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Versão On-line ISBN 978-85-8015-075-9 Cadernos PDE OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE Produções Didático-Pedagógicas

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Versão On-line ISBN 978-85-8015-075-9Cadernos PDE

OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE

Produções Didático-Pedagógicas

FICHA PARA IDENTIFICAÇÃO PRODUÇÃO DIDÁTICO – PEDAGÓGICA

TURMA - PDE/2013

Título: Capanema antes da colonização: vestígios da ocupação territorial e vida cotidiana dos índios que habitavam a Região.

Autor Salete Reckziegel Manchini

Disciplina/Área (ingresso no PDE)

História

Escola de Implementação do Projeto e sua localização

Escola Estadual Santa Cruz E.F Av. Botucaris, 1690 - Santa Cruz, Capanema - PR, 85760-000

Município da escola Capanema– PR.

Núcleo Regional de Educação Francisco Beltrão.

Professor Orientador Prof. Dr. André Paulo Castanha

Instituição de Ensino Superior UNIOESTE – Universidade Estadual do Oeste do Paraná.

Relação Interdisciplinar Artes.

Resumo

Essa proposta se faz necessária mediante a realidade vivenciada no município de Capanema-PR. Esse estudo busca qualificar o ensino nas turmas de 7º ano para levar ao conhecimento dos educandos a história do município e do Sudoeste do Paraná antes da chegada dos colonizadores oriundos do Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Para tanto será trabalhado com fontes históricas encontradas no município de Capanema, mais especificamente nas comunidades de Santa Clara e Santa Ana. Através de visita aos locais onde as fontes foram encontradas faremos observações sobre os locais habitados pelos povos indígenas; entrevistaremos moradores do local e o cacique da reserva de Andressito (Argentina), bem como visita ao museu Magarancho de Capanema para conhecer os utensílios indígenas que se encontram expostos. Estudaremos as leis que regulamentam as terras indígenas e produziremos um documentário, com o objetivo de estudar a história indígena local a partir de fontes históricas encontradas no município, procurando identificar as razões da resistência das autoridades e comunidades locais em divulgar e aprofundar os estudos sobre a história do município de Capanema antes da colonização.

Palavras-chave ( 3 a 5 palavras)

Indígenas no Sudoeste, Capanema, História local, fontes históricas, comunidades Indígenas.

Formato do Material Didático Unidade Didática.

Público Alvo

Alunos do 7º ano do Ensino Fundamental.

Declaração solene dos povos indígenas do mundo Nós, povos indígenas do mundo, unidos em uma grande assembleia de homens sábios, declaramos a todas as nações: Quando a Terra Mãe era nosso alimento, quando a noite escura formava nosso teto, quando o céu e a lua eram nossos pais, quando todos éramos irmãos e irmãs, quando nossos caciques e anciãos eram grandes líderes, quando a justiça dirigia a lei e sua execução, então chegaram outras civilizações! Com fome de sangre, de ouro, de terra e de todas as riquezas, trazendo em uma mão a cruz e na outra a espada, sem conhecer nem querer aprender os costumes de nossos povos, nos classificaram abaixo dos animais, nos roubaram nossas terras e nos levaram para longe delas, transformando em escravos os Filhos do Sol. No entanto, não puderam eliminar-nos! Nem nos fazer esquecer o que somos, porque somos a cultura da terra e do céu. Somos de uma ascendência milenar. E somos milhões. E mesmo que nosso universo inteiro seja destruído, nós viveremos por mais tempo que o império da morte!

Conselho Mundial dos Povos Indígenas. Port Alberini - 1975

Apresentação

A disciplina de história tem se mostrado de fundamental importância na

formação do cidadão, no que diz respeito a sua formação étnico-social, pois

sabemos que o ser humano só respeita o que conhece e para conhecer, faz-se

necessário a busca de informações que o leve ao conhecimento e,

consequentemente despertar o interesse para buscar novas informações.

Esta Produção Didático-pedagógica tem por objetivo estudar a história

indígena local a partir de fontes históricas encontradas no município, procurando

identificar as razões da resistência das autoridades e comunidades locais em

divulgar e aprofundar os estudos sobre a história do município de Capanema antes

da colonização.

