perfil socioeconômico de mulheres feirantes: um estudo no interior

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Vitória da Conquista Bahia 05 a 07 de junho de 2013 1 Perfil Socioeconômico de Mulheres Feirantes: um estudo no interior baiano Almiralva Ferraz Gomes 1 Joice de Souza Freitas Silva 2 Adilson Almeida dos Santos 3 Weslei Gusmão Piau Santana 4 José Antonio Gonçalves dos Santos 5 Resumo As feiras livres são espaços de importância comercial e cultural bem como de inclusão social, em especial para muitas mulheres. Elas são o objeto desta pesquisa, que lida com a percepção atual do contexto do trabalho, tomando as feiras como espaços de construção histórico- cultural. Dentro desta perspectiva, buscou-se conhecer a realidade socioeconômica e empresarial de mulheres que atuam na Central de Abastecimento Edmundo Flores, localizada em Vitória da Conquista. O objetivo proposto foi alcançado a partir de uma pesquisa do tipo exploratório-descritiva, de um suporte teórico, além de recorrência à pesquisa empírica. Os resultados revelaram que a opção por tornar-se feirante, em muitos casos, surgiu da necessidade. No entanto, através de trabalho árduo, elas se inseriram neste mercado, que faz poucas exigências de qualificação. Essas mulheres enfrentam um trabalho duro em seus cotidianos laborais e transpuseram e continuam transpondo, dia a dia, inúmeras dificuldades para manterem-se no mundo do trabalho. Introdução As feiras livres, desde a Antiguidade, têm se mostrado um importante meio de comercialização de produtos, principalmente agrícolas e artesanais, mas também podem ser entendidas como espaço de lazer e de encontros. Não seria despropositado considerá-las como artefatos culturais, resilientes ao passar do tempo, apesar do declínio e de seus desafios crescentes frente às novas demandas, que remetem ao questionamento de seus métodos tanto de comercialização como de manipulação de produtos, considerados por muitos como ultrapassados. Da mesma forma, seria razoável apontar que as feiras livres são locais propícios para inserção inicial no mercado de trabalho, uma vez que as atividades ali desenvolvidas não exigem muita capacitação e/ou experiência. Mais ainda, segundo Godoy (2005), as feiras livres possuem uma grande capacidade de absorção de mão de obra feminina. Com as dificuldades de se inserirem em outros setores, muitas mulheres atuam como feirantes, também por ser esta também uma atividade que permite uma maior flexibilidade de horários 1 Doutorado em Administração, Professora Adjunto da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, [email protected] 2 Graduanda em Administração, Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, Bolsista PIBIC/CNPQ, [email protected] 3 Engenheiro Florestal, Secretaria de Meio Ambiente Agropecuária e Desenvolvimento, Sustentável de Jiquiriça, [email protected] 4 Doutorado em Administração, Professor Adjunto da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, [email protected] 5 Mestre em Economia, Professor Assistente da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, [email protected]

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Vitória da Conquista – Bahia – 05 a 07 de junho de 2013

1

Perfil Socioeconômico de Mulheres Feirantes: um estudo no interior baiano

Almiralva Ferraz Gomes

1

Joice de Souza Freitas Silva2

Adilson Almeida dos Santos3

Weslei Gusmão Piau Santana4

José Antonio Gonçalves dos Santos5

Resumo

As feiras livres são espaços de importância comercial e cultural bem como de inclusão social,

em especial para muitas mulheres. Elas são o objeto desta pesquisa, que lida com a percepção

atual do contexto do trabalho, tomando as feiras como espaços de construção histórico-

cultural. Dentro desta perspectiva, buscou-se conhecer a realidade socioeconômica e

empresarial de mulheres que atuam na Central de Abastecimento Edmundo Flores, localizada

em Vitória da Conquista. O objetivo proposto foi alcançado a partir de uma pesquisa do tipo

exploratório-descritiva, de um suporte teórico, além de recorrência à pesquisa empírica. Os

resultados revelaram que a opção por tornar-se feirante, em muitos casos, surgiu da

necessidade. No entanto, através de trabalho árduo, elas se inseriram neste mercado, que faz

poucas exigências de qualificação. Essas mulheres enfrentam um trabalho duro em seus

cotidianos laborais e transpuseram e continuam transpondo, dia a dia, inúmeras dificuldades

para manterem-se no mundo do trabalho.

Introdução

As feiras livres, desde a Antiguidade, têm se mostrado um importante meio de

comercialização de produtos, principalmente agrícolas e artesanais, mas também podem ser

entendidas como espaço de lazer e de encontros. Não seria despropositado considerá-las como

artefatos culturais, resilientes ao passar do tempo, apesar do declínio e de seus desafios

crescentes frente às novas demandas, que remetem ao questionamento de seus métodos tanto

de comercialização como de manipulação de produtos, considerados por muitos como

ultrapassados.

Da mesma forma, seria razoável apontar que as feiras livres são locais propícios para

inserção inicial no mercado de trabalho, uma vez que as atividades ali desenvolvidas não

exigem muita capacitação e/ou experiência. Mais ainda, segundo Godoy (2005), as feiras

livres possuem uma grande capacidade de absorção de mão de obra feminina. Com as

dificuldades de se inserirem em outros setores, muitas mulheres atuam como feirantes,

também por ser esta também uma atividade que permite uma maior flexibilidade de horários

1 Doutorado em Administração, Professora Adjunto da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia,

[email protected] 2 Graduanda em Administração, Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, Bolsista PIBIC/CNPQ,

[email protected] 3 Engenheiro Florestal, Secretaria de Meio Ambiente Agropecuária e Desenvolvimento, Sustentável de Jiquiriça,

[email protected] 4 Doutorado em Administração, Professor Adjunto da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia,

[email protected] 5 Mestre em Economia, Professor Assistente da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia,

[email protected]

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(CARREIRA; AJAMIL; MOREIRA, 2001). Desse composto, por um ou outro motivo, tem-

se um conjunto de empreendedoras.

