psicopatologia descritiva - aspectos históricos e conceituais

26
 17 1  Rev. Lati noam. Psic opat. Fund ., São Paulo, v. 15, n. 1, p. 171-196, março 2012 Psicopatologia descritiva: aspectos históricos e conceituais* German E. Berrios Este artigo oferece uma análise conceitual e histórica da  psic opato logi a descr itiv a. A prim eira seção a defi ne como um sist ema cognitivo constituído por termos, suposições e regras para a sua aplicação. Traça as implicações conceituais dessa definição e as relaciona à prática clínica. A segunda seção contém uma avaliação do trabalho histórico sobre a psicopatologia descritiva e oferece uma hipótese para explicar o seu desenvolvimento durante o século XIX. Sugere-se que o trabalho envolvido no teste de hipóteses deve ser  realizado por psiquiatras com formação em história e enquanto uma especialidade separada. Conclui-se que a calibração histórica dos sintomas psiquiátricos deve ser considerada como uma etapa essencial na construção de uma psicopatologia descritiva viável. Palavras-chave: Psicopatologia – história, modelos psicológicos, psiquiatria – história, linguagem * Publicação ori ginal: Descriptive psychopathology: conceptual and historical aspects, Psychological Medicine, n. 14, p. 303-313, 1984. Tradução de Lazslo A. Ávila e revisão técnica de Ana Maria G . R. Oda.

Upload: renan-martimiano-vieira

Post on 02-Nov-2015

226 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

....

TRANSCRIPT

  • 171

    Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., So Paulo, v. 15, n. 1, p. 171-196, maro 2012

    Psicopatologia descritiva:aspectos histricos e conceituais*

    German E. Berrios

    Este artigo oferece uma anlise conceitual e histrica dapsicopatologia descritiva. A primeira seo a define como um sistemacognitivo constitudo por termos, suposies e regras para a suaaplicao. Traa as implicaes conceituais dessa definio e asrelaciona prtica clnica. A segunda seo contm uma avaliao dotrabalho histrico sobre a psicopatologia descritiva e oferece umahiptese para explicar o seu desenvolvimento durante o sculo XIX.Sugere-se que o trabalho envolvido no teste de hipteses deve serrealizado por psiquiatras com formao em histria e enquanto umaespecialidade separada. Conclui-se que a calibrao histrica dossintomas psiquitricos deve ser considerada como uma etapa essencialna construo de uma psicopatologia descritiva vivel.Palavras-chave: Psicopatologia histria, modelos psicolgicos,

    psiquiatria histria, linguagem

    * Publicao original: Descriptive psychopathology: conceptual and historical aspects,Psychological Medicine, n. 14, p. 303-313, 1984.Traduo de Lazslo A. vila e reviso tcnica de Ana Maria G. R. Oda.

  • R E V I S T A

    L A T I N O A M E R I C A N A

    DE P S I C O P A T O L O G I A

    F U N D A M E N T A L

    172

    Introduo

    O temor de que a histria da medicina e da psiquiatria possatornar-se subserviente aos mdicos levou alguns historiadores a su-perestimar sua autonomia. Em relao psiquiatria, uma expressocomum dessa preocupao tem sido a de sobre-enfatizar os seusaspectos sociais (Drner, 1969). Em relao medicina em geralalguns se sentem autorizados a escrever: O compromisso comuma histria mdica neutra no foi apenas difcil, mas muitasvezes pde gerar nada menos do que m histria uma histriacom a raiva deixada de fora (Neve, 1983).

    Embora haja algo a ser dito em favor de escrever a histriaraivosa, principalmente em relao aos aspectos sociopolticos dapsiquiatria, a mudana sugerida tambm teve indesejveis conse-quncias. A preocupao exclusiva com os macroconceitos e asquestes sociais tm, em certas ocasies, resultado em obras psi-quitricas histricas que se lem como manifestos polticos (Castel,1973; Drner, 1969; Blasius, 1980; Scull, 1979).

    Uma vtima deste modismo tem sido a investigao histricasobre a origem e evoluo dos sintomas psiquitricos. A histria dapsicopatologia descritiva, devido sua especial vulnerabilidade sacusaes de presentismo, ou internalismo foi deixada para osclnicos idosos ou confinada s sees introdutrias de estudos cl-nicos.

    H uma demanda, no entanto, para este tipo de estudo. Asdores ticas dos anos 1960, provocadas pelo movimento da antipsi-quiatria, foram substitudas pelo furor descritivo dos anos 1970.

    Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., So Paulo, v. 15, n. 1, p. 171-196, maro 2012

  • 173

    Aqueles autores, cuja tarefa a calibrao da nomenclatura da psiquiatria, neces-sitam da ajuda dos historiadores. A resposta entusistica destes ltimos, no en-tanto, levou [os psiquiatras] a uma fabricao histrica de faa-voc-mesmo,que luta sem sucesso contra a falta de treino formal histrico, acesso limitado afontes primrias e obstculos lingusticos (Andreasen, 1982; Rome, 1979; Munro,1982; Kendler & Tsuang, 1981). Como consequncia, os padres de pesquisana histria psiquitrica, que deveriam ser to rigorosos quanto em neuroqumi-ca, no foram mantidos.

    Este trabalho apresenta a viso de que o trabalho colaborativo entre os m-dicos psiquiatras e os historiadores urgentemente necessrio e sugere, comoprimeira tarefa comum, a calibrao da psicopatologia descritiva. Como um passoinicial para esta aproximao, oferece uma anlise da estrutura conceitual da psi-copatologia descritiva e ento descreve um modelo geral para explicar a sua g-nese durante o sculo XIX. Este modelo pode ser empiricamente testado atravsda realizao, por exemplo, de estudos sobre a evoluo dos sintomas individu-ais (Berrios, 1977, 1981a, b, 1982).

    Questes conceituais

    A psiquiatria e sua linguagem

    A psiquiatria definida neste trabalho como o conjunto de consequncias(cognitivas e no cognitivas) que resultam da utilizao adequada de uma lingua-gem psicopatolgica. Cognitivo deve ser entendido como cientfico ou cl-nico e no cognitivo significa sociopoltico (McLeod, 1977).

    Uma linguagem psicopatolgica, por sua vez, definida como uma coleosistemtica de princpios gerais, enunciados descritivos, e regras para a sua apli-cao. Discursos regionais deste tipo foram criados pela maioria dos grupos so-ciais para descrever as formas de comportamento assumidos como resultantesde disfunes corporais ou psicolgicas indesejveis (Miller & Berrios, 1984).

    A utilizao da linguagem psicopatolgica considerada como apropriadaquando limitada ao domnio onde foi calibrada. A calibrao da linguagem ba-seia-se na observao histrica, clnica e estatstica cumulativa. Uma vez atingi-do um estado de equilbrio [steady state], a linguagem clnica perdura at que(1) os objetivos cognitivos da comunidade de usurios (Laudan, 1977) ou co-letivo de pensamento (Fleck, 1979) mudem de direo, ou (2) o objeto psico-patolgico em si passe por uma transformao para alm dos limites permissveis(Hare, 1974; Marchais, 1983), ou (3) a interao controlada entre o objeto e a lin-

    HISTRIA DAPSICOPATOLOGIA,POR GERMAN E.

    BERRIOS

    Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., So Paulo, v. 15, n. 1, p. 171-196, maro 2012

  • R E V I S T A

    L A T I N O A M E R I C A N A

    DE P S I C O P A T O L O G I A

    F U N D A M E N T A L

    174

    guagem promova maior desenvolvimento cientfico (Pandit, 1983). A psicopato-logia descritiva deve ser considerada como uma instituio conceitual que ofereceuma interface dinmica entre o observador e os fenmenos psicopatolgicos.

    Fenmenos psicopatolgicos e o observadorO comportamento psicopatolgico consiste em um caleidoscpico conglo-

    merado de sintomas de configurao e durao variveis. Em essncia, estes sin-tomas no so mais do que variaes identificveis na forma e no contedo dodiscurso e nos padres de motilidade do paciente. Por isso, uma pura descriofenomenolgica dessas variaes raramente (ou nunca) alcanada na prticaclnica; a situao mais comum de interpretao superficial em termos de sis-temas compartilhados de pistas sociais. Sintomas psicopatolgicos tm, portan-to, dois componentes: uma fonte biolgica (uma disfuno), que engendra umdeslocamento do comportamento, e um aspecto psicossocial que diz respeito interpretao do deslocamento comportamental pelo prprio paciente e pelos de-mais. O rudo psicossocial, associado a cada sintoma, pode variar de estadosem que ele muito acentuado, tal como nos sintomas de interao como a ma-nipulao (Mackenzie et al., 1978) at disfunes comportamentais que so ma-nifestaes estereotipadas de disfuno de estrutura (hardware) como a prpriadesorientao (Berrios, 1983).

    A observao clnica do fenmeno psicopatolgico controlada por um con-junto perceptual (Blashfield et al., 1982; Slz & Gigerenzer, 1982). A inevitabili-dade deste vis de observao vem exercitando os filsofos da cincia h muitotempo (Hesse, 1966; Wartofsky, 1979). Outra fonte de vis do observador ou ins-tabilidade diz respeito ocorrncia de peridicas mudanas epistemolgicas(Bachelard, 1938; Marchais, 1983).

