por que aprender hist+¦ria

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19 Peter Lee 1 Tradução: Maria Auxiliadora Moreira dos Santos Schmidt e Marcelo Fronza 2 RESUMO A partir da constatação de que ninguém escapa do passado e da importância da relação que as pessoas estabelecem com o passado, buscou-se apontar, a partir de pesquisa em fontes relacionadas à filosofia da História, alguns fundamentos para o significado da aprendizagem da história. Nesse sentido, temas como a importância da História para a validação do passado, a relevância das evidências, a problemática das leis e generalizações, bem como o significado da experiência vicária para a construção da apren- dizagem histórica, foram objetos de análise, no sentido de se mostrar por que é importante aprender História. Palavras-chave: aprendizagem Histórica; Educação Histórica; epistemo- logia da aprendizagem Histórica. ABSTRACT Knowing that nobody escapes from the past and the importance of the relationship that people establish with the past, this aimed to point out some fundaments for the meaning of History learning, based in researches related to History’s philosophy. Thus, themes such as the importance of History to validate the past, the relevance of evidences, the problematic of laws and generalizations and also the meaning of vicarial experience to build the learning of History were objects of analysis with the objective of showing why it is important to learn History. Keywords: History learning; Historical Education; epistemology of History learning. Por que aprender História? Why learn History? 1 Professor da History Education Unit – School of Arts and Humanities, University of London Institute of Education-UK. 2 Maria Auxiliadora Schmidt é professora de Metodologia e Prática de Ensino de História e do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Paraná (PPGE/UFPR); é Coordenadora do Laboratório de Pesquisa em Educação Histórica da Universidade Federal do Paraná (LAPEDUH/UFPR). Marcelo Fronza é doutorando do PPGE/UFPR, professor da Rede Estadual do Paraná e pesquisador do LAPEDUH/UFPR. Educar em Revista, Curitiba, Brasil, n. 42, p. 19-42, out./dez. 2011. Editora UFPR

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    Peter Lee1

    Traduo: Maria Auxiliadora Moreira dos Santos Schmidt e Marcelo Fronza2

    RESUMO

    A partir da constatao de que ningum escapa do passado e da importncia

    da relao que as pessoas estabelecem com o passado, buscou-se apontar,

    a partir de pesquisa em fontes relacionadas filosofia da Histria, alguns

    fundamentos para o significado da aprendizagem da histria. Nesse sentido,

    temas como a importncia da Histria para a validao do passado, a

    relevncia das evidncias, a problemtica das leis e generalizaes, bem

    como o significado da experincia vicria para a construo da apren-

    dizagem histrica, foram objetos de anlise, no sentido de se mostrar por

    que importante aprender Histria.

    Palavras-chave: aprendizagem Histrica; Educao Histrica; epistemo-

    logia da aprendizagem Histrica.

    ABSTRACT

    Knowing that nobody escapes from the past and the importance of the

    relationship that people establish with the past, this aimed to point out

    some fundaments for the meaning of History learning, based in researches

    related to Historys philosophy. Thus, themes such as the importance of

    History to validate the past, the relevance of evidences, the problematic of

    laws and generalizations and also the meaning of vicarial experience to

    build the learning of History were objects of analysis with the objective of

    showing why it is important to learn History.

    Keywords: History learning; Historical Education; epistemology of History

    learning.

    Por que aprender Histria?

    Why learn History?

    1Professor da History Education Unit School of Arts and Humanities, University of LondonInstitute of Education-UK.

    2Maria Auxiliadora Schmidt professora de Metodologia e Prtica de Ensino de Histria e doPrograma de Ps-Graduao em Educao da Universidade Federal do Paran (PPGE/UFPR); Coordenadora do Laboratrio de Pesquisa em Educao Histrica da Universidade Federal do Paran(LAPEDUH/UFPR). Marcelo Fronza doutorando do PPGE/UFPR, professor da Rede Estadual doParan e pesquisador do LAPEDUH/UFPR.

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    O passado, historicidade e Histria

    No se escapa do passado. Ele construdo a partir de conceitos que nsempregamos para lidar com o dia a dia do mundo fsico e social. Algumas ve-zes os conceitos encapsulam o passado sob a forma de processos causais (ex.rvore, me, bombas). Algumas vezes, envolvido um passado insti-tucional no caso de se falar em um governo ou uma criana ilegal, ou em ca-sos que alguns critrios de legitimidade no foram encontrados. Mas, o controledo passado sempre menos formal. Cincia, Comunismo ou Estado-naopodem ser definidos de uma maneira mais ou menos informal pelos dicionrios.Mas comunismo no apenas o nome de smbolos de crenas ou atitudes, quens podemos encontrar numa definio do dicionrio ou mesmo numa anliseescolar destas crenas ou atitudes. Parte do comunismo deve ser procurada noque os comunistas fizeram. E tambm para liberalismo, capitalismo e outros.Da mesma maneira, nossa noo de cincia importa a concepo de comodeterminadas formas ou atividades tm dado conta cientificamente do passadoe um quadro de mudanas que a cincia tem causado na vida cotidiana. Damesma forma, a noo que ns obtemos de estados-naes inevitavelmenteinfluenciada pela nossa compreenso do passado. O passado d concreticidadeaos nossos conceitos. Em muitas reas do conhecimento, o passado a refernciapara o nosso conhecimento de regras e para a nossa capacidade de selecionaracontecimentos. Alternativamente, o passado ser o rbitro quando se precisadeterminar se a aplicao de uma regra pode ser satisfatria ou no.

    Os conceitos carregam uma bagagem temporal. Mas nosso mundo noconsiste somente em exemplos de conceitos. Ele povoado tambm por coisasindividuais e particulares, com passados particulares. O Mercado Comum,Alemanha ou Guerra Fria de diferentes maneiras derivam muito das substnciasde suas extenses temporais. O Mercado Comum, por exemplo, uma instituioque fez aumentar os preos na Gr-Bretanha e instalou um controle burocrticosobre a vida cotidiana das pessoas. o passado que revela a natureza dainstituio e, certamente, uma instituio dificilmente poder ser consideradacomo algo espontneo. Falar em renascer de uma instituio somente serinteligvel como uma invocao do passado. Da mesma maneira, Alemanha menos uma entidade geogrfica do que uma entidade temporal e o que querque o seu passado revele, ela ser3. A Guerra Fria o nome de uma srie deeventos particulares e tambm de certa espcie de comportamento por parte

    3Como usualmente Kitson Clark insere no corao do tema: As palavras Alemo, catlico eJudeu dizem respeito respectivamente a uma nao, a uma Igreja e a uma raa. Elas so usadas paradescrever coisas as quais existem no mundo hoje e, assim, as reaes dos homens a elas sero presumi-

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    de pessoas, governos e estados. A vida til desse conceito incerta: recentementepensou-se que ele morreu, mas os jornais, de tempos em tempos, predizem ouanunciam seu revival. Falar na ressurreio destes conceitos parece inteligvelsomente como uma invocao do passado.

    Conexes entre o presente e o passado so mais do que isto. Aes sorealizadas por algumas razes e pessoas (individualmente, em grupos sociaisou instituies) tm objetivos, procurando ou se colocando em determinadassituaes. Estas situaes, por sua vez, so frequentemente compreendidasquando referidas em termos de passado. Um agente (ou instituio) v a simesmo como estando ameaado, ou insultado, ou enfraquecido; uma srie deeventos caracterizada em termos de tradies, as quais prescrevem no somentecomo tais eventos poderiam ser vistos, mas a partir de que exemplos um conjuntode respostas pode ser dado (entre a diplomacia ocidental, o trade unionismo, apoltica e as finanas do capitalismo, por exemplo, ns podemos encontrareventos caracterizados como apaziguamentos, lockout, democratizao oucrescimento industrial). As razes para as aes so referenciadas no passadoe precisam ser entendidas pelas suas prprias razes. Em geral, como Olafsontem apontado: Nosso sistema de distines temporais colocado nossadisposio por seres que esto, eles prprios, no tempo, e [...] sendo este ocaso, eles devem ser pelo menos uma caracterstica de suas situaes do presen-te e no podem ser descritos sem referncia a uma situao precedente.(OLAFSON, 1979, p. 97; p.150 ).

