os maias - marcas estético literárias queirosianas e narrador

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Eça de Queirós - Os Maias Caricatura de Abel Manta

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Page 1: Os Maias - marcas estético literárias queirosianas e narrador

EçadeQueirós-OsMaias

CaricaturadeAbelManta

Page 2: Os Maias - marcas estético literárias queirosianas e narrador

Presençanaação

Focalização

Narradorheterodiegé=coNãointervémnaaçãocomopersonagem

FocalizaçãoomniscienteDescriçãodoRamalhete,passadodosMaias,formaçãodeCarlos,retratodeJoãodaEga…Focalizaçãointerna•  Vilaça:educaçãodeCarlos,emSantaOlávia•  CarlosdaMaia:JantardoHotelCentral,CorridasdeCavalos…•  Ega:Redaçãodojornal“ATarde”,SaraudaTrindade

Linguagem, estilo e estrutura

O romance: presença e focalização do narrador

Page 3: Os Maias - marcas estético literárias queirosianas e narrador

A descrição do real e o papel das sensações

AdescriçãodorealéfeitacomrecursoaoIMPRESSIONISMOLITERÁRIO.

O impressionismo é uma escola de pintura que valoriza acor, a luminosidade, os contornos esfumados, os efeitosprovocadospelarealidadeobservada.

Assensações(visuais,audiOvas,olfaOvas,gustaOvasetáteis)assumemumpapelessencialnadescriçãodoreal,construindobelasimagenssinestésicas.Naprosaimpressionistaqueirosiana,privilegia-se,entreoutrosrecursos,asinestesia–recursoexpressivoqueconsistenaassociaçãodeduasoumaissensaçõespertencentesaregistossensoriaisdiferentes.Ex.:“umaluzmacia,escorregandodocementedoazul-ferrete,vinhadourarasfachadasenxovalhadas”.

P.A.Renoir,MoulindelaGale<e

Page 4: Os Maias - marcas estético literárias queirosianas e narrador

A descrição do real e o papel das sensações

C.Monet,MadameMonetandChildinaGarden

Valorizaçãodaobservaçãoedaanálisedasociedade(episódiosdecorrentesdosubXtulo).

Descriçãoexataerigorosadoreal(descriçãodoRamalhete).

Recursoaumvocabulárioquetransmitediferentessensações,nomeadamentenadescriçãodosespaços(descriçãodeAToca).

Page 5: Os Maias - marcas estético literárias queirosianas e narrador

Cap.X -Nodomingoseguinte,pelasduashoras,

Carlosno seu faetondeoitomolas, levandoao

ladoCraYqueduranteosdoisdiasdecorridasse

instalaranoRamalhete,parouaofimdolargode

Belém, no momento em que para o lado do

Hipódromo estavam já estalando foguetes. Um

dos criados desceu a comprar o bilhete de

pesagem para o CraY, numa tosca guarita de

madeira, armada ali de véspera, onde semexia

umhomenzinhodegrandesbarbasgrisalhas.Era

umdia jáquente,azul ferrete, comumdesses

ru=lantessóisdefestaqueinflamamaspedras

da rua, doiram a poeirada baça do ar, põem

fulgoresdeespelhopelasvidraças,dãoatodaa

cidade essa branca faiscação de cal, dum vivo

monótono e implacável, que na lenOdão das

horas de verão cansa a alma, e vagamente

entristece.

Prenúncio de que esta corrida de cavalosserá pouco digna, já que tudo foipreparadode“véspera”esemcuidado.

DiminuOvocomsenOdopejoraOvo–descredibilizaapessoaqueestáaterestafunção.

Impressionismoliterário–valorizaçãodassensações,nestecasoasensaçãovisualeaimportânciadaluz.

Este ambiente sugere a asfixia e oincómodo que a situação provoca nospresentes.

