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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO MESTRADO EM ESTUDOS FRONTEIRIÇOS MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL CAMPUS DO PANTANAL BETH DE OLIVEIRA FONSECA AS POLÍTICAS PÚBLICAS DE VIGILÂNCIA EM SAÚDE NA FRONTEIRA BRASIL-BOLÍVIA CORUMBÁ - MS 2011

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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO

MESTRADO EM ESTUDOS FRONTEIRIÇOS

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL

CAMPUS DO PANTANAL

BETH DE OLIVEIRA FONSECA

AS POLÍTICAS PÚBLICAS DE VIGILÂNCIA EM SAÚDE NA

FRONTEIRA BRASIL-BOLÍVIA

CORUMBÁ - MS

2011

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BETH DE OLIVEIRA FONSECA

AS POLÍTICAS PÚBLICAS DE VIGILÂNCIA EM SAÚDE NA

FRONTEIRA BRASIL-BOLÍVIA

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-

Graduação Mestrado em Estudos Fronteiriços

da Universidade Federal de Mato Grosso do

Sul, Campus do Pantanal, como requisito

parcial para obtenção do título de Mestre.

Linha de Pesquisa: Saúde e Trabalho da

População de Fronteira.

Orientador: Prof. Dr. Edgar Aparecido Costa

Corumbá/MS

2011

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Ao meu amigo, criador da vida: Sabedoria.

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AGRADECIMENTOS

A realização deste trabalho só foi possível graças à colaboração direta de muitas

pessoas. Manifesto minha gratidão a todas elas e de forma particular:

Ao Prof. Dr. Edgar Aparecido – Que jamais deixou de incentivar – pela orientação,

compreensão e amizade;

Aos meus pais, meus heróis, Pedro Guilherme da Fonseca Filho e Elizabeth Ramona

de Oliveira Fonseca – pelo modelo de caráter, fidelidade, parceria, dedicação e amor;

Aos meus amores, Itamar e Guilherme – pela compreensão e amor;

Ao Prof. Dr. Marco Aurélio – pela amizade e incentivo.

Aos dirigentes da UFMS e do mestrado em Estudos Fronteiriços – pela oportunidade

de realização do curso de mestrado.

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RESUMO

A fronteira, enquanto franja ou área de convivência, de passagem, comunicação e intercâmbio

impõe a sua população, apesar dos limites estabelecidos por dois Estados nacionais e suas

legislações específicas, a necessidade de compartilhamento de políticas públicas cooperativas

para enfrentamento das questões que lhes são específicas. O objetivo da dissertação foi

realizar levantamento das políticas públicas de vigilância em saúde existentes na área de

fronteira Brasil-Bolívia nas cidades de Corumbá (BRA) e Puerto Quijarro (BOL), além de

compreender seu funcionamento através das ações de vigilância em saúde realizadas. Buscou-

se também, investigar as principais dificuldades de combate às endemias que ocorrem nesses

territórios. Metodologicamente se buscou junto à prefeitura municipal de Corumbá, a cópia

dos acordos formais e parcerias informais de cooperação para o desenvolvimento de ações de

vigilância em saúde praticadas entre as cidades citadas. Após essa etapa foi realizada visita ao

centro de vigilância epidemiológica de ambos os territórios fronteiriços a fim de conhecê-los,

e realizar levantamento dos agravos e do sistema de notificação dos mesmos. Também foi

feito levantamento bibliográfico e entrevista com os gestores de ambos os territórios. Foi

possível perceber que, nos anos mais recentes, existe um reconhecimento da importância de

tratar a vigilância em saúde para além dos limites territoriais dos municípios dessa fronteira.

Isso ficou marcado nos vários acordos, programas e reuniões para tratar de saúde e de

estratégias de combate e prevenção de doenças pactuadas entre Corumbá e os municípios

bolivianos vizinhos. Entretanto, ainda é necessário avançar em termos de estratégias

compartilhadas para ampliar a segurança para viver na fronteira.

Palavras-chave: Fronteira, Políticas públicas, Vigilância em Saúde.

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RESUMEN

La frontera, como franja o area de convivencia, de pasaje, comunicación e intercambio,

impone a su población, a pesar de los límites establecidos por dos Estados nacionales y sus

legislaciones especificas, la necesidad de compartir políticas públicas cooperativas para

enfrentar los problemas que les son comunes. El objetivo de la disertación fue realizar un

sondeo de las políticas públicas de vigilancia de la salud existentes en el área de la frontera

Brasil-Bolivia en las ciudades de Corumba (BRA) y Puerto Quijarro (BOL), además de

comprender su funcionamiento a través de las acciones de vigilancia en salud practicadas. Se

busco también investigar las principales dificultades de combate a las endemias que ocurren

em estos territórios. Metodológicamente, se busco en los archivos de la Prefectura Municipal

de Corumba, copia de los acuerdos formales y parcerías informales de cooperación para el

desarrollo de acciones de vigilancia en salud llevadas a cabo entre las ciudades citadas.

Después de esta etapa, fueron realizadas visitas a centros de vigilancias epidemiológicas de

ambos territorios fronterizos a fin de conocerlos y realizar investigaciones de perjuicios y de

la forma de notificación de los mismos. También fueron hechas investigaciones bibliográficas

y entrevistas con los agentes de ambos territorios. Fue posible percibir, que en el momento

actual, existe un mayor reconocimiento de la importancia de tratar la Vigilancia en salud más

allá de los límites territoriales de los municipios de esta frontera. Eso quedo evidenciado en

los varios acuerdos, programas y reuniones para tratar de salud y de estrategias de combate y

prevención de enfermedades pactadas entre Corumba y los municipios bolivianos vecinos.

Mientras, se hace necesario avanzar en términos de estrategias compartidas para ampliar la

seguridad de vivir en una frontera libre de estos inconvenientes.

Palabras-clave: Frontera, Políticas públicas, Vigilancia de la Salud.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Incidência de dengue no município de Corumbá-MS: 2000-2009 ................ 23

Figura 2 – Incidência de dengue no município de Corumbá-MS: 2000-2008 ................ 24

Figura 3 – Incidência de leishmaniose visceral no município de Corumbá-MS: 2000-

2009 ................................................................................................................................. 25

Figura 4 – Casos notificados e confirmados de leishmaniose tegumentar no município

de Corumbá-MS: 2000-2009 .......................................................................................... 26

Figura 5 – Casos notificados e confirmados de hanseníase no município de Corumbá-

MS: 2000-2006 ............................................................................................................... 27

Figura 6 – Casos confirmados e óbitos por tuberculose no município de Corumbá-

MS: 2000-2008 ............................................................................................................... 27

Figura 7 – Casos de raiva canina no município de Corumbá-MS: 2000-2008 ............... 28

Figura 8 – Casos de mordedura por caninos e felinos no município de Corumbá-MS:

2000-2008 ....................................................................................................................... 29

Figura 9 – Cronologia dos acordos e reuniões sobre vigilância em saúde na fronteira

Brasil-Bolívia, no Mato Grosso do Sul: 2005-2009 ....................................................... 38

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 9

1 SAÚDE E FRONTEIRA: A DIFÍCIL TAREFA DA GESTÃO PÚBLICA 11

1.1 A fronteira e a vigilância em saúde 11

1.2 Território e políticas públicas em área de fronteira 14

1.3 Gestão territorial para a área de saúde na fronteira 17

1.4 SIS-Fronteira e gestão territorial fronteiriça 19

2 AS POLÍTICAS DE VIGILÂNCIA EM SAÚDE NA FRONTEIRA BRASIL-

BOLÍVIA 21

2.1 Os principais agravos em Corumbá 23

2.2 Os acordos e as políticas fronteiriças de Saúde 29

2.2.1 O acordo sobre a raiva 30

2.2.2 Política e acordo de combate a dengue 36

2.3 O desenvolvimento das ações de vigilância em saúde pelos brasileiros e pelos

bolivianos 39

2.3.1 Ações de combate à raiva 39

2.3.2 Ações de combate à dengue 42

2.4 Os avanços e os retrocessos no combate às doenças na fronteira 43

2.5 Sugestões para melhoria da vigilância em saúde na fronteira Brasil-Bolívia 47

CONSIDERAÇÕES FINAIS 50

REFERÊNCIAS 52

APÊNDICES 55

ANEXOS 58

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INTRODUÇÃO

As fronteiras são locais que traduzem características particulares. Estudos que tratam

da temática na fronteira tendem a suscitar ideias que remetem a uma porção do espaço

geográfico composta por dois territórios simbolizados nos seus Estados nacionais e

materializados nos municípios que se encontram com elementos espaciais, formação histórica,

política, cultural e legislações distintas. No entanto, apesar de diferentes, nesse espaço

contíguo, naturalmente são compartilhados elementos climáticos, recursos hídricos, formação

geológica/geomorfológica, enfim substrato físico semelhante que comporta a vida na

fronteira.

A proximidade geográfica é também um importante indutor do compartilhamento de

muitos dos vetores causadores de doença. Sendo assim, a fronteira impõe a necessidade de

cooperação entre os dois territórios no que se refere às políticas públicas de saúde. É

impossível garantir um resultado eficiente de controle a esses vetores se apenas um dos lados

que compõe a fronteira desenvolverem ações de vigilância em saúde com verdadeiro rigor

técnico e padrão de qualidade. Se os vetores não reconhecem os limites internacionais, logo,

as políticas públicas de combate aos mesmos não podem restringir a um território, sob pena

de ineficácia.

A pretensão desta pesquisa é esclarecer as várias questões que se referem à saúde em

áreas de fronteira. Mais especificamente a região de fronteira que abrange as cidades de

Corumbá, no extremo oeste do estado do Mato Grosso do Sul e a cidade de Puerto Quijarro

pertencente à província de German Busch, do Departamento de Santa Cruz, na borda leste do

país. Puerto Quijarro fica a mais de 600 km de Santa Cruz e tem cerca 17 mil habitantes e

semi-conurbada a Corumbá, que fica distante 418 km de Campo Grande, a capital do estado, e

que possui uma população de quase 100 mil habitantes.

O objetivo geral desta pesquisa é compreender o funcionamento das práticas

sociais/institucionais e das políticas públicas de vigilância em saúde existentes na fronteira

Brasil-Bolívia nas cidades de Corumbá (BRA) e Puerto Quijarro (BOL), bem como seu

funcionamento e a responsabilidade de cada uma das partes. Além disso, se buscou identificar

as principais dificuldades de combate às endemias que ocorrem nessa fronteira, a partir das

cidades de Corumbá (Brasil) e Puerto Quijarro (Bolívia).

Na primeira etapa da pesquisa, levantou-se junto ao setor de vigilância em saúde da

prefeitura municipal, a cópia dos acordos e parcerias de políticas públicas de vigilância em

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saúde, tanto formais quanto informais praticadas entre as cidades citadas. Após essa etapa, foi

realizada visita ao centro de vigilância epidemiológica de ambos os territórios fronteiriços a

fim de conhecer e realizar levantamento dos agravos e do sistema de notificação dos mesmos.

Esse procedimento serviu para comparar as formas praticadas por um e outro território que

compõe essa fronteira.

A fim de se evidenciar os principais agravos foram considerados os números de casos

das patologias ocorridas entre 2000 e 2009. Tal opção se ancora no interesse em diagnosticar

os surtos mais recentes. Isso serviu para produzir uma discussão sobre as dificuldades de

enfrentamento do controle de endemias nesta fronteira. Para tanto, foi considerada a

experiência da pesquisadora como gestora de Estratégia de Saúde da Família e os

depoimentos dos gestores de saúde de ambos os lados da fronteira.

Paralelamente ao levantamento bibliográfico foi construído um roteiro de entrevistas

sendo dividido em três partes: 1) identificação do entrevistado e de sua função no sistema de

saúde, 2) conhecimento dos acordos e de sua funcionalidade, e 3) gestão e percepção das

dificuldades na vigilância em saúde fronteiriça. Esse instrumento foi aplicado aos gestores

locais responsáveis pelas ações de vigilância em saúde nessa região de fronteira para avaliar a

forma de notificação dos agravos, as práticas sociais/institucionais, os acordos e as políticas

públicas de vigilância em saúde bem como conhecer a noção de importância dessas

notificações por parte dos profissionais que as executam.

A partir de conhecido o conteúdo desses acordos, se pretendeu verificar seu

funcionamento através do levantamento das ações de vigilância em saúde realizadas em

Corumbá (BRA) e em Puerto Quijarro (BOL). Depois da obtenção dos dados foi realizada a

sistematização e análise através do uso de técnicas padronizadas. Os dados gerados a partir da

entrevista foram analisados de forma qualitativa, procurando explorar o conteúdo das

informações oferecidas pelos gestores de saúde.

O trabalho foi organizado em dois capítulos. O primeiro apresenta uma discussão

teórica dos elementos essenciais para compreensão da gestão da saúde na fronteira. No

segundo, se lançou um olhar para as políticas de vigilância em saúde na fronteira Brasil-

Bolívia, além de apresentar os principais agravos à saúde em Corumbá e Puerto Quijarro,

procurando trazer algumas sugestões para melhoria desse setor na fronteira Brasil-Bolívia.

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1 SAÚDE E FRONTEIRA: A DIFÍCIL TAREFA DA GESTÃO PÚBLICA

1.1 A fronteira e a vigilância em saúde

Na América do Sul, apenas seis países (incluindo Brasil e Bolívia), reconhecem a

faixa ou zona de fronteira como uma unidade espacial distinta e sujeita à legislação específica.

A faixa de fronteira é a área de 150 km de largura paralela à linha divisória terrestre do

território nacional. O Brasil tem uma faixa de fronteira extensa de 15.719 km que corresponde

a 27% do território nacional. Nela estão sediados 588 municípios de onze estados que

bordeiam dez países da América do Sul, onde vivem cerca de 10 milhões de pessoas

(CARVALHO, GUIMARÃES, BEZERRA, 2007).

Os municípios fronteiriços caracterizam-se por estarem localizados até 10 km da linha

de fronteira, ao longo dos 15.719km de fronteira terrestre brasileira. Essa área abrange 11

estados e 121 municípios, reúnem aproximadamente três milhões de habitantes e faz fronteira

com 10 países da América do Sul: Guiana Francesa, Suriname, Guiana, Venezuela, Colômbia,

Peru, Bolívia, Paraguai, Argentina e Uruguai (BRASIL, 2009). Esses não são os limites

estabelecidos pela Legislação Brasileira que considera a faixa de fronteira numa extensão de

150 km.

