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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE LINGUAGENS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DE LINGUAGEM - MESTRADO MARIA ANTONIA CORREA PRÁTICA PEDAGÓGICA REFLEXIVA EM CURSOS DE FORMAÇÃO CONTINUADA: UM ESTUDO CRÍTICO ETNOGRÁFICO Cuiabá - MT 2013

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Page 1: PRÁTICA PEDAGÓGICA REFLEXIVA EM CURSOS … · courses: an ethnographic critical study Dissertation (Master’s Degree). Federal ... potential for inclusion, since teacher’s critical

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

INSTITUTO DE LINGUAGENS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO

EM ESTUDOS DE LINGUAGEM - MESTRADO

MARIA ANTONIA CORREA

PRÁTICA PEDAGÓGICA REFLEXIVA EM CURSOS DE FORMAÇÃO CONTINUADA: UM ESTUDO CRÍTICO

ETNOGRÁFICO

Cuiabá - MT 2013

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MARIA ANTONIA CORREA

PRÁTICA PEDAGÓGICA REFLEXIVA EM CURSOS DE FORMAÇÃO CONTINUADA: UM ESTUDO CRÍTICO

ETNOGRÁFICO

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Estudos de Linguagem do Instituto de Linguagens da Universidade Federal de Mato Grosso, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Estudos de Linguagem. Área de Concentração: Estudos Linguísticos. Orientadora: Prof.ª Dra. Solange Maria de Barros.

Cuiabá-MT

2013

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Dados Internacionais de Catalogação na Fonte

Catalogação na fonte: Maurício S.de Oliveira CRB/1-1860.

C824p Correa, Maria Antônia.

Prática pedagógica reflexiva em cursos de formação continuada: um estudo

crítico etnográfico / Maria Antônia Correa. – Cuiabá, 2013.

xi, 127 f. ; 30 cm (incluem figuras e tabelas)

Orientadora: Solange Maria de Barros

Dissertação (mestrado) -- Universidade Federal de Mato Grosso, Instituto de

Linguagens, Programa de Pós-graduação em Estudos de Linguagem, Cuiabá,

2013.

Bibliografia: f. 117-121

1.Docência – formação continuada. 2. Professor reflexivo. 3.

Transformação social. I.Título.

CDU 81:371.13

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DEDICATÓRIA

Aos meus pais, que ao longo da vida

tem dedicado a mim todo amor e atenção, por

compartilharem minhas angústias e alegrias,

a minha família e amigos, dedico-lhes esta

conquista.

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AGRADECIMENTOS Obrigada Por Dar muito mais que mereço Pela força Espiritual para a realização deste trabalho Por me permitir Unir amizade, carinho e cumplicidade Pelas inúmeras vezeS que errei e pude consertar, obrigada. A Força que recebo da minha família me ajuda a caminhar, Nas pAlavras de minha mãe, no silêncio do meu pai, no carinho dos irmãos Tudo isso Me ajuda a superar as dificuldades, pois sei que não estou só. Ela é insubstituÍvel, está sempre no meu pensamento e no meu coração; O presente mais valioso e sagrado que Deus pôde me dar: minha família Agradeço por ter nascIdo neste seio familiar que sempre me ensina a amar Muito obrigado por me fAzer acreditar que sou capaz. Ao vivenciar este ano muitas amizades conquistei, outras consolidei Se o Mundo fosse feito de amigos não haveria problemas sem solução. Eu sou muIto grata por terem enriquecido meus dias, também devo a vocês Sou mais que aGradecida pelos gestos de atenção, delicadeza e respeito. Sem vocês nenhum dOs lugares por onde passei teria sentido: Cuiabá, Cáceres, RJ, SP Agradeço os benquistoS gestos, favores, empréstimos e a tábua de salvação. Caros colegas, muitas lutas ainda nos esperam, mas essa já foi conquistada NossOs caminhos se cruzaram, partilhamos muitas descobertas, desafios e conquistas Agora faz faLta o abraço que demos, as risadas nos corredores, saudades de tudo... Hoje somos diferEntes desde a primeira vez que nos encontramos. O que importa é que aGora aprendemos muito na nossa caminhada, sentirei saudades Mas o que seria das nossas vidAs sem as lembranças, de todas ficam as melhores Obrigada a cada um de vocês peloS momentos de prazeres e alegrias desta jornada. Por muitos anos, os professores têm passado por minha vida, e espero que continuem EteRnas serão as lembranças desses profissionais, da experiência de aprender QueridOs , obrigada por terem compartilhado conosco o aprendizado e sabedoria Neste dia Feliz, não tenho como deixar de agradecê-los, a todos meu respeito e afeto Todos foram Especiais à sua maneira, nos preparando para o futuro, abraços à minha Orientadora Dr.ª Solange Maria de Barros, aos professores que me acompanham desde a Minha graduação, EliaS Alves de Andrade, Ana Antonia de Assis Peterson e outros Que conheci no mestradO: professor Sérgio Flores Pedroso, Maria Inês Pagliarine Cox, Roberto Leizer Baronas, Maria Rosa Petroni, Danie Marcelo de Jesus, Claudia Graziano Paes de Barros, Simone Padilha de JEsus, Célia Maria Domingues da Rocha Reis, Manoel Mourivaldo Santiago Almeida. Vocês São muito importantes para todos nós. Muito obrigada.

Felizmente agradecer é muito bom, e eu sou abençoada por ter inúmeros motivos para fazê-lo, manifesto aqui a minha gratidão a todos os professores, colegas e funcionários do MEel. Meus respeitosos agradecimentos pela contribuição da banca examinadora, Prof.ª Dr.ª Celina Aparecida de Garcia de Souza Nascimento, Prof.ª Dr.ª Ana Antônia de Assis-Peterson e a minha orientadora Prof.ª Dr.ª Solange Maria de Barros.

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RESUMO CORREA, Maria Antonia. Prática pedagógica reflexiva em cursos de formação

continuada: um estudo crítico etnográfico. Dissertação (Mestrado). Universidade

Federal de Mato Grosso. Instituto de Linguagens. Programa de Pós-graduação em

estudos de linguagem 2013.

O presente estudo visa investigar as experiências de professores acerca da prática pedagógica reflexiva, em cursos de formação continuada, na Escola Estadual ‘Meninos do Futuro’, localizada no Centro Sócio Educativo no Complexo Pomeri, bairro Planalto, em Cuiabá/MT. A pesquisa tem como objetivos específicos: (1) Conhecer quais as reflexões dos professores acerca da sua prática pedagógica; (2) Verificar se as reflexões feitas pelos professores estão em consonância com as teorias crítico-reflexivas; (3) Compreender de que forma cursos de formação continuada contribuem para reflexões e mudanças de atitudes dos professores. Dentre os pressupostos que balizaram este estudo estão: (1) Empoderamento do professor, por meio de cursos de formação continuada, criando potencialidades para a inclusão, uma vez que o pensamento crítico do professor pode (e deve) resultar estímulo ao desenvolvimento do pensamento crítico do aluno; (2) Temas de interesse do professor, debatidos nos cursos de formação continuada, oportunizam reflexões positivas acerca da prática pedagógica na sala de aula; (3) Conhecimento de teorias críticas e reflexivas contribui para mudanças de atitudes e posturas frente à realidade. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, de cunho etnográfico colaborativo. Os dados foram coletados por meio de observação participante, com propósito de compreender o contexto da escola, incluindo anotações em um diário de campo e entrevistas gravadas em áudio. O estudo está ancorado na teoria acerca da formação crítico-reflexiva, onde o programa de formação contínua é a ideia de um processo envolvendo reflexão crítica sobre a prática pedagógica (GIROUX. 1992; CONTRERAS, 2002; BARROS, 2010). O presente estudo envolveu professores da escola em cursos de formação continuada, dentro de uma visão multiplicadora, mediando um trabalho reflexivo e coletivo. A análise dos dados amparou-se na abordagem de análise de conteúdo (BAUER e GASKELL, 2004; BARDIN, 2009; RICHARDSON, 2011) assentado em três fases cronológicas: a pré-análise, exploração do material e o tratamento dos resultados, inferência e interpretação. Dá analise depreendeu-se que os professores da Escola ‘Meninos do Futuro’ tecem reflexões a cerca da sua prática pedagógica, pautados na reflexão ‘sobre a ação’ e reflexão ‘na ação’. As reflexões feitas pelos professores, por meio da formação continuada, possibilitaram uma visão mais crítica da sua prática pedagógica, visando à inclusão dos alunos, da Escola ‘Meninos do Futuro’.

Palavras- Chave: Formação continuada; Professor reflexivo; Escola pública; Transformação social.

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ABSTRACT

CORREA, Maria Antonia. Reflexive Pedagogic Practice in continuing education

courses: an ethnographic critical study Dissertation (Master’s Degree). Federal

University of Mato Grosso. Language Institute. Post-graduation Program in 2013

language studies.

This study aims to investigate the experiences of teachers about reflexive pedagogic practice, in continuing education courses, in ‘Meninos do Futuro’ State School, located in the Social Educational Centre in the Pomeri Complex, in the Planalto district, Cuiabá/MT. The specific aims of this research are: (1) To get to know about the teachers’ reflections on their pedagogical practice; (2) To verify if the reflections made by the teachers are consonant with critical-reflexive theories; (3) To understand how continuing education courses contribute to the teachers’ reflections and changes of attitudes. Among the assumptions that guided this study are: (1) Teacher empowerment, through continuing education courses, creating potential for inclusion, since teacher’s critical thinking can (and should) result in the fostering of the development of student’s critical thinking; (2) Themes of interest to the teacher, discussed in the continuing education courses, provide opportunity for positive reflections about the pedagogical practice in the classroom; (3) Knowledge of critical and reflexive theories contributes to changes of mindset and attitudes towards reality. This is a qualitative, collaborative ethnographic research. The data were collected through participant observation in order to understand the school content, including notes in a field diary and audio recorded interviews. The study is based on the theory about the critical reflexive training, where the continuing education program is the idea of a process involving critical reflection about the pedagogical practice (GIROUX. 1992; CONTRERAS, 2002; BARROS, 2010). This study involved teachers from the school in continuing education courses, within a multiplying vision, mediating reflexive and collective work. The data analysis was based on the approach of content analysis (BAUER e GASKELL, 2004; BARDIN, 2009; RICHARDSON, 2011) in three chronological phases: the pre-analysis, exploration of the material and the treatment of the results, inference and interpretation. The analysis showed that the teachers of the ‘Meninos do Futuro’ school weave reflections about their pedagogical practice, based on reflection-on-the action’ and reflection-in-the action’. The reflections made by teachers, through continuing education, provided a more critical view of their pedagogical practice, seeking the inclusion of the students from ‘Meninos do Futuro’ school.

Keywords: Continuing Education; Reflexive teacher; Public school; Social change.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Foto 1 Corredor que dá acesso às salas de aula 57

Foto 2 Sala de aula 57

Foto 3 Piscina do Socioeducativo 57

Foto 4 Frente da unidade de internação masculina 57

Foto 5 Quadra de esportes do Socioeducativo 58

Foto 6 Entrada de uma das alas, biblioteca e sala de artes 58

Foto 7 Pátio do Socioeducativo 58

Foto 8 Pátio do Socioeducativo 58

Foto 9 Foto aérea do Complexo Pomeri 59

Foto 10 Auditório 64

Foto 11 Auditório 64

Foto 12 Livros de receitas produzidos pelos alunos 64

Foto 13 Maquete das igrejas do Rosário e Matriz confeccionada pelos alunos 64

Foto 14 Apresentação de fantoche encenada pelos alunos 65

Foto 15 Confecção de cartazes 65

Foto 16 Cenário da Paixão de Cristo confeccionada pelos alunos 65

Foto 17 Poesias compostas pelos alunos 65

Foto 18 Paçoca de pilão feita pelos alunos 65

Foto 19 Doce preparado pelos alunos 65

Foto 20 Cartaz confeccionado pelos alunos 66

Foto 21 Cartaz produzido pelos alunos 66

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LISTA DE QUADROS QUADRO 1 Tipos de modalidades analisadas neste trabalho ................................. 41 QUADRO 2 Tema dos encontros sala de professor 2011 ........................................ 63

QUADRO 3 Planejamento, realização e carga horária ............................................ 68

QUADRO 4 Planejamento do curso de Letramento Crítico - novembro 2011 .......... 69

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LISTA DE SIGLAS

CEFAPRO - Centro de Formação e atualização de Professores

CEP - Comitê de Ética em Pesquisa

CISC - Centro Integrado de Segurança e Cidadania

CONEP - Conselho Nacional de Saúde

DEA - Delegacia Especializada do Adolescente

DEDICA - Delegacia Especializada de Defesa dos Direitos da Criança e do

Adolescente

ECA - Estatuto da Criança e Adolescente

EVA - Etil Vinil Acetato

FUNDEB - Fundo de Manutenção e Desenvolvimento de Ensino Fundamental e

Valorização do Magistério

LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

OCEM- MT - Orientações Curriculares para Ensino Médio

PPP - Projeto Político-Pedagógico

PRODEAGRO - Programa de Desenvolvimento do Agronegócio

PROSOL - Fundação de Promoção Social

SEDUC-MT - Secretaria de Educação do Estado de Mato Grosso

SEJUSP - Secretaria de justiça e Segurança Pública

TCLE - Termo de Consentimento Livre Esclarecido

UFMT - Universidade Federal de Mato Grosso

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 13

CAPITULO I - BASES TEÓRICAS ............................................................................ 20

1.1 Teoria social crítica e formação de educadores na sociedade capitalista

moderna ................................................................................................................. 20

1.2 Breve histórico do pensamento reflexivo ......................................................... 23

1.3 O conceito de professor reflexivo ..................................................................... 26

1.4 Formação crítica do educador no Brasil ........................................................... 30

1.5 Formação continuada do educador de línguas ................................................ 36

1.6 Alguns aspectos lingüísticos: modalidades e pronomes .................................. 40

1.6.1: Modalidades .............................................................................................. 40

1.6.2 Pronomes .................................................................................................. 42

1.7 Formação do socioeducador: uma proposta para reflexão ............................. 43

CAPITULO II - METODOLOGIA DE PESQUISA ...................................................... 46

2.1 Abordagem qualitativa de pesquisa: etnografia colaborativa ........................... 46

2.2 Procedimentos de coleta de dados .................................................................. 50

2.3 Instrumentos para a coleta de dados ............................................................... 51

2.3.1 Da observação ........................................................................................... 51

2.3.2 Da entrevista .............................................................................................. 52

2.3.3 Dos documentos ........................................................................................ 53

2.4 Aspectos éticos ................................................................................................ 54

2.5 Contexto da pesquisa ...................................................................................... 55

2.5.1. Escola 'Meninos do Futuro' ....................................................................... 55

2.6 Entrada em campo ........................................................................................... 61

2.7 Curso de formação continuada (Sala de Professor) ........................................ 62

2.8 Atividades realizadas pelos alunos .................................................................. 64

2.9 Curso de Letramento Crítico (trabalho colaborativo) ........................................ 66

2.10 Participantes da pesquisa .............................................................................. 70

2.11 Procedimentos de análise .............................................................................. 71

CAPITULO III - ANÁLISE DE DADOS ...................................................................... 74

3.1 Professor crítico reflexivo: comprometimento em relação à prática pedagógica ... 74

3.1.1 Reflexão ‘sobre a ação’: compreensão de atitudes ...................................... 89

3.1.2 Reflexão ‘na ação’: atitudes para resolver problemas ............................. 103

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3.1.3 Algumas impressões ............................................................................... 107

CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 110

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................ 117

APÊNDICE A - Roteiro de observação participante ................................................ 123

APÊNDICE B - Questionário de perfil ..................................................................... 124

APÊNDICE C – Questões orientadoras para entrevista semi-estruturada. ............. 125

APÊNDICE D – Termo de Consentimento Livre Esclarecido – TCLE ..................... 126

ANEXO A – Termo de aprovação ........................................................................... 128

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INTRODUÇÃO

Este estudo tem como objetivo investigar as experiências de professores

acerca da prática pedagógica crítico-reflexiva. Os educadores trabalham com

adolescentes e jovens, em contexto de exclusão social. A investigação foi realizada

na Escola Estadual ‘Meninos do Futuro’, localizada em Cuiabá, capital mato-

grossense. Por meio de pesquisa qualitativa, de cunho etnográfico-colaborativo,

procurei analisar as percepções e atitudes dos professores sobre a prática

pedagógica crítico-reflexiva.

Nas últimas décadas, muito tem se discutido a respeito da formação

continuada de professores (cf. PIMENTA, 2005; GATTI, 2009, entre outros). Por

melhor que seja a formação inicial, o professor precisa de um acompanhamento

contínuo, servindo de base para que ele possa atender as necessidades que lhe são

exigidas para o desenvolvimento da qualidade da educação, pautado no seu

desenvolvimento profissional.

A partir da década de 80, com vistas a suprir as necessidades do professor,

muitas vezes relacionadas à sua formação inicial, ocasionou o surgimento de

programas de educação continuada pelo Ministério da Educação, com intuito de

complementar o conhecimento do docente. Em decorrência das experiências da

década de 80, nos anos 90 foi aprovada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação -

LDB (Lei n. 9394/96) que ocasionou impulsos na formação continuada, promovendo

a valorização dos profissionais da educação, com concepção de desenvolvimento

contínuo ao longo da vida profissional. Com isso, surgiram modelos de formação

pautados na prática crítico-reflexiva, valorizando o trabalho coletivo, muitas vezes

realizado no próprio espaço escolar. Foi o caso deste estudo, onde a pesquisa foi

realizada durante o curso de formação continuada dos professores.

Os novos paradigmas da formação continuada, particularmente, a Sala de

Professor, tem oportunizado aos educadores momentos de discussões críticas e

reflexivas. Parece redundante falar em professor critico-reflexivo, uma vez que tanto

a reflexão quanto a critica são qualidades inerentes aos seres humanos. Porém,

para estudiosos como (CONTRERAS, 2002; PIMENTA, 2005; LIBÂNEO, 2011) entre

outros, a reflexão crítica relaciona-se a uma reflexão com objetivos específicos, em

que o professor reflete sobre sua prática com o objetivo de (re) significar a sua

prática.

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No âmbito do Estado de Mato Grosso novas políticas de qualificação

profissional passaram a ser implementadas pela Secretaria de Estado de Educação

– SEDUC. Com a publicação do documento OCEM/MT, as escolas passaram a se

organizar em um plano de formação continuada, visando à melhoria da prática

pedagógica. O objetivo é preparar o educador para as mudanças que ocorrem no

âmbito educacional. Entendo ser necessário associar a atuação do professor ao

contexto em que exerce sua profissão, ou seja, o lugar onde ocorrem suas

experiências, o espaço escolar em que atua. Muitas vezes, essas experiências

enraízam-se no processo histórico de atuação do professor, somando-se com a sua

vivência como aluno.

Muitas vezes, essas experiências vão sendo internalizadas e nem sempre

passam por um processo de reflexão por parte do professor. Assim, muitos dos

conhecimentos adquiridos vão influenciando nas suas decisões e ações de maneira

inconsciente. Contudo, importa entender a relação entre o conhecimento do

professor e as teorias relacionadas à formação continuada deste, voltando-se para a

qualidade da educação e os fatores que podem influenciar no sucesso da prática

docente. Nesses termos, pesquisar a formação continuada associada ao

pensamento crítico-reflexivo do professor pode oportunizar a compreensão da

complexidade da reflexão crítica relacionada à prática docente.

Dentre as pesquisas relacionadas ao tema de formação continuada está o de

(MATTOS, 2010; SOUZA, 2008) cujos objetivos visam analisar os dizeres de

professores da escola pública em processo de formação crítico-reflexiva. Os

resultados dessas pesquisas apontam as consonâncias e dissonâncias encontradas

nos dizeres dos professores em processo de transformação dentro do paradigma

crítico-reflexivo, em que relatam possíveis contribuições para o aprimoramento da

práxis docente.

Em alguns aspectos, essas pesquisas se assemelham a este estudo, por

relacionar a reflexão crítica ao processo de ensino aprendizagem, bem como por

trabalharem com professores da escola pública e por pautarem as falas dos

professores dentro do arcabouço teórico pertinente à prática docente crítico-

reflexiva. No entanto, em alguns aspectos diferenciam-se, pois, as pesquisas

pautadas na reflexão, mesmo sendo aplicados em escolas públicas, não estão

voltados para contextos de socioeducação, com é o caso desta pesquisa.

Ainda sobre a questão da formação continuada, o trabalho de Crozatto

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(2011) é relevante, pois abrange a formação continuada envolvendo a linguagem.

Traz em seus objetivos, identificar as possíveis contribuições da formação

continuada à prática do professor, o que se aproxima dessa pesquisa. Os resultados

mostram que a formação continuada do professor é condição básica para a reflexão

da prática pedagógica e que estas contribuem para que os professores repensem e

aprimorem as ações didático-pedagógicas do cotidiano escolar. Ressalta que os

professores valorizam a formação e que essa proporciona a troca de experiências.

Essas pesquisas também engendram o desejo em valorizar a formação continuada

do professor, para se repensar e melhorar a sua prática em sala de aula na rede

pública de ensino.

No entanto, pesquisas relacionadas à escola pública e que atende

instituições socioeducativas, como a de (NASCIMENTO, 2011) apresentam

semelhanças e dissemelhanças com esta pesquisa. O estudo realizado pela

pesquisadora buscou interpretar as representações de professores e alunos. Ambas

as pesquisas assemelham-se por estarem presentes em ambiente socioeducativo.

Porém, diferenciam-se por este estudo pautar nas reflexões dos professores em

contexto de formação continuada.

O estudo de (XAVIER; LEIRO, 2011) também se volta para escolas que

atuam em unidades socioeducativas; porém tem como objetivo comparar práticas

pedagógicas de professores em duas unidades de ensino. Tal estudo, por exemplo,

mostrou como a formação continuada de professores pode influenciar as práticas

pedagógicas com jovens privados de liberdade. Assemelha-se a este estudo quando

os professores também apresentam uma prática de escuta e de construção de

vínculo na tentativa de unir o que precisa ensinar para os jovens com aquilo que ele

deseja aprender, fortalecendo o interesse pela escola e criando estratégias didáticas

que mobilizam um fazer diferenciado. Assim, utilizam variados materiais didáticos

para alcançar a realidade dos jovens.

O interesse pelo tema desta pesquisa relaciona-se às minhas vivências

profissionais. Desde a minha graduação em Letras (Português/Inglês), na

Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) em 2007 atuei como professora nas

turmas do Ensino Fundamental e Médio da rede pública de ensino, reconhecendo

fundamentalmente a relevância que a formação continuada acrescenta na prática

pedagógica do professor. A experiência em sala de aula possibilitou-me refletir

acerca dos problemas que afetavam o meu desempenho na prática pedagógica,

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onde buscava sempre refletir sobre metodologias que pudessem orientar-me em

sala de aula.

Em decorrência de inúmeras indagações e discussões em ambiente de

trabalho, percebi os pressupostos da formação continuada crítico-reflexiva,

implantada no Brasil a partir da década de 90, em decorrência das mudanças

sociais, quando a educação recebia destaque. Chamou-me atenção esta temática

por constituir-se nas ultimas décadas em possibilidade para a melhoria da qualidade

do ensino, elemento central das reformas educativas.

Neste contexto, discutir a formação continuada do professor é como tratar de

sua competência profissional. As trocas de experiências sobre como se preparar

para dar conta do conjunto de atividades educativas capazes de preparar os alunos

para a convivência em sociedade. Para tanto, é necessário compreender a formação

a partir do professor, seus saberes e suas práticas.

Como aluna de mestrado da área de Estudos de Linguagens, o meu olhar se

voltou para a formação continuada do profissional de educação da rede púbica de

ensino. Mais especificamente da Escola Estadual de 1º e 2º Graus ‘Meninos do

Futuro’ do Centro Sócio Educativo de Cuiabá-MT, onde há professores trabalhando

com jovens em situação de vulnerabilidade social. A preocupação relacionada à

formação de professores tem sido a tônica dos debates envolvendo pesquisadores

como Barros (2010), Pimenta (2005) entre outros. Cada vez mais a questão do

professor como um profissional crítico e reflexivo merece atenção desses

estudiosos.

Compreender a formação do educador crítico-reflexivo, bem como as ações

resultantes desta no processo ensino-aprendizagem, em contexto de exclusão

social, certamente promoverão reflexões não apenas a esta pesquisadora, mas

também aos professores da escola ‘Meninos do Futuro’. A meu ver, o professor é o

centro do processo de formação continuada, atuante como um sujeito que age tanto

de forma individual quanto coletiva, participante da prática que ele pesquisa e

constrói. Como afirma Perrenoud (2002, p. 23) “a formação continuada trabalha com

aqueles que estão exercendo sua função, que tem anos e mesmo décadas de

experiência; desta forma, a formação reflexiva encontra um terreno privilegiado entre

eles”.

Este estudo encontra-se fundamentado nas teorias críticas educacionais.

Mais especificamente, nos conceitos acerca da reflexão crítica da pratica

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pedagógica. Entendo que, para ser crítico, o professor deve refletir sobre aspectos

socioeconômicos, culturais, políticos e ideológicos do contexto da sua práxis

educativa.

Objetivos do estudo

Neste estudo, alguns objetivos estão assim delineados:

(1) Identificar quais as reflexões dos professores acerca da sua prática pedagógica;

(2) Verificar se as reflexões feitas pelos professores estão em consonância com as

teorias crítico-reflexivas;

(3) Compreender de que forma cursos de formação continuada contribuem para

reflexões e mudanças de atitudes dos professores.

Com base nesses objetivos, as seguintes perguntas norteiam esta pesquisa:

(1) Quais são as reflexões feitas pelos professores acerca da sua prática

pedagógica?

(2) As reflexões empreendidas pelos professores estão em concordância ou

discordância em relação às teorias crítico-reflexivas?

(3) De que maneira a participação desses professores, em cursos de formação

continuada, no contexto da escola, contribuiu para uma postura mais crítica? As

reflexões feitas por eles influenciam sua prática docente?

Alguns pressupostos balizaram este estudo

(1) Empoderamento do professor, por meio de cursos de formação continuada,

criando potencialidades para a inclusão, uma vez que o pensamento crítico do

professor pode (e deve) resultar estímulo ao desenvolvimento do pensamento crítico

do aluno;

(2) Temas de interesse do professor, para serem discutidos e debatidos nos cursos

de formação continuada, oportunizam reflexões positivas a cerca da prática

pedagógica na sala de aula;

(3) Conhecimento de teorias críticas e reflexivas contribui para mudanças de atitudes

e posturas frente à realidade.

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Do ponto de vista metodológico, optei pela pesquisa de cunho etnográfico

colaborativo. Estabeleceu-se uma parceria com os professores da escola de forma

que pude envolver-me, juntamente com eles, no curso de formação continuada.

Assim, tanto esta pesquisadora quanto os professores contribuíram, mutuamente,

para aquisição de novos conhecimentos.

Esta dissertação está organizada em três capítulos. O capítulo I é dedicado à

fundamentação teórica. Inicialmente, discorro a respeito da teoria crítica, sua origem

e contribuição para a educação. Em seguida abordo a questão do pensamento

reflexivo. Discuto, ainda, o conceito de professor reflexivo, ancorado no

conhecimento de reflexão na ação. Apresento os conceitos de professor crítico e sua

relevância na prática pedagógica. São feitas considerações a respeito da formação

continuada de professores, contextualizando seu percurso no Brasil e em Mato

Grosso. O capítulo se encerra com reflexões acerca da formação do socioeducador.

No capítulo II é apresentada a metodologia utilizada nesta pesquisa, a

abordagem elencada para este estudo, os procedimentos da coleta de dados, os

instrumentos de coleta utilizados, são apresentados os aspectos éticos, não sem

discorrer dos participantes da pesquisa, versa-se sobre a entrada em campo,

encerrando com o método eleito para a análise dos dados.

No capítulo III apresento a análise dos dados. Utilizei a análise de conteúdo,

com a leitura flutuante e organização dos dados, fases em que estes foram

codificados e categorizados para posterior interpretação dos mesmos. A análise

pauta-se na interpretação de significados presentes nos enunciados dos

professores, destacando-se alguns itens lexicais que melhor contribuíssem para a

compreensão dos sentidos. Por último, teço algumas considerações finais com

possíveis contribuições.

Vale salientar aqui, que, como esta pesquisa buscou compreender as

reflexões a respeito do pensamento crítico e reflexivo dos professores, em apenas

uma unidade escolar, não é possível fazer generalizações. Como afirma Pfaff (2010),

nas pesquisas etnográficas estudam-se contextos específicos e suas peculiaridades.

Independente do objeto de estudo etnográfico nas escolas, os pesquisadores

precisam lidar com algumas particularidades da escola como um campo social, as

quais têm impacto sobre o processo da pesquisa.

A partir dos resultados apresentados neste estudo, outros questionamentos

poderão ser suscitados, instigando a novas investigações, principalmente, sobre o

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trabalho realizado por professores que atuam em instituições socioeducativas, por

constituir-se um contexto social de risco, envolvendo jovens que convivem em

ambiente de exclusão social.

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CAPITULO I - BASES TEÓRICAS

Neste capítulo, apresento as bases teóricas deste estudo. Na primeira

seção, verso sobre a teoria crítica da sociedade, sua origem e contribuição para a

educação. Em seguida, discorro sobre o pensamento reflexivo, abordando o

conceito de professor reflexivo. Entreabro a noção de professor crítico,

considerando-a relevante para a prática do profissional docente. Teço considerações

a propósito da formação continuada de professores, contextualizando seu percurso

no Brasil e em Mato Grosso. Apresento, ainda, contribuições teóricas sobre a

linguagem focalizando os elementos léxico-gramaticais. E, por último, descortino

reflexões acerca da formação do socioeducador.

1.1 Teoria social crítica e formação de educadores na sociedade capitalista moderna

A teoria crítica se remete à teoria da sociedade, cujo propósito é a

emancipação e o esclarecimento, ao tornar os agentes cientes de coerções ocultas,

libertando-se assim dessas amarras, deixando-os em condições de determinar onde

se encontram seus verdadeiros interesses. A teoria crítica teve início com um

ensaio-manifesto, publicado por Max Horkheimer em 1937, com o título Teoria

Tradicional e Teoria Crítica (PRESTES, 1994).

A teoria crítica tem como objetivo emancipar o homem por meio da

transformação da realidade social, cuja teoria está associada à Escola de Frankfurt.

Consoante Giroux (1997, p. 22), “[...] o conceito de teoria crítica refere-se à natureza

de crítica autoconsciente e à necessidade de se desenvolver um discurso de

transformação social e de emancipação que não se afere dogmaticamente a seus

próprios princípios doutrinários”.