Page 6: Os Maias - marcas estético literárias queirosianas e narrador

Umacalechedepraçapassou,comdoissujeitosdefloresaopeito,acabandodecalçarasluvas;depoisumdog-cart,governadoporumhomemgordo,delunetaspretas,quasefoiesbarrarcontraoArco.Enfim,CraYvoltoucomoseubilhete,tendosidodescompostopelohomemdebarbasproféOcas.Paraalémdoarco,apoeirasufocava.Pelasjanelashaviasenhorasdebruçadas, olhando por debaixo de sombrinhas. Outrosmunicipais,acavalo,atravancavamarua.Àentradaparaohipódromo, aberturaescalavradanummurodequintarola, o faeton teve de parar atrás do dog-cart do homemgordo - que não podia também avançar porque a porta estavatomada pela caleche de praça, onde um dos sujeitos de flor aopeito berrava furiosamente com um polícia. Queria que se fossechamaroSr.Savedra!OSr.Savedra,queeradoJockeyClub,Onha-lhe dito que ele podia entrar sem pagar a carruagem! Ainda lhodissera na véspera, na boOca do Azevedo! Queria que se fossechamar o Sr. Savedra! O polícia bracejava, enfiado. E o cavaleiro,Orandoasluvas,iaabriraporOnhola,esmurrarohomem-quando,trotandonagrandehorsa,ummunicipaldepunhoalçadocorreu,gritou, injuriou o cavaleiro gordo, fez rodar para fora a caleche.Outro municipal intrometeu-se, brutalmente. Duas senhoras,agarrando os ves=dos, fugiram para um portal, espavoridas. Ea t ravés do rebu l i ço , da poe i ra , sen=a-se ad iante ,melancolicamente,umrealejotocandoaTraviata.O faeton entrou - atrás do dog-cart, onde o homem gordo, aestoirar de fúria, voltava aindapara trás a face escarlate, jurandodarpartedomunicipal.-Tudoistoestáarranjadocomdecência,murmurouCraY.

CríOcadecostumes–oespaçoondeiria decorrer a corrida não Onhacond i ções , hav i a demas i ada“poeira”, tanta que “sufocava”, aen t r ada e r a uma “ abe r tu r ae s c a l a v r a d a n um mu r o d equintarola” e as pessoas nãoconseguiam ter um comportamentodigno, já que estavam a provocardesacatos. Apesar disso, ouvia-se a“Traviata” numa tentaOva de elevaro evento ao nível das corridas deInglaterra.

RecursosexpressivosqueconferemironiaàdescriçãoemordacidadeàcríOca.•  ExpressividadedosadjeOvos;•  Expressividadedosadvérbios;•  Ironia;•  Expressõesquecriamumefeito

decómico;•  Discursoindiretolivre;•  Gerúndio;•  Expressividadedosverbos.

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Norecintoemdeclive,entreatribunaeapista,haviasóhomens, a gente do Grémio, das Secretarias e da CasaHavaneza; a maior parte à vontade, com jaquetõesclaros, e de chapéu coco; outros mais em esOlo, desobrecasacaebinóculoaOracolo,pareciamembaraçadose quase arrependidosdo seu chic. Falava-sebaixo, compassos lentos pela relva, entre leves fumaraças decigarro. Aqui e além um cavalheiro, parado, de mãosatrás das costas, pasmava languidamente para assenhoras.Ao ladodeCarlosdoisbrasileirosqueixavam-se do preço dos bilhetes, achando aquilo «umasensaboriaderachar.»Defronte a pista estava deserta, com a relva pisada,guardada por soldados: e junto à corda, do outro lado,apinhava-seomagotedegente,comascarruagenspelomeio,semumrumor,numapasmaceiratristonha,sobopesodosoldejunho.

O cenário que deveria ostentar aexuberânc i a e o co lo r ido de umacontecimento mundano como as corridasde cavalos, demonstra, uma imagemprovinciana indesmenXvel. Isto torna-semais significaOvo, se pensarmos que noclima humano do Hipódromo predominavaumacarênciademoOvaçãoevitalidade.

As pessoas não sabiam como se vesOr ecomoagir.Oshomensestão separadosdasmulheres.

ParaalémdodesacatoinicialcomosenhorquequeriaentrarsempagaruOlizandoumacunha(osenhorSavedra),existemaisumtumultoatravésdos“doisbrasileiros”quesequeixamdopreçodoevento,comaagravantedestenãoserminimamenteinteressante.

