organização de equipes efetivas

28
Análise Porto Alegre v. 17 n. 1 p. 139-166 jan./jul. 2006 8 ORGANIZAÇÃO DE EQUIPES EFETIVAS: ESTUDO DE UMA EMPRESA GAÚCHA André Hartmann Duha* Nedio Antônio Seminotti** Resumo: O propósito principal deste estudo é investigar como se organizam as equipes de trabalho efetivas. O argumento central é o de que essas equipes se organizam ao redor de objetivos e procedimentos externamente definidos pela organização. A auto- organização do grupo é limitada por esses fatores externos, fazen- do com que os aspectos ligados à tarefa sejam mais importantes do que os humanos e relacionais na organização dessas equipes. Nesta investigação, foram utilizados os princípios da psicologia topológica e de dinâmica de grupo propostos por Kurt Lewin. O método de pesquisa escolhido se fundamenta num paradigma qualitativo, para estudar o caso de um grupo de vinte e uma pessoas do setor administrativo-financeiro de uma empresa de grande porte do setor metal-mecânico do Rio Grande do Sul. O estudo sugere um modelo explicativo de como a empresa influen- cia a organização de uma equipe de trabalho efetiva, analisando uma seqüência de explanações, intervenções e manipulações do gestor (como representante da empresa) ao longo do processo. Palavras-chave: Trabalho em equipe. Desempenho de equipes. Organização de equipes. Abstract: The main purpose of this study is to investigate how effective work teams organize themselves. The central argument defended by the researchers is that effective work teams organize themselves around goals, roles, rules and procedures that are externally established by the organization. The group self organization is limited by these out side factors, making all the aspects related to the work task more important than those related to human and relationship aspects in the organization of this teams. To accomplish this investigation there were used the principles of topological psychology and group dynamics proposed by Kurt Lewin. The research method chosen is based on a **Mestre em Administração e Negócios pela PUCRS. Professor da FACE/PUCRS. E-mail: [email protected] ** Doutor em Psicologia pela Universidad Autonoma de Madrid. Professor do PPG em Psicologia da PUCRS. E-mail: [email protected]

Upload: isabela-santana

Post on 12-Nov-2015

219 views

Category:

Documents


3 download

DESCRIPTION

Artigo

TRANSCRIPT

  • Anlise Porto Alegre v. 17 n. 1 p. 139-166 jan./jul. 2006

    8

    ORGANIZAO DE EQUIPESEFETIVAS: ESTUDO DE UMA

    EMPRESA GACHAAndr Hartmann Duha*

    Nedio Antnio Seminotti**

    Resumo: O propsito principal deste estudo investigar como seorganizam as equipes de trabalho efetivas. O argumento central o de que essas equipes se organizam ao redor de objetivos eprocedimentos externamente definidos pela organizao. A auto-organizao do grupo limitada por esses fatores externos, fazen-do com que os aspectos ligados tarefa sejam mais importantesdo que os humanos e relacionais na organizao dessas equipes.Nesta investigao, foram utilizados os princpios da psicologiatopolgica e de dinmica de grupo propostos por Kurt Lewin. Omtodo de pesquisa escolhido se fundamenta num paradigmaqualitativo, para estudar o caso de um grupo de vinte e umapessoas do setor administrativo-financeiro de uma empresa degrande porte do setor metal-mecnico do Rio Grande do Sul. Oestudo sugere um modelo explicativo de como a empresa influen-cia a organizao de uma equipe de trabalho efetiva, analisandouma seqncia de explanaes, intervenes e manipulaes dogestor (como representante da empresa) ao longo do processo.Palavras-chave: Trabalho em equipe. Desempenho de equipes.Organizao de equipes.

    Abstract: The main purpose of this study is to investigate howeffective work teams organize themselves. The central argumentdefended by the researchers is that effective work teams organizethemselves around goals, roles, rules and procedures that areexternally established by the organization. The group selforganization is limited by these out side factors, making all theaspects related to the work task more important than those relatedto human and relationship aspects in the organization of thisteams. To accomplish this investigation there were used theprinciples of topological psychology and group dynamics proposedby Kurt Lewin. The research method chosen is based on a

    ** Mestre em Administrao e Negcios pela PUCRS. Professor da FACE/PUCRS.E-mail: [email protected]

    ** Doutor em Psicologia pela Universidad Autonoma de Madrid. Professor do PPGem Psicologia da PUCRS. E-mail: [email protected]

  • 140

    Anlise, Porto Alegre, v. 17, n. 1, p. 139-166, jan./jul. 2006

    Duha, A.H. & Seminotti, N.A.

    qualitative paradigm. The research design that was adopted wasthe case study of a twenty one employees group from theadministrative and financial sector of a large company in the me-tal-mechanic sector in the state of Rio Grande do Sul. As the mainresult, the study suggests an explanatory model that shows howthe company influences the organization of an effective work team,analyzing a sequence of explanations, interventions e managementmanipulations (as the company representative) along the process.Key words: Team work. Team performance. Team organization.JEL Classification: M10 General. M54 Labor Management.

    1 IntroduoNos ltimos anos, as organizaes vm realizando gran-

    des modificaes nas prticas de gesto e na forma comoorganizam o trabalho, o que parece refletir as mudanas sig-nificativas percebidas nas prticas culturais e poltico-econ-micas que vm ocorrendo no Brasil e no mundo a partir doincio da dcada de 70. Estas modificaes esto levando asorganizaes a substituir um modelo baseado na hierarquia,na racionalizao e diviso do trabalho cuja nfase estavanas rotinas, no controle e na disciplina, por um outro maisflexvel voltado para a multifuncionalidade, a mudana e ainovao (Harvey, 1999).

    Dentro deste contexto, as organizaes comeam a incen-tivar a formao e o desenvolvimento de equipes, conside-rando-as como a unidade bsica de desempenho organiza-cional (Nadler, Gerstein e Shaw, 1993; Manz e Sims, 1996).Na rea de gesto, surge um grande interesse por modelos eprogramas que possibilitem a criao de equipes efetivas,preparando as organizaes para enfrentar os desafios doambiente competitivo (Parker, 1995; Drexler, Sibbet e Forrester,1996; Katzenbach e Smith, 2001).

    Entretanto, aquilo que parecia ser a soluo para os pro-blemas organizacionais passou a ser uma grande fonte dedecepo, pois se comeou a perceber a dificuldade de fazercom que as pessoas trabalhassem efetivamente em equipe(Robbins e Finley, 1997). Na maioria das vezes, os resultadosalcanados pelas organizaes foram piores que nos modelosde gesto e estruturao tradicionais, assim como para osempregados, onde o trabalho em equipe passou a ser fontede insatisfao e gerao de estresse (Robbins, 1999).

  • 141

    Anlise, Porto Alegre, v. 17, n. 1, p. 139-166, jan./jul. 2006

    Organizao de equipes efetivas: estudo ...

    Estas consideraes levaram a propor este estudo, cujopropsito principal investigar como as equipes de trabalhoefetivas se organizam. Como conceito central desta pesquisautilizou-se o conceito de equipe, proposto por Katzenbach eSmith (1993), que procura diferenciar as equipes verdadeirasde um mero grupo de pessoas com uma tarefa em comum.Para eles, uma equipe um pequeno nmero de pessoascom habilidades complementares que esto comprometidascom um propsito comum, metas de desempenho e uma abor-dagem pelos quais se mantm mutuamente responsveis(Katzenbach e Smith, 1993, p. 45).

    Embora exista uma grande variedade de tipos de equipe(Parker, 1995; Johnson e Johnson, 1997; Robbins, 1999,Katzenbach, 2001), todas elas possuem critrios de efetividadeque esto vinculados aos objetivos das organizaes nas quaisesto inseridas. Ainda que alguns autores (Gonzlez, Silva eCornejo, 1996) procurem salientar a existncia de critriosinternos ao grupo para avaliar a sua efetividade, Katzenbache Smith (1993) afirmam que uma equipe no pode ser confundi-da com um conjunto de valores que faz com que as pessoastrabalhem bem juntas, apresentando comportamentos de apoioe cooperao. Ela , acima de tudo, uma unidade bsica dedesempenho que busca resultados organizacionais efetivos.

    O argumento central deste estudo o de que as equipesde trabalho efetivas se organizam ao redor de objetivos, pa-pis, regras e procedimentos que so externamente defini-das pela organizao. Ou seja, a auto-organizao do grupo limitada por estes fatores externos, fazendo com que os as-pectos ligados tarefa sejam mais importantes do que osaspectos humanos e relacionais na organizao destas equi-pes efetivas.