A Lei 11.645 promulgada em 2000 torna obrigatório o ensino da história e

cultura das populações indígenas nas escolas, mas percebemos que muita história

referente aos indígenas ainda não estão registradas ou não são conhecidas pela

sociedade brasileira. A situação se agrava ainda mais, se nos reportarmos à história

do Estado do Paraná e principalmente dos municípios do Sudoeste do Estado.

Esta produção Didático-pedagógica será realizada em forma de unidade

didática, a qual será aplicada aos alunos do 7ºano da Escola Estadual Santa Cruz

Ensino/Fundamental, no município de Capanema, durante o primeiro semestre de

2014. A ideia é tornar as aulas de história mais voltada à pesquisa e investigação,

principalmente no que se refere a história local, trazendo a tona a história de

indígenas que habitaram essa região, mas que hoje seus descendentes residem em

reservas de municípios vizinhos e também na vizinha Argentina.

Por serem povos nômades e coletores, percorriam longas distâncias em

busca de um lugar mais adequado para montar suas casas e por consequência

essas mudanças de locais se davam de forma frequente, não deixando grandes

registros de sua existência, cultura ou história, mas que através de pequenos

objetos encontrados podemos reconstruir se não no todo, mas parte de suas

histórias e para isso podemos contar com a colaboração de seus descendentes e

assim enriquecer nosso conhecimento referente a história local, estadual e nacional.

Obrigatoriedade e Importância do Estudo da Temática Indígena na Escola.

Após 2002, percebeu-se a necessidade de algumas mudanças no ensino de

História, voltado a história local. As novas DCE (Diretrizes Curriculares Estaduais),

de 2008 enfatizam a obrigatoriedade do ensino dos conteúdos de História do

Paraná, da cultura Afro-brasileira e da história e cultura dos povos indígenas nas

escolas. As Diretrizes Curriculares para o ensino de História na Educação Básica, do

Paraná orientam os professores:

• o cumprimento da Lei n. 13.381/01, que torna obrigatório, no Ensino Fundamental e Médio da Rede Pública Estadual, os conteúdos de História do Paraná; • o cumprimento da Lei n. 10.639/03, que inclui no currículo oficial a obrigatoriedade da História e Cultura Afro-Brasileira, seguidas das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das relações étnico-raciais e para o ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana; • o cumprimento da Lei n. 11.645/08, que inclui no currículo oficial a obrigatoriedade do ensino da história e cultura dos povos indígenas do Brasil. (2008, p.45).

Partindo do conceito de que se respeita somente o que se conhece

percebemos a importância de conhecer as histórias e culturas dos povos indígenas,

a necessidade desses sujeitos em buscar no passado a resposta para questões do

presente e futuro. As mesmas Diretrizes Curriculares Estaduais enfatizam:

• a observação de que as necessidades dos sujeitos na sua vida cotidiana

em sua prática social estão ligadas com a orientação no tempo. Essas

necessidades fazem com que os sujeitos busquem no passado respostas

para questões do presente. Portanto, fica claro que os sujeitos fazem

relação passado/presente o tempo todo em sua vida cotidiana;

• as teorias utilizadas pelo historiador instituem uma racionalidade para a

relação passado/presente que os sujeitos já trazem na sua vida prática

cotidiana. Essas teorias acabam estabelecendo critérios de sentido para

essa prática social. Esses critérios de sentidos são chamados de ideias

históricas;

• os métodos e técnicas de investigação do historiador produzem

fundamentações específicas relativas às pesquisas ligadas ao modo como

as ideias históricas são concebidas a partir de critérios de verificação,

classificação e confrontação científica dos documentos; • as finalidades de orientação da prática social dos sujeitos retomam as interpretações das necessidades de orientação no tempo, a partir de teorias e métodos historiográficos apresentados; • essas finalidades se expressam e realizam sob a forma de narrativas históricas. (p.46)

A história que anteriormente era passada de pai para filho entre os indígenas

brasileiros sempre tinha um fundamento, uma base na experiência de vida que

esses povos viviam. Os nomes dados aos filhos ou locais, sempre estavam

baseados nos conhecimentos e realidades vividas por eles.

