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FACULDADES INTEGRADAS DE PEDRO LEOPOLDO Mestrado Profissional em Administração OS REFLEXOS DA RELAÇÃO DE CONFIANÇA INTERPESSOAL E MUDANÇA ORGANIZACIONAL NO PROCESSO DE PROFISSIONALIZAÇÃO. Um estudo de caso em uma empresa de transporte rodoviário de cargas Margareth Rodrigues Pena Pedro Leopoldo 2008

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  • FACULDADES INTEGRADAS DE PEDRO LEOPOLDO Mestrado Profissional em Administração

    OS REFLEXOS DA RELAÇÃO DE CONFIANÇA INTERPESSOAL E MUDANÇA ORGANIZACIONAL NO

    PROCESSO DE PROFISSIONALIZAÇÃO. Um estudo de caso em uma empresa de transporte

    rodoviário de cargas

    Margareth Rodrigues Pena

    Pedro Leopoldo 2008

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  • Margareth Rodrigues Pena

    OS REFLEXOS DA RELAÇÃO DE CONFIANÇA INTERPESSOAL E MUDANÇA ORGANIZACIONAL NO

    PROCESSO DE PROFISSIONALIZAÇÃO.

    Um estudo de caso em uma empresa de transporte rodoviário de cargas.

    Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado Profissional em Administração das Faculdades Integradas de Pedro Leopoldo, como requisito para obtenção do título de Mestre em Administração.

    Orientador: Prof. Lúcio Flávio Renault de Moraes, PhD.

    Pedro Leopoldo 2008

  • Sete coisas distinguem o sábio do ignorante: 1. O sábio não fala em presença de quem o ultrapasse em

    ciência ou em idade. 2. Nunca interrompe quem fala.

    3. Não responde nunca com precipitação. 4. Interrompe com método e responde com precisão.

    5. Discute as questões segundo a ordem por que foram postas. 6. Quando não compreende uma coisa, confessa este fato com

    franqueza, e curva-se ante a verdade. 7. O ignorante faz precisamente o contrário.

    Piquet Avot

  • A meus pais, Adilson (in memoriam) e Ana Maria.

    A produção deste trabalho só foi possível devido aos valores que me ensinaram, entre eles a confiança,

    sempre presente em nossa convivência. Independentemente de estarmos fisicamente juntos,

    sei que vibram com alegria e intensidade por essa conquista, que é inteiramente dedicada a eles.

  • AGRADECIMENTO ESPECIAL

    Ao meu orientador, Prof. Lúcio Flávio Renault de Mo raes

    Um mestre funciona como um agente catalisador, cuja simples presença

    estimula...

    As flores começam a desabrochar... O sol não está se dirigindo a cada flor,

    forçando-as a se abrir, pelo menos não de forma direta; entretanto, os seus raios

    dançam ao redor de cada uma, dando-lhes calor e encorajando-as delicadamente.

    As flores têm que ser tocadas de forma suave; se você forçar as pétalas, ao abrir,

    elas não resistirão. O sol simplesmente cria o clima para que elas desabrochem. Um

    desejo interior surge dentro delas, algum instinto misterioso entra em sintonia com o

    calor do sol. E as flores se abrem e começam a exalar sua fragrância. Exatamente

    como o trabalho do mestre...

    Ele não pode entregar tudo aquilo que conhece, mas pode criar um campo de

    energia capaz de criar no outro a coragem suficiente para dar o salto, e assim o

    milagre torna-se possível.

    Zen Osho. (Adaptação)

  • AGRADECIMENTOS

    A Deus, sempre me iluminando, mostrando-me os caminhos a serem

    percorridos, dando-me paciência, tolerância e sabedoria para fazer escolhas e tornar

    mais um sonho realidade.

    À Cris e ao Paulo, meus irmãos, por nunca medirem esforços em me ajudar e

    incentivar a concretizar essa etapa.

    Às minhas amigas – em especial a Adriana –, minha afilhada Isabella, e a

    Cynthia Amaral, que foram tão tolerantes com as minhas inúmeras desculpas em

    não poder encontrá-las em tantos momentos.

    Ao amigo Adão Ladeira e à professora e amiga Patrícia Mafili, que tanto me

    incentivaram desde o início dessa trajetória, e que acreditaram mais na minha

    capacidade do que eu mesma.

    Ao Eduardo, que me acompanhou durante toda essa trajetória, e que,

    incansavelmente mostrou-me os futuros ganhos desse projeto.

    Ao Professor Cláudio Paixão e à colega Heliete, que me acolheram e

    mostraram-se tão disponíveis em todos os momentos.

    À Marina Patrus, que, no momento de uma mudança em minha trajetória

    profissional, me incentivou, depositou confiança em meu trabalho, abriu as portas da

    sua empresa, para que eu pudesse não só realizar a minha pesquisa de campo,

    como também estabelecer com a Empresa X uma parceria profissional alicerçada

    pela relação de confiança.

  • RESUMO

    Esta dissertação teve como objetivo analisar os reflexos da confiança interpessoal

    no processo de mudança organizacional em uma empresa familiar. A inexorabilidade

    da inserção na nova economia e seus impactos trazem para tais empresas a

    necessidade de reinventar-se, uma vez que, no ambiente familiar as relações de

    confiança são muitas vezes mais valorizadas do que os resultados produzidos. Para

    tanto, escolheu-se uma empresa de transportes de cargas completas e fracionadas,

    onde, entre outras mudanças decorrentes desse contexto, iniciou-se o processo de

    profissionalização, a partir da segunda geração. Mudando-se os decisores, os

    critérios de afiliação e senso de “pertencimento”, bases da relação de confiança,

    também se alteraram. Este estudo investigou os reflexos da confiança interpessoal

    entre os membros da organização, através do estudo de caso em um contexto de

    profissionalização.

    Palavras-chave: Mudança Organizacional. Gestão de Pessoas. Confiança

    Interpessoal. Profissionalização da Empresa familiar.

  • ABSTRACT

    This dissertation has as objective analyzes the reflexes of the trust between people

    in the process of organizational change, in a family company. Among the several

    peculiarities the family atmosphere, they identify the trust relationships, that a lot of

    times are more valued that the own produced result. The general context of change

    brings for such companies the need of reinvent them own, mainly before the impacts

    of globalization and the obligation to be insert in the process of the new economy.

    One of the changes happened in that context was professionalization, adopted by the

    second generation. Moving the people that has the power of decision, the affiliation

    criteria and the sense of to be part of it, bases of the trust relationship, also has

    changed. It interests the researcher to verify which are the reflexes of trust among

    members of organization in a growth context and changes.

    Key-words: Change. People. Trust. Administration. Family company.

  • LISTA DE QUADROS

    Quadro 1: Contexto atual de mudanças e os impactos no ambiente de negócios........................................... ........................................................................ 20

    Quadro 2: Metáforas da Organização ................ .................................................... 21

    Quadro 3: Panorama conceitual sobre mudança organiz acional ....................... 30

    Quadro 4: Evolução dos Modelos de Mudança ......... ........................................... 32

    Quadro 5: As cinco perspectivas de mudança organiza cional ........................... 37

    Quadro 6: Ambiente de confiança e risco nas cultura s pré-modernas .............. 42

    Quadro 7: Evolução das definições de confiança e re spectivos enfoques ....... 47

    Quadro 8: A construção das relações de confiança .. .......................................... 49

    Quadro 9: Abordagem dos autores sobre confiança int erpessoal e organizacional. ................................... ..................................................................... 52

    Quadro 10: Perspectivas da confiança organizacional ....................................... 53

    Quadro 11: Elementos da confiança transacional e tr ansformadora ................. 56

    Quadro 12: Entrevistados da Pesquisa Empírica ..... ............................................ 72

  • LISTA DE FIGURAS

    Figura 1: Etapas da mudança – Modelo clássico de Le win ................................. 22

    Figura 2: As três características intrínsecas da mu dança .................................. 26

  • SUMÁRIO

    1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 11 1.1 Problema de pesquisa .......................... ............................................................ 12 1.2 Objetivo principal e objetivos intermediários . ................................................ 17 1.3 Delimitações do estudo ........................ ............................................................ 17

    2 REFERENCIAL TEÓRICO ............................. ........................................................ 18 2.1 Mudança organizacional ........................ ........................................................... 20 2.1.2 Categorias de Mudança Organizacional ....................................................... 31

    2.2 CONFIANÇA: CONCEITOS E ABRANGÊNCIA ............ .................................... 39 2.2.1 As bases para a construção das relações de co nfiança ............................ 48 2.2.2 Confiança organizacional e interpessoal ..... ................................................ 51 2.2.3 Confiança transacional .................................................................................. 56 2.2.4 Confiança transformadora ............................................................................. 64 2.2.5 Dimensões da confiança interpessoal ......................................................... 63 2.2.6 Desenvolvimento da confiança interpessoal ............................................... 64

    3 METODOLOGIA DA PESQUISA ......................... .................................................. 69 3.1 Aspectos metodológicos ........................ .......................................................... 69 3.1.1 Tipo de pesquisa ............................................................................................ 69 3.1.2 Unidade de análise, sujeitos e coleta de dados .......................................... 70 3.1.3 Tratamento dos dados ................................................................................... 72 3.2 Apresentação, caracterização da empresa pesquis ada e análise

    dos dados ......................................... ................................................................. 73 3.2.1 Apresentação e caracterização da empresa ................................................ 73 3.2.1.1 Empresa X: ontem e hoje . ........................................................................... 74 3.3 Análise dos dados ............................. ................................................................ 76 3.3.1 Caracterização dos entrevistados ................................................................ 76

    4 CONCLUSÕES, LIMITAÇÕES DA PESQUISA E RECOMENDAÇÕE S............... 93

    REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 96

    APÊNDICE A – CARTA CONVITE PARA OS ENTREVISTADOS .. ...................... 112

    APÊNDICE B – ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA DIRETORES, GERENTES E FUNCIONÁRIOS ................................................................................................. 114

  • 11

    1 INTRODUÇÃO

    O falecimento do seu fundador, em 2000, trouxe para os filhos o desafio de

    dar continuidade a esse empreendimento da empresa X, iniciado em 1973. Diante

    do novo cenário, a segunda geração entendeu que, a partir daquele momento, o

    caminho deveria ser trilhado com a presença de novos profissionais que, vindos do

    mercado, imprimiriam uma gestão mais autônoma e menos dependente dos laços

    familiares.

