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9912249274 - DR/PR MINISTÉRIO PÚBLICO / PR FECHAMENTO AUTORIZADO PODE SER ABERTO PELA ECT Revista do Ministério Público do Estado do Paraná | nº 2 | Julho 2011 ISSN 2236-2738 Precisamos de mais hidrelétricas? O Paraná tem o maior potencial hidrelétrico instalado do país. Mesmo assim, outros 322 projetos do Governo Federal focam os rios paranaenses, esbarrando em questões que envolvem direitos fundamentais. MP-PR entra na discussão. BOAS PRÁTICAS Como monitorar a política de assistência social IDEIAS E DEBATES Descriminalização das drogas volta à pauta

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9912249274 - DR/PR

MINISTÉRIOPÚBLICO / PR

FECHAMENTO AUTORIZADOPODE SER ABERTO PELA ECT

Revista do Ministério Público do Estado do Paraná | nº 2 | Julho 2011 ISSN 2236-2738

Precisamos de maishidrelétricas?O Paraná tem o maior potencial hidrelétrico instalado do país. Mesmo assim, outros 322 projetos do Governo Federal focam os rios paranaenses, esbarrando em questões que envolvem direitos

fundamentais. MP-PR entra na discussão.

BOAS PRÁTICAS

Como monitorar a política de assistência social

IDEIAS E DEBATES

Descriminalização das drogas volta à pauta

2 | CONTEXTO | Julho/2011

é uma publicação trimestral do Ministério Público do Estado do Paraná. ISSN 2236-2738. Procurador-geral de Justiça: Olympio de Sá Sotto Maior Neto. Corregedor-Geral: Moacir Gonçalves Nogueira Neto. Coordenação/Edição: Jaqueline Conte (jornalista responsável

- MTB 3535-PR). Redação: Jaqueline Conte, Patrícia Ribas, Maria Amélia Lonardoni. Colaboração: Vanessa Klas. Fotografia: Assessoria de Comunicação MP-PR, Rogério Machado/FAS, Cristina de Lara Campos (Capa/I Concurso Clique Cidadão), bancos de imagens. Projeto gráfico/Diagramação: Marcos Werneck Galiotti. Impressão: Via Laser Artes Gráficas Ltda. Tiragem: 2.000 exemplares. Ministério Público do Paraná - Procuradoria-Geral de Justiça - Assessoria de Comunicação - Rua Marechal Hermes, 751 - Centro Cívico - Curitiba - PR - 80530-230 - www.mp.pr.gov.br

04 Planejamento e Gestão A estratégia do MP-PR para

ampliar a educação infantil

06 Boas Práticas Dado a dado, construindo

cidadania

13 Perfil Paulo Tavares

14 Administração por projetos: em busca da excelência na gestão

16 Capa Precisamos de mais

hidrelétricas?

20 Acontece no MP

23 Servidores e tecnólogos em Gestão Pública

24 Entrevista Samia Saad Gallotti

Bonavides

08 Ideias e Debates Descriminalização das

drogas volta à pauta

26 Opinião MP e as Novas Medidas

Cautelares (Lei nº 12.403/11)

29 Quando eu Passei por Lá A primeira diligência de

Dallagnol

30 Viva+ Em tempo de lidar com o

Tempo

32 Eu Indico Dicas de Eduardo Capistrano

Sumário

Julho/2011 | CONTEXTO | 3

Junho. No mês marcado pelas comemorações ao Dia Mundial do Meio Ambiente, a [CONTEXTO] submerge nas águas turbulentas de uma discussão que atinge diretamente o Ministério Público e a sociedade

paranaense: as Usinas e Pequenas Centrais Hidrelétricas. Nosso estado é o primeiro em potencial hidrelétrico instalado. Dos 2.071 projetos de empreendimentos hidrelétricos em desenvolvimento hoje no país, 322 se referem a estudos para instalação de usinas hidrelétricas (UHE) e pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) em rios paranaenses. “Como agentes constitucionalmente incumbidos da defesa do meio ambiente, não podemos ficar alheios a esse debate e nele intervir de forma positiva, buscando atender aos melhores interesses da sociedade”, afirma o procurador-geral de Justiça, Olympio de Sá Sotto Maior Neto, sobre o tema que ganha a capa desta edição.

O número também aborda um assunto polêmico: a descriminalização das drogas, que voltou à pauta com a liberação das “Marchas da Maconha” pelo Supremo Tribunal Federal e o lançamento de documentário, idealizado e apresentado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. O tema ganha destaque na seção “Ideias e Debates”, onde especialistas em Direito e em Saúde Pública e membros do MP-PR expressam suas opiniões, com diferentes pontos de vista.

A estratégia institucional está presente em várias das matérias desta edição. Além da seção sobre “Planejamento e Gestão”, que aborda o projeto estratégico que visa garantir a ampliação de vagas na educação infantil em todo o Estado, a coluna “Boas Práticas” fala sobre outra iniciativa ligada ao mapa estratégico da instituição, o projeto de implantação do “Sistema de monitoramento da política de assistência social”. Matéria específica sobre a área administrativa aborda, por sua vez, alguns dos muitos projetos setoriais e estratégicos que estão sendo desenvolvidos e que trarão impacto no dia a dia da instituição.

E como falar de planejamento sem falar em administração do tempo? Na seção Viva+, vamos conhecer algumas táticas para domar esse parceiro e algoz. Aproveite também para conhecer mais sobre quem fez e faz a nossa instituição nas histórias e dicas das páginas “Perfil”, “Quando eu passei por lá”, “Eu Indico” e “Entrevista”, que traz ainda informações sobre o Encontro Estadual do MP-PR, previsto para o segundo semestre.

Embarque nesses contextos, e tenha uma ótima leitura!

AVALIE A [CONTEXTO]Está disponível na área do site do MP-PR destinada à Assessoria de Comunicação pesquisa de opinião sobre a revista [CONTEXTO]. Participe e apresente suas sugestões!

Editorial9912249274 - DR/PR

MINISTÉRIOPÚBLICO / PR

FECHAMENTO AUTORIZADO

PODE SER ABERTO PELA ECT

Revista do Ministério Público do Estado do Paraná | nº 2 | Julho 2011ISSN 2236-2738

Precisamos de mais

hidrelétricas?hidrelétricas?O Paraná tem o maior potencial hidrelétrico instalado do país. Mesmo assim, outros 322 projetos

do Governo Federal focam os rios paranaenses, esbarrando em questões que envolvem direitos

fundamentais. MP-PR entra na discussão.

BOAS PRÁTICAS

Como monitorar a política

de assistência socialIDEIAS E DEBATES

Descriminalização das

drogas volta à pauta

RECONHECIMENTO NACIONALA [CONTEXTO] obteve o segundo lugar na categoria Revista no Prêmio Nacional de Comunicação e Justiça 2011. O resultado foi divulgado em 22 de junho, no encerramento do VII CONBRASCOM - Congresso Brasileiro dos Assessores de Comunicação da Justiça. O Prêmio, organizado pelo Fórum Nacional de Comunicação e Justiça (FNCJ), organização não-governamental sem fins lucrativos voltada à promoção de debates e ações para aproximar as organizações públicas do cidadão, visa contribuir para o aperfeiçoamento dos produtos e serviços das Assessorias de Comunicação a partir do destaque de experiências bem sucedidas. A [CONTEXTO] concorreu com publicações de órgãos de todo o país ligados aos vários ramos do Poder Judiciário, Ministério Público, Defensorias Públicas, Tribunais de Contas e Associações correlatas.

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A estratégia do MP-PR para ampliar a Educação Infantil

Maria Amélia Lonardoni

Planejamento e Gestão

Estima-se que quatro de cada dez crianças paranaenses não frequentam a pré-escola. Ou seja, se a Emenda Constitucional nº 59

fosse aplicada hoje, em torno de 132 mil crianças ficariam sem escola no Paraná. A emenda torna obrigatória a frequência escolar a partir dos 4 anos de idade. A regra passa a valer em 2016. Porém, um levantamento feito pelo Ministério Público do Paraná mostra que a maioria absoluta dos municí-pios paranaenses não possui estrutura para aten-der as crianças desta faixa etária. Faltam vagas na Pré-Escola.

O relatório do MP-PR foi elaborado pelo Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Proteção à Educação (CAOPEduc), em conjunto com a Subprocuradoria-Geral de Justi-ça para Assuntos de Planejamento Institucional (SUBPLAN). A pesquisa revela ainda que, dos 399 municípios do Paraná, 20 apresentam déficit de vagas superior a 75%; em 118 cidades, o índice varia entre 50% e 75%; e em outros 128, estaria entre 25% e 50%.

Esses dados surgiram após a comparação en-tre o número de matrículas na pré-escola (segun-do o MEC/Inep - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira) e o número de crianças de 4 e 5 anos que residem em cada município do

Estado (projeção do IBGE para 2010). O mesmo foi feito com as crianças de 0 a 3 anos. Para esta faixa etária, as estatísticas se revelaram ainda mais alarmantes.

CrEChE - NãO há VAgAs!Para as crianças mais novas, a situação é

ainda pior. Segundo o levantamento, os muni-cípios paranaenses oferecem vagas para apenas 134 mil das 564 mil crianças com idade entre 0 e 3 anos que vivem no estado. Ou seja, de cada dez crianças nessa faixa etária, sete estão fora das creches.

A promotora de Justiça Hirmínia Dorigan de Matos Diniz, coordenadora do CAOPEduc, conta que o problema é saber quantas das que estão sem creche precisam realmente de vagas, uma vez que muitas famílias não matriculam as crianças nesta etapa da vida por opção. “Temos uma grande dificuldade em identificar a real de-manda por vagas em creche, pois só conseguimos saber que faltam vagas quando os pais procuram o Conselho Tutelar ou o Ministério Público para fazer valer o direito do filho. Caso contrário, de-pendemos de informações dos municípios, que nem sempre têm interesse em fornecer tais da-dos”, afirma.

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A estratégia do MP-PR para ampliar a Educação Infantil

Planejamento e Gestão

DE OLhO NOs NúmErOsEm Curitiba, acredita-se que o déficit de va-

gas na pré-escola seja de 50% (23.192 crianças) e que o de vagas em creche atinja 63% (23.556 crianças). A tabela abaixo mostra a estimativa nas principais cidades do interior do Estado.

ATuAçãO DO mP-PrFazer com que os municípios criem nos pró-

ximos anos novas vagas para a Educação Infantil é uma das principais metas do MP-PR. Para isso, no dia 8 de junho, a instituição lançou, por meio do CAOPEduc, a campanha “100% Pré-Escola e Creche para Todos”, que integra o conjunto de ações do projeto estratégico institucional para a área da educação.

Pelo projeto, as Promotorias de Justiça de Pro-teção à Educação deverão atuar junto aos gesto-res públicos, a fim de incentivá-los a desenvolver um Plano de Ampliação das Redes Municipais de Ensino, de modo que, até o ano letivo de 2016, o Paraná atenda todas as crianças em idade escolar, como estabelece a Constituição Federal.

Os dados sobre déficit em creche e pré-escola, apresentados separadamente, deverão servir de apoio à atuação das Promotorias. “Trata-se de uma projeção muito próxima da realidade, pois está baseada em pesquisas oficiais. Como temos nota-do que esses dados não vêm se alterando muito nos últimos anos, temos condições de estimar a realidade futura”, afirma Hirmínia.

A EsTrATégIA DO PrOjETOA campanha “100% Pré-Escola e Creche pa-

ra Todos” busca incentivar uma atuação coletiva e simultânea em todas as comarcas do Estado. Durante o mês de maio, o CAOPEduc apresen-tou modelos de portaria, de ofícios e de Termo de Ajustamento de Conduta para que os promotores de Justiça que atuam nas áreas da Educação e da Infância e Juventude pudessem contribuir com sugestões para os documentos. No mesmo perío-do, assessores da SUBPLAN tabularam os dados, a partir de orientação do Centro de Apoio. O roteiro técnico e os números foram disponibilizados aos promotores de Justiça juntamente com material de apoio sobre a importância da Educação Infantil.

“A diferença des-ta ação em relação às do passado é o víncu-lo ao planejamento estratégico, que per-mite a avaliação con-tínua dos indicado-res, da evolução e do desempenho de nossa atuação. Desta forma, poderemos assegurar uniformidade no trabalho e produzir resultados efetivos em benefício da sociedade”, afirma Bruno Sérgio Galatti, subprocurador-geral Justiça para Assuntos de Planejamento Institucional.

A campanha foi lançada oficialmente por meio de transmissão ao vivo pela internet (web-cast), no início de junho. Na ocasião, o procurador--geral de Justiça do Paraná, Olympio de Sá Sotto Maior Neto, afirmou que, ao garantir educação às crianças, outros direitos fundamentais são promovidos: “Considerada a realidade brasileira, garantir educação infantil significa - para além das janelas de oportunidades que se abrem na perspectiva da socialização - acesso à nutrição e saúde, indispensáveis para adequado desenvol-vimento especialmente das milhares de crianças oriundas de famílias empobrecidas”.

PróXImOs PAssOsPara que os resultados sejam positivos em

âmbito estadual, é preciso o esforço coletivo dos promotores que atuam nas áreas da Educação e da Infância e Juventude. Até o final de setembro, espera-se que todas as Promotorias de Justiça já te-nham instaurado os Procedimentos Preparatórios e que, até o dia 30 de novembro, possam informar quantos e quais cidades de suas comarcas apre-sentaram uma proposta de ampliação gradativa da educação infantil. O acompanhamento deverá ser feito anualmente, até que sejam criadas vagas su-ficientes para atender todas as crianças do Paraná.

