política operacional sobre povos indígenas e estratégia

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Política operacional sobre povos indígenas e Estratégia para o desenvolvimento indígena Banco Interamericano de Desenvolvimento Washington, D.C. Série de estratégias e políticas setoriais do Departamento de Desenvolvimento Sustentável

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Page 1: Política operacional sobre povos indígenas e Estratégia

Política operacional sobre povos indígenas

e

Estratégia para o desenvolvimento indígena

Banco Interamericano de Desenvolvimento

Washington, D.C.

Série de estratégias e políticas setoriais do

Departamento de Desenvolvimento Sustentável

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Esta política e esta estratégia foram elaboradas por uma equipe de trabalho interdepartamental coordenada por Anne Deruyttere, Chefe da Unidade de Povos Indígenas e Desenvolvimento Comunitário. Nossos agradecimentos a Carmen Albertos, Diego Belmonte, Kristyna Bishop, Fernando Bretas, Elizabeth Brito, Elisa Canqui, Clothilde Charlot, María da Cunha, Elizabeth Davidsen, Suzanne Duryea, Wanda Engel, Marco Ferroni, Camille Gaskin-Reyes, Steven Geiger, Mia Harbitz, Carlos Jarque, Helena Landazuri, Héctor Malarin, Dana Martin, Jacqueline Mazza, Joseph Milewski, Marilia Mirza, Robert Montgomery, Dianna Moyer, Gil Nolet, Trond Norheim, Carlos Perafán, Peter Pfaumann, Ricardo Quiro-ga, Alicia Ritchie, Mary Thompson, María Teresa Traverso, Anne Marie Urban, Lina Uribe, Gabriela Vega, Aimee Ver-disco, Carlos Viteri Gualinga, Mark Wenner, Robert Wilen e Natalia Winder, dentre outros, por suas contribuições. A Unidade de Povos Indígenas e Desenvolvimento Comunitário agradece, ainda, aos representantes de povos indígenas, governos, agências de cooperação e organizações da sociedade civil pelas contribuições recebidas durante os processos de consulta, bem como às Representações do BID por haverem facilitado as consultas presenciais. A política (OP-765) e a estratégia (GN-2387-5) foram aprovadas pela Diretoria Executiva do Banco em 22 de fevereiro de 2006. Publicação do Banco Interamericano de Desenvolvimento, julho de 2006.

Gerente Interino do Departamento de Desenvolvimento Sustentável: Antonio Vives Subgerente do Subdepartamento de Desenvolvimento Social e Governança: Marco Ferroni

Cópias adicionais desta publicação (IND-111) podem ser obtidas no seguinte endereço: Publicações IND Parada W-0502 Banco Interamericano de Desenvolvimento 1300 New York Avenue, N.W. Washington, D.C. 20577 E-mail: sds/[email protected] Fax: (202) 623-1463 Página na internet: www.iadb.org/sds/ind (Cataloging-in-Publication) Dados de catalogação fornecidos pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento Biblioteca Felipe Herrera

Política operacional sobre povos indígenas e estratégia para o desenvolvimento indígena.

p.cm. (Sustainable Development Department Sector Strategy and Policy Papers Series ; IND-111.) “Esta política e esta estratégia foram elaboradas por uma equipe de trabalho interdepartamental coordenada por Anne Deruyttere”—t.p. verso. “A política (OP-765) e a estratégia (GN-2387-5) foram aprovadas pela Diretoria Executiva do Banco em 22 de fevereiro de 2006.”—t.p. verso. Includes bibliographical references.

1. Indigenous peoples—Latin America. 2. Latin America—Social policy. 3. Inter-American Development Bank. I. Deruyttere, Anne. II. Inter-American Development Bank. Sustainable Development Dept. Indigenous Peoples and Community Development Unit. III. Series.

GN380 .O83 2007 305.8 O83

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Preâmbulo O Relatório do Oitavo Aumento Geral dos Recursos do Banco, aprovado em 1994, requer a inclusão sis-temática dos temas indígenas nas políticas e nos projetos do Banco (documento AB-1704, parágrafo 2.27). Este novo enfoque proativo complementa o anterior, centrado em evitar ou mitigar os impactos negativos dos projetos do Banco sobre os povos indígenas, e coincide com o crescente protagonismo dos povos e das organizações indígenas em seus respectivos países e no plano internacional. O Banco, por meio de suas experiências, veio a reconhecer as necessidades, os direitos, as demandas e as aspirações desses povos, de acordo com a cosmovisão própria dos mesmos. Conseqüentemente, o Banco busca apoiar processos de desenvolvimento socioculturalmente apropriados à economia e à governabili-dade dos povos indígenas, priorizando sua integridade territorial e cultural, a relação harmoniosa com o meio ambiente e sua segurança diante da vulnerabilidade, respeitando, ao mesmo tempo, os direitos dos povos e pessoas indígenas. O Banco reconhece a necessidade de consolidar as condições que possibilitem aos povos indígenas exercer o direito de participar, efetivamente, da definição de seu próprio futuro polí-tico, econômico, social e cultural, num contexto de participação em sistemas democráticos e de constru-ção de Estados pluriculturais. Estas política e estratégia buscam consolidar e renovar a definição do papel e do compromisso do Banco com o desenvolvimento com identidade dos povos indígenas.

Antonio Vives Gerente a.i.

Departamento de Desenvolvimento Sustentável

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Índice geral

Parte I: Política operacional sobre povos indígenas

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Parte II: Estratégia para o desenvolvimento indígena 13

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Parte I

Política operacional sobre povos indígenas

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Política operacional sobre povos indígenas

Índice

I. Definições 5II. Objetivos e metas 6III. Alcance da aplicação da política 6IV. Diretrizes da política 6V. Implementação 10VI. Coordenação e internalização da temática indígena 11VII. Indicadores, monitoramento e relatórios 11VIII. Entrada em vigor 12

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I. Definições Povos indígenas1, para os fins desta política, este termo se refere aos povos que cumprem os seguin-tes três critérios: (i) são descendentes dos povos que habitavam a região da América Latina e do Caribe na época da Conquista ou da Colonização; (ii) qualquer que seja sua situação jurídica ou sua localização atual, conservam, parcial ou totalmen-te, suas próprias instituições e práticas sociais, e-conômicas, políticas, lingüísticas e culturais; e (iii) se auto-identificam como pertencentes a po-vos ou culturas indígenas ou pré-coloniais. Direitos indígenas incluem os direitos dos povos e das pessoas indígenas2, quer originários da legis-lação indígena emitida pelos Estados, da legisla-ção nacional pertinente, das normas internacio-nais3 aplicáveis e vigentes para cada país, ou dos sistemas jurídicos indígenas4 que, em seu conjun-to, passam a denominar-se “normas de direito a- 1 Os termos “povos”, “integridade territorial” e “território” são emprega-dos na presente política em seu sentido geral e seu uso não deverá ser in-terpretado como tendo qualquer implicação no que tange aos direitos e-ventualmente conferidos a esses termos no direito internacional. O al-cance desses termos no contexto da presente política está sujeito às mesmas limitações a eles atribuídas no Convênio 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). 2 Quando coexistirem direitos coletivos e individuais, prevalecerão os di-reitos coletivos, particularmente no que se refere a direitos sobre terras, territórios e recursos naturais. 3 A legislação internacional inclui, segundo sua vigência para cada país, a Declaração Universal de Direitos Humanos das Nações Unidas (1948); o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (1966); a Convenção Americana de Direitos Humanos (1969); o Pacto Internacional de Direi-tos Econômicos, Sociais e Culturais (1976); a Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial (1966); a Convenção sobre os Direitos da Criança (1990); o Convênio 107 da OIT relativo à Proteção e Integração das Populações Indígenas e de ou-tras Populações Tribais e Semitribais nos Países Independentes (1957); o Convênio 169 da OIT sobre Povos Indígenas e Tribais em Países Inde-pendentes (1989); a Agenda 21 aprovada pela Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (CNUMAD) (1992); o Convênio sobre a Diversidade Biológica (1992), bem como a jurisprudência internacional correspondente da Corte Interamericana de Direitos Humanos ou de órgãos semelhantes, cuja jurisdição tenha sido aceita pelo país relevante. Outros instrumentos internacionais atualmente em processo de preparação, tais como o projeto de Declaração das Na-ções Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas e o projeto de Decla-ração Americana sobre os Direitos dos Povos Indígenas, estabelecem princípios gerais que poderão ser levados em conta na medida em que os referidos instrumentos forem concluídos e assinados pelo país rele-vante. 4 O conceito de sistema jurídico indígena, também conhecido como di-reito próprio ou interno, inclui as normas de origem, os direitos consue-tudinários, os usos e costumes e os sistemas jurídicos e de justiça indíge-nas. Dezessete dos 19 países com população indígena na América Latina e no Caribe reconhecem o direito consuetudinário. O Banco realizou uma revisão exaustiva e uma análise comparativa da legislação pertinen-te aos povos indígenas em todos os países da região, que pode ser con-sultada em www.iadb.org/sds/ind.

plicáveis”5. Os sistemas jurídicos indígenas serão considerados em conformidade com as regras para seu reconhecimento estabelecidas na legislação do país correspondente. Na ausência dessas regras, os referidos sistemas serão reconhecidos sempre e quando forem coerentes com a legislação nacional e não contrariarem os direitos fundamentais pre-vistos na legislação nacional e nas normas inter-nacionais6. Governança indígena é definida como o âmbito de autogestão dos povos indígenas que, em con-sonância com as normas de direito aplicáveis e dos estados nacionais dos quais os referidos povos fazem parte -e tendo-se em conta as formas de organização próprias dos povos indígenas- con-templa o controle de seu próprio desenvolvimento econômico, social e cultural, a gestão interna de suas terras e seus territórios7 em reconhecimento da relação especial existente entre o território e a identidade étnica e cultural, bem como uma parti-cipação efetiva dos povos indígenas no governo local, subnacional e nacional. Desenvolvimento com identidade dos povos indí-genas refere-se ao processo que compreende o fortalecimento dos povos indígenas, a harmonia com o meio ambiente, a boa administração dos territórios e recursos naturais, a geração e o exer-cício de autoridade, e o respeito aos valores e di-reitos indígenas, inclusive os direitos culturais, econômicos, sociais e institucionais dos povos in-dígenas, segundo sua própria cosmovisão e go-vernança. Esse conceito fundamenta-se nos prin-cípios de eqüidade, integridade, reciprocidade e solidariedade, e busca consolidar as condições que permitam aos povos indígenas e seus integrantes desfrutar de bem-estar e crescer em harmonia com seu ambiente, aproveitando para tanto, segundo suas próprias prioridades, o potencial dos seus bens culturais, naturais e sociais.

5 Todas as referências no texto desta política a “normas de direito apli-cáveis” devem ser entendidas com o alcance estipulado na definição de direitos indígenas contida neste parágrafo. 6 No caso de controvérsias, o Banco não assumirá um papel de árbi-tro ou intermediário entre os interessados, mas exigirá evidência de uma resolução satisfatória antes de proceder com a atividade corres-pondente. 7 Ver nota de rodapé 1.

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II. Objetivos e metas O objetivo da presente política é potencializar a contribuição do Banco para o desenvolvimento dos povos indígenas, apoiando os governos nacio-nais8 da região e os povos indígenas na consecu-ção dos seguintes objetivos: (a) Apoiar o desenvolvimento com identidade dos

povos indígenas, inclusive o fortalecimento de sua capacidade de gestão.

(b) Salvaguardar os povos indígenas e seus direi-

tos de impactos adversos potenciais e da ex-clusão nos projetos de desenvolvimento fi-nanciados pelo Banco.

III. Alcance da aplicação da política

A política se aplica ao Banco Interamericano de Desenvolvimento e ao Fundo Multilateral de In-vestimentos. As atividades e os instrumentos su-jeitos à presente política englobam todas as opera-ções e atividades apoiadas com recursos do Ban-co, inclusive produtos financeiros e não financei-ros.

IV. Diretrizes da política A política contém duas séries de diretrizes. A primeira requer que o Banco empregue seus me-lhores esforços para apoiar o desenvolvimento com identidade dos povos indígenas. A segunda estabelece salvaguardas destinadas a evitar ou minimizar a exclusão e os impactos negativos que as operações do Banco possam gerar para os po-vos indígenas e seus direitos. Apoio ao desenvolvimento com identidade O Banco empregará seus melhores esforços para apoiar os governos nacionais e os povos indígenas da região, bem como os atores relevantes do setor privado e da sociedade civil, na incorporação dos temas indígenas às agendas locais e nacionais de

8 Se entende por “governos nacionais” todas as entidades governamen-tais no âmbito nacional, inclusive entidades descentralizadas, estatais e locais.

desenvolvimento e ao inventário de projetos do Banco. Para tanto, o Banco adotará iniciativas es-pecíficas e -sempre e quando tecnicamente viável e apropriado- integrará medidas complementares a atividades, operações e iniciativas gerais. Inclusão de temas especificamente indígenas nas agendas de desenvolvimento por meio de opera-ções independentes. O Banco buscará apoiar as i-niciativas dos governos e dos povos indígenas destinadas a promover o desenvolvimento social, econômico, político e organizacional dos referidos povos, por meio de atividades e operações socio-culturalmente apropriadas e de mecanismos ino-vadores. O Banco realizará estudos participativos de diagnóstico e promoverá a inclusão das conclu-sões e recomendações correspondentes na elabo-ração de projetos, programas e cooperações técni-cas. Para serem consideradas pelo Banco, as ope-rações destinadas especificamente a beneficiários indígenas deverão contar com o apoio ou a não objeção do respectivo país membro e com proces-sos socioculturalmente apropriados de consulta aos povos indígenas envolvidos. As consultas de-verão ser realizadas de forma apropriada às cir-cunstâncias com a finalidade de chegar a acordos ou obter consentimento9.

Inclusão da especificidade indígena nos projetos com enfoque geral (mainstreaming ou inclusão transversal). Em atividades e operações cujo en-foque não seja especificamente os povos indíge-nas, mas que possam afetá-los positivamente, o Banco promoverá e apoiará os países mutuários ou os proponentes de projetos10 para que proce-dam aos ajustes apropriados que permitam atender às necessidades e oportunidades de desenvolvi-mento dos povos indígenas. Isto inclui medidas complementares tecnicamente viáveis para: (i) i-dentificar e focalizar os povos indígenas potenci-almente beneficiados; (ii) implementar processos socioculturalmente apropriados e eficazes de con-sulta aos referidos povos; (iii) respeitar o conhe-cimento tradicional e o patrimônio cultural, natu-ral e social, bem como os sistemas próprios espe-

9 Para os fins desta política, acordos e consentimento devem ser obtidos livres de coerção ou influência indevida, e com base em informações i-dôneas aos afetados no que concerne à natureza, ao alcance e aos impac-tos das atividades propostas. 10 “Proponentes de projetos” incluem os mutuários dos setores público e privado durante as etapas de preparação e execução dos projetos.

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cíficos nos âmbitos social, econômico, lingüístico, espiritual e legal11; (iv) adaptar serviços e outras atividades para facilitar o acesso dos beneficiários indígenas, inclusive tratamento eqüitativo e, sem-pre que viável, adequação de procedimentos e cri-térios, e programas de capacitação e compensação de fatores de exclusão; e (v) elaborar as medidas e atividades complementares por meio de negocia-ções de boa fé com as comunidades indígenas afe-tadas. Em seus esforços para facilitar o diálogo e apoiar a inclusão da temática indígena, o Banco procura-rá abordar, na medida do factível e apropriado, os diferentes componentes do desenvolvimento com identidade, dentre os quais se destacam: (a) A visibilização e compreensão dos desafios do

desenvolvimento indígena nos contextos ru-rais e urbanos, inclusive as dinâmicas de mi-gração indígena interna e ao exterior , com vistas a promover programas adequados de desenvolvimento enfocados territorialmente em assentamentos, bairros ou comunidades indígenas, tanto rurais como urbanos.

(b) O desenvolvimento de soluções sociocultural-

mente apropriadas para melhorar a disponi-bilidade e qualidade dos serviços sociais, par-ticularmente de saúde e educação para os po-vos indígenas, mediante o desenvolvimento de sistemas próprios, a adequação dos ser-viços gerais, a articulação de elementos tradi-cionais com os sistemas gerais com base nu-ma perspectiva intercultural, e a capacitação de pessoal e profissionais indígenas.

(c) O reconhecimento, a articulação e a imple-

mentação dos direitos indígenas contempla-dos nas normas de direito aplicáveis, bem como o apoio a processos solicitados pelos governos nacionais para aprimorar, em con-junto com os povos indígenas, o marco nor-mativo.

(d) O apoio à cultura, à identidade, ao idioma, às

artes e técnicas tradicionais, bem como aos recursos culturais e à propriedade intelectu-

11 Conforme o alcance definido no parágrafo sobre os direitos indígenas na Seção I desta política.

al12 dos povos indígenas, inclusive o apoio aos governos nacionais e aos povos indígenas no fortalecimento dos marcos jurídicos cor-respondentes.

(e) O fortalecimento dos processos de legaliza-

ção e administração física dos territórios, das terras e dos recursos naturais tradicio-nalmente ocupados ou utilizados pelos povos indígenas, em conformidade com as normas de direito aplicáveis, bem como com os obje-tivos de proteção do meio ambiente. Esses processos incluem o fomento da sustentabili-dade dos usos culturais da terra, a promoção do investimento em bens comunitários e pro-jetos produtivos em áreas indígenas, e a ges-tão ambiental indígena no âmbito de suas ter-ras e seus territórios.

(f) Em projetos de manejo ou extração de recur-

sos naturais ou gestão de áreas protegidas, a promoção de mecanismos apropriados de consulta, de participação na gestão dos recur-sos naturais e de participação nos benefícios dos projetos por parte dos povos indígenas em cujas terras e territórios os projetos sejam e-xecutados.

(g) O desenvolvimento de iniciativas específicas

para implementar alternativas eficazes e so-cioculturalmente apropriadas para melhorar o acesso dos povos indígenas aos mercados fi-nanceiros, produtivos e de trabalho, à assis-tência técnica e às tecnologias de informação.

(h) O apoio à governança dos povos indígenas

mediante o fortalecimento das capacidades, das instituições e dos processos de gestão, toma de decisões e administração de terras e territórios nos âmbitos local, nacional e regio-nal; a melhoria da gestão do orçamento públi-co, a fim de promover o uso eficaz, eficiente, eqüitativo e transparente do investimento pú-blico nos territórios dos povos indígenas; e a institucionalização dos mecanismos de con-sulta e negociação de boa fé entre o governo e os povos indígenas, particularmente na formu-

12 Serão utilizadas como referência as definições de “conhecimento indí-gena”, “recursos culturais” e “propriedade intelectual” da legislação na-cional e internacional aplicável.

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lação e implementação de estratégias e políti-cas públicas que os afetem.

(i) O apoio à participação, à liderança e à pro-

teção de mulheres, idosos, jovens e crianças, bem como à promoção da igualdade de direi-tos.

(j) O fortalecimento da capacidade institucional

dos povos indígenas, de entidades governa-mentais, do setor privado, da sociedade civil e do próprio Banco para atender à temática in-dígena em todos os âmbitos, com especial a-tenção à formação de líderes indígenas para a gestão de projetos e a administração empresa-rial, bem como à geração de capacidade indí-gena para uma participação efetiva nos pro-cessos de consulta e negociação de boa fé.