Quando os europeus aqui chegaram, foram se apossando das terras e

tentando incorporar entre os índios os seus costumes, tradições e cultura, os povos

indígenas foram sendo dizimado, isso resultou numa minoria fazendo com que seus

costumes e tradições fossem se perdendo com o tempo. Essa mudança forçada de

comportamento causou prejuízos culturais aos povos indígenas e a história local de

municípios e regiões onde esses grupos viveram. Vejamos fatos narrados no

Caderno de Educação Indígena:

No ano de 1985, em fevereiro, aconteceu um acidente muito grave em Angra dos Reis, no Rio de Janeiro, perto da aldeia guarani de Sapukai. Choveu muito e as águas pluviais provocaram deslizamentos de terras das encostas da Serra do Mar, destruindo o Laboratório de Radioecologia da Central Nuclear Almirante Álvaro Alberto, construída em 1970 num lugar que os índios Tupinambá, há mais de 500 anos, chamavam de Itaorna. O prejuízo foi calculado na época em 8 bilhões de cruzeiros. Os engenheiros responsáveis pela construção da usina nuclear não sabiam que o nome dado pelos índios continha informação sobre a estrutura do solo, minado pelas águas da chuva. Só descobriram que Itaorna, em língua tupinambá, quer dizer pedra podre, depois do acidente, que talvez pudesse ter sido evitado se o conhecimento dos índios fosse levado a sério. (2006, p. 40)

Fato semelhante aconteceu no Rio Grande do Sul, só que dessa vez

relacionado com o uso da mandioca, o que nos faz perceber a importância de se

conhecer outros povos, sua história e sua cultura como podemos observar no fato

relatado pelo Caderno de Educação Indígena.

No mesmo ano, em abril, uma criança morreu e quinze pessoas ficaram intoxicadas, todas elas por comerem mandioca furtada de uma horta no bairro Vila Nova, na periferia de Porto Alegre (RS). Na época, o secretário de Saúde e do Meio Ambiente, Germano Bonow, informou que “todas as

semanas há casos no Rio Grande do Sul de intoxicação leve de pessoas que comem mandioca, porque não sabem diferenciar a mandioca do aipim”. A mandioca foi domesticada pelos índios do alto Amazonas há quatro mil anos, segundo os arqueólogos (LATHRAP, 1970). De lá para cá, os índios fizeram experimentos e inventaram muitos tipos de mandioca, enriquecendo a espécie. Só na região do Rio Negro (AM), entre os índios Tukano, foram encontradas 137 espécies diferentes. A preservação, as técnicas de cultivo e a forma de extrair o veneno da mandioca vêm sendo transmitidas eficazmente pelos horticultores indígenas através da tradição oral. (2006, p. 40).

A fragmentação na transmissão de costumes repassados de geração a

geração, ocasionaram perdas memoriais que eram fundamentais para a

sobrevivência das gerações passadas e como podemos observar a falta desse

conhecimento levou a morte de sucessores. (Cadernos de Educação Indígena)

Esses dois acontecimentos mostram que houve a quebra de elos na cadeia de transmissão oral de conhecimentos, prejudicando a memória. Por causa disso, a sociedade brasileira deixou de se apropriar de um saber milenar, útil para a sua sobrevivência, pois a escrita não substituiu, nesses casos, as funções de registro e de memória. Afinal, qual é a importância da tradição oral para a memória dos povos indígenas e dos brasileiros? (2006, p. 40)

Praticamente em todo território Brasileiro podemos perceber através de

objetos encontrados, a presença passageira ou fixa de grupos indígenas no

passado, e no Sudoeste do Paraná não foi diferente.

Em Capanema, muitos agricultores, ao trabalharem a terra, encontraram

pequenos objetos como machadinhas de pedra, bolandeira etc., porém até a

descoberta do cemitério na comunidade de Santa Clara em 2004, não havia nada

mais concreto sobre a existência de grupos indígenas no município, a não serem os

relatos de autores como Cabeza de Vaca de 1541, contando sobre suas andanças

por essas terras e a presença de grupos remanescentes de guaranis que andavam

perambulando por aqui até que foram enviados pela FUNAI, para a reserva de

Mangueirinha.

