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X^fc Ifg ^^wm^ BOLETIM INFORMATIVO DO GTME N 0 39 Marcos Guilherme u Mo puàn nos eíimmr; nem nosfaw esquecer o que somos. Especial; 0 lESTUlINHO DOS POVOS DO NORDESTE » Anciã do povo Tremembé I. URUBU-KAAPOR ZTEMBÉ 3. GUAJÀ 4. GUAJAJARA 5. GAVlAO-PUKOBIÉ 6. KANELA RANKOKAMEKRA 7. KANELA APANIEKRA 8. KANELA 9. TREMEMBÉ IO.TAPEBA II. GENIPAPO-KAN1NDÉ 12. POnOUARA 13. TAEAJARA 14. RERIÚ 15. KARIRI 16.TRUKA 17. ATIKUM 18. PANKARARU 1». KAMEIWA 20. KAPINAWÀ 21. XUKURU 22.FIILNI-Ô 23. GERIPANKÔ 24. KARIRI-XOKÕ 25. XUKURU-KARIRJ 26. WASSU 27. TINGUI-BOTÓ 28. KARAPOTÓ 29. XOKÓ 30.TUXA 31. KANTARURÉ 32. PANKARARÉ 33. KAIMBÉ 34. XDURI 35. PATAXÓ HA-HÂ-HÃE 3«. frfDIOS DE OUVENÇA 37. PANKARU 38. PATAXÓ COROA VERMELHA 39. ARICOBÉ Leia e divulque: Censo do IBGE ignora populações indígenas As propostas de Estatuto e a opinião de lideranças indígenas do Leste-Nordeste. Ultima página: Espaço pra imaginação.

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Page 1: BOLETIM INFORMATIVO DO GTME N0 39 Mo puàn nos … · claração Solene dos Povos Indígenas do Mundo: "Nós, povos indígenas do mundo, unidos numa grande Assembléia de homens sábios,

X^fc Ifg

^^wm^ BOLETIM INFORMATIVO DO GTME ■ N0 39

Marcos Guilherme

uMo puàn nos eíimmr; nem nosfaw esquecer o que somos.

Especial; 0 lESTUlINHO DOS POVOS DO NORDESTE

»

Anciã do povo Tremembé

I. URUBU-KAAPOR ZTEMBÉ 3. GUAJÀ 4. GUAJAJARA 5. GAVlAO-PUKOBIÉ 6. KANELA RANKOKAMEKRA 7. KANELA APANIEKRA 8. KANELA 9. TREMEMBÉ IO.TAPEBA II. GENIPAPO-KAN1NDÉ 12. POnOUARA 13. TAEAJARA 14. RERIÚ 15. KARIRI 16.TRUKA 17. ATIKUM 18. PANKARARU 1». KAMEIWA 20. KAPINAWÀ 21. XUKURU 22.FIILNI-Ô 23. GERIPANKÔ 24. KARIRI-XOKÕ 25. XUKURU-KARIRJ 26. WASSU 27. TINGUI-BOTÓ 28. KARAPOTÓ 29. XOKÓ 30.TUXA 31. KANTARURÉ 32. PANK ARARÉ 33. KAIMBÉ 34. XDURI 35. PATAXÓ HA-HÂ-HÃE

3«. frfDIOS DE OUVENÇA 37. PANKARU 38. PATAXÓ COROA VERMELHA 39. ARICOBÉ

Leia e divulque: Censo do IBGE ignora populações indígenas

As propostas de Estatuto e a opinião de lideranças indígenas do Leste-Nordeste.

Ultima página: Espaço pra imaginação.

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TUPARI JUNHO/91

Cartaz CLAI 500 anos

Evangelização e Cultura Indígena

Consideramos tarefa difícil escrever sobre mis- sões entre os povos indígenas. Sentimos que

não raras vezes o assunto tem suscitado polêmica. Mas afinal, que podemos dizer sobre o assunto? Sa- bemos que os índios sofreram e ainda sofrem com as arbitrariedades cometidas pelo invasor que aqui chegou há 500 anos e que o índio hoje é cada vez mais consciente de seus direitos. Devemos entender que fazer missões entre os po- vos indígenas hoje é colocar- se ao lado deles na luta a fim de que os seus direitos e inte- resses sejam garantidos.

Queremos evocar aqui a missão integral que deve in- cluir todo esforço para levar o evangelho todo ao homem to- do. O missionário deve esta- belecer a ponte entre os valo- res do Reino de Deus — como justiça, paz e integridade — e a cultura indígena. O evange- lho deve ser para os povos in- dígenas restauração de valores próprios, especialmente, na posse do bem maior que eles esperam — a terra. Como dis- se o coordenador do Conselho Indigenista Missio- nário (Cimi), Aquilas Paulus: "o índio precisa de terra e de respeito por sua cultura para sobreviver". Precisamos de um evangelho que respeite a cultura indígena.

Colocamos a seguir, para nossa reflexão, a De- claração Solene dos Povos Indígenas do Mundo: "Nós, povos indígenas do mundo, unidos numa grande Assembléia de homens sábios, declaramos a todas as nações: quando a terra-mãe era nosso alimento, quando a noite escura formava nosso teto, quando o céu e a lua eram nossos pais, quando todos éramos irmãos e irmãs, quando nossos caciques e anciãos eram grandes lí- deres, quando a justiça dirigia a lei e sua execução, aí outras civilizações chegaram!

Com fome de sangue, de ouro, de terra e de to- das as suas riquezas, trazendo numa mão a cruz e na outra a espada, sem conhecer ou querer aprender os costumes de nossos povos, nos classificaram abaixo dos animais, roubaram nossas terras e nos levaram para longe delas; transformando em escra- vos os "filhos do sol". Entretanto não puderam nos eliminar; nem nos fazer esquecer o que somos, porque somos a cultura da terra e do céu, somos de uma ascendência milenar e somos milhões, e mesmo que nosso universo inteiro seja destruído, Nós viveremos por mais tempo que o império da morte!" (Fort Alberni, 1975 - Conselho Mundial dos Po- vos Indígenas)

Para fazer missões entre os povos indígenas hoje, há necessidade de conscientização por parte da Igre- ja. Esta precisa estar engajada na luta pela dignida- de. O evangelho é relevante e pertinente ao homem de hoje, índio ou não índio.

Rev. Jonas Furtado do Nascimento Igreja Presbiteriana independente Cuiabá - MT

ESPAÇO Dí LEITOR

Max Lopez Rodriguez

Sentindo que poucas pessoas nesta região, principalmente em nosss igre- jas, têm se preocupado com a questão indígena, fiquei feliz ao ler duas maté- rias publicadas neste boletim, escrita por pastores da Igreja Presbiteriana In- dependente do Brasil, que é a igreja onde sou professora dominical e coor- denadora de jovens. Além do mais os próprios companheiros do GE AI -

Grupo Ecumênico de Apoio ao índio de P. Bueno, tam- bém vibraram per- cebendo que nossa luta já não é somen- te de uns poucos e sim de muitos, fal- tando somente um mecanismo para unir as nossas idéias, e assim lutar- mos por um mundo mais humano, onde há lugar para todos.

Estou divulgando este boletim, e den-

tro em breve pretendo fazer uma assi- natura para a igreja, pois assim será mais fácil trocar experiências e envol- ver todos os elementos que tenham vontade de levar avante esta luta.

Aproveito a oportunidade para fa- zer uma assinatura para o GEAI-PB.

Eliane Basso Pimenta Bueno - Rondônia

"Estive na prisão e fostes ver-me" (S. Mateus 25:36b)

Em nome de Jesus Cristo desejo re- ceber vários exemplares, mesmo dos números passados, para usar na Evan- gelização de Presidiários.

Contamos atualmente com cerca de mais ou menos 100 presidiários que ouvem a preciosa Palavra de Deus.

Nós estamos precisando de muitas literaturas para realizar esta gloriosa obra do Senhor.

Deus abençoe rica e poderosamente este vosso ministério. Amém.

Em Cristo Jesus. Aloísio Sousa de Oliveira, Conselheiro Lafaiete-MG

Em atenção à correspondência refe- rente à Área Indígena Kaingang de Irai, cumpre-me informar que a Co- missão Especial de Análise, instituída através da Portaria n0 398/91, com a finalidade de rever os trabalhos de identificação e delimitação das terras indígenas, analisou e aprovou os limi- tes da área, conforme Parecer n0 01/ CEA/92, de 28.02.92, publicado no D.O.U de 26.03.92.

O Processo Funai/BSB/519/92 de declaração da referida área, encontra- se em instância superior no Ministério da Justiça, para onde deverão ser en- viadas doravante as manifestações a seu respeito.

Atenciosamente, Isa Maria Pacheco Rogedo - Funail

Brasília, 22 abril 92 Graça, paz e saúde.

Gostaria, antes de mais nada, de agradecer o material que vocês vêm me enviando e de dizer que o mesmo tem me ajudado a refletir na luta dos povos indígenas para buscar e ocupar os espaços que eles têm direito.

Graças a Deus vejo e sinto o povo evangélico atuando com firmeza nesta missão tão necessitada e envolvente e que é um convite à seriedade da Vida Abundante, proposta por Jesus Cristo.

Sou pastor Metodista e me encon- tro na cidade de Juiz de Fora-MG. tra- balhando junto aos toxicômanos e seus familiares, bem como com a socieda- de. O trabalho vem crescendo e em breve, se Deus permitir, estará conso- lidado todos os projetos que o envolve.

Na realidade, sinto-me chamado por Deus para esta obra, mas, assim que a mesma estiver em condições de caminhar melhor sem a minha presen- ça, penso em contribuir um pouco na missão junto aos povos indígenas. Márcio da Fonseca Almeida

O Tupari ê o informativo trimestral

dariedade. Avenida dos Trabalhadores. 3.419 ■ Caixa , !

78.001-Cuiabá-MT-Brasi! Telefone: (066) 322-7476 Equipe de Redação: Artindo Leite, JaiderSati Rubens Seibeie Vilíi Frttz Seilert. Diagramaçâofpagmaçâo; Cláudio ( Composição. FotolUo e Impressão

081 - Fe

EX TE

■-."

...Este boletim é elaborado a par- tir das contribuições de amigos e amigas dos povos indiqenas, que enviam, de todas as partes do

A todos/ as somos muito agra-

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JUNHO/92 TUPARI

JUVENTUDE

Jovens refletem sobre os "500 anos %J Tobias Baeske

yy

Cerca de 55 jovens luteranos das paróquias de Cuiabá,

Rondonópolis, Tangará da Serra e Chapadões, partes do Distrito Eclesiástico do Mato Grosso da IECLB, estiveram reunidos nos dias 1, 2 e 3 de maio na cidade de Chapada dos Guimarães-MT para refletirem sobre o movimento dos jovens evangélicos em época dos 500 anos de invasão e da resistên- cia dos povos indígenas.

