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OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE Artigos Versão Online ISBN 978-85-8015-080-3 Cadernos PDE I

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OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE

Artigos

Versão Online ISBN 978-85-8015-080-3Cadernos PDE

I

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COMPREENDENDO A REPRESENTAÇÃO ABSTRATA NO GRAFISMO DO

GRUPO ÉTNICO AVA-GUARANI

Salete Rosa Motter1

José Ronaldo Fassheber2

RESUMO

Este artigo discorre sobre processo de implementação de projeto realizado no

Programa de desenvolvimento Educacional do Paraná (PDE). A abordagem teve

como objetivo construir proposta de intervenção pedagógica que fundamentasse a

prática em teorias acerca da história do povo Ava-guarani, sob vários aspectos, com

ênfase às manifestações culturais, mais especificamente o grafismo indígena,

promovendo uma discussão a respeito das diversidades étnica, social e cultural

como possibilidade no ensino da Arte. O projeto foi efetivado com uma turma do 1º

ano do curso de Formação de Docentes, do Colégio Estadual João Manoel

Mondrone, Município de Medianeira – PR. A pesquisa contou com pesquisa de

campo, em visita à comunidade indígena Tekoha Ocoy, em São Miguel do Iguaçu –

PR, e pesquisa bibliográfica, com vistas a discutir a questão da alteridade, que parte

do pressuposto básico de que todo homem social interage e interdepende do outro.

A partir da análise e mudança de conceitos a respeito da perspectiva indígena

quanto à forma de ver e entender o mundo, destacamos a pesquisa iconográfica do

grafismo indígena para apresentar respostas e entender a origem e formação das

imagens na pintura corporal indígena.

Palavras-Chave: Grafismo Ava-guarani, cultura, diversidade.

1 Professora de Arte da Rede Pública do Estado do Paraná - PDE/2014-2015. Lotada no Colégio Estadual João

Manoel Mondrone, Medianeira – PR. 2 Professor Orientador, lotado no Departamento de Educação Física da Universidade Estadual do Centro-

Oeste/UNICENTRO Possui graduação em Educação Física pela Universidade Federal de Juiz de Fora/MG

(1993), mestrado em Antropologia Social pela Universidade Federal de Santa Catarina/SC (1998) e doutorado

em Educação Física pela Universidade Estadual de Campinas/SP (2006). Atualmente é professor da

Universidade Estadual do Centro-Oeste/PR. Tem experiência, produção e atuação em Antropologia do Corpo e

da Saúde (Corporalidade, Kaingang, Etnologia Indígena e Relações de Gênero). contato:[email protected]

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Introdução

O presente artigo apresenta os resultados do trabalho desenvolvido nos

anos de dois mil e quatorze e dois mil e quinze no Programa de Desenvolvimento

Educacional – PDE, do Governo do Estado do Paraná. A escolha do tema se deu

devido ao fato de participar da equipe multidisciplinar da escola e perceber a

necessidade de aprofundamento sobre o tema, pois o desconhecimento sobre a

cultura dos povos indígenas em nosso país soa como uma lacuna curricular, ainda

que, segundo a teoria de Ribeiro (1995), na obra “O Povo Brasileiro”, a construção

da identidade nacional está fundamentada na mistura de raças e culturas: a

miscigenação entre índios, europeus e africanos é uma parte fundamental desta

identidade. Portanto, conhecer a cultura brasileira é também conhecer as matrizes

indígenas e africanas.

Constatamos, no cenário escolar brasileiro, a quase inexistência de práticas

metodológicas que se voltem aos conhecimentos ligados à arte e cultura indígena.

Tal situação se deve, principalmente, ao desconhecimento de nosso referencial

cultural e de estudos de bibliografia já produzida a respeito, e que trata das

influências de palavras em nossa língua, a influência no sotaque de algumas

regiões, os hábitos herdados, como, por exemplo, a pintura corporal (tatuagens), o

banho diário, dormir na rede, as crenças, os objetos, e até os alimentos, além da

história de resistência cultural e social num panorama de investidas contra as

mesmas.

Desta forma, trabalhar com o tema Grafismo Indígena e com as

manifestações artísticas e culturais indígenas em sala de aula constitui um desafio,

sobretudo pela falta de material didático que viabilize aos profissionais da educação

reconfigurar o pensamento para a diversidade cultural e os processos

discriminatórios implícitos na construção da identidade indígena ao longo da história

do Brasil, e fazer a relação aos significados e sua importância no contexto

educacional.