Segundo Pensavento (2002, p.36), “[...] as fronteiras não podem ser apenas encaradas

como marcos divisórios construídos, que representam limites e estabelecem divisões”, mas

que “[...] também induzem a pensar na passagem, na comunicação, no diálogo e no

intercâmbio”.

Outro aspecto importante é acrescentado por Gadelha; Costa (2004, p.32), quando

relata que a fronteira, além de “[...] tradicionalmente tratada como local de isolamento, [...]

configura-se hoje como uma região deprimida, marcada por profundas iniqüidades; essas

agravadas por questões diplomáticas peculiares a territórios contíguos entre duas ou mais

nações”.

Cataia (2007, p.2) aponta que “Hoje, em face à globalização, a compartimentação do

espaço mundial revela duas facetas contraditórias e solidárias [...]”. E acrescenta que, se por

um lado, as fronteiras delimitam com clareza o território nacional do internacional,

oferecendo a sua comunidade prováveis abrigo, por outro lado, “[...] a economia

transnacionalizada opera fluxos financeiros e normativos que atravessam as fronteiras,

promovendo um enfraquecimento de suas funções destinadas à proteção”.

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O mundo global é, sobretudo, um aprofundamento dos fluxos. A partir das ideias de

House1, Steiman; Machado (2002, p.6) aponta na atualidade para uma tendência de “[...]

formação de blocos econômicos regionais e as diásporas de povos com nacionalidade

compósita numa escala sem precedentes no passado [...]” e argumentam que essas tendências

“[...] provocaram uma mudança fundamental na abordagem das fronteiras e limites

internacionais”.

Com a instituição do meio técnico-científico-informacional, proposto por Santos

(1997) ocorre uma facilitação da circulação econômica de mercadorias, de pessoas e de

serviços. Também é produzida a ampliação dos “limites fronteiriços das patologias”,

necessitando assim, que o serviço da vigilância em saúde ultrapasse fronteiras nacionais a fim

de diminuir muitos danos à população.

Raffestin (1993) trata a abolição de limites como uma mitologia sem o menor sentido,

pois o limite é uma necessidade incontestável, um instrumento de regulação do Estado para

maior segurança de sua população contra o caos. Quando esses limites internacionais parecem

não mais interferir no cotidiano de uma população ainda assim marcam as diferenças legais, a

base da identidade territorial e a separação entre “nacionais” e “não nacionais” pelas normas e

representações ideológicas.

Cabe ressaltar que o entendimento de fronteira proposto por Raffestin (1993) em “Por

uma geografia do poder” é o de fronteira enquanto limite. Essa pesquisa parte da concepção

de fronteira como zona, franja ou área de convivência, de trocas, de fluxos.

Quase sempre as fronteiras geopolíticas não coincidem com as fronteiras sanitárias e

epidemiológicas e o limite estabelecido pela linha fronteiriça não garante a proteção

necessária à manutenção da saúde da população fronteiriça. Por isso, é necessária a efetivação

de uma atenção diferenciada com vistas a alcançar os princípios do Sistema Único de Saúde

(SUS): integralidade, universalidade equidade, descentralização, controle social e

regionalização.

A questão fundamental da fronteira nas políticas de vigilância em saúde é a

convivência, a aproximação com o outro e não a soberania, o controle do limite externo de

uma área. As patologias não reconhecem limites internacionais. Ocampo (2006, p.110)

entende a fronteira como “[...] um espaço territorial, sociológico e econômico, de relações de

interdependência, [...]”. O principal objetivo da saúde pública é a melhoria de qualidade de

vida. No caso da fronteira, não se pode olhar somente para uma de suas faces, mas sim

1 House, J. “The Frontier Zone. A Conceptual Problem for Policy Makers”, International Political Science

Review 4(1): 456-477, 1980.

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considerar que nesse espaço territorial existe intensa interação populacional. Apesar de suas

diferenças quando se refere aos símbolos próprios a cada nação, sua história vivida, sua

cultura, seu nacionalismo, essas duas culturas ou mais se misturam num mesmo ambiente, se

interagem criando, muitas vezes, uma cultura própria de vida, híbrida, diferente de cada uma

de suas nações de origem (COSTA, 2006).

Procurando demonstrar o relacionamento do sujeito com o lugar, Nogueira (2007,

p.33) introduz o conceito de fronteira vivida. Para ele, a interpretação da fronteira deve ser

“[...] a partir da compreensão que seus habitantes têm dela e de como se relacionam, quando

se relacionam, com seus vizinhos e mesmo com seus compatriotas das regiões centrais”.

A fronteira é entendida como faixa de contato, mas é considerada também como limite

de aproximação, pois a fronteira ao mesmo tempo em que representa uma área de separação,

de desconhecido, apresenta-se como perspectiva de contato entre povos. Portanto, torna-se

evidente que o espaço territorial cuja separação se faz pela linha fronteiriça, precisa de

integração para que possam ser conhecidas suas especificidades a fim de diminuir as

dificuldades em se produzir e pôr em funcionamento políticas públicas eficientes numa região

de fronteira (COSTA, 2009; NOGUEIRA, 2007; STEIMAN; MACHADO, 2002).

Quando se leva em conta apenas cada lado do território nacional sem a integração

necessária, dificilmente se poderão alcançar bons resultados. Nesse sentido, Barcellos et al

(2001) indicam que no Brasil a integração regional possui elevada importância em razão da

extensa faixa fronteiriça. A fronteira é resultado do encontro de dois territórios internacionais

e se caracteriza por ser um local de contato, de circulação de pessoas e territorialidades.

Assim, apesar de ser uma questão muito delicada, por envolver interesses de diferentes

Estados nacionais, elementos espaciais e legislações distintas, compreender o funcionamento

dos acordos existentes entre Brasil e Bolívia referentes às ações de vigilância em saúde é de

grande relevância para a sociedade já que os agravos ocorrem de forma endêmica, não se

limitando a apenas um dos lados da fronteira. Recentemente, o Ministério da Saúde tem

demonstrado interesse em conhecer e tratar a região de fronteira de forma diferenciada, o que

só pode se realizar se houver estudos que descrevam as especificidades locais.

Para a vigilância em saúde a fronteira representa um constante estado de alerta, pois os

cuidados precisam ocorrer em ambos os territórios, e um simples indicador da manifestação

de uma doença endêmica já causam tremenda inquietação. De acordo com as informações do

Centro de Controle de Zoonozes (CCZ) de Corumbá, até julho de 2009, havia quinze meses

que não se conhecia nenhum caso de raiva canina no município. Entretanto, no primeiro

semestre de 2009 foi registrado um caso em Puerto Suarez e, no ano anterior, 14 casos na

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fronteira, no lado boliviano. Isso significa que existe a presença da circulação viral na região

fronteiriça. Tanto assim que a cidade de Ladário, conurbada a Corumbá, registrou um caso de

raiva canina em 2009.

Outro caso bastante contundente foi a epidemia de dengue ocorrida no primeiro

semestre de 2009 em Corumbá. Em conformidade com os dados do CCZ, no ano anterior,

foram confirmados 56 casos de dengue nessa cidade de um total de 475 notificados. Até julho

de 2009 foram confirmados 4.278 casos de dengue de um total de 7.122 casos notificados.

Como os principais surtos de dengue verificados em Corumbá e em Campo Grande não se

deram simultaneamente, é possível especular que essas epidemias ocorridas nessa fronteira

tenham motivações particulares desse contato territorial local, carecendo de informações para

comprovação.

Portanto, a fronteira precisa de um tratamento diferenciado, para além da jurisdição

dos territórios nacionais. Nesse sentido, o entendimento sobre o conceito de território ajuda a

clarear o funcionamento das políticas públicas, bem como elucidar alternativas para a saúde e

qualidade de vida.

1.2 Território e políticas públicas em área de fronteira

Para Raffestin (1993, p.144), o território é “um espaço onde se projetou um trabalho,

seja na forma de energia ou de informação e que, por consequência, revela relações marcadas

pelo poder”. O território para o autor “é construído a partir do espaço”, tido como “prisão

original”, sendo que o território é a “prisão que os homens constroem para si”.

Concordando com esse pensamento, Haesbaert (2005, p.6774) acrescenta que

território, “em qualquer acepção, tem a ver com poder, mas não apenas ao tradicional poder

político”. “Ele diz respeito tanto ao poder no sentido mais concreto de dominação, quanto ao

poder no sentido mais simbólico, de apropriação”.

Medeiros (2009, p.217) aponta que “[...] o espaço e o território não podem ser

dissociados, pois o primeiro se faz necessário para demarcar a existência do segundo, e esse

por sua vez é a condição para que o espaço se humanize”. Ainda referindo-se ao território, o

autor comenta que é uma “[...] parcela do espaço enraizada numa mesma identidade e que

reúne indivíduos com o mesmo sentimento” (MEDEIROS, 2009, p. 217).

A maneira de se conceituar território demonstrado por Haesbaert (2004, p.40)

apresenta três vertentes básicas:

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- política: (...) a mais difundida, onde o território é visto como espaço delimitado e

controlado através do qual se exerce um determinado poder, na maioria das vezes

relacionada ao poder político do Estado.

- cultural (...) ou (simbólico-cultural): prioriza a dimensão simbólica e mais

subjetiva, onde território é visto, sobretudo, como produto de

apropriação/valorização simbólica de um grupo em relação ao seu espaço vivido.

- econômica (...): menos difundida, enfatiza a dimensão espacial das relações

econômicas, o território como fonte de recursos e/ou incorporado no embate entre

classes sociais e na relação capital-trabalho, como produto da divisão “territorial” de

trabalho, por exemplo.

Os territórios podem, então, conforme descreve Souza (2000), serem construídos e

desconstruídos na medida em que o poder passa a ser exercido por um indivíduo ou

instituição ou quando esses não são mais tidos como representantes de certo número de

indivíduos que lhes delegam poder.

O território é entendido como um espaço ocupado de onde se emanam relações de

poder. Dentro desse espaço, o agir social, ou seja, as relações do individuo ou do grupo social

com seu meio é denominado territorialidade.

Segundo Saquet (2007, p.115), a territorialidade é “um fenômeno social, que envolve

indivíduos que fazem parte de grupos interagidos entre si, mediados pelo território”.

A territorialidade sofre influência do território a que está inserido, pois suas normas

sociais e seus valores culturais variam de sociedade para sociedade. Ela também reforça a

identidade do grupo na medida em que se expressa um sentimento de pertencimento a esse

território. Por isso, conforme comenta Saquet (2007, p.115) “os planos e as políticas de

desenvolvimento devem partir de uma geografia que reconheça as relações, ou seja, de uma

geografia da territorialidade”.

Haesbaert (2005, p.6776) acrescenta que a territorialidade, “além de incorporar uma

dimensão estritamente política”, diz respeito também às “[...] relações econômicas e culturais,

pois está intimamente ligado ao modo como as pessoas utilizam a terra, como elas próprias se

organizam no espaço e como elas dão significado ao lugar”.

Nessa mesma linha de pensamento, Raffestin (1993) já havia indicado que o território

é a parte materializada pelas relações que a sociedade mantém com a natureza, enquanto a

territorialidade seria a parte imaterial, como as próprias relações sociais. Assim, como pensar

em fronteira sem analisar esse território e conhecer suas territorialidades? Como estabelecer

melhoria para uma região fronteiriça sem considerar as ações desses indivíduos em seu

ambiente, seu habitat?

O território em saúde não deve ser visto apenas como um espaço delimitado

geograficamente, mas sim concebido como um local onde as pessoas vivem e estabelecem

suas relações de contato e integração cultural. Portanto, para que se possam identificar os

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problemas de saúde no território é necessário conhecimento prévio das especificidades e

vulnerabilidades locais, a fim de intervir de forma verdadeiramente eficaz.

A atuação em saúde em área de fronteira não pode, então, ser igual a realizada na parte

central desses paises fronteiriços, pois a realidade da fronteira é especifica. Segundo comenta

Monken; Barcellos, (2005, p.202-3) “[...] para (re)conhecer os usos diversificados do

território, é necessário investigar as práticas sociais transformadas em rotina no espaço”.

Ao se pensar em fronteira como uma prática de contato deve-se, da mesma forma,

arranjar elementos que promovam a qualidade de vida da população, estabelecendo

uniformidade de indicadores sociais e sanitários. Não se quer aqui fazer apologia dos

indicadores de saúde como uma espécie de “caixa de soluções”, que contenha todas as

respostas sobre o processo saúde/doença, mas é preciso conhecer, dentre outras necessidades,

as práticas sociais, culturais, políticas nos territórios fronteiriços e como essas se imbricam, se

misturam, hibridizam ou se separam.

Nessa mesma linha de pensamento, Costa (2006, p.138), comenta que a fim de se

conhecer as especificidades das regiões fronteiriças “[...] é necessário um sistema de

informação que contemplem os indicadores básicos dessa região, para que se possa, a partir

desse conhecimento, planejar e executar ações de vigilância em saúde adequadas às

características geográficas e populacionais”.

Falar de indicadores básicos equivale tratar dos sistemas de informação em saúde que

desempenham papel fundamental para que os serviços possam ser organizados, uma vez que

subsidiam a tomada de decisões de maneira mais prática, para o controle de doenças, bem

como o planejamento de ações para promoção da saúde.

É mister organizar um sistema de informação em saúde que funcione sob a lógica de

suas características regionais, para se ter noção do arranjo da vida no lugar. Nas fronteiras,

podem ser identificadas algumas condições de saúde/doença similares que interferem na

saúde das populações de ambos os lados, o que demonstra a necessidade de pensar em

respostas integradas e a oferecer serviços com uma visão unificada.

Por sua vez, Peiter (2005) indica a necessidade de uma cooperação internacional para

a prevenção e controle de doenças infecciosas. Demonstra ainda, que não se pode tratar a

população residente nas áreas de fronteira com unilateralidade. É preciso considerar as

especificidades de cada região para oferecer um atendimento de qualidade, bem como a

prática de controle específico.

Nessa mesma linha de pensamento, Figueiredo (2005), comenta a importância de se

conhecer os fatores que levam à manifestação de doenças, a fim de se conhecerem riscos aos

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quais os grupos estão submetidos. Monken e Barcellos (2005) indicam que conhecer o

território é uma maneira de avaliar de forma objetiva os arranjos de produção, circulação,

residência, comunicação e sua relação com o jeito de viver local.