Salvaguardas nas operações do Banco Para ser elegíveis para financiamento por parte do Banco, as operações devem cumprir as normas de direito aplicáveis, ajustar-se às salvaguardas esta-belecidas na presente política, enumeradas nos pa-rágrafos a seguir, e ser conformes com as disposi-ções das demais políticas do Banco. Impactos adversos. O Banco desenvolverá suas operações de uma maneira que evite ou mitigue os impactos adversos diretos e indiretos sobre os po-vos indígenas, seus direitos, ou seu patrimônio, tanto individuais como coletivos. Nesse sentido, o Banco adotará os critérios técnicos e os procedi-mentos, e implementará mecanismos necessários para identificar, avaliar e prevenir ou mitigar os referidos impactos. Para tanto, proporcionalmente à natureza e à intensidade dos impactos adversos potenciais de cada projeto, o Banco aplicará as seguintes salvaguardas específicas, de acordo com os procedimentos delineados no parágrafo sobre medidas operacionais (Seção V) desta política: (a) O Banco requererá e verificará que o propo-

nente do projeto realize avaliações para de-terminar a gravidade dos impactos negativos potenciais sobre a segurança física e alimen-tar, as terras, os territórios, os recursos, a so-ciedade, os direitos, a economia tradicional, a forma de vida e a identidade ou integridade cultural dos povos indígenas, identificando os

indígenas afetados e seus legítimos represen-tantes, bem como seus processos internos de toma de decisão. Essas avaliações incluirão consultas preliminares aos povos ou grupos indígenas potencialmente afetados.

(b) Nos casos em que se identifiquem impactos

adversos potenciais, o Banco requererá e veri-ficará que o proponente do projeto inclua a formulação e a implementação das medidas necessárias para minimizá-los ou evitá-los, inclusive processos de consulta e negociação de boa fé conformes com os mecanismos legí-timos de toma de decisão dos povos ou grupos indígenas afetados, bem como medidas de mi-tigação, monitoramento e compensação justa.

(c) No caso de potenciais impactos adversos par-

ticularmente significativos, que impliquem um alto grau de risco para a integridade física, territorial ou cultural dos povos ou grupos in-dígenas envolvidos, o Banco requererá e veri-ficará que o proponente demonstre haver ob-tido, mediante processos de negociação de boa fé, os acordos sobre a operação e as me-didas de gestão dos impactos adversos para respaldar, a juízo do Banco, a viabilidade so-ciocultural da operação.

Territórios, terras e recursos naturais. As opera-ções que afetem, direta ou indiretamente, a situa-ção jurídica, a posse ou a gestão dos territórios, das terras ou dos recursos naturais tradicio-nalmente ocupados ou utilizados pelos povos in-dígenas, incluirão salvaguardas específicas, con-formes com as normas de direito aplicáveis, inclu-sive o marco normativo sobre proteção de terras e ecossistemas. Isto inclui respeitar os direitos reco-nhecidos de acordo com as normas de direito apli-cáveis, bem comoincluir nos projetos de extração e manejo de recursos naturais e gestão de áreas protegidas: (i) mecanismos de consulta prévia pa-ra salvaguardar a integridade física, cultural e e-conômica dos povos afetados e a sustentabilidade das áreas ou dos recursos naturais protegidos; (ii) mecanismos para a participação desses povos na utilização, administração e conservação desses re-cursos; (iii) compensação justa por qualquer dano que possam sofrer como resultado do projeto; e (iv) sempre que possível, participação nos benefí-cios do projeto. Caso a proteção jurídica ou admi-

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nistrativa seja insuficiente para evitar que o proje-to resulte, direta o indiretamente, na deterioração da integridade física ou da situação legal das ter-ras, dos territórios ou dos recursos, o projeto in-cluirá as restrições ou as medidas corretivas ou compensatórias pertinentes. Direitos indígenas. O Banco terá em conta o res-peito aos direitos dos povos e das pessoas indíge-nas estabelecidos nas normas de direito aplicáveis, segundo sua relevância para as operações do Ban-co.

Prevenção da exclusão por motivos étnicos. O Banco não financiará projetos que excluam grupos indígenas por motivos étnicos. No caso de proje-tos nos quais existam fatores implícitos que ex-cluam povos ou pessoas indígenas dos benefícios das atividades financiadas pelo Banco por motivos étnicos, essas atividades incluirão medidas corre-tivas, tais como: (i) informação a indivíduos e or-ganizações indígenas sobre seus direitos nos ter-mos da legislação trabalhista, social, financeira ou empresarial, bem como sobre os mecanismos de reivindicação disponíveis; (ii) divulgação, capaci-tação e medidas de eliminação de barreiras de a-cesso a benefícios e recursos como crédito, em-prego, serviços empresariais, serviços de saúde e educação, e outros benefícios gerados ou facilita-dos pelos projetos; (iii) concessão aos trabalhado-res, empresários e beneficiários indígenas da mesma proteção conferida pela legislação nacio-nal a outras pessoas em setores e categorias seme-lhantes, tendo-se em conta os aspectos de gênero e segmentação étnica dos mercados de trabalho e de bens, inclusive fatores lingüísticos; e (iv) conces-são de garantias de igualdade de condições para as propostas apresentadas pelos povos indígenas. Cultura, identidade, idioma e conhecimentos tra-dicionais dos povos indígenas. Em reconheci-mento das características socioculturais e lin-güísticas particulares dos povos indígenas, as ope-rações do Banco incluirão as medidas necessárias para salvaguardar esses bens de potenciais impac-tos negativos. Os projetos relevantes incluirão processos de consulta e negociação de boa fé para identificar os riscos e impactos potenciais e para elaborar e implementar respostas sociocultural-mente apropriadas. No caso de desenvolvimento comercial de recursos culturais e conhecimentos

indígenas, será requerido o acordo prévio dos po-vos afetados que inclua salvaguardas para a pro-priedade intelectual e o conhecimento tradicional, bem como disposições para sua participação eqüi-tativa nos benefícios derivados desse desenvolvi-mento comercial. Povos indígenas transfronteiriços. Em projetos regionais, de dois ou mais países, ou em áreas de fronteira com a presença de povos indígenas, o Banco adotará as medidas necessárias para que seus projetos não afetem adversamente os povos transfronteiriços, tais como: processos de consulta e negociação de boa fé, programas de segurança jurídica e controle territorial, e outros programas culturalmente adequados relacionados com direi-tos e prioridades nas áreas de saúde, livre trânsito, binacionalidade (no contexto das normas de direi-to aplicáveis) e integração econômica, social e cultural entre os povos, entre outros. Povos indígenas não contatados13. Tendo-se em conta a natureza excepcional dos povos não conta-tados, também denominados “povos em isolamen-to voluntário”, bem como sua especial vul-nerabilidade e a impossibilidade de aplicação de mecanismos de consulta prévia e negociação em relação a esses povos, o Banco somente financiará projetos que respeitem o direito dos referidos po-vos de permanecer nessa condição e de viver li-vremente de acordo com sua cultura. A fim de salvaguardar a integridade física, territorial e cul-tural desses povos, projetos que possam afetar po-tencialmente essas pessoas, suas terras e seus ter-ritórios ou sua forma de vida deverão incluir me-didas socioculturalmente adequadas para reconhe-cer, respeitar e proteger suas terras e seus territó-rios, seu meio ambiente, sua saúde e sua cultura, e para evitar contato com esses povos como conse-qüência do projeto.

13 O alcance dessa salvaguarda limita-se aos casos de pequenos grupos e povos que vivem principalmente em áreas de refúgio da selva Amazôni-ca e do Chaco, que não desejam estabelecer contato com a civilização ocidental e cuja saúde, cultura e forma de vida são extremamente vulne-ráveis aos contactos.

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V. Implementação O Banco adotará as medidas necessárias para im-plementar ou verificar a implementação das sal-vaguardas previstas nesta política e identificar o-portunidades para a promoção ativa da inclusão do desenvolvimento com identidade dos povos in-dígenas nos planos gerais de desenvolvimento e na carteira do Banco. Essas medidas serão deta-lhadas em guias específicas sobre aspectos técni-cos e de procedimentos aprovadas para essa fina-lidade de acordo com a Seção VI e, na medida do possível, ajustar-se-ão os procedimentos vigentes no Banco para a revisão sócio-ambiental de suas operações. Medidas estratégicas. Para os países com popula-ção indígena significativa em tamanho, diversida-de ou vulnerabilidade, o Banco proporá a seus go-vernos que os processos de programação e estra-tégia do país, bem como as estratégias operacio-nais, setoriais, nacionais e sub-regionais, incluam a temática de desenvolvimento com identidade. Em sua análise preparatória para esses processos, o Banco considerará os seguintes aspectos da te-mática indígena em cada país ou região: (i) identi-ficação das prioridades do desenvolvimento com identidade e dos desafios e oportunidades corres-pondentes; (ii) situação normativa e institucional; (iii) experiência do Banco e de outros organismos multilaterais; (iv) definição de prioridades estra-tégicas para o Banco; (v) políticas dos países nes-sa matéria; e (vi) contribuições de uma amostra de pessoas ou grupos potencialmente afetados ou conhecedores dos temas, incluindo, especialmen-te, entidades governamentais especializadas e or-ganizações, grupos e especialistas indígenas. O Banco discutirá com o governo os objetivos estra-tégicos e possíveis ações para abordar os temas prioritários para o desenvolvimento com identida-de dos povos indígenas no país e incorporará os acordos alcançados aos documentos de estratégia. Nos casos apropriados, o documento de progra-mação incluirá as atividades e metas específicas do desenvolvimento com identidade a serem in-cluídas na carteira do Banco no país, bem como critérios e medidas de gestão de riscos para facili-tar a aplicação das salvaguardas estabelecidas nes-ta política.

Medidas operacionais. Os procedimentos de apli-cação desta política incluirão os requisitos deta-lhados a seguir para a aprovação, execução e su-pervisão dos projetos do Banco. O Banco examinará técnica e sistematicamente a um exame técnico das operações submetidas à sua consideração nas etapas de programação e identi-ficação, tendo em conta as perspectivas dos povos indígenas, para: (i) determinar a presença de po-vos indígenas e a maneira como estes poderiam ser afetados, e identificar benefícios e impactos potenciais diretos, indiretos, cumulativos ou regi-onais sobre os mesmos; e (ii) de acordo com a na-tureza, o alcance e a intensidade dos impactos e benefícios identificados, determinar o nível de a-nálise necessário para atender à temática indígena, inclusive análises socioculturais e processos de consulta e negociação de boa fé. Esse exame será realizado pela divisão do Banco responsável pelo projeto. Quando o projeto merecer, o exame será feito com o apoio de especialistas em temas indí-genas e, sempre que possível, com contribuições dos povos indígenas potencialmente afetados pelo projeto. Os resultados desse exame serão incluí-dos no Documento Conceitual de Projeto. Uma vez tomada a decisão de ir adiante com o processamento de um projeto com impactos po-tenciais adversos, o Banco orientará e verificará, o mais cedo possível no ciclo do projeto, o cumpri-mento por parte do proponente da operação, à sa-tisfação do Banco, dos seguintes requisitos: (i) preparação de avaliações socioculturais que sir-vam de contribuição para o documento de emprés-timo, para o trabalho da missão de análise e para a avaliação sócio-ambiental; (ii) realização de pro-cessos de consulta e negociação de boa fé com os indígenas afetados14, que sejam socioculturalmen-te apropriados e devidamente documentados, no que concerne à elaboração, análise de alternativas, preparação, devida diligência e execução15; e (iii) incorporação ao projeto, evidenciada pelo conteú- 14 Nos países que contam com órgãos governamentais especializados na temática indígena e na proteção dos direitos indígenas, o proponente do projeto buscará a participação desses órgãos em todas as etapas do pro-cesso de consulta. 15 Excepcionalmente, quando não houver interesse da parte dos indíge-nas potencialmente afetados em participar dos processos de consulta, o proponente do projeto poderá satisfazer este requisito apresentando evi-dência de suas tentativas, em boa-fé, de realizar a consulta com os povos afetados, e dos meios alternativos utilizados para identificar as medidas de mitigação necessárias e socioculturalmente apropriadas.

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do do documento de empréstimo e dos documen-tos contratuais do projeto16, de medidas exigíveis de mitigação, restauração e compensação, detalha-das oportunamente em planos de proteção, com-pensação ou desenvolvimento indígena, ou em ou-tros instrumentos. Além dos requisitos descritos no parágrafo anteri-or, no caso de projetos com impactos potenciais adversos especialmente significativos sobre povos ou grupos indígenas, o Banco requererá que o proponente apresente, no mais tardar antes da a-provação da operação pela Diretoria Executiva do Banco, evidência devidamente verificada pelo Banco, e à sua satisfação, dos acordos obtidos com os povos afetados, em conformidade com a alínea (c) do parágrafo sobre impactos adversos da Seção IV desta política17. O Banco implementará medidas de supervisão e avaliação desenhadas para garantir que o propo-nente do projeto cumpra, de forma satisfatória pa-ra o Banco, as medidas acordadas para atender aos requisitos da presente política no que se refere ao projeto, inclusive mecanismos socioculturalmente apropriados para a participação dos povos indíge-nas afetados nos processos de monitoramento e avaliação da implementação dessas medidas. Em caso de descumprimento, o Banco adotará as medidas corretivas necessárias para que o proponente do projeto corrija os problemas identificados dentro de um prazo aceitável.

VI. Coordenação e internalização da temática indígena

O Banco implementará medidas de divulgação e capacitação para tornar visível a temática indígena dentro da instituição e na região, e para aumentar o grau de conhecimento e sensibilidade de seu 16 Esses documentos incluirão o contrato de empréstimo, regulamentos operacionais e documentos de licitação, conforme previsto no relatório do projeto. 17Excepcionalmente, a prova de acordos poderá ser apresentada: (a) an-tes do primeiro desembolso para operações nas quais o proponente possa demonstrar haver acordado com os povos indígenas afetados que as cir-cunstâncias da operação justificam etapas adicionais de negociação para concluir os referidos acordos; e (b) ao longo de operações com investi-mentos não definidos a priori, sempre e quando se conte com um plano de consulta e negociação acordado com os povos afetados pré-identificados e disponível para os povos que venham a ser identificados em etapas posteriores.

pessoal e de suas contrapartes em relação aos po-vos indígenas. O Banco aplicará as medidas necessárias para su-perar as barreiras de entrada enfrentadas pelos po-vos indígenas e, sempre que tecnicamente viável e factível, assegurar a igualdade de condições para a participação de indígenas como beneficiários dire-tos de projetos, funcionários contratados e forne-cedores de bens e serviços em contratos financia-dos com recursos do Banco. Essas medidas serão coerentes com as normas de contratação do Banco e poderão incluir instrumentos e procedimentos especiais que busquem identificar e implementar critérios de qualificação e procedimentos diferen-ciados e simplificados, adequados às característi-cas particulares dos candidatos indígenas, além de programas de informação e treinamento, dentre outras medidas apropriadas. O Banco aplicará esta política em conformidade com todas as políticas, estratégias e orientações relevantes do Banco, particularmente outras polí-ticas de salvaguarda, inclusive a política OP-710 sobre reassentamento involuntário. Em caso de controvérsia, será aplicada a norma que conceda o nível mais alto de proteção aos povos indígenas e seus direitos. A Comitê de Programação da Administração emi-tirá guias para facilitar a implementação desta po-lítica. A Estratégia de Desenvolvimento dos Po-vos Indígenas também servirá para orientar a im-plementação da política. As guias operacionais de avaliação sociocultural, a Política de meio ambi-ente e cumprimento de salvaguardas, os instru-mentos setoriais específicos aplicáveis e asguias e ferramentas metodológicas emitidas periodica-mente pelo Banco serão utilizados para o mesmo fim. A Administração do Banco atualizará perio-dicamente as guias, para que reflitam a evolução das melhores práticas internacionais. As guias se-rão disponibilizadas ao público.

VII. Indicadores, monitoramento e relatórios

As guias para esta política proporão indicadores verificáveis de seu cumprimento e eficácia, inclu-

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sive a eficácia dos projetos em melhorar as condi-ções de vida dos povos indígenas e em considerar as especificidades culturais desses povos. O moni-toramento desses indicadores será realizado, con-forme pertinente, por meio dos instrumentos de avaliação do Banco. O Banco avaliará periodicamente a implementa-ção da presente política e a consecução de seus objetivos, mediante revisões independentes que incluirão consultas aos governos nacionais, aos povos indígenas, ao setor privado e à sociedade civil. A primeira avaliação será realizada no mais tardar cinco anos após a entrada em vigor da polí-tica, no entendimento de que a Administração ou a Diretoria poderão iniciar avaliações parciais an-tes desse prazo. Os resultados das avaliações serão apresentados à Diretoria Executiva e divulgados em conformidade com a Política do Banco sobre Disponibilidade de informações (OP-102).

VIII. Entrada em vigor Esta política entrará em vigor seis meses a contar de sua aprovação pela Diretoria Executiva do

Banco, para que se disponha do tempo necessário para implementar as mudanças administrativas e os procedimentos necessários no âmbito da insti-tuição. A política será aplicada às operações in-corporadas ao inventário do Banco18 a partir da data de sua vigência, bem como aos documentos de estratégia de país e, quando pertinente, às estra-tégias setoriais ou regionais, que não tenham sido iniciadas até esse momento. As reformulações de operações previamente apro-vadas que requeiram a aprovação da Diretoria E-xecutiva do Banco serão avaliadas em termos de sua viabilidade sociocultural, em conformidade com o conjunto de salvaguardas desta política. A divisão responsável no Banco deverá julgar se es-sas reformulações dão lugar a novos impactos e riscos significativos para os povos indígenas, seus direitos ou seu patrimônio. Nesse caso, esta políti-ca será aplicável a esses novos impactos e riscos, e a aprovação da reformulação estará sujeita à ob-tenção dos acordos e consentimentos necessários dos mutuários, conforme especificado na docu-mentação legal pertinente. Os documentos de pro-posta de reformulação deverão mencionar o cum-primento desse requisito.

18 Para os fins deste parágrafo, a data de ingresso de um projeto no in-ventário do Banco corresponderá à data de assinatura da carta-mandato para os projetos do setor privado; e à data de emissão do número de pro-jeto para os projetos do setor público.

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Parte II

Estratégia para o desenvolvimento indígena

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Estratégia para o desenvolvimento indígena

Índice

I. Introdução e propósito 17II. Desenvolvimento com identidade 19III. Diagnóstico 22IV. A experiência do Banco 29V. Objetivos da estratégia 33VI. Eixos estratégicos e prioridades para a ação do Banco 35VII. Ações de implementação 43VIII. Indicadores de desempenho 49

Gráficos

1. Taxas de pobreza 232. Empréstimos que incluem indígenas vs. total de empréstimos 303. Estratégia de desenvolvimento indígena no âmbito econômico 34

Tabelas 1. Porcentagem de mudança na taxa de pobreza 232 Legalização de terras coletivas de povos indígenas 25

Quadros 1. Educação intercultural bilíngüe 242. Bolívia: Lei de participação popular 263. O Banco e a jurisdição indígena 284. Povos indígenas em isolamento: o caso de Camisea 285. Brasil: projeto de mitigação de impactos ambientais e sociais PMACI 296. O DECOPAZ serviria como modelo? 327. O Banco e o fomento da governança e do empresariado indígena 378. Rumo a uma nova geração de projetos indígenas 399. Incorporação do conhecimento tradicional ao ordenamento territorial 41

10. A participação indígena no nível regional: o Conselho Consultivo Indígena para un diálogo no âmbito do Plano Puebla Panamá

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11. Análise de sujeitos sociais, consulta e participação 47

Anexo Indicadores socioeconômicos e de pobreza 51

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I. Introdução e propósito A adoção de uma estratégia especificamente des-tinada ao desenvolvimento dos povos indígenas19 é, para o Banco, o ápice de uma trajetória concei-tual e operacional iniciada com o mandato da Oi-tava Reposição de Recursos, em 1994. Dessa for-ma, o Banco começa a reconhecer a correlação entre povos indígenas e níveis de pobreza, o po-tencial do patrimônio cultural e natural dos povos indígenas para seu próprio desenvolvimento e pa-ra o desenvolvimento da sociedade como um todo, bem como a importância de promover a inclusão dos temas indígenas nas políticas, nos programas e nos projetos do Banco20. Durante a última década21, os povos indígenas conquistaram importantes avanços, especialmente no marco jurídico e normativo nacional e interna-cional, no que se refere a seus direitos específicos e ao protagonismo de suas organizações e seus movimentos. Entretanto, esses avanços não foram capazes de reverter ou deter a deterioração das condições de vida dos povos indígenas. Tam-pouco se reverteram as tendências de expropria-ção de terras de ocupação ancestral, a deterioração das condições ambientais em territórios22 indíge-nas, ou os problemas relacionados com a migra-ção de indígenas para áreas marginais urbanas e estrangeiras.

