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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO MESTRADO EM ESTUDOS FRONTEIRIÇOS MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL CAMPUS DO PANTANAL KIASE SEBASTIANA MORAES SIQUEIRA A INSERÇÃO DE ESTRANGEIROS NAS SOCIEDADES FRONTEIRIÇAS: O CASO DOS PARAGUAIOS EM CORUMBÁ, MS. CORUMBÁ – MS 2009

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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO

MESTRADO EM ESTUDOS FRONTEIRIÇOS

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL

CAMPUS DO PANTANAL

KIASE SEBASTIANA MORAES SIQUEIRA

A INSERÇÃO DE ESTRANGEIROS NAS SOCIEDADES FRONTEIRIÇAS: O CASO DOS PARAGUAIOS EM CORUMBÁ, MS.

CORUMBÁ – MS 2009

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KIASE SEBASTIANA MORAES SIQUEIRA

A INSERÇÃO DE ESTRANGEIROS NAS SOCIEDADES FRONTEIRIÇAS: O CASO DOS PARAGUAIOS EM CORUMBÁ, MS.

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Mestrado em Estudos Fronteiriços da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Campus do Pantanal, como requisito final para obtenção do título de Mestre. Linha de Pesquisa: Ocupação e Identidades Fronteiriças Orientador(a): Prof. Dr. Marco Aurélio Machado de Oliveira.

Corumbá - MS 2009

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FOLHA DE APROVAÇÃO

Este documento corresponde à versão final da dissertação de mestrado

intitulada A INSERÇÃO DE ESTRANGEIROS NAS SOCIEDADES FRONTEIRIÇAS: O

CASO DOS PARAGUAIOS EM CORUMBÁ, MS, à Banca Examinadora do Curso de

Mestrado em Estudos Fronteiriços da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Campus

do Pantanal, tendo sido considerada ___________________________________.

Corumbá, _______ de ____________________ de 2009.

Presidente da Banca Examinadora

Prof. Dr. Marco Aurélio Machado de Oliveira.

Avaliadora

Profª. Drª. Vanessa Santos Bivar Bodstein

Avaliador

Prof. Dr. Gustavo Villela Lima da Costa

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Este trabalho é dedicado especialmente à minha mãe Regina, responsável pela formação do meu caráter, princípios em acreditar sempre no meu potencial, ao meu padrasto Joaquim que também sempre acreditou que a educação é a maior herança que se pode deixar aos filhos. E ao meu irmão João Daniel, solidário, incentivador e encorajador. A vocês que me ensinam a ser uma pessoa melhor a cada dia, meu referencial e porto seguro em todas as horas, todo meu amor.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, que nunca me abandonou em nenhum momento, e sempre me deixava mais

motivada e animada a cada dia, em completar esse trabalho com dedicação.

A minha família por entenderem os momentos de ausência e isolamento, acreditando e

incentivando a minha realização profissional não medindo sacrifícios e esforços para

concretizá-lo.

Aos professores maravilhosos e super profissionais, dedicados e dispostos a ajudar a

toda hora que precisei meu carinhoso agradecimento. Em especial ao Professor Doutor Edgar

Aparecido da Costa que se revelou uma pessoa solícita, atenciosa, generoso, competente, tudo

com a maior simplicidade, digno de ser merecedor de todo nosso respeito e amizade.

Aos meus colegas de turma, a primeira, a saber, o que era ultrapassar as “fronteiras”

de um mestrado em Estudos Fronteiriços em Corumbá, alguns um carinho especial, ao

Moyses agradeço as discussões e generosidade em compartilhar o conhecimento; a Lívia

muito atenciosa e atenta aos fatos, sempre prestativa; a Luciene Lemos, carisma, profissional

de primeira linha e amiga da família, tornou-se durante esses dois anos, pelo convívio mais

intenso, uma inspiração por sua inteligência, garra, vontade todo meu carinho e respeito.

Ao grande amigo de longa data Luciano agradeço pelo apoio e incentivo em não me

deixar esmorecer jamais, na incessante busca pelo conhecimento.

A senhora Hortência que sempre me recebeu de portas abertas, em todos os momentos

que pude desfrutar de sua companhia saia revigorada e admirada com tão grande generosidade

e atenção, por tudo que me ajudou sou muito grata.

A minha mais nova, porém não menos querida, amiga Vanessa Bivar, a quem sempre

me ofertava com palavras de apoio e incentivo nos momentos de sufoco e apreensão, obrigada

pela paciência, carinho e amizade.

Ao meu Professor Doutor José Luis dos Santos Peixoto que desde minha graduação

incentivou-me a continuar os estudos, meus sinceros agradecimentos.

Ao meu grande amigo e orientador Professor Doutor Marco Aurélio Machado de

Oliveira, grande pesquisador, incomparável e respeitado profissional, uma pessoa ímpar,

generosa, esteve comigo em todos os momentos da minha graduação como um mestre querido

e como meu orientador no programa de mestrado. Após anos de conhecimento e convivência

tenho o imenso prazer de registrar o quão feliz sou por te-lo como amigo. A esse grande

homem toda minha admiração, sem dúvida, sem seu apoio e incansável esforço não seria

possível desfrutar desse momento, grande idealizador e batalhador pela implantação do

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Programa de Mestrado em Estudos Fronteiriços, certamente não estaríamos, nesse momento

desfrutando a contemplação de um sonho realizado pelo magnífico Professor Marco Aurélio,

a quem eu dedico não apenas esse trabalho, como todo meu carinho, respeito, confiança. Mais

que um orientador ele é um amigo de todas as horas, sou grata a tudo que fez.

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SIQUEIRA, Kiase Sebastiana Moraes. A Inserção de Estrangeiros nas Sociedades Fronteiriças: O Caso dos Paraguaios em Corumbá, MS. 2009. Dissertação de Mestrado do Programa de pós- graduação strictu senso Estudos Fronteiriços, da Fundação Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Campus do Pantanal. Corumbá, MS.

RESUMO

O eixo principal da pesquisa é o estudo da imigração paraguaia na cidade de Corumbá

em dois momentos históricos de maior fomento populacional desse grupo de imigrante, tais

momentos compreendidos o primeiro na segunda metade do século XIX e o segundo na

primeira metade do século XX. Suas contribuições, dificuldades, alegrias, desafios, conflitos,

esperanças, aceitação e miscigenação, conceitos esses que se mesclam na vida de pessoas que

emigram em busca de melhores oportunidades por vários fatores. A pesquisa apresenta dois

fatores propulsores dessa emigração. Verificou-se a comprovação de teses acerca dessa

fronteira peculiar, referimos aqui a Corumbá, que se apresenta, ainda na atualidade, múltipla

em seu cotidiano identitário. A interferência e consequências ocorridas em virtude de atitudes

de poucos influenciam a vida de milhares de famílias.

A visão que temos sobre fronteira, um linde invisivelmente visível, mas que por vezes

ignorada e pensada como igual nos leva a compreensão da necessidade de desmistificar

conceitos turvos sobre essa região ímpar.

Palavras-chave: fronteira – imigração - Paraguai

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SIQUEIRA, Kiase Sebastiana Moraes. A Inserção de Estrangeiros nas Sociedades Fronteiriças: O Caso dos Paraguaios em Corumbá, MS. 2009. Dissertação de Mestrado do Programa de pós- graduação strictu senso Estudos Fronteiriços, da Fundação Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Campus do Pantanal. Corumbá, MS.

RESUMÉN

El eje principal de la investigación es el estudio de la inmigración Paraguaya en la

ciudad de Corumbá en dos momentos históricos de una promoción más grande de la

población de este grupo del inmigrante, tal los momentos entendidos primer por la mitad

segundo del siglo XIX y como por la mitad primer del siglo XX. Sus contribuciones,

dificultades, alegrías, desafían, los conflictos, las esperanzas, aceptación y miscegenación,

conceptos éstos que si mezclan en la vida de la gente que emigra en busca de ocasiones

mejores para algunos factores. La investigación presenta dos factores del propulsor de esta

emigración. Era evidencia verificada de teses referentes a esta frontera peculiar, relacionamos

aquí el Corumbá, que si los presenta, aún en el actual tiempo, múltiple en su identitário diario.

La interferencia y las consecuencias ocurridas en la virtud de actitudes de pocos influencian la

vida de mil de familias.

La visión que tenemos en la frontera, una es invisiblemente visible contiguo, pero que

por épocas no hizo caso y pensó como igual de ellas toma la comprensión de la necesidad

para desmitifica disturbios de los conceptos en esta región desigual.

Palabras-llave: frontera – imigración - Paraguay

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LISTA DE MAPAS

Mapa 1 - Zonas de Fronteira: Territórios Especiais Mapa 2 - Formação Territorial dos Estados da América do Sul: Independência Paraguaia.

Mapa 3 - Principais Disputas de Fronteira envolvendo o Paraguai: a Grande Guerra e Guerra do Chaco, com os territórios perdidos e incorporados. Mapa 4 – Divisão Política e Administrativa da América Latina Colonial (1800).

Mapa 5 – Comparativo da Imigração de Procedência Paraguaia com outras imigrações sul americanas no Brasil.

Mapa 6 - Imigrantes da década de 1990 procedentes do Paraguai, conforme município de residência.

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LISTA DE FOTOS

Foto 1 - Placa na base que sustenta a imagem de Nossa Senhora de Caacupé

Foto 2 - Imagem da Santa ofertada pelo cônsul paraguaio

Foto 3 - ATA de fundação do então Centro Social Paraguaio

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LISTA DE QUADROS

Quadro 01 - Demonstrativo de matrimônios em Corumbá no período de 1870 a 1895, envolvendo paraguaios e paraguaias.

Quadro 02 - Demonstrativo de batizados em Corumbá no período de 1878 a 1886, envolvendo paraguaios e paraguaias.

Quadro 03 - Demonstrativo dos dados acerca da relação entre batizados e casamentos.

Quadro 04 - Recenseamento de Imigrantes paraguaios

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .................................................................................................... 13 PARTE 1 ................................................................................................................ 16 1 - A FRONTEIRA E A FRONTEIRA BRASIL-BOLÍVIA: EM BUSCA DE UM

CONCEITO .......................................................................................................... 16

1.1 REDES SOCIAIS EM TERRITÓRIO FRONTEIRÇO ........................... 27 2 - O PARAGUAI ................................................................................................ 28 2.1 A GRANDE GUERRA .................................................................................. 33 3 - A IMIGRAÇÃO PARAGUAIA NO PRIMEIRO MOMENTO: PÓS GRANDE GUERRA .............................................................................................................. 39 3.1 A ACOMODAÇÃO NA NOVA TERRA: O MATRIMÔNIO .................. 46 3.1.2 BATIZADOS ............................................................................................... 50 PARTE 2 ............................................................................................................... 56 1 - A IMIGRAÇÃO PARAGUAIA NO SÉCULO XX .................................... 56 ANTECEDENTES DA IMIGRAÇÃO PARAGUAIA NO SÉCULO XX...... 56 1.1 A ACOLHIDA EM CORUMBÁ ................................................................ 71 1.2 ACOMODAÇÃO NA NOVA TERRA: O TRABALHO .......................... 74 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA ................................................................... ANEXOS ..............................................................................................................

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INTRODUÇÃO

Estudar fronteira, um território complexo por si só, que comporta variadas histórias de

grupos de imigrantes, impulsionados por diferentes motivos, em momentos históricos

particulares. Esses grupos se misturam e se consolidam nesse território denominado por

Raffestin de “magia” que é a fronteira. Um lugar mágico repleto de relações múltiplas. Para a

escolha do tema foi necessária a observação de hábitos corriqueiros da cidade de Corumbá.

Para a realização da dissertação foi traçado um plano de estudo com referencial teórico

e conversas, acredito que entrevista não seja a melhor denominação para as informações orais

recebidas, pois não fiz entrevistas, procurei sim manter um diálogo o mais próximo de um

relacionamento formal, mas com total liberdade de confrontar informações, de certa forma

invadir, com muito respeito e sensibilidade, a intimidade familiar dos colaboradores da

pesquisa. A troca de informações tornou-se imprescindível e esclarecedora para todos os

envolvidos na pesquisa. As informações obtidas a partir dos referenciais teóricos tornaram-se

o alicerce do trabalho.

A imigração paraguaia é especialmente retratada no período que abrange a segunda

metade de século XIX, em Corumbá especialmente por ter sido um dos palcos da Grande

Guerra, encontra-se muito sobre esse período e raros trabalhos escritos sobre a imigração

ocorrida no século XX.

A dissertação versa acerca de dois momentos históricos marcantes, que impulsionaram

a chegada de paraguaios à cidade de Corumbá. O primeiro deles, talvez o mais conhecido, foi

após o fim da Grande Guerra, ainda na década de 1870, nesse período fica evidente a posição

da sociedade local, sociedade aqui no seu sentido mais amplo, dividida em dois blocos, o

pequeno formado pela Elite com ações preconceituosas, quando lhe convinha. O outro bloco

constituído grande parte da sociedade, que os aceitou com receptividade comprovada nos

levantamentos feitos em livros de casamentos e batizados da primeira Igreja fundada em

Corumbá. Neles está registrada a aceitação do povo brasileiro, e não só corumbaense, para

com esse grupo de imigrantes.

Outro momento relevante para a pesquisa ocorreu no século XX, em particular após a

Guerra do Chaco, já na década de 1930, aqui as adversidades se apresentaram na escassez de

referencial teórico que pudesse amenizar nossas dificuldades. Decidimos então nos nortear

por intermédio da oralidade, fonte usualmente utilizada, quando se tem a oportunidade.

Tamanha foi nossa surpresa em nos deparar com pessoas que nos deram informações ricas em

detalhes de uma história de solidariedade entre patrícios.

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O imigrante vive uma situação atípica, a do nacional, quando se torna imigrante,

emigrante, nativo essas definições são separadas por uma faixa muito estreita, e que de certo

modo oscila numa aparente ordem des-ordenada que envolva essas denominações. A

exclusão sofrida pelo imigrante é um fato altamente relevante, o individuo se exclui dos

direitos que exerce quando está no seu país, por outro lado também vive excluído do país do

acolhimento. Mesmo que procure se manter informado dos fatos que envolvam sua pátria, não

mais influenciam ou interferem de forma direta no cerne das disputas políticas, por exemplo.

Igualmente não podem interferir nas decisões, conflitos, disputas que ocorra no país do

acolhimento, é como se ele estivesse invisível, de mãos atadas sem poder de reação. Porém se

analisarmos friamente a situação do imigrante e por que não dizer também do emigrante, é de

alguém que não é identificado nem lá nem cá, nesse sentido, a naturalização, é talvez uma

opção para quem deseja e pode fazer essa escolha. Ao se tornar emigrante o individuo deixa,

em parte, de ser nacional e tornando-se imigrante ele não é, mas está parte da população.

Desde a antiguidade essa relação é norteada pela exclusão, os metecos, denominação dos

estrangeiros que moravam na Grécia, não tinham direitos que um cidadão grego, mas tinham

obrigações de pagar imposto como qualquer cidadão grego.

Os conceitos atribuídos a esse indivíduo diaspórico, são difíceis de orientar, é claro

que, pela experiência nesses dois anos e meio trabalhando com o tema imigração, a

consciência que os paraguaios, objeto dessa dissertação, têm de sua condição, ficou muito

evidente. Eles mantêm-se informado, por meio da mídia, dos fatos ocorridos no Paraguai, têm

opiniões formadas, discutem, se expressam, mas não pensam em voltar, os anos no Brasil

deram a eles o discernimento e esclarecimento necessário em saber que hoje, após décadas no

país, eles se sentem nacionais, entretanto como toda regra tem exceção há alguns que se

sentem binacionais, declaram amor as suas duas pátrias como poesia.

Mis Dos Amores “Tengo dos amores, Señores: Paraguay y Brasil Paraguay mi solar nativo Y Brasil mi país cautivo Porque lo tengo dentro de mi corazón Yo soy la cautiva De este suelo inmenso Que me brinda albergue, cariño y sustento Amo esta patria, sus gentes, sus artes, sus cantos Sin que yo me olvide de mi patria amada Y de sus encantos.

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¿Se puede tener dos amores, Señores? ¡Claro que se puede! En mi caso, Señores ¡Se puede!”

Lilia Roa

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Parte 1 A FRONTEIRA E A FRONTEIRA BRASIL-BOLÍVIA: EM BUSCA DE UM

CONCEITO

A fronteira é estabelecida pela demarcação de um território, uma região que envolve

dois ou mais países, com legislações próprias que refletem na população fronteiriça os efeitos

peculiares dessa localidade. Nessas regiões estão envoltas pessoas de diversas nacionalidades,

consequentemente várias culturas, modos de vida que se misturam.

Nesse sentido é que Raffestin observa que fronteira não é uma linha, a fronteira é um

dos elementos da comunicação biossocial que assume uma função reguladora. Ela é a

compreensão de um equilíbrio dinâmico que não se encontra somente no sistema territorial,

mas em todo sistema biossocial1.

Ainda a esse respeito o Grupo Retis de Pesquisa da Universidade Federal do Rio de

Janeiro, apresenta uma definição mais complexa no tocante à fronteira que leva em

consideração dois vetores presentes que podem estender ou diminuir a fronteira: um

relacionado ao bloqueio de movimento, de controle de fluxos e o outro relacionado à abertura

de comunicação, relação e troca. Esses vetores – bloqueio e abertura – dependerão do tipo de

relação existente entre os vizinhos, então “a fronteira seria, portanto, uma zona na qual seus

habitantes vivem os efeitos da proximidade entre dois ou mais países. Ela contém um

conjunto de instituições, práticas, sujeitos e modos de vida particulares2”.

A fronteira, então se estabelece em decorrência de vários fatores, um deles é a

construída “naturalmente”, fronteiras definidas por montanhas, rios, mares etc. Entretanto

autores como Aldo Janotti ressalta que “uma fronteira natural como um rio não pode ser

entendida como um obstáculo (...) mas como um caminho, de via de mão-dupla que permite

uma articulação inter-regional e intercontinental3.” O que de forma alguma tais fatores podem

ser enfrentados como impedimento para a integração dos países envolvidos.

Portanto as fronteiras são delimitadas sob várias perspectivas, a mais pontual é a ‘linha

demarcatória’ de um território. Linha essa que delimita os limites de uma cidade, estado ou

1 RAFFESTIN, Claude. A ordem e a desordem ou os paradoxos da fronteira. . In OLIVEIRA, Tito C. M. (org.). Territórios sem Limites. Campo Grande: UFMS, 2006. p.13 2 Grupo Retis de Pesquisa da Universidade Federal do Rio de Janeiro 3 Cf. JANOTTI, Aldo.Op. cit. p. 240-254. Apud: CORRÊA, Lúcia Salsa. História e Fronteira. O sul de Mato Grosso. (1870-1920). Campo Grande: UCDB, 1999.

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país. Esse limite faz-se necessário até para que se cumpra à lei, pois cada território tem uma

legislação que precisa ser cumprida. Essa noção de limite implica intenção de poder, onde o

espaço é natural e seus atores constroem seus limites. Para Raffestin4, por exemplo, o espaço

é uma ‘prisão original’, o território é a prisão que os homens constroem para si. Essa

afirmação deixa clara a relação de poder e dominação, fundamentais à permanência de uma

coesão territorial e controle dos seus atores sociais. Mais ainda a fronteira para o autor é

compreendida como zona de contato e limite, ou seja, é uma linha de separação definida que

cristalizada se torna então ideológica, pois justifica territorialmente as relações de poder. 5

O território nacional faz fronteira com dez países, com tanta abrangência fronteiriça

não há, entretanto uma completa ou menos contrastante integração e desenvolvimento da

faixa de fronteira. Não há uma política que vise às especificidades dessas regiões, ou ao

menos que minimize o aporte de transeuntes que procuram serviços no país mais bem

equipado. Portanto é necessário que haja parcerias para promover infra-estrutura adequada a

essas regiões diferenciadas.

4 RAFFESTIN, Claude. Apud: SAQUET, Marcos Aurélio. Abordagens e concepções sobre território. São Paulo: Expressão Popular, 2007. p. 76. 5 RAFFESTIN, Claude. Por uma geografia do poder. Apud: PEREIRA, J. H.V. Processos identitários da segunda geração de migrantes de diferentes etnias na fronteira Brasil-Paraguai.

