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O PAPEL DO POLICIAL COMO CONSCIENTIZADOR DA SOCIEDADE DESAPARECIMENTOS Série Análise Criminal Volume 3 distribuição gratuita

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O PAPEL DO POLICIAL COMO CONSCIENTIZADOR DA SOCIEDADE

DESAPARECIMENTOS

Série Análise Criminal Volume 3

distribuição gratuita

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Coleção INSTITUTO DE SEGURANÇA PÚBLICA

Coordenador: Paulo Augusto Souza Teixeira

Série Análise Criminal

Organizadoras: Vanessa Campagnac e Thaís Chaves Ferraz

Volume 03

Desaparecimentoso papel do policial como conscientizador da sociedade

Autora

Thaís Chaves Ferraz – ISP

Tiragem: 2.900 exemplares

© 2009 by Instituto de Segurança Pública

Direitos de publicação reservados ao Instituto de Segurança Pública.

É permitida a reprodução, total ou parcial, e por qualquer meio, desde que citada a fonte.

Revisão ExecutivaThaís Chaves Ferraz

Revisão OrtográficaMarcela Lemos Cordeiro

Ficha CatalográficaElenice Glória Martins Pinheiro

Coordenação TécnicaVanessa CampagnacThaís Chaves Ferraz

ConsultorGláucio Soares

Apoio TécnicoMarcus FerreiraRenato Dirk

Equipe TécnicaPriscila RiscadoEmmanuel RapizoGuilherme LinharesNadja Valéria de SouzaSaint‘ Clair Velloso Ricardo AgumThiago Barcelos Soliva

Coordenação AdministrativaMarcos da Motta

Apoio AdministrativoFlorisvaldo MoroJosé Motta de SouzaJosé Renato Biral Belarmino Kelson Moreira

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T266d

Teixeira, Paulo Augusto Souza (Coord.)

Desaparecimentos: o papel do policial como concientizador da sociedade.

/ Coordenador Paulo Augusto Souza Teixeira; Organizadoras Vanessa Campagnac

e Thaís Chaves Ferraz. – Rio de Janeiro: Riosegurança, 2009

32 p.: il. – (Coleção Instituto de Segurança Pública: Série Análise criminal. v. 3)

1. Segurança Pública. – Rio de Janeiro (Estado) – Manuais, guias etc. 2. Desaparecidos – Rio de Janeiro. I. Campagnac, Vanessa II. Ferraz, Thaís Chaves. III. Instituto de Segurança Pública. IV. Título. V. Análise Criminal

CDD 363.2098153

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Desaparecimentos: o papel do policial como conscientizador da sociedade

SumárioApresentação .....................................................................................5

Introdução - A Pesquisa .....................................................................6

A Publicação .......................................................................................7

Evitando desaparecimentos: o papel do policial como conscientizador da sociedade .....................8

A necessidade de preencher o Registro de Ocorrência de forma completa ......................................9

Policial e comunicante: uma interação fundamental .......................10

Detalhamento da Pesquisa ................................................................12

Etapas da Pesquisa .......................................................................12

1ª fase

2ª fase

3ª fase

Análises da Pesquisa .....................................................................13

Quem desaparece?

Onde desaparece?

Por que desaparece?

Perfis que se destacam entre os desaparecidos ............................20

Idosos

Adolescentes e jovens

Desaparecidos e dados da Saúde e do Detran-RJ ............................25

O preenchimento correto do RO também ajuda a área de saúde .....26

Vítimas de desaparecimento são vítimas de homicídio? ....................27

Reaparecimentos ..............................................................................29

Conclusão .........................................................................................30

Equipe e agradecimentos ..................................................................31

Referências Bibliográficas ..................................................................32

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Série Análise Criminal

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ApresentaçãoMuitas obras editadas recentemente sobre segurança pública nos apre-sentam os enormes desafios que representam esse tema, que é essen-cial para a vida em sociedade. Ao tratar do caso brasileiro, Veloso & Ferreira1 equiparam a dimensão do desafio aos esforços desenvolvidos por governo e sociedade no sentido de conter um dos maiores vilões nacionais das últimas décadas do século xx: a inflação.

Embora haja algumas semelhanças, devido à abrangência e à di-versidade de causas, inflação e (in)segurança pública guardam grandes diferenças. No caso da inflação, depois de diversas tentativas, a criação da Unidade Real de Valor (URV) propiciou um atalho seguro para con-ter aquele grande problema. Já no caso da (in)segurança encontramos uma variedade de abordagens que têm tornado esse caminho mais longo.

Nesse processo de busca de soluções para uma questão nacional, diversas inovações têm sido propostas. Uma delas resultou na criação do Instituto de Segurança Pública (ISP), autarquia vinculada à Secretaria de Estado de Segurança do Rio de Janeiro e que vem se consolidando como uma fonte segura de informações para diversos públicos e um canal de participação da sociedade na formulação de ações voltadas para a melhoria das suas condições de vida.

Diversas pesquisas já foram realizadas pelo ISP, e através do tra-balho que ora é apresentado buscamos responder especificamente ao desafio de estudar os casos das pessoas desaparecidas no Estado, pois muito tem sido dito sobre o tema sem uma análise mais aprofun-dada. A partir de uma solicitação do Exmº Sr. Secretário de Segurança, Sr. José Mariano Beltrame, o Instituto desenvolveu essa tarefa, focando nos casos registrados no ano de 2007 nas Delegacias de Polícia Civil.

Na época em que o projeto foi elaborado havia uma forte demanda por informações por parte da opinião pública, em virtude de diversas notícias que associavam o aumento dos desaparecimentos a um pro-blema atual e ligado a dinâmicas de crimes, como os homicídios do-losos. Para dar conta de uma tarefa tão desafiadora contamos com

1 VELOSO, Fernando & FERREIRA, Sergio G. É possível: gestão da segurança pública e redução da violência. Rio de Janeiro : ContraCapa / Instituto de Estudos de Política Econômica, Casa das Garças, 2008.

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a consultoria pro bono do Prof. Dr. Gláucio Ary Dillon Soares. A sua grande experiência trouxe colaborações inestimáveis para a realização dessa pesquisa tão importante.