Na visão dos conquistadores, os aldeamentos eram necessários para

catequização dos indígenas e assim torná-los civilizados, dominá-los e incorporá-los

à população paranaense. Esse convívio nem sempre se deu de forma harmoniosa

entre indígenas, conquistadores, religiosos, governo e elite agrária do país, que era

quem controlava o poder político. Conforme podemos conferir por meio da mídia,

esses conflitos ainda persistem. Ora os agricultores invadem as Terras dos índios,

ora, os índios invadem novas áreas para reivindicarem novas Terras.

Em 1978, havia alguns indígenas guaranis que circulavam nos municípios da

região Sudoeste, era composto por aproximadamente doze pessoas, entre eles

crianças. Esse grupo, quando vinha ao município de Capanema, muitas vezes se

acampava numa área de eucalipto na propriedade do senhor Waldemar Swem

Reckziegel em Santa Clara, e faziam pequenos trabalhos para os proprietários de

terra vizinhos, especialmente ao senhor Waldemar, como arrancar feijão, que era

muito produzido na região naquela época. “Preferimos ficar no mato, é mais seguro

que no galpão”. Frase dita pelo líder do grupo, quando meu pai, Waldemar, ofereceu

a varanda do galpão, após acertar um trabalho com eles.

Em 2006, encontrei a esposa do líder do grupo e esta me perguntou sobre

minha mãe, disse ter saudades, pois minha mãe “era gente muito boa” e esclareceu-

me que atualmente residiam na reserva de Mangueirinha e como houve o problema

na reserva, vieram junto com o grupo que invadiu a escola (desativada), na linha

Sanga Verde em Santa Clara, próxima à propriedade do senhor Waldemar.

O município de Capanema faz divisa com a Argentina. Nesse país há a

reserva de Andressito onde se encontram índios de nação guaranis. Pela

proximidade com Capanema, esses índios serão nosso foco de estudo do povo

guarani que ali habita e frequentemente visita nosso município, com pequenos

grupos permanecendo por alguns dias, acampados na entrada da cidade. Porque

esses indígenas visitam um país estrangeiro e que fala um idioma diferente do

deles?

Segundo o cacique da reserva de Andressito esses indígenas vem em busca

de doações como roupas, pois são bem recebidos e para eles essas doações

ajudam principalmente no inverno, e assim eles aproveitam para venderem alguns

objetos de artesanato confeccionado por eles.

A reserva de Andressito existe há trinta anos e é ocupada pelos Guaranis e

tem como órgão responsável o Conselho do Cacique da Argentina. É uma área de

145 hectares de terra e conta atualmente com 145 famílias o que compreende um

hectare por família, mas conforme informações do cacique seguidamente recebem

outras famílias oriundas de outras reservas que passam a morar com eles,

diminuindo a área pertencente a cada família. As produções são independentes e o

cultivado é apenas para o consumo próprio.

Para sobreviver, contam com uma pequena ajuda do governo argentino, mas

segundo o cacique não é o suficiente e, por isso, produzem artesanatos

confeccionados com madeira, como pequenos animais, que são vendidos em Foz

do Iguaçu e aos turistas que visitam a reserva.

Imagem 1- Animais confeccionados em madeira, pelos índios de Andressito - Argentina

Fonte: acervo pessoal de Salete Reckziegel Manchini

Na reserva existe uma escola e um centro de eventos. Os professores são

guaranis e argentinos, onde estudam alunos de 1º ao 8º ano, aprendem o guarani e

o espanhol, além das matérias da grade comum (disciplinas que compõem o quadro

de matérias exigidas pelo governo de estado). Estudam neste local, 85 alunos

indígenas.