    2 Fundamentao tericaPara realizar esta investigao, procuramos identificar,

    dentre as principais teorias que tm se ocupado do fenmenogrupal (Gonzlez, 1997), uma que possusse uma sistemati-zao terica capaz de proporcionar uma anlise adequadadeste fenmeno. Neste estudo, utilizamos os princpios dapsicologia topolgica e de dinmica de grupo propostos porKurt Lewin (1965; 1973; 1975; 1978). Para este autor, a orga-

  • 142

    Anlise, Porto Alegre, v. 17, n. 1, p. 139-166, jan./jul. 2006

    Duha, A.H. & Seminotti, N.A.

    nizao e o funcionamento de um grupo pode ser analisadacom base nos mesmos princpios da fsica topolgica. A teo-ria proposta por Lewin utiliza conceitos como o de espaotopolgico, campo de foras, sistemas de tenso, vetores,objetivos, locomoo, barreiras, etc. para explicar a dinmicados grupos.

    Com o propsito de dar um melhor direcionamento a esteestudo foram definidas algumas questes de pesquisa combase na psicologia topolgica de Lewin (1973):

    1. Quais as principais caractersticas do espao psicolgicoou espao vital criado pela equipe? Ou seja, quais as represen-taes das relaes estruturais nos indivduos assim como deseu ambiente psicolgico?

    Lewin (1973) define espao psicolgico ou espao vital comoaquele espao que permite uma representao das relaesestruturais dentro da pessoa assim como de seu ambiente psi-colgico. Para o autor, o espao vital de uma pessoa pode serrepresentado como uma regio subdividida em vrias partes ousub-regies, sendo que a situao atual da pessoa pode serrepresentada por um ponto localizado na parte ou sub-regioque corresponde ao seu comportamento atual em relao regio como um todo. Utilizando os conceitos retirados dafsica, Lewin concebe este espao vital ou psicolgico comoum espao topolgico, utilizando grficos e desenhos pararepresent-lo. A topologia uma geometria do espao que seinteressa mais pelas propriedades qualitativas do que asquantitativas das formas e dos objetos (Gonzlez, 1997).

    2. Como os membros da equipe lidam com o conflito entrea liberdade individual e a operatividade grupal? Por sua vez,como os indivduos e o grupo lidam com o conflito entre aliberdade do grupo e a operatividade organizacional?

    Lewin considera que o fato de pertencer a um grupo pro-duz uma influncia na conduta dos indivduos, o que resul-tado de duas dimenses superpostas. Primeiro, as necessida-des e metas pessoais que so trazidas pelos indivduos e queno so abandonadas quando comeam a fazer parte de umgrupo. Segundo, as metas, normas e valores que soestabelecidas pelo grupo e iro se impor a ele como ummembro deste grupo. A possibilidade de adaptao do indi-

  • 143

    Anlise, Porto Alegre, v. 17, n. 1, p. 139-166, jan./jul. 2006

    Organizao de equipes efetivas: estudo ...

    vduo ao grupo depende da evitao de um excessivo conflitoentre ambos os conjuntos de foras (Gonzlez, 1997).

    Mais tarde, em seus estudos, Lewin (1965) estende o con-ceito de espao vital, que inicialmente estava relacionado aoindivduo, para uma esfera mais abrangente, o fenmeno so-cial. O objeto de estudo passa a ser o espao social, ou cam-po social permitindo que, atravs da teoria topolgica, pos-samos representar o campo de foras a que est submetido ogrupo como unidade de anlise. Modificando-se o nvel deanlise, podemos supor que existe tambm um conflito a seradministrado entre as necessidades e metas do grupo e aque-las definidas pela organizao onde o grupo est inserido.

    3. Como se configura o sistema de tenses dentro da equi-pe, bem como o processo de estabelecimento de objetivos?

    Lewin critica o conceito de necessidade que era utilizadona poca e o substitui pelo de sistema de tenso que impli-ca por sua vez, no uso do conceito de campo de foras. Oautor define o sistema de tenso como o conjunto de todas asforas (vetores) que atuam simultaneamente sobre o sistemaem determinado momento (Lewin, 1973).

    Para Lewin (1965), as necessidades esto relacionadascom as metas resultantes deste campo de foras. O autorentende por meta toda a sub-regio que apresente caracte-rsticas de atrator no campo de foras, ou seja, que possuiuma valncia positiva. Por contraposio, uma sub-regio aver-siva seria aquela que gera um campo de foras repulsivo em seuentorno imediato, ou seja, possui uma valncia negativa.

    Um objetivo aparece no espao vital do indivduo ou dogrupo quando surge uma necessidade psicolgica, o que podeser representado pela apario de uma fora no espaotopolgico. Existe uma meta se, e somente se, existir umafora de atrao no espao vital do sujeito em direo a umasub-regio que representa a meta (Lewin, 1965).

    4. Quais as principais locomoes, barreiras, conflitos emudanas estruturais que ocorrem na equipe a partir de umprocesso de reflexo sobre a tarefa?

    Segundo Lewin (1965), a fora ou tenso relacionada a umobjetivo desaparece se tal objetivo for alcanado. O fato deque uma vez alcanado um objetivo desaparea a fora que o

  • 144

    Anlise, Porto Alegre, v. 17, n. 1, p. 139-166, jan./jul. 2006

    Duha, A.H. & Seminotti, N.A.

    originava, provoca uma mudana no sistema de foras queatuam sobre o indivduo, produzindo locomoes. A locomo-o (Lewin, 1973) significa uma modificao na relao deposies do campo de foras em diferentes momentos. Umalocomoo no dada por uma fora, mas sim pela resultantedo campo de foras: sempre que existir uma fora resultante(distinta de zero) haver locomoo na direo desta fora.

    Portanto, todo o comportamento ou processo psicolgicopode representar-se como uma locomoo dentro do espaovital da pessoa e induzido pela resultante do sistema deforas em cada momento dado. Por sua vez, toda locomooimplica uma mudana estrutural no espao psicolgico, poisaltera o campo de foras. Ou seja, a estrutura topolgica doespao vital constantemente modificada por cada uma daslocomoes do indivduo (Lewin, 1965).

    O conflito aparece como ausncia de locomoo quando aresultante das foras se anulam devido ao fato de terem igualmagnitude, mas um sentido contrrio. A magnitude do confli-to proporcional magnitude das foras do campo, quandosua resultante nula (Lewin, 1975). Embora os conflitos pos-sam ocorrer quando existem duas foras de atrao opostasentre si e de igual magnitude, eles tambm ocorrem quandoexiste uma fora de atrao e outra de repulso atuandosobre a mesma posio, ou quando existem duas foras opos-tas de rechao.

    Um outro conceito proposto por Lewin (1973) o de bar-reira. Segundo ele, barreira aquela fronteira ou campo deforas que gera uma dificuldade em relao a uma determinalocomoo. As barreiras determinam a facilidade com queuma regio pode ser alcanada pela locomoo. Elas tambmpodem impedir que a pessoa apresente um comportamentode fuga frente a uma situao de conflito.

    Como foi visto anteriormente, as locomoes influencia-das pelos objetivos, conflitos e barreiras modificam a estru-tura do campo vital do indivduo ou do grupo. As mudanasestruturais do campo vital podem ocorrer por vrios motivosdiferentes: aumento das sub-regies pela diferenciao; com-binao de regies que eram separadas; diminuio do n-mero de sub-regies; dissoluo de uma regio em outrassub-regies; ou, simplesmente, atravs da reestruturao docampo vital (Gonzlez, 1997).

  • 145

    Anlise, Porto Alegre, v. 17, n. 1, p. 139-166, jan./jul. 2006

    Organizao de equipes efetivas: estudo ...

    5. Como as equipes podem satisfazer as necessidades deseus membros?

    A interdependncia surge da tendncia dos indivduos deassociar-se a um grupo para satisfazer suas necessidades.Determinadas necessidades podem satisfazer-se melhor den-tro da atividade de um grupo, embora outras s possam sa-tisfazer-se pertencendo e atuando num grupo social maisamplo. Em qualquer caso, conseguir alcanar os objetivospessoais e grupais dentro de um grupo s pode ocorrer seestabelecerem laos de interdependncia entre seus mem-bros (Gonzlez, 1997).