Os resultados, que serão apresentados em detalhes, permitiram desconstruir alguns mitos. A partir deles foi possível traçar um perfil dos desaparecidos (tendo como base um conjunto de informações dis-poníveis nos registros policiais) e localizá-los espacialmente, além de fornecer elementos para traçar uma tipologia explicativa. Essa tipologia permite identificar as principais causas de desaparecimento e esse con-junto de conhecimentos pode subsidiar o poder público na formulação de políticas públicas efetivas voltadas para a prevenção e a elucidação dos casos. Além disso, pode também fornecer a diversos segmentos da sociedade informações que gerem mudanças de atitude, como nos casos daqueles que têm sob a sua responsabilidade jovens e idosos que demandam cuidados especiais.

Finalizando, gostaria de ressaltar que essa pesquisa dirige-se, ainda, às pessoas e famílias que vivem o drama da incerteza, entre a notícia de um desfecho trágico ou o retorno daquele que desapareceu.

Paulo Augusto Souza TeixeiraDiretor-Presidente do ISP

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IntroduçãoA Pesquisa de Desaparecidos, realizada pelo Instituto de Segurança Pública a pedido da Secretaria de Estado de Segurança do Rio de Ja-neiro, analisou os casos de desaparecimento ocorridos no ano de 2007 no Estado do Rio de Janeiro. O estudo é pioneiro ao abordar a temática no Brasil e teve como objetivo entender melhor a dinâmica desse tipo de evento.

Os resultados ajudaram a delinear um perfil dos desaparecidos que abarcava faixa etária, sexo, cor, nível de escolaridade, ocupação e es-tado civil. Construiu-se também uma análise espacial, e a partir dela tornou-se possível distribuir os registros por Regiões e Municípios. Nos episódios ocorridos na capital do Rio de Janeiro fez-se um aprofunda-mento, com a delimitação por Zonas e Bairros.

Desenvolveu-se também uma comparação entre os homicídios do-losos e os casos de desaparecimento. Finalmente, foram estudados os reaparecimentos, e as análises mostraram que somente 2% destes foram comunicados à Polícia.

A Pesquisa de Desaparecidos no Estado do Rio de Janeiro em 2007 trouxe dados inéditos e de grande relevância para a prevenção do de-saparecimento. Por essa razão, o ISP teve a iniciativa de criar uma pu-blicação dirigida aos policiais, para que eles pudessem aproveitar essas informações na sua função cotidiana de colaborar com a sociedade.

A publicação pretende, assim, não apenas contribuir para a compre-ensão do fenômeno em sua totalidade, mas também servir de subsídio para a efetivação de políticas públicas no Estado do Rio de Janeiro que contemplem o planejamento estratégico na área de segurança.

A equipe

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A publicação O objetivo dessa publicação é oferecer ao seu principal público-alvo, os policiais, algumas orientações sobre como agir diante de um caso de desaparecimento. Mesmo com a experiência que a Polícia possui, por lidar no seu dia a dia com as pessoas e com os episódios ligados ao desaparecimento, acreditamos que chamar a atenção para detalhes – como pequenos cuidados para prevenir o desaparecimento, que os policiais podem ensinar aos cidadãos – pode ter um efeito altamente positivo no contato com parentes de desaparecidos ou até mesmo na solução do caso.

Apesar de a Polícia Civil já possuir um procedimento padrão para o preenchimento de RO e também para a dinâmica que envolve o de-saparecimento, esta publicação pretende ser uma ferramenta comple-mentar para a atuação do policial nessa rotina.

Policiais militares também podem identificar na publicação algumas ideias para auxiliar pessoas com relação aos casos de desaparecimen-to, seja nas ruas, quando solicitam sua ajuda ou informações, seja em palestras ou cursos, nos quais são perguntados a respeito.

A intenção é fornecer novos dados e informações para conscientizar os diversos setores da sociedade a respeito da prevenção do desapa-recimento – e o papel do policial como multiplicador do conhecimento é fundamental nessa iniciativa.

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Evitando desaparecimentos: o papel do policial como conscientizador da sociedade

A palavra-chave para evitar o desaparecimento é comunicação. Além de ser a principal ferramenta de trabalho da Polícia quando se trata de um caso de desaparecimento, ela é a base de um bom relacionamento familiar – algo que pode prevenir esse tipo de episódio.

Os estudos da Pesquisa de Desaparecidos realizada pelo ISP con-cluíram que 25,6% das vítimas de desaparecimento são adolescentes (12 a 17 anos), e que muitos também eram idosos, pessoas com pro-blemas mentais e usuários de drogas e álcool. Essas pessoas têm cui-dadores, ou seja, adultos que são responsáveis por elas, como pais, filhos (algo muito comum com relação aos idosos), padrinhos, tios, ami-gos e outros parentes em geral.

A comunicação interpessoal, nesse caso, ultrapassa a ideia de que é preciso, simplesmente, ter um diálogo em casa e chega ao patamar de necessidade social, no que diz respeito à prevenção do desaparecimento por fuga ou por abandono, por exemplo. As brigas na família refletem di-retamente no comportamento dos seus membros, e a decisão de fugir, se afastar ou abandonar o lar pode ter origem nesses desentendimentos.

Na literatura internacional já existem termos para definir essa conduta, relacionados especialmente aos adolescentes. São os runaways (“fugiti-vos”) e throwaways (“abandonados”), “nomes dados aos jovens que fogem ou são expulsos de casa, que caracterizam parte substancial da popula-ção pré-adulta de rua nos países desenvolvidos” (SOARES, 2003,p.6)2.

Um pai que dialoga com seu filho adolescente sabe dizer quem são as companhias mais frequentes dele e quem são os amigos que ele fez recentemente. Um cuidador que escuta o que o idoso tem a dizer sabe quais são as necessidades deste, e a que lugares ele vai quando sai. A mulher que conversa com o marido dependente de álcool tem uma boa ideia de onde achá-lo quando ele demora mais para voltar para casa. O fato de existir diálogo entre parentes ou entre cuidadores e quem rece-be essa atenção facilita a interação, aproxima as pessoas e faz com que estas se conheçam melhor.

2 SOARES, Gláucio. Meninos na rua, pivetes da lua. IUPERJ e CESeC, 2003. p.6. Di-sponível em: <http://ibmecsp.edu.br/pesquisa/download.php?recid=3439>. Acesso em: 22/11/2009.

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Sendo assim, o policial está realizando uma extensão do seu traba lho quando estimula esse contato. Ao conscientizar os diversos setores da sociedade sobre a importância dessa coparticipação entre membros da família e amigos, a Polícia contribui para a construção de núcleos familia-res coesos e previne, consequentemente, possíveis desaparecimentos.