De modo geral, existe uma visão errônea da arte indígena como ingênua e

simples. A antropóloga Lux Vidal, em seu livro Grafismo Indígena, contesta esta

visão, referindo-se ao julgamento do homem ocidental sobre as artes dos povos

indígenas como pertencentes a “[...] uma ordem estática de um Éden perdido”. O

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que acaba por inferiorizar a riqueza da arte indígena com o rótulo de primitiva e que

“[...] deixa de captar, usufruir e incluir no contexto das artes contemporâneas, em pé

de igualdade.” (Vidal, 2000, p.13)

O conhecimento sobre a chamada “arte indígena” é, de modo geral, ainda

pequeno. Até mesmo na temática indígena a arte é comumente relegada a um plano

menos importante. Mas entendemos que o desconhecimento generalizado também

contribui para a omissão deste conteúdo.

Dentro das contribuições que a arte indígena pode dar, o uso da abstração é

um tópico que merece atenção, pois o significado cosmológico da pintura corporal

indígena desperta interesse pela profundidade de seus significados. Temos por

hipótese que a percepção do mundo sob uma concepção diferente da nossa acaba

por influenciar na forma de representação, criando imagens providas de um rico

sistema de composição, síntese de cores e de formas, que propiciam um rigor

formal, e, ao mesmo tempo, uma grande beleza. Desenhos que, se estudados mais

a fundo, podem revelar toda a grandiosidade e genialidade disfarçadas em suas

formas simples, mas não ingênuas. Conforme Vidal (2000, p.13), “[...] apenas

recentemente a pintura, a arte gráfica e os ornamentos do corpo passaram a ser

considerados como material visual que exprime a concepção tribal de pessoa

humana, a categorização social e material e outras mensagens referentes à ordem

cósmica.

As representações do grupo étnico Ava-Guarani, observadas na cestaria e

no seu sistema gráfico que utiliza padrões geométricos, aparentemente abstratos,

dispostos em estruturas modulares, mas que possuem significados associados aos

elementos da natureza, da cultura e do sobrenatural, despertaram o interesse em

aprofundarmos os conhecimentos a respeito do tema.

Não é possível pensar na cultura brasileira excluindo a presença da cultura

indígena. O professor de Arte, assim como o artista, atua como comunicador e

participa ativamente da produção cultural de nossa sociedade; por isto, atribui-se a

ele o papel de desenvolver sua capacidade de articular e manipular estes

conteúdos, oferecendo ferramentas para que eles se transformem em produtores de

conhecimento histórico, artístico e cultural, tornando-se agentes de transformação

da sociedade. Buscamos, com esse trabalho, trazer este tema para discussão a fim

de permitir uma análise e reflexão sobre as culturas formadoras da identidade

nacional e atrair o olhar dos alunos para outros focos passíveis de estudo.

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A arte, além do prazer estético e da humanização que desperta quando em

contato com o observador, pode favorecer um trabalho em sala de aula que leve à

discussão das diversas formas de opressão que insistem em se perpetuar em nossa

cultura e que desencadeiam as mais diversas formas de intolerância.

1.1 CULTURA

A cultura está presente no meio social, nas atividades compartilhadas, na

arte, na produção material, no trabalho. Pode ser definida como estilo de vida, com

as tradições, os rituais, as festas, enfim, tudo que envolve a organização social e a

identificação de determinada sociedade. Também os fatos ambientais exercem

influência sobre a cultura de um povo, como a maneira de se vestir e os hábitos

alimentares, a religião e a forma de produção econômica.

No estudo proposto, utilizamos o conceito de cultura trabalhado por

Thompson (1998), que a coloca como sinônimo de modos de vida, ou

[...] um conjunto de diferentes recursos, em que há sempre uma troca entre o escrito e o oral, o dominante e o subordinado, a aldeia e a metrópole; é uma arena de instrumentos conflitivos, que somente sob uma pressão imperiosa – por exemplo, o nacionalismo, a consciência de classe ou a ortodoxia religiosa predominante assume a forma de um sistema. E na verdade o próprio termo cultura, com sua invocação confortável de um consenso, pode distrair nossa atenção das contradições sociais e culturais, das fraturas e oposições existentes dentro do conjunto. (THOMPSON, 1998, p. 17)

Tal noção de cultura é defendida pelo historiador, que em sua prática de

pesquisa dialogou fortemente com a Antropologia. A noção de experiência implica,

necessariamente, o reconhecimento dos sujeitos como reflexivos que, em suas

ações, repõem continuamente o movimento da história.

Da cultura advém a arte, uma criação humana, a qual compreende

conhecimentos, um conjunto de procedimentos técnicos, as emoções, bem como

valores estéticos próprios de uma época, de fatos históricos, intrinsecamente ligados

à cultura. A Arte expressa e movimenta o desenvolvimento do homem, que a cria e,

com ela, estabelece alguma relação; cria objetos e situações para satisfazer

necessidades e que são meios de expressão e de registro de suas ideias, emoções

e sentimentos. A Arte é uma das formas de revelar o ser social; ela representa a

realização que vai além das necessidades imediatas.

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De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (1996), a cultura é

elaborada pelas sociedades, num processo histórico, pelos padrões de

comportamento, valores e crenças, e envolve toda a prática humana de construir e

dar significação às coisas.