    Historicidade, ou abrindo o passado e o futuro, central para a com-preenso do que aprender histria. Mas historicidade uma coisa, e histria

    damente condicionadas pelo que elas so agora. De fato, contudo, em cada caso, as reaes humanasso largamente afetadas pelas memrias da histria, ou o que tomado como histria, o que parecedesconectar a natureza de Alemes ou Judeus, ou Romanos Catlicos, de suas aes. (KITSON CLARK,G. The Critical Historian. Portsmouth: Heinemann Educational Books, 1967, p. 6). Dois comentriospodem ser feitos a isto. Primeiro, exemplos menos dramticos so igualmente significantes. Segundo,para Kitson Clark medianamente surpreso o fato de as pessoas hoje no considerarem as coisas co-mo elas realmente so, e isto seja talvez injustificvel. Diante deste ponto de vista, at agora, ns po-demos falar das grandes entidades histricas (ou pelo menos ento para este assunto), no h umasrie de momentos presentes desconectados, mas entidades temporais, as quais carregam seus passadoscom elas, como habitantes, crenas, papis, filosofias de vida, constituindo relaes sociais. Mesmoonde h uma maior ruptura com o passado (por exemplo, Alemanha em 1945, onde instituies,moralidade pblica e filosofia poltica sofreram mudanas repentinas), o passado ainda inescapvel;devido a questes ainda suspensas como quo profunda esta ruptura se fez, e em virtude de o que uma ruptura, O que a Alemanha agora no poderia ser respondido sem uma referncia ao passado,mesmo que todos os alemes sejam questionados pelos socilogos e cientistas polticos, porque opassado estaria embebido nas respostas. O passado, o presente e o futuro formam um simples dom-nio de referncia [...] entre o qual o presente tem somente um tipo de prioridade qualificada [...] In:Heideggers parlance, a human life stretches itself along. (OLAFSON, F.A. The dialectic of Action.Chicago: University of Chicago Press, 1979. p. 97).

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    outra. Falar que os seres humanos so no tempo e estas aes referem-se aeventos do passado, ou que particularidades como Alemanha ou o MercadoComum carregam com elas concepes dos seus passados, no dizer quetipo de passado est em questo. Portanto, a Guerra Fria pode ser o nome deum grupo coligado de eventos e aes historicamente reconstrudos, ou podeser o nome de uma explanao poltica, social ou de um mito nacionalista. Nsno podemos escapar de um tipo de passado. Mas ns podemos estar emcondies de escolher que tipo de passado ns teremos. J. H. Plumb (1969,p.17) nos oferece a escolha entre um mero passado, o qual sempre umacriao ideolgica com um propsito, designado para controlar indivduos oumotivar sociedades, ou inspirar classes, e histria, cujo futuro limpar ahistria que feita com o objetivo de formar vises propositais sobre opassado. Onde o passado usado para legitimar autoridades ou oferecer umguia para o destino, histria por sua prpria natureza [...] dissolve-se simples-mente, por meio de generalizaes estruturais a partir das quais nossos ante-passados interpretaram, historicamente, as finalidades da vida. (1969, p.136).Alm disso, Plumb conclui que a morte do passado j nos precedeu: Histria,a qual profundamente comprometida com o passado, tem, num sentido,ajudado a destru-lo como uma fora social, como uma sinttica e compreensivadeclarao do destino da humanidade.(1969, p.14)4. Para Plumb, a Histria destrutiva, mas pode ainda ensinar sabedoria. Ela oferece um passado noqual o fazer das condies humanas melhorou por meio do uso da razo. O queno fica claro se esta sabedoria substantiva ou formal. Por enquanto, agrande contribuio que o historiador pode fazer ensinar para todos, literal-mente, a natureza da mudana social, e, naturalmente , no haver acordoentre historiadores que falam com as suas diferentes vozes (1969, p. 142-143).H, ento, na perspectiva de Plumb (1969, p. 144), uma ambiguidade entrehistria como, de um lado, um instrumento formal e negativo e, de outro lado,como uma fonte de sabedoria positiva, fornecendo os conhecimentos dosmecanismos das mudanas histricas, demonstrando o papel da razo nossucessos humanos e, portanto, preenchendo, pelo menos, alguns dos significadosdo passado morto.

    Uma outra questo que pode ser levantada a partir da posio de Plumb se o seu obiturio da morte do passado no prematuro. o passado realmentemorto ou ele est morrendo? verdade que a histria destri os passadosparticulares como um cupim trabalhando no corao da madeira sempreativo, mas raramente visto na superfcie. (1969, p. 123). Mas a destruio do

    4Mas Plumb no d somente histria o crdito para isto. Veja a pgina 14 da mesma obra.

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    passado particular no significa, necessariamente, o fim do passado. Escrevendodois anos antes de Plumb, Kitson Clark foi menos sanguinrio. Ele advertiusobre a desordem massificada dos conhecimentos nebulosos, das informaesfragmentadas, das fices e vestimentas fantasiosas e nem sempre conscien-tes memrias histricas [...] entrelaados num grupo de associaes histri-cas as quais se esparramam acima da conscincia humana inteira. Portanto,palavras so convertidas em pragas, smbolos so dotados com fora emocionale esteretipos emergem, os quais pretendem descrever grupos inteiros de pes-soas e predizer, a partir dos seus passados, suas condutas possveis no futuro(KITSON CLARK, 1967, p. 7)5.

    No h razo aparente por que um passado deste tipo no tenha pretensesde fornecer as sanes e as chaves para o destino o qual Plumb acreditava es-tar desacreditado pela histria. A Histria ento no tem efeito? o passadoum monstro de sete cabeas? tentador perguntar que, se a histria no podeextirpar o passado, ela tem o prolongado indefinidamente, dotando-o com umgrupo de um longo processo evolucionrio e transformando-o dentro de umamudana mais ou menos rpida.

    A maioria dos homens e mulheres [...] acreditam que eles so parte de umprocesso histrico que vem mudando atravs dos sculos [...] e que o processode mudana tem acelerado e est acelerando, ento necessrio saber o que anatureza deste processo tem sido e . Eles necessitam de um passado histrico,objetivo e verdadeiro (PLUMB, 1969, p 16).

    No h dvida que a histria tem uma mo nisto: mas aqui parece seruma pequena dvida, que a cincia natural e as mudanas sociais causadaspelo rpido desenvolvimento industrial e urbano possuem, pelo menos, umpapel igual6. No menos do que isto, por alguma razo, ns trazemos at nsum passado bastante longo, complexo e confuso, alm de dinmico o bastantepara reduzir o poder de alguma sano particular ou destino que possam serencontrados nele, e o passado apela histria para a sua validao. O passadoainda contm heris e grandes homens, exemplos morais e mticas idades doouro. Eventos histricos ainda rolam rapidamente das bocas dos comentadorese jornalistas. Mas a noo de evento histrico importante: por todas as suasconexes e sensacionalismos e o Guinness Book of Records carrega com ele a

    5Este autor acredita que a base do passado confusamente lembrada a partir de lies aprendidasna escola, as reinterpretaes de afirmaes polticas, as misteriosas colees de controvrsiasjornalsticas, fragmentos de informaes especiais de experincias pessoais ou as histrias de chancescoincidentes, e a pintura clara de situaes histricas ou de personagens conhecidos, pelas novelashistricas ou filmes.

    6Veja Toulmin, S.; Goodfield, J. The discourse of Time. London: Hutchinson, 1965.

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    ideia de escriba da histria, escondida em suas asas, gravando, analisando epesando o significado dos eventos. A princpio, o passado agora o lugar dahistria e, a despeito da ambiguidade do que a histria mostra, a histriacomo disciplina racional que est reorganizada como corte de apelao, mesmose estes procedimentos so pouco entendidos7.

    Se a diviso de Plumb entre o passado e a histria no suficiente e seuepitfio para a histria tambm apressado, a distino de Michael Oakeshottentre histria e passado prtico pode ser pensada como tambm radical8.Ns descuidamos da histria no passado prtico, quando o passado parece seruma relao especfica com o presente ou designado para justificar [...]crenas prticas acerca do presente e do futuro (OAKESHOTT, 1933, p. 105).Este o passado usado pelo advogado, poltico ou sacerdote. Entretanto, nohistrico, como oposio ao passado prtico, no existem culminncias, acon-tecimentos principais, pontos de referncia ou catstrofes: somente um mundode eventos inter-relacionados9. Em histria, nenhum homem morre rapidamentepor acidente; [...] Nada est previamente aprovado, no existem condiesprevistas a partir das quais as aes podem se realizar e nada est denunciado(OAKESHOTT, 1962, p. 148). O passado prtico consiste em acontecimentos

    7O conceito de A corte da histria, no qual historiadores so alguma coisa como juzes e (naspalavras de Ambroise Bierce) grandes e meticulosos fofoqueiros, fazendo e desfazendo reputaes,no declarando abertamente as noes de histria e de passado. Fundamentalmente, isto pertence aopassado prtico, mas, em reconhecimento ao fato de que historiadores empregam evidncias a partirde certos procedimentos mais ou menos acordados entre eles, admite-se que a histria uma disciplinaracional na qual o passado alguma coisa a ser investigada e que as concluses dos historiadores soelas mesmas submetidas ao criticismo.