A programação do encontro es- teve distribuída entre momentos de estudos, atividades artísticas, gin- cana bíblica e muita animação.

No primeiro dia, introduzindo o tema dos 500 anos contamos com a contribuição de Villi Seilert, .as- sessor do GTME, que nos dirigiu algumas informações muito inte- ressantes, entre as quais podemos destacar: que, pra começar, o ter- mo "índio" é o primeiro equívoco da história, porque está carregado de preconceito e não traduz a ri- queza da diversidade dos povos in- dígenas encontrados pelos coloni- zadores nestas terras; que é muito perigoso manter-se desinformado sobre o que de fato ocorre com os povos indígenas, é perigoso acei- tarmos toda e qualquer informação

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Juventude Luterana Matogrossense

ou notícia sem que tenhamos a pre- ocupação de checar suas veracida- des com pessoas, organizações que estão convivendo com a realidade dos povos indígenas, ou mesmo com os próprios indígenas; que sem esse exercício poderemos es- tar reproduzindo uma história mal contada sobre o que significou pa- ra os povos indígenas a chegada dos colonizadores e da evangeliza- ção dominadora; que a principal reivindicação dos 230 povos indí- genas que vivem atualmente no

país é que suas terras sejam demar- cadas e respeitadas; e que os povos indígenas, de acordo com suas es- pecificidades histórico-culturais experimentam no seu cotidiano uma relação muito rica com a di- vindade criadora, através de um culto vivo, onde a natureza tem participação central.

No dia seguinte houveram tra- balhos de grupo baseados nalguns textos, através dos quais pudemos refletir sobre: "a vida do índio", "o encontro do branco com o ín-

Dons e ministérios do movimento popular O Ministério de Ação Popular

-MAP - da Igreja Metodista da 5a Região Eclesiástica, realizou en- tre os dias 1, 2, 3 em Araraquara/ SP, o I Encontro Celebrativo do Mi- nistério da Ação Popular. Este en- contro vem reforçar a caminhada dos movimentos populares nestes 500 anos de luta e resistência.

Formado por cristãos (metodis- tas ou não) preocupados e ativos junto aos movimentos populares do país, o MAP tem sua origem em 4 encontros de "Dons e Ministérios" no movimento popular, realizados pela Igreja Metodista nos anos de 1990 e 1991. Hoje, na 5a Região, as equipes que exercem atividades em nome do MAP concentram-se no acompanhamento das lutas dos tra- balhadores rurais sem-terra e assala- riados rurais, na divulgação da cau- sa indígena e junto a grupos popula- res nas periferias.

No início do encontro, o MAP realizou uma reflexão sobre a con- juntura econômica e focalizou a de- sigualdade que vem separando as classes sociais do país, dando pistas aos participantes sobre a atual con-

juntura latino-americana. Durante o encontro, foram realizados mini-ce- lebrações por diversas pessoas que relembravam a história de lutas, massacre e resistência nestes 500 anos de invasão que exterminaram muitos povos indígenas do continen- te.

O contato dos integrantes do MAP, com entidades populares, foi de grande valor, pois a experiência adquirida em encontros seminários, etc... deu como resultado os seguin- tes laboratórios:

Releitura bíblica (CEBI) - Asses- sor Mariano.

Assunto: O caminhar com o pró- ximo, ajudando-o na sua luta.

Questão Agrária (CPT) - Asses- sor Luiz Barrori e Marcelo.

Assunto: A luta pela posse da terra pelos diversos grupos da socie- dade.

Questão Indígena: (GTME) - Assessora Juracilda Veiga.

Assunto: Massacre, resistência e sobrevivência dos diversos povos in- dígenas do país.

Os assuntos discutidos nos labo- ratórios, se completaram quando co-

locavam o caminhar da fé para res- peitar e auxiliar o próximo nas suas dificuldades.

Os participantes tiveram a opor- tunidade de conhecer o assentamen- to dos Sem-Terra de Araraquara, onde foi realizada uma celebração ecumênica. Os moradores do assen- tamento deram sua contribuição com testemunhos de sua luta para a conquista da terra. O assessor do programa Dons e Ministérios da Igreja Metodista Ely Eser Barreto César, relembrou a história da Igre- ja e os 500 anos que influenciaram para a dizimação de vários povos, principalmente do Brasil. Ele aler- tou sobre a festa triunfalista da Igre- ja e sua omissão diante dos desastres cometidos para com os verdadeiros donos da terra.

Entre os participantes estavam os representantes da juventude Cató- lica (PJE), seminaristas da Igreja Metodista, moradores do assenta- mento de Araraquara, estudantes universitários, o Bispo da 5a região Eclesiástica I. Metodista, João Al- ves de Oliveira Filho e membros da Igreja local. Os presentes no encon-

dio", "a ótica da imprensa" e "como a Igreja se posiciona frente aos 500 anos". Algumas idéias fo- ram muito importantes, como por exemplo: que os "cristãos" que vieram com pretexto de evangeli- zação, queriam mesmo era a domi- nação e a escravidão dos povos da- qui habitantes; que os evangeliza- dores tinham um jeito estranho de conduzir os índios à missa, amar- rando-os e árrastando-os, algo bem diferente do amor ensinado por Cristo àqueles que eram evangeli- zados no seu tempo; devemos sem- pre e, em especial à partir de ago- ra, estarmos atentos para os noti- ciários sobre a questão indígena e os 500 anos, pra não nos enganar- mos à respeito dos fatos; nossas igrejas têm responsabilidade quan- do agiam com passividade diante dos massacres contra os povos in- dígenas e os mais fracos; e pedi- mos pedão a Deus por todas as ve- zes que erramos, invocando forças para que participemos da luta pelo direito de vida abundante para to- dos, todos os povos, etnias e todos os que são marginalizados.

Tobias Baeske da Juventude Evangélica Lutera- na

João Luiz Ferreira

Juventude Metodista em ação popular

tro tiveram a oportunidade de assis- tirem ao filme: "Nós, os Kaiapó", durante uma celebração, dando uma pista do trabalho junto às populações indígenas. Neste caminhar temos que nos doar para o crescimento da causa popular e contribuir para a construção do Reino de Deus.

João Luiz Ferreira é jornalista. Participa da Igreja Metodista.

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TUPARI JUNHO/92

Encontro da Juventude Presbiteriana Independente Aconteceu em Lençóis Paulis-

ta/SP, nos dias 16 a 19 de abril do corrente, o Encontro Na- cional da Juventude da Igreja Pres- biteriana Independente - IPI, orga- nizado pelo Conselho Nacional da Juventude. O tema geral do encon-

tro foi "O Universitário e a Luta pela Vida", subdividido em temas específicos, como: O universitário e a degradação dos Direitos Huma- nos; sexualidade: conceitos e pre- conceitos; o universitário e à dico- tomia entre política e religião; 500

anos de América; evangelização ou colonização, etc. Cada tema con- tou com assessoria específica.

O GTME foi representado por Rubens Seibel que orientou as dis- cussões sobee o tema 500 anos de América: evangelização ou coloni-

p-———r ■

GTME vê situação do índio na Bahia 3 SauloBini

A convite do pro- jeto Teologia

para o Desenvolvi- mento, do Presbitério de Salvador da Igreja Presbiteriana Unida, Villi Seilert contou a experiência do Grupo de Trabalho Missio- nário Evangélico jun- to a diversos povos indígenas e teve a oportunidade de co- nhecer mais um pou-' co da triste realidade do índio na Bahia. O antropólogo José Au- gusto Laranjeiras Sampaio, membro da Associação Nacional de Apoio ao índio/ BA, enfatizou que, por causa da relação de muita semelhança entre o povo caboclo e sertanejo do nordeste e os povos indígenas da região, há uma tendência de se negar a identi- dade indígena destes povos por parte da sociedade nacional. "É preciso saber o que identifica um povo não é o que ele usa e sim, a consciência de ser portador de uma tradição própria", argumentou o antropólogo.

Durante o encontro discutiu-se questões ligadas à colonização das Américas, do Brasil, em particular — a propósito da comemoração dos 500 anos — políticas indigenis- tas no Brasil, das missões jesuíti- cas aos direitos constitucionais, participação dos índios na ECO 92, resistência cultural, etnocen- trismo, demarcação das terras e as seqüelas provocadas pelo contato

Encontro de imigração em Salvador-BA

com nossa sociedade. Villi relem- brou a história da ação missionária destacando que "o trabalho de al- guns grupos desconsidera as bases culturais dos povos indígenas, e contribui para sua desestruturação. Esse trabalho se restringe ao servi- ço missionário tradicional, sem qualquer relação com as necessida- des fundamentais e os direitos ple- nos dos povos indígenas, como saúde, educação, organização e de- marcação de suas terras. "Falta na ação missionária convencional en- xergar os sinais de Deus no povo" — frisou Villi.

Solidariedade O encontro terminou com a for-

mação de grupos de solidariedade que, com o apoio do GTME e da AN AÍ/BA, vão repassar as infor- mações obtidas e promover even- tos que divulguem e defendam a

luta indígena. Na celebração final, todos cantaram: "A terra é santa, a terra é mãe, a terra é do índio, a terra é de Deus (...)".

Participaram: Associação Na- cional do Apoio ao índio da Bahia (AN AÍ/BA), Centro de Estudos e Assistência às Minorias Oprimidas (CEASMO), Comunidades Ecle- siais de Base (CEBs), Coordenado- ria Ecumênica de Serviços (CE- SE), Instituto Pastoral para uma Ação Comunitária (ISPAC), Insti- tuto de Educação Teológica da Ba- hia (ITEBA), e as Igrejas Batista da Graça, Batista Nazareth, Con- gregacional da Federação, Meto- dista de Feira de Santana, IPU de Salvador e IPU de Valério Silva, entre outras.

Jane Lemos é jornalista e membro da Igreja Evangélica Congregacional. Elabora o Jornal da SETE - Sociedade dos Estu- dantes de Teologia Evangélica.

Encontro de Iniciação Encontro de Iniciação Curso de Antropologia Encontro de Iniciação Encontro de Iniciação

Tanqará da Serra/MT 25 - 26/07/92 Belém/PA 01 - 03/09/92 Cascavel/PR 07-18/09/92 Porto Alegre/RS 14-16/09/92 Passo Fundo/RS 03 - 05/10/92

zação, partindo do histórico da questão indígena no Brasil e refle- xões em grupo sobre a presença da Igreja na América, os conceitos e práticas evangelizadoras.

Márcia Assis IPI - Osasco/SP

"Aprofundamento" No decorrer do anos de 1991

cerca de 50 pessoas partici- param dos três encontros de ini- ciação sobre a questão indígena e missionária promovidos pelo GTME em Aimorés/MG, São Bernardo do Campo/SP e Cuia- bá/MT. Várias destas pessoas - manifestaram interesse num me- lhor conhecimento da questão.

