o risco sistémico na indústria financeira

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UNIVERSIDADE DE COIMBRA FACULDADE DE DIREITO CURSO DE PÓS GRADUAÇÃO EM DIREITO BANCÁRIO, DA BOLSA E DOS SEGUROS O RISCO SISTÉMICO NA INDÚSTRIA FINANCEIRA ANÁLISE DOS POTENCIAIS IMPACTOS NA ESTABILIDADE EXIGIDA Filipe José Trigo Simões Coimbra, 13 de Junho de 2011 [Escreva o resumo do documento aqui. Normalmente, o resumo é um sumário curto do conteúdo do documento. Escreva o resumo do documento aqui. Normalmente, o resumo é um sumário curto do conteúdo do documento.]

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UNIVERSIDADE DE COIMBRA

∗ FACULDADE DE DIREITO ∗

CURSO DE PÓS – GRADUAÇÃO EM DIREITO BANCÁRIO, DA BOLSA E DOS SEGUROS

O RISCO SISTÉMICO NA INDÚSTRIA FINANCEIRA

ANÁLISE DOS POTENCIAIS IMPACTOS NA ESTABILIDADE EXIGIDA

Filipe José Trigo Simões Coimbra, 13 de Junho de 2011

[Escreva o resumo do documento aqui. Normalmente, o resumo é um sumário curto do conteúdo do documento. Escreva o resumo do documento aqui. Normalmente, o resumo é um sumário curto do conteúdo do documento.]

O risco sistémico na indústria financeira Análise dos potenciais impactos na estabilidade exigida

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Mudam-se os Tempos, Mudam-se as Vontades

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,

Muda-se o ser, muda-se a confiança:

Todo o mundo é composto de mudança,

Tomando sempre novas qualidades.

Continuamente vemos novidades,

Diferentes em tudo da esperança:

Do mal ficam as mágoas na lembrança,

E do bem (se algum houve) as saudades.

O tempo cobre o chão de verde manto,

Que já coberto foi de neve fria,

E em mim converte em choro o doce canto.

E afora este mudar-se cada dia,

Outra mudança faz de mor espanto,

Que não se muda já como soía.

Luís Vaz de Camões, in "Sonetos"

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Índice

1. Introdução ....................................................................................................................................... 5

2. A definição de risco sistémico segundo o FSB e o IAIS .................................................................... 12

2.1. Os critérios utilizados para a identificação de instituições sistemicamente relevantes ........... 12

2.1.1. Dimensão .......................................................................................................................... 14

2.1.2. Interligação ....................................................................................................................... 15

2.1.3. Substituibilidade................................................................................................................ 16

2.1.4. Tempo ............................................................................................................................... 18

2.2. Factores que contribuem para a avaliação da importância sistémica ..................................... 18

2.3. O processo de insolvência e de falência: a experiência da indústria Seguradora .................... 19

2.4. Conclusão sobre os critérios utilizados pelo FSB e o IAIS relativos ao risco sistémico ............. 22

2.5. A limitação interventiva das autoridades públicas competentes e seus efeitos ...................... 23

2.6. A natureza do risco sistémico, e o processo dinâmico de acumulação de riscos..................... 23

2.7. A gestão de risco na indústria financeira................................................................................ 26

2.7.1. Risco de crédito ................................................................................................................. 26

2.7.2. Risco de mercado .............................................................................................................. 27

2.7.3. Risco de liquidez ................................................................................................................ 27

2.7.4. Risco operacional .............................................................................................................. 28

2.7.5. Risco de taxa de juro do Balanço ....................................................................................... 29

3. O nível de concorrência na indústria financeira global ................................................................... 31

3.1. Barreiras à entrada, à saída e à mobilidade na indústria financeira........................................ 33

3.2. Fixação do prémio de risco na actividade desenvolvida pelo sector financeiro ...................... 34

3.3. Fixação por parte do mercado do Prémio de risco do sector financeiro ................................. 34

3.4. Fixação do Prémio de risco por parte dos reguladores para o sector financeiro ..................... 35

4. Identificação de actividades potencialmente sistémicas................................................................. 38

4.1. A organização das actividades de crédito ............................................................................... 38

4.1.1. Nível concorrencial ............................................................................................................ 39

4.1.2. Fixação do Prémio de risco ................................................................................................ 40

4.1.3. Risco sistémico na actividade de crédito............................................................................ 44

4.2. A actividade Seguradora ........................................................................................................ 46

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4.2.1. A organização da actividade seguradora ............................................................................ 46

4.2.2. Nível de concorrência ........................................................................................................ 53

4.2.3. Fixação do prémio de risco ................................................................................................ 54

4.2.4. Solvência II, a configuração de um novo quadro regulamentar prudencial Europeu .......... 61

4.2.5. Os riscos decorrentes da arbitragem regulatória ............................................................... 64

4.2.6. A actividade Seguradora e o possível risco sistémico associado ......................................... 64

4.3. Operações no mercado de capitais ........................................................................................ 66

4.3.1. A organização das actividades no mercado de capitais ...................................................... 67

4.3.2. Nível de concorrência ........................................................................................................ 68

4.3.3. Fixação do preço de risco .................................................................................................. 70

4.3.4. O VaR como modelo de projecção de perdas potenciais ................................................... 72

4.3.5. Métodos comummente utilizados para o cálculo do VaR de um portfólio ......................... 73

4.3.6. Problemas na avaliação de riscos associados ao VaR ......................................................... 74

4.3.7. A liquidez dos instrumentos financeiros ............................................................................ 75

4.3.8. O papel das agências de rating na avaliação do risco de mercado e de liquidez................. 76

4.3.9. As actividades do mercado de capitais e o risco sistémico ................................................. 77

5. Autoridades europeias que supervisionam o mercado financeiro .................................................. 78

5.1. Sistema Europeu de Supervisão Financeira ............................................................................ 79

5.2. Autoridade Europeia de Supervisão ....................................................................................... 79

6. Conclusão ...................................................................................................................................... 81

7. Bibliografia citada .......................................................................................................................... 84

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1. Introdução

A recente crise financeira lançou a tomada de consciência para a prevenção do risco

sistémico, bem como para o desenvolvimento de modelos, e técnicas prudenciais que

possam de certa forma vir a contribuir para a mitigação dos efeitos que podem incidir

sobre os vários agentes económicos. A noção de risco sistémico não constitui um elemento

novo, abrangendo uma série de questões amplamente debatidas a nível académico, mas

ainda sem a dimensão, e a profundidade desejada, assentes num quadro regulatório

imperativo, amplo e exigente. As consequências da enorme crise do subprime sobre o

mundo financeiro e a economia real, já colocaram o risco sistémico no primeiro plano de

trabalho internacional sobre a regulação financeira. No recente encontro do G20 que

decorreu em Pittsburgh1, onde se discutiu os temas relacionados com os mercados

financeiros, e a economia mundial, foram tomadas decisões no sentido de haver uma

maior regulação dos mercados financeiros, assim como para a importância da reforma das

instituições de Bretton Woods, onde foram assumidos diversos compromissos no sentido

de se criar uma cultura defensiva que vise prevenir e superar, as consequências adversas

que podem resultar, independentemente do seu impacto associados a diferentes tipos de

riscos, e que visem acautelar as instituições financeiras que sejam consideradas

sistemicamente relevantes.

Ainda segundo as palavras de Mário Murteira2, vivemos ou caminhamos, para a “economia

baseada no conhecimento”, ou até para a “sociedade do conhecimento”. Na realidade,

estamos cada vez mais dependentes de frágeis economias baseadas na especulação

financeira. E esta, por seu turno, gera além do mais um conhecimento adequado ao

prosseguimento dessa especulação. Além de tudo isto, e em consequência da evolução

própria da economia norte-americana, a colossal globalização financeira das últimas

décadas, veio dar o predomínio a novas formas de acumulação de capital financeiro, sem

contrapartida na economia real. Fazem-se, e desfazem-se grande “bolhas” no mercado

global de capitais. No aspecto financeiro, tem-se dito que a recente grande crise mundial é

sistémica e não poderá ser resolvida por apressados regressos ao “business as usual”, para

benefício dos grandes manipuladores de dinheiro que ainda dominam a economia

mundial.

1 Pittsburgh G-20 Partnership - Pittsburgh Summit 2009, www.pittsburghg20.org 2 Professor emérito do ISCTE, Instituto Universitário de Lisboa, in Crises e oportunidades, O risco sistémico, Mário Murteira, Junho de 2010.

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De uma forma geral, a percepção do risco sistémico tem origem numa externalidade

negativa3. O termo externalidade negativa, aplicado ao sector financeiro, relaciona os

custos que o sector financeiro impõe à economia real, no caso de uma crise sistémica. Essa

ideia também faz sentido dentro do próprio sector financeiro, na medida em que a falência

de uma instituição financeira, tendo um impacto directo sobre todos os stakeholders4 que

interagem com essa sociedade, pode conduzir a um enfraquecimento de outras

instituições financeiras, devido às relações de interligação, e de dependência que se

estabelecem. Assim, todo o sistema financeiro, e a economia real podem ser afectados pela

materialização de um risco assumido por um único Banco, cabendo identificar os riscos

financeiros de natureza sistémica, que ameaçam toda a comunidade, e que geram custos

que não são assumidos pelos agentes responsáveis por esses riscos.

Essa externalidade pode ser determinada quando, por exemplo, uma grande instituição

financeira não dispõe de recursos suficientes para pagar a uma outra contraparte, fazendo

com que esta também não disponha dos recursos necessários para que possa pagar a uma

terceira entidade, e assim por diante gerando um efeito dominó, o que pode conduzir

eventualmente a uma expectativa de colapso de todo o sistema financeiro, ou seja, a uma

crise sistémica, entendida como uma interrupção na cadeia de pagamentos.

O desencadeamento de uma crise sistémica começa com um choque, que depois se espalha

por todo o sector financeiro. Este choque pode resultar na insolvência de um mercado ou

de uma instituição financeira. Também pode surgir de uma situação de desequilíbrios

macroeconómicos. Mas nem todos os choques necessariamente conduzem a uma crise

sistémica. Isso pressupõe que o choque se propague por todo o sector financeiro, e

posteriormente por toda a economia real. A difusão apenas sucede se o sistema financeiro

de forma gradual, tiver sido enfraquecido por via da acumulação de riscos que podem vir a

afectá-lo como um todo.

O efeito de amplificação por via de um choque exógeno na economia tem subjacentes

diversos elementos. Primeiro, é sabido que a capacidade de investimento dos diversos

agentes económicos é limitada, por via de uma restrição orçamental, assim como por via

do preço da remuneração do factor produtivo capital, a taxa de juro. Em segundo lugar, o

3 Termo recorrentemente utilizado para descrever uma situação, em que as acções de um agente económico têm um impacto negativo sobre a posição de um outro agente, sem o sofrimento ao anterior pelo dano causado a este último. 4 Por stakeholders entende-se toda a comunidade que envolve uma empresa, e que tem interesse no seu desenvolvimento. Os stakeholders, geralmente com maior interesse na performance de uma empresa incluem dois tipos de parceiros, os parceiros internos (e.g. accionistas, os colaboradores e as equipas de gestores), e os parceiros externos (e.g. os clientes, os fornecedores e o Estado), In Produtividade, J. Eduardo Carvalho, 2004, Quimera Editores.

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nível de actividade económica em termos agregados, condiciona o preço dos factores

produtivos no sector de actividade em causa. Terceiro elemento tem que ver com o preço

dos factores produtivos que vai determinar o ganho individual líquido dos detentores

desses factores. Por último, o rendimento líquido determina a escassez dos seus

constrangimentos financeiros, afectando a disponibilidade, ou o preço do financiamento

externo. Estes factores contribuem para uma considerável redução da actividade

económica, que por sua vez deprime o preço dos activos produtivos, e assim por diante,

conduzindo a um ciclo de auto reforço na queda nos preços dos activos financeiros,

contribuindo para uma deterioração do rendimento líquido, forte restrição nas condições

de financiamento, e no declínio da actividade económica5. O choque pode atingir

inicialmente uma instituição, ou um mercado, propagando-se através de contágio para o

sistema financeiro em geral, ou afectando diversas instituições e mercados em simultâneo.

O mecanismo de ajustamento para um novo ponto de equilíbrio pode ser particularmente

violento, representando uma ruptura completa, e abrupta com o equilíbrio anterior. A

magnitude do choque inicial, e o mecanismo de ajustamento determinam a intensidade do

impacto da crise sobre a economia real, a economia do emprego, dos salários e da

produção, assim como o bem-estar da população.

Segundo Steven L. Schwarcz6, o risco sistémico, é o risco de um choque contra uma parte

limitada do sistema, a falência de uma grande instituição financeira, por exemplo, que se

propaga por todo o sistema financeiro, conduzindo a uma reacção em cadeia de falências, e

à quebra do sistema, manifestando um forte impacto sobre as taxas de juro, câmbio e os

preços dos activos em geral, e condicionando a política económica que possa estar

definida pelos diversos Governos, uma vez que estas variáveis são utilizadas como

variáveis macroeconómicas na definição das diferentes políticas, em contraste com o risco

associado a uma entidade individual, um grupo ou apenas a uma componente do sistema.

O Comité de Bancos de Basileia, definiu o risco sistémico como sendo aquele em que a

inadimplência de uma instituição em conseguir honrar os seus compromissos contratuais

pode vir a gerar uma reacção em cadeia, atingindo grande parte do sistema financeiro.

Esta definição pressupõe uma elevada exposição directa entre as instituições, assim como

relações de interligação, e de interdependência entre os agentes de um sistema ou

mercado, no qual a insolvência ou falência de uma única entidade ou grupo de entidades

5 Anton Korinek, Systemic Risk-Taking: Accelerator Effects, Externalities, and Regulatory Responses, University of Maryland, October 2008. 6 Systemic Risk, Steven L. Schwarcz Stanley, A. Star Professor of Law and Business Duke University School of Law, Founding Co-Academic Director Duke Global Capital Markets Center, Research Paper No. 163 March 2008.

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pode provocar falências em cascata, o que poderia conduzir o sistema, ou o mercado como

um todo a uma bancarrota.

Mas ainda no seguimento do exposto, convém clarificar um outro conceito que devido à

sua semântica pode ser gerador de algum enleio. Referimo-nos ao conceito de risco

sistemático (systematic risk), que consiste no risco relacionado com o mercado como um

todo, no seu conjunto, como por exemplo, nos seus aspectos políticos, sociais ou

económicos, ou ainda outros que alteram o comportamento da maioria dos investidores.

Este risco é distinto do risco individual de cada um dos valores cotados por ser um risco

do mercado no seu conjunto, e por isso chama-se também risco não diversificável, na

medida em que não é possível reduzi-lo, ou cobri-lo através da diversificação da carteira

por diversos títulos ou sectores. Em contraponto ao que já foi indicado para o risco

sistémico, que se encontra presente no sistema monetário, e que derivado de uma falência

de uma entidade financeira pode desencadear uma reacção em cadeia de falências, que

colocam em risco o próprio sistema. Este risco deriva da teia de relações que liga todas as

entidades financeiras, via relações de crédito, investimento e contraparte. Relações essas

que acontecem num contexto de alavancagens elevadas, fruto da própria concepção do

sistema bancário.

A identificação do risco sistémico requer uma definição de crise sistémica. Na falta de uma

definição teórica, amplamente aceite, vários organismos internacionais têm trabalhado

numa definição em comum, considerando que a crise sistémica consiste numa interrupção

no fluxo de serviços financeiros, (i) causada por uma deficiência no todo ou parte do

sistema financeiro e, (ii) que possa ter difundido consequências negativas sobre a

economia real. O risco sistémico consiste portanto numa ameaça na interrupção do fluxo

de serviços financeiros, e que de um modo susceptível pode afectar todo o sector

financeiro, assim como a economia real.

A identificação do risco sistémico constitui uma tarefa complicada, não se limitando

apenas a um quadro regulamentar predeterminado, ou de um único critério subjacente.

Uma análise da recente crise financeira, não produziu um único critério comum a todas as

instituições financeiras cujos problemas poderiam ter prejudicado em conjunto o sector

financeiro. Por exemplo, o tamanho das instituições financeiras não deve ser o único

critério a servir de base, tendo em vista a identificação das entidades que possam vir a ter

uma importância sistémica. Em primeiro lugar, os riscos apresentados por instituições

financeiras, não podem ser analisados meramente pelo critério do Balanço total, dado o

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peso da sua exposição fora do Balanço de muitos dos valores mobiliários, e instrumentos

derivados que se encontram inscritos fora do Balanço destas entidades, assim como para a

existência de diferenças observadas nas normas contabilísticas que vigoram nos

diferentes países, apesar do crescente trabalho que tem vindo a ser realizado a nível

internacional através da IFRS7 de forma a tornar a informação contabilística comparável.

Em segundo lugar, uma maior dimensão pode traduzir um maior grau de diversificação de

riscos como sucede com os Bancos universais e, por essa via apresentarem uma maior

resistência aos choques exógenos. Em contrapartida, os hedge funds e as seguradoras

podem, em determinadas circunstâncias, ser considerados como entidades

sistemicamente relevantes devido à natureza da sua actividade. A situação

macroeconómica, e os ciclos económicos também podem desempenhar um papel

relevante no surgimento de crises sistémicas. Um estudo realizado pelo Federal Reserve

Bank de Cleveland8, aponta adicionalmente outros 4 factores para além do factor dimensão

na avaliação de uma instituição, cobrindo o risco de contágio, a correlação existente, o

grau de concentração e as condições de contexto.

Uma análise relativa ao risco sistémico, não se pode limitar somente às entidades

bancárias. Embora o sector bancário tenha sofrido as maiores perdas com a crise do

subprime, muitas contrapartes não bancárias desempenharam igualmente um papel

importante no desencadeamento, e na propagação da crise. Os exemplos incluem os hedge

funds, que prejudicaram os principais Bancos, sobretudo a Banca de Investimento como a

UBS e o Bear Stearns. Identificar o risco sistémico requer uma análise aprofundada da

actividade desenvolvida por todo o sector financeiro, sendo que na ausência de critérios

que possam distinguir claramente as instituições financeiras que podem vir ou não, a

desempenhar um papel relevante em termos sistémicos, o risco sistémico apenas poderá

ser identificado através de uma análise pormenorizada das actividades, e estratégias

financeiras, através de uma combinação adequada de todas as categorias legais.

7 As normas IFRS (International Financial Reporting Standards) foram adoptadas (entre outros) pelos países da União Europeia, através do regulamento 1725/2003/CE da Comissão Europeia, actualizado posteriormente pelo Regulamento 1126/2008/CE, com o objectivo primordial de harmonizar as demonstrações financeiras consolidadas publicadas pelas empresas europeias que tenham o seu capital disperso no mercado de capitais. Actualmente diversos países têm projectos de convergência das normas contabilísticas nacionais para as normas IFRS. O principal objectivo das demonstrações financeiras através das normas IFRS é dar informações sobre a posição financeira, os resultados e as mudanças na posição financeira de uma entidade, que sejam úteis, a um grande número de destinatários (investidores, empregados, fornecedores, clientes, instituições financeiras ou governamentais, agências de notação, e público em geral) no seu processo de tomada de decisão. Assim, os elementos das demonstrações financeiras (Balanço, demonstração de resultados, demonstração dos fluxos de caixa, informações por segmento de negócio, as notas, e as divulgações) podem alcançar características qualitativas das demonstrações financeiras em IFRS, como a compreensibilidade, a relevância, confiabilidade e a comparabilidade. 8 Measuring Systemic Risk, Viral V. Acharya, Lasse H. Pedersen, Thomas Philippon, and Matthew Richardson Working Paper, March 2010.

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Existem duas escolas de pensamento conflituante sobre a origem desta crise. A primeira

destaca a acumulação excessiva de riscos, enquanto a segunda, enfatiza as falhas de

regulação financeira. Dada a multiplicidade de sistemas de supervisão, e de regulação

vigentes à data dos acontecimentos nas diferentes economias, ficou patente que todos se

revelaram como sendo falíveis, não sendo suficientemente eficazes, uma vez que os

mesmos são idealizados, implementados e alimentados por pessoas, e as pessoas como se

sabe falham. Na realidade, este debate revela que os factores macroeconómicos,

nomeadamente os desequilíbrios económicos, e financeiros estão directamente ligados na

manifestação de uma crise sistémica. A origem da crise, em parte, pode igualmente ser

explicada por meio de outros factores, devido ao endividamento excessivo dos agentes

privados em certos países ocidentais, em períodos de expansão económica, chegando a

níveis que não eram mais sustentáveis. Esta situação afectou sobretudo as famílias dos

EUA, através da crise do subprime que começou no Verão de 2007, após a retracção do

mercado imobiliário dos EUA. Estes níveis de dívida foram possíveis graças à abundância

de liquidez a nível mundial, e à flexibilização das condições de crédito, ajudado por baixas

taxas de juro. A desaceleração no mercado imobiliário dos EUA, propagou-se para o sector

financeiro através de operações de habilidosa engenharia financeira, através das

conhecidas operações de titularização ou securitização de crédito. Uma análise das

vulnerabilidades macroeconómicas do sistema financeiro é, portanto, um aspecto

fundamental na identificação do risco sistémico. O risco sistémico é de natureza

macroeconómica, e não está claramente identificado nas normas financeiras, ao contrário

dos tradicionais riscos microeconómicos (risco de taxa de juro, risco de crédito).

De todos os riscos aos quais uma entidade, ou sistema como um todo se encontram

diariamente sujeitos (e.g. risco de liquidez, risco operacional, risco legal, risco de crédito,

ou o risco de mercado, entre outros), o risco sistémico, pela sua natureza e impacto talvez

seja o que represente o maior desafio para os supervisores, e para os mercados

financeiros, sendo que um quadro uniforme e flexível de gestão e de controlo dos riscos,

juntamente com os níveis de capital adequados seja essencial para um contínuo e

ordenado funcionamento do mercado financeiro a nível global.

Por fim espaço ainda para uma pequena elucidação para a justificação do título do

presente trabalho, no qual decidi designar como indústria, todo o sector financeiro, dada a

definição de indústria que se encontra desenvolvida no livro do Professor Luís Cabral9,

9 In, Economia Industrial, Mc Graw-Hill, 2001.

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onde se demarca do conceito tradicional de indústria associado ao aço e à ferrugem, para

evoluir em direcção a um conceito mais amplo, e dinâmico, onde se inclui toda a actividade

económica que opere em larga escala (e.g. indústria do turismo, dos seguros), e o sector

financeiro pela sua missão, e dimensão global preenche os requisitos indicados.