Em razão da intensificação da circulação mundial de pessoas, mercadorias e

informação, promovidas pela globalização, a preocupação com a circulação internacional de

doenças passou a ocorrer de forma mais sistemática nesse início de século XXI.

Conforme Peiter (2007, p.238),

[...] la movilidad transfronteriza es una estrategia de las poblaciones, pero también

es un problema para la vigilancia a.m. el ámbito de la salud, ya que dificulta los

registros de salud, el seguimiento del tratamiento de pacientes, la planificación y la

implementación de acciones en salud. [...] además de hacer ineficaces acciones

territoriales de salud como la inmunización, el control de vectores, y el control

ambiental. Por estos motivos, la frontera debe ser vista como un área

particularmente vulnerable para la salud. Sin embargo, no basta reconocer la vulnerabilidad de la frontera, se tiene que considerar también las especificidades de

cada región para que se instituyan políticas públicas de salud más adecuadas.

Para Peiter (2005, p.292), “[...] por mais eficientes que sejam os programas de controle

de doenças transmissíveis no lado brasileiro da faixa de fronteira sempre haverá a

possibilidade de introdução de patógenos a partir dos vizinhos, caso não haja uma forte

cooperação com os mesmos”.

Partindo-se do princípio de que os patógenos causadores de danos à saúde não

“respeitam” limites territoriais, há de se perceber que a questão da cooperação entre os dois

lados da fronteira deixou de ser uma possibilidade para se tornar uma urgente necessidade,

tendo em vista ser a saúde dessa população o maior “tesouro” a ser resguardado na fronteira.

É, sem dúvida, uma importante demanda que deve ser tratada na gestão do território.

1.3 Gestão territorial para a área de saúde na fronteira

A gestão territorial nos municípios brasileiros é, em sua imensa maioria, fruto dos

planos de governo. Assim, quando um prefeito assume a gestão, junto com sua equipe,

organiza um plano de ações baseado naquilo que compôs sua plataforma de governo durante a

campanha eleitoral. Isso ocorre principalmente na eleição de um novo prefeito (especialmente

se for de outro partido). Entretanto, os empreendimentos anteriores são deixados de lado em

nome de novos propostos pela gestão ingressante.

Ora, a gestão territorial deve ser um produto das várias racionalidades que compõe um

território, fruto de um plano de desenvolvimento e não de um plano de governo. Ou seja, é

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necessário se planejar aonde se quer chegar de maneira duradoura e para além dos interesses

políticos partidários. Essa discussão tem seu “carro chefe” nas recentes políticas de

ordenamento territorial.

O ordenamento territorial é uma estratégia que busca resolver problemas globais de

ocupação, uso e transformação do espaço físico a partir do desenvolvimento sustentável das

regiões, em busca da melhora na qualidade de vida, estabelecendo as necessidades

populacionais atuais e futuras, a fim de fazer uma utilização adequada do solo.

Ao definir o ordenamento do território, Lopes (1997) comenta que o termo se refere a

gestão da influência mútua homem/espaço natural. Remete ao planejamento de como se darão

as ocupações e uso do solo, buscando potencializar as infraestruturas existentes e a fim de

assegurar a conservação dos recursos naturais.

Em sintonia, Costa (2009, p.71) acrescenta que ordenamento territorial “[...] é um

instrumento da prática administrativa de um território. É o desenho que se planeja para o

mesmo a partir de sua realidade [...]”.

Para Mafra; Silva (2004, p.8).

[...] o objecto e a finalidade do planeamento e gestão do território é o

ordenamento territorial, significando esta expressão a análise da distribuição

dos locais destinados a habitação e a actividades produtivas e outras num dado

espaço, bem como das formas de utilização pelos diversos agentes envolvidos.

(Grifo do autor).

Conforme Moraes (2005, p.45), o ordenamento territorial “[...] diz respeito a uma

visão macro do espaço, [...], aborda o território nacional em sua integridade [...] numa visão

de contigüidade que se sobrepõe a qualquer manifestação pontual no território”.

Costa (2009, p.72) acrescenta que “[...] o ordenamento territorial deve ser proposto

para melhorar a qualidade de vida dos habitantes de um dado território, produzindo o

desenvolvimento socioeconômico equilibrado entre as regiões ou áreas que a compõe”.

Para isso, é fundamental conhecer a realidade de cada local, bem como conhecer a

lógica dos planos das diferentes regiões. O ordenamento se inicia com o estabelecimento de

normas jurídicas e termina com a execução de planos que trazem soluções para que se possa

organizar o território.

Vale enfatizar que a fronteira é formada por dois territórios que carrega na paisagem,

marcas de diferenças culturais, sociais, econômicas, de ocupação e uso do território. Para se

pensar num ordenamento territorial adequado é preciso compreender o espaço vivido e suas

características, como essa sociedade se organiza, conhecer o uso do território, bem como dos

elementos que a compõe (pessoas, paisagem própria, identidade, costumes e mitos). Conhecer

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as necessidades e condições de vida de quem ocupa esse território, respeitando suas etnias e

culturas.

Logo, conhecer a realidade local, o tipo de vivência é fundamental para que se possa

interferir nos problemas acarretados pelos patógenos causadores de danos a saúde que

constantemente atravessam os limites territoriais da fronteira.

Em seu estudo, Peiter (2005) comentou que nas questões de saúde, quando se deseja

oferecer melhor eficácia às ações de controle de doenças, prevenção e promoção de saúde, é

necessário existir interesse de ambos os lados em oferecer um tratamento específico e

diferenciado, tendo em vistas a realidade local da fronteira.

Como visto, anteriormente, a fronteira é formada por dois territórios que se encontram

nos limites internacionais. Sendo assim, a gestão pública do território, juridicamente, poderá

estender sua territorialidade somente no espaço compreendido por sua jurisdição. Isso porque

cada território é a razão das relações de poder que o formaram e que essas são exclusivas do

mesmo na sua forma de manifestação. Nesse caso, uma das possibilidades de gestão pública

da saúde na fronteira é a compartilhada pelos territórios que a compõem.

1.4 SIS-Fronteira e gestão territorial fronteiriça

O Sistema Integrado de Saúde das Fronteiras (SIS-Fronteira), instituído pela Portaria

GM/MS n. 1.120 de 06 de junho de 2005, foi criado para melhorar os serviços de saúde dos

121 municípios de fronteira existentes naquele momento. O Artigo 1º dessa portaria apresenta

como objetivos SIS-Fronteira:

I - contribuir para o fortalecimento e organização dos sistemas locais de saúde;

II - verificar as demandas e a capacidade instalada;

III - identificar os fluxos de assistência;

IV - analisar o impacto das ações desenvolvidas sobre a cobertura e a qualidade

assistencial;

V - documentar os gastos com assistência aos cidadãos; e VI - integrar os recursos assistenciais físicos e financeiros (BRASIL, 2005, p.1).

O SIS-Fronteira tem como estratégia incentivar a gestão para a saúde nas cidades

fronteiriças, distantes dos grandes centros político-econômicos. Portanto, o sistema nasceu

com a vocação para considerar as especificidades locais desses municípios a partir do

levantamento da realidade vivida. O objetivo da implantação desse projeto foi buscar o

desenvolvimento socioeconômico regional capaz de oferecer serviços de saúde a partir da

racionalização e otimização de todos os recursos existentes nessa região (BRASIL, 2007).

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Outro interesse na implantação do projeto SIS-Fronteira foi estimular essas regiões a

efetivarem os princípios do SUS: integralidade, universalidade, equidade, descentralização,

controle social e regionalização (BRASIL, 2005). Como a ideia presente no projeto é

conhecer para sistematizar racionalmente as ações, a operacionalização do mesmo é composta

de três fases: Diagnóstico e Plano Operacional; Implantação de Serviços para Áreas de

Fronteiras; e Qualificação de Gestão em Áreas Estratégicas.

Na primeira fase, o município deve fazer um diagnóstico tanto da clientela que atende

quanto da condição de saúde e da infraestrutura presente para seu atendimento. Para isso,

recebe a primeira parcela de incentivo financeiro do Ministério da Saúde, correspondente a

30% dos recursos previstos (COLLEONE et al, 2009).

De acordo com Colleone et al (2009, p.248), na segunda fase está prevista:

[...] a qualificação da gestão, serviços e ações e a implantação da rede de serviços de

saúde nos municípios fronteiriços incluindo os serviços para atendimento

ambulatorial básico a 100% da população, atendimento as urgências, e criação de

mecanismos para garantia de acesso aos serviços especializados.

Nessa etapa, o município recebe 35% dos recursos previstos, sendo utilizados para

implantação de serviços como: Serviço de Atendimento Móvel de Urgência-SAMU, Farmácia

Popular e outros (COLLEONE et al, 2009).

Na terceira e última fase, devem ser implantados e consolidados os serviços de saúde,

identificando os pontos críticos de áreas estratégicas, relacionados com: “[...] estrutura dos

serviços, capacidade institucional local, perfil epidemiológico da população, qualidade e

sustentabilidade da atenção e abrangência do Programa para Qualificação da Gestão”

(COLLEONE et al, 2009, p.249). Com isso, o município se credenciará para receber os 35%

restante.

Vale ressaltar que a proposição do SIS-Fronteira não remete a uma solução para as

especificidades (re)produzidas nos municípios fronteiriços. Significa, contudo, o

reconhecimento pelo governo federal que esses municípios precisam ser tratados de maneira

diferenciada dos demais em função das interações fronteiriças. Assim, implica conhecimento

real do território pelos gestores da vigilância em saúde. Essa condição indica a necessidade da

implantação de um sistema de informação em saúde nas fronteiras, que permita a tomada de

decisões de forma ágil para oferta de serviços com uma visão unificada.

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2 AS POLÍTICAS DE VIGILÂNCIA EM SAÚDE NA FRONTEIRA BRASIL-

BOLÍVIA

A concepção das políticas de vigilância em saúde denota o rompimento com a visão

cartesiana, fragmentária que se teve durante quase todo o século XX. A noção de saúde passa

a assumir uma visão holística concebendo o ser humano como biopsicossocial, produto e

produtor do ambiente em que vive. O indivíduo precisa ser considerado como uno e múltiplo

e as condições de saúde/doença resultam das relações desses entre si e com o meio.

A vigilância em saúde é entendida:

[...] como uma forma de pensar e agir, tem como objetivo a análise permanente da

situação de saúde da população e a organização e execução de práticas de saúde

adequadas ao enfrentamento dos problemas existentes. É composta pelas ações de

vigilância, promoção, prevenção e controle de doenças e agravos à saúde, devendo constituir-se em um espaço de articulação de conhecimentos e técnicas vindos da

epidemiologia, do planejamento e das ciências sociais, é, pois, referencial para

mudanças do modelo de atenção (BRASIL, 2008, p.6).

A vigilância em saúde é realizada com a integração das três formas de vigilância:

epidemiológica, sanitária e saúde ambiental. Essa prática intersetorial é fundamental para que

realize ações contemplando “[...] a vigilância e controle das doenças transmissíveis; a

vigilância das doenças e agravos não transmissíveis; a vigilância da situação de saúde,

vigilância ambiental em saúde, vigilância da saúde do trabalhador e a vigilância sanitária”

(BRASIL, 2007b, p.10).

A vigilância epidemiológica foi definida pela LEI Nº 8.080, de 19 de setembro de

1990, como:

[...] conjunto de ações que proporciona o conhecimento, a detecção ou prevenção de

qualquer mudança nos fatores determinantes e condicionantes da saúde individual

ou coletiva, com a finalidade de recomendar e adotar as medidas de prevenção e

controle das doenças ou agravos (BRASIL, 1990).

A vigilância epidemiológica deve conhecer “[...] o comportamento epidemiológico da

doença ou agravo escolhido como alvo das ações, para que as intervenções pertinentes

possam ser desencadeadas com oportunidade e efetividade” (BRASIL, 2007b, p.11). Para

tanto, deve coletar, sistematizar, analisar e interpretar dados epidemiológicos, investigando e

recomendando medidas mitigatórias e preventivas.

A vigilância sanitária também foi definida pela LEI Nº 8.080, de 19 de setembro de

1990. Essa lei foi “[...] entendida como um conjunto de ações capazes de eliminar, diminuir

ou prevenir riscos à saúde e de intervir nos problemas sanitários decorrentes do meio

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ambiente, da produção e circulação de bens e da prestação de serviços de interesse da saúde”

(BRASIL, 1990).

A vigilância sanitária envolve o controle de bens de consumo desde o momento da

produção até o consumo final, incluindo a prestação de serviços que direta ou indiretamente

está relacionada à saúde.

A vigilância ambiental em saúde foi definida em 2002 pela FUNASA (Fundação

Nacional de Saúde) como:

[...] um conjunto de ações que proporciona o conhecimento e a detecção de qualquer

mudança nos fatores determinantes e condicionantes do meio ambiente que

interferem na saúde humana, com a finalidade de identificar as medidas de

prevenção e controle dos fatores de risco ambientais relacionados às doenças ou

outros agravos à saúde (BRASIL, 2002, p.7).

A vigilância em saúde ambiental está focada em três tipos de controles: da qualidade

da água para consumo humano (VIGIAGUA), de populações potencialmente expostas a solo

contaminado (VIGISOLO) e da qualidade do ar (VIGIAR).

É preciso destacar que as ações de vigilância em saúde não consideram apenas uma ou

duas de suas divisões, mas a integralidade delas. Um exemplo disso é a saúde do trabalhador

que integra tanto as ações de vigilância epidemiológica, quanto de vigilância sanitária, e

igualmente da vigilância ambiental em saúde, pois o trabalhador não pode ser visto fora do

seu ambiente de trabalho e de vida.

Outro exemplo é a concepção adotada para promoção da saúde que: “[...] é

compreendida como estratégia de articulação transversal, à qual incorpora outros fatores que

colocam a saúde da população em risco trazendo à tona as diferenças entre necessidades,

territórios e culturas presentes no país” (BRASIL, 2007b, p.13).

A promoção da saúde tem por objetivo melhorar a qualidade de vida e minimizar a

vulnerabilidade e os riscos à saúde. São levados em conta tanto os determinantes quanto os

condicionantes de saúde: “[...] modos de viver, condições de trabalho, habitação, ambiente,

educação, lazer, cultura e acesso a bens e serviços essenciais” (BRASIL, 2007b, p.13).