A escola de Frankfurt diz respeito a uma escola de teoria social, associada

ao Instituto para Pesquisa Social da Universidade de Frankfurt. Inicialmente, era

composta por cientistas sociais marxistas que acreditavam em alguns seguidores de

Karl Marx. Contudo, alguns teóricos, como Erich Fromm, Hevert Marcuse e Theodor

Adorno, perceberam que a teoria tradicional marxista não explicava o

desenvolvimento da sociedade capitalista do século XX. Com o intuito de preencher

as omissões do marxismo tradicional, os teóricos de Frankfurt procuraram extrair

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informações de outras escolas do pensamento subsidiadas pela sociologia, pela

psicanálise, como a filosofia existencialista (GIROUX, 1997).

Assim como Marx, os teóricos de Frankfurt se preocupavam, com as

condições que permitiam mudanças sociais e sua ênfase no componente crítico da

teoria. Buscavam associar pensamento prático e normativo para que assim fosse

possível explicar o que estava errado com a sociedade, objetivando a emancipação

dos seres humanos daquilo que os escravizam. Giroux (1997) aponta, como

exemplo, que os estudantes da classe trabalhadora, as mulheres, os negros, em

meio a outros, precisam afirmar sua própria história. Isto poderia ofertar aos

estudantes que, tradicionalmente, não têm voz nas escolas, condições de

confrontar-se com aquilo que a sociedade faz deles. O que precisam é rejeitar ou

afirmar sua própria história, para que possam iniciar um processo de lutas habilitado

a viver uma existência auto-dirigida.

Na concepção de Souza Santos (2007) importa uma inovação teórica,

pautada na construção da emancipação, assentada numa nova relação entre o

respeito da igualdade e o princípio do reconhecimento da diferença. O autor ressalta

a relevância da construção teórica em que as duas estejam presentes, afirmando

que o importante não é a hegemonização, mas as diferenças iguais. Enfatiza, da

mesma forma, que devemos tentar uma renovação teórica nas sociedades

capitalistas, que, vale acrescer, abrigam vários sistemas.

Os sistemas aos quais Souza Santos (2007) alude, reduzem-se a dois: de

desigualdade e o de exclusão. A relação de desigualdade, nas sociedades

capitalistas, está relacionada com capital/trabalho. Caracteriza a desigualdade como

um sistema de domínio hierarquizado, em que aquilo que está embaixo está dentro,

não sem assinalar que, para o sistema funcionar, tem que estar dentro.

Já o sistema de exclusão se qualifica quando o que está embaixo está fora,

ou seja, não existe assim um sistema de exclusão propriamente dito, dado que se

pauta por não estar alinhado com o controle social, quando alguém fica totalmente

de fora. Mesmo sem teorização, Souza Santos (2007, p. 63) afirma:

Cada vez mais gente passa do sistema de desigualdade ao sistema de exclusão; de estar dentro de uma maneira subordinada a estar fora, a sair do controle social, da sociedade civil: são os desocupados que não têm esperança de voltar a ser ocupados; e os jovens em milhares de guetos urbanos das grandes cidades.

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Com o crescimento da riqueza e da economia, atualmente, a sociedade se

encontra em uma situação nova, qual seja a de se libertar de uma sociedade rica,

que se desenvolve nas necessidades materiais do homem. Talvez sejamos de uma

sociedade de indivíduos livres, na linha do que argumenta Bauman (2001, p. 23):

“Sentir-se livre significa não experimentar dificuldade, obstáculo, resistência ou

qualquer outro impedimento aos movimentos pretendidos ou concebíveis”.

Contudo, isso não significa que nossa sociedade tenha suprimido o

pensamento crítico, ao contrário disso, fez da crítica da realidade a expressão de

insatisfação. Somos seres reflexivos que, muitas vezes, não concordamos com os

resultados, porém essa reflexão não vai longe o suficiente para alcançar os

resultados esperados.

Seguindo os pressupostos da Escola de Frankfurt, a teoria crítica em muito

contribui para a educação. Na esteira do pensar de Maar (2008), emerge uma

explicitação entre o que é e o que deveria ser, entre aparência e essência, não

esquecidos de que a essência da educação estaria na emancipação. Nesse viés, a

educação associada à teoria crítica estabeleceria a produção de consciência

albergando significado político. Como ilumina Maar (2008, p. 61) “neste sentido,

mais do que buscar uma proposta pedagógica na teoria crítica, cabe aprendê-la

globalmente como abordagem formativa, educacional, da sociedade

contemporânea”.

Ao se reportar à educação humana, os frankfurtianos concebem o processo

educacional como um conjunto de objetivos e ações, cujos problemas devem ser

resolvidos por meio de reflexões de si mesmo. O principal problema está centrado

na formação, que, não raro, faz dos indivíduos sujeitos passivos e conformistas em

relação à realidade que vivem. Contudo, a educação deve ensejar aos homens a

autorreflexão crítica, a emancipação e a autonomia intelectual e política. Assim, a

escola deve estar comprometida com o conhecimento científico, além de auxiliar os

alunos na construção de ideias. Fiquemos com Prestes (1994, p. 98):

A escola deve, portanto, ter compromisso com a constituição das estruturas mentais, com a formação de sujeitos capazes de operar formalmente para que se criem as condições necessárias à tomada de consciência e, de forma articulada com a prática, se dê a ruptura com o caráter ideológico, mistificador de uma racionalidade que desumaniza.

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Com efeito, é relevante a preocupação do professor em relação ao

desenvolvimento do pensamento crítico de seus alunos, convidando-os a trilhar o

caminho da autonomia, cujo processo de construção intelectual deve ser mediado

pelo professor. Porém, os alunos devem ser conscientes e pensar por si mesmos, de

maneira crítica e autônoma. Em adendo, Guess (1988) pontua que aquilo que se

espera de uma teoria crítica é a autoconsciência de um processo satisfatório de

esclarecimento e emancipação.

Para se chegar a um estado de esclarecimento e emancipação, a teoria

crítica ressalta a relevância da autorreflexão, pois, ao refletir, cada individuo percebe

sua forma de consciência que, aqui e ali, se faz imposta. Uma vez que se percebe

isto, a coerção perde seu poder e o indivíduo é emancipado. No entender de Guess

(1988, p. 141),

A emancipação aqui em questão deve ser emancipação ‘real’. Ou seja, não basta que os agentes oprimidos cessem de colaborar voluntariamente com sua própria frustação, deve haver uma mudança nas instituições sociais básicas que suprima o sofrimento vivido e a restrição das possibilidades humanas que motivaram os agentes a adotar a teoria crítica.

Contudo, se o indivíduo está em situação de ilusão ideológica, ou seja, não

está esclarecido, através da reflexão lhes é mostrado a ele o sentido de engano. Daí

é de salientar a importância da reflexão no processo de emancipação. A teoria crítica

é reflexiva, pois encerra também uma concepção voltada às teorias sociais, o modo

como elas surgem e como podem ser explicadas, o que revela a importância da

reflexão para a teoria crítica. Salienta-se neste estudo a relevância do conhecimento

reflexivo e suas influências no processo do pensamento do indivíduo.

1.2 Breve histórico do pensamento reflexivo

De forma singular, pensamento é tudo o que nos ocorre à mente. Em muitos

casos, trata-se de pensamento sem importância, o que, segundo Dewey (1933, p.

12) traduz “o ato de pensar ao acaso”. Pode significar devaneios, construção de

fantasias, recordações, ou seja, pensamentos sem sequência lógica que perpassam

pela mente. Na visão de Lipman (1994), pensar é uma arte, e cada artista procede

de modo diferente.

Ao contrário, o pensamento reflexivo, este o entendimento de Dewey (1933,

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p. 12), “tem sequência lógica, não sendo meramente uma sucessão de ideias”. Não

basta pensar em alguma coisa casualmente, pois a reflexão não é apenas sucessão,

e sim uma série lógica de ideias, de modo que uma produza a seguinte como

sequência natural, articulando-se com a ideia anterior.

Deste modo, os anéis da corrente do pensamento reflexivo advêm dos atos

ou fatos do passado que fornecem elementos para concluir algo com relação ao

presente e ao futuro, dando origem aos atos imediatos. As ideias não vão e vêm.

Cada fase do raciocínio é um passo em direção ao outro; cada termo contribui para

o termo seguinte.

Para Dewey (1933, p. 14), “o pensamento reflexivo aspira sempre a chegar a

uma convicção”. Dessa forma, as belas histórias contadas pelas crianças, embora

coerentes, o que se assemelha ao pensamento reflexivo, não aspiram a atingir

conhecimento ou verdades, por isso não se confundem com o pensamento reflexivo.

A bem dizer, os que manifestam tais pensamentos não pretendem que venhamos a

acreditar no que contam. Pretendem, sim, ser admirados pela narrativa. Esses

pensamentos se desenrolam brilhantemente, dos sentimentos associados à

emoção, o que auxilia tal propósito. O pensamento reflexivo examina o

conhecimento, apoiado nos argumentos que sustentam os fatos requerendo um

esforço consciente e voluntário.

Contudo, pode-se dizer que há tipos de pensamento. Entre eles, um

elemento em comum: não existem linhas divisórias entre as variações de

pensamento. Essas diversas espécies de pensamentos se misturam, o que pode

gerar dificuldades no desenvolver bons hábitos de pensamento. Tomemos em conta

um caso rudimentar de pensamento que, segundo Dewey (1933), se encaixa entre o

exame da evidência e uma série de fantasias inconscientes.

De repente, uma pessoa, ao passear, sente uma brisa fria, olha para o céu e

percebe que este se encontra com nuvens escuras. A primeira coisa que se lhe

esvoaça no pensamento é que vai chover. Então, questiona-se: pode-se dizer que

houve um pensamento? Dewey (1933) afirma que nem o ato de passear nem a

sensação de frio constituem pensamentos. O que pode ocorrer é que a chuva foi

sugerida pelas sensações. Ao sentir frio, a pessoa automaticamente pensou nas

nuvens e numa possível chuva.

Este caso, segundo Dewey (1933), pode assemelhar-se ao de quando

contemplamos uma nuvem que nos lembra uma forma ou um rosto humano, pois,

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em ambos os casos, tanto com a convicção quanto com a fantasia, o pensamento se

acorrenta à ideia de uma coisa observada. Junto com o fator semelhança, paira a

dissemelhança, quando não se crê que seja realmente um rosto a ser visto na

nuvem. Dessa forma, não existe um pensamento reflexivo.

Enquanto a iminência da chuva representa a possibilidade de um

acontecimento, a nuvem observada não significa nem indica a existência de um

rosto. Esta apenas sugere, ao passo que o frio oferece indícios de possível chuva.

Uma coisa nos faz pensar em outra. Há a relação entre algo visto e algo sugerido.

Assim, Dewey (1933) aponta que, por reflexão, está subentendido que se crê ou não

em alguma coisa, não apenas por causa dela, mas por meio de outra que sirva de

prova e garantia, sendo considerado o fundante daquilo que se crê, ou seja, da

crença. Desse modo, as convicções que apenas induzem a algo não se revestem de

segurança absoluta.

Em toda operação reflexiva existem vários aspectos exteriores ao

pensamento que revelam subprocessos como um estado de perplexidade, hesitação

ou dúvida. Os atos de pesquisa ou investigação têm o fim imediato de descobrir

outros fatos que sirvam para colaborar ou destruir a convicção sugerida. Assim, na

trilha de Dewey (1933, p. 20), dizer: “penso que será assim” está a subentender que

não se sabe ainda como será. Em complemento, as convicções poderão ser

confirmadas mais tarde e conferir absoluta certeza, mas enquanto isso não se dá,

será, até certo ponto, apenas hipótese.

Dewey (1933, p. 20) assinala “a importância da certeza” como elemento do

pensamento reflexivo. No exemplo em passo anterior citado, a propósito da

sensação de frio, há um momento de confusão, quando momentaneamente, se

suspende a convicção anterior no tocante ao tempo não estar frio. Surge à

necessidade de explicar, identificar ou localizar a mudança de temperatura, e isso

propõe a reflexão como meio para eliminar a incerteza surgida.

Neste caso, Dewey (1993) elucida que houve uma investigação com o fim

de descobrir provas. Virar a cabeça, erguer o olhar e observar o céu são atos de

investigação que podem responder à sensação de frio. Os fatos insinuam a ideia de

nuvens. O ato de olhar para o céu era um modo de confirmar que a explicação

aventada não se distanciava da realidade, algo de bem alvitre, portanto.

O ato de olhar pode ser considerado uma investigação, uma pesquisa, tendo

como objetivo obter ou não a confirmação da convicção sugerida, o que confirmaria

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a ideia de possível mudança de tempo. A reflexão fará o indivíduo se esforçar para

pinçar outras informações que sanem suas dúvidas. Assim, a necessidade de

solucionar uma dúvida é o fator básico e orientador em todo o mecanismo da

reflexão. O ato de pensar desta forma é regulado por seus objetivos, conforme

assegura Dewey (1933).

1.3 O conceito de professor reflexivo

Inúmeras considerações importantes são feitas a respeito do conceito de

professor reflexivo. O mesmo é discutido desde a década de 30 do século passado,

por John Dewey. A partir de então, pesquisadores se ancoram nas concepções

teóricas do movimento reflexivo. Donald Schon, formado em filosofia, mestre e

Ph.D., em seu trabalho, na qualidade de pesquisador, dedicou-se ao aprendizado

organizacional e à eficácia profissional, discutindo o modelo da prática reflexiva

ancorada nos conceitos de conhecimento na ação, reflexão na ação, reflexão-sobre-

a-ação e reflexão sobre-a-reflexão-na-ação (SCHON, 2000).

Tendo em conta as ideias de Schon (2000) “conhecer-na-ação” se relaciona

com inúmeras atitudes ou atos diários. As pessoas conseguem realizar atividades

que não são capazes de explicar e, quando os tentam, incidem em erros. Isto pelo

fato de que o conhecimento está implícito nas ações, o que causa incoerência nas

explicações pelo que está sendo feito. A isso Schon (2000, p.31) chama de

“conhecer-na-ação”. Ou seja, são conhecimentos revelados em nossas

performances físicas, publicamente observáveis, como andar de bicicleta, que

podem ser explicados pela ação. O ato de conhecer reside na ação, o autor acentua

que esta característica é nossa, vale dizer, sermos incapazes de tornar tal ação

verbalmente explícita.

Dessa forma, executamos diversas atividades complexas sem dar uma

descrição verbal adequada, em que estas encartam diferentes tipos e seguem

procedimentos, sequências de operações e pressupostos que formam nossa teoria.

Para Schon (2000, p.31),

[...] qualquer que seja a linguagem que venhamos a empregar, nossas descrições do ato de conhecer-na-ação são sempre construções. Elas são sempre tentativas de colocar de forma explícita e simbólica um tipo de inteligência que começa por ser

tácita e espontânea.

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Já a reflexão sobre-a-ação ocorre quando, após um fato esperado, se

medita retrospectivamente sobre a atitude tomada a tal respeito. A isso Schon (2000)

chama de “refletir sobre a ação”. O autor também aponta a alternativa de poder-se

refletir no meio da ação sem interrompê-la, ao que ele chama de “reflexão-na-ação”.

Igualmente, corrobora ser “um período de tempo variável com o contexto, durante o

qual ainda se pode interferir na situação em desenvolvimento” (SCHON, 2000, p.

32). Esta maneira de pensar milita para dar nova forma ao que se está fazendo,

enquanto ainda o faz. Assim, o profissional trabalha o problema no momento em que

este ocorre.

Na linha do pensamento de Schon (2000), que conceituou explicitamente a

figura do profissional reflexivo, Perrenoud (2002) também tece considerações

importantes a respeito do conceito, enfatizando a significância da reflexão durante a

ação. Pondera que “consiste em perguntar o que está acontecendo ou o que vai

acontecer, o que podemos fazer o que devemos fazer, qual é a melhor tática, que

desvios e precauções temos de tomar, que riscos corremos” (PERRENOUD, 2002,

p.30).

A partir daí, pode-se inferir referência à prática reflexiva, valorizando a

relação com a realidade vivenciada, que, muitas vezes, encerra algo que não se

espera. Vimos, em Schon (2000), que a ação pode se desenvolver em questão de

segundos. A esse respeito, Perrenoud (2002) afirma que depende da forma como se

considera a ação, ou seja, se ela é pontual ou uma estratégia em longo prazo.

Sendo pontual, resolve-se a questão de imediato. Se de longo prazo, as ações se

dividem.

Na visão de Perrenoud (2003) refletir sobre a ação consiste no fato de que o

indivíduo toma sua própria ação como objeto de reflexão, de modo que pensa no

que poderia ou deveria ter feito. Assim, depois de efetivar a ação, a reflexão sobre

ela tem sentido para compreender o que aconteceu. Consoante Perrenoud (2002, p.

31), a reflexão sobre a ação se relaciona com “questões que não podem ser tratadas

naquele momento, mas às quais o profissional promete retornar 'com a cabeça fria'.

Ele não faz isso com regularidade, em contrapartida, esta é uma das fontes da

reflexão sobre a ação”.

Diferentemente, na reflexão havida no decorrer da ação, o profissional

pedagógico tem pouco tempo para meditar. Necessariamente se reflete para tomar

uma decisão logo em seguida, como exemplifica Perrenoud (2002, p. 33):

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Interromper ou não uma conversa, iniciar ou não um novo capítulo antes do final da aula, aceitar ou não uma desculpa, punir ou não um aluno indisciplinado, responder ou não a uma pergunta insolente, idiota ou descontextualizada, permitir ou não que um aluno se retire da sala de aula, etc.

Assim, a reflexão durante a ação é rápida, quando o processo de decisão

não acolhe opinião de terceiros, nem mesmo se tem um tempo mínimo para pensar,

o que induz se deve ou não tomar uma decisão. Por outras palavras, no momento da

ação, é possível decidir agir de forma imediata ou adiar para que se possa refletir

mais tranquilamente. Em algumas situações, é justificável adiar uma resposta.

O professor, quando sente que uma ação rápida demais não seria adequada, tendo em vista que ele está sob o império da emoção, ou que não possui todos os elementos de apreciação, para tomar uma decisão com pleno conhecimento de causa, por vezes, pode dizer abertamente aos alunos: 'não sei. Vou refletir. Amanhã lhes direi minha decisão'. Em outras situações, esse pensamento não é manifestado em voz alta (PERRENOUD, 2003, P. 34).

No caso de professores que já convivem com situações problemáticas

repetidas rotineiramente, como aquelas de sala de aula em que afloram

comportamentos, a exemplo da falta de respeito do aluno para com o colega, de

atrasos e outros fatos que conduzem o professor a uma prévia opinião a respeito da

turma. Tais condições contribuem para que a reflexão na ação do professor o induza

apenas a decidir se deve agir de forma imediata ou adiar a fim de que possa refletir

tranquilamente em momento posterior.

Em alguns casos, o docente se distancia da ação, não interagindo de

imediato com os alunos. Este posicionamento é tomado para que possa refletir sobre

o que aconteceu e sobre a forma como agiu para decidir o modo como deve

enfrentar o problema. Nessa marcha, a reflexão se revela uma retrospectiva, ligando

o passado ao futuro, que ajuda o profissional a fazer um balanço e a compreender o

que deu e o que não deu certo. A este processo, Perrenoud (2002) chama de

reflexão distante do calor da ação.

Nem sempre essa reflexão é tranquila, podendo ocorrer em vários

momentos importantes e roubar o tempo livre dos professores, seja em conversas

com colegas, seja no trânsito, às vezes em seu momento de intervalo, às vezes no

“meio do dia”, quando não no final de sua jornada de trabalho escolar. De raro em

raro, resulta de um problema que deve ser resolvido às pressas como, seja exemplo,

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a suspeita relativa à realização de um trabalho entregue pelo aluno. Devido ao fluxo

dos acontecimentos de sala de aula, a reflexão a esse propósito pode ser

interrompida, por necessitar que se iniciem outras decisões e reflexões.

O termo reflexão entreabre alguns significados relevantes. Segundo

Perrenoud (2002, p. 31), reportando-se a reflexões, esclarece: “em francês, esse

adjetivo tem uma forte conotação de sabedoria, tem muitas semelhanças com

aquele que conta até cem antes de falar” e medita longamente antes de agir.

Acredita-se que essa deve ser a atitude esperada dos profissionais da educação,

que, a todo momento, precisam agir embebidos de sabedoria.

Isso sobreleva a relevância da formação sobre a prática reflexiva, que

oriente o professor tanto na competência como na consciência profissional, para que

este continue avançando, perseguindo as boas causas, mesmo quando não passa

por dificuldades. Assim, a formação reflexiva não constitui somente um processo de

aperfeiçoamento profissional, mas também transformação das práticas que

constituem a cultura escolar. Consoante Perrenoud, (2002, p. 52):

[…] um profissional reflexivo nunca deixa de se surpreender, de tecer vínculos, porque o que ele observa alude aos seus marcos conceituais, que podem provir de uma longa prática reflexiva pessoal e de saberes privados, que ele permitiu ser construída ao longo dos anos. Em geral, a reflexão é mais fecunda se também for cultivada com leituras, formações e saberes acadêmicos.

Pimenta (2005, p.18) ilustra que “todo ser humano reflete. Aliás, é isso que o

diferencia dos demais animais. A reflexão é atributo dos seres humanos.” A autora

contextualiza o conceito de professor reflexivo argumentando que só a reflexão não

basta. O professor precisa ser capaz de tomar decisões que não fiquem

condicionadas ao contexto em que atuam. Dessa forma, a prática reflexiva não é

individual. A reflexão deve gerar uma mudança institucional.

O estabelecimento da prática reflexiva na educação valoriza a produção do

saber docente e supervaloriza o professor como indivíduo. Assim, Pimenta (2005)

descortina algumas preocupações, como um possível individualismo que poderia

gerar uma reflexão em torno de si próprio, levando a um estancamento da reflexão

para resolver os problemas na prática. Isso pode gerar um modismo e a banalização

da perspectiva da reflexão. Contudo, Pimenta (2005, p. 23) sinaliza que “só a

reflexão não basta, é necessário que o professor seja capaz de tomar decisões

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concretas”. Então, percebe-se que não se pode ignorar o contexto ao qual o

professor está inserido, ou seja, o contexto institucional, e imaginar uma prática

reflexiva individualizada, concernente à instituição em que está inserido.

Ao discorrer sobre o tema, Pimenta (2005) salienta a importância das teorias

educacionais na formação docente, pois o saber do professor não é arquitetado

apenas pela prática. Há a necessidade de contextualização da ação, de modo que o

professor tenha condições de compreender e analisar contextos históricos, sociais e

culturais para que a reflexão não seja particularizada, ou seja, a prática profissional

não pode ser separada do contexto organizacional. Dessa forma, o conhecimento

teórico é indispensável na formação docente, podendo oferecer aos professores

pontos de vista variados para uma ação contextualizada.

Libâneo (2011) no caso, faz referência ao tema professor reflexivo como

reflexividade, em que envolve a capacidade e a competência reflexiva no exercício

profissional. Desta forma, o autor propõe em seus estudos analisar o conceito de

reflexividade buscando diferentes modos de compreender o papel da reflexão dos

professores em seu desenvolvimento profissional. Consoante Libâneo (2011, p.55)

“a reflexividade é uma auto-análise sobre nossas próprias ações, que pode ser feita

comigo ou com os outros”.

Em acréscimo, Libâneo (2011) aponta três significados referentes à

reflexividade: o primeiro significado alude à reflexividade voltada à consciência dos

próprios atos, em que cada indivíduo pensa sobre suas próprias ideias, o que condiz

com uma reflexão interior; o segundo significado aponta a reflexividade relacionada

com situações práticas, decorrente de experiência, em que capacidade reflexiva se

inicia com uma situação concreta; o terceiro apontamento está assentado no

entendimento da reflexividade voltada à reflexão dialética, ou seja, quando uma

dada realidade ganha sentido com o agir humano.

1.4 Formação crítica do educador no Brasil

Com as transformações havidas na área de formação de professores no

Brasil, o discurso educacional tem visualizado o professor como profissional

comprometido com sua prática reflexiva e com as mudanças sociais. Isso a

compasso de estar voltado para a pedagogia crítica, expressão que brotou com a

pedagogia libertária, encantando o objetivo de ressaltar o que está por trás das

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estruturas sociais e provocar mudanças nas atitudes das pessoas, em que o

educador se ocupa com os problemas e experiências da vida diária e com os que

orbitam ao redor da escola.

No que tange aos fundamentos da pedagogia crítica no Brasil, pesquisas

relacionam os aspectos da pedagogia com críticas à sociedade injusta e desigual.

Tendo Freire (2006) como seu maior defensor, parte para uma educação libertadora,

preocupando-se com a condição social do sujeito. Alberga como objetivo principal a

transformação social, registrando que essa transformação está relacionada com o

conhecimento. A escola é um dos pontos principais desta prática, devendo ser

percebida porta aberta para o início de uma luta por uma política consciente.

Muitos são os conceitos referentes a professor crítico, mas o objetivo é o

mesmo. Alguns autores como (FREIRE, 2006; GIROX, 1992; CONTRERAS, 2002 e

ALARCÃO, 2007) querem repassar a ideia de construção e fortalecimento do

individuo através de transformações pessoais que refletem em suas ações,

almejando quebrar as desigualdades sociais. Assim, o ser humano não pode viver

sem se socorrer das palavras. Ele precisa transformar o mundo por meio delas.

Dessa forma, o diálogo se concretiza pelo encontro dos homens na relação eu-tu,

solidificando a ação de seus sujeitos. O indivíduo se posiciona muito além de mero

expectador, deixando de ser “vasilha vazia”, sempre aberta ao depósito mecânico de

conteúdos (FREIRE, 2006).

A essa luz, Freire (2006) aponta a educação voltada para o diálogo entre

educador e educando, para que ambos façam parte do processo de construção do

conhecimento através de trocas, sem que haja o estabelecimento da autoridade do

conhecimento. Educador e educando são sujeitos críticos, reflexivos e

investigadores. O educador valoriza o conhecimento que cada educando traz,

desenvolvendo seu poder de compreensão e capacitação, para que possa haver o

compartilhamento de experiências e, em contrapartida, educador também possa

aprender com o educando.

O autor nos apresenta o papel conscientizador da educação em prol da

liberdade do próprio medo, pois, segundo Freire (2006), vivemos em uma sociedade

em que somos divididos por privilégios. Dito de outra forma, uns são mais

favorecidos que os outros, uma sociedade dividida em classes e, dentro destas

classes, a educação, para parte expressiva da população, é realidade de exclusão.

Nesta sociedade podem-se encontrar também dois tipos de pedagogia: a dos

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opressores, em que impera a dominação, e a do oprimido, aquela dominada,

subjugada, que precisa ser liberta através da conscientização à liberdade. O que se

deve ao próprio oprimido.

Em relação à educação, ela é um dos principais instrumentos para trabalhar

a prática da liberdade, pois se espera despertar a inquietação do homem tendente a

querer saber mais, a lutar pela humanização, pelo trabalho livre, pela afirmação do

homem como pessoa. Toda essa inquietação é advinda de um processo histórico de

desumanização manifestada pela violência dos opressores sobre os oprimidos.

Giroux (1992) percebe o professor como intelectual crítico, em oposição às

concepções que reproduzem o trabalho do educar como função técnica ou

instrumental.

A concepção do autor relaciona o professor à ideia de autoridade

emancipadora, com o objetivo de um ensino dirigido à formação de cidadãos críticos

e ativos. Para o entendimento da autoridade na qualidade emancipadora, o

professor deve associar as ideias de liberdade, igualdade e democracia. Consoante

Giroux (1992, p. 32) “a escolarização, a reflexão crítica e a ação tornam-se parte

fundamental de um projeto social para ajudar os alunos a desenvolver uma profunda

e inabalável fé no combate para vencer as injustiças e mudar a si próprios”.

No entanto, com isso, faz-se necessário que os professores tenham clareza

sobre seus referenciais políticos e morais para constituir sua autoridade no ensino.

Intento é que as escolas se tornem espaços para que os alunos aprendam a lutar

coletivamente por condições de liberdade individual, capazes de atuar na sociedade.

De sua parte, o docente, por meio de capacitação, tornar-se-ia intelectual

transformador para pensar e agir criticamente.

O ensino voltado à transformação social implica preparar o aluno a assumir

riscos, tornando-se capaz de adquirir um conhecimento crítico no que respeita às

estruturas sociais básicas, que envolvem conhecimento político, econômico, cultural

e o mundo do trabalho. Neste caso, uma transformação voltada à humanização da

ordem social. Para tanto, Giroux (1992, p. 33) pontua que:

[...] isto significa trabalhar para criar condições materiais e ideológicas na escola e na sociedade mais ampla, que deem aos alunos a oportunidade de se tornarem agentes de coragem cívica; isto é, cidadãos que possam atuar como se uma autêntica democracia realmente prevalecesse, fazendo o desespero parecer inconvincente e a esperança exequível.

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Seguindo a mesma esteira de pensamento, Contreras (2002, p. 158)

encadeia a ideia da escola como esfera democrática. Nessa direção, afirma que,

“não há possibilidade de transformação profunda na educação se não forem

estruturando e mediando a função da escola no contexto mais amplo da sociedade,

levadas em consideração as organizações institucionais que estão”. Há a

necessidade da participação dos professores num contexto mais amplo, ou seja,

criar condições de envolvimento social além dos muros da escola, ser sensível à

comunidade, assumindo um papel pedagógico e político. Por acréscimo, consciente

dos entraves que devem ser superados, preparando seus alunos de forma a se

tornarem cidadãos críticos, comprometidos em seguir uma vida pública, assentados

nos princípios de solidariedade e esperança.

No que diz respeito à reflexão crítica, Contreras (2002) a diferencia do ato

de reflexão, enfatizando que este foca a ideia do professor sobre suas práticas e

suas incertezas. Desse modo, o autor amplia a reflexão notabilizando a base crítica

como suporte em que o docente, além de refletir sobre sua ação, analisa e

questiona as estruturas em que trabalha e as imposições impostas às quais

obedece.

Contreras (2002) assegura que a reflexão crítica não ocorre como um

processo de pensamento sem orientação. Decorre do contexto de uma ação, em

que há uma participação ativa no âmbito social, atentando para a postura do sujeito

diante dos problemas. Dessa forma, a reflexão crítica não se notabiliza como um

trabalho individual da mente. É, por igual, concebida como atividade pública, com

pessoas envolvidas em um processo sistemático de crítica, o que pressupõe

relações sociais.