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2. A definição de risco sistémico segundo o FSB e o IAIS

Segundo estes dois organismos, o risco sistémico pode ser entendido como, "o risco de

perturbações no fluxo da prestação de serviços financeiros, (i) devido a uma deficiência

identificada no todo ou em parte do sistema financeiro, e (ii) com a possibilidade de vir a

gerar consequências negativas para a economia real." O princípio fundamental subjacente

nesta definição, consiste na ideia de que o risco sistémico está associado a um conjunto de

externalidades negativas e, ou em falhas de mercado, sendo que a insolvência de uma

instituição financeira, ou o seu mau funcionamento, podem prejudicar de forma acentuada

o sistema financeiro e, em último caso transmitir os seus efeitos para a economia real

culminando numa crise capaz de se propagar por diversos patamares, começando por ser

apenas de natureza financeira, evoluindo para uma crise económica, culminando

posteriormente numa crise com contornos sociais agravando os equilíbrios existentes.

2.1. Os critérios utilizados para a identificação de instituições

sistemicamente relevantes10

(i) Dimensão, é medida através do volume de serviços financeiros prestados por

cada elemento do sistema financeiro.

(ii) Interligação, refere-se ao nível de interdependência dos mercados uns sobre

os outros, bem como sobre as instituições que nele operam.

(iii) Substituibilidade, em que medida um outro elemento do sistema pode

fornecer os mesmos serviços, no caso de se observar uma insolvência por parte

de um concorrente, e este já não se encontrar em condições de continuar a

prestar os seus serviços no mercado.

(iv) Tempo, o risco sistémico na actividade seguradora normalmente não gera de

forma imediata os efeitos de um choque, uma vez que a sua actividade se

desenvolve num horizonte temporal mais longo.

10 Guidance to Assess the Systemic Importance of Financial Institutions, Markets and Instruments: Initial Considerations, Prepared by: Staff of the International Monetary Fund and the Bank for International Settlements, and the Secretariat of the Financial Stability Board, October 2009.

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Para as instituições, a dimensão da exposição, os volumes de transacção ou os activos sob

gestão são indicativos da amplitude a que os clientes e os outros membros podem ser

lesados. Um grupo de instituições em termos individuais pode não ser considerado como

relevante, mas em termos colectivos ser significativo, porque em caso de falha, todas as

instituições, independentemente da sua dimensão, sofrem em simultâneo, e ao mesmo

tempo as mesmas dificuldades e consequências. No caso das instituições que prestam

serviços essenciais, tais como os serviços de compensação e de liquidação, necessitam de

assegurar a existência de um membro substituto que possa assumir este papel no caso de

um dos membros deixar de reunir as condições para realizar essa tarefa. A interligação

compreende os casos em que a dificuldade sentida por uma instituição, aumenta a

possibilidade de um outro membro, também ele poder vir a sentir as mesmas dificuldades.

Para o mercado, a avaliação da importância do risco sistémico apresenta desafios mais

conceptuais. A importância sistémica de um mercado deriva para uma extensão a partir

das instituições que nele participam. No entanto, a dimensão de um mercado é um

determinante de potenciais custos económicos em caso de um deficiente funcionamento.

Se a importância de um mercado sob pressão não pode ser replicada por meio de um outro

mecanismo, o impacto económico pode então ser significativo.

A definição do FSB, é a que surge mais vezes sempre que se discute o risco sistémico em

fóruns de supervisão e de regulação. O FSB tem estabelecido alguns critérios relativos à

dimensão, interligação, e substituibilidade através dos quais a relevância relativa ao risco

sistémico de instituições pode ser avaliada. O FSB também especificou critérios

secundários, que podem contribuir para potencializar a vulnerabilidade de algumas

instituições como sejam, a complexidade, a alavancagem e o risco de liquidez.

A IAIS adicionalmente sugeriu a inclusão da variável tempo a estes critérios, reflectindo o

papel crítico que a velocidade de propagação desempenha na transmissão de um evento

exógeno ao sistema financeiro, e o tempo que este demora a ser absorvido. No entanto,

aceitando apenas os critérios que o FSB tem apresentado, é importante fazer notar que o

impacto destes critérios no risco do sistema financeiro pode ser muito diferente nas

diversas actividades desenvolvidas. Importa salientar que os critérios devem apenas ser

aplicados em concreto à actividade desenvolvida, e não às instituições.

Aplicando cegamente os critérios a todos os riscos incorridos pelas diferentes instituições,

acrescentando uma carga adicional de regulamentação sobre o sistema de estabilização

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das instituições, pode-se para além disso, não se estar a contemplar algumas entidades

que possam verdadeiramente desenvolver as actividades que sejam geradoras de risco

sistémico. Concentrando a sua actuação apenas numa lista de instituições, por essa via

torna-se difícil conseguir detectar ou controlar os riscos sistémicos de uma forma eficaz,

em vez disso, é provável que incentive a uma migração do risco, que conduz à

subestimação do risco sistémico, e ao desenvolvimento do risco moral (moral hazard).

2.1.1. Dimensão

A dimensão constitui uma medida imperfeita da avaliação do risco. Se não é tomado em

consideração o capital económico, então os activos e a capitalização de mercado dessa

instituição não se consegue traduzir de forma conveniente o risco associado. Por exemplo,

as grandes seguradoras geralmente encontram-se bem diversificadas, tanto a nível

geográfico, como através de diferentes linhas de negócio. Isso espelha o seu modelo de

negócio, o que faz com que estejam expostas a uma ampla gama de modalidades de riscos

potencialmente seguros, de mercado, de negócio entre outros riscos. Como esses riscos

são na sua generalidade idiossincráticos, e partilham uma relação mútua11, o risco total da

instituição é menor do que a soma dos riscos individuais. Esta diversificação ajuda a

explicar a resistência da maioria das grandes seguradoras durante a crise, sendo notável

que uma grande Seguradora é mais diversificada do que um grande Banco. Assim, o

critério relativo à dimensão, carece de distinção entre a concentração de riscos, e a

diluição do risco através do efeito de diversificação.

Naturalmente que a dimensão de uma instituição constitui um factor relevante, e nem

sempre precisa de ser o caso de um grande Banco, que é menos diversificado do que uma

Seguradora de grande dimensão. Mas, portanto, o significado da dimensão para a análise

do risco sistémico vai depender da composição da actividade desenvolvida por uma

instituição, a dimensão de cada um, e da sua interacção com outros factores de risco

sistémico, tais como as interligações. Não é tanto a dimensão que constitui um perigo

visível, mas sim, uma dimensão não diversificada. Tomando em linha de conta a dimensão

11 O princípio da mutualidade constitui uma das principais características da actividade seguradora, onde se garante através de um contributo individual, a distribuição equitativa por uma comunidade de indivíduos, das consequências da verificação de um risco que possa afectar um elemento daquela comunidade, ajudando-o a fazer face aos respectivos prejuízos. Para o bom funcionamento deste princípio é necessário que os riscos assumidos pela Seguradora sejam semelhantes entre si (riscos homogéneos), e que o contributo de cada elemento da comunidade seja igualmente semelhante. Às comunidades assim constituídas damos o nome de comunidades de riscos. São constituídos pelos diversos ramos ou modalidades de seguros explorados pelas seguradoras, como o ramo vida, o ramo acidentes, ou o ramo automóvel, e devem ser economicamente autónomos, no sentido de que os Prémios recebidos por cada ramo devem ser suficientes para pagar as necessárias indemnizações em caso de sinistro.

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como variável institucional, pode-se ignorar este problema, e o risco de julgamentos

errados que estão a ser feitos relativos à relevância sistémica.

2.1.2. Interligação

A interligação constitui uma condição necessária para a relevância sistémica. Só no caso de

o risco poder ser transmitido, pode uma instituição, ou as suas actividades constituírem de

facto um risco para o "sistema". As interacções que se registam entre as diferentes

instituições do sector financeiro são de natureza distinta, incluindo, por exemplo,

participações cruzadas, interacções nos sistemas de pagamentos e operações explícitas de

transferência de riscos (e.g. resseguro e derivados).

Mas aparentemente, semelhante tipo de interligação pode ter efeitos muito diferentes

sobre o sistema financeiro. A título de exemplo, podemos considerar dois tipos de

actividades de transferência de risco, operações de resseguro entre as seguradoras e os

resseguradores, e as transacções de CDS entre Bancos. Ambos envolvem várias partes. No

entanto, enquanto as operações de resseguro mitigam o risco sistémico (distribuindo os

riscos existentes entre várias congéneres, e permitindo a diversificação de riscos), as

operações sobre CDS podem agravá-lo. E, enquanto as operações de resseguro constituem

uma pequena parte do Balanço total de uma seguradora, a crise que antecedeu a

negociação dos CDS foi significativa em relação ao total do Balanço dos Bancos.

O Resseguro efectivamente distribui um risco, cujo tamanho constitui um factor limitador

ao interesse subjacente da actividade seguradora, através de diversas partes, ao mesmo

tempo que permite a diversificação dos diferentes riscos. O risco moral é atenuado, porque

a seguradora continua exposta a uma parte das perdas numa operação de resseguro.

No contexto das catástrofes naturais, a estrutura da indústria de seguros contempla duas

linhas de defesa. Os Resseguradores assumem os denominados "riscos de pico", e actuam

na primeira linha de defesa na ocorrência de eventos extremos (e.g. catástrofes),

proporcionando uma barreira que protege as seguradoras primárias de perdas maciças e

de potenciais insolvências. Em caso de perdas extremas que originem a insolvência dos

resseguradores, o capital das seguradoras primárias, proporciona uma segunda linha de

defesa. Teoricamente, é possível que os efeitos decorrentes de um evento sejam tão

grandes que consigam superar toda a indústria seguradora, mas isso seria, então, uma

catástrofe nacional ou global de proporções inimagináveis (e.g. o furacão Katrina

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enquadrou-se dentro da capacidade da indústria). Nesta circunstância, a natureza do

evento teria causado uma perda, e não a actividade da Seguradora em si.

As operações interbancárias realizadas sobre os CDS, pelo contrário, podem desassociar o

risco de detenção do risco subjacente. Quando o Lehman Brothers entrou em processo de

insolvência em Setembro de 2008, detinha US $ 155 biliões em dívida, e ainda US $ 400

biliões em dívida por saldar através de CDS. Por conseguinte, é possível que as perdas dos

CDS decorram a partir de um evento, com impacto de forma substancial em vários

investidores, do que o próprio evento em si, sendo que a interligação existente no mercado

pode conduzir a um contágio do sistema como um todo.

O efeito de contágio pode ser agravado através de um efeito de opacidade. A complexidade

dos vários instrumentos derivados, e o facto de muitos deles serem comercializados em

mercado OTC, ao invés de serem negociados em mercado bolsista, torna mais difícil de

avaliar a posição de risco das contrapartes no mercado interbancário. Esta opacidade

constituiu um factor importante para a perda de confiança no auge da crise no final de

2008. As transacções entre Seguradoras gozam de um grau de transparência muito

superior, sendo dominadas por um pequeno número de mecanismos padronizados que

são bem compreendidos pelos operadores envolvidos e pelo resto do mercado.

Não se pode discutir que a interligação não seja um critério relevante na avaliação do risco

sistémico de uma seguradora, cabe no entanto salientar que a interligação pode ser um

factor altamente significativo no desenvolvimento de algumas actividades, enquanto para

outras, a interligação é um factor pouco relevante.

2.1.3. Substituibilidade

O grau de substituibilidade de uma instituição de serviços financeiros deve ser avaliado,

considerando duas questões:

(i) A instituição possui alguma especificidade técnica, ou desempenha um papel

único no mercado, que seja difícil de a conseguir substituir em tempo útil por

um outro operador de mercado no curto prazo, caso a instituição esteja na

iminência de desaparecer?

(ii) São as competências que a instituição desenvolve no seu mercado, tão

singulares, ou únicas que outros operadores não possam intervir com

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capacidade suficiente para permitir que o mercado se ajuste e consiga alcançar

o equilíbrio concorrencial?

Por meio destes testes, verifica-se que a actividade seguradora é substituível, e portanto

sistemicamente não é considerada relevante através da análise por meio deste critério. Em

primeiro lugar, nenhuma seguradora detêm o monopólio em qualquer ramo de seguro,

nem existe uma instituição que desempenhe um papel central no mercado, actuando como

câmara de compensação ou actuando como intermediário na negociação de valores

mobiliários ao invés do que se verifica com as instituições de crédito e sociedades

financeiras. Em segundo lugar, a capacidade das seguradoras é substituível. As

seguradoras obtêm a sua capacidade de subscrição de novos negócios a partir de um

variado número de fontes, incluindo o capital externo. No entanto, podemos olhar para os

resseguradores como os derradeiros fornecedores da faculdade de garantirem às

seguradoras uma crescente capacidade para que estas possam de forma contínua,

assegurar e continuar a aceitar novos contratos em diferentes modalidades de seguro. Mas

a capacidade de substituição de um operador no mercado de resseguro, não constitui uma

tarefa árdua. Após a ocorrência de uma catástrofe natural, verifica-se que existe uma

redução na capacidade de resposta do ressegurador, ocorrendo em simultâneo um

incremento nos preços do resseguro que se vai manter por vários anos.

É óbvio que a recapitalização necessária da indústria após uma grande catástrofe não

ocorre da noite para o dia. No entanto também não existe o problema de um operador ser

substituído subitamente por outro. Em primeiro lugar, o critério colocado em relevo pelo

IAIS, demonstra aqui a sua relevância. Enquanto para algumas actividades bancárias seria

exigido de imediato um membro substituto, na realidade, esta urgência não se verifica na

indústria seguradora, sendo que o processo de liquidação de uma seguradora, não implica

que a perda da cobertura garantida ocorra no imediato.

Em segundo lugar, a indústria seguradora e de resseguro, é altamente diversificada por

meio das habituais medidas regulamentares presentes em cada país, e no mundo inteiro

para a actividade de resseguro, sendo que apenas um evento que possa desencadear um

efeito devastador sobre toda a indústria, consegue tornar impossível a contínua subscrição

de novos contratos de seguro. Devido à organização e estrutura do mercado segurador e

ressegurador, a substituibilidade, não é tão relevante para as seguradoras quanto para os

Bancos, onde os sistemas de compensação e de liquidação que ocorrem por exemplo no

mercado monetário interbancário desempenham um papel crítico.

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2.1.4. Tempo

A gestão das participações de sinistro, processa-se de uma forma mais lenta do que a

regularização das margin call, as garantias colaterais e de depósito que existem na

actividade bancária. Por exemplo, menos de metade das reclamações relativas ao evento

do World Trade Center, foram resolvidas dois anos após o evento. Isto é uma consequência

directa da natureza dos sinistros que se registam em larga escala, uma vez que em alguns

casos, o mesmo risco se encontra garantido por diversas apólices.

A falência de um Banco, e as consequentes dificuldades de funding que se sentem no

mercado monetário interbancário, podem provocar o colapso do sistema Bancário muito

rapidamente. Em contrapartida, a insolvência de uma Seguradora constitui um processo

mais ordenado. O ritmo mais lento de uma insolvência aumenta a necessidade de

"substituição", através da garantia do tempo necessário para que se possa restabelecer o

capital necessário e a capacidade da indústria. Podemos desta forma argumentar que as

insolvências na indústria Seguradora apresentam um menor risco sistémico, em

comparação com as falências Bancárias. No entanto, observa-se igualmente que as

dificuldades causadas pela divisão da AIG Financial Products, apresentou uma enorme e

imediata ameaça sistémica, devido em grande parte à política conduzida pelos decisores

governamentais dos EUA, o que conduz de novo para a necessidade de se considerar para

efeitos de análise ao risco sistémico a actividade desenvolvida, ao invés das instituições.

2.2. Factores que contribuem para a avaliação da importância sistémica

Cada um dos três factores seguintes, nível de alavancagem, liquidez e o nível de

combinação entre o activo e o passivo que compõe o Balanço de uma instituição, e nível de

complexidade, de forma independente não são fontes geradoras de risco sistémico, mas

devem ser considerados juntamente com o principal critério. Podemos considerar o nível

de alavancagem e de liquidez em conjunto, à semelhança das actividades de alavancagem

realizadas no mercado Bancário (por exemplo, o uso de financiamento por grosso para

aumentar a capacidade da instituição de crédito em relação à sua base de depósitos, por

meio do aumento do rácio de transformação), e uma inadequada gestão integrada da

liquidez para que uma instituição passe a ter uma exposição ao risco de falta de liquidez

no mercado por grosso, durante um determinado período de tempo.

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Mas para as Seguradoras tradicionais, o conceito de alavancagem é diferente daquele que

vigora no mercado Bancário e, portanto, a natureza do risco de liquidez é diferente. A

actividade Seguradora é auto financiada através da afluência dos Prémios que são

cobrados, sendo que a alavancagem não constitui uma parte do modelo de negócio do

Seguro, sendo que as Seguradoras não necessitam de recorrer ao efeito de alavancagem

para poderem funcionar. As Seguradoras têm que manter a liquidez adequada, à medida

que vão tendo a necessidade de proceder a pagamentos junto dos seus tomadores de

Seguro. Muitos desses pagamentos são sinistros já previstos, assim como o pagamento de

pensões, mas em alguns casos, os tomadores têm a capacidade de acelerar os pagamentos,

através de resgates antecipados dos contratos. Estes pagamentos são financiados, em

primeiro lugar, através de entradas de Prémios, e posteriormente através da alienação de

valores mobiliários detidos na sua carteira de investimentos. As Seguradoras não se

encontram dependentes do financiamento em larga escala, a fim atenderem aos resgates

dos seus tomadores, ou devido a qualquer outra necessidade operacional. Por conseguinte,

enquanto a liquidez é um tema relevante em todas as instituições financeiras, a natureza

do risco é muito díspar para diferentes actividades, assim como as métricas necessárias

para se poder medir este risco, e as medidas necessárias para a sua mitigação.

Finalmente, o FSB elege a complexidade como um factor contribuinte. A complexidade, por

si só não constitui uma questão relevante, excepto na medida em que as transacções intra-

grupo, podem vir a impedir uma insolvência ordenada, contribuindo para um

agravamento do risco sistémico. Para os Bancos, este é o particular caso quando as

operações intra-grupo também são desenvolvidas em diferentes geografias. Mas para um

grupo Segurador que não exerça actividades Bancárias, as operações intra-grupo são

usadas tendo em vista alcançar uma maior eficiência na gestão do capital, não devendo

com isso, interferir numa ordenada insolvência, assim como na regulação da entidade

global mais complexa, uma vez que o Balanço de cada Seguradora constitui uma entidade

regulada.

2.3. O processo de insolvência e de falência: a experiência da indústria

Seguradora

Enquanto as tentativas de regulamentação, visam limitar a possibilidade de insolvência e,

em particular as insolvências provocadas por meio de decisões de gestão imprudentes, as

insolvências das seguradoras, como tal, não devem ser consideradas como algo que deva

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ser evitado a qualquer custo. O desaparecimento de um operador, e o surgimento de novos

participantes no mercado constitui um elemento essencial, que deve estar presente nas

economias de mercado.

No entanto, a regulamentação constitui um factor importante na garantia da estabilidade

no mercado segurador, através da definição de regras ou de princípios, que evitem ou

mitiguem os efeitos das insolvências em circunstâncias que possam despoletar um colapso

sistémico, bem como prestar protecção aos direitos e garantias dos tomadores de seguro e

de outros beneficiários. A experiência da indústria de Seguros em casos de insolvência

contrasta com a do sector bancário. A insolvência por parte de Seguradoras, e a

descontinuidade de operações no mercado, tradicionalmente são conduzidas de uma

forma ordenada.

(i) Os sinistros são resolvidos de forma ordenada, uma vez que as Seguradoras

são obrigadas a deter reservas para fazer face aos sinistros participados pelos

seus segurados, bem como para os sinistros ocorridos, mas que ainda não

foram participados, sendo que um processo de insolvência acelerado é de todo

um cenário a evitar. A valorização das obrigações decorrentes dos contratos de

seguro em reembolso, em particular, no que diz respeito à avaliação das

reservas de perda, é inteiramente avaliada como parte do processo de

insolvência.

(ii) Uma intervenção antecipada por parte dos supervisores de mercado permite à

gestão da Seguradora trabalhar em estreita colaboração com o regulador, a fim

de se poder garantir a melhor forma de acção, que vise a protecção dos

tomadores de seguro, e que contemple a transferência da carteira de apólices

de Seguro para uma outra congénere, que apresente melhores condições de

Solvabilidade.

(iii) Assiste-se a uma baixa percentagem de apólices do ramo Vida que anulam por

falta de pagamento durante um processo de insolvência, em comparação com

os casos que se observam durante a execução de um Banco, (resgate maciço de

depósitos seja à ordem, ou a prazo), embora de forma ligeiramente superior

assente num pressuposto de continuidade. Para as Seguradoras do ramo Vida,

desde que as anulações estejam associadas a significativas penalizações para

os tomadores de seguro, o índice de anulações transversal a todas as

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responsabilidades da carteira do ramo Vida, durante uma insolvência, não

podem ser comparados com o processo de insolvência de um Banco. Deste

modo não se verifica um aumento imediato na necessidade de liquidez. Além

disso, a insolvência de uma carteira (fechada) de apólices do ramo Vida pode

constituir um bom negócio para algumas congéneres concorrentes.

(iv) O processo de recuperação de uma Seguradora pode estender-se por vários

anos, em alguns casos, muito antes da instauração do processo formal de

insolvência, desde que a maturidade dos seus passivos se possa estender

durante um período prolongado de tempo. A longevidade dos diferentes

passivos vai permitir a recuperação do valor dos activos mobiliários que

estejam vinculados a essas responsabilidades, que não podem servir como

garantia, ou penhor perante os credores, a não ser a favor dos beneficiários das

apólices, uma vez que constitui um património autónomo.

(v) A partir de uma perspectiva sistémica, é importante observar a estrutura

original da carteira da Seguradora. As Seguradoras denotam uma falta de

negociação em dois sentidos, uma vez que a maioria tem apenas um conjunto

de suportes de responsabilidades, os seus tomadores de Seguro, e apenas um

conjunto de activos, os seus investimentos. Assim, o risco de envolvimento,

colateral e de contraparte em espiral, por esta via não representam os

principais riscos em caso de insolvência.