Hirmínia ressalta que, além da questão do cumprimento da EC, a estratégia deverá interferir positivamente nas ações que o MP-PR vem pro-pondo, ou que pretende ajuizar, para garantir, de pronto, escola para as crianças de famílias que manifestaram interesse ou necessidade de matri-cular os filhos nos CMEIs - Centros Municipais de Educação Infantil. “Como o cronograma de am-pliação do sistema será gradativo, as primeiras crianças atendidas deverão ser as que estão nas chamadas “listas de espera”, diz a promotora. “A instituição também possui diversas ações e Termos de Ajustamento de Conduta para viabilizar vagas para essa demanda manifesta e vai continuar atu-ando no que for necessário para garantir escola tanto para as crianças de 4 a 5, como para as de 0 a 3”, destaca.

MunicípioCrianças fora da pré-escola

(4 a 5 anos)

Déficit de vagas

pré-escola

Crianças fora da creche

(0 a 3 anos)

Déficit de vagas em

creche

Cascavel 4.667 50,17% 14.753 83,19%

Foz do Iguaçu 6.897 59,19% 18.590 88,35%

Guarapuava 4.272 74,49% 8.247 80,69%

Londrina 1.289 9,63% 18.782 78,69%

Maringá 769 9,71% 7.717 50,63%

Ponta Grossa 3.450 35,28% 13.329 81,01%

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Boas Práticas

O Ministério Público tem entre seus deve-res constitucionais defender os direitos sociais e individuais indisponíveis, ou,

trocando em miúdos, atuar na defesa de bens maiores, como a saúde, a educação, a vida, a dig-nidade humana. Mas como fazê-lo sem políticas públicas efetivas? Foi pensando nessa conta, que nem sempre fecha, que entre os projetos estra-tégicos do MP-PR está a implantação do “Siste-ma de monitoramento da política de assistência social”. Mais conhecido como “Projeto SUAS”, a iniciativa prevê a construção de uma sistemática de monitoramento, apoio e fiscalização à imple-mentação do Sistema Único de Assistência Social no Paraná (SUAS), a fim de assegurar aos usu-ários da política o exercício pleno dos direitos socioassistenciais.

Coordenada pelo Centro de Apoio Operacio-nal das Promotorias de Justiça dos Direitos Cons-titucionais, com a parceria de todos os promotores de Justiça que atuam na área, o projeto tem entre os objetivos práticos a ampliação do número de equipamentos de proteção social básica e especial (CRAS e CREAS) no Estado e a intensificação do acompanhamento do IGD - Índice de Gestão Des-centralizada, indicador que mostra a qualidade da gestão do Programa Bolsa Família no âmbito mu-nicipal e propicia a ampliação ou não dos recursos financeiros repassados pelo Governo Federal.

Dentro desse panorama, pretende-se, por exem-plo, verificar se os municípios paranaenses têm insta-ladas unidades de CRAS e CREAS, de acordo com as leis e regulamentos, se os serviços estão sendo pres-tados efetivamente e se há equipe técnica adequada.

Dado a dado,construindo cidadania

Jaqueline Conte

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CrAs e CrEAsOs Centros de Referência de Assistência So-

cial (CRAS) são equipamentos públicos que pro-porcionam à população em situação de vulnerabi-lidade acesso aos direitos socioassistenciais bási-cos, propiciando, por exemplo, acesso a documen-tação, ingresso em programas de transferência e geração de renda, e atividades sócio-educativas envolvendo crianças, familiares e comunidade, para fortalecer vínculos e prevenir ocorrência de situações de exclusão social e de risco, em espe-cial a violência doméstica e o trabalho infantil, entre outras formas de atendimento. Os Centros de Referência Especializados de Assistência So-cial (CREAS), por sua vez, prestam assistência de média e alta complexidade, nas diversas si-tuações em que já há violação de direitos, como em caso crianças e adolescentes em situação de risco, ou que praticaram ato infracional, idosos que precisam ser inseridos em instituição de longa permanência, moradores de rua que necessitam de albergues, entre outras situações.

Uma das metas do projeto do MP-PR é que, até 2012, todo município paranaense tenha pelo menos um CRAS e que os municípios com mais de 50 mil habitantes estejam atendidos por um CREAS.

Dados de 2010 mostravam que 191 muni-cípios do Paraná estavam em situação irregular quanto às exigências mínimas da política nacional de assistência social. Após a intervenção do MP - e também em decorrência das ações dos demais atores dessa política - já houve melhora nesses índices. O número de municípios em situação ir-regular baixou para 98, a demandar atuação do MP. Hoje, 93 daqueles 191 municípios tiveram sua situação regularizada, estando devidamente habilitados aos níveis básico ou pleno de gestão. O número já superou a meta estabelecida para todo o projeto, quanto a estes indicadores, que era a adequação de 84 municípios.

Bolsa FamíliaOutro objetivo do projeto é aumentar o ní-

vel de acompanhamento das condicionalidades do programa Bolsa Família, no que concerne à educação, saúde e assistência social. Para que a população dos municípios possa se beneficiar do programa de transferência de renda do Governo Federal, o Executivo Municipal tem de acompa-nhar, por exemplo, se as famílias beneficiárias mantêm os filhos na escola, se estão com o calen-dário de vacinação em dia, se as gestantes par-ticipam dos programas de acompanhamento à maternidade e se os dados sobre renda, endereço, etc estão atualizados.

O MP-PR pretende aferir se os municípios realmente estão fazendo esse acompanhamento de forma eficaz, uma vez que o Governo Federal

repassa à municipalidade recursos para a reali-zação desse trabalho. “Nossa meta é que todo município paranaense tenha índices de acompa-nhamento das condicionalidades do programa superiores às metas estabelecidas ou pactuadas com o Governo Federal”, conta o promotor de Justiça Fabio Bruzamolin Lourenço. “Isso de-manda boa gestão do município”. “Nos que es-tão com índices abaixo do esperado, a atuação firme dos promotores de Justiça vai mostrar o porquê desta situação. As escolas não colocam os dados no sistema de informação do Ministério da Educação? Falta posto de saúde? As crianças beneficiárias não estão frequentando a escola? É preciso saber o que está falhando e cobrar ações para regularizar a situação”, afirma o promotor, gestor do projeto estratégico. Em alguns muni-cípios um dos índices desse acompanhamento já teve sensível melhora, a partir da atuação do MP-PR. Um dos casos mais significativos é o de General Carneiro, no Sul do Estado. A atualiza-ção do cadastro de assistência social, uma das “condicionalidades” acompanhadas, subiu de 10% para 97%. De acordo com a promotora de Justiça Rosana Maria Longo, de União da Vitória, o fato de General Carneiro e de pelo menos ou-tras três cidades da comarca terem melhorado o índice de atualização de dados dos beneficiários do Bolsa Família é decorrente da cobrança feita pelo MP-PR. “Mandamos ofícios para os municí-pios, nos moldes dos sugeridos pelo CAOP, e eles atenderam prontamente e começaram a fazer o acompanhamento mais de perto. O resultado até superou as expectativas. O fato de o MP es-tar mais próximo faz com que os municípios se sintam mais comprometidos e mais apoiados, porque sabem que também podem contar com a instituição, no que precisarem”, afirma Rosana.

Para efetivar o projeto, o CAOP dos Direi-tos Constitucionais trabalha para a obtenção e análise conjuntural periódica dos dados e para a elaboração de formas de ação e de instrumentos para a intervenção dos promotores de Justiça. “Buscamos facilitar e potencializar o trabalho de monitoramento, para que possamos ter cada vez melhores índices de implementação das políticas de assistência social. Inclusive para viabilizar a própria atuação dos promotores de Justiça, nas mais diversas áreas. O que adianta o promotor indicar a aplicação de uma determinada medi-da de proteção a um adolescente em situação de risco, por exemplo, se a estrutura pública não oferece os equipamentos e serviços necessários para esse atendimento?”, exemplifica Bruzamolin. “Garantir que o SUAS esteja plenamente imple-mentado é viabilizar o oferecimento de serviços socioassistenciais absolutamente necessários à atuação eficaz do Ministério Público e do Poder Judiciário”.

Dado a dado,construindo cidadania

Jaqueline Conte

Com a proposta de iniciar “um debate sério e bem informado sobre o complexo problema das drogas no Brasil e no mun-do”, foi lançado em junho o filme “Quebrando o Tabu”, do

diretor Fernando Grostein Andrade. Apresentado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o documentário traz depoimentos de personalidades como o médico Dráuzio Varella, o escritor Paulo Coelho e os ex-presidentes norte-americanos Bill Clinton e Jimmy Carter. Quase que paralelamente, no dia 15 de junho, o Supremo Tribunal Federal liberou a realização de manifestações pró-legali-zação da maconha, como o movimento auto-intitulado “Marcha da Maconha” (no Paraná, a realização da passeata foi suspensa judi-

Documentário “estrelado” pelo ex-presidente Fernando Henrique

Cardoso e disseminação de manifestações pró-maconha pelo país colocam o tema novamente

em discussão

Patrícia Ribas

Ideias e Debates

das drogas volta à pautaDescriminalização

8 | CONTEXTO | Julho/2011

Julho/2011 | CONTEXTO | 9

cialmente, em maio, por solicitação de dois deputados e do Ministério Público do Paraná, via Grupo de Atuação Espe-cial de Combate ao Crime Organizado). Em contrapartida, também em maio, o Governo do Paraná deflagrou a Opera-ção Liberdade, grande ofensiva contra o tráfico, especialmente o do crack, que culminou com a prisão, só em Curiti-ba, de 40 pessoas e na apreensão de 80 quilos da droga, o equivalente a 250 mil pedras. Por esses e outros fatos, a questão da descriminalização voltou à pauta. Assim, vamos ao debate.

Para o desembargador Telmo Che-rem, do Tribunal de Justiça do Para-ná, é importante discutir o tema sob critérios racionais, científicos e sociais. Ele lembra que a Constituição Federal consagrou como fundamento do Estado Democrático de Direito o princípio da dignidade da pessoa humana, além de explicitar como fundamentais o direito à saúde e à previdência social. “Dessa forma, não se mostra possível, ante a Carta da República, a descriminalização do porte para uso próprio da maconha e outras drogas, na medida em que is-so contraria valores pétreos nela consa-grados: a defesa do próprio indivíduo e do corpo social, frente às nocividades físicas, psíquicas e sociais que delas de-correm”, afirma. O jurista diz não acreditar que a descriminalização implicaria a redução da cri-minalidade e menor poder aos traficantes. “Não é a ilicitude da droga que aumenta a violência, mas sim a dependência química e psíquica que ela causa ao usuário. O argumento de que a des-criminalização do uso, produção ou comércio da maconha diminuiria a violência e a influência do narcotráfico não corresponde à realidade, uma vez que o crime organizado articula-se de outras formas - inclusive com inovação de substâncias - para obter mais ‘lucros’”. Para ele, a questão não está restrita unicamente ao direito à liberdade individual de uso ou não de substâncias ilícitas, mas “ultrapassa essa fronteira para abranger os direitos de toda a coletividade, não devendo a insuficiência do aparelho estatal no combate ao tráfico servir de pretexto para justificar a descri-minalização do uso de substâncias ilícitas”. Che-rem avalia, inclusive, que a “atual lei de drogas - diversamente da anterior - trata, adequadamente, o usuário como caso de saúde pública, bastando a adoção de ações políticas e sociais efetivas para o cumprimento da Carta Magna e da lei vigente”.

A delegada Elisângela Melo Reghelin, da Polícia Civil do Rio Grande do Sul, defende um tratamento diferenciado ao da criminalização

absoluta. “Essa lógica da proibição pura e dura não tem apresentado bons resultados, pois está descontextualizada, desconsidera que o proble-ma tem facetas culturais e, principalmente, de saúde pública. Tudo isso tem que andar junto”, diz. Doutora em Direito Penal e Criminologia pela Universidade Pablo de Olavide (Espanha) e pes-quisadora da Universidade da Califórnia (EUA), ela sustenta que as autoridades deveriam discutir a questão de fato, não apenas sob o viés criminal, mas também no que tange à informação, educa-ção e atendimento aos usuários. “Por envolver tabus e temas complexos, a tendência é evitar o confronto, o que significaria, muitas vezes, a perda de votos, especialmente num país conser-vador como o Brasil. O tema é multidisciplinar e exige muita reflexão e ação conjunta para o seu enfrentamento com seriedade e respeito à dignidade humana” diz Elisângela, que também é autora de livro sobre política de redução de danos para dependentes de drogas injetáveis. “Quem não tem um familiar dependente quími-co ou, pelo menos, não conhece um? Sobra de-magogia e hipocrisia no tratamento da questão”, afirma. A delegada também se coloca favorável a manifestações públicas para debater o tema da descriminalização, “quando feitas dentro de

Ideias e Debates

das drogas volta à pautaDescriminalização

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limites éticos e responsáveis”. No outro extremo, o delegado da Polícia Fe-

deral Fernando Francischini, hoje deputado fede-ral, coloca-se totalmente contrário à qualquer tipo de liberação de drogas no país. “É um absurdo pensar na ideia de descriminalização. O tráfico é uma atividade extremamente nociva, é o que estimula a violência, financia o crime organizado, mata jovens inocentes, destroi famílias inteiras”, diz o policial, que ficou conhecido em todo pa-ís por, em 2007, coordenar a prisão do mega-traficante internacional de drogas Juan Carlos Ramirez Abadia, criminoso que chegou a figurar na lista dos dez mais procurados do mundo pelo FBI. Ele também destaca que, apesar do usuário precisar de tratamento diferenciado, devendo ser visto como dependente químico, não pode deixar de ser responsabilizado. “Essas pessoas devem ter consciência de que sua conduta, ainda que de ‘for-miguinha’, é ferramenta que colabora no aumento do poderio financeiro do tráfico”, diz Francischini. O deputado foi um dos que representou junto ao MP-PR pelo cancelamento da Marcha da Maconha na capital paranaense. “Sou contra por entender que se trata de mera apologia ao consumo. Acre-dito ainda que, se descriminalizarmos a maconha, no dia seguinte haverá passeatas para liberar a cocaína, e assim por diante”.

