o papel de novas escolas de medicina no ensino...

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~--- OCopyrightMoreiraJr.Editora. :' r=r(~~rrll[C rl'jlr=r~![~[IJ Todos os direitos reservados. o papel de novas escolasde Medicina no ensino médico do Brasil Therole Df new medicalschools in lhe teaching Df Medicinein Brazil Unitermos: novas escolas deMedicina, avaliação das escolas médicas, implantação docurso médico. Uniterms: new medical schools, evaluation 01 medical schools, implementation 01 medical course. José Eduardo Dutra-de-Oliveira* Sônia Ventura Carrillo** Carlos Alberto Nogueira de Almeida** Resumo -A manifestação de diversos órgãos médicos contra a abertura de novas escolas de Medicina no país nos levou, como responsáveis pela implantação da nova Faculdade de Medicina da Universi- dade de Ribeirão Preto (UNAERP), a discutir essa problemática. Concordamos com a posição de ser contra a abertura indiscriminada de novas faculdades de Medicina. Somos, por outro lado, a favor da abertura de algumas que tenham propostas bem fundamentadas e obedeçam as atuais recomen- dações mundiais e nacionais existentes sobre o assunto. Mas somos, também, a favor do fechamento ou renovação daquelas escolas com comprovada incapacidade em formar médicos. O artigo detalha a proposta e a filosofia do nosso novo curso de Medicina na Universidade de Ribei- rão Preto -UNAERP. Ele visa formar o médico generalista e dá ênfase a conhecimentos, habilidades e atitudes, à responsabilidade do aluno no seu próprio aprendizado, ao humanismo e ao respeito às pessoas e aos pacientes. Acreditamos que este projeto pode, muitas vezes, ser mais facilmente implan- tado em uma nova estrutura de ensino do que nas escolas tradicionais. Nós, educadores, devemos mostrar como se podem criar novos cursos elou recuperar estruturas de ensino existentes, levando-as a formar médicos em quantidade necessária e com os padrões de quali- dade profissional que todos desejamos. o~,"wm"""'--~M""/';'i","I"'!J".J"c 'i"" . .INTRODuçAO ~~~'o~~ ~MW~ ~"'" ou "Novas Escolas Médicas fazem mal à Saúde(2)", aos quais ',;, "' '- ; i., nos referiremos posterionnente. A expansão do Ensino Superior no Brasil e particular- Como estamos participando, a convite, de um novo mente a abertura, nos últimos 3-5 anos, de várias escolas de Curso de Medicina na Universidade de Ribeirão Preto este , Medicina em nosso país têm trazido uma onda de protestos artigo é também lastreado em mais de 40 anos de ensino e de órgãos representativos da classe, como o Conselho Federal pesquisa médica em regime de dedicação integral à docência e Regional de Medicina, a Associação Médica Brasileira e a e à pesquisa, na Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Associação Paulista de Medicina. Essas manifestações se ba- seiam no já excessivo número de profissionais na área (quan- Trabalho realizado noCurso deMedicina daUniversidade deRibeirão Preto. tidade acima da recomendada por organismos internacionais), * Professor titular e coordenador do Curso deMedicina daUniversidade de como também, embora em menor ênfase no inadequado pre- Ribeirão Preto -(UNAERP). Professor titular (Apos.) e diretor daFaculda- d édi . d ., I " . fi . al da dedeMedicina de Ribeirão Preto -USP -1978-82. paro os m cos para o eseJave exerC1ClO pro SS10n ** Professores doutores do Curso deMedicina daUniversidade deRibeirão Medicina (qualidade do profissional). Recentemente, um novo Preto -(UNAERP). alerta sobre o problema da abertura de novas escolas médicas Endereço para correspondência: Prof.Or. José Eduardo Dutra-de-Olivei- fi .., -"ra -Curso de Medicina da Universidade de Ribeirão Preto -(UNAERP) - 01 divulgado pelos orgaos de classe, sob os nomes de Por Av. CostábiIe Romano, 2201-TeI.: (16) 603-6795 -Fax: (16) 603-6794 - que somos contra a abertura de novos Cursos de Medicina{3)" CEP14096-380 -RibeirãoPreto -SP -E-mail: [email protected] PEDIATRIAMODERNA -VOL. XXXIX -N' 5 -MAIO/2003 153

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~--- OCopyrightMoreiraJr.Editora.