Diariamente, ao pôr do sol, as famílias fazem danças em agradecimento ao

sol e a terra, pelos alimentos recebidos. Algumas vezes no coletivo e outras nas

suas casas com suas famílias. Esporadicamente são feitas festas com danças para

comemorar alguma data importante, como o ano novo, costumes esses que são

tradições para homenagear a “Mãe Terra” pelo sustento que esta proporciona a eles

e seus familiares.

Imagem 2 - Centro de eventos da reserva indígena de Andressito - Argentina

Fonte: acervo pessoal Salete Reckziegel Manchini

No centro de eventos também é feito o velório dos mortos onde respeitam 24

horas para depois, enterrá-lo no cemitério da própria reserva. Jorge, o cacique,

lembrou que na antiguidade os falecidos eram enterrados em urnas feitas de barro,

mas como a sociedade branca evolui, eles também vêm mudando alguns costumes.

Vejamos com é a morte na cultura Guarani

Diante da morte, o Guarani tem três atitudes: um grande medo dos falecidos, uma conformidade perante a morte e um profundo desejo de chegar à Terra sem Males. Esse medo da morte, que ao mesmo tempo se mistura a um desejo de alcançá-la, pode parecer contraditório, mas o é, apenas aparente. O medo que tem, não é da morte, mas do falecido, ou melhor, da alma que saiu do corpo, a anguêry. Segundo o Guarani, temos três almas: a nhe’enguê ou nhe’em, a alma boa, espiritual, que vai para o Além quando a pessoa morre, não afetando os vivos; a anguêry, a alma animal, responsável pelas más inclinações e que fica na terra por um tempo depois da morte, assombrando os vivos; a avyu-kuê, a sombra, uma cópia imperfeita da pessoa, permanecendo nos ares e não incomodando ninguém. A doença é a ausência temporária da nhe’em, da alma boa. A morte é a saída definitiva dessa alma. O sonho é a saída nhe’em para esse outro mundo. Por isso, os sonhos têm tanta credibilidade, pois são como a mensagem que a alma recebeu dos outros espíritos. Após a morte, a alma boa sai imediatamente, enquanto a alma animal fica vagando próximo ao cemitério por longo tempo, podendo causar mal às pessoas. Por isso, os cemitérios e as antigas aldeias, onde há pessoas enterradas, devem ser evitados, pois são locais onde esses espíritos estão presentes. O lugar onde ocorreu uma morte súbita ou violenta é temido, porque o nhe’em do falecido fica vagando por ali, pois não teve tempo para se preparar para sair do corpo. Logo depois da morte, muitas vezes ouvem-se gemidos ou barulhos estranhos na aldeia e a explicação dada é que o falecido está visitando, pela última vez,

os lugares onde viveu. Quando há choro ou gritos, as pessoas vão ao cemitério, onde acendem uma vela ou fazem uma pequena fogueira, pois acreditam que a alma do falecido está passando necessidades. Na cultura brasileira, o sonho com alguma pessoa falecida é o sinal de que ela está precisando de oração ou de uma vela para iluminá-la. O sentimento de conformidade diante da morte denota uma atitude de resignação ante um fato irreversível, uma certa fatalidade. (Lendas, 1987, p. 155-56).

Para a escolha do cacique na reserva de Andressito, são levados em conta

alguns critérios, como a capacidade de conversar com os grupos responsáveis, ou

seja, as autoridades, turistas e comunidades vizinhas. Segundo o cacique Jorge, ele

é o sucessor de seu tio que era sucessor de seu pai, e ele tem facilidade para

discutir e lutar pelos direitos de seu povo, e já está no comando da reserva há dois

anos e seis meses.

Contou ainda que possuem parentes em Santa Catarina e Rio Grande do Sul,

mas que faz tempo que não tem contato com eles. Informou que na Argentina os

guaranis são a minoria, prevalecendo os caingangues.

A Temática Indígena e a História Local

Os livros didáticos de história (distribuídos pelo MEC) abordam o tema

indígena de forma rápida e superficial, retratando um pouco sobre sua cultura,

costumes e tradições, suas submissões aos povos europeus, seus enfrentamentos e

conflitos entre tribos indígenas e os colonizadores. Pouca ou nenhuma menção é

feita sobre a vida desses povos no Estado do Paraná, dificultando a atuação dos

professores que não encontram material adequado para trabalhar a História do

Paraná, pois os poucos materiais produzidos sobre a História paranaense muitas

vezes apresenta uma abordagem complexa que dificulta a utilização desse material

nas aulas ministradas aos alunos do 6º ao 9º ano.