Os apontamentos de Contreras (2002) se articulam em torno da ideia de que

a reflexão crítica é movida pela emancipação, com interesse libertador das pessoas

e dos grupos sociais. Não se limita apenas em mostrar as formas libertadoras, mas

em auxiliar os grupos sociais a interpretar a si mesmos, elevando a sua

autoconsciência de forma que o universo do professor não se circunscreva à sala de

aula.

Em conformidade com Contreras (2002), Alarcão (2007) afirma que o ser

crítico-reflexivo não se baseia apenas na consciência da capacidade de pensamento

e reflexão, em que o profissional docente, inúmeras vezes em situações incertas,

deve atuar de forma inteligente, criativa e flexível. Para que isso ocorra, ele deve

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estar inserido em um ambiente humano, em que tenha o sentido de liberdade e

responsabilidade social. Assim, Alarcão (2007, p. 32) afirma que,

O espírito crítico não se desenvolve através de monólogos expositivos. O desenvolvimento do espírito crítico faz-se no diálogo, no confronto de ideias e de práticas, na capacidade de ouvir outro, mas também de se ouvir a si próprio e de se auto-criticar.

Nesse diapasão, a escola constitui lugar privilegiado para que se

estabeleçam discussões críticas, por favorecer um contexto social organizativo com

valor educativo. Desnecessário registrar que o conhecimento do contexto é

essencial. Professores e alunos devem, também, assenhorear-se da consciência

crítica para que haja transformação.

Assim, após leitura de várias definições a respeito de professor crítico-

reflexivo, é possível perceber que não é tão simples como se imagina, pois, de raro

em raro, o professor se encontra sozinho na busca de seu melhor. O processo para

se chegar a ser um professor crítico-reflexivo requer que o docente interaja com o

contexto da instituição em que trabalha e que tenha paciência e força de vontade,

pois, caminho longo precisa de suportes para que alcance o estágio desejado.

Salienta-se, igualmente, que o ambiente profissional também deve colaborar, pois

não basta que o professor mude sozinho.

A reflexão e a concepção crítica são instrumentos importantes para o

desenvolvimento de professores em serviço. Para tal acontecer, é necessário que o

professor conte com espaço para estudo em grupo, onde possa promover

conversas colaborativas, ou seja, o momento em que possa partilhar suas

experiências, ter voz e apoiar-se em outros professores. Barros (2010, p. 17), por

sua vez, discute a relevância do pensamento social crítico na formação do

educador, arregimentando questões como estas:

[…] qual a importância da teoria social crítica para a compreensão dos fenômenos sociais existentes na atualidade? Como os educadores de línguas podem se transformar em agentes críticos de mudança na escola e na comunidade, considerando os reais problemas vividos nas diferentes esferas da vida cotidiana?

Na trilha desse pensamento, a autora insere apontamentos que propõem a

inserção dos movimentos populares como alternativas de luta contra as diferentes

formas de opressão, contribuindo acerca da emancipação humana. Noutras

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palavras, considera os movimentos sociais como tentativa de engendrar novos

caminhos e alcançar a emancipação social.

A autora aponta, ainda, haver interesse de estudiosos da linguagem em

repensar o papel do educador, cujas preocupações, no geral, se voltam à prática

docente de ensino e não questiona as estruturas institucionais em que trabalha. Em

adendo, comporta seja mais ativo no processo sócio-histórico, envolvido num

embate constante de reflexões, focando os problemas sociais da comunidade

escolar, tornando-se mais crítico diante da realidade social na qual a escola está

inserida.

Posto isso, Barros (2010) divisa três níveis de reflexões que poderiam

corroborar para a formação do educador crítico: a estrutura interna, as relações

microssociais e as relações macrossociais. A estrutura interna é considerada como

aquela na qual prevalecem as emoções, os valores, os sentimentos. O educador

estaria sempre engajado em projetos sociais movidos por sua vontade. Seria

reconhecido que as mudanças não se dão apenas com a mudança da consciência,

mas principalmente através da ação. No início das relações microssociais, o

educador crítico se volta às questões atinentes à sala de aula, identificando os

problemas que nela ocorrem.

Uma vez identificados os problemas, o educador crítico poderia buscar

subsídios para resolvê-los. No terceiro nível das relações, as macrossociais, o

educador crítico daria atenção para o que ocorre extramuros da escola, estando a

par dos problemas que envolvem a comunidade externa com questões como: abuso

sexual, discriminação racial e meio ambiente, em meio a outros que podem vir a se

refletir dentro da escola. Esses assuntos podem ser tratados por todo o corpo

docente da unidade escolar em parceria com entidades políticas, visando fortalecer

a ligação entre estrutura escolar e estrutura social, por meio de palestras, cursos e

outras atividades do gênero, pois, com base nessa ação conjunta, poderão surgir

outros ideais (BARROS, 2010).

Todos esses apontamentos são relevantes para o processo de formação

continuado do professor, para que possa, de maneira coletiva, levar estes

apontamentos para a prática. Para isso, faz-se necessária a discussão de temas

que abordam a teoria crítica, uma vez que os cursos de formação continuada

abarcam os profissionais experientes, tornando propícia a discussão desta temática.

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1.5 Formação continuada do educador de línguas Em decorrência de inúmeras mudanças ocorridas no mundo, tanto

econômicas como socioculturais, percebe-se que, nas últimas décadas, muito se

tem falado sobre educação, em especial sobre as questões relacionadas com a

formação do profissional docente. Este se torna protagonista do processo atinente à

teoria e à prática. Sua formação continuada abarca as experiências vivenciadas na

prática, com o objetivo de qualificação, visando à preparação e à troca de

experiências com o intuito de aplicar seus conhecimentos em sala de aula.

O tema formação continuada veio a ser, nos últimos anos, de grande

interesse aos pesquisadores. Nas últimas décadas, cada vez mais o sistema de

educação investe na formação continuada de professores com o propósito de

atualização e aprofundamento de conhecimentos. Conforme Pimenta (2005) traduz-

se na valorização do professor, no seu pensar, em seu agir, em suas crenças e

valores, aspectos relevantes para a compreensão de seus fazeres não apenas em

sala de aula, pois os professores não se limitam a cumprir conteúdo. Desempenham

mais que isso, dado que o elaboram, atribuem a ele novas definições e o

reinterpretam.

A ideia de formação continuada na educação brasileira busca o

aprimoramento do professor com uma concepção compensatória em relação à sua

formação inicial, destinado a preencher lacunas nesta formação. A essa constatação

se chegou em razão da avaliação de cursos e de desempenho de alunos, que

demonstrou insuficiência no que se refere à formação inicial de professores em

instituições de ensino superior a partir dos anos 80 (GATTI, 2009).

Verifica-se, então, a necessidade de reformas curriculares, instigando

desafios às instituições formadoras de professores, ocasionando desenvolvimento

de programas de educação continuada. Segundo Gatti (2009, p. 201), “os processos

de formação continuada desenvolvidos desde os anos 1980, quer para atualização

ou complementação de conhecimentos, quer para preparar a implementação de uma

reforma educativa, não produziram os efeitos esperados”.

Muitas as razões apontadas para o insucesso da dificuldade de formação,

dentre elas a formação em massa, a escassez dos recursos financeiros, a falta de

preparação das instituições formadoras e do apoio necessário para a realização das

mudanças esperadas. Acrescidas da mirrada participação dos professores na

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definição de políticas de formação de professores (GATTI, 2009).

Durante a década de 80, após a redemocratização política no Brasil, os

programas educacionais contribuíram para a formação de professores, através de

alternativas que direcionavam a formação para os problemas apontados pela escola.

Dessa forma, entendeu-se haver a necessidade de os professores contarem com

uma formação teórica voltada para a leitura, análise, problematização, interpretação

e sugestão de mudanças para os problemas enfrentados pela escola. Bem por isso,

Pimenta (2005, p. 32) esclarece que:

[...] essa compreensão suscitou novas propostas curriculares tanto nas legislações estaduais quanto nas práticas escolares, possibilitadas por amplos Programas de Formação Contínua, promovidas por Secretarias de Educação com assessoria de Universidades.

Por ocasião de inúmeros debates sobre a relevância e os desafios da

formação continuada, levadas em conta as experiências que se sucederam a partir

de 1980, em relação à formação do profissional docente, na década seguinte foi

aprovada a Lei n. 9.394/96. Associada à Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional (LDB), que regulariza e define o sistema de educação brasileira, esteia-se

nos princípios presentes na constituição. A LDB, promulgada em 1961, reeditada dez

anos após, com nova versão em 1996, agasalha texto que resultou de longa

discussão, algo em torno de seis meses.

Em seu artigo 67, estipula que os sistemas de ensino promoverão a

valorização dos profissionais da educação, assegurando-lhes inclusive, nos termos

dos estatutos e dos planos de carreira do magistério, o aperfeiçoamento profissional

continuado, com licenciamento periódico remunerado para esse fim. Em seu artigo

80, estatui que o Poder Público incentivará o desenvolvimento e a veiculação de

programas de ensino a distância, em todos os níveis e modalidades de ensino e de

educação continuada. Já no artigo 87, das disposições transitórias, parágrafo 3º,

inciso III, enfatiza que é dever de cada município realizar programas de capacitação

para todos os professores em exercício (GATTI, 2009).

A nova legislação ensejou impulsos à formação continuada, o que veio a

somar o desenvolvimento da educação no setor público a partir da criação, em 1996,

do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de

Valorização do Magistério - FUNDEB - que respaldou legalmente o financiamento

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de cursos de formação continuada de professores. Pimenta (2005, p. 34) esclarece:

[...] a valorização profissional, incluindo salários e condições de trabalho, foi totalmente abolida dos discursos, das propostas e das políticas de governo subsequente, que passou a normatizar exaustivamente a formação inicial de professores e a financiar amplos programas de formação contínua.

Após diversas discussões a respeito da formação continuada, recentemente

esta vem passando por um processo de reconceituação. As atuais propostas se

direcionam para a valorização docente, centrada no potencial de autocrescimento do

professor, reconhecendo seus conhecimentos como suporte profissional. As atitudes

e motivações dos professores passam a ser vistas como relevantes para as

inovações na prática educativa. Contudo, Pimenta (2005) compreende que esse

processo de constituição do saber docente abriu caminhos, articulando novas

possibilidades de formação inicial e continuada.

Os novos modelos de formação diligenciam por apagar os processos

formativos que ignoravam a trajetória do professor no decorrer de seu caminho

profissional. A partir de então, a formação continuada é conceituada como

concepção de desenvolvimento contínuo ao largo da vida docente. Mais que isso: os

modelos de oficinas de reflexão sobre a prática e formação, centrada no

fortalecimento institucional, são bem aceitos na literatura educacional. A esse

propósito, Gatti (2009, p. 203) tece seu esclarecimento:

[…] o modelo de reflexão sobre a prática realizada em pequenos grupos é uma estratégia de alto valor formativo e tem produzido efeitos interessantes. Permite maior aderência à realidade do professor e maior atenção ao seu repertório de práticas em culturas escolares diversas, seja para legitimá-la, ressignificá-la ou superá-la.

Os processos formativos que fazem uso da prática reflexiva crítica como

fortalecimento da escola precisam contar com o envolvimento do professor,

direcionado à formação continuada, e da instituição. A esta cabe propiciar condições

estruturais recursos, pedagógicos e material apropriado, valorizando o trabalho

coletivo de forma a dar sustentabilidade às mudanças.

Pode-se verificar que o contexto da formação continuada na escola se

revestiu de força, uma vez que, neste espaço, se enfileiram aqueles que, detendo a

prática, necessitam de uma frente para discutir os conflitos que esta encampa,

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buscando constantemente a qualificação através de cursos de formação continuada.

“Portanto, a formação contínua não se reduz a treinamento ou capacitação e

ultrapassa a compreensão que se tinha de educação permanente” (PIMENTA, 2005,

p. 21).

Por ocasião das melhorias na formação de professores, um sem-número de

iniciativas, por parte de secretarias municipais e estaduais de educação do Estado

de Mato Grosso, objetivavam parcerias visando à busca de soluções para os

problemas relacionados com a formação continuada de professores. Primando pela

qualidade de ensino no Estado, a Secretaria de Educação de Mato Grosso -

SEDUC/MT - volta sua atenção à qualificação dos profissionais docentes. Em suma,

pretende, por meio de projetos, investir em modelos de formação continuada que

venham a atender-lhe a dimensão territorial.

Em 1997, Mato Grosso vincou a formação continuada no Estado com o

Projeto Geração, financiado pela PRODEAGRO/Banco Mundial - Programa de

Desenvolvimento do Agronegócio. Através dele, buscava favorecer uma demanda de

5.000 docentes leigos do ensino fundamental. Contou com a parceria de 49

municípios, habilitando os professores através de cursos de três anos de duração

recorrendo à educação a distância.

Conforme Rodrigues (2007), em relação à participação dos municípios no

referido projeto, em 1995 a escola Sagrado Coração de Jesus, situada em

Rondonópolis, implementou a experiência de grupos de estudos que mirava à

atualização na formação continuada. Por força do êxito e da repercussão positiva

deste grupo de estudos, o Estado criou o CEFAPRO - Centro de Formação e

Atualização de Professores.

Trata-se do órgão responsável pela política de formação, sistematização e

execução de projetos e programas da SEDUC, também responsável pela efetivação

da Política Educacional do Estado no que se refere à qualificação e valorização dos

profissionais da Educação da rede pública. Inicialmente, foram instalados em

Cuiabá, Rondonópolis e Diamantino, depois, expandidos para outros municípios, que

se tornaram polos estabelecidos pela SEDUC. Rodrigues (2007, p. 13) acentua:

O grupo se organizou e criou situações formativas no próprio contexto escolar, o que significou o reconhecimento de que os professores são sujeitos que ensinam, mas que também aprendem em situações formais e colaborativas de auto e co-formação, tendo a autonomia como um desses princípios.

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Atualmente, o CEFAPRO abrange todas as áreas: Tecnologia; Linguagens;

Ciências humanas e sociais e Ciências da Natureza e matemática. Na área da

linguagem, o CEFAPRO tem planejado cursos de formação continuada para

professores de línguas (materna e estrangeira). Letramento Crítico e seus aspectos

semióticos tem sido a tônica no Projeto ‘Sala de Professor’. Tal proposta propõe

discussões sobre como planejar as ações pedagógicas para as linguagens por área

de conhecimento.

O objetivo da temática é o desenvolvimento de capacidades dos

professores. São trabalhados textos de referência que discutem o trabalho com a

linguagem na perspectiva do Letramento e do Letramento Crítico. Com isso, o

CEFAPRO visa oportunizar aos professores reflexão sobre a concepção de

Linguagem desenvolvida pelos profissionais da área nas instituições. Ressaltando a

relevância do trabalho com a mesma em sala de aula e oportunizando que sejam

compartilhados anseios, angustias, dúvidas, alegrias, resultados positivos e

negativos das práticas em sala de aula.

Embora este estudo esteja mais centrado na questão da formação do

professor, é pertinente tecer algumas considerações sobre aspectos linguísticos que

serão utilizados na análise dos dados tais como ‘Modalidade’ e ‘Pronomes’. Versarei

sobre isso na seção a seguir.

1.6 Alguns aspectos lingüísticos: modalidades e pronomes 1.6.1 Modalidade

Conforme Neves (2006) a modalidade apresenta-se como o julgamento do

falante sobre as possibilidades e obrigatoriedades envolvidas sobre o que ele diz. O

modo como às pessoas mostram seu comprometimento, afinidade e solidariedade,

ao fazerem afirmações, perguntas, ofertas e demandas. As afirmações e perguntas

referem-se à troca de conhecimento (modalidade epistêmica) que representa o

comprometimento com a verdade. As ofertas e demandas aludem à troca de

atividade (modalidade deôntica). Esta revela o comprometimento com a

obrigatoriedade/necessidade.

Neves (2006) considera a modalidade como o modo pelo qual o significado

de uma frase é qualificado de forma a refletir o julgamento do falante sobre a

probabilidade de ser verdadeira a proposição que ela expressa. A autora elucida

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que a modalidade é um conjunto de relações entre o locutor, o enunciado e a

realidade objetiva. Assegura ainda, que existem enunciados não-modalizados, do

ponto de vista comunicativo, tendo em vista que a modalidade pode ser considerada

automática, já que não se concebe que o falante deixe de marcar de algum modo o

seu enunciado em termos de verdade do fato expresso, bem como, deixe de

imprimir nele certo grau de certeza sobre essa marca.

Dentre as noções de modalidade, estão as que expressam possibilidade e

necessidade (epistêmica/deôntica). A modalização deôntica está relacionada aos

valores de permissão e obrigação, ligando-se imperativo, que é característico de

interações espontâneas, nas quais se pode esperar que um interlocutor leve outro a

fazer algo. A modalização epistêmica, por sua vez, envolve o julgamento humano do

que é provável acontecer, se estende pelos limites e indefinidos graus do possível

(NEVES, 2002).

Koch (2004) discute sobre modalidade epistêmica, para referir ao eixo de

crença, reportando-se ao conhecimento que temos de um estado de coisas (certo,

excluído, decidido, plausível, contestável, indeciso, não decidido) pautados na

probabilidade e certeza. Enquanto que as modalidades deônticas referem-se ao eixo

da conduta, ou seja, à linguagem das normas, àquilo que se deve fazer (obrigatório,

proibido, ordenado, permitido, facultativo) correspondem a obrigatoriedade e

permissividade.

Assim, a modalidade é expressa por um verbo: auxiliar modal, como em:

“deve ser como na televisão eles preparam...”; por um advérbio: que também pode

associar-se a um verbo auxiliar modal, como em: “provavelmente ele deve ter falado

com você”; por um adjetivo em posição predicativa, como em: “é impossível que ela

empreste em outras condições”; por um substantivo, como em: “eu tenho a

impressão que eles comem coisas mais leves na hora das refeições diárias”; e pelas

próprias categorias gramaticais (tempo/modo) como em: “eu poderia me alimentar só

de carne” (KOCH, 2004).

Observar as modalidades nas análises das entrevistas possibilitará verificar

o grau de comprometimento dos professores participantes desta pesquisa, a partir

de suas afirmações, a fim de revelar a forma com que se compromete com sua

(trans) formação dentro do paradigma crítico-reflexivo de sua prática docente na

escola Meninos do Futuro.

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Quadro 1- Tipos de modalidades analisadas neste trabalho

MODALIDADE

SIGNIFICADO

EXEMPLO NAS FALAS

Modalidade Deôntica

Expressa o comprometimento com a obrigatoriedade/necessidade

..eles tinham que saber..

Modalidade Epistêmica

Expressa comprometimento com a verdade

Que poderá dar certo..

Fonte: As autoras

1.6.2 Pronomes

Não tem como pensarmos nos pronomes apenas como substitutos do (s)

nome (s), pois, esses exercem papel ativo. Segundo Ilari (2002) os pronomes nem

sempre foram analisados como uma classe à parte. Inicialmente os estóicos os

colocavam entre os nomes comuns, mais tarde reconheceram a diferença entre a

natureza do pronome e a do nome. Na gramática, os pronomes abrangem dois

grupos, o dos primitivos (que são as pessoas) e o dos derivados ou bipessoais (que

são os chamados possessivos). Os pronomes pessoais (eu, tu, ele, nós, vós, eles,

elas, me, te, etc.) possui como traço comum a capacidade de identificar de forma

pura a “pessoa gramatical”.

Neste estudo, opta-se em analisar os pronomes, pois estes representam

papéis no discurso1, ou seja, nos enunciados. Ilari (2002) aponta que as gramáticas

sustentam que primeira pessoa é a que fala e que segunda pessoa é aquela a quem

se fala. No entanto, ressalta que não basta simplesmente dizer que a segunda

pessoa é aquela quem se fala. Em alguns momentos, nas duas primeiras pessoas

há, ao mesmo tempo, uma pessoa implicada no discurso e um discurso sobre essa

pessoa, assim, os pronomes de primeira e segunda pessoa se interpretam por um

processo de autorreferência. Desse modo, eu designa a pessoa que fala e implica,

ao mesmo tempo, um discurso sobre ela, a partir dela própria.

No plural, os pronomes podem implicar a possibilidade de uma referência

simultânea a indivíduos que desempenham diferentes papéis do ponto de vista de 1 Embora reconheça a relevância dos estudos discursivos, neste estudo optei pelo método de análise de conteúdo

e etnografia. Contudo, considerei relevante destacar alguns aspectos linguísticos para complementação da

análise.

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quem enuncia. Enquanto que os ‘eles’, ‘elas’, ‘os’, ‘as’, ‘lhes’, podem ser

considerados plurais autênticos de ‘ele’, ‘ela’, etc., as formas nós, nos, (co) nos (co),

a gente, vocês, retomado por lhes (con) si (go) etc., são mais que simples plurais de

eu e você. No caso dos pronomes pessoais, a passagem do singular para o plural

não significa apenas a pluralização, pode-se observar que o pronome pessoal nós

seja igual a eu + eu, mesmo que esse plural não inclua outra pessoal que não a

primeira como em: Nós vamos começar pela pré história (ILARI, 2002).

Esse tipo de emprego, em que o indivíduo institui sua fala com a de um

grupo, mas nele não inclui nem a segunda nem a terceira pessoa, é o

tradicionalmente chamado “plural de modéstia”, considerado por Cunha; Cintra

(2007),

para evitar o tom impositivo ou muito pessoal de suas opiniões, costumam os escritores e os oradores tratar-se por nós em lugar da forma normal eu. Com isso, procuram dar a impressão de que as ideias que expõem são compartilhadas por seus leitores ou ouvintes, pois que se expressam como porta-vozes do pensamento coletivo.

Assim, Ilari (2002) alude que o pronome nós constitui tipicamente a soma do

eu + não-eu, em que o não-eu pode corresponder a uma segunda ou terceira

pessoa ou ambas conjuntamente que podem ser singulares ou plurais. Da mesma

forma que nós, a expressão a gente, geralmente representa um plural que soma eu

+ não-eu, assim como o nós, a expressão a gente também pode referir-se ao

indivíduo que fala (a gente = eu).

A seguir serão apresentadas algumas considerações a respeito dos

conceitos que norteiam a formação de professores que trabalham com a

socioeducação.

1.7 Formação do socioeducador: uma proposta para reflexão

O universo do docente que atua em Unidades socioeducativas, é muito

amplo. No que tange à sua formação, além de estar em constante busca por seu

aprimoramento, o professor prima por conhecer os fundamentos políticos da

socioeducação e sua legislação específica. Igualmente, os objetivos da aplicação

das medidas socioeducativas, respeitados os direitos dos adolescentes, visando

prepará-los para o convívio, contribuindo para que se tornem cidadãos e futuros

profissionais.

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Até 1990, jovens em situação de exclusão social eram atendidos pelo código

de menores, Lei n. 6.697/1979. Por esta Lei, a população infanto-juvenil que cometia

delitos estava dispensada de ações punitivas e repressivas, em consonância com a

política Nacional de Bem-Estar do Menor. Com a aprovação do Estatuto da Criança

e do Adolescente - ECA, em 1990, o atendimento ao adolescente passou a ter

caráter educativo. Em seu capítulo IV, artigo 12, são apresentadas como medidas

socioeducativas a advertência, a obrigação de reparar o dano, a prestação de

serviço à comunidade, a liberdade assistida, a inserção de regime de semiliberdade

e a internação em estabelecimento educacional (BRASIL,1990).

Ao trabalhar com jovens que se acham privados de liberdade, fazendo-o

com medidas socioeducativas, o professor tece reflexões sobre os fundamentos

sociológicos destas medidas. Bem como, uma leitura crítica sobre os motivos que

levam os adolescentes a se envolver em delitos e percebe como a consciência

coletiva é influenciada pela mídia e pelos atores sociais, que determinam o

posicionamento da sociedade perante estes adolescentes.

Costa (2001, p.16) sustenta que trabalhar com educando em situação de

dificuldade social e pessoal implica atitudes por parte do educador. Vejamo-lo:

Não permitir nunca que a visão do ladrão, do homicida, do traficante, da prostituta ou do viciado, existente nos prontuários e relatórios, nos impeça de ver a criança ou o jovem que temos diante de nós. O conhecimento do passado do educando deve ser utilizado pelo educador apenas com uma finalidade: impedi-lo de colocar a exigência antes da compreensão.

Seguindo a mesma esteira de pensamento, Pereira (2008) ressalta que não

se pode impor um certo ou errado. Por igual, não se deve transitar pelo moralismo.

Faz-se necessário que o profissional que trabalha com estes jovens não tenha

preconceitos, vendo-os como pessoas em processo de desenvolvimento. Devem-se

evitar posicionamentos assistencialistas, reconhecendo ao adolescente o direito ao

respeito. Assim, impõe-se favorecer aos adolescentes condições de se constituir

como seres morais, em que percebam que o convívio em comunidade exige

respeito e, para isso, precisam ser respeitados.

Em relação aos aspectos éticos referentes à atuação do professor

socioeducador, a este compete conhecer, aceitar e praticar o código de ética

profissional. De sua vez, o código contempla os direitos humanos, voltados para a

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visão do homem e do mundo e não apenas como dispositivo de natureza jurídica.

Em adendo, reconhece que a violência simbólica (ou psicológica), ou seja,

tratamento humilhante é uma das principais causas de violência reativa por parte

dos adolescentes, em especial por parte dos que vivenciam medidas de privação de

liberdade.

A socioeducação é um direito do adolescente, em situação de privação de

liberdade, tendo como fundamentos os princípios de liberdade e as ideias de

solidariedade, tendentes à formação plena do adolescente, aparelhando-os para o

exercício da cidadania e para sua qualificação profissional. Durante o período de

formação, tende a preparar o educando para o convívio social, possibilitando a ele

tomar decisões pautadas em valores humanos adquiridos durante o tempo em que

houver o contato educando-educador. Costa (2001, p. 30), indo ao encontro dos

direitos humanos dos adolescentes, afirma:

Conferir cidadania pedagógica ao trabalho social educativo dirigido ao adolescente infrator e a outros grupos em situação de risco é, pois, uma tarefa urgente e necessária. Precisamos começar a fazer pedagogia para que não continue a predominar, nessa área de atividade, a transgressão sistemática dos direitos humanos e de cidadania da fração relegada da nossa infância e da nossa juventude.

No campo da filosofia de vida, o educador percebe o jovem em contexto de

exclusão como a própria razão de ser de seu trabalho, missão exercida como ser

humano e profissional, encontrando na socioeducação o sentido para a construção

de um mundo melhor, mais justo e mais solidário. Reconhecer sua prática e ativar

seu pensamento de modo crítico. Diante disso, Costa (2001) pondera que tarefa dos

educadores seria lutar para que os educandos, quando em idade adulta, vejam

realizadas suas promessas de infância.

Faz-se indispensável que o professor assimile os fundamentos históricos do

trabalho socioeducativo voltado aos adolescentes privados de liberdade. Igualmente,

visão clara sobre os aspectos da legislação e da doutrina de proteção aos

adolescentes. Mais: que conheça os fatos e ideias que determinam adoção deste

tipo de ação no Brasil, de modo a conhecer as várias etapas pelas quais deslizou

sua evolução.

De acordo com Pereira (2008), em meio aos conhecimentos sobre os quais

o professor deve estar ciente, estão o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA;

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as normas que regulamentam a apreensão e a condução dos adolescentes em

situação de exclusão; o papel da polícia militar no trabalho de prevenção e

repressão ao delito dos adolescentes; as técnicas de atuação dos policiais em caso

de fugas e motins dos menores. Deve ainda ter clareza das ocorrências disciplinares

que podem ser resolvidas pela equipe da unidade e as que requerem intervenção

policial, por questão de segurança.

Na concepção de Pereira (2008), os regimes socioeducativos devem

constituir-se em condição que garanta o acesso do adolescente às oportunidades de

superação de sua situação de exclusão, bem como acesso à formação de valores

positivos de participação na vida social. Nesse sentido, o trabalho do professor deve

pautar-se em atividades escolares, com temas concernentes à vida familiar, em que

os educandos estejam na condição de filhos ou futuros pais e percebendo, na

orientação sociofamiliar, possibilidades de apoio a eles e a seus familiares.

No próximo capítulo, discorro a respeito do percurso metodológico deste

estudo, findando com o procedimento analítico com base na análise de conteúdo de

Richardson (2011).

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CAPITULO II - METODOLOGIA DE PESQUISA

Apresento neste capítulo o percurso metodológico adotado neste estudo.

Entreaberto descrevendo sobre a abordagem qualitativa de pesquisa, bem como os

procedimentos e instrumentos de coleta de dados, tais como: observação

participante, entrevistas e documentos. São apresentadas as questões éticas,

visando preservar a identidade dos professores. Em seguida, discorro sobre o

contexto da investigação, a entrada em campo e o curso de formação continuada,

com algumas ilustrações das atividades realizadas pelos alunos. Posteriormente,

teço considerações sobre o curso de Letramento Crítico e apresento os participantes

da pesquisa. Por último é apresentado o procedimento analítico.

2.1 Abordagem qualitativa de pesquisa: etnografia colaborativa

Neste estudo, optei pelo método qualitativo, de cunho etnográfico

colaborativo. A pesquisa qualitativa compreende várias abordagens, dentre elas, a

do tipo descritiva, na esteira do que propõe Kruger (2010, p. 42); “o objetivo central

dos aportes descritivos é compreender a realidade social e a percepção dos atores

em seus modos de atuação”. A pesquisa qualitativa explica e descreve os

fenômenos sociais, valorizando métodos interpretativos. Encanta como

característica, focar o universo dos indivíduos e grupos, intentando saber como

percebem e entendem o mundo e como constroem seu conhecimento. Como afirma

Gatti; André (2010, p. 30), “a abordagem qualitativa defende uma visão holística dos

fenômenos, isto é, que leve em conta todos os componentes de uma situação em

suas interações e influências recíprocas”.

A abordagem qualitativa se fundamenta em alguns princípios, como o da

fenomenologia, que, por sua vez, se fraciona em várias correntes: o Interacionismo

Simbólico, a Etnometodologia, os Estudos Culturais e a Etnografia. Em todas essas

correntes, há especial atenção ao universo do sujeito, aos significados por eles

atribuídos e às suas experiências cotidianas, o que possibilita compreender e

interpretar a realidade dos atores sociais (GATTI; ANDRÉ, 2010).

O surgimento desse método se deu pela crescente diversificação do modo

de vida, assinalando que estudiosos do comportamento humano têm como principal

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motivação fenômenos complexos da vida social. Consoante Weller; Pfaff (2010), as

primeiras iniciativas no campo da pesquisa qualitativa deram-se por meio de

observação etnográfica de outras culturas durante o período da colonização, no final

do século XVI. Gatti; André (2010) apontam que a origem da pesquisa qualitativa

remonta aos séculos XVIII e XIX, por ocasião da insatisfação de vários sociólogos,

historiadores e cientistas sociais, com o método de pesquisa das ciências físicas e

naturais.