:' r=r(~~rrll[C rl'jlr=r~![~[IJ Todos os direitos reservados.

o papel de novas escolas de Medicinano ensino médico do Brasil

The role Df new medical schools in lhe teaching Df Medicine in Brazil

Unitermos: novas escolas de Medicina, avaliação das escolas médicas, implantação do curso médico.Uniterms: new medical schools, evaluation 01 medical schools, implementation 01 medical course.

José Eduardo Dutra-de-Oliveira*

Sônia Ventura Carrillo**

Carlos Alberto Nogueira de Almeida**

Resumo -A manifestação de diversos órgãos médicos contra a abertura de novas escolas de Medicina

no país nos levou, como responsáveis pela implantação da nova Faculdade de Medicina da Universi-

dade de Ribeirão Preto (UNAERP), a discutir essa problemática. Concordamos com a posição de ser

contra a abertura indiscriminada de novas faculdades de Medicina. Somos, por outro lado, a favor

da abertura de algumas que tenham propostas bem fundamentadas e obedeçam as atuais recomen-

dações mundiais e nacionais existentes sobre o assunto. Mas somos, também, a favor do fechamento

ou renovação daquelas escolas com comprovada incapacidade em formar médicos.

O artigo detalha a proposta e a filosofia do nosso novo curso de Medicina na Universidade de Ribei-

rão Preto -UNAERP. Ele visa formar o médico generalista e dá ênfase a conhecimentos, habilidades

e atitudes, à responsabilidade do aluno no seu próprio aprendizado, ao humanismo e ao respeito às

pessoas e aos pacientes. Acreditamos que este projeto pode, muitas vezes, ser mais facilmente implan-

tado em uma nova estrutura de ensino do que nas escolas tradicionais.

Nós, educadores, devemos mostrar como se podem criar novos cursos elou recuperar estruturas de

ensino existentes, levando-as a formar médicos em quantidade necessária e com os padrões de quali-

dade profissional que todos desejamos.

o~,"wm"""'--~M""/';'i","I"'!J".J"c 'i"" .

.INTRODuçAO ~~~'o~~ ~MW~ ~"'" ou "Novas Escolas Médicas fazem mal à Saúde(2)", aos quais',;, "' '- ; i.,

nos referiremos posterionnente.A expansão do Ensino Superior no Brasil e particular- Como estamos participando, a convite, de um novo

mente a abertura, nos últimos 3-5 anos, de várias escolas de Curso de Medicina na Universidade de Ribeirão Preto este,Medicina em nosso país têm trazido uma onda de protestos artigo é também lastreado em mais de 40 anos de ensino e

de órgãos representativos da classe, como o Conselho Federal pesquisa médica em regime de dedicação integral à docência

e Regional de Medicina, a Associação Médica Brasileira e a e à pesquisa, na Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão

Associação Paulista de Medicina. Essas manifestações se ba-

seiam no já excessivo número de profissionais na área (quan- Trabalho realizado no Curso de Medicina da Universidade de Ribeirão Preto.tidade acima da recomendada por organismos internacionais), * Professor titular e coordenador do Curso de Medicina da Universidade de

como também, embora em menor ênfase no inadequado pre- Ribeirão Preto -(UNAERP). Professor titular (Apos.) e diretor da Faculda-d édi. d ., I " . fi . al da de de Medicina de Ribeirão Preto -USP -1978-82.

paro os m cos para o eseJave exerC1ClO pro SS10n ** Professores doutores do Curso de Medicina da Universidade de Ribeirão