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MAPA 1: ZONAS DE FRONTEIRA: TERRITÓRIOS ESPECIAIS, 2001.

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Dessa forma estabelecesse a diferença entre limite e fronteira, o limite de um território

pode ser modificado, pode-se perder ou incorporar novas terras, mas a fronteira existirá

sempre. Por outro lado pode-se também adotar uma concepção na qual a fronteira seja o

limite que separa dois países, reafirmando o que foi dito acima, quando se trata da relação de

poder. A esse respeito Oliveira6 afirma:

O sentido de fronteira remete à idéia de limite, resultante da soberania de um Estado sobre um determinado espaço. Portanto são os limites político-geográficos que conformam os territórios nacionais, dentro dos quais se organizam os diversos aspectos da vida social e do Estado.

Em uma região fronteiriça observamos que sua construção é marcada por forças

simbólicas, as quais interferem no cotidiano dos seus atores sociais, que vivem as diferenças

culturais peculiares de uma população miscigenada. Tal poder simbólico é mais presente que

qualquer outro tipo de poder. A magia das fronteiras está na existência de uma desobediência

da ordem nacional em decorrência de estabelecer estatutos próprios. Não tem como negar que

há um modo de vida peculiar em fronteiras. Portanto deve-se ter um olhar diferenciado dessas

regiões que são azadas por sua natureza. Assim o território está sustentado por duas ordens

como observa Oliveira7, uma global e outra local:

A ordem global, externa, está regida sob a lógica dos organismos internacionais e das grandes corporações transnacionais, que ditam os ritmos dos fluxos, em escala planetária, desconsiderando e desconcertando circulações e intenções locais, estendendo, assim, uma manta de feições homogeneizante sobre o território. A outra – local e interna – regida pela organização, atuação e dinâmica dos atores locais imprimem formas variáveis e descontínuas aos fluxos que, por sua vez, permitem fixar as dessemelhanças e identidades aos territórios em relação a ordem global. A justaposição destas duas condições ata na arena do território fronteiriço, complexas redes de intercâmbios.

É evidente que existem relações desiguais entre as nações fronteiriças. E, tais relações

de poder exercidas nas fronteiras também se tornam algo característico, estabelecendo a

6 OLIVEIRA, Naia. Áreas de fronteira na perspectiva da integração Latino-Americana Apud: FEDATTO, Nilce A.S.F. Educação em Mato Grosso do Sul: Limitações da escola brasileira numa divisa sem limites na fronteira Brasil-Paraguai. In OLIVEIRA, Tito C. M. (org.). Territórios sem Limites. Campo Grande: UFMS, 2006. p.492 7 OLIVEIRA, Tito C. M. Fronteiras na América Latina: reflexões metodológicas. p. 03.

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hegemonia de uma nação frente à outra. Consideramos importante observar que a fronteira,

por si só, possui peculiaridades para com as demais regiões de uma nação e, também, é

possuidora de traços próprios quando a comparamos com outras áreas de fronteiras. Dessa

forma o autor8 ressalta que:

Os conflitos, as desconfianças, as regras, bem como os preconceitos são perenes, ainda que pouco aparente, e criam um ambiente de profundo cuidado nas complexas relações de todo tipo, (...). Esta pluralidade de ambiente termina por conceber comportamento similar para a população: os fronteiriços se parecem e criam as condições necessárias para produção e reprodução de uma localidade específica (...). Este ambiente plural transformou as fronteiras em territórios singulares. São singulares em relação ao território-nação e singulares entre si – cada fronteira é uma fronteira.

Assim se abordarmos a formação fronteiriça do estado de Mato Grosso do Sul, Corrêa

evidencia que a fronteira de Mato Grosso, enquanto uma das extremas da ex-Colônia de

Portugal pode ser compreendida como uma área permeável à influência externa9. Desta forma

a autora analisa a delimitação de fronteira:

a abordagem histórica da fronteira no século XIX, vinculou a questão ao Estado Moderno, que pressupõe um território identificado e organizado, uma totalidade de habitantes minimamente integrada (através de um língua nacional, de costumes comuns, de interesses econômicos relativamente articulados, ect.), um controle político e administrativo hegemônico; e, por fim, limites territoriais bem definidos com estados vizinhos estabelecidos em mediações e arbitragens internacionais, definidos suas marcas espaciais.

Ainda sobre a formação fronteiriça do Estado de Mato Grosso do Sul, a autora

evidencia que:

a fronteira de Mato Grosso, enquanto uma das extremas da ex-Colônia de Portugal, pode ser compreendida não apenas como resultado de uma expansão interna (as fronteiras mineiras e agrícolas, por exemplo), mas também como uma área permeável à influencia externa. Nesse sentido é que se pode compreender a fronteira do Sul mato-grossense como parte integrante de um processo global de formação de fronteiras no continente americano.

8OLIVEIRA, Tito Carlo Machado de. Tipologia das Relações Fronteiriças: elementos para o debate Teórico-Prático. In ___________ (Org.). Território sem limites. Campo Grande: Ed. UFMS, 2006. p. 380. 9 CORRÊA, Lúcia Salsa. História e Fronteira. O sul de Mato Grosso. (1870-1920). Campo Grande: UCDB, 1999. p. 44- 49

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Numa tentativa de dividir o continente sul americano entre as Coroas Portuguesa e

Espanhola foi assinado o Tratado de Madri de 1750, porém na prática era muito frágil a julgar

pela dificuldade de aplicabilidade no linde. Assim a demarcação do sul de Mato Grosso foi

sendo estabelecida aos poucos e com a preocupação de limitar o território e definir o controle

da Coroa Portuguesa. Dessa forma decidiu-se fundar às margens do rio Paraguai o Forte

Coimbra em 1775, a partir de então foi necessário à fundação de outros Fortes e povoados ao

longo do rio Paraguai. Aos poucos a área foi povoada e Corumbá fundada em 1778 sob o

nome de Albuquerque.

Os conflitos entre as Coroas eram cada vez mais frequentes em prol da demarcação de

território fronteiriço, nessas agitações foram envolvidos também os índios, que ora estavam

ao lado dos brasileiros ora ao lado dos espanhóis, mas sempre do seu próprio lado,

viabilizando seus interesses10.

As dificuldades foram inúmeras e a cidade de Corumbá ficou, por muito tempo,

esquecida pelo Império. Seus habitantes viviam na miséria e como se fosse pouco a cidade

ainda foi destruída por um incêndio em 1800. O tempo foi passando, a fronteira estava

demarcada e materializada como território brasileiro, mesmo que sem condições necessárias

para uma região de fronteira, extremamente importante pelo papel, que deveria assumir por

sua condição territorial. Contudo sem o aparato necessário à defesa do território nacional, sua

principal função até então.

Somente no início do século XIX, Corumbá começou a acolher imigrantes, a iniciar

pelos que atuavam no mercado internacional, como o português Manoel Cavassa11,

importante comerciante na cidade. Nesse período apareceu um novo componente da estrutura

comercial que ali se implantou, na figura do mascate fluvial, pessoas dedicadas ao lucrativo

comércio de retalho ambulante. Tal atividade permitiu rápido enriquecimento considerando as

condições da região sul de Mato Grosso. O mascate impôs os mecanismos de troca com

grande vantagem e em detrimento da população ribeirinha, uma vez que deteve o controle

10 Cf. ESSELIN, Paulo Marcos. . Índio, Gado e Blindagens na Construção da Fronteira no Sul de Mato Grosso. Boletim Paulista de Geografia n. 32, 2008. 11 “Manoel Cavassa representou um caso típico de mascate fluvial e descreveu detalhadamente sua carreira comercial num Memorandum ao Presidente da República dos Estados Unidos do Brazil, em 22 de Fevereiro de 1894. Imigrante português muito ligsdo `s colonis italiana que se estabeleceu na América por laços de parentesco, Cavassa fixou-se em Corumbá no período anterior à invasão paraguaia e com um pequeno capital inicial, como ele próprio descreveu, conseguiu acumular uma considerável fortuna com a importação e exportação de mercadorias através do comércio fluvial. Cavassa edificou a primeira casa de alvenaria em Corumbá, por volta do ano de 1858, onde havia somente ranchos de palha” Reinvindicou também após a Guerra, a urbanização da rua do Porto. CORREA, , V.B. et al Casario do Porto de Corumbá. Campo Grande: Fundação de Cultura de MS, 1985. p. 31

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sobre o meio de transporte e comunicação e de pequenos estoques de gêneros de primeira

necessidade cujo consumo era garantido12.

Corumbá, no entanto foi muito importante para o estabelecimento do poder central,

primeiro português e depois brasileiro, sobre a fronteira Oeste, sem, contudo receber a

atenção que lhe era devida. Sua povoação foi mal planejada bem como toda estrutura que a

ela convinha. Corrêa13 afirma que:

Os documentos oficiais e as impressões de viajantes, que registraram os tempos pioneiros de Corumbá, revelaram, em última análise, os sacrifícios e os padecimentos da sua população inicial, bem como as medidas inadequadas de seus comandantes, ainda que tivessem propósitos relevantes de proteger e ocupar efetivamente esse território. A história de Corumbá foi, portanto, e sem dúvida alguma, feita de sangue, suor e lágrimas, o que possibilitou, entretanto, a conquista e a formação definitiva do atual contorno dessa fronteira oeste.

Através do Porto de Corumbá, que se fortaleceu com investimentos de imigrantes, a

prática do comércio, entre outras, se encarregou de ser o principal elemento na construção

dessa fronteira. A internacionalização das águas platinas já era fato consolidado, enquanto

prática econômica, porém o mesmo não ocorria no campo político, visto que a Guerra sinaliza

essa questão não resolvida.

Corumbá então se vê envolta ao comércio do próspero casario contrastando com a

pobreza reinante em circunstância da fome e falta de estrutura que abarcasse sua ainda restrita

população. A navegação foi, por um lado à implantação de uma atividade econômica que

proporcionasse a ligação, via fluvial com outros países, ampliando o fluxo de mercadorias no

Porto, bem como assegurar sua estratégica posição geográfica da fronteira oeste para o

Império. A relação com o Paraguai acerca da internacionalização das águas platinas – no

campo político - perpassava por assuntos complexos desde o governo de Francia.

No entanto a ameaça de um conflito propriamente real com os paraguaios só ocorreu

quase um século após o início da formação dessa fronteira. Tal agitação foi se intensificando

até que eclodiu a Guerra da Tríplice Aliança (1864 – 1870) entre os aliados – Brasil,

Argentina e Uruguai – contra o Paraguai.

A Guerra perdurou por cinco anos, durante esse período a cidade foi invadida pelas

tropas paraguaias, retomada pelas tropas brasileiras sob o comando do Coronel Antonio Maria

12 Cf. CORRÊA, V.B. et al Casario do Porto de Corumbá. Campo Grande: Fundação de Cultura de MS, 1985. 13 CORRÊA, V.B. Corumbá: Terra de Lutas e de Sonhos. Brasília: Gráfica do Senado, 2006. p. 14

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Coelho. Houve a reestruturação de Corumbá, nesse período como antes da Guerra a presença

de imigrantes foi de suma importância para o desdobramento da história daquela cidade, bem

como de fundamental significância para o estabelecimento das atividades comerciais no

Porto. Aquela cidade diferenciou-se das demais cidades por apresentar, principalmente em sua

urbanização aspectos heterogêneos como descreve Marin. 14

Corumbá diferencia-se das demais cidades brasileiras pelo aspecto urbanístico. A cidade recebeu influência platina e européia nas construções civis. Particularizava-se entre as demais cidades de Mato Grosso pelo seu cosmopolitismo. As casas comerciais exibiam produtos europeus e no teatro apresentavam-se operetas, zarzuelas e comédias de Buenos Aires, Montevidéu e Asunción. Os cafés, bares, balneários e os jardins públicos permitiam opções culturais e de lazer. As ruas eram largas e calçadas e os passeios ladrilhados eram comparáveis aos existentes no Rio de Janeiro. As famílias mais abastadas realizavam viagens periódicas às cidades platinas e às principais cidades do litoral brasileiro. O complexo arquitetônico denominado “casario do porto”, em estilo neoclássico italiano, foi construído entre o final do século XIX e início do XX. O casario chama atenção pelo ecletismo da arquitetura e pela sofisticação das construções, nos seus jardins e passeios públicos. Enfim, Corumbá era uma cidade cosmopolita e reunia elementos dos países platinos, andinos e europeus, seja na arquitetura ou no estilo de vida da maioria dos moradores (Cidade, 1943, 116).

Tal atividade propiciou a cidade status de um dos principais entrepostos comerciais

do país. Assim como a pecuária que também se apresentava como suporte na economia da

cidade, contemplando personagens ilustres das tradicionais propriedades rurais pertencentes à

elite local. Em suas fazendas também se encontravam inúmeros trabalhadores imigrantes.

Corrêa15 observa que a abertura do porto de Corumbá significou a fomentação da cidade,

tanto populacional quanto econômico visto que:

A abertura da livre navegação do rio Paraguai propiciou de fato o surgimento de um expressivo movimento de pessoas e de mercadorias no porto de Corumbá, que passou a desempenhar as funções de principal entreposto comercial da Província de Mato Grosso e pólo catalisador do desenvolvimento de toda a região sul. O Pantanal mato-grossense passou então a ser mais intensamente ocupado com a abertura de fazendas de gado, cujo núcleo inicial surgiu nos arredores de Cuiabá no século XVIII.

14 MARIN, J. R. Fronteiras e Fronteiriços: Os Intercâmbio e a Nacionalização da Fronteira no Sul do Estado de Mato Grosso. Fronteiras: revista de História, Campo Grande, MS, 4/5 (7/9): 97-122, 2000/2001. p. 157

15 CORRÊA, Valmir B. et al. ..op. cit.. p. 30

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Segundo Marques16 há indícios que o início da construção da Companhia de Estrada

de Ferro Noroeste do Brasil, em novembro de 1905, com origem em Bauru e destino a

Cuiabá, no Mato Grosso foi marcada por dificuldades em construir a ferrovia até a cidade de

Cuiabá, fazendo com que o traçado original, em 1908, fosse alterado para Corumbá, divisa

com a Bolívia e, nesse sentido, em 1914 a Estrada de Ferro Noroeste do Brasil liga as duas

bacias fluviais: Paraná e Paraguai, aos países vizinhos: a Bolívia (através de Porto Esperança)

e o Paraguai (através de Ponta Porã), impulsionando o desenvolvimento do Estado do Mato

Grosso, principalmente da porção sul do Estado, atual Mato Grosso do Sul,

consequentemente, a expansão desses ramais contribuiu no processo de integração da

fronteira com o Paraguai e a Bolívia. A ferrovia, portanto, constituiu-se num dos elementos

propulsores do povoamento entre fronteiras até então praticamente subordinadas à navegação

platina.

Percebemos então que apesar de existir territorialmente a fronteira Brasil – Bolívia,

Corumbá, que após a Guerra do Paraguai e por muitas outras décadas, foi importante porto

fluvial nos caminhos entre o Oceano Atlântico e o centro do Continente, entretanto possuía

intimidade fronteiriça com o Paraguai e não com a vizinha Bolívia, com o qual passou a

manter estreitas relações de fronteira a partir da década de 195017. Por tudo até aqui

apresentado, a cidade de Corumbá é peculiar não só por ser fronteiriça, mas por ter intimidade

fronteiriça com outros países, entendemos por isso uma cidade miscigenada culturalmente,

pois a mesma preserva hábitos provenientes de algumas nacionalidades.

A esse fato podemos atribuir também uma existência de várias identidades fronteiriças

na cidade. Sobre esse assunto há várias definições, tanto com questões de

multiplaterritorialidade como multiterritorialidade, onde os atores sociais exercem influência

no cotidiano popular. Faz-se necessário, entretanto, discutir um pouco mais acerca desses

conceitos sobre território, é interessante constatar que todos nós vivemos em uma

multiterritorialidade. Uma vez que compartilhamos e convivemos com vários grupos ao

mesmo tempo, grupos sociais familiares, grupos de amigos, no trabalho, ect, como

observamos a citação de Barel (1986, p. 131). O autor ressalta que:

(...) é raro que apenas um território seja suficiente para assumir corretamente todas as dimensões de uma vida individual ou de um grupo. O individuo, por

16 MARQUES, Ângela. M. Movimentos migratórios fronteiriços: Bolivianos e Paraguaios em Mato Grosso do Sul. XXVII Congresso Anual da ILASSA, 2007. 17 OLIVEIRA, M. A. M. Espaço, Tempo e Imigrante: O desconcerto de uma fronteira. In: CHIAPPINI, L.: MARTINS, M. H. (Org.). Cone Sul: fluxos, representações e percepções. São Paulo: Hucitec, 2006. p. 254.

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exemplo, vive ao mesmo tempo ao seu ‘nível’, ao nível de sua família, de um grupo, de uma nação. Existe, portanto multipertencimento territorial.

Nesse contexto é que não podemos dissociar o processo TDR – territorialização,

desterritorialização e reterritorialização – até porque não há, na prática, a desterritorialização

para que haja a reterritorialização, é um processo quase simultâneo, sem interrupções

temporais, com exceção de alguns raros casos. É um processo de movimento constante. Esse

processo gera um espaço temporalizado em razão de informações que circulam e comunicam,

bem como de fatores culturais que o condiciona.18 Somos então atores sociais que

pertencemos a vários grupos da sociedade simultaneamente.

A multiplaterritorialidade também está presente no contexto do espaço fronteiriço,

uma vez que se trata de grupos de atores sociais oriundos de diversas nacionalidades.

Somente a partir do século XX, foi intensificado o contingente populacional no Estado

e consequentemente na cidade de Corumbá. Esse aumento populacional contribuiu para

mobilizar as diferenças culturais no município. A influência dos imigrantes fica evidente nas

construções, em especial no casario do porto, construído em estilo neoclássico italiano. As

construções possuem arquitetura sofisticada deixando evidente a ostentação de seus

proprietários e dos seus estabelecimentos. Ou seja, a cidade demonstrava por sua arquitetura

ou hábitos a influência marcante de elementos de países dos seus primeiros imigrantes.

Notamos em toda a história da cidade de Corumbá a presença efetiva de imigrantes

que ajudaram na sua construção e na tradição de sua população, não podemos esquecer que

muitos imigrantes também atuaram na consolidação desse território. No entanto a fronteira

territorial é entre Brasil e Bolívia, porém não percebemos a autêntica integração entre as

cidades vizinhas, talvez até pela falta da política de integração mencionada acima, ou por

ausência de afinidades ou ainda de falsa hipocrisia, quando se trata de preconceito. Há uma

ambiguidade em relação ao país, ou seria somente com as cidades fronteiriças, cuja população

mestiça sofre com a marginalização por parte de alguns brasileiros que ignoram tal

proximidade.

Mesmo a cidade tendo sido notavelmente - analisando sua história - acolhedora com

seus estrangeiros, é importante reconhecer que houve, em contrapartida, a existência do

18 SAQUET, Marcos Aurélio. Abordagens e Concepções sobre Território. São Paulo: Expressão Popular, 2007. p. 78.

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preconceito. Aos bolivianos recaem um sentimento de tolerância por não ter outra alternativa,

afinal não se pode eliminar ou trocar seu vizinho fronteiriço. Sobre isso Silva19 observa:

(...) E o que se visualiza nesta relação dos brasileiros para com os bolivianos não é algo vinculado ao afeto ou/e o bem estar, parcela de brasileiros não gosta dessa relação; ele a suporta, assim como se suporta um vizinho indesejado, que é próximo porque não é possível tirá-lo fisicamente de onde está. Neste sentido, para delimitar bem o espaço e definir quem é quem, marca-se uma linha divisória invisível, sendo que esta vai se construindo através de um distanciamento silencioso, sutil por diversas vezes, mas muito eficiente. Esta proximidade existente faz emergir o conflito entre não querer, mas tolerar, este está entrelaçado com o preconceito assim como a solidariedade está entrelaçada com a permissão, este significaria permitir o outro (boliviano) fazer parte do seu cotidiano mergulhado em um laço recíproco, onde não se faria necessário falsear uma relação solidária, mas ser de fato uma relação alicerçada no bem estar.

