os rumos da política energética brasileira cabe a criação de políticas públicas mais...

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IV Encontro Nacional da Anppas 4,5 e 6 de junho de 2008 Brasília - DF - Brasil 1 Os Rumos da Política Energética Brasileira Leandro Belini (UNESP - Campus Guaratinguetá) Doutorando - Dpto de Engenharia Mecânica [email protected] Nazem Nascimento (UNESP - Campus Guaratinguetá) Prof. Titular - Dpto de Engenharia Mecânica [email protected] Resumo O Brasil constrói um reconhecido desenvolvimento em todos os setores da economia, concomitante ao aumento do consumo interno de energia. Segundo a EPE, projeta-se um crescimento superior a 5% no consumo interno de energia em 2008. Esse consumo deve chegar a 396.473 GWh em 2008 (BRASIL, 2007). Para manter essa estrutura, o governo precisa investir em energia e diversificar sua oferta interna, sem onerar o meio ambiente. Porém, há agravantes: o país está em quarto na lista dos maiores emissores de GEE, em especial relacionado aos setores de uso da terra e desmatamento florestal e de transporte. Com a retomada do “Pró-Álcool” outras questões são debatidas de forma divergentes: a tecnologia “flex-fluel” , nos carros em circulação, está emitindo menos CO 2 , concomitante a mitigação do aquecimento global; mas, projeta-se avanços no cultivo da cana-de-açúcar em áreas de floresta nativas. Políticas adotadas de uso e expansão da oferta de bioenergias no mercado interno e externo colocam o Brasil como uma das potências energéticas do futuro, mas podem ampliar o desmatamento e as emissões de GEE à atmosfera. É possível constatar que o governo brasileiro dá sinais evidentes no interesse de construir novas usinas térmicas a carvão e/ou a gás natural, bem como usinas nuclear. Porém o principal obstáculo, segundo Célio Bermann é que as energias alternativas no Brasil, até agora, continuam sendo vistas como uma opção marginal. Ou seja, há no Brasil propostas de desenvolvimento sustentáveis, mas constata-se que ainda faltam condições estruturais que as façam cumprir (Capela, M; Chiaretti, D. 2007).

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IV Encontro Nacional da Anppas4,5 e 6 de junho de 2008Brasília - DF - Brasil

1

Os Rumos da Política Energética Brasileira

Leandro Belini (UNESP - Campus Guaratinguetá) Doutorando - Dpto de Engenharia Mecânica

[email protected]

Nazem Nascimento (UNESP - Campus Guaratinguetá) Prof. Titular - Dpto de Engenharia Mecânica

[email protected]

ResumoO Brasil constrói um reconhecido desenvolvimento em todos os setores da economia, concomitante ao aumento do consumo interno de energia. Segundo a EPE, projeta-se um crescimento superior a 5% no consumo interno de energia em 2008. Esse consumo deve chegar a 396.473 GWh em 2008 (BRASIL, 2007). Para manter essa estrutura, o governo precisa investir em energia e diversificar sua oferta interna, sem onerar o meio ambiente. Porém, há agravantes: o país está em quarto na lista dos maiores emissores de GEE, em especial relacionado aos setores de uso da terra e desmatamento florestal e de transporte. Com a retomada do “Pró-Álcool” outras questões são debatidas de forma divergentes: a tecnologia “flex-fluel”, nos carros em circulação, está emitindo menos CO2, concomitante a mitigação do aquecimento global; mas, projeta-se avanços no cultivo da cana-de-açúcar em áreas de floresta nativas. Políticas adotadas de uso e expansão da oferta de bioenergias no mercado interno e externo colocam o Brasil como uma das potências energéticas do futuro, mas podem ampliar o desmatamento e as emissões de GEE à atmosfera. É possível constatar que o governo brasileiro dá sinais evidentes no interesse de construir novas usinas térmicas a carvão e/ou a gás natural, bem como usinas nuclear. Porém oprincipal obstáculo, segundo Célio Bermann é que as energias alternativas no Brasil, até agora, continuam sendo vistas como uma opção marginal. Ou seja, há no Brasil propostas de desenvolvimento sustentáveis, mas constata-se que ainda faltam condições estruturais que as façam cumprir (Capela, M; Chiaretti, D. 2007).

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I. Introdução

Diante da atual necessidade de substituição do petróleo, maior responsável palas emissões de

gases que estão alterando o clima da Terra, discute-se as novas fontes de energia limpas. Os

estudos estão sendo direcionados para os mais variados mecanismos de produção de energia:

gás natural, usinas nucleares, uso do hidrogênio, energia eólica, células solares fotovoltaicas, a

força das marés ou ainda o calor do interior da terra (geotérmica). A utilização de fontes primaria

de combustível fóssil tornaram-se a força geradora da economia mundial. Assim, as mudanças

climáticas são reflexos da atual estrutura sócio-econômica de produção e consumo. Esses fatores

conduziram as discussões internacionais com o objetivo de ampliar as fontes renováveis de

energia para reduzir as emissões de gases de efeito estufa. Estas destacam-se como as mais

cotadas na substituição das fontes fósseis e, portanto, seria a condição necessária para alcançar

as metas previstas no Protocolo de Kyoto para reduzir em 5,2% as emissões de mundiais.

No século XX foi consumido 1 trilhão de barris de petróleo. Os geólogos dizem que resta 1 trilhão

para retirar. Portanto, as reservas poderão se esgotar em 30 ou 40 anos, diz José Goldemberg

(IEE/USP). A civilização construída no século XX não pode durar, pois têm um problema de

sustentabilidade. Ou seja, o atual modo de produção de consumo de recursos naturais poderá

causar impactos irreversíveis ao planeta. O professor Goldemberg afirma que, se mantidas esse

comportamento as reservas conhecidas de gás natural durarão mais 64 anos e 155 de carvão.

Como reflexo, com a escassez da produção, os seus custos também aumentarão quando as

reservas se aproximarem da exaustão e quando tecnologias mais caras forem utilizadas para

explorar e extrair tais recursos (GOLDEMBERG, 2007).

Atualmente os combustíveis fósseis (petróleo, gás natural e carvão) representam 80% do total do

suprimento de energia consumida no planeta. Destes, o petróleo é responsável por 35%, o carvão

23% e o gás natural 21%. Os demais recursos, entre eles a energia nuclear que representa 6%,

as fontes renováveis 13,6%, sendo que a hidroeletricidade corresponde a metade desse

percentual e o restante, as chamadas “novas renováveis”, sendo 1,7% promovida pela biomassa

moderna (como por exemplo, o produto da cana) e 0,5% das demais fontes renováveis - a maior

parte é de biomassa tradicional responde por 8,5% da energia primária (GELLER, 2003, p.17). A

biomassa tradicional são aquelas não sustentáveis, utilizadas de maneira rústica, em geral para

suprimento residencial (cocção, aquecimento do ambiente) em comunidades isoladas. Entre as

biomassas tradicionais encontra-se a madeira, resultante de desflorestamento; resíduos florestais;

dejetos de animais.

A luta pelo controle das fontes de energia tem sido um dos vetores mais significativos para

entender as crises políticas vivenciadas em nossa sociedade. Nesse cenário, a falta do petróleo,

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por exemplo, pode levar à crise as maiores economia do planeta. Mas, a energia deve ser vista

não apenas pelo ângulo do desenvolvimento econômico, tecnológico e social, mas, sobretudo,

pelo lado político. A questão que se coloca nessa discussão, está para além das tecnologias de

exploração das reservas de petróleo. A realidade geopolítica do tema e suas implicações diretas,

ou seja, as dificuldades de acesso as reservas, a nacionalização e/ou o fechamento de mercados

de exportação, levam a questões de ordem estratégicas internacionais que, muitas vezes,

culminam em instabilidades políticas, resultantes da possibilidade de acesso aos recursos

energéticos disponíveis (SIMÕES, 2007).