Medicina (qualidade do profissional). Recentemente, um novo Preto -(UNAERP).alerta sobre o problema da abertura de novas escolas médicas Endereço para correspondência: Prof. Or. José Eduardo Dutra-de-Olivei-fi .., -"ra -Curso de Medicina da Universidade de Ribeirão Preto -(UNAERP) -01 divulgado pelos orgaos de classe, sob os nomes de Por Av. CostábiIe Romano, 2201 -TeI.: (16) 603-6795 -Fax: (16) 603-6794 -

que somos contra a abertura de novos Cursos de Medicina{3)" CEP 14096-380 -Ribeirão Preto -SP -E-mail: [email protected]

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o papel de novas eS<Olas de Medicina no ensino médico do Brasil

vezes essa titulação, obtida dentro das normas atuais de pós- que os alunos copiaram e entenderam do que o professor

graduação existentes, nem sempre garanta o melhor ensino/ transmitiu, do que o raciocínio, a reflexão e a análise crítica

aprendizado dos alunos. Queremos desde já salientar que con- do que é ensinado e aprendido (O Provão comprova clara-sideramos o envolvimento de alguns médicos sem mestrado mente esta falta de interiorização e de fixação do conheci-

ou doutorado, mas com seus 20, 30 ou mais anos de prática mento, pois mostra que os alunos não são capazes de res-

clínica na comunidade e aliados ao interesse no ensino, um ponder a perguntas sobre disciplinas nas quais já foram an-

apoio muitas vezes maior ao aprendizado dos alunos do que teriormente aprovados e são reprovados em testes formula-

muitos recém-pós-graduandos. Estes, em geral, são mal pre- dos por professores que não aqueles que lhes ministraram

parados para ensinar e têm pouca experiência prática. Procu- anteriormente o mesmo assunto).

ramos e defendemos, assim, a participação de médicos não O nosso programa de ensino/aprendizado é, em diver-

titulados, mas com a experiência clínica retrocitada como um sos aspectos, diferente do das escolas convencionais, uma

salutar reforço ao aprendizado dos alunos. vez que ele é coordenado, articulado e integrado pela Equi-

Aos alunos, futuros médicos, futuros profissionais, é pe do Núcleo de Aprendizagem Assistida e não por departa-enfatizada sempre a sua responsabilidade no seu próprio mentos autônomos e soberanos. Ele é centralizado no curso

aprendizado. Eles são estimulados a aprenderem a aprender, como um todo e não em programas de departamentos in-

à auto-aprenderem, a se tomarem aprendizes contínuos du- dependentes. Como acentuamos, o programa é coordenado e

rante toda a sua vida. Criamos uma "Oficina de Aprendiza- centralizado pela Faculdade e não mais por cada um dos de-

gem VIrtual", onde os alunos treinam inglês técnico-científi- partamentos que atualmente são os responsáveis diretos pelas

co e informática médica. Ela é aberta e utilizada diariamente diferentes disciplinas, ementas, exames, avaliação dos alunos,

por todos os alunos, de todas as etapas do curso. Ela facilita e notas etc. No nosso caso, essas atribuições são do curso e do

estimula os alunos a compreenderem que inglês e informática núcleo de ensino e aprendizagem. Não existindo departamen-

são ferramentas indispensáveis e fundamentais à atualização tos, os professores devem participar de diversas fases do ensi-

e ao exercício profissional dos futuros profissionais. no, com funções bem determinadas e em diferentes etapas do

Recursos pedagóg.icos modernos, como aprendizado ba- curso, integradas em propostas coordenadas.

seado em problemas, aprendizado fundamentado em evidên- No que diz respeito à infra-estrutura física utilizada para

cias e aprendizado individual assistido (onde diferenças pes- o curso, como salas de aula e laboratórios, elas existem

soais de certos alunos requerem atenção especial para o apren- intramuros, abrangendo a maiori~ das atividades básicas. Por

dizado), vão sendo introduzidos no decorrer do curso com o outro lado, as atividades extramuros ou comunitárias são

apoio de um Núcleo de Aprendizagem Assistida. Este último, desenvolvidas desde a primeira etapa do curso, utilizando

substitui, em relação ao ensino, os tradicionais departamen- creches, escolas, indústrias, centros comunitários e unida-