    Assim, tal decisão – particularmente pela idade dos sucessores – expressa um

    conjunto de pressupostos dos herdeiros acerca do fenômeno organização x família,

    que interessa ser investigado mais de perto, porque a passagem de um modelo de

    gestão para outro traz importantes questionamentos sobre a mudança da relação

    dos empregados com a empresa.

    As empresas familiares brasileiras além de oferecerem a possibilidade de

    maior absorção de mão-de-obra e geração de empregos, são responsáveis pela

    sustentação da economia e aquecimento do mercado. Também são as que mais

    sentem os reflexos da globalização. O conceito de empresa familiar adotado no

    presente estudo considera uma empresa como familiar quando um ou mais

    membros de uma família exerce considerável controle administrativo sobre a

    empresa, por possuir parcela expressiva da propriedade do capital, Lanzana (1999).

    Uma das mudanças mais significativas no contexto da profissionalização das

    empresas familiares diz respeito à relação de confiança. É fato conhecido – e

    apontado na literatura especifica – que a empresa gerenciada pelo seu fundador,

    geralmente, valoriza uma série de qualificadores, normalmente não muito

    enfatizados em organizações de múltiplos donos ou empresas de capital aberto.

    Entre esses qualificadores, podem-se citar a lealdade, o fato de o profissional ter

    crescido junto com a empresa, as relações de amizade e afeto, e mesmo o

    parentesco, os quais interferem no processo decisório. A relação de confiança é um

    desses expressivos qualificadores, valorizada pela empresa familiar quase como

    centro de suas decisões. No entanto, ao mudar o modelo de gestão, muda-se

    também essa relação, posto que esta se dá pessoa a pessoa. Mudando os atores

    organizacionais, rompem-se potencialmente os laços relacionais, necessitando cada

    pessoa de rever-se no contexto que se insinua pouco a pouco.

  • 12

    A definição do problema no presente estudo partiu da inquietação da

    pesquisadora em compreender as mudanças ocorridas na organização desde então

    e aprofundar-se na análise da confiança interpessoal a partir da profissionalização

    da sua gestão. Pettigrew (1990) afirma que o futuro da organização deve ser

    construído considerando-se seu passado, posto que os eventos de ontem delineiam

    o comportamento de hoje.

    Para o alcance do objetivo proposto, foram abordados conceitos e diferentes

    perspectivas associadas à mudança e à confiança interpessoal. Procurou-se

    investigar a forma de a organização encarar as mudanças e a maneira de as

    pessoas se comportarem diante de um ambiente dinâmico e incerto. Wood Jr.

    (2004) afirma que organizações de todos os tipos têm se deparado com cenários

    substancialmente modificados e significativamente mais dinâmicos que os

    anteriores, o que as tem feito buscar firmemente a adaptação a esses cenários. O

    autor afirma que as organizações têm, gradativamente, abandonado uma atitude

    reativa para assumir uma postura proativa em relação às mudanças. As

    organizações vêem-se compelidas a criar, desenvolver, tentar novas formas de agir

    e antecipar os movimentos do ambiente. Antes de responder às mudanças, deve

    existir um esforço de fazer a mudança.

    1.1 Problema de pesquisa

    Um levantamento inicial de dados sobre o cenário organizacional demonstra a

    relevância das empresas familiares. Estima-se que as companhias controladas por

    famílias representam 80% do universo empresarial, o que representa quase a

    metade do PIB mundial. (HSM MANAGEMENT, 2003, p.84-120).

    É impossível analisar a representatividade da empresa familiar, sem

    considerar algumas características peculiares, cujas complexidades variam de

    acordo com o porte da empresa e com as características da estrutura familiar. Com

    a expressiva representatividade no mercado, o desafio que se faz presente é o da

    continuidade. A falta de profissionalismo, o excesso de pessoas de confiança e a

    escassez de pessoas capacitadas e competentes, aliados ao conflito de interesses

    entre família e empresa, à falta de planejamento financeiro, à resistência à

  • 13

    profissionalização e à indefinição dos futuros dirigentes definem as principais causas

    de apenas 35% delas passarem para a segunda geração familiar e menos de 13%

    para a terceira geração. “As estatísticas informam que de cada cem empresas

    familiares fundadas no Brasil e no mundo, apenas trinta sobrevivem à segunda

    geração, quinze à terceira e quatro à quarta.” (HSM MANAGEMENT, 2003, p. 83).

    O estágio mais crítico nos processos de mudança das empresas familiares,

    segundo Ehlers (2004), é o da sucessão, pois há uma interferência direta de dois

    subsistemas de diferentes naturezas e interesses: família e empresa. Os valores que

    levam uma família a ser bem-sucedida não são, necessariamente, os mesmos que

    levam uma empresa ao sucesso.

    Durante a fase de criação da empresa, a participação familiar desempenha um

    papel fundamental, o que não se observa nas fases de crescimento e maturidade

    organizacional. Para Drucker (2002), três pontos são fundamentais para a

    continuidade de uma empresa familiar:

    1. Capacidade dos integrantes da família no mínimo igual a dos demais

    colaboradores.

    2. Capacidade de pelo menos um membro da família na gestão do negócio e

    aceitação dessa posição pelos demais membros.

    3. Com a única exceção das empresas familiares muito pequenas, o restante

    necessita, cada vez mais, de profissionais sem vínculo de sangue nos cargos

    essenciais.

    As mudanças profundas e em alta velocidade, tais como a redução do ciclo de

    vida dos produtos e serviços, os avanços tecnológicos, a gestão da cadeia de

    fornecimento, entre outros, anunciam constantes modificações no mundo dos

    negócios e atingem as empresas familiares de maneira mais intensa do que em

    outros tipos de estabelecimentos. Aquino (2002) afirma que as mudanças rápidas

    são mais assustadoras para empresas familiares, muitas vezes por viverem

    “engessadas” em suas tradições, por adotarem uma cultura que privilegia a

    estabilidade, ou, então, pelo paternalismo que rege as suas relações: seus

    proprietários em geral são avessos a riscos e os sucessores hesitam em desafiar a

    filosofia ou o estilo de gestão vigente.

  • 14

    O processo de mudança pelo qual as empresas têm de passar para alcançar

    sucesso e amadurecimento no mercado se traduz no diferencial entre as empresas

    familiares que fracassam e as que triunfam. Assim, é necessário um processo de

    “desaprendizagem”, ou seja, o abandono de antigas formas de pensar e agir,

    ancoradas no passado, e a instalação de uma cultura orientada para as mudanças,

    o que não significa sacrificar valores familiares. Pádua (2004) destaca que toda

    empresa familiar deve estabelecer, implementar e controlar as suas diretrizes e

    estratégias apoiadas em um modelo de gestão formalizada, em decisões mais

    racionais, em um quadro de recursos humanos competente, e, ainda, em um

    programa de ações minimizadoras de conflitos entre a família e a empresa. Ainda

    afirma que os processos de formalização das atividades de planejamento,

    organização, direção, controle das ações organizacionais e da inserção de membros

    da família nesse processo possibilitam a familiarização com o negócio e o

    aprendizado necessário para ampliar significativamente as possibilidades de

    crescimento da empresa familiar.

    Segundo Altrão (2001), a necessidade do empreendedor gira em torno de

    aceitar o fato de que as empresas não são criadas para viverem enquanto durar a

    vida das pessoas que interagem com elas, mas para continuarem os seus objetivos,

    independentemente de as pessoas envolvidas serem outras. Para evitar a excessiva

    influência da vida das pessoas sobre a vida das empresas e como ninguém é

    insubstituível neste processo, é indispensável que a empresa tenha vida e alma

    próprias. Por possuírem interesses, na maioria das vezes imediatos, acarretam o

    que Bernhoeft (2004) chama de “miopia mercadológica”, pelo fato de não se

    prepararem para o futuro, perdendo, assim, oportunidades de mercado.

    No que se refere ao mundo empresarial, independentemente de sua

    composição familiar, Zanini (2007) afirma que a transição do industrialismo para o

    informacionismo passou a exigir estruturas organizacionais descentralizadas e

    flexíveis, capazes de oferecer rápidas respostas às constantes mudanças

    institucionais. Isso significa basicamente "achatar" as estruturas burocráticas ou

    horizontalizá-Ias, criando unidades com maior autonomia. Na prática, o autor afirma

    que o desafio atual dos gestores é oferecer respostas e soluções ao exercício da

    flexibilidade organizacional, sem perder os ganhos de coordenação das tradicionais

    burocracias.

  • 15

    Na concepção do autor, flexibilizar significa aumentar a autonomia, reduzir o

    controle e a monitoração formal, concedendo mais poder de decisão aos níveis

    gerenciais inferiores, ou seja, será preciso implantar uma gestão orientada por

    princípios, em que a confiança nas pessoas e em suas competências será

    diferencial.

    As empresas deverão adotar como princípios orientadores de ações

    individuais e coletivas mecanismos cada vez mais informais de coordenação e

    motivação. Na visão de Senge (2001), o comprometimento compartilhado para a

    mudança só pode ser desenvolvido se tiver uma capacidade coletiva de gerar

    aspirações compartilhadas. As pessoas só começam a discutir as questões

    “indiscutíveis”, quando começam a desenvolver habilidades de reflexão e indagação

    que lhes permitam falar abertamente sobre questões complexas e conflitantes, sem

    assumir uma atitude defensiva. Morgan (2002) afirma que as organizações, para

    aprender e mudar, precisam estar preparadas para questionar e mudar as regras

    básicas do jogo.