Se o policial recebe um comunicante de desaparecimento na Dele-gacia, deve ouvi-lo com atenção, considerar suas opiniões e respeitar seu desespero (se for o caso). Desempenhar o papel de ouvinte atento e paciente é exercer também uma função social.

A necessidade de preencher o Registro de Ocorrência de forma completa

O Registro de Ocorrência é um dos principais elementos que possibili-tam a busca por pessoas desaparecidas. Infelizmente, o seu preenchi-mento incorreto é comum.

A Pesquisa de Desaparecidos buscou nos Registros de Ocorrência os contatos dos comunicantes, as características elementares da vítima (sexo, idade, nome completo) e a dinâmica básica do desaparecimen-to (descrição do evento). Mesmo possuindo campos específicos para esses dados, grande parte dos RO estavam incompletos ou traziam informações confusas.

A seguir, alguns casos de preenchimento inadequado de RO encon-trados pela equipe da Pesquisa:

• A pessoa que desapareceu e o comunicante são chamados de “víti-ma”. Sabemos que amigos e parentes do desaparecido sofrem com o fato, mas a “vítima” real do ocorrido é quem desapareceu. Dentre os Registros, a equipe encontrou muitos casos com comunicantes definidos como vítimas.

• Diversos Registros eram duplicados, ou seja, o mesmo episódio foi registrado mais de uma vez.

• O Registro informa que a sobrinha do comunicante desapareceu, mas se refere a ela apenas literalmente (“a sobrinha do comunicante”; “a sobrinha”; “sua sobrinha”), sem mencionar o nome da vítima.

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• No Registro, campos como “idade” e “cor” são preenchidos como “ignorado”, mesmo na presença de um dos pais, que é o comuni-cante e a pessoa indicada para fornecer esse tipo de informação.

Além das categorias-chave (para idade, cor, sexo, etc.), os Registros de Ocorrência possuem espaços para preenchimento com informações adicionais. O policial deve tentar extrair o máximo de informações rele-vantes do comunicante, para transferi-las para o RO com a finalidade de facilitar o reconhecimento da vítima e as buscas por seu paradeiro.

É importante mencionar:•Marcas de nascença•Cicatrizes•Tatuagens•Cor e corte de cabelo•Se usa óculos•A roupa com a qual a pessoa foi vista pela última vez•Se houve uma briga•Se a pessoa estava deprimida•Se tomava algum remédio, e qual era essa medicação•Se fazia uso de substâncias ilícitas ou de álcool

O policial encarregado de registrar a ocorrência deve estimular o comunicante a respeito desses dados, que em um primeiro momento podem parecer superficiais, mas que são de grande auxílio na resolução do episódio.

Em sua rotina, o policial já sabe que esses recursos são indispen-sáveis, e é fundamental que ele seja pró-ativo para despertar essa per-cepção no comunicante. A investigação do caso e sua elucidação de-pendem da boa qualidade desse preenchimento, então, é essencial que ele seja completo.

Policial e comunicante: uma interação fundamental

A Polícia e a família trabalham juntas para encontrar o desaparecido. Essa frase resume a interação que deve existir entre os policiais e os co-municantes do desaparecimento, afinal, só quem convive com a vítima saberá detalhes que ajudarão na identificação e investigação.

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A família é que poderá dizer se a pessoa fugiu ou não, a partir do “clima” que existia em casa; quem eram as companhias mais próximas da vítima; se ela tinha feito novos amigos; se seu comportamento esta-va alterado ultimamente; quais locais a pessoa costumava frequentar; e quais eram seus hábitos.

O policial, ao receber o comunicante do desaparecimento, deve ser solícito e paciente. Os julgamentos pessoais devem ser evitados, na medi-da do possível. Deixar que o comunicante fale e ter paciência, tanto para tranquilizá-lo como para extrair informações e impressões, é fundamental.

Ao ouvir parentes ou amigos, o policial deve procurar não endossar opi-niões negativas a respeito da vítima. Quem comunica um desaparecimento está nervoso, preocupado. Para alguns, “falar mal” é um desabafo.

Mesmo que o policial perceba algum indício de comportamento desviante por parte do comunicante ou da vítima (por exemplo, se ele suspeitar que o desaparecido é envolvido com tráfico, prostituição, jogo do bicho, agiotagem ou qualquer atividade ilícita), ele deve privilegiar a isenção, agir com naturalidade e tratar com respeito a pessoa com quem ele conversa.

Não é preciso esperar para registrar o desaparecimento

Muitas pessoas acreditam que só é possível registrar um desaparecimento 24 horas (ou 48 horas) depois que o fato ocorreu. Felizmente, isso não é verdade. Não é preciso esperar.

No caso de crianças e adolescentes existe, inclusive, uma Lei Federal 3 que dá ao comunicante o direito de registrar o desaparecimento assim que este acontece e prevê investigação imediata do ocorrido.

A Polícia pode conscientizar a sociedade a esse respeito. Quando a pessoa vai à Delegacia comunicar um desaparecimento, ela precisa de apoio. Ao informá-la de que não existe um prazo para fazer esse registro, o policial está colaborando para que ela fique mais tranquila e segura.

3 Fonte: BRASIL. Lei Federal nº 11.259, de 30 de dezembro de 2005. Acrescenta dis-positivo à Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente, para determinar investigação imediata em caso de desaparecimento de criança ou ado-lescente. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/_Ato2004-2006/2005/Lei/L11259.htm>. Acessado em: 4/12/2009.

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Detalhamento da pesquisa

Etapas da pesquisa

1ª fase:

A Pesquisa de Desaparecidos foi realizada pelo Instituto de Segurança Pública e teve como objeto de estudo os casos de desaparecimento ocorridos no ano de 2007 no Estado do Rio de Janeiro. As informações principais são provenientes dos cerca de 4.600 Registros de Ocorrência feitos pela Polícia Civil sobre esse fato.

A partir desses Registros montou-se um banco de dados, cuja uti-lização gerou resultados importantes para traçar o perfil das pessoas vítimas de desaparecimento. A articulação dos dados com indicadores sociodemográficos, tais como cor, idade e sexo, tornou possível a ob-servação de características relevantes dos desaparecidos.

2ª fase:

Em uma segunda fase foi construído um questionário, do qual consta-vam perguntas sobre a dinâmica do desaparecimento, hábitos e práti-cas das pessoas desaparecidas, para ser aplicado por telefone. Tam-bém havia espaços específicos para incluir fatos e informações que o respondente considerasse importante mencionar, além dos dados já fornecidos durante a conversa.

