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UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL MESTRADO EM POLÍTICAS SOCIAIS NÚCLEO DE ESTUDOS E PESQUISAS SOBRE POLÍTICAS E PRÁTICAS SOCIAIS COM FAMÍLIAS NEPPSF Projeto de Pesquisa POLÍTICAS E PRÁTICAS SOCIAIS COM FAMÍLIAS: desafios para a efetivação de direitos Pesquisa I: FAMÍLIAS E PRÁTICAS SOCIAIS: interlocução com produções literárias sobre a Política de Assistência Social RELATÓRIO DE PESQUISA SÃO PAULO SP Março de 2014

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UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL MESTRADO EM POLÍTICAS SOCIAIS

NÚCLEO DE ESTUDOS E PESQUISAS SOBRE POLÍTICAS E PRÁTICAS SOCIAIS COM FAMÍLIAS – NEPPSF

Projeto de Pesquisa POLÍTICAS E PRÁTICAS SOCIAIS COM FAMÍLIAS: desafios para a efetivação de direitos

Pesquisa I: FAMÍLIAS E PRÁTICAS SOCIAIS:

interlocução com produções literárias sobre a Política de Assistência Social

RELATÓRIO DE PESQUISA

SÃO PAULO – SP

Março de 2014

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RELATÓRIO DE PESQUISA

FAMÍLIAS E PRÁTICAS SOCIAIS: interlocução com produções literárias sobre a Política de Assistência

Social

Dalva Azevedo de Gois (Coord.) Maria Teresa Nobili Menzio Regina Stella Barco Inácio

Sandra Maria Andrade Freitas

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LISTA DE SIGLAS

CF – Constituição Federal

CLT – Consolidação das Leis de Trabalho

CNAS – Conselho Nacional de Assistência Social

CRAS – Centro de Referência de Assistência Social

CREAS – Centro de Referência Especializado de Assistência Social

Loas – Lei Orgânica da Assistência Social

NOB/Suas – Norma Operacional Básica do Sistema Único da Assistência Social

ONG – Organização Não Governamental

PNAS – Política Nacional de Assistência Social

Suas – Sistema Único da Assistência Social

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Produções consultadas com especificação das existentes, das elegíveis e das

selecionadas para análise de conteúdo (pré-seleção e seleção final)...................................13

Tabela 2 – Produções do eixo temático famílias por

embasamento em marcos legais.....................................................................................................61

Tabela 3 – Produções do eixo temático práticas sociais por

embasamento em marcos legais............................................................................................84

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Produções por fonte-gênero e por elegíveis e analisadas....................................14

Figura 2 – Produções analisadas por gênero-fonte de produção...........................................15

Figura 3 – Produções analisadas por ano de realização........................................................16

Figura 4 – Produções analisadas por gênero e ano de publicação........................................17

Figura 5 – Produções analisadas por temática abordada (em números absolutos)..............18

Figura 6 – Produções analisadas por temática abordada (em números percentuais)...........19

Figura 7 – Produções do eixo temático famílias por inclusão do termo em aspectos

estruturais do texto.................................................................................................................32

Figura 8 – Produções do eixo temático famílias por recorrência do termo em aspectos

estruturais do texto.................................................................................................................32

Figura 9 – Produções do eixo temático famílias por categorias analíticas definidas a priori.34

Figura 10 – Produções do eixo temático práticas sociais por inclusão do termo em aspectos

estruturais do texto.................................................................................................................66

Figura 11 – Produções do eixo temático práticas sociais por recorrência do termo em

aspectos estruturais do texto..................................................................................................67

Figura 12 – Produções do eixo temático práticas sociais por categorias analíticas

utilizadas.................................................................................................................................68

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ........................................................................................................................... 7

1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS E RESULTADOS DA PRIMEIRA ETAPA DA

PESQUISA ............................................................................................................................... 10

2 A ABORDAGEM DOS EIXOS TEMÁTICOS FAMÍLIAS E PRÁTICAS SOCIAIS NAS

PRODUÇÕES SOBRE POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL ........................................... 23

2.1 EIXO TEMÁTICO FAMÍLIAS ............................................................................................. 23

2.1.1 Dos aspectos estruturais ............................................................................................. 31

2.1.2 Das categorias analíticas ............................................................................................. 33

2.1.2.1 Classe social ................................................................................................................ 34

2.1.2.2 Gênero ......................................................................................................................... 37

2.1.2.3 Etnia ............................................................................................................................. 43

2.1.2.4 Articulação entre esferas privada e pública para o exercício das responsabilidades

familiares .................................................................................................................................. 48

2.1.2.5 Percurso sociofamiliar .................................................................................................. 57

2.1.3 Do embasamento em marcos regulatórios relacionados à temática ..................... 61

2.2 EIXO TEMÁTICO PRÁTICAS SOCIAIS ............................................................................ 63

2.2.1 Dos aspectos estruturais ............................................................................................. 66

2.2.2 Das categorias analíticas ............................................................................................. 68

2.2.2.1 Direitos Sociais ............................................................................................................ 69

2.2.2.2 Socioterritorialidade ..................................................................................................... 74

2.2.2.3 Matricialidade sociofamiliar .......................................................................................... 79

2.2.3 Do embasamento em marcos regulatórios relacionados à temática ..................... 83

CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................................... 85

REFERÊNCIAS ...................................................................................................................... 888

ANEXOS .................................................................................................................................. 94

APÊNDICES............................................................................................................................. 96

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INTRODUÇÃO

O presente relatório refere-se a uma das três pesquisas associadas ao Projeto

“Práticas sociais com famílias e acesso a direitos: a efetividade da Política de Assistência

Social na interface com a Justiça da Infância e da Juventude”1, realizado no NEPPSF2, que

é vinculado à linha de pesquisa “Políticas sociais, famílias e desigualdades sociais”, do

Mestrado Acadêmico em Políticas Sociais da Universidade Cruzeiro do Sul/SP. A segunda e

a terceira dessas três pesquisas contaram com o apoio da Coordenadoria da Infância e da

Juventude do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo/SP, para fins de sua

apresentação aos juízes das Varas de Infância e Juventude e das Varas Especiais, nas

quais as referidas pesquisas seriam aplicadas.

Esta pesquisa I, que constitui um recorte teórico e teve por base um levantamento

bibliográfico, buscou identificar o debate sobre famílias e práticas sociais presente em

produções que versam sobre a Política Nacional de Assistência Social, publicadas entre

janeiro de 2006 e dezembro de 2010, momento em que já estava em vigor a Norma

Operacional Básica da Assistência Social (NOB/Suas) (aprovada em julho de 2005). As

referidas produções foram selecionadas em programas de pós-graduação de duas

universidades de São Paulo e em artigos de três revistas indexadas e editadas em três

regiões do país, os quais têm, senão exclusividade, ênfase no Serviço Social.

O interesse na investigação desse assunto emergiu do entendimento de que a

assistência social tem sido foco de discussões em âmbito nacional nas últimas décadas,

sobretudo pelas exigências postas pela vigência da Lei Orgânica de Assistência Social

(Loas), de modo que ela representasse um avanço da assistência social como dever do

Estado e direito do cidadão, e, posteriormente, no desenho de uma política para esse

campo que consolidasse essa mesma perspectiva de direito, o que se efetivou por meio da

Política Nacional de Assistência Social3.

1 O relatório final das pesquisas que fazem parte desse Projeto teve o título alterado para “Políticas e

práticas sociais com famílias: desafios para a efetivação de direitos”, conforme consta na folha de rosto deste relatório. 2 A segunda pesquisa desse Projeto, que tem como título “Realidade Social, direitos e perda do poder

familiar: desproteção social x direito à convivência familiar e comunitária”, coordenada por Eunice T. Fávero, abordou a destituição do poder familiar, pós-aprovação da Lei 12.010/2009. A terceira, “Os impactos da Política de Assistência Social no cotidiano das famílias de adolescentes em conflito com a lei: repercussões nas condições de vida”, coordenada por Maria Raimunda Chagas Rodriguez, discutiu o acesso de famílias de adolescentes em conflito com a lei a benefícios socioassistenciais. 3 A Lei Orgânica da Assistência Social (Loas) foi instituída pela Lei n. 8.742, de 7 de dezembro de

1993, e em 2004 o Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) aprovou o texto da Política Nacional de Assistência Social (PNAS), publicado pela Resolução n. 145, de 15 de outubro de 2004.

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Apresentava-se, então, o debate sobre os fundamentos da assistência social e sobre

sua implementação, com vistas a sua efetivação como política pública e direito social. Nessa

direção, a construção do Sistema Único de Assistência Social (Suas)4 apresentava-se como

requisito primordial para a materialização das diretrizes da política socioassistencial. O

debate sobre a assistência social e sobre alcances e limites da PNAS e do Suas permeia os

espaços de organização e de prática dos assistentes sociais, posto que, em sendo o Serviço

Social uma profissão que lida diretamente com as expressões da questão social, tem

necessariamente lugar privilegiado na discussão, na intervenção e em proposições no

âmbito socioassistencial.

Frente à relevância de o assistente social apreender criticamente a realidade social

para assumir o desafio de oferecer subsídios para a formulação, a execução, o

monitoramento e a avaliação de políticas e práticas sociais que assegurem direitos à

população, os estudos sobre a Política de Assistência Social, em seus principais aspectos,

emergem como necessidade. Assim, esta investigação está centrada na análise do espaço

que têm as produções, de Serviço Social ou de áreas afins, sobre a Política de Assistência

Social no âmbito de programas de pós-graduações e de revistas indexadas, especialmente

no que se refere a famílias e a práticas sociais. O intuito é também o de captar a(s)

direção(ões) teórico-metodológica(s) presente(s) nessas produções e, a partir daí, elaborar

diretrizes que poderão nortear o NEP sobre “Políticas e Práticas Sociais com Famílias” em

suas análises e proposições sobre a temática, oferecendo subsídios também a outros

pesquisadores dessa matéria.

Para tornar didático o registro da sistematização e a análise das informações

coletadas nesta pesquisa, o presente relatório foi organizado em dois itens e vários

subitens, constando também algumas considerações finais, referências, anexos e

apêndices.

O primeiro item foi dedicado a apresentação e discussão dos procedimentos

metodológicos adotados na pesquisa, bem como ao registro e à análise das informações

resultantes de sua primeira etapa.

O segundo item aborda os dois temas focos da pesquisa “Famílias e Práticas

Sociais: interlocução com produções literárias sobre a Política de Assistência Social”. Cada

um desses temas é explorado sob diferentes aspectos, o que implicou sua organização em

4 O Sistema Único de Assistência Social (Suas), instituído pela Lei n. 12.435, de 6 de julho de 2011,

vinha sendo implementado desde 2005, quando a Norma Operacional Básica (NOB/Suas) foi aprovada pelo Conselho Nacional de Assistência Social, em 15 de julho de 2005 (Resolução n. 130/2005). Essa resolução foi revogada em dezembro de 2012 com a aprovação da nova NOB/Suas, por meio da Resolução n. 33, de 12.12.2012.

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vários subitens, cujos títulos correspondem, majoritariamente, às categorias analíticas a

partir das quais foram discutidos.

Por fim, são apresentadas algumas considerações sobre as principais questões

objeto de nosso estudo.

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1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS E RESULTADOS DA PRIMEIRA ETAPA DA

PESQUISA

Para alcançar os objetivos propostos, o procedimento metodológico adotado nesta

pesquisa foi a Análise de Conteúdo, na perspectiva da análise temática, na qual o conceito

central é o tema. Franco (2008) e Gomes (2011) apresentam, ambos baseados em Bardin

(1979), mas avançando em termos da amplitude de seu uso, a importância da

sistematização e da interpretação das informações coletadas e do próprio movimento que

geralmente se processa entre a coleta, a análise e a interpretação. A Análise de Conteúdo é

definida como:

Conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitem a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens (BARDIN, 1979 apud GOMES, 2011, p. 83).

Outro aspecto salientado pelos autores citados é a escolha das fontes a partir das

quais se fará a coleta de informações relativas ao objeto da pesquisa. Não é necessário

abranger o universo total, posto que o foco é a exploração de opiniões e significados do

tema em investigação, e “[...] a dimensão sociocultural das opiniões e representações de um

grupo que tem as mesmas características costumam ter muitos pontos em comum ao

mesmo tempo que apresentam singularidades próprias da biografia de cada interlocutor”

(GOMES, 2011, p. 79). Entende-se, contudo, que é necessário ter critérios bem definidos

para a escolha das fontes.

Cientes da importância da escolha das fontes documentais que uma pesquisa dessa

natureza exige, entendeu-se como fundamental que o levantamento bibliográfico

abrangesse produções acadêmicas e artigos de revistas científicas representativas no

campo social e, preferencialmente, sediadas em diferentes regiões do país,

compreendendo-se que nelas estaria contemplada a abordagem da Política de Assistência

Social e, nesta, a discussão de famílias e práticas sociais. Assim, a partir do diálogo com as

coordenadoras das duas outras pesquisas, com o conjunto dos pesquisadores do NEPPSF

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e, especialmente, com aqueles que integram esta pesquisa5, ficaram definidas para este

levantamento bibliográfico as seguintes fontes:

- Programa de Estudos Pós-Graduados em Serviço Social da PUC-SP (dissertações e teses, de 2006 a 2010);

- Mestrado em Políticas Sociais da UNICSUL-SP (dissertações de 2006 a 2010);

- Revista Serviço Social e Sociedade (São Paulo, Editora Cortez, n. 85 a 104);

- Revista Katálysis (Programa de Pós-Graduação em Serviço Social da UFSC, Florianópolis, n. 9 a 13);

- Revista Ser Social (Departamento de Serviço Social da UNB, Brasília, n. 18 a 27).

Estabelecidas as fontes e os gêneros literários a serem pesquisados, o passo

seguinte foi a definição de palavras-chave para orientar a escolha dos textos que fariam

parte da investigação. Nesse primeiro momento, fizeram parte desse levantamento todas as

produções que versavam sobre a política de assistência social, as quais foram eleitas a

partir da identificação, em suas palavras-chave ou no título, dos seguintes termos:

Assistência social, Sistema Único de Assistência Social, Política Nacional de Assistência

Social, Lei Orgânica de Assistência Social, Política Social/Pública, Seguridade Social,

Proteção Social, Benefícios Eventuais, Benefícios de Transferência de Renda (ou Benefício

de Prestação Continuada, Renda Mínima, Bolsa Família, Família Cidadã, Pró-Família),

Programa Social ou Socioassistencial, CRAS e CREAS.

Para a definição desses termos, a partir dos quais seriam identificadas as produções

que versavam sobre política de assistência social, partiu-se do conhecimento já acumulado

e foram feitas consultas a algumas obras referenciais sobre a temática. Posteriormente,

elaborou-se um instrumental com os termos eleitos e outras informações necessárias à

orientação de nossa investigação (Apêndice 2), assim como realizou-se um pré-teste com o

objetivo de avaliar o instrumental e de capacitar os pesquisadores para sua utilização.

5 A primeira parte desta pesquisa foi realizada, sob a coordenação de Dalva Azevedo de Gois, pelos

seguintes pesquisadores: Dalva Azevedo de Gois (assistente social e doutora em Serviço Social), Luiz André Barbosa (teólogo e mestre em Políticas Sociais), Márcia Assis da Costa (assistente social e doutoranda em Serviço Social), Maria Teresa Nobili Menzio (psicóloga e mestre em Políticas Sociais), Maurice Silvestre da Silva Moura (assistente social), Regina Stella Barco Inácio (assistente social e mestre em Políticas Sociais), Sandra Maria Andrade de Freitas (assistente social e especialista em famílias) e Yldson Augusto Macias Serrão (gestor de órgãos públicos e mestrando em Políticas Sociais).

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Esse levantamento foi realizado, em sua maioria, virtualmente e com base nos

títulos, resumos e palavras-chave da produção. Com base no instrumental I (elaborado para

essa etapa), um pesquisador fazia o levantamento e registrava-o no instrumental, enquanto

que um segundo pesquisador realizava a conferência, com o intuito de assegurar o rigor na

investigação.

De posse desse primeiro levantamento, iniciou-se o segundo momento dessa

investigação, que consistia em selecionar nessas produções que versavam sobre política de

assistência social aquelas que, de alguma forma, abordavam as temáticas “famílias” e

“práticas sociais”. Para tanto, também foi elaborado o instrumental II (Apêndice 3) e

novamente foram definidas palavras-chave que orientariam esse segundo levantamento:

FAMÍLIA(S) ou: pai, mãe, homem, mulher, gênero, filhos, crianças, adolescentes;

PRÁTICA(S) SOCIAL(IS) ou: trabalho social, trabalho/apoio socioeducativo, trabalho com

famílias, programa social/socioassistencial, ação social/socioassistencial, socioassistencial,

intervenção, prática socioassistencial, proteção/direito(s) social(is)/socioassistenciais, prática

profissional/trabalho no CRAS-CREAS, implantação/implementação do CRAS-CREAS.

Assim, nesse segundo momento, que foi chamado de “refinamento”, foram extraídas

do primeiro levantamento todas as produções que tinham no título ou nas palavras-chave

também algum(s) do(s) termo(s) constante(s) do Instrumental II. Da mesma forma que no

anterior, esse segundo passo ficou sob a responsabilidade de dois pesquisadores, de modo

a assegurar o necessário rigor de um processo de pesquisa.

Todas as dúvidas surgidas no decorrer dos levantamentos realizados eram

discutidas com toda equipe de pesquisadores, ocasião em que se buscava saná-las e

aprofundar o entendimento sobre a investigação em foco. À coordenadora da pesquisa –

que também era uma de suas executoras – cabia, entre outras atribuições, organizar o

trabalho feito pelo conjunto dos pesquisadores e sistematizar as informações para a próxima

etapa.

Os resultados desses primeiros passos da investigação constam na tabela

demonstrativa seguinte. No Apêndice 1, estão relacionadas as produções que fizeram parte

da análise de conteúdo.

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Tabela 1 – Produções consultadas com especificação das existentes, das elegíveis e das selecionadas para análise de conteúdo (pré-seleção e seleção final)

FONTE/GÊNERO

DA PRODUÇÃO

Período:

2006 a 2010

PRODUÇÕES

EXISTENTES

PRODUÇÕES

ELEGÍVEIS

PRODUÇÕES

PARA

ANÁLISE

(pré-seleção)

PRODUÇÕES

PARA

ANÁLISE DE

CONTEÚDO

(seleção final)

OBSERVAÇÕES

TESES SERVIÇO

SOCIAL PUC-SP

81 79 17 12

15%

02 teses referiam-se

a outros países.

DISSERTAÇÕES

SERVIÇO SOCIAL

PUC-SP

140 136 26

15

11%

04 dissertações

referiam-se a outros

países.

DISSERTAÇÕES

MESTRADO

POLÍTICA SOCIAL

UNICSUL

24 24 11 05

21%

REVISTA SERVIÇO

SOCIAL E

SOCIEDADE –

CORTEZ ED.

185 171 51 10

6%

Editoriais, trocando

em miúdos,

depoimentos,

informativos e

entrevistas não

foram considerados

REVISTA

KATÁLYSIS – UNIV.

FEDERAL SANTA

CATARINA

152 134 21 10

7%

Editoriais, resenhas,

entrevistas e

palestra não foram

considerados.

REVISTA SER

SOCIAL – UNIV.

NACIONAL

BRASÍLIA

76 59 12 04

7%

Editoriais, resenhas,

debates e resumos

não foram

considerados, nem

artigos/ensaios que

não se referissem

ao Brasil.

TOTAL

658 603 138 56

9%

Fonte: Pesquisa FAMÍLIAS E PRÁTICAS SOCIAIS: interlocução com produções literárias sobre a Política de Assistência Social – 2013.

Considerando as produções elegíveis e as selecionadas para análise (colunas em

vermelho da Tabela 1)6, pode-se verificar que dentre as 603 produções elegíveis (vide nota

de rodapé n. 6), as quais versam sobre diferentes temas, 138 (23%) delas referem-se à

Política de Assistência Social em seus vários aspectos. Destas, 56 (9% das 603 produções

6 Para fins de nossa pesquisa, nas produções do Programa de Estudos Pós-Graduados em Serviço

Social (teses e dissertações), deixaram de ser consideradas as produções que se referiam exclusivamente a outros países; aquelas relativas a dois ou três países, incluindo o Brasil, entraram em nosso levantamento bibliográfico. Nas revistas, foram considerados para esse fim somente os artigos, os temas livres, os relatos de pesquisa e os ensaios, excluindo-se editoriais, resenhas, entrevistas, depoimentos, “trocando em miúdos” e informes.

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e 41% das 138 que discorrem sobre a Política de Assistência Social) foram selecionadas

para constituir a base de nossa pesquisa, por abordarem as temáticas famílias e práticas

sociais na Política de Assistência Social.

A relevante presença da temática política de assistência social nesse período de 2006

a 2010, certamente, está associada à sua importância no campo social, especialmente para

o Serviço Social, a partir da entrada em vigor da Política Nacional de Assistência Social e da

Norma Operacional Básica da Assistência Social NOB/Suas (aprovada em julho de 2005),

que definem diretrizes para a implementação dessa política social em âmbito nacional.

Avalia-se que o crescimento de estudos e de publicações sobre o assunto reflete a

importância do debate sobre seus vários aspectos, inclusive em decorrência dos desafios

presentes em sua implementação.

A discussão de famílias e práticas sociais também mereceu destaque e, para melhor

visualização, consta abaixo, em percentuais, o panorama das produções elegíveis e

posteriormente analisadas, especificadas pelo gênero literário e pela fonte de publicação.

Figura 1 – Produções por fonte-gênero e por elegíveis e analisadas

Fonte: Pesquisa FAMÍLIAS E PRÁTICAS SOCIAIS: interlocução com produções literárias sobre a Política de Assistência Social – 2013.

Pela Figura 1, verifica-se que, do total das produções elegíveis em todas as fontes,

somente 9% responderam a todos os critérios eleitos para definição das produções a serem

analisadas. Ao se observar cada uma das fontes, constata-se que 26% das produções da

PUC (15% das teses e 11% das dissertações) foram selecionadas; da UNICSUL, foram

21%; dos artigos da Revista Serviço Social e Sociedade, 6%; da Revista Katálysis, 7%; e da

Revista Ser Social também, 7%.

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Quanto à especificação por gênero, observa-se pela figura seguinte que 56% das

produções são teses ou dissertações e 44% artigos de revistas:

Figura 2 – Produções analisadas por gênero-fonte de produção

Fonte: Pesquisa FAMÍLIAS E PRÁTICAS SOCIAIS: interlocução com produções literárias sobre a Política de Assistência Social – 2013.

A Figura 2 também indica que, do total das produções analisadas, 20% são teses da

PUC-SP; 27% são dissertações da mesma universidade e 9% são dissertações da UNICSU-

SP; 16% são artigos da Revista Katálysis (SC); 7% são artigos da Revista Ser Social (DF); e

21% são artigos da Revista Serviço Social e Sociedade (SP).

Da classificação das produções analisadas por ano, verifica-se, na Figura 3, que

entre 2006 e 2010 ocorreu significativo aumento percentual das produções relativas à

Política de Assistência Social que abordavam questões relativas a famílias e práticas

sociais:

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Figura 3 – Produções analisadas por ano de realização

Fonte: Pesquisa FAMÍLIAS E PRÁTICAS SOCIAIS: interlocução com produções literárias sobre a Política de Assistência Social – 2013.

Tanto em 2006 como em 2007, conforme demonstrado na Figura 3, 14% das

produções elegíveis abordaram as duas temáticas em pauta (famílias e práticas sociais); em

2008, esse percentual subiu para 18%; em 2009, para 23%; e, em 2010, chegou-se a 31%.

Portanto, entre 2006 e 2010, teve-se um crescimento de 17% em teses, dissertações ou

artigos de revistas indexadas que abordaram a Política de Assistência Social, no que se

refere a famílias e a práticas sociais.

A observação sobre a especificação de gênero e ano de produção indica oscilações,

conforme representado na figura seguinte:

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Figura 4 – Produções analisadas por gênero e ano de publicação

Fonte: Pesquisa FAMÍLIAS E PRÁTICAS SOCIAIS: interlocução com produções literárias sobre a Política de Assistência Social – 2013.

Observa-se, na Figura 4, que tanto as produções acadêmicas como os artigos de

revistas oscilaram em seus índices: as primeiras tiveram em 2006 um percentual de 7%,

decairam para 3% em 2007 e nos dois anos seguintes (2008 e 2009) subiram para 11% e

20%, respectivamente, voltando a descer, em 2010, para 16%. Os índices dos artigos de

revistas também tiveram oscilação, mas só houve queda nos anos de 2008 e 2009. A

análise do total das produções sobre Política de Assistência Social nesses anos, nos

gêneros e fontes consultados, também tiveram variações que podem ser equivalentes às

das produções analisadas relativas às temáticas, mas não foi possível identificar as razões

que contribuiram para isso.

De posse da listagem das produções sobre Política de Assistência Social que, de

alguma forma, versam sobre famílias e práticas sociais (Apêndice 1), partiu-se para o

terceiro momento de nossa investigação: a análise de conteúdo propriamente dita. Para

esse passo, foi construído o Instrumental III (Apêndice 4), com o intuito de identificar na

estrutura e no conteúdo dos textos pesquisados as referências sobre famílias e sobre

práticas sociais a elas direcionadas, na perspectiva de construir um entendimento de como

os estudiosos da política de assistência social abordam essas duas temáticas. Da mesma

forma que nos passos anteriores, procedeu-se a um pré-teste do instrumental para avaliá-lo

e para tornar convergente o entendimento dos pesquisadores sobre o Instrumental III e sua

utilização.

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Nessa etapa, pôde-se constatar que um maior número de produções sobre a Política

de Assistência Social abordava a eixo temático práticas sociais, seguido das que tratavam

do eixo temático famílias e das que versavam sobre as duas temáticas, conforme consta a

seguir:

Figura 5 – Produções analisadas por temática abordada

(em números absolutos)

Fonte: Pesquisa FAMÍLIAS E PRÁTICAS SOCIAIS: interlocução com produções literárias sobre a Política de Assistência Social – 2013.

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Figura 6 – Produções analisadas por temática abordada (em números percentuais)

Fonte: Pesquisa FAMÍLIAS E PRÁTICAS SOCIAIS: interlocução com produções literárias sobre a Política de Assistência Social – 2013.

