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Página 1 Projeto Stockton
PROJETO STOCKTON
(peça em um ato)
Versão 6 [11/2015]
© Copyright. Registrado no Ministério da Cultura, Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro (2015)
Direitos Autorais.
Contatar: CAROL RAINATTO (11) 97113-8994
e-mail: [email protected]
Nota do Autor
É uma peça aliada ao formato audiovisual, A representação da obra deve
contar com projeção de imagens e vídeo. Isto será necessário para que o
decorrer da trama se desenvolva como quando criada. Não existe a
possibilidade de o personagem “Francis Harper” ser apresentado de outra
forma, que se não o vídeo.
2014
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PERSONAGENS
Francis Harper
Chefe de pesquisa científica, 50 anos.
Jacob Miller
Músico desempregado, solteiro, 33 anos.
Sophia Williams
Dona de casa, casada, 28 anos.
A ação transcorre em Fort Stockton, Texas
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Peça em um ato (O cenário é composto por um telão branco ao fundo, uma cama, um balcão central, uma fruteira, um cinzeiro, um livro, duas xícaras, duas cadeiras, duas toalhas, uma banheira com chuveiro e Box.).
Prólogo TELÃO 1964, Fort Stockton – Texas. Pesquisa Experimental do Comportamento. "Insere-se um estímulo em uma das pequenas aberturas para, em seguida, sair um pacote de reações" (Burt, 1962, p. 232).
LOCUÇÃO EM OFF DE JACOB – Jacob Miller, pianista, solteiro, boêmio à
vista dos outros. Meu dia só é válido se eu tiver nele meu gole de café matinal
ao som de George Benson ou Ray!
LOCUÇÃO EM OFF DE SOPHIA - Meu nome é Sophia. Sou mãe de duas
meninas, dona de casa. Amo meu esposo, Thomas. Sonho em ver minhas
filhas felizes, realizadas.
LOCUÇÃO EM OFF DE JACOB – Um sonho? Talvez o de não deixar de
sonhar.
LOCUÇÃO EM OFF DE SOPHIA - (Foco em Sophia.) Acredito que o que me
trouxe até aqui é o que também trouxe os outros. Necessidade financeira de
urgência. Serão três meses. Thomas, meu esposo está para voltar de uma
viagem. Ele perdeu o emprego e foi em busca de novas oportunidades.
LOCUÇÃO EM OFF DE JACOB - (Foco em Jacob.) Não tenho onde morar.
Procurei, neguei a ideia, voltei a considerar. E quando soube do valor e me vi
despejado, senti que aquele anúncio era meu. Fui guiado a estar aqui.
LOCUÇÃO EM OFF DE SOPHIA - Eu, ou melhor, o Thomas, levaria em torno
de... Dez, quinze anos? Para conseguir um valor equivalente ao que vocês
estão oferecendo.
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LOCUÇÃO EM OFF DE JACOB - Experiência é o que me aquece... Rumo a
mais uma, não tenho nada a perder.
LOCUÇÃO EM OFF DE SOPHIA - (Luz em Jacob.) Adoro cuidar do meu
jardim, acabou de nascer um pé de morangos. Um dia, quem sabe, quero ser
dona de uma fábrica de tortas.
LOCUÇÃO EM OFF DE JACOB - (Luz em Sophia.) Tenho aqueles
momentos de deitar na minha rede, que eu mesmo fiz, diga-se de passagem, e
me permitir simplesmente pensar.
LOCUÇÃO EM OFF DE SOPHIA - O que mais vai me fazer falta?... O
Thomas.
LOCUÇÃO EM OFF DE JACOB - Uma boa música. Não tenho dúvida.
LOCUÇÃO EM OFF DE SOPHIA - Sem sombra de dúvida. É claro que eu
tenho medo de ficar trancada. Aliás, eu tenho medo de muitas coisas... Essa
ficha por acaso vai ser divulgada?
LOCUÇÃO EM OFF DE JACOB – Meu único receio é pensar que algum
estudioso possa me julgar. Não quero julgar nem ser julgado.
Corte seco.
JACOB - Fort Stockton, Texas. Verão de 1964 (mil novecentos e sessenta e quatro.). As pessoas aqui estão acostumadas com a vida veraneia, com o som
dos lagos, uma boa família, uma boa inércia. Eis que surgem impressos por
toda a região com o anúncio: “Oportunidade para mudar sua vida”.
SOPHIA - Tratava-se de uma experiência em uma casa especialmente
desenvolvida, onde cinco casais sem conhecimento da existência um do outro,
deveriam passar três meses dentro do mesmo ambiente. A recompensa: o
pagamento de uma boa quantia de dinheiro em espécie, efetuada no dia da
confirmação dos participantes por um termo de adesão.
JACOB – Regras deveriam ser seguidas e tarefas cumpridas. Nada poderia
fugir da ordem, o que atrapalharia nos resultados das pesquisas. A desistência
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implicaria na devolução imediata de toda a quantia recebida, mais o valor de
uma multa exorbitante.
SOPHIA - A experiência nomeada como “Projeto Stockton” teria a finalidade de
analisar as respostas psicológicas do ser humano para estímulos e situações
com seus semelhantes. Uma pesquisa inofensiva.
JACOB - Até que se contrarie o que for imposto.
Cena 1
Luz Branca
SOPHIA - Bom... Estamos oficialmente no Projeto Stockton. Esse é o nosso lar
temporário.
JACOB - Nada mal... Muito bom o espaço, chuveiro, “caminha”. Um só livro...
Olha, tem até fruteira.
SOPHIA - É... Só me parece que aqui não tem muita ventilação. Nem área
para cozinhar.
JACOB – Eles enviam a comida... Bem que poderia ter uma varanda!
SOPHIA – Não temos nenhum utensílio...
JACOB – Nem cafeteira?
SOPHIA – Nada disso.
JACOB - (vê o balcão) Pelo menos temos água. Qual é mesmo seu nome?
Vídeo
FRANCIS HARPER - “A Equipe Texas tem o prazer de introduzi-los ao Projeto
Stockton. Eu sou Francis Harper, chefe da equipe de pesquisa e porta-voz para
tarefas e informações. Vocês foram selecionados para a maior pesquisa já
realizada em nossa Universidade. Agradecemos a confiabilidade em nossos
mestres. O nosso curso de Psicologia tem sido o de maior evolução desde sua
introdução na Universidade de Texas. Nossos setores estão direcionados para
a descoberta do funcionamento do comportamento humano, uma grande
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incógnita para a sociedade. Esta experiência terá o foco em analisar a psique
humana quando pressionada em determinadas situações. Vocês
permanecerão durante três meses dentro deste galpão localizado em Fort
Stockton, em salas elaboradas pelos melhores engenheiros do estado, para
atender as necessidades básicas. Apresento o local e suas regras: Vocês
receberam uniformes com sensores, eletrodos e monitoramento que deverão
ser ativados ao som deste sinal (Alarme 1). Para finalização, o mesmo sinal
será acionado. Assim, acompanharemos o funcionamento dos batimentos
cardíacos. Abaixo do balcão será disponibilizada a alimentação diária de quatro
em quatro horas, juntamente à reposição das frutas. Semanalmente faremos a
troca de higiene pessoal. Medicações serão encaminhadas após análise. Não
existem objetos cortantes no local. No caso de participantes fumantes, serão
fornecidos três cigarros diários para cada casal. (Alarme 2). Este é o sinal para
a introdução de tarefas ou infrações de regras. Estamos atentos vinte e quatro
horas por dia e a desistência implicará na devolução imediata do pagamento. A
Equipe Texas agradece e esperamos executar um excelente trabalho.”
JACOB - Uau! Estou impressionado com a organização da coisa. (Ri) Onde eu
me enfiei? É mais sério do que eu imaginava. Bom... Três cigarros por dia...
Um problema pra mim! Não fomos apresentados, meu nome é Jacob.
SOPHIA - Sophia, prazer. É... Estou até me sentindo honrada de termos sido
escolhidos.
JACOB – Eu realmente espero que você não fume, você fuma?
SOPHIA – Não, não! Pode ficar tranquilo quanto a isso.
JACOB - Sophia. Parece que seremos só nós dois.
SOPHIA - Por muito tempo! Vamos precisar ter paciência.
JACOB - Não acho que seja tão difícil assim não. A estrutura deles é boa, até
me surpreendi (acende um cigarro.). Já me vi em situações parecidas com
essa.
SOPHIA - Já?
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JACOB - Várias vezes!
SOPHIA - Não, eu quis dizer o cigarro. Já vai fumar?
JACOB - Ah. Já! Estava precisando há um bom tempo!
SOPHIA - Mas você só tem direito a três.
JACOB - Eu prefiro aguardar os três próximos a ter que aguardar que a
vontade passe, sabe?
SOPHIA - Coerente. Então, isso lhe parece fácil?
JACOB - Sim, com essa técnica! Esse vício acaba comigo, eu já fumei uma
palha do chapéu de um vizinho tamanho o desespero.
SOPHIA - Não, eu quis dizer sobre a experiência. Já passou por coisas, você
disse... Parecidas.
JACOB – Ah, talvez até piores. Estou achando interessantíssima essa coisa de
descobrir o comportamento humano. Na verdade, era tudo o que eu sabia, não
quis me informar de mais nada além. Esse vídeo acabou de me situar.
SOPHIA - Pesquisas para estudantes de psicologia! Eles dizem que nos darão
toda assistência necessária... Mas eu me preparei para condições piores. Veja
só. Nós temos o básico para sobreviver. Ninguém enlouquece em tão pouco
tempo num lugar como esse.
JACOB – Se eu enlouquecer mais você vai sair batendo a cabeça na parede,
implorando para te tirarem daqui, só por minha causa. Não acho possível que
eu enlouqueça mais, fique tranquila.
SOPHIA - Isso quer dizer que você tem algum desequilíbrio psicológico? Eles
sabem disso?
JACOB – Não, foi só maneira de dizer. Só quis frisar que eu posso ser um
pouco intenso. (Vê o livro.) Bela escolha de livro. Quer começar e depois nos
revezamos?
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SOPHIA - Não, não... Fique à vontade. Prefiro pensar na distribuição da
organização, e também eu não conheço muito sobre ele. Posso fazer a limpeza
e a arrumação geral um dia sim e um dia não para que nada se acumule.
JACOB - Como é que alguém pode não se interessar por E.E Cummings?
SOPHIA - Oi?
JACOB - O autor do livro. Como alguém pode não se interessar?
SOPHIA - De maneira nenhuma. Eu apenas não o conheço tão bem a ponto de
querer acompanhá-lo numa leitura diária.
JACOB - Entendo. Este livro aqui pode ajudar a gente a se preencher.
SOPHIA - Você trabalha com o quê, Jacob?
JACOB - Com “Migo” mesmo. Meu único e atual parceiro.
SOPHIA - Como assim?
JACOB - Sou músico. Mas tenho feito coisas que só necessitam de mim e de
ninguém mais.
SOPHIA - Nunca antes conheci um músico, sempre tive a curiosidade de saber
como vocês vivem.
JACOB - Respirando ué, assim como você. E você Sophia?
SOPHIA - Eu moro com minhas filhas e com meu esposo Thomas. Trabalho na
nossa casa, cuido deles. E modéstia à parte, sou uma boleira de mão cheia.
Certa vez, fiz encomendas para a vizinhança após eles terem experimentado
um simples bolo de limão, que nem é a minha especialidade. Disseram que era
cremoso e sutilmente doce. Chamavam de pedaço de céu.
JACOB - Olha só... Espero um dia poder experimentar este bolo...
SOPHIA - Pedaço de céu!
JACOB - (Constrangido) Pedaço de céu...
SOPHIA - Não há quem não goste! Vamos pedir os ingredientes necessários e
dou um jeito de fazer aqui mesmo.
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JACOB - (Sem graça) Acho que não Sophia...