Todas essas questões expostas pelos pesquisadores se voltam ao

conhecimento sobre o ser humano, cuja compreensão pode ensejar uma

aproximação do real, assumindo que fatos e valores estão relacionados. Por ocasião

desses pressupostos, configura-se o surgimento da pesquisa qualitativa, que se

contrapõe ao esquema que divide a realidade em unidade possíveis de mensuração,

ou seja, o esquema quantitativista de ciência, que estuda a realidade isoladamente

(GATTI; ANDRÉ, 2010).

Embora a pesquisa qualitativa seja oriunda ao século XVIII, foi a partir de

1960 que ganhou destaque na área da educação. No pensar de Gatti; André (2010),

essa demora se deve ao fato de que os estudos de Educação eram apoiados na

psicologia experimental, o que gerou dificuldade de aceitação da perspectiva

fenomenológica.Contudo, o clima favorável para os estudos da Educação se deu

pela inquietude dos movimentos sociais.

Como exemplo, temos as lutas contra a discriminação racial, pela igualdade

de direitos. Neste contexto, a pesquisa qualitativa dava voz aos participantes.

Também na década de 60 ocorreram as rebeliões estudantis, que repercutiram em

vários países do mundo. Como apontam esses mesmos autores, essas rebeliões

despertaram interesse de educadores para saber o que acontecia no dia a dia da

escola e da sala de aula, ocasionando o acolhimento de estudos etnográficos.

No Brasil, a introdução de métodos qualitativos na pesquisa em Educação

foi influenciada pelos estudos desenvolvidos na área de avaliação de Programas e

Currículos. Em 1972, em um seminário realizado em Cambridge (Reino Unido),

foram discutidos métodos não convencionais de avaliação, ocasião em que vários

textos de representantes de uma série de países causaram impacto. Fiquemos com

Gatti; André (2010, p. 31):

Um exemplo desse impacto é a publicação no Brasil, em 1978, do

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artigo 'A abordagem etnográfica: uma nova perspectiva na avaliação educacional' (ANDRÉ, 1978), que discute duas novas propostas para a avaliação de programas: a iluminativa e a responsiva. O texto defende ainda o uso da abordagem qualitativa nos estudos em Educação.

Antes de a etnografia ser utilizada na investigação qualitativa, tal abordagem

era utilizada por missionários, exploradores e administradores coloniais para as

descrições e avaliações das raças e culturas mundiais. Muitos dos relatos antigos de

igrejas e arquivos eram feitos por representantes de missões, cujos primeiros

objetos da pesquisa etnográfica foram os “povos incivilizados”. A investigação

etnográfica remonta a uma época em que a Antropologia, a Sociologia e a Educação

não eram estabelecidas como disciplinas científicas (PFAFF, 2010).

“No sentido literal, a palavra grega 'etnografia' denota a descrição (grafhien)

de um povo ou cultura (ethnos) estranha, uma vez que faz parte da antiga

antropologia colonial”. Na contemporaneidade, há várias interpretações atinentes ao

termo; contudo, denota um estilo específico de pesquisa, com uma tradição literária

e científica. Borislaw Malinowski (1922) desenvolveu o trabalho de campo

etnográfico conhecido como o clássico, caracterizado por um conjunto específico de

procedimentos de coleta de dados, atualmente utilizados, incluindo observação

participante, entrevistas ou filmagens e análise documental (PFAFF, 2010, p. 254).

Consoante Mattos (2001, p.13) “[...] a etnografia desenvolve-se entre o final

do século XIX e início do século XX, como uma tentativa de observação mais

holística dos modos de vida das pessoas. Foi encontrada primeiramente em livros

de viagem, descrevendo sociedades exóticas”. O objetivo dos antropólogos era o de

compreender a cultura em contato com o grupo pesquisado no decorrer de dilatados

períodos. Mais tarde, os sociólogos também intuíram algo auspicioso nesta

abordagem, visando a melhor compreensão dos fenômenos sociais. O centro das

preocupações dos etnógrafos reside nas experiências quotidianas dos participantes.

Perspectivas educacionais já eram encontradas nos primórdios da

antropologia, por meio da observação da vida familiar, o que despertou interesse

científico. Os primeiros estudos etnográficos, no campo da educação, conferiam

atenção à comparação da organização escolar. “Pode-se afirmar que a tradição mais

antiga na área da Educação está representada pela pesquisa etnográfica, a qual

trata de mundos da vida alheios ou estranhos, respeitando a perspectiva destes.”

(WELLER; PFAFF, 2010, p. 15).

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Em face do exposto e atentando ao fato de que um estudioso que se socorre

da etnografia tem como princípio sua inserção no meio pesquisado, neste estudo

não se pretendeu utilizar a escola apenas como espaço de observação. Considerou-

se relevante a construção de uma experiência colaborativa com o grupo a ser

estudado.

Conforme se depreende de Bortoni-Ricardo (2008, p. 71) “[...] a pesquisa

etnográfica colaborativa tem suas raízes na tradição social crítica, oriunda do

Marxismo, neomarxismo e da escola de Frankfurt”. De acordo com Magalhães

(1994), na pesquisa etnográfica colaborativa, o pesquisador não é apenas um

observador passivo em busca do entendimento do outro, que, de sua vez, não tem

também ele um papel passivo. Ambos são coparticipantes no ato da construção do

conhecimento.

Contudo, em estudos orientados pelos princípios da pesquisa etnográfica

colaborativa, o pesquisador se ancora no visualizar as necessidades do grupo

pesquisado e no tentar atender a eles, partindo do procedimento básico da

observação participante. Balizado no conhecimento crítico, os estudos que se guiam

por este caminho não visam apenas ao conhecimento técnico, mas, sim, a focar na

ação, ou seja, no processo da própria ação, considerado por Magalhães (1994)

fundamental para a mudança social. Em tal processo, o professor se torna sujeito,

em lugar de mero objeto de estudo.

Tanto a etnografia colaborativa quanto a etnografia crítica são oriundas da

mesma escola de pensamento. Gerin (2009) nos traz um breve histórico da

etnografia crítica, na segunda metade do século XX. Mais particularmente depois de

meados da década de 1970, investigadores de diversas escolas do pensamento

crítico, em sua maioria de sociologia, apropriaram-se da análise qualitativa e da

abordagem etnográfica em particular. Os adeptos da teoria crítica, a exemplo dos

marxistas e das feministas, viram na abordagem etnográfica uma forma de melhor

compreender as relações de força existentes na sociedade, dando assim origem a

nova corrente: a etnografia crítica.

Segundo Oliveira; Lima (2009, p. 5), a etnografia crítica, diferentemente da

etnografia convencional que “descreve o que é”, “pergunta o que poderia ser”.

Assim, o objeto de interesse da etnografia crítica é a consciência crítica dos sujeitos,

portanto, é um processo que busca o rompimento da domestificação dos sujeitos por

meio da descrição interpretativa de suas práticas e do questionamento dos

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mecanismos de controle e de poder presentes nelas, o que torna os sujeitos

indiferentes a elas. Para Gerin (2009) a etnografia crítica abriga como propósito aliar

a teoria crítica à investigação empírica, a fim de favorecer as mudanças sociais e,

assim, alterar as relações de poder existentes na sociedade.

A escolha pela pesquisa qualitativa de cunho etnográfico, adjetivada como

colaborativa passa pelo interesse de compreender a vivência do grupo, associando

teoria e prática. Contudo, elegi o presente método para que, na qualidade de

pesquisadora, compreendesse os sujeitos através do diálogo. Uma vez que há a

interação pesquisador-pesquisado, com o crescimento de ambos são privilegiados

não apenas o pesquisador, mas também o colaborador.

2.2 Procedimentos de coleta de dados

Visando atender às características da pesquisa etnográfica, procurei realizar

um estudo de caso, particularizado por André (2009) como o estudo descritivo de

uma unidade. Tal estudo foi empreendido em uma escola pública, localizada na

capital mato-grossense, inserida no complexo Pomeri, descrita mais adiante na

página 55, cujo trabalho é dedicado a jovens e adolescentes que cumprem medidas

socioeducativas. O foco da pesquisa é a formação do professor. Procurei investigar

as experiências de três professores participantes no curso de formação continuada

(Sala de Professor)2. No mês de novembro desse mesmo ano, passei a me envolver

no projeto do curso de ‘Letramento Crítico3, sendo este último, ministrado pela

pesquisadora e orientadora desta pesquisa.

Foram utilizados os seguintes instrumentos de coleta de dados: observação

participante em que esta pesquisadora fazia anotações escritas, norteadas por um

roteiro de observação (APÊNDICE A). Foram realizadas também entrevistas

semiestruturadas com os três professores participantes do curso de formação

continuada (Sala de Professor) e no curso de Letramento Crítico’, sendo este último

ministrado pela professora pesquisadora e orientadora deste estudo. As entrevistas

foram gravadas em áudio, ancoradas em um roteiro de entrevista (APÊNDICES B e

2 O Curso de Formação Continuada (Sala de Professor) é um projeto desenvolvido com o propósito de promover

a reflexão por meio de encontros para discutir assuntos relacionados à educação. Geralmente ocorre nas

dependências da escola. Quando cheguei à escola no dia 16 de abril de 2011, o curso já estava em andamento. 3 O Curso de Letramento Crítico foi uma iniciativa dos professores da escola, tendo em vista necessidade em que

os mesmos estavam sentindo naquele momento. Os professores desejam conhecer as teorias acerca dessa

temática para trabalhar com seus alunos em sala de aula.

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C); e anotações das leituras de documentos tais como Projeto Político-Pedagógico

da Escola (PPP); Projeto (Sala de Professor) e Relatório do professor. As múltiplas

atividades de coleta de dados só foram possíveis com a colaboração de toda equipe

escolar, composta pelos professores, diretoria, coordenadoras e funcionários.

2.3 Instrumentos para a coleta de dados 2.3.1 Da observação

Na etnografia, a observação do ambiente investigado é tida como o principal

método de coleta de dados, cujo pesquisador é o principal agente. Neste estudo

procurei conhecer as experiências de três professores no curso de formação

continuada (Sala de Professor), bem como no Curso de Letramento Crítico. Elegeu-

se como um dos instrumentos de coleta de dados a observação participante no

contexto de formação continuada da Escola ‘Meninos do Futuro’, em Cuiabá-MT.

Houve, como desafio, minha inserção enquanto pesquisadora neste

contexto escolar, pois tive que desempenhar um papel ativo e atento e ao mesmo

tempo, valorizando a empatia, visando beneficiar a comunicação e confiança entre

sujeitos do estudo e pesquisadora. De acordo com André (2009, p. 62), “se há um

clima de confiança, as informações fluirão naturalmente e com isso o entrevistador

se sentirá à vontade para ir a fundo num determinado aspecto, tocar em questões

delicadas e explorar pontos de vista controvertidos”.

Interagir com a realidade que o pesquisador procura conhecer é uma das

características da observação participante. Assim, o observador deve tentar se pôr

no lugar do outro, visando à maior aproximação das suas falas, de suas atitudes e

de seus pensamentos, explícitos durante a convivência pesquisador-colaborador.

Dessa forma, o pesquisador assume, até certo ponto, o papel de integrante do

grupo. Contudo, a observação participante facilita o acesso às situações habituais do

grupo estudado.

Sem dúvida, métodos de observação devem ser compreendidos como essenciais para a coleta de dados dentro da abordagem etnográfica. Desse modo, a observação participante, a obtenção do acesso a um determinado campo social por parte do pesquisador, exigindo que se apresente como pesquisador ao campo e a seus atores individuais com o objetivo de encontrar sua posição entre eles, selecionar situações e fenômenos, estruturar as próprias observações, e, por último, relatar as observações de uma forma

adequada aos problemas de pesquisa (PFAFF, 2010, p. 257).

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As observações realizadas foram centradas em questões como a

adequação dos recursos, o material utilizado no ambiente onde ocorrem os

encontros, a coerência entre os temas, objetivos e conteúdo eleito para discussão e

sua implementação. Somem-se ainda a sequência no desenvolvimento dos

encontros, as características do grupo como o relacionamento entre os participantes,

as demonstrações de interesse e envolvimento ou não nas atividades através da

comunicação verbal, (através de palavras), não verbal (comunicação corporal) e

paraverbal (forma como as palavras são ditas, como tom de voz, tempo de fala,

reticências, hesitações, etc.), o que compõem o apêndice A.

As observações de campo não foram gravadas em vídeo e sim descritas

em diário de campo, logo após a finalização de cada encontro, para posterior

transformação em relatório. Desde a minha inserção em campo, observei a dinâmica

dos professores, para fins de coleta de dados. Iniciei esse trabalho, a partir do

momento em que os professores da escola não mais me percebessem como um

sujeito estranho, passando a referir-se a minha pessoa como mais uma componente

do grupo.

2.3.2 Da entrevista

O segundo instrumento utilizado para a coleta de dados foram entrevistas

semiestruturadas. A entrevista representa um dos instrumentos básicos para a coleta

dos dados, caracterizada por Lakatos; Marconi (2011) como uma conversa entre

duas pessoas, com objetivo de obter informações importantes e experiências das

pessoas entrevistadas. O autor aconselha o uso de um roteiro simples que vise

guiar o entrevistador pelos tópicos principais. Sabe-se que há variados tipos de

entrevistas, cujo propósito difere de acordo com o objetivo do entrevistador.

Richardson (2011, p. 207) afirma a esse propósito:

O termo entrevista é construído a partir de duas palavras, entre e vista. Vista refere-se ao ato de ver, ter preocupação de algo. Entre indica a relação de lugar ou estado no espaço que separa duas pessoas ou coisas. Portanto, o termo entrevista refere-se ao ato de perceber realizado entre duas pessoas.

Nas pesquisas etnográficas, lança-se mão de diferentes tipos de entrevistas,

dentre elas as semiestruturadas. Pfaff (2010) pontua que qualquer tipo de

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entrevistas pode ser utilizado num contexto etnográfico. Para este estudo, elegi as

semiestruturadas. Conforme Minayo (2007), elas combinam perguntas fechadas e

abertas, em que o entrevistado tem a possibilidade de discorrer sobre os temas em

apreço, sem se perder da indagação formulada.

Para o fim deste estudo, compuseram-se três entrevistas semiestruturadas

com professores da Escola Estadual ‘Meninos do Futuro’, atendendo a um roteiro

(APÊNDICE C) elaborado com base nos objetivos da pesquisa. As entrevistas, em

local escolhido pelos entrevistados, foram gravadas em áudio.

Existem pelo menos dois motivos que justificam a realização de entrevistas durante a pesquisa de campo etnográfica. Um deles está relacionado à produção de dados textuais que representam diretamente a perspectiva dos sujeitos da pesquisa. O outro diz respeito à necessidade de informações sobre as pessoas, contextos sociais, rituais ou cenas, que não são utilizados como único material para a análise em profundidade, mas como importante ferramenta para o exame dos fatos protocolados pelo pesquisador durante sua

estadia no campo (PFAFF, 2010, p. 258).

Salienta-se que a coleta de dados se iniciou apenas após a validação do

roteiro de entrevista. Aplicou-se o instrumento em um dos professores do contexto

socioeducativo que não foi incluído como sujeito da pesquisa, com posterior análise

de sua aplicação, feitas as readequações necessárias.

2.3.3 Dos documentos

Para complementação dos dados coletados, utilizei-me de leituras e

anotações dos documentos existentes na escola (Projeto Político Pedagógico –

PPP; Projeto ‘Sala de Professor’ e Relatório dos professores). Existem variados

materiais que possuem valor documental para a ciência social, entre eles os

documentos fotográficos, fonográficos, videocassetes. Esses documentos

constituem a base da observação documental. Conforme Richardson (2011, p. 228)

“assim pode-se comprovar a grande diversidade de documentos e a abrangência

que oferece o estudo desses documentos. Todos os elementos mencionados

constituem uma fonte quase inesgotável para a pesquisa social”.

Fachin (2006) considera documento, qualquer informação sob a forma de

textos, imagens, sons, sinais em papel/madeira/pedra, gravações, pinturas,

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inscrições, leis, atas, relatórios, ofícios, ordem régia etc. De outra parte, Severino

(2011, p.124) interpreta documentação para coleta de dados de pesquisa como

“toda forma de registro e sistematização de dados, informações, colocando-os em

condições de análise por parte do pesquisador”.

Vale ressaltar, aqui, que neste estudo, a pesquisa documental foi

considerada apenas como fonte complementar de dados e suporte para a pesquisa,

incluindo documentos institucionais da escola como o Projeto Político-Pedagógico

(PPP), Relatórios dos professores e o Projeto ‘Sala de Professor’. Além das leituras

e anotações acerca dos documentos, bem como da observação participante,

ancorei-me ainda nas entrevistas, como fonte para geração dos dados. Todo esse

trabalho de coleta de dados foi realizado durante o período em que estive na escola.

2.4 Aspectos éticos

Para garantia dos direitos dos sujeitos da pesquisa, encaminhou-se cópia

do projeto de pesquisa para análise do Comitê de Ética em Pesquisa Com Seres

Humanos (CEP) do Hospital Universitário Júlio Müller da Universidade Federal de

Mato Grosso - CEP\HUJM\UFMT. A coleta de dados teve seus primeiros passos

apenas após seu aval positivo, que ocorreu em 19-10-2011, protocolo número

115/CEP-HUJM/2011 (ANEXO A).

Uma vez definidos os atores ou participantes, procedeu-se ao estudo

conforme orientações da Resolução 196/96/CONEP. Foram entregues a cada

colaborador a ser entrevistado duas cópias de um Termo de Consentimento Livre

Esclarecido (TCLE) que integra o apêndice D, lido em conjunto, esclarecidas as

possíveis dúvidas pela pesquisadora. O TCLE enfeixa informações sobre a pesquisa

e convida o sujeito a participar em caráter de voluntariado. Explicita a possibilidade

de negar sua participação sem prejuízo em seu ambiente de trabalho, além da

garantia de sigilo no tocante às informações relatadas, resguardada sua identidade,

trocou-se os nomes por denominação de flores. Franqueia-se a possibilidade de

excluir seu consentimento a qualquer momento, se assim resolvesse até o momento

da conclusão deste estudo, sem sofrer prejuízos e sem a necessidade de mais

detalhes a esse propósito. Informou-se sobre as formas de contato com a

pesquisadora, caso necessário.

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Antes das entrevistas, e feitos os devidos esclarecimentos, os

colaboradores assinaram o TCLE em duas vias. Uma cópia ficou com a

pesquisadora para fins legais, outra ficou com o colaborador.

2.5 Contexto da pesquisa 2.5.1. Escola ‘Meninos do Futuro’

A Escola Estadual Meninos do Futuro agasalha características específicas, e

estas a torna diferente de uma escola comum. Seu principal objetivo é atender a

jovens e adolescentes excluídos do contexto social, ou seja, adolescentes que

cumprem medidas socioeducativas. A sede da escola se situa na Avenida Dante

Martins de Oliveira, s/n., bairro Planalto, no Complexo Pomeri, em Cuiabá – Mato

Grosso. A Escola Estadual Meninos do Futuro foi criada após a extinção da Escola

do 1º Grau Agostinha Guimarães, autorizada pelo decreto 1803/13/08/92,

reconhecida pela Portaria 3217/92, voltada à clientela da modalidade pré-escolar ao

ensino fundamental de I a VIII séries.

Cessadas as atividades da Escola Agostinha Guimarães, houve a

necessidade da criação de outra escola, que viesse a cuidar de crianças e

adolescentes encaminhados para as unidades da Fundação de Promoção Social -

PROSOL, sob guarda judicial e em situação de rua. Ocorreu, assim, a criação da

escola Meninos do Futuro, através do decreto n. 404, Diário Oficial n. 21.746 de 22-

09-1995, e autorizada pela resolução 27, de 14 de fevereiro de 1997, mantida pelo

Governo do Estado por meio da Secretaria de Estado de Educação - SEDUC em

parceria com a Secretaria de Justiça e Segurança Pública - SEJUSP. O imóvel em

que hoje se localiza a sede da escola é cedido pela JESUSP (PROJETO POLÍTICO-

PEDAGÓGICO, 2009).

O nome da nova escola foi escolhido pelos adolescentes, eleito por meio de

votação. Para eles, o novo nome representaria o futuro de cada um, pois acreditam

que a escola age de forma mobilizadora e transformadora, garantindo assim um

futuro promissor. Desde sua criação, em 1995, até 1998, a escola foi instalada no

município de Várzea Grande – MT, na Rua Julião de Brito, n. 520. A partir de 1998,

mudou-se para Cuiabá, com permanência de três anos, em um prédio cedido pela

PROSOL, no bairro Bandeirantes. A partir de 2001, ganhou novo endereço: o bairro

Lixeira. Suas instalações atendiam ao público-alvo da época: crianças e

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adolescentes encaminhados para as unidades da PROSOL, sob guarda judicial ou

em situação de rua. (PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO, 2009).

Em janeiro de 2003, o então governador Blairo Borges Maggi, através do

Decreto n. 4/2003, transfere para a Secretaria de Estado e Segurança Pública a

gestão da política de atendimento ao adolescente em conflitos com a lei. A Escola

Meninos do Futuro foi incluída nesta transferência de gestão. Em 2004, a escola foi

transferida para o Complexo Pomeri. Neste atual endereço, a sede passa a

funcionar em um espaço físico fora dos muros do Centro Socioeducativo, mas dentro

do Complexo Pomeri, onde funcionam a diretoria e a secretaria escolar. As salas de

aula foram deslocadas para dentro dos muros do Centro Socioeducativo, visando

aos adolescentes das unidades de Internação Masculina e de Internação Provisória

(vide foto 9, página 59).

Entende-se a parceria entre SEDUC e SEJUSP em função de a clientela

atendida ser composta por adolescentes e jovens que cumprem medida

socioeducativa. A escola oferece o ensino fundamental, ensino médio regular e

educação de jovens e adultos. É pacífico que a Escola ‘Meninos do Futuro’ abriga

características específicas, haja vista que sua clientela se encontra no quadro dos

excluídos. Atualmente, a escola se ocupa apenas dos alunos internos do Centro

Socioeducativo de Cuiabá.

A escola, com as salas de aula intramuros na unidade socioeducativa, é

toda cercada, tem uma quadra esportiva coberta e, ao lado, uma piscina. Possui 16

salas de aula, uma sala para os professores, uma sala para as coordenadoras, uma

cozinha, um banheiro e uma sala com computadores para acesso dos professores.

São disponibilizados aos alunos, laboratório de informática, biblioteca, sala de vídeo,

e sala de artes. Ao lado da sala dos professores, há um corredor, com

aproximadamente dez metros, onde estão algumas salas de aula.

As salas dispõem de espaço amplo, acomodam os alunos confortavelmente,

são pintadas em tons de bege e branco até o teto, forrado com madeira. O piso é

cinza. Uma das salas se destaca por contar com um banheiro em seu interior,

localizando-se distante das demais, cuja frente se volta para os fundos da escola.

Todas as salas contam com janelas grandes, gradeadas. Como mobiliário, uma

mesa média e uma cadeira para o professor e carteiras para os alunos, além de um

quadro verde na parede, dois ventiladores e quatro lâmpadas fluorescentes. Em

média, a sala recebe cerca de 12 alunos.

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Fonte: Socioeducativo Fonte: Socioeducativo

Fonte: Socioeducativo Fonte: Socioeducativo

Foto 1 Corredor que dá acesso às salas de aula

Foto 2 Sala de aula

Foto 4 Frente da unidade de internação

masculina

Foto 3 Piscina do Socioeducativo

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Fonte: Socioeducativo Fonte: Socioeducativo

Fonte: Socioeducativo Fonte: Socioeducativo

A escola funciona nos três períodos: matutino, vespertino e noturno. Todos

os seus professores possuem licenciatura plena. Dos 26 professores do quadro da

escola, 7 são efetivos, aprovados em concurso público, e 19 são contratados para

trabalhar durante o ano letivo, o processo de contratação ocorre por meio de edital

pela SEDUC - MT. Para visualização do leitor, abaixo apresentamos uma foto aérea

do Complexo Pomeri: para termos de ilustração, a delimitação em vermelho

demarca o espaço do Complexo Pomeri; a delimitação em amarelo, o espaço do

Centro Socioeducativo.

Foto 5 Quadra de esportes do Socioeducativo

Foto 6 Entrada de uma das alas, biblioteca

e sala de artes

Foto 7 Pátio do Socioeducativo

Foto 8 Pátio do Socioeducativo

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Fonte http://wikimapia.org/#lat=-15.580349&lon=-56.0426733&z=17&l=9&m=b

Unidade de

Internação

provisória

Piscina

Quadra de esportes

Bloco velho - Inter. Masc.,

Salas de aula, Coord.,cozinha.

Centro

Socioeducativo de

Cuiabá

Sede da Escola

Meninos do

Futuro

Bloco de

saúde

Posto policial

Bloco 1

Internação

masculina

Barracão Ala 3

Ala 4

Foto 9 Foto aérea do Complexo Pomeri

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O Complexo Pomeri se localiza no bairro Planalto, a 10 quilômetros do centro

de Cuiabá. Tem acesso pela Avenida Dante Martins de Oliveira, mais conhecida

como Avenida dos Trabalhadores. Por tratar-se de uma unidade direcionada ao

atendimento de adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de

internação, não há inter-relação com o bairro, conforme se percebe pela foto 9, na

página anterior. O Complexo recebe adolescentes de vários municípios de Mato

Grosso e, em alguns casos, de outros Estados do Brasil.

O bairro conta com alguns serviços à comunidade, como centro comunitário,

policiamento, unidade de saúde, centro odontológico e transporte coletivo.

Consoante o Projeto Político-Pedagógico (2009, p. 25) “a comunidade do bairro teve

início no ano de 1979, quando um grande número de famílias foram desapropriadas

de uma área onde seria construída a atual rodoviária da Capital”. À época, as

famílias foram transferidas para uma área desabitada, então considerada periférica

em relação à região central do município. Hoje, com o desenvolvimento acelerado

de Cuiabá, a região é, em princípio, privilegiada, tendo na Avenida Dante de Oliveira

uma das principais vias de acesso para outros grandes bairros.

O Complexo Pomeri foi inaugurado em 2001, conhecido como Centro

Integrado de Atendimento à Criança e ao Adolescente, atendendo ao preconizado

pela Lei 8.069/90, em seu artigo 88, inciso V. A centralização dos Órgãos de

Atendimento à Criança e ao Adolescente, no governo de Dante Martins de Oliveira,

foi denominada Complexo Pomeri.

POMERI, conforme algumas etnias indígenas Ikpeng (Karibe) e na sociedade Xavante de Mato Grosso, é um cerimonial onde os jovens passam por um processo de ‘reclusão’ em torno de dezoito meses onde são preparados para o exercício da cidadania junto às suas

respectivas comunidades (ANCHIETA, 2011, p. 09).

É composto pelo Juizado da Infância e da Juventude (varas cível e

infracional); Ministério Público (varas cível e infracional), Defensoria Pública (varas

cível e criminal), Escola Meninos do Futuro, Secretaria de Estado de Justiça e

Segurança Pública - representada pela Superintendência do Sistema

Socioeducativo, Superintendência do Sistema Prisional e Centro Socioeducativo.

Ainda fazem parte a Delegacia Especializada do Adolescente - DEA, a Delegacia

Especializada de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente - DEDICA, o

Projeto Rede Cidadã, sob responsabilidade da Polícia Militar, o Batalhão de Guarda

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da Polícia Militar e o Centro Integrado de Segurança e Cidadania -CISC.

O Socioeducativo de Cuiabá, pertencente à Superintendência do Sistema

Socioeducativo, é composto pelas Unidades de Internação Masculina e Internação

Provisória (também masculina). A Unidade de Internação Masculina atende

adolescentes com idade entre 12 e 18 anos, e, excepcionalmente, até 21 anos,

quando cumprem Medida Socioeducativa de Internação. São adolescentes que, por

ordem judicial, estão sob regime de internação: medidas privativas de liberdade,

sujeitas aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito a condição de

convívio em sociedade, no qual poderão permanecer por até três anos.

A Unidade de Internação Provisória atende a adolescentes, na faixa etária

de 12 a 18 anos, encaminhados pela DEA ou pelo juizado da infância e da juventude

com determinação provisória, onde o adolescente permanece no máximo por 45

dias. Nesse período, é realizado estudo psicossocial para encaminhamento ao

Poder Judiciário, Com o fim de liberação ou aplicação de medida socioeducativa,

respeitando o que prevê a legislação vigente. (PROJETO POLÍTICO-

PEDAGÓGICO, 2009).

Durante a etapa de permanência no Socioeducativo, o adolescente participa

de atividades sócio-pedagógicas e ocupacionais, resguardada sua integridade física,

psíquica, moral, bem assim seus direitos e deveres, individuais e coletivos. De

acordo com o art. 123 do Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA, parágrafo

único, no decorrer do período de internação, incluindo a provisória, são obrigatórias

as atividades pedagógicas (ECA, 1990).

2.6 Entrada em campo

A minha entrada em campo deu-se no dia 16 de abril de 2011, data esta em

que passei a frequentar os encontros com todos os professores da escola,

envolvidos no curso de formação continuada (Sala de Professor). Fui apresentada à

diretora da escola como aluna do Mestrado em Estudos de Linguagem, munida de

uma declaração expedida pela instituição, em que me apresentava como aluna e

posterior solicitação para que eu pudesse participar dos encontros. No primeiro

momento, havia uma preocupação da minha parte em como ser recebida pelo grupo

de professores. A intenção de iniciar a coleta de dados era apenas após minha

adaptação ao grupo a ser pesquisado. Isso ocorreu quando os professores

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passaram a me ver como um deles, não mais havendo estranhamento com relação

a minha presença.

Esta inserção foi importante para garantir maior fidedignidade aos dados

coletados, evitando-se ao máximo as alterações no comportamento do grupo

estudado em face da presença de novo agente. Aos poucos fui sendo recebida

como mais uma colega de trabalho, o meu relacionamento com os professores foi

harmonioso, mantínhamos diálogos constantemente, a respeito da escola e outros

assuntos corriqueiros, o que me deixou bastante confortável e motivada para realizar

a pesquisa.

2.7 Curso de formação continuada (Sala de Professor)

Como dito anteriormente a minha participação no curso de formação

continuada (Sala de Professor) se deu no dia 16 de abril de 2011. Relevante

assinalar que os encontros eram realizados quinzenalmente. A rotina de observação

participante no curso caminhou até sua finalização, em 8 de outubro do mesmo ano.