Durante muitos anos, as políticas governamentais (bem como a cooperação internacional) para os povos indígenas se caracterizaram pela exclusão ou pelo enfoque na integração e assimilação, por considerar-se que as características socioculturais dos povos indígenas obstaculizavam o desenvol-

19 Ver nota de rodapé 1. 20 Assembléia de Governadores, relatório sobre o Oitavo Aumento Geral dos Recursos do Banco Interamericano de Desenvolvimento, AB-1704, agosto 1994, p. 22. 21 Essa década coincide com o Decênio Internacional dos Povos In-dígenas proclamado pela Assembléia Geral das Nações Unidas, Re-solução 48/163, de 21 de dezembro de 1993. 22 Ver nota de rodapé 1.

vimento. Em vista dos escassos resultados desses programas, os povos indígenas propõem visões de desenvolvimento baseadas em sua própria cosmo-visão e cultura. Nesse contexto, o Banco reconhe-ce a especificidade da cultura, dos direitos e das aspirações dos povos indígenas, em razão de sua descendência de populações que habitavam a re-gião da América Latina e do Caribe na época da conquista ou da colonização. O propósito desta Estratégia para o desenvolvi-mento indígena e da Política operacional sobre povos indígenas que a complementa é potenciali-zar a contribuição do Banco ao desenvolvimento com identidade dos povos indígenas, definindo metas e áreas prioritárias específicas para a ação do Banco. A estratégia é um documento de orien-tação de prazo médio que apresenta a visão, as prioridades e as linhas de ação para o trabalho do Banco. A política, por sua vez, como documento vinculante para o Banco, define os objetivos de longo prazo, os princípios, os requisitos, as condi-ções e as regras para a implementação da estraté-gia e para as ações do Banco em prol dos povos indígenas, em geral. Os perfis da Estratégia para o desenvolvimento indígena e da Política operacional sobre povos in-dígenas, que incluíram um plano de consulta, fo-ram avalizados pelo Comitê de Políticas e Avalia-ção da Diretoria Executiva do Banco em 11 de março de 200423. O resumo do processo de con-sulta e os estudos técnicos de apoio para a prepa-ração desta estratégia e da política operacional es-tão disponíveis na página do Banco na internet24.

23 Relatório do Presidente do Comitê de Políticas e Avaliação da Di-retoria, com data de 19 de junho de 2002 (RE-261). 24 www.iadb.org/sds/ind.

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Este documento define o conceito de desenvolvi-mento com identidade e apresenta um resumo su-cinto do diagnóstico da situação dos povos indí-genas na região e da experiência do Banco. Tam-bém define os objetivos e os eixos estratégicos e

as prioridades para a ação do Banco. O documen-to apresenta opções para os serviços do Banco e sua implementação, indicadores de desempenho25, e um anexo para aprofundar o diagnóstico.

25 Esta estratégia ajusta-se as normas estabelecidas pelo documento Revisão das estratégias, políticas e diretrizes setoriais (GN-2077-15) aprovado pela Diretoria Executiva em 23 de janeiro de 2002.

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II. Desenvolvimento com identidade Quem são os povos indígenas? Na América Latina e no Caribe residem mais de 400 povos indígenas com alta diversidade étnica e lingüística. As legislações e os instrumentos cen-suários nos diferentes países, por sua vez, adotam diversos conceitos que, em alguns casos, podem incluir critérios estereotípicos ou discriminatórios. Devido a essa grande heterogeneidade, não há uma definição única de quem são os povos in-dígenas. Entretanto, um ponto de referência im-portante é a definição estabelecida no Convênio 169 sobre Povos Indígenas, de 1989, da Organi-zação Internacional do Trabalho (OIT), ratificado por 13 países latino-americanos e que serve de modelo para muitas das normas adotadas na gran-de maioria dos países da região. Assim, para os fins desta estratégia, adota-se como conceito ope-racional uma versão simplificada dessa defini-ção26, considerando-se como povos indígenas a-queles que atendem aos seguintes três critérios: (a) São descendentes dos povos que habitavam a

região na época da conquista ou da coloniza-ção;

26 Essa definição de povos indígenas baseia-se no Convênio 169 da OIT sobre Povos Tribais e Indígenas em Países Independentes, Arti-go 1º, conforme aplicável aos países membros do Banco. Os países latino-americanos signatários do Convênio 169 são: Argentina, Bolí-via, Brasil, Colômbia, Costa Rica, Dominica, Equador, Guatemala, Honduras, México, Paraguai, Peru e Venezuela. A definição diz tex-tualmente: “Artigo 1º. O presente Convênio se aplica a: (a) Povos tribais em países independentes cujas condições sociais, culturais e econômicas os distinguem de outros setores da coletividade nacional e que são regidos por seus próprios costumes ou tradições, ou por uma legislação especial; (b)Povos em países independentes conside-rados indígenas pelo fato de descender de populações que habita-vam o país ou uma região geográfica a que pertencia o país na épo-ca da conquista ou da colonização, ou do estabelecimento das atuais fronteiras do Estado e que, independentemente de sua condição ju-rídica, conservam todas as suas instituições sociais, econômicas, culturais e políticas, ou parte delas; (c) A consciência de sua identi-dade indígena ou tribal deverá ser considerada um critério funda-mental para determinar os grupos aos quais se aplicam as disposi-ções do presente Convênio; e (d) O emprego do termo ´povos´ neste Convênio não deverá ser interpretado no sentido que tenha qualquer implicação no que concerne aos direitos que possam ser conferidos ao referido termo no direito internacional”. O termo “povos” é em-pregado nesta estratégia em seu sentido genérico e com o mesmo alcance que lhe é atribuído no Convênio 169 da OIT.

(b) Qualquer que seja sua situação jurídica ou sua localização atual, conservam, parcial ou totalmente, suas próprias instituições e práti-cas sociais, econômicas, políticas, lingüísticas e culturais próprias; e

(c) Auto-identificam-se como pertencentes a po-

vos ou culturas indígenas ou pré-coloniais.

Especificidade dos povos indígenas Os povos indígenas da América Latina e do Cari-be são, simultanemaente, herdeiros e criadores de um importante patrimônio natural, cultural e soci-al, que há sido desgastado pelas políticas de ex-clusão, integração e/ou assimilação que domina-ram a ação pública até os anos 1950. Os processos de negação da cultura original e de assimilação à sociedade ocidental contribuíram para o empo-brecimento e a destruição do patrimônio, da dig-nidade e da auto-estima dos povos indígenas, bem como para a geração de conflitos internos e entre esses povos e outros setores da população, para a migração rural-urbana, a perda de conhecimentos e práticas ancestrais, e para a exclusão de sua par-ticipação política como sujeitos sociais de direito dentro dos Estados. Entretanto, apesar de sua he-terogeneidade e de seus diferentes níveis de inte-ração com as sociedades dominantes, nas três úl-timas décadas surgiram organizações indígenas sólidas que reivindicam o direito a sua identidade como povos indígenas, revalorizando seu patri-mônio não apenas como a base para a identidade e a sobrevivência cultural, mas também como um recurso para o desenvolvimento econômico e so-cial de seus próprios povos e da sociedade em ge-ral27. As razões que justificam uma estratégia específica para os povos indígenas, diferentemente de outros grupos da população, são as seguintes: (i) a espe-cificidade da cultura, dos direitos e dos objetivos de desenvolvimento e conceitos de bem-estar, a raiz de sua preexistência na região da América La-

27 Declaração da Reunião de Ministros da Cultura, Bogotá, 2002.

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tina e do Caribe na época da conquista ou da co-lonização; (ii) a alta correspondência entre territó-rios de ocupação indígena e de elevada fragilidade ecológica, aliada à necessidade de revalorizar o papel de conhecimentos e práticas ancestrais, quando seja coerente com o manejo sustentável de terras e territórios; (iii) marcos jurídicos nacionais e internacionais específicos que necessitam ser acompanhados de medidas para sua implementa-ção e de sistemas indígenas jurídicos próprios que requerem ações de articulação com os sistemas judiciais nacionais; (iv) a diversidade política e cultural dos povos indígenas e diferentes graus de articulação com o meio econômico e social; e (v) demandas indígenas por uma maior autonomia nas decisões sobre seus próprios assuntos e por uma maior participação no governo, na definição de modelos de desenvolvimento econômico e social próprios, e nas políticas públicas de seus países. Esses elementos constituem novos desafios e o-portunidades, especialmente no contexto atual de descentralização e democratização, e necessitam de respostas para proteger a segurança cidadã e fomentar o desenvolvimento eqüitativo e a demo-cracia participativa e inclusiva. Direitos indígenas Nas últimas décadas foram adotados, no nível na-cional e internacional, marcos jurídicos relativos aos direitos dos povos indígenas, entre eles o Convênio 169 da OIT sobre povos indígenas (1989)28. Os projetos da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas e da Declaração Americana sobre os Direitos dos Po-vos Indígenas da OEA29 integrarão este marco ju-

28 Convênio 169 da OIT sobre Povos Indígenas e Tribais em Países Independentes, ver nota de rodapé 26. 29 A legislação internacional compreende, segundo sua vigência em cada país, a Declaração Universal de Direitos Humanos das Nações Unidas (1948); o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (1966); a Convenção Americana de Direitos Humanos (1969); o Pac-to Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1976); a Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial (1966); a Convenção sobre os Direitos da Criança (1990); o Convênio 107 da OIT relativo à Proteção e Inte-gração das Populações Indígenas e de outras Populações Tribais e Semitribais nos Países Independentes (1957); o Convênio 169 da OIT sobre Povos Indígenas e Tribais em Países Independentes (1989); a Agenda 21 aprovada pela Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (CNUMAD, 1992); e o Convênio sobre a Diversidade Biológica (1992), bem como a juris-prudência internacional correspondente da Corte Interamericana de Direitos Humanos ou de órgãos similares cuja jurisdição tenha sido aceita pelo país relevante. Outros instrumentos internacionais atual-

rídico na medida em que forem aprovados segun-do as normas vigentes nos sistemas internacional e interamericano, respectivamente. Esses instru-mentos influenciaram a adoção, em muitos países da região, de normas constitucionais e jurídicas que reconhecem a natureza pluriétnica e multicul-tural de suas sociedades e os direitos específicos dos povos indígenas no que se refere a seus terri-tórios e recursos naturais, sua identidade, sua lín-gua, sua cultura, seus sistemas jurídicos indígenas (às vezes denominados direitos consuetudinários) e o direito de exercer controle sobre seus próprios assuntos30. Várias instituições financeiras interna-cionais, doadores bilaterais e o setor privado ado-taram políticas específicas de proteção dos direi-tos dos povos indígenas31. O desafio enfrentado pelos países e pelos povos indígenas é dar efeito prático às normas de direito adotadas, a fim de criar o espaço necessário que possibilite o desen-volvimento com identidade dos povos indígenas. Para os fins das salvaguardas incluídas na Política

mente em processo de preparação, tais como a Declaração das Na-ções Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas e o projeto da Declaração Americana sobre os Direitos dos Povos Indígenas pode-rão ser levados em conta, na medida em que esses instrumentos fo-rem concluídos e assinados pelo país relevante. Finalmente, cabe observar que as empresas privadas também adotaram medidas de proteção, conhecidas como Equator Principles (Princípios do Equa-dor), elaboradas a partir das políticas da Corporação Financeira In-ternacional (IFC). 30 Nas constituições de 13 países da América Latina estão consagra-dos, de forma específica, os direitos dos povos indígenas, e muitos dos demais países adotaram pelo menos algumas disposições legisla-tivas referentes a esses povos. Dezessete de 19 países com povos indígenas reconhecem alguma forma de sistemas normativos ou jurí-dicos indígenas. O Banco preparou uma compilação e uma análise comparativa da legislação sobre os povos indígenas de todos os paí-ses da região, que pode ser consultada em: www.iadb.org/sds/ind. 31 Entre as políticas específicas sobre povos indígenas se podem citar as seguintes: Política do Banco Mundial sobre os Povos Indígenas: Diretriz Operacional 4.10 do Banco Mundial, 2005; Banco Asiático de Desenvolvimento, Política sobre os Povos Indígenas, 1999; Pro-grama das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), Política de Compromisso com os Povos Indígenas, 2001; Organização Pan-americana da Saúde (OPAS), Orientação Estratégica para a Aplica-ção da Iniciativa de Saúde dos Povos Indígenas das Américas, 1997; Comissão Mundial de Represas, As Represas e o Desenvolvimento, 2000; Banco Europeu de Reconstrução e Desenvolvimento (BERD), Mandato relativo às Minorias Étnicas, 1993; União Européia, Reso-lução do Conselho sobre os Povos Indígenas no Marco da Coopera-ção para o Desenvolvimento da Comunidade e dos Estados Mem-bros, 1998; DANIDA, Estratégia Dinamarquesa de Apoio aos Povos Indígenas, 1994; Alemanha, Ministério Federal de Cooperação e Desenvolvimento Econômico, Conceito relativo à Cooperação para o Desenvolvimento com os Povos Indígenas da América Latina, 1996; Organismo Suíço de Cooperação e Desenvolvimento, Ação Suíça em Favor dos Povos Indígenas, 1998; Agência Espanhola de Cooperação Internacional (AECI), Estratégia Espanhola para a Cooperação com os Povos Indígenas, 1997; Países Baixos, Ministério de Assuntos Exteriores, Os Povos Indígenas na Política Externa e a Cooperação para o Desenvolvimento dos Países Baixos, 1993.

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operacional sobre povos indígenas, os direitos in-dígenas incluem os direitos dos povos e das pes-soas indígenas, quer originárias da legislação in-dígena sancionada pelos Estados, da legislação nacional pertinente, das normas internacionais a-plicáveis e vigentes para cada país32, ou dos sis-temas jurídicos indígenas que, em seu conjunto, passam a denominar-se “normas de direito aplicá-veis”33. Os sistemas jurídicos indígenas serão con-siderados em conformidade com as regras para seu reconhecimento estabelecidas na legislação do país correspondente. Na ausência dessas regras, esses sistemas serão reconhecidos sempre e quan-do forem coerentes com a legislação nacional e não contrariarem os direitos fundamentais estabe-lecidos na legislação nacional e nas normas inter-nacionais. O conceito de sistema jurídico indíge-na, também conhecido como direito próprio ou interno, inclui as normas de origem, os direitos consuetudinários, os usos e costumes e os siste-mas jurídicos e de justiça indígenas34. No caso de controvérsias, o Banco não assumirá um papel de árbitro ou intermediário entre os interessados, mas exigirá evidência de uma resolução satisfatória, antes de proceder com a atividade correspondente. Desenvolvimento com identidade O desenvolvimento com identidade dos povos in-dígenas se refere a um processo que compreende o fortalecimento dos povos indígenas, a harmonia e interação sustentada com seu meio ambiente, a boa administração dos territórios35 e recursos na-turais, a geração e o exercício de autoridade, e o respeito aos valores e direitos indígenas, inclusive os direitos culturais, econômicos, sociais e ins-titucionais dos povos indígenas, de acordo com sua própria cosmovisão e governança. Esse conceito encontra sustentação nos princípios de eqüidade, integridade, reciprocidade e solidari-

32 Ver nota de rodapé 29. 33 Todas as menções no texto desta estratégia a “normas de direito aplicáveis” deverão ser entendidas com o alcance estipulado na defi-nição contida neste parágrafo. 34 Dezessete dos 19 países com população indígena na América Lati-na e no Caribe reconhecem o direito consuetudinário. O Banco pro-cedeu a um exame exaustivo e a uma análise comparativa da legisla-ção pertinente aos povos indígenas em todos os países da região, que pode ser consultada em www.iadb.org/sds/ind. 35 O termo “território(s)” é empregado nesta estratégia em seu sentido genérico e com o mesmo alcance atribuído ao referido termo no Convênio 169 da OIT.

edade, e busca consolidar as condições em que os povos indígenas possam estar bem e crescer em harmonia com seu ambiente, aproveitando para tanto, segundo suas próprias prioridades, o poten-cial de seus bens culturais, naturais e sociais36. Adotar conceitos diferenciados para o desenvol-vimento indígena implica a aceitação dos objeti-vos econômicos desses povos que, em muitos ca-sos, não buscam necessariamente maximizar a rentabilidade dos recursos a curto ou médio prazo, mas que priorizam uma visão de suficiência de bem-estar, de equilíbrio com o meio ambiente e de preservação dos recursos para necessidades fu-turas. Essas economias tradicionalmente não con-sideram o acúmulo de riquezas por meio de exce-dentes de produção –especialmente individual ou em grupos de elite– como um fator que contribui para o bem-estar ou a segurança de suas socieda-des. O contato com a sociedade ocidental, as pres-sões do mercado e os fluxos migratórios estão contribuindo para mudanças graduais desses con-ceitos, com resultados mistos. O desafio para esta estratégia é apoiar e promover as iniciativas de desenvolvimento e os sistemas de organização próprios dos povos indígenas, para melhorar suas condições de vida com base em sua própria lide-rança e de forma coerente com a visão e a situação sociocultural específica de cada povo. Isso signi-fica aumentar o acesso, com igualdade de gênero, às oportunidades de desenvolvimento socioeco-nômico que fortaleçam a identidade, a cultura, a territorialidade, os recursos naturais e a organiza-ção social, e que reduzam a pobreza material e a marginalização. Essas ações devem ser orientadas pela premissa de que o desenvolvimento sustentá-vel requer a iniciativa e o empoderamento dos be-neficiários indígenas, o respeito aos direitos dos povos e das pessoas indígenas, o exercício de con-trole sobre sua própria forma de desenvolvimento econômico, social e cultural, e a gestão interna de seus espaços territoriais dentro dos Estados dos quais fazem parte, bem como uma participação eficaz nas esferas políticas e de gestão pública pa-ra o pleno exercício de seus direitos e suas res-ponsabilidades como cidadãos e povos indígenas.

36 Essa definição foi elaborada em conjunto com os membros do Conselho Assessor Indígena em suas reuniões de dezembro de 2004 e fevereiro de 2005.