Nesse sentido, o conhecimento do grafismo indígena deve ser ampliado, por

meio de uma análise crítica sobre a forma, as estruturas de composição, as técnicas

e materiais utilizados, sua pretensão de significados, estimulando a percepção que

deve estar presente no olhar dos alunos

1.2 RELAÇÃO ENTRE ARTE E CULTURA

A arte é uma área do conhecimento e uma disciplina que estão intimamente

ligadas à cultura e a suas diversas formas de expressão, ou seja, manifestações

simbólicas pelas quais os seres humanos expõem suas sensações, emoções,

experiências, conhecimentos e descobertas.

Petinati e Tizzo (2012) enfatizam que a linguagem é um produto das

comunidades humanas e que a socialização/educação do indivíduo se dá pelo

código linguístico da comunidade em que se vive, pela sua compreensão e seus

significados. Com ele, o indivíduo se entende no mundo, pela cultura vivida. Cultura

significa que um grupo tem características próprias, um “jeito de ser” forma a

personalidade cultural de um grupo social, e define-lhe os traços culturais comuns a

todos. Pelo mecanismo da endoculturação, as pessoas interiorizam o estilo cultural

de vida.

Deste modo, conforme Duarte (1991), a arte se manifestou desde os

primórdios da vida do homem, ligada às crenças religiosas das primeiras

civilizações. Arte e religião eram inseparáveis, por meio delas a imaginação humana

se tornava concreta, se aperfeiçoava ao produzir imagens em ações e gravá-las em

inscrições rupestres. Foi o primeiro passo da criação da arte e da linguagem. O

homem passou a construir símbolos que significavam o objeto ausente por uma

linguagem, ou seja, um código simbólico. Mas a arte e suas formas não podem ser

consideradas símbolos convencionais como as palavras, pois não possuem

convenções. A arte exprime sentidos explorando seu pólo expressivo, cria imagens

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que se dirigem aos sentimentos. O artista não apresenta um significado conceitual,

ele apresenta os sentimentos de forma harmônica.

Para chegar às considerações acima referidas, o autor faz a distinção dos

conceitos de comunicação e expressão como processos sociais em que se dá o

inter-relacionamento humano. Comunicar se refere à transmissão de significados

explícitos, reduzindo a um mínimo as conotações. Já a expressão diz respeito à

manifestação de sentimentos, utilizando diferentes sinais ou signos. O autor

assevera que esses conceitos não são estanques. Eles se completam, visto que,

quando se comunica algo, se expressam certos sentimentos.

Ainda de acordo com Duarte (1991), pelo ato criador se opera a imaginação,

capacidade fundamental do homem e que vai além dos limites do imediatismo, do

presente e da materialidade das coisas. O ato criador, além de mobilizar a razão, a

esfera lógica por meio dos símbolos linguísticos e matemáticos, apoia-se na vivência

dos sentimentos. Ele se caracteriza por ser um ato de rebeldia na medida em que

nega o pré- estabelecido, o existente e propõe algo novo.

O teórico acrescenta ainda que o expectador de uma obra de arte passa

pela experiência estética, que é a de apreciar o belo. A beleza está na relação da

consciência do sujeito, no apreciador da arte, e no objeto de arte, despojada de

conceitos linguísticos. A apreciação estética flui como uma corrente de sentimentos

voltados para a harmonia de formas e ritmos. Na arte contemporânea não há o rigor

na supremacia técnica e não existe um compromisso com o “belo” (grifo do autor),

dentro dos padrões estabelecidos em períodos anteriores.

Para Brandão (2002), a cultura diz respeito à multiplicidade de formas de

existir da humanidade como um todo, ou seja, como produto coletivo da vida

humana, ao mesmo tempo de cada povo, nação sociedade e grupos humanos. Há

uma lógica interna em cada realidade cultural, a qual se deve procurar conhecer

para que façam sentido as suas práticas, costumes, concepções e as

transformações pelas quais passam.

Santos (1996) acrescenta:

É grande a variedade de procedimentos culturais conforme os contextos em que são produzidos. Porém, no caso das culturas dos povos e nações que habitaram as terras da América Latina, e no caso o Brasil, antes da conquista européia, foram tratadas como um mundo à parte das culturas nacionais que se desenvolveram. Sua importância para essas culturas nacionais só costuma ser

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reconhecida na medida em que contribuem para esta última, em que fornecem elementos e características que dão a elas caráter particular, tais como comidas, nomes, roupas, lendas etc. (SANTOS, 1996, p. 71).

Levando em conta as considerações dos autores, entendemos que a

manutenção de uma identidade cultural está intimamente relacionada ao campo do

saber, “[...] de registrar e preservar os elementos culturais que não têm garantias de

permanência, fica clara a necessidade de garantir a memória social preservando o

que foi significativo dentro do vasto repertório do Patrimônio Cultural sempre foi uma

preocupação de historiadores, arqueólogos, antropólogos e outros profissionais”.