3ª fase:

Os entrevistadores especificamente procuravam pelo comunicante do desaparecimento, mas caso não fosse possível fazer contato, conver-savam com alguém da família que tivesse conhecimento do ocorrido. Para a aplicação desse questionário foi necessário fazer uma amostra (uma porcentagem extraída estatisticamente), e se chegou a 456 pes-soas, as quais foram contatadas a esse respeito. Além da análise quan-titativa do problema, a Pesquisa extraiu das experiências pessoais dos entrevistados informações cruciais para o traçado desse perfil.

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Análises da Pesquisa de Desaparecidos no Estado do Rio de Janeiro em 2007

Quem desaparece?

O total de vítimas encontrado preliminarmente era de 4633 pessoas. Contudo, esse número foi reduzido para 4423, devido a fatores como Registros de Ocorrência duplicados, casos que se referem a cartas pre-catórias, um registro de auto de resistência contendo três vítimas, etc. Por isso, foi realizada uma correção no banco de dados, para eliminar as incongruências dessa principal fonte de informações da Pesquisa.

Assim, chegou-se aos seguintes resultados a respeito da Pesquisa de Desaparecidos no Estado do Rio de Janeiro em 2007:

Sexo:

• 61,6% das vítimas eram do sexo masculino e

• 38,4%, do sexo feminino.

Faixa etária:

• Em 3705 dos casos foi possível saber a idade das vítimas. Faixas etárias que se destacaram:

De 15 a 19 anos (20,8%);

De 10 a 14 anos (12,4%); e

De 20 a 24 anos (8,9%).

Juntas, essas faixas somam 42,1% do total de desaparecimentos.

• Quando consideramos as idades que apresentam concentração de vítimas, encontramos que pessoas de 14, 15, 16 e 17 anos agregam sozinhas 20,3%. Ou seja, uma cifra considerável dos desaparecidos ainda não alcançou a maioridade.

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Resultados por sexo e por idade:

• De 0 a 19 anos houve uma maior concentração de vítimas do sexo feminino.

• A partir da faixa etária de 20 a 24 anos até os 70 anos ou mais, a predominância foi do sexo masculino.

• A faixa etária com maior concentração de casos de desaparecimen-to (de 15 a 19 anos) possui predominância do sexo feminino, com 54,6%.

Cor:

• As vítimas eram, em sua maioria, de cor parda (39,7%), branca (34,6%) e negra (16,7%).

Ocupação:

• A ocupação das vítimas foi informada em 3374 casos. A categoria “estudante” foi a mais citada (28,1%). O fato condiz com as faixas etárias que concentram o maior número de casos (indo dos 11 aos 20 anos, de uma forma geral) e se relacionam com a idade escolar.

• As outras categorias mais citadas são “desempregado” (5,8%) e “aposentado” (5,0%). Esta última reflete um dado importante da Pes-quisa: os idosos são uma parcela expressiva entre os desaparecidos.

Escolaridade:

• A escolaridade dos desaparecidos foi reportada em 2886 registros.

• As categorias que mais se destacaram foram:

1º Grau Incompleto (atual Ensino Fundamental): 30,9%

1° Grau Completo: 13,8%

2° Grau Completo (atual Ensino Médio): 8,5%

Estado civil:

• A prevalência do estado civil das vítimas também segue a mesma lógi-ca da faixa etária. Faz sentido o fato de a maioria ser solteira (59,9%).

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Onde desaparece?

Em todas as 4423 ocorrências foi possível verificar em que Região o desaparecimento supostamente aconteceu. A capital do Rio de Janeiro concentrou 40,3% dos desaparecimentos, seguida pela Baixada Flu-minense, com 25,9%, e pelo Interior 4, que respondeu por 24,6%. Por fim, a Grande Niterói (composta por Niterói, São Gonçalo e Maricá) está ligada a 9,2% da totalidade de desaparecimentos do ano de 2007.

A cidade do Rio de Janeiro apresentou a maior prevalência de ví-timas, com 40,3%. Duque de Caxias veio em seguida, com 6,1% do total.

Apesar de a Grande Niterói responder pelo menor número vítimas, a cidade de São Gonçalo foi a terceira em número de desaparecimentos, com 5,4%.

Na cidade do Rio de Janeiro, a distribuição de vítimas ocorreu da seguinte forma:

• Zona Norte: 46,2%

• Zona Oeste: 37,4%

• Centro: 8,7%

• Zona Sul: 7,6%

Os Bairros com as maiores incidências de desaparecimento foram (dentro dos totais de cada Zona):

• Zona Norte – Bonsucesso (7,5%)

• Zona Oeste – Campo Grande (16,5%)

• Centro (50,6%)

• Zona Sul – Copacabana (34,6%)

4 Toda a área do Estado do Rio de Janeiro que não está inserida na capital, na Baixada Fluminense ou na Grande Niterói.

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Por que desaparece?

A motivação do desaparecimento também foi analisada pela Pesquisa. Na maioria dos casos essa identificação foi possível, e os estudos apontaram para a existência de grandes grupos de motivos, ou seja, os porquês do desaparecimento eram idênticos e recorrentes em vários episódios.

Categorias que sobressaíram :

• Fuga

• Distúrbio mental

• Motivação de lazer

• Desaparecimento nas águas

• Abandono de lar

• Falta de comunicação

• Causas violentas

• Uso de álcool e de drogas

• Hospitalização

O detalhamento dessas motivações traz características que poderão servir de referência no traçado dos perfis comportamentais das vítimas de desaparecimento e das pessoas com as quais estas conviviam:

Fuga

Geralmente, a fuga é protagonizada por menores de idade que ainda dependem financeiramente dos pais ou da família. Os casos agrupados como “fuga” pela Pesquisa de Desaparecidos estão relacionados a:

A) saídas de casa motivadas pelo desacordo com as regras institu-ídas pelos pais e/ou pelos conflitos daí derivados (conflitos sobre horá-rios, lugares permitidos e proibidos, namoro e outros);

B) busca por uma “mudança de vida” e pela tentativa de “viver um sonho” (como relataram muitos entrevistados).

