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Cristiano Luiz Lacerda de Miranda Os Benefícios Cardiovasculares da Meditação

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Cristiano Luiz Lacerda de Miranda

Os Benefícios Cardiovascularesda Meditação

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Os Benefícios Cardiovasculares

da Meditação

Cristiano Luiz Lacerda de Miranda

www.cristianomirandacardiologia.com

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Agradecimentos

Eu gostaria de agradecer a meus pais, em especial o pragmatismo e a praticidade que herdei de meu pai, e da sensibilidade e a capacidade de filosofar herdados de mi-nha mãe.

À minha irmã Zuleica pelo exemplo de vida, determi-nação, suavidade e alegria, bem como ao apoio, carinho e companheirismo de minha irmã Karina. À minha esposa Luciana pela paciência, amor e o pensamento científico.

Aos professores do curso de pós-graduação em psi-cologia transpessoal que contribuíram para a ampliação de minha consciência. Em especial, ao Professor Dr. José Maria Martins por orientar a monografia que precedeu este livro.

A meus pacientes-mestres, que me instigam a querer conhecer mais sobre mim e o mundo que nos cerca, assim como sua influência sobre o processo de cura, acolhimen-to e esperança.

Ao momento presente por me proporcionar tantas experiências de aprendizado e por poder participar da construção de um novo paradigma emergente, em que o conhecimento transcendente e científico se completam da mesma forma que a mente e o coração se alinham, construindo uma visão mais harmônica e saudável do ser humano com seu mundo interno e sua relação com o nos-so planeta.

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Sumário

INTRODUÇÃO 5

Meditação e o aparelho cardiovascular 6

Definição de meditação e descrição dos principais tipos 8

Estresse, hipertensão e fatores de riscos relacionados às doenças cardiovasculares 11

Efeitos da meditação sobre a pressão arterial 12

Meditação e os fatores de risco para doenças cardiovasculares 15

Meditação e a variabilidade da frequência cardíaca 18

Efeitos da meditação sobre o cérebro e o comportamento 21

Por que temos dificuldade e resistência em praticar meditação? 25

Meditação negativa ou ruminação 27

CONCLUSÃO 28

REFERÊNCIAS 30

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INTRODUÇÃO

Este livro nasceu da conclusão do curso de pós-graduação em Psicologia Transpessoal da Faculdade Metropolitana de Belo Horizonte em parceria com a Universidade Internacional da Paz - Unidade Minas Gerais.

A meditação como prática terapêutica está inserida em diversas áreas do conhecimento acadêmico e científico, tais como teologia, medicina e a psicologia. Objeto de pesquisa da neurociência, fisiologia e da espiritualidade, além de fazer parte da interface transdisciplinar dessas disciplinas com a Car-diologia. Vários estudos descrevem associação positiva entre a meditação e a melhora da saúde psicológica, neurofisiológica e cardiológica. Nesta obra, optamos por abordar os benefícios cardiovasculares promovidos pela meditação, destacando a re-dução do risco de desenvolvimento de doenças crônicas, prin-cipalmente as que acometem o coração, o cérebro e as artérias. Achados envolvendo a meditação e o aparelho cardiovascular demonstram diminuição do estresse, dos níveis glicêmicos em diabéticos e dos níveis pressóricos em portadores de hiperten-são, e uma redução de até 30% na taxa de mortalidade por do-enças cardiovasculares.

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Meditação e o Aparelho Cardiovascular

Há cerca de três milênios a meditação vem sendo pratica-da. Entretanto, os experimentos pioneiros e esporádicos da dé-cada de 1960 apenas tentavam documentar as façanhas fisioló-gicas de controlar a frequência cardíaca (FC) de alguns iogues. Somente no final dessa década é que começaram as pesquisas sistemáticas, e a partir de então elas não pararam de expandir (WALSH; VAUGHAN, 1997).

Já os primeiros estudos demonstrando a associação positi-va entre a meditação e o aparelho cardiovascular (coração e os vasos sanguíneos) datam de 1969. Patel e North (1975 apud KOENIG; MCCULLOUGH; LARSON, 2001) observaram a redução da pressão arterial (pressão no interior das artérias) em pessoas hipertensas que faziam meditação e ioga. Ainda Koenig, McCullough, Larson (2001), Blackwell et al. (1976) relataram redução da pressão arterial (PA) e dos níveis de an-siedade após 12 semanas de meditação transcendental (MT). Alguns praticantes dessa meditação procuraram Herbert Ben-son, um cardiologista da universidade de Harvard, para testar a capacidade de reduzir a própria pressão sanguínea. Benson demonstrou em estudos subsequentes que não só isso aconte-cia, como a prática de MT estava associada à redução das dores crônicas e ao aumento da longevidade (ALPER, 2008).