    Ao se juntarem duas grandes referências: a necessidade de delegação para a

    sobrevivência da empresa familiar e a necessidade de horizontalização das

    empresas de modo geral, o desafio torna-se maior, posto que tais requerimentos

    exigem decisões que colidem, muitas vezes, com os valores da empresa familiar,

    entre os quais os da relação de confiança.

    O presente estudo está voltado para a compreensão das relações de

    confiança interpessoal diante das mudanças organizacionais, no contexto de

    profissionalização da empresa familiar. O trabalho envolve conceitos de mudança

    organizacional e confiança interpessoal, na tentativa de articulá-los teórica e

    empiricamente.

    A escolha da pesquisadora em optar pelo setor de Transporte Rodoviário de

    Cargas (TRC) para a aplicação da pesquisa de campo deveu-se os seguintes

    aspectos:

    1. Posição expressiva que o segmento de TRC ocupa na economia nacional – o

    transporte é definido como o termômetro da economia, o que faz a atividade

    ter alto impacto no contexto econômico global. Ter demanda de transporte

    significa que o país está produzindo, consumindo e, conseqüentemente,

    crescendo economicamente. É importante dar destaque às dimensões

  • 16

    continentais do país, em que outros modais, como o aéreo, ferroviário e

    pluvial ainda têm participação pequena no volume anual transportado,

    absorvido fortemente pelo transporte rodoviário.

    O segmento de transporte rodoviário de cargas responde por mais de um

    terço da receita do segmento de transportes, serviços estes que geraram

    R$97,5 bilhões de receita, em 2006, e R$90,6 bilhões, em 2005. Entre esses

    serviços, um dos destaques foi a atividade de transporte rodoviário1 (de

    cargas e de passageiros), responsável por 66,0% da receita do segmento de

    serviços de transportes, em 2006. Os serviços de transporte rodoviário de

    cargas representaram 37,0% da receita do setor de transportes, em 2006,

    percentual acima dos 35,2% observados, em 2005. O crescimento da Patrus2

    de 2004 para 2006 foi de 72,2%, com um crescimento anual de 31,2%.

    2. Contexto de transição do modelo de gestão familiar para o modelo de gestão

    profissional – tal diretriz definiu mudanças que impactaram diretamente a

    cultura organizacional, as estratégias e o comportamento das pessoas.

    3. Acesso à empresa, através da consultoria de prestação de serviços iniciada

    pela pesquisadora em janeiro de 2008.

    1 Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, publicado em 30 de julho de 2008, pesquisa anual de serviços – 2005 e 2006. 2 Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, publicado em 30 de julho de 2008, pesquisa anual de serviços – 2005 e 2006.

  • 17

    1.2 Objetivo principal e objetivos intermediários

    Com a finalidade de responder à questão-problema, elaborou-se o objetivo

    geral, qual seja: compreender os reflexos da confiança interpessoal no processo de

    mudança, em uma empresa familiar, no segmento de transporte rodoviário de

    cargas completas e fracionadas.

    Partindo do problema de pesquisa e do objetivo principal, emergiram os

    seguintes objetivos intermediários:

    1. Analisar mudanças bem e mal sucedidas no processo de profissionalização,

    para que, com base nesses resultados, possam ser sugeridas ações futuras.

    2. Analisar as conseqüências das mudanças nas relações de confiança

    interpessoal.

    Esta dissertação foi estruturada em cinco capítulos. Nesse primeiro,

    desenvolveu-se a introdução. No capítulo 2, a primeira seção trata da mudança

    organizacional; a segunda discute confiança interpessoal. No capítulo 3, é

    apresentada a metodologia aplicada na pesquisa empírica. O capítulo 4 apresenta e

    discute os dados da pesquisa. No capítulo 5, encontram-se as conclusões finais.

    1.3 Delimitações do estudo

    O presente estudo pretendeu identificar as correlações da confiança

    interpessoal no processo de mudança vivenciado pela organização. Portanto,

    estruturou-se em torno de duas temáticas: mudança organizacional e confiança

    interpessoal. Embora se reconheça que tal mudança se dá em uma empresa

    familiar, este tema não foi tratado, por se constituir referencial já bastante explorado.

    No que tange ao referencial “relação de confiança”, é importante destacar que os

    estudos sobre o tema são recentes no Brasil, sendo o Grupo de Estudos Avançados

    em Comportamento Organizacional (GEACO) um dos pioneiros, o que justifica o

    recorte feito nesta pesquisa.

  • 18

    2 REFERENCIAL TEÓRICO

    O acelerado desenvolvimento científico e tecnológico tem provocado a ruptura

    de modelos tradicionais de gestão empresarial, e o final do século XX pode ser

    relacionado a uma palavra-chave: mudança. (TAPSCOTT; CASTON, 1995).

    Hoje se tornou lugar comum afirmar que a economia, os processos de fusões,

    aquisições e internacionalizações intensificam a interdependência e o grau de risco

    enfrentados pelas organizações. Em resposta a essas mudanças, vem se

    estruturando um novo modelo organizacional, construído sob o enfoque

    interdisciplinar, que engloba cultura, valores, conceitos de gestão, estratégia,

    processos, sistemas de informação, tecnologia e arquitetura humana. Hitt (2003)

    afirma que o modelo administrativo tradicional não seria capaz de conduzir uma

    empresa à competitividade estratégica diante desse novo cenário.

    Para atingir a sobrevivência, Prahalad e Hammel (1995) reforçam a

    necessidade das empresas de se adaptarem às novas realidades, chegando ao

    ponto de reinventar os seus próprios ambientes. Foi nesse contexto que se instalou

    um ambiente de contínuas mudanças, seja pela implantação dos processos de

    reengenharia, downsizing, terceirização, formação de parcerias e alianças

    estratégicas, ou pelas arquiteturas organizacionais, de modo particular, pela

    emergência das empresas-rede, que atuam em conjunto dentro de uma determinada

    cadeia de valor.

    Na sociedade global, nenhuma empresa deixou de ser afetada por esse novo

    ordenamento no campo dos negócios. Mesmo as sociedades limitadas, de controle

    familiar, viram-se na contingência de alterar o seu modo de funcionar no

    alinhamento das pessoas com as estratégias de negócio, na implantação de

    decisões que, na maioria das vezes, afetam as relações profissionais e os contratos

    psicológicos (ROUSSEAU, 1998), historicamente construídos entre as pessoas e a

    organização. O núcleo de tal contrato (psicológico) constitui-se exatamente na

    relação de confiança, mantida ou violada segundo a evolução das partes envolvidas.

    A mudança organizacional planejada exige, pois, um conjunto articulado de

    ações que colocam o fator humano como centro e alvo simultâneo das decisões.

    Wood Jr. (2000) entende que o processo de mudança pode e deve ser gerenciado

    segundo alguns critérios e premissas. O autor afirma que o grande desafio das

  • 19

    organizações não é a mudança tecnológica, mas a mudança da cultura

    organizacional e das pessoas, que necessitam renovar os seus valores para ganhar

    vantagem competitiva.

    O tema “cultura organizacional”, além de polissêmico, engloba um conjunto de

    construtos que não foram desenvolvidos neste trabalho. Adotando-se a perspectiva

    de Schein (1991), foi feito um recorte no papel das relações pessoais na construção

    da cultura. Embora não seja abordado o tema da cultura, Schein (1991) induz à

    reflexão sobre o impacto das mudanças nos valores tradicionais de uma dada

    organização, sobretudo quando a tipologia da mudança está relacionada com a

    reconfiguração do poder e, portanto, das relações de confiança.

    É difícil imaginar uma empresa que, de algum modo, em algum lugar, não se

    sustente em algum tipo de confiança (BENNIS; NANUS, 1998, p. 37), associada por

    muitos estudiosos à melhoria do clima e da satisfação organizacionais (CONDREY,

    1995), ao aumento de performance dos aspectos financeiros e mercadológico

    (SAKO, 2000; KRAMER, 1999; ZAHEER et al, 1998).

    O termo confiança pode ser relacionado a diferentes perspectivas, portanto o

    significado da palavra confiança deve ser interpretado em função dos campos

    abordados. No senso comum, o substantivo abstrato "confiança" refere-se à crença

    na probidade moral e nas qualidades de outrem, às expectativas otimistas quanto à

    realização de uma missão por parte do depositário da confiança, e também às

    características pessoais, tais como credulidade, autoconfiança, atrevimento e

    petulância (FERREIRA, 1999).

    Lewicki et al, (2003) apresentam três elementos que contribuem para o

    estabelecimento da relação de confiança: a predisposição para confiar no outro

    (característica de personalidade); o contexto; e a relação entre as partes. Quando

    as pessoas confiam umas nas outras, elas ficam propensas a comunicar com

    precisão as posições e os fatos da situação. Contrariamente, quando as pessoas

    não confiam umas nas outras, é provável que elas adotem posições rígidas. Com a

    posição defensiva, a desconfiança provavelmente será recíproca e conduzirá a um

    esforço improdutivo. Portanto, é possível observar que mudança e confiança são

    processos complexos, dinâmicos e contínuos, pois envolvem percepção, interação,

    entendimento do contexto cultural, conflitos de interesses, ameaças, oportunidades,

    entre outros.

  • 20

    2.1 Mudança organizacional

    O cenário atual do ambiente de negócios retrata a ocorrência de mudanças

    cada vez mais persistentes e velozes. Neste fim de século, tais mudanças (sociais,

    econômicas, políticas e tecnológicas) originam incertezas, que, a todo instante,

    desafiam a capacidade de adaptação das organizações. (Harari, 1991; Herzog,

    2001; Land & Jarman, 1981; Handy,1995; Want, 1986; Peters, 2001;

    Schonberger,1988; Helfgott, Naisbitt & Aburdene, 1986; Basil & Cook, 1974).