A insolvência de uma Seguradora, ou de um Banco, não são perfeitamente comparáveis

uma vez que assentam em modelos de negócio diferenciados, através de mecanismos de

desdobramento quer de responsabilidades quer das suas consequências. A natureza

ordenada do desenrolar de uma insolvência de uma Seguradora, actualmente contribui

para a estabilidade do sistema financeiro. No entanto, observa-se que a natureza das

insolvências além fronteiras, é justificada após uma análise mais aprofundada, e

coordenada entre os reguladores a nível nacional e internacional.

Uma rigorosa regulamentação é imposta para que as reservas sejam suficientes para a

cobertura dos passivos. Em diversos regimes jurídicos, existem os chamados "bens

vinculados", que tem que corresponder às reservas em montante, e que devem ser

investidos de forma segura, de acordo com as regras de investimento mais ou menos

prescritivas. Além disso, existem requisitos de constituição de reservas significativos que

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visam garantir possíveis participações de sinistros, "incorridas, mas que ainda não foram

participados" (e não apenas "participados, mas ainda não liquidados”). Os sinistros dos

tomadores de seguro em geral, costumam ser motivo de tratamento privilegiado quando

se está perante um processo de insolvência de uma seguradora, através de uma ordenação

(tipificação) das situações que inspirem uma maior atenção, dada a natureza do sinistro,

ou através da definição de outros mecanismos de resolução.

Os Supervisores dispõem de poderes suficientes perante uma insolvência, que passam por

um recuo na licença atribuída, uma falência forçada, e a transferência da carteira de

apólices para uma ou um grupo de Seguradoras em separado, que dêem garantias de

estabilidade. Durante os procedimentos decorrentes de um processo de insolvência, os

Supervisores podem actuar como liquidatários, ou procederem a uma desintegração da

entidade em causa.

2.4. Conclusão sobre os critérios utilizados pelo FSB e o IAIS relativos ao risco

sistémico

Os critérios de risco sistémico apresentados pelo FSB e o IAIS, demonstram como o risco

sistémico reverte, não para as empresas, mas para as actividades em concreto dessas

empresas.

(i) A dimensão pode indiciar a presença de risco sistémico na instituição, quando

as suas exposições estão concentradas apenas numa única área. No entanto,

quando a dimensão é acompanhada pelo efeito de diversificação, pode

conduzir a uma redução do risco sistémico.

(ii) A interligação constitui um critério essencial na avaliação do risco sistémico.

No entanto, diversas actividades altamente interligadas, podem mostrar uma

velocidade de propagação, e consequentemente um diferenciado impacto e,

portanto, com implicações muito diferentes na avaliação do risco sistémico.

(iii) O risco de substituibilidade no sector segurador, depende em parte da

velocidade e do impacto financeiro do "evento de crise". Uma crise como a que

se presenciou no sector da Banca, a qual acelerou ao longo do tempo, não

concede o tempo suficiente para que o mercado se consiga recapitalizar. Em

contraste, um evento de uma grande Seguradora vai abrandando ao longo do

tempo, o que permite que o mercado possa recuperar ao longo do tempo.

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2.5. A limitação interventiva das autoridades públicas competentes e seus

efeitos

A experiência recente demonstrou, que a insolvência das instituições sistemicamente

relevantes pode exacerbar numa crise, se as suas consequências sobre o sector financeiro

como um todo não forem correctamente geridas. Os acontecimentos que acompanharam a

crise financeira do Fortis Bank, Lehman Brothers, e dos Bancos Islandeses, ilustram bem o

grau em que a ausência de um quadro de resolução adequado pode ser prejudicial para a

estabilidade financeira do sistema financeiro como um todo. De facto, na gestão da recente

crise, os Governos tenderam a circunscrever-se aos activos domésticos dos grupos que

operam internacionalmente, e a aplicar instrumentos de resolução de crises nacionais a

entidades individuais, em vez de procurarem uma solução ao nível do grupo, ou seja, para

o conglomerado financeiro. No entanto, a delimitação dos activos nacionais, poderá

complicar ao invés de facilitar, a resolução de um problema que afecta um grupo

transnacional. Em alguns casos, este tipo de medida resulta em perdas mais pesadas para

o grupo financeiro (conglomerado) como um todo. O incentivo para os Governos

aumentarem o nível de cooperação, e se absterem da delimitação dos activos domésticos

durante a crise transfronteiriça, foi amortecido através da necessidade em proteger os

interesses das partes interessadas a nível nacional, (em especial, os credores, os

contribuintes, e o sistema de garantia de depósitos). Esta barreira para a cooperação na

resolução da insolvência de um grupo transfronteiriço está limitada a um campo

estritamente nacional das Leis de insolvência. Se estas leis são nacionais, as autoridades

nacionais têm um interesse legítimo, e um forte interesse político, na protecção do

património nacional de um Banco que se encontre em dificuldades, com o objectivo de

proteger os seus depositantes, e maximizando os recursos disponíveis para os credores

dessa entidade.

2.6. A natureza do risco sistémico, e o processo dinâmico de acumulação de

riscos

Empiricamente observa-se de uma forma geral, de que os retornos obtidos pelos

investidores na indústria financeira, apresentam um desempenho mais elevado do que em

qualquer outro sector da economia. O indicador de desempenho mais comum seguido

pelos investidores, a fim de poderem basear as suas opções de investimento, é o return on

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equity12 (ROE). Olhando para além do desempenho das empresas em termos individuais,

destacam-se os níveis de rentabilidade característicos dos diferentes sectores da

economia. Comparações feitas antes da crise financeira, os dados tendem a revelar que o

retorno sobre o sector financeiro, foi geralmente mais elevado do que o observado noutros

sectores da economia. No entanto, essas comparações devem ser analisadas com alguma

precaução, uma vez que o sector financeiro não é homogéneo. Diferentes actividades e

linhas de negócio, geram retornos muito diferentes sobre o capital próprio. Mas, na

ausência de qualquer padrão de definição de sectores específicos, especialmente no que

diz respeito aos serviços da Banca de retalho, e de investimento, uma análise muito

detalhada sobre as empresas de serviços financeiros, o ROE demonstra alguma evidência.

Mesmo assim, no decorrer da crise que se viveu, esta tendência parece não ter sido

contrariada. Depois de um declínio acentuado que se verificou em 2008, a rentabilidade

dos serviços financeiros, e dos Bancos em particular, recuperou rapidamente em 2009,

devido principalmente à actualização da carteira de negociação, bem como pelas taxas de

juro historicamente baixas, que permitem realizar de forma contínua sucessivas operações

de arbitragem em diferentes mercados, e sobre diversos valores mobiliários.

As expressivas indemnizações que foram pagas aos traders, e às equipas de gestão

colocando de lado as questões éticas que possam ser suscitadas, e que geraram profundas

discussões a nível mundial, em parte constituem o reflexo associado à elevada

rentabilidade que o sector financeiro mundial apresenta. O ponto de ruptura nesta

questão, coloca-se através da legitimidade que os traders apresentam para terem sido

contemplados com elevados bónus, e em alguns casos, indemnizações milionárias (golden

parachutes) quando na realidade o total do rendimento passível de ser distribuído por

uma sociedade financeira em alguns não era significativo.

Por outro lado, o próprio esquema de incentivos delineado por muitos Conselhos de

Administração de várias empresas, que incorporavam a perspectiva de elevadas

compensações futuras, foi um dos catalisadores que incentivou os traders a privilegiarem

nos seus planos estratégicos, uma estratégia assente fortemente em acções de curto prazo,

que posteriormente se vieram a revelar, como sendo potencialmente arriscadas, e

12 O ROE consiste na relação entre o resultado líquido da empresa, obtido num determinado exercício económico, e o seu capital próprio, traduzindo a taxa de retorno para os accionistas, e expressando a eficiência da empresa em gerar lucros sobre cada unidade monetária do seu capital próprio, ou seja, mostra como a empresa usa o dinheiro dos accionistas para gerar resultados. Uma empresa com um ROE elevado comparado com o das suas congéneres, pode através do reinvestimento dos resultados, conseguir uma taxa de crescimento muito mais elevada (até exponencial).

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perturbadoras com um forte impacto no normal funcionamento destas empresas, em

particular na confiança já alcançada junto dos diferentes stakeholders.

Após a reunião do G20 em Pittsburgh, em Setembro de 2009, foram adoptados vários

princípios com o objectivo de se conseguir controlar a matriz de compensações dos

gestores, com o objectivo de os conseguir envolver, e comprometer perante metas de

desempenho de médio a longo prazo, que passariam a ser obrigatórias por parte de cada

um dos países signatários deste acordo. O Reino Unido e a França em 2009, decidiram

adicionalmente, criar um imposto fiscal que passou a incidir sobre o bónus que

futuramente fossem pagos aos traders e aos gestores.

À primeira vista, as características da rentabilidade do sector financeiro justificam-se

através do papel económico que desempenham. Na verdade, o papel primal do sector

financeiro é o de cobrir, agregar e gerir os riscos que os agentes económicos de forma

individual demonstram não ter a suficiente capacidade para tomar sobre si. Por outras

palavras, o sector financeiro acumula riscos para garantir que o sistema económico

funcione perfeitamente. Temos assim os Bancos a administrar os riscos de mercado,

crédito, e a converterem riscos, uma vez que a maturidade dos seus empréstimos, é maior

do que a do seu refinanciamento, o que demonstra ser de uma importância vital para o

financiamento da economia. As Seguradoras através dos riscos que foram subscritos no

passado, gerem os potenciais riscos de perda dos seus Tomadores de Seguro,

independentemente da sua natureza, através das participações de sinistros, e das

provisões técnicas que regularmente têm que ser monitorizadas e ajustadas face aos

custos de contexto. Os lucros que os stakeholders das sociedades financeiras conseguem

obter acima do alcançado pelos stakeholders de empresas não financeiras durante os

períodos de crescimento, parecem em parte justificar-se, pelo facto destes lucros gerados,

servirem especialmente para recompensar os riscos incorridos pelos seus accionistas, por

via da exigência de um prémio de risco mais elevado, o que pode conduzir a graves riscos

económicos, no caso de se verificar um evento exógeno, e as sociedades financeiras terem

que posteriormente vir a suportar a factura motivada por um default de uma empresa, ou

por via de uma catástrofe natural.

Olhando mais profundamente, podia-se colocar a questão, se o nível de rentabilidade

obtido, exprimiria a influência ou não, de outros factores, tais como a falta de

concorrência, ou a assumpção de riscos demasiadamente excessivos.

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2.7. A gestão de risco na indústria financeira

Uma instituição que opere na indústria financeira, independentemente da sua actividade, é

obrigada a realizar de forma contínua uma monitorização da gestão dos seus riscos (risco

de crédito, de mercado, de taxa de juro de balanço, de liquidez e operacional), em que

incorre, uma vez que por via dos seus efeitos pode desencadear um efeito de alavancagem

sobre o mercado originando desta forma o surgimento de uma cadeia sistémica, com

efeitos de propagação sobre os diferentes players, com consequências previsíveis de

influenciarem o seu resultado operacional e financeiro.

2.7.1. Risco de crédito

O risco de crédito, resulta da possibilidade de ocorrência de perdas financeiras

decorrentes do incumprimento do cliente ou contraparte relativamente às obrigações

contratuais estabelecidas através da instituição de crédito no âmbito da sua actividade

creditícia, constitui o risco mais relevante a que se encontra exposta a actividade de um

Banco. Na generalidade dos Bancos tem sido prosseguida uma política de gestão

permanente das carteiras de crédito que privilegia a interacção entre as várias equipas

envolvidas na gestão de risco ao longo das sucessivas fases da vida do processo de crédito.

Para tal, tem vindo a verificar-se uma melhoria contínua ao nível:

(i) Da modelização do risco de crédito, com consequente diminuição do peso da

subjectividade na sua apreciação.

(ii) Dos procedimentos e circuitos de decisão, com destaque para a independência

da função de risco, delegação de poderes de acordo com níveis de rating13 e

adequação sistemática do pricing, maturidade e garantias dos clientes.

(iii) Dos sistemas de informação relacionados com a disponibilização das

diferentes variáveis inerentes à avaliação do risco de crédito de modo a

permitir a sua consulta a todos os intervenientes no processo de crédito.

(iv) Da independência do processo de formalização e execução das operações de

crédito face à estrutura de originação.

13 Termo utilizado para designar a classificação de uma empresa ou instituição em termos de risco de crédito, tendo em conta a sua situação económica e financeira.

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A implementação do vasto conjunto de iniciativas desenvolvidas ao longo dos últimos

anos, aliada à cobertura quase integral das posições creditícias por ratings internos,

permite que o processo de concessão de crédito por parte de instituições bancárias seja

assente na utilização abrangente de métricas de rendibilidade ajustada pelo risco. De

forma transversal à quase totalidade dos segmentos comerciais, os ratings internos são

incorporados directamente na definição dos poderes de crédito dos diferentes escalões de

decisão, sendo igualmente utilizados como suporte à diferenciação de pricing.

2.7.2. Risco de mercado

Por seu lado o risco de mercado representa genericamente a eventual perda resultante de

uma alteração adversa do valor de um instrumento financeiro, em consequência da

variação de taxas de juro, taxas de câmbio, preço dos valores mobiliários (e.g. acções) e no

preço das mercadorias.

O principal elemento de medição do risco de mercado consiste na estimação das perdas

potenciais sob condições adversas de mercado, para o qual é utilizada a metodologia Value

at Risk (VaR). Algumas instituições financeiras utilizam a simulação de Monte Carlo, com

um intervalo de confiança de 99% e um período de investimento de 10 dias para calcular o

VaR. As volatilidades e correlações são históricas, com base num período de observação de

1 ano, ou através de outras iniciativas como exercícios de back testing, que consistem na

comparação entre as perdas previstas no modelo e as perdas efectivas. Estes exercícios

permitem aferir a aderência do modelo à realidade, e assim melhorar a sua capacidade

preditiva. Como complemento ao VaR, têm também sido utilizados cenários extremos (de

stress testing) para avaliação das consequentes perdas potenciais. De forma a

complementar a mensuração do risco, procede-se ainda à análise da simulação de cenários

extremos a todos os factores de risco, tendo como base as variações mais e menos

positivas verificadas a 10 dias nos últimos 20 anos.

2.7.3. Risco de liquidez

O risco de liquidez, é o risco actual, ou futuro que deriva da incapacidade de uma

instituição poder solver as suas responsabilidades à medida que se vão vencendo, sem

incorrer em perdas substanciais. Os Bancos estão sujeitos a risco de liquidez por inerência

do seu negócio de emprestadores de longo prazo, e depositários de curto prazo. O ano de

2010 foi marcado pela crise do risco soberano na zona Euro. Esta crise reflectiu a

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desconfiança dos investidores relativamente à capacidade de algumas economias

manterem níveis de endividamento elevados num ambiente económico que, a partir da

crise do crédito subprime, passou a ser caracterizado por uma liquidez global menos

disponível e por critérios de financiamento muito mais restritivos. Passos importantes na

estabilização da zona Euro foram a actuação do BCE na aquisição de títulos de dívida das

economias da periferia, bem como o prolongamento das injecções de liquidez no sistema

financeiro. A gestão do risco de liquidez deve estar centralizada num comité, ou

departamento onde seja delineado anualmente um Plano Financeiro baseado no

orçamento aprovado. Com base nas necessidades de financiamento previstas, é

estabelecido um plano anual de emissões e securitização, devendo este plano ser

monitorizado regularmente, e revisto ao longo do ano sempre que necessário.

Monitorizar e controlar o risco de liquidez, reveste-se de uma importância fundamental

para qualquer instituição Bancária. O seu objectivo visa manter um nível satisfatório de

disponibilidades no curto prazo para fazer face às suas necessidades financeiras, bem

como assegurar o refinanciamento atempado da sua actividade corrente, optimizando o

custo e maturidade através do recurso a várias medidas como gaps de liquidez, e rácios de

liquidez. Efectuar igualmente stress-tests onde são consideradas necessidades adicionais

de financiamento, com base em cenários extremos mas plausíveis de forma a se poder

antecipar possíveis constrangimentos que afectem a liquidez da instituição.

Como fonte adicional de liquidez, algumas instituições mantêm na carteira títulos, valores

elevados de títulos elegíveis para redesconto, quer junto do Sistema de Bancos Centrais

Europeus quer no mercado de repos.

2.7.4. Risco operacional

O risco operacional representa a probabilidade de ocorrência de eventos com impactos

negativos, nos resultados, ou no capital, resultantes da inadequação ou deficiência de

procedimentos, sistemas de informação, comportamento das pessoas ou motivados por

acontecimentos externos, incluindo os riscos jurídicos. Desta forma, assumimos o risco

operacional como o cômputo dos seguintes riscos: operativo, de sistemas de informação,

de compliance e de reputação. A gestão do risco operacional é efectuada através da

aplicação de um conjunto de processos que visam assegurar a uniformização,

sistematização e recorrência das actividades de identificação, monitorização, controlo e

mitigação deste risco.

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O modelo de gestão de risco operacional encontra-se suportado por uma estrutura

organizacional exclusivamente dedicada ao seu desenho, acompanhamento e manutenção,

em estreita articulação e com a participação activa dos seguintes elementos:

(i) Representantes do risco operacional dos departamentos, sucursais e

subsidiárias integradas no perímetro da gestão do risco operacional. Aos quais

compete assegurar, nas suas unidades, a aplicação dos procedimentos

definidos e a gestão diária do risco operacional, em estreita articulação com a

área de risco operacional.

(ii) Departamento de compliance, nomeadamente a através de uma unidade de

gestão do sistema de controlo interno, pelo seu papel na garantia da

documentação dos processos, na identificação dos seus riscos específicos e dos

controlos implementados, na determinação do rigor do desenho dos controlos

e na identificação das acções de melhoria necessários para a sua plena eficácia,

sendo contínua a comunicação de, e para a gestão do risco operacional.

(iii) O departamento de auditoria interna, pelo seu papel no teste da eficácia da

gestão dos riscos e dos controlos, bem como na identificação, e avaliação da

implementação das acções de melhoria necessárias.

(iv) Gabinete de coordenação de segurança, pelo seu papel no âmbito da segurança

de informação, segurança física e de pessoas e da continuidade de negócio.

Os elementos subjacentes ao risco operacional que uma instituição Bancária se encontra

mais exposta basicamente dizem respeito a eventos relacionados com o risco de dano em

activo físico, fraude externa, fraude interna, interrupção do negócio e falhas de sistemas,

gestão de recursos humanos, e segurança no local de trabalho, execução, distribuição e

gestão de processos a clientes, produtos e práticas de negócio.

2.7.5. Risco de taxa de juro do Balanço

O risco de taxa de juro do Balanço, refere-se à exposição da situação financeira de um

Banco a movimentos adversos nas taxas de juro. Pode ser interpretado de dois modos

diferentes mas complementares, como o efeito sobre a margem financeira, ou como o

efeito sobre o valor do capital, decorrente de movimentos nas taxas de juro que afectam a

carteira Bancária da instituição. As variações nas taxas de juro de mercado, afectam a

margem financeira do Banco, através da alteração dos proveitos, e dos custos associados

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aos produtos de taxa de juro, e através da alteração do valor subjacente dos seus activos

passivos, e instrumentos fora de balanço.

No caso de uma instituição Bancária, Seguradora ou Fundo de Pensões, o risco de taxa de

juro advém essencialmente das obrigações a taxa fixa emitidas a longo prazo que não se

encontrem devidamente cobertas por swaps de taxas de juro ou para as quais não existam

activos (obrigações, e crédito a taxa fixa) que mitiguem a exposição a esse risco.

A exposição ao risco de taxa de juro da carteira de investimentos é calculada com base na

metodologia do Banco de Pagamentos Internacionais (BIS). Segundo este método, são

classificadas todas as rubricas do activo, do passivo e extra patrimoniais que sejam

sensíveis a oscilações das taxas de juro, e que não pertençam à carteira de negociação, por

escalões de refixação da taxa de juro. O modelo utilizado baseia-se numa aproximação ao

modelo de cálculo da duration, e consiste num cenário de stress testing correspondente a

uma deslocação paralela da curva de rendimentos (yield curve) de 200 pontos base, em

todos os escalões de taxa de juro (Instrução nº 19/2005 do Banco de Portugal).

As medidas de risco de taxa de juro quantificam, essencialmente, os efeitos das variações

das taxas de juro na situação líquida, e no resultado financeiro.

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3. O nível de concorrência na indústria financeira global

A literatura académica relativa à concorrência, abrange em grande parte a economia

industrial, a investigação sobre a concorrência nos serviços financeiros, é por este motivo

residual. Isto justifica-se em parte, porque o mercado relevante para analisar o nível de

concorrência em certas actividades financeiras tornou-se global (e.g. as actividades de

corporate, de investment banking, e a gestão de activos alternativos), e nenhum organismo

internacional, com a possível excepção da OCDE, consegue reunir e tratar a informação

existente sobre esta temática. O mesmo já não se pode dizer das actividades financeiras,

em que o mercado relevante é constituído pelo mercado nacional (e.g. Banca de retalho e a

indústria Seguradora). Como as actividades financeiras estão organizadas a nível global, o

pressuposto baseado na característica do mercado relevante, sugere que a concorrência é

insuficiente. Em particular, as condições de concorrência perfeita, que ponto de vista do

consumidor, é a situação ideal, porque são aquelas que garantem um preço mais baixo e

uma garantia de maior satisfação, não são cumpridas quando se verificam os seguintes

pressupostos:

(i) Atomicidade: existência de um elevado número de vendedores, e de

compradores, todos eles de importância e dimensão reduzidas, de tal forma

que, individualmente, nenhum deles tem capacidade para influenciar,

significativamente, nem o preço nem as quantidades oferecidas do bem.

(ii) Homogeneidade do produto: os bens oferecidos pelos diversos vendedores são

homogéneos, por isso, para o comprador é indiferente optar pelo bem do

produtor A ou B.

(iii) Transparência: todos os intervenientes no mercado têm acesso a toda a

informação disponível.

(iv) Perfeita Mobilidade (livre acesso ao mercado): não existem barreiras nem à

entrada nem à saída do mercado. Qualquer produtor pode passar a produzir

esse bem quando desejar, e deixar de o produzir da mesma forma.

Sempre que um dos pressupostos mencionados em cima não se verifique, o mercado é

considerado de concorrência imperfeita.