Estudos recentes que investigam as modificações da pres-são arterial provocadas pela meditação apontam que essas al-terações são observadas tanto em pessoas normotensas (com

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pressão normal), quanto em hipertensos (indivíduos com níveis de pressão aumentados). Alterações de tamanha mag-nitude podem levar à redução do risco de desenvolvimento de doenças cardiovasculares (DCV) (ANDERSON; LIU; KRYSCIO, 2008). Outros es-tudos demonstraram que a meditação pode melhorar os níveis de colesterol (tipo de gordura presente no sangue), epinefrina e norepinefrina (hormônios produzidos pela glândula suprarrenal), placa ateromatosa (placa de gordura que se acumula na parede das artérias), contribuindo para di-minuição da mortalidade por DCV (SCHNEIDER et al., 2006). Essas alterações serão abordadas de forma mais deta-lhada posteriormente.

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Definição de Meditação e Descrição dos Principais Tipos

Meditação é um termo utilizado de forma muito vaga no ocidente, vista como um meio de desenvolver o senso de calma e centramento. Podemos defini-la como um método sistemáti-co de aquietar, acalmar, dirigir e/ou focalizar a mente e a cons-ciência normal, evitando que o indivíduo seja dominado pelos seus pensamentos e emoções. Ela pode ser praticada em silên-cio ou com som ambiente, até mesmo em locais barulhentos, os olhos podem ficar abertos ou fechados. As posições adotadas na meditação são: assentado, andando ou quieto. Variadas tam-bém são as centenas de práticas e técnicas de meditação. Gran-de parte dos estudos tem sido feita com um sistema específico, a meditação transcendental, mas provavelmente os resultados encontrados nesses estudos sejam válidos para outros sistemas de meditação (FADIMAN, FRAGER, 1979).

Meditação é toda disciplina voltada para o aumento de percepção pelo direcionamento consciente da atenção. A aten-ção pode ser focada em um objeto particular como a respiração, as sensações, sons e imagens, ou ainda manter-se aberta, focada em toda a experiência. Em outras modalidades de prática me-ditativa, são geradas e vivenciadas emoções específicas como o amor ou a compaixão (WALSH; VAUGHAN, 1997).

A meditação transcendental (MT) é uma das práticas meditativas mais recentes e populares no ocidente. Citadas com frequência em artigos científicos, a MT foi criada por Maharishi Mahesh Yogui e consiste em assentar e concentrar

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a atenção em um som, repetindo-o várias vezes (DANUCA-LOV; SIMÕES, 2006).

Goleman (1971), em concordância com o próprio Maha-rishi Mahesh Yogui, descreve que esses sons, ou palavras-cha-ves, são chamados de mantras, originários do sânscrito (antiga língua indiana), e que eles seriam o veículo provocador da mu-dança para outros níveis e estados de consciência. Essa técnica é uma forma contemporânea da prática de ioga, cujas raízes se originam da tradição dos Sutras da ioga Patanjali.

A meditação zen é historicamente uma meditação budista e possui várias modalidades, bem como níveis de dificuldades. A técnica consiste em focar a mente no presente, no aqui e no agora, sem julgamentos. Introduzida na China pelos monges budistas bodidarmas, ela era chamada de chan e no Japão ficou conhecida com o nome de zen (CHIESA, 2009). Existem ain-da as técnicas zen focadas na respiração e na observação dos pensamentos. Na primeira, os praticantes concentram-se no processo natural de respiração sem influenciar o ritmo respira-tório. Na segunda modalidade, o indivíduo apenas observa os pensamentos sem se fixar em nenhum deles, reduzindo então a tagarelice mental (PERESSUTI et al., 2009).

A meditação do ioga consiste em observar os pensamen-tos, as ideias e as imagens, até que o fluxo incessante se apazigue. Exige um grande treinamento, principalmente para nós ociden-tais que temos dificuldade em nos centrar no agora. Com o pas-sar dos anos, o ioga, um dos mais belos produtos gerados pelo povo indiano, desmembrou-se em inúmeras vertentes. Esse sistema filosófico religioso e seus pressupostos originam-se no que talvez seja o conjunto de escritos mais antigo de nossa civi-lização (DANUCALOV; SIMÕES, 2006).

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Voltando às escolas de Yoga, somos obrigados a versar um pouco mais profundamente sobre aque-las que talvez sejam as mais citadas atualmente, ao menos no ocidente, por historiadores e pesquisado-res sérios: o Yoga clássico e o Hatha-yoga (DANU-CALOV; SIMÕES, 2006, p.197).

