psicologia hospitalar - teoria e pratica

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f\ * Learnlng Valdemar Augusto Angerami - Gamon (org.) Fernanda Alves Rodrigues Trucharte Rosa Berger Knijnik Ricardo Werner Sebastiani PSICOLOGIA HOSPITALAR Teoria e Prática Kdo revistb e ampliada

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Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

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Page 1: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

f\• * L e a r n l n g

Valdemar Augusto Angerami - Gamon (org.)

Fernanda Alves Rodrigues Trucharte

Rosa Berger Knijnik

Ricardo Werner Sebastiani

PSICOLOGIA HOSPITALAR Teoria e Prática

Kdo revistb e ampliada

Page 2: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

SILVA FREIRE

A r v e P - S J

<23\2 20// . I

Biblioteca Silva Freire - UNTVAG

1 3 0 8 8 5

Dados I n t e r n a c i o n a i s de Catalogação na Publicação ( C I P ) (Câmara B r a s i l e i r a do L i v r o , SP, B r a s i l )

T r u c h a r t e , F e r n a n d a A l v e s R o d r i g u e s P s i c o l o g i a h o s p i t a l a r : t e o r i a e prática / Fernanda A l v e s

Rodrigues T r u c h a r t e , Rosa Berger K n i j n i k , R i c a r d o Werner S e b a s t i a n i ; Valdemar Augusto Angerami — Camon ( o r g a n i z a d o r ) . — 2. ed. r e ­v i s t a e ampliada — São Paulo : Cengage L e a r n i n g , 2010.

B i b l i o g r a f i a . ISBN 978-85-221-0794-0

1. Doentes - P s i c o l o g i a 2. H o s p i t a i s - A s p e c t o s psicológi­co s 3. P a c i e n t e s h o s p i t a l i z a d o s - P s i c o l o g i a I . K n i j n i k , Rosa B e r g e r . I I . S e b a s t i a n i , R i c a r d o Werner. I I I . Angerami — Camon, Valdemar Augusto. I V . Título.

09-09842 CDD-362.11019

índices p a r a catálogo sistemático:

1. H o s p i t a i s : P s i c o l o g i a 362.11019

Psicologia Hospitalar Teoria e Prática

2- edição revista e ampliada

^•Idemar Augusto Angerami - Camon (organizador)

Fernanda Alves Rodrigues Trucharte Rosa Berger Knijnik

Ricardo Werner Sebastiani

C E N G A G E Learning"

Austrália • Brasil • Japão • C o t e i a . México • Cingapura • Espanha • Reino Unido • Estados Unidos"

Page 3: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

•% C E N G A G E Learning"

Psicologia Hospitalar - Teoria e Prática - 2- edição © 2010 Cengage Learning Edições Ltda. revista e ampliada

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro Valdemar Augusto Angerami - Camon (org.) poderá ser reproduzida, sejam quais forem os meios Fernanda Alves Rodrigues Trucharte empregados, sem a permissão, por escrito, da Editora. Rosa Berger Knijnik Aos infratores aplicam-se as sanções previstas nos Ricardo Werner Sebastiani artigos 102,104,106 e 107 da Lei n° 9.610, de 19 de

fevereiro de 1998.

Gerente Editorial: Patrícia La Rosa Para informações sobre nossos produtos, entre em Gerente Editorial: Patrícia La Rosa contato pelo telefone 08001119 39

Editoras de Desenvolvimento: Ligia Cosmo Cantarelli Gisele Gonçalves Bueno Quirino de Souza Para permissão de uso de material desta obra, envie

Supervisora de Produção Editorial: Fabiana Alencar seu pedido para [email protected]

Albuquerque

Produtora Editorial: Monalisa Neves © 2010 Cengage Learning. Todos os direitos reservados.

Copidesque: Adriane Peçanha

Revisão: Alexandra Costa ISBN-13: 978-85-221-0794-0 Fernanda Batista dos Santos ISBN-10: 85-221-0794-7

Diagramação: Ponto & Linha Cengage Learning Diagramação: Ponto & Linha Condomínio E-Business Park

Capa: Eduardo Bertolini Rua Werner Siemens, 111 - Prédio 20 - Espaço 04 Lapa de Baixo - CEP 05069-900 - São Paulo - SP Tel.: (11) 3665-9900 - Fax: (11) 3665-9901 SAC: 0800 1119 39

Para suas soluções de curso e aprendizado, visite www.cengage.com.br

Impresso no Brasil Printed in Brazil 2 3 4 5 6 7 8 14 13 12 11 10

Os Autores

V a l d e m a r A u g u s t o A n g e r a m i — C a m o n

Psicoterapeuta existencial, professor de p ó s - g r a d u a ç ã o em Psicologia da Saúde na l ' l ' ( ! SP,

cx-professor de psicoterapia fenomenológico-existencial na PUC-MG, coordenador do Centro

de Psicoterapia Existencial e professor de psicologia da saúde da Universidade l v d n . i l dn

Rio Grande do Norte (UFRN) . Autor com o maior n ú m e r o de livros sobre Psicologia pu

blicados no Brasil. Suas obras t a m b é m são adotadas em universidades de Portugal, Méxii 11

c C a n a d á .

F e r n a n d a A l v e s R o d r i g u e s T r u c h a r t e

Psicóloga Cl ín ica . Espec ia l ização em Psicologia Hospitalar pelo Instituto Sedes Sapientiae

R o s a B e r g e r K n i j n i k

Psicóloga C l ín i ca . Psicopedagoga. Espec i a l i z ação em Psicologia Hospitalar pelo Ins i i iu io

Sedes Sapientiae.

R i c a r d o W e r n e r S e b a s t i a n i

Ex-coordenador do Serviço de Psicologia Hospitalar do Hospital e Maternidade Paii-ame-

ricano. Coordenador do Nême ton - Centro de Estudos e Pesquisas em Psicologia e Saúde,

Professor universi tár io.

Page 4: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

Caminho... os corredores são sombrios, frios... sem vida, sem cor, sem calor... os corredores são longos, estreitados com a dor... são longos mas não o suficiente para acolher a todos os pacientes... os gemidos são ensurdecedores, amedrontadores como o silvo da serpente... são gemidos de desespero, de dor, de sofrimento. É o uivo dos umbrais... Lá de fora ecoam sirenes de ambulâncias, de viaturas policiais... sirenes de desespero, sirenes de esperança, sirenes apressadas, angustiadas. Lá de fora brotam cores de harmonia, de luz, de amor... cores trazidas pela esperança nesse momento de dor. A saúde também agoniza junto com o paciente, exaurida... as necessidades do paciente não podem ser supridas... faltam condições mínimas de atendimento, de unguento... faltam médicos, profissionais burocráticos, enfermeiros... falta tudo; e na falta de todos padece o doente. A doença no Brasil é vexatória... a doença torna-se constrangedora, predatória... a doença faz do paciente uma vítima; vítima da falta de condições do sistema de saúde. Observo... vejo a saúde padecendo juntamente com um amontoado enorme de doentes... assisto à s a ú d e enraizando-se como um privilégio de poucos... vejo a luz da esperança carreada apenas pelas cores da utopia... a saúde não existe... existe apenas uma maneira paliativa de assistência para alguns poucos doentes em seu desatino... O lixo hospitalar mistura-se aos escombros da dignidade humana... Saúde é dejeto que não pode ser reciclável. Saúde é bem precioso apenas nas empresas hospitalares. Quando proporcionam lucros. Grandes lucros... A mercantilização da saúde exclui aqueles que já foram anteriormente excluídos. Exclui aqueles que já perderam a dignidade por um nada no mundo. Lamento... observo o ritual lento e aterrorizante de todos os envolvidos na saúde... um ritual macabro feito de desalento e que piora a cada momento... E observo a tentativa ténue de transformação dessa realidade por um punhado de idealizadores... Espectadores dessa vergonha intitulada sistema de sau e... vergonha nacional tida como prioritária em qualquer planejamento social... A realidade, a triste realidade, é o escarro da podridão social na dor do doente. A vergonhosa situação dessa realidade é a constatação odienta de que não existe nenhum sistema de saúde no Brasil...

"Acordes de um Réquiem VALDEMAR AUGUSTO ANGERAMI - CAMO

Para Mathilde Neder Paixão, sonho e e spe rança . . . nas alamedas da vida, vida regato l ímpido da Psicologia Hospitalar

Para Karlinha, Uma nova guerreira das lides hospitalares a preservar a luta pela dignidade do paciente...

Page 5: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

Sumário

A p r e s e n t a ç ã o XI

1 O Psicólogo no Hospital 1 Valdemar Augusto Angerami - Camon

I n t rodução 1

A D e s p e r s o n a l i z a ç ã o d o Pac ien te 2

Ps i co te rap ia e Ps i co log ia Hosp i ta la r 4

O Setting Te rapêu t i co 5

A R e a l i d a d e Inst i tuc ional 7

A Ps i co log ia H o s p i t a l a r - O b j e t i v o s e Pa râmet ros 10

C o n s i d e r a ç õ e s F ina is 14

2 De Como o Saber Também é Amor 15 Valdemar Augusto Angerami - Camon

I n t rodução 15

D o c e s Remin i s cênc i a s 16

O u t r o s T e m p o s 18

3 Atendimento Psicológico no Centro de Terapia Intensiva 21 Ricardo Werner Sebastiani

I n t rodução 21

Desmi s t i f i c ando o CTI 21

O b j e t i v o s G e r a i s d o A c o m p a n h a m e n t o Ps i co lóg i co no CTI 24

Fa to res Pessoa i s D e c o r r e n t e s da In te rvenção C i rú rg i ca c o m o Poss íve i s

G e r a d o r e s d e C o m p l i c a ç õ e s na E v o l u ç ã o d o P ó s - O p e r a t ó r i o 27

Page 6: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

MC 11.,--I >lt.11.,I

A t e n d i m e n t o ao Pac i en te e m P ó s - O p e r a t ó r i o Imed ia to 28

R e a ç ã o à C i ru rg ia : Le ta rg ia e A p a t i a 30

A g r e s s i v i d a d e nos Pac i en tes C i rú rg i cos 32

D e p r e s s õ e s no Pac i en te Pós-C i rú rg i co 34

D e p r e s s õ e s no Hosp i ta l G e r a l 36

R e a ç õ e s d e Pe rda no Pac ien te Pós-C i rú rg i co 39

A t e n d i m e n t o Ps i co lóg i co ao Pac ien te N ã o C i rú rg i co 41

Fa to res A m b i e n t a i s c o m o C a u s a d o r e s ou A g r a v a n t e s d o Q u a d r o

P s i c o - O r g â n i c o d o Pac ien te 42

Fatores Orgân i cos c o m o Ref lexos Decor ren tes do Per íodo d e Internação . 42

O Pac ien te A n s i o s o 44

O Pac ien te A g r e s s i v o 47

O Pac ien te c o m A g r e s s i v i d a d e La ten te 48

Pac i en tes Su i c idas no CTI 50

O Pac i en te c o m A l t e r a ç õ e s d o P e n s a m e n t o e S e n s o - P e r c e p ç ã o :

C o n s i d e r a ç õ e s G e r a i s 53

D is túrb ios P s i copa to lóg i cos e d e C o m p o r t a m e n t o no CT I 55

O Pac ien te e m C o m a no CT I 60

Re fe rênc ia s B ib l iográ f i cas 6 3

Rote i ro C o m p l e m e n t a r d e E s t u d o s 64

I Estudos Psicológicos do Puerpério 65 Fernanda Alves Rodrigues Trucharte e Rosa Berger Knijnik

I n t rodução 65

O b j e t i v o s 66

M e t o d o l o g i a 66

F u n d a m e n t a ç ã o Teór i ca 66

C a s o s I lustrat ivos 72

C o n c l u s ã o 89

Re fe rênc ias B ib l iográ f i cas 90

Pacientes Terminais: Um Breve Esboço 91 Valdemar Augusto Angerami - Camon

I n t rodução 91

A P rob lemát i ca Soc ia l d o Pac ien te Te rmina l 9 2

A l g u n s D a d o s R e l a c i o n a d o s c o m a V i vênc ia d o Pac ien te Te rmina l 99 Re fe rênc ia s B ib l iográ f i cas 106

Apresentação

Dez anos nos separam da nossa pr imei ra p u b l i c a ç ã o em forma de l iv ro . Dez anos da

pr imei ra p u b l i c a ç ã o de Psicologia Hospitalar. As cãs dos nossos cabelos es t ão a mos­

t rar que, apesar de todas as dificuldades encontradas ao longo dessa jo rnada , mui to foi

conquistado, mui to foi a l c a n ç a d o .

A Psicologia Hospitalar nesse p e r í o d o deixou de ser u m sonho, uma aventura de u m

punhado de pessoas que acreditavam em uma performance profissional, ao mesmo tempo

em que sonhavam com outra concretitude, algo muito a l ém do p r ó p r i o sonho. Talvez ainda

sejamos sonhadores. Mas em n ú m e r o mui to maior.

Os sonhos de e n t ã o tornaram-se realidade ou simples abs t r ações que o indelével n ã o

consegue tocar. Sempre é prazeroso saber que fazemos parte dos processos de t r ans fo rmação

social e o simples fato de estarmos em busca de u m novo a m a n h ã na Psicologia Hospitalar

é alento de novas buscas e esforços.

É praticamente impossível arrolar o n ú m e r o de q u i l ó m e t r o s percorridos na d i v u l g a ç ã o

da Psicologia Hospitalar. U m s e m - n ú m e r o de horas de espera em saguões de aeroportos,

em antessalas de confe rênc ia e em noites e pernoites distantes do p r ó p r i o canto. Quantos

amigos fizemos ao longo desses percursos é outra q u e s t ã o que jamais poderemos detalhar.

Quan to aprendemos com todos esses amigos é nuance que nunca poderemos atingir . E

a té mesmo o enriquecimento da nossa p r ó p r i a vida a pa r t i r dessas e x p e r i ê n c i a s é p r i v i ­

légio que nem todas as elegias c c â n t i c o s de agradecimentos p o d e r ã o re t r ibui r . Tantos

acontecimentos t ã o significativos ficaram na m e m ó r i a que a simples ideia de tentar des­

crevê- los é tarefa inconceb íve l . U m a d é c a d a é uma vida . V i d a v iv ida em intenso frenesi

de e m o ç ã o e p a i x ã o . De tantas coisas faladas, efetuadas e apreendidas no farfalhar das

nossas t ra je tó r ias .

Page 7: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

r-.M ni(ji |i,i 11• >'.|>11.11.<>

Assumir que <> verdadeiro aprendizado li>i aquele realizado com <> paciente em seu

leito hospitalar é talvez a nossa maior conquista. N à o estamos desprezando o aprendizado

a c a d é m i c o , tampouco as tantas horas de re l lexào e leitura, apenas queremos enfatizar que

se existe algo para ser propagado, é o lato de que aprendemos apreendendo a a n g ú s t i a , a

dor e tantas outras coisas e sentimentos de nosso paciente. Ksse paciente que nos ensina

sobre a força de enfrentamento da dor e do desespero da morte; que nos ensina a tolerar

as p r ó p r i a s vicissitudes da vida; que nos ensina uma nova forma de entender o significado

da ex i s t ênc ia ; que nos ensina sobre a suavidade da doce f r a g r â n c i a existente em cada

momento, em cada encontro.

N ã o houve em momento a lgum a p r e t e n s ã o de sermos pioneiros, precursores; apenas

sempre fomos sonhadores que ideal izaram uma p r á t i c a alternativa. E assim esperamos

continuar. Aprendendo e crescendo sem nunca esquecer as nossas reais l imi tações .

Valdemar Augusto Angerami - Camon

X I I

0 Psicólogo no Hospital

Valdemar Augusto Angerami - Camon

Introdução

A i n t e n ç ã o deste trabalho é levantar alguns pontos de reflexão sobre o significado da

Psicologia no Hospital e a a t u a ç ã o do ps icólogo nesse contexto. A ev idênc ia qu< me

ocorre inicialmente é que, apesar dos i n ú m e r o s trabalhos e artigos que hoje norteiam a

prá t ica do psicólogo no hospital, ainda assim é notór io o fato de que apenas tartamudeamos

as primeiras palavras nesse contexto. A p r ó p r i a d i n â m i c a da exis tência parece encontrar

no contexto hospitalar u m novo p a r â m e t r o de sua o c o r r ê n c i a , dando-lhe uma d i m e n s ã o

na qual ques tões que envolvem a d o e n ç a , a morte e a p r ó p r i a perspectiva existencial apre

sentam u m enfeixamento inerentemente peculiar.

A Psicologia, ao ser inserida no hospital, reviu seus p róp r ios postulados adquirindo con­

ceitos e questionamentos que fizeram dela u m novo escoramento na busca da compreensão

da ex is tênc ia humana. Assim, por exemplo, n ã o mais é possível pensar-se em um curso

de g r a d u a ç ã o em psicologia no qual ques tões como morte, s aúde púb l i ca , hosp i t a l i zação <•

outras t e m á t i c a s , que em pr inc íp io eram pertinentes apenas à Psicologia Hospitalar, não

tenham prioridade ou n ã o sejam exigidas como necessá r ias para a f o r m a ç ã o do psicólogi >.

O atual quadro da f o r m a ç ã o do ps icólogo difere do que colocamos em texto anterior 1 de

1984, quando afirmamos que a atuação do psicólogo no contexto hospitalar, ao menos no Brasil, é

uma das temáticas mais revestidas de polémicas quando se evocam discussões sobre o papel da Psicologia

1 - Angerami , V . A . Psicologia Hospitalar. A Atuação do Psicólogo no Contexto Hospitalar. S ã o Paulo: T r a ç o , 19K-I.

Page 8: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

Psicologia Hoipltalai

na realidade institucional.. [formação académica do psicólogo ifalha cm rtlaçâo aos mbsídios teóricos ata

possam embasá-lo na prática institucional. Essa formação académica, sedimentada em outros modelos de

atuação, não provê o instrumental teórico necessário para uma atuação nessa realidade. K praticamente

prevendo uma m u d a n ç a nesse quadro, o mesmo texto coloca que apenas recentemente a

prática institucional mereceu p r e o c u p a ç ã o dos responsáveis pelos programas a c a d é m i c o s

em Psicologia. 2 E dentro dessa perspectiva que se abre ao psicólogo no contexto hospitalar

que iremos tecer nossas reflexões na busca de u m melhor dimensionamento dessa p rá t i ca .

É na fé i n q u e b r a n t á v e l que o ps icólogo adquire cada vez com mais nitidez u m e s p a ç o no

hospital a par t i r de sua c o m p r e e n s ã o da c o n d i ç ã o humana. Iremos caminhar por trilhas

e caminhos que nos c o n d u z i r ã o a novos horizontes profissionais.

A Despersonalização do Paciente

A o ser hospitalizado, o paciente sofre u m processo de total despersonal ização . Deixa de ter

o seu p rópr io nome e passa a ser u m n ú m e r o de leito ou en tão a lguém portador de uma de­

terminada patologia. O estigma de doente - paciente até mesmo no sentido de sua própr ia

passividade perante os novos fatos e perspectivas existenciais - i rá fazer com que exista a

necessidade premente de uma total re formulação a té mesmo de seus valores e conceitos de

homem, mundo e re lação interpessoal em suas formas conhecidas. Deixa de ter significado

p rópr io para significar a part i r de diagnóst icos realizados sobre sua patologia. Berscheid e

Walster 3 destacam que fundamentalmente quando dizemos que sabemos qual a atitude de uma pessoa,

queremos dizer que temos alguns dados, a partir do comportamento passado da pessoa, que nos permitem pre­

dizer seu comportamento em determinadas situações* Ta l a f i rmação , utilizada para embasar muitos

princípios teóricos em psicologia, perde sua força e autenticidade ao ser confrontada com o

comportamento de uma determinada pessoa em uma si tuação de hospi tal ização. Embora sem

querer negar que o passado de uma determinada pessoa irá influir n ã o apenas em sua conduta

como até mesmo em sua r ecupe ração física, ainda assim n ã o cometemos erro ao afirmar que

a s i tuação de hospi ta l ização será algo ún ico como vivência, n ã o havendo a possibilidade de

previsão anterior à sua p rópr i a ocorrência . Goffman 5 coloca que o estigma é um sinal, um

signo utilizado pela sociedade para discriminar os indivíduos portadores de determinadas

2 - Berscheid, E . ; Walster, E . H . Atração Interpessoal. S ã o Paulo: Bliicher, 1973. 3 - Ibid. Op. cit. 4 - Idem, Op. cit..

5 - Goffman, E . Estigma. R i o de Janeiro: Zahar , 1978.

( ) ( > | ( l ( | ( ) I H ) I ll)-.|>il,ll

Características. E o simples lalo (Ir se lotnai "hospitalizada" faz com que a pessoa adquira os

signos que irão cnquadia-la muna nova performance existencial, sendo que até mesmo seus

vínculos interpessoais passarão a existir a partir desse novo signo. Seu espaço vital não é mais

algo que dependa de seu processo de escolha. Seus hábi tos anteriores terão de se transformar

diante da realidade da hospitalização e da doença. Se essa doença for algo que a envolva apenas

temporariamente, haverá a possibilidade de uma nova rees t ru tu ração existencial quando do

restabelecimento orgânico, fato que, ao contrário das doenças crónicas, implica necessariamente

uma total r ees t ru tu ração vi ta l . Sebastiani 6 explica que "a pessoa deixa de ser o José ou Ana

etc. e passa a ser o '21A' ou o 'politraumatizado de leito 4', ou ainda 'a fratura de bacia de l>"

andar'". 7 E, tentando aprofundar ainda mais tais colocações, afirma que "essa caracterísl ica,

que felizmente notamos em grande parte das rotinas hospitalares, tem cont r ibu ído muito para

ausentar a pessoa de seu processo de tratamento, exacerbando o papel de 'paciente'".8

A d e s p e r s o n a l i z a ç ã o do paciente deriva ainda da f r a g m e n t a ç ã o ocorrida a par t i r dos

d iagnós t i cos cada vez mais específicos que, a l é m de n ã o abordarem a pessoa em sua um

plitude existencial, fazem com que apenas u m determinado sintoma exista naquela vida.

Apesar disso, assistimos cada vez mais ao surgimento de novas especialidades que reduzem

o e spaço v i t a l de uma determinada pessoa a u m mero determinismo das implicações de

certos d iagnós t i cos , que trazem em seu bojo signos, estigmas e preconceitos. Ta l carga de

abordagem e confrontos t eó r i co -p rá t i cos faz da pessoa portadora de determinadas pato­

logias a l g u é m que, a l é m da p r ó p r i a patologia, necess i t a r á de cuidados complementares

para livrar-se de tais estigmas e signos. A espec ia l i zação c l ín ica , na maior ia das vezes, ao

aprofundar e segmentar o d i agnós t i co , deixa de levar em conta a té mesmo as impl icações

dessa patologia em outros ó rgãos e membros desse doente, que, embora possam n ã o apre­

sentar sinais evidentes de d e t e r i o r a ç ã o e comprometimento o r g â n i c o , e s t a r ã o sujeitos a um

s e m - n ú m e r o de a l t e rações .

A s i tuação de hosp i t a l i zação passa a ser determinante de muitas s i tuações que se rão

consideradas invasivas e abusivas na medida em que n ã o se respeitam os limites e imposições

dessa pessoa hospitalizada. E, embora esteja vivendo u m total processo de despersonali­

z a ç ã o , ainda assim algumas p rá t i ca s são consideradas ainda mais agressivas pela maneira

como são conduzidas no â m b i t o hospitalar. Assim, se rá visto como invasivo o lalo de a

6 - Sebastiani, W . R . Atendimento Ps i co lóg i co e Ortopedia . Psicologia Hospitalar. A Atuação do Psicólogo no Contexto Hospitalar, Angerami , V . A . (org.). S ã o Paulo: T r a ç o , 1984.

7 - Ibid. Op. cit.

8 - Ibid. Op. cit.

3

Page 9: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

P s i c o l o g i a Hosp i ta l . i r

cnlcrmcira acordar o paciente para aplicar injeção, OU a alcndentr <|ii<' interrompe uma

determinada atividade para servir-llie as relcições. Tudo passa a ser invasivo. Tudo passa

a ser algo abusivo diante de sua necessidade de ace i t ação desse processo'. K até mesmo a

presença do psicólogo, que, se n ã o se efetivar cercada de alguns cuidados e respeito ã própria

d e l i b e r a ç ã o do doente, impl ica ser mais u m dos es t ímulos aversivos e invasivos existentes

no contexto hospitalar, e, em vez de propiciar al ívio ao momento da hosp i t a l i zação , es ta rá

a ml r ibu indo t a m b é m para o aumento de vetores que to rnam o processo de hosp i t a l i zação

extremamente penoso e difícil de ser v iv ido . O hospital, o processo de hosp i t a l i zação e o

tratamento inerente que visa ao restabelecimento, salvo aqueles casos de d o e n ç a s c rón icas

e degenerativas, n ã o fazem parte dos projetos existenciais da maior ia das pessoas. Nesse

sentido, toda e qualquer invasão no espaço v i t a l é algo aversivo que, a l ém do c a r á t e r abu­

sivo, apresenta ainda componentes de dor e desalento. E a té mesmo evidencia que muitos

processos de hosp i t a l i zação t ê m o reequ i l íb r io o r g â n i c o prejudicado por causa do processo

de de spe r sona l i z ação do doente, que, ao sentir sua desqua l i f icação existencial, pode conco­

mitantemente, muitas vezes, abandonar seu processo interior de cura o r g â n i c a e a té mesmo

emocional. A o trabalhar no sentido de estancar os processos de despersona l i zação no âmbi to

hospitalar, o psicólogo e s t a r á ajudando na h u m a n i z a ç ã o do hospital, pois seguramente esse

processo é u m dos maiores aniquiladores da dignidade existencial da pessoa hospitaliza­

da. U m trabalho de ref lexão que envolva toda a equipe de saúde é uma das necessidades

mais prementes para fazer com que o hospital perca seu c a r á t e r meramente curativo para

transformar-se em uma ins t i tu ição que trabalhe n ã o apenas com a reab i l i t ação o r g â n i c a ,

mas t a m b é m com o restabelecimento da dignidade humana.

Psicoterapia e Psicologia Hospitalar

A Psicologia Hospitalar, assim como a Psicoterapia, tem seu instrumental t eó r i co de atua­

ç ã o calcado na á r e a cl ínica." Apesar dessa conve rgênc i a , h a v e r á pontos de d ive rgênc i a que

mostram os limites de a t u a ç ã o do ps icólogo no contexto hospitalar, bem como ques tões

que tornam totalmente inadequada a i n t e n ç ã o de muitos profissionais da á r e a de tentarem

'I - Kxislcm muitos pmlissii mais da área que defendem que a Psicologia Hospitalar, mesmo tendo como referencial os princípios (la área c l ín i ca , seja considerada unia nova r a m i f i c a ç ã o da Psicologia. Ass im, a l é m da c láss ica d i v i s a » n u (ílinica, Educacional e (Irganizacional, haveria t a m b é m u m a quarta rami f i cação: a Psicologia Hospitalar. E embora aeja uma ques tão que envolva bastante celeuma quando de seu aprofundamento, evi-deni ia IC também I nei euidade de uma nova ó l i . a sobre a Psicologia Hospitalar, seja pelo seu crescimento,

seja ainda pela sua diversidade teórica.

4

( 1 l \ i ( <)lo(|<) n<> I losp i l . i l

definir a a t u a ç ã o no contexto hospitalar como sendo prá t ica ps ico te ráp ica , ainda que rea­

lizai la no contexto institucional. A seguir < (escrevemos alguns desses pontos.

Objetivos da Psicoterapia A Psicoterapia, independentemente de sua o r i e n t a ç ã o t eór ica , tem como principais obje-

I ivt >s levar o paciente ao autoamhecimento, ao autocrescimento e à cura de determinados sintomas. O

enleixamento desses objetivos, ou ainda de a lgum deles isoladamente, desde que leve esse

paciente a um processo pleno de l ibe r t ação existencial, é, por assim dizer, o ideal que norteia

c i processo ps ico te ráp ico . A Psicoterapia, ademais, tem como carac te r í s t i ca pr inc ipa l o fato

(le ser um processo no qual a procura e a d e t e r m i n a ç ã o de seu início se d á pela m o b i l i z a ç ã o

do paciente. Assim, u m paciente, ao ser encaminhado para u m processo ps i co te ráp ico ,

muitas vezes demora u m p e r í o d o bastante longo entre esse encaminhamento e a procura

propriamente di ta desse processo. Chessick1" adverte que a psicoterapia falha quando n ã o

existe uma afinidade precisa entre aquilo que busca o paciente em sua psicoterapia e aquilo

(pie o psicoterapeuta tem condições de oferecer-lhe. Até mesmo a falta de definições precisas

dos objetivos do processo p o d e r á determinar impl icações que seguramente e m p e r r a r ã o o

processo, a l é m de a r r a s t á - l o ao longo de u m p e r í o d o de maneira indevida.

A o decidir pela psicoterapia, o paciente j á realizou u m processo in ic ia l e introspectivo

da necessidade desse tratamento e suas impl icações em sua vida. Isso tudo evidentemente

a l ém da inse rção de suas necessidades aos objetivos da psicoterapia.

O Setting Terapêutico

A o procurar pela psicoterapia, o paciente será e n t ã o enquadrado no chamado setting tera­

pêu t i co . Assim as normas e diretrizes do processo se rão colocadas de maneiras bastante

claras e precisas pelo psicoterapeuta, formalizando-se assim as nuances sobre as quais se

n o r t e a r á esse processo. Detalhes como h o r á r i o de d u r a ç ã o de cada sessão, eventuais re­

posições de sessões, prazo de aviso para eventuais faltas etc. são e sboçados e o processo se

desenvolve e n t ã o em perfeita consonânc ia com esses preceitos. E a té mesmo alguma eventual

resistência inicial do paciente em procurar pela psicoterapia, bem como outras impl icações ,

s e rão resolvidas em u m processo cujo contrato é estabelecido em acordo com as duas par­

tes envolvidas. Embora seja no tó r io o n ú m e r o de casos encaminhados à psicoterapia que,

10 - Chessick, D . R . Why Psychoiherapists Fail. Nova York: Science House, 1971.

Page 10: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

r-.M o i i K | i . i i i o ' . | ) i t , i i , i i

por alguma forma de resistência, demoram muito paia procurar por tal processo, ainda

assim é t i xivei liei Ue estabelecer (|iie, pelo fato de o paeieule estar totalmente fragilizado <•

necessitando desse tipo de tratamento, a busca por tal processo se d a r á única e t ão somente

quando esse paciente romper com determinadas amarras emocionais. A inda que surjam

outras dificuldades e resis tências ao longo do processo, a res is tência inicial ao tratamento

é transposta pelo simples fato de o paciente procurar pela psicoterapia.

A psicoterapia a inda tem outra c a r a c t e r í s t i c a bastante peculiar de ser u m processo

em que o psicoterapeuta tem no paciente a l g u é m que caminha sob sua responsabilidade,

mas que de forma simples tem nesse v í n c u l o seu objetivo em si. Assim, u m psicoterapeuta

n ã o prec i sa rá prestar conta de seu paciente a nenhuma entidade, salvo naturalmente aqueles

casos nos quais o atendimento é vinculado a a lgum processo de superv i são . O processo em

si é conduzido pelo psicoterapeuta com a n u ê n c i a do paciente e, no caso de a lgum impe­

dimento, a r e l ação se resolve apenas e t ã o somente pelas partes envolvidas nesse processo.

C) setting t e r apêu t i co i m p õ e ainda uma privacidade ao relacionamento que torna toda e

qualquer in te r fe rênc ia externa ao processo plausível de ser analisada e enquadrada nos

p a r â m e t r o s desse relacionamento.

Chessick 1 1 salienta que o psicoterapeuta descende diretamente do confessor religioso

o u e n t ã o do m é d i c o de f amí l i a , aquele profissional que, a l é m de cuidar dos males do

organismo, escutava as a n g ú s t i a s e dificuldades do paciente. O psicoterapeuta em sua

l i nhagem apresenta t a m b é m re squ íc io s do curandei ro das antigas f o r m a ç õ e s t r iba is ,

encarregado de trazer bem-estar e a l ív io aos membros dessa comunidade. A p r o t e ç ã o

sentida pelo paciente nos limites do setting t e r apêu t i co mostra ainda que essa or igem n ã o

é apenas perpetuada, mas apresenta requinte de evo lução no resguardo dos aspectos en­

volvidos nesse processo. E a té mesmo u m " q u ê " de samaritanismo presente no processo

ps ico te ráp ico é t a m b é m res íduo dessas marcas que o psicoterapeuta traz de sua or igem e

desenvolvimento. A e m o ç ã o presente na atividade ps ico te ráp ica é outro fator que faz com

que nenhuma outra forma de relacionamento possa ser comparada com sua performance.

E nesse sentido temos t a m b é m a c o l o c a ç ã o de muitos especialistas de que a psicoterapia

é o su s t en t ácu lo do homem c o n t e m p o r â n e o dentre outras tantas formas buscadas para

al ívio e crescimento emocional.

A inda no chamado setting t e rapêu t ico vamos encontrar a peculiaridade de que a maioria

dos processos jamais tem suas sessões interrompidas, seja por sol ici tações externas, seja

11 - Ibid. Op. cit.

6

( ) |'\i< l ) l l ) l | (> IH) I l ( ) \ | ) l l . l l

, l inda por outras var iáve is decorrentes, muitas vezes, do p r ó p r i o processo em si. Assim,

i pi atii amenle impossível , por exemplo, que um psicoterapeuta interrompa uma sessão

estancando o choro de angús t i a do paciente para simplesmente atender uma l i gação tele-

li i i i M a. ( ) u ainda que uma sessão seja igualmente in ter rompida para que o psicoterapeuta

I i i i . .a recepcionar a lgum amigo que eventualmente vá visi tá-lo. O setting t e r apêu t i co assim

resguarda a sessão para que todo o mater ia l catalisado naqueles momentos seja apreen­

dido e elaborado de maneira plena e absoluta. Tais ca rac t e r í s t i ca s fazem, inclusive, com

que seja mui to difícil avaliar-se u m processo p s i co t e r áp i co que n ã o seja fundamentado

nesses moldes.

A Realidade Institucional

l fma das primeiras dificuldades surgidas quando se pensa na atividade do ps icólogo na

realidade hospitalar é sua inse rção na realidade insti tucional. J á afirmamos que: 1 2

a formação do psicólogo é falha em relação aos subsídios teóricos que possam embasá-lo na prática

institucional. Essa formação académica, sedimentada em outros modelos de atuação, não o provê com o

instrumental teórico necessário para uma atuação nessa realidade. Torna-se então abismático o hiato que

separa o esboço teórico de sua formação profissional e sua atuação prática. Apenas recentemente a prática

institucional mereceu preocupação dos responsáveis pelos programas académicos em Psicologia.

A i n d a que hoje em dia seja no tó r io o n ú m e r o de cursos de g r a d u a ç ã o em Psicologia

que t ê m dedicado grande e s p a ç o para o contexto inst i tucional em seus programas de

f o r m a ç ã o , estamos distantes daqui lo que seria o ideal em termos de s e d i m e n t a ç ã o t eó r i -

co -p r á t i c a . E na medida em que o hospital surge como uma realidade institucional com

carac te r í s t i cas bastante peculiares, embora reproduzindo as condições de outras realidades

institucionais, apresenta sinais que evidenciam tratar-se de amplitude sequer imag ináve l

em uma aná l i s e que n ã o tenha u m real comprometimento com sua verdadeira d i m e n s ã o . "

12 - Psicologia Hospitalar. A Atuação do Psicólogo no Contexto Hospitalar. Op. cit. 13 - Escrevemos um trabalho intitulado "Elementos Institucionais Básicos para a Implantação do Serviço de Psicologia

no Hospital" (in A Psicologia no Hospital. S ã o Paulo: T r a ç o , 1988) e surpreendentemente percebemos, a partir de

sua a d o ç ã o em vários cursos e seminár ios realizados sobre realidade institucional, n ã o apenas a precariedade de

publ icações a respeito como principalmente a maneira como esse trabalho tornou-se um verdadeiro paradigma

a tantos que procuravam pela i m p l a n t a ç ã o de um S e r v i ç o de Psicologia no Hospital G e r a l .

7

Page 11: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

(>l()()i.l I l ( > S | ) i t , l l . l l

T a m b é m é inegável que, a par t i r do surgimento das reflexões realizadas principalmente

pelos profissionais da Argentina sobre a realidade institucional, esse aspecto ganhou uma

corporeidade bastante precisa e importante na esfera c o n t e m p o r â n e a da Psicologia. Assim,

o termo "aná l i se inst i tucional" deixou de ser uma mera c i t ação abstraia cie alguns textos

para tornar-se realidade, ao menos de d i scussão t eór ica , para u m s e m - n ú m e r o de acadé ­

micos que, a pa r t i r de e n t ã o , passaram a interessar-se pela t emá t i ca .

E apesar do psicólogo ainda estar iniciando uma prática institucional nos parâmetros da

eficácia e respeito às condições institucionais que delimitam sua situação nesse contexto, a busca

de determinantes nessa prática o levou de encontro a convergências bastante significativas na

estruturação teórica dessas atividades.u

E fato que a realidade hospitalar apresenta celeumas e cond ições que ex ig i r ão do psi­

cólogo algo a l ém da d iscussão meramente t e ó r i c o - a c a d ê m i c a . Valores ét icos e ideológicos

s u r g i r ã o ao longo do caminho e e x i g i r ã o performances sequer imaginadas antes de sua

oco r r ênc i a . Como i lus t ração dessa a f i r m a ç ã o cito o grande n ú m e r o de c r i a n ç a s que pade­

cem nos hospitais de S ã o Paulo de insuficiência h e p á t i c a causada por i n a n i ç ã o . Deparar

com c r i anças que padecem vitimadas pela fome em plena cidade de S ã o Paulo é algo que

nenhum a c a d é m i c o imagina quando idealiza efetivamente u m a atividade no hospital.

O u e n t ã o , que dizer dos casos de c r i a n ç a s atacadas por ratazanas enquanto dormem, em

uma ev idênc ia da precariedade e da falta de cond ições m í n i m a s de dignidades existencial

e habitacional em que a falta de saneamento bás ico é t ã o abismante que conce i tuá - lo de

absurdo nada mais é do que aproximar-se da verdadeira realidade dessa p o p u l a ç ã o ?

0 psicólogo, no contexto hospitalar, depara-se de forma aviltante com um dos direitos básicos

que estão sendo negados à maioria da população, a saúde. A saúde, em princípio um direito de

todos, passou a ser um privilégio de poucos em detrimento de muitos. A precariedade da saúde da

população é, sem dúvida alguma, um agravante que irá provocar posicionamentos contraditórios,

e, na quase totalidade das vezes, irá exigir do psicólogo uma revisão de seus valores académicos,

pessoais e até mesmo sociopolíticos}0

14 - Psicologia Hospitalar. A Atuação do Psicólogo no Contexto Hospitalar Op cit 15 - Ibid. Op. cit.

8

( I | \ i c i>lo<]<> IKI Mti-.|iit.il

( ) contexto hospitalar disla de hu ma significativa daquela idea l i zação leila nas lides

a c a d é m i c a s . Assiste-se, nesse contexto, a c o n d i ç ã o desumana a que a p o p u l a ç ã o , ja bas

lanle causada de sofrer todas as l õ r m a s possíveis de injustiças sociais, leni de se submetei

em busca do recebimento de u m tratamento adequado. Cenas ocorrem fruto das mais

l amentáve i s s i tuações a que u m ser humano pode submeter-se. E o que é mais agravante:

tudo passa a ser considerado normal . Os doentes são obrigados a aceitar como normail

Iodas as formas de ag re s são com as quais se deparam em busca de s aúde .

Tudo é visto como normal ; passa a ser normal ficar seis horas em uma fila de espera em

busca de atendimento m é d i c o , e muitas vezes a p ó s vár ios retornos â ins t i tu ição hospitalar,

derivados de encaminhamentos feitos pelos especialistas, por sua vez decorrentes de examei

realizados especulativamente. T a m b é m passa a ser normal o fato de ser atendido i ú

piero imenso de pacientes em u m p e r í o d o de tempo absurdamente curto. Tudo passa a n i

normal . E os profissionais que a tuam na á r e a de s a ú d e assistem desolados e conformados

a esse estado de coisas. Tornam-se praticamente u tóp icas outras formas de atendime

que n ã o essas que impiedosamente são impostas à p o p u l a ç ã o .

O ps icólogo está inserido nesse contexto da saúde de forma t ão emaranhada quanto

outros profissionais atuantes na á r e a da saúde e, muitas vezes, sem uma real consi iem ia

dessa realidade.

C o n t r a d i ç õ e s i n ú m e r a s sucedem em todos os níveis no contexto hospitalar. I - se poi

u m lado os hospitais apresentam essas enormes filas de pacientes que, padecendo em

corredores, m i n g u a m por a lgum tipo p r e c á r i o de atendimento, por outro encontraremos

algumas ins t i tu ições nesse mesmo contexto que apresentam alta e spec i a l i zação resultante

do enorme processo do conhecimento na á r e a das c iências humanas.

Descobriremos, nessa realidade, profissionais altamente especializados. Sempre muito

bem informados das técn icas existentes, es tão constantemente aprimorando-as em cursi >s

e congressos nos centros mais desenvolvidos da Europa e Estados Unidos. É possível, poi

exemplo, a u t i l i zação do m é t o d o Sahling de aná l i se do metabolismo do feto, bem como 0

acompanhamento e le t rônico do eletrocardiograma fetal. Os avanços na á r e a da ()bstet ríi ia

permi tem ainda a p rev i são do sexo do feto ou uma possível m a l f o r m a ç ã o congén i t a . No

entanto, em termos de realidade, temos, segundo re la tór ios sobre estudos realizados em

vár i a s regiões brasileiras, dados alarmantes informando que 95% dos partos são realizai li >s

em casa e sem o menor acompanhamento p r é - n a t a l . E o n ú m e r o de pessoas que recebem

a lgum t ipo de assis tência é quase nulo. Esse contexto c o n t r a d i t ó r i o e incongruente recebe

o ps icó logo, que tem sobre si outras c o n t r a d i ç õ e s que o envolvem diretamenle desde

lides de sua f o r m a ç ã o a c a d é m i c a . E o psicólogo percebe no contexto hospitalar que os ensinamentos

9

Page 12: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

o l .1 11ospi t . i l . i l

e leituras teóricas de sua prática académica não serão, poi maiores que tejam as horas de estuda t reflexão

teórica sobre a temática, suficientes para embasar sua atuação. E aprende que terá de aprender apreendendo,

como os pacientes, sua dor, angústia e realidade. PI o paciente, de modo peculiar, ensina ao psicólogo sobre

a doença e sobre como lidar com a própria dor diante do sofri mento.u'

A Psicologia Hospitalar - Objetivos e Parâmetros

A Psicologia Hospitalar tem como objetivo principal a minimização do sofrimento provocado pelo

hospitalização. Se outros objetivos forem a lcançados a par t i r da a t u a ç ã o do psicólogo com o

paciente hospitalizado - inerente aos objetivos da p rópr i a psicoterapia antes citados — trata-se

de simples acréscimo ao processo em si. O psicólogo precisa ter muito claro que sua a tuação no

contexto hospitalar não é psicoterápica dentro dos moldes do chamado setting terapêutico. Como

m i n i m i z a ç ã o do sofrimento provocado pela hospi ta l ização, t a m b é m é necessár io abranger

n ã o apenas a hospi ta l ização em si - em termos específicos da patologia que eventualmente

tenha originado a hospi ta l ização —, mas principalmente as sequelas e decor rênc ias emocio­

nais dessa hospi ta l ização. Tomemos como exemplo, arbitrariamente, uma c r i a n ç a de 3 anos

de idade que nunca tenha vivido longe do seio familiar. E m dado momento, simplesmente

coloquemos essa c r i ança em uma escola maternal durante apenas u m pe r íodo do dia. Essa

c r i ança , em que pese a escola ser u m ambiente em pr inc íp io agradável e repleto de outras

c r i anças , se d e s a r v o r a r á e e n t r a r á em u m processo de p â n i c o e deses t ru tu ração emocional ao

se perceber longe da p ro t eção familiar. E tantos casos ocorrem nesse enquadre que a maioria

das escolas possui o chamado pe r íodo de a d a p t a ç ã o , no qual algum dos representantes desse

núcleo familiar se faz presente na escola para acudir essa c r i ança nos momentos agudos de

dificuldade. E isso tudo em u m ambiente ag radáve l de escola onde muitas vezes a c r i ança

i rá se deparar com est imulações e recreações sequer imagináve is sem seu universo simbólico.

O que dizer en t ão de uma c r i ança que em u m determinado momento se vê hospitalizada 1 '

sem a p resença dos familiares e em u m ambiente na maioria das vezes hostil?! Certamente

ela e n t r a r á em u m nível de sofrimento emocional e muitas vezes a té físico em decor rênc ia

dessa hospi ta l ização. Sofrimento físico que transcende até mesmo a patologia inicial e que

se origina no processo de hospi ta l ização.

16-nu op. HL 17 - E m b o r a seja alentador o fato de que hoje muitos hospitais p e d i á t r i c o s adotem a p r e s e n ç a da m ã e ou de algum

outro familiar durante o processo de h o s p i t a l i z a ç ã o da c r i a n ç a , a inda assim a grande maioria dos hospitais

n ã o apresenta sequer uma maior flexibilização até mesmo quanto ao horár io de visitas.

10

( ) r-.u ol()(|t) no I l o sp i l . i l

A minimização do sofrimento provocado pela h o s p i t a l i z a ç ã o i m p l i c a r á u m leque

bastante amplo de opções de a t u a ç ã o , < ujas var iáveis d e v e r ã o ser consideradas para que 11

atendimento stja coroado de êxi to . I Ima mulher mastectomizada, em outro exemplo, lei a

no processo de e x t i r p a ç ã o do tumor, na maioria das vezes, a e x t r a ç ã o dos seios com Iodas

as impl i cações que tal ato incide. O processo de h o s p i t a l i z a ç ã o deve ser entendido Fifto

apenas como u m mero processo de ins t i t uc iona l i zação hospitalar, mas, e principalmente!

i orno u m conjunto de fatos que decorrem desse processo e suas impl i cações na vida do

paciente. N ã o podemos, assim, em u m simples determinismo, aceitar que o problema da

mulher mastectomizada se inic ia e se encerra com a hosp i t a l i zação . Evidentemente que

muitos casos abordados pelo ps icólogo no hospital ex ig i r ão , após o processo de hospitali

z a ç ã o , encaminhamentos específicos para processos de psicoterapia tal a complexidade e

o emaranhado de sequelas e comprometimento emocional.

Embora muitas vezes seja bastante t énue a s e p a r a ç ã o que del imita tais aspei los, anula

assim é mui to importante o clareamento desse posicionamento para que o processo em a

n ã o se perca em mera e v ã d ig res são teór ica .

A Psicologia Hospitalar, por outra parte, contrariamente ao processo psicoterápico, não

possui setting t e r apêu t i co t ã o definido e t ã o preciso. Nos casos de atendimentos realizados

em enfermarias, o atendimento do psicólogo, muitas vezes, é in terrompido pelo pessoal de

base do hospital, seja para ap l i cação de injeções, p r e sc r i ção medicamentosa em detei mi

nado h o r á r i o , seja ainda para processo de l impeza e assepsia hospitalar. O atendimento,

dessa forma, t e r á de ser efetuado levando-se em conta todas essas var iáve is , a l ém de outros

aspectos mais delicados que citaremos a seguir.