SOPHIA - Ora, por quê? Só precisamos de um forno.
JACOB - (Leve ironia) Ah, coisa simples “né”? Mas o regulamento já foi bem
específico quanto ao que temos ou não direito.
SOPHIA - A ué, seria uma bela maneira de passar o meu tempo ao invés de ler
o livro.
JACOB - Praticamente uma ofensa.
SOPHIA - Eu te ofendi?
JACOB - Não, você trocar um clássico autor da literatura americana por uma
mexida de farinha e ovos.
SOPHIA – Mas fazer bolos também é uma arte.
JACOB - Tem toda a razão. Teremos tempo. Pra te consertar.
SOPHIA - Me consertar?... E eu devo agradecer por esta gentileza rapaz?
JACOB - De modo algum. Apenas tenho esperança em conseguirmos extrair
algo novo disso tudo aqui.
SOPHIA - Mas você sabe Jacob que estive pensando nisso durante a espera
pra vir? Imaginei o que essa experiência poderá nos trazer. Porque acho que
podemos trocar algo, não acha?
JACOB - (Sem graça) Acho.
SOPHIA - Nós estamos aqui por alguns motivos, certo?
JACOB - Certo.
SOPHIA – Eu e Thomas temos uma dívida da nossa casa, ele até está
voltando de uma viagem que fez para levantar fundos. E tudo dando certo, eu
quero abrir uma fábrica de tortas.
JACOB - Ah que ótimo!
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SOPHIA - Acho uma oportunidade linda de conseguirmos tudo o que
queremos. Conheceremos outra pessoa, apenas ficaremos dentro de uma sala
e poderemos ainda ajudar jovens estudantes, isso não é incrível?
JACOB - Incrível.
SOPHIA - Também acho! E você? Quais são suas metas, está aqui por quê?
JACOB - Eu? ... Bom... Porque eu precisava de algo temporário para morar.
SOPHIA - Você não tem casa?
JACOB - Tinha, mas perdi. Perco, numa estimativa básica, uma casa a cada
dois anos.
SOPHIA – É mesmo? Deve ser insuportável a dor de não ter onde morar.
JACOB - Não. Acho pior passar mais do que dois anos da minha vida no
mesmo lugar, com a mesma visão, os mesmos vizinhos. Sou mais feliz desse
jeito, e é o único que eu tenho...
SOPHIA -... E a sua família?
JACOB - O quê é que tem?
SOPHIA - Gosta também de mudanças tão constantes?
JACOB – Ah, não. Eu não tenho família.
SOPHIA - Ora... Mas quem é que não tem família?
JACOB - O que vos fala.
SOPHIA - Ninguém “não tem” uma família, Jacob...
JACOB - Prazer!
SOPHIA - Por acaso nasceu de chocadeira?
JACOB - Não. Mas não teria problema nenhum se tivesse nascido.
SOPHIA - Você não deve ter consciência do quão grave é isso que você “tá”
falando.
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JACOB - Grave? Eu hein!... Grave é querer “cagar” querer se limpar e se dar
conta de que não tem braço, mas isso não é grave
SOPHIA - Sua mãe provavelmente te deserdaria ao ouvir isso. E esposa? Você
tem?
JACOB - Não... Só homens. Algum choque?
SOPHIA - (Chocada) Absolutamente.
JACOB - Já vi que você é conservadora e mentirosa. Eu, apenas mentiroso.
Não gosto de homens, mas valeu à pena só para ver essa sua cara aí de
espanto. Me fala da sua família.
SOPHIA - Ah, eu sou casada com o Thomas... E têm também as minhas filhas,
por quem eu dou a minha vida. Ou talvez, daria. Se eu pudesse... Hoje eu
posso dizer que faria tudo por eles e eles por mim.
JACOB - Acho muito bonito. Mas prefiro a minha companhia e uma xícara de
café. Sabe Sophia, não acredito que a felicidade esteja em uma só pessoa...
Eu, por exemplo, já a senti de perto por várias vezes e com pessoas que posso
considerar bem distintas. Todas me fizeram feliz de alguma forma. Ou na
convivência, ou no apoio profissional, ou simplesmente em um toque que
fosse.
SOPHIA - Que interessante. Não consigo nem pensar em ser feliz longe deles.
JACOB - Você deveria não conseguir pensar em ser feliz longe de você
mesma. Guarda isso.
JACOB E SOPHIA -... Eu acho que vou tomar um banho.
SOPHIA - Pode ir primeiro, eu espero.
JACOB - Obrigado. Estou bem mais suado que você.
SOPHIA - (Para si)... Ou eu sou mais educada que você...
JACOB - Oi?
SOPHIA – Nada.
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Jacob pega a toalha e vai para o chuveiro. Sophia analisa o ambiente, olha para as câmeras. Pega a toalha , uma cadeira e aproxima-se delas. Sobe e tenta tapá-las. O Alarme 2 – (Infração) - é acionado. Ela se assusta e o Alarme para.
SOPHIA - Acho que eu não posso fazer isso.
JACOB - (Coloca a cabeça para fora do Box.) O quê foi?
SOPHIA - Era um alarme.
JACOB - Sim, eu sei, mas a gente tem que fazer alguma coisa?
SOPHIA - Não, acionei sem querer
JACOB - Ah! (Volta para o Box.)... Como?
SOPHIA - Tentando tapar uma das câmeras.
Ela está incomodada. Ele sai do banho.
JACOB - Ah! Renovado!
SOPHIA - Já se banhou?
JACOB - Maravilhosamente.
SOPHIA - Tão rápido!
JACOB - É que a água estava fria.
SOPHIA - E você não podia esquentar?
JACOB - Podia, mas só tomo banho gelado. Pode ir lá.
SOPHIA - Está bem, muito obrigada.
Pausa.
JACOB - (Veste o macacão.) Não vai mais?
SOPHIA - É que eu pensei que talvez você pudesse de alguma maneira evitar
olhar.
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JACOB - Entendi. Olha Sophia, com todo respeito que eu tenho desde agora
por você, pela sua família e pelo seu ilustre esposo...
SOPHIA - Thomas!
JACOB - Ele mesmo, mas isso vai se repetir durante noventa e um dias, e sim
uma hora ou outra a gente vai se ver, e sim pode tomar seu banho nua e não,
eu não irei olhar para você e sentir desejo. E agora licença pra eu fumar meu
segundo cigarro, enquanto leio meio parceiro poeta.
SOPHIA - Apenas pensei que seria mais fácil se tentássemos respeitar isso de
alguma maneira, já que penso que Thomas não ficaria nada contente em
imaginar alguém me vendo tomar banho (ele não dá atenção.). Mas de
qualquer forma, percebi que você não está mesmo vendo, então...
JACOB - Quê que é?
SOPHIA - Vou tomar banho.
JACOB - Sim, você já disse.
SOPHIA - Sim, mas agora vou de fato.
Ela pega a toalha. Ele pega a maçã da fruteira. Ela entra no banho.
SOPHIA - Primeira coisa realmente estranha. Tomar banho.
JACOB – É um momento de deleite.
SOPHIA - Mas é que não me parece nada correto. Fazer isso assim, na sua
frente.
JACOB - Você não está na minha frente, Sophia.
SOPHIA - Praticamente estou.
JACOB - Você se sente invadida?
SOPHIA - Acho que sim! Estou me sentindo nua!
JACOB - Você está nua. Ou por acaso está tomando banho de roupa?
SOPHIA - Não. Apenas com trajes de baixo.
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JACOB - Então você está deixando de aproveitar um banho delicioso, porque
eu realmente não estou te olhando. Sempre que for a minha vez, não estarei
atento a esse detalhe de estar nu.
SOPHIA - Não tem problema, eu me sinto mais confortável desse jeito. É que é
estranho pensar que um homem vai me olhar tomar banho, enquanto meu
marido me respeita mesmo quando está dentro do próprio banheiro.
Silêncio.
JACOB – Posso dar minha opinião?
SOPHIA - Sobre o meu traje?
JACOB - Eu acho isso grave.
SOPHIA - O quê tem nele de grave?
JACOB - Seu marido não te observa nua? Já se questionou sobre a
sexualidade dele?
SOPHIA - De quem? Do Thomas? Mas ele arranca os seus dois braços à
dentadas se ouvir o que diz. Apenas estamos num momento delicado.
(T)
As roupas de Jacob estão espalhadas pelo chão. Sophia sai do banho e veste-se com o macacão.
SOPHIA - (Recolhe as roupas.) Imagine, o Thomas com este tipo de
comportamento, seria o fim dos tempos. O que temos nessa fruteira? Uvas...
Pensei em ter visto uma maçã aqui. (Jacob joga a maçã, já mordida.) Tudo
bem... Era só uma gula mesmo. Você come alguma dessas outras frutas?
JACOB - Como.
SOPHIA - Então se não te incomodar, prefiro a maçã. É uma das poucas que
eu gosto.
JACOB - Pode deixar, me lembrarei disso!
SOPHIA - Bom, prefiro já me deitar. Estou bastante cansada. Você se importa?
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JACOB - La volontè, cherry.
SOPHIA - Pois não?
JACOB - Nada não.
SOPHIA - Ah, sim. Boa noite Jacob (senta-se. Reza. Deita-se.).
JACOB - Durma como um anjo...
(T)
JACOB -... Sonharei como o diabo.
SOPHIA - O quê foi que você disse?
JACOB - (Jacob se assusta.) Mulher! Pretende me matar do coração no
primeiro dia?
SOPHIA - Eu não, mas ouvi você dizer algo que...
JACOB – Foi uma força de expressão. Eu hein! Pensei alto.
SOPHIA – Eu ouvi. Você disse que sonharia como o diabo?
JACOB - (Ri.) Você é divertida Sophia... Tenta um dia.
SOPHIA - O quê?
JACOB - Sonhar assim.
SOPHIA - Deus que me livre.
JACOB - No dia que um sonho te prender, você não vai pedir pra ser livrada.
SOPHIA – Não posso nem imaginar.
JACOB – E qual o problema nisso? O que é pecado para um, não é para o
outro. Guarda isso pra você.
SOPHIA – Mas isso é o cúmulo.
JACOB - O cúmulo é nem num sonho poder extrapolar.
SOPHIA - “O maior infortúnio é sofrer a privação da Fé e prosseguir vivendo”...
Tenha uma boa noite.
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JACOB - Boa noite anjo.
SOPHIA - Ah, Jacob?
JACOB - Uhn?
SOPHIA - Vou deixar os travesseiros para você, é melhor.
JACOB - Ué, por quê? Vai acordar com dores no pescoço.
SOPHIA - São muito moles e não me trazem bons sonhos. Já estou
acostumada a dormir sem! Pode dormir abraçado com o meu.
JACOB - “Tá” bom. Obrigado. Boa noite.
Sophia vai dormir, Jacob lê. Pensamentos em cena.
SOPHIA - Estou tranquila, talvez pelo cansaço. Um bom homem. Um bom
homem amargurado. Não deve dormir. Deve ser do tipo de pessoa que só
dorme depois que a mente já está corroída de tanto se ativar... Quando o céu
começa a ficar colorido...
JACOB - Delícia de livro. Deve ser cedo e ela já se deitou. Uma típica mal
amada, coitada. Tem cara de quem luta por todo mundo e não é comida nunca
pelo marido. Será que dorme com meias de seda? Lava a parte debaixo com
perfume de alfazema? (Ri).
Cena 2
Sophia levanta-se e lava o rosto. Jacob pega o pó de café no balcão.
SOPHIA - Esqueceu de esvaziar a banheira!... Tenho sentido que as horas
estão passando rapidamente.
JACOB – É porque conversamos. (Tira sua meia.) Talvez quando os assuntos
se esgotarem, o tempo passe como câmera lenta.