O hatha-ioga é, possivelmente, a escola mais nova. Surgi-da em épocas medievais possui diversas linhas, trabalha com a mente e de forma mais enfática com o corpo. Já o ioga clássico ou ioga-sutras foram compilados pelo grande filósofo indiano Pantañjali, que viveu alguns anos antes de cristo, e não se apoia em uma metafísica holística (DANUCALOV; SIMÕES, 2006).

Na tradição ocidental podemos citar a meditação chama-da por Keating (apud NEWBERG; WALDMAN, 2009) de “oração centrante”, e que é praticada por vários cristãos e ca-tólicos. Ela consiste em escolher uma palavra com significado sagrado e concentrar-se nela durante vinte minutos enquanto fica sentado confortavelmente com os olhos fechados.

De uma forma geral, a meditação é uma técnica autoin-duzida que utiliza a autofocalização com percepção sensorial, envolvendo o relaxamento muscular, o estado alterado de cons-ciência e, em algum ponto, o estado de relaxamento da lógica (DANUCALOV; SIMÕES, 2006).

A palavra meditação parece originar-se do grego e do la-tim, da mesma forma que medicina. Ambas são derivadas de palavras que significam “tomar medida de alguém”. Nas anti-gas sociedades tradicionais, quando o médico era um curador e ao mesmo tempo um guia espiritual, era comum ele prescrever técnicas de meditação aos seus pacientes (GORDON, 1998).

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Estresse, Hipertensãoe Fatores de Risco Relacionados às

Doenças Cardiovasculares

As doenças cardiovasculares (DCV) são hoje as principais causas de morte e invalidez no Brasil e no mundo. Dados apon-tam que, de 1980 a 2000, no Brasil, as causas de DCV que mais levaram ao óbito foram o acidente vascular cerebral (AVC), cha-mado popularmente de derrame cerebral, seguido das doenças isquêmicas do coração, como o infarto do miocárdico (IAM) e a angina de peito. Na10ª revisão da Classificação Internacional de Doenças (OMS) – CID-10, as DCV são as que acometem o cora-ção, a circulação pulmonar, as artérias, as veias, os vasos linfáticos e a circulação cerebral. Podemos citar como principais exemplos o IAM, a hipertensão arterial sistêmica (HAS), o AVC e a insufi-ciência cardíaca (ICC, doença caracterizada pela falha da função de bombeamento do coração) (LOTUFO; LAURENTI, 2005).

Nos Estados Unidos da América, mais de 40% da popu-lação sofre de doenças crônicas (DC). Entre elas, a principal causa de mortalidade e invalidez também são as DCV, promo-vendo um custo de 396 milhões de dólares por ano para tratar o IAM e o AVC (SCHNEIDER et al., 2006).

Hoje, os fatores predisponentes ao desenvolvimento de DCV, chamados de fatores de risco (FR), tais como tabagismo, obesidade, hipertensão, sedentarismo, diabetes, são classica-mente conhecidos na literatura médica. Eles apresentam tanta importância quanto o mais recente e estudado fator de risco, o estresse crônico (RAINFORTH, 2007).

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Efeitos da Meditação Sobre aPressão Arterial

A hipertensão arterial Sistêmica (HAS) pode ser definida de forma simplificada como um aumento da pressão no inte-rior das artérias, sendo um dos fatores mais importantes para o desenvolvimento das DCV. A HAS está relacionada a 40% das mortes por AVC e 25 % das mortes por IAM (FADIMAN; FRAGER, 1979). Estudos que acompanharam mais de 3000 indivíduos europeus durante sete anos demonstraram que o es-tresse crônico pode levar ao desenvolvimento de HAS (RAIN-FORTH, 2007). Estes achados foram replicados no estudo CARDIA, que também demonstrou que o estresse crônico pode levar ao desenvolvimento da HAS em até 15 anos após o início do estilo de vida estressante (SCHNEIDER et al., 2006).

Os primeiros estudos demonstrando associação positi-

va entre a meditação e o ACV foram em 1969. Patel e North (1975) observaram a redução da PA em pessoas hipertensas que faziam meditação e Ioga. Em 1976, Blackwell et al. relata-ram redução da pressão arterial (PA) e dos níveis de ansieda-de após 12 semanas de meditação transcendental (KOENIG; MCCULLOUGH; LARSON, 2001).