(LEMOS, 1987).

De acordo com Andrade (1936, apud LEMOS, 1987), o Patrimônio Artístico

Nacional são:

“[...] todas as obras de arte pura ou de arte aplicada, popular ou erudita, nacional ou estrangeira” Além disso, agrupava a arte em oito categorias: Arte arqueológica; Arte ameríndia; Arte popular; Arte histórica; Arte erudita nacional; Arte erudita estrangeira; Artes aplicadas nacionais e Artes aplicadas estrangeiras. Quanto às artes arqueológicas e ameríndias diz que delas fazem parte objetos, como fetiches, instrumentos de caça, de pesca, da agricultura, domésticos, indumentária, jazidas funerárias, sambaquis, inscrições rupestres, elementos da paisagem, do meio ambiente, os vocabulários, cantos, lendas, magias, medicina, culinária etc. (LEMOS, 1987, p. 37)

O teórico acrescenta que a preocupação com a conservação do patrimônio

cultural e ambiental no mundo cresceu ao longo do tempo e motivou muitos

congressos, que proliferaram a partir do início da década de 1970, quando no Brasil

emanou o célebre “Compromisso de Brasília”, assinado pelo Ministério da Educação

e Cultura da época, em cujas decisões destacamos, conforme Lemos (1994, p. 91):

“[...] 4. Sendo o culto do passado elemento básico da formação da consciência

nacional, deverão ser incluídos nos currículos escolares de nível primário, médio e

superior, matérias que versem o conhecimento do acervo histórico e artístico das

jazidas arqueológicas e pré-históricas, das riquezas naturais e de cultura popular”.

Observamos ainda em suas colocações o reconhecimento da importância do

acervo histórico e artístico como objetos do conhecimento.

Nesse sentido, Zamboni (2001, p.23) assevera: “[...] a arte não é apenas um

conhecimento por si só, mas também pode constituir-se num importante veículo para

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outros tipos de conhecimento humano, já que extraímos dela uma compreensão da

expressão humana e de seus valores”. O autor entende que a expressão artística

transmite mensagens de natureza bastante ampla, são faces do conhecimento que

se ajustam e se completam sem que uma suplante a outra.

Quanto às culturas consideradas primitivas e as civilizadas, Duarte (1981)

afirma que nas sociedades primitivas há a transmissão direta do saber, de maneira

informal, pelo contato diário e vivencial entre adultos e crianças; aprende-se pela

experiência. Nas civilizadas ou letradas não existe uniformidade cultural, mas formas

diferentes de culturas, que, por vezes, são conflitantes, e formam as chamadas

subculturas. Também o autor lembra que as sociedades atuais passaram por

profundas e radicais transformações sociais, políticas e econômicas, resultando em

uma divisão do saber entre as classes dominantes e dominadas, e criaram-se

escolas.

1.3 CONCEPÇÕES TEÓRICAS DO MULTICULTURALISMO

Kincheloe e Steinberg3 (1997), citados por Moreira (1999), afirmam que o

multiculturalismo não é algo em que se acredite ou com o qual se concorde: é algo

que simplesmente é. É a inevitável condição da vida ocidental contemporânea.

Pode-se responder a essa realidade de diferentes modos, mas não se pode negá-la

ou apagá-la. Multiculturalismo representa a natureza dessa resposta, que envolve a

formulação de definições conflitantes de mundo social decorrentes de distintos

interesses econômicos, políticos e sociais, além de particulares. Nessa formulação,

as relações de poder desempenham papel crucial, auxiliando a conformar o modo

como indivíduos, grupos e instituições reagem à realidade cultural. O

multiculturalismo em educação envolve a natureza dessa resposta em espaços

educacionais. Trata-se, nesse caso, de contextualizar e de compreender a produção

das diferenças.

3 Changing Multiculturalism (1997) Kincheloe e Steinberg . A obra reconhece a realidade de que no final de

1990 em que vivemos um novo contexto racial. A reafirmação da supremacia branca criou um mundo social e educacional, onde muitos brancos estão com raiva, sentir racialmente vitimado, e estamos prontos para proteger seus privilégios. Tais condições criam o medo, ódio e mais violência. Qualquer educação multicultural que não reconhece estas condições vão seguir o caminho da irrelevância - um caminho demasiado frequentemente tomadas por reformas educacionais anteriores. Disponível em: https://www.questia.com/library/119547460/changing-multiculturalism. Acesso em: 27 jan. 2016.

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Acreditamos que não se pode falar em multiculturalismo sem se especificar

com clareza o sentido atribuído ao termo bem como as concepções teóricas que o

fundamentam.