    8Embora existam alguns problemas no The death of the past, ele uma das poucas refernciasda histria e seu desenvolvimento, o qual em geral sustenta a interpretao da historiografia Whig.Paradoxalmente, o livro Man and his Past, de Herbert Butterfield (Cambridge, UK: CambridgeUniversity Press, 1969), est radicalmente infestado por tal interpretao, na qual a histria da histriaparece como um tipo de fora confusa para responder a problemas modernos, a qual poderia somenteser bem-sucedida se acompanhada pela moderna crtica metdica: outros interesses no passado tendema ser deixados de lado como primitivos ou como tristes tentativas para a histria. Uma aproximaosemelhante est baseada no livro Annalists and Historian (London: Methuen, 1977), de Denys Hay.Plumb fez um ou dois comentrios descaracterizados (por exemplo, seu comentrio sobre a longevidadedos patriarcas, p. 122), mas em geral apresentou uma ampla viso, examinando diferentes conceitosdo passado em seus prprios termos, tanto quanto incentivando o crescimento da crtica histrica. Na-turalmente, h um sentido legtimo no qual o desenvolvimento do conceito racional de histria precisaser encontrado, e Collingwood forneceu em seu livro The Idea of History um esboo inacabado de co-mo isto poderia ser feito. Mas, tal referncia a histria de um trabalho progressivo fora dos grupos dereferncia e to filosfico quanto histrico. A histria de nossa compreenso do passado est quaseda mesma maneira na triste posio da histria da cincia trinta anos atrs. A Histria da cincia foialm da catalogao linear da atual concepo do mundo natural e est comeando a elucidar as ori-gens histricas e racionais de outras concepes. A histria do passado aguarda tratamento semelhante.

    9Ver: DRAY, W. H. Michael Oakeshotts theory of history. In: PAREKH, B. C.; KING, P. T.(Eds.). Politics and Experience. Cambridge: Cambridge University Press, 1968. p. 32.

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    reorganizados para contriburem s sucessivas condies das aes, enquantoque a histria representa um interesse nos eventos do passado [...] respeitandosua independncia nas sucesses do tempo ou nos eventos do presente (1962,p. 154/155). necessrio admitir que se a anlise de Oakeshott impe limitesimpossveis histria e, ao mesmo tempo, a corta pela raiz no h nadaerrado em princpio com pesquisas partindo de interesses correntes ou problemasprticos10. Mas a fora desta referncia que ela nos permite distinguir entreum passado leigo habitado por heris e observado em lies de moral e o passadohistrico que paralelo a ele, no enterrando prematuramente o passado leigo,j que agora teramos um passado histrico para substitu-lo, mas reconhecendodiferentes caminhos pelos quais o passado continua a ser tratado11.

    O limite que tanto Plumb e Oakeshott tm a dizer que sem histria nopode haver passado racional. Certamente, se na ausncia da histria o passado apenas prtico, difcil ver como poderia haver uma concepo consensualsobre o passado, mesmo em princpio; mesmo se houvesse ocorrido na vidaprtica. (E se esta condio for encontrada, o mundo seria muito diferentedaquilo que correntemente)12. Sem histria o passado serve meramente ainteresses prticos e assim, em um importante sentido, ns seramos destitudosde nossa prpria experincia. Para a pesquisa histrica, simplesmente umainvestigao racional do passado e, desde que ns no podemos escapar do

    10Os limites impossveis aqui referidos so inerentes em largo sentido ao dado por Oakeshottpara prtico em sua justaposio ao passado histrico e prtico. difcil ver, por exemplo, por queo tratamento histrico dado ao Tratado de Versalhes deveria excluir conexes com eventos subse-quentes na Alemanha e h necessidade de distinguir, primeira vista, do tipo de tratamento que v oTratado como justificativa para a destruio da Repblica de Weimar, ou examinar alguns aspectosdele como sendo a origem de alguma parte do presente. Para a discusso do ponto de vista histricode Oakeshott, ver o artigo de Dray referenciado na nota 5 e tambm na antologia de Walsh, W. H. Thepratical and historical past.

    11No existe inteno aqui em sugerir a ideia do passado tratado de diferentes maneiras eque no existem questes sobre se o passado descoberto ou constitudo. Oakeshott em nenhum casoolha o passado como o presente sendo de uma maneira particular. Mas, no o lugar de discutir esteassunto.

    12Teria que haver um mundo sem moral, religio ou disputas legais e sem disputas de interessesmateriais. Talvez uma concepo pr-freudiana de sociedade socialista como entendida por Marxpode alcanar algum lugar prximo a ser encontrado? Mas, deixada deste jeito, minha referncia muito simples. H limites para a objetividade histrica, mas ela pode ser a base de nossa avaliao pa-ra o que relevante para uma pesquisa ou (mais amplamente) o que importante em histria, at ago-ra como isto no foi estabelecido com antecedncia pela pergunta feita, ou por qualquer sorte de teo-ria, est a ser encontrado em alguma forma compartilhada de vida. De acordo com a relativa importn-cia das mudanas massivas no modo de vida possvel para um vasto nmero de pessoas, de uma lon-ga expectativa de vida e de liberdades de vrios tipos, talvez para ser guiada para algum acordobsico em aparatos psicolgicos, percepes importantes ou outros. (Algum tipo de caso poderia noter dvidas de fazer na direo das linhas de Wittgenstein, mas esto de maneira ambgua no olhar deWittgenstein sobre formas de vida, os quais apresentam dificuldades). (Ver tambm nota 22).

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    passado, ns temos que procurar o melhor conhecimento que pudermos obtersobre ele13. por esta razo que se torna original perguntar que uso a histriatem ou por que a histria poderia ser aprendida. Se nosso conhecimento domundo presente no nunca um conhecimento instantneo, e nos traz, querqueira, quer no, alguma concepo substantiva do passado, ento, serhistoricamente ignorante , justamente, ser ignorante.

    Evidncia

    Afirmei que a histria fornece o nico meio racional de investigar opassado. Esta afirmao se baseia em parte no conceito de desenvolvimento deevidncia na histria (e das tcnicas de manuseio) da evidncia. Tem havidouma grande discusso sobre evidncias histricas e sua importncia para oensino de histria nos ltimos anos e eu no desejo discutir os pontos fortes efracos dos mtodos e dos contedos especficos de aulas aqui. O que importante para o assunto em mos que, se o uso de evidncias o que, decerta maneira faz uma investigao racional do passado possvel, ento ser

    13Tudo o que dito neste captulo planeja sugerir a justificativa de uma forma de conhecimentopara a histria e, com isto, uma nfase na sua aquisio na escola sob a forma de uma disciplina. Restaa complexa questo de como a histria substantiva deve ser ensinada; um assunto largamente comentadonos ltimos quinze anos, invocando os critrios da pedagogia pelos quais tudo pode ser ensinado, osquais exemplificam a disciplina algumas vezes as habilidades da histria. Isto no suficiente:primeiro, porque entre os paradigmas dos perodos selecionados uma escolha dever ser feita entre oque importante e o que no ; e, segundo, porque o ensino de uma disciplina tambm envolve o ensi-no de seus critrios de importncia. O que estes critrios so uma questo a ser trabalhada. No hespao neste captulo para fazer um esforo srio para esmiuar isto, mas vale a pena arriscar um oudois comentrios. impossvel prover as crianas, com antecedncia, dos seus interesses, com um ca-tlogo de tudo o que voc precisa saber. Os interesses prticos, de alguma forma, no podem orga-nizar o passado no ensino de histria, ou o passado prtico tomar o lugar da histria. Mas, consideran-do que ns somos os tipos de pessoa que somos, vivendo a vida que ns vivemos, ns somos propensosa ter interesse mais em uma passagem do passado do que em outra. J foi colocado que, como sereshumanos, ns compartilhamos uma forma comum de vida e em algum nvel isto nos permite a possibi-lidade de uma intersubjetividade consensual do que humanamente importante. Isto feito, talvez (mi-nimamente) um passo pode ser ganho sobre o conceito do que intrinsecamente importante em histria.Isto tambm pode ser um argumento acerca da prpria natureza da histria. A atividade histricapressupe, pelo menos, a preocupao quanto liberdade em assegurar o que a evidncia nos leva acrer (para ns mesmos e para os outros); e tambm uma concepo de homem como um ser racional(como oposto a irracional). Isto pressupe uma igualdade de tratamento e um respeito por pessoas co-mo fontes de argumentos. Nestas circunstncias, isto parece ser profundamente razovel sem poderososcontra-argumentos (e o nus disto recai em quem desagrada a produo destes argumentos) para ne-gar que estas mudanas do passado esto no curso da liberdade, igualmente no respeito pelas pessoase no desenvolvimento da racionalidade da sociedade, como de importncia intrnseca para a histria.Inquestionavelmente, tudo isto envolve apelar para alguma concepo de interesse humano e talveztambm para um critrio implcito de educao; mas o histrico e o educacional no esto em conflitoaqui. Mesmo os historiadores mais limitados necessitam alguma ideia de diversidade da vida humanae do que possvel para o homem ser e fazer. A importncia do histrico depende de uma concepode interesse humano e a histria nos possibilita usar esta concepo criticamente.