Posteriormente, passei a frequentar as dependências da escola para sequenciar

coleta de dados, momentos em que tive a oportunidade de estar presente em alguns

eventos comemorativos. Nos primeiros encontros, depreendi que minha aceitação se

associaria mais às minhas relações pessoais com o grupo do que às explicações

que eu pudesse ofertar a respeito do motivo de minha presença, embora elas

fossem importantes.

Quando da observação participante, percebi que, à medida que as

atividades eram realizadas, ouvia os professores e obtinha respostas para perguntas

que nem havia feito e que nem mesmo faria na realização das entrevistas. Cada

encontro se revestia de uma programação preestabelecida, determinada por

reunião, entre coordenação e professores, ocasião em que foi elaborado o projeto

da formação continuada (Sala de Professor). Esclareça-se que os temas a serem

discutidos eram eleitos de acordo com as necessidades do grupo.

Nessas reuniões, além de elencarem os temas a serem discutidos, os

professores decidiam como seriam as apresentações, alguns grupos optavam em

trazer palestrantes especialistas nos assuntos. No quadro 2 são apresentados os

temas discutidos no Curso de Formação Continuada (Sala de Professor) da Escola

Estadual “Meninos do Futuro”.

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Quadro 2 Tema dos encontros sala de professor 2011

DATA TEMA

09-03 Normas e condutas

10-03 Educação/Socioeducativo

11-03 Funcionamento Socioeducativo

12-03 Contando história

07-04 Trabalho pedagógico

16-04 Diversidade, sexualidade e bullying

30-04 ECA SINASE: Estatuto da Criança e do Adolescente - Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo

14-05 Medidas protetivas/Estatuto da Criança e Adolescentes

21-05 Relação interpessoal

04-06 Linguagem em sua diversidade e projeto na escola

18-06 O papel do professor na reinserção social por meio de medidas socioeducativas

02-07 Transdisciplinaridade, letramento e Educação de Jovens e Adultos (EJA)

18-07 Interdisciplinaridade áreas específicas

19-07 Interdisciplinaridade áreas específicas

20-07 Interdisciplinaridade áreas específicas

13-08 Cidadania- longo caminho da construção

27-08 Construção de projetos - eixos temáticos

10-09 Teoria da aprendizagem

08-10 Didática da organização

22-10 Educação transformando vidas

Fonte: Elaborado pelas autoras

Os encontros da formação continuada se deram nas manhãs de sábado, no

auditório da diretoria do Centro Socioeducativo de Cuiabá, das 8 às 12 horas. O

espaço é amplo, climatizado, bem iluminado. Costumava chegar alguns minutos

antes que se iniciassem os encontros, para observar a chegada dos professores,

que revelavam relacionar-se de forma harmoniosa.

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Fonte: Diretoria do Socioeducativo Fonte: Diretoria do Socioeducativo

2.8 Atividades realizadas pelos alunos

No período de minha coleta de dados, alguns produtos das aulas

ministradas pelos professores pesquisados estiveram expostos, tematizando

diversas questões a fim de proporcionar aos alunos um resgate e debates em torno

da relação dos jovens com o meio social, demonstrando a construção do

aprendizado crítico e reflexivo.

Fonte: Evento, aniversário de Cuiabá/Páscoa Fonte: Evento, aniversário de Cuiabá/Páscoa

Foto 10 Auditório

Foto 11 Auditório

Foto 12 Livros de receitas produzidos pelos alunos

Foto 13 Maquete das igrejas do Rosário e

Matriz confeccionada pelos alunos

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Fonte: Evento, aniversário de Cuiabá/Páscoa Fonte: Evento aniversário de Cuiabá/Páscoa

Fonte: Evento, aniversário de Cuiabá/Páscoa Fonte: Evento, aniversário de Cuiabá/Páscoa

Fonte: Evento, aniversário de Cuiabá/Páscoa Fonte: Evento, aniversário de Cuiabá/Páscoa

Foto 14 Apresentação de fantoche encenada pelos alunos

Foto 15 Confecção de cartazes

Foto 16 Cenário da Paixão de Cristo confeccionada pelos alunos

Foto 17 Poesias compostas pelos alunos

Foto 18 Paçoca de pilão feita pelos alunos

Foto 19 Doce preparado pelos alunos

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Fonte: Comemoração Dia das Mães Fonte: Comemoração Dia das Mães

2.9 Curso de Letramento Crítico (trabalho colaborativo)

Focando no trabalho colaborativo, minha orientadora e eu, começamos a

compreender que havia algo mais a ser desenvolvido que não a apreensão da

relação entre a formação continuada do professor e sua prática. Em dados

momentos, minha presença se traduziria em contribuição para o processo ensino-

aprendizado dos professores em uma relação simbiótica de aprendizado conjunto e

colaborativo. Esclarecedor o pensar de Spradley (1980, p. 3): “Mais que estudar as

pessoas, etnografia significa aprender com elas”.4 A pesquisa etnográfica

colaborativa possibilitou, desse modo, proporcionar um contexto de construção

conjunta, de forma que, associados aos professores, pudéssemos questionar e

construir novos conhecimentos, tornando-nos, conjuntamente, investigadores de

nossa própria prática.

Nesta pesquisa, optei por investigar as experiências dos professores da

escola, mesmo porque o trabalho de formação continuada já vinha sendo

desenvolvido há seis anos, assentado numa parceria entre UFMT e a escola

Meninos do Futuro, com a participação da minha pesquisadora-orientadora,

atendendo os anseios dos professores sobre a necessidade de estudar temas

inerentes ao ensino e aprendizagem. Visando contribuir com os professores, fui

convidada a participar nesta parceria, como auxiliar na parte teórica do curso de

‘Letramento Crítico’ e também na organização das atividades que pudessem ir ao

4No original: “Rather than studying people, ethnograph means learning from people”

Foto 20 Cartaz confeccionado pelos alunos

Foto 21 Cartaz produzido pelos alunos

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encontro da elaboração de novas estratégias dos trabalhos dos professores em sala

de aula.

A proposta da professora pesquisadora (orientadora desta pesquisa) foi

trabalhar o letramento crítico, um anseio dos professores da escola que já vinham

almejando trabalhar com essa temática. Além do letramento crítico, foram debatidos

tópicos sobre emancipação e a perspectiva do professor crítico reflexivo.

O curso teve como objetivo discutir e refletir acerca da linguagem,

enfaixando as diversas áreas do conhecimento, assinando que o conteúdo

ministrado estava relacionado com a preparação dos alunos para a leitura,

abordando-se a Linguística Geral, de Ferdinand de Saussure (1857 – 1913),

problematizando a dicotomia entre Língua x Fala, etc. A seguir, apresento as etapas

do planejamento do curso de letramento crítico:

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Quadro 3 Planejamento, realização e carga horária.

PLANEJAMENTO

Desde o primeiro momento em que minha orientadora sugeriu que

organizássemos um curso de formação para os professores da

Escola Meninos do Futuro e professores da Rede Pública de

Ensino, prosseguimos com a efetivação de encontros nos meses

de agosto, setembro e outubro de 2011. Neste contexto ampliamos

nossas leituras acerca da linguagem, do tema letramento crítico,

incluindo a formação crítico-reflexiva do professor, nos três níveis:

‘estrutura interna’, ‘relações microssociais’ e’ relações

macrossociais’5. Ao optarmos por trabalhar com professores de

diversas áreas do conhecimento, selecionamos textos e atividades

que viessem a contribuir para o melhor entendimento de todos os

professores. Vale ressaltar que essa etapa do planejamento foi

muito importante, uma vez que nem todos os professores são da

área de linguagem. Dessa forma tivemos que aprofundar nossos

estudos com objetivo de atender a todos os docentes possibilitando

entendimento e propiciar a eles novas possibilidades de trabalho

em suas disciplinas. Nesta preparação ficou acordado que após as

explanações dos temas os professores no final do curso iriam

planejar atividades e expor ao grupo.

REALIZAÇÃO

O curso foi realizado no auditório, mesmo local de realização do

curso de Formação Continuada (sala de professor), no mês de

novembro de 2011, ministrado por duas pesquisadoras, orientadora

e mestranda em Estudos Linguísticos na Universidade Federal de

Mato Grosso (UFMT).

CARGA HORÁRIA

O curso encerrou um total de 40 h (quarenta horas), ministrado nas

segundas e terças-feiras, das 16 às 19 horas (aulas expositivas e

dialogadas) e, aos sábados, das 08 às 12 horas, (leitura e

discussão dos textos).

Fonte: Elaborado pelas autoras

5 Estrutura interna considera-se as emoções, valores e sentimentos. Relações microssociais envolvem

questões inerentes à sala de aula, o professor precisa identificar os problemas que estão afetando a sala de aula. E

Relações macrossociais – o professor volta seu olhar para questões mais abrangentes (problemas vividos pela

comunidade, etc. (BARROS, 2010).

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Quadro 4 - Planejamento do Curso de Letramento Crítico - novembro 2011

DATA CONTEÚDOS ATIVIDADES

DESENVOLVIDAS

MATERIAIS AVALIAÇÃO

07-11

- 1ª aula ministrada

- Estudos das concepções de linguagem

- Aula expositiva dialogada Slides

08-11

- Letramento

- Letramento crítico

- Aula expositiva dialogada - slides

19-11

- Estudo de texto – Letramento e alfabetização: as muitas facetas –

Magda Soares

- Leitura coletiva do texto - Cópia do

texto

- Debate oral

21-11 - Revisão da leitura do texto – Tema discutido tipos de texto e Gênero - Aula expositiva dialogada -

22-11

- Discussão e debate acerca do texto - Projetos de letramento em turmas

de EJA: O aluno como agente – Regina Lúcia de Medeiros

- Aula expositiva dialogada

- Leitura e discussão do

texto em grupos

- Slides

- Cópia do

texto

- Exposição

oral para o

grupo

26-11

- Estudo de texto – Formação crítica do educador de línguas: por uma

política emancipatória e de transformação social (BARROS, 2010).

- Estrutura microssocial e macrossocial

- Sugestões de atividades a serem desenvolvidas em sala de aula.

- Aula expositiva dialogada

- Leitura e discussão do

texto em grupos

- Slides

- Cópia do

texto

- Exposição

oral para o

grupo

03-12

- Atividades desenvolvidas pelos professores/ avaliação do curso.

- Apresentação das propostas de atividades com o gênero em sala de

aula.

- Exposição das atividades

desenvolvidas em grupos

- Slides -Exposição

oral para o

grupo

Fonte: Elaborado pelas autoras

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2.10 Participantes da pesquisa

A seguir, apresento os três participantes desta pesquisa, registrando terem

eles recebido nome de flor para que sua identidade fosse preservada: Cravo,

Violeta e Hortênsia.

Professor Cravo - 54 anos, graduado em pedagogia, pós-graduado (nível de

especialização). Há 14 anos leciona na Escola Meninos do Futuro. Trabalha com o

ensino fundamental no período matutino, com 30 aulas semanais. Não possui

vínculo empregatício além deste, com a Secretaria Estadual de Educação, onde é

concursado. Iniciou seu trabalho na escola por acaso, uma vez que desconhecia sua

real situação, qual seja a de unidade socioeducativa. Cravo afirma ter se adaptado

satisfatoriamente na escola e acredita que se sai bem como professor, pois

considera ter características importantes para trabalhar com esses jovens:

considera-se educado, respeitador, comprometido, paciente e atencioso. Professor

Cravo foi o meu primeiro entrevistado e elegeu sua casa como local da entrevista,

realizada em 11 de dezembro de 2011. Com o intuito de auxiliar na entrevista, o

professor preparou um texto em que relata a breve história da escola, a mudança do

nome, incluída a alteração de comportamento dos alunos. Após o encontro da

entrevista, anotei no diário de campo informações subjetivas que não puderam ser

captadas com as falas, tais como olhares, gestos e o contexto da entrevista.

Professora Violeta – Educadora há 22 anos, graduada em geografia, pós-graduada

(Nível de especialização). Nos últimos oito anos leciona na Escola Estadual Meninos

do Futuro, onde se ocupa com o ensino fundamental e médio, no período vespertino

e noturno. É responsável por 23 aulas semanais não detendo outro vínculo

empregatício que não o contrato com a Secretaria Estadual de Educação. Começou

sua carreira com o magistério, pois o tinha como a única profissão que não impediria

o exercício da maternidade, desempenhado concomitantemente. Confessa que o

que chamou a atenção não foi a paixão pela sala de aula, mas as condições de

trabalho, podendo trabalhar por meio período. Afirma que acabou gostando da

profissão. Trabalhou durante dez anos com alfabetização, dizendo-se apaixonada

por essa fase de ensino. Após dez anos de magistério, cursou licenciatura, ocasião

em que passou a lecionar no ginásio, na área específica de sua formação

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licenciatura em geografia, pela qual se considera tão apaixonada quanto pela

alfabetização. Antes de trabalhar na Escola Meninos do Futuro, nada sabia a

respeito desta instituição de ensino. O que a motivou a querer lecionar nessa escola

foi à proximidade da sua residência. Julga-se envolvida com o objetivo de preparar

jovens para o retorno ao convívio social. A professora Violeta escolheu as

dependências da escola para a entrevista, realizada em 18 de abril de 2012, durante

o intervalo entre suas aulas.

Professora Hortênsia – Graduada em Letras Pós-graduada (nível de

especialização), 34 anos, leciona há 7 anos. Por 4 anos, dedica seu trabalho aos

alunos da Escola Meninos do Futuro. Atua no ensino fundamental no período

matutino, responsável por 20 aulas semanais. Não possui outro vínculo

empregatício, apenas o contrato com a Secretaria Estadual de Educação. Afirma que

sua história como professora começou por necessidade financeira. Com o passar do

tempo, envolveu-se com a profissão e garante amar o que faz. Antes de trabalhar na

Escola Meninos do Futuro, não tinha conhecimento algum sobre ela. Assegura já ter

ouvido falar da 'fazendinha' - nome como é vulgarmente conhecido o complexo

Pomeri no município de Cuiabá - mas não sabia como funcionava e tinha certo

receio de trabalhar neste ambiente, devido às constantes rebeliões divulgadas pela

imprensa. Com receio, passou a trabalhar na escola. Assevera ter amado essa

experiência. Elegeu sua residência como local para a entrevista.

2.11 Procedimentos de análise

Após a coleta de dados, deu-se início ao processo de organização dos

mesmos com posterior codificação e categorização para a análise. Considerei os

relatórios de diário de campo, elaborados com base nas observações dos

participantes, gravações de entrevistas semi-estruturadas, assim como as do curso

sobre ‘Letramento Crítico’. Esses dados foram também complementados com

documentos institucionais, para conferir suporte à análise.

Para o estudo minucioso das entrevistas e do curso, amparei-me na

abordagem de análise de conteúdo, usada nas ciências humanas e sociais, tendente

a descrever e interpretar o conteúdo de toda classe de documentos e textos em

especial em pesquisas de cunho qualitativo (BARDIN, 2011; MINAYO, 2007;

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BAUER; GASKELL, 2004; RICHARDSON, 2011). Como aponta Bauer; Gaskell

(2004), a análise de conteúdo foi desenvolvida na pesquisa social com o propósito

de analisar material textual, notadamente material impresso.

A matéria da análise de conteúdo pode constituir-se de qualquer material oriundo de comunicação verbal ou não-verbal, como cartas, cartazes, jornais, revistas, informes, livros, relatos auto-biográficos, discos, gravações, entrevistas, diários pessoais, filmes, fotografias, vídeos, etc. (MORAES, 1999, p. 3).

A análise de conteúdo se assenta em três fases ou polos cronológicos: a

pré-análise, a exploração do material e o tratamento dos resultados, inferência e

interpretação (BARDIN, 2011, p. 121). A pré-análise representa a fase de

organização propriamente dita, em que ocorre a retomada dos objetivos iniciais em

relação ao material coletado. Nesta fase, foram elaborados os indicadores que

orientaram a interpretação dos dados (RICHARDSON, 2011; BARDIN, 2011). Os

autores consideram esta fase indispensável, uma vez que permite a eliminação, a

substituição e a introdução de outros elementos que contribuam para melhor

explicação do estudo.

Richardson (2011) põe em relevo algumas atividades que foram efetivadas

nesta fase. Ei-las: leitura superficial do material e escolha dos documentos. A leitura

superficial se particulariza pelo contato inicial com o material, descortinando as

primeiras impressões em relação aos documentos. Em adendo facilita o

reconhecimento dos conceitos mais utilizados, possibilitando, aos poucos, que a

leitura se torne mais precisa no concernente a questões básicas da pesquisa.

A escolha dos documentos se notabiliza, nesta pesquisa, pelo recolhimento

de documentos que pudessem disponibilizar informações necessárias para este

estudo. Assim, foram seguidos alguns princípios básicos, o primeiro é a

exaustividade: após a definição do tipo de documento, fez-se um levantamento de

sua possível utilização, sem afetar o rigor científico. Quanto à representatividade,

foram selecionadas amostras cujas características estampassem reflexos dos

documentos. No que toca à homogeneidade, tanto os documentos como as

entrevistas, se referiram ao mesmo tema. A esses princípios acresça-se a

adequação: os documentos selecionados proporcionaram informações adequadas,

cumprindo com os objetivos da pesquisa.

A segunda fase da análise dos dados se circunscreveu à exploração do

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material. Neste estágio, os dados brutos foram codificados visando alcançar a

compreensão do material coletado. Posteriormente, esse material foi organizado em

categorias temáticas condizentes com os objetivos da pesquisa. Oportuno

testemunho de Richardson (2011, p. 233): “Assim, a codificação é uma

transformação – seguindo regras especificadas dos dados de um texto, procurando

agrupá-los em unidades que permitem uma representação do conteúdo do texto”.

Bardin, (2011, p.129) sustenta que em complemento:

A codificação corresponde a uma transformação – efectuada segundo regras precisas – dos dados em bruto do texto, em transformação esta que, por recorte, agregação e enumeração, permite atingir uma representação do conteúdo, ou da sua expressão; susceptível de esclarecer o analista acerca das características do texto, que podem servir de índices.

Da codificação se encaminhou para a escolha da unidade de registro,

denominada por Richardson (2011) como segmento de conteúdo, unidade base da

análise que visa à categorização. O autor distingue dois tipos de unidades de

registro: aquelas com base gramatical e aquelas com base não gramatical. Neste

estudo, elegeu-se a de base gramatical, sendo utilizados itens lexicais mais

relevantes como verbos, pronomes, adjetivos etc. que pudessem dar maior

credibilidade à análise.

A partir da codificação dos dados, chegou-se a três categorias:

(1) Professor crítico-reflexivo’

(2) Reflexão ‘na ação’

(3) Reflexão ‘sobre a ação’

A terceira fase foi de interpretação dos resultados. Nessa fase, os dados

brutos foram trabalhados de maneira a darem significados para a pesquisa. Os

dados tratados foram interpretados à luz do referencial teórico e dos objetivos

propostos, sendo enriquecido com a observação participante e os documentos.

A seguir apresento o capítulo analítico, ancorado na abordagem da análise

de conteúdo de Richardson (2011). Apresento as três categorias analíticas,

desvelando as reflexões dos professores da Escola Meninos do Futuro.

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CAPITULO III - ANÁLISE DE DADOS

Neste capítulo, apresento à análise dos dados da pesquisa, com base nas

entrevistas realizadas com os professores Cravo, Violeta e Hortênsia, sendo

complementada com a observação de campo e anotações acerca dos documentos

da Escola. Inicialmente, apresento a análise dos enunciados dos professores

presentes na categoria ‘Professor crítico-reflexivo’. Em seguida, descortino o que os

mesmos enunciaram na categoria ‘Reflexão sobre a ação’. E, finalmente, na

categoria ‘Reflexão na ação’ analiso as considerações feitas pelos professores. Essa

análise contribuiu para melhor compreensão das experiências vivenciadas pelos

professores na escola.

3.1 Professor crítico reflexivo: comprometimento em relação à prática pedagógica

Nas entrevistas realizadas com os três professores, percebi a preocupação

deles em socializar os acontecimentos ocorridos na escola, de forma a resolver os

problemas em conjunto. Os seus enunciados revelam inquietude em tentar sanar as

dificuldades do dia a dia, por meio do trabalho em equipe, pautado em oferecer aos

alunos melhores condições de aprendizagem. Essa preocupação estende-se

também aos demais colegas ao comprometerem-se com o contexto social onde

trabalham. Demonstram interesse em promover algum tipo de mudança nesse

ambiente de ensino. Em suas declarações apresentam envolvimento com a escola.

Tais características estão em consonância com a perspectiva de professor

crítico-reflexivo, presente neste estudo. A reflexão crítica enquanto atividade coletiva,

envolvendo processo de ‘autocrítica’, com interesse libertador, em que o professor

age diante de um problema, buscando solução no coletivo. Além de refletir sobre

suas ações, os professores questionam as estruturas sociais em que trabalham. Na

sequência apresentada, abaixo, os dizeres de Violeta sinalizam sua visão acerca

dos colegas da escola, a respeito do trabalho coletivo, em que as palavras se

entrelaçam com as ações e atitudes reflexivas, no sentido de construir o contexto

escolar.

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Sequência 1 (linhas 1 a 4)

(1) [...] ás vezes nós juntamos fazemos grupos de professores houve a ideia fala sim não

(2) hoje nos precisamos dar uma aula diferenciada a qual os alunos não estão querendo

(3) assistir aula então nos juntamos todos os professores unimos e determinamos

(4) escolhemos alguma coisa para ta trabalhando com eles.

(Entrevista com a professora Violeta, em 18-4-2012)

Nesse exemplo, Violeta expressa que as ações realizadas, coletivamente,

entre ela e seus colegas, tem como objetivo melhorar o processo de aprendizagem

dos alunos. Segunda ela, em alguns momentos os estudantes não querem assistir

as aulas. Ao enunciar “nós juntamos” (linha 1), Violeta demonstra atitude de

solidariedade entre ela e seus colegas. O uso do pronome ‘nós’ tem caráter

coletivo/inclusivo, demonstrando o sentido de que Violeta inclui-se ao grupo de

professores. A forma verbal ‘juntamos’, ‘unimos’ (linhas 1 e 3) revela sentido de

união.

Violeta também usa a modalidade deôntica ‘precisamos’, expressando,

dessa forma, o seu comprometimento e dos colegas, a necessidade em ministrar

uma aula ‘diferenciada’, no sentido de que as aulas eram sempre iguais, e que em

alguns momentos causava a insatisfação dos alunos. As condições de trabalho

nesse cenário educacional deveriam ser diferentes, para alcançarem melhores

resultados. Isso envolve a busca constante de atividades motivadoras e relevantes

para a sala de aula, atividades que promovam interação e que sejam adequadas ao

nível do aluno.

É interessante destacar aqui que, ao ler os documentos da escola (Projeto

Sala de Professor) verifiquei a importância dada à reflexão do trabalho coletivo, o

que entrelaça as palavras da professora Violeta. Na justificativa do projeto consta

que ser educador na Escola Meninos do Futuro exige muito mais que preparação

técnica, é necessário esforço coletivo direcionado a uma prática menos irreal e mais

humanizada, atendendo às especificidades dos adolescentes. A preocupação

exposta no Projeto Político Pedagógico instaura uma forma de organização do

trabalho pedagógico que busque superar os conflitos e dificuldades.

A forma verbal na terceira pessoa do plural ‘unimos’ deixa clara a

aproximação entre ela e os professores que acreditam poder realizar ações em

conjunto, possibilitando melhor interação com os alunos em sala de aula. Relação

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cooperativa com objetivo de superar as dificuldades, uma tentativa de não apenas

valorizar o trabalho em conjunto, mas principalmente, de colocarem-se como

agentes críticos de mudanças.

Nesse exemplo, Violeta parece fundamentar sua fala nos princípios da

perspectiva crítico-reflexiva, ligada à reflexão como resultado de uma vontade que o

professor pode expressar e provável busca por soluções, o que segue a trilha do

pensamento de Prestes (1994), em que o professor deve ter compromisso com o

desenvolvimento do pensamento crítico do aluno, sendo o mediador do seu

processo de construção intelectual. Violeta sabe que é possível ensinar em ambiente

de socioeducação, apesar de todos os desafios que existem. Ao perceber que seus

alunos não estão correspondendo às atividades propostas, ela para, conversa,

procura manter uma sintonia com os alunos, para que eles não se sintam

desmotivados.

Sequência 2 (linhas 1 a 4)

(1) Não gosto de trabalhar só com livros, não gosto de trabalhar só com aquilo ali que

(2) Fala, ás vezes isso é bom, mas tem algo melhor e esse algo melhor é a minha pesquisa,

(3) Saber é fazer essa coisa de refletir o que o aluno fez na aula anterior pra eu trazer

(4) Coisas melhores pra ele na próxima aula.

(Entrevista com a professora Hortênsia, em 2-5-2012)

Nessa sequência, Hortênsia usa o advérbio de negação ‘não’, revelando a

maneira como ela se vê enquanto professor pesquisador e de como acredita que

essa postura pode melhorar o seu trabalho. Inicia sua fala utilizando-se do advérbio

de negação ‘não’, seguido do verbo ‘gostar’ (linha 1), para expressar como

desenvolve o seu trabalho: “Não gosto de trabalhar só com livros” (linha 1). Ao dizer

isso, Hortênsia desvela como ela vê o seu próprio trabalho, sinalizando o desejo de

expandir o seu processo de preparação das aulas. Assim, Hortênsia revela não

concordar que as suas aulas se pautem apenas em livros.

Ainda na linha 1, o uso do advérbio de exclusão ‘só’ expressa o sentido de,

somente, sugerindo que a mesma utiliza outros recursos, além dos livros para

auxiliá-la na preparação de suas aulas. Em seguida, o advérbio ‘só’ aparece,

novamente, com o mesmo sentido do anterior, acompanhado da expressão “com

aquilo” (linha 1), o que denota não ser considerado bom para o trabalho do

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professor pautar-se apenas em livros didáticos.

Hortênsia, ao dizer ‘algo melhor’ (linha 2), utiliza de adjetivo de

superioridade ‘melhor’, expressão esta, recorrente três vezes em sua fala (linhas 2

e 4). Tal atitude demonstra, conforme o pensamento de Perrenoud (2002), que esse

professor reflete sobre sua ação, questiona sua prática e busca como melhorá-la,

como ser diferente em relação aos demais colegas. Tal atitude da professora

corrobora que não é qualquer coisa que ela quer levar para sala de aula, o que

requer conhecimento metodológico, saber se a atividade proposta desenvolve as

habilidades necessárias dos alunos.

Em um dos encontros da formação continuada, foi destacada a relevância

sobre a formação do professor, voltado ao compromisso político, ou seja, em

reafirmar a necessidade de pensar de forma crítico-reflexivo. Para tal, o professor

precisa conhecer a escola, a família, promover reuniões e palestras com os pais e

comunidade. Na próxima sequência, a professora pontua algumas dificuldades

contextuais, ao tentar trabalhar de forma criativa. Demonstra que necessita ser ainda

mais criativa para lidar com as dificuldades que encontra em uma unidade

socioeducativa:

Sequência 3 (linhas 1 a 5)

(1) ás vezes não podia levar uma tesoura para recortar revistas, certo tipo de

(2) revista não podia levar... uma vez, em um trabalho com jornais, eles tinham

(3) que saber o que era uma reportagem... uma noticia no jornal. Peguei, levei pra

(4) sala. Quando viram eu indo pra sala com este jornal fizeram eu voltar urgente.

(5) (...) prá resolver o problema eu passei uma noticia no quadro, mas ai são grandes.

(Entrevista com a professora Hortênsia, em 2-5-2012)

Na linha 1, Hortênsia começa empregando a modalidade dêontica ‘podia’

junto do advérbio de negação ‘não’, recorrente duas vezes (linhas 1 e 2),

expressando, dessa forma, que não havia a possibilidade de levar alguns materiais

pedagógicos para a sala de aula, o que dificultava o desenvolvimento do seu

trabalho junto aos alunos.

A criatividade pauta o trabalho da professora Hortênsia, que conta com mais

um desafio em ambiente escolar: as especificidades do ambiente de Centro de

ressocialização. Além de necessitar de muita criatividade para o trabalho, pois

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alguns dos materiais (tesoura, estilete, reportagens), utilizados para fins didáticos em

ambiente escolar são restritos no ambiente da Escola Meninos do Futuro. A

professora parece valorizar a criatividade como aspecto a ser estimulado entre seus

alunos. Ser crítico e reflexivo é necessário para lidar com as dificuldades

encontradas nesse contexto educativo.

Na linha 2, o pronome ‘eles’ nomeia os alunos da escola e a modalidade

dêontica ‘tinham que’ (linha 2) expressa a convicção de Hortênsia de algo que os

alunos tinham que saber. Essa atitude revela seu comprometimento com

obrigatoriedade para modificar a situação de desigualdade, principalmente, na

condição de educadora reflexiva, consciente de seu papel sociopolítico e de sua

responsabilidade com os alunos.

Quanto ao uso dos identificadores, destaco o uso do pronome ‘eu’

(autorreferencial) (linhas 4 e 5), expressando afinidade de Hortênsia com a

proposição. Isso sinaliza sua certeza de que o posicionamento do professor é

fundamental, refletindo a respeito da possibilidade e eficácia da aplicação de um

material. Mostra sua preocupação em fazer o trabalho docente de melhor maneira

possível, mesmo com todos os percalços, de cuja existência ela demonstra ter

conhecimento. As atitudes da professora entrelaçam ao pensamento de Contreras

(2002) quando foca a reflexão como suporte em que o docente, além de refletir

sobre sua ação, analisa e questiona as estruturas em que trabalha e as imposições

às quais obedece.

Sequência 4 (linhas 1 a 3)

(1) [..] eu uso a borracha EVA pra construir o próprio texto no EVA grande e corto esse EVA

(2) também em pequeno pedaço pra poder registrar, as silabas, registrar as palavras e ajudar

(3) na alfabetização e se pode levar não da problema.

(Entrevista com professor Cravo, em 11-12-2011)

Assim como Hortênsia, o professor Cravo pauta sua criatividade na

elaboração das atividades a serem desenvolvidas com os alunos. Ressalta a

relevância do trabalho com o EVA6. Cravo tece comentários específicos do que é

6 E.V.A é a sigla de “Etil Vinil Acetato”. Trata-se de um produto químico de diversos produtos materiais, tais

como: resinas, agentes de expansão, cargas, ativadores, auxiliares de processo, pigmentos, e outros polímeros

como borracha ou termoplásticos. Borracha não-tôxica que pode ser, e é, aplicada em diversas atividades

artesanais e pedagógicas.