Page 8: Os Maias - marcas estético literárias queirosianas e narrador

-Vamosnósverasmulheres,disseCarlos.Seguiramdevagaraocompridodatribuna.Debruçadasnorebordo,numafilamuda,olhandovagamente,comodumajanelaemdiadeprocissão,estavamalitodas as senhoras que vêm no high-life dos jornais, as dos camarotes de S.Carlos,asdasterças-feirasdosGouvarinhos.AmaiorparteOnhavesOdossériosde missa. Aqui e além um desses grandes chapéus emplumados àGainsborough,queentãosecomeçavamausar,carregavadumasombramaiorotomtrigueirodumacarinhamiúda.Enaluzfrancadatarde,nograndeardacolinadescoberta,aspelesapareciammurchas,gastas,moles,comumbaçodepódearroz.Carlos cumprimentou as duas irmãs do Taveira, magrinhas, loirinhas, ambascorretamentevesOdasdexadrezinho:depoisa viscondessadeAlvim,nédiaebranca,comocorpetenegroreluzentedevidrilhos,tendoaoladoasuaternainseparável,aJoaninhaVilar,cadavezmaischeia,comumquebrantocadavezmaisdocenosolhospestanudos.AdianteeramasPedrosos,asbanqueiras,decoresclaras,interessando-sepelascorridas,umadeprogramanamão,aoutradepéedebinóculoestudandoapista.Aolado,conversandocomSteinbroken,a condessa de Soutal, desarranjada, comumar de ter lamanas saias.Numabancadaisolada,emsilêncio,Vilaçacomduasdamasdepreto.AcondessadeGouvarinhoaindanãoviera.EnãoestavatambémaquelaqueosolhosdeCarlosprocuravam,inquietamenteesemesperança.-Éumcanteirinhodecaméliasmeladas,disseoTaveira,repeOndoumditodoEga.Carlos,noentanto,forafalaràsuavelhaamigaD.MariadaCunhaque,haviamomentos, o chamava com o olhar, com o leque, com o seu sorriso de boamamã.EraaúnicasenhoraqueousaradescerdoreOroajaneladodatribuna,evir sentar-seembaixo, entreoshomens:mas, comoeladisse, nãoaturara asecadeestarláemcimaperfilada,àesperadapassagemdoSenhordosPassos.E, bela ainda sob os seus cabelos já grisalhos, só ela parecia diverOr-se ali,muitoàvontade,comospéspousadosna travessadumacadeira,obinóculonoregaço,cumprimentadaacadainstante,tratandoosrapazespormeninos...

Carlosnãoestáinteressadonascorridas.

A s m u l h e r e s e s t a v a mdesenquadradas, pareciamqueiam para uma procissão –completo desajuste do traje eda postura para a ocasião emqueestãoinseridas.

O ambiente que deveria serrequintado, mas ao mesmotempo ligeiro como compete aum evento desporOvo eradeturpado,pelafaltadegostoepeloridículodasituaçãoquesequeriarequintadasemoser.

Ú n i c a m u l h e r c om umcomportamentodiferente.

Valordos:•  diminuOvos;•  adjeOvos;•  advérbios.

Page 9: Os Maias - marcas estético literárias queirosianas e narrador

-Vamosnósverasmulheres,disseCarlos.Seguiram devagar ao comprido da tribuna. Debruçadas no rebordo,numa fila muda, olhando vagamente, como duma janela em dia deprocissão, estavam ali todas as senhoras que vêm no high-life dosjornais, as dos camarotes de S. Carlos, as das terças-feiras dosGouvarinhos.AmaiorparteOnhavesOdossériosdemissa.AquiealémumdessesgrandeschapéusemplumadosàGainsborough,queentãosecomeçavamausar,carregavadumasombramaiorotomtrigueirodumacarinha miúda. E na luz franca da tarde, no grande ar da colinadescoberta,aspelesapareciammurchas,gastas,moles,comumbaçodepódearroz.Carlos cumprimentou as duas irmãs do Taveira, magrinhas, loirinhas,ambas corretamente vesOdas de xadrezinho: depois a viscondessa deAlvim,nédiaebranca,comocorpetenegroreluzentedevidrilhos,tendoao lado a sua terna inseparável, a JoaninhaVilar, cada vezmais cheia,comumquebranto cada vezmais docenos olhos pestanudos.AdianteeramasPedrosos,asbanqueiras,decoresclaras, interessando-sepelascorridas, uma de programa na mão, a outra de pé e de binóculoestudandoapista.Aolado,conversandocomSteinbroken,acondessadeSoutal, desarranjada, comumarde ter lamanas saias.Numabancadaisolada,emsilêncio,Vilaçacomduasdamasdepreto.AcondessadeGouvarinhoaindanãoviera.EnãoestavatambémaquelaqueosolhosdeCarlosprocuravam,inquietamenteesemesperança.- Éumcanteirinhodecaméliasmeladas,disseoTaveira, repeOndoumditodoEga.Carlos,noentanto,forafalaràsuavelhaamigaD.MariadaCunhaque,haviamomentos,ochamavacomoolhar,comoleque,comoseusorrisodeboamamã.EraaúnicasenhoraqueousaradescerdoreOroajaneladoda tribuna, e vir sentar-se em baixo, entre os homens:mas, como eladisse, não aturara a seca de estar lá em cima perfilada, à espera dapassagem do Senhor dos Passos. E, bela ainda sob os seus cabelos jágrisalhos, só ela parecia diverOr-se ali, muito à vontade, com os péspousados na travessa duma cadeira, o binóculo no regaço,cumprimentadaacadainstante,tratandoosrapazespormeninos...

