o icms e os serviÇos de comunicaÇÃo destinados...

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1 O ICMS E OS SERVIÇOS DE COMUNICAÇÃO DESTINADOS AO EXTERIOR Sonia Maria de Oliveira Pirajá 1 1-Introdução 2- Breve digressão histórica 3- Serviços de comunicação destinados ao exterior posições doutrinárias 4- Sistema tributário e a denominação econômica 5- Conceito de prestação de serviço nas telecomunicações 6- Os serviços de comunicação na modalidade longa distância e a EC nº 42/03 7- Telecomunicações como serviço redes e sistemas 8- Responsabilidade pelo recolhimento. 9- Considerações finais. 1. INTRODUÇÃO Os serviços de comunicação experimentaram, ao longo dos últimos anos, uma transformação estrutural, cuja essência situa-se no rompimento da idéia monopolista na exploração dessa atividade, dando lugar à exploração em regime de competição privada, ensejando o surgimento de grandes operadoras de serviços de telecomunicações, tanto na telefonia local como de longa distância. Viu-se, assim, a passagem das telecomunicações como monopólio público para a esfera de concorrência regulada, atribuindo aos particulares o direito de exercício dessas atividades, mediante concessões, permissões ou autorizações, sob permanente controle estatal. 1 Procuradora do Estado de São Paulo desde 1991, em exercício na Procuradoria Fiscal, Especialista em Direito Tributário pela PUC/SP, Especialista em Direito do Estado pela Escola Superior da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo, Monitora em Direito Tributário junto à Escola Superior da PGE Tributário, e-mail [email protected].

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O ICMS E OS SERVIÇOS DE COMUNICAÇÃO DESTINADOS AO

EXTERIOR

Sonia Maria de Oliveira Pirajá1

1-Introdução 2- Breve digressão histórica 3- Serviços de comunicação destinados ao

exterior – posições doutrinárias 4- Sistema tributário e a denominação econômica 5-

Conceito de prestação de serviço nas telecomunicações 6- Os serviços de

comunicação na modalidade longa distância e a EC nº 42/03 7- Telecomunicações

como serviço – redes e sistemas 8- Responsabilidade pelo recolhimento. 9-

Considerações finais.

1. INTRODUÇÃO

Os serviços de comunicação experimentaram, ao longo dos últimos anos, uma

transformação estrutural, cuja essência situa-se no rompimento da idéia monopolista na

exploração dessa atividade, dando lugar à exploração em regime de competição privada,

ensejando o surgimento de grandes operadoras de serviços de telecomunicações, tanto na

telefonia local como de longa distância.

Viu-se, assim, a passagem das telecomunicações como monopólio público para a

esfera de concorrência regulada, atribuindo aos particulares o direito de exercício dessas

atividades, mediante concessões, permissões ou autorizações, sob permanente controle estatal.

1 Procuradora do Estado de São Paulo desde 1991, em exercício na Procuradoria Fiscal, Especialista em Direito

Tributário pela PUC/SP, Especialista em Direito do Estado pela Escola Superior da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo, Monitora em Direito Tributário junto à Escola Superior da PGE – Tributário, e-mail [email protected].

2

Assim, as empresas de telecomunicações angariaram largo espaço de atuação e

obtenção de receitas; criaram mecanismos de execução e comercialização de suas atividades,

baseadas em redes de serviços de telecomunicações alheias, conjuntamente com suas próprias

redes.

Na mesma proporção passaram a responder por considerável cifra na arrecadação

do ICMS. No entanto, os Estados estão enfrentando inúmeras controvérsias sobre a tributação

incidente nas telecomunicações, especialmente no que tange à modalidade de longa distância,

discutindo-se: (i) a hipótese de incidência do ICMS na prestação de serviços de comunicações

iniciados no Brasil e concluídos no exterior; (ii) se as prestadoras locais, utilizando-se de

redes comutadas de terceiros, responderiam por esse tributo.