tos, que foram abolidos de nossa estrutura. O núcleo inclui des básicas de saúde, permitindo a farniliarização dos estu-

pessoal médico, pedagogos, sociólogos e outros profissionais dantes com o meio onde exercerão suas atividades profissi-envolvidos e interessados no ensinar/aprender dos alunos e onais futuras. Nesses locais os alunos, além de contatos hu-

no desempenho dos professores. Papel importante desse gru- manos, desenvolvem práticas elementares, como avaliações

po é o acompanhamento do aprendizado dos alunos, nos quais socioeconômicas, antropometria, medidas da pressão arte-

também introduzimos inovações no sistema de avaliação. rial etc. Procura-se apresentar aos alunos a comunidade "nor-

Na avaliação, além das notas dos professores, obtidas mal", do ponto de vista físico, psíquico e social, nos dois

através dos exames tradicionais, desde o 10 semestre do nosso primeiros anos do curso. Em seguida, utilizamos outros dois

curso incluímos a valorização de atividades extracurriculares anos enfatizando o treinamento com pacientes em ambula-I e submetemos os alunos a repetidos testes de conhecimen- tórios/hospitais e centralizando o trabalho em hospitais/co-

tos gerais, preparados por docentes que não ministraram a munidade nos últimos dois anos do curso. A proposta, des-

matéria no curso regular, com o objetivo de acompanhar o de o início do curso, é ser comunitário e não hospitalo-

desenvolvimento cognitivo do aprendizado de todos os alu- cêntrico, utilizando como campo de ensino/aprendizagem a

nos, nas diversas etapas do curso. Este exercício inclui per- comunidade com toda a sua estrutura domiciliar e médico-

guntas de todas as disciplinas do curso médico, num forma- assistencial disponível, inclusive hospitais.

to que depois foi utilizado pelo CINAEM e é elaborado por Desde o início do curso até o 60 ano o programa inclui

diversos professores. Procuramos com isso descaracterizar, um forte conteúdo de Medicina comunitária e domiciliar.

dessensibilizar os alunos ao impacto dos tradicionais exa- Este é desenvolvido concomitantemente a estudos de ciên-

mes parciais e finais. Estes últimos medem muito mais o cias sociais e humanas de importância para a Medicina (an-

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o papel de novas escolas de Medicina no ensino médico do Brasil

tropologia, sociologia, psicologia), ao lado do conteúdo bi- do que vem sendo apregoado pelas recentes e modernas ten-

ológico tradicional (anatomia, histologia, bioquímica, para- dências do ensino médico(4). Têm como peculiaridade o fato

sito etc.), contribuindo todos juntos para a formação bio- de que nossa experiência já vem sendo implementada há

psicossocial dos nossos alunos. mais de três anos, antes mesmo que outros grupos se mani-

festassem formalmente sobre o assunto. Salientem-se os se-

R CARAaERlmCAS DO PROFISSIONAL MÉDICO PRO- guintes aspectos:POSTO .Ensino e pratica médica centrados nas necessidades do

indivíduo e da comunidade;Com base na proposta de formação do médico .Contato continuado entre professores, alunos e indivíduos,

generalista, comunitário, com uma visão integral e humanista como parceiros no processo de construção do conheci-

das pessoas, queremos acentuar que o perfil que visualizamos mento;para os nossos futuros profissionais é bastante claro, como .Ciências básicas como complemento permanente ao

apresentamos anteriormente(12). É semelhante ao que vem aprendizado do exercício da profissão;sendo defendido recentemente pela Comissão lnterminis- .Conteúdos curriculares selecionados através de critérios

terial de Avaliação do Ensino Médico (CINAEM), tais como: éticos, humanísticos e potencialidade de prevenção pri-

.Formação ética, humanística e científica para identificar, mária; icom objetividade e precisão, as necessidades dos indiví- .Avaliação continuada de conhecimentos, habilidades e '

duos e comunidades, incorporando racionalmente novos atitudes, com o objetivo de corrigir a trajetória do pro-

conhecimentos e novas tecnologias; cesso de aprendizado.

