os modelos da teoria de painel fissurado aplicados
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OS MODELOS DA TEORIA DE PAINEL FISSURADO APLICADOS AO
DIMENSIONAMENTO DE VIGAS DE CONCRETO ARMADO
Camilo Vinicius de Pina Corriça
Rio de Janeiro
Agosto de 2015
Projeto de Graduação apresentado ao Curso de
Engenharia Civil da Escola Politécnica,
Universidade Federal do Rio de Janeiro, como
parte dos requisitos necessários à obtenção do
título de Engenheiro Civil.
Orientador:
Sergio Hampshire de Carvalho Santos
OS MODELOS DA TEORIA DE PAINEL FISSURADO APLICADOS AO
DIMENSIONAMENTO DE VIGAS DE CONCRETO ARMADO
Camilo Vinicius de Pina Corriça
PROJETO DE GRADUAÇÃO SUBMETIDO AO CORPO DOCENTE DO CURSO DE
ENGENHARIA CIVIL DA ESCOLA POLITÉCNICA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO
RIO DE JANEIRO COMO PARTE DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA A
OBTENÇÃO DO GRAU DE ENGENHEIRO CIVIL.
Examinado por:
_____________________________________________
Sergio Hampshire de Carvalho Santos, D. Sc., EP/UFRJ
____________________________________
Benjamin Ernani Diaz, Dok. Ing., EP/UFRJ
____________________________________
Cláudia Ribeiro Éboli, D.Sc., EP/UFRJ
RIO DE JANEIRO, RJ – BRASIL
AGOSTO DE 2015
iii
Corriça, Camilo Vinicius de Pina
Os Modelos da Teoria de Painel Fissurado Aplicados
ao Dimensionamento de Vigas de Concreto Armado /
Camilo Vinicius de Pina Corriça. – Rio de Janeiro:
UFRJ/Escola Politécnica, 2015.
VIII, 59 p.: il.; 29,7 cm.
Orientador: Sergio Hampshire de Carvalho Santos
Projeto de Graduação – UFRJ/ Escola Politécnica/
Curso de Engenharia Civil, 2015.
Referências Bibliográficas: p. 58-59.
1. Painel Fissurado. 2. Concreto Armado. 3.
Cisalhamento. I. Santos, Sergio Hampshire de Carvalho II.
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Escola
Politécnica, Curso de Engenharia Civil. III. Título.
iv
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus, que me permitiu chegar até aqui, com firmeza e
determinação, certo das minhas escolhas e perseverante na minha profissão.
Agradeço a minha mãe, Vera Cardoso de Pina Corriça pela incansável dedicação,
abnegação, zelo e amor ao longo desses 27 anos.
Agradeço ao meu pai, Camilo Alberto Corriça, pelo amor e por ter me sustentado
até aqui, de forma financeira também, mas principalmente de forma moral e
emocional, sendo acima de tudo exemplo.
Agradeço a minha avó, Conceição Maria Ferreira Pina por ter cuidado de mim na
infância e hoje, pelo amor e pela sabedoria que não pude encontrar nos livros.
Agradeço ao meu irmão, José Victor de Pina Corriça, pelo amor e pela paciência.
Agradeço enormemente a toda a minha família pelo apoio e carinho.
Agradeço a minha noiva, Paula Carolina de Andrade da Costa, pela paciência,
companhia, carinho, incentivo e amor nos últimos e mais difíceis momentos dessa
empreitada.
Agradeço aos meus amigos da faculdade, Ana Luiza, Eduardo, Frederico,
Guilherme, Juliana, Luiz Felipe, Marina e Rodrigo, que se tornaram a minha família,
pelo companheirismo, paciência e amizade ao longo desses cinco anos e meio. Sem
vocês nada disso teria sido possível.
Agradeço especialmente ao meu amigo Piter Valadares Pedrosa, que fez por mim
o que só um irmão realmente faria. Obrigado irmão.
Agradeço aos meus amigos da Exactum, Bruno Hubner, Tiago Amorim, Rafaela
Pillar, Roberto Freitas e Wagner Macedo por terem me transmitido com tamanha
paciência a parte prática.
Agradeço aos amigos que fiz ao longo da vida pelas experiências e a amizade.
Agradeço aos meus mestres da Escola Politécnica.
Agradeço por fim ao professor Sergio Hampshire de Carvalho Santos, pela
orientação nesse trabalho com conhecimento e entrega, mas também pela paciência e
dedicação despendida a mim em todas as cadeiras de concreto que com ele cursei.
v
Resumo do Projeto de Graduação apresentado à Escola Politécnica/ UFRJ como parte
dos requisitos necessários para a obtenção do grau de Engenheiro Civil.
OS MODELOS DA TEORIA DE PAINEL FISSURADO APLICADOS AO
DIMENSIONAMENTO DE VIGAS DE CONCRETO ARMADO
Camilo Vinicius de Pina Corriça
Agosto/2015
Orientador: Sergio Hampshire de Carvalho Santos
Curso: Engenharia Civil
RESUMO
Existem diversos métodos racionais derivados da teoria do painel fissurado, que
consideram a influência do esforço cortante no dimensionamento de elementos de
concreto armado e a não-linearidade física. Essa teoria deriva da treliça de Mörsch e
considera os ângulos das bielas comprimidas de concreto como variáveis ao longo da
altura da seção. O primeiro método aqui apresentado, considerado como o “estado da
arte” no dimensionamento do concreto estrutural é a Teoria do Campo de Compressão
Modificado. Sua utilização não é prática para o cálculo usual sem a adoção de
simplificações grosseiras. Assim, foi utilizado nesse projeto o programa RESPONSE
2000, que fornece soluções baseadas neste método. O Método da Seção Equivalente
é uma adaptação do método do painel fissurado, apresentando uma maneira prática
de se obter o fluxo de cisalhamento ao longo de uma seção transversal. Com base
nesse método é apresentado o programa FNL-CORTE. Os resultados dessas duas
teorias são comparados com os resultados do dimensionamento usual pela teoria da
treliça, pela NBR 6118:2014 e pelas considerações do fib Model Code 2010.
Palavras-chave: Painel Fissurado, Concreto Armado, Cisalhamento
vi
Abstract of Undergraduate Project presented to POLI/UFRJ as a partial fulfillment of
the requirements for the degree of Engineer.
MODELS BASED ON THE THEORY OF CRACKED PANELS APPLIED ON THE
DESIGN OF REINFORCED CONCRETE BEAMS
Camilo Vinicius de Pina Corriça
August/2015
Advisor: Sergio Hampshire de Carvalho Santos
Course: Civil Engineering
There are several rational methods based on the theory of the cracked panel, that
consider the influence of the shear forces on the design of reinforced concrete
members and the physical nonlinearity. This theory is derived from the Mörsch’s lattice
and considers the angles of compressed concrete struts as variable along the section
height. The first method presented herein, considered as the "state of the art" in the
design of structural concrete, is the Compression Field Modified Theory. Its use is not
practical for current calculations without adopting gross simplifications. Therefore, the
software RESPONSE 2000, which provides solutions based on this method is used
herein. The Equivalent Section Method is an adaptation of the cracked panel theory,
presenting a practical way to obtain the shear flow along a transversal section. The
software FNL-CORTE based on this method is also presented. The results of these two
methods are compared with the results obtained using the current design rules of the
NBR 6118:2014 and the considerations of the fib Model Code 2010.
Keywords: Cracked Panel, Reinforced Concrete, Shear Design
vii
Sumário
1. Introdução ............................................................................................................. 1
2. Objetivo ................................................................................................................. 3
3. Revisão Bibliográfica ............................................................................................. 4
4. Modelo de Treliça e Resistência ao Cisalhamento ................................................ 5
Teoria do Painel Fissurado ........................................................................... 10
Modelo de Bielas e Tirantes ......................................................................... 11
Dimensionamento Segundo a NBR 6118:2014 ............................................. 14
Verificação da Compressão Diagonal do Concreto ................................ 15
Cálculo da Armadura Transversal .......................................................... 15
Decalagem da Armadura do Banzo Tracionado .................................... 17
Condições Gerais .................................................................................. 17
Condições Relativas às Cargas Próximas aos Apoios ........................... 18
O dimensionamento segundo o fib Model Code ............................................ 19
Dimensionamento ao Esforço Cortante ................................................. 19
Condições Gerais .................................................................................. 21
Condições relativas a cargas próximas aos apoios ............................... 22
Dimensionamento .................................................................................. 23
5. Método da Seção Equivalente............................................................................. 26
O Programa FNL-CORTE ............................................................................. 32
6. A Teoria do Campo de Compressão ................................................................... 33
Teoria do Campo de Compressão Modificada .............................................. 34
Equações de Equilíbrio Interno .............................................................. 35
Equações de Compatibilidade ............................................................... 37
Relações Constitutivas .......................................................................... 38
Abordagem geral do programa RESPONSE 2000 ........................................ 44
7. Exemplos ............................................................................................................ 46
Exemplo 1 .................................................................................................... 46
Dimensionamento pelo Método das Bielas e Tirantes (Treliça) ............. 47
Dimensionamento pela ABNT NBR 6118:2014 ...................................... 48
viii
Dimensionamento pelo fib Model Code 2010 – Level III ........................ 48
Dimensionamento pelo Método da Seção Equivalente .......................... 49
Dimensionamento pela Teoria do Campo de Compressão .................... 49
Comparação de Resultados .................................................................. 49
Exemplo 2 .................................................................................................... 52
Dimensionamento pelo Método das Bielas e Tirantes (Treliça) ............. 52
Dimensionamento pelo fib Model Code 2010 – Level III ........................ 53
Comparação de Resultados .................................................................. 53
8. Conclusão ........................................................................................................... 56
9. Bibliografia .......................................................................................................... 58
1
1. Introdução
A verificação de uma peça de concreto armado é composta de dois procedimentos
básicos. O primeiro consiste em se determinar como as tensões resistentes se
apresentam no interior da peça. Em seguida, correlacionando-se a essas tensões as
propriedades dos materiais através de suas respectivas equações constitutivas, se
obtém para cada ponto no interior da peça suas respectivas deformações.
Nem sempre tais equações se desenvolvem em regime elástico-linear, passando
as análises então a ocorrer em regime não-linear. Tal regime é representado por
curvas que tentam da melhor maneira reproduzir o comportamento dos materiais,
variando de acordo com o tipo de solicitação. Este comportamento é notável no
concreto, que apresenta ótima resistência à compressão, em face de um
comportamento de baixa resistência a tração. A busca de uma solução para o
problema não linear, não é direta e nem exata, passando na maioria das vezes por
pesquisas iterativas intensas a fim de se obter uma convergência, com o equilíbrio
entre ações de resistência e solicitantes.