PrOBLEmA DE sAúDENa área da saúde, a questão das drogas tem

relação direta com os programas de redução de danos (RD), nos quais o usuário recebe suporte do Estado para garantir que os problemas advindos do consumo dos entorpecentes sejam minorados a partir de ações como, por exemplo, a distribuição de seringas e agulhas esterilizadas para viciados em drogas injetáveis. No Brasil, a RD começou a ser implantada em 1989, na prefeitura de Santos (SP). À época, o MP de São Paulo chegou a propor

ação penal contra a equipe de profissionais de saúde que coordenava o projeto, por tráfico de drogas, mas o processo foi arquivado.

O médico sanitarista Fábio Mesquita, que participou do trabalho em Santos e foi um dos denunciados, diz que desde então o país já avan-çou bastante na questão, mas ainda há muito a ser feito - e isso implica uma discussão efetiva sobre a legalização das drogas. “O Brasil tem de progredir na legislação e tem de esvaziar a fonte de renda do crime organizado”, diz o médico, doutor em Saúde Pública pela USP e há seis anos na Organização Mundial da Saúde. Ele defende a descriminalização de todas as drogas. “Tenho participado de muitos eventos pelo mundo que discutem o tema e tenho certeza hoje de que o maior dano à vida que um usuário de drogas pode ter, na verdade, não deriva do consumo de drogas, mas de sua criminalização”, afirma. “Não sou a favor de liberar geral, ao contrário: defendo uma política pública de drogas racional e sob o con-trole do Estado. O modelo do tabaco é fantástico, temos controle sobre o produto e seus danos. Hoje quem controla todas as outras drogas é o crime organizado e não o Estado brasileiro”, sustenta Mesquita, que atualmente chefia o Programa de AIDS da OMS no Vietnã, país onde a epidemia da doença é totalmente associada ao uso de drogas injetáveis.

Com 35 anos de experiência com dependentes químicos, o médico psiquiatra Ronaldo Laranjei-ra, PhD em Dependência Química na Inglaterra e coordenador da Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas da Faculdade de Medicina da UNIFESP (Universidade Federal do Estado de São Paulo), acredita que, do ponto de vista da saúde pública, é errado legalizar as drogas. “Acredito que a solução é promover a prevenção e o tratamento baseados em evidências e não em ideologia”, diz o médico. Ele afirma que, apesar de já haver bastante avanço

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na área terapêutica, ainda faltam pesquisas sobre formas efetivas de prevenção. Também destaca que, ao se falar em política de drogas, não se pode deixar de lado as “lícitas”, como o álcool e o tabaco. “O desafio de formular e por em prática uma estratégia para as drogas é buscar o balanço para cada uma, sempre visando a uma diminuição global do con-sumo. Somente teremos uma boa política quando houver ações tão complexas quanto o tamanho do problema”, avalia Laranjeira. “Penso que há vários questionamentos que ficam em aberto pelos que defendem a liberação: as substâncias seriam distri-buídas de graça pelo Estado ou os usuários ainda teriam que pagar? Se tiverem que pagar, a violência dos que precisam de recursos para manter o vício não se manteria? Quem receberia as drogas? Usu-ários ocasionais? Dependentes químicos? Se uma pessoa se envolve em um acidente sob efeito de droga oferecida por fonte pública, o Estado tam-bém é responsável? Os proponentes da legalização apontam argumentos a favor, mas não apresentam uma clara operacionalização de como isso deveria ocorrer”, afirma o psiquiatra.

Confira a seguir a opinião de membros do MP-PR sobre a questão. No link da revista [CONTEXTO] na internet também estão disponí-veis a íntegra de todas as entrevistas feitas para a produção da matéria.

MARCO ANTONIO TEIXEIRA, procurador de Justiça, coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias da Saúde Pública

“A questão certa não é se devemos descrimi-nalizar as drogas ou não, mas sim por que as pessoas estão procurando cada vez mais

as drogas, e substâncias cada vez mais nocivas, e enfrentar essas causas. Creio que esse seria o ponto principal - aferir a motivação do consumo, em todos os segmentos sociais: das classes mais favorecidas à, sobretudo, grande parcela da po-pulação que não tem direito à educação, à saúde, ao lazer, que vive em regiões já dominadas pela criminalidade e pelo tráfico. Também há de se con-siderar que as drogas são um fenômeno que movi-menta algo em torno de 20% da economia global, com ramificações diretas e indiretas em diversos segmentos, inclusive no Brasil. Qual o impacto, em todos os sentidos, de se reduzir drasticamente esse valor? Estamos sinceramente preparados para assumir esse custo e o queremos? A descriminali-zação nada mais é do que uma forma de falência como sociedade e estado organizados, pois se trata de rendição a uma situação para a qual não se consegue uma solução satisfatória. O que não quer dizer que o sistema que aí está produza efeitos minimamente desejáveis nesse assunto e que deva permanecer intocado. Hoje, sequer temos projetos terapêuticos e socialmente eficazes para atender

essa população, quanto mais projetos que deem perspectiva de futuro útil, que substituam o uso e as miragens que as drogas produzem. Ou seja, o discurso da descriminalização das drogas proibidas nada mais é do que um discurso que maquia efeitos de uma situação grave e que tende a se manter, na sua substância, inalterada”.

ROBERTSON FONSECA DE AzEvEDO, promotor de Justiça em Maringá

“A atual política de drogas não funciona, isso é fato. Quem lucra com a ilegalidade da ma-conha e outras substâncias psicoativas é o tra-

ficante e o agente público corrupto. A ilegalidade também não permite qualquer tipo de controle da produção ou do comércio, o que leva à violência e expõe os consumidores a substâncias muito mais nocivas do que as drogas em questão. O que temos de concreto hoje, sobretudo em relação à maconha, é a existência de um grande número de usuários, que por conta da questão criminal ficam sujeitos à violência que está sempre associada ao tráfico. Também temos como “lícitas” diversas substâncias reconhecidamente perigosas, que fazem mal à saú-de e implicam em dependência, como o tabaco e o álcool. As bebidas alcoólicas, inclusive, têm relação direta com a questão da violência doméstica, mas não se questiona criminalizar o álcool.”

MAuRO AlCIONE DOBROwOlSkI, promotor de Justiça em Guarapuava

“Com o advento da Lei n.º 11.343/06, pelo tipo de sanção trazida no art. 28, muitos juristas e aplicadores do direito passaram a entender

que ocorreu a descriminalização tácita do uso de substância entorpecente, fazendo com que muitas pessoas, que até então não utilizavam, devido à penalização, passassem a utilizá-la, ocorrendo um incentivo tácito ao uso indiscrimi-nado de droga. Discutir a descriminalização do uso da maconha, com os índices altíssimos de cri-minalidade no Brasil e caos na saúde pública, é mais uma vez reconhecer a incompetência dos di-rigentes estatais em conseguir adotar medidas de redução dos crimes ligados às drogas e não en-frentar de forma direta os problemas de segu-rança pública. O usuário de droga não deixa de ser um infrator e como infrator deve ser tratado pelas leis penais, punindo-o, pois o usuário detém parcela de culpa sobre o aumento do tráfico e da criminalidade brasileira. É ele quem dá a sustentabili-dade ao traficante, como o receptador dá a sustentabilidade ao que pratica crimes contra o patrimônio. Não se resolverão os problemas de segurança pública com o aumento da impunidade.”

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JACSON luIz zílIO, promotor de Justiça em Guarapuava

“Falar sobre descriminalização das drogas - não apenas do uso, mas da produção e comércio - em uma entrevista de poucas

palavras, é assumir o risco da superficiali-dade. De todo modo, ainda assim arriscaria apontar alguns “inconvenientes” cometidos por aqueles que, desde sempre, defendem tal opção político-criminal. Primeiro, os parti-dários da continuidade dessa política penal fracassada confundem propositalmente as propostas de descriminalização com ideias de desregulamentação total. Essa sensação de vazio normativo é o que gera a impopu-laridade da retirada do direito penal desse campo de atuação. Segundo, os defensores da criminalização confundem os efeitos pri-mários com os efeitos secundários das dro-gas. Só estes últimos efeitos são importantes ao Direito Penal. Os efeitos primários, rela-cionados com a natureza em si das drogas, são relevantes para o desenvolvimento de políticas terapêuticas e assistenciais, mas na-da importam ao Direito Penal. Aqui valem os efeitos secundários, notadamente os que incidem sobre o “funcionamento do sistema penal”. Aí a criminalização mostra seu alto poder de exclusão social: político-criminal-mente mostra-se inidônea (aumenta o ní-vel de violência e seletividade, prejudica ou impede o tratamento dos usuários, fomenta economicamente a estrutura dos que atu-am na ilegalidade, etc.) e dogmaticamente apresenta-se como insustentável (violação do princípio da lesividade, proporcionalida-de, legalidade e intervenção mínima). No que se refere ao uso em si (que pressupõe a posse, obviamente), qualquer política penal seria inconstitucional e reacionária: puni-ção de autolesões afronta a CF (arts. 1˚, III (dignidade humana), 5˚, caput (liberdade), 5˚, VI e VIII (liberdade de consciência) e 5˚, X (intimidade, vida privada). Disso deveria tomar mais cuidado o defensor do regime democrático de Direito.”

ROSâNgElA gASPARI, promotora corregedora

“Não há qualquer argumento capaz de me convencer de que a descriminaliza-ção irá trazer algum benefício efetivo

à sociedade. Se o direito penal não esta-belecer mais a conduta como criminosa, abre-se, indubitavelmente, um raciocínio, mesmo que não desejado pelos que são fa-voráveis à legalização, de que a posse não é mais reprovável, passando a equivocada mensagem de que fazer uso de um cigarro de maconha não traria consequências da-nosas - e é inadmissível a banalização dos efeitos prejudiciais dessa droga, que leva os viciados à autoexclusão da sociedade, à destruição de sua saúde. Isso sem citar o rompimento de seus laços afetivos, da sua vida profissional e da dor que provoca aos familiares. Tratar o consumo apenas como tema de saúde é menosprezar a realidade de que o Estado somente poderá intervir nessa seara se o usuário assim o desejar - como hoje ocorre com fumantes, por exemplo. Ademais, se for seguido o raciocínio de que a ilegalidade dificulta o controle do tráfico, não terá que ser usada esta linha de pensa-mento também para o aborto criminoso e outras práticas ilegais de difícil fiscalização? Conclui-se, pois, que a legalização não dimi-nuirá o consumo da maconha e de outras drogas: apenas reduzirá os impeditivos para tanto, pois acabará com os freios inibitórios da prática de uma conduta ilegal.”

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Ético, humano, companheiro, comprometido com a instituição.

Sempre de bom humor e pronto para ajudar quem quer que seja. Verdadeiro

patrimônio do Ministério Público do Paraná. Parece exagero, mas é assim que os colegas definem o promotor de Justiça Paulo César Vieira Tavares,

decano do MP em Londrina.

Há 26 anos na carreira, o paulista de 51 anos, nascido em Bauru, poderia ser procurador de Justiça há pelo menos sete anos, mas o

gosto pela lida de primeiro grau sempre pesou mais. Casado há 27 anos, pai de três filhas e santista de coração, ele não come carne

vermelha há dez anos, corre, pratica tênis, futebol e natação. O amor pelo direito, pelas

causas sociais e pelo esporte reflete a família: a mulher é assistente social, a filha mais velha,

advogada, e a do meio cursa educação física.

perfilPaulo Tavares

Reconhecido por seu trabalho na saúde pública, sendo titular da Promotoria especializada desde 2002, a atuação na área inspirou inclusive sua tese acadêmica. Primeiro aluno de Direito nos 20 anos de história do mestrado em Saúde Coletiva, da UEL, seu trabalho, concluído no ano passado, aborda a atuação do MP na saúde. Seu estudo demonstrou, por exemplo, que 81% das demandas que chegam na área são resolvidas extrajudicialmente.

Outra marca do promotor é a atuação no atendimento ao cidadão. Por 13 anos consecutivos coordenou a Promotoria de Justiça das Comunidades, trabalhando voluntariamente à noite, no atendimento à população nos bairros. Agora, assume mais um desafio, coordenar o novo formato de Promotoria, projeto piloto vinculado ao objetivo estratégico da instituição que visa aumentar a interação com a sociedade. A nova Promotoria será a porta de entrada do cidadão que procura o MP-PR em Londrina. O Ministério Público receberá a população em uma nova sede, que acaba de ser ocupada, em frente à Prefeitura. Lá, a partir de triagem feita por equipe específica, o cidadão terá sua demanda resolvida ou encaminhada para a área

especializada do MP, já com as orientações necessárias, data e horário para atendimento. Tavares conta que a proposta é atender às demandas coletivas, sobretudo em três eixos: saúde, educação e assistência social. “O antigo formato permitia que nos envolvêssemos em demandas individuais. A ideia é que agora essas questões sejam encaminhadas para os escritórios de aplicação das universidades e para a Defensoria Pública, e que centremos esforços nas demandas coletivas”, afirma o promotor. “É uma mudança de postura do MP. Sempre trabalhamos com as conseqüências; temos que atacar a causa dos problemas e não continuar ‘secando gelo’. Para isso, a instituição tem que se inserir mais nos movimentos sociais, no controle social, fazer mais visitas, participar de reuniões, dar palestras, ampliar os contatos, enfim, ser um aglutinador de forças, para que consiga resolutividade”. A nova sede da Promotoria das Comunidades também pretende ser espaço de cidadania, para que organizações da sociedade civil, movimentos populares e outras entidades representativas possam se reunir para tratar de temas de relevância social.

