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CONVERSA COM JOÃO SEMEDO: No reino da paz podre FARMÁCIA PORTUGUESA PUBLICAÇÃO TRIMESTRAL 204 OUT/NOV/DEZ ‘13 ENTREVISTA ROSÁRIO ZINCKE: “Água mole em pedra dura…” CONGRESSO ANF EXPOFARMA: Edição de 2013 foi um sucesso O NOVO CONTRATO SOCIAL PARA A FARMÁCIA

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conversa comJoão Semedo: No reino da paz podre

FarmÁcIa PorTUGUesa

P U B L I C A Ç Ã O t r I m e s t r A L • 2 0 4 • O U t / N O V / D e Z ‘ 1 3

enTrevIsTaRoSáRio Zincke: “Água mole em pedra dura…”

conGresso anF expofaRma: Edição de 2013 foi um sucesso

o novo conTraTo socIal Para a FarmÁcIa

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FARMÁCIA PORTUGUESA • 204 • OUT/NOV/DEZ‘13

consUlTorIa JUrÍDIcaAcórdão do Tribunal Constitucional e as Farmácias de Oficina

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consUlTorIa De GesTãoUtilizar ferramentas de análise da performance da Farmácia

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consUlTorIa FIscalAs devoluções

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enTre nós74

Índice

eDITorIal

úlTIma Hora

noTIcIÁrIo

05

anF

HomenaGem

Prémio João Cordeiro: Inovação em Farmácia

Maria Irene Noronha da Silveira

O novo contrato social para a Farmácia

10

15

04

06

enTrevIsTaRosário Zincke: “Água mole em pedra dura…”

12

11.º conGresso nacIonal Das FarmÁcIas

16

FlasHes

em FocoPatologias de Inverno

58

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conversa comJoão Semedo: No reino da paz podre

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Desde há muitos anos que as farmácias dispõem de softwa-re de apoio às suas operações, designadamente às compras, às vendas, à faturação, aos stocks, etc., como acontece com o Sifarma. Porém, não dispunham ainda de uma ferramenta que, integrada com esse software lhes permitisse fazer uma análise cuidada do seu negócio e, através dela, tomar deci-sões mais sustentadas. Espera-se agora que esta situação possa vir a mudar já no final do primeiro semestre do pró-ximo ano, quando for lançado o novo sistema de gestão de indicadores, promovido pela ANF. Este encontra-se em fase avançada de desenvolvimento e, conforme comenta Miguel Lança, chief information offi-cer da ANF, «permitirá às farmácias monitorizar, através de um conjunto de indicadores, de que forma se está a desenrolar o negócio» e deixa espaço para «a tomada de decisão estratégica assente em evidência». A nova ferramenta recebe como input os dados operacio-nais existentes nos sistemas locais (Sifarma) e, com base em cálculos e cruzamentos automáticos, gera indicado-res de análise, como a margem bruta em percentagem e valor, os cash-flows, o break even point mensal, etc., possibilitando, ainda, outras leituras mais “finas”, como a rentabilidade por colaborador, por posto de trabalho, por produto, por laboratório, etc. De referir que o processo de disponibilização de indicadores garante «a confidenciali-dade dos dados».«Os sistemas de suporte à decisão já têm alguns anos, mas são, apesar de tudo, razoavelmente recentes quando com-parados com os sistemas de suporte à operação. Porém,

dado o momento que o setor atravessa, com todas as contin-gências económicas e financeiras que as farmácias enfren-tam, justifica-se a aposta da ANF», porque trará robustez à gestão da atividade das farmácias, salienta Miguel Lança.O chief information officer da ANF destaca ainda as ca-racterísticas user friendly do sistema. «Estamos em crer que, para trabalhar com a ferramenta que iremos dispo-nibilizar, a formação necessária será mínima. Ou seja, em poucas horas a farmácia ficará apta para poder interagir com a mesma. O que não significa, no entanto, que fique automaticamente apetrechada para poder interpretar os indicadores que serão disponibilizados. Aí, a formação em Gestão é, objetivamente importante para tirar o maior partido possível deste software».

ANF lança novo software de apoio à gestão em 2014

última hoRa

Uma das necessidades identificadas pelas farmácias passa pelo incremento de ferramentas auxiliares à gestão do negócio, algo que assume particular relevância no momento atual. A ANF está, por isso, a promover o desenvolvimento de um software de apoio à decisão, que facultará indicadores de gestão às farmácias, devendo chegar ao setor no final do primeiro semestre de 2014.

RPO - Produção Gráfica, Lda.

Depósito Legal n.º 3278/83Isento de registo na ERC ao abrigo

do artigo 9.º da Lei de Imprensa n.º 2/99, de 13 de Janeiro

DIreTora \ Dr.ª Maria da Luz Sequeira

conselHo eDITorIal \ Dr. Nuno Vasco Lopes

Dr.ª Filipa Duarte-Ramos \ Dr. Duarte Santos

coorDenaDora Do ProJeToDr.ª Maria João Toscano

coorDenaDora reDaTorIalDr.ª Rosário Lourenço

Email: [email protected]

Sónia [email protected]

Tel.: 961 504 580

ProPrIeDaDe consUlTora comercIal

ImPressão e acabamenTo

FARMÁCIA PORTUGUESA é uma publicação da Associação

Nacional das FarmáciasRua Marechal Saldanha, 1, 1249-069

Lisboa

DIsTrIbUIção

www.anF.PT

1 Ano (4 edições) - 50,00 eurosEstudantes de Farmácia - 27,50 euros

ContactosTelef.: 21 340 06 50

Fax: 21 340 06 74Email: [email protected]

Periodicidade: TrimestralTiragem: 3 000 exemplares

assInaTUras

Distribuição gratuita aos associados da ANF

Edifício Lisboa OrienteAv. Infante D. Henrique, 333 H, 37

1800-282 LisboaTel.: 218 504 060 - Fax: 210 435 935

ProDUção

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FARMÁCIA PORTUGUESA • 204 • OUT/NOV/DEZ‘13

editoRial

2013-2014: há anos mais iguais que outros?Nós, que dedicamos a nossa vida profissional à Saúde, vi-mos aumentar o nosso pessimismo e a nossa frustração a cada dia que passou do ano que agora finda. E para o que agora chega não se perspetivam horizontes mais idílicos.O nosso setor, resistindo até ao limite, como nós tão bem sabemos, procura a todo o custo não soçobrar.Será, aliás, a capacidade de resistência das farmácias a nota mais positiva a registar num 2013 terrível para a Farmácia.Apesar de todos os alertas e de todos os sinais, pouco ou nada foi feito pelo poder político de modo a travar, ou mes-mo atenuar, as dificuldades económicas e financeiras do setor, pelo que convivemos hoje com um grave problema de acesso ao medicamento, com sérias repercussões para os doentes. Todos o reconhecem, a começar pela tutela, que peran-te as flagrantes evidências deixou de poder negar a crise que ajudou a instalar e passou o ano a dizer que, de facto, algo teria de ser feito pelas farmácias, pois que, de fac-to, tinham atingido o patamar mais baixo possível e que, de facto, não tinham mais capacidade económica para se manter no atual quadro. Porém, de facto, pouco ou nada fez! Recentemente assistimos ao anúncio de uma alteração nas margens de comercialização dos medicamentos, mas restam dúvidas quanto à sua positividade para o setor, as-sim como vimos comunicado que a dispensa de medica-mentos genéricos poderá ser objeto de remuneração adi-cional às farmácias, eventualidade que, para já, não passa disso mesmo. Ou seja: pouco ou quase nada foi feito.

O nosso sentido de resistência e de sobrevivência levou--nos a uma reinvenção de nós próprios. Fiéis ao nosso espírito de sempre, temos proposto múltiplos caminhos alternativos e sinérgicos, geradores de mecanismos de sustentabilidade para as farmácias e de poupança e efi-ciência de recursos para o Estado. Mas nenhum foi até agora, consequente junto da tutela. E isso é igualmente um facto. À data de fecho desta edição, do Orçamento Geral do Estado para 2014 conhecem-se apenas propostas. O que se sabe de concreto é que a tendência de austeridade será mantida e até, em alguns casos, agravada. O ano de 2013, foi de profunda mudança também na ANF, com a saída do seu líder histórico, João Cordeiro, e a pos-terior eleição da atual equipa diretiva, dirigida por Paulo Duarte. Embora seja ainda cedo para fazer balanços, constatamos que a nova equipa procura atualizar conceitos e encontrar e demarcar o seu próprio percurso, como se pode avaliar, por exemplo, através do sucesso que foi o 11.º Congresso Nacional das Farmácias, onde, talvez pela primeira vez, foi possível assistir à concordância generalizada de todos os parceiros do setor, inclusive o político, quanto à mais-valia do alargamento do contributo das farmácias no sistema de saúde. Desejo, à nova Direção, sucesso e sorte no novo ano, deles dependerá em grande parte o sucesso e a sorte das far-mácias. Desejo a todas as Farmácias Portuguesas, e às suas equi-pas, muito Boas Festas. E que 2014 nos traga, pelo menos, alguma esperança!

Maria da Luz Sequeira

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noticiáRio

revista Farmácias Portuguesas outono/Inverno 2013/14A 12.ª Revista Farmácias Portuguesas, na sua edição Outono/Inverno 2013/14, já disponível nas Farmácias Portuguesas, aborda como tema de capa a Higiene Oral, especialmente dedicada a manter a saúde oral dos pequenotes sempre impecável. Adicionalmente, inclui uma entrevis-ta ao Prof. Doutor Agostinho Marques (Pneumologista, Diretor do Serviço de Pneumologia do Hospital de São João, no Porto), onde são focadas as principais

questões sobre a gripe - riscos, sinto-mas e prevenção. Também são expostas as vantagens da administração da vaci-na nas Farmácias Portuguesas aderen-tes à campanha, onde se alia o conforto à segurança.Esta 2ª edição de 2013 inclui mais de 580 opções de Serviços e Produtos de Saúde e Bem-Estar, que estarão disponíveis para rebate até 31 de março de 2014, de marcas com reconhecimento, implanta-ção e da preferência do mercado.

OUTONO/INVERNO 2013/14 N.º 12

mais de

580produtose serviços

para si

HigieneoralBONS HÁBITOS PARA UM SORRISO SAUDÁVEL DESDE CRIANÇA

VACINAÇÃOA PREVENÇÃO

É NUCLEAR

DESCONGESTÃO NASAL

NARIZINHO DESENTUPIDO

Lançamento do CapítuLo português do Ispor em dubLIn

avaliação económica do medicamento e outcomes researchDurante a Conferência Europeia da International Society for Pharmacoeconomics & Outcomes Research (ISPOR), que decorreu em novembro em Dublin, teve lugar a sessão de lançamento do Capítulo Português do ISPOR. Perante uma plateia de portugueses que exercem a sua atividade na área da Avaliação Económica do Medicamento, quer na indústria farmacêutica quer em entidades reguladoras, bem como em agências de avaliação de tecnologias de saúde e em centros de in-vestigação, Carlos Gouveia Pinto, professor no CISEP/ISEG, disse que o Capítulo Português do ISPOR «nasce da ideia de reunir o conhecimento do que é feito por portugueses no domínio da Avaliação Económica do Medicamento e Outcomes Research e de congregar a academia, centros de investigação, consultoras, in-dústria e reguladores sob um mesmo Fórum, fiel ao espírito do ISPOR e sob a sua chancela». De notar que, para além de Gouveia Pinto, que a preside, inte-gram ainda a atual Direção do Capítulo Português do ISPOR Luís Silva Miguel do CISEP/ISEG, Céu Mateus da Escola Nacional de Saúde Pública e Mónica Inês dos Laboratórios Pfizer Portugal. Presente na ocasião, Hélder Mota Filipe, vice-pre-sidente do Infarmed, sublinhou a disponibilidade da entidade para colaborar com o Fórum, cuja criação saudou. Pretende-se que este, à semelhança dos seus congéneres regionais, venha a discutir matérias, em contexto multidisciplinar, num plano científico de apoio

à tomada de decisão no país nos domínios da Avaliação Económica do Medicamento e Outcomes Research, sendo igualmente seu objetivo trazer a Portugal, num futuro próximo, a Conferência Europeia do ISPOR.Participante habitual na Conferência Anual do ISPOR, o CEFAR, através de Suzete Costa e Inês Teixeira, também compareceu no lançamento do Capítulo Português, a convite da sua Direção.No âmbito das comemorações dos 20 anos do CEFAR, em 2014, teremos oportunidade de revisitar este tema na Revista e abordar os highlights da Conferência Europeia do ISPOR.

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FARMÁCIA PORTUGUESA • 204 • OUT/NOV/DEZ‘13

artIgo pubLICado no dIárIo de CoImbra, 3 de outubro de 2013

Deixem-nos Trabalharsenhor Diretor,

Ao longo da minha vida profissional tenho-me dedicado à Farmácia Comunitária. Aprendi que em saúde, como em qualquer área de atividade, em equipa valemos mais e conseguimos melhores resultados – no nosso caso, mais e melhor saúde para os utentes.Não existe nenhuma guerra aberta entre os vários pro-fissionais de saúde. Na verdade, passam os seus dias a cuidar empenhadamente da saúde dos nossos cida-dãos, em articulação, cada um com as suas competên-cias e com o seu contributo próprio; trabalham em con-junto para os melhores resultados em saúde. Porém, o Sr. Bastonário da Ordem dos Médicos parece apostar definitivamente numa linha belicista, de apelo cons-tante ao conflito – como pude presenciar num curso de pós-graduação em que participei.No último painel do curso – Envelhecimento Ativo, mais vida por menos custo, o moderador foi precisamente o Sr. Bastonário da Ordem dos Médicos. Iniciou o tema ape-lando eloquentemente aos colegas para estarem atentos, porque as farmácias andavam a trocar os medicamentos das receitas por outros mais caros e a enganar os utentes. Pediu-lhes para recolherem o máximo de dados sobre to-das as trocas de medicamentos, para ele poder promover posteriores publicações…Não pude deixar de intervir, enquanto farmacêutica, assim pedi a palavra: “Agradeço ao Prof. Veríssimo o excelente conteúdo do curso, que aliás já frequento há 3 anos, com aplicação prática de alguns conhecimentos na minha far-mácia. Gostava de reforçar as palavras do último orador, Dr. Ermida, quanto ao papel das equipas de saúde e aos bons exemplos alcançados nos EUA, onde há muitos registos de ganhos em saúde. Conheço bem a realidade desses colegas e era bom que também nós conseguísse-mos trabalhar em equipas multidisciplinares.Mas, estou muito triste, pelas palavras do Sr. Bastonário da Ordem dos Médicos, Prof. José Manuel Silva, porque nós não fazemos substituições nas nossas farmácias, nem enganamos os doentes.Gostava de esclarecer que andamos todos um pouco per-didos: os sistemas informáticos – com diferentes progra-mas nos hospitais, centros de saúde e farmácias – dificul-tam a atuação dos vários profissionais, podendo inclusiva-mente despoletar a ocorrência de erros.Assim, passo a explicar: os médicos, só têm que prescre-ver por CNPEM, ou seja, Código Nacional para a Prescrição Eletrónica de Medicamentos. Todos os medicamentos têm um CNPEM próprio. Quando o utente chega à farmácia, este código permite visualizar todas as opções de que dis-põe, para o próprio poder decidir.

No nosso caso, todos os utentes têm registo dos medica-mentos que tomam e as substituições resultam das alte-rações de prescrição que os médicos fazem; estes referem que, muitas vezes, prescrevem o que por defeito surge no início da lista – nem sempre sendo fácil de selecionar.Esclareço, também, que acabei de consultar 6 fornece-dores e nenhum tem o medicamento Atorvastatina 40 mg Azevedos, que o Sr. Professor se dignou a publicar na página comprada do Correio da Manhã, o que prova que ninguém o podia vender.Já agora, esclareça-me o que pode a farmácia fazer quan-do os seus colegas prescrevem:- Montelucaste Tetrafarma (medicamento suspenso), não havendo outro mais barato…- Ácido Alendrónico Arrowblue (laboratório que encerrou)…- E por fim: ninguém, a não ser por erro, ou por não dominar o programa informático, prescreveria agulhas para canetas de insulina invocando a “Exceção B: rea-ção adversa” – recebi esta receita há dois dias na minha farmácia. Parece que o problema é transversal a todos os profissionais.Infelizmente, também há falta de humanismo em alguns profissionais de saúde, que nunca deviam ter ingressado na profissão de médico, enfermeiro ou farmacêutico, entre outras. Contudo, existem muitos que são bons profissio-nais e eu só peço: deixem-nos trabalhar como equipa.Na minha farmácia temos seguimento farmacoterapêuti-co e fazemos reconciliação da terapêutica dos utentes, pe-dindo colaboração do Centro de Saúde de S. Julião, Buarco e Hospital da Figueira da Foz. Estão nesta sala muitos mé-dicos com quem colaboro, aos quais pode perguntar se alguma vez os enganei. Está na hora de darmos as mãos e trabalharmos em equipa, para bem do utente.Por favor, Sr. Professor, peço mais uma vez: DEIXEM-NOS TRABALHAR…Após a minha intervenção seguiram-se aplausos dos par-ticipantes. Tenho, pois esperança no futuro das equipas de Saúde…Não posso, porém, deixar de fazer nota do facto do Sr. Bastonário da Ordem dos Médicos – depois das graves acusações sobre todos os farmacêuticos e na sequência dos apelos ao conflito e à discórdia que lançou a esta pla-teia – perante as questões objetivas que lhe coloquei, se ter refugiado no muito tempo que alegadamente lhe toma-ria a resposta para nada me esclarecer.

Anabela mascarenhas, Diretora técnica

da Farmácia saúde – Figueira da Foz

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noticiáRio

prémIo ambIente 2013

valormeD distingue 57 farmácias

aveIro beJa

Farmácia Simões Roque, Barrô Farmácia Fonseca, Beja

Farmácia Verdemilho, Aradas Farmácia Fialho, Ferreira do Alentejo

Farmácia Paiva, Espinho Farmácia Fonseca, Beja

braGa braGança

Farmácia de Joane, Joane Farmácia Atlântico, Campo Redondo

Farmácia Carmo, São Pedro Merelim Farmácia Bragança, Mirandela

casTelo branco coImbra

Farmácia Silva Domingos, Vila de Rei Farmácia Santo André, Vila Nova de Poiares

Farmácia Diamantino, Fundão Farmácia Fonseca, Lousã

Farmácia Mousaco Torrão, Ferro Farmácia Galvão, Arganil

Farmácia Borges, Semide

Évora Faro

Farmácia Paços, Évora Farmácia Amparo, Portimão

Farmácia Nova, Vendas Novas Farmácia Ilda, Mexilhoeira Grande

GUarDa leIrIa

Farmácia Patrício, Gouveia Farmácia Lis, Marrazes

Farmácia Central, Sabugal Farmácia Magalhães, Alcobaça

Farmácia Albuquerque, Moimenta da Serra Farmácia Confiança, Atouguia da Baleia

lIsboa

Farmácia Veritas, Paço de Arcos Farmácia Central, Bobadela

Farmácia Sacoor, Nova Oeiras Farmácia Central de Carnaxide Lda., Carnaxide

Farmácia Paula de Campos, Portela Farmácia do Fórum Sintra, Alto do Forte

Farmácia Uruguai, Lisboa Farmácia Nova Odivelas, Odivelas

Farmácia Rodrigues Garcia, Agualva PorTaleGre

Farmácia Alcoitão, Alcoitão Farmácia Elvas, Portalegre

Farmácia Pinto Leal, Massamá Farmácia Freixedas, Castelo de Vide

A VALORMED premiou as farmácias que mais se destacaram na recolha de embalagens vazias e me-dicamentos fora de uso, durante o ano de 2012. A cerimónia de entrega dos prémios decorreu no dia 17 de outubro, na Estufa Fria, em Lisboa.As farmácias premiadas foram selecionadas em to-dos os distritos do continente e das regiões autó-nomas, levando em consideração a conjugação de

diversos fatores, nomeadamente o esforço, a dedi-cação, o empenho e o envolvimento ao longo de 2012 neste projeto em defesa do ambiente e da saúde dos portugueses. Este é o reconhecimento, pela VALORMED, da ação das farmácias para estimular os cidadãos a deposi-tar nos pontos de recolha as embalagens vazias e os medicamentos fora de uso.

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FARMÁCIA PORTUGUESA • 204 • OUT/NOV/DEZ‘13

PorTo reGIão aUTónoma Dos açores

Farmácia Nova de Valbom, Pinheiro d'Aquem Farmácia Santa Casa da Misericórdia da Maia, Maia

Farmácia Ferreira da Silva, Senhora da Hora Farmácia da Misericórdia, Angra do Heroísmo

Farmácia de Gondarém, Porto

reGIão aUTónoma Da maDeIra sanTarÉm

Farmácia do Caniço, Caniço Farmácia Carlos Pereira Lucas, Entroncamento

Farmácia Cristo Rei, Caniço Farmácia Pereira Martins, Lapas

seTúbal vIana Do casTelo

Farmácia Parreira, Lavradio Farmácia do Jardim, Valença

Farmácia do Fogueteiro, Amora Farmácia Afifense, Afife

Farmácia Cerqueira, Cova da Piedade

vIla real vIseU

Farmácia Borges de Figueiredo, Ribeira de Pena Farmácia Viso, Viso Sul

Farmácia Mesquita, Vila Real Farmácia da Lajeosa, Lajeosa do Dão

A proposta de guião com orientações para a reforma do Estado, aprovada no Conselho de Ministros de 30 de ou-tubro e apresentada no mesmo dia pelo Governo, dedi-ca atenção particular à área da saúde. Entre os eixos da reforma na saúde que o Governo considera prioritários, destacam-se os mais relevantes para o setor: - Continuar a reforma da política do medicamento para aumentar o acesso e a qualidade na terapêutica, manten-do as diretrizes e medidas que têm vindo a ser tomadas, assentando essencialmente na aplicação de normas de orientação clínica, na implementação do formulário na-cional do medicamento e no reforço da monitorização e do controlo da prescrição, dispensa e conferência em ambu-latório e hospitalar; - Redução da carga de doença, como fator essencial para garantir a sustentabilidade do sistema de saúde e

do SNS a longo prazo, atuando sobre os principais de-terminantes de saúde, de forma a promover a saúde e prevenir as doenças. - Acompanhamento das reformas por uma nova estrutura funcional do Ministério da Saúde, separando o financia-mento da prestação de cuidados, tendo por base as fun-ções essenciais do Estado nesta área: regulação, financia-mento e prestação pública de cuidados. O guião integra, ainda, o conjunto de medidas adota-das ao longo do atual mandato governativo. No âmbi-to do medicamento, o Governo destaca a definição de padrões de qualidade através de normas de orienta-ção clínica, o enfrentamento das “rendas excessivas e consentidas na política do medicamento”, o avanço da prescrição por DCI e a reorganização dos cuidados primários.

Propostas para a saúde no guião para a reforma do estado

A Loja do Coração, uma iniciativa da Glintt e da Cegedim, em parceria com a Sociedade Portuguesa de Cardiologia (SPC), esteve aberta ao público na praça central do Centro Comercial Colombo, em Lisboa, nos meses de novembro e dezembro. Exclusivamente dedicada à saú-de cardiovascular, proporcionou aos visitantes experiên-cias diferentes e gratuitas, dando a conhecer o coração e

ajudando a prevenir as doenças cardiovasculares.A Loja do Coração é a primeira iniciativa integrada na Feira da Saúde, que decorre de 16 a 18 de Maio de 2014, na FIL Expo. Sendo um projeto dirigido a toda a população, pretende-se através da divulgação de informação de qua-lidade incentivar a adoção de estilos de vida saudáveis e a prevenção da doença.

loja do coração no colombo

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Numa altura em que o setor procura reinventar-se, a Direção da ANF decidiu criar um prémio para apoiar o desenvolvimento de projetos inovadores em Farmácia, mas também homenagear aquele que foi o seu maior impulsionador. O Prémio João Cordeiro nasce igualmente inspirado no seu espírito empreendedor e visionário, resultando numa fusão perfeita entre os valores do passado e a vontade de construir o futuro.

anf

Incentivar a inovação e o empreendedorismo

A Direção da ANF escolheu o mo-mento da sessão de encerramen-to do 11.º Congresso Nacional das Farmácias para apresentar, publica-mente, a sua iniciativa de instituição do “Prémio João Cordeiro: Inovação em Farmácia”, que será atribuído, pela primeira vez, no próximo ano de 2014.Na génese deste galardão estão dois objetivos, ligados entre si de modo absolutamente intrínseco. O primeiro, homenagear aquele que é considerado o líder histórico da Associação e visto como a persona-lidade que mais contribuiu para o progresso da Farmácia em Portugal. João Cordeiro presidiu à construção de um universo associativo forte, que conduziu à unidade do setor e à sua independência, e empenhou-se per-manentemente pela sua moderni-zação e pela qualidade dos serviços prestados pelas farmácias à popula-ção. Moldou, inquestionavelmente, a realidade. O segundo nasce assim inspirado na visão empreendedora singular de

INTRODUÇÃOA Associação Nacional das Farmácias deliberou instituir o Prémio João Cordeiro desti-nado a premiar projetos inova-dores cuja implementação pro-mova o desenvolvimento das farmácias.Ao atribuir ao prémio o nome de João Cordeiro, pretendeu a ANF prestar homenagem à visão empreendedora do líder histórico das Farmácias para que o seu exemplo seja um estímulo ao desenvolvimento do setor. O presente regulamento define as regras de candidatura e atri-buição do prémio, nos termos seguintes:

ARTIGO 1.ºobjetivoApoiar e premiar projetos origi-nais que promovam o espírito de inovação e desenvolvimento nas farmácias portuguesas.

ARTIGO 2.ºnome e PeriodicidadeO prémio designar-se-á “Prémio João Cordeiro – Inovação em Farmácia” e será atribuído anual--mente. O prémio será atribuído pela primeira vez em 2014.

ARTIGO 3.ºPrémios adicionaisPara além do “Prémio João Cor-deiro – Inovação em Farmácia”, poderão ser atribuídos prémios adicionais em áreas temáticas. Em 2014, serão atribuídos dois prémios adicionais com as desig-nações seguintes:Prémio João Cordeiro • Desenvolvimento ProfissionalPrémio João Cordeiro • Instrumentos de Gestão

reGUlamenTo

João Cordeiro e propõe-se a apoiar e premiar, anualmente, novos proje-tos, conceitos, tipologias e soluções para as farmácias portuguesas. Poderão candidatar-se a este Pré- mio entidades individuais ou coleti-vas, públicas ou privadas, entre os meses de janeiro e março de cada ano. Os projetos serão selecionados em função do seu caráter de inova-ção e excelência, da estimativa de impacto e pelo valor acrescentado para a atividade da farmácia. Para além deste, serão ainda atribu-ídos, em 2014, dois outros prémios, na área do desenvolvimento profis-sional e de instrumentos de gestão. O júri será constituído por perso-nalidades de reconhecido relevo no país e no setor de Farmácia e os premiados, para além de um va-lor monetário para investimento no desenvolvimento dos projetos, be-neficiarão também de apoio na sua implementação pelas estruturas do universo ANF. Para mais informações, consulte o regulamento aqui publicado.

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FARMÁCIA PORTUGUESA • 204 • OUT/NOV/DEZ‘13FARMÁCIA PORTUGUESA • 204 • OUT/NOV/DEZ‘13

ARTIGO 4.ºelegibilidadePodem candidatar-se aos prémios entidades individuais ou coletivas, públicas ou privadas.

ARTIGO 5.ºapresentação de candidaturasOs processos de candidatura deve-rão ser submetidos à ANF através do endereço eletrónico ([email protected]) ou pela entrega na sede da ANF, na Rua Marechal Saldanha, n.º 1, em Lisboa, entre 1 de janeiro e 31 de março de cada ano.O processo de candidatura deve-rá ser estruturado nos seguintes termos:

• Identificação do prémio a que se candidata, inovação em farmá-cia ou prémio adicional.

• Resumo do projeto e apresen-tação das razões da candida-tura à luz do objetivo central do Concurso e do impacto da implementação do mesmo no universo das farmácias (máxi-mo de 2 páginas com fonte de tamanho 12 e espaçamento simples entre as linhas).

• Apresentação de um Business Plan de acordo com um modelo a disponibilizar pela ANF.

ARTIGO 6.ºcritério de avaliação das candidaturasAs candidaturas serão avaliadas por um Júri, segundo os critérios seguintes:• Adequação do produto em causa

ao objetivo central do concurso.• Característica inovadora do pro-

duto que o diferencie pela sua excelência e lhe confira vanta-gens competitivas nos merca-dos onde se propõe competir.

• Inserção do processo de desen-volvimento e comercialização

do produto objeto do projeto numa estratégia global de inova-ção na farmácia.

• Cumprimento das regras impos-tas pela legislação em vigor nos mercados aos quais o produto ou produtos se dirigem.

• Avaliação de impacto prático em eficiência, eficácia e produtivida-de da farmácia.

• Viabilidade e sustentabilidade eco-nómica do produto ou produtos objeto do projeto.

ARTIGO 7.ºInstrução dos processos de candidaturaO Júri será coadjuvado por uma equipa executiva da ANF na recolha, sistematização e análise de informa-ção relativa a cada dossier de candi-datura.O Júri e a equipa executiva pode-rão consultar os concorrentes bem como as entidades que disponham de informações consideradas rele-vantes para o processo de tomada de decisão.

ARTIGO 8.ºconstituição e competências do JúriO Júri será constituído por um número de personalidades de reconhecido relevo no País e no Setor de Farmácias, nomeados pela Direção da ANF, até um má-ximo de doze e um mínimo de oito membros.As decisões do Júri serão to-madas por maioria simples dos membros presentes na reunião, tendo o Presidente voto de qua-lidade.A decisão do Júri não é suscetível de recurso.O Júri poderá não atribuir prémios ou atribuí-los Ex aequo a mais do que uma candidatura.Compete ao Presidente do Júri con-vocar e dirigir as reuniões.

O Júri reunirá na sede da ANF que, para o efeito, disponibili-zará instalações e apoio ade-quados.

ARTIGO 9.ºvalor dos PrémiosO valor dos prémios é o seguinte:•“Prémio João Cordeiro – Inovação em Farmácia”: € 20.000 (vinte mil euros). • Prémio adicional temático: € 12.500 (doze mil e quinhentos euros).• O prémio poderá ser disponi-bilizado por tranches, de acordo com o critério do Júri, em função do cumprimento das principais fases do projeto.

