, no longo prazo, de modo a chegarmos a 40% no modal ferrovi-ário, 20% no rodoviário e 40% do aquaviário – considerando somente a distribuição de participação entre esses modais.

Cerca de 75% das rodovias são classificadas pela CNT como pés-simas, ruins ou regulares. As estradas apresentam problemas de sinali-zação, pavimentação e/ou geometria. Ou seja, o transporte está concen-trado num modal mais custoso e com problemas na maior parte de sua infra-estrutura. Além dos altos investimentos para reestruturar a ma-triz, é preciso realizar investimentos urgentes na própria infra-estrutura rodoviária.

O pífio investimento estatal em transportes – média de 0,2% do PIB ao longo dos últimos anos – tem se concentrado no modal rodo-viário, ultrapassando 4/5 do total, o que tende a manter e reproduzir o quadro atual.

A malha ferroviária apresenta uma série de gargalos físicos e lo-gísticos. Esses entraves comprometem a competitividade, a eficiência e a capacidade da malha nacional e dos corredores de transporte ferro-viários. Os principais gargalos de infra-estrutura são construções irre-gulares às margens das vias, excesso de passagens em nível críticas nas malhas, problemas de expansão e integração, inclusive no tráfego entre malhas de diferentes operadoras, diferenças de bitolas, gargalos logísti-cos (acesso limitado aos portos, corredores com pouca capacidade), fal-ta de oferta para ampliação e reforma do material rodante (com inves-timentos prejudicados pela taxa de juros da economia) e superestrutura deficiente (terminais multimodais, terminais de transbordo).

Após as privatizações, em meados da década de 1990, os investi-mentos no setor aumentaram e houve melhoras operacionais. No en-

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tanto, a malha ferroviária nacional ainda opera distante das condições ideais. Seus principais problemas demandam ações e investimentos que só o Estado pode realizar. Segundo a Pesquisa Ferroviária CNT 2006 (p. 111), “o setor ferroviário privado calcula a necessidade de investimento de cerca de R$ 1,5 bilhão na construção das principais variantes – linhas alternativas que evitam os traçados antigos que apresentam fortes su-bidas e sinuosidades”. Estimamos que R$ 3,5 bilhões sejam necessários para solucionar os problemas de curto e médio prazo do setor.

O modal aquaviário é pouco competitivo. A bandeira brasileira é cada vez menos significativa na navegação internacional, com o sucate-amento da marinha mercante, impulsionado pelo processo de privati-zação, acarretando maior dispêndio de divisas para pagamento de fretes no comércio exterior – cerca de R$ 6,5 bilhões por ano. Já a navegação de cabotagem, que deve ser fundamental para os transportes de cargas no Brasil e na América do Sul, é pouco utilizada e se ocupa essencial-mente de granéis líquidos e sólidos. Em um país com a dimensão terri-torial e costeira do Brasil, com abundância de rios, o modal aquaviário deve ser um importante instrumento de transporte interior e exterior, de cargas e de passageiros.

Os portos brasileiros enfrentam uma série de problemas de curto, médio e longo prazo para a operação eficiente. O setor privado não reú-ne condições ou interesse de realizar os investimentos necessários. Os principais problemas são: (a) processos burocráticos, informatização e dimensionamento/treinamento de mão-de-obra; (b) manutenção inefi-ciente dos portos, principalmente no que diz respeito à regularidade na dragagem; (c) falta de manutenção regular na criação e especialização de berços, dragagem e expansão de retroáreas para contêineres e ar-mazéns, aumentando a disponibilidade logística, modernização e aqui-sição de equipamentos, e principalmente equipamentos de transbordo (guindastes móveis, portêineres, transtêineres, sistemas de recepção e expedição, ship-loaders etc.); (d) melhora na infra-estrutura e em aces-

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sos rodoviários, ferroviários e aquaviários, bem como ações de integra-ção dos portos aos demais modais; (e) construção de novos terminais; (f) revisão do marco regulatório e saneamento das companhias Docas, para que elas sejam auto-sustentáveis e financeiramente saudáveis, com gestão profissional, voltadas ao desenvolvimento dos portos, aumentan-do a capacidade de gestão e de investimento; (g) necessidade de finan-ciamentos direcionados para a modernização e aumento da capacidade dos portos, tendo em vista acompanhar o crescimento de demanda e, principalmente, fazer a oferta andar na frente da demanda; (h) existên-cia de alguns portos sobrecarregados (como o de Santos) e outros subu-tilizados (como o de Itaguaí).