Atendendo-as e dando segui- mento ao programa de formação do GTME, lhes oferecemos a oportunidade de aprofundar nos estudos então iniciados, através do envio de materiais e suges- tões de atividades. Neste senti- do, escrevemos às pessoas acima referidas e mais algumas que ha- viam participado em outros eventos promovidos pelo GTME há mais tempo, propondo um ro- teiro de estudos abordando oito temas a serem tratados sucessi- vamente. Estes temas constam do programa discutido na As- sembléia Geral do GTME reali- zada em 1991, no item "Apro- fundamento": — situação atual dos povos indígenas; — movi- mentos e organizações indíge- nas; — origens da atual situação dos povos indígenas; — contexto social brasileiro em que vivem os povos indígenas; — entidades indigenistas não governamentais nem ligadas a Igrejas.

Enviamos 55 cartas com esta proposta e recebemos até o mo- mento (final de maio) 12 fichas de inscrição de pessoas que es- tão interessadas no estudo. Re- metemos, então, a estas pessoas, o roteiro da primeira unidade de estudo — "Situação atual dos povos indígenas no Brasil" — que consta de um texto-base so- bre o assunto, acompanhado de cinco "anexos" e das "suges- tões de atividades" a serem rea- lizadas.

Estamos, agora, aguardando respostas a esta primeira remes- sa de material, para prosseguir- mos com o estudo, abordando o segundo tema: "Movimentos e Organizações Indígenas".

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JUNHO/92 TUPARI 5

Curso de Antropologia Arlindo G. Leite

Curso de Antropologia para missionários/as. Ao centro, em pé, Márcio Silva, assessor.

Atendendo à proposta da últi- ma Assembléia Geral do GT-

ME, realizou-se em Rolim de Moura/RO, entre os dias 19 e 30 de abril de 1992, um Curso de An- tropologia, que contou com a as- sessoria do professor Mareio Fer- reira da Silva, do Departamento de Antropologia da Universidade Es- tadual de Campinas - UNICAMP, e a participação de 11 companhei- ros que atuam nas áreas indígenas Kulina (4), Cinta-Larga (2), Me- quéns (2), Enawenê-Nauê (2) e Katukina (!)• Seis destas pessoas são membros do GTME, quatro da OPAN e uma do CIMI. Da parte da equipe executiva do GTME, es- tiveram presentes Arlindo e Jaider, respectivamente na Ia e 2a sema- nas.

O curso dedicou um ou dois dias ao estudo de cada um dos po- vos junto aos quais atuam os parti- cipantes, relacionando os vários aspectos analisados com os outros povos conhecidos pelos cursistas: sistema de parentesco, relações in-

tra e intertribais, xamanismo, cos- mologia, rituais, mitos, trocas sim- bólicas, demografia, etc.

Foi realizado, também, um exercício de registro etnográfico, e no final do curso as pessoas elabo- raram uma proposta de pesquisa para suas áreas de atuação, a partir das discussões ocorridas.

Em termos gerais, o curso foi avaliado positivamente: localiza- ção, duração, convivência, asses- soria. Quanto ao conteúdo e méto- do, foi especialmente apreciado o fato de terem sido trabalhados vá- rios aspectos da realidade vivida pelos participantes nas áreas indí- genas, de forma comparativa, esta- belecendo relações e confrontos entre os povos conhecidos. Márcio conseguiu orientar muito bem todo este trabalho.

Agradecemos de modo especial ao casal de pastores da IECLB lo- cal, Élio e Regene, que acolheram e deram todo apoio ao grupo que participou do curso.

Leituras recomendadas FRANCO, Sciíla Minha Prece — Coletânea de textos indígenas e missionários São Bernardo do Campo, Editeo, 1992, 133 pági- nas Lançado durante a Semana Wesleyana realizada entre os dias 19 e 22 de maio de 1992, este livro é um tributo ao Rev. Scilla Franco, falecido em 07/10/1989. Scilla Franco atuou, na década de 70, junto aos índios Kaiowá e Terena de Doura- dos-MS, e foi um dos fundadores do GMTE, que coordenou por cinco anos. O livro reúne vários textos, que manifestaram a dedicação indigenista e missionária que marcou a vida do autor. SOARES, Geralda Chaves OS BORUN DO WATU - Os índios do Rio Do ce Belo Horizonte, CEDEFES, 1992, 198 páginas Atendendo a um pedido do Povo Krenak, no sen- tido de que o CEDEFES "pesquisasse a história de seus antepassados, relatando-a em um livro, afim de torná-la viva para que os seus jovens de hoje conhecessem a vida e a resistência de seus antepassados, entendendo melhor a história de ho- je", a autora pesquisou e organizou a documenta- ção escrita e recolheu depoimentos orais entre os Krenak. O resultado é este texto, amplamente do- cumentado e ilustrado. Centro Ecumênico de Documentação e Infor- mação POVOS INDÍGENAS NO BRASIL - 1987/88/ 89/90 São Paulo, CEDI, 1991, 592 páginas "Nas 592 páginas desse volume, o leitor encon-

trará 1142 notícias, baseadas em 94 fontes de im- prensa e 19 outras (relatórios, ofícios, documen- tos oficiais etc), além das fontes diretas (depoi- mentos e informações pessoais); 61 comentários assinados; seis entrevistas; 25 mapas e igual nú- mero de quadros; e 275 fotos. Todo esse material foi organizado por etnia e/ou área indígena, agru- padas por 20 regiões geográficas. Temas gerais aparecem nos quatro capítulos iniciais." (Apre- sentação, página?). MEIHY, José Carlos Sebe Bom CANTO DE MORTE KAIOWÁ São Paulo, Loyola, 1991, 303 páginas Quatro pesquisadores em "história oral" realiza- ram um levantamento e estudo, ao mesmo tempo, científico e envolvente sobre a questão dos suicí- dios entre os Kaiowá. O trabalho foi efetivado no decorrer do ano de 1991 e publicado no final do mesmo ano. TASSARA, Eda e BISILLIAT, Maureen O ÍNDIO/ONTEM, HOJE, AMANHÃ São Paulo, Edusp, 1991, 165 páginas Trata-se de um dossiê de manifestações culturais sobre os povos indígenas da América, ocorridas em junho/julho de 1990 no Pavilhão da Criativi- dade do Memorial da América Latina — São Pau- lo/SP. Inclui depoimentos de Aiiton Krenak, Syd- ney Possuelo, Anine Suruí, Sebirope Gavião e Orlando Villas-Bôas; sinopses sobre diversos ví- deo-documentários; depoimentos e debates entre documentaristas, antropólogos, estudiosos e inte- ressados na questão indígena; no final, uma ampla abordagem da questão Yanomami.

Semana de Teologia discute os 500 anos e a responsabilidade dos evangélicos

w ças me

' os dias 19 a 22 de maio, cerca de 100 pastores (as) e lideran-

ças metodistas, de todo o país, esti-, veram na Faculdade de Teologia, em São Bernardo do Campo, para repensar a evangelização junto aos povos indígenas. Dentre os partici- pantes, quase 20 estão diretamente envolvidos na missão de solidarieda- de a 8 diferentes povos indígenas no Brasil. Houve momentos criativos de liturgia, depoimentos de repre- sentantes dos Krenak e Kaiowá, conferências com antropólogos, teó- logos e indigenistas. Coube ao GT- ME coordenar um dia da programa-

ção e provocar e discussão acerca da prática das Igrejas evangélicas na pastoral indigenista até agora e que tipo de evangelização deve ser de- senvolvida. O coral da Unimep apresentou a "Missa da Terra Sem Males" e foram lançados os livros "Teologia Africana" de Gabriel Se- tiloane, da África do Sul e "Minha Prece", uma coletânea de reflexões da pastoral indigenista, do falecido bispo Scilla Franco. Uma comissão elaborou um documento final, que foi aprovado e assinado por todos os participantes no ofertório da cele- bração final.

Franze Souza Lima

"Que tipo de evangelização queremos." Semana Wesleyana

A Igreja Metodista, os povos indígenas e os 500 anos

Carta Aberta A todo o Povo Metodista

Reunidos durante a 41a Semana Wesleya- na, no mês de maio de 1992, na Faculdade de Teologia, refletimos durante quatro dias sobre o tema "A Igreja Metodista diante dos 500 anos. Repensando a Evangelização junto aos Povos Indígenas", e constatamos:

— que nós, da Igreja Metodista, devemos em todas as nossas comunidades, reconhecer que a América, descoberta pelos povos indíge- nas que aqui chegaram ants do europeu, sofreu um dos mais sangrentos processos de conquis- ta da história, causando genocídio entre os po- vos indígenas e a destruição de suas culturas.

— que a Igreja Metodista, em várias partes das Américas, foi cúmplice e co-participante, através de seus membros, nesse processo de destruição das nações indígenas;

— que, conseqüentemente, devemos buscar, em ato de confissão e arrependimento, o per- dão de Deus para uma dívida tão imensa.

Reconhecemos também que, como Igreja Metodista, desde seus pioneiros João e Carlos Wesley, lemos sido chamados a aprender com os índios em diálogo e respeito, e a servi-los em humildades e solidariedade, no espírito do amor de Jesus Cristo;

— que hoje, através de suas frentes de servi- ço com os Kaiowá, com os Makuxi, com os Krenak, com os Tupinikim, com os Guarani, com os Tapeba, com os Pataxó, a Igreja Meto- dista no Brasil procura viver o evangelho soli- dariamente, através da Pastoral de Convivên- cia e do diálogo, respeitando a autonomia de cada povo e sua cultura;

— que as Boas-Novas do Evangelho só têm sentido para os povos indígenas se ajudar a re- construir as suas próprias culturas, a refazer os seus direitos sobre a terra e a recobrar a digni- dade que os filhos e filhas de Deus possuem.

Nesse evento, pela primeira vez, pudemos reunir os metodistas que estão trabalhando di- retamente com povos indígenas, em diferentes partes do país. Sentimos que a Igreja Metodis- ta, como comunidade missionária a serviço do povo, está sendo chamada a assumir mais ple- namente essa vocação. Para isso, necessitamos do apoio decidido e constante das comunidades metodistas às causas indígenas e aos missioná-

rios brasileiros que atuam nessa área. Preocupa-nos hoje o aumento da violência e

a impunidade reinante em relação aos crimes cometidos contra as comunidades e lideranças indígenas.

Preocupa-nos hoje o terrível empobrecimen- to dos muitos povos indígenas — entre os quais aqueles que buscamos servir - que, pre- midos pelas necessidades, vêem com desânimo o futuro, temendo pela própria sobrevivência.

Preocupa-nos hoje a demora e a demagogia que o governo tem revelado na questão da de- marcação das terras indígenas.

Preocupa-nos hoje a seqüência de suicídios entre os Kaiowá, especialmente entre os jo- vens.

Solicitamos, portanto, às igrejas metodistas que se manifestem por carta ao Congresso Na- cional, onde está sendo discutido atualmente o Novo Estatuto do índio, no sentido de que as reivindicações indígenas sejam ouvidas e aos seus direitos e interesses efetivamente respeita- dos e atendidos, tanto pela Comissão que pre- para o Anteprojeto bem como pelos demais parlamentares.

