o uso de fÁbulas no processo de ensino … · entre a leitura de palavras e a leitura de mundo....

14

Upload: lythuy

Post on 13-Dec-2018

215 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

1

O USO DE FÁBULAS NO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM EM AULAS

DE INGLÊS

Maria Edileusa Santiago Frare

Resumo: O projeto de implementação visou introduzir o trabalho com fábulas no ensino da Língua Inglesa. Este trabalho é um grande desafio para o professor de LEM, pois além de ter que lidar com a rejeição que alguns estudantes demonstram de aprender uma nova língua, o professor também lida com a inversão de valores éticos que passou a ser uma constante na sociedade atual. De qualquer forma, a fábula é um gênero textual que tem o poder de prender a atenção, de entreter e de deixar um ensinamento de conduta através de sua mensagem. Enfim, trabalhar com fábulas em inglês na sala de aula é uma excelente alternativa para superar a rejeição dos alunos, pois trata-se de uma narrativa curta, dinâmica, reflexiva, e normalmente de temática bastante conhecida pelos alunos.

Palavras-chave: valores éticos, inversão, conduta.

I. Introdução:

Desde a mais tenra idade, as fábulas estão presentes na vida das pessoas e

a moral de cada uma aparece muitas vezes como alerta para determinadas

situações, comportamentos ou contextos sociais. Assim, ao incorporar fábulas no

processo de ensino-aprendizagem de Língua Estrangeira Moderna (LEM),

possibilita-se trabalhar o conhecido (fábula) com o desconhecido (LEM),

oportunizando maior interação do público-alvo, no nosso caso, os alunos, com os

conteúdos de sala de aula. O trabalho com questões morais e éticas, tão

necessárias ao desenvolvimento do ser humano e à sociedade retratada nos meios

de comunicação, encontra suporte, por conseguinte, nas fábulas por ser tema

inerente a elas.

Estamos vivendo em um mundo cheio de informações, onde nosso aluno está

a mercê de conceitos elaborados pela mídia, que infelizmente estão mais acessíveis

e são mais apelativos a eles do que nós educadores. Por este motivo, temos sempre

que buscar caminhos alternativos e educativos, para que os alunos não se percam

dentro de uma sociedade que cada vez mais apresenta sintomas de que a moral

2

não existe ou de que não é importante ser pensada e discutida. Precisamos buscar,

como educadores, orientar o nosso jovem, levando até ele gêneros textuais que,

acreditamos, poderão agradá-los, bem como despertar o interesse pela leitura em

ambiente escolar.

Essa preocupação com a escola e o ensino está presente nas palavras de

Paulo Freire (2000, p.29), quando o autor afirma que: “(...) a importância do papel do

educador, o mérito da paz com que viva a certeza de que faz parte de sua tarefa

docente não apenas ensinar conteúdos, mas também ensinar a pensar certo”.

Nesse sentido, a escola é um ambiente que desencadeia grupos de leitura, direta e

indiretamente e pode exercer forças positivas sobre a família e a comunidade no

papel de difusora de livros, de leituras e do gosto pela leitura.

As fábulas, por exemplo, podem ser uma alternativa no trabalho pedagógico

por se tratarem de textos curtos e possibilitarem questionamentos e possíveis

entendimentos da moral apresentada pela história.

Por isso, a prática de leitura de fábulas tem como finalidade entreter e

aconselhar os alunos, além de ser uma maneira lúdica de se retratar questões de

valores morais e éticos de forma apropriada e descontraída. O objetivo de um

trabalho de reflexão sobre práticas de leitura é fazer com que os alunos interajam

entre si, expondo seus pontos de vista de acordo com o seu conhecimento da

questão levantada.