.Competência para a realização de anarnnese e constru-ção da história clínica, bem como domínio da arte e da .COMENTÁRIOS .;,;:;!-"

técnica do exame físico;.Capacidade de desenvolver raciocínio clínico de forma Não há dúvidas de que a má formação dos médicos e a

global, ábordando cientificamente os problemas em seu precária assistência médica corrente no país têm múltiplascontexto histórico, familiar, social e ocupacional; causas. Estão ligadas à quantidade de escolas médicas, à

.Proficiência na realização do estudo e empatia no cuida- qualidade do ensino oferecido por muitas delas, à má remu-

do médico imediato e continuado; neração do profissional médico e, inclusive, à inadequada.Familiaridade, competência e desenvoltura no trato de distribuição dos médicos no vasto território deste imenso

problemas comuns das diferentes especialidades médicas, Brasil Outras e múltiplas causas podem também ser apon-

nos diversos níveis de complexidade da atenção à saúde; tadas. O que nos propomos a discutir, e com mais profundi-

.Capacidade para o encaminhamento das urgências e emer- dade neste artigo, é o quanto de todos esses problemas po-gências de todas as áreas de especialidades médicas. deria estar diretamente ligado aos novos Cursos de Medici-

na e, especificamente, às novas Escolas de Medicina.

.CARAaERlsnCAs DO PROCESSO DE FORMAçAO -É preciso que se saiba que das 90 e tantas escolas médi-~ -.cas hoje existentes no Brasil, 80 e poucas foram implanta-

Os meios para se garantir a proposta de formação pro- das até 1995. Podemos então dizer que são elas, juntamente

fissional integrada se concentram na inexistência de cáte- com os responsáveis pela autorização de seus funcionamen- ,

dras nem mesmo de departamentos, mas em uma equipe tos e não as mais recentes e novas escolas, as grandes res-

coordenadora e supervisora do ensino/aprendizado no cur- ponsáveis pela excessiva quantidade e inadequada forma- 1

so médico. Como acentuamos anteriormente, ela está inclu- ção dos médicos em exercício no país. As dez ou mais novas

ída no Núcleo de Aprendizagem Assistida, que é o respon- escolas de Medicina que começaram a funcionar depois de

sável pela articulação e integração de todas as atividades 1995 ainda não formaram nenhuma turma de médicos e não

didáticas e pedagógicas do curso de Medicina. Trabalha-se podem ser antecipadamente responsabilizadas pelas crescen-

com os professores e com os alunos, com o objetivo comum tes denúncias contra os novos cursos médicos, como vêm

de coordenar e integrar o curso e de garantir instrumentos e sendo apontadas pelas nossas entidades médicas(3).

ferramentas básicas para que todos os estudantes aprendam Queremos por isso afirmar, mais uma vez, que é tão

e se tomem aprendizes contínuos e permanentes. importante tomarmos cuidado na abertura de novas escolas

Aspectos comuns desse processo formativo são apre- de Medicina, como termos a coragem de fechar aquelas quesentados a seguir. Eles também não diferem substancialmente não ofereçam ou não consigam adaptar-se ao desejável nível

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o papel de novas estolas de Medicina no ensino médico do Brasil

de fonIlação do médico de que o país está necessitando. A lizadas em diversas partes do país. Acredito que todos esta-

abertura de algumas novas escolas e a modernização e reno- mos conscientes de que o bom ensino médico pode ser me-

vação de escolas existentes com renovadas e atualizadas pro- lhorado, utilizando e aprimorando a residência médica jápostas de ensino devem ser a futura garantia de uma melhor existente no país. Achamos, também, que a parte do treina-

qualidade do novo profissional médico. Este deve responder mento hospitalar não requer necessariamente o enOnIle e tra-

às necessidades atuais e futuras da assistência médica que a dicional Hospital das Clínicas, com as suas centenas de leitos

comunidade reclama. Inclua-se nisto a vigilância e a partici- e avançada tecnologia. Hospitais comunitários, com a devida

pação ativa de Conselhos e Associações Médicas, para que se supervisão de docentes bem preparados, podem complemen-garanta o desejável padrão de ensino médico em todo o país. tar o treinamento do recém-doutor no setor hospitalar.