    Lewin (1965) afirma que uma necessidade s pode sersatisfeita alcanando o objetivo desejado ou alcanando umobjetivo substituto. Entretanto, quando em grupo, existe umadiscrepncia entre o espao de vida da pessoa e o espao demovimento livre. Quando uma barreira se interpe entre apessoa e seus objetivos, possvel que a pessoa se voltepara outras regies do seu espao vital que correspondem aum nvel menos maduro de comportamento, buscando pelomenos alguma satisfao para a sua necessidade.

    3 MtodoO mtodo escolhido para a realizao deste estudo teve

    como base os pressupostos de uma pesquisa qualitativa,apontados por Serrano (1994). A razo da escolha de ummtodo que se fundamenta num paradigma qualitativo justi-fica-se, tendo em vista os principais objetivos e caractersti-cas do delineamento desta pesquisa, baseada em estudo decaso do tipo interpretativo/explicativo (Serrano, 1994; Yin,2001). Esse mtodo consiste, alm de um conjunto de descri-es ricas e aprofundadas do fenmeno, na criao de cate-gorias conceituais para ilustrar, defender ou desafiar pressu-postos tericos ou para explicar os fenmenos.

    O entendimento do fenmeno pode depender de uma boaescolha do caso. Por isso, foi escolhido um caso com o qual sepodia aprender mais ao se realizar o estudo (Stake, 1994). Ogrupo pesquisado, composto por vinte e uma pessoas, faziaparte do setor administrativo-financeiro de uma empresa degrande porte do setor metal-mecnico gacho. A escolha sedeu com base em dois critrios, um de carter conceitual e

  • 146

    Anlise, Porto Alegre, v. 17, n. 1, p. 139-166, jan./jul. 2006

    Duha, A.H. & Seminotti, N.A.

    outro tcnico, de fundo operacional. O primeiro se refere aoprprio conceito de efetividade proposto por Katzenbach eSmith (1993), que procura identificar a qualidade do resulta-do final do trabalho da equipe. Com base neste critrio, bus-cou-se identificar uma equipe que trouxesse resultados efeti-vos para a organizao. O segundo critrio refere-se possi-bilidade operacional dos pesquisadores de acompanharefetivamente o trabalho da equipe durante um longo perodode tempo para poder coletar os dados necessrios para oestudo.

    Os dados foram coletados no prprio local de trabalho daequipe estudada. Trs tcnicas de coleta de dados foramutilizadas na pesquisa. A primeira foi a anlise dos documen-tos relativos s prticas e polticas da organizao; a segun-da foi a observao participante de doze reunies e encon-tros da equipe pesquisada ao longo de um ano e a terceira foium conjunto de entrevistas individuais em profundidade comcada um dos membros da equipe. Com isso, pretendeu-secoletar informaes sobre a organizao e o funcionamentoda equipe, assim como, a percepo dos participantes destesfenmenos.

    O mtodo de anlise dos dados utilizado foi a anlise decontedo, que resultou em uma descrio objetiva, sistemti-ca e qualitativa do contedo manifesto das comunicaes. Aseguir, os dados foram interpretados com a finalidade defazer inferncias que culminaram em uma generalizao maisabrangente (Serrano, 1994; Bauer, 2002).

    Segundo Yin (2001), quatro testes costumam ser utiliza-dos para determinar a qualidade de uma pesquisa socialemprica: validade de construto, validade interna, validadeexterna e confiabilidade. Para obter a validade do construtoforam utilizadas fontes de evidncia diferentes e o relatriofinal de pesquisa foi submetido a alguns dos participantesque faziam parte da equipe em estudo; para a validade inter-na foi utilizada a tcnica da construo da explanao; paraestabelecer o domnio pelo qual os resultados da pesquisapodiam ser generalizados, os pesquisadores tiveram comofoco a busca de generalizaes essencialmente analticas; epara assegurar a confiabilidade, minimizando os erros e vi-ses tendenciosas do pesquisador, foi elaborado um cuidado-so protocolo de estudo de caso.

  • 147

    Anlise, Porto Alegre, v. 17, n. 1, p. 139-166, jan./jul. 2006

    Organizao de equipes efetivas: estudo ...

    4 Anlise dos dadosCom base nas questes de pesquisa que foram definidas

    para dar um direcionamento a este trabalho, os dados seroanalisados atravs de cinco categorias capazes de ajudar acompreender como se organizam as equipes de trabalho efe-tivas no ambiente organizacional. A primeira se refere ca-racterizao do espao psicolgico ou espao vital criadopela equipe e seus gestores, ou seja, as representaes dasrelaes estruturais nos indivduos assim como de seu am-biente psicolgico. A segunda est relacionada forma comoos membros da equipe lidam com o conflito entre a liberdadeindividual e a operatividade grupal, por sua vez, como osindivduos e o grupo lidam com o conflito entre a liberdadedo grupo e a operatividade organizacional. A terceira buscademonstrar como se configura o sistema de tenses dentroda equipe e o processo de estabelecimento de objetivos. Aquarta se refere s principais locomoes, barreiras, conflitose mudanas estruturais que ocorreram na equipe a partir deum processo de reflexo sobre a tarefa. A quinta e ltimaprocura demonstrar como as equipes podem satisfazer asnecessidades de seus membros.

    4.1 Caracterizao do espao vitalA anlise dos dados ser iniciada fazendo uma breve

    contextualizao da empresa onde a equipe estava inserida,visto que a estruturao e os processos do grupo demonstra-ram possuir uma relao direta com as caractersticasorganizacionais e o momento de mudana pela qual estavapassando a empresa naquele momento. Estas informaesso capazes de caracterizar o espao psicolgico ou espaovital criado pelo grupo no incio dos trabalhos.

    A empresa da pesquisa, que detm uma grande fatia domercado de peas automotivas, vinha passando por dificul-dades financeiras nos ltimos anos, o que levou venda docontrole acionrio para outros investidores e fundos de pen-so administrados por grandes bancos nacionais. Capaz deproduzir produtos com elevada qualidade, a empresa vinha,cada vez mais, adotando estratgias para a reduo dos cus-tos e para o aumento da produtividade nas suas linhas demanufatura e reas de apoio. Uma organizao com uma

  • 148

    Anlise, Porto Alegre, v. 17, n. 1, p. 139-166, jan./jul. 2006

    Duha, A.H. & Seminotti, N.A.

    cultura caracteristicamente familiar, onde os cargos mais im-portantes costumavam ser ocupados por pessoas de confian-a dos diretores, mas que nem sempre possuam a competn-cia requerida para desempenhar a funo. Detentora de umatecnologia de produo em grande escala, mas que, ao mes-mo tempo, exigia elevados investimentos para provocar asmudanas necessrias e atender os objetivos organizacionais.A empresa tambm costumava adotar prticas de gerencia-mento de recursos humanos voltadas para a valorizao indi-vidual em detrimento do trabalho em equipe, remunerandoas pessoas pelo cargo que ocupavam e avaliando o desempe-nho com base na tarefa atribuda a cada indivduo.

    Dentro deste contexto, o setor administrativo-financeirotambm estava sofrendo grandes modificaes estruturaisna busca de melhoria na qualidade dos servios prestados ereduo dos custos fixos e do quadro de pessoal. Duas novasreas foram incorporadas ao setor trazendo com isso um anti-go diretor, que perdera o cargo de chefia e passara a atuarem atividades tcnico-administrativas, assim como uma re-duo significativa no nmero total de funcionrios. Paragerenciar a rea, foi sugerido que o antigo chefe do setor fossesubstitudo por uma jovem contadora que havia passado poruma srie de treinamentos de capacitao gerencial e apresen-tava um elevado potencial de liderana. Esta sugesto, acatadacom muita relutncia pela direo da empresa, ia contra a tradi-o da empresa familiar de colocar em cargos de chefia apenaspessoas mais velhas e normalmente do sexo masculino.

    Passado um ano dessas modificaes iniciais, o setor con-tinuava apresentando resultados pouco satisfatrios: cons-tantes atrasos, baixa qualidade nos servios prestados e ele-vado nmero de erros e retrabalho. As causas estavam sendoatribudas baixa qualificao do pessoal e falta de compe-tncia da chefia (conforme relato da direo). O grupo estavadesmotivado, com brigas entre colegas, levando a demissese transferncias de setor.