Nesse sentido, Silva e Brandim afirmam que

[...] o multiculturalismo é uma estratégia política de reconhecimento e representação da diversidade cultural, não podendo ser concebido dissociado dos contextos das lutas dos grupos culturalmente oprimidos. Politicamente, o movimento reflete sobre a necessidade de redefinir conceitos como cidadania e democracia, relacionando-os à afirmação e à representação política das identidades culturais subordinadas. Como corpo teórico questiona os conhecimentos produzidos e transmitidos pelas instituições escolares, evidenciando etnocentrismos e estereótipos criados pelos grupos sociais dominantes, silenciadores de outras visões de mundo. Busca, ainda, construir e conquistar espaços para que essas vozes se manifestem, recuperando histórias e desafiando a lógica dos discursos culturais hegemônicos. Os estudos sobre os fenômenos culturais partem da necessidade de compreensão dos mecanismos de poder que regulam e autorizam certos discursos e outros não, contribuindo para fortalecer certas identidades culturais em detrimento de outras. (SILVA E BRANDIM, 2008, p.60)

Os autores acrescentam que a abordagem culturalista contemporânea teve

início com Hoggart, Williams e Thompson, no final dos anos 50 e início dos anos 60.

Conhecida como Estudos Culturais, essa área se firma por meio do Centro de

Estudos Culturais Contemporâneos, fundado em 1964 por Hoggart, e ligado ao

Departamento de Língua Inglesa da Universidade de Birmingham na Inglaterra. As

pesquisas do Centro preocupam-se com o papel dos mediadores na formação do

consenso e do conformismo político. Stuart Hall participa da formação dessa área

incentivando o desenvolvimento de estudos etnográficos, análises dos meios

massivos e a investigação de práticas de resistência dentro de subculturas. Essa

área, apoiada na Sociologia e na Antropologia, reúne as contribuições de teóricos

marxistas, tais como Althusser (conceito de ideologia) e Gramsci (conceito de

hegemonia). Posteriormente, passa a englobar os estudos feministas, o pós-

estruturalismo e o pós-modernismo, com base em teóricos como Michel Foucault e

Henri Giroux.

Os estudos culturais são hoje uma área reconhecida e praticada,

constituindo-se em fenômeno internacional, com adeptos em países como Estados

Unidos, Austrália, Canadá, na África e na América Latina. Esse campo de saber

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focaliza as estratégias e políticas de formação de identidades sociais, as dinâmicas

de funcionamento do cinema, televisão e revistas populares, os estudos sobre a

mulher e a teoria de raça e gênero, as noções de subjetividade, política, gênero e

desejo, além de estudos afro-americanos, latinos, e de culturas indígenas. A

abordagem culturalista estuda a linguagem e o poder, particularmente, em termos de

como a linguagem é usada para moldar identidades sociais e assegurar formas

específicas de autoridade.

Na visão de Silva (1999), os Estudos Culturais se diferenciam das disciplinas

tradicionais pelo seu envolvimento explicitamente político, sem qualquer pretensão

de neutralidade ou imparcialidade, tomando claramente o partido dos grupos em

desvantagem nas relações de poder.

O multiculturalismo se destaca como uma das preocupações dos Estudos

Culturais. A multiplicidade de culturas e a pluralidade de identidades, em face de

relações de poder assimétricas, geram a necessidade de questionar e desafiar

práticas silenciadoras de identidades culturais. Particularmente, as questões de

racismos, machismos, preconceitos e discriminações, tão importantes para a escola

e o currículo, só podem ser analisadas produtivamente sob uma perspectiva que

leve em conta as contribuições dos Estudos Culturais.

No Brasil, vem aumentando o interesse pela abordagem culturalista e

multiculturalista, na medida em que as orientações e reformulações por que passam

o sistema educacional e a revisão teórica sobre essas questões apontam para uma

concepção escolar que considere o caráter pluriétnico e pluricultural da sociedade.

A abordagem sócio-interacionista concebe a aprendizagem como um

fenômeno que se realiza na interação com o outro. A aprendizagem acontece por

meio da internalização, a partir de um processo anterior de troca, que possui uma

dimensão coletiva. Segundo Vygotsky (1998), a aprendizagem deflagra vários

processos internos de desenvolvimento mental, que tomam corpo somente quando o

sujeito interage com objetos e sujeitos em cooperação. Uma vez internalizados,

esses processos tornam-se parte das aquisições do desenvolvimento.

O sócio-interacionismo surge da ênfase no social. Os estudos de Vygotsky

sobre o aprendizado decorrem da compreensão do homem como um ser que se

forma em contato com a sociedade: “Na ausência do outro, o homem não se

constrói” (VYGOTSKI, 1998).

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Para Vygotsky (1998), a formação se dá numa relação dialética entre o

sujeito e a sociedade a seu redor – ou seja, o homem modifica o ambiente e o

ambiente modifica o homem. Para ele, o que interessa é a interação que cada

pessoa estabelece com determinado ambiente, a chamada experiência

pessoalmente significativa.