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No entanto, o que se verifica em alguns mercados, é precisamente o oposto.

(i) Em alguns mercados, os participantes podem ser poucos em número, mas

cinco instituições podem ser responsáveis por mais de 70% do mercado em

questão14.

(ii) Falta de homogeneidade nos produtos que são comercializados. Isto aplica-se

especialmente aos instrumentos derivados over the counter, uma vez que

apenas uma parte destes instrumentos são negociados em mercado

organizado.

(iii) Pressuposto de uma forte assimetria na informação entre os diferentes

participantes, bem como, o acesso a informação privilegiada (inside trading).

(iv) Barreiras à entrada, e à saída em determinados mercados, não sendo por isso

considerados como verdadeiramente livres, dado o custo de acesso a

actividades mais sofisticadas, uma vez que os recursos técnicos, e humanos

necessários para desenvolver por exemplo uma sala de trading são

manifestamente elevados.

O único critério de concorrência perfeita aparentemente satisfeito, prende-se com a

mobilidade dos factores de produção, o factor produtivo trabalho na actividade financeira

é muito móvel. A organização de determinadas actividades financeiras mais sofisticadas a

nível internacional, traz à mente as teorias de oligopólio natural, sendo que alguns dos

lucros gerados pelas actividades financeiras, correspondem a um comportamento do tipo

rent-seeking15. O motivo pelo qual os diferentes reguladores de mercado atribuem um peso

tão reduzido ao comportamento concorrencial dos stakeholders que actuam no mercado

financeiro, justifica-se pelo facto de a relação entre a concorrência e a estabilidade

financeira não se encontrar devidamente definida por não ser transparente, e pelo facto de

não existir uma relação directa, nem de causalidade, entre a posição dominante dos

stakeholders financeiros presentes num mercado, e o seu comportamento de risco.

14 Medido através do índice Ck, que representa um índice de concentração, onde o valor de Ck varia entre k/n, onde n é o número total de empresas (concentração mínima) e 1 (concentração máxima). A situação de concentração mínima verifica-se quando todas as empresas têm a mesma quota de mercado in Economia Industrial, Mc Graw-Hill, 2001. 15 Rent seeking é uma transferência de recursos, sem contrapartida, de uma outra pessoa ou pessoas, para o rent-seeker, como resultado de uma “decisão favorável de uma política pública”. O termo foi concebido por Anne Kreuger (1974). Exemplos de comportamentos rent-seeking incluem todas as formas de lobbying de indivíduos ou grupos nos impostos, na despesa pública e na regulação da actividade económica, que confira benefícios ou outra vantagem especial para os rent-seekers à custa dos contribuintes, dos consumidores ou outros indivíduos, com quem os rent-seekers estão em competição pelos recursos. Um exemplo de rent-seeking nas universidades, é um aluno procurar boas notas na base de copiar por outro aluno.

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3.1. Barreiras à entrada, à saída e à mobilidade na indústria financeira

Para Bain16 verificam-se barreiras à entrada na medida em que, no longo prazo, as

empresas instaladas possam fixar preços acima do custo médio mínimo, sem com isso

induzir a entrada de novas empresas no mercado. Stigler17, por outro lado, defende que as

barreiras à entrada podem ser definidas como custos que têm de ser incorridos por

empresas que desejem entrar no mercado, mas não pelas empresas que já se encontram

no mercado. Tanto a definição de Bain como a definição de Stigler têm os seus problemas.

Consideremos por exemplo o caso de um “monopólio natural”, entendido aqui como um

mercado em que uma empresa pode ser rentável ser for monopolista, mas se não tiver a

concorrência de uma segunda empresa (note-se, no entanto que esta não é a definição

mais comum de monopólio natural). No equilíbrio de longo prazo deste mercado, apenas

uma empresa estará activa, e esta, supostamente, fixará um preço superior ao mínimo do

custo médio. Por conseguinte, verificam-se barreiras à entrada segundo a definição de

Bain. No entanto, este equilíbrio é compatível com a hipótese de que a empresa instalada e

os potenciais entrantes tenham a mesma tecnologia, não se verificando, por conseguinte,

barreiras à entrada segundo a definição de Stigler.

Problemas de definição semelhantes encontram-se também quanto aos conceitos de

barreiras à saída, e de barreiras à mobilidade. Diz-se que se verificam barreiras à saída

quando uma empresa instalada tem de incorrer, directa ou indirectamente num custo para

sair do mercado. Por exemplo, a cessação de uma determinada operação (e.g.

desinvestimento numa filial) tem custos associados, sendo este um custo directo. Uma

empresa proprietária de capital físico não amortizado, e específico do negócio, que queira

sair do mercado, incorre num custo de oportunidade por não ser possível vender esse

capital, ou aplicá-lo em actividades alternativas, este é um custo indirecto.

O conceito de barreiras à mobilidade, finalmente, procura generalizar os conceitos de

barreiras à entrada e de barreiras à saída. A entrada num determinado segmento de um

determinado mercado, dá-se não somente por entrada de empresas completamente novas

mas também por empresas já instaladas noutros segmentos. Segundo R. Caves e M. Porter,

o que impede as empresas de livremente escolherem um segmento ou outro, é o facto de

possuírem activos cuja utilidade é específica do segmento em que se encontram. É

justamente a existência destes activos específicos que constitui as chamadas barreiras à

16 Joe Bain in Industrial Organization, New York, Wiley, 1968. 17 George Stigler, The Organization of Industry, Chicago: University of Chicago Press, 1983.

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mobilidade (assim, o conceito de barreiras à mobilidade aproxima-se da definição de

Stigler de barreiras à entrada)18.

3.2. Fixação do prémio de risco na actividade desenvolvida pelo sector

financeiro

Os retornos obtidos a partir dos investimentos realizados no passado, são proporcionais

aos riscos assumidos numa determinada actividade, através de uma contrapartida,

compreendida através do binómio risco vs retorno. O cash-flow libertado (dividendos,

cupões, direitos de subscrição) pelos diferentes valores mobiliários que constituem a

carteira de investimento dos diferentes accionistas, investidores, gestores e traders deve

assim permitir a cobertura dos potenciais prejuízos que podem vir a sofrer, no caso de o

risco se materializar. A rentabilidade das actividades financeiras, depende em larga

medida dos riscos incorridos.

Existem duas entidades que exercem uma influência no cálculo desses riscos:

(i) Os investidores, ou seja, o mercado, que em troca da dotação prevista pela

tomada de risco, geralmente na forma de dívida ou de capital próprio,

procuram uma compensação compatível com a estimativa dos riscos

envolvidos.

(ii) Os reguladores, que submetem os agentes financeiros às exigências

regulatórias, e prudenciais consoante os níveis estimados de risco.

3.3. Fixação por parte do mercado do Prémio de risco do sector financeiro

Existem pelo menos dois factores que sugerem que o mercado possa não estar a reflectir

correctamente o Prémio de risco no sector financeiro. Em primeiro lugar, a complexidade

das actividades financeiras coloca a grande maioria dos investidores numa desvantagem

face aos agentes financeiros de maior dimensão. Esta assimetria pode conduzir a uma

subestimação dos riscos assumidos por parte dos investidores, quando decidem entrar no

capital de uma determinada sociedade (accionistas), ou tomar parte numa emissão de

dívida (credores) de uma determinada instituição, ou sociedade financeira e, portanto,

exigirem um Prémio de risco menor, incrementando deste modo a rentabilidade da

instituição financeira. Constitui o principal papel das agências de rating, a elaboração de

18 Richard E. Caves e Michael E. Porter, “From entry barriers to mobility barriers: conjectural decisions and contrived deterrence to new competition”, Quarterly Journal of Economics 91 (1977), 241-267.

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informação financeira relativa a essa sociedade, de forma a esclarecer os investidores,

tanto quanto possível, para que as suas decisões sejam tomadas em consciência. No

entanto, os métodos das agências de rating não tiveram, e continuam a não reflectir

convenientemente todos os riscos, atribuindo em particular, uma importância insuficiente

ao risco de liquidez. Além disso, os investidores podem ser levados a subestimar os riscos

assumidos nas instituições financeiras, se acreditarem, que estas instituições são

demasiadamente “too big to fail”, e por esta via possam vir a beneficiar de algum tipo de

garantia implícita prestada por parte das autoridades governamentais do país de origem.

3.4. Fixação do Prémio de risco por parte dos reguladores para o sector

financeiro

A prestação de serviços financeiros, é suportada na teoria de que não pode existir uma

arbitragem regulatória, ou seja, não podem haver “almoços grátis", não sendo permitido

aos diferentes players que operam no mercado obterem um lucro certo e sustentável a

partir de uma estratégia de custo zero. Por outras palavras, para uma única actividade não

podem existir duas medidas de risco inerentes, correspondendo a dois níveis possíveis de

rentabilidade. Se uma actividade gera retornos excepcionais, em parte devido à

predisposição de um agente ser mais avesso ao risco (menos prudente), isso terá que se

verificar de forma pontual, caso contrário, os agentes financeiros irão rapidamente

replicar esse mecanismo, e o retorno tenderá a diminuir, com as previsíveis consequências

e impactos. Actualmente a arbitragem regulatória, devido às imperfeições na supervisão,

carecem de uma harmonização internacional, uma vez que não abrangem todos os agentes

financeiros. Como tal, as instituições financeiras são capazes de realizar actividades que

devido ao Prémio de risco, por meio de uma estratégia menos prudente, tanto em termos

de capital, como de liquidez, são capazes de gerar maiores retornos.

Compreender a origem do risco sistémico, presume um interesse no incentivo que conduz

as instituições financeiras a acumularem riscos em determinados segmentos. Além da

identificação das instituições que podem conduzir à propagação de uma crise sistémica,

devemos conseguir identificar os comportamentos, estratégias e modelos de negócio que

são susceptíveis de causar uma crise sistémica. Uma crise sistémica não é accionada

apenas pela simples acumulação de riscos no sector financeiro, o papel dos desequilíbrios

macroeconómicos globais, pode revelar-se tão ou mais importante. Mas a tendência da

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indústria financeira no processo de acumulação de riscos, enfraquece, e torna-a vulnerável

ao aparecimento de uma crise sistémica.

O trabalho em identificar a espiral do risco sistémico, consiste em destacar, actividade por

actividade, as diferentes formas de incentivo que podem conduzir os diferentes

stakeholders financeiros a acumular de forma racional os riscos sem qualquer tipo de

constrangimento legal. Estes incentivos podem ser procedentes dos próprios investidores,

que manifestando uma incorrecta percepção sobre os riscos incorridos, não exigem o

adequado Prémio de risco. Sendo que a existência de qualquer medida que reduza a

perspectiva do mercado de que as instituições financeiras são demasiado grandes para

falir, automaticamente contribui para o incremento do incentivo para que o investidor seja

capaz de melhor gerir os riscos apresentados pelas instituições financeiras a que se

encontra exposto, e cujas perdas terá que ter capacidade de suportar em caso de default.

Estes incentivos podem derivar igualmente a partir da própria estrutura da actividade

financeira, que pode inferir ou não, numa relação causal automática entre as posições de

rent-seeking de certos participantes no mercado, e do seu comportamento perante o risco.

Verifica-se ainda que os erros cometidos por parte dos reguladores relativos à fixação do

Prémio de risco inerente à actividade financeira, pode contribuir para que os agentes

continuem a acumular esses riscos. Nesse caso, deve existir uma identificação exacta das

actividades financeiras cujos riscos não se encontram devidamente cobertos, o que

significa que eles geram um retorno em excesso de regulamentação. Existem duas

potenciais causas decorrentes desta desvalorização dos riscos:

(i) As falhas de regulamentação a um nível micro-prudencial, que deixam

oportunidades de arbitragem regulamentar, e que habilitam os participantes

do mercado a evitar assumir todos os riscos ligados à sua negociação. Isso

pode envolver a arbitragem regulamentar entre as áreas regulamentadas, e

não regulamentadas de supervisão. A gestão alternativa não regulamentada de

activos como os hedge funds, constitui um exemplo de arbitragem regulatória

em relação às actividades do mercado Bancário, e das actividades tradicionais

de gestão de activos. Pode também envolver a arbitragem regulatória dentro

de um único aspecto da supervisão das actividades financeiras, sendo o caso

das operações de crédito, em particular.

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(ii) Observam-se igualmente limitações intrínsecas ao nível da regulamentação

micro-prudencial, que não medem com a devida precisão o risco sistémico. As

ferramentas micro-prudenciais não têm em devida conta os acontecimentos

extraordinários, como o risco sistémico. Este é o caso do Value at Risk (VaR),

que é utilizado para avaliar os riscos de mercado.

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4. Identificação de actividades potencialmente sistémicas

4.1. A organização das actividades de crédito

A actividade de crédito encontra-se no coração da indústria Bancária. A concessão de

empréstimos presume um nível de alavancagem, expresso através do loan/ deposit ratio,

que mede o crédito concedido, tendo por base os depósitos aceites, ou seja, é um rácio de

transformação que mede o grau de dependência do Banco face aos fundos emprestados, o

que vai condicionar a detenção de activos com maturidades mais longas em relação aos

passivos, que se reflecte no risco de liquidez, que em certas situações justifica o acesso aos

mecanismos de refinanciamento previstos pelo Banco Central.

Duas tendências paralelas marcaram a mudança de paradigma na concessão da actividade

de crédito ao longo das duas últimas décadas:

(i) O desenvolvimento de modelos de organização de crédito rivais, por um lado, o

modelo tradicional de intermediação Bancária, em que os empréstimos são

concedidos por um Banco comercial, que os detém até ao seu vencimento, em

parte graças aos depósitos dos seus clientes, por outro lado, o modelo de

securitização em que os empréstimos concedidos por um intermediário

Bancário são vendidos a investidores, sob a forma de títulos de dívida, ou de

uma carteira de empréstimos. É nos Estados Unidos, que este último modelo se

encontra mais desenvolvido, onde cerca de dois terços dos empréstimos à

habitação se encontram securitizados. Este modelo diversifica as fontes de

financiamento, mas ao mesmo tempo, aumenta os custos devido ao seu

elevado grau de complexidade, porque a dívida mobiliária geralmente é

estruturada, ou seja, dividida em parcelas de acordo com o risco incorrido, e o

retorno a ser oferecido.

(ii) A crescente vaga observada na actividade de crédito que se encontra fora do

alcance da supervisão bancária, para além da vasta gama de sociedades

jurídicas previstas para a constituição de um Banco, as actividades de crédito

têm sido desenvolvidas por grupos não Bancários fora do âmbito

regulamentar19. Este sistema é descrito como sendo um sistema Bancário

19 No seio da mesma sociedade pelo recurso à figura geral da coligação de sociedades (art. 481.º e sgs. do Código das Sociedades Comerciais), formando-se “conglomerados financeiros”. Trata-se de grupos de empresas que prestam diversos serviços financeiros entrelaçados (“allfinance”, “allfinanz”) nos três sectores, o sector da Banca, o sector da Bolsa e o sector dos Seguros, sujeitos ao mesmo e único controlo, não raro uma holding ou Sociedade de Gestão de Participações Sociais (S.G.P.S.) que não é nem instituição de crédito ou sociedade financeira nem

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sombra das sociedades que possuem nas suas carteiras risco de liquidez, e de

maturidade, decorrentes das suas responsabilidades, mas privados do acesso

ao refinanciamento do Banco Central, ao contrário dos Bancos tradicionais (e.g.

veículos de investimento estruturado, SPV’s, Banca de investimento, fundos

mútuos, entre outros). Este sistema Bancário sombra, tem crescido de forma

particularmente expressiva nos Estados Unidos.

4.1.1. Nível concorrencial

Os Bancos de crédito tradicionais, estão sobretudo organizados a nível nacional, e

portanto, sujeitos a uma adequada monitorização por parte dos seus concorrentes locais.

Para o mercado interno europeu, existe também um procedimento de controlo adaptado

aos grupos que desenvolvem as actividades de crédito em mais do que um país da UE. O

FSB faz notar que em alguns países, em especial nos Estados Unidos e Reino Unido, a crise

aumentou a concentração Bancária principalmente nas actividades de crédito.

O nível de concorrência no sector Bancário comercial na generalidade dos países europeus

depende de muitos factores. Apesar da existência de um grande número de operadores,

com uma rede comercial agressiva em todo o país, e com a chegada dos Bancos que

operam por intermédio de plataformas on-line, em teoria devia haver um estímulo

concorrencial, mas o seu impacto não pode esconder a persistente concentração, sendo

que em alguns casos, os cinco principais grupos Bancários continuam a injectar mais de

80% dos empréstimos na economia. Devido a questões de qualidade, e das assimetrias

existentes na procura por parte dos consumidores de serviços financeiros dos diferentes

países, é difícil obter conclusões definitivas a partir dos estudos realizados pela Comissão

Europeia relativos aos encargos e às comissões bancárias cobrados em ambiente

concorrencial. Os dados disponíveis sobre a evolução dos preços dos serviços financeiros

às famílias desde 2000, no entanto, indicam que estes estão a aumentar, mas abaixo da

inflação, as despesas das famílias em serviços financeiros caíram de 0,67% do consumo

em 2000 para 0,53% em 2008.

Um exemplo relevante para aplicação destas ideias é dado pelo sector Bancário português.

A partir de 1984, o sector tem sido progressivamente aberto à iniciativa privada. No

entanto, continua a ser um sector altamente regulado pelo Governo, e pelo Banco de empresa de investimento ou Companhia de Seguros. Fenómeno este a colocar problemas delicados de controlo consolidado, coordenação de regulação/ supervisão e até regulação/supervisão integrada. In Banca, Bolsa e Seguros, Direito Europeu e Português, 2ª Edição, Revista e Aumentada, João Calvão da Silva, Novembro 2007 Almedina.

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Portugal. Uma das consequências das medidas de regulação, incluindo os limites de

crédito, foi (ou tem sido) a alta margem de intermediação do sector. Segundo a opinião de

muitos especialistas, actualmente encontramo-nos numa situação de overbanking e

overbranching, uma vez que o número de habitantes por dependência Bancária em

Portugal é superior ao da maioria dos países europeus, mas este não é um argumento

relevante, a não ser que se assuma que os restantes países se encontram no óptimo social.

Através dos dados conhecidos sobre o sector Bancário, atribuem alguma razão de ser à

política de dificultar (e, em certo sentido, tributar) a entrada no sector. De facto, a partir de

uma situação de equilíbrio com livre entrada, um decréscimo do número de empresas

aumenta o nível de bem-estar. Logo, a livre entrada está associada a uma entrada em

excesso de operadores que se mantêm enquanto o lucro de mercado for maior do que

zero. Assim, as barreiras à entrada podem em certas situações implicar uma melhoria de

bem-estar20.

Proceder à realização de um estudo à margem de intermediação financeira (e.g. gap entre

a remuneração do crédito concedido e o custo dos recursos afectos) de todos os Bancos,

revela-se uma tarefa complicada. Vale lembrar que a margem de lucro de um Banco não

pode ser definida tão facilmente como a de uma empresa normal, em parte, porque os

procedimentos Bancários para a transformação de maturidades exigem um cálculo exacto

do custo dos recursos, e por outro lado, porque esta margem não deve pagar apenas as

despesas gerais de funcionamento do Banco, mas também a cobertura de risco, antes de

qualquer contribuição para os lucros. Em particular, torna-se imperativo que os Bancos

avaliem o custo do risco de uma forma justa. Em períodos de abrandamento económico, o

agravamento do risco pode conduzir a um aumento justificado na margem bruta Bancária.

No entanto, a fixação elevada do custo dos empréstimos pode também restringir o

financiamento da economia.

4.1.2. Fixação do Prémio de risco

As actividades de crédito encontram-se expostas a vários riscos, como anteriormente já foi

desenvolvido no ponto 2.7 (e.g. risco de crédito, de mercado, de liquidez, operacional e de

taxa de juro do Balanço), mas condicionadas com base em regras padrão, excepto no que

diz respeito à gestão do risco de liquidez. Em particular, o risco de crédito, que resulta da

possibilidade de ocorrência de perdas financeiras decorrentes do incumprimento do 20 Cfr. Carl-Christian von Weiszäcker, “The welfare analysis of entry barriers”, Bell Journal of Economics 11 (1980), 399-420.

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cliente ou contraparte relativamente às obrigações contratuais estabelecidas através da

instituição de crédito no âmbito da sua actividade creditícia, constitui o risco mais

relevante a que se encontra exposta a actividade de um Banco. A sua gestão e controlo são

suportados pela utilização de um robusto sistema de identificação, avaliação e

quantificação de risco, sendo coberto através de um conjunto de requisitos:

(i) Pilar I, requisitos mínimos de capital, que gozam de um grau razoável de

harmonização internacional. O nível destes requisitos é de taxa fixa, se o Banco

aplicar as normas de Basileia I, ou ponderados de acordo com o perfil de risco

de contraparte se o Banco aplicar as normas de Basileia II. O risco de

concentração também é abrangido pelas regras relativas aos grandes riscos, a

exposição de um Banco a uma única contraparte não pode ultrapassar um

determinado limite. Para os Bancos sujeitos a regulamentações de Basileia II,

outros riscos tais como de taxa de juro, concentração geográfica, e o controle

interno, podem ser cobertos por meio de outros requisitos.

(ii) Pilar II, os requisitos mínimos de capital são estabelecidos pelo regulador de

mercado. Até ao momento, não existem regras coerentes a nível internacional

sobre o risco de liquidez, no entanto, algumas entidades reguladoras

adoptaram medidas restritivas para controlar o risco de liquidez dos Bancos.

Face às particularidades inerentes aos diferentes segmentos de clientes que compõem

uma instituição de crédito, a nível interno são desenvolvidos, e implementados diversos

sistemas internos de notação, e de parâmetros de risco, quer para empresas, quer para

particulares. Conforme previsto na nova regulamentação sobre requisitos mínimos de

capital (Basileia II), e seguindo as melhores práticas de gestão de risco, a validação dos

sistemas internos de notação de risco é efectuada de uma forma periódica, através do

exercício de validação interna dos diversos modelos de rating para os principais portfolios

de crédito de forma a confirmar a robustez, e a adesão destes modelos no exercício de

aferição do risco de crédito. No que concerne aos modelos de rating para carteiras de

empresas, são adoptadas abordagens distintas em função da dimensão, e do sector de

actividade dos clientes. São ainda utilizados modelos específicos adaptados a operações de

crédito de project finance, acquisition finance e financiamentos à construção.