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    capaz de usar evidncias , dessa forma, aquisio valiosa. Mas, h limitesquanto ao que pode ser afirmado aqui. No se pode presumir que o conceito deevidncia histrica coextensivo com o conceito de evidncias em geral e amaneira pela qual a evidncia usada na histria no necessariamente a mes-ma como ela usada em, digamos, cincia natural. A diferena , em parte, re-lacionada s tcnicas, mas existem diferenas mais fundamentais. As perguntasa serem respondidas so diferentes e, em consequncia e tambm em grandeparte, o material evidencial. Eu no posso aprofundar este ponto corretamenteaqui, mas bvio que as questes como o que se pretendia, em certas aes,no surgem em conexo com o comportamento de objetos inanimados e osignificado de um documento ou o significado de uma prtica social ou daquelesque dela participam no tem qualquer contrapartida com os problemasevidenciais na cincia natural.

    Pode parecer que o preo a ser pago para distinguir a evidncia na histriada evidncia em outras disciplinas empricas alto: aprender a lidar com aevidncia histrica pode no ter nenhum valor de transferncia para outrasdisciplinas. Se a aprendizagem da histria importante, tambm o ser aprendera usar a evidncia histrica, mas o ltimo no pode dar apoio independente aoprimeiro, uma vez que dele deriva. Mas isso no to restritivo quanto parecee certamente no limita o que aprendido no uso de evidncia histrica dopassado obscuro e morto. J vimos que o passado no pode ser claramente di-vidido a partir do presente: a compreenso de uma pessoa no pode ser isoladada compreenso da outra. verdade que ensinar as crianas a usar a evidnciahistrica no pode ser, ipso facto, equip-las para fazer uso efetivo do passadoprtico; talvez as pessoas empreguem mais facilmente o passado para resolveremos seus problemas atuais, quando esto cientes apenas do passado prtico.Algum pode at ter argumentado que as crianas precisam de respostas rpidaspara problemas prticos e no da histria, que trar para elas apenas paralisantesdvidas acadmicas. Mas seria difcil ter uma viso to sria como a da educaoprescritiva, porque equivaleria a uma negao da importncia da verdade e,com ela, de toda a atividade cognitiva. (Talvez as doutrinas mais prximas detal posio nos tempos modernos sejam o futurismo e o fascismo.) Menos ge-ralmente ela equivaleria a uma bno sobre os usos do passado deplorado porPlumb e to claramente exemplificado na contempornea Irlanda do Norte.

    Aprender a usar a evidncia histrica e talvez, acima de tudo, adquirir apaixo racional concernente verdade, objetividade e assim por diante,que so essenciais para a operao dos procedimentos histricos tanto umadas principais razes para a aprendizagem da histria como uma parte centraldo que a aprendizagem histrica realmente implica.

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    LEE, P. Por que aprender Histria?

    Leis, lies e generalizaes

    A relao entre o passado e o presente envolve outros aspectos da histria.Entre os historiadores acadmicos, talvez uma das justificativas mais desacre-ditadas para a histria que ela ensina lies. Polticos, jornalistas e muitosoutros (incluindo alguns historiadores profissionais) ainda assim persistem empensar que a histria tem lies a ensinar. Munique, a experincia do conflitoracial nos EUA e a Revoluo Industrial so colocados diante de ns comoexemplos do que pode, poderia ou vai acontecer se (respectivamente) os pode-res da Otan tivessem tentado apaziguar a antiga URSS. A decadncia urbanainterior e a discriminao racial continuam desenfreadas, ou o chip de silciono aproveitado de forma adequada. Inquestionavelmente, o passado podeser pressionado em favor de uma causa, na defesa de um curso de ao, pelomenos como um passado prtico. Mas h algo como isto que, legitimamente,pode ser procurado no passado histrico?

    As lies da histria so geralmente enquadradas como generalizaesde algum tipo, apoiando as previses. Estas ltimas podem ser advertncias decomo o mundo vai agir como se fosse por si s, se um determinado curso deao no for orientado. Alternativamente, podem se declarar e demonstrar aspossveis (mesmo inevitveis) consequncias de uma ao particular, enfati-zando a sua convenincia ou inconvenincia. Na cincia natural, claro, asprevises so frequentemente baseadas em teorias que incorporam as decla-raes de regularidades ou leis gerais e especificao das condies iniciaisrelevantes. E a aplicao da cincia a problemas prticos resultou em sucessossurpreendentes. tentador pensar que, portanto, as generalizaes que so ouformam a base das lies da histria so equivalentes s teorias formalmentearticuladas do paradigma cientfico, apenas talvez um pouco menos precisas.Tal suposio perigosa. Este no o lugar para tentar uma anlise aprofundadada possibilidade ou da funo lgica de leis gerais da histria, mas algunscomentrios no podem ser evitados14. H claramente generalizaes somativasna histria que so explicativas do ponto de vista do senso comum, mas fornecem

    14A discusso sobre leis e generalizaes em histria frequentemente feita com dificuldadepara distinguir as diferenas dos tipos envolvidos. Uma lista simplificada poderia ser essa:

    (a) generalizaes reduzindo a um nmero finito de casos conhecidos;(b) generalizaes sobre um indivduo;(c) leis universais, se confirmado ou meramente provado, isto verdade plausvel, a

    qual envolve diferentes sentidos de probabilidade a partir da qual segue o item (d);(d) leis estatsticas, apresentando probabilidades numricas isto , eventos de um certo tipo

    ocorrendo em uma populao de eventos de outro tipo;(e) leis normativas, descrevendo as tendncias das coisas (ver BHASKAR, R. A realistic theory

    of science. London: Version, 1997);

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    LEE, P. Por que aprender Histria?

    uma base frgil para a predio. Como Atkinson salienta: A surpresa de algum[...] que uma determinada Reforma do Parlamento foi preparada , inegavel-mente, diminuda pela descoberta de que todas elas foram. (ATKINSON, 1978,p. 111). Mas, a menos que saibamos por que elas estavam preparadas, nopodemos empregar a generalizao de alguma forma til, para alm dos casosque foram resumidos15. Ento, algo mais necessrio: talvez, leis universais ougeneralizaes estatsticas?

    Sem dvida, em princpio possvel que as leis universais ou genera-lizaes estatsticas possam ser descobertas como aplicveis histria. Tambmpode ser que, ao dar explicaes, historiadores necessariamente comprome-tam-se com a afirmao implcita de que alguma lei que cobre uma explicaoexiste, mesmo que ningum possa formul-la16. Mas, mesmo se ambos osargumentos forem aceitos (e no sem dificuldades) ofereceriam poucaorientao sobre as questes centrais a este captulo. Em primeiro lugar, leisuniversais e genuinas aplicveis histria possivelmente so de baixa pro-babilidade, no sentido de que as chances delas serem verdadeiras so peque-nas. difcil pensar em um nico exemplo em que isto no se aplica. Em se-gundo lugar, as leis estatsticas, que podem ter uma melhor pretenso de verda-de, so aplicveis a uma gama limitada de reas, onde h um grande nmerode eventos que podem ser considerados como os mesmos; normalmente elesso encontrados na histria demogrfica (e alguns na histria econmica).Olafson argumentou que as mltiplas rotinas pelas quais a vida de uma co-munidade humana organizada e estabilizada arando um campo, por exem-plo so do tipo recomeou de novo e de novo sem mudana significativa, etoda a histria delas seria uma releitura de uma histria que j foi contadainmeras vezes. Colocadas lado a lado, essas histrias [seriam] essencial-mente autossuficientes e [poderiam] ser entendidas sem referncia a qualquerepisdio em especial (OLAFSON, 1979, p.115-117). 17. Para que uma histriaseja possvel, os eventos devem ser logicamente cumulativos. Pessoasdescrevem eventos de modo a escolher (a partir das muitas descries possveisdisponveis) certas caractersticas a que elas podero reagir. Estas caractersticasrefletem as crenas, expectativas, intenes e propsitos de quem est reagindo,

    (f) trusmo (ver SCRIVEN, M. Truisms as the ground for historical explanation. In: GAR-DINER, P. (Ed.). Theories of History. Free Press, 1959.

    (g) Leis heursticas ou generalizaes;(h) Princpios de ao. Considerando a preocupao desse captulo, a discusso ir ser focada

    nos itens (a), (c) e (d), mas tambm ser feita breve referncia em relao aos itens (g) e (h).15Exceto enquanto um instrumento heurstico.16Ver WHITE, M. Foundation of historical knowledge. Harper & Row, s/d., p. 14-104.17Ver tambm p. 100-101.

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    LEE, P. Por que aprender Histria?

    os quais pressupem uma capacidade para referir-se a pontos anteriores ouposteriores, na ordem do tempo [...] para se referir.