ARTIGO 10.ºoutros apoiosOs premiados beneficiarão tam-bém de apoio à implementação dos seus projetos, por parte das estruturas do Universo ANF, a definir de acordo com a especi-ficidade de cada caso.

ARTIGO 11.ºentrega dos PrémiosA decisão do Júri e a sua divul-gação terão lugar no prazo de três meses a contar do termo do prazo para apresentação das candidaturas.A entrega dos prémios terá lu-gar em sessão pública, em data a definir pelo Júri.

ARTIGO 12.ºvigência e revisãoO presente regulamento vigora por tempo indeterminado, po-dendo ser revisto a todo o tem-po pela Direção da ANF.A revisão do regulamento não se aplica aos processos de candidatura que estiverem em curso.

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ENTREVISTA

rosárIo ZInCke, presIdente da pLataforma saúde em dIáLogo

“Água mole em pedra dura…”A Plataforma saúde em Diálogo apresentou, recentemente, a “Declaração de Lisboa”, um documento que concentra e dá visibilidade à força de 15 anos de trabalho e que, ao mesmo tempo, se anuncia como uma afirmação de intenções e da estratégia para o seu alcance. As prioridades apontadas são, afinal, ao nível de um humanismo quase primário, e o poder político escusa de se escudar na crise. trabalho e vontade são o que é preciso, pois segundo rosário Zincke, presidente da direção, há muito que deve e pode ser feito e que não representa custos.

FarmÁcIa PorTUGUesa - a Pla-taforma saúde em Diálogo tem, desde março, novos órgãos so-ciais. Quais são os seus principais objetivos?rosário Zincke – Decidimos olhar para o trabalho que havia sido feito ao longo dos 15 anos de existência

da Plataforma, por acharmos que era altura de arrumar ideias, ou seja, ao invés de criar coisas no-vas, propomo-nos aproveitar toda a riqueza do trabalho que já estava realizado, sistematizando-o num único documento, ao qual chamá-mos “Declaração de Lisboa” - pela

simples razão de ter sido assinado em Lisboa! –, e que apresentámos publicamente a 23 de outubro.

Fs - como avalia o seu impacto?rZ - Gostávamos de já ter tido um feedback mais positivo, mas te-mos consciência de que o nosso

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trabalho é de persistência e que as coisas demoram tempo. Não obs-tante, ligaram-me recentemente da Presidência da República a pe-dir para enviar a Declaração, o que acho que é um bom sinal. Devo dizer que, para este docu-mento, nos inspirámos um pouco no que tem sido a performance da Alzheimer Europe, que é, também ela, uma associação de associa-ções, e cujo êxito está no facto de ter as suas ideias muito bem ar-rumadas: sabe exatamente quais são as suas linhas de atuação, está atenta àquilo que se passa à sua volta, a nível social, político e eco-nómico, e tira partido desses mo-mentos para falar de si, dos seus objetivos, prioridades e iniciativas. É isso que estamos a fazer agora na Plataforma.

Fs - Diria que a Plataforma era uma casa desarrumada?rZ - Não. O que encontrámos foi uma organização sólida, com um trabalho muito sério, ao qual fal-tava apenas dar um toque de visi-bilidade. Queremos, agora, dizer que existimos e que temos uma enorme utilidade na vida econó-mica, política e social deste país, e foi por esse motivo que apareceu a “Declaração de Lisboa”, onde chamamos a atenção para o que é a Plataforma Saúde em Diálogo, para a importância de congregar 41 associações de doentes, de pro-motores de saúde, de defesa do consumidor e de profissionais, e onde definimos os nossos objeti-vos, estratégia e prioridades.Ao nível dos objetivos, focamo-nos em diferente grupos de destinatá-rios, desde logo os doentes e uten-tes de saúde: queremos que eles detenham a informação necessá-ria para tomar decisões livres e esclarecidas na área da saúde e queremos um acompanhamento mais solidário e efetivo das pesso-as doentes e dos seus familiares.

Os decisores políticos, e a socieda-de de um modo geral, são outros destinatários, pelos quais preten-demos ser reconhecidos como um parceiro, assim chamando a aten-ção para a Plataforma e as asso-ciações que a integram, bem como para a importância do diagnóstico precoce, da promoção da saúde e, mais uma vez, da informação.As nossas prioridades assentam em dois aspetos essenciais, a co-meçar pelo estatuto do doente cró-nico. Trata-se de um assunto já an-tigo mas que, apesar da resolução, há dois anos, da Assembleia da República, convidando o Governo a legislar sobre esta matéria, ainda não está resolvido.

Fs - Terá a crise que o país atra-vessa contribuído para que o pro-cesso não avançasse?rZ - Possivelmente, mas a crise não pode servir de desculpa, por-que há muitas coisas que se po-dem fazer sem que isso se traduza em custos. Fs - nestes dois anos, houve al-gum feedback do Governo rela-tivamente ao estatuto do doente crónico?rZ - Não, mas julgo que uma das razões talvez seja porque a reso-lução da Assembleia da República ligou a questão do estatuto do do-ente crónico a uma outra, que tem a ver com a revisão da tabela nacional de incapacidades. Não há dúvida que é preciso atu-ar neste campo, porque a tabela está muito pensada na ótica dos acidentes de trabalho e a reali-dade é bem mais vasta, mas jun-tar os dois temas acabou por ser contraproducente. A decisão da Plataforma de desligar os assun-tos não foi despropositada.Por outro lado, dentro do estatu-to do doente crónico há múltiplos subtemas. A prioridade passa por definir o que é a doença crónica,

o que não será complicado, dado que já existe na Lei Nacional dos Cuidados Continuados Integrados uma descrição bastante boa, que vai buscar muito do que é a defi-nição da OMS e que nos agrada, porque realça o impacto social da doença nas pessoas afetadas e nos seus familiares. Quais deverão de-pois ser consideradas as doenças crónicas é que poderá ser um pou-co mais complexo, mas para além de já existir trabalho feito nis-to, contamos com a colaboração imprescindível das associações que integram a Plataforma. Onde reconheço que poderão existir maiores dificuldades, por se tra-tar de algo mais ambicioso, será na determinação das medidas es-pecíficas que deverão ser tomadas relativamente a este grupo.Mais simples, mas indispensável, é a criação do cartão do doente cróni-co. Pelo menos uma das nossas as-sociações já tem experiência neste campo, através do cartão do doente raro, e a nossa ideia é aproveitar mui-to do trabalho que foi feito a esse pro-pósito para não partirmos do zero.

Fs - a criação do estatuto do cui-dador informal é outra das bata-lhas por que a Plataforma se bate.rZ - Sim, sabemos, e há estudos que o provam, que cerca de 80% dos cuidados prestados aos doentes são-no em casa, pelas famílias. Estas pessoas enfrentam desa-fios enormes para conjugar tais responsabilidades com uma vida

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«A crise não pode servir de desculpa, porque

há muitas coisas que se podem fazer

sem que isso se traduza em custos »

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ativa, e não recebem nenhum tipo de apoio ou proteção, além de algumas previsões espalhadas pela legislação do trabalho. O mesmo acontece com aquelas que já estão reformadas e que têm a árdua tarefa de cuidar de alguém muito dependente. A realida-de é tão absurda que dita que se deve privilegiar a permanência das pes-soas no seu domicílio, criando boas condições para que assim seja, mas, ao mesmo tempo, os poucos apoios que existem são exclusivos para a co-locação em lares. Ora, é imprescindí-vel que os decisores percebam que, como vamos depender cada vez mais destes cuidadores informais, algu-mas medidas têm de ser tomadas. Fs - Qual é o vosso calendário de ação?rZ - Apresentámos agora a “Decla-ração de Lisboa” e temos algumas ações planeadas para o próximo ano. Na primavera que-remos fazer uma conferência so-bre a importância das associações, tema que julgamos que nessa al-tura poderá estar mais maduro e que importa debater na ótica do pa-pel que desempenham na socieda-de portuguesa e as suas vertentes.

Posteriormente, mais para o final do ano, pensamos fazer uma expo-sição, em moldes ainda a estudar, na Assembleia da República, dedi-cada aos estatutos do doente cróni-co e do cuidador informal. Entretanto, temos pedidos de audi-ências junto do ministro da Saúde e do ministro da Segurança Social, tencionamos reforçar os proto-colos que temos com as univer-sidades, nomeadamente com as faculdades de Medicina e Farmácia, e queremos trabalhar muito na área da formação.

Fs - as associações de doentes são verdadeiramente ouvidas?rZ - É politicamente correto reu-nir com as associações, dedicar-

-lhes algum tempo, mas serem verdadeiramente ouvidas impli-ca, também, que façam um es-forço de maturidade e se con-sigam unir, e é por isso que a Plataforma é tão importante. Se formos 50, a falar cada uma por seu lado, tornamo-nos pou-co eficazes. É muito importante encontrar pontos comuns e focar as nossas forças nisso.

Fs - De que modo é que as far-mácias e os farmacêuticos se podem encaixar mais, numa perspetiva colaborativa, no tra-balho da Plataforma saúde em Diálogo? rZ - Devo, antes de mais, di-zer que já o fazem, através da ANF, que é o grande apoio da Plataforma. Temos todo o auxí-lio logístico de que necessitamos e acesso a uma estrutura “cin-co estrelas”, que nos permite fo-carmo-nos naquilo que é verda-deiramente essencial.Mas as farmácias, como são um serviço de proximidade em quem as pessoas confiam, podem de-sempenhar um papel muito im-portante de sistematicamente encaminhar as pessoas para as associações. Nós vivemos ainda num modelo muito clínico, mas os doentes e os seus cuidado-res precisam de mais que isso, necessitam de apoio social, de quem tenha tempo para as ou-vir e partilhar experiências que, sendo comuns, são específicas daquela doença.Por outro lado, seria muito interes-sante que os farmacêuticos partici-passem nas ações de formação que temos previstas, no âmbito da lite-racia, dos direitos e de formas mui-to concretas de lidar com as mais diversas patologias.

ENTREVISTA

«Seria muito interessante que os farmacêuticos participassem nas ações de formação que temos previstas »

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homenagem

marIa Irene noronha da sILveIra

Um retrato da determinaçãoFaleceu maria Irene Noronha da silveira, depois de uma luta de anos pela sobrevivência à doença. A determinação daquela que, entre muitas outras coisas, foi a única mulher bastonária da Ordem dos Farmacêuticos é aqui recordada por João silveira.

Maria Irene Noronha da Silveira faleceu em Coimbra, no dia 16 de novembro, vítima de doen-ça prolongada, sua indesejada companheira durante mais de 20 anos e contra a qual combateu com a mesma audácia que apli-cou em outras lutas da sua vida, certamente de significado menos gigante, mas de enorme impor-tância. João Silveira, presidente da Mesa da Assembleia-Geral da ANF, que com ela privou na Ordem dos Farmacêuticos e de quem era amigo, recorda «uma mulher de grande determinação. Ela era uma força da natureza e se

estava decidida numa causa, leva-va a sua avante contra tudo e con-tra todos. Vários são os exemplos que nos deixou, quer como mu-lher quer como académica, quer ainda como farmacêutica».

«UMA FORÇA DA NATUREzA»

Irene Silveira era uma mulher de pergaminhos vários. Destacou-se na área académica. Na Universidade de Coimbra, de que foi vice-reitora, era professora catedrática da Faculdade de Farmácia e foi responsável pelo Laboratório de Bromatologia, sendo uma referência nesta área. Mas foi pela Ordem dos Farma-cêuticos que os laços com João Silveira se estreitaram. «Acom- panhou-me desde o primeiro mo-mento da minha candidatura a basto-nário da Ordem dos Farmacêuticos, e o seu apoio foi estruturante na renovação da nossa Ordem e na afirmação dos farmacêuticos em Portugal. Durante três anos, as-sumiu a presidência da Secção Regional de Coimbra da Ordem dos Farmacêuticos, mas poucos acre-ditavam nesse desfecho quando re-solveu aceitar candidatar-se, porque era uma mulher que ia contra o his-tórico status quo da região Centro. Venceu essas eleições com 70% dos votos graças à sua determinação, porque a partir do momento em to-mou a decisão, não mais parou de desenvolver contactos para conven-cer as pessoas da razão da sua, e da nossa, candidatura». Na Ordem, foi também presidente da Assembleia-Geral, e mais tarde,

«quando entendeu candidatar-se a bastonária, mais uma vez foram mui-tos os que opinaram que ela não te-ria a menor hipótese de ser eleita e, mais uma vez, ela provou como esta-vam enganados. Infelizmente, a do-ença, sob cuja sombra viveu durante 20 anos e que voltava à sua presença de tempos a tempos, desenvolveu--se, e a professora foi obrigada a ab-dicar do cargo». João Silveira testemunha que, des-de então, a sua vida foi uma cons-tante luta de sobrevivência e pro-longamento de tempo, «e no qua-dro da sua situação física, apenas pela sua determinação, pelo seu querer viver, pela força com que estava agarrada à vida e aos seus, conseguiu resistir».«A última vez que estivemos jun-tos foi em setembro, no Dia do Farmacêutico, em Lisboa, porque apesar da sua condição debilita-da, fez questão de estar presente nas celebrações. Nessa ocasião fui gentilmente homenageado com a Medalha de Honra da Ordem dos Farmacêuticos, e a sua intervenção na altura marcou-me profunda-mente. Fez questão de estar tam-bém no jantar, onde tive a felicidade de partilhar a mesma mesa que ela e o que é um facto é que, do princí-pio ao fim, estivemos na companhia de uma mulher com uma força in-terventiva e animadora que quase esmagava os restantes. Para mim, isto diz bastante acerca da força interior da Prof.ª Irene, que foi de facto uma mulher fantástica, tanto como académica como farmacêuti-ca, e que continuará a ser uma re-ferência para todos nós».

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11.º Congresso naCIonaL das farmáCIas

Quando o objeto não é a ideia mas o seu sentido O conceito de novidade, contendo, no seu ADN, características disruptivas, tem a particularidade de causar, ini-cialmente, estranheza.Não foi para trazer novidades que o 11.º Congresso Nacional das Farmácias foi desenhado, e o seu tema, “O Novo Contrato Social para a Farmácia”, também não era, em si mesmo, novo. Tem sido, como é sabi-do, propalado amiúde pela Direção da Associação Nacional das Farmácias, resumindo a sua visão de uma estra-tégia para o futuro do setor. E foi precisamente nessa especi-

ficidade que residiu a brutal robus-tez dos trabalhos, concedendo-lhes um alcance, inquestionavelmente, inovador.Durante dois dias, escrutinou-se o contexto da Farmácia portuguesa em círculos cada vez mais concên-tricos, sempre com a preocupação de trazer para dentro do debate aquilo e aqueles que a rodeiam, e de olhar as melhores práticas, em cada um dos grandes temas, no mundo para lá das nossas frontei-ras. A cada momento, o permanente exercício de perscrutação de falhas

ou lacunas, fundamentos e forças, e a constante resposta a sublinhar a certeza da justiça e da pertinência das propostas feitas.O 11.º Congresso Nacional das Farmácias ficará para a história não como um evento de novidades, mas como aquele onde se consoli-daram ideias e solidificaram propó-sitos, aquele a partir do qual toda e qualquer estranheza relativamen-te ao “Novo Contrato Social para a Farmácia” deixou de ter sentido.Convidamo-lo a confirmar isso mes-mo nas páginas seguintes.

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sessão de abertura

espírito inconformadoA sessão solene de abertura dos trabalhos de mais um Congresso Nacional das Farmácias permitiu vincar a postura do setor perante a situação atual: a sua crise é real e atinge laivos de brutalidade. O reposicionamento é possível e desejável no quadro do país. As farmácias estão prontas para um novo contrato social com o estado.

A sessão de abertura foi presidida por Maria Antónia Almeida Santos, pre-sidente da Comissão Parlamentar de Saúde, e contou com a presença do Secretário de Estado da Saúde, Manuel Teixeira.O mote do Congresso foi lança-do pelo presidente da Mesa da Assembleia-Geral, João silvei-ra, embora atingisse o seu apo-geu, mais tarde, com o discurso do presidente da Direção, Paulo Duarte. «as farmácias são a uni-dade de saúde de maior proxi-midade e mais fácil acesso, são uma porta aberta de grande pro-fissionalismo, humanidade e sem barreiras», à imagem do próprio congresso, «que reflete no seu programa e diversidade de orado-res o mesmo espírito de abertura

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à sociedade, aos parceiros e aos doentes», afirmou João Silveira.A sustentabilidade, conforme fez notar, iria ali servir de fio condutor, atravessando todos os painéis, o que só teria razão de ser se «for tratada num sentido lato e não apenas no quadro do orçamento do SNS. Se for pensada ao nível da saúde na comu-nidade e na busca do indivíduo por melhores resultados clínicos, huma-nos e económicos, âmbito em que nos preocupam as consequências em saúde pós-Troika e a previsível degradação dos principais indicado-res. Se for pensada ao nível do me-dicamento, garantindo a sua quali-dade, segurança e eficácia a preços razoáveis, aproveitando, obviamente, os genéricos, mas tendo consciência que os preços não podem baixar até

ao “inferno”, e garantindo o acesso à inovação farmacêutica, que tanto tem contribuído para a melhoria da qua-lidade e aumento da esperança de vida de todos nós». O medicamento, comentou, considerado até há pou-co tempo «a panaceia para todos os males, parece ter-se tornado agora na sua causa. Temos de o recolocar no devido lugar e parar de destruir valor».o momento é de crise, e não ape-nas económica, também de valo-res. Portugal vive sob um programa de assistência há quase três anos, «mas pouco fizemos para atacar as causas da nossa desgraça. As crises trazem oportunidades para avaliar situações, para ir à causa das coisas, falar verdade, aprender com os erros, corrigir o que está mal.

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Espero que esta não seja mais uma oportunidade perdida para o nos-so país», muito embora os sinais sejam sombrios, já que «o Estado, principal responsável dos nossos males, endividamento e ineficiên-cia, continua praticamente na mes-ma ou pior, alimentando-se da bu-rocracia que diariamente vai crian-do, constituindo a principal barreira ao desenvolvimento».

LOUVOR AO MÉRITO COM ATRIBUIÇÃO DE INSíGNIAS

Ainda com a palavra, João Silveira realçou que «uma profissão afirma o seu prestígio e dignidade no quotidia-no da sua atividade, cumprindo a sua missão no seio da sociedade em que está inserida», mas também «pela humildade de reconhecer entre os seus pares aqueles que se distin-guem pelas suas qualidades huma-nas, pelo seu trabalho e dedicação às causas, neste caso concreto às cau-sas da saúde e da farmácia, que aca-bam por ser uma única». Feito este enquadramento, o Presidente da Mesa da Assembleia-Geral anunciou a atribuição das Insígnias da ANF aos colegas Maria da Luz Sequeira, Francisco Guerreiro Gomes e a David Hora Branco», que lhes forem en-tregues por João Silveira e Paulo Duarte. ( Ver páginas 22 e 23)

A CORAGEM E RESILIêNCIA DAS FARMÁCIAS

Era chegado o momento do discur-so do presidente da Direção, Paulo Duarte, em torno do qual se vinha gerando alguma expectativa, muito por se tratar do primeiro Congresso de Paulo Duarte enquanto líder da Associação Nacional das Farmácias.Paulo Duarte iniciou o seu discurso por uma felicitação às farmácias e respetivas equipas «pela coragem com que têm resistido à crise que atravessamos» e também pela re-siliência na superação de obstácu-los, bem conhecidos da ANF e que,

muitas vezes, nada têm a ver com a crise do país. Em causa estão «di-ficuldades gratuitas, algumas a ro-çar o absurdo». Somos diariamente sujeitos a uma chuva miudinha de novos pontos e alíneas, muitas ve-zes incoerentes e inexequíveis, nor-malmente para aplicar logo no dia seguinte». É, considerou Paulo Duarte, uma «estranha forma de o Estado se re-lacionar com as empresas e a socie-dade», e que, conforme notou, tem o único mérito de gerar consenso, pois «há muito que estamos todos de acordo: é preciso vencer a buro-cracia», algo urgente nos dias que correm, em que «já temos graves problemas para resolver». Um deles reside na permanente di-ficuldade das farmácias adquirirem os medicamentos de que necessi-tam, agravada pela continuada pres-crição de referências «que pura e simplesmente não estão disponíveis no mercado». Para o demonstrar, a ANF fez um levantamento junto de 50% das farmácias e concluiu que as mesmas não conseguiram adquirir, só no recente mês de setembro, dois milhões de embalagens de genéricos receitados pelos médicos ou pedidos pelos doentes, «mais de 3200 apre-sentações de medicamentos gené-ricos não foram, sequer, fornecidas ao mercado», sendo que «dos 20

genéricos com maior dificuldade de aquisição, 11 tinham um dos cin-co preços mais baixos». Em suma: «está a ser pedido às farmácias que resolvam, na própria hora, falhas de abastecimento no mercado impossí-veis de ultrapassar».Relativamente aos genéricos, disse «as farmácias não têm lições a re-ceber de ninguém». Há 20 anos que reclamavam uma lei que garantisse aos portugueses o acesso a medica-mentos com a mesma qualidade e mais baratos». Iniciaram, na década de 90, «praticamente sozinhas, com a hostilidade de muitos e a indiferença do Estado», um combate responsá-vel pela criação do mercado de gené-ricos, o qual demorou um quarto de século a dar os primeiros resultados. Mais: o setor avisou, «com décadas de antecedência», para os graves ris-cos de erros, atrasos e omissões de uma política eleitoralista na área da Saúde. «Sabíamos que a insustenta-bilidade dessa política iria abater-se sobre as farmácias, mas também so-bre todos os portugueses». O Estado,

Paulo Duarte, presidente da ANF

«A Direção da ANF está consciente das suas responsabilidades e das dificuldades de todos nós. O que pudermos fazer em benefício das farmácias, faremos», garantiu Paulo Duarte

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FARMÁCIA PORTUGUESA • 204 • OUT/NOV/DEZ‘13FARMÁCIA PORTUGUESA • 204 • OUT/NOV/DEZ‘13

porém, e durante décadas, «adiou as reformas inevitáveis e gastou sem limites, como se o país vivesse na maior das abundâncias» e, «quando acordou, Portugal estava falido».«Teria sido melhor prevenir a saúde financeira do país, do que entregá-lo agora no “serviço de ur-gência” da Troika!». As farmácias estão, por isso, em crise, «mas de consciência tranquila».

FALTA DE RECONHECIMENTO DO ESTADO

Até porque, para além do mais, o setor desenvolveu-se e modernizou--se ao longo dos últimos 40 anos investindo nisso os seus próprios recursos e colocando-se sempre ao lado de todas as soluções favoráveis aos doentes e contribuintes portu-gueses. A população reconhece-o, mas o Estado não: antes penaliza o esforço diário das farmácias para ga-rantir que os utentes continuam a ter acesso aos fármacos, seja por «reti-ficações absurdas de receituário, as-sentes num formalismo incompre-ensível que ignora a realidade atual do circuito do medicamento», seja por, juntamente com os doentes, se-rem «confrontadas todos os dias com receituário que transforma em regra situações a que a lei atribui caráter excecional».

Não o reconhece porque, quem go-verna, é inconsequente nas políti-cas que implementa, como o prova a imposição de uma austeridade que supera já os 300 milhões de euros, quando o acordo da Troika «exigia das farmácias e dos gros-sistas uma contribuição de 50 mi-lhões para a redução da despesa pública com medicamentos. Nós já pagámos seis vezes a “taxa mode-radora” acordada com os credores internacionais». Ao contrário do próprio Estado, que não concorreu ainda para qualquer diminuição do dispêndio com o consumo de medi-camentos nos hospitais que tutela. «Até hoje, a Saúde contribuiu com 1.200 milhões de euros para a re-dução da despesa pública prevista no Orçamento Geral do Estado, dos quais 600 milhões de euros foram conseguidos à custa da redução da despesa com medicamentos em ambulatório e, destes, mais de 300 milhões foram à custa dos gros-sistas e das farmácias. Ora, nem os medicamentos em ambulató-rio pesam metade do orçamento da Saúde, nem a distribuição pesa metade da despesa com medica-mentos em ambulatório. A injustiça é evidente», acusou Paulo Duarte. O poder político, porém, aparenta oti-mismo, «parece comprazer-se com a circunstância de continuarem, na sua

grande maioria, abertas ao público». Acontece que, conforme observou, ter as portas abertas não é sinónimo de cumprimento da sua função se, con-comitantemente, não tiverem medi-camentos. «Iludir esta situação com a abertura de novas farmácias pode ser politicamente tentador mas só agra-va o problema», do qual, de resto, os responsáveis da política de Saúde têm consciência, caso contrário não se en-tenderia «que esta semana tenha sido publicado um regulamento com pro-cedimento urgente para a abertura de postos farmacêuticos móveis nos locais de encerramento de farmácias, ainda que temporários». A ANF não se opõe a soluções de emergência para assegurar a acessibilidade da população aos medicamentos, «mas melhor seria adotar as soluções que já propusemos para evitar o encerra-mento de farmácias». E ainda sobre a falta do reconheci-mento do Estado, a vacinação contra a gripe é dele exemplo paradigmático. «as farmácias portuguesas são elo-giadas internacionalmente pelo ser-viço de vacinação, pela inovação em que ele se traduziu, pela qualidade com que é prestado, pela sua acessi-bilidade às populações, pela confian-ça dos doentes neste serviço e pelos seus resultados. mas, em Portugal, o ministério da saúde, em vez de incentivar a sua colaboração neste domínio, preferiu criar um serviço alternativo e concorrente. Perdem os doentes, que são obrigados a deslo-car-se ao centro de saúde para efei-tos de vacinação; perde o Ministério da Saúde, que não atinge os objetivos de cobertura vacinal; e perde o erário público pelas vacinas adquiridas e não administradas». Os doentes reconhe-cem o valor das farmácias, os resul-tados de estudos, inclusive do próprio INSA, comprovam a larga preferência dos utentes pela vacinação nas suas instalações. O Estado, não. E se assim não fosse, haveria muito mais que as farmácias poderiam já estar a fazer no domínio do uso racio-nal dos medicamentos e da adesão à

Paulo Duarte, presidente da ANF

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terapêutica, na melhoria da situação atual nas áreas dos medicamentos hospitalares, da vacinação, dos do-entes polimedicados, dos antidia-béticos orais, do desperdício, entre tantas outras coisas com benefício também… para o próprio Estado!

A NECESSÁRIA MUDANÇADE ATITUDE DO ESTADO

A realidade, tal como bem demonstra cada novo dia, mudou. «O equilíbrio em que assentou o funcionamento da atividade de Farmácia de Oficina nas últimas décadas, o “contrato so-cial” de direitos e obrigações entre o Estado e as farmácias foi destruído e ainda não foi substituído por nenhum outro», referiu Paulo Duarte.A ANF propõe, assim, a construção de um novo “contrato social”, em que o Estado e as farmácias se compro-metam a assegurar uma assistência farmacêutica de qualidade às popu-lações, mas de acordo, necessaria-mente, com um novo modelo, onde «as farmácias querem assumir mais responsabilidades, prestar mais ser-viços à comunidade», em que estão «disponíveis para partilhar os riscos das novas soluções, porque têm a certeza do seu valor acrescenta-do para a sociedade». Mas querem também «ser justamente compen-sadas de acordo com o valor que a sua intervenção representar para o Sistema de Saúde e para os portu-gueses».As farmácias querem também ser tratadas com equidade: «o critério de remuneração que for aplicado para uns deve ser aplicado para todos». Querem, enfim, hoje, «como quise-mos sempre, construir o futuro». Chegado a este ponto, o presidente da ANF particularizou o seu discurso.Primeiro, saudou a disponibilidade, «recentemente manifestada», do bastonário da Ordem dos Médicos «para cooperar connosco na de-fesa desses grandes valores», relembrando que apesar de o con-fronto ser um recurso disponível

e ao alcance da Associação, ele só será usado «quando definiti-vamente estivermos convencidos que é a única solução». Essa não é «a nossa política. A confrontação que desejamos é a de ideias». Depois, dirigiu-se aos responsáveis do Ministério da Saúde, ali repre-sentados pelo secretário de Estado Manuel Teixeira, reconhecendo «a coragem que tiveram para aplicar uma política de austeridade, impopu-lar, mas necessária para salvar o país da bancarrota», mas formulando o desejo de que «essa coragem políti-ca se mantenha agora para retificar o que deve ser retificado, decidir o que tiver de ser decidido, para implemen-tar uma política de Saúde estável e coerente, que respeite os interesses do Estado, que respeite os doentes, mas que respeite também os setores de atividade indispensáveis à subsis-tência do Sistema de Saúde». Por fim, falou para os associados da ANF. «Estamos numa encruzilhada. Temos de ser fortes para vencer as dificuldades e eu sei que os asso-ciados são fortes nas suas convic-ções. Temos de estar unidos porque a união faz a força e nós sempre es-

tivemos, estamos e estaremos uni-dos. Temos de ser determinados e eu conheço a vossa determinação. Não devemos ser pessimistas, por-que o pessimismo é uma dificulda-de acrescida para vencer as dificul-dades. Mas, também ninguém nos pode exigir que sejamos otimistas em relação ao futuro. O que nos pode ser exigido é que sejamos responsáveis e, isso, nós seremos seguramente. A Direção da ANF está consciente das suas respon-sabilidades e das dificuldades de todos nós. O que pudermos fazer em benefício das farmácias, fare-mos. Com a nossa unidade, com a razão que nos assiste, com a con-fiança das populações, estou certo que acabaremos por vencer a crise e construir um futuro melhor».