Em uma cidade fronteiriça que se constituiu, marcantemente, por imigrantes,

acolhendo-os prontamente, em particular os provenientes da Europa, a tal ponto de se

miscigenarem intensamente, a manifestação de preconceito possui contornos desconcertantes.

19 SILVA, Solange Gomes da. Bolivianos e brasileiros em Corumbá, MS: preconceitos e cooperação mútuos. Corumbá, MS, 2004 (mimeo). p. 12

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1.1 REDES SOCIAIS EM TERRITÓRIO FRONTEIRIÇO

Num território formado por vários grupos de imigrantes, como é o caso da cidade de

Corumbá, a formação das redes é inevitável, contemplar objetivos, metas comuns aos seus

componentes demonstrando a integração entre seus membros é uma prerrogativa. Essa

consistência deve ser de forma linear, contínua. Portanto, a união de grupos que viabilizem

projetos beneficiando a todos e por consequência a si próprio, interagindo com a sociedade

local, formam a adesão de uma sociedade em redes. Sobre essa trama de retalhos na formação

de uma rede Costa salienta.

Dessa forma, a realidade se apresenta como um Manto de Arlequim, porque o manto que configura o mundo não é feito de um único tecido, mas de retalhos, que ao se conectarem por intermédio das linhas formam uma veste aparentemente homogênea, mas que ao ser dissipada a eloqüência do poder do discurso se revela em sua totalidade heterogênea (Serres, 1993). Pensar a sociedade de redes é atentar para essa totalidade fragmentada, mas complexa, onde a rede é uma constituinte de diversos pontos conectados. E esse é seu objetivo – a conexão de pontos, mostrando uma configuração territorial aparentemente homogênea, mas que quando analisada se revela desconexa em muitos pontos, onde o que realmente se revela é uma realidade heterogênea. Nesse caso, não é compreender o objeto que se torna o mais importante, mas o conteúdo das ações que os produzem e os põem em funcionamento. 20

As redes de solidariedades estão presentes em Corumbá e pensar em identificação de

um grupo, é de qualquer forma pensar na sua compreensão, um conceito aparentemente

simples na prática, mas que na teoria torna-se complexo. Sobre esse conceito de identificação

Hall21 descreve

Trata-se de um campo semântico demasiadamente complexo para ser deslindado aqui, mas é útil estabelecer, pelo menos indicativamente, sua relevância para a tarefa que temos à mão. Na linguagem do senso comum, a identificação é construída a partir do reconhecimento de alguma origem comum, ou de características que são partilhadas com outros grupos ou pessoas, ou ainda a partir de um mesmo ideal. É em cima dessa fundação que ocorre o natural fechamento que forma a base da solidariedade e da fidelidade do grupo.

20 COSTA, Jodival Mauricio da. Redes e Território: Notas sobre a reticulação espacial. IX Encuentro Internacional Humboldt. Juiz de Fora, 2007. 21 HALL, Stuart. Quem precisa da identidade? In: SILVA, Tomaz Tadeu da. (Org.). Identidade e diferença. Rio de Janeiro; Vozes, 2007. p. 105-106.

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O estabelecimento das redes sugere, no caso específico dos paraguaios, um resguardo

da sua identidade, a esse respeito o autor ressalta que.

Essa concepção aceita que as identidades não são nunca unificadas; que elas são, na modernidade tardia, cada vez mais fragmentadas e fraturadas; que elas não são, nunca, singulares, mas multiplamente construídas ao longo de discursos, práticas e posições que podem se cruzar ou ser antagônicos. As identidades estão sujeitas a uma historicização radical, estando constantemente em processo de mudança e transformação.

Seguindo esse conceito de “pluralidade individual”, as redes nos permitem esse olhar,

uma vez que participamos em diversas redes. Somos capazes de conviver com uma relação e

integração que o mundo nos oferta, conciliar política, economia, cultura de várias naturezas

nos leva a compreensão do indivíduo e suas “faces”, Saquet observa que “cada indivíduo age,

ao mesmo tempo, em diversas redes, participando com objetivos, formas, intensidades e

significados distintos, no mesmo ou entre diferentes lugares”.

São as relações sociais que, de certo modo, dão forma ao território, pois envolve

vários elementos como a compreensão, reciprocidade, é uma construção contínua de via de

mãe dupla. E é em decorrência dessas relações sociais que é evidenciada a identidade da

população de região de fronteira. As redes envolvem aspectos essenciais para a formação

dessa identidade. A coesão dessas relações é inerente aos seus atores sociais, a comunicação,

a reciprocidade, a solidariedade e a forma de atuação das redes contribuem para solidificar um

território, aparentemente diferente, torna-se, de modo geral, único, ou seja, vários territórios

agrupados formam um grande e heterogêneo território aparentemente homogêneo.

Os elementos que compõem a fronteira, aqui representada na cidade de Corumbá

reforçam a diversidade cultural presente naquela cidade. As redes sociais relacionam-se

abarcando diferenças e semelhanças, compartilhamentos, solidariedade, troca de informações,

é um verdadeiro exercício de democracia em uma cidade que demonstra, historicamente, ser

receptiva ao imigrante.

A preservação e perpetuação da tradição é um forte elemento na formação de uma

rede, quando essa se encontra em um território heterogêneo oportuniza sua concretização,

tendo como moldes básicos os citados acima, possibilitando assim a junção do grande quebra

cabeça que é uma fronteira.

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2 O PARAGUAI Sabemos que o Paraguai apresenta uma população caracteristicamente mestiça em

virtude da junção do espanhol com os índios, estes de costumes muito marcantes e de

inúmeras etnias. Nesse sentido é de conhecimento comum que o Paraguai tem sua origem dos

povos indígenas, sua cultura representa, em grande parte, seus costumes, que se difere entre si

em decorrência de suas várias comunidades indígenas. A colonização dos espanhóis também

agregou a cultura indígena nessa inevitável aproximação, que suscitou a base populacional do

que representa a atual sociedade paraguaia, a esse respeito o arqueólogo Martins22 acrescenta.

Para os índios, inicialmente, era interessante o laço familiar com os espanhóis. Eles os tinham como parentes e isso representava status e uma suposta proteção. Ao perceberem este aspecto cultural dos índios e a utilidade que ele trazia para as metas coloniais, os espanhóis, astutamente conduzidos por Irala, promoveram casamentos em massa e coletivos. Cada espanhol casou-se ao mesmo tempo com várias índias, originando, dessa forma, em poucos anos, uma extensa prole mestiça, que foi, sem dúvida, o alicerce demográfico da atual sociedade paraguaia.

Ainda acerca dessa constante política de miscigenação, existe ainda a questão das

terras, garanti-la era uma forma de permanecer produtivo no país, a esse fato deveu-se

inúmeros conflitos, visto que a economia era sustentada pela agricultura. Sobre isso Susnik23

observa.

La agricultura era la actividad de la mayor parte de la población; el beneficio de la yerba, el estanco del tabaco, la abundancia del ganada y la explotación de los bosques en los obraje para la extracción de la madera, eran los principales rubros de exportación del Paraguay por esta época, además cobraban importancia los astilleros, las fábricas del tabaco torcido, y el nuevo oficio de la curtiembre para la producción de suelas para zapatos, todos éstos rubros de exportación de productos elaborados

22 MARTINS, G. R. A Cultura Guarani na Formação da Sociedade Paraguaia. ARCA. Campo Grande, MS, nº 4, 1993. p. 9. 23 SUSNIK, 1988, Apud: PUSINERI, Adelina. Indígenas Monteses y Pueblerinos em el Paraguay del Siglo XIX. “Comunidad o Libertad”. Fronteiras: revista de História, Campo Grande, MS, 4/5 (7/9): 97-122, 2000/2001. p. 12.

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Ainda sobre a questão da terra, e a exigência de se produzir intensamente Pusineri24

ressalta.

A los “tava-pueblos”25 coloniales de indígenas guaraní – a mediados del siglo XVIII y hacia el fin de la colonia, - debido a la explotación de los yerbales intensivamente, al gran auge de los tabacales, se les exigieron desde el Virreinato remesas de tabaco mensuales. Cada tava tuvo que cumplir con un cupo, creándose fábricas, demandando mano de obra de los tava, cuyos administradores, faltando los guaraní pueblerinos se vieron obligados a tomar mestizos y criollos pobres, quienes se asentaban en forma clandestina en tierras no cultivadas de los tava, denominándoseles ya “feligreses externos”. Se inicia así una lucha por la tierra, pues el criollo se encontraba en desventaja por no poseer tierras, viendo en las baldía y sin cultivar de los tava, una ocasión de ocuparlas, ya que los indígenas también las abandonaban para ir a los conchabos.

A proximidade entre colonizadores e nativos foi fundamental à relação projetada

futuramente pelos espanhóis, é evidente que os indígenas não imaginavam tais conseqüências

desse ato. Os índios da etnia Guarani foram de importância inquestionável a essa relação,

mister salientar a habilidade dos espanhóis como relata ainda o autor.

Nos primeiros momentos do contato inter-étnico, a aliança era vantajosa para ambos os lados. Os espanhóis garantiram as suas necessidades vitais em alimentos e recursos humanos para a implantação definitiva do modelo colonizador, em troca da proteção militar que dariam aos seus parceiros, em confrontos com outras tribos. (...) Nos anos iniciais do convívio, os termos da relação eram equilibrados e formais, com algumas doses de cordialidade mútua. (...) Os índios não tinham consciência de que as intenções colonizadoras eram bem mais abrangentes. A habilidade e oportunismo da diplomacia conquistadora ludibriou os chefes guarani a ponto destes não perceberem que estavam comprometendo, irremediavelmente, a sua própria soberania. (...) A composição com os guarani era fundamental para os planos ibéricos de conquista do Alto-Paraguai e utilização destes como trampolim para investidas terrestres no noroeste chaquenho, onde, acreditavam, estaria localizado o “Eldorado” ou a mitológica “Serra de prata”, que, de acordo com as tradições indígenas, ocultavam as imensas riquezas acumuladas por um rei branco – Reino do Paititi. (...) Sem o apoio da infra-estrutura econômica e demográfica Guarani, teria sido impossível para os espanhóis empreenderem, entre 1537 e 1550, as sucessivas expedições militares e exploratórias no território cha-quenho e sul-mato-grossense, infestados de perigos e densamente povoados por tribos refratárias aos colonizadores26.

24 PUSINERI, Adelina. Indígenas Monteses y Pueblerinos em el Paraguay del Siglo XIX. “Comunidad o Libertad”. Fronteiras: revista de História, Campo Grande, MS, 4/5 (7/9): 97-122, 2000/2001. p. 13. 25 Termo referente a população indígena paraguaia, que em 1793, apresentava uma população aproximada de 100.000. 26 Idem. p. 08

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Em virtude dessa aproximação inevitável pelas circunstâncias apresentadas acima, a

forte influência das comunidades indígenas no Paraguai, contribuiu para que o idioma nativo

– o guarani - torná-lo oficial junto ao castelhano. Segue o autor.

A cultura paraguaia, em grandes aspectos, deve muito aos povos indígenas que originalmente ocuparam as Bacias do Prata e do Paraguai. Exemplo disso é o idioma Guarani, herança maior deixada pelos nativos do século XVI, que hoje junto ao Castelhano, é ensinado como língua oficial no Paraguai. 27

O Paraguai conseguiu sua independência na primeira metade do século XIX, mais

precisamente em 1811, após depor o então governador Bernardo Velasco, os paraguaios

liderados por Fulgencio Yegros, Pedro Juan Caballero e Vicente Ignácio Iturbide,

proclamaram a independência do país em 14 de maio. Em 1814 assume o poder no Paraguai

Jose Gaspar Rodriguez de Francia, instaurando a ditadura no país.

27 Idem. p. 04

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MAPA 2 - Formação Territorial dos Estados da América do Sul: Independência Paraguaia.

Adaptado de PASTORE, Fortunato. Soldados Nus: Filhos do Acaso ou Filhos da Glória. Estratégia Militar e Economia na América Latina Independente, 1810-2000. São Paulo, 2007 Tese (Doutorado em História Social) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo.

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2.1 A GRANDE GUERRA Breve Histórico

Na segunda metade do século XIX, houve a maior guerra, na visão de muitos autores,

ocorrida na América do Sul, a estatística não precisa o número exato de mortos, entretanto o

que se sabe, ao certo, é que inúmeras vidas foram perdidas num confronto que se arrastou por

anos. Antes, porém a principal preocupação do Paraguai após sua independência, ocorrida em

15 de maio de 1811 foi, além de preservá-la, manter a livre navegação nos rios platinos.

Quando já consolidada e reconhecida sua independência, faltava a definição do território,

enquanto limite, com seus vizinhos platinos. A Argentina e o Brasil mantinham intensas

relações com a Europa, em particular com a Inglaterra, em contra partida o Paraguai manteve-

se autônomo, isolado política e economicamente de seus vizinhos, algumas medidas foram

implantadas reforçando tal objetivo, como relata MOTA. 28

O Paraguai manteve-se isolado. A longa ditadura do doutor José Gaspar Rodríguez de Francia isolou o país, ao cortar relações diplomáticas e comerciais com os demais, exceção feita ao Brasil. Foram proibidas a imigração e a emigração, tentou-se atingir uma certa auto-suficiência baseada na agricultura e na industria artesanal. Os dois ditadores que lhe sucederam no poder, Carlos Antonio López e o filho, Francisco Solano López, abriram o país ao comércio exterior e atraíram imigrantes e técnicos estrangeiros.

Com a guerra civil uruguaia declarada entre os partidos blancos e colorados que

contou com a intervenção brasileira em favor do partido colorado, sob o comando do general

uruguaio Venâncio Flores, que o Paraguai declara guerra ao Brasil e em seguida a Argentina,

quando essa tentar manter-se neutra e tem suas terras invadidas pelos paraguaios. Vejamos

como esses fatos ocasionaram a Guerra segundo Bethell. 29

O país já era e permanecia sendo não apenas geograficamente isolado (até a derrota da Bolívia na Guerra do Pacífico, o Paraguai era o único Estado latino-americano cercado por terras), uma nação que falava predominantemente a língua guarani, como era também um país culturalmente isolado. Sob a ditadura do doutor José Gaspar Rodríguez de

28 MOTA,Carlos Guilherme. A Guerra contra o Paraguai A História de um Silêncio. In: MARQUES, M.E.C.M. Guerra do Paraguai 130 Anos Depois. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1995. p.44 29 BETHELL, Leslie. A Guerra do Paraguai História e Historiografia. In: MARQUES, M.E.C.M. Guerra do Paraguai 130 Anos Depois. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1995. p. 14

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Francia (1813-1840) e, em menor proporção (pelo menos até a década de 1850), sob a ditadura do seu sucessor, Carlos Antonio López, o Paraguai tinha se isolado política e economicamente de seus vizinhos. Seu papel fora bem pouco significativo nas guerras civis e interestaduais do Rio da Prata durante a primeira metade d século XIX. Ele tinha, contudo, muito receio e alimentava sentimentos de profunda desconfiança com relação aos dois vizinhos – muito maiores muito mais populosos do que ele e potencialmente predatórios - as Províncias Unidas do Rio da Prata (Argentina) e o Brasil, que, por sua vez, tinha pendências envolvendo domínio territorial contra o Paraguai. (...) Durante a década de 1850 o governo de Carlos Antonio López passou a implementar, com crescente empenho, um política de modernização econômica e militar passando então a fazer uso efetivo da tecnologia britânica e dos técnicos britânicos.

Após a morte de Carlos Antonio López, assume o poder no Paraguai se filho Francisco

Solano López que tinha como aliado natural o partido uruguaio dos blancos, adversários do

partido colorado que contava com o apoio do Brasil e da Argentina. Sobre esse momento que

antecedeu a Guerra o autor evidencia ainda:

Francisco Solano López tinha assumido o poder no Paraguai, em outubro de 1862, depois da morte do pai. Inicialmente hesitante em estabelecer uma aliança formal com os blancos – seus aliados naturais - contra os colorados, no Uruguai, agora este último contava com o apoio tanto do Brasil como o da Argentina, durante a segunda metade daquele ano, López começou, numa espiral ascendente, a advertir a Argentina e o Brasil contra o que ele considerava uma ameaça crescente ao equilíbrio de poderes existentes no Rio da Prata, que, em sua opinião, garantia a segurança, a integridade territorial e a independência do Paraguai. Ele também vislumbrou uma oportunidade de fazer sua presença sobressair na região, uma chance de desempenhar um papel que estivesse à altura do novo poder econômico e militar do Paraguai. No início de 1864, López começou a se mobilizar, tendo em vista uma possível guerra. 30

Tais atitudes paraguaias deflagram a ação mais temida pelo Paraguai, a união dos seus

vizinhos contra seu país. No entanto a guerra apresentava-se reprovada, ao que tudo indica

inicialmente, pelos povos brasileiro e argentino, como assinala Bethell.

Nem o Brasil nem a Argentina tinham uma contenda suficientemente séria com o Paraguai que justificasse uma situação de guerra. Eles não desejavam nem planejavam uma guerra com o Paraguai. A Argentina não contava com o apoio nem era uma reivindicação popular. Na verdade, a guerra provou impopular, falando em termos genéricos, nos dois países, mas sobretudo na Argentina. Mas a necessidade de se defender contra a agressão paraguaia

30 Idem. p. 15-16

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(fosse ela em grande parte provocada ou justificada) ofereceu aos dois países (Brasil e Argentina) uma oportunidade de fazer um “acerto de contas” com o Paraguai, bem como de punir e enfraquecer, talvez mesmo de destruir, um poder emergente e preocupante dentro de sua região. 31

Para Souchaud dentre os países envolvidos, o Paraguai foi quem mais sofreu as

consequências desse conflito com perdas irreparáveis, o autor também faz uma breve análise

acerca do legado do ditado Solano López.

El Paraguay e a Triple Alianza se enfrascan oficialmente en una guerra al final de la cual las pérdidas territoriales y demográficas para el Paraguay son considerables. A partir de 1862, fecha del fallecimiento del general Carlos Antonio López, el poder es asegurado por su hijo Francisco Solano López que muera en 1870 en el campo de batalla ultimado por las tropas brasileñas, en la batalla de Cerro Corá, en el actual departamento de Amambay. Francisco Solano López representa mucho más que su padre el símbolo de la resistencia heroica del Paraguay al imperialismo extranjero. Una vez más la identidad paraguaya parece forjarse sobre la voluntad heroica, encarnizada y desesperada de resistencia a la invasión extranjera. Las consecuencias espaciales y territoriales directas e indirectas de este conflicto son esenciales pues se hacen sentir más allá de la segunda mitad del siglo XX. El balance de pérdidas humanas paraguayas no ha sido establecido con certeza; se considera comúnmente que la población se redujo en cinco años aproximadamente al cuarto de su volumen de antes de la guerra. (…) .Una verdadera catástrofe demográfica. En realidad, estas cifras son objeto de controversia (...) lo que tendería disminuir la importancia de esta catástrofe demográfica. Establecer toda la verdad sobre este episodio histórico es importante ya que los efectos de la guerra son comúnmente evocados para explicar los erráticos de los modelos paraguayos del siglo seguinte.32

Para Bethell a Guerra pode ser dividida em três principais fases a primeira quando da

invasão paraguaia no sul de Mato Grosso, culminando com a batalha do Riachuelo, a segunda

quando os aliados invadiram o território paraguaio e conquistaram a fortaleza fluvial de

Humaitá e a terceira quando finda a Guerra com a morte de Solano López, o autor descreve

tais momentos.