Desta forma, o objeto do presente estudo é examinar a incidência do Imposto

sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre os serviços destinados ao exterior,

tendo em vista o art. 155, § 2º, X, “a” da CF, com nova redação dada pela EC nº 3, de

17.03.1993 e EC nº 42, de 19.12.2003, bem como o art. 3º, II e 32 da LC nº 87/96.

Palavras chave: ICMS na modalidade longa distância, responsabilidade pelo imposto,

exploração industrial.

2. BREVE DIGRESSÃO HISTÓRICA

A Constituição Federal previu a competência dos Estados para instituir imposto

sobre operações relativas à circulação de mercadorias e serviços de transportes interestadual e

intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no

exterior ( art. 155, II da CF/88).

No art. 155, § 2º, inciso X, alínea a, da CF/88, estabeleceu-se que o ICMS não

incidiria sobre as operações que destinassem ao exterior produtos industrializados (excluídos

os semi-elaborados definidos em Lei Complementar) sem fazer nenhuma menção aos serviços

de comunicação. No entanto, ao dispor no inciso XII do par. 2º do art. 155, que a Lei

Complementar definiria os elementos de incidência do ICMS, a CF/88 possibilitou a exclusão

da incidência do imposto à exportação de serviços para o exterior.

3

Com fundamento no art. 34, par. 8º do ADCT da CF/88 sobreveio o

Convênio ICM nº 66/88, que estabeleceu todas as regras necessárias à incidência do imposto,

sem, no entanto, dispor sobre a não-incidência do ICMS nas exportações de serviços ao

exterior. Na vigência desse Convênio, foi editado outro Convênio (nº 04, de 21.02.1989),

onde, na cláusula terceira, determinou o recolhimento do Estado em que situasse o

equipamento terminal da operadora.

Seguindo essa sistemática, em 29.03.1994, foi editado o Convênio ICMS nº

27/94, determinando a redução da base de cálculo do ICMS na prestação de serviços de

telecomunicações internacionais para 13% (treze por cento).

Finalmente em 13.09.1996, editou-se a LC nº 87/96, que dispôs:

Art. 3º O imposto não incide sobre:

(...)

II – operações e prestações que destinem ao exterior mercadorias, inclusive

produtos primários e produtos industrializados semi-elaborados, ou serviços:

(...)

Art. 32. A partir da data da publicação desta Lei Complementar:

I – o imposto não incidirá sobre operações que destinem ao exterior mercadorias,

inclusive produtos primários e produtos industrializados semi-elaborados, bem

como sobre prestações de serviços para o exterior.

Em 1998, sobreveio outro Convênio (nº 126), revogando o Convênio ICMS

04/89, ao dispor sobre questões relativas à incidência do ICMS nos serviços de comunicações.

Da mesma forma o Convênio nº 07/2000, revogou a redução da base de cálculo imposta nas

ligações internacionais.

Feita esta breve digressão, temos que a matéria está veiculada, na

atualidade, perante as regras do art. 3º, inciso II, e 32, inciso I, da LC nº 87/96, em

consonância com a regra matriz de competência estatuída no nosso texto constitucional ( art.

155, II e X, a da CF/88), com nova redação dada pela EC nº 3, de 17.03.1993 e EC nº 42, de

19.12.2003.

4

3- SERVIÇOS DE COMUNICAÇÃO DESTINADOS AO EXTERIOR –

POSIÇÕES DOUTRINÁRIAS

O tema em questão é objeto de divergências doutrinárias, onde a primeira

corrente chamada de subjetiva sustenta a aplicação desses dispositivos somente se e quando

o tomador do serviço de comunicação (o contratante e não o destinatário da ligação) estivesse

localizado no exterior. Por sua vez a segunda corrente, denominada de objetiva, aduz em seu

abono, a aplicabilidade desses dispositivos também quando o tomador estivesse aqui situado e

sua ligação destinasse ao exterior.

A primeira corrente, subjetiva, encontra seu fundamento de validade no

aspecto subjetivo e geográfico, ou seja, o ponto situado no exterior vale apenas para

caracterizar o serviço como de longa distância internacional. Isto porque o tomador do

serviço está se servindo de uma linha telefônica situada no Brasil, e a operadora coloca à

disposição os meios necessários para que a comunicação se estabeleça e o usuário dela se

utiliza, independentemente se este está no País ou fora dele.