SOPHIA - Ainda não compreendo como isso nos afetaria. Eu, por exemplo,
passo boa parte do meu dia e até uma parcela de minha noite, sem nem ouvir
o som da minha voz. Não preciso conversar para sobreviver.
JACOB - Você é uma maluca Sophia, isso sim (prepara o café na meia).
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SOPHIA - Está coando o café na sua meia, finge que eu não estou vendo,
pensa que não sei que está usando água da banheira pra isso, e eu é que sou
maluca?
JACOB – “Perai”, “perai”, “perai”! É a primeira vez que faço isso.
SOPHIA - O que não deixa de ser uma realidade.
JACOB - Eu não podia desperdiçar o pó que eles mandaram... E que o café vai
ficar bom, vai.
SOPHIA – E como de costume, não me deu ouvidos. Pode deixar que eu
esvaziarei a banheira.
JACOB – Não esvaziei porque tenho oitenta e um dias para esvaziar!
SOPHIA - De modo algum, faço com o maior prazer...
JACOB - Mulher, deixa para fazer isso outra hora.
SOPHIA – Não me incomodo em deixar organizado.
JACOB - Eu sei que não se incomoda.
SOPHIA - Acho que é dever meu mesmo.
JACOB - Aqui não é o lugar dos seus deveres.
SOPHIA - Temos como tarefa manter o nosso ambiente.
JACOB - Eles é que determinam as tarefas, Sophia! Não você!
SOPHIA - Mas é bom mantermos em ordem. Os lençóis também não devem
ficar amarrotados...
JACOB - (Embola os lençóis e os joga no chão) Mas eu quero que fiquem
amarrotados! E sujos!... Pronto! Um dia como eu quero!
Alarme 1 - Monitoramento Cardíaco.
SOPHIA – Qual é esse sinal?
JACOB – Monitoramento cardíaco. Precisamos ligar!
Acionam os eletrodos dos macacões.
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JACOB - Tenho uma ideia brilhante, vamos jogar “Eu mando”.
SOPHIA - Como assim, “você manda”?
JACOB - É o nome da brincadeira ô “bocó”. Seguinte, eu narro uma história da
maneira que eu bem entender e você executa, portanto, eu mando e você
obedece!
SOPHIA - E se eu não quiser brincar?
JACOB - (Imita-a) Você vai brincar mesmo assim, porque a gente não tem
outra coisa pra fazer!
SOPHIA - Não sou muito boa para jogos.
JACOB - Meu amor, sutileza à parte, mas se eu depender de você aqui a
gente vira planta.
SOPHIA - Adoro plantas...
JACOB - Eu quis dizer que ficaremos enraizados!
SOPHIA –... Deixam o ambiente lindo.
JACOB - A é? Então fica aí em pé parada no mesmo lugar, por mais de dez
minutos e veja se continua achando isso lindo, sua louca da limpeza!
Ouve-se som de batimentos cardíacos durante a frase. Ambos estranham. Aos poucos o som diminui.
SOPHIA -... Como é mesmo o nome do jogo?
JACOB - Eu mando.
SOPHIA -... Posso tentar.
JACOB - Boa! Tentar já é legal.
SOPHIA - Eu tenho que fazer tudo o que você falar?
JACOB - Isso, mas como se fosse um personagem, não vale ser Sophia.
SOPHIA - “Tá” bom.
JACOB – A começar pelo cabide.
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SOPHIA - Não entendi.
JACOB - Aquele que você engoliu antes de vir pra cá.
SOPHIA - Eu não engoli na...
JACOB - (Empurra os ombros dela para baixo) Imagina se tivesse engolido.
SOPHIA - Ah!
JACOB - Pronto! Agora sim. Vamos lá, eu mando que: você é uma garota
muito feliz. Nossa, que contagiante! Você está num ponto de ônibus
aguardando alguém chegar, tira o cabide! Você está esperando seu ônibus
chegar (ela exagera). É assim que você espera um ônibus?
SOPHIA - Ué, não é assim que se espera um ônibus?
JACOB - Não, se você é uma pessoa que tem controle sobre seus próprios
movimentos.
SOPHIA - “Tá” vendo, eu falei que não sabia brincar dessas coisas!
JACOB - Não, não, não, “tá” ótimo “tá” lindo, a gente supõe que você não seja
uma pessoa que tem controle sobre seus próprios movimentos, de repente
você se depara com um ladrão! Ele tem uma arma. Não, você não chora! Você
é valente (Sophia levanta o dedo). Ai, quê que é Sophia?
SOPHIA - É que quando eu fui assaltada...
JACOB - Ah, meu “cú” pro seu assalto...
SOPHIA – (Horrorizada) Como assim, seu “cú”? O quê isso quer dizer...
JACOB - Vai. Cabide! Ela então decide seduzir o ladrão de alguma forma.
Mostra seus dotes. Belas pernas, bom requebrado... Poucos seios, muito
alongamento (ela desajeitada, ele quer rir). Caminha sensualmente até ele.
Sensualmente!...Começa a passar a mão na parte mais exuberante de seu
corpo... A parte mais exuberante do seu corpo é o seu joelho?
SOPHIA - Ué, quê que tem?
JACOB - Quem é que tem “tesão” num joelho Sophia?
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SOPHIA - Que saco, não quero mais brincar.
JACOB - “Nossa, aquele joelho é uma delícia, ah não, aquele outro tem
trombose”.
SOPHIA - Eu não tive tempo de pensar! Fiquei intimidada, pronto.
JACOB - Comigo?
SOPHIA - Não. (Sussurra) Com quem possa estar nos analisando.
JACOB - Hum... Entendi. (Sussurra) Não precisa falar nesse tom! Porque não
adianta nada, eles nos monitoram!
SOPHIA - Você não se sente observado?
JACOB - Só quando você me questiona. Por que a pergunta? Isso é mesmo
um problema para você, né?
Pausa.
JACOB - Sophia me diz uma coisa. Quando na sua vida você é feliz?
SOPHIA - Eu sempre sou feliz, que pergunta mais estranha.
JACOB - Não duvido disso meu anjo, apenas quero saber em que situações o
seu coração fica a ponto de balas?
SOPHIA - Acredito que várias vezes.
JACOB - Com que frequência você tem uma sensação de expansão, sabe?
Quando sua alma infla?
SOPHIA – A alma infla? Quando eu tenho a sensação de deveres cumpridos.
JACOB - De que tudo deu certo, que nada saiu dos trilhos, o conforto da
precisão... Você se realiza ao realizar sua família, mas eu “tô” perguntando de
você.
SOPHIA - Mas é que a minha família faz com que eu alivie minha cabeça.
JACOB - Você precisa errar. Pra dar valor quando a alma inflar.
SOPHIA – Eu já errei muito Jacob. E só eu sei o que isso me pesa.
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JACOB – Então tenta começar a errar aqui dentro também, eu tenho até uma
“receitinha” pra você: para de fazer a cama milimetricamente, de rezar todas as
noites, de deitar cedo só para ver o dia acabar logo, de querer que eu esvazie
sempre a porra dessa banheira, e dá um grito!
SOPHIA – Um grito?
JACOB – É! Dá um grito.
SOPHIA – O quê? Você está bem?
JACOB - (Grita) Estou ótimo!
SOPHIA - Aquele seu desequilíbrio deve estar atacando...
JACOB - Então acompanha ele, vai!
SOPHIA - Você não... Separaram comprimidos para ele?
JACOB - Dá um grito!
Batimentos cardíacos.
SOPHIA - A!
JACOB - Eu quero um grito Sophia.
SOPHIA - Aaaa.
JACOB - Não uma gemida!
SOPHIA - Meu deus, ele não tem que tomar nenhuma medicação não?
Aumentam batimentos.
JACOB - Só quero uma voz para fora, vai!
SOPHIA - Aaaaa...
JACOB - Mais alto (Grita para mostrar).
SOPHIA - (Grita).
JACOB - (GRITA).
SOPHIA - (GRITA).
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Jacob e Sophia gritam juntos. Ele a segura pelos ombros. Aumentam batimentos, seguidos de ameaça de um som agudo.
JACOB – Que barulho é esse?
Sophia continua gritando.
JACOB – Pode parar.
Pausa.
JACOB - Isso não te deixa feliz?
SOPHIA - (Desesperadamente.) Não!
Silêncio.
SOPHIA - Isso me deixa assustada.
JACOB - Que se foda, o que eu quero dizer é que isso te tira do seu eixo... Te
infla.
SOPHIA -... E eu posso não querer mais inflar?
JACOB - Estupidez de sua parte.
SOPHIA - Então assumo, sou estúpida.
JACOB - Cala essa boca.
SOPHIA - Como é que é?
JACOB - É isso mesmo que você ouviu, cala essa sua “merdinha” de boca.
SOPHIA - Escuta, o mínimo que devemos um ao outro é respeito.
JACOB - Quero que o respeito pegue fogo. O respeito, você e o “cú” do
Thomas.
SOPHIA - Você não tem o direito de...
JACOB - O respeito é meu e eu tenho o direito sim de querer que o “cú” dele
pegue fogo, junto com toda a sua “familiazinha” ridícula.
SOPHIA - Você está começando a abusar rapaz, falando assim da minha
família, usando esse palavreado inapropriado...
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Projeto Stockton
JACOB - (Imita-a) “Rapaz”, fala que nem um ser humano porra!
SOPHIA - Eu sou um ser humano.
JACOB - Não me parece!
SOPHIA - E você por acaso parece? Um homem amargurado de trinta e três
anos que não tem (batimentos cardíacos) nem onde morar! Não tem
sensibilidade para dizer o que é um ser humano.
JACOB - Olha, ela fala! Resolveu falar alguma coisa de verdade, vai, fala!
SOPHIA - Eu quero que você pegue fogo junto com esse seu livro (rasga páginas do livro) e essa sua alma inflada infernal!
JACOB - Infernal? E o que mais você quer?
SOPHIA -... Que você me respeite.
JACOB – Eu já faço isso!
SOPHIA – Dizendo as coisas da forma como você diz? Sem um pingo de
educação?
JACOB - Deixa sua educação pegar fogo por apenas um minuto!
SOPHIA – E pra quê eu faria isso?
JACOB – Pra deixar de ser tão chata!
SOPHIA – Você é um grosseiro!
JACOB – Ah, que coisa mais sem graça de ser! E o quê mais eu sou?
SOPHIA - Um ser amargurado.
JACOB - Mais forte.
Aumentam batimentos.
SOPHIA - (Fala alto) Um ser amargurado!
JACOB - Não, não, eu quis dizer algo mais forte, amargurado é muito gentil.
SOPHIA - Maluco!
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Projeto Stockton
JACOB – “Ih”, isso pra mim é elogio, vai, fala que eu sou uma merda de
pessoa.
SOPHIA - Você é uma merda de pessoa!
JACOB - Isso!
Aumentam batimentos.
SOPHIA - (Mais alto) Uma merda de pessoa!
JACOB - Ah que lindo!
SOPHIA - (Ainda mais alto) Uma merda de pessoa vazia e seca por dentro!
JACOB - Isso! Conseguimos um palavrão.
Jacob age como se nada tivesse acontecido.
SOPHIA - (Perdida.)... Eu não consigo mais...
JACOB - Já está bom.
(T)
SOPHIA - O que foi isso?
JACOB - Como se sente?
SOPHIA - Aliviada.
JACOB - Ótimo. Você inflou.
SOPHIA - Inflei?
Alarme 1 - desligar monitoramento.
SOPHIA – E agora? Pra quê é isso mesmo?
JACOB - Desligar monitoramento!... Agora entende do que eu te falo. É um
gozo.
SOPHIA - Ahm?
JACOB - Totalmente delicioso.
SOPHIA - O quê?
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JACOB - É como um gozo! Como quando você termina de fazer sexo.
SOPHIA - Eu sei o que é um gozo, mas o quê é que isso tem a ver?
JACOB – É similar a sensação. E você não sabe o que é um gozo.