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III. Diagnóstico Importância dos povos indígenas Os mais de 400 povos indígenas da região re-presentam uma grande heterogeneidade cultural e lingüística e uma diversidade significativa em seus meios de produção, formas de articulação com o ambiente natural e inserção na sociedade nacional. Apesar da escassez de dados oficiais confiáveis, a maioria das fontes coincide ao es-timar o número total de indígenas entre 40 e 50 milhões de pessoas, ou seja, cerca de 8 a 10% da população total da região, com altas taxas de cres-cimento demográfico. Em países como a Bolívia, a Guatemala ou o Peru, a população indígena cor-responde pelo menos à metade da população total. Condições de vida e pobreza material Em comparação à riqueza de suas civilizações e de seus recursos naturais em épocas pré-colombianas, os povos indígenas sofreram expro-priação de suas terras ancestrais, empobrecimento e marginalização. Estudos preliminares do Banco Mundial e do BID bem como os mapas de pobre-za de vários países mostram, com base em indica-dores convencionais de pobreza, um alto grau de correlação entre grupos indígenas e índices de po-breza (Gráfico 1). Com base nos Indicadores Mundiais do Desenvolvimento de 2002, a grande maioria da população indígena pertence aos estra-tos mais pobres, definidos nos termos convencio-nais da renda média diária37, o que significa que a população indígena representaria entre 20 e 25% da população que subsiste abaixo da linha de po-breza. Apesar das grandes migrações para zonas urbanas e o exterior, estima-se que entre 60 e 70% dos indígenas vivem em zonas rurais, o que repre-senta entre 45 e 50% da população rural pobre. Os níveis de pobreza persistiram durante a última dé-cada, embora a população indígena seja menos vulnerável às crises, provavelmente devido ao fato de que, para muitos povos indígenas, suas econo-mias são primordialmente de reciprocidade e auto-

37 Patrinos, H. y G. Hall, Indigenous People: Poverty and Human Development in Latin America, 1994-2004, Banco Mundial, 2005.

consumo e pouco monetarizadas (Tabela 1), e os valores de reciprocidade, equilíbrio e espiritua-lidade lhes têm permitido enfrentar a pobreza e encontrar alternativas de sobrevivência. Por outro lado, muitas organizações questionam a relevância dos indicadores convencionais e insistem na ne-cessidade de complementá-los com indicadores que retomem valores fundamentais dos povos in-dígenas coerentes com seu próprio conceito de de-senvolvimento com identidade, tais como a quali-dade do ambiente natural, a segurança jurídica de seus territórios, o acesso a recursos naturais e a espaços para a prática de sua espiritualidade, e a qualidade do capital social em suas comunidades e organizações38. Acesso aos serviços e sua qualidade Apesar de melhorias pontuais ou em termos abso-lutos, persiste uma lacuna significativa entre a po-pulação indígena e a não indígena no acesso a serviços sociais, como mostram os indicadores de educação e saúde. Essas lacunas se manifestam na área da educação primária e secundária, especial-mente para as mulheres indígenas, que apresentam as piores taxas de analfabetismo e de escolarida-de39. Apesar dos avanços na educação bilíngüe in-tercultural (Quadro 1), persistem problemas sérios de repetência e evasão escolar, baixa qualificação dos professores, qualidade deficiente da educação e retornos da educação inferiores aos recebidos pelo restante da população (ver Anexo). Além disso, perdura uma séria desvantagem no acesso à educação superior por parte dos indígenas em re-lação aos não indígenas, o que contribui para a segmentação no mercado de trabalho. Da mesma forma, o acesso das populações indígenas aos ser-

38 Estudos recentes analisam os indicadores convencionais à luz das demandas dos indígenas, oferecendo sugestões para a complementa-ção desses indicadores com aqueles que melhor refletem as priorida-des dos povos indígenas e que incluem indicadores relacionados com o bem-estar (ver: Renshaw J. et al. Indicadores de pobreza indígena, SDS/IND, 2004, versão preliminar). 39Abram, M. Estado da Arte da Educação Bilíngüe Intercultural na América Latina, versão preliminar, SDS/IND, agosto de 2004; Patri-nos y Hall, op. cit. UNICEF, Eqüidade com Dignidade, 2004, relató-rio anual UNICEF, 2004.

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viços de saúde é mais limitado, conforme mos-tram os índices de morbidade e mortalidade, espe-cialmente materno-infantil, muito superiores aos da população não indígena. Por outro lado, na Bolívia, na Colômbia, no Equador, na Venezuela,

no México e no Peru, os beneficios da medicina tradicional indígena são reconhecidos como com-plemento da medicina alopática, e a mesma conta com um certo grau de apoio do Estado.

Tabela 1. Porcentagem de mudança na taxa de pobreza

País Não indígenas Indígenas

Bolívia (1997-2002) -8 Mudança inferior a 0,1 Equador (1994-2003) +14 Mudança inferior a 0,1 Guatemala (1989-2000) -25 -15 México (1992-2002) -5 Mudança inferior a 0,1 Peru (1994-2000) +3 Mudança inferior a 0,1 Fonte: Patrinos, H., e Hall G., Indigenous People: Poverty and Human Development in Latin America, 1994-2004. Rela-tório Preliminar, Banco Mundial. Dados baseados nas linhas nacionais de pobreza.

Gráfico 1. Taxas de pobreza(Porcentagem da população com renda inferior a US$2 por dia)

Fonte: Duryea, S. y Genoni, M. E. Ethnicity, Race and Gender in Latin American Labor Markets. BID, 2004, baseado nos censos domicilares de 1998 e 1999.

0.62

0.60

0.49

0.81

0.77

0.75

0.49

0.44

0.44

0 0.2 0.4 0.6 0.8 1

Bolívia

Guatemala

Peru

População total Indígenas Não indígenas

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Terras, territórios e recursos naturais O crescimento demográfico, os avanços das fron-teiras agrícolas (inclusive a exploração pecuária e a sobre-exploração pesqueira), a extração de hi-drocarbonetos e de recursos florestais e a minera-ção, bem como o turismo massivo e a criação de infra-estrutura nacional e transnacional, au-mentaram as pressões sobre os territórios e as e-conomias indígenas, tanto campesinas como tri-bais, resultando na redução da qualidade de vida e no deterioro de condições anteriormente sustentá-veis. Em alguns casos, a criação de áreas de pro-teção ou de parques naturais40 resultou na imposi-ção de limitações para as comunidades indígenas no acesso a seus recursos naturais e, em outros, até mesmo em seu reassentamento. Apesar desses processos de expropriação e degradação ambiental

40 Com base nas informações compiladas pela União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), mais de 80% das novas á-reas protegidas estabelecidas nas Américas a partir de 1992 estão em terras e territórios ocupados ou utilizados por povos indígenas.

de suas terras e seus territórios ancestrais, persiste um elevado grau de correspondência entre a loca-lização dos territórios indígenas e as áreas de mais alta biodiversidade e conservação de recursos na-turais41. Nos últimos anos, a maioria dos países avançou significativamente na definição dos mar-cos jurídicos e institucionais para o reconheci-mento, a proteção e a regularização dos direitos coletivos dos povos indígenas sobre seus territó-rios e recursos42. Entretanto, a aplicação desses marcos ainda é frágil, o que implica sérias defici-ências nos processos de demarcação, regulariza-ção e administração própria. Em vista das pres-sões crescentes sobre as terras e os territórios, es-sas medidas se tornam necessárias para manter ou recuperar sua sustentabilidade ancestral e, assim, evitar que as economias e as sociedades indígenas se tornem inviáveis (Tabela 2).

Quadro 1. Educação intercultural bilíngüe

A partir dos anos 1980, a educação bilíngüe vem sendo adotada, com raras exceções, como política pública nos países da região. Em 2004, havia programas de educação intercultural bilíngüe (EIB) em 18 países. As características da EIB variam entre países: da adoção do idioma nativo como língua de instrução nos pri-meiros anos de escolaridade, a modificações significativas nos conteúdos curriculares e nos métodos de ensino, envolvendo os idosos da comunidade. Estudos promovidos por UNESCO, PREALC, Banco Mun-dial, AID, entre outros, avaliam a educação intercultural da seguinte forma: • Aumenta a qualidade da aprendizagem de matérias curriculares em geral, reduz a repetência e aumen-

ta os anos de permanência na escola, sobretudo das meninas. • Aumenta a eficiência do investimento total, incluindo o ensino de conhecimentos práticos de uso lo-

cal. • Aumenta e desenvolve a auto-estima, dando novo dinamismo e “empoderamento” às comunidades. • Contribui para a convivência pacífica, o diálogo e a interculturalidade. • Enriquece os modelos de educação latino-americana. • Permite a participação ativa também daqueles pais de família que não falam castelhano e fomenta a

participação em geral.

41 Ver por exemplo: Povos Indígenas e Ecossistemas Naturais na América Central e no Sul do México, publicado pelo Center for the Support of Native Lands e pela National Geographic Society, Wa-shington D.C., 2002. 42 Ver nota de rodapé 30.

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Tabela 2. Legalização de terras coletivas de povos indígenas

País Número de títulos Km2 % do país

Brasil 368 1.017.627 12 Colômbia 638 313. 100 27 Costa Rica 22 3.300 6 Equador S/D 27.819 10 Panamá 5 16.347 21 Bolívia 412 49.553 5 Fonte: Roldán, R. 2004. Importancia de los territorios colectivos de indígenas y afroamericanos en el desarrollo rural, en desarrollo territorial rural en América Latina y el Caribe. R. Echeverría (ed.), BID, 2003. INRA, Bolívia.

Falta de oportunidades econômicas Para a grande maioria dos povos indígenas assen-tados nos planaltos andinos ou mesoamericanos, o modo de produção baseia-se em uma economia agropecuária com diferentes graus de inserção nas economias nacionais. Uma pequena –embora cul-turalmente importante– porcentagem da popula-ção indígena vive em zonas de floresta e no Cha-co, com economias tradicionais isoladas e basea-das na horticultura, na caça e na colheita. Nos úl-timos anos, as comunidades indígenas passaram por um processo crescente de migração para as á-reas marginais das grandes cidades e para o exte-rior. Essa diversidade no grau de inserção social e econômica implica desafios especiais na formula-ção de políticas e programas socioculturalmente apropriados para esse segmento da população. Em geral, tanto os povos indígenas cuja economia de-pende essencialmente do autoconsumo e da reci-procidade em seus territórios ancestrais, como a-queles que estão mais integrados ao mercado na-cional, encontram-se em desvantagem em termos de acesso a serviços técnicos e financeiros e a mercados de trabalho regulamentados. Muitas comunidades continuam sofrendo limitações no que se refere ao acesso e controle de suas terras e seus recursos, o que, por sua vez, gera limitações importantes em relação às oportunidades econô-micas. Ainda para aquelas comunidades que obti-veram a proteção jurídica de suas terras e seus ter-ritórios coletivos, a ausência de investimento pú-blico e privado nesses territórios que respondam pelo princípio de participação ativa e eqüidade nos benefícios, bem como limitações na capa-

cidade de gestão administrativa e empresarial das organizações indígenas, ainda representam gran-des desafios para potencializar a melhoria das condições de vida das comunidades. Nesse con-texto, a demanda indígena busca maior acesso aos serviços convencionais financeiros, empresariais e de capacitação profissional e para o trabalho43, além do fortalecimento ou da recuperação de me-canismos ancestrais de prestação de serviços mo-netários ou em espécie (como o censo enfitêutico de intercâmbio de usufruto de terras, os mecanis-mos de intercâmbio de produtos por meio dos pi-sos ecológicos verticais e os sistemas de permutas, armazenamento e contabilidade de produtos -conhecidos como qollqas- dentre outros), cujas regras se regem por seus próprios sistemas norma-tivos44, bem como a capacitação para a governan-ça econômica de seu patrimônio territorial, cultu-ral e de recursos naturais.

43 A falta de acesso a serviços do sistema financeiro convencional se deve à ausência de instituições financeiras em áreas indígenas ou à falta de reconhecimento de outro tipo de garantia que não o título in-dividual em comunidades indígenas que adotam sistemas de posse coletiva de seus territórios. Nos casos em que os indígenas têm aces-so a serviços de poupança, não o têm aos serviços de crédito, o que, na prática, significa que os benefícios do multiplicador bancário são desviados para outros setores da população. 44 Os sistemas jurídicos indígenas (ou “direito indígena próprio”, para diferenciá-lo da legislação indígena de cada país), às vezes denomi-nados “sistemas normativos indígenas” ou “direitos consuetudiná-rios”, são reconhecidos de formas diferentes pelos países da região: de fonte de direito a usos e costumes que devem ser aplicados pelos juízes, até sistemas normativos ou jurídicos indígenas autônomos no âmbito de um conceito de pluralismo jurídico. Para fins da estratégia, emprega-se o conceito mais amplo de “sistemas jurídicos indígenas”, limitando-se o uso do termo “direito consuetudinário” aos direitos re-lacionados com a ocupação e o uso de terras e recursos naturais.

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Quadro 2. Bolívia: Lei de participação popular

A Lei de Participação Popular de 1994 reconheceu a personalidade jurídica das Organizações Territoriais de Base (OTB) e as relacionou com os órgãos públicos, delimitando como jurisdição territorial do governo muni-cipal a Seção de Província, e incrementando recursos em favor dos governos municipais, com base no princí-pio de distribuição por habitante dos recursos de co-participação transferidos aos departamentos. Entretanto, os povos indígenas não se sentiam identificados com as OTB, já que essa figura não se aplicava às formas de organização própria. Assim, decidiram não seguir os trâmites legais para a constituição da personalidade jurí-dica necessária para que fossem reconhecidos como sujeitos da Lei. Em vista dessa situação, a lei foi modifi-cada em 1996, passando a reconhecer a “personalidade jurídica de Comunidades Indígenas, Povos Indígenas e Comunidades Campesinas e Assembléias Municipais, , respectivamente, [como ...] organizações territoriais de base, relacionando-as com os órgãos públicos, em conformidade com a Lei” (Art. 2º da Lei 1702).

Participação política Os povos indígenas aumentaram de forma notável sua participação nos espaços nacionais, inclusive nas legislaturas e no poder executivo, em países como Equador, Bolívia e México. No caso da Bo-lívia, a participação indígena no Congresso au-mentou de 1% em 1998 para 27% em 2001. Um crescimento semelhante vem ocorrendo no Equa-dor e, embora em números menores, na Argentina, na Colômbia e em outros países. Na esfera execu-tiva, os indígenas têm ocupado postos importantes tais como vice-presidências, ministérios de rela-ções exteriores, educação, cultura e outros, bem como o governo de estados federais, províncias e municípios. As leis de descentralização, em geral, favorecem o acesso a esses espaços políticos. En-tretanto, a baixa participação indígena no gasto público, a escassez de recursos e a falta de insti-tuições adequadas para a gestão local própria e sua articulação com as autoridades nacionais e subnacionais, além da ausência de critérios socio-culturais, limitam seu alcance (Quadro 2). Esses limites se materializam particularmente na dis-crepância crescente entre o poder político e os di-reitos dos povos indígenas, bem como no acesso a instâncias institucionais, recursos e mecanismos que traduzam o protagonismo político em melho-rias nas condições de vida dos povos e em maior liberdade e capacidade para tomar decisões sobre seu próprio destino e seus recursos. Essa dis-crepância resulta numa relação antagônica entre indígenas e não indígenas, que dificulta a geração de modelos de desenvolvimento construtivos e mutuamente benéficos.

Situação das mulheres indígenas A cosmovisão de muitos povos indígenas fun-damenta as relações de gênero na dualidade e no equilíbrio. Entretanto, atualmente, muitas mulhe-res indígenas enfrentam violência doméstica e uma situação de desigualdade em relação aos ho-mens, refletida em atrasos na alfabetização e na educação formal, no acesso desigual a recursos produtivos e oportunidades econômicas, e na ex-clusão de processos de decisão em suas comuni-dades e organizações. Além disso, os processos de migração urbana e para o exterior resultam em al-tas taxas de lares chefiados por mulheres. Reco-nhecendo a grande diversidade das culturas e de suas normas, bem como o caráter dinâmico tanto dos povos indígenas como das sociedades nacio-nais, um desafio especial é a articulação dos direi-tos das mulheres e dos direitos indígenas reconhe-cidos nas constituições nacionais45. Nesse sentido, nos últimos anos as organizações de mulheres in-dígenas têm reivindicado o reconhecimento de seu papel preponderante na família, na comunidade, na economia indígena e como guardiãs e trans-missoras, entre gerações, do patrimônio cultural de seus povos46. As organizações de mulheres es- 45 Cabe notar que entre as leis mais avançadas sobre esse tema estão as da Guatemala, que criaram, dentre outras medidas, a “Defensoria da Mulher Indígena”. 46 A Memória da Primeira Cúpula de Mulheres Indígenas das Améri-cas, Oaxaca, 2002 (que contou com o apoio do Banco), a União Continental de Mulheres Indígenas, o Fórum Internacional de Mu-lheres Indígenas e a II Sessão do Fórum Permanente das Nações U-nidas sobre Questões Indígenas (dedicado ao tema da mulher in-dígena) demonstram a vitalidade dessas organizações e seu prota-gonismo na busca de melhores condições de vida para as mulheres, suas comunidades e seus povos.

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tão exigindo a igualdade de gênero e de oportuni-dades a partir de suas próprias cosmovisões, bem como a proteção e a aplicação de seus direitos como indígenas e como mulheres. Indígenas urbanos e processos migratórios A maioria dos países enfrentou processos acele-rados de migração indígena para os centros urba-nos, resultando na expropriação e colonização de terras ancestrais ou no seu fracionamento —ou “minifundização”—, na busca de melhores condi-ções econômicas de emprego ou educação e, em alguns países, em situações de conflito. Estudos47 confirmam a importância demográfica da migra-ção rural-urbana: 40% da população indígena do Equador é urbana; no Chile, essa proporção é de pelo menos 50%48. Longe de subjugar-se à cultura urbana dominante ou de assimilá-la, a maioria dos indígenas urbanos mantém fortes vínculos eco-nômicos, sociais e culturais com suas comunida-des de origem, em alguns casos invertendo pro-cessos de assimilação observados em décadas an-teriores e reconstruindo ou reinterpretando, nos centros urbanos, suas tradições culturais e suas re-des sociais, tal como demonstram assentamentos ou bairros indígenas em cidades como Santiago, El Alto, Cidade do México, Quito e outras. Esses vínculos entre os indígenas urbanos e suas comu-nidades de origem estão se convertendo em novas oportunidades para a revitalização das economias rurais indígenas e para a criação de empresas in-dígenas urbanas, valendo-se das vantagens com-parativas dos recursos naturais, culturais e sociais das comunidades de origem e apoiando a articula-ção gradual entre práticas tradicionais e modernas.

47 Ver por exemplo: Exclusión Social y Estrategias de Vida de los In-dígenas Urbanos en Perú, México y Ecuador, J. Uquillas, Tania Ca-rrasco e Martha Rees (eds.), Banco Mundial, 1993. 48 Ver MIDEPLAN, Programa Orígenes, Antecedentes de las Políti-cas Indígenas en Chile, Santiago, 2003.

Entretanto, o aproveitamento dessas oportuni-dades requer novos modelos institucionais, alian-ças estratégicas, projetos inovadores e capacita-ção. Caso contrário, a tendência desses processos é aumentar a concentração de indígenas em con-dições marginais nas grandes cidades, inviabilizar as economias rurais das comunidades de origem e, eventualmente, dissipar a base social das culturas indígenas, resultando em sua fragmentação e, em casos extremos, em sua extinção. Povos indígenas não contatados e transfronteiriços Em face da expansão da infra-estrutura e da cres-cente inserção de empresas extrativas em territó-rios indígenas, os povos indígenas não contatados, também denominados “em isolamento voluntá-rio”, e aqueles localizados em zonas fronteiriças, estão em situação de alta vulnerabilidade (Quadro 4). Os povos indígenas não contatados ou em iso-lamento voluntário são grupos muito pequenos que vivem em áreas remotas da floresta amazôni-ca e no Chaco, e que não desejam estabelecer con-tato com a civilização ocidental, dada a sua vulne-rabilidade frente aos impactos resultantes desse contacto (tais como enfermidades para as quais não possuem defesas, deterioração de seus recur-sos naturais de subsistência e conflitos violentos). Os povos indígenas transfronteiriços, localizados no território de dois ou mais países, também se encontram em uma situação de vulnerabilidade frente aos processos de integração. Essa vulne-rabilidade demanda a adoção de marcos jurídicos e administrativos específicos e harmonizados en-tre países.

