periodismo maçônico e cultura política na corte imperial brasileira (1871-1874)

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  • 7/24/2019 Periodismo Manico e Cultura Poltica Na Corte Imperial Brasileira (1871-1874)

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    UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

    INSTITUTO DE CINCIAS HUMANAS E FILOSOFIA

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM HISTRIA - MESTRADO

    THIAGO WERNECK GONALVES

    PERIODISMO MANICO E CULTURA POLTICA NA CORTE

    IMPERIAL BRASILEIRA (1871-1874)

    NITERI

    2012

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    THIAGO WERNECK GONALVES

    PERIODISMO MANICO E CULTURA POLTICA NA CORTE IMPERIAL

    BRASILEIRA (1871-1874)

    Dissertao apresentada ao Curso de Ps-Graduao

    em Histria da Universidade Federal Fluminense, como

    requisito parcial para a obteno do Grau de Mestre.rea de Concentrao: Histria Social.

    ORIENTADORA: PROF. DR. GIZLENE NEDER

    Niteri

    2012

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    THIAGO WERNECK GONALVES

    PERIODISMO MANICO E CULTURA POLTICA NA CORTE IMPERIAL

    BRASILEIRA (1871-1874)

    Dissertao apresentada ao Curso de Ps-Graduao

    em Histria da Universidade Federal Fluminense, como

    requisito parcial para a obteno do Grau de Mestre.

    rea de Concentrao: Histria Social.

    Aprovada em: __ / __ / 2012

    BANCA EXAMINADORA

    Profa. Dra. Gizlene Neder (Orientadora)

    Universidade Federal Fluminense

    Prof. Dr. Humberto Fernandes Machado

    Universidade Federal Fluminense

    Profa. Dra. Jessie Jane Vieira de Sousa

    Universidade Federal do Rio de Janeiro

    Niteri

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    AGRADECIMENTOS

    Ao Grande Estrategista da Criao seja entregue toda a minha gratido inicial. Este,

    que independente de qualquer manifestao ou crena religiosa, sempre se far presente emtodos os momentos de minha vida, figurando como precursor e sustentculo de toda e

    qualquer vitria.

    professora Gizlene Neder, pela confiana, compreenso e presena segura,

    competente e estimulante, sem a qual no seria possvel concluir esta pesquisa.

    Aos professores Humberto Fernandes Machado e Giselle Martins Venncio, pelas

    suas participaes e inestimveis consideraes apresentadas durante o exame de

    qualificao.

    Ao mestre Francisco dos Santos Loureno, pela criteriosa leitura deste trabalho e

    pelas valiosas sugestes.

    minha famlia, pelo afeto, compreenso, respeito e carinho.

    Aos meus amigos, prximos ou distantes, pelo apoio nos momentos mais difceis

    desta trajetria.

    Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior (CAPES), pelo

    apoio financeiro.

    Agradeo, enfim, a todos aqueles que permaneceram ao meu lado e torceram pelo

    meu sucesso.

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    Nada mais difcil de manejar, mais perigoso de conduzir, ou de mais incerto sucesso, doque liderar a introduo de uma nova ordem de coisas. Pois o inovador tem contra si todosos que se beneficiam das antigas condies e apoio apenas tbio dos que se beneficiarocom a nova ordem.

    Nicolau Maquiavel

    A histria mostra que a poltica o lugar das contradies que mais tem desafiado aargcia intelectual, o senso prtico e a capacidade de adaptao da Igreja. Em todos osplanos, transparecem elas, no curso do processo histrico eclesistico civil, ora sob formasmoderadas, ora sob formas violentas.

    Oscar Figueiredo Lustosa

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    SUMRIO

    AGRADECIMENTOS, p. 4.

    LISTA DE ILUSTRAES, p. 8.

    RESUMO, p. 9.

    ABSTRACT, p. 10.

    RSUM, p. 11.

    RESUMEN, p. 12.

    INTRODUO, p. 13.

    CAPTULO IMAONARIA: HISTRIA E HISTORIOGRAFIA, p. 18.

    1.1Discusso historiogrfica acerca do tema, p. 18.

    1.2A historiografia sobre as origens das maonarias, p. 26.

    1.3Breve histrico das relaes institucionais entre Estados Nacionais, Igreja catlica emaonarias nos sculos XVIII e XIX, p. 41.

    1.4O hbito e o avental: a Igreja catlica e as maonarias na Questo Religiosa(1872-1875), p. 49.

    CAPTULO II AS MAONARIAS E A IMPRENSA BRASILEIRA NASEGUNDA METADE DO SCULO XIX, p. 65.

    2.1O periodismo manico oitocentista, p. 65.

    2.2O Apstolo: peridico religioso, moral e doutrinrio consagrado aos interesses dareligio e da sociedade (1872-1874), p. 69.

    2.3 Anlise do contedo temtico d O Apstolo: peridico religioso, moral edoutrinrio consagrado aos interesses da religio e da sociedade (1872-1874), p. 72.

    2.4OBoletim do Grande Oriente do Brazil: jornal official da maonaria brazileira Crculo manico do Lavradio (1871-1874), p. 84.

    2.5Anlise do contedo temtico do Boletim do Grande Oriente do BrazilCrculomanico do Lavradio (1871-1874), p. 90.

    2.6OBoletim do Grande Oriente Unido e Supremo Conselho do Brazil: jornal officialda maonaria brazileiraCrculo manico dos Beneditinos (1873-1874), p. 106.

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    2.7 Anlise do contedo temtico do Boletim do Grande Oriente Unido e SupremoConselho do Brazil: jornal official da maonaria brazileira Crculo manico dosBeneditinos (1873-1874), p. 109.

    CAPTULO III LEITORES EM CENA: ASPECTOS DO PERIODISMOMANICO OITOCENTISTA, p. 133.

    3.1Escrita e leitura na Corte imperial brasileira: periodismo e sociedade analfabeta, p.133.

    3.2Imprensa manica: uma comunidade interpretativa, p. 143.

    CONCLUSO, p. 162.

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS, p. 166.

    ANEXOS, p. 178.

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    LISTA DE ILUSTRAES

    QUADRO 1 Compilao resumida das evidncias que apontam para o surgimento damaonaria moderna na Esccia (sculo XVII), p. 32.

    QUADRO 2Cronologia dos primrdios da maonaria brasileira, p. 38.

    QUADRO 3Nmero de maons por atuao profissional, p. 89.

    QUADRO 4ndice de analfabetismo no Brasil em 1872, p. 133.

    TABELA 1 Remessa e recepo de peridicos (Crculo manico do Lavradio), p.147.

    TABELA 2Remessa e recepo de peridicos (Crculo manico dos Beneditinos), p.153.

    FIGURA 1Os graus manicos do Rito Escocs Antigo e Aceito, p. 178.

    FIGURA 2 Capa do livro Le Diable au XIXe sicle (O Diabo no Sculo XIX, 1892),escrito pelo Dr. Bataille (na verdade Leo Taxil, um dos maiores provedores de boatosantimanicos no sculo XIX), p. 179.

    FIGURA 3 Editorial do Boletim do Grande Oriente Unido e Supremo Conselho doBrazil, Ano II, edio de fevereiro e maro de 1873, p. 180.

    FIGURA 4 Capa do Boletim do Grande Oriente Unido e Supremo Conselho do Brazil,Ano II, edio de fevereiro e maro de 1873, p. 181.

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    RESUMO

    A pesquisa intitulada Periodismo manico e cultura poltica na Corte imperial brasileira

    (1871-1874), foi desenvolvida no mbito do Programa de Ps-Graduao em Histria daUniversidade Federal Fluminense (PPGH-UFF) com o apoio financeiro da Coordenao deAperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior (CAPES). Investigou-se a presena daimprensa manica difundida na Corte imperial brasileira, especialmente no perodocompreendido entre 1871 e 1874, buscando analisar o seu papel tanto na difuso da culturaimpressa quanto na construo dos espaos pblicos modernos. Foram analisados os

    jornais oficiais das maonarias brasileiras, sob a guarda da seo de Peridicos daFundao Biblioteca Nacional, instituio localizada na cidade do Rio de Janeiro.Tomamos o periodismo manico tanto como fonte quanto objeto de pesquisa. Trata-se deuma importante ferramenta para a anlise da histria da imprensa, entre o final do sculoXIX e incio do sculo XX na cidade do Rio de Janeiro, perodo no qual a ao da

    instituio manica ligou-se ao campo liberal, especialmente em torno da luta peloestabelecimento de uma sociedade secular. Assim, os posicionamentos anunciados pelaimprensa manica eram contrrios viso de mundo preconizada pela Igreja catlica.Durante o movimento ultramontano as autoridades catlicas intensificaram as crticas emrelao maonaria, deixando transparecer sua insatisfao com a emergncia de umanova sociedade. Ao mesmo tempo, os maons travaram na imprensa uma luta com o cleroultramontano, o qual, em funo de seu discurso conservador, foi considerado o maiorinimigo do progresso e da civilizao.

    Palavras-chave: maonaria, periodismo manico, cultura poltica

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    ABSTRACT

    This study entitled Periodismo manico e cultura poltica na Corte imperial brasileira

    (1871-1874) [Masonic Journalism and Political Culture in the Brazilian Imperial Court]was developed as part of the Post-Graduate History Programme at Fluminense FederalUniversity (PPGH-UFF) with the financial support of the Brazilian Federal Agency forSupport and Evaluation of Graduate Education (CAPES). It investigates the presence ofthe Masonic press spread through the Brazilian Imperial Court, particularly during theperiod of 1871-1874. It seeks to analyse its role both in the spread of print culture and inthe construction of modern public spaces. The official newspapers of the different branchesof Brazilian Freemasonry were analysed where they are kept in the Periodicals Section ofthe National Library Foundation, an institution located in the city of Rio de Janeiro. Weconsidered Masonic journalism both as source and object of the research. It serves as animportant tool for analysing the history of the press between the end of the nineteenth

    century and the beginning of the twentieth century in the city of Rio de Janeiro. This was aperiod in which the Masons became involved in the Liberal movement, especiallyregarding the fight for the establishment of a secular society. This meant that positionsannounced by the Masonic press went against the world vision established by the CatholicChurch. During the Ultramontane Movement Catholic authorities intensified criticisms ofFreemasonry, revealing their discontent at the emergence of a new society. The Masonsmeanwhile waged a war in the press against the Ultramontane clergy, which, due to itsconservative discourse, was considered the greatest enemy of progress and civilisation.