Neste capítulo, foi dado maior enfoque a uma das formas de vigilância em saúde: a

epidemiológica. Entretanto, como é impraticável o olhar numa particularidade apenas, já que

essas políticas são tratadas de maneira integralizada, também foram abordadas outras

vigilâncias: sanitária e saúde ambiental. Partiu-se da análise dos principais agravos em

Corumbá para os acordos e as políticas fronteiriças de Saúde. Em seguida, se fez uma busca

sobre o desenvolvimento das ações de vigilância em saúde pelos brasileiros e pelos

bolivianos, abordando os avanços e retrocessos no combate às doenças na fronteira. Por fim,

se buscou apresentar algumas propostas para melhorar a gestão da saúde fronteiriça.

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2.1 Os principais agravos em Corumbá

No ano de 2000, o município de Corumbá sofreu uma epidemia de dengue. Neste ano

ocorreu o maior número de notificações (672) e confirmações (247), se comparados aos oito

anos posteriores. No ano seguinte somente 6 casos foram confirmados. Nos cinco anos

seguintes não houve números significativos de casos confirmados da doença, sendo até

mesmo zerado em alguns deles. No ano de 2007 quando o estado de Mato Grosso do Sul

sofreu uma epidemia com a entrada do sorotipo 3, Corumbá registrou 209 casos confirmados.

No ano seguinte, foram 57 confirmados dentre os 476 notificados. O ano de 2009, o

município vivenciou a maior epidemia já registrada (Figura 1). Novamente, como no ano de

2000, com a circulação do vírus 1, foram notificados 7.283 e confirmados 5.726 casos.

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Casos

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Figura 1 - Incidência de dengue no município de Corumbá-MS: 2000-2009.

Fonte: Vigilância Epidemiológica de Corumbá-MS, organizado pelo autor.

Segundo o plano operacional 2010 da Secretaria de Saúde, a rápida disseminação da

doença pode ter sido favorecida pelos seguintes fatores: a presença de uma epidemia de

grandes proporções na Bolívia, a grande circulação de bolivianos e brasileiros na fronteira

seca Brasil-Bolívia, a grande circulação do sorotipo 1 (que não circulava no Estado de Mato

Grosso do Sul havia muitos anos) e a grande proporção de indivíduos susceptíveis ao tipo de

vírus circulando. Além, evidentemente, dos índices de infestação domiciliar do vetor Aedes

aegypt em patamares que permitiram a circulação do vírus em grande intensidade.

A suspeita de subnotificação pelas unidades responsáveis decorre de informação da

vigilância epidemiológica do município que precisou fazer busca ativa no Pronto Socorro

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Municipal para conhecer a epidemia. Em relação a um possível ciclo da manifestação de

dengue, quando extraímos a excepcionalidade representada pelo ano de 2009, o gráfico

demonstrativo dos casos notificados e dos confirmados aponta para certa periodização (Figura

2). Costuma-se relacionar o aumento da manifestação dessa doença nos períodos mais

chuvosos.

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Casos notificados

Casos confirmados

Figura 2 - Incidência de dengue no município de Corumbá-MS: 2000-2008.

Fonte: Vigilância Epidemiológica de Corumbá-MS, organizado pelo autor.

Outra patologia que merece especial atenção da vigilância em saúde é a leishmaniose,

nas suas duas formas de manifestação: tegumentar e visceral. No município de Corumbá, a

incidência da leishmaniose visceral, entre os anos 2000 a 2004, apresentou uma média de 15,6

casos confirmados, tendo sido 2000 o ano com maior número de casos confirmados (20). O

ano de 2008 foi o que apresentou o menor, apenas 03. Quando verificados o número de óbitos

durante esses cinco primeiros anos, temos uma média de 2,4 casos ano, sendo que o ano de

maior índice foi 2002, com quatro óbitos registrados e 2005 a 2008 foram notificados uma

média de 6,5 casos ano (Figura 3). Nesses quatro anos, não foram registrados óbitos por

leishmaniose visceral no município. Vale lembrar que houve 02 casos provenientes da

Bolívia, dentre os confirmados nos anos de 2006 e 2007 no município de Corumbá tendo sido

um caso em cada ano. Segundo a Vigilância em Saúde, essa região é endêmica para

leishmaniose chegando à positividade de 30% do inquérito canino em Corumbá. Na Província

de German Bush, não é feita a captura de cães vadios.

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Figura 3 - Incidência de leishmaniose visceral no município de Corumbá-MS: 2000-2009.

Fonte: Vigilância Epidemiológica de Corumbá-MS, organizado pelo autor.

A ocorrência da leishmaniose tegumentar teve incidência mais elevada no ano de

2001, com 08 casos confirmados. Além de 2004 e 2005 com, respectivamente, 05 e 06 casos

confirmados (Figura 4). À exceção de 2007 (sem nenhum caso no município), nos demais

anos foi confirmado apenas 01 caso/ano. Quanto à leishmaniose tegumentar, nesses nove

anos, não foram registrados óbitos nesse município pela doença, porém ocorreram 02 casos

provenientes da Bolívia, dentre os confirmados nos anos de 2003 e 2004 no município de

Corumbá, um caso em cada ano. Nesses anos, o número de casos suspeitos se igualou aos

confirmados.

Enquanto a leishmaniose visceral apresentou números de notificação e confirmação

decrescentes, a tegumentar vem mostrando um caráter cíclico, com oscilações entre 2 e 3 anos

de picos e declínios. Como não existe ou não se tem acesso à informação de casos

procedentes dos municípios bolivianos, não é possível estimar com precisão a dimensão da

presença dessas patologias nessa fronteira.

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Casos

Figura 4 – Casos notificados e confirmados de leishmaniose tegumentar no município de Corumbá-

MS: 2000-2009.

Fonte: Vigilância Epidemiológica de Corumbá-MS, organizado pelo autor.

Outra doença que exige elevada atenção de vigilância é a hanseníase – uma patologia

crônica proveniente de infecção causada pelo Mycobacterium leprae, cuja ocorrência está

ligada a condições de pobreza. Brasil et al. (2003), aponta o domicílio como espaço

privilegiado para transmissão da doença, pois a transmissão é interpessoal. A incidência de

hanseníase apresentou média de 48,8 casos confirmados nos sete anos registrados. Observa-se

que o ano de 2004 foi o de maior incidência com 78 casos confirmados, seguido do ano de

2003 com 68. O ano de 2000 foi o de menor número de casos com 32 confirmados (Figura 5).

Nesses sete anos, não foram registrados óbitos por hanseníase no município. Vale lembrar que

04 casos, dentre os confirmados nos anos de 2002 e 2003 (03 e 01 casos respectivamente),

foram provenientes da Bolívia. Nesses anos, o número de casos suspeitos se igualou aos

confirmados.

Observa-se que os números da hanseníase demonstram necessidade de maiores

cuidados, pois durante os sete anos do período analisado sempre apresentaram valores

superiores a 30 indivíduos por ano. Brasil et al. (2003) descrevem que os principais grupos

susceptíveis residem na faixa inferior a 15 anos dependendo, em especial, do grau de

endemicidade do meio, com grande potencial de contaminação, apesar da baixa

patogenicidade. Conforme observado anteriormente, a transmissão se dá pelo contato entre as

pessoas. Sendo assim, é preciso planejar para a melhoria das condições de vida dos moradores

de toda a fronteira e não somente de Corumbá, já que os fluxos humanos são frequentes e

cotidianamente excedem os limites internacionais.

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Figura 5 – Casos notificados e confirmados de hanseníase no município de

Corumbá-MS: 2000-2006.

Fonte: Vigilância Epidemiológica de Corumbá-MS, organizado pelo autor.

A tuberculose é também uma doença endêmica no município, apresentando uma

média anual elevada, de 86,2 nos nove anos verificados. Observa-se que o ano de 2003 foi o

de maior incidência com mais de 120 casos confirmados, seguido dos anos de 2001 e 2007,

ambos superando 100 casos (Figura 6).

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Figura 6 – Casos confirmados e óbitos por tuberculose no município de

Corumbá-MS: 2000-2008.

Fonte: Vigilância Epidemiológica de Corumbá-MS, organizado pelo autor.

O ano de 2008 foi o de menor número de casos com 75 casos confirmados.

Verificamos 10 óbitos em 2003 e 06 óbitos em 2001. Nos outros anos, não houve registros de

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óbitos. Vale lembrar que houve 12 casos provenientes da Bolívia dentre os confirmados, nos

anos de 2002 a 2006 no município de Corumbá. Também ocorreram 18 casos de abandono de

tratamento, sendo 17 em 2001 e 01 no ano seguinte.

A elevada presença da tuberculose na fronteira demanda de uma atenção mais

cautelosa em relação a proposição de práticas coletivas (intrafronteiriças), cuja ausência

expõe toda população, mesmo a daqueles locais em que a prevenção é adotada como

estratégia de controle endêmico. Como a transmissão é realizada pelo ar, quando o indivíduo

contaminado pelo bacilo de Koch (Mycobacterium tuberculosis) tosse ou espirra, a

convivência fronteiriça se torna um potencial ambiente de proliferação da doença.

Outra grave zoonose, que precisa de ações de vigilância em saúde é a raiva canina,

tendo em vista que o contato do cão contaminado com o ser humano provoca uma doença

incurável (raiva humana). Quando se relaciona a raiva canina e felina no município, percebe-

se que do ano de 2000 até o ano de 2005 não houve notificação. Já no ano de 2006, houve 1

caso, seguido de 4 casos em 2007 e 5 casos em 2008. Até o ano de 2005, a vacinação era feita

em postos fixos, depois disso passou a ser casa a casa, passando de 14 mil doses utilizadas

para 22 mil doses (Figura 7).

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Figura 7 – Casos de raiva canina no município de Corumbá-MS: 2000-2008.

Fonte: Vigilância Epidemiológica de Corumbá-MS, organizado pelo autor.

O risco de transmissão da raiva canina aos seres humanos é potencializado pelo

elevado registro de mordeduras ocorridas no município. O número de mordeduras vem

aumentando progressivamente. Em 2000 foram notificados apenas 11 casos e em 2008, 1.079

casos (Figura 8). Evidentemente que o aumento das notificações pode estar relacionado ao

aumento da população canina, mas também com a melhoria no sistema de notificação.

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Percebemos que nos primeiros 06 anos, quando não foi diagnosticado nenhum caso de raiva

canina no município, a média de mordeduras foi de 239 casos. Já de 2006 a 2008, quando

houve diagnóstico de raiva canina no município, a média de mordeduras foi de 751 casos

notificados.

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Figura 8 – Casos de mordedura por caninos e felinos no município de Corumbá-MS:

2000-2008.

Fonte: Vigilância Epidemiológica de Corumbá-MS, organizado pelo autor.

Na província de German Bush, não há dados atualizados sobre os indicadores de saúde

dos principais agravos que sofre aquela população, devido à perda de dados da gestão anterior

em agosto de 2005. Segundo o técnico de endemias daquela província, estima-se que a

população canina seja de 7.657 na Província de German Bush, sendo 3.170 em Puerto Suarez,

3.477 em Puerto Quijarro e 1.020 em Carmen Rivero Torrez.

Todos esses agravos ou possibilidades deles não são locais, mas ocorrências

fronteiriças devendo, pois, serem encarados como tal, a fim de se produzir mais

coerentemente políticas públicas de vigilância em saúde. O foco não pode ser a base territorial

do município, mas o ambiente de manifestação patológica ou de seus vetores.

2.2 Os acordos e as políticas fronteiriças de Saúde

Esta região de fronteira é endêmica para alguns agravos que constantemente coloca em

risco a saúde da população fronteiriça. Dentre os agravos mais comuns nessa fronteira estão a

dengue, leishmaniose, raiva canina, hanseníase e tuberculose no lado brasileiro, enquanto no

lado boliviano, além dessas, há preocupação com patologias como Chagas, malária, febre

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amarela. Todas elas geram preocupação constante para a vigilância epidemiológica do

município, inclusive pelo desconhecimento da situação de todo o espaço fronteiriço, ficando

apenas com os dados do município de Corumbá.

Existem apenas dois acordos de cooperação para vigilância em saúde nesta fronteira.

O controle da raiva canina é balizado como um acordo formal, mediado pela Organização

Pan-Americana da Saúde (OPAS). O combate à dengue não é formal, sendo pactuada pelo

Programa de Combate a Dengue na Fronteira Brasil-Bolívia, elaborado pela Prefeitura de

Corumbá para desenvolvimento de ações conjuntas nos dois municípios fronteiriços. Para os

demais agravos são feitos monitoramentos pontuais pela vigilância epidemiológica brasileira.

2.2.1 O acordo sobre a raiva

A necessidade de ação conjunta para combater o vírus da raiva foi uma das

motivadoras das primeiras conversações para uma política comum de fronteira. O vírus da

raiva, após sua penetração no organismo, se dirige para o sistema nervoso central tanto nos

homens como nos animais e, dentre as diversas zoonoses, representa um sério problema de

saúde pública, pois apresenta prognóstico fatal em todos os casos (BRASIL, 2006).

É fundamental ter um serviço de vigilância epidemiológica que realize ações como a

intensificação da vacinação de cães e gatos e a captura de animais vadios. Esses animais de

convivência doméstica são os principais transmissores da raiva aos seres humanos, pelo

contato com a saliva pela lambedura ou mordida do animal infectado.

Essas informações precisam ser utilizadas de forma que se possa alcançar um

planejamento regionalizado. Para isso, é necessário um sistema de informação conjunto que

contemple indicadores dos principais agravos que podem interferir nas condições de saúde

dessa população fronteiriça.

Caramori Junior (2003) comenta sobre a ampla distribuição geográfica que a raiva

apresenta tendo em vista a morte de cerca de 50 mil pessoas anualmente nos países pobres,

sendo 90% no sudeste asiático. Levantamento da Organização Mundial de Saúde, em 1992,

apontou que o cão responde por 99% dos casos de raiva humana.

Schneider et al (2005) relatam que no ano de 2004 o índice de ocorrência da raiva

canina na Bolívia agravou sensivelmente, com destaque para as cidades de La Paz,

Cochabamba e Santa Cruz. Apontam, para o mesmo período, o registro de 975 casos de raiva

canina em 14 países do continente americano, destacando a Bolívia (355), seguida por El

Salvador (194) e Brasil (104). Observa ainda que os países latinoamericanos, a exemplo de

Peru, Equador, México, Bolívia e Brasil ainda possuem regiões endêmicas de raiva canina.