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Quadro 4. Povos indígenas em isolamento: o caso de Camisea

O gasoduto dos campos de Camisea está parcialmente localizado na reserva Nuhua Kugapakori, ocupada por povos indígenas em isolamento voluntário. Após um intenso processo de diálogo e reflexão, o Banco decidiu apoiar esse projeto, exigindo que as empresas privadas envolvidas e o Governo peruano criassem medidas de proteção, como, por exemplo, um código para evitar contatos forçados, um plano de contin-gência médica, o fortalecimento da situação legal da reserva, medidas de monitoramento do acesso à área e o fortalecimento da institucionalidade do Estado. Em vista da ausência de normas claras no âmbito nacio-nal e internacional e da possibilidade de que projetos semelhantes venham a surgir, o Banco deve definir seus critérios de decisão, seus processos de avaliação de riscos e seus padrões, a fim de evitar ou mini-mizar impactos potenciais adversos para povos em isolamento, em razão de sua alta vulnerabilidade.

Quadro 3. O Banco e a jurisdição indígena

O Banco está apoiando o Conselho Superior da Magistratura e os povos indígenas da Colômbia em um projeto que tem como objetivo melhorar a articulação entre a jurisdição indígena e o sistema judiciário na-cional. Esse projeto inclui estudos de caso, o desenvolvimento de um Atlas de jurisdições indígenas, a cri-ação de um diário de decisões, o apoio a projetos-piloto de escolas de direito indígena, a capacitação de ju-ízes nos sistemas indígenas e a consulta de um projeto de lei de articulação das jurisdições. Da mesma forma, o Banco está cooperando com o Instituto Interamericano de Direitos Humanos em um programa re-gional de intercâmbio de experiências e capacitação das Defensorias Públicas, no que se refere ao acesso dos povos indígenas à justiça e à aplicação dos sistemas jurídicos ou normativos indígenas.

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IV. A experiência do Banco Institucionalização da temática indígena no Banco Até meados dos anos 1980, o apoio do Banco a comunidades indígenas limitou-se a projetos es-pecíficos de menor magnitude (especialmente por meio do então Programa de Pequenos Projetos49). A partir de meados da década de 1980, a raiz da experiência com projetos de infra-estrutura com impactos sobre povos indígenas vulneráveis (Quadro 5), o Banco passou a abordar os possíveis impactos negativos de seus projetos em comuni-dades indígenas, como parte de seus proce-dimentos de controle da qualidade ambiental e so-cial. Em 1990, foram adotados procedimentos in-ternos (Estratégias e procedimentos para temas socioculturais relacionados com o meio ambiente) para evitar, mitigar ou compensar impactos nega-tivos sobre comunidades indígenas. Da mesma forma, foi formalizada a inclusão da temática in-dígena no mandato do Comitê de Impactos Ambi-entais e Sociais (CESI, originalmente denominado CMA).

49 Redefinido como Programa de Empresariado Social em 1997.

O mandato da Oitava Reposição de Recursos de 1994 requer que o Banco assuma um papel mais proativo em temas indígenas e faz referência es-pecífica aos desafios e às oportunidades para che-gar a um processo de desenvolvimento indígena participativo, buscando sua inclusão sistemática e pertinente nas operações regulares do Banco, por meio de componentes e enfoques específicos so-cioculturalmente apropriados (AB-1704, p. 22). Em 2001, a adoção pelo Banco de um plano de ação para combater a exclusão social por motivos raciais ou étnicos (CS-3362-3), que inclui os indí-genas como um de seus grupos-meta, reafirmou o mandato da Oitava Reposição com ações e objeti-vos concretos e mensuráveis. Em 2003, o Plano de Ação para a Integração de Gênero (GN-2249) in-cluiu os compromissos da Cúpula de Mulheres Indígenas e outras ações para melhorar a situação da mulher indígena. Do mesmo modo, a Estraté-gia para a Participação Cidadã nas Atividades do Banco (GN-2232-5, que recebeu parecer favorável da Diretória Executiva em maio de 2004) ressalta os mecanismos de participação dos povos indíge-nas.

Quadro 5. Brasil: projeto de mitigação de impactos ambientais e sociais PMACI

Em 1985, o Banco aprovou um projeto de pavimentação da rodovia 365 de Porto Velho a Rio Branco, capital do estado do Acre. O plano de mitigação de impactos ambientais e sociais (PMACI) definiu medidas especí-ficas para as comunidades indígenas, mas não foi implementado como estava previsto. Em vista das deman-das da sociedade civil local e internacional, o Banco suspendeu os desembolsos em 1988 e facilitou a refor-mulação do PMACI. O plano de mitigação passou de um enfoque centralizador e pouco participativo admi-nistrado a partir de Brasília, para um enfoque altamente participativo, com liderança das instâncias estatais e das comunidades locais. Além disso, fortaleceu-se a proteção jurídica dos territórios indígenas e dos serin-gueiros, e adotaram-se outras medidas de atenção aos problemas sociais da área do projeto. Após sua refor-mulação, o programa obteve grande êxito e se tornou um modelo para outros projetos de mitigação, bem co-mo para processos de desenvolvimento integral apoiados pelo Banco (por exemplo, o ESTAP, em Belize, e o Darién, no Panamá). A raiz desse programa, o Banco criou uma divisão de meio ambiente em 1990 e fortale-ceu o comitê para a revisão da qualidade ambiental e social dos projetos, incluindo, de forma específica, a consideração dos impactos sobre os povos indígenas.

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Fonte: SDS/IND, BID, 2005.

Número de empréstimos BID vs. número de empréstimos com ações etno-específicas

Porcentagem de empréstimos que incluem indígenas por anoEmpréstimos com e sem medidas etno-específicas

Gráfico 2. Empréstimos que incluem indígenas vs. total de empréstimos

0

20

40

60

80

100

120

140

1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003

Número de empréstimos sem PPF Projetos IND com ações (CA)

5 % 4 %

15 %19 %

2 4 %2 7 %

2 2 %

4 3 % 4 3 %

54 %

12 %

7%

17 % 15 %

2 6 %

3 3 %

13 %

5 0 %

15 %

0 %

12 %

2 9 %

7%

18 %

4 %0 %

3 %

2 0 %

0%

10%

20%

30%

40%

50%

1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003

Projetos IND Projetos IND com ações (CA)

Evolução da carteira de projetos Uma análise dos projetos do Banco com com-ponente ou enfoque indígena aprovados desde 199050, mostra um aumento gradual e significa-tivo do número de operações que incluem, de forma implícita ou explícita, a população indígena como grupo-alvo (Gráfico 2). Nos últimos anos, a porcentagem dos empréstimos do Banco que in-cluem medidas específicas de enfoque ou de pla-nejamento socioculturalmente diferenciado atin-giu aproximadamente 20% da carteira aprovada anualmente. Essa porcentagem se compara a cerca de 40% dos projetos do Banco que, por sua cober-tura geográfica, incluem a população indígena em sua população-alvo, sem que haja uma estratégia diferenciada para a população indígena e não in-dígena.

50 Base de dados de projetos de SDS/IND e relatório de Steven Geiger, et al., SDS/IND, 2004.

Lições aprendidas Embora o tema mereça um estudo mais profundo, o relatório da Unidade de Povos Indígenas e De-senvolvimento Comunitário (SDS/IND) sobre a carteira de projetos conclui que, para ser eficazes em termos do acesso aos seus benefícios, os proje-tos destinados a melhorar as condições de vida dos povos indígenas somente alcançam esse pro-pósito quando há medidas específicas para melho-rar o enfoque, reduzir as barreiras de acesso e a-dequar os serviços às características socioculturais e lingüísticas dos povos indígenas, bem como para propiciar sua participação ativa na identificação, no planejamento, no desenvolvimento e na avalia-ção das ações respectivas. Portanto, apesar de a-vanços importantes no número de projetos que in-cluem, de forma específica, os povos indígenas, há uma porcentagem significativa de projetos que, embora implícita ou teoricamente incluam os in-dígenas como parte dos beneficiários, pecam pela falta de mecanismos diferenciados específicos em termos étnicos ou socioculturalmente apropriados e não chegam, na prática, a beneficiar o segmento

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indígena da população-alvo51. O relatório conclui que esses projetos representam uma oportunidade desperdiçada para beneficiar os povos indígenas, já que sem essas medidas etno-específicas os in-dígenas enfrentam barreiras de acesso ou sofrem processos de assimilação em detrimento de sua identidade, sua cultura e seu bem-estar. Algumas conclusões mais específicas do estudo constatam que: (i) a qualidade dos projetos melho-rou, especialmente quando sua elaboração se ba-seou em diagnósticos socioculturais e em proces-sos de consulta e participação dos beneficiários, ou quando os projetos contaram com especialistas em temas indígenas para sua elaboração e para en-focar os beneficiários (Quadro 6); (ii) poucos pro-jetos contam com linhas de base ou sistemas de informação desagregada por grupo étnico, o que dificulta o monitoramento e a avaliação; (iii) um dos obstáculos no âmbito dos países é a frágil ca-pacidade institucional dos governos para atender à temática indígena, apesar dos avanços em matéria do marco jurídico e das políticas públicas nos úl-timos anos; (iv) em termos gerais, os projetos de meio ambiente e de infra-estrutura (no último caso devido a planos de mitigação de impactos negati-vos) tendem a ser mais específicos no sentido de identificar medidas etno-específicas do que os projetos sociais, de redução da pobreza ou de re-forma do Estado, que tendem a não estabelecer

51 Um estudo de avaliação elaborado pelo OVE mostra que os resul-tados dos 10 projetos analisados em relação ao seu impacto nos po-vos indígenas indicam que os projetos da amostra foram geralmente positivos (ver documento RE-261), mas não analisa as diferenças en-tre projetos com ou sem medidas etno-específicas.

uma distinção entre indígenas e não indígenas, embora seja precisamente nesses setores que os indígenas enfrentam importantes barreiras de a-cesso; e (v) a consideração da temática indígena nos projetos depende do avanço nas políticas pú-blicas e nos marcos normativos dos países, e não da relativa importância numérica da população in-dígena do país. Essas conclusões preliminares co-incidem com estudos de análise de carteira ou de avaliação52 realizados por outras instituições de cooperação e por algumas organizações indíge-nas53. As limitações dos projetos setoriais (saúde, edu-cação, eletrificação rural, água potável, microem-presa e outros) para beneficiar as comunidades in-dígenas, bem como as reivindicações indígenas para que se estabeleçam enfoques mais integrais e participativos, resultaram na definição de uma no-va geração de projetos de desenvolvimento local integral, que reconhece o protagonismo das orga-nizações e comunidades indígenas na conceituali-zação do projeto, no planejamento participativo, na execução descentralizada e no fortalecimento das capacidades locais. Apesar dos desafios insti-tucionais decorrentes da organização setorial dos serviços públicos, esses projetos parecem ser mais bem sucedidos em obter uma maior apropriação dos benefícios por parte da população-alvo e mai-or sustentabilidade no longo prazo.

52 Em reuniões periódicas do Grupo Interagências sobre Desenvolvi-mento Indígena (criado pelo BID e o Banco Mundial em 1991), ficou demonstrado que as experiências do BID são coerentes com as de ou-tras instituições. Ver: Banco Mundial. Implementation of Opera-tional Directive 4.20 on Indigenous Peoples: an Independent Desk Review (Volume I); e Evaluation of Results (Volume II). Relatórios Nº .25332 e 25754, de 2003. 53 Ver entre outras fontes: Después de la Década de los Povos Indí-genas: Recuentos y Horizontes, Declaración de Tepoztlán, 12 de ou-tubro de 2004, assinada por 21 líderes indígenas; Declaración desde el Centro del Mundo: Avaliación del Decenio Internacional y la Co-operación con los Puebloss Indígenas, Quito, outubro de 2004; Ba-lance y Perspectivas de la Cooperación con los Pueblos Indígenas de América Latina; Memoria de la IV Reunión de Agencias de Coope-ración Internacional para el Desarrollo de los Puebloss Indígenas de América Latina, Santa Cruz, Bolívia, maio de 2004; e Resultados Preliminares de la V Reunión Interagencial sobre Cooperación con los Puebloss Indígenas de América Latina, Quito, Equador, outubro de 2004.

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Quadro 6. O DECOPAZ serviria como modelo?

Em 1996, o Banco aprovou o programa DECOPAZ para apoiar a reconstrução de comunidades indígenas após o conflito armado na Guatemala. Esse programa foi um dos primeiros a adotar um enfoque de desen-volvimento comunitário integrado. Dentre as realizações do programa destacam-se: a construção de infra-estrutura em comunidades muito necessitadas, a participação das comunidades na execução e gestão dos projetos, e a criação de fontes de renda nas comunidades. Entretanto, o programa também enfrentou algu-mas limitações, dentre as quais: objetivos muito ambiciosos, que o transformavam em um programa seme-lhante aos fundos de investimento social de caráter mais geral, e problemas com a institucionalização do programa. Nesse último caso, o programa privilegiava as entidades municipais que, dada sua falta de articu-lação com as comunidades e organizações orgânicas dos povos indígenas, dificultaram o acesso às comuni-dades e geraram desconfiança. As lições extraídas do programa DECOPAZ influenciaram a concepção de outros projetos de desenvolvimento comunitário integral para povos indígenas, dentre os quais se destacam: CAPI (Argentina), PROPAIS (Venezuela), Darién e Bocas del Toro (Panamá), Corredor Biológico Mesoa-mericano, FISE III (Equador), PAPIN (Honduras) e Orígenes (Chile).

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V. Objetivos da estratégia O objetivo da estratégia é orientar a programação e execução das atividades e operações do Banco54, por meio da definição de linhas de ação e modali-dades específicas, com o propósito de: (i) apoiar os governos nacionais55 e os povos indígenas na promoção do desenvolvimento com identidade e da capacidade de gestão e articulação institucional dos povos indígenas; e (ii) evitar ou mitigar os impactos negativos que as operações do Banco possam gerar para os povos indígenas e seus direi-tos. Para tanto, esta estratégia incorpora esses ob-jetivos às ações do Banco de uma forma sistemá-tica e transversal, aproveitando as lições aprendi-das, as boas práticas, e o processo de consulta que a alimentaram. Para apoiar o desenvolvimento com identidade —tal como definido no parágrafo sobre desenvol-vimento com identidade na Seção II desta estraté-gia— o Banco se propõe a implementar ações em três áreas: (a) Fortalecer as terras, o território e a gover-

nança das sociedades e economias tra-dicionais indígenas nos territórios e comuni-dades rurais de origem, em conformidade com as normas de direito aplicáveis e as formas de organização própria dos povos indígenas, co-mo espaço cultural próprio e base para a iden-tidade étnica e a segurança alimentar, incluin-do uma margem de segurança em situações de crise.

54 No contexto das estratégias institucionais aprovadas pela Diretoria Executiva do Banco em 2003 e do conjunto de mandatos internacio-nais (Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, Cúpulas de Québec, Guadalajara, Durban e Joanesburgo, entre outras) assumidos pelo BID, os sete pilares de estratégia do Banco são: Redução da Pobreza e Igualdade Social; Crescimento Econômico Sustentável; Integração Regional; Competitividade; Desenvolvimento Social; Modernização do Estado; e Meio Ambiente. Outro importante documento de refe-rência é a Estratégia para a Participação da Sociedade Civil nas A-tividades do Banco (GN-2232-5), que recebeu parecer favorável da Diretoria Executiva do Banco em maio de 2004. 55 “Governos nacionais” são todas as entidades governamentais no âmbito nacional, inclusive entidades descentralizadas, estatais e lo-cais.

(b) Reduzir a marginalização e a exclusão nos espaços da sociedade nacional e no âmbito urbano, para facilitar maior acesso, qualidade e pertinência sociocultural dos serviços soci-ais e financeiros, dos mercados de trabalho e das oportunidades de desenvolvimento.

(c) Potencializar as vantagens comparativas dos

povos indígenas baseadas em seu capital natu-ral, cultural e social, para aproveitar o espaço intercultural como base para melhorar a qua-lidade de vida das comunidades indígenas, tendo-se em conta os nichos do mercado na-cional e global nos quais há demanda por pro-dutos e serviços indígenas.

Essas três áreas —que se articulam de modo dife-rente conforme a situação específica de cada po-vo, seu grau de inserção na sociedade nacional e sua própria visão do desenvolvimento— se apli-cam em todas as esferas das políticas e dos pro-gramas e projetos enfocados sobre os povos indí-genas, inclusive saúde, educação, manejo de re-cursos naturais, desenvolvimento produtivo, pro-jetos de infra-estrutura, governança, segurança ju-rídica e outros. O gráfico 3 ilustra esse conceito no que se refere ao desenvolvimento econômico e reflete a dinâmica entre o meio tradicional indíge-na, o contexto externo local e as oportunidades e os desafios para o desenvolvimento indígena exis-tentes em cada área. Nesse contexto, a estratégia busca apoiar o processo de autodesenvolvimento dos povos indígenas para a consecução de suas próprias metas em espaços tradicionais ou inter-culturais onde os povos indígenas possam desen-volver suas comunidades, organizações e capaci-dades de gestão, sem estar sujeitos a agendas ex-ternas. O desenvolvimento nesses espaços ajuda a

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reafirmar a importância central dos valores socio-culturais das comunidades indígenas, o que, por sua vez, fomenta a confiança necessária para o exercício da autonomia e da independência nas re-

lações interculturais com a sociedade e o Estado56. Para tanto, foram identificados os eixos estratégi-cos apresentados na seção VI desta estratégia.

56 Center for Aboriginal Health Research, Universidade de Manitoba. Best Practices in Intercultural Health-Interim Report, SDS/IND, fe-vereiro de 2005.

Gráfico 3. Estratégia de desenvolvimento indígena no âmbito econômico

Economía de mercado

Economía interculturalEconomía

interculturalEconomía tradicional

indígena

Fonte: SDS/IND, BID, 2005.

Fortalecer território

• Regularizar posse.• Segurança alimentar.• Sustentabilidade de usos culturais.• Produção e entrega de bens e

serviços na comunidade.• Acesso a serviços.• Mecanismos alternativos de

financiamento.

Aproveitar vantagens comparativas e nichos de mercado• Turismo étnico.• Gestão de patrimônio.• Manejo de áreas protegidas.• Arte, artesanato.• Plantas medicinais.• Serviços ambientais.• Produtos orgânicos. • Outros.

Aumentar inclusão

• Mercados de trabalho.• Mercados de bens e

serviços.• Educação superior e

capacitação.• Serviços sociais.• Serviços financeiros e

empresariais.

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VI. Eixos estratégicos e prioridades para a ação do Banco Visibilizar os povos indígenas e sua especificidade Para obter uma inserção sistemática e pertinente (mainstreaming ou incluão transversal) dos temas indígenas nas agendas de desenvolvimento dos países e em sua própria carteira de operações, o Banco procurará: (a) Nos censos e nas pesquisas domiciliares, a-

vançar na inclusão de variáveis e indicadores que permitam melhorar as informações neces-sárias para a definição de políticas e a desti-nação de recursos para os povos indígenas, incluindo um enfoque de gênero57.

(b) Incluir nos diagnósticos e nas estratégias de

redução da pobreza, informações demo-gráficas e indicadores de pobreza, ou proces-sos para obtê-los, desagregados por grupo ét-nico, incluindo, na medida do possível, as concepções indígenas de pobreza e bem-estar e processos participativos de validação de da-dos, bem como uma análise dos fatores de-terminantes específicos da pobreza indígena, desagregados por gênero, com os dados de li-nha de base correspondentes.

(c) Promover de forma sistemática a inclusão no

registro civil e a adequação do mesmo às par-ticularidades dos povos indígenas, para facili-tar o exercício dos direitos políticos e econô-micos e melhorar o enfoque de serviços, bene-fícios e outras ações do Estado de uma manei-ra socioculturalmente pertinente.