A Guerra em si pode ser dividida em três fases. A primeira teve inicio com as limitadas ofensivas paraguaias contra Mato Grosso, em dezembro de 1864, e Corrientes, em abril de 1865. Em maio de 1865, o exército paraguaio finalmente atravessou as Missiones e invadiu o Rio Grande do Sul. No começo muito bem-sucedida, a invasão acabou sendo contidas pelas forças

31 Idem. p. 16 32 SOUCHAUD, Sylvain. Geografía de la migración brasileña en Paraguay. Asunción: UNFPA, 2007. p. 68-69.

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aliadas. Os paraguaios nunca chegaram a alcançar o Uruguai. (...) No fim do primeiro ano da Guerra, as únicas tropas paraguaias que permaneciam em solo aliado eram umas poucas localizadas em Mato Grosso (que continuou como front secundário dentro da Guerra). Nesse ínterim, em 11 de junho em Riachuelo, no Rio Paraná, logo abaixo do porto fluvial de Corrientes, na única batalha naval da Guerra que realmente foi importante, a marinha brasileira destruiu a marinha paraguaia e instituiu um efetivo bloqueio do Paraguai, mantido até o final da Guerra. A segunda e principal fase (que incluiu diversos períodos em que quase não havia luta de fato) começou quando os aliados finalmente invadiram o Paraguai, em abril de 1866, e estabeleceram seu quartel-general em Tuiuti. Nesse local, em 24 de maio, eles rechaçaram uma violenta investida paraguaia e ganharam a primeira grande batalha terrestre da Guerra. (...) os aliados sofreram a sua pior derrota na Guerra. Eles não renovaram seus esforços de avanço até julho de 1867, quando foi iniciado um movimento para cerca a grande fortaleza fluvial de Humaitá, que bloqueou o acesso ao rio Paraguai e à capital paraguaia, Assunção. Em uma terceira fase da Guerra López constituiu um novo exército na Cordilhera a leste de Assunção e liderou uma campanha de guerrilha que, embora limitada, foi bem-sucedida, contra as forças aliadas. Finalmente foi derrotado e teve suas tropas massacradas, em 16 de agosto de 1869, na última grande batalha dessa Guerra. O próprio López escapou novamente. Ele e sua companheira foram perseguidos, em direção ao norte, pelas tropas brasileiras, por mais uns seis meses, até que López foi finalmente encurralado e morto em Cerro Cora, no lado extremo da região nordeste do Paraguai, em 1º de março de 1870.33

Em decorrência da guerra civil no Uruguai envolvendo os partidos blancos e

colorados e consecutivas intervenções paraguaias e brasileiras em crescente apoio a seus

respectivos aliados eclodiu a Guerra da Tríplice Aliança em 1864 com a invasão paraguaia ao

território brasileiro. Após a invasão de Corrientes a Argentina também entra na guerra contra

o Paraguai, em 1865 é assinado o Tratado da Tríplice Aliança entre o Brasil, a Argentina e o

Uruguai contra o Paraguai. As invasões ocorridas no Brasil envolveram o Rio Grande do Sul

e o sul de Mato Grosso. Tais invasões refletiram o poderio paraguaio e a organização da

expedição brasileira. Entre derrotas e vitórias a guerra arrastou por anos findando-se em 1870

com a vitória dos países da Tríplice Aliança. Os acordos de paz assinados pelos envolvidos

consolidou os anseios dos vencidos como relata Squinelo34

Os acordos de paz que se configuraram após a Guerra consolidaram os anseios dos grandes leões platinos. O Tratado de Paz e Amizade Perpétua e de Limites imposto ao Paraguai pelo Brasil e assinado em 09/01/1872 garantiu a esse último a posse do território entre os rios Apa e Branco, no

33 BETHELL, Leslie. A Guerra do Paraguai História e Historiografia. In: MARQUES, M.E.C.M. Guerra do Paraguai 130 Anos Depois. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1995. p. 18-19-20 34 SQUINELO, Ana Paula. A Guerra do Paraguai, essa desconhecida: ensino, memória e história de um conflito secular. Campo Grande: UCDB, 2003. p. 20-21

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atual Mato Grosso do Sul, conforme reivindicação anterior ao conflito. Outro Tratado, assinado em fevereiro de 1876, cedeu os territórios litigiosos das Missiones, entre os rios Bermejo e Pilcomayo, à Argentina. Os territórios entre os rios Pilcomayo e Verde foram submetidos ao arbítrio norte-americano, que concedeu a região ao Paraguai.

MAPA 3 - Principais Disputas de Fronteira envolvendo o Paraguai: A Grande Guerra e Guerra do Chaco, com os Territórios perdidos e incorporados.

Adaptado de PASTORE, Fortunato. Soldados Nus: Filhos do Acaso ou Filhos da Glória. Estratégia Militar e Economia na América Latina Independente, 1810-2000. São Paulo, 2007 Tese (Doutorado em História Social) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo.

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Passado mais de um século do fim da Grande Guerra ou Guerra da Tríplice Aliança é

atribuída a ela os constantes acontecimentos ocorridos no Paraguai nos anos que a seguiram.

A destruição de seu território foi uma catástrofe, apontada como grande empecilho de seu

desenvolvimento e do longo período de instabilidades políticas paraguaias. Ainda marcada

por controvérsias e munida do legado deixado por Solano López, os paraguaios mantêm

intrínseco o sentimento de ser paraguaio, preservando sua cultura mesmo vivendo em outros

países. A Guerra findou e o Art. 1º do Tratado de Amizade, Navegação e Comércio com o

Paraguai de 6 de abril de 185635, parece ter voltado a direcionar o comportamento e ações dos

brasileiros e paraguaios, o artigo propunha que “Haverá paz perfeita, firme e sincera amizade

entre Sua Majestade o Imperador do Brasil e seus sucessores e súditos, e a República do

Paraguai e seus cidadãos, em toda as suas possessões e territórios respectivos. As altas partes

contratantes velarão em que esta amizade e boa inteligência sejam mantidas constante e

perpetuamente”. Esse Tratado não conseguiu manter sua proposta quando do início da Guerra,

porém, ao que tudo indica, impetraram tal anseio no início da década de 1870, no período pós-

guerra.

35 Tratados de Limites Internacionais que Interessam à Mato Grosso. Cuiabá: Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso, 2002.

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3 A IMIGRAÇÃO PARAGUAIA NO PRIMEIRO MOMENTO: PÓS GRANDE GUERRA

O processo emigratório dos paraguaios já foi objeto de outros estudos. Menciono aqui

Carla Centeno, que realizou estudos de mestrado e doutorado acerca da emigração paraguaia

na fronteira do Estado. Em seus trabalhos a autora trata do tema sob o viés da educação dos

trabalhadores paraguaios nos ervais da fronteira sul do Mato Grosso. Sua pesquisa versa sobre

ocupação do estado, envolvendo os conflitos, dificuldades inerentes, devido a instabilidades

desses territórios por sua natureza. Para então discutir sobre a educação no estado no fim do

século XIX ao início do XX, transitando por inúmeros trabalhos de diversos autores

historiadores e autodidatas que tratam do tema da fronteira e imigração paraguaia. Entretanto

sua pontualidade na fronteira com o Paraguai é direcionada para a cidade de Ponta Porã,

cidade vizinha territorial com o país. O modo exploratório ao qual são submetidos os

trabalhadores ervateiros paraguaios pelas grandes empresas é um dos pontos da pesquisa que

propicia o entendimento da população brasileira abastada para com esse imigrante.

Aproveitando da sua força física e carência de outras atividades de trabalho, o balanço real da

empresa era muito elevado, o que de certa forma nos orienta a entender que a mão de obra,

qualificada ou não, dos paraguaios era tida como fonte de renda para seus empregadores.

O trabalho exercido por esses trabalhadores era, em grande parte, especializada, ou

seja, cada um tinha uma função específica no processo de tratamento da erva, desde o plantil a

etapa final. Isso de certa forma induziu, no sistema capitalista, a sistematização e exploração

dos paraguaios nos ervais. Mesmo ainda em moldes manufatureiros, essa demonstrou ser uma

prática muito lucrativa aos proprietários das Companhias empregadoras dessa mão de obra.

É fato, portanto que esses trabalhadores já eram explorados na fronteira de Ponta Porã,

segundo a autora. Eram vistos tão somente como braços fortes e resistentes, pois tinham que

sustentar sobre seus ombros em torno de duzentos quilos por longas distâncias. A pesquisa

tem em consideração uma média de trabalhadores paraguaios nessa atividade, é impreciso o

número exato mas é real a grande porcentagem desses estrangeiros nessas condições em Ponta

Porã.

Para tentar entender os processos migratórios ocorridos no Paraguai é importante saber

que existiu uma politica de isolamento promovida pelo Estado. Embora, isso já tivesse

ocorrido antes mesmo de sua independência, foi após ela que se verificou um endurecimento

dessa prática governamental que tinha o intuito de manter coesa sua população sem

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influências estrangeiras e sem o risco de migração36. O governo permitia que suas terras

fossem cultivadas por toda população mediante irrisorios pagamentos. Assim o fluxo

migratório era portanto muito incipiente, salvo exceções cuja interferencia era em virtude de

fenômenos naturais:

(...) durante la primera mitad del Siglo XIX, no existían restricciones al acceso de la tierra, se aprecia en los últimos años del período una incipiente diferenciación social expresada en la diferencia del tamaño de las tierras estatales arrendadas, en la expansión del régimen de asalarización y en las disposiciones sobre vagabundos. Las mayores limitaciones a la explotación de la tierra en este periodo histórico, parecían ser las originadas en calamidades como sequías y ataques de plagas 37

O governo paraguaio era proprietário de cerca de 95% do território oriental e de todo o

Chaco, essa atitude de nacionalizar a terra tinha como preocupação assegurar ao país sua

independência como observa Souchaud 38

En el siglo XIX, la colonización rural alcanza igualmente los dos objetivos que se había fijado. El primero relativo al desarrollo de la agricultura principalmente familiar, a fin de asegurar al país una independencia alimentaría y por qué no, un superávit monetario susceptible de ser inyectado en otros sectores de la economía paraguaya. Esta función de motor económico del sector agrícola será cumplida ampliamente.

Ainda sobre a distribuição de terra aos colonos o autor revela ainda:

Desde fines del siglo XVIII la Provincia precede a la apropiación jurídica de las tierras y los derechos inmobiliarios se redistribuyen a colonos para que desarrollen la actividad de extracción de la yerba mate (...) en grandes extensiones. Simultáneamente, grandes estancias ganaderas toman posesión en estos lugares. Finalmente se instalan contingentes armados en las ciudades y se alienta la formación de colonia de pequeños agricultores, destinadas a alimentar los mercados locales.

O autor ressalta também que a imigração na segunda metade do século XIX foi

escassa, referindo-se a “población flotante, sin ningún arraigo en el país”.

36 MORISON, S. E. Política Colonial de Colón. 1983.; Apud: SOUZA, José Carlos de. O Fenômeno da Migração Paraguaia no século XX. Fronteiras: revista de História, Campo Grande, MS, 4/5 (7/9): 97-122, 2000/2001 37 Idem p.103 38 SOUCHAUD, Sylvain. Geografía de la migración brasileña en Paraguay. Asunción: UFNPA, 2007. p. 62- 63

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Contudo as atitudes tomadas pelas autoridades não causaram o impacto esperado e sua

população começou a migrar para a Argentina inicialmente. Os estudos de Genaro Romero

citado por Souza39, expõem como causa desse fenômeno migratório paraguaio, a

disponibilidade da terra para o uso, moradia e plantio, o temor do recrutamento compulsório

nos exércitos, necessário para o combate das inúmeras revoluções que pretendiam derrubar os

governos. Tais conflitos intensificaram no século XX. Para o autor ainda era melhor repatriar

os paraguaios que incentivar migrações estrangeiras. O histórico problema da instabilidade

política no país também colaborou à prática da migração do seu povo.

Além de emigrarem pela necessidade de sobreviver, os paraguaios também foram

obrigados a fazê-la em virtude da escravidão por dívida como observa Centeno. 40

Os paraguaios começaram a migrar para o sul de Mato Grosso no final de Guerra da Tríplice Aliança (1864-1870), movidos pela grande instabilidade que se instalou nos anos seguintes no Paraguai. A maior parte veio pela fronteira seca e constituiu o maior contingente estrangeiro da fronteira. Era formada, sobretudo, por camponeses expropriados que, não tendo capitais para adquirir terras, transformaram-se em trabalhadores ervateiros. Muitos foram trazidos à força ou eram contratados no Paraguai num sistema que foi denominado na fronteira de escravidão por dívidas.

Muitos começaram sua viagem acompanhando os soldados brasileiros após a Guerra.

Várias paraguaias e centenas de outros imigrantes, dentre muitos, paraguaios, aventuraram-se

junto às forças brasileiras instaladas em Assunção ao regressarem a pátria anos após o

conflito. É notável que muitos paraguaios vieram para o Estado para trabalhar no cultivo do

erva mate41.

As correntes imigratórias não foram exclusivamente para o sul de Mato Grosso tão

pouco estiveram ligadas somente a erva mate. Também se deslocaram em direção a Corumbá,

uma das opções mais pontuais dos paraguaios em decorrência das possibilidades de emprego.

Entretanto quando lá chegaram não encontraram o que esperavam, em decorrência disso

muitos não tiveram como permanecer, retornando ao seu país ainda em precárias condições. A

necessidade de emigrarem, por falta de alternativa, pois não tinham como continuar no

Paraguai, fez com que os imigrantes se deslocassem para a cidade de Corumbá. Uma das

39 SOUZA, José Carlos de. A Fenômeno da Migração Paraguaia no século XX. Fronteiras: revista de História, Campo Grande, MS, 4/5 (7/9): 97-122, 2000/2001. p. 103-104 40 CENTENO, C. V. A educação do trabalho nos ervais de Mato Grosso (1870-1930): uma crítica da historiografia regional, de suas concepções de história, trabalho e cultura. Campo Grande: Dissertação (Mestrado em Educação). UFMS, 2000. p. 60-61 41

idem.

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peculiaridades dessa corrente que lá se fixou, foi exatamente a forma de inserção deles na

sociedade local. Acostumados a todo tipo de trabalho esses imigrantes se depararam com uma

realidade desconhecida e talvez inesperada. Entretanto estavam dispostos a exercer qualquer

função que lhe fosse atribuída. Mesmo que essa, em muitos casos não fosse bem vista em

virtude de se tratar de crimes entre outras atividades de caráter amoral.

A opção de escolher Corumbá deveu-se, sobretudo a política implantada pelo governo

imperial que concedia aos paraguaios, passagens gratuitas em viagens nos vapores que subiam

o rio Paraguai até a cidade de Corumbá42. Essa prática contribuiu para fomentar a cidade,

contudo não agradou grande parte da população quanto à presença desses imigrantes nas ruas

da cidade, porém eram empregados nas fazendas como mão de obra barata e sem ninguém

para olhar por eles.

Diferentemente de alguns grupos de estrangeiros, a maioria dos imigrantes paraguaios

estava na cidade como trabalhadores braçais, fazendo inclusive o trabalho que ninguém

gostava de fazer. Dessa proximidade resultou, entre outros, o estabelecimento de linhas

fluviais regulares entre Corumbá e Assunção que perdurou até bem pouco tempo43. Quando

chegaram à cidade os mesmos passaram por inúmeras dificuldades, viviam em condições

precárias, dependendo muitas vezes da caridade de outros, eram pelas circunstâncias, vítimas

da fome, da completa miséria.

Outros, contudo trabalhavam em fazendas, alguns sob escolta de outros empregados,

que ficavam sempre atentos ao seu trabalho além de intimidá-los. Consta também que tais

imigrantes eram utilizados em trabalhos forçados, na construção de estradas, bem como sendo

escravizados por índios da região e as mulheres escravas de soldados brasileiros e

desertores44. Acerca das condições das imigrantes paraguaias Corrêa45 expõe o relato da

Agência de Colonização que observou o seguinte fato:

uma grande parte desses immigrantes é do sexo feminino e compõem-se em sua quasi totalidade de mulheres perdidas, da mais baixa espécie, (...) que trazem consigo os vícios mais repugnantes e aqui se vêm entregar a mais imunda devassidão fugindo completamente a todo e qualquer trabalho ...

42 CORRÊA, V.B. Corumbá; Terra de Lutas e de Sonhos. Brasília: Edição do Senado, 2006. p. 48 43 OLIVEIRA, Marco A. M. Espaço, Tempo e Imigrante: O Desconcerto de uma Fronteira. In CHIAPPINI, L.; MARTINS, Maria H. (org.). Cone Sul: fluxos, representações e percepções. São Paulo: Hucitec, 2006. p. 255 44 idem. 45 Queira vê Relatório do Juiz de Direito da Comarca de Santa Cruz de Corumbá, J. J. Ramos Ferreira, dirigido ao Presidente da Província em 26 de janeiro de 1879. Manuscrito. Lata 1879B, Doc. av. APMT, Cuiabá – MT Apud : CORRÊA, Lúcia Salsa. História e Fronteira: o Sul de Mato Grosso 1870-1920. Campo Grande: UCDB, 1999. p. 212.

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causa de constantes desordens, roubos e desmoralisação ... / Há quatro annos, Ex mo Senr., que resido neste lugar, e posso assegurar a V. Exa. Que durante esse tempo, conduzidas em vasos de guerra nossos, e em navios mercantes de toda a espécie têm aportado aqui seguramente tres mil mulheres paraguayas, e no entanto não se encontra uma dellas que queira justar para o serviço doméstico, e o trabalho propriamente de mulheres, como seja, a lavagem de roupa e o engomado é caríssimo; ao passo que nas palhoças das immediações desta Villa, nas barracas dos soldados, encontrão-se grupos dessas infelizes entregues á mais completa ociosidade e mais cubertas de asquerosas enfermidades.

Ainda sobre as enfermidades desses imigrantes o médico João Severiano da Fonseca

nos revela:

tendo ouvido por diversas vezes dizer que ainda não vio em parte alguma tanta gente afectada de mal venéreo como neste lugar, e que a maior parte da desproporcional mortalidade de crianças que aqui se observa é devida á affecções syphilicas... Além das causas gerais que em todo Império actuão em sentido desvantajoso a colonisação em cujo numero se conta principalmente as deficiências das nossas leis que regulão o casamento ... [danificado] males que se podem aleviar, apresenta esta província o terrivel inconveniente que resulta de sua posição geographica, seu clima, a que não podem, resistir entregando-se ao serviço da lavoura, homens acostumados ao clima da Europa.46

Esses relatos deixam presente a explicita forma de julgamento a qual os paraguaios

estavam submetidos, perante parcela da sociedade local. A esse olhar estava atribuído o modo

de atuação ou desempenho da elite que os empregava de maneira coercitiva em suas fazendas.

Corumbá se apoiou na economia portuária, devido à localização estratégica na Bacia

Platina, como pólo de escoamento de mercadorias. A pecuária também se apresentava como

suporte na economia da cidade. A essa atividade foram inseridos inúmeros trabalhadores de

descendência paraguaia, assim como na construção civil, em trabalhos domésticos e

atividades urbanas. Entretanto tais imigrantes foram vistos como mão de obra alternativa e

concreta para suprir o contingente no trabalho em atividades diversas, sobretudo em escala

extensiva. Também eram aproveitados como braço armado em lutas que envolviam questões

de disputas de terras. Sobre o trabalho escravo ao qual eram submetidos os paraguaios

46 Idem. p. 212

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baseava-se, principalmente na suposta propensão aos vícios, à rebeldia como observa Correa47

sobre as informações do Agente de Colonização de Corumbá, sob o punho de Fonseca:

(...) não encontrando emprego, deixava-se abater pelo desânimo ou pelo vício da embriaguez ou da prostituição. E nesses termos expressou uma visão recorrente que justificava a exploração de homens e mulheres livres e pobres, degredados involuntários (...) Essa visão foi ancorada na apologia do trabalho e na sua contrapartida: a condenação da vadiagem, da embriaguez, do jogo, da prostituição e da indolência inerente ao paraguaio, bem como sua suposta aptidão para os vícios e para a rebeldia. Esses preconceitos constituíram na fronteira um peculiar código de valores, fundados nas relações capitalistas de produção e na necessidade de exploração do trabalho (e na violência) numa região carente de população, código acionado e quase sempre apontado na direção da massa dos paraguaios estabelecidos nessa área fronteiriça, como forma de submetê-los à superexploração, nos limites da escravidão.