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As operações de securitização de empréstimos podem constituir uma arbitragem

regulatória longe da intermediação Bancária tradicional. Por meio da securitização, a

intermediação Bancária pode ser realizada em óptimas condições financeiras, e este é, um

entre os vários benefícios tradicionais da securitização, sendo ainda de destacar para a

melhor avaliação dos riscos, a segmentação de compradores, e uma maior socialização nos

potenciais riscos incorridos. Algum deste benefício é devido aos regulamentos micro-

prudenciais para um risco subjacente equivalente, os valores mobiliários emitidos por

meio de securitização requerem menos capital e liquidez do que um empréstimo bancário

tradicional. A arbitragem regulatória que os Bancos realizam nesta base, é ainda mais clara

quando eles próprios subscrevem os valores mobiliários emitidos, que são registados na

carteira de negociação, enquanto os empréstimos tradicionais são inseridos na carteira

Bancária. Neste exemplo, as operações de securitização geram uma espécie de retorno em

excesso de regulamentação.

Assim sendo, uma operação de titularização de créditos envolve converter uma carteira de

créditos de características homogéneas, num veículo de investimento desconsolidado, e

refinanciado de forma independente, mas expondo o Banco originário a uma liquidez

residual, e risco de crédito cujo custo em termos de capital prudencial é menor do que se

os empréstimos permanecessem no Balanço da instituição. Existem duas formas de

arbitragem regulatória associadas a este tipo operação.

1. Titularização directa: operação que consiste na transferência de uma carteira de

empréstimos, para um determinado veículo independente do financiamento da

titularização de créditos.

Supondo que um Banco tem em carteira 10.000 milhões de € em empréstimos com

um prazo de emissão a 10 anos, e com uma notação de rating avaliada entre BBB+

e BB-, ponderadas a 100% de acordo com a abordagem avançada de Basileia II.

Se o Banco mantiver este portfolio registado no Balanço:

- Terá de alocar um capital Tier One igual a 4% dos activos ponderados

pelo risco, ou seja, 400 milhões de €.

- Vai refinanciar os empréstimos a 10 anos com recursos de médio e longo

prazo, que são mais caros do que o refinanciamento de curto prazo, de

modo a não prejudicar a sua relação de transformação.

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Se o Banco optar por transferir essa carteira para um veículo de titularização

(fundo de empréstimos titularizado ou SPV):

- Terá que alocar uma quantidade muito menor de capital Tier One, igual a

40 milhões de €, se as garantias dadas aos investidores (liquidez, reforço

de empréstimos) forem ponderados a 10%.

- Deixará de assumir os custos directos de refinanciamento, uma vez que

como o veículo se refinancia de forma independente, e de forma mais

barata no mercado, por exemplo, através da emissão a curto prazo de papel

comercial não existem limites no rácio de transformação.

Através do mecanismo de securitização da carteira de empréstimos, o Banco economizou

€ 36 milhões em capital, e todos os custos relacionados com a carteira de refinanciamento.

Se o fundo obtém o seu refinanciamento de forma totalmente independente, do ponto de

vista do Banco, essas sinergias de capital, e liquidez serão parcialmente justificadas por

meio de uma transferência real. Mas se a liquidez do veículo, que evita os limites de

transformação é parte da responsabilidade do Banco, existe uma arbitragem regulatória

gerando um lucro igual ao resultado do veículo de gestão dos activos e passivos, que é

superior ao que o Banco teria feito em termos contabilísticos.

2. Titularização indirecta: operação que consiste na transferência de uma carteira de

empréstimos para um veículo de titularização, em parte financiados pelo Banco de

origem através da sua carteira de negociação. Supondo que o mesmo Banco

transfere a mesma carteira no valor de 100 milhões de € para um veículo de

titularização, e compra 10 milhões de € em ABS21 para financiar a operação. Se o

Banco entrar com esses títulos na sua carteira de negociação:

- Neste cenário terá de alocar um capital Tier One calculado de acordo com

o VaR (risco de mercado), ou seja, 3 a 4 vezes menos capital do que para o

risco de crédito, o que significa menos de 10 milhões € de capital.

- Irá obter refinanciamento de curto prazo em melhores condições

financeiras mediante a assinatura de acordos de recompra sobre os

contratos pendentes, (o horizonte temporal para a liquidação potencial da

21 Um asset backed security, constitui uma garantia cujo valor e rendimentos pagos são procedentes ou garantidos através de um colateral específico ou de um conjunto de activos subjacentes.

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posição, é fixado em 10 dias úteis pelo regulador Bancário, e não no

horizonte temporal dos empréstimos).

Por meio deste mecanismo, o Banco afastou-se das normais exigências regulamentares

que incidem sobre uma operação de crédito (poupou recursos na ordem dos 30 milhões

de € em custos de capital e de refinanciamento), ao passo que os riscos não foram

transferidos. Esta arbitragem regulatória é amplificada através de todo o sistema

Bancário, quando os títulos são comprados pelo Banco não originário, mas por um outro

Banco, esta operação constitui a securitização indirecta.

4.1.3. Risco sistémico na actividade de crédito

A intermediação Bancária tradicional não parece apresentar um elevado risco sistémico,

partindo do pressuposto de que existe um efectivo sistema de gestão do risco de liquidez.

O preço dos principais riscos associados à tradicional intermediação Bancária (crédito e

taxa de juro) não oferece possibilidades de arbitragem regulatória que conduziriam à

acumulação de risco sistémico. Isso não significa porém, que as actividades de crédito não

possam ser responsáveis por uma crise. Erros de gestão podem conduzir um Banco a

entrar num processo de insolvência. Do mesmo modo, uma desaceleração

macroeconómica pode colocar todas as actividades de crédito em sérias dificuldades. Mas

enquanto este risco se encontra rigorosamente monitorizado, e aplicado pelos Bancos sob

o controlo dos supervisores de mercado, o quadro prudencial em torno das actividades de

crédito não conduz a um comportamento de risco superior ao risco medido pelas normas

regulamentares. Por outro lado, na ausência de liquidez consistente, e de regras de

transformação e de gestão de risco, as actividades de crédito apresentam uma fragilidade

sistémica, conforme se observou em várias instituições financeiras que tiveram problemas

durante a recente crise devido à má gestão destes riscos.

As operações de securitização de empréstimos como alternativa subestimada à

intermediação Bancária, parecem representar um maior risco sistémico. O maior retorno

obtido na titularização de créditos constitui uma fonte de acumulação de créditos de risco

que as normas prudenciais não consideram de forma adequada. Esta tendência sistémica é

ainda mais notável à medida que uma parcela significativa do risco automaticamente

permanece concentrada dentro do sistema Bancário, em vez de ser transferido para os

investidores. Os Bancos subscrevem unidades de titularização por meio de negociação

(registo por conta própria), ou tomam o controlo das unidades adquiridas por

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investidores para suportarem a liquidez. Além disso, para proteger a sua reputação (risco

reputacional), os Bancos são frequentemente obrigados a recomprar as unidades de

titularização aos investidores em veículos que não fazem parte do seu perímetro de

consolidação para os quais transferiram os seus empréstimos. A recente crise do subprime

realçou esta espiral, que conduziu muitos Bancos a terem que recomprar os créditos

titularizados, e com isso voltar a inscreve-los no seu Balanço, operação que teve reflexos

nos seus rácios prudenciais, consumindo recursos de capital necessários para cobrir essa

exposição.

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4.2. A actividade Seguradora

4.2.1. A organização da actividade seguradora

O negócio da actividade Seguradora consiste em transferir o risco de um indivíduo para

um grupo de segurados (mutualização do risco), onde este agrupamento de riscos é

particularmente eficaz, uma vez que se baseia numa grande população de indivíduos,

permitindo uma diversificação suficiente entre os diferentes indivíduos, os tipos de risco e

a área geográfica. A actividade da indústria Seguradora encontra-se dividida em dois

grandes ramos, as operações inerentes ao ramo Vida, e as do ramo não Vida, que na

generalidade das congéneres são desenvolvidas em termos jurídicos, e operacionais em

separado, por via de imposições regulamentares.

Assim podemos interpretar o Seguro como o mecanismo de compensação dos efeitos do

acaso pela mutualidade científica organizada (Chaufon), ou a operação pela qual uma das

partes (o segurado) obtém mediante certa remuneração (Prémio) paga à outra parte

(Segurador), a promessa de uma indemnização para si, ou para terceiros, no caso de se

realizar um risco (Marcelo Caetano).

A primeira destas definições destaca o carácter aleatório do risco, e a natureza mutualista

do Seguro. A segunda tem um cariz predominantemente jurídico, colocando o ênfase na

relação contratual, e integra os elementos principais de um contrato de seguro: o risco, o

Prémio e a indemnização. Como contrapartida do Prémio pago à Seguradora, o tomador

(ou o segurado), têm o direito, conforme os casos a uma indemnização para si próprio

quando sofre determinados prejuízos materiais em consequência de um sinistro (seguros

de incêndio), ou que a companhia pague as devidas indemnizações a terceiros a quem

causou prejuízos (seguros de responsabilidade civil). A receber um capital contratado,

como compensação económica por lesões corporais (nos seguros de acidentes pessoais,

por exemplo), ou a receber uma renda vitalícia ou pensão por invalidez em certas

circunstâncias (seguros de vida).

O Decreto-Lei nº 94B/98, de 17 de Abril transpõe para a ordem jurídica interna o

conteúdo da Directiva n.º 2005/68/CE, do Parlamento Europeu, e do Conselho, de 16 de

Novembro de 2005, relativa ao Resseguro, e ao reforço da tutela dos direitos dos

tomadores de Seguro, segurados, beneficiários ou terceiros lesados na relação com as

empresas de Seguro.

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Este diploma vem proceder à alteração do regime de acesso, e exercício da actividade

seguradora e Resseguradora, tendo em vista efectuar a transposição de uma directiva

comunitária relativa ao Resseguro. A adopção de um regime harmonizado em matéria de

acesso, e de exercício da actividade de Resseguro vem permitir o reconhecimento mútuo

das autorizações baseado num sistema de autorização única, válida em toda a União

Europeia, e a aplicação do princípio da supervisão pelo Estado membro de origem. Em

termos genéricos, será aplicável às empresas de Resseguro, com as devidas adaptações, o

regime previsto para as empresas de Seguro directo.

Em paralelo, são reforçados os princípios em matéria de conduta de mercado e

introduzidos alguns ajustamentos em matéria de sistema de governo, em linha com as

recomendações do Fundo Monetário Internacional no âmbito do Financial Sector

Assessment Program realizado em 2006. Entre estas alterações, destacam-se as exigências

de qualificação adequada e idoneidade aos directores de topo, de elaboração e

monitorização de um código de conduta ética, de instituição de uma função específica de

responsável pela gestão das reclamações dos clientes e, finalmente, a exigência de

definição de uma política de prevenção, detecção e reporte de situações de fraude nos

Seguros. Ainda em matéria de conduta de mercado, e à semelhança do já previsto para os

Fundos de Pensões abertos, introduz-se a figura do provedor do cliente, ao qual competirá

apreciar as reclamações que lhe sejam apresentadas pelos clientes das empresas de

Seguro.

A Directiva 2002/92/CE estabelece as normas relativas ao acesso da actividade de

mediação de Seguros, ou de Resseguro, e ao seu exercício por pessoas singulares ou

colectivas estabelecidas num Estado-Membro, ou que nele pretendam estabelecer-se. No

seguimento da aprovação e publicação desta directiva foi transposto para o ordenamento

jurídico nacional o Decreto-Lei nº 144/2006 de 31 de Julho, que procedeu à transposição

da Directiva nº 2002/92/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de Dezembro,

relativa à mediação de Seguros, que visa, por um lado, a coordenação das disposições

nacionais relativas aos requisitos profissionais, e ao registo das pessoas que nos diversos

Estados membros exercem a actividade de mediação de Seguros ou de Resseguro, tendo

em vista a realização do mercado único no sector e, por outro lado, o reforço da protecção

dos consumidores neste domínio.

Tendo presente este enquadramento, a Norma Regulamentar 17/2006 do ISP, pretende

consagrar soluções, que dentro dos limites dos princípios, e das regras do Decreto-Lei nº

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144/2006, de 31 de Julho, melhor correspondam aos objectivos de profissionalização, de

aumento da transparência, de melhoria da eficiência da supervisão, e, sobretudo, de

valorização da mediação de Seguros e de Resseguros enquanto actividade de relevância

crucial para o bom funcionamento do mercado segurador. De salientar ainda que a Norma

Regulamentar visa introduzir soluções que imponham os menores ónus possíveis aos

operadores, e incrementar a desmaterialização de procedimentos, através do recurso às

novas tecnologias de informação e comunicação.

Assim, o exercício da actividade depende de uma autorização única, válida para todo o

território comunitário, em regime de estabelecimento de sucursais ou de livre prestação

de serviços, através do designado passaporte europeu. A referida autorização compete à

autoridade de controlo e supervisão do Estado-membro, no caso português compete ao

Instituto de Seguros de Portugal, organismo com autonomia administrativa e financeira,

sujeito à tutela e superintendência do Ministro das Finanças, onde estiver localizada a sede

da companhia que a solicita, competindo, também, àquela autoridade o controlo das

respectivas garantias financeiras, o chamado controlo prudencial.

As entidades que podem exercer a actividade seguradora, são as sociedades anónimas,

mútuas de seguros, sucursais de seguradoras com sede em território de outros estados-

membros, e as sucursais de seguradoras com sede fora do território da União Europeia.

As regras de acesso ao exercício da actividade, definidas no Decreto-Lei 94-B/98, obrigam

as Seguradoras a constituir várias garantias financeiras, nomeadamente provisões

técnicas, margens de solvência, fundos de garantia, visando a defesa dos interesses

abrangidos pela actividade Seguradora. São o garante da estabilidade financeira das

Seguradoras, estabilidade essa de que os Segurados são os principais beneficiários. Da

obrigatoriedade na constituição das provisões técnicas resulta uma capacidade financeira

que torna as Seguradoras um investimento atractivo para os grupos económicos.

Os montantes das provisões técnicas devem, em qualquer momento, ser suficientes para

permitir à Seguradora cumprir, na medida do razoavelmente previsível, os compromissos

decorrentes dos contratos de Seguro, quer em relação ao exercício da actividade no

território da Comunidade Europeia, quer fora dele. São várias as provisões técnicas

exigidas, nomeadamente, as provisão para Prémios não Adquiridos, provisão para riscos

em curso, provisão matemática no ramo Vida, provisão para envelhecimento (para os

seguros de doença), provisão para sinistros, provisão para participação nos resultados,

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provisão para desvios de sinistralidade, entre outros. Das provisões técnicas apenas se

indicam as mais importantes, que são a Provisão para Prémios não Adquiridos e a

Provisão para Sinistros.

(i) Provisão para Prémios não Adquiridos: os Prémios cobrados pelas

Seguradoras respeitam muitas vezes a períodos de risco que se estendem para

além do final do ano em que são emitidos. Na óptica contabilística da

especialização do exercício, há que constituir no final de cada ano uma

provisão para o Prémio correspondente ao período não decorrido. O somatório

destes prémios ascende normalmente a valores que representam entre 30% e

40% dos Prémios do exercício. Esta percentagem não é constante, pois

depende de como se distribuem os riscos ao longo do ano, uma maior

incidência de Apólices com vencimento em 1 de Janeiro, determina uma menor

provisão e, ao contrário, se os vencimentos ocorrerem na sua maioria no final

do ano, a provisão representará uma maior parcela dos Prémios. Só a variação

deste montante afecta a conta de ganhos e perdas de cada ano.

(ii) Provisão para sinistros: os sinistros participados dão imediatamente lugar à

constituição de uma provisão que deverá corresponder à estimativa do seu

custo final. A soma destas provisões ascende, no final de cada ano, a uma

percentagem significativa dos Prémios processados mas, também neste caso,

só a sua variação afecta a conta de ganhos e perdas. Na provisão para sinistros

está também incluída a respeitante a sinistros ocorridos e não participados

(IBNR, Incurred But Not Reported).

Quando um sinistro é participado, e aberto o respectivo processo, não é possível

determinar com rigor qual será o seu custo final. Neste caso, virão a ocorrer

reajustamentos, indesejáveis quando relativos a processos abertos em anos anteriores,

pois subvertem o principio da especialização do exercício.

As Seguradoras a operar em Portugal devem dispor de uma margem de solvência

suficiente em relação ao conjunto das suas actividades, margem essa que corresponde ao

seu património livre de toda, e qualquer obrigação previsível, e deduzido dos elementos

incorpóreos. Através deste cálculo, é determinado um valor que depende essencialmente

do volume de Prémios retidos (método dos Prémios) ou do valor médio dos sinistros

(método dos sinistros), qual dos dois tenha o resultado mais elevado. O valor assim obtido

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tem de estar coberto por capitais próprios, e a proporção entre eles dá a medida de solidez

da Seguradora.

As Seguradoras com sede em Portugal, e as sucursais de empresas de Seguros com sede

fora do território da Comunidade Europeia devem, desde que são autorizadas, dispor e

manter um fundo de garantia que faz parte integrante da margem de solvência, e que

corresponde a um terço do seu valor, não podendo, no entanto ser inferior a determinados

limites legalmente impostos, quer para o ramo Vida, quer para o ramo não Vida.

A actividade Seguradora difere dos outros sectores de actividade económica na medida em

que o seu ciclo produtivo se encontra invertido, uma vez que o Prémio de seguro é

cobrado de forma antecipada pela companhia de Seguros antes da prestação do serviço, ou

seja, da concretização do risco seguro, garantindo a necessária solidez financeira da

Seguradora, para que seja capaz de honrar os compromissos que foram assumidos no

passado perante os Tomadores de Seguro.

Além do mais, a actividade Seguradora desempenha um papel importante como factor de

estabilidade económico e social em todas as economias, seja no sistema financeiro por via

da captação e gestão segura das poupanças das famílias a médio e longo prazo, seja a nível

social, pelo apoio e protecção que garante às pessoas e bens, valores que contribuem para

o desenvolvimento pessoal e empresarial de um país.

Outra particularidade inerente à actividade Seguradora assenta no princípio da

mutualidade, que constitui uma das principais características da actividade Seguradora,

onde se garante através de um contributo individual, a distribuição equitativa por uma

comunidade de indivíduos, das consequências da verificação de um risco que possa afectar

um elemento daquela comunidade, ajudando-o a fazer face aos respectivos prejuízos. Para

o bom funcionamento deste princípio, é necessário que os riscos assumidos pela

Seguradora sejam semelhantes entre si, ou seja, estarem perante riscos homogéneos, e que

o contributo de cada elemento da comunidade seja igualmente semelhante. Às

comunidades assim constituídas damos o nome de comunidades de riscos. Estas

comunidades são constituídas pelos diversos ramos ou modalidades de seguro explorados

pelas Seguradoras, como o ramo Vida, o ramo acidentes, ou o ramo automóvel, e devem

ser economicamente autónomos, no sentido de que os Prémios recebidos por cada ramo

devem ser suficientes para pagar as necessárias indemnizações em caso de sinistro.

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A mutualidade faz dos Seguros uma forma privilegiada de solidariedade humana, na

medida em que o conjunto dos tomadores e segurados de um determinado ramo,

compartilham do facto de um dos seus elementos ser atingido pelo risco contra o qual

tenha sido efectuado o seguro.

Os diferentes Seguros eram tradicionalmente agrupados em Seguros de coisas e de

pessoas, mas a existente diversidade de Seguros veio obrigar a uma classificação mais

detalhada e sistemática dos vários ramos e modalidades conforme descrito no Decreto-Lei

nº 94-B/98, de 17 de Abril.

Por outro lado a actividade de Resseguro, e de Co-Seguro, permite que as empresas de

Seguro reduzam a sua exposição ao próprio risco da sua actividade, o que faz com que

determinadas actividades económicas sejam passíveis de serem seguráveis (e.g. grandes

riscos industriais ou catástrofes naturais). Por muito elevadas que fossem as importâncias

recebidas como Prémios por esses seguros, e mesmo que durante anos seguidos não se

registassem sinistros, que permitiriam àquela seguradora a constituição de fortes

reservas, logo que se manifestasse um sinistro de certa importância, nem Prémios, nem

reservas seriam suficientes para fazer face à indemnização que teria que ser paga. Daqui a

necessidade de divisão dos riscos. Esta divisão dos riscos entre Seguradoras constitui a

operação do Resseguro, em que a Seguradora, cedente, transfere uma parte do risco para

outra, a Resseguradora. O Resseguro pode ser efectuado relativamente a cada risco

subscrito, Resseguro facultativo, ou através de contratos, os tratados de resseguro, em que

uma Resseguradora se compromete a aceitar, de forma automática, uma parte dos riscos

subscritos pela cedente. Os tratados de Resseguro podem ainda classificar-se de

proporcionais, nos casos em que a Resseguradora aceita uma parte do risco, e recebe a

parte proporcional do Prémio respectivo, e de não proporcionais, em que mediante um

Prémio calculado sobre toda a carteira, a Resseguradora responderá pelo valor dos

sinistros que exceda a retenção da cedente. Os tratados de Resseguro constituem uma

protecção face à ocorrência de grandes sinistros, mas podem também ser contratados

relativamente à acumulação de um significativo número de sinistros em resultado do

mesmo evento (protecção da retenção). Resumindo todos estes conceitos, há apenas uma

Seguradora responsável perante o Tomador, não sabendo este da existência do

Ressegurador, não havendo qualquer responsabilidade do Ressegurador perante o

tomador original. O Resseguro é o seguro que a Seguradora directa faz das

responsabilidades assumidas perante os tomadores, é assim o seguro do seguro. É um

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contrato de indemnização pois tem como objectivo proteger a Seguradora contra a

diminuição do seu património em virtude do pagamento das indemnizações pelos riscos

que assume, sendo que a maior parte das normas do Resseguro são de ordem contratual.

Os contratos de Resseguro podem ser:

(i) Facultativos, quando dizem respeito a um determinado contrato, ou a vários

contratos individualizados.

(ii) Obrigatórios, respeitam à generalidade dos contratos de Seguro de

determinado ramo ou ramos, sem necessidade de acordo caso a caso.

Os contratos obrigatórios são designados como "tratados" e podem ser:

(i) Proporcionais, quando a cedente (a Seguradora) e o Ressegurador repartem a

soma segura, o Prémio e as indemnizações, de acordo com percentagens

previamente estabelecidas.