(d) Promover, para o cumprimento das metas de

desenvolvimento nos países, inclusive dos Ob-jetivos de Desenvolvimento do Milênio, a de-sagregação dos indicadores correspondentes e a adoção de indicadores socioculturalmente

57 Esse tema foi enfatizado em vários fóruns internacionais sobre questões indígenas, inclusive o Segundo e o Terceiro Fórum Perma-nente das Nações Unidas sobre Questões Indígenas, e nas Conferên-cias "Todos Contamos".

apropriados e específicos para grupos étnicos e povos indígenas.

(e) Apoiar os governos nacionais na formulação

de políticas públicas que reflitam o reconhe-cimento dos povos indígenas segundo os mar-cos jurídicos que, na maioria dos países, in-corporam a plurietnicidade e a multiculturali-dade.

(f) Apoiar a definição de medidas de inclusão da

população indígena em termos da aplicação de enfoques, planejamento e metodologias so-cioculturalmente pertinentes.

(g) Apoiar atividades para entender e visibilizar a

dinâmica rural-urbana, seus desafios e suas oportunidades, a fim de promover processos mais adequados e pertinentes de desenvolvi-mento indígena.

(h) Promover o conhecimento do conjunto de le-

gislação específico para os povos indígenas adotado pelos países da região e pelo direito público internacional, bem como os sistemas normativos e jurídicos indígenas, no marco do pluralismo jurídico da região.

(i) No âmbito institucional, local ou nacional nos

países, bem como internamente no Banco, promover a capacidade institucional do Ban-co, dos governos nacionais, dos povos indíge-nas e seus representantes, e dos atores rele-vantes do setor privado e da sociedade civil, incluindo a contratação de especialistas em temas indígenas e de peritos indígenas, a pre-paração e o uso de metodologias de análise sociocultural e de enfoques participativos que reconheçam a especificidade indígena, além do fomento de espaços de diálogo e negocia-ção de boa fé, políticas, mecanismos institu-cionais, estratégias, planos e projetos que re-flitam esses critérios.

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Potencializar a governança Com o objetivo de fortalecer, resgatar e promover, no escopo do marco das normas de direito aplicá-veis e da institucionalidade nacional, as condições que assegurem o livre exercício, por parte dos po-vos indígenas, do direito de determinar seu pró-prio futuro político, econômico, social e cultural e de participar do processo de governo democrático e descentralizado, o Banco procurará: (a) Fortalecer a capacidade dos povos indígenas

para a gestão e a governança de suas terras e seus territórios, de acordo com sua cos-movisão e seu conhecimento tradicional e su-as formas de organização socioeconômica e de controle social, superando modelos assis-tencialistas, quer estatais ou geridos por ou-tros intermediários. Para tanto, deverá levar-se em conta a necessidade de proteger as formas tradicionais de vida desses povos, procurando manter sua segurança alimentar e promovendo ações que melhorem a sustentabilidade ambi-ental e social baseada na promoção dos usos culturais sustentáveis da terra, coerentes com as prioridades indígenas e com a normativa nacional sobre a proteção de terras e ecossis-temas no contexto atual.

(b) Impulsionar, na esfera dos programas de des-

centralização, a adoção de esquemas para promover uma maior participação indígena no gasto público e o acesso de autoridades locais indígenas às parcelas do orçamento nacional destinadas a transferências locais: (i) promo-vendo o exame de esquemas para melhorar a gestão do orçamento público, tanto no âmbi-to nacional como no subnacional, a fim de fomentar o uso eficaz, eficiente, eqüitativo e transparente do investimento público nos ter-ritórios dos povos indígenas; (ii) fomentando o reconhecimento das formas de organização social e autoridades tradicionais dos povos in-dígenas para assumir responsabilidades de gestão local de suas comunidades, inclusive a gestão de recursos públicos; (iii) apoiando as instituições dos povos indígenas para efeitos de uma governança econômica adequada e

eqüitativa desses recursos e de sua economia em geral; e (iv) apoiando a institucionalização de estruturas socioculturalmente apropriadas para a articulação das autoridades indígenas locais com as autoridades dos diferentes ní-veis do Estado, especialmente os municípios.

(c) Continuar apoiando e fortalecendo os projetos

de desenvolvimento comunitário integrado, cuja perspectiva holística, transetorial, territo-rial, descentralizada e participativa se ajuste ao conceito de desenvolvimento com identi-dade, buscando soluções para os problemas institucionais, inclusive articulações entre comunidades e municípios, com base nas li-ções aprendidas nos projetos já aprovados (Quadro 6).

(d) Fortalecer a governança econômica dos povos

indígenas em termos da gestão de recursos públicos e da gestão administrativa e técnica de empresas e empreendimentos indígenas de forma transparente, inclusive por meio do re-investimento e da distribuição dos lucros des-sas atividades bem como do monitoramento e da sustentabilidade desses projetos (Quadro 7).

(e) Promover e fortalecer a capacidade institucio-

nal dos povos indígenas (particularmente suas organizações próprias com base comunitária), dos estados e de outros atores relevantes para responder às demandas indígenas, com ênfase no fortalecimento das capacidades locais e in-dígenas de planejamento, gestão e articulação, bem como na busca de apoio externo adi-cional (ONGs, fundações, empresas privadas, outros grupos indígenas, etc.), quando neces-sário e socioculturalmente pertinente.

(f) Fortalecer a capacidade dos povos indígenas

para o diálogo e a negociação com Estados, empresas privadas e outros intermediários (ONGs, agentes financeiros e outros). Para tanto, é necessário fortalecer a capacidade dos povos indígenas para planejar seu próprio de-senvolvimento e elaborar, apresentar e execu-tar projetos.

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Quadro 7. O Banco e o fomento da governança e do empresariado indígena

Governança econômica. No marco da cooperação técnica do Banco com empresas indígenas de hidrocarbone-tos da Amazônia equatoriana, se vem discutindo a liderança política indígena na gestão dessas empresas. Das li-ções aprendidas surgiu um consenso sobre a necessidade de separar a gestão técnica empresarial da liderança política, propondo-se como resultado a criação de um fideicomisso para o qual seriam transferidos os lucros lí-quidos das empresas, deduzindo-se os custos de operação e reinvestimento. A liderança política participaria des-se fideicomisso com base em regras estabelecidas por decisão das comunidades para o investimento em áreas como capacitação profissional, capital semente para novos empreendimentos e recursos de co-financiamento pa-ra redirecionar o investimento público para os territórios indígenas. Empresariado indígena. No projeto do Corredor Viário Norte da Bolívia, foram examinadas alternativas para a gestão de impactos sobre a comunidade Aymará de Yolosa. Em vez de limitar-se ao pagamento de uma indeni-zação, optou-se por promover um esquema de empoderamento empresarial da comunidade, criando-se um com-ponente para a constituição de uma empresa para operar um centro de comércio na rodovia que inclui uma esta-ção de serviço, uma oficina mecânica, um restaurante, um hotel e postos de venda de produtos locais e artesana-to. O componente inclui capacitação, acordos com comunidades e municípios vizinhos, um plano de remaneja-mento de moradias, a construção de uma escola, a identificação de sócios potenciais para a operação, além de transferência de tecnologia. Articulação de economias tradicionais indígenas com o mercado. Como parte do Projeto de Desenvolvimen-to da Fronteira Norte do Equador, está sendo executada uma cooperação técnica com a organização indígena CONFENIAE, que inclui três projetos qollqa para as comunidades indígenas da Amazônia equatoriana, com o objetivo de melhorar a eficiência da articulação com o mercado das economias tradicionais não monetárias ba-seadas em intercâmbios de reciprocidade, comuns aos povos indígenas da região. A operação inclui a criação de centros atacadistas que recolhem a produção das comunidades para vendê-la no mercado e, com esses recursos, financiar um varejo que abasteça as comunidades com produtos de mercado. O sistema baseia-se em avaliações do uso do dinheiro nas comunidades e de seus intercâmbios de reciprocidade. Além disso, inclui um sistema de contabilidade para realizar as equivalências, projetos de transformação secundária e comercialização no centro atacadista, além da prestação de serviços pelos sócios do sistema para compensar eventuais déficits de suas con-tas.

(g) Promover a institucionalização de mecanis-

mos e processos de informação, divulgação oportuna, consulta, negociação de boa fé e participação dos povos indígenas no âmbito da estrutura estatal de cada país, com vistas a cumprir os compromissos assumidos na esfera nacional e internacional relativos à consulta e à participação dos povos indígenas em temas, atividades e decisões que os afetem. Esses mecanismos e processos deverão levar em conta o princípio geral do livre consentimento prévio e informado dos povos indígenas, co-mo instrumento do exercício de seus direitos de “decidir suas prioridades no que concerne ao processo de desenvolvimento, na medida em que este afete suas vidas, suas crenças, su-as instituições e seu bem-estar espiritual, e as

terras que ocupam ou utilizam de alguma forma, bem como de controlar, na medida do possível, seu desenvolvimento econômico, social e cultural”58.

Melhorar o acesso aos serviços sociais e sua qualidade Para que os povos indígenas possam ter acesso aos serviços sociais (dentre os quais educação e saúde) em termos comparáveis com a população não indígena, é necessário reduzir as barreiras de acesso e aumentar a pertinência cultural dos servi-ços. 58 Ver Convênio 169 da OIT sobre Povos Tribais e Indígenas em Paí-ses Independentes, Artigos 6.2 e 7.1.

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(a) O Banco promoverá, na medida do factível e apropriado: (i) a eqüidade no gasto público para que os Estados invistam nos serviços destinados aos povos indígenas pelo menos o valor médio per capita correspondente; (ii) o fomento dos sistemas próprios e a adequação dos serviços às particularidades culturais dos povos indígenas como, por exemplo, o bilin-güismo e a interculturalidade nos serviços de educação e saúde, e a adequação cultural dos projetos de infra-estrutura; (iii) o acesso à in-fra-estrutura de comunicação e às tecnologias de informação e comunicação, especialmente em áreas geográficas isoladas; e (iv) o enfo-que de serviços em bairros indígenas urbanos, por meio de intervenções que resgatem e a-proveitem o capital social e cultural dessas comunidades, ajustem culturalmente a oferta de serviços às suas demandas e necessidades e busquem superar os fatores implícitos ou ex-plícitos que impedem o acesso eqüitativo des-sas comunidades aos serviços de saúde, edu-cação, habitação e saneamento, dentre outros.

(b) Na área da educação, o Banco continuará a-

poiando e fomentando projetos ou componen-tes de educação básica bilíngüe ou intercultu-ral e promovendo o acesso dos povos indíge-nas à educação secundária e superior. Para tanto, serão promovidas inovações e projetos-piloto de sistemas próprios de educação. Também será estimulada a criação de currícu-los bilíngües e interculturais que levem em conta conhecimentos e práticas culturais. Ou-tro tema de importância que contará com o apoio do Banco é a questão de escolas em ter-ritórios indígenas, considerando-se o potencial da educação à distância por meio das tecnolo-gias de comunicação e informação. Da mesma forma, o Banco apoiará o acesso de estudantes indígenas a universidades ou centros de ensi-no pós-secundários, bem como o desenvolvi-mento de modelos alternativos de educação superior, tal como universidades indígenas com currículos interculturais. Por último, o Banco financiará campanhas e medidas de sensibilização sobre temas indígenas na soci-edade nacional.

(c) Na área da saúde, o Banco apoiará, na medida do factível e apropriado, ações específicas que busquem preencher a lacuna quantitativa e qualitativa nos serviços de saúde recebidos pelos povos indígenas, por meio de interven-ções preferenciais e socioculturalmente apro-priadas, que levem em conta a importância de potencializar práticas tradicionais próprias, superar barreiras culturais de acesso aos ser-viços de saúde pública e articular os sistemas de saúde alopática e indígena. Além disso, nos projetos de saúde que apóia, o Banco dedicará atenção especial aos temas relacionados com a saúde materno-infantil, a mortalidade ma-terna e a formação de pessoal indígena local.

Melhorar as oportunidades para o desenvolvimento econômico É necessário potencializar as vantagens compara-tivas, reduzir e eliminar barreiras de acesso, au-mentar a pertinência cultural de oportunidades e serviços e fortalecer a capacidade de gestão dos povos indígenas para que possam participar, em igualdade de condições, das atividades econômi-cas. Para tanto, o Banco apoiará: (a) Programas que facilitem a identificação e o

desenvolvimento de oportunidades econômi-cas para homens e mulheres indígenas, espe-cialmente no aproveitamento dos recursos ou das vantagens comparativas das comunidades. Nesse contexto, o Banco facilitará o apoio à criação de empresas indígenas em áreas que incluam, sem limitar-se a elas: produtos e ser-viços para a auto-suficiência; serviços ambi-entais; gestão do patrimônio cultural; ecotu-rismo; arte e artesanato; produtos florestais, de mineração e hidrocarbonetos; agricultura e produção orgânica; conhecimentos e proprie-dade intelectual sobre biodiversidade; forne-cimento público ou privado de bens e serviços no âmbito de suas comunidades; processa-mento de alimentos; têxteis; transporte; pro-dução e gestão de água; infra-estrutura (por exemplo, eletrificação, saneamento e estradas rurais); e serviços de manutenção, bem como a articulação e o acesso aos mercados para produtos indígenas.

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(b) A redução da segmentação e da discrimina-ção nos mercados de trabalho, promovendo ações que permitam o fortalecimento e a apli-cação das normas e dos direitos aos mercados de trabalho e financeiros tanto formais como informais, para eliminar a discriminação e os obstáculos enfrentados pelos indígenas, espe-cialmente as mulheres indígenas, e promover o acesso de pessoas indígenas a cargos técni-cos e de gerência nas esferas pública e priva-da. Quando pertinente e tecnicamente factível, as iniciativas nessa área levarão em conta a flexibilização de procedimentos e condições para propiciar um acesso mais eqüitativo aos serviços e às oportunidades do mercado, bem como esquemas positivos de inclusão nas prá-ticas trabalhistas do proprio Banco. Essas me-didas devem estar centradas em programas de capacitação complementar para a eliminação de barreiras e no acesso preferencial a oportu-nidades educacionais e econômicas apropria-das, tendo-se em conta a especificidade socio-cultural dos indígenas.

(c) A facilitação do acesso aos serviços de comu-

nicação, informação e financiamento, inclusi-ve a adequação do crédito e de outros serviços financeiros convencionais, por meio de siste-mas de garantia pessoal e de usufruto, esque-mas financeiros e legais para superar as limi-tações de garantias sobre terras coletivas, mo-delos de participação no capital de empresas

indígenas, inclusive a constituição de empre-endimentos conjuntos (joint ventures), dentre outros. Além disso, quando viável e de acordo com as visões de desenvolvimento e gestão própria dos povos indígenas envolvidos, o Banco apoiará esquemas complementares aos serviços financeiros convencionais, fomen-tando mecanismos de intercâmbio próprios das economias tradicionais de reciprocidade, promovendo mercados internos indígenas de arrendamento da terra, intercâmbio de produ-tos entre pisos ecológicos e outros métodos não tradicionais de acesso ao crédito e ao ca-pital, que levem em conta as condições parti-culares dos povos indígenas (Quadro 8). No âmbito dos serviços financeiros, bem como nas áreas de acesso à informação em geral e da facilitação de trâmites comerciais e admi-nistrativos, o Banco apoiará inovações no uso, pelos povos indígenas, de tecnologias de in-formação e comunicação.

(d) A promoção do acesso ao capital de risco, in-

clusive o uso de remessas de emigrantes indí-genas para projetos de investimento nas co-munidades de origem, e a promoção de siste-mas de poupança e crédito, reduzindo os cus-tos de transação e criando oportunidades de desenvolvimento econômico que levem em conta as vantagens comparativas do patrimô-nio indígena e os vínculos socioculturais entre comunidades de emigrantes e de origem.

Quadro 8. Rumo a uma nova geração de projetos indígenas

Programas setoriais Desenvolvimento integral e transetorial Cobertura nacional Enfoque territorial Planejamento por especialistas Planejamento participativo Cultura como obstáculo Cultura como meio Mecanismo centralizado de prestação de serviços Articulação município-comunidade Processo de decisão intragovernamental Participação de ONGs e OCBs em decisões Fortalecimento de instituições governamentais Capacitação e fortalecimento de ONGs e OCBs Ordenamento territorial imposto Ordenamento territorial em consenso com a comunidade Titulação individual Opção de titulação comunitária Assistencialismo estatal Autogestão de recursos com mecanismos de controle social Execução de 4 a 6 anos Projetos multifase

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(e) A co-gestão indígena do manejo de recursos naturais e do meio ambiente em seus territó-rios e áreas adjacentes, incluindo recursos de hidrocarbonetos e mineração, em conformida-de com as normas do Art. 15 do Convênio 169 da OIT e a normatividade nacional, no que se refere: (i) à participação dos povos in-dígenas na gestão e no manejo sustentável dos recursos; (ii) à compensação justa; e (iii) sem-pre que possível, à participação dos povos in-dígenas nos benefícios gerados pelo aprovei-tamento desses recursos. Para tanto, o Banco apoiará os governos e os proponentes de pro-jetos na elaboração e adoção de esquemas de gestão das receitas geradas por essa participa-ção, a fim de incluir a transferência direta e transparente de recursos aos povos indígenas, tendo-se em conta os planos de desenvolvi-mento desses povos como critério fundamen-tal no planejamento dos investimentos das mesmas. O Banco também apoiará o fortale-cimento da institucionalidade indígena interna para a administração eficaz e o controle social dos recursos, bem como o desenvolvimento da capacidade dos povos indígenas para a ges-tão ambiental e iniciativas indígenas nas áreas de gestão, empresas e serviços ambientais.

(f) A promoção de projetos e componentes de

desenvolvimento comunitário integrado com enfoque territorial e altamente participativo, com ênfase no desenvolvimento da capacida-de de autogestão, planejamento participativo, incorporação de conhecimentos tradicionais e direitos indígenas, e desenvolvimento socioe-conômico e produtivo. Reconhecendo a com-plexidade da execução desses projetos, o Ban-co buscará sistematizar as modalidades de projetos multifase ou outras modalidades que permitam adequar seus instrumentos e proces-sos às realidades do trabalho com comunida-des e organizações indígenas, bem como a-proveitar projetos setoriais e iniciativas espe-cíficas para complementar esses projetos e fortalecer as áreas mais frágeis (Quadro 8).

Promover os direitos, a normatividade e a segurança jurídica Os povos indígenas possuem direitos específicos nos âmbitos nacional e internacional, bem como

sistemas jurídicos indígenas próprios (direitos próprios ou consuetudinários), de especial impor-tância no que se refere aos seus territórios e recur-sos naturais. Com o propósito de garantir a segu-rança jurídica dos povos indígenas e de suas terras e seus territórios, o Banco procurará: (a) Apoiar os governos nacionais e os povos indí-

genas na promoção do cumprimento das nor-mas de direito aplicáveis59 a povos e direitos indígenas em cada país. Isso incluirá, por par-te do Estado, o fortalecimento dos órgãos go-vernamentais responsáveis por assuntos indí-genas, a articulação dos sistemas jurídicos in-dígenas com os sistemas jurídicos nacionais para promover maior acesso e qualidade dos serviços de justiça, a eliminação da dis-criminação no acesso a outros serviços, e o fomento da capacitação e da institucio-nalização de mecanismos adequados à imple-mentação dos direitos indígenas.