    Para solucionar esses problemas, foi implementado umprograma de formao e desenvolvimento de equipes, co-ordenado por uma empresa de consultoria responsvel peloprocesso de reestruturao organizacional. Aps um ano deencontros, treinamentos e adoo de novos mtodos de tra-balho, o desempenho do grupo ainda continuava baixo; au-

  • 149

    Anlise, Porto Alegre, v. 17, n. 1, p. 139-166, jan./jul. 2006

    Organizao de equipes efetivas: estudo ...

    mentava a descrena na empresa de consultoria e na capacida-de do gestor de modificar a realidade. Durante este perodo, osproblemas do grupo ficaram conhecidos por todos na empresa,afetando fortemente o humor e a auto-estima dos envolvidos.

    Numa nova tentativa para resolver os problemas e formaruma equipe de trabalho efetiva, o novo gerente convidou ospesquisadores para acompanhar um conjunto de reuniesque estava planejando para o grupo, num processo de refle-xo sobre os possveis problemas que estavam ocorrendo nosetor, a fim de buscar um melhor alinhamento entre os objeti-vos do grupo e os objetivos organizacionais.

    4.2 Conflitos, liberdade grupal e operatividadeAcompanhados pelos pesquisadores, os primeiros encon-

    tros realizados pelo grupo foram utilizados para discutir ossentimentos de cada participante em relao aos colegas, aosetor e organizao. Eles demonstravam uma clara percep-o dos conflitos existentes no grupo e seu impacto no traba-lho que deveriam realizar. Os participantes pareciam trazerduas grandes mgoas oriundas dos trabalhos que tinhamsido feitos pela empresa no ano anterior. A primeira delasestava relacionada imposio de algumas regras e procedi-mentos padronizados de trabalho que foram definidos pelaorganizao e que alteravam algumas prticas anteriormenteadotadas pelo setor. A segunda estava ligada a um conjuntode tcnicas e dinmicas utilizadas pela empresa para esti-mular a troca de feedbacks entre os integrantes do grupocom o intuito de eliminar os conflitos, mas que gerou inimiza-des e o mal falado [...] hbito de se dizer abertamente o quese estava sentindo em relao aos outros e s situaes.

    Os depoimentos demonstraram que frente percepo doconflito os participantes passaram a adotar comportamentosmenos maduros (agresses, dissimulaes, resistncia passi-va, etc.) ou de fuga na tentativa de alcanar os seus objeti-vos, ou seja, manter a sua liberdade individual. Para impedira regresso e evitar que os participantes fizessem um deslo-camento dos conflitos para a esfera pessoal, o gestor passoua estimular uma interao espontnea e aberta entre os par-ticipantes logo nos primeiros encontros; no havia a preocu-pao de administrar os conflitos existentes, mas com o in-

  • 150

    Anlise, Porto Alegre, v. 17, n. 1, p. 139-166, jan./jul. 2006

    Duha, A.H. & Seminotti, N.A.

    tuito de deixar clara a existncia destes conflitos, suas di-menses e o seu impacto no trabalho do grupo.

    Nos encontros que se seguiram, o gestor parecia ter dei-xado de lado os conflitos que foram externalizados nos en-contros anteriores e passou a direcionar o foco da discussopara a busca de um consenso a respeito do propsito princi-pal do grupo, ou seja, o que os caracterizaria como um gruponico dentro da organizao com uma funo especfica. Nasprimeiras definies ficou claro que as pessoas no tinhamuma noo sobre o que as tarefas que realizavam tinham emcomum, definindo o propsito do grupo como o resultado deuma atividade especfica desempenhada por algum ou poralguma parte do setor. As longas discusses que se segui-ram provocaram um aumento da diferenciao e diferentescombinaes do espao vital de cada um dos componentesdo grupo, fazendo com que eles adotassem uma perspectivamais ampla e sistmica em relao ao seu trabalho.

    O processo levou-os a concluir que o propsito do grupodeveria ser algo que representasse a soma de todas as tare-fas realizadas pelos seus componentes e que fosse importan-te para a empresa. Este exerccio reflexivo fez com que osindivduos no apenas definissem um propsito comum parao grupo, mas tambm que pudessem identificar a relao desuas tarefas com as dos outros componentes, assim como acontribuio do seu trabalho para o resultado final do setor.O conflito, embora latente, perdeu a fora de atrao que atento possua, modificando a estrutura do campo vital decada um dos participantes. A influncia externa na definiode objetivos a serem perseguidos pelos indivduos e pelaequipe no foi percebida como uma forma de tolher a liberda-de do grupo, pois ela foi acolhida como uma alternativa ca-paz de minimizar os conflitos existentes.

    Durante este processo, o gestor parecia demonstrar umagrande preocupao de que tudo aquilo que estava sendodefinido pelo grupo pudesse estar alinhado com as necessi-dades ou objetivos organizacionais. Toda vez que um dosparticipantes gerava uma idia que o gestor no consideravaapropriada, este procurava fazer consideraes, correes ouat mesmo evitava que o assunto tomasse um direcionamentoerrado, afirmando que aquilo no seria aceito pela organiza-o: No isso que eles esperam de ns, dizia o gestor. O

  • 151

    Anlise, Porto Alegre, v. 17, n. 1, p. 139-166, jan./jul. 2006

    Organizao de equipes efetivas: estudo ...

    grupo parecia no se opor ao direcionamento do lder, consi-derando-o porta-voz da empresa naquelas discusses. Estaatribuio de papel fornecida pelo grupo permitiu que o gestorcolocasse um grande nmero de barreiras que impediram cer-tas locomoes e direcionaram a reestruturao do espao vitaldos componentes do grupo, sem, com isso, gerar uma percep-o de perda da liberdade por parte de seus integrantes.

    Uma outra preocupao do gestor durante este perodoparecia estar centrada mais em aspectos motivacionais dogrupo do que propriamente na definio do seu propsito.Toda vez que algum se referia a alguma tarefa realizadapelo grupo como algo simples e de pouca importncia, eleprocurava salientar os aspectos positivos do trabalho ou pro-porcionava um panorama do que estas tarefas poderiam setornar no futuro. Este comportamento parecia contribuir paraa aceitao de um propsito comum, visto que alguns partici-pantes que no conseguiam perceber a importncia das suasatividades para o desempenho do grupo no presente, podiamvislumbrar a importncia que elas poderiam vir a ter para ogrupo no futuro. Este comportamento do gestor possibilitouuma reestruturao de determinadas regies do espao vitalde alguns dos participantes, que seriam capazes de aumentaros conflitos entre a liberdade individual e a operatividade dogrupo. A preocupao do gestor estava em se certificar de quetodos pudessem encontrar objetivos pessoais que estives-sem estar alinhados aos objetivos do grupo e da organizao.

    Como foi salientado anteriormente, nestes encontros ini-ciais foi bastante discutido o comportamento de alguns mem-bros do grupo e os problemas de relacionamento ocasiona-dos pelas tcnicas de feedback utilizadas no passado pelaempresa. A preocupao no parecia estar focada naquiloque ocorrera no passado, mas principalmente, nos comporta-mentos que deveriam ser adotados no futuro por todos osintegrantes do grupo. Os membros do grupo pareciam bus-car com grande empenho alguns objetivos a serem comparti-lhados por todos os colegas para que os conflitos entre elesfossem eliminados. Durante este perodo, o gestor procuroudeixar claro que, os problemas que pareciam ser pessoais,estavam, de alguma maneira, relacionados aos processos edemandas do trabalho. Aproveitando as mudanas que esta-vam ocorrendo no campo vital dos participantes decorrente

  • 152

    Anlise, Porto Alegre, v. 17, n. 1, p. 139-166, jan./jul. 2006

    Duha, A.H. & Seminotti, N.A.

    da diminuio da fora ou tenso relacionada aos objetivosindividuais, o gestor passou a sugerir modificaes nestesobjetivos, despersonalizando-os e relacionando-os s tarefasa serem realizadas pelo grupo. Ou seja, atravs de suas cont-nuas intervenes durante as reunies, o gestor aumentou afora de atrao de determinadas sub-regies no espao vitaldos sujeitos, modificando o sistema de tenso e conseqen-temente a capacidade de atrao de determinados objetivos.