    Esta dependncia da psicopatologia descritiva sobre o controle da themata(Holton, 1973) propiciou interpretaes relativistas e a crena errnea de queos sintomas seriam apenas construes culturais. Variaes relacionadas coma cultura na apresentao de um sintoma, no entanto, no significam necessaria-mente que no haja nenhuma base biolgica para ele ou que, se houver, seja ir-relevante para o seu entendimento (Rack, 1982). Paran-Vial (1966) mostrou queos fatos de observao nas cincias comportamentais so, apesar do rudo so-cial, parcialmente intercambiveis. Esta constncia deveria tornar possvelpara os mdicos triangular o sintoma e autenticar qualquer excesso cultural quepossa estar mascarando a disfuno subjacente. Na verdade, esta a fundaoepistemolgica da assim chamada interconfiabilidade do avaliador.

    Esta constncia deveria explicar a surpreendente estabilidade exibida poruma srie de sintomas desde o sculo XIX. Uma vez que duvidoso que seja to-

    Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., So Paulo, v. 15, n. 1, p. 171-196, maro 2012

  • 175

    talmente devida a fatores sociais, pode ser plausivelmente afirmado que a fixi-dez formal de muitos sintomas derive, como algumas das categorias estruturaispropostas por Kant e Lvi-Strauss, de um nmero limitado de deslocamentos deestrutura [hardware]. Isso conferiria para alguns sintomas sua qualidade estereo-tipada e montona, apesar das variaes acentuadas no contedo e na gravidadedos mesmos.

    Psicopatologia descritivaA tarefa declarada da psicopatologia descritiva, desde o incio do sculo XIX,

    tem sido a identificao de classes de atos mentais anormais. De acordo com ateoria dos signos, ento vigente, um nome tinha que ser dado para cada classe(Franck, 1875b). O aparecimento das unidades de anlise tornou-se o modelooficial em termos do qual geraes de psiquiatras passaram a fragmentar o com-portamento de seus pacientes em sintomas discretos. Este procedimento descri-tivo foi considerado menos como uma fratura do que uma boa desarticulaodo comportamento anormal, pois se acreditava, com base em uma verso da on-tologia dos tipos naturais, que articulaes existissem no fluxo de compor-tamento. As partes resultantes, Griesinger (1867) denominou de distrbioselementares de doena mental (p. 60). Desde essa poca, apenas calibraesmenores na terminologia foram necessrias.

    A acurcia da calibrao original pode ser testada de duas maneiras. Por umlado, cada descrio deveria se aplicar maioria dos membros de sua classe emquesto (vigor extensional); isso est na base da noo de validade. Por outro, seunome deveria evocar na mente de cada observador treinado o mesmo sintoma,forma ou imagem (vigor intensional), esta a essncia da confiabilidade.

    A utilidade da calibrao tambm pode ser testada. A maneira mais simples examinar a eficincia das regras que decidem se um sintoma est ou no presente.Desde o sculo XIX, essas regras foram baseadas em pontos de corte tcitos paraa intensidade, durao e frequncia dos sintomas putativos, e tambm sobre cri-trios de plausibilidade que ajudam a avaliar os relatos do fenmeno e sua com-patibilidade com outros sintomas. Por exemplo, na literatura histrica podem serencontrados casos em que a genuinidade de um sintoma posta em questo,a despeito do fato de que, primeira vista, ele preencheria todos os critrios.

    Por isso deve ser assumido que o critrio de plausibilidadeesteja em operao em algum nvel e que a sua eficcia depende do fato de queele seja passado de uma gerao de psiquiatras para a prxima. Sugere-se nestetrabalho que regras de rejeio esto, portanto, contidas na gramtica profun-da da linguagem clnica. Da mesma forma, deve-se presumir que regrastransformacionais tambm devam existir para que sintomas atenuados possam ser

    HISTRIA DAPSICOPATOLOGIA,POR GERMAN E.

    BERRIOS

    Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., So Paulo, v. 15, n. 1, p. 171-196, maro 2012

  • R E V I S T A

    L A T I N O A M E R I C A N A

    DE P S I C O P A T O L O G I A

    F U N D A M E N T A L

    176

    ampliados ou postos em foco apesar do mascaramento contextual ou do rudopatoplstico.

    Uma anlise similar pode ser oferecida quanto ao critrio de compatibilida-de. A psicopatologia descritiva do sculo XIX desenvolveu, apesar de seus ml-tiplos sistemas taxonmicos, combinaes e hierarquias de sintomas permitidas.Sistemas classificatrios que preservaram essas combinaes foram mais propen-sos a sobreviver do que os que ofereciam pontos de partida radicais. sabido,por exemplo, que uma classificao das psicoses, com base em descries de sin-tomas marcadamente diferentes, foi apresentada por volta do mesmo perodo quea de Kraepelin (Leonhard, 1957; Burckard, 1931). A falta de sucesso do sistemade Wernicke no pode ser totalmente explicada como uma falha cientfica, por-que nenhum estudo comparativo crucial foi realizado. mais provvel que o sis-tema kraepeliniano expressasse melhor quais distines e permutaes estavamimplcitas na psicopatologia descritiva do sculo XIX.

    A psicopatologia descritiva como um sistema cognitivoUm sistema cognitivo pode ser definido como um dispositivo para organi-

    zar o conhecimento. Originalmente, o termo sistema se aplicava apenas a umacoleo de itens fsicos, mas desde o sculo XVI, tambm se referiu s prpriascategorias (Franck, 1875a; Rescher, 1979). O conceito de um sistema diz res-peito estreitamente teoria da verdade como correspondncia: sua validade de-pende do sucesso com o qual sua configurao retrata os objetos que eledescreve.

    Desde o sculo XVIII uma srie de traos tem sido reconhecida como ca-racterizando um sistema. Rescher (1979) lista a totalidade, integridade, autossu-ficincia, coeso, consonncia, arquitetura, unidade funcional, regularidadefuncional, simplicidade funcional, complementaridade mtua e eficcia funcional.Estes parmetros influenciaram a construo da psicopatologia descritiva du-rante o sculo XIX.

    Condillac (1947), cuja influncia sobre Pinel (Riese, 1968) e sobre a psiquia-tria francesa do sculo XIX tem sido bem atestada (Le Roy, 1937), identificou ossistemas especulativo e experimental. Este ltimo, segundo ele, gera conhe-cimentos sobre o mundo, que esto baseados em fatos de observao. Sua visolevou a considerar a psicopatologia como um sistema cognitivo durante osculo XIX; na verdade, essa crena nunca foi completamente deixada na Fran-a, como indica um apelo recente por um mthode systmale (Marchais, 1977).

    Sistemas so entidades dinmicas e variam em estrutura de acordo com seuassunto. Rescher (1979) afirma que:

    Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., So Paulo, v. 15, n. 1, p. 171-196, maro 2012

  • 177

    A sistematicidade tem vis--vis seus componentes o carter de um perfil (emvez de uma mdia). Assim como a sade de uma pessoa determinada por umapluralidade de fatores constituintes, assim a sistematicidade de um corpo de co-nhecimento determinada em termos de uma grande variedade de consideraesseparveis embora inter-relacionadas. E haver intercmbios entre os vrios pa-rmetros de sistematicidade. (p. 11) do maior interesse para o historiador identificar os intercmbios [trade

    offs], que tiveram lugar na formao da psicopatologia descritiva do sculo XIX.Estes podem ter sido requeridos tanto para assegurar a sobrevivncia do sistemacomo um todo como para cumprir com as necessidades prticas de lidar com apopulao heterognea dos asilos. Por exemplo, como Rescher (1979) apontou: ...uma maior abrangncia pode ameaar a consistncia ... maior conexo pode exigira insero de elementos desuniformes (p. 14).

    Tipos de psicopatologia descritiva durante o sculo XIX

    Duas definies complementares de psicopatologia descritiva foramoriginadas ao longo do sculo XIX. A crena de que todos os fenmenos mrbidospoderiam ser acomodados dentro das classificaes em curso das funes mentaislevou a um modelo de continuidade. Carpenter (1879) se sentiu capaz deescrever no final do sculo: Pode ser afirmado, sem hesitao, que no h nadanos fenmenos psquicos da insanidade que distinga esta condio dos estadosque podem ser temporariamente induzidos em mentes saudveis? (p. 658). Apsicopatologia, neste sentido, seria apenas um ramo da psicologia (psicologiapatolgica).

    Por outro lado, a compreenso gradual de que alguns sintomas bizarros noencontravam contrapartida no comportamento normal levou ao desenvolvimen-to de um modelo de descontinuidade, isto , de uma patologia psicolgica.Griesinger (1867) coloca assim: Ns encontramos outras anomalias psicolgi-cas no insano que no tem nada de anlogo no estado de sade (p. 62).