(ii) Não proporcionais, quando há uma partilha de responsabilidade com base na

indemnização, e não no capital seguro.

Por outro lado, as operações de co-Seguro encontram-se previstas no Decreto-Lei nº 94-

B/98, de 17 de Abril. A divisão dos riscos que é o objectivo do Resseguro, pode também

resultar de iniciativa do Segurado, sempre que este o distribua por mais do que uma

Seguradora, o co-Seguro. O contrato de co-Seguro é titulado por uma única Apólice,

emitida pela Seguradora leader, e o risco assumido por várias co-Seguradoras, que o

subscrevem, e em que cada uma responde apenas pela parte do capital Seguro assumido. É

também à Seguradora leader que compete fixar as condições do Seguro, cobrar os

respectivos Prémios, e regular os sinistros. Pode ser convencionado entre as co-

Seguradoras, o pagamento à seguradora leader de uma taxa de gestão. Nos contratos em

co-Seguro titulados por Apólice uniforme, é obrigatória a inclusão de cláusula

expressamente aprovada para o efeito pelo Instituto de Seguros de Portugal (Norma do

ISP nº 11/94, de 8 de Setembro), sendo admitido em todos os ramos de Seguro. O co-

Seguro pode existir por vontade dos Tomadores ou das Seguradoras que, mediante um

contrato cujo risco é demasiado grave ou com capitais muito elevados, não estão dispostas

a assumi-lo sozinhas procurando, por isso, outras congéneres que o queiram aceitar em

conjunto.

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O momento entre a subscrição do risco, e a sua ocorrência pode ser longo, por exemplo, no

caso dos seguros de Vida e nos seguros patrimoniais (e.g. edifícios, responsabilidade civil,

acidentes).

4.2.2. Nível de concorrência

Em geral, a actividade Seguradora apresenta uma dinâmica concorrencial tanto a nível

nacional como internacional. Tal como no sector Bancário, uma análise concorrencial da

actividade comercial tem que ser realizada num âmbito nacional, enquanto as actividades

grossistas, ou seja, de Resseguro, devem ser analisadas mais num âmbito internacional

devido à sua vocação geográfica, e ao tipo de responsabilidades que são assumidas.

No caso português, nos últimos anos, a indústria seguradora tem conseguido demonstrar

uma boa dinâmica concorrencial, ao mesmo tempo que demonstra solidez e estabilidade,

tanto no número de companhias que operam no mercado, assim como no número de

colaboradores, e na dimensão dos seus canais de distribuição (mediadores, agentes e

corretores). Não obstante os recentes acontecimentos vividos a nível internacional, a crise

do subprime e mais recentemente a crise da dívida soberana dos países do Euro,

constituem factores de perturbação, com um previsível impacto no mercado português

tanto em termos de emissão de Prémios de Seguro, assim como na carteira de

investimentos das Seguradoras. No contexto nacional, acresce ainda para o facto de ter

sido implementado o Plano de Estabilidade e Crescimento (PEC), que vai sendo executado

através dos diferentes upgrades que este documento vai conhecendo, que irá concerteza

ser também mais um elemento a agravar o desempenho sobre este sector, por via das

medidas recessivas implementadas, e da abolição de muitos dos benefícios fiscais

existentes.

Enquadrando em termos quantitativos o mercado Segurador nacional, temos que nos

seguros de Vida, o maior grupo segurador, o Grupo Caixa Seguros detém uma quota de

mercado de 37,2% do mercado, enquanto os dois players seguintes, a Ocidental Vida

(Grupo Millennium BCP-Ageas), e o Grupo Espírito Santo detêm respectivamente 14,2% e

13% do mercado, sendo que as 5 maiores Seguradoras detêm em conjunto 81,4% do

mercado, e as 10 primeiras 91,1%. A estrutura do canal de distribuição neste segmento, é

realizada principalmente através da rede de distribuição Bancária (+86%), sendo o peso

das redes tradicionais de mediação de Seguro bastante marginal (3%). Nos seguros de

ramos reais (não Vida), as cinco maiores empresas dividem entre si, cerca de 51% do

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mercado, sendo que para os 10 primeiros estão concentrados 78,4% dos Prémios

emitidos. Ao contrário do observado para o ramo vida, a estrutura dos canais de

distribuição passa por uma maior diversificação de opções, podendo os tomadores de

Seguro, optar por entre Mediadores (agentes e corretores 55%), o canal de Bancassurance

(14%) e de venda directa (2,7%). Nos seguros de ramos reais, verifica-se uma maior

mobilidade nas Apólices subscritas, podendo o tomador de Seguro optar por uma

congénere que ofereça um Prémio mais baixo, ou uma gama coberturas mais abrangentes,

o que não descarta porém a hipótese de desenvolvimento de um esquema de fidelização

sobre os Tomadores de Seguro. Certos segmentos, quando se trata de seguros obrigatórios

(e.g. responsabilidade civil profissional, para médicos e auditores) podem ser menos

competitivos, aumentando a importância relativa dos Segurados em questão, mesmo que

as empresas sejam de dimensão reduzida.

A actividade Resseguradora é uma actividade global, a concorrência é bastante intensa

entre os dois líderes, a Munich Re e a Swiss Re, que dominam de forma expressiva o sector

(em torno de £ 30 biliões em Prémios emitidos por cada um, em comparação com os £ 18

biliões do número três, a Berkshire Hathaway, e cerca de £ 10 biliões para os dois

seguintes, Hannover Re e a SCOR). Os Resseguradores de dimensão mais reduzida

contribuem ainda assim para a promoção de uma saudável concorrência internacional.

Além disso, o ciclo de catástrofes naturais ou de outros riscos (e.g. terrorismo) podem

debilitar as posições comerciais existentes. Dito isto, a concentração de riscos deve ser

examinada com cuidado, pois as situações podem variar muito entre as diferentes

entidades. Se, por exemplo, uma Seguradora relevante depender exclusivamente de um ou

dois Resseguradores, a sua importância seria muito maior do que apenas a leitura da sua

quota de mercado global.

4.2.3. Fixação do prémio de risco

As Seguradoras assumem riscos de responsabilidade específicos, mas com um risco de

liquidez limitado. O modelo de negócio específico, utilizado para a actividade Seguradora

implica que a rentabilidade das Seguradoras, só seja conhecida num momento futuro.

Também irá depender de acontecimentos aleatórios, que exigem a constituição de

provisões técnicas correspondentes a obrigações da Seguradora para com os seus

Segurados. Além disso, para absorver as perdas de acontecimentos imprevistos, o

regulador impõe determinados requisitos de adequação de capital. As Seguradoras, por

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conseguinte, assumem um risco de Solvência específico sobre os seus passivos, o que

corresponde ao risco de subestimação dos compromissos assumidos para com os

Segurados (insuficiência de provisões técnicas), e o risco de ser incapaz de lidar com

contingências (reservas de capital insuficientes). O financiamento da indústria Seguradora

baseia-se nos rendimentos previsíveis de longo prazo, que geralmente fornecem uma

almofada quando se verificam crises de liquidez.

As Seguradoras ao adoptarem uma estratégia de investimento baseada no longo prazo,

podem vir a desempenhar um papel contra cíclico no sector financeiro. Devido ao volume

de investimentos que realizam, na proporção das provisões constituídas, e dado o ciclo de

exploração ser longo, as Seguradoras constituem-se como sendo uns dos maiores

investidores institucionais. A carteira de activos detidos para negociação por conta

própria por parte das Seguradoras europeias (excluindo as apólices em unidades de conta,

cujo risco é suportado pelos subscritores) ascendeu a € 6 triliões em 2009, com cerca de

55% da carteira a ser composta por Obrigações. As Seguradoras também são importantes

players no mercado de derivados. No entanto, dado o período de exploração das

Seguradoras, isso significa que a sua estratégia de investimento é essencialmente focada

no longo prazo, o que traduz que as reafectações que ocorrem dentro das suas carteiras

diversificadas estão marcadas por uma inércia distinta. Indiferentes às mudanças que

possam ocorrer no mercado de curto prazo, as seguradoras teoricamente, funcionam

como amortecedores, encontrando-se menos propensas a sentir os movimentos súbitos do

mercado à medida que diversificam a sua carteira de activos. Assim, em teoria, pela

natureza da sua actividade, isto significa que complementam a posição dos Bancos, e são

contra cíclicas. Isso não significa no entanto, que as Seguradoras se encontrem totalmente

protegidas dos choques exógenos, mas devido à sua própria natureza, do seu modelo de

negócio não têm incentivo a tomarem posições especulativas mais arriscadas.

Para além do conjunto de riscos que foram enunciados no ponto 2.7 complementarmente

a indústria Seguradora encontra-se exposta a um conjunto adicional de riscos, como sejam

o risco de subscrição, o risco de crédito, o risco de mercado que engloba diversas

submodalidades de risco (risco de taxa de juro, risco accionista, risco imobiliário, risco de

spread, risco cambial e risco de concentração), risco operacional e por fim o risco de

liquidez.

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Por risco de subscrição22 entende-se o risco que emerge da subscrição dos contratos de

seguro que cada Companhia de Seguros realiza, bem como a todas as coberturas que estes

oferecem, tendo em conta a natureza e particularidade de cada tipo de negócio seguro.

Uma vez que cada Companhia tem condições específicas de tarifa e diferentes critérios de

subscrição, torna-se evidente que este tipo de risco tenha um grau de importância variado,

na medida em que duas situações idênticas podem resultar em duas análises distintas.

Este risco oferece diferentes elementos de risco que se baseiam na volatilidade, nos

fenómenos catastróficos, na incerteza de nível e a incerteza de tendências, encontrando-se

a incerteza de nível associada à estimação incorrecta dos pressupostos considerados para

os anos futuros. A incerteza de tendência tem que ver com a dificuldade de avaliar de

forma correcta a futura direcção dos pressupostos assumidos. Na volatilidade do risco

estão representadas as flutuações dos cash flows futuros em torno de um valor estatístico

médio, sendo que, no caso de se assistirem a eventos extremos (catastróficos), poderão

existir elevados desvios positivos do valor estatístico médio. Assim, o risco catastrófico

está associado às perdas resultantes de acontecimentos extremos ou com carácter

irregular.

O risco de subscrição pode ser subdividido em:

(i) Risco de reserva (reserve risk), que consiste no risco associado aos pagamentos

a efectuar por sinistros relativos às coberturas subscritas. Se por um lado há

uma necessidade de garantir que o nível global de provisões técnicas reflicta o

verdadeiro valor esperado das perdas totais, de forma a evitar que o valor dos

pagamentos futuros com sinistros seja subestimado, por outro, é necessário ter

em conta que devido à natureza estocástica dos cash-flows futuros, os cash-

flows reais irão flutuar em torno do valor estatístico médio.

(ii) Risco de Prémio (Premium Risk), quando é emitida uma Apólice de seguro,

esta, automaticamente, traz associado o risco de que o volume de prémios

pagos não seja suficiente para cobrir os custos dos eventuais sinistros,

acrescidos de todas as despesas inerentes ao contrato subscrito, sendo neste

contexto que surge o Risco de Prémio, ou seja, este risco está associado aos

22 in Projecto de Solvência II, Modelação do risco de subscrição numa Companhia de Seguros não Vida, Marta Marina dos Santos Delgado, Dissertação apresentada no âmbito do Mestrado em Matemática e Aplicações - Actuariado, Estatística e Investigação Operacional na Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa. Orientador: Professor Doutor Rui Manuel Rodrigues Cardoso. Lisboa, 11 de Fevereiro de 2011.

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pagamentos a efectuar com futuros sinistros no âmbito dos contratos

existentes, renovações e ainda possíveis novos negócios, desde que realizados

dentro do horizonte temporal considerado.

Dentro destes dois tipos de riscos apresentados, estão incluídos os eventos catastróficos

que, de maneira a que os mesmos possam ser quantificados, são usualmente definidos

diversos cenários. Estes cenários têm em conta as características específicas do mercado e

podem ser definidos pelo supervisor local. São exemplo destes cenários os eventos

meteorológicos e geológicos, acidentes industriais, ataques terroristas, falência dos

resseguradores, etc.

O risco de crédito advém da incapacidade ou falta de vontade por parte de segurados,

resseguradores, corretores ou qualquer outra entidade emissora, em cumprir a totalidade

das suas obrigações contratuais. De acordo com o enunciado em J.P. Morgan (1997), este

risco pode ser medido através da análise de quatro factores:

(i) Qualidade actual do crédito da contraparte, medido através da sua notação de

risco, rating.

(ii) Matriz de probabilidades de transição de rating, isto é, da possibilidade de num

dado horizonte temporal a contraparte mudar de classe de rating.

(iii) Taxa de recuperação de crédito em caso de ocorrência de incumprimento.

(iv) Taxas de actualização do activo sem risco e credit spreads exigidos para o

horizonte de pagamento dos cash flows.

Este risco encontra-se subdividido em várias categorias, risco directo de incumprimento,

risco de redução de mitigação, risco de crédito indirecto, risco de regularização ou de

liquidação, risco soberano, risco de concentração e risco de contraparte. O risco de

incumprimento dos resseguradores é contudo, a principal componente do risco de crédito,

na medida em que em caso de falência dos mesmos, a Seguradora poderá sofrer grandes

perdas financeiras.

O risco de rercado é definido como sendo a probabilidade de ocorrência de perdas

resultantes da volatilidade do preço dos activos e dos passivos, pelo que depende

fortemente das taxas de juro e de câmbio em vigor, assim como do factor de concentração.

Os activos devem ser suficientemente diversificados a nível geográfico, de forma a poder

garantir que as responsabilidades assumidas na celebração dos contratos de seguro sejam

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satisfeitas. É relevante a existência de uma reflexão prévia dos investimentos feitos com o

intuito de minimizar o risco e maximizar a rendibilidade dos mesmos. Contudo, é um risco

que só pode ser devidamente quantificado se tanto o valor de mercado dos activos como o

valor das responsabilidades for medido adequadamente. Devido à ausência de um

mercado real para as responsabilidades de uma Seguradora, é usual recorrer-se à

aproximação do valor de mercado das responsabilidades da mesma, através de técnicas de

mercado (fair value23).

No nº 5 do Artigo 105º da Directiva 2009/138/CE encontram-se definidas as principais

componentes do Risco de Mercado:

(i) Risco de taxa de Juro, visa reflectir a sensibilidade do valor dos elementos do

activo e do passivo e dos instrumentos financeiros a alterações na estrutura

temporal das taxas de juro ou na volatilidade das taxas de juro. Neste contexto

e uma vez que as seguradoras, que se encontram entre os maiores subscritores

de títulos de dívida soberana, encontram-se expostas ao risco de taxa de juro,

quer em termos de uma queda permanente nas taxas de juro, o que diminui os

retornos esperados dos segurados, ou inversamente de uma alta repentina

(bond crash), o que pode conduzir a elevadas perdas de capital. Em

determinadas condições de mercado, pode verificar-se um círculo vicioso em

que, para honrar os compromissos assumidos perante os seus segurados, as

seguradoras têm que liquidar as suas carteiras de activos com prejuízo, e lutar

para cobrir as margin calls, espalhando a desconfiança entre os segurados e

com este efeito acelerarem o resgate de apólices. Em algumas modalidades

pode ter-se verificado uma subestimação colectiva do risco, como sucedeu nos

Estados Unidos, quando as seguradoras vendiam os CDS associados a

operações de crédito hipotecário, o que conduziu a que as seguradoras

tivessem registado avultadas perdas durante a crise financeira. A

complexidade dos pacotes financeiros associados às apólices garantidas,

evidenciou que algumas seguradoras não foram capazes de determinar com o

rigor necessário as suas próprias necessidades de cobertura. Para oferecer as

23 Fair value ou fair price é uma palavra anglo-saxónica que significa em português justo valor. É uma expressão utilizada em finanças e economia para descrever uma situação em que o preço teórico de um activo ou passivo é igual ao preço de uma avaliação racional e desinteressada em que duas partes detendo igual conhecimento sobre o activo ou passivo aceitariam transacciona-lo ou liquida-lo, respectivamente.

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garantias associadas a este tipo de apólices, as seguradoras precisam de se

proteger a elas próprias, o que pode ser muito caro, ou mesmo impossível,

quando os mercados financeiros estão sob pressão.

(ii) Risco accionista, visa capturar as perdas resultantes da queda do nível dos

preços de mercado das acções, bem como de variações na sua volatilidade;

(iii) Risco Imobiliário, visa capturar as perdas resultantes da queda do nível dos

preços de mercado dos imóveis.

(iv) Risco de spread, visa reflectir a sensibilidade do valor dos elementos do activo

e do passivo e dos instrumentos financeiros a alterações no nível da

volatilidade dos spreads de crédito ao longo da estrutura temporal das taxas de

juro sem risco.

(v) Risco cambial, visa reflectir a sensibilidade do valor dos elementos do activo e

do passivo e dos instrumentos financeiros a alterações no nível ou na

volatilidade das taxas de câmbio.

(vi) Risco de concentração, visa capturar os riscos adicionais decorrentes quer da

insuficiente diversificação da carteira de activos, quer de uma importante

exposição ao risco de incumprimento por parte de um único emitente de

valores mobiliários ou de um grupo de emitentes coligados.

O risco operacional foi inicialmente definido em termos complementares, ao nível do

sector bancário, como abrangendo todos os riscos à excepção dos riscos de mercado, de

crédito e de subscrição. Nele estão incluídos os riscos legais, não contemplando os riscos

resultantes de decisões estratégicas e o risco reputacional. Está associado a todo o tipo de

falhas humanas como os actos fraudulentos e, ou a erros, aos processos quando

incorrectamente definidos e, ou executados, aos erros nos sistemas informáticos utilizados

pelas Seguradoras (perdas de informação e falhas técnicas), e aos factores externos (actos

fraudulentos por parte de segurados ou terceiros e actos terroristas). Apesar das muitas

falências que se verificaram no sector Segurador estarem associadas ao risco operacional,

são poucas as seguradoras que tentam quantificar e incorporar nos seus modelos internos

este tipo de risco, pois para além de implicar uma correlação com os restantes riscos, é

extremamente difícil quantificar essa mesma correlação.

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Ainda assim, quando incluído nos modelos internos das Companhias de Seguros, devem

ser tidos em consideração alguns aspectos, enunciados na Circular nº 7/2009 de 23 de

Abril do ISP:

(i) Realização de um levantamento dos processos internos da empresa de seguros,

assim como dos riscos e controlos associados e respectiva sistematização.

(ii) Registo dos eventos ocorridos que estejam relacionados com riscos

operacionais, atribuindo-lhes as perdas associadas.

(iii) Implementação de um sistema de alertas que, com base nos níveis de

tolerância ao risco e outros limites predefinidos, permita uma intervenção

oportuna e eficaz no sentido de corrigir potenciais situações de risco.

O risco de liquidez analisa todo o processo de perdas resultantes de situações onde não

existam activos líquidos para cumprir com as obrigações assumidas pela Companhia de

Seguros perante os seus segurados. É um risco que está fortemente relacionado com a

indústria financeira, e no caso particular da indústria Seguradora é considerado como a

“exposição a perdas”. Por exemplo, em casos em que os activos líquidos que usualmente

suportam as responsabilidades das apólices sejam insuficientes para satisfazer os cash

flows necessários para dar resposta às obrigações para com os segurados, aquando do

vencimento das mesmas. Quando uma empresa tem que vender antecipada ou

inesperadamente os seus activos por um valor muito baixo com vista a satisfazer os seus

compromissos, significa que está a enfrentar uma situação de falta de liquidez. Assim,

considera-se que o perfil de liquidez de uma empresa é função dos seus activos e

responsabilidades.

Na Europa, o regime prudencial de Solvência I, constituiu uma tentativa imperfeita da

tarifação dos riscos associados à actividade seguradora. Este regime de governo exige

capital suficiente para se poder constituírem provisões matemáticas numa determinada

percentagem para os seguros de Vida (1% para as unidades de conta em que o risco é

suportado pelos tomadores de Seguro, de 4% para as Apólices em euros), e uma

percentagem dos Prémios (16%) para os Seguros do ramo não Vida, existindo uma óbvia

subtarifação para estes últimos contratos. O modelo de negócio da actividade Seguradora

consiste em praticar uma política tarifária de acordo com os riscos através de uma

inversão do ciclo produtivo, exigindo aos stakeholders prudência, sendo que esta

subvalorização prudencial não conduziu a uma excessiva tomada de risco nesta fase. Por

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outro lado a Directiva sobre Solvência II, contempla um completo regime prudencial a fim

se incluírem todos os riscos específicos da actividade seguradora.

4.2.4. Solvência II, a configuração de um novo quadro regulamentar prudencial

Europeu

Decorrente do papel económico e social que a actividade Seguradora desempenha nos

diferentes Estados membros da CE, foram dados passos no sentido de se promover um

processo de harmonização comunitário onde estejam contemplados os direitos e as

garantias dos Segurados.

A actividade seguradora (ramo não Vida) a nível europeu foi inicialmente regida pela

antiga directiva 73/239/CEE aprovada em 1973, onde a maior preocupação dos

Seguradores na altura residia na margem mínima de Solvência. Posteriormente em 1988

houve lugar à aprovação da 2ª Directiva (88/357/CEE), e a 3ª Directiva a ser aprovada em

1992. Em 2002 foi aprovada a primeira Directiva de Solvência I, que passou a ser

obrigatória a partir de 2004, e por fim em 2009 é publicada a Directiva de Solvência II com

a sua obrigatoriedade de implementação a decorrer já em 2012.

A simples transferência para o sector Segurador de medidas de implementação detalhadas

tiradas de Basileia III, iria impor uma solução para um problema inexistente e seria, na

melhor das hipóteses, ineficaz e, no pior dos cenários, onerosa e perturbadora. Em última

instância, uma reacção regulamentar excessiva produziria um impacto negativo sobre os

consumidores e sobre a economia, pois levaria ao aumento nos preços dos produtos de

Seguro e tornaria a indústria Seguradora menos atractiva para os investidores.