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Entre as várias regiões do Brasil que ainda não conseguiram controlar a raiva urbana,

merece evidência o município de Corumbá-MS onde, além da extensa fronteira seca com a

Bolívia, corrobora o costume da criação de animais domésticos circulando livremente pelas

vias públicas em ambos os lados da fronteira. Essa condição dificulta a eficácia das

campanhas de vacinação, favorecendo a dispersão do vírus rábico.

De acordo com os dados da Secretaria Municipal de Saúde de Corumbá, de 1999 até

2005 não havia caso registrado de raiva canina. Contudo, o país vizinho, como demonstrado

anteriormente, apresentava preocupação pela quantidade de notificações desse agravo.

Neste século, ano de 2006, ocorreu o primeiro caso de raiva em um cão vadio no

município de Corumbá. Esse fato produziu um alerta na região, o que levou em abril de 2007,

a Secretaria Municipal de Saúde de Corumbá a realizar a 1ª Reunião de Fortalecimento do

Programa de Vigilância, Prevenção e Controle da Raiva na Fronteira Brasil-Bolívia. Seu

objetivo foi elaborar estratégias de prevenção da raiva nos municípios fronteiriços e ações de

atenção à saúde realizada em conjunto para alcançar os resultados efetivos de proteção à

população.

Ainda assim, não foi possível exterminar o risco desta doença. Nos anos mais recentes,

foi visível o aumento dos casos de raiva canina. Em 2007, foram diagnosticados,

laboratorialmente, quatro casos de raiva canina em Corumbá nos seguintes bairros: Aeroporto

(2), conjunto Vitória Régia (1) e loteamento Pantanal (1). Houve também, um registro na

Bolívia (Arroyo Concepcion, districto de Puerto Quijarro).

No ano de 2008, com todas as ações preconizadas no Programa Nacional de Profilaxia

da Raiva para se evitar novos casos, ainda foram diagnosticados cinco casos de raiva canina,

nos seguintes bairros de Corumbá: Aeroporto (2), Maria Leite (1), Previsul (1) e Popular

Velha (1). No mesmo ano, foram informados 14 casos na fronteira boliviana: 8 em Puerto

Suarez e 5 em Puerto Quijarro. Além desses, houve um caso de raiva humana que levou à

morte uma criança de 4 anos de idade no município de Puerto Suarez.

A preocupação de controle epidemiológico na fronteira não é tão recente. Segundo o

ex-secretário municipal de saúde de Corumbá, Mário Sérgio Kassar2, durante sua gestão

(2000-2004) foram feitos com o município fronteiriço boliviano cerca de duas ações em

conjunto para minimizar os efeitos da dengue e da raiva nesta área. As ações consistiam na

participação de equipe da Secretaria de Saúde de Corumbá, ANVISA e equipe da Bolívia, na

realização de mutirão de limpeza, coletando pneus e materiais que pudessem acumular água

2 Entrevista realizada em 16 de julho de 2010.

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no lado boliviano – essas práticas já eram partes da rotina de serviços no lado brasileiro.

Tratava-se apenas de um acordo tácito, nada formal. Contudo, essa ação se fazia necessário

para que os vetores da doença não atingissem também Corumbá, trazendo um tipo viral

diferente, agravando a situação local. Ocorreu também nessa época de forma conjunta,

vacinação na população canina da área de fronteira, além da análise dos cérebros de cães

encontrados mortos, visando diagnosticar a presença do vírus da raiva.

O acordo formal de vigilância epidemiológica na fronteira Brasil-Bolívia é bastante

recente, datando do início do século XXI. Logicamente, os vetores circulavam livremente

pelo espaço fronteiriço há muito mais tempo, pois são imunes às motivações

políticas/culturais que cercam o limite internacional.

A discussão sobre saúde na fronteira Brasil-Bolívia foi impulsionada somente a partir

da criação do SIS-Fronteira (abordado no capítulo 1) e sua posterior divulgação pelo

Ministério da Saúde. No início do ano de 2005, ocorreu uma oficina estadual e municipal

visando planejar e determinar formas de atuação e implantação do SIS-Fronteira, momento

em que a Secretaria de Saúde de Corumbá tomou conhecimento dessa iniciativa federal.

As regiões de fronteira costumam apresentar fortes divergências. Muitas dessas se

constituem nas diferentes condições econômicas aliadas à existência de uma Constituição

Federal específica em cada lado da fronteira. Essa condição também foi percebida por

Ocampo (2006, p.17) quando relata que: “Provavelmente, a faixa de fronteira constitui o

território em que há maior dificuldade para a implantação de políticas publicas”.

Segundo Costa (2006, p.107), a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS)

percebeu a necessidade de sua intervenção na região de fronteira “[...] para apoiar e fortalecer

processos de integração de saúde na fronteira”. Assim, participou junto com o Ministério da

Saúde na preparação do SIS-Fronteira, propondo a colaboração entre Estados na elaboração

de políticas locais que favorecessem o desenvolvimento local sustentável dessa região,

oferecendo assistência técnica especializada e auxílio financeiro quando necessário

(OCAMPO, 2006).

O ex-secretário de saúde de Corumbá, Hugo Costa Filho (2006, p.65), relatou a

dificuldade que o município enfrentava como região de fronteira em sua gestão. Segundo ele,

essa região precisa de um planejamento regionalizado tendo em vista que “Corumbá vem

prestando atendimento a uma população flutuante, [...] circunstância que restringe a qualidade

e sustentabilidade da assistência realizada”.

Costa Filho (2006, p.68) faz, ainda, referência ao déficit no recebimento de recursos

financeiros vindos do governo federal já que “[...] o cálculo de repasse do teto financeiro

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fundo a fundo, considera o quantitativo populacional” e esses municípios têm “[...] sua

capacidade de provisão prejudicada, uma vez que subestima a população que realmente utiliza

o sistema”. Além disso, lembra que é fundamental o monitoramento das doenças de

notificação compulsória considerando “[...] a realidade da população que transita livremente

pela fronteira”. Caso contrário estará permanentemente atuando “[...] apenas parcialmente na

Vigilância em Saúde” (COSTA FILHO, 2006, p.71).

O compartilhamento da “fronteira seca” levou o Ministério da Saúde, em maio de

2005, através do SIS-Fronteira, a realizar o “I Seminário sobre a Integração das Ações de

Saúde na fronteira do Brasil com a Bolívia". O objetivo desse evento foi discutir e planejar

uma primeira agenda de saúde para essa área de fronteira, a fim de iniciar um planejamento

concreto de tarefas a serem realizadas em conjunto com a Bolívia. Os participantes desse

evento foram agentes de saúde dos dois países e a sociedade civil os quais puderam conhecer

os riscos que a população estaria exposta. Como resultado, foi apontado como prioridade o

combate de vetores de doenças transmissíveis.

Após esse programa, foi realizada, em Corumbá, nos dias 17 e 18 de abril de 2007, a I

Reunião de Fortalecimento do Programa de Vigilância, Prevenção e Controle da Raiva na

Fronteira Brasil-Bolívia, articulada pela Secretaria Municipal de Saúde deste município e

respaldada pelo Governo Federal brasileiro. Essa reunião foi presidida pela Secretaria de

Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde do Brasil e co-presidida pelo Ministério de

Saúde e Deportes da Bolívia. Participaram da mesma, representantes do Estado de Mato

Grosso do Sul, Brasil; Departamento de Santa Cruz, Bolívia; e dos municípios de Corumbá e

Ladário, Brasil e Puerto Quijarro, El Carmen Rivero Torres e Puerto Suarez - a reunião

ocorreu “a portas fechadas”.

As conclusões e recomendações derivadas daquela reunião apontaram, dentre outros

aspectos, para: o fortalecimento da vigilância, prevenção e controle da raiva; o tratamento de

pacientes bolivianos no Brasil mediante encaminhamento por uma Unidade de Saúde - US

boliviana; uniformização dos procedimentos de notificação, acompanhamento e desfecho dos

casos; realização de exames nos laboratórios da rede de diagnóstico da raiva do Brasil em

períodos emergencial, com acompanhamento obrigatório da “Ficha de Remisión de Muestras

Sospechosas de Rabia Animal do Instituto Nacional de Laboratórios de Saúde da Bolívia”;

realização simultânea, a partir de setembro de 2007, de duas campanhas de vacinação canina

contra a raiva, por ano, entre os municípios fronteiriços.

Ficou estabelecido ainda que o Ministério da Saúde do Brasil fizesse a doação de

aproximadamente 60.000 (sessenta mil) doses de vacina antirábica para uso canino, em cada

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campanha, repassado para os municípios bolivianos da fronteira através da rede estadual e

municipal do Brasil. Os demais insumos e os recursos necessários para a execução das

campanhas, assim como a conservação dos imunobiológicos dentro das normas e padrões dos

programas de imunização, serão de responsabilidade da Rede de Saúde Provincial e do

Ministério da Saúde da Bolívia. Também foi pactuado: o apoio aos municípios bolivianos

pelos brasileiros nas atividades de controle de foco de raiva canina e capacitação para técnicos

bolivianos.

Outro resultado foi a criação do Comitê Binacional composto pelos representantes do

Ministério da Saúde do Brasil e da Bolívia, do Estado do Mato Grosso do Sul e do

Departamento de Santa Cruz, Município de Corumbá e Província German Busch. Ficou

acordado que esse Comitê seria secretariado tecnicamente pela OPAS Brasil e OPAS Bolívia.

Após seis meses, em 25 de outubro de 2007, foi realizada a Segunda Reunión para

Prevención y Control de la Rabia entre las Fronteras de Bolívia y Brasil, na cidade de Santa

Cruz de la Sierra, Bolívia, de onde saíram as seguintes recomendações e conclusões: criação

de um comitê binacional de prevenção e controle da raiva em toda fronteira Bolívia-Brasil;

acordo para que os coordenadores estaduais do Brasil realizassem capacitações aos

departamentos bolivianos; compromisso para realização de duas campanhas de vacinação nos

municípios de fronteira a partir de 2008; compromisso do Ministério da Saúde do Brasil em

oferecer curso de formação de gerentes aos profissionais bolivianos dos Centros de Controle

de Zoonoses; formalização de um sistema de informação em fronteira alimentado

mensalmente sob responsabilidade dos comitês binacionais; revisão do método utilizado para

estimar a população canina de ambos os países com as mesmas variáveis.

Posteriormente, também foi pactuada em Corumbá, durante o mês de abril de 2008,

uma Carta de Intenções entre as prefeituras de Corumbá, de Puerto Suarez e Puerto Quijarro,

com o propósito de promover a integração dos municípios de fronteira na região do Pantanal

para o desenvolvimento sustentável por meio de uma agenda binacional a fim de melhorar

suas relações no comércio, saúde e meio ambiente. Foi acordado que as ações seriam por

meio de projetos e programas, nos temas de interesses comuns, conduzidas por Comissões

Técnicas formadas por assessores designados pelos municípios, a partir de um cronograma de

reuniões.

Nesse mesmo período, nos dias 23 e 24 de abril 2008, foi realizada a Terceira Reunião

do Comitê Binacional para Fortalecimento das Ações de Vigilância, Prevenção e Controle da

Raiva na Fronteira do Estado do Mato Grosso do Sul (Corumbá e Ladário), Brasil e Província

de German Busch (Puerto Quijarro, Puerto Suarez e El Carmen Rivero Torres), Bolívia.

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Participaram representantes do Ministério da Saúde e Secretarias de Vigilância Sanitária dos

municípios de Corumbá e Ladário (Brasil), representantes da Bolívia (de Puerto Quijarro, de

El Carmen Rivero Torres e de Puerto Suarez), membros da Organização Pan-Americana de

Saúde. Durante esses dias, foram elaboradas e aprovadas conclusões e recomendações

pertinentes à situação epidemiológica. Dentre essas: realização da primeira reunião do comitê

binacional local para fortalecimento das ações de controle da raiva; reconhecimento da

gravidade da situação epidemiológica da raiva na fronteira, com 5 amostras caninas positivas

(100% de positividade), um caso humano positivo na província de German Busch e 2

amostras caninas positivas (86% de positividade) no município de Corumbá; compromisso de

estruturação da Vigilância de Resposta Rápida para casos de cães suspeitos e/ou positivos no

município de Corumbá (controle de foco) em até 72 horas; fortalecimento do programa

municipal do controle da Raiva; capacitação de colaboradores da Bolívia pelos técnicos de

Corumbá e Ladário.

Durante essa reunião, o prefeito municipal de Puerto Suarez pediu apoio aos

municípios de Corumbá e Ladário para assessorar tecnicamente na construção de uma

Unidade de Controle de Zoonoses e da legislação municipal. Foi pactuado, ainda, que as

Secretarias de Saúde de Corumbá e de Ladário dariam apoio às ações de vacinação antirrábica

canina e felina na fronteira e na captura desses animais na Província de German Busch. A

disponibilização de combustível, alimentação aos técnicos e insumos para a realização da

eutanásia animal em local apropriado e eliminação de carcaças ficou na incumbência daquela

província boliviana. Em havendo necessidade de esquema profilático antirrábico humano, por

um paciente boliviano no Brasil, este deverá ser referenciado por uma Unidade de Saúde

boliviana.

Após dois meses, conforme pactuado na Segunda Reunião, foi feito um parecer

técnico pela responsável, médica veterinária Viviane Ametla, em junho de 2008, de onde

saíram as seguintes conclusões e recomendações: necessidade de uma equipe permanente para

trabalhar na profilaxia da raiva; aperfeiçoamento do sistema de notificação e rotina de

trabalho; capacitação dos profissionais médicos; funcionamento das salas de vacinas em

período integral; manter trabalho articulado com a Província Germam Busch/Bolívia,

conforme previsto nas atas da reunião do Comitê Binacional de Profilaxia da Raiva;

implementação da Lei municipal 1550/98 que autoriza cobrança de multas dos proprietários

que tiverem seus animais apreendidos pela equipe do CCZ; intensificação das ações do

Programa de Profilaxia da Raiva; intensificação da captura de animais soltos em vias

públicas; controle da população canina e felina; envio sistemático de material encefálico

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animal para diagnóstico laboratorial da raiva; parceria com clínicas veterinárias particulares

para auxiliar na Vigilância, apoio da mídia; viaturas para atender o programa.