Hipálage – evidencia o desfasamento entre aaparência e o comportamento do grupofemininoeoexpectávelnascircunstânciasdacorrida..

Recurso ao diminuOvo – confere umaconotaçãoirónicaàsrealidadesdesignadas

Comparação – realça o desinteresse dasmulheres, aproximando as suas aOtudes dasadotadasemsituaçõesdecarizreligioso.

Uso do advérbio com valor de modo –intensifica a abstraçãoe a desadequaçãodaspersonagensfemininasfaceaoespaço.

RecursoaoadjeOvo–confereumaconotaçãoirónicaàsrealidadesdesignadas

Metáfora – sinteOza depreciaOvamente aimpressãoprovocadapelasmulheres.

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ComparaçãoRelação de analogia entre dois termos com o objeOvo de assinalar as suas diferenças ousemelhanças,recorrendoaumapalavraouexpressãocomparaOva.Ex.:“NessemomentoCarlos,cujavozgritavanocorredorpelovovô,precipitou-senoquarto,esguedelhado,escarlatecomoumaromã.”

AcomparaçãoéuOlizadapararealçaracordafacedeCarlose,consequentemente,asuavitalidadeeenergiaenquantocriança.

Linguagem, estilo e estrutura

Recursos expressivos

IroniaExpressão em que se sugerem ideias ou senOmentos contrários ou diferentes do que se diz. Ainterpretaçãocorretadeumaironiadependedocontextoedoentendimentodointerlocutor.Ex.:“omorgadinho,oEusebiozinho,umamaravilhamuitofaladanaquelessíFos”

AironiadácontadaperspeOvacríOcadonarradorfaceàformacomooEusebiozinhoeraapreciadopelapopulaçãolocal.

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MetáforaUOlizaçãodeumtermoparadesignaralgodiferentedaquiloquedesignahabitualmente,aparOrdeelementosquesãocomunsaessetermoeaoqueelerefere.Ex.:“Apesar deste fresconomede vivenda campestre, oRamalhete […]Fnhaoaspeto tristonhoderesidência eclesiásFca que compeFa a uma edificação do reinado da senhoraD.Maria I: com umasinetaecomumacruznotopo,assemelhar-se-iaaumcolégiodeJesuítas.”

Comestametáforarealça-seoaspetoseverodoRamalhete,paraalémdesesugerirainfluênciaclericalnafamíliadosMaias.

PersonificaçãoAtribuição de caracterísOcas humanas (pensamentos, senOmentos, ações) a seres inanimados, aanimaisouaenOdadesabstratas.Ex.:“Opalacetedeitavasobreaquelebocadodeterraçoasombradosseusmurostristes;dovalesubiaumafrescuraeumgrandear;ealgures,embaixo,senFa-seopranteardeumrepuxo.”Atravésdapersonificaçãosugere-seaharmoniaeamelancoliaassociadasaoespaçodescrito.

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SinestesiaAssociaçãodesensaçõesresultantesdaperceçãosensorialdesenOdosdiferentes.Ex.:“Carlostevedificuldadesemencontrara«VilaBalzac»:[…]eaí,numrecanto,ladeadademuros,aparecia enfim uma casota de paredes enxovalhadas, com dois degraus de pedra à porta etransparentesnovosdeumescarlateestridente.”

Atravésdasinestesia(“escarlateestridente”)realça-seumadasprincipaiscaracterísOcasdaVilaBalzac:aexcentricidadeexcessiva.

Usoexpressivodoadje=voEmpregodoadjeOvocomointuitodeconferirbelezaaotextoederealçaracaracterísOcaporeleexpressa.OusoexpressivodoadjeOvopoderesultardaassociaçãodeumnomequedesignaumaqualidadepsicaeumadjeOvodecarácterafeOvo/emocional.OadjeOvopodeaindaseruOlizadoparacriarametáfora,asinestesia,aironia…Ex.:“umaluzmacia,escorregandodocementedoazul-ferrete,vinhadourarasfachadasenxovalhadas,ascopasmesquinhasdasárvoresdomunicípio!…”

OsadjeOvos“enxovalhadas”e“mesquinhas”sãouOlizadosexpressivamente,conferindoàdescriçãoumadimensãocríOca(críOcaàsociedadelisboeta).

