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Universidade do Minho Instituto de Educação julho de 2016 O Ensino das Ciências Musicais e a Retórica: Discurso Musical no Período Barroco Paulo Jorge Miranda Araújo O Ensino das Ciências Musicais e a Retórica: Discurso Musical no Período Barroco UMinho|2016 Paulo Jorge Miranda Araújo

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Universidade do MinhoInstituto de Educação

julho de 2016

O Ensino das Ciências Musicais e a Retórica: Discurso Musical no Período Barroco

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Paulo Jorge Miranda Araújo

julho de 2016

O Ensino das Ciências Musicais e a Retórica: Discurso Musical no Período Barroco

Trabalho realizado sob a orientação daProfessora Doutora Elisa Maria Maia Silva Lessa

Relatório de EstágioMestrado em Ensino de Música

Universidade do MinhoInstituto de Educação

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Nome: Paulo Jorge Miranda Araújo

Endereço eletrónico: [email protected]

Número de Cartão de Cidadão: 10858009

Titulo do Relatório: O Ensino das Ciências Musicais e a Retórica: Discurso Musical no Período

Barroco.

Orientadora: Professora Doutora Elisa Maria Maia Silva Lessa

Designação do Mestrado: Mestrado em Ensino de Música

Ano de Conclusão: 2016

É AUTORIZADA A REPRODUÇÃO INTEGRAL DESTE TRABALHO APENAS PARA EFEITOS DE

INVESTIGAÇÃO, MEDIANTE DECLARAÇÃO ESCRITA DO INTERSSADO, QUE A TAL SE

COMPROMETE.

Universidade do Minho ___ / ___________ / 2016

________________________________________

(Paulo Jorge Miranda Araújo)

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AGRADECIMENTOS

Um agradecimento especial à Professora Doutora Elisa Lessa, minha orientadora

e supervisora de estágio, pela orientação, apoio, otimismo e incentivo não só na

elaboração deste trabalho como também no meu crescimento pessoal e profissional.

Agradeço ao Conservatório de Música do Porto, cujos órgãos de gestão e

administração permitiram a concretização do meu estágio profissional em Música, ao qual

se refere o presente Relatório.

Aos professores cooperantes Sônia Marques e Nuno Rocha, pelo seu apoio e

aconselhamento da prática letiva.

Aos alunos das turmas com as quais trabalhei do Conservatório de Música do

Porto, no ano letivo 2015-2016, pela colaboração e empenho demonstrados ao longo de

todo o projeto.

Aos meus colegas de estudo, David Rodrigues e Leandro Monteiro, pelos

momentos partilhados e pelo incentivo constante ao longo destes dois últimos anos.

À Carina, em especial, pela paciência, carinho, incentivo, compreensão, apoio

constantes, sempre com um otimismo contagiante, nos momentos mais decisivos deste

trabalho.

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RESUMO

O estudo intitulado “O Ensino das Ciências Musicais e a Retórica: Discurso Musical

no Período Barroco”, é uma abordagem à temática da retórica musical no ensino das

Ciências Musicais. Este projeto foi implementado no Conservatório de Música do Porto,

no âmbito do mestrado em Ensino de Música na Universidade do Minho. O trabalho

detém-se nas seguintes questões de investigação:1) o que é a retórica musical, 2) como

abordar com os alunos a problemática da retórica musical barroca, e 3) qual o contributo

da temática em estudo para a formação dos alunos. A metodologia utilizada nesta

investigação é de natureza qualitativa e os participantes foram os alunos de quatro turmas

das disciplinas de Iniciação Musical IV, Formação Musical (6º Ano/ 2º Grau e 9º Ano/ 5º

Grau) e História da Cultura e das Artes (11º Ano) do Conservatório de Música do Porto.

Em síntese, o estudo visa a compreensão a aplicação na didática das Ciências Musicais

das estruturas de discurso retórico nas obras do período musical do barroco, tendo em

conta que a retórica musical é uma temática pouco conhecida/ trabalhada pelos alunos;

que a retórica musical é um tema que se cruza com diversas disciplinas existentes no

currículo nomeadamente Filosofia e Português; que os alunos se interessam pela temática,

conseguindo estabelecer relações com as disciplinas supramencionadas e ainda pelo facto

do material de apoio pedagógico de suporte ser quase inexistente. O presente trabalho é

uma contribuição a uma possível abordagem ao universo da comunicação e organização

do pensamento musical.

Palavras-chave: Retórica Musical, Período Barroco, Didática das Ciências Musicais.

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vii

ABSTRACT

The study entitled “The Education of Musicology and the Rhetoric: Musical

Discourse in the Baroque Period”, is an approach to the subject of musical rhetoric in

the teaching of Musicology. This project was implemented at the Oporto Music

Conservatory, within the framework of a Master's degree in Music Education at the

University of Minho. The study gives close attention to the following research questions:

1) what is music rhetoric, 2) how to deal with the issue of Baroque musical rhetoric with

students, and 3) what is the contribution of the subject matter at hand to the training of

students. The methodology used in this research is qualitative and participants were

students from four different classes studying Music Initiation IV, Music Training (grade

6 / level 2 and grade 9 / level 5) and History of Culture and Arts (Grade 11) at the Oporto

Music Conservatory. In short, the study aims to understand and apply the structures in

rhetoric discourse in the didactics of Musicology in the works of the baroque period,

taking into account that musical rhetoric is a subject that is often unknown / worked on

by students; understand that the musical rhetoric is a theme that overlaps with several

existing subjects in the curriculum including Philosophy and Portuguese; get students

interested in the subject, establishing relationships with the above mentioned subjects

taking into consideration that pedagogical support material is almost non-existent. This

study is a contribution to a possible approach to the world of communication and

organization of musical thought.

Keywords: Musical Rhetoric, Baroque Period, Didactics for Musicology.

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ÍNDICE

ÍNDICE DE FIGURAS .................................................................................................. x

INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 11

I – ENQUADRAMENTO TEÓRICO DA INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA ...... 13

1.1 A Retórica – Breves Apontamentos ...................................................................... 13

1.2 A Teoria dos Afetos .............................................................................................. 18

1.3 Música e Retórica ................................................................................................. 24

1.3.1 As sete artes liberais: Trivium e Quadrivium ................................................. 24

1.3.2 Musica Poetica – Tratados ............................................................................. 25

1.3.3 Retórica Musical ............................................................................................ 27

1.4 Retórica – Análise do Discurso Musical ............................................................... 30

II – INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA ....................................................................... 39

2.1 Contexto geral de intervenção .............................................................................. 39

2.1.1 História e caracterização do Conservatório de Música do Porto ................... 39

2.1.2 Caracterização das turmas alvo de intervenção .............................................. 41

2.2 Observação de aulas .............................................................................................. 43

2.2.1 Formação Musical .......................................................................................... 46

2.2.2 História da Cultura e das Artes ...................................................................... 46

2.3 Plano Geral de intervenção ................................................................................... 47

2.3.1 Transdisciplinaridade no Ensino das Ciências Musicais................................ 47

2.3.2 Formação Musical .......................................................................................... 49

2.3.3 História da Cultura e das Artes ...................................................................... 55

2.3.4 Projeto Artístico “O Bandolim na Era Barroca” ............................................ 65

III – RECOLHA E ANÁLISE DE DADOS ................................................................ 69

3.1 Formação Musical ................................................................................................. 69

3.2 História da Cultura e das Artes ............................................................................. 71

IV – CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES .......................................................... 77

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................... 81

Anexo 1 .......................................................................................................................... 87

Anexo 2 .......................................................................................................................... 89

Anexo 3 .......................................................................................................................... 91

Anexo 4 .......................................................................................................................... 95

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ÍNDICE DE FIGURAS

Figura 1- As Sete Artes Liberais .................................................................................... 25

Figura 2 - Para uma Análise Retórica ............................................................................. 32

Figura 3 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589)) ............. 33

Figura 4 - Excerto do Preludio nº 13 em Fá Maior “Tombeau” de Louis Couperin ...... 33

Figura 5 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) ............... 33

Figura 6 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) c. ........... 34

Figura 7- Excerto de Largo do Concerto nº5, BWV 1056, de Johann Sebastian Bach .. 34

Figura 8 - Excerto Responsório nº2 do Ofício dos Defuntos (1816) de José Maurício

Nunes Garcia. ................................................................................................................. 35

Figura 9 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) ............... 35

Figura 10 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) ............. 36

Figura 11 - Excerto do Behold a virgin shall conceive & O thou that tellest good tidings

to Zion do Messias de Haendel ...................................................................................... 36

Figura 12 - Excerto do Preludio nº 13 em Fá Maior “Tombeau” de Louis Couperin .... 36

Figura 13 - Excerto do Preludio nº 13 em Fá Maior “Tombeau” de Louis Couperin .... 37

Figura 14 - Figura 12 - Excerto do Vinea Fact Est, das Matinas e Vésperas de Sábado

Santo, de Manoel Dias de Oliveira ................................................................................. 37

Figura 15 - Aprendizagem Simultânea ........................................................................... 44

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Introdução

11

INTRODUÇÃO

The union of music with rhetorical principles is one of the most

distinctive characteristics of Baroque musical rationalism and gave shape

to the progressive elements in the music theory and aesthetics of the

period (Buelow, s.d.).

O interesse por este tema foi-nos despertado desde a nossa formação de base, na

Unidade Curricular de História da Música e Análise Musical do período Barroco. Uma

das características deste período é a Teoria dos Afetos, que embora merecesse um

destaque na UC não nos satisfez e sentimos necessidade de o aprofundar.

O tema surgiu ainda durante as primeiras observações de aulas, em que nos

apercebemos que a incidência desta temática nos conteúdos da Disciplina de História da

Cultura e das Artes era demasiado reduzida. As razões do pouco tempo despendido

devem-se sobretudo ao demasiado volume de conteúdos a serem lecionados, incluindo

apenas uma breve abordagem à Teoria dos Afetos. Para que a abordagem desta temática

possa ampliada e compreender de uma forma mais assertiva o pensamento musical e as

obras do período Barroco, e conhecer a respetiva Retórica Musical.

Tendo em conta que a Retórica Musical está umbilicalmente ligada à Filosofia na

Grécia Antiga, nos temas abordados no programa do 11º Ano de Filosofia Argumentação

e retórica, Argumentação e Filosofia como também através do Racionalismo de René

Descartes abordado no conteúdo Estatuto do conhecimento científico (Barros, Henriques,

& Vicente, 2001), e contém um forte paralelismo com a Disciplina de Português do 10º/

11º Ano no módulo Do Renascimento ao Pré-Romantismo, especificamente na

elaboração retórica literária dos Sermões do Padre António Vieira (Campos, Grosso,

Loureiro, Pascoal, & Seixas, 2002), torna-se imperativo relacioná-la com estas disciplinas

aproveitando e direcionando o conhecimento prévio dos alunos deste tema através da sua

génese literária/ filosófica como também na sua contemporaneidade.

Com esta investigação pretendemos responder a questões como: O que é a retórica

musical, como trabalhar com os alunos a problemática da retórica barroca, qual o

contributo da temática em estudo para a formação cultural e profissional dos alunos. Para

concretização dessas respostas teremos que esclarecer a relação da Retórica Musical com

os temas desenvolvidos na disciplina de Filosofia da Grécia Antiga e do racionalismo do

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Introdução

12

século XVII, compreender a forma das obras musicais à luz de uma análise retórica e

compará-la com a estrutura retórica de um sermão do Padre António Vieira.

O trabalho de investigação que apresentamos, O Ensino das Ciências Musicais e

a Retórica: Discurso Musical no Período Barroco está organizado em quatro capítulos.

No primeiro capítulo abordamos de forma sintética uma revisão da literatura sobre

Retórica desde a antiguidade clássica até à Idade Média, a Teoria dos Afetos, um

enquadramento da disciplina da Retórica no curriculum académico medievalista até se

tornar em Musica Poetica e a sua sistematização enquanto corpus para a composição

musical e, por último, ferramentas para uma realização de análise musical numa

perspetiva retórica.

O segundo capítulo, intitulado Intervenção Pedagógica, incide na

contextualização do local de intervenção (Conservatório de Música do Porto), a

caracterização das turmas alvo do projeto, a Intervenção Pedagógica ocorrida nas mesmas

como também a exposição e implantação do projeto artístico “O Bandolim na Era

Barroca”.

No terceiro capítulo, Recolha e Análise dos Dados, analisamos e interpretamos os

resultados obtidos, de acordo com as questões formuladas.

No quarto e último capitulo, apresentamos as conclusões deste estudo.

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Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

13

I – ENQUADRAMENTO TEÓRICO DA INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA

1.1 A Retórica – Breves Apontamentos

O Grande Dicionário da Língua Portuguesa indica que:

Retórica (è), s.f. (do lat. Rhetorica ). A arte de bem falar. || A arte que expõe as

regras para bem dizer ou falar eloquentemente; conjunto dessas regras; a arte do

orador. ||A aula em que se ensina essa arte. || Tratado ou livro que contém as regras

da oratória. || Expansão eloquente; exibição de meios oratórios. || Tudo aquilo de que

nos servimos no discurso para produzir bom efeito no público, para persuadir os

ouvintes. || Afectação da eloquência; discurso empolado e pomposo. || Discurso

pobre de ideias, embora possa ser brilhante na forma. […] Fazer retórica, falar ou

escrever com estilo empolado e em grande opulência de forma […] Figuras de

retórica, artificio de linguagem que modifica a expressão do pensamento, para a

tornar mais viva, mais enérgica ou mais compreensível (Machado, 1981, p. 338).

Segundo Reboul “[A] retórica é anterior à sua história, e mesmo a qualquer

história, pois é inconcebível que os homens não tenham utilizado a linguagem para

persuadir” (Reboul, 2004, p. 1). O que está determinado é a invenção da técnica retórica.

Esta técnica retórica (doravante chamaremos sempre retórica), originou-se em Siracusa,

na ilha da Sicília por volta do ano de 465 a.C.. Esta origem foi devida a uma guerra civil

em que os cidadãos viram retiradas as suas terras pelos tiranos Gélon e Hiéron. Após a

guerra civil, os verdadeiros donos das terras as reclamaram e entraram num processo

judicial. Para oferecer meios de persuasão aos litigantes, Córax e o seu discípulo Tísias

publicaram uma “coletânea de preceitos práticos que continha exemplos para usos de

pessoas que recorressem à justiça” (Reboul, 2004, p. 2). Dá-se também a Córax a primeira

definição da retórica, «a arte da persuasão». De estreitas ligações com Sicília, a Magna

Grécia adotou rapidamente a arte retórica. Para isso contribui em grande parte Górgias,

discípulo de Empédocles como também o foi Córax que, partindo da ilha siciliana para

Atenas no ano de 427 a.C., deslumbrou os cidadãos de Atenas com a sua prosa. A sua

prosa aproximava-se da poesia devido aos recursos estilísticos utilizados como (…)

“assonâncias, rimas, paronomásias, ritmo da frase […] perífrases, metáforas, antíteses”

(…) (Reboul, 2004, p. 4). Atenas, em meados do século V a.C. e em plena instituição da

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Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

14

democracia, necessitava de cidadãos hábeis na arte de bem falar e persuadir para fazer

valer o seu ponto de vista na vida pública.

É neste contexto que surgem os sofistas, que mediante uma remuneração,

ensinavam aos jovens cidadãos a técnica do discurso através da análise de poesia,

definição de partes do discurso e estudo de estilos de debate. Para isso, elaboraram (…)

uma espécie de modelo acrónico, ou melhor, uma certa conjunção de concepções

epistemológicas e éticas” (…) (Barilli, 1979, p. 13), fazendo os primeiros (…) “esboços

de gramática, bem como a disposição do discurso e um ideal de prosa ornada e erudita”

(…) (Reboul, 2004, p. 9). Os fundamentos da retórica sofística baseavam-se na forma e

não no conteúdo, onde o discurso não apresentava uma realidade objetiva, valendo-se da

sua forma/ técnica para persuadir e ganhar o auditório como o apresenta Górgias no seu

diálogo com Sócrates:

Quanto mais se soubesse tudo, Sócrates, a retórica, por assim dizer, abrange o

conjunto das artes, que ela mantém sob sua autoridade. Vou apresentar-te uma prova

eloquente disso mesmo. Por várias vezes fui com meu irmão ou com outros médicos

à casa de doentes que se recusavam a ingerir remédios ou a deixar-se amputar ou

cauterizar; e, não conseguindo o médico persuadi-lo, eu o fazia com a ajuda

exclusivamente da arte da retórica. Digo mais: se na cidade que quiseres, um médico

e um orador se apresentarem a uma assembleia do povo ou a qualquer outra reunião

para argumentar sobre qual dos dois deverá ser escolhido como médico, não contaria

o médico com nenhuma probabilidade para ser eleito, vindo a sê-lo, se assim o

desejasse, o que soubesse falar bem. E se a competição se desse com representantes

de qualquer outra profissão, conseguiria fazer eleger-se o orador de preferência a

qualquer outro, pois não há assunto sobre que ele não possa discorrer com maior

força de persuasão diante do público do que qualquer profissional. Tal é a natureza

e a força da arte da retórica! (Platão, Górgias, 2010).

Sócrates (470-399 a.C.) distanciou-se da retórica sofista ao promover primeiro o

autoconhecimento e só depois a arte de bem falar, e, a retórica não entrava nos domínios

da arte sendo uma habilidade prática e empírica. Já Platão (428/427-348/347 a.C.)

valorizava a filosofia sobre a retórica estando na filosofia a descoberta da verdade,

enquanto a retórica, na sua generalidade, destinava-se a ganhar argumentos através de

manipulação e alguma desonestidade.

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Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

15

Foi Aristóteles (384 a.C.-322 a.C.) que organizou de forma alargada a retórica,

sistematizando-a em quatro partes (…) “que representam as quatro fases pelas quais

passam quem compõe um discurso” (…) (Reboul, 2004, p. 43): Invenção, Disposição,

Elocução e Ação.

Invenção [heuresis]

Invenção é a procura do tema que se vai tratar no discurso. Estes temas podem ser

três como Aristóteles enuncia:

As espécies de retórica são três em número [deliberativo, judicial e epidíctico]; pois

outras tantas são as classes de ouvintes dos discursos. Com efeito, o discurso

comporta três elementos: o orador, o assunto de que fala, e o ouvinte; e o fim do

discurso refere-se a este último, isto é, ao ouvinte (Aristóteles, 2005, p. 104).