E, assim, lá vai Paulo Tavares, em mais um projeto social.

“Tenho o privilégio de trabalhar numa instituição cujo objetivo maior é ajudar as pessoas. Peço a Deus que me dê saúde para continuar sendo útil”.

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CONsTruçõEs E rEFOrmAsTrês novas construções já estão com recursos orça-mentários destinados, em Londrina (com 1 mil m2), Foz do Iguaçu e Ponta Grossa (com 500 m2 cada). Na capital, além da concentração de todos os gabinetes de procuradores de Justiça na sede do Centro Cívico e na subsede Tibagi (que será revitalizada), a grande novidade será a mudança da maioria dos Centros de Apoio para edifício alugado de 11 andares, no Centro, com 3.920 m2 de área total e um andar destinado ex-clusivamente a eventos e reuniões. A chamada “Casa Rosada” será desocupada para restauro e reforma, fi-cando no local apenas o Departamento de Tecnologia da Informação - DTI.

DATA CENTErOutro importante projeto é o “Data Center”, a aqui-sição da estrutura computacional centralizada e pró-pria, uma espécie de “armazém virtual” responsável pela guarda e processamento de dados da instituição, propiciando ao MP-PR independência em relação à Celepar, que hoje hospeda parte das informações. En-tre as muitas vantagens, o data center, que está em fase de aquisição, propiciará maior segurança dos da-dos institucionais e maior capacidade de armazena-mento de e-mails.

COmPuTAçãO móVELO projeto de “Computação Móvel” disponibilizará a todos os membros da instituição (e a um grupo es-pecializado de servidores) notebooks com acesso à internet e à rede interna, permitindo que se faça uso funcional desses recursos mesmo fora do ambiente de trabalho.

TELEFONIA IPUtilizada cada vez mais em grandes empresas públi-cas e privadas, o sistema vai garantir a comunicação de voz entre as unidades do MP-PR (da Capital e do interior), utilizando a rede de fibra ótica da Copel, já instalada, com redução significativa de custos com telefonia.

A partir deste ano, a Subprocuradoria-Geral de Justiça para Assuntos Administrativos passou a trabalhar com base em técnicas

de gestão de projetos, utilizando de maneira sistemática as ferramentas do planejamento estratégico. “Estão sendo desenvolvidos mais de 40 projetos, todos vinculados a pelo menos um dos objetivos elencados no mapa estratégico da instituição”, conta o coordenador executivo da SUBADM, Eliezer Gomes da Silva.

Confira a seguir algumas dessas iniciativas.

Em busca da excelência na gestãoAdministração por projetos:

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gEsTãO ADmINIsTrATIVAO projeto “Excelência na Gestão Administrativa” visa diagnosticar e aperfeiçoar os pontos críticos dos processos de trabalho nas áreas de aquisição de bens e serviços, incluindo os processos de lici-tação; gestão de contratos e convênios; controle patrimonial e de estoque; e planejamento de de-mandas de infraestrutura. Os processos acima se-rão aperfeiçoados neste ano de 2011, mas isto é apenas o início, pois nos anos seguintes todos os processos de trabalho serão estudados e otimiza-dos. O objetivo é torná-los mais eficientes, descre-vendo as atividades envolvidas, criando fluxos e definindo responsabilidades.

CONTrOLE INTErNOO “Manual de Procedimentos Financeiros e Presta-ção de Contas” trará informações e recomendações para membros e servidores sobre procedimentos ou cautelas de gestão e controle financeiro, incluindo, por exemplo, os procedimentos para pagamentos de diárias, ajudas de custo, ressarcimentos, aquisi-ção de bens e serviços.

COmPrAsNa área de compras, uma equipe será capacitada para atuar apenas na formulação dos editais e, outra, nas sessões de julgamento das propostas. A equipe de servidores designados para participar da Comissão Permanente de Licitação passa a incluir servidores do interior do Estado, em regra supervi-sores administrativos das comarcas de entrância fi-nal. Também será implantado o pregão eletrônico.

sIsTEmA DE CusTOsO projeto vai permitir que a administração tenha sistematizadas todas as informações sobre os gas-tos da instituição, permitindo verificar detalha-damente em que áreas e locais os investimentos aumentaram ou diminuíram e ter comparativos históricos e segmentados, de maneira a gerir de forma mais eficiente os recursos financeiros, ma-teriais e humanos.

gEsTãO DOCumENTALO “Programa de Gestão Documental” tem por fi-nalidade o desenvolvimento e a implementação de uma sistemática para tramitação, digitalização, arquivamento, indexação e descarte de documen-tos. Outro projeto prevê a organização do acervo documental de Curitiba e a implementação de po-líticas e práticas de arquivamento para comarcas de entrância final.

AssEssOrAmENTO juríDICO DA suBADmA cargo do Núcleo de Assessoramento Jurídico (NAJ) ficará o projeto “Banco de Pareceres”, que disponibilizará as manifestações jurídicas, devida-mente indexadas, de interesse da SUBADM, nota-

damente em áreas como licitações e contratos e regime jurídico de membros e servidores.

gEsTãO DE PEssOAsO projeto estratégico “Pesquisa de Clima Organi-zacional”, que já está na fase de análise de dados, objetiva medir os níveis de satisfação com as polí-ticas, práticas e recursos da instituição. Os resul-tados nortearão a adoção de medidas corretivas e preventivas.

AVALIAçãO FuNCIONAL EsTrATégICAO projeto setorial (desdobramento do projeto es-tratégico “Boas práticas em recursos humanos”) vai aprimorar os processos de avaliação de servidores, servindo inclusive para subsidiar o Plano de Rees-truturação das Carreiras dos Servidores do MP-PR.

CâmArA DE NEgOCIAçãO AssOCIATIVAPropiciará uma sistemática de negociação salarial entre a administração do MP-PR e os servidores, a fim de facilitar os processos decisórios relacio-nados às demandas remuneratórias suscitadas em cada data-base.

“gEsTãO E LIDErANçA”Visa prover chefes e gerentes de conhecimentos es-pecializados para o bom exercício de suas funções.

PrATA DA CAsAO projeto vai fomentar as boas práticas institucio-nais, premiando iniciativas e ações inovadoras, es-pontâneas e bem sucedidas de membros, servido-res e equipes de trabalho do MP-PR.

gEsTãO AmBIENTALNa recém-criada área de gestão ambiental, o prin-cipal projeto é inserir o MP-PR na “Agenda Ambien-tal da Administração Pública (A3P)”, programa do Ministério do Meio Ambiente que objetiva incorpo-rar os princípios da responsabilidade socioambien-tal em todas as atividades das instituições públicas, revisando comportamentos e práticas internas. Cumprindo os pré-requisitos para o ingresso no A3P, a instituição pretende realizar ações de incen-tivo à economia de recursos e redução de danos ao meio ambiente, como licitação sustentável, gestão de resíduos sólidos e educação socioambiental.

suPrImENTOsO projeto de “Melhoria no Processo de Solicitação de Material”, por sua vez, pretende informatizar os pedidos de suprimentos, com aplicativo de base web, agilizando o processamento e a entrega dos materiais pela Divisão de Estoque e Suprimentos (DISUPRI / DAL), que recentemente mudou-se de prédio alugado no bairro Parolin, para novo local, cedido pelo Departamento de Estradas de Roda-gem (DER), no bairro Atuba.

Em busca da excelência na gestão

Precisamos de mais hidrelétricas?

Em abril de 2008, o Lago Azul, uma das principais atrações turísticas de Campo Mourão, Noroeste do Estado, praticamen-

te secou. Peixes, animais e boa parte da flora aquática da região morreu e o turismo sofreu um baque. O motivo da seca - a utilização ina-dequada do reservatório da Pequena Central Hi-drelétrica Mourão I, pela Companhia Paranaense de Energia. A Promotoria de Justiça de Proteção ao Meio Ambiente da comarca propôs ação civil pública e conseguiu, liminarmente, suspender a licença de operação de usina. Por que relembra-mos essa história?

Com o governo federal anunciando a in-tenção de investir cada vez mais pesado nes-se tipo de energia, a questão das PCHs (usinas menores, com até 30 MW de potência) e das demais usinas hidrelétricas (UHEs) entrou em definitivo na pauta dos Ministérios Públicos de todo país. Segundo dados da Agência Nacional de Energia Elétrica, de abril deste ano, o Brasil tem em trâmite hoje 2.071 projetos de novos

empreendimentos hidrelétricos, sendo que 322 deles se referem a possíveis usinas a serem ins-taladas no Paraná.

Preocupado com o impacto disso na área am-biental e sócio-econômica, especialmente quanto aos direitos das populações que serão diretamente afetadas pelas UHEs e PCHs, o Ministério Público do Paraná, através do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Proteção ao Meio Ambiente, iniciou em junho uma série de reuniões com os promotores de Justiça das comarcas onde há estudos para a criação de usinas.

De acordo com o coordenador do CAOP, pro-curador de Justiça Saint-Clair Honorato Santos, cerca de um terço das Promotorias de Justiça do Estado deve ser envolvido de alguma forma com esse tipo de empreendimento. “O Paraná é um estado plenamente impactado por barragens e o que restou de recursos hídricos, nos rios Piquiri e Ivaí, está na iminência de receber barragens também”, afirma o procurador. Ele sustenta que o Estado já é superavitário em energia e que

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consome apenas 20% do que produz. “O poder público deveria investir em outras fontes de energia notadamen-te sustentáveis, como a eólica e a solar. É um sofisma defender as usinas como alternativa ambiental. Qual-quer hidrelétrica é uma obra altamente impactante”, diz Saint-Clair.

O coordenador do CAOP destaca ainda a necessida-de de mais informações à população a respeito das con-sequências reais da instalação das usinas, principalmente para as famílias que podem ser atingidas diretamente pelos empreendimentos. “Não adianta realizar audiên-cias públicas se as pessoas não entendem de fato a pauta da reunião”, argumenta. Saint-Clair defende ainda a dis-seminação de projetos que somem a questão ambiental à econômica, com ações como o investimento em ICMS Ecológico, ferramenta legal que permite que municípios e donos de propriedades rurais recebam incentivo finan-ceiro por criar e manter áreas de preservação. Segundo dados da Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Insti-tuto Ambiental do Paraná, o município de Adrianópolis, por exemplo, arrecadou no ano passado R$ 1,76 milhão com o ICMS Ecológico, graças ao Parque das Lauráceas. Paranaguá chegou a receber, em 2010, R$ 1,3 milhão, com a manutenção de reservas e unidades de conser-vação. Ainda no litoral, o município de Guaraqueçaba arrecadou R$ 3,58 milhões com o tributo. Matelândia, só com o Parque Nacional do Iguaçu, R$ 2,06 milhões. “Não há desculpas para não se investir em alternativas sustentáveis. Especialmente quando falamos em usinas, estamos tratando de água, recurso natural que não tem preço”, afirma o procurador. Saint-Clair lembra ainda que o Paraná não recebe ICMS pela geração de energia e que os royalties gerados pelas UHEs são temporários. As PCHs nem royalties geram. E conclui: “Somos con-tra a instalação das usinas e vamos velar pela efetiva proteção do meio ambiente e pela defesa dos direitos fundamentais das famílias que podem ser vítimas desses empreendimentos.”

DIrEITOs DEsrEsPEITADOsEm todo país, o Movimento dos Atingidos por Bar-

ragens (MAB), entidade que há 20 anos trata das popu-lações que foram impactadas pela instalação de hidre-létricas, estima que já existam 1,3 milhão de brasileiros que foram prejudicados pela instalação de usinas, não apenas proprietários de terras onde as hidrelétricas fo-ram construídas, mas comunidades indígenas, quilom-bolas e pequenos agricultores que foram afetados pelas mudanças ambientais causadas pelos empreendimentos. Não há números específicos sobre o Paraná, mas o fato é que o Estado é o primeiro do país em potencial hidrelétri-co instalado. Ou seja - vários paranaenses já estão nessa estatística e, com tantos empreendimentos a caminho, muitos estão em vias de entrar.

“De uma nova usina a ser construída no Paraná, que produza 100 MW de energia, somente 20 MW fi-cam no estado, tendo tem vista que 80% da energia produzida é exportada” afirma Robson Formica, um dos coordenadores do MAB no Paraná. Ele cita ainda dados do IPARDES, que indicam que 2% dos estabele-cimentos empresariais (indústrias e grandes comércios) consomem sozinhos 50% da eletricidade consumida no estado, ou seja, dos 20MW que ficariam no Para-ná, a metade disso, 10 MW seria consumido por 2 % dos estabelecimentos consumidores. “Dessa forma, de uma nova usina, construída aqui, que produza 100 MW, efetivamente apenas 10 MW será consumido de fato pelo povo paranaense. Aí cabe a pergunta: precisamos de mais usinas?”, questiona. O MAB também critica a falta de informação e de participação efetiva das co-munidades nos processos de instalação das usinas. “A empresa pode falar ‘não vamos fazer re-assentamento, não vamos fazer acordo coletivo’, o Estado chancela esse direito aos empreendedores. As famílias podem dizer ‘queremos que a energia seja usada nisso, não naquilo’? Não. A relação é unilateral. A população im-pactada não tem voz”, diz Formica.

Também em junho, ele e outros representantes do movimento estiveram em Curitiba para uma audiência na Assembleia Legislativa do Paraná. Na ocasião, apre-sentaram aos deputados relatório da Comissão Especial do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Huma-na, da Secretaria de Direitos Humanos, que aponta 16 direitos fundamentais que são violados nos casos que envolvem as populações impactadas por barragens de usinas hidrelétricas. “O que a gente observa é que a condição concreta de vida das pessoas que são atingidas pelas barragens não melhora”, afirma.