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desenvolvido com o material. Na linha 1, Cravo usa o pronome ‘eu’

(autorreferencial), junto com a forma verbal usar, para relatar suas ações em relação

ao material didático, o que pode ser caracterizado como uma proposição, para

assumir o que ele diz.

Na linha 2, Cravo faz uso do modalizador deôntico ‘poder’, como

possibilidade de que ele tem para desenvolver suas atividades pedagógicas com o

material. Mais adiante, na (linha 3), novamente, Cravo utiliza o modalizador deôntico

‘poder’, expressando permissão, ressaltando que o material pode ser levado para a

sala sem problemas. Denota-se, que ao preparar suas aulas, o professor precisa ter

ciência do que pode ou não ser levado para o contexto de sala de aula, a partir daí

elaborar suas atividades, o que requer planejamento.

Nas minhas anotações de campo constatei que os professores preocupam-

se na elaboração das atividades. No entanto, não consideram que determinados

materiais didáticos como: revistas, jornais, música, tesouras possam interferir no

processo de ressocialização dos alunos. O impedimento de se trabalhar com esses

materiais não vem da parte pedagógica e, sim, da instituição socioeducativa, que

prima pela segurança tanto dos alunos quanto dos professores. Esses professores,

assim como Freire (2006), primam por uma educação libertadora, em que os seus

alunos possam ter condições de serem conscientizados longe da opressão e

dominação, conforme exemplificado na sequência, a seguir.

Sequência 5 (linhas 1 a 7)

(1) Ser um professor crítico reflexivo é ter humildade, que nem sempre você sabe tudo e

(2) nem sempre, sua aula foi boa e você tem que procurar modificá-la certo, procurando

(3) recursos através de livros didáticos e através de colegas mais experientes e também o

(4) professor crítico-reflexivo é ele ter condição de criticar aquilo que não deu certo e

(5) propor aquilo que poderá dar certo e não basta falar que não dá certo bom você tem

(6) que explicar porque que não é bom entendeu, então você tem que ter condição de ver

(7) que aquilo não foi bom e propor uma nova alternativa .

(Entrevista com professor Cravo, em 11-12-2011)

Na linha 1, Cravo faz uso da forma verbal ‘ser’ denotando sentido do que

ele considera ser um professor crítico reflexivo. Mais adiante ele utiliza a forma

verbal ‘ter’ (linha 1), seguido pelo substantivo ‘humildade’, para complementar sua

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ideia de que “ser um professor crítico-reflexivo é ter humildade”, ou seja, não ter

orgulho de pedir ajuda ou dizer que não sabe de determinado assunto.

Nas linhas 1, 2, 5 e 6, Cravo utiliza o pronome ‘você’ de maneira genérica.

Ao fazer uso desse pronome, o professor parece nomear ele mesmo como autor do

seu próprio dizer. O uso de ‘você parece sinalizar atitude de humildade, denotando

que esse professor procura auxílio de outros colegas para sanar suas dúvidas.

Cravo se coloca no grupo de professores, reconhecendo que não sabe tudo. O que

Contreras (2002) qualifica como uma atitude de reflexão, que serve de reforço a uma

atitude crítica. O professor assegura modificar suas atitudes por meio da ajuda de

colegas e outros recursos.

O uso do pronome de intensidade ‘mais’ (linha 3) revela que uns colegas

sabem mais, e que esses podem auxiliar, assim como os livros didáticos. Na linha 4,

o uso da forma verbal ‘ter’ indica obrigatoriedade, seguido pelo substantivo

‘condição’, sinalizando que o professor precisa estar preparado para criticar. A

expressão ‘aquilo’ (linha 4) torna-se um dêitico, pois expressa algo que o professor

esta pensando, em particular, as aulas ministradas por eles.

Na linha 5, Cravo utiliza a modalidade epistêmica ‘poderá’, no futuro do

presente, expressando possibilidade de que algo venha dar certo. Ainda na (linha 5)

Cravo utiliza do pronome ‘você’ (inclusivo), seguido da modalidade deôntica ‘tem

que’ (linha 5), revelando o comprometimento do que é ser um professor crítico-

reflexivo. Na linha 6, Cravo também faz uso da modalidade deôntica ‘tem que’

expressando uma obrigação interna, ditada pela consciência de que o professor

“tem que ter condição” de perceber o seu trabalho e refletir sobre o mesmo,

buscando sempre melhorar.

A fala do professor Cravo ilustra o que é ser um professor crítico, ou seja,

aquele que se utiliza das experiências atuais e passadas como parâmetro para

decidir-se sobre o que buscar, tendo por base uma análise dos pontos fortes e das

fragilidades percebidas. Seus enunciados articulam-se em torno da ideia de que a

reflexão crítica pode levar-se à emancipação, com interesse libertador de pessoas e

grupos sociais, não se limitando apenas em mostrar as formas libertadoras, mas

também, auxiliar grupos sociais a interpretarem a si mesmos, elevando a sua

autoconsciência.

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Sequência 6 (linhas 1 a 3)

(1) ser crítico não é só discordar, ser crítico, você tem que entender da situação que

(2) não deu certo, propor uma nova situação que poderá dar certo e defender essa

(3) ideia, que poderá dar certo.

(Entrevista com professor Cravo, em 11-12-2011)

Percebe-se, nesta sequência, o uso da forma verbal ‘ser’ (linha 1), para

expressar o que considera ser um professor crítico. Ao dizer “não é só discordar”

utiliza do advérbio de negação ‘não’, seguido do advérbio só, indicando que tem

algo a mais do que meramente discordar de algo. Ao usar o modalizador deôntico

‘tem que’, expressa obrigatoriedade do professor em buscar compreensão de

determinado assunto relacionado à prática pedagógica.

Nas linhas 2 e 3, Cravo utiliza do modalizador epistêmico poder no futuro do

presente ‘poderá’ indicando a possibilidade de refletir sobre o que não deu certo,

tentar propor uma solução, não ficar alheio ao que acontece na escola, e sim

envolver-se e apontar possíveis soluções. A conotação das palavras de Cravo indica

que se deve tentar realizar seu trabalho como professor na busca de sempre estar

melhorando, pois tentar é uma possibilidade de que pode-se alcançar seus objetivos,

que como ele afirma, poderá dar certo.

Sequência 7 (linhas 1 a 3)

(1) Eu me considero um professor crítico. (...) pra ser crítico a pessoa tem que ser

(2) um bom observador, ele tem que observar aquilo que não deu certo e propor

(3) aquilo que possa dar certo.

(Entrevista com professor Cravo, em 11-12-2012)

O professor inicia sua fala utilizando o pronome eu (autorreferencial), para

demonstrar o caráter opinativo pessoal em que se considera um professor crítico.

Em seguida usa o modalizador deôntico ‘tem que’ (linhas 1 e 2), seguido da forma

verbal ‘ser’, que expressa sua convicção de que para ser crítico tem que ser

observador, revelando seu comprometimento com a obrigatoriedade do seu trabalho.

Assim o ambiente escolar é propicio para que o professor possa exercer papel

crítico, e relevante que ele tenha conhecimento do contexto ao qual trabalha e

interação com a comunidade escolar.

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Sequência 8 (linhas 1 a 3)

(1) Eu digo gratificante gosto muito dos meninos são ótimos eles querem aprender quando

(2) cai lá dentro ele cai como se fosse no mundo da lua que eu falo que eles falam e cai

(3) dentro de um buraco e ai opa! Cai aqui, quero sair e ai eles começam a participar.

(Entrevista com professora Hortênsia, em 2-5-2012)

Nesta sequência, Hortênsia usa o pronome ‘eu’ (autorreferencial) para

expressar seus sentimentos em relação aos alunos. A presença da forma verbal

‘gostar’ no presente do indicativo ‘gosto’, seguido do advérbio de intensidade

‘muito’, enfatiza o que sente em relação aos alunos. Sua atitude revela

proximidade. Hortênsia faz uso do identificador ‘eles’ para se referir aos alunos. Na

(linha 2), Hortênsia utiliza a forma verbal cair, que, segundo o contexto, pode

representar uma gíria, “cai lá dentro”, significando ser preso.

Ainda na linha 2, Hortênsia refere-se ao verbo cair no sentido de

surpreender-se. Segundo ela, eles ficam “no mundo da lua”, expressão que denota

que os meninos ficam distantes, sem interesse nas aulas. Em certo momento,

Hortênsia incorpora as vozes dos alunos afirmando “eu falo que eles falam”, “cai

dentro de um buraco”, sinalizado proximidade com os alunos. Hortênsia percebe

que, dessa forma, os alunos tomam ciência da situação e começam a participar de

suas aulas, envolvendo-se nas atividades e oferecendo sempre um feedback para o

planejamento de suas aulas.

Durante o período em que estive com os professores na escola e durante o

curso (Sala de Professor), pude apreender que os professores ouvem seus alunos e

dão importância ao que eles dizem. Assim como Hortênsia, Cravo e Violeta também

consideram gratificante o trabalho como professor no socioeducativo. Esses

professores veem os alunos como cidadãos que precisam do saber escolar para

serem úteis à sociedade. Notabilizam a importância da educação para o seu retorno

à sociedade. Observei que a postura desses professores frente aos alunos parece

pautar-se na compreensão e respeito, não se deixando influenciar pelo ato que

levou os adolescentes à internação, como parâmetro para o tipo de tratamento que

oferecerão a eles.

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Sequência 9 (linhas 1 a 3)

(1) Não tem nada melhor do que aluno se sentir bem durante a aula é como se fosse eu

(2) falo que a escola é como um trabalho né o melhor lugar para você trabalhar é onde

(3) Você se sente bem e pra estudar também então é ótimo fazer essa reflexão.

(Entrevista com professora Hortênsia, em 2-5-2012)

Nesta sequência, a professora Hortênsia usa o advérbio de negação ‘não’

enfatizando a expressão “não tem nada melhor”, com o adjetivo comparativo de

superioridade ‘melhor’ (linha 1), para demonstrar que se preocupa com o bem estar

de seus alunos durante as aulas. Prima pela valorização do envolvimento dos

jovens, transformando o ambiente de aprendizado em momentos atraentes, em que

os professores demonstram preocupação em chamar a atenção do aluno para a

participação. Assim, ela considera que, mais do que receber um conteúdo, deve

haver envolvimento do discente no processo ensino-aprendizado como sujeito desta

construção.

Ainda na linha 1, a professora Hortênsia utiliza o pronome ‘eu’

(autorreferencial) seguido do verbo falar no presente do indicativo ‘falo’, enfatizando

seu comprometimento nesse processo de aprendizagem, destacando que, para ela,

a escola é como um ‘trabalho’ (linha 2). Com essa comparação, Hortênsia

recontextualiza o sentir-se bem dos alunos na sala de aula, para a sua vida, porque

assim como eles, ela também considera importante sentir-se bem no trabalho.

O pensar da professora está em consonância com Alarcão (2007), pois

considera ser esse ambiente mais humano, libertador e de responsabilidade social.

Proporciona um desenvolvimento crítico-reflexivo. Na linha 3, a professora afirma na

expressão “é ótimo fazer essa reflexão”, retomando sobre o que disse em sua fala,

ressaltando que o aluno deve sentir-se bem na escola para aprender.

Sequência 10 (linhas 1 a 9)

(1) [...] você pode pegar os cadernos deles tá cheio ta lá entendeu eu tenho cadernos que

(2) são guardados lá pra mostrar da época que foi feito e teve uma época que houve um

(3) limpa lá mais depois eles quiseram guarda não são de todos alunos tem sempre o aluno

(4) que sempre copiou você vai ver caderno lá cheio por que eles copiam em um método

(5) tradicional e o outro que o método que a gente esta tentando levar lá pra dentro que

(6) era do diferenciado que esta coisa de trabalhar com musica, livro, produção

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(7) diferenciação né, mas e eu não vejo muita diferença não eles são alunos como os outro

(8) aqui fora que gosta de brincar conversar de bagunçar na sala como se fosse pra eles a

(9) eles só falam que aqui não estuda meninas mas e igual .

(Entrevista com professora Hortênsia, em 2-5-2012)

A professora Hortênsia inicia sua fala, com o uso do pronome ‘você’

identificador exclusivo para se referir à pesquisadora, seguido do modalizador

deôntico ‘poder’ expressando permissão/possibilidade de que pode olhar o caderno

dos alunos, identificados pela pronome possessivo ‘deles’ (linha 1). Ainda na (linha

1), Hortênsia faz uso do pronome ‘eu’ (autorreferencial), seguido do verbo ter no

presente do indicativo ‘tenho’, para demonstrar que ela tem os cadernos dos alunos

guardados e caso fosse do meu interesse, eu poderia ver.

Na linha 2, Hortênsia faz uso da expressão “da época que foi feito”,

sinalizando saudosismo do trabalho desenvolvido com os alunos. Os cadernos

guardados são como registros daquela época, comprovando a participação dos

alunos nas atividades. Sua fala é intensificada com o uso do advérbio de tempo

‘sempre’ (linha 3), caracterizando que sempre há alunos que participam das aulas e

copiam as atividades no caderno.

Hortênsia refere-se a ‘copiar’ relacionado a um método ‘tradicional’ (linha

3). O que denota ser o ato do aluno copiar o que está no quadro, como se este

hábito estivesse incorporado de forma costumeira nas aulas. Em sua fala, Hortênsia

indica não considerar essa prática adequada, pois, menciona a forma pronominal ‘a

gente’ (linha 5) com o sentido de nós, incluindo-se e a outros colegas de trabalho,

para revelar que são professores comprometidos e preocupados com o

desenvolvimento do processo de aprendizagem dos alunos. Hortênsia afirma que os

professores estão ‘tentando’. O que demonstra a intenção de buscar métodos que

venham auxiliar nas aulas.

Ao falar de tentativa de uma nova forma de trabalho, Hortênsia na (linha 6),

fala em trabalhar ‘diferenciado’, o que representa utilizar de novos métodos,

diversificar as aulas, deixar de usar apenas o quadro, sugere como alternativa o

trabalho com música e livros a produção relacionada a estes itens. Ainda falando em

diferença, Hortênsia afirma não ter em relação aos alunos do socioeducativo e os

que estão em outras escolas, que ela denomina ‘aqui fora’, ressalta que eles

gostam de brincar, conversar, bagunçar como qualquer aluno, e que os alunos

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apenas notam diferença por não ter colegas meninas nas salas de aula.

Nas linhas 1, 2, 3,4 e 5, Hortênsia emprega o advérbio de lugar ‘lá’ referindo-

se à escola, talvez pelo fato da entrevista ter acontecido fora do espaço escolar. Na

(linha 8) utiliza do advérbio de lugar ‘aqui’ referindo-se fora da escola. No entanto,

na (linha 9), também usa o advérbio de lugar ‘aqui’. Dessa vez, retomando ao

contexto da escola, como se estivesse no local, o que denota alto grau de

aproximação com o local de trabalho.

Sequência 11 (linhas 1 a 3)

(1) Que eu possa trabalhar a realidade do aluno junto com as novas tendências que

(2) A educação tá trazendo, não saindo muito do tradicional porque o nosso aluno,

(3) desse meio, eles gostam muito do tradicional.

(Entrevista com professora Hortênsia, em 2-5-2012)

Percebe-se na sequência 11 a preocupação da professora Hortênsia com o

aprendizado dos alunos. Voltado para a realidade e as necessidades deles, ela

enfatiza sua fala fazendo uso do pronome ‘eu’ (autorreferencial) seguido do

modalizador epistêmico ‘posso’ expressando a possibilidade/necessidade em

desenvolver seu trabalho pedagógico unindo as novas ‘tendências’ educacionais

(linha 1). O que denota que o modo de ensinar está mudando, e o professor não

encontra receitas prontas, busca meios adequados para desencadear o processo de

aprendizagem. Podemos perceber a preocupação da professora com a qualidade

das aulas.

Assim, Hortênsia expressa à relação da realidade do aluno e as novas

tendências, no sentido de trabalhar o contexto não como mera imitação da realidade,

mas, com conteúdos que possam explorar o conhecimento de mundo dos alunos,

com materiais que possam apresentar o contexto sociocultural deles. Nesse sentido,

Barros (2010) relaciona relevância do trabalho pedagógico correlacionado com o

que ocorre extramuros da escola.

A professora ressalta que os alunos gostam do método tradicional. O que

nos leva a refletir: por que os alunos prefeririam o tradicional, se o problematizador é

mais envolvente e contextualizado? Essa tendência ao tradicional, segundo Lipman

(1990), relaciona-se com as características da educação, que foi tradicionalmente a

da transmissão de conhecimento. O foco estava voltado a aprender o que os adultos

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já sabiam ou pensavam saber. No entanto, mesmo com mudança de paradigma na

história da educação, conforme o autor, em que o aprender deu lugar ao pensar,

restam resquícios do modelo tradicional.

Paulo Freire (2006) aponta a educação voltada para o diálogo entre

educador e educando, para que ambos façam parte do processo de construção do

conhecimento através de trocas, sem que haja o estabelecimento da autoridade do

conhecimento. Educador e educando são sujeitos críticos, reflexivos e

investigadores. O educador valoriza o conhecimento que cada educando traz,

desenvolvendo o seu poder de compreensão e capacitação, para que possa haver o

compartilhamento de experiências e o educador também possa aprender com o

educando.

Sequência 12 (linhas 1 a 4)

(1) Eu uso alguns materiais que fazem parte da estratégia ou da metodologia... eu

(2) Uso jogo jogos daqueles comprados e às vezes eu faço também jogos através

(3) da borracha EVA. Faço dominó e faço também fichas confeccionadas de EVA

(4) pra ajudar na alfabetização eu faço fichas com sílabas, com palavras

(Entrevista com professor Cravo, em 11-12-2011)

Nessa sequência, Cravo inicia sua fala fazendo uso do pronome ‘eu’

(autorreferencial) seguido do verbo ‘usar’, no presente do indicativo (linha 1).

Expressando ação realizada por ele, ligada a sua experiência e a sua vivência

profissional. O substantivo ‘matérias’, relaciona-se a recursos didáticos

pedagógicos. Ao afirmar “que fazem parte da estratégia”, Cravo demonstra ter

dedicação ao seu trabalho, de maneira habilidosa, para alcançar seus objetivos: a

alfabetização dos alunos.

Tanto Cravo quanto as professoras Violeta e Hortênsia percebem que

precisam utilizar de recursos para estimular o aprendizado do aluno. Porém, isso

parece não ser uma tarefa fácil, pois além de eleger as atividades que melhor

atingirão seus objetivos, os professores precisam escolher os materiais de forma

que possam ser utilizados em sala de aula. Essa prática requer do professor cautela

e conhecimento para que os alunos a associem como um método de aprendizado

para além do aspecto lúdico.

Cravo faz uso do pronome ‘eu’ (autorreferencial), (linha 1, 2 e 4) com

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objetivo de se colocar como professor que tem atitude. Mostrando-se responsável

pelas suas ações. Relacionando o verbo fazer, “faço” no presente do indicativo

(linhas 2,3 e 4). Expressando a ação praticada por ele, a confecção dos jogos e

fichas por meio da borracha EVA, com intuito de melhorar as suas aulas e auxiliar no

aprendizado dos alunos. Na sequência, apresentada a seguir, Hortênsia também

demonstra utilizar de recursos didáticos, para, além de auxiliar nas aulas, atrair a

atenção dos alunos.

Sequência 13 (linhas 1 a 4)

(1) [...] eu utilizava Foi a que eu consegui sair com eles, e eles aprender foi na

(2) música o som o que eles, faziam, pegavam a música que era uma coisa que eles

(3) gostavam, ne pedia para eles escolherem as que música claro que tinha que

(4) condizer com nossa realidade.

(Entrevista com professora Hortênsia, em 2-5-2012)

Neste enunciado, Hortênsia demonstra o planejamento do professor

buscando formas para aproximar-se de seus interesses, ou seja, a interação

professor aluno com preocupação em desenvolver um trabalho voltado a estimular o

aprendizado deles. Contudo, essa busca, segundo Dewey (1933) caracteriza a

reflexão. O que fará com que o professor se esforce para descobrir dados que

sanem suas necessidades. O que o autor aponta como fator básico e orientador em

todo mecanismo de reflexão, sendo regulado pelos objetivos.

O pronome ‘eu’ (autorreferencial) no inicio do parágrafo, seguido do verbo

utilizar no pretérito imperfeito, ‘utilizava’, pode ser entendido como algo que

Hortênsia já vem fazendo há algum tempo com os alunos, representados pelo

pronome ‘eles’ (linha1), demonstrando que o seu interesse era o de trabalhar com

algo que estimulasse a vontade de aprender deles. Em sua fala, Hortênsia diz ter

conseguido alcançar seus objetivos de atrair a atenção dos alunos por meio da

música. Segundo Hortênsia fazendo uso do verbo gostar, no pretérito imperfeito

‘gostavam’ (linha 3), a música chamava atenção deles.

Essa sequência parece caracterizar mais que a reflexão do professor sobre

o processo de desenvolvimento de seu trabalho. O diálogo é demonstrado através

da opinião do aluno, na escolha das músicas a serem trabalhadas em sala de aula,

solidificando a relação dos sujeitos presentes no contexto, ou seja, a relação

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professor aluno. Como aponta Freire (2006) o aluno deixa de ser um mero

expectador, deixando de ser “vasilha vazia”, sempre aberta ao depósito mecânico de

conteúdos.

Na medida em que concede aos alunos a oportunidade de escolherem a

música, “pra eles escolherem” (linha 3), a professora Hortênsia proporciona a eles,

participação na elaboração das aulas, ao mesmo tempo dá a liberdade e a

responsabilidade, pois, pauta na condição de que eles elejam aquela que, condiz

“com nossa realidade” (linha 4), ou seja, o contexto de sala de aula, em outro

momento ela destaca, sem palavras obscenas.

Nestes termos, a reflexão crítica do professor é considerada ingrediente

essencial para o processo de formação dos alunos no contexto o qual se encontram,

em que amplia sua autocompreensão. Conforme Joly (2003) a música proporciona o

desenvolvimento das sensibilidades estéticas e artísticas, o desenvolvimento da

imaginação e o potencial criativo, sendo considerado um sentido histórico da nossa

herança cultural, estimulando o desenvolvimento cognitivo, afetivo e o

desenvolvimento da comunicação não-verbal.

A reflexão crítica, neste caso, não se limita a mostrar as formas libertadoras,

mas, seu compromisso com a emancipação, conforme assegura Contreras (2002)

auxiliando os grupos a interpretarem a si mesmos nas formas de dominação em que

se encontram submetidos, a vislumbrarem as possibilidades de ação que se

mostram diante deles. Assim, o professor por meio da reflexão crítica estaria

ajudando os alunos a tomarem consciência das suas possibilidades de ações,

direcionadas a eliminação das relações muitas vezes injustas, em que o aluno não

participa do seu processo de aprendizagem.

Corroboro com o pensamento de Guess (1988) quando diz que o educador

precisa de uma “autoconsciência”, ou seja, uma autorreflexão para reconhecer a

importância do seu trabalho junto aos alunos. Giroux (1992) também assegura que o

educador “intelectual crítico” deve posicionar-se em oposição às concepções que

reproduzem o trabalho do educador como função técnica ou instrumental. No

contexto ao qual estamos trabalhando, o professor se mostra envolvido em um

trabalho consciente de ajudarem os alunos a mudarem a si próprios.

A base crítica dá suporte ao professor, que além de refletir sobre sua ação,

tem possibilidade de criar condições sobre as estruturas em que trabalha. Mais que

questionar, o professor precisa saber como agir e para isso ele necessita ter apoio

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da instituição, dos colegas, para que num trabalho conjunto possam superar as

dificuldades do dia a dia. As reflexões feitas até agora vêm sendo apontadas como

necessária à formação docente, pois o professor ao entrar em sala de aula deve

estar aberto às perguntas dos alunos e a curiosidade, deve ser crítico e inquietar-se

frente a sua missão. Freire (1996) afirma que ensinar é criar possibilidades para a

própria construção. Percebe-se a preocupação do professor em transferir o

conhecimento por meio de um processo de construção, em que o aluno participe

dele.

Percebi, pelos enunciados dos professores, que estes estão em

consonância com a prática crítico-reflexiva. Ao falarem sobre os alunos e colegas,

asseguram de maneira assertiva, o comprometimento frente à educação dos alunos.

Ao relatarem suas afinidades com a prática crítico-reflexiva, demonstram tentativas

de provocar reflexão entre seus alunos, revelam conhecimento acerca da teoria que

permeiam essa prática e mostram-se sabedores das limitações do contexto de

socioeducação.

Os professores parecem preocupar-se com a transformação social desses

jovens, e assumem papel de construir junto com eles um meio capaz de impulsionar

ações conjuntas para que possam melhorar as condições de ensino aprendizagem e

sociais. Mesmo tendo conhecimento das limitações que a realidade do contexto

apresenta os professores não desistem de tentar desenvolver seu trabalho visando à

melhoria para o desenvolvimento cognitivo e pessoal dos alunos.

3.1.1 Reflexão ‘sobre a ação’: compreensão de atitudes

Nesta categoria, os professores tecem reflexões criticas sobre o seu

trabalho. Em determinados momentos, os dizeres demonstram que refletem sobre o

que faz, logo após realizá-los. Na reflexão ‘sobre a ação’, Schon (2000) considera o

processo de pensar após o fato ocorrido, visando à compreensão de suas atitudes

por meio da crítica ao seu trabalho. Entre os professores entrevistados, esse

conceito esteve presente, relacionando a reflexão com a satisfação do aluno e seu

aprendizado, como resultado da prática pedagógica, conforme sequências

apresentadas a seguir:

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Sequência 14 (linhas 1 a 4)

(1) Eu acredito que refletir sobre a prática pedagógica é você fazer uma reflexão do que

(2) Você ensinou e você aceitar também que alguns conteúdos na sua prática pedagógica

(3) não foram bem inseridos não bem absolvidos pelos alunos ai agente tem que refletir e

(4) depois ação avançar de novo sempre, ação e refletir, refletir ação sempre.

(Entrevista com professor Cravo, em 11-12-2012)

Cravo usa o pronome ‘eu’ (autorreferencial), seguido do verbo acreditar no

presente do indicativo, reforçando sua opinião sobre o que considera ser refletir.

Expressa alto grau de afinidade com o termo, sinalizando sua certeza de que o

posicionamento do professor deve pautar na reflexão do seu trabalho. Cravo

emprega o pronome ‘você’ (inclusivo) nas (linhas 1 e 2), sinalizando solidariedade e

inclusão junto aos demais professores.

O identificador ‘agente’ (linha 3), deixa transparecer a ideia de uma pessoa

que está comprometida com determinado grupo, com propósitos e interesses

coletivos, este sentido é demonstrado pelo uso do modelador deôntico ‘tem que’,

expressando algo que tem que ser feito, revelando comprometimento com a

obrigatoriedade/necessidade do professore refletir sobre a sua prática pedagógica.

Essa reflexão deve pautar tanto nos pontos positivos quanto negativos, assim Cravo

afirma “depois ação” (linha 4), devemos refletir para depois agir. Cravo reforça a

ação de refletir, fazendo uso do advérbio de tempo ‘sempre’, ressaltando que não

devemos deixar de refletir, expressando a ideia de um processo continuo de

reflexão.

Quando o professor afirma “refletir ação” (linha 4), identifica com o que

Schon (2000) afirma de que algo não esta de acordo com as nossas expectativas,

desse modo, pode-se responder por meio da reflexão. Na fala do professor Cravo,

percebe-se a reflexão sobre a ação, quando ele pensa, retrospectivamente, no que

foi feito, podendo proceder desta maneira após o fato em um ambiente tranquilo, ou

se pode fazer uma pausa, parar e pensar.

Sequência 15 (linhas 1 a 3)

(1) Refletir, faço isso, particular, só, eu, mesma, e,, as vezes, quando tem momentos

(2) Assim eu gosto de trabalhar com os alunos sobre isso, sobre esse trabalho em

(3) sala de aula.

(Entrevista com professora Hortênsia, em 2-5-2012)

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Assim como o professor Cravo, a professora Hortênsia também demonstra

que a reflexão sobre a ação, faz parte da sua rotina de trabalho. Em alguns

momentos este pensar sobre a ação é realizado com a participação dos alunos,

oferecendo assim maior aproximação com a realidade do aprendizado deles,

abrindo as portas para o planejamento das aulas de forma mais contextualizada. Na

(linha 1), ela afirma “refletir, faço isso”, expressando que o processo de reflexão

está presente no dia a dia da professora, e que ela se preocupa com o desempenho

do seu trabalho e com os resultados junto a seus alunos, favorecendo o processo de

aprendizagem deles.

Ainda na linha 1, Hortênsia faz uso do advérbio de exclusão ‘só’

expressando sentido de somente, sozinha, e ele ainda reforça dizendo “só eu

mesma”, repassando a ideia de que a professora Hortênsia dedica alguns

momentos de seu tempo para a reflexão do que realizou no seu trabalho. Essa

atitude da professora Hortênsia é caracterizada por Perrenoud (2003), como

processo de reflexão em que o individuo toma sua própria ação como objeto de

reflexão, de modo que pensa no que poderia ou deveria ter feito.

Assim, depois de realizada a ação, a reflexão sobre a mesma tem sentido

para compreender o que aconteceu. Na linha 2, a professora usa o pronome ‘eu’

(autorreferencial) acompanhado do verbo gostar no presente do indicativo ‘gosto’,

para expressar atitude em relação ao trabalho de reflexão realizado com seus

alunos. Mais adiante na mesma linha, Hortênsia refere-se a reflexão pelo uso o

pronome demonstrativo’ isso’.

Com a concepção de reflexão sobre as atividades desenvolvidas, pode-se

depreender que a prática docente é mais que um conjunto de procedimentos

metodológicos para transmissão de conhecimentos, voltando-se assim para um

compromisso com a sociedade pautado na formação dos alunos, por meio da

interação do profissional no contexto social ao qual está inserido. Para o

entendimento da autoridade como emancipadora, o professor deve associar as

ideias de liberdade, igualdade e democracia. A atitude de Hortênsia converge com o

pensamento de Giroux (1992), pois, segundo esse autor, a reflexão pautada na ação

é fundamental para o desenvolvimento social dos alunos, auxiliando-os a vencer as

injustiças e mudar a si próprios.

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Sequência 16 (linhas 1 a 2)

(1) O grupo primeiramente faz um estudo discute as dificuldades do grupo de um todo ai a

(2) dificuldade que cada um tá tendo depois um tenta tirar a dificuldade do outro[...]