    Vergara (2000), utilizando-se dessas fontes introduziu as seguintes reflexões:

    Contexto atual de mudanças Impactos no ambiente de negócios

    • Acelerado desenvolvimento tecnológico

    • Impacto significativo da tecnologia da informação

    • Novas formas de trabalho. • Grande diferenciação de produtos e serviços. • Ênfase em serviços adicionais. • Mudanças no fluxo e tratamento de informações.

    • Competição no mercado globalizado

    • Novas relações com fornecedores e concorrentes

    • Orientação para um mercado global e economia sem fronteiras

    • Relevância da ética, parcerias e alianças.

    • Elevado nível de exigência dos clientes

    • Visão e ação estratégica de todos os membros, com orientação para resultados.

    • Orientação para aprendizagem organizacional e gestão do conhecimento.

    • Gestão de pessoas por competência (desemprego x oferta de emprego – para pessoas detentoras de certas habilidades e informações).

    • Maior alinhamento de diretrizes para todos os níveis da organização.

    • Pressões da sociedade em geral • Recursos cada vez mais escassos. • Exercício da responsabilidade social e ambiental. • Crescente consciência ecológica.

    • Mudanças difundidas, persistentes e velozes

    • Estruturas organizacionais flexíveis. • Novo perfil de competências do gestor. • Ênfase em equipes multifuncionais e

    autogerenciadas.

    • Empregado com maior autonomia para decidir. • Mudanças de estilo de vida.

    Quadro 1: Contexto atual de mudanças e os impactos no ambiente de negócios Fonte: VERGARA, 2000 (Adaptação)

  • 21

    O contexto de mudanças do mundo contemporâneo traz novas necessidades,

    e isso demanda novas maneiras de organizar o trabalho para conseguir lidar com tal

    complexidade. Morgan (1996) afirma que a organização não deve se mostrar inerte

    frente aos acontecimentos e não dispor de estratégias capazes de prepará-la para

    os desafios da sociedade pós-industrial. O autor comenta que cada vez mais as

    organizações devem autodesenvolver e sofrer mutações para poderem existir. Elas

    devem comportar-se como um sistema aberto, realizando uma troca constante com

    o ambiente e relacionando-se apropriadamente com este para poderem sobreviver.

    É o tipo de organização orgânica, que busca a sobrevivência dentro de seu

    ambiente. Mas apenas relacionar-se com o ambiente adaptando-se a ele não parece

    ser satisfatório, pois a organização somente desenvolveria um papel periférico e

    contingencial. Essa perspectiva de fora para dentro não é suficiente, já que o

    ambiente externo altera-se; a organização precisa evoluir internamente, criando

    novas formas de autodesenvolvimento.

    O autor utiliza metáforas do funcionamento do cérebro, do organismo e das

    máquinas e as compara com o funcionamento das organizações.

    Organizações vistas como Máquinas

    Organizações vistas como Cérebros

    Organizações vistas como Organismos

    Segundo Max Weber, a organização burocrática enfatiza a precisão, a velocidade, a clareza, a confiabilidade e a eficiência atingidas através da divisão rígida de tarefas, supervisão hierárquica e regras e regulamentos detalhados. Essa imagem traduz o paradigma taylorista-fordista, que rapidamente influenciou as organizações e ainda hoje é praticado em larga escala.

    São mencionadas duas imagens para as organizações como cérebros. A primeira é a das organizações como sistemas de processamento de informações, que ajuda no impacto das informações. A segunda imagem é a da organização como hologramas, ou seja, fazer o todo em cada parte, criar conectividade e redundância, gerar especialização, generalização e auto-organização simultaneamente.

    Imagem ligada à Escola de Relações Humanas, Teoria dos Sistemas, Teoria da Contingência e à Visão da Ecologia Organizacional. Tais correntes elucidam a importância das relações entre a organização e seu meio, a importância da inovação e a questão da sobrevivência como objetivo central. Permite entender a harmonia entre a estratégia, a estrutura, a tecnologia e as dimensões humanas.

    Quadro 2: Metáforas da Organização Fonte: MORGAN; GARETH, 1996

    Para complementar as metáforas, Morgan enfatiza o holofluxo, o

    holomovimento, para decifrar as relações interativas entre a organização e seu

    ambiente. O conceito de mudança como fluxo é reforçado pelo autor como caráter

    permanente de transformação. Além disso, trata-se de uma visão que enfatiza a

  • 22

    idéia de que a organização é distinta de seu ambiente, como se ela também não

    pudesse influenciá-lo. Revela-se uma abordagem darwinista, pois enfatiza que

    aqueles que não se adaptarem morrerão, e os que obtiverem a adaptação

    sobreviverão (GREY, 2004).

    Lewin (1981), em seu modelo clássico, descreve três etapas para que a

    mudança possa ser bem-sucedida na organização. A fase inicial de

    descongelamento é crítica, por ser um momento em que os focos, a intensidade e as

    causas da resistência às propostas de mudança irão aparecer. O status quo é

    considerado um estado de equilíbrio. Para mudá-lo, é necessário que ocorra uma

    ação, que consiste no aumento das forças impulsionadoras da mudança ou na

    eliminação das forças restritivas, ou mesmo na combinação das duas. A fase do

    descongelamento tem como principal meta identificar as forças que mantêm o atual

    status quo, revelando quais delas são mais fortes (ou mais fracas) e mais fáceis (ou

    mais difíceis) de mudar. O novo padrão de comportamento é consolidado a partir da

    estabilização ou do equilíbrio de forças. No segundo momento, a mudança envolve a

    intervenção na situação, a fim de mudá-la, objetivando a alteração do antigo status

    quo. Nessa fase, novos pressupostos são desenvolvidos por meio da geração de

    aprendizado a partir de reflexão, experimentação e questionamento das regras

    vigentes e que tragam conforto e redução de ansiedade para os membros da

    organização.

    Estágio desejado Tempo

    Diminuição de forças restritivas

    ___status quo___ (equilíbrio)

    Aumento de forças propulsoras

    Figura 1: Etapas da mudança – Modelo clássico de Le win Fonte: BRETAS, 1991 (Adaptação)

    1. Descongelamento do status quo

    2. Movimento 3. Recongelamento

  • 23

    O recongelamento pode ser obtido pelo reforço dos resultados e benefícios

    obtidos pelos movimentos efetivados e pelo reconhecimento da participação das

    pessoas no processo de mudança, ou seja, a evolução cultural, em que os novos

    conceitos e a nova maneira de lidar com o ambiente são consolidados e os novos

    pressupostos desenvolvidos passam a ser aceitos e compartilhados.

    Schein (1991) afirma que a mudança não acontece enquanto o sistema não é

    descongelado e que a mudança não dura enquanto o sistema não é recongelado.

    Na concepção do autor, o processo mais importante e de maior dificuldade é o

    descongelamento, que é onde se cria a motivação para mudar. Ele é feito através da

    alteração das forças que agem no sistema atual. A essência de um processo de

    descongelamento efetivo é um balanço entre a desconfirmação capaz de estimular

    um nível ótimo de ansiedade ou culpa, sem que estimule demais a aprendizagem de

    ansiedade, pois isso pode ser danoso ao causar repressão, projeção ou outros

    mecanismos de defesa. A desconfirmação que Schein (1991) menciona diz respeito

    aos pressupostos básicos que servem de premissa para a resolução de problemas e

    que passam a ser questionados. O descongelamento tem como objetivo motivar o

    alvo da mudança a procurar novas soluções que trarão de volta o equilíbrio e

    produzirão informações que confirmem que tudo está fluindo bem. Quando alguém é

    descongelado, este provavelmente prestará mais atenção a informações, idéias,

    sugestões ou até mesmo a orientações que antes eram ignoradas. As pessoas

    tornam-se solucionadoras de problemas, porque elas estão desconfortáveis e

    motivadas a mudar (SCHEIN, 1991).

    Por outro lado, Antonello (2004) questiona essa noção de equilíbrio, pois, se a

    afirmação corrente é que, em anos mais recentes, as organizações passaram a

    experimentar níveis sem precedentes de turbulência em seus ambientes, como seria

    possível descongelar, congelar e recongelar as organizações?

    Grey (2004, p. 18) diz que, apesar de forças e congelamento, as pessoas não

    agem da mesma forma que os átomos na água; agem de formas tanto imprevisíveis

    quanto – mais importante – sujeitas a mudanças deliberadas e intencionais por parte

    dos indivíduos interessados.

    De acordo com Cummings (2004), esse estágio envolve tornar as mudanças

    parte permanente do funcionamento da organização, reequilibrando as forças

    atuantes, tornando-as relativamente estáveis. Segundo o autor, o modelo adotado

    por Schein (1984) parte da premissa de que os alvos da mudança e os processos

  • 24

    sociais adjacentes são relativamente estáveis, já que tanto as forças que buscam a

    mudança quanto as que têm resistência a ela são equivalentes.

    Apesar de Schein (1986) afirmar que sua proposta, baseada na seqüência

    descongelamento, mudança e recongelamento, possa ser utilizada em mudanças do

    tipo revolucionárias, não-planejadas, imprevistas e inesperadas, é necessária uma

    grande capacidade de adaptação, flexibilidade e de uma cultura preparada para lidar

    com mudanças. Weick e Quinn (2004) comentam que, se uma organização deparar-

    se com um momento de inércia, faz sentido que ela utilize esse tipo de intervenção,

    ou seja, o modelo proposto deve ser usado para iniciar um processo de mudança,

    quando a estabilidade é criada. Fischer (2002) propõe um modelo de intervenção

    baseado em quatro etapas: auscultação, concepção, disseminação/adesão e

    sustentação. A primeira etapa, auscultação, busca o levantamento e as análises de

    dados que ajudam a identificar as características dos processos de trabalho, os

    fluxos de comunicação e a interação entre as diferentes áreas organizacionais, com

    o objetivo de determinar os fatores restritivos e alavancadores da eficiência dos

    procedimentos e da eficácia dos resultados das práticas administrativas, técnicas e

    gerenciais em uso na organização. Na segunda etapa, concepção, há a

    representação da transição entre a constatação de problemas, carências e

    necessidades de aperfeiçoamento técnico e gerencial e a construção de uma forma

    exeqüível de conceber e implementar as mudanças e os aperfeiçoamentos de curto

    e médio prazo. A terceira etapa, disseminação, visa à difusão de objetivos e

    estratégias para os diferentes atores organizacionais, o emprego de sistemas e

    instrumentos de gestão para promover a mudança, a absorção e a internalização de

    objetivos e estratégias, a identificação de aspectos que facilitam ou inibem o

    processo, entre outros objetivos, cuja intenção é consolidar a mudança. Por último, a

    etapa de sustentação tem o propósito de efetuar o monitoramento e a avaliação das

    ações e dos rumos do processo. Fischer (2002) diz ainda que a mudança tem de ser

    conceituada, concebida e gerenciada como um processo de transformação contínua,

    assim como Weick e Quinn (2004) defendem a idéia da continuidade da mudança.