De acordo com o Balanço Energético Nacional (2006) os combustíveis fósseis são consumidos

principalmente pelo setor de transporte e industria. Já a biomassa tradicional é utilizada

principalmente para a produção carvão vegetal e cocção no setor industrial. A biomassa moderna

é utilizada na auto-geração de energia (resíduos agroindustriais), como o biocombustível no setor

de transporte (etanol anidro e hidratado) (GUARDABASSI, p.26). Porém, destacam-se como

biomassa moderna madeira de reflorestamento, bagaço de cana-de-açúcar e outras fontes, desde

que utilizada de maneira sustentável, com processos tecnológicos avançados e eficientes.

Assim, pensar os rumos da geração de energia para o mundo requer pensar a influência das

empresas petrolíferas na consumação de alternativas energéticas. Suas ações afetam

economicamente, politicamente e socialmente as políticas de governos em todo o mundo. Desta

forma, cabe a criação de políticas públicas mais esclarecidas como única alternativa de vencer

algumas barreiras impostas por este cenário energético mundial.

Isto porque, os custos do consumo de petróleo tornam cada vez mais perigosos, pois os países

em desenvolvimento sofrem um golpe dramático por serem obrigados a pagar os preços do

mercado mundial. Em muitos casos, as importações de produtos energéticos absorvem toda a

receita das exportações. Só em 2005, o custo do petróleo, para tais nações, aumentou em 100

bilhões de dólares, o que representa muito mais que o conjunto de ajuda ao países em

desenvolvimento oferecida por todas as nações industrializadas. Enquanto isso, os ganhos das

grandes corporações petroleiras aumentaram de maneira astronômica: em 2005, a Exxon-Mobil

obteve lucro superior a 35 bilhões de dólares; a Shell, de 25 bilhões; a British Petroleum (BP) 22

bilhões de dólares.

Sabe-se que 63,3% das reservas atuais de petróleo do planeta estão no Oriente Médio. A

Europa/eurásia (incluindo a Rússia) reúne 9,2%, a África com 8,2%, América do Sul com 8,6%;

América Central e Norte 5,8% restando apenas 4,2% para a Ásia/Pacifico (SIMÕES. 2007 p. 22).

Por outro lado, os maiores consumidores de energia, são: a América do Norte com 28,7% e a

região da Ásia/Pacífico 26,9%, que juntas consumiram mais da metade de toda energia produzida

no mundo. Estes foram seguidos pela Europa 20,8% e pelos países da ex-União Soviética 10,5%.

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Em seguida estão a América Central e do Sul que juntas consomem 5,7%, restando apenas 4,4%

para o Oriente Médio e 3,7% à África (Deustschland, 2002).

Cenários projetados pela Agência Internacional de Energia (IEA, 2000) prevê um crescimento

anual de energia de, aproximadamente, 2% ao ano e, cerca de 54% entre 1997 e 2020. Isso

significa que o consumo de petróleo crescerá em 56%, o gás natural em 86%, o carvão em 49%,

representando 84% de toda energia fóssil consumida até 2020 (GELLER, 2003). Pensando os

custos, esse aumento no consumo de energia requer investimentos na construção de usinas

elétricas, oleodutos, entre outros, são necessários para o período de 2000 – 2020, e

correspondem a 13 trilhões de dólares. Mas, estes podem chegar a 35 trilhões de dólares para o

período de 2025 a 2050, o que significa investimentos da ordem de até 1 trilhão de dólares ao

ano, em investimentos em fontes alternativas e limpas de produção de energia.

Mas esse cenário terá que ser redesenhado. Um agravante está acelerando a busca por energia

que substituirá o carvão e o petróleo para as próximas décadas: o aquecimento global. Sabemos

que as mudanças climáticas são reflexos da atual estrutura sócio-econômica de produção e

consumo de energia baseada em fontes fósseis e, estas, tornam-se a força geradora da economia

mundial. Porém, para as discussões no âmbito das Conferencias das Partes (COP’s), os

mecanismos de redução das emissões de gases de efeito estufa baseiam-se na ampliação das

fontes renováveis de energia. Destacam-se ainda, como as mais cotadas na substituição das

fontes fósseis e, portanto, seria uma condição necessária, para atenuar da mudança do clima.

Mas, para isso são necessárias mudanças na infra-estrutura, na tecnologia e na economia dos

países para alcançar a meta de 5,2% na redução das emissões dos gases de efeito estufa, com

base em 1990.

2. O Brasil no cenário internacional

Mas a necessidade de se pensar uma nova alternativa de energia está demonstrando que o Brasil

utiliza-se muito mal das fontes de geração de energia. Até o final da década de 1990, o país,

través das construções de barragens, era capaz de suprir boa parte da energia elétrica consumida

no país. Porém nos últimos anos o país vem acumulando um crescimento econômico superior aos

investimentos necessários para acompanhar a demanda econômica/industrial e, o que se

observou foi um defasagem na relação demanda/consumo e, como conseqüência, apagões,

tarifaços e uma grave crise na economia do país foi sentida por todo a população brasileira entre

os anos de 2001 e 2002.

Entre os dias 01 a 04 de junho de 2004, foi realizado em Bonn, na Alemanha, a Conferência

Internacional para Energias Renováveis. Nesse período, representantes de 154 países aprovaram

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por unanimidade um amplo pacote de medidas para fomentar o uso de novas fontes energéticas,

em detrimento do petróleo. Um plano de 165 ações voluntárias, a ser supervisionado pelas

Nações Unidas, visando ampliar o uso global do vento, da luz solar, água, biomassas e

geotérmico. Isso deve garantir o acesso à eletricidade para mais um bilhão de pessoas.

Durante a Conferência destacou-se a geração de energia a partir das fontes hídricas como

renováveis. Tal constatação tornou-se um alivio para o governo brasileiro que vinha recebendo

críticas, principalmente dos movimentos ecológicos brasileiros. A então ministra das Minas e

Energia, Dilma Roussef, era uma das defensoras dos investimentos em energias hídricas, mas

declarou que o Brasil deveria diversificar ainda mais sua matriz energética e, com a criação do

Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica – PROINFA – que previa a

compra de 3300 megawatts de energia eólica, de biomassas e Pequenas Centrais Hidroelétricas

(PCH’s).

Contrariando a opinião política, algumas ONG’s como o Greenpeace e a WWF destacaram a não

concordância com o anunciado, uma vez que não vêem com bons olhos os resultados da

Conferência. Esta significou um pequeno avanço em termos de proteção do clima, mas não foi

possível definir o quadro político necessário para fomentar novas fontes de energia (Greenpeace,

2004).

A Conferência Internacional sobre Energias Renováveis de 2004, foi uma tentativa de respostas

ao IPCC, que aponta os avanços do uso de energia renovável e no desenvolvimento de

tecnologias mais limpa, a única alternativa de reduzir, abaixo do estimado, as atuais emissões de

gases de efeito estufa. Porém, segundo declarou o Prof. Pinguele Rosa, (COPPE/UFRJ) as

poucas fontes alternativas de energia, para a redução das emissões de gases de efeito estufa,

são resultados da falta de investimentos técnicos e econômicos, principalmente por parte das

empresas que não investem em fontes alternativa de energia, do governo e de organizações

internacionais, que não criam mecanismos de incentivo a pesquisa e a sua aplicação.