Materiais indígenas descobertos no município de Capanema, bem como em

demais regiões do Paraná, muitas vezes ficam no esquecimento ou simplesmente

são ignoradas por medo de que a lei vá dar direito de reintegração de posse a

grupos indígenas que venham requerer que esses locais sejam demarcados como

Terras Indígenas.

A Constituição Brasileira Garante aos índios o direito apenas, às terras,

tradicionalmente habitadas e necessárias à sobrevivência e a preservação de sua

cultura. No entanto, boa parte dessas terras não tem na prática esse direito.

Conforme prevê a Constituição Federal, no seu artigo 231, § 1º:

São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as áreas por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários ao seu bem estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições (BRASIL. Constituição Federal, 1989, p.108).

Agricultores do município de Capanema, bem como de outras regiões do

Paraná vem ao longo dos anos ignorando os objetos por eles encontrados, que

poderiam estar fazendo parte do acervo de museus e revelando um pouco da

história de nosso estado e, em especial do município de origem dos objetos.

Em 2004, na comunidade de Santa Clara, no interior do município de

Capanema- PR foi encontrado um cemitério de indígenas às margens do Rio Iguaçu,

cujo material encontrado foi enviado para Curitiba, não ficando nada no município.

Essa descoberta é uma evidência concreta que comprova a presença desses grupos

indígenas no Sudoeste paranaense.

Em abril de 2006, numa eleição bastante disputadas na reserva indígena de

Mangueirinha-PR, o grupo vencedor expulsou os adversários. Como os excluídos

conheciam a história do cemitério descoberto em Capanema, vieram para cá

almejando conquistar a posse da terra, pois a legislação vigente garante algumas

vantagens aos povos indígenas remanescentes. Naquele ano, houve uma luta muito

grande por parte da administração municipal e da FUNAI, para conseguir levar esse

povo novamente para a reserva de Mangueirinha, pois os mesmos haviam se

instalado na antiga escola da linha Sanga Verde, na comunidade de Santa Clara.

Para fazer suas barracas, os indígenas buscavam madeira de lei na reserva legal da

família Reckziegel, pois a mesma era próxima ao acampamento. O episódio foi

descrito nos autos do processo movido pelo Ministério Publico Federal, Procuradoria

da República, sediado no Município de Francisco Beltrão-PR, da seguinte forma:

Conforme se demonstrará a seguir, a situação conflituosa hoje instaurada tem por origem o recente conflito indígena ocorrido na Reserva de Mangueirinha, o qual resultou na expulsão de mais de 20 famílias do local. A motivação alegada para e escolha do Município que sediaria a invasão teve por arrimo uma reivindicação da coletividade indígena, no sentido de que fosse reconhecida uma Terra Indígena tradicional na cidade de Capanema, em razão de indícios históricos que denotavam a remota ocupação autóctone na região. A presente ação tem por objeto a condenação da FUNAI a promover a solução da situação conflituosa instaurada no Município de Capanema-PR, no qual os indígenas expulsos da Reserva de Mangueirinha firmaram acampamento em um prédio municipal localizado na comunidade rural de Santa Clara, com o objetivo de reivindicar o reconhecimento de uma terra

indígena tradicional supostamente existente no indigitado município. O mencionado conflito teve por resultado a transferência compulsória de mais de 20 famílias do local, as quais foram seguidas por outras famílias solidárias aos membros expulsos, que também estavam descontentes com a administração do Cacique da reserva de Mangueirinha. As famílias expulsas seriam acompanhadas pela FUNAI para se alojarem em outras reservas indígenas. Contudo, muitas famílias se recusaram a se dirigir para outras reservas, vindo a se estabelecer no Município de Capanema, sob a justificativa de que alguns antepassados dos índios já haviam se abrigado na região. (p.03)