SOPHIA - Claro que eu sei.
JACOB - Não sabe. Mas vamos deixar essa questão para outro dia, que eu
fiquei completamente exausto nesta minha primeira tentativa de te inflar.
Vão para a cama.
SOPHIA - Bom.
JACOB - (Ri) Foi bom pra você?
SOPHIA - Foi. Estranho. Mas bom.
JACOB - Estranhamente extasiada...
SOPHIA – Do que mesmo eu te chamei?
JACOB – De seco e vazio.
SOPHIA – Estou pensando... Também sou assim.
JACOB - (Sorri). Boa noite anjo.
SOPHIA - Boa noite. (Pensativa).
Jacob se deita. Sophia observa a sala, confusa. Vai para o Box e fica por um tempo. Luz do amanhecer.
Cena 3
Alarme 2 – tarefa.
JACOB - O quê “tá” acontecendo?
SOPHIA - Eu não sei.
JACOB - Você fez alguma coisa que não podia?
SOPHIA - Claro que não, o que eu ia fazer?
JACOB - Tentar me matar, sei lá!
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SOPHIA - Eu não faria mais uma coisa dessas, “tá” ouvindo?
O alarme para. Vídeo.
FRANCIS HARPER – Boa noite! Pesquisadores de Chicago descobriram em
1953 (mil novecentos e cinquenta e três) o movimento rápido dos olhos –
(inserção da sigla “REM” no telão). William Dement acaba de realizar um
estudo e suas descobertas incluíram distúrbios psicológicos moderados, como
ansiedade, irritação e dificuldade de concentração e aumento no apetite.
Introduzo a vocês a nossa nova tarefa que será finalizada com o toque do
alarme.
LETREIRO TELÃO: 25 (vinte e cinco) HORAS SEM DORMIR.
SOPHIA - Isso não pode ser sério.
JACOB - Ele não tava com cara de piada.
SOPHIA - Depois de vinte dias decidem só agora fazer um teste? Qual é o
objetivo disso?
JACOB - Nos estressar com algo que provavelmente no início não estressaria,
óbvio. Ainda bem que eu dormi essa noite como um anjo. Diabo deu vazão.
SOPHIA - Eu preguei os olhos praticamente agora.
JACOB - Ficou acordada?
SOPHIA - Não conseguia me desligar.
JACOB - Se deu mal. Eu estou mais do que disposto, tem pó de café ainda?
SOPHIA - Vai fazer aquela nojeira?
JACOB - Vou. Preciso, necessito... E sem querer jogar praga, hoje você vai
precisar também.
SOPHIA - Deus que me livre, prefiro perder a tarefa.
JACOB - Não diz isso que atrai.
SOPHIA - Aproveita que levantou e esvazia a banheira que você deixou cheia
ontem de novo.
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Projeto Stockton
JACOB - (Vê o pote vazio.) Que merda! Não fizeram a reposição.
SOPHIA - Você tem filhos Jacob?
JACOB - Graças a Deus não.
SOPHIA - Não agradeça a Deus por isso.
JACOB - Agradeço sim, pois foi uma das únicas besteiras que eu não fiz na
minha vida.
SOPHIA – Se eu considerasse minhas filhas uma besteira definitivamente não
estaria aqui. Você está aqui por quem?
JACOB - ... Eu preciso estar por alguém?
SOPHIA - Não. Por vezes esqueço que você é sozinho!
JACOB – Sim, eu sou.
SOPHIA - Pois não deveria.
JACOB - Não preciso de ninguém para mudar a minha vida.
SOPHIA - Porque acha que é capaz de fazer tudo.
JACOB - Eu não acho, eu sou!
SOPHIA - Nem sempre. Você devia conhecer minha família, eles iam te adorar.
Todos os domingos nós fazemos o recanto do churrasco. É uma reunião de
orações e ao final jogamos partidas de baseball.
JACOB - Que bacana...
SOPHIA - Você poderia com certeza jogar com a gente. Só teríamos
problemas quanto ao número de jogadores, ou talvez não, mas isso é um mero
detalhe.
JACOB - (Irônico) Ah que legal entrar no time de vocês... “Êêê”.
SOPHIA – Como você é sarcástico!
JACOB - (Ri) Ah, pelo amor de Deus eu fiz uma piada!
SOPHIA - De muito mau gosto.
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Projeto Stockton
JACOB – Eu nem ofendi ninguém.
SOPHIA – Ofendeu a mim. Mas isso é problema seu, estou pouco me lixando
se você não tem nem com quem passar suas tardes de domingo.
JACOB – Ok, me desculpe.
SOPHIA - E eu já me arrependo de ter te chamado para o nosso time.
Pausa.
JACOB – Quanto amor a esse time, hein.
SOPHIA – Sim. Nos amamos. E ganhamos sempre porque jogamos com o
coração Jacob, com o coração.
JACOB - (Ri) Ah que maravilha! Eu até imagino que vocês tenham aquela
coisa de grito de guerra da família... (Ri levemente. Ela sem graça) Ah! Ah não!
Não vai me dizer que vocês têm um grito de guerra da família... (Gargalha).
SOPHIA - Pode rir Jacob. Futuramente eu vou ter quem me ampare, somos
unidos. E você só terá a porra do seu cigarro!
JACOB - (Sem rir) Falou palavrão! (Ri moderadamente).
SOPHIA - (Sem graça) Não falei...
JACOB - Um muito sem graça, mas falou! (Ri) Ai,ai... Obrigado por este
momento, meu cabidinho.
SOPHIA - Não tem de quê. Aguardo um pedido de desculpas seu, já que
passaremos um total de 2184 (duas mil cento e oitenta e quatro) horas juntos,
e apenas se foram 480 (quatrocentas e oitenta).
JACOB - Gente, que metódica.
SOPHIA - Ofensas familiares não deveriam fazer parte dessa situação...
JACOB - (Tenta fazer a conta) Deus do céu, como fez essa conta tão rápido?
SOPHIA -... A gente precisa, portanto, combinar que eu lhe devo respeito e
você também me deve...
JACOB – “Perai”, “perai”, perdi completamente a linha de raciocínio.
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SOPHIA -... E você dessa sua maneira, nunca terá o seu time!
JACOB - Nem sei mais do que a gente tava falando antes.
SOPHIA - Ótimo!... E eu fiz todos os cálculos na minha casa! (Deita).
(T)
JACOB - Deixa eu ler um poema para você, Sophia? (Pega o livro).
SOPHIA - Estou morrendo de sono, não vou achar graça alguma.
JACOB - Mas você nem sequer pode dormir.
SOPHIA - O poema é desse livro aí?
JACOB - Tem algum outro?
SOPHIA - Não estou com vontade.
JACOB - Anda, vai nos preencher por um momento de alguma forma.
SOPHIA - Não estou interessada.
JACOB - Ah não? “Tá” interessada em quê? Em sentar na cadeira e olhar para
o teto? Esperando o tempo passar? Pensando na porra do grito de guerra?
(Ri). Mas hein? Pelo amor de Deus, “né” Sophia, você nem sequer pode
dormir.
SOPHIA - É que eu... (Sem graça.) Eu acho que não vou entender.
JACOB - O poema?
SOPHIA - É.
JACOB - E quem disse que é para entender?
SOPHIA - No colégio, quando eu tinha que interpretar um texto
gramaticalmente, os poemas acabavam com a minha vida!
JACOB - Não! “Tá” tudo errado! Você não tem que entender nada, tem só que
me ouvir. Vem, levanta.
SOPHIA - Pra quê?
JACOB - Vem deitar aqui no chão.
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Projeto Stockton
SOPHIA - Jamais! Estou ótima aqui, se fizer questão de ler faça daí mesmo
que eu ouvirei “tudinho”.
JACOB - (A puxa) Pronto, já teremos uma perspectiva diferente.
SOPHIA - Ah claro. Agora sim eu vou entender o poema.
JACOB - Fica quieta e me ouve. Agora deita aqui. Fecha os olhos.
SOPHIA - “Tá” bom, mas acho perigoso.
JACOB - Não então abre, se não você vai dormir. (Lê):
“Nalgum lugar em que eu nunca estive, alegremente além
de qualquer experiência, teus olhos têm o seu silêncio:
no teu gesto mais frágil há coisas que me encerram,
ou que eu não ouso tocar porque estão demasiado perto
teu mais ligeiro olhar facilmente me descerra
embora eu tenha me fechado como dedos, nalgum lugar
me abres sempre pétala por pétala como a Primavera abre
(tocando sutilmente, misteriosamente) a sua primeira rosa
ou se quiseres me ver fechado, eu e
minha vida nos fecharemos belamente, de repente,
assim como o coração desta flor imagina
a neve cuidadosamente descendo em toda a parte;
nada que eu possa perceber neste universo iguala
o poder de tua imensa fragilidade: cuja textura
compele-me com a cor de seus continentes,
restituindo a morte e o sempre cada vez que respira
(não sei dizer o que há em ti que fecha
e abre; só uma parte de mim compreende que a
voz dos teus olhos é mais profunda que todas as rosas)
ninguém, nem mesmo a chuva, tem mãos tão pequenas.”
(T)
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JACOB – (Fecha o livro) Foi bom?
SOPHIA - Estranhamente.
JACOB - E novamente temos um gozo!
SOPHIA - Que comparação mais estúpida que você insiste em fazer.
JACOB - (Irônico.) Então ok, vamos lá, no seu linguajar, “se sentiu como um
passarinho ao voar livre no céu”, Lina?
SOPHIA - Um passarinho? Você sempre acha uma maneira de me... Lina?
JACOB - Lina! Te apelidei!
Silêncio.
JACOB -... De naftalina.
SOPHIA - Oi?
JACOB - É que eu imagino muito você com o seu marido, sabe? Acho que são
meio à moda antiga. Daqueles casais que não fazem sexo, mas copulam,
aquela coisa toda. Daí eu brinquei na minha cabeça que a sua... Você sabe...
Tem cheiro de naftalina, e que você guarda essa naftalina junto com os
pertences de sua falecida avó, com os broches, colônias...
SOPHIA – Que imaginação fértil, hein? Então preciso dizer que também
imagino coisas sobre o seu... Aparelho reprodutor.
JACOB - Meu Deus, ela não fala pinto!
SOPHIA - Minha mãe me ensinou que é desrespeitoso falar de quem não está
no ambiente.
JACOB - (Empolgado) Meu Deus ela respondeu com piada! Perai, você quer
dizer que meu pinto é desprezível?
SOPHIA - Eu não quero dizer, eu disse (vai para a fruteira.).
JACOB - Você “tá” insinuando que eu tenho um pinto de merda?
SOPHIA - Cadê a maçã hein?
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Projeto Stockton
JACOB - Eu comi ontem.
SOPHIA - De novo?!
JACOB - Saiba você que eu tenho um belo de um pinto.
SOPHIA - (Irritada) Vê se para de comer essa maçã!
JACOB - E vê se para pra olhar e dizer se meu pinto é desprezível! (Abaixa as calças para ela).
SOPHIA - Meu Deus, o que você está fazendo?
JACOB – Anda, fala mal.
SOPHIA - Esconde isso pelo Amor do Senhor!
JACOB - É um belo pinto ou não é?
SOPHIA - Isso é, não eu não posso, meu Deus! Thomas meu amor, eu não
estou vendo nada!
JACOB - Hein Lina? Me diz!
SOPHIA - Não sei!
JACOB - Faz tempo que você não vê um “né” Lina? Diz se é desprezível só!
SOPHIA - Não, não é! (Jacob vibra) Agora “bota” essa joça pra dentro.
JACOB - (Ri) Lina, não chama meu pinto de joça. Fortes emoções e mal
começamos o dia.
(T)
SOPHIA - Faz muito, muito tempo que eu não vejo um (ri)... Ai ai, eu preciso de
um cigarro!