Descrevemos no trecho inerente ao setting t e rapêu t i co a mob i l i zação do paciente rumo

ao processo psicoterápico: a i m p o r t â n c i a de uma reflexão e de uma posterior constalaçài ida

necessidade de se submeter a esse processo. No hospital, ao con t rá r io do paciente que pn n u r i

pela Psicoterapia após romper eventuais barreiras emocionais, a pessoa hospitalizada será

abordada pelo psicólogo em seu própr io leito. E, em muitos casos, esse paciente sequer I I I I H Iam

qual o papel do psicólogo naquele momento de sua hospi ta l ização e até mesmo de vida."'

18 - Nesse sentido, é muito importante que o p s i c ó l o g o seja inserido na equipe de profissionais de saúde que aluem

em um determinado contexto hospitalar. T a l inserção d e t e r m i n a r á que sua abordagem seja fruiu d e e m .1

alinhamento realizado por i n t e r m é d i o de outros profissionais com esse paciente com a a n u ê n c i a dele pari que, ac ima de qualquer outro preceito, seu arbítr io de querer ou n ã o essa abordagem seja respeitado, Esse é um aspecto importante a ser observado, pois determina muitas vezes até mesmo o êx i to da abordagem d n

p s i c ó l o g o . A i n d a que o paciente necessite de maneira premente da i n t e r v e n ç ã o ps i co lóg i ca , seu arbítrio de> e ser considerado para que a c o n d i ç ã o humana seja respeitada em um de seus preceitos fundamentais.

11

Page 13: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

I\U<||.M|Í.I M<IN|>il.l|.||

I ) i s s . i im i n . i , c muito impoi tinte que <> psicólogo entendi os limites de sua atuação para

n ã o se tornar ele lambem mais um dos elementos abusivamente invasivos que agridem o

processo de hosp i t a l i zação e que permeiam largamente a ins t i tu ição hospitalar. Ainda que

0 paciente em seu processo de hosp i t a l i zação esteja mui to necessitado da i n t e r v e n ç ã o

e seguramente muitos dos pacientes encaminhados ao processo de psicoterapia t a m b é m

es t ão necessitados de tratamento, mas preservam a si o direi to de rejeitar tal encaminha­

mento , a o p ç ã o do paciente de receber ou n ã o esse t ipo de i n t e r v e n ç ã o deve ser soberana

e deliberar a p r á t i c a do psicólogo. Balizar a sua necessidade de in terv i r em determinado

paciente, a p r ó p r i a necessidade desse paciente em receber ta l i n t e r v e n ç ã o , é d e l i m i t a ç ã o

impresc indíve l para que essa a t u a ç ã o caminhe dentro dos p r inc íp ios que incidem no real

respeito à c o n d i ç ã o humana.

De outra parte, é t a m b é m muito importante observar-se o fato de que, ao atuar em uma

ins t i tu ição, o psicólogo, ao con t r á r io da p r á t i c a isolada de consul tór io , tem que ter bastante

claros os limites institucionais de sua a t u a ç ã o . N a ins t i tu ição o atendimento d e v e r á ser nor­

teado a par t i r dos pr inc íp ios institucionais. 1 9 Esse aspecto é, por assim dizer, u m dos deter­

minantes que mais contribuem para que muitos trabalhos n ã o sejam coroados de êxito na

ins t i tu ição hospitalar. R ibe i ro 2 0 pontua que o doente internado é, em síntese, o doente sobre

0 qual a ciência m é d i c a exacerba o seu positivismo, e pode af i rmar a t r anspos i ção da l inha

d e m a r c a t ó r i a da normalidade. Sua patologia reconhecida e classificada precisa ser tratada.

A o c o n t r á r i o do paciente do consul tór io que m a n t é m seu direito de o p ç ã o em aceitar ou n ã o

o tratamento e desobedecer à prescr ição , o doente acamado perde tudo. Sua vontade é apla­

cada; seus desejos, coibidos; sua intimidade, invadida; seu trabalho, proscrito; seu mundo de

relações, rompido. Ele deixa de ser sujeito. É apenas u m objeto da p rá t i ca médico-hospi ta la r ,

suspensa sua individualidade, transformado em mais u m caso a ser contabilizado. 2 1

Esse aspecto inerente à in s t i t uc iona l i zação do paciente enfeixa u m dimensionamento

de a b r a n g ê n c i a de i n t e r v e n ç ã o do ps icó logo rumo à h u m a n i z a ç ã o do hospital em seus

aspectos mais profundos e verdadeiros. A Psicologia Hospitalar n ã o pode igualmente per­

der o p a r â m e t r o do significado de adoecer em nossa sociedade, eminentemente marcado

19 - No caso de d i v e r g ê n c i a dos pr inc íp ios e preceitos da ins t i tu ição onde o p s i c ó l o g o desenvolve sua a t u a ç ã o , po­

derá haver um trabalho de direcionamento de t r a n s f o r m a ç ã o desses pr inc íp ios . A t r a n s f o r m a ç ã o da realidade

institucional, muitas vezes, pode ser determinante de uma r e f o r m u l a ç ã o rumo à própr ia h u m a n i z a ç ã o da

ins t i tu ição . O que n ã o pode ocorrer é, diante da d i s c o r d â n c i a , negar-se os pr inc íp ios institucionais e tentar a

e f e t ivação de um trabalho sem levar em conta tais especificidades.

'20 - Ribeiro, H .P . 0 Hospital: História e Crise. S ã o Paulo: Cortez , 1983. 21 - Ibid. Op. cit.

12

( ) l \ i< o l < ) ( | ( ) no I l o sp i ta l

i ie l i i a s p e c r i o pragmático de produção mercantilista. Ou nas palavras de Pitta, o adoecer nela sociedade c, consequentemente, deixai de produzir e, portarão, de ser; é vergonhoso; logo, deve ser

ocultado e excluído, até porque dificulta que outros, familiares e amigos, também produzam. 0 hospital

perfiz este papel, recuperando quando possível e devolvendo sempre, com ou sem culpa, o doente à sua

situarão anterior. Se um acidente de percurso acontece, administra o evento desmoralizador, deixando que

a mito da continuidade da produção transcorra silenciosa e discretamente A i n t e r v e n ç ã o do psicólogo

nesse sentido n ã o pode prescindir de tais questionamentos com o risco de tornar-se algo

desprovido da profundidade necessá r i a para a b r a ç a r a verdadeira essência do sofrimento

do paciente hospitalizado. E a p r ó p r i a d i r e ç ã o c o n t e m p o r â n e a de desosp i t a l i zação do pa­

ciente tem no ps icólogo u m de seus grandes aliados na medida em que p o d e r á depender

desse profissional uma ava l iação mais precisa sobre as condições emocionais desse paciente.

N ã o se pode, no entanto, perder o p a r â m e t r o de que a psicologia deve se al iar a outras

forças transformadoras para n ã o se incorrer em meramente ilusionistas. O u nas palavras

de Ribe i ro : 2 3 há, no entanto, vários fatores que favorecem a desospitalização, além daqueles apontados

séculos antes. 0 intervencionismo e a onipotência da medicina são olhados com maiores reservas. Cada vez

mais é contestada por doentes, familiares, instituições seguradoras e pelo Estado a abusiva utilização dos

recursos tecnológicos hospitalares. Novos conhecimentos nas áreas da fisioterapia, propedêutica e terapêutica

vêm permitindo diagnósticos e tratamentos que tornam prescindível a intervenção ou a encurtam.

A Psicologia Hospitalar n ã o pode se colocar dentro do hospital como força isolada solitária

sem contar com outros determinantes para a t ingir seus preceitos bás icos . A h u m a n i z a ç ã o

do hospital necessariamente passa por t r an s fo rmações da ins t i tu ição hospitalar como u m

todo e evidentemente pela p r ó p r i a t r a n s f o r m a ç ã o social. O psicólogo, assim, n ã o pode ser

u m profissional que despreze tais var iáve is com o risco de tornar-se alijado do processo

de t r a n s f o r m a ç ã o social.

O u ainda, o que é pior, ficar restrito a t eo r i zações que isolam e a tomizam o paciente

de conce i tuações e conflitos sociais mais amplos. O hospital, assim como toda e qualquer

ins t i tu ição , reproduz as con t r ad i ções sociais, e toda e qualquer i n t e r v e n ç ã o insti tucional

n ã o pode prescindir de tais p r inc íp ios .

O ps icólogo reveste-se de u m instrumental mui to poderoso no processo de humaniza­

ç ã o do hospital na medida em que traz em seu bojo de a t u a ç ã o a c o n d i ç ã o de aná l i s e das

re lações interpessoais. A p r ó p r i a c o n t r i b u i ç ã o da psicologia para clarear determinadas

22 - Pitta, A . Hospital, Dor e Morte como Oficio. S ã o Paulo: Hucitec, 1990.

2 3 - 0 Hospital: História e Crise. Op. cit.

13

Page 14: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

P i i c o l o g i a H o s p i t . i l . i i

manifestações de soma t ização c , i g u a l m e n t e , dec i s i va p a r a l a / c r c o m < | i i<- seu l u g a r na

e q u i p e de saúde da instituição h o s p i t a l a r esteja a s s egurado . A s somati/.açòes c a d a v e v

m a i s são acei tas n o b o j o das intervenções médicas e a a luação d o psicólogo nesse sent ido

é d e t e r m i n a n t e de u m a n o v a p e r f o r m a n c e n a própria relação médieo-paciente. E notória

t a m b é m a ev idênc ia c a d a vez m a i o r d e q u e m u i t a s p a t o l o g i a s têm seu q u a d r o c l ín ico

a g r a v a d o a p a r t i r de compl icações e m o c i o n a i s d o pac i en t e . I n t e r v i r nesse p o n t e a m e n t n

é o u t r a p e r f o r m a n c e que faz d a p s i c o l o g i a u m a força m o t r i z até m e s m o n o diagnóst ico e

compreensão de pa t o l o g i a s p a r a as qua i s a própria M e d i c i n a não t e m expl icação abso lu ta .

A s s i m , não se p o d e negar , p o r e x e m p l o , a importância das variáveis e m o c i o n a i s e m u m

q u a d r o d i a g n o s t i c a d o de câncer o u de a l g u m a c a r d i o p a t i a . C o m o também é inegável a

presença de d e t e r m i n a n t e s e m o c i o n a i s q u a n d o a b o r d a d a s p a t o l o g i a s não d i a g n o s t i c a d a s

c o m precisão... até m e s m o pe l a f a l t a de s i n t o m a s específicos e v a r i a d o s . P odemos i n c l u i r

nesse r o l aqueles casos e m que o pac i en t e que ixa-se o r a de ce fa le ia , o r a de náuseas, o r a de

comiseração e s t o m a c a l etc. O u a i n d a daque les casos e m que o pac i en t e ap resen ta d iversos

s i n t o m a s c o n c o m i t a n t e s a d iversas pa t o l o g i a s s em, n o e n t a n t o , ap r e s en ta r ta is pa t o l o g i a s .

O s exames clínicos nesses casos não c o n s e g u e m fazer u m diagnóst ico p rec i so e abso lu to ,

po i s a própr ia alternância de s i n t om a s d o pac i en t e é a l g o apenas d i a g n o s t i c a d o q u a n d o se

t e n t a c o m p r e e n d e r , a lém dos s i n t o m a s , a d o r d ' a l m a que a c o m e t e ta is pac i en tes .

Nesse s en t ido , é in teressante o b s e r v a r que o avanço d a m e d i c i n a , c o m t o d o o seu apa ­

r a t o tecnológico, não consegue p r e s c i n d i r d o psicólogo p e l a sua condição de escuta das

manifestações d ' a l m a h u m a n a , imperceptíveis à própria t e c n o l o g i a m o d e r n a .

Considerações Finais

Se é v e r d a d e i r o q u e o psicólogo c o n s e g u i u alçar voos r u m o a u m p r o j e t o d i g n i f i c a n t e de

Ps i co log ia H o s p i t a l a r , é i g u a l m e n t e r e a l q u e u m l o n g o c a m i n h o a i n d a resta a ser t r i l h a d o .

E tr i lhá- lo ex ig i rá d o ps icó logo u m a p e r f o r m a n c e c a d a vez m a i s a m p l a n o s e n t i d o de

a b a r c a r as necessidades d a hospital ização e dos p ro f i s s i ona i s t o t a l m e n t e e n v o l v i d o s nas

e n t r a n h a s hosp i t a l a r es . A Ps i co log ia H o s p i t a l a r é r e a l i d a d e que , e m b o r a a i n d a necessite

de b u r i l a m e n t o , aperfe içoamento e m u i t a s buscas, será, c e r t a m e n t e , a m a i s r i c a das a l t e r ­

nâncias d a Ps ico log ia . Será, a i n d a , a m a i s c r i a t i v a das manifestações clínicas d e n t r o não

só d a r e a l i d a d e h o s p i t a l a r , c o m o t ambém das l ides académicas, que , ao a s s u m i r e m - n a ,

assumirão i g u a l m e n t e u m c o m p r o m i s s o c o m o própr io f u t u r o de t o d a u m a geração de

pro f i s s i ona i s . Ps i co l og ia H o s p i t a l a r , s o n h o t o r n a d o r e a l i d a d e a p a r t i r d a necess idade de

humanização d o h o s p i t a l .

1 4

De Como o Saber Também é Amor

Valdemar Augusto Angerami - Camon

Introdução

Este t r a b a l h o r e t r a t a o d e s e n v o l v i m e n t o d a P s i c o l o g i a H o s p i t a l a r n o B r a s i l p e l a descrição

d o r e l a c i o n a m e n t o pessoal c o m a psicóloga D r a . M a t h i l d e N e d e r , u m a das p e r s o n a l i ­

dades que m a i s contr ibuíram p a r a a implantação e sistematização desse c a m p o de atuação

d o psicólogo. Pelas reminiscências desse r e l a c i o n a m e n t o e m e r g e m as q u a l i d a d e s pessoais

dessa d e s b r a v a d o r a que c e r t a m e n t e contr ibuíram p a r a que e la assumisse a l iderança q u e

exerce n o c a m p o d a Ps i co l og i a d a Saúde, u m interesse e m aco lhe r , a lém d a c a p a c i d a d e

de l i m i t e s d e f o r m a c o n c i l i a d o r a e c o n s t r u t i v a , sua l o n g a exper iência académica e m que

inúmeros t r a b a l h o s n o c a m p o d a saúde e n c o n t r a m or ientação e, finalmente, sua modés­

t i a , q u e não i n i b e o c r e s c i m e n t o dos pro f i s s i ona i s q u e n e l a se e s p e l h a m . O a p o n t a m e n t o

d o v a l o r d a D r a . M a t h i l d e N e d e r se faz necessário p o r q u e , além de r e t o m a r a história d a

conf iguração d o c a m p o d a Ps i c o l o g i a H o s p i t a l a r , t e n t a r e p a r a r o r e g i s t r o d e s i g u a l q u e

existe sobre sua influência, j á que , o c u p a d a c o m a prática cl ínica e académica p i o n e i r a e m

Ps i co log ia H o s p i t a l a r , Psicossomática e T e r a p i a F a m i l i a r , r e ssen t imo-nos p o r e x i s t i r p o u c a

produção esc r i t a e m seu n o m e até o m o m e n t o .

U m t r a b a l h o sobre Ps i co l og ia H o s p i t a l a r e suas condições e s t r u t u r a i s f o i d e i x a d o de

l a d o pe l o afã de escrever o q u e ser ia m a i s in te ressante e m u i t o m a i s i n o v a d o r - escrever

sobre u m a das m a i o r e s mes t ras dessa área e f on te d e i m e n s a t e r n u r a e g ene ros idade .

E e is-me a s s im , n o v a m e n t e , e sc revendo sobre M a t h i l d e Nede r .

M a i s u m a vez h o m e n a g e i o nossa m e s t r a c o m esse p u n h a d o de l e t ras , l i n h a s e parágrafos

t r a n s f o r m a d o s e m capítulo de l i v r o .

Page 15: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

I \ l < n l o i . i . l l l . » . . | , l l . , l , „

riste t r a b a l h o c u m soneto de .11 m u , n i n . i e legia da a l m a pa ra d e c a n t a r u m a das ma i s b r i ­

l han tes psicólogas b ras i l e i r a s , s e g u r a m e n t e u m a das m a i s q u e r i d a s e m nossa r e a l i dade .

E s imp les , sem o u t r a preocupação que apenas e tão somen te m o s t r a r o u t r a M a t h i l d e

N e d e r aos o lhos de seus a d m i r a d o r e s , pessoa q u e se m o s t r a de u m a generos idade ímpar e

que , n o e n t a n t o , p oucos têm o pr iv i lég io de c o n h e c e r e c onv i v e r . Sua trajetória p ro f i s s i ona l

lói d e s c r i t a e m l i v r o a n t e r i o r , 1 n o q u a l seu p i o n e i r i s m o está d e t a l h a d a m e n t e n a r r a d o , c o n -

f i g u r a n d o - s e ass im n a v e r d a d e i r a história d a prática d a p s i c o l o g i a h o s p i t a l a r n o B r a s i l .

O o b j e t i v o a q u i é m o s t r a r o u t r a figura, d i s t a n t e d o a c a d e m i c i s m o e d a v ivência hos­

p i t a l a r . U m a M a t h i l d e N e d e r q u e t i v e o pr iv i l ég io de c o n h e c e r e de c o n v i v e r . E a p a r t i r

de convivências c o m o essa é que t e n h o ce r t eza de que se t r a t a de a lguém m u i t o espec ia l ,

po is t a l conv ív io só m e fez crescer c o m o pessoa e m todos os sent idos d a m i n h a experiência

h u m a n a . N ã o é m i n h a pretensão esgotar os de ta lhes que pos sam ser atribuídos à M a t h i l d e ,

t a m p o u c o c o l o c a r - m e c o m o o único q u e os conhecesse e que , p o r t a n t o , se não es t i v e r em

a q u i r e g i s t r ados , não e x i s t e m . T r a t a - s e apenas de u m a p e q u e n a descrição, r e d u z i d a e m

seu espaço de esc r i t a , e es tabe l ec ida e m u m t e m p o m u i t o c u r t o e m razão d a nossa própria

d i f i c u l d a d e de t an t o s e demas i ados c o m p r o m i s s o s p ro f i s s i ona i s . E n f i m , u m t r a b a l h o e m

que o a m o r é b a l i z a m e n t o p r i n c i p a l , e o afeto de seu ser é a e s t r u t u r a m a i o r de seu b o j o e

de seu c o m p r o m i s s o e d i t o r i a l .

Doces Reminiscências

A i n d a e r a académico de p s i c o l o g i a , e e la notória pro fessora n a PUC-SP , q u a n d o o u v i f a l a r

d e M a t h i l d e N e d e r p e l a p r i m e i r a vez. Nesse pe r í odo não p o d i a i m a g i n a r q u e p o d e r i a

c o n v i v e r c o m e la de m o d o tão es t re i to , p a r t i l h a n d o m o m e n t o s dos m a i s d i f e rentes ma t i z e s .

A i n d a académico , c o m e c e i a d e s p e r t a r m e u interesse p a r a a área h o s p i t a l a r e p a r a t odos

os l ados p a r a os q u a i s m e d i r e c i o n a v a , a proeminênc ia m a i o r de referência teórico-prática

s empre e r a M a t h i l d e Nede r .

Nesse m o m e n t o e la e r a p a r a m i m apenas u m a figura m i t i f i c a d a p e l o seu d e s envo l v i ­

m e n t o académico e p o r sua p e r f o r m a n c e p r o f i s s i ona l . A l g u é m q u e v e n e r a m o s , m a s q u e

acreditamos ser d i s t a n t e daque l es q u e apenas estão c omeçando a d a r os p r i m e i r o s passos

e m suas trajetórias p ro f i s s i ona i s . Fr isa-se o t e r m o " a c r e d i t a m o s " , po i s essa é a v e r d a d e i r a

def inição p a r a expressar a r e d o m a e m q u e m u i t o s a c r e d i t a m q u e M a t h i l d e N e d e r se e n -

I - A n g e r a m i , V . A . Tendências em Psicologia Hospitalar. S ã o P a u l o : C e n g a g e L e a r n i n g , 2 0 0 4 .

1 6

I ),• ( I I I I I I I 11 S u b i u l . u n h o m o A m o i

1 i i i i i i .1 A I H n 11ii .11 , n i , n . i n i . i i i i i I . I i l . i s vezes, o c o r r e e m nosso imag inár io e n a d a t e m a ve r

1 u n i .1 própria r e a l i d a d e dc nossos personagens . N o caso de M a t h i l d e Nede r , é isso o que

t t l i i i s s u r p r e e n d e q u a n d o a c o n h e c e m o s e m sua i n t i m i d a d e .

A n t e r m i n a r a f a cu l dade i n i c i e i u m a a t i v i d a d e c o m pac ientes q u e t e n t a v a m suicídio

r e r a m a t e n d i d o s n o P r o n t o - S o c o r r o d o I n s t i t u t o C e n t r a l d o H o s p i t a l das C l ín icas d a

r M t ISI* f a c u l d a d e de M e d i c i n a d a U n i v e r s i d a d e dc São Pau l o . D e p o i s de a l g u m t e m p o

nessa a t i v i d a d e , h o u v e u m a uni f icação dos d i ve rsos serviços de p s i c o l o g i a ex is tentes n o

I l o sp i t a l das Cl ínicas, que estava sendo c o o r d e n a d a p o r M a t h i l d e Ned e r . F o i aí o nosso

p r i m e i r o c o n t a t o .

E desde esse p r i m e i r o e n c o n t r o não m a i s nos l a r g a m o s . A p r e n d i a respeitá-la e admirá-la

p r i n c i p a l m e n t e p e l a h u m i l d a d e d e m o n s t r a d a e m seus atos e até m e s m o gestos t r i v i a i s .

Fui p r o c u r a d o p o r ela p a r a ser av i sado das mudanças que es tavam o c o r r e n d o naque le

m o m e n t o n o H o s p i t a l das Clínicas. A m i n h a p r i m e i r a reação fo i a de que seria s u m a r i a m e n t e

escorraçado d o h o s p i t a l , po is não faz ia p a r t e de seu g r u p o de t r a b a l h o . E c o m esse estado de

espírito f u i encontrá-la. E u , u m p r i n c i p i a n t e n a r e a l i d a d e hosp i t a l a r , e m b o r a coordenasse

u m t r a b a l h o que começava a d e s p o n t a r e t e r bas tan te projeção e m nível teórico-prático, e

M a t h i l d e Neder , a m a i o r autor idade e m Psicologia H o s p i t a l a r no Bras i l , sua p r i n c i p a l p i one i ra ,

e que nesse m o m e n t o r e f o r m u l a v a os serviços de ps i co l og ia d a q u e l a u n i d a d e hosp i t a l a r .

S u r p r e e n d e n t e m e n t e , q u a n d o a e n c o n t r e i , sua reação fo i tão a fe t i va e amis tosa que fiquei

s implesmente atónito, c omp l e t amen t e sem reação, po is h a v i a m e p r e p a r a d o p a r a u m encon t r o

b e l i g e r an t e , d o q u a l c e r t a m e n t e r e s u l t a r i a u m g r a n d e número de pe rdas irreparáveis. M a s

não, lá estava M a t h i l d e Nede r , c o m aque le so r r i so a m i g o e que i n i c i a l m e n t e fez questão de

r e v e r enc i a r o nosso t r a b a l h o , f a z endo g randes e log ios às a t i v i dades d o g r u p o .

S u r p r e s o fiquei e su rp r eso p e r m a n e c i p o r longos m o m e n t o s , po is de fa to estava s imples ­

m e n t e sendo e l o g i a d o p e l a m a i o r a u t o r i d a d e n a r e a l i d a d e h o s p i t a l a r , e log ios esses q u e r e ­

p e r c u t i r a m tão p r a z e r o s a m e n t e e m m e u ser q u e não t i v e c o m o não m e e n c a n t a r p o r e la .

Fa lamos , r i m o s , acer tamos c o m o seria nossa participação nessa reformulação e, p r i n c i p a l ­

mente , c omo seria a transição do nosso mode l o de atuação p a r a o que estava sendo i m p l a n t a d o

naque le m o m e n t o . T u d o m u i t o s imples , m u i t o n a t u r a l , de t a l f o r m a que me sent i também u m

g r a n d e n o m e d a Ps i co log ia H o s p i t a l a r que d i s c u t i a c o m o u t r o g r a n d e n o m e d a área.

C o r r i a então o a n o de 1982. Nessa ocasião, e u t ambém c o o r d e n a v a o c u r s o de espe­

c ia l ização e m Ps i co l og ia H o s p i t a l a r d o I n s t i t u t o Sedes Sap i en t i a e , e a c o n v i d e i p a r a f a l a r

aos nossos a l u n o s sobre sua trajetória p r o f i s s i ona l . E d u r a n t e m u i t o s anos essa r o t i n a fo i

i n a l t e r a d a , c o m sua fa la aos a l u n o s sobre a m a n e i r a c o m o h a v i a se des envo l v i do n a prá­

t i c a h o s p i t a l a r , c o m o h a v i a e s t r u t u r a d o sua atuação p r o f i s s i o n a l d e n t r o dessa r e a l i d a d e .

1 7

Page 16: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

Psi< <) l ( ) (| i . l U ( ) S | > i l . l l . l l

1 )a m e s m a f o r m a , também passei a l a l a r p a r a os a l u n o s dos cursos de a p c r l c i ç o a m e n t i M I M

u n i d a d e de p s i c o l o g i a h o s p i t a l a r d o H o s p i t a l das Cl ínicas d a F M l FSP;

Outros Tempos

E m 1 9 8 8 o c o r r e u , e m R e c i f e / O l i n d a , o I I I E n c o n t r o N a c i o n a l d e Psicólogos d a A r c a

H o s p i t a l a r . L e v e i m e u filho m a i s v e l h o , E v a n d r o , n a ocasião c o m 8 anos de i dade , para q u e conhecesse aqueles can tos tão q u e r i d o s .

Nessa v i a g e m , M a t h i l d e c o n h e c e u E v a n d r o e passou a fazer p a r t e d a nossa família.

P o s t e r i o r m e n t e c o n h e c e u a m i n h a f i l h a , P a u l a , e i g u a l m e n t e não m a i s h o u v e r u p t u r a no

e s t r e i t amen to de nossas relações. A s s i m , bas tava t e r a l g u m congresso f o r a de São P a u l o que

i m e d i a t a m e n t e M a t h i l d e q u e r i a saber q u a l dos meus filhos i r i a c o m i g o e se p r e p a r a v a para c u r t i - l o s n o v e r d a d e i r o sen t ido d o t e r m o . E não só e m congressos, po i s M a t h i l d e passou

a ser figura obrigatór ia nas festas q u e r e a l i z a m o s e m casa, b e m c o m o e m m u i t o s a lmoços

d o m i n i c a i s . E v a n d r o ho je é a r t i s t a plástico e u m a de suas ob ras m a i s q u e r i d a s presenteou

à M a t h i l d e c o m o f o r m a de r e v e r e n c i a r o a fe to q u e t odos t emos p o r e la .

M a t h i l d e d e i x o u então de ser u m a a m i g a q u e r i d a p a r a t o r n a r - s e a lguém d a família,

alguém cu ja presença é indispensável e m todas as ocasiões especiais e até m e s m o r o t i n e i r a s .

U m a presença f o r t e , m a r c a n t e e que , antes de q u a l q u e r o u t r a característica, t r a n s m i t e u m a

h u m i l d a d e que t o r n a m u i t o difícil i d e n t i f i c a r n a sua figura s imples u m a das ma i o r e s perso ­

na l idades n a área d a ps i co log ia . É difícil c ons t a t a r que aque l a pessoa de r i so m e i g o e o l h a r

doce e suave é i g u a l m e n t e a p r e c u r s o r a t a n t o d a Ps ico log ia H o s p i t a l a r c o m o até m e s m o da

psicossomática n o B r a s i l . É difícil estabelecer o p a r a l e l o de que aque l a m u l h e r sempre tão

d ispos ta a o u v i r os ma i s d i ferentes in t e r l o cu to r es é, sem s o m b r a de dúvida, u m a das ma i s n o ­

táveis professoras de nossa r ea l i dade académica, alguém que não sabe de p r o n t o o número de

orientações que possu i n a a tua l i dade . E que seguramente dependerá de u m a g r a n d e pesquisa

bibliográfica p a r a se a p u r a r o número de teses académicas escr i tas sob sua orientação. M a s

c e r t a m e n t e não será de sua b o c a que o u v i r e m o s q u a l q u e r eloquência sobre a m a g n i t u d e dos

t r a b a l h o s que o r i e n t o u ao l ongo de sua trajetória p ro f i s s i ona l . C o m o também, se não fosse

o t r a b a l h o q u e o r g a n i z a m o s 2 r e l a t a n d o sua trajetória p ro f i s s i ona l n a r e a l i d a d e hosp i t a l a r ,

c e r t a m e n t e seus feitos e conqu is tas se p e r d e r i a m ao l ongo d o t e m p o e d o espaço, po is e la não

ser ia capaz de registrá-los o u até m e s m o de narrá-los de m o d o s i s t emat i zado .

2 - Tendências em Psicologia Hospitalar. Op. cit.

1 8

I V I o i n n o S . I I H I I l . i m l m i n «'. A m i n

A l u a h u m i l d a d e a t r o p e l a a g r a n d i o s i d a d e dc suas real izações, po is , p o r m a i s imr í -

\i I (|ue possa parecer , n e m m e s m o suas p r i m e i r a s publicações ela m a n t e v e g u a r d a d a s c

i M I I M i V . M l a s . E isso posso a f i r m a r sem t i t u b e i o , po is p a r a escrever a h i s t o r i a de sua I r a j e -

l u i i . i p ro f i s s i ona l t i ve de l a p i d a r m u i t o m a t e r i a l q u e se a c h a v a m i s t u r a d o a ou t r a s l au ta s

p i i l i l u ações, b e m c o m o g a r i m p a r t r a b a l h o s q u e se a c h a v a m p e r d i d o s nos lugares m a i s

I I Iuu.mináve is . Para se t e r u m a i d e i a d a d imensão dessas colocações, c i t o u m a ocasião, pc I I

Volta de I 9 9 l , q u a n d o estava t r a b a l h a n d o n a descrição dc sua trajetória e prec isava dc u m a

coi i le iência que ela h a v i a p r o f e r i d o n o início de seu d e s e m p e n h o p ro f i s s i ona l . Fu i até S I I . I

i usa, c depo i s de m u i t o p r o c u r a r e n a d a e n c o n t r a r , l eve i -a p a r a assist ir a u m c o m c i t o que

p.n , i m i m e ra imperdível . Q u a n d o v o l t a m o s à sua casa, p r o c u r a m o s p o r t oda I I I . K I I Ugada

. i h f i n a l m e n t e encontrá-la.

E ass im fo i d u r a n t e t o d a a e laboração desse t r a b a l h o , u m incessante g a r i m p o m> q u a l

cada peça e n c o n t r a d a e ra f a r t a m e n t e c o m e m o r a d a pe las d i f i c u l d a d e s apresentadas . E n a u

pense o l e i t o r de m o d o p r e c i p i t a d o que isso possa ser evidência de u m a desorganizaç&i 111<

sua p a r t e , po is o u t r o s t r a b a l h o s indispensáveis à sua prática p ro f i s s i ona l estão d e v i d a i i i c n i i

g u a r d a d o s e c o m fácil acesso e m seu escritório de t r a b a l h o . O r e g i s t r o d c suas a t i v i d a d e i

l i ii d e i x a d o de l a d o p o r sua característica de h u m i l d a d e , que a i m p e d e dc se r c c o n h e i n

c o m o a lguém cujos passos são de e x t r e m a importânc ia p a r a a própr ia história da p i i i O

l o g i a n o B r a s i l .

E m u m a ocasião ela s imp lesmente f a l ou : " Q u e m v a i se interessar p o r u m a conferem l l que p r o f e r i n o final(fim) dos anos 1950?" E , n a ve rdade , faz ia referência a u m a conferem ia que reg i s t ra a p r i m e i r a participação de u m psicólogo e m u m evento o r g a n i z a d o por médii i il

no H o s p i t a l das Clínicas d a F M U S P e no q u a l es tavam reg is t rados os seus primeiros passi i

b e m c o m o o nível de aceitação ao seu t r a b a l h o p o r ou t r o s pro f iss ionais d a saúde. O u de o u i r a

situação e m que s implesmente f a l ou : " N ã o sei p a r a que você está interessado e m saber os de

talhes do m e u t r a b a l h o n o h o s p i t a l " . E novamen t e estávamos d i an t e de u m a situação em l [UC

tais deta lhes c o l o c a v a m e m evidência u m p o u c o d a história d a ps ico log ia no Brasil,

A t é m e s m o u m a fo to dc u m congresso r e a l i z a d o n a E u r o p a , q u a n d o a i n d a era j o v e m ,

e que t i n h a g r a n d e s pe r sonagens d a p s i c o l o g i a m u n d i a l , c o m o M e l a i n e K l e i n e Ernest Becker , e n t r e o u t r o s , só é m o s t r a d a depo i s de m u i t a insistência. D o contrár io , g u a o l . u l . i

está, g u a r d a d a permanecerá . I m a g i n o de o u t r a p a r t e q u e se essa fo to pertencesse a m u

meros o u t r o s co legas, e s t a r i a e m des taque e m suas salas de v i s i tas , c o m o u m dos ma i o r e s

t r i u n f o s d a própr ia trajetória p r o f i s s i o n a l .

U m a das faces m a i s m a r c a n t e s de sua generos idade é o m o d o c o m o aco lhe colegas de

ou t ros Estados , hospedando -os e m sua própria residência. A s s i m , é m u i t o c o m u m encontrar

1 9

Page 17: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

(>l( >< ]1.1 I l o r . p i t . t l . i l

colegas dos m a i s d i f e rentes can tos q ue , ao passarem p o r São Paulo , são r e cepc i onados po i

M a t h i l d e , t e n d o então e m sua residência o l o ca l de referência c proteção. E não pense qu i

se t r a t a apenas de notórios de o u t r a s l o ca l i dades , m a s de q u a l q u e r co lega , académico q m

seja, e q u e s i m p l e s m e n t e necessite de u m a acomodação p o r esses can tos . É c o m o já u m i

de u m co lega de M a c e i ó que lá estava h os pe da do : " A l é m de t u d o , a i n d a t e n h o o pr iv i l eg ie >

de c o n v i v e r c o m o d i a a d i a de M a t h i l d e N e d e r " .

M a t h i l d e , e m sua gene ros idade , g u a r d a hábitos de e x t r e m a va lor i zação d o convív io

f a m i l i a r . E f r e q u e n t e ouv i r - s e d e l a sobre a necessidade de i r até o i n t e r i o r p a r a c u i d a r de

pa ren tes . E l a t ambém é m u i t o r e l i g i o sa , e u m de nossos passeios f r equentes é levá-la pa ra

assist i r à m i ssa d o c a n t o g r e g o r i a n o n o M o s t e i r o de São B e n t o , n o c e n t r o histórico de São

P a u l o . E de q u a l q u e r m a n e i r a e la é s empre g r a t a a q u a l q u e r gesto q u e façamos e m seu

benefício. T u d o é m u i t o c o n s i d e r a d o e não há ação e m q u e não se d e r r a m e e m ag radec i ­

m e n t o s q u a n d o se sente a c a r i n h a d a pe los nossos gestos.

S e m m e d o de e r r o é possível a f i r m a r q u e o g r a n d e e, p o r ass im d i z e r , o seu p r i n c i p a l

de fe i to é a sua escassez de publicações. Pe la m a g n i t u d e de sua v ivência é u m a p e r d a i r r e ­

parável u m número tão r e d u z i d o de t r a b a l h o s académicos. E m b o r a esteja c o n s t a n t e m e n t e

o r i e n t a n d o as m a i s d i f e rentes dissertações e teses académicas, c e r t a m e n t e ter íamos u m a

g r a n d e contribuição se e la dedicasse u m t e m p o de suas a t i v i d a d e s p a r a a publ icação de

sua vas ta exper iência p r o f i s s i on a l . M a s os e n s i n a m e n t o s q u e e la nos l ega a c a d a e n c o n t r o

nos t o r n a m responsáveis p e l a sua difusão. E também não p o d e m o s p e r d e r de v i s t a que dois

dos m a i o r e s pensadores d a h u m a n i d a d e - C r i s t o e Sócrates - n a d a p u b l i c a r a m , c h e g a n d o

suas ide ias e e n s i n a m e n t o s até os d i a s de ho je graças àqueles d e n t r e os seus discípulos que

r e c o l h e r a m u m vas to m a t e r i a l de seus e n s i n a m e n t o s e os p u b l i c a r a m . E ass im , o saber p o d e

se t r a n s f o r m a r e m u m a das m a i s be las manifestações d o amor . . .

S e r r a d a C a n t a r e i r a , e m u m a manhã de i n v e r n o .

2 0

Atendimento Psicológico no Centro de Terapia Intensiva

Ricardo Werner Sebastiani

3

Introdução

OC T I t r a z c o m o sério estereótipo v i n c u l a d o à sua ide ia a i m a g e m de so f r imen to e t(

i m i n e n t e . N a v e rdade , p o r ser u m a u n i d a d e n o hosp i t a l que se ded i ca a o a t c n d i m e n t i i

i le casos e m que o c u i d a d o in t ens i vo e a g r a v i d a d e dos p r o b l e m a s e x i g e m sei \< is c ons t an t e !

e espec ia l i zados , esse t i p o de i m a g e m acaba t e n d o u m b o m c u n h o de r ea l i dade .

A s características intrínsecas ao C T I , c o m o a r o t i n a dc t r a b a l h o m a i s ace le rada , 11 c l i m a

c ons t an t e de apreensão, as situações de m o r t e i m i n e n t e , a c a b a m p o r e x a c e r b a r 0 estado

de "es t resse" e tensão q u e t a n t o o pac i en t e q u a n t o a e q u i p e v i v e m nas 24 horas d o d i a

Esses aspectos , s omados à d imensão i n d i v i d u a l d o s o f r i m e n t o d a pessoa nela in t e i n . i d . i ,

la is c o m o a d o r , o m e d o , a ans i edade , o i s o l a m e n t o d o m u n d o , t r a z e m , sem dúvida, vár io i

e lõrtes fa tores psicológicos q u e i n t e r a t u a m de m a n e i r a m u i t a s vezes g r a v e p o r sobre 0

manifestação orgânica d a e n f e r m i d a d e que a pessoa possu i .

P a r a t a n t o , d iscorrer-se-á s o b r e os a spec t o s m a i s i m p o r t a n t e s desse m o m e n t o da

história d o indiv íduo, c omeçando p o r d e s m i s t i f i c a r o q u e se a c r e d i t a ser u m ( l e n t r o de

T e r a p i a I n t e n s i v a .

Desmistificando o CTI

O C T I é m a i s u m dos f ru t o s d o extraordinár io avanço que as ciências médicas c sua te< n< i

l o g i a a t i n g i r a m n o século X X . O b j e t i v a d o p a r a u m t r a t a m e n t o i n t e n s i v o d o e n f e r m o , vei( >

se e v i d e n c i a n d o c o m o u m a u n i d a d e indispensável p a r a o t r a t a m e n t o de doentes graves.

Page 18: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

l > l l l l | l . l H ( ) S | ) i t . l l . l l

Equipamentos sofisticados, pessoal técnico qualificado, atenção constante, 21 horas diái iu dc medicações, exames , lesies, letisào, r o t i n a , v i s a n d o a u m só fa tor : a pessoa eniérma.

N ã o obs t an t e essas conotações c l o d o a p a r a t o científico c tecnológico, observa-sc u m

l a l o q u e se repe te nas centenas de C T I s espa lhados pe l o nosso País.

E x i s t e , n a m a i o r i a das pessoas, u m estereótipo b a s t a n t e a r r a i g a d o , a ssoc i ado o u c u

l o c a d o c o m o s inón imo de C T I : A M O R T E I M I N E N T E . O fa to r m o r t e , c o n t r o v e r t i d a

r e a l i d a d e de nossa existência d e n t r o d a c u l t u r a o c i d e n t a l , é, p o r p a r a d o x a l q u e pareça,

v i v i d o t o d o o t e m p o n a r o t i n a d iár ia d o C T I , e x i g i n d o das pessoas q u e ne le t r a b a l h a m e

l u t a m p e l a v i d a u m p o s i c i o n a m e n t o m u i t o d u r o p e r a n t e este, m u i t a s vezes o b r i g a n d o - a i

a r e fug i a r - s e e m u m u n i v e r s o r a c i o n a l i s t a p a r a a g u e n t a r a pressão e m o c i o n a l q u e isto

t u d o causa .

A história d a M e d i c i n a t r a z situações q u e se r e p e t e m c o m o passar dos séculos, sem­

p r e q u e s t i o n a n d o o f a t o r m o r t e e a impor tânc ia d a atenção a f e t i v a d o t e r a p e u t a d i a n t e

d o e n f e r m o .

Asc lépio , méd ico d a b a t a l h a de T ró i a (2), c i t a d o p o r H o m e r o e g l o r i f i c a d o depo i s c o m o

deus d a M e d i c i n a , p r e c o n i z a v a e m seus e n s i n a m e n t o s a importânc ia de u m a b o a a c o l h i d a

ao e n f e r m o , interessando-se p o r seu t o d o ; a m b i e n t e , interesses, família, c u l t u r a , motivações

e s i n t o m a s e r a m condições básicas p a r a sua recuperação.

F i r m a d o neste cód igo de respe i to à pessoa h u m a n a , l evanta-se então a necessidade i m i ­

nente de u m a ampl iação n a a b o r d a g e m à pessoa e n f e r m a , q u e b r a n d o a defesa r a c i o n a l e,

ao l a d o de la , v i v e n d o o c o n f l i t o en t r e v i d a e m o r t e . N ã o se t r a t a dc u m a e n t r e g a i m e d i a t a

a o s o f r i m e n t o , p o i s se c a i r i a então n o m e s m o p r i s m a e x t r e m i s t a d a rac ional ização, m a s

s i m de u m "es ta r c o m " e m q u e se p o d e , c o m o m e d i a d o r , a c o m p a n h a r a v i d a e a m o r t e ,

l u t a n d o p o r aque l a o u c o m p r e e n d e n d o , nesta, nossa l imitação, a b a n d o n a n d o a onipotência

q u e m u i t a s vezes nos assola c o m o u m d o m d i v i n o de " s e n h o r d a existência".

Tem-se , p o r t a n t o , c o m o ob j e to d a atenção d o psicólogo n o C T I , u m a tríade constituída

dc : pac i en t e , sua famíl ia e a própr ia e q u i p e de saúde, t odos e n v o l v i d o s n a m e s m a l u t a , m a s

c a d a u m c o m p o n d o u m dos ângulos desse processo.

O s o f r i m e n t o físico c e m o c i o n a l d o pac i en t e p rec i sa ser e n t e n d i d o c o m o co isa única,

po i s os do is aspectos que o c o n s t i t u e m i n t e r f e r e m u m sobre o o u t r o , c r i a n d o u m círculo

v i c i o so d o t i p o : a d o r a u m e n t a a tensão e o m e d o que , p o r sua vez, e x a c e r b a m a atenção d o

pac i en te à própria d o r que , a u m e n t a d a , g e ra m a i s tensão e m e d o , e ass im sucess ivamente

(9). Essa compreensão a juda o psicólogo a q u e b r a r esse círculo v i c i oso de f o r m a a t e n t a r

resgatar , c o m o pac i en t e , u m c a m i n h o de saída p a r a o s o f r i m e n t o , e m eme, de u m l a d o , as

m a n o b r a s médicas, m e d i c a m e n t o s , exames , introdução de apa r e lhos i n t r a e extracorpóreos

2 2

A t l i l l l l l l l l D I l t i i l ' ' . U i i l i i l | l i CI n u ( e l l l l i i c i e I . • r , 11 > I . I I n t l M l s i v . l

v.Hi i i ' s o m a i às d o psicólogo, I I I I C l i t vo rccc a inanileslaçài > dos medos c lantas ias d o p a c i e n -

h i I I I I I I I I . I sua part ic ipação i m t r a t a m e n t o , ouve e p o n d e r a sobre questões q u e o a f l i j a m

' . I I I I M I S I ia , desesperança, mudanças e s t r u t u r a i s na sua relação c o m a v i d a , e x p e c t a t i v a d a

l e e l e . ) , l o d o s e s s e s cslõrços v i s a m m a i s d o que a u m fim p u r o e s imples : v i s a m a u m

i . o i u u l i u dc e n f r e n t a m e n t o d a do r , d o s o f r i m e n t o , e e v e n t u a l m e n t e d a própr ia m o r t e , m a i s

< 111 - o menos s o f r i do possível.

N u m a s e pode esquecer q u e d o l a d o de f o r a d o C T I , n o c o r r e d o r , n a sa la d e espera,

• M l e u m a família i g u a l m e n t e a n g u s t i a d a e s o f r i da , q u e se sente i m p o t e n t e p a r a a j u d a r

l e u f a m i l i a r , q u e também se d e s o r g a n i z o u c o m a doença e q u e t ambém se assusta c o m o

cspee i ro d a m o r t e que m u i t a s vezes r o n d a seus p e n s a m e n t o s .

Essas pessoas também p r e c i s a m d a atenção d o psicólogo e c ons t i tuem-se e m u m a p o -

l e u i e força a f e t i va q u e p o d e e deve ser e n v o l v i d a n o t r a b a l h o c o m o pac i en t e , po is são os

i cp i e s en tan t e s p r i n c i p a i s de seus v ínculos c o m a v i d a e, não r a r o , u m a das p o u c a s fontes

de mot ivação que este t e m p a r a e n f r e n t a r o s o f r i m e n t o e a v i r t u a l i d a d e d a m o r t e .

Sabe-se m u i t o b e m q u e o p a l c o p r i n c i p a l d o t r a t a m e n t o n o C T I acon t ece n o p l a n o

biológico; a infecção sendo c o m b a t i d a pe los antibióticos, as falências dos s istemas sendo

01 impensadas p o r máquinas e fármacos, a v ig i lância d o f u n c i o n a m e n t o d o o r g a n i s m o fe i ta

I i i >r exames e testes l a b o r a t o r i a i s ; às vezes esse processo nos faz esquecer de q u e t u d o isso

t e m u m único o b j e t i v o : p r e s e r v a r a v i d a . E o q u e é essa v i d a senão esse i n t r i n c a d o s is tema

dc emoções , afetos, vínculos, mot ivações que s en t imos e m nosso c o r p o e de nossa a l m a ,

que acontece d e n t r o de u m a m b i e n t e q u e nos c r i a e c r i a m o s c h a m a d o famí l ia , r e l a c i o ­

n a m e n t o s , t r a b a l h o , m u n d o , en f im. . . ? É, p o r t a n t o , p e l a q u a l i d a d e desta v i d a que se l u t a ,

às vezes g a n h a n d o , às vezes p e r d e n d o . Nesse p o n t o a e q u i p e de saúde, q u e , antes de m a i s

n a d a , é t ambém c o m p o s t a de pessoas, v ivência n o seu c o t i d i a n o esse s i g n i f i c a d o de v i v e r c

de m o r r e r . O p r o f i s s i ona l de saúde não d e i x a de ser asso lado p o r s en t imen to s a m b i v a l e n t e s

de onipotência e impotência, a própr ia finitude que é d e n u n c i a d a a c a d a m o m e n t o , as ex­

pec ta t i vas de t odos ( família, pac i en t e , colegas...) são j ogadas sobre eles. P a r a s u p o r t a r isso,

m u i t a s vezes se r e f u g i a m e m suas defesas, o r a c i o n a l i s m o , o não e n v o l v i m e n t o , a própria

onipotência, m a s m e s m o ass im todos esses estímulos estão a l i , presentes n o seu d i a a d i a .