(b) Nos projetos de cadastramento e administra-

ção de terras, promover: (i) a regularização dos territórios indígenas, o reconhecimento das formas consuetudinárias de posse e ma-nejo da terra, bem como do conceito de uso cultural da terra; e (ii) a implementação de es-quemas de co-gestão quando as áreas pro-tegidas se sobrepuserem a territórios indí-genas (Quadro 9). Além disso, o Banco apoia-rá os esforços e as iniciativas dos povos indí-genas para promover os mercados internos in-dígenas de arrendamento da terra e para facili-tar o uso da mesma como capital próprio ou como colateral para obter crédito ou outras formas de financiamento. O Banco buscará formas viáveis de apoio aos governos nacio-nais na implementação de processos de sanea-mento de terras indígenas invadidas e de pro-teção dessas terras diante do risco de novas invasões, inclusive programas de regulariza-ção, cadastros internos baseados no direito consuetudinário da posse da terra, mecanis-mos de solução de controvérsias e sistemas e-ficazes de monitoramento, dentre outros.

59 Ver parágrafo sobre direitos indígenas na Seção II desta estratégia.

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Quadro 9. Incorporação do conhecimento tradicional ao ordenamento territorial O projeto de Manejo Integrado de Ecossistemas Indígenas da América Central, financiado pelo Fundo para o Meio Ambiente Mundial (FMAM), busca fortalecer as comunidades indígenas para que contribuam para o manejo sustentável das áreas de amortecimento do Corredor Biológico Mesoamericano. Uma das estraté-gias do projeto está fundamentada na elaboração de planos de manejo territorial baseados na identificação dos padrões de uso cultural da terra, na qualificação de sua sustentabilidade, e em ajustes nas normas do di-reito indígena próprio necessárias para garantir o manejo sustentável dos seis ecossistemas incluídos no projeto, por meio da metodologia CLAN (análise de usos culturais do solo), desenvolvida pelo Banco.

(c) Promover a proteção da propriedade inte-

lectual dos povos indígenas sobre seus conhe-cimentos, suas artes e suas técnicas, apoiando os governos no fortalecimento dos marcos ju-rídicos correspondentes e na inclusão das sal-vaguardas necessárias nos projetos relevantes financiados pelo Banco.

(d) Nos projetos de proteção ou recuperação do

patrimônio histórico ou cultural, fomentar a participação dos povos indígenas no manejo desses recursos, quando estes estiverem rela-cionados com seu patrimônio ancestral. Além disso, em projetos de turismo em territórios indígenas, o Banco assegurará a participação indígena na gestão, nas receitas e nos benefí-cios de empresas turísticas, inclusive promo-vendo a criação de empreendimentos indíge-nas conjuntos (joint ventures).

(e) Em projetos com impactos adversos potenci-

ais sobre povos indígenas não contatados (também denominados “povos em isolamento voluntário”), requerer que esses projetos res-peitem o direito desses povos de permanecer nessa condição e viver livremente de acordo com sua cultura. Os projetos com potencial para afetar direta ou indiretamente esses po-vos, suas terras e seus territórios ou sua forma de vida deverão incluir as medidas sociocultu-ralmente adequadas necessárias para: (i) sal-vaguardar a integridade física, territorial60 e cultural individual e coletiva desses povos; (ii) reconhecer, respeitar e proteger suas terras e seus territórios, seu meio ambiente, sua saú-

60 Ver nota de rodapé 1.

de e sua cultura; e (iii) evitar contato com es-ses povos como conseqüência direta ou indi-reta do projeto. Nesse sentido, o Banco apoia-rá os esforços dos governos para regularizar os territórios dos povos não contatados e esta-belecer zonas de amortecimento, limitar o a-cesso a esses territórios, e desenvolver as me-didas e estratégias de monitoramento e assis-tência emergencial necessárias, buscando, prioritariamente, evitar o contato.

f) Nos projetos não destinados a comunidades

indígenas que possam afetá-las negativa-mente, fomentar instrumentos para identifi-car, evitar, mitigar e compensar os impactos negativos diretos, indiretos e cumulativos. Pa-ra tanto, será necessário assegurar a participa-ção efetiva dos povos afetados nos processos de avaliação de operações que os possam pre-judicar, na definição e execução dos progra-mas de mitigação e compensação e, sempre que possível, nos benefícios gerados pelos projetos. Antes de aprovar operações com im-pactos potenciais adversos particularmente significativos, o Banco exigirá evidência de que o proponente do projeto chegou a acordos satisfatórios e devidamente documentados com os povos afetados, ou obteve seu con-sentimento. Essa documentação deve respal-dar a viabilidade sociocultural do projeto, a juízo do Banco, nos termos estabelecidos no inciso (c) do parágrafo sobre salvaguardas na Seção VII desta estratégia. Em vista da vulne-rabilidade, da fragilidade institucional e da freqüente desvantagem comparativa no poder de negociação dos povos indígenas, o Banco buscará apoiar os processos de avaliação, con-

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sulta e negociação de boa fé requeridospara a aplicação dessas salvaguardas, com os meca-nismos e os recursos necessários para asse-gurar a qualidade do processo e a criação de condições que propiciem negociações de boa fé destinadas a obter o acordo ou o comsenti-mento61 dos povos ou grupos indígenas afeta-dos. Os proponentes de cada projeto serão res-ponsáveis pela realização desses processos, cuja qualidade será verificada pelo Banco. As partes deverão, ainda, estabelecer prazos ade-quados para permitir que esses processos se desenvolvam de forma eficaz.

(g) Levar em conta, nas iniciativas ou operações

regionais ou transnacionais, os possíveis im-pactos sobre povos indígenas transfrontei-riços, assegurando, quando for o caso, a con-sideração específica de suas preocupações por

61 Ver nota de rodapé 9.

meio de processos de consulta e negociação de boa fé, a partir das etapas iniciais e durante todo o ciclo do projeto. O Banco promoverá medidas e projetos especiais para facilitar a identificação de temas relacionados com os povos transfronteiriços e estimulará acordos binacionais e multilaterais que fomentem a regularização e a segurança jurídica da posse de terras e recursos, o controle territorial, a-lém de outros programas culturalmente ade-quados relacionados com direitos e priorida-des. Essas medidas promoverão o livre trânsi-to e o comércio, a saúde, a integração econô-mica, social e cultural entre os povos, bem como a proteção dos direitos desses povos so-bre os recursos paisagísticos, a biodiversida-de, o patrimônio cultural, o conhecimento tra-dicional e os recursos fluviais, costeiros e ma-rinhos.

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VII. Ações de implementação Esta estratégia será implementada por meio (i) dos mecanismos do Banco para o diálogo com os paí-ses; (ii) dos processos de preparação e negociação da estratégia de país e, quando pertinente, de pro-gramação da carteira do Banco, conforme aplicá-vel; (iii) dos processos de identificação, elabora-ção, execução, monitoramento e avaliação de pro-jetos; (iv) da capacitação e conscientização —no que se refere aos objetivos, alcances e instrumen-tos da política e da estratégia— do pessoal do Ban-co, das entidades governamentais, particularmente dos organismos executores de projetos do Banco e das agências especializadas em temas indígenas, bem como das organizações, comunidades de po-vos indígenas e autoridades tradicionais; (v) da implementação de salvaguardas para prevenir, mi-tigar, compensar ou corrigir os efeitos adversos potenciais de operações do Banco sobre os povos indígenas e seus direitos; e (vi) da adoção de pro-cessos de consulta, negociação de boa fé e partici-pação dos povos indígenas nos mecanismos de implementação desta estratégia e da Política ope-racional sobre povos indígenas. O Comitê de Pro-gramação da Administração aprovará as Guias operacionais necessárias para orientar o pessoal do Banco na implementação desta estratégia e da política operacional. Diálogo com os países O Banco apoiará o fortalecimento dos espaços in-terculturais de diálogo e negociação de boa fé nos âmbitos nacional, regional e internacional entre os povos indígenas, os governos nacionais, o setor privado e os demais setores da sociedade civil, a fim de contribuir para a adoção de políticas, mar-cos jurídicos, planos e projetos que promovam o desenvolvimento com identidade, facilitem a solu-ção de controvérsias, e fomentem uma cultura de maior conhecimento, respeito mútuo e coopera-ção. Nesse sentido, o Banco: (a) Aproveitará os mecanismos e fóruns de diá-

logo existentes e incrementará a coordenação temática interna de suas unidades, bem como

a coordenação com organismos externos, no que se refere aos temas indígenas, conduzin-do, para tanto, os estudos e as consultas ne-cessários.

(b) No âmbito de seu apoio às iniciativas regio-

nais de integração comercial e de infra-estrutura (tal como o Plano Puebla Panamá, o IIRSA, a Comunidade Andina, e os acordos de livre comércio), promoverá a adequação aos padrões internacionais, dos procedimentos de identificação e gestão de impactos ambien-tais e socioculturais diretos e indiretos (Qua-dro 10).

(c) Intensificará seus esforços no sentido de con-

tribuir para um processo de harmonização de seus critérios e procedimentos com os de ou-tros organismos internacionais, coordenará e apoiará as instituições regionais que promo-vem o diálogo e a coordenação entre os go-vernos e os povos indígenas, tal como o Fun-do para o Desenvolvimento dos Povos Indí-genas da América Latina e do Caribe (Fundo Indígena).

(d) Promoverá estruturas culturalmente apropria-

das de trabalho nas diferentes esferas gover-namentais, adequadas às necessidades dos po-vos indígenas.

Medidas estratégicas para incorporar a temática indígena (mainstreaming ou inclusão tranversal) No âmbito dos estudos de país, dos diagnósticos de pobreza, e dos processos de diálogo e negocia-ção com os governos nacionais, o Banco promo-verá, quando pertinente, uma inclusão mais siste-mática da especificidade dos povos indígenas e um maior enfoque em suas demandas e necessi-dades, com o objetivo de:

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Quadro 10. A participação indígena no nível regional: o Conselho Consultivo

Indígena para un diálogo no âmbito do Plano Puebla Panamá Durante 2002 e 2003, com o apoio do Banco, o Conselho Indígena Centro-americano (CICA) realizou uma con-sulta para estabelecer uma estratégia de desenvolvimento indígena na América Central. Com esses insumos, CICA apresentou uma estratégia conhecida como o documento Abya Yala (que significa América na língua tu-le–kuna), na qual expôs as condições para sua participação no Plano Puebla Panamá (PPP), bem como propostas de medidas para mitigar e manejar os impactos negativos, além de várias iniciativas proativas na área de segu-rança jurídica, educação superior, proteção de direitos e sensibilização da sociedade não indígena para a cons-trução de sociedades pluriculturais. A proposta do CICA para a incorporação de um comissariado indígena não foi aceita e, em seu lugar, foi criado o Grupo Assessor de Povos Indígenas e Etnias (GAPIE), com funções con-sultivas, e constituído pelas instituições governamentais sem representação indígena direta. Após quase dois a-nos de negociações, chegou-se a um acordo segundo o qual os povos indígenas criariam um conselho consulti-vo autônomo, o que permitirá retomar a discussão do documento Abya Yala e de outras propostas indígenas, bem como restabelecer a articulação institucional das iniciativas contempladas.

(a) Realizar estudos e dialogar com os governos

nacionais, buscando aumentar a presença de atividades voltadas para os povos indígenas ou com pertinência cultural na carteira de empréstimos, incluindo projetos empresariais e de desenvolvimento integral inovadores, tendo em conta as limitações e vantagens comparativas do Banco e o contexto de de-senvolvimento de cada país e de seus povos indígenas.

(b) Buscar a mobilização de recursos adicionais

de financiamento de caráter não reembolsável ou contingente para projetos-piloto, demons-trativos, ou de alto impacto, priorizando re-cursos e criando alianças estratégicas com en-tidades privadas (fundações, empresas e ou-tras), inclusive organizações indígenas de paí-ses não mutuários.

(c) Para superar as limitações de prazo e conti-

nuidade que caracterizam os projetos conven-cionais, quando possível e pertinente se ade-quará o instrumento de projeto a uma pers-pectiva de desenvolvimento indígena como processo, usando as modalidades dos projetos multifase, dos projetos de inovação do meca-nismo de preparação de projetos, e de Pro-gramas de Enfoque Setorial Amplo (SWAP) e Linhas de Crédito Condicionais para Projetos de Investimento (CCLIP), dentre outros.

(d) Identificar ou criar mecanismos específicos para os povos indígenas, particularmente para facilitar o financiamento direto às comunida-des, tais como associações estratégicas com o setor privado, linhas temáticas de financia-mento e fundos de capital-ponte.

Elaboração, execução, monitoramento e avaliação de projetos Quando pertinente, o Banco incluirá sistematica-mente a temática indígena em todas as fases de seu ciclo de projetos. Para promover a qualidade dos projetos, o Banco desenvolverá ferramentas metodológicas, guias operacionais e boas práti-cas, além das já existentes, para orientar os espe-cialistas do Banco e dos organismos executores. Esses instrumentos metodológicos integrarão as guias para salvaguarda e meio ambiente, atual-mente em fase de preparação. Dentre os referidos instrumentos destacam-se: (a) Procedimentos e critérios para inclusão nos

processos de identificação, elaboração, execu-ção e avaliação de projetos, especialmente: (i) a identificação prévia dos projetos que apre-sentem riscos e oportunidades para os povos indígenas; (ii) os diagnósticos socioculturais elaborados de forma participativa com a po-pulação afetada; (iii) o enfoque territorial, ins-titucional ou temático voltado para iniciati-vas-piloto em áreas emergentes, tais como

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empreendimentos conjuntos indígenas (joint ventures), apoio a sistemas de saúde intercul-tural, uso de tecnologias da informação, aces-so à educação superior e articulação de redes urbano-rurais, dentre outros; (iv) a inclusão da pertinência sociocultural, por meio, dentre ou-tros recursos, da capacitação de organizações, profissionais e líderes indígenas para a elabo-ração e apresentação de projetos; e (v) a ava-liação de impactos e riscos e a mitigação dos possíveis impactos negativos que as operações do Banco possam gerar sobre os povos in-dígenas e seus direitos.

(b) Sistematização da inclusão transversal e so-

cioculturalmente apropriada, quando per-tinente, das necessidades e demandas dos po-vos indígenas nos projetos setoriais de apoio à produção, ao manejo ambiental, à infra-estrutura básica (eletrificação, água e sanea-mento, estradas vicinais) e de serviços básicos (educação, saúde, habitação), inclusive a ade-quação institucional e a articulação intercul-tural.

(c) Adequação de procedimentos, quando possí-

vel e tecnicamente viável, para execução, ele-gibilidade e contratação que reflitam as reali-dades sociais e econômicas dos povos indíge-nas, facilitem a informação sobre a disponibi-lidade de recursos financeiros acessíveis aos povos indígenas, simplifiquem processos con-tábeis e administrativos e promovam a ação afirmativa para assegurar a igualdade de con-dições para a participação de indígenas nos projetos como beneficiários, fornecedores e prestadores de serviço, de forma coerente com os procedimentos de licitação do Banco.

(d) Avaliações do desempenho das atividades e

operações do Banco relacionadas aos objeti-vos desta estratégia, aos requisitos da Política operacional sobre povos indígenas e, em ge-ral, às metas de “desenvolvimento com iden-tidade”, conforme os indicadores específicos previstos na seção VIII desta estratégia.

Capacitação e conscientização O Banco implementará medidas de disseminação e capacitação, incluindo aportes financeiros, para

dar a conhecer a temática indígena dentro da insti-tuição e nos setores público e privado dos países da região, bem como para aumentar o grau de co-nhecimento e sensibilidade de seu pessoal e do pessoal de suas contrapartes no que se refere à di-versidade cultural dos povos indígenas, que inclu-am: (a) Capacitação dos povos indígenas para o diá-

logo e a negociação e para sua participação na conscientização da população não indígena, a fim de obter uma melhor compreensão da rea-lidade, das demandas e das perspectivas dos povos indígenas.

(b) Fortalecimento da capacidade interna do

Banco por meio da diversificação de seus re-cursos humanos, de uma formação adequada de seu pessoal na temática indígena, do forta-lecimento da capacidade técnica das Repre-sentações, da melhoria dos sistemas de moni-toramento e avaliação da carteira de projetos, de incentivos para seu pessoal, e da incorpo-ração de funcionários indígenas a cargos téc-nicos e gerenciais, dentre outros.

(c) Programas de treinamento no nível técnico,

incluindo o Instituto Interamericano para o Desenvolvimento Social (INDES), para o pes-soal dos governos, dos povos e organizações indígenas e de entidades do setor privado, sempre que possível com a participação de instrutores indígenas.

(d) Atividades de promoção de intercâmbios cul-

turais e melhoria de relações mútuas entre a sociedade indígena e não indígena nos âmbi-tos locais, nacionais e internacionais, incluin-do espaços de difusão maciça (rádio, publica-ções, páginas na Internet e outros) e fomento de intercâmbios entre indígenas da América Latina e do Caribe e de países não mutuários.

Salvaguardas Para ser elegíveis para financiamento pelo Banco, as operações devem cumprir as normas de direito aplicáveis, ajustar-se às salvaguardas estabeleci-das na Política operacional sobre povos indígenas, e ser coerentes com as disposições das demais po-líticas do Banco. Conseqüentemente, o Banco

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Page 52: Política operacional sobre povos indígenas e Estratégia

adotará as medidas necessárias para assegurar que suas atividades e operações não prejudiquem ou menosprezem os povos indígenas e seus direitos. Para tanto, de acordo com os requisitos da Política operacional sobre povos indígenas, o Banco im-plementará as seguintes ações: (a) No âmbito dos processos de revisão da quali-

dade social e ambiental dos projetos, fortale-cerá os padrões e as guias relacionados à per-tinência e à viabilidade sociocultural para evi-tar, mitigar, compensar ou subsanar os impac-tos negativos e proteger os direitos e os inte-resses legítimos dos povos indígenas. Esses padrões e guias levarão em conta as perspec-tivas dos povos indígenas e serão integrados aos procedimentos ambientais e de salvaguar-da do Banco por meio de guias operacionais específicas, aprovadas pelo Comitê de Pro-gramação da Administração.

(b) Estabelecerá critérios e mecanismos específi-

cos para salvaguardar os povos indígenas não contatados —também denominados “povos em isolamento voluntário”—, os povos que habi-tam zonas transfronteiriças e aqueles em ou-tras situações de especial vulnerabilidade, e seus direitos.

(c) Implementará mecanismos de consulta, nego-

ciação de boa fé e acordos ou consentimento, nos termos descritos no parágrafo seguinte sobre mecanismos de consulta e participação. Como parte desses processos, o Banco adotará procedimentos e guias específicas para: (i) i-dentificar as operações cujos impactos poten-ciais positivos ou negativos sobre os povos indígenas gerem a necessidade de obter o a-poio, o acordo ou o consentimento desses po-vos para as atividades envolvidas; e (ii) esta-belecer o procedimento pelo qual os propo-nentes de projetos ou atividades e o pessoal do Banco devam obter, verificar e comprovar que esse acordo ou consentimento é suficien-te para respaldar o juízo do Banco sobre a vi-abilidade sociocultural de cada operação. Nesse contexto, a viabilidade sociocultural de um projeto requererá: (i) antecedentes verifi-cáveis que demonstrem a implementação de um processo de negociação de boa fé; (ii) evi-dência do cumprimento das normas de direito

aplicáveis, inclusive a normativa nacional, normas constitucionais e os Artigos 6 e 7 do Convênio 169 da OIT62; (iii) evidência de um fluxo líquido de benefícios para as comunida-des indígenas afetadas; e (iv) amplo apoio por parte dos indígenas afetados.