As Figuras 5 e 6 indicam que 32 (58%) das produções analisadas exploraram

exclusivamente o eixo temático práticas sociais; 8 (15%) versaram exclusivamente sobre o

eixo temático famílias; e 15 (27%) abordaram tanto práticas sociais como famílias. A

predominância da abordagem de práticas sociais pode estar associada, no âmbito do

Serviço Social, a ser uma temática que, classicamente, faz parte dos estudos desse campo,

em contraponto a de famílias, que, embora corrente como aspecto da intervenção, havia

certa tendência nas últimas décadas do século passado ao entendimento de que os estudos

nesse campo não mereciam ser priorizados no Serviço Social, uma vez que nesse período

prevaleceu o debate no âmbito macrossocial. A junção de famílias e práticas sociais em

trabalhos acadêmicos ou artigos de revistas está, possivelmente, correlacionada aos

desafios que emergem da implementação da Política de Assistência Social.

Apresentado esse primeiro panorama da investigação sobre famílias e práticas

sociais em produções acadêmicas e artigos de revistas indexadas sobre Política de

Assistência Social, a etapa seguinte consistiu em explorar mais detalhadamente cada uma

dessas duas temáticas, razão pela qual as informações coletadas e analisadas serão

apresentadas em tópicos específicos.

Para essa etapa, assim como para as anteriores, foi elaborado um instrumental

(Apêndices 5 e 6), que passou por pré-teste, posteriormente discutido com todo grupo de

pesquisadores, com vistas a aprofundar o entendimento de todos sobre seu conteúdo. O

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objetivo desse passo da pesquisa foi, além de identificar como as duas temáticas estavam

presentes nos elementos estruturais das produções, compreender a partir de quais

categorias analíticas estavam sendo abordadas.

Para a definição prévia de categorias analíticas que subsidiariam a investigação

sobre práticas sociais e sobre famílias nas produções objeto de análise da presente

pesquisa, fez-se importante o debate a partir do conhecimento teórico-prático acumulado

pelo conjunto dos pesquisadores e também a investigação de produções de reconhecido

valor acadêmico sobre essas duas temáticas.

A Análise de Conteúdo, procedimento metodológico adotado nesta pesquisa, abarca

a possibilidade de definição de categorias analíticas a priori e a posteriori. A prévia definição

de categorias analíticas exige um percurso significativo por parte dos pesquisadores no

assunto em investigação, de modo a evitar simplificações e mesmo fragmentações da

questão em estudo, conforme lembra Franco (2008). A autora entende que a categorização

é um aspecto fundamental da análise de conteúdo e implica idas e vindas da teoria ao

material de análise e vice-versa, o que costumeiramente leva a várias elaborações e

reelaborações do material, até que se definam as categorias analíticas. Assim, a

categorização é considerada

[...] uma operação de classificação de elementos constitutivos de um conjunto, por diferenciação e, seguidamente, por reagrupamento segundo o gênero (analogias), com critérios previamente definidos. As categorias são rubricas ou classes, as quais reúnem um grupo de elementos (unidades de registro) sob um título genérico (BARDIN, 1979, p. 117).

Além de categorias definidas a priori, ficou estabelecido que, a partir da análise das

informações coletadas, buscar-se-ia apreender outros aspectos que os estudiosos adotam

no debate das duas temáticas em pauta e far-se-ia um esforço com vistas a compor

categorias a posteriori, o que poderia dar maior visibilidade à riqueza do material

pesquisado, em que pesem os desafios desse processo. Para a definição de categorias a

posteriori, emergem como relevantes “a descrição do significado e sentido atribuído” pelo

sujeito da pesquisa e a classificação de “convergências e respectivas divergências”, além

das inferências e interpretações do pesquisador (FRANCO, 2008; GOMES, 2011).

Para essa etapa da pesquisa, ficou estabelecido que analisaríamos duas produções

que fizessem referência a cada categoria analítica definida a priori e, a partir destas,

tentaríamos localizar outras categorias analíticas adotadas pelos autores para discussão de

cada uma das duas temáticas: famílias e práticas sociais. Para escolha dessas produções

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que comporiam esse último passo de nossa pesquisa, os critérios eleitos foram os

seguintes:

entre as produções selecionadas para a investigação de cada uma das temáticas (famílias

ou práticas sociais), eleger pelo menos uma produção de cada gênero (tese, dissertação,

artigo de revista) e de cada fonte (PUC-SP, UNICSUL, Revista Ser Social, Revista Katálysis

e Revista Serviço Social e Sociedade);

respeitar, à medida do possível, a proporcionalidade entre quantidade total daquele gênero

e fonte e a quantidade de produções selecionadas para análise das categorias analíticas;

selecionar produções que, entre as analisadas em cada temática, apresentassem uma

discussão mais aprofundada (comparativamente às demais) de suas categorias analíticas

definidas a priori: para famílias – classe social, gênero e etnia; para práticas sociais –

socioterritorialidade, direitos sociais e matricialidade sociofamiliar;

escolher, à medida do possível, produções que contemplem mais de uma categoria analítica

daquela temática.

Essa seleção resultou em 02 teses da PUC-SP (dos anos 2006 e 2009), 03

dissertações da PUC-SP (dos anos 2006, 2009 e 2010), 01 dissertação da UNICSUL-SP (do

ano de 2009), 01 artigo da Revista Ser Social (Brasília/DF, ano 2010), 01 artigo da Revista

Katálysis (Florianópolis/SC, ano 2010) e 02 artigos da Revista Serviço Social e Sociedade

(São Paulo/SP, anos 2007 e 2008). Duas das dissertações foram eleitas para a análise de

mais de uma categoria analítica. Observa-se que todos os anos do período delimitado para

a pesquisa estão também representados, embora esse não tenha sido um critério escolhido

para a definição das produções que seriam analisadas nessa última etapa de nossa

pesquisa.

Após o exame do material de pesquisa, no nosso caso, as produções selecionadas

(Apêndice 1), a parte final desse procedimento metodológico foi a síntese interpretativa, que

exigiu fazer a devida articulação entre os objetivos desta pesquisa, a base teórica adotada –

no caso, a perspectiva crítica – e as informações empíricas colhidas. Para Gomes (2011),

essa parte se comporia de três etapas: a primeira se constitui de uma leitura compreensiva

do material, na qual se busca ter uma visão de seu conjunto e apreender suas

particularidades. Entendemos que parte dessa etapa consta dos resultados da primeira fase

desta pesquisa (descrita no item 1 do presente relatório). A identificação de temas (ou

aspectos) no material pesquisado, que também faz parte dessa etapa, será incluída no item

seguinte (“Abordagem das temáticas famílias e práticas sociais nas produções sobre Política

de Assistência Social”).

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A segunda etapa da síntese interpretativa, na qual se identificam as ideias explícitas

e implícitas dos sujeitos, a partir da análise das temáticas (GOMES, 2011), foi realizada

parcialmente nesta pesquisa, dada à quantidade de produções consultadas (teses,

dissertações e artigos) e à complexidade daí derivada. Assim, o esforço foi na direção de

identificar aspectos relevantes na abordagem dos temas práticas sociais e famílias e de

entender os sentidos atribuídos a tais temas, o que será apresentado nos itens

subsequentes.

A terceira e última etapa da síntese interpretativa busca “sentidos mais amplos que

articulam modelos subjacentes às ideias”, o que pode ser realizado a partir do diálogo entre

“a fundamentação da teoria adotada [...]; os depoimentos e seus contextos; depoimentos e

observações que registramos no trabalho de campo; objetivos/pressupostos da pesquisa e

ideias presentes nos depoimentos [...]” (GOMES, 2011, p. 104). A nossa pesquisa não

trabalhou com depoimentos propriamente ditos, mas com textos de autores que

evidentemente expressam seu pensamento sobre as questões em pautas e deles extraímos

os sentidos para os aspectos aqui salientados. Desse modo, entende-se que nossa síntese

interpretativa integra todo corpo deste relatório, estando, contudo, mais condensada nos

itens subsequentes e nas considerações finais.

No próximo tópico, constará a sistematização das informações coletadas relativas às

duas temáticas, com especificação de cada uma delas, salientando-se o que se pode

identificar a partir da análise dos aspectos estruturais (títulos, resumos, palavras-chaves,

capítulos e itens) e de conteúdos.

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2 A ABORDAGEM DOS EIXOS TEMÁTICOS FAMÍLIAS E PRÁTICAS SOCIAIS NAS

PRODUÇÕES SOBRE POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL

Os temas famílias e práticas sociais serão aqui abordados na perspectiva crítica,

tomando-se como pressupostos que situações macrossociais, como a desigualdade social e

a divisão sociotécnica do trabalho, são determinantes na organização da vida cotidiana de

indivíduos e famílias. Para a interpretação dos sentidos subjacentes nos escritos dos

autores das produções pesquisadas, buscou-se subsídio em estudiosos reconhecidos no

debate dessas duas temáticas e na reflexão sobre a experiência profissional dos

pesquisadores, visto que a maioria tem significativo percurso no campo social, incluindo

também a participação em outras pesquisas nesse âmbito.

Para uma melhor compreensão, na sequência, os temas famílias e práticas sociais

serão apresentados separadamente. Cada um terá, inicialmente, uma discussão mais ampla

e, em seguida, serão abordadas as categorias analíticas consideradas primordiais para seu

aprofundamento.

2.1 EIXO TEMÁTICO FAMÍLIAS

A aproximação com o tema famílias ocorreu para muitos dos pesquisadores na

prática profissional cotidiana. Os desafios para compreender a complexidade das questões

que se faziam presentes em sua abordagem exigiu deles investigações teóricas sobre o

assunto e os impeliu ao debate com colegas do próprio campo profissional e de outros afins.

Parte-se aqui do entendimento de que família é uma construção histórico-social,

sendo, portanto, expressão das determinações sociais (e, ao mesmo tempo, expressando-

as) daquela dada sociedade, naquele momento. Uma retrospectiva histórica da família,

mesmo que breve, leva à compreeensão da existência de diferentes formas de organização

e de configuração ao longo da história da humanidade, bem como dos papéis socialmente

atribuídos a ela e das relações estabelecidas com o Estado.

As transformações pelas quais passou a família, impulsionadas por mudanças

sociais mais amplas, estão, pelo menos em parte, registradas na legislação vigente em cada

período histórico. Assim, ao se fazer um exame das Constituições Federais brasileiras,

pode-se verificar que a primeira Carta Magna a dedicar capítulo específico à família foi a de

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19347, demarcando sua formação a partir do casamento indissolúvel e garantindo-lhe

proteção especial do Estado, condições que permaneceram nas duas posteriores (1946,

1967) e na Emenda Constitucional de 19698. O entendimento da família como base da

sociedade e tendo especial proteção do Estado é mantido na Constituição Federal de 1988,

que inova ao apresentar como entidade familiar também a união estável entre um homem e

uma mulher, a comunidade formada por um dos pais e seus descendentes, bem como a

igualdade entre o homem e a mulher no que se refere ao exercício dos direitos e deveres na

sociedade conjugal. Posteriormente, em 2011, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a

união estável para casais formados por pessoas do mesmo sexo, passando a entidade

familiar, desde então, do ponto de vista legal, a ser assumida em quatro configurações: a

constituída a partir do casamento, a união estável entre o homem e a mulher, a comunidade

formada por um dos pais e seus descendentes e a união estável entre pessoas do mesmo

sexo.

Para além dos textos constitucionais, a sociedade e o Estado brasileiro vêm

avançando na discussão sobre famílias e buscando conceituá-la de modo a contemplar a

complexidade presente, quer em sua organização, quer nas múltiplas configurações que

vêm se desenhando na contemporaneidade. Nesse sentido, tomando agora somente o

período posterior à Constituição de 1988, mas ainda situando-se no campo dos marcos de

regulação, especialmente nos da Política de Assistência Social, foco desta pesquisa, é

possível observar uma variação conceitual nessas duas últimas décadas, que pode ser

reflexo da tentativa de ultrapassar a noção de família embasada principalmente no poder

paterno, no parentesco e na associação a um único domicílio.

Nessa direção, a primeira legislação a ser citada é a Lei Orgânica de Assistência

Social e sua conceituação sobre família: “[...] entende-se por família a unidade mononuclear,

vivendo sob o mesmo teto, cuja economia é mantida pela contribuição de seus integrantes”

(§ 1º do artigo 20 da Lei n. 8.742/1993). Observa-se nessa definição uma referência explícita

à coabitação – associando, portanto, família a domicílio – e também à participação de vários

integrantes para o provimento da família, não mais somente a do pai – distanciando-se,

nesse aspecto, do ideário da família patriarcal, na qual o pai é provedor exclusivo. Poder-se-

ia supor, de imediato, uma concepção que preserva um aspecto clássico no entendimento

de família, a associação entre família e domicílio, e outro que responde à realidade atual, a

7 A Constituição de 1934 é a terceira do Brasil. A primeira foi outorgada por D. Pedro I, em 1824, e a

segunda foi promulgada pelo governo provisório da República, em 1891. 8 Os textos constitucionais registram, até o de 1969, o casamento como sendo indissolúvel, posto que

a dissolução da sociedade conjugal por meio do divórcio foi instituída no Brasil pela Emenda Constitucional n. 9, de 28 de junho de 1977, e regulamentada pela Lei n. 6.515, de 26 de dezembro de 1977.

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presença de mais de um provedor no grupo. Contudo, muito provavelmente, os legisladores

também estavam atentos aos encargos financeiros dos benefícios socioassistenciais para o

Estado ao referirem-se à manutenção da economia familiar pelo conjunto de seus

integrantes, uma vez que a década de 90 do século XX é marcada pela assunção do

neoliberalismo pelo Estado brasileiro, a partir do que os gastos com o social deveriam ser

reduzidos, mesmo que em detrimento da proteção social necessária à população, sobretudo

àquela em situação de maior vulnerabilidade social.

Na década seguinte, são publicadas as Resoluções n. 145, de 15 de outubro de

2004, e 130, de 15 de julho de 2005, que instituíram respectivamente a Política Nacional de

Assistência Social (PNAS) e a Norma Operacional Básica da Assistência Social

(NOB/Suas)9. A primeira define família como sendo um “[...] conjunto de pessoas que se

acham unidas por laços consanguíneos, afetivos e ou de solidariedade [...]” (PNAS/2004;

NOB/Suas, 2005, p. 41). A segunda, ao referir-se às funções da política pública de

Assistência Social para extensão da proteção social brasileira, indica:

A defesa do direito à convivência familiar, na proteção de Assistência Social, supera o conceito de família como unidade econômica, mera referência de cálculo de rendimento per capita, e a entende como núcleo afetivo, vinculado por laços consanguíneos, de aliança ou afinidade, que circunscrevem obrigações recíprocas e mútuas, organizadas em torno de relações de geração e de gênero (PNAS/2004; NOB/Suas, 2005, p. 90).

Para além dos aspectos que ambas as definições contemplam no entendimento de

família ou de famílias, cabe destacar que, para abarcar a filiação adotiva, o mais apropriado

seria a referência à vinculação por laços de parentesco e não por laços consanguíneos,

como consta nesse extrato da NOB/Suas/2005, uma vez que o termo parentesco abrange

tanto a filiação consanguínea quanto a civil, por meio da adoção. Os laços de aliança e de

afinidade são associados ao casamento, aos parentes do cônjuge ou companheiro10.

Atualmente, também se considera, nos vínculos por afinidade, outras pessoas referenciais

para aquele indivíduo ou grupo que mantêm entre si um nível de relação que pode se

constituir em apoio mútuo em prol da sobrevivência, proteção e cuidados.

Recentemente, em dezembro de 2012, o Conselho Nacional de Assistência Social

publicou a Resolução n. 33, que trata da nova Norma Operacional Básica do Sistema Único

9 Em julho de 2011, o Suas passou a ser regulamentado pela Lei n. 12.435, de 07/07/2011.

10 Disponível em: <https://www.ufmg.br/pfufmg/index.php/pagina-inicial/saiba-direito/445-saiba-mais-

sobre-o-parentesco>. Acesso em: 13 set. 2013.

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de Assistência Social (NOB/Suas) e revoga, a partir de então, a Resolução 130/2005. Em

seu artigo 1º, define funções da política de assistência social e sua forma de organização:

A política de assistência social, que tem por funções a proteção social, a vigilância socioassistencial e a defesa de direitos, organiza-se sob a forma de sistema público não contributivo, descentralizado e participativo, denominado Sistema Único de Assistência Social – SUAS (NOB/Suas, 2012, p. 2).

Do artigo 4º (Cap. I do Anexo) da referida resolução, onde são definidas as

seguranças afiançadas pelo Suas (I – acolhida; II – renda; III – convívio ou vivência familiar,

comunitária e social; IV – desenvolvimento de autonomia; e V – apoio e auxílio), interessa

aqui destacar a terceira segurança, para a qual consta nesse marco de regulação a

exigência de oferta pública de rede continuada de serviços que garantam oportunidades e

ação profissional para:

a) a construção, restauração e o fortalecimento de laços de pertencimento, de natureza geracional, intergeracional, familiar, de vizinhança e interesses comuns e societários; b) o exercício capacitador e qualificador de vínculos sociais e de projetos pessoais e sociais de vida em sociedade (NOB/Suas, 2012, p. 3).

Essas normativas buscam assegurar proteção social às famílias, com vistas à

concretização do direito à preservação dos laços sociais, do convívio familiar e comunitário,

reconhecendo o grupo familiar como referência social básica do indivíduo e espaço

privilegiado para sua proteção e socialização. É notório que as legislações refletem a

dinâmica e as demandas da sociedade e, em certa medida, o debate dos estudiosos sobre o

assunto. Assim, cabe salientar também o que a literatura tem apresentado sobre famílias e

sobre suas transformações ao longo das últimas décadas do século XX e início do XXI.

As questões presentes no debate dessa temática são muitas e complexas e não se

pretende aqui dar conta de todas elas, mas se faz importante apontar pelo menos aquelas

que têm sido referenciais na discussão dos estudiosos. Com o acúmulo de investigação e

discussão anterior a esta pesquisa, a equipe de pesquisadores já estava consciente de que

explorar essa matéria significava localizá-la em classes sociais e adentrar as relações de

gênero e as questões étnicas, o que foi adotado como categoria analítica definida a priori e

será desenvolvido no item 2.1.2 e nos subitens constantes na sequência deste relatório (p.

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29-43). Para além dessas, outras merecem ser apontadas, por emergirem como cruciais nas

reflexões contemporâneas sobre famílias.

Assim, por ensejarem a composição a partir de um conjunto de aspectos, pode-se,

também, entender como categorias analíticas, a articulação entre trabalho familiar e trabalho

remunerado e percurso sociofamiliar. Essas categorias, que integram a discussão

contemporânea de estudiosos que têm se dedicado a compreender e a elaborar suas ideias

sobre famílias, aparecem nas produções analisadas ainda que de forma fragmentada.

Verificou-se que, em considerável parcela dessas produções, os autores fazem referência a

alguns dos aspectos que compõem as categorias analíticas aqui nomeadas, mas, por vezes,

centram a discussão ora em um ponto de vista teórico ora na descrição de situações

empíricas, deixando de ser apresentada uma síntese analítica com a devida articulação

entre a perspectiva teórico-metodológica a que fazem referência e a realidade empírica de

que trata seu estudo. A abordagem dessas duas categorias analíticas também consta no

item 2.1.2 (p. 43-55).

Em face dos pontos já levantados, ficam claros o desafio e, ao mesmo tempo, a

importância de se conceituar famílias levando em conta a multiplicidade de fatores nelas

presentes, sua localização no tempo histórico e no meio social em que vive, bem como as

constantes transformações pelas quais passam na contemporaneidade11. Nesse sentido,

buscamos subsídios em autores considerados referências para o estudo da temática, com

vistas a compor uma conceituação de famílias que responda minimamente aos aspectos

mencionados.

Entre os estudiosos dessa temática, destacamos Sarraceno e Naldini, que, a partir

da análise histórico-social de famílias europeias, principalmente da Itália e de Portugal,

buscam compreendê-la na atualidade. Para tanto, examinam como as grandes

transformações sociais – como o processo de industrialização – atingiram as famílias12,

considerando as autoras que cada cultura e grupo social é distintamente afetado por tais

mudanças. Para elas, “[...] a família não é um simples terminal passivo da mudança social,

mas um dos agentes sociais que contribuem para definir as formas e os sentidos da própria

mudança social, ainda que com diferentes graus de liberdade, conforme as circunstâncias”

(SARRACENO; NALDINI, 2003, p. 21). Entendem que gênero e geração constituem dois

11

Messias e Gueiros (2012) apresentam muitas das questões vivenciadas pela família contemporânea, com especificação de suas principais transformações, inclusive nos marcos legais brasileiros. 12

Para definição de um agrupamento humano como família, Sarraceno e Naldini (2003) enumeram alguns indicadores, como: a vivência conjunta sob um mesmo teto (convivência familiar), parentesco, estabelecimento de regras de convivência, definição de funções, além de delimitações no âmbito relacional, entre outros, enfatizando a complexidade neles presente. Exemplo disso é que a coabitação não é pressuposto para definir família e, nos dias atuais, pessoas que integram um mesmo núcleo podem residir em diferentes domicílios.

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aspectos importantes para se pensar as famílias – definidas por elas como unidade de

convivência – e, nesse sentido, acrescentam:

Lugar em que os dois sexos se encontram e convivem, a família é efectivamente também o espaço histórico e simbólico no qual, e a partir do qual, se desenvolve a divisão do trabalho, dos espaços, das competências, dos valores, dos destinos pessoais de homens e mulheres, ainda que isso assuma formas diversas nas várias sociedades. Antes de mais, é a nível da família que o facto de pertencer a um determinado sexo se torna um destino social, implícita ou explicitamente regulamentado e que se situa numa hierarquia de valores, poder e responsabilidade (SARRACENO; NALDINI, 2003, p. 21).

As relações de geração são vistas como “instrumentos para continuidade no tempo”,

elementos para “diferenciação das experiências, dos interesses” e para “ruptura ou

redefinição de limites” na família (SARRACENO; NALDINI, 2003, p. 21).

Deduz-se daí que as novas gerações abrem espaço para outras formas de ser e

estar na família, no que se refere à hierarquia que é estabelecida no modo organizacional da

família, em suas relações de poder e nas próprias negociações que se efetivam entre pais e

filhos e no sistema fraterno em prol da convivência, da defesa de interesses de cada um e

dos próprios valores que vão nortear o processo socioeducacional daquele grupo, incluindo-

se as mediações com o meio social do qual essa família faz parte.

A perspectiva analítica da família como construção histórico-social, assumida por

Chiara Sarraceno e Manuela Naldini, é também a base do entendimento de Maria Lúcia

Rocha-Coutinho, que, em seus argumentos, afirma:

A família deve ser entendida em sua complexidade e discrepância de interesses, necessidades e sentimentos. Deve, assim, ser apreendida não só em suas funções – econômicas, ideológicas, reprodutivas e sociais –, como também em todas as suas contradições internas. Além disso, a família está inserida no meio social que a circunda e em um tempo histórico determinado, não podendo ser entendida fora deles. Por estar carregada de ideologia da sociedade na qual se encontra, constitui importante ponto de referência para a construção de identidades sociais (ROCHA-COUTINHO, 2006, p. 97).

Nessa conceituação, fica claro o chamado da autora para se atentar aos vários

aspectos presentes nesse agrupamento humano, incluindo suas contradições internas, suas

funções, sua relação com o meio social e sua localização em um determinado tempo

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histórico. Na obra em referência, Rocha-Coutinho salienta as mudanças que se

processaram na família brasileira, havendo, no período colonial, acentuação do poder do pai

sobre os demais membros da família, em nome da defesa do grupo e da propriedade,

desconsiderando, quase sempre, desejos e necessidades individuais, o que já não se

entende mais como predominante nas famílias da atualidade, embora se admita a

coexistência dessa forma relacional com outras que se caracterizam por tenderem a ser

mais igualitárias e respeitarem as peculiaridades individuais.

Nessa direção, cabe mencionar que as mudanças socioeconômicas, o fortalecimento

do Estado e a propagação de hábitos que já estavam se consolidando fora do Brasil,

sobretudo na Europa, influenciaram na redefinição dos papéis de homens e mulheres e,

consequentemente, na redefinição da organização familiar, existindo, contudo, certas

particularidades a depender da classe social a qual se pertence. Para além das mudanças

no comportamento masculino e feminino, processou-se também o questionamento da

qualidade das relações parentais, buscando-se relações mais democráticas entre pais e

filhos ou entre as gerações mais novas e as mais velhas. Este último aspecto também

merece destaque nos estudos de Singly, autor francês que entende que a expansão da

escolarização para filhos e filhas teve um papel importante para o declínio do autoritarismo

nas relações parentais presentes na família que ele denomina de patrimonial, por estar

alicerçada no patrimônio.

Evidentemente, essas questões se expressam nas famílias de diferentes formas,

dependendo do contexto sociocultural por elas vivenciado. Nesse sentido, Sarti (2011), num

rico e detalhado estudo sobre as famílias pobres, apresenta uma importante contribuição

para entendermos o universo moral e as formas de organização e de sociabilidade dessas

famílias, as quais, muitas vezes, têm seus membros adultos alijados do mercado formal de

trabalho.

A autora defende o entendimento de que, entre os pobres, as famílias continuam

tendo como base padrões patriarcais13, nos quais a autoridade masculina é reafirmada “pelo

papel central do homem como mediação com o mundo externo, e fragilizando socialmente a

família onde não há um homem ‘provedor’, de teto, alimento e respeito” (SARTI, 2011, p.

58). A autoridade da mulher estaria associada à sua condição de dona de casa, tendo como

uma de suas importantes atribuições o controle do dinheiro recebido pelos membros da

família que trabalham. Nesse sentido, de acordo com essa pesquisadora, na família pobre, o

homem e a mulher formam um par complementar e hierárquico, estabelecendo-se entre eles

13

Grosso modo, podemos dizer que o que caracteriza a família patriarcal é uma rígida hierarquia entre o homem e a mulher e entre pais e filhos, uma definição também rigorosa de papéis masculinos e femininos e a clara delimitação de fronteiras entre espaços público e privado.

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uma divisão de autoridade: o homem é o chefe da família e a “autoridade moral, responsável

pela respeitabilidade familiar”; a mulher é chefe da casa e autoridade no que se refere à

“manutenção da unidade do grupo” e à “valorização da maternidade” (SARTI, 2011, p. 63).

Outro aspecto discutido por Sarti (2011) e que merece ser salientado é a prevalência

das obrigações morais, configurando uma solidariedade necessária à sobrevivência do

grupo e deslocando a noção de organização em núcleo para a de organização em rede:

A família pobre não se constitui como núcleo, mas como uma rede, com ramificações que envolvem a rede de parentesco como um todo, configurando uma trama de obrigações morais que enreda seus membros, num duplo sentido, ao dificultar sua individualização e, ao mesmo tempo, viabilizar sua existência como apoio e sustentação básicos (SARTI, 2011, p. 70).