Outro conceito-chave da teoria de Vygotsky é a mediação. Segundo a teoria

Vygotskyana, toda relação do indivíduo com o mundo é feita por meio de

instrumentos técnicos e da linguagem – que traz consigo conceitos consolidados da

cultura à qual pertence o sujeito.

Clastres (1978) aponta que, para os povos Tupi-Guarani, a sociedade – todas

as suas regras e necessidades: o trabalho, as leis, as obrigações – têm um peso

insuportável. Ela é demasiadamente maléfica. Alcançar a “Terra sem Mal” é a

possibilidade de superação dessa condição, a contraordem, a recusa da atividade

social. É o momento em que os Guarani, despidos em vida de sua condição

humana, se transmutariam em homens-deuses, e se tornariam capazes de viver

sem ter que trabalhar, eternamente jovens e felizes, numa terra esplêndida.

Clastres (1978), atendo-se ao estudo de populações tupi-guarani, no passado

e no presente, identificou esses mecanismos num fenômeno por assim dizer

religioso designado "profetismo"; fenômeno sustentado por uma série de

concepções relativas à condição humana e à socialidade e por um impulso de

evasão, de busca por territórios desconhecidos muitas vezes designados como

"terra sem mal", lugar onde a ordem social como que se inverte. Ao debruçar-se

sobre esse tema, Clastres (1978) atinou para um ponto delicado na obra de Pierre

Clastres, qual seja, a relação entre o que costumamos chamar de o "político" e o

"religioso" e, mais especificamente, a maneira como esta se estabelece entre certas

populações de língua tupi-guarani que, ao longo dos séculos XV e XVI, parecem ter

se deparado com a ameaça de irrupção de uma espécie de poder político separado,

e, atualmente, parecem elaborar uma séria reflexão sobre a possibilidade de seu

próprio desaparecimento. A terra sem mal constitui uma análise aprofundada de

como uma religião pode se converter num mecanismo de resistência ao mesmo

tempo ontológica e política, combater um ideal de transcendência aderindo a um

projeto de imanência.

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1.3 TERRA INDÍGENA AVA-GUARANI DO OCOÍ

A comunidade Indígena Ava-Guarani do Ocoí vive atualmente numa pequena

faixa de terras remanescente de Mata Atlântica. Caracteriza-se por um espaço

territorial e ambiental respectivamente ínfimo e inapropriado para as necessidades

de subsistência dessa população. O terreno tem a forma de um “V”. Possui em

média apenas 238 metros de largura, tanto de um lado, como de outro dos “braços

do V” contando-se da beira do lago, passando pela Terra Indígena até o início das

terras dos colonos lindeiros. Observando-se a localização deste “V” no seu interior,

apresenta-se um braço do lago que faz parte da represa maior, geradora das águas

da Usina hidrelétrica de Itaipu. As bordas externas deste “V” são ocupadas tanto de

um lado como de outro da área, por colonos lindeiros, estando a população indígena

completamente cercada em todo o perímetro da área. No que se refere à questão

ambiental, esta área é imprópria para ocupação de qualquer população, pois as

margens do lago devem ser protegidas contra possível assoreamento, o que põe em

risco a vida da população indígena ali residente. Na verdade, o espaço físico

ocupado pelo povo em questão é área de proteção do lago. Por essas razões a área

é considerada oficialmente também como Área de Preservação Permanente/APP,

de responsabilidade estadual do Instituto Ambiental do Paraná/IAP. Como os

Guarani foram indevidamente assentados ali, passou a ser também Terra Indígena.

Assim, as duas áreas encontram-se sobrepostas.

Único local onde ocorre habitação de população humana à beira do lago

inteiro da represa da Usina Hidrelétrica de Itaipu é essa Terra Indígena. Esse é o

único local do estado do Paraná onde existe o problema de epidemia de malária.

Atualmente, segundo a Itaipu, a doença está sob controle. Segundo a FUNASA, o

controle está sendo feito através de borrifação periódica. O produto é tóxico,

borrifado na água e margens do lago; o controle, portanto, se dá com mais

contaminação da área (terras e águas), seres humanos e animais. Os Guarani não

podem se afastar dali, pois não há espaço físico para tanto.

1.5 IMPLEMENTAÇÃO E RESULTADOS DO PROJETO GRAFISMO INDÍGENA AVA-GUARANI

Levando em conta o multiculturalismo, além do levantamento teórico,

efetivamos a aplicação do Projeto, um dos principais momentos do PDE; a partir das

elaborações e sistematizações desenvolvemos um trabalho específico na escola de

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atuação. Desta forma, a implementação foi antecedida pelo Planejamento das ações

que compreenderam: escolha da turma, período de realização, atividades a serem

desenvolvidas e apresentação à apreciação da equipe pedagógica da escola.