    Em alguns momentos onde a modificao de objetivosno pareceu funcionar, o gestor passou a apresentar objeti-vos substitutos capazes de diminuir ainda mais os conflitosentre a liberdade dos indivduos e a operatividade do grupoem direo quilo que era desejado pela organizao. Noincio, as discusses estavam voltadas apenas para as suges-tes que surgiam dentro do prprio grupo em relao aosobjetivos e princpios que deveriam ser adotados por todos,mas logo a discusso comeou a incluir os princpios e objeti-vos adotados (e amplamente divulgados) pela empresa. Al-guns participantes chegaram a sugerir que no deveriam serdefinidos princpios especficos para o grupo, e sim que fos-sem seguidos apenas os princpios da empresa, mas a maio-ria preferiu fazer uma mistura entre aqueles definidos pelaorganizao e outros que surgiram dentro do grupo.

    Durante toda a pesquisa, o gestor demonstrou ser umgrande influenciador nestas discusses e tambm nas defini-es finais do grupo. Falando em nome da organizao, eleprocurava caracterizar o profissional ideal que a empresaestava buscando e quais as caractersticas que fariam dife-rena nas futuras promoes. Costumava trazer exemplos deoutras pessoas que tiveram sucesso na organizao ou queestavam participando de programas de capacitao gerencialoferecidos pela empresa. Por ocupar o cargo de chefia hpouco tempo e ser ainda muito jovem (em comparao aosdemais gestores), ele parecia estar falando de seus valorespessoais ao sugerir algum princpio que deveria ser includona lista que estava sendo continuamente revisada pelo gru-po. Com isso, o gestor conseguia aumentar a tenso em rela-o aos objetivos considerados importantes para a organiza-o, ou seja, a magnitude da fora em direo a estes objeti-vos passava a ser ainda maior do que qualquer fora (objeti-vo individual) que pudesse existir em um sentido contrrio.

  • 153

    Anlise, Porto Alegre, v. 17, n. 1, p. 139-166, jan./jul. 2006

    Organizao de equipes efetivas: estudo ...

    A equipe conseguiu organizar-se de modo eficaz, elimi-nando os possveis conflitos existentes entre a liberdade in-dividual e a operatividade do grupo. Como pode ser vistopelos dados coletados, isto ocorreu, pois desde a formaoda equipe, a organizao passou a influenciar na definio efortalecimento dos objetivos atravs das contnuas interven-es do seu gestor. Embora os conflitos tenham sido percebi-dos desde o incio, os indivduos no os consideram comoalgo ocasionado pelo cerceamento da liberdade individual oudo grupo, mas como um problema de relacionamento inter-pessoal. Com isso, os indivduos facilmente estabeleceramum alinhamento entre seus objetivos e os definidos ou espe-rados pela organizao.

    Representando graficamente (Figura 1) a influncia exter-na de fatores organizacionais na organizao de uma equipede trabalho efetiva, no que tange eliminao de conflitosentre a liberdade individual e a operatividade do grupo pode-mos apontar que ela ocorre em trs momentos diferentes:1) quando o gestor aumenta a diferenciao do espao vitalatravs das discusses abertas no grupo; 2) quando ele (en-quanto representante da empresa) coloca barreiras a deter-minadas locomoes; e 3) quando provoca modificaes nosobjetivos ou sugere objetivos substitutos a serem adotadospelo grupo.

    Percepo de Conflito

    Aumento da Diferenciao

    Reestruturao de Regies

    Colocao de Barreiras

    Modificao de Objetivos

    Objetivos Substitutos

    Reestruturao Espao Vital

    Regresso

    Modificao do Espao Vital

    Figura 1 Eliminao de conflitos entre liberdade individual eoperatividade do grupo

  • 154

    Anlise, Porto Alegre, v. 17, n. 1, p. 139-166, jan./jul. 2006

    Duha, A.H. & Seminotti, N.A.

    4.3 Tenses no grupo e estabelecimento de objetivosDurante os trabalhos pde ser identificado um conjunto

    de foras capazes de caracterizar o sistema de tenso vividopelo grupo naquele momento. Fazem parte deste campo deforas: os objetivos distintos das pequenas reas que com-pem o setor, os objetivos individuais dos participantes, a alter-nncia de objetivos do grupo e a apatia e ceticismo de algunsparticipantes do grupo em relao aos objetivos traados.

    Desde o incio dos trabalhos pode ser facilmente percebi-do pelos pesquisadores que havia uma competio acirradaentre as diferentes reas do setor. A mais facilmenteidentificada era uma competio entre os integrantes de duasreas distintas do setor administrativo-financeiro: a reacontbil e a financeira. Cada uma querendo demonstrar queas suas atribuies eram mais importantes do que as daoutra e, portanto, deveriam ser considerados a rea centraldo setor e ter mais poder nos processos decisrios e no esta-belecimento de objetivos. Esta competio ficou ainda maisacirrada a partir do momento em que os integrantes do gru-po comearam a discutir os objetivos a serem alcanados porcada uma das reas e pelo setor como um todo, pois amelhoria do trabalho de um dependia da melhoria do traba-lho do outro e vice-versa.

    Um outro tipo de competio que ficou evidente desde oincio dos trabalhos foi a disputa pela liderana do setorentre trs componentes do grupo. De um lado a nova gestora- uma mulher jovem com boa formao e proximidade com afamlia detentora do controle acionrio da empresa, e do ou-tro lado um antigo gestor que fora transferido para o setoradministrativo-financeiro e perdera o cargo de chefia. O ter-ceiro a entrar nesta disputa pelo poder no grupo era um doscomponentes da rea financeira, que era bastante jovem etambm com excelente formao acadmica. Esta competi-o tambm podia ser considerada uma luta de poder entre ogrupo de pessoas mais velhas aqueles que cresceram coma empresa e possuam experincia prtica e os mais jovens que fizeram curso superior e j foram contratados especifi-camente para aquela funo.

    Inicialmente, ficava evidente que os trs competiam entresi querendo dar a ltima palavra nas discusses, sendo mais

  • 155

    Anlise, Porto Alegre, v. 17, n. 1, p. 139-166, jan./jul. 2006

    Organizao de equipes efetivas: estudo ...

    eloqente do que o outro ou demonstrando ter mais conheci-mento sobre a empresa ou sobre determinado assunto. En-tretanto, durante os trabalhos a dinmica da competio en-tre eles se modificou. A luta pelo poder se polarizou entre osdois colaboradores que procuravam manter o gestor do seulado atravs de conversas laterais, negociaes individuais edemonstrao de apoio explcito. Este processo do grupo for-taleceu a posio de liderana e poder do gestor, visto que asduas pessoas mais influentes procuravam demonstrar aber-tamente para os demais que eles pensavam exatamente damesma maneira do que a chefia. Isto facilitou a definio dosobjetivos e dos critrios que seriam utilizados para a avalia-o do desempenho do grupo.

    Outro aspecto que pode ser observado no grupo foi umacerta apatia de alguns elementos e o ceticismo de outrosquanto possibilidade do trabalho da equipe ter sucesso.Algumas pessoas comentavam que no sabiam o que erarealmente relevante para o setor e sentiam que algumas dasatividades que eles realizavam no agregavam valor algumao trabalho do grupo; comentrios como [...] atividades queno agregam valor so realizadas enquanto aquilo que realmente relevante deixado de lado eram comuns. Outrosno conseguiam perceber como os objetivos das reas estavaminterligados e como cada um deles poderia contribuir paraque o grupo pudesse fazer aquilo que era esperado deles.

    Para diminuir as tenses dentro do grupo e possibilitarque as metas resultantes desse campo de foras estivessemde acordo com os interesses organizacionais, o gestor passoua discutir os objetivos de cada uma das pessoas ou reas dosetor com a participao de todos os componentes da suaequipe. Este processo aumentou a diferenciao e possibili-tou outras combinaes capazes de modificar a estrutura docampo vital dos indivduos e do grupo, visto que todos pude-ram melhor compreender as peculiaridades de cada rea,bem como descrever claramente o papel e a responsabilida-de de cada membro do grupo. Acima de tudo, parecia que aspessoas comearam a conhecer, a partir daquele momento, oque esperar de seus colegas de trabalho e como avaliar a suacontribuio (desempenho).