O psicólogo p o d e então a t u a r c o m o f a c i l i t a d o r d o f l u x o dessas emoções e reflexões, de tec­

t a r os focos de "estresse" , s i n a l i z a r q u a n d o suas defesas se e x a c e r b a r a m t a n t o , a p o n t o de

a l i e n a r e m - s e de si m e s m a s , de seus próprios s e n t i m e n t o s , e favorecer a compreensão de

sua onipotência (que é falsa).

Esse trinòmio merece atenção, merece respeito; o psicólogo o compõe sendo ao mesmo tempo

agente e pac iente de t u d o que se m e n c i o n o u a n t e r i o r m e n t e ; sua presença pode ser inestimável

2 3

Page 19: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

I \ ( i l o q i . i I l i i s p i t . l l . l l

nesse m o m e n t o , quase sempre c r o n i c a m e n t e erítiro, e c a b e também a ele estar atento não

ao o u t r o , mas a si mesmo , p a r a p o d e r a t u a r sempre que puder , respe i tando seus l imi tes .

Objetivos Gerais do Acompanhamento Psicológico no CTI

O presente t r a b a l h o v isa d i s c u t i r os aspectos psicológicos de pacientes submet idos a c i r u r g i a i

de g r ande po r t e , pós-operatório i m e d i a t o , b e m c o m o d i sco r re r sobre as reações emoc iona is de

o u t r o g r u p o de pac i entes (não cirúrgicos) d u r a n t e sua permanência n o C T I .

T e n d o isso c o m o m e t a de t r a b a l h o , buscar-se-á m o s t r a r a intervenção psicológica no

e n f e r m o , q u e p r o c u r a p o s s i b i l i t a r u m a d iminuição e/ou amenização das intercorrências

q u e pode rão v i r a c o m p l i c a r o u r e t a r d a r a recuperação e a reabil i tação de le .

Pa ra que se possa c o m p r e e n d e r c o m m a i s c l a r e za o processo psicofísico d o e n f e r m o , é de

e x t r e m a importância que sejam abo rdados os g r u p o s de fatores que intervêm de f o r m a d i r e ta

o u i n d i r e t a n a evolução d o q u a d r o psico-orgânico d o pac i en t e , c o m o será v i s t o a seguir .

O b s e r v a m o s q u e a situação d o pac i en t e não t e m somen t e o ângu lo de v i d a e m o r t e ,

m a s t ambém o s e n t i m e n t o de a b a n d o n o e d icotomit i zação, po i s é r e g r a c o m u m , n a m a i o r

p a r t e dos C T I s , a proibição das v i s i tas , e é " r e g r a " e m hosp i t a i s , p o r u m prováve l v íc io do

c o t i d i a n o , t r a t a r as pessoas c o m o s i n t o m a s , órgãos o u números (o " 2 0 2 A " , a "es te rose "

d o l e i t o 0 1 , o " n e u r o " d o 5 " andar . . . ) , r e s u l t a n d o n a despersonal ização, o q u e e v i d e n c i a a

importância d o t r a b a l h o d o psicólogo, r e ssa l t ando " o t e m p o e o interesse h u m a n o s " c o m o

p r e p o n d e r a n t e s p a r a o auxíl io n a recuperação a m p l a d a pessoa e n f e r m a .

P a r a t a n t o , o t r a b a l h o d o psicólogo h o s p i t a l a r baseia-se nos segu intes aspectos:

1. A t e n d e r i n t e g r a l m e n t e o pac i en t e e a sua famíl ia, c ons i d e rando - s e os parâmetros

de saúde d a Organ i z a ção M u n d i a l de Saúde (3):

a) t o t a l b e m - e s t a r b i ops i cossoc ia l d o pac i en t e ;

b) atenção pr imár ia , secundária, terciária à saúde.

L o g i c a m e n t e , u m a pessoa i n t e r n a d a n o C T I não t e m c o m o p r i n c i p a l necessidade a

atenção pr imária, mas a preocupação c o m a profilática de u m a orientação a d e q u a d a

antes d a a l t a ; u m p r e p a r o p a r a q u e as l imitações a d v i n d a s d a doença ( t an to físicas

q u a n t o psíquicas) não t r a g a m à pessoa s en t imen to s de i n u t i l i d a d e p a r a si e p a r a o

m u n d o são m u i t o i m p o r t a n t e s .

2. Desenvo l v e r as a t i v i dades sob u m a visão i n t e r d i s c i p l i n a r (médico, e n f e r m e i r a , assis­

tente s oc i a l , fisioterapeuta, b iomédico , n u t r i c i o n i s t a etc. ), baseadas n a integração

dos serviços de saúde v o l t a d o s p a r a o pac i en t e e sua famíl ia.

2 4

A l u i i i l l m n i i t o I ' M < c>lo<|i( D n o l « M i m < l o I m . i p i . t I n t m r . i v . i

I P o s s i b i l i t a r a c o m p r e e n s ã o e n 1 1 . i l . m i e t i t i ) d o s a s p e i t o s p s i c o l ó g i c o s (psicOgênil 0 1

n a s diferentes situações, t a i s c o m o :

. i quadros psicorreativos; b ) síndromes psicológicas;

c) distúrbios psicossomáticos;

d) q u a d r o s convers i vos ;

c) fantas ias mórbidas c angústia de m o r t e ;

F) ans i edade d i a n t e das internações (doenças, evolução, a l ta ) .

O Pac ien te C i r ú r g i c o 1

I r e a l m e n t e notáve l a q u a l i d a d e das reações dos p a c i e n t e s d i a n t e d a cirurgia. N e i H

silnação, as pessoas t e n d e m a m u d a r . E las se r e f a z em , r e f i n a m seu a u t o c o n t r o l e , delibera i l a m e n t e l i m i t a m suas percepções e s en t imen to s , n e g a m o p e r i g o , a c e i t a m c o m est» ii( i smo

o inevitável e c o n s e g u e m , até m e s m o , u m a aparência de satisfação. A considerável valia dessa mudança i n t e r n a , e m b o r a não seja u n i v e r s a l , é ta l vez m a i o r d o q u e s e p e n s a . Com l u a a j u d a , o pac i en t e não apenas se p ro t ege c o n t r a u m m e d o e s o f r i m e n t o a v a s s a l a i l . n l

mas se e n t r e g a t ambém a u m p a p e l m a i s pass ivo , c o o p e r a t i v o e tratável.

Q u e n inguém se de i x e e n g a n a r p e l a contenção e m o c i o n a l de u m pac i en te cirúrgii 0

Não i m p o r t a n d o o g r a u de i m p e r t u r b a b i l i d a d e de sua aparência, sub jacente a e l a , h;

m e d o e u m p a v o r terríveis. O p a c i e n t e s u b m e t i d o a p r o c e d i m e n t o c i rúrg ico apresenta

aspectos psicológicos i m p o r t a n t e s p r i n c i p a l m e n t e c o m relação ao m e d o . T e m tr iedo da

dor , d a anestes ia , de ficar d e s f i g u r a d o o u i n c a p a c i t a d o . T e m m e d o de m o s t r a r m e d o , e

m e d o de m i l e u m a coisas. S o b r e t u d o , t e m m e d o de m o r r e r . E , d i f e r e n t e m e n t e d c a l g u m a s

ou t ras coisas t e m i d a s pe las pessoas, o m e d o d a c i r u r g i a t e m , p e l o m e n o s e m p a r t e , u m a

base c o n c r e t a . E m b o r a a r e a l i d a d e seja s empre e n r i q u e c i d a p e l a imag inação , o m e d o da

c i r u r g i a n u n c a é t o t a l m e n t e imag inár io .

O t i p o de f r e i o q u e os pac i en t e s e x e r c e m sobre o seu m e d o faz m u i t a diferença c m

relação ao seu b e m - e s t a r . A l g u n s o têm firme, r e l a t i v a m e n t e inquebrável e m u i t o útil,

( ) u t r o s o têm tão frágil q u e p r e c i s a m de reforço, e m g e r a l , p o r m e i o de a c o m p a n h i i

ps ico lóg ico e e v e n t u a l m e n t e d r o g a s . O u t r o s a i n d a d i spõem de métodos especia is p a r a

c o n t r o l a r a ans iedade , e n e m todos são benéficos. U m m o d o p a r t i c u l a r é aque le d o pa i iente

q u e , t e n t a n d o a l i v i a r a a n s i e d a d e c o n c e n t r a d a sob r e a p a r t e d o c o r p o c i r u r g i c a m e n t e

1 - Exc ra ído , a d a p t a d o e c o m p l e m e n t a d o a p a r t i r d e B i r d , B . (1), Conversando com o Paciente. S ã o P a u l o : M a n o l e , 1978.

2 S

Page 20: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

I ' M I o l o u i . i I l o s | ) i l . i l , n

a f e tada , t o rna - sc p r e o c u p a d o c o m o u t r a s pa r l e s dc seu c o r p o , o u c r i a p r o b l e m a s a r l i l i i iul

e m o u t r a s regiões orgânicas. Se esse d e s l o c a m e n t o d c u m a p a r t e p a r a o u t r a parece nau

ser p r e j u d i c i a l , não há necess idade de interferência. E m a l g u n s casos, p o r é m , o l i e m

- es ta r d o p a c i e n t e é m a i s b e m p r e s e r v a d o se a e q u i p e o a j u d a a d e v o l v e r a ansiedade , i u

seu l u g a r o r i g inár io .

O fato de u m pac i en te e m p a r t i c u l a r t e n t a r des locar a preocupação de u m órgão afetado

p a r a o u t r o n o r m a l d epende n o r m a l m e n t e d o v a l o r que a t r i b u i ao órgão a fe tado . A c i r u r g i l

d a face e das mãos p o d e causar g r a n d e ans i edade e n t r e pac i entes cu j o t a l e n t o d epende d l

i n t e g r i d a d e dessas e x t r e m i d a d e s . É óbv i o que os órgãos v i t a i s são m a i s co tados . E m gera l ,

q u a n t o ma i s v a l o r i z a d o for o órgão, m a i o r será a ans iedade do pac i en te d i a n t e d a c i r u r g i a i

p o r t a n t o , q u a n d o esses órgãos f o r e m ope rados , será m u i t o provável que o pac i en t e desloque

sua ans i edade deste p a r a o u t r o s órgãos saudáveis e m e n o s i m p o r t a n t e s .

T a n t o o pac iente q u a n t o o cirurgião d e v e m ser p r o v i dos de u m representante pessoal i >

psicólogo - cujas funções se r i am, de u m lado , representar o pac iente que, e m seu estado menta l

e físico afetado, não t e m condições p a r a representar a si m e s m o e, p o r o u t r o l ado , o cirurgiài i ,

que n e m sempre consegue ser tão útil q u a n t o gos tar ia ao l i d a r c o m os medos e fantasias do

paciente e m relação ao que v a i acontecer. O representante seria alguém que n a d a f a r i a - come i

c o r t a r o u s u t u r a r —, caso contrário também ele se v e r i a o b r i g a d o a esconder e r e p r i m i r seus

sent imentos e angústias. É o que se entende c o m o "pr i v i l ég io " do psicólogo no hosp i t a l , na

m e d i d a e m que ele não representa ameaça ( o rgan icamente fa lando) .

Essa p o n t e , o u faci l i tação de v ínculos , t e m g r a n d e impor tânc ia , s o b r e t u d o p a r a o

p a c i e n t e , po i s e l a é u m a das p o s s i b i l i d a d e s c o n c r e t a s de se d e s envo l v e r do i s s e n t i m e n ­

tos imprescindíve is p a r a o b o m prognóst i co e m o c i o n a l d a re lação d o ind iv íduo c o m a

c i r u r g i a e o p rocesso , m u i t a s vezes l o n g o , d e pós -opera tó r i o e reab i l i tação , q u e são a

conf iança e a autor i zação . Essa ú l t ima n e m s e m p r e c o n s i d e r a d a c o m o f a t o r i m p o r t a n ­

te , m a s sabe-se q u e , se não h o u v e r p o r p a r t e d o p a c i e n t e u m a autor i zação expl íc i ta e

impl íc i ta p a r a q u e se i n t e r v e n h a sob seu c o r p o e, e m u m a instância m a i s p r o f u n d a , e m

sua própr ia v i d a , os r i scos de intercorrências e p r , b l e m a s n o t r a n s c u r s o de t r a t a m e n t o

a u m e n t a m s i g n i f i c a t i v a m e n t e .

A questão d a confiança e d a autorização remete-se a u m dos aspectos m a i s i m p o r t a n t e s

n a relação en t r e a e q u i p e de saúde e o pac i en t e que se p o d e d e n o m i n a r de " e n t r e g a p a r t i ­

c i p a t i v a " : o u seja, ao m e s m o t e m p o e m q u e c o n f i a n a e q u i p e e a " a u t o r i z a " a c u i d a r dele,

manipulá- lo , m e s m o e m u m m o m e n t o e m q u e está i n c o n s c i e n t e , p o r t a n t o s em n e n h u m

c o n t r o l e , age p o r o u t r o l a d o m o s t r a n d o - s e in t e r essado p e l o seu es tado , sua evo lução, e

esforça-se p a r a a judar -se n o t r a t a m e n t o e recuperação.

2 6

A l n n d i m i M i t c i l ' s i< o l o q ú o 111> C e n t r o d e l e r . i p i a I n t e n s i v a

I . . . . i aparentemente pequena preoi upaçào que a equ ipe deve l e r e m relação à estruturação

I | I seu v i n c u l o c o m o pac i en te , a despe i to dc colocações adversas c o m o " f a l t a de t e m p o " ,

I Lides m a i o r e s " c ie . , não so o t i m i z a as respostas ao t r a t a m e n t o t a n t o d o p o n t o de

v i .1.1 psíquico q u a n t o físico, c o m o l a m b e m r e d u z o t e m p o de reabil i tação e re integração

|j i i pac i en te , o que , c m última instância, a caba p o r c o n t r a d i z e r os próprios obstáculos que

, i i • 1111 j >< - co l o ca p a r a e m p e n h a r - s e nesse v ínculo.

Putores Pessoais Decorrentes da Intervenção Cirúrgica como Possíveis Geradores de Complicações na Evolução do Pós-Operatório

I e g r u p o dc fa tores pessoais , i n d i v i d u a i s , p o d e ser d i v i d i d o e m do i s m o m e n t o s b e m

• Ir . i m i o s , c a d a u m c o m características próprias.

N o p r i m e i r o m o m e n t o , cons idera-se :

( ) Pós -Opera tó r i o I m e d i a t o , q u a n d o o p a c i e n t e p o d e ap r e s en ta r , d e n t r e o u t r a s , as

l e gu in t e s reações:

a) reação à c i r u r g i a ;

• l e t a r g i a

• a p a t i a

b) ag ress i v idade ;

c) depressão r e a t i v a ;

d) reações de p e r d a .

N o s e g u n d o m o m e n t o j á se c o n s i d e r a o pós-operatór io p r o p r i a m e n t e d i t o , n o q u a l as

manifestações e a s i n t o m a t o l o g i a são d iversas :

a) e laboração i n a d e q u a d a das l imitações i m p o s t a s p e l o a to c irúrgico;

• c o n c r e t a

• imag inár ia

b) d i f i c u l d a d e de c o r r e s p o n d e r ao processo de reabil i tação e re integração s o c i o f a m i -

l i a r a c u r t o , méd io e l o n g o p r a z o s , c ons ide rando - s e t ambém os l i m i t e s q u a n t o às

poss ib i l i dades d o pac i en t e .

A p e s a r de esses fatores pessoais e s t a r e m l i gados d i r e t a m e n t e c o m o a t o c irúrgico e m

si , isso não e l i m i n a n e m d e s v a l o r i z a a importância dos aspectos a m b i e n t a i s c o m o i n t e r v e ­

n ientes p a r a a b o a evolução e recuperação d o pac i en t e .

2 7

Page 21: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

I "-.I< l l l o i j j . l | | ( ) ' , | ) l t . | | , | |

Complementando, podc-sc dizei• ejuc a m b o s os la iores s e i n i e r l i g a m e s e interpõem, •

f o r m a que o t r a b a l h o a ser desenvo l v ido c o m esses pacientes é bastante c o m p l e x o e deli ) a d J

p r e c i s a n d o os p ro f i s s i ona i s t e r e m " f e e l i n g " bas tan te aguçado p a r a de tec tar , c o m p r e e n d i i

e t e n t a r reso lver os fatores c o n f l i t a n t e s d o pac i en t e .

Atendimento ao Paciente em Pós-Operatório Imediato

A s c i r u r g i a s de g r a n d e p o r t e , p r i n c i p a l m e n t e , impõem a necessidade de internação d< i p i

c iente n o C T I , n o pós-operatório i m e d i a t o , d a d o o estado d e l i c ado e m que este se encon i i à

necess i tando , p o r t a n t o , de u m a atenção exc lus i va e maciça p a r a que suas p o s s i b i l i d a d e !

de recuperação se jam m a i o r e s .

É i m p o r t a n t e f r i s a r que a l g u m a s u n i d a d e s hosp i t a l a r es p o s s u e m C T I s des t inados sc >

m e n t e a estes casos, e e m o u t r a s t e m os C T I s m i s t os , q u e não r e c e b e m pac ientes somente

e m pós-operatór io , c o m o também e m o u t r o s casos graves. S e m dúvida, a convivência c om

o u t r o s pac ientes e m estado g rave i n t e r f e r e sobre o pós-operado, g e r a n d o ques t i onamen to s

e fantas ias sobre suas poss ib i l i dades de evolução, seu s o f r i m e n t o e m e s m o sua m o r t e .

N o s casos e m q u e o C T I d e s t i n a seu a t e n d i m e n t o e x c l u s i v a m e n t e ao pós-operado ,

deve-se t e r e m m e n t e q u e este é o m o m e n t o e m q u e o p a c i e n t e estará m a i s d e b i l i t a d o e

dependente . D e f o r m a m a i s a d e q u a d a , o t r a b a l h o d o psicólogo n o a c o m p a n h a m e n t o dessas

pessoas deve ser i n i c i a d o n o pré-operatór io , n o q u a l é d e d i c a d a t o d a u m a atenção a essas

pessoas e suas famíl ias, p r e s t ando - s e or ientação e m relação às e xpe c t a t i v a s d a c i r u r g i a ,

o u v i n d o - s e e d i s c u t i n d o - s e os m e d o s , d e s m i s t i f i c a n d o - s e as f an tas ias e c o n v e r s a n d o - s c

sobre a ans i edade e angústia j u n t a m e n t e c o m eles. Se a s s im for, o t r a b a l h o d o psicólogo

será u m a continuação, a g o r a f o cado n o per íodo de recuperação e reabi l i tação g r a d a t i v a s

d o pac i en t e , q u e j á v e m sendo t r a b a l h a d o desde a internação.

Esse per íodo se i n i c i a c o m a v o l t a d a pessoa à consciência n o C T I , o n d e esta sai d o

sono anestésico, a t o r d o a d a e t o m a n d o (ou não) g r a d a t i v a m e n t e consciência d o seu estado c,

s o b r e t u d o , de si m e s m a . N ã o é u m m o m e n t o fácil p a r a a pessoa, po is , a lém d a alteração do

es tado de consciência, e la começa a se p e r c e b e r l i t e r a l m e n t e a m a r r a d a ao l e i t o , c o m t o d a

u m a parafernál ia de e q u i p a m e n t o s e x t r a e intracorpóreos anexados ao seu c o r p o (cânulas

de entubação, e l e t rodos d o E C G , cateteres de soro e sondas , d r e n o s e t c ) . Nesse m o m e n t o

observa-se, m u i t a s vezes, a pessoa e n t r a r e m estado de agitação, não r a r o t e n t a n d o a r r a n c a r

os apa r e lhos q u e a i n c o m o d a m . No ta - s e q ue , q u a n d o se faz or ientação n o pré-operatór io ,

p r e s t a n d o - s e e s c l a r e c i m e n t o s q u a n t o ao C T I e sua r o t i n a , este é d e s m i s t i f i c a d o p a r a a

pessoa, e m e s m o e m estado a l t e r a d o de consciência a incidência desse c o m p o r t a m e n t o é

2 8

A t m i i l l m i M i t i ) l ' s i i i ) l n i | i i o n o ( i - i i t i c i < l e l i T . i p i a I n l e n s i v . i

I n i u m e n t i r , c c o m isso ale n i c s i i s riset i s orgânicos d i m i n u e m (note b e m : e x e m p l i f i c a n d o ,

I H u . i pessoa e m agilaç;" pós-operatório dc c i r u r g i a cardíaca, além de c o m p r o m e t e r seu

, Indo pela v on tade dc l i \e t ia a p a r e l h a g e m , t e n t a n d o , p o r e x e m p l o , a r r a n c a r a cânula

d , i niubaçào, l e r a , pe lo estado dc agitação, u m fa to r a g r a v a n t e à sua pressão a r t e r i a l e às

l i m a i s funções metabólicas, q u e poderão ser a fe tadas p o r esse q u a d r o ) .

Do p o n t o (le v is ta psicológico, esse m o m e n t o t e m importância ímpar. Já se teve o p o r t u ­

n i d a d e d c v i v e n c i a r o m i s t o de a l ív io d a pessoa n o m o m e n t o d o pós-operatór io , pos t o q u e

i ans iedade m a i o r que r epousava n o e n f r e n t a m e n t o d a c i r u r g i a passou , m a s a v ivência de

i o d o o processo de recuperação, m u i t a s vezes m a i s d o l o r o s o q u e o pré-operatór io , s o m a ­

d o .1 q u e d a de defesas q u e n o r m a l m e n t e a pessoa desenvo lve p a r a s u p o r t a r a ans i edade

1 apreensão pré e per ioperatór io , a c a b a m a c a r r e t a n d o q u a d r o s p s i c o r r ea t i v o s a l t a m e n t e

1 o u 1 p r o m e t e d o r e s ao seu r e s t a b e l e c i m e n t o .

I ) en t r e eles, destaca-se a depressão, m u i t o c o m u m , p r i n c i p a l m e n t e e m c i r u r g i a s ca r ­

díacas (outros q u a d r o s m a i s c o m u n s d e r i v a d o s desta: a n o r e x i a , as t en ia , a p a t i a , até o u t r a s

i t spos tas q u e vão desde agitação p r o p r i a m e n t e d i t a até q u a d r o s c o n f u s i o n a i s de o r i g e m

psico-orgânica).

( l a b e a q u i ressa l tar que , e m m u i t o s m o m e n t o s d o pós-operatór io i m e d i a t o , o pac i en t e

p o d e e x p e r i m e n t a r alterações psicológicas m a i s g raves assoc iadas a intercorrências n a

1 i i u r g i a o u deficiências secundárias que , a p a r t i r d a c i r u r g i a (desencadeadas p o r toxemias )

c de q u a d r o s psicóticos exógenos r e l a c i o n a d o s a déficits n a ox igenação ( p o r e x e m p l o , após

l o n g o pe r í odo de pe rmanênc ia e m c i rculação ex t racorpórea ) , são os m a i s c o m u m e n t e

observados . A a t i t u d e an t e esses q u a d r o s d e p e n d e de intervenção múltipla. D e u m l a d o ,

o médico , b u s c a n d o e l i m i n a r as causas exógenas q u e p r o v o c a r a m o d e s encadeamen to d o

s u r t o , de o u t r o , o psicólogo, a t u a n d o c o m o p a c i e n t e n a reorgan ização das vivências, e,

após a remissão d o q u a d r o , a c o m p a n h a n d o o r e d i m e n s i o n a m e n t o d a pessoa, p o s t o que a

consciência de u m a experiência de r u p t u r a causa c o m p r o m e t i m e n t o s ao equil íbrio p e r s o n a l

d o indiv íduo. Sob esse aspecto discutir-se-á m a i s a d i a n t e .

N o sent ido m a i s a m p l o do t r a b a l h o d o psicólogo, acred i ta -se ser f u n d a m e n t a l ressal tar a

importância d a presença de u m e l e m e n t o m a i s v o l t a d o à atenção a pessoa, q u e possa o u v i r

o o u t r o l a d o de suas q u e i x a s e co locações sem p r e c i s a r p r e o c u p a r - s e c o m o t r a t a m e n t o

cl ínico. T a n t o p a r a o méd ico q u a n t o p a r a os d e m a i s m e m b r o s d a e q u i p e a presença d o

psicólogo auxi l iará a redução d o estresse desta e d o pac i en t e .

O fa to de a a t i t u d e d o psicólogo d i a n t e d a pessoa e n f e r m a estar d e s c o n t a m i n a d a d o

c u n h o i n v a s i v o e agress ivo q u e é v i s t o p e l o p a c i e n t e nos d e m a i s m e m b r o s d o serv iço é

g r a n d e p o n t o a seu favor. V a l e f r i s a r q u e a exigência técnica de c o n d u t a s invas i vas e agres-

2 9

Page 22: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

P s i c o l o g i a H o s p i t a l a r

sivas ( i n t e r p r e t a d a s c o m o ) é p a r t e i n t e g r a n t e d o t r a t a m e , n a u s e n d o possível a l t e ra i

essas características. A o d a r u m a injeção, t r o c a r u m c u r a t i v o o u i n t r o d u z i r u m a s l a , , i

sensação de invasão d e n u n c i a d a p e l o pac i en t e está presente , mas nestas c o n d u t a s r q M i u !

a p o s s i b i l i d a d e de sua recuperação. S e n d o a s s im , a posição d o psicólogo é p r i v i l e g i a d i

c o m o j á se disse, n a relação c o m o p a c i e n t e , p e r m i t i n d o a b r i r u m c a n a l de c o n t a t o n o q u a l

a part ic ipação deste será i m p o r t a n t e p a r a o t o d o q u a n t o à sua reabil itação.

N o a t e n d i m e n t o ao pac i en te pós-operado, a atenção ao seu r e t o r n o ao c o t i d i a n o c

reabilitação e reintegração será também u m dos pon tos de t r a b a l h o psicológico. U m a a\1

hação m i n u c i o s a de t o d a a equ ipe sobre as poss ib i l idades e l imitações que a pessoa terá e m

sua v i d a a c u r t o , médio e l o n g o prazos precisará ser t r a z i d a a e la e a sua família de f o r n i a a

e v i t a r a t i tudes i nadequadas de negação das limitações ( p r o v o c a n d o a r e c i d i v a o u ag ravamen­

to d a en f e rmidade ) , o u , p o r o u t r a p a r t e , a exacerbação d o estado de l imitação, t r u n c a n d o

po t enc i a i s de v i d a d a pessoa, que passa a ser t r a t a d a c o m o u m invál ido abso lu to , q u a n d o

m u i t a s vezes possu i a m p l a s condições de r e c i c l a r sua v i d a de f o r m a p r o d u t i v a e c r i a t i v a . A . >

psicólogo cabe , p o r t a n t o , o r i e n t a r sob este aspecto os f a m i l i a r e s e o pac i en t e , p r o c u r a n d o

observar essas expectat ivas e a t i tudes de ambos pe ran t e a evolução da pessoa, desmis t i f i cand i >

os aspectos fantasmáticos e l aborados a respe i to d a dinâmica L i m i t e x Poss ib i l idade .

Reação à Cirurgia: Letargia e Apatia2

A l g u n s pac ientes cirúrgicos, e m sua t e n t a t i v a de c o n t r o l a r o m e d o crescente, i n i b e m a f u n ­

ção m e n t a l de f o r m a tão e x t r e m a d a que c a e m e m u m estado letárgico o u apático. O s casos

p o u c o graves, m u i t o m a i s c o m u n s , p a r e c e m cons i s t i r e m a l go m a i s d o q u e u m a e x t r e m a

amnésia, a c o m p a n h a d a de u m b a i x o nível de r e a t i v i d a d e e m o c i o n a l e de u m a fa l t a gera l

de interesse.

Ta lvez o pac iente pareça cansado e lânguido, mas , e m u m exame ma is a tento , revelar-se-á

que quase não se m o v e , fa la , s o r r i o u m e s m o se que i xa .

Q u a n d o o processo é m a i s p r o f u n d o , o pac i en te se t o r n a d e f i n i t i v a m e n t e m a i s i n d o l e n t e ,

m e n t a l e fisicamente. O s m o v i m e n t o s e a conversa voluntários p o d e m ser mín imos , e as

p e r g u n t a s e ped idos p r e c i s a m ser r epe t idos várias vezes. 3 O pac i en t e t ende a p e r d e r o i n t e ­

resse m e s m o p o r coisas básicas, c o m o aparência, c o n f o r t o , a l imentação e diá logo. T u d o que

2 - E x t r a í d o , a d a p t a d o e c o m p l e m e n t a d o a p a r t i r d e B i r d , B . (1), Conversando com o Paciente.

3 - Esse e s t a d o l e m b r a o e s t á g i o d e o b n u b i l a ç â o o u t u r v a ç ã o g e r a d o p o r c o m p r o m e t i m e n t o d a c o n s c i ê n c i a , m a s

a a t i v i d a d e m e n t a l d o p a c i e n t e nesses c a s o s está p r e s e r v a d a .

3 0

A l i u i d i t n i i N t " l ' s i< o l o ( | i ( o 110 < c n l i o d e l e i a p i a I n t e n s i v a

1,1/ e p e i i n a n c t c r d e i t ado , o u sentado, ( 01110 s e estivesse d o r m i n d o o u des l i gado d o que o

n o a M e s m o u m a a p a i i a e l e ta rg ia acentuadas c o m o e s s a s p o d e m passar desperceb idas .

I ' , , d . i u d e v e r - s e a o l a t o d e a e qu ipe p r e l e r i i pensar que s e t r a t a de reações "c i rúrg icas" à sua

i l l l u u ldade n o H a l o d e perturbações e m o c i o n a i s e ao seu desejo de não o b s e r v a r evidências

d e ans iedade.

A causa a p a r e n t e dessa l e t a r g i a / a p a t i a pós-operatór ia é a e m o ç ã o p r imár ia , m a s a

A j j rcss iv idade a segue de p e r t o . A cossado pe l o pânico , o pac i en t e , e m u m a m a n o b r a de -

l ísperada, p a r a l i s a seus s en t imen t o s . E l i m i n a de sua consciência não somen te os p e r i g o s

q u e o ameaçam de fo ra s o b r e t u d o os pe r i gos cirúrgicos - c o m o t ambém não se p e r m i t e

perceber sua v i d a i n t e i r a - e m p a r t i c u l a r suas lembranças dos p e r i g o s e injúrias d o pas ­

s a d o , e suas imaginações a l i m e n t a d a s e insu f l adas p o r essas memór ias . E m c e r t o s en t i do ,

l e c l i ando-se , f a z endo c o m q u e ele própr io desapareça, t r a n s f o r m a n d o - s e e m n a d a .

Q u a n d o o pac i en t e v o l t a ao n o r m a l , m e s m o q u a n d o seu n o r m a l é irritável, i m p e r t i -

n c u i e , dif íci l , que i x o so , ans ioso o u t emeroso , a mudança é s empre r e c e b i d a c o m al ív io p o r

p a r l e d a e q u i p e . Sente-se q u e , a g o r a , o pac i en t e está se r e c u p e r a n d o . Es ta crença p o d e ser

ma is que i n o c e n t e . U m pac i en t e q u e m a t o u suas emoções m a t o u t ambém suas esperanças

e v o n t a d e de v i v e r , e u m pac i en t e s em v o n t a d e de v i v e r r ep resen ta u m g r a n d e obstáculo a

s u a s poss ib i l i dades de recuperação, m e s m o q u a n d o o prognóst ico b io lóg ico é b o m .

E x e m p l o de u m a a c e n t u a d a reação apática à ans i edade i n t e n s a deu-se e m u m a m u l h e r

d e m e i a - i d a d e , que so f re ra u m a c o l o s t o m i a de emergência. N o s q u a t r o o u c i n c o d ias pos ­

ter iores à intervenção, e la p e r m a n e c e u i n e r t e , d e i t a d a de costas, c o m os o l hos f echados ,

a p a r e n t e m e n t e d o r m i n d o . A p a c i e n t e não se q u e i x a v a , não e x p r i m i a desejos de q u a l q u e r

espécie e, e m g e r a l , p a r e c i a u m a m u l h e r e s t u p i d i f i c a d a , insensível. C o m o f o r a u m caso

de emergência e n inguém sab ia c o m o e r a antes d a operação , a e q u i p e supôs q u e este e r a

seu estado n o r m a l . Vár ios d ias depo i s , q u a n d o c h e g o u a época de a p r e n d e r a c u i d a r de

si m e s m a , a p a c i e n t e não c o n s e g u i u c a p t a r n a d a , e esta d i f i c u l d a d e - ao l a d o dos o u t r o s

indícios de seu e s t u p o r - l e v o u a e q u i p e a c o n c l u i r q u e a pac i en t e t i n h a características de

r e t a r d o m e n t a l .

D e p o i s de u m a semana , porém, p a r a surpresa g e ra l , a pac i en te começou a se man i f e s ta r .

Descobr iu - se então que sua a p a t i a s e r v i r a p a r a i n i b i r u m estado a g u d o de t e r r o r . Q u a n d o

e n t r o u n o h o s p i t a l , e m u m a cr ise de dor , não esperava sa i r d a l i c o m v i d a . Pensava q u e a

anestesia e r a a m o r t e e q u a n d o a c o r d o u , e p o r m u i t o s d ias a i n d a , a c r e d i t a v a q u e estava

m o r t a . C u r i o s a m e n t e , ao saber que passara p o r u m a c o l o s t o m i a , seu m e d o d a m o r t e não

a u m e n t o u , m a s exe rceu u m efeito m e n t a l e s t i m u l a n t e sobre ela. E m várias t en ta t i vas das

en f e rme i r a s de l h e m o s t r a r c o m o cu ida r - s e , a pac i en t e v a g a r o s a m e n t e começou a pe r cebe r

3 1

Page 23: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

o l o q i . i I I n s p i l a l a i

que, c o m o lhe estavam ens inando o que lazer q u a n d o retomasse para sua casa, cias r e a l m e n i

a c r e d i t a v a m que e la se c u r a r i a . Este fo i 0 p r i m e i r o s ina l dc esperança que se p e r i m i i u M I ,

e daí p a r a a f r en te r e cuperou-se c o m rap ide z .

A l g u m a s vezes esse es tado p o d e s u g e r i r u m a e n f e r m i d a d e c e r e b r a l , u m a p o s s i b i l i d l

de q u e s empre deve ser l e v a d a a sério e m q u a l q u e r reação letárgica p r o l o n g a d a . ( >m, ,

d i f i c u l d a d e d i a g n o s t i c a p o d e se ap r e s en ta r pe las semelhanças en t r e l e t a r g i a e depressa,,

O p a c i e n t e d e p r i m i d o , a m e n o s q u e esteja e m e s t u p o r p r o f u n d o , e m g e r a l f a l a de sua

depressão, a d m i t e q u e se sente t r i s t e (estes são g e r a l m e n t e os casos de depressão r e a t i v j

q u e serão d i s c u t i d o s m a i s ad i an t e ) . O s pac i entes m a i s g r a v e m e n t e d e p r i m i d o s (depressa,,

m a i o r o u patológica) m u i t a s vezes e x p r e s s a m s e n t i m e n t o s de c u l p a e de b a i x a e s t i m a , e J

f a z em c o m o se r e a l m e n t e t i vessem c o m e t i d o a l g u m e r r o g r a v e . P o r t a n t o , c u l p a , fantasia ' ,

mórbidas, não r a r o ide ias de autoaniqui lação, a c o m p a n h a m o pac i en t e d e p r i m i d o , po

d e n d o essa s i n t o m a t o l o g i a ser ac r esc ida de insónia, a n o r e x i a e a m o r f i s m o a f e t i v o - n e s s e

últ imo caso sente p o u c a o u n e n h u m a emoção , é u m es tado n o q u a l se o b s e r v a m at i tudes

de a u t o a b a n d o n o e e n s i m e s m a m e n t o . É i m p o r t a n t e d e s t a ca r nesses casos q u e essa pode

ser u m a das reações d o p a c i e n t e d i a n t e d a m o r t e , q u e não deve ser c o n f u n d i d a c o m o

m o v i m e n t o de desapego d a fase de depressão preparatór ia q u e antecede a aceitação da

m o r t e , c o m o de s t a ca E . K . Ross (4,5). A i n d a sobre esses aspec tos há o u t r o s q u e serão

v is tos m a i s à f r en t e .

Agressividade nos Pacientes Cirúrgicos4

Para a equ ipe , c o m o p a r a a m a i o r i a de nós, a agress iv idade é u m a emoção p e r t u r b a d o r a ,

ta lvez a ma i s p e r t u r b a d o r a de todas as emoções. N ã o c onseguem entendê-la o u considerá-la

j u s t i f i c a d a ; c o n s i d e r a m - n a u m a acusação de coisa ma l f e i t a e, c o m o fizeram t u d o que p o d i a m

pe lo pac i en te , não a c e i t a m f a c i lmen t e as expressões de agress iv idade .

O s cirurgiões que v e e m a agress i v idade desse m o d o m u i t o pessoal a c h a m dif íci l p ensa r

c o m o u m a p a r t e n o r m a l d a v i d a . T o r n a r - s e agress ivo q u a n d o i n j u r i a d o , a t a c a d o o u e m

p e r i g o é n a t u r a l , e deve ser esperado . Desse m o d o , a ag r ess i v idade d o p a c i e n t e e m segu ida

a u m a c i r u r g i a , à q u a l não se p o d e d e i x a r de r e a g i r c o m o a u m a t a q u e , t a m b é m ser ia

n a t u r a l ; s em dúvida, a c i r u r g i a é u m a t a q u e benéfico. N o e n t a n t o , p a r a a v i d a e m o c i o n a l

d o pac i en te , é v iolência - ele se sente de fa to e m p e r i g o , é c o r t a d o , há do r , ele fica i n c a p a -

4 - E x t r a í d o , a d a p t a d o e c o m p l e m e n t a d o a p a r t i r d e B i r d , B . (1), Conversando com o Paciente.

3 2

A l u i u l i m o i i t i > l ' s i ( i i l i i ( | i ( o n o ( ' . c n l i n d e t e r a p i a I n t e n s i v a

, n a d o c , p e r c e b e n d o o u m i o , t o r n a s e agressivo. A l e m disso, e m b o r a a c i r u r g i a e m si seja

I I n a , a causa d e sua necessidade n à o o c .

N e s s e s en t i do , n e n h u m pac i en te está p r e p a r a d o p a r a u m a operação. C o m efe i to , o p a -

, , • <• salvo d e a l go p io r , salvo ta lvez d a m o r t e , mas de q u a l q u e r m o d o t e r i a s ido m e l h o r se

P p r o b l e m a n u n c a tivesse s u r g i d o . A s s i m , t ambém sob este aspecto , p o r causa d a desgraça

p r o vo cada pe lo " d e s t i n o " , pode-se esperar q u e o p a c i e n t e c irúrgico se t o r n e agress ivo.

A l g u n s pac i en tes , n a t u r a l m e n t e , têm razões m a i s explícitas p a r a sua ag r e s s i v i dade :

i i . i u i odas as operações têm êxito " c o m p l e t o " . E m e s m o os pac ientes c u j a intervenção seja

11111 sucesso p o d e m l i g a r sua a g r e s s i v i dade ao q u e c o n s i d e r a m c o m o m o t i v o s rea is . P o r

BXemplo , u m pac i en t e p o d e s en t i r d o r p o r u m t e m p o m a i o r d o que ele própr io esperava ,

n a c i c a t r i z p o d e ser m a i o r , m a i s f r i a , o u estar m a i s e x p o s t a d o que p e n s a r a , o u ta lvez a

i c i uperação seja m a i s l e n t a d o q u e o esperado . P o r t a n t o , não só fantas ias mórbidas e m

i elação à c i r u r g i a , mas também ou t ras m o d a l i d a d e s apa r en t emen t e " p o s i t i v a s " de fantasias,

p o d e m g e r a r frustração e ag ress i v idade .

M a i s p r e j u d i c i a i s são aque l as reações q u e i n t e r f e r e m n o b e m - e s t a r d o p a c i e n t e . Po r

e x e m p l o , a ag ress i v idade d o pac i en t e p o d e man i f e s t a r - s e sob a f o r m a de n e g a t i v i s m o e m

relação aos c u i d a d o s pós-operatórios. Passa então a r es i s t i r a t u d o q u e é fe i to p o r ele, r e -

Cusa-se a fazer t u d o que l h e d i z e m e ins iste e m fazer o que pensa ser o m e l h o r .

S e m p r e q u e se suspe i ta de agress i v idade e s c o n d i d a c o m o causa de perturbação n o p r o ­

gresso o u cu idados d o pac iente , deve-se conversar c o m este sobre a sua agressiv idade. Deve-se

encorajá-lo a expressar a sua agress i v idade o u , então, d escob r i - l a . Q u e m q u e r que seja que

fale c o m ele p o d e d i z e r - l h e que a sua agress i v idade j á e ra esperada ; e, se o pac i en t e se ca l a ,

é necessário c o n t a r - l h e a l g u m a s coisas que d e s p e r t a m a agress i v idade e m o u t r o s pac ientes ,

u sando a projeção c o m o fa to r de manifestação e e laboração d o s e n t i m e n t o agressivo.

I n f e l i zmen te , sabe-se que , m u i t a s vezes, esse sen t imento pode ser desencadeado p o r fatores

e x t e rnos , c o m o , p o r e x e m p l o , o a d i a m e n t o d a c i r u r g i a , a suspensão d a a l t a tão dese jada, a

ausência das v i s i tas o u proibição destas etc. São situações que , s empre q u e possível, d e v e m

ser e v i t adas p e l a e q u i p e ; n o e n t a n t o , q u a n d o o c o r r e m , é imprescindível q u e se a u x i l i e o

pac i en t e a e x p o r sua r a i v a e frustração, de f o r m a a e l i m i n a r o efeito e x t r e m a m e n t e n o c i v o

q u e esse s e n t i m e n t o r e p r i m i d o p o d e causar t a n t o n a sua esfera e m o c i o n a l q u a n t o física.

É i m p o r t a n t e sa l i en ta r , t ambém, o c u i d a d o q u e a e q u i p e deve te r e m re lação à p o s t u r a

d i a n t e d o p a c i e n t e , b u s c a n d o não e n t r a r e m u m processo pessoal de e n v o l v i m e n t o c o m a

ag ress i v idade d o pac i en t e (contratransferência), fa to esse não tão r a r o a s s im , que m u i t a s

vezes a caba p o r g e r a r c on f l i t o s n o v ínculo en t r e e q u i p e - p a c i e n t e , o u até m e s m o a t i tudes

de ev i tação e m relação ao pac i en t e .

3 3

Page 24: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

P s i c o l o g i a H o s p i t a l a r

L i b e r t a r a b e r t a m e n t e |>arte da agress i v idade pode ser dc g r a n d e al ív io e p r o v o c a r i i m . i

m e l h o r a s i g n i f i c a t i v a nos c u i d a d o s c t r a t a m e n t o s d o pac i en te , c ale m e s m o na rap idez d.

sua recuperação pós-operatória.

Depressões no Paciente Pós-Cirúrgico

A m a i o r p a r t e das depressões pós-operatórias é " r e a t i v a " , 5 q u e v a r i a e m g r a u de leve • >

g rave , t e n d o fatores p r i n c i p a l m e n t e a t i vos .

A ag ress i v idade , d a q u a l o pac i en t e quase s empre é i n consc i en t e , está s empre presc in ,

e a t i v a nas depressões. U m dos m e c a n i s m o s que p r o v o c a m a depressão é a identificação

d o pac i en t e c o m a pessoa que é ob j e t o de sua agressão, neste caso, o c i rurg ião o u out ros

d a e q u i p e de saúde. Pela identif icação, t r a n s f e r i r a m - s e os s e n t i m e n t o s pe l o c i rurg ião para

ele própr io . S u a consciência se t o r n a o a t a c a n t e , e e la o a t a ca . Segue-se daí a depressão.

Q u a n t o m a i s s e c r e t amen te ele deseja f e r i r a o u t r a pessoa, m a i s é reforçado p e l a sua cons­

ciência a f e r i r a si m e s m o , e m a i s cresce a depressão.

O o b j e t i v o p r i n c i p a l n o d iá l ogo c o m esses pac i en t e s é t r a t a r essa depressão a g u d a .

A o fazê-lo, é de m a i o r u t i l i d a d e d e s c o b r i r c o m o que o pac i en t e está f u r i o s o , e ajudá-lo a

r e d i r i g i r e a m o b i l i z a r sua ag ress i v idade p a r a o ob j e t o r e a l .

O u t r o fa tor s i gn i f i c a t i v o , g e r a d o r d a depressão r e a t i v a de pós-operatório, está associado

às vivências e con f l i t os e x p e r i m e n t a d o s pe lo pac iente n o pré-operatório. Sabe-se a t u a l m e n t e

q u e existe u m a corre lação ínt ima e n t r e o g r a u de estresse (10) e ans i edade d o pac i en t e n o

pré-operatório, sendo esta u m a das p r i n c i p a i s responsáveis pe la incidência m a i o r de depressão

n o pós-operatór io, p r i n c i p a l m e n t e nas 36 ho ras i m e d i a t a s ao a t o c irúrg ico. Q u a n t o m a i o r

a ação desses fatores , m a i o r e s as chances de presença e i n t e n s i d a d e d a depressão.

C o n f o r m e m e n c i o n a d o a n t e r i o r m e n t e , o estado an ímico d o pac i en t e suscetível a t o d o

o evento (doença-internação-indicações cirúrgicas) m o b i l i z a - s e , b u s c a n d o defender-se o u

esquivar-se d a situação de ameaça q u e pressente. Q u a n d o essa mobi l i zação é i n a d e q u a d a

e/ou os fatores v i v i d o s p e l o pac i en t e g e r a m o u a c e n t u a m o estresse (10) e a ans i edade , o

desgaste e m o c i o n a l t o rna - se c a d a vez m a i s p rog ress i vo . T o d o s seus m e c a n i s m o s de defesa

estão v o l t ados p a r a o e n f r e n t a m e n t o d o e ven to crít ico, q u e n o caso é r e p r e s e n t a d o p e l a

c i r u r g i a . U m a vez supe rada a cr ise , há u m a q u e d a a b r u p t a de t o d a essa ene rg i a m o b i l i z a d a ,

l e v ando , então, o pac i en te a u m estado depress ivo r e a t i v o que , c o m o dissemos, terá duração

5 - L u t o s e m C o m p l i c a ç õ e s ( D S M I I I R ) (6 ) .

3 4

A l o n d i í n n n t i i P s i i o l o q i i o n o ( e n t r o d e l e i a p i a I n t e n s i v a

. In tens idade d e t e r m i n a d a s exa t i n t c p i l o desgaste l i s i co e e m o c i o n a l e x p e r i m e n t a d o ,

iu i l a i i i u l o n o p r é - i i p e i a t o r i o .

1 ' o d c - s c e s q u e m a t i z a r o p r o c e s s o o b s e r v a n d o - s e o s e g u i n t e g r á f i c o :

I I

1

V

1 1

L

E V E N T O C I R Ú R G I C O

( C R I S E )

- M e d o

- Ra iva

- A g r e s s i v i d a d e

A

l i N

1 ' . / A Ç Ã O D O S A G E N T E S ,

- Fan ta s i a s M ó r b i d a s

- Insegurança 1

1 1

S D

T A

l< D

E E

S

S

E

— N Í V E L N O R M A L D E A N S I E D A D E

D A P E S S O A

' E S T R E S S O R E S

Q U E D A D A E N E R G I A

M O B I L I Z A D A

- Intercorrências n o s e x a m e s internação o u re lação e q u i p e - p a c i e n t e

- A d i a n t a m e n t o d e c i r u r g i a e t c .