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Como se verificou na análise das respostas às “perguntas abertas” do questionário aplicado, o dado da dependência é decisivo para o en-tendimento de muitos casos. O planejamento para uma “mudança de vida” é precário, não prevendo os custos materiais da empreitada ou os passos necessários para uma estabilidade que permita a autonomia (e, portanto, o desligamento dos laços de dependência). Também aconte-ce de nenhum plano de médio e longo prazo ser vislumbrado, gerando os frequentes casos de fugas para a casa de amigos, parentes e afins, sem objetivar um abandono total das condições de vida anteriores – o que acontece é um deslocamento provisório.

A decisão de fugir (que leva ao desaparecimento) geralmente é asso-ciada pelos entrevistados à “rebeldia” infanto-juvenil ou à “imaturidade” e “inocência típica dos jovens”. A fuga, nessa Pesquisa, não configurou caso de desaparecimento sem solução – todos os desaparecidos rea-pareceram.

Distúrbio mental

Independentemente dos desaparecimentos de pessoas com histórico de psicopatologia, só entraram na categoria distúrbio mental da Pesquisa os episódios que os entrevistados relacionaram diretamente ao desapa-recimento. Foram relatados casos de Mal de Alzheimer, esquizofrenia, transtorno bipolar, amnésia, etc., mas nem sempre a nomenclatura corre-ta da doença era mencionada, sendo trocada por termos mais populares, como “abobado”, “ruim da cabeça” e “problema de nervos”.

Motivações de lazer

Motivações de lazer são aquelas que ligam o desaparecimento a atividades recreativas (festas, bailes, boates, exposições, viagens, pes-caria, retiro espiritual, relacionamentos amorosos e outros). Nessa ca-tegoria, diferentemente da falta de comunicação, a vítima de desapa-recimento não manifestou interesse em contatar os familiares, amigos e afins durante o período em que ficou desaparecida – por descuido, despreocupação ou mesmo pela intenção de esconder os planos para o lazer.

Enquanto na fuga e no abandono de lar não há, necessariamente, a intenção de retornar, na categoria motivações de lazer a vítima não ob-

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jetiva desaparecer definitivamente. Em todos os casos estudados pela Pesquisa de Desaparecidos houve reaparecimento.

Desaparecimento nas águas

Idêntico à categoria já utilizada pela Polícia, o desaparecimento nas águas compreende os casos nos quais estejam presumidos afogamen-tos ou naufrágios seguidos de afogamentos. As vítimas geralmente es-tavam praticando algum esporte, nadando ou a bordo de embarcações. Esse tipo de situação ocorre não apenas no mar aberto, mas em açu-des, riachos e correntezas formadas pela força da chuva.

Abandono de lar

Na categoria abandono de lar, quem desapareceu optou pela ausên-cia, temporária ou definitiva, do ambiente doméstico ou dos ambientes que frequentava. Geralmente, isso aconteceu por insatisfação com as relações vividas no seio familiar ou no ambiente de trabalho.

Na Pesquisa, houve casos nos quais o hábito da vítima de ausentar-se fez com que as pessoas próximas demorassem a perceber que esta tinha efetivamente desaparecido. Diferentemente da fuga, o abandono de lar é protagonizado por indivíduos autônomos/independentes (maio-res de idade, que já têm renda, etc.). Assim, o abandono de lar carac-teriza-se por uma intenção clara de ausentar-se em conjunto com a real possibilidade de levar essa ausência adiante.

Falta de comunicação

A característica fundamental dessa categoria é a inexistência de co-municação entre a vítima de desaparecimento e aqueles que tinham expectativas de receber notícias suas. A inexistência de comunicação se dá por dois fatores:

A) impossibilidade efetiva de comunicação

B) a pessoa que se ausenta não acredita que é necessário comuni-car-se.

Na primeira hipótese, devido a algum imprevisto, o desaparecido encontra-se incomunicável: a bateria do celular acabou, não tinha sinal, não houve como enviar e-mails, recados telefônicos ou mensagens.

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Um caso de impossibilidade de comunicação observado durante a pesquisa foi a ocorrência de transferência de paciente entre institui-ções de tratamento para dependentes químicos. As clínicas tinham a responsabilidade de entrar em contato com a família ou amigos e, no entanto, não o fizeram, levando-os a crer que o paciente estava desaparecido.

Na segunda hipótese, a vítima de desaparecimento não sente a ne-cessidade de comunicar seu paradeiro – porque perde o senso de horário ou devido ao esquecimento do “dever” de avisar aos familiares, amigos e afins.

De uma forma geral, esse tipo de caso de desaparecimento tem como característica uma “brevidade”. O reaparecimento ocorre em, no máximo, alguns dias, porque depende apenas de comunicação (menos em episódios como o do paciente em tratamento, no qual a possibilida-de de se comunicar está além de suas intenções). Além disso, normal-mente o destino do desaparecido é conhecido pelos parentes.

Causas violentas

Engloba os desaparecimentos ocasionados por ações violentas, de um modo geral, e, portanto, tipificadas como crimes. As vítimas de de-saparecimento, contudo, podem figurar como autoras e/ou vítimas das ações criminosas nessa categoria.

A Pesquisa identificou como causas violentas que motivam o de-saparecimento o abandono forçado do lar decorrente de violência do-méstica ou de ameaça, o envolvimento com o tráfico de entorpecentes, sequestro, provável homicídio (quando a família acredita ou presume que a vítima está morta) e o homicídio, efetivamente.

Uso de álcool e de drogas

Essa categoria corresponde aos casos nos quais a utilização do ál-cool e das drogas, de forma continuada ou não, resultou diretamente no desaparecimento.

Com relação ao álcool, um caso paradigmático de desaparecimento derivado dos efeitos primários de seu uso foi o de um rapaz que se embebedou e pernoitou na casa de um amigo, deixando a família pre-

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ocupada. Em outro episódio, ligado à patologia psíquica degenerativa derivada da ingestão diária da substância, a vítima sofria de demência alcoólica, tendo se juntado a moradores de rua nas proximidades de sua casa sem avisar aos seus.

Nos casos observados de uso de substâncias químicas, a drogadição psíquica ou física – efeito indireto das drogas psicoativas – foi a única causa relatada nas entrevistas como motivo de desaparecimento, porque a pessoa, muitas vezes, permanece nos locais onde adquire os psicotró-picos ilícitos (boca de fumo, ponto de vendas) para consumi-los.