    Nesse caso, uma melhor seqüência seria: congelamento, rebalanceamento e

    descongelamento. Os autores afirmam que congelar a mudança contínua é fazer

    uma seqüência visível e mostrar modelos do que está acontecendo, através dos

    significados de mapas cognitivos, esquemas ou histórias de guerra; rebalancear é

    reinterpretar, redesenhar e refazer a seqüência de modelos, reestruturando

  • 25

    questões, reinterpretando histórias etc. Finalmente, o descongelamento após o

    rebalanceamento é a retomada da improvisação, tradução e aprendizagem em

    maneiras que deixem as seqüências mais claras, mais resilientes a anomalias e

    mais flexíveis em sua execução.

    Se, por um lado, existem os autores que defendem o gerenciamento da

    mudança, por outro, existem pesquisadores afirmando que a mudança não pode ser

    tratada de forma mecanicista, já que a complexidade, a ambigüidade e a incerteza

    envolvidas nesse processo fazem com que seja cada vez mais difícil a elaboração

    ou utilização de formas de intervenção baseadas em congelamento, mudança e

    descongelamento ou outros tipos de variações de intervenções visando ao

    gerenciamento da mudança.

    Um importante contraponto para esse tema pode ser identificado nas idéias de

    Grey (2004), que questiona os pressupostos e práticas existentes no campo da

    mudança organizacional. Para ele, há uma parcialidade na visão de que se vive em

    tempos de mudanças, refletindo a miopia em que as ciências organizacionais estão

    imersas.

    Mudança prevê um tipo de meta-narrativa em muitos discursos sobre gestão e sobre organizações – um tipo de raciocínio e pressupostos que provêm uma justificativa explícita ou implícita para programas específicos de mudança. Tão onipresente é a invocação da mudança na recente literatura sobre gestão e organizações, e tão crucial é nas afirmações que a acompanham, que parece razoável descrevê-la como fetiche (GREY, 2004, p. 111-12).

    Acompanhando essa reflexão, Grey (2004) denuncia a necessidade de se

    adotarem “soluções” homogêneas para os problemas organizacionais como uma

    questão inevitável no discurso e na prática do gerenciamento da mudança,

    incorrendo no equívoco de generalizar o posicionamento adotado, inclusive na

    gestão em geral.

    As panacéias mais usuais para evitar a resistência e o fracasso na

    implementação da mudança são a liderança forte e a consultoria. Também, a partir

    da noção de que talvez não seja mais possível obter o equilíbrio constante via

    congelamento, pode-se contar com outras abordagens – além daquelas que visam

    ao gerenciamento da mudança para leitura, compreensão e intervenção nos

    processos de mudança nas organizações –, uma delas é a análise das narrativas.

  • 26

    Considerando-se que as mudanças organizacionais estão em interação

    dinâmica com pessoas que nela atuam, cabe apresentar as principais características

    intrínsecas da mudança, para, posteriormente, entender os tipos de mudanças nas

    organizações.

    Figura 2: As três características intrínsecas da mu dança Fonte: PEREIRA, 1998

    A primeira característica da mudança se traduz pela sua inexorabilidade, ou

    seja, ela acontece sempre, independentemente da nossa ação. Geralmente os que

    propõem a mudança sentem-se motivados, eufóricos, enquanto os menos

    informados e mobilizados sentem medo, desconfiança, resistem ou temem

    conseqüências negativas (PEREIRA, 1998). As inabilidades na condução dos

    processos de mudança comprometem o envolvimento das pessoas e geram

    tensões.

    Os conflitos gerados pela mudança são caracterizados por um misto de

    expectativas positivas e receios em relação ao próprio indivíduo, ao seu trabalho e à

    organização. Toffler (1980) afirma que as pessoas não estão preparadas nem física

    nem psicologicamente para absorver os efeitos das mudanças rápidas que

    caracterizam a nossa era. Segundo o autor, ou as pessoas estressam, ou negam as

    mudanças que as atingem. A segunda característica da mudança é a ambigüidade,

    que consiste em um conflito entre a necessidade de mudar e o apego à estabilidade.

    Para amenizar esse conflito, tanto as pessoas quanto as organizações precisam

    encontrar um equilíbrio entre a estabilidade e a mudança, aprendendo a reconhecê-

    las e aceitá-las. A ambigüidade é manifestada nos seres humanos através da

    ansiedade ou da crise. A ansiedade é um estado emocional com componentes

    psicológicos e fisiológicos, que faz parte do espectro normal das experiências

    humanas, sendo propulsora do desempenho. Ela funciona como um combustível

    para a mudança e pode ser considerada como uma força propulsora, capaz de

    1. Inexorabilidade 2. Ambigüidade 3. Perda

  • 27

    vencer a inércia e deflagrar o esforço de adaptação. Não é necessariamente

    negativa. Sem ansiedade, não há motivação e esforço. A crise, como expressa o

    ideograma chinês, contém a própria essência da ambigüidade, pois pode significar

    risco, oportunidade, sucesso, fracasso, morte ou semente. A terceira característica

    intrínseca da mudança consiste na perda. Não é possível transitar de um estado a

    outro sem renunciar a alguma coisa, e mesmo que a mudança tenha conseqüências

    positivas, ela implica perdas.

    Há autores que tratam a mudança como algo gerenciável, pois a

    transformação não pode ocorrer de forma imprevista, não planejada, mas

    administrada e modelada com ferramentas e instrumentos que proporcionem sua

    internalização de forma profunda dentro da organização (FISCHER, 2002). Outros

    afirmam que não se deve dar ênfase meramente à mudança como uma relação de

    causa e efeito, mas focar-se nos significados, símbolos e valores nas interações

    humanas e no caráter interpretativo pelo qual as organizações escolhem e

    estruturam o seu ambiente. Entre as diversas abordagens existentes que tratam do

    processo de mudança organizacional do tipo gerenciável, entre outros, o mais

    difundido é o modelo proposto por Schein (2002), segundo o qual existem três tipos

    de mudança que ocorrem em todos os grupos humanos e organizações:

    a) Mudanças evolucionárias naturais: referem-se à miríade de processos de

    aprendizagem que ocorrem dentro de uma organização e ao esforço que suas

    partes fazem para se adaptar às mudanças ambientais.

    b) Mudanças planejadas e administradas: são previstas e geralmente feitas de

    dentro para fora.

    c) Mudanças revolucionárias não-planejadas: são imprevistas e inesperadas.

    Para lidar com elas, é necessária uma grande capacidade de adaptação,

    flexibilidade e de uma cultura preparada para lidar com mudanças.

    Num ambiente pouco previsível, essa ambigüidade é cada vez mais recorrente

    e, progressivamente, os pressupostos compartilhados começam a não ter mais os

    aspectos positivos que sempre tiveram, ou seja, a cultura começa a se transformar.

    Nessa perspectiva, uma organização que tem como meta ser bem-sucedida e que

    vise alcançar evolução sustentável em ambientes competitivos precisaria optar por

  • 28

    estar voltada para a mudança. Buscaria isso através de processos de

    aprendizagem, conseguindo, dessa maneira, as transformações necessárias para

    alcançar esse objetivo. Essa organização teria de abandonar certos pressupostos

    arraigados e dar espaço para que novos conhecimentos sejam absorvidos. A

    mudança apresenta-se como algo inevitável. Devem ser desenvolvidas habilidades

    e posturas que aceitem a mudança ambiental como uma norma, além de serem

    capazes de detectar sinais precoces que indiquem mudanças de tendências e

    padrões. (MORGAN, 2002).

    Porém, identifica-se que são escassos os estudos que, ao associarem

    mudança organizacional e aprendizagem, procuram explicar “como as organizações

    absorvem as visões e opiniões que são imbuídas ideológica e institucionalmente e

    as transformam em práticas e rotinas”. (RODRIGUES et al, 2004, p.28). Para Argyris

    (2002), é importante dar suporte às pessoas no processo de mudança e

    aprendizagem; examinar como elas pensam sobre o seu comportamento e procurar

    novas formas mais efetivas de maneira a quebrar as resistências que as bloqueiam.

    O aprendizado de circuito duplo, para ser bem-sucedido, necessita de uma

    cultura que encoraje assumir riscos e promover mudanças, aceitando que problemas

    e erros são inevitáveis. Esses erros podem, muitas vezes, ser um recurso para um

    novo aprendizado. Isso traz incerteza e ansiedade, mas só lidando com esses

    fatores, mesmo que tragam certos desconfortos inicialmente, novos padrões de ação

    poderão surgir (MORGAN, 2002).

    A resistência de uma organização para mudar face às pressões ambientais e

    à incerteza é um fenômeno para o qual são oferecidas diversas possíveis

    interpretações e soluções. Por um lado, a abordagem popular e amplamente

    discutida para esse problema é a sugerida por Schein (1992), que diz que a raiz do

    problema é a cultura da organização, que causa resistência, e esta precisaria mudar.

    Por outro lado, autores como Grey (2004, p. 20) apontam que perceber a resistência

    como uma resposta defensiva a uma mudança necessária “é entregar-se à fantasia

    de competência ilimitada dos executivos”. Isso porque há uma tendência em utilizar

    modelos que generalizam a mudança, associados ao que se denominou

    “psicologismos”, uma tentativa de explicar o “medo” da mudança.