Outra questão considerada para a o presente estudo foi a necessidade de se

efetivar na escola o que preconiza a Lei 11.645, de 10 de março de 2008, que altera

o Art. 26ª da Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que torna obrigatório o estudo

da história e cultura afro-brasileira e indígena nas escolas

A apresentação do projeto de intervenção pedagógica ao diretor, equipe

pedagógica, professores e funcionários do Colégio Estadual João Manoel Mondrone

– Ensino fundamental, médio e profissional, salientando a importância da

contribuição de todos para o sucesso da aplicação do mesmo, aconteceu na

semana pedagógica, em março de 2015.

A exposição do projeto aos alunos do 1º ano do curso de formação de

docentes e a apresentação da proposta de trabalho ocorreram em junho de 2015,

diferente do previsto, que era o início do período letivo, devido ao fato de a classe

dos professores estar em greve.

Inicialmente conversamos com os alunos sobre o assunto: diversidade e

grafismo indígena, a fim de reconhecer seus conhecimentos prévios sobre o mesmo,

considerando: História de contato, mitologias e rituais, subsistência, arte e cultura

material, artesanato e mudanças ocorridas na arte e na cultura. Assim foi aplicado o

questionário: O que você conhece sobre os índios do Brasil? Onde eles moram?

Como sobrevivem?• Você tem alguma ascendência indígena?• Onde encontramos a

arte nas sociedades indígenas? Perto de onde você mora há alguma reserva

indígena? Qual a situação social dos índios com relação à sociedade brasileira?

Você conhece algum costume, comida, remédios, nomes, palavras que usamos e

que tem origem indígena? Quais as transformações culturais que os índios sofreram

desde a chegada dos europeus no Brasil até hoje?

Nos questionamentos feitos aos alunos, durante a aplicação do projeto, foi

possível perceber que a maioria já conhecia um pouco da cultura indígena.

Relataram a existência da arte na pintura do corpo, nos acessórios, nos vasos, no

artesanato. Os alunos disseram já ter visto indígenas em Medianeira, vendendo

artesanato. Quanto à subsistência, apontaram a venda de artesanato, a pesca,

hortas, agricultura e frutos. Indicaram a televisão como maior fonte de informação, a

escola, a internet, livros, a família. No tocante à situação social dos índios no Brasil,

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os alunos disseram que os índios passam por condições precárias. Com relação aos

costumes, citaram o uso do boldo, babosa, mentruz e hortelã na medicina; a

mandioca, o milho, o feijão, tapioca, na alimentação; a caça e a pesca, nos

costumes. Sendo que as transformações mais visíveis nessa área foram o uso de

roupas, a religião, a habitação e as idas ao médico, o uso das tecnologias como:

celular e computador. Quanto às contribuições indígenas para a cultura do não-

índio, foram citados pratos da gastronomia (o biju, tapioca, abóbora, milho, feijão,

amendoim, a mandioca e o uso de algumas ervas medicinais, como o mentruz, o

boldo, a babosa; bem como nomes de pessoas: Nayara, Rauny, Juruna, Yara,

Tainá, Indianara e Potira; nomes de cidades, como Corumbá, Goioerê, Águas

Claras, também foram citados.

Após o levantamento dos conhecimentos prévios dos alunos, propusemos

conhecer a cultura indígena e sua influência na cultura brasileira, em relação aos

hábitos e costumes inseridos no nosso cotidiano, como vivem nas comunidades

indígenas atualmente e seus projetos. Partindo da pesquisa em grupos sobre os

Kaingang, Xetá, Guarani, e Xokleng, no Paraná, e apresentação para a turma, nos

aprofundamos sobre os grupos étnicos que ainda existem no Paraná, e os alunos

tiveram subsídios para as próximas etapas do projeto.

Fizemos uma visita à Comunidade Indígena Tekoha Ocoy, em São Miguel

do Iguaçu – PR, onde os alunos conheceram danças, canções, mitos, grafismos,

artesanato. Assistimos a um documentário produzido pelos professores da escola

indígena, mostrando como eles sobrevivem no espaço territorial destinado à

comunidade e ao processo de manejo e cultivo de peixes, os ensinamentos

passados as crianças e jovens e o conjunto de manifestações, ritos e práticas

presentes na cultura Ava-Guarani e centralizadas na figura do xamã, em seu papel

de intermediação entre a realidade e a dimensão sobrenatural, em seus transes

místicos e nos poderes mágicos e curativos que lhe são atribuídos.

Participamos de uma palestra com o professor Gersom Ledesma da Unila,

na qual ele fez um contraponto de como o índio foi explorado na América Latina,

sobre o colonialismo e o interculturalismo.

Analisamos e discutimos textos como: Ritos corporais dos Nacirema, entre

outros, e vídeos previamente selecionados. Conhecemos mitos, lendas e canções

indígenas e seus significados, sensibilizando os alunos e aprimorando seu olhar,

levando-os a uma compreensão mais crítica e sensível do mundo em que vivem.

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Mostrar que em cada cultura o mundo cosmológico ajuda a compreender e dar

sentido aos fatos e eventos da vida. Reconheceram a importância da sabedoria

indígena nos seus mitos, lendas e canções e danças, para a cultura nacional.