Hospitalização

A hospitalização também pode ser entendida como falta de comu-nicação. Os casos de hospitalização abarcam as situações em que o desaparecido sai com um destino estabelecido mas, por circunstâncias alheias à sua vontade, é hospitalizado devido à ocorrência de algum pro-blema de saúde súbito ou acidente de trânsito e a família ou os responsá-veis não são avisados (ou demoram a tomar conhecimento do fato).

Perfis que se destacam entre os desaparecidos

Idosos

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, em 2008, “o Brasil tinha 21 milhões de pessoas com 60 anos ou mais, su-perando a população idosa de vários países europeus, como a França, a Inglaterra e a Itália (...). Havia também 9,4 milhões de pessoas com 70 anos ou mais no país (...)”, nesse mesmo período.

O fato do idoso ser “a pessoa de referência do domicílio” em 23,3% dos casos quer dizer que as casas brasileiras são sustentadas por al-guém da terceira idade ou que esse indivíduo é o chefe da família. “A maior proporção de idosos responsáveis pelos domicílios estava no su-deste (24,9%).”

O Rio de Janeiro é o Estado com maior proporção de idosos, de acordo com a Síntese de Indicadores Sociais 2009 do IBGE, significan-

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do 14,9% dos residentes dessa localidade (IBGE, 2009) 5. Os dados do último Censo (2000), também realizado por esse Instituto, revelam que, no Rio de Janeiro, os indivíduos com 60 anos ou mais são a maior faixa etária do Estado, com cerca de 1.541.719 pessoas (MIRANDA; MELLO, 2007,p.12) 6.

Os idosos foram identificados pela Pesquisa de Desaparecidos no Estado do Rio de Janeiro em 2007 como um percentual expressivo com relação a esse tipo de ocorrência. Dos 4423 casos, em 3705 dos episódios foi possível saber a idade das vítimas. Dentro desse total, os números ligados às faixas etárias de idosos se destacaram – informa-ção que se relaciona diretamente aos dados do IBGE de crescimento dessa população e de sua representatividade dentre os habitantes do Rio de Janeiro.

Foram consideradas idosas, para fins dessa análise, as pessoas que se enquadravam nas seguintes faixas etárias: de 60 a 64 anos; de 65 a 69 anos; e 70 anos ou mais. Seus percentuais para os casos de desa-parecimento se mostraram como:

70 Anos ou mais: 3,1%;

De 60 anos a 64 anos: 1,4%; e

De 65 a 69 anos: 1,3%.

Sendo estes dados notáveis em relação às taxas totais calculadas pela pesquisa, é essencial ressaltar a atenção que os cuidadores de idosos devem dar a essas pessoas, à sua rotina e aos seus hábitos, para criar um cotidiano do qual a comunicação faça parte. Conhecer a pessoa de quem se cuida é importante. Medidas simples, como acom-panhar o idoso em sua tarefas e bordar na roupa dele os contatos do responsável, também podem prevenir o desaparecimento. A Polícia pode desempenhar um papel multiplicador, alertando a sociedade e lembrando as pessoas desses detalhes.

5 Fonte: INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Síntese de Indi-cadores Sociais. 2009. Disponível em: <http://www.IBGE.gov.br/home/presidencia/noti-cias/noticia_visualiza.php?id_noticia=1476&id_pagina=1> . Acesso em 25/11/2009.

6 Fonte: MIRANDA, Ana Paula M. & MELLO, Kátia Sento Sé (org). Dossiê da Pessoa Idosa. Rio de Janeiro: ISP, 2007. p.12

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Em novembro de 2009 foi sancionada a Lei de nº 5.569, que criou o pro-grama “S.O.S. Idosos Desaparecidos”. Participam dessa iniciativa a Polícia Civil, através da Delegacia Especial de Atendimento e Proteção ao Idoso, e o Corpo de Bombeiros. Os objetivos são criar um grupo de trabalho para encontrar pessoas idosas desaparecidas; realizar campanhas para divulga-ção de fotos das vítimas, com telefones de órgãos públicos encarregados de centralizar informações sobre desaparecidos; e instituir um banco de dados que agilize essa localização.

Fonte: RIO DE JANEIRO. Lei nº 5.569, de 30 de outubro de 2009 do Rio de Janeiro. Cria no

âmbito do Estado do Rio de Janeiro o programa “S.O.S Idosos Desaparecidos”. Disponível em:

<http://alerjln1.Alerj.Rj.Gov.Br/scpro0711.Nsf/e00a7c3c8652b69a83256cca00646ee5/2dbf0b7

f26342845832572ad007beac3?Opendocument>. Acessado em: 3/12/2009.

Adolescentes e jovens

Os resultados da Pesquisa de Desaparecidos delinearam um perfil das vítimas no Estado do Rio de Janeiro, e as faixas etárias que mais agre-garam desaparecimentos foram de 15 a 19 anos, com 20,8%, e de 10 a 14 anos, com 12,4%. A Pesquisa também concluiu que grande parte dos episódios de desaparecimento ligados a essas idades tem como motivação a fuga.

A fuga foi a principal causa do desaparecimento em 52,3% dos ca-sos que envolviam pessoas de 15 a 19 anos. Na faixa etária de 10 a 14 anos ocorreu o mesmo: 40,0% dos episódios de desaparecimento estavam diretamente relacionados à fuga.

São geralmente os menores de idade que fogem, e suas razões para isso têm a ver com a não-aceitação das regras impostas pelos pais com relação a horários, namoros e comportamentos. A fuga, para os entre-vistados pela pesquisa (que normalmente são os comunicantes dos de-saparecimentos), é característica da impetuosidade dos jovens, da sua imaturidade e falta de experiência. Todos os casos de fuga foram solucio-nados, porque os jovens não tinham realmente a intenção de se afastar da família permanentemente e voltaram, ou foi possível encontrá-los.

O lazer é outra motivação para o desaparecimento nessas faixas etárias que contemplam o que o senso comum considera os primeiros

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anos da juventude. Em 28,3% dos episódios de desaparecimento ocor-ridos nas idades entre 15 e 19 anos a razão foi o lazer. A informação condiz com a relativa autonomia que as pessoas dessa faixa etária já possuem (pois elas têm liberdade para buscar essas atividades recrea-tivas) e que contrasta com os limites que os pais ou responsáveis ainda costumam impor – o que geraria a ausência aliada à falta de interesse de contatar os familiares.

Em todos os casos com essa motivação (de todas as faixas etárias, inclusive) estudados pela Pesquisa de Desaparecidos houve reapareci-mento, porque quem desapareceu por motivações de lazer se ausentou provisoriamente e retornou quando o dinheiro acabou, quando o final de semana terminou, etc.