O tipo deliberativo serve para lidar com assuntos públicos que irão acontecer no

futuro tratando o orador de convencer o público a concordar ou a discordar de um

argumento. O tipo judicial serve para lidar com a acusação ou a defesa de episódios que

aconteceram no passado. Finalmente, o tipo epidíctico lida com a homenagem ou a crítica

individual.

Depois do tema estar decidido, deve-se encontrar instrumentos de persuasão, os

argumentos. Estes são o ethos, o pathos e o logos:

Ethos: é a dimensão relativa ao carácter do orador. Este deve ser virtuoso e

credível para conseguir a confiança do seu auditório.

Pathos: é a dimensão relativa ao auditório. Este deve ser emocionalmente

impressionado e seduzido.

Logos: é a dimensão relativa aos argumentos, ao discurso. O discurso deve

estar bem estruturado do ponto de vista lógico-argumentativo, para que a

tese se imponha como verdadeira.

(Borges, Paiva, & Tavares, 2014, p. 96)

Para um discurso persuasivo torna-se necessário um leque de etiquetas (Topoi),

que funcionam como um esquema de argumentação transversal a todos os géneros de

discursos.

Disposição [taxis]

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Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

16

Independentemente da categoria temática, Aristóteles dividiu o corpo principal de

um discurso em quatro partes, de forma semelhante a Córax, estabelecendo exórdio ou

introdução, narração, confirmação e peroração. Exórdio é a parte inicial do discurso, na

tentativa de conquistar o auditório. A narração é a parte devotada à exposição dos factos

que mais interessam ao orador. A confirmação (…) “uma parte nitidamente mais longa

[…] [traz] […] um conjunto de provas, seguido por uma refutação (confutatio), que

destrói os argumentos dos adversários” (…) (Reboul, 2004, p. 57). A peroração é a parte

final do discurso, onde o orador conclui de forma categórica.

Elocução [lexis]

A parte em que se redige o discurso e passam as ideias a estarem fixas. O orador

deve escrever bem, ou seja, num bom vernáculo, orientado para o tema para que este seja

o mais persuasivo possível. Para isso, deve escolher bem o estilo que se adapta melhor ao

assunto que vai tratar. Também deve adaptar o estilo do seu discurso ao auditório a fim

de se tornar claro e convencer o público da sua causa. Por último, o orador deve (…)

“mostrar-se em pessoa no seu discurso, ser colorido, alerta, dinâmico, imprevisto,

engraçado ou caloroso, numa palavra, vivaz” (…) (Reboul, 2004, p. 63).

Ação [hipócrisis]

A ação é o culminar do discurso retórico, quando o orador se apresenta diante do

seu público e através da sua interpretação leva este ao encontro do que diz.

Após a conquista da Grécia pelo Império Romano, a retórica foi introduzida em

Roma, tendo tido um rápido desenvolvimento. O tratado de autor anónimo Rhetorica ad

Herennium (c. 85 a.C.) e os sete tratados de Cícero (106-43 a.C.) como também o tratado

Institutio oratoria (92-94 d.C.) de Quintiliano (35-100 d.C.) organizaram

sistematicamente os conteúdos didáticos, latinizando os termos do discurso retórico. As

fases traduziram-se em Inventio, Dispositio, Elocutio e Pronuntiatio, e foi acrescentada a

fase da Memoria. As definições das quatro fases da elaboração do discurso retórico

latinizadas são as mesmas dos gregos só definindo a Memoria como um processo de

interiorizar as informações com o intuito de falar de improviso (Mccreless, 2002, pp. 849-

850). O corpo principal do discurso mantém-se em seis partes, mas com termos latinos:

exordium, narratio, partitio, confirmatio, refutatio e peroratio, mantendo também as suas

definições. Para Cícero, os objetivos da retórica são docere, movere e delectare, ou seja,

a (…) “capacidade de atingir o entendimento (ensinar), de mover os afetos e a vontade

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Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

17

(inclinar), de estimular os sentidos (deleitar)” (…) (Massimi, 2008, p. 55) e o orador deve

possuir, além das técnicas da retórica, uma fundamentação filosófica e ética.

Com o declínio do Império Romano do Ocidente, a retórica política foi também

desvanecendo, mas, foi sendo apropriada e reinventada pelo primeiro Cristianismo,

mudando de paradigma, do político para o religioso. A igreja, depositária da cultura e

retórica do Império Romano, rejeitou os autores pagãos de retórica, mas (…) “não podia

deixar esses meios de persuasão em mãos de adversários” (…) (Reboul, 2004, p. 77) e,

para fazer uma leitura produtiva da Bíblia, cheia de recursos retóricos, tinha que

compreender a arte que rejeitava, como postula Santo Agostinho (354-430):

É um facto, que pela arte da retórica é possível persuadir o que é verdadeiro e o que

é falso. Quem ousará, pois, afirmar que a verdade deve enfrentar a mentira com

defensores desarmados? Seria assim? Então, esses oradores, que se esforçam por

persuadir o erro, saberiam desde o proémio [exórdio] conquistar o auditório e torná-

lo benévolo e dócil, ao passo que os defensores da verdade não o conseguiriam?

(Agostinho, 2002, p. 208).

A utilização da retórica por Santo Agostinho tinha como fim ensinar a verdade

cristã pelo uso de eloquência e, para isso, valia-se dos autores antigos como Cícero,

citando-os com frequência. A retórica desenvolveu-se na Idade Média sobretudo sob a

alçada e desígnios da Igreja, mas também na literatura profana. A educação secular

medieval incluía, nos seus currículos de estudos académicos nas universidades, a retórica

englobando-a no Trivium, que compreendia outras duas disciplinas, a gramática e a

lógica. Pertencendo ao Quadrivium estavam as disciplinas de música, aritmética,

geometria e astronomia. Estas, o Trivium e o Quadrivium, compreendiam as setes artes

liberais. A retórica deixou de ter uma participação com um auditório, ou seja, um discurso

público e voltou-se para as artes literárias, a poesia e a prosa (Mccreless, 2002, p. 850).

A retórica, desvalorizada para as suas disciplinas irmãs do Trivium, (…) “alcanzará

un papel preponderante durante os siglos XV, XVI y XVII, tanto na arte da enseñanza

como en el de la cultura” (…) (Hernández & García, 2005, p. 91). Para isso contribuíram

as descobertas dos autores latinos como Cícero e Quintiliano, que levaram os humanistas

a revalorizarem a retórica grega pois esta era a geradora das formas e dos conteúdos e

também dos adornos, dos textos clássicos. O campo da retórica alargou-se a outros

campos e a outras disciplinas com natural incidência na literatura e de forma

preponderante na música.

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18

1.2 A Teoria dos Afetos

Desde sempre existiu uma clara tentativa de representar em música algo exterior

a ela. Segundo Harnoncourt (1995) pode indicar-se quatro linhas de aproximação: 1)

imitação acústica, 2) representação musical de imagens visuais, 3) retrato musical de

pensamentos e emoções e 4) música como linguagem (Harnoncourt, 1995, p. 118).

Destas, a última foi explorada exaustivamente pelos compositores barrocos.

Porém, a palavra música, como a entendemos atualmente, tem a sua génese

etimológica da palavra grega mousiké, que no período clássico significava «a arte das

musas» e, estava intrinsecamente ligado com as ciências do saber (matemática, geometria

e astronomia), e incorporando todas as artes como a poética, a prosa, o teatro, a dança e

a música.

Platão (427 a.C. -347 a.C.) na sua obra “A República”, através do diálogo entre

Sócrates e Gláucon1, discrimina as harmonias (ou modos medievais) que farão a boa

formação de guerreiros e as que, pelo seu carácter, atraem atitudes e comportamentos

inadequados a um estado ideal. Assim, as harmonias menos viris e as de carácter mais

ébrio são excluídas, pois umas são lamentosas e as outras festivas e apropriadas para os

banquetes. Nestas englobam-se as mixolídia e sintonolídia, quanto ao aspeto menos viril

ou lamentoso, e umas variedades da jónia e da lídia, próprias da preguiça e da moleza. As

harmonias ótimas para uma boa educação são a dória e a frígia que traduzem na perfeição

a coragem, a força e o bom senso pedidos a um guerreiro. Mesmo com estas duas

harmonias, basilares na educação dos jovens, não se deve praticar música em excesso,

pois assim condicionará a sua personalidade tornando-a mais mole e efeminada, e

acontecerá exatamente o contrário, com uma personalidade bruta e rude, se só exercitar o

corpo na ginástica. Assim, o equilíbrio ideal para a educação de um indivíduo é entre a

música e a ginástica, cada uma na sua justa parte, trabalhando o corpo no ginásio e a

mente nas aulas de música. Também é feita a distinção entre a música de Apolo, associada

a instrumentos de corda como a khitara2, de sons sóbrios e pacificadores, próprias para

uma educação regrada e de acordo com as harmonias atrás referidas, e a de Dionísio, com

1 Irmão mais velho de Platão. 2 Cítara – instrumento de cordas.

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a sonoridade excitante e vibrante do aulos3, mais próxima da diversão e do relaxamento

inerentes aos desvios de carácter. Esta dicotomia notava-se nas grandes festas gregas: o

apolíneo, utilizado em grande escala nas festas Apolíneas, e o dionisíaco nas festas

Dionisíacas. Platão, sem entrar em pormenores musicais de natureza técnica, observa

como a música pode influenciar profundamente a personalidade de um indivíduo e assim,

com a educação através desta e da ginástica, encontra um equilíbrio na formação de

cidadãos ideais (Platão, 2001).

Discípulo de Platão e professor na sua academia, Aristóteles (384 a.C. – 322 a.C.),

em particular no livro VIII da sua obra “Política”, alargou o estreito espectro das

harmonias sugeridas pelo seu mestre, acrescentando à música um carácter lúdico e não só

educacional, como seu mestre fez. Para ele, a educação musical teria um objetivo de

cultivar o gosto pela música, que se tornará transversal durante toda a vida. Esta educação

musical não teria tanto impacto nos músicos profissionais, mas sim naqueles que a fruem

e assim veicular formas mais fáceis de partilha e de prazer na sua audição. Não reduzindo

a música só ao seu deleite, distingue três tipos de melodias: as éticas, as de ação e as

entusiásticas. Estas duas últimas são as ideais para apreciar enquanto os outros tocam, ora

procurando entretenimento nas de ação, ou de catarse (katharsis4) nas entusiásticas. Para

a educação, as que melhor se adequam são as melodias éticas, indo ao encontro do

pensamento de Platão. Quanto à aprendizagem dos instrumentos na escola, Aristóteles

aconselha como limite de idade a infância, pois é pouco digno os homens livres serem

instrumentistas profissionais, e tentou abolir as audições dos alunos com as suas peças de

difícil técnica a fim de não criar entusiasmo nas crianças. Os instrumentos a aprender

seriam os de sopro (aulos), a que ele não se refere como prejudiciais à educação, ao

contrário dos de corda (khitara) que deveriam ser retirados da educação (Strunk, 1950).

Na Idade Média, o texto e a música atuavam em conjunto para servir a adoração,

contemplação e doutrinação religiosa, os modos e os ritmos eram escolhidos de acordo

com o que se pretendia, de acordo com a herança grega, como Santo Agostinho postula:

O deleite da minha carne, ao qual não convém entregar a mente, que por ele seria

necessariamente enfraquecida, engana-me muitas vezes, quando o sentimento não

acompanha a razão de modo a ir resignadamente após ela, mas além disso, uma vez

3 Instrumento de sopro de palheta dupla. 4 Katharsis - no século IV a.C. significa assumir a vontade dos deuses. Procura obter a purificação através

de emoções fortes.

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que mereceu ser admitido por causa dela, tenta até ir adiante e guiá-la. Assim, sem

me dar conta, peco nestas coisas e depois dou-me conta disso. (...). Quando me

lembro das minhas lágrimas, que derramei perante os cânticos da Igreja, nos

primórdios da recuperação da minha fé, e quando mesmo agora me comovo, não

com o canto, mas com as coisas que se cantam, quando são cantadas com uma voz

clara e uma modulação perfeitamente adequada, reconheço de novo a grande

utilidade desta prática. Assim, flutuo entre o perigo do prazer e a experiência do

efeito salutar, e inclino-me mais, apesar de não pronunciar uma opinião irrevogável,

a aprovar o costume de cantar na igreja, a fim de que, por meio do prazer dos ouvidos,

um espírito mais fraco se eleve ao afeto da piedade. Todavia, quando me acontece

que a música me comova mais do que as palavras, confesso que peco de forma a

merecer castigo e, então, preferiria não ouvir cantar. (Confissões. X, 33)

O texto e a música atuavam em conjunto para servir a adoração, a contemplação e

a doutrinação religiosa e, como na Grécia Clássica, os modos e os ritmos eram escolhidos

de acordo com a finalidade objetiva funcional da música.

Com a gradual relevância das disciplinas linguísticas no Renascimento e a paralela

humanização do pensamento musical, o texto expressivo levou a uma redução do peso da

musica theorica (música especulativa). A preocupação latente do compositor

renascentista deveria incidir na expressão dos afetos através do texto, adequando as

palavras com a música de forma harmoniosa, equilibrada, deixando de lado a capacidade

desta no despertar de afetos no ouvinte. Este equilíbrio entre música e texto foi perturbado

quando o texto ganhou demasiada preponderância resultando no maneirismo musical.

O compositor/ teórico barroco procurava com a música despertar e mover espírito

humano, criando afetos e demarcando-se do período anterior, que os espelhava

passivamente. Como refere Bartel:

To the Renaissance affectus exprimere the Baroque added affectus movere. It was

no longer enough simply to present the affection objectively through the music: the

listener was to be drawn into the drama of the presentation, to be emotionally

affected himself. The Baroque composer wanted to move the listener to a heightened

emotional state (Bartel, 1997, p. 32).

Para o ouvinte ficar num estado emocional intensificado surge um conceito barroco

dos afetos em que o compositor trabalhava, de forma racional/ calculada, para uma dada

reação emocional do ouvinte, controlando o seu estado emocional através do poder da

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música. O afeto desejado poderia ser despertado através de um modo apropriado ou de

uma tonalidade, de um compasso ou ritmo juntamente com todo o arsenal de métodos e

artifícios retóricos. Ou seja, os compositores e teóricos barrocos, para o melhor despertar

de sentimentos e dos afetos, racionalizaram os conceitos tornando-os objetivos e

codificando-os numa linguagem puramente musical.

De uma grande quantidade de obras literárias barrocas concernentes ao tema, Les

Passions de l'âme5 (1649) de René Descartes foi a primeira tentativa moderna para

desenvolver uma teoria sistematizada e abrangente dos afetos, bem como uma das mais

influentes no mundo artístico da época sendo obrigatória para conhecer a visão barroca

sobre os afetos.

Descartes distingue entre alma e corpo, em que o corpo é explicado racionalmente

(através de processos mecânicos) e a alma localizada no cérebro na glândula Pineal,

comandando-a e assim provocando as paixões. Segundo o sistema cartesiano, existem

quatro temperamentos humanos, nomeadamente sanguíneo, melancólico, fleumático e

colérico concatenados com os elementos da Terra: ar, terra, água e fogo e determinam-se

por uma combinação de dois dos quatro atributos principais: quente e frio, húmido e seco.

Cada temperamento também está associado a um certo fluido corporal ou humor,

produzido por um órgão.

O temperamento humano está de acordo com a sua fisiologia, determinado em

parte, no momento do nascimento através dos astros. A idiossincrasia revelava-se na

conjugação equilibrada destes fatores, reagindo diferentemente a qualquer estímulo

afetivo externo. Este estado de equilíbrio altera-se quando se é despertado para

determinados afetos por estímulos, neste caso a música, provocando diferentes reações

dos ouvintes. Então, um modo ou tonalidade pode despertar a um indivíduo um

determinado afeto e a outro um diferente.

Embora não existisse uniformidade na atribuição de temperamentos diferentes a

diferentes modos/ tonalidades, teóricos e compositores versaram sobre a temática e

propuseram relações como sintetiza Cano (2000):

5 Editado em português com o titulo As Paixões da Alma. Este foi o último texto filosófico de René

Descartes, publicado no ano de 1649.

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CHARPENTIER (1643-1704)

MATTHESON

(1681-1764) RAMEAU

(1683-1764)

Dó Maior Alegre, guerreiro Cólera, Raiva, impertinencia Vivo, jubilante

Dó menor Deprimido, triste Doçura transbordante, tristeza

intensa

Ternura,

lamentação

Ré Maior Alegria, raiva Obstinação, acuidade, escândalo,

beligerância, animação

Vivo, jubilante

Ré Menor Solene, devoto

[religioso]

Calma, religiosidade,

grandiloquência, alegria refinada

Doçura, tristeza

Mi bemol Maior Cruel, duro Agudeza, seriedade, reflexão,

lastimoso

Mi bemol menor Horror, espanto

Mi menor Afeminado, amoroso e

lacrimoso

Reflexão, profundidade, tristeza,

expressa dor

Doçura, ternura

Fá Maior Fúria, cólera Generosidade, resignação, amor Tempestuoso,

raiva

Fá menor Deprimido, magoado Ansiedade, desespero, fragilidade,

relaxado

Ternura,

lamento,

deprimente

Fá sustenido menor Tristeza profunda, solidão,

languidez

Sol Maior Doce, jovial Insinuação, persuasão, brilho,

alegria

Canções ternas

e alegres

Sol menor Severo, magnificente Graça, complacência, nostalgia

moderada, alegria e ternura

moderadas

Ternura, doçura

Lá Maior Jovial, pastoral Lamentação, comovedor, tristeza Vivacidade,

regozijo

Lá menor Terno, lacrimoso Choro, nostalgia, dignidade,

relaxado

Si bemol Maior Magnificente, jovial Diversão, ostentação Agitação, raiva

Si bemol menor Deprimido, terrível Extroversão Canções tristes

Si Maior Duro, lacrimoso

Si menor Solitário, melancólico Raro, temperamental, melancolia,

mudança de humor constante

Traduzido a partir de (Cano, 2000, p. 67)

O ritmo, compasso e pulsação também foram examinados, explicados e aplicados na

composição musical de acordo com as suas propriedades afetivas, como também os vários

tipos de danças e outras composições. Cano (2000) sintetiza desta forma as interpretações

de Johann Mattheson no seu tratado Der Vollkommene Capellmeister6 (1739) em relação

ao tempo musical/ andamento:

Adagio: tristeza

Lamento: lamento

Lento: alivio

Andante: esperança

Afetuoso: amor

Allegro: consolo

Presto: desejo

6 Tradução do titulo para português “O Maestro de Capela Perfeito”. Este tratado contempla a descrição

mais detalhada e abrangente da conceção musical segundo as prescrições da retórica.