O estudo de peças de concreto armado fica, portanto baseado nessas duas
etapas. Aqueles métodos que conseguem de alguma forma realizá-las são bem
sucedidos em suas conclusões, mesmo quando impõem uma ou mais simplificações.
Como exemplo disso, nesse trabalho serão considerados diversos métodos de
dimensionamento, baseados no modelo de painel fissurado e que se restringem a uma
abordagem bidimensional, com a suposição de predominância de um estado plano de
tensões.
A primeira dessas teorias a ser abordada será o Método das Seções Equivalentes,
desenvolvido por DIAZ [4], que realiza o dimensionamento de forma semelhante à
usual, com a vantagem de permitir a determinação do fluxo de cisalhamento ao longo
da altura da viga em estudo. Neste trabalho, foi utilizado o programa FNL-CORTE,
desenvolvido por CELESTE [7] para a obtenção desses resultados com base neste
método.
A teoria do campo de compressão considera, por sua vez, as equações
constitutivas desenvolvidas por VECCHIO e COLLINS [13], que são extremamente
representativas, e permitem a consideração de singularidades como uma contribuição
do concreto na resistência a tração e um campo biaxial de tensões. Neste trabalho, os
resultados baseados nessa teoria foram obtidos com a utilização do programa
RESPONSE 2000 [18].
2
Os resultados desses dois métodos foram comparados com os resultados de
outros métodos usuais de dimensionamento, oriundos do modelo de painel fissurado.
Esses métodos consideram de forma diferente a angulação das bielas de concreto a
partir da teoria da treliça tradicional, como nas definições da NBR 6118:2014 [1] para
dimensionamento à flexão e ao cisalhamento e na metodologia da fib – Model Code
2010 [2] no seu nível de aproximação III.
3
2. Objetivo
O objetivo desse trabalho foi avaliar como os diferentes métodos derivados da
Teoria do Painel Fissurado realizam o dimensionamento das peças de concreto
armado do tipo viga, principalmente no tangente à consideração ou não do esforço
cortante e de que forma é realizado o acoplamento desse esforço cortante com a
flexão, além da determinação da inclinação das bielas comprimidas de concreto.
4
3. Revisão Bibliográfica
Para este trabalho foram usadas principalmente como referências as Dissertações
de Mestrado de CELESTE [7] e VILLELA [9] e Projeto de Graduação de NUNES [8].
As dissertações expõem o tema do painel fissurado, comparando métodos de
análise e aproximações, além da elaborar programas de dimensionamento. O último
compara as considerações de diversos métodos quanto ao dimensionamento à força
cortante.
5
4. Modelo de Treliça e Resistência ao Cisalhamento
Os modelos de treliça, apesar de terem sido criados no início do século passado,
permanecem sendo largamente utilizados no dimensionamento das vigas de concreto.
Sua formulação teórica pode ser considerada como uma simplificação do modelo do
painel fissurado. A metodologia original considera no dimensionamento os esforços
longitudinais atuando de forma independente dos esforços transversais. Esse
acoplamento só é feito posteriormente, através da decalagem do diagrama de
momentos fletores.
O método continua sendo considerado como satisfatório no atendimento da
maioria dos casos usuais de dimensionamento de vigas de concreto, como as seções
retangulares, em forma de I ou de T. Sua finalidade é unicamente de
dimensionamento à ruptura da peça, não fornecendo nenhuma informação sobre o
comportamento das peças em serviço. Da mesma forma, o modelo não encontra
aplicação em casos particulares de dimensionamento que fogem ao usual.
Mesmo assim, a utilização deste modelo é de fundamental importância no
entendimento dos esforços internos que se apresentam em vigas de concreto armado
submetidas a esforço cortante, por traduzir de forma extremamente clara e didática os
mecanismos que se originam dessa solicitação, sem fugir muito da realidade física
deste comportamento.
O modelo indica que uma viga de concreto armado fissurada se comporta como
uma treliça com dois banzos longitudinais paralelos, e simula a alma da viga através
da interação entre bielas de concreto comprimido, posicionadas em uma determinada
inclinação e estribos verticais agindo como montantes.
Figura 4-1 – Modelo de Treliça para uma viga em concreto armado
6
A grande dificuldade desse método é justamente determinar a inclinação
dessas bielas para uma situação qualquer de carregamento. Somente as equações de
equilíbrio não são suficientes para se encontrar essa inclinação, devido ao número de
variáveis do problema: forças nos banzos longitudinais, nos estribos, nas bielas e
finalmente a própria inclinação destas bielas. Para o dimensionamento na ruptura, a
Teoria do Limite Inferior da Plasticidade nos permite simplesmente arbitrar um valor
para esta inclinação, considerando um modelo estático de ruptura que garanta a
estabilidade quando submetido a dado carregamento. Cada método de
dimensionamento adota sua própria inclinação para as bielas a fim de contornar a
existência dessa incógnita.
Não obstante a longuíssima investigação realizada quanto a essas inclinações,
a mais recorrente na etapa de dimensionamento a cortante é considerar a proposta
clássica de RITTER [11] e MÖRSCH [10], com as bielas inclinadas a 45º, respeitando
as devidas adaptações geométricas.
Investigações experimentais demonstraram que a angulação de 45º fornece
resultados bastante conservadores, principalmente para vigas com pouca ou nenhuma
quantidade de armadura transversal. Aliás, sabe-se que uma viga com ausência de
armadura transversal, quando submetida a esforço cortante, resiste à parte deste
esforço antes de fissurar e romper. Esta parcela de resistência é considerada em
algumas normas como forma de correção da treliça a 45º e é comumente chamada de
Vc. Outras formas de correção, sugeridas por outras normas, consideram inclinações
diferentes de 45º (ver ref. [13] e [16]).
De fato, inclinações menores das bielas conduzem a resultados mais realistas
para vigas submetidas ao cisalhamento. No entanto, o problema de se determinar
essas inclinações persiste.
A grande vantagem do método, por outro lado, é que ele atende, sem a
necessidade de operações corretivas como a decalagem, ao equilíbrio da seção
inclinada a 45º. É importante salientar, no entanto, que o modelo apresenta uma
simplificação notável, para não dizer grosseira. Partindo do suposto que o concreto
não resiste à tração, no momento em que ele sofre a solicitação pura de flexão (Figura
4-2 a), se desenvolve o mecanismo resistente da Figura 4-2 b), onde foi aceita, a
adoção da simplificação usual de resultante única para as tensões de compressão do
concreto, funcionando a peça com dois banzos longitudinais, um comprimido e outro
tracionado.
7
Figura 4-2 – Seção de uma viga de concreto armado submetida a flexão pura
A partir daí, considere-se então conjuntamente à flexão, uma solicitação de
esforço cortante V. Pode-se então, aplicar o modelo das treliças, incluindo-se na
Figura 4-2 a), a presença das bielas comprimidas como mostrado na Figura 4-3 a).
Deve-se observar que, após essa inserção, surge a necessidade de um novo
equilíbrio, onde a componente vertical desses esforços será equilibrada pela própria
força V, enquanto a componente horizontal deverá ser equilibrada com os banzos
longitudinais, ficando então equilibrados o sistema de forças e os esforços resistentes
da seção.
A Figura 4-3 b) ilustra a transformação do diagrama de tensões de compressão
na seção. Mesmo na região de alongamentos da viga, abaixo da linha neutra, existem
tensões de compressão, combinação que, apesar de confusa, a de compressão com
alongamento, reflete uma singularidade da análise seccional das peças em concreto
armado submetidas a esforços transversais cisalhantes.
Figura 4-3 – Seção de uma viga de concreto armado submetida a flexão simples
Isso reflete o grau de complexidade enfrentado quando se deseja determinar
essas tensões longitudinais da seção em presença de esforço cisalhante. Isto porque,
8
quando acontece a flexão pura, pode-se estabelecer a relação tensão-deformação dos
materiais a partir de suas equações características e considerando-se que o
comportamento das fibras longitudinais de concreto se assemelha ao de um cilindro
feito do mesmo concreto e carregado axialmente. No entanto, quando está presente
também o esforço de cisalhamento, a consideração das relações tensão-deformação
fica inviabilizada, pois as tensões longitudinais não estão mais somente ligadas a
deformações longitudinais.
Retornando-se ao equilíbrio da componente horizontal da compressão na biela
oriunda do esforço cortante, é importante salientar que o equilíbrio dessa componente
gera um aumento da força no banzo tracionado e uma diminuição da força no banzo
comprimido. Isto pode ser visto no equilíbrio da Figura 4-4.
Figura 4-4 – Equilíbrio das solicitações na seção de uma viga de concreto armado submetida a flexão simples
Isto corresponde ao próprio processo da decalagem e acarreta um menor
encurtamento das fibras comprimidas e um maior alongamento das fibras na região de
tração. Concomitante a isto ocorrerá uma mudança na posição da linha neutra da
seção Na Figura 4-5 a) é possível visualizar o comportamento típico da seção
submetida à flexão pura, com uma região de encurtamento e outra de alongamento
longitudinal, além da região de concreto submetida a tensões de compressão. Com a
introdução do esforço cortante, a linha neutra sofre uma elevação, independentemente
do sentido de aplicação desta solicitação. Além disso, toda a seção de concreto passa
a ser solicitada por tensões de compressão, inclusive a região abaixo da linha neutra,
como mostrado na Figura 4-5 b).
9
Figura 4-5 – Deformação e tensão de compressão na seção de uma viga de concreto armado submetida a flexão a) pura e b) simples
O método pressupõe que a peça de concreto está completamente fissurada e
que o concreto não resiste de forma alguma à tração. Isto conduz a resultados
diferentes dos observados na prática, maiores tanto nos valores do alongamento
longitudinal quanto nas tensões nos estribos e nas bielas de compressão. Além disso,
considera-se a inclinação das bielas como constantes e coincidentes com a direção
das fissuras e que dentro dessas bielas existe um campo de compressão uniaxial.
Essas considerações esbarram em resultados experimentais que indicam o
contrário. Considerando o comportamento da peça desde o início do carregamento
para uma solicitação combinada de flexão e cortante atuando no plano médio da
mesma, percebe-se que sob o efeito de cargas baixas, a estrutura resiste aos esforços
sem fissurar, o que significa que o concreto está trabalhando tanto à compressão
quanto à tração, prevalecendo um regime elástico de resistência onde a presença da
armadura é pouco relevante.
No entanto, a partir do momento em que as tensões de tração superam as
tensões limites do material, processa-se o início da formação de fissuras, e a peça
procura um novo arranjo de equilíbrio. Constata-se que as primeiras fissuras surgem
na direção das tensões principais de tração, permanecendo ainda um comportamento
aproximadamente elástico dos materiais. O progressivo aumento da carga ocasiona
uma evolução no surgimento das fissuras. Algumas delas se originam a partir da
região tracionada, seguindo pela alma através da seção transversal da peça. São
fissuras de flexão (“flexural cracking”). Outras surgem na alma da viga e se propagam
diagonalmente; são as fissuras causadas por esforço cisalhante (“web-shear
cracking”). O último grupo de fissuras surge como fissuras de flexão e ao se propagar
pela alma da peça se convertem em fissuras de cortante (“flexure-shear cracking”).