A Igreja Metodista tem no saudoso Bispo Scilla Franco, um exemplo para a sua vocação missionária entre os povos indígenas. Mas, nem sempre, tem dado a atenção que esse cha- mado requer. Por isso, conclamamos a todos os metodistas a expressarem concretamente a sua solidariedade — na oração, no estudo e no reconhecimento das causas indígenas, nos con- cílios, na ação política junto aos órgãos gover- namentais, e no apoio aos missionários, nome- ados ou não, que estão buscando servir e ouvir os nossos irmãos e irmãs indígenas. De nossa parte, reafirmamos o nosso compromisso de nos envolvermos mais intensamente na missão da Igreja Metodista junto aos povos indígenas.

Em Cristo, Participantes da Semana Wesleyana de 1992 São Bernardo do Campo, 22 de maio de

1992 IGREJA METODISTA, COMUNIDADE

MISSIONÁRIA A SERVIÇO DO POVO

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6 TUPARI Equipe Kulinada IECLB

JUNHO/92

Pastores debatem missão entre os povos indígenas

...... . . ■.

Assembléia do Alto Purus

Assembléia Kulina no Purus

Aconteceu nos dias 7 a 10 de abril deste ano a 7a Assembléia do Povo Kulina, na aldeia Sobral, município de Manoel Urbano/AC.

Este encontro reuniu aproximada- mente 400 pessoas, lideranças indíge- nas, professores, agentes de saúde, jo- vens, mulheres e crianças das aldeias do Povo Kulina do Alto Purus, do Ju- ruá, Tarauacá, Envira, de São Bernar- do, no Peru e lideranças dos Povos Kaxinawá e Jaminawá de todas as al- deias do Alto Purus/AC.

Na Assembléia foi reforçada a união deste povo, reafirmando o com- promisso conjunto de defesa das terras indígenas, dos seus lagos e da mata, contra a invasão de pescadores e ma- deireiras, do direito dos povos indíge- nas à uma educação específica que res- peite a cultura, seu modo de viver e seja reconhecida pelo sistema oficial, direito à assistência à saúde, principal- mente cobrando do Governo seu dever de demarcar imediatamente as áreas indígenas do Alto Purus e Médio Ju- ruá, conforme os limites conhecidos Delas comunidades.

Nesta Assembléia os Povos do Alto Purus também fizeram um documento, após uma longa reflexão, contra a cria- rão do novo município de Santa Rosa, o que provocaria o aumento de não ín- dios nas proximidades de suas terras.

Este evento firmou um crescimento na aliança para defesa dos direitos des- tes povos. "Nossos avós deixaram uma sementinha que agora está cres- cendo. .. Todas as noites temos que so- nhar como vai ser o nosso futuro" ^Mário Kaxinawá). Com esta união, os índios estão firmes a defender suas ter- ras, mesmo que ainda não tenham do- cumento da demarcação. "Nossos do- cumento está na nossa cabeça" (Noba Kulina).

Além da organização, a reunião foi narcada por muita alegria. Todas as .noites o pessoal se reuniu no terreiro da aldeia para dançar o Madri.

Agora, algumas lideranças destes povos vão à Brasília discutir propostas para o novo Estatuto do índio.

Esta Assembléia contou com o apoio e assessoria do CIMI - Conselho Indigenista Missionário, OPAN - Ope- ração Anchieta, IECLB - Igreja Evan- gélica de Confissão Luterana no Bra- sil, UNI - Acre e Sul do Amazonas - União das Nações Indígenas, e do GT- ME - Grupo de Trabalho Missionário Evangélico.

Com uma ampla maioria de presbiterianos e batistas en-

tre os 200 participantes, foi reali- zado de 6 a 10 de abril, em Cuia- bá, um encontro de pastores de toda a região Centro-Oeste, pro- movido pelo Conselho de Minis- tros Evangélicos e pela Visão Mundial. Como desdobramentos do tema geral "Unidade da Igre- ja: realidade e esperança", foram

As Igrejas e a Pastoral indigenista Reunião do Comin

abordados questões da cidadania, cristianismo e sociedade, a situa- ção das crianças de rua, as bases bíblicas para a unidade dos cristã- os e os compromissos de missão. Numa das manhãs — com a asses- soria do GTME, a missão entre os povos indígenas foi o assunto mo- tivador, provocando debate e inte- resse.

Representantes das igrejas membros do CLAI - Conselho Latino-Americano de Igrejas — e organismos eclesiásticos estiveram reunidos em Porto Alegre- RS, no dia 5 de abril de 1992 para uma consulta sobre a Pastoral Indigenista das igrejas no Brasil. A consulta pro- movida pelo COPAL - Conselho de Pastoral Aborígene Latino Americano — objetivou analisar com as próprias igrejas o desenvolvimento do trabalho indigenista nas igrejas evangélicas bra- sileiras, assim como oferecer assessoria a elas e a grupos que trabalham com a questão indígena no país.

Participaram como observadores Antônio Brand, representante do CIMI - órgão da Igreja Católica, ligado a CNBB e Natalino Gog Crespo, índio Kaigang, professor da comunidade de Guarita de Tenente Portela-RS. Ambos forneceram orientações e sugestões re- levantes à consulta.

Parte da consulta constituiu-se de informes sobre o COPAL e GTME, suas finalidades e perspectivas à respei- to da pastoral indígena. As partes en- volvidas firmaram compromisso atra- vés de documento: "Nós, representan- tes das igrejas filiadas ao CLAI, região Brasil, reunidos nesta consulta propo- mos que o CLAI trabalhe em parceria com o GTME, visto que o mesmo dis- põe de uma estrutura de atuação e man- tém diálogo com grupos ligados ás mis- sões confessionais, além de fazer a arti- culação com as igrejas através dos departamentos internos ligados à causa indígena, como o GTI, COMIN, SMI, CIMI e outros. Com base nesta propos- ta recomenda-se que o representante do COPAL viabilize visitas aos departa- mentos eclesiásticos para a causa indí- gena, a fim de que a decisão seja a mais democrática possível."

Antônio Brand disse que a pastoral indígena do CLAI deve procurar am- pliar o diálogo e melhorar a presença missionária dos grupos conservadores que estão atuando na causa indígena a fim de melhorar o serviço ao índio. Já Natalino Gog Crespo salientou que "em qualquer trabalho com o índio tem que se levar em conta o que ele tem a dizer", ou seja, restituir-lhe a palavra que foi roubada e silenciada durante o processo de civilização nestes 500 anos.

Reuniram-se no dia 16 de maio/92 o Conselho de Mis-

são Entre os índios — COMIN, Operação Anchieta — OPAN e Grupo de Trabalho Missionário Evangélico — GTME, no Institu- to Salete, em Curitiba/PR, por ocasião da reunião da diretoria do COMIN. Na oportunidade procu- rou-se ampliar a discussão em tor- no da união de forças na tarefa missionária, almejando trabalhos conjuntos de complementação e cooperação mútua no campo do indigenismo, conforme diálogos anteriores.

A partir da reunião ficaram fir-

mados os seguintes aspectos: Pos- sibilidade de encaminhamento pe- lo GTME e COMIN de pessoas para o programa de estágio ofere- cido pela OPAN; Cedência de agentes indigenistas por parte da OPAN para suprir a demanda nos trabalhos do COMIN; Participa- ção conjunta dos missionários e agentes atuantes em área nos cur- sos específicos oferecidos pelo GTME, através de seu programa de formação: Disposição para se desenvolver novos projetos de tra- balho conjunto, onde a presença se sentir necessária para os povos indígenas.

solidariedade a índios Grosso, íí

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JUNHO/92 TUPARI

Nordeste: 500 anos de lutas indígenas

1. Os "Filhos da Terra" "Nós somos filhos da terra.

Nós num sai, prefere morrer aqui que essa terra é nossa". Se por um lado a fala de Mocinha, índia Kapinawá (Buíque-PE), revela a força da luta do seu po- vo contra os grileiros, por outro lado, expressa também a me- mória da presença indígena mi- lenar na região. As descobertas arqueológicas mais recentes têm confirmado a antigüidade da presença humana na Região Nordeste. E foi o litoral nor- destino a primeira região a ser invadida pelos europeus, já an- tes mesmo da invasão portugue- sa, em 1500. Portanto, a inva- são européia no Brasil, iniciou- se no Nordeste.

As invasões portuguesas, inicialmente com a do litoral e o plantio da cana-de-açúcar, en- contraram a firme resistência dos povos que habitavam as áreas litorâneas. Para a con- quista da Paraíba por exemplo, os portugueses enfrentaram por 13 anos a Guerra Potiguara.

A Guerra Kariri (1692- 1969), que também ficou co- nhecida na história oficial como a "Guerra dos Bárbaros", reu- niu os Povos da Grande Família Kariri, habitantes dos sertões nordestinos: do interior da Ba- hia, ao longo das margens do Rio São Francisco, e até o Cea- rá. Organizados em uma confe- deração, os povos Kariri se re- belaram contra as invasões por- tuguesas e a implantação das fazendas de gado.

O Nordeste guarda a memó- ria de 500 anos de resistência e lu.as indígenas: desde as guer- ras contra as conquistas portu- guesas no início da coloniza- ção, como a participação nos Quilombos e em outras rebe- liões negras e ainda, nas tantas outras lutas populares posterio- res como a Balaiada, no Mara- nhão, a Revolta de Pinto Ma- deira e a luta do Caldeirão, no Ceará, a Cabanada em Alagoas e Pernambuco, Canudos na Ba- hia, e o Cangaço por todo o sertão nordestino.

Foram índios, negros, "ho- mens livres", pobres sem terra, pequenos posseiros, os oprimi- dos aliados em lutas históricas de libertação, de construção de um projeto político próprio, frente ao projeto das elites do- minantes.

2. A Realidade Indígena Hoje no Nordeste, moram

cerca de 42.000 indígenas, es- palhados por diversos estados (ver mapa).

A invasão das terras indíge- nas e a violência física e cultu- ral são marcas desses 500 Anos. Reunidos em Assembléia Xocó, na Ilha de São Pedro em Sergipe, em 13 de janeiro de 91, com a "Carta dos povos in- dígenas do Leste-Nordeste para a população em geral e as auto- ridades competentes", os indí- genas exigiram: "Punição con- tra os assissinos de Antônio Gilvan da Cruz, índio Truká (Cabrobó-PE), assassinado no dia 28 de novembro de 90 e Abdon Leonardo da Silva, caci- que do povo Atikum (de Flores- ta, no Pernambuco) e seu irmão Abdias João Leonardo, assassi- nados no dia 28/12/90 ao mes- mo tempo em que sua mãe re- cebia um disparo de espingarda calibre 12, por reconhecer os criminosos dos seus filhos. A mesma continua sob pressão dos criminosos, pois a qualquer momento eles podem terminar o que iniciaram, isto é, matá-la também. A Assembléia denun- ciou também que a violência, os assassinatos, os espancamen- tos, acontecem em todas as áre- as indígenas da região pelos fa- zendeiros e latifundiários. A omissão da Funai e do Governo Federal que em momento al- gum se posicionaram ou toma- ram qualquer providência está ligada ao fato de nenhuma área indígena no Nordeste encon- trar-se demarcada e legaliza- da".