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A alguns tipos de danças e composições:

Minueto: alegria moderada

Gavota: alegria jubilosa

Bourrée: contentamento,

satisfação, indiferença e laxismo

Rigaudon: deliciosa coqueteria

Marcha: heroísmo e valentia

Entrée: altivez e majestosidade

Giga inglesa: ardente e

precipitada; ansiedade, raiva

efémera.

Louvre: altivez e pomposidade

Canarie: desejo

Giga italiana: velocidade e

ímpetos extremos

Polonaise: sinceridade e

franqueza

Angloise: obstinação

Passepied: frivolidade

Rondeau: firmeza e convicção

Sarabanda: ambição

Courante: doce esperança

Allemande: espírito contente e

feliz que se deleita na calma e na

ordem

Fantasia: imaginação

Chacona e Passacaglia: saciedade

Intrata: promessa

Sonata: complacência: cada um

encontrará o afeto, de acordo com

o movimento indicado (adagio,

andante, presto, etc.)

Concerto grosso: sensualidade,

inveja, vingança e ódio

Sinfonia: o mesmo do resto da

obra

Abertura: nobreza

As tonalidades, o ritmo/ compasso e o texto (quando cantado) são as primeiras

indicações/ prescrições que um compositor deveria considerar para alcançar um

determinado afeto com a composição musical. Embora em algumas indicações os teóricos

barrocos não sejam concordantes, essas diferenças esbatem-se no panorama geral,

obtendo-se uma certa homogeneidade, não variando da alegria para a tristeza o afeto

proposto para uma certa tonalidade.

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1.3 Música e Retórica

1.3.1 As sete artes liberais: Trivium e Quadrivium

A existência de um vocabulário comum entre a disciplina de retórica e música

como tropo, colores, clausula, cópula, diminutio e variatio, a utilização de figurae

(ornamentos retóricos de estilo presentes no elocutio), e a utilização de recursos

mnemónicos como a mão Guidoniana como forma de memorizar as figuarae musicais

são certamente pontos com algum contacto entre a retórica literária e a musical.

No período renascentista, os compositores utilizaram, de forma isolada, a projeção

afetiva do texto, o uso de acordes em suspensão (fermata) em palavras-chave, a elegância

no texto poético, assim como a preocupação latente da expressão musical das palavras, a

gramática, as cadências, o ritmo utilizado entre outros, denotando uma ligação mais

próxima com a retórica, vitalizada pela descoberta dos tratados de Cícero e de Quintiliano

neste período (Wilson, s.d.).

Tal como na Antiguidade clássica, a música, na educação medieval, estava

associada ao Quadrivium das sete artes liberais. Esta configuração é creditada a Boécio

(480-524), filósofo romano e educador que veiculou a conceção Pitagórica da música, ou

seja, uma disciplina intimamente relacionada com relações matemáticas, sendo por isso

especulativa, teórica. No seu tratado, De institutione musica, define três categorias de

música: Musica Mundana na sua dimensão cosmológica; musica humana na sua relação

com o corpo e o espírito humanos; e musica instrumentalis, a relação entre música e os

instrumentos.

Este conceito de música como uma arte matemática mudou no início do século

XVI, sendo o estudo da música abordado em duas perspetivas diferentes. Ao Quadrivium

pertenciam as disciplinas matemáticas, com o número na sua génese. O conhecimento

procurado através destas disciplinas é racional e a música é abordada na sua dimensão

matemática pitagórica, sendo a manifestação sonora desta. Os músicos que abordavam a

música por esta perspetiva consideravam-se superiores aos músicos práticos.

No Trivium encontram-se as disciplinas dedicadas à palavra, ou seja, à linguagem.

A musica practica, sendo uma aplicação prática da música foi considerada com uma

relação mais estreita com as disciplinas da palavra. Quem pertencia à musica practica era

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compositor, dirigia os coros e ensinava a sintaxe musical como também Latim e Retórica,

estando assim muito próximos do Trivium (Bartel, 1997).

Esta divisão da música seria aumentada por Nicolaus Listenius no seu tratado

Musica (1537), ao acrescentar a musica poética às duas existentes. A nova disciplina

voltava-se para o ensino da composição musical e, naturalmente, a retórica tornou-se a

fonte desta (Cano, 2000).

Figura 1- As Sete Artes Liberais (Liao, 2015, p. 20)

A musica theorica radicada no Quadrivium relaciona-se intimamente com a

matemática como a musica practica, na sua dimensão aplicada une-se à retórica. Nesta

configuração das disciplinas das universidades teria sido instruído o músico (compositor

ou cantor) e apreendido esta dimensão poética da música.

1.3.2 Musica Poetica – Tratados

Segundo Cano “El término “poética” (del griego “crear”) se refiere a la

teorización, normativización, sistematización e invención de instrucciones,

conocimientos y recursos técnicos con los cuales cuenta el artista durante el proceso de

creación” (Cano, 2000, pp. 38-39). Os tratadistas pré-barrocos e barrocos sistematizaram

e normalizaram a Musica Poetica. Passaram da utilização da terminologia retirada da

retórica literária a uma conceção da música seguindo os princípios retóricos. Segundo

Bartel (1997), os mais importantes tratadistas e seus respetivos tratados, são os seguintes:

Septem artes liberales

Quadrivium:

Arithmetica

Musica

Geometrica

Astronomia

Musica

Musica theorica Musica practica

Ars cantus

Ars executionis

Ars compositionis

(Musica poetica)

Trivium:

Grammatica

Rhetorica

Dialectica

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Joachim Burmeister (1564-1629)

Hypomnematum musicae poeticae (1599)

Musica autoschediastike (1601)

Musica Poetica (1606)

Johannes Nucius (ca. 1566-1620) Musices Poeticae (1613)

Joachim Thuringus (?-?) Opusculum Bipartitum (1624)

Athanasius Kircher (1601-1680) Musurgia Universalis (1650)

Christoph Bernhard (1628-1692)

Tractatus compositionis augmentatus (ca.

1660)

Ausführlicher Bericht vom Gebrauche der

Con – und Dissonantien (?-?)

Wolfgang Caspar Printz (1641-1717) Phrynis Mytilenaeus (1676-79)

Johann Georg Ahle (1651-1706) Sommer-Gespräche (1695)

Tomás Baltazar Janovka (1669-1741)

Clavis ad Thesaurum magnae artis

musicae (1701)

Mauritius Johann Vogt (1669-1730)

Conclave thesauri magnae artis musicae

(1719)

Johann Gottfried Walther (1684-1748) Praecepta der musicalischen Composition

(1708)

Musicalisches Lexicon (1732)

Johann Mattheson (1681-1764) Der vollkommene Capellmeister (1739)

Meinrad Spiess (1683-1761) Tractatus musicus compositorio-practicus

(1745)

Johann Adolf Scheibe (1708-1766) Der critische Musikus (1745)

Johann Nikolaus Forkel (1749-1818) Allgemeine Geschichte der Music (1788-

1801)

(Bartel, 1997, pp. 93-164)

Todos estes tratados têm temas em comum, embora em alguns não sejam

abordados todos eles. Dos assuntos principais destacam-se a estreita relação com a

retórica, o seu contributo significativo como função pedagógica e o caráter divino da

música, de acordo com a doutrina luterana onde se manifestou com grande expressão.

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1.3.3 Retórica Musical

A partir das fases de construção de um discurso (Invenção, Disposição, Elocução,

Memória e Representação/ Ação), Joachim Burmeister, no seu tratado Musica Poetica de

1606, adaptou-a para a composição musical e estabeleceu três partes na estrutura do

Dispositio/ Disposição: Exórdio (Exordium), Corpo da Composição e Conclusão como

também uma lista de figuras musicais a serem utilizadas pelo compositor como assegura

Harrison:

Burmeister's analysis of Lassus's In me transierunt perfectly illustrates an

analysis based on principles of secondary rhetoric. The analysis consists of a

division of the text into sections using the rhetorical terms exordium, confirmatio,

and epilogue as well as a listing of musical figures (Harrison, 1990, p. 4).

Desde o tratado de Joachim Burmeister (1566-1629) foram escritos vários

tratados, mas foi o tratado de Johann Mattheson de 1739, Der volkommene Capellmeister,

o mais elaborado e discricionário da utilização da Retórica Musical na composição, com

um receituário de estruturas retóricas musicais a serem utilizadas pelo compositor

(Bukofzer, 1939). Segue-se uma exposição do que se trata nas fases de composição

musical.

Inventio – Invenção

Para a composição é necessário obter ideias ou argumentos musicais adequados.

O sistema funcional do Inventio musical denomina-se loci topici, (…) “conceito de tópico

[que] vem da retórica aristotélica. Esse conceito concerne a um sistema pelo qual se obtém

argumentos eficazes com o mínimo de informações disponíveis. […] A fórmula loci-

topici, pela qual os tópicos eram designados, apresentava uma série de estratégias

composicionais para a produção do discurso musical” (Duarte, 2006, p. 48). Para

Matheson, haviam 15 topi-lopici diferentes:

Locus notationis

Locus descriptionis

Locus generis et specie

Locus totius et partium

Locus causae efficientis

Locus effectorum

Locus adjunctorum

Locus circumstantiarum

Locus comparatorum

Locus oppositorum

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Locus causae materialis

Locus causae formalis

Locus causae finalis

Locus exemplorum

Locus testimoniorum

(Cano, 2000, pp. 76-77)

Dispositio – Disposição

Dispositio é a estruturação do discurso, como ordenar o(s) lopi-topici do inventio

para obter mais impacto e assim mais persuasão. Nas palavras de Cano:

La dispositio musical es una infraestructura, un ordenamiento subyacente que

permite entender cada momento musical como parte funcional de un todo orgánico

y se vincula directamente con el discurso musical en acción, es decir, en el mismo

instante en que se percibe como sonidos distribuidos en el tiempo, dirigidos en un

espacio y a un público específicos (Cano, 2000, p. 88).

A estrutura (flexível) do dispositio literário compreende Exordium, Narratio,

Propositio, Confutatio, Confirmatio e Peroratio, como já referido anteriormente, assim

como a musical, embora sofresse pequenas alterações na sua aplicação. Na sua aplicação

prática é o esboço da composição, as linhas gerais.

Exordium – introdução ao tema musical com a finalidade de captar a atenção do público

e preparar para o que vem a seguir. Para Bartel (…) “this might take the form of a prelude

to a fugue or […] an opening ritornello in an aria or concerto (Bartel, 1997, p. 81)”.

Narratio – a definição ou afirmação do tema e a sua natureza. Pode ser a entrada da voz

numa aria ou a entrada do instrumento solista num concerto. Este pode ser incorporado

no Propositio.

Propositio – como o narratio pode ser incorporado no propositio. Numa fuga pode ser a

primeira reexposição do sujeito. Apresenta o propósito da composição.

Confutatio, Confirmatio – confutatio ou refutatio faz alterações substanciais ao tema com

cromatismos, modulações entre outros, afastando-se do tema, refutando-o e depois com

uma resolução eficaz o eleva. Confirmatio afirma o tema através de repetições mais ou

menos variadas. Podem ser dois processos contrastantes, mas com o mesmo objetivo,

reforçar e elevar o tema principal através da sua discussão.

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Peroratio – a conclusão da composição podendo ser através da repetição do exordium ou

ritornello.

Elocutio – Elocução

No elocutio ou decoratio ocorre o ajuste da escrita ao esboço prévio, obtido do

dispositio. Para tornar a composição musical mais apelativa ou mais persuasiva

acrescentam-se alterações, ornamentações, entre outros. No discurso literário é a escolha

acertada das palavras como também das figuras de estilo e na composição musical é a

escolha de figuras retóricas musicais. Para Cano a figura retórica musical:

Es el proceso de transgresión a la regla musical que provoca que, en un contexto

determinado, la forma “correcta” de la realización musical, ceda su lugar a otra de

carácter sorpresivo, inesperado, inusitado y extracotidiano que se propone ofrecer al

discurso musical belleza, refinamiento, elegancia, atractivo y, sobre todo, se propone

mover los afectos del oyente (Cano, 2000, p. 109).

Uma figura musical opera basicamente de quatro modos: adição, subtração ou

supressão, permutação e substituição. Podem ser classificadas segundo a sua hierarquia,

o seu estilo e os elementos musicais afetados.

Classificação por hierarquia

Nucius (1613) divide as figuras em dois grandes grupos:

A) Figurae principalis: fuga, commisura, repetitio.

B) Figurae minus principalis: climax, complexio, syncopatio, homoioteleuton.

Classificação por estilos

Segundo Bernhard (1660), as figuras classificam-se pelos seguintes estilos:

A) Stylus gravis: polifonia religiosa tradicional. Prima prattica.

B) Stylus luxurians communis: música de câmara. Seconda prattica.

C) Stylus luxurians theatralis: ópera, oratório, cantata, etc.

Classificação por elementos musicais afetados

Figuras que afetam a melodia:

Figuras de repetição.

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Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

30

Figuras descritivas: Hypotiposis

Figuras que afetam a harmonia:

Figuras de dissonância

Figuras de acordes

Figuras que afetam vários elementos:

Por adição

Por subtração

Por permutação e/ou substituição

(Cano, 2000, pp. 117-121)

Memoria – Memória.

A memória é importante para quem executa/ interpreta música, recorrendo a

sistemas mnemónicos para melhor assimilar. No período barroco, a música era para a

contemporaneidade e como tal não era necessário memorizar peças do passado, e não

tendo tempo para memorizar as do imediato. Mas pode considerar-se o Baixo Contínuo

um sistema mnemónico.

Pronuntiato – Representação/ Ação

Representação, ou seja, a forma de executar a composição musical foi bastante

importante para vários compositores do período barroco, como François Couperin,

deixando várias indicações para uma forma correta de tocar. François Couperin e J.S.

Bach deram indicações precisas de como executar as suas obras bem como se deviam

estudar, mostrando uma forte preocupação com a representação do seu discurso musical

(Benedetti, 2012).

1.4 Retórica – Análise do Discurso Musical

A retórica é a arte da persuasão e assim, qualquer análise retórica deve começar

com uma única pergunta: “Qual é o objetivo persuasivo no discurso ou na composição?”

Esta pergunta leva a outras questões de que se destaca: “Quais os meios retóricos pelo

qual o orador/ compositor se recorre para tornar o seu discurso/ composição o mais

persuasivo/a possível?” (Anderson, 2012, p. 39).

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Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

31

Como já foi supramencionado, ao longo do período barroco os princípios da

retórica eram prescritivos: eles forneceram técnicas de rotina para o processo de

composição em vez de técnicas descritivas para uma análise. Assim, para realizar uma

análise eficaz, torna-se necessário desconstruir uma composição à luz dos seus princípios

prescritivos (Bent & Pople, 1980).

Como sintetiza Bartel (1997), um compositor, na fase do inventio, primeiramente

escolhe um tema que será a base para evocar um determinado afeto. Em segundo lugar,

determina a tonalidade de acordo com o afeto pretendido. Em terceiro, escolheria o ritmo

(compasso) e a métrica adequada. Se o compositor trabalhasse num texto pré-

determinado, este sugeriria de acordo com a sua natureza, uma certa tonalidade, um ritmo

e obviamente a métrica. Para uma composição vocal, a análise naturalmente começará

pelo texto. No caso das composições instrumentais, em que as palavras não ajudam para

determinar o tema ou afeto pretendido, o ritmo e o andamento serão determinantes como

também a tonalidade. No caso das Suite de dança, os diferentes compassos, ritmos e

andamentos utilizados estão conotados com um determinado afeto.

Depois de determinar o género de inventio, a análise deve incidir no dispositio, ou

seja, como a composição se apresenta estruturada. Para isso, torna-se necessário uma

análise à estrutura harmónica para melhor compreender as partes do discurso musical.

Com uma estrutura harmónica realizada torna-se mais óbvia a segmentação em partes do

discurso musical, seguindo as prescrições dos teóricos da época. Como já referido

anteriormente, o Exordium faz a introdução ao tema musical, o Narratio define ou afirma

o tema e a sua natureza, o Propositio (que pode ser incorporado no narratio) reafirma o

tema, o Confutatio (Refutatio) e o Confirmatio em que o primeiro faz alterações

substanciais ao tema com cromatismos, modulações entre outros e o segundo assegura o

tema através de repetições mais ou menos variadas e, por último, o Peroratio, a conclusão

da composição.

Para finalizar, identifica-se as figuras retóricas utilizadas na composição,

associando-as ao afeto pretendido no geral como também no seu particular. Se uma

composição é alegre e festiva, naturalmente as figuras retóricas terão esse carácter na sua

generalidade, mas o compositor, com a intenção de reforçar a alegria e a jovialidade pode

utilizar outras menos próprias a esse afeto desejado. Nas composições vocais analisam-

se as figuras retóricas de acordo com o afeto presente no texto.

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Enquadramento Teórico da Intervenção Pedagógica

32

Segue um esquema de como proceder a uma análise retórica:

Figura 2 - Para uma Análise Retórica

Análise do Elocutio

Determinação das Figuras Musicais

Estrutura do dispositio

Análise harmónica

Exordium - pode ser o prelúdio que antecede a fuga, o próprio sujeito da fuga, o ritornelloinicial numa aria ou concerto.

Narratio e Propositio - pode ser a entrada da voz ou do instrumento solista num concerto.

Confutatio - passagens contrastantes com utilização de suspensões, cromatismos.

Confirmatio - repetições variadas e inventivas do Propositio/ Narratio.

Peroratio - a conclusão da composição que pode ser a repetição do ritornello inicial, do exordium ou uma passagem pedal.

Determinação do Inventio e/ou dos afetos pretendidos

Natureza do texto (se a composição for vocal)

Tonalidade

Compasso

Andamento

Métrica

Análise Musical numa Perspetiva Retórica

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33

Seguem alguns exemplos de figuras retóricas comumente utilizadas, e o seu significado

afetivo7:

Catabasis – Passagem musical descendente, que expressa imagens ou afetos negativos,

de lamento, submissão ou humildade.

Figura 3 – Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) com uma Catabis nos compassos 2 e 3

(Rodrigues, 2006, p. 41)

Figura 4 - Excerto do Preludio nº 13 em Fá Maior “Tombeau” de Louis Couperin (Persone, 1996, p. 93)

Suspiratio – Expressão musical de um suspiro através de uma pausa.

Figura 5 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) com um Suspiratio no compasso 18

(Rodrigues, 2006, p. 42)

7 No capítulo III, Definitions and Translations of the Musical-Rhetoric Figures, do livro Musica Poetica do

autor Dietrich Bartel (Bartel, 1997, pp. 165-438) e na seção Registro de Figuras do livro Música y Retórica

en el Barroco do autor Rubén López Cano (Cano, 2000, pp. 123-237) tem uma lista e definição

pormenorizada das Figuras Musicais.