JACOB - Que cigarro? Desde quando você fuma?
SOPHIA - Desde agora que acabei de tomar esta decisão. Estou eufórica, sem
dominar os meus pensamentos e você sempre diz que ele te acalma, então...
JACOB - Já acabaram.
SOPHIA - Todos?
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Projeto Stockton
JACOB - Todos os três!
SOPHIA - (Irritada) Olha só, a partir de amanhã eu quero esses cigarros
divididos “tá” ouvindo? E quando eu digo divididos, eu quero que até o terceiro
seja cortado pela metade!
JACOB - Uau. De onde é que “tá” vindo esse diabo, anjo?
SOPHIA - Da puta que te pariu!
JACOB - Boca suja... Gosto dessa versão!
SOPHIA - Ah não...
JACOB - Sua expressão muda.
SOPHIA - Não acredito...
JACOB - Sério, dá pra ver que vive alguém aí.
SOPHIA - Tinha esquecido disso.
JACOB - Do quê?
SOPHIA - Problemas femininos. Vou precisar de uma toalha extra.
Sophia pega uma toalha e vai para o Box. Jacob observa.
JACOB - Nunca entendi essa irritação momentânea feminina.
SOPHIA - É uma questão física, Jacob.
JACOB - Sim eu sei, mas vocês não têm capacidade de se controlar?
SOPHIA - (Sai do Box com a toalha) Se eu não tenho nem capacidade de
controlar o que sai de mim, eu vou ter pra controlar meu nervoso?
JACOB - Por isso vocês mulheres me desnorteiam tanto. Vou comer essa
última fruta aqui “tá”?
SOPHIA - “Tá”! Mesmo porque eu não estou com fome Jacob, muito obrigada!
JACOB - Não tem de quê!
Pausa.
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SOPHIA - (Volta) Agora entendo quando disse que nasceu de chocadeira.
JACOB - Entende? Que evolução!
SOPHIA - Entendo, porque você não teve nenhuma educação.
JACOB - Aí que você se engana meu bem, eu tive sim.
SOPHIA - Ah teve? E quem é que foi essa pessoa tão equivocada?
JACOB - Alguém equivocado! Justamente por isso, optei por ficar sozinho.
SOPHIA - Não devia culpar alguém pela sua frieza.
JACOB - Frieza? Se tem um único adjetivo que não me pertence é esse. Eu
sempre vejo o lado bom das coisas.
SOPHIA - Mas não vê o lado bom das pessoas.
JACOB - Porque é difícil elas terem.
SOPHIA - Infelizmente você só deve ter tido encontros com pessoas ruins.
Quando sairmos daqui eu te levarei para conhecer um lugar.
JACOB - Já imagino do que se trata e não tenho interesse algum, tenho até
repulsa!
SOPHIA - “Não percas a sua fé entre as Sombras do Mundo”.
JACOB - Não preciso de nada que tenha qualquer ligação que seja com fé!
SOPHIA - Eu respeito. Mas precisa pelo menos ter compaixão.
JACOB - Ah, tenha dó, Sophia! E alguém “lá” teve compaixão por mim algum
dia?
SOPHIA - Estou achando que não. Mas você tem um bom coração mesmo
assim.
JACOB - Eu sei disso.
SOPHIA - Sempre se pode melhorar.
JACOB - Pode, mas não preciso de ninguém para isto.
SOPHIA – Não se engane. Sempre precisamos.
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Projeto Stockton
Pausa.
SOPHIA - Você sabe dançar?
JACOB - Claro que sei.
SOPHIA - Não sabe nem ser gentil com uma moça, quanto mais cortejá-la.
JACOB - Ué, você me perguntou se eu sabia dançar e não cortejar.
SOPHIA - Faz parte de um todo. Dança comigo?
JACOB - Quê?
SOPHIA - Dança comigo, “tô” com vontade.
JACOB – Aqui? Sem música?
SOPHIA – Aqui, sem música. Só pra gente se distrair.
JACOB - Tá bom (Pega as mãos dela e dança).
SOPHIA - (Ri) Assim não Jacob! Você tem que me abraçar.
JACOB - Ai cacete...
SOPHIA - “Shhh”. Palavrões não são bem vindos.
JACOB - “Tá”.
SOPHIA - (Dançam. Ela sussurra) Agora...
JACOB - “Uhm”.
SOPHIA - Deixa eu te levar.
JACOB - (Sussurra) “Tá”.
Dançam. Silêncio.
Cena 4
Alarme 2 - fim da tarefa.
LETREIRO: 25 (vinte e cinco.) HORAS CUMPRIDAS. CONFERIR BALCÃO.
JACOB - (Lê um papel) Apresento-lhes o questionário real, Posicionem-se em
pontas opostas e amarrem as vendas. Ouçam com atenção às nossas
Página 36
Projeto Stockton
perguntas. Para as respostas positivas, permaneçam no mesmo lugar. Para as
respostas negativas, deem um passo para trás.
Sophia e Jacob se posicionam.
VOZ EM OFF
- Esta experiência tem sido importante?
- Você já se sente confortável?
- Tem saudades de alguém que está lá fora?
- Acha seu parceiro agregador de alguma forma?
- Acredita que ele possa te ajudar aqui dentro?
- Tem qualquer tipo de sentimento por ele?
Durante o questionário, Sophia não sai do lugar. Jacob dá um passo para trás em todas as questões, até encostá-la. Silêncio.
VOZ EM OFF - Podem retirar as vendas.
Sophia vai para o banho. Jacob se senta na cama e tenta observá-la. Ela volta.
JACOB - Você tem dormido bem?
SOPHIA - Não. Ainda mais agora com fome.
JACOB -... Odeio a comida daqui.
SOPHIA - Eu também. Saudade da minha.
JACOB - Quem está cuidando das suas meninas?
SOPHIA - A babá. Desde que eu entrei aqui, enquanto ele não voltava da
viagem.
JACOB - E ele já voltou?
SOPHIA - Era para ter voltado.
Silêncio.
SOPHIA - Ele não sabia que eu vinha pra cá.
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JACOB - Você não contou?
SOPHIA - Ele jamais permitiria! E eu sei que não conseguiu nada na viagem.
JACOB - Entrou aqui sem o consentimento do Thomas?
SOPHIA - Sim.
JACOB – Logo você? ...Você quis fugir.
SOPHIA - Fugir de quê?
JACOB - De alguma coisa, dele, das suas filhas...
SOPHIA - Não ouse abrir a boca para falar das minhas filhas!
JACOB - Qual é o problema de falar delas? Aliás, você nunca me disse os
nomes.
SOPHIA - É porque não tenho que te dizer.
JACOB - Mas eu só perguntei os nomes.
SOPHIA - Melanie! Melanie e... Brenda.
JACOB - Bonitos... Quantos anos?
SOPHIA - Cinco e dois.
JACOB - Se parecem com você?
SOPHIA - Ok, chega deste assunto!
JACOB - Eu só quero saber se elas são bonitas!
SOPHIA - Mas eu não quero falar nada a respeito delas!
JACOB - Elas não são os amores da sua vida?
SOPHIA - (Grita) Não quero mais falar sobre minhas filhas!
Alarme 1 - monitoramento.
SOPHIA – Mas que saco isso toda hora também!
JACOB – A monitoração é diária.
Ambos acionam o monitoramente. Ele arruma o macacão, ela pega maçã.
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Projeto Stockton
SOPHIA - Que marcas são essas nas suas costas?
JACOB - Tenho desde que nasci.
(T)
SOPHIA - Silêncio chato esse hoje. você nunca é quieto desse jeito.
JACOB - Pequei.
Pausa.
SOPHIA - A vida é tão chata.
JACOB - Você é chata.
SOPHIA - Tem hora que eu chego a ficar nauseada.
JACOB - Por quê?
SOPHIA - Porque eu “tô” estafada.
JACOB - Estafada de não fazer nada?
SOPHIA - De pensar que os dias estão se repetindo, de rezar pelos próximos...
JACOB - Agora entende porque eu me mudo com tanta frequência?
SOPHIA - Acho que sim. Escuta... Como vai ser quando acabar?
JACOB - Você vai estar rica.
SOPHIA - Não, não isso. Como é que a gente volta para nossas vidas
normalmente?
JACOB - Ele não te deixa feliz, “né”?
Batimentos cardíacos.
SOPHIA - Thomas? Claro que sim, ora ele é meu esposo.
JACOB - Isso não elimina a questão.
SOPHIA - Eu não o teria escolhido se não me deixasse.
JACOB - Se isso fosse verdade não teria dúvida nenhuma em ter que voltar.
Batimentos cardíacos.
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Projeto Stockton
JACOB - Ele não te faz feliz.
SOPHIA - Jacob... Eu estou começando a achar que estou voltando a ficar...
Que eu estou ficando louca.
JACOB - Só porque se deu conta disso?
SOPHIA - Não tomo mais conta do que penso. Fico nauseada sempre que me
lembro da minha casa, da minha rotina, e eu já tive essas sensações há alguns
anos. Mas o mais estranho de tudo é que eu ainda prefiro a inércia dentro
dessa sala. Eu gosto mais de estar aqui. Tenho medo do que possa
acontecer... Do que eu possa fazer. As coisas parecem não estar mais sob o
meu controle, mais uma vez. Nem o que eu penso, nem o que eu sinto.
Batimentos cardíacos.
JACOB - Eu acho que nunca estiveram, Sophia. Isso aqui foi a desculpa que
você encontrou para sua fuga.
Batimentos cardíacos aumentam. Pausa.
SOPHIA - O final disso me apavora.
JACOB - O final disso pode ser o seu começo.
Sophia se entristece. Jacob tenta acalmá-la. Sentam-se na cama. Aumento dos batimentos. Inicia-se um som agudo incômodo. Eles reagem ao som. Tapam os ouvidos.
Cena 5
Vídeo
FRANCIS HARPER - Completamos um mês e meio de trabalho, com a
grandiosa colaboração de vocês. Repetiremos uma tarefa por necessidade de
aprofundamento. Vocês devem permanecer acordados pela período de vinte
horas. A alimentação será disponibilizada duas vezes durante esse tempo.
Agradecemos a paciência, Equipe Texas.
Pausa.
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SOPHIA - Tem hora que eu penso que não devo ir até o fim.
JACOB - “Ih”, nem entra nessa Lina, você escolheu estar aqui meu anjo, não
se esqueça disso.
SOPHIA - Preferia ter dado um tiro no meu pé.
Jacob pisa com força no pé de Sophia, que grita.
SOPHIA - Qual é o seu problema?
JACOB - Pensa nessa dor mais do que triplicada!
SOPHIA - Você é completamente louco...
JACOB - Ainda prefere o tiro “bocó”?
Jacob joga um travesseiro em Sophia.
SOPHIA - (Reage) Escuta aqui, nunca mais encosta essa merda de travesseiro
em cima de mim “tá” me ouvindo? Louco, seu louco!
JACOB - (Vai para cima dela) Ah, eu sou o louco? Você fica trancafiada o dia
inteiro dentro da sua casa de tijolinhos, fazendo biscoitinhos amanteigados,
levando uma vidinha medíocre, esperando o “BosThomas” chegar...
SOPHIA - É Thomas! O nome dele é Thomas!
JACOB - Thomas, Jonas, que seja, esperando aquele “bosta” chegar e tirar as
botinas de couro do jacaré da Patagônia, pra sentir aquele cheiro de queijo
vencido e ainda assim ter que dar um banho de “baciazinha” nos pés dele,
porque “ah meu deus, ele está cansado, ele está cansado”.
SOPHIA - Eu apenas esquento a água...
JACOB - Que se foda o que você faz! O que importa é que você tira o chulé de
um ogro que nem sequer “trepa” com você!
SOPHIA – (Assustada) Para com isso! A gente já fez amor...