O aluno do Ensino Médio geralmente apresenta dificuldades na produção

escrita, na produção oral e na leitura nas aulas de língua inglesa (LI). Parece haver

um grande desinteresse em aprender de maneira geral na escola, e em se tratando

de uma Língua Estrangeira (LEM), o desinteresse é ainda maior, já que a disciplina

muitas vezes é vista como menos importante do que as demais. Estimular a leitura

tornou-se um grande desafio para o professor, uma vez que ele sabe que o aluno

que não lê apresenta mais dificuldades em comunicar-se e entender os outros. A

dificuldade de expressão, tanto oral quanto escrita, pode ser entendida como reflexo

da falta de leitura. Se logo cedo a criança fosse estimulada à leitura, sua visão de

mundo poderia ser muito diferente, possivelmente mais crítica e ampliada, uma vez

que a consciência crítica não nasce com o indivíduo, mas é estimulada pela prática,

que pode ser iniciada pela leitura.

3

Precisamos, porém, estar sempre atentos, pois os alunos preferem caminhos

mais dinâmicos e para muitos a leitura não faz parte da sua vida. Ler para eles é

apenas uma tarefa de sala de aula e que muitas vezes também não acontece

naquele ambiente. Por exemplo, um pequeno enunciado pode não ser entendido

pela falta de prática de leitura e não pelo desconhecimento de determinado assunto,

causando o pedido por explicações em vez da realização da leitura necessária para

que determinada tarefa seja desenvolvida. Além disso, os pais das classes sociais

menos favorecidas têm dificuldades muitas vezes de introduzir seus filhos numa

idade ainda inicial no universo dos livros como objetos físicos a serem manipulados

e com os quais se aprende a interagir, mesmo antes da aquisição da leitura

(BRASIL, 2006, p.100). A falta de contato e de hábito dos alunos em relação à

leitura faz parte dos desafios que a escola enfrenta e, portanto, precisa ser levada

em consideração.

Acreditamos que essa pesquisa contribuiu com os desafios escolares.

Considerando a fábula sempre bem aceita, pois sua leitura é rápida e seu debate

logo vem à tona, por que não pensar em um projeto que pudesse unir o gosto pela

leitura e o desenvolvimento do senso crítico dos alunos? Por meio da fábula, é

possível para o professor fazer uma avaliação sobre o aluno, pois no debate

promovido a argumentação e a coerência com que o aluno necessita expor suas

ideias são analisadas.

Este projeto de implementação teve como objetivo maior oportunizar o

aprofundamento de conhecimentos de alunos do Ensino Médio em Língua Inglesa

ao analisar questões éticas e morais presentes nas fábulas para desenvolver a

criticidade e a capacidade de interpretação. Para tanto, fez-se uso de três fábulas

que, após a leitura, eram compreendidas com o auxílio da professora no sentido de

oportunizar a expressão oral dos alunos acerca do entendimento que construíram da

leitura feita.

Considerando as questões apresentadas e o objetivo dessa proposta, foi

necessário um estudo prévio sobre a prática de leitura em sla de aula e como esta

pode ser facilitada. Para tal, os autores estudados foram Paulo Freire (2000 e 2003),

Ivete Morosov & Juliana Martinez (2008), William Roberto Cereja (2005), Maria José

Coracini (2002), Miguel Arroyo (2011), Agnes Heller (1970) e Clarissa Jordão (2006).

4

Além deste, fizemos a leitura e análise de documentos oficiais, quais sejam as

Orientações Curriculares Nacionais de Línguas Estrangeiras para o Ensino Médio

(BRASIL, 2006) e as Diretrizes Curriculares de Língua Estrangeira Moderna

(PARANÁ, 2006).

As leituras realizadas foram de extrema valia para aprimorar o conhecimento

fundamentado por grandes autores. Tal proposta teve seu foco nas práticas de

leitura escolares, considerando o contexto das aulas de língua inglesa. Depois de

concluir o Ensino Fundamental, o aluno brasileiro inicia o Ensino Médio, onde a

literatura lhe é apresentada. Nesse novo caminho, ele vai interagir com vários e

diferentes estilos de autores e linguagens, ampliando seu contato com os mais

diversos gêneros textuais. A leitura vai estar mais presente no Ensino Médio, pois

temos em mente que este aluno tem que ser um leitor assíduo, uma vez que precisa

estar em condições para enfrentar os desafios de um possível vestibular, ou mesmo

aqueles encontrados no dia-a-dia.