    Keywords: Freemasonry, Masonic journalism, political culture

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    RSUM

    La recherche intitule Presse maonnique et Culture politique la Cour imprialebrsilienne (1871-1874) a t mene dans le cadre du Programme de 2me et 3me cycleen Histoire de lUniversit fdrale Fluminense (PPGH-UFF) avec le soutien de laCoordination de perfectionnement des personnels de niveau suprieur (CAPES). Lon y atudi la prsence de la presse maonnique au sein de la Cour impriale brsilienne,

    particulirement pendant la priode allant de 1871 1874, dans le but danalyser son rle,aussi bien dans la diffusion de la culture de la presse que dans la construction des espacespublics modernes. Ont t analyss les journaux officiels des diffrentes loges brsiliennes,conservs par la Section des priodiques de la Bibliothque nationale de Rio de Janeiro.Lon a considr la presse maonnique tant comme source que comme objet de recherche.Il sagit dun outil important pour lanalyse de lhistoire de la presse entre la fin duXIXme et le dbut du XXme sicle dans la vile de Rio de Janeiro, une priode laquelle

    laction des institutions maonniques a rejoint celle du camp libral, principalement autourdu combat pour ltablissement dune socit sculaire. Ainsi, les positions assumes par lapresse maonnique allaient lencontre de la vision du monde dfendue par lglisecatholique. Pendant le mouvement ultramontain, les autorits catholiques intensifirentleurs critiques envers la franc-maonnerie, laissant clairement apparatre leur refus delmergence dune nouvelle socit. En contrepartie, les francs-maons menrent dans lapresse un combat contre le clerg ultramontain, qui en raison de son discours conservateurtait considr comme le plus grand ennemi du progrs et de la civilisation.

    Mots-cls: franc-maonnerie, presse maonnique, culture politique

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    RESUMEN

    La investigacin denominada Periodismo masnico y cultura poltica en la Corte imperial

    brasilea (1871-1874), se desarroll en el mbito del Programa de Posgrado en Historia dela Universidad Federal Fluminense (PPGH-UFF), con el apoyo financiero de laCoordinacin de Perfeccionamiento de Personal de Nivel Superior (CAPES). Se investigla presencia de la prensa masnica difundida en la Corte imperial brasilea, especialmenteen el perodo comprendido entre los aos 1871 y 1874, con el intento de analizar su papeltanto en la difusin de la cultura de prensa, como en la construccin de los espaciospblicos modernos. Se llev a cabo el anlisis de peridicos oficiales de las masonerasbrasileas, con base en la seccin de Peridicos de la Fundacin Biblioteca Nacional,institucin ubicada en la ciudad de Ro de Janeiro. Tomamos el periodismo masnico tantocomo fuente como objeto de investigacin. Se trata de una importante herramienta para elanlisis de la historia de la prensa, entre los fines del siglo XIX y el principio del siglo XX,

    en la ciudad de Ro de Janeiro, perodo en el que la accin de la institucin masnicaestaba relacionada al campo liberal, sobre todo respecto a la lucha por el establecimientode una sociedad secular. De ese modo, los posicionamientos anunciados por la prensamasnica eran contrarios a la comprensin de mundo defendida por la Iglesia catlica.Durante el movimiento ultramontano, las autoridades catlicas intensificaran las crticasrelacionadas con la masonera, mostrando su insatisfaccin con la emergencia de unanueva sociedad. Los masones, a la vez, entablaron en la prensa una batalla con el cleroultramontano, el que, debido a la funcin de su discurso conservador, fue consideradocomo el ms grande enemigo del progreso y de la civilizacin.

    Palabras-clave: masonera, periodismo masnico, cultura poltica

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    INTRODUO

    O presente trabalho representa a continuao de uma pesquisa desenvolvida ao

    longo da Graduao em Histria na Universidade Federal Fluminense, e que foi

    apresentada sob a forma de monografia de concluso de curso.1 Nela analisamos, a partir

    do uso de peridicos manicos e catlicos, a Questo Religiosa (1872-1875) ocorrida

    durante a fase final do Segundo Reinado, sendo abordados os seus antecedentes dentro do

    contexto do avano do iluminismo e dos confrontos entre a Igreja catlica e as maonarias

    na Europa, alm de seus reflexos no cenrio poltico-religioso brasileiro.

    No decorrer desse estudo monogrfico, tivemos contato com os jornais O Apstolo

    (ligado Igreja catlica) e A Famlia (associado s instituies manicas), o queaumentou o nosso interesse sobre o papel desempenhado pela imprensa na Histria. Dentro

    dessa lgica, e visando problematizar a atuao do periodismo manico no processo de

    difuso da cultura impressa brasileira na dcada de 1870, tomamos os seus boletins oficiais

    como fontes e objetos histricos.

    O estudo do periodismo (no caso manico), seguindo um movimento de

    renovao no campo da Histria, foi eleito o principal foco de nossa investigao. Assim, o

    redimensionamento da imprensa como fonte (...) possibilitou a busca de novasperspectivas para a anlise dos processos histricos.2

    Nesse sentido, abandona-se o ponto de vista que entendia os meios de

    comunicao como transmissores imparciais de acontecimentos, j que os impressos no

    possuem informaes neutras e no devem ser lidos de forma acrtica. Para o historiador

    Ciro F. Cardoso:

    Um documento sempre portador de um discurso que, assim considerado,

    no pode ser visto como algo transparente (...). O historiador deve sempreatentar, portanto, para o modo atravs do qual se apresenta o contedohistrico que pretende examinar, quer se trate de uma simples informao,

    1 Monografia intitulada O hbito e o avental: a Igreja catlica e a maonaria na Questo Religiosa (1872-1875), sob a orientao da Profa. Dra. Gizlene Neder, Faculdade de Histria, Universidade FederalFluminense, Niteri, 2008. Para uma verso resumida deste trabalho, consultar GONALVES, ThiagoWerneck. O hbito e o avental: a Igreja catlica e a maonaria na Questo Religiosa (1872 -1875). In:SEMANA DE HISTRIA POLTICA, 5. SEMINRIO NACIONAL DE HISTRIA: POLTICA ECULTURA & POLTICA E SOCIEDADE, 2. 2010. Rio de Janeiro.Anais da V Semana de Histria Poltica- II Seminrio Nacional de Histria: Poltica e Cultura & Poltica e Sociedade. Rio de Janeiro: EDUERJ,2010, p. 750-758.2

    FERREIRA, Tnia Maria Tavares Bessone da Cruz; MOREL, Marco; NEVES, Lcia Maria Bastos Pereiradas. (Orgs.). Histria e imprensa: representaes culturais e prticas de poder. Rio de Janeiro:FAPERJ/DP&A editora, 2006, p. 10.

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    quer se trate de idias (...). A histria sempre texto, ou mais amplamente,discurso, seja ele escrito, iconogrfico, gestual etc., de sorte que somenteatravs da decifrao dos discursos que exprimem ou contm a histriapoder o historiador realizar seu trabalho.3

    Mais do que simples discursos, verificamos nas pginas dos boletins manicos

    oficiais a existncia de verdadeiros projetos de poder, indicando as diferentes vises de

    mundo e os mais variados ideais difundidos, bem como as lutas travadas no interior das

    prprias maonarias no sentido de angariar o apoio de amplos setores da sociedade

    brasileira.

    Foram abordados os impressos das duas correntes manicas que rivalizavam na

    dcada de 1870. OBoletim do Grande Oriente do Brazil encontra-se relacionado ao Vale

    do Lavradio e oBoletim do Grande Oriente Unido e Supremo Conselho do Brazil liga-se

    ao Vale dos Beneditinos.

    Ambos podem ser consultados no acervo da Fundao Biblioteca Nacional (seo

    de Peridicos). Portanto, esta pesquisa foi viabilizada em funo da existncia e da

    disponibilidade, em arquivos pblicos, de uma documentao adequada ao seu propsito.

    Para alm da circulao e da divulgao de idias, os jornais manicos

    representaram espaos privilegiados para as disputas polticas e ideolgicas existentes no

    seio da Corte imperial brasileira. De fato, a imprensa no sculo XIX atuou como

    propagandista de diversos posicionamentos polticos.4

    O historiador Robert Darnton assinalou que os textos jornalsticos no so meros

    transmissores de informaes, mas divulgadores de uma narrativa de segunda mo sobre

    os fatos ocorridos, pois a notcia no o que aconteceu no passado imediato, e sim o

    relato de algum sobre o que aconteceu.5

    Em seu livro sobre So Lus, Jacques Le Goff nos forneceu importantes indicaes

    sobre as questes relacionadas s pesquisas no campo histrico. Para o autor, a modalidade

    biogrfica faz com que o historiador se depare com os problemas essenciais porm

    clssicosde seu ofcio, a saber:

    3 CARDOSO, Ciro Flamarion. Histria e anlise de textos. In:______; VAINFAS, Ronaldo (Orgs.).Domnios da histria: ensaios de teoria e metodologia. Rio de Janeiro: Ed. Campus, 1997, p. 377-378.4 CAMISASCA, Marina; VENNCIO, Renato. Jornais mineiros do sculo XIX: um projeto de digitalizao.

    Revista Eletrnica Cadernos de Histria - Publicao do Corpo Discente do DEHIS/UFOP, Ouro Preto, MG,ano II, n. 1, p. 7, mar. 2007. Disponvel em:. Acesso em: jan.

    2012.5 DARNTON, Robert. Introduo. In: ______. O beijo de Lamourette: mdia, cultura e revoluo. So Paulo:Companhia das Letras, 1990, p. 18.

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    (...) posio de um problema, busca e crtica das fontes, tratamento numtempo suficiente para determinar a dialtica da continuidade e da troca,redao adequada para valorizar um esforo de explicao, conscincia do

    risco atualou seja, antes de tudo, da distncia que nos separa da questotratada.6

    Tendo em vista esses pressupostos, nossa pesquisa tomou os impressos manicos

    oficiais como o principal fenmeno histrico a ser problematizado e investigado. Do ponto

    de vista metodolgico, desenvolvemos uma abordagem que enfatizou a fonte documental

    primria, ressaltando que embora no representem fontes inditas, os boletins manicos

    permanecem pouco explorados.

    Foram levados em considerao tanto os seus aspectos materiais (aparncia fsica,

    diagramao e estruturao, relaes com o mercado e a publicidade), quanto os seus

    contedos (ordenao dos temas, ttulos das matrias, linha editorial, pblico alvo e

    colaboradores), conforme as sugestes da pesquisadora Tania Regina de Luca.7

    Partimos das seguintes perguntas: Quais eram as fontes de financiamento e o custo

    de impresso desses peridicos? Eles circulavam atravs de vendas em pontos fixos ou

    apenas por assinaturas? Quais eram as relaes existentes entre os seus redatores e as redes

    de comunicaes da cidade, ou seja, como se articulavam com os demais produtores deinformao, tanto os de menor porte, quanto queles de maior estrutura? Quais eram os

    seus principais interlocutores?

    Durante a fase de coleta e classificao dos dados, utilizamos o modelo de ficha

    que foi proposto pelo historiador Marco Morel para a abordagem e o levantamento da

    imprensa do sculo XIX.8

    Mesmo com a existncia de alguns folhetos que faziam propaganda das maonarias

    desde a primeira metade do sculo XIX, foi somente no incio da dcada de 1870 quesurgiram as publicaes manicas com edies mais regulares, e de propriedade dos

    Grandes Orientes.

    6 LE GOFF, Jacques. So Lus: biografia. Trad. Marcos de Castro. Rio de Janeiro: Record, 1999, p. 20.7 DE LUCA, Tania Regina. Histria dos, nos e por meio dos peridicos. In: PINSKY, Carla Bassanezi (Org.).Fontes histricas. 2ed. So Paulo: Contexto, 2008, p. 111-153.8

    MOREL, Marco; BARROS, Mariana Monteiro de. Palavra, imagem e poder: o surgimento da imprensa noBrasil do sculo XIX. Rio de Janeiro: DP&A editora, 2003, p. 123-126.