Schneider, Staggers et al. (1995 apud KOENIG; MC-CULLOUGH; LARSON, 2001), em um estudo controlado duplo cego, acompanharam 111 mulheres afro-americanas entre 55 e 85 anos por três meses. Elas eram hipertensas com níveis pressóricos menores ou iguais a 179 x 104 milímetros de mercúrio (mmhg). Essas mulheres foram separadas em três

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grupos. O primeiro recebeu orientações educacionais sobre mudança do estilo de vida, o segundo recebeu exercícios de relaxamento muscular progressivo, e o terceiro grupo realizou meditação transcendental duas vezes por dia. O grupo do re-laxamento muscular progressivo reduziu apenas 4,7 mmhg na pressão sistólica (PS) e 3,3 na pressão diastólica (PD). Enquan-to o grupo que recebeu a MT reduziu 10,7 mmhg na PS e 6.4 mmhg na PD, com valores estatísticos significativos (p<0,003) e (p< 0,0005) respectivamente. Por fim, no grupo que recebeu somente as orientações sobre modificação do estilo de vida, não houve modificação nos níveis pressóricos. Esses achados foram confirmados em dois trabalhos clínicos posteriores de Alexander e Selesnick (1996), e de Wenneberg et al. (1997).

Em 2006, uma meta análise foi feita para avaliar os estudos

existentes sobre os efeitos da meditação transcendental MT e sua influência na pressão arterial. Ficou demonstrado que a MT está associada à redução da PA, de aproximadamente 4,7 mmhg para pressão sistólica e 3,2 mmhg para pressão diastó-lica, valores estatisticamente significativos com p< 0,011 e p< 0,08 respectivamente. Redução similar foi encontrada tanto em normotensos, quanto em hipertensos. Achados dessa magnitu-de podem ser acompanhados de redução significativa no risco de desenvolver DCV (ANDERSON; LIU; KRYSCIO, 2008).

Em outra meta análise mais recente, de 2007, foram iden-tificados 107 estudos relacionados à redução da PA em hiper-tensos, com diversas formas de redução de estresse, como, relaxamento induzido por biofeedback monitorizado por apa-relhos que identificam as ondas cerebrais, relaxamento mus-cular, treinamento e gerenciamento de estresse, e a meditação transcendental. Os achados dessa meta análise mostraram que a MT pode levar à redução da PA em cerca de 5 a 2,8 mmhg para

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pressão sistólica e diastólica respectivamente (p=0.002/0.02), com melhoria dos resultados clínicos. Os valores encontrados são tão importantes quanto os valores provocados pela modifi-cação do estilo de vida, recomendados pelo sétimo relatório da Junta Nacional Americana para Detecção, Prevenção e Trata-mento de HAS (RAINFORTH, 2007).

O estresse pode levar ao desenvolvimento da HAS, o que contribui para o desenvolvimento futuro do IAM e AVC. Alguns estudos demonstraram que a resposta aguda ao estresse, proces-sada principalmente no córtex pré-frontal e no sistema límbico é interpretada no sistema nervoso central como uma situação hostil de luta ou de fuga, pode funcionar como um gatilho para a ativação do sistema nervoso simpático e do eixo hipotálamo-hi-pófise-adrenal, com consequente liberação aumentada de cor-tisol, epinefrina (adrenalina) e norepinefrina (noradrenalina) pelas glândulas suprarrenais. A epinefrina e a norepinefrina pro-vocam aumento da frequência cardíaca e da pressão arterial, já o cortisol leva ao aumento das taxas de glicose no sangue. Essas modificações são produzidas para que o indivíduo possa fugir ou lutar. Como a MT pode modular as alterações neurofisiológicas e neuroendócrinas com redução da ativação do sistema nervoso simpático e do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, reduzindo os hormônios do estresse (cortisol, epinefrina e norepinefrina) de forma imediata. A longo prazo, ela pode abaixar tanto a pressão arterial como a frequência cardíaca, além de melhorar os níveis glicêmicos. Essa maior coerência do sistema nervoso, com con-sequente redução da interpretação hostil de situações corriquei-ras, provocadas pela MT, pode melhorar a resposta adaptativa ao estresse, prevenindo as consequências fisiológicas negativas como a hipertensão, o infarto do miocárdico e o AVC (RAIN-FORTH, 2007).

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Meditação e os Fatores de RiscoPara Doenças Cardiovasculares

Diversas são as pesquisas que vêm demonstrando que a meditação pode reduzir os principais fatores de risco para o desenvolvimento das doenças cardiovasculares. Em alguns es-tudos, a MT reduziu o colesterol após três meses de prática meditativa (SCHNEIDER et al., 2006). Em outros trabalhos científicos, a MT está relacionada à redução da atividade sim-pática pelos receptores beta-adrenérgicos com consequente di-minuição da epinefrina e norepinefrina, e redução também da atividade do eixo hipotálamo-hipofise-adrenal com melhora dos níveis pressóricos e das taxas de glicose e gorduras no sangue (SCHNEIDER et al., 2006).