Contrariando a Conferência de Bonn (2004) sobre Energias Renováveis, Pinguelle Rosa, que

coordenou uma pesquisa desenvolvida no COPPE/UFRJ, concluiu que as hidrelétricas, principal

fonte de geração de energia do Brasil, são responsáveis pelas emissões de gases de efeito

estufa, resultado, dentre outros, da decomposição submersa dos vegetais. O pesquisador aponta

que “O caminho seguido até hoje não é bom. O modelo das hidrelétricas não é ideal, as

privatizações não deram certo e o modelo é falho” (ROSA, 2002).

Concordando com Rosa, o Prof. Emilio Lèbre La Rovere (2002) afirma que os investimentos do

Brasil ainda estão no inicio, ocasionados pela crise do Estado, em particular das finanças públicas

que induziram a privatização do setor energético. Segundo o Prof., o que falta para que essas

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fontes se tornem realmente usadas como alternativas de energia é a atuação do governo ao fixar

preços de acordo com o custo de uso de cada energético causa à sociedade. Não só os custos

dos produtores, mas também os custos sociais e ambientais (LA ROVERE, 2002).

Assim, percebe-se a reestruturação das novas bases econômicas e políticas no Brasil. Estas, por

sua vez, constroem um reconhecido desenvolvimento em todos os setores da economia,

concomitante ao aumento do consumo interno de energia. Segundo a Empresa de Pesquisa

Energética, ligada ao Minstério de Minas e Energia, projeta-se um crescimento superior a 5% no

consumo interno de energia em 2008. Esse consumo deve chegar a 396.473 GWh em 2008

(BRASIL, 2007). Para manter essa estrutura, o governo precisa investir em energia e diversificar

sua oferta interna, sem onerar o meio ambiente. Sendo assim, em quais estruturas governistas

que irão se basear as transformações energéticas brasileiras?

Isto posto, o objetivo desse trabalho é analisar brevemente os rumos do setor energético

brasileiro, frente ao crescente aumento na demanda interna de energia e apontar as fontes de

geração de energia que mais contribuem para o aumento nas emissões de gases de efeito estufa,

bem como aquelas que evitam suas emissões.

Para subsidiar essa análise, a proposta consiste em basear-se nos dados publicados no Balanço

Energético Nacional 2007 (BEN, 2007), bem como demais documentos do governo, assim como

artigos de pesquisadores da área.

3. As Bases da Reestruturação Energéticas Brasileira

O governo brasileiro, em especial, a administração do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, por

meio do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC – colocou em construção mega projetos

de desenvolvimento do país, entre os quais, construir de grandes hidrelétricas, estradas e até

usinas termoelétricas, alimentadas por gás natural ou carvão. No entanto, tais projetos vêm sendo

duramente questionado por cientistas, ambientalistas e até por representantes governamentais,

dentre os quais o Ministério do Meio Ambiente. As divergências governamentais são levantadas a

partir das propostas do Programa, pois contradizem a corrida pela redução das emissões de

gases de efeito estufa no país, como é o caso das concessões florestais. Isto porque, o Brasil é o

quarto maior emissor de gases de efeito estufa no planeta, se contabilizadas as emissões do

desmatamento da floresta amazônica.

Outro exemplo que causou intensas discussões no cenário nacional, e até internacional, das

obras propostas pelo PAC, são as hidrelétricas do Rio Madeira. Essas foram planejadas por

empresas como Furnas e Odebrecht e chegaram a ser discutidas por técnicos do governo, alguns

cientistas e organizações não governamentais, mas pouco da participação social brasileira na

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tomada de decisão, nem mesmo os atingidos direta ou indiretamente, dentre os quais os

ribeirinhos, índios e outras comunidades tradicionais, foram ouvidos sobre as obras.

Podemos citar como política pública energética e que tem causado insegurança na sociedade

brasileira é a retomada dos trabalhos para a construção de Angra IV. O projeto está previsto para

ser construído no eixo Rio – São Paulo, ou seja, as duas maiores capitais brasileiras, o que

suporia a participação pública. Esses exemplos estão sendo debatidos também com relação as

obras do Rio São Francisco, que obrigaria a ouvir-se boa parte da população do Nordeste.

Atualmente, cerca de 44,4% da matriz energética tem origem em fontes renováveis. Destas,

14,6% correspondem à geração hidráulica e 29,4% à biomassa, sendo que a participação

nacional dos derivados da cana-de-açúcar na Oferta Interna de Energia (OIE) passou de 13,8%,

em 2005, para 14,4% em 2006. Ou seja, um crescimento de 9,7%, passando, nesse período, de

30,1 milhões de toneladas equivalente de petróleo (tep) para 33,1 milhões de tep. Além do etanol,

também são derivados da cana-de-açúcar, o bagaço e o açúcar, que obteve um aumento de

produção de 17,7%, chegando a 30,9 milhões de toneladas. Com a demanda do etanol e do

açúcar em alta, o cultivo da matéria-prima apresentou uma expansão de 12% em 2006, atingindo

um patamar de 430 milhões de toneladas. Com isso, a energia produzida a partir da biomassa da

cana-de-açúcar, aproxima-se da energia hidráulica. Os 55,6% restantes provêm de fontes fósseis

e outras não renováveis (BRASIL, 2007).

Com isso, pode-se dizer que o Brasil constrói um reconhecido desenvolvimento em todos os

setores da economia, concomitante ao aumento do consumo interno de energia. Segundo a

Empresa de Pesquisa Energética (EPE), ligada ao Ministério de Minas e Energia, projeta-se um

crescimento superior a 5% no consumo interno de energia para o ano de 2008. O setor comercial

responderá por 7,5% da demanda, seguido pelo setor residencial, que aumentará seu consumo

em 6% e pelo setor industrial, 4%. O consumo de energia elétrica total deve chegar a 396.473

GWh em 2008 (BRASIL, 2007). Para manter essa estrutura de crescimento, o governo brasileiro

precisa investir fortemente em energia e diversificar sua oferta interna, sem onerar o meio

ambiente. Esses investimentos, segundo dados do Ministério de Minas e Energia (MME), terão

que ser superiores a US$ 800 bilhões nos próximos 25 anos, para expandir a oferta interna de

energia e atender ao crescimento na demanda até 2030. A estimativa consta do Plano Nacional

de Energia (PNE-2030), e prevê uma média anual de US$ 32 bilhões, ou seja, próximo de 2,2%

do Produto Interno Bruto do país (BRASIL, 2005).

No entanto, há agravantes no cenário interno brasileiro: o país está em quarto na lista dos maiores

emissores de gases responsáveis pelo aquecimento global. Os setores que mais contribuem para

esse cenário estão relacionados ao uso da terra e desmatamento florestal (principalmente na

Amazônia) e o setor de transporte. Com a retomada do “Pró-Álcool” outras duas questões estão

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sendo debatidas de forma bastante divergentes: por um lado, o uso da tecnologia “flex-fluel”, nos

carros em circulação no Brasil, está emitindo menos CO2, concomitante a mitigação do

aquecimento global; por outro lado, destaca-se o avanço no cultivo da cana-de-açúcar em áreas

de florestas nativas. Ou seja, as políticas adotadas de uso e expansão da oferta de bioenergias,

no mercado brasileiro e internacional, podem colocar o Brasil como uma das potências

energéticas do futuro, mas também podem ampliar o desmatamento e as emissões de gases de

efeito estufa à atmosfera.