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    Por conseguinte, o recorte temporal desta pesquisa foi estabelecido com base nessa

    questo prtica, j que a disponibilidade de jornais manicos oficiais coincide com o ano

    inicial proposto neste trabalho (1871).

    A data-limite, em 1874, foi estabelecida a partir da percepo de que esse ano

    representa o auge da crise relacionada tambm denominada Questo Episcopo-

    Manica, conforme observado pela historiadora Renata Batista Brotto.9

    Para o Boletim do Grande Oriente do Brazil (Crculo manico do Lavradio)

    foram estudados os anos de 1871 a 1874. No que diz respeito ao Boletim do Grande

    Oriente Unido e Supremo Conselho do Brazil (Crculo manico dos Beneditinos),

    devido sua indisponibilidade na coletnea de microfilmes da Fundao Biblioteca

    Nacional, no foi possvel realizar a pesquisa para o seu ano I (1872). Por esta razo, suaanlise ficou restrita ao binio de 1873-1874.

    Quanto ao recorte espacial, a escolha pelo Rio de Janeiro foi motivada pelo fato de

    a cidade ter sido a sede do Imprio e, conseqentemente, palco das disputas polticas

    nacionais, alm de abrigar os poderes centrais das maonarias no pas.

    oportuno apontar ainda que a nossa abordagem incluiu a fonte catlica O

    Apstolo (1872-1874), posto que este peridico se transformou em um dos principais

    interlocutores dos boletins manicos oitocentistas. Seu estudo foi importante para avisualizao dos conflitos entre a Igreja catlica, o Estado imperial e as maonarias, os

    quais assumiram uma proporo extraordinria durante a dcada de 1870.

    O semanrio catlico foi entendido como fonte/objeto auxiliar e, por isso, optou-se

    metodologicamente pelo estudo completo apenas de seu ano inicial (1872). Para o binio

    de 1873-1874 foram eleitos os meses de maio (quando comemorada a Coroao de

    Nossa Senhora), junho (perodo de introduo do Apostolado da Orao) e dezembro

    (por oferecer um panorama dos meses do ano).Em virtude deMaonaria ser um tema controverso, realizarmos, em primeiro lugar,

    uma introduo acerca dos principais aspectos dessa temtica. Assim, nossa dissertao foi

    dividida em trs captulos.

    O primeiro versa sobre a histria da maonaria no Ocidente, tendo sido exploradas

    as questes relativas ao seu surgimento. Foram estudadas as suas caractersticas poltico-

    culturais e as suas relaes com os Estados Nacionais e a Igreja catlica. O texto foi

    9

    BROTTO, Renata Batista. Mdicos e padres: maternidade e representaes dos papis sociais da mulher(1860-1870). 2009. Dissertao (Mestrado em Histria) Programa de Ps-Graduao em Histria dasCincias e da Sade, Casa de Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), Rio de Janeiro, 2009, p. 19.

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    desenvolvido a partir de um debate bibliogrfico, cujo objetivo foi pensar tanto com as

    literaturas manicas e antimanicas disponveis, quanto com a historiografia de origem

    acadmica.

    Ainda no captulo introdutrio, levamos em considerao um episdio especfico

    do sculo XIX brasileiro a Questo Religiosa , visto que as literaturas disponveis

    apontam para o papel relevante que teria sido desempenhado pelas maonarias no curso

    desses acontecimentos histricos. Esse embate representou o ponto culminante das

    divergncias entre a Igreja catlica, as maonarias e o Estado imperial, que vinham se

    acumulando ao longo de todo o Segundo Reinado.

    O segundo captulo contm os achados da pesquisa e apresenta a anlise dos

    peridicos estudados. Trata-se da parte mais extensa de nosso trabalho, onde traamos umaviso geral acerca da imprensa no Brasil oitocentista e abordamos criticamente o amplo

    quadro comparativo dos iderios manicos e catlicos, o qual foi estruturado a partir de

    um inventrio temtico.

    O terceiro e ltimo captulo reflete sobre a problemtica da imprensa, sua escrita e

    leitura em meio a uma sociedade cujo ndice de analfabetismo era elevado. Foram

    discutidos os aspectos permanentes da oralidade nos primrdios da cultura impressa

    brasileira.De forma anloga, investigamos a recepo e a circulao dos boletins manicos

    na imprensa expondo os seus principais leitores e interlocutores. Partimos da anlise das

    fontes primrias para a discusso bibliogrfica sobre o tema, entendendo o periodismo

    manico enquanto parte de uma comunidade interpretativa, de acordo com a concepo

    do crtico literrio Stanley Fish.10

    Por fim, salientamos que as chamadas numricas para as citaes foram

    organizadas por sees, e que com o intuito de facilitar a leitura das fontes primrias, suasortografias foram atualizadas para o portugus considerado moderno, com exceo dos

    ttulos dos peridicos, os quais foram mantidos com suas grafias originais.

    10

    FISH, Stanley. Is there a text in this class? The authority of interpretive communities. Cambridge,Massachusetts/London, England: Harvard University Press, 1980.

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    18

    CAPTULO 1MAONARIA: HISTRIA E HISTORIOGRAFIA

    1.1Discusso historiogrfica acerca do tema

    Ao estabelecermos a maonaria como objeto de anlise, nos deparamos diante do

    seguinte panorama: a diminuta presena do tema no meio acadmico e o parcial acesso s

    fontes documentais a seu respeito, em funo dos obstculos inerentes prpria estrutura

    fechada ou secreta da instituio. Embora o tpico tenha sido muito citadoespecialmente

    em alguns momentos da histria brasileira do sculo XIX a pesquisa sobre essa ordem

    secreta permaneceu ausente durante um longo tempo da historiografia desenvolvida em

    mbito nacional.Ao contrrio do que vem ocorrendo em alguns pases europeus, a exemplo da

    Frana, onde os maons doaram seus acervos anteriores ao sculo XX para aBibliothque

    Nationale (Paris),1 no Brasil os arquivos manicos conservam-se fechados aos chamados

    profanos,2 ou seja, continuam inacessveis aos no maons. Ademais, as monografias a

    respeito dessa temtica tm recebido no Velho Continente um acrscimo substancial nas

    ltimas dcadas, inclusive com a criao de cadeiras e centros universitrios para o estudo

    exclusivo das maonarias.3

    Em nosso pas, ainda que lentamente, observamos uma expanso significativa de

    produes acadmicas que abordam as organizaes manicas considerando as suas

    particularidades.4 Mesmo com o incremento das ltimas dcadas, ainda existe uma

    verdadeira carncia se a compararmos com outros temas de nossa histria.

    1 MOREL, Marco. Sociabilidades entre luzes e sombras: apontamentos para o estudo histrico das

    maonarias da primeira metade do sculo XIX. Estudos Histricos. Rio de Janeiro, n. 28, p. 4, 2001.2 Em linguagem manica,profano designa todo indivduo que no foi iniciado na ordem.3 Centros de pesquisa para o estudo das maonarias esto associados a diversas universidades europias, aexemplo de Sheffield: The Centre for Research into Freemasonry (Inglaterra) e Leiden (Holanda). Oendereo eletrnico do primeiro : . Acesso em: jan.2012. Informaes acerca da Chair for Freemasonry as an Intellectual Current and Socio-cultural EuropeanPhenomenon (Universidade de Leiden) podem ser obtidas atravs do seguinte endereo eletrnico:. Acesso em: jan. 2012.4 Entre os trabalhos mais recentes podem ser citados, entre outros: BARATA, Alexandre Mansur. Luzes esombras: a ao da maonaria brasileira (1870-1910). Campinas: Ed. da UnicampCentro de Memria daUnicamp, 1999; VSCIO, Luiz Eugnio. O crime do padre Srio: maonaria e Igreja catlica no Rio Grandedo Sul (1893-1928). Santa Maria (RS): editoraufsm; Porto Alegre: Ed. da UFRGS, 2001; COLUSSI, ElianeLucia. A maonaria brasileira no sculo XIX. So Paulo: Ed. Saraiva, 2002; BARATA, Alexandre Mansur.

    Maonaria, sociabilidade ilustrada e independncia do Brasil (1790-1822). So Paulo-Juiz de Fora:Annablume-EDUFJF-FAPESP, 2006; MOREL, Marco; SOUZA, Franoise Jean de Oliveira. O poder damaonaria: a histria de uma sociedade secreta no Brasil. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2008.

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    19

    Diante disso, os estudos acerca das sociabilidades modernas em geral, e da

    maonaria em particular, ainda se encontram limitados, apesar da qualidade dos trabalhos

    de que dispomos. Para o historiador Alexandre Mansur Barata: apesar dos avanos

    notveis ocorridos nos ltimos anos, a histria da maonaria continua praticamente

    desconhecida, tanto no Brasil quanto fora dele.5

    Para alm da rea de histria, o tema de nossa pesquisa est despertando o interesse

    do mercado editorial e, at mesmo, do ramo cinematogrfico. Nos ltimos anos cresceram

    as circulaes de revistas, documentrios em formato de DVD e folhetos que discutem as

    sociedades secretas como um todo.6

    Exemplo ilustrativo dessa nova onda de curiosidade em torno da aura de mistrio

    que cerca tais organizaes O smbolo perdido, livro que mergulhou nos segredos damaonaria norte-americana e foi lanado pelo escritor Dan Brown, famoso pelo seu best-

    seller O cdigo da Vinci.7

    Alm disso, necessrio levarmos em considerao que apesar do relativo silncio

    estabelecido na historiografia acadmica em torno da atuao da maonaria, fora desse

    universo existe uma ampla literatura manica e antimanica disponveis, que podem ser

    caracterizadas como apologticas, no caso da primeira, e condenatrias, no caso da

    segunda.A historiografia de vertente manica quantitativamente superior de seus

    opositores,8 sendo os seus principais objetivos a propaganda da ordem e a exaltao de

    seus membros. A obraHistria do Grande Oriente do Brasil, de Jos Castellani, constitui-

    se em um exemplo dessa marca apologtica, visto que se trata de um texto com vigor

    5 BARATA, Alexandre Mansur. Maonaria, sociabilidade ilustrada e independncia (Brasil, 1790-1822).2002. Tese (Doutorado em Histria)Programa de Ps-Graduao em Histria, Universidade Estadual deCampinas, Campinas, 2002, p. 13.6 Podemos mencionar as seguintes matrias que foram capas de publicaes: Os maons. Revista HistriaViva. So Paulo, ano II, n. 24, 2005; Os segredos da maonaria. Revista Super Interessante. So Paulo,edio 217, ano IX, n. 9, set. 2005; Ao entre irmos. Revista O Globo. Rio de Janeiro, ano V, n. 221, out.2008; A radiografia da maonaria. Revista Histria em Foco Sociedades Secretas. So Paulo, ano I, n. 1,2009; Maonaria nas sombras do poder.Revista Histria Viva. So Paulo, ano VI, n. 71, 2009.7 BROWN, Dan. O smbolo perdido. Rio de Janeiro: Editora Sextante, 2012. Id., O cdigo da Vinci. Rio deJaneiro: Editora Sextante, 2012.8 De acordo com o levantamento bibliogrfico realizado pela historiadora Eliane Lucia Colussi. COLUSSI,

    Eliane Lucia. Plantando ramas de accia: a maonaria gacha na segunda metade do sculo XIX. 1998. Tese(Doutorado em Histria)Programa de Ps-Graduao em Histria, Pontifcia Universidade Catlica do RioGrande do Sul, Porto Alegre, 1998a, p. 57.