Contudo esse elevado número de paraguaios naquela cidade contribuiu para o

crescimento populacional, mesmo enfrentando inúmeras dificuldades de adaptação e

preconceitos de parte da população local. Esse fluxo populacional oscilou de forma crescente

e decrescente até meados de 1878, quando estabilizou o número de saída e de entrada de

estrangeiros naquela cidade. Esse movimento migratório foi analisado pelo Juiz de Direito da

Comarca de Corumbá48 que relatou:

Com a retirada das Forças Brasileiras de Assumpção acompanharão os Batalhões que vieram para esta cidade [Corumbá] mais de mil mulheres paraguayas; vieram tambem centenas de estrangeiros procurar aqui o trabalho que não encontravão em Assumpção reduzida a ultima miséria. O arsenal de Ladario occupava então centenas de operários, que para alli tinhão trazidos seus agregrados, família, etc. E assim duplicou rapidamente em 1875 a população desta cidade. Em fins de 1875 e principios de 1876 porem, despedio-se grande numero de operários do arsenal de Ladario: suspenderão-se as obras que alli se fazião, continuando apenas aquellas que absolutamente não podiam deixar de continuar; e a irrigação monetária que alli se fazia foi diminuindo consideravelmente ate extinguir-se. Os immigrantes que tinhão chegado aos cem e duzentos em cada vapor, começaram a sahir da mesma forma, porque não encontravam trabalho em Corumbá e não lhes davam passagens gratis para Cuyabá e Villa Maria como muitos pretendião; e como para Assumpção lhes davão passagens gratuitamente para alli regressaram. Assim foi decrescendo a população até

47 Idem p. 213 48 Relatório do Juiz de Direito da Comarca de Santa Cruz de Corumbá, J. J. Ramos Ferreira, dirigido ao Presidente da Província em 26 de janeiro de 1879. Manuscrito. Lata 1879B, Doc. av. APMT, Cuiabá – MT Apud: CORRÊA, Lúcia Salsa. História e Fronteira: o Sul de Mato Grosso 1870-1920. Campo Grande: UCDB, 1999. p. 212-213.

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quase fins de 1878 em que paralizou-se este movimento, sendo hoje quase equivalente o numero de sahidas e de entradas de estrangeiros.

Mesmo demonstrando todo desconforto com a presença de imigrantes paraguaios

naquela cidade, deixando clara a insatisfação com a política implantada pelo Império, parcela

da população local não se sentia desconfortável em maltratar de forma violenta seus

funcionários paraguaios. E de caracterizá-los pejorativamente. Bem como de evidenciar que a

violência que imperava de modo costumeiro em Corumbá era fruto desses imigrantes e

cobravam uma solução eficaz para tal situação. No entanto as autoridades reiteravam que a

violência na região fronteiriça não ultrapassava os limites. Até porque a região contava com

duas guarnições, e era normal tal situação em virtude de haver naquela cidade uma população

muito heterogênea, assim como em virtude da sua posição geográfica.

Devido toda essa situação de preconceito para com os paraguaios, houve ainda a

resistência à integração desses imigrantes na sociedade local. Contudo a interação foi se

realizando não só na cidade, mas também em todo Estado através do alistamento e

engajamento militar nas guarnições fronteiriças, bem como mercenários, forças rebeldes,

trabalhadores urbanos, ervateiros, em grandes Companhias como a Matte Larangeira ou como

autônomos, peões e camaradas49 nas fazendas de criação de gado, também se integraram

49 “[...]” camarada era um termo usado para se referir a trabalhadores livres ou libertos que eram contratados para desenvolver uma determinada atividade. Os acordos de trabalho poderiam ser temporários ou não. E os trabalhadores assim definidos poderiam saber algum ofício específico, sendo contratado para tal, ou empregados para desenvolver atividades diversas. Podemos supor que a utilização de um vocábulo para definir aspectos de coleguismo, proximidade, reconhecimento e parceria, foi adaptado nos séculos XVIII e XIX, para se referir a uma pessoa livre que vendia sua força de trabalho a quem dela necessitasse, justamente pelo fato de que o contratante ao negociar com o contratado os serviços a serem prestados, estreitava-se certa aproximação entre ambos, às vezes no convívio diário, ou na proximidade das tarefas realizadas. Não precisava necessariamente morar sob o mesmo teto, mas o ajuste estabelecia algumas relações entre patrão e [p. 35] empregado, o que levou usualmente a utilização da palavra camarada para se referir a uma categoria de trabalhadores livres e pobres.

Os camaradas estavam presentes nos meios urbanos e rurais da capitania/província de Mato Grosso, no desenvolver de todo tipo de atividade, poderiam ser encontrados também na área de mineração, ajustados junto a mineiros. Os camaradas nos ambientes urbanos poderiam ser vistos morando nos arredores das cidades, ou na casa de seus patrões.

Arrieiro, vaqueiro, guia, trabalhador de lavoura, feitor, ferreiro eram ocupações presentes em ambientes rurais, e também, desenvolvidas por camaradas. Estes eram homens, poderiam saber ou não algum ofício, e desenvolviam atividades a um contratante, chamado de patrão, por meio de um acordo. O ajuste poderia ser temporário, o suficiente para percorrer os locais da capitania/província, ou poderia mais tempo, sendo que o serviço a ser realizado era que demandava a temporalidade do acordo. Remadores e guias, por exemplo, contratados em Cuiabá para conduzir uma embarcação até São Paulo tornavam-se camaradas de quem os contratasse durante o tempo da viagem, da mesma forma que um condutor de tropa por um período em que estava responsável por uma determinada carga. Além disso, o acordo poderia durar o tempo do cultivo de uma lavoura (preparação da terra, plantio, colheita e transporte) ou durar mais tempo, como por exemplo, camaradas que moravam por longos períodos na propriedade do patrão.” (p. 35-36). Apud: SENA, Divino Marcos de. Camaradas: A presença de livres e pobres em Mato Grosso (1808-1850). Exame de qualificação. Dourados: UFGD, agosto de 2009, Curso de Mestrado em História.

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como posseiros em pequenas comunidades próximas a cidades em crescimento e ainda como

contrabandista, pistoleiros de aluguel e bandoleiros50. E de forma particular a inserção social

pelo matrimônio.

3.1. A acomodação na nova terra: o matrimônio Quadro 01 Demonstrativo de matrimônios em Corumbá no período de 1870 a 1895, envolvendo paraguaios e paraguaias.

NOIVOS NOIVAS MATRIMÔNIOS Espanhóis Paraguaias 1 Austríacos Paraguaias 1

Ingleses Paraguaias 1 Bolivianos Paraguaias 3 Franceses Paraguaias 3

Portugueses Paraguaias 4 Italianos Paraguaias 6

Brasileiras Paraguaios 8 Paraguaios Paraguaias 10 Brasileiros Paraguaias 74

Fonte: Paróquia Nossa Senhora da Candelária, Corumbá, MS, Livros de Casamento nº I, II e III (1870 - 1895).

Assim como houve inserção social pelo trabalho em diversas áreas, o casamento deve

também ser considerado como fator de inserção. Os casamentos miscíveis demonstraram de

forma notável a aceitação, e consolida legalmente sua permanência na cidade, o que

contribuiu para disseminar seus costumes.

A análise do Quadro 01 nos revela o casamento de imigrantes paraguaios com

brasileiros e outras nacionalidades que viviam em Corumbá. Foram analisados cento e onze

casamentos abarcando aqueles imigrantes. Destes, oitenta e dois envolviam brasileiros e

imigrantes paraguaios. Apenas dez não caracterizam relações miscíveis. E os dezesseis

casamentos restantes foram miscíveis entre paraguaios e outras nacionalidades existentes na

cidade. Muitos desses brasileiros eram de outros estados do país, que para lá foram em

decorrência da Guerra. E contribuíram de certa forma, para o processo de aceitação desses

imigrantes na cidade.

50 CORRÊA, Lúcia Salsa. História e Fronteira: o Sul de Mato Grosso 1870-1920. Campo Grande: UCDB, 1999.

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Após a leitura acerca do modo como eram vistos os imigrantes paraguaios, e

analisarmos os casamentos percebe quantitativamente que a miscigenação entre brasileiros e

paraguaios ocorreu ainda na década de 1870. Essa realidade é no mínimo contraditória com os

depoimentos da Agência de Colonização de Corumbá. Por outro lado esses imigrantes

procuravam adaptar-se e consequentemente buscavam a aceitação de sua presença, assim

como de seus costumes. E uma das hipóteses sugerida pela leitura dos dados obtidos na tabela

é que o casamento é uma das formas de inserção social, em busca de sua aceitação e

permanência na cidade.

É imprescindível, contudo, perceber como o imigrante se sente fora do seu país,

enfrentando dificuldades por sua conjuntura. O imigrante é um individuo em busca de novas

terras, e para tanto é preciso lembrar que o mesmo é deslocado de um lugar para outro, o que

acarreta uma série de questões que se tornam complexas. Partindo do princípio de enfrentar o

desconhecido, decidir sair, e para onde ir, bem como a aceitação na terra nova e viver os

conflitos inerentes a sua condição. Sobre isso Oliveira51 ressalta:

Uma das principais dificuldades que é encontrada na conceituação do imigrante está na inserção de questões amplamente complexas como tempo, espaço e memória. Isto, pois, admitir que o imigrante é tão-somente aquele que internacionalmente se desloca de um lugar para outro é aceitar que não exista complexidade em seu ato, isso desde a aceitação e decisão da saída, até a aceitação e conflitos no novo lugar em que passou a se encontrar. Desta forma, o tempo, categoria altamente discutível quanto à sua definição é, desconcertantemente, um dos principais elementos que constituem aquilo que pode ser denominado de conjunto epistemológico do (i)emigrante. Ou seja, ao romper as barreiras internacionais, também o fez com o tempo cultural que assegurava algumas espécies de estatutos na terra de origem. Mais, ainda, ao desafiar uma espécie de 'ordem temporal' que estava instituída em seu lugar de origem, passou a se posicionar na esfera de um novo tempo a ser associado, identificado, assimilado.

A inserção social é determinada por inúmeros fatores, entre eles o trabalho e o

casamento, pois assim cria-se um vínculo forte com a região em que vivem. Isso motiva a

intensa relação entre a população da terra nova à transição que passa o imigrante. A esse

respeito Oliveira52 observa ainda que:

51 OLIVEIRA, Marco Aurélio Machado. O mais importante era a raça. Sírios e Libaneses na política em Campo Grande, MS. Tese de Doutorado. F.F.L.C.H., USP, 2001 p. 14-15 52 Idem p. 35

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A inserção social pelas vias do casamento é, em outras palavras, um deslocamento, falo isso tentando fugir de algumas banalidades. Em síntese, esse deslocamento é uma variação do processo inicial - ou, melhor, uma adaptação. Volto a insistir, falar da imigração é falar da sociedade com um todo, em dimensões diacrônicas e sincrônicas53, contemporânea e anacronicamente. Quero, com isso, reafirmar que matrimônio, nesse momento, guardava à feição dos imigrantes/descendentes e da região em que viviam a sua paradoxia elementar: improviso e estratégia.

Esse entrelaçamento entre atividade econômica, convívio social e matrimônio, está

presente, na cidade de Corumbá, no processo de miscigenação com os paraguaios, desde o fim

do século XIX. O imigrante adquire novos hábitos a fim de serem aceitos pela população. A

vontade de se misturar a nova realidade é um dos fatores que o estimula a concretizar esse

entrelaçamento. O casamento proporciona a aceitação e acomodação esperada pelo imigrante

na nova terra. O casamento propicia a entrada dos imigrantes para a sociedade local pela porta

da frente. Nesse primeiro momento os paraguaios estavam envoltos a condição de miséria,

fome, prostituição, trabalhadores de fazendas, mão de obra barata sujeita a humilhações e

descriminações. O matrimônio contribui para a tão esperada aceitação social e motiva a sua

pratica. Com isso a proximidade do modo de vida e até a troca de costumes com a população

da nova terra, faz com que os imigrantes se misturem a essa rotina e se adaptem ao meio que

escolheram para morar.

Como se pode observar no quadro 01, as noivas imigrantes, em grande parte, casaram

antes dos vinte anos de idade, algumas inclusive com quatorze. Seria uma forma de inserção

social acelerada, pois quanto mais cedo ocorrer à aceitação, menores são as dificuldades

enfrentadas por elas.

Os casamentos envolvendo brasileiras e paraguaios ocorreram todos na década de

1890, alguns, entretanto sugerem que sejam de descendência paraguaia, por alguns fatores

como o sobrenome e o próprio nome, bem como a idade. Do início de sua chegada a cidade já

havia passado mais de vinte anos, idade compatível com seis das noivas da tabela. Pois

somente uma apresenta idade superior ao tempo de imigração. E outra que não consta sua

idade no registro matrimonial. Voltamos aqui a enfatizar que o casamento entre esses casais,

provavelmente, elas de origem paraguaia, reforça um caminho para a consolidação de sua

presença naquela cidade.

Dos setenta e quatro casamentos entre brasileiros e paraguaias, quarenta e nove

ocorreram na década de 1870, ou seja, depois de mais de vinte anos já se tem a segunda

53 Cf: SAYAD, Abdelmalek. A Imigração. Trad. de Cristina Murachco. São Paulo, Edusp, 2000, p. 16.

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geração dessa família. Consequentemente a hipótese levantada tem razão de ser. A

miscigenação desenvolveu – se então naquela cidade, pois não havia entre esses imigrantes a

necessidade de conservar os costumes, até porque eles já haviam os disseminado após décadas

de convivência. Não eram por assim dizer um grupo fechado, restrito aos seus. Além de

levantar outra questão, a visão dos habitantes de Corumbá não era tão discriminatória, ou

parcela dessa população não era, pois as reclamações levadas às autoridades da capital do

Estado eram de pessoas que integravam a elite. Reivindicações feitas pelas senhoras e

senhores proprietários de terras, que tinham empregados paraguaios e que em alguns casos os

exploravam em trabalhos forçados.

GRÁFICO DOS CASAMENTOS

CASAMENTOS ENVOLVENDO PARAGUAIOS E OUTRAS

NACIONALIDADES (%)

Br/ Py (66%)

Bol/ Py (2,7%)

Aust /Py (0,9%)

Ita/ Py (5,4%)

Port/Py (3,6%)

Py/Py (9%)

Fr/Py (2,7%)

Ing/Py (0,9%)

Esp/Py (0,9%)

Brª/Py (7,2%)

total (100%)

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Casamentos por Individuo

Br + Py (74)

Bol + Py (3)

Aust + Py (1)

Ita + Py (6)

Port + Py (4)

Py+ Py (10)

Fr + Py(3)

Ing + Py (1)

Esp + Py (1)

Brª + Py (8)

total (111)

3.1.2 Batizados Quadro 02 Demonstrativo de batizados em Corumbá no período de 1878 a 1886, envolvendo paraguaios e paraguaias.

PAIS MÃES BATISMOS Espanhóis Paraguaias 1 Austríacos Paraguaias 1 Franceses Paraguaias 3

Portugueses Paraguaias 4 Paraguaios Paraguaias 4 Brasileiros Paraguaias 5

Sem Nacionalidade Identificada

Paraguaias 7

Italianos Paraguaias 10 Fonte: Paróquia Nossa Senhora da Candelária, Corumbá, MS, Livros de batismos nº II e III (1878 - 1886).

Assim como houve inserção social pelo matrimônio, deve também ser considerado o

batismo dessas crianças, fruto da união desses imigrantes com outros e com população local.

Foram analisados trinta e três batizados no período compreendido entre os anos de 1878 a

1886, Diferente do matrimônio, onde a maior referência de miscigenação era entre brasileiros

e paraguaias, o batismo apresenta maior índice de pais imigrantes italianos com mães

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paraguaias constituindo dez batizados, seguido por brasileiros e paraguaias, cinco batismos, e

com o mesmo percentual entre portugueses e paraguaias, constituindo quadro batismos bem

como a relação não miscível entre paraguaios. Aqui surge um fato interessante na análise dos

dados obtidos, ou seja, como é possível tanta miscigenação matrimonial entre brasileiros e

paraguaias e o batismo não acompanhar essa progressão, que deveria ser lógica, a que se deve

esse fenômeno?

Algumas hipóteses podem ser levantadas, uma delas seria o retorno dos soldados ao

seu estado de origem, levando consigo sua família. Visto que muitos eram de outro estado do

Brasil, havia nordestinos, paulistas, cariocas, gaúchos entre outros.

GRÁFICO DOS BATIZADOS

Porcentagem de Batizados de Filhos de Paraguaias com

outras Nacionalidades

Ita/ Py (30%)

Br/ Py (15%)

Aust /Py (3,0%)

Port/Py (12%)

Py/Py (12%)

Fr/Py (3,0%)

Esp/Py (3,0%)

SNI/Py (21%)

total (100%)

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Batizados por Indivíduo

Ita + Py (10)

Br + Py (5)

Aust + Py (1)

Port + Py (4)

Py+ Py (4)

Fr + Py (1)

Esp + Py (1)

SNI+Py (7)

total (33)

Quadro 03- Demonstrativo dos dados acerca da relação entre batizados e casamentos.

Pais Filhas Eduardo Elias – Francês

Feliciana Valente – Paraguaia

Emilia

Pedro Gonçalves. Paraguaio Rosalia Ximenes. Paraguaia

Rosenda

Ramão Augusto. Brasileiro Maria Rita. Paraguaia

Paula

O fato é que a cada ano, a cada casamento miscível e os batizados de descendentes

paraguaios constata-se a integração de povos heterogêneos. A esses dados estão envoltas

outras curiosidades como quando fizemos a relação entre os casamentos analisados acima e

batizados, só conseguimos chegar a três casais da Tabela 1 (em anexo) que batizaram seus

filhos no período analisado. Dois casais apresentando relação miscível e um casal de mesma

nacionalidade.

O quadro 03 surgiu após feita a relação de batizados – do Quadro 02 – de filhos de

imigrantes paraguaios e dos casamentos – Quadro 01 - foi subtraído somente três casais que

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batizaram seus filhos na mesma Igreja que realizaram seu casamento. Fato relevante, pois

dentre cento e onze casamentos e trinta e três batismos, essa relação tão surpreendentemente

irrisório, visto que o período analisado dos batizados está contido, do início ao fim, no

período analisado dos casamentos.

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Parte 2 1 A Imigração Paraguaia no século XX ANTECEDENTES DA IMIGRAÇÃO PARAGUAIA NO SÉCULO XX.

A situação do Paraguai após a Grande Guerra não era das melhores, assim como não o

foi por muito tempo. Mais de 90% das terras paraguaias pertenciam ao Estado, constituindo

cerca de 16.239 de um total de 16.590 léguas quadradas54. Em decorrência das dificuldades

pós-guerra, o governo paraguaio privatizou suas terras para amenizar a situação financeira do

país. Tal medida abriu caminhos para que a influência argentina principiasse então no

território paraguaio como relata Bandeira.

Em 1870, quando a Guerra da Tríplice Aliança terminou, cerca de 16.239 léguas quadradas, de um total de 16.590, que constituíam o território paraguaio, pertenciam ao Estado; apenas 261 léguas quadradas estavam em mãos de particulares. O Estado ainda possuía 72 km de ferrovia em funcionamento, 148 edifícios em Assunção e 352 em cidades e vilas do interior. Mas logo em seguida o processo de privatização começou, a fim de possibilitar o pagamento das obrigações e amortizar emissões de papel moeda, com o que todo aquele patrimônio, no curso de alguns anos, passou para o controle dos investidores de outras nações, particularmente da Argentina, da qual o Paraguai não apenas copiou a Constituição como adotou o próprio Código Civil. O historiador paraguaio Ricardo Caballero Aquino salientou que "a maioria dos especuladores estrangeiros, que chegaram ao Paraguai para investir em terras, vieram desde ou através da Argentina" e esta situação contribuiu para incrementar ainda mais a dependência do país em relação a Buenos Aires, cujos bancos e instituições financeiras começaram a receber e enviar grandes somas de divisas a Assunção. Conforme outro historiador paraguaio, Efraim Cardozo, "a venda de terras públicas converteu os capitalistas argentinos nos maiores proprietários do país", sendo que a companhia La Industrial Paraguaya se apropriara de mais da metade das plantações de erva-mate, o mais importante item de sua pauta de exportações, e suplantara, vantajosamente, a Mate Laranjeira, a concorrente brasileira, afetada ainda mais pelas taxas alfandegárias.