OBJETIVOS E MEDIDAS DO GOVERNO

Usou da palavra em seguida o secre-tário de estado da saúde, manuel Teixeira, com um discurso que, ape-sar de repetir, em grande parte, al-gumas ideias já anunciadas noutras ocasiões, aqui e ali prometia abertu-

Manuel Teixeira, secretário de Estado da Saúde

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FARMÁCIA PORTUGUESA • 204 • OUT/NOV/DEZ‘13FARMÁCIA PORTUGUESA • 204 • OUT/NOV/DEZ‘13

ra ao diálogo e consenso, e mesmo a um certo grau de compromisso.Manuel Teixeira referiu-se ex-pressamente à mais-valia da in-tervenção farmacêutica em prol da saúde, para descrever depois «o momento excecionalmente di-fícil e exigente» que se atravessa e que «obriga a medidas muitas vezes impopulares», nomeada-mente ao nível da política do me-dicamento, mas que «o Ministério tem assumido de modo conscien-te e transparente, focado no prin-cipal desígnio do Estado: promo-ver e alcançar poupanças públicas e proteger o acesso da população ao medicamento». Para tal, relembrou algumas des-sas medidas, como a prescrição e dispensa dos medicamentos por DCI, que classificou como uma re-forma estrutural, entre outras que, no seu conjunto, «deram já alguns resultados impressivos, de que é exemplo o facto de mais de um quarto das embalagens vendidas em farmácia ser de medicamentos genéricos». Disse também que a tutela reconhe-ce, particularmente, «o substancial contributo das farmácias, que en-frentaram e enfrentam significativas reduções de rentabilidade e, em ca-sos limite, a inviabilidade de funcio-namento», bem como outras gran-des dificuldades. Todavia, notou que se tivessem sido outras as opções do Governo, se este tivesse escolhi-do transferir os encargos para os utentes ou ignorar as famílias nas poupanças, «os doentes deixariam de ter acesso aos medicamentos e o circuito deixaria de funcionar, o que levaria a consequências mais signi-ficativas que a diminuição da sua rentabilidade». O Ministério não ignora, de facto, os problemas do setor da farmácia, e tem, por isso, «procurado tomar medidas para aliviar a pressão» dos seus encargos. Entram neste côm-puto a diminuição e flexibilização dos horários mínimos de funcionamento,

Maria Antónia Almeida Santos, presidente da Comissão Parlamentar de Saúde

assim como do número mínimo de farmácias de serviço noturno, a elimi-nação do regime de reforço de turno e a criação de um regime excecional de funcionamento para as farmácias mais pequenas. «Reconhecemos que não são medidas estruturais que solucionem os problemas, mas são sinal da nossa atenção e sensibilida-de», afirmou o secretário de Estado, acrescentando que «reafirmamos, aqui, a nossa disponibilidade para o diálogo, e assumimos, de forma clara, a necessidade de encontrar soluções inovadoras que correspon-dam à manutenção de uma trajetória de poupança e sustentabilidade e de proteção de acesso dos doentes aos medicamentos».

DISPONIBILIDADE PARA AVALIAR PROPOSTAS

Manuel Teixeira garantiu que, nes-te sentido, o Ministério da Saúde se compromete «a avaliar as propostas que contribuam para um horizon-te alargado de sustentabilidade», reforçando, contudo, «que será im-possível um regresso ao passado», assim como não serão assumidos «compromissos impossíveis de cum-prir». A disponibilidade da tutela é para «discutir medidas inteligentes», como «o alinhamento de incentivos ou a partilha de ganhos no cresci-mento do mercado de genéricos, como retribuição ao empenho das farmácias no seu desenvolvimento», algo que o Governo considera mes-mo «oportuno». Adicionalmente, «de modo mais es-trutural», o Governo está também disponível para avaliar as opor-tunidades de melhoria da função das farmácias enquanto espaço de saúde, «potenciado pela sua distri-buição muito equilibrada pelo terri-tório, assente em serviços de apoio à sociedade, como são exemplo a troca de seringas e a substituição narcótica, correspondendo a uma visão articulada, sinérgica e com-plementar ao SNS».

É, pois, num espaço de «serenida-de» que o Governo se comprome-te a «uma análise e ponderação destas oportunidades, esperando poder encontrar nelas soluções consonantes com a manutenção da excelência da atividade das farmácias e os parâmetros do novo contrato social, sem igno-rar que tal será necessariamente exigente e difícil no cenário atual do país».maria antónia almeida santos en-cerrou, depois, a sessão, com uma breve comunicação que pretendeu, acima de tudo, mostrar o reconhe-cimento «unânime» da comissão de saúde da assembleia, que con-sidera a anF «um parceiro im-prescindível ao sns», bem como a disponibilidade da Assembleia da República para dialogar e assim contribuir para que se encontre um novo relacionamento das farmácias com o Estado, «que promova a rela-ção com os doentes e a sustentabi-lidade do setor». O congresso estava oficialmente aberto!

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No decorrer da sessão de Abertura do 11.º Congresso das Farmácias, a ANF prestou a sua homenagem e público reconhecimento ao prestimoso contributo de três dos seus associados, entregando-lhes as suas Insígnias. maria da Luz sequeira, David Dias da Hora Branco e, a título póstumo, Francisco Guerreiro Gomes, entraram assim para a restrita galeria de personalidades que, na perspetiva da ANF, mais colaboraram para a evolução e desenvolvimento do setor em Portugal.

atribuição de insígnias

o reconhecimento do mérito

marIa Da lUZ seQUeIraA decisão de distinguir Maria da Luz Sequeira com a atribuição das Insígnias da ANF foi tomada a 19 de maio de 2012, em reunião conjunta da Direção e Mesa da Assembleia-Geral (AG) da ANF, que quiseram as-sim enaltecer «a relevância com que o seu desempe-nho tem contribuído para o progresso da Farmácia em Portugal». No ato da entrega, Maria da Luz Sequeira confessou-se «muito lisonjeada. vejo nestas Insígnias um reconhecimento do meu trabalho e do meu esfor-ço, e isso é sempre muito gratificante».Maria da Luz Sequeira foi convidada, em 1992, a in-tegrar a estrutura associativa da ANF, onde desem-penhou os cargos de delegada de zona e distrital, tendo sido novamente por convite que, em 1995, integrou a Direção da ANF, de que foi eleita vice--presidente em 1998. Nesse mesmo ano esteve na origem da Plataforma Saúde em Diálogo, nela assumindo desde sempre a representação da ANF. Aí desenvolveu «um trabalho notável no âmbito desta entidade e na defesa dos di-reitos dos doentes», valendo-lhe o público reconhe-cimento através da atribuição da Comenda da Ordem de Mérito, em 2004, pelo Presidente da República Jorge Sampaio. Tal galardão «não só faz justiça à competência de Maria da Luz Sequeira, como eno-brece a ANF e as farmácias por ela representadas». Mais que o desempenho de cargos de gerência e ad-ministração em várias empresas do Universo ANF e organizações na vertente associativa, quis-se com estas Insígnias vincar o seu contributo «decisivo» no cimentar da estrutura associativa da ANF. «A postu-ra firme e ao mesmo tempo dialogante foi basilar na forma excecional como interagiu com todas as far-mácias associadas, mas, em especial, com delega-dos de círculo, zona e regionais, sendo para estes um exemplo a seguir».

Em declarações à “Farmácia Portuguesa”, Maria da Luz Sequeira sublinhou que «nada se faz sem esforço e pouco se faz sozinho, motivo pelo qual partilhei esta condecoração com to-das as pessoas que contribuíram para a con-cretização dos projetos em que me envolvi. Estou-lhes reconhecida por isso!», especial-mente «à minha filha Vera, pelo seu carinho, compreensão e apoio, e pelas muitas vezes em que abnegou da minha presença ao longo deste meu percurso». Foi particularmente a ela que devotou as Insígnias, estendendo, porém, a de-dicatória a todos os jovens farmacêuticos, «tra-duzindo o incentivo que lhes quero dar. Nestes tempos difíceis que atravessamos, é preciso que acreditem que o futuro pode ser melhor, se usarem a sua inteligência, a sua ousadia e a força e perseverança no seu trabalho. E tenho simultaneamente a esperança de que podem, participando no desenvolvimento associativo da profissão, continuar o que de bom foi feito e alcançar alguns dos objetivos a que, nós, os mais velhos, nos propusemos e não consegui-mos atingir».

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FrancIsco GUerreIro GomesA atribuição das Insígnias a Francisco Guerreiro Gomes (1944-2012), deixou profundamente sensibili-zada a sua família. A homenagem, com que a Direção e a Mesa da AG pretenderam sublinhar «o seu exemplo, a sua per-manente disponibilidade para o trabalho associativo, o legado humano, cívico, profissional e cultural que nos deixou», foi «um gesto muito bonito, pelo qual agra-decemos sinceramente, eu e toda a família», comen-tou, em declarações à “Farmácia Portuguesa”, Maria Teresa Cavaco Gomes, esposa do saudoso farmacêuti-co, falecido prematuramente.Francisco Guerreiro Gomes foi o primeiro farmacêu-tico contratado da ANF quando, em 1982, aceitou o desafio de exercer funções de secretário-técnico, com a responsabilidade de organizar e desenvolver um programa de Formação Contínua para farmacêuticos de oficina. Conforme citado na ata da reunião de 10 de setembro entre os dois órgãos da ANF, «cumpriu essa missão de forma exemplar e bem-sucedida, e a sua prestação profissional no seio associativo significou o início de um conjunto de serviços de apoio à profissão que teve e continua a ter uma importância decisiva na modernização e na intervenção social da Farmácia no nosso país». Foi ele também «um dos principais responsáveis pelas Boas Práticas de Farmácia, que contribuíram de forma assinalável para a melhoria do exercício profissional em Farmácia Comunitária». Entre 1986 e 1995 fez parte da Direção da ANF, sen-do simultaneamente o diretor da revista “Farmácia Portuguesa”, cargo a que regressou em 2005 e ocupou até 2012. Foi igualmente um dos principais responsá-veis pela criação do Museu Nacional das Farmácias.Francisco Guerreiro Gomes «foi um exemplo para to-dos nós». maria Teresa cavaco Gomes diz-se «muito grata à anF, por ter reconhecido o trabalho do meu marido. Foi, sem dúvida, uma atitude muito nobre e muito comovente».

DavID DIas Hora brancoNa mesma reunião de 10 de setembro, foi ainda de-cidido atribuir as Insígnias da Associação a David Dias da Hora Branco. Técnico de farmácia, sócio proprietário da Farmácia Gramacho desde 1964, participou, em 1974, no movimento que transformou o antigo Grémio na ANF, onde desempenhou, desde então, vários car-gos, com relevante destaque para a presidência do Conselho Nacional, atual AG de Delegados, e da Mesa da AG, de 1995 a 2012, e mais recentemente, do Conselho Fiscal, de 2012 a 2013. «No exercício dessas funções, sobressaiu sempre a lucidez das suas intervenções, o equilíbrio das suas posições, o espírito de consenso e a promoção da unidade associativa».O serviço à comunidade local sempre ocupou igual-mente lugar de relevo na sua vida quotidiana, fosse ao nível associativo, fosse como autarca, como co-laborador da Imprensa Regional ou impulsionador, participante e organizador de atividades diversas de âmbito cultural. Tal envolvimento mereceu-lhe, em 2001, a atribuição, em cerimónia pública, da Medalha de Alto Mérito (Grau Ouro) pela Câmara Municipal da Maia, «por atos e serviços conside-rados notáveis e relevantes em favor do Concelho e dignos de público reconhecimento e de assinala-do apreço», o que muito contribui também para o prestígio do setor de Farmácias.Para David Hora branco, em face da galeria de distinguidos com estas Insígnias, a atitude da ANF «constitui muito mais um ato de generosida-de que de justiça. no entanto, paradoxalmente, mesmo sabendo que não o mereço, aceito, mui-to honrado e com orgulho». E pelo que classifica como a «enorme generosidade da honra que me foi conferida», concluiu com duas palavras: «muito obrigado».

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paIneL I: uma saúde sustentáveL para portugaL

espírito verdadeiramente interessadoUma discussão profícua não se faz, nunca, sem se abordar o seu contexto. Parte-se do geral para que, percebendo-se o enquadramento, se possam, depois, com maior segurança, apontar ideias concretas e mais sólidas. Assim foi desenhado o programa deste congresso, que iniciou a debater os riscos da crise e os caminhos da sustentabilidade da saúde, onde ficaram bem evidenciadas as possíveis áreas para um sinérgico e efetivo contributo das farmácias.

Os trabalhos arrancaram, num pri-meiro painel, sob condução de Paulo Baldaia, diretor da TSF, que anunciou que o objetivo das duas horas seguin-tes passaria por «tentar perceber como se consegue uma saúde sus-tentável para Portugal».Conforme sublinhou, trata-se de uma discussão «feita num clima de forte austeridade, que, obviamente, condi-ciona o caminho que está a ser segui-do», no qual «a urgência em reduzir a despesa pública acelera os efeitos secundários das medidas que estão

a ser tomadas para garantir um ser-viço público de saúde». Estava as-sim lançado o mote para a primeira apresentação da manhã, sobre os efeitos da austeridade na saúde.

UMA QUESTÃO DE MAGNITUDE

A crise económica, segundo Joana Madureira Lima, da Universidade de Oxford, não tem necessaria-mente de ter impacto sobre a saúde das pessoas, o qual está

antes dependente da resposta dos Governos. Não se trata, portanto, de uma fatalidade e há mesmo quem teorize que as crises podem ter efeitos positivos: a falta de dinheiro pode levar os indivíduos a deixarem de beber e de fumar, de andar de carro e passar a andar mais a pé… Há menos acidentes de tráfego… E há, também, o outro lado da realida-de, como acontece hoje, por exem-plo, em Espanha, onde não há ór-gãos para transplante, a qualidade nutricional da alimentação é mais

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Segundo Miguel Gouveia, « vamos estar, por muito tempo, a fazer ajustamentos»

pobre, etc. No fundo, defendeu a in-vestigadora no decurso da primeira palestra da manhã, «o equilíbrio entre os efeitos positivos e negati-vos joga-se nas respostas dos go-vernos e sociedades aos problemas que surgem». Alguns estudos, ainda em curso, so-bre os efeitos de crises anteriores parecem, no entanto, sugerir uma relação. É o caso de uma investiga-ção de 2008, cujos dados prelimina-res indicam que houve um aumento das mortes devidas a doenças car-diovasculares nos países desenvolvi-dos, num contexto teórico em que as pessoas temem pelo futuro dos seus investimentos e poupanças, sendo o aumento do stress o mecanismo causal. Mas é em consequência da desor-çamentação em Saúde Pública e do desinvestimento em programas de prevenção que são mais concretas as conclusões das pesquisas, no senti-do de uma relação causal com a in-cidência de determinadas patologias. «O caso grego permite observações

destas em diferentes âmbitos: ime-diatamente a seguir aos cortes or-çamentais no Centro de Controlo e Prevenção das Doenças Infecciosas o país enfrentou um surto de infe-ções por vírus do Nilo Ocidental que tirou a vida a 70 pessoas, assim como assistiu ao regresso da malária, há muito erradicada da Europa, e está a enfrentar um gravoso aumento das infeções por VIH. O orçamento em prevenção na Grécia foi literalmente das primeiras coisas a serem corta-das – corte de 36%».Em resumo, concluiu: há, aparente-mente, efeitos. A sua magnitude, to-davia, pode ser discutida.

«NÃO VAI EXISTIR UM PóS-TROIkA»

Miguel Gouveia, da Universidade Ca-tólica Portuguesa, falou de seguida,

tendo começado a sua intervenção com um pedido de desculpas. É que havia sido convidado para falar so-bre “Financiamento e resultados em saúde no período pós-Troika”, mas iria passar toda a sua preleção a defender que «esse período não vai existir. Ou seja, como os problemas que nos levaram a ser intervenciona-dos não estão resolvidos, o que quer que se siga à saída da Troika do país vai ser igual ao que foi durante a sua permanência. Vamos estar, por mui-to tempo, a fazer ajustamentos». Até porque «teremos sempre difi-culdades em encontrar quem nos empreste dinheiro enquanto o rácio entre a dívida portuguesa e o PIB continuar a crescer», algo de difícil resolução dado o principal problema da nossa Economia: o crescimen-to do desemprego. «É verdade que houve nos anos recentes uma ace-leração, mas a tendência verifica-se desde 2002, 2003». Há muito, observa o professor, que não se investe na Economia portu-guesa e, assim, «excetuando o últi-mo trimestre, o PIB tem vindo sem-pre a descer». O défice por recupe-rar «é brutal», e «mesmo que o

Para Joana Lima, a crise tem efeitos sobre

a saúde, embora de magnitude discutível

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O PSD «está disponível para ouvir as propostas da ANF e explorar a hipótese de haver sistemas remuneratórios associados à prestação de serviços», disse Miguel Santos

enquadramento orçamental mudas-se ou o cenário internacional fosse alterado – e seria ingénuo pensar que a mudança poderia vir daqui, uma vez que o crescimento da Economia a nível mundial não é propriamente cor-de-rosa! -, a verdade é que não temos capacidade instalada para o fazer rapidamente. O melhor que pode acontecer a Portugal é crescer devagarinho e a única coisa que po-derá ajudar um pouco no futuro são as exportações, isto é, transformar-mo-nos num país especializado em bens transacionáveis». Só que, para cúmulo, Portugal é mal comportado nos orçamentos, fez no-tar Miguel Gouveia.Em 2013 já é visível um substancial relaxamento do esforço de conso-lidação da política orçamental, re-flexo de «um problema grave, que pode designar-se por fadiga da austeridade. Este ano praticamente não houve ajustamento e estamos a atrasar-nos imenso. Por outro lado, as taxas de juro começaram a subir nos últimos tempos, porque toda a gente percebe que a dívida em rela-ção ao PIB tem uma evolução que é bastante insustentável».O orador conduziu então um exer-cício de prospeção, onde, sobre uma folha de Excel, alterando as diferentes variáveis – taxas de juro, crescimento do PIB, défices pri-mários -, procurava perceber qual seria o comportamento da dívida nacional. Depois de várias combina-ções de fatores, todas de resultado

incomportável, encontrou uma que permitiria ao país, daqui a 30 anos, reduzir a dívida para níveis susten-táveis. «Ora, todos sabemos que não é politicamente viável ter nos próximos anos, de forma sistemáti-ca, um comportamento em todas as variáveis tão extraordinariamente positivo. Isto significa que temos um problema»: a dívida não é pagável!O que vai acontecer então? «Para mim é um mistério, mas a minha opinião é que um dos cenários a ter em conta passa por, se nos com-portarmos relativamente bem, os credores, em especial as institui-ções internacionais como o Banco Central Europeu, nos perdoarem uma parte da dívida, direta ou indi-retamente, através do abaixamento das taxas de juros, etc. Julgo, aliás, que o momento apenas está a ser protelado para que todas as enti-dades privadas internacionais que têm dívida portuguesa se possam ir, calmamente, livrando dos títulos,

passando-os para as instituições». Quanto às entidades nacionais, ou seja, os bancos, «que vão ficar com dívida pública que deixa de valer di-nheiro, passado um tempo, o siste-ma de supervisão bancária europeu começa a funcionar e, com ele, um fundo de garantia que já está na ca-lha para livrar alguns da falência». Pensando na área da Saúde, «nes-te momento, há boas razões para acreditar que o ajustamento ainda não terminou. Em 2011, ano a que correspondem os dados mais re-centes da OCDE, continuávamos a gastar em saúde muito acima do que seria de esperar para um país com as características do nosso». Logo, «toda a gente sabe que esta vai continuar a ser uma área de re-dução de despesas». Expondo uma longa lista de medidas a tomar da autoria da Troika, «al-gumas já implementadas», miguel Gouveia observou que «as únicas que de facto pouparam dinheiro foram no setor do medicamento», o qual pode ainda vir a ser atingi-do, «sobretudo por uma grande expansão dos genéricos e através de uma maior afetação de uma área que até agora foi menos pro-porcionalmente tocada: a dos me-dicamentos hospitalares».

HÁ MAIS CORTES PARA ALÉM DO MEDICAMENTO

Sobre as implicações da crise e redu-ção das despesas na saúde, os dife-rentes casos que analisou mostram que «o impacto nos grandes indica-dores não aparenta ter sido muito grande. Há, claro, subdimensões da saúde que são desproporcionalmen-te afetadas, como é o caso da saú-de mental e do desemprego», mas «apesar das críticas, parece que ain-da é possível e faz sentido que conti-nue a haver redução de despesa na área da Saúde». Onde é que, do seu ponto de vista, se podem continuar a fazer cortes no sentido de ajudar a equilibrar as finanças públicas e com impacto

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Maria Antónia Almeida Santos acusa o Governo de ter ido muito além da Troika e de ter «exagerado na dose» das suas políticas

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mínimo? Na área do medicamento, principalmente no ambulatório, pou-co haverá a fazer, «já se foi longe de mais. Repare-se que para cada sete euros de corte em despesa com me-dicamentos, o resto do setor da saú-de só fez um. Foi de tal modo despro-porcional, que hoje temos problemas com excesso de exportação paralela, redução no acesso aos fármacos ino-vadores, saída da indústria do país, insustentabilidade das farmácias… Mas na área hospitalar ainda é possí-vel haver ganhos de eficiência, assim como nos dispositivos médicos, que só há muito pouco tempo passaram a ser alvo de atenção por parte das autoridades». O Orçamento de Estado para 2014 já fala na reforma do sistema hospita-lar, «o que foi uma surpresa, pois fi-nalmente parece que é possível pou-par algum dinheiro». Ainda assim, diz, é referido um valor de aforro de 207 milhões de euros nos próximos anos, «quando a sétima revisão da Troika falava de um número entre 250 a 400 milhões». Para Miguel Gouveia não é óbvio de onde virá este dinheiro, «mas o Governo falou na devolução de algumas unidades às Misericórdias em troca de ganhos de eficiência. Porém, onde é possível, realmente, economizar muito dinhei-ro é na correção do excesso de oferta hospitalar. Em Lisboa, por exemplo, abrimos um hospital em Loures e até agora não se conseguiu fechar a MAC». Em suma, «considero que há muitos cortes que se podem realizar ainda na área da saúde e não é claro para mim que os seus impactos tenham necessariamente de ser muito ne-gativos. Haverá, certamente, conse-quências menos boas em casos es-pecíficos, mas é preciso ter cuidado para não entrar em demagogias po-líticas baratas».

ERRO DE DOSEAMENTO POR EXCESSO

Às duas conferências seguiu-se o já tradicional debate com os depu-

tados da Assembleia da República, representantes dos partidos com as-sento no Parlamento. A primeira questão de Paulo Baldaia foi dirigida a Maria Antónia Almeida Santos, do PS, a quem perguntou, tendo em conta que 10% do PIB nacional é gasto em Saúde, se não estaríamos igualmente obrigados a pensar nos consumos nesta área, ainda que não intervencionados? Na réplica, a deputada socialista fez notar que «há mais de trinta anos que ouço falar dos problemas da in-sustentabilidade, mas ainda não che-gámos ao ponto de declarar o SNS insolvente! Temos conseguido man-tê-lo a funcionar com muitas dificul-dades, é certo, mas apesar de tudo também com muitas alegrias, até em termos de índices e resultados a nível mundial».Poderão esses resultados estar, agora, com a crise, a ser postos em causa? «Os estudos mostram que o impacto da crise na saúde é

real», disse, mas lembrou que «te-mos uma filosofia subjacente à nossa Constituição que, apesar de suscetí-vel de sofrer alguns melhoramentos, não deve ser mudada, e que dita que cada um de nós contribui para o SNS, ou seja, pagamos saudáveis para po-dermos beneficiar quando estiver-mos doentes. Este, não obstante tudo o resto, ainda é um modelo válido e do qual não devemos desistir». Para Maria Antónia Almeida Santos, isto significa que não devem ser criados novos impostos sobre a Saúde, caso contrário incorre-se no risco de des-virtuar a filosofia primária do SNS, coisa que não tem sido acautelada pelo Governo, que «foi muito além das recomendações da Troika». As políti-cas que vêm sendo seguidas, pecam, segundo defende, por um doseamen-to errado: «tem sido um exagero e de-veríamos retomar algum equilíbrio».

O TEMPO MOSTRARÁ A RAzÃO

Dirigindo-se a Miguel Santos, do PSD, Paulo Baldaia considerou que «a sua será certamente uma visão diferente. Temos assistido a uma pressão sobre o SNS para o corte de custos, mas, por outro lado, não constituirá um pa-radoxo, no presente momento, desin-vestir na saúde?». O social-democrata confirmou que «não temos, de facto, uma visão tão simplificada da Saúde. O SNS é ab-solutamente imprescindível para os portugueses, mas, durante mais de

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Teresa Caeiro considera que «não nos podemos permitir desperdiçar um parceiro que nos pode, efetivamente, ajudar»

30 anos, fomos cumulando défices, maiores ou menores conforme a análise, e isso não o derrotou, nem ao setor da saúde, apenas porque os défices foram sendo suplantados quer por reforços dos Orçamentos de Estado quer pela acumulação de dívida. Julgo que estamos todos de acordo que tal situação não seria sustentável ad aeternum». Miguel Santos sublinhou, todavia, que ape-sar de uma dívida superior a três mil milhões de euros, «agravada por défices crónicos», o orçamento para a Saúde «não sofreu cortes nestes dois anos. Antes pelo contrário, hou-ve um reforço extraordinário que foi possível negociar com a Troika, e que permitiu uma dotação especial, no valor de 497 milhões de euros, para pagamento de compromissos, «e é possível que cheguemos ao final do ano com uma dívida muitíssimo infe-rior. Os dados da execução financeira em agosto são muito animadores, apresentando um saldo positivo de 456 milhões de euros, coisa que há anos não era vista, e uma execução 307 milhões abaixo da despesa». Mas não poderão estas contas estar, de algum modo, a pôr em causa a qualidade dos serviços? «Será, real-mente, necessário mais tempo para que se entenda o custo do preço que estamos a pagar. O regime de taxas moderadoras, por exemplo, que é algo que tem sido alvo de muita “con-versa”, e onde o que aconteceu foi um crescimento que atingiu, sobretudo, a

classe média - dado que isentámos mais um milhão de cidadãos, subindo o total para cinco milhões num poten-cial de sete» - não terá tido os resul-tados catastróficos anunciados pela oposição, defendeu. «Os dados assis-tenciais, de acesso aos sistemas de saúde, têm vindo a melhorar em toda a linha: nas cirurgias, nas consultas hospitalares… Nos cuidados de saú-de primários há um ligeiro decrés-cimo, tendência que nos preocupa, mas que é atenuada pelo aumento das consultas médicas domiciliárias, por uma muito maior assistência dos enfermeiros no domicílio e pelo facto de as idas aos centros de saúde para renovação de receitas estarem a diminuir».

UMA SUSTENTABILIDADE INSUPORTÁVEL

O moderador evocou, então, a afir-mação da Troika, de que Portugal atingiu o limite do que é possível

cortar no SNS e, interpelando João Semedo, afirmou que o seu partido, o BE, bem como o PCP, têm defen-dido a tese ali apresentada antes por Miguel Gouveia, que diz que não va-mos conseguir pagar a dívida. «Acha que a Saúde está a ser a principal ví-tima deste memorando?». Fiel ao seu estilo, o bloquista iniciou a considerar que «a intervenção do Prof. Miguel Gouveia, entre outros méritos, teve o de evidenciar que a trajetória da dívida deixou de ser um património do pensamento polí-tico da Esquerda, para passar a ser do pensamento político sensato, e também o de revelar que tudo isto é supérfluo, para não dizer inútil, porque daqui a 10 anos ninguém se recordará das mil e uma discussões que tivemos, com tanta paixão, sobre o assunto. É verdade que a Troika diz isso, mas o ministro tem afirmado que tem havido uma discriminação positiva da saúde, o que já não é ver-dade. Há um corte que ainda não se percebe muito bem onde será feito». Segundo João semedo acredita, «a sustentabilidade do sns não pode ser resolvida tornando-o insuportá-vel para os doentes, e eu julgo que já estamos nessa fase. Há demasia-dos sinais disso.Temos assistido a muitos cortes, que constituem me-didas pontuais, e muito poucas re-formas». Esse é um campo que, no entender do deputado, tem sido re-sumido «à fusão de hospitais, o que não reforma nada! Nenhum passou a funcionar melhor! E, depois, a par do desinvestimen-to há um não investimento puro. Ou seja, «é claro que todos gosta-ríamos que houvesse mais inves-timento e falar sobre isso é fácil, o que já não parece tão óbvio é que essa também é uma decisão ra-cional no domínio da despesa. Diz- -se, por exemplo, que não há vontade política ou dinheiro para o hospital de Lisboa [Todos os Santos], mas quan-tos milhões se poupariam?». É nesta linha de raciocínio que, defende João Semedo, está a verdadeira génese de uma reforma, «o resto é gerir um

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«No momento em que o acesso aos cuidados de saúde se restringe, deve ser alargada a carteira de cuidados e serviços prestados pelas farmácias», advoga João Semedo

orçamento, coisa muito diferente de gerir um serviço nacional de saúde».

QUERER ALGO E O SEU CONTRÁRIO

Aproveitando o mote, Paulo Baldaia comenta, com Teresa Caeiro, que se poupou «no que é pago à indústria e também com os genéricos, assim como no que se paga à restante atividade farmacêutica, mas nos hospitais continua a gastar-se mui-to dinheiro. Essa reforma está em curso, ou é uma ilusão e é preciso acelerar muito para que ela acon-teça?», perguntou. Para a deputada do CDS, a reforma hospitalar está a avançar, «e espanto--me que o Sr. deputado João Semedo não tenha referido a medida, recen-temente adotada, no sentido de con-centrar determinadas especialidades nas urgências noturnas, quando esse é exatamente um dos seus aspetos importantes. Reformar não é só en-cerrar edifícios – onde mais uma vez contámos com oposição frontal rela-tivamente ao encerramento da MAC, por exemplo - e construir um novo». Teresa Caeiro lamentou, a propósi-to, que «as pessoas, muitas vezes, querem algo e o seu contrário», mas fazer uma reforma «pressupõe decisões muito difíceis de tomar e frequentemente tardam a acontecer porque a população quer centros de elevada diferenciação e qualidade, com os melhores especialistas, e em

cada esquina, e isso é impossível em Portugal, assim como o é em países mais ricos que o nosso».