Nessa atividade propusemos a dramatização de mitos, lendas indígenas,

bem como canções e danças indígenas. Comparamos os processos criativos na

produção do artesanato e artefatos indígenas, os alunos produziram trabalhos

artísticos utilizando o trançado com papel, a tecelagem, a arte plumária, máscaras

de apapatáis, esculturas, os adornos como colares feitos com sementes, etc. Após

assistirmos aos vídeos sobre a arte indígena, orientamos processos para a produção

artística em cada grupo que produziu uma modalidade da arte indígena e depois

apresentou à turma (explicando o significado, material utilizado, etc.)

Estudamos artistas que representavam o índio no início da colonização e

como hoje ele é representado nas pinturas. Destacamos quais são os processos

desenvolvidos pelos artistas; quais as imagens de indígenas do passado e do

presente foram apresentadas, comparadas, textos estudados e discutidos,

instigando os alunos a perceberem diferenças e características culturais, quem é o

índio na sociedade brasileira, suas contribuições à nossa cultura, alguns problemas

como a perda de suas terras, diminuição demográfica, problemas de subsistência e

geração de renda. A partir dos estudos fizemos um contraponto: os alunos

representaram o índio após os estudos realizados. Produzimos, junto aos alunos,

obras de arte, a partir de pesquisas de grafismos indígenas e imagens do índio

enaltecendo a riqueza cultural indígena.

Na sequência, identificamos as pinturas corporais e o grafismo indígena,

bem como sua origem e significado na cultura indígena. Produzimos pigmentos

utilizando: urucum, jenipapo, açafrão.

Apresentamos um vídeo: grafismos indígenas – Brasil. Orientados pela

professora, e utilizando sua criatividade, os alunos confeccionaram uma caneta de

bambu para produzir os grafismos. Os alunos e a professora pintaram grafismos na

mão e no braço dos colegas da turma; cada aluno pintou grafismos inspirados na

cultura indígena estudada.

A participação dos alunos do 1º ano do curso de formação de docentes foi

efetiva, as percepções de aprendizagem dos alunos foram relevantes, reagiram de

forma positiva, demonstrando maturidade e sensibilidade. Os mesmos testaram seus

próprios conceitos e preconceitos com as experiências pedagógicas e com certeza

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houve uma reflexão sobre o respeito à diversidade e a forma de ver o “outro” sob a

ótica da sua perspectiva cultural. Conceitos como: o indígena só retira da natureza o

que necessita, tem um profundo respeito por ela. Exemplo: Corta uma árvore para

fazer uma canoa e o restante do tempo fica com a família e passando a cultura às

crianças, enquanto que o branco fortalece a cultura do acúmulo, do consumismo do

desrespeito aos recursos naturais.

A finalização do projeto ocorreu com a apresentação, pelos alunos, dos

mitos: A conquista do fogo, a origem da música e a lenda do Uakti, além das

Músicas: Tupi – todo mundo fala língua de índio, a música Índia e Cara de Índio,

bem como a exposição dos trabalhos na Mostra Cultural do colégio, realizada nos

dia 17, 18 e 19 de novembro de 2015, aberta à comunidade.

A turma produziu e contribuiu muito nas pesquisas e questionamentos. Os

resultados foram animadores.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Entendemos as aulas da disciplina Arte, ênfase ao trabalho na escola

pública, como uma oportunidade de discutir a sociedade em que vivemos, com sua

diversidade cultural, para conhecer e discutir conceitos arraigados e que geram

inúmeros preconceitos.

A cultura indígena em geral, desconhecida pela maioria, ou pretensamente

conhecida por estereótipos, está fisicamente muito próxima do contexto escolar em

que trabalhamos, entretanto muito distante se considerarmos o quanto a

desconhecemos.

Por meio do projeto proposto, ao qual a fundamentação teórica auxiliou

sobremaneira, pudemos estimular os alunos a discutirem seus conhecimentos

acerca da cultura Ava-guarani e a reverem muitos preconceitos, além de

entenderem as motivações sócio-culturais de muitas manifestações artísticas da

referida etnia, abordadas durante as aulas e em pesquisas extraclasse, em

apresentações de trabalhos e em atividades interativas, como o canto, o desenho e

as exibições de documentários, sempre com vistas a entender as relações

multiculturais.

Muito além de cumprir a Lei 11.645 (2008), acreditamos que este projeto

contribuiu para o desenvolvimento da mesma, fortalecendo e despertando o

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interesse pelos conteúdos abordados, bem como conceitos estereotipados e muitas

vezes passados de forma equivocada nos livros didáticos.

O projeto constituiu uma oportunidade de conhecer melhor nossas raízes

culturais e, a partir desses estudos, é possível um aprofundamento e uma adaptação

efetiva em diversos anos do ensino profissional e mesmo aos anos do ensino médio

e fundamental.

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