    A psicopatologia descritiva durante este perodo tambm atuou como umainterface entre a filosofia e a psiquiatria clnica. A nova medicina desde o inciodo sculo XIX exigiu descries refinadas das manifestaes de doena (LanEntralgo, 1978; Ackerknecht, 1967; Foucault, 1972a); a terminologia disponvelde insanidade era incapaz de fornecer essas descries. Da escritores comoGriesinger (1875) rejeitarem os termos antigos como demasiado gerais. A lingua-gem comeou a ser considerada como relevante no s para a descrio dos sin-tomas, mas tambm para a anlise da experincia subjetiva patolgica(Starobinski, 1974). Para lidar com os problemas conceituais decorrentes, uma

    HISTRIA DAPSICOPATOLOGIA,POR GERMAN E.

    BERRIOS

    Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., So Paulo, v. 15, n. 1, p. 171-196, maro 2012

  • R E V I S T A

    L A T I N O A M E R I C A N A

    DE P S I C O P A T O L O G I A

    F U N D A M E N T A L

    178

    teoria do conhecimento era necessria e alguns alienistas propuseram a sua pr-pria (Falret, 1864). Isto no foi sempre aceitvel para os filsofos que aponta-ram que os alienistas, em seu esforo para desenvolver um sistema descritivo,tendiam a optar por um dos termos cartesianos (fisiologia mecnica) em detrimen-to do outro (isto , dos dados psicolgicos) (DAmiens, 1875). Estudos colabo-rativos foram tentados no incio do sculo para preencher a lacuna, por exemplo,Antoine Royer-Collard convidou Maine de Biran para compor uma monografiasobre a relao entre a psicologia e a biologia (Royer-Collard, 1843; Maine deBiran, 1841; Swain, 1978). Um papel intermedirio similar foi reivindicado paraa psicopatologia durante o sculo XX (Deshaies, 1967; Thuilleaux, 1973).

    Psicopatologia e quantificaoO fato de que no sculo XIX a psicopatologia descritiva tenha sido apenas

    marginalmente influenciada pela introduo da medio em medicina (Shryock,1961) e nas cincias comportamentais (Boring, 1961; Zupan, 1976) exige expli-cao. As correlaes normativas estabelecidas entre certas noes psicolgicasassociacionistas (por exemplo, diferena apenas perceptvel; tempo de reao)e parmetros fsicos (Boring, 1942) nunca foram acompanhadas de estudos se-melhantes com os doentes mentais (Ziehen, 1909; Whitwell, 1892).

    Essa falha pode ter resultado do fato de que a maioria dos sintomas mrbi-dos reconhecidos pelos alienistas tiveram origem na psicologia das faculdades econstituram pacotes de perturbao que atravessaram as unidades abstratas deanlise dos associacionistas. Noes tais como confuso, estupor ou delrio erammuito complexas para a nova psicopatologia experimental ser capaz de manejar.

    Alm disso, qualquer desenvolvimento na psicopatologia experimental dadoena mental iria sofrer um duro golpe prximo ao final do sculo pelo apare-cimento dos modelos psicodinmicos.

    A psicopatologia e a nova psicologia dinmicaOs modelos psicodinmicos exploraram a distino entre forma e conte-

    do e fizeram disso seu mister ao desenvolver um instrumental conceitual paradar conta desse ltimo. Descritivamente, no entanto, as teorias psicodinmicasmantiveram-se surpreendentemente prximas psicopatologia do sculo XIX,como mostra uma leitura atenta dos trabalhos precoces de Janet e Freud. A mu-dana gradual para contedo j havia ficado implcita nos trabalhos de Brenta-no (Fancher, 1977). Este autor, como Freud mais tarde, enfatizou a anliseretrospectiva da experincia subjetiva (Ellenberger, 1970). A tradio do hipno-tismo tambm contribuiu para a criao de um espao interno ou discursobuscando os mecanismos no conscientes (Barrucard, 1967). Em Janet (Prevost,

    Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., So Paulo, v. 15, n. 1, p. 171-196, maro 2012

  • 179

    1973) e mais tarde em Freud (Bercherie, 1983) estas tendncias convergiram ea nova psicopatologia dinmica reuniu contedo, fonte e mecanismo emum modelo terico unificado.

    Contexto geral

    Linguagens (de vrios graus de resoluo) foram geradas pela maioria dassociedades e durante diversos perodos histricos para descrever a loucura, e seuestudo resultou na psicopatologia transcultural (Rack, 1982) e histrica, respec-tivamente. Perodos de estabilidade descritiva e de ruptura conceitual (Bachelard,1938) podem ser discernidos na anlise longitudinal. Cabe ao historiador identi-ficar os mecanismos responsveis por estes processos. Modelos de mudanacientfica (Hacking, 1981; Laudan, 1977; Pandit, 1983) podem ajud-lo de ummodo geral, mas ele necessita explicaes regionais. O historiador clnico quersaber, por exemplo, como reconhecer os primeiros ou mais crticos sinais de umaruptura epistemolgica em sua prpria disciplina. Mais importante, ele quer sa-ber se essa crise decorre de falha de linguagem ou de mudana de objeto(Marchais, 1983). Este artigo afirma que a ltima ruptura na linguagem psico-patolgica ocorreu durante a primeira metade do sculo XIX. Ele tambm suge-re que o processo por meio do qual a nova psicopatologia foi construda foiprimeiro concludo na Frana, logo aps meados do sculo.

    O estado da arte histrica

    O Simpsio de Yale sobre a Histria da Psiquiatria ocorreu h 15 anos [es-crito em 1984] (Mora & Brand, 1970). Seus anais oferecem uma avaliao justados frutos da historiografia tradicional e so mais do que apenas um livro infor-mativo para nefitos (Braceland, 1970). O mesmo esprito inovador levou Marx(1970) a afirmar em um trabalho clssico que para a escritura histrica nesta reaera necessrio uma viso da histria, uma definio de psiquiatria e um precei-to do que a psiquiatria deve ser (p. 603); mais tarde ele ampliou essa viso laka-toshiana da histria como um constructo provisrio (Marx, 1977). Opiniessemelhantes foram expressas com relao histria das cincias comportamen-tais (Young, 1966) e histria da medicina (Clarke, 1971).

    Desde aqueles dias felizes a histria da psiquiatria tornou-se bem povoada.O esforo ps-foucaultiano no mostra sinais de diminuir, e as generalizaes deseu mentor (Foucault, 1972b) foram submetidas a progressiva correo(Sedgwick, 1981; Castel, 1977; Swain, 1977; Gauchet & Swain, 1980). Em uma

    HISTRIA DAPSICOPATOLOGIA,POR GERMAN E.

    BERRIOS

    Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., So Paulo, v. 15, n. 1, p. 171-196, maro 2012

  • R E V I S T A

    L A T I N O A M E R I C A N A

    DE P S I C O P A T O L O G I A

    F U N D A M E N T A L

    180

    corrente diferente, escritores franceses renomados, como Ey, Baruk, Lanteri-Lau-ra e Postel publicaram, nos ltimos anos, documentos histricos de primeira or-dem que, infelizmente, permanecem praticamente desconhecidos no mundoanglfono.

    Historiadores sociais tambm tm feito importantes contribuies para a his-tria da psiquiatria (Scull, 1981; Alexander, 1976; Castel et al., 1979; Blasius,1980; Drner, 1969). Sua nfase frequente sobre a aplicao da teoria dos con-troles sociais para a compreenso da loucura tem, por vezes, levado ao abando-no de seus aspectos biolgicos. Estas obras, portanto, podem ser vistas comomenos relevantes para a compreenso da gnese da psicopatologia descritiva doque uma srie de recentes publicaes histricas (Werlinder, 1978; Janzarik, 1979;Wallace & Pressley, 1980; Simon, 1978; Sauri, 1969; Roccatagliata, 1973, 1981;Lopez Piero & Morales Meseguer, 1970; Clarke, 1975; Dewhurst, 1982; LopezPiero, 1963; Bercherie, 1980; Postel & Qutel, 1983).

    Tendncias historiogrficas gerais tambm tm influenciado a histria dapsiquiatria (Brieger, 1980). Ocasionalmente, questes complexas na histria dascincias comportamentais foram tornadas momentaneamente translcidas pelaaplicao fcil de termos kuhnianos tais como paradigma, anomalia, comu-nidade cientfica, mudana de Gestalt (Kuhn, 1962). Assim, em vez de tentardesenvolver uma epistemologia das cincias inexatas (Helmer & Rescher, 1959),alguns escritores se contentaram com a crena de que cincias do comportamentoestariam descansando em algum tipo de limbo pr-paradigmtico (Farrell, 1978;Warren, 1971). Um ponto de vista historiogrfico anterior, e igualmente ingnuo,havia levado outros autores a considerar a psiquiatria pr-freudiana como pr--histrica (Zilboorg, 1941; Alexander & Selesnick, 1966).