Ficou demonstrado em outro estudo que, após oito meses de prática de MT, as paredes das artérias carótidas (artérias do pescoço), podem reduzir a quantidade de gordura acumulada em suas camadas (íntima e média). Sabemos que, quanto maior for a placa de gordura nas camadas dessas artérias, maior será a chance do indivíduo desenvolver um AVC. Desta maneira a prá-tica meditativa pode reduzir as placas de gordura das artérias ca-rótidas diminuindo o risco de desenvolvimento de um acidente vascular cerebral (SCHNEIDER et al., 2006).

A MT, em um estudo piloto, aumentou a tolerância ao exer-cício físico em pacientes com entupimento das artérias coroná-rias (artérias do coração) reduzindo os sintomas de angina (dor no peito provocada pelo entupimento dessas artérias) e cansaço físico. Houve redução, inclusive, da isquemia cardíaca (falta de

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sangue em determinada região do coração em função das artérias doentes) demonstrada pela diminuição do infradesnivelamento do segmento ST (alteração eletrocardiográfica compatível com isquemia do coração), que ficou evidente nos traçados de ECG (eletrocardiograma) (SCHNEIDER et al., 2006).

O estresse é outro fator de risco para as DCV, que também pode ser reduzido com a MT, o que contribui para diminuição do desenvolvimento de doenças crônicas futuras como o IAM, HAS, AVC. Diversas são as pesquisas que apontam o estresse como um dos fatores de risco mais importantes para o desenvol-vimento dessas doenças (RAINFORTH, 2007).

A meditação zen protege o cérebro contra o declínio cog-nitivo secundário ao envelhecimento. Essa prática meditativa é capaz de reduzir o estresse oxidativo através da liberação au-

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mentada do oxido nítrico (ON), um importante vasodilatador arterial que se mostra aumentado durante e após a meditação. O ON provoca aumento da luz dos vasos arteriais. Com o di-âmetro aumentado, o sangue passa a fluir com mais facilidade. Nas doenças cardíacas, este importante vasodilatador encontra--se reduzido. Dessa maneira, a meditação zen pode aumentar esses níveis de ON, levando à redução do estresse oxidativo por aumentar o diâmetro das pequenas artérias com consequente melhora do aporte sanguíneo que chega às células. Além de re-duzir a pressão arterial por aumentar a luz das artérias de grande calibre, melhorando, ou até evitando, as doenças isquêmicas do coração (CHIESA, 2009).

Com os benefícios metabólicos, hemodinâmicos e psico-

lógicos, a prática meditativa pode contribuir para reduzir o risco de desenvolvimento de doenças cardiovasculares além de me-lhorar clinicamente os portadores dessas doenças. Um estudo randomizado controlado, com seguimento de quase nove anos, mostrou que a MT reduziu 23% da mortalidade por todas as causas e 30% a taxa de mortalidade por DCV, valores anterior-mente encontrados apenas em estudos que envolviam os FR para as DCV e o uso de medicamentos. Estes achados são tão importantes que o pesquisador compara a MT a uma nova clas-se de medicamentos (RAINFORTH, 2007).

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Meditação e a Variabilidade daFrequência Cardíaca

A natural elevação ou diminuição da frequência cardíaca em resposta à pressão arterial, respiração, hormônios e emo-ções, é denominada variabilidade da frequência cardíaca (VFC). Considera-se que seus valores refletem ou predizem a saúde ou a doença psicológica. A VFC representa um marcador da ativi-dade autonômica. Logo, reflete o grau de controle autonômico do coração. Uma VFC deficiente tem sido observada em diver-sos quadros clínicos, como a neuropatia diabética (doenças que atingem os nervos dos portadores de diabetes), transplante car-díaco, infarto do miocárdio e patologias psicológicas (KULUR et al. 2009).

Devido ao fato da diminuição da VFC estar associada com um prognóstico desfavorável, alguns pesquisadores concluíram que o aumento da VFC aumentaria a sobrevivência. Sabe-se que a atividade respiratória influencia a frequência cárdica através de mecanismos fisiológicos e anatômicos, e que a respiração ab-dominal lenta e regular diminui a atividade do sistema nervoso simpático, reduz a tensão nos músculos respiratórios, a ansieda-de e promove a sensação de relaxamento (KULUR et al., 2009).

A VFC é definida como uma medida das alterações bati-mento a batimento na frequência cardíaca, sendo considerada a medida mais dinâmica e precisa dos nossos estados emocio-nais interiores. E que a FC estável era considerada sinal de boa saúde. Hoje, no entanto, através da analise da VFC, sabemos ser normal haver variações entre os batimentos, mesmo quan-

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do dormimos, e que a perda desta variação é um sinal de doen-ça e um forte indicador de problemas de saúde. Como a VFC declina à medida que envelhecemos, ela serve para avaliar o nosso envelhecimento fisiológico (CHILDRE; MARTIN; BE-ECH, 2006).