O Brasil possui cerca de 43 mil km de rios, dos quais 28 mil km são navegáveis. Destes, apenas 10 mil km de hidrovias são utilizados, o que mostra uma subutilização dos rios e do modal hidroviário, que tem grande potencial de crescimento. Tendo em vista melhorar a navegabi-lidade de diversos trechos fundamentais para desenvolver o setor hi-droviário de navegação interior no Brasil devem ser feitas intervenções como dragagem, construção de terminais, represamento, construção de eclusas, canais para rios sinuosos etc. A navegação interior tem impor-tância apenas na região Norte, tendo pequena participação relativa nas demais regiões por causa da rigidez operacional e/ou baixa adequação geoeconômica (ressalve-se a importância crescente da hidrovia Tietê-Paraná). Nas obras de engenharia, devem ser utilizados os comboios tipos máximos sempre que possível.

Quanto aos gargalos operacionais do setor a serem resolvidos, des-tacam-se o dimensionamento e o custo da mão-de-obra nos portos, a informatização dos procedimentos, a racionalização dos processos bu-rocráticos, a superação de impasses referentes a aspectos legais e à legis-lação ambiental, de modo a desatar nós para uma ação governamental eficiente, o estímulo a operações de cabotagem, transbordo e serviços de feeder e navegação interior.

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O transporte dutoviário no Brasil ainda é muito incipiente, princi-palmente diante da extensão do país, e participa apenas marginalmen-te do transporte de cargas. Como a infra-estrutura dutoviária é mais direcionada aos combustíveis, o seu desenvolvimento tem ficado mais a cargo do setor de energia. A infra-estrutura de gasodutos é pouco de-senvolvida. Esse é o principal problema do setor, que pode ser atribuído ao maior enfoque da Petrobras na questão do petróleo, tendência que deve se reverter por causa do aumento da importância do gás na matriz energética nacional.

O transporte aéreo, que tem crescido continuamente, sofre com falta de planejamento e com uma visão que o separa dos demais meios de transporte e da vida nacional. Além disso, não há controle eficaz sobre os recursos gastos no setor. Seu crescimento desordenado tem levado a concentrações das operações em alguns aeroportos sobre-uti-lizados, como o de Congonhas (SP), e subutilização de outros, como o Galeão, o que tem levado a diversos problemas. A tendência do setor no transporte de cargas é de crise em aproximadamente três anos, caso os investimentos previstos não sejam realizados de forma ordenada.

Dois fatores de grande peso nos custos de transportes e logísticos brasileiros, sem dúvida, são a concentração no modal rodoviário e a falta de intermodalidade. A intermodalidade dá a opção de usar o mo-dal mais barato no transporte de mercadorias no momento adequado. É preciso que o Brasil implante um sistema de transportes intermodal, aproveitando-o em toda sua potencialidade, com apoio logístico mo-derno e eficiente.

Os principais problemas em logística são: oferta inadequada, com escassez de espaço para armazenamento de grãos nas áreas produtoras; gargalo nas estradas de aproximação aos portos, especialmente Santos; estradas em más condições, demandando de grande volume de inves-timento em restauração e manutenção; frota de caminhões com idade média alta (estimada em cerca de vinte anos); estradas de ferro pouco

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rentáveis e com necessidade de investimentos significativos; utilização precária do transporte aquaviário e da navegação de cabotagem.

As ações de integração nacional e intermodal devem ser acom-panhadas de outros investimentos, como estradas alimentadoras, ter-minais e pátios intermodais, armazenagem nas propriedades, terminais portuários especializados etc. Nesses casos, a intervenção governamen-tal poderá contar com expressiva participação do setor privado como investidor direto e/ou na montagem de esquemas de financiamento. A infra-estrutura logística exige ação conjunta de todas as esferas execu-tivas do poder público, de empresas privadas, cooperativas, associações de produtores e outras entidades da sociedade civil, visando a superar problemas no interior de microrregiões, cidades, distritos etc.