JACOB - Ah, “tomá” no cú! (Vai pra cima dela.), “A gente faz amor, a gente se
relaciona, pratica o coito”. Vão à merda!
SOPHIA - Alguém está vendo isso? (Se esquiva).
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JACOB - (Em cima dela) Vão à merda você e o “BosThomas”, que não serve
nem para te dar um único orgasmo no mês!
SOPHIA - (Encolhe-se) Pelo amor de Deus, alguém me ajuda!
JACOB – “Tá” com medo de mim Sophia? Medo das verdades esdrúxulas que
eu tenho pra te falar?
SOPHIA – Ele vai me matar! Eu já pedi perdão, eu não queria.
JACOB – Não queria o quê?
Som agudo
JACOB - Que merda é esse som agora?
Jacob e Sophia se incomodam muito com o som.
SOPHIA – Não sei, mas você “tá” me assustando!
O som agudo para. Pausa.
JACOB - Ô meu anjo, eu “tava” fazendo uma brincadeira com você.
SOPHIA - Sai daqui! Tira a mão de mim, por acaso alguém está vendo isso?
Grande silêncio. Jacob pega uma cadeira e se aproxima de Sophia.
JACOB - Olha aqui, eu “to” brincando com você meu anjo. Eu jamais te
agrediria.
SOPHIA – Não diga jamais. A nossa cabeça trai.
JACOB - Me desculpa. (Puxa outra cadeira) Vem cá, senta aqui. Só respira.
Pensa no sol, no mar, no reflexo... Num cheiro adocicado, como de algum dos
seus pedaços de céu... Calmamente você vai boiar na água... (Sophia dorme). Não, Sophia pelo amor de Deus não dorme, fica acordada. Faltam umas duas
horinhas só.
SOPHIA - Eu não “tô” dormindo.
JACOB - Eu sei só não fecha os olhos, “tá”? Eu não deixo você dormir e você
não me deixa.
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Projeto Stockton
SOPHIA - Acho uma ótima ideia... Você precisar de mim. Sabe Jacob, quando
eu era pequena, costumava dormir na casa da minha avó. Eu tinha medo do
quarto dela por causa de um boá de pele que ficava no mancebo, e eu achava
que de noite ele se transformava num monstro. Ela me dizia que eu não
precisava me preocupar, que ele tinha medo da noite, da escuridão. E só se
transformava nos dias ensolarados, muito quentes. Então eu achava que se eu
dormisse com a janela aberta ia resolver tudo, pois ficaria escuro e frio. Mas aí,
eu não conseguia dormir, porque o vento que tocava no meu rosto me deixava
acordada... (Jacob beija sua mão.)... Acordada o tempo todo. (Jacob sopra o rosto dela.)... A noite toda.
Alarme 1 - fim do monitoramento.
JACOB – Vem, vamos desligar o monitoramento.
Jacob desliga o monitoramento de ambos.
VOZ EM OFF - Atenção, tenham muita atenção. Um de nossos casais
selecionados acaba de ser eliminado por alguns motivos. A partir desse final de
segundo mês estão proibidas relações físicas diretas, que envolvam brigas ou
coitos. Segundo pesquisas anteriores, os resultados são drasticamente
alterados, o quê prejudica a nossa pesquisa. Essa é a nova regra, sujeito à
eliminação caso descumprida. A Equipe Texas agradece.
JACOB – Tem gente se dando mal a essa hora.
Cena 6
Sophia inicia uma canção. Jacob lê o livro.
JACOB - Bonito isso!
SOPHIA - Canto para as minhas filhas.
JACOB - Você ama muito a sua família “né”?
SOPHIA - É o meu princípio.
JACOB - Canta um trecho?
SOPHIA - Acabei de cantar!
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Projeto Stockton
JACOB - Do grito de guerra!
SOPHIA - Ah não!
JACOB - Por favor!
SOPHIA - Não começa, Jacob.
JACOB - Te dou todos os cigarros de amanhã.
SOPHIA - Todos?
JACOB - Todinhos. Inteirinhos!
SOPHIA - E não vai ficar estressado por isso?
JACOB - Serei um “gentleman” com você.
SOPHIA – Não sei o que é isso.
JACOB - (Impaciente) Vai, canta logo Sophia!
SOPHIA - “Tá”!... Vê se não vai rir! (Envergonha-se e desafina). “Aqui estou de peito aberto em meu lar, onde guerreiros se encontram no Natal/ Vale sorrir,
vale chorar e se alegrar, guerreiros somos do início até o final/ Meu coração
batendo forte, forte, forte! Bate tão forte que parece um tambor/ É a família, ai
meu Deus que bom que sorte! Pra sempre juntos todos com muito amor!”
JACOB - (Ri)... Parece um tambor...
SOPHIA - Significou muito pra mim.
JACOB - No passado?
SOPHIA - Significa.
Pausa.
SOPHIA - Hey, hey, hey, já sei, vamos fazer o jogo?
JACOB - Agora não.
SOPHIA - A não, por favor, Jacob!
JACOB - Eu ia dar uma cochilada.
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Projeto Stockton
SOPHIA - Cochilada pra quê, você vai ter muitas horas pra pensar em cochilar!
JACOB – De onde é que você tirou essa empolgação?
SOPHIA – Não sei... Talvez eu esteja aprendendo com você.
JACOB - “Tá” bom vai. Só porque eu nunca te vi desse jeito.
SOPHIA - Eu mando e você faz!
JACOB - Hum... Ousada!
SOPHIA - “Tá”... É... Um pub. Você está em um pub!
Jacob age de acordo com o que Sophia narra.
SOPHIA - Você observa as pessoas cautelosamente... É, não,
misteriosamente. Isso! (Demora a continuar).
JACOB - (Entre os dentes.) Vai, vai, “tá” demorando já!
SOPHIA - É “tá”... Vai descobrir um assassinato. Seu nome é Michel... É.
Michel não, Michaela! Você é um detetive. Um não, uma! (Ele, mal humorado).
Cabide! Há! (Jacob corrige a postura.). Isso! Uma mulher muito poderosa que
está num pub no centro da cidade para descobrir um assassino. Você acha
graça no ambiente, fuma um cigarro e toca um instrumento (Jacob finge tocar um violino). Um piano! Muito bem, um piano. Isso, apenas para distrair o cliente
que entrou. Ela olha pra ele. Michaela olha pra ele! Sensualmente Michaela!
Não para de tocar o piano Michaela! “Sensualiza” no piano! Aí, ela levanta. E
anda até o seu suposto assassino. Faz charme. Coloca suas luvas, olha
sorrateiramente... Deixa cair seu lenço... E fala: “Ops” (Ele fala). Abaixa-se para
recolher o lenço, todos a observam. Porém ela não se intimida! Não se
intimida, ninguém mexe com ela... Ninguém mexe como ela. Sim! Porque
Michaela além de tudo também é dançarina. Ela dança o “tchatchatcha”, o
tango, ela enlouquece os homens e faz uma dança esquisita, chamada o
bumbum de vida própria! (Ele mexe. Caem na gargalhada).
SOPHIA - Eu não consigo parar de rir.
JACOB - Eu nunca tinha ouvido você gargalhar.
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Projeto Stockton
SOPHIA - Nem eu!
Vídeo
FRANCIS HARPER - Vinte horas cumpridas! De acordo com a teoria de nosso
grande Watson, é uma função da Psicologia observar, quantificar, descrever o
comportamento através da causa e consequentemente do efeito, obtendo a
resposta de um indivíduo a um determinado estímulo. Vários estímulos acabam
formando uma situação, onde os objetos exteriores causam reações físicas.
Watson estabelece dessa forma relações múltiplas entre estímulo e resposta.
LETREIRO: LUZ E ÁGUA POR 72 (setenta e duas) HORAS + SISTEMA SDS
JACOB - SDS? O quê é isso?... Bom, ficaremos sem banho.
SOPHIA - Não achei tão ruim.
JACOB - Por três dias? “Tá” maluca?
SOPHIA - Não! Porque a última pessoa que tomou banho, não abriu o ralo
para esvaziar a banheira... O que significa que ainda temos uma boa
quantidade de água.
JACOB - Eu sou um gênio.
SOPHIA - Me poupe de sua modéstia.
JACOB - O que seria de você sem mim? Pode ser sem querer, mas a minha
maior qualidade é fazer coisas boas inconscientemente.
SOPHIA - Por exemplo?
JACOB - Ué, por exemplo, isso que aconteceu agora. Ou por exemplo uma
vez que eu fiquei uma semana jogando comida estragada da geladeira na
lixeira da minha rua, sem saber que dessa forma eu estava alimentando um
casal de cachorros e seus respectivos filhotes, Brigitte e Bardot.
SOPHIA - Mas isso é um acaso.
JACOB - Qualidade inconsciente!
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Projeto Stockton
SOPHIA - E “peraí”, que você estava jogando comida fora, o que é muito
grave.
JACOB - “Vamô” parar de ver empecilhos na minha virtude?
SOPHIA - Não está mais aqui quem falou. Muito virtuoso você!
Pausa.
JACOB - Qual é a maior virtude do Thomas?
SOPHIA - Por que isso agora?
JACOB - A título de curiosidade.
SOPHIA - Fidelidade.
JACOB - E a sua?
SOPHIA - Fidelidade.
JACOB - Ai que chatice!
SOPHIA - Ser fiel é uma chatice?
JACOB - Não só isso, como também ser a mesma dos dois.
SOPHIA - Até a minha virtude é uma chatice pra você! Então me diz a sua.
JACOB - Ser imprevisível.
SOPHIA - E defeito?
JACOB - Individualismo. E o do Thomas?
SOPHIA - Desatenção.
JACOB - E o seu?
SOPHIA – Falsa fragilidade.
JACOB - Te acho um anjo, sabia Lina? (Pega o livro e lê) “nada que eu
possa”...
SOPHIA - Ah não, para com esse livro! (Vai pegar a maçã).
JACOB - “... perceber neste universo”...
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SOPHIA - Eu já até decorei isso!
JACOB E SOPHIA - “Iguala o poder de tua imensa fragilidade“...
JACOB - “Cuja textura compele-me com a cor de seus continentes”... (Ela morde a maçã. Ele segura sua mão). “Restituindo a morte e o sempre cada vez
que respira”.
Jacob leva a maçã à boca junto com a mão de Sophia. Morde a maçã. Olham-se. Silêncio.
JACOB - Continua sem te preencher?
SOPHIA - (Respira. Continua (joga o livro).
Blackout.
SOPHIA - Ótimo! Sem energia!
JACOB - É agora que os pensamentos vão fluir de vez.
SOPHIA - Ou agora que vamos perder completamente o senso da realidade.
JACOB - A gente aproveita para dormir.
SOPHIA - Eu já estou na cama!
Cena 7
Acende-se uma luz fraca. Ambos agem como se não estivessem enxergando.
JACOB - Cadê você?
SOPHIA - Aqui! Viu só como você precisa de mim? Nem andar no escuro
sozinho você consegue.
JACOB - Espero que você não imagine que isso seja um mérito!
SOPHIA - Boa noite! (Joga o travesseiro nele).
JACOB – Você e o Thomas dormem separados?
SOPHIA - Ora, claro que não. Apenas quando a Melanie fica com medo e
preciso ir dormir com ela.
JACOB - E a Brenda?
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Projeto Stockton
SOPHIA - A Brenda é um anjinho, não tem medo!
JACOB - Entendi. É que eu pensei que você tivesse esse costume de dormir
sem travesseiro, para usar como uma espécie de barreira, para vocês se
separarem durante a noite...
SOPHIA - Boa noite Jacob.
JACOB - Bom... Boa noite...
(T)
SOPHIA - “Tá” acordado? Jacob?
Sophia vai até o Box. Jacob a segue e a ouve. Sophia sai.
SOPHIA - Jacob? Acordou?
Jacob não responde e espera ela se deitar. Senta-se na beira da cama. Luz do dia, ela acorda.