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Usoexpressivodoadvérbioemprego do advérbio com o intuito de conferir beleza ao texto e de realçar determinado valorsemânOco.Ousoexpressivodoadvérbiopodecontribuirparaaconstruçãodaironia.Ex.:“OEusebiozinhofoientãopreciosamentecolocadoaoladodaFF”

Oadvérbio“preciosamente”éusadoironicamente,sugerindootomdepreciaOvodonarradorrelaOvamenteàsuperproteçãoeaomimodequeEusebiozinhoéalvoporpartedafamília.

•  “cabelosmagnificamentenegros”•  “Ovenerávelgatogostavadelambercomoseuvagarestúpido”•  “luzmacia”•  “omorgadinho,oEusebiozinho,umamaravilhamuitofaladanaqueles

síOos”•  “sim,coitado,coitadinho,coitadíssimo!”•  “oconchegoquenteeumpoucosombriodosestofosescarlatesepretos

eraalegradopelascorescantantesdevelhasfaiançasholandesas”•  “Eàdistância,semcessar,oestalaralegredefoguetesmorrianoar

quente”•  “Em1858MonsenhorBuccarini,NúnciodeS.SanOdade,visitara-ocom

ideiadeinstalarláaNunciatura,seduzidopelagravidadeclericaldoedipcioepelapazdormentedobairro”

•  “masnuncaeleaprovaraqueAfonsosedesfizessedeBenfica–sópelarazãodaquelesmurosteremvistotantosdesgostosdomésOcos.”

•  “passou-lheparaosbraçosumadeliciosacadelinhaescocesa,depelosesguedelhados,finoscomosedaecordeprata”

•  Comparação•  Sinestesia•  Metáfora•  Personificação•  Ironia•  Gradação•  Usoexpressivodo

adjeOvo•  Usoexpressivodo

advérbio

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DiscursodiretoModalidadedereproduçãododiscursoemquesereproduzodiscursooriginaltalcomoeleterásidoditopeloemissor.Naescrita,introduz-seportravessãooudelimita-seportravessõesouaspas.Ex.: “—Que diabo, nãome hão de esquecer as queijadas!—murmurou Cruges, para simesmo,afastando-sedoparapeito.”

Odiscursodiretoébastanteexpressivo,evidenciandoacoloquialidadedalinguagemeapreocupaçãodeCrugescomas“queijadas”deSintra(cf.expressividadedoverbo“murmurar”,queintroduzodiscursodireto).

Reprodução do discurso no discurso

DiscursoindiretoModalidade de reprodução do discurso em que se reproduz o discurso num novo discurso, comalgumastransformações.Faz-sepormeiodasubordinação.Ex.: “EgamurmurouqueaHistória se encarregariaumdiade reCficar esse facto. […] E entãooGouvarinho,queacenderaocharuto,espreitaraoutravezorelógio,perguntouseosamigosCnhamouvidoalgumacoisadoMinistérioedacrise.”

Atravésdodiscursoindireto,onarradorreproduzomurmúriodeEgaeaperguntadoGouvarinho.

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DiscursoindiretolivreModalidadedereproduçãododiscursoquesurgesobretudoemtextosliteráriosequeémarcadapelasobreposiçãododiscursodonarradoredapersonagem.Faz-sesemrecursoàsubordinação,masrecorrendoà3.ªpessoaverbalemantendopalavras,expressõesesintaxedecarizoralizante.Ex.:“Depois,reclinando-separaascostasdacadeiraeabrindooleque,declarou,atrasbordardeironia,que,talvezporterainteligênciacurta,nuncacompreenderaavantagemdos«métodos»...Eraàinglesa,segundodiziam:talvezprovassembememInglaterra;masouelaestavaenganada,ouSantaOláviaeranoreinodePortugal.Atravésdodiscursoindiretolivre,reproduz-seexpressivamenteodiscursoproduzidoporD.AnaSilveira,evidenciando-seocarácterretrógradoeprovincianodestapersonagem.

QualéaformaderelatodediscursouOlizadanafrase:“Dâmaso…conheceraarapariga,a

quederaas facadas,quandoelaeraamantedoviscondedaErmidinha…Seerabonita?