    Ao abordar o tema mudança organizacional, Basil e Cook (1974) destacam a

    mudança estrutural-institucional, a tecnológica e a sociocomportamental. Na

    concepção desses autores, tais mudanças geram impacto sobre o indivíduo, sobre

  • 29

    as organizações e sobre a geopolítica, pois elas interagem, de modo a formar uma

    mudança ainda maior, com um efeito cada vez mais difuso sobre o homem, sua

    vida, suas organizações e suas instituições. Por outro lado, a gestão na mudança

    implica administrar os elementos fundamentais: estratégia, estrutura, tecnologia,

    indivíduos e processo, de forma a obter sinergia para enfrentar a turbulência

    ambiental e alcançar os objetivos organizacionais. Wood Jr., Curado e Campos

    (1995, p.190) entendem que Mudança Organizacional "... é qualquer transformação

    de natureza estrutural, estratégica, cultural, tecnológica, humana ou de qualquer

    outro componente, capaz de gerar impacto em partes ou no conjunto da

    organização". Percorreu-se vários conceitos para identificar as múltiplas visões dos

    autores sobre mudança organizacional como mostra o quadro 3.

    Autores Múltiplas visões e conceitos de mudança org anizacional

    Land e Jarman (1981)

    Desenvolvem uma tipologia para os ciclos da mudança, através de três fases. Na primeira fase o sistema descobre a si próprio e a seu mundo, organiza-se e cria um padrão de comportamento. Na segunda fase ocorre a regulamentação, ou seja, o crescimento acontece por repetição do padrão e negação da diferença. Na terceira fase acontece a integração. O sistema ultrapassa a eficiência de seu padrão repetitivo. Para continuar a crescer, reduz a rigidez do padrão e a força de seus vínculos internos, passando por uma fase de ruptura, abertura e inovação.

    Deal e Kennedy (1982)

    A mudança se tornou um modo de vida para as organizações. Elas não mudam mais apenas para adequar-se ao ambiente ou à tecnologia, mas porque se espera que elas mudem. A cultura protege a organização dos modismos e flutuações de curto termo. A mudança é necessária quando ocorrem grandes perturbações ambientais e mudar torna-se uma questão de sobrevivência.

    March (1981) e Kanter (1984)

    Exploram as bases para a mudança. Os conceitos e visões que dirigem as mudanças devem basear-se nas tradições e pontos fortes da organização. Além disso, há de se considerarem no processo todos os aspectos conceituais, culturais e intelectuais envolvidos. As organizações estão continuamente mudando, mas essas mudanças não podem ser arbitrariamente controladas. Na realidade, a maior parte das mudanças ocorre simplesmente como resposta a alterações do meio ambiente.

    Waterman (1987) As organizações devem buscar a convivência feliz com a mudança, que, em sua visão, deve fazer parte do seu quotidiano. O fator renovação é destacado como o ponto central para a sobrevivência nas empresas.

    Peters (1989)

    O autor menciona duas estratégias conhecidas para enfrentar o ambiente turbulento: a primeira é a de compra de venda da empresa e a segunda é enfrentar as incertezas através de uma qualidade de classe universal, com inovações de curto prazo e flexibilidade.

    (continua)

  • 30

    (continua)

    Ginsberg e Bucholtz (1990)

    Analisam duas linhas de pensamento sobre a natureza das mudanças. Os teóricos da adaptação racional vêem as organizações como entidades prontas a mudar, em função das alterações exógenas. Os teóricos da seleção natural visualizam complexas redes de comprometimento e forças institucionais que restringem severamente a capacidade de mudança das organizações. Os autores propõem o inverso e enfatizam a prática de uma abordagem integradora que possa incorporar as várias correntes de pensamento.

    Want (1990)

    Categoriza cinco tipos de mudança: por opção, quando a organização não está sujeita a nenhuma pressão, operacional, para fazer frente a deficiências específicas, direcional, quando uma alteração estratégica é necessária, fundamental quando a própria missão é alterada; e total, nos casos mais críticos, como uma iminência de falência.

    Beer (1990)

    A melhor abordagem para a mudança tem base no alinhamento de tarefas, começando na periferia e se direcionando ao núcleo da empresa. Esta seria a maneira mais eficaz de se alcançar uma mudança organizacional duradoura. Enfim, acredita-se que a chave para a mudança vem consistindo, cada vez mais, na diminuição da confiança depositada e restrita a autoridades gerências e diretores, diminuição de regras e procedimentos formais e divisões restritas de trabalho. Tudo isto vem sendo substituído pela criação de equipes, troca rápida de informações e delegação de tarefas e responsabilidades a outros níveis da linha hierárquica.

    Brown (1991)

    Explora o impacto das inovações tecnológicas na mudança organizacional. O autor cita um Centro de Pesquisas da Xerox, como exemplo de como a geração contínua de produtos inovadores leva a empresa a adotar novas formas de trabalho, renovando as práticas administrativas.

    Huey (1991)

    Apropria-se do conceito de Thomas Kuhn sobre paradigmas na ciência para mostrar como as mudanças são necessariamente acompanhadas por quebras de paradigmas e a necessidade de que isso ocorra para que a inércia organizacional seja vencida e dê lugar a novos padrões.

    Harari (1991) Critica a adoção de planos que se apóiam em modas passageiras. A mudança organizacional deve ser encarada como processo e caracterizada pelo princípio da melhoria contínua.

    Ulrich (1998, p. 47)

    Mudar é a capacidade de uma organização melhorar a concepção e a implementação de iniciativas e de reduzir o tempo de ciclo em todas as atividades organizacionais.

    Motta (1998) Mudar consiste em adaptar a organização aos caminhos possíveis permitidos pela evolução natural do ambiente.

    Quadro 3: Panorama conceitual sobre mudança organiz acional Fonte: Adaptado pela pesquisadora, a partir de conc eitos de mudança

    organizacional pesquisados

    Entre os significados, etapas e abordagens apresentadas pelos autores sobre

    o tema mudança organizacional, não é simples definir o conceito mais adequado e o

    melhor caminho a ser trilhado, tendo em vista a necessidade de se compreender em

    que contexto a mudança acontece, quais variáveis estão relacionadas, quem são as

    pessoas envolvidas, o que se deseja mudar, enfim, todos esses fatores devem ser

    levados em consideração, para que seja definida a abordagem mais eficaz. Segundo

    Kotter (1997), até agora, os principais esforços de mudança ajudaram algumas

  • 31

    organizações a se adaptarem, de forma significativa, às condições de

    transformação, a aprimorarem a posição competitiva de outras e a prepararem

    algumas para um futuro melhor. Ainda, segundo o autor, em muitas situações,

    porém, as melhorias foram decepcionantes e o quadro final aterrador. Boonstra

    (2004) afirma que mais de 70% dos programas de mudança implantados em

    organizações sucumbem prematuramente ou falham em alcançar o resultado

    esperado. Essas constatações levam a crer que as organizações vislumbram a

    necessidade da constante mudança como sendo algo inevitável, mas a maior

    dificuldade está em escolher qual caminho trilhar, de forma a se obterem resultados

    bem-sucedidos e, principalmente, sustentáveis a longo prazo.

    2.1.2 Categorias de Mudança Organizacional

    Os modelos de Mudança Organizacional surgiram como uma tentativa de

    auxiliar as empresas a viabilizar as suas estratégias. A mudança organizacional

    carrega, como elemento-chave, a revisão do modelo de gestão, definido por Chanlat

    (2000, p.119) como "o conjunto de práticas administrativas colocadas em execução

    pela direção de uma empresa, para atingir os objetivos que ela se tenha fixado."

    De maneira simples, a mudança organizacional pode ser categorizada em

    duas formas: estrutural e comportamental.

    As mudanças estruturais estão ligadas aos princípios da Escola de

    Administração Clássica, e as Mudanças Comportamentais estão ligadas às

    características da Escola de Relações Humanas. Após a Segunda Guerra Mundial,

    inspirados nos valores da escola de relações humanas, surgiram os modelos

    comportamentais, centrados nos processos interpessoais, nas funções e no

    comportamento organizacional, inspirados, principalmente, na psicologia e na

    sociologia. De 1990 em diante, surgiram formas e práticas de mudança, que

    serviram para focalizar, principalmente, a excelência no tratamento dos clientes e o

    aperfeiçoamento contínuo dos processos produtivos.

    Além dos modelos de mudança, Pereira (1998) tece observações sobre como

    as mudanças podem ocorrer na organização, conforme mostra o quadro 4.

  • 32

    Ambiente Dimensão Crono-logia Abordagem Teoria Modelo Autores

    Estável

    Relativo

    Sistema fechado

    1911 a 1935 Racional

    Clássica Estrutural

    Burocrática

    Racionalização do trabalho

    Taylor Fayol Weber

    Pequenos grupos

    1935 a 1960 Social

    Relações Humanas

    Treinamento gerencial

    Dinâmica de grupo

    E. Mayo C. Barnard Kurt Lewin

    Instável Sistema social

    Década de 1960 Sociotécnica Mudança de Paradigma

    H. Simon T.Parsons

    Emery-Trist

    Proativo

    Turbulento

    Sistema aberto 1970

    Racional (tese) Neoweberiana

    Modernização administrativa

    Desburocratização Planejamento

    Estratégico

    Blau, Scott Thompson Drucker, Ansoff

    Organização total

    1990 Social (antítese)

    Contingencial Institucional

    Desenv. Organizacional Pesquisa-ação

    Bennis, Beckard, Blake

    y Mouton, Reddin,

    Hersey, Katz e Kahn

    Criativo

    Visão holística sistêmica

    Mundo

    1990

    ?