    Este processo tambm possibilitou que o gestor modifi-casse a valncia de determinados vetores, fazendo com que

  • 156

    Anlise, Porto Alegre, v. 17, n. 1, p. 139-166, jan./jul. 2006

    Duha, A.H. & Seminotti, N.A.

    algumas sub-regies (metas) se tornassem mais atrativas doque outras. Com o intuito de diminuir as tenses no grupo ogestor estimulava a negociao entre pessoas e reas, dei-xando sempre claro quais os objetivos que a empresa iriavalorizar mais. Com isso, objetivos que no eram considera-dos relevantes passaram a ter uma importncia maior e ou-tros que eram anteriormente valorizados, passaram a no terimportncia alguma. A partir da definio desses objetivos ogestor comeou a adotar estratgias para aumentar a tenso(fora de atrao) relacionada a eles. Ele solicitava que osresultados alcanados por pessoas e reas fossem continua-mente apresentados aos demais componentes da equipe e aosconvidados pertencentes alta administrao da empresa.

    Uma representao grfica (Figura 2) da influncia exter-na de fatores ligados empresa na organizao de uma equi-pe de trabalho efetiva, no que tange diminuio das ten-ses do grupo e o estabelecimento de objetivos, pode serrealizada considerando trs momentos-chave: 1) quando ogestor aumenta a diferenciao do espao vital atravs dasdiscusses abertas no grupo; 2) quando ele modifica avalncia dos objetivos apontados pelo grupo; e 3) quando ele(como representante da empresa) aumenta a tenso relativade determinados objetivos.

    Sistema de Tenso

    Objetivos Pessoais

    Objetivos das Pequenas reas

    Falta de Objetivos

    Apatia e Ceticismo

    Modificao do Espao Vital

    Modificao da Valncia

    Reestruturao do Espao Vital

    Aumento da Diferenciao

    Aumento da Tenso

    Figura 2 Diminuio das tenses do grupo e estabelecimento de objetivos

    4.4 Locomoes, barreiras e mudanas estruturaisInicialmente, alguns integrantes resistiam em aceitar as

    idias geradas pelos outros colegas do grupo, mesmo quan-

  • 157

    Anlise, Porto Alegre, v. 17, n. 1, p. 139-166, jan./jul. 2006

    Organizao de equipes efetivas: estudo ...

    do no tinham uma melhor alternativa para solucionar osproblemas de sua rea. Com o passar do tempo alguns come-aram a modificar este comportamento. Eles pareciam nocompreender como deveriam proceder em determinadas si-tuaes e passaram a solicitar orientao do gestor ou dealgum outro membro do grupo, at mesmo sobre algumastarefas especficas de sua rea. Chegou um momento em queas discusses tinham como foco principal o estilo de trabalhode cada um, como as decises deveriam ser tomadas, o graude liberdade para provocar mudanas nos processos de tra-balho e a abrangncia do territrio de cada rea ou pessoa.Ficou evidente que aps a eliminao de conflitos marcantesentre a liberdade individual e a operatividade grupal e aps adiminuio das tenses no grupo atravs do estabelecimentode objetivos especficos, os integrantes da equipe passaram aexplorar os espaos ainda no-estruturados do seu campo vital.

    As constantes reflexes sobre as tarefas e as opinies doscolegas a respeito das alternativas para a realizao do tra-balho, fizeram vir tona um sentimento de inadequao dealgumas pessoas para atender s expectativas do grupo. Al-guns componentes explicavam por que no conseguiriam fa-zer determinada tarefa, outros salientavam os conhecimen-tos necessrios para a realizao de uma atividade que nocostumavam executar. Comearam a demandar mais infor-maes do gestor em relao a outras reas da empresa edemandar dos seus colegas informaes sobre as suas res-pectivas reas do setor administrativo-financeiro. A buscadestas informaes sobre a empresa e sobre o trabalho doscolegas e a constante troca de idias dentro do grupo possi-bilitou uma ampliao do espao de livre movimento dosparticipantes. Ou seja, as pessoas aumentaram a sua percep-o de quais as regies do espao vital eles poderiam acessar,quais a locomoes que seriam permitidas e quais as modifi-caes na estrutura do campo vital poderiam ser realizadas.

    Nos momentos de intervalo dos encontros que foram acom-panhados pelos pesquisadores, foi observado que vrios par-ticipantes vinham solicitar ao gestor informaes adicionaisou a liberao para realizar aes ou tomar decises. Eramfreqentes as perguntas sobre o que a empresa permitiria ouno fazer e se o gestor considerava que teriam o apoio dorestante da equipe para realizar modificaes nos processos

  • 158

    Anlise, Porto Alegre, v. 17, n. 1, p. 139-166, jan./jul. 2006

    Duha, A.H. & Seminotti, N.A.

    de trabalho. Eles, claramente, demonstravam estar testandoos limites do espao de livre movimento, isto , at ondepoderiam ir (locomoes) sem serem impedidos por barreirasimpostas pelo grupo ou pela organizao. Muitas vezes ogestor percebia que alguns componentes do grupo apresen-tavam comportamento de fuga frente a uma situao de con-flito gerada pela colocao de barreiras. Para evitar este com-portamento regressivo ele sempre levava a situao de con-flito para ser discutida no grande grupo delineando clara-mente as fronteiras do espao de livre movimento.

    Mais uma vez, a estratgia utilizada pelo gestor para in-fluenciar no processo de organizao da equipe para que elano perdesse a sua efetividade foi aumentar a diferenciaodo campo vital dos participantes. Ao envolver todos inte-grantes da equipe nas discusses sobre as metas e estratgiaspara cada rea, o gestor possibilitou o aumento, a combi-nao e a dissoluo de regies do seu espao vital. Emboraalguns membros do grupo achassem melhor que estas dis-cusses fossem realizadas pelos integrantes de cada reaseparadamente (devido ao aproveitamento do tempo e pelafalta de conhecimento tcnico de certas pessoas), o gestorestimulava que todos participassem, pois, segundo ele, des-ta forma todos ficavam sabendo at onde poderiam ir. Co-mentrios como [...] eles esto sempre me dizendo que nopodem fazer isto ou aquilo, mas eles tm liberdade para fazermuito mais do que eles imaginam. S no sabem disso,eram freqentes por parte do gestor.

    importante considerar a influncia externa na colocaode barreiras ao livre movimento do grupo. Ao mesmo tempoem que o gestor estimulava as discusses e possibilitava oaumento do espao de livre movimento, ele colocava ou refor-ava certas barreiras importantes para a organizao. O ob-jetivo do gestor era eliminar todas as barreiras consideradasdesnecessrias, deixando ou colocando apenas aquelas quea empresa considerava essenciais para que os objetivos fos-sem alcanados. Muitas destas novas barreiras eram coloca-das durante os processos de negociao de metas e estrat-gias entre duas ou mais reas. O gestor adotava o papel demediador dos conflitos, e com o intuito de dirimir determinadosimpasses, ele colocava o que poderia ser aceito ou no pelaempresa. Muitas vezes trazia exemplos de outros setores, de-

  • 159

    Anlise, Porto Alegre, v. 17, n. 1, p. 139-166, jan./jul. 2006

    Organizao de equipes efetivas: estudo ...

    monstrando como determinadas barreiras eram necessrias ouat mesmo desejadas para o bom funcionamento da empresa.

    Nos encontros destinados apresentao das metas eestratgias de cada rea o gestor procurava enfatizar acriatividade e a ousadia de determinadas pessoas, procuran-do deixar clara a acessibilidade de novas regies e as loco-moes que passaram a ser permitidas. Ele tambm tinha ohbito de convidar para estas apresentaes representantesda alta administrao, que recebiam previamente informa-es sobre possveis problemas e pontos de resistncia sbarreiras impostas. Com isso, ele levava o convidado a refor-ar a necessidade de respeitar os limites impostos pela orga-nizao e reforava a existncia de um grande espao delivre movimento que poderia ser acessado com o intuito detrazer melhores resultados para a empresa. Nestes encontrostambm era reforada a importncia dos objetivos, aumen-tando a tenso destes pontos no espao vital do grupo.

    Como podemos perceber a partir desta anlise, possvelrepresentar graficamente (Figura 3) a influncia externa defatores organizacionais no processo de organizao de umaequipe de trabalho efetiva, no que se refere colocao debarreiras e a definio do espao de livre movimento. ne-cessrio para tanto considerar trs momentos principais:1) quando o gestor aumenta a diferenciao do espao vitalatravs das discusses abertas no grupo; 2) quando ele (comorepresentante da empresa) coloca barreiras ao livre movi-mento no espao vital; e 3) quando ele aumenta a tensorelativa de determinados objetivos.