Como exemplo a “Rodovia da soja”, como vem sendo chamada a BR 163, teria passado por um

acirrado debate com as entidades ambientalistas e outros interessados, chegando-se a um plano

sustentável de asfaltamento. Devido ao aumento nos custos da obra, o governo federal as obras

diminuiu, apesar da pressão dos grandes sojicultores de exportação, os maiores interessados na

rodovia, que faria a ligação com o porto de Cuiabá – Santarém. A BR 163 é uma das principais

fontes de escoamento da soja produzida no Mato Grosso e em outros trechos, até Santarém. O

objetivo é a comercialização no mercado internacional ou até mesmo como matéria prima para a

produção do biodiesel.

3.1 - PAC e os Biocombustíveis

O PAC - programa do governo Lula, retomou o pioneirismo brasileiro no desenvolvimento de

projetos para grandes centrais hidroelétricas e a utilização do álcool como biocombustível. O

plano de ação possibilitou ao país consolidar características bastante peculiares no suprimento de

energia elétrica e, concomitantemente, a redução do consumo de combustíveis fósseis exportado,

uma vez que destaca-se como um dos países com maior percentual de exploração de fontes

alternativas em sua matriz energética. Tal característica também pode ser referenciada no uso do

etanol a partir da cana de açúcar. Entretanto, a política do biocombustível brasileiro desponta no

cenário internacional como um candidato a grande exportador privilegiado, relacionando-o com os

grandes países do oriente médio exportadores de petróleo. No entanto, a sociedade conhece

muito pouco dos impactos sócioambientais, ao destinarem-se grandes porções de terras à

produção de monoculturas de cana-de-açúcar ou de grãos destinados a produção de

biocombustíveis para exportação, sem considerar comparativamente a agricultura familiar e a

segurança e diversidade de alimentos. No entanto, o argumento do governo brasileiro baseia-se

na enorme área agrícola disponível no país para a agricultura, mas que se encontra subutilizada.

Pensando estratégias de produção e comercialização do biodiesel e dos biocombustíveis foram

incluídos na Lei nº 9.478 de seis de agosto de 1997, que dispõe sobre a política energética

nacional, bem como foram alteradas as denominações da Agência Nacional do Petróleo para

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Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) e a sua finalidade passa a

abranger a regulação, a contratação e a fiscalização de atividades integrantes da indústria do

petróleo do gás natural e dos biocombustíveis (SANTOS, p.22).

3.2 - Os Biocombustíveis no Cenário Internacional: o caso Brasileiro

As discussões em torno d o uso dos biocombustíveis ganha força no cenário internacional. Os

Estados Unidos e a União Européia destacam-se por fortes incentivos à produção e consumo de

biocombustíveis como uma forma de substituir parte dos combustíveis fósseis, um esforço na

redução das emissões de gases de efeito estufa e a dependência de combustíveis fósseis como

preços crescentes, fornecidos por países politicamente instávies.

Com a aprovação do Protocolo de Kyoto por 125 paises, acelerou-se a substituição dos

combustíveis fósseis por renováveis. A consolidação dos biocombustíveis se dará paulatinamente,

uma vez que a produção interna dos maiores consumidores ainda é pequena. Sabe-se que o

Brasil exportou 3,4 bilhões de litros de álcool em 2006. Destes, 1,76 bilhões para os Estados

Unidos, 591 milhões para a União Européia (principalmente para os países baixos e Suécia) e 225

milhões para o Japão (PEZZO; AMARAL, 2007).

No entanto, cresce na América Latina a demanda por álcool brasileiro. Em 2006 essa demanda foi

superior a 657 milhões de litros. No entanto, metade desse volume foi direcionado para os

Estados Unidos. Isso ocorreu a fim de se aproveitar as vantagens de acesso de alguns países da

América Central a esse mercado, através do Tratado de Livre Comércio com a América Central

(Costa Rica, El Salvador, Guatemala, Honduras, Nicarágua e República Dominicana. O álcool

hidratado brasileiro é utilizado como matéria prima para a produção de álcool anidro nesses

países, posteriormente vendido aos Estados Unidos (PEZZO; AMARAL, p. 21, 2007).

Nos Estados Unidos o álcool é produzido a partir de milho que tem balanço energético baixo,

quando comparado ao de cana-de-açúcar, porque a conversão da planta em energia é baixa,

alem de a produção ser dependente de grandes quantidades de insumos agrícolas, tais como

fertilizantes e defensivos. Segundo dados da OECD, para cada unidade de energia fóssil

investida, é produzida entre 1,25 e 1,66 unidades de energia renovável, enquanto que no caso do

álcool da cana-de-açúcar resultam entre 8,3 e 10,2 unidades. Esses indicadores destacam a

produção da cana-de-açúcar como um enorme potencial para a produção de energia. Mas, a

União Européia, por exemplo, se recusa a importar bioenergias sem certificação de

sustentabilidade ambiental e social, enquanto o biocombustível consumido internamente demanda

intenso uso de fertilizantes químicos e defensivos agrícolas, resultando em baixo rendimento ao

final do processo.

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Sabe-se que essas políticas de importação da União Européia e dos Estados Unidos estão

diretamente relacionadas à influência da agroindústria na tomada de decisão para a abertura ao

mercado externo (PEZZO; AMARAL, p.22, 2007). Esses países querem com a certificação barrar

os produtos importados, mas competitivos e proteger o seu mercado interno. Como conseqüência,

tem-se nesse cenário, um produto energético menos sustentável que compromete o impacto das

políticas ambientais (dentre as quais a redução antrópicas de gases de efeito estufa), associado

ao desenvolvimento econômico dos países em desenvolvimento.

Associado a essa condição, as criticas dirigidas a produção de biocombustíveis sustentam-se no

baixo rendimento energético em relação ao combustível fóssil. Outro ponto bastante debatido

refere-se à perda de áreas agricultáveis, na qual a produção de alimentos compete com as áreas

de monocultura para a produção das bioenergia.

Porém, segundo John A. Mathews (Universidade de Macquarie - Austrália), essas criticas só

fazem sentido se analisadas as condições agrícolas dos Estados Unidos e da Europa. A

competição por terras para a produção de alimento e o desempenho irrisório do balanço

energético são conseqüências do baixo potencial dessas regiões de produzir biomassas e da falta

de disponibilidade de terras agricultáveis para a expansão da produção, fatores esses

diferenciados dos países em desenvolvimento. Nesse sentido, a FAO, acredita que 70% de toda

expansão do potencial agrícola para a produção de alimento está na África Subsaariana, nas

Américas do Central e do Sul.

No entanto, a Agência Internacional de Energia fala em acordo de uso sustentável das economias

desenvolvidas e em desenvolvimento a fim de criar um pacto o fornecimento de biocombustíveis

em larga escala internacional. Para isso, fala-se em um marco regulatório internacional sustentado

em sistemas de certificação de qualidade dos biocombustíveis, bem como num processo intensivo

de fiscalização dos impactos ambientais de produção. Ainda é proposta da AIE a criação de uma

cooperação tecnológica, na qual os principais países produtores de biocombustíveis pudessem

garantir a sua comercialização.