Ainda acerca da influencia argentina no território paraguaio o autor observa que:

54 BANDEIRA, L.A.M. A Guerra do Chaco. Revista Brasileira de Política Internacional. Brasília, vol 41, nº1, jan/jun, 1998. p. 3

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E este predomínio se ampliou cada vez mais, embora a política interna não se estabilizasse e evoluísse para uma situação próxima da anarquia, sem que a República sequer se democratizasse. Uma série de quarteladas, golpes de Estado e revoluções começou, com o Partido Liberal a dividir-se em facções que lutavam entre si pelo poder. Desde então, nenhum Presidente do Paraguai, cujos governos não foram menos autoritários do que os dos seus predecessores do Partido Colorado, completou o mandato de 4 anos, estabelecido pela Constituição de 1870.55

Sobre a instabilidade política paraguaia o autor ressalta ainda:

Juan Batista Gaona não permaneceu mais que um ano na Presidência do Paraguai. Caiu em 9 de dezembro de 1905, derrubado pelos seus companheiros, integrantes da facção dos Liberais Cívicos, cujo "óbvio argentinismo" levava-os a falar "con cierto acento rioplatense", e Cecil Baez, ideólogo do liberalismo, substituiu-o, a fim de preparar as eleições e entregar o poder ao próprio General Benigno Ferreira, chefe militar da revolução de 1904. Este, eleito em 1906, não demorou no governo mais do que dois anos. Sob a acusação de pender demasiadamente para o lado da Argentina, teve de renunciar à Presidência da República, em 2 de julho de 1908, após sangrento levante chefiado pelo Coronel Albino Jara, seu ex-companheiro de armas, durante a revolução de 1904, e pertencente à facção radical do Partido Liberal. O Vice-Presidente, Emiliano Gonzáles Navero assumiu o governo, também por um brevíssimo período, bem como sucessores, Manuel Gondra e o próprio Coronel Jara, dado que as sublevações e os golpes de Estado não cessaram, mantendo o país em permanente turbulência. 56

Como a influência argentina era refletida fortemente no território paraguaio, o Brasil

sentia-se ameaçado pela crescente organização política econômica do vizinho platino que,

segundo percepção do governo brasileiro, vislumbrava a recomposição do território das

fronteiras do Vice-Reino do Rio da Prata.

55 Idem p.5 56 Idem p. 5

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Mapa 4 – Divisão Política e Administrativa da América Latina Colonial (1800).

Fonte: Adaptado de R. A. HUMPHREYS. The Evolution of Modern Latin América.

A capacidade de alcance da influência argentina no território paraguaio era evidente;

para o chanceler brasileiro Octávio Mangabeira o Paraguai, em 1927, era uma "verdadeira

província" ou uma espécie de "feudo" da Argentina, a ela atrelado pelo Tratado de Comércio

de 1916, que estatuíra um regime de franquias e sanções alfandegárias, a permitir o livre

comércio entre os dois países, este relato consta no Relatório Reservado sobre a Política

Externa do Brasil e dos países da América do Sul, organizado por ordem do Ministro de

Estado das Relações Exteriores pelo 1º. Oficial da Secretaria de Estado, Ronald de Carvalho,

do Gabinete do Ministro sediado no Rio de Janeiro57.

57 Apud: BANDEIRA, L. A. M. A Guerra do Chaco. Revista Brasileira de Política Internacional. Brasília, vol 41, nº1, jan/jun, 1998. p. 6

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Não ficou restrita ao Paraguai a influência argentina. Na Bolívia, por exemplo, as

empresas argentinas desfrutavam de benefícios, além do fato deles deterem o domínio de

grande parte do Chaco boliviano.

Além das questões econômicas e territoriais, o Paraguai também se enfraqueceu

politicamente, uma vez que os conflitos civis entre partidos – Liberal e Colorado –facilitavam

influências estrangeiras. Em virtude dessa instabilidade, os presidentes não conseguiam

governar até o fim do seu mandato. Suportavam desde o fim do século XIX ao início do

século XX, seguidos conflitos armados contra os governantes do Paraguai.

Ao Brasil coube amenizar o avanço do poderio argentino no território boliviano com a

solidificação do Tratado de Petrópolis assinado em 1903. De certa forma essa atitude tomada

pelas autoridades brasileiras impediu que a Argentina conseguisse influenciar de forma mais

eficaz a Bolívia, como o fez no território paraguaio. Entretanto, a Bolívia apresentava-se

insatisfeita com a limitação via fluvial, bem como fora fortemente atingida por crises

desencadeadas pela queda da Bolsa de Nova York em 1929. Sob o governo do presidente

Daniel Salamanca a Bolívia declara a Guerra do Chaco ao Paraguai, julgando-se superior

militarmente como observamos:

Ela se julgava mais bem armada, mais forte, militarmente, que o vizinho, com o qual disputava o território, e, conforme as palavras do Embaixador Antônio Salum-Flecha, "desengañada de sus anteriores tentativas diplomáticas para obtener una salida sobre el rio Paraguay”, inició una nueva política como medio efectivo de incorporar el Chaco a sus domínios consistentes en una penetración pacífica. 58

Ainda sobre o início da Guerra do Chaco o autor ressalta:

Esta política o Presidente Daniel Salamanca (1931-1935) se dispôs a executar com determinação quando assumiu, em 1931, o Governo da Bolívia, e propôs ao Estado Maior do Exército que elaborasse um plano para "penetração pacífica", ocupação militar e exploração do Chaco. Seu propósito era "prestar maior atenção" a esta questão, devido não só à honra como ao "supremo interés del porvenir de Bolivia, tanto para asegurar sus territórios del sudeste, constantemente usurpados, como para abrirse una salida al Plata". Inevitável, portanto, o agravamento do conflito se tornava. A Bolívia, em meados de 1931, tomou a iniciativa de suspender novamente as relações diplomáticas com o Paraguai. Poucos meses depois, em setembro, tropas bolivianas, com ordem de ocupar os lugares providos de água, tomaram o posto avançado paraguaio Masamaklay, rebatizado Água Rica. E as refregas recresceram e se generalizaram, em 1932, quando o regimento Lanza, sob o comando do Major Oscar Moscoso, capturou o Fortim Antônio

58 Idem p.8

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Carlos López, na verdade, um rancho que albergava insignificante guarnição de 1 cabo e 5 soldados, à margem da laguna Pitiantuta, ou Chuquisaca, cuja importância consistia no fato de constituir o único reservatório de água, em muitas léguas ao longo da região. A guerra do Chaco, formalmente, começara. 59

Depois de declarada a Guerra, o interesse nesse território aumentou em decorrência de

supostos poços de petróleo, diante disso o então presidente paraguaio Eusébio Ayala declarou:

Nuestra frontera natural e histórica llega al Parapeti, cordillera Chiriguanos y Pilcomayo. Si la victoria no nos asegura esta frontera, se originará un hondo malestar en el país (...) La posesión de la zona del petróleo nos servirá además para recuperar nuestras pérdidas y levantar el país de la postración en que había de quedar.60

A Argentina não se manteve a par da situação, interferiu mesmo que de modo

mascarado em benefício do Paraguai, ou segundo o autor em seu próprio benefício, como

observa:

Esta crença, a de que o sub-solo da Bolívia, na região do rio Parapeti, lindeira do Chaco Boreal, e adjacências, escondia imensos depósitos de petróleo, influenciou também os dirigentes da Argentina e concorreu para que ela respaldasse o Paraguai, sob o disfarce do que denominou de neutralidade benévola. Este comportamento, durante o conflito e no curso da Conferência de Paz realizada em Buenos Aires (1935-1938), não obedeceu, certamente, às prováveis ambições da Royal Deutch Shell, apesar de que com elas pudesse coincidir, e sim aos reais interesses da Yacimentos Petrolíferos Fiscales (YPF), já a responder por 37,5% (835.565 m³) da produção nacional contra uma participação de 62,5% (1,4 milhão de m³), das companhias particulares, entre as quais a Standard Oil of New Jersey como sua principal concorrente aparecia. Ao que tudo indicava, os militares nacionalistas, que, não obstante a queda do General Mosconi, ainda influíam no Governo de Buenos Aires, temiam que a Standard Oil, com a posse de enormes reservas na Bolívia, segundo imaginavam, alcançasse a saída para o estuário do Prata, através do rio Paraguai, e terminasse por esmagar a YPF, ao ponto de excluí-la até mesmo da exploração das jazidas existentes em Salta, Jujuy, Mendoza e em outras Províncias da própria Argentina. Por esta razão, o Governo do General Agustín P. Justo, embora tratasse de assegurar os investimentos britânicos e se opusesse ao monopólio estatal do petróleo, resistiu, tanto quanto pode, à demanda de concessões da Standard Oil, escorada por poderosos políticos de Salta, como Robustiano Patrón Costas, que se tornara um dos árbitros do regime. Naquelas condições, portanto, à Argentina absolutamente não convinha à vitória da Bolívia, pois desviaria do seu território as atividades relacionadas com a indústria do petróleo, se ela a conquistar viesse um litoral apropriado. Por outro lado, em face da completa

59 Idem p.8 60 Idem p.17

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dependência e subordinação da economia do Paraguai à Argentina, reforçada por toda a espécie de cooperação durante a guerra, inevitável tornar-se-ia a concentração de acordos, mediante os quais toda a produção de petróleo da região de Parapeti, na Bolívia, e a que ocorrer viesse no Chaco Boreal cairia em poder da YPF. Não sem razão todos perceberam, como o Coronel Francisco Barrero V., que o "objetivo estratégico" da Argentina e do Paraguai só podia ser a destruição da máquina militar da Bolívia, tendo por "meta econômica" o Chaco e o petróleo. E, se esta questão já se tornara, durante a guerra, cada vez mais importante, ela assumiu uma significação ainda maior, como fator de negociação diplomática, após a instalação da Conferência de Paz em Buenos Aires, com a cessação das hostilidades, em junho de 1935. 61

Após tantas diversidades e anos de conflitos o acordo decisivo, ao que parece, foi

assinado 74 anos finalizado o conflito. O acordo foi elaborado por vários países, dentre eles o

Brasil e assinado em Buenos Aires pelos presidentes Fernando Lugo e Evo Morales selando

pacificamente o fim, em definitivo, da Guerra do Chaco ocorrida entre 1932 a 1935.

Após o fim da Guerra do Chaco os anos seguintes no Paraguai não foram tranquilos,

ao contrário, o país sofreu com conflitos civis entre os partidos políticos na disputa pelo

poder. Um nome oriundo do exército com alta patente ainda muito jovem surgiu e apoiado

pelo partido Colorado tomou o poder e permaneceu por 35 anos de 1953 a 1988. A ditadura

de Alfredo Stroessner foi marcada por forte repressão a população, o que estimulou a

migração paraguaia em equidade a sua forma de governo.

Em virtude de conflitos ocorridos no século XX, houve grande fluxo migratório,

abarcados por fatores políticos. A imigração paraguaia ocorrida nesse século apresenta uma

motivação diferente da ocorrida no século XIX, pois nesse momento a instabilidade política

renovou a iniciativa de migrar do Paraguai. Acontecimentos como guerras civis, a Guerra do

Chaco até o governo de Alfredo Stroessner Matiauda, provocaram grandes migrações, em

particular para o estado de Mato Grosso do Sul. Essa situação de inconstância advém desde o

fim do século anterior. O reflexo da Grande Guerra no século XX é evidente, até porque não

houve por parte dos governos seguintes a reconstrução rural do país segundo Souchaud,

congelaram qualquer possibilidade de desenvolvimento do setor rural. Ainda sobre essa

questão o autor escreve “Paraguay, país de enormes tierras vírgenes, expulsará a sus

campesinos hacia los frentes pioneros extranjeros”.

O setor agrário no país sofreu com perdas em decorrência da Grande Guerra bem

como a venda de parte de suas terras, para o plantio da erva mate, a compradores estrangeiros.

Ao contrario da política preventiva exercida no século XIX, o Paraguai abriu de maneira

61 Idem p.18

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ampla sua economia ao capital estrangeiro. As grandes Companhias começam a exploração

dos ervais. Aos camponeses restaram a pratica de uma técnica arcaica sem retorno esperado.

A este respeito observamos que:

A agricultura tradicional sobre quemados se basa en una gran disponibilidad de tierras arables donde se practica una agricultura itinerante y extensiva, limitando así el empobrecimiento de los suelos. Por lo tanto la saturación de la tierra que se necesita pone fin a las posibilidades de rotación. La agricultura practicada sigue siendo arcaica: al estar muy poço diversificada produce poços excedentes monetarios. El sector agrícola empobrecido constituye, sin embargo, la base de la economía paraguaya. Se podría casi decir que en esa época el Paraguay era un país agrícola sin agricultura. 62

Diferente da política preservacionista empregada no século XIX, nesse momento

houve a necessidade de aproximar de seus vizinhos assim como da Europa, por acreditarem

que a política econômica do país seria mais bem desenvolvida. Ainda que seletiva, a

implantação dessa política traria benefícios ao Paraguai. Veja o discurso do presidente

Ayala63 acerca do fato:

En la inmigración, hay que preferir siempre la calidad a la cantidad, y proteger eficazmente la corriente sana y útil de poblaciones laboriosas (...) necesitamos extranjeros inteligentes y laboriosos que enseñen a nuestros campesinos el hábito del trabajo y del ahorro ... A fin de prevenir resultados negativos que podrían aparecer en el futuro, es menester buscar en la inmigración seleccionada, los hombres capacitados que por su moral y energía puedan convertirse en elementos estables y útiles.

A política implantada pelo governo paraguaio no século XX propiciou o incremento

populacional no Estado de Mato Grosso de imigrantes paraguaios, cujo principal fator

motivador desse êxodo foram as atitudes dos seus governantes. Souchaud descreve os fatores

e o desdobramento dos acontecimentos que impulsionaram a decisão de “tornar-se” imigrante.

Segue o autor dizendo que:

Durante la primera mitad del siglo XX el Estado paraguayo selecciona a los migrantes según criterios económicos, sociales, culturales y políticos y da una neta preferencia a la inmigración extranjera, concediéndole facilidades de acceso a la propriedad rural. Un segundo elemento va a acentuar la marginalización del campesinado paraguayo cuando el poder central encara la cesión de los dominios públicos (tierras fiscales). Las transferencias

62 SOUCHAUD, Sylvain. Geografia de la migración brasileña en Paraguay. Asunción: UNFPA, 2007. p. 72 63 El Paraguay Contemporâneo Apud: SOUCHAUD, Sylvain. Geografia de la migración brasileña en Paraguay. Asunción: UNFPA, 2007. p. 76

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siguen entonces dos procedimientos. En el primer caso se venden a los extranjeros, esencialmente colonos europeos, parcelas pequeñas o medianas. La segunda vía consiste en poner a la venta tierras propuestas a los paraguayos y a los extranjeros de países limítrofes. Los precios propuestos son, a menudo muy bajos pero como los lotes se presentan únicamente bajos la forma de amplios dominios ganaderos, el campesinado se ve imposibilitado de accender a la propriedade inmobiliaria.

O autor segue ainda relatando a decisão de imigração dos paraguaios aos países

vizinhos.

El Estado durante todo este período actúa, bien y pronto, contra el desarrollo de la pequeña propriedad campesina y contra la valorización paraguayo/ paraguaya de los territorios periféricos. El campesinado local de la región Central no tiene otro recurso que él éxodo. Los campesinos paraguayos emigran, se unen entonces a los frentes pioneros de las naciones vecinas que, en fase de crecimiento, llevan más lejos fronteras internas. Este es el caso del Mato Grosso do Sul brasileño a partir de los años 1870 (Wilcox,1993), (...). “El censo brasileño de 1920 destaca la presencia de cerca de 17.000 paraguayos en él país, 13.000 de los cuales solo en el Mato Grosso” (Wilcox,1993).

Com períodos turbulentos em seu país, muitos paraguaios optaram pela saída do

Paraguai e novamente o Estado de Mato Grosso foi escolhido pela proximidade territorial. Na

década de 1930 e até um pouco antes a imigração era prática constante, em todo o Estado

eram encontradas pessoas com essa nacionalidade e em Corumbá não era diferente. Pois

desde a Grande Guerra a cidade acolhia imigrantes paraguaios. Ainda na primeira metade do

século XX, em decorrência dessa intensa migração paraguaia, algumas atitudes foram

tomadas pelos governos. Exemplo disso foi a tentativa de aproximar os países vizinhos no

tocante ao idioma, como observamos no artigo do Jornal Tribuna no fim da década de 1930.

O exemplo do Paraguay O governo do Paraguay acaba de instituir o ensino obrigatório da língua portugueza nas escolas primárias. Referem os telegramas que assim fazendo, que aquele governo justifica o seu ato com as mais sugestivas razões de fraternidade continental. 64

As informações contidas no jornal Tribuna, que circulava na cidade de Corumbá,

trazia notícias do país vizinho, eram apresentadas as condições as quais passavam o Paraguai

assim como as turbulentas crises envoltas no país. Algumas reportagens nos chamaram a

64 Jornal Tribuna, 26-08-1938

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atenção em virtude da constatação que a vinda desses imigrantes ao Estado, foi de

importância para o crescimento do mesmo.

Uma honrosa visita a Mato Grosso (...). O chanceler paraguayo Don César A. Vasconcellos ainda demorará sua permanência em nosso país, em visita a vários dos nossos serviços públicos, notadamente os de caráter social, pretendendo regressar a Assunção via Mato Grosso, a fim de conhecer neste grande Estado as condições de apreciável labor e confraternidade em que vivem os súditos paraguayos entre nós, colaborando com os brasileiros nos progressos do Estado. 65

A relação de brasileiros e paraguaios era exposta pelos artigos como sendo de afetuosa

e duradoura como deveria ser a relação de nações co-irmãs.

Republica do Paraguay Festeja hoje a data de sua independência a nobre Republica do Paraguay, de tantas e tão altivas tradições no conserto das federações sul americanas. A presente efeméride se exalça entre as passadas especialmente pelo fato de emergir a nação co-irmã de uma situação caótica produzida pelos pruridos de revoluções consecutivas, das quais o governo Morinigo se saiu soberanamente, mais fortalecido, quiçá nas suas prerrogativas. Em todas as datas comemorativas da conquista de sua soberania, costuma o representante consular paraguaio entre nós abrir a sua sede para receber os cumprimentos das nossas autoridades civis e militares e também a alta sociedade local, envolvendo-os no trato distinto e cordial que caracterisa a personalidade do seu titular, o estimado cavalheiro Don Antonio Alonso Quíntana. Infelizmente motivos supervenientes impediram que tal sucedesse este ano, forçando Don Alonso Quíntana a afastar se para o Rio de Janeiro em companhia de sua Exma família há dias, e obrigando o ali permanecer algum tempo. Felicitando com êste registro aquele distinto servidor do Governo Paraguaio, fazemos partilhar da sinceridade nos nossos votos os súditos aqui residentes da nação amiga com os quais convivemos na formação de uma amizade das mais afetuosas e duradouras. O fato de uma expressiva presença de tais imigrantes demonstra a preocupação de manifestar sobre os acontecimentos e datas festivas do país vizinho, reforçando a vontade de se viver fraternamente com esses imigrantes. 66

65 Jornal Tribuna, 06-05-1948 66 Jornal Tribuna, 14-05-1948

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A imigração paraguaia concentrou-se no Centro Oeste do Brasil, em áreas fronteiriças,

porém não se limitou a essa área, como descreve os autores. 67

A imigração sulamericana para o Brasil é destacadamente concentrada zona de fronteira, sobretudo ao longo da porção brasileira da bacia hidrográfica Paraguai/Paraná, ainda que outras regiões do país também recebam parcelas importantes desses migrantes, como representado na Figura 1, adaptada de Matos et. al. (2005). Essa concentração é resultado, em boa medida, da centralidade regional exercida pelo núcleo e o entorno de Foz do Iguaçu e da atração da agroindústria localizada no Sul e no Centro-Oeste brasileiro, responsável pela crescente recepção de imigrantes procedentes do Paraguai. Em menor volume, é também significativa a presença de imigrantes na região do litoral sul, sobretudo na Região Metropolitana de Curitiba e de Porto Alegre, bem como no Sul de Mato Grosso do Sul e nos estados de Mato Grosso e de Rondônia (Matos et. al, 2005).