T E M P O

D E P R E S S Ã O

C o m o se p o d e observar , a a t i t u d e ma i s a d e q u a d a d a equ ipe é a de a g i r p r e v e n t i v a m e n t e ,

já n o iníc io d o c o n t a t o c o m o p a c i e n t e , se possível a i n d a n o ambula tór io o u consultór io,

q u a n d o a i nd i c a ção c i rúrg i ca m u i t a s vezes é u m a das p o s s i b i l i d a d e s , i n t e n s i f i c a n d o

esse t r a b a l h o n a internação . Fa to res c o m o conf iança, d i s p o n i b i l i d a d e , cont inência a o

p a c i e n t e p a r a q u e e x p o n h a seus s e n t i m e n t o s , o r i entação e desmist i f icação das fan tas ias

são f u n d a m e n t a i s .

Sabe-se, n o e n t a n t o , q u e e m vários casos essa c o n d u t a não é possível, p r i n c i p a l m e n t e

nas c i r u r g i a s de urgência, nas q u a i s o t e m p o en t r e o diagnóst ico o u even to q u e i n d i c a a

c i r u r g i a e esta é e x t r e m a m e n t e d i m i n u t o . Nesses casos, a atenção ao p a c i e n t e n o C T I deve

ser r e d o b r a d a , e a aval iação de suas reações e m o c i o n a i s ao evento c o m o u m t o d o , a v a l i a d a ;

s empre q u e possível, p o s s i b i l i t a r ao pac i en t e espaço p a r a explorá-las e manifestá-las.

É m i s t e r s u b l i n h a r que r a r a m e n t e o pac iente q u i e t o , passivo, v i s to c o m o " b o n z i n h o " está

b e m . Inúmeras vezes p o r trás deste c o m p o r t a m e n t o aparentemente " a d e q u a d o " temos quadros

de apa t i a , depressão, o u m e s m o de u m a depressão m a s c a r a d a , que , g e r a lmen t e , redundarão

e m complicações e d i f i cu ldades p a r a o pac iente e e qu ipe n o pós-operatório i m e d i a t o , t a r d i o ,

e e m t o d o seu processo de reabil itação e reintegração s o c i o f a m i l i a r e p ro f i s s i ona l .

3 5

Page 25: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

I'?,i< I l o s p i l . l l . i l

Depressões no Hospital Geral

A s depressões têm s ido a l vo de estudos, discussões e reclassificações ao l ongo dessas úll imas

décadas, sendo e m a l g u n s casos a l vo de po l em i ca s i m p o r t a n t e s n o que tange ao diagnóst i< < >

d i f e r e n c i a l c às estratégias terapêuticas p a r a combatê-las.

A t e r e m o - n o s a q u i a d i s c u t i r o fenómeno depress ivo , q u a n d o o c o r r e e m circunstâncias

específicas de internação h o s p i t a l a r , e às d iversas situações q u e e la d e f l a g r a .

P a r a t a n t o , c lass i f i ca remos as depressões e m dois g r a n d e s g r u p o s , que d e n o m i n a r e m o s

Depressão Pato lóg ica (Depressão M a i o r - D S M I I I - R ) e Depressão R e a t i v a ( L u t o sem

Comp l i cação - D S M I I I - R ) (6).

N o I a g r u p o (Depressão M a i o r ) , des tacam-se c o m o s ina is e s i n t o m a s p r e d o m i n a n t e s :

e s t r e i t a m e n t o das pe r spec t i vas ex i s t enc ia i s até seu a n u l a m e n t o ;

ambivalência a fe t i va ( carac te r i zada , sobre tudo , p e l a querelância e re f ra tar i edade ) ;

agi tação p s i c o m o t o r a ( inquietação);

- perturbações d o ape t i t e ;

persistência dos s i n t omas p o r m a i s de duas semanas ;

a m o r f i s m o a f e t i vo ;

i s o l a m e n t o ;

- ide ias a u t o d e s t r u t i v a s ;

- insónia, h i p e r s o n i a ;

- prostração, a p a t i a ;

não percepção dos m o t i v o s q u e g e r a m o es tado an ímico , c o m eleição de " B o d e s

expiatór ios" q u e se a l t e r a m r a p i d a m e n t e ;

c u l p a i n j u s t i f i c a d a .

Já n o 2" g r u p o ( L u t o sem Comp l i cação ) , o b s e r v a m o s situações m a i s a t e n u a d a s , das

q u a i s se d e s t a c a m :

e n t r i s t e c i m e n t o , t o d a v i a , c o m permanênc ia de pe r spec t i vas ex i s t enc ia i s ;

situação de p e r d a ( luto) c l a r a m e n t e l o c a l i z a d a n o t e m p o e espaço histórico d o i n d i ­

v íduo ( p o r ele pe r ceb ida ) ;

e m p o b r e c i m e n t o de a feto , m a s sem p e r d a de sua modulação q u a l i t a t i v a ;

- s e n t i m e n t o de angústia l i g a d a ao c o n t e x t o de p e r d a .

3 6

A t e n d i m e n t o l ' s i< c >l< >< | i< <> n u ( r i i t i n d e 1 c i a p i a I n t e n s i v a

No I l o s p i l a l ( i e r a l , o s e g u n d o g r u p o aparece c o m u m a frequência b e m m a i s a l t a que o

p i ' i r o , no q u a l a l g u m a s circunstâncias específicas d a situação de relação d o indiv íduo

1 1 H I I a doença e internação se d e s t a c a m :

depressão de pós-operatório;

depressão r ea t i va dc pós-parto (não c o n f u n d i r c o m depressão p u e r p e r a l ) ;

depressão e m situações críticas de m o r t e i m i n e n t e [ E . K . Ross (4,5)];

s i n t omas d a angústia de m o r t e ;

depressão d i a n t e d a p e r d a d e f i n i t i v a de ob je tos (amputação, diagnóst ico de doença

crónica);

depressão p o r estresse h o s p i t a l a r , l i g a d a à fase de exaustão d e n t r o d o critério d o

S .G .A . de Selye e/ou H o s p i t a l i s m o [Sp i t z (10,26) ] .

Nesses casos, a situação de p e r d a e o processo de e laboração d o l u t o são identificáveis

n o d i s cu r so d o pac i en t e , c o m aval iação m a i s a t e n t a p o r p a r t e d o t e r a p e u t a .

Nas depressões pato lóg icas , g e r a l m e n t e t em-se u m histór ico p r é -mórb ido l i g a d o a

i ml ros episódios s i m i l a r e s e, ao l o n g o d a v i d a d o ind iv íduo, o g r a u de c o m p r o m e t i m e n t o

a l c i i v o e as ide ias de autodestruição são b a s t a n t e i n t ensas , a ausência de fa tores c i r c u n s ­

tanc i a i s c l a ros n o r m a l m e n t e está presente e, m e s m o q u a n d o t emos fatores desencadeantes

r ca t i v o s c o m o os j á v i s t os , a inconstância d o d i s c u r s o d o p a c i e n t e d e n u n c i a q u e estes f u n ­

c i o n a r a m apenas c o m o d e f l a g r a d o r e s d e u m processo m a i o r , e não c o m o seu causado r .

A resistência às t e n t a t i v a s de a j u d a é g r a n d e , ao m e s m o t e m p o e m q u e s o l i c i t a m a p o i o

o t e m p o t o d o .

Nas situações específicas de a p a r e c i m e n t o de fenómeno depress ivo q u a n d o d a pessoa

i n t e r n a d a e m H o s p i t a l G e r a l , é de f u n d a m e n t a l importância o diagnóstico d i f e r e n c i a l p o r

p a r t e d a e q u i p e e as m e d i d a s terapêuticas cabíveis.

S e m p r e é i m p o r t a n t e s a l i e n t a r que as depressões a l t e r a m não só o estado an ímico d o

pac i en te , c o m o t ambém p o d e m p r o v o c a r alterações nas respostas imunológicas e, o b v i a ­

m e n t e , e m função d a a p a t i a e prostração, a part ic ipação a t i v a d o pac i en t e e m seu processo

de recuperação ( q u a n d o é o caso) c o m p r o m e t e - s e s o b r e m a n e i r a .

D e s t a c a m o s a l g u n s p o n t o s i m p o r t a n t e s a se rem cons ide rados p e l a e q u i p e n o a c o m p a ­

n h a m e n t o desses pac ientes :

a) A r a p i d e z n o Diagnóst ico D i f e r e n c i a l ( descar ta r poss ib i l i dades orgânicas o u ou t r o s

distúrbios psicóticos).

3 7

Page 26: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

P s i c o l o g i a H o s p i t a l . i r

I)) Continência c presença ao l ado do pac iente , m e s m o q u a n d o este sc mos t r a r e l i a l i

à e q u i p e .

c) Ava l i ação c o n j u n t a dos aspectos e m o c i o n a i s e físicos q u e se sobrepõem,

d) N a s depressões rea t i vas , a c o m p a n h a m e n t o e a p o i o psicoterápico i n t e n s i v o de G

a a u x i l i a r o indiv íduo n a e laboração de l u t o e/ou angústia de m o r t e .

e) A p o i o e or ientação às pessoas q u e têm representação a f e t i v a s i g n i f i c a t i v a p.u a ,,

pac i en t e de f o r m a que estas t ambém a t u e m c o m o agentes terapêuticos.

f) B u s c a de focos m o t i v a c i o n a i s q u e p e r s i s t a m n o pac i en t e de f o r m a a p r o v i d e n c i a I , ,

q u a n d o possível e estimulá-los.

g) N a s depressões patológicas, é imprescindível a solicitação de aval iação específii a

p a r a introdução de medicação de a p o i o , a lém de a c o m p a n h a m e n t o psicoterápii o

h) Nesses casos, p r i n c i p a l m e n t e orientação à equ ipe e vigi lância m a i o r sobre o paciente

e m função de a u m e n t o d o r i s co de t e n t a t i v a de suicídio.

i) N o s casos e m q u e a depressão está assoc iada à situação de m o r t e i m i n e n t e , c om

prognóst ico r e s e r vado , c o n s i d e r a r s e m p r e o m o v i m e n t o d o p a c i e n t e , p e r m i t i n d o

que ele d e t e r m i n e o c u r s o de sua e laboração sobre a m o r t e .

O B S . : C u i d a d o c o m as antecipações, c o m o " P a c t o d o Si lêncio", o u a i n d a c o m a i

d i f i c u l d a d e s q u e m u i t a s vezes pac i en t e , famíl ia e e q u i p e e n f r e n t a m p a r a d e n u n c i a i

e d i s c u t i r a situação de m o r t e e m o r r e r ,

j ) A i n d a nesse c o n t e x t o , as defesas p o r p a r t e d a e q u i p e , c o m o e v i t a r c o n t a t o c o m i >

pac i en t e , falsas informações q u e p o d e m ser c o n t r a d i t a d a s , d i s t a n c i a m e n t o e f r ieza

n o c o n t a t o d e v e m ser de tec tadas e d i s c u t i d a s e n t r e os c o m p o n e n t e s .

N ã o p o d e m o s esquecer que a hospital ização t r a z , e m seu b o j o , situações c la ras de pe rda

(saúde) e l u t o , e que os q u a d r o s reat i vos são de frequência bas tante a l t a . I m p o r t a n t e ressaltar

que as mobi l izações ge radas p o r situações graves de p e r d a nas qua i s a e laboração d o l u t o

mos t ra -se c o m p r o m e t i d a p o d e m desencadear u m processo de depressão m a i o r .

O f enómeno dep r e s s i v o v i v i d o p e l o p a c i e n t e i n t e r n a d o n o H o s p i t a l G e r a l , se não

c o n s i d e r a d o e a c o m p a n h a d o , p o d e t o r n a r - s e o d i v i s o r d e águas e n t r e a o p ç ã o p e l a

v i d a o u a e n t r e g a à m o r t e . Pode-se o b s e r v a r inúmeros casos e m q u e , e m b o r a o p r o g ­

nóst ico d o p a c i e n t e fosse b o m , a depressão q u e se i n s t a l o u f u n c i o n o u c o m o a g r a v a n t e

ser i íssimo de seu e s t a d o b i ops i co l óg i co , d e r i v a n d o p a r a a g r a v a m e n t o s somát icos d o

q u a d r o c l ín ico , e e v e n t u a l m e n t e l e v a n d o à m o r t e . E , m e s m o n a q u e l e s casos e m q u e a

m o r t e é inexoráve l , a e l aboração d a angúst ia de m o r t e é q u e p o s s i b i l i t a a estruturação

d o desapego c o m o cond i ção p a r a ace i tação de u m m o r r e r p e r m e a d o p o r s e r e n i d a d e e

3 8

A i . n i l i i i i e i i t o Ps ic o l ò g i c o n o C e n t r o d e T e r a p i a I n t e n s i v a

i a , a o , o u , ( a s o contrár io , o a i i l o a b a n d o n o q u e i n e v i t a v e l m e n t e r e d u n d a e m s o l r i -

I I I I l l l i i , desespero e do r .

Nossa função n o a c o m p a n h a m e n t o dessas pessoas pressupõe: continência, s o l i c i tude ,

Dl i , \a c , s o b r e t u d o , u m estado pessoal b e m e q u a c i o n a d o p a r a que não c a i a m o s nas

u n e s I o n nas de p o s t u r a q u e são c a r a c t e r i z a d a s pe los do is e x t r e m o s : f r i e z a e indiferença

p o i m u l ado ; desespero, d o r e s o f r i m e n t o p o r o u t r o .

Hamções de Perda no Paciente Pós-Cirúrgico6

I a n ge ra l , pensa-se nas reações de p e r d a e m c i r u r g i a s mutilatórias, q u a n d o , p r i n c i p a l m e n t e

p a r t e d o c o r p o , i m p o r t a n t e , g r a n d e o u desejável, f o i r e t i r a d a ; p o r e x e m p l o , u m braço ,

a p e r n a , es tômago , o l ho s o u pu lmão . T a l v e z a r e spos ta m a i s dramát i ca des ta espécie

dc v ivência de p e r d a seja o c o n h e c i d o " m e m b r o f a n t a s m a " , q u a n d o , após a amputação ,

o p a c i e n t e c o n t i n u a t e n d o a sensação de p o s s u i r o m e m b r o p e r d i d o . N ã o se sabe até

que p o n t o esta r e spos ta é d e v i d a à est imulação c o n t i n u a d a de fibras ne r vosas c o r t a d a s ,

mas pa r e c e q u e t e m p a p e l i m p o r t a n t e u m a t e n t a t i v a psicológica de não desprende r - s e

da p a r t e p e r d i d a .

Nesse p o n t o tem-se c l a r a m e n t e d e n u n c i a d o que esquema c o r p o r a l , c o m o evento neu ros -

sensor ia l [destaca-se aí a existência d a percepção sometésica d o Homúncu lo Sens i t i vo de

I V n l i e l d e R a s m u n s e n (7)] e a u t o i m a g e m c o m o evento bas i camen te psicológico associam-se

c mesc lam-se de f o r m a quase indissociável. A própr ia estruturação d a consciência d o E U

se dá pe las experiências c o r p o r a i s d a cr iança assoc iadas a interpretações das sensações

e vivências pessoais. Tem-se o q u e t e o r i c a m e n t e é c h a m a d o de E U físico e E U psíquico

i n t e g r ando - s e e o r i g i n a n d o então a Consciência d o E U (9).

Nesses casos m a i s graves , e m b o r a a e q u i p e esteja quase c e r t a ao p e r c e b e r que seu p a ­

c iente sofrerá u m s e n t i m e n t o de p e r d a , e la ta lvez não t e n h a consciência d o efeito g rave que

ta is reações p o d e m ter sobre a recuperação i m e d i a t a o u sobre u m a adaptação e v e n t u a l à

pe rda . Ta l v e z não pe r ceba que l e v a n d o o pac i en te a f a l a r l i v r e m e n t e sobre seus sent imentos ,

m u i t o p o d e ser fe i to p a r a i m p e d i r u m r e s u l t a d o desfavorável.

Nas operações menores , c o m remoção de par tes menos i m p o r t a n t e s e menores do c o r p o ,

e, s ob r e tudo , c o m a exérese de par t es indesejáveis o u afetadas, e m b o r a se v e r i f i q u e m reações

m a i s suaves, t ambém estas p o d e m t e r u m efeito s i g n i f i c a t i v o sobre a convalescença.

6 - E x t r a í d o , a d a p t a d o e c o m p l e m e n t a d o a p a r t i r d e B i r d , B . (1), Conversando com o Paciente.

3 9

Page 27: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

P s i c o l o g i a H o s p i t a l a r

O m a i s difícil dc c o m p r e e n d e r c que , m e s m o d u r a n t e a c i r u r g i a , q u a n d o a b s o l u t a m i >u>

n a d a é r e t i r a d o , p o d e h a v e r u m a p e r d a r e a l , u m a p e r d a â q u a l a l g u n s pac ientes rcauri||

des f avo rave lmen te . O que sempre se p e r d e e m q u a l q u e r c i r u r g i a c a i n t e g r i d a d e d pu

A pe le é c o r t a d a e n u n c a m a i s será a m e s m a . Parece r idículo que u m pac i en t e reaja a i t t |

tão p e q u e n o , m a s acontece .

C a r a c t e r i s t i c a m e n t e , as reações de p e r d a são imprevis íve is . U m p a c i e n t e pode n.tti

t e r u m s e n t i m e n t o de p e r d a e m respos ta a u m p r o c e d i m e n t o m a i o r , e m c o n t r a p a r t i d a

so f r endo u m a intervenção m e n o r , p o d e so f rer u m s e n t i m e n t o de p e r d a a c e n t u a d o . I . . |

inconsistência e m g e r a l p o d e ser c r e d i t a d a ao fa to de que ta is reações não se d e v e m apentt

à r e a l i d a d e d o q u e se p e rde . São a l t a m e n t e pessoais e d e p e n d e m e m l a r g a escala do siff

n i f i c a d o específico que o pac i en t e a t r i b u i à p a r t e a f e t ada e à sua função. Por e x e m p l o ,

pac i en t e cu ja v i d a g i r e ao r e d o r d o p r a z e r p o r sua h a b i l i d a d e física p o d e sent ir -se a r r a s a i l i ,

p e l a p e r d a d o m o v i m e n t o l i v r e de u m m e m b r o , m e s m o que este não seja r e m o v i d o . Era

ta is pac ientes , a fixação, r i g i d e z o u disfunção d o m e m b r o p o d e c o n s t i t u i r a p e r d a m a i o i

E m o u t r a s p a l a v r a s , m a i s i m p o r t a n t e que o a to c irúrgico, a interpretação que o pac i cn ie

dá a este é que d e t e r m i n a suas reações e relação c o m o evento .

A c i r u r g i a que i m p l i c a os o lhos o u os órgãos geni ta is quase sempre evoca reações de perda

que p o d e m ter p o u c a relação c o m prejuízo físico. A c i r u r g i a que afeta todas as par tes visí­

veis do c o r p o - face, escalpo, o re lhas , na r i z . . . quase sempre é seguida p o r reações pessoais

exclusivas de p e r d a . Porém, n u n c a é i n t e i r a m e n t e seguro i n f e r i r qua is operações provocarão

ta is reações, sendo m u i t o m a i s p rove i t o so t e n t a r d e s c o b r i r a aval iação que c a d a pac iente

a t r i b u i à p e r d a que v a i sofrer.

N ã o se p o d e d e i x a r de t e r e m m e n t e que , c o m o se disse, o u n i v e r s o de símbolos, va lores

e vivências pessoais d o pac i en t e é que v a i i n f l u e n c i a r m u i t o sua interpretação e reação â

p e r d a . N o e n t a n t o , p r i n c i p a l m e n t e n a c u l t u r a o c i d e n t a l , sabc-sc que existe u m a correlação

íntima ent re o s en t imen to de p e r d a e a relação do indivíduo c o m a m o r t e , esta r epresentando

a p e r d a m a i s a b s o l u t a e irreversível q u e a lguém p o d e t e r e q u e é d e n u n c i a d a e m t odas as

situações e m q u e o u t r o s t i p o s de p e r d a s a c o n t e c e m n a v i d a d a pessoa. N o caso d o pac i en te

pós-operado e m C T I , é de s u p o r q u e a questão d a m o r t e esteja i n t i m a m e n t e presente e m

suas vivências, se jam i n t e r n a s , s e j am a m b i e n t a i s , e x a c e r b a n d o ass im essa corre lação. Da í

0 a g r a v a m e n t o d o risco de processos d i s soc i a t i vos , depress ivos , l i g a d o s a essa v ivência.

As reações de p e r d a pós-operatórias, m u i t a s vezes, e x e r c e m u m p a p e l a t i v o e m o u t r a s

reações cirúrgicas, e m p a r t i c u l a r n a depressão e n o es tado d e l i r a n t e . Essa conexão é tão

c o m u m e i m p o r t a n t e que todos os pac i entes d e p r i m i d o s e c o m del ír io d e v e m ser suspeitos

dc estar s o l r e n d o s en t imen tos g r a n d e s de p e r d a , dos qua i s ta l vez não t e n h a m consciência.

4 0

A l l i i n i M i t i i Psic < >l< .< |i< o n o ( I I I I I K I ( I n l e i a p i a I n t e n s i v a

i p a n e d o t r a b a l h o d o psicólogo, | a t u o , 6 s empre b o m l e r e m men t e q u e a depressão

Ntiido d e l i r a n t e p o d e m ser, p e l o menos e m p a r t e , u m a t en ta t i v a d o p a c i e n t e de negar

m i i i a n p e n s . i l o s s en t imen tos d e p e i d a .

At . . m b m o n t o Psicológico ao Paciente Não Cirúrgico

t l u t rus pessoas p o d e m necessi tar dos c u i d a d o s d o C T I , i n d e p e n d e n t e m e n t e d o processo

, Irúrgico. As situações de p o l i t r a u m a t i s m o , as p a t o l o g i a s orgânicas m a i s graves l e n l a r l o s ,

QUlldros p u l m o n a r e s , r ena i s etc.) l e v a m , m u i t a s vezes, o indiv íduo à internação ncsia u m

j i d e , a b r i n d o - s e a p o r t a p a r a u m per íodo de vivências p o n t u a d o p e l o sofrer, p e l a

n i i n e n t e , pe la angústia e pe l o i s o l a m e n t o .

A convivênc ia c o m a própr ia m o r t e e a d o o u t r o é m u i t o f r e q u e n t e no ( I T I , l c m - s e

Observado q u e , ao l o n g o destes anos , as vivências e x p e r i m e n t a d a s pe las pessoas que p a s

. a i . i n i a l g u m t e m p o nesta situação p r o v o c a r a m , e m m u i t a s delas, mudanças I . K I K a i s n o

, , i , icesso de existência, não só p a u t a d a n a condição de alteração orgânica, mas , s< .1 i r e t l •< l« i

n a i n t ens idade d a v ivência de m o r t e e m o r r e r .

Para c u i d a r dessas pessoas, é i m p o r t a n t e que a própr ia d imensão de m o r t e e m I I d o

Pro f i ss iona l de saúde, p a r t i c u l a r m e n t e d o psicólogo, b e m c o m o a d o so frer e m u m l e n i tdl I

bas tante a m p l o , seja t r a b a l h a d a (dado a q u i d a t e r a p i a d o t e rapeu ta ) , u m a vez que a Al itU

de do psicólogo s empre estará vulnerável ao sofrer , po i s suas defesas r a c i o n a i s I U S . K l a i n< i

e o l i d i a n o ) p o d e m i n t e r f e r i r m u i t o n o processo de relação pessoa a pessoa e x i g i d o de

d o C T I . T r a t a - s e , p o i s , d a equação pessoa l c o m o ind iv íduo e t e r a p e u t a q u e pret LM II

alcançar, e m q u e o p o n t o de equi l íbr io está e q u i d i s t a n t e d a f r i e za d a r a c i o n a l i z a r a , i e d o

e n v o l v i m e n t o d e s o r g a n i z a d o q u e o excesso de s ens ib i l i dade p o d e t raze r .

A a t i t u d e d o psicólogo d i a n t e d a v i d a e d a m o r t e p o d e ser u m f a t o r m a u a n u pa ra I

pessoa q u e este a c o m p a n h a , d a d a a sua v u l n e r a b i l i d a d e e dependência, e m u m m o m e n t o

e m que suas defesas se e s v a z i a m , e seus va l o res e v e rdades ( adqu i r i dos ) estão e m p r o f u n d o

q u e s t i o n a m e n t o p e l a questão m a i s básica q u e a existência t r a z (e q u e m u i t a s v e z e s n o s

negamos a ver ) , que é a relação ínt ima e n t r e v i d a e m o r t e .

A d i a n t e serão l e van tadas a l g u m a s considerações sobre t a l relação, c o m o l a m b e m sobre

a m o r t e e o m o r r e r .

4 1

Page 28: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

P s i c o l o g i a H o s p i t a l a r

Fatores Ambientais como Causadores ou Agravantes do Quadro Psico-Orgânico do Paciente

Sabe-se que o C e n t r o de T e r a p i a I n t e n s i v a possu i a l g u m a s características especílicas < |in

i n t e r f e r e m d i r e t a m e n t e n o estado e m o c i o n a l d o pac i en t e .

Situações c o m o as descr i tas a s egu i r p r o v o c a m alterações n o estado d o pac i en t e , l a n i i i

n o nível físico (orgânico) c o m o psíquico ( emoc iona l ) :

a) estresse c o n s t a n t e d o pac i en t e ;

b) tensão c o n s t a n t e d o pac i en t e ;

c) i s o l a m e n t o d o pac i en t e p e r a n t e as f i gu ras q u e l h e g e r a m segurança e c o n f o r t o ;

d) relação i n t e n s a c o m a p a r e l h o s e x t r a e intracorpóreos;

e) c l i m a de m o r t e i m i n e n t e ;

f ) v isão e s t e r eo t i pada de i r r e v e r s i b i l i d a d e d o q u a d r o mórb ido ;

g) p e r d a d a noção de t e m p o e espaço;

h) part ic ipação d i r e t a o u i n d i r e t a d o s o f r i m e n t o a l h e i o etc.

N o simpósio sobre fatores de ans iedade n o t r a t a m e n t o i n t e g r a d o d o pac i en te , o professoi

M a x H a m i l t o n , d a U n i v e r s i d a d e de Leeds , I n g l a t e r r a , apresen ta 16 situações de distúrbios

e m o c i o n a i s causados p e l a i n t ensa ans i edade d a pessoa e n f e r m a , fatores estes secundários à

e t i o p a t o g e n i a d a moléstia, ma s t r a z e m cons i go u m peso e n o r m e n a evolução d a pa to l o g i a

e m função j u s t a m e n t e d a ans i edade , causada pe las situações sup rac i t adas .

Este , então, ser ia o g r u p o n o q u a l fatores a m b i e n t a i s p o d e r i a m p r e j u d i c a r de a l g u m a

f o r m a a evolução d o pac i en t e . E a q u i não p o d e m o s nos esquecer de que q u a l q u e r alteração

n o estado e m o c i o n a l d o pac i en t e re f le te d i r e t a m e n t e n o seu q u a d r o cl ínico.

Fatores Orgânicos como Reflexos Decorrentes do Período de Internação

D e n t r e eles, p o d e m o s c i t a r d e t e r m i n a d o s s i n t o m a s , c o m o :

a) agitação;

b) depressão;

c) a n o r e x i a ;

d) insónia;

e) p e r d a d o d i s c e r n i m e n t o .

4 2

A t e n d i m e n t o Psi< n l o q i i o n o C e n t r o d e l e i a p i a I n t e n s i v a

ai [ n i c i a n d o - s e pela agitação, p o d e m o s já i d e n t i f i c a r u m a reação bas tan t e ave rs i va à

recuperação da pessoa, po is esta I r a / , c o m o r c l l e x o orgânico , s o m a d o à ans i edade ,

a u m e n t o d a pressão a r t e r i a l , d i f i c u l d a d e s c irculatór ias, b a i x a resistência à d o r .

S e g u n d o S/.asz (2Í5), a tensão a u m e n t a a c a p a c i d a d e de atenção à dor , d i m i n u i n d o

o l i m i a r e a e x c i t a b i l i d a d e d a pessoa, b e m c o m o , e m m u i t o s casos, b l o q u e a n d o até

a absorção de cer tas d r ogas .

In A dcjiirssão e n t r a r i a c o m o u m a instância final n o q u a d r o psíquico e v o l u t i v o do e n -

l i r i n o , cujos m e c a n i s m o s de defesa, c o m o a rac ional ização, a negação e a projeção,

vcem-sc f a l i dos , ap r e s en t ando - s e u m a a p a t i a à v i d a e a persistência de fantas ias

mórbidas, m u i t a s vezes e v o l u i n d o n e g a t i v a m e n t e até a m o r t e sem u m a expl icação

técnica plausível.

D e v e m o s ressa l tar a q u i q u e cer tos distúrbios orgânicos, p r i n c i p a l m e n t e hidrolíti-

CO, c o m o m e t a b o l i s m o d o potássio, p o d e m t r a z e r q u a d r o s de depressão, mas c o m

cono tação orgân ica , b a s i c a m e n t e p e l a in ib ição de áreas d o s i s t ema l ímb ico . A s

depressões p o s s u e m a i n d a o u t r o s aspectos e fatores desencadeantes , p a r t e deles j á

m e n c i o n a d o s a n t e r i o r m e n t e .

c) D e v e m o s r e s s a l t a r q u e a anorexia a c o m p a n h a , m u i t a s vezes , a depressão, s e n d o

t a m b é m u m a f o r m a de agressão a u t o d i r i g i d a . A a g r e s s i v i d a d e a u t o d i r i g i d a é

d i t a d a p o r M u n i z e m sua o b r a 0 Tratamento da Angina e do Enfarto (8), a s s o c i a d a

a u m a espéc ie d e p r o j e ção d o s p rópr i os s i n t o m a s a o m e i o , " n a d a está b o m " ,

" a c a m a é r u i m " , " a c o m i d a é péss ima" , " a e n f e r m a g e m não a t e n d e d i r e i t o " . A

pessoa t o r n a - s e de di f íc i l c o n t a t o e passa a r e c l a m a r e s o l i c i t a r a t o d o s o t e m p o

t o d o , m u i t a s vezes n e g a n d o a sua p r óp r i a p a t o l o g i a o u não a e n c a r a n d o c o m o

r e a l i d a d e p r e s e n t e .

A ag r ess i v i dade a u t o d i r i g i d a e as manifestações de depressão, s o b r e t u d o as m a s ­

ca radas , c o m p õ e m u m dos q u a d r o s psicológicos m a i s p e rn i c i o sos p a r a o pac i en te

i n t e r n a d o n o C T I , devendo sempre ser l evada e m con ta e feita intervenção psicológica.

Estímulos pos i t i v os , ca tarse , e laboração dos c o n f l i t o s , desmistif icação de fantas ias

mórbidas, c o n f r o n t o c o m os s en t imen to s de impotência e m o r t e i m i n e n t e que , e n ­

t r e o u t r o s , p o d e m estar assoc iados àquelas s i n t o m a t o l o g i a s , de f o r m a a ev i tar -se o

a g r a v a m e n t o d o q u a d r o e m o c i o n a l d o pac i en t e e, p o r consequência (nesses casos

d i r e t a ) de seu q u a d r o cl ínico c o m o u m t o d o .

d) A o f a l a r de insónia, e s tamo-nos r e f e r i n d o aos fatores suprac i t ados , nos qua is p o d e m o s

ter c o m o causadores d a m e s m a a agitação, a ans iedade etc. I m p o r t a n t e destacar que ,

nos q u a d r o s de depressão m a i o r , a insónia é u m dos s i n t o m a s m a i s p r o e m i n e n t e s ;

4 3

Page 29: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

P s i c o l o g i a H o s p i l . i l . i r

destaca-se o l a t o dc o sono estai ' , p a r a cer tos pac ientes , assoc iado à m o r t e , e i l n

desta impõe o q u a d r o dc insone .

e) A perda de discernimento t e m j á u m aspec to m a i s sério d o p o n t o de v i s t a p s i c o d i n .

co. T e m o s u m q u a d r o p e c u l i a r dos C T I s , p r i n c i p a l m e n t e daque les que a p r e s e m , n u

a m b i e n t e t o t a l m e n t e a r t i f i c i a l , s em l u z d o d i a e sem alterações s i gn i f i c a t i v as e m na

r o t i n a ( d i u r n a e n o t u r n a ) .

A cadência de a t i v i d a d e s cons tan t e s n o C T I , nas 2 4 h o r a s d o d i a , a r o t i n a r c p d i d i t

inúmeras vezes, o a c o r d a r e d o r m i r i n t e r m i t e n t e d o e n f e r m o , a ausência de c o n t a t o c

m u n d o e x t e r n o , a f a l t a de u m a conve r sa , de orientação, a c a b a m t r a z e n d o p a r a a pessoa,

c o m m a i s de três d ias de C T I , u m a p e r d a i n i c i a l de noção de t e m p o crono lóg ico , que . a,,

poucos , v a i se a g r a v a n d o c o m a p e r d a d a consciência de t e m p o e espaço físico e psicológit i >

[ s e gundo Jaspe rs (9)], de t a l f o r m a q u e c o m p o r t a m e n t o s e s t r anhos começam a aparece i

Frases desar t i cu ladas , fuga de ideias, a t i tudes obsessivas, o c o r r e n d o não r a r o derivações pata

q u a d r o s de l i r an t e s e desconfigurações d a i m a g e m pe r spec t i v a r e a l . No ta -se que a a l t e ra ra , i

s ensope rcep t i va in i c i a - se p e l a ausência de estímulos s imp les , c o m o o c o n t a t o c o m o d i a e

a n o i t e , e v a i se a g r a v a n d o à m e d i d a q u e o própr io c i c l o c i r c a d i a n o d o p a c i e n t e passa po i

processo de desorganização e m função d a ausência de a t i v i d a d e s , d a ação de fármacos,

das oscilações de consciência, d a f a l t a de estímulos específicos à pessoa etc.

Esse q u a d r o , q u e se d e n o m i n a v a de S índrome de C T I , ca r ece de atenção espec ia l ,

c u i d a d o este s empre q u e possível p r e v e n t i v o , b u s c a n d o a i n t e g r i d a d e psíquica d o e n f e r m o

p o r m e i o dc u m c o n t a t o c or ientação cons tan tes , t r a z e n d o - l h e a importância de sua co la­

boração n a evolução p r o d u t i v a de seu q u a d r o .

Est imulação v i s u a l , reforçar o p a c i e n t e a e x e c u t a r a t i v i d a d e s de q u e goste e t e n h a c o n ­

dição de d e s e m p e n h a r , v i s i t a o r i e n t a d a de f a m i l i a r e s , informações sobre o m u n d o e x t e r n o

que l h e p o s s i b i l i t e m c o n t a t o c o m o u t r a s coisas que não a doença são pequenas m e d i d a s que

p o d e m p r e v e n i r esse q u a d r o .

O Paciente Ansioso7

A ans i edade é o s i n a l d o p e r i g o d a m e n t e , u m s i n a l q u e se m a n i f e s t a e m presença de u m

p r o b l e m a . C o m o s i n a l , a ans iedade é análoga à d o r e tão i m p o r t a n t e q u a n t o esta. O h o m e m

7 - E x t r a í d o , a d a p t a d o e c o m p l e m e n t a d o a p a r t i r d e B i r d , B . (1), Conversando com o Paciente.

4 4

A t e n d i m e n t o l ' s i< o l o ( | i i o i i . i ( e n l i o ( l o l e i a p i a I n t e n s i v a

D I u p u d e v i v e i u o i i n a l i n e n l c s e m s e n l i i ans i edade . E s t e s en t i do d c ans i edade , c m g e ra l

I n p l a i l o a p e n a s c o m o u m a sensação, se i n a n i l e s l a , d e i x a n d o - n o s i n q u i e t o s , p r e o c u p a d o s ,

i i i l a d o s , o u <le a l g u m m o d o ameaçados.

I >(.,( m o d o , incapazes d e r e m o v e r na prática a e n f e r m i d a d e o u a ans i edade , p rocura - s e

| n i . I h o i s a í d a : l e n l a - s e e l i m i n a r a m b a s m e n t a l m e n t e . O u t r a co isa q u e se p r a t i c a , quase

, i n p i c a l g u m êxito, é des l i g a r a ans i edade d a e n f e r m i d a d e e t r a n s f e r i - l a p a r a u m

p i o l i l i I I I . I menos i m p o r t a n t e o u p a r a o u t r o n o q u a l se possa fazer a l g u m a co isa .

I v . s a distorção, negação e d e s l o c a m e n t o de s i n t o m a s físicos p o d e fazer u m p a c i e n t e

m n l i r - se m e l h o r , m a s n o processo e v o l u t i v o o q u a d r o cl ínico p o d e ser de t a l m o d o a l t e r a d o

i | i n 11 médico se perderá. Este é o m o t i v o p e l o q u a l , c o n v e r s a n d o c o m o pac i en t e ans ioso ,

p< issível l e v a n t a r u m q u a d r o v e r d a d e i r o d a doença q u a n d o a ans i edade d o pac i en t e é

M i o l o c a d a e m u m a p e r s p e c t i v a a d e q u a d a à sua e n f e r m i d a d e .

I «mbre - s e t ambém de que a resposta ansiosa d o pac i en t e à e n f e r m i d a d e a t u a l n u n c a se

d e v e apenas àquela afecção. A ans i edade é histórica. T o d a s as experiências passadas c o m

i h K uça o u o u t r o s p e r i g o s , s i m i l a r e s o u não, t e n d e m a a c u m u l a r - s e n a a t u a l . É deste m o d o

BUe cada pessoa g r a d u a l m e n t e constrói sua m a n e i r a característica de r e a g i r à e n f e r m i d a d e

c a ans i edade que e la p r o v o c a .

( ) c o n h e c i m e n t o das reações características dos pac ientes p o d e , c o m frequência, a j u d a r

I I e qu ipe a j u l g a r rápida e p r e c i s a m e n t e a ser i edade de suas afecções.

( ) l a t o de que a ans i edade t e n h a raízes históricas t ambém p o s s i b i l i t a e x p l i c a r u m pâ­

n i co " inexp l i cáve l " d o pac i en t e e m respos ta a u m a e n f e r m i d a d e o u a u m p r o c e d i m e n t o

médico m e n o r ; o p r o b l e m a a t u a l e sem importância a s s u m i u o l u g a r de u m a experiência

m a i s terrível de u m a época a n t e r i o r , t a l v e z de u m pe r í odo esquec ido d a infância, u m a

exper iência q u e há m u i t o está e n c a p s u l a d a e q u e , exce to p o r ocasião d a ameaça a t u a l ,

ass im p e r m a n e c e u d u r a n t e anos . E m v i s t a d a l igação d i r e t a d a ans i edade c o m o passado,

é sempre útil suspe i tar , n o caso de q u a l q u e r ans i edade inexplicável, q u e a reação presente

d o pac i en t e está sendo i n f l u e n c i a d a p o r a l g u m a co isa q u e acon t e ceu há m u i t o t e m p o , o u

que o p a c i e n t e está r e a g i n d o ass im p o r q u e está r e p e t i n d o o m o d o c o m o r e a g i u antes.

F a l a r c o m o pac i en t e sobre suas ans iedades e s en t imen to s não expressos o u m e s m o des­

conhec i dos r e d u z i m e d i a t a m e n t e o p o d e r n o c i v o destes. A s ide ias que p a i r a m m u d a s n o a r

são t r e m e n d a m e n t e ameaçadoras p o r q u e não c o n h e c e m l i m i t e s . C o l o c a d a s e m p a l a v r a s ,

p o d e m ser e x a m i n a d a s c o m o u m ob j e t o , n o q u a l e q u i p e e pac i en t e p o d e m e n x e r g a r seu

p e r i g o e, a s s im , ficar bas tan t e n e u t r a l i z a d o .

A ans i edade é p r o f u n d a m e n t e r i c a e m máscaras. U m de seus d is farces c o m u n s é u m a

s imples t r o c a de n o m e s , c o m o , p o r e x e m p l o , " s i n t o - m e ne r voso , t enso , f r a c o , assustado,

4 5

Page 30: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

I ' M C o l o ç j i . l I l o s | > i t . i l , i l

apreens ivo , instável, deprimido, a b o n e i i do , i n q u i e t o , p reo i up . i do , o u , então, l ieo Lulu

de no i t e , não cons i go comer , d o r m i r o u t o m a r u m a decisão". ( ) pac i en te usa centena i l l

p a l a v r a s e m l u g a r de ans i edade , e a l g u n s pro f i s s i ona i s estão p r o n t o s a a c r e d i t a r que <|

usa essas p a l a v r a s não está ans ioso , apenas u m p o u c o ne r voso , tenso, a b o r r e c i d o . N a u á|

v e r d a d e , a ans i edade i n c l u i t odas .

T a l v e z o o u t r o d i s fa rce c o m u m d a ans i edade é sua representação c o m o u m s ina l ou

s i n t o m a corpóreo . Esse d i s fa rce p o d e t r a z e r p r o b l e m a s , s o b r e t u d o p a r a o médico qtt i >

sente m a i s à v o n t a d e c o m as q u e i x a s físicas d o que c o m a ans i edade .

C o n t u d o , r o t u l a r esses s i n t omas físicos m e r a m e n t e c o m o " e m o c i o n a i s " o u " f u n c i o n a i 1

o u " a n s i e d a d e " é u m e r r o de i g u a l proporção . P a r a o pac i en t e , esse t i p o de rótulo é u m a

acusação q u e se sente o b r i g a d o a r e f u t a r e d a q u a l se de fende .

Por que não pensar nesses s in tomas físicos c o m o o m e d o de expressar e m o s t r a r ansiei [adi

d o pac iente? Por que não i m a g i n a r q u e o fa to de ele c o n t a r ao méd ico essas reações físii u

a situações tens ivas é seu m o d o de l h e d i z e r que se sente ans ioso d i a n t e delas? (Salienta-sc

a q u i o uso do m e c a n i s m o de conversão, m u i t a s vezes u t i l i z a d o c o m o f o r m a de manifestai .1.1

d o s e n t i m e n t o de ans i edade e ameaça. )

A ans i edade t ambém se esconde p o r trás de o u t r a s emoções: os pac i entes q u e se tot

n a m e x t r e m a m e n t e irritáveis, agressivos, p o d e m estar r e a g i n d o a u m a situação subjacente

p r o d u t o r a de ans i edade .

O u t r o s pac i en tes , e m resposta a situações assustadoras , r e co lhem-se e t o r n a m - s e fr ios ,

p a r a l i s a d o s e m u d o s . Essa reação ao p e r i g o e m ge ra l s i g n i f i c a u m c o n f l i t o e n t r e a depen ­

dência pass iva d a pessoa e sua ag ress i v idade v i o l e n t a : u m c o n f l i t o que o l eva a u m estado

de p a r a l i s i a .

O C T I , p o r todos os aspectos j á descr i tos, destina-se a ser u m g r a n d e g e rado r de situações

ansiógenas, a começar pe l o seu própr io estereótipo, c o m o m e n c i o n o u - s e a n t e r i o r m e n t e .

Pode-se então d e d u z i r que todos esses c o m p o n e n t e s ge rados p e l a ans i edade , descr i tos

pe l o D r . B i r d (1), têm, n o C T I , condições a b s o l u t a m e n t e e xac e r bado r a s , g e r a n d o c o m isso

reações emoc iona is das mais va r iadas . M i s t e r sa l i entar que vivências ansiógenas in te rmi t en tes

de l o n g a duração e/ou g r a n d e i n t en s i dade são u m a das p r i n c i p a i s causadoras d a Síndrome

G e r a l de Adap tação ( SGA ) e das Doenças de Adap tação (DA ) tão b e m i d e n t i f i c a d a s p o r

Selye (10). A experiência de internação n o C T I p o d e g e r a r n o pac i en t e , p o r causa desses

fatores, prejuízos físicos e e m o c i o n a i s e n o r m e s que , q u a n d o não cons ide rados , po i s reações

a p a r e n t e m e n t e secundárias ao q u a d r o mórb ido q u e d e u o r i g e m à sua internação, v ã o

g e r a n d o u m estado g e r a l de falência d i a n t e d o s o f r i m e n t o de t a l m o n t a que a c a b a m p o r

e n t r e m e a r e m - s e c o m a p a t o l o g i a de base m e s m a d o pac i en t e . C o n s i d e r a n d o os conce i tos

4 6

A l c t i i f l i i t i m i t o I V . i i o l o i | l o < e n l i n ( l o l o i a p i a I n t e n s i v a

,|, S i l u I Kl ) , O ( M l l avore i e s o b r e m a n e i r a a evolução d o estado dc a l a r m e p a r a o de es-

u i i l a i iK n l o i i o r a p i d a m e n t e , fa lo q u e p o d e passar despe rceb ido pe la e q u i p e e m função,

a h d e i o d a a t e n ç ã o q u e o q u a d r o d e b a s e e x i g e d e s t a .

O Paciente Agressivo8

"A agress i v idade , deve-se l e m b r a r , não é u m a ocorrência patológica, n e m r a r a : t odas as

pessoas a l g u m a s vezes se t o r n a m agress ivas . "

I l a u m aspecto d a ag ress i v idade m u i t o i m p o r t a n t e , s o b r e t u d o ao c o n s i d e r a r a saúde e

a i nlérniidade: a ag ress i v idade p o d e estar i m p l i c a d a e m todos os atos e inc iden t es d a v i d a

h u m a n a . N e n h u m a situação v i t a l e l i m i n a a p o s s i b i l i d a d e de u m s e n t i m e n t o , p e n s a m e n t o

o u a i o d c r a i v a . Desde o n a s c i m e n t o até a m o r t e , não há n a d a que não possa d e s p e r t a r e m

n o s u m s e n t i m e n t o de r a i v a . N ã o há n a d a q u e possamos fazer que não t e n h a , pe l o m e n o s

p a r c i a l m e n t e , u m a mot ivação agress iva .

A ag ress i v idade , b a s i c a m e n t e , é u m a proteção. É a força que , m u i t o m a i s q u e apenas o

m e d o , p e r m i t e p r o g r e d i r . O m e d o o u a ans i edade é u m s i n a l , u m a exper iência sensor ia l ,

u m av i so d e p e r i g o e, a s s i m , é essenc ia l p a r a q u a l q u e r a t i t u d e a u t o p r o t e t o r a . E m s i , o

m e d o não p ro t ege . O que o faz é u m a ação o fens iva o u de fens iva . T a l ação não é su f i c i ente ,

i si eto n a m e d i d a e m que o acesso à ag ress i v idade é s i g n i f i c a t i v o . A agress i v idade é que

d á ao a to sua ene r g i a .

T u d o que p o d e e deve-se saber, e m r e g r a , é que , e m l a r g a m e d i d a , a ag ress i v idade é

histórica e não " c a u s a d a " pe los p r o c e d i m e n t o s e p a l a v r a s d a e q u i p e , p e l o que esta d i z o u

laz. A l g u n s pac i en tes têm reações físicas: ba lançam a cabeça, se c o n t r a e m , o u às vezes

m e r g u l h a m e m u m silêncio o u r e s p o n d e m c o m monossílabos g u t u r a i s . O u t r o s pac ientes

a p r e s e n t a m p o u c a s alterações físicas e d e s c a r r e g a m t u d o pe las p a l a v r a s .

Os deta lhes de c o m o os pacientes e x p r i m e m a agress iv idade e do que os leva a isso não são

tão i m p o r t a n t e s p a r a a equipe c o m o seu r econhec imento de que boa parce la da a t u a l agressiv i­

dade se o r i g i n a do passado e se d i r i g e c o n t r a a equ ipe apenas p o r q u e estes agora r epresentam

alguém o u a l g u m a coisa desse passado que os ameaça. Bas icamente u m a a t i tude p ro j e t i va .

A agress i v idade d i r i g i d a ao a m b i e n t e p o d e r i a , então, ser i n t e r p r e t a d a c o m o u m a f o r m a

de o pac i en t e t e n t a r pro teger -se não só das agressões que sente que o m e i o lhe impõe , m a s

também das agressões que a doença e seus s i n t o m a s estão l h e c a u s a n d o .