Quando a solicitação se aproxima das cargas finais de ruptura, as fissuras atingem a
menor distância possível entre elas, chegando à configuração fissurada definitiva.
10
Como para carregamentos baixos o concreto apresenta alguma resistência à
tração, somente no limite da ruptura é que a consideração da não resistência à tração
se torna mais adequada. As fissuras surgem a partir do momento em que essa
resistência é superada e de forma gradual, contrariando a hipótese da peça já estar
completamente fissurada. A inclinação das bielas e das fissuras é coincidente em
algum momento, mas com o aumento da solicitação, essa inclinação varia e novas
fissuras vão sendo formadas. A consideração do modelo de treliça implica em que as
direções de fissuras são independentes do histórico de carregamento, o que se
comprova não ser verdade. Por fim, a presença dos estribos e a aderência existente
entre eles e o concreto faz surgir um campo biaxial de tensões na região das bielas
em lugar do campo uniaxial assumido pelo método.
Portanto, a teoria da treliça só simula de forma mais adequada os estágios
finais de carregamento. Porém, suas considerações foram e continuam sendo
essenciais para o entendimento do comportamento das peças. Métodos mais
sofisticados, que consideram os painéis fissurados de concreto, a resistência do
concreto à tração, uma inclinação de bielas mais próxima da real e o efeito biaxial das
tensões nas bielas serão apresentados a fim de melhor se compreender o
comportamento real das peças.
Teoria do Painel Fissurado
A teoria trata, como mostrado por VILLELA [9], de uma generalização de
teorias oriundas do modelo de treliça. A análise é feita com um elemento infinitesimal
de concreto armado, microfissurado, solicitado por um sistema de duas tensões axiais
(x e y) e uma tensão cisalhante (xy), que agem em seu plano médio, como indicado
na Figura 4-6.
Figura 4-6 – Elemento infinitesimal da teoria do painel fissurado
11
~
Esses elementos infinitesimais são montados, compondo um elemento de
chapa (semelhantemente ao que é feito no Método dos Elementos Finitos) permitindo
que uma peça possa ser analisada. A partir daí, o problema se converte em
capacidade de refino de uma malha, tornando desnecessárias as definições usuais
como a do banzo comprimido. A qualidade dos resultados obtidos passa a estar ligada
diretamente ao nível de discretização adotado.
Como um dos princípios dessa teoria, alguns efeitos locais do concreto armado
fissurado, como por exemplo, o aumento da tensão nas proximidades das armaduras,
acabam sendo desprezados, e valores médios são utilizados para a determinação de
tensões e deformações. O problema então passa a ser definir de que forma as
tensões (x, y e xy) se relacionam com as deformações (x, y e xy).
Grandes avanços no entendimento e resolução do problema do esforço
cortante vieram com essa nova teoria, como por exemplo, a possibilidade de se
considerar diferentes inclinações das bielas de compressão ao longo da mesma seção
transversal. Três direções de fundamental importância podem ser definidas no estudo
do painel fissurado de concreto armado:
• Direção da tensão principal de compressão;
• Direção da deformação principal de compressão;
• Direção das fissuras.
Modelo de Bielas e Tirantes
Como mostrado por SANTOS[3], em uma zona não perturbada de uma viga,
onde se caracterizam os campos de compressão em diagonal, temos o
desenvolvimento a seguir.
12
Figura 4-7 – Diagrama do modelo de treliça para a teoria de bielas e tirantes
onde:
• θ – ângulo de inclinação das bielas;
• z – braço de alavanca entre o centro de gravidade das armaduras e a
resultante da força longitudinal de compressão;
• V – esforço cortante na seção;
Temos então a projeção horizontal da distância entre as bielas:
z.cot =r (4-1)
A distância entre as bielas:
z.cos =t (4-2)
Força normal na biela:
sen
V = f c2 (4-3)
É feito então o estudo da treliça contínua como uma viga genérica, sujeita as
solicitações combinadas de cisalhamento e flexão conforme mostrado na Figura 4-8,
para que em etapa posterior se encontrem os esforços entre duas seções próximas 1
e 2.
13
Figura 4-8 – Carregamentos e esforços em uma viga bi-apoiada genérica
Escolheram-se essas duas seções, pois será passada por elas uma terceira
seção, entre os pontos 1 e 2 e que tem a inclinação da direção do ângulo da biela θ.
Nessa nova seção será feito o equilíbrio.
Figura 4-9 – Equilíbrio na seção inclinada com o ângulo da biela de compressão
Fazendo o equilíbrio das forças na direção vertical, tem-se a força por metro
nos estribos:
q - Y
V1 = w
(4-4)
q1 q2 Q
q
Cargas Aplicadas
M1 M2
Diagrama de Momentos Fletores
V1 V2
Diagrama de Forças Cortantes
14
Fazendo-se o equilíbrio de momentos no nó 2, tem-se a força de tração na
armadura inferior:
cot.2
V1 +
z
M1 = T1
(4-5)
Fazendo-se o equilíbrio de momentos no nó 1, tem-se a força de compressão
no banzo superior:
cot.2
V2 -
z
M2 = C2
(4-6)
Dimensionamento Segundo a NBR 6118:2014
O dimensionamento no Estado Limite Último de elementos lineares sujeitos a
esforço cortante é apresentado no item 17.4 da NBR 6118:2014 [1] de acordo com as
prescrições reproduzidas abaixo.
“As condições fixadas por esta Norma para elementos lineares admitem dois
modelos de cálculo que pressupõem a analogia com modelo em treliça, de banzos
paralelos, associado a mecanismos resistentes complementares desenvolvidos no
interior do elemento estrutural e traduzidos por uma componente adicional Vc”.
“O modelo I admite diagonais de compressão inclinadas de θ = 45º em relação
ao eixo longitudinal do elemento estrutural e admite ainda que a parcela complementar
Vc tenha valor constante, independente de VSd.”
“O modelo II admite diagonais de compressão inclinadas de θ em relação ao
eixo longitudinal do elemento estrutural, com θ variável livremente entre 30º e 45º.
Admite ainda que a parcela complementar Vc sofra redução com o aumento de VSd.”
Em ambos os modelos de cálculo propostos pela Norma, o ângulo de
inclinação da armadura transversal, α, em relação ao eixo longitudinal do elemento
estrutural, pode ser adotado na faixa de 45º ≤ α ≤ 90º. A garantia de segurança
estrutural ocorrerá quando for assegurado que as resistências do elemento, em uma
determinada seção transversal atendam às condições expressas a seguir:
Condição de Resistência à Compressão Diagonal do Concreto:
• VSd ≤ VRd,2
15
Condição de Resistência da Armadura Transversal:
• VSd ≤ VRd3
• VRd3 = Vc + Vsw
onde:
• VSd – Força cortante solicitante de cálculo, na seção;
• VRd2 – Força cortante resistente de cálculo, relativa à ruína das diagonais
• comprimidas de concreto;
• VRd3 – Força cortante resistente de cálculo, relativa à ruína por tração
diagonal;
• VC – Parcela de força cortante absorvida por mecanismos complementares
da treliça;
• VSw - Parcela resistida pela armadura transversal.
Verificação da Compressão Diagonal do Concreto
Os dois modelos de cálculo compartilham a mesma equação para VRd2, mas o
modelo I tem como particularidade o fato de assumir para θ o valor de 45º. Assim:
)cot.(cot....0,54. = 2
2v2Rd2 sendbfV wc (4-7)
onde:
2501v2
ckf
(4-8)
A parcela 0.54 vem da multiplicação entre a relação entre o braço de alavanca
z e a altura útil d; z/d = 0.9 e o coeficiente 0.6 que é o definidor da resistência fcd2 do
concreto nesta situação. Esse fator definidor de 0,6 foi determinado no estudo de
ROBINSON e DEMORIEUX [21] sobre ensaios de tração e compressão em almas de
vigas de concreto armado.
Cálculo da Armadura Transversal
Os dois modelos de cálculo compartilham a mesma equação para Vsw, mas o
modelo I tem como particularidade o fato de pressupor para θ o valor de 45º.
sen).cot.(cotf.d/s).0,9.A( = V ywdswsw (4-9)
16
A parcela Vc se refere à força cortante absorvida por mecanismos
complementares ao da treliça e no modelo de cálculo I é definida por:
• Vc = 0 – Linha neutra se situa fora da seção;
• Vc = Vc0 – Linha neutra cortando a seção.
onde:
dbfV ...0,6 = wctdc0 (4-10)
com:
c
ctm
c
infctk,
ctd .7,0 =
fff (4-11)
Na hipótese de ocorrerem solicitações de flexo-compressão a parcela Vc é
dada por:
máxSd,
0
c0c 1. = M
MVV (4-12)
onde:
• M0 – “Momento fletor que anula a tensão normal de compressão na borda
da seção (tracionada por MSd,máx), provocada pelas forças normais de
diversas origens concomitantes com VSd, sendo essa tensão calculada
com valores de γf e γp iguais a 1,0 e 0,9 respectivamente; os momentos
correspondentes a essas forças normais não podem ser considerados no
cálculo dessa tensão, pois são considerados em Msd; devem ser
considerados apenas os momentos isostáticos de protensão” [1].
Já no modelo II, Vc é definido por:
• Vc = 0 – Linha neutra se situa fora da seção;
• Vc = Vc1 – Linha neutra cortando a seção;
• Vc1 = Vc0 – Quando Vsd ≤ Vc0;
• Vc1 = 0 – Quando Vsd = VRd2.
Se a força cortante solicitante estiver no intervalo entre Vc0 ≤ VSd ≤ VRd2, deve ser
feita uma interpolação linear para se obter o valor de Vc1.
17
Decalagem da Armadura do Banzo Tracionado
De acordo com a NBR 6118:2014[1], duas maneiras para se considerar a
decalagem são possíveis.
A primeira é definida pelo cálculo de um deslocamento do diagrama de
momentos fletores, paralelo ao eixo da peça, a1. Esse deslocamento é calculado de
acordo com o modelo de cálculo adotado. Para o modelo de cálculo I, temos a
seguinte equação:
d
VV
Vda
cot
.2
)cot1.(. =
cmáxSd,
máxSd,
l (4-13)
onde:
• al = d, para |VSd,máx| ≤ |Vc|;
• al ≥ 0,5.d, no caso geral;
• al ≥ 0,2.d, para estribos inclinados a 45º;
Já para o modelo de cálculo II, a1 é definido pela equação a seguir:
dda )cot(cot.0,5. = 1 (4-14)
onde:
• al ≥ 0,5.d, no caso geral;
• al ≥ 0,2.d, para estribos inclinados a 45º.