Esse fenômeno deve ser contextualizado considerando o aumento da participação

feminina no mercado de trabalho. O crescimento consistente da presença das mulheres na

esfera econômica contrasta com o padrão antigo, de exclusivas “donas do lar”. A já intensa

participação feminina no mundo do trabalho se dá nas várias esferas empresariais, destacando

a comercialização de produtos populares em feiras livres em grandes centros e no interior

brasileiro. Vitória da Conquista, no semiárido baiano, tomado como caso em estudo, possui

uma central de abastecimento que acolhe pouco mais de mil feirantes. Deste total, algo em

torno de 44% são mulheres que, na maioria das vezes, desdobram-se entre as atividades do lar

e o comércio no espaço destinado a realização da feira no centro da cidade. Levando-se em

conta a importância da feira enquanto espaço de construção histórica e cultural dos núcleos

populacionais e comerciais, levantou-se a seguinte questão de pesquisa: qual seria a realidade

socioeconômica de mulheres empreendedoras que atuam na Central de Abastecimento

Edmundo Flores, localizada no centro da cidade de Vitória da Conquista, Região Sudoeste da

Bahia?

Para efeito desta pesquisa de caráter exploratório-descritivo, foi aplicado um

questionário estruturado junto ao universo de mulheres feirantes do local. Os dados obtidos

foram submetidos à análise descritiva. Resultaram daí informações que permitiram algumas

inferências apresentadas ao longo das últimas seções deste artigo, que antes discorre sobre o

empreendedorismo no Brasil, a inserção no mercado de trabalho e as feiras livres.

Empreendedorismo no Brasil

Visto comumente como processo inovador, de mudanças, de criatividade e de risco, o

empreendedorismo é um tema que tem despertado interesse no meio econômico, político e

acadêmico. Todo o interesse por este tema dá-se por se tratar de um processo que induz

mobilização econômica e social que, de alguma forma, é responsável pelo crescimento e

fortalecimento das economias locais e melhoria das condições de vida de muitos cidadãos

(DEGEN, 1989; DORNELAS, 2001; GOIS, 2006; GOMES, 2006; PAIVA JR.; LEÃO;

MELLO, 2003; SCHUMPETER, 1982).

O empreendedorismo é acompanhado, desde 1997, pelo Global Entrepreneurship

Monitor (GEM), liderado pelo Babson College e pela London Business School. O GEM avalia

o empreendedorismo em vários países de todos os continentes e criou indicadores hábeis para

comparação entre os países pesquisados. De um modo geral, os relatórios emitidos pelo GEM

atestam que o empreendedorismo interfere na prosperidade econômica e que um país sem

altas taxas de criação de novas empresas corre o risco de estagnação econômica. Assim, o

GEM, propõe uma relação entre empreendedorismo e desenvolvimento. Já no Brasil, o

Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas – SEBRAE – e a Sociedade

Brasileira para Exportação de Software – SOFTEX – são as entidades mais voltadas ao estudo

do empreendedorismo (GOMES, 2006).

De acordo com a Tabela 1, o Brasil vem apresentando uma Taxa de Atividade

Empreendedora (TEA) girando em torno de 12, medida de acordo com o GEM, exceto em

2000, primeiro ano em que participou do GEM. Isso quer dizer que a cada 100 brasileiros, 12

realizam alguma atividade empreendedora. Em 2008, o Brasil ocupou a 13ª posição no

ranking mundial de empreendedorismo e, em 2009, a 14ª. Pela primeira vez, o Brasil ficou,

por dois anos consecutivos, fora do grupo dos dez países com as maiores taxas.

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Tabela 1. Evolução da Taxa de Atividade Empreendedora – TEA – no Brasil (2000-2010)

Fonte: Elaborado a partir de GLOBAL ENTREPRENEURSHIP MONITOR. Empreendedorismo no Brasil:

relatório nacional 2001 (2002). Curitiba: IBQP/SEBRAE. ______. Empreendedorismo no Brasil: 2010 (2010).

Curitiba: IBQP/SEBRAE. ______. Empreendedorismo no Brasil: 2009 (2010). Curitiba: IBQP/SEBRAE.

______. Empreendedorismo no Brasil: relatório executivo 2005 (2006). Curitiba: IBQP. ______.

Empreendedorismo no Brasil: relatório executivo 2006 (2007). Curitiba: IBQP. ______. Empreendedorismo no Brasil: relatório executivo 2007 (2008). Curitiba: IBQP/SEBRAE. ______. Empreendedorismo no Brasil:

relatório nacional 2003 (2004). Curitiba: IBQP/SEBRAE. _____. Empreendedorismo no Brasil: sumário

executivo 2004 (2005). Curitiba: IBQP/SEBRAE. ______. Relatório global de empreendedorismo no Brasil:

2002 (2003). Curitiba: IBQP/SEBRAE.

De acordo com o Relatório do GEM (2008), essa mudança se deve principalmente à

alteração no conjunto de países participantes da pesquisa GEM (2008) e não significa

necessariamente uma piora relativa do Brasil. Embora se tenha registrado uma queda por dois

anos consecutivos, o Brasil, segundo o GEM (2010) retornou ao grupo dos 10 primeiros.

Além disso, sua TEA tem sido superior à média dos países pesquisados pelo GEM. A TEA

média brasileira de 2001 a 2008 foi de 12,72% contra uma TEA média dos demais países de

apenas 7,25%. Isso indicaria a alta capacidade empreendedora nacional (GEM, 2008).