A constituição da rede de suporte e proteção, cuja base é a obrigação moral, ganha

relevância nos casos em que há rompimentos no grupo doméstico (por separação e morte),

instabilidades econômicas ou nas situações em que a mãe é solteira, especialmente para

assegurar o cuidado a crianças. Assim, “as crianças passam a não ser uma

responsabilidade exclusiva da mãe ou do pai, mas de toda rede de sociabilidade em que a

família está envolvida” (SARTI, 2011, p. 77).

A partir dessas considerações, poderíamos dizer – correndo o risco de não abarcar a

pluralidade e a complexidade inerentes à temática – que as famílias se constituem como

unidades de convivência, estão em constante transformação e continuam sendo referencial

para o indivíduo, mesmo em face de suas contradições, as quais podem ensejar tanto o

acolhimento e a proteção como a vivência de confrontos e de violências. As múltiplas

configurações a partir das quais as famílias se expressam indicam sua formação com base

em vínculos de parentesco, de afinidade e de reciprocidade, sua organização em núcleo

(cuja base é o parentesco) ou em rede (a partir de um sistema de obrigações mútuas que

tem como principal finalidade a sobrevivência). Destaque-se, ainda, a importância de pensá-

las na articulação entre seus aspectos universais e singulares e de considerá-la como

sujeito político.

Compreender as famílias a partir dessa conexão entre universalidade e singularidade

talvez seja um dos maiores desafios para estudiosos e profissionais. Temos observado que

os rebatimentos que advêm do pertencimento a uma determinada classe social, das atuais

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relações de gênero e de geração e das questões étnicas14 no cotidiano das famílias tomam

contornos diferentes – que decorrem do percurso sociofamiliar por elas realizado

(migrações, inserção no mercado de trabalho, permanências e rompimentos no grupo

familiar, entre outros aspectos) e da história e dos valores morais construídos ao longo das

gerações – e demarcam as relações internas do grupo e seu intercâmbio com o meio social

em que está inserido e, em consequência, as condições e formas de exercício de suas

funções primordiais. É mister destacar que a legislação do país tem importância

considerável em relação ao assunto, uma vez que tanto pode conceber a família de modo a

abarcar suas efetivas expressões como tratá-la de forma reducionista e, principalmente,

garantir-lhe ou não o acesso a direitos sociais imprescindíveis ao cuidado, à proteção e ao

desenvolvimento de seus membros.

Após essa discussão conceitual sobre famílias, cabe apresentar como as produções

analisadas nesta pesquisa abordaram a temática. Inicialmente, constam as indicações

quantitativas das referências dos autores ao assunto nos aspectos estruturais de seus

textos; na sequência, a abordagem refere-se às categorias analíticas definidas a priori e

àquelas que emergiram de seus textos, fazendo-se apontamentos conceituais e relativos à

forma como foram tratadas nas produções analisadas.

2.1.1 Dos aspectos estruturais

Neste item, constam as informações relativas às referências que os autores fizeram,

nos aspectos estruturais de seu texto – título, resumo, palavras-chave e capítulos/itens –, ao

termo famílias ou suas derivações. Cabe lembrar que as produções aqui analisadas são

somente aquelas que versam sobre o eixo temático famílias.

14

As questões étnicas às quais nos referimos estão associadas, sobretudo, a afinidades linguísticas, culturais, religiosas e à identidade racial.

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Figura 7 – Produções do eixo temático famílias por inclusão do termo em aspectos estruturais do texto

Fonte: Pesquisa FAMÍLIAS E PRÁTICAS SOCIAIS: interlocução com produções literárias sobre a Política de Assistência Social – 2013.

A Figura 7 mostra que 74% das produções pesquisadas que versam sobre famílias

incluíram esse termo ou suas derivações no título; 91% no resumo; 61% nas palavras-

chaves; e 78% nos capítulos ou itens, o que indica que as produções exploraram

efetivamente essa temática. Essa conclusão pode ser corroborada pela figura seguinte, que

indica a incidência do termo (ou suas derivações) nos aspectos estruturais.

Figura 8 – Produções do eixo temático famílias por recorrência do termo em aspectos estruturais do texto

Fonte: Pesquisa FAMÍLIAS E PRÁTICAS SOCIAIS: interlocução com produções literárias sobre a Política de Assistência Social – 2013.

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Se a avaliação for realizada em relação à recorrência em que a temática foi situada

nos aspectos estruturais do texto, examinando as 23 produções que abordam o eixo

temático famílias, constata-se que, em 03 delas (13%), o termo família (ou suas derivações)

foi incluído em apenas um dos elementos estruturais (título, resumo, palavras-chaves ou

capítulos/itens do texto); em outras 03 produções (13%), essa inclusão se deu em dois

aspectos estruturais; em 05 delas (22%), esse termo foi inscrito em três dos quatro aspectos

estruturais aqui relacionados; e, por último, em 12 produções (52%), o referido termo

constava em todos os quatro elementos estruturais do texto. Portanto, pode-se dizer que a

maioria das produções sobre famílias analisadas estava voltada para o estudo da temática,

posto que 74% (22% em três aspectos + 52% em quatro aspectos) delas a situaram em três

ou quatro dos elementos estruturais do texto aqui examinados.

O tópico seguinte dedica-se à leitura relativa às categorias analíticas a partir das

quais o eixo temático famílias foi examinado, iniciando-se pelas categorias definidas a priori,

seguidas por aquelas que, embora menos recorrentes e com discussões mais parciais,

também emergiram nos estudos sobre famílias por nós consultados e nas produções

universo desta pesquisa.

2.1.2 Das categorias analíticas

Neste item, apresentamos as categorias analíticas a partir das quais foi realizada a

abordagem do eixo temático famílias, iniciando-se com a ilustração (Figura 9) de como elas

emergiram quantitativamente nas produções acadêmicas e nos artigos de revistas por nós

pesquisados.

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Figura 9 – Produções do eixo temático famílias por categorias analíticas definidas a priori

Fonte: Pesquisa FAMÍLIAS E PRÁTICAS SOCIAIS: interlocução com produções literárias sobre a Política de Assistência Social – 2013.

A Figura 9 indica que, das categorias analíticas definidas a priori, o maior índice,

39%, ficou com as produções que abarcaram conjuntamente as três categorias; depois, com

26%, vêm aquelas que abordaram o eixo temático famílias situando-o em classe social e

gênero; em terceiro lugar, as que, dessas categorias analíticas, fizeram referência somente

a classes sociais, 18%, seguidas pelas que trataram a temática a partir de classe social e

etnia; com 13% e 0% referiu-se a gênero e etnia conjunta ou exclusivamente. Das

produções analisadas, somente 4% fizeram a abordagem sem se referirem a nenhuma

dessas três categorias analíticas, o que pode ser indicativo de efetivamente tratar-se de

categorias fundamentais nessa temática.

Para uma melhor compreensão desse panorama, será especificada cada uma

dessas categorias analíticas na perspectiva de situá-las conceitualmente e de indicar como

emergiram nas produções que foram alvo desta pesquisa.

2.1.2.1 Classe social

A perspectiva que norteia nossas análises neste estudo leva-nos ao entendimento de

classe social subalterna, a qual se remete à maioria absoluta das produções analisadas

nesta pesquisa, como um grupo amplo de pessoas em condições de opressão econômica,

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política e social, cujo resultado se traduz em desigualdade social e em discriminações

expressas de diferentes formas, ou seja, na negação de seus direitos.

Para fundamentar esse entendimento, buscamos subsídios em estudos do militante

socialista italiano Antonio Gramsci (1891-1937), de formação marxista. A teoria gramsciana

está concatenada com uma perspectiva transformadora, cuja abordagem implica

conhecimento da realidade e sua modificação, através da filosofia da práxis ou materialismo

histórico15. O autor busca compreender os princípios sobre os quais se estrutura a formação

da sociedade classista, reivindicando cultura à classe trabalhadora subalterna16 como

instrumento de defesa contra as opressões sofridas em decorrência da ganância da classe

capitalista dominante. As classes sociais díspares evidenciam as desigualdades da

sociedade capitalista, ficando os subalternos submetidos aos dominantes.

Simionatto e Rodrigues (2012), alicerçadas na filosofia da práxis, conforme

entendimento de Antonio Gramsci, indicam que tal teoria constitui uma fonte de pesquisa

fidedigna para a renovação dos fundamentos pertinentes às práticas sociais, através da

conscientização e fortalecimento da sociedade em prol da ampliação da democracia, do

exercício da cidadania e da disputa contra-hegemônica. Nesse sentido, Del Roio (2007)

afirma que a contra-hegemonia pode ser construída pelas classes subalternas unificadas,

por meio de um projeto de caráter autônomo, na busca de uma nova ordem social.

Segundo Simionatto e Rodrigues (2012), o pensador Gramsci dedicou sua vida

refletindo sobre um projeto social que divergisse do capitalismo, uma vez que a citada

dinâmica está calcada na divisão de classes, que a alimenta. Nessa linha de abordagem,

existe uma força que mantém a interdependência das classes: os dominantes precisam da

força de trabalho dos subalternos, de sua produção, para obterem seus lucros abusivos; e

os subalternos necessitam dos dominantes para receberem um salário injusto, fruto da

exploração do trabalhador. Gentili e Frigotto (2002) entendem que a classe dominante

detém o controle do trabalho para garantir o desenvolvimento do processo produtivo e a

produtividade. Frigotto (1995, p. 11) acrescenta:

Os socialistas estão aqui para lembrar ao mundo que em primeiro lugar devem vir as pessoas e não a produção. As pessoas não podem ser sacrificadas. [...] O futuro do socialismo assenta-se no fato de que continua

15

O materialismo histórico e dialético pode ser considerado como um método de análise da sociedade aplicado à história, desenvolvido por Marx e Engels, que consideram as relações sociais inteiramente ligadas às forças produtivas, em que a produção material determina a organização política e as representações intelectuais de uma época. 16

Na obra gramsciana, as primeiras noções sobre o termo “subalterno” aparecem nos escritos pré-carcerários, empregadas para designar a submissão de uma pessoa a outras, mais especificamente no contexto da hierarquia militar (SIMIONATTO, 2009).

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tão necessário quanto antes, embora os argumentos a seu favor não sejam os mesmos em muitos aspectos. A sua defesa assenta-se no fato de que o capitalismo ainda cria contradições e problemas que não consegue resolver e que gera tanto a desigualdade (que pode ser atenuada através de reformas moderadas) como a desumanidade (que não pode ser atenuada).

A desigualdade enfrentada pelas classes subalternas é evidenciada nas produções

analisadas, as quais enfatizam a dificuldade de acesso de seus membros a direitos sociais.

Embora 22 das 23 produções que abordam a temática famílias situem os sujeitos de suas

pesquisas como pertencentes aos segmentos subalternos, a maioria delas não apresenta a

necessária conceituação e reflexão sobre classe social. As duas produções selecionadas17

para discussão dessa categoria analítica (SANTOS, 2009; SILVA, 2006) estão alinhadas à

perspectiva sócio-histórica, contudo fazem caminhos diferentes. Ambas localizaram

socialmente suas populações-alvo, mas numa a ênfase está na discussão da questão

social, ficando implícitos aspectos relativos a classes sociais, enquanto na outra se constata

uma discussão conceitual de classes sociais suficiente para explicitar o entendimento do

autor sobre o assunto, conforme é possível verificar na sequência.

Silva (2006) aponta as desigualdades sociais restritas às classes mais pobres como

fruto da questão social no Brasil e, referenciando-se em Bogus,Yazbek e Belfiore, cita que

a questão social diz respeito aos vínculos históricos, que amalgamam cada sociedade, e às tensões e contradições que levam à sua ruptura. Nesse sentido, ela é parte constitutiva dos componentes básicos da organização social – Estado, Nação, cidadania, trabalho, etnia, gênero, entre outros – considerados essenciais para a continuidade e mudança na sociedade (SILVA, 2006, p. 11).

Santos (2009) apresenta a discussão sobre classes sociais tomando como referência

Pierre Bourdieu (1930-2002), francês de formação filosófica, sociólogo por excelência, que,

preocupado desde cedo com as diferenças sociais, avançou no conceito de classes sociais

introduzido por Marx, pesquisando os fatores que “condicionam” os dominados na

manutenção da preponderância da classe dominante como “estratégia” (por vezes,

inconsciente) de sobrevivência no mundo capitalista.

Para fundamentar o entendimento sobre classe social na perspectiva de Bourdieu,

baseamo-nos também em Souza (2012). A autora entende que, para Bourdieu, essa relação

17

Os critérios estabelecidos para a seleção das produções que subsidiariam a discussão das categorias analíticas constam nas páginas 20 e 21.

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entre dominados e classe dominante é “consentida”, sentida como natural, alicerçada pela

incorporação de símbolos que fazem a sua manutenção. Assim, os sistemas simbólicos,

estruturas compostas por instrumentos de conhecimento e comunicação, veiculados pela

linguagem (fenômeno sócio-histórico), são, muitas vezes, ditados sub-repticiamente pela

classe dominante no intuito de manter o poder.

Para Souza (2012), Bourdieu ressalta que além do capital simbólico adquirido,

fundamental para o homem se situar no mundo, o capital cultural construído pela aquisição

da cultura erudita e escolar estabelece o patamar a ser por ele alcançado. O capital social

angariado, considerado pelo sociólogo, criaria condições para o homem estabelecer

relações sociais que determinam o seu pertencimento, que pode ser de dominação ou de

subserviência.

Santos (2009) faz alusão à importância da bagagem e cabedal cultural das famílias,

ressaltando a impossibilidade das camadas pobres de ascenderem socialmente, pela

insuficiência do seu capital cultural, social e econômico em comparação às classes média e

alta da sociedade. Diante disso, tornam-se evidentes a desigualdade social e a negação dos

direitos do cidadão.

Em face do exposto, entendemos que o acesso a esses direitos poderá ocorrer

quando as classes subalternas, conscientes do seu poder e das necessidades do grupo

social a que pertencem, reivindicarem, organizadamente, o estabelecimento de políticas

públicas efetivas para seu desenvolvimento social.

2.1.2.2 Gênero

Gênero como categoria de análise é algo relativamente novo. Surge no final do

século XX e sua discussão passa por distintas correntes de pensamento. Porém, neste

texto, interessa-nos abordá-lo a partir de uma perspectiva histórica e política, na qual a

ênfase recai sobre o sistema de relações sociais e de poder.

Nessa direção, fomos buscar subsídios em autores que em suas abordagens acerca

de gênero contemplam nossas reflexões sobre o assunto, entendendo que “a partir do

gênero pode-se perceber a organização concreta e simbólica da vida social e as conexões

de poder nas relações entre os sexos” (TORRÃO FILHO, 2005, p. 136). A concepção do

autor em referência tem por base a compreensão de Scott (1995) sobre gênero e pode-se, a

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partir dela, entender que as relações de poder são articuladas entre os sexos, podendo, a

partir daí, ser significadas naquele meio sociocultural.

Entre as diferentes abordagens existentes sobre gênero, adotamos a de Joan Scott,

que, ao elaborá-la, indica que, diferentemente de classes sociais, gênero e raça são

categorias analíticas para as quais a abordagem ainda não conta com a necessária clareza

e coerência. Acrescenta a autora que os historiadores em geral (até o surgimento das

feministas)

[...] reconheceram a história das mulheres e, em seguida, confinaram ou relegaram essa história a um domínio separado da história dos homens. Tendo sido assim, a história das mulheres mais ligada à família e ao sexo, separadamente da história da política e da economia (SCOTT, 1995, p. 74).

Gênero como categoria de análise é, desse modo, essencial para compreender

como funcionam as relações sociais humanas e como se dá um sentido à organização e à

percepção do conhecimento histórico. A autora faz uma crítica à forma como gênero foi

utilizado em muitas análises históricas, “incluindo as mulheres, sem nomeá-las” (SCOTT,

1995, p. 75).

A autora constrói sua conceituação a respeito de gênero em duas partes e algumas

subpartes, que, embora articuladas entre si, ela entende ser importante analisá-las

distintamente, as quais estão sinteticamente apresentadas neste tópico. O núcleo principal

de sua definição está embasado na conexão entre duas proposições: “O gênero é um

elemento constitutivo de relações sociais baseado nas diferenças percebidas entre os

sexos”, e o “gênero é uma forma primeira de significar as relações de poder” (SCOTT, 1995,

p. 86). Entende a autora que a mudança em uma dimensão (relações sociais) corresponde

sempre a uma modificação em outra dimensão (relações de poder), porém seu sentido pode

não ser o mesmo. Acrescentaríamos que o grau e o ritmo dessas mudanças também podem

ser distintos entre as duas dimensões.

Em relação ao gênero como “elemento constitutivo de relações sociais baseado nas

diferenças percebidas entre os sexos”, Scott (1995, p. 86) destaca que estão implicados

quatro elementos associados entre si. O primeiro estaria representado por “símbolos

culturalmente disponíveis que evocam representações múltiplas (e com frequências

contraditórias)”. O segundo diz respeito ao que ela denomina de “conceitos normativos que

colocam em evidência interpretações do sentido dos símbolos que tentam limitar e conter as

suas possibilidades metafóricas” (SCOTT, 1995, p. 86). Esses conceitos são expressos em

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doutrinas do âmbito religioso, educacional, jurídico, político, entre outros. O terceiro

elemento refere-se à inclusão de uma “noção do político, tanto quanto uma referência às

instituições e organizações sociais” (SCOTT, 1995, p. 87), do qual fazem parte, além do

sistema de parentesco, o mercado de trabalho, a educação e o sistema político. O quarto e

último elemento apresentado pela autora é a “identidade subjetiva” (SCOTT, 1995, p. 87).

No que se refere ao gênero como uma “forma primeira de significar as relações de

poder” ou como um “campo primário no interior do qual, ou por meio do qual, o poder é

articulado” (SCOTT, 1995, p. 87), a ênfase é dada a persistência e recorrência dessa forma

para “possibilitar a significação do poder no ocidente, nas tradições judaico-cristãs e

islâmicas” (SCOTT, 1995, p. 87).

Para compreender a relação entre história, política e gênero, a autora lança uma

série de indagações, dentre as quais destacamos: “Qual é a relação entre as leis sobre as

mulheres e o poder do Estado? Como as instituições sociais têm incorporado o gênero nos

seus pressupostos e na sua organização?” (SCOTT, 1995, p. 93). Entre as questões que a

autora também ressalta está aquela que diz respeito à invisibilidade da mulher como sujeito

histórico, uma vez que é conhecida sua participação em eventos da história da humanidade.

Por fim, argumenta:

A exploração dessas perguntas fará emergir uma história que oferecerá novas perspectivas a velhas questões. [...] Além do mais, essa nova história abrirá possibilidades para a reflexão sobre as estratégias políticas feministas atuais e o futuro (utópico), porque ela sugere que o gênero tem que ser redefinido e reestruturado em conjunção com a visão de igualdade política e social que inclui não só o sexo, mas também a classe e a raça (SCOTT, 1995, p. 93).

Para encerrar essa síntese sobre a concepção de Scott (1995) acerca de gênero,

ressaltamos sua noção de que gênero e poder se constroem reciprocamente, podendo um

servir para justificar ou provocar o outro. Salienta a autora que a categoria gênero é, ainda,

um meio de decodificar o sentido e de compreender as relações complexas entre diversas

formas de interação humana, deixando, claro, contudo, que uma perspectiva social e política

fundada na igualdade está ancorada no tripé classe social, gênero e raça18.

18

Para refletir sobre questões de gênero, indicamos também o texto de Freitas (2002), no qual ela discute a dimensão de luta da mulher, na condição de mãe. Ilustrando com situações emblemáticas de violências praticadas pela sociedade ou pelo Estado brasileiros, a autora diz: “[...] Uma luta contra a impunidade e a violência, pela justiça e por um mundo melhor, mais solidário. São tais ideias que essas mães vem encarnando [...]” (FREITAS, 2002, p. 92).

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No conjunto das obras analisadas nesta pesquisa, 15 abordam a categoria gênero.

As publicações nas quais essa categoria está mais presente são os artigos de revistas (11

artigos) e, dentre estes, destacamos nesta análise aqueles que articulam gênero e práticas

sociais e/ou políticas sociais.

Entre as dissertações de mestrado e teses de doutorado que foram objeto de

investigação desta pesquisa, as quais estão associadas a famílias e/ou práticas sociais, a

categoria gênero aparece com menos frequência (seis dissertações de mestrado e uma tese

de doutorado). Nenhuma delas discute gênero como categoria central, mas assume como

uma das categorias importantes para análise de suas temáticas.

Nesse sentido, Santos (2009), por exemplo, questiona quais políticas o Estado tem

sido capaz de lançar visando à participação da família na vida escolar dos filhos. Para tanto,

refere-se às mudanças da família contemporânea e situa a entrada da mulher no mercado

de trabalho, assim como sua participação ativa no cenário político. Avança em sua

discussão indicando que a escola vem sendo local de reprodução de desigualdades sociais,

sobretudo quando se trata de unidades destinadas às famílias de camadas populares.

Ainda, cita Singly (2007), para referir-se ao “pluralismo familiar como resultado de uma

profunda transformação das relações de gênero e da emergência de um novo equilíbrio

entre autonomia individual e pertencimento familiar” (SINGLY, 2007 apud SANTOS, 2009, p.

83).

O autor ressalta que na amostra por ele estudada há majoritária participação das

mães na vida escolar dos filhos, em comparação à participação dos pais, mesmo sendo a

amostragem composta em sua maioria por famílias nas quais há a presença do casal (pai e

mãe) e não por famílias monoparentais, por exemplo. Em sua análise, sugere que essa

presença maior de mães poderia ser atribuída à cultura e aos costumes do pensamento

ocidental burguês, com sua tradicional divisão de papéis.

Nas produções acadêmicas (dissertações e teses) que fazem parte desta pesquisa,

a abordagem de gênero se dá predominantemente de forma descritiva, em geral apontando

a constatação do real incremento da participação da mulher no mercado de trabalho aliado

ao papel de chefe da família, em especial pela constituição de famílias monoparentais nas

camadas sociais mais empobrecidas. Outros aspectos presentes nas produções analisadas

referem-se à vulnerabilidade a que ficam expostos os membros dessas famílias

(principalmente filhos, idosos, doentes) e à sobrecarga das mulheres chefes de famílias, ao

assumirem tanto os papéis de proteção afetiva como os de sustento material da família.

Em relação aos artigos de revistas, percebeu-se certa tendência de aproximarem-se

um pouco mais de uma discussão conceitual, com base, principalmente, numa visão que

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articula questões de gênero e questões sociais mais amplas, indicando seus

desdobramentos nas políticas de proteção social.

Nessa direção, Teixeira (2010) aponta, por exemplo, a sobrecarga às famílias, em

especial às mulheres, quando o Estado impõe condicionalidades de acesso a benefícios

sociais, na expectativa de que determinados papéis sejam exercidos pelos membros da

família. Em suas palavras:

[...] O benefício é destinado à família, mas condicionado às obrigações desta com os filhos no tocante à escola e à saúde, e deve ser entregue, preferencialmente, às mulheres, ficando explícita a preocupação governamental em minorar a pobreza, mas também de reforçar as responsabilidades familiares, particularmente das mulheres (TEIXEIRA, 2010, p. 77).

Contudo, para a referida autora, as políticas educacionais, especialmente as de pré-

escola até o ensino médio, poderiam, se oferecidas de forma suficiente – o que não ocorre

no Brasil –, diminuir “o tempo dedicado aos cuidados familiares” e “compatibilizar

responsabilidades familiares e inserção produtiva das mulheres” (TEIXEIRA, 2010, p. 77).

Campos e Teixeira (2010, p. 20) propõem-se a discutir os “fatores que constroem

desigualdades sociais na estruturação e no desenvolvimento da sociedade bras ileira atual”,

destacando, dentre outros, processos que se desenvolvem nesse sentido e que dizem

respeito às relações de gênero. Assim, entende:

Na perspectiva analítica introduzida pelo reconhecimento da categoria gênero, a construção da masculinidade e da feminilidade é considerada um produto histórico, variável no tempo e no espaço. Para além da diferença biológica e sexual entre homens e mulheres, as sociedades elaboram de maneira diferenciada, social, econômica e culturalmente determinada, um conjunto de normas, valores, costumes e práticas que definem modos de ser, atitudes e comportamentos próprios a homens e mulheres. Esta construção prescreve as próprias relações entre ambos, frequentemente caracterizadas por assimetria na distribuição de poderes (CAMPOS; TEIXEIRA, 2010, p. 21).

Na continuidade da sua análise, as autoras apontam as relações de poder que

hierarquizam homens e mulheres na sociedade e questões concernentes a políticas de

proteção social, salientando a falta de aprofundamento do debate sobre a “participação da

família e da mulher nos sistemas de proteção social” (CAMPOS; TEIXEIRA, 2010, p. 22).

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Ressaltam a significativa dedicação das mulheres ao trabalho não remunerado como meio

de prover bem-estar aos membros da família. Nesse sentido, em decorrência de reduzidos

gastos do setor público nesse campo, o que resulta em insuficiente cobertura no que se

refere à seguridade social,

[...] a família usa seus recursos internos, suas hierarquias e relações assimétricas de gênero e geração, inclusive as reproduzindo e perpetuando, para suprimir suas necessidades de sobrevivência, como também para o seu bem-estar, com serviços e cuidados, tarefas distribuídas conforme as diferenças de gênero (CAMPOS; TEIXEIRA, 2010, p. 24-25).

As autoras apresentam em suas conclusões o entendimento de que as políticas

sociais adotadas na América Latina reproduzem “as desigualdades criadas entre os

gêneros”, o que estaria conectado com “as condições oferecidas pelo mercado de trabalho e

com a estrutura familiar predominante” (CAMPOS; TEIXEIRA, 2010, p. 26).

De modo geral, os artigos e trabalhos acadêmicos estudados são concordantes na

compreensão de que, no Brasil, os programas de transferência de renda e as medidas

protetivas acabam por responsabilizar as famílias, em especial as mulheres, pelo bem-estar

de seus membros. Percebeu-se também a tendência de compartilharem com o

entendimento de que esse aspecto poderia ser redefinido com um avanço no campo da

proteção social, que seria promovido caso o Estado assumisse, de forma efetiva, sua

responsabilidade no que se refere à proteção social, o que poderia resultar na liberação da

mulher para uma participação em melhores condições no mercado de trabalho, por

exemplo. Contudo, parte considerável das produções analisadas deixou de aprofundar a

discussão sobre essa relação entre gênero e políticas sociais.