8 - E x t r a í d o , a d a p t a d o e c o m p l e m e n t a d o a p a r t i r d e B i r d , B . (1), Conversando com o Paciente.

4 7

Page 31: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

P ' . M < > I < ). 11.1 | |oS|>Ít.ll. l l

l'i de s u m a importância des tacar a q u i do is pon tos re levantes n u s qua i s a man i l i - s t i

d a ag ress i v idade t e m características pecu l i a r e s ;

O p r i m e i r o , que desafortunadamente aparece com u m a frequência bastante a l i ; s In is| M I M .

do Bras i l , está l i gado à manifestação agressiva c omo a t i tude reat i va à situação de p r o l i i n i la itll

siedade, tensão e frustração; refere-se a q u i p r i n c i p a l m e n t e àquelas situações em que o pai H I I I I

p o r exemplo , a g u a r d a u m exame i m p o r t a n t e ou c i r u r g i a (com fantasias, medo , e x p e c t a m a i

após t r i c o t o m i a , en te roc l i sma o u u m longo período de j e j u m , descobre que o p r o c ed ime I , , i

ad i ado o u cance lado. M u i t a s vezes o aviso é dado t a r d i a m e n t e , sem outras explicações, e s e m ,

sobre tudo , p e r m i t i r - s e que o paciente mani fes te suas emoções e m relação ao o c o r r i d o . Nesse»

casos, explosões de r a i va , a companhadas de gr i tos , palavrões, ofensas d i r i g i d a s ao Hospi ta l ,

equ ipe o u ao pro f i ss iona l que está à sua frente são c omuns , ressalte-se a q u i , ma i s saudáveis i lu

que aquela pseudorresignação, que, e m b o r a não i n comode a equipe , processa estragos dc G11 m a

sub-reptícia, importantíssimos, n a autoconfiança do pac iente , e m sua confiança e aceitaçãt t d a

equ ipe , do t r a t a m e n t o , e e m sua d i spon ib i l i d ade e vontade de t ratar-se e ajudar-se.

O u t r a manifestação específica de agress iv idade está l i g a d a à fase de r e vo l t a , apresentada

p o r E . K . Ross (4,6) e m seus estudos sobre as reações d o pac i en t e d i a n t e d a m o r t e : i n c o n f o i

m i s m o , i so lamento , acusações, r e f ra ta r i edade ao con ta to são a l gumas das manifestações dessa fase, e cabe ressaltar-se a q u i que e la p o d e apa r e c e r e m o u t r a s situações críticas específicas

a lém d a de m o r t e i m i n e n t e : p o r e x e m p l o , n o processo de e laboração d o l u t o p e l a a m p u t a ­

ção dc u m m e m b r o o u ext i rpação de ó rgão d o c o r p o , situações i g u a l m e n t e f r equentes no

C T I . M a i s u m a vez, o r i en ta -se aos interessados que c o n s u l t e m o r o t e i r o bibl iográf ico de

estudos, n o fim d o presente capítulo, p a r a a p r o f u n d a m e n t o n o t e m a .

N u n c a é d e m a i s l e m b r a r que t o d a e q u a l q u e r reação d o pac i en t e t e m , c o m o e l emento

básico, seu u n i v e r s o simból ico, suas vivências e p r i n c i p a l m e n t e a f o r m a p a r t i c u l a r c o m o ele

está e n c a r a n d o e e l a b o r a n d o o episódio c o n f f i t i v o de doença, internação e t r a t a m e n t o , que

v i ve n o seu a q u i e ago ra , d e t e r m i n a d o pe l a sua h i s t o r i c i dade , pelas variáveis soc ioambien ta i s

que o c e r c a m e pelas relações e n t a b u l a d a s en t r e a e q u i p e , a famíl ia e o própr io pac i en te .

O Paciente com Agressividade Latente9

O que se disse é su f i c i ente q u a n t o à ag ress i v idade expressa. M a s , e q u a n t o à ag ress i v idade

que o pac i en te apresenta , mas não mos t r a? O u à agress iv idade la tente , m a s d a q u a l não t e m

9 - E x t r a í d o , a d a p t a d o e c o m p l e m e n t a d o a p a r t i r d e B i r d . B . (1) , Conversando com o Paciente.

4 8

A l i i n d i m c i n l o l ' s i i o l o i j i i n o ( o n t i o d o l o i a p i a I n t e n s i v a

,,,,, , i a . ' I , ma i s lai i l , de i e i l ido , lazer a lgo pe ran t e u m a agress iv idade a b e r t a . N ã o

t «cm i a / a o que s e ev i ta d e spe r t a r u m CÍO a d o r m e c i d o ; além disso, os próprios pac ientes

hn i l i i u m i o q u e r e r r e c onhece r a própria ag r ess i v i dade . C o n t u d o , q u a n d o se vê a l g u m a

i i u , a que pa rece ag ress i v idade c m u m pac i en t e , u m a t e n t a t i v a de c o n d u z i - l a p a r a u m a

• K p i c s s á o c l a ra pode ser de g r a n d e va l o r . E is to p o r q u e os s en t imen to s for tes , de q u a l q u e r

mu i u e / a , q u a n d o não expressos, p o d e m p e r t u r b a r o p e n s a m e n t o lóg ico e o c o m p o r t a m e n -

i o i i/oave l e , a s s im , c o n t u r b a r as t e n t a t i v a s de d iagnóst ico d a e q u i p e e de c o m o t r a t a r

l a i pai lente. ( ! o m frequência ta l vez m a i s d o que se i m a g i n a - , esses s en t imen to s estão

i i u l a i p r o f u n d i d a d e q u e e s c a p a m ao p o d e r d a e q u i p e de alterá-los, m a s , a l g u m a s vezes,

p i mi as pa l a v ra s f u n c i o n a m . M o s t r a r - s e disponível e in te ressado pe los s en t imen to s d o p a -

i |i ntc a u x i l i a a manifestação destes, f avorecendo ass im o a f l o r a m e n t o d a q u e l a agress iv idade

que de f o r m a la t en te p o d e g e r a r alterações i m p o r t a n t e s , c o m o episódios de somatização

rises convers i vas . Sa l i enta-se a q u i que a atenção ao conteúdo d o d i s c u r s o d o pac i en t e

i f u n d a m e n t a l , po i s não é r a r o esse d i s c o r r e r sobre seus medos , r a i vas , r e ssen t imentos de

I a f i g u r a d a , p o r e x e m p l o , f a l a n d o d a situação d o país, c o n t a n d o u m caso q u e o c o r r e u

Bom o u t r e m c q u e a p a r e n t e m e n t e não t e m n a d a a v e r c o m ele o u seu es tado de saúde, m a s

i | i i e c o n t a de f o r m a c i f r a d a a manifestação desses s e n t i m e n t o s la tentes .

( h i t r a f o r m a de ag r e s s i v i dade l a t en t e é a d o t i p o e m q u e m e l h o r se r i a chamá- la de

"fúria".

Ent re adolescentes e j ovens adu l tos , é bastante c o m u m esse t i p o de fúria i n t e r i o r , a q u a l

parece estar p o r trás de a l guns de seus inexplicáveis c o m p o r t a m e n t o s e p r o b l e m a s pessoais.

I ,m a l guns casos, a expressão do sen t imento é c l a ra , ao passo que , e m ou t ros , é r e p r i m i d a .

A l g u n s fatores c o m p o r t a m e n t a i s p o d e m c o n t r i b u i r p a r a a repressão d a agress iv idade e m

pac ientes i n t e r n a d o s , o n d e se des taca também o rece io de não ser ace i to p e l a e q u i p e . A ne ­

cessidade de apo i o e aceitação leva o pac iente , não r a r o , a e v i t a r d e m o n s t r a r seus sent imentos

à e q u i p e , p r i n c i p a l m e n t e os s e n t i m e n t o s l i gados à r a i v a e à h o s t i l i d a d e p o r t emer , e m suas

fantasias, represálias p o r p a r t e desta. Essa a t i t u d e c o n t r i b u i p a r a o a g r a v a m e n t o do q u a d r o

e m o c i o n a l d o pac i en t e , e e m a l g u n s casos a e q u i p e é corresponsável pe los s en t imen tos , po is

se co l o ca d i s t a n t e d o pac i en t e o u i n c o n s c i e n t e m e n t e reforça as a t i tudes i n a c e r t i v a s dele. O s

s en t imen to s que o pac i en t e p o d e susc i ta r n a e q u i p e t ambém d e v e m ser a l v o de observação

e ref lexão, p a r a q u e se ev i te a t u a r c o n t r a t r a n s f e r e n c i a l m e n t e n a relação.

Aque l e s j o v e n s q u e p r o c u r a m o méd ico e m ge ra l têm u m a agress i v idade r e p r i m i d a o u

la tente , aqueles q u e f a z e m t u d o p a r a não a g i r s e g u n d o seu i m p u l s o agress ivo o u , q u a n d o

a g e m , t e n d e m a a tacar -se . São esses j o v e n s q u e a d o e c e m física e m e n t a l m e n t e e p e d e m

a atenção d o méd ico . P r o c u r a m - n o p o r várias razões. M u i t o s são a u t o d e s t r u t i v o s e isso

4 9

Page 32: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

I ' ' . u o l o q i . i I l i i ' , | i i l , i l . i l

s empre é u m a p i s la p a i a a existência da agress i v idade r e p r i m i d a . A s s i m , q u a l q u c i |nvi u

q u e , de a l g u m a l i i r n i a , parece f adado ao fracasso, que parece i n c l i n a r - s c pa ra o insui i i

deg radação o u autodestruição, c suspe i t o de a g r e s s i v i d a d e . A suspe i ta j u s l i l n a s i n ||

i m p o r t a n d o o que d i z , faz o u os s i n t o m a s q u e apresen ta à equ ipe .

A o u t r a f o r m a que esses j o v e n s agressivos e n c o n t r a m p a r a c o n t r o l a r sua agressivit lai li i

adoecer . P a r e c e m ser m a i s suscetíveis às e n f e r m i d a d e s orgânicas que os jovens c o m i

saudáveis e, neste p a r t i c u l a r a spec t o , d e s e n v o l v e m s i n t o m a s psicossomáticos e rei

h i s t e r i f o r m e s e depress ivas.

Pacientes Suicidas no CTI

D i s c o r r e r sobre o suicídio e a t e n t a t i v a de suicídio de f o r m a m a i s a b r a n g e n t e l e var ia J

presente t e x t o a sa i r de seu propósito. O suicídio r epresen ta u m capítulo à p a r t e nos estudol

dos distúrbios psicológicos. Ater-se-á a q u i ao episódio d a pessoa q u e t e n t o u suicídi

per íodo e m q u e esta, q u a n d o é o caso, passou pe l o C T I .

A t e n t a r c o n t r a a própr ia v i d a não p o d e ser c o n s i d e r a d o u m even to n o r m a l n a histói \i

d a pessoa, e r a r a m e n t e essa situação o c o r r e e m função de u m episódio i so lado dessa mesmf

história. O que se q u e r d i z e r é q u e , ao a t ende r u m a pessoa que t e n t o u suicídio, m a i s atl

d o que e m o u t r o s casos, a e q u i p e e, p a r t i c u l a r m e n t e , o psicólogo, d e v e m estar atentos ad

t o d o d a pessoa.

C o n s i d e r a r e m o s p a r a fins didáticos e de aval iação cl ínica a t e n t a t i v a de suicídio apa­

r e c endo d e n t r o de duas m o d a l i d a d e s , c ons ide rando - se os critérios de L e v y (11): o suicídio

( tentat iva ) a t i v o e o suicídio ( t entat iva ) pass ivo .

N a p r i m e i r a moda l idade , tem-se o g r u p o de indivíduos que de l iberada e objet ivamente atenta

c o n t r a a própria v i d a . Nos C T I s encont ramos inúmeros casos, c o m o intoxicações exógenas. N o

Bras i l p r e d o m i n a m a ingestão de psicofármacos e de ou t r o s p r o d u t o s químicos, p o r exemplo ,

a soda cáustica, seguida de inalação de gás, cortes n o c o r p o ( p r e d o m i n a n t e m e n t e pulsos), uso

de a r m a s de fogo, quedas o u a provocação d e l i b e r a d a de ac identes, d e n t r e t an tos .

Nesses casos o p a c i e n t e chega ao C T I , q u a n d o a g r a v i d a d e das lesões o u p r o b l e m a s

g e rados n o o r g a n i s m o são de t a l m o n t a q u e inúmeros c u i d a d o s serão necessários p a r a

t e n t a r sua recuperação . N a m a i o r i a das vezes esses p a c i e n t e s dão e n t r a d a n o C T I v i a

P r o n t o - S o c o r r o , i n consc i en t e s , p o d e n d o v o l t a r g r a d a t i v a m e n t e à consciência depo i s de

a l g u m t e m p o (às vezes d ias depo i s de sua admissão).

C a b e à e q u i p e a l g u n s c u i d a d o s imprescindíveis , e o b v i a m e n t e o p r i m e i r o deles é a

atenção d i r e t a sobre o r i s co de m o r t e q u e a t e n t a t i v a p r o v o c o u , m a s c o m p l e m e n t a n d o

5 0

A t i i i i i l i i n i i n t o l ' s i i o lo i i i i o n o ( e n t i o d e l o r . i | ) i . i I n t e n s i v a

. i iileueào e m u i t o i m p o r t a n t e o b t e i dados d o pac i en te p o r intermédio d a famíl ia e/ou

rii i i i n p . i n l i . m t e s , c ass im que possível i n i c i a i c o n t a t o c o m o próprio pac i en t e . O s dados d a

10 a d a pessoa já p o s s i b i l i t a m ler u m a p r i m e i r a hipótese sobre o p e r f i l psicológico desta

i t i i o . i u d c r iscos que i r emos e n f r e n t a r < aso ela r e t o m e a consciência e v e n h a a r e c u p e r a r

l l l i i * funções v i l a i s t a n t o físicas q u a n t o psicológicas. O q u e s i gn i f i c a , nesse p r i m e i r o m o -

i i o . a l u a r p r e v e n t i v a m e n t e sobre o r i sco de n o v a t e n t a t i v a a i n d a n o C T I .

Vários fatores p o d e m l e va r o indivíduo a a t e n t a r c o n t r a a própria v i d a , desde distorções

K v r i a s na e s t r u t u r a d a p e r s o n a l i d a d e , e m que as pulsões tanáticas são fortíssimas, e n c a i -

R M I H I D - S C nesses casos distúrbios de o r d e m psicótica, até questões p s i c o p a t o l o g i c a m e n t e

11 li i I O S graves , m a s n e m p o r isso m e n o s críticas, c o m o o suicídio de balanço, c o m o sa l i en ta

A C a r m a (12), o u a t e n t a t i v a de suicídio p o r intenções m a n i p u l a t i v a s h i s t e r i f o r m e s , m u i t o

l o q u e n t e m e n t e obse rvadas e m adolescentes.

N o p r i m e i r o caso, o g r a u de m o r b i d e z d a e s t r u t u r a psíquica d o p a c i e n t e é b a s t a n t e

i p r o m e t i d o , seus antecedentes pessoais a p o n t a m c l a r a m e n t e p a r a u m p e r f i l psicótico,

i a b e n d o então à e q u i p e v ig i lância m a i s a t e n t a ao pac i en t e d u r a n t e a internação, e enca ­

m i n h a m e n t o e a c o m p a n h a m e n t o psiquiátrico tão l o go seja possível. N o s casos de p a c i e n ­

tes p o r t a d o r e s de depressão m a i o r , o diagnóst ico d i f e r e n c i a l d a depressão c intervenção

m e d i c a m e n t o s a e psicoterápica são f u n d a m e n t a i s . I m p o r t a n t e f r i s a r nesse p a r t i c u l a r que

o per íodo e n t r e o início d a med icação an t i d ep r ess i va até a p r o x i m a d a m e n t e 3 0 d ias após

es te é o m a i s crít ico. Estatísticas i n d i c a m u m a u m e n t o n o r i s co de t e n t a t i v a de suicídio

nesse per íodo d a o r d e m de 8 0 % .

Já nos g r u p o s de indivíduos q u e p o d e m ser e n q u a d r a d o s nas duas últimas m o d a l i d a ­

d e s sup rac i t adas , cabe ressa l tar q u e , inúmeras vezes, a v ivência de m o r t e i m i n e n t e e t o d a

mobi l i zação, t a n t o pessoal q u a n t o f a m i l i a r q u e o a t o ge ra , p o d e l e va r a u m a reaval iação

d e sua opção . Obse rva - se c o m o processo f r equen t e nesses casos u m a p r o f u n d a angústia,

s en t imen tos de fracasso, c u l p a , r e v o l t a , a u t o p i e d a d e . Processo esse q u e deve receber i m e ­

d i a t a m e n t e atenção psicológica, c o m o o b j e t i v o p r i n c i p a l de a u x i l i a r o pac i en t e a ree la ­

b o r a r suas vivências, va l endo-se o t e r a p e u t a i n c lus i v e d o m o m e n t o de g r a n d e f r a g i l i d a d e

e ausência o u e n f r a q u e c i m e n t o de suas defesas, de m a n e i r a a buscar-se novas a l t e r n a t i v a s

d e v i d a c o m a pessoa. Imprescindíve l l e m b r a r que o processo de a c o m p a n h a m e n t o não

p o d e l i m i t a r - s e ao per íodo de internação n o C T I e q u e , n a m a i o r p a r t e das vezes, deve ser

ex tens i vo ao g r u p o f a m i l i a r d o pac i en t e .

Este t ambém se e n c o n t r a m o b i l i z a d o e x p e r i m e n t a n d o s en t imen tos dos m a i s d iversos ,

c o m o c u l p a , impotência, r a i v a , c on f l i t o s in te rpessoa i s etc. Sabe-se q u e e m g r a n d e p a r t e

dos casos a famíl ia teve e terá part ic ipação i m p o r t a n t e n o processo de relação d o pac i en t e

5 1

Page 33: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

I ' s i ( o l o i j i . i I l o s p i t a l a l A l n n d i m o n l o l ' s i c D I I I I | I I I I n o ( o n l i o d o l o i a p i a I n t e n s i v a

c o m a v i d a . A intervenção psicológica o ma i s breve possível l o rna -sc cnlào p a i t e i n i i y i

d » t r a t a m e n t o . É i m p o r t a n t e , i g u a l m e n t e , nesses casos ressal tar l a m b e m q u e o p e i u n i u 11||

que o pac i en te p e r m a n e c e n o h o s p i t a l , n o r m a l m e n t e d e t e r m i n a d o u n i c a m e n t e p e l o a s p e i ||

bio lóg ico, deve ser a p r o v e i t a d o ao m á x i m o , inc lus i v e n a detecção dos focos coníl it ivo 1it||

l e v a r a m a pessoa a o p t a r p e l o suicídio e n a sensibil ização desta e de sua família part i I

c o n t i n u i d a d e d o a c o m p a n h a m e n t o psicológico pós-alta. É r e l a t i v a m e n t e a l t a a i n c i d em l i

de casos e m que após a a l t a t a n t o o pac i en t e q u a n t o a famíl ia b u s c a m n e g a r e o c u l t a i o I . H o

dos o u t r o s e de si mesmos , g e r a n d o u m a espécie de " p a c t o de s i lêncio" sobre o oc Iu

m a s n e m p o r isso os fatores desencadeantes d o even to são reso l v idos , o q u e faz c o m qui j

m a n t e n h a m os m e s m o s c o m p o n e n t e s c o n f l i t i v o s , n o pac i en t e e e m seus núcleos v i n c u la ri

m a n t e n d o ass im o r i s co de n o v a t e n t a t i v a bas tan t e e v iden t e .

A s e g u n d a m o d a l i d a d e m e n c i o n a d a é a d o suicídio pass ivo .

A q u i se e n c o n t r a m aque l es p a c i e n t e s q u e l i t e r a l m e n t e d e s i s t i r a m d a v i d a , p e s s o a »

desesperançadas, não r a r o depress ivas , q u e não e n x e r g a m p o s s i b i l i d a d e s q u a n t i t a i i\

e q u a l i t a t i v a s p a r a a sua existência. Esse t i p o de p a c i e n t e é e n c o n t r a d o e m m a i o r g i .n i

naque les p o r t a d o r e s de pa t o l o g i a s crónicas.

O suicídio pass ivo é o b s e r v a d o pe las a t i tudes a u t o d e s t r u t i v a s i n d i r e t a s , c o m o : a negl l

gência ao t r a t a m e n t o , a não observância das orientações médicas, a insistência e m rea l i za i

a t i v i d a d e s o u o u t r a s ações c o n t r a i n d i c a d a s p a r a seu q u a d r o c l ínico e f r e q u e n t e m e n t e q

a b a n d o n o p u r o e s imp les d o t r a t a m e n t o . São pessoas c u j a a t i t u d e de a u t o a b a n d o n o pei

m e i a o c o t i d i a n o . E m a l g uns casos, i n d e p e n d e n t e m e n t e das pe rspec t i vas prognósticas, e s s a

a t i t u d e passa a d o m i n a r o indiv íduo, d i f i c u l t a n d o s o b r e m a n e i r a a intervenção d a equ ip i

de saúde.

São indivíduos que p r e c i s a m m u i t o d a atenção e d a so l i da r i edade d a equ ipe e d a família,

m e s m o que d e m o n s t r e m indiferença o u r e v o l t a d i a n t e dessas t en t a t i v a s de aproximação.

O ps icó logo deve es tar a t e n t o a q u a l q u e r mani festação m o t i v a c i o n a l d o p a c i e n t e p a r a

utilizá-la c o m o e l e m e n t o de estímulo. E i m p o r t a n t e es tar consc i en t e de q u e a p i o r a r m a ­

d i l h a p a r a a e q u i p e de saúde é e n t r a r n a m e s m a s i n t o n i a d o p a c i e n t e e, p o r consequência,

"abandoná- lo " também. O t r a b a l h o c o m esse pac i en te most ra -se n a m a i o r i a das vezes árido

e p o u c o c o m p e n s a d o r , não o b s t a n t e os esforços dos q u e o c e r c a m . N o e n t a n t o , a busca

dc u m a relação q u a l i t a t i v a m e l h o r c o m a existência não p o d e a b a n d o n a r as intenções da

e q u i p e , i n d e p e n d e n t e m e n t e d o t e m p o supos to de s o b r e v i d a d o p a c i e n t e o u d o péssimo

prognóst ico que seu q u a d r o t e m .

Sabe-se, p e l a prática clínica, q u e u m pac i en t e q u e desiste de a judar -se , i n d e p e n d e n t e ­

m e n t e de seu q u a d r o clínico, t e m r e d u z i d a s , e m m u i t o , suas perspec t i vas rea is de sobrev ida .

52

I h i i , p o r t a n t o , o a l e r ta a t oda equ ipe que t r a b a l h a c o m pessoas que e n t r a r a m nesse estágio.

iVihcvciança, so l i c i tude e compreensão são i n s t r u m e n t o s indispensáveis p a r a a t e n t a t i v a

i l i a|uila . i pessoa que p o r t a n t o so frer desesperançou-se de si m e s m a .

0 Paciente com Alterações do Pensamento e Senso-Percepção: Considerações Gerais 1 0

t » i p i m e n t o c o m a r e a l i d a d e e alterações n a c a p a c i d a d e s enso -pe r cep t i va e/ou de i n -

n i prciação d o p e r c e b i d o p r o v o c a os delírios e as alucinações.

( )s delírios e alucinações d o del ír io, não i m p o r t a n d o o seu g r a u de b i z a r r i a , t e n d e m a

1 ur i s imples , d i r e t a s t en ta t i v a s simbólicas de n e g a r o c o n f l i t o r e a l d o pac i en t e . Seu conteúdo

l lmbólico, e m gera l , t e m u m ob j e t i vo d i r e t o de satisfação de u m desejo, que serve não apenas

, p r o b l e m a s a tua i s obscuros , m a s p a r a c r i a r falsas cu r a s e crenças q u e são o opos to , e m

a l g u m a f o r m a , d a situação a t u a l . P o r e x e m p l o , u m p a c i e n t e i n t o x i c a d o , que está con fuso

i d e so r i en t ado , e c u j a c a p a c i d a d e i n t e l e c t u a l so f reu u m a interferência temporár ia , p o d e

e x p e r i m e n t a r delírios de que é u m génio matemát ico.

M e s m o q u a n d o os delírios e alucinações d o estado d e l i r a n t e são desagradáveis, eles t e n ­

d e m a ser u m a t e n t a t i v a de e n c o b r i r p r o b l e m a s rea is q u e são a i n d a m a i s desagradáveis.

Sempre se deve supor que há p r o b l e m a s reais , d o a q u i e agora , e m u m pac i en te d e l i r an t e .

P rob l emas q u e são físicos, químicos o u psicológicos, o u u m a combinação dos três.

Não desanime ante a complex idade e a falta de sentido do estado de l i rante . C o m a l g u m tempo

e u m p o u c o de h a b i l i d a d e , o sent ido pode ser e n c o n t r a d o mesmo nas aberrações graves.

N ã o p r o c u r e causas i so ladas . R a r a m e n t e há apenas u m a . H á , e m g e r a l , vár ios fatores

c m j ogo p a r a trazê- lo à t o n a . A febre é u m agente c o m u m , tão c o m u m que a m a i o r p a r t e

de nós, d u r a n t e u m a febre a l t a , sofre p e l o m e n o s a l g u m a interferência n o f u n c i o n a m e n t o

m e n t a l . A s t o x i n a s p r o d u z i d a s p o r a l g u m a s moléstias são o u t r a causa , e t odas as enfer ­

m i d a d e s " t óx i cas " t e n d e m a a f e ta r a m e n t e , p r o v o c a n d o delírios. A s substâncias tóxicas

i n t r o d u z i d a s n o o r g a n i s m o p o d e m i g u a l m e n t e p r o d u z i r alterações n o ju í z o d a r e a l i d a d e

( pensamento ) e/ou n o senso-percepção. O álcool, p o r e x e m p l o , ta l vez seja u m dos agentes

m a i s c o m u n s d o es tado d e l i r a n t e , e o " d e l i r i u m t r e m e n s " t a l v e z seja a f o r m a d o es tado

de de l í r io m a i s e s p e t a c u l a r e l e t a l . A f a d i g a , os t r a u m a s orgânicos e a f o m e são o u t r o s

agentes i m p o r t a n t e s .

10 - E x t r a í d o , a d a p t a d o e c o m p l e m e n t a d o a p a r t i r d e B i r d , B . (1), Conversando com o Paciente.

53

Page 34: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

P s i c o l o g i a I l n s p i t . l l . i l

O s fatores psicológicos, e m b o r a dc g r a n d e importância et io lógica, sào m u i t a s vi I

subes t imados . P r o c u r a d o s c r e c onhec i dos , p o d e m ser inestimáveis não apenas pa t a . n|||

p r e e n d e r a razão d o e s t a d o d e l i r a n t e , mas p a r a o r i e n t a r b e m o seu t r a t a m e n t o . Deste i In

va le sempre a p e n a p r o c u r a r choques psicológicos, tensões e sen t imentos de p e r d a . ' I à I \ / m

situações psicológicas m a i s d i gnas de atenção se jam os fatos que ameaçam o u i n t e r r |

o c o n t a t o d o pac i en t e c o m seu própr io m u n d o p a r t i c u l a r , s o b r e t u d o a q u i l o q u e o afasta 111

pessoas, lugares e ob je tos f a m i l i a r e s , e d o fluxo de seus estímulos próprios.

M u i t o s i g n i f i c a t i v o o fa to de ter-se o b s e r v a d o inúmeros casos de pac i entes p o r t a d o !

de p a t o l o g i a s g raves , c o m prognóst ico r e s e r v a d o , q u e , após p a s s a r e m p o r u m pc li i

a n t e r i o r de e x t r e m o s o f r i m e n t o físico e e m o c i o n a l , e n t r a r a m e m q u a d r o de dissociaçAtd

c o m alterações pr imár ias i m p o r t a n t e s n a a f e t i v i d a d e , consciência d o E U e Pensamento

seguidas de alucinações, e m que o s u r t o aparece c o m o u m a f o r m a de defesa d e r r a d e i r a (I,.

pac i en t e d i a n t e d a ameaça r e a l e inexorável de aniqui lação (13).

Nesses casos, deve-se o b s e r v a r p r i n c i p a l m e n t e do i s aspectos f u n d a m e n t a i s , a sabe i :

a) O a p a r e n t e q u a d r o de confusão d o pac i en t e r e ve l a n o conteúdo de seus s i n t o m a

p r o d u t i v o s (delírios e alucinações) t o d a a r e a l i d a d e c l a r a e n u a de seu p a v o r de an l

qui lação. A f i g u r a d a m o r t e , d o s o f r i m e n t o , das p e r das irreversíveis, d a impotência

abso lu ta , d a t o t a l f a l t a de perspec t i vas ex is tenc ia is a p a r e c e m c l a r a m e n t e n o discursa

e nas descrições p e r c e p t i v a s " d i s t o r c i d a s " d o pac i en t e .

b) Ge ra lmen t e , o paciente em sur t o i n c o m o d a e ameaça a equipe de saúde, p r i n c i p a l m e n i i

no H o s p i t a l G e r a l e p a r t i c u l a r m e n t e n o C T I . A equ ipe de saúde t e m , n a m a i o r parte

das vezes, p o u c a i n t i m i d a d e c o m o c h a m a d o "pac i en t e psiquiátrico", e p o r t oda a sub-

j e t i v i d a d e do q u a d r o , as d i f i cu ldades de avaliação e intervenção são ma io res , gerando,

não r a r o , a fas tamento do con ta t o c o m o pac iente , sensação de incómodo e impotência,

a l gumas vezes hos t i l i dade , e também ansiedades de t a l m o n t a que l e v em ao desejo cie

"verem-se l i v res do pac i en te " , p r e c i p i t a n d o condutas o u e n c a m i n h a m e n t o s .

Nesses casos, s empre é i m p e r a t i v o o diagnóstico d i f e r e n c i a l fe i to p e l o c o m p o n e n t e de

saúde m e n t a l d a e q u i p e o u , n a ausência deste, a solicitação de i n t e r c o n s u l t a .

A ausência dessas c o n d u t a s d e s a f o r t u n a d a m e n t e g e ra m a i s s o f r i m e n t o , m a i s c o n f l i t o ,

p o r c onsegu in t e o a g r a v a m e n t o d o q u a d r o , c r i a n d o a s s im u m círculo v i c i o s o e m que , em

última instância, t odos s o f r em .

Por este m o t i v o , os hospitais p o d e m ser nocivos p a r a esses pacientes. En t r e t an t o , no hospi ta l ,

o pac iente fica a fastado de todas as coisas das quais m u i t o s de nós dependemos p a r a a m a n u -

5 4

A t e n d i m e n t o I ' M < O I O O H O n o ( e n t i o d e t e r a p i a I n t e n s i v a

1 10 i l o l i cn i - c s l a i men ta l . < > mesmo vale para a perda do con ta to c o m pessoas que lhe são

hlli: i id,is, assim c o m o para a ausência do lar, da c a m a , do q u a r t o , das roupas , dos a l imentos ,

i iu mesmo dos objetos pessoais. E m lugar da r o t i n a estável e f a m i l i a r , l i g a d a às pessoas e às

, ,n i , .o paciente é jogado no me io de estranhos e de circunstâncias comp l e t amen te novas. E le

pode a inda m a n t e r seu cont ro l e , mas todos os seus pontos de referência não estão lá.

A l e m d i s so , o f u n c i o n a m e n t o m e n t a l d o p a c i e n t e h o s p i t a l i z a d o p o d e ser a f e t a d o

pi las d r o g a s e, q u a n d o i s to se dá , p o d e h a v e r m e s m o u m a p e r d a de c o n t r o l e . A s d r o g a s

, , I u i\, hipnóticas e analgésicas, a d m i n i s t r a d a s p a r a m a n t e r o p a c i e n t e c a l m o , p o d e m

•ii i | i c r i g i isas p a r a aque les q u e p o s s u e m tendência a o es tado d e l i r a n t e . E m l u g a r de p r o -

v e r e m o s o n o e o r e l a x a m e n t o , e las p o d e m r e d u z i r o níve l d o i m p a c t o s e n s o r i a l dos

, m i o s e x t e r n o s , d i m i n u i n d o a s s im a c a p a c i d a d e d o p a c i e n t e de m a n t e r a or ientação e

l a l o c o m o q u e o c e r ca , fa tos q u e p o d e m l e v a r a u m es tado d e l i r a n t e o u a episódios

, n n f u s i o n a i s , c o m desor ientação n o t e m p o e n o espaço , l apsos de m e m ó r i a e o u t r o s .

1 )c q u a l q u e r m a n e i r a , q u a n d o o c o r r e r u m es tado d e l i r a n t e , deve-se p r o c u r a r u m a

11 imbinação de causas que , e m c o n j u n t o o u h i e r a r q u i c a m e n t e , t e n h a a f e tado c r i t i c a m e n t e

a c apac i dade m e n t a l d o pac i en t e .

A p r o p o s t a o r i g i n a l d o presente t r a b a l h o t e m c o m o p r i n c i p a l p ressupos to u m a l e i t u r a

B i u l t i f a t o r i a l e i n t e r d i s c i p l i n a r d a pessoa que está à f r en te d a equ ipe , e sua doença. E e xa t a -

u ie i i t e a s o m a dos c o n h e c i m e n t o s e observações de t odos os m e m b r o s d a e q u i p e , médicos,

e n l c r m e i r o s , a u x i l i a r e s , a t enden t e s , técnicos, psicólogos, n u t r i c i o n i s t a s , fisioterapeutas,

assistente s o c i a l e até m e s m o ( i m p o r t a n t e ressa l tar ) o pessoa l de a p o i o , c o m o c o p e i r a s ,

l a x i n e i r a s e t c , que n a sua observação e c o n t a t o c o m o pac i en t e p o d e m d a r p is tas i m p o r ­

tantes p a r a u m a b o a compreensão do fenómeno que assola o pac i en te e, consequen temente ,

n o r t e a r a c o n d u t a m a i s a d e q u a d a p a r a auxil iá-lo.

Distúrbios Psicopatológicos e de Comportamento no CTI

Nos H o s p i t a i s G e r a i s , c c m p a r t i c u l a r nos C T I s , t em-se n o t a d o c e r t a d i f i c u l d a d e q u e a

e q u i p e ap resen ta p a r a l i d a r c o m pac ientes de distúrbios psicopatológicos.

A própr ia est igmatização que a pessoa p o r t a d o r a desse t i p o de distúrbio v e m so f r endo

ao l o n g o dos anos s o m a d a ao fa to de esses distúrbios t e r e m u m cu r so sub j e t i vo , que foge dos

concei tos car tes ianos nor t eadores das avaliações e intervenções clínicas, a c a b a m p o r a g rava r

essas d i f i c u l d a d e s , g e r a n d o , não r a r o , sérios p r o b l e m a s p a r a a equ ipe e o pac i en t e .

Destacar-se-ão neste capítulo a l g u n s dos q u a d r o s psiquiátricos m a i s f r e q u e n t e m e n t e

obse rvados n o C T I .

5 5

Page 35: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

I \ i l ( > | C ) ( ] I . I I

N ( ) T A : A b o r d a - s c espec i f i camente os I r a n s t o r n o s de o r d e m psicótica, c o n s i d c r a n d

critérios classificatórios desse g r u p o de pa to l og i a s , s e g u n d o S< I m l l e e T o l l c ( I I ) .

G e r a l m e n t e , o que ma i s m o b i l i z a e d i f i c u l t a o t r a b a l h o d a equ ipe de saúde são os q u a d f J

que vêm a c o m p a n h a d o s , s ob r e tu do , dos s in t omas p r o d u t i v o s o u secundários, c o m o dei »

e alucinações, acresc idos de agitação p s i c o m o t o r a , f u r o r e confusão m e n t a l .

Esses s i n t o m a s , n a v e r d a d e , p o d e m aparece r e m d iversos q u a d r o s de f o r m a con j i

o u e m g r u p o s , o q u e o b r i g a r i a a e q u i p e a estabelecer antes de q u a l q u e r intervenção d i t i l

nóstico-diferencial.

T a m b é m nos q u a d r o s depress ivos m a i o r e s (depressão patológica) tem-se p r o b l e m a s ,n

soc iados à t e n t a t i v a de suicídio e à a p a t i a e a u t o a b a n d o n o d o pac i en t e , fatores que inc i t leni

d i r e t a m e n t e sobre o q u a d r o cl ínico, p o d e n d o agravá- lo o u l e v a r o pac i en t e à m o r t e

Tratar-se-á, então, de c lass i f i car os g r a n d e s g r u p o s de t r a n s t o r n o s de f o r m a a fac i l i i .u

a aval iação d o pac i en t e .

I - PSICOSES E N D Ó G E N A S

Destacam-se nesse g r u p o p r i n c i p a l m e n t e as Esqu i zo f r en ias , a P M D , a M e l a n c o l i a I n v o l u i i\

e a Pe r sona l i dade Psicopática.

N a s e s q u i z o f r e n i a s , p a r t i c u l a r m e n t e e m suas s u b f o r m a s Paranó i co A luc ionatór ia c

Hebefrênica, a exuberância dos s i n t o m a s p r o d u t i v o s é m u i t o f r equen t e , c o m delírios per

secutórios, del ír ios de referência, alucinações a u d i t i v a s ( p r e d o m i n a n t e m e n t e ) e v i sua is ;

confusão m e n t a l , sa l ada de p a l a v r a s e o u t r o s distúrbios graves e n v o l v e n d o pensamentos ,

a f e t i v i d a d e e consciência d o E U t a m b é m estarão presentes . R a r a m e n t e esses episódios

o c o r r e m c o m o p r i m e i r o s u r t o n o C T I ; t emos história pregressa de p a c i e n t e c o m out ros

s u r t o s , não r a r o internações psiquiátricas, n a r r a t i v a d a famí l ia e/ou a c o m p a n h a d o s de

es t ranhezas de c o m p o r t a m e n t o d o pac i en t e .

A obtenção desses dados é f u n d a m e n t a l p a r a f o rnece r as p r i m e i r a s p is tas p a r a o d i a g ­

nóstico d i f e r e n c i a l . Imprescindível também n a a n a m n e s e saber-se d o uso de psicofàrmacos

p o r p a r t e d o p a c i e n t e , que , caso se jam suspensos, p o d e m r e i n c i d i r o s u r t o . C a b e a q u i à

e q u i p e médica aval iação dos r iscos e, s o b r e t u d o , de c o m o c o m b i n a r o t r a t a m e n t o cl ínico

de urgência q u e m o t i v o u a internação n o C T I c o m a p s i c o p a t i a q u e i n t e r i n f l u e n c i a o c o m ­

p o r t a m e n t o d o pac i en t e e/ou a própria p a t o l o g i a que é o a l v o das atenções.

O u t r o s q u a d r o s de psicoses endógenas, c o m o a fase maníaca d a P M D e a Pe r sona l i dade

Psicopática, q u a n d o presentes n o pac i en t e i n t e r n a d o n o C T I , t r a z e m a l g u m a s vezes p r o ­

b l emas , s o b r e t u d o n a esfera d o r e l a c i o n a m e n t o en t r e e q u i p e e pac i en t e . Po r se t r a t a r de

processo e m que ex is te e lação d o h u m o r , grandi loquência, delírios de g r a n d e z a (em a l g u n s

5 6

A t e n d i m e n t o l \ i < o l o i j i i o n o < e n t r o d e t e r a p i a I n t e n s i v a

, U N O S ) , inquietação ( p o d e n d o a l i n g i i a le a agitação p s i c o m o t o r a ) , i m p u l s i v i d a d e i n t ensa ,

i m o r a l i d a d e , d e n t r e o t t t r i is s i n t o m a s , esses pac ientes t e n d e m a ser negligentes c o m o t r a t a -

n o , m o b i l i z a m m u i t o as atenções sobre si mesmos , p o l e m i z a m , c r i a m con f l i t o s en t r e a

• q i l i p e , m a n i p u l a m funcionários e pac ientes , g e r a n d o c l i m a de a t r i t o s e d e s e n t e n d i m e n t o .

N o i m a l m e n t e são refratários â a b o r d a g e m psicológica e não p o s s u e m n e n h u m a crítica

«obre seu es tado psieopatológico. A l g u m a s m e d i d a s p o d e m a u x i l i a r a e q u i p e a l i d a r c o m

0 p r o l t l ema , o b s e r v a n d o os j o g o s q u e o pac i en t e t e n t a i m p o r nas suas relações, p r o c u r a n d o

o.10 incentivá-los. A indicação m e d i c a m e n t o s a específica é, e m m u i t o s casos, necessária,

1 c i m p o r t a n t e dar -se l i m i t e s ao pac i en t e , sem, n o e n t a n t o , e n t r a r e m c o n f r o n t o c o m este.

( ) psicólogo deve estar a t en to à d inâmica d o q u a d r o e a t u a r t ambém o r i e n t a d o às pessoas

que têm c o n t a t o c o m o pac i en t e sobre a f o r m a de i n t e r a t u a r c o m este.

II - PSICOSES E X Ó G E N A S

1 fma g a m a bas tan t e s i g n i f i c a t i v a de eventos sobre o m e t a b o l i s m o o u a fisiologia d o c o r p o

p o d e m gerar , c o m o s i n t o m a c o m p l e m e n t a r , alterações de c o m p o r t a m e n t o , senso-percepção,

h u m o r , p e n s a m e n t o , consciência d o E U , memór ia etc.

Q u a d r o s toxêmicos, in fecc iosos , obstrução hepática, sep t i cemias , alterações a b r u p t a s

d a PA, descompensações d o equi l íbr io hidroeletrol ít ico, c o m p r o m e t i m e n t o s n a absorção

de O n o S N C são a l g u m a s causas possíveis dessas alterações.

T e m o s a i n d a intoxicações exógenas p o r p r o d u t o s químicos d iversos e c o m p r o m e t i m e n ­

tos gerados p o r reações a d e t e r m i n a d o s t i p o s de fármacos, a l g u n s inc lus i v e u t i l i z a d o s n o

próprio t r a t a m e n t o d o pac i en t e .

Esses q u a d r o s são c lass i f icados e m três s u b g r u p o s :

a) Psicoses Sintomáticas: C o m o o própr io n o m e sugere, o s u r t o aparece c o m o s i n t o m a de

u m q u a d r o de base m a i o r , assoc iado a alterações metabólicas, c o m o p o r e x e m p l o

s ep t i c em ias o u déficit n a absorção de 0 2 pe los neurónios, c o m o o c o r r e e m a l g u n s

casos e m que h o u v e circulação extracorpórea n o processo cirúrgico. Esses episódios

d e v e m ser de tec tados p e l a aval iação clínica d o pac i en t e , c o n s i d e r a n d o seu histórico

psieopatológico pregresso (que n o r m a l m e n t e não t e m dados s i gn i f i c a t i v o s pré-mór-

bidos ) , o c o n t e x t o fisiológico e metaból ico d o pac i en t e e as características d o s u r t o ,

q u e a p a r e c e m a b r u p t a m e n t e , m a n t e n d o es tado de consciência d o E U e ju í z o de

r e a l i d a d e o s c i l a n t e . O t r a t a m e n t o deve s e m p r e b u s c a r o s a n e a m e n t o das causas

físicas ( infecção, hemólise e t c ) , c a b e n d o ao psicólogo i n t e r v i r e m três m o m e n t o s

específicos, a saber:

5 7

Page 36: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

I V . i l u l o i j i . i H(>S|>ÍI,ll.ll

n u diagnóstico d i l i i c m i a l c o m a e q u i p e ;

na atenuação do s u i I n . p r i n c i p a l m e n t e q u a n d o este é a c o m p a n h a d o de agitação

p s i c o m o t o r a e confusão m e n t a l . Sabe-se q u e esses even tos p o d e m p r o v o c a r

al terações n o pac iente c, c o n s i d e r a n d o - s e a d e l i c a d e z a de seu q u a d r o , o p r ó ­

p r i o p a c i e n t e p o d e com] >rometer sua reabi l i tação. U m a das técnicas u t i l i z a d a s

nesses casos é a de e n t r a r n o s u r t o a t u a n d o c o m o p a c i e n t e , b u s c a n d o aos

p o u c o s i n t r o d u z i r dados de r e a l i d a d e e m seu d i s c u r s o , p r o c u r a n d o aca lmá- lo

e p o s s i b i l i t a n d o à equ ipe t e m p o p a r a as m e d i d a s necessárias p a r a atenuação

d o q u a d r o ;

o t e r c e i r o m o m e n t o de atenção refere-se ao auxí l io de que o pac i en t e precisará,

após a remissão do surto, p a r a a reorganização de vivência, pos to que n a m a i o r i a

das vezes este mantém na memór ia o episódio c on fus i ona l e essa experiência a t i va

seus s en t imen to s de a m a r g u r a , insegurança e ameaça, a f i n a l , u m episódio de

" l o u c u r a " é u m dos eventos m a i s t em idos p o r b o a p a r t e das pessoas, e a sensação

de f r a g i l i d a d e ego ica passa a a g i r c o m o ameaça cons tan t e ,

b) Psicoses Tóxicas: p rovocadas p o r intoxicações exógenas, l i g adas à ingestão de d rogas

o u substâncias químicas. O b s e r v a d a s e m a l g u n s casos de t e n t a t i v a de suicídio e

p r i n c i p a l m e n t e n o uso de drogas psicodislépticas, c o m o a p s i l o c i b i n a , a d i e t i l a m i d a

do ácido l isérgico, a heroína, e de a l g u m a s d r ogas psicoanalépticas, c o m o o c r a c k ,

a cocaína e os anfetamínicos, m u i t a s vezes associados a o u t r o s fármacos, c o m o o

álcool. Esse últ imo merece u m a atenção espec ia l e m v i r t u d e d o g r a n d e número de

pessoas p o r t a d o r a s d a doença d o a l c o o l i s m o .

Observa -se e m C T I s gerais internações de pac ientes p o l i t r a u m a t i z a d o s v í t imas de

ac identes , quedas , a t r ope l amen tos , ac identes automobilísticos etc. E m g e r a l , o p a ­

c iente é a t e n d i d o nos P ron tos -Soco r ros e, u m a vez c o n s t a t a d a a g r a v i d a d e d o caso,

e n c a m i n h a d o ao C T I . Por se t r a t a r de a t e n d i m e n t o de urgência e de inúmeras vezes

o pac i en te encon t ra r - s e inconsc iente o u não ap r e s en ta r condições de f o rnece r dados

à e q u i p e , seguem-se os p r o c e d i m e n t o s de urgência, d e i x a n d o p a r a o u t r o m o m e n t o

a a n a m n e s e m a i s d e t a l h a d a do pac i en t e . D e n t r e esses pac i entes p o d e m o s e n c o n t r a r

alcoólatras crónicos, que , ao r e t o m a r e m a consciência j á n o C T I , depo i s de a l g u m

t e m p o de internação, e n t r a m e m síndrome dc abstinência o u , c m o u t r o s casos, e m

" d e l i r i u m t r e m e n s " .