    Racional (tese)

    Social (antítese)

    Mercadológica

    Cultural

    Reengenharia Qualidade total Benchmarking

    PNL Aprendizagem organizacional Endomarketing

    M. Hammer T. Peters Deming

    Juran Ishkawa

    A Robbins M.Knowles

    R.Shon P.Senge R. Moller

    Quadro 4: Evolução dos Modelos de Mudança Fonte: PEREIRA, 1998

    Nas mudanças naturais, a principal preocupação é com a sobrevivência. A

    administração é baseada na figura do líder ou do fundador, a quem todos respeitam

    e de quem todos dependem. Logo após, ocorre a busca de estabilidade: em

    decorrência do crescimento, a burocracia, os controles e os conflitos começam a

    existir. As soluções do passado mostram-se insatisfatórias aos problemas do

    presente e à capacidade de auto-renovação: marca o advento da administração

    profissional. As mudanças reativas são rotineiras, as organizações adotam-nas de

    forma incremental, quando não podem mais resistir a elas. São implantadas sem um

    plano definido ou uma análise minuciosa de seus efeitos. São adotadas por

    empresas acomodadas ou resistentes, que esperam até o último momento para

    introduzir mudanças. As mudanças evolutivas são planejadas, conscientes, voltadas

    para o crescimento, expansão e desenvolvimento. Quase todos os processos de

    mudança evolutiva baseiam-se em estratégias educacionais. São lentas, pois geram

  • 33

    resultados a longo prazo. As mudanças revolucionárias acontecem de forma rápida,

    têm grande impacto, são provocadas por eventos externos significativos e surgem

    de uma mudança estratégica da direção, fruto de momentos difíceis que exigem

    soluções radicais e que prescrevem medidas duras de reestruturação,

    enxugamento, fusão, venda ou privatização.

    Wilson (1995) sintetiza as formas de pensar a mudança sobre duas

    dimensões: a primeira tem como extremos a mudança planejada e a emergente.

    A mudança planejada busca aprimorar a capacidade da organização de adaptar-se

    a mudanças em seu ambiente e a mudar o comportamento do empregado. A

    mudança emergente é caracterizada pelo determinismo: as forças internas e/ou

    externas traçam o caminho das mudanças, sem que os dirigentes tenham total

    controle sobre elas. De acordo com essa visão estão as correntes que abordam a

    organização como sistema aberto e o ciclo de vida da organização.

    A segunda dimensão tem como extremos o processo e a implementação da

    mudança. Entender o processo consiste em examinar criticamente o contexto, os

    antecedentes, o movimento e a história das mudanças, mantendo, ao mesmo

    tempo, um olho analítico nas teorias da organização atuais que possibilitam essa

    análise. Implementar consiste em colocar em ação modelos preconcebidos de

    mudança, com o intuito de alcançar uma série de resultados esperados, desejados

    ou predeterminados (WILSON, 1995). O papel do gerente é altamente enfatizado na

    implementação de uma mudança planejada; essa é a visão de mudança mais

    difundida entre as organizações. A responsabilidade da efetividade da mudança por

    essa visão recai sobre o gerente. Morgan (1988, p.1) sentencia que “os gerentes do

    futuro terão de dirigir esta turbulência aumentando habilidades; muitas capacidades

    importantes serão necessárias”.

    Na visão de Hellriegel e Slocum (1980, p.549), as greves e a redução da

    produtividade são formas explícitas de resistência à mudança. Já o aumento do

    absenteísmo, solicitações de transferências, pedidos de desligamentos, perda da

    motivação do trabalho, "erros mentais" e impontualidade no trabalho são

    considerados, por estes autores, indicações de resistência implícita. Markus (1983)

    acredita que tratar de resistência é importante, pois, mesmo informalmente ou

    implicitamente, ela guia o comportamento e influencia as ações tomadas pelos

    gestores envolvidos na implementação de uma mudança.

  • 34

    Nesse sentido, diversos autores têm se empenhado em identificar modelos de

    gestão da mudança que sejam capazes de reduzir as dificuldades ou as possíveis

    resistências internas, por meio de esforços institucionais que facilitem o fluxo de

    comunicação, abrindo caminho para o engajamento pleno das pessoas. (CLARKE;

    GARSIDE, 1997; KOTTER, 1995; ARGYRIS, 1994, PETTIGREW, 1992; ALLAIRE;

    FIRSIROTU, 1989; NADLER, 1989).

    Em outras palavras, parece haver um reconhecimento crescente de que, se

    existem resistências à mudança por parte das pessoas das quais se espera um

    pleno engajamento, tais resistências são em grande parte, ou mesmo

    predominantemente, originadas pelo modo como a organização conduz o processo.

    Para amenizar as resistências à mudança, Bittencourt e Ruas (1996) sugerem a

    criação e o desenvolvimento de um ambiente propício à aceitação dos novos

    objetivos e metas da empresa. Esse ambiente deve englobar práticas de gestão

    participativa que promovam o envolvimento dos funcionários, além de sistemas de

    trabalho compartilhados, canais de comunicação eficazes e gestão de clima

    organizacional. Além da capacidade de adaptação às mudanças, é fundamental que

    a empresa consiga perceber as tendências e transformações, para agir de forma

    rápida e eficaz. Adizes (1998) afirma que as empresas que se transformam

    constantemente são muito vulneráveis, e que é preciso mudar, sem perder a

    unidade e a confiança das pessoas.

    As formas de interação cooperativas têm sido cada vez mais valorizadas e

    percebidas como promissoras para o fortalecimento das relações inter e intra-

    organizacionais, visto que estratégias de ação embasadas no conceito de sociedade

    colaborativa subsidiam a empresa a desenvolver um alto nível de confiança e a

    tornarem-se mais preparadas para se posicionarem estrategicamente frente às

    constantes mudanças econômicas e tecnológicas. (HERZOG, 2001). Os

    relacionamentos orientados para formas de cooperação dentro das organizações

    mostram-se favoráveis a relação de confiança. (HANDY, 1995; LEWICKI; BUNKER,

    1996; KRAMER; BREWER; HANNA, 1996; JONES; GEORGE, 1998; LANE, 2000;

    O´REILLY II; PFEFFER, 2000; LAWLER III, 2000).

    O reconhecimento de que as resistências à mudança originam-se muito mais

    nas condições às quais os indivíduos estão expostos do que propriamente por uma

    reação meramente interior tem sido acompanhada da percepção de que a

    implementação de qualquer tipo de estratégia de transformação organizacional só se

  • 35

    faz possível, se há uma completa integração entre um conjunto de fatores, que

    compreende o engajamento das pessoas, os processos de trabalho, o fluxo de

    informação, as competências organizacionais, metas claras e compartilhadas, o

    desenvolvimento de uma cultura organizacional coerente com os objetivos

    propostos. (CAMILLUS, 1997; PORTER, 1996; VOLLMAN, 1996; KAPLAN;

    NORTON, 1992; NADLER, 1989).

    Nesse sentido, os elementos fundamentais para o desenvolvimento desse

    foco na integração baseiam-se em:

    1. uma visão organizacional plenamente compartilhada por todos, da qual façam

    parte a consciência sobre a missão, os valores e a visão de futuro sobre a

    organização (THORNBERRY, 1997; COLLINS; PORRAS, 1996);

    2. um forte sistema de gestão de processos que procure focalizar, acima de

    tudo, as necessidades e a satisfação do cliente e que seja capaz de

    desenvolver a ação de todos em torno de objetivos comuns. (HAMMER;

    STANTON, 1999; ATKINSON; WATERHOUSE; WELLS, 1997; HAMMER,

    1996; MAJCHRZAK; WANG, 1996; RUMMLER; BRACHE, 1992);

    3. um espírito de pleno compartilhamento do conhecimento organizacional, que

    não apenas seja capaz de fortalecer a integração, mas que contribua para

    desenvolver a capacidade de inovação, de modo a garantir o sucesso

    continuado da estratégia (GARVIN et al., 1998; KROGH; NONAKA; ICHIJO,

    1997; NONAKA, 1991).

    Do mesmo modo, eleva-se continuamente a crença de que o sucesso na

    implementação de uma mudança ou de transformação estratégica é o resultado de

    um processo participativo. É algo que se constrói a cada dia, por meio da interação,

    da ação integrada, do modo como se desenvolvem a comunicação e as trocas entre

    as pessoas posicionadas nos diferentes níveis da organização. (BAREIL, 1999;

    DEMERS, 1999; LIEDTKA; ROSEMBLUM, 1996; FORD; FORD, 1995).

    Em síntese, pode-se dizer que a preocupação essencial das organizações,

    com relação ao processo de implementação de suas estratégias, passa a

    concentrar-se acima de tudo sobre as pessoas, não simplesmente objetivando a

    redução de suas supostas resistências, mas reconhecendo que elas compõem o

  • 36

    ingrediente mais importante para que qualquer tipo de estratégia possa ter sucesso

    (WOOD Jr, 2000).

    Ao apresentarem o conceito da nova era corporativa, Naisbitt e Aburdene

    (1986) destacam a mudança radical das estruturas sociais, dada a transição da

    sociedade industrial para a sociedade da informação. O trabalho passou a ser

    encarado como forma de desenvolvimento humano, em função da tecnologia de

    informação, que vem determinando, cada vez mais, o desaparecimento da

    burocracia, dos controles e dos níveis intermediários das organizações. O capital

    humano passou a ser o recurso mais importante, e, pela relativa escassez,

    mais valorizado.

    Segundo Quinn Mills (1991), a maior barreira do renascimento das

    organizações ainda se faz pela ruptura do modelo hierárquico baseado em

    comando e controle. O autor propõe o modelo de clusters, entendido como a

    formação de grupos multidisciplinares de pessoas, organizadas de forma natural e

    unidas por uma visão fortemente orientada para clientes e resultados.

    Não se pode, entretanto, limitar o entendimento da mudança organizacional

    simplesmente a adaptações às pressões externas. Isso ocorre porque, apesar de ter

    de responder às demandas ambientais, elas precisam ser reconhecidas e

    interpretadas pelos membros da organização. (HININGS; GREENWOOD, 1989).