Isso remete a uma questão imediata: porque o brasileiro é considerado tão

empreendedor? Qual seria a razão que leva os indivíduos a abrir uma empresa? Estas questões

são por demais complexas e requer um estudo profundo e meticuloso, o que, aliás, não faz

parte do escopo do presente trabalho. No entanto, deve-se esclarecer que, desde 2001, a

pesquisa do GEM tem apresentado duas medidas para o empreendedorismo: as taxas de

empreendedorismo por necessidade ou por oportunidade. De acordo com o GEM (2002),

essas taxas possibilitam verificar se os motivos que levam as pessoas a montar um negócio

decorrem do aproveitamento de oportunidade ou se estão relacionados à falta de opções no

mercado de trabalho. Essa distinção traz novos elementos para a compreensão do fenômeno

do empreendedorismo, evidenciando a sua complexidade.

A taxa de empreendedorismo por oportunidade reflete, segundo o Relatório do GEM

(2008), o “lado positivo” da atividade empreendedora nos países. Segundo o Relatório do

GEM (2008), no caso brasileiro, o percentual daqueles que montam seu próprio negócio,

motivados pela oportunidade – seja pelo desenvolvimento de novos produtos (bens ou

serviços) ou processos, seja pela abertura de novos mercados ou pela adaptação de conceitos

novos para o mercado local – subiu de 38,5%, em 2007, para 45,8% em comparação com o

número de indivíduos que alegam estar empreendendo simplesmente porque não encontram

outra opção para auferir renda. Embora a taxa brasileira não seja como a norte-americana ou

francesa, que apresenta de sete a oito pessoas empreendendo por oportunidade,

respectivamente, para cada pessoa empreendendo por necessidade, o quadro brasileiro não é

tão desalentador, uma vez que já apresentou uma situação mais delicada quando tinha um

percentual muito mais significativo de pessoas motivadas pela necessidade ao invés de serem

motivadas pela oportunidade. Por último, cabe ressaltar que outros dados indicam que as taxas

Ano TEA Posição no ranking Quantidade de países participantes

2000 21,4 1º 21

2001 14,2 5º 29

2002 13,5 7º 37 2003 12,9 6º 27

2004 13,5 7º 34

2005 11,3 7º 35

2006 11,7 10º 42

2007 12,7 9º 40

2008 12,0 13º 60

2009 15,3 14º 54

2010 17,5 10º 59

Vitória da Conquista – Bahia – 05 a 07 de junho de 2013

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de mortalidade de empreendimentos abertos por necessidade é bastante superior a dos

empreendimentos iniciados por oportunidade, mais bem planejados e geridos por pessoas com

maior experiência (GEM, 2010). Tal realidade constitui-se em uma ameaça aqueles que

incorrem no empreendedorismo por falta de outra opção de inserção na categoria de

economicamente ativo, caso potencial das feirantes baianas em estudo.

Implantação do próprio negócio como forma de inserção no mercado de trabalho

É de certo que o elevado nível de empreendedorismo registrado no Brasil está

estreitamente atrelado a abertura de novos negócios. No entanto, especialmente no Brasil, o

elevado número de negócios iniciados, na maioria das vezes, não se sustenta por muito tempo.

Dados do SEBRAE (2003) apontam o primeiro ano após a abertura do negócio como o

momento mais crítico e instável, uma vez que a taxa de mortalidade das micro e pequenas

empresas chega a 80% antes de completarem o primeiro ano de funcionamento. A partir do

segundo ano de funcionamento a taxa de mortalidade dos novos negócios vai se reduzindo a

cada ano de sobrevivência completado pela empresa, mas os problemas enfrentados por elas

permanecem durante o período em que continuam operando. Segundo o IBGE (2006), a

mortalidade se dá tanto em negócios formais como informais mais ou menos nos mesmos

percentuais.

Uma das alternativas para o desemprego é o trabalho por conta própria que, segundo

definição do IBGE (2006), é composto pela categoria de trabalhadores que exploram o

próprio empreendimento, sozinhos ou com um sócio, sem empregar trabalhador assalariado.

As dificuldades quanto a se manterem de forma sustentável no mercado é explicada

principalmente porque, na maioria das vezes, micro e pequenas empresas são iniciadas por

empreendedores com pouca experiência gerencial. Na maioria das vezes, por não

conseguirem se alocar de outra forma no mercado de trabalho, estes sujeitos acabam por

iniciar seu próprio negócio mesmo sem experiência, correndo assim mais riscos que o risco

habitual do empreendedorismo (BENEDETTI; CARVALHO; DAROS, 2005).

Segundo Gomes (2006) e Lavinas (2003), a abertura do próprio negócio, em muitos

casos, decorre do imperativo de flexibilidade de horários. Muitas pessoas preferem trabalhar

para si mesmo como forma de conciliar a atividade empresarial com outras do dia a dia. Este

modelo aparentemente atrai as mulheres, que têm maior necessidade de conciliar a atividade

empresarial com as do lar, dentre outras, distanciando-se do modelo de empreendedorismo

por oportunidade, de maior risco.

Contextualização do cenário de pesquisa

A característica marcante de uma feira livre é a reunião de pessoas em um determinado

local para realizar vendas ou trocas de produtos. Na Idade Média, especialmente depois da

revolução agrícola e com o aumento da população, as pessoas se aglomeravam nas frentes dos

castelos para comercialização dos bens produzidos dentro dos feudos. No Brasil, a feira é

encontrada desde o tempo da colônia e ficaram mais populares com a chegada da família real,

em 1808, quando a Corte tomou algumas medidas que beneficiou a feira livre, como a

abertura dos portos às nações amigas. A história das feiras livres é longa e marcada por

diversas transformações. Em alguns momentos, inclusive, pensou-se que elas iriam

desaparecer, mas apesar dos percalços ocorridos, a feira livre persistiu e resistiu a todas essas

mudanças.