Formica também sustenta que estão sendo emitidas várias licenças ambientais prévias sem que haja uma fis-calização efetiva das empresas pelos órgãos competentes. “Como regra, os condicionantes dos empreendimentos não são respeitados. Questões ambientais, re-assentamento de famílias, acordos coletivos e valores de indenização ficam apenas no papel”, diz Formica, que atualmente está atu-ando diretamente no suporte às comunidades que podem ser impactadas pela instalação de UHEs e PCHs no Rio Chopim, sudoeste do Estado, na região de Palmas e Dois

Precisamos de mais hidrelétricas?

Patrícia Ribas

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Vizinhos. “Sabemos de 14 empreen-dimentos para serem construídos ali, o que deve impactar diretamente pe-lo menos 1.200 famílias”, diz.

“Não é questão de radicalismo. Nos amparamos em fatos. Temos estudos que mostram que 70% das famílias atingidas por barragens re-grediram na questão econômica.”, afirma Formica, que busca a partici-pação dos agentes do MP na questão. “O Ministério Público tem papel fun-damental no sentido de estar presen-te nas discussões, de garantir os di-reitos não apenas do meio ambiente, mas das comunidades e municípios. A instituição legitima a discussão”, avalia. Durante a discussão na ALEP, o representante do MAB ainda colo-cou a seguinte questão: o Movimento calcula que 170 empreendimentos a serem instalados no Estado devem impactar 30 mil famílias. “É o equi-valente ao número de famílias que não foram re-assentadas nos últimos 20 anos. Vamos criar mais esse passi-vo?”, pergunta.

BErçárIO NATurALDa parte dos ambientalistas, a

grande preocupação quanto à instala-ção de novas hidrelétricas no Paraná se refere especialmente à possibilida-de de construção de usinas nos rios Ivaí e Piquiri - únicos que ainda não têm barragens. “A Bacia do Piquiri, por exemplo, ainda pouco estudada, é o último remanescente de reprodu-ção de diversas espécies de peixe do Rio Paraná. A instalação de barragens leva ao fim as áreas de desova das es-pécies. Assim, se esse rio for barrado, pode haver um comprometimento sério da pesca no Estado, especial-mente na região do reservatório de

Em 1989, o Paraná incluiu na Constituição do Estado a previsão do ICMS Ecológico. Foi o primeiro estado brasi-leiro a adotar a medida, regulamentada em 1991, com a Lei Complementar nº 59/1991. A seguir, o “imposto verde” passou a ser adotado em São Paulo (1993), Mi-nas Gerais (1995), Amapá (1996), Rio Grande do Sul e Rondônia (1997), Mato Grosso do Sul, Pernambuco e Mato Grosso (2000), Tocantins (2002), Acre (2004), Rio de Janeiro e Ceará (2007). Segundo informações dos portais www.icmsecologico.org.br e www.tri-

butoverde.com.br, a aplicação do imposto ainda é objeto de estudo em outros estados. Ainda segundo essas entidades, que apresentam dados da Secretaria Estadual do Meio Ambiente, após a implementação do ICMS Ecológico houve um aumento considerável na superfície das áreas preservadas no Paraná: uma alta de 1.894% nas unidades de conservação muni-cipais, 681% nas estaduais, 30% nas federais e terras indígenas e 100% nas RPPN`s (Reservas Particulares do Patrimônio Natural) estaduais.

forma: que primeiro sejam feitos estudos amplos e sérios a respeito da viabilidade e impacto dos empre-endimentos e só depois se instalem as barragens”, diz o biólogo. “O que temos como regra, infelizmente, é o oposto: se cria a usina, os proble-mas ambientais aparecem, e depois se tenta remediar. E isso sempre im-plica obras muito caras e não raro sem grande resultado”, avalia.

DECIsõEs FAVOráVEIsEm Campo Mourão, a promoto-

ra de Justiça responsável pelo caso do Lago Azul, Rosana Araújo de Sá Ribeiro Pereira, lembra que, além de suspender liminarmente o funciona-mento da PCH, a intervenção do MP--PR levou a Copel, responsável pela usina, a criar um setor responsável pela parte de meio ambiente. “Além disso, a partir da propositura da ação, a PCH passou a funcionar sempre dentro de uma cota de segurança”, conta Rosana.

Em maio deste ano, as Promoto-rias de Justiça de Palmas e União da Vitória conseguiram impedir a reali-zação de audiências públicas a res-peito da instalação de três PCHs na região de Palmas, Coronel Domingos Soares e Bituruna, com o argumento de que a população ainda não havia sido devidamente esclarecida sobre o assunto, o que impediria um debate efetivamente democrático. Os res-ponsáveis por essas medidas foram o promotor de Justiça Marcio Soares Berclaz e a promotora substituta Be-atriz Aguiar Arend.

Na esfera criminal, em 2008, o promotor de Justiça Robertson Fon-seca Azevedo, à época atuando junto ao CAOP do Meio Ambiente, apresen-tou ação penal por crime ambiental contra o então presidente do IAP, sob o argumento de ter sido concedida, indevidamente, licença ambiental para a construção da UHE de Mauá, na Bacia do Rio Tibagi. A denúncia foi recebida e a ação está em trâmite.

Sobre a instalação de usinas na Bacia do Tibagi, em maio deste ano, o Ministério Público Federal conse-guiu uma importante vitória: o Tri-bunal Regional Federal da 4ª Região determinou a “realização de Avalia-ção Ambiental Integrada da Bacia do

PArANá FOI PIONEIrO NO “ImPOsTO VErDE”

Itaipu”, afirma o biólogo Almir Cuni-co, doutor em Ecologia de Ambientes Aquáticos Continentais pela Universi-dade Estadual de Maringá e integran-te do Laboratório de Ecologia, Pesca e Ictiologia da Universidade Federal do Paraná, Campus Palotina. Ele conta que, ao longo dos anos, com a criação de usinas e consequente barramento dos principais rios do Estado, os pei-xes perderam os locais que usavam para desova, “migrando” para rios ainda não barrados. “Hoje, restam na Bacia do Paraná apenas quatro rios tidos como ‘berçários naturais’ de peixes e outras espécies: o Ivaí e o Piquiri, no Paraná, e o Ivinhema e o Baía, no Mato Grosso do Sul”.

O pesquisador explica que as usinas alteram a velocidade da água e a composição química, além de im-plicarem em barragens, ou seja, a água corrente passa a ser represada em um lago. “Tudo isso gera impac-to, é drástico para o meio ambiente”, diz Cunica. O professor afirma que nas barragens de PCHs, por exem-plo, é comum que não seja mantida uma vazão mínima para água, o que faz com que o rio praticamente se-que - como no caso do Lago Azul, citado no início da matéria. Ele também critica o “peso” maior que é dado à questão econômica, em de-trimento à ambiental, no caso das hi-drelétricas. “Quando há períodos de estiagem, por exemplo, as empresas retêm água para garantir a geração de energia. Isso inviabiliza as cheias nos rios e o desenvolvimento das es-pécies de peixes, entre outros pro-blemas”, afirma. “Não somos contra a energia elétrica ou a necessidade de usinas. O que defendo é que a questão seja conduzida de outra

Rio Tibagi como pré-requisito para a concessão de licença ambiental para construção de qualquer usina hidre-létrica” naquela bacia hidrográfica, à exceção da UHE de Mauá, que já estava construída. Assim, para a ins-talação de outras usinas na região, as empresas interessadas devem apre-sentar laudos de impacto ambiental completos, que tratem da bacia hi-drográfica como um todo. A ação foi proposta em 1999, pela Associação Nacional dos Atingidos por Barra-gens (ANAB), e posteriormente as-sumida pelo MPF em Londrina (autos 1999.70.01.007514-6).

DIrEITOs VIOLADOsRelatório da Comissão Especial

do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, da Secretaria de Direitos Humanos, apresentado no final de 2010, aponta para 16 direitos humanos que são sistema-ticamente violados nos casos que envolvem as populações impactadas por barragens de usinas hidrelétricas. Foram avaliadas por quatro anos as populações afetadas pelas usinas de Canabrava (RJ), UHE Tucuruí (PA), UHE Aimorés (MG/ES), UHE Foz do Chapecó (SC/RS), PCH Fumaça (MG/ES), PCH Emboque (PB) e Bar-ragem de Acauã (PB). São eles:1. Direito à informação e à participa-ção; 2. Direito à liberdade de reunião, associação e expressão; 3. Direito ao trabalho e a um padrão digno de vi-da; 4. Direito à moradia adequada; 5. Direito à educação; 6. Direito a um ambiente saudável e à saúde; 7. Direi-to à melhoria contínua das condições de vida; 8. Direito à plena reparação das perdas; 9. Direito à justa negocia-ção, tratamento isonômico, conforme critérios transparentes e coletivamen-te acordados; 10. Direito de ir e vir; 11. Direito às práticas e aos modos de vida tradicionais, assim como ao acesso e preservação de bens culturais, materiais e imateriais; 12. Direito dos povos indígenas, quilombolas e tradi-cionais; 13. Direito de grupos vulne-ráveis à proteção especial; 14. Direito de acesso à justiça e a razoável duração do processo judicial; 15. Direito à re-paração por perdas passadas; 16. Di-reito de proteção à família e a laços de solidariedade social ou comunitária.

Qual a posição do IAP e do ÁguASPARA-NÁ sobre a instalação de novas hidre-létricas no Estado, uHEs e PCHs, haja visto o passivo ambiental existente das grandes usinas, entendendo que a bacia hidrográfica é uma unidade de planejamento?IAP - O IAP tem a função de licenciar, fisca-lizar e fazer cumprir os estudos licenciados e aprovados. O Instituto é um agente fiscalizador ambiental do Estado e por isso deve manter-se neutro.ÁGUASPARANÁ - Temos como atribuição nos manifestarmos com relação à disponibilidade hídrica para aproveitamentos hidrelétricos, in-dependentemente do porte. A outorga prévia, decorrente da análise da referida disponibilida-de, equivale à declaração de reserva de disponi-bilidade hídrica, dispositivo exigido tanto para a outorga da ANEEL, quanto para o licenciamento ambiental.

vale mais investir em hidrelétricas ou em outras formas de energia, como a eólica ou a solar?IAP - Essa é uma atividade governamental. Cabe à presidente da República definir a produção energética do país.ÁGUASPARANÁ - O potencial hidrelétrico do Estado do Paraná é inegável, decorrente das características físicas das nossas bacias hidro-gráficas, comprovado pelos aproveitamentos existentes e os remanescentes. A opção pelo aproveitamento da energia eólica e solar está vinculada aos estudos e leilões propostos pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e não po-de estar afastada de uma ampla análise técnica de viabilidade econômica, ambiental e social.

Especialistas da área ambiental e de ci-ências sociais ponderam que áreas que recebem hidrelétricas são definitiva-mente impactadas e que, como regra, não há recuperação efetiva do dano ambiental e as populações diretamente atingidas não são compensadas. O que os senhores dizem sobre isso?IAP - Qualquer interferência que se tenha no meio ambiente gera um impacto ambiental. O que a instituição preza é a recuperação am-biental máxima e mais rápida possível das áreas

impactadas. Os estudos de impacto ambiental em suas reuniões e audiências públicas dão a oportunidade à população diretamente atingi-da para discutir e exigir as compensações, em um processo democrático.ÁGUASPARANÁ - Todo e qualquer empreen-dimento ou atividade gera impactos no meio ambiente. No entanto, cabe ao empreendedor propor medidas mitigadoras e compensatórias, que devem ser atestadas pelos órgãos ambien-tais. As PCHs, por exemplo, via de regra, são im-plantadas praticamente a “fio d’água”, portanto, sem gerar grandes áreas alagadas.

Há alguma intenção do IAP e do AguAS-PARANÁ em promover campanhas de informação a respeito das PCHs para a população, especialmente nas regiões que podem vir a receber esse tipo de empreendimento?IAP - Os estudos de impacto ambiental promo-vem de uma maneira transparente as informa-ções que são repassadas à população através das audiências públicas. São também de má-xima importância as ações e a participação de outros agentes fiscalizadores do Estado, como o Ministério Público, que tem participação no acompanhamento desses projetos.ÁGUASPARANÁ - O processo de licenciamento ambiental brasileiro é exigente e moderno a ponto de envolver em todas as suas etapas a população do entorno dos empreendimentos. Portanto, o processo de comunicação e de par-ticipação deve estar garantido inclusive pelas exigências da legislação.

O IAP estuda impor algum tipo de obri-gação efetiva quanto ao passivo sócio--ambiental gerado pelas PCHs às empre-sas que se propõem a investir nesse tipo de energia?IAP - O licenciamento ambiental e as con-dicionantes desse definem as obrigações do empreendedor quanto ao passivo ambiental do empreendimento.ÁGUASPARANÁ - Obrigações efetivas com rela-ção ao passivo sócio-ambiental de qualquer tipo de empreendimento devem ser concebidas no decorrer do ritual de licenciamento ambiental, inclusive aproveitando as audiências públicas para tanto.

Confira a seguir entrevista sobre a questão com os presidentes do Instituto Ambiental do Paraná (IAP), Luiz Tarcísio Mossato Pinto, e do Instituto das Águas do Paraná (AGUASPARANÁ), Márcio Fernando Nunes.

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Acontece no MP20 | CONTEXTO | Julho/2011

Novos promotoresForam empossados seis novos promotores substitu-tos do MP-PR: Clarice Bonelli Santos Salgado e Ju-liana Mitsue Botomé, em 22 de março (1); Gilberto Geraldino Filho, Mabiane Czarnobai Message e Ana Vanessa Fernandes Bezerra, no dia 5 de abril (2); e Lucas Cavini Leonardi, em 26 de abril (3).