Muitobonita.Umasmãosdeduquesa…Ecomoaquilocantavaofado!”?

NestafraseuOliza-seodiscursoindiretolivre.

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Diminu=voOsdiminuOvossão,igualmente,umacaracterísOcaimportanteemEçadeQueirós,jáquetransmitemoafetodasrelaçõese,maisfrequentemente,estãoaoserviçodotomcaricaturaledepreciaOvodonarradoraquandodasuacríOcadecostumesàsociedadedoseutempo.Ex.:“Eusebiozinho”.

AtravésdodiminuOvoéreforçadoocarácterdébil,frágilepoucodesenvolvidodestapersonagem.

Emprés=mosApresençadeemprésOmos(francesismoseanglicismos)surgeparadesignarrealidadesquealínguaportuguesanãoabarca,masestátambémassociadaàintençãocríOcaqueacentuaojogodasaparênciasdasociedadelisboetaeasuanecessidadedeimitartudoaquiloqueéestrangeiro.Ex.:“Chicavaler!”

EstaéumafalaXpicadeDâmasoquecaricaturaestapersonagem,namedidaemquesublinhaonovo-riquismodestapersonagem.

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Outros recursos expressivos característicos de Eça de Queirós

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Cap.II,pp.68-69D.AnaSilveira,asolteiraemaisvelha,passavapelatalentosadafamília,eera em pontos de doutrina e de eOqueta uma grande autoridade emResende. A viúva, D. Eugénia, limitava-se a ser uma excelente epachorrenta senhora, de agradável nutrição, trigueirota e pestanuda;Onhadoisfilhos,aTeresinha,anoivadeCarlos,umarapariguinhamagraevivacomcabelosnegroscomoOnta,eomorgadinho,oEuzebiozinho,umamaravilhamuitofaladanaquelessíOos.Quase desde o berço este notávelmenino revelara um edificante amorporalfarrábioseportodasascoisasdosaber.AindagaOnhavaejáasuaalegria era estar a um canto, sobre uma esteira, embrulhado numcobertor, folheando in-fólios, como crâniozinho calvo de sábio curvadosobreas letrasgarrafaisdeboadoutrina:depoisdecrescidinhoOnhatalpropósito que permanecia horas imóvel numa cadeira, de perninhasbambas,esfuracandoonariz:nuncaapeteceraumtamborouumaarma:mascosiam-lhecadernosdepapel,ondeoprecoceletrado,entreopasmodamamãedaOO,passavadiasatraçaralgarismos,comalinguazinhadefora.Assim na família Onha a sua carreira desOnada: era rico, havia de serprimeirobacharel,edepoisdesembargador.QuandovinhaaSantaOlávia,a Oa Anica instalava-o logo à mesa, ao pé do candeeiro, a admirar aspinturasdumenormeericovolume,OsCostumesdetodosospovosdoUniverso.Jáláestavaessanoite,vesOdocomosempredeescocês,comoplaiddeflamejantexadrezvermelhoenegropostoaOracoloepresoaoombro por uma dragona; para que conservasse o ar nobre dum Stuart,dumvalorosocavaleirodeWalterScoy,nuncalheOravamobonéondesearqueava comheroismo uma ruOlante pena de galo; e nada haviamaismelancólicoqueasuafacezinhatrombuda,aqueoexcessodelombrigasdavaumamolezaeumaamarelidãodemanteiga,osseusolhinhosvagose azulados, sem pestanas como se a ciência lhas Ovesse já consumido,pasmandocomsisudezparaascamponesasdaSicília,eparaosguerreirosferozesdoMontenegroapoiadosaescopetas,empíncarosdeserranias.

Eça de Queirós é um exímio prosador,tendo uma linguagem e esOlo muitopróprios e expressivos, por isso escolhecriteriosamenteaspalavraqueuOliza.

Marcas estético-literárias queirosianas

Diminu=vos:•  fundamentalmente,comumsen=do

irónicoepejora=vo;•  reforçamoretratocaricaturalde

Eusebiozinho,comoem«craniozinho»,«perninhas»,«linguazinha»,emboratambémsurjaparadaranoçãodepequenezedefragilidade\sica,comoem«Teresinha»e«rapariguinha»,quecaracterizamairmãdeEuzebiozinho.