Partindo desse princípio, muito já se discutiu sobre o processo de

ensino/aprendizagem de LEM e as práticas de leitura na escola. Atualmente,

seguindo as DCEs de LEM (PARANÁ, 2006), percebemos a grande caminhada que

já traçamos, quando este documento afirma que “(...) ao contextualizar o ensino da

Língua Estrangeira, pretende-se problematizar as questões que envolvem o ensino

da disciplina, nos aspectos que o tem marcado, sejam eles políticos, econômicos,

sociais, culturais e educacionais” (PARANÁ, 2006, p.49). A prática de leitura nas

aulas de língua estrangeira pode então ajudar a cumprir esses objetivos traçados

pelas DCEs.

Dentro desse contexto, então, podemos questionar como o ensino com textos

tem ocorrido na escola. Segundo Coracini (2002, p. 18),

Nas aulas de Línguas, em particular - língua materna e língua estrangeira -,

o texto é, na maioria das vezes, usado como pretexto para o estudo da

gramática, do vocabulário ou de outro aspecto da linguagem que o

professor (ou o livro didático) reputa como importante ensinar. Assim, o

texto, parte do material didático, perde a sua função essencial que é a de

provocar efeitos de sentido no leitor/aluno, para ser apenas o lugar de

reconhecimento de unidades e estruturas linguísticas cuja funcionalidade

parece prescindir dos sujeitos.

5

Isso nos faz pensar que é preciso rever o trabalho com textos que vem sendo

realizado na escola, deixando de lado o uso do texto como pretexto para explorar a

gramática da língua, e fazendo uso de uma abordagem mais funcional do trabalho

com leitura.

As posturas teóricas que privilegiam o texto como portador de sentidos se

revelam na escola, em nível consciente ou inconsciente, no tratamento que se dá ao

texto em qualquer disciplina curricular: um objeto único, completo, que tem um fim

em si mesmo. O texto constitui, na escola, o objeto instituído do saber e, por isso

mesmo, funciona pedagogicamente como objeto onde se inscreve objetivamente a

verdade, que parece atemporal e definitiva, verdade essa a ser decifrada

(descoberta) e assimilada pelo aluno; e nisto consiste a aprendizagem que será

avaliada em função de um maior ou menor grau de assimilação (CORACINI, 2002,

p.18).

Nossos alunos estão cada vez mais buscando informações disponibilizadas

rapidamente e a leitura para eles é simplesmente o que vem pelas redes sociais, por

serem estas os meios aos quais a maioria hoje tem acesso. Por esta razão, quando

preparamos nossas aulas temos que levar em conta que alunos nós temos, seus

interesses e expectativas, além de ter conhecimento sobre diferentes métodos e

abordagens no ensino de LE. É fundamental que nós, professores, saibamos qual

concepção de língua e ensino está por trás de determinado método, para que

possamos fazer nossas escolhas, e não simplesmente seguir determinado livro

didático sem ter conhecimento teórico da concepção de ensino que ali se encontra

(MOROSOV & MARTINEZ, 2008, p.20). Nossas escolhas, portanto, precisam ser

fundamentadas e justificadas com seriedade.

Essas reflexões nos mostram a importância do papel do professor na escola.

Ele precisa estar sempre atento às necessidades de seus alunos, e consciente dos

objetivos educativos. Pensando sobre isso, então, a escolha desta pesquisa foi

relacionar a fábula, como gênero de leitura, aos objetivos do ensino de língua

inglesa, enfocando especialmente no uso de estratégias de leitura, e à função da

escola. Essa escolha se deu por entender que a fábula é um tipo de texto com o

6

qual podemos refletir sobre questões morais, e contextualizar com o momento

vivido, pois é um texto sempre atual, justamente por ser atemporal.