OBRIGAÇÃO VS. OPÇÃO POLíTICA

Até ali, observou Paulo Baldaia, toda a discussão havia sido muito focada nos aspetos financeiros, pelo que a pergunta que fez a Paula Santos, do PCP, foi no sentido de saber a sua opinião sobre como poupar e, ao mesmo tempo, manter ou aumentar a qualidade dos serviços prestados. Segundo a deputada comunista, esse é um aspeto que, a par da acessibi-lidade, tem, precisamente, ficado à margem da decisão política. «As pes-soas são aqui o mais importante, pelo que é preciso olhar e perceber onde e como as medidas implementadas impactam a sua saúde. Por exem-plo, estamos todos de acordo que é

preciso investir ao nível dos cuidados de saúde primários, que são a porta de entrada no SNS, mas aquilo a que temos assistido vai precisamente no sentido contrário, com o encerra-mento e redução de serviços por todo o país. O Governo refere que quer tirar das urgências hospitalares os casos que não são verdadeiramente dessa índole, mas como é que isso é possí-vel quando, ao nível local, fecharam um conjunto de respostas que exis-tiam e, nas suas áreas de residência, o único serviço que as pessoas têm disponível é o hospital? ».Mais: para o PCP, a necessidade de otimização de recursos não se coadu-na com medidas «como a concentra-ção de determinadas especialidades no período noturno na área metro-politana de Lisboa. Veja-se o caso da urgência psiquiátrica que, no período noturno, é assegurada na área me-tropolitana de Lisboa, mas também de Santarém, Alentejo e Algarve, por um hospital! É este o sentido de oti-mização que queremos?». Por outro lado, defende, muito há igualmente a dizer sobre a equidade na aplicação das medidas. «As taxas moderadoras, por exemplo: quando se fala no número de isenções e que elas não constituem um obstáculo no acesso aos serviços, é preciso olhar aos inúmeros casos concretos, e per-ceber que uma família de três ele-mentos, cujo rendimento seja de 600 euros e em que o filho tenha mais de 12 anos, não tem isenção». Paula Santos recorda que aos cor-tes que já foram assumidos e im-plementados em anos anteriores na saúde, o Governo pretende este ano somar mais cortes, sendo que da verba disponível em orçamento, metade é para o pagamento de dí-vidas. Ao mesmo tempo, diz, «é in-teressante comparar a disponibili-dade no Orçamento de Estado para outras rubricas como as PPP, que aumenta. Corta-se em quem mais precisa, e nos grandes grupos eco-nómicos não se toca; esta é a nossa presente equidade!». Em suma, de-fende: «as medidas que estão a ser

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implementadas não são uma inevi-tabilidade, mas sim uma opção polí-tica, pelo que, quando se fala que vi-vemos acima das nossas possibilida-des, seria importante perceber, em concreto, de quem se está a falar». Até porque, sublinhou, «os rendi- mentos do país dividem-se entre 48% que são do trabalho e 52% do capital, sendo que 75% do que é pago em impostos diretos é suportado pelos 48%. É importante perceber isto quando se questiona onde é que podemos ir buscar receitas para su-portar o Estado Social e, com ele, o SNS».

EXEMPLO DE DESPERDíCIO

Entretanto, Miguel Gouveia, tendo pedido para intervir, apresentou o que considera ser um exemplo concreto do «enorme desperdí-cio no nosso sistema de saúde: o Hospital de Todos os Santos, em Lisboa, projeto que está parado e que implica que, nos próximos anos, vamos continuar a ter um conjunto de hospitais a funcionar em vez de um, com muitos maiores custos e menor qualidade de cuidados. É um enorme desperdício e é interessante perguntar porque é que isto está a acontecer? É que o FMI sabe, a OMS sabe, o Banco Mundial sabe, que em todos os países, por esse mun-do fora, quando o sistema político não funciona bem, quando se abre um novo hospital nunca se fecha outro. Como os sistemas não têm credibilidade, não se fazem investi-mentos racionais porque a política é disfuncional. Abrimos um novo hos-pital em Loures e o Governo tentou fechar a MAC, mas o nosso sistema jurídico, que é disfuncional, resolveu intrometer-se num assunto de ges-tão. O que é que tivemos a dizer ao FMI, à OMS, etc? É que se abrirmos um hospital novo, provavelmente todos os outros continuarão a fun-cionar. Moral da história: o inves-timento muito rentável para toda a gente, que seria objetivamente uma

enorme redução do desperdício em Portugal, não vai acontecer nos próximos tempos».

É PRECISO VER A FARMÁCIA

Aberto o debate aos congressistas no auditório, interveio João Correia da Silva, afirmando, desde logo, que a política do medicamento ha-via sido tema que, apesar de muito importante, só de passagem fora mencionado. «Fala-se muito de dívida e, quando assim é, tenta--se misturar aquilo que é a dívida hospitalar, que se mantém igual ou aumenta, com a do ambulató-rio, que sofreu sete baixas de pre-ços sucessivas. É, de facto, muito mais fácil fazer um decreto-lei para baixar margens e preços, assim asfixiando uma farmácia, do que implementar medidas es-truturais». Não obstante, «e de forma quase heroica, as farmá-cias continuam a estar ao lado do Estado, ao lado de quem as está a atacar, e continuam a querer tra-balhar de forma construtiva. Nós queremos fazer parte da solução e não do problema, nós queremos e podemos ajudar. Nesta altura, basta que olhem para nós e per-cebam isto. A Dra. Paula Santos disse há pouco que em muitos lo-cais às vezes só há um hospital, mas eu digo que em muitos locais nem um hospital há, mas existe sempre uma farmácia, com um profissional de saúde, com a porta aberta e que está sempre pronto a ajudar os utentes. De uma vez por todas, o Governo tem de olhar para o nosso setor e ver-nos nes-sa perspetiva». Pedindo a palavra, Isaura Martinho fez notar aos deputados que «nós, farmacêuticos, não fazemos “con-versa”. Tudo o que nós, farma-cêuticos, escrevemos nos nossos programas eleitorais, da nossa Associação ou da Ordem, cumpri-mos religiosamente, coisa que não tem acontecido dessa parte para

connosco. O que nós queremos de vós, políticos, é que, como nós, tra-balhem, e que o façam com base na evidência, que executem os vossos programas de governo, porque foi para isso que nós votámos em vós, para que cumprissem as vossas propostas. Se o fizessem, as far-mácias não estavam falidas, a re-forma hospitalar estava em curso, a reforma dos cuidados primários não estava interrompida. Assim, digam aqui, objetivamente, o que é que se propõem fazer para dignifi-car a nossa classe, o seu trabalho e as pessoas que nós servimos».

PSD DISPONíVEL PARA UM NOVO CONTRATO SOCIAL

Paulo Baldaia exortou, então, os de-putados a dizer «o que é que enten-dem que deve ser feito para valorizar as farmácias e os farmacêuticos», começando a ronda por miguel santos, representante do maior partido da governação. Este destacou, desde logo, «o as-peto emocional das duas inter-venções, que compreendo e tem toda a legitimidade. Gostaria de dizer, no entanto, que, da parte do grupo parlamentar do PSD, temos desenvolvido um diálogo constan-te com todos os intervenientes do setor, inclusive com a ANF, como sei que tem acontecido também com o Governo». O deputado re-conheceu que tem de ser feito um esforço suplementar de contri-buição dos hospitais, à imagem de outros setores, e registou que terá sido aquela «a primeira vez que ouvi o BE dizer que quer ter uma reforma hospitalar, que de facto é importante». Por fim, o social-democrata acres-centou que não ficaria bem com a sua consciência se não referisse «a alteração fundamental na re-muneração das farmácias, que é inegável e perfeitamente assumida, com todos os custos políticos ine-rentes, mas será muito difícil que se regresse ao passado», pelo que

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Paula Santos defende que, à semelhança do que verifica noutros países, deve ser estudada uma taxa fixa para a dispensa do medicamento

«saúdo as palavras do presidente da Direção da ANF sobre um novo contrato social e digo que estamos disponíveis para encarar esse desa-fio, para ouvir as propostas da ANF e explorar a hipótese de haver sis-temas remuneratórios associados à prestação de serviços, de aumentar a capacidade de prestação de servi-ços ao nível dos cuidados de saúde primários por parte dos farmacêu-ticos diretamente junto das popu-lações, beneficiando das suas altas qualificações e da excecional rede de farmácias que Portugal tem, bem como para analisar medidas como a que já está a ser discutida e que pre-vê a possibilidade de haver incenti-vos ao crescimento do mercado de genéricos».Maria Antónia Almeida Santos sublinhou a realidade de dificuldade de acesso aos medicamentos das próprias farmácias e enfatizou a de-dicação dos farmacêuticos aos seus utentes, mesmo no atual momento difícil por que o setor atravessa.

AS POTENCIALIDADES DAS FARMÁCIAS

João Semedo, por seu turno, disse que, do seu ponto de vista, «é preciso perceber que, no momento em que o acesso aos cuidados de saúde se res-tringe, deve ser alargada a carteira de cuidados e serviços prestados pe-las farmácias na comunidade. Isso é absolutamente indispensável e deve ser, naturalmente, remunerado. As farmácias fazem parte do serviço na-cional de saúde, não lhe são corpos estranhos, portanto é preciso traba-lhar sobre todas as suas potenciali-dades. Depois, julgo que o sistema mais equilibrado de remuneração dos cuidados prestados nas farmá-cias é a introdução de um valor fixo e que essa solução responderia me-lhor às necessidades quer do serviço nacional de saúde quer das próprias farmácias. Em terceiro lugar, as far-mácias são vítimas de um mercado do medicamento completamente caótico no domínio da multiplicação

das formas que são distribuídas e essa irracionalidade tem de ser con-trolada. Bem sei que há princípios de livre concorrência, mas também há uma coisa que se chama interesse comum e que impõe, muitas vezes, a necessidade de fixar e implementar algumas regras». Paula Santos testemunhou que os comunistas valorizam «a inter-venção das farmácias na área da saúde e junto da comunidade», e observou que «este, que era um setor próspero, tem vindo a ser muito penalizado, não apenas des-de a alteração das margens de lu-cro, mas já lá atrás, com a venda dos medicamentos não sujeitos a receita médica fora das farmácias, a alteração na propriedade… Nós consideramos que é preciso to-mar medidas, porque as farmácias constituem um serviço público de enorme relevância na saúde, as-sente numa rede de grande proxi-midade que está a ser colocada em

causa. Mas entendemos, com toda a frontalidade, que as soluções que forem encontradas não podem onerar os utentes, e isso é possí-vel. Por exemplo, à semelhança do que é a experiência que se verifica noutros países, deve ser estudada a possibilidade de uma taxa fixa para a dispensa do medicamento. Também acreditamos que há aspe-tos que devem ser revistos na le-gislação que regula a propriedade, porque ela se encaminha no sen-tido de um objetivo, que não é de hoje, que é o da concentração». A última palavra coube a Teresa Caeiro, que disse «sobre a redução do preço dos medicamentos, concor-do que há maior pressão sobre um setor farmacêutico do que sobre o outro, e é importante assegurar que haja um equilíbrio na repartição dos esforços, mas, dito isto, é de assina-lar o que foi uma verdadeira reforma na saúde, que passa por assegurar o acesso ao medicamento a pessoas que, sobretudo num contexto de cri-se, certamente teriam muito maio-res dificuldades se não tivesse havido uma redução dos preços». Teresa Caeiro terminou advogando que «seria um desperdício indes-culpável se um país como o nosso não aproveitasse uma rede de três mil unidades de saúde que estão espalhadas da forma mais capilar por todo o território nacional; não só do ponto de vista da saúde pública, pelos cuidados que podem ser pres-tados pelos farmacêuticos, como também por essa ser uma forma de atenuar o tremendo impacto que as farmácias sofreram nos últimos tempos». Há várias opções em aber-to, muitas com provas dadas a nível internacional, disse, mencionando «os incentivos à dispensa de gené-ricos, o alargamento do espetro de medicamentos a dispensar a alguns de âmbito, hoje, exclusivo hospita-lar», etc. «Não nos podemos permi-tir desperdiçar um parceiro, que nos pode, efetivamente, ajudar». Assim chegava ao fim o primeiro painel do congresso.

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paIneL II: ContrIbuto do medICamento para uma saúde sustentáveL

espírito cooperativoDepois de avaliar o contexto do sistema de saúde em que a Farmácia se insere, foi tempo de dialogar com os parceiros da cadeia do medicamento, procurando, desse modo, compreender as visões e motivações atuais de cada um e, nesse entendimento mútuo de realidades, encontrar o espaço que existe para o estabelecimento de pontes colaborativas e sinérgicas. A conclusão foi que há muito mais daquilo que os une, que daquilo que a todos separa.

O painel dedicado ao contributo do medicamento para uma saú-de sustentável, moderado por Francisco Batel Marques, dire-tor da Unidade de Avaliação de Tecnologias de Saúde na AIBILI, arrancou com Hubert Leufkens, presidente da Agência Holandesa do Medicamento, que veio a Lisboa para falar sobre políticas do medica-mento baseadas na evidência, des-crevendo o que seria a sua palestra como «um esforço para demonstrar que nenhuma parte isolada conse-gue fazer todo o trabalho, é sempre preciso trazer para a equação con-tributos dos diferentes parceiros». Citando dados de um estudo que será em breve apresentado, Leufkens verificou que «entre 2008 e 2011, numa amostra de países financeiramente estáveis foram implementadas uma média de cin-co medidas legislativas para controlo

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de custos nesta área; valor que subiu para 12 em países menos es-táveis, sendo que em Portugal foram mais de 20!». A questão que importa colocar, disse, «é: quantas destas decisões foram baseadas em evi-dência?». Segundo crê, nenhuma: «os decisores políticos, sob grande pressão, procuram reagir à realida-de deliberando e implementando, mas muito frequentemente não sa-bem, nem nós sabemos, quais serão os resultados que daí advirão». O que é então preciso para que se coloque mais evidência na to-mada de decisão? O passo pri-mordial é perceber o contexto.

“A TRADIÇÃO JÁ NÃO É O QUE ERA”

A realidade é ditada por uma cada vez maior influência dos doentes e das suas associações sobre os processos de decisão, uma enor-me pressão sobre as questões de segurança e gestão do risco, assim como sobre o controlo de custos. Concomitantemente, o atual cená-rio das Ciências Farmacêuticas é «florescente», e se todas as des-cobertas se traduzissem em novos medicamentos, «extravasariam o teto desta sala. Mas sabemos que isso não é verdade, pelo que há também uma necessidade de repen-sar o processo de desenvolvimento de novas drogas». Nos dois últimos anos foram lançados no mercado mundial entre 15 a 20 novos pro-dutos, «o que alguns poderão con-siderar suficiente, mas, no fundo, reflete uma relação de desequilíbrio entre a quantidade de dinheiro que está a ser investido no processo e os resultados que estão a ser gerados. Também a Indústria está à procura de um futuro diferente!». Talvez por isso, a atualidade do setor pareça estar cada vez mais depen-dente de aspetos económicos, ao ponto de o orador aconselhar os seus alunos, na Universidade de Utrecht, a, «quando quiserem ter a noção de quais serão os resultados de um

ensaio clínico, olharem primeiro para o “Financial Times” e o “Wall Street Journal”». A suportar esta ideia, apresentou dados de uma pesqui-sa que mostra como o mercado de ações sofre significativas alterações mesmo antes de serem divulgados os resultados dos estudos científicos.Segundo referiu, «temos vindo a assistir, ao longo dos últimos anos, a uma mudança no foco de atenção

da Indústria Farmacêutica no que se refere a áreas de investimento. Quando olhamos para as pipelines, verificamos um interesse cres-cente nas áreas oncológicas e, em contrapartida, doenças do foro psi-quiátrico ou outras, como a hiper-tensão, têm assistido a uma forte diminuição de investimento. Em

resultado, o que chega ao mercado são produtos para o cancro e para o cancro e, uma vez mais, para o can-cro! São, sem dúvida, boas notícias para os doentes oncológicos, mas o número de áreas negligenciadas está a aumentar». Mais: este estado da arte coloca im-portantes dilemas às autoridades nacionais, porque, «muitas vezes, ao analisar os dossiers, concluímos

que aquela droga foi efetiva a travar o desenvolvimento da doença duran-te quatro meses, mas com perda de qualidade de vida observável no gru-po tratado. Aprovamos um tal produ-to? E, depois, comparticipamo-lo?». Por outro lado, o ciclo de vida de aprovação dos medicamentos mu-dou. «No passado, a Indústria desen-volvia um produto, depois era apro-vado, era colocado no mercado com ou sem comparticipação, e o ciclo terminava. Hoje, o mesmo produto é constantemente alvo de atualiza-ções, o que o mantém no ciclo! Nove em cada dez decisões que tenho de tomar diariamente têm a ver com no-vas informações de segurança, novas informações sobre doses terapêuti-cas, melhores indicações…». Em suma, «a atualidade coloca-nos grandes desafios, mas em termos de uma política baseada na evidên-cia, aquilo a que temos de respon-der é: quem é que poderá realmente

Segundo Hubert Leufkens, «a desconexão entre o medicamento e o seu uso representa uma oportunidade falhada de poupança de 500 mil milhões de dólares todos os anos»

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Helder Mota Filipe lembrou a importância

da colaboração de todos os profissionais

na construção de processos que tendam ao uso

racional do medicamento

beneficiar dos produtos?». Os deci-sores, defende, estão a esforçar-se para tomar cada vez melhores me-didas em todas as fases do ciclo de vida dos medicamentos, o que não é fácil, porque «há sempre muito pouca evidência sobre se o produto irá resultar ou não».

QUANDO O MELHOR A FAzER É NADA FAzER

Muita dessa incerteza deve-se ao que intitulou como “lacuna entre a eficiência e a efetividade do me-dicamento”. «As autoridades têm confiança no produto, no modo como ele foi desenvolvido, nos re-sultados e segurança que demons-trou, ou seja, na sua eficácia, e aprovam-no. Mas, muito frequen-temente, quando os medicamen-tos abandonam os seus ambientes controlados e entram no mercado, começamos a ver o seu uso off--label - nem sempre, mas muitas vezes errado e ligado a custos au-mentados -, a sua prescrição ina-propriada, a sua toma desregrada ou a falta dela… E os benefícios que aquele fármaco prometia são lar-gamente ultrapassados pelos pre-juízos que assim causa. Não é efe-tivo». Este é um dos campos onde o contributo das farmácias pode ser mais importante e fazer uma

enorme diferença, disse, pois «a desconexão entre o medicamento e o seu uso» representa, segundo dados avançados no ano passado no congresso da FIP, «uma opor-tunidade falhada de poupança de 500 mil milhões de dólares todos os anos».Perante tudo o que foi dito, uma questão se levanta: como criar e apresentar melhor evidência? Procurando perceber a eficácia de um novo produto, não contra place-bo, mas quando comparado com o medicamento standard no mer-cado, e os seus resultados em ambiente real, avançou, acres-centando que «este é o gran-de objetivo da Investigação em Efetividade Comparada». Não se trata, porém, de algo simples ou sequer possível por vezes, porque «os investigadores na área da de-cisão política sobre o medicamen-to deparam-se, amiúde, com obs-táculos importantes que impedem uma avaliação das mudanças que decorrerão da implementação de uma decisão». Ajuda, no entanto, colocar sempre três perguntas: qual o diagnóstico do problema? Qual a sua etiologia? Qual o seu prognóstico? «Isto é exata-mente o que os médicos fazem com os doentes: tentam diagnosticá-los, procuram perceber como é que a

doença se está a desenvolver e ques-tionam-se sobre se e como podem tratar os doentes no sentido de um melhor prognóstico ou se, pelo con-trário, não devem fazer nada. Muitas vezes a conclusão a que se chega é que não tomar medidas é a melhor medida, e assim deveria acontecer também com os decisores políticos. Em Portugal a lista supera as 20! Se calhar, tinha sido melhor, em muitos casos, nada ter feito, porque se cria-ram novos obstáculos, impediram-se outros resultados».

FAzER MAIS COM MENOS

Helder Mota Filipe, vice-presidente do Infarmed, veio falar sobre o tema da acessibilidade e uso racional do medicamento, «dois aspetos rele-vantes, que se complementam e são, até certo ponto, sequenciais». Usando como gancho a conferência anterior, dispôs-se a fazer um diag-nóstico da situação atual, elencando como fatores a ter em conta o rápido envelhecimento da população com inversão da pirâmide etária, a neces-sidade de garantir o acesso a medi-camentos inovadores, a transição destes da área “química” para a área “biológica/genética”, e cidadãos que têm hoje acesso a mais informação, mas não são, necessariamente, mais informados.

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Para além disto, o contexto econó-mico do país é «o mais difícil dos úl-timos anos, com impacto em todos os elos da cadeia do medicamento», não sendo novidade a influência do Memorando de Entendimento, «onde são apontadas como metas uma des-pesa nesta área inferior a um ponto do PIB, o uso obrigatório da DCI na prescrição, a remoção das barreiras legais e administrativas à entrada dos medicamentos genéricos no merca-do, e uma quota dos mesmos de 45% no final deste ano, que deverá subir para 60% no próximo». Em resumo, e no que toca ao finan-ciamento do Estado, «havendo recur-sos limitados, quando olhamos para as alternativas temos de identificar as melhores que nos permitam, com os meios disponíveis, gerar o máximo de eficiência». Essa avaliação, todavia, não é tarefa simples, testemunhou. Reveste-se, antes, de uma série de dificuldades, para as quais contribuem a crescen-te complexidade e especificidade dos novos medicamentos, a necessidade de demonstração de valor terapêuti-co acrescentado face às alternativas e a grupos de doentes, a harmoni-zação de decisões a nível nacional e cada vez mais a tentativa de harmo-nizar a nível internacional, a perceção da razão da necessidade da utilização daquele medicamento e a eficiência na gestão dos recursos públicos.

MEIOS PARA ATINGIR UM FIM

Helder Mota Filipe centrou-se, de-pois, em três áreas que considera importantes do ponto de vista quer do acesso quer da racionalidade te-rapêutica: os genéricos, os biossi-milares e o Formulário Nacional de Medicamentos.No que se prende com os primeiros, destacou como principais medidas já tomadas para promover os valores apontados a criação rápida de gru-pos homogéneos sempre que apare-ce um novo genérico; o impedimento de os hospitais do SNS assumirem

compromissos de aquisição, para além deste ano, de medicamentos de marca que se espera possam vir a perder patente ou ter concorren-tes no mercado nessas circunstân-cias; e a delegação de competências no Infarmed para a inclusão, ou ex-clusão, de genéricos nas listas de medicamentos comparticipados, no sentido de acelerar o processo. Sobre os medicamentos biossimila-res, esclareceu que se trata de fár-macos biológicos similares a outros já existentes, ou seja, são genéricos de medicamentos de referência biológicos e, como tal, apenas podem ser comercializados após expirada a patente. Por inerência da sua juven-tude relativamente aos compostos químicos, só há pouco começaram a cair as primeiras proteções e os biossimilares só recentemente fize-ram a sua entrada no mercado, pelo que, a par do que aconteceu com os

genéricos, também eles enfrentam mitos que é preciso desconstruir, defendeu. «Temos atualmente 12 medicamentos com quatro DCI de biossimilares», os quais levaram já a quebras muito significativas nos pre-ços. «Esperamos que com os novos anticorpos monoclonais, que estão a chegar ao mercado biossimilar, a poupança gerada seja enorme».Por fim, falou no Formulário Nacional de Medicamentos que a recém-cria-da Comissão Nacional de Farmácia e Terapêutica tem a missão de criar. A sua composição obedece a uma série de critérios, esclareceu, «desde logo o princípio da segurança, ou seja, o produto deve ter inequivocamente um perfil de segurança adequado para utilização em medicina huma-na», e o princípio da necessidade, «que dita que o produto tem de ser medicamente necessário para o diagnóstico, tratamento ou profila-xia de uma determinada condição patológica». São ainda considerados os princípios da eficácia, onde tem de ser demonstrado um resultado terapêutico comparativo; a análise do custo efetividade, que corres-ponde ao princípio da economia; e o princípio da alternativa terapêutica, que pressupõe que a existência de medicamentos alternativos preside à seleção entre várias opções tera-pêuticas identificadas como tal no Formulário». Para já, o Formulário encontra--se, numa primeira fase, dedicado

«Pretendemos remover o que não está a ser comercializado da base de dados de prescrição e que também é hoje percecionado como falha», avançou Helder Mota Filipe

António Amaral testemunhou que os doentes estão dispostos a pagar por serviços na farmácia, desde que os benefícios sejam evidentes

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a uma série de áreas terapêuticas que representam maiores encar-gos para o Estado. «Terminou já a avaliação da área do VIH/Sida, da esclerose múltipla e oncologia da próstata», e está em fase terminal de avaliação um conjunto de outras, de que se destacam, no ambulató-rio, os antidiabéticos, os anti-hiper-tensores e os antidislipidémicos.A finalizar, o vice-presidente do Infarmed relembrou que o objetivo do regulador é sempre promover uma maior e mais equitativa acessibili-dade ao medicamento, «mas as de-cisões assim tomadas têm também de contribuir para a sustentabilidade do sistema de saúde, caso contrário, comprometemos o acesso no futuro. São necessárias políticas proativas neste campo, mas não apenas da parte dos políticos: são igualmente importantes os contributos dos pro-fissionais e dos doentes, no sentido de se construírem processos colabo-rativos que tendam para o uso racio-nal do medicamento». ALFINETADAS PARA TODOS

Francisco Batel Marques, exemplar no seu papel de moderador, iniciou o período dedicado ao debate por Carlos Gouveia Pinto, presidente do Capítulo Português do ISPOR e professor associado do ISEG, junto do qual procurou saber se Portugal,

com uma população progressivamente envelhecida e mais de metade não ativa, é, ele mesmo, sustentável. Os países, lembrou Gouveia Pinto, não vão à falência, «podem é viver com menor ou maior dificuldade, e sendo a primeira opção o objetivo, temos de admitir a necessária sus-

tentabilidade. Mas o envelhecimento, em si mesmo, não é um problema, não encarece a saúde – represen-ta 7% do crescimento da despesa. Estou mais preocupado com os eco-nomicamente ativos e não ativos».Sendo a nossa uma sociedade em transição, entre dois polos extre-mos de um Estado - de bem-estar por um lado, minimalista por outro -, quis o moderador conhecer como enfrentam os doentes esta mudança, num país onde a Saúde tem no seu Ministério um ator determinante. António Amaral, representante da Myos na Plataforma Saúde em Diálogo e dos doentes no de-bate, disse que estes encaram a realidade presente com muita preocupação. «A Plataforma re-presenta doentes crónicos que, embora com diferentes tipos de gravidade, precisam que esteja assegurado o seu acesso ao me-dicamento e restantes cuidados, o que, por si só, significa que necessitam do Estado. A nossa expectativa é que se mantenha o pendor social».E o que pensam os médicos sobre a farmácia neste contexto? António Pereira Coelho, presiden-te do Conselho Regional Sul da Ordem dos Médicos, diz que, «com os meus 68 anos, habituei-me, de tal modo, a coexistir com as farmá-cias, que só posso pensar que esse convívio vai continuar, num clima

«Estou surpreendidocom a adesão dos

médicos à DCI, e mesmo na prescrição

electrónica a adaptação foi relativamente fácil», referiu António Pereira

Coelho

Se fosse ministro da Saúde, Carlos Gouveia Pinto « reviria rapidamente a rede hospitalar» e daria prioridade aos cuidados de saúde primários

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que se pretende o mais harmonioso, amistoso e tecnologicamente correto possível. Julgo que, por maiores que sejam as crises ou a concorrência de múltiplos setores da sociedade, as farmácias, tal como os médicos, con-tinuarão a existir e só desejo que o re-lacionamento entre ambas as partes regresse a um regime de compatibili-dade como até há cerca de 10 anos».Ao bastonário da Ordem dos Farmacêuticos, Batel Marques per-guntou o que é que não está bem com a prescrição de medicamentos? Mas Carlos Maurício Barbosa optou por cilindrar a provocação e adotar um estilo politicamente correto, dizendo que «a prescrição, que se segue ao extraordinário ato do diagnóstico, é um ato médico de elevada responsa-bilidade e seriedade, que nos merece o maior reconhecimento. A seguir, vem algo distinto, a terapêutica», mais do foro farmacêutico.Em igual registo afoito, a primeira questão que dirigiu ao presidente da Apifarma foi se a instituição que dirige mantém a mesma opinião, hoje, que tinha na altura em que lançou uma campanha publicitária dizendo que os medicamentos genéricos não tinham qualidade. Da plateia chegaram risos, mas Almeida Lopes não desarmou: «os genéricos são hoje uma questão incontornável em Portugal, onde têm uma taxa de penetração exemplar mas, e não querendo fugir à pergunta, a verdade é que, dada a minha prove-ta idade, já não me lembro disso!». A audiência estava conquistada, rea-tiva ao que se passava no palco, como se viu, logo de seguida, pelo maru-lho bem-disposto, quando o mode-rador perguntou a Paulo Duarte se as farmácias se estavam a dar bem com o crescimento dos genéricos. «Diria que sim», afirmou o presi-dente da ANF, «porque do ponto de vista estratégico alinhou as farmá-cias com os interesses dos doentes e do Estado. Imagine-se qual seria a dimensão do mercado e dos cortes a que estaria sujeito se dos medica-mentos dispensados, um quarto não fossem genéricos!».

E, dirigindo-se a Paulo Lilaia: «diga--me, dez anos volvidos, o ponto em que a Indústria de Genéricos se en-contra corresponde ao que eram as suas expectativas?». Não, defendeu, categórico, o presidente da Apogen, «a minha expectativa era que pudés-semos estar mais além. É certo que no início houve grandes resistências, muitas campanhas de má publicida-de, mas também é um facto que à medida que foram sendo divulgados dados e as dúvidas dissipadas, passou a ser claro e aceite que os genéricos têm qualidade assegurada, e até pela - ou especialmente pela! - nossa si-tuação económica, julgo que Portugal tem de alinhar rapidamente o consu-mo de medicamentos genéricos com o nos restantes países europeus». A ronda introdutória de questões ter-minaria com um repto ao vice-pre-sidente do Infarmed, Hélder Mota Filipe: «explique-me: temos uma avaliação para que os medicamentos tenham autorização de introdução

no mercado (AIM), uma avaliação do seu benefício versus o risco, uma avaliação do seu valor terapêuti-co acrescentado, uma avaliação da Comissão Nacional de Farmácia e Terapêutica… Paralelamente, temos guidelines, temos as Normas de Orientação Clínica (NOC) da DGS… Não há normas a mais?». Para o interpelado, não só não são a mais, como «são muito importantes e conseguimos identificar claramente as balizas de cada avaliação».