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    ideolgico e que, em diversas passagens, exalta a grandeza e os feitos da maonaria no

    Brasil.9

    Por outro lado, a literatura antimanica oriunda, sobretudo, de autores religiosos

    e, por isso, manteve-se vinculada aos histricos conflitos entre a maonaria e a Igreja

    catlica. O clrigo Boaventura Kloppenburg foi identificado pelos prprios maons como

    um de seus principais inimigos,10 j que em seus escritos buscou demonstrar a

    incompatibilidade existente entre ser catlico e maom ao mesmo tempo. Convm ressaltar

    que, em suas obras, o sacerdote demonstrou um bom nvel de conhecimento sobre as

    questes inerentes maonaria.11

    Entendemos que as literaturas partidrias no devem ser descartadas de nossa

    anlise, pois apesar de seu carter tendencioso e parcial, elas podem nos oferecer umaleitura baseada em duas verses opostas de um mesmo tema relevante para a histria da

    maonaria. A perspectiva de cunho manico, por exemplo, reproduziu uma documentao

    que ainda encontra-se inacessvel aos historiadores no ligados sua organizao,

    expandindo, dessa forma, o seu acesso, tal como apontado pela historiadora Eliane Lucia

    Colussi.12

    No obstante, o objetivo principal deste trabalho abordar os mais recentes estudos

    desenvolvidos no mbito acadmico, especialmente aqueles que buscam compreender opapel da instituio manica na formao histrica de nosso pas. Dentro dessa lgica,

    podemos apontar o artigo de Clia Maria Marinho de Azevedo como a primeira reviso

    historiogrfica acerca de nossa temtica.13

    A historiadora iniciou o texto indicando a falta de visibilidade do assunto nos textos

    acadmicos de seu tempo e, posteriormente, percorreu as origens da instituio manica.

    Por fim, ela analisou comparativamente as abordagens de Francisco Adolfo de Varnhagen,

    Manuel de Oliveira Lima e Caio Prado Jnior a respeito da maonaria no Brasil.9 CASTELLANI, Jos. Histria do Grande Oriente do Brasil: a maonaria na histria do Brasil. Braslia:Grfica do Grande Oriente do Brasil, 1993. Cabe ressaltar que Jos Castellani um dos historiadoresmanicos mais respeitados no Brasil. De sua autoria foram consultados tambm: A maonaria e omovimento republicano brasileiro. So Paulo: Trao Editora, 1989; Anlise da Constituio de Anderson.(Co-autor: Raimundo Rodrigues). Londrina: Editora manica A Trolha, 1995; As origens histricas damstica maonaria. So Paulo: Landmark, 2003; A ao secreta da maonaria na poltica mundial. 2ed.revisada. So Paulo: Landmark, 2007.10 COLUSSI, op. cit., 1998a, p. 63.11 Foram consultadas as obras: A maonaria no Brasil: orientao para catlicos. Petrpolis: Ed. Vozes,1956; O ser do padre. Petrpolis: Ed. Vozes, 1972;Igreja e maonaria: conciliao possvel? Petrpolis: Ed.Vozes, 1992.12

    COLUSSI, op. cit., 1998a, p. 57.13 AZEVEDO, Clia Maria Marinho de. Maonaria: histria e historiografia.Revista USP, So Paulo, n. 32,p. 178-189, dez. 1996-fev. 1997.

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    Um balano bibliogrfico mais detalhado e criteriosamente esquematizado foi

    estabelecido por Eliane Lucia Colussi em sua tese de doutorado, defendida na Pontifcia

    Universidade Catlica do Rio Grande do Sul.14 Este trabalho refletiu criticamente tanto

    sobre a escrita da histria manica, quanto sobre as etapas dessa histria. Em sua segunda

    parte, a autora observou uma aproximao entre os monarquistas liberais e a maonaria no

    Sul do Imprio brasileiro, situando esta ltima como um dos grupos da elite intelectual que

    fomentou a defesa e a divulgao do pensamento liberal na segunda metade do sculo

    XIX.

    Eliane Lucia Colussi demonstrou ainda que a atuao dos maons deu-se,

    sobretudo, no campo poltico-cultural, orientando-se a partir de posies anticlericais. Sua

    tese de doutorado foi posteriormente transformada em um livro esclarecedor.15

    O trabalho pioneiro, entretanto, o de Alexandre Mansur Barata, que em sua

    dissertao de mestrado, defendida no Programa de Ps-Graduao em Histria Social da

    Universidade Federal Fluminense, investigou a ao dos grupos manicos brasileiros no

    perodo de 1870-1910.16

    O autor examinou a atuao dos maons no contexto do movimento liberal

    ilustrado, considerando a especificidade de suas relaes de sociabilidade, inclusive com a

    montagem de quadros quantitativos bastante explicativos a esse respeito. Ele revelou aindaque as organizaes manicas desempenharam uma atuao expressiva, engajando-se nos

    variados debates intelectuais daquela poca, deixando claro que a instituio no se

    constituiu em uma ordem homognea ou monoltica. Trata-se de uma leitura indispensvel,

    que disponibiliza informaes precisas sobre o perodo compreendido entre 1870 e 1910.

    Outra importante publicao a do historiador David Gueiros Vieira. Mesmo

    abordando com menor especificidade a maonaria, pois destacou a insero do

    protestantismo no Brasil, seu estudo trouxe como contribuio a revelao de um possvelvnculo de cooperao entre protestantes e maons durante os embates relativos Questo

    Religiosa ocorrida na dcada de 1870.17

    14 COLUSSI, op. cit., 1998a, passim.15 COLUSSI, Eliane Lucia.A maonaria gacha no sculo XIX. Passo Fundo: EDIUPF, 1998b.16 BARATA, Alexandre Mansur.Luzes e sombras: a ao dos pedreiros-livres brasileiros (1870-1910). 1992.Dissertao (Mestrado em Histria) Programa de Ps-Graduao em Histria, Universidade Federal

    Fluminense, Niteri, 1992.17 VIEIRA, David Gueiros. O protestantismo, a maonaria e a Questo Religiosa no Brasil . Braslia: Ed. daUnB, 1980.

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    As interpretaes de David Gueiros Vieira e Alexandre Mansur Barata convergem

    no que diz respeito ciso ocorrida no interior do Grande Oriente do Brazil,18 em 1863,

    quando uma importante diviso atingiu o seu quadro de dirigentes. Alegando a ocorrncia

    de irregularidades durante o processo eleitoral para a escolha dos postos de comando do

    Grande Oriente, Joaquim Saldanha Marinho decidiu fundar o Grande Oriente do Vale dos

    Beneditinos. O ncleo original, por sua vez, ficou conhecido como Grande Oriente do Vale

    do Lavradio, tendo como gro-mestres, inicialmente o baro de Cairu e, posteriormente, o

    visconde do Rio Branco.

    Tal diviso durou at o ano de 1883, com um pequeno intervalo em 1872, quando

    em meio Questo Religiosa deu-se uma unio provisria, atravs da formao do

    Grande Oriente Unido e Supremo Conselho do Brazil. Alexandre Mansur Barata e DavidGueiros Vieira indicaram uma correspondncia na diviso entre os Grandes Orientes

    concorrentes e a fragmentao entre monarquistas e republicanos.

    Cabe ressaltar que os nomes Vale do Lavradio e Vale dos Beneditinos tiveram

    origem a partir dos espaos geogrficos situados na Corte imperial brasileira, onde as sedes

    dos grupos manicos dissidentes passaram a funcionar.

    No ano de 2006, Alexandre Mansur Barata estabeleceu novamente a maonaria

    enquanto matria de estudo, buscando elucidar a trajetria dessa instituio no cenrio depreparao para o processo brasileiro de independncia. O pesquisador sugeriu que a

    sociabilidade das lojas19 contribuiu para a criao de uma nova cultura poltica, marcada

    pela prtica do debate, da representao, da elaborao de leis, da substituio do

    nascimento pelo mrito.20

    Outro livro, de autoria de Marco Morel e Franoise Jean de Oliveira, traa, em uma

    linguagem acessvel a todos os pblicos, a histria da maonaria no Brasil, desde o

    estabelecimento dos primeiros maons at a sua atuao nos dias atuais. Os autoresreforaram a idia de que no existe uma maonaria nica, ou seja, a instituio no deve

    ser compreendida enquanto um centro possante, aglutinador e atemporal, mas inserida

    no jogo poltico de diversas associaes que, ao longo do tempo, apoiaram as mais diversas

    ideologias.

    18 Os Grandes Orientes e/ou Supremos Conselhos formavam as instncias que abrigam diversas lojasmanicas, que constituem, por sua vez, a aglomerao de base nas maonarias. MOREL, op. cit., 2001, p.19.19

    A loja a unidade bsica da maonaria local onde os seus membros se renem para realizar as maisvariadas atividades relacionadas s prticas manicas.20 BARATA, op. cit., 2006, p. 30.

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    Trata-se, enfim, de uma obra sntese da histria manica, mas que no se limitou

    insero tradicional da ordem no quadro excludente dos ditos eventos polticos mais

    marcantes e relevantes do pas.21

    No mbito da produo acadmica nacional sobre a maonaria, o trabalho mais

    atual que identificamos em nossa pesquisa o de Clia Maria Marinho de Azevedo.22 Nele,

    a autora buscou relacionar a histria transnacional da maonaria com as trajetrias

    intelectuais de maons negros que se destacaram no mundo das elites brancas, em uma

    poca marcada pela escravido.

    A autora destacou o papel desempenhado por trs personagens negras na circulao

    de idias em prol da cidadania e da igualdade das pessoas ditas de cor. O primeiro,

    Francisco G de Acaiaba e Montezuma tambm conhecido como visconde deJequitinhonha foi um indivduo muito ativo no cenrio de luta pela independncia do

    Brasil tanto inicialmente como redator do jornal O Constitucional, quanto posteriormente

    em sua atuante carreira poltica.

    Segundo Lcia Maria Paschoal Guimares, Montezuma foi o primeiro homem

    pblico que se empenhou pela emancipao dos cativos, apresentando no Senado projetos

    para a abolio sem indenizao e a curto prazo.23

    O segundo maom de origem mestia estudado pela professora Clia MariaMarinho de Azevedo foi Francisco de Paula Brito, um dos principais editores no Brasil dos

    Oitocentos, tendo sido tambm o fundador da sociedade literria conhecida como

    Petalgica.