Mecanismos de consulta e participação O Banco implementará mecanismos que assegu-rem que os povos indígenas participem antecipada e efetivamente nas etapas pertinentes daquelas o-perações e atividades do Banco com potencial pa-ra afetá-los negativamente de forma significativa. Da mesma forma, assegurar-se-á que esses povos não sejam excluídos intencional o involunta-riamente daqueles projetos ou atividades com po-tencial para beneficiá-los significativamente. Nes-se sentido, o Banco: (a) Requererá diagnósticos, revisões por especia-

listas e, sempre que possível, processos de consulta e negociação de boa fé antecipados e socioculturalmente apropriados, destinados a identificar os indígenas afetados e seus repre-sentantes genuínos, bem como a identificar e avaliar os benefícios e impactos potenciais sobre os povos ou grupos indígenas.

(b) Em conformidade com a nova Estratégia para

a participação da sociedade civil nas ativida-des do Banco, que dedica especial atenção às oportunidades e aos requisitos para a partici-pação dos povos indígenas, promoverá a in-clusão de representantes indígenas para a consulta nas etapas iniciais do ciclo do proje-to, inclusive a constituição de conselhos ou espaços de diálogo com representantes dos povos indígenas, quando pertinente (Quadro 11).

(c) Nas operações independentes especificamente

voltadas para beneficiários indígenas, requrerá a obtenção do acordo ou do consentimento dos povos ou grupos indígenas afetados.

(d) Nas operações que incluem medidas específi-

cas para povos indígenas (mainstreaming ou inclusão positiva), requererá processos socio-

62 Conforme sua vigência em cada país.

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Page 53: Política operacional sobre povos indígenas e Estratégia

culturalmente apropriados de consulta e nego-ciação de boa fé com os povos indígenas afe-tados.

(e) Nas operações que afetem os povos indígenas

de forma adversa e particularmente significa-tiva, requererá acordos que demonstrem a vi-abilidade sociocultural do projeto.

(f) Segundo a natureza e a intensidade dos im-

pactos ou benefícios potenciais, aplicará os procedimentos apropriados para consulta, ne-gociação de boa fé, acordo ou consentimento e participação nas etapas subseqüentes do de-senvolvimento de projetos, tais como a elabo-ração do projeto e de alternativas, a inclusão de planos de mitigação, compensação ou de-senvolvimento indígena, conforme o caso, a implementação, o monitoramento e a avalia-ção para fomentar critérios comuns com os povos indígenas no que se refere aos projetos e à apropriação, pelos mesmos, dos processos e resultados que se busca promover.

(g) De acordo com suas políticas e seus proce-

dimentos, facilitará o financiamento para que

os povos indígenas realizem seus próprios processos de consulta.

O proponente do projeto ou da atividade terá a responsabilidade básica de atender a esses requisi-tos63. Os proponentes e os povos indígenas afeta-dos pelo projeto poderão solicitar o apoio logísti-co, financeiro ou de facilitação do Banco. Nesse sentido, o Banco buscará priorizar recursos e ins-talar programas de resposta rápida como parte do Mecanismo de Preparação de Projetos, além de fundos temáticos e outras fontes existentes ou no-vas de apoio. Nesse processo, o Banco levará em conta a necessidade de superar desequilíbrios de poder e recursos entre as partes. O pessoal do Banco encarregado da operação ou atividade terá a responsabilidade de orientar, apoiar quando for possível, e verificar, à satisfação do Banco, a qua-lidade dos processos e a legitimidade e viabilidade dos resultados e acordos alcançados. A qualidade dos processos e resultados e o cumprimento dos critérios de viabilidade serão validados pelos me-canismos institucionais de controle de qualidade geral, social e ambiental estabelecidos pela Admi-nistração do Banco.

Quadro 11. Análise de sujeitos sociais, consulta e participação

Em 1998, para o Programa de desenvolvimento sustentável do Darién, o Banco concebeu uma estratégia para identificar os sujeitos sociais por meio da análise de usos culturais da terra e de dinâmicas socioculturais, encon-trando doze grupos culturais diferentes de indígenas, afro-descendentes e camponeses. Essa análise permitiu i-dentificar suas formas de autoridade, enfocar os eventos de consulta com seus representantes, elaborar planos de manejo territorial participativos e adequados aos seus padrões de uso, e criar um esquema de execução do pro-grama por demanda, “empoderando” as comunidades beneficiárias. O custo desse processo, apenas, representou 8% do valor total de preparação do programa. No transcorrer to tempo e a partir das experiências do Darién, a Divisão de Meio Ambiente e Recursos Naturais do Departamento Regional de Operações 2 (RE2/EN2) vem depurando essa metodologia em outros projetos, tais como os programas de desenvolvimento da Bacia do Canal do Panamá, Bocas del Toro, Trifiño, Sixaola, a Re-gião Huetar e a Região da Reserva da Biosfera Maya. Essa metodologia sistematiza em uma etapa antecipada, o diagnóstico sociocultural dos atores sociais, sua repre-sentação e suas agendas, as consultas e os espaços de negociação de boa fé e participação comunitária, bem co-mo a articulação com os atores institucionais na execução do projeto.

63 Nos países que contam com órgãos governamentais especializados na temática indígena e na proteção dos direitos indígenas, o propo-nente do projeto buscará a participação desses órgãos em todas as e-tapas do processo de consulta.

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Em seus projetos e programas, o Banco promo-verá a institucionalização da participação indíge-na. Nesse sentido, está prevista a criação de um Conselho Assessor Indígena no âmbito da Sede do Banco, que se reunirá periodicamente com o obje-tivo de acompanhar a implementação desta estra-tégia e da Política operacional sobre povos indí-genas. Além disso, o Banco promoverá, quando pertinente, a constituição de entidades de assesso-ramento indígenas ou outros espaços de diálogo nas Representações, a fim de monitorar e acom-panhar os projetos que beneficiem ou possam afe-tar significativamente os povos indígenas. Essas entidades de assessoramento, no nível de cada pa-ís, poderão ser complementadas por outras formas

de participação em apoio ao processo de prepara-ção e execução de operações específicas, confor-me necessário. No caso de programas regionais, o Banco promoverá a criação de mecanismos de consulta para facilitar o diálogo entre os povos in-dígenas e os países envolvidos. As entidades de assessoramento devem ser constituídas, principal-mente, por representantes designados pelas orga-nizações indígenas dos países mutuários. Sem pre-juízo do que precede, as entidades poderão incluir especialistas e profissionais indígenas que não es-tejam diretamente ligados a autoridades tradicio-nais e cujo conhecimento e experiência possam contribuir para os temas em discussão.

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VIII. Indicadores de desempenho Os indicadores de produto, resultado e impacto para avaliar o êxito da implementação desta estra-tégia deverão ser coordenados com os instru-mentos para medir a eficácia do desenvolvimento que estão sendo preparados pelo Banco, inclusive o fortalecimento dos processos de monitoramento e avaliação de projetos. Ao mesmo tempo, os in-dicadores relativos a esta estratégia devem incluir os indicadores sui generis apropriados à realidade de cada povo ou grupo indígena em seu respectivo contexto nacional, e estar vinculados, no que for pertinente, à medição do avanço na consecução dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, e incorporados ao Plano de Ação de Prazo Médio para a Eficácia no Desenvolvimento (MTAP, na sigla em inglês). Os indicadores incluirão tanto medidas quantitativas como qualitativas que le-vem em conta as dificuldades metodológicas, tais como a atribuição de resultados às ações do Banco e a causalidade entre insumos, resultados e impac-tos. Os indicadores de produtos que mediriam os a-vanços do Banco na geração dos produtos reque-ridos para a implementação da estratégia poderão incluir: (a) A adoção de um plano de ação para a imple-

mentação da Política operacional sobre povos indígenas e da Estratégia para o desenvolvi-mento indígena, no qual se estabeleçam a li-nha de base, o processo e a periodicidade de medição dos indicadores.

(b) A inclusão no processo de elaboração das es-

tratégias de país, sempre que pertinente, de estudos para o diagnóstico e a análise da te-mática indígena no país.

(c) A avaliação da evolução da carteira de proje-

tos, em termos quantitativos e qualitativos, que refletem maior inclusão dos temas indí-genas.

(d) O aumento dos recursos não reembolsáveis, tanto para cooperação técnica como para co-financiamento de projetos voltados para a po-pulação indígena.

(e) O aumento da participação dos povos indíge-

nas nos órgãos de consulta, diálogo e partici-pação propiciados pelo Banco nos países da região.

(f) O aumento da participação indígena nas soli-

citações, elaborações e execuções de projetos. (g) A criação ou ampliação nas Representações,

quando pertinente, de espaços de diálogo en-tre o Banco e os povos indígenas, para fins de monitoramento e acompanhamento das medi-das e dos projetos que os beneficiem ou afe-tem negativamente.

(h) A criação, no âmbito da sede do Banco, de um

Conselho Assessor Indígena encarregado de assessorar o Banco na implementação da Polí-tica operacional sobre povos indígenas e da Estratégia para o desenvolvimento indígena.

Os indicadores de resultados diretos das ativida-des do Banco que mediriam a eficácia dos produ-tos na consecução dos objetivos da estratégia in-cluirão: (a) Informação sistemática, por meio dos marcos

lógicos ou instrumentos semelhantes, que re-flita os avanços na consecução dos objetivos e eixos estratégicos definidos na seção VI desta estratégia.

(b) Informação sobre os projetos com impactos

potencialmente negativos sobre povos indíge-nas, que demonstrem a eficácia das orienta-ções sobre salvaguardas enunciadas na estra-tégia e na política.

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Os Indicadores de impacto que mediriam o pro-gresso alcançado, no contexto de cada país, na consecução do propósito final da estratégia e da política, ou seja, “desenvolvimento com identida-de”, fornecerão informações sobre variáveis-chave que indiquem melhoria nas condições de vida da população-meta, e incluirão indicadores de acesso e adequação cultural de serviços, prote-ção da integridade cultural e articulação entre o “desenvolvimento com identidade” e o desenvol-vimento nacional e regional, tais como: (i) aumen-to da segurança alimentar e da produção agrícola das comunidades indígenas em geral; (ii) melho-ria dos indicadores de saúde e do número de pro-gramas que reconheçam a medicina tradicional indígena e busquem sua articulação com a medi-cina alopática; (iii) acesso e qualidade (bilin-güismo e interculturalidade) à educação em geral, particularmente à educação superior; (iv) segu-rança territorial, tais como reconhecimento, de-marcação, saneamento e implementação de direi-tos; (v) criação de empresas indígenas rentáveis e articulação e acesso de produtos indígenas ao mercado; (vi) melhoria no acesso à justiça e arti-culação dos sistemas jurídicos indígenas com os nacionais; (vii) qualidade, controle e acesso dos recursos naturais em áreas de interesse indígena; (viii) acesso a espaços para a prática da espiritua-lidade indígena; (ix) criação de instrumentos fi-nanceiros e empresariais adequados às economias tradicionais e interculturais indígenas; (x) inova-

ções na economia intercultural; (xi) proteção e promoção do conhecimento tradicional; (xii) cria-ção de organismos de desenvolvimento e de pes-quisa indígena nos países, com participação indí-gena ativa e eficaz; (xiii) qualidade do capital so-cial nas comunidades e organizações dos povos indígenas; (xiv) institucionalização da participa-ção indígena nos processos de toma de decisões que os afetem; (xv) investimento real e distri-buição de benefícios entre indígenas e não indíge-nas para os projetos em áreas indígenas; e (xvi) consecução dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, desagregados para a população indígena quando possível e pertinente. Esta estratégia será avaliada ao final de cinco anos de sua aprovação em todos os aspectos rela-cionados com o desenvolvimento com identidade dos povos indígenas, por meio de avaliações inde-pendentes que incluirão consultas aos governos nacionais, aos povos indígenas, ao setor privado e à sociedade civil. O Banco adotará instrumentos e procedimentos de avaliação que propiciem uma participação adequada dos povos indígenas na i-dentificação de indicadores e nos processos de a-valiação relacionados com a implementação da política e da estratégia. Os resultados das avalia-ções serão apresentados à Diretoria Executiva e divulgados conforme a Política do Banco sobre a disponibilidade de informação (OP-102).

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Anexo

Indicadores socioeconômicos e de pobreza População indígena As estimativas do número de pessoas indígenas variam conforme a fonte de informação. Em alguns casos, os censos nacionais tendem a subestimar a população indígena devido a problemas relacionados com o isolamento geográfico, com as limitações metodológicas no desenvolvimento dos instrumentos censitá-rios e em sua aplicação, e com a falta de confiança nos órgãos censitários. A tabela 3 apresenta as estima-tivas da população indígena por país, com base na combinação de várias fontes.

Tabela 3. Estimativa da população indígena na

América Latina (em milhares)

População População nacional

População indígena

Porcentagem

Bolívia 8.329 5.914 71 Guatemala 12.640 8.342 66 Peru 27.013 12.696 47 Equador 12.920 5.556 43 Belize 250 47 19 Honduras 6.250 938 15 México 100.350 14.049 14 Chile 15.211 1.217 8 El Salvador 6.123 429 7 Guiana 697 56 8 Panamá 2.808 168 6 Suriname 431 26 6 Nicarágua 4.813 241 5 Paraguai 5.586 168 3 Colômbia 39.686 794 2 Venezuela 23.543 471 2 Costa Rica 3.644 36 1 Argentina 36.955 370 1 Trinidad e Tobago 1.075 12 1 Brasil 166.113 332 0 Uruguai 3.278 1 0 Total 477.715 51.851

11

Fontes: Roldán, R. 2003. OIT, BID, TCA e outras fontes.

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Indicadores de pobreza Segundo estudos realizados pelo BID e o Banco Mundial, as taxas de pobreza para a população indígena são muito mais altas do que para a população não indígena. Além disso, na maioria dos países sobre os quais há dados disponíveis, os níveis de pobreza permaneceram altos durante a última década. Por outro lado, a população indígena é menos vulnerável as crises. A tabela 4 mostra que no caso de Equador, Gua-temala, Peru, México e Bolívia (urbano), a porcentagem de indígenas que vivem abaixo da linha de po-breza é muito superior àquela dos não indígenas e que na última década, mesmo quando em quatro desses cinco países a taxa de pobreza da população não indígena permaneceu constante ou apresentou uma ligei-ra melhora, a taxa de pobreza para os indígenas se manteve estável (ou piorou ligeiramente). Portanto, a lacuna entre indígenas e não indígenas aumentou em quatro dos cinco países. Em particular, as mulheres indígenas se encontram nos estratos mais pobres e marginalizados, apresentando níveis inferiores de edu-cação e renda, maior morbidade e mortalidade, além de altas taxas de mortalidade materno-infantil (Tabe-la 5).

Tabela 5. Relação de médias salariais por emprego principal

País Salário Mulheres Homens Todos Bolívia Indígenas/não indígenas 41.4 42.9 42.4 Guatemala Indígenas/não indígenas 50.3 48.5 50.0 Peru Indígenas/não indígenas 53.7 62.7 56.7 Fonte. Duryea S. e Genoni, María Eugenia. Ethnicity, Race and Gender in Latin American Labor Markets. BID, 2004, baseado nas pesquisas domiciliares de 1998 e 1999.

Tabela 4. Porcentagens de pobreza da população indígena x a não indígena

Ano anterior Ano seguinte

Indígena Não indígena Indígena Não indígena Bolívia urbano (1989-2002) 62 58 57 52 Equador (1994-2001) 80 58 80 60 Guatemala (1989-2000) 95 78 81 61 México (1992-2002) 90 52 90 51 Peru (1994-2000) 62 61 63 62 Fonte: Patrinos, H. e Hall G. Indigenous People: Poverty and Human Development in Latin America, 1994-2004. Relatório preliminar, Banco Mundial. Dados baseados nas linhas nacionais de pobreza.

Indicadores de educação Como se pode constatar nos gráficos 4 e 5 seguintes, houve algum progresso no acesso à educação, mos-trando, no caso dos países que dispõem de dados confiáveis, melhorias nos indicadores de escolaridade e na cobertura da educação pública básica para a população indígena (Gráfico 4). A partir dos anos 1980, houve uma forte expansão dos serviços de educação bilíngüe, adotada, com raríssimas exceções, como política pública nos países da região64. De fato, em 2004, 18 países haviam implementado programas de

64 Igualdade com dignidade, relatório anual UNICEF, 2004.

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educação intercultural bilíngüe, em comparação com apenas seis países nos anos 197065. Apesar dos a-vanços na escolaridade para indígenas e não indígenas, persiste uma diferença muito acentuada no nível de escolaridade entre os dois grupos, embora alguns países registrem avanços na diminuição dessa lacuna (Gráfico 5). Entretanto, persiste um problema muito grave de repetência e evasão escolar, bem como de baixa qualificação dos professores, que é mais sério entre crianças indígenas que entre as crianças não indígenas. Essa desproporção é ainda mais acentuada entre homens e mulheres indígenas, com as mulhe-res indígenas, apesar de avanços significativos em alguns países, em geral exibindo as piores taxas de a-nalfabetismo e escolaridade.

Fonte: Patrinos, H. Banco Mundial. Dados preliminares, 2005.

Gráfico 4. Média de anos de escolaridade de adultos

Faixa3,7 años

Faixa3,2 años

0

2.5

5

7.5

10

12.5

Bolívia 2002 Guatemala 2000 México 2002 Equador 2001

Indígenas Não indígenas

Faixa3,7anos

Faixa2,3 anos

Faixa3,2 anos

Faixa3,3 anos

Indicadores de saúde A situação de saúde dos povos indígenas é inferior à de outros segmentos da população, com índices de mortalidade e morbidade muito superiores aos da população não indígena. A lacuna em termos de acesso aos serviços de saúde pública é igualmente grande, enquanto em apenas três países (Bolívia, México e Pe-ru) há um reconhecimento e um apoio por parte do Estado à medicina tradicional indígena66. A mortali-dade infantil é especialmente alta entre a população indígena. Com exceção do Chile, em todos os países com população indígena superior a 5% as taxas de mortalidade oscilam entre 26 e 62 por cada 1.000 nas-cidos vivos (em comparação a uma taxa média de 25 por 1.000 em toda a população da América Latina). Em países como México, Bolívia e Equador, a mortalidade infantil indígena é aproximadamente o dobro

65 Abram M., Estado da arte da educação bilíngüe intercultural na América Latina, versão preliminar, SDS/IND, agosto de 2004; Patrinos, H. e Hall G., Indigenous People: Poverty and Human Development in Latin America, 1994-2004. Relatório preliminar, Banco Mundial. 66 UNICEF, Igualdade com dignidade, 2004.

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Page 60: Política operacional sobre povos indígenas e Estratégia

da não indígena. Igualmente preocupante é a alta taxa de mortalidade materna entre indígenas, muito mais elevada do que entre mulheres que não têm ascendência indígena (por exemplo, em Honduras, a mortali-dade materna oscila entre 190 e 255 por 100.000 nas comunidades com alta concentração indígena, em comparação a uma média nacional de 147 por 100.000; na Bolívia e no Peru, a taxa do mesmo índice va-ria entre 390 e 270 por 100.000 em zonas indígenas, em comparação a uma taxa média na região de 125 por 100.000)67. A taxa de desnutrição infantil também é alta. No Equador, a desnutrição entre crianças indígenas é 1,7 vezes maior do que entre crianças sem ascendência indígena. Na Guatemala, a desnutrição crônica é de 67,8% entre crianças indígenas, em comparação a 36,7% entre crianças não indígenas.

Fonte: Duryea, S. Measuring Social Exclusion, Departamento de Pesquisa, BID, 2001.

Gráfico 5. Diferenças em retorno da educaçãoMulheres indígenas x não indígenas

-0.05

-0.04

-0.03

-0.02

-0.01

0

0.01

PeruBolíviaGuatemala

Educação primária

-0.03

-0.025

-0.02

-0.015

-0.01

-0.005

0

PeruBolíviaGuatemala

Educação secundária

67 OPAS, Boletim 2004, UNICEF, Igualdade com dignidade, 2004.

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