Considerando a importância da leitura e o fato de que esta está sempre

relacionada com o momento histórico vivenciado, podemos recorrer novamente às

palavras de Paulo Freire. Segundo Freire (2003, p. 15), há uma ligação significativa

entre a leitura de palavras e a leitura de mundo. Para ele “a leitura da palavra, da

frase, da sentença, jamais significou uma ruptura com a “leitura” do mundo. Com ela,

a leitura da palavra foi a leitura da palavra mundo”. Diante disso, podemos concluir

também que leitura e cultura estão interligadas. Dessa forma é importante ressaltar

que para adquirirmos o aprendizado de uma língua estrangeira é necessário que

estejamos abertos para aprendermos muito mais do que simplesmente ler e falar

com fluência.

Ao ensinar e aprender uma língua estrangeira, o professor e o aluno devem

estar preparados, pois o processo de ensino-aprendizagem necessita do entusiasmo

e da disponibilidade de ambos, uma vez que ambos precisam mergulhar em uma

nova cultura e contexto social, enfim modificar maneiras de pensar e ver o mundo.

Essa nova maneira de entender o significado de ensinar e de aprender línguas está

baseada numa concepção que entende que

(...) a disciplina Línguas Estrangeiras na escola visa a ensinar um idioma

estrangeiro e, ao mesmo tempo, cumprir outros compromissos com os

educandos, como, por exemplo, contribuir para a formação de indivíduos

como parte de suas preocupações educacionais. (BRASIL, 2006, p. 91)

Aprender uma língua estrangeira não significa apenas participar de um

ensino voltado para o aspecto linguístico do idioma, mas sim educar o aluno a ser

um cidadão.

Quando falamos sobre o aspecto educacional do ensino de Línguas

Estrangeiras, referimo-nos, por exemplo, à compreensão do conceito de

cidadania, enfatizando-o. Esse é, aliás, um valor social a ser desenvolvido

nas várias disciplinas escolares e não apenas no estudo das Línguas

Estrangeiras. (BRASIL, 2006, p.91)

7

Isso nos faz pensar que o aprendizado da Língua Inglesa tornou-se realmente

importante para nossos alunos, pois eles estarão mais preparados não só para

ingressarem em suas carreiras e poderem se comunicar com outros países e

culturas, mas principalmente pensar no papel que ocupam no mundo enquanto

cidadãos.

Depois das leituras dos textos que embasam este projeto, ficou mais claro o

quanto a leitura é importante para o nosso aluno. Diante disto, e com maior

conhecimento sobre a importância da leitura, elaboramos material didático a partir

do uso de fábulas com alunos do ensino médio. Os detalhes da proposta serão

apresentados a seguir.

Diante do material didático produzido, nossa intenção foi, num primeiro

momento, abordar o tema da fábula a ser trabalhada e em seguida propor atividades

diversificadas que envolvessem a prática de leitura, realizadas tanto individualmente

pelos alunos como em grupo e com a professora. Num segundo momento, foram

verificados os sentidos dos vocabulários desconhecidos, já que se tratavam de

textos em LI, e daí sim trabalhamos com a finalidade da leitura, e dentro disso foi

levantada a questão da moral que cada fábula apresentava. Logo em seguida,

ouvimos e discutimos as opiniões dos alunos sobre o tema abordado. Esse é um

ponto de extrema importância nas atividades, uma vez que “(...) as interpretações

que construímos nunca são neutras, nunca estão em maior grau de distância em

relação a uma determinada realidade externa objetiva, porque a realidade não é

dada, não tem existência independente de quem pensa sobre ela ou a experimenta”

(JORDÃO, 2006, s/p).

Quando pensamos em leitura, sabemos que o entendimento do texto vai

depender de cada pessoa e que, portanto, dá margem a diferentes pontos de vista.

As fábulas e as atividades propostas serão retomadas na sequência. Procedemos à

leitura de três fábulas que, mesmo conhecidas pelos alunos, sempre despertam

interesse, pois abordam temas que dizem respeito ao aluno do ensino médio. Além

disso, entendemos que por serem alunos de ensino médio, eles teriam condições de

compreender a moral das fábulas, podendo assim colocá-las em prática no seu dia-

a-dia.