A intensidade de imigração de paraguaios no século XX pode ser observada no mapa

02, como a opção de escolha foi, além do estado de Mato Grosso do Sul, parte da costa oeste

do Brasil, além de ser a maior imigração sul americana no país, se comparar com a imigração

dos países vizinhos ao Brasil. O mapa 03 demonstra o quantitativo de imigrante paraguaios

nessa costa oeste brasileira, percebe-se maior concentração na região centro sul do país. Essa

concentração apresenta-se já no fim do século passado.

Diferentemente do século XIX, onde o número de imigrantes paraguaios do sexo

feminino era muito superior ao masculino, até mesmo em virtude dos motivos propulsores da

imigração, o século XX, os paraguaios são maioria, pode-se atribuir esse fato ao motivo, que

nesse momento era predominantemente político, diferente da imigração anterior.

Em decorrência desse altíssimo índice de paraguaios na cidade é que foi fundada, no

ano de 1936, a Igreja de Nossa Senhora de Caacupé, uma comunidade pertencente à Paróquia

de Nossa Senhora da Candelária, igreja Matriz da cidade, dizem os moradores e integrantes da

coordenação dessa comunidade que a Igreja surgiu quando um cônsul paraguaio que trouxe

consigo uma imagem dessa santa, cuja devoção no Paraguai é intensa, para rezar junto ao

Asilo São José, situado ao lado da Igreja. A proposta inicial era, segundo relatos, exatamente

essa, acalmar àqueles que precisavam de conforto, conversa e é claro rezar, não se tinha

pretensão de imediato fundar a comunidade de Caacupé, porém a prática desse hábito,

exercido diariamente abarcou a vizinhança, dando início a comunidade com uma pequena

capela onde ficava a Santa trazida e ofertada pelo cônsul paraguaio Antonio Alonso Quintana

67 LOBO, C. et al. Novas Territorialidades e a mobilidade espacial dos imigrantes procedentes do Paraguai residentes no Brasil. Trabalho apresentado no III Congresso da Associação Latino Americana de População, realizado em Córdoba, Argentina, 2008. p. 3

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como mostra a placa, localizada atrás da base da imagem. A Santa original fica aos cuidados

dos coordenadores na comunidade. A lenda e os milagres atribuídos a Virgencita de Caacupé,

como é chamada no Paraguai é contada pelos paraguaios orgulhosos de ter uma

“representante” em Corumbá. A lenda apresentada por Sigrist. 68

Dos vocábulos Caá – que significa erva, e Cupê – que significa atrás, a palavra Caacupé se traduz em “atrás da erva-mate”. Isso vale para explicar o significado relativo à Virgem, que se sustenta em uma lenda indígena, contada da seguinte forma: - um índio estava sendo perseguido pelos seus donos, quando se lembrou de Nossa Senhora e prometeu-lhe que se a mesma o salvasse da perseguição, esculpiria a sua figura em madeira da erva mate. Quando os patrões chegaram, ele se escondeu atrás de um pé de erva e não foi visto, o que lhe possibilitou a fuga em seguida. Conta-se que a primeira santa encontrada era esculpida em madeira de erva-mate. Corre a crença de que o lago de Ypacaraí, que quer dizer “água santa”, inicialmente era um poço que foi transbordado e o povo da região rezou à Virgem, para que o transbordamento não continuasse, pois poderia trazer grandes prejuízos às plantações. A santa fez com que aquilo se transformasse num lindo lago, hoje cantado em versos pelos poetas e músicos da terra.

Placa na base que sustenta a imagem de Nossa Senhora de Caacupé

SIQUEIRA, Kiase S. M. O dia 08 de dezembro é comemorado o dia de Nossa Senhora de Caacupé, a data é

celebrada não só no Paraguai onde é feriado nacional, bem como em todo Estado de Mato

Grosso do Sul, e em Corumbá não poderia ser diferente. Há missa presidida em espanhol,

68 SIGRIST, Marlei. A Resistência Cultural do Povo Paraguaio ARCA. Campo Grande, MS, nº 4, 1993. p. 56.

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onde grande parte de imigrantes e descendentes paraguaios revivem a festa de poder

homenagear, agradecer, renovar pedidos, enfim estar presente e atuante numa comemoração

que os fazem lembrar do seu povo. A essa religiosidade Sigrist69 observa ainda:

Assim como no Paraguai, as cidades do Mato Grosso do Sul (...) continuam com a tradição de festejar o dia de N. S. de Caacupé, que acontece dia 08 de dezembro. Missas são rezadas e comida em abundância entre as famílias, muita música, dança, podem ser acompanhadas de perto por todo aquele que deseja conhecer um pouco mais dessa cultura. (...) A maior forma de se pagar uma promessa é fazer uma visita à santa, na cidade de Caacupé-Paraguai – a 54 km de Asunción, para onde se dirigem caravanas, romarias de peregrinos, com o objetivo de venerar a imagem, participando de atos religiosos e de festas populares.

69 idem. p. 56.

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Imagem da Santa ofertada pelo cônsul paraguaio

SIQUEIRA, Kiase S. M.

A imigração paraguaia é uma marcante no Estado de Mato Grosso do Sul, bem como

se apresenta também em outros Estados do Brasil, o Mapa 02 mostra o território brasileiro

onde há grande concentração desse grupo. Demonstra também que tal imigração é a maior das

imigrações sul americana em solo brasileiro, englobando oito Estados nacionais envolvendo

do sul ao centro oeste do Brasil. O Estado de Mato Grosso do Sul aparece com quase sua

totalidade territorial coberta por esse grupo de imigrante.

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Esse comparativo deixa evidente a influencia da cultura paraguaia no Estado, não

obstante, em Corumbá. Contudo podemos perceber que o número de imigrantes vem

diminuindo a cada ano e hoje é muito ínfimo, contudo visitas à cidade são frequentes, em

particular para rever amigos e parentes que vivem em Corumbá.

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Mapa 5 – Comparativo da Imigração de Procedência Paraguaia com outras imigrações sul americanas no Brasil.

Fonte: Adaptado de Matos et. al (2005)

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Mapa 6 - Imigrantes da década de 1990 procedentes do Paraguai, conforme município de residência.

Fonte: IBGE, Censo Demográfico de 2000 (dados da amostra) Base Cartográfica Digital do IBGE.

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A intensidade de imigração de paraguaios no século XX pode ser observada no mapa

05, como a opção de escolha foi, além do estado de Mato Grosso do Sul, parte da costa oeste

do Brasil, além de ser a maior imigração sul americana no país, se comparar com a imigração

dos países vizinhos ao Brasil. O mapa 06 demonstra o quantitativo de imigrantes paraguaios

na costa oeste brasileira, por número de indivíduos, o agrupamento maior está na faixa

fronteiriça, percebe-se maior concentração na região centro sul do país. O que, de certa forma,

consolida a escolha feita pela proximidade territorial. A fronteira seca também favorece essa

imigração, feita em muitos casos de modo ilícito, a Lei do estrangeiro exige algumas regras

que o imigrante deve cumprir ao se tornar um imigrante.

Segundo a Lei do Estrangeiro, quem entrar no país tem que apresentar passaporte ou identidade à Polícia Federal, que lhe dará um visto de entrada e permanência de no máximo 90 dias. A partir daí, para se conseguir o “visto provisório”, haverá uma demora nos trâmites de quase dois anos. Se o estrangeiro pleitear o “visto permanente” – só concedido a quem tiver filho nascido no Brasil ou for casado com uma brasileira, terá que esperar por mais alguns anos. Só que, durante esse tempo, o estrangeiro não poderá exercer atividades profissionais e muito menos ter algum vinculo empregatício, sob pena de ser expulso do país. Nesse período em que os pais não têm documentação brasileira, os filhos, mesmo que tenham nascido no Brasil, não podem se matricular em escolas brasileiras. 70

Entretanto não houve fiscalização com afinco por parte das autoridades brasileiras, até

porque muitos desses imigrantes viviam na clandestinidade trabalhando nas fazendas do

Estado. Não se detinha, portanto o controle de entrada e saída de inúmeros paraguaios que

imigraram para o sul de Mato Grosso. Em meados do século XX a cada ano a imigração

paraguaia vem reduzindo, gradativamente, para o Estado de Mato Grosso do Sul como mostra

o quadro abaixo.

Quadro 04 - Recenseamento de Imigrantes paraguaios Ano Homens Mulheres Total 1940 6.692 5.109 11.801 1950 6.375 5.207 11.581 1960 6530 5601 12131 1970 6597 5306 11903 1980 2562 2646 5208 1990 1849 2073 3922 Fonte: Censo Demográfico Mato Grosso do Sul.

70 Os dados da Imigração. ARCA. Campo Grande, MS, nº 4, 1993. p. 03

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1.1 A acolhida em Corumbá

A organização dos imigrantes paraguaios que já residiam na cidade, foi fundamental

ao auxílio à base de apoio, denominada como o 1º Centro Social Paraguayo Brasileiro, uma

espécie de Casa de Abrigo, fundada entre as décadas de 1940-1950, cuja finalidade era a de

ajudar a todos os imigrantes paraguaios que aportavam na cidade, havia inclusive uma

chalana de propriedade de um paraguaio, o mesmo prestava serviços aos patrícios trazendo-os

das embarcações até o porto, pois as embarcações maiores não atracavam no porto de

Corumbá necessitando, portanto, de uma outra de menor tamanho, para atracarem. Ao

aportarem na cidade, os imigrantes eram dirigidos a uma casa71 – casa essa de um imigrante

paraguaio, que já havia adquirido sua independência financeira - e lá permaneciam até

conseguirem emprego, a partir desse momento deixavam a casa cedendo o lugar para outro

patrício que necessitasse da mesma ajuda, até sua adaptação à cidade, era um processo

rotativo. A preocupação era em não deixar abandonado um irmão de pátria. Inicialmente uma

vez por semana, normalmente aos domingos, todos se reuniam para compartilhar da tradição

paraguaia, regados de almoços típicos, com muita música, dança tudo realizado a fim de

aproximar os patrícios e amenizar a falta de familiares. Esses eventos concretizaram a

importância da fundação do 1º Centro Social Paraguayo, porém com a morte dos fundadores

do Centro, os eventos, as festas não foram mais realizadas, perdendo sua essência e prática até

então costumeira. É imprecisa a data de fundação desse 1º Clube, entretanto, ele foi de suma

relevância à fundação do 2º Centro Social Paraguayo Brasileiro, este fundado no dia 6 de

agosto de 1979 com o desígnio de “congregar a comunidade local e a colônia paraguaia”

como reza seu estatuto, preservando sua cultura, um espaço onde há frequentes festas com

ritmos e danças paraguaios como a polca, por exemplo. Os imigrantes e descendentes

paraguaios conseguiram junto ao governo municipal o terreno para a construção da sede do

Centro Social Paraguayo Brasileiro. Com o terreno ofertado, os imigrantes ergueram o clube e

criaram seu estatuto, bem como sua ATA de fundação, cuja designação Brasileiro ainda não

tinha sido incorporado em seu nome.

71 Este local está situado na rua sete de setembro, hoje o local é ponto comercial, na verdade pode se dizer que era peça ampla que era dividida para acomodar os paraguaios.

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Foto 3 - ATA de fundação do então Centro Social Paraguaio.

SIQUEIRA, Kiase, S. M.

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A grande presença desses imigrantes, a preservação e o orgulho de ser paraguaio e

descendente dos mesmos, realizando bailes e acima de tudo sua organização naquela cidade

foram determinantes para que o presidente do Paraguai fizesse uma brevíssima visita a

Corumbá, em meados do século XX, honrando a todos os seus patrícios com sua presença.

Esse fato demonstra a importância que a cidade tinha para o país. Atualmente o Clube é

composto pelo presidente, vice-presidente, tesoureiro, primeiro secretário, segundo secretário,

as eleições ocorrem a cada dois anos e pode haver reeleição do candidato, a escolha do

presidente é realizada pelos sócios através do voto. Hoje o espaço é também reservado a

festas particulares. Porém perdeu-se muito da essência do objetivo que era manter a tradição

paraguaia num espaço próprio, a organização de outrora tão concreta, hoje se revela

carecendo de uma boa injeção de ânimo, que seria a volta dos patrícios na participação

efetiva.

A importância da presença das colônias paraguaias e bolivianas na cidade foi

fundamental à realização de um programa de rádio apresentado em espanhol e ou guarani

semanalmente, com duração de duas horas na programação da Radio Clube cujo público

almejado era os imigrantes, sobretudo os bolivianos e paraguaios. O programa intitulado

Cultura Tupi-Guarani foi ao ar por quatro anos na década de 1990, como podemos constatar

na reportagem do Jornal Folha de São Paulo. O programa mereceu destaque por ser líder de

audiência. Veja a reportagem escrita pelo correspondente em Campo Grande Fábio Guibu:

“Programa em guarani lidera a audiência.

A Rádio Clube de Corumbá (MS) vem dedicando duas horas de sua programação semanal aos bolivianos e paraguaios. O programa, que se chama “Cultura Tupi-Guarani”, é narrado em castelhano e guarani e vai ao ar aos domingos, das 18h às 20h. Líder de audiência no horário, o programa é apresentado pela paraguaia Lilia Roa. Ela fala sobre os idiomas e a literatura dos dois países e dá dicas a respeito do Brasil aos paraguaios e bolivianos. O programa tem como patrocinadores empresas brasileiras de exportação e comerciantes bolivianos da região da fronteira”.

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1.2 Acomodação na nova terra: o trabalho

Assim como o casamento, o batizado, a religiosidade, o trabalho também é uma

formada inserção social. Os imigrantes paraguaios a se fixarem em Corumbá, uma cidade

distante da capital do Estado, Campo Grande cerca de 400 km e mais distante ainda de Ponta

Porá 767 km, cidade que faz divisa com o Paraguai e, portanto mais fácil de apresentar

elevado fluxo de imigrantes paraguaios no Estado. Entretanto em entrevistas imigrante

paraguaia72, que chegou a cidade de Corumbá no ano de 1951, aos 21 anos de idade em busca

de melhores condições de vida, foi possível conhecer um pouco mais sobre esses imigrantes

que aqui residem há muito tempo. Segundo relato da depoente, os imigrantes vinham sempre

em busca de vagas de trabalho, independente da cidade e não importando a distância, onde

houvesse trabalho era o destino de quem o almejava. Assim a cidade de Corumbá oferecia

vagas para quem estivesse disposto a trabalhar, foi exatamente com esse intuito e esperançoso

em conseguir essa vaga que o seu tio chegou à cidade na década de 1920, foi trabalhar em

uma fazenda de gado leiteiro, começou como empregado, anos mais tarde conseguiu, com o

auxilio de sua patroa e dedicação, tornar-se pecuarista, portanto empregador.

Conseguiu estabilidade econômica, posses, respeito e, sobretudo, foi, para sua família,

um porto seguro, pois trouxe, após garantir sua estabilidade, alguns membros de sua família a

Corumbá. Dentre eles sua sobrinha, que reside até hoje na cidade. As dificuldades

encontradas inicialmente foram desvendando-se grandes barreiras a serem superadas, segundo

a depoente a maior delas foi à diferença no idioma – português e espanhol/ castelhano – pois

nada era compreendido, tudo era diferente do que estava acostumada a ver, ouvir e fazer.

Entretanto, os imigrantes não se deixaram abater, até porque aos poucos essas dificuldades e

diferenças foram sendo superadas, dando espaço a um carinho pela cidade que os acolheu,

como podemos observar nessa poesia.

JÁ TE AMAVA CORUMBÁ Corumbá eu te amei antes de te conhecer E cheguei a teu porto décadas atrás Encontrei aqui, parentes, amigos, trabalho e até pretendente. A tua beleza deixou-me encantada As tuas palmeiras são lindas, fagueiras. E o teu pantanal belo sem igual. Foi no carnaval que vi a cultura Deste povo alegre e hospitaleiro Nada entendia do idioma que falavam estes pantaneiros

72 Entrevista realizada com uma imigrante paraguaia.

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Mas com a vivencia e o estudo do idioma Foi ficando fácil e tudo compreensível. Iniciei aqui uma nova vida bebi numa fonte de novas culturas Ensaiei no campo da Literatura Escrevi uns cantos e mais outros cantos E assim ingressei no grupo de homens letrados Que me convidaram para fazer parte da ALEC, da APEC e eu aceitei. Com tanto incentivo dos homens letrados consegui escrever algumas poesias Consegui amar muito, muito mais esta Corumbá. E esta terra linda chamada Brasil. Lilia Roa

No mesmo ano chegaram àquela cidade, inúmeros paraguaios que também foram

trabalhar em fazendas, bem como, em décadas posteriores, exerciam sua profissão. Este fato é

de fundamental importância para diferenciar os dois principais momentos da imigração

paraguaia. Diferentemente da imigração ocorrida no século XIX, cujos fatores foram

econômicos, os paraguaios imigrantes do século XX, como se pode notar é mais bem

acolhido, e aceito pela sociedade e participa ativamente com sua profissão, muitos desses

eram marceneiros, carpinteiros, agricultores e exerciam em Corumbá tais atividades. Os

reflexos desse grupo de imigrante estão no cotidiano da população daquela cidade, nos seus

hábitos de fim de tarde, nas rodas de tereré, na dança, como o chamamé, na alimentação, entre

outros. A integração desses povos – brasileiros e paraguaios – há mais de cem anos

consolidou-se em uma cidade fronteiriça que abarcou não só os paraguaios como também

inúmeros outros povos estrangeiros que chegaram a ela. Corumbá é uma fronteira especial

não só por sua condição territorial mais por demonstrar a integração de várias culturas.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pensar em estudar fronteira é uma fascinante aventura e acima de tudo um desafio.

Fascinante porque se abre um leque de oportunidades de pesquisa e um desafio, pois não é

conceituar, como se pode imaginar, erroneamente, de forma transparente esse tema. Por ser

uma cidade receptiva aos imigrantes que a escolheram como a cidade do acolhimento, o novo

lar.

As opções de estudo dos grupos de imigrantes encontrados naquela cidade é variada, a

escolha pela imigração paraguaia surgiu quando da observação de hábitos de influencia

paraguaia em Corumbá.

Os paraguaios estão presentes na cidade desde o fim do século XIX, uma das

imigrações mais antigas nessa fronteira e que, no entanto permanece com um “véu sobre seu

rosto”, ou seja, ainda sabe-se muito pouco, tentamos então levantá-lo ao menos alguns

centímetros.

Os paraguaios e seus descendentes nos receberam tão prontamente, foram muito

receptivos e especialmente dispostos a nos auxiliar em tudo que necessitamos. Mesmo com

forte influência no cotidiano da cidade de Corumbá, algumas lacunas da história desse grupo

de imigrantes, nos intrigou e aguçou nossa curiosidade, o desafio tinha sido lançado e nosso

objetivo era contribuir com a história dessa fronteira, pesquisando e entendendo os caminhos

percorridos por esses imigrantes. A história de Corumbá precisa ser desvendada e escrita.

A constatação de que Corumbá sempre foi receptiva com seus imigrantes não nos

surpreendeu, essa é sua a marca histórica, característica marcante da cidade. Um fato

importante e estimulador de permear sobre sua história, sua gente, seus estigmas, suas ruas

que revelam a simbologia dos “heróis”, bem como apresenta a contribuição de seus

imigrantes na sua formação.

A solidária Corumbá, aberta a oportunidades, apresentada em todo processo de

investigação e levantamento bibliográfico. Este por sua vez revelou ser escasso sobre o objeto

de pesquisa dessa dissertação, sobretudo do século XX. Mesmo com as adversidades

souberam superá-las e realizaram obras significativas naquela cidade.