(Entrevista com professora Violeta, em 14-4-2012)

Nas observações durante o curso de formação continuada (sala de

professor), percebi que os assuntos discutidos, quase sempre, oportunizam aos

professores, envolvidos com medidas socioeducativas, momentos de reflexões

pedagógicas, sobre ações a serem executadas nessa situação singular em que se

encontram. Essa percepção pode ser confirmada pela fala da professora Violeta,

quando na (linha 1) ela diz que “o grupo”, referindo ao conjunto de professores da

escola incluindo ela, faz estudo de suas ‘dificuldades do grupo’, expressando a

ideia que primeiramente, eram discutidos assuntos relacionados de modo geral, ou

seja, que era comum a todos os professores.

O projeto ‘Sala de Professor’ traz entre seus objetivos específicos, viabilizar

estudos em grupo visando melhorias nas condições educacionais, possibilitando que

os objetivos e metas sejam alcançados. Pelas observações de campo e anotações

sobre os documentos da escola, pude perceber que os professores demonstram

trabalhar de forma harmônica, relacionando o que foi discutido com a sua prática.

Pautam na evolução e aperfeiçoamento das práticas educacionais, norteando

noções que visem atender as necessidades específicas do grupo.

Na linha 2, o uso do pronome indefinido ‘cada um’, expressa que está

implícito o sujeito professor, dessa forma as dificuldades também eram discutidas de

maneira particular, ou seja, atendendo as necessidades de cada professor. Após

elencadas as dificuldades individuais e coletivas, a professora expressa pela fala

“um tenta tirar a dificuldade do outro”, que as discussões em grupo

proporcionavam momentos de reflexões coletivos pautadas num bem comum, que

era ajudar um ao outro a sanar as suas dificuldades pedagógicas. Gatti (2009)

salienta a relevância da prática reflexiva em grupos escolares, ressaltando que o

mesmo possui alto valor formativo, trabalhando em consonância com a realidade ao

qual o professor está inserido. Afirma que isto garante maior envolvimento tanto do

professor quanto da instituição com a formação continuada, valorizando o trabalho

coletivo.

Percebi que, em todos os encontros, de modo geral, os professores

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participaram de maneira ativa, valorizando o curso de formação (Sala de Professor)

para a contribuição na sua prática pedagógica em sala de aula. Aproveitavam os

temas discutidos para esclarecer dúvidas e relacioná-las no seu dia a dia em sala de

aula. Para esses professores a formação continuada contribui para fortalecer a

relação entre os professores, alunos e a escola, não se reduzindo apenas a

treinamento ou capacitação, mas abrindo espaço para discussões, primando pela

qualificação e qualidade do ensino.

Os temas discutidos no curso de formação continuada do professor estão

relacionados ao trabalho de reflexão. Os conteúdos trabalhados devem possibilitar

o agrupamento dos alunos pelo seu nível de escolaridade e domínio da leitura e

escrita, bem como da capacidade de se expressar oralmente. Mesmo os tópicos do

curso sendo elencados pelos professores, os mesmos demonstram interesse em

aprofundar mais os seus conhecimentos, e relacioná-los diretamente a realidade de

sala de aula, de forma a contextualizar a prática ao conhecimento científico. Os

professores parecem organizar suas ações, considerando que a trajetória escolar da

maioria dos adolescentes da Escola ‘Meninos do Futuro’ é marcada por fracassos e

contínuas repetências, conforme os enunciados a seguir:

Sequência 17 (linhas 1 a 5)

(1) [...]eu descobri que o guri era desenhista de primeira mão, mas não sabia ler, que eu

(2) Comecei fazer, pedi pra ele colocar nome nos quadros dele, ele sabia escrever do

(3) quadro, mas ele não sabia ler e se eu falasse ele não sabia.. comecei trabalhar minhas

(4) aulas bem diferentes, tirar aquele português mesmo, aquela coisa de todo dia quadro e

(5) foi que teve bastante resultado.

(Entrevista com Professora Hortênsia, em 2-5-2012).

Nessa sequência, Hortênsia faz uso do pronome ‘eu’ (autorreferencial),

seguido do verbo descobrir no presente do indicativo ‘descobri’, expressando que

ela tinha notado o dom artístico de um aluno, que ela chama de ‘guri’ (linha 1). Em

seguida faz uso da conjunção adversativa ‘mas’, estabelecendo uma relação de

oposição, denotando que, apesar de ser “um desenhista de primeira mão” ele não

sabia ler. Diante de tal situação, Hortênsia percebe que tem que fazer algo para

sanar esta dificuldade do aluno.

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A primeira atitude de Hortênsia foi pedir ao aluno que colocasse nome nos

‘quadros’ dele, (linha 2), referindo-se as obras do aluno. No entanto, a professora já

tinha percebido que o aluno só sabia escrever copiando do ‘quadro’ (linha 3),

referindo ao quadro-negro ou lousa. A partir de então Hortênsia afirma: “comecei

trabalhar minhas aulas bem diferentes”, ao fazer uso do verbo começar no

prefeito do indicativo ‘comecei’, percebo que há uma ideia de transformação em

função do melhor aprendizado do aluno, repassando o sentido de que a partir de

agora terá mudança nas aulas.

Na linha 4, a expressão “tirar aquele português”, o verbo tirar repassa a

ideia de permanente, que não mais voltará ser como era, o pronome demonstrativo

‘aquele’, foi usado no sentido de fazer referências de como o português era

ensinado nas aulas, algo que já ficou para trás. O que reforça a expressão “aquela

coisa de todo dia quadro”, ou seja, aquele método de ensinar, pautado em passar

as atividades no quadro e o aluno copiar, que até então, tinha utilidade, porém,

Hortênsia percebeu a necessidade de diversificar suas aulas e trabalhar diferente.

Cravo também fala sobre o projeto ‘Sala de Professor’. É interessante

destacar que no projeto pedagógico da escola, os objetivos estão claros acerca de

promoção de atividades para que o professor perceba que sua prática deve ser

guiada pela necessidade do aluno, lançando desafios, despertando interesse dele

para a necessidade do conteúdo. Na sequência ilustrada a seguir, percebe-se que

Cravo busca o contexto do aluno para as discussões, partindo da sua realidade

como ponto para as reflexões em sala de aula:.

Sequência 18 (linhas 1 a 4)

(1) você tem que partir também pro lado religioso, que eles gostam muito de conversar

(2) sobre família, sobre assuntos religiosos, de vez em quando, você tem que parar um

(3) pouquinho e fazer uma roda e também conversar sobre esses assuntos, porque eles

(4) Gostam. (Entrevista com professor Cravo, em 11-12-2011)

O uso do pronome ‘você’ (inclusivo), seguido do modalizador deôntico ‘tem

que’, expressa necessidade/obrigatoriedade de transcender a transmissão do

conteúdo, direcionando o processo ensino-aprendizado dos alunos para o seu

contexto e suas necessidades. Há dias em que considera necessário abordar a

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religião, em outros, a família, temas estes que Cravo considera necessidade

específica deste grupo de alunos, embora também aborde assuntos da atualidade.

Em outras palavras, afirma que busca transcender os conteúdos programados.

Cravo utiliza também o pronome ‘eles’ (linha 1), referindo-se aos alunos,

que vem acompanhado do verbo gostar no presente do indicativo ‘gostam’, seguido

do advérbio de intensidade ‘muito’, ressaltando os sentimentos dos alunos em

relação aos assuntos ligados a religião e família. Novamente, na (linha 2), Cravo faz

uso do pronome ‘você’ (inclusivo) acompanhado do modalizador deôntico ‘tem que’,

expressando a necessidade/obrigatoriedade de em alguns momentos parar ‘um

pouquinho’, o que passa a ideia de pausar o conteúdo cientifico e abordar ‘esses

assuntos’, citados anteriormente que são a religião e a família.

Em sua fala Cravo demonstra estar consciente dessa relação entre os

assuntos religião e família. Por essa razão, mantém essa prática em sala de aula,

atitude de alguém que procura construir uma relação mais aberta com os alunos, na

tentativa de criar uma atmosfera de solidariedade. Cravo mostra que conhece seus

alunos, e que seu papel em sala de aula vai além de ensinar um conteúdo, aplicar

uma avaliação e corrigi-la, se mostra bem tranquilo quanto ao seu papel, pois sabe

da sua responsabilidade, uma vez que os alunos estão em processo de formação

acadêmica e de formação como pessoas.

Temas abordando religião e família, não pertencem apenas a Cravo.

Constatei que, de maneira geral, os professores trabalham religiosidade com os

alunos, por visualizarem nestes necessidade de acolhimento, confirmando a fala do

professor supracitado. Tanto a professora Violeta quanto a Hortênsia, em

determinados momentos da aula, abordam estes assuntos.

Sequência 19 (linhas 1 a 5)

(1) Olha! eles são muito tementes a Deus, porque muitos se apegam a religião a gente

(2) já até presenciou muitas pessoas já transformaram através da palavra de Deus,

(3) então pra eles o fator principal é a religião, pra eles ali dentro eles respeitam muito

(4) eles participam muito e eles pedem pra gente fazer oração constantemente pra

(5) eles, por que é isso ai que falta a família né falta Deus na vida deles.

(Entrevista com professora Violeta, em 18-4-2012)

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Violeta inicia sua fala com uma interjeição de evocação, ‘Olha!’ No sentido

de chamar minha atenção para o assunto religiosidade, faz uso do advérbio de

intensidade ‘muito’ para destacar que os alunos são tementes a Deus, não no

sentido de temor, mas de respeito. Violeta justifica o temor a Deus pelo fato dos

alunos se apegarem a religião, no sentido de recorrer à mesma, por meio da oração.

Violeta faz uso do ‘agente’ (linha1), no sentido de nós, incluindo ao grupo de

professores, para destacar que já presenciaram transformações de ‘muitas

pessoas’ (linha 2), referindo-se aos alunos.

Essas transformações transmitem a ideia de que muitos alunos tenham se

arrependido dos seus atos. Assim ela enfatiza que para eles “ali dentro” o principal

é a religião, talvez pela distância da família, e por encontrarem conforto na palavra

de Deus. Segundo Violeta os alunos pedem para que os professores façam orações,

‘constantemente’, o que denota alto grau de aproximação entre professor e alunos,

pois estes depositam confiança nos professores, que representa uma figura familiar

e talvez até paternalista.

Muitos desses alunos não tem muito contato com os pais, e o mais próximo

se torna o professor, que além de transmitir conhecimento científico, dá conselhos,

uma palavra amiga, segundo Violeta falta a família e Deus na vida desses alunos.

Esse comportamento dos adolescentes está alicerçado na convivência com os

professores e na confiança que deposita neles. O que pode contribuir de maneira

positiva para a transformação social desses jovens.As decisões resultantes da

reflexão sobre a ação devem vir acompanhadas da fundamentação teórica, visando

relacionar o contexto da prática do professor com seu preparo profissional de forma

sólida, buscando alternativas de trabalho bem embasadas, conforme podemos ver

na sequência 7.

Sequência 20 (linhas 1 a 3)

(1) você tem que entender da prática do dia a dia, e entender também das teorias,

(2) conhecer teorias também, é você se embasar em alguns autores que te ajudam a

(3) compreender esse tipo de comportamento dos educandos.

(Entrevista com professor Cravo, em 11-12-2011)

Cravo inicia sua fala com o pronome ‘você’ (autorreferencial) seguido do

modalizador deôntico ‘tem que’ expressando sua obrigatoriedade/necessidade de

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entender da prática do dia a dia, para melhor desenvolvimento do trabalho em sala

de aula, no entanto o professor destaca que também é necessário entender das

teorias. O uso do pronome ‘você’ (linha 2), também refere-se a todos os

professores que trabalham nessa perspectiva, incluindo ele mesmo. Assim como o

pensamento do professor, Pimenta (2005) ressalta a importância das teorias

educacionais na formação docente, afirmando que o saber não está apenas na

prática; o professor precisa contextualizar a sua ação de forma coletiva, não se

separando do contexto organizacional.

Na linha 2, Cravo indica sua percepção em relação ao conhecimento das

teorias por meio do verbo ajudar, no presente do indicativo ‘ajudam’, demonstrando

que acredita, que por meio de autores, poderá compreender melhor o

comportamento dos alunos. Na (linha 3), refere-se a “esse tipo de

comportamento”, o que dá a ideia de que seja um comportamento específico, no

entanto, pelo contexto de outros segmentos, podemos perceber que emergem vários

significados, entres eles, o de desmotivação em participar das aulas, afeto aos

professores e apego a religião. Assim como Cravo, Hortênsia também prima pelo

conhecimento teórico, contextualização a sua prática diária, como podemos

perceber na sequência ilustrada, a seguir.

Sequência 21 (linhas 1 a 4)

(1) nós debatíamos o assunto no curso, o assunto da escola ne, sempre esta ali debatendo

(2) mais que vamos ver, ler, nos pegássemos um debate sobre tal ator ou um teórico,

(3) alguém que estiveste falando mais, ai trazíamos aquela realidade que ele estava

(4) falando para nossa realidade.

(Entrevista com professora Hortênsia, em 2-5-2012)

Hortênsia inicia sua fala fazendo uso do pronome ‘nós’ referindo-se a ela e

aos demais professores. O que demonstra comprometimento do grupo em discutir

os assuntos relacionados à escola, como ela mesma aponta ‘no curso’, em

específico a sala do professor. Ela enfatiza com o advérbio de tempo ‘sempre’ para

destacar que as discussões são constantes nos encontros. Dessa forma repassa a

ideia que cada professor tinha sua voz ouvida com possibilidade de questionamento.

O dizer de Hortênsia relaciona-se ao de Rodrigues (2007) quando aponta que todo

esse processo de formação no contexto escolar significa reconhecimento de que os

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professores são sujeitos que ensinam, mas que também aprendem em situações

formais e colaborativas.

Ao falar sobre as leituras de determinados autores, Hortênsia usa ‘mais’

(linha 3) para expressar o sentido de que o assunto era mais condizente com o

contexto que os professores trabalham. Em seguida, ela afirma, “trazíamos aquela

realidade” (linha 3), ou seja, configura a preocupação em contextualizar o ensino

repassado pelos autores em suas aulas, ‘para nossa realidade’ (linha 4). Tal

apontamento expressa o comprometimento dos professores em pautar suas leituras

e discussões com teóricos que contribuíssem não somente com a prática

pedagógica, mas também, com as atitudes que moldam o quê ensinar e para quê

ensinar. No que tange ao Curso de Letramento, Cravo fala sobre o seu

aprendizado.

Sequência 22 (linhas 1 a 4)

(1) O curso contribui, porque você passa a ter mais conhecimento e conhecimento diferenciado

(2) Né, além de conteúdos científicos, então, é bom ter um conhecimento assim embasado em

(3) alguns autores, igual esse curso que vocês deram para nós por exemplo, a Solange ela deu

(4) aquele curso de letramento e alfabetização eu aproveitei bem esse curso.

(Entrevista com professor Cravo, em 11-12-2011)

Ao falar sobre a participação no curso de formação continuada, Cravo

refere-se ao letramento crítico, enfatizando que o mesmo contribuiu para seu

aprendizado. Cravo usa o pronome ‘você’ (autorreferencial) para destacar que ele,

por meio desse curso, adquiriu ‘mais conhecimento’. O advérbio de intensidade

‘mais’ sinaliza maior aproveitamento. Destaca ainda sobre o conhecimento

‘diferenciado’, ou seja, o curso promoveu o conhecimento de novas formas de

trabalhar a leitura e a escrita com os alunos da Escola Meninos do Futuro,

enriquecendo sua prática pedagógica, aspecto que favorece a relação professor,

aluno e conhecimento.

Na linha 2, Cravo utiliza o advérbio ‘além’, repassando o sentido de

acréscimo, expressando que o curso possibilitou mais que conteúdo ‘cientifico’,

(linha2), destaca por meio do adjetivo ‘bom’, expressando qualidade, a relevância

de se adquirir um conhecimento como o que foi transmitido. Ainda na (linha 2) faz

uso da forma verbal ‘embasado’ transmitindo a ideia que o curso está

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fundamentado, ou seja, sustentado por princípios que sustenta um raciocínio,

conforme o professor, por meio de ‘autores’.

A expressão “igual esse curso que vocês deram”, reforça o sentido que o

curso ao qual Cravo se refere é o de letramento crítico, o uso do adjetivo ‘igual’

expressa o sentido que numa comparação não apresenta diferença das qualidades

até então descrita por ele. O pronome ‘vocês’, refere-se a esta pesquisadora e a

orientadora-pesquisadora, como facilitadoras. A expressão “eu aproveitei bem esse

curso” (linha 4) sinaliza a ideia de que o professor Cravo declara ter gostado do

curso e ter tirado proveito do mesmo, entende-se que representou uma fonte de

reflexão de suas práticas e como apropriação de novos conhecimentos.

Assim, depreende-se que o processo de formação continuada vai se (re)

construindo, à medida que novas experiências são vivenciadas pelos professores,

sendo a disposição deles, à busca de novas experiências, característica básica para

que isso aconteça, visando renovar as suas práticas pedagógicas. Na próxima

sequência a professora Violeta também expressa suas experiências acerca do

curso de Letramento crítico.

Sequência 23 (linhas 1 a 5 )

(1) ....vamos falar os itens que trabalhamos, o ano passado falou muito de letramento né, o

(2) letramento a qual agente tinha noção, assim, que o letramento era aquela pessoa que tinha,

(3) letramento pessoa alfabetizada. Letramento é a pessoa conhecer o mundo, trazer a vivência

(4) dele de mundo para a sala de aula, então, isso aí, acaba influenciando, porque nos

(5) Acabamos, faz com que agente entenda o aluno melhor.

(Entrevista com professora Violeta, em 18-4-2012)

Nesta sequência, a professora Violeta, assim como o professor Cravo, ao se

referir ao curso de formação continuada, destaca o curso de letramento crítico.

Violeta relembra itens trabalhados no ano anterior, através da expressão “o ano

passado falou muito de letramento”, sendo destacado através do advérbio de

intensidade ‘muito’, o que intensifica a ocorrência desse tema nos estudos na

escola. Porém, na (linha 2) a expressão “letramento a qual a gente tinha noção”,

repassa a ideia, através do inclusivo ‘a gente’, de um entendimento de letramento

diferente da qual foi repassada até então. Para ela, o conceito de letramento era

entendido como pessoa alfabetizada.

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Ainda sobre o curso de letramento crítico, Violeta afirma “letramento é a

pessoa conhecer o mundo”, ou seja, assimilar um novo entendimento sobre o

assunto, de maneira mais abrangente. Ela procura associar ao trabalho que deve

ser desenvolvido com seus alunos. Ao dizer “trazer a vivência dele” (linhas 3 e 4)

Violeta expressa o pronome demonstrativo ‘dele’ para se referir ao aluno, que se

deve relacionar o que os alunos já sabem com os conteúdos em sala de aula.

Na linha 4 Violeta afirma que “isso ai acaba influenciando”, ou seja, o que

foi transmitido no curso interfere na sua pratica pedagógica, pois, possibilita a

mudança de comportamento frente à preparação de suas aula. Confirmado pela

expressão “faz com que agente melhore a visão de sala de aula”, proporcionando

inovação em sala de aula. Depreende-se, pelos enunciados de Violeta, de que ela

poderá desenvolver novas idéias, relacionadas a uma reflexão mais detalhada de

sua prática. Essa preocupação por parte dela favorece a formação de leitores

críticos.

Na próxima sequência veremos preocupação em valorizar a relação entre

objetividade (conhecimento teórico-científico) e subjetividade (sentimento de amor

pelos alunos-envolvimento). Em que a professora destaca a importância da teoria

para completar a prática, e que ambas precisam caminhar juntas.

Sequência 24 (linha 1)

(1) [...] ali é trabalhar com muito amor primeiramente, pra depois ir nas teorias.

(Entrevista com professora Hortênsia, em 2-5-2012)

Nessa sequência, Hortênsia, demonstra a relação de afeto que tem com os

alunos, usa o advérbio de lugar ‘ali’, para identificação do socioeducativo,

destacando que antes de metodologia, planejamento e teorias deve-se “trabalhar

com muito amor”, enfatiza sua fala com o advérbio de intensidade ‘muito’, para

mostrar sua preocupação com o próximo, sem que isso represente um caráter

religioso ou caridoso. Tal atitude demonstra que não tem como trabalhar naquele

contexto sem gostar, pois é necessário um envolvimento para que depois possa

desenvolver o trabalho proposto.

O professor não deve se deixar influenciar pelo ato cometido pelos alunos, e

sim vê-los como jovens e adolescentes em processo de desenvolvimento, não

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confundindo respeito com piedade, para que os alunos percebam que o convívio

social exige respeito mutuo. O professor, conforme Pimenta (2005) deve procurar

compreender e analisar contextos históricos, sociais e culturais de seus alunos e do

contexto institucional ao qual pertence. O conhecimento teórico é importante na

formação docente, podendo oferecer aos professores pontos de vista variados para

uma ação contextualizada.

Na sequência 10, Cravo expõe a necessidade de compreensão do

conhecimento de mundo do aluno para direcionar o processo avaliativo deles, pois

assim como a professora Hortênsia e a professora Violeta, o professor Cravo

preocupa-se com a qualidade do ensino e o respeito aos alunos.

Sequência 25 (linhas 1 a 4)

(1) Você tem que refletir sua prática escolar e da sala de aula porque às vezes o professor

(2) Tem mania de avaliar o aluno de maneira tradicional... maneira tradicional que eu falo

(3) é avaliar só aquele momento, aquele conteúdo e não o que ele sabia antes ou outros

(4) conteúdos que ele sabe.

(Entrevista com professor Cravo, em 11-12-2011)

Cravo inicia sua fala com o pronome ‘você’ (autorreferencial), referindo-se a

ele e aos demais professores, seguido da modalidade deôntica ‘tem que’,

expressando obrigatoriedade/necessidade do professor refletir sobre a sua prática

escolar e de sala de aula. No entanto, Cravo aponta ‘o professor’, expressão que

denota que ele não se inclui nesse grupo. Ao usar o advérbio de tempo ‘às vezes’,

Cravo suaviza sua fala quando aponta que o professor tem mania de avaliar de

modo tradicional.

Ainda fazendo referência ao uso do termo ‘o professor’ (linha 1), Cravo

indica que estes “tem mania de avaliar o aluno de maneira tradicional”

conceituado, por ele, como o ato de avaliar “só aquele momento”. Pelas palavras

de Cravo, ele indica que ás vezes, o professor não leva em consideração o

conhecimento que o aluno traz consigo, pautando suas avaliações apenas nos

conteúdos ministrados em sala de aula. Assim, Cravo da importância de o professor

direcionar o processo ensino-aprendizado, sobretudo o processo avaliativo, a partir

do contexto do próprio aluno, considerando sua história, seus conhecimentos

prévios e o seu aprendizado durante as atividades de sala de aula.

Cravo também, nessa sequência, faz referência aos temas discutidos no

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curso de formação continuada (Sala de Professor), realizado no dia 18 de julho de

2011 (7º encontro), cujo tema foi avaliação e relatório descritivo. Nessa

oportunidade, os professores puderam esclarecer suas duvidas a respeito da

avaliação. Naquele momento a palestrante esclareceu sobre a avaliação somativa,

feita apenas no final do processo, deu como exemplo a Prova Brasil, Enem, que são

para verificar se o aluno sabe, e a avaliação somativa, feita no processo, a todo

momento o aluno está sendo avaliado, no sentido de ser retomado todo o conteúdo

e seu conhecimento, ocorre durante todo o processo e não tem o objetivo de provar.

Os dizeres do professor Cravo se relacionam à avaliação somativa.

Depreende-se, aqui, que ele busca colocar em prática todo ensinamento adquirido.

O professor deve ter clareza do seu papel, trabalhar a afetividade acolher a todos

em um processo reconhecendo que cada aluno é de um jeito. A contribuição da

reflexão dos professores para o seu desenvolvimento em sala de aula, como um

todo frente ao trabalho desenvolvido com os alunos, pode ser confirmado na

entrevista com a professora Violeta na sequência a seguir.

Sequência 26 (linhas 1 a 3)

(1) Durante as aulas paro para refletir, pra saber se aquilo que estou trabalhando

(2) com eles realmente é necessário, se tá servindo de alguma coisa ou não, se

(3) precisa estar mudando toda uma didática.

(Entrevista com professora Violeta, em 18-4-2012)

Violeta inicia sua fala com a preposição ‘durante’, para destacar que no

decorrer das aulas ela procura parar e refletir, com o intuito de verificar se ‘aquilo’,

ou seja, o conteúdo trabalhado por ela, realmente é ‘necessário’, ou se poderia

deixar de explorar alguns item e buscar outros mais contextualizados. Sua atitude

está em consonância com Schon (2000), pois esse autor acredita que esse processo

de refletir no momento em que está realizando alguma ação, possibilita a

reestruturação das estratégias ou as formas de conceber problemas.

Na linha 3, Violeta usa o modalizador deôntico ‘precisar’, o que expressa a

necessidade ou não de estar mudando o que já havia planejado, pois preocupa-se

em levar ao aluno assuntos que venham contribuir no processo de aprendizagem,

assim, a professora se posiciona a favor de prática pedagógica centrada no aluno, o

que representa, que as atividades devem ser direcionadas ao universo sociocultural

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a que o aluno pertença e que seu conhecimento prévio de mundo seja levado em

conta.

Nessa categoria, pude perceber que os professores procuram refletir,

criticamente, antes, durante e depois da ação. Uma característica importante

destacada na fala dos professores é que eles não dissociam a questão social de sua

pratica docente. Pautam a reflexão sobre a ação, como parâmetro para

compreenderem o que aconteceu e como pode melhorar o seu desempenho

enquanto professor. Outro ponto que destaco, é que os professores se posicionam

fortemente a favor de uma prática pedagógica centrada no aluno.

A meu ver, o trabalho desenvolvido pelos professores pauta nas atividades

direcionadas ao universo dos alunos, valorizando o conhecimento de mundo deles.

Além de envolver o aluno no próprio processo de aprendizagem, os professores

demonstram carinho e respeito pelos jovens, não levando em consideração seus

atos. Eles têm uma visão do aluno como ser humano, que precisa ser respeitado e

aprender respeitar, se mostram conhecedores da complexidade e diversidade do

contexto escolar atual.

3.1.2 Reflexão ‘na ação’: atitudes para resolver problemas

Assim como a reflexão ‘sobre a ação’, a reflexão ‘na ação’ também é uma

categoria oriunda dos dizeres dos professores durante as entrevistas, que carregam

em si a reflexão crítica. Conforme sugere Schon (2000) é um período de tempo em

que se pode refletir sobre uma ação no momento em que ela ocorre, sem um tempo

longo para que se possa refletir. Tais características estiveram presentes nos dizeres

dos professores que demonstraram praticar tal atitude quando em momentos

necessários tem que tomar atitudes para resolver problemas relacionados ao dia a

dia da sua prática pedagógica com os alunos. Esta maneira de pensar serve para

dar nova forma ao que se está fazendo, enquanto ainda o faz. Assim, o profissional

trabalha o problema no momento em que o mesmo ocorre, o que o autor chama de

refletir-na-ação.

Sequência 27 (linhas 1 a 3)

(1) Durante as aulas paro para refletir, pra saber se aquilo que estou trabalhando

(2) com eles realmente é necessário, se tá servindo de alguma coisa ou não, se

(3) precisa estar mudando toda uma didática.

(Entrevista com professora Violeta 18-4-2012)

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Em sua fala Violeta destaca, com a preposição ‘durante’, que no decorrer

de suas aulas ela para por determinado tempo para ‘refletir’. Isso sugere uma

autoanálise do seu trabalho. Para Schon (2000) esta maneira de pensar serve para

dar nova forma ao que se está fazendo, enquanto ainda o faz. Assim, o profissional

trabalha o problema no momento em que o mesmo ocorre. O que o autor chama de

refletir-na-ação. Segundo Violeta, para no intuito de saber ‘se aquilo’, ou seja, o

conteúdo ao qual está sendo ministrado aos alunos, representado por ela pelo

pronome ‘eles’ (linha 2) ‘realmente é necessário’.

O uso do modalizador epistêmico ‘realmente’ (linha 2) manifesta a intenção

de Violeta em realçar o extremo da certeza e a precisão do trabalho desenvolvido

com os alunos, complementando pelo adjetivo ‘necessário’. O que dá sentido para

que Violeta certifique se o trabalho desenvolvido esta ‘servindo’ (linha 2), o que

passa a ideia se o proposta está gerando resultado ou não, como ela mesma diz,

“servindo de alguma coisa ou não”, se os alunos estão conseguindo assimilar o

conteúdo, ou se irá contribuir para o crescimento intelectual ou pessoal desses

jovens.

Na linha 3 Violeta demonstra preocupação e comprometimento em

preocupar-se com o trabalho realizado com os alunos, pois, ao usar a modalidade

deôntica ‘precisa’, expressa obrigação e transmite a ideia que ela está disposta a

rever o seu trabalho caso não esteja conseguindo atingir o objetivo proposto que é o

de ensinar algo aos alunos, expresso quando diz, “se precisa estar mudando toda

uma didática”. A fala de Violeta repassa a ideia que além de refletir na ação, utiliza-

se desta reflexão para direcionar o trabalho de sala de aula.

Na sequência a seguir, percebe-se que a reflexão na ação em alguns

momentos pode ser prevista antecipadamente, havendo flexibilidade com relação ao

próprio planejamento que, antes de ser seguido, deve ser contextualizado. Essa

preocupação parecer ser como uma ferramenta do professor, pautado em estar

preparado para possíveis contratempos. Nota-se também uma relação entre o

pensar sobre a ação e o pensar na ação como um ‘continuum’:

Sequência 28 (linhas 1 a 3)

(1) A gente tem sempre que ter um plano B você vai com o seu plano principal e

(2) sempre tem que ter como alternativa o segundo plano certo, se acontecer um

(3) imprevisto, você tem que estar preparado para improvisar e se dar bem.

(Entrevista com professor Cravo, em 11-12-2011)

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Cravo inicia sua fala com a forma nominal ‘a gente’ (inclusivo), expressando

sentido de que inclui todos os professores da escola, pode-se inferir que o

modalizador deôntico ‘tem’ repassa a ideia de uma obrigação interna, ditada pela

responsabilidade do professor em estar sempre preparado para ministrar suas aulas.

Na (linha 1), quando Cravo afirma “ter um plano B” indica reflexão a respeito da

possibilidade e eficácia da aplicação de um conteúdo, ele mostra sua preocupação

em fazer o trabalho docente da melhor maneira possível, mesmo com todos os

percalços, de cuja existência ele tem demonstrado ter conhecimento.