A segunda maneira possível e a que mais nos interessa nesse trabalho é a
decalagem do diagrama de forças no banzo tracionado. Seu cálculo considera a
contribuição de forças de tração na armadura, tanto devido à flexão quanto devido à
força cortante. A expressão a seguir define isso.
z
MVMF
máxSd,máxSd,Sd
corSd,2
cotcot.
z =
(4-15)
onde, MSd,máx é o maior momento fletor de cálculo do diagrama de momento
fletor do trecho analisado.
Condições Gerais
O item 17.4.1.1.1 da NBR 6118 [1] contém algumas condições gerais para o
dimensionamento, as quais são apresentadas a seguir.
18
a) Armadura transversal mínima
Todos os elementos lineares submetidos à força cortante, com exceção dos
casos indicados em 17.4.1.1.2 [1] (basicamente lajes), devem conter armadura
transversal mínima, constituída de estribos, com taxa geométrica definida pela
seguinte equação:
ywk
ctm
f
f
b
A2,0
.s.sen =
w
sw
sw
(4-16)
onde:
• Asw – Área da seção transversal de estribos;
• s – espaçamento dos estribos, medido segundo o eixo longitudinal do
elemento estrutural;
• α – Inclinação dos estribos em relação ao eixo longitudinal do elemento
estrutural;
• bw – Largura média da alma, medida ao longo da altura útil da seção, para
elementos estruturais com bw < 5.d (em que d é a altura útil da seção);
• fywk – Resistência característica ao escoamento do aço da armadura
transversal;
• fct,m – Resistência à tração do concreto, dada por:
3/2
ck0,3. = ffctm (concretos até classe C50) (4-17)
)11,01ln(2,12. = ckffctm (concretos de C50 até C90) (4-18)
b) Composição da armadura transversal
A armadura transversal pode ser constituída de estribos, ou pela composição
de estribos e barras dobradas. Na utilização de barras dobradas, estas não devem
suportar mais do que 60% do esforço total resistido pela armadura.
Barras verticais soldadas também podem ser utilizadas, combinadas com os
estribos, respeitando a proporção anterior e os requisitos de ancoragem do item
9.4.6.2 [1].
Condições Relativas às Cargas Próximas aos Apoios
Quando a carga e a reação de apoio forem aplicadas em faces opostas do
elemento, comprimindo a alma, valem as seguintes prescrições para o cálculo da
armadura transversal [1]:
19
• “a força cortante oriunda de carga distribuída pode ser considerada, no
trecho entre o apoio e a seção situada à distância d/2 da face do apoio,
constante e igual à desta seção”;
• “a força cortante devida a uma carga concentrada aplicada a uma distância
a ≤ d/2 do trecho teórico do apoio pode, nesse trecho de comprimento a,
ser reduzida multiplicando-a por a/2d”.
As reduções indicadas se aplicam somente para a determinação das armaduras
transversais, não se aplicando à verificação da resistência à compressão diagonal do
concreto.
O dimensionamento segundo o fib Model Code
Neste item será apresentado o método de dimensionamento de vigas de
concreto armado segundo o fib Model Code 2010 final draft [2]. Este código considera
em sua formulação a analogia da viga fissurada com uma treliça. Na Figura 4-10 é
apresentado o modelo considerado no dimensionamento e as notações adotadas pelo
código.
Figura 4-10 – Modelo de Treliça - fib Model Code
Dimensionamento ao Esforço Cortante
No item 7.3.3 [2], o código apresenta o dimensionamento no Estado Limite
Último ao esforço cortante. A resistência ao esforço cortante da alma de uma viga
segundo o fib é determinada pela equação a seguir:
EdsRd,cRd,Rd = VVVV (4-19)
onde:
20
• VRd – é o esforço cortante resistente de cálculo;
• VRd,c – é o esforço cortante resistente de cálculo atribuído ao concreto;
• VRd,s – é o esforço cortante resistente de cálculo proveniente da armadura
transversal;
• VEd – é o esforço cortante solicitante de cálculo;
Existe ainda uma limitação do valor de VEd quanto ao valor de cálculo do
esforço transversal resistente máximo, VRd,máx, por sua vez limitado pelo esmagamento
das bielas de concreto.
Os valores de VRd,c e VRd,s são determinados de acordo com o nível de
aproximação utilizado. Cada um desses níveis apresenta uma diferente complexidade
no método aplicado e consequentemente nos resultados obtidos. A Figura 4-11
exemplifica essa variação.
Figura 4-11 – Níveis de aproximação - fib Model Code
a) Nível de aproximação I (Level I Approximation):
Indicado geralmente para os casos em que será concebida ou pré-
dimensionada uma nova estrutura.
b) Nível de aproximação II (Level II Approximation):
Nível de aproximação apropriado para a concepção de uma nova estrutura,
mas indicado principalmente para a avaliação geral ou breve de um elemento
existente;
c) Níveis de aproximação III e superiores (Level III (and higher) Approximation):
Níveis recomendados para o dimensionamento de um elemento em um estado
de carregamento complexo, ou uma avaliação mais elaborada de uma estrutura.
21
Os valores adotados para o ângulo θ variam de um nível de aproximação para o
outro e este é o principal aspecto do código que se deseja avaliar. Com isso, para o
escopo desse trabalho, somente o nível III será considerado e uma melhor descrição
dele será feita adiante. O código não estabelece nenhuma restrição ao ângulo α de
inclinação dos estribos. Nas equações de dimensionamento são utilizados os
parâmetros explicitados a seguir.
• MEd – momento fletor solicitante de cálculo;
• NEd – esforço normal solicitante de cálculo;
• Asw – área da seção transversal dos estribos;
• As – área da armadura longitudinal passiva;
• Ap – área da armadura longitudinal ativa;
• bw – menor largura da seção, compreendida ao longo da altura útil;
• d – altura útil da seção, sendo igual à distância da borda comprimida ao
centro de gravidade da armadura de tração;
• dv – altura útil média ao longo do elemento;
• sw – espaçamento longitudinal entre os elementos da armadura transversal;
• z – braço de alavanca interno;
• fc – resistência a compressão cilíndrica do concreto;
• fck – valor característico de fc;
• αcc – coeficiente que leva em consideração os efeitos de longo prazo na
resistência à compressão e os efeitos desfavoráveis resultantes do modo
como a carga é aplicada;
• fp0 – tensão nos cabos de protensão quando a tensão circundante no
concreto é igual a zero;
• fyk – valor característico da tensão de escoamento à tração do aço das
armaduras passivas;
• fywd – valor de cálculo da tensão de escoamento do aço das armaduras
transversais;
• Es – modulo de elasticidade da armadura passiva;
• Ep – modulo de elasticidade da armadura ativa.
Os coeficientes de majoração e minoração a serem aqui usados são os
mesmos da NBR 6118:2014 [1], de forma a possibilitar as comparações de resultados.
Condições Gerais
A seguir serão apresentadas as condições gerais da norma.
22
a) Armadura transversal mínima:
Quando a armadura transversal for necessária, a área mínima da armadura
deve ser:
yk
wwck
f
sbfA
.0,12. = mínsw,
, com ckf em MPa (4-20)
b) Composição da armadura transversal:
A armadura transversal poderá ser constituída por uma combinação de:
• Estribos ou tirantes perpendiculares ao eixo do elemento;
• Malha de arame soldado, com arames perpendiculares ao eixo do
elemento, desde que os arames possam sofrer um alongamento mínimo
de 4%;
• Barras longitudinais dobradas para fornecer uma parcela inclinada, com
um ângulo com relação ao eixo do elemento maior ou igual a 30º, e
cruzando potenciais fissuras inclinadas. Entretanto, apenas a área de 3/4
da parte inclinada dessas barras, pode ser considerada efetiva.
Condições relativas a cargas próximas aos apoios
O código define uma seção de controle posicionada a uma distância z da face
do apoio, onde z pode ser aproximado por z = 0,9d, como pode ser visto na Figura
4-12.
Figura 4-12 – Definição da seção de controle - fib Model Code
Na determinação da força cortante de cálculo na seção de controle,
descontinuidades de geometria ou forças transversais aplicadas devem ser
23
consideradas. Se essas forças de cálculo induzirem compressão no elemento, as
seções localizadas entre a seção de controle e a face de apoio devem ser
dimensionadas para esse esforço.
Dimensionamento
A resistência de cálculo ao esforço cortante de uma alma deve ser determinada
como:
sRd,cRd,Rd = VVV (4-21)
Entretanto, esse valor está limitado a:
)cot1(
)cot(cot.... =
2cmáxRd,
zb
fkV w
c
ck (4-22)
Este valor de resistência apresenta duas componentes. Uma é referente à
resistência do concreto e outra é referente à resistência da armadura. A parcela
resistente atribuída ao concreto é:
zbf
kV w
c
ck... = vcRd,
, com ckf em MPa (4-23)
onde o valor de ckf não pode ser maior do que 8 MPa. A parcela atribuída à
armadura pode ser determinada por:
senfzs
AV ).cot.(cot.. = ywd
sw
sRd,
(4-24)
Entretanto, esta equação só é válida se a seguinte condição for respeitada:
yk
ck
w 0,08. f
f , com ckf e ykf em MPa (4-25)
Os valores dos coeficientes kv e kv dependem do nível de aproximação.
4.4.4.1. Nível de Aproximação III
As equações aqui consideradas foram determinadas tendo como base a Teoria
do Campo de Compressão Modificada, que será posteriormente explicada. O ângulo θ
de inclinação das bielas é determinado por:
24
x 700029 (4-26)
onde εx pode ser encontrado pela equação:
ppss
ppEdEd
Ed
xAEAE
fANVz
M
2
5,0
0
(4-27)
Med/z indica a força que atua na armadura longitudinal tracionada. É importante
salientar que na determinação de VRd,máx o valor de θ = 45º deve ser utilizado na
equação. A determinação dos coeficientes de kc e kv é feita por:
55,030
0,55. 3
1
ck
c
fk , com ckf em MPa (4-28)
x
k15001.