Não é mais possível pensar que a existência de detenninado Não podemos, antes de terminar, deixar de fazer refe-1número de médicos (e não de professores de Medicina) e de rência a dois questionáveis requisitos exigidos pelo Minis- l

um hospital sejam suficientes para se implantar uma nova es- tério de Educação e Cultura. Um é a necessidade da existên- 1Icola de Medicina, como se fazia anterionIlente. cia de uma biblioteca altamente especializada, na qual li- I'

;.O fato é que, dentro desse paradigma moderno de ensi- vros e dezenas de revistas indexadas/especializadas devam '

no/aprendizagem, salientamos que novas escolas de Medi- estar à disposição dos alunos de Graduação do Curso Médi-

cina, apoiadas em modernos conceitos do ensino médico, co e "sem a qual não se fonIlariam médicos". Ora, na época

não podem ser previamente discriminadas e acusadas de não da comunicação, da infonIlática, exigir que um aluno de

terem capacidade de fonIlar profissionais de boa qualidade. graduação tenha à disposição uma biblioteca e leia, para o

Muitas vezes quero acreditar que algumas delas podem ter seu aprendizado de graduação, revistas especializadas como

até melhores condições de fonIlar um bom médico do que o New England Joumal of Medicine, o Joumal of Obstetrics

escolas existentes que sabemos, comprovadamente, não es- and Gynecology ou outras revistas que publicam artigos ultra-

tarem fonIlando bem os seus alunos. Acredito que as Asso- especializados, que publicam nas sua páginas os últimos

ciações Médicas garantiriam menor quantidade de médicos avanços de suas respectivas especialidades, é no mínimo

e melhor quâlidade da assistência médica se imediatamente querer muito. Vamos ensinar nossos alunos a lerem cons-

começassem a colaborar com propostas sérias de ensino tantemente livros -textos (hábito que não têm) e saibam da

médico nas novas e velhas escolas de Medicina, apoiando- existência e do que é publicado nas revistas especializadas.as e fiscalizando-as com regras e nOnIlas bem definidas. Ao mesmo tempo, é mais importante e cada vez mais dispo-

Não há dúvida de que tanto o Provão como o CINAEM, nível saberem usar a Internet, na medida em que as novida-

sem serem perfeitos, já estão contribuindo para a melhoria do des e os artigos mais recentes estarão cada vez mais dispo-

ensino médico no país. O Provão deveria ser aperfeiçoado e níveis n~sse meio de infonIlação e não só nas bibliotecas,ser realizado para todas as etapas do curso médico, o que já mas também em qualquer casa, consultório e hospital do

estamos fazendo na nossa Faculdade de Medicina da Univer- país. A Internet pode fornecer aos alunos infonIlações atua-

sidade de Ribeirão Preto. O CINAEM deveria passar a fazer lizadas de tudo o que está acontecendo no mundo médico,

menos discussões-reuniões, oferecendo mais apoio didático- nas mais diferentes especialidades. Mais importante, então,pedagógico direto e localmente aos novos e antigos cursos do que ter acesso manual às últimas revistas é exigir e ter

médicos. Diga-se de passagem que os defensores do CINAEM, acesso aos atuais meios de obter infonIlações virtuais.

que tanto criticaram o Provão por avaliar apenas a memória, o Outro aspecto a ser renovado e avaliado é a nossa de-

conhecimento e não a habilidade dos futuros médicos, come- cantada pós-graduação em Medicina. É preciso, em primei-

çou suas primeiras atividades práticas pela mesma avaliação ro lugar, dizer que ela foi a responsável por um enOnIle pro-

de conhecimento como o está fazendo o Provão, estendendo- gresso no ensino e especialmente na pesquisa em Medicina.