Na linha 2 Cravo reforça com uso do advérbio de tempo ‘sempre’ seguido

do modalizador deôntico ‘tem que’ expressando que em todos os momentos de

preparação das aulas os professores devem ter além do plano principal o segundo

plano, com o intuito de estar preparado caso precise fazer alguma adequação em

sua aula. À medida que o professor tece sua teia de ações, aflora sua postura

enquanto professor reflexivo, preocupando com o que pode acontecer quando

afirma, “se acontecer um imprevisto”. Na verdade, essa reflexão-na-ação é dada

por uma postura que envolve a experiência, que proporciona uma nova possibilidade

de agir que deverá ser descoberta na ação.

Na (linha 3), Cravo usa o pronome inclusivo ‘você’, seguido do modalizador

deôntico ‘tem que’ para reforçar que o professor tem a necessidade de estar

preparado, o que transmite a ideia de sempre que for planejar as aulas, pensar em

atividades extras, pois caso venha ocorrer algum imprevisto o professor como

afirma Cravo possa “se dar bem”, ou seja, alcançar seus objetivos de dar uma aula

bem planejada. Essa atitude de Cravo está em consonância com Schon (2000) que

afirma que a reflexão-na-ação, contribui para o repertório de temas exemplares do

profissional a partir dos quais, em casos posteriores de sua prática poderá compor

novas variações. Também pude perceber a prática da reflexão-na-ação em outros

trechos das falas das professoras Violeta e Hortênsia.

Sequência 29 (linhas 1 a 3)

(1) ...muitas vezes você vem preparado com um plano de aula e você tem que mudar

(2) totalmente aquele plano de aula pra refazer sempre tem a segunda carta na

(3) mão...às vezes não...

(Entrevista com professora Violeta, em 18-4-2012)

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Violeta inicia sua fala com uso da expressão adverbial ‘muitas vezes’

sinalizando uma circunstância que ocorre com frequência, seguido do pronome

‘você’ (inclusivo), para destacar que essa repetição refere-se ao planejamento das

aulas, em que muitas vezes, é feito um plano e por algum motivo imprevisto Violeta

afirma com uso do modalizador deôntico ‘tem que’ expressando a

necessidade/obrigatoriedade em fazer alterações para dar prosseguimento a aula.

Na linha 2, Violeta faz uso do advérbio ‘sempre’ seguido do verbo ter no

presente do indicativo ‘tem’, afirmando que constantemente ela necessita ter uma

‘segunda carta na mão’, ou seja, ela deve estar sempre preparada, mas em alguns

momento Violeta afirma que “às vezes não” (linha 3), expressão adverbial que

passa o sentido de, de vez em quando, não sempre, está preparada, talvez porém

não entrou em detalhes a respeito do que vem acontecer nessa situação.

Sequência 30 (linhas 1 a 4)

(1) nós nunca vamos para a sala de aula somente com o plano de aula. Não

(2) conseguimos ir somente com um plano de aula, você tem que ir com vários

(3) quando acontece isso, você já tem que ter, como as meninas sempre falam,

(4) uma carta na manga.

(Entrevista com professora Hortênsia, em 18-4-2012)

Hortênsia inicia sua fala com o pronome ‘nós’, incluindo ela e os demais

professores, demonstram solidariedade. O advérbio de tempo ‘nunca’ expressa que

ela e os professores jamais vão para a sala de aula ‘somente’ com um plano de

aula. O uso desse advérbio transmite a ideia de que eles estão sempre preparados

com mais de um plano de aula, sinalizando preocupação em estar sempre

preparados para possíveis imprevistos.

Na linha 2, Hortênsia usa o pronome ‘você’ inclusivo, acompanhado do

modalizador deôntico ‘tem que’ expressando obrigatoriedade/necessidade do

professor ir para as aulas sempre com dois planos de aula. No sentido de que o

docente está constantemente preparado para tentar encontrar saídas a questões

relativas tanto ao trabalho em sala de aula propriamente dito, como as necessidades

da instituição, o que passa o sentido de que a reflexão, o saber do professor e suas

experiências produzem mais conhecimento, pois para Pimenta (2005) só a reflexão

não basta, o professor tem que ser capaz de tomar decisões.

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A reflexão ‘na ação’, desses professores, parece, em determinadas

situações, chamar a atenção para tomadas de decisões, no momento que é

necessário, tendo pouco tempo para a reflexão em si mesma. Reestruturam suas

estratégias de ação concebendo novas formas de resolver os problemas, com

tomada de consciência em que é adotada uma postura crítica diante de situações de

sua prática pedagógica que fazem parte do dia a dia.

No período em que estive em campo, durante os meses de abril a

novembro/2011, bem como no período do curso de formação continuada (Sala de

Professor), e em outros momentos no espaço escolar, muitas interrogações ainda se

faziam presentes; porém, com o passar do tempo percebi desses professores, que

além de educadores, em determinados momentos, assumem papel de conselheiro,

ouvinte e amigo de seus alunos.

Foi possível perceber, por exemplo, que os professores rejeitam o rótulo que

a sociedade parece impor a todos aqueles jovens que estão ali indistintamente;

entretanto não demonstram conflito nem se dividem entre o ensinar e o respeitar.

Primam por uma educação humanizadora e menos excludente, tendo em vista que

muitos daqueles adolescentes vivem privados de bem estar, cidadania e políticas

públicas adequadamente direcionadas, tornando-os vulneráveis à sociedade.

3.1.3 Algumas impressões

Entrelaçando os enunciados desses professores com a teoria crítica da

sociedade, defendida por Souza Santos (2007), asseguro, assim como esse autor, a

necessidade de compreender o mundo, estabelecer uma concepção mais ampla de

poder e de opressão, pois há tempos a sociedade concentra-se apenas na opressão

como forma de dominação do capital-trabalho. Souza Santos nos mostra que

existem outros obstáculos estruturais, termo usado para designar as relações de

poder aos quais estamos sujeitos na sociedade. Dentre os obstáculos estruturais

está o espaço-tempo da comunidade, onde a forma de poder é a diferenciação

desigual entre quem pertence à comunidade e quem não pertence. Desse modo, os

jovens privados de liberdade passam por processos de não pertencimentos, sendo

considerados excluídos da sociedade, por uma relação de poder e saber.

Souza Santos (2007) aponta para uma tentativa de uma teoria política nova,

uma democracia de alta intensidade, em que haja democracia em todos os espaços,

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em que as relações de poder sejam substituídas por relações de autoridade

compartilhada, pautada no respeito à igualdade e reconhecimento da diferença.

Entendo que, tanto os professores da Escola ‘Meninos do Futuro’ quanto seus

alunos estão sujeitos à relação de poder estabelecida nas diferentes estruturas

existentes na escola, designadas como espaços-tempo, formas de sociabilidade que

implicam lugares, mas também temporabilidade e duração.

Nos momentos presentes junto a eles, pude constatar a natureza social da

ação socioeducativa, que é pautar na preparação dos jovens para o convívio social,

por meio da educação formal, proporcionando a eles atividades culturais, o respeito,

com o propósito de desenvolver seu potencial para ser o que quiserem e se

relacionarem socialmente de forma harmoniosa. O trabalho desenvolvido pelos

professores centra-se nos alunos, influenciado pela percepção de suas

necessidades e carências, interpretação feita pelos professores, influenciado pelo

contexto.

Como exemplo, temos a professora Hortênsia, que descreve as dificuldades

que enfrenta no processo de ensino aprendizagem com seus alunos, relacionados a

determinados tipos de materiais didáticos que não podem ser utilizados em sala de

aula, devido a esse específico contexto socioeducativo. Esse fato não constituiu-se

em fator limitante para o seu fazer pedagógico, suas aulas transcendem às

explanações gramaticais referentes ao assunto a ser trabalhado, características da

pedagogia diretiva. Hortênsia se posiciona como professora reflexiva, não se

enquadrando dentro do paradigma de transmissão de conhecimento.

Assim como Hortênsia, Cravo e Violeta também guiam o seu trabalho no

ensino de qualidade, não se deixando abater pelas dificuldades encontradas, no

ambiente de socioeducação. Cravo utiliza seus conhecimentos e experiências para

auxiliar a sua prática pedagógica. È possível depreender que esses professores

assimilaram novas ideias, que às vezes, podem nos parecem corriqueiras. Observei

que os professores compreenderam que a formação continuada tem proporcionado

fundamentação teórica e prática, que subsidiam seus trabalhos desenvolvidos em sala

de aula.

Esses professores realizam um trabalho interdisciplinar para estimular a

auto-estima dos alunos em um processo de ensino aprendizagem, envolvendo

conhecimentos científicos e a realidade da vivência no contexto em que está

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inserido. Registram atividades e resultados alcançados por meio de relatórios,

portfólio, cartazes, painéis, bem como nos processos de observação diária em sala

de aula. A partir dos resultados podem rever procedimentos utilizados e realizar ou

não a reelaboração de suas aulas, caracterizando o que Schon (2000) chama de

reflexão sobre ‘a ação’.

Descrever a prática pedagógica de professores que trabalham com jovens

que estão em situação de risco não é simples, porém é enriquecedor e necessário,

pois as mensagens muitas vezes trágicas anunciadas pela mídia limitam em muito a

visão da sociedade sobre estes meninos. É necessário conhecer a realidade,

anunciada por estudiosos e que caracterizam as práticas pedagógicas dos

professores e as dificuldades encontradas por eles. Estes profissionais abraçam o

compromisso assumido na busca da construção de uma sociedade includente, mais

humana, ética, política e socialmente justa. Freire ( 2006) sempre se colocou

presente e agia em favor da emancipação do educando. Para esse autor, o

professor deve compreender a base dos alunos na realidade dos mesmos, tendo

como a possibilidade de fazer isso através da educação.

Liberdade para Freire (2006) consiste, fundamentalmente, na reflexão e

ação, para agir a partir da própria consciência; contudo, para a realização de uma

prática pedagógica que envolva ação socioeducativa é necessário uma prática

emancipadora e crítica, longe do assistencialismo. Neste estudo percebi que a

prática pedagógica realizada pelos professores é pautada na construção de valores,

com intuito de (re) inserção dos jovens na sociedade; para isso, é relevante que o

professor conquiste a confiança do aluno, para que veja sentido nas aulas e

acredite que a escola representa possibilidade de renovação em sua vida.

Nesse contexto, educar tem sentido de (re) socializar e (re)inserir, cujo papel

da educação é relevante frente a responsabilidade de transmitir aos alunos

conceitos até então deixados de lado por eles, e que necessitam reaprender e

redesenhar suas perspectivas. Baumam (2001) considera que não há outro caminho

para buscar a liberdade senão submeter-se à sociedade, ou seja, os jovens só

saberão se estão preparados para retornarem a liberdade quando estiverem em

contato com ela.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

As experiências realizadas com esta pesquisa, na Escola Meninos do Futuro

permitiram-me, enquanto pesquisadora, compreender que a formação continuada no

contexto da escola é condição básica para a reflexão crítica da prática pedagógica

do professor e, consequentemente, para o seu aperfeiçoamento profissional. São

reflexões que levam o educador a repensar e aprimorar as ações didático-

pedagógicas no cotidiano escolar. Em especial, no que tange aos processos de

ensino aprendizagem da leitura, letramento crítico e preparação dos jovens a (re)

inserção à sociedade.

Vale relembrar que o significado da formação continuada está em

desenvolver e promover diversos saberes docentes, resultante de vários momentos

de interação entre todos os professores e a escola. Os professores participantes da

pesquisa demonstraram ter conhecimentos, experiências e vivências acerca da sua

profissão, dentre os quais se destacam: os saberes oriundos das experiências

acumuladas em sala de aula; saber científico; saber articulador da teoria e prática;

saber que promove a interação professor e aluno interligado pelo conhecimento.

As análises realizadas nessa pesquisa convergiram com os estudos feitos

por Pimenta (2005, p. 23) quando destaca que “só a reflexão não basta, é

necessário que o professor seja capaz de tomar decisões concretas”. Assim, pode-

se perceber pela análise dos dizeres dos professores que eles primam por uma

educação de qualidade, preocupando-se em, além de estarem preparados

teoricamente, colocar em prática todo ensinamento absorvido, de forma a contestar

os obstáculos encontrados e tentar saná-los. O que é expresso pelo conteúdo a ser

ensinado, constituído pelos métodos e técnicas de ensino.

Os professores participantes da pesquisa demonstram valorizar a sua

formação, uma vez que esta contribui para promover reflexões relacionadas à

prática de sala de aula. A ‘reflexão na ação’ e ‘reflexão sobre a ação’ instigam a

buscar novas práticas para o processo de ensino aprendizagem. Ao mesmo tempo

fazem referências a vários métodos que aplicam em sala de aula. Esse processo de

reflexão é concretizado pelas ações dos professores, através de seus enunciados,

expressando comprometimento/obrigatoriedade em suas ações.

Ao relatarem sobre suas experiências na escola, com os alunos e colegas,

esses educadores me fizeram refletir acerca de conceitos teóricos que balizaram

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estudo. Percebi uma conexão entre as teorias do professor crítico reflexivo, bem

como sobre o conhecimento na ação e sobre a ação. Esses professores mostraram

que é necessário conhecer o contexto ao qual está inserido, ter domínio do conteúdo

a ser ensinado e estar preparado para a prática do dia a dia. A formação continuada

privilegia a teoria e a prática, o que implica a relação da produção do conhecimento

à organização do curso, pautando no professor como elo para o crescimento

profissional dele e desenvolvimento sócio-cognitivo de seus alunos.

No curso de formação continuada, envolvendo o de letramento crítico, por

exemplo, ressalto a sua relevância à medida que possibilitou aos professores um

espaço de formação com vistas a proporcionar troca de experiências entre os

professores, voltadas à valorização do próprio professor como mediador no

processo de ensino aprendizagem. Além disso, o curso ofereceu oportunidade de os

professores serem agentes da sua própria formação, contribuindo para fortalecer

relações coletivas e duradouras, melhorando sua prática pedagógica no exercício da

docência. É relevante destacar que os cursos de formação não privilegiam apenas

os saberes específicos de cada disciplina, mas também considera o contexto da

instituição e dos alunos. O que permite ao professor articular seus saberes didáticos

aos disciplinares, na construção do trabalho de criações e (re) construção de sua

prática pedagógica.

No curso (Sala de Professor), os professores vislumbraram a oportunidade

de discutir, coletivamente, as dificuldades vivenciadas na escola e na sala de aula,

tecendo comentários e reflexões que puderam auxiliar a própria organização do

curso, pautados na construção de um trabalho conjunto, bem como fomentando

contribuições acerca do trabalho de toda equipe. Possibilitou aos professores melhor

compreensão de sua pratica pedagógica, ancorada em teorias que se relacionam ao

seu trabalho. Os professores afirmaram que, antes da teoria, eles procuram

trabalhar com amor. A partir das teorias, os professores usaram-nas para auxiliar a

preparação de suas aulas, perceber suas falhas e, assim, melhorá-las.

Neste estudo, as perguntas foram desenvolvidas com base nos objetivos

específicos assim, procurei responder as seguintes perguntas de pesquisa

entrelaçada aos objetivos e em consonância com a teoria apresentada:

1) Quais as reflexões feitas pelos professores acerca da prática

pedagógica?

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A análise primou em identificar as reflexões dos professores em torno da

prática pedagógica. Segundo os postulados de (PIMENTA 2005; CONTRERAS,

2002; GIROUX, 1992, entre outros que pautam a reflexão a uma atividade

organizada por pessoas envolvidas em elaboração de processos de crítica, em que

permite a reformulação da teoria e prática social e das condições de trabalho. Pelos

enunciados dos professores foi possível perceber que as reflexões empreendidas

por eles acerca do que é ser professor crítico reflexivo, conforme o pensamento de

Contreras (2002) associa-se à reflexão crítica, pois além de refletir sobre sua ação

analisa e questiona o contexto ao qual atua e as imposições impostas.

Os professores demonstraram organizar o seu trabalho de forma coletiva,

quase sempre para motivar os alunos, considerando no contexto no qual se

encontram. Fazem referência à união de forças para, juntos, tomarem decisões que

visassem a uma solução. Fica a impressão de que os professores preocupam-se

com o ambiente de trabalho, conscientes da relevância de agir coletivamente, com

intuito de sanar as dificuldades encontradas no dia a dia.

Os três professores da Escola Meninos do Futuro, participantes da pesquisa,

pautam a organização do curso por meio de reflexão crítica. Teceram considerações

relevantes a respeito da significância dos temas a serem discutidos e sua

aplicabilidade em sala de aula. Consideraram a necessidade de conectar os temas

estudados à realidade dos alunos, primando pela qualidade no ensino. Em diversos

momentos das entrevistas, os professores demonstraram comprometimento com a

prática pedagógica, julgando necessário contextualizar os temas das aulas a

realidade dos alunos e buscar meios que atraiam a atenção deles.

As reflexões dos professores também giraram em torno da reflexão sobre a

ação, pois em diversos momentos demonstram que refletem sobre o que realizaram

com os alunos, percebendo, nesses momentos, oportunidade de (re) construir a sua

prática pautada na compreensão do que aconteceu após a realização das aulas,

visando melhorá-las. As reflexões estão relacionadas ao melhor desenvolvimento da

prática pedagógica para levar aos alunos um ensino de qualidade, focando na

contextualização das aulas a realidade dos jovens.

A reflexão na ação também se fez presente nas reflexões dos professores,

que em determinados momentos sentiram a necessidade de durante a prática

pedagógica parar e pensar sobre o que estava acontecendo e o que podia ser

melhorado. Oportunidade em que o professor tenta sanar uma dificuldade no

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momento em que a mesma ocorre. Para isso, os professores destacaram que

sempre vão preparados com um segundo plano. Nesse contexto de formação, o

professor é levado a refletir sobre sua atuação em sala de aula para poder lidar com

as incertezas da sua prática profissional, (re) significando as ações cotidianas

sempre direcionando as necessidades dos alunos.

A partir do momento que o professor para e reflete sobre sua ação, está

pensando e organizando o que está de fato realizando, geralmente esse tipo de

atitude acontece diante de situações inesperadas, para as quais ele encontra

respostas imediatas, o que Schon (2000) denomina de conhecer na ação. No

entanto, essa capacidade de articular conhecimentos teóricos e práticos advém da

compreensão do conhecimento e experiência por parte do professor.

2) As reflexões empreendidas pelos professores estão em concordância ou

discordância em relação às teorias crítico-reflexivas?

Os enunciados dos professores demonstram consonância com as teorias

discutidas neste estudo, no que concerne a reflexão crítica, tanto o professor Cravo

quanto a professora Hortênsia e Violeta. Revelaram comprometimento com a escola.

Desejaram promover algum tipo de mudança e primaram por um trabalho coletivo.

Buscaram reflexão de suas atividades, bem como fizeram questionamentos acerca

das estruturas sociais nos quais trabalham. Esses apontamentos estão em

consonância com o paradigma do professor crítico e reflexivo, em que a

preocupação do professor deve estar pautada na preocupação com a transformação

social. Seu envolvimento deve impulsionar ações conjuntas.

As atitudes dos professores revelaram uma postura de reflexão sobre a

prática, procuraram pensar antes, durante e depois de sua ação, demonstrando

preocupação com os alunos. Revelaram também ter conhecimento da teoria e das

limitações em aplicar o seu trabalho, tais características entrelaçam com as teorias

apresentadas por Freire (2006) que considera a educação voltada ao diálogo. Girox

(1992) também entende que a reflexão crítica é fundamental para ajudar os alunos a

se desenvolverem e vencer as injustiças sociais.

Os enunciados dos professores sinalizaram que eles fazem reflexão sobre a

ação, pois para que a mesmo ocorra o professor precisa pensar sobre o fato

ocorrido por meio da crítica ao seu trabalho. Os professores demonstraram tal

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atitude quando afirmaram que refletiam sobre o trabalho realizado. Perrenoud (2002)

considera que tal atitude tem sentido de compreender o que aconteceu com algumas

questões que não podem ser tratadas naquele momento.

Ao afirmarem que param e refletem durante a aula para saber se o que está

ensinando é necessário, os professores demonstram estar consonância com o que

Schon (2000) chama de reflexão na ação. Em muitos momentos os professores

precisavam agir para resolver problemas que não podem ficar para depois, tendo

que tomar atitudes imediatas, tendo pouco tempo para refletir. Perrenoud (2002)

considera a reflexão na ação rápida assim o professor em determinados momentos

pode avaliar se vale apena tomar uma atitude ou adia-la.

3) De que maneira a participação desses professores, em curso de

formação continuada, no contexto da escola, contribui para uma postura mais

crítica? As reflexões feitas por eles influenciam sua prática docente?

Os três professores consideraram que os cursos de formação continuada

dão espaço para reflexões constantes sobre suas práticas, contribuindo para

possíveis mudanças na sala de aula. Os cursos contribuem para que todos possam

refletir e oportunizar um ensino mais significativo, alicerçado por teorias atreladas a

prática. Depreende-se que isso só foi possível porque os professores estavam

abertos ás mudanças e comprometidos com as propostas da formação.

Subtrai-se das análises que os professores perceberam a relevância dos

cursos de formação continuada. Aproveitaram os temas discutidos para sanar suas

dúvidas e relacioná-los ao seu dia a dia. Sem o compromisso do professor nos

cursos de formação, os mesmos se tornam vazios. Perceberam que é preciso ter

conhecimento teórico, trabalhar em grupo, ouvir os colegas e também ser ouvido

numa relação de troca de conhecimento, e assim poder questionar e refletir sobre as

estruturas na quais trabalham.

Depreendeu-se que os saberes construídos com base nas trocas de

experiências são muito importantes para a solidificação da profissão de professor.

Pela análise, os professores Cravo, Hortênsia e Violeta parecem atrelar o

conhecimento individual ao coletivo. São abertos a sugestões de seus colegas e

possuem vontade para fazer o mesmo. Os professores destacaram a troca de

experiência como contribuição ao aprimoramento de suas práticas no cotidiano de

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sala de aula, confirmando que as discussões em grupo proporcionam momentos de

reflexões coletivas pautadas num bem comum.

Orientados por temas relevantes que venham contribuir para seu

crescimento profissional, percebe-se que os professores querem discutir os seus

saberes e experiências, conhecer o trabalho de seus pares, suas dificuldades e

posição diante das dificuldades enfrentadas. Tal atitude parece consolidar o espaço

de formação como um momento de reflexão, exercendo papel de formando e

formador, ouvindo e sendo ouvido. A análise demonstra comprometimento dos

mesmos em discutir assuntos relacionados à escola e possíveis contribuições a sua

prática pedagógica.

Contribuições e limitações da pesquisa

De maneira geral considera-se que a formação continuada relacionada ao

contexto escolar leva em consideração os estudos propostos pelo conhecimento já

adquiridos pelos professores atrelados as suas necessidades e angustias o que

deve ser levado em consideração para discussão sobre a formação do professor.

Por meio desta pesquisa, fica claro que as reflexões feitas pelos professores acerca

da sua prática, demonstram qualidade de relacionamento entre os professores e

colegas, professor e alunos e professor e a instituição.

As três categorias apontadas neste estudo indicaram a relevância da

formação continuada para a melhoria da prática pedagógica do professor. A

formação continuada oferece ao professor oportunidade de aprimora-se. Destaco,

aqui, a prática crítico- reflexiva, como possível em ambiente de socioeducação,

apesar de todas as barreiras impostas no contexto educacional. Os professores

perceberam que o caminho da prática reflexiva é longo, porém contribui para seu

processo constante de aprendizagem.

Este estudo suscitou novas possibilidades de pesquisas sobre formação

continuada em ambiente de socioeducação. Questionamentos tais como: (1) Quais

seriam os efeitos dos cursos de formação na aprendizagem de sala de aula? (2)

Que expectativas os alunos teriam em relação aos seus professores? (3) Como os

alunos avaliariam seus professores? (4) Qual seria a relação entre a Escola, o

Centro Socioeducativo e a Secretaria de Segurança do Estado? (5) Em que medida

a SEDUC incentivaria o professor a divulgar suas experiências, em eventos

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científicos e à sociedade, para, posteriormente, ter o reconhecimento do seu

trabalho, através da contagem de ponto? São questões pertinentes que mereceriam

ser investigadas.

Esta pesquisa revelou que, para que se construa uma prática crítico-

pedagógica, envolvendo professores que se dedicam aos jovens que cumprem

medidas socioeducativas, é preciso valorizar, fundamentalmente, a formação

continuada, procurado estabelecer elos entre o ‘saber’ e o ‘fazer’, além de um

engajamento sócio-afetivo por parte do educador, bem como um conhecimento

sobre o contexto social no qual se encontram esses jovens, privados de liberdade.

Por tratar-se de um estudo qualitativo em uma única unidade educacional,

os resultados da pesquisa não podem ser generalizados.

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE LINGUAGENS

COORDENAÇÃO DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DE LINGUAGEM - MESTRADO

APÊNDICE A - Roteiro de observação participante 1- Qual o objetivo do encontro do curso de formação continuada (Será

explicitamente colocado pelo pesquisador)

2 – Conteúdos discutidos nos encontros.

3- Recursos utilizados nos encontros (recursos áudio visuais, textos, outros.)

4 – Características ambientais (descrição dos elementos que compõem a

infraestrutura)

5 – Características dos professores (faixa etária, número de professores presentes

nos encontros, masculinos e femininos, nível de interesse, comportamentos

evidenciados)

6 – Desenvolvimento do encontro (relato da sequência do encontro)

7 – Relacionamento entre os professores (se é cordial tensa, informal)

8 – Participação dos professores durante o encontro.

9 – Temas abordados nos encontros.

10 – Expressão dos participantes (descrever a expressão dos participantes, gestos e

posturas).

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE LINGUAGENS

COORDENAÇÃO DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DE LINGUAGEM - MESTRADO

APÊNDICE B - Questionário de perfil Código ( Violeta)

1 - Sexo: Feminino ( ) Masculino ( )

2 - Idade: --------------------

3 - Formação: Graduação ( ) Especialização ( ) Mestrado ( ) Doutorado ( )

4 - Tempo de exercício na profissão de professor:-------------

5 - Há quanto tempo leciona nesta instituição?-------------------

6 - Com qual nível de ensino você trabalha? Ensino Fundamental ( ) Ensino

médio ( )

7 – Qual disciplina você leciona? ---------------------------------

8 - Trabalha no período: Matutino( ) Vespertino ( ) Noturno ( )

9 - Número de aulas semanais:--------------------------

10 - Tem quantos alunos por sala? -----------------------

11 - Possui outro vínculo empregatício? Sim ( ) Não ( )

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE LINGUAGENS

COORDENAÇÃO DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DE LINGUAGEM - MESTRADO

APÊNDICE C – Questões orientadoras para entrevista semi-estruturada.

1. O que significa para você refletir sobre a sua prática pedagógica?

2. Você se considera um (a) professor (a) crítico - reflexivo?

3. Durante as suas aulas você reflete sobre o que está ocorrendo naquele

contexto?

4. Após as aulas você reflete sobre o seu trabalho em sala de aula?

5. O curso de formação continuada tem contribuído para sua prática em sala de

aula?

6. Você considera os assuntos trabalhados durante a formação continuada

suficientes para te auxiliar na sua prática pedagógica?

7. Você considera o conteúdo ministrado em sala de aula suficiente para o

aprendizado do aluno?

8. Como você faz para adequar as suas aulas caso ocorra algum imprevisto,

tanto quanto ao material a ser utilizado como ao comportamento dos alunos?

9. Você utiliza de algum recurso para adequar a sua aula ao contexto dos

alunos?

10. Que tópicos você gostaria que fossem mais abordados no curso de formação

continuada?

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE LINGUAGENS

COORDENAÇÃO DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DE LINGUAGEM - MESTRADO

APÊNDICE – D Termo de Consentimento Livre Esclarecido – TCLE

Você está sendo convidado (a) para participar, como voluntário, da pesquisa,

Professores de Línguas em Contexto de Exclusão Social: Um Estudo Crítico

Etnográfico.

Após ser esclarecido (a) sobre as informações a seguir, no caso de aceitar

fazer parte deste estudo, assine ao final deste documento, que está em duas vias,

uma delas é sua e a outra é do pesquisador responsável. Em caso de recusa você

não terá nenhum prejuízo em sua relação com o pesquisador ou com a instituição

que recebe assistência.

O Objetivo deste estudo é Investigar as reflexões feitas pelos professores de

línguas (materna/estrangeira), da Escola ‘Meninos do Futuro’, sobre questões que

envolvam a formação crítico-reflexiva.

Sua participação nesta pesquisa consistirá em conceder entrevistas

gravadas em áudio, em local privado, com duração entre 30 a 40 minutos, dispor de

documentos relacionados a prática pedagógica, tais como: plano de aula, relatório

semestral, entre outros .

Os riscos relacionados com sua participação na pesquisa são mínimos. Pois,

esta pesquisa não oferecerá complicações que interfiram na sua atividade física ou

intelectual de rotina.

Os benefícios para você enquanto participante da pesquisa são:

possibilidade de reflexão sobre os aspectos pedagógicos relacionados à prática

docente; obter por meio dos resultados desta pesquisa, que contribuirão para

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possíveis transformações em nível pessoa e\ou profissional.

Os dados referentes à sua pessoa serão confidenciais e garantimos o sigilo

de sua participação durante toda a pesquisa, inclusive na divulgação da mesma. Os

dados não serão divulgados de forma a possibilitar sua identificação, de acordo com

a metodologia do projeto, os participantes serão identificados por nomes de flores,

onde a relação do nome das pessoas será apenas de conhecimento do pesquisador.

Você receberá uma cópia desse termo onde tem o nome, telefone e

endereço do pesquisador responsável, para que você possa localizá-lo a qualquer

tempo. Meu nome é Maria Antonia Correa, Funcionária da Secretaria Municipal de

Educação de Várzea Grande – MT, Lotada na EMEB Tenente Waldemiro Delgado

Bertulio, telefone (65) 9213-6188, e-mail, [email protected]

Em caso de dúvida você pode procurar o Comitê de Ética em Pesquisa do

Hospital Universitário Júlio Muller – UFMT – pelo telefone (65) 3615-8254, com a

Prof.ª Shirley F. Pereira (coordenadora).

Considerando os dados acima, CONFIRMO estar sendo informado por

escrito e verbalmente dos objetivos desta pesquisa e em caso de divulgação por foto

e/ou vídeo AUTORIZO a publicação.

Eu (nome do participante ou responsável ).......................................................

Idade............sexo:.....................................Naturalidade.................................................

RG Nº............................................declaro que entendi os objetivos, riscos e

benefícios de minha participação na pesquisa e concordo em participar.

Assinatura do participante

__________________________________________________

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ANEXO A – Termo de aprovação