0,4 v
(4-29)
Deve-se observar que essa definição de kv só é válida se ρw ≥ 0,08.(√fck)/fyk,
com fck e fyk em MPa, semelhantemente à equação de VRd,s. Para a utilização das
equações do nível de aproximação III alguns requisitos devem ser obedecidos:
• VEd e MEd devem ser tomados como positivos e MEd ≥ VEd . z;
• Na determinação dos valores de As e Ap, em que o comprimento das
barras, a partir da seção em consideração, é menor que o comprimento de
ancoragem, seus valores devem ser reduzidos na proporção de sua falta
de desenvolvimento completo;
• Se o valor de εx calculado segundo a equação (4-27) for negativo, seu
valor deve ser tomado igual a zero, ou seu valor deve ser recalculado com
o denominador da equação substituído por 2(Es.As+Ep.Ap+Ec.Ac), onde Ec é
o módulo de elasticidade reduzido do concreto e Ac é a área de concreto
da seção transversal. Entretanto εx não deve ser tomado menor que
0,0002;
• Para seções mais próximas do que z da face do apoio, o valor de εx
calculado na seção distante de z da face do apoio deve ser utilizado na
avaliação da resistência ao cortante;
• Se a tensão axial é grande o suficiente para fissurar a região comprimida
por flexão, o incremento resultante em εx deve ser levado em
consideração. Em vez de cálculos mais precisos, o valor calculado na
equação deve ser dobrado;
25
• É permitido, na determinação de θ e kv, usar um valor de εx maior do que o
determinado pela equação (4-27); entretanto εx não deve ser maior que
0,0003.
A fim de que o único parâmetro a ser comparado nesse trabalho seja realmente
o ângulo de inclinação das bielas, o método para se encontrar o braço de alavanca e
os valores de cálculo de tração na armadura longitudinal será o mesmo da NBR
6118:2014, semelhantemente ao que foi considerado quanto ao coeficiente de
majoração e minoração. A armadura longitudinal final deve ser capaz de suportar uma
força adicional, devido ao esforço cortante, definida por:
)cot.(cot2
)cot.(cot2
RdcEd
td
VVF (4-30)
Entretanto, a demanda total de armadura não deverá exceder a demanda na
seção de máximo momento fletor.
O texto final do fib Model Code 2010 [22] apresenta novas expressões para o
dimensionamento ao cisalhamento.
26
5. Método da Seção Equivalente
A base teórica do método aqui descrito foi apresentada por DIAZ [4] e
desenvolvida por SHULZ [5] e CUNHA [6]. Trata-se de uma aproximação do modelo
de painel fissurado às regras usuais de dimensionamento a flexão, tendo o mérito de
permitir que se obtenha o fluxo de cisalhamento ao longo da altura da seção.
Uma aproximação do método é não considerar no seu desenvolvimento a
compatibilização de deformações. O procedimento é dirigido para cálculos de
dimensionamento de peças usuais de concreto armado de forma prática.
O método admite que a seção transversal da peça a ser analisada seja
constante e com simetria em relação ao eixo Z. Como simplificação, para facilidade
dos cálculos, os estribos são supostos como verticais e a armadura longitudinal terá
sua distribuição ao longo da altura de forma discreta, embora sua seção possa variar
ao longo da peça. O trecho analisado deve estar fora da zona de perturbação e dentro
do seu domínio de validade, os esforços normal e cortante devem ser constantes.
Essa última simplificação não limita o uso do método. Ela foi considerada para que se
obtenham expressões analíticas mais simples. Finalmente, não são admitidos
deslocamentos relativos entre o concreto e armadura. A resistência do concreto à
tração é desprezada, juntamente com mecanismos resistentes complementares.
A hipótese da viga de Navier-Bernoulli (viga com seção plana) conduz a uma
relação tensão-deformação satisfatória quando se trabalha somente com solicitações
normais na seção transversal. Porém, quando solicitações tangenciais são inseridas
surgem também distorções na seção transversal, descaracterizando a hipótese da
seção plana. A distribuição exata das tensões e deformações oriundas das forças de
cisalhamento é complexa e varia em função da distribuição das fissuras na seção e da
distribuição das armaduras.
A solicitação de momento fletor varia ao longo de uma viga na presença
simultânea ao longo desta viga de esforço cortante. Esse aumento da solicitação de
flexão causa consequentemente um incremento das tensões axiais, que variam ao
longo da altura da seção e são equilibradas por tensões transversais. A Figura 5-1
ilustra essa situação.
27
(a) (b)
Figura 5-1 – Plano de tensões de cisalhamento em uma viga: a) esforços em uma
viga; b) equilibrio de tensões em uma fibra
A equação de equilíbrio das tensões nas fibras é dada por:
0
zx
xzx (5-1)
A tensão de cisalhamento em qualquer ponto da seção )z(xz pode ser obtida
como:
z
wx
w
xz dzbxb
z0
...1
)(
(5-2)
Em se tratando de material isotrópico e elástico, a solução para a equação
anterior é simples e bem conhecida:
w
z
0w
w
xzb.I
)z(S.Vdz.
I
z.b.V.
b
1)z( (5-3)
Sendo:
• S(z) – Momento estático dos elementos de área equivalentes integrados
em relação ao centro de gravidade da seção equivalente.
• I – Momento de inércia da seção equivalente.
• bw – Largura da alma da viga.
Uma ferramenta utilizada no desenvolvimento do método, chamada de “áreas
equivalentes”, consiste em representar as forças resistentes dos materiais em
resposta a uma deformação imposta ao longo da altura da peça como áreas. Essa
28
representação conduz a uma aplicação de conceitos da Mecânica Clássica como
centro de gravidade, momento de inércia e momento estático de forma simples e
didática.
O cerne do método consiste no conceito das seções equivalentes. Esse
conceito estabelece que essas seções são obtidas pelo somatório da multiplicação
das áreas das fibras das seções de concreto b(z).dz pelo módulo de deformação
longitudinal tangente do concreto Ec(εx) e o somatório da multiplicação das áreas de
aço Asi por [Es (εx) – Ec(εx)], sendo Es(εx) o módulo de deformação longitudinal tangente
do aço. Para o concreto considera-se o diagrama tensão-deformação da NBR
6118:2014 [1].
Um esquema demonstrativo deste conceito é apresentado na Figura 5-2 com
uma deformação longitudinal com linha neutra dentro da seção. Considera-se que o
concreto não resiste à tração e sua tensão máxima ocorre à εi = -2,0 ‰ e a
deformação do aço não é suficiente para atingir o escoamento. A configuração da
deformada longitudinal da seção segue a equação εi = (ε0 + κ0.zi).
Figura 5-2 – Determinação do fluxo de cisalhamento pelo Método da Seção
Equivalente
A grande simplificação feita pelo método é supor que as tensões tangenciais τxz
obtidas, como se mostra através das expressões (5-1) e (5-3), a partir das tensões
normais longitudinais de compressão 𝜎x, podem ser aproximadas por uma distribuição
de tensões 𝜎xn, expressa de acordo com as regras usuais de dimensionamento a
flexão, como aparece na Figura 5-3. A equação (5-1) passa a ser representada por
(5-4):
29
0
zx
xzxn (5-4)
A Figura 5-3 permite também que se insira o conceito de tensões longitudinais
complementares 𝜎xt, correspondentes à solicitação do esforço cortante V na seção.
Essa tensão, agindo concomitantemente com as tensões longitudinais de flexão 𝜎xn,
por sua vez oriundas do par de esforços solicitantes N e M e incrementados pelo par
de esforços MeN , resultam na distribuição de tensões longitudinais 𝜎x,
correspondentes aos esforços solicitantes N e M.
Figura 5-3 – Tensões decorrentes de força normal, momento fletor e força cortante
atuantes em vigas de concreto armado.
Chega-se então a:
xtxnx (5-5)
Duas hipóteses adotadas pelo método facilitam sobremaneira o seu manuseio.
A primeira é a consideração de que o concreto não resiste à tração, (𝜎1=0). A segunda
hipótese define não se considerar a compatibilidade de deformações, implicando numa
simplificação das equações constitutivas usadas pelo método.
A Figura 5-4 apresenta o circulo de Mohr para as tensões no concreto
fissurado, que verdadeiramente não resiste aos esforços de tração.
30
Figura 5-4 – Circulo de Mohr das tensões no concreto fissurado que não resiste aos
esforços de tração
Conhecidas as tensões longitudinais de flexão 𝜎xn e as tensões tangenciais τxz,
pode-se obter o ângulo θ de inclinação das fissuras, se admitirmos que elas se
orientam de acordo com a direção da tensão principal de compressão 𝜎2.
xn
xztg
.2.
2
1 1 (5-6)
A partir de θ e de τxz, resolvendo o equilíbrio de tensões em cada nível,
obtemos as tensões normais transversais 𝜎z, as tensões normais 𝜎x e as tensões na
direção da biela comprimida 𝜎2.
tg
xzx (5-7)
Usando a equação (5-7) juntamente com a equação (5-5), obtemos as tensões
longitudinais complementares 𝜎xt:
tg
xzxnxt (5-8)
De acordo com CELESTE [7], no dimensionamento das armaduras
longitudinais da seção, essas devem resistir aos esforços N, M e V e também ao
incremento de esforços MeN . Resumindo, o dimensionamento no sentido
longitudinal deve ser feito usando-se o par de esforços NR e MR, definidos como:
NNNR (5-9)
MMM R (5-10)
31
Se considerarmos a deformação longitudinal εi e usarmos a relação tensão-
deformação do concreto à compressão 𝜎c(εc) podemos encontrar o valor de 𝜎xn, ou
seja:
)( icxn (5-11)
Para a seção de concreto discretizada em lamelas de altura dzi, isso conduz às
seguintes equações globais de equilíbrio:
siizn
nb
i
isi
n
i
iixnR AzdbNNN )]..().([..)..(11
(5-12)
).()]..().([..).).(.(11
isiizn
nb
i
isi
n
i
iiixnR zAzdbzMMM
(5-13)
Com o intuito de facilitar o cálculo do fluxo cisalhante τxz, o processo será
realizado em relação ao centro de gravidade da área equivalente, distante zcg do topo
da seção. As derivadas parciais da força normal resistente 𝜕𝑁𝑅
𝜕𝜀0 e
𝜕𝑁𝑅
𝜕𝜅0, em relação à
deformação específica e a curvatura no centro de gravidade da seção respectivamente
são calculadas para a largura fixa da alma, bw. Então, a distância zcg é facilmente
obtida através da equação:
00 RR
cg
NMz (5-14)
Já as derivadas parciais dos momentos resistentes, 𝜕𝑀𝑅
𝜕𝜀0 e
𝜕𝑀𝑅
𝜕𝜅0, calculadas em
relação ao centro de gravidade zcg e da largura fixa da alma bw, irão fornecer os
resultados do momento estático dos elementos de área equivalente S(zi) e o momento
de inércia I, como se segue:
0RM
I (5-15)
iR
i
MzS
1 0
)(
(5-16)
A partir daqui, o fluxo de cisalhamento τxz(zi) pode ser calculado ao longo da
altura da seção zi, com a aplicação das equações (5-15) e (5-16) na equação (5-3). As
tensões longitudinais 𝜎x(εi) são encontradas com o uso da equação (5-7) e os esforços
N, M e V são finalmente determinados a partir das equações que se seguem.