Não apenas os adolescentes e jovens desaparecem, mas dois dos motivos mais recorrentes de desaparecimento representam percentuais elevados entre eles, como a fuga e o lazer. O abandono também apre-sentou taxas expressivas: 12,8% para idades entre 15 e 19 anos.

Esses dados vêm reforçar a importância que os laços familiares têm na prevenção do desaparecimento. O diálogo entre parentes ou com os responsáveis é fundamental na construção de uma convivência har-moniosa, para que o jovem não veja na fuga uma nova oportuni-dade de vida, ou para que não recuse informar aonde foi, com quem estava, quando volta.

A Polícia pode orientar os pais a tomar algumas medidas sim-ples, como:

• Procurar saber quem são os amigos de seus filhos, onde moram e o que fazem.

• Incentivar os filhos a não descaracterizarem o uniforme da escola, que é uma forma de identificação.

• Acompanhá-los até o local de lazer, dando carona para festas e tra-zendo-os de volta para casa.

• Interessar-se pelos hábitos deles, suas atividades e horários na es-cola e no trabalho.

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• Obter os principais contatos do jovem, não hesitando em pedir o número de telefone de amigos e locais que ele frequenta (trabalho, igreja, centro, paróquia, clube, escola, faculdade).

• Buscar detalhes a respeito dos ambientes virtuais preferidos por ele: conhecendo as páginas da internet que ele visita e, se for o caso, controlando o acesso.

• Orientá-lo a respeito de perfis em páginas de relacionamento (Orkut, Facebook). Pedir que ele não dê muitas informações sobre sua ro-tina.

O policial também pode conscientizar o jovem ou adolescente a:

• Sempre informar ao responsável o local para onde está indo.

• Apresentar os amigos e dar aos pais o telefone deles.

• Possuir (e dar aos seus responsáveis) os telefones das instituições que frequenta: escola, trabalho, igreja, casa de amigos.

• Avisar, se for dormir fora de casa, deixando o contato do local para onde vai. Se não quiser contar para os pais, informar esses detalhes para alguém em quem confia (deve ser uma pessoa com quem seus responsáveis tenham contato. Pode ser um tio, um primo ou o me-lhor amigo, por exemplo).

Aos pais cabe a iniciativa de desenvolver um bom relacionamento; aos jovens, comunicar o seu destino, a sua rotina; e aos policiais, ajudar a promover esse intercâmbio, destacando, sempre que possível, a relevân-cia da interação entre as pessoas que compartilham seus cotidianos.

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Desaparecimentos e dados da Saúde e do Detran-RJPara realizar uma análise completa, a Pesquisa de Desaparecidos no Estado do Rio de Janeiro em 2007 buscou informações em outras duas fontes além dos Registros de Ocorrência da Polícia Civil: os bancos de dados do Departamento de Trânsito do Estado do Rio de Janeiro (Detran-RJ) e do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), liga-do ao Sistema Único de Saúde (SUS).

Os dados obtidos pela Pesquisa foram comparados com os dados dessas duas instituições, e a partir daí chegou-se a novas informações. Os resultados tornaram possível excluir pessoas encontradas em outros Estados que não o Rio de Janeiro, indivíduos que reapareceram mas não comunicaram à Polícia esse retorno e casos de óbito.

O banco de dados do Detran-RJ foi usado para verificar se alguma pessoa listada como vítima de desaparecimento havia obtido certidão de casamento ou tirado a carteira de identidade (ou de motorista) em outros Estados – esse comportamento ocorre em casos de fuga 7. Infe-lizmente, as informações contidas não indicavam a data exata em que ocorreu o evento localizado pelo Detran, ou seja, não foi possível verifi-car se o fato (casamento, pedido de nova documentação, etc.) aconte-ceu antes ou depois do desaparecimento.

Sendo assim, o principal uso dado a esse banco foi a respeito dos aprisionamentos. Se a pessoa desaparecida tinha sido presa, ela estava automaticamente localizada e era, então, retirada das estatísticas da Pesquisa de Desaparecidos.

O banco de dados do SIM/SUS permitia a exclusão por óbito. Um exemplo relacionado é o da vítima que morre em hospitais, a família não é notificada e, quando fica sabendo do fato, não comunica à Polícia, fazen-do com que a pessoa continue sendo procurada como desaparecida.

Procurava-se no banco do SIM/SUS se havia indicação de óbito para os nomes das pessoas desaparecidas contidos no banco de da-dos da Pesquisa, com suas respectivas filiações. Em seguida fazia-se um levantamento de todas essas mortes cujos nomes e filiação eram idênticos aos encontrados pela Pesquisa, descartando-as.

7 Ver página 16 , sobre motivações do desaparecimento.

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O preenchimento correto do RO também ajuda a área de saúde

Para se chegar aos nomes no banco de dados do SIM/SUS, os Regis-tros de Ocorrência foram uma peça-chave. O preenchimento de RO de forma completa é fundamental para reunir informações como:

• As causas de morte a serem tabuladas para as estatísticas de mor-talidade, quando se trata de óbitos por causa externa (acidentes e violências).

• As circunstâncias do óbito.

• O local de ocorrência do evento (acidente ou violência).

• A provável intenção, se ficar comprovado que a morte foi provocada.

Esses elementos fornecidos pelo RO são de grande valor, portanto, para que sejam afastados os dados incongruentes e incompletos, re-sultando em maior agilidade e precisão nas investigações, análises es-tatísticas e na coleta de informações, de forma geral. A integração entre as áreas de saúde e de segurança pública merece colaborações tão es-senciais quanto um preenchimento completo de RO para se fortalecer e gerar frutos que satisfaçam aos propósitos de ambos os setores.

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Vítimas de desaparecimento são também vítimas de homicídio?Uma das questões mais relevantes da Pesquisa de Desaparecidos no Estado do Rio de Janeiro em 2007 está ligada às taxas de homicídio. Esse estudo demonstrou que os perfis das vítimas de desaparecimento e de homicídio são diferentes. Portanto, os desaparecimentos não es-tão diretamente relacionados às chamadas mortes por causa externa.

A Pesquisa comparou8 as vítimas de desaparecimento com os da-dos de homicídio doloso no ano de 2007. Foram levados em conta o sexo, a cor e a faixa etária das vítimas, além da população total do Estado do Rio de Janeiro nesse período.