Seguindo essa corrente a Procuradoria da Fazenda Nacional editou o

Parecer PGFN-CAT nº 381, de 08.04.99, a saber:

“(...) não podemos dizer que há uma prestação de serviço destinada ao

exterior. A ligação telefônica é que tem como destinatário alguém fora do território

nacional, mas essa prestação se dá internamente. O tomador do serviço é quem está

utilizando a linha telefônica paga, no Brasil, mais especificamente na unidade federada de

onde a ligação é originária, o valor correspondente a toda prestação e à empresa ( ou

empresas – já que, dependendo da origem da ligação, ela pode ser efetivada pelas

diferentes companhias telefônicas que exploram internamente os serviços de

comunicações) operadora, que coloca a disposição do usuário todo o aparato para que a

comunicação ocorra, presta um serviço ao tomador que está localizado no País. O

destinatário da ligação não participa desta relação jurídica, então formada entre tomador e

prestador do serviço de comunicação, nem lhe é prestado qualquer serviço. A referência

feita quanto ao ponto situado no exterior vale apenas para caracterizar o serviço como

5

longa distância internacional, pois somente quando houver a interligação entre dois

pontos situados, um no Brasil, e outro no exterior, a comunicação se realiza”.

Já a segunda corrente, nominada de objetiva, parte do pressuposto de que a

LC nº 87/96, no art. 3º, inciso II, impede a incidência do ICMS, que a matéria é

exclusivamente jurídica e não econômica. Neste sentido Ives Gandra da Silva Martins:2

“como se percebe, os dois serviços (transportes e comunicações)

sujeitos ao ICMS, mesmo que iniciados no Brasil, se concluídos no exterior, não estão

sujeitos ao ICMS. Tanto o transporte que inicia no País e é concluído no exterior, quanto

a comunicação cujo usuário final está no exterior, não podem estar sujeitos ao ICMS (...)

E, a partir da LC nº 87/96, quanto aos serviços iniciados no Brasil e

concluídos no exterior, o próprio art. 3º, inciso II, impede a incidência do ICMS, repita-

se, sobre os únicos dois serviços outorgados à competência impositiva dos Estados”

No entanto, a interpretação que está sendo dada com fito de excluir a

incidência do ICMS na prestação de serviços de comunicação internacional encontra

obstáculos nas premissas básicas do sistema tributário brasileiro e que serão de forma

sintética a seguir abordadas.

4. SISTEMA TRIBUTÁRIO E A DENOMINAÇÃO ECONÔMICA

A primeira premissa que podemos extrair do nosso sistema tributário é a

unidade do sistema onde as entidades políticas federadas não são só autônomas, mas

integrantes da República Federativa. Isto ocorre porque as normas nacionais “valem para todo

o território nacional, alcançando todas as pessoas que nele estejam e que são de cumprimento

obrigatório pelos Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios”.3

Ainda, como complemento dessa unidade, encontramos uma hierarquia de

leis tributárias e a não admissibilidade de invasão de competência tributária ou subtração de

receitas por meio de isenções não autorizadas.

2 Revista Dialética de Direito Tributário n. 73/159

6

A outra premissa básica do sistema tributário nacional é a discriminação

constitucional de rendas tributárias através de impostos denominados pelo seu objeto

econômico.

De fato, os impostos no sistema tributário nacional são denominados por

expressões econômicas, fundamentadas em figuras da microeconomia. A nomenclatura dos

impostos deixou de ser jurídica (de termos jurídicos) para ser econômica (de termos

econômicos), como se vê agasalhado na forma de agrupamento dos impostos no nosso

sistema tributário, a exemplo, impostos sobre patrimônio e renda; impostos sobre produção e

circulação e etc.

Daí o primeiro contraponto na interpretação sobre a matéria, com referência

ao ICMS na prestação de serviços de comunicação, onde vê-se que o objeto relevante é o

fator econômico e não definição exclusivamente jurídica.