Em 15 de dezembro de 2009, na cidade de La Paz (Bolívia), ocorreu outra reunião

onde foi aprovada a Cooperação Técnica entre os Países (TCP) para eliminação da raiva

humana transmitida por cão na Argentina, Bolívia, Brasil e Peru. Estavam presentes os

representantes do Ministério de Saúde e Desportos da Bolívia, do Ministério de Saúde da

Argentina, o responsável pelo controle da raiva canina do Ministério da Saúde do Brasil, a

diretora geral da Saúde do Peru e os representantes da saúde dos departamentos de La Paz,

Tarija y Potosí, representante do CCZ do município de Corumbá e da direção regional de

saúde de Puño, um representante da PANAFTOSA e OPS/OMS da Bolívia.

As recomendações e conclusões dessa reunião foram as seguintes: o compromisso dos

gestores para reforçar a importância das campanhas de vacinação na fronteira, coordenadas de

forma conjunta pelos dois países; a garantia, através dos Ministérios de Saúde, da provisão

das vacinas conforme a necessidade local; o conhecimento da situação epidemiológica da

raiva canina para monitoramento e alcance da cobertura vacinal canina.

2.2.2 Política e acordo de combate a dengue

Conforme dados da Vigilância Epidemiológica, o município de Corumbá apresentou

no ano de 2006 índices de infestação larval do Aedes aegpyti de 2,30% e a Bolívia com

índices muito altos (em Puerto Suarez, 10%, Puerto Quijarro com 8% e para Carmen Rivero

Torrez, 20%), já que o Ministério da Saúde considera normal o índice igual ou menor a 1%.

É necessário intensificar as ações de prevenção e combate ao vetor da dengue já que

isso constitui atualmente um grave problema de saúde pública no mundo, especialmente em

países tropicais cujas temperaturas favorecem a reprodução mais rápida e, consequentemente,

o aumento da quantidade de mosquitos.

A Secretaria de Saúde de Corumbá elaborou o Programa de Combate a Dengue na

Fronteira Brasil-Bolívia, contendo ações a serem desenvolvidas em conjunto nessa região de

fronteira nos meses de Janeiro a Abril/2006. Esse Programa teve como objetivo reduzir a

infestação pelo Aedes aegypti, a incidência e a letalidade por febre hemorrágica. Dentre as

ações propostas e que foram realizadas estão a intensificação do combate ao vetor, ações de

educação em saúde, comunicação e mobilização social, capacitação de recursos humanos,

intensificação das ações de vigilância epidemiológica, formação de um comitê de combate

com vários segmentos da sociedade.

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Essas ações quando foram concretizadas na Província de German Bush, contaram com

a participação voluntária das forças armadas bolivianas que receberam capacitação no

combate aos vetores.

Conforme informações do Técnico da Província, a última vez em que foi feito o

Levantamento do Índice Rápido de Infestação (LIRA) do Aedes aegypti, foi no ano de 2008

quando Puerto Suarez estava com 17%, Puerto Quijarro com 35%, porém em Carmen Rivero

esse levantamento não foi realizado.

Segundo a Vigilância em Saúde de Corumbá, as ações realizadas nessa região de

fronteira se deram somente na implantação do Programa em 2006. Vale lembrar que no ano

de 2007, quando houve uma epidemia em nível nacional, a capital do Estado sofreu uma

grande epidemia, mas no município de Corumbá houve apenas cerca de 400 casos de dengue.

Já no ano de 2009 quando houve uma grande epidemia na Bolívia, em especial na cidade de

Santa Cruz de la Sierra, um dos primeiros casos identificados no município de Corumbá, foi a

de um passageiro que veio direto de Santa Cruz para esse município. Naquele ano, o

município teve sua pior epidemia já registrada com a circulação viral do tipo I. Nesse sentido,

não podemos negar a possibilidade de influência dessa fronteira para a proliferação, tendo em

vista a intensa circulação de pessoas e animais nesse local. Ressalta-se ainda o alto índice de

infestação nessa Província todas as vezes em que é realizado o LIRA. Além disso, não há

rotina estabelecida de combate ao vetor. No entanto, é importante frisar que não existe dengue

onde não há Aedes aegypti.

Segundo o Técnico de endemias de German Bush, todos os casos registrados são

importados de Santa Cruz ou do Brasil, e surgem em período de muita circulação de pessoas

como em época de férias e carnaval, sendo que nos outros meses não há casos suspeitos de

dengue. Nesses meses são feitos mutirões de limpeza, com participação das forças armadas,

estudantes e prefeituras de Puerto Suarez e Puerto Quijarro. Logicamente, essas informações

não procedem, pois foram confirmados, como demonstramos anteriormente, índices muito

elevados de infestação do Aedes aegypti, tanto em Puerto Suarez quanto Puerto Quijarro.

Portanto foram várias iniciativas desenvolvidas, especialmente nos anos mais recentes,

demonstradas anteriormente e organizadas cronologicamente na figura 9. Corumbá foi palco

das principais reuniões, talvez pela melhor organização do sistema público de saúde e das

ações de vigilância em saúde historicamente desenvolvidas.

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Cronologia Acordo/reunião Local Objetivo Principal

Maio 2005

I Seminário sobre a

Integração das Ações de

Saúde na fronteira do

Brasil com a Bolívia. Corumbá

Discutir e planejar uma primeira

agenda de saúde para essa área de

fronteira a fim de iniciar um

planejamento concreto de tarefas a

serem realizadas em conjunto com a

Bolívia

Dezembro

2005

Programa de combate a

dengue na dengue na

fronteira Brasil-Bolívia Corumbá

Diminuir a infestação pelo Aedes

aegypti considerando as

peculiaridades da saúde nessa região

fronteiriça a partir da realização de

ações conjuntas na fronteira Brasil-

Bolívia.

Abril 2007

1ª Reunião de

Fortalecimento do

Programa de Vigilância,

Prevenção e Controle da

Raiva na Fronteira Brasil –

Bolívia.

Corumbá

Elaborar estratégias de prevenção da

raiva nos municípios fronteiriços e

ações de atenção à saúde realizada

em conjunto para alcançar os

resultados efetivos de proteção à

população.

Outubro

2007

Segunda Reunión para

Prevención y Control de la

Rabia entre las Fronteras

Bolívia y Brasil,

Santa

Cruz de la

Sierra

Controle e prevenção da raiva entre

as fronteiras da Bolívia e Brasil

Abril 2008

Carta de Intenções entre as

prefeituras de Corumbá, de

Puerto Suarez e Puerto

Quijarro. Corumbá

Promover a integração dos

municípios de fronteira na região do

Pantanal para o desenvolvimento

sustentável por meio de uma agenda

binacional para melhorar suas

relações no comercio, saúde e meio

ambiente.

Abril 2008

Terceira Reunião do

Comitê Binacional

Corumbá

Fortalecimento das Ações de

Vigilância, Prevenção e Controle da

Raiva na Fronteira do Estado do

Mato Grosso do Sul (Corumbá e

Ladário), Brasil e Província de

German Busch (Puerto Quijarro,

Puerto Suarez e El Carmen Rivero

Torres), Bolívia.

Junho 2008

Parecer Técnico

Corumbá

Descrever situação epidemiológica da

raiva canina no município de

Corumbá e necessidades gerais para

melhoria do serviço

Dezembro

2009

Cooperação Técnica entre

os Países (TCP) La Paz

Eliminação da raiva humana

transmitida por cão na Argentina,

Bolívia, Brasil e Peru. Figura 9 – Cronologia dos acordos e reuniões sobre vigilância em saúde na fronteira Brasil-Bolívia, no Mato

Grosso do Sul: 2005-2009.

Organização: FONSECA, B.O., 2010.

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Nas entrevistas com os gestores de saúde de Corumbá e da Província de German Bush,

se pode perceber que não foram firmados outros acordos de cooperação para vigilância em

saúde nessa área de fronteira. Portanto, fica patente a necessidade de

aprimoramento/ampliação de cooperação fronteiriça para inibir a ação dos vetores

epidemiológicos.

2.3 O desenvolvimento das ações de vigilância em saúde pelos brasileiros e pelos

bolivianos

Após o levantamento e análise dos acordos e reuniões realizadas entre as autoridades

brasileiras e bolivianas nessa fronteira, partiu-se para verificar como as ações, dentre as que

foram acordadas, estão sendo realizadas. Primeiramente, discutiram-se as ações sobre o

acordo formal de vigilância em saúde da raiva e em seguida, o acordo informal de combate à

dengue.

2.3.1 Ações de combate à raiva

Dentre as ações emanadas da primeira reunião fronteiriça de combate à raiva, o

fortalecimento da vigilância, prevenção e controle vêm sendo cumpridos, mas precisa ser

intensificada já que é muito dependente das ações dos brasileiros. O Centro de Controle

Zoonoses (CCZ) trabalha em conjunto com a Vigilância Epidemiológica e Unidades de Saúde

durante todo o ano realizando ações de rotina no município. As ações realizadas são as

capturas de animais vadios através de arrastão nos bairros da cidade, notificação das

agressões, avaliação de tratamento ao paciente, busca ativa dos faltosos, intensificação da

vacinação de cães e gatos de casa em casa realizada duas vezes por ano (abril e setembro) e

monitoramento da circulação viral no município. Outras ações são: encaminhamento para

análise laboratorial dos materiais coletados dos animais suspeitos (sintomatologia nervosa),

inter-relacionamento com as clínicas veterinárias, educação em saúde, orientação dos

profissionais de saúde na profilaxia e prevenção da raiva, observação do animal agressor para

auxiliar o tratamento do paciente.

Anualmente, a equipe do CCZ realiza as mesmas ações de combate a raiva canina no

município de Corumbá e na Província de German Bush, nesse caso, em parceria com as

Forças Armadas e polícia local. São realizados, portanto, a captura de animais vadios, a

vacinação de cães e gatos, palestras quanto à prevenção da raiva (sobre a gravidade da doença

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e dos riscos de não vacinar). A equipe da Vigilância Epidemiológica de Corumbá também

orienta frequentemente, os profissionais bolivianos quanto aos procedimentos a serem

adotados em relação a pessoas agredidas, incluindo capacitação de técnicos bolivianos, das

escolas municipais e das forças armadas.

Conforme informação da gerente de Vigilância em Saúde, dentre as ações pactuadas

nessa fronteira, algumas estão sendo cumpridas, outras não. A ação de campanha de

vacinação em conjunto com a Bolívia tem acontecido duas vezes ao ano, durante os meses de

abril e setembro. Nesse caso, a Província de German Bush fica responsável pelo combustível

utilizado na ação, bem como alimentação e uma parcela dos recursos humanos, enquanto CCZ

de Corumbá entra com sua equipe para ação e os demais materiais utilizados. A provisão de

vacinas para as campanhas é de responsabilidade do município de Corumbá que oferece, em

média, 1.500 unidades para cada município da província. De acordo com as informações

obtidas, a vacinação, em alguns anos, ficou comprometida pela ausência de simultaneidade

das ações naquela Província.

O município de Corumbá recebe cerca de 8 mil reais do Ministério da Saúde para

campanha, mas a sua plena realização tem um custo em torno de 20 mil. Vale ressaltar que até

o ano de 2005 a vacinação era feita em postos fixos, atingindo 14 mil animais e, a partir de

2006, quando a vacinação passou a ser “de casa em casa”, passaram a ser vacinados 22 mil

cães e gatos em Corumbá. Estima-se que soma de vacinações em cães e gatos realizadas

anualmente nos municípios bolivianos totalizam em torno de 27 mil vacinas.

A grande questão é que não se conhece precisamente o quantitativo de animais a

serem imunizados do lado boliviano. Entretanto, pelas informações disponíveis, percebe-se

que a oferta de vacina é insuficiente, pois como demonstrado anteriormente3, a população

total de cães da Província German Bush é da ordem de quase 8 mil. Isso é preocupante, pois

praticamente a metade dessa população canina está ficando sem imunização, permanecendo o

risco de transmissão da raiva.

Além da possibilidade bastante real da existência de cães não vacinados, no lado

boliviano não ocorre a captura de cão vadio, em função da cultura e da falta de legislação

específica. Outro agravante é o fato da maioria das casas serem apenas cercadas, facilitando

que os cães permaneçam soltos nas vias públicas.

Outra recomendação do acordo é sobre o encaminhamento para tratamento. Esse

deveria ser feito por uma unidade de saúde boliviana, mas isso ainda não existe, conforme

3 Cf. Final do Item 2.1 “Os principais agravos em Corumbá”.

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informações do técnico responsável. O que vem sendo feito é a condução dos pacientes

bolivianos acometidos de mordeduras pelo próprio técnico para tratamento no lado brasileiro.

Em relação à uniformização dos procedimentos de notificação, podem-se notar alguns

avanços. Não existe um sistema comum de notificação informatizada e as fichas são

diferentes. Contudo, toda vez que ocorre o registro de uma mordedura em indivíduos no lado

boliviano e que necessite de encaminhamento, o técnico responsável informa, por telefone, a

Vigilância Epidemiológica de Corumbá. O grande problema está no acompanhamento e

desfecho dos casos: fundamentalmente, é um caso de falta de pessoal técnico. No lado

boliviano, a busca ativa4 dos faltosos e a observação do animal agressor é responsabilidade de

apenas uma pessoa para toda extensão provincial. Em Corumbá, existem duas equipes para

esse monitoramento: o CCZ e a Vigilância Epidemiológica.

Por outro lado, a indicação do acordo para a realização de exames nos laboratórios da

rede de diagnóstico da raiva no Brasil tem sido feito rotineiramente. Anteriormente, os

diagnósticos laboratoriais realizados no Brasil não eram aceitos na Bolívia. Com o acordo,

não só passaram a aceitar como também a tornar isso uma prática comum. Porém, esse

atendimento só se tornou possível com envolvimento da Agência Estadual de Defesa Sanitária

Animal e Vegetal do Estado do Mato Grosso do Sul (IAGRO-MS) que dá suporte

laboratorial. Os casos suspeitos de raiva canina (cão ou o somente seu encéfalo) são levados

pelo mesmo técnico (único da Província) ao CCZ de Corumbá para fins de diagnóstico.