    Dentro de um contexto desse tipo, o evento original assume um significado como uma ameaa, por exemplo, ou como a criao de uma oportunidade,que lhe d uma orientao no tempo, como bloquear ou facilitar outras aespossveis. Assim, um evento inicia uma sequncia em que reaes apropriadasso feitas para eventos passados vistos da mesma maneira (OLAFSON, 1979,p. 100-101)18. As rotinas recorrentes, que so tpicas do domnio de leisestatsticas (sobre, por exemplo, o nmero de nascimentos por mil, sob certascondies) no exibem esse carter logicamente cumulativo. Assim, tais leisestatsticas, como so atualmente encontradas na histria, esto confinadas acertos tipos especficos de anlise histrica. Claro que, a longo prazo, rotinasrecorrentes podem produzir alteraes (por exemplo, a eroso do solo ou umaexploso populacional) que exigem uma ao fora do repertrio estabelecidode tais rotinas: mas precisamente este tipo de alteraes que fazem com queo estabelecimento de leis estatsticas dificilmente transcenda determinadaspocas e lugares. O ponto deste captulo no que no existe nenhum candidatopara o status de tais leis, ou que tais leis nunca so pressupostas nas explicaeshistricas, mas que poucos poderiam apoiar previses. E se difcil pensar emqualquer lei estatstica, seria de arriscar a prpria camisa que ainda maisdifcil de encontrar qualquer lei universal bem fundamentada.

    H uma razo importante para isso. Assim como no h leis da fsicasobre radiadores de automveis quebrados que vo explicar por que um radiadorespecial quebrou, mas sim leis de mudanas relativas presso de lquidosconforme a temperatura e volume, ento na histria no de se esperar quehaver leis sobre a derrubada dos reis ou sobre as aes dos secretrios es-trangeiros. Mas, na histria, ao contrrio da fsica, no h ainda nenhum conjun-to de conceitos abstratos do tipo certo. Mesmo que tais esquemas conceituaisfossem desenvolvidos, haveria problemas importantes sobre seu emprego nahistria. Isso acontece porque muitos eventos histricos so referncias paratrs e (no sentido de Olafson) logicamente cumulativos. A estrutura conceitualnos termos pelos quais esses eventos so escolhidos e compreendidos pelosagentes envolvidos a prtica cotidiana, na qual as coisas so feitas por razes.O significado disso trazido pela considerao de alguns pontos que foramlevantados por Davidson19. Afirmaes causais, argumenta Davidson, implicam

    18Conferir a discusso de G. H. von Wright sobre as cadeias quase causais. In: Explanationand Understanding. London: Routledge & Kegan Paul, 1971, p. 139-143.

    19No h espao aqui para discutir a possibilidade da sociologia histrica que investiga estrutu-ras de mudanas na sociedade. Os marxistas s vezes argumentam por algo mais fechado do que isso,

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    leis apenas no sentido fraco que A causou B e implicam que existe uma leicausal explicada por algumas descries verdadeiras de A e B. Podemos darexplicaes causais vlidas, sem conhecer leis preditivas pertinentes. Almdisso,

    [...] uma generalizao, como Janelas so frgeis, e as coisas frgeis

    tendem a quebrar quando atingidas forte o suficiente, nas mesmas con-

    dies no uma lei preditiva em bruto as leis preditivas, se elas exis-

    tirem, seriam quantitativas e usariam diferentes conceitos. A generaliza-

    o, como a nossa generalizao sobre o comportamento, tem diferentes

    funes: ela fornece evidncias para a existncia de uma lei causal, cobrindo

    o caso mo (DAVIDSON, 1968, p. 91-92).

    Por conta disso, a histria pode ser explicativa sem ser preditiva. No ca-so do comportamento humano, isto particularmente importante. Se quisermosexplicar uma ao (caracterizada em termos do dia a dia), no precisamos de(e no podemos ter) uma lei no sentido de que pessoas acreditam de tal ou qualforma ou possuem tal maneira de agir. Para ter certeza, a ao ir instanciar(sob alguma descrio verdadeira) leis causais ento, razes so causas ra-cionais. Mas essas leis causais no lidam com conceitos em que a explicaoracional tem de lidar (onde noes como evidncia, boas razes para acreditar,e assim por diante, devem entrar). Os conceitos necessrios nas leis causaisrelevantes e, se ns os soubssemos, podem at ser de qumica, neurologia oufsica (DAVIDSON, 1968, p. 93)20. Leis empregando esse tipo de estrutura

    e os conceitos marxistas tm afirmaes preconcebidas em relao ao nvel necessrio de abstrao.Mas, o tipo de estudo examinado por marxistas no empregaria leis da mesma forma (dito) por Hempel.Ver Bhaskar, op. cit. e sua The possibility of naturalism, Harvester, 1979; tambm, Cohen, G. A. KarlMarxs Theory of History, a defense. Oxford: Oxford University Press, 1979.

    20O argumento de Davidson pode ser (cruamente) resumido como: (a) Se desejo e crena sopara explicar uma ao do modo certo, eles devem provoc-la do mesmo modo: talvez atravs de umacorrente de raciocnios, encontrando modelos de racionalidade; (b) ns no podemos distinguir o tipocerto de processos causais sem levar em conta como a deciso alcanada luz do conflito de evidnciase do conflito de desejos; isso significa que ns devemos usar as noes de evidncia, boas razespara acreditar, entre outras. Portanto, (c) ns no podemos fornecer condies suficientes e necessriaspara agir sobre a razo, se ns usamos somente conceitos como crena, desejo e causa. (d) Pelas mes-mas razes, ns no podemos fornecer leis srias, conectando razes e aes. Se ns tivssemos con-dies suficientes poderamos dizer: Toda vez que um homem tem tais e tais crenas e desejos, e taise tais condies satisfeitas, ns agiremos de tal e tal modo. No existem leis srias como essa (i.e.com probabilidades fixas, transbordando a partir da natureza da teoria, e onde ela possvel paradeterminar, posteriormente, se as condies de aplicao so satisfeitas). In Psychology as philosophy(In: GLOVER, J. (Ed.). The Philosophy of mind. Oxford: Oxford University Press, 1976) Davidsonconclui que atitudes, crenas, desejos etc. no so, mesmo na teoria, disponveis para predio precisaou subsunes sobre determinadas leis. O limite, ento, colocado sobre as cincias sociais, postono pela natureza, mas por ns, quando decidimos ver o homem como um agente racional, com objetivose propsitos, e como sujeito capaz de avaliar moralmente. (p. 109-110).

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    conceitual no poderiam lidar com eventos entendidos como razes de qualquermodo, muito menos sob a forma de descries, to frequentes na histria, emque razes so as referncias passadas. Um quadro conceitual que ultrapas-sasse razes, ultrapassaria essas razes tambm, e seria, portanto, incapaz deexplicar um relacionamento central entre passado e presente. Se Olafson estcerto, isso tornaria grande parte da histria impossvel.

    Naturalmente, h muito mais neste argumento21. O que importa para estecaptulo, no entanto, que, mesmo na anlise mais plausvel de razes comocausas, ainda h srias dificuldades para qualquer afirmao que podemos es-perar para conseguir leis universais, influenciando sobre a ao humana inter-pretada como ao. Temos na histria poucas (se houver) leis universais quepoderiam suportar o peso de predies. Ns talvez poderemos (no futuro) tertais leis, ao preo de um novo quadro abstrato conceitual. O preo a ser pagoseria que seremos incapazes de explicar as razes como razes e aes comoaes.

    Se o estudo da histria no oferece leis nas quais as previses podem serbaseadas, pode oferecer tudo o que nos dar algum produto no futuro? A primeiracoisa a notar que, no senso comum e na cincia prudente, previses condicio-nais so possveis sem leis (algo reconhecido de uma forma qualificada peloprprio Hempel)22. Uma vez aceito que possvel dar apoio indutivo para afir-maes sobre o futuro, independente de leis gerais, a previso com base no co-nhecimento histrico j no , em princpio, inadmissvel23. Enquanto se reco-nhece que todas as previses so condicionais (particularmente na histria, on-de as coisas muitas vezes se recusam a permanecerem iguais, mas em vez distomudam) e que no objetivo da histria servir de base para a previso (histria at mesmo a histria marxista no organizada dessa forma), no h malem dizer que o conhecimento histrico pode, por vezes, permitir que as previsessejam feitas24. Em segundo lugar (sem invocar leis gerais), explicaes sempretm implicaes para alm do caso em mos. Se algum cita A como umaexplicao de B, pode-se repudiar uma explicao semelhante em outro casosomente se houver uma diferena relevante entre eles. Isso no justifica tanto a

    21Para um argumento mais detalhado, ver Peare, D. Questions in the philosophy of mind.Duckworth, 1975, especialmente o captulo 5; Sketch for a causal theory of wanting and doing;Mackie, J. L. The cement of the universe. Oxford: Oxford University Press, 1974, cap. 11: Teleology;Davidson, D. Psysichology as Philosophy. In: Glover (Ed.). Op. cit., e Olafson, op. cit., p. 175-188.