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Saltus duriusculus – Salto dissonante.

Figura 6 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) com um Saltus Duriusculus no compasso

27 (Rodrigues, 2006, p. 45).

Figura 7- Excerto de Largo do Concerto nº5, BWV 1056, de Johann Sebastian Bach com um Saltus Duriusculus

entre o compasso 3 e o 4 (Lanzoni, 2013)

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Passus Duriusculus – Ocorre quando a voz sobe ou desce meio-tom.

Figura 8 - Excerto Responsório nº2 do Ofício dos Defuntos (1816) de José Maurício Nunes Garcia.

Auxesis – Repetição de uma passagem musical um tom acima.

Figura 9 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) com um Auxesis no solo dos compassos

19 e 20 (Rodrigues, 2006, p. 44)

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Circulatio – Série geralmente oito notas de forma formação circular ou senoidal.

Figura 10 - Excerto de Dominus Deus, Agnus do Gloria de Vivaldi (RV 589) com um Circulatio na voz no texto

Agnus Dei, Filius Patris (Rodrigues, 2006, p. 42)

Noema – Passagem homofónica inserida numa textura de contraposição.

Figura 11 - Excerto do Behold a virgin shall conceive & O thou that tellest good tidings to Zion do Messias de

Haendel (Mateus, 2016, p. 47)

Interrogatio – pergunta musical.

Figura 12 - Excerto do Preludio nº 13 em Fá Maior “Tombeau” de Louis Couperin (Persone, 1996, p. 93)

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Anabasis – Passagem musical ascendente, expressando imagens positivas.

Figura 13 - Excerto do Preludio nº 13 em Fá Maior “Tombeau” de Louis Couperin (Persone, 1996, p. 94)

Aposiopesis – Pausa ou silêncio inesperado.

Figura 14 - Figura 12 - Excerto do Vinea Fact Est, das Matinas e Vésperas de Sábado Santo, de Manoel Dias de

Oliveira (Soares & Neto, 2014)

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Intervenção Pedagógica

39

II – INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA

2.1 Contexto geral de intervenção

2.1.1 História e caracterização do Conservatório de Música do Porto

O projeto O Ensino das Ciências Musicais e a Retórica: Discurso Musical no

Período Barroco foi implementado no Conservatório de Música do Porto (CMP), que é

uma escola pública do Ensino Artístico Especializado em Música e é, conjuntamente com

todos os outros conservatórios e escolas artísticas públicas, um setor específico do nosso

sistema educativo.

O CMP surgiu para responder a uma necessidade de criar uma instituição pública

destinada ao ensino de Música, na cidade do Porto. Esta necessidade foi despoletada

desde a segunda metade do século XIX, após a criação do Conservatório Nacional de

Lisboa em 1835 e foram feitas várias tentativas por nomes insignes como Carlos Dubbini

ou Ernesto Maia.

Porém, o CMP foi fundado somente no século XX, em reunião de 1 de junho de

1917, por votação unânime do senado da Câmara Municipal e inaugurado no dia 9 de

dezembro de 1917, sendo o mérito reconhecido ao diretor de orquestra e pianista

Raymundo Macedo. Logo no ano letivo de inauguração do CMP, matricularam-se 339

alunos, para os cursos de Piano, Violino e Violeta, Violoncelo, Canto, Instrumentos de

Sopro e Composição, sendo o corpo docente constituído por 12 professores entre os quais

Raymundo Macedo, Moreira de Sá e Luís Costa.

O acervo bibliográfico e documental, as obras de arte, instrumentos e objetos

pessoais de personalidades da nossa história constituem o seu património, bem como os

espólios de Guilhermina Suggia e Nicolau Ribas, doados a esta instituição.

A necessidade de instalações com maior capacidade e com mais potencial para

responder à procura de formação artística, aliado às (re)organizações consequentes do 25

de abril de 1974, levaram a que fosse possível uma transferência do CMP para um

palacete municipal8, a partir de 13 de março de 1975.

8 O Palacete Municipal pertenceu à família Pinto Leite e situa-se no nº13 da Rua da Maternidade na cidade

do Porto.

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Intervenção Pedagógica

40

Embora o edifício e jardins envolventes fossem repletos de qualidade e beleza,

não conseguiam responder às necessidades de espaço que o CMP precisava. No sentido

de responder à procura exponencial deste tipo de ensino bem como assumir outros

regimes de frequência, o CMP mudou de instalações, passando a ocupar a área oeste da

Escola Secundária Rodrigues de Freitas, a partir do dia 15 de setembro de 2008, até à

atualidade.

Hoje em dia, tem mais de 1000 alunos matriculados, desde o primeiro ciclo até ao

final do ensino secundário. Dado que se trata de uma escola de Ensino Artístico

Especializado em Música, é necessário que os alunos (com idades compreendidas entre

os 6 e os 23 anos) realizem provas de admissão/ aferição. Os critérios de seleção baseiam-

se exclusivamente nas suas aptidões musicais, independentemente do estatuto

socioeconómico das suas famílias ou da sua área de residência. É importante salientar que

o CMP não consegue dar resposta ao elevado número de estudantes que anualmente

procuram ter acesso, não só pelo número (ainda) limitado de meios físicos (salas de aula

ou outros espaços e equipamentos) como também de recursos humanos (professores e

pessoal não docente).

Deste modo, a escola (re)orientou conceções relativas a normas de organização e

de oferta formativa, nomeadamente o alargamento da frequência a outros regimes.

Assim, os alunos podem matricular-se escolhendo um de diversos regimes de

frequência que a legislação atual (Decreto-Lei n.º 344/90 de 2 de novembro) admite,

nomeadamente: a) regime integrado; b) regime supletivo e c) regime articulado.

a) regime integrado: quando os alunos obtêm a formação geral e a formação

específica (neste caso música) na mesma escola.

b) regime articulado: quando os alunos obtêm a formação geral numa outra escola

e integram o CMP neste regime para aprender música. É a solução mais adequada para

estudantes que vivem fora da cidade pois permite uma maior facilidade de gestão do seu

horário e do seu currículo. Por exemplo, o CMP tem um horário bastante alargado,

funcionando das 8h20 às 22h20 de 2ª a 6ª, e das 8h20 às 13h20 ao sábado. Este

prolongamento noturno conduz a uma panóplia de escolhas de horários, principalmente

para as famílias cujos filhos frequentam duas escolas. O CMP não cede apoio

socioeducativo a estes alunos pois cabe à escola que leciona a formação geral prestar este

tipo de apoio.

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c) regime supletivo: quando os alunos frequentam o ensino especializado de

música numa escola para esse efeito independentemente das habilitações que possuem.

Por exemplo, o ano letivo de 2013/ 2014, de 1053 alunos, 545 frequentaram o

regime supletivo, 445 o integrado e apenas 63 o regime articulado.

É fundamental realçar que a escolha de estudar música, qualquer que seja o

regime, tem algumas implicações, nomeadamente o trabalho individual e continuado por

parte dos alunos em casa; apresentações públicas (concertos, audições, concursos, provas

e exames), algumas delas fora da escola; acompanhamento, compreensão e envolvimento

dos encarregados de educação. Para os alunos que não têm possibilidade de adquirir o seu

próprio instrumento musical, o CMP cede por empréstimo (Conservatório de Música do

Porto, 2016) (Rocha, 2007) (Conservatório de Música do Porto, 2016).

2.1.2 Caracterização das turmas alvo de intervenção

A prática pedagógica supervisionada desenvolveu-se no Conservatório de Música

do Porto, ao longo do ano letivo 2015/2016 dividindo-se em duas fases distintas: uma

fase de observação e uma fase de intervenção. A observação das aulas iniciou-se no final

do mês de outubro em níveis diferentes: Formação Musical ao 4º, 6º e 9º Ano e História

da Cultura e das Artes a uma turma de 11º Ano, lecionadas respetivamente pelos

professores cooperantes Nuno Rocha e Sónia Marques. A fase de observação revelou-se

fundamental no sentido de uma compreensão da realidade das turmas alvo para uma

melhor formulação de planificações, estratégias e metodologias adequadas a cada turma.

Para esta compreensão foram também de enorme importância, as informações obtidas por

parte dos professores cooperantes.

Formação Musical 6º Ano A/ 2º Grau

A turma de Formação Musical do 6º Ano A em regime de ensino integrado da

escola Conservatório de Música do Porto do ano letivo 2015/2016 é constituída por 11

alunos, 6 elementos do sexo feminino e 5 elementos do sexo masculino entre os 11 e 12

anos de idade. Todos os alunos frequentam o curso básico de Música de interpretação.

Das informações cotejadas ao longo do ano, de observação direta de aulas e

transmitidas pelo professor cooperante, constatou-se que a turma apresenta níveis

díspares de conhecimento das matérias, salientando-se dois/três elementos que

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sobressaem em relação aos demais. Doravante, a turma exibe capacidades suficientes para

a assimilação dos conteúdos da disciplina.

De uma forma geral, o ambiente na sala de aulas é saudável, propiciando a

aprendizagem só contrariado algumas vezes por dois/ três alunos, que por vezes iniciam

conversas paralelas perturbando o normal funcionamento da disciplina.

Formação Musical 4º Ano/ Iniciação IV

O primeiro turno de Formação Musical do 4º Ano em regime de ensino integrado

da escola Conservatório de Música do Porto do ano letivo 2015/2016 é constituída por 12

alunos, 4 elementos do sexo feminino e 8 elementos do sexo masculino entre os 9 e 10

anos de idade. Todos os alunos frequentam o curso básico de Música de interpretação.

O segundo turno é constituído por 12 alunos, 5 elementos do sexo feminino e 7

elementos do sexo masculino, também entre os 9 e 10 anos e também frequentam o curso

preparatório de Música de interpretação.

Através das informações recolhidas da observação direta ao longo do ano como

também das partilhadas pelo professor cooperante, constatou-se que a turma apresenta

níveis similares de conhecimentos dos conteúdos, sobressaindo 4 elementos em cada

turno com uma facilidade de aprendizagem e assimilação de conhecimentos acima da

média.

A nível comportamental, é uma turma calma, que acata e entusiasma-se com os

conteúdos da disciplina, respondendo maioritariamente de forma positiva. Como na

generalidade, existem alunos mais introvertidos e alguns mais expansivos, mas não

interferem de forma significativa no desenrolar normal da aula.

Formação Musical 9º Ano B/ 5º Grau

O primeiro turno de Formação Musical do 9º Ano B em regime de ensino

integrado da escola Conservatório de Música do Porto do ano letivo 2015/2016 é

constituído por 12 alunos, 4 elementos do sexo feminino e 8 elementos do sexo masculino

entre os 14 e os 15 anos. Todos os alunos frequentam o curso preparatório de Música de

interpretação.

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O segundo turno é constituído por 12 alunos, 4 elementos do sexo feminino e 8

elementos do sexo masculino entre os 14 e 15 anos e também frequentam o curso

preparatório de Música de interpretação.

Através de observação direta no momento de lecionação, constatou-se que o

primeiro turno tem conhecimentos díspares em relação aos conteúdos da disciplina.

Quanto ao nível de comportamento mostraram-se sempre atentos, sem conversas

paralelas nem comentários impróprios a uma sala de aula.

O segundo turno demonstrou ser bastante diferente tanto ao nível de

conhecimentos como ao nível comportamental. O nível de conhecimentos é inferior ao

primeiro turno, com algumas assimetrias entre alunos. Ao nível do comportamento é um

turno bastante expansivo nas atitudes, demonstrando menos motivação que o primeiro,

existindo conversas paralelas e comentários pouco próprios a uma sala de aula.

História da Cultura e das Artes 11º Ano

A turma de História da Cultura e das Artes é constituída por dezassete alunos (6

alunos e 11 alunas) sendo uma turma heterógena. As idades estão compreendidas nos

16/17 anos com exceção de uma aluna que já é maior de idade. A turma é muito unida

notando-se, por exemplo, no apoio aos colegas com maior dificuldade na aprendizagem.

Da totalidade da turma destacam-se algumas alunas com uma capacidade de

aprendizagem acima da média como também alguns alunos com maior dificuldade na

aprendizagem, mas na generalidade da turma salienta-se que existe um à vontade na

aprendizagem dos conteúdos da disciplina. A escolha da disposição física dos alunos na

sala de aula é por parte dos alunos e estes escolheram juntar pares de alunos bons com

alunos regulares, ajudando desta forma os colegas e demonstrando a referência anterior

sobre a união da turma.

2.2 Observação de aulas

A composição era ensinada a partir da invenção de um motivo (muitas vezes

como estereótipo), passando pela estrutura global, até à execução e

ornamentação (inventio, dispositio, elaboratio, decoratio), assim como pela

divisão em secções ou frases (incisiones, periodi) e pelo uso de flores de retórica

para determinadas representações (do texto), chamadas figuras (Michels, 2007,

p. 305).

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Intervenção Pedagógica

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O período da História da Música a que o autor se refere sobre o ensino da

composição musical é naturalmente o Barroco, instruída através dos princípios retóricos

levando a uma produção musical assente nestes mesmos. Como estes princípios retóricos

foram basilares na composição do barroco musical e doravante na sua música, tudo

levaria a crer que o ensino das Ciências Musicais na atualidade, lhe dedicasse um espaço

na lecionação de acordo com essa importância. O preencher desta lacuna norteou a Prática

Pedagógica com o objetivo de dar a conhecer os fundamentos/características da retórica

musical. As turmas comtempladas para a aplicação deste projeto, como referido

anteriormente, são Iniciação IV, 2º Grau/ 6º Ano e 5º Grau/ 9º Ano em Formação Musical

e 11º Ano em História da Cultura e das Artes. Como as disciplinas são de natureza

diferente e os alunos compreendem idades em fases de desenvolvimento diferentes o tema

também foi abordado de forma bastante díspar.

Assim, em Formação Musical procurou-se conduzir a lecionação a partir de uma

aprendizagem simultânea como referida por Paul Harris (Harris, 2006), ou seja, foi a

partir de uma ou mais obras do repertório do período barroco que todas as atividades da

sala de aula se desenvolveram, sempre de acordo com o nível de ensino da turma em

questão. A Aprendizagem Simultânea, defendida por Paul Harris é uma filosofia que

habilita os alunos a um entendimento musical completo, num percurso holístico e

orgânico a partir de obras existentes, independentemente do seu género ou do período

estilístico:

Figura 15 - Aprendizagem Simultânea (Harris, 2006, p. 11)

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Quanto a História da Cultura e das Artes, os conteúdos abordados foram os do

próprio currículo, mas de uma perspetiva orientada através de uma análise retórica da

música. A lecionação desenvolveu-se no período barroco, com exceção da última aula

confinada na transição entre períodos e também no clássico. Foi também realçada a ponte

existente com as disciplinas de Filosofia e Português, promovendo uma

transdisciplinaridade sendo que a retórica faz parte dos currículos destas.

O projeto de Intervenção pedagógica foi acolhido pelos professores cooperantes

da melhor forma já que acreditam que novas estratégias de ensino são sempre benéficas

para os alunos. Foi sendo estabelecido, durante a fase de observação, a melhor altura para

a fase de implementação do projeto de acordo com os conteúdos a abordar como também

respeitando o plano anual do professor cooperante.

A observação das aulas iniciou-se no final de outubro de 2015 na turma do 6º Ano/

2º Grau de Formação Musical e no 11º De História da Cultura e das Artes. A observação

das turmas de Iniciação Musical IV e Formação Musical 9º Ano/ 5º Grau iniciou-se a

meados do segundo período.

A informação mais relevante sobre os conhecimentos, aptidões e comportamentos

da turma foram facultadas em conversas informais com os professores cooperantes, mas

foi a fase de observação que trouxe um plano mais delimitado e direcionado para a

lecionação e implementação do projeto nas duas disciplinas de acordo com as suas

especificidades tanto ao nível de conteúdo a ser lecionado como também ao nível

comportamental e recetivo.

Devido à diferença das duas disciplinas como também aos diferentes níveis de

maturidade, os professores cooperantes diferiam na forma de trabalhar. Em Formação

Musical o ensino centrou-se nos exercícios propostos pelo professor e em História da

Cultura e das Artes numa exposição dialogante do professor com os alunos e posteriores

reflexões dos alunos sobre o conhecimento adquirido.

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2.2.1 Formação Musical

6º Ano/ 2º Grau; Iniciação IV; 9º Ano/ 5º Grau

O processo de ensino desta disciplina divide-se em três grandes blocos quase

sempre nesta ordem: 1) Imitação, leitura e identificação rítmica; 2) Leitura solfejada; e 3)

Entoações. Nestes grandes blocos é inserido, quando necessário, o conteúdo teórico

subjacente à parte prática desta disciplina. No bloco rítmico, o professor utiliza vários

recursos para expor/ consolidar/ recapitular os conteúdos. Sendo assim e com este bloco

ocorrendo de uma forma dinâmica, os alunos estavam motivados e atentos, o que se notou

ao nível da aprendizagem/ sedimentação dos conteúdos, estando os alunos muito à

vontade com as metas do programa. No bloco relativo à leitura solfejada, observou-se

uma quebra na motivação dos alunos. Isto acontece, na nossa opinião, à própria essência

do que é uma leitura solfejada, um conteúdo pouco motivador em que existe a dificuldade

em encontrar materiais e formas de o expor apelativas para os alunos. No bloco relativo

a entoações/ improvisações /ditados melódicos/ distinção auditiva de intervalos e acordes,

as turmas estavam motivadas, fazendo corretamente, mas de forma pouco segura,

principalmente as entoações. Os ditados melódicos com ou sem ritmo dado foram

alcançados pela maior parte dos alunos de forma razoável. Estes três blocos

supramencionados têm como recurso material uma sebenta realizada pelo professor

cooperante, que foi entregue aos alunos no início do ano e contém quase tudo o que os

alunos viriam a necessitar durante o ano letivo.

De uma forma geral, o ambiente na sala de aulas revelou-se saudável, propiciando

a aprendizagem contrariado algumas vezes por dois alunos, por vezes três, que conversam

bastante na sala de aula levando a que, o professor interrompa a aula para fazer chamadas

de atenção mais vincadas, terminando-as.