Sob a perspectiva do direito financeiro, tributo é uma receita derivada, que

advém do patrimônio do particular para fazer frente às despesas do Estado. Assim, já nos

ensinava Geraldo Ataliba “a receita derivada provém do patrimônio do particular. É o

tributo”.4

Do acima exposto temos que o sistema constitucional tributário é sem

dúvida um sistema de tributação, onde a própria Constituição aponta as competências

tributárias privativas de cada pessoa política. Isso significa que nenhuma norma

infraconstitucional, pode ir além ou aquém dos marcos constitucionais.

Roque Antonio Carrazza preleciona que “por exigência do princípio

federativo, nem a União pode invadir a competência tributária dos Estados, nem estes a da

União .... é defeso apossarem das competências tributárias uns dos outros. Demais disso, a

União não pode estipular – nem mesmo por meio de lei – como os Estados exercitarão suas

3 OLIVEIRA, Regis Fernandes: HORVATH Estevão. Manual de direito financeiro. 5. Ed. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2002, p. 27. 4 OLIVEIRA, Regis Fernandes: HORVATH Estevão. Manual de direito financeiro. 5. Ed. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2002, p. 35-36.

7

competências tributárias, que este é tema acerca do qual eles próprios, com a autonomia que

possuem, devem decidir”.5

Somando-se essas assertivas, vê-se que sob o aspecto material a lei

complementar há de ficar circunscrita a determinadas matérias, com exclusão de outras. Essa

posição já foi externada pelo STF na ADI 1.789/DF. Rel. Min. Celso de Mello: “Só cabe a lei

complementar, no sistema do direito brasileiro, quando formalmente reclamada a sua edição

por norma constitucional explícita”.

Decidir se determinado serviço é tributável, ou não, em face da lei

complementar, diz respeito a “interpretação e aplicação desta lei, sem possibilidade de ofensa

à regra de competência inserta naquele preceito constitucional”.6

Assim, a exegese que se pretende atribuir a LC 87/96 (art. 3º), não encontra

respaldo no nosso ordenamento jurídico, já que o modelo de Sistema Tributário

Constitucional está baseado na repartição de competências federativas, o que impede a

subtração de receita pública, por meio de interpretação ampliativa.

5. CONCEITO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO NAS

TELECOMUNICAÇÕES

O art. 155, II, da Constituição Federal estabelece competência aos Estados e

ao Distrito Federal para a instituição do imposto sobre “operações relativas à circulação de

mercadorias e sobre prestações de serviços (...) de comunicação, ainda que as operações e as

prestações se iniciem no exterior”. Com advento da EC nº 42/03, acresceu-se nova redação ao

inciso X alínea “a”, do art. 155 da CF/88.

Por sua vez, o art. 2º, III, da LC nº 87/96, nos diz que o ICMS incide sobre

prestações onerosas de serviços de comunicação, por qualquer meio, inclusive a geração, a

emissão, a recepção, a transmissão, (...) de comunicação de qualquer natureza. O que

5 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito Constitucional tributário. 2004. Malheiros Editores, p. 901.

6 TRIGUEIRO, Min. Oswaldo: RT, vol. 456, p. 289

8

demonstra que a hipótese de incidência do ICMS é a prestação a terceiros, mediante

contraprestação econômica de um serviço de comunicação.

Neste sentido Guilherme Cezaroti, nos diz que “o ICMS não incide sobe a

comunicação propriamente dita, mas sobre a colocação à disposição de outrem dos meios

necessários para que a comunicação ocorra”. 7

Mais adiante enfatiza:

“a prestação de serviço de comunicação só ocorre quando há a junção simultânea

de serviço e do processo comunicacional, de modo que a atividade a ser realizada

pelo prestador tenha como objetivo possibilitar a comunicação entre o emissor e

terceira pessoa, mediante remuneração. O emissor da mensagem é o tomador do

serviço de comunicação, que contrata o prestador para colocar à disposição os meios

que tornem possível a transmissão da mensagem ao destinatário.