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Cap.II,pp.68-69D.AnaSilveira,asolteiraemaisvelha,passavapelatalentosadafamília,eera em pontos de doutrina e de eOqueta uma grande autoridade emResende. A viúva, D. Eugénia, limitava-se a ser uma excelente epachorrenta senhora, de agradável nutrição, trigueirota e pestanuda;Onhadoisfilhos,aTeresinha,anoivadeCarlos,umarapariguinhamagraevivacomcabelosnegroscomoOnta,eomorgadinho,oEuzebiozinho,umamaravilhamuitofaladanaquelessíOos.Quase desde o berço este notávelmenino revelara um edificante amorporalfarrábioseportodasascoisasdosaber.AindagaOnhavaejáasuaalegria era estar a um canto, sobre uma esteira, embrulhado numcobertor, folheando in-fólios, como crâniozinho calvo de sábio curvadosobreas letrasgarrafaisdeboadoutrina:depoisdecrescidinhoOnhatalpropósito que permanecia horas imóvel numa cadeira, de perninhasbambas,esfuracandoonariz:nuncaapeteceraumtamborouumaarma:mascosiam-lhecadernosdepapel,ondeoprecoceletrado,entreopasmodamamãedaOO,passavadiasatraçaralgarismos,comalinguazinhadefora.Assim na família Onha a sua carreira desOnada: era rico, havia de serprimeirobacharel,edepoisdesembargador.QuandovinhaaSantaOlávia,a Oa Anica instalava-o logo à mesa, ao pé do candeeiro, a admirar aspinturasdumenormeericovolume,OsCostumesdetodosospovosdoUniverso.Jáláestavaessanoite,vesOdocomosempredeescocês,comoplaiddeflamejantexadrezvermelhoenegropostoaOracoloepresoaoombro por uma dragona; para que conservasse o ar nobre dum Stuart,dumvalorosocavaleirodeWalterScoy,nuncalheOravamobonéondesearqueava comheroismo uma ruOlante pena de galo; e nada haviamaismelancólicoqueasuafacezinhatrombuda,aqueoexcessodelombrigasdavaumamolezaeumaamarelidãodemanteiga,osseusolhinhosvagose azulados, sem pestanas como se a ciência lhas Ovesse já consumido,pasmandocomsisudezparaascamponesasdaSicília,eparaosguerreirosferozesdoMontenegroapoiadosaescopetas,empíncarosdeserranias.

U=lizaçãoexpressivadeadje=vos:•  expressõescomo«asolteirae

maisvelha»,«excelenteepachorrenta»,«trigueirotaepestanuda»e«magraeviva»reforçamacaracterizaçãodasirmãsSilveira,mostrandoasduasfacesdarealidade:aobje=vaeasubje=va,ouseja,umanotamaisconcretaeoutramaisemocionalouvaloraOva,demodoaconseguirumadescriçãomaisfieleexpressiva,sendosobretudocrí=ca.

•  acentuaaindaapersonalidadedeEusebiozinho(«notável»,«calvodesábio»,«imóvel»,«melancólico»,«facezinhatrombuda»)marcadapelaeducaçãointelectualepelasuapassividadeetristeza.

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Cap.II,pp.68-69D.AnaSilveira,asolteiraemaisvelha,passavapelatalentosadafamília,eera em pontos de doutrina e de eOqueta uma grande autoridade emResende. A viúva, D. Eugénia, limitava-se a ser uma excelente epachorrenta senhora, de agradável nutrição, trigueirota e pestanuda;Onhadoisfilhos,aTeresinha,anoivadeCarlos,umarapariguinhamagraevivacomcabelosnegroscomoOnta,eomorgadinho,oEuzebiozinho,umamaravilhamuitofaladanaquelessíOos.Quase desde o berço este notávelmenino revelara um edificante amorporalfarrábioseportodasascoisasdosaber.AindagaOnhavaejáasuaalegria era estar a um canto, sobre uma esteira, embrulhado numcobertor, folheando in-fólios, como crâniozinho calvo de sábio curvadosobreas letrasgarrafaisdeboadoutrina:depoisdecrescidinhoOnhatalpropósito que permanecia horas imóvel numa cadeira, de perninhasbambas,esfuracandoonariz:nuncaapeteceraumtamborouumaarma:mascosiam-lhecadernosdepapel,ondeoprecoceletrado,entreopasmodamamãedaOO,passavadiasatraçaralgarismos,comalinguazinhadefora.Assim na família Onha a sua carreira desOnada: era rico, havia de serprimeirobacharel,edepoisdesembargador.QuandovinhaaSantaOlávia,a Oa Anica instalava-o logo à mesa, ao pé do candeeiro, a admirar aspinturasdumenormeericovolume,OsCostumesdetodosospovosdoUniverso.Jáláestavaessanoite,vesOdocomosempredeescocês,comoplaiddeflamejantexadrezvermelhoenegropostoaOracoloepresoaoombro por uma dragona; para que conservasse o ar nobre dum Stuart,dumvalorosocavaleirodeWalterScoy,nuncalheOravamobonéondesearqueava comheroismo uma ruOlante pena de galo; e nada haviamaismelancólicoqueasuafacezinhatrombuda,aqueoexcessodelombrigasdavaumamolezaeumaamarelidãodemanteiga,osseusolhinhosvagose azulados, sempestanas como se a ciência lhas=vesse já consumido,pasmandocomsisudezparaascamponesasdaSicília,eparaosguerreirosferozesdoMontenegroapoiadosaescopetas,empíncarosdeserranias.