A s índrome de abstinência d o á lcoo l é u m q u a d r o b a s t a n t e c l a r o , d e v e n d o ser

a v a l i a d o p e l a e q u i p e p a r a que m e d i d a s c o m p l e m e n t a r e s ao p o l i t r a u m a t i s m o se jam

t o m a d a s , i n c lu s i v e p r o c u r a n d o e v i t a r o a g r a v a m e n t o deste. O s p r i n c i p a i s s i n t o m a s

5 8

A t m u l i n M i n t o IV.ic ( i l o i | i i o n o ( o n t i o d o l o i . i p i . i I n t o n s i v . i

dc síndr • d e a b s l i n c n i 1.1 a l i oólica s ã o : t r e m o r e s dc e x t r e m i d a d e s , desorientação

a u t o c alopsíquica, q u e i x a s d e d o n s de M I S , alterações d a senso-percepção c o m

predominânc ia d e alucinações tácteis e v i s u a i s (zoopsias) , ag i tação p s i c o m o t o r a

e i d e i a s persecutór ias . A s m e d i d a s terapêut icas nesse m o m e n t o são méd i cas :

des intox icação, uso d c m e t a q u a l o n a o u admin is t ração c o n t r o l a d a de álcool p a r a

r e t i r a d a g r a d a t i v a des te , e o u t r a s a cr i tér io d o c l ín ico q u e e s t i v e r a v a l i a n d o o

p a c i e n t e . O b v i a m e n t e esse t r a b a l h o deve l e v a r e m consideração o q u a d r o c l ín ico

g e r a l d o p a c i e n t e .

A o psicólogo cabe a aval iação n o diagnóstico d i f e r e n c i a l e t r a b a l h o i n i c i a l , a i n d a n o

C T I , de sensibilização p a r a t r a t a m e n t o específico de a l c o o l i s m o e e n c a m i n h a m e n t o

p o s t e r i o r à a l t a a serviço espec ia l i zado ,

c) Psicoses Organocerebrais: desencadeadas a p a r t i r de processo g r a d a t i v o de d e t e r i o r a ­

ção o u c o m p r o m e t i m e n t o f u n c i o n a l d o S N C . Esse g r u p o de psicoses exógenas é de

prognóst ico m a i s r e se r vado , ge rado p o r expansão dc t u m o r e s n o cérebro, processos

in fecc iosos meníngeos, deterioração dos s istemas de condução n e u r a l (na demência

a lcoól ica e demência epi léptica, p o r e x e m p l o ) , e n t r e o u t r o s . P r e d o m i n a m , c o m o

s in t omas psíquicos, confusão m e n t a l , fuga de ide ias , delírios, crises de agress iv idade ,

desorientação au to e alopsíquica, despersonalização, l a b i l i d a d e a fe t i va . O q u a d r o de

base nesses casos é c l a r o p e l a evolução clínica d o pac i en t e , que m o r m e n t e se a r r a s t a

ao l o n g o de vár ios anos c o m o processo psicótico se i n s t a l a n d o g r a d a t i v a m e n t e .

E m a l g u n s casos de t u m o r e s cerebra is , pode-se t e r o a p a r e c i m e n t o dos distúrbios

psiquiátricos antes de o u t r o s s in tomas , d i f i c u l t a n d o a aval iação d o q u a d r o e m u m

p r i m e i r o m o m e n t o . A i n d a nesses casos, a l guns processos expans ivos têm pe rspec t i va

c irúrgica e seu prognóst ico m e l h o r a d o .

O u t r o g r u p o de distúrbios psicológicos p o d e s u r g i r assoc iado aos T C E s , A V C e a

o u t r o s p r o b l e m a s de o r d e m neurológica. Nesse c a m p o e m p a r t i c u l a r a n e u r o p s i c o -

l o g i a t e m , nos últimos anos , o b t i d o avanços s i gn i f i c a t i v os . Des t acam-se distúrbios

de g n o s i a e propr iocepção , alterações d o h u m o r e c o m p r o m e t i m e n t o g ene ra l i z ados

nas a t i v i d a d e s m e n t a i s básicas.

C o m o se m e n c i o n o u n o início, a g a m a de distúrbios psicopatológicos e c o m p o r t a ­

m e n t a i s é ex tensa e de causas múltiplas. P r o c u r o u - s e a q u i d a r or ientação g e r a l e m

relação a a l g u n s casos obse rvados nos C T I s c o m m a i o r frequência.

Recomenda-se aos interessados p r o c u r a r n o fim desse t r a b a l h o as Referências B i b l i o ­

gráficas c o m p l e m e n t a r e s p a r a estudos ma i s a p r o f u n d a d o s (14, 15, 16, 17, 18, 26).

5 9

Page 37: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

P s i l o l o i p . l I l o s p i t i i l . i i

O Paciente em Coma no CTI

D u r a n t e m u i t o t e m p o , e t a l v e z a i n d a ho je , c ons i d e r ou - s e q u e , sob o p o n t o de v is ta il it

intervenção psicológica n o pac i en te c o m a t o s o , q u e r p o r c o m a traumático, q u e r po i < i

anestésico, h a v i a m u i t o p o u c o o u n a d a a se fazer.

P a r t i n d o - s e d o p r e s supos t o de q u e o c o m a e r a i g u a l à ausência de v i d a psíquica, o

u n i v e r s o m e n t a l d o pac i en t e passou a ser s i m p l e s m e n t e descons ide rado nos casos c m qur

este se e n c o n t r a v a nesse estado.

N o en tan to , u m a coletânea cada vez m a i o r de relatos, n o mín imo inqu ie tan tes , fornec ido*

p o r pacientes que saíram do c o m a , sobre suas vivências, o u memória de vivências, no perít >< li i

de c o m a , ac resc ida de pesquisas recentes sobre respostas e m o c i o n a i s e c o m p o r t a m e n t a l - ,

d o p a c i e n t e c o m a t o s o , c omeçam a a p o n t a r p a r a o u t r a r e a l i d a d e , a i n d a p o u c o c onhec i da ,

sobre a a t i v i d a d e m e n t a l d o p a c i e n t e d u r a n t e o processo de c o m a .

O fenómeno d a v i d a psíquica t e m s ido a l v o de atenção m a i s d e t a l h a d a de pesqu isa i li i

res d o m u n d o i n t e i r o , p a r t i c u l a r m e n t e a p a r t i r d a década de 1990 , c o n s i d e r a d a a década

d o cérebro n o q u e t a n g e a i n v e s t i m e n t o s e m pesquisas nos g r a n d e s c en t r o s d e estudos do

m u n d o , p a r t i c u l a r m e n t e nos Es tados U n i d o s .

Avanços s i g n i f i c a t i v o s , q u e c o m p r o v a m a existência de v i d a psíquica j á n o feto dc 6

meses de i d a d e g e s t a c i o n a l , até o m a p e a m e n t o t r i d i m e n s i o n a l d a atuação de sistemas

intrapsíquicos n o cérebro h u m a n o através d o P E T S c a n n e r e d o S q u i d , têm p o s s i b i l i t a d o a

estudiosos das neurociências d o m u n d o i n t e i r o d e s v enda r a l g u n s dos incontáveis mistérios

que e n v o l v e m o f u n c i o n a m e n t o d o cérebro h u m a n o , e s o b r e t u d o começar a construção di­

u r n a p o n t e conf iável c i e n t i f i c a m e n t e e n t r e cérebro e m e n t e . A l g u m a s subespec i a l i dades

n o v a s c o m e ç a m a s u r g i r , c o m o a p s i c o l o g i a pré-natal (19,20,21) e a n e u r o p s i c o l o g i a (22,

2 3 , 24). U m dos segmentos desses es tudos a b a r c a o t e m a q u e o r a se desenvo l ve e passa

p e l a i n q u i e t a n t e p e r g u n t a : há v i d a e m u m p a c i e n t e c o m a t o s o , e se há, c o m o detectá-la

e acessá-la?

O fenómeno d a consciência, q u e s e g u n d o J a s p e r s (9) p o d e ser c o n s i d e r a d o c o m o " T o d o

o m o m e n t o d a v i d a psíquica", t e m s ido a l v o de discussões e controvérsias e n t r e d iversos

estudiosos, médicos, psicólogos, filósofos, fisiologistas, den t r e ou t ros tantos , não r a r o g e rando

m u i t o m a i s p e r g u n t a s d o que respostas.

O f a t o d e o b s e r v a r - s e inúmeros r e l a t o s d e p a c i e n t e s saídos d o c o m a d e s c r e v e n d o

conve rsas t i d a s e n t r e e q u i p e , v i s i t a n t e s o u o u t r a s pessoas à v o l t a de le , e m u m pe r í odo

e m q u e este estava sendo c o n s i d e r a d o c o m o i n c o n s c i e n t e , o u de d a d o s científ icos m a i s

c o n t u n d e n t e s , c o m o os apresentados p e l o psicólogo n o r t e - a m e r i c a n o H e n r y B e n n e t t e m

6 0

A t i . o d i n i o i i t o l \ i < o l o ( | i ( o n o C o n t i o d o I p i a I n t e n s i v a

1'l lt ' l ( 2 : n , d e m o n s t r a m de lo i m a bas tante c l a ra que o pac i en te sob e le i to de anestesia g e r a l

n. io só pode c a p t a r o que o c o r r e a sua vo l ta no c e n t r o c irúrgico, mas também encont ra - se

p a i i i i u l . n m e n t e sugcstionávcl às e v en tua i s in lórmações q u e absorve . Isso t u d o t e m l e v a d o

Inúmeros pro f i ss i ona is in l ens i v i s l a s a c o n s i d e r a r o u t r o s fatores n a relação c o m o pac i en t e

c o m a t o s o que não só o e s t r i t a m e n t e bio lógico.

S o b esse aspec to a l g u m a s considerações d e v e m ser fe i tas:

( ) Icnômcno que a b a r c a o processo S - * R , q u a l seja, a p a r t i r d a e n t r a d a de d e t e r m i ­

n a d o estímulo o u g r u p o s de estímulos n o S N C até a efet ivação d a resposta , t e m s ido a l v o

dc atenção dos pesqu isadores , n a t e n t a t i v a de e x p l i c a r o q u e p o d e es tar o c o r r e n d o c o m o

pac iente c o m a t o s o , a l g o c o m o a p o s s i b i l i d a d e de se abso r v e r e c o m p r e e n d e r o estímulo.

Não c o n s e g u i r acessar os me ios p a r a a efetivação explícita d a resposta p o d e estar n o c e rne

das avaliações inexa tas que às vezes se faz d o pac i en t e e m c o m a , até p o r q u e se obtêm dados

da consciência pe las respostas e g r a u de sofisticação destas.

D e f o r m a esquemática tem-se :

S i g n i f i c a n t e

S — > • P e r c e p ç ã o — * - A p e r c e p ç ã o — * - D e c o d i f i c a ç ã o <j

/ © © E x t e r n o V S i g n i f i c a d o

C o m p r e e n s ã o —

©

— + - Recod i f i c a ção — * - E le ição d o s m e i o s d e r e s p o s t a — » - A t i v a ç ã o d e s t e s — > - Emissão d a R e s p o s t a R

® ©

Esse processo , que se i n i c i a a p a r t i r d o a c o n t e c i m e n t o d o estímulo, v a i g r a d a t i v a m e n t e

acessando processos m e n t a i s q u e se i n i c i a m p o r m e i o das A t i v i d a d e s M e n t a i s Básicas,

p a r t i c u l a r m e n t e a senso-percepção: 1 - p r o s s e g u i n d o c o m a solicitação de intervenção de

o u t r o s c o m p o n e n t e s d o a p a r e l h o psíquico, j á pe r t encen t es ao g r u p o de a t i v i d a d e s m e n t a i s

super i o res , c o m o p e n s a m e n t o , memór ia , inteligência, a f e t i v i d a d e , mot ivação e vol ição; 2 -

até c u l m i n a r c o m a at ivação dos m e c a n i s m o s específicos p a r a resposta , l i n g u a g e m ( v e rba l

e não ve rba l ) , respostas p s i c o m o t o r a s e t c ; 3 - o c a m i n h o que o evento p e r c e b i d o e consc i en -

t i z a d o p e r c o r r e p o d e estar c o m p r o m e t i d o e m a l g u m nível p e l a p a t o l o g i a o u situação que

g e r o u o c o m a , mas não necessa r i amente n o m o m e n t o p r i m e i r o d a percepção. Pelos fatos

n a r r a d o s , sobre pac ientes que de s c r e v em as vivências e m u i t a s vezes até sua angústia e m

6 1

Page 38: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

I '\i< t >I a >< | •. I I I n s p i l . l l . l l

não c o n s e g u i r respi nu l e i , I u< lo leva a c r e r <|uc, pe lo menos nesles casos, o even to per i ol I I 11

seu c a m i n h o até n o m ín imo a compreensão (los estímulos, mas <|uc não houve c o n i l

de e fet ivar-se a resposta . Pela ausência desta , p o r m e n o r que lóssc, os m e m b r o s da cquipt

l o t a m l e vados a i n t e r p r e t a r , e r r o n e a m e n t e , a ausência de consciência, v i n d o esta a i i

d e n u n c i a d a p o r a l g u n s pac ientes t e m p o s depo i s , q u a n d o estes r e c o b r a m não a cons

c i a , c o m o c o m u m e n t e se d i z , m a s a c a p a c i d a d e de r e s p o n d e r aos estímulos. O b v i ;

t emos inúmeros o u t r o s casos nos qua i s essa n a r r a t i v a não aparece n o d i s c u r s o d o pa i ii nti

pós-coma, e o u t r o s a i n d a e m q u e a m o r t e sobrevêm antes m e s m o de u m a r e t o m a d a ' I |

c a p a c i d a d e r espons i va p o r p a r t e deste.

Está-se m u i t o p e r t o , pe l a evolução dos meios de avaliação d o f u n c i o n a m e n t o ce rebra l , ih

se ch eg a r ao p o n t o de p o d e r a v a l i a r de f o r m a c l a r a e o b j e t i v a até que p o n t o a v i d a psíquicf

do pac iente e m c o m a está a t i va . N ã o obs tante , e n q u a n t o esses recursos não estão disponíveil,

acred i ta -se ser bas tan t e a d e q u a d o c o n s i d e r a r que a poss i b i l i dade de se m o b i l i z a r o pacient!

p o r m e i o de comentários, v is i tas o u o u t r a s f o r m a s de est imulação d i r e t a p o d e a c a r i c i a i

t a n t o reações pos i t i vas q u a n t o nega t i vas neste. Esse t i p o de c u i d a d o é possível, e caberá .1

e q u i p e a t e n t a r p a r a ele. A s s i m c o m o caberá espec i f i camente ao psicólogo p r o p i c i a r ao pa

c iente estímulos pos i t i vos , poss ib i l idades de c o n t a t o c o m o m u n d o e x t e r n o , p a r t i c u l a r m e n t e

c o m coisas que lhe são s i gn i f i c a t i vas (obtém-se esse d a d o c o m os f am i l i a r e s ) e s o b r e t u d o a

famíl ia, que , d e v e n d o ser o r i e n t a d a a d e q u a d a m e n t e antes d a v i s i t a , p o d e e deve p a r t i c i p a i

d o t r a b a l h o de estimulação. N o t a m - s e a q u i a l g u n s dados c o m p l e m e n t a r e s s i g n i f i c a t i v o ,

que a p a r e c e m e m a l g u n s pac ientes p o r m e i o d a l e i t u r a d o seu estado cl ínico g e r a l , c omo

p o r e x e m p l o : a u m e n t o d a PA e m m o m e n t o s m a i s críticos e m o c i o n a l m e n t e d e n t r o d o C T I ;

alteração d a F C q u a n d o d a v i s i t a de f a m i l i a r e s o u de comentários i n a d e q u a d o s ao l a d o di 1

p a c i en t e ; manifestações m o t o r a s "automát icas" i m e d i a t a m e n t e após a l g u m even to m o b i l i

zan te ; e a l g u n s casos até o c h o r o , lágr imas e s co r r endo d o ros to i n e r t e de u m a pessoa não

tão i n consc i en t e , t a m p o u c o insensível ao g r a n d e d r a m a que a cerca .

Gostar íamos de f a l a r neste parágra fo u s a n d o a p r i m e i r a pessoa, p a r a c o l o c a r m o s que

t e m s ido t a m b é m exper iênc ia nossa t o d a g a m a de even tos m e n c i o n a d a . A c r e d i t a m o s ,

p o r t a n t o , que c o n s i d e r a r a p o s s i b i l i d a d e de existência de v i d a psíquica n o p a c i e n t e c o m a ­

toso, respeitandõ-o, e s t i m u l a n d o - o , e s t ando a seu l a d o e daque l es que l h e são caros , pode

não ser, c o m o m u i t o s a i n d a a c r e d i t a m , u m gesto vão , u m a p e r d a de t e m p o . Pode ta lvez

r e p r e s e n t a r o e lo e n t r e o l i m b o de i n c o m u n i c a b i l i d a d e e a v i d a de re lação e interação.

Pode r ep r e s en ta r t ambém u m m o r r e r s en t indo -se a c o l h i d o e r e spe i t ado n a sua d i g n i d a d e

de pessoa, n o seu an t i g es to s i l enc ioso de adeus aos q u e ficam...

6 2

Al iMi i l i ine i i lo !'• loipi o iu . < e n l i o i le l iM.ipia In tens iva

Rofe rênc ias B i b l i o g r á f i c a s

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6 3

Page 39: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

I ' M ( ( ) lc ) (| l , l I l ( > ' . | ) l l . l l . l l

R o t e i r o C o m p l e m e n t a r d e E s t u d o s

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SZASZ, T. Dor e Prazer. Rio de Janei ro: Zahar, 1976.

6 4

Estudos Psicológicos do Puerpério

Fernanda Alves Rodrigues Trucharte \ Berger Knijník

Introdução

Opresente capítulo t e m c o m o t e m a c e n t r a l a b o r d a r aspectos i m p o r t a n t e s d o per íodo

d o puerpér io , i l u s t r a n d o , p o r m e i o d o desenho gráf ico de a l g u m a s pac i entes , s en t i ­

men to s , emoções e fantas ias ace r ca desse m o m e n t o de transição.

A esco lha d o t e m a deve-se à necessidade de u m estudo m a i o r dessa fase de v i d a p a r t i n d o

de vivências c o m o m e m b r o s i n t e g r a n t e s de u m serviço dc G i n e c o l o g i a e Obstetrícia.

É i m p o r t a n t e c o n s i d e r a r q u e os s en t imen to s e reflexões a respe i to d o puerpér io d e v e m

ser c l a r a m e n t e d i s cu t i dos p e l a e q u i p e de saúde, po is , às vezes, i n t e r f e r e m c o m o d i f i cu l dades

en f r en t adas n a nossa r o t i n a .

T a m b é m cabe-nos sa l i en ta r que u m a intervenção psicológica neste per íodo v isa p r e v e n i r

a saúde m e n t a l e física d a mãe e d o bebé, c o m o o b j e t i v o de e s t i m u l a r u m a l igação m a i s

saudável en t r e a m b o s .

P a r a sua real ização, f o r a m u t i l i z a d o s r ecursos bibliográficos c o m o o b j e t i v o de f u n d a ­

mentá-lo t e o r i c a m e n t e e n f o c a n d o : características e m o c i o n a i s d o puerpér io , o s i g n i f i c a d o

psicológico d a amamentação , o n a s c i m e n t o d o apego e aspectos d a assistência h o s p i t a l a r

n o puerpér io .

P o s t e r i o r m e n t e , seguem-se os desenhos gráf icos de a l g u m a s puérperas, p r o c u r a n d o

entendê-las d i n a m i c a m e n t e q u a n t o ao seu f u n c i o n a m e n t o , e m u m a integração en t r e t e o r i a

e prática.

Por fim, há u m a conclusão sobre o que f o i ap r e sen tado , f u n d a m e n t a d o e d i s c u t i d o ao

l o n g o d o t r a b a l h o .

Page 40: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

I ' M < o l o < | i . i I l i i s p i t i i l . i l

Objetivos

O a t e n d i m e n t o de puérperas teve c o m o ob je t i vo c ompreende r as emoções, sent imentos , Fantl sias e t emores deco r r en tes desse per íodo de transição, a l i v i a n d o as ans iedades present i

V i s a t ambém e s t i m u l a r u m a l igação m a i s saudável en t r e mãe e bebé, esc larecendo .

i n f o r m a n d o ace r ca dos aspectos re ferentes ao puerpér io .

S o b r e t u d o , p r e v e n i r a saúde m e n t a l de a m b o s : mãe e bebé.

Metodologia

Este t r a b a l h o f o i d e s e n v o l v i d o n o Se r v i ç o de G i n e c o l o g i a e Obstetr íc ia d o H o s p i t a l |

M a t e r n i d a d e P a n - a m e r i c a n o .

A c l i e n t e l a a t e n d i d a é constituída de pac i en t es q u e p o s s u e m convénios p a r t i c u l a r e i

c o m o : A m i l , U n i m e d , B l u c L i f e , Interclínicas etc.

P a r a t a n t o f o r a m r e a l i z a d a s e n t r e v i s t a s i n d i v i d u a i s , a t e n d i m e n t o e m g r u p o , acom p a n h a m e n t o f a m i l i a r e o r i en tação s o b r e m a n e j o das p a c i e n t e s c o m e q u i p e médica e

de e n f e r m a g e m .

A o término de c a d a a t e n d i m e n t o solicitávamos do is desenhos: figura h u m a n a e outro desenho q u e demons t rasse os s e n t i m e n t o s d o p a c i e n t e n a q u e l e m o m e n t o de v i d a .

Fundamentação Teórica

1. C a r a c t e r í s t i c a s E m o c i o n a i s d o P u e r p é r i o

S e g u n d o M a l d o n a d o (1985) , o puerpér io , ass im c o m o a g r a v i d e z , é u m per íodo bas tante

vulneráve l à ocorrênc ia de cr ises , d e v i d o às p r o f u n d a s mudanças i n t r a e in t e rpessoa i s

desencadeadas p e l o p a r t o .

K i t z i n g e r (apud M a l d o n a d o ) cons ide ra o puerpério c o m o o " q u a r t o t r i m e s t r e " d a g r a v i ­

dez, c ons id e rando -o u m per íodo de transição que d u r a a p r o x i m a d a m e n t e três meses após 11

p a r t o , p a r t i c u l a r m e n t e a cen tuado n o p r i m e i r o filho. Nesse período, a m u l h e r to rna-se espe­

c i a l m e n t e sensível, m u i t a s vezes confusa , q u a n d o a ans iedade n o r m a l e a depressão reat i va

são e x t r e m a m e n t e c o m u n s .

Os p r ime i r o s dias após o p a r t o são carregados de emoções intensas e var iadas . As p r ime i r a s

24 horas c o n s t i t u e m u m per íodo de recuperação do cansaço p o r causa d o p a r t o . A puérpera,

e m ge ra l , scnte-se d e b i l i t a d a e con fusa , p r i n c i p a l m e n t e q u a n d o o p a r t o é fe i to sob narcose .

A l a b i l i d a d e e m o c i o n a l é o padrão m a i s característico d a p r i m e i r a s e m a n a após o p a r t o : a

6 6

I s t I H l o s o l o i | i < o s d o r u m | l e i ii i

c o l o r i a e a depressão alternam i c r a p i d a m e n t e , p o d e n d o cstt i última atingir grande intensi­dade. A l g u n s autores c o n s i d e r a m que esses s i n t omas são dev idos às mudanças bioquímica! que se p rocessam logo após o p a r l o , la is c o m o a u m e n t o da secreção dc co i I i c ocs l e i o ides e a

subi la queda dos níveis h o r m o n a i s . Supõem também a atuação dc o u t r o s la lores , (ais ci uni >

as frustrações e m o n o t o n i a d o per íodo de internação c a passagem da situação de espera

ansiosa típica do f i m d a g rav i d e z p a r a a conscientização d a n o v a r ea l i dade , que , ao l ado da

satisfação d a m a t e r n i d a d e , s i gn i f i c a também a r e sponsab i l i dade de a s s u m i r novas tare ias e

a l imitação de a l g u m a s a t i v i dades an te r i o res . A s vezes é difícil d e t e r m i n a r a l i n h a divisória

ent re a n o r m a l i d a d e e a p a t o l o g i a n o caso d a depressão pós-parto. D c t o d o m o d o , a i n i e n

silicação o u permanência dos s i n t omas depressivos a l g u m a s semanas pós-parto m c i c i em

ser v istas c o m ma i s c u i d a d o .

O b s e r v a m o s , neste p e r í odo ( c o n f o r m e So i f e r ) , es tados de confusão na p a r i n l c ,

ans i edades de e s v a z i a m e n t o e de castração, o u seja, a ambiva lênc ia e n t r e o p e r d i d o >

g rav idez ) e o a d q u i r i d o (o filho).

U m aspecto i m p o r t a n t e é que , p a r a a mãe, a r e a l i d a d e d o feto " i n útero" não <• a me .ma

r e a l i d a d e d o bebé recém-nascido, e p a r a m u i t a s m u l h e r e s é dif íci l fazer essa transição,

e s p e c i a l m e n t e as q u e a p r e s e n t a m f o r t e dependênc ia i n f a n t i l e m re lação à própi ia mie

o u ao m a r i d o . P o d e m f a c i l m e n t e gos ta r d o f i l h o e n q u a n t o a i n d a está d e n t r o delas e a in . o

u m a i m a g e m i d e a l i z a d a d o bebé, m a s não a r e a l i d a d e d o recém-nascido. A s observi

d a a u t o r a m o s t r a m que isso o c o r r e p r i n c i p a l m e n t e nas m u l h e r e s q u e t e n d e m a a< reditftl que seu bebé será " d i f e r e n t e " - t r a n q u i l o , que c h o r a p o u c o , d o r m e à no i t e desde

etc. - , n e g a n d o a n t e c i p a d a m e n t e a r e a l i d a d e de u m bebé nas p r i m e i r a s semanas de \a

d i a n t e d o q u a l se s en t em f r e q u e n t e m e n t e assustadas e confusas c o m a responsabilidade dos c u i d a d o s m a t e r n o s .

K i t z i n g e r ( apud M a l d o n a d o ) c o m e n t a que , n a g r a v i d e z , o filho é m u i t a s vezes sen t ido

c o m o p a r t e d o c o r p o d a mãe e, p o r essa razão, o n a s c i m e n t o p o d e ser v i v i d o c o m o u m a

amputação. A p ó s o p a r t o , a m u l h e r se dá c o n t a de q u e o bebé é o u t r a pessoa: to rna-se

necessário e l a b o r a r a p e r d a d o bebé d a f an tas i a p a r a e n t r a r e m c o n t a t o c o m o bebé real

Essa t a r e f a se t o r n a p a r t i c u l a r m e n t e penosa n o caso de crianças que nascem c o m problemas graves o u c o m mal formações extensas.

A c r e d i t a - s e que u m a intervenção n o puerpér io , c o n s i d e r a d o c o m o cr ise v i t a l pa ra a

m u l h e r , é f a t o r de prevenção p a r a a q u a l i d a d e d a relação mãe x f i l h o e mãe v f i l h o \.

S e g u n d o a l g u n s auto res , o pe r í odo de duração d o puerpér io é variável . N o e n l ;

sabemos que os p r i m e i r o s seis meses após o p a r t o s e r v e m c o m o parâmetro na avaliação d a saúde m e n t a l d a m u l h e r q u a n d o d a e laboração desta fase.

6 /

Page 41: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

r - . i i <>i<><11.11icv .pit.ii.n

A l g u n s l iosp i la is p e r m i t e m o estabelec imento do sistema de a lo jamento c on jun to " ||J

i n " o bebé p e r m a n e c e no q u a r t o c o m a mãe, que c u i d a dele e g e ra lmen t e dispõe da aj i l l||

de en f e rme i ras . O a l o j a m e n t o c o n j u n t o t e m a g r a n d e v a n t a g e m de e v i t a r a separaçãi i dc ma>

e f i l h o e m u m a época tão c r u c i a l p a r a a consolidação d o vínculo m a t c r n o - l i l i a l . Po r tan l i l

o a l o j a m e n t o c o n j u n t o p o d e ser c ons ide rado u m a e tapa n a preparação p a r a a m a t e i n i i Im I ,

a m p l i a n d o o a t e n d i m e n t o obstétrico p a r a o período de pós-parto, c o m o ob je t i vo de satislii i ,

as necessidades físicas e emoc i ona i s de p r o x i m i d a d e e c o n t a t o en t r e mãe e f i l h o .

A s possíveis consequências benéficas d o a l o j a m e n t o c o n j u n t o dependerão n u m , . ,|<

aspectos d a p e r s o n a l i d a d e d a mãe.

E i m p o r t a n t e sa l i en tar que o puerpério causa g r a n d e i m p a c t o n o m a r i d o , que pode i .1

p a r t i c i p a r a t i v a m e n t e dos cu idados d o bebé, d i v i d i n d o c o m a m u l h e r a responsab i l idad i |

d a n d o - l h e apo io e encora jamento , o u sentir-se m a r g i n a l i z a d o , re je i tado n a relação mãe-filho

sent imentos que t e n d e m a agravar-se c o m a abstinência sexual das p r i m e i r a s semanas e com d

m a i o r e n v o l v i m e n t o d a m u l h e r c o m o bebê. E m mu i t os casos, o m a r i d o recor re a mecan is 1

de fuga , m e r g u l h a n d o n o t r a b a l h o o u e m relações ex t racon juga i s .

A intensidade das vivências do parto e a regressão da esposa induzem-no também a um estado

depressivo e regressivo, embora menos intenso, que se choca com as exigências impostas pelo puerpério

da mulher. Por outro lado, sente-se necessidade de apoio e estímulo; encontra-se sozinho em casa,

assumiu nova responsabilidade, experimenta um sentimento ante esse desconhecido que é o bebê,

agora seu rival definido (Soifer, 1980, p. 70).

E m caso de mães multíparas, observa-se t ambém u m g r a n d e i m p a c t o d o puerpér io m 1 9

o u t r o s filhos. O s s en t imen to s m a i s típicos são de ciúme, traição e a b a n d o n o . E n f r e n t a m

t ambém u m a situação de cr i se , c o m m u i t a s mudanças: a mãe u m d i a sa i de casa e não

v o l t a , ausenta-se p o r a l g u n s d ias e ao v o l t a r t r a z c o m e la u m bebê q u e passa a so l i c i t a i .1

m a i o r p a r t e de seu t e m p o e de sua atenção.

São c o m u n s os s i n t o m a s regress ivos p o r p a r t e dos o u t r o s filhos, t a i s c o m o : v o l t a r a

m o l h a r a c a m a , q u e r e r m a m a d e i r a o u c h u p e t a , s o l i c i t a r atenção e c u i d a d o s etc.

C o n f o r m e V i d e l a (1973): " U m i rmão é a m a i o r r i q u e z a psicológica q u e os pa i s p o d e m

d a r ao filho. Será o c a m i n h o que o conduzirá à social ização h u m a n a , o m o d o m a i s s imples

o n d e aprenderá a c o m p a r t i l h a r , a r ecebe r e d a r , a q u e r e r e ser q u e r i d o p o r a l guém de seu

m e s m o sangue e/ou o u t r o ser s e m e l h a n t e " .

O u t r o f a t o r i m p o r t a n t e a c o n s i d e r a r são as influências c u l t u r a i s , soc ia is e económicas

r e l a c i onadas ao puerpério.

6 8

Estudos Psicológicos do Puerpério

Segundo I lelene Deutch (1960), o | rsso psíquico do puerpério, c m seu con junto , depende

n a t u r a l m e n t e ,|u . u i i b i e i i i e , d . i situaç cal de v i da , dos costumes dos pais , da família etc.

Por l i t n , V i d e l a (1973) e xp l i c a que a mulher não necessita que l h e d i g a m o s c o m o o bebê

deve f i car n o pe i t o , n e m q u a n d o e n e m q u a n t o t e m p o de c a d a l ado . O q u e deve acon tece r

e 11111 mé todo de ensa io c e r r o p o r m e i o desta d e l i c a d a a p r e n d i z a g e m t a n t o d a cr iança

t o m o d a mãe.

2 . C o n s e q u ê n c i a s d e u m M a u P u e r p é r i o

I V s t a c a r e m o s a g o r a as mani festações d a depressão p u e r p e r a l e x a c e r b a d a , c o n h e c i d a

c o m u m e n t e c o m o psicose p u e r p e r a l .

T a l estado carac ter i za -se pe l o repúdio t o t a l ao bebê: a pac i en te não q u e r vê-lo, a t e r r o -

r iza-se c o m ele, p e r m a n e c e t r i s t e , a fas tada , ausente, sofre insónia, inapetência, descuida-se

d a própria aparência, não se veste, não se b a n h a n e m se pen te i a . M u i t a s vezes faz referência

a alucinações g e r a l m e n t e a u d i t i v a s o u e x p r i m e ide ias de l i r an t e s . T a l estado p o d e r e m i t i r

p o r si m e s m o , ao c abo de a l guns d ias , semanas o u meses. N a remissão, é m u i t o i m p o r t a n t e

a capac idade dos f a m i l i a r e s p a r a to l e ra r , abso rve r e m o d i f i c a r a ans iedade que d e t e r m i n a

o q u a d r o : ans iedade de e s va z i amen to o u de castração. A s ide ias de l i r an t es são d o t i p o p a -

r a n o i d e : a lguém v e m r o u b a r a pac i en te , matá-la, envenená-la. T a m b é m p o d e m apresentar

sen t imentos de autodepreciação e au t o c ensu r a c o m características melancólicas: e la se vê

inútil, imprestável, não sabe se poderá c r i a r os filhos etc.

À s vezes, esse q u a d r o é tão i n t enso q u e p r o d u z a l a r m e n a famíl ia e se r e c o r r e então ao

p s i q u i a t r a . E n t r e as manifestações a l a r m a n t e s p o d e m o s m e n c i o n a r as t en ta t i vas de suicídio

o u o a t a q u e d i r e t o ao bebê. E m g e r a l , antes de chega r à ação, a puérpera c o m u n i c a suas

intenções nesse s en t ido , p e d i n d o a juda .

O u t r a f o r m a de depressão a n o r m a l é a maníaca. A puérpera age c o m o se n a d a tivesse

a c o n t e c i d o , m o s t r a - s e a l e g r e e não se o c u p a d o bebê . A p a r t i r d a s e g u n d a o u t e r c e i r a

s e m a n a , p r o c u r a p e r m a n e c e r o m a i s a fas tada possível d o filho, d e i x a n d o - o aos c u i d a d o s

de o u t r a pessoa. A a n o r m a l i d a d e se e x p r i m e p o r u m estado de tensão p e r m a n e n t e , i r r i t a ­

b i l i d a d e e h i p e r a t i v i d a d e .

3. O P u e r p é r i o e a A m a m e n t a ç ã o

A p ó s o p a r t o , os pa i s se d e f r o n t a m c o m a percepção das diferenças e n t r e o " b ebê i m a g i ­

ná r i o " (gestação) e o " b ebê r e a l " , c o m suas características e p e c u l i a r i d a d e s .

O per íodo d o puerpér io t r a z m u i t a s transformações deco r r en tes d o a j u s t a m e n t o a u m a

r e a l i d a d e n o v a .

6 9

Page 42: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

P s i c o l o g i a H o s p i t a l a r

A interação mãe-bebê c o início dessas m a m a d a s logo após o p a i to nos compre ivaiH I

existência de u m a s i n t o n i a su t i l e n t r e a d u p l a .

Q u a n d o existe u m e n t e n d i m e n t o e h a r m o n i a e n t r e a mãe o seu f i l h o no m o m e n t o ' la

amamentação , o le i te flui n o r m a l m e n t e e v a i a c o n t e c e n d o u m a regulação e n t r e a sui çau

d a criança e a l iberação d o le i te p r o d u z i d o .

Por o u t r o l ado , q u a n d o há d e s a r m o n i a no con ta to d a m a m a d a , surgem várias d i f i c u l d a d e

e p r o b l e m a s q u e b l o q u e i a m a lactação, i n i b i n d o a produção e/ou a l iberação d o l e i t e

A l é m de u m a f a l t a de s i n t o n i a e n t r e b o c a e m a m i l o , d i f i c u l d a d e s d a mãe , d a criança,

e bo ico tes f a m i l i a r e s , a instituição h o s p i t a l a r c o m sua r o t i n a r íg ida e f a l t a de a l o j a m ,

c o n j u n t o c o n t r i b u e m p a r a m a i o r e s p r o b l e m a s nesse per íodo .

O u t r a questão i m p o r t a n t e é que o leite é u m p r o d u t o i n t e r i o r do co rpo , assim c o m o a mens­

truação e o gozo sexual. Ass im, se p r e d o m i n a u m a au to imagem de que o in t e r i o r do corpo é r u i m

e seus p rodutos , c on taminados (essa a u t o i m a g e m é o r i u n d a de vivências re lat ivas à cu lpa sexual,

doenças, i n f e r t i l i d ade , abor tos e tc ) , a amamentação pode ser " s abo t ada " desde o início.

A l igação sexo e amamentação t ambém deve ser c o n s i d e r a d a , po is há u m a dissocia

ção en t r e m a t e r n i d a d e e sexo, t o r n a n d o difícil esta integração p a r a h o m e n s e mu lhe r e s ;

m u i t o s h o m e n s se u n e m ao " nã o q u e r e r a m a m e n t a r " d a m u l h e r , d e s e s t i m u l a n d o - a p a r a a

amamentação , ao colocá-la c o m o antagónica ao e n c o n t r o s e xua l .

A puérpera " m ã e recém-nascida" p r o v o c a inve j a n o h o m e m , f a m i l i a r e s e pro f i ss iona is

de saúde c o m sen t imen to s contraditórios: po i s a " n u t r i z " detém o p o d e r de a c o l h e r v i d a e

n u t r i - l a a p a r t i r de seu própr io c o r p o .

Neste per íodo , a m u l h e r t o rna -se vulnerável às pessoas e situações que a c e r c a m , e a

amamentação fica i n f l u e n c i a d a p o r fatores e obstáculos q u e d e v e m ser ana l i s ados .

Por fim, é i m p o r t a n t e ressa l tar q ue , nas m u l h e r e s e m que o " não q u e r e r " a m a m e n t a r

t o rna - se u m a esco lha , a p o s s i b i l i d a d e de ser b o a mãe não se esgota n o a to de a m a m e n t a r ,

m a s , s o b r e t u d o , n a i n t i m i d a d e e e m favorecer o d e s a b r o c h a r de seu filho.

4 . O N a s c i m e n t o d e A p e g o

M u i t o s autores a f i r m a m que o processo de formação d o v ínculo mãe-f i lho in i c ia -se d u r a n t e

a g r a v i d e z .

E m a l g u m a s m u l h e r e s , os vínculos afet ivos c o m seus bebés se i n i c i a m o u se i n t e n s i f i c a m

ao apa rece r os m o v i m e n t o s fetais.

K l a u s e K e n n e l l (1978) r e l a t a m que esse s e n t i m e n t o de apego começa e m u m pós-parto

i m e d i a t o , c h a m a n d o - o per íodo sensível.

B o w l b y (1981) sa l ienta que ex is tem condições necessárias p a r a que o apego se dê entre mãe

e filho. E n t r e elas se r ia a s ens ib i l i dade d a mãe d i a n t e dos s ina is d o bebê , c o m o também

7 0

1 s t I I , l o s 1 ' s l l l l l t l l j l l o s d o P i l e i p e i l o

a i apae i dade d o bebé p a r a s c n l i i que suas i n i c i a l i v a s soc ia is l e v a m a t r o ca a fe t i va c o m

s u a mãe.

Esse autor acredita que ao tél mi lo p r i m e i r o a n o a d u p l a mãe-bebê já t e n h a desen­

v o l v i d o u m padrão próprio de interação.

De a c o r d o c o m estudos r ea l i zados nesta área, o c o r r e nas mães u m a d u p l a identificação:

i u n i o feto e c o m sua própria mãe.

1, i m p o r t a n t e s a l i e n t a r neste s en t i do que as relações estabelec idas pe las mães c m sua

família dc o r i g e m p o d e m i n f l u e n c i a r a l igação c o m seu filho.

A s s i m c o m o também o desejo de g r a v i d e z , a e x p e c t a t i v a d o sexo d o nené, as fantasias

an t e r i o r e s ao n a s c i m e n t o deste, as frustrações e s en t imen to s o c o r r i d o s neste per íodo l en i

l igação d i r e t a n a interação d a d u p l a mãe-bebê .

D e n t r e os s e n t i m e n t o s q u e s u r g e m nas m u l h e r e s , a t r i s t e z a p e l a separação c p e r d a

o c o r r e e m todos os p a r t o s c o m s i g n i f i c a t i v a frequência.

Essa sensação de perda ocorre em todas as mulheres depois de qualquer tipo de parlo, a consequência

do período realmente gratificante em que carrega o bebê dentro de si (Brazelton, 1988, />. 95).

E m t o d o p a r t o ex iste u m c u r t o per íodo e m q u e sobrevêm a sensação de p e r d a e sepa­

ração de u m a p a r t e m u i t o a m a d a d o própr io c o r p o .

A l g u m a s instituições h o s p i t a l a r e s s e n t e m q u e a separação e n t r e a mãe e seu f i l h o é

desnecessária e tóxica p a r a a m b o s .

Segundo K l a u s - K e n n e l l (1978), "este vínculo ent re mãe e filho é a fonte de onde e m a n a m ,

depo is , todos os vínculos que haverão de ser estabelecidos pe l a criança e que c o n s t i t u e m a

relação que se formará d u r a n t e o curso d a criança. Pa ra t oda a v i d a , a força e a qua l i dade

deste laço i n f l u i sobre a q u a l i d a d e de todos os fu turos vínculos que serão estabelecidos c o m

out ras pessoas".

C o m isso é i m p o r t a n t e c o n c l u i r q u e a q u a l i d a d e d a relação en t r e mãe e filho i n f l u e n ­

c i a d i r e t a m e n t e o d e s e n v o l v i m e n t o físico e e m o c i o n a l d o bebê, f o r m a n d o a base p a r a u n i

p rog resso a d i c i o n a l pos t e r i o r .

5. A s p e c t o s da Ass i s tênc ia H o s p i t a l a r no P u e r p é r i o

M e s m o antes, n a própria gestação, o obs t e t ra não se r es t r inge somente aos exames rotineiros

nos a t e n d i m e n t o s , mas t ambém e m estar a t en t o às necessidades e m o c i o n a i s d o paciente,

O obs t e t r a é figura i m p o r t a n t e c o m q u e m a m u l h e r j á estabeleceu u m vínculo quando

a a c o m p a n h o u n o pré-natal, e t ambém e e spec i a lmen t e neste m o m e n t o d o puerpér io em

que todos d e d i c a m atenção somente ao bebê.

Page 43: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

P s i c o l o g i a H o s p i t a l a r

A r o t i n a e m u m hosp i t a l pode ser n o c i v a p a r a a mãe o s e u bebé, l ' m a delas s e i i l , 1 ,

t r a z e r o recém-nascido para a mãe somen te 24 horas após o p a r l o , q u a n d o vários estudo!

e n t r e eles de K l a u s e K e n n e l , d e m o n s t r a m que essa separação in t e r f e r e n e g a t i v a m e n t e na

consol idação d o v ínculo mãe-bebê, i n t e n s i f i c a n d o a depressão pós-par lo e p r e jud i t andl

a amamentação .

O u t r o fa tor que nos faz pensar c o m o n o c i v o seria o berçário, po is i m p l i c a u m a separai, a n

mãe-bebê e e m u m a r o t i n a " a r t i f i c i a l " , s a b o t a n d o a amamentação . O bebê, q u a n d o i I

m a m a d e i r a n o berçár io , chega ao q u a r t o d a mãe já sem f ome , p r e j u d i c a n d o a p r o d u ç l l

de le i te . Faz-se necessária aí a ação t a n t o d o obs t e t r a q u a n t o d o p e d i a t r a , suspendendo •

m a m a d e i r a s .

O a l o j a m e n t o c o n j u n t o t r a z m u i t a s van tagens p a r a m u i t a s m u l h e r e s . U m m a i o r conta to

d o bebê c o m seus pa i s d i m i n u i a ans i edade d a saída p a r a casa, u m a vez que a mãe já sai

d a m a t e r n i d a d e sabendo l i d a r c o m seu filho.

O a m b i e n t e d a m a t e r n i d a d e d e v e r i a ser m a i s c a s e i r o d o q u e h o s p i t a l a r p a r a q u e .,

m u l h e r pudesse sent i r -se a c o l h i d a .

À s vezes, n e m t u d o o c o r r e b e m , o u seja, q u a n d o m ã e e filho n e m s e m p r e estão em

per fe i tas condições, i n s t a l ando - s e u m a situação crítica de c u i d a d o s especia is .

Q u a n d o nasce u m a criança m a l f o r m a d a o u m o r t a , ins ta la -se u m a situação de crise

n a famíl ia.

A criança q u e m o r r e ao nascer e m decorrência de a c i d en t e (e não d a mal formação

e m g e r a l , susc i ta p r o f u n d o s s e n t i m e n t o s de p e r d a e depressão - a m u l h e r e a famíl ia se

p r e p a r a r a m p a r a a c o l h e r o bebê, q u e sequer chega a i r p a r a casa. A m u l h e r sente-se espe­

c i a l m e n t e d e p r i m i d a q u a n d o chega o le i te , então sem função. A lactação, e m m u i t o s casos,

cessa e s p o n t a n e a m e n t e ; e m o u t r o s , t o rna - se necessário o uso de substâncias i n i b i d o r a s .

Q u a n d o a criança é m a l f o r m a d a , espec ia lmente se nasce c o m deformações visíveis, sua

m o r t e t raz não só t r i s teza , mas também alívio, m u i t a s vezes inconfesso e v i v i d o c o m cu lpa .

Casos Ilustrativos

S o l i c i t a m o s desenhos de o i t o puérperas cu jas idades v a r i a v a m de 19 a 4 5 anos . F o r a m

p e d i d o s do is desenhos : o p r i m e i r o de figura h u m a n a e o s e g u n d o de c o m o elas e s t a v a m se

s e n t i n d o naque l e m o m e n t o .

A p a r t i r desses dados , j u n t a m e n t e c o m as entrev is tas , pudemo s traçar a l g u m a s caracterís­

t icas gera is dessas puérperas e m u m t r a b a l h o e m que t e o r i a e prática se c o m p l e m e n t a m .

7 2

I s l l l l l o s 1 ' s i l o l o ( | l < o s d o 1 ' u e i p e l i o

I n t e r p r e t a ç ã o d o s D e s e n h o s

I . Análise Individual

Desenho 1

Dados de Identificação

N o m e : M . K .

I d a d e : 23 anos

E s t a d o C i v i l : casada

N u de filhos: 2a filho

T i p o de p a r t o : n o r m a l

Interpretação

O desenho d a figura h u m a n a apresen ta f a l t a

de mãos e pés, o q u e i n d i c a u m a d i f i c u l d a d e

de c o n t a t o c o m o m u n d o .

A f a l t a de base sugere c e r t a insegurança

( "sem chão " ) .

O círculo desenhado a c i m a d a cabeça pode

re f l e t i r u m "p e so " e m relação à m a t e r n i d a d e : a

pac i en t e p o d e estar a m e d r o n t a d a c o m a n o v a

situação de v i d a .

N o s e g u n d o d e s e n h o a p a r e c e m p e r n a s

e braços q u e b r a d o s , o que n o v a m e n t e p o d e

i n d i c a r c e r t a d i f i c u l d a d e de c o n t a t o . Sente-se

" a m p u t a d a " p a r a abraçar e crescer.

O c o r r e n o v a m e n t e a ausência de base.

N e s t e m e s m o d e s e n h o d e n o t a - s e u m a

a m b i g u i d a d e e m re lação aos s e n t i m e n t o s ,

ao m e s m o t e m p o e m q u e apa r e c e u m a sen­

sação de f e l i c i dade . Percebe-se t ambém u m a

sensação de c h o r o e t r i s t e z a .

A l é m disso , é u m desenho i n f a n t i l i z a d o .

7 3

Page 44: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

7 4

I \ t l l d i i ' . I \ i < < > 11 >• 11 • I I ' . i l n

Desenho 2

Dados de Identificação N o m e : S . k .

I dade : 2H anos

Ks tado ( l i v i l : casada

N " d c f i lhos : 1" filho

l i p o de p a r t o : n o r m a l

Interpretação

( ) desenho d a f i g u r a h u m a n a aparece envo l to ,

p r o t e g i d o , o que p o d e d e n o t a r c e r t a confusão

en t r e e la (mãe) e o bebê. O seu desejo de p r o ­

teção é m a r c a n t e .