O receptador da mensagem não é parte do contrato de prestação de serviço de

comunicação, mas sua presença é necessária para que ocorra a comunicação”.8

Serviço não é representado pela mera atividade, mas sim, pela atividade em

favor de terceiros, mediante paga, é o que já nos dizia o Ministro Moreira Alves “em direito, o

sentido normal da expressão serviço é atividade que se realiza para terceiros”.9 É um bem

imaterial, incorpóreo, objeto de circulação econômica.

No mesmo sentido Luciana Angeiras “presta serviço de comunicação a

pessoa que coloca à disposição os meios físicos necessários à concretização do vínculo

comunicacional”.10

Como ainda, Roque Antonio Carrazza “o serviço de comunicação tributável

por meio do ICMS se perfaz com a só colocação à disposição do usuário dos meios e modos

aptos à transmissão e recepção de mensagens”.11

7 CEZAROTI, Guilherme. Revista dialética de direito tributário nº 83, p. 47

8 Ob. Cit. p.49

9 STF, RE nº 101.339-7, AC de 14.03.84, in JSTF, Lex, vol.68, p. 280

10 ANGEIRAS, Luciana. Tributação dos provedores de acesso à Internet: O direito na era virtual. Luis Eduardo

Schoueri. Rio de Janeiro: Forense. 2001, p.236 11

CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 157.

9

Não poderia ser de outra forma, já que na hipótese de incidência de serviços

de telecomunicações, como diz Pedro Gonçalves “o serviço de telecomunicações prestado

pelo operador não tem por objeto o transporte de informações, mas o acesso a um sistema

que, por si só, efectua o transporte”.12

Conforme acima demonstrado, o processo de comunicação envolve a

transmissão de uma mensagem, por meio de um canal, emissor para o receptador, que

possuem os elementos necessários para decodificar a mensagem.

Prestação de serviço de comunicação consiste na atividade de colocar à

disposição do usuário os meios necessários à transmissão e recepção de mensagem.

Misabel Abreu Machado Derzi, nos mostra a distinção:

1. A prestação de serviços configura uma utilidade ( material ou imaterial), com execução de

obrigação de fazer e não de dar coisa;

2. Deve ser prestada a terceiro, excluindo-se os serviços que a pessoa executa em seu próprio

benefício, como transporte de mercadoria de um estabelecimento a outro da mesma pessoa;

3. Executado sem vínculo de subordinação jurídica, mas em caráter independente, razão pela qual

excluem-se os serviços prestados pelos empregados a seus empregadores e pelos serviços públicos;

4. Deve ser habitual e não meramente eventual;

5. Assim como ser objeto de circulação econômica, executado com objetivo de lucro, excluindo -se

os serviços gratuitos ou de cortesia, beneficentes ou a preços baixos, como alimentação servida a

empregados gratuitamente ou a preço de custo;

6. Finalmente, o serviço deve ser prestado em regime de direito privado ( por pessoa física ou

jurídica, empresa pública ou sociedade de economia mista): se público, haverá imunidade, exceto para

aquele serviço dado em concessão ou permissão a terceiros”13

12

GONÇALVES, Pedro. Direito das telecomunicações. Coimbra: Almedina, 1999, p. 15. 13

DERZI, Misabel, in BALEEIRO. Aliomar. Direito tributário brasileiro. Rio de Janeiro: Forense. 1999, p.49

10

6. OS SERVIÇOS DE COMUNICAÇÃO NA MODALIDADE LONGA

DISTÂNCIA E A EC Nº 42/03

A primeira observação sobre o tema consiste em que a EC nº 42/03, ao dar

nova redação ao art. 155, par. 2º, X, “a” da CF/88, não utilizou a expressão “serviços

prestados a tomadores localizados no exterior”, mas apenas “serviços prestados a destinatários

no exterior”, o que nos leva a interpretar que “destinatário no exterior” é quem recebe a

ligação e não aquele que contrata. Essa interpretação vai de encontro a definição do serviço de

ligação internacional dada pela LGT, que não atribuiu qualquer relevância à localização da

parte contratante. Assim, em face da qualificação dada pela LGT, a interpretação que venha

alterar essa definição encontra óbice no art. 110 do CTN.