2.2.2 História da Cultura e das Artes

A turma observada demonstrou uma grande união notando-se, por exemplo, no

apoio aos colegas com maior dificuldade na aprendizagem. Da totalidade da turma

destacam-se algumas alunas com uma capacidade de aprendizagem acima da média como

também alguns alunos com maior dificuldade na aprendizagem, mas no grosso da turma

salienta-se que existiu um à vontade na aprendizagem dos conteúdos da disciplina. A

escolha da disposição física na sala de aula é feita pelos alunos e, estes fizeram

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normalmente a escolha a pares de alunos bons com alunos regulares, ajudando desta

forma os colegas e demonstrando a referência anterior sobre a união da turma. A relação

entre alunos e docente foi excelente, este ajudando-os nas mais variadas situações, de uma

forma mais concisa na disciplina que leciona.

As aulas foram lecionadas de uma forma expositiva-dialogante. Assim, os

conteúdos foram sendo expostos à turma, com muitas intervenções por parte dos alunos,

pedidas pela professora ou surgindo da curiosidade natural dos alunos. Notou-se o esforço

da professora cooperante na síntese e esquematização dos conteúdos pois estes são

extensos para o número de aulas a lecionar e ainda com a incumbência de, devido ao

atraso do começo do ano letivo de 2014/2015, ter lecionado os conteúdos da última fase

do Renascimento (conteúdos do último período do 10º Ano) neste ano letivo (2015/2016)

que ocuparam maior parte das aulas do 1º período.

De um modo geral as aulas observadas tinham o seguinte itinerário: elaboração

do sumário com uma exposição breve dos conteúdos a serem abordados, recapitulação,

com a ajuda voluntária ou solicitada dos alunos, das aulas anteriores de forma breve e

esquemática, obrigando alguns alunos a reverem os apontamentos dessas mesmas aulas.

Depois da recapitulação, a lecionação incidia nos conteúdos, numa exposição-dialogante,

com uma utilização do quadro para esquematizar os conteúdos e para apontar os nomes

dos intervenientes da História da Música e das suas obras. As aulas foram sempre

pontuadas com audições/ visualizações de obras relevantes para a disciplina

nomeadamente composições musicais/ tratados/ textos/ quadros pictóricos, entre outros,

fazendo a ponte entre o tronco comum desta disciplina e o tronco específico do ensino

especializado da música. As dúvidas suscitadas pelos alunos foram sendo dissipadas e se

alguns demonstravam alguma dificuldade na compreensão dos conteúdos, não se

avançava na exposição de nova matéria até a anterior estar assimilada e compreendida.

2.3 Plano Geral de intervenção

2.3.1 Transdisciplinaridade no Ensino das Ciências Musicais

A transdisciplinaridade, como o prefixo “trans” indica, diz respeito àquilo que

está ao mesmo tempo entre as disciplinas, através das diferentes disciplinas e

além de qualquer disciplina. Seu objetivo é a compreensão do mundo presente,

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para o qual um dos imperativos é a unidade do conhecimento (Nicolescu, 1999,

p. 11).

Na génese deste projeto já estava plantada a ideia da transversalidade do tema a

várias disciplinas do 11º Ano nomeadamente História da Cultura e das Artes, Filosofia e

Português. Ao longo da pesquisa dos programas destas disciplinas e da pesquisa

bibliográfica relativa ao tema, a sua transversalidade recorria:

[…] a essa lógica [transdisciplinaridade] quando articulam os conhecimentos das

diversas disciplinas. Os temas transversais, tendo em vista um tema social,

transgridem as fronteiras epistemológicas de cada disciplina, possibilitando uma

visão mais significativa do conhecimento e da vida. Na medida do viável, os temas

transversais resgatam as relações existentes entre os conhecimentos (Santos, 2008,

p. 75).

De qualquer forma a implementação deste projeto não poderia ser transdisciplinar

devido aos constrangimentos do mestrado em ensino e a dificuldade de articular com as

várias disciplinas sem estar um período mais longo de tempo durante a semana escolar.

Inserido num projeto curricular com as várias disciplinas em articulação e com

“empréstimo” de conhecimentos levaria com certeza a uma (…) “visão mais significativa

do conhecimento e da vida” (…) (Santos, 2008, p. idem) por parte dos alunos.

Privilegiando a disciplina berço deste projeto, História da Cultura e das Artes, a sua

implementação poderia ser, sem afetar significativamente os conteúdos curriculares, um

aprofundar da Teoria dos Afetos e do simbolismo musical do período barroco que

desembocaria numa exposição dos fundamentos/ características da retórica musical e a

audição de exemplos musicais durante a lecionação do período barroco, recorrendo a

guias de audição e realizando análises, ambos numa perspetiva retórica.

Quanto à disciplina de Formação Musical, principalmente no ensino básico e

preparatório, a lecionação passaria por mais cultura dentro da sala de aula, com exemplos

“reais” e aprendizagens simultâneas destas. Balizar um dado período estilístico nos

exemplos “reais” não nos parece motivador e procedente, mas a cultura da audição e da

sua contextualização, seja ela de que período ou género estilístico for, nos seus mais

variados aspetos deveria estar presente nas aulas desta disciplina, adequando obviamente

a complexidade do pensamento ao nível de ensino.

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2.3.2 Formação Musical

Para a implementação do projeto em Formação Musical foram estipuladas duas

aulas de 90 minutos para o 6º Ano/ 2º Grau, duas aulas de 45 minutos para Iniciação IV

e duas aulas de 90 minutos para o 9º Ano/ 5º Grau. Como já referido anteriormente, as

lecionações das aulas tiveram como matéria basilar peças de repertório do período

barroco, partindo destas para uma aprendizagem simultânea.

A primeira aula foi lecionada ao 6º Ano/ 2º Grau. Para esta disciplina e para os

blocos de 90 minutos optou-se por dividi-los em blocos de 45, para fazer uma planificação

mais conseguida e controlada no tempo.

Recorrendo ao livro Lectures d'auteurs a chanter: pour le Préparatoiure:

transcription à 1 ou 2 voix avec accompagnement foi escolhido uma aria (Ato V, Cena

2) da ópera King Arthur de Henry Purcell (Gartenlaub, 1985, pp. 14-15), adequada ao

nível dos alunos a lecionar.

O excerto da obra foi analisado quanto aos seus conteúdos teóricos como

tonalidade, ritmo e compasso utilizado e intervalos mais frequentes. Estes conteúdos

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teóricos estavam bem presentes nos alunos e não foi necessário fazer uma recapitulação

ou exposição destes mesmos excetuando do compasso 6

4 , em que este ainda não tinha

sido exposto aos alunos. Assim optou-se por levar a pulsação à unidade semínima e não

à mínima com ponto, próprio dos compassos compostos. Foi feita uma leitura solfejada

na clave de Fá da pauta inferior do sistema que não estava prevista na planificação e

depois nas duas claves em conjunto.

O segundo momento da aula teve como objeto de estudo o tema do projeto na qual

foi feita uma breve exposição sobre o significado da tonalidade de Fá M no período

Barroco e do andamento Allegro à luz dos princípios da Teoria dos Afetos/ Retórica

Musical:

Fá Maior: Segundo o teórico e compositor Johann Mattheson esta

tonalidade tem a capacidade de exprimir os sentimentos generosidade,

fidelidade ou amor de maneira natural e sem qualquer esforço.

Allegro: consolo.

Se seguida, foi realizada uma leitura/ entoação apontada da escala de Fá M,

tonalidade do excerto. De seguida os alunos entoaram a linha mais grave da Clave de Fá.

Sugerido pelos alunos, foram entoadas as duas vozes por dois grupos com a ajuda do

professor cooperante na voz mais grave, trocando os grupos para uma última vez.

O momento seguinte incidiu na análise do excerto obra Les Moissonneurs de

François Couperin (Gartenlaub, 1985, pp. 18-19) quanto à tonalidade e compasso

utilizado. De seguida, foi feita uma breve exposição sobre a tonalidade de Si bemol no

período barroco e o último momento da aula foi dedicado a um ditado melódico com

ritmo dado desta peça de repertório do período barroco.

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Para este ano 6º A/ 2º Grau foi lecionada também a quarta aula. Depois da audição

do Minueto em Sol Maior (BWV Anh.116) e da distribuição da ficha de trabalho contendo

o material a ser utilizado durante a aula, foi proposto aos alunos uma breve análise do

excerto (Bach, 1993, pp. 8,9). Os alunos indicaram a tonalidade, o compasso, a escala da

tonalidade, as figuras rítmicas mais frequentes como também os intervalos mais

frequentes. Depois desta análise, foi feita uma exposição do significado barroco da

tonalidade de Sol M e deu-se a conhecer uma edição fac-similada do Pequeno Livro de

Anna Magdalena Bach (Bach, 1988). Foi também feita uma breve contextualização do

compositor maior do barroco, J.S. Bach.

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O exercício seguinte foi uma leitura solfejada do excerto por todos os alunos da

clave de Sol e da clave de Fá com marcação de pulsação. O desafio seguinte foi a

realização do solfejo do primeiro compasso na clave de Sol e o seguinte na clave de Fá,

alternando sempre até ao fim do excerto.

O momento seguinte foi dedicado à entoação do excerto. Para um aquecimento

vocal, fez-se ordenações na escala de Sol Maior como também uma leitura apontada do

excerto. Depois, realizou-se identificação auditiva de intervalos, estes relacionados com

o excerto e de seguida, foi executada uma leitura rítmica a duas partes adaptada também

do excerto.

De seguida foi realizado um ditado rítmico com notas dadas da obra Polonaise em

Sol menor, BWV Anh.119 (Bach, 1993, p. 11). A obra escolhida estava em Sol menor

numa natural atenção com a tonalidade de Sol M do excerto anterior, trabalhando

auditivamente e teoricamente as escalas maiores e menores. Fez-se uma breve análise e

procedeu-se à audição da melodia para os alunos realizarem o ditado.

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O momento seguinte dedicou-se à realização de um ditado melódico com ritmo

dado (Bach, 1993, p. 4) da obra Minueto em Sol Maior, BWV Anh.114, esta também

extraída e adaptada do Pequeno Livro de Anna Magdalena Bach.

A segunda, terceira, quinta e sexta aula foram aulas lecionadas a quatro turnos

diferentes, ou seja, uma aula por turno, o que tornou mais difícil a concretização do

objetivo proposto para este projeto. Para a aula lecionada aos dois turnos de Iniciação

Musical IV, ao primeiro turno e segundo turno respetivamente, optou-se por não

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implementar o projeto devido principalmente, ao nível de maturidade dos alunos como

também ao tempo de aula disponível, 45 minutos.

A aula lecionada ao primeiro e segundo turno do 9º Ano/ 5º Grau iniciou-se com

uma leitura rítmica a duas partes (Jollet, 1988, p. 29) sendo seguido por um ditado rítmico

a duas partes em compasso composto. Foi também realizada uma leitura vertical e

horizontal nas claves de Dó na 4ª linha, Sol na 2ª linha e Fá na 4ª linha (Jollet, 1988, p.

45 (1)).

O ditado melódico proposto foi extraído e adaptado da parte do contralto do coral

de J.S. Bach Befiehl du deine Wege (Bach, 2008, p. 13 (20)). Por último foi realizado um

ditado melódico adaptado a duas vozes, também de um coral de J.S. Bach, An

Wasserflussen Babylon (Bach, 2008, p. 9 (15)). Antes da realização do ditado foram feitas

ordenações e uma leitura apontada na escala de sol Maior. Relativamente à implantação

do projeto, foram expostos o significado na Teoria dos Afetos/ Retórica Musical das

tonalidades de Sol Maior e Ré Maior como também uma breve contextualização do

compositor J. S. Bach.

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2.3.3 História da Cultura e das Artes

Para a implementação do projeto em História da Cultura e das Artes foram

estipuladas quatro aulas de 90 minutos e uma de 45. Estas aulas foram divididas no tempo

e dedicadas aos conteúdos do currículo desta disciplina no período barroco, excetuando

a última que foi dedicada ao período clássico. Como o projeto só teria uma implementação

eficaz se uma aula fosse totalmente dedicada para a exposição teórica deste mesmo, foi

então reservada uma aula.

A aula iniciou-se com uma apresentação formal e uma pequena contextualização

do que se pretende com o projeto de estágio e a consequente investigação. Para esta aula

foi utilizada uma exposição dialogante com os alunos através dos conteúdos

programados. Iniciou-se sobre a etimologia da Suite barroca e depois uma exposição das

suas características gerais. De seguida, foi exposto a fixação em quatros danças por

Froberger (A-S-C-G) seguido da suite para instrumento solo em François Couperin e J.P.

Rameau (ordres) e em J.S. Bach (partitas, ouvertures).

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No momento seguinte abordou-se as Suites Orquestrais de Bach e o acrescentar

das danças. Para a audição de uma Suite orquestral de J.S. Bach foi escolhida a Badinerie

da Suite Orquestral BWV 1067.

Para expor o contexto social das mega suites de Haendel optou-se por dar a ler um

texto de um testemunho da estreia da Música Aquática a um aluno e no correr ouviu-se a

Abertura da Música Aquática deste mesmo compositor.

Relativamente ao tema do projeto de investigação, foi relembrada a importância

da Teoria dos Afetos no meio musical barroco e como este se manifestava no género de

música Suite Orquestral e como os ritmos/ compassos das danças estavam associados a

propriedades afetivas (Cano, 2000, pp. 68,69).

A segunda parte da aula foi dedicada ao Concerto Orquestral Barroco. Iniciando

os conteúdos planeados para esta aula, sempre numa exposição dialogante, foi abordada

a etimologia do Concerto. Para isso fez-se uma recapitulação do período tardio do

renascimento e da policoralidade veneziana. Enquanto se fazia esta recapitulação

entregava-se aos alunos dois guias de audição.

Depois da apresentação dos antecedentes do Concerto, foi feita uma exposição das

características gerais do Concerto Grosso e Solo e de seguida as características específicas

do Concerto em Arcangelo Corelli com uma Audição do Concerto Grosso Op. 6 Nº 10

Dó Maior e em com uma Audição do Concerto Solo para Trompete em Ré Maior.

No momento seguinte, foi abordado o Concerto em Vivaldi e a revolução na forma

com a sistematização do ritornello, enunciando as suas características específicas e o

contexto social da sua composição. Após a exposição foi pedido aos alunos para fazerem

uma audição seguindo o guia do primeiro andamento do Concerto para Violino em Mi

Maior, Opus 8, Nº 1 – Primavera.

Por último, foi abordada a influência do Concerto italiano na Alemanha,

principalmente em J.S. Bach e as características do seu tipo de concerto. Para a audição

foi escolhido o primeiro andamento do Concerto Grosso Nº2 de Brandeburgo através do

Guia de Audição dado no início da aula. Na finalização da aula e para um enquadramento

global com o projeto foi reiterada a enorme importância que os afetos tiveram na

composição musical no período barroco e da importância da retórica musical na

estruturação da forma na música instrumental.

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As duas aulas seguintes (uma de 90 minutos e outra de 45 minutos) foram

dedicadas a compositores do período barroco. Como os conteúdos são inúmeros e as aulas

são escassas para tanto, a professora cooperante sugeriu a lecionação de três blocos de 45

minutos dedicados ao projeto, mas a partir de trabalho realizado pelos alunos. Assim,

decidiram-se os compositores a serem tratados, conceberam-se os grupos dos alunos e a

cargo do mestrando as indicações para a realização do trabalho. Ficou decidido que os

alunos fariam uma pequena apresentação do compositor e teriam que entregar um resumo

escrito da apresentação oral. A avaliação ficou decidida em 70% para a apresentação e

30% para o resumo escrito. A apresentação deveria comtemplar uma biografia resumida

do compositor e um destaque especial para uma obra desse mesmo compositor. Para a

avaliação recorreu-se a duas grelhas, uma para a apresentação e outra para o resumo

escrito. A avaliação final foi a soma da avaliação oral do mestrando e da professora

cooperante dividida por dois, englobados nos 70% da avaliação e a avaliação do trabalho

escrito era exclusivamente pelo mestrando contando 30%.

Estas aulas deram-se no início do 3º período letivo. Cada bloco de 45 minutos foi

destinado para a apresentação de dois grupos, mas, na primeira aula só um grupo

apresentou. Segundo explicações dos alunos, isto deveu-se à distância geográfica que

existe entre eles pois quase todos vivem em diferentes concelhos limítrofes. Ficou

acordado então que as seguintes apresentações teriam que ser mais breves para todos as

conseguirem realizar.

Sendo assim, a apresentação da primeira do trabalho sobre o compositor J.S. Bach

foi mais extensa e com mais intervenções construtivas por parte dos alunos que pela nossa

parte. As outras apresentações foram mais breves, mas o trabalho pedido foi bem

realizado o que se traduziu na avaliação. A implementação do projeto decorreu de forma

natural, com análises retóricas breves dos exemplos musicais apresentados pelos alunos

como a tonalidade escolhida, a natureza do texto se fosse uma peça vocal, o compasso e

algumas figuras retóricas musicais mais evidentes.

A quarta aula (90 minutos) esteve destinada a uma explicação aprofundada do

projeto de estágio e da investigação. Para a implementação do projeto e uma possível

introdução deste nos conteúdos curriculares desta disciplina será sempre necessária uma

aula de exposição dos seus conteúdos teóricos para obtenção de um conhecimento mais

lato e profundo deste e assim, relacioná-lo com os conteúdos deste na disciplina de

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Filosofia e a de Português. Por isso esta aula foi fundamental para a consolidação do

projeto de estágio.

No início da aula foi distribuído um Guia de Audição para quatro audições de

diferentes géneros de composições como também de diferentes compositores. Este guia

foi estrutural para a aula e poderá ser consultado posteriormente se os alunos assim o

quiserem. Incluídos também neste guia está um pequeno enquadramento teórico ao tema.

De uma forma expositiva dialogante, abordou-se o tema, recorrendo sempre ao

conhecimento dos alunos deste tema nas disciplinas de Filosofia e Português. Assim,

começou-se por uma breve história da retórica clássica, matéria já estudada pelos alunos

em Filosofia. Depois, duas breves abordagens à retórica latina e à medieval cristã e a

relação da disciplina música no contexto académico medieval.

O ponto seguinte foi a relação entre retórica e música no período barroco, as fases

da elaboração da retórica musical e a estrutura (dispositio) da retórica musical presente

no Guia de Audição. Durante esta exposição foi-se questionando os alunos sobre a relação

da retórica com a disciplina de Português, no caso específico da estrutura retórica dividida

em exórdio, exposição/ confirmação e peroração (Catarino, Fonseca, & Peixoto, 2014,

pp. 83,114) do Sermão aos Peixes do Padre António Vieira, conteúdo curricular desta

disciplina.