Comparação(«comoseaciêncialhasOvessejáconsumido»):•  expressaashorasgastasaestudar

ealer.

Impressionismoliterário:•  orecursoamuitasnotaçõesdecor

queajudamoleitoravisualizaroaspeto\sicodeEusebiozinhoeacompreenderacaricaturaqueoautorlhepretendefazeraoexageraralgunsdosseustraços(«oplaiddeflamejantexadrezvermelhoenegro»,«amarelidãodemanteiga,osseusolhinhosvagoseazulados»).

Gerúndio,comoem«esfuracando»e«pasmando»prolongaaação,fazendocreraoleitorque,nestecaso,Eusebiozinhopermaneciamuitotemposnessapostura.

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Cap.II,pp.68-69D.AnaSilveira,asolteiraemaisvelha,passavapelatalentosadafamília,eeraempontos de doutrina e de eOqueta uma grande autoridade emResende. Aviúva,D. Eugénia, limitava-se a ser umaexcelente e pachorrenta senhora, deagradável nutrição, trigueirota e pestanuda; Onha dois filhos, a Teresinha, anoivadeCarlos,umarapariguinhamagraevivacomcabelosnegroscomoOnta,eomorgadinho,oEuzebiozinho,umamaravilhamuitofaladanaquelessíOos.Quase desde o berço este notável menino revelara um edificante amor poralfarrábioseportodasascoisasdosaber.AindagaOnhavaejáasuaalegriaeraestaraumcanto,sobreumaesteira,embrulhadonumcobertor,folheandoin-fólios, como crâniozinho calvo de sábio curvado sobre as letras garrafais deboadoutrina:depoisdecrescidinhoOnhatalpropósitoquepermaneciahorasimóvel numa cadeira, de perninhas bambas, esfuracando o nariz: nuncaapeteceraumtamborouumaarma:mascosiam-lhecadernosdepapel,ondeoprecoce letrado, entre o pasmo da mamã e da OO, passava dias a traçaralgarismos,comalinguazinhadefora.AssimnafamíliaOnhaasuacarreiradesOnada:erarico,haviadeserprimeirobacharel, e depois desembargador. Quando vinha a Santa Olávia, a Oa Anicainstalava-ologoàmesa,aopédocandeeiro,aadmiraraspinturasdumenormee ricovolume,OsCostumesde todosospovosdoUniverso. Já láestavaessanoite, vesOdo como sempre de escocês, com o plaid de flamejante xadrezvermelhoenegropostoaOracoloepresoaoombroporumadragona;paraqueconservasseoarnobredumStuart,dumvalorosocavaleirodeWalterScoc,nuncalhe=ravamobonéondesearqueavacomheroismoumaru=lantepenadegalo;enadahaviamaismelancólicoqueasuafacezinhatrombuda,aqueoexcessodelombrigasdavaumamolezaeumaamarelidãodemanteiga,osseusolhinhos vagos e azulados, sem pestanas como se a ciência lhas Ovesse jáconsumido, pasmando com sisudez para as camponesas da Sicília, e para osguerreiros ferozes do Montenegro apoiados a escopetas, em píncaros deserranias.

Ironia:•  conseguida, sobretudo,

através do uso abundantede diminu=vos com umsen=do deprecia=vo e daadje=vação expressiva,assim como a presença deexpressões que criam umefeito de cómico. A suaprincipal expressividadeconsiste em ridicularizar oretrato de Euzebiozinho edemonstrar uma visãodeprecia=vadomesmo.