Assim, com base na pesquisa realizada e em nosso conhecimento empírico, pode-se

dizer que quando as políticas sociais elegem a mulher como responsável pelo

equacionamento de certas demandas emergentes da articulação entre famílias e serviços

públicos, essas políticas estão interpretando que a mulher permanece no tradicional papel

de cuidado e de educação dos membros da família, desconsiderando sua efetiva

participação no mercado de trabalho. Nessa direção, podemos fazer referência ao cuidado

de crianças em idade pré-escolar e de idosos, que, pela insuficiente presença do Estado,

fica a cargo da família, principalmente da mulher.

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2.1.2.3 Etnia

Adotar etnia como uma das categorias importantes para se pensar famílias significa

assumir o entendimento de que para se conhecer em profundidade esse agrupamento

humano referencial para o indivíduo é necessário apreender suas questões universais e

singulares, articuladamente. Concebe-se assim que, associada à classe social e gênero,

essa categoria analítica favorece uma maior compreensão das tramas das relações

humanas e sociais, em especial da imbricação entre questões macrossociais e aquelas

relativas à cultura, à raça, à religião e às formas como se expressam na vida cotidiana de

indivíduos e famílias.

Para o entendimento de etnia, buscamos subsídios em alguns autores e vimos que

parte deles tende a discuti-la como identidade cultural enquanto outros a abordam na

interseção com raça. Entre os primeiros, destacamos Lúcio Kreutz, que, embasado em

Stuart Hall, afirma:

Quanto à etnia, Stuart Hall define-a “pelas características culturais – língua, religião, costumes, tradição, sentimento de ‘lugar’ – que são partilhadas por um povo” (1997, p. 67). Alerta, porém, que a identidade étnica vai se reconstruindo e reconfigurando ao longo do processo histórico. Não se pode entendê-la como algo dado, definido plenamente desde o início da história de um povo. Por isso, para Hall, o fato de projetarmos a “nós próprios”, nas identidades culturais, enquanto internalizamos seus significados e valores, tornando-os “parte de nós”, contribui para vincular nossos sentimentos subjetivos aos lugares objetivos que ocupamos no mundo social e cultural. Entende que identidade costura o sujeito à estrutura (KREUTZ, 1999, p. 82).

A noção da categoria analítica etnia como transversal às dinâmicas e às práticas

sociais e o entendimento de que as identidades étnicas são construídas historicamente e

não biologicamente apontam para a importância das relações de poder entre os diferentes

grupos sociais e culturais, conforme defende o referido autor: “A Etnia é uma categoria que

nos ajuda a perceber o quanto a dimensão cultural concorre na concreção do processo

histórico, entendendo étnico como processo que se constrói nas práticas sociais, no jogo de

poder e na correlação de forças” (KREUTZ, 1999, p. 82).

Como referido anteriormente, outros autores trabalham com a associação etnia/raça

e para alguns desses autores contemporâneos os conceitos de etnia/raça têm servido, ao

longo da história, para justificar construções que embasaram diferenças e privilégios sociais.

O significado da palavra etnia como “grupo homogêneo cultural e biologicamente” é

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contestado. Na discussão de etnia, no que se refere especificamente à raça, há atualmente

alguma controvérsia: para uns, se não existem diferenças biológicas entre as raças, não se

deve, então, falar de “raças”. Contudo, para Guiraldelli e Engler (2008), situando esse

conceito na dinâmica das relações sociais, sua discussão ainda faz sentido, tanto por

questões morais quanto pelas desigualdades sociais existentes entre as raças.

Fundamentando-se em Telles (2003)19, os autores afirmam:

A categoria raça não é dotada de fundamentação científica e as concepções populares são permeadas de ambiguidades e, sendo assim, no Brasil e no restante do mundo, o critério de autoidentificação é considerado o mais aceito, não sendo tido como discriminatório, diante da diversidade humana, onde cada indivíduo se reconhece como membro de uma respectiva cultura, com uma identidade e uma trajetória de vida (GUIRALDELLI; ENGLER, 2008, p. 259).

Para os autores, as ciências sociais não poderiam dispensar essa categoria de

análise, a não ser nas condições apontadas por Guimarães (2002)20:

[...] quando não houver identidades raciais, ou seja, quando já não existirem grupos sociais que se identifiquem a partir de marcadores direta ou indiretamente derivados da ideia de raça; segundo, quando as desigualdades, as discriminações e as hierarquias sociais efetivamente não corresponderem a esses marcadores; terceiro, quando tais identidades e discriminações forem prescindíveis em termos tecnológicos, sociais e políticos, para a afirmação social dos grupos oprimidos (GUIMARÃES, 2002 apud GUIRALDELLI; ENGLER, 2008, p. 259).

A inclusão da categoria de análise etnia traz ângulos de compreensão da realidade

que uma categoria como classe social não pode oferecer. Nesse sentido, entendemos que,

no tangente a famílias e práticas sociais, pode constituir-se em contributo importante para se

pensar essas temáticas com a devida articulação entre seus aspectos universais e

singulares. Nessa perspectiva, compartilhamos com as ideias de Guimarães (2002)21:

19

TELLES, E. Racismo à Brasileira. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2003. 20

GUIMARÃES, A. S. A. Classes, raças e democracia. 34. ed. São Paulo: Fundação de Apoio à Universidade de São Paulo, 2002. 21

GUIMARÃES, A. S. A. Classes, raças e democracia. 34. ed. São Paulo: Fundação de Apoio à Universidade de São Paulo, 2002.

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Quando os conceitos de “raça” e “gênero” são aplicados aos estudos sobre desigualdades socioeconômicas ou pobreza eles têm o efeito virtuoso de revelar aspectos que o conceito de “classe” não poderia explicitar. Eles desvelam certas particularidades na construção social da pobreza que eram antes ignoradas (GUIMARÃES, 2002, apud GUIRALDELLI; ENGLER, 2008, p. 250).

Desse modo, ficam explícitas a transversalidade da categoria analítica etnia à

dinâmica da vida social, sua construção histórica e as questões de poder presentes nas

relações entre os grupos sociais, bem como a possibilidade de, por meio dela, capturar

especificidades não apreensíveis, caso fossem tomadas como referência somente as

questões relativas à classe social.

Na amostra das produções analisadas, etnia, como categoria de análise, é discutida

sob um dos prismas que aqui adotamos, em artigo que apresenta um estudo sobre as

dimensões do Benefício de Prestação Continuada (BPC).

O artigo aborda a “questão da negritude e feminização da pobreza brasileira,

expressas nas diferenças salariais, educacionais e de consumo entre negros e brancos e

entre homens e mulheres” (GÓIS et al., 2008). Os signatários do artigo em referência citam

estudos de diversos autores, dentre eles Telles (2003)22, afirmando que os achados da

pesquisa realizada com beneficiários do BPC confirmam os estudos daqueles autores no

que concerne à predominante negritude da pobreza brasileira.

Refere-se ainda o artigo à significativa diferença entre os beneficiários em função de

cor/raça. Entre outros apontamentos e exemplos, os autores registram que, enquanto 55%

do total de brancos moram em imóvel próprio, somente 30,1% dos pardos e 13,7% de

pretos têm a mesma condição. Em relação à população brasileira como um todo, o texto

destaca, com base em Ricardo Henriques (2001)23: “[...] Os negros em 1999 representavam

45% da população brasileira, mas correspondiam a 64% da população pobre e 69% da

população indigente. Os brancos, por sua vez, são 54% da população total, mas somente

36% dos pobres e 31% dos indigentes” (HENRIQUES, 2001 apud GÓIS et al., 2008, p. 72).

O censo de 2010 indica que a soma da população residente no Brasil de cor parda e preta

resulta em um percentual de 50,7% da população brasileira. Do total de pardos e negros

(96.600.169 pessoas), 74% vivem sem rendimentos ou com até um salário mínimo de

renda24.

22

TELLES, E. Racismo à Brasileira. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2003. 23

HENRIQUES, Ricardo. Desigualdade racial no Brasil: evolução das condições de vida na década de 90. Textos para discussão. Brasília: IPEA, 2001. 24

Disponível em: <ftp://ftp.ibge.gov.br/Censos/CensoDemografico_2010/Caracteristicas_Gerais_ Religiao_Deficiencia/caracteristicas_religiao_deficiencia.pdf>. Acesso em: 13 dez. 2013.

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Ainda entre as produções analisadas, concordando com os conceitos referidos no

início desta análise, em especial com o de Kreutz (1999), a dissertação de mestrado de

Santos (2009) cita Pierre Bourdieu25, com vistas a fundamentar a sociologia das

desigualdades sociais e culturais:

[...] São princípios geradores de práticas distintivas o que o indivíduo come, e sobretudo sua maneira de comer, o esporte que pratica e sua maneira de praticá-lo, suas opiniões políticas e sua maneira de expressá-las diferem sistematicamente do consumo de atividades correspondentes de outros indivíduos; sendo, portanto, esquemas classificatórios, princípios de classificação, princípios de visão e de divisão e gostos diferentes. Eles estabelecem o que é bom e mau, entre o bem e o mal, entre o que é distinto e o que é vulgar, mas elas não são as mesmas. Assim, o mesmo comportamento ou o mesmo bem pode parecer distinto para um, pretensioso ou ostentatório para outro e vulgar para um terceiro (BOURDIEU, 1996 apud SANTOS, 2009, p. 89).

A mesma produção trata da importância de observar o “capital econômico, social e

cultural” das famílias estudadas, entendendo que o “capital cultural” seria representado por

uma dimensão simbólica que resulta da disputa entre os diferentes grupos sociais para

ocupar uma melhor posição na estrutura social por meio da legitimação e dominação de

determinadas práticas sociais e culturais. Nesse estudo, Santos (2009, p. 75) aponta que

políticas na área da educação foram formuladas e implementadas unilateralmente,

considerando, por exemplo, que “as famílias das camadas populares possuem a mesma

bagagem e cabedal cultural daquelas que compõem as classes médias e alta da sociedade

contemporânea”.

Santos (2009, p. 84) destaca ainda que “a escola passa a ser percebida como uma

instituição a serviço da reprodução e afirmação da dominação e controle das elites,

transmitindo uma cultura socialmente reconhecida como autêntica e caracterizada por

Bourdieu (2004)26, por meio da seguinte síntese”:

Enquanto instrumentos estruturados e estruturantes de comunicação e de conhecimento que os sistemas simbólicos (língua, arte, ciência, religião, cultura etc.) cumprem a sua função política de instrumentos de imposição e de legitimação da dominação, que contribuem para assegurar a dominação de uma classe sobre a outra (violência simbólica) dando o reforço de sua própria força às relações de força que as fundamentam e contribuindo,

25

BOURDIEU, Pierre. Razões práticas: sobre a teoria da ação. Campinas: Papirus, 1996. 26

BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. 7. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004.

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assim, para a “domesticação dos dominados” (BOURDIEU, 2004 apud SANTOS, 2009, p. 85).

Em face do exposto, pode-se dizer que do mesmo modo que historicamente o poder

colonialista buscou implantar a homogeneização dos padrões culturais à semelhança dos

colonizadores e que vários campos do conhecimento, entre eles a filosofia, a política e a

ciência, expressaram e registraram conceitos que revelam suas dificuldades em lidar com as

diferenças étnicas, os grupos oprimidos, especialmente os pobres e negros, vêm sendo

tratados na literatura e nas práticas sociais de forma homogeneizada.

Uma porcentagem mínima das produções analisadas toma a categoria de análise

etnia em consideração. Quando a abordam, na maioria das vezes, levam em conta a

perspectiva da negritude e de sua relação com a pobreza, tendendo a certa

homogeneidade, sem adentrar suas características identitárias.

Entendemos como necessários estudos que incluam a categoria etnia em suas

investigações e análises, visando que as políticas sociais em geral, e não somente a de

assistência social, e as práticas sociais estejam atentas às particularidades dos diferentes

públicos a que se destinam. Indivíduos e famílias pertencentes a uma mesma classe social

e a um mesmo território não têm, necessariamente, as mesmas demandas e

potencialidades.

À semelhança da proposta de Giroux27 (apud KREUTZ, 1999, p. 93) para as escolas,

as práticas sociais poderiam auxiliar os grupos populacionais aos quais estão destinadas

suas ações a “alargar a compreensão de si mesmos”, contribuindo para que as

comunidades examinem “criticamente sua própria localização histórica em meio às relações

de poder, privilégios e subordinação”.

Para finalizar a discussão sobre etnia, nosso entendimento é o de que propiciar

condições para que a população perceba as “especificidades étnico-culturais próprias,

distinguindo e reconhecendo as especificidades de outros grupos étnicos, incentivando-os a

um diálogo intercultural” (KREUTZ, 1999, p. 93), pode se constituir em fator de

transformação social e, associadas à garantia de outros direitos sociais, contribuir para a

redução das desigualdades sociais.

Conforme mencionado anteriormente, consideramos importante incluir outras duas

categorias para análise da temática família: a primeira denominamos de Articulação entre

trabalho remunerado e trabalho familiar e a segunda, de Percurso sociofamiliar.

27

GIROUX, H. A. Praticando estudos culturais nas faculdades de educação. In: SILVA, T. T. (Org.). Alienígenas na sala de aula: uma introdução aos estudos culturais em educação. Petrópolis: Vozes, 1995. p. 85-103.

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2.1.2.4 Articulação entre esferas privada e pública para o exercício das responsabilidades

familiares

Para discutir a articulação entre esferas privada e pública para o exercício das

responsabilidades familiares28 é importante considerar os muitos aspectos que nela então

presentes, os quais incluem tanto questões estruturais referentes à esfera pública,

notadamente as relações de trabalho e as políticas de proteção social, quanto aquelas que

emergem das formas de organização das famílias, que estão associadas principalmente às

relações de gênero e de geração e à qualidade de mediações entre família e mundo social.

Nessa articulação entre as duas esferas no que se refere às responsabilidades familiares,

encontram-se presentes dimensões de igualdade, justiça, equidade ou dominação, estando

a preponderância de uma ou de outra associada tanto ao acesso a direitos individuais e

sociais, no interior das relações sociais, quanto à forma como estão compostas as relações

intrafamiliares.

Merece ser ressaltado que o debate dessa categoria analítica está presente em

produções de autores do Brasil e de outros países, mas não necessariamente com essa

nomenclatura. Para essa discussão, destacamos pesquisas e estudos liderados por Maria

Cristina A. Bruschini e por Chiara Sarraceno, além da Convenção 15629 da Organização

Internacional do Trabalho, que trata da Igualdade de Oportunidades e de Tratamento para

Trabalhadores e Trabalhadoras com Responsabilidades Familiares. O que está sendo

discutido aqui abrange o que Sarraceno e Naldini (2003) denominam de trabalho familiar e o

que Bruschini e Ricoldi (2009, 2012) chamam de trabalho doméstico e também

responsabilidades familiares, de acordo com o constante na Convenção 156 da OIT.

Para avançar nessa discussão, vamos, inicialmente, nos subsidiar em Serraceno e

Naldini (2003, p. 277), pesquisadoras europeias que definem o trabalho familiar como sendo

[...] todos os trabalhos necessários hoje em dia à reprodução e criação cotidiana da família e dos indivíduos que a compõem: desde o trabalho doméstico em sentido estrito, ao trabalho de cuidados a familiares não autossuficientes por razões de idade ou invalidez, ao trabalho de consumo, que não compreende apenas a compra e eventual transformação de bens, mas também o trabalho necessário para utilizar adequadamente os serviços públicos e privados que hoje constituem uma parte importante dos recursos familiares, até o chamado trabalho de relação. Este último refere-se à

28

Inicialmente, estávamos denominando de “articulação entre trabalho familiar e trabalho

remunerado”, mas consideramos que, neste contexto, é mais apropriado denominar “articulação entre esferas privada e pública para o exercício das responsabilidades familiares”. 29

A Convenção OIT 156 entrou em vigor em 11 de agosto de 1983.

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atividade de criação e manutenção das relações, de comunicação dentro da família, entre esta e a rede parental, bem como entre a família e cada um dos seus membros e o sistema de serviços.

Na abordagem da articulação entre trabalho familiar e trabalho remunerado, as

referidas autoras adentram questões relativas à família como espaço no qual pode se dar a

definição da oferta de trabalho e também de consumo de bens e serviços, sendo, portanto,

nesse caso, espaço de criação e de procura de trabalho. Incluem também nesse enfoque a

avaliação do trabalho doméstico-familiar, tanto no que diz respeito a sua composição no

grupo e a seu valor econômico quanto no tocante a suas implicações no que elas

denominam de “sistema global família-trabalho”,30 além das “interferências em termos

organizativos31, entre tempos de trabalho remunerado, tempos de trabalho familiar e

organização da família” (SARRACENO; NALDINI, 2003, p. 262).

Entre os autores que consideramos referenciais na abordagem de questões relativas

à articulação entre família e trabalho estão Bruschini e colaboradores, cujas pesquisas

foram realizadas no Brasil. Em artigo de 2009, que tem base em pesquisa com

trabalhadoras brasileiras integrantes de famílias nucleares ou monoparentais chefiadas por

mulheres, com filhos até 14 anos, Bruschini e Ricoldi (2009) apresentam subsídios para a

reflexão sobre as políticas de apoio a trabalhadoras urbanas de baixa renda, que trabalham

fora de casa e têm responsabilidades familiares, salientando serem elas as responsáveis

pelos cuidados com a casa e com a família.

Salientam a importância de os estudos e pesquisas sobre a vida familiar se

reportarem ao trabalho doméstico, destacando:

[...] Esse conjunto de atividades aparentemente óbvias e sem muita importância e sempre identificadas como atributo essencial das mulheres, só nas últimas décadas começou a ser percebido como indispensável para o bem-estar dos indivíduos que fazem parte da família. Não são poucos os estudos que têm mostrado a universalidade e a persistência de uma divisão sexual do trabalho, que atribui aos homens principalmente as atividades de caráter produtivo, geradoras de renda e desenvolvidas no espaço público, e às mulheres as tarefas reprodutivas, por elas entendendo-se tanto os cuidados com o bem-estar físico e emocional dos membros da família – incluindo alimentação, limpeza, vestuário, higiene pessoal e saúde física e

30

Sarraceno e Naldini (2003, p. 284) conceituam o sistema família-trabalho como sendo “a interdependência entre organização e exigência de tempo do trabalho remunerado e exigências de tempo do trabalho familiar”. 31

No que se refere às interferências em termos organizativos, o entendimento de Sarraceno e Naldini (2003, p. 284) é o de que, para os homens, “o tempo de trabalho remunerado constitui uma interferência no tempo de trabalho (mas também de relação) familiar”; enquanto para as mulheres, “o tempo de trabalho familiar constitui uma interferência no tempo de trabalho remunerado, além do tempo para si”.

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mental – quanto aos cuidados com a própria moradia e com a criação e educação dos filhos (BRUSCHINI; RICOLDI, 2009, p. 96).

O artigo em pauta aborda, entre outros aspectos, a divisão sexual e etária do

trabalho doméstico, tendo as trabalhadoras, quando da pesquisa qualitativa realizada,

referido-se à pequena participação dos cônjuges e ex-cônjuges nos afazeres domésticos, o

que, segundo as autoras, está em conformidade com informações quantitativas32 que

indicam que 90% das mulheres e 45% dos homens participam desses afazeres. Contudo,

em face de mudanças societárias, a participação masculina no espaço doméstico, de

alguma forma, está se fazendo presente:

[...] Aparentemente, as mudanças demográficas e sociais (famílias menores, aumento das famílias chefiadas por mulheres, ingresso das mulheres no mercado de trabalho etc.) acabam por impulsionar alguma mudança em direção a uma distribuição mais simétrica da divisão sexual do trabalho doméstico, mais acentuada em relação aos companheiros, do que aos filhos/as (BRUSCHINI; RICOLDI, 2009, p. 105).

O tempo gasto com os afazeres domésticos tem diferença significativa entre

mulheres e homens, bem como as trajetórias profissionais. Nesse último aspecto, a

constatação dessas autoras, com base em pesquisa realizada com mulheres, é a de que as

trajetórias profissionais femininas são influenciadas pelas necessidades familiares,

sobretudo no que se refere ao cuidado com crianças, o que nos parece compatível com as

observações de Sarraceno e Naldini (2003, p. 262) quanto às interferências entre tempos de

trabalho remunerado, tempos de trabalho familiar e organização da família.

Como estratégias de conciliação entre trabalho e família emergem principalmente as

creches e as escolas de educação infantil, embora estejam longe de atender as demandas

de todas as famílias, especialmente daquelas cujas mães são trabalhadoras. Outras,

mesmo que precárias, também são acionadas, como a presença da criança no local de

trabalho da mãe e o cuidado por vizinhas. Políticas sociais, de responsabilidade do Estado,

que concorram para a participação de crianças e adolescentes em atividades de esportes e

lazer e em educação no contraturno escolar e para o uso de transporte que conduza os

alunos da residência até a escola e/ou aos espaços onde realizam essas outras atividades,

bem como flexibilidade dos empregadores para favorecer a participação das mães em

32

Bruschini e Ricoldi (2009), para fazerem essa afirmação, apoiam-se na publicação: FIBGE. IBGE divulga indicadores sobre a mulher. Comunicação Social, 7 mar. 2002. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br>, por elas acessada em 26 mar. 2006.

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reuniões escolares dos filhos, são apontadas também no texto de Bruschini e Ricoldi (2009,

p. 121), que o concluem afirmando:

[...] Assim, as políticas públicas de conciliação entre trabalho e família devem levar em consideração não só facilidades familiares que possibilitem às mulheres as mesmas oportunidades de trabalho existentes aos homens, mas também mecanismos de responsabilização masculina nessas tarefas [...].

Para a discussão dessa categoria analítica “articulação entre esferas privada e

pública para o exercício das responsabilidades familiares”, outra referência que se faz

importante é a Convenção 156 da Organização Internacional do Trabalho (OIT –

Recomendação 165). Esse documento, que dispõe sobre a “Igualdade de Oportunidades e

de Tratamento para Trabalhadores e Trabalhadoras com Responsabilidades Familiares” e

foi adotado pela OIT em 1981, ainda está pendente de ratificação no Brasil33. O

entendimento dos movimentos de mulheres e feministas, que defendem a ratificação dessa

Convenção 156, é o de que ela é um instrumento para estimular a sociedade a pensar o

papel de homens e mulheres, especialmente no que concerne à composição entre as

responsabilidades familiares e o trabalho remunerado.

Ao adotar a Convenção 156, em sua Convenção Geral realizada em Genebra no ano

de 1981, a OIT registra seu reconhecimento de que as questões de trabalhadores e

trabalhadoras com responsabilidades familiares extrapolam o âmbito familiar, dizem respeito

à sociedade e devem ser consideradas nas políticas nacionais. Nessa direção, reconhece

também a necessidade de “se estabelecer uma efetiva igualdade de oportunidades e

tratamento entre trabalhadores e trabalhadoras com responsabilidades familiares e entre

estes e os demais trabalhadores”, definindo em seu primeiro artigo:

33

Informação constante em sites oficiais, entre os quais o da Organização Internacional do Trabalho – promovendo o trabalho decente (escritório no Brasil), que apresenta a relação das convenções não ratificadas pelo Brasil. Disponível em: <http://www.oit.org.br/content/convention_no>, consultado em 25 de setembro de 2013. Pudemos verificar em nossas pesquisas que a conciliação entre trabalho e responsabilidades familiares tem sido objeto de discussão, desde 2005, na Comissão Tripartite de Igualdade de Oportunidades e de Tratamento de Gênero e Raça no Trabalho (CTIO), presidida pelo Ministério do Trabalho e Emprego e composta por representantes do governo, trabalhadores e empregadores. A discussão sobre a ratificação da Convenção 156 já passou pela Comissão Tripartite de Relações Internacionais (CTRI), que recomendou seu encaminhamento ao Ministério das Relações Exteriores, que a enviou à Casa Civil para submissão ao Congresso Nacional (informações disponíveis em <http://www.ilo.org/public/portugue/region/eurpro/lisbon/pdf/nota_1.pdf>, consultado em 25 de setembro de 2013).

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1. A presente Convenção aplica-se a homens e mulheres com responsabilidades com relação a seus filhos e filhas dependentes, quando estas responsabilidades restringem a possibilidade de se prepararem para uma atividade econômica e nela ingressar, participar ou progredir. 2. As disposições desta Convenção aplicar-se-ão também a homens e mulheres com responsabilidades com relação a outros membros de sua família direta com necessidade de seus cuidados e sustento, quando essas responsabilidades restringirem a possibilidade de se prepararem para uma atividade econômica e de nela ingressar, participar ou progredir (ARTIGO 1º DA CONVENÇÃO 156, DA OIT).

Na referida Convenção também está estabelecido o papel do Estado e da sociedade

na promoção de meios de compartilhamento com a família das responsabilidades com os

membros que necessitam de cuidados e sustentos, conforme se pode verificar no quinto

artigo:

Deve se adotar, ainda, todas as medidas compatíveis com as condições e possibilidades nacionais para: a) ter em conta as necessidades de trabalhadores e trabalhadoras com responsabilidades familiares no planejamento das comunidades locais ou regionais; b) desenvolver ou promover serviços comunitários, públicos ou privados, tais como serviços e equipamentos de assistência à infância e à família.

Desse compartilhamento de responsabilidades entre esfera privada (família) e esfera

pública (Estado e sociedade), além da disponibilização de serviços de suporte para o

cuidado e proteção de pessoas que deles necessitem, outro fator de suma importância

corresponde aos direitos assegurados legalmente e que dizem respeito à licença

maternidade, à licença parental e à licença para cuidado de filhos e filhas ou de outro

familiar em situação de enfermidade. Nessa direção, está estabelecido na Recomendação

165 da OIT, adotada em 23 de junho de 1981, no item IV, que trata das Condições de

Trabalho, o seguinte:

Devem ser adotadas todas as medidas compatíveis com as condições e possibilidades nacionais e com os interesses legítimos dos demais trabalhadores para que as condições de trabalho e emprego sejam tais que permitam aos trabalhadores e trabalhadoras com responsabilidades familiares conciliar suas responsabilidades profissionais e familiares (RECOMENDAÇÃO 165 – OIT, ITEM IV, SUBITEM 17).

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Além de uma série de medidas que dizem respeito às condições de realização do

trabalho, inclusive tempo de duração dos turnos de trabalho, está recomendada a licença

parental, que pode ser concedida tanto ao pai quanto à mãe, conforme se verifica na

sequência:

1) Durante um período imediatamente posterior à licença maternidade, a mãe ou pai devem ter a possibilidade de obter uma licença (licença parental) sem perder seu emprego e conservando os direitos que dele derivam. 2) A duração do período posterior à licença maternidade e a duração e as condições da licença a que faz referência o subparágrafo 1) devem ser determinadas em cada país através dos meios previstos no parágrafo 3 desta Recomendação

34.