    De acordo com Martha Abreu e Larissa Moreira Viana, os textos oriundos da

    tipografia fundada por Paula Brito possuam uma forte conotao social, como demonstra

    a publicao de O homem de cor, impresso em 1833, e tido como um dos primeiros jornais

    brasileiros a discutir o preconceito racial.

    24

    Por fim, Clia Maria Marinho de Azevedo se debruou sobre a atuao de um

    poltico que, a julgar pelo universo manico, dispensa maiores comentrios. Trata-se de

    21 MOREL; SOUZA, op. cit., passim.22 AZEVEDO, Clia Maria Marinho de. Maonaria, anti-racismo e cidadania: uma histria de lutas edebates transnacionais. So Paulo: Annablume, 2010.23 GUIMARES, Lcia Maria Paschoal. Francisco G de Acaiaba e Montezuma (Visconde de

    Jequitinhonha). In: VAINFAS, Ronaldo (Org.). Dicionrio do Brasil imperial (1822-1889). Rio de Janeiro:Objetiva, 2008, p. 292.24 ABREU, Martha; VIANA, Larissa Moreira. Francisco de Paula Brito. In: ibid., p. 288.

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    Joaquim Saldanha Marinho, lder republicano e gro-mestre25 do Grande Oriente dos

    Beneditinos.

    Visando ampliar os limites das fronteiras de nossa anlise, necessrio mencionar

    dois autores que, embora situados fora da historiografia acadmica nacional,

    influenciaram, sobremaneira, os estudos a respeito das instituies manicas no Brasil e

    ao redor do mundo.

    O primeiro Maurice Agulhon, que com sua clssica obraescrita originalmente

    como tese de doutorado em 1968 reintroduziu no campo histrico o estudo das

    sociabilidades e, por extenso, das maonarias.26 O historiador francs forneceu uma

    contribuio terica fundamental para o enfoque da vida associativa em um quadro

    cronolgico-espacial delimitado.Para ele, no sculo XVIII, as diversas formas de associao emergentes revelavam

    o surgimento de uma esfera pblica27 marcada pela crtica ao Antigo Regime, sob a

    influncia do movimento iluminista:

    Todo bar, se alm da bebida consumida, oferece passatempos e prazeres deconvvio, torna-se naturalmente um local de freqncia regular econhecimento mtuo: todo caf vive com seus fregueses habituais. Da a queesses fregueses habituais monopolizem uma sala dos fundos e se constituamuma sociedade (club inglesa, cercle sua), apenas um passo.28

    (grifos do autor).

    Essas sociedades foram sendo fundadas seguindo o princpio da adeso voluntria

    de seus membros. Alm disso, a nova sociabilidade que ento se institua (...) pode ser

    considerada liberal, em primeiro lugar porque veiculava, entre outras, as idias das Luzes,

    e a seguir porque sua prpria existncia tinha um princpio liberal.29

    Dentro dessa complexidade histrica, as lojas manicas se constituram em um

    local favorvel para o exerccio dessa nova forma de sociabilidade, pois protegidos pelo

    25 O ttulo gro-mestre refere-se chefia suprema inexistindo, dentro da Maonaria Simblica, outraautoridade que lhe seja superior. A escolha de um Gro-Mestre est na dependncia do que determinam asConstituies manicas, as quais variam de pas a pas. CAMINO, Rizzardo da.Dicionrio manico. 3ed.So Paulo: Madras, 2010, p. 190.26 AGULHON, Maurice. Pnitents et francs-maons de lancienne Provence: essai sur la sociabilitmridionale. 3ed. Paris: Fayard, 1984.27 Para o conceito de esfera pblica de poderver: HABERMAS, Jrgen. The structural transformation of the

    public sphere. An inquiry into a category of bourgois society. Massachussetes: The Mit Press, 1991.28

    AGULHON, Maurice. As sociedades de pensamento. In: VOLVELLE, Michel (Org.). Franarevolucionria (1789-1799). So Paulo: Brasiliense, 1989, p. 55.29 Ibid., p. 56.

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    segredo, os maons debatiam as idias oriundas da Ilustrao, alm de terem institudo um

    sistema prprio de votao para eleger os seus dirigentes.

    As lojas eram espaos de circulao de idias e uma instncia de aprendizagem

    de prticas modernas, como a escolha dos associados e o livre debate entre os seus

    pares.30 Assim, a maonaria pode ser vista como uma entidade portadora de uma forma

    inovadora de cultura poltica,31 visto que os maons surgiam como construtores e sujeitos

    de um espao pblico moderno, contribuindo para a inaugurao de um novo tipo de

    comportamento poltico.

    Ainda que os maons no conspirassem contra os reis absolutistas, suas instituies

    exerciam umpoder simblico32 perigoso, porque no interior das lojas, os irmos viviam

    como se o governo do Estado Nacional no existisse. Conforme indicado pela historiadoraLcia Maria Bastos Pereira das Neves:

    A historiografia tem buscado identificar a maonaria, a partir de 1750, comoo embrio de um reino da crtica, ou de um espao pblico moderno, queteria viabilizado as primeiras discusses da sociedade civil conduzidas deforma independente do crculo privado de poder constitudo pela Corte.33

    Nesse sentido, apontamos o segundo autor estrangeiro, o alemo Reinhart

    Koselleck, para quem as ordens manicas significavam um verdadeiro poder paralelo, que

    era exercido de forma indireta pela ascendente burguesia no interior do regime absolutista.

    Ao funcionarem enquanto organizaes portadoras de um sistema autnomo, cuja

    soberania escapava autoridade poltica do Leviat, as lojas formaram o embrio do

    reino da crtica.34

    De fato, dentro dos cafs, clubes e sales formava-se uma opinio pblica no

    autorizada pelo Estado, que, gradativamente, ultrapassava os espaos reservados e

    30 Ibid., p. 57.31 Busca-se estudar a cultura poltica como instrumento para a compreenso das motivaes que orientam ocomportamento poltico individual ou coletivo, alm do papel desempenhado pelos diferentes espaos desociabilidade para a emergncia, difuso e recepo das culturas polticas. De acordo com Serge Berstein, acultura poltica constitui-se como uma espcie de cdigo e de um conjunto de referentes, formalizados noseio de um partido ou, mais largamente, difundidos no seio de uma famlia ou de uma tradio poltica. Cf.BERSTEIN, Serge. A cultura poltica. In: RIOUX, Jean-Pierre; SIRINELLI, Jean-Franois (Dir.). Para umahistria cultural. Lisboa: Editorial Estampa, 1998, p. 350.32 Entendido na concepo de Pierre Bourdieu. Cf. BOURDIEU, Pierre. O poder simblico. Rio de Janeiro:Bertrand Brasil, 1989.33

    NEVES, Lcia Maria Bastos Pereira das. Maonaria. In: VAINFAS, op. cit., p. 506.34 KOSELLECK, Reinhart. Crtica e crise: uma contribuio patognese do mundo burgus. Trad. LucianaVillas-Boas Castelo-Branco. Rio de Janeiro: EDUERJ/Contraponto, 1999, passim.

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    expandia-se pela esfera pblica. Alexandre Mansur Barata estudou a maonaria baseado

    nas concepes dos autores estrangeiros supracitados. Para ele:

    Pensar os novos espaos pblicos surgidos no sculo XVIII (clubes,sociedades literrias, lojas manicas), compreender, (...) a emergncia deuma nova cultura poltica, marcada pela progressiva politizao dessesespaos intelectuais e pelo deslocamento da crtica em direo a domniostradicionalmente interditos: a Igreja e o Estado.35

    Partindo dessa linha de raciocnio, o historiador brasileiro chamou ateno para a

    edificao de uma forma particular de cultura poltica, determinada pelo gradual processo

    de politizao do espao intelectual organizado pela instituio manica. Portanto,

    resgatar a maonaria como uma instituio formadora de opinio implica a necessidade depens-la, como uma forma especfica de sociabilidade que possui no carter secreto-

    fechado um elemento definidor.36

    1.2A historiografia sobre as origens das maonarias

    Maonaria um assunto invariavelmente controverso, cercado por polmicas que,

    no raro, se relacionam com aspectos lendrios e mticos. A seu respeito, existe uma

    quantidade indefinida de idias, teorias e histrias, que parecem surgir em cada direo

    para atender e respaldar interesses individuais ou coletivos.

    Por exemplo: devido existncia de uma multiplicidade de significados presentes

    no imaginrio social, o simples exerccio de buscarmos uma definio para essa associao

    se constitui em uma tarefa rdua. Todavia, podemos entend-la como uma sociedade que

    apresenta um

    (...) carter fraternal, possuidora de uma organizao baseada em rituais esmbolos na qual o segredo ocupa papel fundamental. uma instituio quefoi e permanece sendo acessvel principalmente ao sexo masculino e que tempor objetivos o aperfeioamento intelectual da sociedade, de seus filiados e apromoo da ao filantrpica interna e externa.37

    35 BARATA, Alexandre Mansur. Discutindo a sociabilidade moderna: o caso da maonaria. In: RAGO,Margareth; GIMENEZ, Renato Aloizio Oliveira (Orgs.). Narrar o passado, repensar a histria. Campinas:

    Ed. da Unicamp, 2000, p. 222.36 BARATA, op. cit., 1999, p. 116.37 COLUSSI, op. cit., 1998b, p. 33.

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    Outro trao delicado a prpria origem da maonaria, pois existem tantas hipteses

    sobre a sua formao quanto existem curiosos em torno do tema. Diversas obras assinalam

    que a mesma tem origens remotas, perdidas na Antiguidade, entre os outrora famosos

    mistrios egpcios, judaicos, gregos e persas.

    Assim, grande parte de sua histria oculta como a de um meteoro que, nascido

    no Oriente, se encaminhou para o Ocidente, traando uma trajetria sempre luminosa

    atravs dos sculos.38 oportuno mencionar a opinio da historiadora Clia Maria

    Marinho de Azevedo a respeito desse assunto:

    Seria uma tarefa v querer precisar o momento de fundao da maonaria,uma vez que suas origens se perdem em um passado povoado de mitos e

    lendas, remontado ao rei Salomo e outros personagens do VelhoTestamento, a comear de Ado, apontado em algumas verses como oprimeiro maom.39

    As interpretaes que buscam apresentar a maonaria como uma ordem fundada em

    pocas imemoriais so oriundas, sobretudo, da prpria literatura produzida pelos seus

    membros. Abordando esse tema, o historiador e jesuta Jos Antonio Ferrer Benimeli

    criticou as verses lendrias, argumentando o seguinte sobre os seus autores:

    Cegos pela vaidade e pela ambio de remontar a gnese da instituio auma alta antiguidade, (...) se deixaram induzir em erro pela analogiaexistente entre os smbolos e os costumes das Lojas e os dos antigosmistrios. Em vez de procurar a maneira como essas prticas foramintroduzidas na Franco-Maonaria, eles se apoiaram em hipteses paraconvert-las na prpria origem da instituio, considerando-as comoindicao certa de filiao direta.40

    De fato, o arcabouo simblico manico41 tributrio de diversos povos e

    tradies antigas, a exemplo dos egpcios, dos druidas, dos hermticos e da cabala. Hainda elementos dos universos greco-romanos, judaico-cristos e medievais. Todo esse

    conjunto de signos e sinais apropriados pelos maons contribuiu para reforar as

    38 LEADBEATER, C. W. Pequena histria da maonaria. So Paulo: Ed. Pensamento, 2000, Prlogo.39 AZEVEDO, op. cit., 1996-1997, p. 180.40 BENIMELI, Jos Antonio Ferrer. Arquivos secretos do Vaticano e a franco-maonaria. So Paulo:Madras, 2007, p. 25.41

    Sobre os conceitos manicos e sua linguagem simblica, ver: MELLOR, Alec. Dicionrio da franco-maonaria e dos franco-maons. So Paulo: Martins Fontes, 1989; MACNULTY, W. Kirki.A maonaria:smbolos, segredos, significado. Trad. Marcelo Brando Cipolla. So Paulo: Martins Fontes, 2007.