    A histria e o clnico

    Parece haver, portanto, uma necessidade legtima (Daumezon, 1980) deestudos histricos que levantem questes especficas sobre a gnese das catego-rias descritivas psicopatolgicas e sobre suas interaes com o contexto psico-lgico e filosfico (Bercherie, 1980; Qutel & Morel, 1979; Postel, 1981; Swain,1977). Este artigo prope um modelo de pesquisa que pode ser melhor descritocomo um ninho de caixas chinesas: com as caixas interiores contendo osconceitos filosfico-psicolgicos, e as caixas exteriores o contexto sociopol-tico. Afirma ainda que a anlise conceitual da caixa interior j pode dar umaadequada conta da formao da linguagem psicopatolgica. Esta histria concei-tual particularmente adequada para a pesquisa em psicopatologia e fornece ao

    Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., So Paulo, v. 15, n. 1, p. 171-196, maro 2012

  • 181

    clnico tcnicas prticas de calibrao. A nfase analtica nas caixas interioresno deve ser interpretada como uma rejeio das caixas exteriores. Ela signifi-ca apenas que a anlise histrica das ltimas no essencial para os efeitos pr-ticos de compreenso da estrutura interna da psicopatologia descritiva.

    A hiptese histrica

    O modelo sentencial (Harr, 1970) proposto nesse trabalho pode ser resu-mido da seguinte forma (evidncia detalhada pode ser encontrada em Berrios,1988).1. A psicopatologia descritiva desenvolveu-se durante a primeira metade do sculo

    XIX. O processo foi concludo primeiro na Frana.2. Estabeleceu-se como uma linguagem descritiva. Como tal, ela continha uma ter-

    minologia, proposies relacionais e regras para sua aplicao.3. O significado de cada termo passou a depender tanto da sua relao com uma

    determinada forma comportamental (funo sinal) como de outros termos den-tro do sistema descritivo (funo de compatibilidade).

    4. As regras para a aplicao de cada termo referem-se a: (a) avaliao do observa-dor da intensidade, durao e qualidade da experincia dos sintomas tal como des-critos pelo paciente, e (b) um nmero de associaes permitidas, de acordo como qual decises sobre a presena de um sintoma eram tomadas em termos dapresena ou ausncia de outros sintomas, dentro de um determinado domnio.

    5. A origem histrica da psicopatologia descritiva multideterminada: fatoresbiolgicos e sociais podem ser identificados.

    6. Um fator social importante refere-se exigncia descritiva (a necessidade demanter bons registros clnicos), que os primeiros psiquiatras tiveram de seadequar. Para este fim, nomes genricos (por exemplo, mania, melancolia,phrenitis) no eram suficientes. A fragmentao dessas categorias foi, portan-to, necessria. Isso foi realizado em termos dos princpios da psicologia dasfaculdades mentais (Albrecht, 1970; Brooks, 1976) e do associacionismo(Warren, 1921; Hoeldtke, 1967), as duas influentes teorias psicolgicas duranteo incio do sculo XIX na Frana (Boutroux, 1908; Ravaisson, 1885).

    7. Um fator terico importante foi representado por mudanas na epistemologiada medicina (Ackerknecht, 1967). O ponto de vista anatomoclnica, desenvol-vido na Frana no incio do sculo XIX (Lopez Piero, 1983), exigiu que fos-sem estabelecidas correlaes entre a leso anatmica e as manifestaesexternas da disfuno, isto , os sinais ou fenmenos (Lan Entralgo, 1978).

    HISTRIA DAPSICOPATOLOGIA,POR GERMAN E.

    BERRIOS

    Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., So Paulo, v. 15, n. 1, p. 171-196, maro 2012

  • R E V I S T A

    L A T I N O A M E R I C A N A

    DE P S I C O P A T O L O G I A

    F U N D A M E N T A L

    182

    8. O descritivismo que se seguiu logo se tornou uma semiologia (Barthes,1972), isto , um sistema cognitivo. Este novo sistema procurou legitimida-de epistemolgica em um retorno viso baconiana de cincia (Ravaisson,1885, p. 60) como ilustrado pela reinterpretao positivista de Comte dodatum baconiano (Rmusat, 1857). Relativo aos contatos diretos entre filso-fos e alienistas, conta-se que em 1826 Comte fez palestras para um pblicoselecionado que inclua Esquirol (Mazlish, 1967).

    9. A fragmentao das categorias da loucura seguiu de perto a classificao tri-partite das faculdades da mente que Kant (Hilgard, 1980) e os filsofos es-coceses tinham reconstrudo (Spoerl, 1936). Ao longo do tempo tanto distin-es nosolgicas quanto sintomticas foram construdas ao longo destaslinhas. Por exemplo, as alucinaes (que originalmente se referiam apenas sexperincias visuais) tornaram-se distrbios de percepo em geral (Berrios,1982) e a monomania (uma condio clnica) foi classificada em intelectual,emocional e volitiva (Linas, 1882).

    10. Dois tipos de sintomas resultaram desta fragmentao. Alguns distrbios comoas alucinaes poderiam ser considerados como exageros ou distrbios dafuno normal (ponto de vista de continuidade). Outros estados que se refe-rem ao bizarro, como as obsesses, os delrios ou o estupor, que no encon-trariam nenhuma contrapartida clara no normal (ponto de vista dadescontinuidade). Este sistema de duas camadas tem se mantido at nossaatualidade (Lanteri-Laura, 1968). O ponto de vista da continuidade pode serencontrado nas obras de Freud (Broustra, 1975) e Eysenck (McGuire, 1973),e o ponto de vista da descontinuidade nos trabalhos de Jaspers (1963),Weibrecht (1968), Bash (1955) e Conrad (1958). Estas duas vises refletemde perto as permutaes conceituais que ligavam o normal e o patolgicodurante o sculo XIX (Canguilhem, 1975).

    11. No incio do sculo XIX, a psicopatologia descritiva se baseava em dados ob-tidos a partir da observao de comportamento manifesto. A utilizao gra-dual de dados psicolgicos ou subjetivos comeou na Frana na dcadade 1840 (Dubois, 1845), principalmente com Moreau de Tours (Riese, 1960;Bollote, 1973; Pigeaud, 1980; Delacroix, 1924). Logo depois, a introduo dasnoes psicolgicas de conscincia (Berrios, 1981b) e de introspeco(Boring, 1953) legitimaram o valor semiolgico dos contedos de conscin-cia. Este desenvolvimento histrico pode ajudar a compreender a origem dadicotomia forma e contedo.

    12. Um processo de seleo ocorreu aps 1850 em que alguns sintomas foram re-tidos (delrios, por exemplo) (Ball & Ritti, 1882) e outros foram descartados(por exemplo, hematoma aural e alucinaes unilaterais) (Rgis, 1881). O

    Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., So Paulo, v. 15, n. 1, p. 171-196, maro 2012

  • 183

    mecanismo e a ideologia que presidiram esta seleo requerem maior eluci-dao. Apenas um pequeno nmero de sintomas sobreviveu de fato no sculoXX. At o final do sculo XIX este nmero limitado de sintomas (e de per-mutaes de sintomas) tinha se revelado insuficiente para fazer diagnsticostransversais confiveis. Nosologistas fin de sicle como Magnan (Pichot,1982) e Kraepelin (Havens, 1965) tentaram resolver o problema introduzin-do fatores diagnsticos longitudinais ou diacrnicos, tais como a irrever-sibilidade e a histria natural. Em certas ocasies, no entanto, isso conduziua uma relativa negligncia dos sintomas descritivos. Exemplificando, comoHavens (1965, p. 23) observou, Kraepelin raramente deu muita importnciapara os delrios diagnosticamente ou prognosticamente.

    13. Na ltima parte do sculo XIX os sintomas sobreviventes foram reorganiza-dos em algumas sndromes (Bercherie, 1980; Pichot, 1982). Alguns destes,como o delirium, permaneceram praticamente iguais a antes da fragmentao(Berrios, 1981a), outros, tais a insanidade manaco-depressiva ou os trans-tornos obsessivos (Berrios, 1985), constituram novas configuraes. Algunsdos termos clssicos tambm foram reaproveitados (mania, melancolia, pa-ranoia, demncia e estupor), mas com um significado diferente (Leibbrand &Wettley, 1961; Bercherie, 1980).

    14. Logo no incio do sculo XX, a psicopatologia descritiva encontrou-se coma fenomenologia. Esta muito falada aliana pode ser melhor descrita como umcasamento de convenincia. Em torno deste perodo, a base conceitual da psi-copatologia descritiva tinha se tornado suspeita (aps o declnio da psicolo-gia clssica do sculo XIX) e exigia escoramento. A Fenomenologia, com suanfase na subjetividade e descries neutras, tornou-se a parceira ideal. Masa Fenomenologia em si tambm se encontrava na necessidade de ancoragememprica, o que resultava do fato de que, apesar de todo o seu antipsicolo-gismo e exigncias de neutralidade (De Boer, 1978), a fenomenologia se de-senvolveu em uma outra variedade de psicologia de poltrona e ficou,portanto, teoricamente comprometida (Rancurello, 1968).A eloquncia juvenil de Jaspers (1968) fez parecer como se a fenomenolo-gia tivesse sido posta, afinal, a trabalhar em um problema concreto; esta crenapermanece at os dias de hoje (Shepherd, 1983; Spiegelberg, 1972).

    Contudo, uma comparao cuidadosa do significado clnico e da utilizaodos sintomas bsicos, antes e depois de 1913 (Jaspers, 1963), mostra que o tra-tamento fenomenolgico no os alterou em nada. De certa forma, isso no surpreendente porque a utilizao de Jaspers da fenomenologia neste estgioinicial era puramente metodolgica: Este trabalho preliminar de representar, de-finir e classificar fenmenos psquicos, perseguido como uma atividade indepen-dente, constitui a fenomenologia (Jaspers, 1968, p. 1314).