Para Sá (2010), o comércio de feira livre é ainda hoje uma atividade econômica e social

relevante para a vida de muitos brasileiros, principalmente no Nordeste do Brasil, onde parte

significativa da população possui ainda o hábito de fazer compras semanais nestes locais. No

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entanto, para Coutinho et al. (2006), apesar de resistir às inovações contemporâneas, as

feiras não têm acompanhado a evolução dos mercados e dos serviços prestados ao consumidor

na comercialização de alimentos. Ainda segundo estes autores, geralmente, é possível

observar, nas feiras, problemas como: falta de higiene, má estrutura das barracas,

comercialização de produtos não permitidos, falta de segurança e desorganização. Porém, do

ponto de vista cultural, a feira livre é uma importante instituição que resguarda tradições,

indiferente, inclusive, ao processo de modernização.

Especificamente, o objeto desta pesquisa está localizado no município de Vitória da

Conquista. Este município está situado na Região Sudoeste do Estado da Bahia e Sul do

Nordeste do Brasil, aproximadamente a 100 km da divisa Bahia-Minas. Vitória da Conquista

está a 509 km de distância da capital baiana. Não obstante a liderança da Região

Metropolitana de Salvador nos indicadores baianos, principalmente nos econômicos, o

município é considerado um portador de potencialidades e de perspectivas promissoras.

Vitória da Conquista possui uma dinâmica social e econômica fundamentada em bens e

serviços essenciais que atendem e destinam-se a sua área de influência. No entanto, a

economia conquistense desenvolveu-se, até os anos 1950, baseada na atividade pecuária, com

a criação extensiva de bovinos para a produção de carne. O município assumiu uma posição

central na Região, principalmente, a partir da construção da rodovia BR-116, no início dos

anos 1960, quando se tornou um importante ponto de apoio para o transporte de carga e de

passageiros (IBGE, 2009; VITÓRIA DA CONQUISTA, 2008). Como uma cidade de

entroncamento, cruzada por rodovias importantes, se tornou estratégica à medida que integrou

não só o Sudeste/Sul ao Nordeste do país como também a região cacaueira ao sertão da Bahia,

possibilitando o escoamento da produção e o incremento de seu comércio.

A Central de Abastecimento Edmundo Flores, também conhecida como Ceasa de

Vitória da Conquista, foi construída numa área antes denominada “Mamoneiras” (próximo à

“Baixa da Égua” - uma ladeira que permitia o acesso à Praça Hercílio Lima, entre o Centro e

o bairro São Vicente). A Central de Abastecimento foi construída com recursos municipais e

através de empréstimo financeiro realizado junto a uma instituição bancária. Inaugurada em

1986, ao longo dos anos, transformou-se numa grande Feira Popular. Idealizada como central

de abastecimento para comércio atacadista, caracteriza-se, hoje, principalmente, pela venda

direta ao mercado consumidor.

Figura 1. Vista parcial da Central de Abastecimento Edmundo Flores

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Fonte: Pesquisa de campo, abril de 2011.

Este importante equipamento urbano conta com cinco pavilhões cobertos, intercalado

por quatro rampas e abriga desde comerciantes de hortifrutigranjeiros, passando por

confecções e utilidades domésticas, até movelaria e açougues. Boa parte da cultura do

conquistense (natural de Vitória da Conquista) é percebida através dos produtos

comercializados na Central de Abastecimento Edmundo Flores. Nas duas últimas gestões

municipais, tem sido modernizado todo o seu entorno, construído novos sanitários públicos e

regularizado o pavilhão da Feira de Carnes. Além da área comercial, há ainda um prédio

administrativo que abriga a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social e a Secretaria

Municipal de Serviços Públicos. Ademais, o espaço físico da Central de Abastecimento além

de possuir água, esgotamento sanitário, luz e pavimentação asfáltica também disponibiliza

serviço de telefonia fixa. Segundo cadastro de feirantes disponibilizado pela Secretaria de

Serviços Públicos através da Gerência de Serviços Básicos, na área, estão organizados cerca

de 1.032 comerciantes.

Procedimentos Metodológicos

Para alcance do objetivo pré-estabelecido para o presente estudo, realizou-se uma

pesquisa do tipo exploratório-descritivo. Ademais, para alcançar o objetivo proposto, além de

um suporte teórico, também se recorreu à pesquisa empírica. Portanto, o caráter da presente

pesquisa é teórico-empírico tendo em vista que não só utilizou de análise da literatura sobre o

assunto, como também, buscaram, em campo, dados capazes de sustentar o desenvolvimento

deste estudo. Como técnica de pesquisa optou-se por um estudo tipo survey ou levantamento

tendo em vista que se pretendeu solicitar “informações a um grupo significativo de pessoas,

acerca do problema estudado, para em seguida, mediante análise quantitativa, obterem-se as

conclusões correspondentes aos dados coletados” (GIL, 1988, p. 56).

O instrumento utilizado para a coleta de dados foi o questionário estruturado para

facilitar a coleta e a tabulação dos dados. Como instrumento de coleta, o questionário permite

a obtenção de informações de um grande número de pessoas em um tempo relativamente

curto, além de apresentar relativa uniformidade entre as medições pelo fato de que o

vocabulário, a ordem das perguntas e as instruções são iguais para todos os respondentes. No

entanto, para conhecimento prévio do objeto de estudo da presente investigação entrevistou-se

o gerente de Serviços Básicos da Secretaria Municipal de Serviços Públicos. O roteiro de tal

entrevista não foi estruturado e visava basicamente sondar a realidade a ser estudada.