o a todas as etapas do curso. É preciso, de qualquer maneira, Por outro lado, ela pode também ser considerada a grande

que ambos mantenham continuidade e certamente já estão responsável por afastar os melhores e mais experimentadosr contribuindo para melhorar o ensino médico no país. professores do ensino dos cursos de graduação, onde pres-r

É preciso, também, que se cuide de alguns outros as- tariam a maior e a necessária colaboração ao aprendizado

pectos que influenciam a fonIlação do profissional médico. prático e clínico dos jovens alunos. Muitas das nossas me-

Devem existir e ser exigidas Residências Médicas suficien- lhores escolas de Medicina passam, atualmente e cada vez

tes para atenderem todos os fonIlandos, de escolas antigas e mais, a fonIlar pesquisadores/investigadores e não os neces-

novas. As residências médicas precisam ter um padrão ade- sários professores de Medicina, num país que infelizmente

quado, serem autorizadas, estimuladas, implantadas e fisca- tem muito poucos locais que podem realizar pesquisa médi-

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o papel de novas escolas de Medicina no ensino médico do Brasil

ca, A pós-graduação nos moldes atuais deu e continuará dan- autorizadas a funcionar antes de 1995 e não entre as novas,

do a sua contribuição ao desenvolvimento da ciência no país, que ainda não graduaram nenhuma tunDa de médicos.

mas seria preciso que, ao lado de pesquisadores, formasse

alternativamente o especialista e o professor universitário. -SUMMARY [,:,';'J":j !11Vm".lo !I"'" ,~", ", ,'.0.""':0 :., :~m.1i.1E', l' d ' l' d ", " " "" ,..precIso preparar e lormar aca effilcamente prolessores e ,~._, -~- ~ --"~-~-'"~ ---o., .

Medicina, É preciso que nossos médicos, que queiram ensi- The authors of the present paper were invited to orga-

nar os outros a aprenderem, recebam uma adequada e ne- nize a new Medical School at the University of Ribeirão

cessária formação didático/pedagógica. Estas duas últimas Preto, Brazil. They are, in principie, against the Brazilian

formações, especialista e professor, nos atuais cursos de PG Govemment permission to open an unlimited number of

são reconhecidamente deficientes e prejudicam, sem dúvi- medical schools in the country, as is happening today, On

da, o ensino/aprendizado nas novas e velhas escolas de Me- the other hand, contrai of the situation will also require the

dicina. Não nos esqueçamos de que os títulos de Mestre e closing of the old schools that are unable to keep a desir-

Doutor não formam médicos, são os professores bem pre- able standard of teaching and training in Medicine.

parados os seus principais responsáveis, Estamos, muitas The proposal of our new medical school at the Univer-

vezes, ouvindo observações de que "diferentemente de ou- sity of Ribeirão Preto emphasizes new ways of teaching/

tras áreas, especialmente das ciências humanas, a gradua- leaming Medicine, including knowledge, skills and attitudes,

ção e especialização do médico não têm como objetivo a community training along with the responsibility of the stu-

formação do professor", ou "na maioria das vezes, o profes- dent for his own leaming. Such a project could be carried

sor de Medicina é contratado tendo-se como critério apenas out easier in a new school than in old ones.

a qualidade de seu desempenho como profissional dou pes- Following these premises it is pointed out that new medi-

quisador e não como professor"(!). cal schools, with a limited number of students, well trained

Fica, por outro lado, sendo um contra-senso no Brasil o professors and the needed community facilities would im-

fato de que as melhores e maiores escolas de pós-graduação prove the teaching of the students and could be useful alter-

sejam sistemàticamente contrárias à abertura de novas esco- native for a better and new quality program of preparing

Ias médicas. Elas continuam investindo em programas de physicians in Brazil. It should always be kept in mind that

pós-graduação e treinando os seus alunos a serem pesquisa- allowing the opening of some and closing of other medica I

dores e a publicarem seus trabalhos em revistas indexadas. schools or the removal of their teaching programs should

Por outro lado, não podem contratar todos os seus pós- be par! of this proposal.