    Figura 3 Colocao de barreiras e definio do espao de livre movimento

    Espao No-Estruturado

    Testar Acesso a Regies Espao de Livre Movimento

    Reestruturao Espao Vital

    Acessibilidade e Locomoes

    Colocao de Barreiras

    Aumento da Tenso

    Regresso

    Aumento da Diferenciao

    Regresso

    Espao No-Estruturado

  • 160

    Anlise, Porto Alegre, v. 17, n. 1, p. 139-166, jan./jul. 2006

    Duha, A.H. & Seminotti, N.A.

    4.5 Operatividade e satisfao das necessidadesNos encontros finais, uma das grandes preocupaes do

    grupo passou a ser o cumprimento dos prazos e aimplementao das aes que haviam sido definidas. Emconversas individuais que ocorriam nos momentos de inter-valo alguns dos integrantes se mostravam preocupados como engajamento de todos, ou seja, desconfiavam do real com-prometimento dos seus colegas de trabalho. Nas discussesem grupo, o discurso girava em torno da necessidade decoordenao, controle e alinhamento entre as aes de todosos envolvidos para que os resultados fossem alcanados. Eramfreqentes as solicitaes para que o gestor colocasse novasbarreiras ao espao de livre movimento de algumas integran-tes do grupo. Com isso os participantes queriam garantir quesuas necessidades seriam satisfeitas.

    Para atender a esta solicitao em uma das reunies ogestor sugere a criao de um conjunto de planilhas paraacompanhamento e controle das atividades planejadas pelogrupo. Apenas alguns dos participantes contestaram a su-gesto, afirmando que a existncia de registros geraria maistrabalho e traria poucos resultados; para eles o que era preci-so era apenas maior conscientizao de todos os colegas dosetor. Entretanto, o grupo rapidamente sugeriu formas deregistro e controle, agendou reunies de trabalho e estabele-ceu prazos para a apresentao de resultados. Os objetivosindividuais estavam to alinhados com os objetivos organi-zacionais que os componentes do grupo no percebiam queas barreiras impostas se interpunham entre a pessoa e asatisfao de suas necessidades.

    Mesmo durante os ltimos encontros, foram acompanha-dos pelos pesquisadores, ainda podia ser percebido que de-terminados integrantes do grupo consideravam que suas ne-cessidades no poderiam ser satisfeitas com o trabalho queestava sendo realizado, visto que seus objetivos pessoaisno estavam totalmente alinhados com os objetivos defini-dos pelo grupo. Toda vez que isto era verbalizado por algumou era percebido pelo gestor devido ao comportamento dealgum integrante da equipe (demonstrao de apatia, ceti-cismo ou competio irrelevante), ele parava o trabalho detodos e solicitava uma reunio para discutir coletivamente osobjetivos individuais. Esta estratgia permitia a colaborao

  • 161

    Anlise, Porto Alegre, v. 17, n. 1, p. 139-166, jan./jul. 2006

    Organizao de equipes efetivas: estudo ...

    de todos os participantes na modificao de certos objetivosou na substituio dos mesmos por outros mais alinhadosaos objetivos do grupo. O propsito do gestor, segundo seusdepoimentos, era que todos pudessem satisfazer algumas desuas necessidades ao trabalhar no grupo.

    Uma preocupao que surgiu naquele momento tinha re-lao com a sobrecarga de trabalho de todos os envolvidos.Embora as pessoas estivessem satisfeitas com os resultadosalcanados, algumas comearam a verbalizar sua preocupa-o com o excesso de horas de trabalho e com o cansao dealguns colegas. Em um dos ltimos debates, o grupo ficoupolarizado entre aqueles que defendiam maior padronizaodos processos de trabalho para evitar a sobrecarga, enquan-to outros defendiam a manuteno da flexibilidade de cadauma das reas para melhor atender as diferentes demandasque poderiam surgir a partir das necessidades das outrasreas da empresa. Pelos depoimentos dos participantes, du-rante todo o andamento do trabalho parecia haver uma gran-de preocupao com a manuteno de um espao de livremovimento que pudesse ser acessado pelos indivduos, masao mesmo tempo uma grande preocupao com a diminuiodas tenses dentro do grupo.

    Quando este sentimento ficou mais forte e passou a serum tema recorrente nos encontros do grupo, o gestor come-ou a criar oportunidades para que o grupo pudesse divulgaros seus resultados e sua abordagem de trabalho para o res-tante da empresa. Surgiram vrios comentrios de como eleshaviam contribudo com outros setores da empresa ao com-partilhar suas experincias e o gestor passou a convidar pes-soas de outros departamentos para participar dos encontrosdo grupo. Pessoas de outras reas passaram a desejar traba-lhar no setor e isto fez com que a percepo de vrios inte-grantes fosse modificada. Um participante comenta que: [...]posso avaliar o desempenho do setor pelo desejo de outraspessoas (de outras reas e setores) em trabalhar conosco.Provocar este desejo sinal que estamos transmitindo algode bom no nosso relacionamento e com o nosso trabalho.

    Durantes as ltimas reunies os integrantes do grupo uti-lizavam grande parte do tempo para comunicar aos demaissobre o andamento dos trabalhos e para buscar um melhoralinhamento entre as diferentes tarefas das vrias reas do

  • 162

    Anlise, Porto Alegre, v. 17, n. 1, p. 139-166, jan./jul. 2006

    Duha, A.H. & Seminotti, N.A.

    setor. Podia ser observado que, quando uma rea apresenta-va seu relatrio, as outras teciam comentrios, davam suges-tes e apontavam a relao que aquela tarefa (e seus resulta-dos) tinha com uma atividade da sua rea. Alguns demons-travam surpresa em saber que depois de tanto tempo traba-lhando juntos no setor administrativo-financeiro, ainda noconheciam as interligaes (relaes de interdependncia)entre as vrias atividades do setor. Pde-se observar tam-bm que algumas reas e pessoas tiveram o status aumenta-do enquanto outras perderam espao e poder. O gestor apro-veitava estes momentos para trazer novas informaes edirecionamentos da empresa, aumentando a diferenciaodo espao vital dos participantes e possibilitando que hou-vesse uma renovao constante no trabalho.

    5 Consideraes finaisO estudo apresentou como principal concluso que as

    equipes de trabalho efetivas, embora se organizem ao redorde objetivos, papis, regras e procedimentos que so exter-namente definidas pela organizao, no o fazem diretamen-te a partir de aspectos ligados tarefa, mas atravs dosfatores humanos e relacionais. Principalmente atravs dassucessivas explanaes, intervenes e manipulaes doslderes formais e informais existentes dentro do grupo.

    Para que se possa melhor compreender a atuao do gestorcomo representante dos anseios organizacionais na condu-o de seu grupo de trabalho, ser utilizado um modeloexplicativo (Figura 4) capaz de demonstrar como e quandoele atua na organizao de uma equipe de trabalho efetiva.

    Aumento da Diferenciao e Combinaes

    Aumento da Tenso dos Objetivos

    Modificao da Valncia

    Colocao de Barreiras

    Evitar a Regresso

    Modificao de Objetivos

    Figura 4 Influncia do gestor na formao de equipes de trabalho efetivas

  • 163

    Anlise, Porto Alegre, v. 17, n. 1, p. 139-166, jan./jul. 2006

    Organizao de equipes efetivas: estudo ...

    Primeiramente, o gestor aumenta a diferenciao do es-pao vital dos participantes, atravs da gerao de discus-ses, do estmulo troca de idias e do repasse de informa-es. Em alguns momentos, ele proporciona o aumento donmero de sub-regies, em outros ele sugere combinaesde regies que estavam separadas ou estimula a dissoluode regies em outras sub-regies. Esta reestruturao docampo vital dos participantes cria a sensao de um aumen-to do espao de livre movimento e de que existe a possibili-dade de satisfazer as suas necessidades participando do gru-po de trabalho. Eles passam a testar as barreiras, eliminandoalgumas e substituindo outras, fazem locomoes e experi-mentam a sensao de que muitos conflitos aparentes deixa-ram de existir. Esta experincia gera nos integrantes do gru-po a necessidade de saber claramente quais os seus objeti-vos e quais as fronteiras ao livre movimento.