Alguns pontos, como a elaboração retórica musical e a sua estrutura, foram mais

demorados e recorreu-se a uma utilização de temas (peças musicais, canções) da

atualidade e transportá-los, com as devidas notas, para o universo musical barroco. Segue

o plano desta aula na página seguinte:

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Plano de aula lecionada nº 6

Identificação da turma

Escola: Conservatório de Música do Porto

Professora:

Curso Secundário: regime integrado

Disciplina: História da Cultura e das

Artes

Turma: 11º Ano

Duração: 45 m (13:35 – 14:20)

Data: 28 – 04 – 2016

Caracterização da Turma

A Turma é constituída por 17 alunos, sendo uma turma heterogénea a nível de atitudes/

comportamentos. Os alunos mostram interesse e motivação.

Recursos Materiais

Caderno diário e material de escrita; computador com colunas de som; data show.

Conteúdo

A retórica Musical no período barroco, os seus antecedentes desde a Grécia clássica.

As fases da elaboração na retórica musical.

As Figuras retóricas.

O aluno deverá estar apto a:

Descrever e enquadrar a evolução da retórica desde a época clássica até à

retórica musical.

Relacionar com a disciplina de Filosofia os conteúdos comuns (retórica e

argumentação; retórica e democracia; o racionalismo de René Descartes).

Relacionar com a disciplina de Português os conteúdos comuns (a elaboração

retórica do Sermão aos Peixes do Padre António Vieira).

Identificar as fases da elaboração retórica musical.

Identificar a disposição/ estruturação retórica musical.

Metodologia:

1. O professor inicia explicando como decorrerá a aula e quais serão os conteúdos

abordados (5m).

2. O professor, numa exposição dialogante, responde às questões sobre a génese da

Retórica (15m).

3. O professor expõe a relação entre retórica e música no período barroco (10m).

4. O professor expõe as fases da elaboração da retórica musical (8m).

5. O professor expõe a estruturação da retórica musical (7m)

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Avaliação:

Tendo em conta a metodologia utilizada – exposição dialogante – o docente tomou

boa nota/ reteve: 1) a atenção de cada aluno e 2) a participação espontânea ou

solicitada.

Bibliografia:

Bartel, D. (1997). Musica Poetica: Musical-Rhetorical Figures in German Baroque

Music. Nebraska: Nebraska University Press.

Buelow, G. J. (s.d). Rhetoric and music – 2. Baroque. Em G. G. Stanley Sadie, The New

Grove Dictionary of Music and Musicians online. Obtido em 23 de abril de 2016.

Cano, R. L. (2000). Música y Retórica en el Barroco. Ciudad Universitaria: Universidad

Nacional Autónoma de México.

Grout, D. & Palisca, C. (2007). A História da Música Ocidental, 5ª edição. Lisboa:

Gradiva.

Hill, J. (2008). La Música Barroca. Madrid: Ediciones Akal.

Mccreless, P. (2002). The Cambridge history of Western music theory. (T. Christensen,

Ed.) Cambridge: Cambridge University Press.

Michels, U. (2003). Atlas de Música Vol. I, Lisboa: Gradiva.

Michels, U. (2007). Atlas de Música Vol. II, Lisboa: Gradiva.

Reboul, O. (2004). Introdução à retórica. (I. C. Benedetti, Trad.) São Paulo: Martins

Fontes.

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O segundo momento da aula foi dedicado de forma exaustiva ao projeto de

estágio. Como foi supramencionado, este projeto não se desvia dos conteúdos presentes

no currículo da disciplina. Para a disciplina de História da Cultura e das Artes neste caso

com incidência maioritária da História da Música Ocidental, os conteúdos curriculares da

história da música ocidental balizam-se no período barroco e no clássico. Neste projeto

de estágio foi feita uma leitura crítica do período barroco musical sob o enfoque da

retórica musical. Para isso, tornou-se fundamental dar a conhecer análises retóricas de

várias composições de diferentes géneros e de diferentes compositores. O momento

anterior foi para expor o tema de forma aprofundada de modo a ser possível compreender

e fazer uma analise retórica de uma composição.

Assim, consagrou-se na audição, análise e comentários sobre os vários exemplos

musicais. O primeiro exemplo foi Dominus Deus, Agnus Dei do Gloria de Vivaldi (RV

589) (Rodrigues, 2006). Depois da audição orientada através de um guia numa perspetiva

retórica foram feitas considerações sobre a análise quanto ao inventio, dispositio e figuras

retóricas utilizadas.

A análise da peça seguinte, de outro género e compositor diferente, foi a fuga em

Ré Maior de J.S. Bach. Desta peça, também orientada pelo Guia de Audição, destacamos

a gravação escolhida não ter sido a mais acertada, devendo ter sido uma gravação ao piano

e não ao cravo, instrumento mais familiar para os alunos e com maior expressão retórica.

A última peça a ser analisada (Persone, 1996) foi o Preludio n° 13 em Fá Maior

“tombeau” de Louis Couperin (1626-1661). Esta análise teve um impacto profundo nos

alunos, pois não conheciam a peça como também não conheciam os prelúdios non

mesurès. Foi assim alargado o repertório conhecido dos alunos a um tipo de um género,

pouco abordado nas aulas e foi feito através de uma análise retórica. Por falta de tempo o

último exemplo (Mateus, 2016) teve só uma breve consideração e uma recomendação

para ouvirem em casa seguindo o Guia de Audição.

Segue o plano desta aula na página seguinte:

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Plano de aula lecionada nº 7

Identificação da turma

Escola: Conservatório de Música do Porto

Professora:

Curso Secundário: regime integrado

Disciplina: História da Cultura e das

Artes

Turma: 11º Ano

Duração: 45 m (14:20 – 15:05)

Data: 28 – 04 – 2016

Caracterização da Turma

A Turma é constituída por 17 alunos, sendo uma turma heterogénea a nível de atitudes/

comportamentos. Os alunos mostram interesse e motivação.

Recursos Materiais

Caderno diário e material de escrita; computador com colunas de som; Gravações

musicais e partituras.

Conteúdo

A disposição/ estruturação da música barroca sob o escrutínio de uma análise retórica

musical.

As figuras retóricas no despertar dos afetos barrocos.

O aluno deverá estar apto a:

Identificar as fases de elaboração retórica na música barroca.

Identificar a disposição retórica na música barroca.

Identificar a utilização das figuras retóricas barrocas para o despertar dos afetos.

Metodologia:

1. O professor inicia explicando como decorrerá a aula e quais serão os conteúdos

abordados (5m).

2. O professor expõe uma análise retórica do Dominus Deus, Agnus Dei do Gloria

de Vivaldi (RV 589) (10m).

3. O professor expõe uma análise retórica da fuga BWV 850 em Ré Maior de J.S.

Bach (5m).

4. O professor expõe uma análise retórica do Preludio n° 13 em Fá Maior “tombeau”

de Louis Couperin (1626-1661) (10m).

5. O professor expõe uma análise retórica do Behold a virgin shall conceive & O

thou that tellest good tidings to Zion do oratório Messias de Haendel (10m).

6. Considerações finais sobre o barroco musical visto sobre o prisma de uma análise

retórica e o seu declínio no período clássico (5m).

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Intervenção Pedagógica

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Avaliação:

Tendo em conta a metodologia utilizada – exposição dialogante – o docente tomou

boa nota/ reteve: 1) a atenção de cada aluno e 2) a participação espontânea ou

solicitada.

Bibliografia:

Bartel, D. (1997). Musica Poetica: Musical-Rhetorical Figures in German Baroque

Music. Nebraska: Nebraska University Press.

Buelow, G. J. (s.d). Rhetoric and music – 2. Baroque. Em G. G. Stanley Sadie, The New

Grove Dictionary of Music and Musicians online. Obtido em 23 de abril de 2016.

Cano, R. L. (2000). Música y Retórica en el Barroco. Ciudad Universitaria: Universidad

Nacional Autónoma de México.

Grout, D. & Palisca, C. (2007). A História da Música Ocidental, 5ª edição. Lisboa:

Gradiva.

Mateus, F. (24 de março de 2016). Sala de Estudo Textos. Recuperado de Flávio Mateus:

http://www.flaviomateus.com

Mccreless, P. (2002). The Cambridge history of Western music theory. (T. Christensen,

Ed.) Cambridge: Cambridge University Press.

Persone, P. (1996). A Interpretação Das Obras “Non Mesures” Para Cravo, Explicadas

Segundo As Leis Da Retórica (Dissertação de Mestrado, Universidade de

Campinas). Obtido de http://www.bv.fapesp.br/pt/bolsas/88950/a-interpretacao-

das-obras-non-mesures-para-cravo-explicada-segundo-as-leis-da-retorica/

Rodrigues, A. (2006). Análise de alguns aspectos Retórico-musicais de “Domine Deus,

Agnus Dei” Do Gloria rv 589 de Antonio Vivaldi. Música Hodie, 6(1), 35-49.

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Intervenção Pedagógica

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A quinta aula, como foi referido já estava balizada no período clássico, em que

este já estava fora do âmbito estilístico do projeto de investigação. Mesmo assim, tornava-

se necessário expor aos alunos que uma das características do período clássico era um

gradual abandono da retórica musical como base no ato de composição.

Para esta aula o conteúdo a ser abordado foi o género sonata no período clássico,

as suas características estilísticas e formais, como também a sua dimensão social e

pedagógica, recapitulando os seus antecedentes barrocos. Foi preparada também uma

breve exposição da forma sonata, caso os alunos não tivessem compreendido bem a sua

estrutura formal nas aulas anteriores. Foi utilizada uma apresentação em PowerPoint

numa tentativa de os alunos assimilarem mais e melhor e, fazer fluir melhor o decorrer

da aula. As audições utilizadas foram Sonata em Lá Maior, H. 186, Wq. 55/4, 2º

Andamento de C.P.E. Bach para esclarecer e demonstrar os antecedentes barrocos e o

período de transição para o clássico. Para esclarecer e demonstrar os meios de divulgação/

publicação da Sonata e evidenciar o desenvolvimento expressivo e organológico do

piano, foram ouvidos excertos da Sonata em Ré Maior, Op. 5, No. 2 de J.C. Bach no cravo

e no piano.

Os conteúdos seguintes foram as características da Sonata na Primeira Escola de

Viena, ou seja, em Haydn, Mozart e Beethoven. Para exemplificar auditivamente uma das

várias fases cronológicas e estilísticas de Haydn utilizou-se a Sonata para Piano Nº 31 em

Lá bemol Maior, Hob XVI-46, 1º Andamento. As características da Sonata do compositor

Mozart foi o conteúdo seguinte e o exemplo auditivo foi a Sonata para violino e piano em

Dó Maior KV6 – 1º Andamento.

O tema do projeto e de investigação esteve sempre presente durante toda a aula.

Palavras chave do barroco e do classicismo, como por exemplo artificialidade e

naturalismo, foram devidamente enquadradas dentro de um pensamento retórico musical

como também o seu declínio nesta mudança paradigmática do pensamento filosófico e

político.

O destaque foi dado à sonata em Beethoven, dando um exemplo musical, 1º

Andamento da Sonata n° 8 em Dó menor, Opus 13, “Patética”, orientado através de um

guia de audição numa perspetiva retórica (Assumpção, 2007, pp. 98-112). Através da

análise retórica desta peça, foi exposto o declínio da retórica e a sua importância como

ajuda na composição musical, já referido na aula anterior. Foi dado a compreender que a

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Intervenção Pedagógica

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retórica acompanha a criação nas suas mais variadas formas, atravessando os tempos e os

lugares, mas que a consciência e, escrever ou compor a partir dela teve uma importância

extrema no período barroco, o que não se verificou nesta magnitude noutros períodos da

música ocidental, principalmente nos consequentes.

2.3.4 Projeto Artístico “O Bandolim na Era Barroca”

Este Projeto Artístico partiu da iniciativa conjunta de dois estagiários no

Conservatório de Música do Porto. Devido à dificuldade de inserir um só projeto numa

agenda tão cheia e rica como é a desta instituição, optamos, David Rodrigues e Paulo

Araújo, por unirmos as nossas ideias num Projeto Artístico transversal aos temas de

ambos os projetos de Investigação. Assim, tornou-se mais fácil encontrar meios e horários

compatíveis com este, tornando-o de maior relevo e mais enriquecedor para ambos. Como

os temas de ambos projetos estão compreendidos no mesmo período temporal (Barroco),

e a observação das aulas coincidem nos mesmos anos de História da Cultura e das Artes

(11º) e em anos próximos de Formação Musical (6º e 7º Ano/ 2º e 3º Grau) a concretização

do projeto tornou-se mais fácil e, de certeza, terá maior impacto.

Este projeto foi desenvolvido pelos mestrandos David Rodrigues e Paulo Araújo

e foi parte integrante dos temas em desenvolvimento “O Repertório para Cordofones

Dedilhados: Uma Fonte de Aprendizagem no Ensino das Ciências Musicais” e “O Ensino

das Ciências Musicais e a Retórica: Discurso Musical no Período Barroco”.

A implementação de uma apresentação fora do contexto de sala de aula surgiu

com o intuito de reforçar os trâmites dos projetos que se encontraram em desenvolvimento

de forma a dar uma resposta mais assertiva aos problemas apresentados nos momentos

iniciais que deram mote aos projetos de investigação.

Por um lado, esta intervenção surgiu face à constatação dos seguintes factos: o

pouco conhecimento sobre alguns cordofones dedilhados, em particular, o bandolim no

ensino vocacional artístico; a dificuldade, por parte dos alunos, em reconhecer a dimensão

prática das Ciências Musicais; a utilização de um repertório referencial que,

habitualmente, não defende obras para cordofones dedilhados, quer no âmbito da

formação em Ciências Musicais, quer no domínio da interpretação musical; a associação

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Intervenção Pedagógica

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do instrumento bandolim apenas à música tradicional e popular. Por outro lado, procurou-

se dar uma importância maior à retórica musical neste período, partindo da análise

retórica de obras e doravante, explanar de uma obra musical para o contexto social da sua

criação.

“O Bandolim na Era Barroca” pretendeu ser uma atividade didática que aborde os

temas já referidos numa perspetiva expositiva-dialogante com interpretações musicais em

tempo real, direcionada à comunidade educativa do Conservatório de Música do Porto.

Na organização deste projeto participaram, para além dos Mestrandos já referidos,

a Professora Doutora Elisa Lessa enquanto supervisora dos mestrandos e a Professora

Sónia Marques como professora cooperante de ambos os estagiários e docente no

Conservatório de Música do Porto na disciplina de História da Cultura e das Artes. A

dinamização da atividade contou com professores do conservatório nomeadamente o

Professor António de Sousa Vieira e, como convidado, o professor Rui Gama.

Este projeto artístico decorreu no auditório do Conservatório de Música do Porto,

um espaço ideal para o seu desenlace e o Guia de Audição numa Perspetiva da Análise

Retórica (Anexo 4) para o primeiro andamento do concerto de Dó Maior de Antonio

Vivaldi foi distribuído no início da atividade.

Na continuidade e como planeado, o meu colega de estágio David Rodrigues fez

umas breves considerações sobre a história do bandolim. Na continuação, o Professor de

bandolim do Conservatório de Música do Porto, António de Sousa Vieira, fez uma

pequena palestra sobre a técnica do bandolim e os diferentes tipos existentes, expondo os

instrumentos para a plateia visualizar. Também tocou nos três bandolins com o objetivo

de a plateia diferenciar o timbre específico de cada um considerando as suas diferenças

de construção.

De seguida o professor António de Sousa Vieira no bandolim e o professor Rui

Gama na guitarra clássica interpretaram três peças para bandolim do período barroco. O

primeiro a ser ouvido foi a Sonata para Bandolim K.81 de Domenico Scarlatti, tocada na

sua totalidade. O segundo foi o primeiro andamento do Concerto em Dó Maior, RV485

de Antonio Vivaldi. A plateia seguiu com interesse o Guia de Audição numa Perspetiva

da Análise Retórica distribuído na fase inicial, acompanhando o primeiro andamento do

concerto através do Guia. O terceiro e último foi a Sonata para bandolim e baixo contínuo

de Aleixo Botelho de Ferreira, um ilustre português desconhecido.

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Intervenção Pedagógica

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No final do concerto notou-se que o público aderiu e mostrou-se entusiasmado

com o repertório barroco para bandolim, pouco conhecido e reconhecido nos dias atuais.

Com certeza irão procurar ouvir e conhecer mais repertório para este instrumento.

Relativamente ao Guia de Audição, teve o resultado esperado, que foi despertar a

curiosidade deste tema para o público geral. Como era de todo impossível fazer uma

pequena palestra sobre o tema pois este pede muito mais tempo, a opção pelo Guia de

Audição numa Perspetiva da Análise Retórica resultou e foi demonstrado pelo público

perguntando como se realizava uma análise musical numa perspetiva retórica. Foi

também pedido pela professora cooperante de História da Cultura e das Artes para expor

numa outra turma do 11º ano o tema do projeto.

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Recolha e Análise de Dados

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III – RECOLHA E ANÁLISE DE DADOS

Este capítulo compreenderá uma análise da literatura de base das duas disciplinas

onde os professores coligem a informação a ser transmitida aos alunos como também uma

apresentação e análise dos dados recolhidos na implementação do projeto. Quanto às

ferramentas utilizadas para a análise dos conhecimentos adquiridos por parte dos alunos

durante a realização do plano de intervenção em contexto de aula são na forma de

observações diretas/ diário de bordo coligidas durante e após a sua implementação, tanto

na disciplina de Formação Musical como na de História da Cultura e das Artes.

3.1 Formação Musical

Literatura

Em Formação Musical é notória a escassez de métodos ou manuais baseados, de

uma forma holística, em peças de repertório erudito e muito menos do período barroco,

no mercado livreiro o que leva a uma proliferação de sebentas/ repositório de exercícios

elaboradas pelos professores desta disciplina. Esta recolha de material, por vezes, não é a

mais adequada como também toma demasiado tempo ao professor, ressentindo-se disso

os alunos, pois leva algum tempo a polir/ melhorar a sua qualidade.

A escassez do mercado livreiro de literatura especializada ao serviço da disciplina

de Formação Musical, advém de dois fatores, na nossa opinião: 1) Falta de orientação

mais visível nos currículos de Formação Musical por parte do Ministério da Educação e

2) O número residual de alunos que frequentam Formação Musical, comparado com

outras disciplinas, que economicamente torna pouco viável a edição de manuais por parte

das editoras.

Assim e como refere (Pedroso, 2006, p. 8) “Um dos aspectos centrais da

disciplina de FM é a educação do ouvido, isto é, o desenvolvimento das capacidades de

identificação e escrita dos sons musicais ouvidos, bem como a capacidade de

imaginar/ouvir os sons/estruturas sonoras escritos”. Para a concretização deste

desenvolvimento a mesma autora, corroborada por vários autores, salienta que “é

fundamental o recurso a música “real”” e que:

É igualmente fundamental o recurso a outras áreas do conhecimento musical –

como a Teoria Musical, a História da Música, a Acústica, a Análise, a Composição.