Novos procuradoresTomaram posse como procuradores de Justiça Isabel Claudia Guerreiro, Reginaldo Rolim Pereira, Pau-lo José Kessler, Mauro Mussak Monteiro e Manoel Ilecir Heckert, em solenidade realizada no dia 24 de março (4); Wanderlei Carvalho da Silva, em 13 de abril (5); Alberto Vellozo Machado e Julio Victor Milléo Filho, no dia 25 de abril (6); Édina Maria Silva de Paula, em 10 de maio (7), e Ivonei Sfoggia, no dia 20 de maio (8).

mP-Pr tem novo ouvidor-geralO procurador de Justiça Carlos Aldir Loss foi eleito no dia 18 de maio para o cargo de ouvidor-geral do Ministério Público do Paraná (9). Ele assumiu o posto an-teriormente ocupado pelo procurador de Justiça Luiz do Amaral.

mobilização pela saúdeQuase 500 pessoas, entre procuradores e promotores de Justiça, servidores e estagiários do MP-PR participaram do evento que marcou o Dia Mundial da Saúde, em 7 de abril, na sede da Pro-curadoria-Geral de Justiça, em Curitiba

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(10). Com o lema “Saúde, cuide desse bem”, a ação, coor-denada pela Assessoria de Comunicação, ofereceu diversos serviços gratuitos, durante sete horas, no que foi denomi-nado “Circuito Saúde”: 112 pessoas cadastraram-se para doação de medula óssea, 452 fizeram a medição de glice-mia, 364 aferiram a pressão arterial e 209 passaram por avaliação corporal e física, com a orientação de parceiros como as Secretarias Municipais de Saúde e de Esporte e Lazer, Hemepar, Sesc e Unibrasil.

Política anti-drogas na adolescênciaNo dia 25 de abril, cerca de 220 pessoas se reuniram no MP-PR durante o seminário “Boas práticas e políticas públi-cas destinadas a crianças e adolescentes usuários de subs-tâncias psicoativas” (11). O objetivo do encontro, realiza-do pelo Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Criança e do Adolescente e pelo CEAF, foi discutir maneiras de prevenção e de atendimento a crianças e adolescentes usuários de drogas e as formas de exigir do Estado a im-plementação de políticas públicas que resultem em ações, projetos e na estrutura adequada ao tratamento do público infanto-juvenil.

Diretos fundamentais e ações coletivas Ainda em abril, no dia 26, foi realizada na sede do MP-PR a mesa redonda “Direitos Fundamentais e Ações Coletivas: questões processuais” (12). O debate foi promovido pelo Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Direitos Constitucionais, em parceria com o CEAF. Conduzi-ram as discussões o procurador de Justiça Alberto Vellozo Machado, do CAOP de Direitos Constitucionais, e os pro-motores de Justiça Clayton Albuquerque Maranhão, Mauro Rocha e Eduardo Augusto Salomão Cambi. O evento foi transmitido ao vivo pela internet, via webcast.

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Povos IndígenasO Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Proteção às Comunidades Indígenas, em parceria com o CEAF, promoveu entre os dias 4 e 6 de maio o III Seminário Indígena - História e Atualidade (13). O evento foi realizado na sede do MP-PR, em Curitiba, com transmissão ao vivo via webcast, e teve como objetivo abordar questões indígenas no Paraná e no Brasil, ressaltando a inclusão social, a autossustentabi-lidade e o respeito à diversidade. Participaram das discussões algumas das maiores autoridades do país na área, como o professor Orlando Villas Bôas Filho, mestre e doutor em Direito, filho do sertanista e indigenista Orlando Villas Boas (1914-2002), e representantes dos índios de destaque nacional, como o cacique kaiapó Raoni Metuktire.

Estratégia Nacional de justiça e segurança Pública O MP-PR, o Poder Judiciário e as Polícias Civil e Militar assumiram no dia 20 de maio o compromisso de atuar de forma integrada na persecução dos homicídios ocorridos no Estado. A parceria é parte da Estratégia Nacional de Justiça e Segurança Pública - ENASP, ação coor-denada pelos Conselhos Nacionais do Ministério Público (CNMP) e de Justiça (CNJ) e pelo Ministério da Justiça, discutida durante seminário realizado na sede da instituição, em Curitiba (14). Organizado pelo Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça Criminais, do Júri e de Execuções Penais, com apoio do CEAF, o evento contou com 250 participantes, entre integrantes do Ministério Público, membros do Judiciário e policiais civis e militares.

serviço social no mP-PrNos dias 12 e 13 de maio, foi realizada a Jornada de Trabalho dos Assistentes Sociais do MP-PR, reunião em que se discutiu o papel do profissional de Serviço Social ante as demandas institucionais. O pro-curador-geral de Justiça Olympio de Sá Sotto Maior Neto participou da abertura do encontro, bem como o subprocurador-geral de Justiça para Assuntos de Planejamento Institucional, Bruno Sérgio Galatti, e o coordenador executivo da Subprocuradoria-Geral de Justiça para Assuntos Administrativos, promotor de Justiça Eliezer Gomes da Silva.

Orientação Coletiva para estagiáriosNo dia 25 de maio o CEAF promoveu a 2ª Orientação Coletiva para Estagiários do Ministério Público do Paraná (15). Realizado no audi-tório da sede, em Curitiba, o encontro teve a participação presencial de 312 estagiários da instituição. O evento também teve transmissão via webcast.

Concurso para promotor substitutoCom 2.662 participantes - o maior número de candidatos já registrado em concursos para ingresso na carreira da instituição - foi realizada no dia 29 de maio, na sede da PUC-PR, em Curitiba, a primeira etapa do concurso de 2011 para promotor substituto do MP-PR. Comparado ao processo seletivo de 2009, neste ano houve quase o dobro de can-didatos. Os candidatos disputam 8 vagas, mas como o certame tem validade por dois anos, este número pode aumentar.

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Servidores e tecnólogos em

gestão Pública25 de maio deixou um gosto especial para

21 servidores do MP-PR. Com o apoio da instituição, eles receberam seus di-

plomas de graduação em Tecnologia da Gestão Pública, pela UFPR / IFPR. Os alunos do MP-PR fazem parte do grupo de funcionários municipais, estaduais e federais que compuseram a primeira turma de servidores públicos a concluir o curso semi-presencial, transmitido para 104 cidades do Estado. A graduação começou em 2008 e os custos para os servidores do MP-PR foram arcados pela instituição.

O coordenador do curso, Ciro Bächtold, conta que o sucesso dessa primeira turma e sua boa avaliação pelo Ministério do Planejamento ga-rantiram a ampliação da iniciativa. “A partir do ano que vem, ele será ofertado para todo país, com aulas transmitidas de Curitiba”. A partir de agosto também devem ser oferecidas diversas pós--graduações na área. Ciro afirma que as turmas foram marcadas pela heterogeneidade: “Tivemos desde pessoas com doutorado a alunos que es-tavam havia 20 anos fora do ambiente escolar”. Dos 21 servidores que concluíram a graduação com o auxílio do MP-PR, apenas três já tinham curso superior.

hIsTórIAs DE VIDAEm nível estadual, o curso era inicialmente

oferecido aos servidores do Executivo. A disponi-bilização também ao MP-PR se deu a partir da ini-ciativa da auxiliar técnica Ana da Conceição de Je-sus. Ela conta que quando soube do curso, tentou

se inscrever e não conseguiu. Frente à negativa, mandou uma mensagem para o e-mail “Fale com o Governador”, perguntando a razão de servidores do MP não poderem participar. A resposta veio. Seria necessário um convênio da instituição com o Estado. Assim, entrou em contato com o CEAF, que conseguiu a disponibilização de vagas. Ana, hoje com 46 anos, três filhos e três netos, conta que se casou e foi mãe cedo. Essa situação, soma-da à falta de condições financeiras na juventude, fizeram com que a servidora adiasse o sonho de fazer uma faculdade. “Quando soube que o curso era à distância, com aula presencial uma vez por semana, e na área em que eu queria, pensei: essa oportunidade eu não posso perder!”, conta.

Servidora do MP há 17 anos, Maria Antonieta B. Kosak, 52 anos, também não teve oportuni-dade de concluir uma faculdade antes. Quando soube da turma, foi logo se informar sobre como participar. A vontade de se aprimorar e o apoio dos familiares, sobretudo do marido, fez com que ela vencesse as dificuldades típicas de quem está longe dos estudos por algum tempo. “No começo foi difícil; tive que aprender a lidar com programas de computador que não dominava, a conquistar o respeito dos colegas que tinham mais experi-ência acadêmica; a disputar o micro com meus filhos, em casa... Foi muito puxado, mas consegui, e agradeço à instituição por essa oportunidade”, diz Antonieta, que tem planos de seguir em uma pós-graduação.

O MP-PR buscará renovar a parceria, a fim de oferecer novas vagas aos interessados.

Formaram-se na turma Adriana Kopplin Carrilho, Ana da Conceição de Jesus, Carmen Siman, Claudia Kleina Fernandes da Silva, Cláudia Martins, Fernando Coelho de Oliveira, Haroldo de Oliveira Tinti, Leni Izabel da Silva Bahry, Luci Helena Siman de Lima, Maria Antonieta Binhara Kosak, Maria Lucia Trindade da Cruz, Michelle Andréa Bini Salsa, Odenir Antonio Marqueti, Roberto Luis Fonseca de Freitas, Rosane do Rocio Cardoso, Roseli Tavares de Oliveira, Rosimar Anderli Witkowski, Sonia Mara Dias Prestes, Valmir Junior de Oliveira, Vanessa Hermann Alves Borges dos Santos e Vera Lucia Duarte Misurelli, todos lotados na capital. Outros dois servidores também concluíram o curso: Lauro Pinto Junior e Daniel Mealha Cabrita, que iniciaram a graduação quando eram servidores de outros órgãos.

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Entrevista

A procuradora de Justiça samia saad gallotti Bo-navides coordena o Centro de Estudos e Aper-feiçoamento Funcional do MP-PR desde 2008.

Integrante da instituição há 31 anos, ela também traz na bagagem vasta experiência na área acadêmica, ten-do sido reitora da atualmente denominada Universi-dade Estadual do Norte do Paraná e vice-diretora do curso de Direito da mesma instituição de ensino. À frente do CEAF, Samia trabalha para a concretização do objetivo estratégico da instituição que visa “aper-feiçoar continuamente a qualificação de membros e servidores”, a partir da definição e implementação de cursos e eventos de capacitação, presenciais e à distân-cia. Nesta entrevista, ela trata deste tema e fala sobre o Encontro Estadual do MP-PR, que será realizado no segundo semestre.

Como coordenadora do CEAF, a senhora está à frente da organização do Congresso Estadual do mP-Pr. O que os integrantes da instituição podem esperar deste encontro?Um momento de renovação de votos de Ministério Público, de se travar um diálogo institucional para traçar rumos, em tempos que requerem estratégias diferenciadas de ação. Hoje, o conhecimento novo é difundido pelos mais variados meios, não pode sozi-nho ser o objetivo de um congresso, sendo o encontro um local para troca de experiências e metodologias de ação.

O tema é “ministério Público: responsabilidade Po-lítica e social”. Como ele foi definido e que questões estarão em debate?A busca foi por um tema amplo que condensasse bem a presença social do Ministério Público hoje. Só o MP reúne tantas atribuições em áreas tão diversas. Portan-to, a dimensão que tem uma promotora de Justiça, um

Samia Saad gallotti Bonavides

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Responsabilidade Política e Social

promotor, um procurador e uma procuradora de Justiça, com a possibilidade de interferir positivamente para me-lhorar a vida das pessoas sob diversos aspectos, como saúde, habitação, meio ambiente, educação, segurança, e tantos outros, cria um grau elevado de solicitações e cobranças, e consequentemente põe em relevo nossa responsabilidade social e política, além de uma necessi-dade de respostas. Como isso tudo provoca um estresse institucional constante, é importante discutir nosso pa-pel, tanto como formadores de opinião, condutores de políticas sociais, enfim, como agentes legitimados para propor e buscar soluções a respeito de tantos assuntos relevantes.

Como a senhora avalia a importância do aprendiza-do contínuo e da busca por conhecimento em áreas diversas? É vital. O aprendizado é revitalizador; faz sair de um patamar de redução, para um de expansão de horizon-tes. É a aventura do conhecimento, que abre caminhos, portas; mostra que a vida é rica de possibilidades, apesar das dificuldades. Investir na formação contínua é uma necessidade básica para a Instituição, como para nosso corpo é respirar, dormir, comer, etc.