No ano de 2008, na comunidade de Santa Ana, localizada às margens do Rio

Iguaçu seis quilômetros rio acima da comunidade de Santa Clara. Quando um

agricultor preparava o solo para o plantio, encontrou alguns potes de barro

enterrados, os quais estavam dispostos em grupo, com tampa e um deles continha

alguns ossos humanos. Tais materiais foram deixados na barranca do rio e

ignorados pelo proprietário da terra. Fui informada do caso e visitei o local. Após iss,

comuniquei o Núcleo Regional de Educação, setor de História sobre a existência dos

referidos objetos. A pessoa responsável por esse setor no Núcleo e Regional de

Educação entrou em contato com Curitiba e uma equipe veio conhecer o material.

Em comum acordo entre mim, o Prefeito e o Instituto Indígena, esse material foi

enviado ao museu de Capanema, localizado junto ao Magarancho e permanece lá

até hoje.

Vejamos algumas imagens de materiais encontrados em Capanema PR.

Imagem 3 - Material indígena encontrado na barranca do rio Iguaçu em Santa Ana, município de Capanema no

ano de 2008.

Fonte: acervo pessoal de Salete Reckziegel Manchini

Imagem 4 - Material indígena encontrado na barranca do rio Iguaçu em Santa Ana, contendo ossos humanos.

Fonte: acervo pessoal de Salete Reckziegel Manchini

Imagem 5 – Objetos indígenas expostos no museu Magarancho

Fonte: acervo pessoal de Salete Reckziegel Manchini

Imagem 6 – Museu Magarancho (particular)

Fonte: acervo pessoal de Salete Reckziegel Manchini

Com receio de novas invasões, essas descobertas não foram divulgadas. Na

época não houve maiores interesses por parte das comunidades, pois o objetivo era

manter a tranquilidade, no município. Tal decisão gerou uma perda histórica

considerável em relação aos povos indígenas e a história do Sudoeste.

Orientações Metodológicas

Nesta unidade didática apresentada para o 7º ano do Ensino Fundamental da

Escola Estadual Santa Cruz, as estratégias de ação a seguir, auxiliarão o professor

na sua prática de intervenção ao investigar, analisar e compreender a história

indígena da região.

Nesse sentido, em cada unidade da proposta, os alunos serão levados a

investigar e discutir o material gerado na investigação, possibilitando o

esclarecimento da problemática levantada.

Serão utilizadas visitações ao museu de Capanema, a reserva indígena de

Andressito e ao local onde foram encontrados os objetos que se encontram no

museu, entrevista com moradores do local e da reserva, pesquisa em livros e

internet entre outros meios disponíveis. Com o resultado obtido, pretende-se

esclarecer a problemática proposta.

Para tal, a produção didático-pedagógica é apresentada em unidades,

procurando responder aos objetivos propostos no projeto, iniciando com a

apresentação de slides onde os alunos irão conhecer os objetos expostos no museu

Magarancho, a forma como ocorreu essa descoberta e o deslocamento dos vestígios

ao museu. No andamento dos trabalhos, faremos o estudo da lei de direito a terra

prevista na Constituição Brasileira e documentos da FUNAI.

Unidade I

Inicialmente o professor apresentará para a turma o Artigo 231, parágrafo 1º

da Constituição Federal Brasileira, que trata do direito a terra aos povos indígenas,

tradicionalmente ocupadas por eles. O referido texto possibilitará a compreensão

acerca de aspectos relativos a distribuição de terras Indígenas no Brasil

Os alunos receberão uma cópia do texto para acompanhar as atividades.

Com base no texto proposto, a professora trabalhará as questões legais de

direito a terra pelos povos indígenas, de forma oral e escrita.

Partindo do conteúdo contido no texto apresentado, a professora dividirá a

turma em grupos para discutir e responder oralmente as questões propostas a

seguir:

- Qual sua opinião sobre o direito à terra aos indígenas garantidos na

Constituição Federal Brasileira?

- Por que vocês acham que os índios brasileiros seguidamente fazem

protestos?