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Recolha e Análise de Dados

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Os alunos poderão assim construir um conhecimento mais aprofundado e

contextualizado de conceitos que, ensinados num plano meramente teórico, sem o

suporte de situações musicais reais, se tornam estéreis e, muitas vezes, mal

compreendidos (Pedroso, 2006, p. 9).

Na conclusão a autora aponta um caminho que deveria ser percorrido e que foi uma

referência nas nossas planificações das aulas:

Uma preparação para a música – seja como músico, seja como público informado – deve,

necessária e logicamente, basear-se em música real, pelo que esta deve ser parte integrante

e constante das aulas de FM. O recurso a exemplos de música real pode/deve então servir

ambos os objectivos: para além de desenvolver a cultura musical dos alunos, permite

abordar, trabalhar e desenvolver conhecimentos, conteúdos e competências em contexto

real. Será igualmente importante englobar conhecimentos de outras áreas das ciências

musicais, bem como utilizar diferentes tipos de fontes musicais – em termos de épocas, de

estilos, de origens geográficas (Pedroso, 2006, p. 16).

Embora este artigo já tenha uma década de existência e que porventura alguma

realidade descrita nele pudesse ter sido mudada, o que se verifica nas aulas de Formação

Musical é uma proliferação de exercícios soltos que não englobam conhecimentos de

outras áreas das ciências musicais e também não são baseados ou extraídos do repertório

“real”.

Análise de dados recolhidos via observação direta.

As aulas lecionadas em Formação Musical tiveram quase sempre como ponto de

partida peças de repertório do período barroco. Como a lecionação desta disciplina se

dividiu por vários níveis de ensino também se dividiram as aulas previstas na sua

totalidade. Assim, a turma que a implementação do projeto teve uma fase mais duradoura

foi o 6º Ano/ 2º Grau com duas aulas de 90 minutos no mesmo turno, seguida pelo 9º

Ano/ 5º Grau com duas aulas de 90 minutos a dois turnos e a Iniciação IV com duas aulas

de 45 minutos a dois turnos.

A implementação do projeto foi bem acolhida em todas as turmas lecionadas. Nas

aulas observadas pode-se constatar que raramente eram utilizadas peças do repertório e

das que foram utilizadas nenhuma delas estava incluída nas peças de repertório do período

barroco excetuando o 9º Ano/ 5º Grau que faziam ditados a duas vozes de Corais de J.S.

Bach. Também se verificou que a implementação do projeto passaria por um trabalhar de

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Recolha e Análise de Dados

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aprendizagens simultâneas a partir de uma dada peça ou peças do repertório deste período

referindo o seu compositor, a época da criação e alguns aspetos – adaptados à faixa etária

– para uma análise musical numa perspetiva retórica como, o significado das tonalidades

e dos compassos presentes no excerto.

Quanto à utilização de peças de repertório do período barroco a maioria das

reações dos alunos foi positiva e tiveram uma atitude ativa durante as aulas e,

compreenderam que para os compositores barrocos a tonalidade e o tipo de compasso

utilizados eram importantes para definir a natureza afetiva das suas composições. As

aprendizagens simultâneas a partir de música “real” barroca foram importantes para eles

notando-se na atenção e na participação ativa de alguns alunos como também na

realização entusiasmada dos exercícios propostos. Alguns alunos fizeram comentários,

principalmente nas peças do Pequeno Livro de Anna Magdalena Bach, de como já as

conheciam ou tocaram e que era “engraçado” estudarem música conhecida.

Relativamente à utilização na sala de aula de gravações dessas peças por músicos

profissionais, os comentários dos alunos apontaram como uma mais valia na sala de aula,

não para fazer a totalidade dos exercícios (ditados melódicos com ou sem ritmo dado e

ditados rítmicos com notas dadas) através das gravações, mas, para ouvirem a peça na sua

totalidade em contexto de sala de aula.

Verificou-se também que a cultura musical dos alunos aumentou pois conheceram

e compreenderam peças do repertório erudito barroco, os seus compositores, alguns

aspetos dos seus métodos de composição e trabalharam de forma holística as

competências a desenvolver na disciplina como noção de intervalos, figuras rítmicas,

padrões melódicos, entoações entre outros.

3.2 História da Cultura e das Artes

Literatura

A análise sobre a literatura especializada para História da Música, especificamente

sobre a retórica na música do período barroco, escrita em Português compreenderá quatro

livros, certamente os mais utilizados pelos professores e pelos alunos como apoio a esta

disciplina. Os livros são História da Música Ocidental dos autores Claude Palisca e

Donald Grout (Grout & Palisca, 1994), Breve História da Música Ocidental em que o

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Recolha e Análise de Dados

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período barroco é da responsabilidade de Clive Unger-Hamilton (Unger-Hamilton, 2013),

Atlas de Música II de Michels Ulrich (Michels, 2007) e (Borges & Cardoso, 2003).

O espaço reservado para “Os Afectos” por Grout & Palisca (1994, p. 312) ocupa

menos de uma página. É referido de uma forma breve tanto a Doutrina dos Afetos como

também a utilização da estrutura da retórica literária e das figuras musicais pelos

compositores da época. As fases de elaboração retórica são três e são resumidas da

seguinte forma:

O próprio processo de composição musical era concebido, por analogia com as

regras da retórica, como consistindo em três passos: invento, a «descoberta» de um

tema, ou ideia musical de base; dispositio, a planificação ou exposição das divisões

ou «subtítulos» da obra; elaboratio, a elaboração do material (Grout & Palisca, 1994,

p. 312).

Esta divisão em três passos da estrutura retórica foi primeiramente introduzida por

Athanasius Kircher mas foi rapidamente desenvolvida e consumada por Johann

Mattheson no seu famoso tratado Der Volkomenne Capellmeister, aumentando as duas

finais, memoria e pronuntiatio (Bartel, 1997, pp. 76-77) e não está referida no livro em

análise. As figuras musicais são também referidas de forma superficial, mas devidamente

enquadradas no pensamento da elaboração retórica na música.

A importância dada por estes autores a este tema não vai de encontro à importância

e impacto que este teve na música do período barroco como também nas outras artes e na

ciência e filosofia.

Na seção do livro Breve História da Música Ocidental (Unger-Hamilton, 2013)

dedicado ao período barroco não está referido em qualquer momento a Teoria dos Afetos

nem, como é óbvio, a utilização da retórica na composição musical.

Quanto ao livro Atlas de Música II, expõe de uma forma sintética o Simbolismo

Musical, a Teoria dos Afetos como também a Musica Poetica. Resumidamente mostra

a utilização pelos compositores dos princípios e da estrutura da retórica na composição

como também algumas figuras retóricas associadas a virtudes ou sentimentos e, traça a

relação da Teoria dos Afetos com o pensamento filosófico de autores como Descartes.

Para uma ajuda ao declarado no texto tem tabelas com o significado do simbolismo

sonoro e da teoria das figuras retóricas como também alguns exemplos demonstrativos

destas (Michels, 2007, p. 305).

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Recolha e Análise de Dados

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O livro História da Música – Manual do Aluno 2º Ano descreve A Teoria dos Afetos

na sua estilização das (…) “relações entre os sentimentos, as virtudes ou os estados da

alma, quer com os modos/ tonalidades, quer com os instrumentos que os deveriam

representar” (Borges & Cardoso, 2003, p. 11). Refere também, sem esclarecer e

aprofundar, a utilização “particularmente importante” da retórica musical na composição

da música dramática (Borges & Cardoso, 2003, pp. 11,12).

Toda esta literatura aborda, com exceção da Breve História da Música Ocidental,

a Teoria dos Afetos e a utilização da retórica como parte estruturante e importante na

composição de música barroca. O tema está mais presente no Atlas de Música II com uma

exposição introdutória eficaz como também na utilização de exemplos isolados de figuras

retóricas e tabelas como por exemplo, a das relações entre virtudes e modos. Fazendo

parte da génese deste livro, relaciona sumariamente o pensamento filosófico e a

estilização da composição musical. O seguinte é naturalmente História da Música

Ocidental, com uma introdução vaga à Teoria dos Afetos como à utilização da retórica

como ferramenta na composição enunciando a estrutura retórica adaptada da literatura

para a composição musical. Concluindo no História da Música – Manual do Aluno 2º

Ano e de acordo com a sua natureza, ou seja, um manual para o aluno do secundário,

aborda resumidamente a Teoria dos Afetos e o simbolismo musical, e faz uma referência

residual à utilização da retórica na composição mesmo salientado a sua importância.

Neste género de livros, compêndios da História da Música Ocidental, não se espera uma

abordagem exaustiva da retórica musical no período barroco, mas também que a

informação não seja somente introdutória para uma das características fundamentais na

composição musical barroca e transversal na sua cronologia. Para compreender as fases

de elaboração retórica e a sua génese na Grécia clássica, o seu percurso no tempo até aos

dias do período barroco, a sua vida no currículo académico das Universidades Medievais,

o esclarecimento das fases de elaboração retórica como também nas divisões do dispositio

tem que se socorrer a livros especializados sobre o tema, algo que poderia ser realizado

resumidamente em poucas páginas.

Numa abordagem mais aprofundada ao tema, o livro Music in the Baroque Era:

From Monteverdi to Bach de Manfred Bukofzer e o La Música Barroca de John Walter

Hill oferecem uma visão mais alargada e mais contundente da importância da Retórica

Musical/ Teoria dos Afetos no período barroco. O primeiro expõe a importância da Teoria

dos Afetos para a composição barroca, a estereotipização das figuras retóricas para retratar

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os afetos como também a crescente relevância desta ao longo do período barroco

(Bukofzer, 1947, pp. 388-390). No segundo, numa seção intitulada La Retórica de las

Artes (Hill, 2008, pp. 31-36), é feita uma eficiente introdução ao tema, retratando a sua

dimensão no meio social alfabetizado, a sua ascendência à cultura grega e latina, as suas

fases bem como a sua divisão estrutural. Em cada uma das fases (Inventio, Dispositio,

Elocutio, Memoria e Pronuntiato) é exposto o seu significado como também para as

partes da divisão estrutural do Dispositio. A Teoria dos Afetos e a Retórica Musical são

aprofundados posteriormente numa seção intitulada La Doctrina de los Afectos (Hill,

2008, pp. 400-416), relacionando-os com o pensamento filosófico da época,

principalmente com René Descartes, enunciando as propriedades afetivas das danças da

Suite barroca, explicando algumas figuras retóricas e concluindo com exemplos

analisados sob uma perspetiva retórica.

Relativamente ao programa de História da Cultura e das Artes, o espaço dedicado

a este tema aborda de uma forma residual a Teoria dos Afetos e o simbolismo musical,

sem referir a utilização sistemática da elaboração e estruturação retórica na composição

musical no período barroco.

Análise de dados recolhidos via observação direta.

A implementação do projeto pela sua natureza do seu tema, teve uma orientação

mais vincada para a disciplina de História da Cultura e das Artes neste caso História da

Música. Questões como “O que é para os alunos a retórica musical?”, “Como trabalhar

com os alunos a problemática da retórica barroca?” e “Qual o contributo da temática em

estudo para o desenvolvimento profissional e cultural dos alunos?” foram sendo

respondidas quer através de uma pesquisa bibliográfica quer na observação e contato com

os alunos desta disciplina.

Nas aulas lecionadas os alunos mostraram-se na sua maioria atentos e curiosos

com o tema do projeto. Mostraram-se entusiasmados com os guias de audição, seguindo-

os com atenção na audição de exemplos musicais. Ficaram a conhecer os

fundamentos/características da análise numa perspetiva retórica, relacionando-os com as

disciplinas de Filosofia e de Português, com os alunos a participarem ativamente, a maior

parte por iniciativa própria e alguns quando solicitados, trazendo o conhecimento

adquirido das duas disciplinas para a aula. Nas aulas dedicadas a trabalhos de grupo sobre

a vida e obra dos compositores maiores do período barroco tiveram aprendizagens

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Recolha e Análise de Dados

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significativas sobre estes e, sobre o seu processo composicional, revelando-se esta

aprendizagem na boa avaliação que tiveram nas suas apresentações e nos trabalhos

escritos. Fizeram uma reflexão crítica a partir da análise musical numa perspetiva retórica

para as outras artes, como por exemplo a arquitetura, evidenciado por comentários por

parte dos alunos sobre a ornamentação simbólica dos retábulos barrocos, observados

durante a visita de estudo a monumentos barrocos da cidade do Porto, serem a

representação do simbolismo musical como também das figuras retóricas musicais.

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Conclusões e Recomendações

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Conclusões e Recomendações

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IV – CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES

O presente relatório de estágio pretende uma exposição clara e objetiva do que foi

a implementação do projeto nas turmas de Formação Musical e de História da Cultura e

das Artes no Conservatório de Música do Porto. Este processo ao longo do ano letivo de

2015/2016 permitiu um enorme número de aprendizagens, tanto a nível profissional como

a nível pessoal. A expressão “Aprende-se ensinando” foi substanciada pelas experiências

ao longo do ano letivo quer pela pesquisa bibliográfica, no sentido de sistematizar o

conhecimento para os alunos, quer pelas interpelações e reflexões destes, que no sentido

de as responder, levando-nos a um novo conhecimento e aprofundamento das matérias

tratadas.

Um dos problemas para a ausência da análise musical numa perspetiva retórica no

ensino básico, preparatório e secundário, prende-se com a sua ausência também nas

licenciaturas e mestrados em ensino do ensino superior. Os estudos superiores em

Portugal não contemplam nos seus planos de estudo um estudo aprofundado da retórica

musical no período Barroco. Da pesquisa realizada ao plano de estudos da licenciatura

em Ciências Musicais da Universidade Nova de Lisboa (Universidade Nova de Lisboa,

2016), comprovou-se que no período barroco a bibliografia recomendada não contempla

alguma referência específica à retórica musical e, do conteúdo enunciado, na cadeira

História da Música – de 1600 a 1750, só “Pensamento teórico musical na primeira metade

do século XVIII” parece ter alguma interseção. O mesmo acontece na licenciatura em

Musicologia na Universidade de Évora (Universidade de Évora, 2016), que embora o

plano de estudos não esteja detalhado quanto à bibliografia a utilizar como à

caracterização da unidade curricular, não aparece nenhuma com uma designação que nos

leve a uma análise musical numa perspetiva retórica. Quanto à licenciatura em Ciências

Musicais da Universidade do Minho (Universidade do Minho, 2016), tanto a bibliografia

a utilizar como o programa sucinto não indicam um estudo aprofundado da retórica

musical. Porém, nesta licenciatura este tema foi absorvido em algumas aulas dedicadas a

uma breve explicação dos princípios da análise retórica na música como também a uma

análise musical numa perspetiva retórica. Quanto aos mestrados em Ensino de Música de

Ciências Musicais/ Musicologia, onde poderia estar o tema da retórica musical

aprofundado, podemos referir o da Universidade de Aveiro (Universidade de Aveiro,

2016) que não contempla no sitio online qualquer informação a este tema como também

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Conclusões e Recomendações

78

o da Universidade do Minho. De uma pesquisa, não exaustiva, dos planos de estudo das

licenciaturas e de mestrados em ensino das Ciências Musicais/ Musicologia deparamo-

nos com falta de formação nesta área, sendo que se os professores não têm essa formação

de base, dificilmente lecionarão análise retórica e a sua contextualização na sala de aula

das Ciências Musicais nos níveis de ensino básico, preparatório e secundário.

Dos dados recolhidos durante a observação direta e posteriores apontamentos e

reflexões, podemos concluir que os objetivos do projeto foram cumpridos. Relativamente

à disciplina de Formação Musical, como a interseção com o projeto não se manifesta tão

visível e as aulas lecionadas ocorreram de forma dispersa pelos vários níveis de ensino,

tornaram também a avaliação da sua implementação mais difícil, mas, podemos concluir

que uma primeira contextualização histórica das peças de repertório barroco

relativamente ao compositor, género, instrumentação, pequenos apontamentos de uma

abordagem inicial à análise retórica entre outros, tornou as aulas mais motivadoras,

levando os alunos a um maior conhecimento de repertório e também a uma maior cultura

musical, não deixando de lado as aprendizagens significativas próprias desta disciplina

obtidas durante a lecionação do projeto. Para a disciplina de História da Cultura e das

Artes – História da Música, segundo o nosso ponto de vista os objetivos foram

alcançados. Os alunos compreenderam e assimilaram a importância da retórica na

composição musical no período barroco, a sua ligação umbilical às disciplinas de

Filosofia e de Português, os conceitos para uma análise retórica musical como também

uma olhar crítico sobre a construção social da época baseado na codificação dos

sentimentos em música próprio da retórica musical, do simbolismo e da Teoria dos Afetos.

A utilização de guias de audição numa perspetiva de análise retórica conduziu a mais

motivação para audições por parte dos alunos que resultaram em aprendizagens

significativas.

As limitações deste estudo/ projeto prendem-se sobretudo com os dados

recolhidos, quer na sua insuficiência quer na sua fiabilidade. As aulas de lecionação e

implementação do projeto são insuficientes para fazer uma avaliação capaz deste, como

também o número de alunos intervencionados. No caso da disciplina de Formação

Musical, o número de alunos intervencionados foi de alguma forma significativo (cerca

de 50) mas o número de aulas foi muito reduzido o que levou a uma redução expressiva

da sua implementação e da consequente recolha de dados. No caso da disciplina de

História da Cultura e das Artes, um terreno mais fértil para a implementação deste projeto,

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Conclusões e Recomendações

79

as aulas de lecionação/ implementação do projeto foram suficientes, mas a recolha de

dados por metodologia qualitativa, obtidos via observação direta podem levar a uma

conclusão enviesada. Neste caso, o número de alunos intervencionados deveria ser

exponencialmente maior e o método de recolha de dados deveria ser tanto por via

metodológica qualitativa como quantitativa, no sentido de obter uma conclusão mais

categórica. A amostra deveria também comtemplar as opiniões dos docentes das duas

disciplinas relativamente à implementação do projeto pois estes, fazendo uma metáfora

militar, estão na linha da frente do sistema educativo. Num sistema educativo que tudo é

decidido hierarquicamente, de cima para baixo, também se torna necessário considerar as

opiniões de quem faz os currículos das disciplinas e, questioná-los sobre as suas decisões

pois, estas afetam muitos docentes como também muitos mais alunos. Se a avaliação deste

tipo de projetos serve para aferir uma possível aplicação no futuro, torna-se necessário

que esse futuro contemple uma abertura para a inserção deste tipo de projetos no currículo

das disciplinas.