VISõES E OPINIõES “INTERSETORIAIS”

A segunda ronda de questões iniciou--se, uma vez mais, pela visão mais abrangente e «outsider» da Saúde de Carlos Gouveia Pinto, conforme assinalado por Batel Marques, que, a propósito dos estudos de avaliação económica, lhe levantou o dilema de uma Economia positiva ou normati-va? Na resposta, o professor asso-ciado do ISEG deixaria assegurado que «a Economia só tem sentido se for normativa. Diz-se que é positivo aquilo que é descritivo, mas de nada vale, depois, desenvolvermos modelos muito bonitos se daí não forem extra-ídas conclusões para o que deve ser a sociedade». Trata-se, portanto, defen-deu, de «uma falsa questão». Segundo Gouveia Pinto, «lidamos hoje com uma situação nova que nos irá marcar para o resto dos tempos,

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Os fornecedores da Saúde, «aos quais o Estado não paga», são hoje um «outsourcing da contenção», acusou João Almeida Lopes

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e que nos deixa como principal lição o facto de que não podemos continu-ar a gastar mais do que produzimos. Esta não é uma constatação política, resulta tão só da capacidade de intuir a realidade do país e daquilo que nos rodeia. Para a Saúde, isto significa que a despesa, em regra, não deve aumen-tar mais do que a taxa de crescimento do produto, ou seja, a riqueza gerada, que é aquilo que de facto existe para sustentar os nossos gastos. Isto obri-ga a um exercício de definição de uma restrição orçamental ao quanto pode-mos gastar, procurando maximizar a saúde nesse dado intervalo. A avalia-ção económica é útil nesse exercício, e deverá ser estendida a todas as tecno-logias, não apenas ao medicamento».Tempos diferentes implicam diferen-tes abordagens e, a Almeida Lopes, foi pedido que falasse sobre o que tem de mudar no paradigma da Indústria Farmacêutica para que se alcancem ganhos em eficiência e ao mesmo tempo se compatibilize a necessida-de social do copagamento dos medi-camentos. O presidente da Apifarma começou por concordar que «tem de haver, de facto, um esforço grande de adaptação, mas penso também que, de algum modo, é a isso que te-mos vindo a assistir. Veja-se o refe-rencial de preços hoje em compara-ção com há alguns anos: em última análise, a diferença vem claramente de um aguçar das dificuldades em termos de financiamento da despesa por parte dos Estados e que levam a uma compressão dos preços». Porém, continuou, em termos de evolução da despesa com a saúde, «se, como diz o Prof. Gouveia Pinto, ficarmos apenas a olhar para a evolução do PIB, não sei se iremos muito longe, uma vez que as perspetivas não são muito positivas. Na minha opinião, há outros caminhos importantes pelos quais se pode op-tar para corte de custos, ao invés dos mesmos continuarem a incidir sobre esta cadeia que é, afinal de contas, estratégica e geradora de saúde. O país enveredou por restrições orça-mentais e, na saúde, centrou-se na área do medicamento, e não estamos

a permitir a entrada de muita inova-ção, sendo que é dela que dependem os genéricos de amanhã». E a Farmácia? Para Batel Marques, «nesta otimização da cadeia de va-lor, é previsível uma mudança no modelo do exercício da Farmácia, de modo a contribuir com maio-res rácios de custo efetividade». Assim, a questão colocada a Paulo Duarte foi «como é que, generica-mente, as farmácias pensam que têm de se reposicionar neste perí-odo de transição?». A verdade, se-gundo o presidente da ANF, é que «nós procurámos antecipar esse reposicionamento. Não é por aca-so que em 1999 a ANF surgiu com uma nova abordagem à profissão, a partir da qual, com a celeridade possível no nosso país, tem vindo a fazer diferentes propostas, assim como desenvolveu competências internas e trabalhou para a melho-ria das farmácias, no terreno, nes-se sentido». Porém, a rapidez com que o enquadramento se alterou esgotou o anterior modelo, que urge

ser substituído por um outro. «E, aí, temos dois caminhos: ou pro-movemos a nossa diferenciação e contribuímos para os objetivos de sustentabilidade, alinhados com os outros agentes do setor do me-dicamento, que é, no fundo, o que queremos e nunca o escondemos, ou, se isso não nos for permitido, seguiremos o caminho de reali-dades que nada têm a ver com a nossa. A certeza, porém, é só uma: as farmácias irão adaptar-se aos modelos - e só a esses - que lhes permitam sobreviver». Ao moderador, afigura-se como um dos caminhos possíveis uma tran-sição em direção à prestação de serviços de saúde. Assim sendo, «como é que a Ordem dos Médicos vê essa transição?», equacionou jun-to de Pereira Coelho. Este começou por afirmar que, a primeira vez que substituiu o seu bastonário foi num encontro que tinha por tema a DCI, «assunto que dominava na altura to-das as discussões entre os médicos e onde eu tive a ousadia de dizer que, da parte da classe médica, havia já uma evolução francamente satisfatória na adesão à DCI e aos medicamen-tos genéricos – estive à beira de ser trucidado no Conselho Nacional, mas posso assegurar, com muita satisfa-ção, que isso não aconteceu! [Risos da plateia] E, de facto, estou surpre-endido com a adesão dos médicos à DCI, e mesmo na prescrição eletróni-ca a adaptação foi relativamente fácil – embora já não possa classificar do mesmo modo o comportamento do Ministério da Saúde, onde houve e continua a haver uma imensa anar-quia interna, como se pode verificar pelas receitas, de que modelos já ti-vemos quatro! Concretamente sobre o que refere, não considero esse um problema transcendente para os mé-dicos! Ou seja, será seguramente um problema mais teórico que prático», como os exemplos referidos!Maurício Barbosa, a quem havia sido solicitado que partilhasse as suas ideias para o estatuto remunerató-rio dos farmacêuticos, apressou-se

Carlos Maurício Barbosa defende que «integração e reorganização» são palavras-chave para um novo modelo da Saúde

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a concordar com Pereira coelho, sublinhando que «também acha-mos que as alterações sistemáticas não beneficiam ninguém, como, de resto, estamos em sintonia em muitas outras situações. a minha visão é que farmacêuticos e médi-cos têm de trabalhar em conjunto, o que aliás já acontece há muito no terreno, apesar das divergências pontuais ao nível das cúpulas orga-nizativas». Respondendo depois ao repto que lhe havia sido lançado, o bastonário disse que «é público que a Ordem dos Farmacêuticos defen-de há muito uma alteração do mo-delo remuneratório da farmácia e consideramos que o atual está per-feitamente esgotado. Outros países, antes mesmo da crise e da espiral recessiva, introduziram aqui altera-ções, como aconteceu na Suíça que, há já cerca de 15 anos, e enfren-tando a incompreensão da própria classe, hoje muito contente, se des-vinculou do preço do produto. Isso é fundamental!». Os doentes, por seu turno, e a crer no testemunho de António Amaral, estariam dispostos a pagar pela prestação de serviços nas farmácias, desde, claro, «que o possam fazer e percebam que isso lhes traz grandes benefícios, como é o caso do acom-

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panhamento terapêutico, que seria mesmo muito importante para os doentes crónicos». O mercado ético, fez notar Batel Marques, divide-se entre um grupo onde há concorrência - os medica-mentos genéricos - e um outro onde existem monopólios. A pergunta a Paulo Lilaia foi se este se sentia «confortável com os medicamentos genéricos a concorrer pelo preço?». A réplica foi positiva, «somos a fa-vor de um mercado concorrencial», desde que, enfatizou, «os mecanis-mos existentes não façam descer os preços para níveis onde a viabilida-de da presença do fármaco no mer-cado ou mesmo das empresas seja posta em causa». Conforme fez no-tar o presidente da Apogen, «hoje, em Portugal, queremos ser como os países mais desenvolvidos, mas como temos menos riqueza, temos de fazer de modo diferente. As nos-sas expectativas estão ao nível dos noruegueses mas o nosso PIB está ao nível… bom, de Portugal! [Risos na plateia] Em África, temos paí-ses muito bonitos, com locais muito agradáveis, mas onde o sistema de saúde é algo praticamente inexisten-te e as pessoas morrem por tudo e por nada. Já na ex-URSS, há países onde existe um SNS, mas nada é

comparticipado. o que Portugal tem de fazer é procurar um modelo que lhe permita ter a sua saúde ao nível dos últimos 30 anos, com um preço mais baixo». A próxima interpelação ao vice--presidente do Infarmed teve como objetivo saber se este teria notado, em todo o recente processo de al-teração e ajuste do mercado, algu-ma falha de regulação, tendo este concluído que sim. Aliás, «menti-ria se dissesse que não. As falhas de medicamentos no mercado são disso evidência. Há várias razões para essas falhas: há companhias de genéricos que não mantêm o mercado abastecido, e há um con-junto de fármacos objeto de uma exportação paralela exagerada - repare que disse exagerada e não ilegal, porque a exportação parale-la é legal. Os fatores são diversos e têm de ser tratados de modo dife-rente. Por outro lado, o Infarmed e a ACSS estão a trabalhar na limpe-za da base de dados, retirando-lhe um conjunto de medicamentos que não existem, o que até aqui não era fácil de fazer. Pretendemos remover o que não está a ser co-mercializado da base de dados de prescrição e que também é hoje percecionado como falha».

«As farmácias irão adaptar-se aos modelos - e só a esses - que lhes permitam sobreviver», afirmou Paulo Duarte

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A Apogen, segundo Paulo Lilaia, é a favor de um mercado concorrencial, desde que «os mecanismos existentes não façam descer os preços para níveis onde a viabilidade seja posta em causa»

“SE EU FOSSE MINISTRO DA SAúDE…”

E se os cortes não fossem na área do medicamento? E se cada um dos intervenientes no deba-te fosse o ministro da Saúde? Expurgando os medicamentos da equação, que prioridades teriam para tornar o SNS e o sistema de saúde sustentáveis? Para Paulo Duarte «a minha prio-ridade seria alterar a lei», ou, conforme explicou depois, termi-nar com o tratamento discriminado, com todas as suas implicações, en-tre o que é estatal e o que é priva-do. «era, no fundo, considerar um sistema nacional de saúde, olhan-do para as diferentes áreas e con-tratualizando serviços com aqueles que os prestam melhor e de modo mais eficiente. Estou convencido de que o sistema, se for bem regulado, irá gerar eficiência».Já António Amaral, considerando que «o cidadão quer ser atendido nos locais da sua preferência», agi-ria nesse sentido, mas, «tratando--se de uma utopia, espero que as-segurem às pessoas os serviços prioritários e primários».Paulo Lilaia relembrou o guru do Marketing, Michael Porter, e o seu relatório sobre Portugal, onde este concluiu que os por-tugueses deveriam fazer melhor vinho, melhores sapatos, melhor turismo… «Ou seja, fazer melhor aquilo que já fazem bem e onde têm uma posição confortável, para se tornarem especialistas e distintivos. No Sistema de Saúde, é igual: parece-me claro que o que há a fazer é uma melhoria sobre o sistema que já existe». António Pereira Coelho, por seu turno, confessou-se grandemen-te preocupado com a «manifes-ta perda de qualidade do SNS e a degradação segura nos próximos anos, quer pelo número de alunos em Medicina quer pela dificuldade que vão ter em encontrar vagas

no regime de internato, apontan-do igualmente o que considerou ser «uma nítida discriminação por parte do poder, no setor privado, entre aquele que é financiado pe-los grandes grupos económicos e os pequenos prestadores», áreas onde, se fosse o detentor da pasta ministerial, iria agir.Carlos Gouveia Pinto escolheria o percurso mais próximo do seu coração e «abriria o Instituto de Tecnologias de Saúde, transpondo para a decisão os seus pareceres». Mas não se ficaria por aí: «reviria rapidamente a rede hospitalar, em unidades e recursos humanos, e daria efetiva prioridade aos cuida-dos primários de saúde. Não tem qualquer sentido a concentração de

tecnologias da saúde nos hospitais, como hoje acontece». Para Helder Mota Filipe a priorida-de seria «a geração sistemática de evidência, bem como a medição de resultados. Passamos o tempo a de-cidir com base na perceção de qual-quer coisa, até porque toda a gente que deveria notificar não o faz, toda a gente que deveria sentir-se respon-sabilizado não se sente… e isso não pode continuar». maurício barbosa alinha pelo mes-mo diapasão, e elegeria como obrigatório o «estudo prévio, a criação de evidência, a avaliação de impactos. se assim fosse, a re-alidade não seria compatível com a unidose nos moldes atuais, a abertura de farmácias em hospi-tais, etc, etc. Também acredito na liberdade de escolha dos doentes, e a primeira seria logo em relação ao médico de família, bem como a reorganização do sistema, através da integração das diferentes va-lências profissionais. Integração e reorganização», sublinhou. Por úl-timo, e sem destoar, João Almeida Lopes comentaria que «acho que, de facto, se gere muitas vezes pelo “cheira-me que isto vai dar certo”, e a referência do Prof. Helder Mota Filipe é fundamental, assim como seria a tomada de decisões e a sua manutenção no quadro legislati-vo». Alguma estabilidade, portanto! «Depois, deixaria de eleger a saúde como o primeiro local onde cortar custos» e que traz hoje os fornece-dores da saúde, «aos quais o Estado nem sequer paga», na posição de «outsourcing da contenção». Coube a Hubert Leufkens, a pedido do moderador, um último comentário, tendo este dito que «sou muito hu-milde ao aconselhar Portugal no que quer que seja, porque as instituições portuguesas estão ao nível das mais importantes do mundo, mas concordo que o setor deverá continuar a investir na criação de evidência».Assim chegava ao fim, sob for-te aplauso, o segundo painel dos trabalhos.

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expofarma

edição de 2013 foi um sucessoSimultaneamente ao 11.º Congresso Nacional das Farmácias teve lugar, como vem sendo já habitual, a realização da edição de 2013 do salão de Farmácia Expofarma, com o lema “Valorizar a Saúde”. No balanço da ini-ciativa, o diretor do certame deu conta da presença de 70 expositores visi-tados por um total de 7.032 pessoas nos três dias de atividade, dados que, suportados «pelo feedback muito positivo que recebemos» dos primeiros, permitem a Filipe Mota Rebelo considerar que o evento foi «um sucesso». Mota Rebelo sublinha ainda a forte aposta, tanto da organização como das entidades presentes, na componente formativa em áreas de especialidade da saúde e de outros temas transversais, consubstanciada na realização de diferentes conferências e workshops inseridas no contexto da feira, assim se contribuindo «para o enriquecimento pessoal e profissional dos participantes»; bem como a dinâmica de convívio e interatividade entre ex-positores e visitantes, sempre presente no Espaço Lounge. Entretanto, já a pensar em 2014, a organização deixa, sem adiantar ainda grandes deta-lhes, a promessa de um novo modelo para a Expofarma.

NOITE DA FARMÁCIA

O já tradicional jantar “Noite da Farmácia”, onde são entregues os Prémios Expofarma procurando distinguir os melhores expositores do salão, voltou a ter lugar, no sábado, no Salão Preto e Prata do Casino Estoril, onde os convidados puderam assistir, depois, ao espetáculo "Lord of the Voices", com Fernando Pereira. Confira os vencedores na tabela. Foi também na Noite da Farmácia que teve lugar a atribuição do Prémio Responsabilidade Social, englobado no espírito de apoio a Associações de Doentes e que este ano a Expofarma, em parceria com o BES, atribuiu à Associação Portuguesa de Doentes de Parkinson.

PrémIOs exPOFArmA 2013

Prémio Vencedor Outros nomeados

meLHOr DesIGN sANDOZCaudalie MorenoSensilis

meLHOr stAND De eQUIPAmeNtOs

e serVIÇOs

ALLIANCe HeALtHCAre

Barclays Plural

Top Atlântico

meLHOr stAND INDústrIA FArmACêUtICA

PFIZerLabesfal

MylanSandoz

PrémIO INter-PAres sANDOZLabesfal MorenoSensilis

exPOsItOr DO ANO myLANActavisPfizer

Sandoz

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O presidente do Infarmed, Eurico Castro Alves, foi moderador no úl-timo painel do do Congresso, antes do seu encerramento. O tema que a seguir se abordaria foi, para si, de escolha «muito oportuna». “O con-tributo da Farmácia para uma saú-de sustentável” «é hoje um assunto de fundamental debate. Acredito, verdadeiramente, que o papel das farmácias passa também por aju-dar a sustentar o sistema nacional de saúde, no qual têm uma parti-cipação preponderante. São elas muitas vezes o primeiro e geral-mente o último contacto do doente com o sistema, e o seu trabalho vai, seguramente, muito além da dis-pensa do medicamento». Sobre isso se falaria a seguir.

paIneL III: ContrIbuto da farmáCIa para uma saúde sustentáveL

espírito construtivoO último painel do Congresso Nacional das Farmácias permitiu, em linguagem corrente, atar as pontas que se vinham desfiando. Por outras palavras, colocou a Farmácia no centro das análises e demonstrou como, com trabalho e sem preconceitos, o setor pode não apenas ser sustentável, mas contribuir largamente para a sustentabilidade e elevação da qualidade do próprio sistema de saúde em que se insere.

SOBRE O DESPERDíCIO DE RECURSOS

António Vaz Carneiro, do Centro de Estudos de Medicina Baseada na Evidência (CEMBA) da Faculdade de Medicina de Lisboa, veio apresentar um ensaio, realizado em conjunto pela instituição que representa e o Centro de Estudos Aplicados (CEA) da Católica Lisbon School of Business and Economics, sobre a transferência de cuidados de saúde prestados em meio hospitalar para a rede de cuida-dos primários e continuados. A pesquisa, divulgada em relatório há um ano, pretendeu não só identificar e quantificar os cuidados passíveis de assim serem deslocados, «mas tam-bém estimar o impacto financeiro

dessas mudanças, sob um ponto de vista societal», explicou, acrescen-tando que o modelo aplicado é ainda muito inicial, porque não há muita matéria publicada nesta área, care-cendo, por isso, de melhorias. Mas serve, defendeu, para se fa-zer uma primeira reflexão sobre o tema e perceber, desde logo, al-gumas das potencialidades desta transferência. As conclusões apon-tam para uma aparente manuten-ção da qualidade dos cuidados, em-bora a mudança venha a implicar, sempre, algum nível de reestrutu-ração e uma melhor comunicação entre as entidades hospitalares e os cuidados de saúde primários. Para estes últimos, os benefícios seriam mais evidentes a longo

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prazo, mas o impacto orçamental seria globalmente positivo, tendo o estudo apurado, em custos diretos e totais, um valor de poupança po-tencial de 355,97 milhões de euros.

SOBRE A EFICIêNCIA NA SUA APLICAÇÃO

Alexandre Lourenço, da Administra-ção Central do Sistema de Saúde (ACSS), veio falar sobre “Contra- tualização e Modelos de Paga- mento nos Cuidados de Saúde Primários”.Ao longo da sua conferência, procurou sublinhar a importância da redução de custos no âmbito da Saúde, mas sempre com a preocu-pação de proteger aquilo que con-siderou ser o núcleo essencial do sistema: «a prestação de cuidados

de elevada qualidade e eficiência, que não deve ser tocado».Segundo partilhou com a audiên-cia, há uma quantidade de fatores que são conhecidos. «Sabemos que 1% da população é responsá-vel por 25% da despesa em saúde realizada num ano, que 5% é res-ponsável por 50% e outros 10% por 66%. Logo, se trabalharmos sobre esta população, temos mais probabilidades de ter maior valor em saúde. Sabemos também, por outro lado, que existe um conjun-to de ineficiências na prestação dos cuidados, assim como tare-fas não clínicas realizadas por profissionais de saúde e outras administrativas, de gestão e de suporte que não trazem mais-valias ao sistema. É nestas áreas que de-vemos trabalhar em termos de

redução da despesa, para que o núcleo se possa expandir».Sobrepondo estas duas realidades conhecidas, uma terceira emana: a gestão da doença crónica e o acom-panhamento, na comunidade, da população doente resulta sempre numa menor despesa em saúde a médio prazo, quando compara-da com a abordagem tradicional, baseada em hospitais. «Há gran-des exemplos disto, como os casos de mortalidade ao nível do cancro colorretal, onde Portugal aparece sempre muito mal posicionado a ní-vel internacional! Se promovermos programas de prevenção, poupare-mos em termos puros, quer na cria-ção de resultados em saúde quer na redução de custos. Ou no caso da diabetes, em que é possível ter uma maior gestão da doença, evitando uma consequência do descontrolo como o são as amputações». É aqui, diz, que entra a contratu-alização dos cuidados em saúde, «que se baseia numa averiguação das necessidades, no desenho de respostas concretas e efetivas, e na identificação dos prestadores mais preparados». Esta lógica pressupõe o abandono de uma abordagem aos operadores como se constituíssem «silos que não conseguem comuni-car entre si», e evoluir para uma visão mais aproximada daquela que o próprio cidadão tem sobre es-tes temas, mais horizontal. «A

«A interligação dos vários atores promoverá uma melhor saúde para todos», acredita Alexandre Lourenço

A transferência de cuidados do hospital para a rede primária e continuada representa uma poupança potencial de cerca de 360 milhões de euros, disse António Vaz Carneiro

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interligação dos vários atores pro-moverá uma melhor saúde para to-dos», acredita.Terá sido este o modelo aplicado aos cuidados de saúde primários, traduzido no processo de contratu-alização com as unidades de saúde familiares (USF) e, mais recente-mente, com alguns agrupamentos de centros de saúde (ACC), e que se baseia em indicadores de saúde ao invés de atividade. «Posso já anun-ciar uma evolução no próximo ano, pois passará a ser baseado em re-sultados em indicadores de saúde, como a percentagem de diabéticos controlados ou de hipertensos con-trolados. Esta mudança irá promo-ver, certamente, uma melhor saúde, mas também, a prazo, uma redução de custos». Entretanto, já há estu-dos que comprovam uma melhoria na prestação dos cuidados e a pro-moção de melhores resultados em saúde, como acontece na percenta-gem de primeiras consultas de vida até aos 28 dias ou na percentagem de inscritos entre os 50 e 74 anos com exame de deteção precoce do cancro colorretal atualizado.Para Alexandre Lourenço, ao pro-curar-se identificar os prestadores, «devemos ter presente a noção de aproveitamento de todas as opor-tunidades» e a preocupação de fa-zer prevalecer aquelas que repre-sentem para o doente «uma maior proximidade, eficácia e flexibilidade para uma resposta atempada, inte-grada e capaz». Depois, no âmbito do pagamento, assumir que este deve ocorrer depois dos resultados alcançados, ou seja, «não faz senti-do pagar por percentagem de testes efetuados, mas pelos resultados em saúde alcançados».

SOBRE A RODA JÁ INVENTADA

kate Mulvenna trouxe ao congresso o caso irlandês de contratualização de serviços entre o Estado e as far-mácias, começando por fazer um breve enquadramento do sistema

Poster vencedorNo decurso do 11.º Congresso Nacional das Farmácias estive-ram em exposição 35 posters admitidos a concurso, refletin-do igual número de diferentes iniciativas já realizadas ou em curso nas farmácias associadas da ANF. Imediatamente antes da Sessão de Encerramento do congres-so, Margarida Caramona, da Faculdade de Farmácia da Universidade de Coimbra e membro da Comissão Científica, anunciou o trabalho intitulado como “Fatores de risco de resul-tados clínicos negativos identifi-cados na revisão da medicação de doentes idosos” (*), como tendo sido considerado o que melhor correspondeu aos crité-rios em avaliação pela Comissão Científica, distinguindo-se, por-tanto, entre os demais.Para a decisão, segundo disse, contribuiu a componente cientí-fica que acompanhou a vertente prática do caso, a demonstração inter pares da mais-valia da in-tervenção, o reconhecimento do esforço dos colegas para a concretização desta etapa e o

impacto futuro do trabalho, que deverá traduzir-se em melhorias para os doentes, para a profissão e para a farmácia.

(*) Autores - Andreia Madanelo, Paulo Monteiro: Farmácia S. José, Coimbra. Isabel V. Figueiredo, Margarida Castel-Branco, Margarida Caramona: Grupo de Farmacologia e Cuidados Farmacêuticos, FFUC. Fernando Fernandez-Llimós: Departamento Sócio-Farmácia, FFUL.

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de comparticipação no seu país, que assenta em quatro esquemas principais: suporte total dos ser-viços de saúde prestados, abran-gendo 40% da população; apoio no pagamento de medicamentos acima dos 144 euros mensais, que atinge 60% da população; compar-ticipação dos medicamentos em 15 patologias previamente definidas (diabetes, epilepsia, Parkinson, esclerose múltipla…); e compar-ticipação de medicamentos “High Tech”, antes fornecidos em am-biente hospitalar, «mas que esco-lhemos disponibilizar através da farmácia comunitária, para os tor-nar mais acessíveis às pessoas e reduzir uma parte da pressão sobre o sistema hospitalar». Antes de 2002, altura em que a le-gislação foi alterada, quis-se trans-ferir algum do peso que estava no lado dos médicos da rede de cui-dados primários e, para tal, as far-mácias vinham sendo encorajadas a investir nas suas instalações e a aumentar o número de farmacêu-ticos nas suas equipas. Antes des-ta legislação a instalação de novas farmácias estava condicionada a regras de distanciamento e capi-tação e, nessa altura, havia 12 mil farmácias na Irlanda. Hoje são 17 mil, em função das mu-danças legislativas operadas. Esta- beleceu-se um novo contrato entre o Estado e o setor, onde o primeiro reconhece, em diversas cláusulas, a expertise profissional do segun-do, sendo o caso, por exemplo, da passagem das terapêuticas High Tech para o ambulatório, em que a farmácia recebe o medicamen-to, que é pago em avançado pelo Estado, a custo zero e um fee, atu-almente de 62 euros mensais, por cada paciente que a escolha para prestadora do serviço. Por outro lado, havendo a noção da evolução tecnológica ao nível das terapêuti-cas e da importância de manter os farmacêuticos atualizados para a prestação de um serviço de quali-dade, o Estado investe dinheiro na

sua formação contínua, sem custos para as farmácias. Outra questão importante que o novo contrato encerra assenta na revisão da terapêutica, ou seja, antes da dis-pensa do medicamento, o farmacêuti-co tem de avaliar esse ato no contex-to da realidade terapêutica daquele doente nos últimos meses. «Assim se torna mais fácil detetar erros, interações e sobreposições medica-mentosas, ao mesmo tempo que, ao dialogar com o doente, se assegura que são transmitidos alguns concei-

tos importantes e que se procurou consciencializá-lo para a importân-cia da adesão à terapêutica». O programa de administração de metadona, a troca de seringas e a va-cinação são outros dos serviços cuja prestação é contratada com a farmá-cia, este último com a particularida-de de que é o Estado que, à imagem do que acontece com os centros de saúde, fornece as vacinas. «Todos os setores apresentam desa-fios, assim como todas as escolhas que se fazem, mas cabe ao Estado pensar o caminho mais eficiente possível que o doente tem percorrer no circuito da Saúde», defendeu kate Mulvenna, acrescentando que, na Irlanda, «o Estado percebeu que já tinha investido e continuava a investir

«O Estado irlandês percebeu que já tinha investido e

continuava a investir na especialização técnica

dos farmacêuticos, e tinha agora de tornar

esse recurso valioso acessível»,

testemunhou kate Mulvenna

na especialização técnica dos farma-cêuticos, e tinha agora de tornar esse recurso valioso acessível».

SOBRE O TANTO QUE HÁ POR FAzER

“USF e Farmácias - Uma aposta de futuro” foi o título da conferên-cia de José Luis Biscaia, da USF de São João da Figueira, que veio ao congresso defender a ideia-chave de parceria entre estas duas entidades da saúde.

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Conforme tem defendido, «as Unidades de Saúde Familiar foram, no quadro da Administração Pública, a única reforma de Estado que se operou nos últimos 15 anos», o que facilmente se pode aferir através da caracterização do próprio perfil de USF. «Uma USF é um conjunto de pessoas que, acreditando num pro-jeto, se uniram para lhe dar forma, comprometendo-se com uma visão e valores para cumprir uma missão muito clara, que é a prestação de cui-dados de saúde primários centrados na pessoa e na família. Ao contrário do que acontecia com os centros de saúde, têm uma carteira básica de serviços (e carteiras adicionais) que fornecem a uma população inscrita; têm autonomia organizacional - o que representa um salto imenso na Administração Pública - e contratua-lizam resultados práticos, contextua-lizando recursos e necessidades em saúde, monitorização e acompanha-mento. São igualmente inovadoras no seu sistema retributivo, ligado ao desempenho, e no facto de todo o seu processo de desenvolvimento ter sido construído de baixo para cima, ou seja, com adesão voluntária dos profissionais». Como operacionalizar, então, uma parceria entre estas entidades e as farmácias? Para José Luis Biscaia é óbvio que, ao invés de no medica-mento, o foco terá de ser na pessoa, ou seja, «na identificação do que cada um faz para que se alcance determi-nado resultado em saúde». Isto pres-supõe que as organizações sejam inteligentes «no modo como gerem o conhecimento e a sua disseminação, na sua capacidade de renovação, na garantia da inclusão e participação das pessoas e na obtenção de re-sultados eficazes e satisfatórios por meios sustentáveis». E presume também o uso de sistemas de infor-mação, em alguns níveis partilhados, «que por si só potenciam a mudança do fluxo do próprio doente no circuito de saúde». Para concretizar estes conceitos, o médico apresentou então quatro

exemplos práticos do que pode ser feito numa lógica colaborativa. «na avaliação do risco cardiovas-cular, temos de sair do campo do “rastreiozinho”. as farmácias, le-gitimamente, fazem um conjunto destas iniciativas, que se forem inseridas no processo de cuidados que definiram em conjunto com as UsF e a informação ficar acessí-vel a ambas as partes, permitem poupar tempo e recursos. Mas atenção: não estaremos a medir o colesterol, estaremos a avaliar o risco cardiovascular, porque é nes-se campo que iremos intervir». Outro âmbito a explorar é o da gestão da doença aguda, «onde, certamente, se irão levantar muitos tabus. Há um conjunto de questões que tem de ser discutido calmamente, como a possi-bilidade de, em casos de doença agu-da, se definir um processo de cuida-dos para intervenção, referenciação e desde logo dispensa de um medi-camento já identificado em protocolo de atuação. Isto implica apenas que

as pessoas se sentem para trabalhar em conjunto e definir processos, tal como acontece ao nível dos proto-colos de intervenção ou formulários locais, em que há muito que médicos e farmacêuticos podem discutir para coligar saberes e experiências». O mesmo no que concerne à automedi-cação, conciliação e adesão terapêu-tica, onde os campos de intervenção podem ser muito vastos.Os ganhos são, em sua opinião, evidentes: «qualifica-se o acesso, obtêm-se melhores resultados, promove-se um uso mais racional do medicamento, geram-se ganhos de eficiência, garante-se mais segu-rança ao doente e fomenta-se uma maior capacitação de todos para fa-zer as coisas melhor».