Ainda, esse critério da destinação ou fluxo que se dá ao serviço, objeto do

contrato, vai de encontro com a sistemática do ICMS, na medida em que sempre se levou em

conta o “fluxo desses serviços” e não a localização das partes contratantes, como podemos

deduzir na própria interpretação histórica da tributação dos serviços de telecomunicações, na

medida em que sempre se levou em conta o fluxo desses serviços e não a localização das

partes contratantes, tal como o CTN considerava o fato gerador do antigo ISC14

; o Convênio

ICM nº 04/89 dava importância ao ponto de origem dos serviços, colocando em relevo o local

em que estava situado o equipamento terminal da operadora que auferisse receita com a

prestação de serviço.

7. TELECOMUNICAÇÕES COMO SERVIÇO – REDES E

SISTEMAS

Antes de tudo, consigne-se que redes de telecomunicações constituem

circuitos de interligação de centrais telefônicas, com finalidades de interligarem todos os

titulares de redes abertas ao publico, visando maior universalização do sistema e impedimento

de duplicidade de infra-estruturas, possibilitando a comunicação entre ausentes.

14

Imposto de Transmissão e Recebimento de Mensagem

11

A necessidade de comercialização de meios e serviços entre as redes

interligadas fez surgir a figura da “revenda”, que consiste na execução e comercialização de

atividades de telecomunicações baseadas em redes e serviços de telecomunicações alheias, em

conjunto com a gestão operacional de redes de telecomunicações próprias15

, ou seja, trata-se

de contratação de redes de terceiros, os quais da mesma forma que prestam serviços

diretamente aos seus usuários finais, podem igualmente atuar no seguimento industrial,

conforme hipótese expressa na LGT, regulada pela ANATEL sob a denominação de

“exploração industrial.16

Como se vê, o escopo da utilização de redes alheias visa alcançar maior

competitividade na prestação dos serviços de telecomunicações, em escala industrial.

Neste sentido, Helena de Araújo Lopes Xavier17

, nos diz “do ponto de vista

tributário, essas modalidades de “revenda” reconduzem-se, porém, às hipóteses típicas de

tributação, notadamente no que concerne às hipóteses de incidência tributária específicas da

prestação de serviços de telecomunicações (como é, por exemplo, o caso da contribuição para

FUST e do ICMS sobre prestação de serviços de comunicação)”.

8. RESPONSABILIDADE PELO RECOLHIMENTO

Auferir a responsabilidade pelo pagamento do tributo é tarefa a ser somada

com a adequada compreensão e qualificação dos contratos de interconexão de redes e no

correto entendimento da natureza do serviço que envolve o conceito de telecomunicação.

Por questão lógica de raciocínio, precisamos conhecer primeiramente o

conceito de telecomunicação que envolve a comunicação propriamente dita no nosso sistema

brasileiro. E a forma mais basilar é considerá-la como qualquer transmissão, recepção ou

emissão de sinais que permite a comunicação entre ausentes. Assim, as telecomunicações

prestam-se a criar sistemas complexos identificados entre “redes” a permitir a comunicação

15

XAVIER, Helena de Araujo Lopes. A tributação da “revenda” de serviços de telecomunicações. S. Paulo. Thomson. 2004, p. 255 16

Cf. arts. 154, LGT e 61, RST 17

Ob. cit. p. 260.

12

entre pessoas a distância, através “meios” próprios para tal fim.

Fala-se em meios próprios para tal fim, na medida em que toda a

comunicação pressupõe emissor, receptor, mensagem e canal de transmissão de mensagem,

que entre ausentes, o canal transmissor se perfaz com a interação de meios, é o objeto dos

chamados “serviços de comunicação”, onde, na via telefonia, são meios físicos inseridos na

forma de “ redes” ou “sistemas” denominados de “ infra-estrutura de telecomunicações”.

Neste sentido a nossa LGT (Lei nº 9.472/97) define o conceito de

“telecomunicações”, como “o conjunto de atividades que possibilita a oferta de

telecomunicação”, complementando no seu par. 1º, que “Telecomunicação é a transmissão,

emissão ou recepção, por fio, radioeletricidade, meios ópticos ou qualquer processo

eletromagnético, de símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou informações de

qualquer natureza”.