Solvência II, irá permitir uma análise global da situação das Seguradoras e, pela primeira

vez, estabelecer um conjunto de requisitos mais sofisticados de solvência com base numa

avaliação do risco económico. A Directiva de Solvência II irá oferecer um novo quadro

prudencial para o sector Segurador, usando uma abordagem baseada em três pilares

semelhante à de Basileia II para os Bancos:

(i) O primeiro pilar relacionado com os requisitos quantitativos de capital

necessários para o cálculo das provisões técnicas, do qual existem dois:

Solvency capital required (SCR), que constitui o principal indicador de solvência

uma vez que no seu cálculo integra todos os riscos quantificáveis a que a

empresa de Seguros se encontra exposta. Realiza uma aproximação ao capital

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necessário para suster um choque correspondente ao Value at Risk de 99,5%

(evento 1/ 200 anos) para o horizonte temporal a 1 ano. Passa a ter em linha

de conta os efeitos das técnicas de mitigação de riscos e, quando se revele

apropriado, observa os efeitos de diversificação entre os diferentes riscos

existentes, assente numa fórmula padrão europeia aprovada pela autoridade

de supervisão competente.

Minimum Capital Required (MCR) representa o nível de fundos próprios a

partir do qual o risco de insolvência é considerado excessivo, desencadeando

posteriormente acções extremas por parte da autoridade de supervisão.

Apresenta uma grande simplicidade e objectividade no seu cálculo (fórmula

linear, sujeita a corredor entre 25% e 45% do SCR) onde a actuação do

supervisor passa a ser proporcional em função do deficit identificado.

(ii) O segundo pilar diz respeito aos requisitos qualitativos, ao sistema de

governação (fit and proper, sistema de gestão de riscos, sistema de controlo

interno e funções chave), auto avaliação do risco e da Solvência (ORSA),

requisito de capital adicional (capital add-on) e o processo de supervisão.

(iii) O terceiro pilar assenta nas questões relativas à transparência, reporte e

divulgação de informação, ou seja, questões inerentes à disciplina de mercado.

O estudo de impacto quantitativo, designado doravante por QIS (Quantitative Impact

Study), surgiu por iniciativa da Comissão Europeia tendo por base dois grandes

objectivos24:

(i) Recolha dos elementos necessários para a elaboração de um estudo de impacto

quantitativo, cujas conclusões serão apresentadas pela Comissão ao

Parlamento Europeu em Julho de 2007, de acordo com o último roadmap,

juntamente com a framework directive. Este estudo analisará as consequências

da nova legislação ao nível micro económico, e de estabilidade financeira,

Seguradoras e autoridades de supervisão, mercado Segurador e consumidores.

(ii) Avaliar a aplicabilidade das metodologias propostas nos pareceres técnicos

emitidos pelo CEIOPS em resposta às call for advices solicitadas pela Comissão.

24 Fonte, Associação Portuguesa de Seguradores.

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O QIS será composto por um conjunto de testes (alguns deles de repetição) de diferentes

níveis de sofisticação estando estes fortemente influenciados pelo roadmap definido e

pelos desenvolvimentos técnicos realizados ao nível do pilar I. O CEIOPS optou por

desenvolver um teste preliminar, designado por preparatory field study, que pretendeu

compreender a capacidade de resposta das Seguradoras do ramo Vida e recolher

informação para o desenvolvimento de testes futuros.

Os QIS, surgem da necessidade de ser avaliada em termos quantitativos, o impacto que a

introdução de novos métodos para o cálculo dos requisitos de capital irá causar, assim

como recolher elementos quantitativos necessários para suportar a Directiva

2009/138/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 25 de Novembro de 2009.

Este trabalho teve o seu inicio em 2005 através de um estudo preliminar, o preparatory

field study, e teve a sua continuidade através dos Estudos de Impacto Quantitativo (QIS 1,

QIS 2, QIS 3, QIS 4 e QIS 4 bis) que presentemente já se encontram cumpridos por parte

das diversas Seguradoras intervenientes. Recentemente em 2010, foi realizado um novo

exercício neste âmbito, o QIS 5, do qual foram conhecidos recentemente os seus

resultados.

O objectivo inerente à realização destes estudos passa por encontrar as melhores opções

de avaliação das provisões técnicas, e o cálculo dos requisitos de capital propostos para o

novo modelo de solvência dos ramos Vida e não Vida da actividade Seguradora. O QIS é

certamente um dos grandes desafios do projecto Solvência II, estando o seu sucesso

fortemente relacionado com o empenho e participação do mercado Segurador. Apesar do

carácter facultativo que assume, a participação é fortemente incentivada, não havendo

qualquer limitação para a participação de empresas que apresentem menor dimensão e,

ou grau de sofisticação, sendo que a informação disponibilizada pelas empresas

participantes no contexto do QIS não poderá ser utilizada para objectivos de supervisão

por parte dos supervisores nacionais.

O contacto nesta fase com questões e metodologias defendidas, que poderão muito

provavelmente vir a ser utilizadas futuramente, dotará as Seguradoras participantes das

ferramentas, e do conhecimento que lhes permitirá a obtenção de uma consciencialização

atempada assim como de uma postura mais competitiva e pró-activa. Permitirá ainda a

participação do sector Segurador na edificação das recomendações técnicas feitas à

Comissão Europeia, tendo em conta o diálogo entre Seguradoras e entidades de supervisão

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que decorrerá sobre a natureza prática da abordagem recomendada e das metodologias

utilizadas.

4.2.5. Os riscos decorrentes da arbitragem regulatória

Os Riscos de arbitragem regulatória no sector segurador, podem em parte ser explicados

devido a lacunas a nível internacional, em resultado da ausência de regras de

harmonização. A regulamentação prudencial que rege a actividade seguradora não é

padronizada a nível internacional. A entrada em vigor do projecto de Solvência II pode, em

teoria, conduzir a uma arbitragem entre os regulamentos europeus e os existentes noutras

geografias. Uma apreciação rigorosa da equivalência dos níveis de supervisão será

portanto um ponto essencial. Os riscos de arbitragem regulatória são mais significativos

no Resseguro, actividade abrangida por uma directiva europeia desde 2005. Neste sector

de B2B25, a localização geográfica do operador é relativamente insignificante com muitos

dos Resseguradores a estarem localizados nas ilhas Bermudas (paraísos fiscais).

Os riscos inerentes a certas actividades próximas da actividade Seguradora são mal

compreendidos nos regulamentos micro-prudenciais. Em particular, a venda das garantias

financeiras pode alternar entre a regulamentação bancária e a regulamentação seguradora

(caso da carteira de CDS da AIG). Estas actividades são frequentemente realizadas nos

Estados Unidos por empresas sujeitas a pouca ou nenhuma regulamentação, como as

seguradoras especializadas na comercialização de garantias.

4.2.6. A actividade Seguradora e o possível risco sistémico associado

A natureza da actividade Seguradora devido às suas especificidades não pode ser descrita

como sendo meramente sistémica. Embora as Seguradoras possam revelar uma

importância sistémica segundo os critérios do FMI-BIS-FSB, e ajudar a difundir uma crise

com efeitos sistémicos, as características intrínsecas da sua actividade, limitam a

acumulação de riscos não abrangidos por regulamentação prudencial adequada. Por

exemplo, após os ataques ao World Trade Center em 2001, o sector experimentou um

choque nas suas responsabilidades, devido às indemnizações que foram pagas, e no

conjunto dos activos detidos devido, à crise dos mercados financeiros que se seguiu, sem

causar com isso qualquer interrupção na prestação dos serviços financeiros. As

indemnizações e os reembolsos foram sendo progressivamente pagos durante um longo

25 Business to Business.

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período (apenas 40% dos montantes foram efectivamente pagos em 2004), permitindo

aos Resseguradores visados pela catástrofe recomporem-se.

Em particular, podemos verificar que as Seguradoras encontram-se menos expostas ao

risco de contágio sistémico. Comparado com os Bancos, a insolvência de uma Seguradora é

menos provável de provocar a insolvência de uma outra Seguradora. O risco de contágio

pode, portanto, só se materializar através de ligações indirectas, por exemplo, se a falência

de uma Seguradora provocar danos reputacionais em todo o sector, ou se um

Ressegurador entrar em processo de insolvência. O risco de uma corrida para resgatar as

Apólices também é limitado, em contraste com o sector Bancário no qual os indivíduos

podem fechar as suas contas a qualquer momento, os Segurados só podem anular e

resgatar as suas Apólices antecipadamente em casos muito específicos.

O baixo nível de substituibilidade de algumas partes na indústria Seguradora, contudo

nunca exigiu grande atenção. Isto é o que se verifica em particular, com a actividade

Resseguradora. Embora a concorrência seja forte neste mercado, não podemos descartar a

possibilidade de que a insolvência de um dos principais players do mercado Ressegurador

possa causar sérios problemas para as companhias de seguros. Isto deve ser devidamente

analisado no seu contexto, embora, como apenas actualmente uma pequena percentagem

dos compromissos se encontram ressegurados (5,6% para não Vida e 2,4% para a Vida), e

como se encontra previsto em Solvência II as Seguradoras futuramente terão que

diversificar as suas fontes de Resseguro. Além disso, a suficiência das Resseguradoras no

decorrer dos desastres ocorridos no passado foi restabelecida num curto espaço de anos.

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4.3. Operações no mercado de capitais

Analisando a organização das actividades presentes no mercado, estas exigem um estudo

acerca da organização dos próprios mercados e da organização dos participantes nestes

mercados. Na presente análise pode-se distinguir entre:

(i) Mercados organizados, onde ocorrem as transacções multilaterais que

envolvem instrumentos financeiros padronizados, e

(ii) Mercados over the counter, em que as operações bilaterais envolvendo

instrumentos financeiros geralmente feitos à medida têm lugar. Na União

Europeia, os mercados organizados incluem os mercados regulamentados

(RM), que detêm o monopólio sobre a admissão de valores mobiliários para

negociação, e sistemas de negociação multilateral (MTS), que consistem em

plataformas para negociação de títulos, que podem ou não ter sido admitidos

num mercado regulamentado, mas que são alternativas para os sistemas de

mercado regulamentado.

Os mercados organizados de negociação de acções, constituem o modelo primitivo de

negociação. São caracterizados por uma elevada liquidez, um grande número de

participantes, grande transparência nos preços e nos volumes negociados, e um bom nível

de segurança nas transacções que são realizadas, devido em parte às sólidas infra-

estruturas de mercado. Durante a crise, o mercado accionista nunca parou de funcionar

permanecendo como o mercado mais líquido. É por isso que sofreram os efeitos

decorrentes da falta de liquidez nos outros mercados (e.g. títulos de dívida), porque os

investidores trocaram os riscos de incumprimento do emitente, obtendo a cobertura

através de acções desses mesmos emitentes. Os mercados OTC, conheceram um

crescimento exponencial nos últimos 20 anos, mercado esse que abrange uma série de

operações bilaterais que não são muito transparentes em termos de volume, preço ou

número de investidores. São operações que costumam atender a uma necessidade

específica de um agente económico que procura algum tipo de protecção contra a

volatilidade do mercado, onde se incluem os riscos de taxa de juro e do risco cambial.

As operações OTC podem incidir igualmente sobre produtos padronizados, tais como as

acções que são negociadas nas redes de retalho de um Banco, que não se encontram

sujeitas às mesmas regras que as aplicadas a RM e MTS. A liquidez das operações OTC é

geralmente fornecida pelos market maker (criadores de mercado) ou pelos traders, que

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em determinado momento vão actuar como contraparte na execução das ordens de

compra e de venda dos seus Clientes.

4.3.1. A organização das actividades no mercado de capitais

Os Bancos de Investimento neste contexto, são os principais agentes condutores das

actividades desenvolvidas neste mercado num sentido estrito do termo, apesar de outras

instituições financeiras (Bancos Comerciais, Seguradoras, Sociedades Gestoras, Fundos,

entre outros) também participarem no seu desenvolvimento.

As actividades do mercado de capitais abrangem um vasto leque de serviços:

(i) A negociação que abrange a compra e a venda de diversos valores mobiliários

de tesouraria e de derivados destinados a gerar uma margem entre os preços

de compra e de venda, designado como spread, este constitui o negócio

tradicional do trader que realiza as operações de arbitragem.

(ii) Operações de market making (operações de liquidez), que compreende as

posições tomadas voluntariamente pelos operadores para poderem oferecer

preços em volumes significativos, mas variáveis. Beneficiam do spread ao qual

a contraparte negoceia com eles e, em particular, através de todas as ordens de

compra e de venda, que fornecem uma avaliação constante das suas posições,

que variam de acordo com a tendência estimada do mercado. Esta actividade,

muitas vezes resulta numa concentração muito elevada em apenas alguns

participantes.

(iii) As vendas, que abrangem todos os serviços financeiros prestados aos clientes

(soluções de financiamento, emissão de acções e de obrigações, processos de

gestão de risco e derivados). Também está sujeita a uma actividade separada,

caso a relação com o cliente exija um serviço de excelência, e um clima de

confiança, assim como competência para prestar serviços de consultoria, o

conhecimento da política de fluxos de caixa e dos investidores das empresas, e

uma adaptação dos produtos do mercado às necessidades dos diferentes

clientes.

(iv) O proprietary trading, que abrange as actividades em que os traders investem o

capital do Banco, a fim de gerarem mais-valias através de uma correcta

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previsão das mudanças no mercado, através da tomada de posições na

presumível tendência do mercado.

As fronteiras entre estas actividades não se encontram totalmente definidas. A actividade

de trading é muitas vezes essencial, no sentido de servir como complemento a outro tipo

de actividades financeiras. As actividades de market making, e de trading constituem

actividades inseparáveis, à medida que o número de contrapartes e de transacções

representa um número crescente de oportunidades para gestão de posições de um Fundo.

Além disso, para atender às necessidades dos seus clientes, os Bancos devem garantir que

existe uma contraparte às suas posições (de trading) e de gestão de riscos.

4.3.2. Nível de concorrência

A organização das actividades no mercado de capitais por natureza é oligopolista, uma vez

que não respeita as condições ideais de concorrência em diversos aspectos.

(i) Inexistência de um número significativo de participantes, uma vez que poucos

demonstram ter capacidade para atingir uma dimensão crítica, e com isso

oferecer uma gama completa de actividades de mercado, dispondo de todos os

derivados e instrumentos monetários de que os clientes podem precisar, e

possuir os recursos tecnológicos mais eficientes. A recente crise tem conduzido

a que algumas dessas empresas reduzam as suas actividades de mercado,

contribuindo assim para um maior fortalecimento das posições dos seus

concorrentes. As actividades no mercado estão a tornar-se um pouco mais

concentradas devido em parte, à especialização em determinados segmentos

de mercado, tais como CDS, ou os derivados sobre acções.

(ii) O desenvolvimento destas actividades apresenta um conjunto elevado de

barreiras à entrada neste mercado, uma vez serem necessários recursos

humanos altamente especializados, e de infra-estruturas que se traduzem em

investimentos e despesas operacionais que representam um insuportável

custo de entrada, e que nem todos são capazes de suportar. Na verdade, as

salas de negociação requerem recursos em número considerável, IT,

comunicações e instalações, bem como uma monitorização do risco e

ferramentas de controlo e de reporte. Exigem igualmente técnicos

especializados, capacidade de inovação, recursos dedicados ao

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desenvolvimento da base de clientes, e na estruturação, e montagem de

produtos que estejam adaptados às suas necessidades comerciais e de

mercado.

(iii) Os produtos nem sempre são homogéneos, uma vez que a abordagem

executada à medida, no mercado de operações OTC, em oposição a uma

normalização dos mercados organizados, reduz a consistência dos produtos

comercializados. Esta falta de homogeneidade limita e cria um trade off (custo

de oportunidade), para a devida adaptação dos contratos às necessidades

específicas de cada cliente, o que em parte também se justifica devido às

margens de venda serem substancialmente superiores.

(iv) A transparência nem sempre se encontra garantida, especialmente nas

operações OTC. Na negociação directa, os requisitos de confidencialidade e

também a complexidade das operações OTC, diminuem a transparência dos

preços e volumes comercializados, em simultâneo tanto para o regulador,

como para o restante mercado. Esta opacidade revela ser especialmente

problemática para as entidades públicas ou privadas que compõem a base

subjacente a estes contratos.

Os factores produtivos apresentam uma elevada mobilidade, daí a necessidade de uma

abordagem internacional no que diz respeito à remuneração dos traders. Os principais

Bancos Comerciais e de Investimento, afirmam que alguns dos seus lucros são realizados

através da inovação financeira, e sob o princípio do “primeiro a chegar, primeiro a servir-

se”, mas na ausência de qualquer sistema de patentes para proteger os novos produtos

desenvolvidos, as empresas procuram defender-se contra o chamado "escoamento

industrial", oferecendo aos seus empregados níveis de remuneração muito elevados.

É interessante verificar que a procura dos clientes por operações do tipo OTC continua a

ser expressiva. Os clientes empresariais e institucionais, preferem os mercados OTC, onde

os contratos celebrados com um Banco reputado encontram-se vinculados ao sigilo

profissional, e prestam ainda adicionalmente ao mercado, serviços de gestão de risco de

forma a satisfazer as suas necessidades específicas de cobertura de risco, as quais nos

contratos padrão não estão adaptados nem contemplados a servirem esse tipo de

necessidade específica.

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As normas contabilísticas também incentivam o recurso por parte das empresas a este

tipo de operações. E, olhando para além das suas necessidades de cobertura, as

instituições financeiras utilizam os produtos OTC nas operações de compra e de venda por

conta própria. A ausência de normas mínimas aplicáveis à colateralidade dos contratos é

tanto mais provável que conduza a riscos de contraparte em mais de metade de todas as

transacções OTC que parecem não exigir qualquer tipo de garantia financeira.

O mercado de CDS26 ilustra a natural actividade do mercado em direcção ao oligopólio. O

mercado de CDS, constitui um dos mercados mais recentes de operações OTC, e é

dominado apenas por alguns grandes players a nível global. O mercado de CDS tem-se

desenvolvido em grande escala nos últimos 10 anos, sendo actualmente dominado por

cinco CIB’s27 internacionais que actuam como dealers primários através dos quais todas as

transacções são executadas.

4.3.3. Fixação do preço de risco

O custo do capital referente às actividades desenvolvidas no mercado de capitais, é

complicado e incoerente, expondo o trader a três riscos distintos em termos de

regulamentação micro-prudencial:

(i) O risco de mercado, que representa a perda potencial do trader em caso de

queda do valor da sua posição, os compradores temem uma queda no mercado,

por outro lado os vendedores um aumento.

(ii) O risco de contraparte, que representa a perda potencial do trader em caso de

incumprimento da contraparte, antes da sua maturidade (vencimento).

(iii) O risco operacional, que abrange todos os demais riscos associados a erros

humanos (confirmação incorrecta de uma operação, fraudes, entre outros),

falha informática, e até mesmo a eclosão de conflitos civis.

26 Um credit default swap, é um instrumento financeiro negociado por investidores no mercado de renda fixa (obrigações) para especular ou fazer hedging (cobertura), caso uma empresa entre em incumprimento na sua dívida (risco de crédito). Um CDS envolve duas contrapartes, um comprador de protecção na entidade de referência, e um vendedor de protecção na entidade de referência. O risco introduzido pelo CDS é o risco de contraparte sobre o vendedor do CDS, ou seja, o comprador fica com o risco de que o vendedor não cumpra as suas obrigações, em caso de falência da entidade de referência. No caso de uma empresa estar na impossibilidade de reembolsar uma dívida emitida por ela (obrigações), o vendedor de um CDS compromete-se a reembolsar o comprador desse CDS, ou seja, quanto mais elevado é o risco de falência, mais alta é a cotação dos CDS para essa entidade. 27 Corporate and Investment Banking.

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Podemos igualmente verificar as seguintes diferenças nas principais normas prudenciais:

(i) Para os participantes que não se encontram abrangidos pela regulamentação

de Basileia II, (Bancos colados a Basileia I, e os operadores de mercado não

regulamentado, tais como os hedge funds), não existem regras sobre o ajuste

dos requisitos de adequação de capital específico em relação aos riscos

incorridos nas actividades de mercado. Estas são determinadas de forma

independente, quer por parte dos participantes com base na sua própria

análise, e os retornos esperados pelos seus accionistas, ou por meio de

restrições regulamentares. Em 1996 na reforma realizada relativa ao risco de

mercado, por exemplo, os órgãos reguladores dos EUA aplicaram requisitos

prudenciais adicionais aos Bancos sujeitos ao regime de Basileia I. Na prática,

aqueles que não se encontram sujeitos à regulamentação de Basileia II, em

geral usam como indicador o VaR28 para calcular os riscos de mercado e alocar

o devido capital tendo em vista a sua cobertura. Em termos de riscos

operacionais não abrangidos pelo acordo de Basileia I, os reguladores não têm

implementado qualquer tipo de medidas similares.

(ii) Para os Bancos sujeitos à regulamentação de Basileia II, os requisitos de

adequação específicos de capital são definidos para os riscos de mercado, de

contraparte e operacional, aplicando o método padrão, ou um método

avançado de medição com base em modelos internos de risco. Aqui,

consideramos a abordagem avançada. Os riscos de mercado, são medidos

através do modelo VaR, que determina a perda máxima que um investidor

pode suportar, dentro de um determinado período de tempo e de acordo com

uma dada probabilidade, em caso de situações adversas de mercado. O risco de

contraparte é medido através do cálculo da exposição máxima ligada à posição

no mercado, e criando cenários de perda em caso de incumprimento por parte

da contraparte, como sendo o risco de crédito. O risco operacional, é calculado

com base numa série histórica de perdas associadas a erros humanos

ocorridos dentro da instituição e falhas materiais.

28 Value at Risk é uma medida, que traduz a maior perda potencial esperada para um activo ou carteira, num determinado horizonte de tempo (holding period) e dada uma probabilidade de ocorrência (nível de confiança). O VaR deve ser sempre associado a uma moeda (valor monetário), um intervalo de tempo e a uma probabilidade com que a perda será percebida.

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As actividades de mercado encontram-se geralmente subestimadas ao nível do capital, em

parte devido a dois factores de origem,

(i) Micro prudencial, onde os requisitos prudenciais aplicáveis aos Bancos

regulados, conduzem de forma imediata a uma maior alocação de capital para

operações de crédito do que propriamente para as actividades de mercado.

Esta harmonização relativa aos requisitos prudenciais das actividades de

mercado não é suportada na teoria do capital óptimo necessária para cobrir

estas actividades, mas reflecte as preocupações expressas durante as

negociações de Basileia II, para evitar penalizar em excesso as actividades de

mercado, as quais anteriormente nunca tinham sido sujeitas a qualquer

requisito específico.