3) A licença a que se faz referência no subparágrafo 1) deve ser introduzida de forma gradual (RECOMENDAÇÃO 165 – OIT, ITEM IV, SUBITEM 22).

São igualmente recomendadas licenças para o cuidado de membros com

enfermidades:

1) Um trabalhador – homem ou mulher – com responsabilidades familiares relativas a filhos ou filhas dependentes deve ter a possibilidade de obter uma licença em caso de enfermidade do filho ou filha. 2) Um trabalhador – homem ou mulher – com responsabilidades familiares devem ter a possibilidade de obter uma licença em caso de enfermidade de outro membro de sua família direta que necessite seu cuidado ou sustento. 3) A duração e as condições da licença a que se faz referência nos subparágrafos 1) e 2) anteriores devem ser determinadas em cada país por um dos meios previstos no parágrafo 3 desta Recomendação (RECOMENDAÇÃO 165 – OIT, ITEM IV, SUBITEM 23).

Considerando que os deslocamentos entre a casa e a unidade de trabalho, as

condições de moradia e o trabalho doméstico são fatores que impactam as condições para a

conciliação entre o trabalho familiar e o trabalho remunerado, o item VII da Recomendação

165, relativo à “Ajuda no Desempenho de Responsabilidades Familiares”, também abrangeu

esses aspectos:

34

O item 3 da Recomendação 165 da OIT diz: “Para fins desta Recomendação, os termos filho e filha dependente e outro membro da família direta com necessidade de cuidado e sustento são as pessoas definidas como tais, em cada país, por um dos meios referidos no parágrafo 3”. O parágrafo 3 refere-se a leis, regulamentos, contratos coletivos e outros que tratem de tais questões.

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54

Dado que muitas das medidas destinadas a melhorar as condições dos trabalhadores em geral podem repercutir favoravelmente na situação dos trabalhadores e trabalhadoras com responsabilidades familiares, as autoridades e organismos competentes de cada país devem fomentar toda ação pública e privada que seja possível para adaptar os serviços comunitários às necessidades dos trabalhadores e trabalhadoras, como os de transporte público, fornecimento de água e energia elétrica nas casas dos trabalhadores ou nas suas proximidades imediatas e construção de habitações funcionais com a finalidade de aliviar as tarefas domésticas (RECOMENDAÇÃO 165 – OIT, ITEM IV, SUBITEM 34).

Esse conjunto de medidas visa, segundo consta nas considerações da

Recomendação 165, promover a igualdade de oportunidade e de tratamento, no que se

refere a trabalho, entre trabalhadores e trabalhadoras com responsabilidades familiares e

destes com os demais trabalhadores.

O Brasil não conta com uma política de família – temos somente o estabelecimento

de ações relativas à família nas diferentes políticas sociais – e ainda não ratificou a

Convenção 156 da OIT. Para o suporte aos trabalhadores e trabalhadoras no que concerne

a suas responsabilidades familiares, a legislação brasileira estabelece a licença maternidade

de 120 dias, a licença paternidade de 5 dias, o salário-família e o acréscimo de 25% à

aposentadoria por invalidez do segurado que necessitar da assistência permanente de outra

pessoa35.

Os parâmetros para a licença-maternidade estão estabelecidos na Lei n. 8.213, de

24 de julho de 1991, que dispõe sobre benefícios da Previdência Social e define sua

finalidade e seus princípios básicos:

Art. 1º A Previdência Social, mediante contribuição, tem por fim assegurar aos seus beneficiários meios indispensáveis de manutenção, por motivo de incapacidade, desemprego involuntário, idade avançada, tempo de serviço, encargos familiares e prisão ou morte daqueles de quem dependiam economicamente (LEI n. 8.213/1991, TÍTULO I, ART. 1º).

Na lei em referência, os meios previstos para a segurança de que trata o referido

artigo estão definidos no Título III, Capítulo II (Das Prestações em Geral), Seção I (Das

Espécies de Prestação) como sendo os seguintes: aposentadoria especial; auxílio-doença;

35

Esse acréscimo consta do Artigo 45, do Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999.

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salário-família; salário-maternidade e auxílio-acidente. Na Seção V (Dos Benefícios), consta

o salário-maternidade, extensivo também às situações de adoção, nos seguintes termos:

O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade (LEI 8.213/1991, TÍTULO III, SEÇÃO V, SUBSEÇÃO VII, ART. 71, COM REDAÇÃO DADA PELA LEI 10.710/2003).

A licença-maternidade pode ser ampliada, em casos excepcionais, no período de

repouso anterior e posterior ao parto, por mais duas semanas, mediante atestado médico

específico (ART. 294 DA INSTRUÇÃO NORMATIVA INSS/PRES Nº 45, de 06 de agosto de

2010: DOU de 11/08/2010, ALTERADA). Dependendo da categoria profissional a que

pertença a segurada, a licença-maternidade pode ser ampliada para até 180 dias. O cálculo

do salário-maternidade tem algumas especificidades a depender da condição do

contribuinte, mas, no geral, a referência é o valor do último salário de contribuição

(empregada doméstica) ou uma média dos 12 últimos salários de contribuição para as

demais seguradas.

Ainda sobre amparo à maternidade, a CLT, em seu artigo 389, § 1º, determina que

“os estabelecimentos em que trabalharem pelo menos 30 (trinta) mulheres com mais de 16

(dezesseis) anos de idade terão local apropriado onde seja permitido às empregadas

guardar sob vigilância e assistência os seus filhos no período da amamentação (incluído de

conformidade com o Decreto-lei n. 229, de 28.2.1967)”. No § 2º do referido artigo consta que

essa exigência pode ser suprida por creches mantidas diretamente ou conveniadas e por

meio da Portaria 3.296/1986, do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Além disso, a

empresa poderá atender a citada exigência adotando o sistema de reembolso-creche.

A Lei n. 8.213/1991 também prevê, em seu Art. 65, o pagamento de salário-família36

para os segurados com salário mensal de até R$ 971,78, que tiverem filhos (ou

equiparados37) de até 14 anos ou inválidos de qualquer idade, mediante condicionalidades

36

O salário-família está estabelecido na Constituição Federal de 1988, em seu Art. 7º, Parágrafo XII, do Capítulo II (do Título II e da Lei 8.213/1991), que trata dos direitos sociais. Os Parágrafos XVIII e XIX desse mesmo artigo estabelecem, respectivamente, a licença à gestante (que consta também do Art. 392 da CLT e da Lei 8.213/1991) e a licença-paternidade (regulamentada pelo Art. 10, § 1º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT). 37

Equiparam-se aos filhos os enteados e os tutelados. Em relação a estes últimos, para fins de salário-família, é necessário comprovar dependência econômica.

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(frequência escolar e vacinação obrigatória)38. Esse benefício é extensivo também ao

aposentado por invalidez ou por idade e aos demais aposentados com 65 anos (se do sexo

masculino) ou 60 anos (se do sexo feminino), sendo pago juntamente com a aposentadoria.

A licença-paternidade de cinco dias, remunerada, quando do nascimento ou adoção

de filhos, consta do Artigo 7º da Constituição Federal de 1988. Anteriormente, a CLT, em

seu Art. 473, previa apenas um dia. Atualmente tramitam na Câmara dos Deputados vários

projetos de lei que tratam de licença parental: alguns estão direcionados para a ampliação

da licença paternidade para 15 dias ou para 30 dias; outros, para o direito à licença-

paternidade, em condições iguais a licença-maternidade, quando da morte ou invalidez da

mãe do recém-nascido; e outros para a concessão de licença-paternidade e salário-família

para o pai adotivo, quando ele for solteiro e adotante exclusivo39.

No Brasil, o Regime Geral da Previdência Social não estabelece nenhum dispositivo

para licença parental complementar ou para assistência a filho, nem quando se trata de

cuidado a filhos ou outros parentes enfermos. Essas modalidades de licença, que são

posteriores à licença parental inicial, podem chegar a até dois anos e ser destinadas tanto à

mãe quanto ao pai, estando previstas em alguns países como Portugal e França40.

Constata-se, assim, que no Brasil os mecanismos para compartilhamento do trabalho

familiar (ou das responsabilidades familiares) entre esfera pública e privada ainda são

incipientes, se comparados com países europeus, por exemplo. Essa insuficiente

participação do Estado e da sociedade, por meio da garantia de direitos sociais e da

estruturação de serviços, como os apontados neste texto, traz desafios significativos para

38

Informações colhidas em 2013 indicam que o valor da cota do salário-família por filho ou equiparado de até 14 anos ou inválido é de R$ 33,16 para os trabalhadores com salário mensal de até R$ 646,55 e de R$ 23,36 para os que ganham salário mensal entre R$ 646,55 e R$ 971,78, conforme consta na Portaria Interministerial MPS/MF n. 15, de 10 de janeiro de 2013. 39

Entre os projetos de lei que tramitam atualmente na Câmara dos Deputados, citamos o de n. 879/2011, que estipula licença-paternidade de 30 dias; o de n. 2272/2011, que dispõe sobre o direito à licença-paternidade e ao salário-família ao pai adotivo solteiro; o de n. 3212/2012, que concede ao pai empregado o direito à licença-paternidade nos mesmos moldes da licença-maternidade, em caso de falecimento da mãe em decorrência de complicações no parto ou por sua invalidez temporária ou permanente; e o de n. 6753/2010, que dispõe sobre licença parental, no qual estão apensados todos esses outros projetos de lei aqui citados, e, no momento (setembro 2013), aguarda parecer na Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio (CDEIC). 40

Em Portugal, a legislação prevê, além da licença parental inicial, a complementar que, a depender da situação, amplia em até três meses e oferece outros benefícios para assistência ao filho e também a licença para assistência ao filho, até o limite de dois anos, conforme consta no Decreto-lei n. 91, de 9 de abril de 2009, do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social. Disponível em: <http://dre.pt/pdf1s/2009/04/07000/0219402206.pdf>, consultado em 07/10/13. Ver também <http://www.portugalglobal.pt/PT/InvestirPortugal/guiadoinvestidor/SistemaLaboral/Paginas/LicencaMaternidad Paternidade.aspx>. Na França, inclusive pela política de incentivo à natalidade, os direitos relativos à licença parental têm variações conforme o número de filhos. Ver informações em: <http://www.cleiss.fr/docs/regimes/regime_france/pt_1.html > e <http://journalbebe.blogspot.com.br/2011/02/licenca-maternidade-na-franca.html>, consultados em 07/10/13.

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homens e mulheres, sobretudo para estas assumirem suas responsabilidades conjugais e

parentais e participarem igualmente do mercado de trabalho.

Feitas essas considerações acerca da articulação entre articulação entre esferas

privada e pública para o exercício das responsabilidades familiares, apresentamos na

sequência alguns subsídios sobre percurso sociofamiliar, outra categoria analítica que

entendemos ser importante para a análise de famílias.

2.1.2.5 Percurso sociofamiliar

Para a abordagem dessa categoria analítica, partimos do entendimento de que

necessário se faz pensar o percurso sociofamiliar ao longo de duas ou três gerações e a

partir de alguns aspectos, como migração, participação no mercado de trabalho,

pertencimento socioterritorial e cultural e modos de organização da família, entrecruzando-

se, assim, eventos intrafamiliares com aqueles que se processam entre família e meio

social.

Para essa discussão, buscamos subsídios em diferentes autores, nos quais

encontramos variações na terminologia, mas com aproximações de conteúdo. Vitale (2013)

e Vitale, Gueiros e Sette (2008) costumam referir-se a percurso de vida; Cabanes (2006) e

Telles (2006), entre outros, utilizam o termo trajetórias sociais; e Duarte e Gomes (2008)

referem-se a trajetórias transgeracionais. Neste relatório, foi adotado o termo percurso

sociofamiliar, por entendermos que deixa mais clara a articulação entre eventos que se

processam no interior da família e a conexão destes com relações sociais mais amplas.

Iniciamos com a abordagem de Vitale (2013), que, ao discorrer sobre percurso de

vida familiar em contraponto com ciclo vital da família e com base em pesquisa realizada

com famílias de crianças acolhidas institucionalmente, afirma:

Muito mais do que etapas cristalizadas do ciclo vital, a ideia de percurso de vida familiar inclui uma dimensão sócio-histórica. Por essas razões, é uma categoria que se imbrica, como já foi dito, com classe social, gênero, geração e etnia e está para além da evolução interna do grupo familiar. Aponta, portanto, para possibilidades e limitações de acordo com o modo de inserção das famílias na realidade social e também com as motivações

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próprias dos sujeitos (Charton, 2006)41

. Os percursos familiares são, portanto, heterogêneos. [...] Nesta perspectiva, a participante da investigação, por intermédio do genograma, trouxe as “vozes” familiares e os significados atribuídos às encruzilhadas do percurso que atingem as crianças em seu direito à convivência familiar. Cada família tem uma história que dá significado à experiência vivida. O entrecruzamento das trajetórias individuais no tempo compõe o percurso de vida familiar. O percurso que iremos ilustrar passa pela família de origem em que o sujeito de nossa pesquisa é criança até o momento do abrigamento de um ou mais filhos. E projeta-se até um possível envelhecimento (VITALE, 2013, p. 4-5)

42.

Cabanes (2006) também parte do entendimento de que o percurso familiar, ou

sociofamiliar, como estamos denominando neste texto, resulta da articulação entre questões

internas à família e suas relações com o mundo social:

O percurso das famílias resulta em diferentes “lugares” ou pontos de chegada, tomando caminhos que se pretendem qualificar por meio de um eixo de articulação entre as formas assumidas pelas relações internas às famílias e as formas das relações com o mundo social: formas de relações imediatamente presentes no seu ambiente social e formas de associação e de organização de maior envergadura (partidos, sindicatos, religiões) (CABANES, 2006, p. 390).

Ao discorrer sobre os lugares da família e mais especificamente sobre a trama que

se estabelece entre espaço privado e espaço público, a partir de histórias biográficas de

famílias, Cabanes (2006) faz um esforço analítico na direção de explicitar as repercussões

de um espaço no outro, particularmente no que concerne a posicionamentos no mundo

social, expressos por intermédio do trabalho, da religião e da política, e à organização da

família, especialmente entre os cônjuges. Nessa direção, o autor, ainda que saliente ser só

uma primeira síntese, identifica quatro modos de interação entre família e mundo social que

se expressam em percursos e projetos que reproduzem o mundo social ou que buscam se

nuclear na perspectiva das famílias ou, ainda, famílias que pretendem estender suas ações

ao mundo social, podendo haver ou não interações significativas entre o espaço privado e o

espaço público, conforme segue:

41 Para Charton (2006 apud Vitale, 2013), os percursos familiares se inscrevem na temporalidade, associados aos modelos de família moderna, mas também marcados pelo poder do ator social de imprimir sua experiência. (CHARTON, L. Familles contemporaines et temporalités. Paris: L’Harmattan, 2006). 42

Essa citação de Vitale (2013) encontra-se em texto mimeo que será brevemente publicado (está no prelo), porém, como ainda não dispomos da referência do livro, estamos indicando-a conforme paginação do texto mimeo.

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1 – famílias cujas relações e percursos permitem observar a reprodução, direta ou indireta, de alguns princípios e modos de funcionamento do mundo social do seu ambiente, contraditórios entre si; 2 – famílias cujo percurso e objetivos próprios se organizam em torno da resistência e da sobrevivência, projeto pouco interativo com o mundo social a sua volta, sem ser, entretanto, necessariamente determinado por este último; 3 – famílias cujo projeto manifesta a preocupação de uma criação autônoma, a preocupação de constituição de um espaço privado, que procura se prolongar sem muita eficácia no mundo social; 4 – famílias, comparáveis ao caso precedente, cuja interação com o mundo social é intensa e virtuosa (CABANES, 2006, p. 405-406).

O autor em pauta avalia que, no momento atual, espaços público e privado têm

estatutos equivalentes e que no espaço privado se explicitam o modo de ser de indivíduos e

famílias e suas relações sociais (CABANES, 2006).

Ainda para subsidiar essa discussão a respeito de percurso sociofamiliar,

apresentamos contribuições de Duarte e Gomes (2008), que, ao traçarem o que denominam

trajetórias transgeracionais em famílias de classes populares, entendem ser dimensões

constitutivas:

[...] a situação de luta ingente pela garantia de sobrevivência econômica; o regime de identificação e solidariedade intrafamiliar generalizado; a preservação e manutenção de um espaço de habitação referencial essencial para a rede familiar (ou da qualidade moral de sua vizinhança e entorno); a competição diferencial específica dentro das fratrias (e das linhagens decorrentes); os complexos efeitos das mobilidades ascendentes e descendentes entre os membros e as linhagens (o que inclui situações de trabalho, estudo, agência política, casamento etc.) relacionados aos diferentes momentos do ciclo de desenvolvimento das unidades domésticas; as implicações das marcas de “cor” e da hexis corporal construída dentro das redes; e os efeitos de ethos religiosos (incluindo a recente emergência de uma pluralidade religiosa popular no Brasil) [...] (DUARTE; GOMES, 2008, p. 10).

Em pesquisa com famílias de crianças acolhidas institucionalmente, nos percursos

sociofamiliares traçados, observou-se uma árdua luta dessas famílias pela sobrevivência,

culminando, contudo, naquele momento, em condições objetivas e subjetivas tão

precarizadas que resultaram no acolhimento institucional de suas crianças. Para o

delineamento desses percursos, buscou-se capturar aspectos que permeavam a

organização de suas vidas cotidianas, determinando seus fluxos, sobressaindo-se

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deslocamentos geográficos que implicaram trajetórias repletas de rupturas relativas a suas

referências territoriais e culturais, bem como trabalhos quase sempre precarizados e

ocupações pouco qualificadas. Também foi constatada, em decorrência da insuficiência de

renda e do não acesso a políticas públicas habitacionais, a moradia conjunta com outras

famílias (famílias conviventes), aspecto comumente determinante para o rompimento

parental. Questões de saúde física e mental, sem a devida atenção, e a participação em um

ou mais espaços religiosos foram também marcantes nos percursos sociofamiliares das

famílias estudadas (VITALE, GUEIROS, SETTE, 2008).

Assim, o percurso sociofamiliar exige uma análise histórico-social, de modo a

compreender como a realidade social transpassa a organização familiar, definindo fluxos

que nem sempre expressam os projetos ou aspirações das famílias. No percurso

sociofamiliar, estão condensadas questões que emergem do pertencimento (ou não) a um

território e a uma cultura; da condição de participação na esfera pública, por intermédio do

trabalho e da religião ou de outras práticas associativas; e das relações de geração e de

gênero, que se estabelecem na família, entre outras.

Para encerrar a discussão sobre essa categoria analítica, as palavras de Vitale

(2013, p. 8) nos parecem oportunas:

[...] Não se trata de pensar a família como “resultado” de seu percurso de vida, isto seria aprisioná-la em esquemas teóricos, mas também não se pode cristalizar a família no momento presente, por vezes seu pior momento. Ao se considerar o percurso de vida, abre-se o horizonte para pensar a família não no tempo cronológico, mas no tempo vivido [...]

43.

Cabe destacar que nas produções fontes desta pesquisa não fizemos levantamento

específico sobre essas duas últimas categorias analíticas, mas, quando do levantamento

das demais categorias, observamos como, de modo geral, os autores faziam referência a

elas.

No que concerne à articulação entre trabalho familiar e trabalho remunerado, vimos

que várias publicações, embora não tratem propriamente dessa articulação, fazem análises

ou referências à sobrecarga de responsabilidades das famílias, ou mais especificamente da

mulher, em relação àqueles que precisam de cuidados por razões de idade, de enfermidade

ou de invalidez, mesmo diante das exigências relativas à necessidade de prover o grupo.

Essas produções indicam também a insuficiência ou ineficácia de políticas públicas de

43

Ver nota de rodapé n. 41.

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suporte às famílias, nas várias áreas: assistência social, saúde, educação e habitação, entre

outras.

Quanto ao percurso sociofamiliar, a discussão também aparece nas produções

objeto da presente pesquisa, mas de forma fragmentada. Observaram-se referências a um

aspecto ou outro que teria incidência maior na situação presente das famílias, contudo, de

modo geral, não apareceram análises que apontassem o histórico familiar entremeado por

eventos intrafamiliares e suas conexões com o mundo social. Queremos, contudo, salientar

a tese de doutorado de Mercedes Cywisnk, de 2007, que, ao buscar entender as

repercussões do programa Renda Cidadã, de Santo André/SP, no período compreendido

entre 1998 e 2001, analisa a trajetória de vida das famílias participantes do referido

programa.

A análise de famílias comporta, para além das categorias analíticas aqui

mencionadas e exploradas, uma incursão nos marcos legais do país, de modo a

compreender como, historicamente, as famílias estão neles conceituadas e consideradas,

no que diz respeito à proteção social, à equidade de gênero e às responsabilidades

intergeracionais, entre outros aspectos. Assim, entendeu-se também importante examinar

essas produções no que tange à inclusão de aspectos legais em sua fundamentação,

conforme consta no item seguinte.

2.1.3 Do embasamento em marcos regulatórios relacionados à temática

Da análise feita nas teses, dissertações e artigos de revista, chegou-se à seguinte

tabela, na qual se observa certa preponderância de referência a aspectos legais nas

produções acadêmicas:

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Tabela 2 – Produções do eixo temático famílias por embasamento em marcos legais

Fonte: Pesquisa FAMÍLIAS E PRÁTICAS SOCIAIS: interlocução com produções literárias sobre a Política de Assistência Social – 2013.

A Tabela 2 indica que, do total das produções sobre famílias, 65% incluiram

referências a legislações relativas à temática e 35% deixaram de situar os aspectos legais

das questões em discussão. Na especificação por gênero literário, observa-se certa

distinção no tratamento desse aspecto entre as produções acadêmicas e os artigos de

revistas, pois, nestes, somente 40% (04 dos 10 artigos pesquisados) embasaram a

exploração do assunto também na legislação vigente; já nas produções acadêmicas, 85%

(11 das 13 produções pesquisadas) fizeram menção a leis ou regulamentos relativos a

questões de famílias. É possível que essa diferença percentual entre os dois gêneros

literários, no que se refere ao embasamento do conteúdo em marcos legais, esteja

associada às próprias condições de elaboração de um e de outro, uma vez que trabalhos

acadêmicos têm exigências próprias, resultam de discussões que se processam ao longo do

tempo com orientadores e outros colegas pesquisadores e contam com um total de páginas

suficiente para abranger um número maior de aspectos na abordagem do assunto.

Na finalização da discussão do eixo temático famílias – que apresentou subsídios

para investigação da temática, incluindo a discussão de categorias analíticas fundamentais,

e apontou seu registro quantitativo e alguma análise de conteúdo, nas produções que

versam sobre a Política de Assistência Social –, merece ser ressaltada a necessária

articulação entre aspectos universais e singulares da temática, de modo a se evitar análises

generalistas ou individualizantes, as quais seriam insuficientes para subsidiar ações,

programas ou políticas direcionadas às famílias. Nosso entendimento é o de que realizar

análises embasadas nas categorias analíticas aqui exploradas, as quais se imbricam entre

si, e também subsidiadas em marcos regulatórios, por exemplo, pode resultar em maior

consistência e possibilidade de abarcar a complexidade da temática famílias.

PRODUÇÕES ACADÊMICAS REVISTAS

INDEXADAS

TESES DISSERTAÇÕES ARTIGOS TOTAL

Consta

embasamento legal

na discussão do

conteúdo

02 09 04 15

65%

Não consta

embasamento legal

na discussão do

conteúdo

01 01 06 08

35%

TOTAL 03 10 10 23

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Após essa exploração do eixo temático famílias, serão apresentados os mesmos

tópicos no que se refere a práticas sociais, com o intuito de maior compreensão de sua

incidência nas produções analisadas.

2.2 EIXO TEMÁTICO PRÁTICAS SOCIAIS

Para um entendimento rigoroso de prática social, temos que considerá-la como uma

categoria teórica que possibilita apreender a constituição do ser social e a construção do

mundo humano-social, conforme indica Baptista (2009, p. 13-14):

A prática social é uma categoria teórica que possibilita o conhecimento e a explicitação do processo pelo qual se constitui e se expressa o ser social, e da dinâmica da construção histórica do mundo humano-social. A essa prática social Gramsci (1978:112) chama de praxis, tomando-a como a unidade determinada pelo desenvolvimento dialético entre o homem e a matéria, isto é, ela resulta da relação entre a vontade humana, a superestrutura e a infraestrutura econômica

44.

Contudo, para fins deste relatório de pesquisa, estamos utilizando o termo em seu

sentido lato. Nessa perspectiva, tomando por base Baptista (2009), compreendem-se

práticas sociais como processos diretamente relacionados ao Serviço Social e outros

externos a ele, tendo como referência um aporte teórico-metodológico fundado na

perspectiva sócio-histórica, as relações sociais que caracterizam a sociedade

contemporânea, o “perfil” dos profissionais e as condições de trabalho da categoria. No

entendimento da referida autora, a “[...] prática profissional está situada no âmbito das

relações sociais concretas de cada sociedade [...], constitui uma dimensão historicamente

determinada da prática social que se manifesta concretamente, em uma situação social

específica, e, como tal, é expressão das relações de classe” (BAPTISTA, 2009, p. 17)45.

No que tange às relações sociais do Brasil atual, destacam-se a acentuada

concentração de renda e o avanço do trabalho precário e todas as outras consequências da

política neoliberal, que resultam na imensa desigualdade social e no restrito acesso a

direitos sociais. Em relação ao “perfil” dos profissionais, que contempla formação e

44

Os termos em itálico constam do original. 45

Os grifos em itálico constam do original de Baptista (2009).

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alinhamento com o projeto ético-político da profissão, temos que considerar sua associação

a questões estruturais da sociedade, posto que, para se trabalhar na direção da defesa

intransigente dos direitos humanos – diretriz do projeto ético-político –, há que se ter

conhecimento teórico-metodológico e técnico-operativo e compromisso ético-político, os

quais são desenvolvidos na formação que, para tanto, deve responder a diretrizes

curriculares estabelecidas no (tenso) diálogo entre órgãos da categoria (especialmente

ABEPSS) e o Ministério da Educação e da Cultura. Salienta-se também que um exercício

profissional direcionado para a defesa intransigente dos direitos humanos é tensionado tanto

pelas condições de trabalho da categoria, que, na sociedade contemporânea, estão cada

vez mais precarizadas, quanto pela própria insuficiência do sistema de proteção social

brasileiro, que deixa parcela considerável da população alijada de direitos sociais já

formalizados em marcos legais.