    HISTRIA DAPSICOPATOLOGIA,POR GERMAN E.

    BERRIOS

    Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., So Paulo, v. 15, n. 1, p. 171-196, maro 2012

  • R E V I S T A

    L A T I N O A M E R I C A N A

    DE P S I C O P A T O L O G I A

    F U N D A M E N T A L

    184

    Logo aps, a fenomenologia iria se tornar um conglomerado de escolas(Spiegelberg, 1982). Embora algumas destas tenham se provado importantes parao desenvolvimento das psicologias e terapias existenciais (Spiegelberg, 1972), afenomenologia era uma ferramenta metodolgica muito abstrata e heterogneapara ter muita relevncia para a psicopatologia descritiva prtica. Subsequentesesforos neste sentido, tanto em psiquiatria (De Koning & Jenner, 1982) comoem psicologia clnica, tm sido bastante escassos (Merleau-Ponty, 1945; Thins,1977). De fato, a previso de Ryle de que a fenomenologia iria terminar afinalseja em subjetivismo autodestrutivo ou em um misticismo etreo parece ter seconfirmado (Ryle, 1932).

    Concluses

    Uma srie de concluses podem ser tiradas. Em primeiro lugar, estudos his-trico-conceituais so parte integrante da construo da linguagem na psicopa-tologia pois, sem esses dados, a calibrao estatstica torna-se uma atividadeincompleta. Em segundo lugar, a psicopatologia descritiva uma atividade vin-culada linguagem que, apesar de sua crescente formalizao cientfica, ainda con-tinua dependente de uma tradio escrita e oral. Escolas e modas so maisrelevantes para isso do que o clnico mdio est disposto a admitir (Blashfield &Feighner, 1982). Em terceiro lugar, hora de que mais pesquisas sejam realiza-das sobre a histria dos sintomas individuais, idealmente, este trabalho deve serrealizado por mdicos historicamente treinados e deve ser considerada como umasubespecialidade vivel em psiquiatria. Em quarto lugar, ateno tambm deve serdedicada identificao da estrutura epistemolgica da linguagem da psicopato-logia. Neste contexto avanos mais importantes foram feitos na Europa(Daumezon, 1957; Daumezon & Lanteri-Laura, 1961; Fdida, 1964; Pistoia, 1971;Castilla del Pino, 1978; Tizon, 1978; Georgin, 1980; Marchais, 1981; Lanteri-Lau-ra, 1982, 1983) do que nos EUA (Kroll, 1979; McHugh & Slavney, 1982).

    Desde que instrumentos como o DSM-III (APA, 1980) e o PSE (Wing et al.,1974; Wing, 1983) esto sendo amplamente adotados como glossrios, os clnicosem geral querem saber se os seus direitos descritivos em breve sero revogadospor um fechamento prematuro (Spitzer et al. 1975, p. 1191), e, mais importante,eles querem saber se lhes sobra algum direito de tentar formas alternativas depsicopatologia (Shapiro, 1975; Clifford & Frosh, 1982). Em face dos benefciosdecorrentes da formalizao estatstica das descries, perguntas como estaspodem soar ingnuas ou desagradveis. No entanto, vale ressaltar que umconhecimento mais familiarizado da histria da psicopatologia descritiva podemoderar esforos agudos para alcanar confiabilidade e, quem sabe, lembrar a

    Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., So Paulo, v. 15, n. 1, p. 171-196, maro 2012

  • 185

    todos que a validade tambm uma importante caracterstica da linguagemcientfica. A histria da psicopatologia deve ser considerada mais do que uma meracomdia de erros, exerccio de antiqurio, ou anlise poltica dos aspectos sociaisda psiquiatria. uma poderosa tcnica de calibrao por meio da qual a linguagemda psiquiatria conceitualmente ajustada e preparada para a quantificao.

    Referncias

    ACKERKNECHT, E.H. Medicine at the Paris Hospital, 1794-1848. Baltimore: JohnsHopkins Press, 1967.ALBRECHT, F.M. A reappraisal of faculty psychology. Journal of the History of theBehavioral Sciences, n. 6, p. 36-40, 1970.ALEXANDER, F.G.; SELESNICK, S.T. The History of Psychiatry: An Evaluation ofPsychiatric Thought and Practice from Pre-historic Times to the Present. New York:Harper, 1966.ALEXANDER, M.D. The administration of madness and attitudes towards the insane innineteenth century Paris. Doctoral Dissertation. Baltimore: John Hopkins Press, 1976.AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Diagnostic and Statistical Manual of MentalDisorders (DSM-III). 3rd. ed. Washington, D.C.: APA, 1980.ANDREASEN, N. C. Should the term Thought Disorder be revised? ComprehensivePsychiatry, n. 23, p. 291-299, 1982.BACHELARD, G. La formation de lesprit scientifique. Paris: Vrin, 1938.BALL, B.; RITTI, A. Dlire. In: Dictionnaire encyclopdique des sciences mdicales.(ed. A. Dechambre). Paris: Asselin, 1882. V. 26, p. 315-408.BARRUCARD, D. Histoire de lhypnose en France. Paris: Presses Universitaires deFrance, 1967.BARTHES, R. Smiologie et mdecine. In: Les sciences de la folie. (ed. R. Bastide).Paris: Mouton, 1972. p. 37-46.BASH, K. W. Lehrbuch der allegemeinen Psychopathologie. Grundbegriffe undKlinik. Stuttgart: Georg Thieme, 1955.BERCHERIE, P. Les fondements de la clinique. Histoire et structure du savoirpsychiatrique. Paris: La Bibliothque dOrnicar, 1980.____ . Gense des concepts freudiens. Paris: Navarin, 1983.

    BERRIOS, G.E. Henri Ey, Jackson, et les ides obsdantes. Lvolution psychiatrique,n. 42, p. 687-699, 1977.

    HISTRIA DAPSICOPATOLOGIA,POR GERMAN E.

    BERRIOS

    Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., So Paulo, v. 15, n. 1, p. 171-196, maro 2012

  • R E V I S T A

    L A T I N O A M E R I C A N A

    DE P S I C O P A T O L O G I A

    F U N D A M E N T A L

    186

    ____ . Stupor: a conceptual history. Psychological Medicine, n. 11, p. 677-688, 1981a.____ . Delirium and confusion in the 19th century: a conceptual history. British

    Journal of Psychiatry, n. 139, p. 439-499, 1981b.____ . Tactile hallucinations: conceptual and historical aspects. Journal of

    Neurology, Neurosurgery and Psychiatry, n. 45, p. 285-293, 1982.____ . Orientation failures in medicine and psychiatry. Journal of the Royal Society

    of Medicine, n. 76, p. 249-256, 1983.____ . Obsessional Disorders during the Nineteenth Century: A Conceptual History.

    Terminological and Classificatory Issues. In: BYNUM, W. F. et al (eds.). The Anatomyof Madness. London: Tavistock, 1985. V. 1, p. 166-187.____ . Historical background to abnormal Psychology. In: MILLER, E.; COOPER, P.

    (eds.). Adult Abnormal Psychology. London: Churchill Livingstone, 1988. p. 26-51.BLASHFIELD, R.K.; FEIGHNER, J.P. Invisible colleges and the Matthew effect.Schizophrenia Bulletin, n. 8, p. 1-6, 1982.BLASIUS, D. Der verwaltete Wahnsinn. Eine Sozialgeschichte des Irrenhauses.Frankfurt: Fischer Taschenbuch, 1980.BOLLOTE, G. Moreau de Tours 1804-1884. Confrontations psychiatriques, n. 11, p. 9--26, 1973.BORING, E.G. Sensation and Perception in the History of Experimental Psychology.New York: Appleton-Century-Crofts, 1942.____ . A history of introspection. Psychological Bulletin, n. 50, p. 169-189, 1953.____ . The beginning and growth of measurement in psychology. Isis, n. 52, p. 238-

    -257, 1961.BOUTROUX, E. De linfluence de la philosophie cossaise sur la philosophie franaise.In: tudes dhistoire de la philosophie (ed. E. Boutroux). Paris: Alcan, 1908. p. 413-433.BRACELAND, F.J. Foreword. In: Psychiatry and its History. Methodological Problemsin Research (ed. G. Mora and J.L. Brand). Springfield. Ill.: Charles Thomas, 1970. p. vii.BRIEGER, G.H. History of medicine. In A Guide to the Culture of Science. Technologyand Medicine (ed. P. T. Durbin). New York: Free Press, 1980. p. 121-194.BROOKS, G.P. The faculty psychology of Thomas Reid. Journal of the History of theBehavioral Sciences, n. 12, p. 65-77, 1976.BROUSTRA, J. Les schizophrnes. Paris: Jean-Pierre Delarge, 1975. Cap. 5.BURCKARD, E. Les conceptions psychiatriques de Wernicke. Travaux de la cliniquepsychiatrique de Strassbourg, n. 9, p. 45-141, 1931.CANGUILHEM, G. Le normal et le pathologique. 3rd ed. Paris: Presses Universitaires deFrance, 1975.

    Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., So Paulo, v. 15, n. 1, p. 171-196, maro 2012

  • 187

    CARPENTER, W.B. Principles of Mental Physiology. London: C. Kegan Paul & Co., 1879.CASTEL, R. Le psychanalysme. Lordre psychanalytique et le pouvoir. Paris:Franoise Maspero, 1973.____ . Lordre psychiatrique. Lge dor de lalinisme. Paris: Minuit, 1977.

    CASTEL, R., CASTEL, F.; LOVELL, A. La societ psychiatrique avance. Paris: Grasset etFasquelle, 1979.CASTILLA DEL PINO, C. Introduccin a la psiquiatria Vol. 1: Problemas Gnerales,Psico(pato)logia. Madrid: Alianza Editorial, 1978.CLARKE, B. Mental Disorders in Earlier Britain: Exploratory Studies. Cardiff:University of Wales Press, 1975.CLARKE, E. (ed.). Modern Methods in the History of Medicine. London: AthlonePress, 1971.CLIFFORD, P.; FROSH, S. Towards a non-essentialist psychology: a linguisticframework. Bulletin of the British Psychological Society, n. 35, p. 267-270, 1982.CONDILLAC, E.B. Trait de systmes. In: Oeuvres philosophiques de Condillac. (ed. G.Le Roy). Paris: Presses Universitaires de France, 1947. V. 1, p. 121-217.CONRAD, K. Die beginnende Schizophrenie. Versuch einer Gestalanalyse des Wahns.Stuttgart: Georg Thieme, 1958.DAMIENS, D. Folie. In: Dictionnaire des sciences philosophiques par une socit deprofesseurs et de savants (ed. A. D. Franck). Paris: Hachette, 1875. p. 548-552.DAUMEZON, G. Reflexions sur la semiologie psychiatrique. Lvolution psychiatrique,n. 22, p. 207-237, 1957.____ . Lgitimit de lintret pour lhistoire de la psychiatrie. Linformation

    psychiatrique, n. 65, p. 647-653, 1980.DAUMEZON, G.; LANTERI-LAURA, G. Signification dune semiologie. LEncephale, n. 14,p. 478-511, 1961.DE BOER, T. The Development of Husserl s Thought. Nijhoff: The Hague, 1978.DE KONING, A.J.J.; JENNER, F.A. (eds.). Phenomenology and Psychiatry. London:Academic Press, 1982.DELACROIX, M. H. Maine de Biran et lcole mdico-psychologique. Bulletin de laSocit franoise de philosophie, n. 24, p. 51-63, 1924.DESHAIES, G. Psychopathologie gnrale. Paris: Presses Universitaires de France,1967.DEWHURST, K. Hughlings Jackson on Psychiatry. Oxford: Sandford Publications,1982.

    HISTRIA DAPSICOPATOLOGIA,POR GERMAN E.

    BERRIOS

    Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., So Paulo, v. 15, n. 1, p. 171-196, maro 2012

  • R E V I S T A

    L A T I N O A M E R I C A N A

    DE P S I C O P A T O L O G I A

    F U N D A M E N T A L

    188

    DRNER, K. Brger und Irre. Zur Sozialgeschichte und Wissenschaftsoziologie derPsychiatrie. Frankfurt: Europaische Verlagsanstalt, 1969.DUBOIS, F. Quelques considrations sur lalination mentale au point de vue de lapsychologie. Bulletin de lAcadmie royale de mdecine, n. 10, p. 533-543, 1845.ELLENBERGER, H. The Discovery of the Unconscious. The History and Evolution ofDynamic Psychopathology. London: Allen Lane, 1970.FALRET, J.F. Des maladies mentales et des asiles daliens. Paris: J. B. Baillire, 1864.FANCHER, R.E. Brentanos psychology from an empirical standpoint and Freuds earlymetapsychology. Journal of the History of the Behavioral Sciences, n. 13, p. 207-227,1977.FARRELL, B.A. The progress of psychology. British Journal of Psychology, n. 69,p. 1-8, 1978.FDIDA, P. Le structuralisme en psychopathologie. Lvolution psychiatrique, n. 29,p. 85-129, 1964.FLECK, L. Genesis and Development of a Scientific Fact. Chicago: University ofChicago Press, 1979.FOUCAULT, M. Naissance de la clinique, 2rd ed. Paris: Presses Universitaires deFrance, 1972a.____ . Histoire de la folie a lge classique. Paris: Gallimard, 1972b.

    FRANCK, A.D. Systme. In: Dictionnaire des sciences philosophiques par une socitde professeurs et de savants. 2rd ed. (ed. A. D. Franck). Paris: Hachette, 1875a.p. 1703-1704.____ . Signes. In: Dictionnaire des sciences philosophiques par une socit de

    professeurs et de savants. 2rd ed. (ed. A. D. Franck). Paris: Hachette, 1875b. p. 1608-1616.GAUCHET, M.; SWAIN, G. La pratique de lesprit humain. Paris: Gallimard, 1980.GEORGIN, B. Remarques sur le discours nosologique en psychiatrie. Lvolutionpsychiatrique, n. 45, p. 5-17, 1980.GRIESINGER, W. Mental Pathology and Therapeutics. Transl. C. L. Robertson and J.Rutherford. London: New Sydenham Society, 1867.____ . Vortrag zur Erffnung der psychiatrischen Klinik zu Berlin. In: Gesammelte

    Abhandlungen. Berlin: Hirschwald, 1875. V. I, p. 127-129.HACKING, I. (ed.). Scientific Revolutions. Oxford: Oxford University Press, 1981.HARE, E.H. The changing content of psychiatric illness. Journal of PsychosomaticResearch, n. 18, p. 283-289, 1974.

    Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., So Paulo, v. 15, n. 1, p. 171-196, maro 2012

  • 189

    HARR, R. The Principles of Scientific Thinking. London: MacMillan, 1970. p. 33.HAVENS, L. Emil Kraepelin. Journal of Nervous and Mental Disease, n. 141, p. 16-28, 1965.HELMER, O.; RESCHER, N. On the epistemology of the inexact sciences. ManagementScience, n. 8, p. 25-52, 1959.HESSE, M.B. Models and Analogies in Science. Paris: University of Notre DamePress, 1966.HILGARD, E.R. The trilogy of mind: cognition, affection, and conation. Journal of theHistory of the Behavioral Sciences, n.16, p. 107-117, 1980.HOELDTKE, R. The history of associationism and British medical psychology. MedicalHistory, n. 11, p. 46-64, 1967.HOLTON, G. Thematic Origins of Scientific Thought. Cambridge, Mass.: HarvardUniversity Press, 1973.JANZARIK, W. (ed.). Psychopathologie als Grundlagenwissenschaft. Stuttgart: Enke,1979.JASPERS, K. General Psychopathology. Transl. M. Hamilton and J. Hoenig.Manchester: Manchester University Press, 1963.____ . The phenomenological approach in psychopathology. British Journal of

    Psychiatry, n. 114, p. 1313-1323, 1968.KENDLER, K.S.; TSUANG, M.T. Nosology of paranoid schizophrenia and otherparanoid psychoses. Schizophrenia Bulletin, n. 7, p. 594-610, 1981.KROLL, J. Philosophical foundations of French and US nosology. American Journalof Psychiatry, n. 136, p. 1135-1138, 1979.KUHN, T. The Structure of Scientific Revolutions. Chicago: Chicago University Press, 1962.LAN ENTRALGO, P. Historia de la medicina. Barcelona: Salvat, 1978.LANTERI-LAURA, G. Psychologie pathologique. In: Encyclopdie mdico-chirurgicale.Psychiatrie. Paris: Editions Techniques, 1968. V. I. 37032 C10.____ . La connaissance clinique: histoire et structure en mdecine et en psychiatrie.

    Lvolution psychiatrique, n. 47, p. 423-469, 1982.____ . La smiologie psychiatrique: son volution et son tat en 1982. Lvolution

    psychiatrique, n. 48, p. 327-363, 1983.LAUDAN, L. Progress and its Problems. Towards a Theory of Scientific Growth.Berkeley: University of California Press, 1977.LE ROY, G. La psychologie de Condillac. Paris: Boivin et Cie., 1937.LEIBBRAND, W.; WETTLEY, A. Der Wahnsinn. Geschichte der abendlndischenPsychopathologie. Freiburg: Karl Alber, 1961.

    HISTRIA DAPSICOPATOLOGIA,POR GERMAN E.