A face h u m a n a não apresen ta o r e lhas , o

q u e p o d e i n d i c a r p a s s i v i d a d e e d i f i c u l d a d e

de c o n t a t o .

A ausência de braços c o r r o b o r a esta ide ia .

N ã o a p a r e c e m n o d e s e n h o os m e m b r o s

i n f e r i o r e s e s omen t e p a r t e dos supe r i o r e s , o

que nos m o s t r a u m p r o f u n d o desconhec imento

d o própr io c o r p o .

O s e g u n d o desenho aparece m u i t o i n f a n ­

t i l i z a d o .

N ã o há u m a distinção ent re casa e t e lhado ,

o q u e p o d e s u g e r i r a f a l t a de d i ferenc iação

en t r e v i d a i n s t i n t i v a e v i d a e m o c i o n a l .

A casa, a árvore e a flor m o s t r a m - s e " s o l ­

t a s " , apesar d a t e n t a t i v a de base, o q u e p o d e

i n d i c a r c e r t a insegurança.

Page 45: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

I Desenho [i

Dados I/I Identificação N o m e : (!.F.

I d , i d e : l ! l anos

Es tado ( i i v i l : ( a sada

N " d e filhos: l " f i l h o

I i p o de p a r t o : cesárea

Interpretação

N o d e s e n h o d a f i g u r a h u m a n a , os o l h o s

apresen tam-se f echados , o q u e p o d e i n d i c a r

i m a t u r i d a d e p a r a e n f r e n t a r a n o v a situação

de v i d a .

O nó n o pescoço e o c inturão p o d e m su­

g e r i r q u e a pac i en t e sente-se " f e c h a d a " p a r a

a v i d a s exua l .

N o v a m e n t e aparece a ausência de base, o

que p o d e i n d i c a r c e r t a insegurança.

N o segundo desenho aparecem três coque i ­

ros e m t a m a n h o s d i f e r en tes , q u e p o d e m ser

vistos como a mãe, o p a i e a f i l ha recém-nascida.

E in te ressante o b s e r v a r o m e s m o traçado e m

do i s dos c o q u e i r o s , o q u e p o d e d e m o n s t r a r

identif icação c o m o m e s m o sexo.

O s cocos p o d e m s i m b o l i z a r a c a p a c i d a d e

de gerar .

O cor te v e r t i c a l que aparece desenhado n a

f o lha pode d e m o n s t r a r que a pac iente sente-se

f echada p a r a out ras coisas; é c o m o se u m a de­

t e r m i n a d a fase tivesse acabado e o u t r a prestes

a se i n i c i a r .

O sol r ep resen ta u m a figura superego ica .

I • . I l i d i r . P M I I i l i n | i i n s ( I n 1 ' i H H | m i i i i

Page 46: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

7 8

I ' . l l l i l l , ' . I ' • , !( I I ||. , ,•

l)«'NI'Illl(> 'I

Dmlin dr Identificação

N u m e : A . ( I.

idade: 37 anos

l . s l . ido ( l i v i l : ( a sada

N " dc f i lhos : 3" filho

T i p o dc p a r t o : cesárea

Interpretação

< íhservando o desen f i o d a f i g u r a h u m a n a ,

BOta-se que o braço d i r e i t o aparece q u e b r a d o

c há a ausência dc mãos, o q u e p o d e s u g e r i r

d i f i c u l d a d e de c o n t a t o e ta l vez p o u c a d i s p o ­

n i b i l i d a d e p a r a a m a t e r n i d a d e .

N o segundo desenho aparecem duas m o n t a ­

nhas que p o d e m s i m b o l i z a r os seios. T a m b é m

aparece u m c a m i n h o l e v e m e n t e t o r t u o s o , o

que p o d e r e p r e s e n t a r a c h e g a d a desse n o v o

filho e a necessidade de mudanças.

4 K

Page 47: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

8 0

Desenho >

/ W m de Identificação Nome: M . ( ! . Idade: 24 anos

I . S I . K I O ( l i v i l : ( a s a d a

N " . l c f i lhos : I " filho

I ' i p o de p a r l o : cesárea

Interpretação

A figura h u m a n a mos t ra - se não i d e n t i f i c a d a

i o n í , i f i g u r a f e m i n i n a , p o d e n d o nos i n d i c a r

BUe . i pac i en te não se sente i d e n t i f i c a d a c o m

o própr io sexo. A p a r e c e , s i m , u m a g r a n d e

identificação c o m o bebê.

P a r e c e n ã o s a b e r r e p r e s e n t a r s i m b o l i ­

c a m e n t e seus s e n t i m e n t o s , u t i l i z a n d o - s e d a

escr i ta p a r a isso.

N o s e g u n d o desenho apa rece t ambém a

escr i ta c o m o u m a f o r m a de não s imbol izaçâo

adequada de seus s en t imen tos .

I s t t l d o s l \ i . o l o ( | l i o I > I I O | | I O M O

(11

Page 48: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

I \ i < ( ) l ( ) ( | j . l I I -.11a<11>•. I \ o l o ( | ( I n 1 ' I H I I

D c S f l l l l O !>

Qadoi de Identificação Nome: M . l ) . l i Lu le: 'M) anos

l i s t a d o ( l i v i l : casada

N " de f i lhos : 3 " filho

Ti|><> dc p a r t o : cesárea e l i g a d u r a tubária

Interpretação

N i I ( lescii l io da f i gura h u m a n a aparece nos olhos

a ausência de p u p i l a , p o d e n d o d e n o t a r c e r t a

d i f i c u l d a d e i n t e r n a de v i s u a l i z a r as coisas.

Aparece u m a transparência na área gen i ta l ,

o que nos faz pensar e m u m a d i f i c u l d a d e nesta

área, p r i n c i p a l m e n t e c o m a procr iação.

Parece u m a pessoa so f r ida , m a r c a d a p e l a

\< la. Podemos observar isto pe la face d a figura

h u m a n a , b e m c o m o pe la du r e za do desenho.

( ) d esenho apa rece s em base, i n d i c a n d o

c e r t a insegurança.

N o s egundo desenho a pe r spec t i v a d a m a ­

t e r n i d a d e é v i s t a c o m o u m a castração. Parece

q u e a " a l e g r i a " d a l i g a d u r a tubária está se

s o b r e p o n d o à situação d a m a t e r n i d a d e .

Page 49: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

P s i c o l o g i a H o s p i t a l a r

8 4

Desenho 7

Dados de Identificação Home: E.S. [dade: 45 anos

l i s t a d o ( a v i l : s eparada

N " de f i lhos : < i " l i l h o

l i p o dc p a r t o : n o r m a l

Interpretação

A l i s u r a h u m a n a aparece bas tan t e c o m p r o ­

m e t i d a , po is não há u m a discr iminação en t r e

a s pessoas e os a n i m a i s .

( ) d esenho das pessoas está bas tan t e d i s ­

t o r c i d o e d e f o r m a d o .

Há u m e n q u a d r a m e n t o do desenho , o que

p o d e i n d i c a r c e r t a r i g i d e z . Pode-se s u g e r i r

também u m a v i d a difícil, u m e m p o b r e c i m e n t o

d a v i d a a f e t i va .

N o segundo desenho há u m a desproporção

entre casa, árvore, r a m o de flores e fo lha. A casa

•parece r odeada de objetos b e m maiores , o que

pode sugerir sensação de medo. A paciente parece

v i v e r e m u m m u n d o dc coisas per igosas.

O s desenhos n o v a m e n t e a p a r e c e m e n q u a ­

d r a d o s , o que p o d e i n d i c a r r i g i d e z .

A casa aparece " s o l t a " n o ar , o que p o d e

i n d i c a r c e r t a insegurança.

Page 50: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

8 6

I • • t l l d o ' . ! '• Ió(|i< <)•. ( l o 1 ' l l n l | x . | I . .

D e s e n h o 8

Dados dc Identificação

N c: K . I . .

Id . ide : 2.r) anos

Es tado ( l i v i l : casada

N a d e f i l hos : 3 a filho

T i p o de p a r t o : cesárea

Interpretação

A figura h u m a n a desenhada é do sexo m a s c u ­

l i no , o que pode suger i r a fa l ta de identificação

I I n 1 1 o própr io sexo e q u a n t o a exper iênc ia

d a m a t e r n i d a d e p o d e ser d i f í c i l p a r a es ta

pac i ente .

( ) d esenho aparece de p e r f i l , o q u e p o d e

r ep r esen ta r c e r t a d i f i c u l d a d e de e n f r e n t a r o

me io .

• A p a r e c e a ausência de base, o q u e p o d e

i n d i c a r c e r t a i nsegurança d i a n t e d a n o v a

e tapa de v i d a .

N o s egundo desenho, a p a r e c e m c i n c o p e i ­

xes, q u e p o d e m i n d i c a r sua situação f a m i l i a r

a l u a i (ela, o m a r i d o e os três filhos).

Este d e s e n h o d e n o t a c e r t a regressão e m

função d o m e i o l íquido q u e aparece .

f t /

Page 51: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

Psicologia Hospitalar I s l l l l l n s l \ i ( i l i > P l l l t i p i - l l o

I n t e r p r e t a ç ã o Ge ra l d o s D o s o n h o s G r á f i c o s

i r desenhos r s i udados dn i<> lam t i n i a v a r i e d a d e de s en t imen tos c a r a c t e r i z ados p o r a l e g r i a ,

do i . onfusão e s ina i s de a p a r e n t e t r i s t e za . Esses s e n t i m e n t o s p o d e m ser c o n s i d e r a d o s

a d e q u a d o s se p e n s a r m o s q u e p rovém de pac i en tes q u e a c a b a r a m d c g a n h a r seus bebés

i que . d c c e r t a f o r m a , lerão dc r e o r g a n i z a r suas v i d a s c o m a c h e g a d a de a lguém n o v o

na famíl ia.

( I I I I I I I I já l o i a b o r d a d o a n t e r i o r m e n t e , nesse m o m e n t o s u r g e m dúvidas, necessidade dc

mudança dc papéis, reestruturações pessoais e f a m i l i a r e s , que p o d e m estar sendo v i v i d o s

i o i n ( c r i a ambivalência (a legr ia - t r i s teza ) .

A l g u n s desenhos m o s t r a m - s e i n f a n t i l i z a d o s e r e g r ed i do s .

A ausência de base aparece e m m u i t o s desenhos, d e n o t a n d o insegurança.

É in t e ressante o b s e r v a r e m a l g u n s desenhos o s e n t i d o d c famíl ia s i m b o l i z a d o p e l o i

i o que i r o s e pe los pe ixes .

1 )<• todos os desenhos de figura h u m a n a es tudados , apenas e m u m deles aparece a l i g u i a

m a s c u l i n a , o q u e p o d e d e m o n s t r a r a não identif icação c o m a figura f e m i n i n a c q u a i M o a

m a t e r n i d a d e p o d e ser u m a experiência difícil p a r a esta pac i en t e , po i s , q u a n d o se desenha

a f i g u r a h u m a n a d o sexo f e m i n i n o , é a comprovação d a f e m i n i l i d a d e c o m a m a t e r n i t lai lc

Para m u i t a s m u l h e r e s , isso é u m a descobe r t a , sentem-se m u l h e r e s q u a n d o são mães.

N o desenho 6, a p e r s p e c t i v a d a n o v a m a t e r n i d a d e se vê c o n t a m i n a d a c o m 0 p ro i ed i

i n c u t o d a l a q u e a d u r a tubária. A pac i en t e d e s enhou u m útero c o r t a d o q u a n d o sol i i i tada B

desenha r sobre seus s en t imen t o s .

A p a r e c e u m c o m p r o m e t i m e n t o i m p o r t a n t e n o desenho de figura h u m a n a 7, c m que M

I i guras estão bas tan te d i s t o r c i das e d e s p r o p o r c i o n a i s , m i s t u r a n d o - s e c o m a n i m a i s .

Denota-se também, nos desenhos 5 e 6, a d i f i cu l dade de representar s imbo l i c amen t e os

sent imentos, nos quais as pacientes p rec i savam da l i n g u a g e m escr i ta p a r a expressá-los.

Conclusão

A p a r t i r d a real ização d o presente t r a b a l h o , concluímos que a presença d o psicólogo e m

u m a u n i d a d e de G i n e c o l o g i a e Obstetr íc ia é de f u n d a m e n t a l importância.

P r i m e i r a m e n t e p o r q u e esta é, p a r a m u i t a s pac i entes , a o p o r t u n i d a d e única de s e e x ­

p r e s sa r em , f a l a r e m sobre seus t emores , rece ios , dúvidas, ans iedades , fantas ias n o per íodo

de transição c a r a c t e r i z a d o p e l o puerpér io .

S e g u n d o , p e n s a m o s que este t r a b a l h o p o d e ser v i s t o c o m o p r e v e n t i v o , o u seja, p o r uma

l igação m a i s saudável en t r e mãe e filho, q u a n d o se l u t a p o r u m a m a t e r n i d a d e m e l h o r .

8 7

Page 52: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

I '\l< < l loC j l . l I l ( ) ' ,|)jt,||,||

K m t e r c e i r o luga r , a c r e d i t a m o s que a puérpera sci i lc-se m u i t a s vezes desp ro t eg ida i

d e s a c o m p a n h a d a p e r a n t e u m a relação f o r m a l c o m o médico, c o n t r i b u i n d o p a r a u m a f a l h l

da comunicação e n t r e a m b o s , i n i b i n d o - a de expressar c l a r a m e n t e suas dúvidas.

K i m p o r t a n t e s a l i e n t a r que e m u m hospital g e ra l c o n g r c g a n i - s c profissionais de divi I

sas espec i id idades , b e n e f i c i a n d o o pac i en t e e m u m a t e n d i m e n t o m a i s g l o b a l e e f ic iente i

c o n t r i b u i n d o p a r a u m a t r o c a de informações s i g n i f i c a t i v a e n t r e psicólogo e o u t r o s p n >l i .

s iona is . A o m e s m o t e m p o , u m a e q u i p e d i s soc i ada p r e j u d i c a a q u a l i d a d e d o atendimento

P o d e m fazer p a r t e desta r o t i n a de a t e n d i m e n t o carência de número de pro f i s s i ona i s , i li

equipamentos e medicações, t o r n a n d o o t r a b a l h o d o psicólogo l i m i t a d o .

Por o u t r o l ado , e m a l guns m o m e n t o s médicos, en f e rme i ras e pac ientes i m a g i n a m e \ v e m

0 psicólogo c o m o " S a l v a d o r " , " u m mág i c o " , c apaz de s o l u c i o n a r t odos os p r o b l e m a s .

C a b e ao psicólogo d e s m i s t i f i c a r essa f an tas ia , m o s t r a n d o - s e também l i m i t a d o d i an t e

de várias situações.

Refe rênc ias B i b l i o g r á f i c a s

BOWLBY, John . Cuidados Maternos e Saúde Mental. São Paulo: Mar t ins Fontes, 1981.

BRAZELTON, T. Berry. O Desenvolvimento do Apego: Uma Família em Formação. Porto A legre Ar tes M é d i c a s , 1988.

DEUTSCH, Helene. La Psicologia de la Mujer. Buenos Aires: Losada S.A., 5. ed . , 1960.

MELLO FILHO, Jul io de , et al. P s i c o s s o m á t i c a Hoje. Porto A leg re : Ar tes M é d i c a s , 1992.

KLAUS, Kennel l . La Relation Madre - Hijo. Buenos Aires: Losada S.A., 5. ed. , 1960.

MALDONADO, Maria Teresa. Comunicação entre Pais e Filhos-A Linguagem do Sentir. P e t r ó p o l i s Vozes, 1988.

. Psicologia da Gravidez. P e t r ó p o l i s : Vozes, 7. ed . , 1985.

SOIFER, Raquel. Psicologia da Gravidez, Parto e Puerpério. Porto A leg re : Ar tes M é d i c a s , 1980.

VIDELA, Mi r ta . Maternidade, Mito y Realidad. Buenos Aires: A . Pena Lil lo, Edi tor S.R.L, 1973.

WINNICOTT, D.W. Os B e b é s e suas Mães. Co leção Psicologia e Pedagog ia . São Paulo: Mar t ins

Fontes, 1988.

9 0

Pacientes Terminais: Um Breve Esboço

Valdemar Augusto Angerami - Camon

D e d i c a d o a Regina D ' A q u i n o

Introdução

Este t r a b a l h o f o i p u b l i c a d o e m m e u p r i m e i r o l i v r o . 1 N a m e d i d a e m q u e essa publ icação

se esgotou e sua reedição carece de propósitos m a i s a tua l i z ados , c u r v e i - m e à insistência

c o m que m u i t o s colegas, r e i t e radas vezes, p e d i r a m p o r u m a n o v a edição deste capítulo e m

publicação específica de Ps i co l og ia H o s p i t a l a r . K, a s s im , depo i s de r e cusa r n o v a p u b l i c a ­

ção e m d iversas rev is tas e ana i s espec ia l i zados , e i - lo r eescr i t o e m a n t i d o e m sua e s t r u t u r a

básica, f a t o r imprescindível p a r a q u e a essência não fosse a l t e r a d a , isso s empre s e g u n d o a

ótica desses colegas.

Este t r a b a l h o é apenas u m a t e n t a t i v a de r e l a t o sobre u m a problemática específica, o p a ­

ciente t e r m i n a l , o d e f i n h a m e n t o corpóreo e suas implicações. N ã o houve a intenção de c r i t i c a r

os pos tu l ados existentes, t a m p o u c o de compará-los, assumi- los o u refutá-los; s imp lesmente

• h o u v e u m a t e n t a t i v a de q u e s t i o n a m e n t o d a problemática d o d e f i n h a m e n t o corpóreo.

A s s i m , t en tou-se a e laboração de u m t r a b a l h o e m que as p r i n c i p a i s proposições e ce­

l eumas existentes n o seio das discussões teóricas sobre a problemática d o pac i en t e t e r m i n a l

fossem a r r o l a d a s . Res ta a i n d a , p o r o u t r o l a d o , a ce r t e za de que m u i t o s dados p o d e r i a m

ser a p r o f u n d a d o s e e x p l o r a d o s . I g u a l m e n t e o u t r o s ficaram omissos p o r não t e r e m s ido

cons ide rados i m p o r t a n t e s o u até m e s m o necessários p a r a a e laboração deste t r a b a l h o .

1 - A n g e r a m i , V . A . Existencialismo & Psicoterapia. S ã o P a u l o : T r a ç o , 1 9 8 4 .

Page 53: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

r- , i< o i o c j i . i i i o s | > j t . i i . i t

seguramente, muito resta a ser dito e exploradt >. mas o i m p o r t a n t e é o ques t i ona nu ntt i

e o d e s p e r t a r de eonseiêneia s< ibre latos e coisas n útil içadas, p r i i K i pa l men t e pela omissAn

soc ia l c até m e s m o académica. E l a t o , po rém, que a p a r t i r d o t r a b a l h o dc colegas qu i •

d e d i c a m i n t e r m i t e n t e m e n t e ao es tudo d a temática d a m o r t e ' , esse q u a d r o está c m pleno

processo de alteração, h a v e n d o c a d a vez m a i s l u g a r p a r a u m a compreensão m a i s h . m a

e digna das questões q u e e n v o l v e m a m o r t e .

i Problemática Social do Paciente Terminal3

A ) A S o c i e d a d e e o Pac ien te Te rm ina l

A o debruçarmo-nos sobre a temática dos aspectos terapêuticos inerentes ao pac i en t e tei

m i n a i , d e p a r a m o - n o s i n i c i a l m e n t e c o m as implicações ex istentes n a soc iedade , b e m c

c o m o c o n t e x t o i n s t i t u c i o n a l h o s p i t a l a r que i n c i d e sobre ele. T o r r e s 4 a f i r m a q u e a m o r t e

é, n o século X X , o suje i to ausente d o d i s cu r so . E n t r e t a n t o , nos últimos 5 0 anos , o silén

c i o começa a ser r e m o v i d o nas ciências h u m a n a s . H i s t o r i a d o r e s , antropólogos, b ió logo

filósofos, psicólogos, p s i q u i a t r a s e p s i c ana l i s t a s i n i c i a m c o m audácia u m a l u t a c o n t r a a

m o r t e i n t e r d i t a , d e n u n c i a n d o as causas q u e l e v a r a m à negação d a m o r t e e r e d e s c o b r i n d i >

a importância d o t e m a . 5

E m u m a soc iedade n a q u a l a pessoa é espo l i ada e e x p l o r a d a m e r c a n t i l m e n t e , a p e r d a da

capac idade p r o d u t i v a fará c o m que o " d e s a m p a r o s o c i a l " seja sent ido c o m m a i s in tens idade ,

A f a l t a de p e r s p e c t i v a e x i s t e n c i a l t o rna - s e o p r i m e i r o indíc io de desespero e m situações

nas q u a i s a p e r d a d a c a p a c i d a d e f u n c i o n a l t o rna -se i m i n e n t e . O t o t a l a b a n d o n o a que se

e n c o n t r a m entregues os inválidos de m a n e i r a g e r a l l eva o pac i en t e t e r m i n a l a desesperar-se

d i a n t e d a r e a l i d a d e q u e se l h e apresenta .

O q u a d r o degenerat ivo faz de seu p o r t a d o r alguém soc ia lmente a l i jado da competição av i l ­

t an te existente e m nosso me i o soc ia l , alguém que irá merecer sent imentos de complacência.

2 - N e s s e s e n t i d o , g o s t a r i a d e r e g i s t r a r o t r a b a l h o p i o n e i r o d a s c o l e g a s R e g i n a D ' A q u i n o e W i l m a C . T o r r e s , e

m a i s r e c e n t e m e n t e d e M a r i a J u l i a K o v a c s e M a r i s a D e c a t d e M o u r a . E e m q u e p e s e o f a t o d e q u e a o c i tá- las

c o m e t o e n o r m e in just iça c o m o u t r o s t a n t o s p r o f i s s i o n a i s q u e i g u a l m e n t e t r a b a l h a m nessa m e s m a d i r e ç ã o , o

d e t e r m i n i s m o , o a r r o j o e o p i o n e i r i s m o desses p r o f i s s i o n a i s t o r n a r a m a t e m á t i c a d a m o r t e p r e s e n t e d e m a n e i r a

ind i sso lúve l n a s l i d e s a c a d é m i c a s e h o s p i t a l a r e s .

3 - E m n o s s o t r a b a l h o e s t a m o s f a z e n d o r e f e r ênc i a a o p a c i e n t e t e r m i n a l p o r t a d o r d e d o e n ç a d e g e n e r a t i v a .

4 - T o r r e s , C . W . A R e d e s c o b e r t a d a M o r t e . In: A Psicologia e a Morte, T o r r e s , C . W . , G u e d e s G . W . e T o r r e s C R .

R i o d e J a n e i r o : E d i t o r a d a F u n d a ç ã o G e t ú l i o V a r g a s , 1 9 8 3 .

5 - Ibid. Op. cit.

9 2

I ' . n t o s l o i m i n a i s I l i n I t i e v o I s l i o ç o

Dessa m a n e i r a , e i l i . n e , pac i entes p o r t a d o r e s dc doenças d eg ene ra t i v a s que ,

Riesmo não s e e n c o n t r a n d o no aspei to t e r m i n a l dc suas v idas , n e m a p r e s e n t a n d o s ina is

visíveis de d e f i n h a m e n t o corpóreo , e inc lus i v e não a p r e s e n t a n d o s ina is de c o m p r o m e t i ­

m e n t o e m seu p r a g m a t i s m o , não c o n s e g u e m v o l t a r às a t i v i d a d e s an t e r i o r e s ao s u r g i m e n t o

da doença. ( ) própr io hosp i t a l é c o n i v e n t e c o m essa d iscr iminação. R i b e i r o 6 c o l o c a que o

hosp i t a l acaba sendo u m a o f i c i n a , e o médico , seu p r i n c i p a l mecânico . C u m p r e a ele fazer

c o m que a máquina h o m e m r e t o r n e o m a i s depressa possível à c irculação c o m o m e r c a d o ­

r ia a m b u l a n t e . In te ressa consertá-la, m a s interessa m e n o s e v i t a r que se q u e b r e . E l a t e m

que ter, c o m o q u a l q u e r máquina, u m t e m p o útil, d u r a n t e o q u a l p r o d u z a m a i s e m e l h o r ;

t o d a v i a , há o u t r o s homens-máquina sendo p r o d u z i d o s e que p r e c i s a m ser c o n s u m i d o s , e

é b o m , p o r isso, q u e e la vá ass im aos poucos . . . 7

A presença d a doença d e g e n e r a t i v a faz c o m q u e o p a c i e n t e seja d i s c r i m i n a d o e até

m e s m o r e j e i t ado nas situações m a i s d i ve rsas , q u e p o d e m v a r i a r desde situações f a m i l i a r e s

até situações e m q u e se e x e r c e m a t i v i d a d e s p r o d u t i v a s . O p a c i e n t e p o r t a d o r de doença

d e g e n e r a t i v a , a lém d a d e b i l i d a d e orgân ica i n e r e n t e à própr ia doença, c a r r e g a o f a r d o

dc a l guém " d e s a c r e d i t a d o " s o c i a l m e n t e , seja e m t e r m o s de c a p a c i d a d e p r o d u t i v a , seja

e m t e r m o s d a mit i f i cação de q u e se reveste a prob lemát ica d a doença. E a instituição

h o s p i t a l a r surge n o b o j o das contradições socia is de e x i g i r produção c o m o s inónimo d o

própr io r e s t a b e l e c i m e n t o orgânico . Saúde-produção é u m b inómio invisível, q u e insere o

doen t e e m u m a condição de signif icação apenas e tão somen te a p a r t i r de sua condição

p r o d u t i v a . O u a i n d a , nas p a l a v r a s de R i b e i r o : 8 " O h o s p i t a l , seja públ ico o u p r i v a d o , r e ­

p r e s en ta a emergênc ia de interesses submersos d a produção i n d u s t r i a l e m saúde. O que

aparece , t o d a v i a , é o seu r e s u l t a d o m a i s b r i l h a n t e e s o c i a l m e n t e ace i to : o c u i d a d o c o m o

e n f e r m o . S e m e m b a r g o , é b o m q u e a recuperação aconteça, m a s é melancó l ico saber q u e

o u t r o s t a n t o s adoec i dos dos m e s m o s ma les e de o u t r o s s o c i a l m e n t e p r o v o c a d o s e evitáveis

ocuparão os m e s m o s le i tos , r e p e t i n d o o suplício de Tân ta l o , q u e a c a b a sendo a função

d o h o s p i t a l " .

E m u m a soc i edade q u e e s c r a v i z a o h o m e m , v a l o r i z a n d o os m e i o s de p rodução e m

d e t r i m e n t o dos va l o r e s de d i g n i d a d e h u m a n a , a saúde passa a ser a l g o v a l o r i z a d o apenas

q u a n d o está e m r i s c o a c a p a c i d a d e f u n c i o n a l d o ind iv íduo. Este , c o m o ser b io lóg i co e

t a m b é m s o c i a l , v i v e essa interação de m a n e i r a t o t a l e c o n s e q u e n t e m e n t e sofre e m níveis

6 - R i b e i r o , P. H . O Hospital: História e Crise. S ã o P a u l o : C o r t e z , 1 9 9 3 .

7 - Ibid. Op. cit.

8 - Ibid. Op. cit.

9 3

Page 54: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

P s u o l o ( | i , i H o s f i i t . i l . I I

organísmicos t odas as contradições da problemática s o c i a l , da (|tial l a / parte i n e n i m

e i n d i s s o l u v e l m e n t e .

A d e m a i s , ex is te t o d a u m a propulsão soc ia l de negação d a m o r t e c o m o fenómeno, l i

negação de f o rma const r i ta cerceia t oda e qua lquer tentat i va de compreensão das implicações i l . i

mor t e no co t id iano das pessoas. Tor res ' a f i r m a que o m o r i b u n d o só tem o status que lhe c coulei n 1.1

pe lo un iverso hosp i ta la r , isto é, u m status negat ivo , o de u m h o m e m que, p o r não pode r voltai à n o r m a l i d a d e f u n c i o n a l , encontra-se à espera. O m o r i b u n d o é a lgo que i n c o m o d a . U m a vei

que a própria m o r t e é o cu l t a , masca rada , esvaziada, e que sobre e la se f i xa o c o n j u n t o de V I

lores negat ivos d a sociedade, a a gon i a não pode ter status autónomo. N ã o pode ser valorizai l l

E prec iso que e la desapareça n a pa to l og i a , submersa, p e r d i d a , irreconhecível. 1"

T a m b é m é n o pac i en te t e r m i n a l que t o d a sorte de preconce i tos , i ndependen t emen t e d l

pa t o l o g i a que possa acometê-lo, encontra-se en f e i xada e d i r e c i o n a d a p a r a a t i tudes que pro

p u l s i o n a m m u i t o ma i s a d o r do t r a t a m e n t o em si p a r a aspectos per t inentes a tais preconceitOI

A s s i m , u m pac iente , ao ser r o t u l a d o c o m o aidético, p o r e x e m p l o , trará sobre s i , além de todo o so f r imen to de sua deb i l i d ade orgânica, u m a série de acusações sobre a m a n e i r a d is torc ida

c o m o a soc iedade concebe sua p a t o l o g i a . O m e s m o ocorrerá c o m o pac i en te p o r t a d o r de

câncer, o u a i n d a de q u a l q u e r o u t r a doença degenera t i va . O preconce i t o faz c o m que t oda e

q u a l q u e r pa t o l o g i a associada d i r e t a m e n t e à ide ia de m o r t e seja cons iderada in f ec tocon tag i i i s a

e seus po r t ado r e s , pessoas que necess i tam ser al i jadas d o convív io soc ia l . Evidência disso c

a própria denominação das doenças e m u m a configuração d i r e t a c o m a ide i a d a d e s t r u t i v i -

dade . O t e r m o câncer, c o m o m e r a citação, fo i associado à doença pe la semelhança desta a< >

ca rangue j o (no B r a s i l , q u a n d o se p r o n u n c i a a p a l a v r a câncer, não se associa de i m e d i a t o â

figura do crustáceo, t a l q u a l o co r r e n a E u r o p a , onde essa definição teve lugar ) . 1 1

A s s i m , o " cânce r " a p r i s i o n a sua v í t ima t a l q u a l o crustáceo que l h e e m p r e s t a o n o m e

até a m o r t e . E m b o r a o progresso d a M e d i c i n a seja notór io n a área de o n c o l o g i a , h a v e n d i >

inc lus i ve casos e m que é possível u m a atuação bas tante ef icaz q u a n d o de seu d e s c o b r i m e n t o

p r e coc e , a i n d a a s s im é dif íci l não se v e r n o " cânce r " u m a e n f e r m i d a d e i m e d i a t a m e n t e

assoc iada ao espec t ro d a m o r t e . E , d a m e s m a f o r m a c o m o o c o r r e c o m o u t r a s doenças que

i g u a l m e n t e e s t i r p a v a m e c e i f a v a m m u i t a s v i das h u m a n a s - u m e x e m p l o disso é a l ep ra : tão

l ogo passou a ser d o m i n a d a p e l a m e d i c i n a , teve sua designação m u d a d a p a r a hanseníase,

9 - Psicologia e a Morte. Op. cit.

10 -Ibid. Op. cit.

11 - A n g e r a m i , V . A . e M e l e t i , R . M . A A t u a ç ã o d o P s i c ó l o g o J u n t o a P a c i e n t e s M a s t e c t o m i z a d a s . In: Psicologia

Hospitalar. A Atuação do Psicólogo no Contexto Hospitalar. S ã o P a u l o : T r a ç o , 1 9 8 4 .

9 4

P a i i i t u t u s l o i m i n a i s : U m H m v i i I s b o ç o

11o lusive e m u n i a homenagem • A l m a u e r < i c h a r d I l ansc , m e d i c o que d e s c o b r i u o b a c i l o

específico que p r o v o c a v a a doença , 0 câncer c e r t a m e n t e g a n h a r a o u t r a denominação q u a n d o for t o t a l m e n t e d o m i n a d o pela m e d i c i n a . ' '

( ) pac i en te t e r m i n a l está a f r o n t a n d o l odos os prece i tos dc negação da m o r t e . E c o m o se

mostrasse a cada ins tan t e que a m o r t e , e m b o r a negada de f o r m a irascívcl pe la soc iedade , o

a lgo ex is tente e inevitável. K i i b l c r - R o s s 1 ' sa l i en ta q u e a m o r t e é u m t e m a e v i t a d o , i g n o r a d o

po r nossa soc i edade a d o r a d o r a d a j u v e n t u d e e o r i e n t a d a p a r a o progresso . E quase co

se a considerássemos apenas m a i s u m a e n f e r m i d a d e n o v a a ser debe l ada . O l a l o , p o r e m , é

que a m o r t e é inegável. T o d o s nós m o r r e r e m o s u m d i a ; é apenas u m a questão dc t c i n p i i . A

m o r t e , n a v e r d a d e , é tão p a r t e d a existência h u m a n a , d o seu c r e s c imen to e d e s e n v o l v i m e i r

t o , q u a n t o o n a s c i m e n t o . E u m a das poucas coisas n a v i d a dc que temos cer teza . E l a n a u

é u m i n i m i g o a ser c o n q u i s t a d o n e m u m a prisão de o n d e devemos escapar: e u m a pai le

i n t e g r a l de nossas v i das que realça a existência h u m a n a . A m o r t e estabelece u m l i m i t e em

nosso t e m p o de v i d a e nos i m p e l e a fazer a l g o p r o d u t i v o nesse espaço de t e m p o , e n q u a n t o

d i s p u s e r m o s de l e . 1 4

A s o m a de t o d a a incongruência soc i a l , os con f l i t o s de va lo res , de esteio da d i g n i d a d i

f a zem c o m que o pac i en t e t e r m i n a l seja depositário de u m a série de incer tezas q u e n ã o

c u l m i n a r t o r n a n d o - o a lguém v i t i m a d o não apenas p o r u m a d e t e r m i n a d a patologia em ll mas , e p r i n c i p a l m e n t e , p o r t o d a u m a incompreensão de sua r ea l situação. Humanizai ai

condições de v i d a d o pac i en t e t e r m i n a l é, a c i m a de t u d o , b u s c a r u m a congruência maioi e m t o d o o seio d a soc i edade , h a r m o n i z a n d o a v i d a e a m o r t e de m a n e i r a indissolúvel. S o m e n t e ass im p o d e r e m o s assegurar aos nossos descendentes a condição de m o r t e e \a

d i g n a s . A m o r t e p r ec i sa ser v i s t a c o m o u m processo n o q u a l a esperança se f u n d e C u m a

p e r s p e c t i v a e x i s t e n c i a l s em exclusão de q u a l q u e r u m a das poss ib i l i dades d a existência.

O m o r r e r é p a r t e i n e r e n t e d a condição h u m a n a e o a p o i o a a lguém que se encontra

n o l e i t o mortuár io é, antes de t u d o , o r e c o n h e c i m e n t o d a nossa própr ia finitude. D a n< >ssa

condição de seres m o r t a i s e, p o r t a n t o , passíveis das m e s m a s vivências e ocorrências d o

pac i en t e t e r m i n a l . 1 '

12 -Ibid. Op. cit.

13 - K u b l e r - R o s s , E . Morte, Estágio Finalda Evolução. R i o d e J a n e i r o : R e c o r d , 1 9 7 5 .

14 - Ibid. Op. cit.

15 - É c o m o se h o u v e s s e u m a n e c e s s i d a d e p r e m e n t e d e a m o r t e d e i x a r d e s e r t e m á t i c a m e r e c e d o r a d e a t e n ç ã o

a p e n a s c t ã o s o m e n t e d e r e l i g i o s o s . E i n t e r e s s a n t e o b s e r v a r - s e nesse s e n t i d o q u e a m a i o r i a d a s f a c u l d a d e !

d e M e d i c i n a e P s i c o l o g i a s e q u e r t e m e s p a ç o e m s u a s e s t r u t u r a ç õ e s p r o g r a m á t i c a s p a r a a d i s cussão dessa

t e m á t i c a . A s s i m , esse p r o f i s s i o n a l , a o d e i x a r as l i d e s a c a d é m i c a s e i n g r e s s a r e m u m a a t i v i d a d e e s p e c i f i c a n a

9 5

Page 55: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

P s i c o l o g i a H o s p i t a l a r

B) O Staff e o C o n t e x t o H o s p i t a l a r D i a n t e d o Pac ien to Te rm ina l

O pac i en t e t e r m i n a l é u m ser h u m a n o que está v i v e n d o u m e m a r a n h a d o dc emoções i | i n

i n c l u e m ans i edade , l u t a p e l a sua d i g n i d a d e e c o n f o r t o , a l e m dc u m a c e n t u a d o l e i | i n

se r e l a c i o n a c o m seu t e m p o de v i d a , l i m i t a d o , f i n i t o . M a u k s c h " ' a f i r m a que , na soc iedadl

tecnológica m o d e r n a , m o r r e r é a l g o que acontece n o h o s p i t a l . M a s os hospitais sào

tuições ef ic ientes e despe r sona l i z adas , o n d e é m u i t o difícil v i v e r c o m d i g n i d a d e não ha

t e m p o n e m luga r , d e n t r o d a r o t i n a , p a r a c o n v i v e r c o m as necessidades dos en f e rmos . ( >.

hosp i t a i s são instituições c o m p r o m e t i d a s c o m o processo de c u r a , e os pac i entes à n u i l tl

são u m a ameaça a essa função prec ípua. O s p r o f i s s i o na i s têm p e r s p e c t i v a s e r o t i n a s I

c u m p r i r : eles s imp l e smen t e n a d a têm a v e r c o m os doentes e os que estão p a r a m o r r e i < »

m o r r e r é u m a ameaça às funções desses pro f i s s i ona i s e c r i a s en t imen to s de i m p r o p r i e d a d e ,

incompatíveis c o m suas funções d e f i n i d a s - de pessoas q u e e f e t i vamente p o d e m l i d a r ci n u

doenças. N ã o há l u g a r nas funções p r esc r i t a s desses p ro f i s s i ona i s p a r a que se comportem c o m o seres h u m a n o s n o a t e n d i m e n t o a seus pac ientes q u e se e n c o n t r a m à m o r t e . 1 7

Esse pac iente v i v e u m m o m e n t o do q u a l seus f a m i l i a r e s e o j(o//Tiospitalar também fazem p a r t e . Essa part ic ipação m u i t o v a i i n f l u i r n o estado desse pac i en t e , d e t e r m i n a n d o inclusive os aspectos de rejeição o u aceitação d o t r a t a m e n t o , e até m e s m o d a própr ia doença.

Q u a n d o u m pac i en t e é a d m i t i d o n o h o s p i t a l , a e q u i p e d e l i n e i a a c h a m a d a "trajetória

h o s p i t a l a r " . Essa trajetória se dá p o r m e i o de e n c a m i n h a m e n t o s r ea l i z ados p e l o p r o n l o -

- s o c o r r o o u a i n d a p o r intermédio de diagnósticos r e a l i z a d o s fora d o h o s p i t a l . U m a vez

h o s p i t a l i z a d o , o pac i en t e é e n c a m i n h a d o p a r a o setor específ ico de t r a t a m e n t o , onde , a

p a r t i r de intervenções necessárias - c i r u r g i a s , t r a t a m e n t o s m e d i c a m e n t o s o s , infiltrações

etc. - , são d e l i m i t a d o s os i tens de sua permanênc ia e m u m d e t e r m i n a d o setor." 1 Essa t ra je ­

tória, de u m a f o r m a g e ra l , a lém d o diagnóstico, consiste até m e s m o nas e x pe c t a t i v a s dessa

e q u i p e p e r a n t e esse pac i en t e . A s var iações dessa trajetória i rão i n f l u i r n o c o m p o r t a m e n t o

d a e q u i p e , h a v e n d o s empre a p o s s i b i l i d a d e d o s u r g i m e n t o de inúmeras contradições na

interação e q u i p e - p a c i e n t e . M a u k s c h 1 " ressa l ta q u e o p a c i e n t e deve sent i r -se d ependen t e

q u a l a m o r t e s u r j a c o m o p o s s i b i l i d a d e r e a l , t e rá d e a d q u i r i r as c o n d i ç õ e s necessár ias p a r a t a l a b o r d a g e m dc

m a n e i r a i n t u i t i v a , e m u i t a s v e z e s s e q u e r t e m c o n d i ç õ e s e m o c i o n a i s p a r a t a l . É f a t o q u e a m o r t e s e m p r e é u m a

v i v ê n c i a ún i ca , p e s s o a l e in t rans f e r í ve l , e q u e os s e n t i m e n t o s d i a n t e d e s u a o c o r r ê n c i a são i g u a l m e n t e p e c u l i a r e s

a c a d a i n d i v í d u o , m a s a ausênc ia t o t a l d e u m a d i scussão s i s t e m a t i z a d a s o b r e a m o r t e e s u a s i m p l i c a ç õ e s na

ex i s t ênc i a h u m a n a é , n o m í n i m o , u m t o t a l a c i n t e a essas f o r m a ç õ e s a c a d é m i c a s .

16 - M a u k s c h , O . H . O C o n t e x t o O r g a n i z a c i o n a l d o M o r r e r . In: Morte, Estágio Final da Evolução. Op. cit.

17 - Ibid. Op. cit.

18 - A n g e r a m i , V . A . ^ 4 Psicologia no Hospital. S ã o P a u l o : T r a ç o , 1 9 8 4 .

1 9 - 0 Contexto Organizacional do Morrer. Op. cit.

9 6

l 'a< i o n t o s I l u m i n a i s U m H i o v o I s l i o ç o

de seus médicos e enfermeiras, deve lentir que deve r i a ser g r a t o pelos c u i d a d o s que r e i ebe

dessas "pessoas m a r a v i l h o s a s , "

A interação e q u i p e - p a c i e n t e g i r a t ambém c m t o r n o de incessantes c o n f l i t o s en t r e a

lu la d o pac i en te a g o n i z a n t e c a e q u i p e d o hosp i t a l desejosa de d e s i g n a r cer tos papéis ao

pac i en te , que envolvem inc lus i ve sua c o m p l e t a despersonalização e i s o l amen to . ( ) pac iente

e m a r g i n a l i z a d o , passando a c a r r e g a r o e s t i g m a de m o r i b u n d o , a lguém d e s p r o v i d o dc

s en t i do e x i s t e n c i a l . D e i x a d c ser u m a pessoa e passa a ser u m l e i t o a m a i s no h o s p i t a l

Sua existência g a n h a signif icação n a doença e o t o d o ex i s t enc i a l passa a ser apenas c ião

somente a doença e suas impl icações. 2 1

E e v i d en t e que as reações d o pac i en t e a essa despersonalização e isolamento irão variai m u i t o , d e p e n d e n d o de c a d a história, ficando difícil p a r a o staff h o s p i t a l a r l i d a i i I l l

diferenças. E é consenso , i n c l u s i v e , n o m e i o h o s p i t a l a r , q u e o pac i en t e considerado m i e

q u a d o " é aque l e que ace i ta de m o d o inquestionável o t r a t a m e n t o e as n o r m a s impOltai

pe la e q u i p e h o s p i t a l a r . A q u e l e o u t r o pac i en t e , q u e se r ebe l a c o n t r a o tratamento e, muitai vezes, i n c l u s i v e , ace i ta até m e s m o a i d e i a de res ignar -se e a m o r t e de maneira plena, trai sobre si t o d a a i r a d a instituição h o s p i t a l a r .

O staff h o s p i t a l a r a c r e d i t a q u e , não o f e r e c e n d o a c u r a ao p a c i e n t e , não poderá lh(

oferecer, n a d a m a i s . T e m e q u e o p a c i e n t e o u a famíl ia v e n h a m a pensa r na hipóteit d .

fracasso. A instituição h o s p i t a l a r ex iste p a r a c u r a r , não a d m i t i n d o n a d a que transi endl esses princípios. A m e d i c i n a é d e f i n i d a c o m o a a r t e de m a n t e r acesa a chama d a \a

t o r n a n d o - s e inadmissível a c e i t a r o c o n t a t o c o m a l g o tão terrível e q u e p o n h a c m 1 1 o

esses princípios.

O í/a//lrospitalar, r eves t ido desses princípios, vê-se então n a r e sponsab i l i dade dc • u i d a i

d o pac i en t e e de sua doença de m a n e i r a infalível. O c u i d a r d o pac i en t e p r o v o c a m t e n s ã o

nesse p r o f i s s i o n a l n a m e d i d a e m que não t e n h a l i d a d o o u e l a b o r a d o seus sentimentos de onipotência, q u e n a m a i o r i a das vezes não são man i f e s t o s , e m b o r a se jam d e t e r m i n a n t e s

d a m a i o r i a dos p r o c e d i m e n t o s assumidos p o r esses p ro f i s s i ona i s .

Q u a n d o isso o c o r r e , esse p r o f i s s i o n a l t e n t a pro teger -se c o n t r a o r i s co d a fa lha profis­

s i o n a l - a m o r t e . A s s i m , não será d a d a a m e n o r importância p a r a a q u i l o que o pac iente

d e m o n s t r a : m e d o , fantasias e ans iedades e m relação ao seu t e m p o de v i d a . Esse p ro l i s s i on . i l

reagirá de f ens i vamen t e a esses s en t imen to s presentes n a relação: a ce r t eza la tente de não

2 0 - Ibid. Op. cit.

21 - O c o n c e i t o d e d e s p e r s o n a l i z a ç ã o é m a i s b e m a b o r d a d o n o c a p í t u l o 1, " O P s i c ó l o g o n o H o s p i t a l " .

Page 56: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

P s i c o l o g i a H o s p i t a l a r

p o d e r sa l var a v i d a d o pac i en te . ( ) c u i d a r d o pac i en te c o n s t a n t e m e n t e o u m e s m o a presi ti

ça deste será u m prenúncio d a impotência desse p r o f i s s i o n a l , o (|tic, s e g u r a m e n t e , poderá p r o v o c a r desejos nebu losos e p o u c o prec isos de que o pac i en t e m o r r a , l i n d a n d o assim .1

l o n g a a g o n i a desse r e l a c i o n a m e n t o . M a u k s c h 1 ' " a f i r m a que o pac i en t e h o s p i t a l i z a d o i a m

b é m p r o c u r a d e s c o b r i r qua i s são as r e compensas e as punições p a r a o c o m p o r t a m e n t o til I

h o s p i t a l . E n t r e t a n t o , é m a i s difícil p a r a o pac i en t e d e s c o b r i r isso p o r q u e as regras nà< > s . n .

c l a ras , v a r i a m as definições e não ex is te c o m u n i d a d e i n f o r m a l de pac ientes . Esse c l i m a d e

dependência an t e o pessoal d a instituição esgota n o pac i en t e o senso de i n d i v i d u a l i d a d e .

de v a l o r h u m a n o . E m t a l a m b i e n t e é possível ap resen ta r u m de meus órgãos p a r a conser ta

porém é m u i t o m a i s difícil e n c a r a r o f a to de que estou m o r r e n d o . 2 '

Po r o u t r o l a d o , q u a n d o o pac i en t e deseja m o r r e r , não s u p o r t a n d o m a i s fisicamente, e s s e

pro f i s s i ona l i n c o n f o r m a d o in t ens i f i ca o t r a t a m e n t o e i r r i t a - s e q u a n d o ele se recusa a a l g u m a

mudança terapêutica, po i s essa recusa s i gn i f i c a , de m a n e i r a m u i t o c l a r a , q u e o paciente está apenas e tão somente m a n i f e s t a n d o o desejo de rendição, o que e m última instância s i gn i f i c a desejar o "a l ív io de m o r r e r " . K u b l e r - R o s s 2 4 c o l o ca que esses pac ientes represem a 111

u m fracasso d a instituição n o seu p a p e l de apo i o à v i d a , e não há n a d a nesse s is tema que

sup ra a carência d o espírito h u m a n o q u a n d o o c o r p o necessita de c u i d a d o s . 2 : '

D e o u t r a f o r m a , assume o p a p e l de esc larecedor , i n f o r m a n d o o pac i en t e sobre o que

r e a l m e n t e está a c o n t e c e n d o , não n o s e n t i d o de d a r - l h e o d iagnóst ico d a doença, 2 1 ' m a s

esc la recendo dados sobre a internação h o s p i t a l a r , b e m c o m o o e s t i g m a que envo l v e esses

aspectos, e o q u e é m a i s i m p o r t a n t e , d e i x a de ve r n o p a c i e n t e u m a e n f e r m i d a d e que eslá

p o n d o e m r i s co sua eficácia p r o f i s s i o n a l .