Essa disposição legal demonstra que tudo isso serve a permitir concretizar

atos de comunicação, mediante prestações de serviços próprias para tal fim. Concluindo-se

que se trata de um “meio”, um instrumento necessário para garantir o direito de comunicação

(através de redes e sistemas), ou seja, toda a comunicação via telefonia exige um complexo de

meios físicos, sob a forma de “redes” e “sistemas”, ao qual se denomina de “infra-estrutura de

telecomunicações”.

Heleno Taveira Tôrres nos ensina que “o serviço de telefonia tem por objeto

a exploração comercial do transporte endereçado de voz, em tempo real, com origem e

destino em pontos terminais da mesma rede ou, pela interconexão, com pontos terminais de

redes distintas, visando a garantir o direito de todos à comunicação. Daí o art. 60, da LGT,

definir o “serviço de telecomunicações” como sendo “ o conjunto de atividades que possibilita

a oferta de telecomunicação” 18

.

Mais adiante ressalta ”não se tome a “oferta” como simples disposição

contratual, mas como conclusão dos serviços prestados, pela disponibilidade de meios para

prover a comunicação”, ainda “Este serviço consistirá na colocação de meios suficientes e

18

TôRRES, Heleno Taveira. Direito Tributário das Telecomunicações. SP/São Paulo: Thomson –IOB. 2004, p. 311.

13

eficazes para propiciar a vontade humana de interação comunicativa.19

A própria interpretação histórica tal como a Norma nº 05/79, aprovada pela

Portaria nº 663, de 18 de julho de 1979, do Ministério das Comunicações, já tinha por

objetivo regular as condições gerais de prestação do serviço telefônico público, dispondo

sobre direitos e obrigações entre Prestadora, Usuário, Assinante e Locatário.

Essa regulamentação legal, deixa-nos perceber que o chamador, quando

fazia telefonemas, seja lá para onde fosse não mantinha relação jurídica com nenhuma outra

prestadora de serviço telefônico público que não aquela cuja área de atuação (área de

concessão) compreendia a local no qual estava instalada a linha telefônica por ele utilizada.

Assim, qualquer um que se utilizasse de uma linha telefônica, fosse para uma

chamada local, ou nacional ou internacional, mantinha relação jurídico tão-somente com a

empresa que prestava regularmente o serviço telefônico público na “localidade ou região

prestadora”. Conseqüentemente, o chamador que tirasse proveito de uma linha telefônica

instalada pela operadora local, na sua área de concessão, não importava o local para onde

seria dirigida a chamada, mantinha relação jurídica única e exclusivamente com a mesma.

Esta, por sua vez, para alcançar alguém no exterior, utilizava-se de redes

compartilhadas de outras empresas do gênero, tal qual na atualidade se diz em “revendas”, ou

seja, exploração industrial, o que configuraria incidência do imposto de ICMS, na

modalidade em questão.

Mesmo porque nos ensina ainda, Heleno Taveira Tôrres que:

“Para fins de incidência tributária, não importa, contudo, a relação entre o Estado

e as titulares de concessões ou operadoras de telecomunicações, quanto à

disponibilidade de meios, mas sim a situação jurídica das operações, no seio das

relações entre usuários e demais operadoras do tráfego local e internacional. Neste

plano, importa unicamente a efetivação dos serviços prestados (service provision),

para fins de incidência do ICMS

(....)

19

Ob. Cit. p. 312

14

Nessa última acepção, o serviço prestado consiste em permitir ao usuário “acesso

à rede”, garantido o seu uso efetivo, que pode ser feito em rede local ou mediante

interconexões, nacionais e internacionais, como exige a própria LGT, no seu art.