Nessa mesma perspectiva analítica, Iamamoto (2000, p. 57), ao discutir a prática

profissional como trabalho e a inserção dos assistentes sociais em processos de trabalho,

afirma que o Serviço Social é uma “profissão socialmente determinada na história da

sociedade brasileira” e indica seu desenvolvimento enquanto uma especialização do

trabalho na sociedade. Acrescenta que pensar a profissão significa concebê-la também

como “fruto dos sujeitos que a constroem e a vivenciam”46 (IAMAMOTO, 2000, p. 58). Nesse

sentido, corroborando o anteriormente afirmado, nas práticas sociais que se efetivam no

âmbito do Serviço Social se expressam tanto questões mais gerais da sociedade quanto a

própria formação dos profissionais.

Para a autora em referência, a matéria-prima da prática dos assistentes sociais é a

questão social47 em suas diferentes expressões, entendimento que é comum aos demais

pensadores do Serviço Social, sobretudo aos que se alinham com a perspectiva histórico-

crítica. Para uma melhor compreensão dessa noção de prática no âmbito da profissão em

pauta, buscamos subsídios mais uma vez em Iamamoto (2000, p. 85):

[...] o chão comum tanto do trabalho quanto da cultura profissional é a história da sociedade. A realidade social e cultural provoca e questiona os assistentes sociais na formulação de respostas, seja no âmbito do exercício profissional, seja das elaborações intelectuais acumuladas ao longo da

46

Em itálico, no original. 47

Sobre questão social, nessa mesma obra, a autora assim a define: “Questão social apreendida como o conjunto das expressões das desigualdades da sociedade capitalista madura, que tem uma raiz comum: a produção social é cada vez mais coletiva, o trabalho torna-se mais amplamente social, enquanto a apropriação dos seus frutos mantém-se privada, monopolizada por uma parte da sociedade” (IAMAMOTO, 2000, p. 27).

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história do Serviço Social, os saberes que construiu, as sistematizações da prática que reuniu ao longo do tempo.

A apreensão e a análise crítica da realidade social constituem, portanto, condição

para um exercício profissional que se pauta pela compreensão da incidência das

determinações sociais na vida cotidiana de indivíduos e famílias e pelo compromisso com a

defesa de direitos sociais da população com a qual se trabalha.

Embora as políticas sociais não tenham exclusividade no pensar e no exercício da

prática profissional, não se pode deixar de considerar que elas constituem elemento

privilegiado nessa área. Também há de se ressaltar que o conjunto dos direitos sociais –

segurança alimentar, saúde, educação, habitação, assistência social, previdência social –,

os quais são materializados por meio das políticas sociais, se assegurados regular e

historicamente em uma sociedade, constituem uma prática social voltada para a

preservação da vida humana de forma digna.

Não temos o propósito de discutir aqui as várias políticas sociais, mas, sendo esta

pesquisa centrada na Política de Assistência Social, necessário se faz que situemos sua

direção. Formulada como direito do cidadão e responsabilidade do Estado, visa garantir aos

que dela necessitam, sem contribuição prévia, a provisão de proteção social. Portanto, é um

dos meios de promover alguns direitos sociais de modo a se enfrentar expressões da

questão social, sobretudo as situações que ensejam maior vulnerabilidade social, uma vez

que sua implementação ainda não é de abrangência universal.

A Política Nacional de Assistência Social tem como forma de gestão o Sistema Único

de Assistência Social, que prevê um modelo descentralizado e participativo e a regulação e

organização em todo território nacional. Está posto, então, o enorme desafio de conceber a

gestão de uma política levando em consideração as significativas diferenças e

desigualdades econômicas, sociais e culturais do país. Para enfrentar esse desafio, o Suas,

que visa materializar o conteúdo da Lei Orgânica da Assistência Social, tem entre seus

eixos estruturantes o alcance de direitos socioassistenciais pelos usuários, a matricialidade

sociofamiliar e a territorialização (BRASIL, 2005).

Assim, a título de promover reflexão e disparar novos questionamentos, diríamos que

as práticas sociais associadas à Política de Assistência Social, tendo como lastro a história

da sociedade e o compromisso de apreender e analisar criticamente a realidade social e

cultural, devem ser pensadas na direção de capturar a matriz social das famílias

destinatárias de suas ações e a dinâmica territorial na qual estão inseridas, visando a

efetivação de seus direitos sociais.

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Contudo, direitos sociais, matricialidade sociofamiliar e socioterritorialidade não têm

uma única perspectiva de entendimento e, excetuando-se direitos sociais, que já contam

com vasta literatura e posicionamentos claros sobre sua abordagem, os estudos acerca dos

dois outros assuntos ainda são insuficientes. Nesse sentido, buscamos reunir neste relatório

de pesquisa, a partir dos estudos já disponíveis, alguns subsídios para pensá-los, indicando

também como tais assuntos, que estamos classificando como categorias analíticas,

emergem nas produções acadêmicas e artigos de revistas objetos de nossa pesquisa.

Para iniciar essa discussão, apontamos, na sequência, como essas categorias

analíticas podem ser identificadas na estrutura dos textos pesquisados e com que

incidência.

2.2.1 Dos aspectos estruturais

Este subitem apresenta, quantitativamente, a inclusão do termo prática social (ou

suas derivações) nas obras pesquisas, especificando-se seu registro no título, no resumo,

nas palavras-chaves ou nos capítulos ou itens.

Figura 10 – Produções do eixo temático práticas sociais por inclusão do termo em aspectos

estruturais do texto

Fonte: Pesquisa FAMÍLIAS E PRÁTICAS SOCIAIS: interlocução com produções literárias sobre a Política de Assistência Social – 2013.

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De acordo com a Figura 10, 81% das produções pesquisadas que versam sobre

práticas sociais incluíram esse termo ou suas derivações no título; 85%, no resumo; 74%,

nas palavras-chaves; e 77%, nos capítulos ou itens, o que pode ser entendido como

indicativo de que as produções estavam centradas na discussão dessa temática. A figura

seguinte pode corroborar esse entendimento pela incidência do termo (ou suas derivações)

nos aspectos estruturais.

Figura 11 – Produções do eixo temático práticas sociais por recorrência do termo em aspectos estruturais do texto

Fonte: Pesquisa FAMÍLIAS E PRÁTICAS SOCIAIS: interlocução com produções literárias sobre a Política de Assistência Social – 2013.

Da mesma forma que no eixo temático famílias, se a avaliação for realizada

considerando a recorrência em que a temática foi situada nos aspectos estruturais do texto,

verifica-se na Figura 11 que das 47 produções relativas a práticas sociais em 07 delas

(15%) o termo práticas sociais (ou suas derivações) foi incluído em apenas um dos aspectos

estruturais (título ou resumo, ou palavras-chave ou capítulos/itens do texto); em outras 03

produções (6%), essa inclusão se deu em dois aspectos estruturais; em 11 delas (23%),

esse termo foi inscrito em três dos quatro aspectos estruturais aqui relacionados e; por

último, em 26 produções (56%), o referido termo constava de todos os quatro aspectos

estruturais do texto. Portanto, pode-se dizer que a maioria das produções sobre “práticas

sociais” analisadas estava voltada para o estudo da temática, posto que 79% delas (23% em

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três aspectos e 56% em quatro aspectos) a situaram em três ou quatro dos aspectos

estruturais dos textos examinados.

No próximo tópico, passaremos para a leitura das categorias analíticas a partir das

quais o eixo temático práticas sociais foi examinado.

2.2.2 Das categorias analíticas

De início, apresenta-se um panorama quantitativo de como as produções analisadas

nesta pesquisa discutiram ou, ao menos, fizeram referência às categorias analíticas aqui

assumidas como primordiais para a discussão de práticas sociais.

Figura 12 – Produções do eixo temático práticas sociais por categorias analíticas utilizadas

Fonte: Pesquisa FAMÍLIAS E PRÁTICAS SOCIAIS: interlocução com produções literárias sobre a Política de Assistência Social – 2013.

Verifica-se, mediante Figura 12, que entre as categorias analíticas definidas a priori

45% das produções referiram-se, de alguma forma, ao conjunto das três categorias

(socioterritorialidade, direitos sociais e matricialidade sociofamiliar); em seguida, vêm

aquelas que, ao analisarem práticas sociais, situaram-nas também a partir de

socioterritorialidade e de matricialidade sociofamiliar; depois, com 15%, estão as que,

dessas categorias em pauta, abordaram exclusivamente direitos sociais e; por último, com

2%, as que se remeteram exclusivamente a socioterritorialidade ou a matricialidade

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sociofamiliar48. Nenhuma das produções examinadas abordou conjuntamente

socioterritorialidade e matricialidade sociofamiliar ou direitos sociais e matricialidade

sociofamiliar. Todas as produções em pauta, ao analisarem práticas sociais, referiram-se a,

pelo menos, uma das categorias analíticas definidas a priori, o que pode ser indicativo de

efetivamente tratar-se de categorias fundamentais nessa temática.

Na sequência, será especificada cada uma dessas categorias analíticas, com vistas

a sua definição conceitual e a indicar como emergiram nessas produções, base desta

pesquisa.

2.2.2.1 Direitos Sociais

Iniciamos a discussão sobre direitos sociais remetendo-nos à afirmação de Santos

(2013, p. 42), a qual nos parece traduzir bem a realidade atual: “A grande maioria da

população mundial não é sujeito de direitos humanos. É objeto de discursos de direitos

humanos”49. Esse entendimento de que o direito formalizado nem sempre é implementado

integra as reflexões de estudiosos dessa área, posto que a legislação (fazemos referência à

brasileira, mas sabemos que o mesmo acontece em outros países) assegura uma série de

direitos sociais, os quais ainda não se efetivam para parcela significativa da população.

Guerra (2011, p. 36) agrega outro aspecto nessa discussão ao afirmar que “[...] o

discurso do direito na sociedade burguesa tem sido um instrumento de regulação que

participa das estratégias de controle do Estado sobre a classe trabalhadora”. Em suas

reflexões sobre essa questão, a autora destaca a despolitização daqueles que se utilizam

dos serviços/políticas sociais e a própria escamoteação dos interesses que estão em jogo

no pretenso acesso à cidadania pela via da formalização de direitos universais. Acrescenta

ainda:

48

Cabe esclarecer que se trata de uma única produção que não tratou das duas outras categorias analíticas aqui mencionadas (direitos sociais e socioterritorialidade), mas o fez em relação a outros aspectos relativos a práticas sociais, tendo mencionado a matricialidade sociofamiliar sem, no entanto, aprofundá-la. 49

De acordo com Santos (2013, p. 43), “a matriz liberal concebe os direitos humanos como direitos individuais e privilegia os direitos civis e políticos [...]”. As concepções de direitos humanos de inspiração marxista ou socialista reconhecem “os direitos coletivos e privilegiam os direitos econômicos e sociais”.

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[...] Tal discurso, autonomizado das medidas que buscam alcançar a efetivação dos direitos e abstraído de relações sociais e históricas, porta tendência conservadora de reprodução da ordem social, porque tanto despolitiza a chamada “questão social”, naturalizando-a, quanto, ao secundarizar as diferentes possibilidades de acesso aos bens e serviços dadas pela condição social das classes, acoberta as desigualdades (e a injustiça) e as condições históricas nas quais os direitos sociais resultaram de conquistas da classe trabalhadora [...] (GUERRA, 2011, p. 36)

50.

Porém, cabe indagar sobre o momento em que surgem os chamados direitos

sociais, de que direitos sociais estamos falando e o que são direitos sociais. Para responder

a primeira indagação, vimos que a discussão e a luta pela aprovação de direitos sociais

ganham visibilidade no século XX, originadas nas relações – contraditórias e tensas – entre

as demandas do capital e as demandas dos trabalhadores. No Brasil, a primeira

Constituição Federal a tratar especificamente de direitos sociais é a de 1988, que

estabelece em seu Título II “Dos Direitos e Garantias Fundamentais”, Cap. II “Dos Direitos

Sociais”, Art. 6º, a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a

segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos

desamparados, como direitos sociais, devendo-se ressaltar que somente com a Emenda

Constitucional n. 64, de 4 de fevereiro de 2010, a alimentação passou a integrar a relação

dos direitos sociais constitucionais.

No que diz respeito à indagação sobre o que são direitos sociais, partimos do

constante em Couto (2010), que os entende como históricos e constituídos a partir de

determinações sociais, culturais políticas e econômicas, como redistributivos e dependentes

da intervenção do Estado, tendo sua materialidade efetivada por meio de políticas sociais

públicas. A autora afirma:

Os direitos sociais são fundamentados pela ideia de igualdade, uma vez que decorrem do reconhecimento das desigualdades sociais gestadas na sociedade capitalista. Representam, na visão de Bobbio (1992), poderes, pois são entendidos como direitos de crédito do indivíduo em relação à coletividade. Expressam-se pelo direito à educação, à saúde, ao trabalho, à assistência e à previdência (COUTO, 2010, p. 48).

Em relação a processos que resultam em direitos sociais e seu significado para a

sociedade, Guerra (2011) aponta aspectos que corroboram a perspectiva de entendimento

aqui em desenvolvimento. O posicionamento da autora indica que os direitos sociais

50

Os grifos em itálico constam do original.

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derivam de conquistas da classe trabalhadora e sua materialidade ou efetivação se dá por

meio das políticas sociais, devendo-se ressaltar que o capitalismo tende a instrumentalizá-

los a seu favor, por vezes, suprimindo-os. Acrescenta a autora:

Nesta ótica, os direitos sociais são não apenas mediações que permitem aos homens alçarem uma nova condição na trajetória da humanidade, como também a sua efetividade depende de um sistema de mediações (econômicas, institucionais, jurídico-formais, ideoculturais, políticas e partidárias) a ser requisitado, criado e/ou acionado pelos sujeitos sociais/agentes profissionais no âmbito individual e coletivo. Eles permitiram reformas que vão refletir na histórica condição de submissão do trabalho ao capital e desembocam na construção do Estado de Bem-Estar Social (GUERRA, 2011, p. 43).

Desse modo, a discussão sobre direitos sociais no contexto brasileiro exige levar

em consideração as particularidades do sistema capitalista, que concentra a riqueza do país

em pequena parcela da população e deixa uma maioria em condições aviltantes,

configurando a grave desigualdade social com a qual convivemos historicamente. Há de se

fazer referência também à desigualdade de acesso aos direitos humanos – sociais, civis ou

políticos – existente entre os brasileiros, a depender de sua localização na estratificação

social. Necessário se faz demarcar que à luta pela conquista de direitos sociais formais

soma-se o esforço cotidiano, de forma individual ou coletiva, para se acessar esses direitos

já estabelecidos em legislação, visto que as políticas sociais, por meio das quais são

materializados, não são universais e efetivas.

Nesta pesquisa, verificamos que entre as 47 produções relativas a práticas sociais,

45 delas (96%) fazem referência a direitos sociais, mesmo que não aprofundem a discussão

sobre o assunto. Certamente, esse alto percentual está diretamente associado ao

entendimento da Política de Assistência Social como direito. Dessas produções que

abordam de alguma forma direitos sociais, destacamos três: o artigo da Revista Serviço

Social e Sociedade, de Oliveira (2007), a tese de doutorado em Serviço Social da PUC-SP,

de Nery (2009), e a dissertação do Mestrado em Serviço Social da PUC-SP, de Sant’Anna

(2009).

Encontramos em Oliveira (2007) uma profícua discussão sobre direitos, na qual a

autora analisa também a possibilidade da formação de uma cultura de direitos pela

assistência social nesse país, em consonância com princípios e diretrizes da Lei Orgânica

de Assistência Social (Loas). Situa a questão dos direitos na contemporaneidade

relacionados diretamente à cidadania, contextualizados no interior de uma sociedade

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capitalista e sob a perspectiva liberal, utilizando-se para essa reflexão de autores como

Marshall (1967), Nogueira (2001), SAES (2003) e Marx (1993). Analisa historicamente os

diferentes aspectos da efetivação de direitos que permearam a sociedade brasileira,

entendendo existir fragilidade e precariedade no estabelecimento dos direitos, mesmo após

a Constituição de 1988.

Oliveira (2007, p. 17-18) aponta a Constituição Federal de 1988 como resultado de

um processo histórico da formação da “noção de cidadania” e difusão de uma “cultura de

direitos, na contramão da tendência mundial da perda de direitos”. A autora indica, porém, a

fragilidade e a precariedade com que esses direitos foram estabelecidos após a Constituição

de 1988, no que diz respeito potencialmente a políticas públicas universais e direitos sociais.

Para ela, no país, existe a prática apenas da provisão dos serviços, sem a incorporação dos

direitos humanos, citando, nesse aspecto, documentos referenciados nas Relatorias

Nacionais em Direitos Humanos, Econômicos, Sociais e Culturais, em 2005. Credita ao

Suas a expectativa da implementação de inovações “que podem contribuir na afirmação da

assistência social como política pública” (OLIVEIRA, 2007, p. 27).

A produção de Nery (2009) – cuja proposta é investigar os saberes e as práticas

construídos por assistentes sociais e psicólogos alicerçados nas Políticas Sociais Públicas,

em especial a Política Nacional de Assistência Social (PNAS) e o Sistema Único de

Assistência Social (Suas) –, no que se refere a direitos sociais, ressalta a ação do

neoliberalismo, que restringe o direito socioassistencial e o particulariza: “Numa sociedade

constituída segundo o princípio da liberdade, a pobreza não dá direitos, ela confere deveres”

(NERY, 2009, p. 21). A autora faz referência ao processo de redemocratização do país,

decorrente da mobilização da sociedade na segunda metade da década de 1980, e a uma

crescente reivindicação social por um campo de direitos que reflete uma gestão

democrática, a universalidade dos direitos e a primazia da responsabilidade estatal na

efetivação de políticas públicas que materializem direitos sociais. A autora afirma:

A Política Social pós 1988 marca um divisor de águas na história brasileira, balizando um salto democrático do ponto de vista dos direitos sociais e o alargamento da cidadania. Todavia, o Estado é marcado pelo reformismo neoliberal, na medida em que, segundo tal perspectiva, é o responsável pela grave crise econômica do País, devendo, simultaneamente, imprimir severo ajuste fiscal das contas públicas e reduzir áreas de atuação (NERY, 2009, p. 54).

Nery (2009) faz alusão à implantação do Suas como um avanço na

operacionalização dos serviços sociais, contudo salienta, com base em Behring e Boschetti

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(2006), o papel do Estado brasileiro na defesa dos interesses da classe dominante em

detrimento da efetivação de direitos constitucionais a que faz jus a população. No tocante

aos textos normativos, entende existir, em relação à prática profissional na Assistência

Social, “uma relevância substantiva para a defesa dos direitos sociais enquanto alicerce

para o trabalho, por meio de uma atuação participativa e democratizadora na relação com o

usuário” (NERY, 2009, p. 113).

A outra produção por nós destacada, de Sant’Anna (2009), situa seu estudo em um

município de pequeno porte do Estado de São Paulo e foca sua discussão na efetivação ou

não de direitos sociais, notadamente os relativos à Política de Assistência Social no

município em referência. Sua proposta é verificar as possibilidades de implantação do

modelo de gestão básica do Suas em pequenos municípios brasileiros, para efetivação dos

direitos de seus usuários, desvinculando-os de uma ação assistencialista e de uma cultura

clientelista, fato corrente ainda, segundo ela, em muitos municípios brasileiros.

A autora em pauta aponta que, muitas vezes, falta clareza para a própria gestão

municipal sobre o papel do CRAS, no tocante aos programas, serviços e projetos, fazendo-

se necessário destacar a função do CRAS como unidade de proteção social básica. Faz

referência à importância de as ações sociais serem articuladas com uma rede social, o que

muitas vezes inexiste nos municípios, tornando-as estanques, pontuais e sem efetividade.

Entende ela que a falta de perspectivas da população, no que diz respeito ao acesso a

direitos sociais, e o papel ainda assistencialista da Política de Assistência Social local

vitimizam os beneficiários e os tornam usuários da assistência social por longo tempo.

Acrescenta dificuldades relativas à formação do Conselho Municipal de Assistência Social,

inclusive pela falta de representantes da sociedade que possam assumir devidamente seu

papel. A autora propõe uma reestruturação organizacional na assistência social local, tendo

como parâmetro as peculiaridades da cidade e a perspectiva de superação do

assistencialismo e do clientelismo presentes, de modo a alcançar a condição de uma política

pública de direitos.

Essa incursão sobre Direitos Sociais nos deixa o entendimento de que as

particularidades do sistema capitalista vigente no Brasil – associadas às consequências da

adoção do neoliberalismo pelo Estado brasileiro, que reduz seu papel na aprovação e

implementação de políticas sociais públicas, e à desigualdade de acesso a direitos conforme

a posição social do indivíduo – impõem a necessidade de lidar com o seguinte paradoxo: a

instalação da noção de cidadania e da difusão de uma cultura de direitos decorrentes do

processo que culminou com a promulgação da Constituição Federal de 1988 e a fragilidade

e precariedade na implementação, por meio de políticas públicas de caráter universal, de

direitos sociais estabelecidos na referida Constituição. Talvez fosse mais apropriado falar da

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tensão entre um Estado que reconhece formalmente direitos sociais e um Estado que não

promove esses direitos por ele reconhecidos.

Para concluir essa discussão sobre direitos sociais, buscamos novamente Santos

(2013), que, em sua abordagem sobre as tensões nos direitos humanos, e mais

especificamente sobre “a tensão entre o Estado e o anti-Estado”, aponta:

Os últimos trinta anos mostram bem que a aceitação da ideia de indivisibilidade dos diferentes tipos de direitos humanos

51 tem ocorrido mais

no nível dos princípios do que no nível das práticas, já que a versão neoliberal dos direitos humanos em vigor nos últimos trinta anos veio a repor a doutrina liberal com maior extremismo e com maior hostilidade em relação à promoção dos direitos sociais e econômicos por parte do Estado (SANTOS, 2013, p. 67).

Feitas essas considerações sobre direitos sociais, apresentamos na sequência

subsídios para a reflexão sobre socioterritorialidade, outra importante categoria analítica

para a discussão de práticas sociais no âmbito da Política de Assistência Social.

2.2.2.2 Socioterritorialidade

A Política Nacional de Assistência Social define como uma de suas diretrizes a

descentralização político-administrativa, com a garantia do comando único das ações em

cada esfera do governo e o respeito às diferenças e às características socioterritoriais

locais. Introduz, assim, a perspectiva de pensar a formulação e o desenvolvimento de ações

com base no território e nas relações que nele se estabelecem.

O Suas, modelo de gestão da PNAS, que prevê o compartilhamento, o

cofinanciamento e a cooperação técnica entre os três entes federativos e tem por objetivo

consolidar um sistema descentralizado e participativo, apresenta como um de seus eixos

estruturantes a territorialização (NOB/Suas, 2004, 2012). A Lei n. 12.435, promulgada em 6

de julho de 2011, estabeleceu, em seu Artigo 2º, Item II, como um dos objetivos da

Assistência Social, “a vigilância socioassistencial, que visa a analisar territorialmente a

capacidade protetiva das famílias e nela a ocorrência de vulnerabilidades, de ameaças, de

51

Os autores se referem à indivisibilidade entre direitos cívicos e políticos e direitos econômicos e sociais.

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vitimizações e danos”. Desse modo, fica consubstanciada a relevância da dimensão

socioterritorial na implementação da Política de Assistência Social.

Para compreender essa diretriz da PNAS, faz-se necessário explicitar o conceito de

território, que, uma vez imbuído de caráter relacional, não se restringe à sua dimensão

geográfica. Nessa direção, Santos (2006) indica:

O território não é apenas o resultado da superposição de um conjunto de sistemas naturais e um conjunto de sistemas de coisas criadas pelo homem. O território é o chão e mais a população, isto é, uma identidade, o fato e o sentimento de pertencer àquilo que nos pertence. O território é a base do trabalho, da residência, das trocas materiais e espirituais e da vida sobre os quais ele influi (SANTOS, 2006, p. 97).

Na mesma perspectiva de Santos, Koga (2002, p. 22) ressalta que para se conhecer

com propriedade as cidades brasileiras é preciso considerá-las em “[...] suas desigualdades

ou diferenças internas ou nas diversidades entre a qualidade de vida de seus moradores

[...]”. O território é, assim, um lugar dinâmico, cujos choques de interesses divergentes

vivenciados pelos seus atores fazem eclodir as relações sociais cotidianas, alicerçadas por

sua história construída a partir da apropriação do espaço (socioterritorialidade).

Nesse sentido, importa diferenciar a dimensão da territorialidade no debate sobre o

território. Segundo Raffestin (2011, p. 145),

a territorialidade se inscreve no quadro da produção, da troca e do consumo de coisas. Conceber a territorialidade como uma simples ligação com o espaço seria fazer renascer um determinismo sem interesse. É sempre uma relação, mesmo que diferenciada, com os outros atores.

Koga (2002) alerta que a “cultura de abandono do território”, com todas as suas

nuances, prejudica o real conhecimento das cidades, pois o território é o coração da cidade,

cujas artérias denunciam as trajetórias vividas pela população no seu dia a dia. Salienta a

autora que as Políticas Públicas, até a inclusão dessa perspectiva socioterritorial, eram

construídas apenas a partir de parâmetros econômicos das cidades, que não retratavam a

verdadeira dinâmica social do território.

No que se refere à Política de Assistência Social, critérios que levavam em conta

somente informações quantitativas começaram a ser revistos para incluir conteúdos

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relativos à dinâmica territorial, por exemplo. Conforme já mencionado, a Política Nacional de

Assistência Social e a Norma Operacional Básica Sistema Único de Assistência Social

(NOB/Suas), de 2004, e, posteriormente, a Resolução n. 33 de 12/12/2012, que institui a

nova NOB/Suas, explicitam essa dimensão em seus textos. Nesse sentido, o capítulo III

dessa nova NOB/Suas, em parágrafo 2º, estabelece o diagnóstico socioterritorial como o

Item I da estrutura do Plano de Assistência Social. Esse referido marco regulatório define o

Plano como um instrumento de planejamento estratégico para organização e regulação da

execução da PNAS na perspectiva do Suas, tendo a União, os Estados, o Distrito Federal e

os Municípios que elaborá-lo a cada quatro anos.