    BERRIOS

    Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., So Paulo, v. 15, n. 1, p. 171-196, maro 2012

  • R E V I S T A

    L A T I N O A M E R I C A N A

    DE P S I C O P A T O L O G I A

    F U N D A M E N T A L

    190

    LEONHARD, K. Aufteilung der endogenen Psychosen. Berlin: Akademie, 1957.LINAS, A. Monomanie. In: Dictionnaire encyclopdique des sciences mdicales. 5thVol., 2nd Series. (ed. A. Dechambre). Paris: Asselin, 1882. p. 146-195.LOPEZ PIERO, J.M. Origenes histricos del concepto de neurosis. Valencia: Institutode Historia de la Medicina, 1963.____ . Historical Origins of the Concept of Neurosis. Transl. D. Berrios. Cambridge:

    Cambridge University Press, 1983.LOPEZ PIERO, J.M.; MORALES MESEGUER, J.M. Neurosis y psicoterapia. Un estudiohistrico. Madrid: Espasa-Calpe, 1970.MACKENZIE, T.B.; ROSENBERG, S.D.; BERGEN, B.L. The manipulative patient: aninteraction approach. Psychiatry, n. 41, p. 264-271, 1978.MAINE DE BIRAN. Nouvelles considrations sur les rapports du physique et du moralde lhomme. In: Oeuvres philosophiques de Maine de Biran. (ed. V. Cousin). Paris:Librairie de Ladrange, 1841. V. 4, p. 1-146.MARCHAIS, P. La mthode systmale en psychiatrie. Annales mdico-psychologiques,n. 135, p. 677-695, 1977.____ . Les processus psychopathologiques de ladulte. Paris: Privat, 1981.____ . Les mouvances psychopathologiques: essai de psychiatrie dynamique. Paris:

    rs, 1983.MARX, O.M. What is the history of psychiatry? American Journal ofOrthopsychiatry, n. 40, p. 593-605, 1970.____ . History of psychology: a review of the last decade. Journal of the History of

    the Behavioral Sciences, n. 13, p. 41-77, 1977.MAZLISH, B. Comte, Auguste. In: The Encyclopedia of Philosophy. (ed. P. Edwards).New York: Macmillan, 1967. V. 2, p. 173-177.MCGUIRE, R. Classification and the problem of diagnosis. In: Handbook of AbnormalPsychology. (ed. H. J. Eysenck). London: Pitman Medical, 1973. p. 3-33.MCHUGH, P.R.; SLAVNEY, P.R. Methods of reasoning in psychopathology: conflict andresolution. Comprehensive Psychiatry, n. 23, p. 197-215, 1982.MCLEOD, R. Changing perspectives in the history of science. In: Science, Technologyand Society: A Cross Disciplinarian Perspective. (ed. I. Spiegel-Rosing and D.D.S.Price). London: Sage Publications, 1977. p. 149-196.MERLEAU-PONTY, M. Phnomnologie de la perception. Paris: Gallimard, 1945.MILLER, E. & BERRIOS, G. E. Medical model and psychiatry, 1984. (Submitted forpublication.)

    Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., So Paulo, v. 15, n. 1, p. 171-196, maro 2012

  • 191

    MORA, G.; BRAND, J.L. (eds.). Psychiatry and its History. Methodological Problems inResearch. Springfield, Ill.: Charles Thomas, 1970.MUNRO, A. Paranoia revisited. British Journal of Psychiatry, n. 141, p. 344-349, 1982.NEVE, M. Up market in Manhattan. Times Literary Supplement, n. 4170, p. 208, 1983.PANDIT, G.L. The Structure and Growth of Scientific Knowledge. Dordrecht: Reidel, 1983.PARAIN-VIAL, J. La nature du fait dans les sciences humaines. Paris: PressesUniversitaires de France, 1966.PICHOT, P. The diagnosis and classification of mental disorders in French-speakingcountries: background, current views and comparison with other nomenclatures.Psychological Medicine, n. 12, p. 475-492, 1982.PIGEAUD, J.M. Le rle des passions dans la pense mdicale de Pinel Moreau deTours. History and Philosophy of the Life Sciences, n. 2, p. 123-140, 1980.PISTOIA, L. del. Le problme de la temporalit dans la psychiatrie franaise classique.Lvolution psychiatrique, n. 36, p. 445-474, 1971.POSTEL, J. Gense de la psychiatrie. Les premiers crits de Philippe Pinel. Paris: LeSycamore, 1981.POSTEL, J.; QUTEL, C. (eds.). Nouvelle histoire de la psychiatrie. Paris: Privat, 1983.PREVOST, C.M. La psycho-philosophie de Pierre Janet. Paris: Payot, 1973.QUTEL, C.; MOREL, P. Les fous et leurs mdecins de la renaissance au XXe sicle.Paris: Hachette, 1979.RACK, P. Race, Culture and Mental Disorder. London: Tavistock Publications, 1982.RANCURELLO, A.C. A Study of Franz Brentano, His Psychological Standpoint and hisSignificance in the History of Psychology. New York: Academic Press, 1968.RAVAISSON, F. (1867). La philosophie en France au XIXe sicle. 2nd ed.). Paris:Hachette, 1885.RGIS, E. Des hallucinations unilaterales. LEncphale, n. 1, p. 43-74, 1881.RMUSAT, C. de. Bacon, sa vie, son temps, sa philosophie, et son influence jusqunos jours. Paris: Hachette, 1857.RESCHER, N. Cognitive Systematization. A System-theoretic Approach to aCoherentist Theory of Knowledge. Oxford: Basil Blackwell, 1979.RIESE, W. The impact of nineteenth century thought on psychiatry. InternationalRecord of Medicine, n. 173, p. 7-19, 1960.____ . La mthode analytique de Condillac et ses rapports avec loeuvre de Philippe

    Pinel. Revue Philosophique, n. 158, p. 321-336, 1968.

    HISTRIA DAPSICOPATOLOGIA,POR GERMAN E.

    BERRIOS

    Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., So Paulo, v. 15, n. 1, p. 171-196, maro 2012

  • R E V I S T A

    L A T I N O A M E R I C A N A

    DE P S I C O P A T O L O G I A

    F U N D A M E N T A L

    192

    ROCCATAGLIATA, G. Storia della psichiatria Antica. Milan: Ulrico Hoepli, 1973.____ . Storia della psichiatria biologica. Florence: Nuova Guaraldi, 1981.

    ROME, H.P. The classification of schizophrenia: a historical review. PsychiatricAnnals, n. 9, p. 5-13, 1979.ROYER-COLLARD, H. Examen de la doctrine de Maine de Biran sur les rapports duphysique et du moral de lhomme par Antoine-Athanase Royer-Collard. Annalesmdico-psychologiques, n. 2, p. 9-45, 1843.RYLE, G. Phenomenology. Proceedings of the Aristotle Society, n. 11 (Suppl.), p. 68--83, 1932.SAURI, J.J. Historia de las ideas psiquiatricas. Buenos Aires: Carlos Lohl, 1969.SCULL, A. T. Museums of Madness. The Social Organization of Insanity inNineteenth Century England. London: Allen Lane, 1979.SCULL, A. T. (ed.). Madhouses, Mad-doctors and Madmen. The Social History ofPsychiatry in the Victorian Era. London: Athlone Press, 1981.SEDGWICK, P. Michel Foucault: The anti-history of psychiatry. PsychologicalMedicine, n. II, p. 235-248, 1981.SHAPIRO, M.B. The requirements and implications of a systematic science of psycho-pathology. Bulletin of the British Psychological Society, n. 28, p. 149-155, 1975.SHEPHERD, M. Introduction: The sciences and general psychopathology. In:Handbook of Psychiatry Vol. I: General Psychopathology. (ed. M. Shepherd and O.L. Zangwill). Cambridge: Cambridge University Press, 1983. p. 1-8.SHRYOCK, R.H. The history of quantification in medical science. Isis, n. 52, p. 215-237,1961.SIMON, B. Mind and Madness in Ancient Greece. The Classical Roots of ModernPsychiatry. Ithaca: Cornell University Press, 1978.SPIEGELBERG, H. Phenomenology in Psychology and Psychiatry. Evanston:Northwestern University Press, 1972.____ . The Phenomenological Movement. A Historical Introduction. Nijhoff: The

    Hague, 1982.SPITZER, R.L.; ENDICOTT, J.; ROBINS, E. Clinical criteria for psychiatric diagnosis andDSM-III. American Journal of Psychiatry, n. 132, p. 1187-1192, 1975.SPOERL, H.D. Faculties versus traits: Galls solution. Character and Personality, n. 4,p. 216-231, 1936.STAROBINSKI, J. The role of language in psychiatric treatment in the French RomanticAge. A note on Dr. Laurent Cerise. Psychological Medicine, n. 4, p. 360-363, 1974.

    Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., So Paulo, v. 15, n. 1, p. 171-196, maro 2012

  • 193

    SLZ, K.D.; GIGERENZER, G. ber die Beeinflussung psychiatrischer Diagnoseschematadurch implizite nosologische Theorien. Archiv fr Psychiatrie undNervenkrankheiten, n. 232, p. 5-14, 1982.SWAIN, G. Le sujet de la folie. Naissance de la psychiatrie. Paris: Privat, 1977.____ . Lalin entre le mdecin et le philosophe. Perspective psychiatriques, n. 65,

    p. 90-99, 1978.THINS, G. Phenomenology and the Science of Behaviour. London: George Allen andUnwin, 1977.THUILLEAUX, M. Connaissance de la folie. Paris: Presses Universitaires de France,1973.TIZON, J.L. Introduccin a la epistemologia de la psicopatologia y la psiquiatria.Barcelona: Ariel, 1978.WALLACE, E.R.IV.; PRESSLEY, L.C. Essays on the History of Psychiatry. South Carolina:Hall Psychiatric Institute, 1980.WARREN, H.C. History of the Association Psychology. New York: Scribners Sons,1921.WARREN, N. Is a scientific revolution taking place in psychology? Scientific Studies,n. 1, p. 407-413, 1971.WARTOFSKY, M.W. Models. Representation and the Scientific Understanding.Dordrecht: Reidel, 1979.WEIBRECHT, H. J. Psychiatrie im Grundriss. 2nd ed. Berlin: Springer, 1968.WERLINDER, H. Psychopathy: A History of the Concepts. Analysis of the Origin andDevelopment of a Family of Concepts in Psychopathology. Acta UniversitatisUpsaliensis: Upsala, 1978.WHITWELL, J.R. Pulse in insanity. In: A Dictionary of Psychological Medicine. (ed. D.H. Tuke). London: Churchill, 1892. 2 vols., p. 1042-1052.WING, J. K. Use and misuse of the PSE. British Journal of Psychiatry, n. 143, p. 111--117, 1983.WING, J.K.; COOPER, J.E.; SARTORIUS, N. Measurement and Classification ofPsychiatric Symptoms. Cambridge: Cambridge University Press, 1974.YOUNG, R.M. Scholarship and the history of the behavioural sciences. History ofScience, n. 5, p. 1-51, 1966.ZIEHEN, T. Introduction to Physiological Psychology. Transl. C. C. Van Liew and O.W. Bryer. London: Swan Sonnenschein, 1909.ZILBOORG, G. A History of Medical Psychology. New York: Norton, 1941.

    HISTRIA DAPSICOPATOLOGIA,POR GERMAN E.

    BERRIOS

    Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., So Paulo, v. 15, n. 1, p. 171-196, maro 2012

  • R E V I S T A

    L A T I N O A M E R I C A N A

    DE P S I C O P A T O L O G I A

    F U N D A M E N T A L

    194

    ZUPAN, M.L. The conceptual development of quantification in experimentalpsychology. Journal of the History of the Behavioral Sciences, n. 12, p. 145-158,1976.

    Resumos

    (Descriptive Psychopathology: Historical and Conceptual Aspects)This article consists of a historical and conceptual analysis of descriptive psycho-

    pathology. The first section defines this field as a cognitive system consisting of terms,suppositions and rules for application. The section conceptual implications of this defi-nition are outlined and related to clinical practice. The second section consists of anupdated evaluation of the historical work carried out in descriptive psychopathologyand presents a new hypothesis to explain how it developed during the 19th century. Theauthor suggests that the testing of hypotheses should be conducted by psychiatrists withtraining in history, and seen as a separate specialty. We conclude that investigation intothe history of the psychiatric symptoms of patients should be considered an essentialstage in the construction of a feasible descriptive psychopathology.Key words: Psychopathology history, psychological models, psychiatry history,

    language

    (Psychopathologie descriptive: aspects historiques et conceptuels) Cet article propose une analyse conceptuelle et historique de la psychopathologie

    descriptive. La premire section la dfinit comme un systme cognitif compos de termes,de suppositions et de rgles pour son application. Elle expose les implications concep-tuelles de cette dfinition et les relie la pratique clinique. La deuxime section contientune valuation de louvrage historique sur la psychopathologie descriptive et offre unehypothse qui explique son dveloppement au cours du XIXe sicle. Larticle suggre quele travail impliqu dans le test des hypothses doit tre effectu par des psychiatresqualifi en histoire et en tant que spcialit distincte. Il sensuit que lhistoire de lta-lonnage des symptmes psychiatriques doit tre considre comme une tape essentiellede la construction dune psychopathologie descriptive viable.Mots cls: Psychopathologie histoire, modles psychologiques; psychiatrie histoire,

    langage

    (Psicopatologia Descriptiva: aspectos histricos y conceptuales)Este artculo ofrece um anlis conceptual e histrico de la psicopatologia

    descriptiva. En La primera parte se la define como um sistema cognitivo constituido portrminos, suposiciones y reglas para su aplicacin. Se delinea las implicaciones

    Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., So Paulo, v. 15, n. 1, p. 171-196, maro 2012

  • 195

    conceptuales de esa definicin y se las relaciona con la prctica clnica. La segundaparte contiene una evaluacin del trabajo histrico sobre la psicopatologia descriptivay ofrece una hiptesis para explicar su desarrollo durante el siglo XIX. Se sugiere queel trabajo supuesto en el testeo de hiptesis debe ser realizado por psiquiatras conformacin en historia como una especialidad distinta. Se concluye que calibrarhistricamente los sntomas psiquitricos debe ser considerado como una etapaesencial en la construccin de una psicopatologia descriptva viable.Palabras clave: Psicopatologia historia, modelos psicolgicos, psiquiatria historia,

    lenguaje

    (Deskriptive Psychopathologie: historische und konzeptionelle Aspekte)Dieser Beitrag bietet eine konzeptionelle und historische Untersuchung der de-

    skriptiven Psychopathologie. Im ersten Teil wird sie als ein kognitives System aus Begrif-fen, Annahmen und Anwendungsregeln beschrieben. Es werden die konzeptionellen Im-plikationen dieser Definition aufgefhrt und der klinischen Praxis gegenbergestellt.Der zweite Teil umfasst eine Zusammenfassung der historischen Arbeit bezglich derdeskriptiven Psychopathologie und prsentiert eine Hypothese zur Erklrung ihrer Ent-wicklung im 19. Jahrhundert. Es wird vorgeschlagen, dass die Aufgaben des Hypothese-Tests von Psychiatern mit einer Ausbildung in Geschichte und als eigenstndige Spezia-lisierung durchgefhrt werden sollten. Man ist zu dem Schluss gekommen, dass die histo-rische angemessene Einschtzung der psychiatrischen Symptome eine wesentliche Etap-pe in der Entwicklung einer umsetzbaren deskriptiven Psychopathologie sein sollte.Schlsselwrter: Psychopathologie Geschichte, psychologische Modelle, Psychiatrie

    Geschichte, Sprache

    Citao/Citation: BERRIOS, G.E. Psicopatologia descritiva: aspectos histricos e conceituais.Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, So Paulo, v. 15, n. 1, p. 171-196,maro 2012.

    Editor do artigo/Editor: Prof. Dr. Manoel Tosta Berlinck

    HISTRIA DAPSICOPATOLOGIA,POR GERMAN E.

    BERRIOS

    Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., So Paulo, v. 15, n. 1, p. 171-196, maro 2012

  • R E V I S T A

    L A T I N O A M E R I C A N A

    DE P S I C O P A T O L O G I A

    F U N D A M E N T A L

    196

    Recebido/Received: 23.4.2011 / 4.23.2011 Aceito/Accepted: 25.7.2011 / 7.25.2011Copyright: 2009 Associao Universitria de Pesquisa em Psicopatologia Fundamental/University Association for Research in Fundamental Psychopathology. Este um artigo de li-vre acesso, que permite uso irrestrito, distribuio e reproduo em qualquer meio, desde queo autor e a fonte sejam citados/This is an open-access article, which permits unrestricted use,distribution, and reproduction in any medium, provided the original author and source arecredited.Financiamento/Funding: O autor declara no ter sido financiado ou apoiado/The author hasno support or funding to report.Conflito de interesses/Conflict of interest: O autor declara que no h conflito de interes-ses/The author declares that has no conflict of interest.

    GERMAN E. BERRIOSMdico e filsofo pela Universidad Nacional de San Marcos, Lima, Peru; Psiquiatra; Neurolo-gista; Psiclogo; Filsofo; Historiador e Filsofo da cincia (Oxford University, England); Pro-fessor de Neuropsiquiatria e de Epistemologia da Psiquiatria (University of Cambridge, England),desde 1976; Neuropsiquiatra e Chefe do Departamento de Neuropsiquiatria do HospitalAddenbrooke, University of Cambridge, por 32 anos; Coordenador do Comit de tica em Pes-quisa com Humanos na mesma universidade, por 20 anos; Editor Responsvel de History ofPsychiatry; Autor de 14 livros, incluindo The History of Mental Symptoms, DescriptivePsychopathology since 19th Century (Prmio Nacional BMA, 1997), A History of ClinicalPsychiatry (com Roy Porter), e Delirio (com F. Fuentenebro) e mais de 400 artigos e captulosde livros; Membro do Royal College of Psychiatrists; da Associao Britnica de Psicologia eda Academia Britnica de Cincias Mdicas; Membro Vitalcio do Robinson College, Cambridge;doutor Honoris-Causa da Universidade de Heidelberg (Alemanha), da Universidade NacionalMayor de San Marcos (Peru) e da Universidad Autnoma de Barcelona (Espanha); Gro Ofi-cial da Ordem del Sol (Condecorao do Governo Peruano, 2007); prmio Ramon y Cajal 2008concedido pela Asociacin Internacional de Neuropsiquiatria.University of CambridgeBox 189, Hills RoadCambridge,UK CB2 2QQe-mail: [email protected]

    Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., So Paulo, v. 15, n. 1, p. 171-196, maro 2012