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Quando alguém instiga: questionando Ronai Rocha Gisele Secco UFRGS

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Quando alguém instiga: questionando Ronai

RochaGisele Secco

UFRGS

Quando alguéminstiga: questionando

Ronai Rocha

§ Há uma “dificuldade da objetividade” implicada na confecção desta apresentação sobre a “caderneta de campo muito pessoal” do Prof. Ronai;

§ O livro é um desafio:

§ 1. Mobiliza um arsenal conceitual pouco conhecido por parte de certos auditórios – a quem, aparentemente, o livro se dirige;*

§ 2. Suas teses e argumentos podem ser, a despeito da mesma clareza, mal interpretadas por certos e variados auditórios e, por conseguinte, munir argumentos e ações política e ideologicamente problemáticos no contexto atual;

§ 3. A transparência e a dinâmica de seu estilo podem induzir leituras ligeiras**

Um livro em trêspartes

Introdução

Primeira parte

O currículo e as competições ferozes Onde nos extraviamos? O currículo como iniciação O currículo como mensagem Formas do conhecimento “Ninguém educa ninguém” Variedades do conhecimento

Segunda parte

Currículo e epistemologia O resgate do uno

Terceira parte

Primeira série de lembrançasSegunda série de lembrançasTerceira série de lembrançasQuarta série de lembrançasQuinta série de lembranças

Currículo e epistemologia

Duas interdisciplinaridades

O resgate do unoA interdisciplinaridade e o “professor fragmentado” As primeiras caracterizações da interdisciplinaridade O segundo afloramento da interdisciplinaridade O mistério da multiplicação das áreas de conhecimentoO resgate do uno

Terceira série de lembrançasAs disciplinas escolares...

Quarta série de lembrançasA interdisciplinaridade como teoria e como panaceia ...

… e quatro parábolas

Quando alguéminstiga: questionando

Ronai Rocha

§A quem se dirige o livro?

§É relevante perguntar-se “desde onde” foi escrito?

§Com quais finalidades foi escrito?

§Seria o momento de realizar este tipo de questionamento ao patrono da educação nacional?

§O que este livro faz?

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Essesconceitos–eeunãoprocureiserexaustivo-fazempartedeum

vocabulárioquedeveserlevadoemconsideraçãonodesenhocurricularepedagógico,poiscadaumdelesindicaumadimensãorelevantedaformaçãoeaprendizadoshumanosquepodeseradequadamenteprojetadanosestudoscurriculares.Paranãodeixaresseassuntosemumailustração,vejaoquadroa

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seguir:

Alinhahorizontalinferior,noquadroacima,indicaoeixoontológico,que

simbolizaalocalizaçãodeumindivíduoemumalinhadetempo.Alinhasugere,

nocantoesquerdo,onascimentodecadaumdenósnoâmbitonalínguamaterna

eanossainscriçãoposteriornasociedademaisampla,pormeiododomínioda

línguaescritaepelaelaboraçãodenovasidentidades,maisamplasdoqueaquela

dafamília.

Alinhaverticalindicaoeixoepistemológico,quesimbolizanossainserção

nomundodosconhecimentos,cujaapropriaçãoé facilitadapelaescola.A linha

sugere uma hierarquia, entre outras possíveis, entre esses conhecimentos,

quando consideramos a proximidade deles em relação ao mundo da vida do

educando.Époressarazãoquesurgeotriângulointerno.Eleindicaopontode

partida inevitável da relação pedagógica, constituído pelo mundo da vida

cotidiana e pelos conceitos domundo comum. É a partir dele que o educando

podeapropriar-sedos conceitos complexospropostospelo currículo.As linhas

cheiassugeremosfatosdosquaispartimos;oprincipaldeleséqueoeducando

Currículo e epistemologia

§ Não são expressões estranhas uma à outra; Em tempos de “discussão” sobre a BNCC, “(...) fala-se sobre muita coisa e pouco sobre os critérios conceituais que devem presidir as decisões de desenho curricular

(...)”;

§ O PNE renova pressões anteriores para práticas curriculares interdisciplinares nas escolas, o que supõe planejadores “boa noção das características dos domínio da experiência e do conhecimento que serão alvo do currículo”;

(Parte II, cap. 8, p. 94)

“Perguntas singelas”

§ Como compreendemos a estrutura conceitual peculiar de cada disciplina?