SOPHIA - A luz já voltou?
JACOB - (Pensativo) Não. Só temos a fresta da luz do dia.
SOPHIA - Você não dormiu?
JACOB - Sophia, por que faz isso escondida?
SOPHIA - Quê?
JACOB - Eu já sei.
SOPHIA - Do quê você está falando?
JACOB - Todos temos segredos! (Para si) Você está escondendo alguma
coisa de mim.
SOPHIA - Ora essa, o quê eu esconderia?
JACOB - Eu sei que está. Uma mulher que não fala direito sobre suas filhas
que tanto ama, que carrega uma culpa cristã absurda, e que acredita que ter
prazer na calada da noite não vai ser pecado, tem algum segredo.
Pausa.
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SOPHIA - Não sei se agora é uma boa hora.
JACOB - Tudo bem. Quando for pra você, será pra mim.
SOPHIA - Eu nunca falei nada pra ninguém.
JACOB - Até aí, eu também não!
SOPHIA - As minhas filhas... Não consigo...
JACOB - Eu espero.
(T)
JACOB - Quero brincar de “Eu Mando”.
SOPHIA - Não é o momento, Jacob.
JACOB - Vamos quebrar logo esse gelo horroroso que criei.
SOPHIA – Eu preciso conseguir me afastar disso.
JACOB - Quero ver você na mesma cena daquela primeira vez, lembra?
SOPHIA - Mas eu estou nervosa, não quero fazer jogos.
JACOB - Eu disse que “Eu mando”.
SOPHIA - Que democrático.
JACOB - Se a gente brincar eu limpo a casa por três dias seguidos. E tiro a
água da banheira! E faço massagem nas suas costas!
SOPHIA - “Tá”.
A luz está fraca.
JACOB - Pronta?
SOPHIA - Não.
JACOB - Que se “foda”! Eu mando que: você é uma garota que está muito
feliz... É, muito feliz. (Surpreso) Olha! Dessa vez sem cabide!
SOPHIA - Cala a boca!
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Projeto Stockton
JACOB - Você está num ponto de ônibus e aguarda alguém chegar. De
repente se depara com um ladrão. Ele tem uma arma. Você não chora! Você é
valente. Vai seduzi-lo de alguma forma. Então você mostra seus dotes. Belas
pernas, bom requebrado... Poucos seios, muito alongamento. Passa a mão na
parte mais exuberante de seu corpo... Precisa convencê-lo, então vai até ele.
Caminha ao seu encontro. Percebe que ele está em suas mãos. Precisa fazer
com que ele se sinta desejado (Sophia senta no colo de Jacob). Sente o toque
dele, pega sua mão... Beija sua mão...
Sophia chupa o dedo de Jacob. Pausa. Notam uma fumaça. Quebra brusca.
SOPHIA - “Tá” com calor?
JACOB - Ahm?
SOPHIA - Calor? (Sai do colo de Jacob).
JACOB – Muito!
SOPHIA - Estranho... Não sou calorenta.
JACOB - Eu nesse momento não sei o que eu sou.
SOPHIA - Será que é o tal elemento surpresa, qual era mesmo o nome?
Sophia pega um cigarro.
JACOB - Ah minha filha, a essa altura do campeonato, só Deus sabe!
SOPHIA - Acho que era SSD, SDS...
JACOB - Nome de doença... Eu hein!
SOPHIA - Esse calor sem tomar banho não vai dar não hein! Não vai dar, ”tão”
ouvindo? Quando tudo isso acabar, o quê é que você vai fazer?
JACOB - Soltar todos os ratos de laboratório do mundo.
SOPHIA - (Ri). E com você? O quê é que você vai fazer?
JACOB - Continuar a ser feliz, se tudo der certo.
SOPHIA - O quê pode dar errado?
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JACOB - A minha alma se perder.
SOPHIA - E como é que se perde a alma Jacob?
JACOB - Quando a gente cristaliza.
Pausa.
JACOB - Você está aos poucos perdendo a sua. (T) Está vivendo a vida
deixando de ser você para ser a mulher do Thomas, que sonha com uma
família perfeita, mas que sabe que essa mentira enlouquece. Deixando de ser
esse anjo! Essa mulher, que quando se despe desse peso é a coisa mais bem
desenhada que alguém pode ver. Que vai aprender a ter euforia. E deixar de
ser a esposa... Pra ser apenas Sophia.
SOPHIA - Sabe o que te torna tão interessante? Você fazer eu ter interesse por
tudo que não me interessa!
JACOB - Sistema de Sauna.
SOPHIA - Quê?
JACOB - Olha a fumaça. Era SDS a sigla, não era? Então, sistema de sauna!
SOPHIA - Sauna? Quer dizer que teremos vapor aqui? É sério isso?
JACOB – Parece que sim.
SOPHIA - Jacob, eu realmente tenho problemas quando me sinto sufocada.
JACOB - Mas elimina toxinas, pense assim.
SOPHIA - Olha, eu não “tô” brincando, eu não posso me sentir sem ar. “Tá”
escuro, sem água, um calor insuportável...
JACOB - Calma Sophia...
SOPHIA - O quê é isso hein? Algum tipo de brincadeira comigo? (pega o cigarro).
JACOB - Você precisa se controlar, me dá esse cigarro.
SOPHIA - É o último!
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Projeto Stockton
JACOB - Sorte a minha!
SOPHIA - Me dá, eu preciso ficar calma!
JACOB - Acredite: isso não está adiantando.
SOPHIA - Pede pra eles pararem! É uma espécie de castigo?
JACOB - Que castigo, Sophia?
SOPHIA - O ar ficando assim, rarefeito.
JACOB - Daqui a pouco passa.
SOPHIA - Eu não queria fazer, eu não sei o que aconteceu.
JACOB - Do quê você “tá” falando?
SOPHIA - Não me deixa morrer assim Jacob, por favor!
JACOB – Morrer? Você “tá” precisando de ajuda, se acalma Sophia.
SOPHIA – Esse era o propósito disso ? Fazer eu me sentir desse jeito?
Volta a luz. Corte SDS.
Cena 8
Vídeo
FRANCIS HARPER – A real fúria existe em todo ser humano. Estudos vêm se
realizando para comprovar sua existência. Sempre que instigado da maneira
correta, o indivíduo responde a ordens que a revelam. Este é o teste de
eletrochoques. Apenas um deve colocar o capacete que está em cima do
balcão.
Jacob coloca o capacete.
VOZ EM OFF: O outro participante, deve pegar o controle e sentar-se. Quando
julgar que a resposta de seu parceiro é uma mentira, pressione o botão.
Solicitamos atenção às perguntas. Responda em voz alta. Você está feliz?
JACOB - Não.
VOZ EM OFF - Acha esta pesquisa importante?
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Projeto Stockton
JACOB - Não.
VOZ EM OFF - Gosta de poder participar?
JACOB - Não.
VOZ EM OFF - Gosta de estar aqui?
JACOB - Não.
Sophia aperta o botão. Jacob toma choque.
VOZ EM OFF - Tem algo que o prende lá fora?
JACOB - Não.
VOZ EM OFF - Acha seu parceiro interessante?
JACOB - Não.
Sophia aperta o botão.
VOZ EM OFF – O considera um bom parceiro?
JACOB - Não.
Sophia aperta o botão.
VOZ EM OFF - Acha que seu parceiro está feliz?
JACOB - Sim.
VOZ EM OFF - Você guarda algum segredo?
JACOB - Não.
Sophia aperta o botão.
VOZ EM OFF - Seu parceiro guarda algum segredo?
JACOB - Sim.
VOZ EM OFF - Seu parceiro sente-se atraído por você?
JACOB - Sim.
Sophia aperta o botão.
VOZ EM OFF - Você se sente atraído por seu parceiro?
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Projeto Stockton
JACOB - Não.
Sophia aperta o botão.
VOZ EM OFF - Sente algo ruim por esta pessoa?
JACOB - Não.
VOZ EM OFF - Esta pessoa sente algo ruim por você?
JACOB - Não.
Sophia aperta o botão.
VOZ EM OFF - Esta pessoa tem saudades de fora?
JACOB - Não.
Sophia aperta o botão repetidamente. Quebra de clima e luz.
VOZ EM OFF - 97% (noventa e sete por cento) de aproveitamento. Teste
finalizado.
Cena 9
Alarme 1 – monitoramento.
JACOB – Ah, que caralho! Que merda, merda!
SOPHIA – Você tem que ligar o monitoramento...
JACOB – Eu sei! (Procura um cigarro). Cadê meu vício?
SOPHIA - Falei que aquele era o último, esqueceu?
JACOB - E você fumou o último cigarro?
SOPHIA - Você fumou!
JACOB - Por que você foi acender aquela merda hein?
SOPHIA - Jacob, você fumou ele inteiro e eu nem reclamei.
JACOB - Mas se você não tivesse acendido eu não teria fumado (limpa o suor.). Que merda esse calor agora.
SOPHIA - Não “tá” mais calor, eles já desligaram o SDS!
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Projeto Stockton
JACOB - Merda, merda!
SOPHIA - Ué, cadê sua teoria para os momentos de abstinência?
JACOB - Não faz a estupidez de tirar sarro da minha cara agora. Já “tô”
passando mal, eu suo muito, cadê o cigarro?
SOPHIA - Não tem cigarro Jacob.
JACOB - A gente só fumou um pela manhã e outro agora, tem que ter mais
um.
SOPHIA - Seu buço está pingando.
JACOB - Acabei de falar que suo muito.
SOPHIA - Então limpa, ué!
JACOB - Cadê o terceiro cigarro?
SOPHIA - Eu fumei.
JACOB - E não dividiu por quê?
SOPHIA - Você está ficando corado!
JACOB - Não me faz ser grosseiro com você.
SOPHIA - Para com esse chilique, a gente já passou por coisa muito pior!
JACOB - (Alterado) Vai à merda! Vai à porra da merda! Mulher estúpida! Não
vai ser a porra da mulher estúpida do tambor (bate no peito, imitando-a) que vai
tirar a minha sanidade! Não vai!
Som agudo. Jacob chuta o que vê pela frente.
JACOB - E essa merda desse barulho insuportável!
O som agudo para.
SOPHIA -... Acabei de tirar sua sanidade! (Jacob vai para cima de Sophia) Eu
não tenho medo de cara feia e já não me assusto mais com seus escândalos.
(Grita) E eu só vou parar de fumar o seu cigarro quando você parar de comer a
porra da minha maçã!
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Projeto Stockton
JACOB- Me beija? (Pausa)
SOPHIA – Como?
JACOB – Agora, me beija?
SOPHIA – O quê “tá” acontecendo? Você não está bem (sai).
JACOB – (A segura) Era o que eu mais queria agora.
SOPHIA – Do quê você “tá” falando?
JACOB – Não sei. De repente é o que eu mais queria que acontecesse.
SOPHIA - Não fala isso Jacob.
JACOB - Subitamente comecei a pouco me lixar pra isso tudo aqui. E agora eu
só queria... Talvez um beijo.
SOPHIA – Não é correto, nós não podemos...
JACOB - O quê é correto? Eu não seguir o que o meu corpo “tá” querendo?
SOPHIA – Você não tem certeza se é isso que seu corpo quer, esse lugar
aqui...
JACOB - Não tenho certeza de nada, mas eu sei o que ele queria há um
instante atrás...
SOPHIA – Viu, e já não quer mais...
JACOB –... E continua querendo neste segundo agora.
SOPHIA – É melhor a gente se afastar.
JACOB – Não quero, preciso de um beijo. Quero te olhar, fica quieta e deixa só
eu te olhar. Você também precisa.
SOPHIA – Não preciso.
JACOB – Precisa e quer. Me beijar, me fazer carinho... Me sentir.
SOPHIA – Eu não posso.