As fábulas escolhidas foram: The Kid and the Wolf; The Dog and the Shadow;

8

e The Ant and the Grasshopper. Em comum, as três fábulas contam com a presença

de animais como personagens principais e lidam com questões morais e éticas. Já

em relação aos procedimentos adotados para implementação, ressaltamos que o

trabalho feito teve enfoque maior no desenvolvimento da habilidade de leitura, e

contou com três etapas distintas. Na primeira etapa, Before Reading, os alunos

tiveram seu primeiro contato com a fábula e puderam fazer uso de seu

conhecimento prévio e de mundo para traçar hipóteses sobre a leitura. Na segunda

etapa, While Reading, os alunos tiveram oportunidade de ter um contato

individualizado com o texto, na forma de leitura silenciosa. Por fim, na terceira etapa,

After Reading, os alunos fizeram o trabalho de compreensão mais abrangente dos

textos, posicionando-se criticamente em relação aos valores e dilemas apresentados

em cada um. O objetivo era de que com as discussões os alunos estariam

preparados para reformular seus conceitos e perceberem como nossas concepções

de língua enquanto código ou enquanto discurso são de extrema importância no

processo de ensino e aprendizagem da LE. Além disso, a proposta de leitura com a

subdivisão em pre reading, while reading e after reading encontra suporte em

teóricos da área de ensino e aprendizagem de Língua Inglesa tais como Jeremy

Harmer (2001) e Douglas Brown (2001), por ser um trabalho que não leva em

consideração apenas o texto sendo lido, mas o conhecimento que o aluno traz para

compreender o texto.

A escolha pelo gênero escrito – fábula, também se justifica por atender dois

requisitos importantes, identificados como característicos da turma objeto desta

pesquisa: por serem textos curtos e estruturalmente bem sinalizados e, portanto,

poderem ser trabalhados em duas aulas de 50 minutos cada, e serem textos sobre

temática de interesse da faixa etária envolvida, a saber: questões morais e éticas,

uma vez que os adolescentes estão construindo seus entendimentos do que sejam

comportamentos e posições adequados e inadequados.

Como sugestão de trabalho envolvendo leitura e compreensão de texto os

alunos farão uso de estratégias de leitura, tais como: skimming, scanning, prediction,

e identificação de palavras-chave. Tais estratégias são sugeridas pelos teóricos

Douglas Brown (2001) e Christine Nuttall (1996).

9

Estas estratégias são exemplos de dois processos de leitura, o top-down e o

bottom-up, que combinados fazem da leitura um processo interativo. De acordo com

Christine Nuttall (1996), no processo bottom-up, o leitor (ou aluno) constrói

significados a partir dos elementos que estão no texto, ou seja: das letras, palavras,

e frases. Já no processo chamado de top-down, o leitor (ou aluno) faz uso do seu

conhecimento de mundo e de sua experiência de vida para entender um texto.

Aplicando-se essas noções à compreensão de uma fábula temos que no exemplo de

bottom-up, o leitor (ou aluno) fará a identificação de nomes de animais como sendo

os de personagens da estória, por saber que em fábulas é corrente o uso de animais

como personagens. Já no uso do processo de top-down, o aluno pode ler imagens

que acompanham a fábula e tecer conjecturas sobre o enredo desta.

Para entender um pouco mais as estratégias, que são parte integrante desses

processos, recorremos às explicações da H. Douglas Brown (2001, p. 306-310).

Para ele, as estratégias envolvidas na leitura são:

a) Identificar o propósito da leitura;

b) Usar todos os elementos gráficos de um texto para decodificar sua

mensagem;

c) Aplicar a estratégia de skimming à leitura do texto para localizar a ideia

principal e as ideias secundárias;

d) Aplicar a estratégia de scanning à leitura de um texto para localizar

informações específicas;

e) Usar mapas semânticos para ativar esquemas mentais que auxiliem na

identificação de palavras-chave (que muitas vezes se repetem) presentes no texto,

no período anterior à leitura;

Além disso, os alunos ativam estratégias de compensação para sanar

possíveis lacunas em relação a itens lexicais presentes nos textos. O uso de

diferentes estratégias ajuda o leitor a se concentrar no essencial. Às vezes, só as

palavras e o estilo do título já oferecem uma “particularidade” que auxilia na

compreensão do todo. Outras vezes, uma gravura pode chamar a atenção do leitor

para determinada disposição ou contexto. Em alguns textos, o estilo da linguagem

utilizada ou seu layout na página ou na tela podem oferecer dicas úteis sobre o

provável conteúdo. Com outros textos, o nome do autor pode alertar o leitor para o

10

provável ponto de vista social, histórico ou político a ser construído no texto. Por ser

um gênero textual conhecido, a fábula desperta a atenção do aluno assim que é

entregue, e este já começa a ativar possíveis estratégias mentais para compreender

as informações veiculadas.