SOBRE O QUE TEM DE SER FEITO

O último orador da manhã de traba-lhos foi Pedro Pita Barros, da Nova School of Business and Economics, que trouxe alguns dados prelimi-nares do estudo em desenvolvi-mento sobre “Um Novo Modelo de Remuneração para as Farmácias”.No enquadramento da sua preleção, explanou que o estudo da Nova tem como ponto de partida a redução de margens das farmácias, em resulta-do da baixa dos preços dos medica-mentos, situação que classificou ro-

Para José Luís Biscaia, «há muito que médicos e farmacêuticos podem discutir para coligar saberes e experiências»

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Pedro Pita Barros abordou os círculos de qualidade suiços, dinamizados por farmacêuticos e dirigidos a médicos, com vista à melhoria da qualidade da prescrição

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tundamente como sendo «estrutural e não conjuntural».«Nesta componente da sua atividade, que é a mais importante, a farmácia não controla nem o preço nem quan-tidade das suas vendas, pelo que não consegue evitar que o preço seja me-nor que o “custo marginal” de cada receita». Em semelhantes condições, relembrou, a solução não passa por uma concentração da atividade, uma vez que o problema não se verifica ao nível da diluição de custos fixos. Por outro lado, o enquadramento atual, definido pelo Estado, apresenta for-tes limitações: os preços dos medi-camentos não vão subir, assim como não se pretende que cresça a despe-sa do Estado nem dos cidadãos. Ao nível do mercado, também não se preconiza fácil ou mesmo possível uma subsidiação através de ativida-des desenvolvidas em âmbitos dis-tintos ou venda de produtos de tipos diferentes. As soluções, por isso, são mais escassas que noutros setores, mas não inexistentes, podendo passar por uma alteração da forma de re-muneração das farmácias, deixan-do de a fazer depender do preço de venda ao público do medicamento (ou pelo menos atenuar fortemen-te) e/ou remunerando atividades desenvolvidas. Sobre o primeiro ponto, o atual siste-ma de remuneração da dispensa de medicamentos já apresenta, desde 2011, alguma flexibilidade, conside-rando uma parte fixa e uma parte percentual do preço, consoante os escalões, pelo que o princípio técnico já foi introduzido. O passo seguinte passa por reduzir a parte percentu-al do PVP e redefinir a parte fixa. O que se pretende com o estudo em desenvolvimento é descrever as ca-racterísticas principais dos modelos de remuneração europeus mistos (Suíça, Reino Unido, Eslováquia, Bélgica, Espanha, Irlanda, França, Alemanha) e simular a aplicação das margens desses países ao mercado português. Depois, com base nisso, nos resultados de estudos anteriores

e em critérios equitativos, propor um ou mais modelos de remuneração para Portugal. Foi já possível fazer algumas obser-vações importantes e tirar daí al-gumas elações, mas, neste âmbito, Pedro Pita Barros resolveu debru-çar-se com algum pormenor sobre o caso suíço. «A Suíça tem um siste-ma de pagamento às farmácias que assente não só numa margem per-centual sobre o preço, mas também num valor fixo por embalagem, num valor por dispensa de medicamento (linha de receita) e por validação de tratamento (por doente por dia), e em valores de serviços incluídos (dispen-sa de urgência, dispensa de genéri-co, revisão da terapêutica, dose uni-tária semanal, toma sob observação direta, etc.). Em termos conceptuais, a remuneração está dividida em pa-gamento de custos logísticos e de capital, e pagamento da dispensa, decorrendo a primeira parte da par-ticipação das farmácias na logística de distribuição/gestão de stocks, estando a segunda parte, análoga às margens reguladas em Portugal, completamente desligada do preço do medicamento e assente num sis-tema de pontuação de serviços de dispensa». Um dos efeitos positivos deste sistema foi uma redução média do preço dos medicamentos.Outra característica interessante do sistema suíço é a existência de círcu-los de qualidade interdisciplinares.

«O conceito foi introduzido em 1997/98 por médicos, com o objetivo de melhorar a qualidade da prescri-ção, e a sua difusão tem sido lenta, mas segura». Havendo-se percebi-do que uma melhor terapêutica leva a um menor custo, foi entretanto criado um fundo que financia o pro-jeto, ao qual a adesão é voluntária. Funciona por grupos compostos por um mínimo de cinco e um má-ximo de 15 médicos de família, e entre um a três farmacêuticos, que cumprem o papel de animadores do círculo. Promovem, pelo menos, três sessões anuais para discussão de quatro de nove temas possíveis (car-diovascular, pneumologia, diabetes, antibióticos, etc..), apresentando e discutindo nesse âmbito estatísticas de prescrição e debatendo casos de doentes escolhidos pelos médicos. Recebem, para tal, cerca de 13 mil euros por ano, pouco, se comparado com os 42% de redução nos custos que a sua participação nas reuniões com médicos de família promoveu somente entre 1999 e 2007. Este pode ser para Portugal um exemplo de uma nova atividade a ser remunerada, por cumprir aquilo que Pita Barros define como essencial nestes casos: verificar-se um benefí-cio social superior ao preço e ao cus-to. «Basta um destes princípios não se verificar para um serviço não ser passível de fazer parte de um novo sistema de remuneração».

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Dirigidas à prática profissional quotidiana, as cinco workshops que nesta edição fizeram parte do programa de trabalhos do congresso da ANF, apesar de muito diferentes entre si, tiveram em comum uma preocupação: dotar a farmácia de ferramentas que lhe permitam melhorar os seus resultados.

NUTRIÇÃO NA FARMÁCIA

Os objetivos da workshop dedicada à “Nutrição na Farmácia” prendiam-se com a análise de casos reais de su-cesso de implementação deste tipo de serviço, o qual passou a ser pre-visto legalmente com a publicação do Decreto-Lei N.º 307/2007, que alar-gou o objeto da atividade das farmá-cias, e da Portaria N.º 1429/2007, que definiu o seu enquadramento. Desde então, a prestação deste ser-viço tem feito o seu caminho com resultados assinaláveis. De facto, dados referentes a agosto de 2013,

Ferramentas para a mudança

Workshops

retirados da “Análise de Mercado” do “Observatório da Farmácia”, mos-tram que este ocupa o sétimo lugar no TOP10 dos serviços mais vendidos em Farmácia quando considerado o volume, ascendendo, porém, a um interessante segundo lugar quando o parâmetro observado é o valor.Na introdução da workshop, le-vada a cabo por Ana Nogueira do Departamento de Cuidados Farmacêuticos da ANF, foi ainda re-ferido que este é um serviço poten-cialmente dirigido a todos os utentes da farmácia, podendo ser particular-mente útil aos doentes com proble-mas relacionados com a alimentação,

como a obesidade, a hipertensão ar-terial, a dislipidemia, a diabetes tipo 2, a osteoporose, etc. A sua presta-ção obriga à presença de um profis-sional qualificado - nutricionista ou dietista reconhecido pela Ordem dos Nutricionistas - e à disponibilidade de instalações adequadas e autono-mizadas. O modelo de prestação do serviço pode diferir, variando entre o profissional com ligação a alguma marca ou produto ou sem qualquer conexão dessa índole, e ainda o pro-fissional que presta o serviço para um grupo de farmácias. Foi precisamente com a preocupa-ção de mostrar diferentes realidades

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e possibilidades de trabalho, que foram trazidos ao congresso dois ca-sos distintos: o da Farmácia Planalto, que tem implementado o modelo de consulta ligado a uma marca, e o do grupo Fastfarma, que congrega as farmácias Aliança no Porto e Santo António em Rio Meão, e a parafarmá-cia Espaço Saúde Lionesa em Leça do Balio, assim partilhando dos ser-viços da mesma nutricionista.

A GRÁVIDA E O RECÉM-NASCIDO

Como potenciar a venda de produ-tos na área das grávidas e recém-

-nascidos foi o tema da segunda workshop do congresso, conduzida por Cristina Simões, farmacêu-tica e diretora de Marketing dos Laboratórios Expanscience, que justificou a pertinência do assunto numa altura em que se verificam alterações no perfil de consumo dos novos pais. É que, fruto da crise, o consumidor faz hoje uma gestão mais comedida do seu orçamento e encontra-se, por isso, mais sensível ao preço e menos disponível para pagar mais por qualidade, estando, ao mesmo tempo, mais interessado em ofertas especiais, vouchers e va-les de desconto.

Mas, os futuros pais continuam a ser também pessoas que, neste momento particular das suas vidas – que se pode estender por quatro anos, enfatizou! -, precisam da se-gurança que lhes é garantida pelos farmacêuticos. É pois neste intervalo que a Farmácia deve apostar, tornando cada visita destes utentes numa boa e útil expe-riência. Para tal, deve comunicar-se de forma inteligente para atrair con-sumidores: tem de capitalizar sobre a imagem já positiva que a sociedade tem dos farmacêuticos e da qualida-de dos produtos que recomendam, e mudar a perceção de que os vendem muito caros. Cristina Simões deixou, então, algu-mas sugestões práticas de como in-teragir com este grupo-alvo no atual panorama. A sessão terminou, depois, com a apresentação, por Filipa Monte, do caso da Farmácia Belém, em Lisboa, onde deu a conhecer a sua estratégia de ação neste segmento e os resultados alcançados com a sua implementação.

CONHECER E UTILIzAR O NOVO ANFONLINE

A terceira workshop deste congresso levou os participantes numa viagem virtual que pretendeu dar a conhecer

Workshop Performance na FarmáciaWorkshop Nutrição na Farmácia

Workshop A Grávida e o Recém-Nascido

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Workshop ANFOnline

Workshop Performance da Farmácia

Workshop Recursos Humanos Workshop Recursos Humanos

a nova plataforma ANFOnline, explo-rando todos os seus cantos e recan-tos e, a cada passo, expondo todas as suas potencialidades enquanto fer-ramenta de trabalho e comunicação. Foi, depois, com o intuito de de-monstrar o seu lado prático, que se deram a conhecer os exemplos da Farmácia Codeço, em Monção, e da Farmácia Santos Monteiro, em Lamego, que testemunharam os

moldes do seu relacionamento com a plataforma e o modo como impac-tou o seu dia-a-dia.

GESTÃO DE RECURSOS HUMANOS

A workshop sobre gestão de re-cursos humanos arrancou com um breve enquadramento nacio-nal das farmácias a este nível, da

responsabilidade de Ana Cristina Gaspar, da Direção da ANF, onde deixou claro que 79% do universo de associadas não tem implemen-tado um sistema de avaliação de desempenho. Posteriormente, Ana Maia, consul-tora da Escola de Pós-Graduação em Saúde e Gestão, veio falar sobre a mudança nos recursos humanos, começando por referir que é co-mum a noção de que, apesar das alterações que tiveram lugar no setor, neste capítulo poucas dife-renças ocorreram, o que é um erro, porque é obrigatório que todos nos ajustemos ao nosso ambiente, pois só assim conseguiremos evoluir.Mudar é, então, essencial. Mas mu-dar, o quê? Segundo a oradora: a forma de ver o trabalho, a forma de ver a farmácia e a forma como as pessoas se veem a si mesmas, ou seja, a farmácia, como microcos-mos, deve (re)pensar e (re)definir a sua estratégia, e planear a sua im-plementação.Raquel Moreno e Pedro Marques testemunharam, depois, as suas experiências nas farmácias Mo-derna e Carlos Pereira Lucas, respetivamente.

ANÁLISE DA PERFORMANCE DA FARMÁCIA

A quinta workshop inclusa nos trabalhos, teve por tema a análise da performance da farmácia, ten-do sido conduzida por Luis Lopes, do Departamento de Planeamento e Controlo da ANF que, ao longo da sua apresentação, procurou demonstrar como, recorrendo a diferentes fontes de informação, é possível preencher um “tableau de board”, ferramenta de grande utilidade na medição do desem-penho da farmácia, com base em alguns indicadores previamente definidos. O tema apresentado foi abordado na Rubrica Consultoria de Gestão da presente Revista Farmácia Portuguesa (Pág 56).

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sessão de enCerramento

espírito convicto, reforçado e proativoA sessão solene de encerramento do 11.º Congresso Nacional das Farmácias resumiu o resultado dos dois dias de trabalhos e, através desse esforço de compactação, saíram destacadas as ideias de necessidade, exequibilidade e, acima de tudo, consenso em torno de uma nova forma de relacionamento entre as farmácias e o estado. em suma: pouco mais há a provar, é chegado o momento de implementar um novo contrato social.

Eurico Castro Alves, presidente do Infarmed, veio em representação do ministro da Saúde, ausente do país, presidir à sessão. Seria, pois, sua a última palavra; a primeira, porém, cabia a João Silveira.Para o presidente da Mesa da Assembleia Geral da ANF, este foi «um bom congresso»: «falou-se em Saúde além do Orçamento» e ficou demonstrada «a determina-ção das farmácias em resistir e dar o seu melhor, indo ao encontro das necessidades das pessoas. Apesar do caos, as farmácias gritaram bem alto “contem connosco”. Elas e as suas equipas são os verdadei-ros heróis nacionais». Mas, mais que isso, foram ali trazidas notícias que «nos dão esperança e alento».

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O setor, sublinhou, conforme havia ficado bem patente no decorrer do congresso, exige ser tratado com equidade, não através de greves ou insultos, mas da força da razão, por-que, afinal, «nós podemos!».

DO CONSENSO À CONSTRUÇÃO

O bastonário da Ordem dos Farmacêuticos falou de seguida, lembrando que se aquele era o con-gresso das farmácias, «a alma das farmácias são os farmacêuticos», e estes têm feito muito em prol da saúde dos portugueses, «apesar das ameaças à sua honorabilidade. As farmácias, onde trabalham mais de oito mil farmacêuticos, são a montra da nossa profissão, são ver-dadeiros exemplos de serviço pú-blico prestado por privados e, num momento em que o Estado natu-ralmente desinveste nos seus pró-prios serviços e encerra unidades, na mais pequena povoação, onde o médico já não dá consultas, onde o advogado já não dá consultas, onde já nem o padre lá vai, continua a ha-ver uma farmácia e o Estado deveria reconhecer isto».Segundo Maurício Barbosa, para servir cada vez melhor os cidadãos, «o sistema de saúde deve ser per-manentemente recriado», e defende que a sua reorganização deve obe-decer a duas lógicas: permanecer ancorado no SNS e assentar na in-tegração dos cuidados. «Os painéis deste congresso apontaram, inva-riavelmente, para uma recriação do sistema de saúde, mas para concre-tizar todas as ideias aqui apresenta-das será preciso, verdadeiramente,

revolucionar as mentalidades neste país. Todos estamos de acordo em que há que alterar a forma de traba-lhar; então por que não o fazemos? o que é que é preciso para que seja legalmente consagrada a inclusão da Farmácia na rede de cuidados primários?». Para o representante da classe, «a apresentação do Dr. José Luís Biscaia foi fundamental, tal como será que ela chegue a todo o lado, porque dela se infere o modo corre-to de trabalhar». Assim como «pre-cisamos, cada vez mais, de olhar e aprender com o que se passa à nos-sa volta», como se deduz «do caso aqui trazido pelo Prof. Pita Barros, dos círculos de qualidade instituídos na Suíça, e que nos faz questionar por que não existem também em Portugal? Dir-nos-ão que é neces-sário investimento, mas o Infarmed tem todo o interesse em promover a excelência na prescrição médica no nosso país e tem fundos que podem ser aplicados aqui, ao invés de se-rem canalizados para recapitalizar os hospitais, por exemplo. Portugal precisa de pôr os profissionais a dia-logar uns com os outros». Também o modelo irlandês pode servir de benchmarking. «Veja-se a vacinação: na Irlanda a prática pou-co difere da nossa, mas lá os atos são verdadeiramente remunerados, enquanto cá montamos um sistema que funciona bem e é reconhecido

«Portugal precisa de pôr os profissionais a dialogar uns com os outros»

Carlos Maurício Barbosa, Bastonário da Ordem dos Farmacêuticos

e, a dada altura, a DGS resolve criar um outro, paralelo, para os maiores de 65 anos. Porquê? Os maiores de 65 anos não podiam ser vacinados nas farmácias? Dizem que poupa-ram um milhão, mas ninguém fala dos dois milhões que foram gastos».Maurício Barbosa aproveitou ainda a ocasião para anunciar que a Ordem irá promover um estudo sobre o va-lor económico do ato farmacêutico, «atualizando os estudos anterior-mente feitos e objetivando encontrar o valor desse ato, quer para o cida-dão quer para o Estado».

EQUIDADE, JUSTIÇA E RACIONALIDADE

Antes de dar início ao seu discur-so final, Paulo Duarte convidou os presentes a tomarem conhecimen-to de uma iniciativa da Direção da ANF, através do visionamento de um vídeo, onde foi apresentado o “Prémio João cordeiro – Inovação em Farmácia”, diligência fortemen-te aplaudida pelo auditório. (Ver ar-tigo página 10) Prosseguiu, depois, anunciando a participação de 2500 congressistas nos trabalhos e o cumprimento dos objetivos a que a organização se ha-via proposto, considerando que se tratou de «uma grande manifestação de unidade das farmácias, de vonta-de de cooperação entre os setores do medicamento, e de interesse do

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FARMÁCIA PORTUGUESA • 204 • OUT/NOV/DEZ‘13FARMÁCIA PORTUGUESA • 204 • OUT/NOV/DEZ‘13

Parlamento, do Governo e dos par-tidos políticos em cooperar connos-co». O congresso foi «uma grande manifestação de solidariedade dos nossos convidados, pela disponi-bilidade em participar e pelo apoio expresso nas suas intervenções». Mas foi igualmente um evento «com memória, em que homenageámos o nosso passado associativo e distintos líderes que o ajudaram a construir», e um evento «de afetos, porque con-vivemos fraternalmente e este é também um bom motivo para estas reuniões». De assinalar que, ditas estas palavras, Paulo Duarte reco-lheria a primeira de várias ovações à sua preleção.Sobre a necessidade de um novo contrato social entre o Estado e as farmácias, que serviu de lema ao congresso, disse que «fizemos uma análise detalhada dos seus fundamentos e definimos o cami-nho a seguir. Foi reconhecida a im-portância das farmácias enquanto rede de cuidados de saúde de pro-ximidade, a qualidade dos serviços que prestam à comunidade, a crise do setor e as suas consequências na acessibilidade da população aos medicamentos». A esse respeito, salientou, «ouvimos as preocu-pações manifestadas pelo senhor secretário de Estado da Saúde» e

«a disponibilidade para tomar me-didas, nomeadamente no domí-nio dos incentivos ao crescimento do mercado de genéricos». Foi reconhecida «a capacidade e as vantagens de as farmácias pres-tarem mais serviços aos doentes» e «ouvimos o senhor secretário de estado da saúde valorizar o interesse público da prestação de novos serviços pelas farmácias. A celebração de um novo contrato social foi um tema consensual no congresso e a ele se referiu expres-samente também o representante do Governo». Mas, no âmbito desse contrato, «não nos esqueceremos de que estamos a ser marginalizados na vacinação contra a gripe» ou que «o Ministério da Saúde pôs termo, unilateralmen-te, ao programa de troca de seringas nas farmácias», ao mesmo tempo que, como ficou mais uma vez subli-nhado, é claro «o sentido de respon-sabilidade das farmácias, no seu po-sicionamento constante ao lado dos doentes e no respeito pelas obriga-ções internacionais do Estado». As farmácias, reiterou, reclamam do Ministério da Saúde «uma nova po-lítica do medicamento» e estão con-victas de que os seus responsáveis «terão a coragem e a determinação para a implementar, em coerência com as expectativas criadas aos ci-dadãos, aos profissionais de saúde, aos agentes do setor e na opinião pública». Uma política «equitativa nos contributos de cada um para a redução da despesa pública, em que as farmácias assumam plenamente as suas capacidades, competên-cias e responsabilidades perante o Sistema de Saúde e os doentes», e justa «no critério de remuneração de todos os setores do medica-mento», sendo que aquele que for escolhido pelo Ministério «deve ser aplicado a indústria, grossistas e farmácias». As farmácias reclamam, enfim, uma política racional, onde não ca-bem medidas como a que levou à

instalação de unidades de venda a público nos Hospitais do SNS. Por entre fortes aplausos, Paulo Duarte classificou esta como sendo uma «iniciativa falhada e com elevados custos para todos, como bem eviden-cia um relatório da Inspeção-Geral das Finanças, que faz referência a prejuízos para o Estado de vários mi-lhões de euros». E isto, sem que se-quer alguma destas farmácias res-pondesse a qualquer necessidade de cobertura farmacêutica ou tivesse constituído alguma fonte de receita para os respetivos hospitais. «Bem pelo contrário, todas elas se trans-formaram numa fonte de problemas e processos judiciais que ameaçam não ter fim. O diploma que permite a instalação de farmácias nos hospi-tais do SNS deve ser revogado».

DE OLHOS POSTOS NO OBJETIVO

A desejada e necessária nova políti-ca «exige uma atitude construtiva e um sentido de parceria entre todos os setores profissionais da área da Saúde e entre estes e as entidades reguladoras. Essa será sempre a nossa atitude» e, nesse âmbito, «o Infarmed é uma instituição essen-cial para se construir um espírito de parceria na área do medica-mento», com o qual, aliás, «temos mantido relações de estreito diálo-go que consideramos, pela nossa parte, muito positivas». A Direção da ANF está, por isso, convencida de que «estão criadas boas condi-ções para uma cooperação estru-turada, duradoura e benéfica para o Sistema de Saúde». Sendo este um setor transparen-te, permanentemente escrutinado por várias entidades, em particu-lar pelo Infarmed, a verdade é que «estamos muito tranquilos com esse escrutínio, não temos nada a esconder e queremos mesmo aprofundar com o Infarmed um trabalho conjunto para organiza-ção de inspeções pedagógicas às Eurico Castro Alves, presidente do Infarmed

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«Toda a atividade da ANF está concentrada no objetivo de contribuir para a resolução da crise»

Paulo Duarte, presidente da ANF

As farmácias, reclamam do Ministério da Saúde

«uma nova política do medicamento»

e estão convictas de que os seus responsáveis

«terão a coragem e a determinação

para a implementar»

farmácias, com o objetivo de ele-var ainda mais a qualidade da as-sistência farmacêutica que pres-tam às populações», vaticinou, detalhando, porém, que a mesma preocupação inspetiva tem de ser alargada a todas as entidades que se relacionam com os medicamen-tos. «Ninguém pode ser deixado para trás. A qualidade e a seguran-ça na utilização dos medicamentos são um compromisso de todos: de quem fabrica, prescreve, distribui e dispensa medicamentos». Para o presidente da ANF, «a cri-se económica e financeira das farmácias é hoje o nosso pro-blema fundamental» e a sua resolução depende de todos: «do Estado, que tem o poder político e legislativo para criar as condições necessárias à celebração de um novo contrato social com as farmácias»; delas mesmas e de «continuarem a ser capazes de se adaptarem aos tempos de austeridade que vive-mos»; e da «atividade associativa e daquilo que formos capazes de cons-truir coletivamente». Ao nível associativo, assegurou que «toda a atividade da ANF está con-centrada no objetivo de contribuir para a resolução da crise» do setor, e anunciou que, com esse fim, «a Direção da ANF deliberou que as comparticipações das entidades, a partir dos fornecimentos do pró-ximo mês de novembro, inclusive, serão adiantadas às farmácias na mesma data de adiantamento das comparticipações do SNS». Por en-tre aclamações, acrescentou que «é uma medida que não resolve o problema financeiro das farmácias,

mas é um sinal que queremos dar ao Estado de que as farmácias e a ANF estão a fazer tudo o que está ao seu alcance para sobreviverem à crise. Chegou o momento de o Estado assumir ele também as suas responsabilidades na resolu-ção do problema». Concluindo, afirmou que «tal como vos disse na Sessão de Abertura deste Congresso, lutaremos com todas as nossas forças por um novo contrato social que promova

uma assistência farmacêutica de qualidade e ao mais baixo custo e assegure a sustentabilidade das farmácias. Os órgãos sociais e a estrutura associativa estão unidos nesse objetivo. A Direção sente--se revigorada com a vossa parti-cipação e o êxito deste congresso, e acredito que esse é também o sentimento dos associados. Temos muito trabalho pela frente. As far-mácias têm futuro. Com sentido de responsabilidade e trabalho bem feito, os resultados vão aparecer. Mãos à obra!».

REFLETIR E CONCRETIzAR RAPIDAMENTE

Eurico Castro Alves encerraria, de seguida, o 11.º Congresso Nacional das Farmácias, notando que, no de-correr de todos os painéis, «foram apontadas diferentes perspetivas para uma saúde sustentável», mui-to embora «a abordagem tenha de ser enquadrada no momento atual, onde se pretende manter e garantir a própria existência do SNS». Essa

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é também, afirmou, a realidade das medidas to-madas na área do medicamento, cujos resultados considerou serem incontestáveis, pois permitiram atingir o fim de garantir o acesso dos cidadãos a fármacos seguros, de qualidade, eficazes e a pre-ços suportáveis. «Reconhece-se, no entanto, o seu forte impacto» no setor, acrescentou. A autoridade nacional, disse, tem todo o interesse em «manter e regular o funcionamento do mer-cado do medicamento no nosso país», e apesar de ciente das limitações atuais, o empenho do Infarmed na busca «de soluções que minimizem os problemas é efetivo. Procuramos trabalhar em conjunto para que, mesmo em momentos de dificuldade, se identifiquem possibilidades de me-lhoria de eficiência do sistema, em benefício de todos». Nessa senda, «não pode ser desconside-rado o uso da rede de farmácias, por exemplo, nos ganhos gerados por um sustentado crescimento do mercado de genéricos. A aposta nestes medi-camentos, associado a um sistema remuneratório equilibrado, contribuirá decisivamente para o in-cremento da acessibilidade e para o ajustamento adequado dos encargos do cidadão» nesta área. Por isso, defende que «estas oportunidades são merecedoras de uma reflexão entre todos os par-ceiros, de modo a serem encontradas formas de as concretizarmos tão rapidamente quanto possível». Portugal encontra-se num momento de viragem relativamente ao modelo que quer seguir, e a sua definição importa também ao setor, «que tem de criar bases para o desenvolvimento de uma política de saúde sustentável, acessível, equitativa e cen-trada nos portugueses. Esse foi também o objetivo deste congresso», sublinhou.Por fim, o presidente do Infarmed destacou o papel da ANF na «maturidade da rede portu-guesa de farmácias», considerando que «a pro-ximidade do farmacêutico à população torna o seu papel imprescindível» e, confidenciando uma situação particular, convidou os presen-tes à reflexão: «recentemente, o Governo pediu ao Infarmed que determinasse por que moti-vo um dado medicamento estava em falta nas farmácias. Foi então lançado um programa de inspeções e eu próprio fui para o terreno, visi-tar farmácias. Estive em dezenas delas e reco-lhi duas notas, uma negativa e outra positiva. A negativa, foi que ninguém me reconheceu, o que foi mau para o meu ego! A positiva é que em todas, sem exceção, fui tratado de modo amigável e percebi que vocês fazem os doen-tes sentirem-se seguros. Continuem assim e contem com o Infarmed».

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A análise de indicadores de perfor-mance da Farmácia foi tema de apre-sentação e discussão na Workshop 5 – Análise da Performance da Farmácia realizado no âmbito do 11º Congresso das Farmácias. O intuito desta Workshop foi o de apresentar às Farmácias uma ferramenta de indicadores de gestão que permi-tisse de forma simples, a análise da situação económica/financeira da Farmácia.A ferramenta apresentada, ficheiro disponível no ANFOnline, foi constru-

ída para que de uma forma simples a Farmácia após o carregamento dos seus dados consiga analisar os seus indicadores e através de um sistema de cores (verde para positivo, cin-zento para neutro e vermelho para negativo), e com base em intervalos definidos, avaliar qual a situação da Farmácia nas várias áreas de análise presentes na ferramenta.Para o carregamento desta fer-ramenta a Farmácia necessita de utilizar as seguintes fontes de informação:

• Pharmacy Watch Profile (rela-tório mensal disponibilizado na área reservada da Farmácia no ANFOnline);

• Informação financeira (informa-ção disponibilizada pela conta-bilidade).

Em relação à primeira fonte de infor-mação, Pharmacy Watch Profile, o foco vai para o crescimento acumu-lado da Farmácia no “Mercado Total” e nos segmentos com maior peso nas vendas (Medicamentos Sujeitos a Receita Médica, Medicamentos Não Sujeitos a Receita Médica e Produtos de Saúde). Para que exis-ta uma comparação com uma re-alidade próxima, existe também a necessidade de obter e comparar os dados da Farmácia com os dados Distritais.Relativamente aos dados financei-ros, a informação necessária para o preenchimento do ficheiro de indicadores tem origem em três fontes, sendo estas o balancete, a demonstração dos resultados e o balanço. Estando descritas, na folha “Fontes” do ficheiro disponibilizado, as respectivas contas contabilísti-cas e rubricas necessárias para o preenchimento da ferramenta. Os valores a preencher neste caso são os valores acumulados da Farmácia até à data de análise.A ferramenta tem na sua folha “Relatório” o cálculo de 13 indica-

conSultoRia de geStão

Utilizar ferramentas de análise da performance da FarmáciaA utilização de ferramentas de gestão tornou-se fundamental pelas Farmácias, uma análise atempada da situação económica/financeira permite a implementação de medidas de forma a melhorar a performance da Farmácia.

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dores e a construção de um grá-fico, estando estes apresentados em quatro áreas distintas:• Vendas e Mercado;• Rendibilidade e Eficiências;• Capital Circulante e Endividamento;• Gráfico – Distribuição da Margem Bruta

VENDAS E MERCADO

O que se pretende nestes indica-dores é que as Farmácias tenham uma noção mais directa do seu crescimento face ao crescimento do Distrito, quando a sua posição for mais favorável que a do Distrito o valor aparece sombreado a verde, podendo ainda a Farmácia calcular o seu crescimento orgânico através da diferença entre o seu cresci-mento e o crescimento do Distrito. A análise desta área pode ajudar a Farmácia a definir melhor a sua estratégia de vendas, identificando sobre qual o segmento necessita de realizar mais trabalho.