Após a realização da segunda reunião fronteiriça de combate à raiva, muito das ações

contidas na primeira foram reforçadas. Dentre os novos compromissos, três não têm sido

cumpridos. O Ministério da Saúde do Brasil não consegue capacitar os profissionais

bolivianos para controle de zoonoses, porque simplesmente não existem esses técnicos na

Província de German Bush. O sistema de informação em saúde na fronteira ainda não foi

criado e tampouco revisado o método de estimar a população canina com as mesmas variáveis

em ambos os países.

Da terceira reunião, apesar de solicitado pelo prefeito de Puerto Suarez, o

assessoramento técnico por Corumbá para a construção de uma Unidade de Controle de

Zoonoses e de Legislação específica, não frutificou. De acordo com informações da gerente

de Vigilância em Saúde, o município de Corumbá passou para a prefeitura de Puerto Suarez

toda planta baixa, com especificação de terreno, legislação específica, mas não houve

continuidade no projeto pela Bolívia.

4 Procedimento executado pelo órgão de vigilância quando o paciente não comparece para continuidade do

tratamento.

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2.3.2 Ações de combate à dengue

O programa de combate a dengue na fronteira Brasil-Bolívia foi elaborado pela

secretaria de Saúde de Corumbá em dezembro de 2005 para ser realizado no ano de 2006

durante os meses de janeiro a abril, meses mais chuvosos e com maior número de casos

notificados de dengue. Nele constavam ações de combate a dengue que foram desenvolvidas

pela equipe de Corumbá nas cidades de Corumbá e German Busch. Essa foi a primeira vez

que foi elaborado um programa para ser desenvolvido em conjunto.

Durante os anos anteriores eram realizadas algumas ações emergenciais em conjunto,

nessa época do ano. Também nos anos posteriores, segundo a gerente de vigilância em saúde

de Corumbá, as ações em conjunto na Província são realizadas sempre que é solicitado

parceria, já que a Bolívia não possui um programa nacional de combate a dengue. Assim, a

Secretaria de Saúde de Corumbá, sempre que possível, disponibiliza alguns serviços para

serem realizados na província, como o LIRA, identificação larval, borrifação com fumacê e

ações educativas. No entanto, essas ações não têm periodicidade e não estão inseridas na

rotina de trabalho.

O programa de combate à dengue foi executado em três linhas de ação em toda essa

área de fronteira: promoção em saúde, vigilância em saúde e atenção em saúde. Assim, várias

ações foram desenvolvidas, tais como: ações de combate ao vetor e controle ao vetor,

capacitações dos profissionais de saúde, intensificação das ações educativas à população,

otimização das ações diagnósticas, atendimento diferenciado aos pacientes, formação de um

comitê de mobilização de combate a dengue e a realização do disque dengue no município

(CORUMBÁ, 2006).

A partir do mapeamento de áreas críticas pelo LIRA realizado em conjunto na

Província foram desencadeadas ações para extermínios dos possíveis focos. O município de

Corumbá ofereceu o larvicida e apoiou na aplicação. A limpeza dos terrenos baldios foi feita

com apoio de soldados das Forças Armadas local.

Outra ação foi a capacitação de profissionais de saúde bolivianos que foi realizada

pelos profissionais da vigilância epidemiológica de Corumbá, com apoio de um intérprete.

Realizada em fevereiro de 2006, no município de Puerto Suares, contou com a presença de

médicos, enfermeiros, lideranças de bairros, soldados do Exército e marinheiros que

participaram da oficina de combate a dengue. Posteriormente essas informações foram

repassadas a comunidade boliviana pelos voluntários capacitados.

Também foi realizado um trabalho para identificação do tipo viral encontrado. O

material coletado era encaminhado para o laboratório de entomologia do município de

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Corumbá, sendo contabilizado para manter atualizados os índices de infestação e tipologia da

dengue dessa fronteira.

O Programa tinha, inicialmente, duração prevista para o ano de 2006, mas apresentou

alguns desdobramentos, dentre os quais a criação de um comitê local de combate a dengue

pela Secretaria Municipal de Saúde de Corumbá: o Comitê de Mobilização de Combate a

Dengue. Esse comitê tinha como objetivo criar um grupo técnico para acompanhamento da

situação, além de apoiar e auxiliar a Vigilância em Saúde nas ações educativas e de prevenção

da dengue. Contavam com a participação de vários segmentos da sociedade, além de

representante do município de Ladário e da Província German Bush.

Até inicio de 2011 o referido comitê continuava ativo. Entretanto, as reuniões têm sido

esporádicas, sem um calendário definido, demonstrando dificuldades de reunir todos os

representantes das instituições e segmentos sociais componentes. Dessa forma, não se

conseguem manter atualizados os índices de infestação da área de fronteira e tampouco foi

criado um sistema de informação capaz de apoiar no gerenciamento das ações de combate à

dengue.

2.4 Os avanços e os retrocessos no combate às doenças na fronteira

A fim de apresentar uma dimensão dos avanços e dificuldades no processo de

vigilância em saúde nesta fronteira, se buscou a percepção dos atuais (final de 2010, início de

2011) gestores de saúde. Nesta etapa do trabalho, foram realizadas cinco entrevistas com

gestores do lado brasileiro e uma do lado boliviano. A pretensão foi entender o que o gestor

conhecia sobre os acordos e pactos para vigilância na fronteira, indagando sobre o

cumprimento de ações acordadas para cada território, sobre o sistema de notificação dos

agravos, as principais dificuldades e as sugestões para melhorar o sistema de vigilância em

saúde.

Em Corumbá foram entrevistados: o médico Lauther da Silva Serra, Secretário

Municipal de Saúde, a veterinária Viviane Campos Ametlla de Oliveira gerente de Vigilância

em Saúde, a enfermeira Keyla Brito, coordenadora da Vigilância Epidemiológica, a psicóloga

Diva Albaneze, gestora de projetos e coordenadora do SIS-Fronteira, e a bióloga sanitarista

Grace Kelly Sguario do Valle Bastos, chefe do Centro do Controle de Zoonoses.

Na Bolívia seriam entrevistados: a médica, gerente de vigilância em saúde, o médico

do hospital de Puerto Suarez e o técnico de endemias, Sr. Ronald Fábio Vargas Parada, mas

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após três meses de tentativas com idas frequentes até os mesmos, somente uma entrevista foi

obtida, com o técnico de endemias.

Em relação ao conhecimento da existência de acordos e/ou tratados nessa fronteira e

sua funcionalidade, 04 profissionais de Corumbá relataram ter conhecimento e apenas 01

apontou seu desconhecimento, exatamente por ser mais recente na sua atividade no

município. Como acordos formais foram citados o Comitê Binacional de Programa de

Vigilância, Prevenção e Controle da Raiva na Fronteira, a Carta de Intenção entre prefeitos

dessa região, o Tratado de Roboré, o Acordo de Cooperação Técnica entre universidades da

Bolívia e Brasil. Como acordos informais, as cooperações entre a Secretaria de Saúde de

Corumbá e Alcaldia de Puerto Quijarro no controle e prevenção da dengue e o Comitê

Binacional de Combate a Raiva. Para o gestor boliviano seriam formais os acordos para

combate à raiva e leishmaniose e informais os da dengue, malária e febre amarela.

Percebe-se que existe enorme confusão em torno do que seja formal e informal em

termos de acordos de saúde nesta fronteira. Verdadeiramente é formal apenas o controle da

raiva, sendo que todas as demais ações são informais, variando apenas os níveis de

cooperação entre os vizinhos.

Sobre o que compete a cada território, os gestores corumbaenses indicaram que a

Secretaria de Saúde do município participa de ações que ocorrem na Bolívia, em cooperação

com o Exército Boliviano para combate a dengue, raiva, leishmaniose e outros. Na fala do

Secretário de Saúde se pode apurar que quanto ao combate a raiva canina, compete ao Brasil

fornecer todo material imunológico e recursos humanos necessários para a realização da

vacinação, além de capacitação e viaturas. Os bolivianos entram com insumos, planejamento

das ações e ficam com a responsabilidade pela entrega do encéfalo canino suspeito para

diagnóstico. Essas ações estão sendo cumpridas pelas partes, observando, porém, algumas

interrupções por parte da Bolívia por falta de estrutura operacional.

Na visão da gerente de Vigilância em Saúde se pode perceber que através do Comitê

Binacional de Combate a Raiva foram pactuadas ações para intensificar a vigilância na

fronteira, onde as prefeituras assumiram obrigações e deveres e que estão cumpridas na

integralidade, mas necessitam ser intensificadas. Quanto à Carta de Intenções dos Prefeitos,

cujos trabalhos deveriam ser realizados através da implantação das câmaras técnicas, com

técnicos dos municípios envolvidos para realizar um diagnóstico da área e debater possíveis

soluções, não houve avanços, somente algumas reuniões técnicas sobre diversos assuntos,

sem objetividade.

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O gestor boliviano entende que compete a cada território cumprir com os programas

estabelecidos, devendo ser compromisso das autoridades municipais. Informa que dentre as

ações cumpridas desses acordos estão as campanhas de vacinação canina, vacinação de

pessoas mordidas por cães e o combate a dengue.

Alguns gestores do lado brasileiro informaram que Puerto Quijarro muitas vezes não

cumpre sua parte em relação aos investimentos no controle de endemias, provavelmente por

falta de planejamento ou de recursos, ou ainda pela morosidade de sua liberação para as

ações.

Em relação à percepção das dificuldades na vigilância em saúde fronteiriça, quando

questionados sobre os principais agravos, os gestores de saúde fronteiriços foram unânimes

em apontar a dengue, a raiva e a leishmaniose. Entre outros agravos foram mencionados:

violência, diarreia, DST (Doenças Sexualmente Transmissíveis), tuberculose, febre amarela,

doença de Chagas e hepatite.

No que refere ao conhecimento de como funciona o sistema de notificação realizada

nessa região de fronteira, a maioria dos gestores corumbaenses tem conhecimento apenas dos

procedimentos do lado nacional. Poucos afirmaram conhecer como os bolivianos realizam

suas notificações de agravos. Em Corumbá, as unidades de saúde notificam para a vigilância

epidemiológica, sendo disponibilizada uma equipe no Pronto Socorro Municipal para efetuar

as notificações, e outra equipe para realizar a busca ativa dos casos notificados. A gerente de

Vigilância em Saúde acrescentou que no Brasil os profissionais de saúde mandam as

informações para vigilância epidemiológica que investiga os casos e posteriormente digita os

dados no SINAN (Sistema Nacional de Notificação). Em acordo com sua fala, as notificações

em Puerto Quijarro também são realizadas pelos profissionais de saúde, só que de uma forma

mais limitada, devido principalmente a deficiência de recursos humanos e ao sistema como

um todo. Vale ressaltar que existe somente um servidor que realiza o controle de dengue,

leishmaniose, raiva e doença de Chagas em toda a Província German Bush (Puerto Quijarro,

Puerto Suarez, El Carmen), além da dificuldade logística (carro e ausência de telefone na

Gerência de Saúde).

Em conformidade com a explicação da chefia do Centro de Controle de Zoonoses, em

Corumbá, o sistema de notificação dos agravos pertinentes à sua gestão ocorre com troca de

informações entre a Vigilância Epidemiológica, o Centro de Controle de Zoonoses

(Vigilância Entomológica) e a ANVISA. Em Puerto Quijarro está ligada a German Bush -

Subprefeitura em Puerto Suarez, sob a responsabilidade do Sr. Ronald Fábio Vargas Parada,

técnico de endemias. O CCZ de Corumbá e a Vigilância Epidemiológica recebem o material a

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ser analisado em relação à raiva e envia ao IAGRO. O gestor boliviano tem conhecimento

apenas do funcionamento do sistema de notificação realizada no lado boliviano dessa região

de fronteira. Segundo ele, a notificação ocorre nas seguintes situações: a) as clínicas

particulares repassam as notificações aos hospitais mais próximos; b) as notificações dos

hospitais são feitas pelos médicos responsáveis; c) o técnico de endemias recolhe as

informações nos hospitais e dá prosseguimento, informando às instâncias correspondentes no

Departamento.

Procurando entender as razões da não coincidência temporal das epidemias de dengue

em Campo Grande (2007 e 2010) e Corumbá (2009), se buscou indagar dos gestores de

Corumbá como explicariam a ocorrência da mesma nesta fronteira. Na opinião do Secretário

Municipal de Saúde, dentre as causas estão a introdução de um sorotipo novo que há mais de

dez anos não circulava no Estado, além disso, o primeiro caso registrado em Corumbá, veio

de Santa Cruz de la Sierra que encontrou na região um ambiente propício para propagação.

Para a gerente em Vigilância em Saúde, as razões da epidemia de 2009 foram a junção

de vários fatores, destacando a entrada do vírus tipo 1, que a população local estava

vulnerável a ele, bem como o alto índice de infestação predial do Aedes aegypti, sendo que

em janeiro daquele ano, era de 30% no município de Puerto Quijarro e de aproximadamente

2% em Corumbá. Os demais entrevistados lembraram questões como falta de sensibilização

da população para os cuidados de prevenção, falta de um controle sanitário eficiente na

fronteira, a falta de uma equipe que atue a prevenção com ações constantes no lado boliviano.

O gestor boliviano acredita que a ocorrência de dengue está na própria conformação da

fronteira, pelo livre trânsito de pessoas. Outro agravante é o fato dos municípios bolivianos,

muitas vezes não cumprirem com o apoio logístico para combate da dengue. É preciso estar

atento a esse pensamento, pois sem a presença do Aedes aegypti não existe a doença.

Sendo assim, não se encontrou uma relação que pudesse indicar explicações mais

definitivas sobre a diferença temporal dos casos de Corumbá e Campo Grande. Contudo,

pelas entrelinhas das entrevistas, foi possível perceber a preocupação epidemiológica

diretamente relacionada com o território boliviano. Ainda precisam mais pesquisas para

explicar porque as epidemias de dengue em Corumbá não ocorrem nas mesmas

temporalidades que outras cidades do estado de Mato Grosso do Sul, como é o caso de Campo

Grande.

Quanto a percepção sobre a diferença nas ações de prevenção realizadas entre

Corumbá e Puerto Quijarro, foram apontados pelos gestores brasileiros alguns elementos: o

fato da Bolívia ser carente em recursos humanos e financeiros para realização de ações

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constantes; a rotina de combate direto ao mosquito/larva que não se verifica em Puerto

Quijarro; a captura dos cães errantes que é praticado somente no lado brasileiro; o controle

epidemiológico que está estruturado no município de Corumbá e inexiste do lado boliviano.