Outro instrumento de coleta de dados, que visou dar mais validade ao estudo, foi a

observação não participante. A observação do tipo não participante permitiu que os

pesquisadores atuassem como espectadores atentos, apenas observando e registrando as

ocorrências que interessavam ao trabalho. Ressalta-se ainda que a observação não participante

pode captar aspectos das relações sociais que permeiam o cotidiano laboral e que nem sempre

são percebidos através de outras técnicas de coleta de dados.

Por fim, como fonte secundária, utilizou-se de pesquisa documental junto ao arquivo da

Secretaria de Serviços Públicos no intuito de se identificar o quantitativo de mulheres que

atuam como feirante na Central de Abastecimento Edmundo Flores.

A população alvo da pesquisa foram mulheres feirantes que atuam na Central de

Abastecimento Edmundo Flores, no centro da cidade de Vitória da Conquista, Bahia. De

acordo com a Gerência de Serviços Básicos da Prefeitura Municipal de Vitória da Conquista,

existiam, no período da pesquisa, 1.032 empreendimentos cadastrados na Secretaria

Municipal de Serviços Públicos. A pesquisa nos documentos da Secretaria revelou que, deste

total, 455 estão registrados em nome de mulheres. No entanto, durante o período de coleta de

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dados, só foram identificadas 152 mulheres. Ao que parece, muitos empreendimentos estão

cadastrados em nome de mulheres, mas não são elas que os gerenciam. Quando abordadas, 36

negaram-se a participar da pesquisa. Na maioria das vezes, a justificativa foi a falta de tempo.

Portanto, diante de uma população estimada em 455 mulheres feirantes, foram aplicados

questionários junto a 116 mulheres que desempenham a função de feirante e dona do seu

próprio negócio na Central de Abastecimento. A amostra assim constituída pode ser

classificada como não-estatística. Não é apropriado inferir daí dados para a população e as

conclusões devem embutir tal restrição.

A coleta de dados foi realizada no mês de abril de 2011. Como sexta-feira e sábado são

os dias da semana em que há uma grande concentração de consumidores, portanto, a

prioridade das feirantes é atender ao cliente, optou-se por coletar os dados entre as segundas e

quintas-feiras. Antes de iniciar a coleta, foi realizado um pré-teste para verificar a validade e

fidedignidade do questionário que seria utilizado na pesquisa. O pré-teste serviu de base para

o aprimoramento posterior de algumas questões. Os dados foram tabulados com o auxílio do

programa Excel. A pesquisa realizada foi do tipo quantitativa e na análise dos dados coletados

foi empregado estatística básica descritiva. No entanto, não foram dispensadas análises

qualitativas.

Quanto às limitações do estudo, é preciso ressaltar que uma das restrições de que esta

pesquisa pode ter sido vítima diz respeito, principalmente, ao jogo da ocultação daquilo que

se pensa, se sente e se faz em relação às indagações que foram feitas às mulheres. Muitas

vezes, o que as respondentes revelam através do questionário é o que elas gostariam ou

pensam que são e não realmente o que são e fazem.

Resultados e Discussões

A coleta de dados juntos as feirantes que trabalham na Central de Abastecimento

Edmundo Flores em Vitória da Conquista forneceu informações que possibilitaram obter uma

visão mais ampliada dos negócios que lá atuam. Nesta seção, portanto, serão apresentados

parte dos dados coletados durante a pesquisa. Alguns dados, para facilitar a visualização,

serão apresentados em forma de quadro ou gráfico já outros apenas serão comentados no

decorrer da análise tendo em vista a extensão da pesquisa.

Os primeiros questionamentos tiveram caráter demográfico e buscaram identificar a

faixa etária, o nível de escolaridade e o estado civil das mulheres (Tabela 2). O que se viu na

amostra foi um percentual relativamente significativo de mulheres maduras que atuam na

feira, ou seja, 59% possuem idade superior a 41 anos de idade e que uma parcela considerável

da amostra (31%) é formada por mulheres que já completaram 50 anos. Este dado revela que

a idade não é um obstáculo para o desenvolvimento de atividades profissionais e de que

aquele pensamento ou mesmo crença de que a mulher a partir dos 50 deveria ficar em casa

cuidando de netos não é realidade para muitas mulheres atualmente. A pesquisa também

apontou que pelo menos 22% dessas mulheres já desempenham suas funções há mais de 20

anos nessa Central. A maioria das mulheres entrevistadas é casada (58%) e as solteiras, na

maioria das vezes, são as mais jovens.

A baixa escolaridade é um grave problema do interior nordestino, que também é

encontrado no universo pesquisado. O analfabetismo é refletido nos resultados obtidos, uma

vez que 13% das mulheres são analfabetas (Tabela 2), percentual este que está acima da

média nacional, 9,6% segundo o IBGE (2009), não obstante a existência de diversos

programas de formação do governo federal voltados para a alfabetização de adultos. Vale

ressaltar que apenas 4% das mulheres informaram que estão estudando atualmente. O nível de

instrução dos pais também foi considerado demasiadamente baixo pois, segundo as

informantes, 58% dos pais eram analfabetos. Ao que parece, a baixa escolaridade das

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feirantes decorre não só do fato de terem origem em famílias de baixo nível de escolaridade

como também pelo fato de a feira livre representar, de um modo geral, uma atividade pouco

exigente no que diz respeito à escolaridade. Aliás, talvez uma das opções de inserção no

mercado de trabalho que restou a essas mulheres com baixo nível de escolaridade foi tornar-se

feirante. Ademais, a comercialização de produtos em feiras livres parece proporcionar uma

fonte de renda a pessoas que pouco estudaram ou até mesmo que nunca tiveram a

oportunidade de estudar (GODOY, 2005).