RENDIBILIDADE E EFICIêNCIAS

Nesta área a Farmácia pode ana-lisar a sua prestação ao nível de várias rubricas financeiras, nome-adamente da demonstração dos resultados. Assim a Farmácia terá o cálculo da sua Margem Bruta, sendo esta um reflexo dos valo-res registados pela contabilidade das faturas de venda e de com-pra. Terá igualmente o cálculo da percentagem sobre as vendas dos Fornecimentos e Serviços Externos, dos Gastos com o Pessoal, servindo estes valores para a Farmácia ava-liar o peso dos seus principais gas-tos operacionais sobre as vendas, estes indicadores assumem par-ticular importância numa conjun-tura onde o valor das vendas tem vindo a diminuir. Adicionalmente existe também a identificação da Rendibilidade Operacional, através

produto roda no stock da Farmácia. O último indicador calculado nesta área pretende fornecer à Farmácia uma noção do número de anos que demoraria a liquidar os finan-ciamentos obtidos com o actual Resultado Operacional Bruto.

GRÁFICO – DISTRIBUIÇÃO DA MARGEM BRUTA

O gráfico apresentado nesta fer-ramenta pretende demonstrar à Farmácia qual a utilização que a mesma está a efetuar do valor abso-luto de Margem Bruta que obtem, o conceito apresentado neste gráfico é diferente do apresentado na área de Rendibilidade e Eficiências, onde se apura as percentagens sobre as vendas. Neste caso pretende-se de-monstrar à Farmácia que percenta-gem da sua Margem Bruta está a ser utilizada e onde.Uma parte fundamental de todas as análises que podem ser efetuadas a partir desta ferramenta é a fiabilida-de dos dados, por isso torna-se de especial importância o envio atem-pado de informação para a contabi-lidade, nomeadamente a posição de inventário no final de cada mês, o mapa recapitulativo das vendas, fa-turas de compra, entre outros. Este envio atempado de informação vai permitir receber a documentação da contabilidade mais cedo e reali-zar uma análise o quanto antes da situação económica/financeira.Por fim podemos concluir que na atu-al conjuntura que o setor atravessa torna-se essencial que as Farmácias se munam das ferramentas neces-sárias para conseguirem realizar uma análise atempada da sua situa-ção económica/financeira e assim to-mar as medidas indispensáveis para a resolução das potenciais dificulda-des porque estejam a passar.

Luís LopesDepartamento de Planeamento

e Controlo da ANF

do cálculo da percentagem sobre as vendas do Resultado Operacional Bruto.Nesta área também se encontra calculado o valor médio mensal em euros que cada colaborador da Farmácia vende (vendas sem IVA), bem como qual o ponto de equilí-brio operacional da Farmácia com a atual estrutura de gastos. Este valor representa o valor mensal que cada colaborador da Farmácia necessita de vender para que a Operação da Farmácia seja zero.

CAPITAL CIRCULANTE E ENDIVIDAMENTO

A informação obtida na área do Capital Circulante e do Endivida-mento está relacionada com três rubricas do balanço, nomeadamen-te os fornecedores, o inventário e o financiamento. Em relação à pri-meira rubrica temos o cálculo do Prazo Médio de Pagamentos que nos permite verificar quantos dias em média a Farmácia demora a efe-tuar o pagamento aos fornecedores, e assim a obter as melhores condi-ções comerciais. O cálculo do Prazo Médio de Existências e da Rotação de Stock permite à Farmácia verifi-car o número de dias que em média um produto fica no seu inventário e quantas vezes ao ano o mesmo

A ferramenta foi construída para que de uma forma simples a Farmácia consiga analisar os seus indicadores e avaliar qual a sua situação nas várias áreas de análise

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É ALTURA DE RELEMBRAR…

A mudança brusca de temperatura e a redução da hu-midade relativa do ar fazem do inverno uma estação em que há maior predisposição para ocorrência de infla-mações e infeções respiratórias. O tempo frio predispõe para uma maior concentração de pessoas em ambien-tes fechados, aquecidos, frequentemente mal ventila-dos, facilitando a transmissão de infeções respiratórias, com particular destaque para constipações e gripes.Os utentes são cada vez mais exigentes, procurando, avidamente, soluções rápidas e eficazes para os sinto-mas associados a estes males de Inverno. A Farmácia depara-se, assim, com um contexto no qual, a par de uma oportunidade valiosa para intervir sugerindo e aconselhando os medicamentos e produtos de saúde mais adequados a cada situação, é imperioso que as-suma uma postura ativa promovendo a adoção de com-portamentos preventivos e sensibilizando para a im-portância do uso racional dos antibióticos, ainda muito procurados, indevidamente, para a resolução destas situações.As constipações (nasofaringite aguda) são infeções virais benignas mas podem constituir a porta de entrada infe-ções bacterianas secundárias, que podem atingir, quer as vias aéreas superiores (rinite ou sinusite bacteriana, otite média aguda), quer a árvore brônquica (bronquite aguda). Podem, ainda implicar agravamento de patologia respira-tória prévia (asma ou doença pulmonar obstrutiva crónica - DPOC). Os sintomas surgem dois a três dias após o con-tágio e podem manter-se por duas semanas.A gripe, causada pelos vírus Influenza, continua a ser um importante problema de saúde pública pelo ser per-fil de contágio – origina epidemias sazonais com elevada sobrecarga dos serviços de saúde – e pelo potencial de complicações graves, principalmente em grupos de ris-co. Em regra, manifesta-se de forma súbita com febre elevada, só ao fim de dois a três dias surgem os sintomas respiratórios que podem permanecer por 5 a 7 dias.

Chegou o inverno, e agora?

PATOlOgIAS dE INvERNO

em foco

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De entre as possíveis complicações da gripe destaca--se a pneumonia, particularmente grave em idosos, debilitados ou doentes crónicos. Pode ser provocada pelo próprio vírus da gripe (pneumonia viral primária), caracterizada por dispneia e dor no peito, ou resultar de uma infecção respiratória secundária (pneumonia bacteriana secundária), caracterizada pelo reapareci-mento, na segunda semana a contar do início da gripe, de febre, arrepios, tosse produtiva, com mais ou me-nos expetoração de cor amarelada, esverdeada ou cor de ferrugem, dificuldade respiratória ou mesmo falta de ar, dor torácica e mal-estar geral. Estes sintomas instalam-se de forma rápida e podem, ou não, existir todos ao mesmo tempo.A bactéria Streptococcus pneumoniae (pneumococo)1 é o principal agente causador de pneumonia nos adultos (30 a 70% dos casos). Esta doença é normalmente dete-tada tardiamente, uma vez que os seus sintomas se po-dem confundir com patologias menos graves. Segundo um relatório da Direcção Geral da Saúde (DGS), a taxa de mortalidade por pneumonia em Portugal é o dobro da média europeia, sendo que o seu pico coincide com a actividade gripal. a farmácia deverá estar atenta aos sinais de alerta e encaminhar o utente ao médico, quando necessário.

1 O Streptococus pneumoniae é o agente causal das doenças pneumocócicas: meningite; pneumonia; bacteremia e sepse (infecção na corrente sanguínea); sinusite; otite médica (infeção do ouvido).

tabela 1 – Resumo das diferenças entre Constipação e Gripe

É ALTURA DE ACONSELHAR…

A farmácia tem disponíveis inúmeras alternativas que po-dem ser indicadas, de acordo com as queixas e o perfil do doente, para alívio dos sintomas e redução do desconforto associado a gripes e constipações, quando o doente ape-nas apresente queixas ligeiras a moderadas. De produtos de saúde a mnsrm, passando por suplementos alimen-tares, medicamentos homeopáticos, chás ou rebuçados para a tosse, a escolha é vasta. O recurso à informação e às funcionalidades integradas no sistema informático Sifarma permite a verificação fácil e cómoda da informa-ção relativa a indicações, posologia e recomendações de toma de cada medicamento ou suplemento alimentar e a identificação da alternativa com melhor perfil de seguran-ça para cada utente tidas em conta as condições ou pato-logias que o caracterizam e outros medicamentos que já toma. Em complemento ao aconselhamento a prestar ao utente, estão igualmente disponíveis, no Sifarma, folhetos isaúde2 , os quais são sugeridos em contexto da dispensa de medicamentos ou outros produtos. Temas atualmente disponíveis:

• Constipação - Vírus há muitos• Tosse - Um reflexo natural• Dor de Garganta - Quando engolir é difícil• Gripe - Uma presença anual• Congestão Nasal - Respiração comprometida• Rouquidão e Afonia

“MAS EU QUERO UM ANTIBIóTICO…”

Muitos utentes continuam a solicitar erradamente a dis-pensa de antibióticos, porque acreditam que os antibióti-cos são o melhor tratamento contra gripes e constipações. Na realidade, o seu uso nestas situações não só não traz qualquer benefício como expõe o doente a reações ad-versas desnecessárias e contribui para a resistência aos antibióticos, que é um dos mais preocupantes problemas de saúde pública, criado em grande parte pelo mau uso e abuso desta arma terapêutica. Neste contexto, o devido e necessário esclarecimento dos utentes representa uma importantíssima intervenção das farmácias no âmbito da educação para a saúde e da preservação da Saúde Pública. Para suportar este aconselhamento, podem ser utilizados os seguintes folhetos iSaúde, disponíveis no Sifarma:

• Antibióticos - Saber usar• Resistência aos Antibióticos - Prevenir está nas suas mãos• Antibióticos em crianças - Usar sem abusar

2 Temas sugeridos no atendimento, em contexto de uma dispensa – destaque para o botão iSaúde (Shift + I) ou menú “Utentes” > “iSaú-de” > “Folhetos”; Folhetos igualmente disponíveis no ANFOnline >acessível pela homepage na área “Publicações” > “iSaúde”

sINtOmAs CONstIPAÇÃO GrIPe

Início dos sintomas Gradual Súbito

mal-estar geral Ligeiro Intenso

Febre Ausente ou ligeira (< 38ºC)

Elevada; durante 3-4 dias

Dor de cabeça Raramente Forte

mialgias Ligeira Comum; por vezes intensa

Fadiga extrema Nunca Intensa e surge no início da doença

Congestão Nasal ou rinorreia

Comum Ocasional

espirros Comum Raros

Garganta inflamada Comum Ocasional

tosse, sensação de "peso" no peito

Ligeira a moderada Comum; pode tornar-se grave

Complicações

Congestão dos seios nasais ou dor de ouvidos

Bronquite, pneumonia; eventualmente fatal

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PATOlOgIAS dE INvERNO

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MAS NUNCA É TARDE DEMAIS PARA PREVENIR!

a vacinação dos grupos de risco é a principal medida de prevenção da gripe sazonal e das pneumonias. Existem também liofilizados de lisado bacteriano, indicados na prevenção da recorrência de infecções das vias respira-tórias superiores e inferiores em adultos e crianças, e na diminuição dos episódios agudos nas exacerbações da bronquite crónica e DPOC moderada nos adultos. Adicionalmente, é importante privilegiar as medidas pre-ventivas gerais, a colocar em prática por todos.

tabela 2 – Cuidados gerais de Prevenção da Gripe e Constipações

CUIDADOs GerAIs

Evitar ambientes mal ventilados, secos e com fumo.

Evitar o contacto direto com pessoas infectadas.

Evitar partilhar utensílios do dia-a-dia.

Utilizar lenços de papel descartáveis.

Ingerir alimentos ricos em vitamina C (kiwi, papaia, laranja, limão,…).

Ingerir líquidos regularmente.

Tossir ou espirrar para o antebraço, nunca para as mãos.

Lavar frequentemente as mãos.

Quem deve ser vacinado contra a gripe? e contra as doenças pneumocócicas?A vacina da gripe é recomendada a pessoas com ris-co de desenvolver complicações após contato com o vírus, como: utentes com idade igual ou superior a 65 anos (particularmente frequentadores de centros de dia ou residentes em estruturas residenciais); doentes crónicos e imunodeprimidos com 6 ou mais meses de idade; grávidas com tempo de gestação su-perior a 12 semanas; profissionais de saúde e outros

prestadores de cuidados em contacto com grupos de risco. Além destes grupos prioritários, aconselha--se também a vacinação às pessoas com idade com-preendida entre os 60 e os 64 anos. A vacina pneumocócica é especialmente recomen-dada a crianças, indivíduos de todas as idades per-tencentes a grupos de alto risco, e adultos a partir dos 50 anos.A utilização das vacinas pneumocócicas e da vacina da gripe deve ser estabelecida com base em reco-mendações oficiais que tenham em consideração o risco de doença invasiva nos diferentes grupos etários, comorbilidades subjacentes, bem como a variabilidade epidemiológica dos serotipos em dife-rentes zonas geográficas.

Quando deve ser feita a vacinação contra a gripe?A vacina da gripe deve ser administrada entre os me-ses de setembro e dezembro (de preferência no início de outubro), e tem que ser repetida todos os anos. Pode ser administrada em simultâneo com todas as vacinas do Plano Nacional de Vacinação (PNV), e com a vacina contra as doenças pneumocócicas, desde que em locais anatómicos diferentes. Quando não administradas em simultâneo, as vacinas podem ser

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administradas em qualquer altura, sem ser necessá-rio respeitar qualquer intervalo entre administrações.

Qual a composição da vacina da gripe?As vacinas comercializadas em Portugal são vacinas de vírus inativado. A composição da vacina pode ser alterada de ano para ano, de acordo com a previsão as estirpes de vírus Influenza A e Influenza B circulan-tes. Em Portugal, as vacinas contra a gripe são todas inativadas pelo que é importante informar que as vaci-nas não provocam a gripe, mas também não protegem contra outras infeções respiratórias virais que possam eventualmente surgir e que se podem confundir com a gripe.

…e da vacina pneumocócica? Com indicação para prevenção da pneumonia e infe-ções pneumocócicas sistémicas em adolescentes e adultos pertencentes a grupos de risco elevado estão disponíveis dois tipos de vacinas pneumocócicas, am-bas produzidas a partir da bactéria inativada:• Vacina adsorvida pneumocócica poliosídica con-

jugada de 13 valências (Pn13), constituída pelos polissacáridos capsulares, todos conjugados com uma proteína transportadora – Prevenar 13®;

• Vacina pneumocócica polissacárida de 23 valên-cias (Pn23), produzida a partir da cápsula bac-teriana, contém polissacáridos de cadeia longa – Pneumo 23®.

De acordo com os dados epidemiológicos nacio-nais, coligidos no âmbito do Grupo de Estudo da Doença Invasiva Pneumocócica (GE DIP), a Pn13 inclui na sua composição os serotipos responsá-veis por cerca de 80% dos casos de doença invasiva pneumocócica. Já os 23 serotipos de Streptococus pneumoniae incluídos na Pn23 serão responsáveis por cerca de 80 a 90% das doenças pneumocócicas graves, tais como pneumonias, meningites, bacte-riemias e septicemias.Independentemente de anteriormente ter sido vacina-do com uma vacina pneumocócica, se for considerada apropriada a administração de ambas as vacinas – Pn23 e Pn13 –, a Pn13 deve ser administrada primeiro.

a vacinação contra as doenças pneumocócicas deve ser feita todos os anos?De acordo com os conhecimentos atuais, não é neces-sária a reimunização sistemática de todos os indivídu-os previamente vacinados com a Pn23. Contudo, este reforço é recomendado em indivíduos de alto risco de infeção, que tenham recebido esta vacina há mais de 5 anos, ou cujo título de anticorpos tenha diminuído. A necessidade de revacinação com uma dose adicional de Pn13 não foi estabelecida. outros recursos…Encontra mais informação sobre as doenças respi-ratórias do inverno, opções de tratamento e medidas de prevenção nos seguintes recursos, disponíveis no ANFOnline:• vacinas contra a gripe - época 2013-2014; - Ofício Circular n.º 3332-2013• as vacinas do inverno – Revista Farmácia Portuguesa n.º 188, Jul/Set 2010• Gripe e constipação - Aconselhar suplementos – Boletim Farmácia

Prática n.º26, Out/Dez 2009• Gripe e constipação - Boletim Farmácia Técnica n.º 1, Set/Out 2005• congestão nasal - Boletim Farmácia Técnica n.º 3,

Jan/Fev 2006• Dor de garganta - Boletim Farmácia Técnica n.º 3,

Jan/Fev 2006• Tosse - Boletim Farmácia Técnica n.º 3, Jan/Fev 2006

elaborado por: Amadeu mendes e Joana Pinto, CeDIme| [email protected]

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CONVERSA COM...

FarmÁcIa PorTUGUesa - o con-ceito de “a minha farmácia” é-lhe familiar?João semedo – Sim, mas a minha experiência de relacionamento com o setor não será das mais comuns, sendo, desde logo, influenciada pelo facto de eu ser médico, o que me leva a olhar a farmácia e os far-macêuticos com uma proximidade maior, diferente. De qualquer modo, em Lisboa vivi sempre no mesmo local, e lembro-

João semedo, deputado e Coordenador do bLoCo de esquerda

No reino da paz podrePara João semedo, para além de toda a vertente profissional e técnica, as farmácias têm uma dimensão humana, de base verdadeiramente comunitária, que importa preservar. Os últimos Governos, porém, parecem não ter tido essa mesma sensibilidade, desvalorizando sistematicamente esse seu lado agregador. O contexto atual pode representar uma oportunidade política para corrigir isso e outros desperdícios, bastando para tal que o ministro abra a sua política orçamental a algumas medidas de saúde.

-me de ir com os meus pais às mes-mas duas farmácias que ainda vou hoje, e sou tão conhecido por quem lá trabalha como o eram a minha mãe ou o meu pai. O mesmo acon-tece no Porto, onde vivo. Há uma far-mácia perto de minha casa onde vou sempre, conheço os profissionais e eles conhecem-me a mim, e sinto a mesma aura de familiaridade de que me lembro do passado. E repare que, sendo eu hoje o que vulgarmente se designa por figura pública, e apesar

de isso, de um modo geral, me apro-ximar mais das pessoas, a verdade é que quando entro numa papelaria ou noutro local o sentir não é o mesmo.

Fs - não sente que a vida moderna tenha interferido nesse tão carac-terístico vínculo que parece esta-belecer-se entre as pessoas nestes espaços?Js - Não, e mesmo nas grandes cidades, mais cosmopolitas, julgo que não alterou muito, ao longo do

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dão sequer tempo para se encostar ao balcão.

Fs - Há quem diga que são os males menores de um mercado livre!Js - Acontece que mesmo aqueles que defendem o mercado inteiramen-te livre tropeçam frequentemente nos inconvenientes da total liberalização, a qual muitas vezes é uma selva.Tive muitas reservas quando o Go-verno de José Sócrates decidiu auto-rizar a venda de medicamentos nas grandes superfícies, porque, no meu ponto de vista, existem questões que

devem ser acauteladas. Por exemplo, fala-se do risco de asfixia pelos gran-des grupos económicos e desapa-recimento do pequeno e tradicional comércio, mas não se preveniu, neste contexto, a situação das farmácias. Depois, embora ache que se possa facilitar o acesso a alguns fármacos de utilização simples e generaliza-da, a oferta nestes espaços vai muito além disso, comercializando medica-mentos que devem ser tomados por indicação médica.

Fs - É, portanto, ainda mais res-tritivo que a criação de uma ter-ceira lista?Js - Nalguns casos sim. A terceira lista é uma fantasia, é um estrata-

«Outro disparate, e este Governo parece estar a insistir nisso, foi a instalação de farmácias nos recintos dos hospitais, uma modernice muito populista, que permitiu alguns bons negócios, para alguns grupos pouco escrupulosos»

tempo, a relação que temos com os farmacêuticos comunitários. Aconteceu-me, recentemente, por duas vezes, ter de ir a farmácias que não são aquelas a que recorro habi-tualmente e reparei que, em ambos os casos, estavam pessoas à conver-sa, tal como antigamente se estava nas leitarias, nas pastelarias… Fiquei a pensar nisso, porque veio reforçar a ideia que tenho de que as farmácias prestam um serviço comunitário fan-tástico. Não se limitam a dispensar medicamentos, as pessoas obtêm um aconselhamento de qualidade e com uma rapidez que não teriam noutro local e, para além disso, ainda encontram uma palavra amiga, al-guém para as escutar. Conto muitas vezes esta história ve-rídica: havia uma senhora, de muita idade, que todos os dias ia ao centro de saúde e, a determinada altura, deixou de aparecer durante quatro dias. Todos se questionavam o que seria feito dela, o que lhe teria acon-tecido. Quando, ao quinto dia, re-gressou, perguntaram-lhe: «então, D. Palmira, por onde andou?» Sabe o que respondeu? «Estive doente»! Este caso ilustra bem as fronteiras ténues entre a solidão e a doença. Hoje, nos grandes centros urbanos, a solidão, o isolamento e o abando-no são um problema terrível, sobre-tudo entre os mais idosos, que são também quem mais recorre às far-mácias por necessidade efetiva, mas também, simplesmente, procurando companhia.

Fs - a crise do setor pode ameaçar essa componente?Js - Sim, mas não só. Esse risco já existe desde antes, com as mudan-ças que, de certa forma, também contribuíram para a presente crise. Veja-se a deslocação para os centros comerciais ou a abertura de espaços autorizados a comercializar medi-camentos em grandes superfícies: aí, ninguém conversa com ninguém. Não se vai a um hipermercado e fi-ca-se a conversar com a menina da caixa, nem num centro comercial lhe

gema para descomparticipar medi-camentos de uma só assentada. Se por um lado é positivo, porque reco-nhece que há fármacos que apesar de não serem de prescrição médica devem ser dispensados apenas em ambientes protegidos, como o são as farmácias, ao mesmo tempo es-tá-se a usar este bom e tecnicamen-te recomendável princípio para dei-xar de comparticipá-los. Este modo de agir é muito pouco transparente. O apoio ou não do Estado à aquisição de um dado medicamento não deve ser ditado pelo local onde é vendi-do, mas pelo seu uso terapêutico. O Bloco de Esquerda, aliás, está a pre-parar um projeto-lei para corrigir isso, procurando impedir mais este estrago na política farmacêutica.Outro disparate, e este Governo pa-rece estar a insistir nisso, foi a ins-talação de farmácias nos recintos dos hospitais, uma modernice muito populista, que permitiu alguns bons negócios, para alguns grupos pouco escrupulosos - e estou a medir as palavras! Que era um grande negó-cio, algo fantástico para toda a gente, mas vê-se bem o fracasso completo em que se traduziu, para além de ter sido mais uma decisão que veio agravar as dificuldades do setor das farmácias. Sempre defendi que, em determinado contexto, os hospitais e centros de saúde pudessem dispen-sar medicamentos, mas não percebo por que é que uma farmácia privada há de ter o privilégio de estar instala-da à porta do hospital.

Fs - Que contexto?Js - Nos casos de alta de interna-mento em determinados períodos da noite, acautelando que as pesso-as possam não estar em condições de convalescença que lhes permi-tam ter autonomia para ir à farmá-cia de serviço, ou mesmo ter apoio familiar para o fazer. O BE apresen-tou um projeto que foi aprovado e é lei, e que dita que os hospitais, den-tro destas circunstâncias específi-cas, devem fornecer, gratuitamente, a medicação necessária para os três

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CONVERSA COM...

dias sequentes. De resto, assegura-das as primeiras tomas, há depois farmácias distribuídas de forma equilibrada.

Fs - a lei que fala foi aprovada pos-teriormente, esvaziando ainda mais de sentido estas farmácias… Js - Sim, mas inseria-se num lógica diferente, de introdução de huma-nidade no sistema hospitalar, fa-zendo parte de um pacote de outros projetos, também eles aprovados, e que respondiam a questões muito concretas. Por exemplo, ao direito a acompanhamento no serviço de ur-gência, para que as pessoas não per-maneçam horas sozinhas, enquanto a família espera o mesmo tempo sem notícias dos seus entes.

Fs - mas na prática o efeito de esva-ziamento de lógica foi o mesmo. o que se pergunta então é, sem haver uma efetiva necessidade e havendo graves problemas, porque se insis-te nesta medida? Js - Muitas decisões políticas são resultado de um jogo de interesses e da relação de força como se expri-mem esses interesses na sociedade portuguesa. No caso dos centros comerciais e grandes superfícies, eles são detidos por grandes poten-tados económicos e financeiros que impõem muitas regras, e acho que o Governo decidiu em função disso. Mas quando decidiu abrir as farmá-cias nos hospitais, julgo que a con-versa é outra, porque o que se quis foi instabilizar o mercado; quis-se criar “uma pequena picardia” com o setor das farmácias. Sobretudo, o que não se teve nunca em conta foi o mais importante: é que é muito fácil haver uma relação comunitária intensa entre uma farmácia e os re-sidentes da sua área, mas ninguém vai estabelecer essa relação num hospital. Se me perguntar o que é que eu va-lorizo muito na farmácia, para além, naturalmente, do serviço que presta, é essa relação, que é extremamen-te importante e por muitos motivos.

Estou farto de dizer publicamente que o SNS tinha toda a vantagem em institucionalizar na sua relação com as farmácias.

Fs - Institucionalizar?Js - Sim, legislar. Não há outra for-ma! O Estado não pode continuar a dizer às farmácias que “prestam uma grande serviço comunitário, muito obrigado, desejamos que continuem”… É preciso encontrar um modelo de relação que, no meu ponto de vista, passa por definir uma carteira de cuidados e serviços que as farmácias possam prestar e por valorizar os que já hoje prestam, bem como a relação entre o farma-cêutico e o médico do centro de saú-de, no sentido do respeito mútuo e da complementaridade entre quem

prescreve e quem dispensa; e isso tem de ser feito pelas ARS, julgo. Quando fui diretor de um hospital, muito pomposamente chamado de presidente do concelho de adminis-tração, parte dos meus colegas mé-dicos resistiram muito a que o far-macêutico os acompanhasse e aos enfermeiros nas tradicionais visitas semanais. Não fazia parte da cultu-ra institucional! Mas quando se quer mudar essa cultura, decide-se e acrescenta-se alguma coisa. Quando digo institucionalizar é mudar, e para mudar é preciso legislar sobre um modelo de relação entre as farmá-cias e os centros de saúde - com os hospitais parece-me mais complexo.

Fs - e, no entanto, mesmo aí, no âm-bito hoje hospitalar, há espaço para

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que as farmácias possam trabalhar, nomeadamente ao nível da adminis-tração a nível ambulatório de alguns medicamentos. Js - Aí seria mais cauteloso. Nós ti-vemos uma experiência fantástica, que infelizmente acabou, que foi a troca de seringas, e que evidenciou que há cuidados que as farmácias podem prestar, mas há certas pa-tologias que impõem condições, às quais é preciso assegurar que as far-mácias estão adaptadas. Por exem-plo, em muitas das medicações que menciona as tomas são feitas sob observação direta…

Fs - como acontecia com a meta-dona…Js - Sim, claro, mas nisso devemos ser muito prudentes. Durante muito tempo, era o Dr. João Cordeiro o pre-sidente, a ANF fez grande insistência para que certos medicamentos hos-pitalares pudessem ser dispensa-dos nas farmácias, e eu não tenho nenhuma objeção de princípio, mas é preciso assegurar que existem as condições não só logísticas, mas também de recursos humanos para isso poder ser feito. É que o risco é enorme, são terapêuticas onde a adesão do doente é decisiva.

Fs - não lhe parece que essa ade-são será mais facilmente garantida perto de casa do doente, ao invés de numa unidade hospitalar?Js - Provavelmente, por isso lhe digo que não tenho nenhuma objeção de princípio, apenas um sentido de pre-caução muito grande, que me dita que se trata de matéria que precisa de ser estudada.Mas há outras coisas que devem mu-dar, como o facto de as farmácias continuarem a ver o seu serviço re-munerado por uma percentagem.

Fs - o que é que, para si, o setor está a fazer mal?Js - [Pausa] Não sei, mas seria ilu-sório pensar que, com a crise social, económica e financeira gravíssima que o país atravessa, as farmácias

não fossem atingidas. Não quero es-tar com grandes sentenças, mas um setor que foi sempre muito organi-zado, muito bem estruturado, onde nada parecia acontecer por acaso, com múltiplos suportes à sua ativi-dade, mesmo financeiro, da ANF, e que não sendo uma rede institucio-nalizada, funcionava como tal, teria, evidentemente, que readaptar a sua estrutura de custos à nova realidade que lhe foi imposta. Não sei até que ponto isso foi feito, mas sei segura-mente que num setor cujas margens são uma percentagem sobre o seu volume de negócio, se este baixa, baixa a percentagem e a sua receita económica. Por isso defendo que se deve discutir uma modalidade diferente de remu-neração, um valor fixo.

Fs - concorda então com essa proposta?Js - Concordo, mas não é uma con-cordância fácil, demorei muito tempo a render-me a esta ideia.

Fs - Porquê?Js - Porque acho que o outro siste-ma também tem algumas virtudes, mas no quadro atual, considero que esta é a forma talvez mais simples de encontrar uma remuneração mais justa para o que as farmácias fazem. O problema nisto é sobrecarregar o

utente. Eu, ponderando os prós e contras, inclino-me, já com uma ra-zoável segurança, para o pagamento de uma taxa fixa, eventualmente di-ferente, de acordo com os cuidados prestados.Outra medida, mais complicada, passaria por introduzir regras no mercado que impedissem a proli-feração de centenas de apresen-tações para a mesma substância. Não consigo imaginar uma ativida-de comercial a ter esta capacidade de stock, que ao mesmo tempo que desregula completamente o mer-cado, tem custos elevados para as farmácias. Do meu ponto de vista, era mais simples, com base num formulário para o ambulatório, o Estado organizar concursos de fornecimento, como acontece nos hospitais. Há práticas tão boas nes-ta matéria, que não se percebe por que o Estado não procura revertê--las também para o ambulatório.