§ Há alguma organização implícita nas disciplinas?

§ Em que consiste isso?

§ E quando consideramos o currículo como um todo, o que há ali de estrutura implícita?

§ Como se dá a correlação de conceitos, nas disciplinas e no currículo?

§ Existem (quais são?) tipos de organizações implícitas que podemos identificar no currículo e nas disciplinas?

§ Quais são as formas fundamentais de experiência e conhecimento humanos?

§ Quais são as relações entre os conceitos em cada área do conhecimento?

(Ainda p. 94)

Duas interdisciplinaridades

(p. 95)

“O interdisciplinar escolar...

“é uma tarefa curricular e didático-pedagógica. É curricular porque pode ser antecipada nas fases de macroplanejamento, é didático-pedagógica porque sua realização efetiva na escola

depende da mobilização de vontades particulares, da sensibilidade aos contextos de aprendizagem e da

subordinação aos objetivos formacionais.”

• A demanda crescente por interdisciplinaridade na escola se intensifica conforme os fracassos na realização dos fins da escola são reconhecidos;

• Como exercê-la?

• Mais do que isso: ela força o nível superior de ensino a busca-la em seu contexto (cf. “As licenciaturas”, p. 136).

(p.95)

O resgate do uno

• Nas epistemologias curriculares em voga, as disciplinas são “mera” herança de um cartesianismo sempre mal caracterizado; (minha expressão)

• Ronai apresenta dois momentos de instituição da interdisciplinaridade como demanda em documentos do MEC;

• Aponta para a falta de explicitação de critérios dos curriculistas (o caso da Matemática);

• Mostra como no caso de documentos oficiais do RS as coisas desandam (pp. 108-9);

• Aponta, de modo crítico, para situação na qual nos encontraríamos se, no limite, uma “democracia epistemológico-curricular” se instituísse;

(pp. 99-110)

“uma posição radical...

... que postularia a igualdade de direitos entre as disciplinas e, portanto, uma divisão igualitária das cargas horarias: divide-se o número de disciplinas pela disponibilidade de horas na semana escolar e voilá, teríamos uma espécie de democracia epistemológico-curricular. A premissa dessa posição seria a crença que todas as disciplinas são igualmente importantes e nenhuma pode ter privilégios quanto ao tempo escolar. Tal crença na igualdade democrática das disciplinas implicaria um conjunto adicional de crenças sobre a natureza e o papel delas no crescimento e na formação humanas. Ora, estaríamos aí no núcleo duro de uma discussão de epistemologia e currículo, no inicio de uma longa conversa sobre a natureza dos conhecimentos, habilidades e competências que queremos promover na escola. Seriam necessárias melhores evidências de nossa penúria do que trechos como o que citei acima e a simples possibilidade dessa ‘democracia epistemológica’ ser defendida?”

(p. 110-11)

As disciplinas escolares

• Vivemos em um clima conceitual pautado por muitos especialistas do

esfarelamento curricular; ocorre aí um “triplo jogo de faz de conta”, em que:

§ A. Manter as disciplinas implica fragmentações já insuportáveis;

§ B. A escola deve visar a unificação;

§ C. Áreas de saber são unidades pedagogicamente operacionais.

§ A. “a diversidade de disciplinas não é o resultado de caprichos burocráticos. Ela expressa apenas o fato trivial que cada uma das

disciplinas tradicionais é uma faceta peculiar da curiosidade humana, com suas características e nuances.”

§ B. Não podemos confundir os anseios por um sentimento de unidade na vida de cada um de nós com a fantasia de uma unidade do

conhecimento. O que isso significaria: uma mesma metodologia operacional aplicada a todas as ciências?”

§ C. A pesquisa sobre a integração das disciplinas em áreas, se existe, não chega nem às escolas nem aos livros. A prática usual de uma escola é a do “cada um por si”, mas isso nada tem a ver com uma suposta falta de

unidade do conhecimento humano, é apenas uma falha no trabalho de formação pedagógica.

(p. 131)

“O que fazer?”

“Poderia me dizer, por favor, que caminho devo tomar para ir embora daqui?”

“Depende bastante de para onde quer ir”, respondeu o Gato. “Não me importa muito para onde”, disse Alice.