Em um recente artigo publicado nos Arquivos Brasileiros de Cardiologia (KULUR et al., 2009), os autores do trabalho pesquisaram o efeito da respiração diafragmática regular sobre a VFC nos pacientes com doença cardíaca isquêmica provoca-da pela Diabetes. Nos pacientes diabéticos, existe comprome-timento das pequenas fibras nervosas, levando à neuropatia autonômica grave em 40% dos casos. A neuropatia autonômi-ca pode conduzir inicialmente a distúrbios do sistema nervoso parassimpático e, posteriormente, do sistema nervoso simpáti-co, com consequente redução do domínio de tempo da VFC. Os pacientes que apresentam diminuição da VFC apresentam um prognóstico negativo. Os autores concluíram que diferen-temente dos pacientes que não estavam dispostos a executar o exercício, o grupo que executou a modalidade respiratória dia-fragmática apresentou melhora significativa da VFC, em uma di-reção prognosticamente favorável, além da melhora dos índices glicêmicos. Os indivíduos foram ensinados a respirar a uma taxa de seis ciclos respiratórios por minuto, cinco segundos para ina-lação e cinco segundos para exalação. O exercício era realizado de manhã e de noite, durante o tempo que decorreu a pesquisa: três meses para um grupo e um ano para o outro grupo.

Segundo Walsh e Vaughan (1997), meditação é toda disci-plina voltada para o aumento de percepção pelo direcionamen-to consciente da atenção, podendo ser focada em um objeto particular como a respiração.

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Já outros autores relatam que a meditação zen consiste em focar a atenção e concentram-se no processo natural de respira-ção (PERESSUTI et al.., 2009).

Para DANUCALOV e SIMÕES (2006) a meditação do ioga inicia obtendo-se o foco na respiração; a partir daí, estados mentais mais apurados podem ser desenvolvidos.

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Efeitos da Meditação Sobre o Cérebro e o Comportamento

Nos últimos anos, os avanços da neurociência revolucio-naram a maneira de pensarmos o cérebro. Hoje, os cientistas o enxergam como uma massa em constante mudança. Segundo evi-dências recentes, esse órgão pode, através da neuroplasticidade – habilidade do cérebro humano de se rearranjar estruturalmente em resposta a uma ampla variedade de eventos positivos e negati-vos –, apresentar mudanças neuronais em questões de horas. Nos mamíferos, os dendritos – milhares de receptores em forma de tentáculos que se estendem em uma das extremidades de cada neurônio – crescem rapidamente e se retraem em um período de duas horas (NEWBERG; WALDMAN, 2009).

O ganhador do prêmio Nobel Eric Kandel demonstrou que os neurônios nunca param de aprender e provou que se alterarmos o estímulo ambiental, a função das células mudará, gerando novas extensões chamadas axônios. Essa importante

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característica da neuroplasticidade permite que qualquer mu-dança no ambiente – interno ou externo – leve a um rearranjo no crescimento e nas atividades neuronais. Pesquisas recentes utilizando tomografia computadorizada do cérebro sugerem que a meditação pode ajudar a manter um equilíbrio estrutu-ral saudável, retardando o processo de envelhecimento (NEW-BERG; WALDMAN, 2009).

A meditação promove um aumento significativo na ati-vidade neural no córtex pré-fontal, uma área cerebral que nos ajuda a manter a atenção clara e focada em uma tarefa. Outra área ativada é o cíngulo anterior, uma estrutura que está en-volvida com a regulação das emoções, da memória e aprendi-zado. Essa estrutura é particularmente vulnerável ao processo de envelhecimento. O cíngulo anterior tem um importan-te papel na redução da irritação e da ansiedade, aumenta a consciência social e a compaixão, ajudando a pessoa a se tor-nar mais sensível aos sentimentos dos outros (NEWBERG; WALDMAN, 2009).

A ativação do córtex pré-frontal e do cíngulo anterior me-lhoram a memória, a cognição, e se opõe aos efeitos da depres-são. Outros estudos apontam que pacientes com Alzheimer e Parkinson também apresentam redução da atividade no cíngulo anterior, o que sugere que a técnica de meditação poderia redu-zir a deterioração causada por estas doenças. Em 2007, pesquisa-dores da Universidade de Emory descobriram que a meditação zen tinha efeitos neuroprotetores e reduzia a perda cognitiva as-sociada ao envelhecimento neural. Hoje, existem evidências que um treinamento de três meses de ioga, posturas, alongamentos e meditação reduze a atividade da amígdala, o principal órgão do sistema límbico gerador do medo e da ansiedade (NEWBERG; WALDMAN, 2009).