Outro dado relevante é a busca pela capacitação profissional, uma vez que apenas 21 das

116 entrevistadas já realizaram algum curso profissionalizante com mais de 12 horas. De um

modo geral, várias instituições de capacitação oferecem, inclusive gratuitamente, cursos

profissionalizantes no município. Esses treinamentos visam capacitar os trabalhadores e

trabalhadoras a exercerem melhor sua atividade profissional ou a se capacitarem para uma

nova profissão. No entanto, o percentual de frequência nesta modalidade de capacitação foi

considerado baixo entre as feirantes. Na maioria das vezes, os cursos frequentados pelas

mulheres investigadas estão relacionados aos labores domésticos como culinária, cuidados

pessoais, etc. Brasil (2007) acredita que situações deste tipo vêm mostrar o desenvolvimento

cultural mais recente entre as mulheres que são forçadas a procurar modos de contribuição

para a sobrevivência da família, buscando maior escolaridade, portanto, aquelas de menor

idade conquistam melhores patamares no que diz respeito ao nível escolar.

Tabela 2. Síntese do perfil das entrevistadas

Questão Alternativas Percentual

Idade

De 18 a 30 anos 19%

De 31 a 40 anos 22%

De 41 a 50 anos 28%

Acima de 50 anos 31%

Escolaridade

Não alfabetizada 13%

Alfabetizada 14%

Ensino fundamental incompleto 26%

Ensino fundamental completo 16%

Ensino médio incompleto 7%

Ensino médio completo 24%

Está estudando atualmente Não 96%

Sim 4%

Estado civil

Casado 58%

Solteiro 12%

Viúvo 9%

Separado 14%

Divorciado 4%

União estável 3%

Fonte: Pesquisa de campo, abril de 2011.

No que diz respeito à existência de filhos desempenhando atividades laborativas no local

de trabalho materno, apenas 18% admitiram que seus filhos as auxiliam na feira (Tabela 3).

Deste total, 53% delas informaram que possuem apenas um filho trabalhando e 73% delas de

que a idade do filho é superior a 20 anos (Tabela 3). Este dado destoa das observações

realizadas pelos pesquisadores que identificaram várias crianças trabalhando ao lado dos

familiares e da entrevista realizada com o gerente de Serviços Básicos da Secretaria

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Municipal de Serviços Públicos. Ao que parece, as mães temem as repercussões de órgãos

fiscalizadores como Conselho Tutelar que combatem o trabalho infantil e, por isso, preferem

negar a existência dessa situação.

Tabela 3. Existência, quantidade e idade de filhos no local de trabalho.

Questão Alternativas Percentual

Possui filhos que trabalham na feira Não 82%

Sim 18%

Quantidade de filhos que trabalham na

feira

1 filho 53%

2 filhos 33%

3 filhos 14%

Idade dos filhos que trabalham na

feira

De 12 a 19 anos 27%

De 20 a 31 anos 58%

Acima de 31 anos 15%

Fonte: Pesquisa de campo, abril de 2011.

Quando entrevistadas, 41% das mulheres declararam não ser naturais de Vitória da

Conquista, ou seja, são originárias de outras cidades do estado da Bahia e até mesmo de

outros estados como Minas Gerais, Pernambuco, Paraná e Espírito Santo. Este dado confirma

as estatísticas do IBGE quanto à expansão demográfica do município desde a década de 1970.

Segundo o IBGE (2010), nas décadas de 1970 a 1990, a cidade de Vitória da Conquista

registrou a sua maior expansão populacional, o que explica o fato de 27% das mulheres de

outras naturalidades residirem em Vitória da Conquista há mais de 20 anos e 42% residirem

no município há mais de 30 anos (Figura 3).

Figura 3. Tempo de residência em Vitória da Conquista

Fonte: Pesquisa de campo, abril de 2011.

Das entrevistadas, 71% iniciaram o negócio com recursos próprios, 24% iniciaram o

negócio com recursos financeiros de algum membro da família e as que utilizaram recursos de

terceiros somaram 5% (Tabela 4). Machado et al. (2003), estudando a criação de empresas

por mulheres empreendedoras brasileiras e canadenses, verificaram que as economias

pessoais e os empréstimos familiares, em conjunto, representam a maioria das origens de

capital inicial. Esses dados advêm do fato de que a maioria dos negócios começou apenas

com uma barraca, na qual as mulheres vendiam às vezes os produtos que elas mesmas

produziam, em sua própria casa ou em sua propriedade rural, não necessitando, a princípio, de

altos investimentos.

10%

21%

27%

42%

1 A 10 ANOS

11 A 20 ANOS

21 A 30 ANOS

MAIS DE 30 ANOS

Vitória da Conquista – Bahia – 05 a 07 de junho de 2013

10

Tabela 4. Principais características dos negócios

Questão Alternativas Percentual

Origem do capital inicial

Recursos próprios 71%

Recursos de familiares 24%

Recursos de terceiros 5%

Como as vendas são registradas

Livro caixa 3%

Caderno de anotações 32%

De cabeça 34%

Dinheiro em caixa 30%

Não registra 1%

Como é apurado o lucro das atividades

Contagem diária 17%

Contagem semanal 48%

Contagem mensal 17%

Não conta quanto lucrou 18%

Fonte: Pesquisa de campo, abril de 2011.

Quanto à gestão do empreendimento, a maioria das entrevistadas não acha importante

registrar as vendas, visto que somente 3% destas registram em livro caixa. 34% declararam

saber de cabeça e 30% pela contagem do dinheiro em caixa (Tabela 4). A apuração dos lucros

se dá, na maioria dos estabelecimentos (48% dos casos), semanalmente, e 18% não apuram os

lucros. Deste modo, as contas domésticas e do negócio são misturadas, tornando o

empreendimento uma extensão do lar uma vez que as despesas são percebidas pelas feirantes,

na maioria das vezes, apenas como contas a serem pagas. Vale salientar que nenhuma das

informantes utiliza planilha eletrônica e talão de nota fiscal como forma de controlar as

vendas realizadas.