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    interpretaes que conferiam sua ordem uma origem remota, gloriosa e distante no

    tempo.

    Na verdade, ressaltando a sua antiguidade, quase todas essas narrativas buscaram

    cobrir a maonaria com um vu de nobreza e legitimidade. Conforme sugerido por

    Marco Morel e Franoise Jean de Oliveira Souza:

    Mais do que desacreditar as lendas, vale assinalar o cho de onde se sonha.A ponte imaginria que uma narrativa lendria constri entre o passado e opresente pode servir como sal da vida, uma vez que ajuda a dar sentidomaior para um cotidiano muitas vezes sem graa.42

    Embora o foco de nossa anlise seja a dimenso histrica do fenmeno manico,

    no devemos simplesmente criticar e descartar os seus mitos, visto que em alguns casos

    eles podem se confundir com tradies histricas concretas. Vejamos, por exemplo, uma

    das mais difundidas narrativas manicas: a lenda de Hiram Abiff.

    Hiram Abiff, arquiteto fencio oriundo de Tiro, foi convocado pelo rei Salomo,

    durante o terceiro ano de seu reinado, para liderar a construo do templo de Jerusalm.

    Para realizar este feito, o distinto obreiro detentor de um refinado conhecimento

    arquitetnico e matemtico para o seu tempochefiou um grande nmero de pedreiros que

    foram divididos por ele em trs categorias: Aprendiz, Companheiro e Mestre. Cadaum desses graus hierrquicos possua os seus smbolos, cdigos e tcnicas especficas,

    alm de uma remunerao prpria e condizente com o nvel de habilidade de cada grupo.

    Reza a lenda que trs maus Companheiros cercaram Abiff exigindo a palavra

    secreta com o objetivo de atingir o grau mais elevado de Mestre. No entanto, o arquiteto

    fencio teria respondido que revelaria o segredo no momento oportuno. Inconformados

    com a recusa de Hiram, os vidos discpulos o teriam assassinado. Conta-se ainda que,

    posteriormente, foi descoberta uma accia plantada no local em que o corpo do Mestrehavia sido enterrado e, por fim, que ele teria ressuscitado.

    De acordo com Rizzardo da Camino, Hiram o arquiteto existiu realmente, e era

    citado nas histrias dos hebreus, contudo o seu assassinato que foi posto em dvida. No

    existem elementos seguros para se afirmar como e por que ocorreu esse assassinato.43

    Mesmo sem comprovao histrica, esse mito de fundao portador de um

    conjunto de ensinamentos ticos, morais e filosficos muito importantes para a liturgia

    42 MOREL; SOUZA, op. cit., p. 15.43 CAMINO, op. cit., p. 202.

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    manica. Por seu intermdio, irmos de todos os ritos so encorajados a seguir os

    exemplos de coragem, dignidade e fidelidade descritos nessa lenda, que muito utilizada

    nas cerimnias manicas, especialmente em seus rituais de iniciao. Segundo Marco

    Morel e Franoise Jean de Oliveira Souza:

    Os rituais de passagem baseiam-se em um esquema que comporta osofrimento, a morte e a ressurreio. Em geral, morre-se para a vida profana,sendo a morte a suprema iniciao, o comeo de uma nova existnciaespiritual (...). A ressurreio representada pelo desvendamento dos olhos,quando o nefito recebe a luz, ou seja, renasce como Hiram, transformado eexperimentando uma nova existncia de sabedoria.44 (grifos dos autores).

    Seja do ponto de vista histrico ou lendrio, preciso considerar que a memriamanica foi exaustivamente trabalhada pelos seus autores. Apesar de toda a polmica

    envolvendo a origem da maonaria, praticamente um consenso entre os estudiosos

    acadmicos que a mesma remonta s corporaes de ofcio das dcadas finais da Idade

    Mdia, quando os pedreiros e suas tcnicas especializadas erguiam as grandes igrejas e

    preparavam o terreno para o posterior surgimento de um moderno grupo secreto.

    Entre as mltiplas associaes medievais, a dos construtores de catedrais se

    destacava por ser detentora de algumas especificidades, a exemplo do simbolismo

    esotrico e do contedo cristo. A respeito desse seleto grupo de talhadores de pedra, Jos

    Antonio Ferrer Benimeli nos indicou que:

    O esquadro, o nvel e o compasso converteram-se em seus atributos esmbolos caractersticos. Decididos a formar um corpo independente damassa de obreiros, imaginaram senhas entre si e toques para se reconhecer.Chamavam isso de instruo verbal, saudao e senha manual. OsAprendizes, os Companheiros e os Mestres eram recebidos com cerimniasparticulares e secretas. O Aprendiz elevado ao grau de Companheiro jurava

    jamais divulgar, em palavras ou por escrito, os dizeres secretos de saudao.Era proibido aos Mestres, e tambm aos Companheiros, ensinar aosestranhos os estatutos constitutivos da Maonaria.45

    A passagem acima descreveu os primrdios do que foi chamado de maonaria

    operativa. No foi sem motivo, portanto, que alguns dos seus principais smbolos tiveram

    origem na arte de construo de alvenaria, a exemplo do esquadro, do compasso, do

    malhete, entre outros.

    44 MOREL; SOUZA, op. cit., p. 25.45 BENIMELI, op. cit., p. 32.

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    A utilizao desses smbolos, primeira vista, pode parecer difcil de ser concebida

    para os indivduos letrados da contemporaneidade. No entanto, no devemos perder de

    vista o fato de que a maior parte dos pedreiros medievais era formada por indivduos

    desprovidos de instruo formal.

    Por esta razo, o uso de elementos simblicos possibilitou o melhor aprendizado

    das tcnicas e, paulatinamente, promoveu um escalonamento hierrquico de sinais e

    signos, sendo considerados mais elevados aqueles que os entendiam e os empregavam de

    forma correta nos trabalhos de edificao.

    O sigilo sobre o que era aprendido no interior de cada um dos graus hierrquicos

    outro aspecto de fundamental importncia para a manuteno das especificidades de seus

    membros. O to propalado segredo manico moderno , afinal, herdeiro direto dessastradies medievais. Para Eliane Lucia Colussi, este grupo oculto de noes

    (...) estava relacionado a um juramento que implicava a no revelao doconjunto dos conhecimentos tcnicos (especialmente matemticos) da arteda construo (...). O segredo da arte de construo foi cercado de rituais esmbolos, religiosos ou no, que garantiriam legitimidade e maiorpermanncia do monoplio.46

    O juramento referido na transcrio anterior foi mais uma das caractersticas

    provenientes do perodo medieval, sendo sua violao punida com o corte da garganta e/ou

    lngua do traidor, ou seja, supostamente com a pena de morte.

    Contudo, segundo Jos Antonio Ferrer Benimeli, essa ameaa se tratava apenas de

    uma alegoria, uma promessa revestida de formalidades, que no a tornam nem mais

    terrvel, nem mais slida, mas solenizam sua emisso, por meio de uma encenao teatral

    destinada a gravar uma lembrana durvel que impea seu descumprimento.47

    Sobre a origem do vocbulo franco-maom, o autor afirmou que existem verses

    diferentes para o seu aparecimento. Seu uso mais antigo teria ocorrido na Inglaterra, em

    1350, quando foi utilizado para distinguir os pedreiros que trabalhavam a pedra ornamental

    e os trabalhadores rudes rough-mason, termo aplicado aos escavadores ingleses. Uma

    segunda explicao se prende questo da independncia desses maons em relao aos

    membros de outras corporaes de ofcio, uma espcie de autonomia sindical.

    46 COLUSSI, op. cit., 2002, p. 5.47 BENIMELI, op. cit., p. 53.

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    No entanto, a interpretao mais aceita relaciona tal expresso aos privilgios

    inerentes aos construtores de catedrais, pois contando com o apoio e a proteo da Igreja

    catlica, os franco-maons estavam isentos de cumprir os estatutos ou ditos locais. Os

    tambm chamados pedreiros livres foram agraciados com as franquias: espcies de

    salvo-condutos, isto , autorizaes para ultrapassar livremente as fronteiras dos pases,

    tanto em perodos de paz como nos de guerra.48

    Com o advento dos sculos XVI-XVII, quando o florescimento do

    antropocentrismo, a expanso comercial e o surgimento do Renascimento desestruturaram

    o universo medieval, a maonaria tambm se modificou.

    As construes de catedrais chegavam ao seu final e os maons ocuparam-sede preferncia construo de edifcios profanos. Quando cessou aconstruo de grandes catedrais, as fraternidades e Lojas manicaspassaram pouco a pouco para as mos dos membros adotivos, ou os franco-maons aceitos.49

    Os maons-aceitos, tal como ficaram conhecidos, eram os nefitos originariamente

    estranhos ao exerccio da profisso de construtores. Suas incorporaes visavam a

    manuteno de privilgios adquiridos pela associao. Foram assim sendo incorporados

    s lojas arquitetos, prncipes e bispos.50 Ademais, a instituio manica se tornou um

    espao de especulao no sentido de debate e discusso sobre cincia e poltica (por isso o

    termo maonaria especulativa).51

    No entendimento de Clia Maria Marinho de Azevedo, a associao depedreiros

    livres pode ser considerada como a continuao por um lado, e a transformao por outro,

    da organizao de ofcio da Idade Medieval e da Renascena, quando o elemento

    especulativo se sobreleva ao elemento operativo.52

    Os detalhes da transformao de uma organizao medieval de artesos habilidosos

    em uma espcie de clube filosfico de cavalheiros permanecem desconhecidos, mas

    prudente relacion-la emergncia do movimento iluminista, quando a ruptura com a

    tradio, a emergncia da idia de progresso e a valorizao do indivduo algumas das

    principais marcas da Ilustraoforam incorporadas ao iderio manico.

    48 Ibid, p. 36-37.49 Ibid., p. 41.50

    COLUSSI, op. cit., 1998a, p. 26.51 Id., 2002, p. 5.52 AZEVEDO, op. cit., 1996-1997, p. 180.