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Outra região cerebral pesquisada na neurociência é o lobo parietal. Essa estrutura, quando ativada, é responsável por nos dar um senso do nosso eu em relação ao tempo e espa-ço, bem como a outros objetos do mundo. As pesquisas com tomografia mostram que a atividade do lobo parietal fica di-minuída durante a meditação contemplativa no budismo e no cristianismo. Com essa redução temporária da atividade pa-rietal, diminuiria também a noção de tempo e espaço, o que poderia explicar o surgimento dos sentimentos de infinitude. Aqueles que meditam há muito tempo apresentam um nível mais alto de atividade do lobo parietal quando não estão me-ditando. Já que esse lobo é responsável por nos auxiliar a ter noção do nosso eu, essa atividade aumentada nos meditado-res mais experientes sugere que a prática meditativa fortalece tanto o sentido pessoal do eu em relação ao mundo, quanto o aumento da consciência, da vigilância e da capacidade de a pessoa compreender os sentimentos e pensamentos dos ou-tros (NEWBERG; WALDMAN, 2009).

A maioria dos estudos de neuroimagem demonstra mu-danças pequenas, mas significantes, na atividade cerebral depois de apenas oito semanas de prática. Eles descrevem ainda que os que praticam meditação durante 30 minutos ou mais, e por vários anos, são os que apresentam maiores diferenças na ati-vidade neural. Os indivíduos talentosos possuem a capacidade de manipular áreas específicas do cérebro que controlam pensa-mentos e emoções. A meditação intensiva pode também ativar uma forma incomum de atividade neural – a deaferentação – na qual uma parte do cérebro ignora a informação que é enviada a ela por outras partes. Quando isso acontece, nossa percepção cotidiana do mundo se altera radicalmente (NEWBERG; WAL-DMAN, 2009).

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Chiesa (2009) observou que, nos estudos eletroencefalo-gráficos de meditadores, ocorria um aumento das ondas Alfa (8-13Hz), Teta (4-7 Hz) e até a onda Delta (< 3,5 Hz) em algumas regiões cerebrais, incluindo a região frontal do córtex cerebral. Alterações estas observadas apenas em estados de relaxamento ou em fases de sono profundo. A intensidade delas apresenta a particularidade de serem proporcionais ao nível de treinamen-to dos meditadores, sendo mais intensas nos mais experientes e avançados praticantes.

A terapia cognitivo-comportamental adaptada para abor-dar a espiritualidade mostrou que a meditação promoveu melhora significativa no tratamento da desesperança e do de-sespero (D`Souza; Rodrigo, 2004 apud PERES; SIMÃO; NA-SELLO, 2007). Outros estudos de neuroimagem demonstra-ram que a meditação zen protege o cérebro contra o declínio cognitivo secundário ao envelhecimento. Já os estudos biológi-cos mostraram que a prática meditativa leva a uma melhora da concentração, reduz a raiva, os níveis de ansiedade e de depres-são (CHIESA, 2009).

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Por Que Temos Dificuldadee Resistância em Praticar

Meditação?

Por que, apesar dos diversos benefícios cardiovasculares descritos pela prática meditativa e das alterações neurofisioló-gicas benéficas que podem mudar o cérebro em questões de minutos, a maioria das pessoas resiste a ela? Existem diversas explicações possíveis, mas a com melhor sentido neurológico é a que, depois de passar décadas construindo uma personalidade estável para controlar as atribulações da vida, o cérebro hesita em mudar suas convicções. Pois, mesmo que o comportamen-to possa ser disfuncional, ele ajudou o individuo a sobreviver, e é exatamente para isso que o cérebro foi projetado. Foram décadas para formar hábitos e circuitos neuronais, e não é fácil desligá-los. Na realidade, é preciso uma enorme energia meta-bólica para fazer crescer novos dendritos e axônios, ou rearran-jar as conexões sinápticas que foram firmemente estabelecidas durante os anos que se sucederam. Além disso, o rompimento nos antigos padrões neurais cria certo grau de ansiedade no sis-tema límbico. Este sistema não é tão flexível e criativo quanto os lobos frontais (NEWBERG; WALDMAN, 2009).

Assim, qual é a solução para mudar esta resistência neural? A atenção focada leva à construção de novos circuitos neuronais que, uma vez estabelecidos, ativarão as áreas do cérebro ligadas às atividades motivacionais. Quanto mais repetimos a ativida-de, mais fortes estes circuitos se tornam. Mecanismo chamado de aprendizado hebbiano – conhecido pelo postulado de que o peso de uma conexão sináptica deve ser ajustado se houver

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sincronismo entre as atividades – é o mecanismo que leva a ad-quirir novos conhecimentos.