A capacitação nas áreas de gestão e desenvolvimento de lideranças é comum no mundo corporativo. O mP--Pr, por meio do CEAF, tem oferecido vários cursos nessa linha. Em julho, por exemplo, começa o módulo sobre “Fundamentos em gerência de projetos”. Esta é uma tendência também no poder público?Aqui eu chamo a atenção para o fato de que a comple-xidade de nossa Instituição requer esse passo além. Mas não só isso, na verdade isso representa uma sintonia com os novos tempos que a Constituição Federal programou e desenhou para a Administração Pública brasileira. Foi ela que trouxe o verdadeiro planejamento para a área

pública. E creio que isso chegou com alguns anos de atraso em nosso país, comparando-se com outros. Por anos a fio, antes dessa nova visão que foi se implantan-do paulatinamente, pós-CF de 1988, o servidor público tinha a indicação de sua mesa e seu material de trabalho, mas não recebia orientação sobre seu papel na organiza-ção pública. Se ele não fosse razoavelmente intuitivo e não tivesse um grau de envolvimento pessoal imanente, poderia ficar ali, simplesmente sem integrar um projeto comum, sem ter qualquer estímulo, sem estar inserido numa “equipe”, enfim, sem produzir eficientemente. Não tem milagre, mas a necessidade de boa orientação, co-nhecimento técnico. Administrar é agir tecnicamente; a liderança é mais ampla, sendo uma tarefa daqueles que têm o perfil de líderes, de estar apontando o horizonte para ser atingido.

muitos cursos oferecidos pelo CEAF foram viabilizados por meio de parceria do mP-Pr com a ENAP - Escola Nacional de Administração Pública, que oferece cursos modulares à distância. Como a senhora vê esta par-ceria e quais capacitações estão programadas para o segundo semestre?As capacitações programadas são para as áreas técnica, comportamental e gerencial. Poder contar com a ENAP é um grande auxílio, pela qualidade dos cursos, pela experiência nas metodologias. O CEAF integra a rede de escolas de governo no Brasil, sistema que foi uma iniciativa da ENAP, como catalizadora, para promover reuniões e para que conjuntamente as escolas de governo conseguissem evoluir. Então, integramos uma rede de parceiros, com grandes possibilidades. Temos podido usufruir dos cursos à distância, e também presenciais, estes ministrados via IMAP - Instituto Municipal de Ad-ministração Pública - e da própria Escola de Governo do Estado do Paraná, mas com o conteúdo, professores e metodologia da ENAP.

Marco Aurélio Romagnoli Tavares*

A Lei nº 12.403/11, com vigência a partir de 4 de julho de 2011, traz inúmeras inovações e as mais sensíveis dizem respeito às novas medidas caute-

lares diversas da prisão, ao aumento de casos suscetíveis de fiança, à possibilidade do juiz conceder liberdade provisória mesmo sem pedido do autuado. Ainda, o auto flagrancial, per si, não será suficiente para manter a se-gregação do indiciado, incumbindo ao juiz convertê-la em prisão preventiva, quando existentes os seus pressu-postos e requisitos, além de ser necessário fundamentar o não cabimento de outras medidas cautelares, aplica-das em caráter individual ou cumulativo. Ademais, a prisão preventiva, como primeira regra, somente pode ser decretada aos crimes dolosos com penas superiores a 4 anos, salvo se cabível a custódia cautelar por ou-tros motivos previstos no art. 313, CPP. Cominada ao crime pena máxima igual ou inferior a 4 anos, a autoridade policial pode arbitrar a fiança.

As medidas cautelares diversas da prisão, elencadas nos incisos do art. 319, CPP, inclusi-ve a fiança, não dependem do flagrante para o juiz decretá-las, podendo fazê-lo mediante requerimento durante a investigação crimi-nal e no transcorrer da ação penal, inclusi-ve sem provocação das partes, desde que presentes os seus requisitos. Quanto à atuação de ofício do juízo pretendemos nos estender adiante.

Opinião

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MP e as Novas Medidas Cautelares

(Lei nº 12.403/11)

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São medidas cautelares o comparecimento periódico em juízo, suspensão do exercício de função pública, recolhimento domiciliar no pe-ríodo noturno e nos dias de folga, monitoração eletrônica, entre outras. As cautelares diversas da prisão para serem aplicáveis, devem ser: a) necessárias para garantir a aplicação da lei penal ou para efetivação da investigação criminal; b) prestarem-se a evitar a prática de infrações pe-nais; c) impostas devido à gravidade do crime, suas circunstâncias e em virtude das condições pessoais do indiciado ou acusado. Neste último particular deve-se fazer um juízo de necessidade e adequabilidade da medida. Saliente-se que a lei explicita que as cautelares são somente de-cretáveis quando cominada pena de prisão ao fato praticado.

O descumprimento injustificado da caute-lar, conjugado com a presença de indícios sufi-cientes de autoria e materialidade do crime, já autoriza a decretação da prisão em caráter sub-sidiário, pois evidenciaria que a medida aplicada não se mostrou eficaz para garantir a aplicação da lei penal e para resguardar a idoneidade da investigação e da instrução criminal, requisitos expressamente exigidos pela nova redação do art. 282, incisos I e II, CPP.

A Lei nº 12.403/11 não alterou os pressu-postos e requisitos da prisão preventiva, que pela nova sistemática será decretada em caráter autônomo, por conversão da prisão em flagrante e subsidiariamente, em caso de descumprimento de cautelar diversa da prisão.

Mesmo para crimes com penas inferiores a 4 anos, a prisão preventiva se justifica se o acusa-do ou indiciado for reincidente ou não tiver sua identidade esclarecida, bem como nos crimes cometidos contra mulher em caso de violência doméstica, para garantir as medidas protetivas de urgência (art. 313, I, II e III, CPP). Igualmen-te cabível a custódia se os crimes envolverem criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, em quaisquer circunstâncias. Percebe-se, neste tópico, que o legislador buscou ampliar a previsão anteriormente trazida pela Lei 11.340/06 para abranger outros crimes, que demonstram maior reprovabilidade da conduta do seu autor, pois praticados envolvendo pesso-as em condição - transitória ou permanente - de vulnerabilidade, a exigir tutela especial do Es-tado.

Feitas estas breves considerações, queremos tratar da previsão legal de possibilidade do juízo decretar, no curso da ação penal, sem provoca-ção das partes, a prisão preventiva, bem como aplicar medidas cautelares, conceder a liberda-de provisória e arbitrar fiança, mesmo sem re-querimento do acusado. De início frise-se que a atuação de ofício do juiz é um ponto conflitante

no âmbito do próprio novel texto legal, ante a previsão do §3º, do art. 282, CPP, que determina a intimação da parte contrária acerca de reque-rimento de medida cautelar, salvo risco de ur-gência ou perigo de ineficácia da medida. Mas não é só.

Sabe-se que desde a reforma pontual do Có-digo de Processo Penal de 2008 se almeja privi-legiar o sistema acusatório, em respeito aos dita-mes constitucionais, extraindo-se ou modifican-do-se dispositivos que preceituam a atuação de ofício do juiz, de clara inspiração inquisitorial. Um bom exemplo da referida reforma legislativa é o art. 212, CPP, que postou as partes como per-sonagens responsáveis pela produção da prova em audiência, pondo o juiz na posição devida e de muito prestígio, que é a de julgar a demanda penal. Portanto, a atuação de ofício do juiz da Lei nº 12.403/11 vem na contramão da história. No entanto, afora a própria Constituição Fede-ral estatuir a garantia do contraditório (art. 5º, LV), hasteando no direito brasileiro a bandeira do processo de partes, o próprio Código de Pro-cesso Penal, no art. 564, III, alínea “d”, prevê a nulidade absoluta do processo ante a falta de in-tervenção do Ministério Público em todos os ter-mos da ação por ele intentada. Assim, devemos fazer letra viva das disposições citadas, atuando nos autos de processo antes de qualquer decisão judicial acerca da prisão e medidas cautelares.

Quanto à atuação do Promotor de Justiça logo após o flagrante, atente-se à redação do art. 306, CPP, que prevê a obrigatoriedade de co-municação imediata ao Ministério Público, que inclui, por evidente, a remessa de cópia do fla-grante pela autoridade policial, sob pena de tor-nar inócua a citada previsão legal. Ora, urge ao Ministério Público saber se a prisão foi realiza-da conforme as previsões legais, pois pode ser o caso de relaxamento da prisão em flagrante. Não só isto, pois o MP deve pugnar pela conversão da prisão em flagrante em preventiva e requerer medidas cautelares, se cabíveis.

Neste tópico, cumpre frisar que a prisão é, inequivocamente, medida de exceção. Entre-tanto, há de ser observado que a edição da Lei 12.403/2011 não elidiu o reconhecimento de sua indispensabilidade quando as medidas cau-telares ali previstas se revelarem inadequadas ou insuficientes (art. 310, II, CPP), tornando a substituição, portanto, incabível (§ 6º, art. 282, CPP).

É fácil concluir a partir do rol do art. 319, CPP, que num caso de roubo qualificado pelo emprego de arma e concurso de pessoas (art. 157, §2º, I e II, CP), as medidas previstas, mes-mo aplicadas cumulativamente, podem ser ab-solutamente inócuas diante da gravidade da infração e das consequências dela resultante no

Opinião

MP e as Novas Medidas Cautelares

(Lei nº 12.403/11)

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meio social, a comprometer a ordem pública. Da mesma forma, diante de reiteração criminosa - facilmente verificada nos crimes contra o pa-trimônio e em tráfico de drogas, por exemplo - poderiam não ter qualquer efetividade sem uma fiscalização apta do Estado, como, por exemplo, as medidas de recolhimento no período noturno e a monitoração eletrônica. Neste último aspec-to a implantação do monitoramento eletrônico necessitará de muitos ajustes técnicos. Em São Paulo, a experiência de uso de tornozeleiras em condenados beneficiados com saídas temporá-rias mostrou que a carga das baterias foi um dos entraves, pois as com sistema GPS duram apenas 36 horas, sem contar que muitos instrumentos foram danificados com facilidade pelos pró-prios presos. Por oportuno, o Projeto de Lei nº 156/09, do novo Código de Processo Penal, que está parado na Câmara Federal - portanto não se espante o leitor se a Lei nº 12.403/11 tiver uma vida curta - prevê como causa de revoga-ção da medida cautelar em questão a destruição do instrumento de controle pelo indiciado ou acusado, ensejando análise de decreto de prisão preventiva. A propósito, o citado projeto de lei prevê a necessidade de consentimento da pessoa a ser monitorada e a medida cautelar seria cabí-vel apenas para crimes com penas superiores a 8 anos. Por arremate, na referida proposta legisla-tiva as medidas cautelares e a prisão preventiva possuem prazo de validade e regras de renova-ção, o que não ocorre na Lei nº 12.403/11.

Enfim, diante destas alterações legislativas, atuais e vindouras, inspiradas no garantismo de tom acentuadamente acadêmico, como recri-minar quem diz que as leis vêm para alavancar os índices de impunidade e esvaziar as prisões, mesmo que ao custo da vida da vítima e teste-munhas, sem prejuízo dos novos crimes que se-

rão praticados por aqueles que deveriam estar na prisão? Na verdade o Estado deve resgatar a dignidade humana nas prisões, para que o cárce-re perdure pelo tempo justo e necessário.

Ainda sobre a eficácia das medidas caute-lares no contexto atual, o recolhimento noturno e nos dias de folga do acusado é outra medida cautelar que só será efetiva com a instituição de um aparato policial específico para tanto. As-sim, consideradas as precárias disponibilidades de fiscalização, diante de notícia de ameaça à vítima ou às testemunhas, sequer deve ser cogi-tado o decreto de medida cautelar de proibição de manter contato com determinada pessoa (art. 319, III, CPP) em substituição à medida constri-tiva de liberdade. Além disso, tal medida somen-te teria eficácia diante de condutas criminosas que não revelem a ousadia do seu autor, sob pena de mostrar-se absolutamente inadequada e insuficiente.

Portanto, inexorável concluir que as medi-das cautelares, diante da remota possibilidade de fiscalização estatal eficiente em curto prazo, bem como frente à gravidade dos crimes cotidia-namente praticados com crueldade e ousadia, nem sempre se revelarão adequadas e suficien-tes, a autorizar a substituição da prisão preven-tiva, razão pela qual se recomenda prudência na análise do MP.

Vê-se que o Ministério Público tem impor-tante compromisso na escrita da história da apli-cação da Lei nº 12.403/11, velando para que não seja mais uma legislação que gere impunidade e aumente a descrença da sociedade na Justiça.

PAULO SERGIO MARKOWICZ DE LIMA, Promotor de Justiça de Curitiba/Paraná,

do Centro de Apoio das PromotoriasCriminais, do Júri e de Execuções Penais.

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Quando eu passei por lá...

Dois Vizinhos, idos de 1971. Janta-vam, como sempre, todos juntos: delegado Boscardin, advogado

Zippin, escrivão criminal Piva, o policial Daniel e Dallagnol, primeiro promotor da comarca. Bem próximo do restaurante da Dona Diversa funcionava o Colégio Esta-dual onde lecionavam o juiz, Nildo, e o advogado, Jaime.

De repente, um aluno irrompeu salão adentro, com atitude de apelo, gritando que alguém tentara matar o diretor, Jaime Guzzo. O delegado, então, deu voz de co-mando: vamos prender o bandido!

“Ora, esse “vamos” incluiria a todos da mesa?”, pensou o promotor. Todos saíram e logo se viu o alvoroço no outro lado da rua: eram vozes e braços gesticulantes: “foi por ali!”. Os gestos indicavam um carreiro rumo a um morro. O delegado correu para a “viatura”, um velho Jeep cedido à dele-gacia pela municipalidade. E todos foram embarcando... não cabia mais ninguém. “O bandido deve sair para a estrada e aí nós o pegamos...”, disse o delegado. E foi-se com sua comitiva, para a estrada principal.

Os alunos e o advogado Jaime pare-ciam olhar para o promotor, como a cobrar alguma atitude de cooperação. “Afinal, eu era “da Justiça”, devia fazer alguma coisa, apesar de não ter nenhuma experiência anterior e a chefia da instituição nunca ter me falado nada a propósito dessas situa-ções...”, brinca Dallagnol.

“Como todo mundo me olhava, fui até meu fusquinha, apanhei um revolvinho 32, bem enferrujado - até mete mais medo, porque os óxidos de ferro são venenosos - coloquei-o à cinta, com dificuldade, e direcionei-me ao bendito carreiro... Ainda olhei para trás, torcendo por algum reforço de retaguarda, ou uma companhia qual-quer. Pensei: “Afinal, o ´homem é um ani-mal social´ - tanto que o delegado levou todo mundo junto”. Mas ninguém tomou o seu rumo.