O atual cenário dos biocombustíveis está associado às mazelas relacionadas à extração e uso

dos combustíveis fósseis. Ou seja, nas emissões de gases de efeito estufa, dependência de

países politicamente instáveis, em constantes conflitos bélicos que ameaçam os direitos humanos,

chegando até a natureza da produção que inevitavelmente gera concentração de renda nos

países produtores. Essas condições estão estritamente atreladas à sustentabilidade da sua

produção e sua irreversível escassez que ameaça as balanças comerciais do mundo todo. Já os

biocombustíveis têm no potencial de promover o desenvolvimento de países pobres, a partir do

aprimoramento das cadeias produtivas agroindustriais, desde que respaldada por políticas

públicas sólidas.

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O cenário dos biocombustíveis tem no Brasil um importante defensor do seu uso e produção em

grande escala. Tal condição está inserida no Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel

(PNPB), decreto 0-002 de julho de 2003, alcançado com a criação de um Grupo de Trabalho

Interministerial que avaliou as condições e as ações para o programa. Com tal decreto, institui-se

a Leio nº 11.097/2005 que dispõe sobre a introdução do biodiesel na matriz energética brasileira,

determinando sua mistura compulsória a todo diesel comercializado no país a um teor de 2% a

partir de 2008 e 5% a partir de 2013 (PEZZO; AMARAL, p.22, 2007).

A fim de garantir a participação da pequena e média propriedade na produção e abastecimento

dos óleos combustíveis no país, o governo federal pensou três mecanismos de contemplação: o

selo “combustível social”; descontos nos impostos federais (PIS/PASEP/COFINS) conforme

região, sistemas de produção e matéria prima de que foi originado o biodiesel; e os leilões

coordenados pela Agencia Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), como

veremos a seguir.

A partir de 2008 a ANP começou a organizar novos leilões a fim de garantir o abastecimento para

a produção de B5 (diesel misturado com 5% de biodiesel). Para garantir sua entrada em vigor, são

necessários 2 bilhões de litros até 2013. Porém, o que se observa refere-se a relação entre o

potencial instalado de produção de biodiesel é muito maior que o mercado interno previsto em

curto prazo (PEZZO; AMARAL, p.26, 2007).

Tal cenário é explicável frente a tentativa do governo de atender a demanda do mercado europeu

que tem uma frota de veículos bastante expressiva movida a diesel. Hoje o que se espera é que o

desenvolvimento de tecnologias de produção e extração da matéria prima do biodiesel possa

torná-la mais competitiva frente ao diesel fóssil. Hoje no Brasil já se desenha futuros

empreendimentos baseados no abastecimento do mercado externo.

A capacidade produtiva das plantas instaladas no Brasil está operando muito abaixo do seu

máximo. Os principais motivos são: mercado ainda restrito aos leilões da ANP; o fluxo da matéria

prima ainda é incerto, pois sua produção concorre com a produção de alimento; as plantas

instaladas estão em fase de aprimoramento, frente as exigência das ANP e, existe um mercado

irregular, sem registro na ANP (PEZZO; AMARAL, p.26, 2007.

Já os avanços tecnológicos são observados quanto aos sistemas de produção pela rota etílica,

que requer ainda ajustes, se comparado ao uso do metanol como reagente; há disponibilidade de

etanol no mercado. A produtividade do biodiesel está sendo possível mediante aos avanços

agrícolas na área, bem como os rendimentos industriais que o país apresenta, frente aos avanços

tecnológicos, melhoramento genético, variedades agrícolas e seleção de linhagem das plantas.

Consequentemente, o mercado também se prepara para um aumento vertiginoso da produção

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dos biocombustíveis, bem como o aumento da sua disponibilidade em todo o mercado nacional. O

aumento da matéria prima no mercado nacional está sendo possível graças ao emprego de

técnicas não convencionais, tais como a transgenia, e o uso de enzimas para a produção de

açúcares.

Já ao tratar o uso da cana-de-açúcar para a produção do álcool combustível, é possível afirmar

que esse cenário foi instituído no Brasil ainda em 1975, mesma época em que foi criado o

Proóleo, embrião do atual programa para o biodiesel. Segundo dados da Companhia Nacional de

Abastecimento (CONAB), hoje são 6,6 milhões de hectares (86,5% localizados na região Centro-

Sul), utilizados para o cultivo da cana-de-açúcar – 7,4% superiores a safra de 2006. Em 2007 a

produção foi superior a 14,54%, superior a 20,01 bilhões de litros de álcool. Destes, 91,2%

proveniente da região Centro-Sul. Essa também é a região que demanda maior consumo de

álcool, principalmente a região Sudeste devido ao crescente aumento das frotas dos carros flex

fluel PEZZO; (AMARAL, p.27, 2007).

Baseado nessa demanda, desenvolveu-se um estrutura tecnologia e de infra-estrutura que

permite atender a região, principalmente o Estado de São Paulo e que hoje apresenta as

produtividades mais altas do país devido ao uso de variedades especiais de cana-de-açúcar

desenvolvidas para as condições climáticas da região, alem de estar próxima dos grandes centros

fornecedores de insumos agrícolas e possuir mão de obra capacitada. No entanto, o desafio é

expandir a tecnologia de produção da cana-de-açúcar aos demais estados do Brasil, nos quais

não são tradicionalmente produtores ou em regiões onde se apresentam baixa produtividade ou a

sua produção requer custos muito alto. Sabe-se que o cultivo da cana-de-açúcar é à base da

produção bioenergias no Brasil. No entanto, intensos debates estão se formando sobre a

manutenção alimentar. Ou seja, a monocultura da cana-de-açúcar está tomando o lugar de

plantações de arroz, soja, milho, feijão e carne (PEZZO; AMARAL, p.28, 2007).

Aspectos tecnológicos, técnicos e políticos influenciaram a aceitação dos biocombustíveis no

mercado internacional. A produção dos combustíveis renováveis ainda são mais caros que os

fósseis. Porem existe duas justificativas que se relacionam: são reconhecidas suas vantagens

relativas e, principalmente, esses produtos serão viáveis à medida que as tecnologias forem se

aprimoram no processo produtivo. O melhoramento de culturas específicas para o aproveitamento

energético é algo que será de grande importância para essa cadeia produtiva, até mesmo para

garantir o suprimento da produção de biocombustíveis, de forma a não competir com a indústria

de alimento.

Três fatores contribuíram para os avanços da tecnicas e tecnologias visando a ampliação das

bioemergias. O primeiro é o subsídio no preço do petróleo, que chegou a 10 dólares por barril na

década de 90 e agora ultrapassou os 120 dólares. Outro fator é o efeito estufa, provocado pela

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emissão de gases tóxicos provenientes do uso de combustíveis fósseis. Como último fator,

devemos mencionar a instabilidade geopolítica do mundo atual: o terrorismo, a ocupação do

Iraque e do Afeganistão, a crise no Oriente Médio, a questão nuclear iraniana e os mísseis da

Coréia do Norte, tudo isso agrava a segurança energética e coloca os biocombustíveis como um

real substituto do petróleo.