O trabalho do professor, nessa proposta, é o de envolver os alunos de forma

entusiasmada, criando interesse no tópico abordado no texto e nas tarefas a serem

desenvolvidas (HARMER, 2001). Neste sentido, em um primeiro momento, o

professor é o organizador da tarefa, para depois seguir como observador, na medida

em que os alunos vão construindo seu conhecimento do que leram, para depois ser

o organizador do feedback que é fornecido pelos alunos, estimulando a participação

ativa de todos (HARMER, 2001, p. 213).

O trabalho envolvendo a aplicação prática de estratégias de leitura visa

estimular o interesse dos alunos, ao mesmo tempo em que os faz ativarem o

conhecimento prévio do gênero escrito estudado e de exemplos já lidos desse

gênero. Com este trabalho, temos presente que os alunos exercem o que leitores

eficientes e efetivos fazem: eles aprendem a usar muitos estilos de leitura para

diferentes propósitos, e tudo com motivação e autonomia construída em conjunto,

pois as atividades são propostas para serem realizadas em grupos, em sua maioria,

com a premissa do conhecimento compartilhado como prática. Quando determinado

gênero textual ainda não é do conhecimento do aluno, ou sua estrutura é de difícil

compreensão, os alunos fazem uso de estratégias de leitura e de compensação. A

longo prazo, tais estratégias auxiliam a leitura de mundo dos alunos.

Após a apresentação do desenvolvimento teórico, passamos ao relato sobre a

aplicação prática do projeto e das unidades temáticas.

O trabalho foi realizado com os alunos do 2º ano do ensino médio, e o curso

de formação continuada GTR para professores. Os alunos participaram de todas as

atividades, tanto orais como escritas, quando discutimos sobre a moral apresentada

em cada fábula, e os exercícios propostos referentes a cada texto.

Na leitura, eles apresentaram um pouco de dificuldade com relação a alguns

itens lexicais, mas a professora, autora do projeto de implementação os ajudava

explicando os significados dos vocabulários de acordo com o texto. Após a leitura,

11

todos discutiam sobre a moral apresentada e em seguida eram feitos os exercícios,

e a correção era feita de forma oral e escrita.

O objetivo foi alcançado, pois em se tratando de textos de leitura rápida e de

fácil entendimento, as fábulas oportunizaram aulas dinâmicas e bem produtivas.

Realmente, foi possível observar que as fábulas são de fato textos atemporais e de

grande valia para que possamos instigar e despertar nos alunos princípios muitas

vezes esquecidos por eles.

Na primeira fábula trabalhamos pontos da personalidade dos personagens,

por exemplo: a bondade, a esperteza que nem sempre é usada para fins honestos

causando muitas vezes um efeito contrário. A ganância, o ponto mais forte

apresentado na segunda fábula, causou muita discussão, pois muitos concordaram

que na maioria das vezes queremos muito mais do que precisamos, e já na terceira

fábula enfocamos na organização da sociedade e nos diferentes pontos de vista que

cada personagem apresentava da vida.

Fazendo uma analogia do livro “O cotidiano e a História”, (Heller, 1970, pg.

20), Agnes fala da essência do indivíduo:

A vida cotidiana é a vida do indivíduo. O indivíduo é sempre,

simultaneamente, ser particular e ser genérico. Considerando em sentido

naturalista, isso não o distingue de nenhum outro ser vivo. Mas, no caso do

homem, a particularidade expressa não apenas seu ser “isolado”, mas

também seu ser “individual”. Basta uma folha de árvore para lermos nela as

propriedades essenciais de todas as folhas pertencentes ao mesmo gênero;

mas um homem não pode jamais representar ou expressar a essência da

humanidade.