As lutas pela terra, as vio- lências ocorridas, as péssimas condições de saúde, de educa- ção e de sobrevivência, levaram

as lideranças indígenas do Nor- deste e dos estados de Minas e Espírito Santo a criarem em de- zembro de 90 a Articulação dos Povos Indígenas do Leste-Nor- deste. A discussão de saída pa- ra os problemas comuns enfren- tados e a união por micro-re- giões, tem significado um grande fortalecimento das lutas na organização indígena e na articulação com as lutas sociais — políticas na região.

Os povos indígenas do Nor- deste mesmo diante de 500 anos de imposição cultural e política, conservam muito de suas raízes sócio-culturais. São expressões fortes nas organizações, na vi- da, no jeito de ser, na maneira de ver o mundo, na vivência re- ligiosa no mundo simbólico, do sagrado.

O Toré é uma dança coleti- va com um sentido religioso- festivo, acompanhada de cantos que evocam a história de cada povo ou a memória coletiva das lutas indígenas do Norteste quando cantam: "Viva o Rei Canindé", liderança da Guerra Kariri.

O Ouricuri, retiro religioso, variando o tempo de duração de povo para povo, é uma outra forte expressão característica dos povos indígenas no NE.

Encontramos também a di- mensão do sagrado, cultivada através de várias festas e ri- tuais, específicos ou semelhan- tes entre os povos, como a "Dança dos Praia", do povo Pankararú (PE) e também do povo Kaimbé (BA) e a "Festa do Menino do Rancho" entre os Pankararú e também entre os Geripankó (AL).

Na relação com a Terra, ela é vista como mãe: "Nós somos filhos da Terra". É uma rela- ção comunitária e que possui um sentido ritualístico religio- so, como expressam os Xucuru da Serra do Ororubá (PE), ao retomarem dos posseiros uma área conhecida como Pedra d'Agua. Eles dizem: "Lá é o lugar pra fazer os nossos ri- tuais". Os Xucuru-Kariri

(AL)— preservam a mata da Cafurna como lugar sagrado, "Templo de Fé".

3. "Ando atrás de um bom dia para o meu povo"

Essas foram as palavras de Antônio Celestino, pajé Xucu- ru-Kariri no sétimo Intereclesial de CEBs, no RJ.

O que significa evangeliza- ção junto aos povos indígenas do Nordeste, 500 anos depois? Quais os desafios da realidade indígenas no Nordeste às igre- jas?

O CIMI Nordeste em sua atuação missionária e através de assessorias no campo da educa- ção, jurídico, saúde e subsistên- cia tem apoiado a organização e as lutas indígenas pela demar- cação e garantia de suas terras, pelo reconhecimento dos seus direitos, bem como articulação das lutas indígenas com as lutas populares.

Em fins de março deste ano, membros do Comitê Cen- tral do CMI - Conselho Muni- dal de Igrejas, estiveram em Recife e viajaram à cidade de Pesqueira, no interior, onde vi- sitaram e apoiaram a luta do povo Xucuru em uma área re- cém ocupada, retomada de fa- zendeiros, invasores.

O CIMI-NE foi convidado a participar na preparação e na programação da visita do CMI juntamente com as igrejas Me- todista, Luterana e Anglicana, além de representantes dos mo- vimentos negros em Recife.

A experiência revelou a abertura das igrejas à causa in- dígena. Esta visita representou um testemunho profético junto aos povos indígenas, perante a sociedade nesta história de 500 anos. As igrejas percebem as exigências de um compromisso evangélico que reverta esta his- tória de massacres e extermí- nios de vários povos. Somos chamados/as a construir os pró- ximos 500 anos.

Edson Silva, indigenista do CIMI- NE e Daniel Rodrigues, advogado do CIMI-NE e membro da Igreja Anglicana.

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8 TUPARI JUNHO/92

Evangélicos do Ceará i pelo reconhecimento dos "ITivendo no litoral de também agricultores, So- usi ▼ Almofala, em Itarema, mando mais de três mil nhí

Ceará, os índios Tremem- pessoas, este povo tem par- Jur bé ocupam-se tradicional- te de suas terras já garanti- mi; mente com a pesca e são das, via reforma agrária e da

se envolvem Tremembé

ícapião, faltando re cimento e demarcação, mer

na luta

"A natureza foi um enfeito que Deus fez no mundo" Marcos Guilherme

Agostinho Félix Jacinto, Tuxaua da Varjota, Tremembé de Al- mofala, Município de Itarema, Ceará — Nordeste do Brasil em 29 de fevereiro de 1992

A natureza, eu me refiro que a natureza foi um enfeito, que

Deus fez no mundo. Esse enfeito foi o homem. Não foi outra coisa. Foi o homem. Porque basta que ele é o dominador de um tudo. Então o homem, o índio é nature- za. É a natureza. E a natureza fei- ta por Deus. Uma obra feita por Deus que existe no Brasil.

Nós, naquela reunião onde nós se encontremos e vimos aquele homem chamar o índio de selva- gem. Mas deixa que no meu co- nhecimento o selvagem são eles que vive de explorar. Esses é que são uns selvagens. O índio é uma natureza — uma obra feita por Deus — é um ser vivo como a ave, como uma ave que Deus fez e nós no mundo para confeito do mundo. Então a gente, a gente vê que o ín- dio, a cultura do índio não é o que está se usando hoje, Hoje está se usando o que? Está se usando é o rádio, é a televisão, é o abismo do mundo. É essas cousas que vale, mas tudo isso foi o poder do opres- sor que botou na nossa cabeça. En- tão, hoje, na nossa estadia de hoje, nós vive trabalhando de que? Tra- balhando de enxada, foice, cava- dor, essas cousas como uma ferra- menta. Quem formou essas cou- sas? Foi o poder. Isso aí não veio da cultura do índio. O índio — era um machado de pau, era arrancan- do batata, batata do mato, cipó, mucunã, essas cousas para comer, para servir de alimento, caçando, usando mesmo a flexa, o arco, es- sas cousas mode fazer, trabalhar no alimento para ele e tudo bem. Mas depois que o Brasil foi invadi- do o índio mudou. Mudou e hoje ele vive numa cultura importante.

Convivência e partilha

mas deixa que é o lado do poder. Foi tudo que o poder botou na ca- beia dele. Não é feito por ele. Vo- cê vê — eu conheci meu pai que pescava com uma tarrafa de fio. A mamãe fiava e ele fazia aquela tar- rafa de fio. Depois começou-se a comprar linha na bodega. A linha 02, 01, 08. Era assim. Linha feita na bodega. Hoje se pesca com ny- lon. Qual é o de nós que sabe fazer o nylon? Mas estamos usando es- sas cousas. Por quê? Porque isto vem do alto poder. Nós vê e adqui- re por lá. O índio aprendeu a tra- balhar de ferro. Por quê? Porque depois do cativeiro que o opressor adquiriu, aí botou para ele para trabalhar como burro. Foi com fer- ro. Trabalhar com ferro. Arrastan- do ferro, sendo amarrado. Aí ele ficou com aquele modo, aquele sis- tema de trabalhar daquele jeito.

Cadê a cultura dele? Que a cul- tura dele era outras cousas. A cul- tura dele era trabalhar na sobrevi- vência dele. Ele não ia fazer futu- ro. Hoje, nós, quem puder comprar uma rês não dispensa. Por quê? Rês é do meu senhor fazen- deiro, né? Então nós sabemos que o índio nada disso possuia. O índio vivia por conta própria e ele cuida-

entre os Tremembé/CE

va da saúde com remédio do mato, com isto, com aquilo. Ele vivia de outras maneiras. Então hoje se a gente não tiver observando o po- der, tiver com parte do poder no nosso meio, tudo depende do usar. Chama-se índio. O nome de índio é uma palavra incrível. Pode ser um lugar ... Os índios ... Aí todo mundo estranha. Naquela reunião que nós tivemos lá em Fortaleza, no 7o Encontro de Caxias. Aque- las crianças deste tamanho queriam vir para reparar os índios. "Quem é os índios? "Lá estava os índios" "Queria ver os índios" Pensando que era uma cousa, um animal, um bicho, uma fera ... É. Já que acon- tece assim é porque não reconhe- ce. Mas deixa que os índios é uma pessoa humana. É uma pessoa que não usa cousa de ignorância. Ago- ra, quando aquele elemento propôs que o índio é um selvagem ... Por que motivo ele dizia que o índio é um selvagem? Porque se o índio não vive de explorar, o índio sel- vagem deve ser ele que vive de ex- plorar. Tomaram a nossa cultura, o nosso Brasil, o nosso chão, as nossas matas, as nossas madeiras e ainda que eles são a gente e nós so- mos selvagens. Devia reconhecer

isto e sabe também eles não enten- dem o que é o índio, eles não sa- bem ... Pensa que a natureza é eles e nós somos uma cousa estranha. Pois é, a gente devia ter-se levan- tado, ter ficado em posição e ter contado a circunstância como era e como não era. Mas como a gente ainda trás aquele regime de obi- diência, a gente ainda tem aquela obidiência ao poder, passa a ser no lugar dele, na cidade — a gente respeita, a gente tem obidiência. Temos porque aquilo vem da natu- reza porque a gente é humano. A gente não é desumano com eles, lapeia a língua na frente da gente e conta o que quer. Ele não conhece, não sabe o que é. Ele pensa que é um selvagem, um bicho que apare- ceu aí, está aí e hoje quer ter um direito. Mas não, o índio tem o di- reito dele. Porque ele é filho natu- ral. O padre não sabe nem do que foi gerado o índio. Como ele não sabe do que foi gerado. Mas como ele aprendeu nos colégios grandes, nos altos poder, ele se refere que é um poderoso. Um padre quer ser até dono de uma tribo, de uma pa- róquia. Os padres foram estes que levaram os índios para que o opressor pegasse porque sem os padres eles não conseguiam. Eles enfrentaram, tentaram para adqui- rir os índios para tomar conta do Brasil. Mas os índios se enturma- ram, se agruparam e vieram contra eles. Porque eles não podiam en- trar, era ura povo de fora. Eles nera sabiam nem se nós era gente ou o que era. Podia acontecer co- mo aconteceu mesmo: eles mata- vam e tomaram de conta. Eles vol- taram e trouxeram os padres — es- ses padres formados por eles para fazer a cabeça dos índios, falando em Deus ... O índio é muito che- gado a Deus Tupã. Então aí acha- ram que é um laço muito bom os padres adquirir nós para eles. De maneira que os padres foram con- versando, alisando e passando a mão por cima e eles fazendo os apreparo deles por fora e quando deu fé estava trancado. Foi o que aconteceu.