    22Ver Nell, E. J. Review Essay (de C. G. Hempels Aspects of Scientific Explanation). Historyand Theory, v. 7, n. 2, p. 224-40.

    23Ibid., passim. Existem, naturalmente, muitos problemas gerais conectados com a induo,mas existem poucos para serem resolvidos por meio do conceito de lei geral.

    24Essas questes foram tratadas em outros trabalhos.

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    afirmao de Sempre que houver A ento haver B ou S se houver A entohaver B, mas implica apenas que porque tem sempre uma referncia paraalm do caso individual, em virtude da generalidade das descries em que osfenmenos em questo so explicados (ATKINSON, 1978, p. 102)25. Conceitostrazem consigo consequncias lgicas que podem ser consideradas (para algunspropsitos) como conjuntos de pressuposies sobre casos semelhantes. Se es-tamos preparados para afirmar que a URSS enviou tropas para a Tchecoslov-quia, porque seu interesses vitais foram ameaados, ento devemos estar pre-parados para mostrar as diferenas relevantes se quisermos repudiar uma ex-plicao semelhante em circunstncias aparentemente similares. O pressupos-to de que as grandes potncias iro proteger seus interesses vitais vago emeramente sugestivo, mas no um trusmo vazio ou totalmente formal, porqueconstrudo sobre o caso que implica que so sugestes a respeito de que tipo decoisa pode ser um interesse vital. Mesmo assim, se as circunstncias so dife-rentes, ou os poderes diferentes, ou se eles falham em reconhecer os seus in-teresses, ou se eles tm razes imperiosas a lista indefinidamente longa opressuposto ir falhar26.

    Sua aplicabilidade est sempre em questo, porque ser uma questo dejulgamento sobre o que para contar como o mesmo e quais so os aspectosque so relevantes para decidir isso. At que ponto os eventos na Polnia tmque ser analisados antes da interveno impelida pelos interesses vitais daURSS? A generalidade mnima implcita no emprego de um conjunto deconceitos em vez de outros, na histria, registra o julgamento de um historiador(muitas vezes singular) e indica onde ele poderia olhar sob outros pontos devista, ao invs de significar a aplicao de uma lei formulada de forma inde-pendente ou com antecedncia. Por esta razo, se optarmos por considerar es-sa generalidade implcita como mais do que formal, bem como considerar ofornecimento do conjunto de pressupostos para outros eventos, isto essencial

    25Um ponto similar feito por Nell, op. cit., p. 230. A afirmao tradicional de que a histriaest preocupada com a compreenso de eventos particulares mais do que em subsumi-los sob as leisgerais no , portanto, falsificada. O fato de que ns empregamos conceitos como empreendimentocognitivo (para no ser forado) no mais comprometendo historiadores na busca ou no emprego deleis gerais do que (diriam) os crticos de arte. O objeto de comparaes e contrastes alm do caso cita-do pode ainda ser a ampliao da prpria compreenso do caso individual e no a sua assimilao pe-los outros casos pela sua submisso lei (ATKINSON, 1978, p. 113).

    26Peter Rogers argumenta que essas pressuposies so preenchidas ou completadas em histriadentro de generalizaes elaboradas indutivamente, reduzindo sua formalidade ainda mais. Eu con-cordo que isso acontece e que ns raramente temos algo melhor para fazer, mas tendo um ponto de vis-ta mais pessimista sobre as predies baseadas a partir deles. Uma dificuldade aqui pode ser ilustra-da comparando com as concepes de Gladystone e Disraeli sobre interesses vitais. Mas eu concordocom Peter Rogers que, enquanto instrumentos heursticos, tais generalizaes so de uma grande im-portncia no ensino de Histria.

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    para perceber que estamos lidando com um dispositivo heurstico, cujo papel chamar a ateno para certos elementos em uma situao como possivelmen-te importante. O mais explcito e preciso torna-se uma lei em tais pressupos-tos. No entanto, no provvel que uma lei seja relevante em todas situaes.Atkinson sugeriu uma analogia aqui com os canhes de gosto: amplamentereconhecido que tais canhes, mais que muletas para iniciantes ou materialpara os produtores de livros didticos equivocados, so defensveis apenas namedida em que nos encorajam para olhar, atravs deles, para obras exemplares,para os temas de comparao e contraste, que so as bases sobre as quais elesocorrem. (ATKINSON, 1978, p. 114). Pressupostos e generalizaes mnimase implcitas, decorrentes dos conceitos empregados na explicao, raramenteso encontrados como declaraes explcitas no trabalho histrico, mas sogeralmente tornados explcitos, a fim de deduzir um conjunto de alternativasde pressupostos. Onde eles surgem nos livros escolares e em transcries defala de professores em interao em sala de aula, ou na popularizao dahistria27. Isso importante muletas para iniciantes um pouco de desprezo para algum aprender histria: generalizaes sugestivas so vlidas e teis,enquanto isto realizado no como destilaes de, ou resultado formal depesquisa histrica. A questo no aplic-las, mas ver alm delas.

    Muitas destas pressuposies e generalizaes implcitas vm a sersemelhantes aos princpios de ao de Dray. Hence Taylor explica essa ge-neralizao, em que a suspeita a relao normal entre grandes potncias,com um princpio esquemtico de ao para conselheiros militares. Afinal, o trabalho de generais, almirantes e marechais do ar de se preparar para asguerras. Eles s podem se preparar mesmo para a guerra, sensatamente, sepreverem um antagonista, e quando eles no podem ver um antagonista bvio,ento, eles encontram antagonistas improvveis. (TAYLOR, 1978, p. 158).Da mesma forma, intimamente questionado por um aluno sobre cuidados comfranceses e holandeses durante a campanha de Marlborough Blenheim, umprofessor responde: Generais no travam batalhas, a menos que eles pensemque vo ganh-las. Tomada tal como est, essa ltima afirmao simplesmentefalsa. Mas, tomada como algo parecido com um princpio de ao para o perodorelevante, quando a formao e manuteno de tropas profissionais foiextremamente caro e a guerra estava longe de ser total, chama a ateno para oque provvel que seja uma importante premissa militar. E usado na lio,tanto para mostrar como a maioria dos generais eram susceptveis de secomportar como para indicar que Marlborough era diferente. Um princpio de

    27Ver, por exemplo, Taylor (1979, p. 158): [] suspeio o relacionamento normal entre osgrandes poderes.

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    ao defensvel em casos individuais, sem que isso seja considerado comointil.

    Se to simplista distino permitida, pode-se dizer que a histria no uma atividade prtica (mas uma atividade cognitiva) que, em situaes im-portantes, como atividade prtica. Nela, uma massa de conhecimento pro-duzido e isso pode ser adquirido por qualquer um que aprenda histria. Maseste conhecimento no formalizado ou articulado em esquemas dedutveis. Eporque no formalizado, no pode ser aplicado em todas as instncias, massomente aplicado em certos casos28. O conhecimento histrico pode ser con-siderado como (entre outras coisas) uma experincia vicria: ela aponta para oque pode ser esperado, enquanto que faz-se evidente que o que esperado ,raramente, como acontece. Isto d alguma concepo para uma gama de pos-sibilidades e abre a oportunidade de tomar esta concepo de forma reflexiva.

    A experincia histrica de um homem afeta seu senso de probabilidade, a

    escolha das coisas que ele acha possveis de acontecer, porque ele acredita

    que j aconteceram antes, ou os motivos que ele acredita como provveis

    de serem tratados, porque ele pensa que homens trataram deles antes. Em

    todos esses problemas, importante que homens e mulheres percebam o

    que, provavelmente, influencia o seu jeito de pensar, porque somente se

    fizerem isto que eles podem trazer tais influncias sob um certo tipo de

    controle. ( KITSON CLARK, 1967, 197).

    A conscincia da crena de algum somente uma condio necessriapara trazer as influncias sob controle, no uma condio suficiente. E, claro,um senso do provvel no um padro do possvel: esse tipo de experincia desastroso se for usado para ser mecanicamente aplicado para o futuro.

    A noo de experincia vicria ser estudada na seo IV, mas h maisum jeito pelo qual a histria pode fornecer alguma adeso do futuro, j men-cionada na seo I. Mais uma vez, as concepes centrais so aquelas de in-tencionalidade e historicidade. Ao poltica, movimentos institucionais ou de-senvolvimentos, manipulao ou tolerncia econmica, todos os conceitos fazemreferncia ao que est acontecendo e so, ao mesmo tempo, relatos do que jaconteceu. Isto particularmente claro no caso de polticas que so tempora-riamente prolongadas. A poltica do Partido Trabalhista, por exemplo, trazconsigo um certo entendimento do que j foi feito por e do que aconteceu noReino Unido no passado, e o que eles significam dentro do contexto de talpassado (OLAFSON, 1979, p. 148). O mesmo verdade (por exemplo) na

    28Referncia para casos pode ser uma distante analogia com a prtica clnica, mas ela aindaimplica muito prximo aos exemplos.