(ii) Macro prudencial, onde a principal ferramenta de avaliação de risco de

mercado assenta no VaR, a qual apresenta várias limitações intrínsecas, o que

significa logo à partida que não possa ser usada para medir todos os riscos que

podem surgir decorrentes das actividades do mercado. Em particular, o VaR

não identifica os riscos extremos, podendo calcular os riscos de perdas dentro

de um intervalo de confiança de 99%, mas não calcula os riscos de perdas

extremas que podem materializar-se nos outros 1%, o que pode desencadear

uma crise sistêmica.

4.3.4. O VaR como modelo de projecção de perdas potenciais

O Value at Risk, é definido como a perda potencial máxima, na sequência de uma evolução

desfavorável no preço dos activos negociados no mercado dentro de um período de tempo

específico, através de um determinado intervalo de confiança. O VaR constitui portanto,

uma medida agregada dos riscos de mercado, aos quais um conjunto de probabilidades se

encontra associadas.

Por exemplo, se o VaR a 10 dias for de 5 milhões € com um intervalo de confiança de 99%,

isso significa que em 99 vezes em 100 possíveis, a sociedade não vai perder mais do que 5

milhões € durante 10 dias consecutivos. O VaR pode ser calculado como um valor

agregado para uma instituição, ou para uma determinada categoria de risco presente em

cada instituição (VaR de renda fixa, VaR de capital, entre outros). Estes diferentes tipos de

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VaR, são todos expressos através da combinação de diferentes medidas do nível de risco

assumido pelos vários agentes nas suas operações de mercado.

Os supervisores Bancários calculam os requisitos de capital para cobrir os riscos de

mercado dos Bancos, suportado num VaR a 10 dias calculado de acordo com o seu modelo

interno, assumindo a prévia aprovação por parte do regulador, e validado através de

frequentes fiscalizações sobre a adequação desse mesmo modelo. Em termos de regras

prudenciais, os requisitos prudenciais de mercado são iguais ao VaR multiplicado por um

coeficiente fixado pelo órgão regulador (de 1 a 6) em função da solidez do modelo interno.

Estes requisitos prudenciais do mercado, são então multiplicados por um coeficiente fixo

de 12,5 para obter um ponderador para o risco de mercado dos activos. O Banco deve, em

seguida, cobrir 4% do risco ponderado destes activos através do Capital Tier One.

Exemplo: Para um activo com um valor nominal de 100 milhões €, e que apresente uma

volatilidade diária de 1%, o VaR é de 7,5 M € (99 vezes em 100, o Banco não irá perder

mais de 7,5 M € durante mais de 10 dias nas suas actividades de mercado). O regulador

aplica um coeficiente de 4. O Banco deve assim deter € 15 M (= 7,5 x 4 x 12,5 x 0,04), em

capital Tier I, para a cobertura dos riscos de mercado que incidam em concreto sobre

essas actividades.

4.3.5. Métodos comummente utilizados para o cálculo do VaR de um portfólio

(i) O VaR paramétrico, é o método mais fácil de usar, mas depende de três

pressupostos, ou seja, o comportamento estatístico do portfólio tem que seguir

uma distribuição normal (curva de Gauss), no que diz respeito aos retornos

dos preços de mercado, independência temporal nas mudanças do valor de

uma carteira, e uma relação linear entre o valor da carteira e a rendibilidade

dos capitais próprios, sendo este método inadequado para o cálculo do VaR das

opções.

(ii) O VaR histórico, que calcula a distribuição de perdas possíveis de acordo com a

hipótese de incerteza de que as mudanças futuras nos mercados serão

semelhantes às mudanças ocorridas no passado. Este é o método mais

utilizado pelos Bancos, e pode ser aplicado a todos os instrumentos.

(iii) Monte Carlo VaR, que é baseado numa simulação em grande escala

(geralmente 10.000 vezes), de possíveis desenvolvimentos futuros nos

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factores de risco (por exemplo, os retornos da carteira de acções), associados a

uma determinada posição detida no mercado, a fim de se poder estabelecer

uma distribuição de ganhos e perdas, a partir da qual se possa inferir um risco

máximo de perdas para um determinado intervalo de confiança.

4.3.6. Problemas na avaliação de riscos associados ao VaR

O VaR não mede o risco de perdas extremas. Por definição, o VaR mede a perda potencial

máxima dentro de um intervalo de confiança, por exemplo 99%, mas não dá qualquer

informação sobre o risco de perda que se possa vir a materializar na parte excedente, os

outros 1%. Possíveis cenários de mercado nestes 1% dos casos são desconhecidos e,

portanto, não abrangidos pelo capital necessário para absorver potenciais perdas. Este

limite é tanto mais problemático, uma vez que não se pode afirmar com total certeza que o

intervalo de confiança não abrangido pelo VaR verdadeiramente se encontre limitado a

1%, a área de perdas extremas dentro deste intervalo de confiança de 1%, pode assim

corresponder à principal área onde se concentre o maior risco para a instituição.

Os Bancos realizam os stress test para tentar identificar os cenários de mercado

correspondentes a esses riscos de perdas extremas, mas os cenários traçados

permanecem imperfeitos. Além disso, o VaR de um portfólio pode ser subestimado.

Tomando em linha de conta que as correlações existentes entre os retornos sobre o

capital, em tempos de baixa volatilidade conduzem a uma diminuição do VaR. Essas

correlações são, todavia, incertas e tendem a aumentar em tempos de crise, condicionando

o efeito por via da diversificação. É justamente durante uma crise sistémica que o VaR de

uma carteira sofre um significativo incremento, uma vez que o retorno sobre o capital

torna-se rigorosamente correlacionado, ilustrando o facto de que o VaR não reflecte a

presença deste risco numa situação normal.

Além disso, e o mais importante, o risco de falta de liquidez no mercado não se encontra

devidamente avaliado devido ao seu tratamento contabilístico favorável. O risco de falta

de liquidez no mercado diz respeito ao súbito desaparecimento da liquidez dos

instrumentos financeiros, conduzindo as entidades que os detêm em carteira, a uma

perigosa espiral de perdas e dificuldades de refinanciamento, uma vez que as suas

posições se tornaram ilíquidas, uma instituição financeira pode ser incapaz de conseguir

fazer cumprir com as suas obrigações de curto prazo, sem fechar as suas posições com

uma perda e, potencialmente, prejudicar as suas condições de refinanciamento, esta

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deterioração pode forçar a instituição a fechar as suas posições em condições de mercado

desfavoráveis tendo em vista reduzir as suas necessidades de refinanciamento. Esta

escassez de liquidez descrita num determinado mercado, afecta todos os seus

participantes, e devido às extremas relações mútuas de dependência que se estabelecem

no mercado que são sintomáticas pode despoletar um choque sistémico.

4.3.7. A liquidez dos instrumentos financeiros

As regras prudenciais encontram-se baseadas através de um quadro contabilístico

referente às actividades financeiras. No entanto, as normas de contabilidade apresentam

uma definição muito ampla de liquidez dos instrumentos financeiros, considerando que

qualquer instrumento financeiro é líquido, se for transaccionável, isto é, da possibilidade

de ser negociado, mesmo apenas como uma contraparte. Neste caso falamos de liquidez

através da negociação, podendo consequentemente ser reconhecido pelo seu valor de

mercado. A liquidez dos instrumentos financeiros não depende portanto de uma análise

das suas características intrínsecas, número de investidores, da sua transparência,

padronização, ou volume de emissão, etc.

A divisão da carteira de negociação em três níveis, demonstra a ampla definição

contabilística que o termo liquidez pode ter. As normas contabilísticas estabelecem três

níveis de reconhecimento da carteira de negociação, dependendo do método de avaliação

utilizado. Este método está directamente dependente da existência de um preço de

mercado para os instrumentos financeiros:

(i) O nível 1 da carteira corresponde aos instrumentos cujo preço (não ajustado),

é cotado num mercado para um determinado instrumento de características

semelhantes.

(ii) O nível 2, corresponde aos instrumentos cujo fair value, é estabelecido com

base na informação de outros preços cotados indicados para o nível 1, e que

pode ser observado directa ou indirectamente, com base em informações

obtidas a partir dos preços.

(iii) O nível 3, corresponde aos instrumentos cujo fair value, é estabelecido com

base na informação que não pode ser observada no mercado. Por outras

palavras, apenas os instrumentos classificados no nível 1, são negociados num

mercado autenticamente apropriado, a fim de poderem garantir a devida

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liquidez dos instrumentos negociados, através de uma adequada transparência

no preço. No nível 2, e no nível 3, os instrumentos, cujo valor não possa ser

directamente observado num mercado verdadeiramente activo, mas é

derivado a partir de um modelo, não oferece essa garantia de liquidez.

O resultado deste tratamento contabilístico, pressupõe que a liquidez permanente dos

instrumentos de negociação, é vaga nos requisitos prudenciais. Como os instrumentos de

negociação são considerados líquidos e negociáveis, em qualquer momento, estes podem

ser refinanciados no curto prazo sem quaisquer requisitos de compatibilidade. O risco de

falta de liquidez é, portanto, subestimado, devido à fraca liquidez de alguns activos na

carteira de negociação que devem parcialmente, estar ligados a taxas de refinanciamento

de longo prazo, impondo os custos de incompatibilidade sobre a entidade que os detém.

4.3.8. O papel das agências de rating na avaliação do risco de mercado e de

liquidez

As agências de rating tiveram uma responsabilidade directa na subavaliação dos riscos de

mercado e de liquidez, que não foram devidamente incorporados nas suas análises. A crise

propagou-se através do sector financeiro, devido à desvalorização repentina dos títulos

que se tornaram ilíquidos. Obviamente que a avaliação do risco de liquidez e de mercado, é

essencialmente da responsabilidade dos auditores e reguladores, mas os métodos das

agências de rating têm-se demonstrado insuficientes em considerar alguns factores tais

como a correlação entre as insolvências. Além disso, esta metodologia tem

insuficientemente consignado o declínio nas condições de mercado nos ratings, bem como

no ajustamento desses ratings à medida que a crise se desenvolvia, sendo que o papel das

agências de rating deve permanecer como o de avaliar o risco de insolvência de um

emitente, ou de produtos financeiros, a fim de proporcionar aos investidores informações

mais fidedignas para melhor compreenderem as condições do mercado, e os seus

parâmetros.

A nível europeu, o Regulamento CE 1060/2009 de 17 de Novembro 2010, estabelece um

sistema de identificação e de controlo, que melhora significativamente as regras de

transparência, nomeadamente no que respeita à identificação específica de produtos

estruturados, a governação e a prevenção de conflitos de interesse dentro das agências de

rating.

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4.3.9. As actividades do mercado de capitais e o risco sistémico

As deficiências identificadas na regulamentação das actividades de mercado ofereceram

incentivos para a acumulação de riscos, em particular, o risco de liquidez. O cálculo dos

requisitos de capital para estas actividades não teve em conta os riscos decorrentes de

perdas extremas. O risco de liquidez no mercado de activos não foi convenientemente

fixado na medida em que depende de tratamento contabilístico favorável. Essas falhas na

regulação criaram incentivos para que os agentes financeiros tivessem acumulado riscos

de natureza sistémica, expondo rapidamente todo o sector financeiro a perdas que

resultaram numa onda de desconfiança, conduzindo a uma rápida sucessão de

insolvências. De facto, a recente crise nasceu da acumulação de posições no mercado que

se tornaram ilíquidas de um dia para o outro, o que para a maioria dos agentes financeiros

representava quantidades consideráveis. Este é especialmente o caso das unidades de

titularização (UT’s) acções de titularização (ABS, CDO, CLOC, etc.) e de outros activos

tóxicos, cuja liquidez subitamente desabou. Uma avaliação efectuada em profundidade a

nível internacional, é essencial tanto para um cálculo mais preciso dos riscos causados

pela grande concentração de participantes sobre os diversos tipos de mercados

financeiros, como para revelar a existência de rendimentos que revelem uma alocação

ineficiente dos recursos existentes na economia.

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5. Autoridades europeias que supervisionam o mercado financeiro

Entrou em vigor no passado dia 1 de Janeiro, as Directivas Comunitárias que criam três

entidades europeias de supervisão financeira, que estavam em estudo, e sob proposta da

Comissão desde o final de 2009 sendo elas,

(i) A Autoridade Europeia de Supervisão (Autoridade Bancária Europeia, criada

através do Regulamento (UE) n.º 1093/2010),

(ii) Autoridade Europeia dos Seguros e Pensões Complementares de Reforma

(criada através do Regulamento (UE) n.º 1094/2010) e a,

(iii) Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e dos Mercados (criada através

do Regulamento (UE) n.º 1095/2010).

Este Comité, com sede em Frankfurt (criado através do Regulamento (UE) n.º 1092/2010

do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de Novembro de 2010, relativo à supervisão

macro prudencial do sistema financeiro na União Europeia), é parte integrante do Sistema

Europeu de Supervisão Financeira (SESF), que tem por objectivo garantir a supervisão do

sistema financeiro da União. O objectivo passa por identificar rapidamente os riscos

sistémicos, e assim conseguir que os Estados-membros actuem em conjunto com maior

eficácia nas situações de emergência, e na resolução de eventuais situações de desacordo

entre autoridades de supervisão.

O novo CERS será responsável pela supervisão macro prudencial do sistema financeiro na

União Europeia (UE), com o objectivo de prevenir, ou atenuar os riscos sistémicos, e

ajudar à estabilidade financeira na UE decorrente das evoluções no sistema financeiro,

tendo em conta a evolução macroeconómica. Pretende-se desta forma, evitar períodos de

crises financeiras generalizadas.

Entre outras atribuições, o CERS, em colaboração com as autoridades europeias de

supervisão, terá de definir um conjunto comum de indicadores quantitativos e qualitativos

através de novos painéis de riscos, para identificação e medição do risco sistémico.

O CERS será presidido nos primeiros cinco anos de existência deste Comité, pelo

Presidente do Banco Central Europeu (Regulamento (UE) n.º 1096/2010 do Conselho, de

17 de Novembro de 2010, que confere ao Banco Central Europeu atribuições específicas

no que se refere ao funcionamento do Comité Europeu do Risco Sistémico).

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5.1. Sistema Europeu de Supervisão Financeira

Este Sistema Europeu compreende:

A Autoridade Europeia de Supervisão (Autoridade Bancária Europeia).

A Autoridade Europeia de Supervisão (Autoridade Europeia dos Seguros e Pensões

Complementares de Reforma).

A Autoridade Europeia de Supervisão (Autoridade Europeia dos Valores

Mobiliários e dos Mercados).

O Comité Conjunto das Autoridades Europeias de Supervisão (Comité Conjunto).

As autoridades competentes ou de supervisão dos Estados-membros especificadas

nos actos da União.

Estas Autoridades Europeias de Supervisão substituem o Comité das Autoridades

Europeias de Supervisão Bancária, o Comité das Autoridades Europeias de Supervisão dos

Seguros e Pensões Complementares de Reforma, e o Comité das Autoridades de

Regulamentação dos Mercados Europeus de Valores Mobiliários, criados em 2009, e

assumem todas as atribuições e competências desses comités.

5.2. Autoridade Europeia de Supervisão

Esta autoridade bancária europeia tem poderes para investigar alegações de aplicação

incorrecta, ou insuficiente de obrigações decorrentes da legislação da União por parte das

autoridades nacionais nas suas práticas de supervisão, após o que apresentará uma

recomendação. Vai, portanto, fiscalizar as entidades de supervisão nacionais. Se uma

autoridade nacional competente não seguir a recomendação, a Comissão poderá emitir um

parecer formal que exija à autoridade nacional que adopte as medidas necessárias e em

falta. Para poder ultrapassar as situações excepcionais de inacção persistente por parte de

uma autoridade competente, esta autoridade europeia pode ainda adoptar decisões

dirigidas a instituições financeiras individuais. Essa competência é no entanto limitada às

circunstâncias excepcionais em que uma autoridade competente não dê cumprimento ao

parecer formal que lhe seja dirigido, e em que exista legislação da União directamente

aplicável às instituições financeiras por força de regulamentos da União em vigor, ou a

adoptar futuramente. Terá ainda a possibilidade de requerer às autoridades nacionais de

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supervisão a adopção de medidas específicas para dar resposta a uma situação de

emergência.

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6. Conclusão

Dada a complexidade do sistema financeiro global, é irrealista esperar que uma única

medida carácter preventivo dirigida ao risco sistémico seja suficiente. A subavaliação de

liquidez em tempos de crise, por sua vez pode conduzir a uma série de distorções, como

seja o facto de os banqueiros assumirem riscos em demasia tanto nos seus financiamentos

como nas decisões de investimento que tomam, e mais em geral, no excesso de

empréstimos concedidos. É sabido que os mercados financeiros apresentam um

comportamento iminentemente pro-cíclico, ou seja, as restrições de financiamento

endógeno são menos restritivas em momentos de expansão económica e contrariamente,

como no actual momento que vivemos tendem a apertar, ou mesmo a serem inexistentes.,

conduzindo este fenómeno a produzir um efeito de amplificação no mercado financeiro,

caso se verifiquem fortes choques negativos.

O sistema financeiro tornou-se consideravelmente mais complexo ao longo das últimas

duas décadas com clara distinção entre as operações realizadas pelos Bancos, hedge funds,

Seguradoras, e os diferentes intermediários que actuam no mercado de capitais, graças em

parte à inovação financeira e da desregulamentação. Embora estas mudanças são sejam

consequência inevitável da prosperidade e crescimento económico que se tem observado,

são no entanto acompanhadas por certas consequências, incluindo a formação do risco

sistémico.

Assim sendo, podemos observar que decorrente do risco de crédito, a falta de liquidez dos

activos Bancários, juntamente com o facto de os Bancos não estarem estruturados para

suportar perdas súbitas, e em grandes volumes (ao contrário dos hedge funds), torna este

um sector potencialmente gerador de risco sistémico. Por outro lado, na ausência de

liquidez consistente, e de regras de transformação, e de gestão de risco, as actividades de

crédito apresentam uma fragilidade sistémica, sendo que se observou que várias

instituições financeiras tiveram problemas durante a recente crise devido à má gestão

destes riscos.

Por outro lado, a própria natureza da actividade Seguradora devido às suas

especificidades não pode ser descrita como sendo meramente sistémica. A nível macro-

prudencial e com base nos critérios para a identificação de riscos sistémicos elaborados

pelo Financial Stability Board (FSB) e da International Association of Insurance Supervisors

(IAIS), o modelo de negócio (core business) das Seguradoras como actividade principal não

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gera um risco sistémico directo para a economia. Os Seguros representam um risco de

contágio muito mais reduzido, uma substituibilidade mais elevada e uma vulnerabilidade

financeira mais baixa que a Banca. A posição financeira dos Seguradores degradasse a um

ritmo muito mais lento do que a dos Bancos, e o enquadramento regulamentar dos

Seguros impõe dois níveis de requisitos de fundos próprios, com o intuito de assegurar a

detecção preventiva de problemas financeiros, e a aplicação de medidas progressivas de

correcção pela gestão e pelos supervisores. Mesmo quando uma Seguradora está em

dificuldades, é muito mais fácil a resolução dos problemas, dado que os Seguradores

cobrem potenciais futuros sinistros com activos suficientes (provisões técnicas). No

entanto, certos Seguradores poderão exercer um número de actividades além da principal

susceptível de relevância sistémica (e.g. operações sobre derivados ou empréstimo de

valores). A estes casos pode aplicar-se a regulamentação micro-prudencial. Na sua

qualidade de grande investidor institucional, o sector Segurador, no seu conjunto, pode

transmitir ou, como ficou demonstrado durante a actual crise, absorver os choques ou

riscos sistémicos gerados por outras áreas do sector financeiro.

Em particular, podemos verificar que as seguradoras encontram-se menos expostas ao

risco de contágio sistémico. Comparado com os Bancos, a insolvência de uma companhia

de seguros é menos provável de provocar a insolvência de uma outra Seguradora. O risco

de contágio pode, portanto, só se materializar através de ligações indirectas, por exemplo,

se a falência de uma Seguradora provocar danos reputacionais em todo o sector, ou se um

Ressegurador entrar em processo de insolvência. O risco de uma corrida para resgatar as

Apólices também é limitado, em contraste com o sector Bancário no qual os indivíduos

podem fechar as suas contas a qualquer momento, os segurados só podem anular e

resgatar as suas Apólices antecipadamente, e em casos muito específicos.

As deficiências identificadas na regulamentação das actividades de mercado

nomeadamente de capitais, ofereceram incentivos para a acumulação de riscos, em

particular, o risco de liquidez. O cálculo dos requisitos de capital para estas actividades

não teve em conta os riscos decorrentes de perdas extremas. O risco de liquidez no

mercado de activos não foi convenientemente fixado na medida em que depende de

tratamento contabilístico favorável. Essas falhas na regulação criaram incentivos para que

os agentes financeiros tivessem acumulado riscos de natureza sistémica, expondo

rapidamente todo o sector financeiro a perdas que resultaram numa onda de

desconfiança, conduzindo a uma rápida sucessão de insolvências. De facto, a recente crise

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nasceu da acumulação de posições no mercado que se tornaram ilíquidas de um dia para o

outro, o que para a maioria dos agentes financeiros representava quantidades

consideráveis. Este é especialmente o caso das unidades de titularização (UT’s) acções de

titularização (ABS, CDO, CLOC, etc.) e de outros activos tóxicos, cuja liquidez subitamente

desabou. Uma avaliação efectuada em profundidade a nível internacional, é essencial tanto

para um cálculo mais preciso dos riscos causados pela grande concentração de

participantes sobre os diversos tipos de mercados financeiros, como para revelar a

existência de rendimentos que revelem uma alocação ineficiente dos recursos existentes

na economia.

Enquanto o risco excessivo, foi suportado por práticas de empréstimos excessivamente

agressivos, a regulamentação pro-cíclica, neste âmbito decorrente das políticas

governamentais, podem ter contribuído para os recentes problemas no mercado

imobiliário dos EUA. Enquanto o comportamento humano é acoplado com a livre

iniciativa, não é realista esperar que as falhas de mercado, e fraudes nunca sejam

completamente eliminadas do nosso mercado de capitais. A melhor esperança para evitar

algumas das consequências mais perturbadoras provenientes destas crises, passa por

desenvolver métodos que consigam monitorizar, mitigar, antecipar e medir os impactos

decorrentes de exposições sistémicas.

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