Fs - as áreas hospitalar e de am-bulatório parecem, por vezes, dois universos perfeitamente indepen-dentes. Há muito em termos de co-municação que falha?Js - Os ministros, durante uns anos, julgaram que governavam melhor pondo os vários operadores do mer-cado uns contra os outros, fossem as ordens profissionais entre si, es-tas contra a indústria e vice-versa, ou mesmo profissionais do mesmo ramo, mas a operar em áreas dis-tintas. E no meio dessas disputas e guerras, o Governo lá ia impondo a sua política, escapando entre as pin-gas da chuva. Os ministros gabavam--se de ser muito hábeis a gerir, com grande agilidade, as contradições. Hoje, porém, isso é um pouco dife-rente, e pela pressão dos cortes e restrições financeiras, os ministros colocam-se numa posição que, em-bora tenha elementos que se justi-ficam inteiramente, é muito popu-lista, de combate às corporações e aos interesses. Este Governo usa e abusa disso. Sabemos mais das in-vestigações da Polícia Judiciária às

«Uma coisa é gerir bem o orçamento do SNS, outra é gerir o SNS. O Dr. Paulo Macedo não faz mal a primeira, mas faz muito mal a segunda. Simplesmente não tem política de saúde. Este ministro existe para cortar.»

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múltiplas fraudes que se têm vindo a revelar do que da reforma hospi-talar. Ou seja, o SNS está pior do que estava, é preciso explicar essas dificuldades de acesso, de funcio-namento, de qualidade, e não há nada mais simples do que disparar contra todas as profissões e ope-radores. Alguns dos disparos são tiros muito certeiros, outros acho que são verdadeiramente apenas tiradas demagógicas e populistas para enganar a população.

Fs - É difícil fazer oposição contra um Governo que apregoa ter sido o salvador do acesso ao medicamento no contexto da crise?Js - Há uma convicção generali-zada entre opinion makers que o ministro Paulo Macedo é o melhor deste Governo. Eu tenho dito e re-pito sistematicamente que uma coisa é gerir bem o orçamento do SNS, outra é gerir o SNS. O Dr. Paulo Macedo não faz mal a pri-meira, mas faz muito mal a segun-da. Simplesmente não tem política de saúde. Este ministro existe para cortar.E depois, no âmbito da nossa con-versa, olhamos para a sociedade portuguesa e identificamos duas tendências claras. A primeira são as dificuldades no acesso aos cuidados de saúde prestados pela via tradicio-nal, seja nos hospitais ou centros de saúde. O ministro bem pode vir com estatísticas, mas o que está à vista de todos é que o acesso ao SNS pio-rou. De seguida, deparamo-nos com as tremendas dificuldades que exis-tem na estabilização da exploração das farmácias. Manda o bom senso que se pen-se num conjunto de serviços que possam ser prestados nas far-mácias, que estão próximas das pessoas, e que sejam justamente – para quem os financia e quem os presta – remunerados. O que o Governo deve fazer é reunir com os responsáveis por esta atividade e decidir o que é que pode ser transferido para as

farmácias, que dificuldades elas podem ajudar a resolver no domí-nio comunitário. Não me parece algo assim tão difícil.

Fs - Diria que existe um preconceito relativamente às farmácias?Js - Um Governo que corta tanto e que tantas dificuldades cria no acesso dos cidadãos aos cuidados de saúde, tem vantagens em ar-ranjar bodes expiatórios e respon-sáveis por todos os males. Eu sei que isso é assim, e também sei que durante um determinado período de tempo as farmácias foram um setor de altíssima rentabilidade, que transformou muitas vezes essa sua pujança em atitudes de grande agressividade, relativamente ao po-der político e até a outros setores sociais da vida portuguesa. Hoje a situação é muito diferente, as far-mácias passam por problemas evi-dentes e o seu encerramento não é só mau para os proprietários e farmacêuticos que lá trabalham, é um serviço que deixa de ser pres-tado àquela comunidade. Deveria haver uma maior compreensão so-bre isso. Julgo que tem havido por parte dos organismos que representam as farmácias uma atitude bas-

tante construtiva, muito menos agressiva, de quem quer fazer va-ler os seus argumentos e razões para resolver problemas que es-tão à vista de toda a gente. É la-mentável que do lado do Governo, que tem o poder de contribuir para a resolução de muitos destes problemas, não haja, pelo menos, a mesma abertura. O ambiente não é tão tenso e agressivo como noutras alturas, o que há é uma certa cultura de paz podre, onde aquilo de que não se fala não existe, e se não exis-te não é problema. Se a situação se continuar a degradar - e não sou muito otimista relativamente a isso, porque acho que estamos longe de sair da crise e quanto mais insistirmos na austerida-de, mais dificuldades o país e as pessoas vão ter -, se se mantiver este curso nos próximos tempos, os problemas que hoje afetam as farmácias não vão melhorar, tenderão antes a agravar-se. O Governo deveria prestar atenção a isto, até porque o ministro da Saúde não é apenas o ministro do Serviço Nacional da Saúde, mas de todo o sistema, de toda a rede envolvente e que é decisiva para a vida das pessoas.

CONVERSA COM...

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conSultoRia JuRÍdica

Foram várias as normas da Lei nº 23/2012, de 25 de junho, julgadas inconstitucionais pelo Acórdão do Tribunal Constitucional nº 602/2013 1.Cingiremos, porém, a nossa aná-lise à parte da decisão com rele-vância imediata para o setor, em

especial tendo presente a regu-lamentação coletiva de trabalho aplicável, a saber:- Descanso compensatório de-

corrente da prestação de traba-lho suplementar;

- Remuneração devida pela pres-

tação de trabalho suplementar;- Retribuição por trabalho normal

prestado em dia feriado.Para além destes temas, apenas porque se trata de matéria suscetível de originar dúvidas em algumas far-mácias, abordar-se-á, igualmente,

Acórdão do tribunal Constitucional e as Farmácias de OficinaO Acórdão do tribunal Constitucional nº 602/2013 apreciou a constitucionalidade de várias normas da Lei nº 23/2012, de 25 de junho, que alterou o Código do trabalho, aprovado pela Lei nº 7/2009, de 12 de fevereiro, tendo este reflexos para o setor das farmácias de oficina que se analisam em baixo.

1 Cobrindo matérias como: banco de horas; despedimento por extinção do posto de trabalho; despedimento por inadaptação; descansos compensatórios pela prestação de trabalho suplementar; remuneração do trabalho suple-mentar; remuneração por trabalho normal em dia feriado; majoração das férias em função da assiduidade

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o tema da majoração das férias em função da assiduidade.

DESCANSO COMPENSATóRIO DECORRENTE DA PRESTAÇÃO DE TRABALHO SUPLEMENTAR

A Lei nº 23/2012, de 25 de junho, veio determinar a revogação das normas legais que constavam do Código do Trabalho e que previam que no caso de prestação de trabalho suplemen-tar, em dia normal, em dia de des-canso semanal complementar ou em dia feriado, o trabalhador teria direito a um descanso compensatório.Ou seja, apenas no caso de trabalho suplementar em dia de descanso semanal obrigatório, ou quando se verifique que a prestação de trabalho suplementar impeça o gozo do perío-do de descanso diário (11 horas entre jornadas de trabalho) se manteve, no plano legal, a previsão do direito a um descanso compensatório.Em ligação com a referida elimina-ção dos referidos descansos com-pensatórios no Código do Trabalho, a mesma Lei nº 23/2012, estabele-ceu, no seu art.º 7º, nº 2 o seguinte regime:“São nulas as disposições de instru-mentos de regulamentação colectiva de trabalho e as cláusulas de contra-tos de trabalho celebrados antes da entrada em vigor da presente lei que disponham sobre descanso compen-satório pelo trabalho prestado em dia útil, em dia de descanso semanal complementar ou em feriado.”.Ora, esta foi precisamente uma das normas que o Acórdão do TC acima referido declarou inconstitucional, com força obrigatória geral, por com-portar uma infundada restrição ao direito de contratação coletiva, vio-lando os artigos 56º, nºs 3 e 4 e 18º, nº 2 da Constituição. Os efeitos conjugados da conside-ração como constitucional da elimi-nação da previsão legal do direito a descanso compensatório, nos casos acima referidos, com a declaração de inconstitucionalidade da norma

constante do nº 2 do art.º 7º da Lei nº 23/2012, de 25 de junho, resultam em que nos casos em que as conven-ções coletivas de trabalho prevejam a existência de descansos compensa-tórios as mesmas continuarão a ser aplicáveis nos respectivos âmbitos de aplicação.Como grande parte das convenções coletivas de trabalho prevêem des-cansos compensatórios pela pres-tação de trabalho suplementar, tal implicará que por força da decisão do TC, as empresas abrangidas terão de, em relação a todo o trabalho su-plementar prestado em dia normal, dia de descanso complementar ou em dia feriado que tenha sido reali-zado desde 1 de agosto de 2012, con-ceder aos trabalhadores o descanso compensatório nos termos previstos nas convenções coletivas aplicáveis.É fácil de antever as complicações organizativas, em matéria de alo-cação de recursos humanos e en-cargos financeiros suplementares que decorrerão para os emprega-dores abrangidos por tais conven-ções coletivas pelo facto de serem agora confrontados com obriga-ção de conceder tais descansos compensatórios acumulados des-de 1 de agosto do ano passado.No caso do setor das farmácias importa, porém, ter presente que a regulamentação coletiva aplicá-vel não prevê o direito a descanso compensatório pela prestação de trabalho suplementar em dia nor-mal ou em dia de descanso sema-nal complementar.Assim sendo, a decisão do TC, quanto a esta matéria, não tem qualquer efeito em relação aos tra-balhadores do setor das farmácias de oficina, continuando a não haver, portanto, nos casos de prestação de trabalho suplementar em dia nor-mal ou em dia de descanso sema-nal complementar obrigatoriedade de concessão ao trabalhador de descanso compensatório decorren-te de tal prestação de trabalho.Já no caso do trabalho suplemen-tar em dia feriado a regulamenta-

ção coletiva de trabalho aplicável ao setor prevê em certos casos a concessão de descansos, os quais, em face do Acórdão em apreço, se mantêm válidos com efeito a 1 de agosto de 2012.

REMUNERAÇÃO DEVIDA PELA PRESTAÇÃO DE TRABALHO SUPLEMENTAR

A remuneração pela prestação de trabalho suplementar consubs-tanciou uma das outras importan-tes matérias que, em sede de ar-ticulação da lei com a contratação coletiva, a Lei nº 23/2012, de 25 de junho, veio introduzir alterações, a saber:i. Redução das percentagens de

acréscimo previstas no Código do Trabalho, pela prestação de traba-lho suplementar:

- Em dia normal: de 50% para 25%, na primeira hora, e de 75% para 37,5% nas horas ou frações subse-quentes;

- Em dia de descanso semanal, obri-gatório ou complementar, ou em dia feriado: de 100% para 50%

ii. Suspensão das normas previstas em instrumentos de regulamenta-ção coletiva de trabalho (IRCT) que disponham sobre “acréscimos de pagamento de trabalho suplemen-tar superiores aos estabelecidos pelo Código do Trabalho”, durante dois anos a contar da entrada em vigor da dita Lei (ou seja, até 1 de agosto de 2014).

iii. Estatuição de que findo aque-le prazo de dois anos (ou seja a partir de 1 de agosto de 2014), caso as disposições de IRCT não tenham sido alteradas, os mon-tantes por elas previstos seriam reduzidos a metade, com o limite das percentagens de acréscimo de remuneração de trabalho su-plementar previstas no Código do Trabalho.

O Acórdão do TC veio decidir pela inconstitucionalidade das alterações acima referidas em iii) e pela conformidade com a

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Constituição quer das alterações referidas quer em i) quer em ii).Assim, até 1 de agosto de 2014, o trabalho suplementar con-tinuará a ser remunerado nos termos que agora estão pre-vistos no código do Trabalho para todos os trabalhadores das farmácias de oficina, indepen-dentemente de estarem ou não abrangidos por contratação cole-tiva, ou seja nos termos supra re-feridos em i).Porém, atenta a inconstitucionalida-de da modificação supra-referida em iii), tomando em atenção que todos os CCT outorgados pela ANF regu-lam especificamente a remuneração de trabalho suplementar, a partir do dia 1 de agosto de 2014 o mesmo vol-tará a ser remunerado nos termos dos CCT em vigor.Por seu lado, os trabalhadores que não forem abrangidos pelos ditos CCT terão direito à remuneração por trabalho suplementar nos termos do Código do Trabalho.

RETRIBUIÇÃO POR TRABALHO NORMAL PRESTADO EM DIA FERIADO

A Lei nº 23/2012, de 25 de junho, alterou o regime legal em matéria de retribuição por trabalho normal prestado em dia feriado, passando a estabelecer que o trabalhador tem direito nesses casos, mediante esco-lha do empregador, a um descanso compensatório com duração de me-tade do número de horas de trabalho prestadas ou ao acréscimo de 50% da remuneração correspondente (art.º 269º, nº 2 do Código do Trabalho)A mesma Lei determinou, a seme-lhança do referido na alínea ii) ante-rior, a suspensão até 1 de agosto de 2014 das disposições de IRCT sobre a matéria e, também à semelhança do referido supra na alínea iii), que após aquela data, caso as disposições de IRCT não tenham sido alteradas “os montantes por elas previstos são reduzidos a metade não podendo ser inferiores ao estabelecido pelo Código do Trabalho”

Ora, o Acórdão do TC, embora tenha julgado constitucional a norma que prevê a suspensão das cláusulas de IRCT que disponham sobre a maté-ria, até 1 de agosto de 2014, julgou inconstitucional a norma da Lei nº 23/2012, de 25 de junho, que deter-minava a redução para metade dos montantes dos IRCT que não fossem revistos até aquela data.No caso das convenções coletivas aplicáveis ao setor, importa sa-lientar que a decisão do Tribunal Constitucional é inócua, uma vez que as convenções coletivas aplicá-veis não regulam especificamente a matéria da remuneração da pres-tação de trabalho normal em dia feriado, aplicando-se, portanto, o regime legal, constante do nº2 , do art.º 269º, do Código do Trabalho e acima referido.

MAJORAÇÃO DAS FÉRIAS

A Lei nº 23/2012, de 25 de junho, veio revogar as disposições do Código do Trabalho que previam a majoração das férias até mais 3 dias, em função da assiduidade e, do mesmo passo, estipular que as majorações de férias que estives-sem previstas em instrumentos de regulamentação coletiva de traba-lho celebrados após 1 de dezembro de 2003 e antes da entrada em vigor da supra-referida Lei (1 de agosto

de 2012) seriam reduzidas, ope le-gis, em montante equivalente, até 3 dias.O Acórdão do TC decidiu pela cons-titucionalidade da eliminação legal da majoração das férias, mas con-siderou inconstitucional a norma da dita Lei que veio determinar a redução, até 3 dias, das disposições de IRCT nas condições acima refe-ridas.Quer isto dizer que as disposições de IRCT que prevejam majorações de férias mantêm-se inteiramente váli-das podendo, portanto, os respecti-vos trabalhadores reclamar as majo-rações a que tenham direito, desde já em relação aos dias de férias a gozar ainda no ano em curso e vencidos em 1 de janeiro de 2013.No caso das convenções coletivas de trabalho aplicáveis ao setor das farmácias de oficina o regime de férias nelas previsto não estipula qualquer majoração da duração das férias em função da assiduida-de, pelo que a decisão do Tribunal Constitucional não tem repercus-sões para as farmácias nesta maté-ria, continuando a vigorar o regime de duração mínima que está previs-to na lei, que actualmente é de 22 dias úteis (cf. art.º 238º CT).

elaborado por:Nuno Guedes Vaz, advogado, PLmJ

– sociedade de Advogados

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alemanha: novo serviço para grávidas nas farmácias Desde o dia 1 de novembro que as farmácias alemãs passaram a prestar um novo serviço dirigido a grávidas, que inclui uma revisão detalhada de todos os medica-mentos e suplementos que estas estão a tomar, com consequente alteração da dose da medicação, se necessário. Nestas consultas, o farmacêutico avalia as possíveis contra indicações, efeitos adver-sos e interações, e promove acon-selhamento específico para dieta e estilos de vida saudáveis.O serviço, remunerado em 33 € por gravidez, permite à mulher gestante ter um acompanhamen-to mais próximo por parte de um profissional de saúde, o qual está disponível para a orientar e es-clarecer questões tão frequentes nesta fase da sua vida.

Fonte: newsletter anF, nº 142, 1 de novembro de 2013

bélgica: serviço remunerado para doentes asmáticos As farmácias belgas estão, desde outubro, a disponibilizar um novo serviço de primeira consulta e mo-nitorização da terapêutica ao longo do tempo para doentes asmáticos em início de terapêutica com cor-ticoesteróides inalados. Trata-se de uma intervenção de particular importância na asma, quer ao ní-vel do ensino da técnica correta de inalação quer da motivação para adesão à terapêutica crónica, mesmo na ausência dos sintomas. Estas intervenções serão pagas pela Segurança Social da Bélgica, que pretende assim, com a colabo-ração dos farmacêuticos, reforçar a adesão aos tratamentos prescri-tos, contribuindo para o uso racio-nal, correto, efetivo e seguro dos medicamentos ao longo do tempo.

Fonte: newsletter anF, nº 139, 4 de outubro de 2013

espanha: Farmácias com dificuldades de abastecimento As farmácias catalãs aderiram massivamente à greve do passa-do dia 7 de novembro para exigir que o Governo pague a dívida, que atingiu um máximo histórico de 416 milhões de euros. Apesar de há quatro meses não rece-berem do Governo o valor cor-respondente à comparticipação dos medicamentos, as farmácias continuam a assegurar o seu adiantamento à população, mas a situação está a ficar comple-tamente insustentável, uma vez que os atrasos se arrastam há mais de dois anos. Logo, há cada vez mais farmácias sem capaci-dade económica para se abas-tecer, especialmente dos fár-macos mais caros, obrigando os utentes a percorrer diversos es-tabelecimentos para obterem a medicação de que necessitam.O setor alerta as autoridades para a necessidade de se encon-trar uma alternativa ao modelo de dispensa de medicamentos comparticipados, de modo a as-segurar a sustentabilidade da sua distribuição à população.

Fonte: newsletter anF, nº 143, 15 de novembro de 2013

austrália: Farmácias protestam contra corte na remuneraçãoCom contornos similares aos da iniciativa “Farmácia de Luto”, reali-zada pelo setor em Portugal, a as-sociação de proprietários de farmá-cia da Austrália (Pharmacy Guild of Australia - PGA) lançou a campanha “Farmácia comunitária sob ame-aça” (Community pharmacy under threat), que alerta para as conse-quências da decisão do Governo fe-deral de alterar o sistema de remu-neração em vigor (Pharmaceutical

Benefits Scheme - PBS).Segundo a PGA, esta medida vai re-duzir drasticamente a remuneração sobre a dispensa de medicamentos à população, colocando em risco mais de 5 mil postos de trabalho em todo o país. As farmácias alertam também que serão «forçadas» a reduzir o ho-rário de funcionamento e a disponibi-lizar menos serviços.No âmbito desta campanha, foi lançada a Petição “Para salvar as

farmácias de bairro, empregos e serviços aos doentes” (To save local pharmacies, jobs and patient servi-ces). Esta é passível de subscrição online e nas próprias farmácias, que pretendem ver assim mantidas as condições necessárias à sua ati-vidade, ao serviço aos utentes, ao emprego da sua equipa e ao garan-te do serviço de turnos.

Fonte: newsletter anFonline estrutura associativa, 25 de outubro de 2013

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As Devoluções

1. ENQUADRAMENTO

Embora seja delas o estímulo que o desencadeia, as Farmácias não têm nem o comando, nem o controlo, do processo de devolução dos medica-mentos e outros produtos adquiridos para venda aos seus fornecedores. São estes que, tendo na sua mão a condução de quase todos os proce-dimentos que lhe estão associados, marcam os tempos e decidem sobre a sua conclusão.A leitura do parecer que, sobre esta matéria, a Administração Tributária e Aduaneira (AT) recentemente pro-duziu e enviou à ANF1 e, sobretudo, a análise da fundamentação que lhe serve de base – está, assente no princípio de que a retificação do valor tributável de uma fatura é incum-bência exclusiva de quem a emitiu - confirma, em pleno, a ideia que aqui deixamos.Já se sabia que, numa devolução, o envio ou a colocação dos bens à dis-posição do respetivo fornecedor não determinava, por si só, a alteração da sua propriedade e que, por isso, não se podia impor à farmácia a obrigação de emitir um “documento retificativo de fatura”2. Como, tam-

1 Parecer / Informação nº 2165, de 30 setembro 2013, da Direção de Serviços do IVA, emitido em resposta à exposi-ção apresentada pela ANF.

2 Artigo 29º, nº 7 e artigo 36º, nº 6, ambos do CIVA. A este respeito se refere a circular da ANF com o nº 3667/2013, de 25 de outubro.

3 Decreto-Lei nº147/2003, de 11 de julho.4 Embora esta conta seja mais dirigida ao registo das mercadorias entregues à consignação, nada impede que ela

possa ser utilizada, também, para este fim. Poderá utilizar-se um 4º dígito para proceder à discriminação por fornecedor.

5 Esta segregação é, também imposta pelo Regime Jurídico das Farmácias (artigo 34º, nº4, do Decreto-Lei 307/2007, de 31 de agosto).

6 Não sendo muito comum, a regularização também pode ser feita com a reposição dos bens devolvidos.

bém, já se tinha por adquirido que a guia ou nota de devolução, emitida pe-las farmácias nestas circunstâncias, não era mais do que uma mera guia de remessa que, se pudesse abrigar, também, os requisitos previstos, como obrigatórios, no Regime de Bens em Circulação3 poderia servir, por equipa-ração, de “documento de transporte”.O parecer da AT que agora nos chega e a fundamentação que está na sua base, torna, tudo, a partir de agora, muito mais claro.

2. PROCEDIMENTOS

2.1. Por parte das Farmácias

A farmácia nada tem a perder se der expressão contabilística aos bens que introduz em processo de devolução, movimentando-os para a conta “326 - mercadorias em poder de terceiros”4. Essa movimentação, que terá a guia ou nota de devolução como suporte, pode-rá ser feita logo que esses bens forem entregues ou colocados à disposição do fornecedor.Embora esta operação contabilística não altere o saldo global do inventário, a segregação que daqui resulta5 ofe-recerá à farmácia uma visão mais ana-

lítica sobre o conjunto das suas exis-tências e permitirá monitorar melhor a evolução desse subconjunto.Como atrás se referiu, esta guia ou nota de devolução não é um “do-cumento retificativo de fatura”, no conceito que é definido no artigo 29º, nº7, do CIVA e, por isso, não terá de conter a referência à fatura a coberto da qual os bens foram ini-cialmente fornecidos.Como os bens introduzidos em pro-cesso de devolução irão circular em espaço público, haverá toda a vantagem em trazer para a nota de devolução todos os elementos que permitam a sua equiparação a “do-cumento de transporte” (indicação dos locais de carga /descarga e data / hora do início do transporte). Isto, para que, dessa forma, se possa, com ela, dar cumprimento às obri-gações impostas pelo Regime de Bens em Circulação.Se, e quando, o fornecedor validar e confirmar a devolução (normalmen-te com a emissão de uma nota de crédito6), a farmácia terá de proceder à regularização do seu inventário e, se for o caso, à regularização do IVA que lhe corresponde (sobre a regula-rização do IVA, ver o ponto 2.3).

A retificação do valor tributável de uma fatura é incumbência exclusiva de quem, antes, a emitiu. esta conclusão está espelhada no parecer emitido pela Administração tributária e Aduaneira sobre esta matéria e que aqui se analisa.

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7 Porque se trata de requisito cujo cumprimento será muito difícil levar à prática, terá de admitir-se que, por decisão da AT, possa vir a ser substituído por um outro mais facilmente executável

8 Artigo 78º do CIVA9 A base tributável corresponde ao valor faturado, líquido de descontos e abatimentos (artigo 16º, CIVA)

10 Nº 5 do artigo 78º, CIVA. A constituição da prova em como o adquirente tomou conhecimento da regularização é responsabilidade do transmitente.

2.2. Por parte dos Fornecedores

Validada e confirmada a devolução, caberá ao fornecedor dar início ao processo de regularização, daí re-tirando, com a emissão da nota de crédito, todos os seus efeitos. A regu-larização do IVA a favor do fornecedor que a nota de crédito poderá ter im-plícita, só será efectuada se isso for da sua conveniência (sobre a regula-rização do IVA, ver o ponto 2.3).Contrariamente à qualificação que é dada à guia ou nota de devolução emitida pela farmácia, a nota de cré-dito emitida pelo fornecedor, nestas circunstâncias, já tem de ser consi-derada “documento retificativo de fa-tura”, dentro do conceito que é defi-nido no artigo 29º, nº7, do CIVA. Dela deve, por isso, constar a referência à fatura em retificação7.Se da guia ou nota de devolução, emitida pela farmácia, constarem todos os elementos que permitam a sua qualificação como “documento de transporte” e se, em momento oportuno, for feita, através do Portal

das Finanças, a comunicação prévia de saída dos bens (locais de carga/descarga e data / hora), a circulação desses bens em espaço público, po-derá ser feita a coberto desse docu-mento.

2.3. Regularização do IVA8

a) Vista do lado do transmitente (do fornecedor)

A efetivação de uma devolução deter-mina, sempre, a correcção, no todo ou em parte, do valor tributável que foi de-finido na fatura inicial9. Como atrás se referiu, esta correcção é da iniciativa do fornecedor (o emitente da fatura).Corrigido o valor tributável, o IVA li-quidado e mencionado na fatura ini-cial tem de considerar-se imposto liquidado em excesso, uma vez que a base sobre a qual incidiu foi alterada para menos. Esta diminuição da base é o fundamento de que o fornecedor necessita para proceder à regulariza-ção do IVA a seu favor (regularização feita na nota de crédito).

Contudo, esta regularização a favor do fornecedor tem natureza faculta-tiva o que significa que nem todas as rectificações da base tributável inicial, feitas para menos, têm associadas regularizações de IVA a favor do for-necedor. Poderá acontecer que o for-necedor prescinda da recuperação da diferença do imposto.

b) Vista do lado do adquirente (da farmácia)

Se o fornecedor considerou na sua nota de crédito que liquidou IVA em excesso e procede, através desse do-cumento, à regularização da diferen-ça de imposto a seu favor, terá de se considerar que o adquirente (a farmá-cia) também o deduziu em excesso, justificando-se que, sobre ele, se co-loque a obrigação de o repor a favor do Estado.Esta regularização (a favor do Estado) só terá de ser efetuada pela farmá-cia se o fornecedor tiver feito a que, a montante, lhe competia (regulariza-ção a seu favor), o que significa que a operação de regularização é, do ponto de vista do seu efeito global, comple-tamente neutra. Isto, porque:

• Se o fornecedor a fizer a seu favor, a farmácia terá de a fazer, pelo mes-mo valor, a favor do Estado;

• Se o fornecedor não a fizer a seu fa-vor, a farmácia também não a terá de fazer a favor do Estado.

Daí que se tenha condicionado a regu-larização do transmitente (a favor do fornecedor) à garantia de que a sua execução chegou ao conhecimento do adquirente (da farmácia)10.

J. A. Campos Cruz(Consultor ANF)

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Paulo Cleto Duarte

A recente aprovação em Conselho de Ministros de alterações ao re-gime de margens das Farmácias é indiscutivelmente um facto positivo.É certo que são alterações finan-ceiramente neutras, quer quanto à despesa do Serviço Nacional de Saúde, quer quanto às receitas das Farmácias.Não contribuem, por isso, para re-solver a nossa atual crise económi-ca e financeira, mas acreditamos que têm a virtualidade de reduzir, no futuro, o seu agravamento, que foi brutal nos últimos três anos.As alterações não são as que es-perávamos e que nos tinham sido anunciadas, mas são um sinal de esperança.As Farmácias continuam em crise, mas acreditamos que será pos-sível construir um novo quadro de relações com o Ministério da Saúde, positivo para os Doentes, para o Estado e para as Farmácias.O nosso espírito tem sido e conti-nuará a ser o de parceria entre as Farmácias e o Ministério da Saúde, subordinada ao princípio da prima-zia do interesse público.Esperamos uma partilha de ga-nhos no crescimento do mercado de genéricos, porque as Farmácias têm tido um papel decisivo nesse crescimento e na redução da des-pesa dele decorrente.A definição dessa partilha deverá ser feita com a nossa colaboração.

sinaisPor outro lado, está em curso a análise da prestação de serviços pelas Farmácias, a contratualizar com o Serviço Nacional de Saúde.Pelo nosso lado, o trabalho está feito.Reunimos com as diversas institui-ções e apresentámos ao Ministério da Saúde uma proposta de Acordo.O princípio-base é o de que a re-muneração dos serviços fica de-pendente da sua avaliação, quer quanto a ganhos em saúde quer quanto à redução da despesa.Aceitaremos correr o risco de prestar esses serviços durante um determinado período de tempo sem garantia da sua remuneração, porque temos a certeza da mais--valia da nossa intervenção.O que não aceitamos é prestar indefinidamente serviços gratui-tos, porque a crise em que o se-tor se encontra não permite às Farmácias essa liberalidade.Esperamos também uma decisão do Ministério da Saúde relativamente às Farmácias instaladas nos Hospitais e actualmente encerradas.Em nossa opinião, está ampla-mente demonstrada junto da opi-nião pública e dos decisores políti-cos a irracionalidade da instalação daquelas farmácias.A própria Inspecção-Geral de Finanças publicou recentemente um relatório demolidor sobre o seu funcionamento e os elevados

prejuízos por elas causados ao erário público.A revogação do diploma que per-mitiu a instalação daquelas farmá-cias seria um sinal de confiança no setor e ajudaria à construção do espírito de parceria que queremos manter e reforçar com o Ministério da Saúde.Conhecemos bem as dificuldades do País e sabemos que as soluções têm de ser encontradas no respei-to por essas dificuldades.Tem sido sempre essa e continua-rá a ser a nossa posição.O País precisa de uma rede de far-mácias que funcione bem, perma-nentemente disponível e próxima, sem rutura de stocks, e a prestar uma assistência farmacêutica de qualidade às populações.É esta normalidade que procura-mos e queremos atingir com equi-líbrio, através de um esforço con-junto com o Ministério da Saúde.Pelo serviço que prestam, pela crise que se abateu sobre elas e pelo esforço que têm feito para ultrapassar as dificuldades, as Farmácias portuguesas são credo-ras de maior atenção por parte do Ministério da Saúde.

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