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    poltica estrangeira de Hitler ou na poltica de apaziguamento. De forma maisgeneralizada, tradies de todo tipo envolvem compreenses compartilhadase, apesar destas,

    [...] podem ser representadas em forma de princpios gerais a partir dos

    quais uma aplicao nas circunstncias do presente , ento, dedutivamente

    derivada [...] duvidoso se essa , de fato, a forma na qual a tradio seria

    entendida pelo povo em questo. A viso mais plausvel que essa tradio

    mantida na mais particularizada e concreta forma de uma conta do que a

    sociedade fez e sofreu, por um perodo de sua existncia. (OLAFSON,

    1979, p. 148).

    Enquanto ao futura e uma continuao das normas (ou tradio), oconhecimento histrico pode fornecer vises para o futuro, por meio de su-gestes de que movimentos possam contar como parte daquela norma. Issono ratifica o relato do passado encravado em tais normas ou tradies, mascria a possibilidade de compreenso e avaliao delas.

    Alm disto, dado que qualquer ao concebida dentro de um certocontexto e de um certo jeito, o conhecimento de elementos histricos (refernciasdo passado), nesta situao, ajudar em qualquer anlise do que possvel serfeito. Taylor, por exemplo, chamando a ateno de uma audincia leiga parapartes do passado que ele claramente pensa que ela sabe pouco, declara:

    De fato, a Rssia foi invadida por um pas europeu, ou outras cinco vezes,

    desde o incio do sculo dezenove. Por Napoleo em 1812, pelos britnicos

    e franceses em 1856, pelos alemes em 1914 at 1917, pelos britnicos e

    franceses de novo em 1919 e pelos alemes em 1941. A Rssia nunca

    invadiu a Europa, exceto em resposta ao conquistador e pode-se dizer,

    como libertador (TAYLOR, 1979, p. 170).

    claro que se a assero de Taylor fosse aceita ela levaria a certasexpectativas do comportamento sovitico no futuro diferentes daquelas queseguem uma anlise mais cptica da histria sovitica. Isso no porque estamosautorizados a esperar que a URSS far sempre o que fez no passado, mas porquenossa compreenso de como aqueles que controlam as polticas soviticaspodem ver as coisas foi modificada. A questo que, para entender o que aURSS fez em uma determinada poca e ter uma melhor ideia do que ela poderiater feito na sequncia, necessrio saber a histria. Alm disto, o conhecimentohistrico pode excluir certas concepes do passado e ento mudar nossasconcepes do futuro do que possvel e desejvel29. O controle da histria

    29Essa investigao demandaria algumas concepes do passado irlands sustentado porparticipantes no conflito da Irlanda e, portanto, algumas concepes sobre a ao possvel, e isso no

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    sobre o futuro no est confinado a avaliaes de probabilidades do que podeacontecer a ns (ou apesar de ns), mas nos oferece alguma base sobre a qualpodemos decidir como agir. E, claro, j que o que tentado raramente o que alcanado, o conhecimento histrico pode (com o tipo de qualificao levan-tada atravs dessa seo) indicar onde olhar para ver o que pode ter uma rela-o entre os eventos, independentemente do que quaisquer agentes histricospensem que eles esto fazendo.

    A Histria diz respeito ao estudo do passado e no do futuro. Mas algumconhecimento sobre o passado nos d um alcance (mesmo que ligeiro) sobre ofuturo. Esse alcance no fortalecido pela tentativa de fazer da histria umafonte pseudocientfica de predies: ela somente tem alguma coisa distinta aoferecer quando nos reportamos a ela30. No est sendo defendido aqui quehistoriadores e aqueles que estudaram histria sero melhores copistas do futurodo que os no historiadores, porque muitas coisas, alm do conhecimentohistrico, entram nessa questo. O que est sendo colocado que um homemcom um conhecimento da histria estar melhor situado no mais do que umhomem carente desse conhecimento, mas do que ele prprio estaria se notivesse esse conhecimento.

    Experincia vicria

    A Histria possibilita uma experincia vicria. Mas, o que se quer dizercom isso? Experincia usada para indicar alguma coisa pessoal (mas nomeramente subjetiva) e alguma coisa acumulada como que se torna mais ex-

    significa fornecer pessoas com notcias, pois informaes mais acuradas os reteriam, sustentandosuas vises. As pessoas podem ter outras razes para sustentar seus pontos de vista. Se ns substitus-semos o conhecimento e a compreenso do passado, ento ex hypothesis os pontos de vista mudariam.Mas, isso meramente um ponto conceitual, e, claro, muito frgil para afetar questes substantivas:a) se isso possvel nas circunstncias econmicas presentes; b) como ele poderia ser alcanado.

    30Existe um perigo aqui em dizer histria fornece uma habilidade para fazer A, B e C. Ento,em vez de se preocupar com trabalhar com fatos dados, ou pensando muito sobre o passado num modosubstantivo, vamos ensinar A, B e C. Se isso era simplesmente uma preocupao contra sustentarinformaes estreis porque no existe compreenso ela seria suficientemente inocente. Mas, elapode levar a confuses em relao ao que existe em histria para ser ensinado. Isso , talvez, evidenteem CONNEL-SMITH, G.; LLOYD, H. A. The relevance of history. Portsmouth: Heinemann EducationalBooks, 1972, no qual, um conhecimento exato dos eventos passados contrastado desfavoravelmentecom, por exemplo, hbitos de julgamento e capacidade para ao (p. 28), e uma abordagem advogadaque eleva as necessidades das pessoas vivas sobre obrigaes tericas em relao ao passado e posteridade ou mesmo para aqueles conceitos mais importantes, verdade objetiva (p. 85). simplesmente assumido que um conhecimento exato dos eventos passados pode no ter conexocom hbitos de julgamento e capacidade para ao e que obrigaes tericas sobre o passado po-dem no ter significado para as necessidades prticas da vida. Quem presumivelmente no tem ne-cessidade da verdade objetiva para os seus propsitos mundanos e cotidianos!

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    LEE, P. Por que aprender Histria?

    perienciada. O que adquirido no necessariamente codificvel e no dara frmula nem a receita para a ao. H paralelos aqui com a arte e o ofcio oucom a prtica de habilidades complexas31. Algum que tem experincia nosignificado em questo pode ter dificuldade para articular com princpios gerais,ou, se ele puder, sentir que eles no so aplicveis sem a experincia de qualquerum que procure segui-los. Um professor experiente capaz de ver coisas queum sem experincia iria perder e saber com que tipo de situao ter de lidar.Um homem do mar pode saber que clima ser favorvel sem ser capaz de ex-plicar como o sabe. No h nada misterioso aqui. Muitas coisas so envolvidas:ter as concepes corretas, reconhecer exemplos, saber princpios, reconhecercondies sob as quais eles so aplicveis, ser capaz de identificar tendnciascontrrias e assim por diante. Com tempo, prtica e experincia, pacincia, eum leque de experincias, a maioria das pessoas pode aprender o que requerido.Mas sem experincia, mesmo se os princpios gerais fossem considerados eisto poderia ser feito de um jeito formal, eles seriam de pouco uso. Eles nopoderiam ser mecanicamente aplicados.

    A experincia adquirida pela histria vicria: de maneira bvia, desegunda mo. Pessoas que leem sobre (ou mesmo pesquisam) modos diferen-tes de vida no os vivem por causa disto e seguir o caminho de negociaesdiplomticas no significa estar engajado na diplomacia. Mas, procurando en-tender por que as pessoas fizeram como fizeram e por que a diplomacia proce-deu de tal forma, uma pessoa pode expandir o leque de situaes com que estequipado para reconhecer e o leque de possibilidades que est preparado paraencontrar.

    Falando de reconhecer situaes, a prpria preparao pode parecer oti-mista em vista do que foi dito na seo III. Mas, de novo, no uma questo deseguir uma receita ou aplicar uma frmula. conseguir conhecer indivduoshistricos (sociedades, naes, partidos polticos, instituies) que ainda estoconosco e tm tradies e normas com tipos de referncias l de trs. Isso sig-nifica a compreenso do sistema de valores e crenas e as condies materiaisem que so baseados32. sabendo algo da imensa variedade de jeitos que pes-soas tiveram e como as sociedades foram ordenadas (colocadas em ordem)que possvel agir. E isto reconhecer a importncia das contingncias aciden-tes, coincidncias ou outros imprevisveis acontecimentos em todas as aven-turas (empreendimentos) humanas, relacionamentos e instituies (GALLIE,

    31Nada disso tem significado para se recusar a existncia de princpios ou mesmo regras opera-cionais na esttica.