    O aumento da diferenciao do espao vital do grupo leva gerao de um grande nmero de possveis objetivos aserem perseguidos pelos seus integrantes. Isto permite queo gestor direcione (influencie) o grupo para que escolhamobjetivos que estejam mais alinhados s necessidadesorganizacionais. Ele modifica a valncia de alguns objetivos,sugerindo que alguns devem ser considerados positivos en-quanto outros devem ser vistos como negativos pelo grupo.Quando os participantes tm dificuldade de escolher objeti-vos adequados para empresa, ele sugere modificaes nosobjetivos que foram sugeridos, tornando-os mais alinhadoscom os requeridos pela organizao, ou, at mesmo, propeque estes objetivos sejam substitudos por outros que nohaviam sido considerados anteriormente. Dessa forma o gru-po no percebe que os seus objetivos foram impostos pelaempresa, mas que eles representam os anseios do prpriogrupo para satisfazer algumas das necessidades de seus in-tegrantes.

    O gestor aproveita este momento e, assumindo o papel derepresentante da empresa, impe algumas barreiras que sodesejadas pela organizao, sugere outras que ele mesmoconsidera adequadas e adota algumas que so apontadaspelo prprio grupo. Os integrantes do grupo assumem estasbarreiras como algo normal ou at mesmo desejado por eles,com o intuito de conseguirem satisfazer algumas de suas

  • 164

    Anlise, Porto Alegre, v. 17, n. 1, p. 139-166, jan./jul. 2006

    Duha, A.H. & Seminotti, N.A.

    necessidades (atingir seus objetivos). Entretanto, frente aosconflitos gerados pela percepo de novas barreiras, al-guns indivduos tendem a adotar comportamentos de fuga(evitao do conflito) ou mais regressivos (agresses, dissi-mulaes, resistncia passiva, etc.). O gestor impede estescomportamentos desviantes atravs da discusso aberta ecoletiva de todas as situaes identificadas, sejam elas decarter pessoal ou coletivo. Os indivduos so obrigados aencontrar solues alternativas, ajustar os seus objetivos ouaumentar a tenso (intensidade da fora) relacionada aosobjetivos desejados pela organizao ou pelo grupo.

    Por fim, o gestor adota estratgias para aumentar a ten-so dos objetivos que so importantes para a organizao.Ele realiza encontros para a apresentao dos resultados al-canados pelo grupo, reconhece publicamente aqueles queso considerados mais importantes e obtm o apoio da altaadministrao da empresa para reforar seus direcionamen-tos. Ao mesmo tempo em que refora alguns objetivos, ogestor procura deixar clara a manuteno de uma grandezona de livre movimento que compe o espao vital do grupoe de seus participantes. Sugere tambm que a existncia debarreiras e objetivos especficos importante para a diminui-o das tenses dentro do grupo e, conseqentemente, paraque todos possam satisfazer suas necessidades.

    importante salientar que este estudo se props apenasa investigar como uma equipe efetiva se organiza, com basena teoria psicolgica de Kurt Lewin, aumentando a compre-enso sobre a natureza e funcionamento das equipes e ge-rando novos conhecimentos que permitam o seu desenvolvi-mento. O trabalho no se prope a trazer novos elementos teoria topolgica de Kurt Lewin e nem a questionar seuspressupostos.

    Embora o trabalho esteja voltado ao estudo das equipes,ele tambm no se prope a servir de base para uma genera-lizao para todas as equipes inseridas nas organizaes.Busca-se, no entanto, trazer novos elementos e reflexes paraa teoria das equipes, para que o leitor interessado possaanalisar a sua prpria realidade e identificar as diferenas esemelhanas com o estudo que ser realizado, decidindo porsua generalizao.

  • 165

    Anlise, Porto Alegre, v. 17, n. 1, p. 139-166, jan./jul. 2006

    Organizao de equipes efetivas: estudo ...

    importante tambm salientar que este estudo poderestar sujeito a outras interpretaes, visto que foi utilizadoapenas uma das diferentes teorias existentes sobre grupospara realizar a anlise dos dados. Um outro fator que limitaos resultados alcanados neste trabalho so as prprias ques-tes de pesquisas trazidas pelos autores, que limitaram oescopo do estudo, assim como definiram o que seria conside-rado na anlise e o que ficaria de fora.

    Embora ciente das limitaes deste estudo, seja por suaabrangncia ou devido ao mtodo de pesquisa que foi utiliza-do, acredita-se que os resultados podero ser de grande valiapara a pesquisa acadmica e para a literatura neste campo.O fato de ser uma pesquisa em psicologia aplicada tambmpermite que os resultados encontrados sejam diretamenteutilizados na prtica, proporcionando benefcios visveis paraas organizaes, em especfico, e para a sociedade em geral.

    Cabe salientar a grande valia deste estudo para a rea docomportamento organizacional, visto a importncia que asequipes tm no desempenho das empresas. Atravs destapesquisa, possvel identificar os limites da auto-organiza-o das equipes inseridas nas organizaes, apontando paraos elementos externos capazes de influenciar positivamenteou negativamente no seu funcionamento. Com isso, as orga-nizaes sero capazes de melhor definir seus objetivos, re-gras e procedimentos com o intuito de facilitar a criao deequipes de trabalho mais efetivas.

    Por sua vez, este estudo tambm capaz de trazer novosconhecimentos e reflexes para a psicologia dos grupos, umavez que pouco se conhece sobre a organizao dos gruposinseridos nas organizaes. As equipes, enquanto gruposque possuem caractersticas especficas, ainda so pouco es-tudadas na rea da Psicologia Social no Brasil, possibilitandoa gerao de novos conhecimentos luz de teorias j consa-gradas nesta rea do saber.

    6 RefernciasBAUER, M. Anlise de contedo clssica: uma reviso. In: Pesquisa qualitativacom texto, imagem e som: um manual prtico. Petrpolis: Vozes, 2002. p. 189-217.DREXLER, A.; SIBBET, D.; FORRESTER, R. The team performence model.California: Grove International, 1996.

  • 166

    Anlise, Porto Alegre, v. 17, n. 1, p. 139-166, jan./jul. 2006

    Duha, A.H. & Seminotti, N.A.

    GONZLEZ, P. Orientaciones tericas fundamentales em psicologa de los gru-pos. Barcelona: EUB, 1997.GONZLEZ, P.; SILVA, M.; CORNEJO, J. Equipos de trabajo efetivos. Barcelo-na: EUB, 1996.HARVEY, D. Condio ps-moderna. So Paulo: Loyola, 1999.JOHNSON, D.; JOHNSON, F. Joining together: group theory and group skills.Boston: Allyn and Bacon, 1997.KATZENBACH, J. Equipes campes: desenvolvendo o verdadeiro potencial deequipes e lderes. Rio de Janeiro: Campus, 2001.KATZENBACH, J.; SMITH, D. The wisdom of teams. Boston: Harper Collins,1993.______. Equipes de alta performance: conceitos, princpios e tcnicas parapotencializar o desempenho das equipes. Rio de Janeiro: Campus, 2001.LEWIN, K. Teoria de campo e cincia social. So Paulo: Pioneira, 1965.______. Princpios de psicologia topolgica. So Paulo: Cultrix, 1973.______. Teoria dinmica da personalidade. So Paulo: Cultrix, 1975.______. Problemas de dinmica de grupo. So Paulo: Cultrix, 1978.MANZ, C.; SIMS, M. Empresas sem chefes! So Paulo: Makron Books, 1996.NADLER, D.; GERSTEIN M.; SHAW R. Arquitetura organizacional: a chavepara a mudana empresarial. Rio de Janeiro: Editora Campus, 1993.PARKER, G. O poder das equipes: um guia prtico para implementar equipesinterfuncionais de alto desempenho. Rio de Janeiro: Editora Campus, 1995.ROBBINS, H.; FINLEY, M. Por que as equipes no funcionam: o que no deucerto e como torn-las criativas e eficientes. Rio de Janeiro: Editora Campus,1997.ROBBINS, S. Comportamento organizacional. Rio de Janeiro: Editora LTC, 1999.SERRANO, G. Investigacin cualitativa. Retos e interrogantes: I Mtodos.Madrid: Editorial La Muralla, 1994.______. Investigacin cualitativa. Retos e interrogantes: II Tcnicas y anlisesde datos. Madrid: La Muralla, 1994.STAKE, R. E. Case studies. In: DENZIN, N.; LINCOLN, Y. Handbook ofqualitative research. Thousand Oaks, California: Sage Publications Inc., 1994.p. 236-247.YIN, R. Estudo de caso: planejamento e mtodos. Porto Alegre: EditoraBookman, 2001.