M u i t a s vezes o pac i en t e e m s o f r i m e n t o d e sa l en t ado r está necess i tando de a p o i o exis­

t e n c i a l , p a l a v r a , c o n f o r t o , e n f i m , de sent ir -se u m a pessoa c o m signif icação e x i s t enc i a l pró-

2 2 - 0 Contexto Organizacional do Morrer. Op. cit.

IZ-Ibid. Op.cit.

2 4 - Morte, Estágio Final da Evolução. Op. cit.

2 5 -Ibid. Op.cit.

2 ( i - C r e m o s e r r a d a a a t i t u d e m é d i c a , c o m u m e n t e e m p r e g a d a , d e n e g a r a i n f o r m a ç ã o a o p a c i e n t e s o b r e s eu própr i i i

s i n t o m a e e l e g e n d o a f a m í l i a c o m o t e n d o c o n d i ç õ e s e m o c i o n a i s p a r a r e c e b e r essa i n f o r m a ç ã o . T a l p rá t i ca ,

c o m u m n o m e i o m é d i c o , r e f l e t e a f a l t a d e u m a a t i t u d e c r i t e r i o s a s o b r e as c o n d i ç õ e s e m o c i o n a i s d o p a c i e n t e . Sc

u m d a d o p a c i e n t e , p o r e x e m p l o , n ã o p o s s u i c o n d i ç õ e s e m o c i o n a i s p a r a r e c e b e r o i m p a c t o d e u m a i n f o r m a ç ã o

s o b r e o d i a g n ó s t i c o d e u m poss í ve l c â n c e r , n a d a p o d e n o s a s s e g u r a r q u e os f a m i l i a r e s p o s s u e m t a l c o n d i ç ã o .

E s s a a t i t u d e m é d i c a r e v e l a , e m ú l t i m a i n s t ânc i a , u m a p o s t u r a e m q u e o p r o f i s s i o n a l r e c u s a - s e a o e n f r e n t a -

m e n t o d a s c o n d i ç õ e s e m o c i o n a i s d o p a c i e n t e d i a n t e d o d i a g n ó s t i c o . T o r n a - s e , a s s i m , c ó m o d o d e i x a r p a r a os

f a m i l i a r e s e s t a r e s p o n s a b i l i d a d e e m q u e p e s e , n a m a i o r i a d a s v e z e s , a fusão d o s s e n t i m e n t o s e m o c i o n a i s s o b r e

es te d i a g n ó s t i c o . A Psicologia no Hospital. Op. cit.

9 8

P a i l e n t e s I e i m i n a i s U m l l i e v e I s l x i ç n

p i i a . E m alguns C a s o s e s s a necessidade s « i b r cpòc -sc i nc lus i ve à necessidade d a terapêutica

m e d i c a m e n t o s a .

E necessário q u e c a d a p r o f i s s i o n a l e n v o l v i d o n e s s a problemát ica t o m e c o n s c i ê i K i . i

d c s u a atuação c o m e s s e t i p o d e p a c i e n t e , po i s de n a d a adiantará u m a r e a l s ens i b i l i d ade

na c o m u n i d a d e d a v e r d a d e i r a c d e s o l a d o r a prob lemát ica d a doença d e g e n e r a t i v a , s i ­

n o a m b i e n t e h o s p i t a l a r esse p a c i e n t e c o n t i n u a r a so f re r t o d a a i n t e n s i d a d e d a rejeição

soc ia l de q u e se reveste a problemática. ' 2 7 A temát ica d a m o r t e p r e c i s a ser inclttíd;

r e f e r e n c i a l das questões e x i s t enc i a i s . O u a i n d a nas p a l a v r a s de K u b l e r - R o s s : ' " " m o r r e r é

p a r t e i n t e g r a l d a v i d a , tão n a t u r a l e previsível c o m o nascer . M a s e n q u a n t o o n a s c i m e n t o

é m o t i v o de c omemoração , a m o r t e t r a n s f o r m a - s e e m u m terrível e inexpr imíve l a s s u n t o

a ser e v i t a d o de t odas as m a n e i r a s n a soc i edade m o d e r n a . T a l v e z p o r q u e ela n o s r e l e m ­

b r a nossa v u l n e r a b i l i d a d e h u m a n a , apesar de t o d o s os avanços tecnológicos, Podemos

retardá-la, m a s não p o d e m o s e s capa r d e l a " .

Alguns Dados Relacionados com a Vivência do Paciente Terminal

O psicólogo h a b i t u a d o a t r a b a l h a r aspectos e esquemas c o r p o r a i s certamente d I o

l i m i a r d a verbal i zação, t e n d o c o m o c e rne de sua atuação o e xp r e s s i on i smo ges tua l , i a p a , -

de e x p r i m i r t o d a e q u a l q u e r espécie de s e n t i m e n t o s . Po r o u t r o l a d o , ao enfatizai R 1 0 I • <

comunicação não v e r b a l , es tamos abe r t o s e m u m a dimensão m u i t o m a i s intensa a o s mal» v a r i a d o s s en t imen to s , que , n a m a i o r i a das vezes, não são passíveis dc verbal ização. M u i t o s

s en t imen to s são inefáveis, e, p o r t a n t o , c o m u n i c a d o s apenas e tão somente pe lo expressio-

n i s m o c o r p o r a l .

N a re lação terapêutica c o m o p a c i e n t e t e r m i n a l , o c o n t a t o e a d imensão d o expres ­

s i o n i s m o c o r p o r a l e x i s t e m , i n c l u s i v e , não apenas c o m o opção de atuação, mas também

c o m o a l t e r n a t i v a ao d e f i n h a m e n t o co rpóreo p r o g r e s s i v o d o p a c i e n t e , que m u i t a s vezes, i n c lus i v e , o i m p e d e de man i f e s ta r - s e v e r b a l m e n t e . Dessa m a n e i r a , v a m o s e n c o n t r a r a l guns

p a c i e n t e s q u e , e m c e r t o s m o m e n t o s , e m consequênc ia d o d e f i n h a m e n t o c o rpó r eo c m

que se e n c o n t r a m , a lém d a d o r e d o t o r p o r p r o v o c a d o p e l o t r a t a m e n t o m e d i c a m e n t o s o

a que são s u b m e t i d o s , não c o n s e g u e m expressar-se de o u t r a f o r m a a não ser pe lo a l a g a i

2 7 - É i m p o r t a n t e r e s s a l t a r - s e q u e , a o se f a z e r re ferênc ia à c o m u n i d a d e c o m o a b r a n g ê n c i a d e t o d a u m a re f l exão s o l i i r

a r e a l i d a d e d o p a c i e n t e t e r m i n a l , e s t a m o s f a z e n d o re fe rênc ia à t o t a l i d a d e d o t e c i d o s o c i a l , aí i n c l u i n d o - I G desd i

a q u e l e s s e g m e n t o s m a i s d i s t a n t e s d a p r o b l e m á t i c a e m s i , até a q u e l e s q u e d i r e t a m e n t e l i d a m c o m a temáti i . i .

2 8 - Morte, Estágio Final da Evolução. Op. cit.

9 9

Page 57: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

P s i c o l o g i a H o s p i t a l a r

dc mãos, o u pe la comunicarão es tabe lec ida pe lo o lha i ' . ( ) o l h a r a n g u s t i a d o e sup l i can te

dc u m pac i en t e t e r m i n a l possu i a imensidão da d o r c d o desespero presentes n o e x i s i n

h u m a n o . M e s m o e m situações nas q u a i s o pac i en te consegue expressar-sc v e r b a l m e n t e , o

r e l a t o s empre v e m a c o m p a n h a d o dc u m f o r t e e x p r e s s i o n i s m o c o r p o r a l . C o m o ilustração,

t emos o caso de N .G .L . , casado , 36 anos , e m estado bas t an t e avançado de d e f i n h a m e n t o

corpóreo . N . G . L . , após re fer i r -se a situações de sua v i d a , r e l a t a : "... e ra preferível m o r r e i

a t e r que v i v e r de f o r m a tão d e g r a d a n t e , a b s u r d a . A s pessoas não m e o l h a m , m i n h a m u

l h e r repete a c a d a i n s t a n t e q u e eu es tou p o d r e e q u e p r e c i s a t r a t a r d a documentação do

inventário. A t é m e u s f i l ho s , q u e são a razão d o m e u v i v e r , a g o r a m e e v i t a m ; eu a c h o que ,

a lém de t u d o , a i n d a d e v e m s en t i r v e r g o n h a d o es tado d o p a i . . . é horr ível , s e r i a m e l h o r

m o r r e r e a c a b a r l o g o c o m isso t u d o . . . . e u não a g u e n t o m a i s (sic)". E m segu ida , c h o r a u n i

c h o r o c o m p u l s i v o , t o t a l m e n t e i n c o n t r o l a d o . A o m a n i f e s t a r - s e nesse c o m o v e n t e d e p o i ­

m e n t o , N . G . L . m o s t r a gestos de desespero , a p e r t a n d o as mãos de t a l f o r m a q u e pa rece

t e r a intenção de destruí-las. C o n c o m i t a n t e m e n t e , l e va as mãos até o ros to , p r o c u r a n d o

esconder-se, p a r e c e n d o e v i t a r t o d o e q u a l q u e r c o n t a t o , l e m b r a n d o através de seus gestos

a rejeição dos filhos e d a m u l h e r .

Por o u t r o l a d o , a v ivência c o m o p a c i e n t e t e r m i n a l po s su i s empre presente o espec t ro

d a m o r t e , a i n d a que ele não man i f e s t e v e r b a l m e n t e essa presença. O própr io d e f i n h a m e n t i i

corpóreo é u m indício m a r c a n t e e v e r d a d e i r o d a m o r t e e m i n e n t e m e n t e presente n a relação,

o que , p o r si só, estabelece u m a v ibração energética n o s en t ido físico d o t e r m o , e que t r a n s ­

cende o l i m i a r d a razão e, p o r t a n t o , d a não razão, e q u e caracter izará a própr ia relação.

E x i s t e m casos e m que a re lação in i c i a - se desde a internação d o pac i en t e n o h o s p i t a l ,

q u a n d o esse a i n d a não apresen ta s ina is visíveis de c o m p r o m e t i m e n t o orgânico. Nesses ca ­

sos, é possível p e r c ebe r t o d o o processo corpóreo , suas implicações e consequências. Ex i s t e

d u r a n t e esse processo a ce r t eza de que t o d a a relação q u e t e r m i n a l eva cons i go u m pedaço

m u i t o g r a n d e d a v i d a das pessoas e n v o l v i d a s nessa relação. A s s i m , e l e vando -se e m c o n t a

que a relação c e r t a m e n t e terminará c o m a m o r t e de u m a das pessoas e n v o l v i d a s ne l a , a

p r o x i m i d a d e d o m o r r e r é s en t i da de f o r m a m u i t o i n t e n s a , c o m o se fosse a l go q u e deixasse

u m leve a r o m a n o espaço e que fosse perceptível apenas n a vivência d o e n v o l v i m e n t o dessa

relação; a l go indescritível p e l a razão, a l go sent ido apenas n a vivência e n a emoção exa ladas

dessa relação. O e x a u r i r d a m o r t e t r a z à t o n a o processo , b e m c o m o t odas as fases pe las

q u a i s t a l p rocesso se d e s envo l v eu , m o s t r a n d o a i r r e v e r s i b i l i d a d e d o t e m p o e d o espaço

nas coisas que se d e i x a r a m p o r fazer, o u q u e f o r a m p r e t e r i d a s o u pos t e rgadas p a r a o u t r o

m o m e n t o . A s razões d o e x i s t i r e a própr ia razão so f r em constantes revisões, t r a n s c e n d e n d o

m u i t a s vezes até o l i m i a r d a existência.

1 0 0

P a i H•!111••. I c o n i n a i ' , U m l l i e v e I ' . I H . I , . .

O o l h a r , d e n t r e as f o r m a s de e x p r e i t i o n i s m o s dos s e n t i m e n t o s , é, s e g u r a m e n t e , a m a i s

a b r a n g e n t e e m t e r m o s de d i m e n s i o n a m e n t o a b s o l u t o , a i n d a q u e t e n h a e m s i a presença da

pró] i r i a subjetividãde In i m a na . I l m o l h a r dc d o r m o s t r a o sol r i m e n t o de u m a m a n e i r a que

as pa l a v r a s sequer p o d e m conceber . I I m o l h a r de desejo desnuda m u i t o além dc q u a l q u c i

o u t r a f o r m a de insinuação. U m o l h a r m e i g o t r a n s m i t e u m a doçura perceptível c inegável

U m o l h a r de ód io f u l m i n a m a i s q u e 0 p u n h a l m a i s c o r t a n t e .

A v ivência c o m o pac i en t e t e r m i n a l t r a z m u i t o presente o o l h a r , seja ta lvez p o r ser o

ma is p u r o dos express ion i smos , seja a i n d a p o r c o n s e g u i r t r a n s m i t i r os v e r d a d e i r o s sen t i ­

mentos daque l e m o m e n t o desesperador. E d i a n t e dessa manifestação d o o l h a r , <• c o m o se

ou t ras f o r m a s de express i on i smo perdessem o sent ido e até m e s m o sua condição na essêni ia

h u m a n a . E x e m p l o dessa citação é o caso de M . C . C . , 6 4 anos , c o m p r o m e t i d a p< n mctáslase

óssea, o que a d e i x a v a t o t a l m e n t e t r a n s t o r n a d a não apenas p e l a d o r c o m o pela condição dc

i m o b i l i s m o . D e p o i s de vários a t e n d i m e n t o s , e p o r causa de seu d e f i n h a m e n t o progress ivo ,

M . C . C , p r a t i c a m e n t e não se expressava v e r b a l m e n t e . A s s i m , o a t e n d i m e n t o e r a t o ta l t(

d i r e c i o n a d o p a r a o u t r a f o r m a de expressão. D u r a n t e esse período, tão l o go a c u m p r i m e n t a v a

e m seu l e i to , c o l o cava m i n h a m ã o d i r e i t a sobre a sua mão esquerda , gesto que fazia I

que M . C . C , respondesse i m e d i a t a m e n t e c o l o c a n d o sua mão d i r e i t a sobre a m i n h a . I . assim

ficávamos a l g u m t empo : suas mãos segurando m i n h a mão d i r e i t a e o o l h a r t rans i m i nu lo t odo

o desespero de q u e m t en tava de todas as m a n e i r a s c o n t i n u a r v i v e n d o ou a i n d a l i b e r t a i I I

d a q u e l a situação de s o f r i m e n t o . E m nosso últ imo e n c o n t r o estava n o v a m e n t e c o m ha

mão d i r e i t a en t re suas mãos q u a n d o pe r ceb i u m b r i l h o e m seu o l h a r até então ( lesemihei Ido

O l h e i fixamente p a r a esse o l h a r t e n t a n d o d e c i f r a r o s i gn i f i c ado daque l e e s t r a n h o b i i l l u i I

ass im passaram-se a l g u n s segundos , i n s t an t e e t e rno d ' a l m a . E m segu ida co l oque i a m i n h a

mão esquerda j u n t o daque las mãos. E então cons ta t e i : M . C . C , h a v i a m o r r i d o naque la frl

ção de segundos . A m i n h a mão esquerda c o n s t a t o u que a v ibração energética das o u i i . e .

mãos se m i s t u r a v a c o m o a r d o r d a m o r t e . A q u e l e b r i l h o e s t r a n h o e m seu o l h a r era o b r i l h o

d a m o r t e . M . C . C , m o r r e u s e g u r a n d o m i n h a m ã o t e n t a n d o aga r ra r - s e à v i d a . M o s t r o u no

b r i l h o d o o l h a r as luzes d o m o r r e r . T e n t o u e m vão s u p l i c a r p o r m a i s a l g u n s instantes di­

v i d a . M o r r e u e seu o l h a r t r a n s m i t i u t o d a a imensidão d o m o m e n t o .

A re lação c o m o pac i en t e t e r m i n a l t e m de ser e n t e n d i d a e a b o r d a d a de f o r m a própria,

a lém das implicações ine ren tes ao fa to de o a t e n d i m e n t o ser r e a l i z a d o ao l a d o do l e i to , na

" c a m a mor tuár ia " d o pac i en t e , o u seja, n o l u g a r o n d e o pac i en t e se vê d e f i n h a n d o , onde

sofre a i n t e n s i d a d e d a d o r c a u s a d a p e l a doença. T e m o s a i n d a o u t r a s variáveis que i n c i d e m

sobre o p a c i e n t e , c o m o o c u i d a d o m e d i c a m e n t o s o , a d o r p r o g r e s s i v a q u e a n i q u i l a i o d a

e q u a l q u e r resistência orgânica, b e m c o m o as impl icações e m o c i o n a i s d o d e f i n h a m e n t o

1 0 1

Page 58: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

Psicologia Hospitalar

corpóreo . E a re lação deve a i n d a ser e n t e n d i d a c o m o específica a r e a l i d a d e na <|iial se

e n c o n t r a i n s e r i d a , não p o d e n d o ser t r a n s p o r t a d a p a r a o u t r o s parâmetros que não aqu i I.

q u e d e t e r m i n a m essa f o r m a de atuação.

A v ivência c o m o pac i en t e t e r m i n a l ex ige d o t e r a p e u t a q u e este t e n h a m u i t o c l a n i e d l

f o r m a a s s u m i d a d e t e r m i n a d o s q u e s t i o n a m e n t o s e va l o r es e m relação à m o r t e e ao ato dl

m o r r e r , o q u e não s i g n i f i c a d i z e r q u e esse p r o f i s s i o n a l t e n h a de ser t o t a l m e n t e insensívi I

à m o r t e . Esse t i p o de exigência, g u a r d a d a s as d e v i d a s proporções, se r ia c o m o i m p o r q u e

u m g i n e c o l o g i s t a não m a i s t e n h a s ens ib i l i dade d i a n t e d a genitália f e m i n i n a , o u então q u e

a existência h u m a n a e m c o n t a t o d i r e t o c o m a m o r t e não c h o r e u m c h o r o p r o f u n d o c do

l o r o s o q u a n d o coisas se v ão e d e i x a m de e x i s t i r n a f o r m a e n a essência h u m a n a s . O exis i n

h u m a n o é único e finito, e c o m o t a l deve ser v i v e n c i a d o e sen t ido . A d imensão d o infinito e

d o i r r e a l t o rna - se m u i t a s vezes inatingível d i a n t e dos aspectos a b s u r d a m e n t e rea is t raz idos

p e l o s o f r i m e n t o d o d e f i n h a m e n t o corpóreo .

Por o u t r o l a d o , naque les casos e m que o pac i en t e m a n i f e s t a o desejo de m o r r e r , i r e m i 11

e n c o n t r a r nuances tão específicas nas qua i s o e x p r e s s i o n i s m o se m i s t u r a às contradições

ine ren tes a o processo e m s i .

É m u i t o dif íci l , e m t e r m o s gera is , a aceitação d a i d e i a de q u e m u i t a s vezes se necessita

m o r r e r , d a m e s m a f o r m a que e m o u t r o s m o m e n t o s necess i tamos d o r m i r , r epousar . Nesse

caso, o p r o f i s s i o n a l se a f l i ge c o m a i d e i a de não p o d e r c o m p e t i r c o m a c o r r i d a invencível

d o t e m p o , t e n d o c o m o fracasso tangível a i m p o s s i b i l i d a d e de c u r a d o p a c i e n t e , po i s , de

f o r m a g e r a l , possu i o s e n t i m e n t o de não estar e f e t i v a n d o os princípios d a m e d i c i n a que

e n v o l v e m a preservação d a v i d a . C o m o ilustração, c i t o o caso de F .A.L . , 16 anos , e também

a c o m e t i d o de metástase óssea. O s nossos e n c o n t r o s i n i c i a i s se d e r a m q u a n d o E A . L . a i n d a

estava h o s p i t a l i z a d o e m São P a u l o . E após várias t e n t a t i v a s de t r a t a m e n t o - i n c l u i n d i i

desde c i r u r g i a s p r e v i a m e n t e m a r c a d a s e p o s t e r i o r m e n t e d e s m a r c a d a s d e v i d o a espec i ­

ficidade d o caso até t r a t a m e n t o m e d i c a m e n t o s o e radioterápico - e r a possível pe r cebe i

q u e E A . L . não t i n h a m a i s disposição p a r a c o n t i n u a r r e s i s t i ndo às intempéries d a doença.

E l e n eg l i g enc i a va t odas as a l t e r n a t i v a s de t r a t a m e n t o que d e p e n d i a m de sua colaboração.

M o s t r a v a - s e e x a u r i d o de t a n t o s o f r i m e n t o , fosse p e l a doença e m si , fosse a i n d a p e l a d o r

q u e o c o n s u m i a . E apesar de t odos os esforços d a e q u i p e de saúde e m demovê - l o dessa

a t i t u d e , os r esu l tados e r a m p r a t i c a m e n t e nu los .

O seu d e f i n h a m e n t o e ra percept ível e a u m e n t a v a c o m a m e s m a i n t e n s i d a d e que a d o r

que o d o m i n a v a . Sua m a i o r re iv indicação passou a ser v o l t a r p a r a M a r i a n a , sua c i dade ,

e a l i p e r m a n e c e r c o m sua família. Q u e r i a descanso, trégua de t o d o aque le a p a r a t o t e c n o ­

lóg ico que apenas t r a z i a d e s c o n f o r t o e q u e e f e t i v amen t e não a l i v i a v a a d o r e o s o f r i m e n t o

1 0 2

T a . i m i t e s I l u m i n a i s : U m Umv i i I s l . o . , . .

que experienciava. A e q u i p e de s.i i ide como u m l o d o mostrava-se i n d i g n a d a diante d o

d e p o i m e n t o de F .A .L . , p i a t i i a m e i i l e i ons i i I c r a i li > e m uníssono c o m o a b s u r d o . A q u e l e

depoimento representava o total • lesprezo pelos avanços da m e d i c i n a e u m a t o t a l entrega

ao descanso da m o r t e . A s u a l e m a idade d e i x a v a a l odos m u i t o m a i s pe rp l exos , c o m o se a

aceitação d a m o r t e lõsse p e r t i n e n t e a o s m a i s ve lhos . M u i t a s reuniões c discussão de caso

en t r e a e q u i p e apenas d e m o n s t r a v a m c o m u m a c l a r e za cada vez m a i s nítida que E A . L ,

r e i usava-se a c o n t i n u a r c e r cado de t o d o aquele a p a r a t o sem ter, no e n t a n t o , a p r o x i m i d a d e

d a famíl ia. E A . L . recusava-se a c o n t i n u a r aque l e coro lár io de s o f r i m e n t o s e m o s t r a v a - s e

i n d i g n a d o d i a n t e d a recusa d a e q u i p e de saúde e m a c e i t a r o seu desejo. ( ) s n o s s o s COntatOl

c s t r e i t a r a m - s e e s e r v i a m c a d a vez c o m m a i s i n t e n s i d a d e p a r a que ele mostrasse quanto

dese java o b t e r o d i r e i t o d e m o r r e r a o l a d o d e seus f a m i l i a r e s , "naquele pedacinho de

c a n t o d o i n t e r i o r dc M i n a s G e r a i s (sic)". E r a difícil p a r a ele ace i t a r qualquer contraponto

que não fosse a sua transferência p a r a p e r t o d a famíl ia. A r g u m e n t a v a , inc lus i v e , sobre as

d i f i c u l d a d e s d a mãe e m visitá-lo, t a n t o p e l a distância e m si c o m o pelo custo finam eira

de ta i s v i a g ens . E A . L . t o c a v a v i o lão antes d a hospital ização e esse d e t a l h e l<v pi<

o nosso r e l a c i o n a m e n t o se estreitasse a i n d a m a i s , e m v i r t u d e também da m i n h a intensa

l igação c o m a música. Vár ios de nossos e n c o n t r o s f o r a m p e r m e a d o s apenas e t . io somenti

p e l a música. E l e a c o n t a r q u a n t o q u e r i a t e r e s t u d a d o música de m a n e i r a mais profunda i

e u a c o n t a r dos t e m p o s e m que m i n h a a t i v i d a d e p r i n c i p a l e ra de musicista envolvid

conce r t o s e r ec i t a i s . Es tabe l ecemos u m vínculo m u i t o f o r t e , n o q u a l , além da compreensão

de seu desejo de m o r r e r , t ínhamos t ambém a música c o m o p o n t o de união e âfinidadi

A e q u i p e de saúde, d e p o i s de m u i t a s discussões, finalmente r e so l v eu liberai I A I

p a r a que ele voltasse p a r a j u n t o de seus f a m i l i a r e s e m M a r i a n a , f o r a m t o m a d a s i o d a . a .

providências - desde ambulâncias p a r a l o comoção até d e t a l h a m e n t o dos cuidados p a i a

q u e a prescrição m e d i c a m e n t o s a fosse s e g u i d a - p a r a q u e E A . L . pudesse então v o h . u p . u a

o seu c a n t o c e r c a d o dos c u i d a d o s mín imos necessários p a r a sua n o v a fase de v i d a . Após

essa decisão, e ra i m p r e s s i o n a n t e o s e n t i m e n t o de fracasso e s t a m p a d o na face de l o d o s o s

m e m b r o s d a equ ipe de saúde. E m cada n a r r a t i v a , e m c a d a gesto, e m cada explicação, < i i l i i n .

e m q u a l q u e r d e t a l h a d a m e n t o e m que o caso e r a expos to , o p r i m e i r o q u e se evidenciava

e ra a sensação de fracasso p e l a de l iberação de E A . L .

N o últ imo e n c o n t r o que t i v e m o s e m São P a u l o , E A . L . c h o r o u m u i t o ao r e l a t a r a a l e g r i a

de p o d e r v o l t a r p a r a o seu c a n t o . Nessa ocasião, eu disse a ele q u e e m a l g u m a s semanas

es ta r i a e m O u r o P r e t o , c i d a d e próx ima à de le , p a r a r e a l i z a r u m t r a b a l h o c o m u m g r u p o

de colegas de B e l o H o r i z o n t e . Disse a i n d a q u e n a t e r c e i r a no i t e d e m i n h a estada naque la

c i d a d e r e a l i z a r i a u m r e c i t a l de música p a r a o g r u p o , a lém de a l g u n s c o n v i d a d o s . E A . L .

1 0 3

Page 59: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

Psicologia Hospitalar

entus iasmou-se de i m e d i a t o e p e r g u n t o u se e l e também p o d e r i a assistir a e s s e r e c i t a l . I ) i .m ie

d a m i n h a anuência ele f i c ou m u i t o fe l iz c e x u l t a n t e , c l i a m a n d o - m c a atenção o c u i d a d o

q u e teve p a r a s i tuar -se e s p a c i a l m e n t e e m relação ao l u g a r o n d e faríamos o n o s s o r e t i r o

p ro f i s s i ona l . E e m b o r a fosse u m l u g a r dc difícil acesso, s i t u a d o nas cercan ias de O u r o Pre to

f o i - l he fácil o e n t e n d i m e n t o t a n t o p e l o interesse d e m o n s t r a d o c o m o p e l o c o n h e c i m e n t o

q u e t i n h a d a reg ião.

D e s p e d i m o - n o s e a sensação p r i m e i r a que m e i n v a d i u e r a q u e aque le e n c o n t r o t a l v e i

fosse a última vez q u e nos v íamos. A d o r d a de sped ida e s t r a n g u l a v a n o p e i t o , esquecem I . .

t odas as circunstâncias q u e d e t e r m i n a v a m o seu a f a s t a m e n t o .

N a sequência f u i p a r a O u r o P r e t o , c o m o estava p r e v i s t o . E n a n o i t e d o r e c i t a l , noi te

f r i a , c o m o l u a r e n v o l v e n d o a c i dade de f o r m a m a g i s t r a l , e n q u a n t o conve r sava c o m a l g u m

a m i g o s nos m i n u t o s que p r e c e d i a m o início d a música, f u i av i sado de q u e h a v i a u m grupe >

de pessoas q u e r e n d o m e d i r i g i r a p a l a v r a . Q u a n d o f u i ao e n c o n t r o desse g r u p o d epa r e i c o m

E A . L . e seus f a m i l i a r e s . U m a cena e m o c i o n a n t e : os f a m i l i a r e s p r o v i d e n c i a r a m u m a cade i ra

de r odas p a r a transportá-lo, po is e m que pese a distância das duas c idades ser p e q u e n a , o

seu estado de saúde i n s p i r a v a bas tante c u i d a d o . M a s lá estava ele e n v o l v i d o e m u m cobe r t o r

de lã x a d r e z , c o m o q u e a m o s t r a r q u e , apesar de todas as d i f i c u l d a d e s , lá estava ele ansios. >

p a r a m e ve r e m e o u v i r . N ã o h o u v e c o m o c o n t e r as lágr imas, e ra m u i t o p r a z e r o s o vê - l o

n o v a m e n t e . E m segu ida ele se a c o m o d o u n a sala onde se r e a l i z o u o r e c i t a l e a l i p e r m a n e c e u

até o fim, o r a a p l a u d i n d o , o r a s o r r i n d o , o r a c o m p e n e t r a n d o - s e n a p r o f u n d a introspecção

d a música. T e r m i n a d a a audição, E A . L . a g r a d e c e u de m o d o c o m o v e n t e p e l a " a l e g r i a e

p a z (sic)", e p e d i u - m e que fosse visitá-lo e m sua casa antes de r e t o r n a r a São Pau l o . E assim

o c o r r e u . N a t a r d e d o d i a segu in te estávamos n o v a m e n t e j u n t o s , a g o r a e m sua casa. E ele

p e d i u então q u e e u tocasse u m a peça de que h a v i a g o s t ado m u i t o . Incontáveis vezes r epe t i

a q u e l a peça. E m d a d o m o m e n t o ele f a l o u que aque l a música e ra m a r a v i l h o s a , r epousan t e ,

i d ea l c o m o a c a l a n t o p a r a " d o r m i r e até m e s m o m o r r e r e m p a z (sic)". E r a d i l a c e r a n t e o u v i r

aque le d e p o i m e n t o de busca de al ívio n a m o r t e , sensação que se t o r n a v a a i n d a m a i s cáustica

d i a n t e d a constatação de que o depoen te , e m b o r a adolescente n a i d a d e , a i n d a m a n t i n h a no

coração a p u r e z a e a inocência de u m a criança. E r a m a i s u m a vez a presença d a d i f i c u l d a d e

de aceitação do "a l ív io d a m o r t e " , e ra a constatação de que aceitá-lo n o desejo de m o r r e r e ra

a l go inconcebível, m e s m o p a r a pessoas que t e o r i c a m e n t e até a c e i t a v a m t a l p o s i c i o n a m e n t o .

M a s ele e ra bas tan te d e t e r m i n a d o e ressa l tava após c a d a execução que a q u e l a música e ra

a c a l a n t o p a r a se m o r r e r e m pa z . N o início d a n o i t e v o l t e i a O u r o P r e t o , d epo i s de u m a

c o m o v e n t e d e sped ida . E após o j a n t a r fiquei i s o l ado d o g r u p o de colegas que se d i v e r t i a

m u i t o , a festejar a última no i t e e m que estávamos r e u n i d o s naque l e espaço. Suas a l ga za r ras

e a l egr ias d e m o n s t r a v a m que naque l e m o m e n t o n a d a m a i s q u e r i a m d a v i d a a não ser u m a

1 0 4

I ' i i t n s I l u m i n a i s : l l m l l n i v u I s l i o ç o

felicidade i.u,ual . i sua v i d a . P u , n o e n l , m i o , eslava i so lado , sentado na v a r a n d a . E naque la

no i te I r i a o l h a v a p a r a 0 céu es t re lad i i c o m o l u a r e s t a m p a n d o a de l i cadeza da N a t u r e z a e m

esplendor . Naque l a no i l e m i o consegu i d o r m i r c o m t r a n q u i l i d a d e . I Ima turbulência i n t e r i o r

m u i t o g l a n d e p r e j u d i c o u - m c o sono. A i m a g e m de E A . L . e ra presença cons tan t e no m e u

imaginár io . N o i n i c i o da manhã, c o m os p r i m e i r o s ra ios de So l c o l o r i n d o a m a d r u g a d a ,

fu i a Pe lo H o r i z o n t e , o n d e a p a n h a r i a o av ião q u e m e t r a r i a a São Pau lo . N o a e r o p o r t o ,

u m a força i m p e r i o s a m e fez l i g a r p a r a o b t e r notícias de E A . L . E o f a m i l i a r que me a t endeu

ao te le fone, aos p r a n t o s , n a r r o u q u e n a q u e l a no i t e ele d o r m i u c o m o faz ia h a b i t u a l m e n t e ,

mas h a v i a a m a n h e c i d o m o r t o . H a v i a m o r r i d o e m paz , ta l vez a i n d a sob o som daque l a s u a

m e l o d i a . C u s t o a c r e r q u e esse caso seja r e a l . T e n h o a sensação de q u e se t r a t a dc u m a

criação d a m i n h a a l m a e m u m m o m e n t o de psicot ização c o m a p r o p r i a r ea l i dade . A n u m

m e parece , m u i t a s vezes, impossível t e r v i v i d o esse e n r e d o de fatos e a con t e c imen tos . ( > que

m e t r a z a i n d a u m p o u c o p a r a a r e a l i d a d e é p o d e r e x e c u t a r essa peça m u s i c a l e m e l e m b r a i

de E A . L . , d e f i n i n d o - a c o m o a c a l a n t o p a r a se m o r r e r e m pa z .

O s e n t i m e n t o de a b a n d o n o q u e e x p e r i m e n t a m o s q u a n d o m o r r e u m pac i en te que a t e u

demos é deso lador . E s o m a d o ao fa to de e s t a rmos a l q u e b r a d o s c o m a d o r da pe rda em l i ,

t emos a i n d a u m a famíl ia q u e a g u a r d a ans iosa p o r a l g u m a f o r m a dc c o n f o r t o e a m p a r o I

a sensação que m u i t a s vezes m e i n v a d e é a de que o pac i en t e , após a m o r t e , é q u e m p a i l l

a c u i d a r de nós, c o m as coisas d e i x a d a s e ens inadas d u r a n t e o per íodo de c o n v i v e m la

O c o n t a t o c o m o pac i en t e t e r m i n a l q u e s t i o n a , de m a n e i r a p r o f u n d a e c r u c i a l , m u i t o .

va lo res d a essência h u m a n a . T u d o passa a ser q u e s t i o n a d o p o r o u t r a ótica, e m u i t a s I o i i a i

t i das c o m o v e r d a d e i r a s e abso lutas p a s s a m a ser c ons ide radas sem a m e n o r i m p o r t a m ia;

e o u t r o s fenómenos, t i d o s c o m o m u i t o p o u c o s i g n i f i c a t i v o s , t o r n a m - s e v e r d a d e i r a m e n t e

s i gn i f i c a t i v o s , o c u p a n d o de f o r m a g l o b a l i z a n t e o s en t i do e x i s t enc i a l , de t a l f o r m a que l í

t r a n s f o r m a m n a essência e n o s en t ido d a própr ia v i d a . O m a i s s i g n i f i c a t i v o nessa v i v e m ia

é a constatação de que o pac i en t e t e r m i n a l nos e n s i n a u m a n o v a f o r m a de v i d a , u m a nova

m a n e i r a de e n c a r a r as v i c i ss i tudes que p e r m e i a m a existência, u m a f o r m a de vivência ma is

autêntica, n a q u a l os va l o res d e c i d i d a m e n t e se jam prese rvados e m d e t r i m e n t o dc aspectos

m e r a m e n t e aparen tes , q u e , n a m a i o r i a das vezes, p e r m e i a m as relações in terpessoa is .

A v i d a g a n h a n o v o s i g n i f i c a d o ao se p e r c e b e r a a m p l i t u d e d a importânc ia de cada

s e g u n d o , de c a d a e n c o n t r o , d o So l r o m p e n d o a n e b l i n a e m u m a manhã d c o u t o n o , da

f l o r a d a d o ipê-roxo e d a suinã n o i n v e r n o , d a emoção d o a m o r c o n t i d a e m u m be i jo c c m

u m a f aga r de mãos.

É c o m o se tivéssemos de c o n v i v e r e s t r e i t amen t e c o m a m o r t e p a r a r e s s i gn i l i c a r a pró­

p r i a v i d a , p a r a r e s s i g n i f i c a r c a d a d e t a l h e d a existência. A m o r t e t o r n a - s e u m processo

1 0 5

Page 60: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

P s i c o l o g i a I l o s p i t . i l . i r

v i ta l , determinante dc um encontro com a plenitude, com a transcendência do amoi e do

transbordar da paixão de simplesmente viver. Simplesmente sorrir diante do encantamento;

sorrir diante do belo. De simplesmente chorar quando a emoção assim o determinar; rhoi .11

diante da dor ou ainda diante de situações de alegria. De simplesmente saber que a vida l

uma emoção contínua e que transborda prazer de forma intermitente.

E necessário u m novo sentimento de ardor para se sorver o deleite de paz propiciado

por essa nova maneira de apreensão da realidade. Por essa nova maneira de vivência na qual o sorriso de uma criança será mais importante que o amealhar de fortunas; uma ni liti de tranqui l idade estreitando-se nos braços u m corpo querido e amado terá significado m

calculável e imensurável; a doçura de uma noite de verão seja a concretude da existência

E o br i lho de u m doce e meigo olhar seja a razão de toda a eternidade.

Refe rênc ias B i b l i o g r á f i c a s

ANGERAMI, V.A. Existencialismo & Psicoterapia. São Paulo: Traço, 1984.

• (org.) Psicologia Hospitalar. A Atuação do Psicólogo no Contexto Hospitalar. São Paulo

Traço, 1984.

. A Psicologia no Hospital. São Paulo: Traço, 1988.

KUBLER-ROSS, E. Morte, Estágio Final da Evolução. Rio de Janeiro: Record, 1975.

RIBEIRO, H.P. O Hospital: História e Crise. São Paulo: Cortez, 1993. TORRES, C.W.; GUEDES, G.W.; TORRES, CR. A Psicologia e a Morte. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1983.

1 0 6

b \E • * Learning

Outras Obras Sobre o Tema

Valdemar A u g u s t o A n g e r a m i - G a m o n ( O r g . )

K a P s i c o l o g i a E n t r o u n o H o s p i t a l . . .

Es t e l i v r o m o s t r a o t r a b a l h o d o p s i c ó l o g o n o h o s p i t a l , b u s c a n d o a h u m a n i z a ç ã o d o p a c i e n t e .• .1

0 impreensão d o s a s p e c t o s e m o c i o n a i s , p r e s e n t e s n o p r o c e s s o d e a d o e c e r . E u m a das m a i s b r i l h a n t e

desc r i ções d e c o m o a P s i c o l o g i a se i n s e r i u n o c o n t e x t o h o s p i t a l a r . E s t a o b r a está n a v a n g u a r d a d. is

t emá t i c a s c o n t e m p o r â n e a s , a p r e s e n t a n d o u m a d a s m a i s no táve i s performances d a P s i c o l o g i a .

Valdemar A u g u s t o A n g e r a m i - C a m o n ( O r g . ) ,

1 l e l o i s a B e n e v i d e s d e C a r v a l h o C h i a t t o n e & E d e l a A p a r e c i d a N i c o l e t t i

O D o e n t e , a P s i c o l o g i a e o H o s p i t a l

9* e d i ç ã o a t u a l i z a d a

T r a t a - s e d e o b r a i n d i s p e n s á v e l a t o d o s q u e d i r e t a o u i n d i r e t a m e n t e t r a b a l h a m n a á r e a d a saúde .

N e l a , os a u t o r e s e s c r e v e m s o b r e o t r a b a l h o q u e d e s e n v o l v e m e m h o s p i t a i s d a c i d a d e d e S ã o P a u l o ,

l e v a n d o , desse m o d o , a u m a r e f l e x ã o p o r m e n o r i z a d a s o b r e a o c o r r ê n c i a d e a l g u m a s p a t o l o g i a s

e suas i m p l i c a ç õ e s e m o c i o n a i s .

A s temát icas a p r e s e n t a d a s - A I D S , câncer , v i o l ênc ia c o n t r a a m u l h e r e a c r iança , a l c o o l i s m o e urgên­

c i a e m p r o n t o - s o c o r r o - são a c r e s c i d a s d e u m a r e t o m a d a d a s c o n s e q u ê n c i a s e s e q u e l a s e m o c i o n a i s

q u e d e r i v a m n ã o a p e n a s d e s u a o c o r r ê n c i a c o m o t a m b é m d e s u a p e r s p e c t i v a d e t r a t a m e n t o .

V a l d e m a r A u g u s t o A n g e r a m i C a m o n ( O r g . )

N o v o s R u m o s n a P s i c o l o g i a d a S a ú d e

A p s i c o l o g i a d a saúde é o n o v o c a m i n h o d e t o d o s os q u e b u s c a m i n s t r u m e n t a l i z a r s u a p r á t i c a

p r o f i s s i o n a l n a á r e a d e S a ú d e M e n t a l . E s t e l i v r o t r a z n o v o s r u m o s n o c a m p o d a P s i c o l o g i a d a

S a ú d e , a p r e s e n t a n d o o q u e e x i s t e d e v a n g u a r d a n a á r e a . P r o f i s s i o n a i s d e t o d a s as á r eas d a saúde

t e r ã o n e s t a o b r a u m i n s t r u m e n t o s e g u r o d e c o n s u l t a p a r a n o r t e a r s u a p r á t i c a nesse c a m p o . O b r a

ind i spensáve l a t o d o s q u e , d e a l g u m a m a n e i r a , se i n t e r e s s a m p e l o s a v a n ç o s e c o n q u i s t a s e f e t i v a d o s

p e l a n o v a f o r ça d a saúde m e n t a l : a P s i c o l o g i a d a S a ú d e .

Page 61: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

V a l d e m a r A u g u s t o A n g e r a m i C a m o n ( O r g . )

P s i c o s s o m á t i c a e a P s i c o l o g i a d a D o r

D i r i g i d a a e s t u d a n t e s , p r o f e s s o r e s e p r o f i s s i o n a i s d o s e t o r d e s a ú d e , a o b r a r e ú n e se te t e x t o s ,

d e v á r i o s a u t o r e s , q u e e n f o c a m os d i v e r s o s a s p e c t o s d o p r o c e s s o d c s o m a t i z a ç ã o . O o b j e t i v o é

a u x i l i a r o l e i t o r a c o m p r e e n d e r os p r o b l e m a s q u e p o d e m se r a p r e s e n t a d o s p e l o s p a c i e n t e s q u e

s o f r e m d e d o r c r ó n i c a e s u a s s e q u e l a s e m o c i o n a i s . O s a r t i g o s são d e J o s é C a r l o s R i e c h e l m a n n ,

E l i z a b e t h R a n i e r M a r t i n s d o V a l l e , M a r i l d a O l i v e i r a C o e l h o , E r i k a N a z a r é S a s d e l l i , E u n i c e

M o r e i r a F e r n a n d e s M i r a n d a , G i l d o A n g e l o t t i , R o s e l i L o p e s d a R o c h a , c o m o r g a n i z a ç ã o d o

p r o f e s s o r C a m o n .

V a l d e m a r A u g u s t o A n g e r a m i - C a m o n ( O r g . )

P s i c o l o g i a d a S a ú d e

U m N o v o S i g n i f i c a d o p a r a a P r á t i c a C l í n i c a

D i r i g i d o a e s t u d a n t e s d o s c u r s o s d e g r a d u a ç ã o e p ó s - g r a d u a ç ã o e m p s i c o l o g i a c l í n i c a e a o s

p r o f i s s i o n a i s d a á r e a , o l i v r o r e ú n e se is t e x t o s q u e b u s c a m s i s t e m a t i z a r u m a n o v a f o r m a d e

c o m p r e e n s ã o d a p r á t i c a c l í n i c a n a á r e a d a saúde .

O s a u t o r e s são p r o f i s s i o n a i s d o s e t o r d e P s i c o l o g i a d a S a ú d e q u e t e n t a m c r i a r u m a c o n f i g u r a ç ã o

t e ó r i c a e m r e l a ç ã o à m a n e i r a d e a b o r d a r a d o e n ç a e o d o e n t e h o j e .

V a l d e m a r A u g u s t o A n g e r a m i - C a m o n ( O r g . )

A É t i c a n a S a ú d e

T r a t a r d o t e m a É t i c a é s e m p r e u m a m i s s ã o t ã o i m p o r t a n t e q u a n t o p o l é m i c a . I m p o r t a n t e p o r

se r c o m p o n e n t e f u n d a m e n t a l d e u m a s o c i e d a d e o r g a n i z a d a q u e t e n c i o n a b u s c a r e a p r i m o r a r o

c o m p o r t a m e n t o h u m a n o , a p e r f e i ç o a n d o o r e l a c i o n a m e n t o e n t r e as p e s soas e c r i a n d o p a r â m e t r o s

d e c o n d u t a . P o l é m i c a p o r e s t a r a n c o r a d a n o j u í z o p e s s o a l , e m c ó d i g o s d e c o n d u t a p r ó p r i o s o u

m e s m o e m c ó d i g o s i m p r e s s o s , o s q u a i s m u i t a s v e z e s d e p e n d e m d e i n t e r p r e t a ç õ e s p e s s o a i s . O

l i v r o está d i v i d i d o e m n o v e cap í tu l o s , c o m d i v e r s a s a b o r d a g e n s s o b r e o t e m a .

A Ê T J I \ | s , \ I >l

Biblioteca Silva I reire - ( J M V A G

I 1 0 H H ' ,

Page 62: Psicologia Hospitalar - Teoria e Pratica

PSICOLOGIA HOSPITALAR Teoria e Prática

Torna-se cada voz mais e v i d en t e o fato de que m u i t a s pa to log ias têm seu q u a d r o cl ínico agravado po r complicações e m o c i o n a i s d o pac iente . Daí a importância da psicologia hosp i ta la r , que t e m c o m o ob j e t i v o p r i n c i p a l minimizar o s o f r i m e n t o causado pela hospitalização.

Esta segunda edição revista e ampliada de Psicologia Hospitalar traz relatos de prof iss ionais exper ientes nos temas diversos da psico log ia hosp i ta lar e i n c l u i u m n o v o capítulo, sobre a trajetória de M a t h i l d e Neder, p i one i ra na área no Brasil.

Apl icações

Leitura recomendada para as d isc ip l inas ps ico log ia hospitalar e psicologia da saúde nos cursos de graduação e pós-graduação em Psicologia.

Biblioteca Silva Freire - U N I V A G

\ C E N G A G I l % Leàrnmg.

P a r a s u a s s o l u ç õ e s d e c u r s o e a p r e n d i z a d o ,

v i s i t e www.cengage.com.br

, „ , - 8 5 - 2 2 1 - 0 7 9 4 - 0 ™

ISBN 10 8 5 - 2 2 1 - 0 7 9 4 - 7

9 7 8 8 5 2 2 » 1 0 7 9 4 0