O que podemos entender é que cada indivíduo tem suas características que o

definem como sujeito único, e que devemos saber conviver bem com as diferentes

visões de mundo.

O trabalho de grupo com as alunas do GTR foi também muito interessante,

pois as alunas estavam bem interessadas no projeto. O trabalho com as alunas do

GTR foi semelhante ao trabalho com os alunos em sala de aula, pois primeiramente

realizamos a leitura do texto e depois as alunas tinham que responder uma questão

12

de acordo com a leitura realizada. Algumas delas, inclusive, chegaram a relatar que

fizeram o mesmo tipo de trabalho com seus alunos, usando as fábulas.

A troca de experiências foi de grande valia para todos os envolvidos, pois

pudemos debater sobre a estrutura das fábulas e as ideias abordadas nelas. Todos

os envolvidos, tanto os professores que participaram do GTR quanto os alunos que

trabalharam com as fábulas, puderam relatar os resultados obtidos com o trabalho

com fábulas e trocar sugestões de atividades que poderiam ampliar ainda mais o

trabalho com elas.

O trabalho com as fábulas foi um processo com o objetivo de desenvolver a

consciência crítica dos alunos. Como defendido por Freire (2003, p. 21):

Num primeiro momento esta consciência é ingênua. Em grande parte é

mágica. Este passo é automático, mas o passo para a consciência crítica

não é. Somente se dá com um processo educativo.

Com o trabalho com as fábulas, pretendíamos também resgatar o prazer da

leitura por parte dos alunos, ao mesmo tempo em que queríamos que eles

desenvolvessem seu senso crítico ao mostrarem suas compreensões dos textos e

suas opiniões sobre os valores abordados. O fato de fábulas serem um gênero de

texto atemporal facilitou essa proposta, já que em qualquer tempo e em qualquer

lugar é possível resgatar suas mensagens. E apesar de ser por muitos considerado

um gênero textual de fácil compreensão, a leitura aprofundada que pode ser feita

com base em uma fábula curta repercute em outras áreas do conhecimento escolar

e mesmo em outras situações do dia-a-dia dos alunos. Ou seja, o ganho é

imensurável.

A liberdade de expressarem suas opiniões também foi trabalhada com os

alunos e objetivou exercitar a consciência crítica, bem como a responsabilidade que

vem junto com a expressão livre de ideias. O fato de que nem todas as opiniões

sãom iguais reforçou apenas a consciência de que todos somos indivíduos únicos e

que podemos aprender e muito com quem tem opiniões divergentes das nossas.

Referências

13

ARROYO, M. O trabalho humano disputa centralidade nos currículos. Petrópolis, RJ:

Ed. Vozes, 2011.

BROWN, Douglas. Teaching by principles. San Francisco State University: Longman,

2001.

HARMER, Jeremy. The practice of English language teaching. 3rd ed. Harlow:

Longman, 2001.

HELLER, A. O Cotidiano e a História. 7ª ed. São Paulo, SP: Paz e Terra, 1970.

CEREJA, R. Ensino de Literatura. São Paulo, SP: Ed. Saraiva, 2005.

CORACINI. M. O jogo discursivo na aula de literatura, Ed. Pontes, 2002.

FREIRE, P. A importância do Ato de Ler. São Paulo, SP: Ed. Cortez, 2003.

FREIRE, P. Pedagogia da autonomia. 14ª ed. São Paulo, SP: Paz e Terra, 2000.

JORDÃO, C. O ensino de línguas estrangeiras – de código a discurso. In: VAZ BONI,

V. (org.) Tendências contemporâneas no ensino de línguas. União da Vitória, PR:

Kaigangue, 2006.

MOROSOV, I. & MARTINEZ, J. A didática do ensino e a avaliação da aprendizagem

em língua estrangeira. Curitiba-PR: Ed. IBPEX, 2008.

NUTTALL, Christine. Teaching Reading skills in a foreign language. New York, Heinle

& Heinle, 1996.