O diagnóstico socioterritorial passa, assim, a integrar a formulação das ações da

Política de Assistência Social e deve ser embasado em estudo completo do território a ser

coberto pelos serviços sociais, de modo a possibilitar a identificação das “dinâmicas sociais,

econômicas, políticas e culturais que os caracterizam, reconhecendo as suas demandas e

potencialidades”, conforme consta no artigo 20 da Resolução n. 33/2012. A referida

Resolução, em seu artigo 21, estabelece que a realização de um diagnóstico socioterritorial

deve contemplar:

I – processo contínuo de investigação das situações de risco e vulnerabilidade social presentes nos territórios, acompanhado da interpretação e análise da realidade socioterritorial e das demandas sociais que estão em constante mutação, estabelecendo relações e avaliações de resultados e de impacto das ações planejadas; II – identificação da rede socioassistencial disponível no território, bem como de outras políticas públicas, com a finalidade de planejar a articulação das ações em resposta às demandas identificadas e a implantação de serviços e equipamentos necessários; III – reconhecimento da oferta e da demanda por serviços socioassistenciais e definição de territórios prioritários para a atuação da política de assistência social. IV – utilização de dados territorializados disponíveis nos sistemas oficiais de informações.

Como bem lembra Koga (2008), compreendida a importância da dimensão

socioterritorial no planejamento das políticas públicas, nesse caso, da Política de

Assistência Social, o desafio é incorporá-la no cotidiano da gestão dessa política, na

totalidade dos municípios brasileiros (5.564 municípios). Igualmente importante, segundo a

autora, é buscar, ao se pensar trabalhos sociais, a identificação das vulnerabilidades sociais

e também das repostas de proteção social. Para ela:

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Talvez a face das respostas, conjugada à face das ausências, permita uma perspectiva mais próxima ao cotidiano vivido nos territórios, cujas vulnerabilidades sociais estão longe de serem homogêneas ou estigmatizadas ou mesmo segregadas, mas carregam interfaces que passam também pela contraditória relação fragilidade/potencialidade (KOGA, 2008, p. 49).

Assim, tendo em vista a concepção de território aqui adotada, pensar

socioterritorialidade na confluência com a Política de Assistência Social implica adentrar nas

diferentes configurações dos territórios, a começar pela distinção entre contextos urbanos e

rurais e seus portes (pequeno, médio e grande) e avançar na direção do reconhecimento de

suas peculiaridades, as quais vão indicar, como diz Santos (2006), as bases em que se dão

o trabalho, as trocas materiais e espirituais, as condições de residência e as características

relacionais, entre outros aspectos. Dessa maneira, ficam plausíveis a análise e a gestão das

vulnerabilidades sociais e das respostas de proteção social do território, de modo a

favorecer condições para os destinatários das ações socioassistenciais se fortalecerem em

suas escolhas e serem considerados em suas demandas, o que pode concorrer para seus

processos de autonomia e emancipação.

Note-se que nesse cenário se percebe ainda um considerável distanciamento entre o

território concebido enquanto uma categoria de análise, o território utilizado como sinônimo

de divisão político-administrativa da gestão e o território de vivência do cotidiano dos

cidadãos.

No que se refere à pesquisa por nós realizada, dentre as obras analisadas relativas à

temática práticas sociais, 39 (83%) abordam, de alguma forma, socioterritorialidade, porém,

nem sempre aprofundam a discussão sobre essa categoria analítica. Analisando essas

produções, no tocante à socioterritorialidade, duas dissertações merecem destaque: a de

Faccioli (2009) e a de Martine (2010). Ambas enfatizam a importância de se estudar o

território em seu sentido mais profundo, para se implantar políticas sociais nas regiões lócus

de suas pesquisas.

Apesar desse avanço teórico, Martine (2010) verificou em sua pesquisa que, embora

as políticas públicas acenem em favor de uma assistência social configurada de forma mais

atualizada, em sua implementação esses avanços ainda não se concretizaram. A teoria,

segundo a referida autora, não se aplica à prática, que ainda traz o ranço do seu passado

assistencialista, e os usuários do CRAS analisados deram indicativos de ainda não terem

assimilado a perspectiva da assistência social como direito, de se sentirem “sujeitos de

direitos”. A análise da autora aponta que eles ainda se sentem culpabilizados pela

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vulnerabilidade em que se encontram e não sabem como conquistar e usufruir seus direitos

com autonomia.

O estudo de Faccioli (2009) assinala que o território escolhido para a pesquisa serviu

de estratégia para a garantia dos direitos sociais aos seus usuários, uma vez que,

considerando sua realidade, fruto da produção e reprodução das suas relações vivenciadas

in loco, possibilitou a conscientização de suas necessidades e do direito de buscar formas

para a satisfação dessas necessidades e demandas.

Embora a pesquisa de Faccioli (2009) apresente resultados que indicam avanços na

perspectiva de ações consoantes com peculiaridades socioterritoriais, a autora avalia que,

de modo geral, o modelo de assistência social praticado nos territórios ainda não incorpora a

dinâmica e a rede de relações sociais, suas características, peculiaridades, conflitos,

conexões, possibilidades, vivências e trajetórias dos habitantes. Nesse sentido, suas

conclusões se assemelham às de Martine (2010).

No que concerne à rede de relações sociais mencionada pela autora, é importante

ressaltar que a discussão sobre rede não é nova e geralmente se associam a ela

características de maior ou menor duração, com vínculos mais intensos ou mais leves e, às

vezes, com significativo grau de complexidade. De acordo com Carvalho (2003, p. 1), utiliza-

se “[...] o conceito de rede para caracterizar a sociedade contemporânea e os novos

modelos de gestão dos negócios privados ou públicos em escala local ou global [...]”. Ainda

segundo a autora:

A rede sugere uma teia de vínculos, relações e ações entre indivíduos e organizações. Elas se tecem ou se dissolvem continuamente em todos os campos da vida societária, estão presentes na vida cotidiana (nas relações de parentesco, nas relações de vizinhança, nas relações comunitárias), no mundo dos negócios, na vida pública e entre elas. O que explica a existência de múltiplas redes são as necessidades humano-sociais que colocam em movimento a busca de interação e formação de vínculos afetivos, de apoio mútuo, para empreendimentos etc. Uma rede envolve processos de circulação, articulação, participação, cooperação (CARVALHO, 2003, p. 1).

No mundo globalizado, onde as barreiras tendem a se romperem, os movimentos

sociais têm um lugar importante na busca de ocupar um lugar de destaque, reivindicando

serviços sociais mais eficientes. Os Estados são pressionados a assumirem a

responsabilidade da implementação de políticas públicas, mesmo que, quase sempre, elas

se efetivem em parceria com a sociedade civil, portanto, com a iniciativa privada ou com

ONGs. Nesse sentido, autores como Carvalho (2003, p. 4) defendem que “[...] a

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articulação/combinação de ações – entre políticas, intersetorial, intergovernamental e entre

agentes sociais – potencializa o desempenho da política pública. Arranca cada ação do seu

isolamento e assegura uma intervenção agregadora, totalizante, includente”.

Como cabe ao Estado a gestão e implementação de políticas sociais, mostram-se

imprescindíveis a conscientização e a mobilização do público-alvo, para que essas ações

atendam as reais necessidades da população do território em questão e se tornem efetivas.

Nesse sentido, contemplar matrizes sociofamiliares, categoria analítica apresentada na

sequência, na formulação e operacionalização das ações socioassistenciais se impõe

também como necessidade.

2.2.2.3 Matricialidade sociofamiliar

A discussão sobre matricialidade sociofamiliar foi introduzida com a publicação do

texto da Política Nacional de Assistência Social, em 2004, que a coloca como um dos eixos

estruturantes do Sistema Único de Assistência Social52, no entanto, quase uma década

depois, ainda é escassa a literatura sobre esse tema. Contudo, da própria PNAS podemos

apreender que na abordagem sobre matricialidade sociofamiliar estão presentes questões

relativas a direitos sociais, à centralidade da família no âmbito das ações da política, às suas

funções primordiais, às transformações demográficas e outras pelas quais vem passando,

associadas direta e dialeticamente às transformações da sociedade contemporânea,

conforme pode se verificar no trecho seguinte da PNAS:

[...] Pesquisas sobre população e condições de vida nos informam que transformações ocorridas na sociedade contemporânea, relacionadas à ordem econômica, à organização do trabalho, à revolução na área da reprodução humana, à mudança de valores e à liberação dos hábitos e dos costumes, bem como ao fortalecimento da lógica individualista em termos societários, redundaram em mudanças radicais na organização das

52

Consta no texto da Política Nacional de Assistência Social, à página 39, que o “Suas define e organiza os elementos essenciais e imprescindíveis à execução da política de assistência social, possibilitando a normatização dos padrões nos serviços, a qualidade no atendimento, indicadores de avaliação e resultado, nomenclatura dos serviços e da rede socioassistencial e, ainda, os eixos estruturantes e de subsistemas conforme aqui descritos: matricialidade sociofamiliar; descentralização político-administrativa e territorialização; novas bases para a relação entre Estado e Sociedade Civil; financiamento; controle social; o desafio da participação popular/cidadão usuário; a política de recursos humanos; a informação, o monitoramento; e a avaliação”.

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famílias. Dentre essas mudanças pode-se observar um enxugamento dos grupos familiares (famílias menores) uma variedade de arranjos familiares (monoparentais, reconstituídas), além dos processos de empobrecimento acelerado e da desterritorialização das famílias gerada pelos movimentos migratórios. Essas transformações, que envolvem aspectos positivos e negativos, desencadearam um processo de fragilização dos vínculos familiares e comunitários e tornaram as famílias mais vulneráveis. A vulnerabilidade à pobreza está relacionada não apenas aos fatores da conjuntura econômica e das qualificações específicas dos indivíduos, mas também às tipologias ou arranjos familiares e aos ciclos de vida das famílias. Portanto, as condições de vida de cada indivíduo dependem menos de sua situação específica que daquela que caracteriza sua família. No entanto, percebe-se que na sociedade brasileira, dada as desigualdades características de sua estrutura social, o grau de vulnerabilidade vem aumentando e com isso aumenta a exigência de as famílias desenvolverem complexas estratégias de relações entre seus membros para sobreviverem.

O teor desse fragmento do texto da PNAS nos dá a chave para pensarmos sobre

matricialidade sociofamiliar. Para além de questões diretamente associadas à enorme

concentração de renda e à consequente desigualdade social da sociedade brasileira, outras

relacionadas a transformações demográficas, a relações de gênero e à própria sociabilidade

vão incidir sobre as famílias e definir, em grande medida, sua forma de expressão. Contudo,

cada família vai dar um sentido singular aos aspectos macrossociais nos quais está imersa,

a depender, entre outros aspectos, de seu percurso sociofamiliar, no qual, por vezes, está

presente a perda de suas raízes socioterritoriais e culturais ao ter que, em busca de trabalho

para sua sobrevivência, migrar de uma região do país para outra, de um Estado para outro,

de uma cidade para outra ou, em metrópoles como São Paulo, poderíamos até dizer de uma

região da cidade para outra.

Nesse sentido, para uma compreensão mais aprofundada das famílias destinatárias

de ações da Política de Assistência Social, é necessário considerar a articulação entre as

relações de produção da sociedade e as condições de vida da população, tomando como

foco os direitos, as necessidades e as peculiaridades das famílias enquanto sujeitos

políticos. Para tanto, a investigação e a análise de seu percurso social (origem cultural e

territorial, processos de migração, inserção no mercado de trabalho, entre outros aspectos),

dos valores morais que alicerçam sua organização e mediação com a sociedade e das

relações de geração e de gênero que se estabelecem em seu interior podem oferecer um

entendimento mais claro e abrangente do momento e da situação social daquela família,

com vistas a gerir suas demandas a partir de suas especificidades. Esse entendimento está

presente em Gueiros e Santos (2011, p. 86), ao ressaltarem:

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A abordagem matricial da família exige que novas formas de enfrentamento das expressões da questão social sejam traçadas para e com a família, de modo integrado e articulado com os serviços socioassistenciais e as demandas que se apresentam a partir de uma interlocução que as considera sujeitos de direitos, agentes sociais.

O Suas define a família como foco da proteção social, questão que merece reflexão

e atenção, inclusive para evitar que responsabilidades que são dos serviços públicos

recaiam sobre ela53. Contudo, ressalvado esse aspecto, na perspectiva de apresentar

subsídios para essa categoria analítica, que constitui um dos eixos estruturantes do Suas,

recorremos também a Couto, Yazbek e Raichelis (2010, p. 54), os quais indicam que

considerar matricialidade sociofamiliar implica o deslocamento da ideia de família “como

modelo idealizado” para a de famílias “resultantes de uma pluralidade de arranjos e

rearranjos [...]” e na redefinição da tendência de alocar “conflitos e contradições que têm

raízes societárias, como os de classe, gênero e etnia, para os âmbitos privados da esfera

doméstica, nas relações intrafamiliares e comunitárias”. Salientam ainda a necessária

adoção de definições que tenham por base a concepção de “família como sujeito social e

de direitos” e o indispensável esforço para transcender a tendência de culpabilizar a família

por suas vulnerabilidades sociais e de analisá-la a partir de uma noção despolitizada de

suas questões e de sua participação na busca de equacioná-las.

Outra autora que apresenta contribuições sobre esse tema é Teixeira (2009), a qual,

assim como Mioto (2008, 2012), apresenta em sua discussão questões relativas ao

familismo e à desfamiliarização, indagando se a centralidade e a matricialidade

sociofamiliar preconizadas na PNAS não estariam contribuindo para a “responsabilização

da família para além de suas possibilidades”, deixando de oferecer “serviços básicos

fundamentais, universais, de apoio às famílias, que independizem os indivíduos das

famílias e das leis férreas do mercado” (TEIXEIRA, 2009, p. 263).

A autora chama a atenção para os desafios da Política de Assistência Social,

reconhecendo que existem avanços e possibilidades de práticas inovadoras, mas também

o risco de conservadorismo. Entre os avanços por ela destacados, não obstante sua

indagação anterior, está a matricialidade sociofamiliar, na qual, em suas palavras,

[...] se dá a primazia à atenção às famílias e seus membros, a partir do território de vivência, com prioridade àquelas mais vulnerabilizadas, uma

53

Para exame desse aspecto, remetemos o leitor a Mioto (2008, 2012), em que a autora discute, respectivamente, questões relativas a “familismo” e a “processos de responsabilização da família na provisão de bem-estar”.

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estratégia efetiva contra a setorialização, segmentação e fragmentação dos atendimentos, levando em consideração a família em sua totalidade, como unidade de intervenção; além do caráter preventivo da proteção social, de modo a fortalecer os laços e vínculos sociais de pertencimento entre seus membros, de modo a romper com o caráter de atenção emergencial e pós-esgotamento das capacidades protetivas da família (TEIXEIRA, 2009, p. 257).

Em relação ao risco de conservadorismo na intervenção com famílias nas práticas

sociais, tendo em vista o princípio da matricialidade sociofamiliar, Teixeira (2002) levanta as

seguintes possibilidades: culpabilização das famílias e, nelas, da mulher, por situações de

misérias e de insuficiências no cumprimento de funções que lhe são socialmente atribuídas;

a busca de retorno a padrões da família nuclear, idealizando-a; a desconsideração à

gravidade da situação socioeconômica das famílias, focalizando em aspectos psicológicos

sua realidade social; e assumir o cuidado como sendo exclusividade do âmbito privado (de

cada família), desresponsabilizando a esfera pública do dever de prover espaços sociais de

cuidado, com qualidade e acessível a todos.

De modo geral, assume-se que matricialidade sociofamiliar é um tema ainda

insuficientemente discutido tanto do ponto de vista teórico como em sua aplicabilidade nas

ações da Política de Assistência Social. A pesquisa que realizamos aponta que em 22

(47%) das produções selecionadas na temática práticas sociais (Figura 12) há alguma

referência ao tema. Observou-se, entretanto, que parte significativa dessas produções

apenas faz referência à matricialidade sociofamiliar como um dos eixos estruturantes do

Suas, porém não aprofunda a discussão. Foi relativamente difícil localizar duas dentre as

produções do universo desta pesquisa (das 55 produções analisadas, 52 delas abordam

práticas sociais, temática da qual faz parte a categoria analítica matricialidade sociofamiliar)

para examinar como essa categoria analítica nelas emerge.

O exame das duas produções selecionadas (FACCIOLI, 2009; MARTINE, 2010) indica

ainda pouco aprofundamento sobre esse tema. Contudo, percebeu-se que em uma dessas

produções a autora situa matricialidade sociofamiliar na PNAS/Suas, explicitando ser eixo

estruturante do Suas e fazendo citações extraídas desse documento legal e do texto

“Capacita Suas”. Desse último, a autora lança mão do trecho que faz referência a “[...]

permanência de velhos padrões e expectativas quanto ao seu funcionamento e

desempenho dos papéis paterno e materno, independente do lugar social que ocupam no

sistema de classes e de estratificação social” (CAPACITA Suas, 2008 apud MARTINE,

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2010, p. 57)54, em que pese o impacto nas famílias das transformações sociais ocorridas na

contemporaneidade. A abordagem da autora não abrange um entendimento próprio sobre o

tema e não o explora quando da análise de suas informações empíricas.

A outra produção examinada apresenta certo avanço na análise de matricialidade

sociofamiliar, se comparada à primeira, situando-a conceitualmente para além do que

consta nos documentos legais já referidos. Nesse sentido, Facciolli (2009) diz:

A primazia da atenção às famílias tem por perspectiva fazer avançar o caráter protetivo da proteção social, de modo a fortalecer laços e vínculos sociais entre seus membros e indivíduos, para que suas capacidades e qualidade de vida atentem para concretização dos direitos humanos e sociais. [...]

Conhecer a família para qual muitas vezes se dirige o trabalho profissional é imprescindível, significa compreender a sua inserção social e o papel que a ela está sendo, atualmente, destinado na sociedade contemporânea, além de atentar para o impacto das mudanças estruturais e conjunturais e dos desafios sobre o cotidiano das relações familiares. É necessário reconhecer e buscar explicações às questões pertinentes ao vivenciado pelas famílias: a situação particular, condições e modo de vida, como ela pensa, sente, age e resiste (FACCIOLLI, 2009, p. 35-36).

Quando da análise de suas informações empíricas, a autora faz referência ao teor

constante nesse trecho citado, e muitas das falas dos sujeitos de sua pesquisa estão

condizentes com esse conteúdo, embora ela não retome tais questões em suas

considerações finais.

Em face dos aspectos mencionados, é plausível dizer que pensar matricialidade

sociofamiliar nas práticas sociais implica situar as questões do ponto de vista da articulação

entre universalidade e singularidade, dos direitos sociais, do lugar que a família ocupa nas

políticas sociais e do entendimento de famílias, considerando a incidência das

transformações societárias em seu cotidiano de vida.

2.2.3 Do embasamento em marcos regulatórios relacionados à temática

54

Essa referência, utilizada por Martine (2010), consta em Capacita Suas, v. 1. Suas: configurando os eixos de mudanças. Brasília: MDS, 2008.

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A análise realizada nas teses, nas dissertações e nos artigos de revista indicou a

seguinte tabela, na qual se observa, assim como no eixo temático famílias, certa

preponderância de referência a aspectos legais nas produções acadêmicas:

Tabela 3 – Produções do eixo temático práticas sociais por embasamento em marcos legais

Fonte: Pesquisa FAMÍLIAS E PRÁTICAS SOCIAIS: interlocução com produções literárias sobre a Política de Assistência Social – 2013.

A Tabela 3 indica que, do total de produções pesquisadas que versam sobre práticas

sociais, 79% incluíram na discussão da temática aspectos legais, enquanto 21% os

deixaram de fora. Na especificação por gênero literário, das 28 produções consultadas

(teses e dissertações), 24 delas (86%) fizeram referência a legislações, percentual que no

caso dos artigos de revistas decresce para 68%. Conforme já salientado na leitura desse

mesmo quadro relativo ao eixo temático famílias, talvez essa diferença percentual ocorra, no

que se refere ao embasamento do conteúdo em marcos legais, pelas próprias exigências de

um trabalho acadêmico, por ele ser fruto de discussões que se processam ao longo do

tempo com orientadores e outros colegas pesquisadores e pelo próprio espaço (número de

páginas das produções), o que possibilita maior abrangência na abordagem do assunto.

Com esse tópico, encerramos a apresentação do conteúdo extraído de nossa

pesquisa, merecendo, contudo, para a finalização deste relatório, a apresentação de

aspectos que, conjunta ou isoladamente, chamaram a atenção por sua incidência nas

produções pesquisadas ou por sua relevância para as duas temáticas em pauta.

PRODUÇÕES ACADÊMICAS REVISTAS

INDEXADAS

TESES DISSERTAÇÕES ARTIGOS TOTAL

Consta

embasamento legal

na discussão do

conteúdo

12 12 13 37

79%

Não consta

embasamento legal

na discussão do

conteúdo

00 04 06 10

21%

TOTAL 12 16 19 47

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Concluída esta pesquisa que, juntamente com duas outras55, integra o Projeto

“Políticas e práticas sociais com famílias: desafios para a efetivação de direitos”, em

desenvolvimento no NEPPSF, pode-se afirmar que o levantamento bibliográfico realizado

possibilitou captar a incidência dos temas famílias e práticas sociais nas produções que

versam sobre a Política Nacional de Assistência Social, relativas ao período de janeiro de

2006 a dezembro de 2010.

Embora todas as produções analisadas estejam centradas na Política de Assistência

Social, nosso interesse não foi a investigação sobre a política propriamente, mas sobre a

abordagem dos estudiosos da Política de Assistência Social em relação às temáticas

famílias e práticas sociais. Cabe informar, inicialmente, que, conforme Tabela 1 (p. 11), nas

fontes e no período definidos para a pesquisa, foram identificadas 603 produções, das quais

138 (23%) tratavam da Política de Assistência Social, índice que foi crescente entre 2006 e

2010, de acordo com o demonstrado na Figura 3 (p. 14). Dessas produções que versam

acerca da referida política, 56 (41%) focalizam famílias, práticas sociais ou ambas as

temáticas. Esses índices nos levam a considerar que a Política de Assistência Social tem se

constituído em matéria de interesse de mestrandos, doutorandos e de articulistas e que a

atenção de significativa parcela deles está voltada para a compreensão de questões

concernentes a famílias e a práticas sociais implementadas no âmbito socioassistencial.

Possivelmente, essa atenção dada às referidas temáticas está associada à

relevância de os profissionais da área social, especialmente os assistentes sociais,

apreenderem criticamente a realidade social, condição primeira para o enfrentamento de

desafios decorrentes do exercício profissional com populações que vivem na linha da

pobreza ou abaixo dela e que têm seus direitos sociais quase sempre violados. Ademais,

compreender como a realidade social incide sobre as famílias e identificar e trabalhar com

os elementos constitutivos de uma prática social qualificada é fundamental para a oferta de

subsídios para a formulação, o monitoramento e a avaliação de políticas e práticas sociais

que assegurem direitos à população-alvo das políticas sociais. Nesse sentido, buscamos

captar a(s) direção(ões) teórico-metodológica(s) presente nessas e em outras produções e

55

A segunda pesquisa, “Realidade Social, direitos e perda do poder familiar: desproteção social x direito à convivência familiar e comunitária”, tem como foco a destituição do poder familiar na Comarca de São Paulo, e a terceira, “Os impactos da Política de Assistência Social no cotidiano das famílias de adolescentes em conflito com a lei: repercussões nas condições de vida”, aborda o acesso de famílias de adolescentes em conflito com a lei a direitos socioassistenciais.

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registrá-las neste relatório de pesquisa, de modo a oferecer elementos para a elaboração de

diretrizes que poderão nortear pesquisadores do NEP sobre “Políticas e Práticas Sociais

com Famílias” e subsidiar outros estudiosos em suas análises e proposições a respeito das

temáticas focos deste estudo.

Para a análise da temática famílias (p. 20-55), nossa investigação apontou a

importância de a realizarmos com base em categorias analíticas que possibilitassem

apreender a articulação entre seus aspectos universais e singulares, sua condição de

sujeitos políticos, de constituírem-se como unidades de convivência, de estarem em

constante transformação e de continuarem sendo referencial para o indivíduo, mesmo em

face de suas contradições, as quais podem ensejar tanto o acolhimento e a proteção como a

vivência de confrontos e de violências. Também se evidenciou como relevante captar as

múltiplas configurações a partir das quais se expressam as famílias, visando, entre outros

aspectos, compreender se sua formação se dá com base em vínculos de parentesco, de

afinidade ou de reciprocidade e se ela está organizada em núcleo (cuja base é o

parentesco) ou em rede (a partir de um sistema de obrigações mútuas que tem como

principal finalidade a sobrevivência).

As categorias analíticas que, frente ao estudo realizado, emergiram como

apropriadas para analisar a temática de modo a abranger os aspectos acima mencionados

são: classe social, gênero, etnia, percurso sociofamiliar e articulação entre trabalho familiar

e trabalho remunerado, as quais estão conceituadas nas páginas 29 a 55 deste relatório.

Nossa pesquisa quantificou a incidência com que os autores das produções analisadas

utilizaram as três primeiras categorias mencionadas em seus estudos, embora nem todos

tenham aprofundado a discussão sobre elas. De qualquer modo, ficou claro que parcela

considerável dos autores discutiu a temática família fazendo referência às três categorias

analíticas conjuntamente, um percentual menor utilizou as categorias classe social e gênero,

um índice um pouco menor abordou somente classe social como categoria analítica utilizada

e, por fim, aparecem aqueles que discutiram a temática com base em classe social e etnia,

conforme pode ser verificado na Figura 9 (p. 30). Cabe ressaltar que, entre essas três

categorias analíticas, classe social foi a mais referenciada nos estudos, embora muitos

deles não a tenham conceituado, assim como ocorreu com gênero e etnia.

Em relação a percurso sociofamiliar e à articulação entre trabalho familiar e trabalho

remunerado, cuja quantificação não foi realizada nas produções pesquisadas, porque, salvo

exceções, elas aparecem de forma muito fragmentada, vimos que a discussão conceitual a

respeito dessas duas categorias ainda é muito incipiente. Deve-se ressaltar, contudo, que

contamos com poucas publicações sobre tais categorias, tanto no âmbito do Serviço Social

como em áreas afins.

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Nosso entendimento é o de que a não consideração a esse conjunto de categorias

analíticas pode trazer prejuízos à apreensão da realidade social e à sua incidência sobre as

famílias, inclusive no que se refere à tensão existente entre o compartilhamento do espaço

privado (famílias) com o espaço público (Estado, por meio da implementação de políticas

sociais) das responsabilidades para o cuidado, a proteção e o desenvolvimento dos

indivíduos e para a efetivação do direito à convivência familiar e comunitária.

Em relação a práticas sociais (p. 56-75), para além do debate sobre os fundamentos

da assistência social e sua implementação como política pública e direito social, parece-nos

importante avançar na direção de sua gestão, que se dá por meio do Sistema Único de

Assistência Social (Suas), contemplando, no conjunto de suas ações, aspectos

socioterritoriais e as matrizes sociofamiliares. Estamos apresentando direitos sociais,

socioterritorialidade e matricialidade sociofamiliar, cuja conceituação consta nas páginas 55

a 66, como categorias analíticas fundamentais à análise de práticas sociais.