Segundo estudos, repetir uma nova tarefa, como a meditação ou uma oração, muda a atividade si-náptica na extremidade de um neurônio e isso al-terará a estrutura da célula. Tais mudanças afetam o modo como a informação é retransmitida para as outras áreas do cérebro (NEWBERG; WALD-MAN, 2009, p. 54).

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Meditação Negativa ou Ruminação

Em um estudo na Universidade de Stanford que utilizou tomografia, pessoas que se concentravam em aspectos nega-tivos delas mesmas ou numa interpretação negativa da vida, apresentaram aumento da atividade das amígdalas cerebrais. Geravam-se ondas de medo, liberando uma corrente neuro-química deletéria para o cérebro e o sistema cardiovascular, com consequente ativação do sistema hipófise-pituitária-adre-nal, elevando o cortisol, a adrenalina, noradrenalina, a FC e a pressão arterial.

Felizmente, a meditação é o oposto da ruminação e asse-melha-se à prática de psicoterapia, na qual aprendemos a ob-servar nossa negatividade e não reagir a ela. Assim, treinamos o cérebro para permanecer tranquilo face às adversidades, e dis-ciplinamos a mente para se tornar menos presa a seus próprios desejos, fixações e convicções. Quando isso acontece, o modo como vemos o mundo e a nós mesmos apresenta uma transfor-mação (NEWBERG; WALDMAN, 2009).

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CONCLUSÃO

O interesse no estudo do papel das várias práticas medi-tativas e de seus benefícios no aparelho cardiovasculares se dá por razões sociais, econômicas, filosóficas e científicas. As pes-quisas sobre o tema – com os primeiros estudos publicados na década de 1960 – vêm apresentando um grande aumento em decorrência dos resultados clínicos e do grande impacto epidemiológico, além da abertura da comunidade acadêmica ao novo paradigma científico não reducionista. O avanço da industrialização e o estilo de vida atual contribuem para o au-mento das doenças crônicas e incapacitantes, o que gera di-minuição da qualidade de vida e gastos dos sistemas de saúde pública. Nesse contexto, a meditação como prática de medi-cina complementar deve ser incluída nos programas de saúde pública e privada, bem como ter também incentivada a devida divulgação nos meios acadêmicos.

A meditação é uma medida bastante eficaz para o tratamen-to e prevenção de diversas doenças como a hipertensão, doen-ças cardíacas e coronarianas, aterosclerose das artérias carótidas, melhora da capacidade de praticar atividade física e de reduzir a isquemia miocárdica entre os portadores de doenças coronaria-nas; melhora da variabilidade da FC e da glicemia nos portado-res de diabetes; redução do colesterol, do estresse psicológico e dos hormônios deletérios liberados pelo estresse; redução da ansiedade, da raiva, além de melhorar de forma significativa a depressão. Destacamos ainda os benefícios na prevenção do Al-zheimer, redução da perda cognitiva em decorrência do enve-lhecimento, reorganização das ondas cerebrais com predomínio

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de ondas lentas, presentes em estados de relaxamento, melhora da empatia, esperança e autoestima.

A maioria dos estudos de neuroimagem demonstrou mu-danças significativas na atividade cerebral depois de apenas oito semanas de prática meditativa, quando realizada duas vezes por semana durante pelo menos quinze a vinte minutos. Eles tam-bém observaram que, entre os que meditam mais de 30 minutos por dia durante vários anos, os benefícios na atividade neural são mais preponderantes.

Os achados dos estudos descritos nesse livro sugerem que a meditação pode levar à melhora clínica de diversas comorbi-dades, sejam elas psicológicas ou fisiológicas, além de reduzir o risco de desenvolvimento de doenças crônicas, principalmente as que acometem o coração, o cérebro e as artérias. Achados de-monstraram reduções surpreendentes de 23% na mortalidade por todas as causas e uma redução de até 30% na taxa de morta-lidade cardiovascular. Lembrando que as doenças cardiovascu-lares estão descritas hoje como a principal causa de morte nos países desenvolvidos e em desenvolvimento.

Alguns autores como Schneider, Alexander, Staggers, salientam que estes achados são bastante significativos, pois previamente só eram encontrados em certas pesquisas que en-volviam os FR para as DCV e o uso de medicamentos. Estes pes-quisadores comparam a MT a uma nova classe de medicamento, com importante impacto na sobrevida, na melhora da qualidade de vida e na promoção da longevidade (RAINFORTH, 2007).

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