3.4 - O etanol

O etanol é utilizado no Brasil desde a década de 70, quando foi instituído o Programa Nacional do

Álcool – Proálcool – lei nº 76.593. O uso de carros movidos a álcool atingiu seu máximo em 1985,

quando alcançou uma produção de 96% no mercado nacional. No entanto, com o melhor preço do

açúcar no mercado internacional, associado à redução no preço do barril de petróleo, as venda de

carros a álcool, atingiu a produção mínima de 0,07% em 1997. Porém, em 2000 o Conselho

Interministerial de Açúcar e Álcool – CIMA – instituíram o projeto de Lei nº 3.546, na qual, toda

gasolina consumida no país teria a mistura de etanol de 20% a 26%. O Programa revive seu

momento auge com a retomada, em 2003, da produção dos carros “flex fluel” ou bicombustível,

superando a produção de carros movidos exclusivamente a gasolina em 2005, num total de 1,25

milhões de unidades. (GUARDABASSI, p.56, 2006)

A retomada do Proalcool no Brasil resulta, principalmente, pelo aumento constante no preço do

barril do petróleo no mercado internacional. Associado a tecnologia do melhoramento genético e o

aumento da variedade de cana-de-açúcar plantada no país, já é possível colher,

aproximadamente, 100 toneladas por alqueire, contra 65 t/alqueire em 1998. O mesmo se observa

com o teor de açúcar. Este aumentou de 9,5% em 1977, para 14% em 2003. Associado a essa

tecnologia, tem-se a melhoria no processamento da fabricação de açúcar e álcool, visando elevar

o rendimento da extração do açúcar da cana de 88% em 1977, para 98% em 2003 e ganho de

17% no rendimento da fermentação, chegando destilarias a rendimentos de fermentação de 92%

(GUARDABASSI, p.56, 2006).

Com os avanços na agroindústria brasileira e no desenvolvimento de tecnologias para a produção

de etanol, já é possível produzi-lo a partir do bagaço e palha da cana-de-açúcar. A hidrólese

consiste no tratamento físico-químico do bagaço da cana de modo que um dos seus principais

componentes, a lignina é dissolvida. Isto porque, seu polímero estrutural da célula é altamente

resistente aos ataques mecânicos e/ou químico inerente ao processamento de álcool.

Dessa forma, os outros dois componentes do bagaço, a celulose e a hemicelulose, ficam liberados

para um ataque ácido que os transforma em glucose, galactose, manose e xilose, substância da

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lignina, esse ataque se torna muito mais rápido: reações que levariam horas para acontecer se

dão em poucos minutos (GUARDABASSI, p.57, 2006).

Alem disso, o aproveitamento do bagaço é mais efetivo do que nos processos tradicionais, nos

quais apenas a glucose é utilizada para a produção do etanol. A galactose e a manose já não são

tão empregadas porque produzem etanol com menor rendimento. E a xilose porque necessita de

um fermento especial para produzi-lo. Na hidrólise, o bagaço é colocado num reator, onde é

adicionado um solvente capaz de dissolver a lignina (normalmente, álcool misturado com água;

mas outros solventes, tais como a acetona ou o dióxido, também pode ser usado. A combinação

da temperatura, com ácido e o solvente é o que possibilita a realização da hidrólise. Ao final do

processo, por meio de um sistema de evaporação, o solvente é extraído e encaminhado para

reuso. O bagaço desaparece e o que sobra é uma mistura de água com açúcares, ácido e

legnina, transformada numa massa postasa e escura que será aproveitada como combustível. A

solução aquosa contendo os açúcares é recuperada e enviada para um sistema de fermentação e

destilação onde será produzido o etanol (GUARDABASSI, p.58, 2006).

3.5 - Plantas oleaginosas e Biodiesel

Em 13 de janeiro de 2005 foi publicado a Lei 11.097, que dispõe sobre a introdução do biodiesel

na matriz energética brasileira, estabelece a obrigatoriedade da edição de um percentual mínimo

de biodiesel ao óleo vendido ao consumidor final, em qualquer parte do território nacional. Esse

percentual obrigatório será de 5% a partir de janeiro de 2013 (oito anos após a publicação desta

lei) havendo um percentual obrigatório intermediário de 2% três anos após a publicação da

mesma (GUARDABASSI, p.60, 2006).

As plantas oleaginosas representam um grande percentual da flora brasileira e que podem ser

utilizados na alimentação, mas também podem ser utilizadas na produção de energia, nos setores

da indústria química e cosmética. Todas essas oleaginosas obedecem peculiaridades muito

regionais. O governo brasileiro levando isso em consideração deve aproveitar o potencial local

para produzir biodiesel a partir das diversas matérias-primas encontradas no país (mamona,

dendê, soja, nabo forrageiro, girassol, pinhão-manso, babaçu, óleos e gorduras residuais, etc.).

Deverão ser utilizadas as diversas oleaginosas, conforme as espécies produzidas em cada região:

óleo de palma na região Norte; mamona, na região Nordeste; soja na região Centro-Oeste, sendo

o etanol, a base do reagente para o biodiesel. Para isso, usará do potencial tecnológico já

conhecido (craqueamento, transesterificação, outras) para alcançar tais finalidades. O processo

que tem apresenta resultado técnico-econômico mais satisfatório é a transesterificação, no qual

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ocorre uma reação entre o óleo vegetal e um álcool (metílico ou etílico), na presença de um

catalisador, e cujos produtos são um éster de ácido graxo (biodiesel) e glicerina.

O processo de comercialização do biodiesel é regulamentado pela Resolução nº. 41/2004 da

ANP, assim como é preciso obter o registro junto à Secretaria da Receita Federal do Ministério da

Fazenda, como estabelecido na Lei nº. 11.116/2005 e na Instrução Normativa SRF nº. 516/2005.

As empresas que desejam usufruir benefícios tributários direcionados à inclusão social e ao

desenvolvimento regional (geração de emprego e renda para agricultores familiares,

especialmente das regiões mais carentes do País), devem obter, adicionalmente, o Selo

Combustível Social (GUARDABASSI, p.58, 2006).

A proposta do governo brasileiro de engajar os agricultores familiares e os produtores agrícolas

das regiões mais pobres do país na cadeia do biodiesel. O programa possibilitou melhores

condições de cultivo, produção e cuidados com a terra, bem como, aumentar a fonte de rende dos

mesmos. O “Selo Combustível Social” é concedido pelo Ministério do Desenvolvimento Social ao

produtor de biodiesel que cumpre os critérios descritos na Instrução Normativa I. Este “selo”

confere o caráter de participar do programa de inclusão social dos agricultores familiares, Estes

são enquadrados no Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF),

conforme estabelecido no Decreto nº 5.297, de 06 dezembro de 2004. Esse status confere ao

produtor de biodiesel acesso a melhores condições de financiamento junto ao BNDES e outras

instituições financeiras, alem do direito de concorrência em leilões de compra de biodiesel pelo

governo federal, junto a ANP (GUARDABASSI, p.61, 2006). Em 2007 foram organizados leilões

que garantiram a comercialização de 840 milhões de litros, volume necessário para a produção da

B2 (diesel misturado com 2% de biodiesel) em todo o Brasil. No entanto, dos 885 milhões de litros

comercializados nos cinco leilões realizados, a ANP registrou a entrega de 190,8 milhões de litros,

produzidos desde 2005. Porém, até o fim de 2007 a capacidade produtiva a instalada era de 1,3

bilhoes de litros, podendo chegar a 4 bilhões em 2010.