Com o intuito de estimular o debate sobre esse eixo temático, estamos defendendo a

ideia de que práticas sociais, as quais no âmbito do Serviço Social têm como matéria-prima

a “questão social” em suas diferentes expressões, tem como lastro para a concretização do

trabalho e da cultura profissional a história da sociedade. Possui também como elementos

norteadores um aporte teórico-metodológico embasado na perspectiva histórico-crítica, as

relações sociais presentes naquela sociedade e naquele momento histórico, além de serem

influenciadas pelo “perfil” dos profissionais e por suas condições de trabalho.

A partir da análise das produções universo da presente pesquisa, vimos que essas

três categorias analíticas fazem parte dos estudos, porém, assim como apontado no eixo

temático famílias, nem sempre se apresentam com a devida discussão teórica. Em termos

quantitativos, a Figura 12 (p. 61) indica que quase metade das produções analisadas fez

referência, de alguma forma, a esse conjunto de categorias, um percentual um pouco menor

referiu-se a duas delas, socioterritorialidade e direitos sociais, e alguns outros estudos

exclusivamente a direitos sociais. Ficou, assim, evidenciada a prevalência de direitos sociais

na fundamentação de práticas sociais, possivelmente porque, em se tratando de uma

política assumida como direito do cidadão, localizar a discussão em relação a esse aspecto

emerge como uma primeira exigência acadêmica. Entendemos também que a

intersetorialidade e as condições objetivas para realização da prática social (infraestrutura

dos serviços e condições de trabalho dos profissionais, por exemplo) são elementos

importantes para sua análise, mas, nesse momento, não nos detivemos na discussão

desses aspectos.

Outro aspecto que mereceu nossa atenção nesta pesquisa refere-se ao

embasamento legal na discussão dos dois eixos temáticos em pauta. De acordo com a

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Tabela 2 (p. 55), vimos que no eixo temático famílias o número de teses e dissertações que

apresentaram fundamentação legal foi bem maior do que aqueles que não levaram em

consideração esse aspecto, ocorrendo o inverso com os artigos de revistas. Em relação a

práticas sociais, conforme a Tabela 3 (p. 74), tanto as dissertações e teses como os artigos

fizeram constar em um maior número a fundamentação legal, se comparadas com aquelas

que não consideraram esse aspecto.

Ao finalizar a análise do material coletado nesta pesquisa, dada a complexidade dos

assuntos tratados e a consciência de que não teríamos condições de responder a tantas

questões que emergem da discussão dos eixos temáticos famílias e práticas sociais, nossa

proposta foi apresentar neste relatório de pesquisa subsídios para discuti-los e alguns

posicionamentos que conseguimos elaborar ao longo desse processo. Entre estes,

destacamos que o estudo consolidou nosso entendimento de que para se apreender e

analisar de forma crítica e consistente a incidência da realidade social no cotidiano de

indivíduos e famílias é importante fazê-lo a partir de algumas categorias analíticas, dentre as

quais as aqui discutidas, de modo a se evitar um discurso crítico amparado somente em

uma ideologia. Do mesmo modo, compreendemos que constituir práticas sociais que

expressem compromisso com a defesa de direitos da população e atenção às suas

demandas e possibilidades de emancipação também exige que as ações sejam formuladas

e operacionalizadas a partir do entendimento dos destinatários da ação como sujeitos de

direitos e de matrizes sociofamiliares, bem como das particularidades e dinâmicas do

território em que vivem.

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90

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TORRÃO FILHO, Amílcar. Uma questão de gênero: onde o masculino e o feminino se cruzam. Cadernos Pagu, n. 24, p. 127-152, jan./jun. 2005. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/cpa/n24/n24a07.pdf>. Acesso em: 12 ago. 2013.

VITALE, Maria Amália F.; GUEIROS, Dalva Azevedo; SETTE, Maria Beatriz A. Histórias de famílias por intermédio do genograma. In: FÁVERO, E. T., VITALLE, M. A., BAPTISTA, M. V. (Org.). Famílias de crianças e adolescentes abrigados: quem são, como vivem, o que pensam, o que desejam. São Paulo: Paulus, 2008. p. 143-174.

VITALE, Maria Amália F. Percurso de vida de famílias pobres: uma história e uma categoria. Texto mimeo, 2013.

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ANEXOS

ANEXO 1 – Parecer Comitê de Ética da Universidade Cruzeiro do Sul

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APÊNDICES

APÊNDICE 1

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Pesquisa: “POLÍTICAS E PRÁTICAS SOCIAIS COM FAMÍLIAS: desafios para a efetivação de direitos” Eixo I “FAMÍLIAS E PRÁTICAS SOCIAIS:

interlocução com produções literárias sobre a Política de Assistência Social”

LISTAGEM DE PRODUÇÕES PARA ANÁLISE DE CONTEÚDO (período jan. 2006 a dez. 2010)

DISSERTAÇÕES – SERVIÇO SOCIAL PUC-SP

Disponíveis em <http://www.sapientia.pucsp.br/tde_busca/resultado-tdes-prog.php?ver=27&

programa=27&ano_inicio=2006&mês inicio=01-01&mes_fim=12-31&ano_fim=2010&grau=Mestre>.

O acesso ao Benefício de Prestação Continuada no município de Campinas/SP: desafios para sua consolidação como direito socioassistencial Silvia Jeni Luiz Pereira de Brito – Defesa: 18/05/2009. Assistência Social: Direito ou favor: um estudo sobre as famílias nos programas sociais da prefeitura de Itatiba (SP) Paula Belgini – Defesa: 09/10/2006. A prática dos assistentes sociais do Setor de Assistência Social (SAS) da Província Marista do Brasil Centro-Sul: sua relação com os princípios e diretrizes da política nacional de assistência social (PNAS) Marco Antonio Barbosa – Defesa: 22/10/2007. A efetivação de direitos dos usuários da assistência social em pequenos municípios: utopia ou realidade? Marilene Ferreira Sant'Anna – Defesa: 06/05/2009. Centro de Referência de Assistência Social de Cabreúva: reflexões sobre o território como estratégia para garantia de direitos sociais Janete Cristina Geraldo Faccioli – Defesa: 03/06/2009. O CRAS como estratégia para efetivação da proteção social básica na esfera municipal: desafios, tensões e direções Therese Abdel Messih Araujo – Defesa: 08/06/2009.

O processo de implementação e implantação dos CRAS em municípios da região oeste do estado do Paraná Solange Silva dos Santos Fidelis – Defesa: 09/10/2009. A implementação e implantação dos CRAS – Centros de Referência de Assistência Social em São José dos Campos: um estudo do CRAS – Eugênio de Melo Elisete de Fátima Rangel – Defesa: 23/10/2009. O desafio do trabalho com famílias na política de assistência social no Vale do Paraíba Rosemeire dos Santos – Defesa: 04/05/2010. Serviço social e a ação sociopastoral da Igreja Católica: assistência, promoção humana e emancipação social Edson Gonçalves Pelagalo Oliveira Silva – Defesa: 14/05/2010. O acesso ao benefício de prestação continuada (BPC) pela mediação do Juizado Especial Federal: uma experiência de alcance de direitos socioassistenciais Solange Pacheco – Defesa: 24/05/2010. O Projeto Pró-Família no município de Piracicaba: uma análise sob a ótica do serviço social Priscila Almeida da Cunha – Defesa: 25/10/2010. O processo de implantação dos Centros de Referência de Assistência Social no município de Taboão da Serra: condições objetivas e subjetivas (na perspectiva dos sujeitos profissionais que implantaram e coordenam os equipamentos) Sandra Augusta Martine – Defesa: 19/10/2010. Um estudo sobre a implantação da proteção social especial de média complexidade: contribuição à efetividade do SUAS: Campinas/SP – 2002/2010 Leniter Venância dos Anjos Sertório – Defesa: 04/11/2010.

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A integração entre o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE) e o Sistema Único da Assistência Social (SUAS) na promoção dos direitos de adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa Adilson Fernandes de Souza – Defesa: 26/05/2010.

TESES – SERVIÇO SOCIAL PUC-SP Disponíveis em: <http://www.sapientia.pucsp.br/tde_busca/resultado-tdes-prog.php?ver=27&programa =27& ano_ inicio=2006&mes_inicio=01-01&mes_fim=12-31&ano_fim=2010&grau=Doutor>.

O direito de proteção social não contributiva à infância e à adolescência no Brasil e na França Carla Rosane Bressan – Defesa em: 24/11/2006. A democratização de gestão da política de assistência social em Londrina/PR no período de 2001-2004: a ampliação do acesso e da participação Autora: Márcia Pastor – Defesa em: 21/06/2006. Retratos entre Trilhos: Famílias do Jardim Helena e Itaim Paulista Autor: Euniciana Peloso da Silva – Defesa em: 14/06/2006. Repercussões do Programa de renda mínima de Santo André/SP – família cidadã (1998-2001): nas trajetórias de famílias Mercedes Manchado Cywinski – Defesa em: 23/11/2007. O Sistema de Informação e Gestão da Assistência Social de Pernambuco (SIGAS/PE): uma possibilidade para a articulação da rede socioassistencial? Cláudia Francisca de Amorim – Defesa em: 24/11/2008. A assistência social no universo da proteção social: Brasil, França, Argentina Silvina María Carro – Defesa em: 08/05/2008. Estado e política de assistência social: particularidades do trabalho do assistente social nos centros de referência de assistência social do estado do Paraná Solange Fernandes – Defesa em: 26/06/2008. A questão da pobreza na percepção de assistentes sociais que trabalham na política de assistência social Maria Cristina de Souza – Defesa em: 04/12/2009. A estratégia do trabalho em rede no SUAS/CRAS – Teresina-PI: uma experiência em movimento Mauricéia Lígia Neves da Costa Bonfim – Defesa em: 05/06/2009. O trabalho de assistentes sociais e psicólogos na política de assistência social: saberes e direitos em questão Vania Baptista Nery – Defesa em: 22/05/2009. O fazer dos assistentes sociais juntos às famílias nos Centros de Referência de Assistência Social – CRAS do município de São Bernardo do Campo/SP Marina França – Defesa em: 15/10/2010. A influência dos modos de custeio na ação do prestador privado de serviços socioassistenciais: o caso de cinco municípios da região metropolitana da grande Vitória Renato Almeida de Andrade – Defesa em: 30/04/2010. REVISTA KATÁLYSIS Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_serial&pid=1414-4980&lng=pt&nrm=iso>.

Política de combate à pobreza no Brasil, concepções e estratégias Darana Carvalho de Azevedo; Luciene Burlandy (Revista Katálysis, v. 13, n. 2, 2010). Visões parciais da pobreza e políticas sociais recentes no Brasil Márcia Grisotti; Carmen Rosario Ortiz G Gelinski (Revista Katálysis, v. 13, n. 2, 2010).

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Participação popular e assistência social: contraditória dimensão de um especial direito Beatriz Paiva; Mirella Rocha; Dilceane Carraro (Revista Katálysis, v. 13, n. 2, 2010). Gênero, família e proteção social: as desigualdades fomentadas pela política social Marta Silva Campos; Solange Maria Teixeira (Revista Katálysis, v. 13, n. 1, 2010). A representação política das mulheres nos Conselhos Gestores de Políticas Públicas Lígia Helena Hahn Lüchmann; Carla Cecília Rodrigues Almeida (Revista Katálysis, v. 13, n. 1, 2010). As políticas sociais públicas e os novos sujeitos de direitos: crianças e adolescentes Jimena Cristina Gomes Aranda Oliva; Samira Kauchakje (Revista Katálysis, v. 12, n. 1, 2009). Contribuições para a supervisão dos programas sociais com foco na família Carlos Eduardo Aguilera Campos; Joana Garcia (Revista Katálysis, v. 10, n. 1, 2007). Bolsa família: projeto social ou marketing político? Paulo Gabriel Martins de Moura (Revista Katálysis, v. 10, n. 1, 2007). Critérios de justiça e programas de renda mínima Simone Diniz (Revista Katálysis, v. 10, n. 1, 2007). REVISTA SER SOCIAL Disponível em: <http://seer.bce.unb.br/index.php/SER_Social/index>.

A família contemporânea e a interface com as políticas públicas Laisa Regina Di Maio Campos Toledo (Revista Ser Social, n. 21, 2007). Gênero e Políticas Sociais: novos condicionamentos sobre a estrutura familiar Tânia Steren dos Santos (Revista Ser Social, n. 22, 2008). Questão Social e mediação de gênero: a marca feminina da Assistência Social Glaucia Russo, Mirla Cisne, Tatiana Brettas (Revista Ser Social, n. 22, 2008). Políticas públicas para a família: o desafio da superação do subdesenvolvimento em serviços de apoio à família Solange Maria Teixeira (Revista Ser Social, v. 12, n. 27). REVISTA SERVIÇO SOCIAL E SOCIEDADE Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_issues&pid=0101-6628&lng=pt&nrm=iso>.

A execução orçamentária da política de Assistência Social e dos programas para crianças e adolescentes Ivante Boschetti, Sandra Oliveira Teixeira, Adriane Tomazelli Dias (Revista Serviço Social e Sociedade, n. 85, mar. /jun. 2006). O SUAS e os direitos socioassistenciais: a universalização da seguridade social em debate Beatriz Augusto Paiva (Revista Serviço Social e Sociedade, n. 87, set. 2006). SUAS e os serviços socioassistenciais Egli Muniz (Revista Serviço Social e Sociedade, n. 86, nov. 2006). Direitos, cultura de direitos e assistência social Íris Maria de Oliveira (Revista Serviço Social e Sociedade, n. 89, set. 2007). Avaliação do Benefício de Prestação Continuada: Características sociais, proteção social e seus efeitos João Bosco Hora Góis, Lanaura de Vasconcelos Costa Lobato, Mônica de Castro Maia Senna, José Rodrigo de Moraes (Revista Serviço Social e Sociedade, n. 96, nov. 2008). Sistema Único de Assistência Social: Institucionalidade e processos interventivos Jucimeri Isolda Silveira (Revista Serviço Social e Sociedade, n. 98, abr./jun. 2009).

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Entre paredes e redes: o lugar da mulher nas famílias pobres Verônica Gonçalves Azeredo (Revista Serviço Social e Sociedade, n. 103, jul./set. 2010). Intervenção Profissional do assistente social e as condições de trabalho no SUAS Raquel Raichelis (Revista Serviço Social e Sociedade, n. 104, out./dez. 2010). O Sistema Único de Assistência Social e a formação profissional. Ana Elizabete Mota, Cezar Henrique Maranhão, Marcelo Sitcovsky (Revista Serviço Social e Sociedade, n. 87, 2006). Dimensões da autonomia no combate à pobreza: o programa Bolsa Família sob a perspectiva das beneficiárias Angela Cristina salgueiro marques, Rousiley Celi Moreira Maia (Revista Serviço Social e Sociedade, n. 92, 2007). Programas de Combate à Pobreza: O poder das mulheres às avessas Rosana de Carvalho, Martinelli Freitas (Revista Serviço Social e Sociedade, n. 96, 2008). DISSERTAÇÕES MESTRADO EM POLÍTICAS SOCIAIS – UNICSUL Disponível em: <http://200.136.79.4/pos_graduacao/mestrado_ps/index.php/menudissertacoes.html>.

O boné e a mesa: uma análise sobre as mentalidades e práticas da política de “proteção integral” ao adolescente envolvendo as ações do Conselho Tutelar de Jandira-SP Geraldo Pereira da Silva Junior – Defesa em: 11/02/2008. Contribuição da Parceria Escola-Comunidade para o Desenvolvimento Socioambiental de uma Área de Mananciais: Estudo de Caso da Escola Estadual Poetisa Cora Coralina na Comunidade do Parque América em Rio Grande da Serra – SP Edson dos Santos – Defesa em: 15/12/2008. As condições da participação da família na vida escolar dos filhos: estudo de caso numa escola estadual da periferia paulistana Flavio Reis dos Santos – Defesa em: 06/08/2009. Programas de Transferência de Renda: uma leitura Social a partir de usuários do programa bolsa da família e educadores da rede publica estadual do ensino de São Paulo Isaias Reis de Paula – Defesa em: 01/02/2010. Programa escola da família: acessibilidade, Políticas de educação, Direitos sociais, Vulnerabilidade social juvenil, Acesso à cidadania Luis Carlos Borges – Defesa em: 02/12/2008.

APÊNDICE 2

Pesquisa: “POLÍTICAS E PRÁTICAS SOCIAIS COM FAMÍLIAS: desafios para a efetivação de direitos”

Eixo I “FAMÍLIAS E PRÁTICAS SOCIAIS: interlocução com produções literárias sobre a Política de Assistência Social”

Instrumental I PARA ANÁLISE DE CONTEÚDO - PERIÓDICO/PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO: _________

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100

PALAVRAS-

CHAVE

PESQUISA

PERIÓDICO/TEXTO

ACADÊMICO (informar

título, número, período e

demais informações

necessárias)

TÍTULO DO

TEXTO E

AUTORIA

(artigo,

dissertação ou

tese)

PALAVRAS-

CHAVE DO

TEXTO

PESQUISADO

PALAVRAS-

CHAVE

SELECIONADAS

Selecionar TODAS

as produções que

tenham no TÍTULO

ou em PALAVRAS-

CHAVE:

Assistência social

Sistema Único de

Assistência Social

Política Nacional de

Assistência Social

Lei Orgânica de

Assistência Social

Política Social/ Pública

Seguridade Social

Proteção Social Benef. Eventuais – BPC Renda Mínima – Bolsa Família – Família Cidadã – Pro-Família – Benef. de Transf. de renda Programa Social ou

Socioassistencial

CRAS-CREAS

APÊNDICE 3 Pesquisa: “POLÍTICAS E PRÁTICAS SOCIAIS COM FAMÍLIAS: desafios para a efetivação de direitos”

Eixo I “FAMÍLIAS E PRÁTICAS SOCIAIS: interlocução com produções literárias sobre a Política de Assistência Social”

Instrumental II PARA ANÁLISE DE CONTEÚDO – PERIÓDICO/PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO: ______

PALAVRAS-CHAVE

PESQUISA

PERIÓDICO/TEXTO

ACADÊMICO

TÍTULO DO

TEXTO E

PALAVRAS-

CHAVE DO

PALAVRAS-

CHAVE

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101

Selecionar as produções

que tenham no TÍTULO ou

em PALAVRAS-CHAVE:

(informar título,

número, período e

demais informações

necessárias)

AUTORIA

(artigo,

dissertação ou

tese)

TEXTO

PESQUISADO

SELECIONADAS

Assistência social

Sistema Único Assist. Social

Política de Assistência

Social

Lei Org. de Assist. Social

Política Social (desde que se refira à Assist. Social) Seguridade Social (desde que se refira à Assist. Social) Benef. Eventuais – BPC – Renda Mínima – Bolsa Família – Família Cidadã – Pro-Família – Benef. de Transf. de renda CRAS – CREAS

ASSOCIADAS A:

FAMÍLIA(S) ou: pai, mãe, homem, mulher, gênero, filhos, crianças, adolescentes. Prática Social ou: trabalho

social, trabalho/apoio

socioeducativo, trabalho

com famílias, programa

social/socioassistencial,

ação

social/socioassistencial,

socioassistencial,

intervenção, prática

socioassistencial,

proteção/direito(s)

social(is)/socioassistenciais,

prática profissional/trabalho

no CRAS-CREAS,

implantação/implementação

do CRAS-CREA

TOTAL DE PRODUÇÕES CONSTANTES NO PERÍODICO ENTRE JAN./2006 E DEZ./2010: ___

TOTAL DE PRODUÇÕES SELECIONADAS PARA A PESQUISA: ___

TOTAL DE PRODUÇÕES SELECIONADAS NO REFINAMENTO: ____

OBS.: das 140 produções nesse periódico, ___ versam sobre questões de outros países (considerar, então, __).

As que se referem ao Brasil e também a outros países estão sendo consideradas para fins de nossa seleção.

APÊNDICE 4

Pesquisa: “POLÍTICAS E PRÁTICAS SOCIAIS COM FAMÍLIAS: desafios para a efetivação de direitos”

Eixo I “FAMÍLIAS E PRÁTICAS SOCIAIS: interlocução com produções literárias sobre a Política de Assistência Social”

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INSTRUMENTAL III PARA ANÁLISE DE CONTEÚDO – COLETA DE INFORMAÇÕES SOBRE CONCEPÇÕES

DE FAMÍLIAS E DE PRÁTICAS SOCIAIS EM PRODUÇÕES ACADÊMICAS RELATIVAS À POLÍTICA DE

ASSISTÊNCIA SOCIAL NO BRASIL

I – DA CARACTERIZAÇÃO DA PRODUÇÃO

1. Natureza da Produção

( ) Tese de Doutorado do Programa de Estudos Pós-Graduados em Serviço Social da PUC-SP

( ) Dissertação de Mestrado do Programa de Estudos Pós-Graduados em Serviço Social da PUC-SP

( ) Dissertação do Mestrado em Políticas Sociais da Universidade Cruzeiro do Sul SP

( ) Artigo da Revista Katálysis

( ) Artigo da Revista Serviço Social e Sociedade

( ) Artigo da Revista Ser Social

2. Especificação da Produção

Título: _________________________________________________________________________________

Autoria ________________________________________________________________________________

Ano da defesa (no caso de teses e dissertações) ________________________________________________

Ano da publicação, volume e número (no caso de revista) _________________________________________

3. Identificação do conteúdo (famílias56

) na produção

( ) Faz parte do título da produção

( ) Faz parte do resumo da produção

( ) Faz parte das palavras-chave

( ) Faz parte de capítulo ou de itens de um capítulo (no caso de dissertações e teses)

( ) Faz parte dos itens do artigo

( ) Outros – Especificar __________________________________________________________________

3. Identificação do conteúdo (práticas sociais57

) na produção

( ) Faz parte do título da produção

( ) Faz parte do resumo da produção

( ) Faz parte das palavras-chave

( ) Faz parte de capítulo ou de itens de um capítulo (no caso de dissertações e teses)

( ) Faz parte dos itens do artigo

( ) Outros – Especificar __________________________________________________________________

II – DA CONCEITUAÇÃO DE FAMÍLIA E PRÁTICA SOCIAL

4. A produção em pauta aborda “famílias” e as “práticas sociais” a elas direcionadas?

( ) aborda ambos os aspectos

( ) aborda somente “famílias”

( ) aborda somente “práticas sociais”

SOBRE FAMÍLIA (e suas derivações)

5. Que autores são tomados como referência para a abordagem da questão “famílias” nessa produção? (incluir

nome do autor, título da obra, editora e ano da publicação)

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

56

Ao termo “família”, estamos associando: pai, mãe, homem, mulher, gênero, filhos, crianças e adolescentes. Ao termo “prática social”: trabalho social, trabalho/apoio socioeducativo, trabalho com famílias, programa social/socioassistencial, ação social/socioassistencial, socioassistencial, intervenção, prática socioassistencial, proteção/direito(s) social(is)/socioassistenciais, prática profissional/trabalho no CRAS-CREAS, implantação/implementação do CRAS-CREAS.

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__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

6. O autor faz considerações sobre localização da família em termos de classe social?

( ) Sim

( ) Não

Especifique

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

7. O autor faz considerações sobre questões de gênero em sua discussão sobre família?

( ) Sim

( ) Não

Especifique

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

8. O autor faz considerações sobre questões relativas a raça e etnia em sua discussão sobre família?

( ) Sim

( ) Não

Especifique

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

9. Que outros aspectos de “família” são abrangidos nessa produção?

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

10. Que concepção de “família” o autor assume nessa sua produção acadêmica?

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

SOBRE PRÁTICAS SOCIAIS (e suas derivações)

5. Que autores são tomados como referência para a abordagem da questão “prática social” nessa produção?

(incluir nome do autor, título da obra, editora e ano da publicação)

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

6. O autor faz considerações sobre localização socioterritorial em sua discussão sobre prática social?

( ) Sim

( ) Não

Especifique

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__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

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7. O autor faz considerações sobre defesa de direitos sociais da população-alvo ao discorrer sobre práticas

sociais?

( ) Sim

( ) Não

Especifique

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

8. O autor faz considerações sobre matricialidade sociofamiliar em sua discussão sobre prática social?

( ) Sim

( ) Não

Especifique

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

9. Que outros aspectos de “práticas sociais” são abrangidos nessa produção?

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

10. Que concepção de “práticas sociais” o autor assume nessa sua produção acadêmica?

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

Outras observações sobre a produção em análise.

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

Pesquisador responsável pela primeira análise de conteúdo ______________________________________

Pesquisador responsável pela “revisão” da análise de conteúdo ___________________________________

Data de realização da análise ______________________________________________________________

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APÊNDICE 5

PESQUISA: “POLÍTICAS E PRÁTICAS SOCIAIS COM FAMÍLIAS: desafios para a efetivação de direitos” Instrumental IV PARA ANÁLISE DE CONTEÚDO – EIXO I – “FAMÍLIAS E PRÁTICAS SOCIAIS: interlocução com produções literárias sobre a Política de Assistência Social”

CARACTERIZAÇÃO DA PRODUÇÃO TEMÁTICA: FAMÍLIAS Orde

m

Título Ano

defesa/

Publicaçã

o

Gênero Universidad

/ Revista

Aspectos Estruturais Conteúdo Observações Título Resu

mo

Palav.

-

chave

s

Cap.

/Iten

s

Clas

soc.

Gên

ero

Etni

a

Outros Aspectos apresentados

pelo autor

Legislações

citadas pelo

autor

01

03

05

09

12

16

....

...

...

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APÊNDICE 6

PESQUISA: “POLÍTICAS E PRÁTICAS SOCIAIS COM FAMÍLIAS: desafios para a efetivação de direitos” Instrumental IV PARA ANÁLISE DE CONTEÚDO – EIXO I – “FAMÍLIAS E PRÁTICAS SOCIAIS: interlocução com produções literárias sobre a Política de Assistência Social”

CARACTERIZAÇÃO DA PRODUÇÃO TEMÁTICA: PRÁTICAS SOCIAIS

Ordem Título Ano

defesa/

Publicação

Gênero Universidade

/ Revista

Aspectos Estruturais Conteúdo Observações Título Resu-

mo

Palav.-

chaves

Cap./

Itens

Socio

terr

DireS

oc.

Matr

icilia

Outros Aspectos apresentados

pelo autor

Legislações citadas

pelo autor

01

02

03

04

05

06

.....

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