A principal queixa das mulheres esteve relacionada às vendas. Segundo as entrevistadas,

a concorrência dificulta o processo de venda e compromete a lucratividade da atividade. 22%

das feirantes declararam que a principal dificuldade enfrentada por elas é o declínio das

vendas. Esta dificuldade não só reflete na lucratividade do negócio como principalmente na

renda mensal das famílias que em 87% dos casos sobrevivem com uma renda mensal inferior

a 3 salários mínimos. Vale salientar que, durante as entrevistas, as informantes, na maioria das

vezes, informavam que sua renda mensal não ultrapassava um salário mínimo. No entanto, na

medida em que se tentava conhecer a venda diária de cada uma delas, verificava-se que sua

renda poderia chegar, mensalmente, a 3 salários mínimos. Ao que parece, as comerciantes não

conhecem de fato seu rendimento ou mesmo temem revelar que sua renda é superior ao

salário mínimo.

Mesmo com a baixa lucratividade da atividade, verificou-se que o rendimento obtido

por essas mulheres é representativo, uma vez que 41% delas informaram que contribuíram, ao

lado do marido, para a aquisição do imóvel próprio para moradia da família e 19% das

entrevistadas declararam que conquistaram o sonho da casa própria individualmente, ou seja,

sem a ajuda de ninguém e com o suor do próprio trabalho. O que não é possível se saber ao

certo é se em todos os casos o recurso para a compra destes foi proveniente apenas da feira.

Vitória da Conquista – Bahia – 05 a 07 de junho de 2013

11

Figura 3. Feirantes em atividade

Fonte: Pesquisa de campo, abril de 2011.

Quando questionadas sobre a primeira atividade profissional, 30 delas admitiram terem

começado sua vida profissional como feirante, 14 como agricultora e 12 como empregadas

domésticas (Figura 4). Aquelas que, originariamente, eram agricultoras, vislumbraram na

atividade comercial uma oportunidade de crescimento da renda, pois os ganhos como

comerciante apresentavam-se superiores. Ao que parece, esta iniciativa pode até certo ponto

ser considerada uma ação empreendedora motivada pela oportunidade afinal de contas elas

correram o risco de sair da esfera da produção e ir para a da distribuição.

Figura 4. Atividade anterior das feirantes

Fonte: Pesquisa de campo, abril de 2011.

Embora os relatórios do GEM de 2002 a 2007, principalmente, esclareçam que os

negócios iniciados por necessidade, de um modo geral, apresentam menores taxas de

sobrevivência, verifica-se que entre aqueles que se tornam empreendedores por necessidade a

questão da oportunidade pode ter estado presente. Afinal de contas estes indivíduos mantêm

seus negócios por muito tempo em função, principalmente, de suas ações empreendedoras que

buscam driblar as dificuldades impostas. As mulheres que participaram da presente pesquisa,

20

5

9 7 6

10

6 4

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12

por exemplo, revelaram que fatores como necessidade de complementação da renda e

dificuldades financeiras estiveram presentes em suas decisões de abrir um negócio na feira. O

Figura 5 apresenta os principais motivos que levaram essas mulheres a iniciar o

empreendimento. Não obstante esse resultado, quando indagadas sobre a importância de a

mulher trabalhar fora mesmo sem necessidade financeira, 92% concordaram ou concordaram

inteiramente com tal assertiva.

Figura 5. Motivos que levaram as mulheres a abrirem um negócio próprio

Fonte: Pesquisa de campo, abril de 2011.

Outra questão abordada foi se a situação atual comparada com a dos respectivos pais

(estaria melhor, pior ou igual). A maioria das entrevistadas, 52%, informou que se encontram

hoje em uma situação melhor. Esse resultado comprova uma significativa mobilidade social

realizada por essas mulheres a partir de seus lares paternos. Das restantes, 34% das

entrevistadas alegaram que sua situação atual é igual à dos pais, 9% afirmaram que a situação

atual é pior do que a dos pais, enquanto que 5% não souberam responder.

Foi questionado às empreendedoras se possuíam cadastro de Microempreendedor

Individual (MEI). Em 19 de dezembro de 2009, foi sancionada a Lei Complementar nº 128

que institui condições especiais para que o trabalhador informal possa legalizar-se como

Microempreendedor Individual (BRASIL, s. d.). A alteração na legislação visa à

desburocratização no processo de legalização de brasileiros que atuam na informalidade que,

segundo o Sebrae (2010), chegam a 11 milhões de brasileiros e brasileiras que trabalham por

conta própria e faturam até 36 mil reais anualmente. A Lei Complementar oferece diversas

vantagens àqueles que se inserem no Programa, tais como: menor carga tributária, controles

simplificados, facilidade para a abertura de conta bancária, acesso facilitado a crédito

bancário em bancos oficiais, além de ter acesso a benefícios como auxílio maternidade,

auxílio doença, aposentaria, entre outros. Entre as mulheres entrevistas somente 11%

possuíam o cadastro, enquanto que o grande percentual de 89% não aderiu ao cadastro

(Tabela 5). Foi possível perceber que muitas dessas mulheres nem sequer conheciam o

assunto. Não obstante à publicidade e ao trabalho de sensibilização realizado pela agência do

Sebrae, localizada em Vitória da Conquista, o teor da proposta do Ministério do

Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior e os benefícios gerados pela legalização não

chegaram ao conhecimento da maioria dessas mulheres.