As empresas detentoras desse “selo” terão acesso a desoneração tributária, a alícota máxima de

PIS/PASEP1 e CONFINS incide sobre a receita bruta obtida pelo produtor ou importador, na

venda de biodiesel, fica reduzido para R$ 217,96 por m3, equivalente a carga tributária federal

para o diesel de petróleo. Foram estabelecidos três níveis de desoneração tributária para a

redução da alíquota, de acordo com os critérios dispostos na Lei nº 11.116 de 18 de maio de 1 Ele foi concebido com o propósito de conceder redução total ou parcial dos tributos federais incidentes sobre os combustíveis (CIDE, PIS/PASEP e COFINS). Para produtores de biodiesel, que apóiem a agricultura familiar, de modo a viabilizar o atendimento dos princípios orientadores básicos do PNPB, promover a inclusão social e reduzir disparidades regionais, mediante a geração de emprego e renda nos segmentos mais carentes da agricultura brasileira. O modelo parte da regra geral de uma tributação federal no biodiesel, nunca superior à do diesel mineral. Entretanto, os produtores de biodiesel que adquirem matérias-primas de agricultores familiares, qualquer que seja a região brasileira, poderão ter redução de até 68% nos tributos federais. Se essas aquisições forem feitas de produtores familiares de dendê (palma) na região Norte ou de mamona no Nordeste e no Semi-Árido, a redução pode chegar a 100%. Se as matérias-primas e regiões forem as mesmas, mas os agricultores não forem familiares, a redução máxima é de 31%. Para usufruir desses benefícios tributários, os produtores de biodiesel precisam ser detentores de um certificado: o Selo Combustível Social.

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2005: o biodiesel fabricado a partir da mamona ou a palma produzida nas regiões Norte, Nordeste

e no Semi-árido pela agricultura familiar: a desoneração de PIS/PASEP e COFINS é total, ou seja,

a alíquota efetiva é nula; o biodiesel fabricado a partir de qualquer matéria prima que seja

produzida pela agricultura familiar, independente da região: a alíquota efetiva é de R$ 70,02 por

m3 (67,9% de redução em relação a alíquota geral); e o niodiesel fabricado a partir de mamona ou

a palma produzida na região Norte, Nordeste e Semi-árido pelo agro-negócio: a alíquota efetiva é

R$ 151,50 por m3 (30,5% de redução em relação à alíquota geral) (GUARDABASSI, p.61, 2006).

O BNDES também dispõe de um Programa de Apoio Financeiro a Investimentos em Biodiesel,

cujo objetivo é fortalecer todas as fases da produção, desde o campo até os equipamentos para a

produção do biodiesel (passando pela produção de óleo bruto, produção de biodiesel,

armazenamento e logística de comercialização). Para isso, o governo federal lança as seguintes

condições de financiamento: os projetos que apresentam o “Selo Combustível Social”: até 90%

dos itens passiveis de apoio e taxas de juros para micro, pequenas e médias empresas de TJLP2

+ 1% a.a. e para grandes empresas TJLP + 2% a.a.; os projetos que não apresentam o “Selo

Combustível Social”: até 80% dos itens passíveis de apoio e taxas de juros para micro, pequenas

e médias empresas de TJLP + 2% a.a., e para grandes empresas de TJLP + 3% a.a.

(GUARDABASSI, p.61, 2006).

3.6 - A cana-de-açúcar

A biomassa da cana de açúcar (bagaço) destaca-se como uma das biomassas modernas por ser

utilizada no suprimento da energia térmica, mecânica e elétrica das unidades de produção de

açúcar e álcool.

Com o desenvolvimento da linha de produção do açúcar e álcool otimiza-se o processo de

preparo da cana. Esta é submetida a um desfibrilador cuja finalidade é aumentar a densidade e a

abertura das células do colmo de cana, otimizando a quantidade de caldo que pode ser extraído,

seguido pelas moendas onde é retirado o caldo no qual o açúcar se encontra dissolvido

(GUARDABASSI, p.64, 2006).

Os produtos desse processo são o caldo, cujo rendimento de extração varia de 92% a 97% e o

bagaço com teor de umidade final de aproximadamente 50% (base úmida). Após a extração do

caldo, o bagaço da cana é constituído de 46% de fibra, 50% de umidade e 4% de sólidos

dissolvidos. São obtidos 240kg a 280kg de bagaço por toneladas de cana moída. Já o teor

energético do bagaço é de 30% a 40% da energia total da planta. O bagaço é então encaminhado

2 Taxa de Juros de Longo Prazo, instituída pela Medida Provisória nº 684 de 31.10.1994, sendo definida como o costo básico dos financiamentos concedidos pelo BNDES. Foi convertida na lei nº 10.183 de 12.02.2001.

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à caldeira, o vapor de alta/média pressão é utilizado para acionar as turbinas a vapor que, por sua

vez, produzem energia mecânica para o acionamento das moendas, desfibriladores, tubos-

bombas e geradores elétricos. O vapor de baixa pressão é utilizado como fonte de energia

térmica, nos processo produtivo do açúcar e também do álcool (BRADUNBECK, CORTEZ, 2005

apud GUARDABASSI, p.64, 2006).

Na década de 80 a oferta de energia hidroelétrica era abundante e a legislação brasileira impedia

a venda de excedentes de energia para rede. Essa realidade alterou-se no inicio de 2001,

mediante a primeira grande crise no abastecimento de energia vivenciada pelos brasileiros - o

“apagão” - elevando o preço da eletricidade a patamares nunca antes presenciados. Cenário que

levou o setor sucroalcooleiro a substituir seus equipamentos obsoletos, por outros mais eficientes

(caldeiras de 60 e 80 bar e turbinas de contra pressão) com o intuito de produzir excedentes de

eletricidade a ser comercializado. (GUARDABASSI, p.65, 2006). Com a crise do setor energético,

o então subproduto da cana-de-açúcar (bagaço) - indesejado na primeira fase do Proálcool -

passou a ser queimado nas caldeiras das próprias usinas, como solução à geração de energia

interna. Segundo a ÚNICA (2005) atualmente a potência instalada pra a geração a partir do

bagaço da cana-de-açúcar e de 3.500 MW dos quais 700 MW estão sendo vendidos para as

concessionárias de energia. A previsão do setor é de que na safra 2009/2010, sejam produzidos

560 milhões de toneladas de cana-de-açúcar, o que corresponde a 45%, elevando a potencia

instalada para 4mil MW. O excedente de eletricidade produzido pelo setor sucroalcooleiro, na área

de concessão da CPFL (Companhia Paulista de Força e Luz) onde estão localizadas 80% de

todas as usinas de álcool do Estado de São Paulo está sendo vendido para a Companhia. Em

2003, foram vendidos 1400GWh, o que representa 6,1% do mercado da CPFL (GUARDABASSI,

p.65, 2006).

Outra questão amplamente discutida no setor agroindustrial é o aprimoramento das técnicas de

colheita da cana-de-açúcar. O Decreto Federal 2.661 de 1998, prevê a eliminação gradual da

queima da palha da cana-de-açúcar, em áreas mecanizáveis, até 2018. No estado de São Paulo,

foi estabelecida legislação que determina a eliminação gradativa da queima de cana, sendo a

eliminação nas áreas mecanizáveis deve ocorrer até 2021 em áreas não mecanizáveis até o ano

2031. No entanto, (HASSUANI; LEAL, 2005 apud GUARDABASSI, p.67, 2006). Pesquisas

comprovam que a cana não queimada já atinge 24% da produção total do Estado de São Paulo.

Isso porque a palha representa até 30% de toda energia contida na planta, ou o equivalente a

cerca de 10t/há.ano de matéria seca (BRAUNDECK; CORTEZ, 2005).