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JUNHOÍ92 TUPARI 9 Marcos Guilherme

Salga de peixe sardinha - povo Tremembé

Com visitas às aldeias e ações de auxílio emergencial, os metodistas da Comunidade Vida e Missão, em Fortaleza, procuram cooperar com o trabalho que a

pastoral indigenista da Arquidiocese Católica vem cum- prindo junto ao povo Tapeba, no município de Caucaia. Sequer considerados índios pelos órgãos do governo, os Tapeba estão reivindicando 4.675 Ha às margens do trilho do rio Ceará. Esse povo tem sua origem na composição ét- nica entre os Potiguara, Tremembé e Cariri, que se junta- ram em Caucaia, durante a história de destruição de suas aldeias.

Arquivo da Pastoral indigenista

Até o século XVI, Caucaia era conhecida como "Vila dos índios", sendo, portanto, indígena a população majoritária. Em 1821, eram 1.260

moradores, todos índios. Em 1950, o recenseamento realizado no

município de Caucaia forneceu os seguintes dados: A população contava com 37.832 habitantes, destes sendo 23.553 pardos, categoria utilizada pelo IBGE para classificar população indígena não assistida pela Fundação Nacional de Apoio ao índio - Funai.

Atualmente, os índios Tapeba estão reduzidos a pouco mais de duas mil pessoas espalhadas pelas comunidades da Vila Nova, Vila São José, Pista, Ilha, Ponte 1, Ponte 2, Açude Capoeira 1, Capoeira 2, Lagoa do Tapeba, Barra Nova, Mestre Antônio e Camurupim ainda não integrados ao sistema de mercado, apesar de algumas comunidades manterem convivência com a população não — índia.

Criança Tapeba em Caucaia/CE

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10 TUPARI JUNHO/92

Povo Potiguara por um fio: Socorro1, f OGRUMIN (Grapo Mulher-

Educação) vem a nível nacio- nal e internacional informar a trá- gica situação do povo Potiguara. São 5 mil pessoas habitando 16 al- deias no estado da Paraíba. As mu- lheres e crianças são as que mais sofrem com o estado de abandono. Diariamente morre uma criança. O estado de pobreza em que se en- contram algumas aldeias é motiva- do pela poluição dos rios que ou- trora forneciam os alimentos. As brigas internas, mortes, o alcoolis- mo, a mendicância, o desânimo para o trabalho e diversas enfermi- dades ocasionadas pela desnutri- ção, motivados pela falta de pers- pectiva de sobrevivência e falta de trabalho. O Chefe de Posto, o ín- dio Marcos Antônio Santana dos Santos, filho do falecido cacique tradicional Potiguara, juntamente com as fortes lideranças Potiguara

(homens e mulheres) encontram-se desesperados num estado psicoló- gico de muito sofrimento e angús- tia, pois se sentem impotentes diante da calamitosa situação. Não há transporte para levar os doentes (casos graves) para o hospital em João Pessoa que fica à duas horas de distância. A desesperança reina nas terras dos nossos antigos guer- reiros ancestrais que até hoje espe- ram justiça e sofrem ao ver as nos- sas vidas violentadas. Os Potiguara estão rezando a Tupã e não querem continuar neste estado de indigni- dade onde apesar de tudo, resitem.

No ano em que a Europa co- memora os 500 Anos de Coloniza- ção e as Nações Unidas promovem a Conferência Internacional do Meio ambiente, não podemos si- lenciar: "Socorro, um índio Poti- guara está gritando e vai às Nações Unidas para ser ouvido!"

Por todas essas razões se reu-

niu no dia 10/02/1992 na aldeia do Forte (área Potiguara) a Comissão Indígena para a Criação do "Cen- tro de Profissionalização da Mu- lher Indígena e Formação de Lide- ranças" que possui 5 programas básicos, alguns já funcionando, mas precariamente:

a) Cursos trimestrais de cerâ- mica, cestaria, tapeçaria, corte- costura, pinturas, confecções de rede de dormir e pescar. Produção e venda. Intercâmbio com outras nações indígenas.

b) Reciclagem dos professores indígenas e elaboração de material didático.

c) Projeto da cabra-leiteira para famílias carentes.

d) Campanha da valorização da identidade indígena contra o alcoo- lismo, estado de desesperança e desânimo.

e) Apoio à saúde da mulher.

Apoio às mães viúvas, separadas, solteiras e a seus filhos menores.

Diante dos obstáculos e sofri- mento que estamos passando e a demora para a solução dos proble- mas, arregaçamos os braços e vi- mos a público solicitar apoios e contatos para as instalações do Centro da Mulher que está projeta- do para a aldeia do Fo rte. Parque Indígena Potiguara, Estado da Pa- raíba, que formará 60 mulheres a nível local e 15 mulheres a nível nacional (por ano), além de asssitir às comunidades locais. Agradece- mos a sua atenção.

Mais informações com: Wilma Santana dos Santos: Par- que indígena Potiguara - Aideia do Forte - Baía da Traição ■ Paraí- ba - CEP: 58.295 - Te!.: (083) 296- 1009 Eiiane Potiguara: Rua da Quitan- da n0 185/503 - Rio - CEP: 20.091 - Tel.: (021) 293-1745.

Lideranças do Leste-Nordeste opinam sobre estatuto e organização

Esta entrevista foi motivada pe- la historiadora Geralda Cha-

ves do CEDEFES (Centro de Do- cumentação Elói Ferreira da Silva) — Envolvendo Kanatejo, Puhuí, e o cacique Baiara, todos Pataxó e Cleonice, Pankararú. A entrevista foi realizada em Belo Horizonte quando essas lideranças retorna- vam da mobilização nacional dos povos indígenas que aconteceu em Brasília de 25 a 30 de abril.

A mobilização teve como obje- tivos discutir o Estatuto do índio e a representação nacional dos povos indígenas.

Participaram cerca de 350 lide- ranças de 103 povos diferentes.

Cleonice Pankararú: - Você Pata- xó de Minas como você avalia essa

mobilização? Foi boa? Faltou algu- ma coisa? Valeu a pena levar essa luta?

Puhui Pataxó: - Eu, como ín- dio da tribo Pataxó, acho que foi uma coisa muito importante a par- ticipação de todas as lideranças. Apesar de que faltaram alguns po- vos devido ao transporte que se en- contra muito difícil.

Senti uma falta grande deles entre nós. Mas foi muita coisa dis- cutida. E isso vai dirigir nossos objetivos à nível de todas as comu- nidades não só para nós que somos Pataxó, mas para todos os índios do Brasil.

Cleonice: - Foram discutidas dentro do Estatuto várias propos- tas. O que você achou das propos- tas apresentadas?

1^ Assembléia dos povos indígenas no Nordeste

Um passo bastante importante para melhorar a articulação entre os povos indígenas no Nordeste foi dado com a realização da I Assem- bléia dos Povos Indígenas dos estados de Pernambuco, Alagoas, Ser- gipe, Ceará e Paraíba. O encontro foi realizado entre os dias 9 e 12 de abril de 1992 na Área Indígena Xurucu, em Pernambuco. Catorze dos 17 povos estiveram presentes através de seus representantes. Uma das decisões mais importantes, foi a criação de organizações indígenas por micro-regiões, objetivando romper o isolamento e fortalecer a articu- lação entre as diversas nações. Pernambuco, por abrigar o maior nú- mero de povos (é o terceiro estado brasileiro em população indígena), foi considerado como uma micro-região.

Puhuí Pataxó: - Para mim to- das elas tinham coisas boas. Prin- cipalmente na área de educação, saúde, demarcação de terra. E a questão do garimpo: para a gente não aceitá-lo dentro de nossa área. Isso é uma coisa que foi marcante.

Cleonice: - Você acha que vai ser fácil esse Estatuto ser aprovado ou não?

Puhuí: - Sim. Vai ser fácil. Porque com nossa união e com nossa força tem que ser aprovado. Eles, os homens brancos, como os parlamentares têm que respeitar nossa luta.

Cleonice Pankararú: - Quanto à união dos povos, a união das na- ções indígenas, como você vê essa união? Você acha que o povo esta indo bem, que o povo está se mo- bilizando para a luta?

Puhuí Pataxó: - Eu achava di- fícil era nos encontrarmos todos nesses dias em Brasília. Eu achava mais difífil. Mas a partir desse mo- mento que a gente contou nossas histórias, nossos problemas de ca- da aldeia, aí vai nascer mais união em toda parte brasileira com todos os índios!

Geralda Chaves: - Cleonice, como ficou a proposta da organiza- ção dos Povos Indígenas depois desse grande encontro em Brasília?

Pankararú: - Bom, depois de várias discussões, vários debates, o pessoal aprovou o Conselho de Articulação e Organização dos Po- vos Indígenas do Brasil. E este Conselho vai representar a nível

nacional todos os povos indígenas. Foram eleitas 25 pessoas de cada organização para nos representar a nível nacional.

Geralda Chaves: - O que esses 25 índios, eleitos para a Coordena- ção vão fazer? Eles vão fica toda vida ou é uma coisa provisória?

Cleonice Pankararú: - Foi muito discutido esse assunto. E fi- cou assim: se o membro do conse- lho trabalhar bem, ele vai ficar de- vidamente 2 anos. E quem vai fis- calizar o trabalho desses membros são as comunidades. Na base, as novas organizações é que vão fis- calizar. E os membros também vão fiscalizar mais aos outros.

E a proposta é a seguinte: É trabalhar articulando as necessida- des. É um trabalho começando da base dos povos indígenas. O obje- tivo mesmo é articular e organizar todos os povos.

Geralda Chaves: - E depois desses 2 anos tem alguma coisa prevista? Vocês firmaram alguma coisa?

Cleonice Pankararú: - Bom, isso ficou para os povos discuti- rem. Depois vai haver outras reu- niões e o pessoal vai ver como vai ficar.

Geralda Chaves: - Você acha que para as comunidades indígenas esse encontro foi positivo? Você acha que as comunidades que não puderam vir vão dar conta de fazer isso mesmo? Você viu muita dis- posição dos índios de fazer o tra- balho? Continua

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JUNHO/92 TUPARI 11

Continuação Sérgio Andrado/F.S.P.

Cleonice Pankararú: - Ah! Sim! As Lide- ranças que participa- ram da mobilização estavam muito dis- postas, foram lideran- ças que participam da luta há muito tempo, então são pessoas que procuram mesmo or- ganizar pessoas que estão levando a sério o trabalho. Eu acho que a coisa vai ser bem encaminhada, porque eu senti que o pessoal está bem dis- posto a trabalhar.

Geralda Chaves: - Kanatejo, como era a organização do en- contro? Era todo mundo numa sala, só discutindo, ou era reunião por grupo?