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    Na verdade, influncias medievais, renascentistas e iluministas, haviam se fundido

    para criar uma instituio que parecia refletir o esprito progressivo da poca, com ideais

    de irmandade, igualdade, tolerncia e razo.53 O ano de 1717momento de fundao da

    Grande Loja de Londres, a partir da unio de quatro lojas inglesas pr-existentes

    normalmente apontado como marco inicial da maonaria especulativa ou moderna. Na

    opinio de David Stevenson:

    A data quase irrelevante no longo processo de avano do movimento [detransformao da maonaria], pois embora a Grande Loja Inglesa tenha tidoum importante papel na organizao da Maonaria, quando fundada elaapenas reuniu quatro Lojas de Londres (...). Entretanto, o fato de a Inglaterrater dado o primeiro passo em direo organizao nacional por meio de

    Grandes Lojas, e de tal gesto ser imitado subseqentemente na Irlanda(1725) e na Esccia (1736), levou muitos historiadores manicos ingleses aconcluir levianamente que a Maonaria se originou na Inglaterra, que depoisa teria passado para o resto do mundo.54

    O historiador apontou evidncias que indicam a Esccia do sculo XVII, durante a

    fase final da Renascena, como a gnese da maonaria especulativa. Nesse sentido, os

    elementos manicos modernos essenciais seriam de origem escocesa e no inglesa,

    conforme os dados presentes no quadro abaixo.

    Compilao resumida das evidncias que apontam para o surgimento damaonaria moderna na Esccia (sculo XVII)

    Atas e registros mais antigos j localizados de lojas manicasUso primordial da palavra loja no sentido manico moderno

    Primeiras tentativas de organizao manica em mbito nacionalIncluso original de elementos no operativos nos quadros manicosPrimeiras referncias Palavra do Maom a senha manica secreta

    Primeiras evidncias indicativas de que a maonaria era considerada sinistra ou

    conspirativaDescries inditas de cerimnias de iniciao e o uso singular de smbolos associados a

    idias ticas e morais especficasPrimeiras evidncias concretas da utilizao de dois graus na maonaria e a indicao

    primordial dos termos Aprendiz e Companheiro para os mesmosFonte: STEVENSON, David.As origens da maonaria: o sculo da Esccia (1590-1710). So Paulo:

    Madras, 2009, passim

    53

    STEVENSON, David. As origens da maonaria: o sculo da Esccia (1590-1710). So Paulo: Madras,2009, p. 23.54 Ibid., p. 20.

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    Se por um lado o processo histrico de transio da maonaria se deu,

    primeiramente, na Esccia (onde as minutas mais antigas com a participao de membros

    aceitos datam do alvorecer do sculo XVII), por outro, o prprio David Stevenson

    reconheceu que no sculo XVIII, os ingleses comearam a inovar e adaptar o movimento

    embora a influncia escocesa permanecesse forte; nesse ponto, a Inglaterra assumiu a

    liderana no desenvolvimento da Maonaria.55

    O sculo XVIII ingls marcou a emergncia do ambiente manico secreto,

    baseado nos princpios de uma fraternidade que se colocava acima das religies e das

    confisses. Para alm do segredo e dos rituais, o que estava presente era uma organizao

    diretamente associada s questes da Ilustrao e influenciada pelos acontecimentos que o

    mundo vivenciou naquele contexto, como o desenvolvimento das denominadasRevolues Burguesas.

    Na Inglaterra reinava um esprito maior de liberdade, atravs da existncia de uma

    Constituio, de um Parlamento e de uma imprensa atuante. Assim, os maons obtiveram o

    espao necessrio para crescer, inclusive com a atrao de membros da aristocracia e da

    prpria realeza para o interior das suas instituies.

    A historiadora Margaret C. Jacob resumiu as transformaes inglesas do sculo

    XVIII por meio da nfase nas prticas representativas e constitucionais, que Londressimbolizava como centro do debate parlamentar e dos partidos polticos.56 Mesmo tendo

    iniciado sua expanso em um cenrio favorvel, as maonarias inglesas no abriram mo

    da discrio e do segredo.

    Em que pese a liberalidade sempre reinante na Inglaterra, onde jamaismaons sofreram as perseguies e humilhaes sofridas em outras partes domundo, a necessidade de reserva nas referncias instituio era mais nosentido de autopreservao, numa poca de instabilidade poltica, com um

    rei devasso e inoperante, ocupando o trono ingls desde 1714.57

    A fundao da Grande Loja de Londres, em 1717, foi um episdio supervalorizado,

    nos devidos termos de David Stevenson, mas pode ser utilizada como uma referncia para

    o contexto de surgimento da maonaria moderna, uma vez que:

    55 STEVENSON, loc. cit.56 JACOB, Margaret C. Living the Enlightenment: freemasonry and politics in eighteenth-century Europe.

    New York: Oxford University Press, 1991, p. 36-37 apud BARATA, op. cit., 2002, p. 21.57 CASTELLANI, Jos. A Constituio de Anderson de 1723: texto bsico. In: ______; RODRIGUES,Raimundo. Anlise da Constituio de Anderson. Londrina: Editora manica A Trolha, 1995, cap. 2, p. 47.

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    A partir desse momento, realiza-se a mudana na orientao da fraternidademanica, pois, mesmo conservando escrupulosamente o esprito da antigaconfraria, com seus princpios e usos tradicionais, abandonar-se-ia a arte da

    construo para os trabalhadores profissionais, mas se manteriam todos ostermos tcnicos e os sinais usuais que simbolizavam a arquitetura dostemplos, embora para tais expresses se lhes tenha dado um sentidosimblico. A partir desse perodo, a Maonaria transformou-se em umainstituio cuja caracterstica era a obteno de uma finalidade tica,suscetvel de se propagar em todos os povos civilizados. Do ponto de vistajurdico, essa foi a vitria do direito escrito sobre o costume e o nascimentode um novo conceito, o da obedincia ou federao de Lojas. No futuro, aque residir a soberania, pois somente a Grande Loja ter autoridade paracriar novas Lojas. E com isso, de fato, surgiu uma legitimidade manicachamada Maonaria Regular.58 (grifo do autor).

    Segundo Jos Castellani, antes da inaugurao do templo manico, tal como ele

    conhecido atualmente, os irmos realizavam as suas reunies em tabernas e cervejarias,

    ou nos adros das igrejas, numa prtica herdada das organizaes de ofcio, pois as tabernas

    europias serviam como local de concentrao e reunio de obreiros do mesmo ofcio.59

    As lojas que originaram o organismo manico central em 1717 tinham os nomes

    ligados s cervejarias The Goose and Gridiron (O Ganso e a Grelha) e The Crown (A

    Coroa), como tambm s tabernas The Apple Tree (A Macieira) e The Rummer and

    Grapes (O Copzio e Uvas).

    Desde o nascimento da Grande Loja de Londres surgiram descontentamentos em

    relao sua autoridade. Esse movimento questionador provocou, em 1751, a fundao de

    uma nova entidade que se autodenominava Grande Loja dos Antigos. As principais crticas

    dirigidas aos modernos estavam relacionadas descristianizao dos rituais e

    omisso das oraes e comemoraes dos dias santos.

    De acordo com Jos Castellani, os obreiros antigos, ou seja, aqueles que no se

    subordinaram Grande Loja de Londres buscavam reviver a Antiga Arte Real, segundo

    os verdadeiros princpios manicos.60 Liderados por seu grande secretrio o irlands

    Laurence Dermottque publicou um livro intituladoAhiman Rezon,61 a Grande Loja dos

    58 BENIMELI, op. cit., p. 43.59 CASTELLANI, Jos. A Constituio de Anderson de 1723: texto bsico. In:______; RODRIGUES, op.cit., p. 52.60 CASTELLANI, Jos. A Constituio de Anderson e a dos Antigos. In: ______; RODRIGUES, op. cit.,cap. 1, p. 28.61

    Este livro tornou-se a Constituio da Grande Loja dos Antigos. O nome Ahiman Rezon oriundo dohebraico ahim = irmos; manah = escolher e ratzon = lei. A frase significa Conselho dado a um irmo.Ibid., p. 35. (grifos do autor).

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    Antigos logo atingiu um nmero significativo de adeptos e passou a rivalizar com a Grande

    Loja de Londres at o ano de 1813, ocasio em que as duas Potncias manicas se uniram

    para formar a Grande Loja Unida da Inglaterra.

    Percebemos que as rivalidades no interior da maonaria moderna esto presentes

    desde o seu aparecimento, o que nos autoriza a utilizar o termo maonarias, no plural.

    Dentro dessa lgica:

    Ainda que surgida e difundida como um movimento mundial, a Maonariase diversificava de forma mais espantosa. A Instituio parecia um Proteu,mudando de forma e contedo de acordo com as circunstncias e filiao.Era capaz de proporcionar uma estrutura institucional para quase todas asreligies e crenas polticas.62

    Aps o movimento de organizao e expanso no sculo XVIII, coube Grande

    Loja de Londres a tarefa de reunir as antigas regras e normas manicas. Essa compilao

    foi iniciada em 1721 e finalizada apenas no ano de 1723, durante o gro-mestrado do

    duque Wharton.

    Trata-se do Livro das Constituies carta magna da maonaria especulativa

    contendo a histria lendria da instituio, alm de seus preceitos e regulamentos bsicos.

    Escrito por dois pastores protestantes, James Anderson (1684-1739), cujo nome aparece

    representado no frontispcio das Constituies e John Thophile Desaguliers (1683-1744),

    esse trabalho se tornou o instrumento jurdico bsico das maonarias modernas.

    Para Jos Castellani, os captulos mais importantes so os que se referem s

    Antigas Leis Fundamentais (Old Charges), sendo o trecho seguinte um dos mais citados

    e comentados em todo o mundo:

    DEVERES DE UM MAOM

    1.CONCERNENTE A DEUS E RELIGIOO Maom est obrigado, por seu ttulo, a praticar a moral; e, se compreenderseus deveres, jamais se converter em um estpido ateu nem em irreligiosolibertino. Apesar de, nos tempos antigos, os Maons estarem obrigados apraticar, em cada pas, a religio local, tem-se como mais apropriado, hoje,no lhes impor seno a religio sobre a qual todos os homens esto deacordo, dando-lhes total liberdade com referncia s suas prprias opiniesparticulares. Esta consiste em serem homens bons e sinceros, homenshonrados e justos, seja qual for a denominao ou crena particular que elespossam ter. Donde se conclui que a Maonaria um Centro de Unio e o

    62 STEVENSON, op. cit., p. 23.

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    meio de conciliar uma verdadeira amizade entre pessoas que, de outramaneira, ficariam perpetuamente separadas.63 (grifos nosso).

    importante destacar os ideais de tolerncia religiosa presentes no texto fundador

    da maonaria especulativa. O extrato acima menciona uma religio sobre a qual todos os

    homens esto de acordo. Devemos levar em considerao que os seus autores foram

    influenciados pelo terror das guerras de religio, as quais provocaram muito sofrimento e

    destruio na Europa.