Estava muito escuro e o promotor não levava lanterna. Adiante, a vegetação já era mais densa, de maior porte. Foi quan-do vislumbrou, à luz das estrelas, alguns arbustos balançando. “Estava aí o bandi-

do”, pensei. “Não iria de arma em punho para não precipitar as coisas. Mas, como essas coisas costumam acontecer? O ban-dido fica à espera da prisão? E as alge-mas? Será que ele aceita a aproximação de alguém sem reagir?” Concluiu que o sujeito haveria de se manifestar ao menos a curta distância... deveria, por certo, gri-tar: “Não venha!”, ou “Olha que atiro!”, ou “Não atire que me entrego!”... “Tudo o que reuni de coragem e arrojo sequer permi-tia avançar mais uns passos... Lembrei que meu pai sofrera atentados a bala e nunca desistiu de sua luta, de seus deveres... Eu devia ter herdado alguma coragem... Ou será que isso sequer é hereditário?! Bem, se eu voltasse, poderia ser ridicularizado e, com que cara haveria de enfrentar uma das comarcas mais perigosas do Estado se sou-bessem que minha coragem tinha saído pe-los furos dos bolsos?!” Foi-se aproximando um pouco mais, pronto para sacar a arma, se fosse necessário: “Inteiramente aberto para o diálogo, segui por mais alguns me-tros... De repente, cinco ou seis latidos eco-aram naquele silêncio sepulcral... Maldito vira-lata errante! Maldito... não, bendito... Sei lá, mas de qualquer forma foi um alí-vio! Melhor o vira-lata do que o bandido!” Refeito, seguiu em frente. Chegou a uma casinha, com lamparina acesa. Perguntou ao cidadão que lhe atendeu se vira alguém armado passar por aí. Asseverou-lhe que não. Então, voltou. “No ponto de partida já estavam todos os passageiros do Jeep e informaram que o bandido não aparecera na estrada...”.

No dia seguinte, soube-se que o mal-fadado era o pai de um aluno que fora “prejudicado” no Colégio e fora tomar satisfação com o dire-tor, ameaçando-o. “Também soube que o bandido era o dono da casa que me in-formara não haver visto ninguém passar por lá ar-mado”. E assim começou a carreira, sem pecha de covardia e grato ao cão, que lhe poupara maio-res dissabores.

A primeira diligência de Dallagnol

O procurador de Justiça aposentado Agenor Dallagnol,primeiro promotor de Dois Vizinhos, fala da diligência “de estreia” naquelas terras do Sudoeste

30 | CONTEXTO | Julho/2011

Viva +

QuANTO FALTA PArA ACABAr O TEmPO? A única certeza que temos é que ele vai aca-

bar. Só não sabemos quando. O dilema é histórico. Desde que a humanidade passou a ter a certeza de que a vida é finita, o tempo passou a ser contado. Ou descontado! Na mitologia grega, o deus Chrónos representa o tempo quantitativo, linear, que pode ser medido. Já seu irmão, Kairós, representa o tempo qualitativo, circular e não mensurável.

Se nos primórdios, os dias e as noites traziam a sensação de que o tempo estava passando, hoje, softwares prometem ajudar as pessoas a aproveitá--lo melhor.

mAs QuEm CONTrOLA O rELógIO? Os dias continuam tendo 24 horas, mas nossa

percepção sobre ele mudou! Com os avanços das novas tecnologias, que nos ligam em tempo real com o outro lado do mundo, cabem mais acontecimentos dentro do mesmo espaço temporal, o que aumenta a sensação de velocidade.

Ansiedade e superficialidade - Com toda es-sa rapidez no acesso às informações, a sociedade reforça a falsa ideia de que também necessitamos ser rápidos para conseguirmos produzir mais em menos tempo, já que a “pilha” cresce sobre a mesa e a pressão por resultados só aumenta. Nossa cultura associa viver mais depressa com felicidade e inteli-gência. Um sujeito rápido é logo identificado como inteligente e o lento como burro. Para os especialis-tas, essa cultura é uma ilusão que gera ansiedade, superficialidade e ineficiência.

Ao fazermos tudo depressa, não conseguimos nos aprofundar em nada. Tudo é feito para burlar o pouco tempo que temos para desempenhar ou absorver o muito que, supostamente, precisamos. As notícias são abreviadas e quase não permitem a reflexão, assim como os textos dos e-mails e sites de relacionamento; o entretenimento de fácil “diges-tão” cria a impressão de que estamos nos divertindo mais em menos tempo, mas será que estamos mais felizes?! A vida está abreviada. Um fenômeno que vem sendo chamado de snack culture, ou, cultura aos pedaços.

No aniversário de 8 anos, Luiza pede um relógio de presente. A mãe questiona: “você ainda é muito nova para se preocupar com as horas!” Mas a menina argumenta: “a professora pede pra gente fazer a atividade em 10 minutos e nunca sei quanto falta para acabar o tempo!”

em tempo de lidar com o

tempo!Maria Amélia Lonardoni

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Viva + “A todo momento somos bombardeados por infor-mações. E tudo que é novo, inesperado, desconhecido, gera ansiedade, um sentimento que leva à busca de mais estímulos, mais novidades. Vivemos numa so-ciedade que está viciada, dependente de estímulos”, explica o psicólogo Willian Mac-Cormick Maron.

juntando os pedaços - Mas como aproveitar com qualidade o tempo que temos para a família, para os amigos, para o trabalho e até para nós mesmos? A administração do tempo vem se tornando uma ciên-cia com número crescente de adeptos. Consultorias, sites especializados e palestras na área têm sido cada vez mais requisitados no mundo corporativo. A lite-ratura também cresce, com dicas e estratégias para que as pessoas consigam aproveitar melhor o tempo que dispõem. Selecionamos alguns trechos do livro “Assumindo o Controle do seu Tempo”, editado pela Harvard Business School, uma das maiores escolas de administração do mundo, que traz algumas dicas que podem contribuir com a sobrevivência de quem vive no contratempo dos tempos modernos. Traduzi-da por Eduardo Lasserre, a publicação reúne artigos de renomados especialistas em Administração e faz parte da série “Gestão Orientada para Resultados”, da editora Elsevier. Confira:

Identifique o que é importanteO objetivo da gestão do tempo é permitir que vo-

cê dedique a melhor parte do seu tempo àquilo que realmente importa, embora não seja relativamente ur-gente. Importante é diferente de urgente. Para alguns especialistas, a urgência decorre, em parte, da baixa auto-estima - se estou sempre assoberbado de traba-lho, isso é sinal de que sou importante. No entanto, as atividades que apresentam urgência aparente carecem de importância. E na hora de definir prioridades, esse último item tem preferência. Concentre-se no trabalho, reservando, diariamente, um período fora dos telefo-nemas e outras interrupções. Outra dica é programar apenas a metade do tempo. Deixar a outra metade para as necessidades do dia.

Lista de tarefasAnote tudo o que você precisa fazer numa lista-

-mestre. Calcule o que tem que ser feito e quando deve ser feito. Em seguida, transfira o assunto para uma lista diária. Numere as tarefas na ordem em que elas devem ser cumpridas. Classifique pela ordem de importância (Tenha o cuidado de analisar as medidas que levarão aos resultados buscados e diferencie o que é urgente do que é realmente importante). Reserve alguns minutos, ao fim de cada dia, para repassar a lista-mestre e classificar as tarefas ou metas de acordo com a prioridade de cada uma delas.

Organização é fundamentalA desorganização consome tempo e produtivida-

de. Os especialistas explicam que não importa o sistema de organização, se digital, se manual, desde que ele

funcione para você. E o que dizer sobre as “pilhas” de trabalho sobre a mesa? Muita gente acha que elas alertam quanto ao que precisa ser resolvido, mas as “pilhas” distraem você daquilo que precisa ser feito. Evite a “administração do empilhamento”. A orientação é que estejam sobre a mesa apenas o telefone, canetas, computador, agenda, uma pasta de assuntos pendentes e o trabalho que se está executando no momento.

Técnica de reuniãoA principal dica dos especialistas é evitar as reu-

niões desnecessárias. Segundo eles, a melhor razão para se convocar uma reunião é a real necessidade de interação entre as pessoas que irão participar. As reuniões produtivas dependem de objetivos claramen-te definidos: é necessário uma pauta. Os assuntos, elencados previamente, devem circular entre os par-ticipantes. Para a reunião, ficam as decisões e enca-minhamentos. Os assuntos que surgirem durante as discussões devem ser anotados para serem incluídos na pauta dos próximos encontros.

Caixa postal cheiaEm vez de começar o dia lendo os e-mails, come-

ce escrevendo um objetivo estratégico. Depois, pla-neje seu dia, reservando uma parte do tempo para trabalhar esse objetivo. Alguns especialistas sugerem: abra seus e-mails somente no fim do dia. Com pres-sa de ir embora, você conseguirá se concentrar nas mensagens importantes e enviar respostas breves. A tecnologia é só uma ferramenta e não deve determinar a maneira como tomamos decisões e administramos nosso tempo.

multitarefasUma agenda abarrotada, com idas e vindas de uma

atividade para outra, pode reduzir a produtividade. Deve-se buscar sempre concluir uma atividade antes de iniciar outra; estabelecer uma dinâmica de trabalho que garanta intervalos de tempo sem interrupção; delegar tudo o que for possível e aprender a dizer não.

mu-dan-ça!Por fim, o livro recomenda: a única forma de

você se libertar da prisão do tempo e de conseguir dominá-lo é promover uma mudança fundamental na maneira como você o encara. Abandone a ideia de que determinadas atividades, como alimentar-se bem, fazer exercícios, ter momentos de lazer com a família ou com os amigos devem ser continuamente adiadas em favor das “exigências” de outras atividades. Ser muito ocupado é mais fácil do que ser eficaz, do que ser feliz!

P.S. Luiza ganhou seu relógio novo. Ele é colorido e troca a pulseira. A menina o utiliza com leveza, como um acessório, sem qualquer pretensão de contar ou controlar o tempo. O argumento da escola não passou de uma estratégia marota para ganhar o presente.

em tempo de lidar com o

tempo!

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Eu indico | Livros & Filmes

Assessoria de Comunicação | Ministério Público do Estado do ParanáRua Marechal Hermes, 751 | CEP 80530-230 | Curitiba - PR

[email protected]

hIsTórIAs EXTrAOrDINárIAsEdgar Allan Poe (2008, Companhia de Bolso, 272 p.)

“O contato precoce com Poe foi essencial para minha formação como escritor e definiu meu gosto pela brevidade do conto. Não preciso louvar Poe: a literatura já o faz, com sua obra firmando marcos da prosa à poesia. Esta coletânea reúne exemplares preciosos que invocam as principais facetas de sua

obra, do satírico “O sistema do dr. Alcatrão e do professor Pena”, ao investigativo “A carta roubada”, ao especulativo “Pequena palestra com uma múmia”, até obras-primas do suspense e do terror, como “A queda da casa de Usher”, “O barril de amontillado” e meu favorito, “A máscara da morte rubra””.

Eduardo Capistrano, 30 anos, é auxiliar técnico do MP-PR, lotado no Departamento de Gestão de Pessoas. Curitibano, bacharel em Direito e amante das letras, o servidor é autor de “Histórias

Estranhas” (2007) e da recém-lançada “A Quarta Dimensão” (2011), obras de contos fantásticos e histórias sobre o tempo (http://www.edcapistrano.blogspot.com/). Em 2008, foi premiado com o primeiro lugar

na categoria “Contos” no concurso “Servir com Arte”, promovido pelo Governo do Estado do Paraná. Nesta seção da Contexto, Eduardo fala de obras que marcaram sua vida pessoal e seu trabalho como escritor.

réQuIEm PArA um sONhO(“Requiem for a dream”, EUA, 2000)

“O drama chocante explora o mundo das drogas com foco sobre o casal vivido por Jared Leto (hoje mais lembrado pela banda 30 Seconds to Mars) e Jennifer Connely e a mãe do rapaz, uma

antiga beldade da televisão que sonha em retornar a um estrelato inexistente, em encarnação surpreendente de Ellen Burstyn. Arrisco-me a dizer que não há filme sobre as drogas mais capaz de transmitir toda a brutalidade do vício. A direção é de Darren Aronofsky, que tem nos presenteado com maravilhas da sétima arte, como “Pi”, “Fonte da Vida” e, mais recentemente, “Cisne Negro””.

1984 - George Orwell (2009, Companhia das Letras, 416 p.)“Considero irônico o sucesso do título do

programa Big Brother, originado nesta brutal distopia de Orwell. A obra, inspirada em

“Nós”, do russo Yevgeny Zamyatin, apresenta um país fictício governado por um regime industrialista totalitário, comandado pelo

Partido e pelo Grande Irmão, misteriosa figura que surge nas “teletelas”, lembrando a população sobre a vigilância constante do

governo. Mal sabia Orwell que a sociedade futura imporia controles mais eficientes, celebraria a vigilância através da idolização dos expostos

pela mídia e se submeteria voluntariamente à propaganda e ao consumismo”.

O hOmEm ELEFANTE(“The Elephant Man”,

EUA, 1980)“O filme todo em

preto e branco descreve a vida de

Joseph Merrick (“John”, no filme),

que desenvolveu deformações

congênitas durante a infância, encontrando trabalho como

aberração de circo antes de ser convidado a residir no Hospital de Londres, onde

permaneceu até a morte. A brilhante direção de David Lynch e memoráveis atuações de

John Hurt e Anthony Hopkins dão imediata perspectiva às nossas vidas, que deixamos ser

ocupadas, muitas vezes, com banalidades”.