Kanatejo: - A gen- te discutiu muito em conjunto, mas depois cada coordenador fi- cou com 39 pessoas. Eu fiquei no Grupo: - Princípios e gerais. Isso foi bem impor- tante porque eram os Princípios do Estatuto do índio. Porque para fazer o estatuto do ín- dio precisava come- çar dos índios. Discu- timos sobre a União. O Estado e os Muni- cípios. A União jun- tamente com os ín- dios, decide as coi- sas. E depois os Estados e os Municípios colaboraram. Mas o Estado e os Municípios não têm direito de entrarem diretamente nas aldeias. A União é quem de- cide junto com os índios.

Geralda Chaves: - E a parti- cipação dos índios?

Kanatejo: - Bem, eles apoia- ram porque antes, no outro Esta- tuto, não tem a participação dos Povos Indígenas juntamente com a União. Essas propostas nossa foi aprovada. Eles acharam im- portante. O nosso grupo levou e todo mundo apoiou.

Geralda Chaves: - Lembra de alguma outra coisa muito im- portante que aconteceu lá? Você gostou da convivência com os outros companheiros indígenas- ... Como foi isso?

Famílias Pankararú vivendo em favelas em São Paulo

Kanatejo: - Achei muito im- portante porque acho que nós ín- dios é quem devemos tomar nos- so caminho, nosso rumo, porque ali foi uma experiência para to- dos nós que nunca tínhamos par- ticipado de um encontro daquele. É para conseguirmos um fiituro para nossos filhos, para nossas crianças, só através da união e organização dos Povos indíge- nas. Só assim o Povo vai respei- tar os índios, porque vai ter uma corrente muito forte, não vai ser só um, só uma pessoa falando em nome de todos os Povos Indíge- nas. Vai ser todo mundo em con- junto para defender um direito comum. Um direito que é direito de todos à terra, à saúde, à edu- cação. Então isso para nós é im- portante: A convivência com os

parentes que não conhecíamos antes.

Geralda Chaves: - Quanto à educação. Ouvi dizer que agora o Estado pode criar uma escola dentro da sua aldeia? Como foi discutido isso, é uma escola de branco dentro da aldeia?

Kanatejo: - Isso aí ficou bem claro para todos nós. Os índios mesmo devem fazer a escola de- les, juntamente com o que é bom para eles. Por que o branco não pode entrar logo com uma escola dentro da área sem saber o que o índio quer: só juntamente com os índios é que pode fazer escola dentro da área.

Geralda Chaves: - Baiara, você como cacique encontrou lá outros caciques? Dessa convivên- cia esses dias você está levando

uma lição importante pa- ra seu povo?

Cacique Baiara: - É o seguinte: tô levando uma mensagem muito grande a respeito daque- le encontro. Todos os caciques participando. O respeito que cada um tem dentro de sua área, de viver junto com seu povo.

É uma participação muito boa para a gente. Não vai sair nunca da cabeça da gente aquela mensagem que os paren- tes levaram e passaram para nós.

Só assim, através da- quele encontro, a gente aprende muita coisa. Eu acho que a gente apren- deu muita coisa. Eu acho que a gente não vai ficar só. Quem foi, tem que transmitir para nos- sas comunidades que não estão participando ainda ou quem está en- contrando barreiras difí- ceis para resolver o pro- blema sozinho. A obri- gação, de nós caciques, é transmitir às outras co- munidades que não tive- ram participação, que não foram...

Então é esse o traba- lho, a obrigação de nós caciques.

Geralda Chaves: - No meio de quase 400 pessoas, as diferenças

eram muito grandes. Você Pata- xó, os Krenak, outros do Nor- deste, gente do Amazonas, Ro- raima... como foi isso para você?

Cacique Baiara: - A gente fi- cou alegre com os povos, irmãos da gente, que a gente nunca tinha visto. Foram momentos de ale- gria para nosso coração. Lem- bramos do tempo passado nosso. Porque o povo nosso, do Leste/ Nordeste foi quem recebeu os primeiros massacres. Nesses anos de opressão, estamos resis- tindo com aquela cultura que os nossos pais deixaram para nós. Então a gente ficou feliz porque a gente ouviu várias línguas dife- rentes, várias pinturas diferentes. Foi um momento de alegria, prestigiar nossos parentes. Isso tudo fez a gente ficar feliz por participar do encontro.

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12 TUPARI JUNHO/92

Os donos dos números Durante o segundo semestre de

1991, vários jornais publica- ram matérias enfatizando a melho- ria das condições gerais de vida dos Waimiri-Atroari, nos últimos anos. Frutos de uma política de marketing intensiva, patrocinada por um Programa de "minimiza- ção" dos prejuízos causados pela alagação de uma parte significativa do território tradicional Waimiri- -Atroari, causada pela Usina Hi- drelétrica de Balbina. Estas maté- rias procuravam, todas elas, de- monstrar as virtudes deste progra- ma, com base em um "dado numérico objetivo": o crescimento da população Waimiri-Atroari, ve- rificado naquele ano, de 7%.

Uma vez que o ingresso na área indígena Waimiri-Atroari vem sendo severamente controlado des- de a implantação deste Programa em 1987, nada se pode dizer sobre estes 7%. Pode ser verdadeiro, po- de não ser. Na mesma época, o próprio Programa Waimiri-Atroa- ri/Funai/Eletronorte declarou — e a imprensa apressou-se a divulgar com certo alarde — que os Waimi- ri-Atroari contavam com uma po- pulação de 505 indivíduos.

Infelizmente, o Programa Wai- miri-Atroari não demonstrou qual- quer interesse em divulgar alguns outros números sobre a questão, tais como: Em 1983, durante o pri- meiro censo realizado entre os Waimiri-Atroari, registrou-se uma população de 332 habitantes. Em 1987, a população era de 420 habi- tantes. Assim, durante o quadriê- nio 83 — 87, a população Waimiri — Atroari cresceu 26,5% (média anual de 6.06%), enquanto que no quadriênio seguinte, 87—91, esta população cresceu apenas 20.2% (média anual de 4.7%). Em outras palavras, o que se observa é, ao contrário do que foi propagado pe- la imprensa, uma notável queda na taxa de crescimento da população (sobretudo se se considera o tama- nho da população) exatamente no período em que o Programa da

Eletronorte vem sendo implemen- tado. Coincidência? Em resumo, como todos sabem, números como estes 7% nunca são dados inocen- tes e imparciais...

Enquanto isso, lideranças indí- genas da região do Alto Solimões (AM) denunciam que agentes do Censo—91 subestimaram a popula- ção dos índios Kurubo do Vale do Rio Javari em quase 40%. Na mes- ma época, segundo depoimentos dos próprios índios, os agentes de- signados para contar a população Krenak do Vale do Rio Doce (MG), solicitavam sistematicamen- te, em entrevistas realizadas dentro da Área Indígena, a apresentação de documentação de identidade emitida pela Funai. Quando estes índios não o faziam, eram definiti- vamente recenseados como "par- dos"...

Prestidigitações censitárias co- mo estas parecem ter ocorrido em muitas outras regiões do País: Um documento elaborado pela Federa- ção das Organizações Indígenas do Rio Negro (FOIRN) afirma que "...na região de Cucuí, de 16 co- munidades indígenas apenas 5 fo- ram contadas; no Alto Içana os re- censeadores não chegaram a ir nas comunidades das regiões de fron- teiras; na região do rio Curicuriari não chegaram a ir recenseadores e

em São Gabriel a população indí- gena, que é maioria, não foi conta- da como população indígena". E não devemos esquecer que exis- tem, apenas nesta região do País, dezessete povos (Tukano, Baré, Dessano, Baniwa, Werikena, Ara- ra, Tariano, Pira Tapuia, Maku, Kubeo, Kuripaco, Karapanã, Ara- paso, Miriti, Tapuia, Barasana, Wanano e Tuiuka) distribuídos, se- gundo estimativas da FOIRN, em 271 comunidades.

Ao que tudo indica, a popula- ção indígena no Brasil vem sendo significativamente subestimada, ou, segundo as próprias lideranças indígenas do Alto Rio Negro... "estes são apenas alguns exemplos que mostram a enorme margem de erro dos números apresentados por este censo oficial. Por isso concluí- mos que este censo não apresenta os números reais".

Nunca devemos esquecer que as sucessivas campanhas junto a opinião pública contra a demarca- ção das terras indígenas neste país procuram sempre argumentar que "é muita terra para pouco índio". Neste quadro, é claro, quanto me- nos índios existirem oficialmente, melhor. Desnecesário lembrar que as agências diretamente interessa- das nestas campanhas não estão

evidentemente preocupadas com questões demográficas teóricas...

Sensível a esta questão, as doze Organizações Indígenas existentes no Rio Negro decidiram promo- ver, através da FOIRN, e com a mobilização de toda a população diretamente atingida, um Censo in- dependente. Como firmaram una- nimemente, trata-se de uma inicia- tiva que pretende... "conhecer com exatidão quantos somos para podermos melhor encaminhar nos- sas ações, tanto no campo da saú- de, educação e subsistência, como também na luta pela demarcação de nossos territórios tradicionais".

Em 1988, a Funai estimou a população indígena da região em cerca de 18.000 habitantes. O Cen- so de 1991 parece antecipar uma população que não ultrapassa 22.000 habitantes, um número com certeza bem mais expressivo que o divulgado por um governa- dor amazônico, segundo o qual a população indígena do Alto Rio Negro estaria em torno de 3.000. Enquanto isso, a FOIRN, com ba- se em informações colhidas junto às doze organizações da região, es- tima a população indígena em tor- no de 30.000 pessoas, cerca de 8.000 a mais que as projeções ofi- ciais.

A realização de um censo inde- pendente constitui um passo decisi- vo do Movimento Indígena no Bra- sil. Em poucas palavras, o Movi- mento Indígena do Rio Negro, diante do risco do Governo Fede- ral fabricar números incorretos so- bre a população indígena da Re- gião, decidiu, com o apoio de to- das as Organizações que o compõem, produzir os seus pró- prios números, instrumentos im- prescindíveis em suas lutas. E, com certeza, os ecos de uma ini- ciativa como esta brevemente po- derão ser ouvidos em outras re- giões do País.

Márcio Silva Unicamp ■ IFCH

Departamento de Antropologia

Os números da violência O Conselho Indigenista Mis-

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tnrio sobre violência contra os

di/ o relatório: "Assassinatos, invasões de terra e ameças de morte contra os povos indígenas

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sinatos, contra 13 verificados em praticada <x 1990. As mortes, em virtude de nas no país. surtos de epidemia saltaram do do feito pcl

feito pelo C1MI sobre violência nas.

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JUNHO/92 TUPARÊ 13

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Três projetos de Estatuto do índio M %J Paulo Jares/VIDEFOTO

Desde março funciona na Câ- mara dos Deputados uma co-

missão especial encarregada de apreciar e dar parecer aos projetos que dizem respeito ao Estatuto do índio.