    32Eu no tentarei clarificar como eles podem ser sustentados: isso uma tarefa alm de minhacompetncia.

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    LEE, P. Por que aprender Histria?

    1964, p. 133)33. Tal experincia vicria til somente em negcios prticos,ela abre novos modos de ver coisas (e assim por diante, sob uma remoo,novas possibilidades de ao) mais do que receitar o que pode ser feito.

    Experincia deste gnero ser de nenhum valor sem um tipo de menteaberta, que a histria por si s no pode garantir, mas que construda em umestudo histrico. Ao mesmo tempo em que um conhecimento histrico requer aarticulao das razes e a habilidade de ver coisas de um ponto de vista diferente,ele pressupe que as pessoas tenham razes para fazer coisas, exigindo umprincpio mnimo de racionalidade (como oposto, para racionalidade, airracionalidade). atravs disto que algo pode ser salvo, a partir da afirmaodesacreditada que aprender histria desenvolve a tolerncia. A tolerncia ofe-recida pela histria no uma vaga sensao de simpatia ou perdo, que aceitatudo sobre a base de bom senso humano e relativismo generalizado. apresentarvontade e habilidade para entrelaar crenas e valores que no so necessa-riamente aceitos (muito menos compartilhados) com o propsito de entendi-mento34. Mas entender no aceitar ou at manter criticismo sobre a eficinciados meios ou do valor dos fins. Uma tolerncia histrica genuna deve ser beminformada e crtica. No entanto, mais do que isso no deve ser afirmado aqui.Ns no sabemos realmente o que afeta modos especficos de ensinar histria,nem sabemos o que exatamente tem de ser ensinado para que uma compreensoe tolerncia histrica desse gnero possam ser alcanadas35. Potencialmente,de qualquer modo, a experincia vicria a ser encontrada no ensino de histria libertria. Ela pode expandir nossa concepo do que o homem capaz,mostrando-nos o que ele fez, pensou e foi, e como ele mudou. Mais diretamente,supre uma imensa gama de exemplificaes concretas de ideais individuais,manifestaes do modo de vida que possvel se levar. Pessoas podem assumirdiferentes modos de vida (ativa, contemplativa, prtica etc.), objetivos diferentes

    33Gallie argumenta que a histria pode e deve ajudar-nos a alcanar a poderosa manipulaoda previso. Ele admite que seria um paradoxo absurdo esperar que a histria nos ajude a anteciparou prever desenvolvimentos especialmente preditos, mas argumenta que ela pode, de uma maneiraanloga prtica de jogos de habilidade, preparar para qualquer coisa que acontecer. Ele desenvolvea analogia em termos de forma uma prontido, rapidez e flexibilidade de respostas e formuladois quase princpios, cuja funo cobrir aquelas situaes que escapam da rede de nossos outrosprincpios e categorias. Essas ele chama de princpios de reserva e os princpios do tudo ou nada.Parece-me que Gallie isolou algo importante para assuntos prticos, o que levanta a necessidade demuitas futuras anlises. verdade que forma em jogos no simplesmente uma matria fsica, masa analogia tem escopo limitado, porque a experincia em histria permanece vicria no sentido daexperincia do expectador.

    34Ver LEE, P. J. Explanation and understanding in history. In: DICKINSON, A. K.; LEE, P. J.(Eds.). History Teaching and Historical Understanding. Portsmouth: Heinemann Educational Books,1978.

    35Ver os trabalhos de Peter Roger.

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    LEE, P. Por que aprender Histria?

    (poder, aprendizagens, riqueza etc.), papis diferentes (cientista, soldado etc.)e diferentes estilos de vida (responsvel, iconoclstico, artstico etc.). Desdeque faa sentido falar de pessoas fazendo escolhas, a histria supre algumabase concreta sobre a qual as decises so tomadas. Tambm d pistas das pos-sibilidades que no so encontradas exemplificadas no mundo contemporneo,sobre as quais nenhuma ateno dada, ou as consequncias que ainda no fo-ram compreendidas nos termos atuais. Obviamente, isso de particular signi-ficado para as crianas, a quem so constantemente oferecidos ideais individuaisdemandados por interesses comerciais de uma sociedade industrial capitalistae por um espectro relativamente estreito de opinio poltica36.

    Devido a todos esses aspectos da experincia vicria, a imaginao podeser considerada central, como um ingrediente e tambm como algo que paraser desenvolvido. No sentido de estabelecer cenrios diferentes para a investi-gao e a imaginao de possibilidades, a histria encoraja e exige a imaginaode duas amplas formas. Exige imaginao de dois modos de vida e diferentescrenas e valores como parte da compreenso histrica. Esse um aspecto fun-damental da imaginao histrica, do qual passvel presumir37. Ao mesmotempo, no sentido de obter avaliaes de importncia ou de localizar causascomo condies necessrias, a histria encoraja a imaginao de aes alterna-tivas, eventos, resultados. Aqui os eventos imaginados so imaginrios, masno so produtos incontrolveis da fantasia38.

    A experincia vicria, que adquirida no ensino de histria, estimula aimaginao e expande a concepo do educando do que ser humano e, assim,do que ele ou ela ou pode vir a ser. Nisso, como em tudo discutido nesse ca-ptulo, a afirmao que uma pessoa que aprendeu alguma histria (incluin-do aqui tanto o conhecimento substantivo como o de segunda ordem) estarmelhor equipada para lidar com o mundo do que ela estaria se no tivesseaprendido. Isso no significa afirmar que algum que estudou histria ser,ipso facto, melhor poltico, empresrio, cidado ou professor do que algumque no estudou.

    Ser modesto, contudo, pode oferecer algumas vantagens. O tempo paraeducao limitado (e no somente nas escolas). Alguma histria pode ser me-lhor que nenhuma mas, como pode a histria competir, em termos de tempo,com outras disciplinas? Alm do mais, a histria no to til quanto a Cincia

    36Eu no defendo, claro, o ensino de histria por meio de biografias, com uma srie de liesmorais para ser aprendida a partir da vida dos grandes homens.

    37J desenvolvi essas ideias em outros trabalhos.38Mesmo se algum der valor s declaraes de alguns historiadores para o fato de que eles no

    esto interessados no que poderia ter acontecido e, portanto, concludo, isso no estritamente histrico,a imaginao pode ter importante lugar na aprendizagem histrica.

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    LEE, P. Por que aprender Histria?

    ou a Matemtica. A fraqueza dessa objeo est na sua concepo crua sobre oque til. O til frequentemente colocado contra o intrinsecamente vlido eh algum sentido em tal justaposio. Mas alguma coisa que expande a nossaprpria concepo de mundo no entra tambm dentro dessa categoria. Aomesmo tempo, seria estranho afirmar que tudo o que tenha produzido umaexpanso intil, mesmo no sendo aplicvel num objetivo especfico sobreum modelo da tecnologia. sempre esquecido que as maiores realizaes dacincia tm sido do tipo no tecnolgica. Atividades como estas so valiosas,seja intrinsecamente, seja para atingir um fim. Naturalmente, alguma coisa til(enquanto instrumento) num sentido estrito pode adaptar-se a muitas finalidadese, ento, existe, frequentemente, ampla concordncia que ela til (mesmoentre pessoas com objetivos conflitantes). Por outro lado, existem grandesdiferenas quanto s finalidades e ento difcil obter acordos acerca do que importante num sentido no tecnolgico. Mas, afinal, devem existir algumascoisas importantes, ou nada poderia ser til como instrumento. O tema desseartigo ter argumentado que a histria valiosa justamente nesse sentido notecnolgico.

    REFERNCIAS

    ATKINSON, R. F. Knowledge and explanation in history. New York:Macmillan, 1978.

    DAVIDSON, D. Action, reasons and causes. In: WHITE, A. R. (Ed.). Thephilosophy of action. Oxford: Oxford University Press, 1968.

    GALLIE, W. B. Philosophy and Historical Understanding. London: Chatto &Windus, 1964.

    KITSON CLARK, G. The Critical Historian. Portsmouth: HeinemannEducational Books, 1967.

    OAKESHOTT, M. Experience and Its Modes. Cambridge: CambridgeUniversity Press, 1933.

    OAKESHOTT, M. The activity of being an Historian. In: ______. Rationalismand Politics. London: Methuen, 1962.

    OLAFSON, F.A. The dialectic of Action. Chicago: University of Chicago Press,1979.

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    LEE, P. Por que aprender Histria?

    PLUMB, J. H., The Death of the Past. New York: Macmillan, 1969.

    TAYLOR, A. J. P. How Wars Begin. London: Book Club Associates, 1979.

    Recebido em 11 de abril de 2011.Aprovado em 30 de junho de 2011.

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