JACOB – Isso pode ser o que você mais quer.
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Projeto Stockton
Eles se tocam, se olham, mas nada acontece. Praticam uma relação de toque e olhares sutis.
JACOB - Só mais um dia.
SOPHIA - Eu vou pedir pra ir embora.
JACOB - Seria a maior das tolices.
SOPHIA - A gente não vai cumprir.
JACOB - Cumprimos até agora.
SOPHIA - Eu não “to” achando justo.
JACOB - Não tem nada injusto, Sophia. A gente entrou sabendo que seríamos
testados.
SOPHIA - Não dessa forma.
JACOB -... Não dessa forma. Não era pra se transformar em penitência.
SOPHIA - O quê será que aconteceu com os outros?
JACOB - Não tenho dúvidas de que somos os últimos.
SOPHIA - Por que você acha isso?
JACOB - Porque o ser humano ou “fode” todo dia, ou enlouquece, ou se mata
ou mata alguém... Ou desiste, ou seja: tudo que temos que cumprir.
Silêncio.
Cena 10
SOPHIA - Você já bateu em uma mulher Jacob?
JACOB - Não. Nunca.
SOPHIA - Nem quando ficou muito nervoso?
JACOB - “Tá” com medo de mim?
SOPHIA -... É que naquela vez que você disse que eu não “trepava” com o
Thomas, eu achei que fosse me bater.
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Projeto Stockton
JACOB - Sinal de que ainda tem sangue nessa veia.
SOPHIA - Fui eu que te deixei daquele jeito?
JACOB - Não anjo, não foi você. . Eu sou assim, só vivo se me exalto.
SOPHIA - O Thomas nunca levantou sequer um dedo para mim, sempre me
tratou da maneira que toda mulher deve ser tratada. Ele nunca me bateu.
JACOB - Abençoado seja.
SOPHIA - Mas também nunca me sentiu. Sabe? Que nem você me fez sentir o
poema?
JACOB - Ah... (Irônico), achei que você estava falando dos dedos dele.
SOPHIA - Dedos?
JACOB - Brincadeira.
SOPHIA - Ai que saco.
JACOB - É brincadeira!
SOPHIA - Não, não é brincadeira que eu já te conheço. Por que tem que levar
tudo para o lado sexual?
JACOB - Pode ir parando, cadê o bom humor que conquistou nesses últimos
tempos hein?
SOPHIA - Você acha que eu sou uma frígida, “né” Jacob?
JACOB - “Ih”... Pronto.
SOPHIA - Parece que todos os meus assuntos são desinteressantes pra você.
JACOB - Claro que não, Lina.
SOPHIA – Vai, Jacob! Começa agora um dos seus assuntos
superinteressantes...
JACOB - “Ih”, “tá nervosinha”.
SOPHIA –... Sobre suas questões existenciais que ninguém aguenta ouvir!
JACOB - Já vai menstruar de novo?
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Projeto Stockton
SOPHIA – Ué, me responda você, o inteligente dessa sala que não sabe que
uma mulher menstrua a cada um mês! Por isso sim, eu vou menstruar! E não,
eu não estou nervosa!
Som agudo. Ambos reagem. Tapam os ouvidos.
JACOB - Vê se “sê” controla!
SOPHIA - Eu não consigo controlar mentira!
JACOB - Não é um detector de mentiras, sua burra! Mulher burra! Esse alarme
tem a ver com as batidas dos nossos corações!
SOPHIA - Então por que você não cala essa sua boca pra ajudar? Homem
burro!
O som agudo para.
JACOB -... Não calo porque você não deixa... Frígida!
SOPHIA - Fica quieto que só eu tenho o direito de falar isso!
JACOB - Ah então diz, você é, Lina?
SOPHIA – Não, eu não sei se sou! E não me chama de Lina, que odeio esse
apelido!
JACOB - “Tá” bom, Nafta! Como não sabe? Como é que uma pessoa não sabe
isso?
SOPHIA - Simplesmente porque eu não sinto nada.
JACOB - Mas ele é seu esposo!
SOPHIA - Eu sei disso! Sei de tudo isso, mas estou começando a achar que eu
não sinto nada. Entende? Nem bom nem ruim, nada. Ás vezes eu acho que
ele não me preenche.
JACOB -... Nem com os dedos, Lina?
SOPHIA - (Parte para cima de Jacob) Filho da mãe, eu odeio esse apelido! (O empurra).
JACOB – Você não pode me bater!
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Projeto Stockton
Som agudo.
JACOB - Para de dar escândalo e coloca esse coração no lugar!
SOPHIA - Pelo menos eu tenho um coração pra isso!
O som agudo para. Alarme 1 - fim do monitoramento. Eles desligam o monitoramento.
SOPHIA – Que inferno de lugar!
(T)
JACOB - Bela bosta ter um coração que você só usa para os outros!
SOPHIA - Você não tem nem pra quem usar!
JACOB - Melhor do que usar para o Thomas, a Melanie e a Brenda.
SOPHIA - Nada do que eu falo te interessa! Você é um egoísta,
desempregado! Eu não me interesso pela sua filosofia, nem pelo tipo de
pessoa que respira e fala que só isso já é a melhor coisa do mundo!
JACOB - Isso! Você sente alguma coisa, me usa para colocar pra fora essa
pessoa presa que tem em você.
SOPHIA -... Existe uma cesta com as frutas de todos os continentes do
universo e você insiste em comer a minha maçã, eu odeio você e odeio que
você coma a única fruta que eu gosto, seu amargurado!
JACOB - Frígida! Grita, chora, sente alguma coisa que seja, Sophia! Você é
capaz de sentir!
SOPHIA - Eu sei do que sou capaz, eu posso sim sentir! Já você, gélido, não
tem ousadia nem para tentar isso!
JACOB - Você não sabe o que está falando, sua estúpida!
SOPHIA - É tão frouxo, tão inseguro a ponto de saber que não pode nem
tentar, porque se você não tenta você não falha.
JACOB – Fica quieta!
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Projeto Stockton
SOPHIA - A pessoa que te criou já devia saber que você nasceu perdedor, e
por isso deixou marcas tão notórias pela sua pele.
JACOB - Cala essa sua boca, Sophia!
SOPHIA - Eu teria feito muito pior. Mas ela conseguiu o resultado que queria,
te deixar oco e fazer com que você se lembrasse todos os dias o quão
fracassado você é!
JACOB - (Ataca Sophia) Cala essa sua boca!
Jacob a segura pelos cabelos, sufocando-a na banheira.
JACOB - Você é uma mulher podre! Tem tanta podridão dentro de você, que
eu faria um bem à humanidade se eu tirasse sua vida...
Alarme 2 – (Infração)
SOPHIA - Para Jacob, você não pode me matar.
JACOB -... Se eu tirasse a sua merda de vida.
SOPHIA - Não me sufoca!
JACOB - Você não faz e nem faria nenhuma diferença no mundo.
SOPHIA - Para!
JACOB - A sua insignificância é tão grande que nem suas filhas notariam sua
morte!
SOPHIA - A Brenda “tá” morta!
Jacob para instantaneamente. O alarme de infração é finalizado. Silêncio.
JACOB – A Brenda o quê?
SOPHIA – Não consegui te contar.
JACOB - Por favor, não se explica.
Silêncio.
SOPHIA – Eu não consigo aceitar...
JACOB – Minha cabeça acabou de me trair...
Página 62
Projeto Stockton
SOPHIA – O quê?
JACOB – Eu ia te matar, Sophia! Eu estava prestes a te matar e ninguém ia
fazer nada para impedir isso... A sua filha?
SOPHIA – Eu não queria, eu estava com tanto sono... Ninguém sabe de nada,
só o Thomas...
JACOB – (Desconexo) Eu já não sei mais o quê está me acontecendo, Sophia
me perdoa... A sua filha... A Brenda... Como? Como ela morreu?
Silêncio.
SOPHIA – Estava tão escuro... O quarto, o dia, a minha cabeça. Os médicos
todos achavam que eu me recuperaria, que a depressão cessaria. “A senhora
Williams só precisa de tempo.” Mas não foi assim. Lembrar do dia escuro, ela
querendo pegar no sono e eu observando. Minha pálpebra fechava e abria
muito vagarosamente. Quando voltei da piscada mais longa, tomei um susto e
fui ver o berço. A Brenda ali, com aquele travesseiro, e eu não conseguia
respirar: foi instantâneo. Um escuro tão escuro. E eu não fiz nada, o tempo
todo do lado dela e não percebi. E eu sozinha. Deixei ela partir sem perceber.
E aquele calor começou a invadir bem o centro da minha cabeça...
JACOB –... O travesseiro.
SOPHIA – Aquilo também era minha alma inflando. A Brenda é meu anjo. Um
anjo que eu não tive capacidade de cuidar.
Pausa.
Cena 11
SOPHIA - Eu não quero voltar a ficar louca.
JACOB - Você não vai.
SOPHIA - Esse lugar vai me deixar de novo.
JACOB - Mas eu não vou deixar. Não vou deixar você sentir nada parecido
com essa culpa de novo.
Página 63
Projeto Stockton
SOPHIA - “Ainda que os teus pés estejam sangrando, segue para frente,
erguendo a fé por luz celeste, acima de você mesmo...
JACOB – Essa fé... Essa fé te desgasta, Sophia.
SOPHIA - “Hoje, é possível que a tempestade amarfanhe o coração,
aguilhoando com a aflição ou ameaçando...
JACOB – Para de recorrer a isso! Você precisa aceitar!
SOPHIA – “Com a morte. Não te esqueças, porém, de que amanhã será outro
dia”.
Início de uma ópera num volume muito alto.
JACOB – Que música é essa?
VOZ EM OFF – Em pouco tempo o Projeto Stockton será oficialmente
encerrado...
SOPHIA - Eu não faço a menor ideia do que eu vou falar, mas eu “tô”
sentindo...
A ópera continua.
JACOB – Você não tem que falar nada.
SOPHIA –... Eu queria ter me tornado tão interessante pra você quanto você
pra mim.
JACOB - Você não precisava. Já se bastava.
VOZ EM OFF – ...Agradecemos a participação de todos e o cumprimento das
tarefas até o fim...
SOPHIA - Vale a pena tudo isso que estamos fazendo?
JACOB - Talvez não. Vale a pena tudo isso que não fizemos?
SOPHIA - Talvez não.
JACOB – Você me é interessante, Sophia.
SOPHIA - Essa experiência.
Página 64
Projeto Stockton
VOZ EM OFF – ...Em poucos segundos vocês terão finalizado o Projeto
integralmente...
JACOB - Tua falsa fragilidade.
SOPHIA - A minha inexperiência.
JACOB - “O poder de tua imensa fragilidade”.
SOPHIA - “Nada que eu possa perceber neste universo iguala o poder de tua
imensa fragilidade. Não sei dizer o que há em ti que fecha e abre”.
JACOB - “Só uma parte de mim compreende que a voz dos teus olhos é mais
profunda que todas as rosas”, você é um monstro Sophia.
SOPHIA – (vai até Jacob) “Ninguém, nem mesmo a chuva, tem mãos tão
pequenas”.
JACOB – Seca e vazia!
Sophia dá um tapa na cara de Jacob. Ele segura seu rosto e a beija. Alarme 2 – Infração. Continuam se beijando.
TELÃO
(Cronometragem com últimas contagens.).
2183h59m50s, 2183h59m51s, 2183h59m52s, 2183h59m53s, 2183h59m54s, 2183h59m55s, 2183h59m56s, 2183h59m57s, 2183h59m58s, 2183h59m59s, 2184h00m00s
Corte seco de luz e telão. Luz branca no palco e na plateia.
VOZ EM OFF – 2183 (duas mil cento e oitenta e três) horas e 59 (cinquenta e
nove) minutos cumpridos. Falha na execução da tarefa, vocês estão
eliminados.
Blackout.
FIM