8 Os dados são provenientes do Registros de Ocorrência da PCERJ referentes ao ano de 2007.

Desaparecidos

Desaparecidos no Estado do Rio de Janeiro em 2007: 4.423 pessoas (de 15.397.366 indivíduos)

Sexo Cor Faixa etária

61,6% do sexo masculino38,4% do sexo feminino

Parda (39,7%)Branca (34,6%)Negra (16,7%)

de 15 a 19 (20,8%)de 10 a 14 (12,4%)de 20 a 24 (8,9%)

Homicídios

Homicídios no Estado do Rio de Janeiro em 2007: 6.217 pessoas (de 15.397.366 indivíduos)

Sexo Cor Faixa etária

81,9% do sexo masculino7,2% do sexo feminino10,9% sem informação

Parda (38,3%)Branca (28,2%)Negra (18,4%)

de 20 a 24 (13,6%)de 25 a 29 (12,8%)de 30 a 34 (9,2%)

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A variável “sexo” revela um padrão no qual os homicídios dolosos são mais frequentes entre os homens (81,9%) do que entre as mulheres (7,2%). Nos casos de desaparecimento, os homens são também as vítimas mais recorrentes, com um percentual de 61,6% dos Registros, contra 38,4% das ocorrências envolvendo mulheres. Mesmo que em ambos os casos a maioria vitimizada seja do sexo masculino, deve-se notar que as taxas de desaparecimento e homicídio apresentam uma diferença francamente significativa.

Com relação aos homicídios dolosos, as maiores taxas estão nas seguintes faixas de idade: de 20 a 24 anos, com 13,6%; 25 a 29 anos, com 12,8%; e 30 a 34 anos, com 9,2%. Já os desaparecimentos têm maioria nas seguintes faixas etárias: 15 a 19 anos, com 20,8%; 10 a 14 anos, com 12,4%; e 20 a 24 anos, com 8,9%.

A partir dos resultados, apesar de algumas semelhanças, como a cor, é possível afastar a hipótese de que pessoas desaparecidas são vítimas de homicídio, já que os perfis que se delinearam são distintos. A correlação dos desaparecimentos com homicídios dolosos distancia esses dois fenômenos e comprova que há muito a ser investigado antes que a questão se esgote.

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ReaparecimentosA Pesquisa de Desaparecidos no Estado do Rio de Janeiro em 2007 estimou que 71,3% das vítimas de desaparecimento retornam. Ou seja, na maioria dos eventos pesquisados, essas pessoas reaparecem.

A predominância da “fuga” (17,4%) entre as causas de desapareci-mento dá uma ideia da razão pela qual as vítimas voltam: reaparecer é re-tornar para casa quando a aventura acaba, quando o “sonho” construído se desfaz. Em uma perspectiva de curto prazo, a categoria “motivações de lazer” (12,3%) também pode ser vista como relacionada a uma volta para a família, já que ocorre quando a diversão ou o dinheiro têm fim.

Infelizmente, o desaparecimento, mesmo quando ocorre momenta-neamente, é sempre um susto, para a família e para a vítima. Os dados ligados aos reaparecimentos mostram que essa experiência angustian-te poderia ter sido evitada se alguns cuidados fossem tomados pelos pais e responsáveis, e até pelos próprios indivíduos.

Segundo dados da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro referen-tes ao ano de 2007 (mesmo período estudado pela pesquisa), somente 2% dos reaparecimentos foram comunicados à Polícia. Se esses reapa-recimentos fossem relatados, a Polícia poderia estar direcionando seus esforços para outros casos.

Faz parte da missão da Polícia, como agente de transformações sociais, alertar a população para a importância de prevenir situações de desaparecimento, e também conscientizá-la a respeito da necessidade de reportar o reaparecimento na Delegacia onde foi registrado o fato.

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ConclusãoA Pesquisa de Desaparecidos no Estado do Rio de Janeiro em 2007, realizada pelo Instituto de Segurança Pública, foi um estudo pioneiro na abordagem dessa temática no Brasil. O objetivo foi entender melhor a dinâmica dos desaparecimentos e traçar um perfil das vítimas. A partir dos resultados foi possível sugerir medidas de prevenção para evitar esse tipo de episódio.

A ideia de criar uma publicação especificamente voltada para a Po-lícia veio da necessidade de agregar toda ajuda possível na prevenção ao desaparecimento. A equipe da Pesquisa direcionou aos policiais os resultados de seus estudos porque esses profissionais são os que li-dam com os casos de desaparecimento, conhecem a rotina do fato, conversam com parentes das vítimas e investigam o ocorrido. Sendo assim, nada melhor que a comunicação direta com esse público, para atualizá-lo a respeito de dados e características.

A publicação pretende chamar a atenção dos policiais para a impor-tância de sua atuação como conscientizadores da sociedade. Agindo dessa forma o policial ajuda a prevenir toda a angústia que envolve um desaparecimento.

O intuito primordial é cooperar, fornecendo novas perspectivas para auxiliar a Polícia no desenvolvimento de seu trabalho ligado aos desaparecimentos, cumprindo, em conjunto com a Instituição, uma função social.

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A equipe da Pesquisa de Desaparecidos do Estado do Rio de Ja-neiro no ano de 2007, composta por

Vanessa Campagnac, Thaís Chaves Ferraz, Thiago Barcelos Soliva, Priscila Riscado, Emmanuel Rapizo, Guilherme Linhares, Nadja Valéria de Souza, Ricardo Agum e Saint‘ Clair Velloso,

gostaria de agradecer a colaboração valiosa deÂngela Maria CascãoCésar PimentaCrystian Sheila PereiraDoriam BorgesDelegada Edna Pinto de AraújoEliane LuzEmerson de Barros DuarteEstagiários do IspDelegado Felipe Renato EttoreMj. PM Florisvaldo MoroInspetor Gilvan Silva FerreiraGláucio SoaresCel. PM José MottaJosé Renato Biral BelarminoKelson MoreiraPerita Lia LoyolaTen. Cel. PM Luiz Antônio Abrantes CoelhoMarcello ProvenzaMárcio Alexandre DuarteTen. Cel. PM Marcos da MottaTen. Cel. PM Marcus FerreiraCel. PM Mário Sérgio De Britto DuarteRenato DirkInspetor Robson FonteneleTen. Cel. PM Robson RodriguesThales Pontes Luz

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