_ O que você sabe sobre o índio brasileiro?

Na sequência a professora apresentará um vídeo “Quem são ele?” Disponível

em: http://www.historia.seed.pr.gov.br/modules/video/showVideo.php?video=5269

acessado em 17/08/2013.

O objetivo do vídeo é fazer o aluno perceber a diversidade indígena e a

realidade vivida por eles, o que eles sentem, do que reclamam etc.

Unidade II

Nesta unidade a professora apresentará aos alunos o processo desenvolvido

contra a FUNAI, que diz respeito a ocupação dos índios da reserva de

Mangueirinha, do prédio público no município de Capanema. “Ação Pública Civil,

com pedido liminar, em face de FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO- FUNAI,

disponível em

:http://6ccr.pgr.mpf.gov.br/atuacaodompf/acaocivilpubliv/docs_classificacao_

tematica/ACP_PRM_Francisco_Beltrao_2006.pdf/view?searchterm=capanema

acessado em 15 de abril de 2013.

A professora explicará o motivo do processo e em seguida, questionará os

alunos sobre:

- Com base no artigo 231 da constituição Brasileira, vocês acham que os

índios tinham direito a essas terras que aqui vieram reivindicar?

- Quem conheceu ou conhece algum indígena que vivia em Capanema?

Se você fosse proprietário de terra e encontrasse objetos indígenas o que

faria?

Unidade III

Nesta unidade, a professora proporá aos alunos uma visita ao Museu de

Capanema e, na sequência na comunidade de Santa Ana, onde foram encontrados

os objetos indígenas que estão dispostos no museu do município e, para tanto,

juntamente com a turma, desenvolverá alguns questionamentos que serão feitos ao

responsável do museu e também aos agricultores que moram em Santa Ana,

proprietário e vizinhos da terra onde os objetos foram encontrados.

As questões serão referentes ao cuidado dispensado aos objetos ali

expostos, e a possibilidade de transformar o museu em um museu municipal; aos

agricultores, questões referentes ao local onde foram encontradas e se novos

objetos foram encontrados, o que pensam a respeito do artigo 231 da constituição

Federal.

Unidade IV

Neste momento os alunos serão organizados em grupos para elaborar

questões de entrevista a serem feitas durante a visita à reserva de Andressito, bem

como organizar as tarefas que cada aluno vai executar, ou seja: filmagem, gravação

entrevista, fotografias etc.

Unidade V

Visita à aldeia indígena de Andressito para conhecer a aldeia, conversar com

o cacique e com demais indígenas, coletar material e informações para a confecção

do documentário.

Unidade VI

Nesta unidade, a professora juntamente com a turma, irá elaborar uma carta

direcionada as autoridades municipais solicitando a criação do museu histórico

municipal.

Unidade VII

Nesta unidade será organizado todo o material levantado e produzido um

documentário que será apresentado aos demais alunos da escola e disponibilizado

aos demais professores e escolas do município e também no YouTube.

Unidade VIII

Apresentação dos trabalhos desenvolvidos, para demais alunos da escola,

professores e pais.

Referências:

AZEVEDO, Gislaine Campos. SERIACOPI, Reinaldo. Projeto Teláris: História.

1.ed. São Paulo: Ática, 2012.

BRAICK, Patrícia Ramos: Estudar história: das origens do homem à era digital.

1.ed. São Paulo: Moderna, 2011.

BRASIL, Ministério Público: Procuradoria da República no Município de Francisco Beltrão-Paraná. 11 abril de 2006, disponível em: http://6ccr.pgr.mpf.gov.br/atuacao-dompf/acaocivilpubliva/docs_classificacao_tematica/ACP_PRM_Francisco_Beltrao_2006.pdf/view?searchterm=capanema acessado em 15 de abril de 2013.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil e Glossário. Rio de

Janeiro: FAE, 1989.

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PROJETO Araribá: História/organizadora Editora Moderna; obra coletiva concebida, desenvolvida e produzida pela Editora Moderna; editora responsável Maria Raquel Apolinário. – 3. Ed. – São Paulo: Moderna, 2010.