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3.7 - Programa Luz para Todos

No “Programa Nacional de Universalização do Acesso e Uso da Energia Elétrica - Luz para

Todos", iniciado em 2004, a proposta consiste em permitir acessos à energia elétrica a todos os

cidadãos brasileiros até 2008. No entanto, a matriz energética brasileira é dividida em sistemas

integrados e sistemas isolados. Nos sistemas interligados estão conectados 96% da capacidade

instalada do Brasil, produzida a partir das hidroelétricas e distribuída ao longo do território nacional

e as usinas termoelétricas sendo distribuídas por longas linhas de transição. Em regiões

extremamente isoladas das regiões norte, que compreende os Estados do Amapá, Acre,

Amazônia, Roraima, Rondônia, e parte do Pará, por exemplo, as linhas de transmissão do sistema

integrado ainda não foram levadas, influenciadas pelo alto custo ou pela dificuldade geográfica ou

ainda, por serem comunidades muito isoladas, o acesso tornam-se inacessíveis. Nessas regiões,

a energia é movida a base de motores diesel, muitas vezes de baixo rendimento e, portanto, a

geração de energia acontece em algumas horas do dia, devido ao custo do transporte. A esses

locais, a utilização de energia renovável, mesmo em muitas regiões rurais, configura-se como a

opção técnica e econômica mais viável. O que se sabe é que nessas regiões o uso de

combustíveis fósseis, principalmente, o óleo diesel, é o principal fornecedor de eletricidade. O

Norte do país é um exemplo. Anualmente são consumidos cerca de 2,5 milhões de toneladas

desse combustível são usados para fornecer energia elétrica aos sistemas isolados, emitindo 7,8

Mt de CO2, o que corresponde a, aproximadamente, 40% das emissões de gás carbono no setor

de energia elétrica no país.

O principal obstáculo, segundo Célio Bermann é que as energias alternativas no Brasil, até agora,

continuam sendo vistas como uma opção marginal. "O incentivo às fontes alternativas não deveria

ser um programa a parte, mas uma prioridade em geração de energia elétrica" (BERMANN, 2007

apud Capela, M; Chiaretti, D., 2007).Ou seja, há no Brasil propostas de desenvolvimento

sustentáveis, mas constata-se que ainda faltam condições estruturais que as façam cumprir.

Com isso, e possível constatar, a partir dessa breve análise, que o governo brasileiro dá sinais

evidentes no interesse de construir novas usinas térmicas a carvão e/ou a gás natural, bem como

usinas nuclear. Ou seja, o modelo energético brasileiro está contrariando a tomada de decisão

dos demais Estados Nação: a direção da redução das emissões de gases de efeito estufa e a

mitigação das mudanças climáticas, por meio de alternativas energéticas limpas.

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4 – Conclusão

O modelo de industrialização alcançado pelos países desenvolvidos seria o caminho a ser trilhado

pelos países pobres, a fim de que estes atinjam o estágio de desenvolvimento vivenciado pelos

países ricos? Uma perspectiva crítica vê o desenvolvimento como um processo de mudanças

estruturais, sociais e políticas, e não apenas por meio de indicadores de crescimento econômico.

Segundo Diegues, “O desenvolvimento e o subdesenvolvimento são faces da mesma moeda, e

criados pelos mesmos processos que aumentam os níveis de produção e qualidade de vida nos

países centrais e mantêm os demais atrasados” (Diegues, 1992, p.23). Isso significa que será

difícil para um país em processo de desenvolvimento atingir um nível que o impeça de se

desenvolver sem uma intervenção direta no clima do planeta, já que suas fontes de energia estão

baseadas no uso de combustíveis fósseis, carvão, etc. Assim, a justificativa para a busca do

progresso ou desenvolvimento econômico e tecnológico como um meio de reduzir as emissões de

gases de efeito estufa não se sustenta, pois mesmo uma superpotência econômica como os

Estados Unidos, que alcançaram o pleno desenvolvimento econômico e tecnológico, o sustenta,

fundamentalmente, baseado em um alto grau dessas emissões, refletida local e globalmente.

O objetivo no processo de transição para uma economia de mercado menos prejudicial ao meio

ambiente, estabilize a concentração equivalente de CO2 na atmosfera entre 450 e 550 ppm, ao

longo dos próximos 10 ou 20 anos, para cair a taxas anuais de 1% e 3%, chegando em 2050, a

índices 25% menores que o presente. No entanto, a custos mundiais de estabilização das

emissões entre 500 e 550 ppm em 2050 seria superior a 1% do PIB mundial. Porém, segundo

avaliação do IPCC, se nada for feito, as mudanças climáticas produziram uma redução irreversível

de consumo per capto entre 5% e 20%, resultado de catástrofes sem precedentes. Só as

catástrofes com desastres naturais (ciclones, inundações, secas, ondas de calor) poderiam custa

por ano entre 0,5% e 1% do PIB mundial até 2050 (RICUPERO, 2007, p. 157).

Entretanto, destaca que o governo brasileiro não possui políticas para atenuar o efeito das

mudanças climáticas e, não incluído medida efetivas no P.A.C., nem deu prioridades no

estabelecimento dessas políticas. Compara o governo atual ao dos militares que, por sua vez,

chegaram a dar boas vindas a investimentos poluidores com o argumento da prioridade de

crescer. A ironia é que acabamos não crescendo por duas décadas e assistimos a Amazônia ser

destruída a ritmo de 24 mil km2 por ano (RICUPERO, 2007, p. 158).

O Brasil tem a maior floresta tropical do planeta; um dos principais reservatórios de água doce do

mundo; riquíssima biodiversidade; equação energética limpa e a experiência mais longa e

comprovada em biocombustíveis. Por outro lado, somos o quarto maior emissor de dióxido de

carbono. Enquanto, o resto do mundo polui com veículos, indústrias e produção de energia, o

Brasil emite até 75% dos gases de efeito estufa a partir das queimadas florestais. Apenas ¼

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restante de nossas emissões provem do setor que impulsiona o crescimento, o que prova a

falsidade do argumento desenvolvimentista (RICUPERO, p.159).

Um exemplo claro desse descaso é o Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia

Elétrica – PROINFA. O governo brasileiro esperava atender a demanda interna de energia a partir

de outras fontes de energia. Para isso, tinha como meta colocar em operação 144 projetos, até

dezembro de 2007, num total de 3.299,40 MW de potência instalada. Destes, 1.191,24 MW a

partir de 63 Pequenas Centrais Hidroelétricas (PCHs); 1.422,92 MW a partir de 54 usinas eólicas;

e 685,24 MW em 27 usinas a base de termelétricas de biomassa. Passados 5 anos de sua

criação, a capacidade instalada do programa alcançou apenas 26,1%, o que significa 860,6 MW

instalados. O programa impulsionou o uso de novas fontes de energia no país, mas os avanços

foram tímidos e, em 2008, encerra-se o prazo do projeto, sem nenhuma previsão para o início da

sua segunda fase (CAPELA; CHIARETTI, 2007).

Ou seja, sabemos que uns dos principais fatores (senão o maior) do aquecimento global é a

utilização em larga escala de combustíveis fósseis na produção de energia. Desse modo,

entendemos ser urgente a adoção de energias consideradas limpas. No entanto, o que se observa

é que tratar a problemática da mitigação do aquecimento global, a partir da ótica das

reestruturações energéticas requer a necessidade de responder coletivamente (atores políticos,

movimentos sociais e operadores econômicos) a repensar o conceito de “bem comum” no plano

político mundial e integrar esforços de regulação de uma nova ordem internacional.

A partir do material analisado, observou-se um intenso estudo por parte dos governos, das

empresas e da comunidade acadêmica, em busca de uma matriz energética que substitua o

petróleo. A meta é diversificar a matriz energética, por outras fontes limpas e renováveis. Portanto,

observou-se uma íntima ligação entre empresas petrolíferas (como a estatal nacional Petrobrás) e

o discurso do desenvolvimento sustentável acerca de novas fontes energéticas.

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