Segundo cálculos da CNT (Pesquisa Rodoviária 2006), os inves-timentos necessários para que o sistema rodoviário alcance um padrão adequado de segurança e desempenho são estimados em R$ 22,2 bi-lhões (0,9% do PIB, para a metodologia de cálculo do PIB adotada em 2007 pelo IBGE, e em torno de 1,1% para o cálculo anterior). Como ob-servamos, são necessários investimentos anuais da ordem de 2% do PIB, no mínimo, para mudar em quatro anos a infra-estrutura de transportes do país, iniciando a reestruturação da matriz. Pode-se argumentar que esse valor é alto e não condiz com a realidade das contas brasileiras. No entanto, observarmos que o Brasil economiza 4,9% de seu PIB para pa-gamento de juros da dívida e paga 8,1% do PIB nesses juros. Tem que ser viável essa proporção de investimentos em um setor prioritário. Países como Venezuela, Argentina, Rússia e Malásia, entre outros, têm inves-tido entre 2% e 6% PIB em infra-estrutura. Os recursos da Cide, ainda que só alcancem 0,4% do PIB, devem ser usados em investimentos em infra-estrutura de transportes e não desviados para outros gastos, como tem ocorrido.

Um novo ciclo de desenvolvimento, que pretenda superar as de-ficiências de nosso modelo, deve enfrentar o desafio de integrar ple-

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namente todas as regiões, reestruturando a matriz de transportes, de modo a estabelecer vias de comunicação adequadas à integração desse arquipélago de espaços geográficos chamado Brasil. E deve ir mais além, propondo a integração física de todos os espaços da América do Sul.

Aproveitar a multiplicidade de nossas vias naturais, representadas pelo extenso litoral e as bacias interiores, integrando-as com modais de maior capacidade – navegação de cabotagem e fluvial e ferrovias –, bem como buscar a integração entre os espaços de tráfego condominiais de que participamos e dos outros que atendam a interesses estratégicos mútuos – nossos e de nações vizinhas – é uma tarefa necessária se qui-sermos obter o máximo de produtividade de nossa economia.

O planejamento da matriz de transportes é o principal instrumen-to de superação de nossas deficiências. Com a ausência de um planeja-mento para a infra-estrutura e, em especial, para o setor de transportes, com programas e projetos de curto, médio e longo prazo, os imediatis-mos do mercado reproduzirão os erros do passado, agravando o quadro existente.

É importante uma regulação eficiente, na qual o poder concedente garanta uma visão estratégica e econômica de longo prazo e as agências reguladoras atuem de acordo com o interesse público. Um programa de infra-estrutura de transportes deve contemplar os princípios gerais que apresentamos: visar a integração, indução e irrigação; promover uma alteração na matriz, explorando a intermodalidade em toda sua potencialidade, tendo em vista maior eficiência no sistema; observar os aspectos logísticos associados às diferentes formas de transporte e à intermodalidade; integrar o espaço brasileiro e sul-americano (com reorientação da IIRSA).

Como vimos, as principais áreas de concentração econômica e po-pulacional da América do Sul encontram-se praticamente desconecta-das entre si e concentradas na faixa litorânea, voltadas para o comércio exterior. O potencial de comércio entre essas áreas, especialmente entre

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as áreas do Atlântico e do Pacífico, não são devidamente explorados. A extensão da região e a distância entre seus centros exigem vultosos flu-xos de transportes de longa distância, em sua maioria realizados através do modal rodoviário, gerando altos custos à produção e ao comércio. Tais custos são obstáculos maiores que as tarifas à efetiva integração sul-americana.

O projeto da IIRSA deve ser aproveitado para impulsionar obras que interliguem as principais regiões econômicas da América do Sul, fomentando uma integração regional dinâmica, baseada na produção industrial e no desenvolvimento dos países da região, e não uma inte-gração meramente econômica, baseada no comércio exterior e voltada para fora.

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