“Então não importa o caminho que tome”, disse o Gato. “Contanto que eu chegue a algum lugar”,

Alice acrescentou... “Oh, isso você ̂certamente vai conseguir”, afirmou o Gato,

“desde que ande bastante”.

[Alice no país da maravilhas, Lewis Carrol]

“O que fazer?”

• Não podemos decidir como seguir se não entendermos como chegamos até onde estamos. Nossas principais dificuldades:

- Democratização do acesso à escola sem a devida atenção em termos de políticas de acolhimento do “novo publico”, e consequente queda de qualidade do ensino e das aprendizagens;

- Ênfase desmedida em leituras sociológicas e políticas das relações educacionais, em detrimento de estudos curriculares epistemologicamente tratados;

- A pesquisa pedagógica prática é melhor em áreas que se dedicam há mais tempo (Ciências Naturais e Matemática, por exemplo);

- E na Filosofia?- Os filósofos, ocupados que estavam com a afirmação de sua

área, dispunham de pouco tempo para pensar os problemas curriculares e didáticos de seu ensino no médio.

As licenciaturas

(p. 136)

• E a expansão da universidade brasileira;

• Sua “bacharelização”;

• Diferenças (bacharelado versus licenciatura) que nos mantém presos: Como supera-las?

“Aqui predomina o ceticismo. A formação docente que ocorre no interior das universidades ainda não encontrou um formato

adequado, mas isso pouco tem a ver com boas ou más vontades. Há fatores objetivos que concorrem para isso. O principal deles é

que o ciclo de afirmação dos departamentos de conhecimento básico, que são essenciais para as licenciaturas, ainda está em

curso. As melhores energias institucionais ainda se concentram na fixação da identidade profissional de cada disciplina e na

construção de uma rede de pós-graduação. ”

“Por outro lado...

(...) não há confusão conceitual entre o campo conceitual da disciplina e o campo conceitual da formação do licenciado. A matemática, por exemplo, não é uma didática. A matemática é um campo da curiosidade humana, um campo de conhecimentos específicos e delimitado epistemologicamente em relação a outros. O ensino dela constitui uma área a parte. Haverá então e sempre uma separação natural entre a disciplina especifica e a formação do professor da área, e isso depende da elaboração de um saber específico.”

No caso da filosofia, esta confusão não só existe “A filosofia é uma didática”), como é causa de dificuldades nas conversas sobre as especificidades do curso de licenciatura; senão vejamos:

Como estão sendo construídas as reformas curriculares induzidas pela resolução do CNE?

Estamos considerando, nelas, o tópico “interdisciplinaridade”?

O “sentimento de obra” e os currículos

das licenciaturas

Encerro refazendo meus pontos de crítica:

1. Quanto ao tipo de pesquisa que nos permitiria avaliar melhor a instauração de currículos epistemologicamente democráticos: o que podemos com conceitos?

2. Quanto ao comprometimento dos Departamentos de Filosofia (Graduações e Pós-graduações) nas discussões sobre ensino: é pouco mesmo o papel das vontades, e maior o das questões “objetivas” (consolidação da identidade e da rede de PG)?

3. Nas reformas curriculares das licenciaturas: como podemos aplicar o que em QNE é pensado na direção da escola? Quais adaptações são necessárias para que apliquemos as críticas feitas no livro aos departamentos alheios sobre nós mesmos ?

QNE: o que sugere?

Reconhecer evidências

Criticar o criticável

Defender o defensável

Aprimorar o aprimorável

A dificuldade da objetividade, seu retorno

Tolstoi: o significado (a importância) de algo reside em sua compreensibilidade geral. – Isso é verdadeiro e falso. O que dificulta a compreensão de um tópico – se há algo significativo e importante – não é que antes de poder entendê-lo você deva ser especialmente treinado em assuntos abstrusos, mas o contraste entre compreender o tópico e o que a maioria das pessoas quer ver. Por causa disso as coisas mais óbvias podem se tornar as mais difíceis de compreender. Não é relacionada ao entendimento que uma dificuldade precisa ser superada, senão à vontade.

Wittgenstein Cultura e Valor

Obrigada!

§ ROCHA, R.P. da (2017) Quando ninguém educa –questionando Paulo Freire. São Paulo: Contexto.

§ WITTGENSTEIN, L. (2000) Cultura e valor. Lisboa: Edições 70.