    Assim sendo, os pastores compiladores dessas Constituies buscaram criar um

    clima de tolerncia e uma atmosfera de fraternidade. O historiador Jos Antonio Ferrer

    Benimeli, prudentemente, nos chamou ateno para o seguinte aspecto relacionado a essa

    temtica:

    Quanto essa religio a respeito da qual todos os homens esto de acordo,no nos enganemos, a mesma no pode ser outra seno a religio crist.Nenhuma outra tem relevncia na Inglaterra, nem mesmo na Europa. Masessa religio crist, em sua diversidade, aquilo que Roma no podiaadmitir, e por essa razo o papado vai combater a Maonaria. No fundo, peloartigo primeiro, retirou-se do catolicismo o privilgio de ser a religiotradicional da Maonaria.64

    A f sempre ocupou uma posio de destaque na doutrina manica. Em 1813, aps

    a fuso da Grande Loja dos Antigos com a dosModernos, o corpo original da Constituio

    Andersoniana sofreu alteraes para acomodar as concepes das duas Obedincias. Em

    1815 foi publicada a nova redao das Antigas Leis Fundamentais, cujas diretrizes

    bsicas foram expostas da seguinte forma:

    Um Maom obrigado, por seu ttulo, a obedecer lei moral e, se

    compreender bem a Arte, nunca ser ateu estpido, nem libertino irreligioso.De todos os homens, deve ser o que melhor compreende que Deus enxergade maneira diferente do homem, pois o homem v a aparncia externa aopasso que Deus v o corao. Seja qual for a religio de um homem, ou

    forma de adorar, ele no ser excludo da Ordem, se acreditar no gloriosoArquiteto do Cu e da Terra e se praticar os sagrados deveres da moral.65

    (grifos nosso).

    63 CASTELLANI, Jos. A Constituio de Anderson de 1723: texto bsico. In:______; RODRIGUES, op.cit., p. 38.64

    BENIMELI, op. cit., p. 49.65 CASTELLANI, Jos. A Constituio de Anderson de 1815: modificada em seu texto metafsico bsico.In:______; RODRIGUES, op. cit., cap. 3, p. 53.

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    Pela passagem destacada, notamos que um dos deveres mais importantes dos

    pedreiros livres o de serem fiis a Deus. Conforme evidenciado por Jos Castellani, ao

    liberalismo e tolerncia religiosa da original compilao de Anderson, sucedia uma

    crena impositiva e (...) marcadamente testa.66 Essa modificao, porm, provocou

    descontentamentos e algumas Potncias manicas optaram pela manuteno do texto

    original elaborado em 1721.

    Com efeito, a exigncia da crena em uma divindade provocou srias rupturas no

    relacionamento entre os maons. Em 1867, por exemplo, o Grande Oriente da Blgica

    excluiu as referncias ao Grande Arquiteto do Universo de seus rituais. Dez anos depois, o

    Grande Oriente da Frana seguiu o caminho belga e provocou uma ciso que permanece

    at os dias de hoje.A Grande Loja Unida da Inglaterra declarou irregular o Grande Oriente da

    Frana e os demais que suprimiram a f religiosa no Arquiteto do Cu e da Terra.

    Segundo Alexandre Mansur Barata:

    Aprofundou-se a ciso no seio da comunidade manica. Os ideais de cadaObedincia tornaram-se cada vez mais divergentes, consolidando,basicamente, duas correntes de pensamento: a francesa, nitidamente maisracionalista, defensora da liberdade de conscincia e republicana; e a inglesa,mais conservadora e religiosa.67

    De forma anloga, a maonaria se fragmentou no que diz respeito aos seus ritos.

    Rizzardo da Camino definiu rito como o conjunto de regras e preceitos com os quais se

    praticam as cerimnias, comunicam-se os sinais, toques, palavras e todas as instrues

    secretas necessrias ao bom desempenho dos trabalhos. a literatura manica.68 O

    autor identificou e descreveu 117 ritos em seuDicionrio manico.

    Outra diviso existente a que classifica a maonaria em simblica oufilosfica. A

    primeira utiliza apenas os trs graus obrigatrios (Aprendiz, Companheiro e

    Mestre), estabelecidos desde a Constituio de Anderson e comum a todos os ritos. A

    segunda funciona com quatro ou mais graus, dependendo do rito adotado. Os graus

    posteriores aos trs primeiros so conhecidos como de aperfeioamento oufilosficos.

    Apesar das mltiplas divergncias, a difuso das maonarias ocorreu rapidamente

    ao redor do mundo, porm de maneira irregular. Em pases onde o poder da Igreja catlica

    66

    Ibid., p. 54.67 BARATA, op. cit., 1999, p. 41.68 CAMINO, op. cit, p. 338.

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    ainda permanecia forte, a exemplo de Portugal e Espanha, esse processo foi prejudicado.

    No que se refere ao nosso territrio, o surgimento das instituies manicas permanece

    envolto em uma questo obscura, pois da mesma forma que alguns relatos sobre as origens

    da maonaria internacional so totalmente fantasiosos, existem textos fundacionais

    brasileiros que carecem de comprovao histrica.

    o caso de uma difundida verso que aponta a loja intitulada Cavaleiros da Luz

    como a primeira organizao manica do Brasil. De acordo com algumas narrativas,

    mesmo antes de sua instalao fsica, ocorrida em 1797, no povoado da Barra, Bahia; as

    sesses iniciais desta suposta loja j teriam ocorrido a bordo da fragata francesa La

    Preneuse, que se encontrava ancorada nas guas de Salvador, sob o comando de monsieur

    Larcher.No entanto, at o final do sculo XVIII, no existia no Brasil a Maonaria,

    entendendo-se como uma organizao institucionalizada e com funcionamento regular nos

    mesmos moldes das outras organizaes manicas internacionais .69 Na mesma linha de

    raciocnio, David Gueiros Vieira argumentou que a primeira notcia escrita que se teve no

    estrangeiro sobre o estabelecimento da maonaria no Brasil, foi o manifesto de 1832,

    publicado noMasonic World Wide-Register, redigido por Jos Bonifcio.70

    Neste documento, Jos Bonifcio indicou que as primeiras lojas no pas foramfundadas em 1801 e 1802, no Rio de Janeiro e na Bahia, respectivamente, e se filiaram a

    Grande Loja Francesa.

    Em virtude da falta de documentos comprobatrios, no foi possvel precisar uma

    data oficial para a instalao manica no Brasil. Por esta razo, recomendvel registrar

    os principais fatos iniciais da maonaria brasileira.

    O quadro abaixo, baseado em dados compilados pelo historiador manico Jos

    Castellani, resume os principais aspectos da histria dessa sociedade secreta em nosso pas,desde os seus primrdios at a fundao do primeiro Grande Oriente nacional.

    Cronologia dos primrdios da maonaria brasileiraDATA FATO1796 Fundao, em Pernambuco, do Arepago de Itamb,

    sociedade criada sob inspirao manica1797 Instalao da loja Cavaleiros da Luz na Bahia1800 Criao, em Niteri, da loja Unio

    69 BARATA, op. cit., 1999, p. 59.70 VIEIRA, op. cit., p. 41.

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    1801 Inaugurao da loja Reunio, sucessora direta da Unio1802 Estabelecimento da loja Virtude e Razo na Bahia1804 Fundao das lojas Constncia e Filantropia no Rio de

    Janeiro

    1806 Fechamento, pela ao do conde dos Arcos, das lojasConstncia e Filantropia

    1807 Instalao da loja Virtude e Razo Restaurada, sucessora daVirtude e Razo

    1809 Criao, em Pernambuco, da loja Regenerao1812 Inaugurao da loja Distintiva, em So Gonalo da Praia

    Grande (Niteri)1813 Estabelecimento, na Bahia, da loja Unio1815 Fundao, no Rio de Janeiro, da loja Comrcio e Artes1818 Expedio de Alvar proibindo o funcionamento das

    sociedades secretas1821 Reinstalao da loja Comrcio e Artes1822 17 de junho: fundao do Grande Oriente

    Fonte: CASTELLANI, Jos. Os primrdios da maonaria no Brasil. In: ______; CARVALHO, WilliamAlmeida de.Histria do Grande Oriente do Brasil: a maonaria na histria do Brasil. So Paulo: Madras,

    2009, cap. 2, p. 31

    A partir da fundao do Grande Oriente do Brasil, a recm nascida maonaria

    brasileira se transformou em uma clula do sistema obediencial internacional e, durante

    todo o sculo XIX,

    (...) recebeu forte influncia especialmente da [maonaria] francesa que, notranscorrer daquele sculo, foi assumindo gradativamente posicionamentospolticos liberais, anticlericais, laicizistas e racionalistas. Exemplo disso foi oGrande Oriente da Frana, que (...) excluiu de seus estatutos a obrigao (...)da crena em Deus, na imortalidade da alma e do juramento sobre a Bblia(...). As maonarias da Inglaterra e dos Estados Unidos reagiram a isso deforma radical e, juntamente com outros pases, romperam relaes com a daFrana e demais pases sob a sua influncia. Assim, consolidaram-se duas

    principais vertentes manicas que j h muitas dcadas atuavam comperspectivas diferentes: a considerada por alguns historiadores comomaonaria regular, ou ortodoxa, e a outra, a maonaria irregular,heterodoxa.71 (grifos da autora).

    Mais uma vez, a rivalidade acima descrita ilustra a ausncia de homogeneidade no

    interior das instituies manicas. Em um debate organizado recentemente pela Fundao

    Biblioteca Nacional, a historiadora Isabel Lustosa chamou ateno para as contradies das

    71 COLUSSI, op. cit., 1998a, p. 31.

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    maonarias brasileiras durante a primeira metade do sculo XIX, afirmando que no havia

    concordncia no pensamento poltico dos grupos que atuaram no Movimento de 1822.

    Dentro dessa lgica, foram percebidos diversos conflitos internos entre os

    partidrios que defendiam a forma republicana de governo para o Brasil independente, a

    exemplo de Joaquim Gonalves Ledo, e os seus concorrentes, entre os quais se destacavam

    Hiplito da Costa e Jos Bonifcio, que visavam a manuteno do regime monrquico.

    Portanto, apesar de uma aparente unio interna, a oposio entre republicanos e

    monarquistas indicou as divergncias no seio dos maons brasileiros. Isabel Lustosa

    concluiu sua exposio afirmando que Gonalves Ledo foi um dos maiores idealistas do

    Brasil, ao lado do Hiplito da Costa, que era o oposto dele. Os dois do a dimenso do que

    era o papel da maonaria no momento de nossa independncia.72

    Alm de toda essa competio interna, a maneira pela qual se processou a expanso

    manica pelo mundo abriu caminho para o estabelecimento de particularidades nacionais.

    Em nosso pas, os testemunhos manicos conferiram sua organizao um papel

    destacado durante o processo de independncia em relao a Portugal.

    Esse fato foi atestado por vrios historiadores acadmicos brasileiros, que

    identificaram os pedreiros livres como um dos principais grupos formadores da

    emancipao poltica do Brasil. No entendimento de Marco Morel, por exemplo, asatividades manicas se constituram em um importante espao de debate e coordenao

    de foras polticas que atuaram no Movimento de 1822.73

    O primeiro Grande Oriente do Brasil foi fundando em 1822, dentro do contexto da

    efervescncia de idias advindas do(s) projeto(s) de independncia brasileira. Sua

    composio inicial oriunda da loja Comrcio e Artes contava com personalidades

    conhecidas da histria brasileira, a exemplo de Jos Bonifcio, Gonalves Ledo e do

    prprio dom Pedro I, que rapidamente se t