Os colaboradores da pesquisa foram fundamentais para elencar opiniões orientadas na

organização e busca de um caminho norteador que pudesse esclarecer a realidade e acreditar

que podemos ultrapassar as muralhas do preconceito, exposto em várias formas.

A análise dos resultados das conversas com os imigrantes e descendentes paraguaios, a

pesquisa nos livros da Igreja, nos documentos particulares sustentam a tese de terra

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acolhedora, pessoas receptivas, que mantêm hábitos tradicionalmente paraguaios até a

atualidade.

Uma história rica em detalhes, que por vezes passam despercebidos, talvez por estar

disseminada em práticas corriqueiras, mas que a um olhar mais atento é possível observar a

satisfação de expor, de forma transparente e desprovida de qualquer situação desconfortável,

sua trajetória.

Ressaltar a convivência que todos temos em vários grupos com os quais nos

relacionamos como família, amigos, colegas de trabalho entre outro, em um território cuja

diversidade cultural é magnificamente ampla.

Alvo de críticas que envolviam práticas laborais das paraguaias no inicio de sua

imigração foram desmistificando ou, mais que desmistificar é esquecer o que, na verdade, não

teve repercussão discriminatória pela maior parte da população. O pior sentimento de

exclusão de um imigrante é a dificuldade de compreensão, o fato de não poder manifestar sua

vontade verbalmente é a etapa mais dolorosa do processo de adequação a nova realidade.

A pesquisa demonstrou que o fenômeno da imigração, que ocorre em todo mundo, e

os fatos históricos reforçam isso, introduzem na sociedade do acolhimento novos hábitos que

se mesclam, deixando, como no caso de Corumbá, uma identidade caracterizada pela

diversidade cultural.

A opção pelo objeto de estudo advem da relação fronteiriça histórica mantida entre

Corumbá e Assunção. O fato de ser uma relação histórica profunda, intensa ainda no período

colonial, em virtude de Corumbá ter sido um dos palcos de batalha da Grande Guerra, nos

norteou a desvendar os meandros desse linde.

A análise dos referenciais teóricos e dos dados obtidos junto aos colaboradores

demonstrou que a proibição, imposição, opressão, exploração promovem a imigração, quando

esses conceitos, no sentido agressivo das palavras, advem de pessoas responsáveis pelo bem

estar da população. Grandes homens políticos proporcionam, pelos seus atos, a emigração de

seu povo.

O estudo dos livros de matrimônios que envolviam paraguaios e brasileiros revela que

a aceitação foi imediata o inicio da imigração. A concentração da imigração paraguaia

confirma a opção de escolha em virtude da proximidade territorial com o estado de Mato

Grosso do Sul. A trajetória percorrida foi variada, dependeu da ocasião dessa decisão e da

ajuda que tiveram da população local e dos patrícios.

Uma informação, infelizmente não pode ser provada, por meio de fonte escrita, sobre a

viagem do Presidente Paraguaio Higino Morinigo à cidade de Corumbá. A esse fato é preciso

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fazer uma terrível constatação: é muito triste descobrir que não há preservação de documentos

do século passado. Não há a preocupação em salvaguardar a história daquela cidade.

Inúmeros exemplares de periódicos da primeira metade do século XX se perderam por falta

de adequada manutenção, cuidado respeito à cidade e por que não aos pesquisadores. Poucos

lugares da cidade de Corumbá têm essa consciência de preservar documentos com o

apropriado cuidado.

A comprovação da forte e marcante influencia paraguaia em Corumbá está retratada

principalmente em duas edificações, o Centro Social Paraguaio Brasileiro, recanto de muitos

patrícios. A perpetuação do hábito de reunirem para discutir acerca da situação do Paraguai,

da imigração, conversas em espanhol ou mesmo em guarani vem, aos poucos, se

desfragmentando, ou seja, como a imigração hoje é muito rara e com pouquíssimos

indivíduos, além de haver poucos remanescentes engajados, as reuniões não mais se realizam

como outrora.

Boas idéias são subitamente abafadas, foi o caso do programa de rádio voltado para

imigrantes e com audiência satisfatória, que terminou por desaparecer, sem motivos concretos

e fortes para tal atitude. Quem sabe eles não reconquistam essa vitória um dia?

Outro prédio a Igreja de Nossa Senhora de Caacupé, que está tão sólida e assiste a toda

comunidade circundante. Percebemos que essa Igreja é preservada com todo cuidado por

imigrantes que enaltecem sua padroeira e se reportam ao feriado paraguaio quando

comemoram seu dia no mês de dezembro.

Os hábitos culinários paraguaios já fazem parte do cotidiano da população e já integra

a identidade tradicional cultura corumbaense.

Fatores diferentes são diretamente proporcionais a inserção dos imigrantes, ou seja, o

motivo determinante da emigração reflete no modo de inserção na sociedade do acolhimento.

Grandes barreiras são superadas, certamente muito ainda tem de ser estudado, contudo

buscamos contribuir no estudo de tema ainda sem processo de desenvolvimento de trabalhos

acadêmicos, e poder colaborar com a história da cidade de Corumbá, cujas lacunas merecem

ser contadas em outras pesquisas. O tema é rico, pesquisar sobre imigração é fascinante,

realizar esse trabalho em uma fronteira peculiar – como é o caso de Corumbá - é mágico.

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ENTREVISTADOS

Livros de batismos nº II e III (1878 - 1886).

Livros de Casamento nº I, II e III (1870 - 1895).

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ANEXO

Anexo 01 Casamentos cujo(a)(s) noivo(a)(s) é (são) paraguaio(a) (s), na cidade de Corumbá, no período de 1870-1895.

Noivo - idade Noiva - idade Data do

matrimônio Nacionalidade

do noivo Nacionalidade

da noiva

Manoel Joaquim de Santana

Maria da Cruz Benites

1871 Brasileiro-SE Paraguaia

Mariano Raimundo de

Castro

Maria Joanna Isabel

1871 Brasileiro-MA Paraguaia

Ramão Filismino Augusto

Maria Rita 1871 Brasileiro-RJ Paraguaia

Adolfo João de Souza

Maria Ignácia Paula da Silva

1872 Brasileiro Paraguaia

Basilio Antonio José

Maria Francisca 1872 Austriaco Paraguaia

Francisco Nascimento

Maria Joanna 1872 Brasileiro-BA Paraguaia

Hermanigildo Manoella 1872 Brasileiro-BA Paraguaia

José Estevão Ferreira

Casimira Maria 1872 Brasileiro Paraguaia

Pedro Batista Maria

Domingues 1872 Brasileiro-PB Paraguaia

Theodoro da Silva

Marta Felicia Pineira

1872 Paraguaio Paraguaia

Antonio Bezerra dos Santos

Joanna Baptista Ferreria

1873 Brasileiro Paraguaia

João Pereira Teixeira

Maria Luiza Maciel

1873 Brasileiro Paraguaia

Joaquim José de Barros

Maria Lucia 1873 Brasileiro Paraguaia

Manoel Cipriana da

Concha 1873 Brasileiro Paraguaia

Manoel Jeorge de Santana

Joanita Gualberta

1873 Brasileiro Paraguaia

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Vicente Ferreira dos Santos

Luiza Maria Dias 1873 Brasileiro Paraguaia

Antonio Raimundo da

Costa

Maria da Conceição

1874 Brasileiro Paraguaia

Gabriel Moreira dos Santos

Petrona Pasquala 1874 Brasileiro Paraguaia

João Luis Gomes Carlota Amida 1874 Brasileiro Paraguaia

Justino Felis de Faria

Assumpção Martinha

1874 Brasileiro Paraguaia

Justino Fernandes Francisca Dolores

1874 Português Paraguaia

Manoel João Vicenta Ximenes 1874 Brasileiro Paraguaia

Miguel Monteiro Maria do Pilar 1874 Boliviano Paraguaia

Pedro Joaquim Maria Domingos

da Conceição 1874 Brasileiro Paraguaia

Theodoro Carreiro

d´Oliveira

Eusebia Maria Franco

1874 Brasileiro Paraguaia

Vicente da Trindade

Maria dolores 1874 Brasileiro Paraguaia

Virgílio Pereira Dutra

Maria da Cruz Martinha

1874 Brasileiro Paraguaia

Antonio Ferreira dos Santos

Simona Espindola

1875 Brasileiro-RJ Paraguaia

Eusébio Soares Gertrudes Meirelles

1875 Paraguaio Paraguaia

José Bulhões Maria Simona

Ayala 1875 Brasileiro-PE Paraguaia

Manoel Fagundes de Santiago

Miguela de Jesus 1875 Brasileiro-MG Paraguaia

Manoel Leandro da Penha

Ignácia Maria Fernandes

1875 Brasileiro-PB Paraguaia

Anastácio Alves Simona 1876 Brasileiro-MG Paraguaia

João Antunes Cunha

Valeriana Fernandes

1876 Brasileiro-RJ Paraguaia

João de Castro Acelina

Gonçalves 1876 Brasileiro-MA Paraguaia

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João Eusébio Vanega

Maria Luiza Mendes

1876 Boliviano Paraguaia

Jose Baptista de Magalhães

Maria Raia Gonçalves

1876 Brasileiro-BA Paraguaia

Jose Vicente da Silva

Rafaela da Aranha

1876 Brasileiro-BA Paraguaia

Larran Bungo Maximinia

Calonga 1876 Paraguaio Paraguaia

Marcelo Jose Pereira

Matilde de Freitas

1876 Brasileiro-BA Paraguaia

David Ferreira dos Santos

Maria Chaves 1877 Brasileiro Paraguaia

Eduardo Elias Feliciana Valente

1877 Francês Paraguaia

Joaquim Casiria de Asambuja

Felizarda Alvaninga

1877 Brasileiro-

naturalizado Paraguaia

Manoel de Barros Eusebia

Gonçalves 1877 Brasileiro-CE Paraguaia

Manoel Pereira de Souza

Anacleta da Rosaria

1877 Brasileiro-PE Paraguaia

Vicente Chaves Maria Paulina 1877 Paraguaio Paraguaia

Eduardo Clart Maria Dinis 1878 Inglês Paraguaia

João Ramires Maria Leandra 1878 Paraguaio Paraguaia

Manoel Ignácio de Moraes

Maria Paulina 1878 Brasileiro-RJ Paraguaia

Rafael João de Souza

Maria ercedes 1878 Brasileiro Paraguaia

Raimundo Rodrigues

Francisca Paula 1878 Brasileiro-CE Paraguaia

Ramigio Carretto Josefa Ignacia

Cruz 1878 Italiano Paraguaia

Agostinho Affan de Castro

Maria Melchiara Espinoza

1879 Brasileiro Paraguaia

Ângelo da França Rosana Lopes 1879 Brasileiro-BA Paraguaia

Antonio Joaquim de Souza

Maria de Jesus 1879 Brasileiro-BA Paraguaia

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Bento José Fernandes

Francisca do Rosário

1879 Brasileiro-RJ Paraguaia

Bernardo F. da Costa Filho

Maria Theresa 1879 Brasileiro-MA Paraguaia

João Herculano Daniela Falaço 1879 Brasileiro-PB Paraguaia

João Matos Oliveira

Joanna Regis 1879 Brasileiro-PB Paraguaia

Luis Gastão Estefania Santos 1879 Brasileiro-BA Paraguaia

Manoel Castilho Rosa Isabel 1879 Paraguaio Paraguaia

Virgilio da Costa Guimaraes

Tarríbia do Carmo

1879 Brasileiro-RS Paraguaia

Manoel Antonio Guimaraes

Maria Germana 1880 Brasileiro-RJ Paraguaia

Manoel Raimundo

Maria Cruz 1880 Brasileiro-BA Paraguaia

Silvio Levas Maximiliano

Maria 1880 Francês Paraguaia

Olimpio Carletti Joseph Isabel 1882 Italiano Paraguaia

Antonio Gomes Francisca Cabanhos

1883 Brasileiro-SE Paraguaia

Manoel dos Santos Rosa

Francisca Ribeiro

1883 Português Paraguaia

Pedro Gonçales Rosalia Ximenes 1883 Paraguaio Paraguaia

João Baptista Pereira

Fernanda Alencan

1884 Português Paraguaia

Manoel A. de Souza Costa

Maria Aguero 1884 Brasileiro-SE Paraguaia

Domingo Candido

Isidora Sanabria 1885 Italiano Paraguaia

Francisco da Silva

Maria Paula 1885 Brasileiro-RJ Paraguaia

João Cristóvão da Silva

Filippa 1885 Paraguaio Paraguaia

João Ignácio Rocha

Francisca Martinha

1885 Paraguaio Paraguaia

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Manoel do Nascimento da

Cunha Maria de Jesus 1885 Brasileiro Paraguaia

Mariano da Silva Marianna Dominga

1885 Brasileiro-MG Paraguaia

Domingos Rompolde

Francisca Calismo

1886 Italiano Paraguaia

João Baptista - 34 Gabriela Gonçales

1886 Brasileiro Paraguaia

Jose Mirales Maria Almada 1886 Brasileiro-BA Paraguaia

João Justino Moreira - 24

Maria do Pilar – 24

1887 Brasileiro-BA Paraguaia

Manoel Francisco de Souza - 36

Jesuína da Maza - 16

1887 Brasileiro-PE Paraguaia

Virgulino Jose Francisco – 45

Maria Pereira Dias - 35

1887 Brasileiro-PE Paraguaia

Adão Primeiro - 35

Maria Francisca Gomes - 45

1888 Brasileiro-MG Paraguaia

Salvator Provençano - 38

Maria Porletha - 22

1888 Italiano Paraguaia

Adelino Gomes da Lira

Maria Angas da Silva

1889 Brasileiro-RN Paraguaia

Francisco de Paula Alhitles

Maria Lucia Triarte

1890 Brasileiro-RJ Paraguaia

João Ricardo Salvatierra - 28

Maria Flores - 29 1890 Boliviano Paraguaia

Jose Gracopella - 55

Cecília Brevenha - 39

1890 Italiano Paraguaia

Mauricio Vicente - 33

Iathania de Jesus - 16

1890 Brasileiro Paraguaia

Feliciano Moreno - 18

Virginia Maria Gonçalves - 17

1891 Paraguaio Brasileira

Gregório Duarte - 28

Emília Francisca de Souza

1891 Paraguaio Brasileira

Pascoal Acostac - 28

Maria Mercedes Barreto – 25

1891 Paraguaio Paraguaia

Jorge Thomaz de Alvarenga

Manoela Davalo 1892 Brasileiro - naturalizado

Paraguaia

Jose Gimenes - 28

Maria Luiza Duarte – 15

1892 Paraguaio Brasileira

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Jose Pereira da Silva - 22

Prudência Antonia

Rodrigues - 21 1892 Brasileiro Paraguaia

Francisco Rabelo Joana Maria

Saraca 1893 Brasileiro Paraguaia

Heros Ramiro - 20

Leopoldina da Conceição

1893 Brasileiro -RJ Paraguaia

João Muy d’ Almeida - 76

Manoela Antonia - 40

1893 Espanhol Paraguaia

Luiz da França Reis - 37

Salustiana Natano - 14

1893 Brasileiro Paraguaia

Ageo Aureliano da Costa Paiva -

52

Maria Dolores Florentina - 26

1894 Brasileiro - PB Paraguaia

Celestino Birestem - 27

Clara Flores - 30 1894 Paraguaio Brasileira

Firmino Jose da Silva - 28

Amélia Maria da Conceição - 21

1894 Português Paraguaia

Manoel Espindola - 28

Carmem Erocar - 14

1894 Brasileiro Paraguaia

Paulino Francisco Rosa - 32

Miguela do Rosário

Navarros -18 1894 Brasileiro Paraguaia

Antonio Rodrigues Pereira

-33

Henriqueta Emilia Vieira Cunha - 21

1895 Brasileiro Paraguaia

Emilio Paniolle - 35

Gregoria Vilalba 1895 Francês Paraguaia

Faustino Espínola - 40

Maria Amélia d’ Oliveira - 18

1895 Paraguaio Brasileira

Jose Luiz Cabral - 30

Maria Cândida das Neves - 23

1895 Paraguaio Brasileira

Miguel Germano da Costa - 22

Maria do Carmo Romaz - 16

1895 Paraguaio Brasileira

Valentim Costelado - 28

Petrona Panyagua - 16

1895 Paraguaio Brasileira

Fonte: Arquivo da Igreja Nossa Senhora da Candelária, Livros I, II e III, Corumbá, MS.

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Anexo 02 Batizados de filhos de paraguaios

Nome da criança

idade Nome do pai Nome da mãe Data do batizado

Emilia 3 meses Eduardo Elias –

Francês Feliciana Valente -

Paraguaia 1878

Maria Rafaela

10 dias

Miguel Piantui - Italiano

Rosana Gonçales - Paraguaia

1878

Guilherme

50 dias

Candido de Souza - Brasileiro

Hermanguda Gonçales - Paraguaia

1878

Jose

5 dias

Francisco Bancisco - Italiano

Maria Rocha - Paraguaia

1878

Basthalanisco

X

Jose Antonio - Paraguaio

Petrona Gonçales- Paraguaia

1878

Beliriana

8 meses

Honesto Jose Leandro

Maria - Paraguaia 1878

Luiz

4 meses

Estevão Baquechimet –

Austríaco

Plácida Puena - Paraguaia

1878

Maria

1 mes Vicente de Arane

Maria Dolores - Paraguaia

1879

Antonia

7 dias

Antonio Lirante - Italiano

Petrona Branca - Paraguaia

1879

Manoel Antonio

6 meses João da Costa -

Paraguaio Juliana - Paraguaia 1879

Theodoro Antonio

X Luis Sambiasi -

Italiano Maria d Assumpção -

Paraguaia 1879

Emilio

3 meses

Eduardo Soares de Mattos - Português

Plácida Canteiro - Paraguaia

1879

Ângelo

X

Nicola Salassi - Italiano

Gabriela Paes - Paraguaia

1879

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Venâncio

20 dias

João Carlos - Italiano

Dolores - Paraguaia 1879

Francisco

2 meses

Vicento De Livio - Italiano

Miguela Sales - Paraguaia

1879

Igna

5 meses Francisco Juliano

Petrona Sanches - Paraguaia

1879

Manoel

4 meses

Jose Ignácio de Carmelo – Português

Maria do Carmo - Paraguaia

1879

Mariana

20 dias

Messias Pereira dos Santos - Brasileiro

Maria do Espírito Santo - Paraguaia

1879

Jaimes

X

Miguel Esceles - Espanhol

Aumerinda Gabaral - Paraguaia

1880

Joanna

50 dias

João Auriemime- Italiano

Ana Raiego - Paraguaia

1880

Cassiano

1 ano

Elistenio Marques. Brasileiro

Anna Josepha da Silva. Paraguaia

1879

Saturnino

1 mês

Gabriel Moreira dos Santod. Brasileiro

Petrona Pasquala. Paraguaia

1882

Paula

X

Ramão Filismino Augusto. Brasileiro

Maria Rita. Paraguaia 1882

Francisco

9 dias

Carlos Maia. Italiano

Ramona Dolores. Paraguaia

1883

Rosenda

1 mês

Pedro Gonçalves. Paraguaio

Rosalia Ximenes. Paraguaia

1883

Maria

3 meses

Vicente Livirio. Italiano

Miguela Valdez. Paraguaia

1884

Filippe

1 dia Manoel Vieira

Francisca Gomes Alves. Paraguaia

1884

Autesio

5 meses

Manoel Augusto dos Santos.

Lourença. Paraguaia 1884

Constantino

5 meses

Jose Germano Pereira Gomes

Margarida. Paraguaia 1884

Hermanogildo

3 meses Firmino Mariano.

Paraguaio Gabriela. Paraguaia 1884

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Maria

7 meses Jose Lopes. Português

Maria Petrona. Paraguaia

1884

Maria

4 meses

Manoel Marinho. Português

Virginia Petronilha. Paraguaia.

1884

Francisco

1 mês Jomaris da Silva. Francisca Pereira.

Paraguaia 1886

Fonte: Arquivo da Igreja Nossa Senhora da Candelária, Livros II e III, Corumbá, MS.