32
siix
nb
i
isi
n
i
iix AzdbN )]..().([..)..(11
(5-17)
).()]..().([..).).(.(11
isiix
nb
i
isi
n
i
iiix zAzdbzM
(5-18)
n
i
iwxzi dzbV1
.. (5-19)
Como não são admitidos deslocamentos entre as armaduras e o concreto
envolvente a estas e considera-se que o esforço cortante seja constante, encontram-
se as forças nas armaduras verticais com a equação a seguir:
zswsw . (5-20)
Onde:
tgxzz . (5-21)
).( sb
A
w
sw
sw (5-22)
A tensão 𝜎sw nos estribos não deve ultrapassar os valores de tensão de projeto
de escoamento do aço utilizado fyd. As tensões de compressão nas bielas podem ser
determinadas com a equação a seguir:
tgtgxz
1.2 (5-23)
Esse valor deve ser inferior ao valor limite de compressão nas bielas
fc2 = 0,6.αv2.fcd, para ângulos entre 30º ≤ 𝜃 ≤ 45 . Se 𝜃 < 30º , admite-se que a tensão
de compressão na biela tem como limite o valor de 0,85 fcd.
O Programa FNL-CORTE
A fim de sistematizar os resultados do Método da Seção Equivalente, neste
trabalho foi utilizado o programa FNL-CORTE desenvolvido por CELESTE [7], que
automatiza as verificações realizadas em vigas de concreto armado usando os
fundamentos do método, através de um processo iterativo de flexão composta, não-
linear, realizando o acoplamento com o esforço cortante.
33
6. A Teoria do Campo de Compressão
Mediante uma analogia com experimentos desenvolvidos sobre instabilidade e
flambagem de almas metálicas solicitadas ao cisalhamento, COLLINS e MITCHELL
[14] propuseram que a direção de inclinação das bielas de compressão fosse igual à
direção da deformação de compressão principal do painel, como mostrado na Figura
6-1.
Figura 6-1 – Compatibilidade das deformações para almas fissuradas:
a) Deformaçoes médias na alma; b) Círculo de Mohr de deformações
onde:
• εx é a deformação linear na direção longitudinal;
• εy é a deformação linear na direção transversal;
• γxy é a deformação de cortante;
• ε2 é a deformação principal de compressão;
• ε1 é a deformação principal de tração.
A partir do círculo de Mohr mostrado na Figura 6-1 b) acima, encontram-se as
relações de compatibilidade das deformações médias na alma, que conduzem a:
2
22
y
xtg (6-1)
COLLINS et al.[15] fizeram mais algumas suposições. Partindo da teoria do
painel fissurado submetido aos esforços de chapa, adotaram uma direção para a
inclinação das bielas de compressão, estabelecendo a compatibilidade das
deformações e outras simplificações do modelo clássico das treliças como, por
34
exemplo, a desconsideração da resistência do concreto a tração. Esse modelo
estrutural passou a ser conhecido como a Teoria do Campo de Compressão.
Teoria do Campo de Compressão Modificada
Esta consiste em uma sofisticação da Teoria do Campo de Compressão, a
partir do aprimoramento das equações constitutivas do concreto.
O esquema resistente da peça de concreto armado é composto de bielas de
concreto (diagonais comprimidas), unidas por armaduras transversais. Tem a
vantagem de permitir a inserção de esforços seccionais que provocam tensões
normais e tangenciais de forma integrada no modelo.
É considerado que a resistência do concreto nas bielas comprimidas não atinge
os valores de resistência do concreto obtidos pelo ensaio de compressão uniaxial,
sendo o diagrama tensão-deformação considerado mais abatido. Além disso, surgem
no interior das bielas, entre as fissuras, tensões de tração, aumentando a resistência
da seção de concreto. As tensões na armadura variam ao longo da altura da alma e,
próximo às fissuras, atingem seu valor máximo.
Considera-se que em todos os elementos discretizados da viga, no equilíbrio
das tensões atuantes e resistentes do concreto fissurado e da armadura, surge um
estado plano de tensões, cujas equações de equilíbrio, que relacionam o aço e o
concreto, permitem expressar essas tensões na forma de deformações médias,
medidas no sentido paralelo ao das fissuras.
É mostrado na Figura 6-2 um trecho de uma viga sujeita a esforço normal,
momento fletor e esforço cortante, em seção longitudinal e transversal. Nesse trecho o
esforço cortante é assumido como constante.
35
Figura 6-2 – Viga fissurada sujeita a esforço cortante, momento fletor e esforço normal
onde:
• 1cf – Tensão principal média de tração no concreto, normal à direção das
fissuras;
• 2cf – Tensão principal média de compressão no concreto, paralela à
direção das fissuras;
• 1 – Deformação específica principal média de alongamento;
• 2 – Deformação específica principal de encurtamento;
• – Ângulo de inclinação médio das fissuras.
Equações de Equilíbrio Interno
Para elementos de concreto fissurado e com armaduras horizontais e verticais,
para a determinação das tensões atuantes 𝜎x,𝜎z e τxz no estado plano, as resistências
de todos os materiais presentes na viga têm sua contribuição considerada. A Figura
6-3 mostra um painel de concreto armado fissurado com as bielas inclinadas de θ e as
armaduras posicionadas perpendicularmente, na direção dos eixos x-z.
36
Figura 6-3 – Tensões nos painéis de concreto, armadura e concreto armado
É importante notar que, devido ao arranjo das armaduras numa disposição
ortogonal uma em relação à outra, as tensões atuantes nas armaduras fsx e fsz têm
valores iguais às tensões devidas às armaduras na direção dos eixos x-z, 𝜎sx e 𝜎sz
geralmente iguais à tensão de escoamento de cálculo do aço fyd. Fazendo-se um
equilíbrio com a soma dos painéis de concreto e de armadura, as resultantes das
tensões serão:
sxsxcxx (6-2)
szszczz (6-3)
czxcxzxz (6-4)
Usando-se o círculo de Mohr é possível encontrar as componentes das
resistências do concreto e da armadura.
Figura 6-4 – Círculo de Mohr das tensões médias no concreto
37
A partir do círculo de Mohr da Figura 6-4, são obtidas as expressões que
relacionam as tensões na direção dos eixos globais com as tensões principais médias
já comentadas.
Tensões no concreto:
tgf cxz
ccx 1 (6-5)
tgf cxzccz .1 (6-6)
tgtg
ff cccxz
1
21
(6-7)
Tensões resultantes no concreto armado:
tgf cxz
csxsxx 1. (6-8)
tgf cxzcszszz .. 1 (6-9)
cxzxz (6-10)
Equações de Compatibilidade
Considerando uma peça de concreto armado fissurado e costurada por
estribos, admitindo que não haja deslizamento entre o concreto e a armadura, as
deformações dos dois materiais tem que ser as mesmas. Na Figura 6-5 é possível
visualizar as deformações especificas lineares de um elemento como o citado acima.
Figura 6-5 – Deformações médias em elementos fissurados de concreto
38
Seguindo o exposto acima quanto à aderência perfeita entre o aço e o
concreto, pode-se admitir que:
cxsxx (6-11)
czszz (6-12)
Como as três componentes de deformação εx, εy, γxz são conhecidas, conforme
mostrado no círculo de Mohr das deformações médias da Figura 6-6, pode-se
encontrar as deformações em qualquer outra direção, usando a geometria.
Figura 6-6 – Círculo de Mohr das deformações específicas médias
Essa geometria pode dar origem a diversas novas identidades. É importante
observar que ε1 é a deformação principal de alongamento e ε2 é a deformação principal
de encurtamento.
tg
xxz
22 (6-13)
21 zx (6-14)
x
x
y
y
z
x
z
xtg
1
2
2
1
1
1
2
22 (6-15)
Relações Constitutivas
A grande contribuição da teoria foi a de que o material concreto se modifica no
instante em que se inicia o processo de fissuração. E aí reside o princípio mais
importante deste modelo. Pois neste instante em que o concreto atinge o estado de
39
fissuração, um novo comportamento tensão – deformação, definido empiricamente, é
assumido. Como os valores considerados pela “Teoria do Campo da Compressão
Modificada” englobam, concomitantemente, os efeitos de deformações locais nas
fissuras, deformações entre fissuras, deformações impedidas e deformações devidas
à formação de fissuras, eles são na verdade valores médios e isso causa um
comportamento diferente da tradicional curva tensão – deformação dos materiais. Em
decorrência disso, as tensões calculadas são também tensões médias que
implicitamente incluem tensões entre fissuras, tensões nas fissuras e na interface de
cisalhamento nas fissuras, ver CELESTE [7].
6.1.3.1. Comportamento da Armadura
É suposto que a tensão axial na armadura depende somente de sua
deformação axial, o que é intuitivo devido ao formato linear das armaduras. Assim:
ydxssx fEf (6-16)
ydzssz fEf (6-17)
Presume-se ainda que as armaduras não resistam às tensões cisalhantes
médias nos planos a elas normais.
0 szsx (6-18)
6.1.3.2. Comportamento do Concreto à Compressão
Embora a direção principal das deformações do concreto desvie um pouco da
direção principal de tensões, é suposto que elas coincidam de forma razoável. Foi
constatado que a tensão de compressão principal do concreto fc2, depende das duas
deformações principais, a de encurtamento ε2 e a de alongamento ε1. De forma que o
concreto fissurado, sujeito a altas tensões de tração na direção normal à direção de
compressão, exibe uma curva de tensão-deformação abatida quando comparada com
os resultados obtidos pelo ensaio clássico de compressão axial em corpos de prova
cilíndricos, conforme a Figura 6-7.
40
Figura 6-7 – Concreto fissurado à compressão – Curva Tensão–Deformação
VECCHIO e COLLINS[13] sugerem a seguinte equação, a fim de considerar a
perda de resistência do concreto à compressão:
2
22,22
''2.
cc
máxcc ff
(6-19)
onde:
c
c
c
máxc ff
f ''.34,08,0
'
1
,2
(6-20)
A grandeza ε’c, que representa a deformação específica de encurtamento do
concreto no início do patamar plástico, e a grandeza ε1, que representa o alongamento
máximo na direção principal, terão sempre sinais contrários, e quanto menor for o
valor da relação entre c'
1
, maior será a redução de fc2,máx. Essa redução é ilustrada
pela Figura 6-8 que exibe os valores de fc2,máx de acordo com os valores de ε1/ε’c. Note
que os valores dessa relação são sempre negativos.
Figura 6-8 – Curva proposta para a tensão máxima de compressão
41
6.1.3.3. Comportamento do Concreto à Tração
Como foi visto até aqui, na prática o concreto sujeito à tração apresenta uma
resistência até que surja a primeira fissura, (ε1 ≤ εcr). Até essa primeira fissura a
resistência do concreto à tração pode ser aproximada por:
11 cc Ef (6-21)
A teoria então apresenta uma equação para a resistência do concreto à tração
a partir da primeira fissura, (ε1 > εcr), que é:
1
1.5001
crc
ff
(6-22)
onde fcr em MPa pode ser calculado como:
ccr ff '33,0 (6-23)
Caso a deformação principal de alongamento ε1 seja elevada, a abertura de
fissuras aumenta, conduzindo a valores de tensão principal de tração menores. Isso é
mostrado na Figura 6-9, onde é apresentado o diagrama tensão média-deformação
média para as situações de tração no concreto fissurado.