Corrobora, ainda, a existência de programas específicos na escala nacional, como por

exemplo, o PNCD no combate a dengue, a estrutura das Estratégias de Saúde da Família e o

fato do município de Corumbá possuir ações específicas próprias que aliadas às políticas

nacionais se tornam mais eficientes.

O entrevistado boliviano acredita que não há diferença entre as ações de prevenção

realizadas em Corumbá e Puerto Quijarro já que na maioria das vezes essas ações são

realizadas em conjunto uma vez que German Busch possui número reduzido de pessoal.

Discordamos dessa visão, pois as ações conjuntas são feitas de forma pontual, enquanto

Corumbá tem ação efetivada permanentemente, o que não se verifica nos municípios

bolivianos.

2.5 Sugestões para melhoria da vigilância em saúde na fronteira Brasil-Bolívia

Antes de tratar das sugestões vale apontar as principais dificuldades informadas pelos

gestores entrevistados. A principal delas, comum à maioria, foi a ausência de uma

comunicação frequente entre os mesmos nesta fronteira. Garantir um adequado fluxo de

informação entre as cidades fronteiriças facilitaria as parcerias para maior eficiência da

vigilância em saúde. O ex-secretário municipal de saúde de Corumbá, médico Mário Sérgio

Kassar, lembrou a ausência de uma equipe com técnicos de nível médio e superior, efetivos,

com capacitação específica para trabalhar nesse espaço geográfico. Também lembrou a falta

de interlocução continuada (reunião bimestral ou trimestral) com trocas de informação

epidemiológicas inclusive no nível estadual/departamental/provincial. Os demais

entrevistados comentaram sobre a falta de intercâmbio entre as secretarias de saúde e a

infraestrutura deficitária dos municípios.

O técnico de endemias da Bolívia relatou como maior dificuldade para a realização de

uma vigilância em saúde com eficácia na Província, a falta de apoio logístico para

investigação do caso, após recebimento das notificações realizadas pelo hospital. Lembrou,

ainda, que é preciso seguir realizando o intercâmbio de informações e com as reuniões entre

os gestores de saúde das cidades que compõem esta fronteira Brasil-Bolívia.

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Os gestores de saúde brasileiros também relataram a questão da necessidade de

melhoria da logística regional já que existem muitas dificuldades com infraestrutura e

disponibilização de equipamentos em número suficiente (veículos, pessoal, laboratórios etc.).

Entre outras sugestões de melhoria foram citadas: a importância da continuidade nos trabalhos

das câmaras técnicas; o estabelecimento de um sistema de informação entre os municípios e

de políticas de saúde da região visando ações em conjunto; aumento da equipe de vigilância

em saúde no lado boliviano da fronteira; padronização do atendimento e tratamento para os

usuários de saúde nessa fronteira; acordo de cooperação técnica formal esclarecendo

obrigações dos dois lados; investimentos de ambos, já que os problemas são comuns, não

sendo possível trabalhar separado; implantação de leis (multas em dinheiro, ou serviços para a

comunidade através do judiciário) e de fiscalização que exija o cumprimento da manutenção

dos terrenos limpos, caixas d‟água tampadas e de outros agravantes que colocam em risco a

saúde das pessoas.

Dentre as questões importantes que precisam ser repensadas nessa área de fronteira

está o fato dos fronteiriços não se assumirem como tal. Os problemas de Corumbá não são

apenas locais, mas fronteiriço. Da mesma forma, interessa a Corumbá os problemas que

ocorrem nos municípios vizinhos (Ladário e os bolivianos). É preciso romper com a escassez

de diálogos entre as autoridades gestoras desses territórios de fronteira para reunir esforços

em defesa da melhoria da qualidade de vida de seus cidadãos.

A utilização de uma única forma de notificação de agravos seria um passo importante

que facilitaria o levantamento de dados, bem como a compreensão por qualquer gestor, tendo

em vista que muitos não conhecem o funcionamento da forma de notificação do outro lado da

fronteira. Na verdade, as diferenças nas formas de notificação não permitem estabelecer

comparações e, portanto, o verdadeiro perfil epidemiológico regional.

A ausência de dados atualizados dos agravos que ocorrem na província de German

Busch, por exemplo, dificulta o levantamento do perfil epidemiológico da fronteira, mesmo

que existam essas informações referentes a Corumbá e Ladário. Se não é possível pensarmos

em saúde pública sem conhecer os dados epidemiológicos que levarão a atuar de forma eficaz

na realidade, a partir de um planejamento regionalizado, então é importante estabelecer um

sistema de informação funcionando sob a lógica de suas características regionais. Vale

lembrar que essa possibilidade já havia sido pensada em 2007, durante a 1ª Reunião de

Fortalecimento do Programa de Vigilância, Prevenção e Controle da Raiva na Fronteira Brasil

– Bolívia, quando foi proposta a formalização de um sistema de informação em fronteira

alimentado mensalmente sob a responsabilidade dos comitês binacionais. No entanto esse

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sistema não foi concretizado, mas reconhecemos que será fundamental a retomada de diálogo

na direção de tal proposição.

Outro importante elemento de divulgação e compartilhamento das informações de

saúde seria a elaboração de um boletim epidemiológico, com periodicidade semestral, da

vigilância em saúde para sensibilização da população em geral.

As políticas públicas de saúde na fronteira precisam considerar os dois ou mais

territórios fronteiriços. Para que sejam efetivadas é necessária a formação de equipe/núcleo

que atue de forma permanente, composta por técnicos com capacitação específica, que seja

capaz de formular estratégias pertinentes e que receba suporte de recursos permanentemente.

É preciso criar territorialidades fronteiriças de combate aos vetores de doença, sem esquecer

as especificidades territoriais de cada um dos componentes desse espaço geográfico tornado

território. São necessários, ainda, canais de diálogos permanentes e criação de um sistema

único de informação geográfica de saúde fronteiriça.

Sabemos que os territórios nacionais impulsionam territorialidades através de políticas

públicas na amplitude de seus limites. Assim, acordos e programas formais de cooperação

fronteiriça dependem, no caso estudado, de Brasília e de La Paz. Contudo, entendemos que na

fronteira se precisa muito mais de ações do que de formalidades. Para tanto, precisa haver o

interesse dos gestores municipais em discutir práticas visando a prevenção e o combate aos

agravos de saúde que afetam a população regional.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A fronteira tem sido discutida sob várias óticas e distintos enfoques. Apesar de seu

sentido ambíguo, uma vez que ao mesmo tempo em que nos remete a ideia de soberania,

proteção, controle do limite de aproximação, temos uma perspectiva de contato entre povos.

Contato esse que, necessariamente leva ao entendimento de um cotidiano compartilhado, que

atravessa os limites da linha fronteiriça.

Nessa aproximação geográfica, há uma mistura de vivências que geram

especificidades locais, ainda que sejam dois territórios internacionais com diferentes

interesses e distintas legislações. Portanto, quando nos referimos a fronteira logo pensamos

em compartilhamento, muitos por interesses próprios, outros pelo simples fato de ser

fronteira. Um exemplo são os vetores causadores de doenças, que não reconhecem limites

internacionais e acabam por produzir uma ampliação dos “limites fronteiriços das patologias”.

Nesse sentido, a realização das ações de vigilância em saúde precisa ser desenvolvida

de forma continuada, sendo inserida na rotina de trabalho em toda extensão da área

fronteiriça. Se estas permanecerem pontuais, como hoje ocorre, não haverá garantia de que

intervenções pertinentes estejam sendo realizadas em tempo oportuno e com efetividade. Sua

intensificação somente de um dos lados que compõe a fronteira não será suficiente para

minimizar a vulnerabilidade e os riscos à saúde da população fronteiriça.

Esse trabalho possibilitou conhecer algumas questões que se referem à vigilância em

saúde nesta área de fronteira, especificamente sobre o funcionamento e as práticas

sociais/institucionais. Nela, foi possível identificar a existência de apenas um acordo formal

de cuidados com a saúde – o de prevenção à raiva. Mas também outros, informais

(acordos/ações), para os demais agravos, entre as prefeituras de Corumbá e de Puerto

Quijarro.

Dentre as ações de vigilância em saúde realizadas reconhecemos esforços entre os

profissionais técnicos para melhoria no combate a raiva canina, a partir de tentativas de trocas

de informações, conforme necessidade. Os gestores também relataram que as ações têm sido

realizadas em conjunto, mas reconhecem que precisam ser intensificadas. No entanto, há

muitas questões importantes que somente poderão ser sanadas se houver uma comunicação

eficiente entre os gestores de ambos os lados da fronteira. Dentre essas dificuldades, é

possível citar a inexistência de um método para estimar a população canina com as mesmas

variáveis em ambos os lados, a dificuldade de desfecho dos casos e busca ativa dos faltosos

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no lado boliviano devido a falta de recursos humanos, deficiência de comunicação, entre

outros. Soma-se a isso o fato das iniciativas partirem de uma perspectiva assimétrica, cabendo

a Corumbá as principais responsabilidades na realização das mesmas. Fora a raiva, não existe

acordos formais de cooperação em vigilância em saúde nessa área de fronteira para os demais

agravos que afetam a população.

Para melhorar a vigilância é necessária a existência de dados fidedignos e atualizados

dos principais agravos que sofre essa população de fronteira. Corumbá e Puerto Quijarro

possuem fichas de notificação compulsórias de agravos semelhantes que poderiam ser

unificadas para facilitar sua compreensão. Será fundamental para o avanço das negociações

entre os gestores dessa área, o interesse de ambas as partes em reconhecer a necessidade de

intensificação da cooperação fronteiriça.

Durante a realização dessa pesquisa foram encontradas várias limitações. Por exemplo,

não foi possível identificar os principais agravos que ocorrem nessa fronteira devido a

dificuldade em adquirir dados epidemiológicos atualizados referentes ao lado boliviano. Em

consequência disso, só foi possível fazer o levantamento dos agravos do município de

Corumbá que possui um setor de vigilância epidemiológica funcionando de forma ativa. A

inexistência de um sistema de informações nessa área de fronteira camufla o conhecimento

real dessa questão. Outra limitação encontrada foi a dificuldade em realizar entrevistas,

especialmente no lado boliviano.

Para realização de trabalhos futuros seriam importantes estudos que demonstrem as

especificidades locais dessa área fronteiriça. É preciso entender que para um controle mais

eficaz do processo saúde doença, a Prefeitura de Corumbá, o Ministério da Saúde, Fiocruz ou

o Programa de Mestrado em Estudos Fronteiriços terão que propor um sistema de informação

compatível com a realidade de cada um e com as necessidades de comparação. Será

importante mapear os focos e a manifestação dos agravos, permitindo estudar seu ambiente de

ocorrência com maior capacidade de entendimento de suas causas. Enfim, pretendemos que

este trabalho tenha chamado atenção para a necessidade de formalização/pactuação

continuada de acordos/ações para vigilância em saúde nesta fronteira.

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APÊNDICE

ROTEIRO DE ENTREVISTAS COM OS GESTORES DE SAÚDE DE CORUMBÁ E

PUERTO QUIJARRO

I – IDENTIFICAÇÃO DO ENTREVISTADO E DE SUA FUNÇÃO NO SISTEMA DE

SAÚDE

a) Nome: ______________________________________________________

b) Cidade: ( ) Corumbá ( ) Puerto Quijarro

c) Função: ______________________________________ d) Tempo de serviço: _____anos.

e) Formação Profissional: ______________________________________________

f) Possui curso de capacitação na área em que atua? ( ) sim ( ) não

g) Se sim, qual? ____________________________ h) Há quanto tempo? ___________

II – CONHECIMENTO DOS ACORDOS E DE SUA FUNCIONALIDADE

a) Você tem conhecimento da existência de acordos e/ou tratados nessa fronteira?

( ) Sim ( ) não

b) se sim, quais são?

Formais: _______________________, _______________________, __________________

Informais: ______________________, _______________________, __________________

c) Nesses acordos o que compete a cada território (Corumbá/Puerto Quijarro)?

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

d) Quais ações desse acordo estão sendo cumpridas?

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

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e) Quais não estão sendo cumpridas? Por quem? Por quê?

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

III – GESTÃO E PERCEPÇÃO DAS DIFICULDADES NA VIGILÂNCIA

EPIDEMIOLÓGICA FRONTEIRIÇA

a) Quais os principais agravos que ocorrem nessa fronteira?

___________________________, __________________________, ___________________

___________________________, __________________________, ___________________

b) Você conhece o sistema de notificação realizada em Corumbá/Puerto Quijarro?

( ) sim ( ) não

c) Se sim, como são realizadas?

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

d) Você conhece como é feita a notificação dos agravos no outro lado da fronteira?

( ) sim ( ) não

e) Se sim, existem dificuldades técnicas para a comparação das informações, devido às formas

de coleta ou os períodos de observação?

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

f) Na sua opinião, quais foram as razões que levaram a epidemia de dengue em 2009

Corumbá/Puerto Quijarro?

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___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

g) Em sua opinião, existem diferenças nas ações de prevenção realizadas em Corumbá e

Puerto Quijarro? ( ) sim ( ) não

h) Se sim, o que é diferente? E qual a implicância nos resultados?

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

i) Em sua opinião, quais as dificuldades na prática para a eficácia da vigilância em saúde da

fronteira como um todo?

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

j) Qual sua sugestão daria para melhorar o sistema de vigilância em saúde da fronteira como

um todo?

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

___________________________________________________________________________

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ANEXOS

Universidade Federal de Mato Grosso do Sul

Comitê de Ética em Pesquisa /CEP/UFMS

C a r t a d e A p r o v a ç ã o

O protocolo nº 1650 da Pesquisadora Beth de Oliveira Fonseca intitulado “Políticas Públicas de Saúde na Fronteira Brasil-Bolívia" , e o seu

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, foram revisados por este comitê e aprovados em reunião ordinária no dia 20 de maio de 2010,

encontrando-se de acordo com as resoluções normativas do Ministério da Saúde.

Prof. Ernesto Antônio Figueiró Filho

Coordenador do Comitê de Ética em Pesquisa da UFMS

Campo Grande, 28 de maio de 2010.

Comitê de Ética da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul

http://www.propp.ufms.br/bioetica/cep/

[email protected]

fone 0XX67 345-7187