Como já foi referido em Transdisciplinaridade no Ensino das Ciências Musicais,

este projeto, quanto a nós, poderá ser enquadrado nos currículos das disciplinas de

Formação Musical e de História da Cultura e das Artes. Este relatório oferece

enquadramento teórico, planificação e material para ser desenvolvido em sala de aula nas

duas disciplinas, como também a base para uma articulação transdisciplinar com as

disciplinas de Filosofia e Português. O docente que queira aprofundar este tema nas suas

aulas tem assim, um ponto de partida para o seu trabalho.

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Referências Bibliográficas

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Anexos

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Anexo 1 – Formação Musical – plano de aula lecionada nº 5

Identificação da turma

Escola: Conservatório de Música do Porto

Professor:

Curso Básico: regime integrado

Disciplina: Formação Musical

Turma: 2º Grau / 6º Ano

Duração: 45 m (8.20 – 9:05)

Data: 26 / 04 / 2016

Caracterização da Turma

A Turma é constituída por 11 alunos, sendo uma turma heterogénea. Destes 11 alunos

4 têm capacidades acima da média, 5 são alunos médios e 2 alunos com dificuldades

em acompanhar as matérias dadas. Os alunos mostram interesse e motivação pela

disciplina na sua componente prática.

Recursos Materiais

Livro do aluno; caderno diário e material de escrita; piano; computador com colunas

de som.

etc…

Objetivos gerais:

Objetivos específicos:

Desenvolver a leitura;

Desenvolver o rigor rítmico;

Desenvolver a capacidade de

memorização;

Desenvolver o ouvido harmónico;

Desenvolver a expressividade na

entoação.

O aluno deve ser capaz de:

Analisar um excerto musical;

Ler à primeira vista;

Cantar com o nome das notas;

Situar-se auditivamente no âmbito

da tonalidade de Sol M;

Desenvolver a consciência rítmica

e melódica;

Entoar afinadamente um excerto

melódico;

Consciencializar-se acerca do

processo de auto e heteroavaliação.

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Anexos

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Estratégias:

1. O professor inicia explicando como decorrerá a aula e quais serão os conteúdos

abordados.

2. Análise musical do excerto quanto aos seus conteúdos teóricos.

3. Recapitulação/ exposição de conteúdos teóricos.

4. Leitura solfejada na clave de sol.

5. Leitura solfejada na clave se fá.

6. Leitura solfejada em pauta dupla.

7. Recapitulação da formação de arpejos/ acordes identificando-os no excerto.

8. Identificação e entoação de intervalos e melodias com e sem partitura.

Atividades:

1. Após apresentação do excerto, o professor, em diálogo com os alunos, propõe uma

breve análise ao excerto pedindo aos alunos para anotarem: tonalidade, ritmo e

compasso utilizado, padrões ritmo-melódicos, intervalos entre outros (8m).

2. Exposição sobre o significado da tonalidade de Sol Maior e do compositor J.S.

Bach. Exposição do fac-smile do Pequeno livro de Anna Magdalena Bach (5m).

3. Solfejo do excerto por todos os alunos da clave de Sol (5m).

4. Solfejo do excerto por todos os alunos da clave de Fá (5m).

5. Solfejo do excerto por todos os alunos alternado entre clave sol e de fá – 1 cp.

cada (5m).

6. Entoação apontada da escala de Sol Maior, o seu arpejo como também ordenações

nesta escala (5m).

7. Entoação do excerto musical pela turma com acompanhamento do piano e de

seguida com acompanhamento pré-gravado. Avaliação da entoação (10m).

8. Autoavaliação (2m).

Avaliação:

Avaliação formativa a partir de observação dos alunos em pontos-chave.

Bibliografia:

Bach, J. S. (1993). Petit livre d'Anna Magdalena Bach. Paris: Editions Henry Lemoine.

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Anexos

89

Anexo 2 – Formação Musical – plano de aula lecionada nº 6

Identificação da turma

Escola: Conservatório de Música do Porto

Professor:

Curso Básico: regime integrado

Disciplina: Formação Musical

Turma: 2º Grau / 6º Ano

Duração: 45 m (9:05 – 9:50)

Data: 5 / 04 / 2016

Caracterização da Turma

A Turma é constituída por 12 alunos, sendo uma turma heterogénea. Destes 12 alunos

quatro tem capacidades acima da média, 6 são alunos médios e 2 alunos com

dificuldades em acompanhar as matérias dadas.

Recursos Materiais

Livro do aluno; caderno diário e material de escrita; piano; computador com colunas

de som.

Objetivos gerais:

Objetivos específicos:

Desenvolver a leitura rítmica;

Desenvolver o rigor rítmico na

execução e na leitura;

Desenvolver a capacidade de

memorização;

Desenvolver o ouvido

harmónico.

O aluno deve ser capaz de:

Realizar leitura rítmica a duas

partes;

Realizar um ditado rítmico com

notas dadas;

Realizar um ditado melódico com

ritmo dado;

Desenvolver a consciência rítmica e

melódica;

Consciencializar-se acerca do

processo de auto e heteroavaliação.

Estratégias:

1. O professor inicia explicando como decorrerá a aula e quais serão os conteúdos

abordados.

2. Desenvolver a identificação e classificação de intervalos através do excerto

apresentado.

3. Desenvolver leituras rítmicas a duas partes.

4. Desenvolver a perceção rítmica de uma melodia.

5. Desenvolver a perceção auditiva.

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Anexos

90

Atividades:

1. O professor, em diálogo com os alunos, pede–lhes para identificarem 8 intervalos

e depois encontrá-los no excerto da aula anterior (10m).

2. O professor explica a utilização e alteração do ritmo a duas partes retirado do

menuet estudado na aula anterior. Realização de leitura rítmica a duas partes

(10m).

3. Realização de um ditado rítmico com notas dadas (10m).

4. Realização de um ditado melódico com ritmo dado (10m).

5. Autoavaliação (5m).

Avaliação:

Avaliação formativa a partir de observação dos alunos em pontos-chave.

Bibliografia:

Bach, J. S. (1993). Petit livre d'Anna Magdalena Bach. Paris: Editions Henry Lemoine.

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Anexos

91

Anexo 3 – Exemplo de material usado nas aulas de História da Cultura e das Artes

Ficha Síntese do Concerto Brandeburgueses nº2 de J.S. Bach

Os seis Concertos de Brandeburgo foram compostos entre 1717 e 1721 estando

J.S. Bach como Kapellmeister (Mestre Capela) ao serviço do príncipe Leopold de Anhalt-

Köthen na Alemanha. O príncipe era um apaixonado pela música como também um bom

violinista, tocando muitas vezes na orquestra, com cerca de dezoito instrumentistas, que

servia para entreter e impressionar os visitantes da sua corte. Nas suas obrigações

profissionais, Bach escreveu e interpretou a sua música numa série regular de concertos

que ocorriam na noite de domingo e, com certeza atraiu alguns talentosos instrumentistas

para a orquestra, quer como membros permanentes ou como convidados.

Esta associação de Bach com o príncipe durou quatro anos, compondo em

predominância música secular. No entanto, quando o príncipe casou com sua prima

Friederika Henrietta, que não partilhava da paixão do seu marido pela música,

gradualmente convenceu-o a gastar menos tempo e recursos nas suas atividades musicais.

Assim o compositor começou a procurar uma nova posição onde seus talentos poderiam

ser mais bem aproveitados e, vendo o Margrave de Brandeburgo como um possível

empregador e patrono, enviou-lhe os seis Concertos.

Bach não conseguiu o emprego, nem, tanto quanto pode ser determinado, ele

recebeu qualquer recompensa financeira pelos seus seis concertos, reformulando-os mais

tarde, mas mesmo assim ficaram esquecidos, sendo redescobertos no século XIX.

Considerações de interpretação

Deve-se considerar a diferença entre uma interpretação/ gravação com instrumentos

utilizados na época e uma da modernidade com os instrumentos atuais como:

O uso de flautas-doces em oposição a flautas transversais

A presença de poucos instrumentistas, de modo a produzir uma sonoridade de

música de câmara

Uso de violone (seis cordas) no lugar dos Contrabaixos

Direção a partir do cravista, em vez da presença de um maestro

A utilização de instrumentos autênticos (da época ou recriados)

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Anexos

92

A afinação: O lá do período barroco pode ser definido em cerca de 415 Hz, em

oposição ao temperamento moderno em que o lá tem 440 Hz (cerca de meio-tom

abaixo).

Existem diferenças significativas entre os instrumentos autênticos e modernos:

Autênticos Modernos

Violinos

Pescoço e braço mais curtos, com

um menor intervalo até à sexta

posição

Cordas feitas de tripa de gato com

um som menos brilhante

Arcos mais curtos e menos curvos

com tensão menor

Três notas possíveis (acorde)

Pouco vibrato, fraseado mais leve

Pescoço e braço mais longos com

maior variedade de alturas

Cordas de metal, som mais forte.

Arcos mais longos, em linha reta

com um som mais robusto

Som mais sustentável para as notas

mais longas

Algum vibrato, levando a um som

mais colorido e variado

Flautas-doces Flautas transversais

Feitas de madeira, menor projeção Feitas de metal (níquel ou prata)

com um som mais forte

Violone Contrabaixo

6 cordas

Som menos vibrante e com

extensão até ao Dó exigido por

Bach.

4 cordas

Som mais cheio mas requer

extensão para notas mais baixas

Concerto

Os Concertos foram a forma instrumental mais popular do período barroco, dando

a oportunidade para os solistas exibirem o seu virtuosismo e foi para a era barroca o que

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Anexos

93

a sinfonia representou mais tarde no período clássico, a excelência da música orquestral.

Um concerto barroco enfatiza contrastes bruscos com uma surpreendente mudança entre

a luz e a escuridão, característica que se pode encontrar facilmente numa pintura barroca.

Um concerto (do Latim concertare, rivalizar/competir) é uma composição musical

marcada por uma competição amigável ou concorrência entre solista(s) e orquestra.

Quando esta rivalidade ocorre entre um solista (violino, flauta, oboé entre outros)

e a orquestra, denomina-se Concerto Solo, mas se um pequeno grupo de solistas compete

em conjunto com a orquestra completa, denomina-se um Concerto Grosso. O grupo maior

forma a orquestra básica e denominam-se Concerto Grosso e, o grupo menor de dois, três

ou quatro solistas, é chamado de concertino. Quando tocam em conjunto constituem a

orquestra completa, chamada de tutti (que significa todos).

Como escrito por Vivaldi e Bach, o Concerto Solo e o Concerto Grosso

compreendiam normalmente três andamentos: rápido-lento-rápido. O primeiro

andamento, mais sério, é composto, obedecendo a uma estrutura chamada ritornello

cuidadosamente trabalhada; o segundo andamento é constantemente mais lírico e suave;

e o terceiro andamento, embora utilize a estrutura ritornello, tende a ser menos sério e

com mais humor.

O primeiro andamento do Concerto Brandeburguês Nº 2 foi incluído na seleção

de músicas da sonda espacial Voyager 1, que se dá pelo título Messages from Earth.

Guia de Audição

J.S. Bach: Concerto Brandeburguês Nº 2 em Fá maior,

Primeiro andamento (c. 4:45)

Data da composição: 1717-1718

Gênero: Concerto Grosso

Concertino: violino, oboé, flauta-doce, trompete

Andamentos:

I. Allegro

II. Andante

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Anexos

94

III. Allegro assai

Primeiro andamento: Allegro; na forma de ritornello

O que ouvir: quatro instrumentos solistas (violino, oboé, flauta-doce, trompete), tocando

solos curtos alternando rapidamente com a orquestra completa.

Ritmo animado e marcado.

Tema recorrente (ritornello) na orquestra unifica o andamento, alternando com solos

individuais curtos. Textura polifônica com várias linhas melódicas ouvidas

simultaneamente.

Ritornello:

Seção Descrição Tonalidade

Ritornello Orquestra Fá Maior

Solo Solo de violino Fá Maior

Ritornello 2 Orquestra Fá Maior

Solo 2 Oboé e violino Fá Maior

Ritornello 3 Orquestra Dó Maior

Solo 3 Flauta-doce e oboé. Fá Maior

Ritornello 4 Orquestra Dó Maior

Solo 4 Trompete e flauta. Fá Maior

Ritornello 5 Orquestra Dó Maior

Solo 5 Trompete, violino, flauta e oboé. Fá Maior

Ritornello 6

Orquestra; tema longo alternado entre os

instrumentos, acabando nos violoncelos.

Várias

Solo 6

Flauta, violino, oboé, trompete. Várias

Longa modulação com várias mudanças

entre instrumentos do tutti.

Ritornello 7 Orquestra. Fá maior

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Anexos

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Anexo 4 – Guia de Audição numa Perspetiva da Análise Retórica

O Bandolim na Era Barroca

Programa:

Sonata para Bandolim K.81 de Domenico Scarlatti

Sonata para Bandolim e baixo contínuo de Aleixo Botelho de

Ferreira

Concerto em Dó Maior, RV425 de Antonio Vivaldi

Com a participação de:

Professor António de Sousa Vieira (Bandolim);

Professor Rui Gama (Guitarra).

10 de maio de 2016

Auditório do Conservatório de Música do Porto

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Anexos

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Antonio Vivaldi

(Veneza, 4 de março de 1678 - Viena, 28 de julho de 1741)

Antonio Vivaldi foi o compositor italiano mais original, popular e influente na sua época,

tendo sido muito rapidamente esquecido. Durante um século o seu nome e a sua obra

estavam no completo esquecimento, sendo finalmente redescobertos no início do século

XX, tornando-se num dos compositores mais ouvidos novamente, e muitas vezes

associado a música excessivamente fácil. Sabe-se agora que ele compôs mais de

quinhentos concertos, além de óperas, sonatas, cantatas e trios.

Vivaldi começou a sua carreira como um virtuoso do violino (estudou com o seu pai),

mas também se preparou para o caminho do sacerdócio, tornando-se padre com 25 anos,

ficando conhecido como o padre-rosso devido à cor ruiva do seu cabelo. Nesse mesmo

ano, aceitou um emprego como diretor de música, professor de violino e compositor em

La Pietà, um orfanato para meninas, cargo que manteria por quase toda a sua vida, ou

seja, por mais de trinta e cinco anos. No auge de sua carreira foi altamente considerado,

inclusive por J. S. Bach, que admirava a sua música, tendo copiado várias das suas obras

e arranjado algumas para diferentes instrumentos. O género de composição/ especialidade

de Vivaldi foi o concerto, para um ou mais instrumentos, que compôs em abundância e

com uma facilidade incomum (Vivaldi alegou que poderia compor um concerto mais

rápido do que um copista poderia copiá-lo). Foi a publicação de uma coleção de doze

concertos chamado L'estro armonico em Amesterdão no ano de 1711 que tornou famoso

o seu nome por toda a Europa, tornando-se a coleção mais vendida no início do século

XVIII (Bach copiou e arranjou seis destes concertos para órgão ou cravo).

É atribuído a Vivaldi o estabelecimento da forma convencional dos três andamentos no

concerto barroco. Não sendo o inventor destes três andamentos, foi ele que os estabeleceu

ao utilizar este modelo constante e variadamente, padronizando e influenciando as

décadas seguintes. Foi também o primeiro compositor a fazer uma utilização regular da

forma ritornello em tonalidades diferentes, mas próximas, para todos os instrumentos

alternando com passagens livres dominadas pelo solista.

O Concerto para Bandolim em Dó Maior data de 1725, e é considerado uma das peças

barrocas mais famosas para bandolim. É dado um tratamento virtuosístico ao bandolim

com exigências técnicas mais elevadas do que a outros concertos. Divide-se em três

andamentos, Allegro, Largo e Allegro.

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Anexos

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Análise Retórica do 1º andamento (Allegro) do Concerto em Dó Maior

para Bandolim de Antonio Vivaldi, RV425

Adotada da retórica literária, esta com uma longa história desde a Grécia clássica, a

retórica musical desenvolveu-se principalmente na Alemanha luterana, tendo-se irradiado

por toda a Europa. Para uma elaboração de um discurso musical foram adotadas também

as fases da elaboração retórica literária:

Inventio – a determinação do tema, assunto, ou ainda do “tópico” sobre o qual se vai

discorrer (compor).

Dispositio – a parte do processo na qual as ideias do inventio serão organizadas. Para que

essa organização seja orientada e organizada, há uma subdivisão tradicional em seções:

Exordium – funciona como uma introdução ao tema, silencia o auditório e prepara

os ouvintes, solicitando sua atenção para o que se seguirá.

Narratio – uma clara definição do tema ou assunto principal, demonstrando a

intenção do orador ou a natureza de uma composição musical. Propositio – na

oratória surgia logo após a narratio, pois era comum que após a narração de factos

se propusesse um juízo acerca destes. Em música essa divisão confunde-se com o

propositio que acaba abarcando também as funções da narratio.

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Anexos

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Confutatio ou Refutatio – ocorrem os argumentos que se opõem ao tema principal,

e que geram tensão e instabilidade. Na música equivale aos momentos

modulatórios, à utilização dos cromatismos e das passagens contrastantes.

Confirmatio – a confirmação das ideias principais, sendo realizadas as objeções

apresentadas na confutatio. É caracterizado pelo retorno à estabilidade da

tonalidade principal, pela aquietação dos materiais temáticos propostos.

Peroratio ou conclusio – a conclusão do discurso ou da composição musical,

numa cadência final cuidadosamente preparada ou ainda numa repetição literal ou

ligeiramente modificada do exordium.

Elucotio – o ajustamento na escrita das partes previamente esboçadas. Poderão ser

acrescidas ornamentações, ligações entre partes e alterações de estilo. Em música, o final

da escrita iniciada no dispositio acontece no elocutio (ou decoratio, como às vezes é

citada). Para que o discurso, organizado no dispositio, pudesse ser persuasivo, fazia-se

necessário reforçá-lo através de figuras retóricas sendo o elocutio ou decoratio, o

momento privilegiado para o fazer. As figuras retóricas são meios de reforço e

ornamentação do discurso, para obter uma comunicação mais eficaz e persuasiva para

com o ouvinte.

Memoria – a memória é importante para quem executa/ interpreta música, recorrendo a

sistemas mnemónicos para melhor a assimilar. No processo composicional (musical), a

memória não é considerada importante.

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Anexos

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Pronuntiato – representação/ ação/ execução da composição musical. Está mais

relacionado com a interpretação musical propriamente dita do que com o processo

composicional.