155: “Para desenvolver a competição, as empresas prestadoras de serviços de

telecomunicações de interesse coletivo deverão, nos caos e condições fixados pela

Agência, disponibilizar suas redes a outras prestadoras de serviços de

telecomunicações de interesse coletivo”. Mas “disponibilizar” aqui tem sentido

bem definido, de permissão para operar negócios jurídicos típicos, a título de

contratos de interconexão, para fins de prestação de serviços em favor das demais

prestadoras de serviços de telecomunicações, mediante remuneração previamente

concertada”. 20

Mais adiante, deixa claro que a relação entre as operadoras de

telecomunicações na prestação dos serviços de telecomunicações são efetivos negócios

jurídicos de interconexão, tratando-se de contratos típicos sujeito à intervenção

administrativa. Veja-se;

“A interconexão é a ligação física e funcional entre redes de telecomunicações,

constituída a partir de contratos típicos firmados entre operadoras e os titulares de

redes públicas de telecomunicações, para permitir que os usuários possam se

comunicar entre si ou acessar diferentes operadores de rede de serviços, em

reciprocidade.

Com a liberação desses serviços e fomento à livre concorrência entre as

operadoras e prestadoras de serviços dos contratos administrativos, regidos pelo

direito administrativo, passou-se aos contratos mercantis, regulados pelo direito

privado, para fins de identificação e qualificação dos contratos de interconexão de

redes de telecomunicações.”

(...)

Firmados e autorizado o Acordo de Interconexão, este gera obrigações recíprocas,

com remuneração garantida pelos mecanismos de preços de interconexão,

mediante um mecanismo de contabilidade separada de custos “.21

20

Ob. cit. p. 313.

15

9. CONSIDERAÇÕES FINAIS

1. Ao se reconhecer a existência de redes compartilhadas numa escala industrial, visando

dar suporte aos serviços de comunicação, por prestadoras licenciadas, ainda que destinados ao

exterior, admite-se a incidência do ICMS, posto que a EC nº 42/03, apenas usou a expressão

“serviços prestados a destinatários no exterior” e não a “tomadores localizados no exterior”,

o que nos faz crer que a opção do legislador foi pelo critério da localização, ou origem do

serviço prestado.

2. A intermediação de terceiros, criando meios físicos para a melhoria das relações

comunicativas, no intuito competitivo, configura a hipótese de incidência do ICMS, na

medida em que se está executando uma obrigação de fazer, com fito de lucro e na forma de

exploração industrial.

3. Para fins tributários, não importa a relação entre o Estado e as titulares de concessões

ou operadoras de telecomunicações, quanto à disponibilidade de meios, mas sim a relação

jurídica entre as prestadoras e os usuários, no sentido de permitir aos usuários “acesso à rede”,

garantido o seu uso efetivo, que pode ser feito em rede local ou mediante interconexões,

nacionais e internacionais.

4. A EC Nº 42/03, não utilizou a expressão “serviços prestados a tomadores localizados

no exterior”, da mesma forma a LC nº 87/96. Por isso a desoneração do ICMS, por meio de

interpretação ampliativa do texto, encontra óbice no sistema de repartição de competências

tributárias.

5. Atuando a prestadora (integradora ou intermediária) num sistema condominial; com

interligação de redes, tal como a nominada figura da “revenda”, mediante exercício de uma

atividade mercantil; prestando a seus clientes, a título oneroso, o serviço que possibilita a

comunicação entre ausentes, responde pelo recolhimento do imposto do ICMS.

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Ob. cit. p. 319

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10. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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virtual. Luis Eduardo Schoueri. Rio de Janeiro: Forense. 2001.

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DERZI, Misabel, in BALEEIRO. Aliomar. Direito tributário brasileiro. Rio de Janeiro:

Forense. 1999.

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OLIVEIRA, Regis Fernandes: HORVATH Estevão. Manual de direito financeiro. 5. Ed. São

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STF, RE nº 101.339-7, AC de 14.03.84, in JSTF, Lex, vol.68.

TÔRRES, Heleno, Direito tributário e direito privado. São Paulo: RT, 2003.

TRIGUEIRO, Min. Oswaldo: RT, vol. 456.

XAVIER, Helena de Araujo Lopes. A tributação da “revenda” de serviços de

telecomunicações. S. Paulo. Thomson. 2004.