Figura 6-9 – Diagrama tensão-deformação médios, para fenômenos de tração no
concreto fissurado
6.1.3.4. Comportamento do Concreto entre duas Faces de Fissuras
Embora seja conveniente para o estudo a formulação de tensão e deformação
utilizando valores médios, não são consideradas possíveis variações locais. Por
exemplo, na seção fissurada, os valores de tensão na armadura transversal assumirão
42
valores superiores aos médios em comparação com a região das bielas, entre
fissuras, que apresentará uma tensão menor do que a média.
Nessa mesma região fissurada, as tensões de tração no concreto assumem
valor zero na região da fissura enquanto que a meia distância da fissura apresentam
valores superiores à média. A determinação dessas variações locais de tensão nas
fissuras é de grande importância porque é a capacidade da armadura de transmitir as
tensões através das fissuras que vai determinar a capacidade última dos elementos
tensionados biaxialmente.
Se compararmos as tensões médias calculadas com as tensões locais na
região da fissura, perceberemos que enquanto o valor de tensão cisalhante média é
zero no plano principal de tensões médias, pode existir uma tensão cisalhante local τci
na fissura, que vem acompanhada de uma pequena tensão de compressão 𝜎ci através
da fissura. Isto é ilustrado na Figura 6-10. Enquanto a seção S1 exibe as tensões
médias calculadas, a seção S2 exibe as reais tensões locais nas figuras.
Figura 6-10 – Detalhe dos esforços localizados nas fissuras e entre fissuras
As equações de equilíbrio da seção S1 foram apresentadas nas equações (6-8)
e (6-9). As equações de equilíbrio das tensões locais na fissura, com as tensões
externas 𝜎x, 𝜎z, τxz, são apresentadas a seguir:
ci
cixz
xsxfisstgtg
(6-24)
cicixzzszfiss tgtg .. (6-25)
Substituindo as equações (6-8) e (6-9) nas equações (6-24) e (6-25):
43
ci
ci
csxsxsxfisstg
f
1
(6-26)
cicicszszszfiss tgf .1 (6-27)
Embora não existam tensões cisalhantes e de compressão nas faces da seção
fissurada, ainda assim é possível se obter o equilíbrio, como mostrado a seguir:
1cszszszfisssxsxsxfiss f (6-28)
Fica a restrição de que a tensão nas armaduras na seção fissurada não pode
exceder o limite da tensão de cálculo de escoamento do aço:
xydsxfiss f , (6-29)
zydszfiss f , (6-30)
Na maior parte dos tipos de concreto, a fissuração irá ocorrer ao longo da
interface da pasta de cimento e das partículas de agregado. Nessas fissuras, surge
um mecanismo que permite fazer a transferência do cisalhamento pela ligação do
agregado, como ilustrado na Figura 6-11:
Figura 6-11 – Transmissão do esforço de cisalhamento em uma região de fissura
através das ligações proporcionadas pelas particulas de agregado
Diversos estudos foram feitos tentando relacionar o cisalhamento que ocorre
ao longo da fissura, τci, à abertura das fissuras, w e a tensão de compressão na fissura,
𝜎ci, chegando-se a seguinte formulação:
44
máxci
cicimáxcici
,
2
, .82,0.64,1.18,0
(6-31)
onde:
)16/(.2431,0
',
aw
f c
máxci (6-32)
Como a tensão de compressão na fissura 𝜎ci é muita pequena em relação à
tensão de cisalhamento na fissura, τci, adota-se a seguinte simplificação:
)16/(.2431,0
'.18,0
aw
f c
ci (6-33)
Em que a é o tamanho máximo das partículas de agregado em mm e as
unidades das tensões nas equações (6-31) e (6-33) são MPa.
Na determinação da abertura das fissuras w utilizada na equação (6-33)
deverá ser utilizada a largura média das fissuras existentes na superfície fissurada e
pode ser tomada como o produto da deformação principal de alongamento pelo
espaçamento das fissuras, sθ, ou seja:
sw .1 (6-34)
mzmx ss
sens
cos
1
(6-35)
Onde smx e smz são os indicadores das características do controle da fissuração
nas direções de armadura em x e y, respectivamente.
Abordagem geral do programa RESPONSE 2000
Embora o método seja considerado o mais próximo do comportamento real das
peças de concreto armado, como foi dito na introdução desse trabalho, a utilização
manual da Teoria do Campo de Compressão Modificada é muita complexa. A
viabilização dessa utilização comumente conduz a diversas aproximações, o que por
vezes esvazia o proposito inicial de se usar um método tão sofisticado.
Para o estudo realizado nesse trabalho, os resultados da Teoria do Campo de
Compressão Modificada serão obtidos com o auxílio do programa RESPONSE 2000.
O programa, desenvolvido por BENTZ e colaboradores [18], foi elaborado com base
45
nos princípios da Teoria da Compressão Modificada. Ele permite o estudo de vigas e
colunas, submetidas a combinações arbitrárias de cargas axiais, momentos fletores e
forças cortantes. Suas hipóteses básicas são a hipótese da viga de Navier-Bernoulli
(seções planas permanecem planas) e que na seção em estudo não existem
concentrações de tensões.
“O RESPONSE-2000 foi comparado com uma base de dados de 534 vigas e
faz a previsão de tensões cisalhantes em relação à média experimental com a razão
de 1,05 e com um coeficiente de variação de 12%. Isto é, se compara favoravelmente
com as 30 proporções de predição do código ACI 318, que têm uma média de 1,20 e
um coeficiente de variação de 32%.”, afirma BENTZ [17].
46
7. Exemplos
Exemplo 1
O Exemplo 1 compara os diversos parâmetros envolvidos no dimensionamento
de uma viga de concreto armado, submetida simultaneamente a esforço de flexão e de
cisalhamento. Esses parâmetros a serem analisados e comparados são obtidos com
as cinco formulações apresentadas ao longo do trabalho:
• ABNT NBR 6118:2014 – Dimensionamento a flexão e cortante
separadamente e de forma usual, levando em conta a correção da força na
armadura principal oriunda do esforço de cisalhamento atuante, conforme
proposto em [1];
• Método das Bielas e Tirantes – Dimensionamento pelo método mostrado
em SANTOS [3], considerando uma treliça com ângulo de inclinação das
bielas de 45º;
• fib Model Code 2010 – Dimensionamento a flexão e cortante
separadamente, seguindo a recomendação do Nível III de aproximação
para a determinação do ângulo θ de inclinação das bielas de compressão
em cada seção;
• Método da Seção Equivalente – Dimensionamento acoplado da flexão e
cisalhamento, com auxilio do programa FNL-CORTE;
• Teoria do Campo de Compressão Modificada – Dimensionamento pela
Teoria do Campo de Compressão, com o auxílio do programa
RESPONSE-2000.
A viga a ser estudada está bi-apoiada e tem 8 metros de comprimento. Sua
seção transversal é retangular, com base de 20 cm e altura de 120 cm. Será
considerado que d’ mede 10 cm e d consequentemente mede 110 cm. O concreto da
viga é C25 e seu coeficiente de minoração da resistência é γc é de 1,4. O aço das
armaduras é do tipo CA-50 e seu coeficiente de minoração é de 1,15. O coeficiente de
majoração das cargas adotado será γf igual a 1,4. A solicitação considerada nesse
exemplo será a de uma carga concentrada aplicada exatamente no centro da viga. A
Figura 7-1 ilustra essas informações, exibindo o carregamento e a distribuição das
armaduras, que são consideradas aqui constantes ao longo da viga.
47
Figura 7-1 – Esquema longitudinal de carregamento(valores característicos) e
armaduras. [3]
Dimensionamento pelo Método das Bielas e Tirantes (Treliça)
Conforme mostrado em SANTOS[3], o braço de alavanca da treliça z=1,00 m é
referente ao Md,máx, como mostrado abaixo É adotado para a inclinação das bielas um
ângulo θ = 45º. O braço de alavanca mínimo, referente ao momento fletor máximo,
como acima citado, é encontrado com o auxílio dos coeficientes adimensionais κMd, κx
e κz como se mostra a seguir:
130,0)..( 2Md
cckw
d
fdb
M
208,08,0
85,0
.211
x
Md
916,04,01z x
mdz 00,1. z
A partir de então são calculadas as forças nas bielas comprimidas, no banzo
comprimido e nos banzos horizontal e verticais tracionados, com auxílio das equações
(4-3) a (4-6), respectivamente, e seus valores avaliados para esforços característicos,
assumindo θ = 45º e z = 1,00. A Figura 7-2 exibe o equilíbrio encontrado para a treliça
discreta usando o método das bielas e tirantes.
48
Figura 7-2 – Treliça discreta – Método das Bielas e Tirantes. [3]
Dimensionamento pela ABNT NBR 6118:2014
Será feito o dimensionamento da força no banzo inferior para o esforço de
flexão, Fsd, para depois calcular-se a correção dessa força devido ao esforço cortante,
Fsd,cor, conforme equação (4-15), para θ = 45º. A deformada da seção transversal será
encontrada em função da deformação da armadura longitudinal, εSd, para a força
FSd,cor, já que a quantidade de aço já está definida. A tensão nos estribos será
determinada com a equação (4-9), adotando θ = 45º e α = 90º. A parcela Vc será aqui
desprezada, a fim de permitir uma melhor comparação com os outros métodos.
Dimensionamento pelo fib Model Code 2010 – Level III
O principal objetivo de se considerar esta metodologia foi o de se utilizar de
suas equações para o ângulo de inclinação das bielas e de força corrigida nas
armaduras. Serão considerados dessa forma, os mesmos coeficientes, de majoração
de cargas e minoração das resistências, utilizados na NBR 6118:2014, de forma que
os únicos parâmetros diferentes sejam realmente os supracitados. A Tabela 7-1 exibe
os valores de εx e θ, calculados com as equações (4-27) e (4-26) respectivamente para
as seções consideradas.
Tabela 7-1 – Valores de εx e θ para cada seção
x (m) εx θ(º)
1 0,41x10-3 31,86
2 0,61x10-3 33,30
3 0,83x10-3 34,80
V=100 kN L=8m V=100 kN
200 kN
z = 1m
0 -100 -200 -300
0 100 100 100 0
-1002 -1002 -1002 -1002
100 200 300 400
49
A partir daqui será realizado um dimensionamento idêntico ao da
NBR 6118:2014, para se encontrar a força na armadura longitudinal, com exceção da
correção dessa força, que utilizará a equação (4-30) com o valor de VRdc desprezado.