A pesquisa revelou que apenas 5% das entrevistadas são membros de sindicato ou

participam de qualquer outra forma de associação (Tabela 5). Este dado denuncia que elas até

21

37

6

36

0

11

4 2

Vitória da Conquista – Bahia – 05 a 07 de junho de 2013

13

então não se interessaram em buscar os benefícios que podem ser gerados pela organização

coletiva e preferem trabalhar isoladamente. O baixo nível de organização certamente

compromete o alcance de objetivos comuns e o atendimento de necessidades que todas têm

como membros de uma sociedade e feirantes da Central de Abastecimento Edmundo Flores.

Já em relação à contribuição para a Previdência Social, 29% das entrevistadas informaram

contribuir. Dentre essas, 47% se inscreveram como contribuinte individual, 38% como

trabalhador avulso, 9% como empregado, 3% como segurado especial e 3% como facultativo

(Tabela 5).

Tabela 5. Informações sobre a situação das feirantes

Questões Alternativa Percentual

Possui cadastro como microempreendedor individual? Sim 11%

Não 89%

Participa de algum sindicato? Sim 5%

Não 95%

Possui inscrição na previdência social? Sim 29%

Não 71%

Categoria de inscrição na Previdência Social

Empregado 9%

Trabalhador avulso 38%

Contribuinte individual 47%

Segurado Especial 3%

Facultativo 3%

Fonte: Pesquisa de campo, abril de 2011.

Embora a maioria dos empreendimentos seja de natureza familiar, os dados revelam

uma incidência significativa (32%) de contratação de auxiliares (Tabela 6). Daquelas que

contratam funcionários, a maioria (27% do total) possui até 3 funcionários. De acordo com as

entrevistadas, 74% dos funcionários contratados são registrados. Este percentual surpreendeu

os pesquisadores tendo em vista que a informalidade parece estar muito presente entre setores

produtivos de baixo valor agregado. Entretanto, em relação à remuneração, 71% ganham

menos de um salário mínimo, 20% um salário e apenas 9% têm a remuneração superior a um

salário mínimo. Este último dado, de certa forma, põe em xeque o anterior, pois um

empregado só pode ser devidamente registrado se ganhar pelo menos um salário mínimo, a

menos que trabalhe em regime parcial. O período de pagamento encontrado foi variado, pois

58% recebem semanalmente, 21% mensalmente, 18% diariamente e apenas 3%

quinzenalmente (Tabela 6). Em alguns estabelecimentos os funcionários escolhem pela

melhor forma de recebimento do pagamento.

Tabela 6.Situação dos trabalhadores

Questões Alternativas Percentual

Número de funcionários

Até 3 pessoas 27%

De 3 a 5 pessoas 2%

Acima de 5 pessoas 3%

Não possui 68%

Estão registrados Sim 74%

Não 26%

Remuneração

Menos de um salário 71%

Um salário 20%

Acima de um salário 9%

Período de pagamento dos funcionários

Quinzenal 3%

Semanal 58%

Mensal 21% Diário 18%

Vitória da Conquista – Bahia – 05 a 07 de junho de 2013

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Fonte: Pesquisa de campo, abril de 2011.

Considerações Finais

Ao longo do estudo buscou-se conhecer a realidade socioeconômica e empresarial de

mulheres que atuam na Central de Abastecimento Edmundo Flores, localizada no centro da

cidade de Vitória da Conquista, Região Sudoeste da Bahia. A escolha de uma amostra

feminina deve-se, essencialmente, ao fato de que a inserção da mulher no sistema produtivo

constitui um dado privilegiado para analisar as transformações que vêm ocorrendo com o

feminino na modernidade.

Os resultados da pesquisa indicam, sobretudo, que as mulheres investigadas, muitas

vezes, apresentam-se como mantedoras de seus lares. A opção por tornar-se feirante, em

muitos casos, surgiu da necessidade. No entanto, através de trabalho árduo, elas se inseriram

neste mercado, que faz poucas exigências de qualificação. Tais empreendedoras obtêm renda

para atender, principalmente, as demandas familiares. O perfil das entrevistadas revela acima

de tudo o trabalho duro enfrentado por essas mulheres em seus cotidianos laborais. Essas

mulheres transpuseram e continuam transpondo, dia a dia, inúmeras dificuldades para

manterem-se economicamente ativas. O fato de essas mulheres inserirem-se e permanecerem

no mercado, gerando emprego e renda para si e seus familiares e até mesmo para outras

pessoas quando contratam empregados, pode ser considerado uma ação empreendedora, pois,

criaram e mantiveram o negócio e cotidianamente, driblam as dificuldades impostas pelo

meio, criando renda.

Diante do exposto, a presente pesquisa revelou-se como uma oportunidade valiosa de se

conhecer um pouco mais a realidade socioeconômica de mulheres feirantes que atuam na

Central de Abastecimento Edmundo Flores em Vitória da Conquista, interior da Bahia. No

entanto, há muito a ser explorado sobre o assunto. Observa-se então que o trabalho ainda está

em processo de construção, necessitando de maior aprofundamento. De todo modo, fica aqui

a esperança de que esta pesquisa tenha contribuído para gerar e provocar questionamentos que

direcionem a exercícios contínuos de diálogos e reflexões sobre o assunto estudado.

A reaplicação do questionário em outra realidade, por exemplo, junto às feirantes

catarinenses, seria uma forma interessante de confrontar os achados aqui apresentados,

permitindo embutir elementos regionais e características demográficas distintas. Tal

possibilidade pode ser tida como convite a outros pesquisadores interessados na inserção das

mulheres sub-preparadas (em termos de educação formal e apoio financeiro) na economia,

além dos serviços domésticos.

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