    Deve-se considerar que o contexto da mudança, o seu processo e conteúdo,

    estão em constante inter-relação. O contexto pode ser distinguido entre externo, que

    se refere à economia mundial e às políticas e contextos sociais, e interno, que se

    refere a estratégias, estrutura, cultura organizacional e formas de gestão da

    organização. A transformação organizacional é um fenômeno altamente complexo,

    que envolve muitas variáveis internas e externas à organização, e que demanda

    para cada caso interpretações e ações diferenciadas. (WOOD Jr., 1995).

    Considerando a organização como um “fenômeno social global”, Motta

    (1991, p.119) afirma que a abordagem sistêmica favorece a compreensão das

    perspectivas que perpassam a mudança organizacional e descreve no quadro 5 as

    cinco perspectivas de mudança organizacional.

  • 37

    Perspectiva estratégica

    Considera-se que, para mudar uma organização, é necessário redefinir sua missão, objetivos e formas de ajustar a organização ao ambiente de mutação.

    Perspectiva estrutural

    A perspectiva estrutural reflete a distribuição da autoridade e das responsabilidades dos membros da organização, o que pode ser observado por meio do status e dos papéis que os membros da organização apresentam e desempenham. Conclui-se que, para mudar uma organização, é necessário alterar a forma como se distribuem formalmente a autoridade e a responsabilidade.

    Perspectiva tecnológica

    A perspectiva tecnológica diz respeito aos processos e métodos de produção. Pode-se dizer que o padrão de inferência com relação à mudança é a alteração de métodos, especialização de funções e seus processos, ou seja, rever a forma como se utilizam os recursos materiais e intelectuais.

    Perspectiva humana

    Na perspectiva humana a organização é percebida como um conjunto de indivíduos e grupos. A mudança nessa perspectiva implica a renovação do contrato psicológico entre o indivíduo e a organização. Considera-se que, para mudar uma organização, é necessário alterar atitudes, comportamentos e a forma de participação dos indivíduos através do incentivo a colaboração, práticas de motivação, liderança e reconstrução do sistema de recompensas de carreira e aperfeiçoamento pessoal.

    Perspectiva cultural

    A perspectiva cultural considera a organização como um conjunto de valores, crenças e hábitos compartilhados coletivamente. Suas expressões podem ser observadas em todas as dimensões da organização: na estrutura, na autoridade, em reuniões, formas de comunicação, entre outros. Este modelo prioriza atitudes e comportamentos individuais. Na mudança, considera-se importante substituir a programação coletiva na busca de um novo sentido de identidade, como se fosse um empreendimento coletivo para alterar os valores das pessoas.

    Perspectiva política

    Sob a perspectiva política, as organizações são examinadas como sistemas de poder, nos quais as pessoas ou grupos procuram maior influência no processo decisório. O poder é visto como um fim em si mesmo. Com relação à mudança, este modelo encontra necessário provocar uma redistribuição de poder, de forma a satisfazer novas prioridades de ação, ou seja, mudar uma organização passa a ser uma interferência nas formas como se articulam e se agregam os interesses e como se equilibra o poder entre interesses individuais coincidentes e conflitantes.

    Quadro 5: As seis perspectivas de mudança organizac ional Fonte: MOTTA, 1997

    Muitos modelos e teorias apareceram com mais força nessas últimas

    décadas com a idéia de transformar, evoluir e gerenciar melhor a mudança (MOTTA,

    1997). Pode-se dizer que, na verdade, não existe um modelo único para garantir a

    eficácia da mudança, assim como a teoria da contingência diz que não existe um

    modelo único para administrar com sucesso a organização. Tudo é relativo e

    depende do contexto analisado.

    Observou-se que muitos pesquisadores e administradores buscam soluções

    para lidar com a mudança propondo formas de intervenção que visam a seu

    gerenciamento, tentando tornar possível a sistematização de maneiras de alterar a

    cultura organizacional e os processos de aprendizagem envolvidos. Questionou-se a

  • 38

    possibilidade da utilização dessas abordagens, principalmente a tentativa de

    descongelar o sistema, realizar as mudanças necessárias e recongelá-lo, ou seja,

    estabelecer um planejamento e gerenciamento da mudança a partir de modelos

    generalizantes e homogeneizantes, assim como dos investimentos em “congelar” as

    narrativas organizacionais em bases de dados. Por outro lado, entende-se que

    propiciar um ambiente de questionamento, reflexão, experimentação e

    compartilhamento tem sido mencionado por Schein (1986) e Argyris (1994) como

    fundamentais no processo de mudança organizacional.

  • 39

    2.2 CONFIANÇA: CONCEITOS E ABRANGÊNCIA

    As condições adversas que marcam o cenário contemporâneo, aliadas ao fato

    de o controle ser visto como um mecanismo de coordenação pejorativo,

    particularmente por aqueles que a ele estão sujeitos, fizeram com que a confiança

    passasse a ocupar um lugar de destaque no mundo empresarial (DRUMOND,

    2007), especificamente no campo da Administração, tendo sido o tema introduzido

    recentemente no Brasil.

    Em função da ausência de um consenso universal, sociólogos, economistas e

    filósofos no campo da política e da ética, vêm gerando um debate interdisciplinar,

    Sato (2003).

    “De um modo geral, a confiança se faz necessária em situações de risco ou

    incerteza, ou ainda quando interesses de um agente não podem ser alcançados,

    sem que haja confiança de um em relação ao outro (LUHMANN, 1988)”. Entende-

    se, portanto, que a confiança pode facilitar as relações de trabalho e as trocas

    econômicas, fazendo com que as atividades “fluam melhor, que os objetivos sejam

    atingidos de forma mais rápida e com menor custo, possibilitando uma gestão mais

    efetiva, Sato (2003)”. Completando o raciocínio, Coleman (1990), Axelrod (1984) e

    Gambetta (1988) convergem para a idéia de que relações de confiança demandam

    tempo para serem construídas. Ainda segundo Sato (2003), Gambetta (1988) afirma

    ainda que confiança não é pré-condição para que exista cooperação, e sim é

    resultado dela, pois, baseada em experiências anteriores de cooperação”, a

    confiança se constrói e se fortalece.

    Gouldner (1960) afirma que o homem está sob a norma da reciprocidade

    quando uma parte beneficia a outra e uma obrigação é gerada. O receptor do

    benefício contrai um débito em relação ao doador, que deverá ser pago, ainda que a

    retribuição do benefício não precise ser imediata. Há um período de tempo no qual o

    beneficiado acumula recursos e não deve prejudicar o seu benfeitor. A norma da

    reciprocidade postula duas demandas mínimas inter-relacionadas de que as

    pessoas devem ajudar àquelas que as ajudaram; e não devem prejudicar os seus

    benfeitores. O sociólogo sugere que a norma de reciprocidade é universal, o que

    não implica afirmar que ela seja incondicional. As obrigações por ela impostas

    variam de acordo com o status dos participantes dentro da sociedade (necessidades

  • 40

    do receptor e recursos do doador), além das condições relacionadas ao tempo e

    lugar. Essa norma desempenha um papel importante na estruturação das relações

    sociais, ultrapassando a questão do desvio e da conformidade com as obrigações da

    parte beneficiada.

    Durante o período no qual há uma obrigação a ser cumprida, é moralmente

    impróprio, sob a norma da reciprocidade, romper relações ou lançar hostilidades

    contra aqueles indivíduos que concederam benefícios aos outros. Desse modo,

    espera-se que haja mecanismos que induzam as pessoas a permanecerem

    socialmente em débito com as outras e inibam a retribuição completa do benefício.

    Reed (2001), apoiando-se no trabalho de Gouldner (1960), afirma que a norma de

    reciprocidade é um mecanismo de construção da confiança. Esta, por sua vez,

    estabiliza e mantém o sistema social, porque ajuda a lidar com as potencialidades

    destrutivas das diferenças de poder, pela contenção de relações exploradoras, que

    poderiam minar o sistema social. A base moral da confiança é apontada por Reed

    (2001 p.1), ao considerar que o “conceito de confiança é tomado para significar e

    representar um mecanismo de coordenação baseado em valores e normas morais,

    apoiando a cooperação e colaboração coletivas dentro de ambientes incertos.”.

    Do ponto de vista da abrangência e da natureza do relacionamento, os

    conceitos mostram que a confiança possui duas características presentes em quase

    todas as linhas de pensamento: confiança implica investimento de risco (de retorno)

    oferecido a alguém (pessoa), para agir em favor de outro.

    Em toda situação que envolve confiança, há algum grau de risco, mesmo que seja negligenciável. A percepção de risco é derivada a partir da incerteza do indivíduo em relação aos motivos, intenções e ações futuras de quem ele depende (KRAMER, 1999).

    Em outras palavras, Rousseau et al. (1998) explicam que as variáveis que

    envolvem a confiança são o risco, ou seja, a possibilidade de perda, e a

    interdependência, em que os interesses de uma parte não podem ser atingidos sem

    a colaboração de outra. Eles entendem que a confiança é um estado psicológico que

    compreende a intenção de aceitar um risco, baseado em expectativas positivas de

    outra pessoa. Os autores enfatizam duas abordagens que auxiliam o entendimento

    do construto, sendo a confiança baseada em expectativas. Essa conceituação é

    focada na crença de uma das partes de que a outra agirá de maneira responsável,

    sem a prejudicar. Já a confiança baseada no comportamental está relacionada ao

  • 41

    parceiro de trocas, mas a vulnerabilidade contextual é aceita e refere-se à tendência

    de ação de uma parte em relação à outra.

    Newell & Swan (2000) sintetizam e concluem que confiança se traduz em um

    conjunto de expectativas compartilhadas por todos aqueles envolvidos em uma

    troca, ou seja, um conjunto de expectativas compartilhadas por pessoas, grupos ou

    organizações, com base na reciprocidade e boa vontade, influenciadas pelo contexto

    institucional.

    As idéias de Giddens (1991) sugerem que a