Dimensionamento pelo Método da Seção Equivalente
Como dito anteriormente, nesse trabalho utilizou-se o programa FNL-CORTE,
desenvolvido por CELESTE [7]. O programa divide a seção transversal de concreto
em 20 faixas horizontais de concreto e uma porção discreta de camada de armadura,
conforme explicado em CELESTE [7]. O programa realiza um processo iterativo de
dez iterações pré-definidas, após o qual se atinge um valor satisfatório para o índice
de convergência.
Dimensionamento pela Teoria do Campo de Compressão
Devido a incapacidade de se utilizar o método manualmente sem ter que
adotar simplificações grosseiras, foi utilizado o programa RESPONSE–2000. O
programa permite a adoção de um concreto que não resiste a tração e nem possui
mecanismos complementares de resistência ao cortante.
Comparação de Resultados
Foram analisadas três seções transversais, espaçadas a cada metro, partindo
do apoio e indo em direção ao vão, já que a estrutura é simétrica. A seção central não
sofre influência do cortante e em sua proximidade a angulação das bielas sofre uma
variação particular, cuja determinação foge ao escopo desse trabalho.
A Tabela 7-2 e a Figura 7-3 apresentam as deformações longitudinais na seção
transversal, sendo εs a deformação no nível da armadura e εcd a deformação no topo
da seção, para os esforços de cálculo em cada uma das seções, calculados por cada
método distinto. Para se encontrar as deformações nos métodos NBR, Treliça, fib e
Método da Seção Equivalente foi utilizado o “software” CAPIBA, desenvolvido por
SOUZA JR [20]. Já o RESPONSE-2000 fornece esse resultado como uma das saídas
do processamento.
50
Tabela 7-2 – Deformações longitudinais (mm/m)
x (m) ····NBR/Treliça -------fib ˗˗˗˗˗˗MSE -·-·-·-RSP
εs εcd εs εcd εs εcd εs εcd
1 0.634 -0.186 0.760 -0.127 0.626 -0.201 0.725 -0.080
2 1.069 -0.459 1.171 -0.422 1,067 -0.486 1.140 -0.438
3 1.513 -0.745 1.595 -0.712 1.511 -0.780 1.569 -0.748
Figura 7-3 – Deformações longitudinais (mm/m)
A Tabela 7-3 e a Figura 7-4 apresentam as forças de tração na armadura
longitudinal, FSd, para os esforços de cálculo em cada uma das seções, calculados por
cada método distinto.
Tabela 7-3 – Forças na armadura longitudinal (kN)
x (m) FSd
····NBR ---Treliça -··˗FIB ˗˗˗ MSE -·˗ RSP
1 199,8 210 242,5 206,6 240
2 335,1 350 371,7 352,1 376
3 476,6 490 507,3 499 517
51
Figura 7-4 – Forças na armadura longitudinal (kN)
A Tabela 7-4 e a Figura 7-5 apresentam as forças de tração nos estribos para 1
metro, Vsw, para os esforços de cálculo em cada uma das seções, calculados por cada
método distinto. É importante lembrar que estão sendo desprezadas a resistência do
concreto a tração e a existência de mecanismos complementares Vc.
Tabela 7-4 – Forças nas armaduras verticais (kN/m)
x (m) VSw
····NBR ---Treliça -··˗FIB ˗˗˗ MSE ˗·˗ RPS
1 129,8 140 80,7 141,1 162.9
2 132,5 140 87,1 146,4 154.9
3 135,5 140 94,2 147,7 154.0
Figura 7-5 – Forças nas armaduras verticais (kN)
52
Exemplo 2
O Exemplo 2 faz as mesmas análises sobre a mesma viga do Exemplo 1.
Porém o carregamento será majorado, a fim de levar a seção ao máximo de sua
capacidade. Essa nova configuração pode ser vista na Figura 7-6.
Figura 7-6 – Esquema longitudinal de carregamento e armaduras. [3]
Dimensionamento pelo Método das Bielas e Tirantes (Treliça)
Com isso, teremos um novo cálculo para os coeficientes adimensionais
relativos ao Md,máx. Novamente adotaremos para a inclinação das bielas um ângulo
θ = 45º. O braço de alavanca mínimo, referente ao momento fletor máximo, como
acima citado, é facilmente encontrado com o auxílio dos coeficientes adimensionais
κMd, κx e κz como se mostra a seguir:
156,0)..( 2Md
cckw
d
fdb
M
255,08,0
85,0
.211
x
Md
898,04,01z x
mdz 00,1. z
A partir de então são calculadas as forças nas bielas comprimidas, no banzo
comprimido e nos banzos horizontal e verticais tracionados, com auxílio das equações
53
(4-3) a (4-6), respectivamente, e seus valores avaliados para esforços característicos,
assumindo θ = 45º e z = 1,00. A Figura 7-7 exibe o equilíbrio encontrado para a treliça
discreta usando o método das bielas e tirantes.
Figura 7-7 – Treliça discreta – Método das Bielas e Tirantes. [3]
Dimensionamento pelo fib Model Code 2010 – Level III
Como as cargas mudaram, deverão ser atualizados os ângulos de inclinação
para o novo carregamento. A Tabela 7-5 exibe os novos valores de εx e θ, calculados
com as equações (4-27) e (4-26) respectivamente para as seções consideradas.
Tabela 7-5 – Valores de εx e θ para cada seção
x (m) εx θ(º)
1 0,49x10-3 32,44
2 0,74x10-3 34,19
3 1,00x10-3 36,03
A partir daqui será realizado um dimensionamento idêntico ao da
NBR 6118:2014, para se encontrar a força na armadura longitudinal, com exceção da
correção dessa força, que utilizará a equação (4-30) com o valor de VRdc desprezado.
Comparação de Resultados
As mesmas seções foram analisadas. A Tabela 7-6 e a Figura 7-8 apresentam
as deformações longitudinais na seção transversal, sendo εs a deformação no nível da
armadura e εcd a deformação no topo da seção, para os esforços de cálculo em cada
uma das seções, calculados por cada método distinto. Para se encontrar as
deformações nos métodos NBR, Treliça, fib e Método da Seção Equivalente foi
54
utilizado o “software” CAPIBA, desenvolvido por SOUZA JR [20]. Já o RESPONSE-
2000 fornece esse resultado como uma das saídas do processamento.
Tabela 7-6 – Deformações longitudinais (mm/m)
x (m) ····NBR/Treliça -------fib ˗˗˗˗˗˗MSE -·-·-·-RSP
εs εcd εs εcd εs εcd εs εcd
1 0.767 -0.230 0.905 -0.145 0.752 -0.242 0.842 0.026
2 1.288 -0.560 1.394 -0.516 1.281 -0.592 1.369 -0.533
3 1.813 -0.910 1.903 -0.881 1.820 -0.959 1.888 -0.919
Figura 7-8 – Deformações longitudinais (mm/m)
A Tabela 7-7 e a Figura 7-9 apresentam as forças de tração na armadura
longitudinal, FSd, para os esforços de cálculo em cada uma das seções, calculados por
cada método distinto.
Tabela 7-7 – Forças na armadura longitudinal (kN)
x (m) FSd
····NBR ---Treliça -··˗FIB ˗˗˗ MSE -·˗ RSP
1 240,4 252 288,5 248 278
2 404,9 420 444,5 423,1 452
3 578,9 588 610,3 600,6 623
55
Figura 7-9 – Forças na armadura longitudinal (kN)
A Tabela 7-8 e a Figura 7-10 apresentam as forças de tração nos estribos, Vsw,
para os esforços de cálculo em cada uma das seções, calculados por cada método
distinto. É importante lembrar que estão sendo desprezadas a resistência do concreto
a tração e a existência de mecanismos complementares Vc.
Tabela 7-8 – Forças nas armaduras verticais (kN/m)
x (m) VSw
····NBR ---Treliça -··˗FIB ˗˗˗ MSE ˗·˗ RPS
1 156,4 168 99,4 169.4 228,2 (*)
2 160,4 168 109,0 176,2 185,7
3 165,0 168 120,0 178,4 185,6
(*) – Este resultado fornecido pelo programa não é coerente
Figura 7-10 – Forças nas armaduras verticais (kN)
56
8. Conclusão
O foco do trabalho foi compreender como as solicitações de flexão e
cisalhamento agem de forma concomitante nas peças de concreto armado. Para isso,
vários métodos racionais, com diferentes graus de sofisticação foram utilizados.
Os resultados indicam quão importante é uma adequada verificação das
tensões combinadas de flexão e cisalhamento no concreto, a fim de se garantir a
integridade da estrutura. As tensões aqui citadas como tração diagonal e compressão
diagonal devem receber especial atenção por parte do projetista durante a etapa de
dimensionamento.
As teorias apresentadas nesse projeto são oriundas do modelo de painel
fissurado, sendo portanto sujeitos a estados de tensão em duas dimensões, incluindo
o cisalhamento. O método da fib Model Code 2010 tem o mérito de apesar de ser um
modelo de treliça, considerar a variação do ângulo θ de inclinação das bielas ao longo
da altura da seção. Os métodos mais sofisticados aqui utilizados, a Teoria do Campo
de Compressão e o Método da Seção Equivalente tem o diferencial de considerar a
não linearidade física em suas relações constitutivas, no momento da definição da
configuração deformada. O Método da Seção Equivalente no entanto não faz
compatibilização das deformações. De forma alguma isso desqualifica o método, já
que o equilíbrio de esforços é mantido. A única incompatibilidade de esforços é o da
força cortante resistente VRd, que será um pouco maior do que a força cortante
solicitante VSd. Nenhuma dessas teoria leva em consideração o histórico de
carregamentos. Além disso, elas supõem comportamento elástico e também a
hipótese de que a inclinação das bielas de compressão e a direção das fissuras
coincidem.
Os exemplos apresentados tiveram o objetivo de verificar o comportamento da
peça sub-armada e balanceada. Eles apresentaram resultados comparativos
satisfatórios entre os modelos analisados. A armadura longitudinal apresentou
comportamento com pouco desvio na comparação dos métodos, tanto para a
deformação quanto para a força. Os valores de força nas armaduras transversais
foram maiores pelo RESPONSE-2000.
A Teoria do Campo de Compressão Modificada apresenta na sua formulação a
compatibilização das deformações. Além disso, considera a resistência do concreto a
tração e os mecanismos complementares de resistência ao cisalhamento. Porém, não
é intuitiva e nem prática, sendo a sua utilização dependente de simplificações
grosseiras que reduzem o proposito de se utilizar um método tão sofisticado. O
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programa RESPONSE-2000 supera esse obstáculo, dando grande agilidade ao
processo de se utilizar o método, sendo amparado em amplo acervo de ensaios
experimentais. Já o Método da Seção Equivalente foi tratado aqui de forma específica,
desprezando a resistência de mecanismos complementares de resistência ao
cisalhamento.
58
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