Na edição anterior do Tupari, Pág. 10, trouxemos aos leitores uma contribuição do Núcleo de Di- reitos Indígenas - NDI sobre a sua proposta de Estatuto das Socieda- des Indígenas (P.L 2057/91). Nes- ta edição, trazendo mais subsídios para o acompanhamento desse im- portante processo, apresentaremos um quadro com as principais pro- posições dos três projetos que atualmente estão tramitando na Câ- mara dos Deputados. Além do ci-

m(ado projeto do NDI, estão tam- bém sendo apreciados os projetos de lei 2160/91 (Funai) e o 2168/92 (Cimi). Os três projetos, nos seus aspectos gerais são bastante con- vergentes, porém, apresentam al- gumas variações e diferenças na abordagem de algumas questões centrais. Vejamos a seguir essas questões:

Quanto aos índios e organizações indígenas

O P.L. 2057/91 (NDI) utiliza a categoria Sociedades Indígenas como institutos de personalidade jurídica de natureza do direito pú- blico interno, motivo pelo qual, sua existência independe de regis- tro público. O P.L. 2160 (Funai) adota a categoria de Comunidades Indígenas como os grupos huma- nos com características sociais. Culturais e econômicas distintas da sociedade envolvente e cujos mem- bros se identificam com as socie- dades pré-colombianas. O P.L. 2168/92 (Cimi) apresenta as cate- gorias Povos Indígenas como gru- pos humanos que se organizam so- cial, política e culturalmente de maneira própria e diferenciada no Estado brasileiro e, comunidades indígenas como os grupos locais com natureza jurídica de direito público interno, portanto, de exis- tência independente de qualquer ato ou registro público.

Quanto à questão da tutela Somente o P.L. 2160/91 (Fu-

nai) prevê o regime tutelar a ser exercido pelo órgão federal de as- sistência indígena, o qual cessará quando por ato de reconhecimento da capacidade jurídica plena da pessoa do índio ou quando requeri- da pelo próprio na Justiça e obede- cidos os requisitos de idade míni- ma de 21 anos, o domínio do por- tuguês e conhecimento dos usos e

O Plernário do Centro Comunitário de Altamira: 650 índios, muita imprensa e observadores

prevê ainda o direito aos povos e comunidades indígenas de promo- verem a autodemarcação de suas terras, desde que possuam elemen- tos que comprovem a sua ocupa- ção.

Quanto à mineração em terras indígenas

A pesquisa e a lavra de recursos minerais em terras indígenas pode- rão acontecer: segundo o P.L. 2057/91 (NDI), quando verificada a sua essencialidade e quando as reservas conhecidas e exploráveis no território nacional forem insufi- cientes para as necessidades do país. Segundo o P.L. 2168/92 (CI- MI) estas ações estarão condicio- nadas à hipótese de interesse na- cional declarada pelo Congresso Nacional; terra demarcada, regis- trada e livre de turbação; comuni- dades contactadas a pelo menos 50 anos; áreas a mais de 20 km das aldeias indígenas; e estudo prévio de impacto ambiental.

Quanto à participação das co- munidades indígenas no resultado da lavra os P.Ls 2160/91 (Funai) e 2168/92 (CIMI) dispõem que tal participação não poderá ser infe- rior a 10% do minério extraído. O P.L. 2057/91 (NDI) determina tal participação através de parte não inferior a 5 % do faturamento líqui- do do minério extraído.

Quanto à Educação Indígena Os três projetos convergem nu-

ma proposta de ação nacional de educação indígena integrada ao Sistema Nacional de Ensino, con- sisderando as diferenças étnicas, reconhecimento dos currículos das escolas indígenas e sistema bilín- güe de ensino escolar diferenciado para cada sociedade indígena.

O P.L. 2168/92 (CIMI) desta- ca o direito das comunidades esco- lherem os seus professores e da participação destes, das comunida- des e das organizações indígenas

costumes da sociedade brasileira, atestado pelo órgão indigenista.

Quanto aos bens indígenas Pelos três projetos, além dos

bens materiais, passam também a compor o patrimônio indígena os bens imateriais, sendo nulos e ex- tintos todos os negócios realizados entre índios e terceiros com prejuí- zo dos índios.

O P.L. 2057/91 (NDI) prevê a competência exclusiva da comuni- dade indígena na administração do seu patrimônio. Prevê ainda o ins- tituto da Patente como instrumento de proteção da propriedade intelec- tual indígena. O Direito Autoral é contemplado pelos três projetos.

Quanto à demarcação das terras indígenas

O P.L. 2057/91 (NDI) propõe: imediata elevação à categoria de terra demarcada aquelas identifica- das até a data da promulgação do Estatuto; demarcação via processo administrativo e demarcação via processo judicial; esta última, quando o presidente do órgão indi- genista não abrir o processo de- marcatório administrativo ou não homologar o processo decorrido.

O P.L. 2168/92 (CIMI) prevê estudo técnico prévio, feito por equipe designada pelo órgão indi- genista, com a participação e con- cordância da comunidade indígena com os resultados dos estudos téc- nicos. Ainda, segundo o mesmo P.L., caberá ao órgão indigenista providenciar o reassentamento dos ocupantes de boa fé, ou seja, os portadores de títulos dominiais que comprovarem desconhecer que a área era de ocupação indígena; os que comprovarem estar cultivando para a subsistência de suas famí- lias, nos casos de área não superior a um módulo rural; e os ocupantes originários de projetos de coloniza- ção, com módulos iguais ou infe- riores a um módulo rural. Tal P.L.

em todas as instâncias consultivas e deliberativas de órgãos públicos responsáveis pela educação escolar indígena.

Quanto aos crimes contra os índios

O P.L. 2057/91 (NDI) enumera como crimes de genocídio: homicí- dio contra membros de uma socie- dade indígena; ofensa a integridade corporal ou à saúde do indígena; submeter indígenas às condições que levem à sua destruição total ou parcial; adoção de medidas inibi- doras ou impeditivas dos nasci- mentos, incitação direta e pública a alguém cometer atos descritos an- teriormente. O mesmo projeto pre- vê outras modalidades de crimes denominados como sócio ambien- tais, cooptação e racismo contra os índios.

Já o P.L. 2160/91 (Funai) rela- ciona os seguintes crimes contra os índios: ações que atentem contra a sobrevivência cultural de uma co- munidade indígena; remoção ou assimilação forçada; ação de danos aos recursos naturais comprome- tendo a sobrevivência física ou cul- tural das comunidades indígenas; utilização sem consentimento do índio ou da comunidade com fina- lidade de propaganda turística ou exibição com fins de lucro; promo- ção e disseminação de bebidas al- coólicas entre os índios; escarned- mento, vilipendio ou perturbação à prática de cerimônia, rito, uso, costume e tradições culturais; e promoção, sem consentimento de autoridade competente de constru- ção ou manutenção de obras em terras indígenas.

O P.L. 2168/92 (CIMI) aponta os seguintes crimes contra os ín- dios: a modalidade culposa (impe- rícia, imprudência e negligência) de crime de genocídio previsto na Lei 2891/56; imposição a uma co- munidade à assimilação forçada de usos, costumes e tradições de ou- tro grupo distinto; dano aos recur- sos naturais do solo, rios e lagos em terras indígenas; escarnecimen- to de índio, seus costumes, cren- ças, tradições e qualquer outro ato de discriminação (crime de racis- mo).

Ainda o mesmo projeto propõe que, para os casos de crimes prati- cados por índios contra índios, se- jam aplicadas as instituições penais indígenas. No caso de vítima não- indígena e autoria indígena, será extinto o processo quando este já tiver sofrido as penas das institui- ções penais indígenas.

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14 TUPARI JUNHO/92

Para Além do Sofrimento Oh! Deus, é tão grande nosso espanto poi&imJilhos bem abertos, nos revelam a verdade Um povo, um povo oprimido, a construir cidades sem ter qualquer direito, de nelas bem viver

Somos gente, gente Afroameríndia desde o berço massacrada, sob branca humilhação E temos uma sórdida herança: cinco séculos de história, à mercê de ímpias mãos.

Cabe hoje à juventude, que tem decisão efé resgatar a liberdade e a beleza desta terra Convidamos as pessoas, as pessoas que ainda son para um caminho alegre, bem alegre e criativo. Para além de toda a dor, para além de toda dor, e de todo sofrimento e de todo o sofrimento.

H3

% * Esta música sobre os 500 Anos foi elaborada pela Juventude Metodista de Colatina/ES, ' -~

e conquistou o 2° lugar do III Festival de Música promovido pela Pastoral da Juventude, cujo tema foi: Latino-Americanos por que nâo? O festival foi realizado em outubro de 1991.

índio O branco vive dizendo que índio não trabalha, é pobre, não tem dinheiro,

não sabe ler nem escrever, não é civilizado, não tem juízo e anda nu, é bicho e come gente. Não é assim não! índio é brasileiro de pé no chão, não é maluco, não voa, nem faz barulho, índio deu paraíso para o branco morar, mas o branco não cuidou, a floresta destruiu, construiu selva de pedra, índio é natureza, não faz cadeia, só faz aldeia. O índio não quer guerra, quer terra. O ditado do branco é assim: Cada um por si e Deus por todos. O ditado do índio é diferente: Um ajuda o outro e Deus ajuda a todos, índio do Amazonas, Acre, Rondônia e Roraima, Amapá e Belém do Pará. índio é brasileiro de pé no chão, não é maluco, não voa, nem faz barulho. Carlos Jacob - Jetiboca, Itarana/ ES, da Comunidade Evangélica de Confissão Luterana.

Salmo dos Povos Indígenas (Leia Salmo 64)

Ouve, Senhor de todos os Povos, Maíra nas origens, Nosso primeiro Pai Nhamandu, ouve sim a nossa voz que vem do fundo das nossas perplexidades, da multidão dos nossos mortos, das nossas incontáveis dores. Preserva-nos a vida do terror dos nossos inimigos. Esconde-nos da conspiração dos malfeitores e dos planos iníquos dos poderosos. Querem as nossas terras, inundam as nossas matas, traficam com nossas vidas e culturas, desprezam a nossa sabedoria milenar. Projetam iniqüidade sobre iniqüidade e o seu coração é um abismo insondável. Mas nós cremos em ti, e celebramos o teu nome, dançamos o teu mistério, cantamos a tua glória, porque nos amas e nos fazes felizes. Sim, ó Mistério da Vida, tu desferes uma flecha contra eles e de súbito serão feridos. Irão tropeçar, a própria língua se voltará contra eles. Será que aprenderão a respeitar o teu no- me, e a acolher os povos outros como irmã- os ? . E isto o que esperamos, confiadamente. Ajuda-os a serem diferentes. Então, nós ficaremos alegres e lhes estenderemos as mãos, sem medo, como irmãos. Tu que criaste a linda terra, as matas, os rios, os peixes, os animais todos sejas bendito para sempre. Amém

Rev. Roberto Zweisch, IECLB

TUPARI

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