graduandos; onde esperam, então, que os seus alunos pos-

sam exercer suas atividades futuras? Em uma primeira fase -REFERÊNCIAS BIBUOGRÁFICAS

têm de fazê-Ia necessariamente no ensino, sem deixar de

fazer al guma po ssívelPes q uisa. t. Batista.. N. A.; Silva, S.H.S.: A função docente em ~edicina e a formação/

educaçao permanente do professor. Rev. Bras. Educ. Med. 22(2/3):31, 1998.Concluindo, consideramos que o ensino médico no Bra- 2. Cremesp. "Novas escolas de medicina fazem mal à saúde". Publicação avulsa

" " .do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo, do AssociaçãoSIl podera ser melhorado SubstancIalmente e a médio prazo Paulista de Medicina e dos Sindicatos Médicos do Estado de São Paulo, 1999.com o ap roveitamento imediato de recursos humanos J' á dis- 3. Cre~esp.: "Porque somos contra a. abertura de .n?vos cursos de M:dicina".

Publicaçao avulsa do Conselho Regional de Medicrna do Estado de Sao Paulo,poníveis, em estruturas onde o ensino/aprendizado seja sé- ~Associação Paulista de Medicina e dos Sindicatos dos Médicos do Estado de

.' d d .. d d E'. 1 d ' Sao Paulo, 1999.noeconSI era opnon a e, precIso, por outro a o,eXl- 4. Cruz, E.M.T.N. Formando médicos dapessoa-O resgate das relações médico-

, ta d .- tuali - d . todas paciente e professor-aluno. Rev. Bras. Educ. Med. 21(2/3):22, 1997.glf es mo ernlzaçao e a zaçao o ensmo em as 5. Outra de Oliveira,J. E.. Assistência médica e ensino médico emShangai, Cbina.

escolas existentes incluindo as velhas É preciso impedir J. do Assoc. Med. Bras. 01104: 5-5,1980.~ '. 6. Outra de Oliveira, J. E.. O plano de ensino médico da PUC de Campinas. J. do

que escolas que nao tenham recursos humanos qualificados ASsoc. Med. Bras. 07/12: 7-8, 1976..nfr ári . / di d .7. Outra de Oliveira, J. E.. Plano de ensino médico na Faculdade de Botucatu, eme 1 a-estruturas necess as ao ensmo apren za o conu- São Paulo, Rev. Assoc. Med. Bras. 12(8):323-330, 1966.

nuem funcionando. É de se esperar que novas escolas, pú- 8. OutradeOliveira,J.E.;Câmera,A.;M~,M.L.;Rossato,~.J:;Souza,~.;Rezende, T. A.; Moura, J. L. A.; Montelli, A.C. Uma expenencla de ensmo

blicas ou particulares, nascidas dentro de um espirito sério e médico formativo na Faculdade de Botucatu, Rev. Assoc. Med. Brasil. 13(8):.., ..' d fu .406-408,1967.

umversItáno Sejam autonza as a ncIonar, com pequenas 9. Outra de Oliveira, J.E. Desafios da Medicina, Revista Revide. Ribeirão Pretu,

tunDas de alunos e métodos modernos de ensinar/a p render;10 l OullO4tra: 3d-5' ol li~: J E A d d . d edi .., . .e velfa,... pren en o e ensman o m cma -expenenclas

caso contrário, devem ser fechadas. Agora é preciso que se nacionais e os "Novos Caminhos" da Harvard. Rev. Assoc. Med. Bras. 37(3),

- fu " dad 127-131,1991. Iacentue, ao encerrar e para nao glf a ver e, que presen- li. Outra de Oliveira, J.E.. Educação médica e assistência médica. A Faculdade de "

temente a maioria das escolas com excessivo número de alu- Medicina do Deserto, Israel.l':ev..Assoc. Med. Bras. 39(4): 194-196,1993. ';

12. Femandes, M.E.; Outra de Oliveira, J.E.: Em busca de novas propostas para o :

nos e inadequada formação de médicos estão entre aquelas ensino médico-contribuições das Ciências Sociais. Medicina 31: 456-459, 1998.

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